23/09/2021 - 14ª - Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional

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Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a 14ª Reunião da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura.
Bom dia a todos e a todas!
Comunico a todos os membros desta Comissão, Senadores e Senadoras, que recebi do Comandante do Exército, General de Exército Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, o convite para participar do Dia de Visita ao Exercício Guardião Cibernético 3.0, a ser realizado no dia 6 de outubro de 2021, das 9h às 10h, no Centro de Instrução de Guerra Eletrônica. O Guardião Cibernético é um exercício simulado de atividades práticas de proteção cibernética que conta com a participação de líderes e de especialistas de tecnologia da informação, civis e militares, oriundos de 58 organizações públicas e privadas, sendo o maior exercício de defesa cibernética do hemisfério sul. A pedido do Comandante Paulo Sérgio, do Exército Brasileiro, estendo o convite a todos os membros desta Comissão, Senadores e Senadoras.
A presente audiência pública tem como objetivo debater os conflitos e desafios atuais do Líbano, em atendimento ao Requerimento nº 16, de 2021, da CRE, de autoria dos senadores Nelsinho Trad e Esperidião Amin, aprovado dia 26 de agosto último.
Compõem comigo a Mesa, presencialmente, a Exma. Sra. Carla Jazzar, encarregada de negócios da República do Líbano no Brasil; e, remotamente, o Exmo. Sr. Embaixador Hermano Telles Ribeiro, Embaixador do Brasil junto à República Libanesa, por isso a sua ausência; Exmo. Sr. Embaixador Ruy Pereira, Diretor da Agência Brasileira de Cooperação (ABC); Sr. Hussein Kalout, pesquisador de Harvard e Senior Fellow do Cebri, que está falando diretamente também de Boston; Sr. Guga Chacra, jornalista e comentarista de política internacional, querido de todos os brasileiros, admirado e respeitado por todos os brasileiros. Os dois, tanto Hussein como Guga Chacra, além de descendentes de libaneses, são dois grandes especialistas na área e sempre falam com muito calor, euforia e prazer sobre esse tema tão delicado que nós estamos vivendo hoje com o nosso país irmão, o Líbano.
A reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do portal e-Cidadania na internet, em senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da ouvidoria, 0800-0612211. Agradeço a presença da representante da Embaixada da Colômbia, Sra. Stefanny Moncada, que está aqui presencialmente. Agradeço a presença da Sra. Claudine Bichara, uma querida amiga, competente gerente de geração de receitas da Embratur; a Embaixadora Cláudia Buzzi, que representa aqui, no Congresso Nacional, o Itamaraty; e a Embaixadora Eliana, que é do Itamaraty, óbvio, e está aqui conosco nos assessorando na Comissão de Relações Exteriores.
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Esclareço aos senhores debatedores que concederei a palavra por 15 minutos a cada um. Em seguida, abriremos a fala de interpelações pelas Sras. Senadoras e Srs. Senadores inscritos.
É com sinceridade, fraternidade e consciência da importância que a Nação brasileira atribui ao Líbano que incluímos esta audiência pública no calendário da Comissão de Relações exteriores do Senado, a pedido dos Senadores Nelsinho Trad e Esperidião Amin, aprovado por unanimidade.
Todos temos ciência do momento crítico de dificuldades e escassez enfrentado por esse país irmão que tem demonstrado, ao longo de sua história, ser exemplo de fortaleza, resiliência e capacidade de superar crises e reconstruir-se. As relações do Brasil com o Líbano são históricas, são fraternas e solidárias. Nosso passado e nosso futuro estão entrelaçados.
O primeiro movimento de relevância nas relações entre o Brasil e o que é hoje o Estado Libanês foi inquestionavelmente a visita realizada por D. Pedro II em 1876, ocasião em que formulou convite para que libaneses se instalassem no Brasil. O Brasil abriu o consulado em Beirute ainda sob o mandato francês, em 1920, e em 1944 o Governo brasileiro reconheceu a independência do Líbano, dando início às relações diplomáticas. Em 1954, foi inaugurada a Embaixada do Brasil em Beirute, mais de 60 anos atrás.
A riqueza e a diversidade das relações entre nossos países tem hoje sua face mais visível na comunidade de libaneses e seus descendentes que vivem no Brasil e que tanto contribuem para o desenvolvimento do nosso País. Trata-se de comunidade mais numerosa do que a própria população atual do Líbano. Existem mais libaneses no Brasil do que no Líbano. O Brasil é, assim, lar da maior diáspora libanesa em todo o mundo, estimada em cerca de 10 milhões de pessoas. Foi em nosso País que tantas famílias libanesas reencontraram a perspectiva de um futuro de realização, criaram raízes e assimilaram o modo brasileiro de ser, criando grandes famílias em nosso País.
A densidade das relações entre o Brasil e o Líbano beneficia-se, não há dúvida, dos laços humanos, mas não se restringe ao papel fundamental da diáspora. Reflete-se igualmente nos planos político-diplomático, econômico-comercial, de defesa, cultural, parlamentar e de cooperação humanitária.
Podemos mencionar algumas das múltiplas facetas do relacionamento bilateral entre Brasil e Líbano: a cooperação no âmbito da Força Interina das Nações Unidas no Líbano e no setor de defesa; o estabelecimento do Conselho Empresarial Líbano-Brasileiro em 2014; a profícua cooperação entre instituições educacionais dos dois países; a atuação do Centro Cultural Brasil-Líbano, em Beirute; a cooperação humanitária com intuito de auxiliar o Líbano na assistência a refugiados presentes em seu território. Diante desse espírito de irmandade, o Governo brasileiro e o Congresso Nacional têm estado atentos à profunda crise que assola o Líbano e aflige os libaneses, que se veem diante do aumento da insegurança alimentar, da escassez de água, de medicamentos e equipamentos hospitalares, além do racionamento de eletricidade.
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Não há como ficarmos indiferentes a essa realidade. Por mais que tenhamos demonstrado nossa solidariedade por meio de ações concretas, de que foi marca a missão multidisciplinar em 2020, após as explosões no Porto de Beirute, não nos parece ser suficiente. Nossa intenção hoje é ouvir os especialistas e encontrar caminhos para intensificar as formas de cooperação e de ajuda humanitária que venham a contribuir para o esforço de superação da crise atual que permita a retomada econômica do país e o reflorescimento da sociedade libanesa.
Muito obrigada.
Eu pergunto a um dos autores do requerimento se deseja falar agora, na abertura. Se sim, tem a palavra o Senador Esperidião Amin. Ele e Senador Nelsinho Trad são os autores do requerimento desta audiência pública, como disse inicialmente.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Para discursar.) - Eu quero, em primeiro lugar, Senadora Kátia, cumprimentar a V. Exa. pelo dinamismo que tem empreendido nesta nossa Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, que é uma Comissão de uma importância transcendental, especialmente neste momento em que a pandemia, as crises locais e internacionais estão nos deixando muito inquietos.
E a propósito deste requerimento, quero reiterar o que V. Exa. já falou. Sendo uma iniciativa do Senador Nelsinho Trad e minha, não deixa ser, aqui eu quero registrar, uma iniciativa do Senado Federal, portanto, do Congresso brasileiro, que reconhece isso que V. Exa. tão bem expendeu aí no seu pronunciamento, que a relação do Brasil com o Líbano é particularíssima, singular. Nós temos muitos Senadores e Parlamentares, Deputados, temos frente parlamentar de amizade com países árabes e com o Líbano e, dentre estes, eu sou um dos poucos que é a primeira geração, porque o meu pai nasceu no Líbano e a minha mãe também não nasceu no Brasil. Portanto, eu sou filho de imigrantes duplamente.
E quero saudar de maneira muito carinhosa a nossa Embaixadora do Líbano, Jazzar, e dizer que nós estamos cumprindo uma obrigação de solidariedade. Por isso, nessa breve intervenção, eu quero agradecer a presteza com que V. Exa. percebeu a importância deste gesto.
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E, especialmente em relação aos nomes indicados, eu queria dizer que pretendo voltar a falar depois que o Sr. Ruy Pereira, que é a pessoa que pode falar pelo Governo e pelos gestos de solidariedade já praticados, já acenados e, eventualmente, a acenar, que podem materializar essa solidariedade que é o que nós estamos procurando estimular.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Esperidião.
Assim que o Embaixador usar a palavra, o senhor pode solicitar.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - Se a senhora me permite, eu queria também homenagear o secretário executivo do Ministério das Relações, Dr. Achilles, Embaixador Achilles, que foi Embaixador no Líbano e na Síria quando nós fizemos uma visita, junto com o Deputado Carlos Melles e com o Deputado Chinaglia, à Síria, em 2018.
Foi uma viagem corajosa e solidária, porque tivemos a oportunidade de visitar o Líbano também, já num outro clima, e o próprio Embaixador Achilles, que conhece bem a região, estimulou-me e aplaudiu essa iniciativa que V. Exa. concretiza.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Esperidião.
Para informar aqueles que nos acompanham no e-Cidadania, a capital do Líbano é Beirute; a população é de 6,8 milhões de pessoas; a extensão territorial é de 10,4 mil quilômetros quadrados; a taxa de alfabetização das pessoas de 15 ou mais anos de idade é de 95%; 99% da população têm acesso à rede sanitária; o idioma é o árabe; está localizado no Oriente Médio; o PIB é de US$53 bilhões, o PIB per capita é de US$7,784; e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é similar ao do Brasil, à média nacional, 0,74.
Portanto, para iniciar, eu quero afirmar que o Senador Nelsinho Trad enviou um vídeo para nós. O Senador Esperidião fará a abertura, como fez agora, e o Senador Nelsinho Trad fará o encerramento desta audiência através do seu vídeo.
Eu pretendo iniciar os nossos trabalhos, não com a nossa Embaixadora, mas com o Sr. Hussein Kalout, pesquisador de Harvard e Senior Fellow do Cebri. Pelo seu sobrenome, eu não preciso nem dizer a sua descendência.
Hussein Kalout é cientista político, professor de relações internacionais, conselheiro do Harvard International Relations Council e pesquisador da Universidade de Harvard.
Entre 2016 e 2018, foi Secretário Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República no Brasil, integrou o Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior (Camex) e foi Presidente da Comissão Nacional de População e Desenvolvimento.
Professor Hussein Kalout é Senior Fellow do Cebri e coordenador do núcleo América do Sul.
Eu pretendo iniciar pelo Professor Hussein justamente para ele contextualizar a todos que aqui acompanham essa importante audiência pública.
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Por favor, Hussein, muitíssimo obrigada pela disponibilidade do seu tempo, por ter tanto interesse em participar - eu o parabenizo por isso - desta audiência pública. Muitíssimo obrigada, mais uma vez, pelo seu apoio.
Com a palavra por 15 minutos.
O SR. HUSSEIN KALOUT (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senadora Kátia Abreu, pelo convite. Parabéns pelo seu trabalho à frente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional!
Eu me sinto muito honrado em estar na companhia de tão ilustres personalidades. Começaria saudando as Sras. Senadoras, os Srs. Senadores, o Senado Federal; saudando à Sra. Carla Jazzar, Encarregada de Negócios da República Libanesa para o Brasil; saudando o Hermano Telles Ribeiro, querido amigo que nos representa em Beirute; o Embaixador Ruy Pereira, Diretor da Agência Brasileira de Cooperação; e, por último e não menos importante, o meu querido e estimado amigo Guga Chacra, quem reputo ser um dos principais, um dos maiores especialistas em Líbano no Brasil.
Senadora Kátia, eu queria tentar fazer uma construção inicialmente um pouco histórica e um pouco conjuntural das transformações por que o Líbano passa. Não quero entrar muito nos detalhes das relações Brasil-Líbano, deixaria isso para os Embaixadores Hermano e Ruy Pereira, e também para que a Encarregada de Negócios Sra. Carla Jazzar pudessem esmiuçar muito mais essas particularidades.
Não é segredo que, da perspectiva, apesar de ser pequeno, apesar de ser um país não tão populoso e apesar de não deter, digamos, recursos de poder vis-à-vis as demais potências regionais, o Líbano tem uma relevância geoestratégica e geopolítica, hoje, indubitável no Oriente Médio; sempre teve ao largo de sua história não só durante ainda o período das navegações, mas no que diz respeito também ao pós-Segunda Guerra. A sua relevância também se dá por ser um mosaico cultural, um mosaico religioso e também um mosaico multicivilizacional. O Líbano, hoje, talvez seja um dos pontos de aglutinação das minorias sociorreligiosas não só do levante, mas também - por que não dizer? - de todo o Oriente Médio.
Dito isso, naturalmente, quando a gente tenta analisar a conjuntura histórica do país, é inescapável lançar um olhar sobre a sua conformação sociorreligiosa e como essa conformação sociorreligiosa acaba impactando na dinâmica econômica, social e política. Então, é um dos primeiros países a adotar uma representação democrático-sectária no poder do Oriente Médio.
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Posteriormente, ou mais recentemente, o Iraque adotou essa divisão sectária na partilha do poder estatal, mas o Líbano, desde o fim da Segunda Guerra, vinha com esse formato de partilha entre cristãos e muçulmanos e entre os sectos, quer dizer, contemplação, na partilha do poder, dos principais sectos religiosos: no campo cristão, os maronitas em primeiro lugar, depois os ortodoxos, depois os católicos; no campo muçulmano, os xiitas e os sunitas, depois os drusos.
Eu procuraria não explorar a simbiose de todos os sectos que o país contém - basicamente 18 grupos sociorreligiosos -, mas é importante olhar o Líbano, eu diria, das últimas duas décadas, quando a ordem internacional passa por importantes transformações e os Estados Unidos iniciam um processo de desengajamento do Oriente Médio.
Esse desengajamento obviamente leva a uma nova topografia do poder regional e, paralelamente a isso, o Líbano se insere num ponto fundamental para as políticas externas das potências regionais em que nós percebemos que existe um processo também de acomodação da reconfiguração das forças no contexto regional. A Turquia, por um lado, volta mais o seu olhar ao Oriente, menos ao Ocidente; canaliza e procura restaurar a sua influência neo-otomana vigente entre o século XVI até praticamente o início do século XX. Israel precisa consolidar ou confirmar a sua supremacia militar. O Egito, depois de ser um baluarte fundamental no mundo árabe, perdeu peso gravitacional na última década e, hoje, busca se reposicionar como um interlocutor geopolítico fundamental para o equilíbrio político regional. O Irã, que anteriormente exercia uma influência muito restrita a alguns países da região, hoje busca desempenhar um papel regional diferente daquele percebido duas décadas atrás, querendo se tornar um player regional e uma potência dominante no espectro geopolítico. E a Arábia Saudita, sem dúvida nenhuma o país mais forte economicamente da região, um país que representa grande proporção do mundo muçulmano, consequentemente procura também manter vívida a sua influência geopolítica, desafiando, por um lado, a hegemonia ou a pretensão hegemônica do Irã e, por outro lado, a contenção das aspirações da Turquia.
