11/06/2021 - 5ª - Comissão Senado do Futuro

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a 5ª Reunião da Comissão do Senado do Futuro da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura, que se realiza nesta data, 11 de junho de 2021.
Antes de iniciar os trabalhos, proponho a dispensa da leitura e a aprovação da Ata da 4ª Reunião, realizada em 31 de maio de 2021. (Pausa.)
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública com o objetivo de debater o tema: o futuro da produção agrícola.
Foram convidados a participar o nosso querido Alysson Paolinelli, Presidente Executivo da Abramilho e nosso grande candidato ao Prêmio Nobel da Paz, que tem todo o nosso apoio, e também o Maurício Antônio Lopes, Presidente do Comitê Gestor do Portfólio de Pesquisa em Energia, Química e Tecnologia da Biomassa da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
A reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania, na internet, em senado.leg.br, ou pelo telefone 0800-612211.
Na exposição inicial, os convidados usarão a palavra por até 30 minutos e, antes de encerrarmos, poderão apresentar suas considerações finais de dez minutos.
Nós vamos iniciar. E vamos inverter, Maurício. Vou passar a palavra, então, para o Maurício Antônio Lopes, que é o nosso Presidente do Comitê Gestor do Portfólio de Pesquisa em Energia, Química e Tecnologia da Biomassa da Embrapa. V. Sa. tem 30 minutos. Com a palavra, então, V. Sa.
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O SR. MAURÍCIO ANTÔNIO LOPES (Para expor.) - Exmo. Sr. Senador Izalci Lucas, Presidente da Comissão Senado do Futuro, um dos pilares da ciência, em apoio à ciência e à pesquisa agropecuária no Parlamento brasileiro, muito obrigado por todo o seu apoio, Senador.
Cumprimento também os Exmos. Senadores e Parlamentares conectados a esta audiência; e o meu caro amigo, mestre, ícone da moderna agricultura do Brasil, nosso candidato ao Prêmio Nobel da Paz, que está comigo neste painel, Alysson Paolinelli, que deve se juntar a nós em breve.
Cumprimento também todos os meus colegas da Embrapa, pesquisadores, estudantes, gestores, produtores rurais, enfim, todos os que nos acompanham nesta discussão tão importante e tão relevante sobre a importância da produção agrícola, os desafios para a produção agrícola no mundo e também no Brasil, neste momento em que vemos todas as questões relacionadas à agricultura e ao sistema alimentar global exacerbadas pela pandemia, também com a preocupação relacionada às mudanças de clima.
Nós temos um quadro que realmente preocupa quando a gente pensa no futuro da produção agrícola, no futuro dos sistemas alimentares. E, como o Brasil é um dos principais protagonistas nessas frentes, na produção agrícola, no cinturão tropical do globo, um dos grandes players no sistema alimentar global, é fundamental, Senador, que discutamos esses desafios e pensemos que trajetória é esta que a agricultura brasileira precisará trilhar no horizonte de 2030, que é o horizonte da atual agenda de desenvolvimento sustentável da ONU, e em horizontes mais longos, em 2050, porque o Brasil precisa manter o seu protagonismo, manter a sua contribuição ao sistema alimentar global.
Eu vou colocar aqui uma apresentação para facilitar um pouco a comunicação da mensagem que eu gostaria de trazer para as senhoras e os senhores. Eu vou, então, compartilhar a minha tela e espero que todos consigam ver com clareza os eslaides que vou apresentar nos próximos 20 minutos. Espero que todos estejam vendo bem. Senador, por favor, me confirme?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Está ótimo, muito bom!
O SR. MAURÍCIO ANTÔNIO LOPES - Muito bem.
O que nós vamos falar, nos próximos 20, 25 minutos, é sobre que futuros nós podemos antecipar para a produção agrícola no mundo e que repercussões os desafios que virão terão para o Brasil, como todos sabem, um grande protagonista nesse mundo da agricultura e da alimentação.
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Eu vou centrar muito da minha fala e das minhas considerações na agricultura que se faz no cinturão tropical. A razão é simples: como vocês veem nesta imagem, com destaque ali entre os trópicos de capricórnio e câncer, que localizam o que nós chamamos do cinturão tropical do globo, o Brasil tem a maior parte do seu Território localizado exatamente nessa região. Essa região do Planeta concentra desafios enormes e também possibilidades extraordinárias. Nós temos as condições mais intensas, mais difíceis para a produção agrícola nos trópicos. Nós temos situações de estresses bastante significativos de calor, de seca, estresses que tendem a ser intensificados com o processo de mudanças de clima. Outro ponto muito importante é que, nessa faixa, no cinturão tropical, estão concentrados os países megadiversos, os países que têm a maior diversidade biológica no Planeta. O Brasil está no topo dessa lista, junto com Colômbia, junto com Indonésia, junto com Costa Rica. Este é um desafio adicional, como todos sabem: como usar bem os nossos biomas, promovendo aumentos na produção física de alimentos, mas, ao mesmo tempo, conservando a nossa base de recursos naturais, os nossos biomas, a biodiversidade, os nossos cursos d'água, e por aí vai. Então, esta pergunta tem que estar sempre à nossa frente: que futuros nós podemos antecipar para a agricultura feita nessa região, que tem muitos desafios à frente, mas que também tem um potencial fantástico? É aqui que nós temos a maior concentração de luz, grandes extensões de terra para a produção de alimentos. Então, nós temos que aproveitar bem essas vantagens, mas também temos que ser prudentes e inteligentes para mobilizar a melhor ciência, o melhor conhecimento para a superação dos desafios que são típicos nessa região do globo.
O Brasil tem muito a falar da agricultura nos trópicos. O nosso querido Alysson Paolinelli certamente vai nos dizer mais sobre isso. Ele, na verdade, foi o grande ícone, o grande líder de toda essa revolução que nós observamos na agricultura do Brasil nas últimas quatro, cinco décadas.
Este eslaide resume um pouco essa trajetória fabulosa do Brasil. Nessa parte esquerda, está-se mostrando o desafio da expansão agrícola que o Brasil enfrentou nos anos 70. Naquele momento, o objetivo era alcançar a nossa segurança alimentar, mas com ciência, uma ciência para a agropecuária fortalecida, criação da Embrapa, fortalecimento das universidades, treinamento de competências... Nós ganhamos muita competitividade, passamos a ser capazes não só de prover alimento para a nossa população, mas também de exportar. Isso vem tendo um impacto enorme na economia e na competitividade brasileira. E agora, mais recentemente, nós estamos entrando na era em que a sustentabilidade ganhou enorme evidência: a responsabilidade de produzir, mantendo a base de recursos naturais segura e capaz de prover para as gerações futuras. E vamos entrar - eu vou falar um pouco sobre isto - numa outra fase em que a agricultura vai ter que prover mais funcionalidades para a sociedade. E isso vai ser objeto da minha apresentação.
Nós estamos vivendo este momento em que a temática do desenvolvimento sustentável ganhou grande relevância. Se eu posso resumir em um eslaide, de forma muito simples, o que é desenvolvimento sustentável, é que o mundo vem acumulando problemas aí em função dessa desconexão entre os sistemas humanos e os sistemas naturais, e o desenvolvimento sustentável é, na verdade, um processo de reconciliação entre estes dois sistemas: os sistemas humanos e os sistemas naturais.
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Nós temos que pensar em sistemas humanos, com as suas dimensões social, ecológica e econômica, cabendo ou se alinhando aos sistemas naturais, à capacidade dos sistemas naturais, aos nossos biomas, porque nós não queremos desgastá-los. O Planeta Terra não tem recursos infinitos, os recursos são finitos. Então, nós temos que ser prudentes para colocar os sistemas humanos em sintonia com os recursos naturais, que são finitos, garantindo que esses recursos estejam disponíveis para os nossos filhos, os nossos netos e os nossos bisnetos.
Existe uma agenda muito poderosa no mundo para se alcançar isso. Todos já ouviram falar da agenda de desenvolvimento sustentável que foi lançada em 2015 pela ONU. Essa agenda, a Agenda 2030, procura dar ênfase a estas cinco dimensões: olhar para as pessoas, erradicar a pobreza, resolver o problema da fome, promover prosperidade para todos e, com isso, promover sociedades mais pacíficas, buscando as parcerias que são necessárias para a gente enfrentar os desafios de um mundo cada vez mais complexo, para ficarmos dentro dos limites que o nosso Planeta tem, para nós não excedermos esses limites, o que pode comprometer o bem-estar dos nossos filhos, netos e bisnetos.
A agenda de desenvolvimento sustentável é muito conhecida por esta figura. Esta figura, na verdade, materializa o plano de ação global, os 17 objetivos do desenvolvimento sustentável, as 169 metas, que permitem, então, o alcance dessa visão, dessa ambição, expressa na Agenda 2030, de resolver os problemas da exclusão, da fome, da pobreza, para forçar que os sistemas humanos se adequem aos limites dos sistemas naturais.
