19/08/2021 - 7ª - Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional

Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a 7ª Reunião da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura.
Gostaria de agradecer a presença conosco hoje dos nossos debatedores: o Chanceler, Embaixador e Ministro Carlos Alberto Franco França, tenho muita alegria e prazer em recebê-lo no dia de hoje, nosso Embaixador equilibrado, um verdadeiro diplomata, que tem tentado minimizar e superar as dificuldades criadas no passado, mas bem amenizadas no presente graças à sua atuação; o Ministro Paulo Guedes, Ministro da Economia, que deverá participar às 11h conosco, já estamos combinados, é um tema muito caro para ele também, e que está aí na luta para tentar fazer com que o Brasil retome o seu desenvolvimento e crescimento; o ex-Chanceler e Embaixador Celso Lafer, cuja presença representa mais um fruto da parceria da CRE com o Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais), instituição em que o Embaixador é Conselheiro, e aproveito para agradecer ao Cebri pela parceria, pela amizade, pelo espírito público e para parabenizá-lo pelos membros que fazem parte deste conselho, brasileiros da maior qualidade que já exerceram funções importantes de Estado e que hoje ainda continuam discutindo, debatendo o Brasil, tentando cooperar para o crescimento da Nação; o Embaixador Guillermo Valles Galmes, Embaixador do Uruguai para o Brasil, eu tive o grande prazer não só de conhecê-lo, mas de aprender com ele, pois foi um dos arquitetos do Mercosul, à época, há 30 anos, da sua construção, sendo um especialista nesse tema e, por isso, convidado aqui neste dia. E com os demais Embaixadores da Argentina e do Paraguai também já estivemos em conversas - ainda ontem, com o Embaixador do Paraguai, e, com o Embaixador da Argentina, aprofundaremos nos próximos dias - e vamos discutir também com outros países da América do Sul. Enfim, todos os Embaixadores da América do Sul, no Brasil, têm cooperado muito com os debates em geral no sentido de unir ainda mais esses países. Contamos também com a presença da Confederação Nacional da Indústria (CNI), aqui representada pelo Sr. Fabrizio Sardelli Panzini, Gerente de Políticas de Integração Internacional, indicado pelo Presidente Robson Braga de Andrade.
Pauta.
A presente audiência pública tem como objetivo debater o tema "Mercosul: Tarifa Externa Comum e potencial de ampliação do bloco", atendendo ao Requerimento CRE nº 7, de 2021, aprovado em 6 de julho. O debate insere-se no ciclo de audiências públicas sobre o tema "Mercosul: ampliação e modernização" do terceiro eixo estruturante do nosso plano de trabalho para 2021/2022, aprovado no início das sessões, antes do recesso.
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Já estão aqui os nossos convidados: o Embaixador do Uruguai e o nosso Exmo. Sr. Ministro de Estado das Relações Exteriores.
A reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do portal e-Cidadania na internet em senado.leg.br/ecidadania ou pelo telefone da Ouvidoria 0800-612211 - 0800-612211!
Registro a presença do Sr. Embaixador Orlando Leite Ribeiro, Secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - é um prazer tê-lo aqui nesta audiência -; do corpo diplomático da Embaixada do Uruguai, representado pela Sra. Ministra-Conselheira Natalia Novoa; do corpo diplomático da Embaixada da Argentina, representado pelo Sr. Rodrigo Bardoneschi; do Embaixador Michel Arslanian, Diretor do Departamento de Mercosul e Integração Regional; e da Embaixadora Cláudia Buzzi, Diretora da Assessoria de Assuntos Federativos e Parlamentares do Itamaraty.
Sobre as falas dos debatedores, esclareço aos senhores debatedores que concederei a palavra por 15 minutos a cada um, com possibilidade, claro, de prorrogação para a conclusão de suas exposições. Em seguida, abriremos a fase de interpelações pelas Sras. Senadoras e Srs. Senadores inscritos que poderão estar presentes ou poderão estar on-line, remotamente, participando da nossa audiência.
Agradeço ao Senador Esperidião Amin, que já está aqui entre nós.
Se me permitem, vamos fazer aqui uma breve apresentação sobre o tema em nome da CRE.
Ao longo dessas três décadas de existência, o Mercosul contribuiu positivamente para a dinamização do comércio do Brasil com a região. O bloco regional representa o primeiro ou o segundo destino das exportações dos sete Estados brasileiros: Amazonas, Ceará, Pernambuco, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul.
De 2011 a 2020, as transações comerciais com os parceiros do bloco, caracterizadas por pauta exportadora diversificada em produtos industriais e alimentícios, renderam ao Brasil um superávit de US$54,9 bilhões. Mais de 80% de nossas exportações para os países do bloco são constituídas por produtos industrializados. Essa atuação foi superada apenas pelo resultado obtido na balança comercial com a China, que registrou US$158,3 bilhões no período, porém, com predominância de gama reduzida de produtos.
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Segundo o levantamento da Confederação Nacional da Indústria, cada 1 bilhão exportado para o Mercosul gera 4,12 bilhões para a economia brasileira. No entanto, constata-se que, depois desse período de crescimento considerável, o dinamismo perdeu força, sobretudo no comércio bilateral Brasil-Argentina, o mais significativo do bloco, como mostram dados do portal Camex e da Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais.
Em 2011, o Brasil exportou para a Argentina 8,9%, em bilhões de dólares, dos transacionados com o exterior. De tudo que transacionamos, comercializamos em 2011, a Argentina representou 8,9%; e, em 2020, apenas 4% das vendas externas totais do Brasil, saímos de 8%, quase 9% para 4,1%, agora no ano de 2020.
Hoje o Mercosul enfrenta uma crise profunda, um momento de inflexão. Seu reflexo mais visível recai sobre o comércio bilateral entre os dois maiores sócios, cuja redução é de 60% em relação a dez anos atrás.
Gostaria apenas de lembrar que todo o PIB do Mercosul... Na composição do PIB do Mercosul, o Brasil representa 81%. Porém, apesar dessa redução significativa ao longo do tempo, o comércio intrabloco continua sendo importante para alguns setores da indústria, especificamente. Além do setor automotivo, a Argentina ainda é o principal comprador de produtos das indústrias de plásticos e de celulose; o segundo maior importador de máquinas e equipamentos e de produtos do setor de borracha e o terceiro maior importador de químicos, orgânicos e produtos farmacêuticos brasileiros.
Essa situação imprime caráter de urgência ao processo de revitalização e modernização do bloco, mediante o reforço da integração interna, a ampliação de acordos comerciais com países estratégicos, a melhoria da competitividade e a estabilidade econômica.
No âmbito deste processo, encontram-se em discussão propostas sobre dois temas complexos que podem afetar as relações entre os próprios membros do bloco e criar um impasse nos avanços da integração do Mercosul, sobretudo nos planos econômico, comercial e de inserção nas cadeias regionais e globais de produção. Trata-se da redução da Tarifa Externa Comum e da flexibilização das regras do Mercosul.
Essas possíveis modificações... Desculpe. Não restam dúvidas de que as alíquotas de importação do bloco, cuja média é superior aos padrões internacionais e de alguns países de porte semelhante ao Brasil... Enquanto a nossa Tarifa Externa Comum, em média, fica em 13%, a dos países semelhantes ao Brasil se encontra de 3% até no máximo 5%. Então, de fato, nós estamos com uma tarifa muito defasada do que significa a abertura importante para os países.
Décadas de alterações pontuais na Tarifa Externa Comum, um dos principais instrumentos de política comercial comum, criaram, ao longo do tempo, inúmeras distorções, além de diversos regimes especiais - em torno de 750 produtos com regimes especiais -, o que faz do subgrupo regional uma união aduaneira imperfeita. A TEC respalda o comércio intrabloco, e sem ela no curto prazo a desaceleração do processo de integração poderá ser ainda mais acentuada. Caso a proposta de flexibilização das regras de negociação com terceiros países venha a ser adotada, o Mercosul poderá deixar de ser uma união aduaneira para transformar-se em área de livre comércio.
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A superação da atual crise passa, portanto, pelo resgate dos valores originais do Mercosul, que não se resume a uma tarifa comum. Nós somos importantes, temos valores similares importantes em outras áreas que não estejam centradas apenas nessa tarifa.
É fundamental que se preserve e intensifique o livre comércio tanto entre os sócios do bloco, quanto com o resto do mundo, de maneira a constituir plataforma de inserção competitiva nos mercados regionais e internacionais. Esse exercício é importante se almejarmos incrementar a produtividade e a competitividade na região - esse exercício será muito importante. Igualmente importante é o fortalecimento do livre comércio no interior do bloco, mediante a conclusão dos acordos de compras governamentais, de facilitação de comércio e de reconhecimento mútuo de indicações geográficas de origem que se encontram sob a apreciação deste Congresso. E estou envidando esforços para agilizar a sua tramitação no Legislativo, em especial, na Câmara dos Deputados.
O único acordo comercial que se encontra no Senado, que já esteve na pauta na semana passada e o Relator pediu que retirasse para mais uma rodada de negociações, é o acordo comercial com o Chile. É o único, exclusivo.
A relevância, a sensibilidade e as implicações políticas e econômicas dos temas envolvidos no processo de modernização do Mercosul e para a própria sobrevivência do bloco requerem discussões abertas, a participação dos segmentos da sociedade interessados na integração regional. Com o intuito de contribuir para o encaminhamento dessas questões durante o atual mandato do Brasil na presidência pro tempore do Mercosul, abro esse espaço de debate com representantes do Executivo, membros desta Comissão e representantes do setor privado.
Muito obrigada.
Iniciamos agora a participação dos nossos convidados. Nosso Ministro faz questão de ouvir os debatedores. Ele tem um horário de saída, mas há tempo para que ele ouça alguns. Muito obrigada, Embaixador, pelo prestígio da presença.
Para dar início à audiência pública, ouviremos o Embaixador Celso Lafer. Lafer serviu como Ministro das Relações Exteriores em duas ocasiões: durante os mandatos dos Presidentes Collor e Fernando Henrique Cardoso, tendo sido ainda Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio no segundo Governo de FHC. Foi Embaixador do Brasil na ONU e na OMC, em Genebra, onde foi Presidente do Órgão de Solução de Controvérsias. É Professor Emérito da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, da USP, onde ministrou Direito Internacional e Filosofia do Direito - eu gostaria de ter sido aluna. O Ministro Lafer recebeu diploma de bacharel da Faculdade de Direito da USP e mestrado e PhD em Ciências Políticas da Universidade de Cornell. Foi até recentemente Presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Nosso grande Chanceler, Embaixador Celso Lafer, concedo a palavra a V. Exa.
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O SR. CELSO LAFER (Para expor. Por videoconferência.) - Eminente Senadora, quero, em primeiro lugar, dizer da minha satisfação de participar desta audiência que está tratando de um assunto de tanto relevo para a política externa do nosso País e que também me dá a oportunidade de homenagear V. Exa., Senadora Kátia Abreu, de tão destacada e corajosa trajetória na vida pública do nosso País, que, além do mais, é uma grande conhecedora das realidades e dos desafios da inserção internacional econômica do Brasil, que tem entre as suas facetas importantes o tema desta audiência, como, aliás, destacado com muita clareza na apresentação inicial de V. Exa.
Coube-me dizer alguma coisa sobre essa dimensão histórica do Mercosul, que é no fundo a dimensão dos seus valores. Então, a primeira observação que eu faço é que ela é a expressão de uma força profunda da nossa diplomacia, o vale do empenho de buscar laços aproximativos de cooperação com a nossa vizinhança; buscar fronteiras de cooperação, que contribuem para relações amistosas no contexto regional, favorecem a paz e criam, enfim, melhores condições para o nosso desenvolvimento.
Os dados que a Senadora apresentou logo na sua abertura indicam o significado também econômico do Mercosul para a vida brasileira. E, além do mais, é um passo importante para a nossa presença no mundo, inclusive para um país de escala continental. Quero dizer que o cuidado com o entorno regional é sempre uma prioridade de política externa. Foi o que levou, por exemplo, os europeus a conceberem a União Europeia; foi o que levou os norte-americanos a se preocuparem com o seu entorno com a criação do Nafta; é o exemplo também na Ásia o papel da Asean.
O antecedente imediato do Mercosul é fruto da redemocratização do nosso País: os entendimentos de acordos de Sarney e Alfonsín, de cooperação econômica. Tiveram os seus desdobramentos com Collor e Menem, na década de 1990, com o Tratado de Assunção, que incorporava ao projeto Argentina, brasileiro, o Uruguai presidido por Lacalle e o Paraguai, por Andrés Rodrígues.
O que foi o Mercosul? Mercosul foi uma resposta, no término das polaridades da Guerra Fria e do esgotamento do processo de substituição de importações, a um mundo que simultaneamente se regionalizava e se globalizava. E obedecia a uma ideia a realizar que se inseria construtivamente em três grandes campos da vida internacional, além do econômico.
No campo da segurança, que é o grande tema da paz e da guerra, a desnuclearização militar da região, iniciada com a Abacc (Agência Brasileiro-Argentina de Controle de Materiais Nucleares), que é um dado da nossa região e é um dado construtivo quando nós olhamos os desafios que existem no mundo.
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No campo dos valores, a defesa da democracia e dos direitos humanos, de onde veio no Mercosul a cláusula democrática.
E, no campo econômico, fazer a melhor economia da nossa geografia, com um aproveitamento das sinergias da conectividade com a vizinhança por meio de um processo de integração econômica, que seguiu a linha de um regionalismo aberto, lastreado numa plataforma de inserção competitiva.
O Mercosul inseriu-se no âmbito da América Latina na moldura jurídica da Aladi e representou uma opção em prol de uma união aduaneira, tendente à criação de um mercado comum. A opção, portanto, foi nesse sentido e não na de uma zona de livre comércio. E, como tal, foi contemplado pelo Gatt e depois pela OMC. E foi nesta modalidade de união aduaneira que se insertou no âmbito do multilateralismo global.
Com esse objetivo, negociou-se uma tarifa externa comum e estabeleceu-se que a negociação com terceiros países seria feita em conjunto pelas suas partes contratantes. Essa negociação decorre de uma política comercial comum em relação a terceiros Estados e a agrupamentos de Estados concebida pelas partes contratantes e provém de uma coordenação de posições em foros econômicos, comerciais, regionais e internacionais. Foi, por exemplo, o que ocorreu nas longas negociações da União Europeia com o Mercosul - aliás, iniciadas na minha gestão ainda como Ministro das Relações Exteriores -, que tiveram entre as suas dificuldades, como a Senadora Kátia Abreu acompanhou no correr dos anos, o acesso ao mercado europeu dos produtos agrícolas do Mercosul, que hoje enfrentam, para sua tramitação definitiva, temas relacionados à pauta ambiental.
O Mercosul, pela natureza do seu projeto e da sua concepção, é um instrumento jurídico que cuida de relações de longo prazo e execução continuada; não é um contrato comercial que trata apenas de compras e vendas entre as suas partes contratantes; tem igualmente dimensões políticas, jurídicas e econômicas no sentido amplo; e, por isso, requer a manutenção no tempo da reciprocidade dos interesses que conferem ao Mercosul a sua sustentabilidade.
Essa manutenção no tempo da reciprocidade de interesses pressupõe o que eu denominei de regras de calibração, que asseguram a coesão dentro da flexibilidade da sua moldura jurídica. Desde o início, o exemplo mais óbvio são as listas de exceção da TEC e também a construção das normas de origem e todos esses regimes especiais que a Senadora Kátia Abreu mencionou na sua apresentação inicial.
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Dessas regras de calibração, tem-se valido, no correr dos anos, a prática do Mercosul para manter o sentido de direção da ideia a realizar, que norteou a sua concepção, de um regionalismo aberto e não autocentrado. Manter esse sentido de direção significa sustentar um entorno regional e de vizinhança, que tem sido muito favorável à consecução de objetivos nacionais valiosos de suas partes contratantes. A Senadora mencionou, logo no início da sua apresentação, os números que indicam o significado deste relevo.
Agora, o Mercosul enfrenta um momento de grande crise, no âmbito do qual não vem operando as regras de calibração. A Senadora também mencionou qual é o impacto desta situação que leva a uma diminuição de gravitação do Mercosul. Quero mencionar que essas regras de calibração foram sempre as que nortearam as lideranças do Mercosul no correr deste período, apesar naturalmente de haver, entre elas, não necessariamente uma permanente identidade de posições pessoais e políticas, mas uma compreensão da importância de que o Mercosul significava para todos.
Então, eu dizia que está perdendo gravitação o Mercosul e é fonte de crescente divergência entre os seus membros, que traduzem não apenas - este é o meu ponto - conflitos de interesse, mas conflitos de concepção. O Mercosul corre o perigo da désuétude, no limite da desintegração, que é o oposto da integração que alimentou sua ideia a realizar. Naturalmente, a responsabilidade para conter essa desintegração é uma responsabilidade que, em conjunto, cabe à Argentina e ao Brasil, que são os dois maiores sócios.
Eu estou convencido - e com isso vou concluindo - de que é algo a ser evitado, entre outras, pelas seguintes razões: existe um aceleramento da redistribuição do poder, da influência e do prestígio no plano global, que tem, como sabemos, dois grandes protagonistas centrais, Estados Unidos e China, mas, na qual, a União Europeia retém o locus standi, inclusive como formulador de regras de alcance geral. Trata-se de um cenário, o atual, de disputas econômicas que não devemos internalizar em nosso âmbito por uma ação isolada.
O segundo ponto: o cenário contemporâneo magnifica um dado da realidade. Muito mais do que tarifas, o acesso a mercados hoje depende de normas técnicas que regulam o acesso ao mercado, dos critérios fitossanitários às exigências ambientais. Interessa-nos a convergência regulatória e não a sua fragmentação. Uma ação conjunta dá espaço para que não sejamos rule takers, meros destinatários de regras formuladas pelos outros e possamos ter um papel no processo em andamento dessa construção de regras. Para isso nos credencia o locus standi, o papel que temos no mundo do agronegócio e o relevo que representamos na agenda de sustentabilidade ambiental global, que são critérios que nos dão condições de participar desse processo por uma ação conjunta muito mais relevante, como peso político, do que por uma ação isolada.
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Eu sei que a cooperação é sempre uma esquiva conquista da razão política, porém, colocar de lado o Mercosul, fragmentando-o e desconsiderando o valor apropriado de regras de calibração, é um sério empecilho à nossa capacidade de nos orientarmos num mundo difícil, instável e de governança precária. É a minha sugestão do caminho que nos cabe pensar na discussão de hoje, desta audiência.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Embaixador e Chanceler Celso Lafer. Nós poderíamos ficar aqui ouvindo o senhor uma manhã toda, um dia todo, pelo seu conhecimento e experiência, e nós sinceramente agradecemos a sua contribuição. E pedimos com veemência que o senhor continue conosco para responder, tirar dúvidas dos nossos Parlamentares e contribuir um pouco mais.
Eu ainda peço ao Chanceler para que nós possamos ouvir mais um membro.
Vou passar a palavra para o nosso Embaixador.
Dando sequência à audiência pública, ouviremos o nosso Embaixador Guillermo Valles Galmes, um especialista e um dos fundadores do Mercosul. E aproveito a oportunidade para dar parabéns ao seu país pelos avanços, pelo crescimento, e brevemente estará lá recebendo, talvez, dois times de futebol em Montevidéu, para a disputa da Copa América. Montevidéu acolherá, se Deus quiser, dois times brasileiros por lá. Parabéns pelo trabalho que vocês vêm desenvolvendo, e crescente, ao longo desta última década!
O Embaixador Guillermo é diplomata uruguaio de carreira, com 45 anos de experiência profissional. É um querido amigo, de confiança, do Presidente da República do Uruguai, exerceu diversos cargos diplomáticos, sendo o primeiro Embaixador do Uruguai na China, na União Europeia, Bélgica, Luxemburgo e perante a Organização Mundial do Comércio e a ONU em Genebra. Foi Vice-Ministro das Relações Exteriores, foi o principal negociador diplomático do Mercosul entre 1992 e 1993. É árbitro painelista do Órgão de Solução de Controvérsias da OMC, licenciado pela Faculdade de Direito e Ciências Sociais da Universidade da República, com o título de doutor em Diplomacia.
Com a palavra, por favor, Embaixador.
O SR. GUILLERMO VALLES GALMES (Para expor.) - Muito obrigado, Sra. Presidente.
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Exma. Sra. Senadora, Exmo. Sr. Ministro, Exmos. Senadores, me dá muito prazer e é uma grande honra, Sra. Senadora, começar esta sessão não só escutando a Sra. Presidente, mas também aquele que nós, no Uruguai, acreditamos ser, verdadeiramente, uma personalidade do Mercosul, que é o Sr. Ministro Celso Lafer, muito querido por todos nós. Também tivemos oportunidade de participar, eu como negociador, nas instâncias históricas do Mercosul, na construção da união aduaneira.
Sra. Presidente, em benefício do tempo, eu não tenho aqui um discurso estruturado para ser lido.
A propósito, gostaria também de me desculpar pelo meu portunhol. Estou aqui há menos de dez meses, então estou começando meus conhecimentos de português.
Mas gostaria, Sra. Presidente, de fazer três reflexões para ilustrar a posição, os interesses do Uruguai. Essas três questões têm relação com o passado, com o presente e com a nossa visão do futuro.
Do passado, brevemente. O Uruguai é um país integracionista não só por mandato constitucional - se me lembro bem, pelo art. 5° da Constituição -, é integracionista latino-americano não só por mandato constitucional, mas também por mandato da história. A construção do nosso país é uma construção que sai da integração. O primeiro acordo internacional que o nosso herói José Artigas tentou foi em 1817, ainda antes da independência do país, quando era considerado o protetor dos povos livres, o protetor da Federação das Províncias Unidas do Rio da Prata. Ele, ao mesmo tempo em que tentava construir o que hoje poderíamos considerar uma união aduaneira, também, no mesmo instante, com a mesma concepção de abertura para o mundo, tratava de negociar um acordo com a potência do momento, a potência Grã-Bretanha, em agosto de 1807.
Mas não vou fazer a pré-história da nossa política comercial, somente vou indicar aos Srs. Senadores, às Sras. Senadoras e à audiência que a integração... O Uruguai participou ativamente, esteve no eixo, em posição protagonista, do tratado de 1960 da Alalc, cuja sede está em Montevidéu. O Uruguai esteve outra vez na modernização dessa instituição nos anos 1980, com o Tratado de Montevidéu, que é a nossa casa comum, em que se insere também o Tratado de Assunção.
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O Uruguai, de um ponto de vista geopolítico, se quiséssemos fazer uma ilustração, joga do ponto de vista das forças, da geografia, um jogo parecido com o da Bélgica, é a sede da integração regional na América do Sul, e não somente na América do Sul. Nesse contexto, que não só respeitamos, mas para o qual contribuímos diretamente, se insere o projeto do Mercosul, em 1991. Então, esse é o passado do Uruguai, um passado ativo.
Acredito que o Uruguai - pode ser vaidade minha, Senadora - é o precursor, com o Brasil... Antes do Mercosul, tínhamos com o Brasil um dos tratados mais profundos de integração, o PEC, Protocolo de Expansão Comercial; com a Argentina também, o Cauce, o chamado Cauce; com o México também, em 1935, uma zona de livre comércio. O Uruguai é uma bisagra, um país "bisagro", um país articulador em prol da integração.
Ao mesmo tempo, também pensamos no mundo, Senadora. Em 1935 teve início a Rodada do Uruguai do Gatt para inserir as normas de agricultura, as normas de vestimentos, têxteis, calçados, de todos aqueles interesses que os países em desenvolvimento tinham fora das regras do comércio internacional, para entrar, para se inserir no comércio internacional, para construir, não para derrubar, mas para construir instituições que depois resultaram na Organização Mundial do Comércio.