Portanto, o Líbano sofre diante de uma situação - não vou dizer que é refém disso -, em certa medida é muito reativo ao desenho geopolítico regional, por um lado, e também ao desenho da geopolítica mundial. Então, a guerra de 2006 entre o Líbano e Israel acaba auferindo ao Líbano um peso diferenciado no que se refere à arquitetura da segurança regional. Posteriormente, a partir de 2011, observa-se o envolvimento de grupos libaneses na guerra da Síria e a forma como isso se reflete na preservação do regime sírio nesse processo de guerra civil. Isso torna também o peso do Líbano ainda mais relevante da perspectiva securitária. Então, são dois pontos muito importantes sobre cuja importância a gente não pode deixar de lançar um olhar.
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Obviamente, o Líbano vive uma situação econômica grave e uma situação política que aparentemente foi resolvida com a formação de um novo gabinete, mas é importante tecer algumas considerações a respeito desse processo.
A primeira é que o Líbano vinha sofrendo cada vez mais duras e graves sanções, especialmente durante o Governo Trump, que buscou estrangular a economia do país e procurou estabelecer basicamente uma divisão, um veto à participação de determinados grupos políticos na formação governamental. É o mesmo que aconteceu no Afeganistão: a tentativa de alijar do poder uma força social e política extremamente representativa, com a qual é impossível não se formar um governo. Essa exclusão literalmente leva a esse imobilismo. Por um lado, talvez a estratégia do Governo Trump tenha sido a de provocar esse imobilismo interno, de provocar o colapso do sistema político e, consequentemente, do sistema econômico, mas, no sistema econômico, também é importante reputar a responsabilidade aos grupos políticos, porque o Líbano segue refém das mesmas lideranças políticas, dos mesmos clãs sociopolíticos partidários desde o fim da guerra civil, no início dos anos 90. São os mesmos grupos, praticamente as mesmas figuras. Com o colapso econômico, isso se refere à incompetência governamental, à incompetência de gestão econômica desses grupos que se instalaram desde então no poder.
Não se pode deixar de mencionar que a formação do novo governo ocorreu, claro, porque houve um acerto franco-iraniano a respeito da formação governamental. É importante compreender, para quem não conhece, que, no Líbano, todas as forças políticas têm suas conexões externas. O processo decisório, às vezes, em matéria de política interna pode parecer soberano, mas ele não é tão soberano como se imagina ser, porque muitos dos partidos são vinculados a governos estrangeiros, têm apoio econômico, apoio político ou, às vezes, precisam ter luz verde para aceitar compor ou não compor o governo, aceitar estar com aquela pasta ministerial ou não. Então, esse regime de tutela, de que a gente pode falar depois, consiste num processo de tutela dos Estados Unidos sobre algum grupo político, do Irã quanto a outro grupo político, da Arábia Saudita sobre outro político, da França sobre outro grupo político. Então, basicamente, todas as forças políticas acabam sendo tuteladas por alguma força regional ou internacional, extrarregional no caso.
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Então, a formação governamental só foi possível, porque, primeiro, o desengajamento americano facilitou, quer dizer, os franceses retomaram, digamos assim, a primazia para conduzirem o processo de negociação interna juntamente com, digamos, o bloco mais forte, que é o bloco que tem como aliado ou potência tutelar o Irã. Esse entendimento franco-iraniano viabilizou a formação governamental, mas é importante reconhecer que o Governo Biden, por não vetar a ação francesa e por não, digamos assim, obstaculizar esse processo, tornou possível chegar-se ao acordo do novo governo. É um novo governo, mas, no fundo, com figuras velhas, com rostos velhos conhecidos da política libanesa.
O desafio do país fundamentalmente - o Hermano, que está lá, conhece a realidade - é superar a crise econômica. E é muito difícil superar a crise econômica quando a corrupção é endêmica, quando o clientelismo rege a relação entre os atores estatais, a mídia e a sociedade e quando o populismo é a prática governamental corrente. Então, é muito difícil equacionar o problema socioeconômico do país enquanto não se procurar dirimir o problema da corrupção, o problema do clientelismo e também tentar reconstruir um poder judiciário independente e transparente. O grande problema do Líbano é que o país não tem um poder judiciário transparente, muito menos independente, assim como não tem um ministério público forte e independente do poder executivo. O ministério público é politizado, e o sistema judiciário basicamente é cooptado. Claro, como toda regra na política, há algumas exceções, mas não é o que tem sido comum.
Esse processo de politização e de falta de transparência acaba também se vendo presente depois da destruição do porto e, até mesmo porque todos sabem que no Líbano a corrupção come solta, praticamente nenhum grande líder político-partidário foi investigado, julgado ou preso, quer dizer, são as mesmas figuras que até hoje permanecem no poder.
Qual é o futuro do Líbano? O futuro do Líbano requer uma renovação política, requer um olhar menos sectário. Por mais que as lideranças internas reafirmem a necessidade de se perseguir a formatação de novos paradigmas para a construção de um Estado laico, isso não me parece sincero, porque as lideranças políticas se nutrem do sectarismo, precisam do sectarismo como instrumento político até para permanecer no poder. Portanto, vai depender de uma nova geração para que haja esse processo de transição.
O Líbano tem um destino que é inseparável dos países árabes, os países árabes são fundamentais para a recuperação econômica do país. É fundamental que o Líbano reate essa interlocução política com os diversos países, a partir do exercício de uma política externa equilibrada e distante dos conflitos regionais, porque os conflitos regionais acabam contaminando o balanço sectário interno.
O futuro do Líbano depende um pouco da diáspora, que, normalmente, procura aportar muitos recursos, especialmente a diáspora brasileira, que tem sido extremamente solidária com as inflexões econômicas do país.
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O país vai depender de investimentos externos e, nesse processo de investimentos externos, alguns atores ressurgem, ou surgem, como pilares desse processo, como a China, que quer fazer aportes e investimentos; a própria Rússia; os iranianos. É por isso que é importante também trazer os investimentos europeus, de franceses, dos países que integram a União Europeia e também, se possível, dos Estados Unidos. Portanto, é um país em que, sem investimentos, não é possível reconstruir o porto, não é possível reerguer a economia.
Bom, o país está em negociação com o Fundo Monetário Internacional, mas é preciso fazer um ajuste fiscal duro, tremendo, que vai requerer, digamos, uma disciplina político-econômica tremenda e, sobretudo, redução do grau de corrupção, porque um aporte do Fundo Monetário não será dado se não houver garantias de contenção da corrupção.
Bom, concluindo, Senadora Kátia Abreu, eu diria que, embora a relação econômica, da perspectiva comercial, entre o Brasil e o Líbano não seja uma relação densa, como é densa com outros países na região, é uma relação que se pauta por um grau de cooperação elevado, por uma relação cultural intensa.
A contribuição do Brasil para o Líbano tem sido enorme desde a sua fundação, não só por haver acolhido os nossos antepassados, mas também porque o Brasil está presente a partir das operações de paz das Nações Unidas e também, sobretudo, a partir do trabalho humanitário que os sucessivos governos brasileiros desempenharam ao longo das últimas décadas.
Fico por aqui, após esta fala introdutória, à disposição para quaisquer indagações.
Muito obrigado pela paciência dos senhores e das senhoras.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Hussein, pela sua explanação. Com certeza, continuará conosco para posterior questionamento de alguns Senadores ou do e-Cidadania. Muito obrigada.
Concedo a palavra à Exma. Sra. Carla Jazzar, Embaixadora da República do Líbano no Brasil. É um prazer recebê-la, principalmente por ser mulher por quem tenho um carinho muito especial e admiração. Parabéns!
A SRA. CARLA JAZZAR (Para expor.) - Obrigada à Sra. Senadora Abreu. Antes de começar, eu quero agradecer por suas boas palavras sobre as relações entre o Brasil o Líbano. Essa relação é muito forte e ancestral.
E cito uma história muito simpática. Eu me lembro do Embaixador do Brasil em Washington, o Embaixador Abdenur: ele me apresentava como representante do "Líbano Pequeno"; ele era representante do "Líbano Grande". (Risos.)
Exma. Sra. Senadora Kátia Abreu, Exmo. Sr. Senador Esperidião Amin, Exmo. Sr. Embaixador Ruy Pereira, Exmo. Sr. Embaixador Hermano Telles Ribeiro, senhoras e senhores, bom dia!
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Antes de mais nada, gostaria de expressar a minha mais sincera gratidão à Presidente desta Comissão de Relações Exteriores, Senadora Kátia Abreu, pelo convite para participar desta audiência tão importante para o Líbano. Sinto-me honrada pela oportunidade de poder falar do meu país em frente a esta assembleia tão eminente, liderada por uma personalidade cuja liderança é unanimemente reconhecida por sua excelência.
Devo também parabenizar os nobres Senadores Nelsinho Trad e Esperidião Amin, distintos membros desta honrosa Comissão.
É um orgulho para a nossa comunidade libanesa-brasileira me receberem, ouvirem e tomarem a iniciativa de realizar esta audiência pública.
Eu não esqueceria de citar os honrosos Senadores Tasso Jereissati, Fernando Collor, Antonio Anastasia e Jaques Wagner, por suas calorosas boas-vindas e seu incentivo.
Gostaria de saudar a presença dos meus caros colegas Embaixadores, Luiz Pereira, Diretor da Agência Brasileira de Cooperação, ABC, e Hermano Telles Ribeiro, Embaixador do Brasil no Líbano. Gostaria também de reconhecer a participação dos senhores Hussein Kalout e Guga Chacra. Tenho certeza de que a contribuição de todos os senhores, para esta audiência, será de grande importância para uma melhor compreensão da situação atual no Líbano.
Queria aproveitar esta oportunidade para estender ao Ministério das Relações Exteriores o meu senso de dever pelo seu apoio desde o primeiro dia minha chegada a este lindo País, há nove meses. Eu gostaria de mencionar, em particular, meus caros amigos Embaixadores Kenneth da Nóbrega e Sidney Leon Romeiro, que têm ajudado na minha empreitada em todos os momentos.
Por último, mas não menos importante, queria parar um momento para lembrar da generosidade brasileira para com o Líbano, em especial depois da terrível explosão que atingiu o Porto de Beirute, naquele trágico 4 de agosto de 2020. A ajuda humanitária e moral brasileira que o Governo, os Congressistas e os brasileiros descendentes de libaneses têm prestado ao povo libanês fortalece a minha crença de que o Brasil é e será, sempre, um dos nossos melhores amigos.
Senhoras e senhores, antes de começar minha apresentação, queria pedir a sua permissão para responder as suas pergunta em inglês ou francês. Estou aqui há nove meses e eu me esforço para conhecer e aprender sua língua, bela língua, mas vocês entendem que, em nove meses, eu não poderia expressar meu pensamento profundo fluentemente. Perdoem-me por isso, mas ainda espero que vocês apreciem minha coragem de comparecer diante de vocês com tão pouca capacidade linguística.
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Senhoras e senhores, uma semana atrás, se vocês tivessem me perguntado sobre a situação no Líbano, eu teria contado que não poderia ser pior. A crise econômica, financeira e social sem precedentes era extremamente grave. A libra libanesa perdeu mais de 90% de seu valor, a inflação chegou a 120%, afetando mais de 75% da população. O desemprego atingiu mais de 40% da força trabalhadora. Os hospitais não podiam mais fornecer tratamentos contínuos para pacientes com problemas nos rins ou cânceres. As farmácias ficaram vazias de remédios, os postos de gasolina ficaram sem combustível, com filas infinitas de carros esperando para conseguir 20 litros de gasolina. Os blackouts de energia elétrica chegaram a 22 horas por dia. E, como o Banco Mundial a definiu, a crise libanesa é uma das piores do mundo deste 1850.
Esta terrível crise econômica, financeira e social veio a ser enxertada a uma situação já desastrosa devido: 1) à presença de um milhão de refugiados sírios e de 400 mil refugiados palestinos em nosso território; 2) à tragédia do 4 de agosto no porto de Beirute, que destruiu o coração de nossa capital cultural e econômica, matando mais de 200 pessoas, ferindo outras 6.500, algumas delas para toda a vida, e desalojando mais de 300 mil; 3) à pandemia do coronavírus, que assolou o setor de turismo e agravou a pobreza e as dificuldades econômicas. E, acreditem ou não, nesse esquema catastrófico, a pandemia está entre os males menores.
Como resultado, a crise social, econômica e financeira no Líbano exacerbou a fragilidade e a fragmentação do país, aumentando o risco de instabilidade social e civil e de erupção esporádica e diária da violência. Mas, ainda mais grave, a situação da crise expôs o país a uma perigosa escassez de recursos, incluindo o capital humano, já que a fuga de talentos se tornou uma crescente e inesperada opção.
Na verdade, senhoras e senhores, o estado em que está o país se assemelha muito ao da Venezuela, com a diferença de que a Venezuela tem vizinhos solidários, como o Brasil, que podem acomodar seus refugiados. No caso do Líbano, estamos por nossa conta, com uma Síria assolada pela guerra em nossas fronteiras, no norte e leste; Israel ao sul; e o mar a oeste. Hoje o Líbano se encontra na mesma situação em que esteve no começo do século XX, que levou os pais e avós de alguns de vocês a migrarem para o Brasil.
Felizmente, na semana passada, e após três meses de negociações, num novo governo libanês, presidido pelo Primeiro-Ministro Najib Mikati, um bom e experiente político, foi formada a nova equipe, que inclui personalidades apolíticas com boa reputação.
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Portanto, hoje uma nova página de esperança está sendo aberta para o povo libanês. O governo atual tem uma missão bem definida de liderar o país no caminho da recuperação econômica, social e financeira por meio das consultas com o Fundo Monetário Internacional, iniciar reformas dos setores econômico e bancário, fornecer uma rede de segurança social e alimentar para o povo libanês e realizar eleições legislativas no domingo próximo.
No entanto, os desafios que o novo Governo enfrentará são enormes. A situação está muito grave e a recuperação muito lenta. De acordo com as estimativas mais otimistas, o caminho de reinício levará cerca de dez anos. Tudo precisa ser refeito ou reformado para tirar o povo libanês do seu sofrimento, mas as necessidades mais urgentes são a provisão rápida dos produtos e serviços básicos, como alimentos, eletricidade, combustível e medicamentos. Quanto às reformas mais urgentes, elas se relacionam, principalmente, com os setores da energia, bancário, de infraestrutura e com todos os setores econômicos produtivos, como a agricultura e a produção industrial.
Dito isso, o Líbano precisa hoje, como ontem, da ajuda das comunidades libanesas ao redor do mundo e dos seus amigos também e, mais do que nunca e principalmente, da comunidade libanesa no Brasil e do Governo brasileiro. Portanto, chegou a hora de agir e de construir sobre essa imensa ponte humana que conecta Líbano ao Brasil para atingir um nível institucional em tempo de traduzir a tremenda influência que tem a comunidade libanesa neste País em uma solidariedade real, tangível e sustentável, como o povo libanês. É hora de pensar grande em uma maneira mais sistemática para ajudar a descobrir um modelo que vá além da captação de recursos ou da coleta de medicamentos quando necessário. É por isso estou aqui hoje.