Essa é uma agenda gerenciável. Pela primeira vez... Eu acho, Senador, que talvez esta tenha sido a agenda mais poderosa que nós humanos fomos capazes de desenvolver na busca de um desenvolvimento racional para o futuro. Ela é gerenciável. Ela tem objetivos que são catalisadores, que são aceleradores. Ela tem uma ambição clara, que é erradicar a pobreza, resolver o problema da fome, resolver o problema das desigualdades. Por isso, ela é muito útil não só para governos, mas para os Estados, para os nossos Municípios, que precisam abraçar essa agenda para que a gente possa avançar.
Um detalhe importante para a nossa discussão aqui, hoje, Senador, é que todos os objetivos do desenvolvimento sustentável têm alguma conexão com a agricultura e os sistemas alimentares - todos os 17 objetivos. Talvez a agricultura seja o sistema humano mais alinhado a esse conjunto de objetivos. Qualquer dos objetivos, como o objetivo 1, erradicar pobreza, tem conexão com agricultura - quase 80% das pessoas pobres vivem em áreas rurais.
Saúde e bem-estar, um tema tão importante neste momento em que a gente está enfrentando uma crise sanitária global. Boa saúde depende de boa nutrição. Estamos vendo os problemas de comorbidades com a Covid-19. A agricultura tem uma responsabilidade importante aí.
Energia acessível e limpa. A agricultura moderna ainda é excessivamente dependente de energia fóssil. E nós precisamos, então, descarbonizar a agricultura. Aqui, uma agenda importantíssima para o futuro: como é que a gente descarboniza a agricultura brasileira, que tem sido muito pressionada na questão das emissões de gases e dos impactos do efeito estufa? Consumo e produção responsáveis. Um terço do alimento produzido no mundo é perdido ou desperdiçado, e com ele é perdida a energia que se usou na produção desse alimento. Então nós temos que resolver esse problema do desperdício. Esse é um desafio enorme para o futuro.
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Combate às alterações climáticas. A agricultura brasileira está em grande evidência, em grande visibilidade, em função dos problemas relacionados a desmatamento, a emissão de gases de efeito estufa... Então, descarbonizar a agricultura é um caminho importantíssimo para a gente responder às mudanças de clima. Então, essa agenda está cheia de desafios, para os quais a gente tem que olhar com carinho, com sabedoria, para, resolvendo-os, fortalecermos o protagonismo e a importância da agricultura brasileira no presente e para o futuro.
Um aspecto muito importante nessa agenda, que tem muito a ver com o futuro da agricultura, é que ela traz o conceito de nexo ou de interdependência. Os alvos pretendidos, na agenda dos objetivos do desenvolvimento sustentável, se complementam e se reforçam, para evitar que o progresso numa área não ocorra à custa de outra, um erro que foi muito comum no passado e que levou a passivos sérios que a gente está enfrentando agora. Então, os nexos estão se tornando muito importantes para a gente pensar futuro e agir para o futuro.
O que é nexo? Nexo é uma conexão, uma série de conexões que cobrem múltiplos fatores inter-relacionados. Exemplos: água, energia, alimento e clima. Não dá para tratar esses temas de forma desconectada. Água, por exemplo: nós estamos vivendo uma realidade de uso competitivo da água. Estamos, agora, na iminência de termos uma crise energética em função da carência de água para se produzir energia. Mas água também é importante para produzir alimento. E água é importante para suprir as cidades. Água é importante para muitas coisas na sociedade. A água impacta clima.
Então o que os nexos nos dizem é que nós temos que ter uma abordagem mais inteligente para os problemas contemporâneos. Nós temos que olhar para conjuntos, e não para problemas isolados. A desconexão entre os sistemas alimentares, de bem-estar e de saúde é um dos inúmeros problemas por décadas ignorado e que agora está exacerbado pela crise provocada pela pandemia. De novo, as comorbidades. A falta de atenção a esse nexo de alimento, nutrição e saúde, a esse balanço, leva a males que comprometem o futuro da sociedade. A agricultura tem uma responsabilidade enorme aqui: garantir alimentos saudáveis, com um bom equilíbrio nutricional, disponíveis a custos acessíveis para as pessoas.
O Brasil, Senador, está criando um novo nexo, que vai marcar o futuro da agricultura no mundo. O nexo lavoura, pecuária e floresta, mostrando que a agropecuária pode incorporar níveis de complexidade que permitam mimetizar a natureza. Uma mensagem importante que eu quero deixar para a nossa discussão: a agricultura do futuro precisará mimetizar a natureza. A natureza está evoluindo há milhões de anos. A natureza é um organismo inteligente, ela criou um modelo de relação com o ambiente natural que é o mais perfeito possível. Ali há reciclagem, ali há cuidado com a sobrevivência dos vários entes: as plantas, os animais e os microrganismos. Então, nós precisamos retornar a essa realidade. A agricultura precisa evoluir mimetizando a natureza para superar os passivos que as atividades isoladas produziram, as grandes monoculturas, o uso excessivo de defensivos e por aí vai. Então, aqui está um nexo que vai marcar o futuro da agricultura no Brasil e no mundo: o nexo de agregar e incorporar lavouras, pecuária e florestas. Então, mensagem importante para a nossa discussão: essa Agenda 2030 da ONU nos diz que nós precisamos pensar numa agricultura no futuro que seja sistêmica e que mimetize a natureza e uma agricultura também que seja multifuncional. A agricultura está entre as atividades com o maior número de funcionalidades; das atividades humanas, é a que tem o maior número de funcionalidades, e eu quero mostrar um pouco disso para vocês.
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A importância dos nexos para o Brasil. O Dr. Alysson Paolinelli vai nos mostrar o desafio que foi alcançar a segurança alimentar no Brasil nos anos 70. O nexo ali era um nexo bem mais simples: nós precisávamos alcançar a segurança alimentar da nossa população, resolver o problema de acesso a alimento e a pobreza. Avançamos de maneira extraordinária e chegamos ao presente, em que os nexos se tornaram extremamente mais complexos. Outros temas ganharam evidência na agenda da sociedade. O tema da sustentabilidade chamou, então, a nossa atenção para um nexo muito mais complicado, em que nós temos agora que olhar também para a energia, para a água, para o meio ambiente, para a pobreza, para a saúde, para a exclusão e tantos outros desafios.
Então, esta é a trajetória que a agricultura no Brasil e no mundo precisam cumprir: sair de nexos, digamos, mais simples, que resolvem problemas de uma maneira mais simples, para nexos mais complexos e usar a melhor ciência e o melhor conhecimento para a gente enfrentar esses nexos. Isso vai ganhar uma importância ainda maior porque métricas estão sendo desenvolvidas para medir a nossa capacidade de fazer essa transição.
Sustentabilidade ainda é um conceito muito elusivo, meio vago. Todos falam em sustentabilidade, mas nós precisamos aprender a medir sustentabilidade se a gente quer gerir sustentabilidade, se a gente quer gerir uma agricultura na direção da sustentabilidade. Isso está vindo. Muitos já devem ter ouvido o conceito de ESG: E para meio ambiente, S para social e G para governança. Esse é um conceito que foi gestado na Europa para viabilizar a medição de sustentabilidade de investimentos, de empresas, de negócios e garantir com métricas que negócios, empresas, investimentos, fazendas estejam sendo geridos para ganhos sustentáveis de longo prazo, e não só para ganho econômico de curto prazo. Então, essas métricas estão vindo e vão nos pressionar na direção da sustentabilidade.
Outra métrica importantíssima: avaliação de ciclo de vida, que são medidas que nos permitem avaliar que materiais foram usados na construção de um alimento ou de um processo, como esses materiais foram usados para fabricar aquele alimento ou aquele processo, como foi armazenado, como foi distribuído, como foi usado e como os resíduos foram descartados. Estão sendo criadas medidas para se avaliar o ciclo de vida de qualquer produto e dizer com precisão, com números sólidos, se esse produto é sustentável ou não é sustentável. Então, a nossa agricultura vai ter que atentar para esse tipo de desafio, incorporar esse tipo de medida, se ela quer ser competitiva e sustentável no futuro. A boa notícia é que o Brasil tem avançado muito no aprofundamento da sua agenda ambiental. Aqui eu tenho que reconhecer os méritos do Parlamento brasileiro, do Congresso brasileiro, que tem sido realmente hábil na construção de políticas que nos colocam nesse caminho. O Brasil talvez seja o grande líder, no mundo, no desenvolvimento de uma agenda ambiental robusta. Basta a gente perguntar: que país no mundo tem um código florestal que permite a expansão inteligente e planejada da agricultura, nas propriedades privadas, com atenção à água, com atenção à biodiversidade? Que país no mundo tem uma agricultura de baixo carbono, para usar a tecnologia da Embrapa, para produzir ganhos em resiliência, em descarbonização nas fazendas? Que país do mundo tem o RenovaBio, com um paradigma energético para ganho de eficiência, redução de emissões, com métricas da emissão de carbono, e com recompensa para aqueles que incorporam tecnologias sustentáveis? Então, essa é a boa notícia. E, de novo, parabéns para o Parlamento brasileiro, para o Congresso brasileiro, que foi capaz de discutir essas questões tão complexas e transformá-las em políticas, o que eu acho que nos coloca em grande vantagem. E o Brasil, pelo investimento que fez em uma agricultura baseada em ciência, também incorporou um arsenal de práticas que nos colocam também em grande vantagem nessa corrida. O Brasil é um grande usuário dessa tecnologia de plantio direto na palha, proteção contra erosão, conservação de água, reciclagem de nutrientes, fortalecimento do microbioma do solo. O Brasil é líder no cinturão tropical do globo de construção de fertilidade. Os nossos solos são, naturalmente, pobres e ácidos, e nós soubemos reverter isso. O Brasil é líder no uso de bioinsumos, como a fixação biológica do nitrogênio na soja e tantas outras tecnologias que estão vindo. O Brasil é líder na produção de energia de biomassa. Nenhum país do planeta tem a escala e a logística para produzir energia renovável como o Brasil tem, através do setor sucroenergético.