Esse é o Uruguai, esse é o passado do Uruguai, e esse é o passado que qualquer governo do Uruguai sempre vai respeitar.
O que estamos hoje, Senadora, pensando no Mercosul? Não é nada estranho, não é nada supressivo.
Em primeiro lugar, quando nós falamos de flexibilidade. Os senhores e as senhoras sabem que gradualismo, flexibilidade e equilíbrio são os três princípios básicos insertos no Tratado de Assunção desde o primeiro momento, está no preâmbulo que, de acordo com a Convenção de Viena, dos tratados, são princípios que regulam o resto do texto.
Flexibilidade. Sra. Presidente, flexibilidade é uma coisa nova no Mercosul? Não é uma coisa nova. Todos, absolutamente todos os instrumentos básicos do art. 1° do Tratado de Assunção estão submetidos àquilo que, com grande clareza, o Sr. Ministro falou: regras de calibração. O que é essa calibração? É a flexibilidade, e vou explicar, do ponto de vista uruguaio, por quê.
Temos flexibilidades, regras de calibração, na zona de livre comércio. É uma zona de livre comércio incompleta. O comércio da indústria automotriz está fora das regras do Mercosul, e é um comércio muito importante entre os países do Mercosul. No caso do Uruguai e do Brasil, quase atinge 23% do nosso comércio. Estão fora. Por que estão fora? Porque fazem parte disso que o Sr. Ministro falava de regras de calibração, que eu digo que é demonstração concertada entre os quatro países e flexibilização.
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União aduaneira, união alfandegária, tarifa externa comum. No momento do início, eu fui negociador. No início, tivemos exceções nacionais diferentes entre os quatro países, tivemos exceções para a Zona Franca de Manaus e para a Terra do Fogo, na Argentina, tivemos exceções para missão temporária. Teremos exceções à tarefa externa comum para regimes especialistas em importação, para agricultura, insumos para agricultura, por exemplo. Então, o que é isso? Essa demonstração é justamente flexibilidade de entendimento, de compreensão daquilo tudo que tínhamos como necessário.
Flexibilidade. Flexibilizar por quê? Eu vou fechando esse capítulo, Senadora. Por que flexibilidade? Porque o Tratado de Assunção, como foi muito bem explicado pelo Ministro Celso Lafer, foi semeado em 26 de março de 1991, um momento histórico da humanidade. E qual era o objetivo? Ter um mercado comum para 31 de dezembro de 1994. Claramente, olhando a história, esse era um objetivo programático. Alguém pode pensar que essa não é uma reinterpretação da história. Alguém pode pensar que o mercado comum, não a união aduaneira, pode ser feito em quatro anos, sem flexibilidade, sem equilíbrio, sem entendimento entre os países, sem essas regras de calibração. Os próprios redatores e negociadores originais conheciam que isso era impossível. Por isso, temos esse princípio de flexibilidade - flexibilidade consensuada.
Foi utilizada, Sra. Senadora, Sr. Presidente, essa flexibilidade no passado. Completamente, absolutamente, todos os acordos do Mercosul com terceiros países têm elementos de flexibilidade, de ritmos diferentes, de exceções especiais, com nossos parceiros, na América Latina, na América do Sul, com nossos parceiros no México. Por exemplo, o Uruguai foi o primeiro a ter um acordo de livre comércio com o México - o México dentro das regras do Mercosul -, e o Brasil também depois. O Paraguai ainda não tem um acordo dessa espécie. O Mercosul entrou em uma fase de pulverização institucional, não porque tínhamos acordo de como utilizar essa flexibilidade.
Agora, eu faço um passo a mais para falar do futuro. O que está buscando, planteando o Uruguai? Falando outra vez de... É um cerceamento do Mercosul.
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O Uruguai é 1% do PIB do Mercosul, e o que diz o Uruguai a propósito dos acordos internacionais? Simplesmente que o Mercosul não deve impor o ritmo de abertura aos outros sócios que não estão em condições de progredir nas negociações externas. Por exemplo, quando os nossos irmãos argentinos plantearam a questão de haver certas negociações, de não participar ativamente nas negociações com a Coreia, por exemplo, o Uruguai aceitou. O Uruguai compreende essa necessidade de flexibilidade, e nós somente pedimos que, se o Mercosul não deve ser um instrumento para impor àqueles que não estão em condições uma certa conduta, uma certa política, também o Mercosul não deve evitar, não deve proibir, não deve limitar especialmente a economia que representa 1% do PIB para avançar. Para avançar em quê?
Eu vou dar simplesmente, Sra. Presidente, um exemplo. O Uruguai é basicamente uma bioeconomia e um produtor de serviços, um dos mais importantes produtores de serviços per capita na América Latina, é exportador de serviços e agroeconomia. Do que necessita o mundo? O mundo necessita de 50% mais de alimentos para o ano 2050; necessita de 50% mais dos víveres agrícolas, 50% mais dos biocombustíveis. É disso que o mundo necessita. Quem vai prover, abastecer, ser o provedor disso? A nossa região, e o Uruguai quer e necessita ser o primeiro, porque nós, o Mercosul representa 30% das exportações netas de alimentos. É uma obrigação moral dos nossos povos fornecer alimentos ao mundo, e o Uruguai não pode...
O Uruguai é um dos primeiros exportadores de carne bovina, como vocês sabem, e de muita qualidade também ao mundo, e enfrenta tarifas absolutamente discriminatórias. Onde? Onde os mercados estão, onde os importadores netos de alimentos estão. Onde estão? Na Ásia, no Pacífico, lá onde temos o CPTPP, o Comprehensive and Progressive Agreement for Trans-Pacific Partnership, em inglês, esse acordo regional do qual participam nossos principais competidores e amigos também - Austrália, Nova Zelândia -, que estão reduzindo as tarifas para entrar onde? Nos mercados importadores netos de alimentos, como o Japão.
Para redondear, fazer um ciclo na ilustração, Sra. Presidente, as nossas carnes de mais alta qualidade têm que pagar cerca 39% - e têm outros picos também - de tarifa alfandegária no Japão. Austrália, nos primeiros anos, como são agora, está pagando dez pontos percentuais a menos. Até quando um país como o Uruguai pode se fechar a uma negociação com esses países?
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O Uruguai compreende absolutamente as necessidades do Brasil, da CNI, das quais somos grandes amigos, das instituições e das pessoas. E compreendemos também os interesses, interesses que são diferentes, como falava o Ministro Celso Lafer. O Uruguai já fez na indústria uma reconversão industrial total ao entrar no Mercosul. Nós fizemos. Temos muitas indústrias que desapareceram. Esse foi o custo social, custo político, custo econômico. Mas por quê? Porque agora temos uma economia muito competitiva, concentrada no agronegócio e nos serviços. Isso nos ajuda hoje a ter até um pouquinho menos de interesses defensivos do que interesses ofensivos. É somente isso. Então, os valores do Mercosul, o interesse por preservar o Mercosul estiveram lá, estão agora e estarão no futuro.
Eu estou representando aqui, Sra. Presidente, o interesse não somente de um partido ou uma coalizão partidária, é o interesse de todos os partidos políticos que estiveram no Governo no Uruguai. As três grandes forças políticas do Uruguai mantêm exatamente a mesma posição. Simplesmente, o que mudou, o que cambiou foram os tempos históricos. E os tempos históricos nos indicam que nós, como dizia também o Sr. Ministro Celso Lafer, temos que estar lá onde se debatem, onde se discutem, não somente com produtos como a carne, com tarifas mais baixas, mas onde também se discutem as normas do comércio, as normas não tarifárias. Nós não podemos ser rude takers. Não podemos aceitar. Nós temos que participar nos fóruns onde as normas são debatidas. Como se pode fazer isso? Somente fazendo parte desses clubes. Nesse exemplo que estou dando, do CPTPP, por exemplo. Então, essa é a participação que o Uruguai está promovendo.
E, para finalizar, a agenda do Mercosul, do ponto de vista do Uruguai, Sra. Presidente, não se limita a questões mercantis, muito pelo contrário, aquilo que estamos trabalhando, com S. Exa. o Ministro França, os Presidentes da República, as autoridades federais, é para melhorar a competitividade dos nossos produtos com infraestrutura. Estamos trabalhando para ter entre a Lagoa Mirim e a Lagoa dos Patos uma magnífica hidrovia, uma magnífica hidrovia que vai proteger o meio ambiente, mas vai atrair também desenvolvimento para o Sul do Brasil e para o Oeste do Uruguai. Infraestrutura também vamos ter e melhoramento da competitividade como segundo ponto no Rio Jaguarão. Infraestrutura que vamos também ter prontamente com uma remodernização da interconexão ferroviária, para que o Porto de Montevidéu possa servir também aos interesses do centro do Rio Grande do Sul, para que a nossa produção possa sair também pelo Porto do Rio Grande do Sul, porque não é uma concorrência, não é uma competência do Porto de Montevidéu, é uma integração portuária. Esses são os interesses do Uruguai. O nosso problema, Sra. Presidente, é pensar que hoje os nossos produtores estão com um grande problema também no Brasil de conexão marítima. Esse é o problema hoje, quando não temos suficientes linhas marítimas, quando não temos suficiente infraestrutura logística de transporte, quando não temos ainda suficientes contêineres. Essa é a crise que está... (Pausa.)
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Amanhã mesmo, amanhã mesmo!
E, aí, temos que estar juntos. Então, a agenda do Mercosul é muito mais rica do que aquilo que se quer, de alguma maneira, limitar dizendo: "Bom, temos uma flexibilidade". Flexibilidade teremos no diálogo. Aqui há não somente um testemunho, Sra. Presidente, mas também um ator dessa flexibilidade, uma flexibilidade que foi encontrada entre os quatro países.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Muito obrigada, Embaixador, por suas palavras, pelos seus esclarecimentos, com os quais eu concordo completamente. Ninguém pode impor um ritmo de abertura nem proibir que cada qual possa fazer da forma com que sente necessidade. O Mercosul ou nenhum acordo comercial do mundo pode pretender existir para ter exclusividade para determinados setores, não importa em que país estejam. O Brasil não pode exigir exclusividade das vendas para a Argentina, ou para o Uruguai, ou para o Paraguai. E o contrário, é verdadeiro: nós não estamos aqui para manter mercado de individuais, mas sim para o crescimento e enriquecimento do nosso País.
Passo a palavra, agora, ao nosso Chanceler Carlos França.
Eu tenho certeza de que os nossos colegas Senadores deverão participar remotamente com perguntas.
Senador... Chanceler... Olha, está vendo? (Risos.)
Chanceler Carlos...
Goiás tem uma vaga agora.
Chanceler Carlos França...
E olha que a minha boca é santa, hein? (Risos.)
Nascido em Goiânia, meu conterrâneo, em 1964, dois anos depois de mim - mais novo, portanto eu tenho ascendência sobre V. Exa., porque sou mais velha. Visitou o Itamaraty quando criança e disse ao pai: "Um dia trabalharei neste palácio". Formou-se em Relações Internacionais - ele também fez a profecia e deu certo -, em 1986, e em Direito, em 1990, pela Universidade de Brasília (UnB) e, em 1992, concluiu graduação em Diplomacia pelo Instituto Rio Branco.
Serviu nas Embaixadas do Brasil em Washington, Assunção e, por duas vezes, em La Paz.
Foi Chefe do Cerimonial da Presidência da República, posição que ocupou até sua nomeação como Ministro de Estado das Relações Exteriores, em 31 de março de 2021. Imaginem a dificuldade do Chanceler em ser Chefe do Cerimonial do Presidente Bolsonaro - conhecedores que somos do seu temperamento um tanto impetuoso! Com certeza, deixou um caminho lá de muita confiança junto ao Presidente, tanto que foi alçado ao MRE. Parabéns pelo trabalho desenvolvido!
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Concedo, então, a palavra ao Ministro França.
O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA (Para expor.) - Presidente, muito obrigado.
É, para mim, uma grande satisfação atender o convite de V. Exa., Presidente Kátia Abreu, para participar desta audiência pública sobre temas de alta relevância da agenda do Mercosul.
A Senadora Kátia Abreu, como Presidente desta Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, estabeleceu valiosa parceria com o Itamaraty, e eu aproveito esta oportunidade para renovar o meu compromisso pessoal de continuar a trabalhar em estreita sintonia com esta Casa e com a Senadora na promoção e defesa dos melhores interesses da inserção internacional do Brasil.
É também motivo de satisfação poder dividir esta Mesa com o Ministro da Economia, Paulo Guedes; com o Professor Dr. Embaixador Celso Lafer, duas vezes Ministro das Relações Exteriores do Brasil; com o Embaixador do Uruguai, meu colega Guillermo Valles; e com o Dr. Fabrizio Panzini, em representação da Confederação Nacional da Indústria. Todos têm, Presidente, grande contribuição a dar ao tratamento do tema que nos reúne aqui, hoje.
Sra. Presidente Kátia Abreu, Srs. Senadores, senhoras e senhores, o Mercosul, como sabemos, comemorou, neste ano, o seu 30º aniversário. Ele é, sem dúvida, a melhor corporificação do mandato da Constituição Federal em favor da integração regional. Historicamente, serviu para consolidar os processos de redemocratização no Cone Sul, para afastar a hipótese de conflito bélico entre o Brasil e a Argentina e para colocar as relações do Brasil com o seu entorno nos trilhos da cooperação e nos trilhos do entendimento.
Em termos estratégicos, o Mercosul contribui para elevar o peso geopolítico do Brasil. É um fator de paz e cooperação na América do Sul, amplia o perfil internacional dos seus integrantes e é um aliado dos nossos esforços de desenvolvimento.
O lado econômico comercial tende a receber mais atenção do público, mas a verdade, como já foi dito aqui, é que o Mercosul possui uma agenda multifacetada. Não há domínio da política pública que não seja tratado em algum fórum específico do Mercosul. Apenas para dar alguns exemplos: o Mercosul alcança temas de justiça, de segurança, de educação, de ciência e tecnologia, de cultura, de defesa do consumidor, entre tantos outros. Em todos esses domínios, buscamos formas variadas de cooperar e integrar, valendo-nos de uma abordagem gradual e progressiva.
O balanço dos ganhos econômicos do Mercosul é significativo. A remoção das barreiras tarifárias ao comércio, levou, no início do projeto integracionista, a um forte crescimento das trocas entre os quatro sócios. Ao longo do tempo, o peso do Mercosul foi diminuindo em nosso comércio total. Porém, ainda hoje, o bloco é o principal destino das vendas brasileiras em setores importantes, como o automotivo, o químico e o têxtil, e também muito relevante em outros segmentos da economia, para não falar dos fluxos de investimento estimulados pelo processo de integração e da dinâmica de integração produtiva, cujo potencial precisamos continuar a explorar.
Não é por outra razão que a indústria nacional constitui uma grande defensora do Mercosul em nossa sociedade. Reconhecer o valor do Mercosul em suas múltiplas dimensões não significa, naturalmente, ignorar as carências e os desafios que ele ainda enfrenta.
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E agora entro num assunto que nos ocupa hoje: a tarifa.
Quando se avalia a trajetória do Mercosul, pode-se identificar uma clara promessa ainda não cumprida. Embora enunciado como objetivo no Tratado de Assunção, o fato é que até hoje o Mercosul não logrou transformar-se em plataforma para inserção competitiva dos seus integrantes nos mercados globais. Se o Mercosul já serviu para estreitar os laços econômicos e comerciais entre os quatro sócios e também com a América do Sul, pouco fez até o momento para a projeção dos seus integrantes na economia global.
O Governo do Presidente Jair Bolsonaro, a que sirvo com muito orgulho, tem trabalhado desde o início para corrigir essa lacuna do Mercosul.
Já nos primeiros dias de 2019, mobilizou-se para dar um impulso decisivo às negociações comerciais do Mercosul com parceiros de fora da região. O foco prioritário residiu inicialmente nas tratativas com a União Europeia, que se arrastavam havia muito tempo. Paralelamente, com o mesmo objetivo, o Brasil trabalhou para introduzir na agenda prioritária do bloco a revisão da Tarifa Externa Comum (TEC), que estabelece o nível de proteção contra a entrada de produtos estrangeiros no mercado ampliado do Mercosul e que constitui o principal instrumento de política comercial da união aduaneira do bloco.
É importante dizer aqui que, em seus 25 anos de existência, Presidente Kátia Abreu, a TEC jamais foi objeto de uma revisão integral.
Revisão da TEC. Negociações externas: duas faces de uma mesma moeda, e ambas as faces refletem o propósito de aumentar os níveis de competitividade e abertura da economia brasileira e de melhorar nossa participação nas cadeias regionais e globais de valor. Trata-se de objetivos do programa de Governo do Presidente Bolsonaro para cuja consecução o Mercosul é e constitui um aliado fundamental.
A revisão da TEC, incluída entre as metas de cem dias do Governo Jair Bolsonaro, foi inserida na agenda de trabalhos do Mercosul já em março de 2019. Para o Brasil, naquele momento, estava claro que um elemento fundamental nessa reforma seria reduzir a TEC, cuja média se situa em 13,5%, um nível bastante alto para os padrões mundiais e que impõe elevados custos e restringe o leque de opções de insumos para a nossa indústria e de bens de consumo para as nossas populações.
Tínhamos muito presente, também, que caberia atacar problemas de estrutura da TEC. Um deles, por exemplo, são os picos tarifários, situações em que as tarifas aplicadas pelo País são consideravelmente superiores às que se observam na média mundial.
No processo de revisão, identificou-se de imediato um alinhamento de posições entre o Brasil, o Paraguai e o Uruguai. A Argentina, que passou por transição política no período, tardou a definir a sua posição e, quando o fez, apenas em agosto de 2020, demonstrou um grau de ambição menor do que a dos demais países, dos demais sócios. Em março do corrente ano - deste ano, portanto -, a partir de uma iniciativa do Ministério da Economia, o Brasil apresentou uma nova proposta de revisão da TEC que levava em conta as dificuldades enfrentadas para se alcançar uma posição convergente dentro do Mercosul, bem como as preocupações de segmentos do nosso setor produtivo com o contexto econômico desafiante, agravado pela pandemia.
A proposta do Ministério da Economia consiste em dois cortes tarifários lineares de 10% para todo o universo de produtos, a serem - esses cortes - implementados em julho e dezembro deste ano, respectivamente.
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Buscava-se obter, por meio de proposta menos ambiciosa e de mecanismo tecnicamente simplificado, um resultado concreto a curto prazo na revisão da TEC. O objetivo era emitir uma sinalização, dentro do Brasil, mas também para o mundo, do claro compromisso do País com a abertura, um dos eixos da plataforma do Governo Bolsonaro.
No mês seguinte, a Argentina apresentou contraproposta que implicava redução média das alíquotas da ordem de 10%, porém sem linearidade ou transversalidade e com foco na desgravação de insumos produtivos e bens não produzidos regionalmente.
Desde então, Presidente Kátia Abreu, as negociações buscam aproximar as posições dos países, e, nesse sentido, o Brasil realizou contínuos esforços para obter um ponto de convergência com a Argentina, que, cabe ressaltar, chegou a apresentar uma modulação de sua proposta ao aceitar uma redução linear de 10%, mas limitada a um universo de produtos a 75% do universo de produtos que tínhamos inicialmente proposto.
Não foi possível, dessa maneira, alcançar um resultado sobre a TEC durante a Presidência argentina do Mercosul no semestre passado. Essa Presidência encerrou-se em 8 de julho deste ano.
Não obstante, nós continuamos a trabalhar para chegar a um acordo nesse tema, que é tão central para o Governo brasileiro, e quero dizer que, para tanto, eu mantenho um diálogo franco, um diálogo fluido, um diálogo muito cordial, por exemplo, com meu homólogo Chanceler Felipe Solá, da Argentina.
Senhoras e senhores, no esforço de transformar o Mercosul em instrumento efetivo da inserção global, o Governo brasileiro tem concentrado esforços não apenas no processo de revisão da TEC, mas também em dar impulso mais decidido em favor das negociações externas. Nesse contexto, temos buscado corrigir um descompasso que se percebe entre as vertentes regional e extrarregional da agenda de relacionamento externo do Mercosul. Se o bloco já possui hoje acordos de livre comércio com quase toda a América do Sul, até a primeira década do século atual, só viemos assinado fora da região acordos de livre comércio com Israel, com a Palestina e com o Egito. Com o avanço das negociações com a União Europeia, a partir de 2016, criou-se um ambiente propício para lançamento, em 2017, de negociações com a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA), que reúne Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein, e, em 2018, com o Canadá, com a Coreia do Sul e com a Singapura.
O Governo Bolsonaro iniciou-se com o firme objetivo de concluir as negociações com a União Europeia e a EFTA, que ocorreu em 2019, e de acelerar as negociações com o Canadá, com a Coreia do Sul e com a Singapura. Naquele ano, também retomamos as negociações de acordo de livre comércio com o Líbano, que haviam sido interrompidas, em 2016. Desde então, estamos trabalhando para concluir as pendências e poder firmar os acordos com a União Europeia e com a EFTA e estamos também trabalhando para lançar novas frentes negociadoras, como as que já foram autorizadas pela Camex, com Indonésia, com Vietnã, e também para ampliar os acordos atuais que temos com Índia e com Israel.
Não é possível mencionar as negociações externas sem tratar das chamadas flexibilidades.
O Governo Bolsonaro tem apontado o conceito de flexibilidade como elemento importante para seguirmos adiante naquelas negociações externas em que não houve grau mínimo de coincidência de interesse entre nós. A regra do consenso, portanto, não pode ser utilizada como instrumento de veto, nem como obstáculo à abertura do Mercosul para o mundo.
É importante ressaltar que o Itamaraty entende o tratamento do tema das flexibilidades tratado sempre dentro da agenda do bloco, sem prejuízo de que a questão possa voltar a surgir, caso a caso, em negociações externas que estejam em curso ou que venham a ocorrer futuramente.
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Se é fundamental, Presidente, avançar nas negociações com parceiros extrarregionais, as tratativas com o nosso entorno não são menos importantes. Quando enfocamos a América do Sul, devemos atentar para o fato de que, em 2019, graças à implementação de acordos que negociou nos anos 90 e no início dos anos 2000, foi conformada uma área de livre comércio de fato do Mercosul com países da região. Esse é um ganho ainda pouco conhecido do público em geral, mas que realça, de forma muito concreta, o papel do bloco como promotor da integração regional.
Cientes da importância estratégica da América Latina, temos buscado consolidar e expandir nossa rede de acordos na região. Em 2019, implantamos o livre comércio automotivo com o México e temos nos empenhado, desde então, em engajar o lado mexicano na ampliação do limitado acordo que possuímos com a aquele país nos demais setores, sobretudo para garantir um acesso efetivo ao mercado agrícola.
Em outra frente, atuamos junto ao Congresso Nacional, com o apoio do setor produtivo, para internalizar o amplo acordo de temas não tarifários que fechamos com o Chile. Estamos ainda em contato com a Colômbia, visando a aprimorar o acesso a produtos agropecuários, a lançar a negociação de acordos sobre compras governamentais, além de aprofundar a liberalização do comércio bilateral no setor automotivo.
Trabalhamos também para expandir a fronteira de liberalização comercial para além da América do Sul mediante tratativas com parceiros da América Central e do Caribe. Durante a Presidência de turno brasileiro do Mercosul, já acordamos com os sócios buscar retomar a reunião da Comissão Administradora do Acordo de Livre Comércio com o Peru e explorar espaços para a atualização do marco normativo que regula a nossa relação econômica e comercial com o Equador. Este ano encontra momento para esses movimentos, uma vez que tivemos, recentemente, eleições e posse de novos mandatários tanto no Peru quanto no Equador.
