Discurso durante a 41ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Voto de pesar pelo falecimento do educador e político brasileiro Sr. Amarilio Ferreira Júnior.

Autor
Marcio Bittar (UNIÃO - União Brasil/AC)
Nome completo: Marcio Miguel Bittar
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Homenagem:
  • Voto de pesar pelo falecimento do educador e político brasileiro Sr. Amarilio Ferreira Júnior.
Publicação
Publicação no DSF de 17/04/2024 - Página 24
Assunto
Honorífico > Homenagem
Indexação
  • VOTO DE PESAR, MORTE, PERSONAGEM ILUSTRE, FAMILIA, MOTIVO, CANCER, COMENTARIO, VIDA PUBLICA, FILIAÇÃO PARTIDARIA, ATUAÇÃO, PROFESSOR, UNIVERSIDADE.

    O SR. MARCIO BITTAR (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - AC. Para discursar.) – Meu Presidente querido, nesta tarde, a razão da minha inscrição se deve à perda de um ente muito querido para a minha família toda.

    Trata-se de um cunhado que me conheceu desde criança, desde 12 anos de idade. Entre namoro e casamento com a minha irmã, Marisa Bittar, foram 48 anos. Ele lutou contra um câncer por quatro anos e meio, e a doença acabou vencendo.

    Eu já fiz encaminhamento à Mesa, um requerimento propondo o voto de pesar a essa figura muito querida e o educador.

    Quero também registrar aqui, com muita alegria, a presença da minha esposa, Thais Fernanda Silva Bittar.

    Sr. Presidente, sei que agora, neste momento, a minha irmã, minhas irmãs estão assistindo. Então, o voto de pesar, Amarilio Ferreira Júnior (11 de fevereiro de 1954 a 3 de abril de 2024).

    Amarilio Ferreira Júnior teve uma trajetória de vida plena, dedicada à educação e à política brasileira.

    Formou-se em história pelas Faculdades Unidas Católicas de Mato Grosso, hoje, Mato Grosso do Sul, onde, em plena ditadura militar, presidiu o Diretório Acadêmico Félix Zavattaro (Dafez).

    Em 1976, aderiu à militância de esquerda, atuando no então Partido Comunista Brasileiro (PCB), partido no qual eu também iniciei a minha militância.

    Nesse partido, engajou-se de corpo e alma na Frente Democrática, liderada pelo MDB/PMDB, defendendo a convergência das forças que desejavam o fim do regime militar.

    Em 1981, chegou a ser preso em Campo Grande, durante uma ação política organizada pelo Partidão.

    Começou a vida profissional em Campo Grande, capital hoje do Mato Grosso do Sul, como professor de escola pública e, em 1981, foi eleito Presidente da Associação Campo-grandense de Professores (ACP), entidade que projetou a sua liderança, já conhecida no movimento estudantil, e seu talento de orador.

    Em 1987, por concurso público, tornou-se professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, lecionando História Antiga, sua grande paixão.

    Por meio de novo concurso público, tornou-se professor da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), na qual lecionou e pesquisou por mais de 30 anos (1993-2024).

    Sua formação acadêmica inclui um curso no Instituto de Ciências Políticas e Sociais de Moscou (1984-1985); mestrado em Educação na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul; doutorado em História Social na USP (1994-1998); e pós-doutorado em História da Educação na Universidade de Londres (2011-2012).

    Manteve intercâmbio com essa universidade britânica desde então e, em parceria com Marisa Bittar, sua companheira de vida e parceria intelectual, realizou pesquisas em seus arquivos especiais, resultando em dois livros inéditos em língua portuguesa: A Educação Soviética (Editora da Ufscar, 2021), e A Escola da Revolução Russa (2023).

    Sua vivência na União Soviética lhe permitiu conhecer o socialismo por si mesmo, reavaliá-lo e escrever sobre a escola real criada pela Revolução Bolchevique, e não aquela utópica e dogmática defendida pelo marxismo acadêmico. Essa obra consagrou Amarilio como pesquisador maduro e original, reconhecido pelos seus pares dentro e fora do Brasil.

    Na Ufscar, Amarílio se tornou um dos professores mais amados pelos alunos, fator que se deveu ao seu profundo amor e compromisso pelo ensino, sua irreverência e brilho intelectual.

    Seu grande sonho era deixar a sala de aula apenas na compulsória, aos 75 anos de idade – viveu 70.

    Por sua liderança, foi eleito duas vezes Presidente da Associação dos Docentes da Universidade Federal de São Carlos, 2017 e 2019, defendendo o lema, abro aspas, "autonomia e pluralidade", fecho aspas. Isto é, um sindicato que representasse a todos, independente de ideologias, e não aparelhado por qualquer partido político.

    Seu destemor em defender esses princípios e em enfrentar grupos cristalizados no poder institucional o tornou alvo de baixezas e de injustiças difíceis de imaginar em um ambiente que deveria primar pelo respeito, pluralidade do conhecimento e circulação livre das ideias.

    Teve contra si o poder institucional da Ufscar, hegemonizado por uma determinada tendência do PT, vocacionada em aparelhar a universidade e torná-la reprodutora de sua cartilha, obcecada em instituir o pensamento único e impor a paz dos cemitérios.

    Avesso a dogmas desde a juventude, tendo incorporado o princípio da pluralidade desde a sua atuação na frente democrática contra a ditadura militar, Amarílio foi incansável na luta contra essa opressão, que desconsiderava, inclusive, a sua condição de figura pública do PT de São Carlos. Ele, porém, que foi uma referência política para sua geração na luta pela democracia, não fez concessões típicas do oportunismo nem se dobrou a qualquer poder.