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Esse é o melhor exemplo de economia circular que existe no planeta: da cana se faz tudo, se aproveita tudo, se aproveita o bagaço para bioeletricidade, se aproveita a cana para produzir açúcar e álcool. A indústria está cada vez mais incorporando essa biomassa para produzir químicos finos e tantas outras coisas. É um exemplo para o mundo.
E o Brasil está entrando também na liderança dessa outra grande revolução que está emergindo na agropecuária global, que é da intensificação sustentável. Como é que a gente aumenta a eficiência dos nossos sistemas para diminuir a pressão sobre os ambientes frágeis, as florestas? Como é que a gente extrai mais de cada hectare para evitar que a gente tenha que desmatar para ampliar o número de hectares necessários para produzir alimentos? O Brasil já é líder no desenvolvimento de tecnologias para recuperação de áreas degradadas. A Embrapa é a instituição líder no desenvolvimento dessas tecnologias.
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Os sistemas integrados ganham cada vez mais espaços no Brasil. É, de novo, a agropecuária mimetizando a natureza: no mesmo espaço, você tem agricultura, pecuária e floresta, não é?
Então, o Brasil, com esse modelo de produção, poderá viabilizar uma produção carbono neutro, produtos carbono neutro. Com esse grau de complexidade, nós seremos capazes de incorporar mais carbono do que emitir carbono, respondendo a uma das grandes questões que o mundo coloca sobre nós, de que a nossa agricultura é muito carbonizada, é emissora e insustentável. O Brasil tem tecnologia para responder, de maneira precisa, a isso. Nós precisamos, então, é ampliar esse modelo de produção mais integrada, carbono neutro.
O Brasil já tem um modelo de produção de carne carbono neutro, que já alcançou o mercado no último ano. A Embrapa já tem acordos com empresas privadas que utilizam esse conceito, de mimetizar a natureza, integrando boi com pasto, com lavoura e com árvore, e, com isso, zerando a emissão de carbono e nos permitindo, então, colocar no mercado uma carne que emitiu zero, não emitiu nenhum carbono. Fora o bem-estar animal: animais sofrem muito nos trópicos, nós temos muita incidência de luz solar, calor intenso, às vezes seca. Criar o boi num pasto que tenha árvores traz bem-estar animal, um valor cada vez mais importante para a sociedade, para os jovens, que atribuem cada vez mais valor às questões de bem-estar animal, às questões éticas relacionadas à produção animal.
Bom, isso para mostrar que nós não estamos dando o primeiro passo numa agricultura sistêmica. O Brasil é líder global no desenvolvimento de um modelo de agricultura sistêmica, viável, passível de entrar no mercado com grande vantagem competitiva para o Brasil. Nós não estamos começando essa jornada, nós estamos muito bem aqui. Precisamos intensificar isso, valorizar isso, apoiar a ciência que dá esse avanço para o Brasil, apoiar instituições como a Embrapa, como as universidades, como o setor privado, que está abraçando esse desafio de fazer essa transição.
Temos outro desafio para o futuro, que é explorar outras funcionalidades da agricultura, que são imensas.
Nesse quadro, eu tento resumir, Senador, as funcionalidades que nós podemos extrair da agricultura. Eu repito: a agricultura está entre as atividades humanas com o maior número de funcionalidades. Além de produzir alimento, fibras e energia, a agricultura pode produzir a ligação entre alimento, nutrição e saúde, a agricultura pode ter uma interface enorme com a saúde, para a gente ter práticas mais preventivas do que curativas, com melhor nutrição, com melhor equilíbrio nutricional.
Serviços ambientais e serviços ecossistêmicos. É um assunto que vem sendo tratado pelo Parlamento brasileiro, com o pagamento de serviços ambientais. Essa agricultura sistêmica pode prover para a sociedade uma enormidade de serviços: produção de água, conservação da qualidade do ar, reciclagem de nutrientes e tantos outros. Nós precisamos, na verdade, pagar àqueles que fazem o sacrifício de incorporar esses serviços e prover esses serviços para a sociedade. Isso aqui pode ser uma grande fonte de ganho, inclusive para os pequenos produtores no futuro.
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Biomassa. Nós temos um potencial gigante de produção de biomassa. Nós já sabemos a importância da biomassa para a produção de energia renovável, mas a biomassa poderá ser o caminho para descarbonizarmos indústrias importantes, a indústria química, a indústria de materiais; desenvolver novos bioprocessos para fabricar, converter e reusar de maneira inteligente, usando o conhecimento da biologia, que é reciclável e que é renovável.
Microbioma é um conceito novo, micro-organismos. Micro-organismo é a matéria escura da vida. A quantidade de micro-organismos que nós temos e as funções que esses micro-organismos guardam é algo extraordinário que precisa ser explorado.
E aqui, este último, é um de que eu gosto muito, Senador: essa ligação da agricultura com a cultura, com a tradição, com a gastronomia, com o turismo; a nossa riqueza alimentar; a tradição de uma cultura extremamente diversa nossa. A nossa gastronomia é fabulosa! Ela pode estimular uma indústria turística fantástica no Brasil, junto com as nossas belezas naturais. Isso tudo está para ser explorado, para ser reconhecido e explorado.
Então, o futuro pede que nós olhemos para esse conjunto de funcionalidades e as exploremos de forma prudente, de forma inteligente, para fortalecer a imagem e o protagonismo do Brasil no futuro.
Sobre essa questão da conexão de saúde, alimento, democracia, nós temos que reconhecer, vamos ter uma população mais urbana, mais idosa, mais exigente no futuro, uma escalada por alimentos de proteínas mais nobres, como leite, carne, ovos, pescado, mais frutas, legumes e verduras. Na medida em que a sociedade se torna mais urbana, mais ascendente, mais informada, a agricultura tem que prover isso de maneira ampla, de maneira acessível para todos.
E não há como ignorar que também o mundo está vivendo uma certa transição nutricional. Nós vemos crescer a importância do vegetarianismo, vemos crescer a importância do veganismo. Agora há essa nova onda, o "flexitarianismo", aqueles indivíduos que seguem uma dieta vegetariana e apenas ocasionalmente consomem algum tipo de carne.
O Brasil, que é um grande produtor agrícola, precisa olhar para essas tendências e perguntar: como é que a gente vai se alinhar? Como é que a gente vai responder a esses desejos da sociedade? Não se trata de tentar contrapô-los e combatê-los. O consumidor é o grande coordenador do sistema agroalimentar, e nós temos que respeitar isso para o futuro.
Quero destacar de novo a relação da sociedade com o alimento, que está mudando. Nós não podemos pensar numa agricultura provedora só de volume, de energia e proteína para as pessoas seguirem as vidas delas, não é? A agricultura, cada vez mais, tem que ser uma provedora de alimentos como experiência: novos aromas, novos sabores, novas texturas, novas sensações. Vocês todos não veem a ansiedade com que as pessoas estão para ir aos restaurantes, encontrar os amigos, provar alimentos diferentes? É uma coisa que cresce na sociedade e que a gente tem que respeitar e reconhecer. É um desafio para a agricultura do futuro prover isso, com maior acessibilidade para a população como um todo.
Nós temos uma nova economia emergindo - não podemos ignorar -, uma economia baseada em sistemas biológicos. A chamada bioeconomia vai crescer na esteira disso tudo que eu falei. A economia do futuro será uma economia baseada em sistema biológico, renovável, reciclável, limpo. Não é absurdo a gente pensar nas fazendas do futuro se tornando também biorrefinarias, e essa é uma realidade que não está tão distante assim. Muitas fazendas já produzem o biogás, já reciclam os seus resíduos. Mas, quem sabe, vamos ter no futuro fazendas com refinarias muito mais sofisticadas, transformando amido, celulose, m-celulose, lignina e óleos em coisas muito sofisticadas para indústrias que pagam bem. Então, as fazendas do futuro poderão incorporar novas funções e alcançar mais recursos em frentes importantíssimas para a descarbonização e para a sustentabilidade dos sistemas humanos.
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Serviços ambientais. Nós precisamos tornar isso realidade. O Brasil precisa aprender a medir, a qualificar e a valorar os serviços que essa agricultura sustentável sistêmica está provendo para a sociedade. Reciclagem de resíduos, fixação de carbono, controle de doenças e pragas, filtragem de água, controle de erosão e enchentes, esses são serviços importantes que a agricultura está provendo pra sociedade: agricultura sistêmica, agricultura sustentável. Então, reconhecer isso... Eu sei que o Parlamento brasileiro está trabalhando nisso, nós temos já políticas para pagamento de serviços ambientais, mas precisamos intensificar isso, nós precisamos tornar isso realidade.
