Discurso durante a 21ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posicionamento contrário ao Projeto de Lei no. 1388/2023, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade e disciplina o respectivo processo e julgamento.

Autor
Plínio Valério (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Francisco Plínio Valério Tomaz
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Processo Penal:
  • Posicionamento contrário ao Projeto de Lei no. 1388/2023, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade e disciplina o respectivo processo e julgamento.
Publicação
Publicação no DSF de 29/03/2023 - Página 52
Assunto
Jurídico > Processo > Processo Penal
Indexação
  • CRITICA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, RICARDO LEWANDOWSKI, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO, IMPEACHMENT.

    O SR. PLÍNIO VALÉRIO (Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - AM. Para discursar.) – Presidente, Sras. Senadoras e Srs. Senadores, volto ao assunto de que a gente tratou meses atrás sobre aquele anteprojeto formalizado, sugerido por uma comissão de notáveis nomeados pelo nosso Presidente Rodrigo Pacheco para tratar sobre o processo de impeachment, alegando atualizá-lo. E eu alertei na época a ousadia e, ao mesmo tempo, a infantilidade de quem fez o anteprojeto achar que nós Senadores pudéssemos aceitar esse tipo de coisa.

    Caberá a nós Senadores avaliar o recém-formalizado projeto que, sob o número 1.388, de 2023, procura reformular todo o projeto de impeachment que se tem adotado no Brasil. Alega que se deseja modernizar a Lei 1.079, de 1950, supostamente anacrônica, a que trata do impeachment. Essa missão foi atribuída a um Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, por certo, claro, parte interessada nisso, que, por sua vez, confiou a relatoria a uma assessora sua. A gente falou sobre isso aqui meses atrás.

    Não poderia dar em outra coisa: o texto, que agora tramita oficialmente no Senado Federal, revela extremo viés ideológico, ou melhor, viés político-partidário; um exame superficial já basta para escancarar esse viés. Tomemos apenas um exemplo. No atual modelo de impeachment, admite-se que o cidadão comum possa solicitar a abertura de processo por crime de responsabilidade de nossas autoridades. Pode-se argumentar que haveria aí abertura ampla demais – é o que eles podem alegar. A alternativa que esse projeto apresenta, no seu art. 26, porém, é adotarem-se os mesmos requisitos da iniciativa legislativa popular. No âmbito federal, portanto, corresponderia hoje a bem mais de 1,56 milhão de cidadãos; não mais só um, teria que ter mais de 1,5 milhão.

    Haveria, então, o intuito de dificultar a abertura de projetos de impeachment? Não exatamente. No inciso anterior desse mesmo artigo, permite-se que ofereça denúncia – olhem só: o cidadão já não pode mais, tem que ter um milhão e poucos cidadãos – partido político com representação no Legislativo, qualquer um partido; a OAB também pode; e também entidade de classe ou sindicato, desde que com alcance nacional ou estadual. Para o cidadão tem que ser mais de 1 milhão, mas qualquer sindicato que tenha cinco anos de existência vai poder fazer, e nós sabemos a que esses sindicatos são filiados, a qual partido são filiados.

    Em outras palavras, seria impossível o protagonismo de uma entidade como, por exemplo, a Associação Brasileira de Imprensa – já não pode mais fazer –, que já teve, inclusive, papel histórico nesse processo, mas se permitiria a abertura mediante iniciativa de qualquer sindicato estadual, por mais modesto que seja. O objetivo político-partidário que eu digo é, neste caso, mais do que óbvio, pelo menos para mim, que não uso viseira, que não tenho tapa-olho. Já preparei uma série de emendas visando corrigir as inúmeras distorções no projeto do Ministro Lewandowski. E essa é, obviamente, uma delas. Seria fácil listar dezenas de absurdos neste texto. E vou selecionar mais um exemplo.

    No art. 7º. inciso IX, capitula-se como crime de responsabilidade, abram-se aspas, está lá no projeto: "Constituir, organizar, integrar, manter, financiar ou fazer apologia de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado democrático", fecham-se aspas. Parece razoável, não é? No entanto, essa redação exclui o estímulo ou a pertinência a qualquer grupo armado, desde que ele não atue escancaradamente contra a ordem constitucional ou o Estado democrático, ou seja, o PCC pode apresentar um pedido de impeachment, e a ABL não pode, e um cidadão comum também já não pode mais; o PCC ou um grupo congênere, entre muitos outros que agridem o povo brasileiro. Mais uma vez, a intenção dos autores do texto se expõe, pois não é só o caso do PCC que está liberado a prevalecer nesse texto.