    Em seus últimos anos de vida, muito doente e continuando a ser alvo do poder autoritário da Ufscar, costumava dizer, abro aspas, "nunca tive medo de nada nem de ninguém", fecho aspas.

    No dia 5 de abril de 2024, Amarílio deveria ministrar a sua primeira aula para alunos da graduação da Ufscar, pois uma disciplina lhe fora atribuída enquanto ele lutava contra o câncer e contra a burocracia universitária, dificultando o seu afastamento para o tratamento oncológico, que, desde a pandemia, ocorria em Campo Grande, Mato Grosso do Sul. E, sem consideração por um professor que já poderia ter se aposentado desde 2014, portanto, dez anos atrás, esse poder burocrático o convocou para uma junta médica, que deveria ser realizada presencialmente, no dia 2 de abril de 2024.

    Nesse mesmo dia, em Campo Grande, Amarílio foi hospitalizado, vindo a falecer no dia 3 de abril, após quatro anos e meio de luta contra a doença.

    No dia 12 de abril de 2024, a turma para quem ele deveria ministrar a primeira aula do semestre na Ufscar prestou-lhe uma homenagem, com o lema, abro aspas, "Amarílio Ferreira Junior, presente! Aula do dia 12 de abril, em homenagem ao Prof. Amarílio Ferreira Junior, no lugar que ele mais amava, a sala de aula", fecho aspas.

    Amarílio Ferreira Junior deixa um profundo vazio na sua geração, na sua família, em mim e nas centenas de jovens estudantes que o amaram. Ele deixa um legado de compromisso incondicional com a educação brasileira e a democracia. Deixa uma obra de fôlego como pesquisador do CNPq e deixa também um legado como ser humano generoso, otimista, alto astral e apaixonado pelo Brasil.

    Essa é uma singela homenagem, Sr. Presidente.

    Eu ouvia aqui o Marcos Rogério, e como uma coisa tem a ver com a outra. Nós perdemos um ente muito querido. Como eu falei, Amarilio fez parte da vida de toda a minha família, não um cunhado qualquer, um cunhado irmão. Na leitura, e eu já sabia da história... E não é porque era de esquerda, Marcos, que não tinha perseguição. Eu acabei de falar aqui de um Professor Doutor, com livros publicados, que sofria perseguição de uma ala que dominava e que domina a Universidade Federal de São Carlos.

(Soa a campainha.)

    O SR. MARCIO BITTAR (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - AC) – A dominação é tão implacável que, mesmo com câncer há mais de quatro anos, a UFSCar manda que ele se apresente fisicamente para fazer uma triagem numa junta médica, como que duvidando da condição dele. E, um dia depois do dia em que ele teria que se apresentar, ele perde a luta contra o câncer.

    E, quando a gente fala de perseguição, de tentativa de censura, lá em Campo Grande, aonde eu fui para passar o primeiro final de semana depois da morte desse querido amigo, meu cunhado, com a minha mãe e com minhas irmãs, eu me encontrei com alguns amigos que – é incrível, Presidente! – criticavam o Elon Musk como sendo alguém que não teria o direito de dar palpite no Brasil. Eu digo: aonde é que está chegando a paixão, que cega as pessoas?! Veja o que esse empresário denunciou – e é gravíssimo...

(Soa a campainha.)

    O SR. MARCIO BITTAR (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - AC) – E as pessoas apaixonadas esquecem – as de um lado e do outro. O que ele denunciou é que um Ministro do Supremo Tribunal Federal mandou a plataforma retirar, derrubar contas de pessoas, de políticos e de jornalistas importantes. Essa é a denúncia. E pior: segundo ele, o mesmo Ministro disse que não podia identificar de onde veio essa ordem. Portanto, Sr. Presidente, a censura, a perseguição só tem começo, não tem fim; ela se espraia.

    A nossa atuação pode ser espelho positivo para o Brasil inteiro para casos como este de alguém que já tinha como se aposentar em 2014, mas que tinha o sonho de se aposentar na compulsória – e não foi até aos 75 anos, porque morreu aos 70 anos...

(Soa a campainha.)

    O SR. MARCIO BITTAR (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - AC) – Um exemplo desse, em vez de ser embalado, prestigiado pelo grupo que domina – o grupo de esquerda, petista – a Universidade Federal... E notem que Amarilio, meu cunhado, também era do PT, mas de outra ala e sofreu perseguição implacável até o dia anterior em que perdeu a batalha contra o câncer.

    A luta pela pluralidade, pelo respeito ao contraditório se espraia pelo Brasil inteiro. E o que alguns ministros estão fazendo no Brasil é um péssimo exemplo para que práticas como essa que eu acabei de narrar continuem proliferando pelo país.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.

    O SR. PRESIDENTE (Veneziano Vital do Rêgo. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PB) – Senador Marcio, transmito a V. Exa. – e, ao fazê-lo, evidentemente, eu gostaria que V. Exa. externasse e transmitisse a todos os seus parentes, a todos os seus familiares, principalmente à senhora sua irmã – as nossas condolências, em nome da Presidência e de todos que fazem este Colegiado, pelo passamento do seu cunhado, o professor, cientista político e filólogo Amarilio Ferreira Junior.

    As nossas mais sinceras condolências, Senador Marcio.

    O SR. MARCIO BITTAR (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - AC) – Obrigado, Presidente. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/04/2024 - Página 24