E a última coisa que eu quero falar aqui, Senador, é que, apesar de tudo isso, da agricultura feita no campo, nas fazendas, um futuro ainda muito interessante que tem para esse modelo de produzir alimentos, nós não podemos esquecer que a ciência segue avançando em velocidade alucinante. O avanço na ciência é exponencial. E nós temos que também colocar no nosso radar, do Brasil, possíveis transformações radicais na maneira de se produzir alimentos no futuro, e uma delas são as fazendas verticais.
Nós vamos ter, daqui para 2050, um processo de urbanização sendo intensificado. Cerca de 80% das pessoas vão viver em cidades em 2050. Já 80% vivem em cidades no Brasil, mas isso ainda vai ser maior em 2050. E a produção de alimentos vai tender a se aproximar das cidades. Por quê? Nós vamos ter, em 2050, uma população mais afluente, mais bem informada, uma população que quer ter algum contato com o alimento que consome, a relação com o alimento vai mudar. Então, é prudente que a gente espere, crescendo com as cidades, que também cresça o conceito das chamadas fazendas verticais urbanas. Nós temos hoje uma enormidade de investidores colocando dinheiro nesse conceito, uma enormidade de startups desenvolvendo esse modelo de produção no futuro.
Eu vou dar um exemplo para vocês do que desponta de possibilidade com essas fazendas verticais urbanas no futuro.
Aqui está a síntese de um artigo de pesquisa que foi publicado no ano passado, em agosto, onde pesquisadores modelaram uma fazenda vertical urbana de trigo. E eles modelaram, então, uma estrutura vertical com dez camadas de um hectare que resultou na produção de 700 a 1.940 toneladas de grãos por hectare. Para vocês terem uma ideia, a produção média de trigo no mundo é de 3,2 toneladas por hectare. Essa modelagem mostrou ser possível produzir não 3,2 toneladas, mas 700 a 1.940 toneladas de grãos por hectare. Isso é 220 a 600 vezes a atual média mundial de rendimentos de trigo!
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Então, nós temos que colocar essas rupturas no nosso radar. Uma grande nação agrícola tem que olhar para essa vertente e perguntar: que impacto essas revoluções poderão ter para nós?
Está vindo aí a edição de genomas, que foi a tecnologia que ganhou o Prêmio Nobel de Química em 2020. Nós vamos ser capazes de editar plantas, de modelar plantas para que elas sejam muito produtivas nesses ambientes. São rupturas que podem favorecer uma produção em fazendas verticais urbanas em países que não têm terra para produzir.
Então, às vezes a gente fica aqui imaginando que o Brasil vai ser para sempre um grande provedor de alimento para o mundo e que países que não têm terra e que não têm condições de produzir alimentos jamais vão conseguir fazê-lo. Isso não é verdade. Nós temos que colocar no nosso radar a possibilidade de, com energias renováveis de baixo custo, a engenharia, a arquitetura e os recursos necessários para tornar tais fazendas viáveis e os custos dos alimentos subindo, esse modelo de produção se tornar viável no futuro.
E olha aqui que possibilidade interessantíssima: esta empresa Climeworks, em Zurique, na Suíça, captura o CO2 do ar e injeta esse CO2 nessas estufas de produtores de hortaliças. E vocês sabem que, se a gente aumentar a concentração de CO2 nesses ambientes fechados, as plantas produzem mais, porque CO2 é o carbono que é alimento para as plantas fazerem produtos importantes para nós, proteínas e energia.
Então, imaginem esta sintonia: ao mesmo tempo em que você tira carbono do ar, você aumenta a produção de alimentos numa fazenda inteiramente fechada, em prédios altíssimos. Então, são realidades que podem parecer distantes, mas que podem se tornar viáveis. E nós temos que colocar isso no nosso radar para o futuro.
As expectativas nessas fazendas são enormes por quê? Há uma redução enorme no uso da terra, e disponibilidade de terra é um desafio. Essas novas ideias nos permitem escapar de rigores do clima, eliminar pragas e doenças, eliminar perda de nutrientes, é uma produção limpa e saudável, porque tá fechada, contida, e a produção está próxima do consumidor. É aquela história: uma sociedade muito urbanizada, e os indivíduos vivendo na urbe têm acesso à produção de alimentos que vão consumir, e nós humanos queremos ter essa proximidade.
A alternativa ainda é inviável, porque não existem espécies e cultivares adequados, o custo de energia é muito alto, o custo de infraestrutura é muito alto, mas uma nação agrícola, uma potência agrícola como o Brasil tem que colocar isso no radar e se perguntar: há possibilidades aqui para nós? E que riscos a emergência dessa maneira de produzir alimentos traria para um grande exportador de alimentos como o Brasil?
Àqueles que acham um absurdo eu falar uma coisa dessa, porque temos grande extensão de terra e tudo o mais, eu gostaria só de lembrar: o consumidor é o grande arquiteto das mudanças, ele é o grande coordenador do sistema agroalimentar e agroindustrial. Eu gosto muito de uma frase dessa senhora, a Tiffani Bova, que é uma consultora da grande empresa Gartner. Ela disse certa vez que a principal ruptura no mercado não é a tecnologia. Nós ficamos deslumbrados com a tecnologia, mas, no fim das contas, a ruptura é o consumidor que está emergindo, um consumidor mais urbano, mais atento, mais afluente, uma sociedade que vai se tornar mais rica.
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Então, é nesse futuro que nós temos que nos colocar e perguntar que desafios são esses que virão. E, a favor desse consumidor empoderado, vêm medidas, vêm métricas, não é? Essa ideia de ficar falando em sustentabilidade, sustentabilidade, sustentabilidade, sem saber qualificar o que é isso, vai desaparecer, porque estão surgindo medidas concretas do que é sustentabilidade. E esse consumidor empoderado vai usar essa medida para pressionar todos os sistemas humanos na direção da sustentabilidade, e nós temos que nos preparar pra isso.
Eu vou terminar aqui com uma reflexão de uma pessoa que construiu uma fortuna significativa, um brasileiro, Jorge Paulo Lemann. Ele falou isso aqui num evento da Harvard e do MIT recentemente. É um bilionário, certamente muito perspicaz, porque construiu um império. Pessoas assim têm grande perspicácia e grande habilidade de lidar com o futuro ou de antever futuros possíveis. Por isso, eu estou compartilhando com vocês o pensamento dessa pessoa, do Jorge Paulo Lemann, que disse muito recentemente, em abril de 2021:
A minha geração, há cinquenta anos, só pensava em ganhar dinheiro. Hoje a juventude se preocupa com o meio ambiente, o clima e o progresso global com energia sustentável. Os jovens líderes pensam mais nisso do que em apenas lucrar, mas isso não quer dizer que não possam ganhar dinheiro e ao mesmo tempo mudar o mundo. É uma combinação promissora e fascinante a ser explorada.
Isso nos anima a olhar para o futuro, 2030, 2050, reconhecer, sim, que o nosso planeta é finito, mas que a criatividade e a inovação são processos sem limites, são processos infinitos. E nós, no Brasil, estamos, a despeito do que muitos podem achar, que não, numa condição privilegiada, porque o Brasil tem instituições, tem competências, e não nos faltam inspiração e bons exemplos.
Nós temos, talvez, o melhor exemplo de todos aqui neste painel: o nosso querido Alysson Paolinelli, a pessoa que lançou essa grande revolução que nos trouxe ao presente, que tanto fez pelo Brasil. Quer inspiração melhor que essa para a trajetória que nós teremos que cumprir daqui para 2030 e de 2030 para 2050? E o Dr. Alysson, que foi o grande coordenador da primeira revolução, está aqui conosco, aos 84 anos, trabalhando na segunda revolução, nessa outra transição. Então, nós temos é muita sorte, não é? E, no fim das contas, o Brasil está numa posição muito privilegiada para ocupar e seguir ocupando espaços importantes, seguir sendo protagonista. Nós precisamos é aprimorar essa visão de futuro e fortalecer, então, a nossa capacidade de mudar, de ajustar os nossos processos, para que a gente siga sendo protagonista na agricultura e no sistema alimentar global.
Era essa a mensagem, Senador, que eu gostaria de trazer para nossa reflexão hoje.
Muito obrigado.
Eu creio que eu passei um pouquinho aí do limite do tempo. O senhor me desculpe por ter ultrapassado um pouquinho aqui o tempo que me foi dado.
Prazer enorme estar aqui com todos!
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Maurício. Foi um prazer, e realmente foi uma aula para todos nós.
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Eu não falei aqui, mas o Maurício Antônio Lopes é graduado em Agronomia pela Universidade Federal de Viçosa; também é Mestre em Genética pela Universidade norte-americana de Purdue; Doutor em Biologia Molecular de Plantas pela Universidade do Arizona. É Pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), de 1986 a 1989; Pesquisador da Embrapa desde 1989; foi Presidente da Embrapa, de 2012 a 2018. Tem longa carreira em atividades científicas e tecnológicas, em gestão de P&D e desenvolvimento institucional da Embrapa e de outras instituições nacionais e internacionais; recebeu inúmeros prêmios como o Título de Doutor em Agricultura Honoris Causa pela Universidade Purdue, norte-americana; teve experiências profissionais na Europa e Ásia. Atualmente é membro do Grupo Assessor ao Diretor-Geral da FAO, em Roma; do Conselho de Promoção da Bioeconomia, em Berlim, Alemanha; e Pesquisador da Embrapa Agroenergia, contribuindo para a integração da agricultura à emergente bioeconomia.