Senhoras e senhores, deste que cheguei a este País, em dezembro passado, venho me engajando com contrapartes no Mistério das Relações Exteriores do Brasil, sobre como agir para ajudar o povo libanês. Assim, surgiu a ideia de um fundo para o povo libanês, criado pela comunidade libanesa neste País e pelos brasileiros de origem libanesa. Levamos tempo para decidir como proceder, especialmente porque o fundo iria envolver recursos privados e monitoramento público. De fato, a ideia do fundo é muito simples. Ela é sobre: 1) identificar comunidades, áreas e negócios no Líbano; 2) fornecer suporte financeiro para essas comunidades, áreas e negócios; 3) fornecer apoio técnico ou apoio tecnológico, provendo com experiência tecnológica e conhecimento do Brasil; 4) investir em novos projetos de desenvolvimento setorial.
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Quantos aos objetivos do fundo, eles são: 1) criar novas oportunidades de trabalho; 2) receitas recorrentes; 3) desenvolver setores como os da agricultura, da produção de energia limpa, da segurança alimentar; 4) garantir a entrada de moeda estrangeira no país; 5) estimular o comércio bilateral.
Em julho passado, depois de consultar a Idal, a autoridade libanesa encarregada de fornecer incentivos e serviços para negócios e investidores locais e estrangeiros para estabelecer suas operações no Líbano, e depois de identificar projetos com potencial de desenvolvimento socioeconômico, trouxe a ideia do fundo para nossa comunidade libanesa em São Paulo. Eu escolhi São Paulo, pois é onde está a maior e mais bem estabelecida parte de nossa família libanês-brasileira. A ideia foi recebida com grande entusiasmo, e a comunidade libanesa lá imediatamente mobilizou esse organismo em grupos de trabalho para estudar os aspectos jurídicos e financeiros do fundo. Hoje uma plataforma financeira está em estudo para definir as condições de transmissão de recursos aos beneficiários.
É aí, senhoras e senhores, que venho solicitar sua ajuda para facilitar as transferências dos fundos e das assistências humanitárias para o Líbano, liberando-as de impostos e dos custos. Se me permitem, gostaria de sugerir a ideia de que vocês definam uma forma legal, mesmo que isso signifique criar uma estrutura própria, uma parceria entre as autoridades brasileiras competentes e as entidades libanesas constituintes do fundo em construção, para permitir um fluxo livre de ajuda financeira, material e medicamentosa também. Dessa forma, as autoridades competentes assumirão a liderança em qualquer tipo de repasse, mesmo que todo o financiamento seja exclusivamente privado. E, se posso dizer mais, colocaria a sua disposição uma especialista no assunto, que poderia sugerir um projeto de lei ou uma emenda a uma lei já existente ou também uma medida provisória.
Para concluir, senhoras e senhores, a ideia que apresentei tem a intenção principalmente de ajudar o povo libanês em sua luta diária pela sobrevivência e facilitar as transmissões de assistência, mas, se adotada, também seria um grande salto na estrutura das relações libanês-brasileiras, seria a chave do fomento e um laço institucional ainda mais produtivo entre os dois países. O que hoje parece uma busca por ajuda pode, na verdade, servir de base para uma contribuição futura do Brasil na reconstrução do Líbano e na sua recuperação. Isso é bom para o Líbano, isso é bom para Brasil, é bom para as nossas relações bilaterais. E, além disso, nessa iniciativa, teremos que elevar nossa amizade a um novo patamar.
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Muito obrigada, senhoras e senhores, pela sua atenção.
Perdoem-me se tomei muito tempo para apresentar o caso do meu povo. Espero tê-los convencido a agir, espero que essa audiência não termine por aqui, espero que possamos desenvolver ideias concretas e espero que as relações entre o Líbano e o Brasil se tornem mais fortes do que nunca.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Muito obrigada, Sra. Embaixadora. Eu tenho certeza de que a sua fala, a sua apresentação mobiliza todos nós que estamos aqui presencialmente, mas também todos que estão participando pelo e-Cidadania, remotamente. Suas palavras, quase uma súplica, com certeza vão calar no coração não só dos descendentes libaneses, mas de todos os brasileiros.
Concedo a palavra ao Exmo. Sr. Embaixador Hermano Telles Ribeiro, Embaixador do Brasil junto à República Libanesa.
O experiente Embaixador Hermano Telles Ribeiro, formado no Instituto Rio Branco em 1979, serviu ao Brasil em Washington, Montevidéu, Paris, Tóquio, Caracas, Atlanta e Londres antes de chegar a Beirute. Em 2000, defendeu a tese de Altos Estudos do MRE intitulada "Brasil e México: convergências e divergências (1995-1999). Desafios de uma parceria possível". É autor de diversos artigos, entre eles "O Centro de Desenvolvimento de Tecnologias Avançadas (CDTA) da 'Georgia Institute of Technology': um instrumento de desenvolvimento econômico".
V. Exa. dispõe de 15 minutos. Muito obrigada por participar.
O SR. HERMANO TELLES RIBEIRO (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Sra. Presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal, Senadora Kátia Abreu, e por seu intermédio eu gostaria de cumprimentar também os Senadores que estão presentes virtualmente ou aí na nossa sala, da qual eu guardo boas recordações de minha sabatina.
Queria saudar o Senador Esperidião Amin, com quem tive uma conversa em que pude ver nos olhos dele a emoção que ele revelou da visita que fez a seus familiares aqui no Líbano. Aquilo me marcou muito.
Cumprimento os demais painelistas, a querida colega Carla Jazzar, cuja fluência em português já se distancia de uma forma fenomenal do meu parco árabe aqui no Líbano. Nós somos quase que parceiros temporais, não é verdade, Carla? Eu cheguei em dezembro aqui, você está há nove meses em Brasília. Meus parabéns por sua fluência, e eu tenho certeza de que muito em breve você estará com um domínio mais completo do nosso idioma. Para mim vai ser páreo duro, digamos assim.
Demais participantes do e-Cidadania, também colegas meus que estão presentes aí à sessão, é uma grande alegria estar aqui.
Minha primeira mensagem, de quem está aqui no terreno, vivendo o dia a dia dos múltiplos desafios libaneses, é de que nós temos um fenômeno de muita felicidade de esta audiência pública estar sendo realizada nesta data.
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Nós estamos realizando esta audiência pública chamando a atenção para a parceria com o Líbano, para os desafios libaneses, no momento em que o novo Governo acaba de, digamos assim, entrar em campo. O novo Governo acaba de ser referendado pelo Parlamento. É um Governo que demorou um mês e meio para se constituir. As tentativas anteriores, é importante assinalar, levaram mais de 11 meses e foram frustradas. Portanto, o Primeiro-Ministro Mikati, em um mês e meio, conseguiu fazer essa costura tão delicada e tão complexa de formar um governo que foi referendado pelo Parlamento. Então, eu acho que a primeira coisa que é muito positiva é que esta audiência esteja ocorrendo neste momento, num momento inaugural, quase, da nova gestão do Primeiro-Ministro Mikati.
Uma segunda coisa é que o Primeiro-Ministro não é uma pessoa que desconheça o nosso País. Eu soube que ele, inclusive enquanto Primeiro-Ministro, visitou o Brasil no período da Rio+20, a segunda Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, e, naquela época, inclusive visitou o Comandante da Marinha brasileira e, evidentemente, se referiu à importantíssima participação da nossa Marinha na força-tarefa marítima das Nações Unidas. Ele conhece bem o nosso País.
Ele terá, o Primeiro-Ministro, uma tarefa extremamente complexa que será de navegar essa, digamos, nau fenícia, esse Líbano, até as próximas eleições, em maio do ano que vem. É complexo, evidentemente, porque as demandas políticas, econômicas e de toda a sorte decorrentes das crises que eu vou brevemente aqui abordar se multiplicam, se retroalimentam num círculo vicioso. Então, é muito difícil você mudar o sinal da equação diante de uma situação com tantos desafios pela frente. De modo que ele terá, desta semana, deste momento que estamos vivendo aqui inclusive até o mês maio do ano que vem para navegar o país, para promover as reformas que se fazem indispensáveis e para conquistar a confiança da população na gestão governamental. Eu creio que, no momento em que isso ocorrer, nós teremos uma virada, teremos uma mudança efetiva na equação política aqui neste país. E temos fé de que isso ocorrerá. Esse é nosso, evidentemente, sentimento olhando para a frente.
Existe, por outro lado, uma grande expectativa da comunidade internacional para as necessárias reformas. O Hussein Kalout falou muito bem, muito brevemente. Como é difícil falar em 15 minutos tudo o que temos aqui pela frente e que tivemos na história libanesa, foi uma maravilha a apresentação dele. Há uma impaciência natural, há uma certa expectativa de resultados de ações de curto prazo de reformas necessárias no domínio fiscal, no domínio, enfim, da gestão governamental, no domínio, sobretudo, da ordem econômica do país.
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E aí eu acredito que a gente pode começar a falar, pela primeira vez - o Senador Esperidião Amin falou em singularidade, eu vou falar várias vezes nessa expressão -, numa singularidade brasileira, que é o fato de que, em alguns casos, os desafios que o Líbano terá pela frente poderão encontrar, de alguma forma, soluções brasileiras. A título de exemplo: há todo um debate e está em curso aqui a implementação de um cartão de renda mínima. Ora, nós temos expertise nesse tipo de ação governamental. Não é de se descartar que haja a possibilidade de uma reforma monetária. Eu estou aqui apenas especulando, mas, enfim, nós temos possibilidades claras de compartilhar com o Líbano a experiência que tivemos, que foi a experiência do Plano Real.
Neste momento, então, eu queria apenas citar brevemente as crises que estão sobre a mesa para o Governo que se inaugura agora.
Há a crise política, que eu aqui mencionei, na medida em que há um déficit de confiança na gestão governamental. E houve a revolução, a chamada revolução de outubro de 2019, em que o povo veio à rua, foi à rua, de forma unânime quase, sem nenhuma cor partidária ou confessional, para dizer que era preciso que houvesse uma mudança de paradigma, não é verdade? Então, há um anseio por uma mudança, mas, neste momento, há também expectativa de que o Governo possa começar a trilhar um caminho e lançar um mapa do caminho claro em busca de uma estabilidade econômica para a sua população.
Há uma crise fiscal e de liquidez. Eu não tenho nem os números aqui de cabeça, mas há endividamento elevado nos setores público e privado.
Há uma crise bancária e cambial. A minha colega Carla mencionou com clareza os dados, inclusive endossados pelo Banco Mundial, sobre a grave questão cambial e bancária do país.
E, por fim, há uma crise energética. Nós estamos falando de um país muito dependente de energia importada, para não dizer completamente dependente, na sua matriz energética, da energia que vem de fora: nós temos falta de óleo para as usinas termelétricas, óleo diesel para geradores, gasolina e gás de cozinha; toda sorte de carência neste momento.
E a essas crises - digamos: política, fiscal, bancária, energética - se soma evidentemente uma crise que não é apenas no Líbano, mas é global, pois o Líbano também está enfrentando a pandemia, não é verdade? E o sistema público de saúde tem procurado atender de forma extremamente competente. Sou testemunha pessoal, porque sou pessoalmente beneficiário das vacinas, eu e minha família, aqui no Líbano. É um sistema que tem um altíssimo nível de capacidade de entrega, não é verdade?
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Mencionada essa conjuntura do terreno, eu queria dizer que, como disse a Carla, uma população que tem entre 5 e 6 milhões - ela mencionou com clareza -, 1 milhão de sírios e 400 mil palestinos... Eu sempre gosto de fazer aquela comparação: na verdade, é como se o Brasil acolhesse em seu Território uma Argentina e um Equador em termos de população. Esse é o impacto demográfico, a complexidade demográfica que enfrenta um país da extensão territorial do Líbano. É como se, em nosso País, nós recebêssemos um contingente demográfico correspondente à população somada de Argentina e Equador. Então, é um impacto muito forte, é um estresse adicional sobre o tecido social.
Eu falaria agora das singularidades da nossa presença, da singularidade da presença brasileira. O Brasil é o único ator global - é preciso que seja dito com toda clareza -, é o único ator global para o qual todas as portas estão abertas no Líbano, de todos os partidos políticos e de todas as confissões. Nós somos recebidos aqui como irmãos por todo o espectro político. Isso é singular, quer dizer, o Brasil tem esse ativo diplomático que foi construído nesses sessenta e tantos anos da nossa embaixada aqui; é um valor extraordinário.
Eu lembro que, quando entreguei minhas credenciais ao Chanceler, ele me disse: "Nós somos uma família. O Brasil e o Líbano, somos uma família". Num momento protocolar, muito solene, em que os discursos são mais formais, eu ouvi esse tipo de mensagem. Então, essa abertura nos permite transitar, nos permite conversar, nos permite ter acesso a todos os níveis: agentes econômicos, acadêmicos, agentes políticos; enfim, é ilimitado o nosso acesso - é ilimitado. Nós temos um salvo-conduto, digamos, um passaporte com todas as possibilidades. E, dada a nossa estrutura, enfim, a nossa cultura própria, nós contamos com a confiança desses atores; dada a nossa história, a história da nossa presença aqui.
Então, na minha visão - e são as orientações que recebo do Itamaraty -, podemos e devemos, progressivamente - como gostam de dizer os japoneses, step by step, tudo por etapas, muito calibrado -, incrementar a nossa colaboração, a nossa presença aqui. Há uma demanda por mais Brasil no Líbano, e isso é irrefutável.
E a nossa presença também é singular porque, no Oriente Médio, a nossa presença em todos os demais países é diferente. Então, a presença brasileira no Líbano, no contexto do Oriente Médio, dado o elemento humano que vertebra a nossa relação, é também singular se comparada à nossa presença em todos os demais países da região.
As relações econômicas e comerciais - não vou cansar vocês com dados - estão muito aquém do nível de ambição que nós temos. Para isso temos o Acordo Mercosul-Líbano, que está em estágio final de negociação. Nós queremos crer que vamos poder fechar esse acordo e temos, evidentemente, a expectativa de que os Congressos possam validar esse acordo. Para além da redução de tarifas, para além da liberalização de comércio, ele é um sinal, ele é um indicador para os agentes econômicos, ele é um indutor de comércio. E comércio é emprego, como nós sabemos; para além de cifras na balança comercial, comércio é emprego, e é disso que se trata aqui. Portanto, é importante.
Há o papel muito ativo da nossa câmara de comércio em São Paulo, que eu queria assinalar aqui - não sei se já extrapolei meu tempo -, e dos atores não governamentais. Nós estamos aqui acompanhando uma ação muito robusta de atores não governamentais, não só de São Paulo, mas do Brasil inteiro, enviando todo tipo de medicamentos que são de primeira necessidade para o Líbano.