Ainda no contexto regional, a articulação com a Aliança do Pacífico é fenômeno relativamente recente. O potencial aqui é claro, os dois agrupamentos respondem, juntos, por cerca de 90% do Produto Interno Bruto e dos fluxos de investimento externo direto na região. O comércio recíproco corresponde a 30% do total das trocas dentro da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi) e é conformado, sobretudo, por produtos de alto valor agregado, geradores de maior renda e empregos de melhor qualidade. Os dois agrupamentos representam cerca de 76% da população regional e representam um mercado, Presidente, de mais de 500 milhões de pessoas.
Se já avançamos na definição de uma agenda de cooperação com a Aliança do Pacífico, ainda resta o desafio de encontrar fórmulas efetivas para gerar resultados concretos.
O Mercosul, a partir de iniciativas do Brasil, colocou sobre a mesa propostas de acordos em facilitação de comércio e convergência regulatória, mas, até o momento, não logramos o entendimento com os parceiros da Aliança, que parecem relutar em conferir uma dimensão propriamente negociadora ao processo de aproximação. Durante o presente semestre, o Brasil estará em contato com a Presidência rotativa da Aliança do Pacífico, que cabe à Colômbia, para tentar impulsionar essa vertente de ação, que esperamos possa vir a converter-se, no futuro, em um dos principais vetores de modernização da integração regional e de penetração nos mercados dinâmicos da Ásia-Pacífico.
Por fim, o tema da ampliação do Mercosul, que pode ser entendido, em seu sentido mais estrito, como a adesão de novos membros ao bloco.
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O que se tem hoje é um processo ainda em curso de adesão do Estado Plurinacional da Bolívia. Acreditamos ser necessário levar em conta aqui as lições aprendidas com a adesão da Venezuela, que se encontra atualmente suspensa do bloco, não apenas por ter violado a cláusula diplomática, mas - aqui é importante ressaltar, Presidente - porque a Venezuela não cumpriu com as normas e compromissos requeridos para a sua adesão.
Uma eventual adesão da Bolívia deveria significar um pleno engajamento dela com o acervo normativo do Mercosul e com sua agenda de modernização, que é caracterizada pela retomada dos valores originais do bloco em favor do livre comércio e da abertura para o mundo. E aqui me permito fazer uma pequena digressão. O Embaixador Guilhermo Valles comentou aqui da vocação do Uruguai como um país articulador - ele chamou aqui um país bisagra; em português, dobradiça -, importante, porque é o que conecta a porta ao batente, então é o que faz a articulação.
A Bolívia também se vê como uma terra de contatos. É muito comum - eu, que servi na Bolívia duas vezes - ouvir, enfim, os bolivianos se referirem à Bolívia como a união entre o Pacífico e o Atlântico, fruto de uma doutrina da Bolívia como terra de contatos de Ostria e de Guachalla, formulada logo após a Guerra do Chaco, que, justamente, entende a Bolívia como esse país articulador.
Então, nós vemos condições de a Bolívia realmente se unir ao Mercosul. Mas, como talvez não tenha acontecido com a Venezuela, mas como aconteceu com os sócios originais do bloco, era importante esse compromisso, essa adesão a todo esse acervo normativo.
Fora a Bolívia, nesse momento não há nenhum outro país que esteja sinalizando interesse em fazer parte do Mercosul como membro pleno. E recordem-se de que todos os países da América do Sul estão de alguma maneira associados ao bloco.
Sra. Presidente, senhoras e senhores, quero, em conclusão, saudar a iniciativa de promover esse debate sobre os rumos do Mercosul, um ativo central para a inserção do Brasil no mundo. Estamos convencidos de que o êxito desse projeto de integração depende fundamentalmente do engajamento da mais ampla gama de atores. Por isso, eu valorizo muito essa oportunidade de trocar pontos de vista no âmbito do Congresso Nacional, que é, por definição, a instância representativa da pluralidade de interesses da sociedade.
Reitero, particularmente, nesse momento em que o Brasil ocupa a Presidência semestral do bloco, o compromisso do Itamaraty de juntos trabalharmos para um Mercosul mais moderno e que possa contribuir para um Brasil mais próspero para todos.
Muito obrigado, Presidente.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Muito obrigada, Chanceler, nosso Ministro.
Apenas um complemento, se puder, Ministro. A Argentina fez a proposta dos 10% para 75 produtos. Isso foi aceito pelo Brasil ou ainda está em curso essa negociação em que o Brasil tinha proposto 20%?
O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA - A proposta original do Brasil era de um corte de 10% transversal, inclusive nos regimes especiais, como, por exemplo, automotivo e o chamado BIT e BK, seguido de um corte de mais 10% no final da Presidência de turno brasileiro, que vai acontecer agora, em dezembro. E a contraproposta argentina foi de que nós tivéssemos um corte linear de 10%, perdão, corte de 10%, mas apenas no universo de 75% dos produtos, daquele universo de produtos. Então, não era transversal e não incluía, enfim, os regimes especiais. Uma vez que não houve consenso, então não se encerrou a negociação. Não se chegou a resultado, não se encerrou a negociação. Foi transferida a negociação agora para a presidência pro tempore brasileira. Nós seguimos negociando.
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A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Ministro.
O Ministro Paulo Guedes já está nos aguardando. Por uma questão de agenda, então vamos ao Ministro.
O Ministro Paulo Guedes, PhD em Economia pela Universidade de Chicago, foi Professor da PUC no Rio de Janeiro, da Fundação Getúlio Vargas e do Instituto de Matemática Pura e Aplicada. Graduou-se na Faculdade de economia da Universidade Federal de Minas Gerais e completou o seu mestrado na Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getúlio Vargas. Fundador do Banco Pactual, da Abril Educação, das Faculdades Ibmec e do Instituto Millenium, Guedes integrou conselhos de administração de grandes empresas.
Muito obrigada pela presença, Sr. Ministro, para debater um tema de tão grande importância. Passo a palavra a V. Exa.
O SR. PAULO GUEDES (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos! Bom dia, Presidente da Comissão, Senadora Kátia Abreu. Obrigado pelo convite para conversarmos sobre os rumos das negociações do Mercosul.
Vou fazer uma digressão rápida, primeiro sobre a importância do comércio internacional para a riqueza dos países: 3,7 bilhões de eurasianos, viúvas dos antigos regimes socialistas na Ásia, desde União Soviética, China, Índia, países do Leste Europeu...
Não, eu quero vê-los. Eu quero vê-los. Eu quero ver a Senadora.
Três vírgula sete bilhões de eurasianos saíram da miséria justamente mergulhando nas correntes globais de comércio. É importante termos ideia disso, porque, numa frase que se tornou muito conhecida e muito usada aqui no Brasil, nunca antes na história tanta gente saiu da miséria exatamente porque mergulhou nos fluxos globais de comércio.
Existe um teorema em economia chamado Teorema de Stolper-Samuelson: quando você começa a comercializar... Vamos supor, o preço dos automóveis nos Estados Unidos era US$40 mil, US$50 mil, US$ 60 mil. Aí chega um carro japonês. Os primeiros a mergulhar nessas correntes foram os japoneses, depois vieram os coreanos, depois vieram os chineses e agora vêm os indianos, que aliás já estão comprando indústria automobilística no mundo inteiro, porque eles têm uma escala tão grande na Índia que eles fazem a indústria crescer rapidamente e compram inclusive... A Rolls-Royce, por exemplo, foi comprada pela Tata, indiana. Então, quando esses preços começam a convergir globalmente, os salários começam a subir na Ásia e os salários não conseguem subir no Ocidente. Nessas grandes correntes de globalização, à medida que os países asiáticos foram mergulhando nas correntes globais de comércio, houve uma tendência à equalização de preço, e o preço do automóvel caía nos Estados Unidos: a indústria em Detroit ficava decadente, a indústria em Chicago ficava decadente, e ao mesmo tempo era o Toyota Corolla, o carro japonês, começando a crescer e a vender no mundo inteiro. Depois, vieram os carros coreanos, Hyundai. Depois, vêm, agora, os chineses.
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Quer dizer, na verdade, nos últimos 30 anos, o comércio global aumentou muito e tirou 3,7 bilhões de pessoas da miséria.
Quer dizer, mergulhando nas correntes globais do capitalismo, do comércio, dos fluxos de investimento, esses países foram saindo da miséria, aumentando a renda per capita e aumentando os salários, a produtividade dos trabalhadores, os investimentos, as inovações.
Enquanto isso, nós, que fomos, talvez, quando criamos o Mercosul, fomos os precursores, os pioneiros nessa ideia de criar os grandes grupos, os grandes blocos de comércio, de integração comercial, nós fomos ficando para trás. Há até um gráfico interessante que mostra isso. Os senhores vão ver agora.
No início do lançamento do Mercosul, olha a participação do Mercosul na corrente de comércio brasileiro. Quer dizer, ali nós temos, na origem, em 1991, quando foi lançado o Mercosul, o fluxo de comércio nosso foi subindo, o comércio Mercosul, vis-à-vis o que o Brasil faz com o resto do mundo, foi subindo de 8% para 10%, 12%, 14%. Chegou a 18%.
Então, o Mercosul foi um grande sucesso como plataforma de aumentar a integração do bloco, e isso serviu como, na verdade, uma plataforma de lançamento para inserção competitiva da economia brasileira na economia global.
Então, era como se fosse um trampolim para que o Brasil pudesse se integrar competitivamente à economia global, que foi o motor de crescimento nos últimos 20, 30 anos no mundo. Foi exatamente esse crescimento integrado.
A China foi quem se beneficiou mais desse processo, com exportações e importações em torno de 40%, 50% e, recentemente, com até quase 60% do PIB, com essa corrente de comércio como participação do PIB interno, repetindo o fenômeno de 200, 300 anos atrás, com a Inglaterra. A Inglaterra foi quem mergulhou nessa corrente de comércio, lá atrás, com a Revolução Industrial, e se tornou, era uma pequena ilha, se transformou numa potência global, num império, durante bastante tempo, porque mergulhou nessas correntes de comércio. Usou a industrialização, naquela época, e se integrou e começou a criar esses fluxos de comércio.
Nós sabemos também que o Brasil foi descoberto numa busca dessa pelos portugueses, numa rota comercial, buscando coisas na Índia. A América foi descoberta assim. Os holandeses foram parar na Ásia. Há uma estátua em Seul a um pioneiro holandês, que chegou lá três, quatro séculos atrás, também em busca de rotas comerciais.
Então, o Mercosul, no início, foi uma força de sustentação para esse esforço de integração nossa. Vocês veem que o fluxo foi subindo, chegou a 18% do PIB. Dali para frente, veio descendo, veio descendo e está hoje com um terço, está um pouco acima de 6%, 7%, menos da metade do que já foi e pouco mais de um terço do que já foi.
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Então, o Mercosul não está correspondendo às expectativas que foram lançadas. Depois de um início forte, com a integração regional, ele simplesmente foi perdendo a importância ao longo do tempo.
Exatamente como nós consideramos o Mercosul, continuamos a considerar o Mercosul como uma plataforma válida e importante, nós precisamos, durante pelo menos a nossa Presidência pro tempore, tentar uma modernização dessa ferramenta.
Essa modernização tem duas dimensões. Uma é essa tarifa, que nós temos que começar a reduzir, porque nós estamos acima do resto do mundo. O resto do mundo se integrou, as tarifas são... Pode tirar o gráfico. As tarifas são hoje, no mundo, estão aí em torno de 4%, 5%, tarifa média, e o Brasil está com 13%, 14%, de tarifa média. São três, quatro vezes... São três vezes a tarifa do mundo. Está entre a metade e dois terços.
Então, nós estamos numa situação em que a ferramenta, que é o Mercosul, não está correspondendo às nossas necessidades.
Isso era uma visão de longo prazo nossa. Não tem nada a ver com crise de curto prazo, nada a ver. Quando nós chegamos aqui, o nosso primeiro movimento foi justamente procurar o Governo da Argentina e dissemos o seguinte: olha, nós estamos conversando há oito anos sobre o Mercosul e não fechamos um acordo. E o Mercosul é uma ferramenta importante, é um trampolim, para nós nos integrarmos à União Europeia. Ou nós nos acertamos, ou a ferramenta não faz sentido para nós.
A Argentina, rapidamente, porque tinha a mesma visão, sob o Governo Macri, ela rapidamente convergiu e fechou um acordo conosco, que estava parado há oito anos. Há oito anos que o Brasil não concluía o acordo do Mercosul, e nós fechamos com o Governo Macri.
Bom, logo depois, juntos com a Argentina, nos encaminhamos para a OCDE e pedimos, fizemos uma aplicação e terminamos... Fizemos, ao mesmo tempo, um pedido de acesso à OCDE e, simultaneamente, concluímos as negociações que também estavam paradas há 20 anos, desde a rodada de Doha. Nós concluímos as negociações com a União Europeia.
Então, o Brasil começou o ano de 2019 decidido a se movimentar em direção à integração global, aumentar a competitividade das empresas, a produtividade dos nossos trabalhadores, a competitividade do País, como um todo, e justamente compensarmos o atraso de 30 anos - nós nos atrasamos 30 anos nessa corrida de integração global.
Ora, fizemos os primeiros movimentos então com o Mercosul, logo depois a OCDE, logo depois o EFTA, que é a área de livre comércio europeia, que é a franja, que fica no entorno da Europa Continental. Logo depois, começamos a conversar também com o Canadá... O Ministro França abordou aí as negociações com o Canadá, com a Coreia, estamos negociando com Singapura, Japão, Indonésia, Vietnã, Índia... Começamos a negociar com todo mundo... Não é negociar; começamos os entendimentos, mas deixando claro que o Brasil, pela força de sua economia, pela vantagem cooperativa no agronegócio, pela capacidade de criar uma grande indústria de transformação, porque tem escala, e poder justamente aumentar a produtividade dos trabalhadores, os salários, a competitividade das empresas, nós acreditamos nessa agenda.
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Na verdade, o Mercosul não foi bom nos últimos 20 anos, 20 para 30 anos. Ele não conseguiu entregar as expectativas que estavam prometidas. É claro que, conversando entre nós, brasileiros, aqui com o nosso Congresso, o Brasil é a maior força econômica do Mercosul. Não é o Brasil que tem que estar dentro do Mercosul; é o Mercosul que tem que tem que estar onde o Brasil está. O Brasil não pode ser prisioneiro de negociações ideológicas que atrasam o progresso brasileiro. Nós não podemos ser prisioneiros disso. Quer dizer, a economia brasileira tem um grande potencial. É uma das oito maiores economias do mundo, tem competitividade em vários setores. E eu sempre disse também o seguinte: nós somos liberal-democratas, queremos fazer uma integração, mas não somos trouxas. Nós só vamos fazer a nossa integração à medida que a gente consiga também preservar o nosso parque produtivo.
As vantagens comparativas que nós temos hoje são na agricultura, mas temos também toda uma indústria de transformação também já instalada e, na verdade, com os impostos muito altos, com os juros muito altos, um sistema tributário disfuncional, a intervenção excessiva do Estado, câmbio sobrevalorizado. Nós tivemos um modelo econômico durante 20, 30 anos, em que ficamos com os juros na Lua e o câmbio lá embaixo, desindustrializando a indústria brasileira. Então, nós não podemos simplesmente abrir a economia de repente - e eu dizia sempre isso - e deixar o chinês correr atrás do industrial brasileiro. Eu dizia isso muito antes dessa guerra, dessa briga ideológica toda aí. Eu dava isso como um exemplo, dizendo: olha, nós precisamos remover os fatores de ineficiência que nós temos aqui dentro. E começamos a fazer essa mudança: baixamos os juros, elevamos a taxa de câmbio, de equilíbrio, ela subiu... Vocês veem que o setor agrícola está forte, a proteção à indústria brasileira aumentou, com a taxa de câmbio um pouco mais favorável, os juros caíram...
Nós estamos querendo fazer justamente a reforma tributária para simplificar e reduzir os impostos, tudo aumentando a competitividade da economia brasileira, para darmos os próximos passos no sentido de uma integração econômica.
E o Mercosul está aqui do lado, é o nosso parceiro preferencial. Partimos primeiro nessa aventura da integração econômica, e todo mundo passou à nossa frente. Quer dizer, o México acabou entrando no Nafta, que é a área de livre comércio com os americanos e canadenses, e acabou crescendo muito mais rápida a corrente de comércio. Várias indústrias, inclusive, se deslocaram do Brasil, que é um país continental, com 200 milhões de habitantes, e foram fazer indústria automobilística lá, nessa área de livre comércio com os americanos. Por outro lado, o Chile e os países do Pacífico, agora a Colômbia, Peru, todo mundo se virou para a Aliança do Pacífico e estão fazendo acordos naquela direção.
E o Brasil ficou aqui, junto com a Argentina - Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai -, prisioneiros de uma aliança que não consegue se modernizar. Então, a nossa missão é modernizar o Mercosul. Justamente pelo valor que atribuímos ao Mercosul, nós queremos fazer a modernização dessa plataforma, de forma a nos ajudar a uma maior integração competitiva com a economia mundial.
Essa modernização exige, ela tem várias dimensões. A primeira dimensão é a tarifa externa comum. E ai entra um interesse também circunstancial de curto prazo. Nós já gostaríamos de ter reduzido as tarifas e gostaríamos de reduzir o que nós chamamos de forma a manter a proteção efetiva, não escolher vencedores nem perdedores, baixar 10% para todo mundo, num primeiro movimento, e, lá na frente, feita a reforma tributária, já com os juros mais baixos, feita a reforma administrativa, já com uma maior visibilidade, porque os impostos sobre as empresas, sendo reduzidos, maior capacidade de atração de investimentos externos... A própria economia ocidental realocando as suas indústrias, porque, depois desse problema com a China, dessa agudização do problema com a China, aumentou a incerteza jurídica.
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A China acabou de declarar, por exemplo, que empresas educacionais e dois ou três outros tipos de empresas não podem ser mais com fins lucrativos. Então, o setor educacional privado, por exemplo, sofreu perdas extraordinárias: 80, 90%. Os americanos, ao mesmo tempo, estão querendo descredenciar abertura de capital de empresas chinesas nos Estados Unidos, porque são dirigidas pelo Estado. Então, deve haver um conflito regulatório entre esses países, que já estão tendo disputas comerciais há algum tempo e estão tendo também disputas sobre leis de patente, sobre propriedade intelectual...
Então, existe aí um possível contencioso na economia global, e o Brasil, como eu sempre disse, desde o início do nosso Governo, está chegando atrasado nessa festa do comércio, da integração competitiva. Isso era uma maldição e acabou nos protegendo durante a pandemia. Nós não tivemos rupturas severas na nossa cadeia produtiva justamente porque nós estávamos isolados. O Brasil é uma das economias mais fechadas do mundo: está em 130º lugar no grau de abertura. E é uma economia com uma extraordinária base produtiva; não deveria ter receio de se integrar aos poucos. Mas tem que ter cuidados para fazer essa integração.
Então, quando começamos a conversar justamente sobre o Mercosul, convidávamos os argentinos e dizíamos: "Olha, vamos entrar para a OCDE juntos. Vamos fazer o acordo", e fizemos esse movimento, aplicamos juntos. Terminamos as negociações com a União Europeia e começamos a negociar com todo o mundo, mas sabendo que esse ritmo tem que ser gradual e previsível. Nós não vamos desorganizar a nossa base produtiva. Nós vamos abrindo devagarzinho. Eu usava sempre esta imagem: o Brasil tem uma bola de ferro na perna direita, e o empresário brasileiro tem uma bola de ferro na perna direita, que são juros muito altos; uma bola de ferro na perna esquerda, que são os impostos excessivos; e um piano nas costas, que são os encargos trabalhistas. Então, nós não podemos agora virar para o industrial brasileiro e dizer: "Olha, corre aí que o chinês vai te pegar". Nós não podemos abrir num ritmo que o sistema produtivo brasileiro não comporte, não resista. Então, nós vamos fazer isso muito gradualmente. Queremos fazer um movimento muito tímido.
Vou dar um exemplo: há setores que têm tarifas de 30% no Brasil. Se nós reduzirmos 10%, a proteção cai de 30% para 27%. Há setores que têm tarifa de 20%, vai cair de 20% para 18%. É um movimento muito brando, muito tímido, muito suave, mas ele é importante para sinalizar para todos os parceiros da área. E eu conversei sobre isso com todos os nossos industriais - eu converso regularmente com eles a cada 45 dias - e eu dizia: "Olha, vocês se preparem. Está todo mundo na frente da televisão, todo mundo engordando, comendo pipoca, assistindo à televisão. Vamos começar a fazer um exerciciozinho. Queremos baixar as tarifas de importação em 10%. E não há hora melhor para você fazer um movimento de abertura, um ensaio de abertura do que quando a economia brasileira está tentando justamente reaquecer e há uma pressão de preços, está subindo comida, está subindo aço, está subindo material de construção, os preços estão começando a subir. Aí você dá um leve aviso para todo mundo: "Olha, vamos derrubar as tarifas de importação em 10%, não vamos abusar do consumidor brasileiro." O momento de abrir é justamente esse. O momento de abrir não é quando você estava em recessão. Com o PIB do Brasil caindo 4%, em meio à covid, você não vai fazer isso. É a mesma coisa com os impostos. Você não pode pegar uma economia em recessão e pensar aumentar imposto, fazer reforma de imposto, não pode mexer nisso. Agora, a economia está crescendo, a arrecadação está vindo forte, é nessa hora que você faz um movimento na direção correta. Então, você virar, como nós viramos, que os argentinos... Olha, primeiro movimento, vamos baixar um pouquinho a nossa tarifa, porque nós estamos entre duas e três vezes mais altos que o resto do mundo. O Brasil está muito isolado, está muito fechado.
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Essa área de livre comércio que se declarou uma união alfandegária não está conseguindo trabalhar assim, ela não está atuando com uma união alfandegária, ela não está entregando o que foi prometido. Então, nós temos que modernizar, justamente porque ela é importante; se não fosse importante, a gente saía. Nós estamos justamente reafirmando a importância da área quando dizemos que queremos modernizá-la.
Essa modernização vem, como eu disse, em pelo menos duas dimensões: a primeira, vamos baixar 10% da tarifa de importação já. Estamos atrasados até. É até bom que ajuda a travar um pouco essa alta de inflação que está vindo aí. A gente dá uma travada. É uma hora justamente de aumentar a oferta de alimentos, a oferta de aço, a oferta de material de construção, tudo isso aí, dar uma acalmada no setor, minério, tudo o que deu uma alta forte agora, dar uma acalmadinha no setor. É bom para o Brasil, é importante. Então, a primeira dimensão é essa, a da tarifa externa comum.
A outra dimensão é a dos acordos comerciais. O mundo fez 350 acordos comerciais. O primeiro deles foi o Mercosul. Depois nós não fizemos mais nenhum acordo comercial relevante. O mundo todo nos atropelou. Há países aqui, como o Chile, que fizeram 30 acordos comerciais bilaterais. Todo mundo está avançando. O Mercosul ficou preso numa armadilha ideológica: eu falo bem de você, você fala bem de mim e nós dois afundamos juntos. É o que aconteceu. Chegou a entrar, inclusive, a Venezuela. Que eu saiba, Mercosul é no Sul, não é? A Venezuela está bem distante do Sul, além de não ser um regime democrático. O Brasil é uma democracia resiliente, forte e confiável. O Brasil é uma grande sociedade aberta em construção. É verdade que há choques entre Poderes, mas é justamente esse barulho que nos mostra a necessidade de que esses Poderes tenham independência. É justamente quando um ator qualquer sai da caixa e faz um avanço que os outros atores, num aperfeiçoamento institucional, recorrem ao VAR. Olha aí! Quem fez a falta? Quem fez o pênalti? Quem está saindo da caixinha? E é isso que traz a força e o vigor de uma democracia. Nós preferimos o barulho de uma democracia do que o silêncio de uma ditadura.