E, pelo que eu sei, é um grande aluno do nosso querido Alysson Paolinelli, que é o nosso grande revolucionário e que é de Bambuí. O Maurício é de Bom Despacho; o Alysson, de Bambuí; e eu sou de Araújos. E Bambuí e Bom Despacho fazem parte da Grande Araújos, que tem 8 mil habitantes. Então, é uma honra muito grande presidir esta reunião aqui com os meus conterrâneos, ali, bem de pertinho, do centro-oeste mineiro.
Bem, o Alysson Paolinelli vai falar para a gente um pouquinho agora. Ele é de Bambuí. É agrônomo, graduado pela Universidade Federal de Lavras; especializou-se nos estudos sobre o potencial da região do Cerrado para a produção agrícola. Em 1971, ele assumiu a Secretaria de Agricultura de Minas e criou incentivos e inovações tecnológicas que tornaram o Estado de Minas Gerais o maior produtor de café do Brasil. Foi Ministro da Agricultura, de 1974 a 1979, período em que a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária)... Ele foi o grande idealizador. Além de ocupar, promover a ocupação econômica aqui do Cerrado, o que fez a grande transformação deste País.
Alysson Paolinelli sempre foi um incentivador da pesquisa, ciência e tecnologia. Implantou um programa de bolsa de estudos para estudantes brasileiros em diversos centros de pesquisa em agricultura pelo mundo afora, como, por exemplo, nos Estados Unidos. Após deixar o ministério, foi Presidente do Banco do Estado de Minas Gerais, Deputado constituinte, Presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA); e, em 2006, ganhou o prêmio World Food Prize. Atualmente, é Presidente Executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho) e Diretor da Verde AgriTech desde 2014. E agora, em 2021, Paolinelli foi indicado ao Prêmio Nobel da Paz.
Todos nós esperamos que ele seja, realmente, o nosso grande vitorioso nisso. Mas já é um grande vitorioso, é um grande exemplo para todos nós.
É uma honra muito grande, Paolinelli, recebê-lo aqui no Senado Federal. V. Exa. é uma referência para todo o País, então é um motivo de muito orgulho estar contigo aqui.
Eu vou passar, então, a palavra agora ao nosso querido Alysson Paolinelli.
Está disponibilizado? (Pausa.)
Pode abrir o microfone, Alysson, para a gente... (Pausa.)
Ótimo. (Pausa.)
Há algum problema com o microfone, com o som aí, Alysson.
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Nós não...
Eu acho que é o microfone seu, Alysson. A gente não está conseguindo ouvir aqui. (Pausa.)
Será que é o fio? Está ativado o microfone, Alysson, com o computador? (Pausa.)
Alysson, eu acho que falta ativar o som no seu computador. Está desativado o som no computador; não é... (Pausa.)
Enquanto o Alysson vai tentando consertar, colocar o som em funcionamento, eu só vou já mandar algumas colocações feitas aqui pelos nossos internautas. Enquanto isso o Alysson consegue fazer a conexão.
O Alessandro de Sousa, lá do Pará, está perguntando aqui, Maurício - e, depois, o Alysson pode falar também -: "Por que o Brasil não investe na produção de agrofloresta?".
A Claudia Regina, do Paraná, pergunta: "Que tal incentivar a soberania alimentar do povo através da agricultura familiar e sustentável ao invés da produção de commodities?".
A Ester Cardoso, aqui do Distrito Federal: "Por que há cada vez menos recursos sendo destinados ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)?"; "A liberação de agrotóxicos no atual Governo é a maior dos últimos 14 anos. Quais os entraves à aprovação de biodefensivos?".
A Nelma Denise, do Rio de Janeiro: "Em que nível a estratégia do Governo e a implantação de novas técnicas agrícolas visa à diminuição do desmatamento e à sustentabilidade?".
A Beatriz Machado, de São Paulo: "Como é possível incentivar a agricultura familiar em uma cidade como São Paulo?".
A Ester Cardoso também, aqui do Distrito Federal: "É essencial o apoio a pequenos agricultores, além da redistribuição e democratização de terras".
Geovana Chagas, de Minas: "A produção agrícola deveria ter como princípio a diversificação da produção, pois monocultura já existe desde o Brasil colônia!".
Renata Grabowski, de São Paulo: "O desmatamento para produção agrícola precisa ser interrompido. Já temos muitas áreas não plantadas e desmatadas; é só remanejar".
E a Maria Zaroni, do Rio de Janeiro, diz aqui: "É importante considerar o acesso dos produtores à informação para o uso sustentável dos recursos naturais".
São algumas perguntas e colocações dos nossos internautas, enviadas aqui através do e-Cidadania. (Pausa.)
Alysson, agora começou... Dá para ouvir. O.k.?
O SR. ALYSSON PAOLINELLI (Para expor.) - Senador, desculpe aí. Eu estou na minha fazenda há bastante tempo...
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Ótimo!
O SR. ALYSSON PAOLINELLI - ... e às vezes aqui a coisa complica.
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De qualquer forma, Senador, quero cumprimentá-lo, agradecer esta oportunidade que o senhor me dá e, principalmente, a oportunidade de ter ouvido o primeiro orador, que foi o Dr. Maurício Lopes.
Eu pediria, com a minha experiência parlamentar, que, se o Senador tiver condição, mandasse gravar essa palestra do Maurício para que ela ficasse à disposição dos nossos Parlamentares para que eles vejam, de uma maneira tão clara e, eu diria, incorrigível - não há o que corrigir - essa palestra que o Maurício apresentou. Ele, com a experiência que tem, com a inteligência que Deus lhe deu e com sua capacidade, que ele desenvolveu ao longo de tantos anos, é hoje para nós no Brasil um modelo que precisa ser seguido e ouvido.
Eu me honro muito, porque acompanhei o Maurício em sua vida de pesquisador. Ele começou lá no nosso Epamig, em Minas Gerais, uma instituição que serviu ao grande Ministro Cirne Lima de inspiração para que ele transformasse o antigo Dnpea (Departamento Nacional de Pesquisa e Experimentação) na Embrapa, o que lhe possibilitou, em 1974, através da Embrapa, construir uma estratégia que deu certo para o País.
Eu reconheço que o Maurício hoje é, indiscutivelmente, uma das melhores cabeças que nós temos como pesquisador, como pensador, como quem acompanha, no dia a dia, as exigências e as oportunidades para a agricultura brasileira.
Esta minha solicitação, Senador, o senhor mais do que ninguém saberá como conduzi-la. O seu prestígio no Congresso, a sua atuação na área da pesquisa, da ciência, tem sido tão grande! E eu quero aproveitar a oportunidade, porque acompanho com muito carinho o trabalho que o senhor vem fazendo para apoiar a pesquisa brasileira, especialmente a pesquisa ligada ao nosso setor agropecuário. Eu só desejo, Senador, que essa sua defesa leve aos seus companheiros, leve ao Executivo, leve ao Judiciário um dos maiores riscos que nós estamos correndo hoje, que é o de reduzir o investimento na pesquisa brasileira. O nosso CNPq não pode sofrer cortes. E o senhor, mais do que ninguém, sabe o que estão fazendo com os recursos do nosso Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.
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Quero agradecer, Sr. Senador, o esforço que o senhor tem feito. Eu me coloco à sua disposição, ao lado, naturalmente, de Maurício, que é um dos melhores consultores que nós podemos ter no Brasil, para que o Governo brasileiro, o Legislativo, o Judiciário e o Executivo estejam mais bem informados de quais são as nossas possibilidades, mas também quais são as necessidades e as exigências para que o Brasil tenha juízo e monte um projeto estratégico para o setor da pesquisa nacional e recupere os orçamentos necessários à manutenção dessa fabulosa Embrapa. Nós vimos, através de um dos seus principais pesquisadores, o que essa empresa representa para o Brasil e a segurança que essa empresa pode nos dar para que não cometamos erros e também não caiamos em sofismas que muitas vezes se apresentam e que constituem um risco à nossa soberania.
Eu pediria, com toda ênfase - e fico muito satisfeito em dizer ao senhor que, depois de Maurício, eu teria muito pouco a acrescentar... A única coisa que acho que posso fazer pela minha independência hoje é dizer claramente aos homens de Governo: o risco que corremos em não permitir que as nossas instituições, a Embrapa, as universidades... Nelas encontramos hoje os melhores cursos de pós-graduação em agricultura tropical que o mundo vai precisar ainda ter.
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A nossa empresa privada acordou e hoje está trabalhando e fazendo investimentos maciços para desenvolver, especialmente o campo da bioeconomia, tão bem definido pelo Maurício aí, porque eles sabem que, através dessa bioeconomia, nós vamos mudar o processo de geração de recursos, nós vamos mudar todas as nossas iniciativas, a começar pelo processo industrial. E, ao atender mais às demandas e às soluções que os pesquisadores da bioeconomia vão lhes oferecer, o Brasil terá uma mudança excepcional.