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E, afinal, de suma importância aqui é a nossa presença consular. Temos uma comunidade estimada, no Líbano, de cerca de 20 mil brasileiros e, acredito, cidadãos com dupla nacionalidade. A comunidade está sobretudo na região do Beqaa, mas não apenas; ela está disseminada. Para que tenham ideia, foram contabilizados ano passado, um ano de covid, 5,5 mil documentos e serviços prestados pelo setor consular.
Por fim, na dimensão cultural, temos um centro cultural que tem dez anos de existência e já tem um acervo extraordinário de trabalhos. Com ele faremos uma exposição em homenagem ao Imperador Pedro II no ano que vem.
Muito obrigado pelo tempo que foi dado e pelo momento em que esta audiência está ocorrendo. Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Sr. Embaixador, por suas palavras e por sua participação.
Eu registro a presença do Embaixador Sidney Leon Romeiro, que é Diretor do Departamento do Oriente Médio do Itamaraty.
Concedo a palavra ao Sr. Guga Chacra, jornalista e comentarista de política internacional.
Guga Chacra, nascido em São Paulo, é neto de imigrantes libaneses. Formado em jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero, fez Mestrado em Relações Internacionais na Universidade de Columbia, em Nova York.
Chacra atuou como correspondente internacional para os veículos Folha de S.Paulo e, atualmente, para O Estado de S. Paulo e GloboNews. Especializado em Oriente Médio, cobriu eventos importantes, como a Guerra do Líbano, entre julho e agosto de 2006; os conflitos na Faixa de Gaza, entre dezembro de 2008 e janeiro de 2009; e a expansão do grupo terrorista islâmico Al-Qaeda no Iêmen, em dezembro de 2009.
Guga, ou Gustavo, é autor do livro Confinado no Front, Notas sobre a nova geopolítica mundial, lançado em 2020.
Eu gostaria também de agradecer à Rede Globo de Televisão por ter autorizado, ter permitido que essa estrela do seu jornalismo pudesse participar desta audiência.
Guga Chacra, por 15 minutos por favor, com a palavra.
O SR. GUGA CHACRA (Para expor. Por videoconferência.) - Senadora, muito obrigado pelo convite para vir aqui, na presença do Embaixador Hermano, do Embaixador Ruy Pereira, da Encarregada de Negócios do Líbano, a Carla Jazzar, e do meu amigo Hussein Kalout.
Só uma coisa: eu sou de O Globo agora, não sou mais do Estadão. Fui correspondente da Folha e do Estadão, mas sou de O Globo, da GloboNews, da TV Globo e da Rádio CBN, em Nova York.
Vou colocar aqui a contagem regressiva, Senadora, para não estourar o tempo.
Bem, vamos lá.
Também ressalto a presença do Senador Nelsinho Trad, que eu tive a oportunidade de conhecer pessoalmente na Assembleia Geral da ONU em 2019, aqui em Nova York, e do Senador Esperidião Amin, que eu gostaria muito de conhecer pessoalmente porque acompanho o trabalho dele há décadas.
Bem, vamos em frente.
O Líbano sempre teve esses problemas, problemas sectários, está numa região onde há conflitos, passou por uma guerra civil de 15 anos. Qual é a diferença do Líbano de agora para o Líbano de poucos anos atrás, quando o Senador Esperidião Amin esteve lá, inclusive, em 2018, mas mesmo aquele Líbano de 2003, 2004, da reconstrução de Beirute?
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Mesmo depois da guerra entre Israel e Hezbollah em 2006, em que houve também uma reconstrução, a gente viu descendentes de libaneses do Brasil indo para Beirute, ficando encantados, indo jantar no Em Sherif, no Abdel Wahab, naqueles restaurantes; ficando deslumbrados com Biblos, com Zahlé, com os montes do Líbano, com o Vale do Kadisha, aquela coisa; voltado e falando: "Nossa, como Líbano é mágico!". O que mudou? O Líbano teve um colapso econômico similar ao que a Argentina teve, depois de anos de câmbio fixo da moeda atrelada ao dólar, 1,5 mil libras valendo US$1, assim como a Argentina teve aquele câmbio fixo dos anos 90, dos anos Menem, com Domingo Cavallo. Uma hora entrou em colapso na Argentina - o Brasil também, mas no Brasil era banda cambial -, a moeda Argentina se desvalorizou de forma abrupta e acentuada, o país ficou ingovernável por um período, voltou a inflação. A mesma coisa acontece no Líbano.
Qual a diferença? Aí, sim, entra ter todo esse sistema sectário, estar numa região em conflito e o principal produto de exportação... A Argentina exporta trigo, a Argentina exporta carne, a Argentina exporta soja, a Argentina é um dos países mais ricos, se assim se pensar, em terra, como o Brasil, mesmo quando o Brasil tem uma banda cambial. A moeda desvaloriza, seu produto fica mais barato para exportar. Você consegue levar dinheiro para a Argentina, você consegue levar dinheiro para o Brasil. O Líbano, não; é um país que importa 80% da comida. E o principal produto de exportação do Líbano é o libanês, quer dizer, o libanês que vai embora, libanês da diáspora, que manda dinheiro de volta para o Líbano. Mas isso é muito triste, porque o Líbano perde os grandes talentos.
É claro que naquela primeira imigração, no final do século XIX, do século XX, eram pessoas de classe média ou pessoas mais humildes que imigravam, como meus avós, como os pais do Senador Esperidião Amin, quer dizer, havia aquele grande fluxo imigratório de libaneses não só para o Brasil, mas para o Canadá - eu tenho parentes em Montreal -, para os Estados Unidos - eu tenho parentes em New Hampshire -, para a Austrália, para a Argentina, para o Chile, para a Colômbia. Nos livros do García Márquez - en el día en que Santiago Nasar murió -, em Crônica de uma Morte Anunciada, Santiago Nasar, sempre mencionando ali que também há uma presença libanesa. Quer dizer, você teve todo aquele fluxo imigratório. E houve o fluxo imigratório durante a guerra civil também.
Só que agora é mais grave. Por quê? Porque muitos libaneses com talento... Aquele libanês que se forma na American University of Beirut - na Universidade Americana de Beirute -, na Lebanese American University, na Université Saint-Joseph vai embora; aquele médico libanês que fez a AUB vai embora, vem para os Estados Unidos ou vai para o Golfo - o Golfo hoje é muito rico; não era assim nos anos 80 e 90, mas agora ele atrai -, vai trabalhar em Dubai, vai trabalhar em Doha, vai trabalhar em Abu Dhabi, vai trabalhar em Riade, vai trabalhar em Manama. Eles vão embora. Você está perdendo esse talento, está acabando aquele Líbano. São pessoas que dificilmente vão voltar. Podem até voltar para passear, como muitos da diáspora libanesa no Brasil, mas vão indo embora, o Líbano vai se empobrecendo dos grandes talentos. E isso é um processo quase irreversível. Sempre é bom para um país receber imigrantes. Basta ver o Brasil: São Paulo, que é o Estado mais rico. São Paulo foi o Estado que mais recebeu imigrantes do Líbano, sírio-libaneses, italianos, japoneses, alemães, judeus; eles foram muito para São Paulo. Você vê os Estados Unidos, o país dos imigrantes. Estou eu e o Hussein aqui, somos imigrantes nos Estados Unidos. Somos brasileiros e libaneses, mas acabamos onde? Nos Estados Unidos. Então, há esse fluxo, essa perda. Essa perda é quase que irreversível para o Líbano.
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E, ainda ficando ali na região, é muito triste ver o que acontece. A gente sempre fala - o Hussein falou - em mundo árabe e tudo, mas o Líbano, a Síria, a Palestina - os palestinos - e o Egito são mediterrâneos também. O Líbano é uma nação levantina, aquela nação da mistura religiosa, multissectária: com os cristãos maronitas; cristãos greco-ortodoxos; cristãos melquitas, que são os greco-católicos; os apostólicos armênios, que alguns chamam de ortodoxos armênios; os católicos armênios; os muçulmanos sunitas; os muçulmanos xiitas; os drusos; até um pouquinho de alauitas. Ali em Trípoli havia muitos judeus no Líbano também. Infelizmente não existe mais essa comunidade judaica muito importante para o Líbano, mas ainda é essa nação levantina, que tinha essa coisa do mundo mediterrâneo.
O Líbano estava com os olhos, sempre teve os olhos muito voltados para o Mediterrâneo. Isso por séculos. Hoje, não. Esse Mediterrâneo Oriental, o Levante decaiu a um ponto... Eu sempre fiquei... Eu cresci ali, eu era pequenininho, eu me lembro da guerra civil, quando mataram Bashir Gemayel, o Líbano estava naquele pior momento, e uma das minhas primeiras memórias era meu pai falando: "Acabou o Líbano!". Ele triste, porque é a terra dos meus avós. Mas o Líbano saiu da guerra civil, se reconstruiu e tudo. E daí começou sempre a ficar aquele sonho: "o Líbano vai melhorar, o Líbano vai melhorar".
Eu ia muito para a Síria. Eu também tinha uma expectativa: "a Síria vai melhorar". Ali eu fui em 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011. Em 2011, quando começou a guerra, meus pais, meu irmão, minha tia, meus primos estavam todos em Damasco, passeando. Damasco foi escolhida a Cidade do Ano pelo The New York Times em 2010. Eu tinha aquela esperança de que haveria um acordo de paz entre Israel e Palestina e que haveria um Estado palestino vivendo em paz e segurança ao lado de Israel. Com a Praça Tahrir, lá no Egito, tive esperança de que o Egito ficasse democrático. Hoje eu sou um completo desiludido, eu não vejo futuro nenhum. É o pior momento que eu vejo do Líbano desde que eu nasci. As pessoas falam que é pior que o momento da guerra civil, em que em alguns momentos parava tudo, tinha aquela economia de guerra e sempre a perspectiva de que poderia, em algum momento, chegar à paz.
Agora em agosto eu tinha férias, eu queria levar meus filhos para conhecer... São pequenininhos, mas eu queria levá-los para o Líbano, mas não dá. Acabei na Itália. Minha mulher é libanesa-italiana que nem eu, metade libanesa, metade italiana. A gente acabou levando nossos filhos para a Itália. É uma pena, porque em vez de eu ter ido ali para a região de Napoli, Positano, Ischia, eu podia ter ido para Beirute e Biblos. Aliás, Beirute parece muito Napoli, mas é mais cosmopolita, até mais sofisticada do que Napoli, de uma certa forma. As praias libanesas não deixam nada a desejar, mas não dá para ir nessa situação caótica em que está o Líbano - dá para ir como jornalista -, nessa decadência libanesa que não havia três anos atrás.
A gente viu a explosão de um porto em Beirute, a maior explosão não nuclear da história da humanidade, por incompetência das autoridades libanesas. Explodiu o porto, destruindo toda uma região ali boêmia, de Mar Mikhael, que é o antigo bairro armênio de Beirute; Saifi Village, que era uma área que foi reconstruída na guerra civil; parte do centro de Beirute, pegando até Achrafieh, que é um bairro sofisticado cristão. Quer dizer, aquela explosão no porto, a falta de coleta de lixo, a falta de eletricidade.
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Isso tudo ficou na ficção, ficou nos anos 50, ficou nos anos 60, no começo dos anos 70. Aquele Líbano acabou e dificilmente vai se reconstruir. Acho que essa crise até, em algum momento, passa, mas aquele Líbano não retorna mais, nem aquela Síria, a esperança de ter uma Síria que possa ser democrática, uma Síria vibrante. Não. Também acabou aquela Síria! O sonho de ter um Estado Palestino... Não vai ter! No curto e no médio prazo... Talvez no longo prazo, mudando gerações completamente. Acabou o sonho palestino de ter um Estado nesse momento ou nos próximos anos. Todo mundo sabe disso. Podem falar: "Ah, o Biden falou na ONU sobre solução de dois Estados". Não vai ter! O Egito ficar democrático... A ditadura do Sisi é pior do que a ditadura do Mubarak.
E o que as pessoas podem fazer para ajudar o Líbano? Como eu falei há pouco - deixe-me ver aqui o tempo -, o que o Líbano tem para exportar sempre foi a diáspora. O Líbano tem que buscar ajuda na diáspora. Não é todo país que tem esse capital humano no exterior, essa vantagem. Quer dizer, quando eu estou ali na GloboNews, no ar, às vezes estou eu, a Andréia Sadi, que também é de origem libanesa; a Julia Duailibi, que é de origem libanesa; o Gerson Camarotti, que tem origem libanesa; a Aline Midlej, que apresenta o Jornal das Dez e tem origem libanesa.
Quando a gente vê um hospital como o Sírio-Libanês, em São Paulo, do qual meu pai é médico... Lá a gente tem todos aqueles médicos de origem sírio-libanesa. A quantidade de políticos de origem sírio-libanesa: o Senador Esperidião Amin; o Senador Nelsinho Trad, que foi citado aí; o Senador Tasso Jereissati. O que São Paulo teve de Prefeito de origem libanesa o Salim Curiati, o Paulo Maluf, o Gilberto Kassab, o Fernando Haddad. Recentemente quase teve o próprio Guilherme Boulos, que também tem origem libanesa. E são de diferentes correntes políticas, isso é interessante, do Líbano, dos descendentes libaneses no Brasil: tem de direita, tem de esquerda, tem de centro; estão em todas as correntes.
Você vê o ex-Presidente Michel Temer também de origem libanesa. A quantidade de advogados, de empresários! Tinha um no Governo do Presidente Jair Bolsonaro, Salim Mattar, também de origem libanesa. Então, você tem essa ajuda toda. E a diáspora precisa... E se mobiliza bastante. Tem o Miled, que acho que está com a gente nesse painel também; a Siham Harati, que ajuda bastante lá no Líbano, lá no Vale do Bekaa. Você também tem a Logibras. Enfim, você tem bastante gente que quer ajudar e tentando se organizar bastante. Acho que essa é a forma que o Brasil pode contribuir mais e que o Líbano pode ter mais ajuda à diáspora libanesa, que é uma coisa bonita. Talvez, junto com a diáspora judaica e a diáspora armênia, seja a diáspora mais bem-sucedida de todo o mundo. Quer dizer, faz sucesso em todos os lugares, seja na África, em países como Serra Leoa, Libéria e Nigéria; seja aqui nos Estados Unidos; seja no Canadá; seja no México, Carlos Slim, por exemplo; seja na Austrália; seja na França; Brasil, enfim, é a forma que o Líbano tem. Já que o principal produto de exportação é o libanês, tem que se aproveitar dessa diáspora, especialmente a que está no Golfo, nesse momento, porque há muitos jovens também que vão para o Golfo.
E o Líbano deve pensar... É um país pequeno, não tem jeito, sempre vai ser pequeno, sempre estará numa região conturbada, tem que resolver algumas questões.