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O Brasil é uma democracia vigorosa, já percorreu todos os espectros ideológicos, já foi para um extremo e já foi para outro. O Mercosul foi capturado, no passado, por correntes ideológicas, a ponto de colocar um país do Norte no Sul. Então, a Venezuela entrou exatamente porque tinha um regime simpático à economia fechada, a uma sociedade fechada, e nós estamos procurando exatamente o contrário. Nós queremos sociedades abertas, integradas economicamente, democracias liberais. É isso que nós queremos. Nós não queremos um país fechado em si, com um regime fechado politicamente. É o contrário, nossa história é o contrário. Nós estamos abrindo o Brasil, e nós estamos numa transição incompleta. Nós fizemos a transição democrática bem-sucedida, mas não conseguimos, ainda, completar essa transição econômica, quando mesmo países que foram socialistas até a alma, como a China, como a Rússia, como o Leste Europeu, todos estão se integrando. Todo mundo está se integrando nas cadeias globais de comércio, e o Brasil e seus parceiros do Mercosul foram perdendo participação, que é aquele gráfico que eu mostrei. Nós já fomos 18% do fluxo de comércio do Brasil, e hoje estamos a 6%. Estamos ficando irrelevantes. O Mercosul está ficando irrelevante para o Brasil. Nós não queremos isso. Nós queremos que ele continue relevante.
Então, nós estamos conversando... Na primeira dimensão, o principal antagonista, entre aspas, o adversário da ideia foram os argentinos, mas, por outro lado, tem outra dimensão, que é a liberdade de acordos comerciais, e aí o grande protagonista, com nosso apoio, é o Uruguai. O Paraguai está em cima do muro. A Argentina está contra a redução das tarifas, e nós estamos negociando duro com eles. Nós queremos reduzir os 10% agora. O Uruguai está a favor da redução, o Paraguai está em cima do muro, mas desce do muro para nos apoiar, porque o Brasil é importante para o Paraguai, é muito importante para o Paraguai. Então, o Paraguai deve nos acompanhar. Seria mais inteligente e prudente da parte dele nos acompanhar. E já os uruguaios querem liberdade para começar a conversar sobre parcerias comerciais. E nós estamos completamente abertos para deixar os parceiros se moverem.
Nós compreendemos o problema da Argentina. A Argentina está com um problema seriíssimo. A Argentina está com um problema com o FMI, ela pode precisar de um, dois, três anos para se adaptar a essa maior liberdade. Ela pode precisar de tempo, mas não é o nosso caso. Nós estamos preparados para fazer esse movimento. Mais do que estarmos preparados, nós precisamos fazer esse movimento. Um ligeiro grau de abertura agora, reduzir só 10% das nossas tarifas revigora toda a área econômica, mostra que nós estamos abertos a um futuro de integração com a economia global.
Então, de um lado, o Uruguai quer ir até mais além e também ter maior liberdade de examinar a possibilidade de acordos. Não há problema nenhum um membro... Suponha que o Uruguai conversou com o Canadá e chegou à conclusão, conseguiu alguns bons termos de negociação para ele. Ele vai trazer para o Mercosul, nós vamos examinar juntos, e nós podemos até melhorar a negociação, falar: "Olha, se vocês abrirem o Mercosul inteiro, em vez de se fecharem só com o Uruguai, o Mercosul inteiro entra se vocês melhorarem os termos da negociação". Então, deixar alguém livre para conversar é bom, não afeta ninguém.
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E, ao mesmo tempo, deixar a liberdade de a Argentina só fazer os movimentos quando se sentir mais confortável também é bom. Então, no fundo, é como se fosse o seguinte: deixa o Uruguai negociar um pouco mais, olhar, examinar outras alternativas que sejam boas para a área; deixa a Argentina, se for o caso, não acompanhar quando nós reduzirmos, por exemplo, a tarifa de importação... Quer dizer, vamos ficar um pouco mais parecidos com uma área de livre comércio. As áreas livre comércio tiveram sucesso. A área de livre comércio da Ásia progrediu e trouxe uma riqueza extraordinária para todo mundo que está lá em volta, tanto que eles estão dobrando a aposta agora e criaram um aprofundamento no movimento inicial. Então, está todo mundo aderindo: Japão, Coreia, Indonésia, Vietnã, está todo mundo entrando. Aqui no Norte a mesma coisa: Canadá, Estados Unidos e México fizeram uma área de livre comércio, avançaram também.
Então, se nós fossemos uma área livre comércio, o Brasil poderia negociar, o Uruguai também. Estaríamos ainda irmãos e juntos, no sentido de que não há tarifas entre nós e estamos todos juntos, com liberdade de comércio entre nós, mas cada um pode escolher também acordos bilaterais. Isso seria uma área de livre comércio. Nós não estamos lá, nós estamos na união aduaneira. Nós não somos hoje nem um, nem outro. Nós não temos as vantagens que uma área de livre comércio teria, de maior liberdade para os seus membros, e não temos também as vantagens que um Mercosul modernizado nos traria, que é um pouco mais de abertura. O Brasil não pode continuar sendo uma economia de baixo crescimento. O baixo crescimento econômico brasileiro, uma nação que tem recursos naturais, que tem uma população de 200 milhões de habitantes crescendo ainda, que tem várias raízes étnicas, é realmente uma verdadeira mistura, é onde o mundo descobriu uma cultura nova, generosa, afetiva. O Brasil é singular, o Brasil é realmente singular. Quanto mais a gente vê o que está acontecendo no mundo inteiro, mais consciência nós temos da nossa brasilidade. E nós não podemos ficar prisioneiros de armadilhas ideológicas, um país fechado só pode negociar com dois ou três e só convida para entrar no grupo quem tem a mesma ideologia. Eu, desde o início deste Governo, disse o seguinte: nós vamos dançar com todo mundo, nós vamos dançar com a China, vamos dançar com os Estados Unidos... Eles dançaram juntos durante 30 ou 40 anos, agora eles brigam e nós vamos parar de dançar? Nós, que não dançamos com ninguém, estamos chegando atrasados. Nós vamos dançar com todo mundo, o nosso objetivo é justamente aumentar a produtividade do trabalhador brasileiro e os salários, aumentar a competitividade e os resultados das nossas empresas e a riqueza das nações. Duzentos e cinquenta anos atrás foi percebido pela Inglaterra, pelos americanos, recentemente pelas viúvas do socialismo... Quer dizer, a China mergulhou nos mercados globais, a Rússia mergulhou nos mercados globais, a Índia está mergulhando nos mercados globais, o Leste Europeu, a Polônia, todo mundo está entrando e o Brasil ficou para trás, prisioneiro de uma união aduaneira que não realizou o seu potencial.
Então, eu faria minhas observações iniciais assim, dizendo que nós esperamos provocar essa modernização durante os próximos seis meses. De um lado, pedindo uma redução da Tarifa Externa Comum de 10%, como um passo inicial que mostra que nós temos a compreensão dos nossos parceiros.
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Da mesma forma que nós temos compreensão com os problemas da Argentina - eles não precisam vir junto conosco enquanto não estiverem mais à vontade -, nós não gostaríamos que a cláusula de consenso do Mercosul virasse um veto, uma cláusula de veto. É uma cláusula que diz que, se alguém não quer andar, o outro também não pode andar. Isso nós não... Nós achamos que o Brasil é um país grande demais, com um potencial grande demais, com desafios enormes, e ele não pode ser prisioneiro de um arranjo institucional que não se moderniza. Nós temos que modernizar o arranjo institucional. O Brasil é grande demais para ser prisioneiro de um arranjo institucional que degenera os fluxos de comércio. Se for para o Brasil virar prisioneiro de uma filosofia de protecionismo, de uma filosofia de atraso, de uma filosofia que atrasou o continente inteiro... A América do Sul, hoje, é um continente de desesperança.
Nós não podemos reservar esse futuro aos brasileiros. Os brasileiros merecem um futuro melhor. Nós queremos trilhar o caminho da prosperidade, e uma parte, um vetor importante do caminho da prosperidade - foi assim 250 anos atrás com os anglo-saxões, é assim hoje com os chineses - é o caminho da integração na economia global, com todo o cuidado, com todas as considerações de preservação do nosso parque produtivo, particularmente do setor industrial. Mas não podemos perder a evolução digital. O Brasil é o quarto maior mercado digital do mundo. Nós queremos receber os investimentos. Nós temos que modernizar nosso ambiente de negócios, para podermos abrir a economia não só do ponto de vista comercial, mas também com os fluxos de comércio.
Então, é uma filosofia. É um Governo que foi eleito para implementar uma filosofia. O caminho de prosperidade é um programa de governo. Só os negacionistas não reconhecem que nós temos um programa de governo.
O Mercosul estava parado há oito anos, a União Europeia estava parada há 20 anos. Fizemos o Efta, estamos negociando com Canadá, Japão, Coreia, Singapura, Índia, Israel. Estamos conversando com todo mundo. Queremos abrir a economia. Fizemos a reforma da previdência, fizemos a reexploração do petróleo com a cessão onerosa. Estamos em plena reforma. Encaminhamos a reforma administrativa, encaminhamos o primeiro capítulo da reforma tributária, que é justamente o fim deste imposto disfuncional que é o PIS/Cofins. São cem regimes diferentes. Estamos enviando os capítulos. Agora estamos mandando o segundo capítulo, que é o do Imposto de Renda, para baixar o Imposto de Renda das empresas. O imposto corporativo caiu de 40% para 20%. A média hoje é de 23% no mundo inteiro, e o Brasil fez o contrário, foi subindo nesses 40 anos.
Então, desde a campanha eleitoral, nós fomos muito claros. Nós temos um programa de governo que estamos executando; só não o vê um negacionista. Nós queremos abrir a economia, estamos fazendo um esforço para abrir e começamos muito bem. O covid fechou as economias do mundo inteiro. Agora o covid está de novo refluindo, e nós estamos retomando nossos contatos comerciais.
Combatemos, eu acho, do ponto de vista econômico... Tivemos o Congresso junto conosco, trabalhamos, e, junto com a sociedade civil, enfrentamos as primeiras ondas e derrubamos a morte. Estamos fazendo a vacinação em massa. A economia... Está havendo um retorno seguro ao trabalho com a vacinação em massa. O tempo inteiro mantivemos o compromisso com as futuras gerações, quer dizer, não faltou dinheiro para a saúde, mas, ao mesmo tempo, foram gastos extraordinários. E o déficit, que era de 10,5% do PIB, o déficit primário, caiu para 1,7%.
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Ninguém fez isso. Quer dizer, mantivemos o compromisso com a saúde, mas, ao mesmo tempo, o compromisso com as futuras gerações. Os gastos eram retráteis. Não faltou dinheiro para a saúde, não faltou dinheiro para a vacina, mas isso não foi transformado em farra eleitoral, isso não foi transformado em gastos permanentes e recorrentes, aumento de salário, expansão descontrolada de crédito, nada disso.
Fizemos nosso trabalho, estamos juntos enfrentando não só a pandemia, mas já agora vislumbrando um futuro melhor, a economia crescendo mais rapidamente, a arrecadação voltando com recursos para os programas sociais dentro do teto, dentro dos parâmetros fiscais que são exigidos para manter a estabilidade da economia.
Os Poderes se respeitam. Quando vem o que eu chamei de um meteoro, que foram os gastos que vieram do Supremo... Eu não posso quebrar a lei, eu não posso quebrar a Lei de Responsabilidade Fiscal, quebrar a lei do teto, não posso fazer isso. Então, eu tenho que oferecer alternativas e essas alternativas foram oferecidas até em conversas com o Presidente do Supremo, Ministro Gilmar Mendes, gente que já enfrentou crises anteriores. E sempre nos ajudaram. O Ministro Dias Toffoli nos ajudou muito também antes. São Ministros que estão atentos ao problema e eles já criaram jurisprudência. Eles parcelaram os precatórios de Estados e Municípios. Então, nós oferecemos essa alternativa. Se essa alternativa não passar, não tem problema: nós vamos mandar um orçamento com R$90 bilhões para o precatório e faltando dinheiro para tudo mais, inclusive para salários nossos, salário no Executivo, no Congresso, no Supremo, no Judiciário, em todo lugar, porque se estiver cumprindo uma lei, você descumpre a outra, a menos que haja uma solução.
Então, nós estamos construtivos, estamos atuantes sempre, confiamos na democracia brasileira. Acreditamos que o barulho é natural. É claro que às vezes há excessos, e há excessos em todos os Poderes. Às vezes um ministro pode cometer um excesso, às vezes pode ser um juiz do Supremo que comete um excesso, mas tem VAR. Todo mundo vê quem está cometendo excesso, e aí a sociedade, organizadamente, pede moderação. Nós precisamos de moderação e colaboração para resolver os problemas que estão aparecendo.
Então, o Mercosul eu considero... Eu agradeço a oportunidade de ir, vamos abrir para as perguntas. Desde a campanha eleitoral, até houve um mal-entendido quando, durante a campanha ainda, uma repórter dizia: "Mas e o Mercosul? E o Mercosul?". E eu querendo explicar que a nossa prioridade eram as reformas internas, a nossa prioridade era exatamente a reforma da previdência e tudo. E eu dizia assim: "Olha, mas a prioridade é a previdência". E ela: "Mas e o Mercosul?" Eu falei: "Escuta, o Mercosul não é a coisa mais importante que está acontecendo no Brasil, não; a coisa mais importante é a reforma da previdência". Aí no dia seguinte: "Ministro Paulo Guedes quer sair do Mercosul". Não foi nada disso que eu disse. O que eu disse é que a coisa mais importante era a reforma da previdência.
Agora, a mesma coisa. Tem coisa muito importante acontecendo agora: vacinação em massa, retorno seguro ao trabalho, fazer um Bolsa Família, um programa de proteção social que caiba nos orçamentos públicos, que seja exequível, ter a colaboração de outros Poderes. Quando houve, no início do ano, um acordo político que não cabia no orçamento, eu tive que dizer: é inexequível, torna-se inexequível o nosso orçamento com acordo político de R$30 bilhões. Agora eu tive que dizer a mesma coisa, só que vem de outro Poder, agora vem do Judiciário: 90 bilhões. Eu digo: é inexequível, vai parar Brasília se tiver que pagar isso com as leis vigentes. Se se fizer a reforma da Lei de Responsabilidade Fiscal, se houver uma exceção para o teto, aí é outra conversa. Mas, com as leis vigentes, eu só tenho um jeito de cumprir e ficar constitucionalmente dentro... É como se eu dissesse o seguinte: para cumprir minhas funções constitucionais, eu preciso desse parcelamento - eu preciso desse parcelamento para cumprir minhas funções constitucionais. Agora, se quiserem mexer na Constituição, tudo bem, a gente pode estudar outra solução.
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No caso do Mercosul, eu estou vindo para esclarecer exatamente o seguinte: num momento como este, seria muito bom e muito importante nós sinalizarmos um grau de abertura muito maior, baixando a tarifa externa comum. Ela sinaliza corretamente que o Brasil está andando também nessa direção, ela é muito moderada - essa redução de 10% é muito moderada.
Foi um choque, quase uma agressão ao Brasil, um Embaixador da Argentina tirar fotografia com ex-Presidentes dizendo que não pode flexibilizar ou dinamizar o Mercosul. Isso é uma agressão ao Brasil! Isso é uma agressão ao Brasil! Quem foi Presidente e fechou a economia teve todo o direito de fazer isso numa democracia. Fechou a economia e manteve a economia fechada por 30 anos. O Brasil se fechou. O Brasil é uma economia fechada, uma das mais fechadas do mundo, há 30 anos. Ora, o nosso Governo ganhou a eleição dizendo que ia abrir a economia. Então, ouvir um Embaixador dizer que não vai abrir porque dois ex-Presidentes estiveram aqui e disseram que não se pode abrir, isso é um desrespeito à nossa democracia, isso é um desrespeito ao voto da população
Evidentemente, eu quero manter o Mercosul. Nós queremos manter o Mercosul e nós respeitamos o Mercosul. É por isso que nós estamos querendo modernizar.
Então, eu acho superimportante o Congresso estar atento a essa dimensão, sabendo que, como tudo que nós fazemos, isso é moderado, é responsável, é parte do nosso programa de governo. O programa de governo é: vamos abrir a economia. Então, nós estamos dinamizando os acordos comerciais e gostaríamos de reduzir um pouco as nossas tarifas.
Da mesma forma que nós compreendemos que os argentinos não querem baixar a tarifa agora porque eles estão lá com os problemas deles no FMI, nós gostaríamos que eles compreendessem que, para nós, é importante baixar tarifa agora, com um pequeno movimento, que também tem como efeito colateral... Na hora em que há uma pressão de demanda na economia e a inflação começa a subir um pouquinho, é a hora certa para se abrir. Isso vai aumentar a oferta de alimentos, vai aumentar a oferta de material de construção, vai ajudar as classes mais baixas - justamente os consumidores que estão vendo os preços subirem. A gente vende os produtos agrícolas para o resto do mundo e não os deixa venderem aqui. Vamos deixá-los venderem aqui. A própria Argentina vai se beneficiar, porque poderá vender um pouco mais de produtos agrícolas aqui. Vai ser bom também para o Uruguai, vai ser bom também para o Paraguai. Se o Brasil cresce mais rápido, o Paraguai vai vender mais chicote elétrico para a nossa indústria automobilística. Então, eles sabem disso. Nós conversamos muito francamente sobre isso.
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Uma coisa que não se pode dizer na linguagem diplomática, mas, como brasileiros, nós temos que ter noção das coisas, é o seguinte: não é o Brasil que fica onde o Mercosul manda; é o Mercosul que tem que ser conveniente pro Brasil. O Brasil é muito grande pra ficar... Não dá pra ficar numa caixinha pequena, não. O Brasil é muito grande, tem um destino com muitos desafios à frente e não pode ficar preso por falta de compreensão de parceiros. Aliás, não são parceiros, é um parceiro só que está um pouco incomodado. O Uruguai quer fazer o movimento. O Paraguai desce do muro se nós formos firmes. A Argentina não está num momento de poder fazer esse movimento. Nós compreendemos, aceitamos e flexibilizaremos. Agora, não podemos aceitar ser prisioneiros de uma armadilha ideológica montada 30 anos atrás; desculpe, montada nos últimos governos, porque 30 anos atrás foi uma ferramenta extraordinária e funcionou muito bem durante o início, depois se desvirtuou e não está sendo funcional e não está entregando as expectativas que nós precisamos.
Então, eu fico por aqui aberto às perguntas.
E, de novo, sou um democrata. Se qualquer sugestão que nós encaminharmos for vencida, não há problema, vamos continuar no caminho da miséria. Eu tenho que ser muito claro a respeito disso. A integração competitiva tirou da miséria 3,7 bilhões de eurasianos. A China saiu da miséria se integrando aos fluxos globais de comércio. A Índia está se integrando. O Vietnã, Coreia do Sul... O Japão foi o grande fenômeno do pós-guerra exatamente porque mergulhou nas correntes... O Japão foi o precursor na Ásia, depois veio a China... Depois veio a Coreia, agora veio a China. Todos estão se beneficiando dessa integração global. E o Brasil é um gigante deitado, derrubado no chão, prisioneiro de ideologias que fecharam a economia brasileira.
Nós queremos abrir a economia brasileira. Agora, com todo o cuidado, preservando o nosso parque industrial. E nós estamos, na verdade, apostando na reindustrialização da economia brasileira. Estamos fazendo as reformas - e eu quero agradecer ao Congresso, eu não posso nunca vir aqui sem agradecer -, reformas além da previdenciária, que foi lá atrás; além da retomada da exploração do petróleo com o gás, com a cessão onerosa; além do combate ao covid, com auxílio emergencial, com benefício emergencial, com o Pronampe, que a Senadora Kátia Abreu também tanto ajudou. Além disso tudo, agora, logo após a eleição dos novos Presidentes da Câmara e do Senado, nós aprovamos, em poucas semanas, o Banco Central independente, justamente pra travar essa alta de inflação que está vindo aí, essa ameaça de aumento de preços setoriais e um aumento transitório de material de construção, de alimentos, justamente porque estávamos em distanciamento social de um lado, produção desativou um pouco e, por outro lado, mantivemos e até ampliamos os gastos de consumo. Então, veio essa pressão de preços, essa pressão inflacionária de curto prazo. Na mesma hora, o Congresso aprovou os gatilhos fiscais, na PEC emergencial, aprovou o Banco Central independente, aprovou a Lei de Falências, pra ajudar as empresas a se levantarem, aprovou o Marco Legal das Startups, pra ajudar as novas empresas nessa revolução digital que está acontecendo no mundo. É por aí que nós vamos sair, o futuro é verde e o futuro é digital.
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Então, nós temos que pensar em matriz de energia limpa, nós temos que pensar em uma economia cada vez mais digitalizada. Aí o Congresso aprovou também Correios e Eletrobras. Então, nós estamos com uma agenda de reformas andando. Também vem o setor elétrico. Logo depois vieram as privatizações de Cedae, desde a de Maceió, lá em cima, até a Cedae... Vocês vejam a importância da Cedae. Numa sexta-feira à tarde, foram mobilizados 50 bilhões; 20 bilhões de outorga e 30 bilhões de compromisso de investimento. Cinquenta bilhões é seis vezes o orçamento do Ministério de Desenvolvimento Regional, Ministério de Infraestrutura. Quer dizer, o setor privado está aí, se nós mantivermos um bom ambiente de negócios... Nós estamos melhorando o ambiente de negócio. Agora, estamos mandando o segundo capítulo da reforma tributária. Se não for aprovada, não tem problema, paramos. Agora, é um erro, é um equívoco.
Então, eu faço questão, toda vez que estou no Congresso, de agradecer ao Congresso. O Congresso tem sido realmente um parceiro das reformas, um Congresso reformista, e tem uma agenda agora que é vacina e reforma. E tem a outra que eu respeito também, que é essa que está aí na CPI da Covid, mas que é uma agenda que está no meio da guerra. Eu sempre falei que nós precisamos andar, vencer a guerra, nós temos que vencer a guerra. Então, eu respeito a agenda, estou sempre muito compreensivo em relação a tudo isso, evidentemente, mas, naturalmente, olhando do ponto de vista econômico, nós precisamos avançar nessa dimensão do Mercosul.
Eu peço a compreensão do Senado exatamente pelo seguinte: nós estamos atrasados 30 anos. A economia brasileira ficou fechada 30 anos. Nós vamos abrir muito cautelosamente, mas nós temos que sinalizar. E agora, a curto prazo, é importante pra ajudar, é o momento exato de abrir, é justamente quando a demanda vem forte. A produção ainda está se reorganizando pra oferecer. Então, se chegar agora mais comida, chegar mais material de construção, chegarem melhores produtos pra população brasileira, moderando, apenas moderando essa exacerbação de reajuste de preço, é o momento ideal, é a hora certa. Então, nós não podemos ser prisioneiros de uma armadilha ideológica que está impedindo o progresso brasileiro.
Eu tenho que ser muito claro a respeito disso. Eu fui muito duro nas conversas com os nossos parceiros comerciais, dizendo o seguinte: "Olha, o Brasil é grande demais pra ficar preso numa gaiolinha; ou nós modernizamos isso aí, transformamos isso num negócio um pouco maior, um pouco mais dinâmico, ou o Brasil vai estourar a gaiola". É muito pequenininha essa gaiola pro Brasil. Então, nós compreendemos o problema da Argentina, mas nós queremos compreensão pros nossos problemas também. E a hora pra nós é agora. Nós vamos fazer um movimento moderado, mas decisivo: 10% todas as tarifas. Essa foi a nossa proposta pra eles.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Ministro, pelas suas considerações, pela sua transparência em suas opiniões.