Temos de reconhecer que somos o País mais rico em biologia do mundo. O Brasil hoje é o grande repositório dos recursos naturais que o mundo deseja. Não podemos perder de vista as mudanças que são necessárias, tão bem definidas por eles, e que nos darão, sobretudo, a independência de produtos químicos que nos fazem gastar hoje US$37,5 bilhões, produtos químicos que a ciência, especialmente a brasileira - e, com orgulho, eu digo que estamos na frente, através da biotecnologia -, está processando. Estamos processando várias mudanças e conceitos para o setor agrícola que vão nos dar, sem dúvida nenhuma, novas referências, novos processos, novas soluções e vão dar ao Brasil aquilo que nós mais desejamos.
Senador, eu quero ser mais rápido, eu sei que o senhor tem outro compromisso e eu também tenho um compromisso, mas gostaria sinceramente de dizer - e falo com a liberdade que eu hoje tenho pela autonomia que me deu a minha vida - que ou conversamos sério em termos de administração no Brasil e estabelecemos os planos estratégicos agora ou pagaremos caro por essa ausência.
Não quero criticar Governo A, B ou C. Ao contrário, tenho de dizer com todas as letras: estamos muito bem servidos com a nossa Ministra da Agricultura, competente, trabalhadora, conhecedora da área que administra e que está mantendo o Brasil no patamar que deve. Tenho que me referir também ao Ministro da Ciência e Tecnologia, pessoa de larga visão, de senso prático e que quer ajudar o País.
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Agora, eu não posso deixar de dizer, sem nominar qualquer governo, que o Brasil, há mais de 30 anos, vem deturpando a estratégia criada na década de 70, chegando ao ponto de fechar, Sr. Senador, a nossa Embrater - por incrível que pareça, Sr. Senador, os governos populistas que a fecharam. Quando foi criada, eu estive pessoalmente no Senado e na Câmara defendendo a necessidade de que, além da criação, da tecnologia, nós tínhamos que ter dois parâmetros: um, assistência técnica creditícia e, sobretudo, assistência social da Embrater para a família do produtor. Lembro-me bem, alguns Parlamentares me questionaram: "Mas, Ministro, o senhor está querendo fazer uma mudança de uma geração?". Eu falei, se for uma geração, eu fico feliz. Sr. Senador, veja, estamos já há quase três governos sem conseguir recriar a Anater, que resolve o problema. Participei de todos os três últimos governos insistindo nessa solução, e ela não saiu até hoje.
E nós não temos como justificar as nossas próprias estatísticas, Sr. Senador: 2017, o estudo estatístico que fizemos no setor rural apresentou ao Brasil o quadro quase dantesco... E a maior revolução feita no mundo tropical que representa, sem dúvida nenhuma, a garantia da sustentabilidade e a garantia da segurança alimentar foi feita em apenas por 842 mil propriedades no Brasil. Sr. Senador, essa mesma estatística nos mostra um quadro de que o Brasil ainda tem 4,5 milhões de propriedades que não conseguiram usar as tecnologias que nós criamos.
Eu fico triste, Senador, porque, na realidade, se os seus antecessores do Congresso realmente previram que se gastaria uma geração, tenho que tristemente lhes dizer: a Embrater está fechada há uma geração. Não podemos concordar.
Esta é, sem dúvida - e o Maurício deixou isto muito claro -, uma das mais importantes tarefas que nós temos: fazer o desenvolvimento sustentável para que ele seja, além de ecológico, econômico e social.
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O Brasil não pode conviver, no estágio em que está, partindo para ser o maior exportador de alimentos do mundo, com essa desigualdade, já que 80% das nossas propriedades são extrativas, fazem uma agricultura apenas de subsistência, mas não têm a sua subsistência. É miséria! O estudo que foi feito pela Embrapa demonstrou que essas propriedades têm uma renda média apenas de dois terços de um salário mínimo, e isso não alimenta nenhuma família.
Senador, estou aproveitando essa magistral apresentação do Maurício, que, com suas advertências e com tanta sutileza, ele, empregado do Governo, soube fazer, mas eu tenho o dever de dizer que não me conformo enquanto não enfrentarmos problemas dessa natureza.
O Brasil já tem toda a infraestrutura para ser o grande supridor de alimentos até 2010, quando se espera que a sociedade tenha um equilíbrio relativo em população. São mais 2 bilhões, 2,5 bilhões de habitantes, mas com muito mais renda, com muito mais voracidade em termos de alimentação. E saibam os órgãos técnicos que o mundo terá de apresentar, no mínimo, 61% a mais de alimentos do que é a oferta de hoje - alguns órgãos falam em 70%. E sabem eles que aqueles que sustentaram por 4 mil anos o nosso abastecimento não têm condição de atingir esse nível. Atingirão um terço disso. Portanto, compete ao Brasil crescer e colocar à disposição da sociedade mundial dois terços a mais na oferta de alimentos que hoje temos.
Sr. Senador, eu digo, com toda a tranquilidade, que só as tecnologias que ainda temos, graças a Deus, como ILPF e irrigação, atenderão perfeitamente a essa tarefa, a essa demanda, sem precisar de desmatar um hectare sequer ou derrubar uma árvore. Cabe a nós realizar essa tarefa. Quero ser muito franco: essa tarefa não será realizada se não provocarmos as mudanças para que essas propriedades que são extrativas e de subsistência, que não saibam ou não possam, tenham a mesma oportunidade que tiveram as 841 mil propriedades, para que elas aproveitem dessa oportunidade também e participem dela.
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O senhor deve ter visto as insinuações da palestra do Maurício. O mundo está mudando o seu hábito alimentar, e essa é uma janela nova que se abre ao clima tropical.
Eu fui convidado para visitar, há dois anos e meio, uma estufa totalmente robotizada nos Estados Unidos. Quando perguntei à empresa que a construiu quanto custam o investimento e a manutenção, eles não sabiam. Essa é uma diferença que nós temos que continuar a aproveitar. O Brasil é, sem dúvida nenhuma, a maior estufa a céu aberto que o mundo já viu. Somos 851 milhões de quilômetros quadrados onde a natureza nos dá, de graça, a luz, a água, a terra, as plantas e os animais. Veja, Senador: Deus nos deu isso.
Se nós não formos capazes de provocar as mudanças... E conseguirmos na agricultura chamada de commodities, somos imbatíveis. Temos agora de conseguir nessa agricultura, que tem de oferecer à comunidade mundial, especialmente a mais rica, alimentos mais saudáveis, naturais, que têm um mínimo de contaminação química. É, sim, Senador, o Brasil um país que pode fazer isso a custos muito menores. Basta que tenhamos estratégia para isso.
Senador, eu gostaria de descrever etapas que vivi para dizer ao Congresso Nacional que não existem sonhos. As mudanças são provocadas fundamentalmente pelo conhecimento novo, a ciência, pela capacidade de transferir essa inovação a toda a sua população, especialmente os mais necessitados. E, no meio disso, Senador, é necessária uma política pública adequada, que dê acesso ao grande, ao médio, ao pequeno ao recurso para promover essa mudança.
Quero, de maneira muito sincera... Não sou político, sou um profissional que acredita no que faz. Não vamos resolver o problema do pequeno, enquanto se entrega o crédito para ele comandado pelo banco. São objetivos muito diferentes o do banco e o do desenvolvimento para um produtor de pequena classe. Ou fazemos uma política pública adequada para ele, com assistência técnica e creditícia e também uma educação informal que lhe dê capacidade de criar as condições de mudança, ou não vamos resolver isso.
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Agradeço a oportunidade, Senador, de ter ouvido a palestra do Maurício, de pedir ao Congresso Nacional que marque e defina essa palestra, para que tenham acesso todos os nossos Congressistas.
E eu estarei, Senador, sempre à disposição, com a independência que tenho para criticar atos que não vemos e lances estratégicos para resolver problemas. Quero agradecer essa oportunidade e dizer que estarei sempre à disposição dos senhores.
Muito obrigado, Senadores.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Bem, nós é que agradecemos muito. É uma honra muito grande recebê-lo aqui, Dr. Alysson Paolinelli, nesta audiência pública.
Nós colocamos a Comissão Senado do Futuro exatamente na perspectiva de construir políticas públicas de Estado, que eu acho que é exatamente o que falta neste País. Basta ver - não é? - o que fez V. Exa. e o que fez nosso querido JK, que, com a visão de futuro que pensa nas próximas gerações, fizeram o que fizeram. Se hoje nós temos aí uma balança comercial e um desenvolvimento do País, a gente deve muito a JK e a V. Exa., que souberam consolidar a questão econômica do Cerrado - porque eu, que cheguei aqui nos anos 70, sei que naquela época praticamente o Cerrado não produzia nada. Então, o Brasil deve muito isso tanto a JK, que teve essa ousadia de construir Brasília em mil dias - hoje você não constrói, hoje você não tem um habite-se em cinco anos -, e a V. Exa., que fez esse belo trabalho e continua fazendo. V. Exa. ainda tem essa visão importantíssima aí de pensar nas próximas gerações.