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A federalização é uma alternativa que pode ajudar. Tem que reformar esse sistema sectário, mas tomando cuidado, talvez fazendo um Senado que mantenha a divisão sectária. Mas claro que há o medo de que um dos grupos sectários possa dominar, por exemplo, a Presidência e o cargo de Primeiro-Ministro. E também há a questão dos cristãos, no caso cristão maronita ter o cargo de Presidente. Isso tudo dá uma certa segurança. É a maior nação cristã, proporcionalmente, de todo o Oriente Médio. Há mais cristãos no Egito do que no Líbano, mas no Líbano eles são um número expressivo, talvez 40% da população. Se levar em conta a diáspora, é ainda mais do que isso. É importante que essa questão seja preservada.
E voltar a atrair turista, voltar a ser essa nação mediterrânea; porque são fantásticos, ali, os montes do Líbano, com aquele Vale do Kadisha, que eu citei, indo para o Norte do Líbano também, além de Biblos, Batroun, Trípoli - que até tem obra do Oscar Niemeyer. Para o Sul, a terra do Hussein, ali para Tiro, para aquela região; Sídon, mesmo ali próximo à fronteira com Israel, ou todo aquele Vale do Bekaa, as vinícolas; Zahle; minha cidade, que é West Bekaa - minha vila, na verdade, é Rashaya -; Baalbek, que talvez sejam as ruínas romanas mais bonitas do mundo.
E só para concluir, espero também que haja paz em toda aquela região, porque eu sempre falo que eu gostaria um dia de poder ir de Tel Aviv, de carro, passar por Haifa, entrar no Líbano, Tiro, Sídon, chegar para Beirute, subir os montes do Líbano, cair no Bekaa, ante o Líbano, chegar a Baalbek, chegar a Damasco e visitar Alepo, voltar para Damasco, cruzar ali para a Jordânia, aí entrar num Estado palestino, quem sabe; ir para Nablus, Jerusalém; depois visitar Jerusalém, Israel, e, enfim, aquela região, porque eu acho que é muito melhor até, inclusive, teria muito mais potencial do que a Europa. Assim eu poderia levar meus filhos para fazer essa viagem, como meu pai fez comigo, em 1997, fazendo Líbano, Síria, Jordânia, Israel, territórios palestinos e Egito, eu quero fazer um dia com os meus filhos.
Faltam dez segundos. Então, Senadora, eu encerro por aqui. Muito obrigado, mais uma vez. Uma honra ter participado com vocês desse evento.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Muito obrigada, Guga, brilhante como sempre, um orgulho do jornalismo brasileiro.
Por último, passo a palavra para o nosso Exmo. Sr. Embaixador Ruy Pereira, Diretor da ABC (Agência Brasileira de Cooperação), representando o Itamaraty, e passando a palavra posteriormente aos nossos Senadores.
O Embaixador Ruy Pereira é o Diretor da agência ABC desde 2018. Anteriormente, serviu como Embaixador do Brasil em Caracas. Foi delegado permanente junto à Associação Latino-Americana de Integração e ao Mercosul, em 2012 e 2013. Pereira ainda serviu em sua carreira diplomática em Montevidéu e em Buenos Aires, entre outras funções que desempenhou no exterior. Em Brasília, foi Assessor Especial do Ministro da Indústria, do Comércio e do Turismo. É membro titular do Grupo de Trabalho Interministerial sobre Cooperação Humanitária Internacional, como representante do Ministério das Relações Exteriores.
V. Exa. tem a palavra por 15 minutos.
O SR. RUY CARLOS PEREIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Sra. Senadora Kátia Abreu, Presidente desta Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.
Eu queria saudar também os Senadores Esperidião Amin e Nelsinho Trad, que foram requerentes desta audiência, assim entendo. Gostaria também de saudar meus colegas, o Embaixador Hermano Telles Ribeiro, Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário do Brasil junto à República do Líbano, em Beirute; a Encarregada de Negócios do Líbano em Brasília, Embaixadora Carla Jazzar; as Embaixadoras Cláudia Buzzi e Eliana Zugaib, também o Embaixador Sidney Romeiro, aqui da Secretaria de Estado das Relações Exteriores, que nos acompanham; representantes de missões diplomáticas estrangeiras acreditadas junto ao Governo brasileiro; colegas que estão participando deste painel, Hussein Kalout e Guga Chacra, que eu não tinha mencionado até agora.
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Queria dizer, Sra. Senadora, que me traz muito boas recordações voltar a esta Comissão, perante a qual estive já em duas oportunidades submetendo-me ao crivo dos Sras. e Srs. Senadores quando da minha indicação para a ocupação de missões ou postos em missões diplomáticas do Brasil no exterior, em 2006 e em 2013. Guardo muito boas recordações inclusive de diálogos que espero teremos de novo com o Senador Esperidião Amin nessas duas oportunidades que mencionei.
Gostaria de dizer à Sra. Senadora que é um privilégio estar nesta Comissão, não só pelas lições que recebemos de todos os que me precederam na palavra, com tantas visões diversas, porém, todas convergentes sobre a situação atual do Líbano, mas sobretudo, como foi dito pelo Embaixador Hermano Telles Ribeiro, pelo caráter singular das relações que marcam o Brasil e o Líbano, dada, como lembrou muito bem o Guga Chacra, a presença absolutamente destacada no cenário social, econômico, político e institucional brasileiro da diáspora libanesa radicada no Brasil. Acho que essa - e concordo inteiramente com o Guga - é talvez a característica mais visível, digamos, das especificidades e singularidades da relação bilateral entre o Brasil e o Líbano.
Eu gostaria de dizer, Sra. Senadora, que esse evento de hoje pela manhã culmina com uma semana libanesa que tivemos aqui na Agência Brasileira de Cooperação. Eu recordo que, no início da semana, e a nossa querida Embaixadora Jazzar se recordará também, no início desta semana, tivemos uma videoconferência muito importante e longa, de quase três horas, com representantes e líderes da comunidade libanesa radicada no Brasil, exatamente sobre o tema que hoje nos ocupa, ou seja, o que fazer, como fazer para poder expandir o grau de auxílio e de cooperação entre o Brasil e o Líbano.
Depois tive a honra de receber, ontem, aqui na Agência Brasileira de Cooperação, a Sra. Embaixadora Carla Jazzar, para dar continuidade a alguns dos temas que tratamos nessa videoconferência, e hoje tenho o privilégio e a honra de, atendendo ao seu convite, Sra. Senadora Kátia Abreu, poder participar desta importante audiência pública. Portanto, temos aí, sem dúvida, uma semana libanesa na Agência Brasileira de Cooperação.
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Eu gostaria de pedir apoio técnico ao pessoal, à Secretaria, que nos acompanha hoje, porque eu tenho uma pequena apresentação em PowerPoint, a exemplo do que fez a Sra. Encarregada de Negócios do Líbano, para guiar um pouco as minhas palavras.
Podemos passar, então, aí está, à cooperação Brasil-Líbano 2020-2021.
Podemos seguir para a próxima lâmina. Eu gostaria de dizer que esta é a lâmina que temos relativamente a cooperação técnica, porque todas as demais que virão depois são relacionadas à cooperação humanitária. A Agência Brasileira de Cooperação é o órgão coordenador do sistema brasileiro de cooperação internacional, tanto recebido quanto oferecido pelo Brasil, e nós temos duas pernas, uma que se ocupa de cooperação técnica e outra que se ocupa de cooperação humanitária.
Em cooperação técnica para o desenvolvimento, eu gostaria de destacar que ontem mesmo à tarde tive o privilégio de assinar, com a Embaixadora Jazzar, um projeto de cooperação técnica do Brasil com o Líbano, a ser implementado ao longo de três anos, portanto, de 2021 a 2024, em parceria com a Universidade Americana de Beirute, que foi aqui mencionada pelo Guga, e produtores rurais libaneses, sobretudo pequenos e médios produtores rurais libaneses, no valor total de pouco mais de US$1 milhão, que tem por objetivo instalar e instaurar no Líbano um sistema certificado de produção orgânica de alimentos, por um lado, e, pelo outro, a estruturação de canais de venda desses produtos orgânicos para o consumo geral, varejistas, lojas especializadas, feiras livres, hotéis e restaurantes. A referência é o sistema que temos no Brasil, cujo símbolo de certificação de qualidade está aí na nossa lâmina, e esse projeto tem o propósito de trazer uma contribuição para aquilo que foi aqui mencionado várias vezes, que foi a desestruturação do componente das cadeias...
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Embaixador...
O SR. RUY CARLOS PEREIRA - Sim?
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Embaixador, por gentileza, as telas não estão passando. Está congelada desde a primeira.
O SR. RUY CARLOS PEREIRA - É que estou ainda na primeira, Senadora. Já vou passar adiante. Eu ainda estou...
A senhora me ouve, Senadora?
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Perfeitamente. A minha assessoria que veio me chamar a atenção de que talvez o senhor não estivesse vendo que as telas não estavam passando. Desculpe-me.
O SR. RUY CARLOS PEREIRA - Então é porque talvez... Só um minutinho que eu verifico isso aqui, por favor.
É porque está na primeira de todas. Essa tela não entrou ainda. É essa que está ali, essa é a única que está.
Entrou agora, Senadora?
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Agora sim, Embaixador. A primeira, do produto orgânico.
O SR. RUY CARLOS PEREIRA - Exatamente. Perfeito. Então, eu não vou repetir o que já disse, com sua licença, Sra. Senadora, para não ocupar muito tempo.
Basicamente, como disse, esse é um projeto de cooperação técnica que assinei ontem com a Embaixadora Jazzar, cuja implementação deveremos iniciar com a Universidade Americana de Beirute já no mês que vem. Há um custo de US$1 milhão da parte brasileira, que está sendo 100% financiado pelo Brasil. O objetivo é contribuir para recuperar, reconstruir a capacidade de produção local de alimentos, no caso orgânicos, no Líbano, que, como o Guga Chacra mencionou, foi muito prejudicada pela explosão no porto de Beirute. O Líbano importa 83% do que usa em termos de alimentação, e essa será uma contribuição de cooperação técnica do Brasil.
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Agora passamos, sim, adiante. Vamos à próxima tela, por favor. A próxima. Aí estamos.
Aqui começamos, então, já, Senadora, o bloco de apresentação relativo à cooperação humanitária. Estamos focando uma primeira doação brasileira no ano passado, voltada para o enfrentamento nacional, no Líbano, da covid-19. Foram 129 milhões; perdão, 129 mil - pudesse eu ter US$129 milhões! Desculpem-me - ao Ministério da Saúde Pública do Líbano para aquisição de equipamentos de proteção individual, testes contra a covid e concentradores de oxigênio. A foto mostra o Embaixador Hermano Telles Ribeiro com o então Ministro de Saúde Pública do Líbano recebendo a doação.
Por favor, a próxima.
Aqui começamos o bloco relativo ao porto de Beirute. A foto é do Presidente Temer junto com o Presidente da República dentro do avião KC-390 da Força Aérea Brasileira, que conduziu ao Líbano, justamente em agosto do ano passado, a missão.
Aqui a Senadora Kátia Abreu se referiu à missão especial humanitária multidisciplinar brasileira, que partiu para o Líbano logo depois da explosão no porto de Beirute. Foram transportadas 4,4 toneladas de doações caracterizadas por mala diplomática brasileira para facilitar a tramitação em fronteira, e foram doações do Ministério da Saúde - ventiladores pulmonares, medicamentos, insumos médico-hospitalares - no valor de US$14,8 milhões e também da comunidade de origem libanesa, que arrecada no Brasil alimentos e medicamentos angariados em campanhas públicas feitas pela comunidade.
Eu gostaria, com a sua permissão, Sra. Senadora, de destacar aqui o papel da Câmara de Comercio Brasil-Líbano, de São Paulo, que já foi antes mencionada, e também do Senador Alfredo Cotait, que nos ajudou muito na organização dessa remessa.
Vamos à próxima, por favor.
Aqui temos outro aporte brasileiro para tratamento da questão relativa à explosão do porto de Beirute. Nós fizemos três reuniões extraordinárias do Grupo de Trabalho Interministerial sobre Cooperação Humanitária Internacional do Brasil, que coordenamos aqui na ABC, e onde estão representados 17 dos 23 ministérios do Governo Federal, dedicadas essas reuniões exclusivamente à definição do conteúdo da assistência humanitária brasileira ao Líbano já no ano passado e no início deste ano também. Fizemos o aporte desses mapas utilizando fotografias satelitais do porto de Beirute. Temos um exemplo à direita. São mapas produzidos a partir de imagens de satélite fornecidas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações e processados pelo Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres do Ministério do Desenvolvimento Regional, que são extremamente úteis porque oferecem uma visão de grande angular, digamos assim, do local de desastre para as equipes que atuam na área de desastre, inclusive no que diz respeito ao planejamento das suas ações e das atividades pós-desastre.
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Também enviamos 1,4 toneladas de doações do Ministério da Saúde, de novo, da comunidade de origem libanesa radicada no Brasil, que transportamos para Beirute com custo pago pela ABC, com o apoio do Ministério das Relações Exteriores, por mala diplomática.
Seguindo adiante.
Aqui temos uma outra contribuição muito relevante do Brasil nesse quadro de dificuldades, de insegurança alimentar e nutricional do Líbano, que é uma doação de quatro mil toneladas de arroz no valor de US$2,2 milhões de dólares, arroz esse dos estoques públicos brasileiros da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. O arroz é fornecido por produtores gaúchos e paranaenses. Ele já começa a ser ensacado neste momento, porque a primeira remessa deverá partir do Porto do Rio Grande para o Porto de Beirute em 30 de outubro, sendo que as quatro mil toneladas deverão estar embarcadas todas até o final do mês de dezembro. Consideramos que esse é um aporte muito relevante para minorar justamente as consequências devastadoras da desorganização econômica, sobretudo da estrutura ou do sistema de distribuição de alimentos no Líbano.
Além disso, a ABC propriamente dita doou recentemente US$200 mil para a aquisição, em parceria com o Programa Mundial de Alimentos, de ventiladores pulmonares e de purificadores de água, com painéis solares e kits voltaicos, o que faz com que, neste momento, seja de extrema utilidade no Líbano, que, como vimos aqui pela apresentação da Embaixada Jazzar, não tem continuidade no fornecimento de energia elétrica. O fato de esses purificadores de água funcionarem a energia solar, independentemente da rede elétrica, dá aos equipamentos uma capacidade de funcionamento que não teriam se dependessem do abastecimento de energia elétrica externa.
Seguindo - por favor, a próxima -, temos uma rápida apresentação da missão especial do Presidente Michel Temer, no ano passado, ao Líbano.
Seguindo adiante, eu vou mencionar, dado que o tempo se esgota, três projetos que nós estaremos então tratando de implementar a partir de outubro, porque assinamos os projetos, felizmente, dentro de mais 40 ou 60 dias, no máximo, que são justamente três projetos de cooperação humanitária pós-desastre que foram identificados pelos especialistas que mandamos para Beirute no ano passado com a missão do Presidente Temer e que tratam, como se pode ver aí, de prevenção de incêndios e gestão de risco de desastres, com a Defesa Civil libanesa e a Universidade Americana de Beirute e, do lado brasileiro, o Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos de Desastres, do Ministério do Desenvolvimento Regional. Temos um segundo projeto na área de traumatologia e ortopedia, entre a faculdade de Medicina da Universidade Americana de Beirute e o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), do Ministério da Saúde; e gestão de resíduos tóxicos em emergências e desastres, entre o Ministério do Meio Ambiente e Desenvolvimento Administrativo e a Unidade de Meio Ambiente e Desenvolvendo Sustentável da Universidade Americana de Beirute e o Ministério do Meio Ambiente.