Eu gostaria de fazer uma pergunta de procedimento. Nós ainda temos o representante da indústria, da CNI, e temos perguntas dos Senadores. Eu pergunto: qual o tempo que o senhor disponibiliza para continuar na participação remota conosco aqui, Ministro?
O SR. PAULO GUEDES - Eu, se não tiver compromisso de almoço, fico sem almoçar e sigo.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Ótimo, emagrecer é sempre bom.
Então, Ministro, muito obrigada, porque nós temos perguntas importantes aqui dos colegas Senadores, eu também gostaria de fazer considerações.
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Então, eu passo a palavra para o Sr. Fabrizio Sardelli Panzini.
Fabrizio é mestre em Economia Política pela PUC de São Paulo, possui pós-graduação em Economia pela Fundação Getúlio Vargas, é o especialista da Unidade de Negociações Internacionais da CNI, desempenhando atividades de coordenação e consolidação do posicionamento do setor privado brasileiro nas negociações do Mercosul-União Europeia.
Com a palavra o Sr. Fabrizio Sardelli.
Por favor.
O SR. FABRIZIO SARDELLI PANZINI - Muito obrigado, Senadora.
Está me ouvindo?
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Sim, claro.
O SR. FABRIZIO SARDELLI PANZINI (Para expor.) - O.k.
Primeiro, é uma honra esse convite. Quero cumprimentar a todos.
Senadora, eu queria só deixar registrado a admiração que a indústria tem pelo seu trabalho, pelo seu trabalho como Parlamentar, pelo seu trabalho aqui na Comissão de Relações Exteriores e pelo trabalho como Ministra da Agricultura. Saiba que a indústria admira muito o seu trabalho, o Presidente Robson admira muito o seu trabalho.
Eu trouxe uma apresentação pra colocar uns números. Eu pretendo fazer da forma mais leve e rápida possível, para contribuir com o debate com a nossa visão, para fazer um balanço. E eu quero começar com o copo meio cheio.
Se puderem passar adiante, por favor. Não sei se eu consigo passar. Pode ir passando adiante.
O primeiro ponto tem a ver com salários e com emprego.
A cada R$1 bilhão que a gente exporta pro Mercosul, a gente gera R$680 milhões em massa salarial e a gente gera 32,5 mil empregos. Isso é apenas inferior às nossas exportações para os Estados Unidos, bem acima dos países asiáticos, parecido ali com a exportação para o México. Então, primeiro ponto: o Mercosul, quando exporta, gera mais massa salarial e mais empregos.
Próximo eslaide, por gentileza.
Aqui a gente tem um ponto relacionado a tributos e produção em cadeia. Em termos de tributos, cada 1 bilhão exportado para o Mercosul gera 363 milhões em tributo. É o maior, acima também dos Estados Unidos, que estavam em primeiro nas outras posições, e maior que os demais, bem maior quando a gente olha na Ásia, não é?
E a produção gerada, ou seja, aquilo que encadeia, se gera - pode voltar o anterior, quero colocar aqui debaixo -, cada 1 bilhão exportado gera mais 4,2 bilhões na economia, 1,2 bilhão por exemplo a mais do que na China. Então, quando a gente olha a importância na pauta, a gente não está olhando para dentro. E aqui a gente trouxe um pouco dos dados para dentro.
Passando adiante, continuando falando do copo meio cheio, a diversidade de agregação de valor no Mercosul é inquestionável.
Eu queria ir direto àquele quadrinho ali embaixo, para mostrar um pouquinho para vocês. Cinquenta por cento do que a gente vende pro Mercosul são 48 produtos. Para os Estados Unidos isso cai para 17; para União Europeia, isso cai para 12; para a China já cai pra 2 produtos apenas.
Quando a gente olha 75% da pauta, o Mercosul tem uma diversidade de 261 grupos de produtos; Estados Unidos, 88; União Europeia, 53; e a China, apenas 3. E assim sucessivamente, 90% da pauta são 757 grupos de produtos. Noventa por cento do que se vende é indústria, com mais agregação de valor, e esses dados que a gente compara importação e exportação da parte industrial dá um pouco da ideia daquilo que a indústria prioriza em termos de acordos comerciais, porque são países com os quais a gente já tem uma certa integração em bens de maior valor agregados, serviços, investimentos, que a gente vai ter possibilidade de integrar mais a cadeia de valor quando a gente fizer os acordos comerciais.
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Passando adiante.
Uma importância regional do Mercosul. A Senadora já comentou isso. Ele é importante de norte a sul. Ele é o primeiro ou o segundo parceiro comercial para o Amazonas, para o Ceará e para Pernambuco. Para esses três Estados aí, no Norte e Nordeste; no Centro-Oeste, ele é o primeiro para o Mato Grosso do Sul ou segundo; no Sudeste, para São Paulo; e, no Sul, para o Paraná e para o Rio Grande do Sul. Então tem uma importância regional aqui para sete Estados.
Adiante.
É só para mostrar um pouquinho que aqui a gente começa a ver um pouco do copo meio vazio. É muito dado aqui, mas, em resumo, é o seguinte: nossas exportações estão crescendo muito mais para fora do Mercosul, com exceção do Paraguai, cujas exportações crescem muito para dentro do Mercosul, para dentro do Brasil, especificamente, fruto de investimentos. Mas, se a gente olhar o Brasil e Uruguai, são os que menos crescem de exportação para dentro do Mercosul, e Brasil e Argentina crescendo muito mais para China e para Ásia.
O próximo eslaide é um pouco de investimentos também. Nós temos recebido muito menos investimentos, como Mercosul, e isso vai gerando um problema de crescimento econômico na região. E isso é uma culpa nossa, não é uma questão que o Mercosul vai conseguir resolver. Isso são políticas econômicas dos países. Esse é um ponto que eu queria abordar, Senador, e, aqui no final, eu vou colocar uma agenda que a indústria vê para o Mercosul.
E nós não investimos em nós mesmos, não é? Só 7% do que a Argentina recebeu, de 2003 para cá, em investimento externo foi do Mercosul; só 1% que o Brasil recebeu foi do Mercosul; no caso do Uruguai, 5%, e no do Paraguai, sim, um número relevante, 18%. E isso é importante, porque investimento no mundo gera comércio. O Fórum Econômico Mundial diz que 70% do comércio tem a ver com investimento de multinacionais.
Passando adiante, um pouco da importância do Mercosul. E aí a gente falou muito da perda de importância na pauta de exportação. Mas olha como é um fenômeno que acontece com todo mundo. Essa é a nossa pauta de exportação. Eu peguei de 1997 a 2000, de 2001 a 2010, e de 2011 a 2020, porque são mais ou menos as três décadas e os dados que havia disponíveis. Mas a perda de participação da União Europeia nas nossas exportações é brutal: de quase 11%, de quase onze pontos percentuais. Desculpe-me. E, cada vez mais, a gente enfrenta o mercado fechado ali, principalmente no nosso agronegócio.
No caso do Estados Unidos, nove pontos percentuais de perda de participação.
O Mercosul é um pouco mais resiliente, apesar de representar menos: seis pontos quatro pontos percentuais de perda. E aí a gente vê a China num crescimento exponencial de vinte pontos percentuais de aumento na nossa participação de exportação.
E o problema aqui, que eu acho que é um problema brasileiro, para a gente prestar atenção no próximo eslaide. É mais um ponto de que a gente tem que cuidar: são as nossas exportações industriais. Elas representavam 81% na década de 1990; 83%, no início da década de 2000, e hoje são 54%, 55% do que a gente vende para o mundo.
Não é ruim que o agronegócio ganhe espaço; é muito importante - garante saldo, garante escala, garante emprego, garante cadeia. Mas é preocupante o lado industrial perder esse protagonismo. De 150 bilhões, a que a gente chegou, para 114 agora, com trinta e poucos bilhões, nós estamos falando de quase 2 milhões de empregos na indústria relacionados à exportação, e que a gente não tem mais. Então, é um ponto de cuidado.
Passando adiante.
Aí eu queria colocar o Mercosul, nesses anos recentes, e a nossa agenda já.
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O Mercosul, nos anos recentes, eu acho lá atrás, quando a gente teve o Tratado do Mercosul... Como os próprios Ministros colocaram, o crescimento da nossa economia nos anos 1990 teve muito a ver com o crescimento do Mercosul. Depois a gente entrou numa maré de crises, uma crise muito forte na Argentina, uma crise forte no Uruguai também. E aí a gente começou a aumentar as barreiras não tarifárias no bloco, o que é algo que a gente não pode aceitar. Se um bloco quer fazer livre comércio com o mundo, se o bloco quer fazer livre comércio entre si, precisa respeitar as regras. Não é compatível com o que o bloco tem.
Depois, nós entramos numa época do Mercosul político. A gente discutia muito a parte política do Mercosul e pouco da agenda econômica. Mas a gente engatou, no final da década de 2010, década de 2010 para frente, um Mercosul com mais agenda econômica. O que que a gente conquistou? Nós conquistamos - passando adiante aí -, a gente retomou as negociações comerciais, a gente fez acordos de investimentos internamente, fizemos acordos de compras públicas em 2017, concluímos o Mercosul na União Europeia, concluímos Mercosul-Efta, fizemos um acordo de facilitação de comércio interno do Mercosul, que está nesta Casa, fizemos um acordo também de compras públicas, como eu mencionei, em 2017, que está nesta Casa.
Qual é a nossa prioridade para o Mercosul? Colocamos cinco pontos na agenda, sendo que o dois, o três e o quatro dependem do Mercosul. Mas talvez o primeiro e o quinto sejam muito mais importantes e talvez valha a gente pensar o quanto a gente está dando culpa ao Mercosul de algo que a gente tem muito mais culpa interna para resolver.
O primeiro ponto: crescimento e estabilidade.
Vamos olhar as três décadas do Mercosul. Olha que interessante este dado: em todas as décadas o Mercosul cresceu não só menos que o mundo, não só menos que o mundo emergente, mas cresceu abaixo do mundo. Chegou à década de 2001 a 2010 - pode voltar um minutinho, por favor - a crescer metade dos emergentes. E agora, nessa última década, dá um quarto dos emergentes.
Então, nós temos um problema de estabilidade econômica na região e nós temos que aceitar isso e resolver: inflação, gastos públicos acelerados... E, se a gente não resolver isso, a gente não vai crescer. E, se a gente não crescer, a gente não vai vender para nós mesmos e não vai fazer com que o Mercosul fique mais importante nem no mundo, nem aqui.
Segundo ponto... Aí, sim, depende da gente. E vou deixar bem claro que a pauta da indústria em acordos comerciais é bastante ambiciosa.
Nós queremos agenda econômica e agenda de acordos comerciais no centro da agenda do Mercosul, e os países com os quais nós queremos acordos comerciais representam 60% do PIB industrial. Não é pouco. Então, nós queremos concluir as negociações que a gente já fez - União Europeia, Efta, México, Canadá -, queremos intensificar a agenda de acordo comerciais com Estados Unidos, América Central e Caribe, Reino Unido, Japão, norte da África... São essas as prioridades que a indústria traz e que representam esses 60% do PIB mundial.
Aí vão perguntar: "Mas e a flexibilidade para a gente negociar?"
Pode voltar um minutinho, porque está no cantinho ali.
A flexibilidade em grande parte já existe. A gente já negociou vários acordos na Aladi, flexíveis, a gente negociou com listas diferentes com o Egito, a gente negociou de modo diferente com a Índia, embora seja um acordo muito pequeno, quase insignificante, e hoje em dia a gente está negociando com a Coreia do Sul, com a Argentina fora da oferta de bens. Então, que flexibilidade exatamente a gente está discutindo?
E nós conseguimos, como bloco, negociar um acordo comercial com o maior parceiro mundial, que é a União Europeia. Será que o Mercosul não consegue dar realmente passos juntos? O alinhamento político é extremamente necessário nesse momento.
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Continuando aí, o que a gente gostaria também de ver no Mercosul seria uma intensificação da transparência e da participação privada. Em alguns acordos comerciais - o Dr. Robson está ali presente -, a gente não se manifesta se não houver fundamentação econômica. São os acordos na Ásia que nos preocupam mais. Com um ganho de competitividade no Brasil, nós podemos encarar, sim, mais acordos com a Ásia, mas há um déficit, um déficit geral, principalmente da indústria. E o superávit que a gente vai ter, muitas vezes no agronegócio, não chega a representar nem um quarto, nem um quinto, muitas vezes, do déficit que a gente vai ter na indústria.
E, muitas vezes, pegando a fala do Embaixador do Uruguai, esses países asiáticos... O centro do protecionismo é onde a gente tem ganhos, e eles não abrem o mercado. A gente viu, com a União Europeia, a dificuldade de conseguir 99 mil toneladas de carne bovina, que vão ser divididas entre quatro países, sendo que, em 2004, a oferta era de 140 mil. Então, temos que saber realmente o que vamos ganhar lá.
Na questão da PEC, eu acho que o Ministro colocou bem. Acho que a agenda brasileira - se puder passar aí também - se tornou menos ambiciosa. A indústria está disposta a conversar, embora a nossa posição esteja pautada no fato de que os problemas estão em outro lugar. Infelizmente, essa queda de tarifa não compensada, sem contrapartidas, pode gerar um impacto para muitos setores que eu coloquei aí e também calculado pela CNI.
Avançando na agenda do Mercosul, aqui estão as tarifas e o custo Brasil. Essa é uma mandala do custo Brasil feita pela própria Sepec (Secretaria Especial), que coloca o custo Brasil em R$1,5 trilhão, e a parte relacionada ao comércio internacional está em 6% desse custo, ou seja, 94% estão em outro lugar - eu falo sobre a parte relacionada basicamente à tarifa. Então, a gente tem muito a consertar, e simplesmente falar de tarifa pode fazer com que a gente adote uma política muito única e que não tenha a complexidade para abarcar todos os problemas de comércio exterior que o Brasil tem.
Este é um outro dado feito pela LCA Consultoria, que diz o seguinte: se a gente quiser se tornar uma Alemanha, um Estados Unidos ou um Japão, qual será a nossa agenda? Em PIB e em produtividade. A questão da alíquota de importação é o último colocado. Então, 97% são outros pontos, além da tarifa. É importante a gente tratar desse tema também, mas a gente está falando de outros problemas complexos que o Brasil tem.
Caminhando para o final, queremos reforçar a integração interna, já que barreiras não tarifárias que não são compatíveis com a regra do bloco não devem perdurar, e internalizar os acordos que a gente tem aqui - e muitos estão nesta Casa -, como facilitação de comércio e compras públicas.
E o quinto ponto é a competitividade. É cada um por si aqui.
Este é o ranking da CNI de 18 países selecionados que parecem com o Brasil de certa forma: por exemplo, Rússia, em recursos naturais; Austrália, em recursos naturais; Coreia do Sul também é um exemplo. O Brasil está em 17º e a Argentina, em 18º. Então, são as duas maiores economias aqui do bloco. E olhem para a parte tributária, no fator de tributação: a gente está bem afastado dos demais.
Este eslaide mostra um pouco da carga tributária, hoje em dia, por setor, no Brasil. A indústria paga 20 pontos percentuais a mais de carga tributária. Então, quando a gente fala da TEC, da tarifa externa, a gente, muitas vezes, está falando das compensações por causa da distorção do sistema tributário brasileiro, infelizmente.
Então, terminando - não sei se há mais um eslaide... Acabamos.
Um ponto, só para registrar, Senadora: há muita pauta também tributária na parte internacional. E a senhora apresentou um projeto aqui para as multinacionais brasileiras recentemente, que ainda não tem relator. A gente paga 34%, a gente é duplamente tributado, as nossas empresas, quando elas vão para fora. Se uma empresa brasileira vai para os Estados Unidos, ela é tributada em 34%; se uma empresa mexicana vai para os Estados Unidos, ela é tributada em 21%. E a integração, hoje, depende muito dos fluxos de investimentos.
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Outros temas: preço de transferência, acordos de dupla tributação, todos com regras da OCDE que a gente não respeita e não é convergente. Então, como é que a gente vai abrir olhando só a tarifa sem olhar esses outros pontos que a gente precisa e que vai fazer com que a gente atraia investimento e faça investimento fora.
Agradeço de novo aqui. Parabéns, Senadora, pelo trabalho.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Fabrizio. Muito obrigada por sua participação.
Eu gostaria de voltar à imagem do Ministro Paulo Guedes, por favor, e passar para o nosso Senador Esperidião Amin, para começar a sua primeira pergunta. Mas, antes, o Chanceler, que precisa se retirar, pede licença para cumprir um compromisso já agendado. Assim, eu peço ao Sr. Fabrizio que passe para a mesa por favor.
Obrigada, Chanceler. (Pausa.)
O Esperidião Amin está em contato?
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - Sim, Presidente.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Pois não, Senador.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Para interpelar. Por videoconferência.) - Eu desejo apenas cumprimentá-la pela iniciativa. Acho que é muito importante essa nossa sintonia fina com os principais interesses do nosso País mundo afora.
Estamos nos recuperando do grande choque da pandemia. Acho que os nossos Ministros, tanto o Ministro Carlos França, que fez uma abordagem bastante ampla dos nossos interesses, não apenas em relação ao Mercosul, como o Ministro Paulo Guedes, sempre exuberante na sua inteligência, no seu discurso e na sua apresentação do nosso futuro, ao focalizar os vários mercados.
Não foi negacionismo - sabe, Ministro? -, mas, quando o senhor falou de Oriente Médio, eu senti a ausência dos nossos compradores tradicionais do Oriente Médio. A sintonia fina aqui não chegou a captar. Importam, especialmente do meu Estado, mais de US$13 bilhões/ano.
Mas eu acho, Ministro, que a sua locução a respeito principalmente dessas dificuldades que nós temos que transpor, mencionando, inclusive, essa questão do meteoro, é realista e nos educa para sermos solidários na solução desta crise excepcional.
Acho que já aprendemos, já aprendemos aí com a pandemia, conseguimos criar várias alternativas. E eu quero me congratular, tanto com o representante da CNI quanto com o Embaixador Celso Lafer, e dizer para ele que, agora, no dia 30 de julho, revi a foto dele lá na Empadas Jerke, de Joinville; ele como estrela na parede das Empadas Jerke; e ao nosso querido Embaixador do Uruguai eu quero dizer que tive a oportunidade de receber os dois Luis Lacalle, tanto o pai quanto o filho, agora, na Ponta das Canas. Eram ambos frequentadores da nossa praia de Ponta das Canas, pela nossa relação com o Uruguai, tanto com a Argentina e com os demais países do Mercosul é muito sólida em Santa Catarina. E a exposição do representante da CNI ressaltou, inclusive, o papel de Santa Catarina na exportação, na importação e nos negócios, especialmente com produtos de valor agregado e serviços.
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De forma que eu deixaria apenas uma indagação ao nosso Ministro Paulo Guedes, que continua aí firme, assistindo a esta parte.
Nós vamos precisar de soluções negociadas em relação a essa dívida relativamente imprevista dos precatórios. Temos que ter o cuidado - e tivemos - de não aumentar despesas permanentes. O ministro tem sido muito didático nisso. Nós fomos capazes de suportar essa pancada de R$630 bilhões, que foram fundamentais para salvar pessoas, economias, Estados e Municípios - muitas vezes a gente se esquece disso -, mas sem criar despesas permanentes. Eu acho que isso foi uma grande lição para os economistas e para nós. Mas nós não teremos condições de atravessar, ministro, essa dificuldade de recursos para a infraestrutura só com concessão e com PPI.
De forma que eu faço aqui como indagação. Para que nós tenhamos capacidade de ampliar o nosso comércio internacional, nós precisamos de logística. E o grande esforço do ministro, competente Ministro Tarcísio Gomes de Freitas, vai precisar de algumas soluções criativas que não gerem inflação e que não insinuem irresponsabilidade fiscal para agilizar empreendimentos logísticos com a participação da iniciativa privada, mas com alguma espécie de subsídio ou garantia já previstos lá na lei das PPP's e na legislação internacional.
Esta é a minha indagação: o que nós podemos esperar? Para incrementar o nosso potencial e transformá-lo em concretude no comércio internacional, nós vamos precisar melhorar nossa logística. É esta a minha indagação pontual: que inovações nós podemos estabelecer para sermos um parceiro mais ativo nesse grande esforço de atrair investimentos tanto nacionais quanto internacionais de iniciativa privada na nossa logística?
Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Esperidião.
Passo a palavra para o Senador Chico Rodrigues, de Roraima.
Com a palavra, Senador. Obrigada pela participação.
Obrigada, Esperidião.
O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR. Para interpelar. Por videoconferência.) - Boa tarde aí em Brasília! Eu estou aqui ainda no hemisfério norte, aqui em Roraima, Presidente, querida Senadora Kátia Abreu. Meu querido amigo também, Senador Esperidião Amin; Ministro, que tem realmente nos animado bastante, Ministro Paulo Guedes, na verdade, com a condução da sua política econômica, como a gente tem verificado. Aos insatisfeitos lamento, mas aqueles que, na verdade, como nós, acreditam na retomada do desenvolvimento econômico do Brasil, queremos parabenizar e louvar a sua ação sempre ativa, sempre eficiente e que tem nos dado realmente um alento enorme e muita esperança.
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Eu gostaria de comentar, minha querida Presidente Kátia Abreu, primeiro, que Brasil é um país continente. A gente vê eventos econômicos acontecendo no sul com pouco ou nenhum reflexo no norte do Brasil, em que está a nossa grande queixa, na Região Norte do Brasil, especificamente, que representa praticamente 52% do Território nacional.
Gostaria de saber do Ministro Paulo Guedes: de que forma os Estados do Norte podem se beneficiar com os avanços nas negociações do Acordo Mercosul?
E até para que não fique muito cansativo, eu tive a felicidade de, em uma audiência com o Ministro Paulo Guedes, ver que ele, na verdade, também tinha o mesmo sentimento que eu tenho em relação à ligação rodoviária de Georgetown para Boa Vista, consequentemente num trecho de 700km, aproximadamente, em que precisa fazer obras rodoviárias. Nós sabemos que, a partir deste evento, haveremos de integrar toda a Região Norte do Brasil, América Central, América do Norte, Europa e Ásia via Canal do Panamá, etc.
Então, gostaria de fazer esta primeira pergunta: como o Mercosul pode ser útil para toda a Região Norte do Brasil? Especificamente, meu querido Ministro Paulo Guedes, como o senhor vê, o senhor continua com essa mesma fortaleza e essa crença de que essa estrada é importantíssima para a integração da Região Norte do Brasil com o resto das economias do mundo?
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Chico Rodrigues. Um abraço a todo o nosso povo querido de Roraima.
Eu transmito aqui uma pergunta. Eu tentei misturar as perguntas de vários internautas - do Mateus Bernardes, da Ester Oliveira e do Geovane -, que, ao fim e ao cabo, perguntam: quais são as principais dificuldades enfrentadas para a ampliação e o crescimento dos países-membros do Mercosul? O Mercosul é realmente capaz de iniciar uma integração econômica e política dos países da América do Sul? Eu acho esta pergunta bastante interessante: quais seriam os principais benefícios trazidos por essa ampliação do bloco Mercosul, que hoje tem apenas quatro países?
Agradeço a participação do Embaixador do Paraguai no Brasil, Juan Ángel, que está nos assistindo, está acompanhando a nossa audiência e manda felicitações. Muito obrigada pela atenção, Embaixador.
Alguns outros Senadores já saíram da sessão - infelizmente, tantos compromissos que todos têm, inclusive é um dia de muita viagem de retorno -, mas eu gostaria de fazer, Ministro Paulo Guedes e nossos outros palestrantes, alguns questionamentos. Eu tenho estudado muito essa matéria com relação ao Mercosul e outros acordos comerciais e eu ando bastante aflita pela abertura do nosso País.