É uma luta difícil: educação e ciência e tecnologia, ainda é muito discurso, não têm prioridade dos recursos. Basta ver a lei que nós aprovamos, de minha autoria, do FNDCT, que é uma coisa óbvia, mas que lamentavelmente, nos últimos anos, inclusive no último ano, houve 90% de contingenciamento, não é? Agora a gente aprovou, porém ainda não resolvemos a questão do recurso, apesar de ter sido derrubado o veto, publicado, sancionado. Mas, ainda este mês, nós vamos exigir aqui a restituição do fundo, que não será definida pelo Ministério da Economia - a lei é muito clara: quem decide a aplicação dos recursos do fundo é o conselho, existe um conselho para isso. Então, não é buscar o que está sendo feito para tentar justificar que está executando o fundo. Não. E nós estamos aí mudando também a taxa de juros da parcela reembolsável, porque a TJLP ficou quase que inviável.
Mas nos próximos 15 dias, com certeza, nós vamos cobrar aqui o que foi prometido: a restituição e a recomposição do fundo, que passou a ser um fundo financeiro também, para que não haja descontinuidade. Porque, quanto à questão da pesquisa, eu, que tive a oportunidade de ser Secretário por dois mandatos, sei que não basta também ter recurso de vez em quando: você tem que ter regularidade. Não se faz política pública sem regularidade.
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Eu queria aproveitar a presença e a experiência do Maurício e de V. Exa. porque, além de Presidente da Frente Parlamentar de Ciência, Tecnologia, Pesquisa e Inovação, em que a gente trabalha aqui também, a gente atuou muito, e sei da importância da questão da regularização fundiária. Metade da população do País ainda vive em áreas irregulares, inclusive nas áreas rurais, e muitas vezes não tem financiamento, não tem como investir praticamente nada, porque não tem escritura, não tem título. É uma demanda antiga. Eu fui o Presidente da Comissão, ainda no Governo Temer, da medida provisória, e depois ajustamos mais um pouco. E precisávamos ajustar ainda mais. Então, eu gostaria de pedir a opinião tanto do Maurício quanto do Dr. Alysson sobre essa questão da importância da regularização dessas terras para haver garantia, principalmente para o pequeno produtor.
Segundo, por mais que tenhamos o reconhecimento de discurso com relação à Embrapa, infelizmente ainda a Embrapa está com o pires na mão, inclusive para a sua própria subsistência, quer dizer, mal consegue pagar a folha. O que aconteceu - o Maurício teve a oportunidade de ser presidente recentemente -, o que houve que a gente não conseguiu colocar na Embrapa que ela tivesse um orçamento de recurso próprio? Pelo tanto que fez pelo País, pelo tanto que fez pela pesquisa, por que a gente não consegue ainda? E, se for o caso, precisamos de sugestão para alterar a lei para que ela tenha receita própria daquilo que ela desenvolve há anos e anos. Porque o que eu vejo aqui todos os dias, nestes últimos anos, é a Embrapa sendo contingenciada, sendo vetado tudo que vem para cá em termos de recurso, e com o pires na mão aqui todo ano. Então, é uma outra questão.
E, com relação... Apesar da nossa exportação na área de alimentação, nós temos no Brasil muitas pessoas, inclusive aqui na Capital, passando fome. Então, como explicar que, sendo o maior produtor de alimentos do mundo, a gente não consegue o mínimo para que as pessoas não passem fome neste País, inclusive aqui na Capital?
E há essas colocações que eu fiz aqui do e-Cidadania.
Quero dizer a V. Exa., Ministro Alysson, que a reunião está sendo transmitida e está sendo gravada aqui - a TV Senado transmite. Também temos já as apresentações, que já estão, inclusive, aqui no nosso site do Senado, da Comissão do Futuro. E, com certeza, essa aula que foi dada será disponibilizada não só para os Senadores; faço questão de encaminhá-la para as faculdades, universidades, que é onde a gente precisa ter uma atenção especial com os jovens. Os nossos jovens precisam de esperança, oportunidades, e infelizmente a educação nos últimos anos caiu muito de qualidade, inclusive na educação básica, principalmente agora. Os nossos jovens...
Eu acho que essa pandemia trouxe mais dificuldade ainda. Nós temos uma evasão muito grande agora do ensino médio. Dificilmente nós vamos conseguir convencer esses jovens a voltarem para a escola, porque a escola, infelizmente, na sua grande maioria, não é atrativa, não é atual. Ainda há muitas escolas que sequer têm saneamento, água, muito menos tecnologia. Basta ver que nós aprovamos agora, na semana passada - na marra, derrubamos veto -, uma legislação no sentido colocar internet nas escolas, banda larga nas escolas, nas escolas rurais. E eu espero que a gente consiga, logo, logo, melhorar um pouco.
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Melhoramos o Fundeb - fui o Relator aqui também -, aumentando os recursos, mas não basta ter recurso. Se não houver planejamento, se não houver foco, se não houver integração, a gente não consegue também fazer um bom investimento.
Então, eu já, para as considerações finais, Maurício e Ministro, quero agradecer muito a presença. Foi uma aula essa audiência pública, muito bacana. E eu tenho certeza que vai despertar muito os nossos jovens, que receberão, com certeza, essa audiência aqui.
Mas, então, já pode fazer esses comentários daquilo que eu coloquei e das perguntas também dos internautas e aproveitar e fazer as considerações finais.
Maurício, obrigado pela sua participação. Foi uma bela aula.
O SR. MAURÍCIO ANTÔNIO LOPES (Para expor.) - Muitíssimo obrigado, Senador; muitíssimo obrigado, Ministro Alysson, pelas suas palavras.
E eu gostaria só de dizer que, se algo fiz e se algo alcancei, é porque tive a felicidade de ter mestres que realmente me ajudaram muito, me iluminaram aí no caminho que eu trilhei - o senhor no topo da lista desses mestres. Então, me sinto privilegiado por ter tido a oportunidade do convívio e do aprendizado com você, meu caro amigo e Ministro Alysson.
Muito rapidamente, Senador, das questões que foram colocadas pelos internautas e pelos pontos que o senhor coloca da regularização, dos recursos da Embrapa, eu acho que eu vou começar um pouco por essa questão da regularização dos pequenos produtores e do desafio para que eles consigam se inserir no mercado, que eles consigam inclusão e sustentabilidade na sua atividade.
Eu vou lembrar aqui os ensinamentos de um outro grande mestre, Eliseu Alves, que sempre nos lembra que nós estamos numa economia capitalista; seguiremos numa economia capitalista. Eu sempre tenho a ilusão, Senador, de que nós vamos reinventar o capitalismo para colocar talvez mais luz, jogar mais luz sobre as dimensões ambientais e sociais da sustentabilidade no capitalismo que a gente tem hoje, e não tanto na dimensão econômica. Eu acho que muitos estão trabalhando nessa direção, mas nós somos uma economia capitalista e, em grande parte, é essa lógica que impõe a imensa exclusão que nós vemos no Brasil. O Ministro Alysson citou 4,5 milhões de pequenos e médios produtores que estão excluídos frente a 800 mil que conseguem acessar tecnologia, conhecimento e mercados.
Qual a razão disso? A razão é um conceito relativamente comum na economia, que são as imperfeições ou as falhas de mercado. Considerando a maneira como a sociedade capitalista, os processos e as cadeias de valor capitalistas estão organizados, os pequenos padecem desse mal, das imperfeições de mercado que fazem com que os pequenos produtores tenham grande dificuldade para acessar conhecimento e tecnologia, porque é muito caro para a capacidade deles - eles não têm a escala que os permita acessar o conhecimento e a tecnologia. E, da mesma forma, por não terem escala, eles não conseguem acessar as cadeias de valor que estão aí, porque a sua produção não terá valor, de novo, por não ter a escala necessária.
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Então, muito sinceramente, Senador, nós precisamos colocar esse tema das imperfeições de mercado no holofote das políticas públicas para o campo. Como se resolve a imperfeição de mercado numa economia que seguirá sendo capitalista? Existem várias formas de fazê-lo e muitos brasileiros sabem fazê-lo. Eu dou o exemplo das cooperativas no Brasil. O Brasil tem cooperativas poderosas na sua metade sul que basicamente souberam resolver o problema das imperfeições de mercado, porque pequenos produtores se unem em cooperativas, no associativismo, e ganham escala para acessar conhecimento e tecnologia e ganham escala para acessar as cadeias de valor que estão aí. Portanto, eles conseguem acessar conhecimento e conseguem acessar recurso porque estão participando do mercado.
Então, nós temos que pensar, se não cooperativas, políticas públicas que criem as condições para que os pequenos produtores possam enfrentar esse que é um mal da economia, que é um mal do capitalismo corrente, que são as imperfeições de mercado que excluem os pequenos, porque não têm escala, não têm acesso ao conhecimento que é necessário para avançar. Dificilmente vai se avançar hoje sem conectividade, sem acesso a insumos avançados... Não estou falando aqui de pesticidas, estou falando dos insumos novos, dos bioinsumos, que vão permitir uma produção limpa e alcançar mercados mais sofisticados e que pagam mais. Então, é preciso que coloquemos esse desafio da escala e das imperfeições de mercado que impedem uma legião de produtores no Brasil de alcançarem esse espaço.