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E estamos embarcando - é a próxima, e com isso termino, Sra. Senadora -, no dia 1º de outubro, em parceria com o Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos, dois kits adicionais de medicamentos e insumos de emergência e saúde para atender a até 1,5 mil pessoas por mês, doados pelo Ministério da Saúde.
Esse é o panorama, Sra. Senadora, da cooperação técnica e cooperação humanitária que o Brasil vem fazendo ao Líbano desde o início do ano passado, praticamente, quando surgiu, inclusive, a Covid-19 - não tínhamos tido ainda a explosão no porto de Beirute -, e esse conjunto de atividades que já fazemos até agora tem custo para o Governo brasileiro estimado em cerca de US$19 milhões, que aparecem aí espalhados nessas diversas iniciativas.
Eu agradeço muito a oportunidade de oferecer essas informações a todos que nos acompanham, Sra. Senadora Kátia Abreu.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Embaixador.
O SR. RUY CARLOS PEREIRA - Agradeço muito pelo privilégio de poder vir aqui para mostrar um pouco do que o Governo brasileiro e o que o Brasil está fazendo já para o Líbano.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Muito obrigada, Embaixador.
Muito obrigada por sua apresentação.
Como de costume, em todas as nossas audiências na quinta-feira, nós temos sempre um pequeno café da manhã aqui oferecido aos participantes, sempre patrocinado por esta Presidente, mas, hoje, especialmente...
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - Hoje, customizado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - É. Hoje, especialmente, a Embaixadora Carla é que está oferecendo esse patrocínio com produtos libaneses que nós todos brasileiros adoramos.
Muito obrigada, Embaixadora, pela delicadeza.
Nós temos 120 pessoas online nos acompanhando no e-Cidadania.
Eu agradeço a todos pela companhia, importantíssima, aqui, neste momento, no nosso site, e eu gostaria de passar a palavra aos nossos Senadores.
Gostaria muito que cada um que se interessar em fazer perguntas diretas aos nossos participantes Hussein Kalout, ou Guga Chacra, ou os nossos Embaixadores que estão aqui presentes, que possam fazê-las nominalmente, para que depois eu possa passar a palavra.
E, se puderem também, para dar bastante objetividade à nossa audiência, sugestões concretas do que nós podemos fazer, além do que já está sendo feito por esta cooperação, por esse país irmão que está passando por tantas dificuldades.
Então, isso seria de grande valia, a experiência de todos, dois que foram ex-Governadores; Chico Rodrigues, um Parlamentar de muitos mandatos. Tenho certeza de que poderão contribuir.
Eu passo a palavra para o primeiro Senador participante e que está em EAD, a distância.
Nelsinho Trad, com a palavra, um dos solicitantes desta audiência pública.
O SR. NELSINHO TRAD (PSD - MS. Para discursar. Por videoconferência.) - Sra. Presidente da Comissão de Relações Exteriores, Senadora Kátia Abreu, na pessoa de V. Exa., gostaria de cumprimentar todos que participam desta manhã de trabalho.
Desde a explosão ocorrida em Beirute, em 4 de agosto de 2020, o Líbano tem visto se agravar uma situação que mesmo antes não estava confortável nem para os seus seis milhões de cidadãos lá residentes, nem para os libaneses exilados e nem para nós que participamos da comunidade de afeição para com aquele país.
Para os que não se recordam, no Brasil existem mais de dez milhões de descendentes libaneses. Há mais libaneses no Brasil do que no próprio território do Líbano. Por isso, chamamos o Itamaraty, as nossas autoridades com influência no campo internacional para que dentro dos princípios constitucionais brasileiros auxiliem nossos irmãos libaneses a enfrentar uma crise que ameaça ser pior do que aquela decorrente da guerra civil que assolou o Líbano na década de 70, indo até 1990.
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Há pouco mais de um ano, participei de uma missão chefiada pelo ex-Presidente Temer, humanitária que foi, que se dirigiu àquele país para manifestar nossa solidariedade e, na qualidade de Presidente desta Comissão de Relações Exteriores, tomei as iniciativas possíveis dentro da institucionalidade.
Ocorre, senhoras e senhores, que a situação se agrava ao ponto de a agência de notícias Reuters usar uma violenta expressão para representar o que está acontecendo lá no Líbano: derretimento econômico. Ainda segundo a Reuters, em dois anos, cerca de 78% da população libanesa foi reduzida à pobreza. Conforme dados do Programa Mundial de Alimentos, o preço da comida aumentou quase 600%, desde outubro de 2019, e houve uma contração da economia em 30%, desde 2017, o que configura uma das maiores depressões econômicas dos tempos modernos.
Num círculo vicioso, a moeda local teve uma desvalorização superior a 90%, o que destruiu o poder de compra de um país que é tão dependente de importações. Com o sistema bancário estagnado, não é permitido aos libaneses com poupança em moeda estrangeira lançarem mão dos seus recursos. Eles são forçados pelo sistema bancário a sacarem o dinheiro na moeda local, o que corrói em 80% o valor dos depósitos.
A desvalorização da moeda enfraquece outros campos como o da segurança institucional. Tendo o soldo, o salário reduzido a proporções ínfimas, os militares deixam de cumprir com suas obrigações. Em consequência, quanto menor a presença do Estado, mais cresce a possibilidade de milicianos se arvorarem como donos de territórios ou de setores de abastecimento e fornecimento de bens e serviços.
No que diz respeito aos combustíveis, a escassez é tão grande que está a prejudicar os serviços essenciais, incluindo os de atendimento médico, a movimentação de ambulâncias e outras formas de socorro. Num país com adversidades que se estendem para além da dimensão econômica, perpassando os grupos étnicos, as confissões religiosas e as respectivas alianças políticas e militares, há fatores que agravam a crise ainda mais. Nos postos de combustíveis, clientes chegam a disputar com armas o abastecimento. Em outras frentes, caminhões com combustível são sequestrados e defendidos com forte aparato de guerra por grupos político-militares.
No campo externo, constata-se o quão insustentável é a dívida pública do Líbano, uma das maiores do mundo, correspondente a R$370 bilhões, ou seja, 150% do PIB daquele país. Ao deixar de pagar 31 bilhões em euro-obrigações, o Líbano tem o fornecimento de bens suspenso e pedido de novos créditos negados.
Para nós do Senado, não está sendo fácil monitorar em tempo real a ajuda humanitária que o Brasil está enviando ao Líbano, razão pela qual, neste pronunciamento, faço também um apelo ao Itamaraty para que nos esclareça a respeito deste assunto e que, com a sua grande capacidade técnica de interlocução, elabore uma espécie de observatório de ajuda humanitária ao Líbano, incluindo a coleta de informações de grupos e associações não governamentais.
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Sabemos da responsabilidade dos atores libaneses e a percepção externa é a de que há muito a ser feito em um país que sofre com a corrupção em um nível que o situa na posição 137 entre os 180 países, num ranking em que quanto mais alta a posição mais corrupto é o país, segundo o índice elaborado pela Transparência Internacional.
Diante de um quadro tão sombrio, percebe-se ser grande a responsabilidade dos atores políticos libaneses e, independentemente da confissão religiosa, origem e identificação étnica ou agremiação política, apelamos para a busca de uma solução negociada interna.
Nos meses mais recentes, jovens e mulheres têm manifestado inconformidade com um sistema de distribuição do poder econômico e político, que tem como base as cotas para as 18 religiões oficiais - 18! Tivemos a notícia de que o Primeiro-Ministro Najib Mikati concordou com o novo gabinete com o Presidente Michel Aoun, o que nos traz esperança.
O Departamento de Estado dos Estados Unidos, por sua vez, emitiu uma nota para afirmar que, além dos US$372 milhões em ajuda humanitária já enviados, tem confiança nesse novo gabinete.
Da parte da França, que exerce uma influência importante, também aquele país tem manifestado preocupação, tendo o Presidente francês organizado, em 4 de agosto, uma reunião para discutir a ação da Europa no Líbano.
Mas e os vizinhos árabes? E os países vizinhos árabes, como têm se posicionado? E de que maneira o Irã pode, efetivamente, contribuir com a paz interna no Líbano? E o Brasil? O que está podendo fazer? Em nossa Constituição, está claro o respeito à autodeterminação dos povos, mas também estamos comprometidos, na ordem internacional, com a solução pacifica das controvérsias. E é dentro desse espírito de busca de solução pacífica das controvérsias que apelamos às autoridades diplomáticas brasileiras para que atuem pela pacificação no Líbano e, nos campos da saúde, da segurança alimentar e de outros essenciais, para que possamos auxiliar com medicamentos, equipamentos, alimentos e recursos humanos para que os libaneses consigam superar o mais depressa possível o crítico cenário de escassez que enfrentam.
Quero aqui ressaltar a ideia de se promover essa reunião, tão bem captada e aceita pela Presidente Kátia Abreu, do nobre colega patrício, descendente de libanês, Esperidião Amin, com a nossa participação.
Eu faço aqui o meu encerramento, dizendo que sou muito sensível a essa causa, até porque aprendi com o meu avô, que é lá do Líbano, que sangue não vira água.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Nelsinho Trad.
Antes de passar a palavra para o Senador Esperidião Amin - a bancada libanesa aqui é muito forte, embaixadora - que maravilha! Maravilha! -, Nelsinho, Esperidião, Tasso, Simone. Muito bom!
Eu gostaria só de ler uma sugestão de um mineiro, Frederico Aborachid, que é o presidente da Fundação Libanesa de Minas Gerais. Ele agradece pela nossa audiência pública e, como proposta, pede a concessão de visto permanente para os libaneses. Segunda proposta: solicita um tratado de livre comércio Líbano/Mercosul.
Muito obrigada, Sr. Frederico, são ótimas sugestões.
Bom, passo a palavra para o Senador Esperidião Amin.
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O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Para discursar.) - Sra. Presidente, eu me permiti fazer uma transação com o Senador Tasso Jereissati, até para que ele que se identifique como realmente levantino que é, porque quem o vê passando pela rua pensa que é inglês.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Eu jurava que ele era mais para suíço, alemão...
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - E às vezes ele até se porta como.
E, naturalmente, a Senadora Simone Tebet quiser desfrutar da mesma concessão, porque está ocupada, eu me permito deferir primeiro às mulheres.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Eu estou muito surpresa, porque de Tasso Jereissati e Gilberto Kassab eu podia imaginar tudo, menos descendência libanesa. Eu pensei que era suíça, alemã...
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - Pela aparência, pelo porte, pela atitude.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Pela aparência, pelos olhos azuis. Mas, é verdade, os nomes confessam.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - Senadora, a única coisa que eu consegui ter mais do que ele... Eu tenho um terno de linho S 120, que, no Brasil, era monopólio do Carlos...
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Jereissati.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - Jereissati, abu, pai.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - O. k., com a palavra, então, o descendente de libanês, nosso grande Senador Tasso Jereissati.
O SR. TASSO JEREISSATI (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - CE. Para discursar.) - Muito obrigado, Senador Esperidião; muito obrigado à nossa querida Senadora Kátia Abreu, nossa Presidente.
Primeiro, eu queria parabenizá-la pela iniciativa, evidentemente inspirada, como foi dito aqui, pelo nosso "brimo" decano, que, sem dúvida, é, apesar de ele, dependendo da embaixadora que está aqui, também, às vezes, se considerar suíço ou italiano - dependendo da embaixadora que estiver aqui -, mas o nome dele não engana: Esperidião Amin. Realmente, não deixa qualquer dúvida e, mais do que isso, o orgulho que ele tem de ser levantino legítimo não faz deixar margem de dúvida ao amor que está contido no seu sangue a essa nossa querida origem.
Mas eu vou ser muito rápido, porque, realmente, é importante ouvirmos o autor dessa ideia. Eu queria sugerir que o nosso querido "brimo", como decano dos "brimos" aqui dentro - "brimos" é a bandeira com que a gente se trata aqui - convocasse uma reunião dos descendentes de libaneses aqui, o mais rápido possível, com a sua força e a sua liderança, para que nós possamos concretamente discutir qual o nosso papel, como a bancada pode ter uma atuação concreta e efetiva diante da situação que vive o Líbano hoje.
Então, eu só queria me colocar à disposição, diante dessa reunião que eventualmente V. Exa., Esperidião, pudesse fazer; colocar-me inteiramente à disposição.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Tasso Jereissati.
Passo a palavra para a Senadora Simone Tebet.
A SRA. SIMONE TEBET (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - MS. Para discursar.) - Obrigada, Sra. Presidente.
Eu vou ser breve, talvez não tão breve quanto o Senador Tasso Jereissati, mas realmente breve.
Primeiro, eu não poderia deixar de dizer que é a primeira vez que estou nesta Comissão - não sou titular nem membro -, tendo V. Exa. como Presidente e que preciso deixar registrado nos Anais desta Casa. É motivo de muito orgulho, embora isso nos entristeça, ver V. Exa. como Presidente da CRE, a primeira mulher Presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal, depois de quase 200 anos de história.
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A diferença está aqui, em pequenos detalhes. Isso aqui não é para nós, mas é oferecido à Exma. Sra. Carla, Encarregada de Negócios, que aqui está aqui representando a Embaixada do Líbano em Brasília, aqui no Brasil.
Então, esta aqui é uma justa homenagem aos convidados, que contribuem tanto com essa relação bilateral, harmoniosa que temos, obviamente, com este país que é o Líbano, que hoje sofre e do qual eu, o Tarso, o Esperidião Amin e o Nelsinho, de alguma forma, descendemos. Eu, particularmente, sou neta dos dois lados, paterno e materno, de libaneses - Nassar e Tebet. Quando os meus os meus avós precisaram de abrigo, o Brasil abriu as suas portas para o Líbano e com eles vieram, para a América Latina, eu acho que mais de 8 milhões de libaneses, naquela época.
Depois disso, o Líbano nos estendeu as mãos nos momentos difíceis. E é isso que significa acordo entre países. Globalização hoje exige essa troca. Não é a troca apenas no discurso, não é a troca apenas nos negócios. A diversidade do Brasil, eu sempre falo, Exma. Sra. Carla, que é a nossa principal riqueza. A desigualdade é a nossa principal vergonha, mas a diversidade é a nossa principal riqueza. E ela vem da pele, ela vem do sangue, ela vem da mistura de raças - negros, brancos, índios, imigrantes que aqui vieram.
Hoje, o Líbano precisa novamente de nós, e o Brasil precisa entender isso. Nesta Reunião, eu só tenho que parabenizar o Esperidião Amin, o Nelsinho e a nossa querida Presidente, tão competente, Kátia. Eu não tenho palavras para dizer da minha alegria de ver novamente, repito, uma mulher presidindo uma Comissão tão importante como essa, porque eu também fui Presidente, pela primeira vez, de uma Comissão que diziam que também era eminentemente masculina, que é a Comissão de Constituição e Justiça.