Eu começo perguntando ao Sr. Fabrizio, da CNI - e é uma pergunta que não quer calar nos meus ouvidos -: se nós tivéssemos efetivado o Acordo Mercosul-União Europeia, como é que esses setores que estão resistindo a uma mínima baixa na taxa de 10% do Mercosul iriam fazer para sobreviver? Porque, se esse acordo tivesse sido efetivado, então seria um Deus nos acuda, e nós já estávamos com ele praticamente pronto, se não fosse o aumento do desmatamento. Então, uma coisa não fecha com a outra. Na verdade, quando a Europa abrir conosco, isso vai servir de espelho e nós vamos abrir para o mundo inteiro. Então, essa tarifa, Ministro Paulo Guedes, para mim, ela se torna ínfima, ela se torna desnecessária, ela se torna desimportante, não justifica essa briga toda.
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E já quero registrar a minha contrariedade, com todo o respeito ao Mercosul, sou super a favor da continuidade do Mercosul, mas uma redução de 10% não tem discussão neste momento. É muito pequena, é pouco ousada para a situação em que nós nos encontramos. Se nós estivéssemos em céu de brigadeiro, não vamos nem mexer, vamos deixar do jeito que está, mas a nossa situação é crítica, é péssima, difícil demais o que nós estamos vivendo no Brasil. A abertura todos nós sabemos que significa um apoio forte na redução da inflação. Nós não temos tempo nem dinheiro para recuperar com tanta rapidez a falta de investimentos em tecnologia e inovação. Nós somos obrigados a importar tecnologia e inovação para acudir, modernizar o País e melhorar a nossa produtividade tão sonhada.
Então, eu registro o pouco percentual que eu atribuo a essa negociação: 20 eu já acho pouco, 10 eu acho inadmissível. Porque o mais importante não é isso, o mais importante que nos une não é essa tarifa. Nós temos muitas coisas mais importantes. E eu pergunto ao representante da CNI: toda essa sua apresentação se reduz praticamente, embora o Mercosul tenha um número grande de produtos, quando você vai fazer a balança econômica disso, isso se resume a automotivas, a peças, e esse acordo não pode sobreviver e ser algo bom para os países concentrado em apoiar e proteger um setor, embora ele mereça toda a minha consideração.
O Uruguai acabou de declamar que pagou um preço alto, que enfrentou a indústria local, perdeu indústrias, fortaleceu outras, mas o país hoje é outro. Então, nós temos que ter uma visão a médio e longo prazo, porque o cidadão contribuinte à excelência, o senhor contribuinte eleitor brasileiro, precisa ser consultado se ele quer pagar um preço mais caro por produtos para proteger determinados setores e que está altamente tributado, como disse o representante da CNI. Não vou discutir isso, eu só acho que o Ministério da Economia com os setores, os segmentos econômicos, precisa encontrar meios do caminho para superar essas deficiências.
Então, como se mostrou aqui, 30 anos do Mercosul não foi suficiente para encontrar soluções para isso e nós vamos ficar mais 30, mais 40? Outra coisa, Ministro Paulo Guedes: 23% do comércio entre os países do Mercosul não é livre. Não existe essa tarifa; essa tarifa é a menos comum do mundo, porque 23% do comércio não é livre, que pode chegar a tarifas de até 30%! Que acordo é esse?
Eu vejo outro erro terrível que foi cometido: o Chile entrou para o Mercosul, para um acordo com o Mercosul - não é que entrou no Mercosul; ele entrou para o acordo com as regras de Mercosul sem as obrigatoriedades que os outros países têm. Então, é o mesmo que ter o Chile hoje junto ao Mercosul, com todo o respeito, tem vida de casado com regalias de solteiro. Certo? É isso que hoje nós permitimos. É justo fazer isso com os outros países que estão dentro do bloco? Então, não vou achar palavras melhores do que essas: eu acho que foi a desmoralização total aceitar essa condição. Não é o Chile, que é um país que eu super-respeito, um país maravilhoso, mas o aceite dessa condição que desmoralizou o Mercosul absolutamente. E o que nós precisamos ter em mente é que o Brasil, a América do Sul, especialmente o Mercosul... Uma expressão que eu ouvi do Embaixador do Uruguai e gostei muito, anteriormente, foi que nós somos a Opep do agro do mundo. E eu acrescento a essa frase dele que nós também somos a Opep da biodiversidade, por conta da Amazônia. E a América do Sul está numa desimportância absoluta diante do mundo. Então, nós precisamos reverter rapidamente, e acho que essa tarifa comum não deveria ser motivo de tanto transtorno, de tanta confusão e de tanta briga.
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Nós tivemos a manifestação do ex-Presidente Lula e do ex-Presidente Fernando Henrique por que eu tenho o maior respeito. A opinião deles é a opinião deles, nós temos que considerar. São pessoas experientes que passaram pelo Governo brasileiro. Mas a opinião deles coincide com a de todo mundo. Ninguém quer acabar com o Mercosul. Agora, não pode ser a qualquer preço e custo. Não podemos admitir, Sr. Ministro Paulo Guedes, que o rabo abane o cachorro. Não, isso não! Oitenta e um por cento do Mercosul é PIB construído pelo Brasil, 12% pela Argentina, 1% pelo Uruguai e 1% pelo Paraguai. Nós não vamos ditar as regras; nós obedeceremos a regras ditas.
Então, compreendemos o problema de todos os países, somos solidários, podemos ajudar no que for possível, mas isto não pode nos enterrar no fundo do poço. Eu concordo com o Ministro Paulo Guedes em número, gênero e grau. Acho que ele está muito pouco ousado.
Vou dar um número aqui e encerrar, passar para vocês.
Vejam bem: segundo o Ipea, um ponto percentual de aumento na taxa de crescimento da abertura de um país ou de um bloco... Hoje, o Brasil é o pior do mundo. Atrás de nós só tem a Coreia do Norte, que não dá nem para considerar. Então, nós temos o pior grau de abertura do mundo. O Mercosul está igual a nós. A Argentina, um pouco mais, o Uruguai, um pouco mais, o Paraguai, um pouco mais, mas nós estamos passando vergonha diante do mundo, certo? Então, a cada ponto percentual de aumento na taxa da abertura do País reflete, gente, diretamente de 012 a 13 no PIB per capita. Então, nós estamos falando de riqueza.
Meu gabinete fez uma simulação com um grande economista, Claudio Adilson, da MCM... Hoje, a nossa corrente de comércio do Mercosul é de R$77 bilhões. Se o acordo entre União Europeia e Mercosul for feito, daqui a dez, nossa corrente será de R$159 bilhões. Simplesmente dobra. Mais do que dobra. Isso, para mim, basta.
Segundo dado: PIB per capita. Se nós não fizemos o acordo do Mercosul com a União Europeia, daqui a dez anos nossa renda per capita será de R$45 mil. Se nós fizemos o acordo, ela vai para quase R$50 mil. Então, nós temos que pensar é no contribuinte, é no consumidor, é na sociedade em primeiro lugar. Claro que a indústria, o agro, todas as empresas do Brasil merecem a nossa consideração, mas não merecem a nossa bajulação. Nós temos que ser pragmáticos, arregaçar as mangas e ver o que vai acontecer com o segmento tal, com um segmento específico, e tentar apoiar por um período. Isso não pode se tornar ad eternum, porque o contribuinte não tem dinheiro para comprar passagem de avião e vir aqui fazer um trabalho de resistência. Cabe a nós Senadores e Deputados fazer a resistência pela maioria do povo brasileiro. Então, eu não me conformo de nós estarmos nessa situação tão precária no mercado internacional, porque a responsabilidade é de vários Governos, não é de um Governo só, mas, com essa veemência que me é peculiar, com respeito a todas as pessoas, a nossa grande solução para o Brasil crescer é abrir as nossas portas. Precisamos de investimento? Não temos dinheiro no Brasil? Precisamos de dinheiro de fora. Nós não temos tecnologia porque não fizemos o dever de casa? Não. Precisamos abrir as portas para importar tecnologia e, ao mesmo tempo, paralelamente, ir crescendo à medida do possível para produzir a sua própria tecnologia. Então, nós temos todos os motivos do mundo para poder abrir as portas do País para o mercado internacional. Custe o que custar, vamos ajudar aqueles a sobreviverem. E ainda temos 36 milhões de pessoas sem trabalho. São 14% desempregados, mais outros milhões desalentados e outros milhões que estão trabalhando muito abaixo da carga horária necessária para se manterem e terem uma vida digna. Então, ao todo são 36 milhões de brasileiros tendo uma vida precária. E nós não temos o direito de usar nenhum instrumento para não reverter essa situação. Muito obrigada.
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Passo a palavra para o Ministro Paulo Guedes.
O SR. PAULO GUEDES (Para expor. Por videoconferência.) - Eu vou começar elogiando a sua posição, Senadora Kátia Abreu, e dizendo que eu subscrevo 100% tudo o que a senhora disse. É reconfortante ouvir isso, porque eu...
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Ministro Paulo Guedes, por favor.
O SR. PAULO GUEDES - Pois não.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Eu peço desculpas. É apenas para que a gente ouça a resposta da CNI, para depois o senhor contraditar, sobre, se o acordo União Europeia-Mercosul tivesse sido feito, como estaria a indústria com todos esses argumentos atuais. Uma resposta objetiva dele para o senhor também fazer os seus comentários sobre esse mesmo assunto, por favor. Desculpa-me.
O SR. FABRIZIO SARDELLI PANZINI (Para expor.) - Muitíssimo obrigado.
Como a gente tem dito sempre, a indústria é favorável ao acordo Mercosul-União Europeia. Nos nossos cálculos, o crescimento de exportação e de importação seria da ordem entre 20% e 30%, no mínimo, e estaria associado, no mínimo, a um milhão de novos empregos criados com o acordo Mercosul-União Europeia.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Com relação às tarifas, como vocês fariam?
O SR. FABRIZIO SARDELLI PANZINI - As tarifas estariam... Como é um acordo comercial, ela cairia a zero e cairia a zero ao longo do tempo. Em um acordo comercial, é a forma que a CNI defende ser mais adequada para a abertura da economia porque ela traz essa previsibilidade e traz o nosso acesso a mercados lá. Eu nem vou falar do agro, porque a gente já sabe que foi muito dolorido a gente negociar várias cotas com a União Europeia, mas no próprio setor industrial a gente tem tarifa de 7%, por exemplo, para vender produtos químicos, a gente tem tarifa de 5% na União Europeia para vender autopeças, a gente tem tarifa de 17% para vender calçados, porque o Brasil é muito competitivo em países desenvolvidos. Então, esse acordo comercial traz um ganha-ganha.
A senhora mencionou o setor automotivo, que, de fato, a Europa é o berço automotivo do mundo, a maior exportadora. Como esse acordo tem previsibilidade na queda da tarifa, a indústria vai se adaptando a essa queda. E é muito importante, Senadora, que a gente internalize rápido esse acordo Mercosul-União Europeia, passe os sinais positivos para o cenário internacional para que ele ande.
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A abertura unilateral, a gente tem, talvez, mais necessidade de conversar para haver mais contrapartidas, porque a gente não teria mais acesso a mercado, mas em relação ao Mercosul-União Europeia, como a senhora perguntou, a indústria é favorável, quer esse acordo e tem feito muito esforço por ele, inclusive o próprio negociador-chefe disse que, não fosse a CNI, esse acordo não teria ido para frente.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - O.k. Obrigada pela resposta. Era isso que eu queria ouvir. Se a CNI apoia o acordo União Europeia-Mercosul, por que resiste à alteração da tarifa interna Mercosul? Uma coisa continua, para mim, não fechando com a outra.
Ministro Paulo Guedes, por favor, desculpe a interrupção, mas eu gostaria que o senhor tivesse ouvido a resposta dele.
O SR. PAULO GUEDES (Para expor. Por videoconferência.) - Perfeito. A Senadora foi perfeita nas colocações. Eu preferia até ser um pouco mais direto. Meu pessoal preparou também apresentações, tenho apresentação de Ipea, tenho apresentação da Sepec, mas eu acho que nós temos que ser um pouco mais objetivos. Vamos olhar os fatos, como a Sra. Senadora apontou.
A primeira pergunta é a seguinte... Primeiro, eu quero que todos saibam o seguinte: nós estamos a favor do Mercosul, só que nós queremos dinamizar o Mercosul. A segunda observação é a seguinte: essa mandala que foi apresentada aí foi construída por nós, nós aqui é que construímos essa mandala, mostrando que há todos esses fatores, que nós estamos atacando. Nós fizemos o diagnóstico.
Se a senhora observar a apresentação que foi feita pela CNI, é uma apresentação que mostra que nós ficamos reduzidos a ter os nossos mais eficientes, os mais resilientes, depois de três décadas de desindustrialização... Nós tivemos três ou quatro décadas de desindustrialização. A indústria brasileira foi esmagada por juros altos, impostos excessivos, recessão, inflação, moratória externa, excesso de intervenção de governo, protecionismo. Então, o Brasil foi desindustrializado aceleradamente. Ao mesmo tempo que o agro acelerou a sua expansão com modernização, investimentos, aumento de produtividade, etc., a nossa indústria ficou encurralada e foi perdendo participação relativa. Isso aconteceu ao longo dos últimos anos, e a CNI estava aí.
Inclusive, um dos grandes fatores da desindustrialização e da falta de competitividade nossa são os encargos trabalhistas, e, aliás, a CNI vive disso, ela vive de encargos trabalhistas e ela financia esses estudos todos. Não é por falta de estudos que nós estamos desindustrializados, não. Há todos esses estudos aí. E eles acreditam que estão defendendo a indústria brasileira. Eu tenho muita compreensão com a posição deles porque eles realmente acreditam que estão defendendo a indústria brasileira, mas a senhora desmontou o argumento em dois minutos: se a gente está querendo realmente entrar para a União Europeia, eles vão ter esse problema de uma redução rápida de tarifas.
Eu sei que a redução é lenta, na verdade, porque nós é que concluímos o acordo. Então, o que eu acho interessante é o seguinte: todo mundo defende o acordo, mas o acordo está parado há 20 anos. Nós é que fizemos o acordo. Nós concluímos o acordo, mas eles dizem que defendem o acordo.
Ao mesmo tempo, eu já pedi para reduzir os encargos trabalhistas. Eles são contra, porque é com esses encargos que eles financiam, inclusive, o estudo aí do professor, eles financiam justamente mostrando... E o professor diagnosticou bem: sobrou só nós com nós mesmos. É claro que, se sobrou só meia dúzia de indústrias... Uma é automotiva, outra é de chicote elétrico, sobrou meia dúzia de industrias, num continente que se fechou. O Brasil em si já é um continente e se fechou, seguiu programas equivocados. Eu nunca vi uma indústria que se diz tão protegida e que na verdade foi quase que destruída. Então, que proteção é essa, se na verdade se desindustrializou o País?
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Nós temos uma coisa errada, nós estamos com encargos trabalhistas excessivos, com impostos excessivos. Aquela mandala que ele fez, nós fizemos a mandala, nós fizemos esse estudo, fizemos esse trabalho e estamos trabalhando em cada dimensão daquela mandala. Eu só não quis justamente pesar o ambiente aqui nosso transformando numa palestra de um professor universitário. Então, essa mandala foi feita por nós e nós estamos atacando cada item dela.
A reforma tributária nós mandamos. É sempre assim no Brasil. Você fala assim: "Uma grande caminhada começa com um passo". Aí você dá um passo, ele diz assim: "Não, a caminhada é muito grande. Esse passo só aí que você vai dar? Com esse passo só, você não vai completar a caminhada". E, com essa estratégia, você paralisa a caminhada, não acontece a caminhada, porque o primeiro passo nunca é dado.
Por exemplo, o primeiro passo para você acabar com o pior dos impostos que existe aí, que são os encargos trabalhistas, é reduzir os encargos. A CNI é contra reduzir os encargos trabalhistas, do informe dela. Ela não quer reduzir. Da mesma forma, você fala assim, o outro segundo pior imposto do Brasil é o ICMS. Vamos reduzir o ICMS, vamos começar com o IVA dual. Vamos fazer um IVA, que é um bom imposto, em nível federal, e aí os Governadores estão convidados a se juntar a nós: "Não, não, não. Ou nós fazemos tudo de uma vez só, ou não fazemos nada".
É sempre a desculpa de que tem que fazer muito para não fazer nada, e aí você não começa a trabalhar a mandala como deve ser trabalhada. Vamos simplificar o Imposto para Valor Adicionado, acabando com mais de cem regimes diferentes, e preparamos para acoplar com governos estaduais. Aí, se você mela a reforma tributária, você não dá nem o primeiro passo. Está um ano no Congresso - está um ano no Congresso - parada a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), que é o passo inicial para fazer a grande simplificação de valor adicionado.
A indústria toda diz que apoia, mas não anda o primeiro passo. Eles dizem que querem dar uma caminhada, mas nunca dão o primeiro passo.
Então, o primeiro passo da reforma tributária está parado há um ano. Agora, nós estamos tentando mandar o segundo passo, está meio difícil também.
Aí você dá o primeiro passo para o choque de uma energia barata, para reindustrializar o Brasil. Eles estão cobrando: "Cadê a queda de 40% do preço da energia que ia acontecer, etc.?". Só foi aprovada agora, levou um ano e meio também parada. Agora, foi aprovado o gás natural, já começaram os investimentos.
Na hora em que aprovou o Marco Regulatório do Saneamento, Maceió fez 2 bilhões por dentro, 2 bilhões de outorga e 2 bilhões de compromisso; e o Rio de Janeiro, com a Cedae, fez 20 bilhões de outorga e 30 bilhões de compromisso; quer dizer, são os primeiros passos, você tem que dar o primeiro passo.
A tarifa é a mesma coisa, é só um primeiro passo, falar assim: "Olha, vamos baixar um pouquinho aqui só para mostrar". Aí ele diz: "Ah, isso aí não é importante. O importante é fazer um acordo comercial". Pergunto: por que não fizeram em 20 anos? Se é tão importante o acordo comercial, por que não foi feito? Porque não querem um acordo, porque, se fizer o acordo, vão ter que baixar a tarifa mais ainda.
Só que eu concordo, nós estamos fazendo com muito cuidado nossa negociação. Eles têm ainda 20 anos de proteção. Os acordos são feitos de forma que a queda é bem lenta, bem gradual, mas, mesmo assim, é difícil dar o primeiro passo.
Então, na verdade, no jogo bruto, e a senhora muito é muito arguta e muito certeira, a senhora diz o seguinte: é o consumidor, é o contribuinte brasileiro.
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Esse é que vota, esse é que compra os produtos, esse é que está vendo a comida mais cara, esse é que está vendo o carro que custa duas vezes mais caro, esse é que está vendo tudo que custa mais caro. E, embaixo disso aí, está toda essa estrutura de impostos. Aí, quando você quer simplificar os impostos: "Não, não, não, está muito estéril. Tinha que ser mais ampla a reforma". Você tem que dar um passo.
Da mesma forma, a senhora foi aguda quando disse o seguinte: 23% estão fora da faixa de livre de comércio, são regimes especiais. A senhora foi aguda também quando disse que o Chile está em um regime que é muito interessante, porque ele tem as vantagens de quem é membro e não tem o custo de ser membro. Na verdade, um gigante feito o Brasil é que deveria ter um regime desses. Se fosse uma área de livre comércio, como os americanos fizeram com os mexicanos e com o Canadá, nós é que ofereceríamos: "Olha, as economias vizinhas querem participar. Podem se juntar a nós, mas nós temos o direito de negociar o que for mais interessante para nós".
Então, é exatamente o que a senhora falou: "O rabo abana o cachorro". Nós aceitamos a nossa desimportância, na verdade, porque existem lobbies muito bem constituídos aqui em Brasília que protegem alguns setores, que são setores normalmente que estão isentos. Há encargo trabalhista para todo mundo, menos para alguns setores. Há imposto alto para todo mundo, menos para alguns setores que conseguem os lobbies aqui em Brasília.
Então, a senhora foi muito aguda e pode até ser um pouco mais ousada do que eu, não é? Eu tenho que ser um pouco mais moderado, tenho que ir com um pouco mais de cuidado. Mas a senhora foi muito aguda, e eu acho que o nosso espírito é o mesmo. Nós queremos a mesma coisa, nós queremos justamente que o Brasil se beneficie do comércio internacional e avance, que os níveis de produtividade subam, que a nossa indústria se modernize com esses investimentos.
Se a senhora observar, na apresentação do Professor, na primeira parte, ele mostra que sobraram algumas poucas indústrias que servem ao Mercosul, e ali é que há o maior valor adicionado, é claro. Se nós retrocedermos uns 30 anos, 40 anos, nós vamos lembrar que um Volkswagen custava no Brasil US$60 mil. Enquanto, em qualquer lugar do mundo, custava US$10 mil ou US$15 mil, no Brasil custava US$60 mil. E se criava muito emprego mesmo! Criamos, por exemplo, muito emprego lá no ABC. Houve muito líder sindical que ganhava 16 vezes o salário médio da economia. Era bom para todo mundo! Era bom para o Governo, que cobrava um imposto alto, fazia, inclusive, controle de preço com o CIP. Era bom para o líder sindical. Só era ruim para o povo brasileiro. Ninguém tinha automóvel. Era igual ao telefone; também ninguém tinha! Ninguém tinha telefone, porque era muito caro para comprar; você botava até no Imposto de Renda. Então, ninguém se lembra do consumidor brasileiro. A senhora foi muito aguda ao se lembrar principalmente do consumidor brasileiro.
Dito isso, nós temos que respeitar essa indústria nossa, que é valente, resiliente. Ela sobreviveu a esse massacre que foi a má política econômica que nós tivemos por 30 anos. Ela sobreviveu ao massacre!
Juros de dois dígitos, a senhora não vê em lugar nenhum do mundo! Está todo mundo tentando uma recuperação econômica. Isso não existe em quase lugar nenhum do mundo. Nós, com a nossa confusão aqui, já estamos começando a empurrar os juros para dois dígitos de novo! Se a gente trabalhar sério, vacinar, baixar a bola, esperar a próxima eleição, o juro fica de um dígito. O Brasil tem uma democracia vigorosa, virtuosa, com uma economia que reagiu bem a todo esse inferno que foi essa pandemia. A economia reagiu bem, está saindo do buraco, está andando em alta velocidade.
Então, nós temos que ter essa energia, temos que seguir o nosso programa e não podemos repetir o que deu errado. Quer dizer, se fechar a economia fosse interessante, nós estaríamos com a renda per capita subindo. O Brasil já teve uma renda per capita maior do que a da Coreia, maior do que a da China, maior do que a de todo mundo. Nós estamos perdendo a corrida exatamente porque seguimos esse modelo protecionista, que é um modelo equivocado, ele é ruim. O industrial está perdendo, há 15 anos eles estão perdendo importância, e eles não estão percebendo que eles estão morrendo disso. Em vez de nós termos um regime um pouco mais aberto onde ele consegue se modernizar e se integrar usando a cadeia produtiva... Aí ele dá alguns dados mostrando que eu negocio mais com os meus vizinhos do que com os distantes. É evidente! Se ele, em vez de fazer o mapa... O nosso maior parceiro comercial é o Mercosul. Se ele fizesse qualquer Estado brasileiro com os vizinhos, também ia ser o mesmo mapa. Ele ia falar: "Olha, os empregos são criados... Quando Minas Gerais negocia com São Paulo cria mais empregos do que quando negocia com o Amapá". É claro, é justamente essa falta de, digamos, vocação para integração.
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O que ele mostrou é o seguinte: você realmente tem meia dúzia de empresas, de indústrias, que você vende aqui para os vizinhos e que elas são muito importantes, porque você não comercializa quase nada com o resto do mundo. E, no fundo, isso é um ciclo vicioso. Sabe por que a gente comercializa pouco com o resto do mundo? Porque nós temos pouca competitividade, não há uma infraestrutura, como o Senador Chico Rodrigues falou, não temos a logística a que o Senador Esperidião Amin se referiu...