    Eu estou aqui, realmente, para você brasileiro saber do que se trata isso. É um alerta ao Senado? Não, não tenho essa ousadia de alertar os Senadores. Cada um sabe o que faz. Todos aqui são preparados. Mas, aqui, eu quero alertar a população brasileira: esse projeto não visa apenas dificultar abertura de processo de impeachment, mas, na prática, impedir sua tramitação ao colocar dezenas de novos obstáculos. Isso se evidencia no que se refere aos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

    E, aqui, está a volta do anzol. Está exatamente aqui, para blindar os Ministros do Supremo Tribunal Federal: o novo texto, contido no projeto, deixa de capitular – olhem só –, entre os crimes de responsabilidade referidos aos Ministros, comportamento hoje incluído na lei que se quer derrubar. Ao mesmo tempo, inclui o Ministério Público e os comandantes militares, ou seja, livra a cara dos Ministros do Supremo, mas inclui nesse projeto o Ministério Público e comandantes militares.

    Em outro paradoxo, o projeto inclui a permissão de responsabilizar – olhem só que coisa mais maluca – criminalmente quem oferecer denúncia sem fundamento. Esse mecanismo objetiva conter o excesso de pedidos de impeachment por motivação política visto nas últimas décadas, caso o assim identificado "abuso no oferecimento de denúncia" seja solicitado na ação do Ministério Público a partir das razões do arquivamento, para apuração de eventual responsabilidade criminal de quem apresentou requerimento contra autoridade. Usa-se, assim, o conceito do abuso do direito de denunciar. É um escândalo isso. Isso não pode, não tem como prosperar, Presidente Veneziano.

    Trata-se de conceito que, no Brasil, tem justificado toda sorte de arbitrariedade. Não é o povo que precisa temer as autoridades, mas aqui é o contrário. É a autoridade que precisa saber que se encontra sob escrutínio popular e não o contrário.

    Como se vê, os obstáculos tecnicamente colocados aos processos de impeachment são, digamos, seletivos. São exatamente seletivos. São feitos para proteger alguns e perseguir ou impedir que outros façam a denúncia. A denúncia de impeachment é um ato de proteção da democracia e passa a não ser mais.

    Não deve ser limitado, mas aberto o pedido. Cabe ao Parlamento, logicamente, o filtro sensível de cada situação. A limitação proposta na redação do projeto de lei enfraquece o cidadão. O cidadão fica completamente vulnerável, já não pode mais ficar apresentando pedido de impeachment e, acima disso, retira do Parlamento a análise dos casos sensíveis que não viriam como decorrência de tamanha restrição da legitimidade para oferecimento de denúncias.

    É dever nosso, no Congresso Nacional, ponderar cada elemento contido no projeto de lei para que essa pretensa renovação do instituto do impeachment se converta em um avanço democrático. Não podemos permitir que se transforme em um novo instrumento de viés político-partidário, assim como também não podemos imaginar que se converta em mero ato de vingança contra os órgãos de controle ou contra a jurisdição.

    Quem apresentar, se a gente aprovar esse projeto, e não comprovar vai passar a ser acusado, vai ser denunciado. Ora, bolas, apresenta-se e no processo de impeachment você tem a oportunidade de provar o que você está dizendo, são indícios, vão se buscar provas.

    Como se vê aqui, essa comissão de notáveis, está nos tratando, Sr. Presidente Veneziano, como pessoas inocentes, ou...

(Soa a campainha.)

    O SR. PLÍNIO VALÉRIO (Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - AM) – ... complicadas, ou compradas, ou cooptadas. Não podemos em hipótese alguma.

    E se, por acaso, esse anteprojeto for aprovado como está, e eu estou apresentando sete emendas, eu quero que conste no Senado que este Senador, Plínio Valério, jamais votaria a favor de um projeto dessa natureza, porque eu não levei 36 anos de minha vida política para chegar aqui e ser manietado, manipulado, conduzido por uma equipe de notáveis que, de tão notáveis, acabou me fazendo notar que fizeram tudo errado.

    Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/03/2023 - Página 52