Mas quem sabe como contribuição, Senador Esperidião Amin, nós possamos estar realmente conversando, tentando ajudar, através do Senado Federal, que esse acordo de livre comércio do Líbano com o Mercosul possa sair o mais rápido possível. Talvez seja a hora. Às vezes, é no momento de grandes crises que a gente abre portas, que a gente quebra a burocracia, que a gente rompe aquela coisa necessária no Estado de direito, mas que, nos momentos de exceção, o próprio Estado de direito, a própria Constituição permite, que é quebrar regras, quebrar regras dentro dos limites da Constituição.
A Constituição permite, em regime de exceção, estado de necessidade, estado de sítio e em outros casos de emergência, que nós possamos fazer leis mais céleres, e, quem sabe, aproveitar este momento. O Líbano precisa de nós. O Líbano provavelmente se encontra em um dos momentos mais tristes da sua história, quando quase 80% da sua população está considerada abaixo da linha da pobreza. Nós, que temos um número muito inferior a isso já não estamos conseguindo vivenciar famílias inteiras na rua, pedindo comida, quanto mais imaginar, Senador Esperidião Amin, que quase 80% dos nossos irmãos libaneses hoje estão abaixo da linha da pobreza.
Então, eu estava dizendo que talvez uma das contribuições que possamos dar seja esta: tentar acelerar esse acordo de livre comércio do Mercosul com o Líbano, abrindo todas as exceções legais, burocráticas, obviamente que dentro dos preceitos constitucionais, porque existe uma exceção. Estamos diante de um Estado de exceção, um estado de necessidade mais que absoluta, e nesses momentos de grandes crises é que nós temos que furar, através de janelas jurídicas, essas barreiras jurídicas e legais para, quem sabe aqui, o Senado se colocar à disposição.
Então, é isso. Eu realmente também tenho uma CPI, a gente está lá participando, mas fica aqui o meu reconhecimento a esta Comissão. O que a Senadora Kátia Abreu, enquanto Presidente, e o Senador Esperidião Amin, como um titular assíduo e um dos grandes responsáveis por esta Reunião, junto com o Senador Nelsinho, fizerem, terão o meu apoio integral.
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Eu espero poder estar junto, Senador Esperidião Amin, na próxima Reunião, em que trataremos do tema.
Muito obrigada e bem-vinda!
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Muito obrigada, Presidente Simone. A sua contribuição vai ser muito importante. E nós vamos, sim, agilizar esse acordo. Já repassei à minha assessoria, à Embaixadora Eliana, para tomar posição, junto com a Embaixadora Claudia, de como está o andamento desse possível acordo União Europeia-Mercosul, e a questão do visto também, liberar o visto para o Brasil para os libaneses. E nós finalmente daremos aqui solução.
Com a palavra agora o Senador Esperidião Amin, autor deste requerimento, junto com o Senador Nelsinho Trad, com apoio de Simone Tebet e de Tasso Jereissati.
Com a palavra.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Para discursar.) - Sra. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, e querida Embaixadora Carla Jazzar, e todos aqueles que estão, de alguma forma, prestigiando este evento, eu vou procurar ser o mais objetivo possível e vou fazer uma única sugestão.
Primeiro, eu quero cumprimentar a participação do Sr. Hussein Kalout, que discorreu de maneira muito objetiva sobre essas peculiaridades decorrentes das nossas singularidades. Uma coisa está conectada com a outra. As palavras da Embaixadora Carla Jazzar contribuíram muito para os nossos objetivos. Quero agradecer, em particular a clareza, a objetividade da manifestação do Sr. Ruy Pereira, porque é para ele, juntamente com o Embaixador, que vai a minha pergunta.
Cumprimento o Chacra, Guga Chacra, que eu também quero conhecer e abraçar. Na medida em que a pandemia vai reduzindo, em termos de temor para todos nós, nós vamos poder nos abraçar como verdadeiros árabes e como bons libaneses: um abraço e, no mínimo, três beijinhos. Ele me fez lembrar Lulu Santos: "Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia." Essa expressão é muito nostálgica, melancólica. E no Brasil, em que se usa o português como língua, evoca a palavra saudade, que só existe em português. E, segundo um bom pernambucano, que diz o seguinte: a saudade é como um parafuso que no buraco cai; só entra se for torcendo, porque batendo não vai. E depois que enferruja lá dentro, nem distorcendo sai.
Então, o Guga trouxe aqui uma miscelânea. Em 15 minutos, ele falou 80 minutos, pela objetividade e por suscitar... Eu só queria dizer para ele que, naquela viagem de 2018, seguindo uma sugestão dele, fomos almoçar no Naranj, que é tido como um dos melhores restaurantes de Damasco, junto com Carlos Melles e Arlindo Chinaglia. No dia seguinte, caiu um petardo ali perto. Nós vivenciamos muitas emoções, em Saidnaya, Maaloula, visitamos o Vale dos Cristãos. E descobri que na Síria, quase na divisa com o Líbano, há uma cidade chamada Mashta El Helou, que é o meu sobrenome: Helou.
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Então, o Guga Chacra deu uma contribuição muito importante, e eu vou aproveitar uma frase dele.
Antes de falar com o Embaixador Hermano Telles Ribeiro, ele disse que a melhor ou a mais volumosa possibilidade de exportação do Líbano foram libaneses, e ele está certo. Como eu disse, eu sou primeira geração. Meu pai nasceu no Líbano.
Queria agradecer ao Embaixador Hermano Telles Ribeiro por se lembrar da descrição que eu fiz da minha visita a Kfarsaroun, que é uma cidade pequena, mais ou menos a 9,5km da cidade da família do Michel Temer. Ele é de Btaaboura. Meu pai era de Kfarsaroun, 9,5km de distância, na mesma província, Koura. Por se recordar sempre que eu conto essa história, que envolve o episódio mais emocionante da minha vida, ele gravou a emoção da minha informação.
Do que eu depreendi aqui, nós temos que abordar novas formas de parceria, não as mesmas. Nada do que foi será do jeito que já foi um dia.
Eu fiquei muito contente com o relatório do Embaixador Ruy Pereira mencionar um acordo com a Universidade Americana de Beirute.
Senadora Kátia, na década de 60, 40% dos graduados que trabalhavam na ONU tinham passado pela Universidade Americana de Beirute, ou seja, ou feito graduação ou uma especialização. Então, saber que a Universidade Americana de Beirute, que tem essa visão holística, ocidentalizada e universal, já está participando de uma parceria no ramo médico, insinua uma participação.
Antes da pandemia, o Líbano já era um centro médico relevantíssimo na região - por exemplo traumatologia, reabilitação, cirurgia reparadora, cirurgia plástica, se quiserem assim chamar. E nós temos uma fortíssima participação de descendentes de libaneses nos mais diversificados e sofisticados ramos da medicina no Brasil.
Então, isso é uma parceria que vai crescer à medida que nós cheguemos a alguma espécie de pacificação na região, porque, junto com a restauração de imóveis, de prédios, de obras, vem também a reabilitação das pessoas traumatizadas no Oriente Médio todo, todo, que têm vivido convulsões, violências e danos psicológicos e físicos.
Eu acho que essa parceria é a melhor notícia que eu tive hoje aqui, esse primeiro convênio. Até se o Embaixador Ruy Pereira depois puder dar uma informação complementar, esta é a minha pergunta: que outras parcerias, baseadas no conhecimento, intercâmbio cultural, intercâmbio educacional, mas do conhecimento, esse grande produto de exportação, que é o libanês e a libanesa, conseguiu gerar no Brasil?
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Vocês já fizeram uma leitura dos nomes árabes, libaneses e sírio-libaneses de especialistas no Brasil na área da medicina? Olhem: é avassalador o número de especialistas em várias especialidades, em vários segmentos da medicina no Brasil.
Então, se nós pudermos transformar isso numa nova rota de ligações e de intercâmbio, isso pode ser o primeiro veio de uma nova relação, que pode se desdobrar por outras especialidades. Por quê? Porque eu confio que os problemas de guerra podem coexistir, mas nós teremos vários tópicos de pacificação na região. Primeiro, a Síria está voltando a uma vida normal. O Iraque está se reabilitando - e eu confio nisto - da traumática intervenção que sofreu.
Então, se nós pudermos, só baseados no conhecimento, no intercâmbio de expertises, de conhecimento, agregar ao livre comércio, ao visto, a toda essa facilidade de relações diplomáticas, se nós pudermos agregar a gestão do conhecimento e o intercâmbio de expertises decorrentes do conhecimento, eu acho que nós estaremos, Senadora Kátia, dando o passo que o Lulu Santos nos reclama: nada será do jeito que já foi um dia, até porque o que trouxe o meu pai, o avô da Senadora Simone? O que os moveu? Moveu a busca de uma oportunidade, que, lá, não havia. E, aqui, de modo geral, conseguiram êxito, sucesso, na medida de cada um.
Então, essa expertise deve ser a renovação do nosso vínculo nesse processo de objetivamente atendermos a emergência. A emergência é uma coisa: é a crise.
Agora, há um Governo estabelecido. Eu tenho aqui os dados do Governo, que tem, inclusive, uma mulher participando do Governo, que é católica do rito latino, ou seja, a Sra. Najla Riachi. É assim que se pronuncia? E temos um Governo posto, fruto de 13 meses de impasse, que não é o maior tempo de impasse para fazer Governo no Líbano. Já houve dois anos de dificuldade para ter o Presidente da República.
Mas, nesta crise, temos que ter um interlocutor, que é o Governo legitimamente constituído.
Eu acho que o Itamaraty, que já deu essa boa notícia, pelo menos no meu ponto de vista, desses acordos firmados, tanto na questão da certificação do produto orgânico quanto no setor da ciência. Além da crise, além da emergência, eu acho que nós podemos contribuir para esse desenvolvimento das relações entre o Brasil e o Líbano, que serão sempre singulares.
Muito obrigado.
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A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Esperidião Amin, como sempre muito iluminado.
Eu gostaria de organizar aqui a nossa finalização, primeiro passando a palavra para as suas considerações finais, ao Hussein e ao Guga, caso eles queiram se afastar da reunião e, posteriormente, aos três Embaixadores, para responderem objetivamente as perguntas dos nossos Senadores.
Então com a palavra o Hussein para as suas considerações finais.
Se quiser fazer alguma sugestão objetiva também fique à vontade.
O SR. HUSSEIN KALOUT (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senadora Kátia Abreu.
Permanecerei com a senhora e com todos os senhores aqui até o final, não tenho nenhuma restrição de horário. Será um prazer ouvir os demais painelistas do debate de hoje.
Bom, eu queria primeiro saudar a Senadora Simone Tebet pela sua sabedoria, pela forma como ela delineou a importância da comunidade e pelo trabalho que ela pode desenvolver de forma coordenada, a partir da presença dos diversos Parlamentares no Senado; o Senador Tasso Jereissati também, a quem rendo sempre o meu profundo respeito; o Senador Nelsinho Trad, um dos solicitantes do requerimento; e o Senador Esperidião Amin, por sua belíssima e lúcida apresentação.
Dito isso, Senadora Kátia, acho que o grande problema do Líbano remonta, digamos, a quatro pontos fundamentais. O país precisa de dinheiro, o país precisa de comida, o país precisa de emprego e o país precisa de energia. Então, se eu não souber endereçar esses quatro pontos o país seguirá agudizando em uma infindável crise econômica.
Objetivamente, quer dizer, o que o Brasil pode fazer, o que é possível fazer? O Brasil pode fazer, talvez poderá ou poderia fazer muito, mas o que é possível fazer é o que é importante, até porque a nossa política externa não goza de uma grande reputação internacional hoje para poder desenhar uma atuação, digamos, mais coordenada com a França ou com outros países de maior relevância no cenário político interno. Então a facilitação do acordo entre Mercosul e Líbano é importante, mas ele não terá efeitos práticos agora na resolução da crise. É importante, sim, avançar, mas o efeito dele será, digamos, mais no médio prazo.
Sobre a solução dos quatro pontos que eu enfatizei - dinheiro comida, emprego e energia -, eu acho que, no que diz respeito à questão energética o Brasil, sim, poderá contribuir através da Petrobras. O país precisa de ajuda energética. Alguns países da região têm facilitado a exportação, a doação de petróleo e gás, portanto teria que ver até que ponto a Petrobras poderia talvez ser um facilitador nesse processo.
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No que diz respeito à parte de segurança alimentar, eu acho que o Brasil a está fazendo e creio que talvez poderia, através dessa articulação interparlamentar, aportar um pouco mais para reforçar a segurança alimentar e nutricional no Líbano, até como bem mencionou o Embaixador Hermano, quer dizer, o número de refugiados sírios e palestinos no Líbano equivale efetivamente a ter um Equador e uma Argentina somados. Então, é fundamental sob esse aspecto.
Quanto a dinheiro e emprego, isso vai depender de dois fatores, de duas variáveis: primeiro, investimento direto - se não houver investimento direto no País, os impactos, no curto prazo, não serão sentidos. Então, somente investimento direto, quase que imediato, vai gerar efeito, digamos, no emprego. Portanto, o Brasil talvez não tenha condição objetiva de aportar investimentos diretos, mas, sim, através de determinados setores empresariais, que poderiam ser enviados, ou o Brasil trabalhar junto com o Fundo Monetário Internacional e com o Banco Mundial para facilitar o aporte de recursos para o Líbano. Obviamente, que o Fundo Monetário e o Banco Mundial têm demandas e exigem garantias, e essas garantias dependem, sobretudo, do compromisso do Governo libanês para a aquisição dessa ajuda.
Dito isso, para concluir, Senadora Kátia Abreu, o ponto fundamental: o Governo que está no poder hoje e que acaba de ser anunciado será um Governo transitório, quer dizer, é um Governo que terá vida útil até maio, e ele precisa entregar resultados. Esses resultados precisam se traduzir objetivamente em emprego e renda. Emprego e renda, o Líbano não tem condição de gerar se não houver estímulos externos, estímulos imediatos de aporte financeiro. E aí entra a União Europeia. O que a União Europeia e os países árabes podem fazer? O fato é que, como o Guga bem lembrou, o Líbano padece de fuga de talentos, e essa fuga de talentos impacta a produtividade da economia e a competitividade da economia, consequentemente. Portanto, é preciso, antes de tudo, trabalhar com os organismos financeiros internacionais para fazer esse aporte imediato.
O que pode acontecer depois de maio? Concluindo, eu acho que, como eu disse, esse Governo tem vida útil até as eleições. Aportar resultados imediatos depende de estímulos financeiros externos, mas, depois de maio, a nova formatação do novo Parlamento é que vai determinar a coloração do Governo, que vai determinar como, doravante, de maio em diante, o Governo poderá evoluir.