Então, justamente não é novidade - no final, usando a linguagem da Senadora - que você converse mais, tenha mais sexo com a sua esposa do que com os parceiros distantes. Quer dizer, não adianta dizer nada a respeito disso, porque realmente, se você está preso em casa... Da mesma forma, se você está preso no seu comércio só com seus vizinhos...
O que a apresentação mostra é que nós realmente temos um milhão de empregos criados com os vizinhos e são empregos valiosos, que são as nossas indústrias mais resilientes, as melhores, as que resistiram. Mas mesmo elas - é o que o dado dele mostra - não conseguem exportar para o resto do mundo. E pior, aí é que é o pior da apresentação: ele mostra que os vizinhos não confiam nos vizinhos, nenhum brasileiro quer saber de investir na Argentina e nem a Argentina no Brasil, o que mostra a falta de fé no futuro da região. Ora, se nós criamos tanto emprego valioso na Argentina, nós deveríamos estar investindo mais lá, e por que a gente não investe lá? Se nossos empregos geram tantos empregos e tanta riqueza que estão exportando para a Argentina, e a Argentina também cria coisas valiosas aqui, por que os argentinos não estão investindo maciçamente a não ser para fugir de férias para as praias catarinenses? Ou a não ser os brasileiros também quando compram um imóvel lá na... Eu me esqueci do nome da... Há uma via importante lá que é onde ficam os grandes restaurantes, os bares..
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PAULO GUEDES - Não, não é a Recoleta, não. É um bairro novo no...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PAULO GUEDES - Não, não. É uma região que foi modernizada...
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Puerto Madero.
O SR. PAULO GUEDES - Puerto Madero, Puerto Madero.
Então, você vê o seguinte: o negócio nosso é tão dinâmico com o nosso vizinho que ele não investe aqui e nem nós investimos lá; ao contrário, nós estamos investindo em outros lugares.
E aí eu vou para o que o Senador Esperidião Amin apontou, com muita propriedade, que é o Oriente Médio, um novo eixo. Realmente, uma das conversas duras que nós tivemos com a Argentina foi exatamente essa. Falei: "Olha, ou vocês estão juntos conosco, e nós vamos entrar para a União Europeia, ou nós preferimos mudar o eixo da nossa expansão". Por exemplo, o Oriente Médio seria um extraordinário entreposto. Toda aquela região é um extraordinário entreposto nosso para nós explorarmos a nova rota das Índias. Nós fomos descobertos na rota das Índias. Nós podemos, através do Oriente Médio, ir para a rota das Índias novamente.
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O que acontece é o seguinte: nós tínhamos um comércio com a China que era de US$4 bilhões, US$5 bilhões no início da década; hoje, nosso fluxo de comércio passou dos cem bilhões com a China. E nós vamos, com o mundo, chegar a um fluxo de comércio este ano de meio trilhão - meio trilhão. Então, no Brasil, apesar do covid, apesar de toda a confusão, nós estamos indo nessa direção. Bem, é verdade que subiram os preços das commodities? É verdade, subiram, mas também caíram antes, e ninguém falou nada a respeito. Então, não quero saber se está subindo, se está caindo. A verdade é que o Brasil continua explorando novos mercados.
Então, nós estamos indo em direção às Índias, passando pelas Índias em direção à China, e, se a gente conseguir... A Índia hoje é uma grande democracia ocidental, e nós temos total interesse em nos aproximarmos dela. É a maior democracia do mundo. A Índia hoje tem um fluxo de comércio conosco que é mais ou menos o que tínhamos com a China no início da década, ou melhor, no início do século - desculpe -, que eram US$4 bilhões, US$5 bilhões, ou seja, há um potencial de nós elevarmos as nossas exportações também, o nosso fluxo de comércio para cem bilhões nos próximos 20 anos se a gente for naquela direção. Então, vamos receber os investimentos do Oriente Médio; vamos transformar todos aqueles... Nós temos... Nós somos a primeira colônia de japoneses fora do Japão; a segunda maior colônia de italianos fora da Itália; a terceira maior colônia de alemães fora da Alemanha; temos mais libaneses no Brasil do que há no Líbano. Então, são nossos parceiros naturais. São entrepostos, são rotas para as Índias. Vamos em direção à Índia e vamos transformar o fluxo de comércio com a Índia também num fluxo de cem bilhões. Vamos nessa direção!
E eu tenho dito isso também para os ministros que nos pedem apoio lá na OCDE. Alguns ministros nos pedem apoio em questões ambientais, e eu digo: "Olha, claro, queremos trabalhar juntos. Nos ajudem também. Nos ajudem a entrar para a OCDE". Porque o que vai acontecer no Brasil é o seguinte: vocês acham que o Brasil é desimportante? Deixem-me dar uns dados rápidos para vocês do que aconteceu durante a pandemia: as importações da Europa para o Brasil caíram 30%; as importações dos Estados Unidos caíram 30%; só que as exportações para a China subiram 40, e acabou ficando no zero a zero para nós. O que os europeus estão dizendo para nós é o seguinte: "Olha, nós não achamos vocês muito importantes, não; nós preferimos a proteção aqui. Estamos preferindo proteger, estamos retardando a entrada de vocês aqui. A agricultura de vocês é protecionista"... Particularmente, França e Bélgica, não é? França, Bélgica... Há dois ou três protecionistas lá que ficam usando o argumento ambiental, que naturalmente é muito importante, mas o jeito de nos ajudar não é nos recriminar, é nos abraçar, nos aceitar no clube. Quando o Ministro da França virou para mim e falou "quero pedir apoio no acordo de bitributação, por causa disso", eu disse: "Olha, eu apoio se você nos aceitar no clube. Se eu estou fora do clube, para que é que você quer o meu apoio?. Nos coloque na OCDE que nós vamos apoiar. Vocês têm que nos abraçar, nos ajudar, inclusive na causa ambiental, e não usar a causa ambiental como protecionismo para vocês", porque o que vai acontecer é o seguinte: a demografia é cruel na Europa. A demografia é cruel na França, é cruel em Portugal, é cruel na Espanha; e, enquanto isso, a demografia é generosa na Índia, no Oriente Médio, na Ásia, em geral. Então, os fluxos de comércio vão se desviar. A Ásia já é o maior centro de crescimento do mundo hoje. À exceção dos americanos, que têm lá as novas tecnologias, a verdade é que o eixo de crescimento do mundo, nos últimos 20, 30 anos, já está se mudando em direção à Ásia. Então, nós temos que ir nessa direção também. Nós vamos em busca de onde está o fenômeno da criação de riqueza. Nós queremos novos parceiros, nós temos que ir nessa direção. Agora, nós compreendemos a CNI, o receio que tem e a proteção que ela quer dar à indústria local. E justamente, na indústria de têxteis e vestuário, ela tem receio de entrar o Vietnã, de entrar a Indonésia. Na economia industrial automotiva, ela tem receio de entrar o coreano, de entrar o japonês. Agora ela não pode... O ponto que a Senadora Kátia Abreu fez é verdadeiro também. Interessa ao brasileiro comprar um carro mais barato, comprar uma vestimenta mais barata também. E esse equilíbrio é que nós temos que manobrar. Nós temos que olhar para o interesse do contribuinte brasileiro, mas preservando também a geração de emprego e renda. Então, nós estamos muito atentos. É claro que nós temos a preferência por fechar um acordo primeiro com o Canadá, com a União Europeia, com a Efta, e fechar um pouco depois, seja com a Coreia, seja com a Indonésia.
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Então, nós sabemos disso. Nós sabemos disso. Agora, nós não podemos usar a desculpa de que uma grande caminhada começa com um passo para não dar o primeiro passo. E isso tem sido uma postura sistemática. Aliás, eu apreciaria muito se justamente houvesse essa compreensão pela CNI. A CNI está a favor da reforma tributária, mas desde que seja muito ampla, ou seja, não acontece; ela está a favor da abertura, desde que seja numa negociação que está parada há 20 anos, ou seja, não acontece. Então, tem que tirar essa fantasia de ataques amistosos e sutis em ocasiões estratégicas. Vamos botar acadêmico para discutir com acadêmico. Vamos botar o pessoal do Ipea para conversar com o Professor. O Ipea é pago por nós, o Professor é pago pela CNI, bota eles discutindo lá, mas vamos para o jogo real, da vida real aqui.
A inflação está subindo. Nós temos que fazer um movimento de abertura. A abertura é feita nas duas dimensões. A primeira dimensão começa com um pequeno passo, como disse a Senadora Kátia Abreu. Eu estou tão envergonhado quanto a senhora, de fazer esse pequeno passo só de 10%, mas é uma atitude de respeito à indústria nacional, dizendo: "Olha, levanta do sofá aí e começa a correr na esteira um pouquinho, só para não ficar sentado, só para não engordar e perder a competitividade" - que aliás é o que tem acontecido ao longo dos últimos 30, 40 anos. Nós estamos perdendo posições importantes. Nós somos o 130º lugar mais hostil aos empreendimentos, nós temos a 140º economia do ponto de vista de abertura, ou seja, o Brasil perdeu a dinâmica de crescimento. Era o país que mais crescia no mundo, trazia os imigrantes, tinha um desenvolvimento forte, crescia mais do que China, Coreia, que todo mundo, e nós deixamos interesses corporativos e modelos obsoletos - obsoletos em tudo, obsoletos na legislação trabalhista, obsoletos nas regras de abertura da economia, obsoletos na legislação tributária... Nós estamos ficando obsoletos. Então, nós temos que olhar a verdade e começar a reagir a isso, mesmo que com pequenos e tímidos passos. Vamos dar, pelo menos, os primeiros passos, em vez de fazer esse jogo de guerrilha de fingir que está a favor das reformas e boicotar sistematicamente as reformas. Isso não é bom para ninguém, não é bom para a indústria brasileira, que perdeu posições, isso só é bom para a CNI, que é uma entidade corporativa, pois, da mesma forma que há sindicato trabalhista defendendo privilégio, há sindicato de empresário defendendo privilégios. Essa é a verdade nua e crua. Então, eu lamento ter que falar a verdade, mas a verdade dói, incomoda. Mas vamos para o segundo ponto do Senador Esperidião. O primeiro ponto muito pertinente também. Estou concordando com a Senadora Kátia Abreu, no sentido de que estamos dando pequenos, modestos passos, não devem assustar ninguém. Primeiro, esse é o ponto crucial, e eu estou 100% com a senhora, Senadora.
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Segundo, do nosso Senador Esperidião Amin. De acordo, o Oriente Médio é o novo eixo, temos que ir para esse lado mesmo. Às vezes, ficamos negociando tempo demais com quem não está dando crescimento, nem investimento, nada para nós, nada, só tem para mostrar que vendeu alguma coisa com um alto poder de geração de renda, de emprego etc., o que é muito valioso, queremos preservar, mas que não tem criado a dinâmica de crescimento de que nós precisamos, virou a administração de uma indústria em declínio, e não é isso que nós queremos. Nós queremos justamente a reindustrialização do Brasil em cima de energia barata, de impostos mais simples, de imposto de valor adicionado, sim - o primeiro passo já está aí no Congresso -, de maiores impostos que hoje pagam zero exatamente para cidadãos que retiram o direito, são os donos afluentes.
Quando você tira o dinheiro da sua indústria, você paga 20%. Se o trabalhador paga 27%, por que você não pode pagar 20%? Você é um cidadão de melhor categoria do que o seu trabalhador? O Imposto de Renda devia ser progressivo. Nós estamos pedindo só 20% para os dividendos. Qual é o problema disso? "Ah, não, já paguei na empresa". Não quero que pague na empresa, está errado tributar na empresa, idealmente a empresa devia pagar zero. Ela é um mecanismo, ela é um ser abstrato, ela é um mecanismo de acumulação de capital, de tecnologia, de inovação, de aumento de produtividade, de dar aumento de salário, ela compete com o mundo inteiro, as empresas têm que ser menos tributadas.
Os impostos caíram de 40% para em torno de 23,5% nos últimos 40 anos. Os impostos sobre as empresas estão caindo há 40 anos e, no Brasil, eles subiram nesses 40 anos.
Por outro lado, o imposto sobre lucros e dividendos é cobrado no mundo inteiro entre 20% e 40%. No Brasil, na Estônia e na Letônia é 0%. Ora, nós estamos colocando um imposto relativamente baixo. Se você deixar o seu dinheiro na empresa, você paga só 20%, vai pagar só 24%, nós vamos cair 10% do imposto sobre as empresas. Agora, se você tirar o dinheiro, como dono afluente, você tem que pagar pelo menos 20%, o que vai dar uma taxa, no máximo, se você tirar o dinheiro todo, de trinta e poucos por cento, que é o que está hoje - hoje é de 34%.
Então, o que nós estamos fazendo é dizendo o seguinte: "Olha, se você tirar o seu dinheiro todo da empresa, você vai pagar o que você tinha que pagar hoje: 34%; agora, se você deixar o dinheiro na empresa, você vai pagar 20%, 24%, vai convergir para a média mundial". Isso vai trazer investimento de fora, como disse a nossa Senadora Kátia Abreu.
Nós precisamos tornar o Brasil um bom ambiente de negócios. Nós pegamos aquela mandala, que foi exposta aí, produzida por nós com uma consultoria lá de fora, nós bancamos essa mandala, que fizemos junto com a indústria brasileira, estamos olhando para essa mandala e justamente falando: "Olha, vamos atacar aqui, choque na energia barata. Vamos ver se baixamos o preço da energia, aumentando a competição no fornecimento e na distribuição". Agora vamos simplificar os impostos. Vamos começar primeiro com o IVA federal. Vamos dar esse primeiro passo. Logo depois, podemos fazer um IVA estadual também, para fazer um... Mas pode ser feito daqui a dois meses. Aprova o primeiro passo e depois dá o segundo. Da mesma forma, estamos reduzindo o imposto para as empresas dramaticamente e estamos tributando o dono afluente quando tira o recurso da empresa. É simples como isso. Ainda estamos também reduzindo impostos sobre assalariados. A pessoa recebe R$2 mil no Brasil e paga Imposto de Renda. O sujeito que receber R$260 bilhões em dividendo paga zero. É uma fábrica de desigualdade. É uma completa disfuncionalidade. Agora, escondido atrás da empresa, você fala: "Não, não, não, a minha empresa já pagou". Eu não quero que a empresa pague. A empresa tem que pagar menos. É a empresa que gera renda, não é o dono afluente. O dono afluente paga o imposto dele: 20%. Agora, deixa a empresa criar renda, investir. Bom, o nosso Senador Esperidião falou da infraestrutura e também o Senador Chico Rodrigues falou da infraestrutura. Com Chico Rodrigues, de Roraima, nós já estivemos juntos, já conversamos sobre isso realmente. E nós estamos 100% de acordo também por uma razão: nós colocamos no NDB, que é o Banco de Desenvolvimento do Brics, é um banco de que faz o financiamento de infraestrutura para os países emergentes, economias emergentes, as cinco maiores do mundo - Brasil, Índia, Rússia, China, África do Sul... Temos lá um brasileiro Presidente. E já desenhamos um plano - estamos chamando de Programa de Crescimento Verde - que é justamente para usar toda essa vocação da Região Amazônica. Nós vamos ter que desenhar vetores de investimento que revitalizem, que preservem o meio ambiente, mas criando ocupação na região, criando atividade econômica, acabando com o desmatamento ilegal, fazendo tudo que tem que ser feito. O Brasil é uma das matrizes... É possivelmente a energia, a matriz... Há uma ilha ou duas aí que têm matriz energética mais limpa do que o Brasil. E o Brasil é um país continental. Então, é um país que tem uma matriz energética limpa, que começou agora, há pouco tempo, os investimentos em energias do futuro, autossustentáveis, como eólica, como solar. Já estamos com 13% de energia eólica e solar, além de termos a matriz hidrelétrica, que é uma matriz bem mais limpa. Tudo que a indústria brasileira produz, desde o copo até o automóvel, é tudo mais limpo, porque a energia básica que nós usamos é limpa também. Então, nós temos que ser reconhecidos como uma potência verde e não como alguém que destrói o meio ambiente. O Brasil é uma potência verde. E será uma potência digital, porque já é a quarta economia de maior penetração digital no mundo. Então, essa é a nossa vocação futura. E nós vamos criar justamente toda essa infraestrutura verde por um lado e, por outro lado, queremos, valorizando não só o Mercosul, mas, na verdade, deveríamos ter um sonho, um futuro maior... Quando eu entrar nos internautas, eu vou falar dessa integração da América do Sul inteira.
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Deixe-me ser mais específico agora com o nosso Senador Chico Rodrigues, falando de Roraima, porque um dos investimentos que certamente é prioridade é essa estrada de Georgetown para Boa Vista. Nós temos que fazer isso aí e tem que ter justamente financiamento. E esse financiamento está preparado, disparado do lado de fora para ajudar justamente a fazer essa estrada.
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O Presidente do NDB, o Marcos Troyjo, está vindo ao Brasil. Nessa ocasião, eu acho que seria ótimo, Senador, ter uma reunião com eles, virmos todos aqui. Porque a ideia é esta: nós temos que fazer uma estrada que saia, uma alternativa, são planos lá do nosso Ministro Tarcísio e tem a ver com a pergunta de logística que foi feita pelo Senador Esperidião Amin. Nós temos que investir pesado nessa estrutura, e, mesmo dentro do Mercosul, há um exemplo claro: o gás natural de Vaca Muerta. Nós deveríamos estar construindo esse gasoduto para trazer... Da mesma forma que nós temos um gasoduto que sai da Bolívia e entra no abastecimento energético brasileiro, nós temos que fazer um saindo de Vaca Muerta, na Argentina. Isso aí é claramente... Essa construção de infraestrutura transnacional é a vocação básica do Banco Mundial, do BID e, certamente, do NDB. Para os senhores terem uma ideia, o NDB tinha emprestado só US$700 milhões para o Brasil nos últimos quatro, cinco anos. No nosso Governo agora, a cifra saltou já para US$1,5 bilhão, só no Projeto Verde que vem aí agora, fora os outros US$3 bilhões ou US$4 bilhões que já estão encomendados. Então, nós vamos dar um salto para quase US$5 bilhões em pouco mais de dois anos. E a ideia básica é esta: vamos construir uma infraestrutura transnacional, vamos integrar a América Latina inteira. Mas deveríamos ambicionar... O mundo, daqui a uns 15 ou 20 anos, vai ter cinco ou seis moedas relevantes. Vai ser o euro; vai ser lá a moeda da China; vai ser lá o dólar, a zona de influência do dólar; e nós deveríamos ter uma integração, a exemplo do que aconteceu na Europa, que fez uma integração. Na verdade, eles começaram como o Mercado Comum Europeu, depois fizeram uma convergência de políticas cambiais, trabalharam vários anos com faixas cambiais e depois convergiram para uma união monetária, que é a forma superior, é uma integração completa. É como se fossem os Estados Unidos da Europa, eles têm uma moeda única, eles têm políticas que são convergentes. Embora cada estado possa ter sua política fiscal, elas têm que convergir porque quem se desalinhar muito acaba com os juros muito altos e perde. É como se estivesse num padrão ouro antigo, há mecanismos de autocorreção, que impõem disciplina para todo mundo.
Então, o Brasil deveria imaginar... Eu cheguei a conversar isso com a equipe da Argentina. Nós falamos: olha, temos que aumentar, temos que começar justamente... Esse sonho de abraçar ideológico que foi feito virou uma política de ideologias, em vez de uma política de resultados, isso deveria ser feito, independentemente da ideologia. Vamos fazer uma aproximação maior, uma área de livre comércio começa a funcionar mais rápido, depois a gente tenta a união alfandegária, e depois nós deveríamos realmente ambicionar uma integração completa. O Brasil teria uma função mais ou menos como a Alemanha foi na Europa. O Brasil tem toda essa gestão monetária mais avançada; a Argentina estava quase que sem moeda, com uma inflação de 50%; a Venezuela, com uma hiperinflação; o Equador teve que se dolarizar. Isso, na verdade, podia ser uma marcha em direção a uma integração monetária lá na frente. O Brasil tem governança, tem Banco Central independente, tem isso, tem uma governança suficiente para juntar todo mundo embaixo dessa governança, mas, naturalmente, como os alemães também fizeram uma deferência, deixando um tempo depois, o Presidente do Banco Central é italiano, o Presidente do Banco Central é francês, que foi a Lagarde... Isso tudo pode ser desenhado para um futuro, porque isso força uma convergência.
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Nos regimes previdenciários, por exemplo, o Chile e o Peru estão muito à frente do Brasil, porque eles já tinham o regime de capitalização, e nós estávamos ainda em repartição. Por outro lado, na legislação trabalhista também o Chile avançou mais rápido, e nós estamos ainda com legislações obsoletas aqui. Deveria haver liberdade de fluxo de bens e serviços e também até de imigração, porque, hoje, há 4 milhões de venezuelanos que desceram para a América Latina inteira, os de maior grau educacional foram parar no Chile, foram parar na Colômbia e os que não tinham recursos para comprar passagem de avião nem nada vieram andando para o Brasil.
Há lá, hoje, em Roraima, o Senador Chico Rodrigues está vendo isso, eu estou conversando também como é que a gente faz um estado de emergência lá e solta recursos para Roraima, porque entraram aí... No primeiro movimento, foram 100 mil, hoje já há muito mais, já há 200, 300 mil venezuelanos lá dentro, e faltam serviços de saúde, faltam serviços médicos, faltam serviços de segurança, está faltando tudo lá porque, em vez de fazer a integração por bem, o que está acontecendo é, na verdade, fuga de corrente de imigração, pessoas fugindo justamente do caminho da miséria. A Venezuela virou o caminho da miséria.
O Brasil não quer ir nesse caminho, o Brasil quer ir no outro caminho, não quer ficar uma economia fechada, não quer ter uma degeneração de sua democracia, não quer ter um fechamento dos fluxos de comércio, não quer virar um país que é o pária dos investimentos, ninguém investe mais no país, ninguém quer entrar nesse caminho. Nós estamos fazendo todo o esforço possível para levar o Brasil na outra direção.
Então, todo esse assunto de infraestrutura, essa estrada Georgetown/Boa Vista, como o gasoduto de Cuernavaca, como uma saída para a transperuana para que toda a produção agrícola do Cerrado... Porque hoje há um caminho: a produção agrícola subir pela Calha Norte, só que os graneleiros pagam muito caro, tira muita competitividade se tiver que atravessar o Canal do Panamá. Então, você sair pelo Norte com a produção agrícola é um negócio que também é difícil e não aumenta tanto a competitividade. Hoje estão fazendo a saída lá pelo Sul, pelo Porto de Santos, tem que dar a volta no Estreito de Magalhães, começar a subir tudo outra vez. Ora, o interessante é que a gente faça uma conexão com a Transperuana. A gente encontra o Pacífico furando com essa infraestrutura e para oferecer uma saída logística para a produção do Centro-Oeste. É a produção, na verdade, de todo o Cerrado poder sair também por um caminho do Pacífico, isso pode encurtar em seis, sete dias uma viagem por exemplo para a Ásia, para a China, dos produtos agrícolas.
Ao mesmo tempo, a nossa indústria, a nossa agroindústria, a indústria de base agrícola teria também um aumento de competitividade brutal se tivesse tanto essa saída pelo Norte como tivesse também a saída pelo Pacífico, além de ter um caminho já convencional via Porto de Santos. Então, o Ministro Tarcísio está fazendo ferrovias. Nós estamos chamando justamente esse apoio financeiro e internacional para nos ajudar a fazer esse esforço de infraestrutura transnacional, e o Brasil devia realmente ter uma aspiração de ser uma liderança dinâmica, uma boa liderança na América do Sul, em vez de ser um passageiro da agonia.