E temos também que pensar em outros... Alguns internautas perguntaram coisas que estão muito conectadas a isso. Agricultura familiar em São Paulo ou nas imediações de São Paulo. Pessoal, nós temos que imaginar que o futuro vai pedir uma agricultura urbana e periurbana mais fortalecida. O futuro vai ser de cidades cada vez maiores, que demandam cada vez mais, e de consumidores que querem acesso a alimentos frescos, alimentos saudáveis, alimentos com os quais eles tenham contato. Essa é uma imensa oportunidade para os pequenos produtores no Brasil. Então, o tema agricultura urbana e periurbana só tende a crescer no mundo. Nós temos que colocar isso no foco das políticas públicas do Brasil. Tecnologia não nos falta, novas tecnologias estão emergindo.
Então, há um espaço fabuloso de inclusão se nós formos hábeis para entender como a economia faz com que uma legião de brasileiros se veja excluída. Se nós não vamos revisitar o capitalismo, se o Brasil não vai mudar o seu paradigma econômico, é preciso ajustar esse paradigma econômico, modulá-lo para que nós resolvamos o problema dessa legião de excluídos no campo que o Brasil ainda tem. Lembrando também que esses produtores terão filhos, eles serão sucedidos por jovens que agora têm mais acesso à conectividade, ao celular, a novas formas de alcançar conhecimento e informação. Está aqui um outro caminho fabuloso, pensar na sucessão. Nós não queremos que os filhos desses produtores sejam excluídos como eles foram até agora. Há um caminho muito importante aqui para política pública inteligente, visionária, olhando adiante.
Essas são as minhas considerações nesse ponto extremamente importante que o Ministro Alysson nos trouxe, um baita de um problema para o Brasil, que nós temos que resolver com inteligência.
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E não há como resolver isso sem olhar para essas questões, imperfeições de mercado, as políticas e os programas que nos ajudarão a resolver, a minorar ou a modular novos mercados, novas cadeias de valor e novos caminhos para inclusão dessa legião de brasileiros.
No outro ponto, para terminar, Senador, recursos próprios para a Embrapa. Eu fui Presidente da Embrapa por dois termos consecutivos, por um tempo longo. Fiz um esforço enorme, inclusive junto ao Parlamento, para criar um mecanismo que nós chamávamos na época Embrapa Tech. Chegamos a ter projeto de lei aprovado no Congresso para a criação da Embrapa Tech, que foi ao Governo e ao Executivo e parou na burocracia.
Era a criação de um novo ente que ia ajudar a Embrapa nessa relação com o mercado de inovação. Esse ente, a Embrapa Tech, receberia os ativos da Embrapa e os negociaria com empresas. Nós somos uma instituição de pesquisa; nós não somos negociadores. Nós não estamos no mercado todo dia negociando tecnologia; nós estamos concentrados nos imensos desafios da inovação.
Então, a Embrapa precisa de um ambiente próprio para pensar negócio. O mundo de negócio é diferente do mundo da ciência e da inovação. Então, a ideia era criar esse ente, mas criar não com a ilusão, Senador, de que um ente como esse resolve todos os problemas de financiamento da Embrapa. Nós temos que imaginar o seguinte: pesquisa pública é locomotiva limpa-trilho, ela vai na frente, limpando o caminho, para que o setor privado encontre os trilhos desimpedidos para colocar os seus vagões, o seu investimento, a sua criatividade e transformar o conhecimento que a gente desenvolve em inovação. É assim que a coisa tem que funcionar.
E o Estado sempre tem que reconhecer essa importância, o Estado empreendedor, obviamente. Nós precisamos de uma visão de Estado empreendedor que aceite pagar uma parte dessa conta. Eu não tenho a ilusão de que a Embrapa um dia será capaz de arrecadar todo o recurso de que ela precisa para sustentar toda a operação dessa locomotiva limpa-trilho, que está abraçando projetos de alto risco. Quem abraça os projetos de alto risco, que levam 15, 20 anos para serem transformados em realidade, é a pesquisa pública, é o Estado empreendedor.
Foi assim no Brasil, o Ministro Alysson fez isto: construiu um arcabouço de Estado empreendedor que investiu na formação de uma legião de jovens nas escolas mais caras do mundo; esses jovens voltaram e, em 40 anos, fizeram a revolução que está aí. Quer dizer, pensar que o setor privado vai pagar por algo assim é ilusão. Quem tem que pagar por isso é o Estado empreendedor.
Então, nós precisamos fortalecer de novo no Brasil a noção de Estado empreendedor. Sem o Estado como locomotiva limpa-trilho, ocupando espaços, empoderando a indústria e as empresas, não há país competitivo no futuro. Essa é a dura realidade que nós temos que encarar. É preciso ter essa visão de Estado empreendedor consolidada, permanente, sistemática, porque o Brasil precisa disso para avançar e para transformar em realidade a imensidão de possibilidades que nós temos: na nossa biodiversidade, na bioeconomia - o Brasil é um país riquíssimo na sua base de conhecimento, na sua base de recursos naturais, mas nós precisamos de um Estado empreendedor, de fato, por trás disso tudo.
Eu vou terminar dando um exemplo do quão importante é o Estado empreendedor, Senador, Ministro.
Está havendo uma grande revolução na pecuária agora, da qual eu falei e o Ministro Alysson também falou, que é a dos sistemas integrados, trata-se de integrar lavoura, pecuária e floresta, agricultura que mimetiza a natureza.
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A Embrapa começou com isso há 30 anos - há 30 anos! Todos riram de nós. Todos deram gargalhada quando a gente falou em misturar, no mesmo ambiente, 365 dias por ano, lavoura, pasto, pecuária, árvore e lavoura de novo. E isso, agora, 30 anos depois, está se tornando o paradigma de agricultura para o futuro. Foi necessário Estado empreendedor bancar a Embrapa, bancar as universidades, bancar jovens sendo treinados nos melhores centros do mundo, para a gente segurar a onda durante 30 anos. Aqueles que riram de nós, há 30 anos, hoje estão falando: "Puxa vida! Na verdade, vocês estavam abrindo um caminho para um futuro que poderá ser a nossa salvação." Trata-se de uma realidade em que vamos ter métricas muito precisas para avaliar quão rapidamente estamos migrando na direção da sustentabilidade. E, se a gente não tiver uma agricultura capaz de mimetizar a natureza, prover serviço ambiental e ser sustentável, de fato, nas três dimensões - econômica, social e ambiental -, a nossa capacidade competitiva para o futuro fica comprometida.
Então, Senador, com essas considerações, eu gostaria de agradecer-lhe e de, primeiro, parabenizá-lo. Durante todos os anos em que estive à frente da Embrapa, recebi um apoio incondicional do senhor, sempre um batalhador, falando pela ciência, falando pela tecnologia, falando pelo Estado empreendedor, que nós precisamos ter e fortalecer no Brasil. Eu acho que o senhor é um ícone desse pedido para que a gente se una em torno de um conceito realmente de Estado empreendedor na ciência e na inovação para o nosso País.
Eu queria parabenizá-lo por isso e agradecer de novo a oportunidade de participar aqui com uma das pessoas que realmente foi da maior importância na minha vida, na minha trajetória, meu querido Alysson, grande mestre, grande inspirador, o melhor candidato a Prêmio Nobel da Paz em 2021, não tenho dúvida nenhuma. Estamos todos com Alysson para o Prêmio Nobel em 2021!
Muitíssimo obrigado, Senador. Foi um grande prazer estar aqui com o senhor. Um grande abraço a todos.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Maurício. Eu é que agradeço muito a honra de vocês estarem participando hoje desta audiência pública.
Passo, então, agora para o nosso querido Ministro para também fazer as suas considerações finais, já agradecendo e torcendo aqui para que a gente possa ter um prêmio da Paz o mais rapidamente possível.
Dr. Alysson Paolinelli.
O SR. ALYSSON PAOLINELLI - O senhor está me ouvindo, Senador?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Estou. Está bem.
O SR. ALYSSON PAOLINELLI (Para expor.) - Eu tenho só que agradecer mais uma vez, Senador, esta oportunidade que o senhor nos dá.
Em primeiro lugar, eu falo do Maurícío, que é, para mim, uma das maiores cabeças que o nosso País tem e que pode tanto ajudar este País, e, principalmente, a oportunidade de agradecer-lhe por sua dedicação e por seu trabalho em prol da ciência nacional.
Eu gostaria, sinceramente, que o senhor tivesse a oportunidade de entrar também no Executivo, porque eu tenho absoluta certeza de que, com o que o senhor está fazendo e com o que já fez, a gente poderá ter esperança de que apareçam, dentro do Executivo, inspiradores para os grandes lances de que o Brasil precisa.
Muito obrigado.
R
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Bem, nós é que agradecemos.
Já estão disponíveis aqui na página do Senado, aqui na Comissão do Futuro, todas as apresentações da nossa audiência. Elas já estão disponíveis, e vamos encaminhá-las também para as nossas faculdades, universidades, porque são muito importantes. Realmente, foi uma bela aula. Tenho certeza de que, com isso, a gente começa a despertar um pouco desse interesse para a ciência, tecnologia, inovação e pesquisa.
Eu agradeço a todos.
Nada mais havendo a tratar, eu declaro encerrada a presente reunião.
Muito obrigado.
(Iniciada às 10 horas e 14 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 57 minutos.)