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O Brasil está sendo um passageiro de uma agonia ideológica que prendeu o Brasil, escravizou o Brasil por 30 anos num modelo equivocado: um modelo de desindustrialização; um modelo de protecionismo que acabou desindustrializando; de juros de dois dígitos, de câmbio sobrevalorizado, de um manicômio tributário; um modelo dirigista, um modelo que afundou a América Latina inteira, à exceção, primeiro, do Chile. Agora, o Peru está tentando sair também desse círculo vicioso, e a Colômbia tentou sair também. Mas nós nos equivocamos. É preciso olhar para trás e não repetir os mesmos erros. Vamos fazer erros diferentes. Os mesmos erros a gente conhece. É melhor dar um passo tímido na direção certa do que um mergulho na direção errada.
Inclusive, quanto à pergunta dos internautas sobre essa integração da América do Sul, a minha reflexão seria esta: nós devíamos estar conversando independentemente de ideologia. "Olha, precisamos integrar as nossas economias. Vamos reduzir não só a Tarifa Externa Comum para aumentar um pouco a nossa competitividade, mas vamos botar mais membros para dentro. Agora, todo mundo com uma certa liberdade e justamente tentando convergir os sistemas previdenciários, tentando convergir os sistemas trabalhistas, para poder ter liberdade e mobilidade, como é na Europa hoje". Se você tem um passaporte europeu, você caminha para qualquer lugar. Se há mais emprego numa região e a outra região está com dificuldade, existe uma migração natural para aquele lugar. Então, seria natural que os venezuelanos viessem para cá, mas, quando a Venezuela melhorasse, eles voltassem de novo. Tudo isso justamente num modelo que, lá na frente, eu acho, faria com que essa região considerasse o Brasil como uma âncora regional, da mesma forma que a Alemanha foi a âncora da integração europeia. O Brasil seria um candidato natural a essa integração.
Agora, se o Brasil segue no caminho da miséria também, ele é uma âncora no sentido literal: ele vai afundar junto - é uma âncora mesmo, vai para o fundo do mar, vai lá para baixo - em vez de ser o comandante ou, pelo menos, uma bússola para orientar uma modernização do Mercosul. Se a gente modernizar o Mercosul, pode ser que outros membros queiram entrar. Não me surpreendeu nada que o Chile não quisesse entrar e, no final, nós tivéssemos que viver um regime de casamento aberto com o Chile, numa tentativa desesperada de trazer um parceiro valioso para dar um pouco de escala para o grupo, já que está no sul, muito mais ao sul do que a Venezuela. Mas o Chile não era um parceiro ideológico, não havia muito interesse. O Paraguai, quando estava num determinado regime, era aceito como parceiro; quando outro grupo ganhou a eleição, tentaram colocar o Paraguai para fora do Mercosul. É um absurdo também!
Então, isso está muito politizado, isso está tudo muito ideologizado. O Brasil tem que manter a cabeça no lugar, com serenidade, dar passos mesmo que moderados, mas na direção certa, pelo menos.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Ministro Paulo Guedes, eu gostaria apenas de dar uma informação.
O senhor tocou no assunto da Índia, que, de fato, é um país promissor para o Brasil, espetacular, e está com a poupança interna muito alta e com muita vontade de abrir o seu mercado. Mas quero apenas lembrar que, hoje, o Acordo Índia-Mercosul está com o seguinte percentual: de tudo que nós vendemos para a Índia, apenas 9% têm tarifas preferenciais. Em contrapartida, de tudo que a Índia vende para o Mercosul, 45% têm tarifas preferenciais.
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Então, está bastante desequilibrado esse jogo e, como eu disse anteriormente, o Brasil é a Opep do alimento, e nós temos que lutar para que esses alimentos do Mercosul, da América do Sul, possam ter mais acesso. Hoje nós sabemos que a agricultura indiana é uma das mais protecionistas do mundo. Aliás, o protecionismo americano e europeu vem sendo reduzido, e China, Índia e Rússia, aumentando os seus subsídios. Então, a Índia não tem o que temer de nós.
A média mundial de utilização de áreas agricultáveis mundo afora é menos de 15%, e a Índia já usa 60% do seu território com produção de alimentos. Então, tudo tem um limite. Há uma classe média muito forte se formando na Índia, isso significa que o aumento do consumo será enorme, e apenas 30% das famílias da Índia têm geladeira. O que uma coisa tem a ver com a outra? Não é para diminuir a Índia, absolutamente; é apenas para mostrar o potencial de aumento de consumo de congelados, de carnes, de proteína animal, produtos que devem ser guardados na geladeira à medida que essa classe média vai se ampliando. Então, é um grande mercado para o agro brasileiro. Eles só precisam tirar um pouco o temor dos agricultores indianos de que a abertura para outros países, como para o Mercosul, mais ampliada, vai ser uma necessidade da Índia. Quatrocentas mil famílias, 400 milhões de pessoas passaram para a classe média na Índia. Então, eu acredito que a ligação de refrigerador, freezer e geladeira, com o aumento de consumo é algo muito impactante, que serve como referência, por incrível que pareça, para que a gente possa medir os mercados.
Ainda queria comentar, Ministro - eu sou muito justa com essa questão dos acordos -, que eu também acho que a Argentina, o Uruguai e o Paraguai não podem ficar prejudicados caso queiram fazer o acordo com a União Europeia, porque hoje esse acordo não se firmou exclusivamente por conta do desmatamento no Brasil. Eu discordo... É claro que tem a questão do protecionismo, mas nós também demos motivos para que esse acordo fosse encerrado. Então, nós temos que ficar muito limpos para que esse acordo possa acontecer. Então, Argentina, Uruguai e Paraguai, repito, estão no prejuízo. E tenho certeza de que nós chegaremos a bom termo antes da COP, para que nós possamos juntos reabrir a possibilidade desse novo mercado.
Eu queria pedir ao representante da CNI que levasse o nosso abraço ao Robson Andrade, que é um querido amigo e que tem feito um grande trabalho na CNI, mas que possa nos repassar individualmente, no gabinete, eu gostaria que você me apresentasse os impactos se a tarifa cair 10 ou se a tarifa cair 20. O que pode acontecer com a indústria? Nós temos que olhar os dois lados, óbvio. E o que poderia ser feito para minimizar esse impacto, para ver se o Brasil tem condições de corresponder.
A sugestão do Ministro Paulo Guedes sobre o Marcos Troyjo, que preside hoje o Brics: nós temos falado quase que diariamente. Em setembro, a CRE vai promover um debate com o banco NDB, que é o dos Brics; o Fonplata; o BID; a Carf; o Banco Mundial, para nós fazermos uma apresentação focada na infraestrutura regional da América do Sul, para que possamos encontrar um funding para financiar hidrovias, ferrovias, estradas de todos os países da América do Sul. Isso já está marcado para setembro, combinado com o Marcos Troyjo, que preside o banco, em Pequim.
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Na segunda e terça-feira que vêm agora, nós faremos um grande seminário de dois dias com todos os especialistas do agro no Brasil para todos os diplomatas brasileiros no Brasil e no mundo, em parceria com o Itamaraty, em que nós queremos mostrar a real face da agricultura brasileira, para tirar esses mitos, mostrar os fatos, preparar, argumentar e ajudar a informar à nossa diplomacia, que já é muito capacitada, muito preparada, mas nós queremos atualizá-los de argumentos não só para a diplomacia brasileira no Brasil e no mundo, mas para diplomatas internacionais que moram no Brasil, estrangeiros que moram no Brasil - vai ser um seminário remoto -, para que possam ouvir a realidade do agro, da agricultura mais sustentável do Planeta, que passa por um período de percalço por conta do desmatamento, mas nós podemos mudar isso com muita rapidez.
Na quinta-feira próxima, também faremos uma reunião com todos os Presidentes de CRE da América do Sul, os meus contrapartes, justamente para discutirmos essa questão do comércio, de nós sermos a Opep dos alimentos do mundo, e a infraestrutura, a construção de infraestrutura de integração transacional, como disse o Ministro. Nós temos o maior interesse que isso aconteça.
Ministro, eu gostaria de passar a palavra para o Embaixador... (Pausa.)
Ele não está ainda. Acabou de sair. O Celso Lafer precisou se ausentar para receber uma homenagem e não foi possível ficar.
Eu passo para as considerações finais do nosso Embaixador do Uruguai, Embaixador Guillermo, por cinco minutos; para o Sr. Fabrizio, representante da CNI; e para as considerações finais do Ministro Paulo Guedes, se ainda houver necessidade e desejo.
Quero parabenizar o Marcos Troyjo, que tem feito um grande trabalho à frente do banco dos Brics. Eu gostaria de registrar isso.
Por favor, Embaixador Guillermo, por cinco minutos.
O SR. GUILLERMO VALLES GALMES (Para expor.) - Muito obrigado, Presidente. Muito obrigado também, Exmo. Sr. Ministro.
Eu poderia fazer muitas considerações finais. Achei a sua intervenção muito interessante e muito, muito convergente com a visão do Uruguai, desde o ponto de vista dos interesses nacionais do Uruguai. Somente, Sra. Presidente, para reafirmar alguns pontos.
Nós estamos falando que somos os países da Opep do mundo, a Opep da agricultura.
Uruguai, o caso do Uruguai: pequeno país, 175 mil quilômetros quadrados. Nós somos o número três no mundo na produção de celulose de fibra curta; somos o número quatro na produção de leite em pó; somos o número quatro no tecido de lã; somos o número seis na soja; somos o número sete na carne bovina congelada; somos o número nove no arroz. Não somos o número um de todos esses produtos; o Brasil é o líder.
Mas para onde vamos exportar? A que mercados vamos exportar, Sra. Presidente, esses produtos? Aos importadores netos de alimentos, aqueles que falamos no começo. Esses importadores netos de alimentos, onde se encontram? Em todos esses países de que falou o Sr. Ministro da Economia. São Japão, Coreia, China, Vietnã, Malásia, a faixa do Médio Oriente, os países do Golfo. Quem vai provisionar esses alimentos, se não somos nós? São aqueles países que até agora têm já acordos de livre comércio.
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O Japão tem, por exemplo, o primeiro importador neto de alimentos do mundo, tem já um acordo de que eu falei, o CPTPP, que nós devemos estudar profundamente, porque aí eu vou contestar também a pergunta do nosso querido Fabrício. Teríamos que conhecer qual o destino dessa... O destino do CPTPP já é conhecido, Presidente. Deixe-me ler somente no caso do Japão: 32% das linhas tarifárias agrícolas do Japão vão eliminar as tarifas de importação. Já conhecemos o destino. Nove por cento dessas tarifas dessas linhas tarifárias de produtos agrícolas vão abaixar lentamente em 20 anos até chegar à eliminação. E nós? O que vai ficar para nós?
A mesma história tem o Vietnã, a Malásia. O Japão vem de finalizar um acordo de livre comércio com a Europa, uma Europa que produz e exporta alimentos, mas não produz e exporta alimentos em forma sustentável, absolutamente sustentável, como os quatro países do Mercosul, incluindo o Brasil.
Eu aí tenho uma pequena diferença, Senador. O Brasil é muito sustentável. Basta visitar o Estado de Goiás ou o Estado de Tocantins para conhecer bem a revolução tecnológica que aí temos, não é? Como vamos aproveitar tudo isso fechando-nos entre nós, sendo tímidos no avanço?
O agro, no caso do Uruguai, Senadora, com todos os serviços associados, representa 25% do PIB. Como é que o Uruguai pode ficar fechado?
E um último ponto, porque aqui eu tenho recebido também muitas questões por meio do WhatsApp, Sra. Presidente. Eu gostaria simplesmente de ler um pequeno artigo muito esquecido do Tratado de Assunção, porque o Tratado de Assunção é a nossa lei madre, não é? Então vou falar, vou ler claramente, claramente. Nós não estamos em uma situação de mercado comum; não estamos em uma situação de Arancel Extern Común completa; não estamos em uma união aduaneira completa, como toda a gente aqui falou. Estamos na transição para esse mercado comum, na transição para uma união aduaneira.
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E o que diz o art. 8º exatamente, no total, que é muitas vezes esquecido? Diz claramente que, nas negociações comerciais externas que empreendam durante o período de transição - esse período - o que farão os países? Estenderão automaticamente aos demais Estados Partes qualquer vantagem, favor, franquia, imunidade ou privilégio que concedam a um produto originário de ou destinado a terceiros países não membros da Aladi.
Quer dizer que, num primeiro momento - eu fui testemunha também - todos os atores do Mercosul sabiam, conheciam, perfeitamente, que o período de transição ia ser muito longo, porque uma união aduaneira, um mercado comum entre quatro parceiros no qual o primeiro parceiro tem 81% do PIB, o segundo parceiro tem 12% do PIB, e os restantes, 1% e pouco do PIB, é uma união aduaneira muito assimétrica. E uma união aduaneira requer não teoria, mas prática, como falou o Sr. Ministro da Economia.
Qual é a experiência que se trouxe do Zollverein há dois séculos na união aduaneira da Europa? É a supranacionalidade e a coordenação de políticas macroeconômicas. Eu me pergunto: como é possível, nessa construção, nessa estrutura de quatro países assimétricos haver supranacionalidades? É essa a pergunta que está no fundo do seu comentário a propósito do rabo e do cão, a propósito da importância da economia. Por quê? Porque temos que ser absolutamente claros. Essas assimetrias existem, essa falta de supranacionalidade existe, essa falta de convergência macroeconômica existe. Essas são as realidades que nós - não é a teoria - os administradores, os governos, temos que administrar. Quais são as taxas de juros entre os quatros países do Mercosul? Quais são as taxas de câmbio dos países do Mercosul? Qual é o déficit fiscal? É absolutamente díspar. Então, a proteção efetiva que nós dá o Arancel Externo Común é absolutamente distorcida do comércio e também do comércio interior do Mercosul. É por isso que é ainda mais de ter o Arancel Externo Común, de cobrar Arancel Externo Común às importações do Mercosul... Não há livre circulação dentro do Mercosul, porque tem que fazer todos esses ajustamentos. Por quê? Porque as coordenações macroeconômicas entre o Mercosul diretamente... Eu tenho que ser franco - é a única forma que conheço de fazer diplomacia: falar os fatos reais. A coordenação macroeconômica do Mercosul não existe. E o que eles decidiram é abandonar o Mercosul? Não.
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O que eu encontro, Sra. Senadora, aqui nesta magnífica, eu diria histórica sessão, estamos todos de acordo. Ninguém quer deixar o Mercosul. Segundo ponto: todo mundo reconhece que a gente, do Mercosul, é muito mais importante que uma agenda mercantil. O terceiro ponto que eu reconheço de todos os pontos de vista é que temos que ser pragmáticos e realistas. E o quarto ponto de vista que eu considero sobre que, realmente, temos um consenso é que não podemos perder tempo histórico.
Eu fui Embaixador do Uruguai quando Deng Xiaoping começou essas reformas que o Brasil quer fazer aqui. Eu vi com meus olhos quando 80% da população na China estava debaixo da linha da pobreza. Hoje, são 8%. Eu fui Embaixador na União Europeia quando eles fizeram um esforço, realmente, de coordenar as políticas e de passarem as comunidades europeias a ser uma União Europeia, a ser uma união política e a ser também uma união monetária de que falava o Sr. Ministro da Economia. Mas, a cada momento, temos que ser realistas; a cada momento, temos que ser absolutamente conscientes dos custos de oportunidades que temos. O Uruguai paga muito altos custos de oportunidades se temos que abrir a nossa economia pensando no último vagão do trem. Nós queremos estar na frente da locomotiva, desse trem, junto com o Brasil.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Muito bem, Embaixador. Muito obrigada por suas palavras finais e pela sua participação.
O Sr. Fabrizio já se deu por satisfeito com as suas palavras, vai enviar todo o material solicitado.
Eu passo, para as considerações finais, para encerrarmos a sessão, ao Ministro Paulo Guedes, que também está sem almoço, assim como nós.
Com a palavra, Ministro Paulo Guedes.
O SR. PAULO GUEDES (Para expor. Por videoconferência.) - Um abraço a todos.
Um abraço à Senadora e muito obrigado pela oportunidade.
Um abraço ao Fabrizio, que é parceiro, está sempre nas discussões técnicas aqui com o Lucas, com a turma nossa aqui. E eu, quando faço essas observações mais agudas, elas não são destinadas, nunca, a ele, que é um homem de conhecimento, que trabalha, que faz o trabalho dele, e, sim, aos lobbies, que existem e que todos conhecem, porque, se estão tão preocupados assim com a modernização e com a competitividade, deveriam colaborar também, trabalhando pela redução dos encargos trabalhistas sobre a folha de pagamento. Vamos achar outro dinheiro, vamos tributar de outro jeito, mas não trabalhar a folha de pagamentos, que é o mais cruel dos impostos, e nós descobrimos que produziu 40 milhões de brasileiros fora da força de trabalho, todos subempregados, no trabalho informal e, na pandemia, agora, eles surgiram. Esse é um efeito colateral dos encargos trabalhistas sobre folhas de pagamento. Tanto assim, que os setores que têm mais lobby e mais força política conseguem seguir isentos. Se todos tivessem que pagar, acabaria o lobby e, na mesma hora, a gente abaixava os encargos. Mas, se alguns são mais importantes e mais especiais que os outros, uns pagam e os outros não.
E, finalmente, quero agradecer, também, ao Embaixador do Uruguai, dizer que nós vamos subscrever todas as observações dele no sentido de que queremos valorizar o Mercosul. Achamos importante, mas achamos importante tanto essa liberdade para abaixar, de um lado, a tarifa externa comum, como, de outro lado, o que é muito caro ao Uruguai e nós também valorizamos muito, deixar ele ser um pioneiro. Ele avança na frente, negocia e nos oferece os mesmos termos que ele conseguiu. Quem sabe até, quando ele trouxer os termos, a gente anunciando que o Mercosul vai segui-lo nas negociações, quem sabe ele até consegue melhores condições ainda, mas ele não está impedido de conseguir o fruto do próprio esforço, simplesmente porque alguns de nós não estão conseguindo acompanhar o ritmo deles.
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Então, eu quero dizer que nós vamos apoiar integralmente a posição do Uruguai - eu tenho deixado isso claro desde o início, eu tenho lutado por essa liberdade - e vamos ver como nós lidamos com o Mercosul.
Temos muito apreço pela Argentina, achamos que a Argentina é um extraordinário parceiro. Como foi dito pela Senadora, 80% do alimento do mundo vão sair dessa região aqui e um pouco lá dos Estados Unidos também. Nós e os Estados Unidos, juntos, vamos ter 80%, 70% da produção de alimentos no mundo.
E a Índia, como foi dito aqui também, a Índia já ocupa 60%, 70% do espaço agrícola que ela tem, e nós sabemos que, do ponto de vista de riqueza natural, do ponto de vista das águas, do regime de águas, o mesmo cálculo que levou a China a trazer as importações do Brasil agora de alimentos - se alimentar no Brasil -, esse mesmo cálculo vai acontecer com a Índia. Você não tem terra para alimentar 1,5 bilhão, porque, na verdade, o Brasil é abundante em água e sol, e a Índia não tem água suficiente para 1,5 bilhão de habitantes.
A China chegou a essa conclusão, ela teve que escolher: ou ela fica na agricultura, todo mundo vai comer, mas não tem o desenvolvimento industrial, não tem o avanço; ou ela tenta avançar e, como disse a Senadora Kátia Abreu, tem uma classe média emergente - no caso da Índia, de 400 milhões -, pessoas que vão melhorar seus hábitos alimentares, vão aumentar seu consumo de proteína animal e vegetal e vão ter que recorrer aos fornecedores. E os fornecedores somos nós, somos nós aqui no Mercosul. Estamos preparados para atender isso, é o caminho da prosperidade.
Nós temos aí 20 anos de expansão pela frente, com a nossa eficiência, sem desmatar a Amazônia, simplesmente aumentando a produtividade, como temos feito, como temos feito nos últimos anos. A agricultura brasileira está dando uma demonstração de exuberância para o mundo.
Então, nós vamos, de novo, seguir esse caminho da prosperidade. A Índia terá que escolher - terá que escolher - economizar água e trazer os alimentos de fora. Nós somos parte desse plano.
O mesmo acontece no Oriente Médio todo, que, na medida em que vai também avançando economicamente, é um grande importador também de alimentos, o padrão de vida vai subir lá, e nós estamos aqui para abastecer essa turma toda. Como disse a nossa Senadora, nós somos os grandes produtores de alimentos e estamos preparados para abastecer.
E só para terminar em uma observação também tópica: quem é que dificulta mais um acordo com a Índia? A Argentina, só para ficar essa observação. Mas nós somos amigos tolerantes, irmãos e vamos avançar juntos com a Argentina, só temos que ser um pouco mais firmes no nosso posicionamento.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Ministro Paulo Guedes, pelas suas considerações.
De fato, a classe média da Índia é quase a população da Europa inteira. Então, dentro da Índia, há uma Europa na classe média. É algo muito significativo e nós temos que lutar, com todas as forças, para essa aproximação.
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E o senhor falou em reforma tributária, que poderá ajudar também a abrir o País. Eu queria fazer só um comentário para reflexão, mas não espero obter respostas e vou encerrar. Somos o único país que tem uma Receita Federal que formula regras, fiscaliza, pune, arrecada e ainda ganha bônus por arrecadação. Não existe isso em lugar nenhum do mundo. Da competência da Receita nós sabemos, de todos os servidores da Receita, mas esse sistema é impraticável! E eu tenho muitas dúvidas se uma reforma tributária vai corrigir essa distorção.
Então, eu mesmo crio as regras que eu vou fiscalizar, que eu vou arrecadar e que ainda vou ganhar o meu bônus. Então, eu fico muito preocupada com isso e acho que merece uma profunda reflexão. É um assunto delicadíssimo, mas esse sistema não fica de pé e não pode funcionar e fazer fluir a reforma tributária, que depois gera regras, regras, milhares, dezenas de regras, todos os dias, e um passivo na Justiça, gerando precatórios, máquinas de precatório, precatório, precatório. Então, nós temos que combater essas distorções para sermos felizes.
Quero, mais uma vez, agradecer a presença do Embaixador Celso Lafer e a sua contribuição; do Embaixador França, nosso Chanceler; do Embaixador Guillermo, do Uruguai, grande contribuição; do Fabrizio, da CNI, que é conhecido de todos nós pela sua competência, sinceridade, eficiência, espírito público; e do Ministro Paulo Guedes por ter dispensado essa consideração de um período tão longo conosco, mas muito produtivo. Acho que, nesse tema, o senhor demonstrou com a sua presença, uma pessoa com tantas responsabilidades, mas a sua presença demonstra a consideração pelo Senado Federal e o quanto esse assunto do Mercosul nos interessa.
O Senado Federal, através da CRE, pretende participar pari passu de todas as negociações no sentido de contribuir. A exemplo do Parlamento europeu, a exemplo do Parlamento americano, nós não queremos ficar apenas como coadjuvantes ou na arquibancada assistindo e esperando os gols ou o gol contra. Nós queremos ajudar o Governo Federal, ajudar a essas questões serem ampliadas, e que o debate possa ser intenso, e que a CRE, mesmo que não passem aqui essas alterações, e, sim, na Camex, mas nós gostaríamos de ter a consideração do Executivo de nos consultar, de nos deixar a par de todas essas negociações.
Muito obrigada.
Agradeço a participação dos senhores e senhoras, dos técnicos, auxiliares, especialistas, e declaro encerrada a presente reunião.
(Iniciada às 10 horas e 16 minutos, a reunião é encerrada às 14 horas e 16 minutos.)