Existe um ponto importante, porque alguns países e alguns organismos internacionais não querem fazer esses aportes antes da eleição, querem esperar a eleição ocorrer para tomarem um novo compromisso das forças políticas quanto a isso. E aí, até maio, eu acho que o país não aguenta mais. Então, se o Brasil puder facilitar e quiser facilitar, parte dessa ajuda, não integralmente, terá que ser ofertada e dada ao País antes da eleição e uma segunda etapa dessa ajuda pós eleição.
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Concluindo, eu queria mencionar que a comunidade de origem libanesa no Brasil se caracteriza muito por seu empreendedorismo. O libanês é culturalmente empreendedor. E, por ser empreendedor, eu creio fielmente que, sim, a comunidade brasileira de origem libanesa tem muito a contribuir nesse processo. Acho que o Senado, através da sua liderança, Senadora Kátia Abreu, juntamente com a Senadora Simone, o Tasso, o Esperidião e também Nelson Trad, poderá ser, sim, um bom indutor desse processo para galvanizar a comunidade e fazer com que ela venha a aportar algo mais objetivo no curto prazo. Isso sem esquecer que o Governo brasileiro, sim, pode fazer muito em matéria de energia e em matéria de segurança alimentar e nutricional.
Muito obrigado!
Sigo à disposição aqui das senhoras e dos senhores.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Professor Hussein.
Eu passo a palavra ao Senador que retornou à sala, Francisco Rodrigues, para fazer as suas perguntas.
E nós, então, passaremos a palavra para o Guga Chacra e para os nossos embaixadores para finalizar.
Por favor, Senador Chico Rodrigues.
O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR. Para discursar.) - Sra. Presidente Kátia Abreu, que sempre merece um elogio pela condução brilhante dos trabalhos aqui na Comissão de Relações Exteriores, participantes deste debate, a que nós assistimos com extrema atenção, avaliando cada palavra que foi proferida aqui nesse momento difícil por que passa esse rico país irmão, que, obviamente, por motivos que fogem à vontade do seu povo, está submetido a uma situação de extrema dificuldade. Esse mesmo país, na verdade, já abrigou, na antiguidade, a civilização fenícia, um país que tem valores culturais históricos e que serve de referência para a humanidade pela capacidade do seu povo, pela formação da sua gente.
O Líbano é um país que tem uma influência fantástica na cultura brasileira. Não sei, mas, procurando informações, verificamos dados que são extremamente importantes: praticamente 4% da população brasileira é composta de libaneses natos ou seus descendentes. Isso implica dizer que há uma relação biunívoca, uma relação quase que familiar entre esses dois povos. O Brasil tem o seu imenso reconhecimento pelo valor de todos esses que têm a sua origem libanesa. E aqui, como falou o Senador Esperidião Amin, há uma área específica, visível, clara, como uma janela sem vidros, que é exatamente a área da Medicina: grandes expoentes da Medicina brasileira são descendentes de libaneses. O nosso ex-Presidente Michel Temer também tem essas raízes libanesas e, mesmo fora do Governo, há poucos meses, se deslocou, por sugestão do Governo brasileiro, ao Líbano para participar e acompanhar aquele momento de extrema dor para a sua população.
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A gente percebe que a localização geopolítica do Líbano, cercado de um lado pela Síria, ao sul, por Israel, mas recebendo uma dádiva imensa de ter, como seu aliado permanente, o Mediterrâneo e, daí para o mundo, para as portas do mundo, está logicamente vivendo momentos de extrema dificuldade. Mesmo assim, tenho certeza de que o futuro, um futuro que seja próximo, possa, na verdade, voltar e devolver à sua população momentos de extrema alegria e de felicidade. Nós vimos, inclusive, várias informações que são ricas e mostram exatamente a importância que o Governo brasileiro dá a esse povo irmão, apoio e ajuda, como agora estamos acompanhando o apoio da ABC (Agência Brasileira de Cooperação), com apoio técnico, com meios físicos para mitigar o sofrimento dos libaneses nesse momento de extrema dificuldade.
Gostaria de apenas fazer uma pergunta, fazendo um rápido resumo. Com a crise no Líbano, 78% da população libanesa vive abaixo da linha de pobreza, segundo as Nações Unidas - 78% segundo as Nações Unidas -, enquanto a libra libanesa perdeu, em menos de dois anos, mais de 90% do seu valor em relação ao dólar do mercado. O Líbano está passando por uma das piores crises econômicas do mundo, desde 1850, de acordo com o Banco Mundial, e enfrenta uma escassez significativa de combustível, o que afeta o fornecimento de fabricação de bens como, especialmente, o pão de cada dia.
Na ausência de divisas, os subsídios de vários produtos básicos foram retirados gradualmente nas últimas semanas. De acordo com uma ONG local, Information International, o fim dos incentivos pode provocar um aumento de 344% do preço da gasolina e de cerca de 387% para o óleo diesel.
A crise econômica sem precedentes - outrora um país próspero - foi agravada por questões, obviamente também políticas internas, que nós esperamos que agora estejam entrando num momento de acomodação. Essa situação causa a diáspora de libaneses, inclusive, de brasileiros que vivem no Líbano. "Dizem que nós somos uma nova Venezuela" - é grave, afirmou uma estudante líbano-brasileira, Nessryn Khalaf, de 25 anos apenas.
Nesse sentido, considerando que o Brasil cumpriu um importante papel humanitário ao recepcionar em seu território imigrantes venezuelanos, principalmente o nosso Estado, o Estado de Roraima, pergunto: De que forma os outros países têm recebido imigrantes libaneses e que políticas têm sido adotadas para recepcionar esses imigrantes? Então, eu diria que, pela história, pela grandeza, pela formação, pela cultura, pelos valores que os libaneses têm... O nosso Estado tem recepcionado mais de 70 mil venezuelanos, eu diria, em território roraimense, porque mais de 500 mil venezuelanos por ali já passaram, em busca de um sonho, de liberdade, de meios de que precisam para habitação, emprego, saúde e tudo de que o ser humano necessita. Então, eu gostaria de deixar essa pergunta, porque ela é fundamental para que nós possamos realmente entender a colaboração que o Brasil pode dar nesse momento difícil por que passam os irmãos libaneses.
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Muito obrigado, Sra. Presidente.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Francisco Rodrigues pelos seus questionamentos.
E vamos nos dirigindo à parte final, respondendo aos questionamentos dos Senadores Esperidião Amin e Francisco Rodrigues e dos nossos internautas com relação ao visto automático e acordo de Mercosul com o Líbano, como já deu a sua opinião aqui o Hussein.
Eu também gostaria de deixar em análise, para reflexão, a possibilidade da utilização da telemedicina para ajudarmos. Já que em São Paulo nós somos um grande centro de Medicina, cirurgia e clínica, se a telemedicina não seria um passo muito avançado para que pudéssemos colaborar, inclusive com esses médicos descendentes de libaneses que estão no Brasil, para que pudéssemos acudir nessa hora desesperadora.
E digo à Embaixadora Carla que eu vejo com muita simpatia o fundo que ela sugere, mas vejo um fundo para médio e longo prazo. Eu sugiro um fundo para curtíssimo prazo, que seria para alimento e remédio, alimento e medicamento. Por isso não dá para esperar. Esse teria que ser, Embaixadora, um fundo mais rápido, um fundo até mesmo menor, mas que pudesse viabilizar rapidamente a condição de ter o alimento ou comprar o alimento. E nisto o Brasil é craque: fazer a cooperação com o sistema Bolsa Família, o sistema do cartão, para que as pessoas tenham a sua renda e possam comprar os alimentos. É muito mais fácil, muito mais rápido e muito mais respeitoso do que entregar uma cesta básica. Então, esse fundo para os descendentes de libaneses no Brasil do setor privado poderia fazer a sua parte, mesmo que não conseguisse alcançar a todos. Eu fiz uma conta aqui rápida de padeiro, como se diz no Brasil: 7 milhões de habitantes, se quase 80 estão abaixo da linha da pobreza, eu coloquei um nível de mais ou menos 2 milhões de famílias que há no Líbano, 1,5 milhão de famílias... Eu não tenho a média de filhos. Eu só dividi aqui rapidamente. Então, quanto seria um cartão, uma renda básica para parte dessa família? Esse fundo teria uma facilidade enorme de se transferir, não haveria compra, não haveria governo no meio, seria direto para as famílias que precisam. É a minha sugestão. Eu tenho certeza de que a comunidade sírio-libanesa em São Paulo e em todo o Brasil poderia se mobilizar. Vamos atingir uma meta de "x" famílias - é o que nós damos conta de fazer. Quanto para cada uma delas? E nós implementaríamos, então, o sistema brasileiro do cartão do Bolsa Família, que é o saque lá para que eles possam comprar o produto diretamente.
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O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR) - Pela ordem.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Só um minutinho.
E aí a telemedicina também, com os nossos hospitais em São Paulo, Rio, enfim, onde tivéssemos disponibilidade dessa telemedicina. E esse fundo, ao mesmo tempo, também poderia contribuir com a compra de medicamentos, já mandar os medicamentos daqui, baseado nesse levantamento que a telemedicina poderia fazer em conjunto com os médicos libaneses.
O Senador Chico Rodrigues gostaria ainda de fazer uma consideração, antes de eu passar aos embaixadores.
O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR. Pela ordem.) - Eu ouvi atentamente, Senadora Kátia Abreu, essa sua proposição, que é absolutamente oportuna. Eu apenas acrescentaria também alguma forma de recursos, através desse fundo, que pudesse atender a questão de combustíveis; na verdade, se incluiriam alimentos, medicamentos e combustível, esse insumo fundamental para o deslocamento de qualquer país em qualquer atividade, até se alinhando diretamente com a questão de saúde, de produção também interna etc.
Eu gostaria de deixar um registro aqui de um livro fantástico de um escritor famoso no Líbano, Nassim Taleb: A Lógica do Cisne Negro, que fala sobre as consequências trazidas por eventos aleatórios inesperados. Na verdade, o livro aborda mais especificamente a armadilha que é darmos mais importância para o que conhecemos em vez de nos prepararmos para o imprevisível. Esse livro é como uma mão na luva, serve também até para o nosso País, de uma forma muito determinada. Então, A Lógica do Cisne Negro é recomendável para nós políticos, para historiadores, pensadores, formuladores de políticas públicas etc.
Era esse o registro que eu gostaria de deixar aqui, minha querida Presidente.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Muito obrigada. É uma excelente e bela sugestão complementar.
Então, diante dessas sugestões, eu gostaria de continuar. O Hussein já deu as suas ótimas sugestões. Eu já ouvi do Esperidião, Francisco Rodrigues - todos nós -, Tasso Jereissati, Simone Tebet, Nelsinho Trad, e essa minha humilde sugestão e modesta sugestão com relação a essa interlocução, porque o próprio cartão do Bolsa Família, no caso, poderia ser suficiente ou atender a compra de alimentos ou de medicamentos familiares. A telemedicina poderia atender consultas, cirurgias e o medicamento hospitalar, e nós poderíamos nos mobilizar com a ONU, com o Banco Mundial para ajudar no suprimento desses medicamentos hospitalares, porque há o medicamento que a família toma em casa e o medicamento hospitalar. Então, eu acho que esses dois pontos seriam fundamentais. E, sobre a questão do combustível, que eu acho muito importante, uma interlocução desse grupo de trabalho com o Governo brasileiro e a Petrobras, o que poderia ser feito nesse período de super emergência.
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Então, eu passo a palavra ao Guga Chacra, por cinco minutos, depois aos Embaixadores e, por último, à nossa Embaixadora do Líbano, para encerrar.
Por favor, Guga Chacra, por cinco minutos.
O SR. GUGA CHACRA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senadora.
Bom, é só para dizer que essa relação do Brasil com o Líbano é algo completamente inédito em todo o mundo, porque relações tão próximas assim, em geral, são de um país que colonizou outro ou entre países fronteiriços. Então, do Brasil com Líbano, é distinto, porque são países distantes que têm essa relação de irmandade, dessa coisa. O Senador Francisco Rodrigues citou o Nassim Taleb, que é de Koura, na região de Koura, que é a mesma região de que é o Senador Esperidião Amin, que citou agora o ex-Presidente Michel Temer. E o que me marcou, Senador Esperidião Amin, foi que o senhor teve essa emoção quando foi visitar ali a vila dos seus pais. Todos os seus ancestrais - todos - vieram daquele lugar onde é o Líbano, ou talvez também alguns do que é a Síria. Todos os ancestrais do meu pai também. Por isso é que eu carrego, aqui, sempre a bandeira do cedro-do-líbano comigo, porque a gente tem que ter esse orgulho.
Mas infelizmente o Líbano é talvez um dos países mais mágicos do mundo - eu acho o país mais mágico: não tem quem não se apaixone por Beirute quando visita aquela cidade, quando visita o Líbano, o Vale do Beca, os Montes do Líbano, o Vale dos Cristãos, o sul do Líbano -, mas, ao mesmo tempo, é um dos países mais trágicos de todo o planeta, disputando ali com Haiti e com Afeganistão, porque sempre acaba acontecendo uma tragédia. Então, nessa questão entre tragédia e magia, eu espero que o Líbano volte o quanto antes a ser mágico; que a magia prevaleça no Líbano.
Obrigado a todos aqui pelo convite para participar deste painel sobre o Líbano.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Nós é que agradecemos a sua grande contribuição, sempre inteligente, Guga. Muito obrigada mesmo!
E agora eu passo a palavra, por cinco minutos, ao Sr. Embaixador Hermano Telles, respondendo, repito, às nossas sugestões, se for possível, incluindo o acordo Mercosul-Líbano, porque, mesmo que não seja um efeito rápido, mas é um efeito moral que pode, no mínimo, contribuir, não em curto prazo, mas no médio e no longo prazo nós já ficaríamos atendidos; o visto automático, o visto simplificado; as questões do cartão, do alimento, da telemedicina; e a questão do combustível Petrobras.
Então, com a palavra, o Sr. Embaixador Hermano Telles, por cinco minutos.
O SR. HERMANO TELLES RIBEIRO (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Senadora, e muito obrigado a todos os Senadores que intervieram e formularam sugestões sempre tão criativas e interessantes.
Vamos por partes. Primeiro o acordo de liberalização de comércio Brasil-Líbano. Esse é um processo que já está em curso há anos, é um processo que já está maduro, é um processo que já está num momento em que a gente chama de lista de troca de ofertas, de concessões, não é verdade? Então, do ponto de vista intra-Mercosul - nós estamos falando dos quatro países do Mercosul -, já há uma harmonia para que possamos caminhar para um desfecho. Do lado libanês, evidentemente, nós vamos agora, com o novo Governo, sentir aqui com o negociador-chefe da equipe libanesa o apetite, para que possamos, na esfera do Executivo... O Itamaraty coordena o grupo negociador, evidentemente, com insumos das áreas técnicas e econômicas.
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Então, estamos nessa fase em que precisamos, digamos, de uma coisa final, de finalização de um processo negociador, que já vem de algum tempo, já vem de alguns anos. O Brasil tem sido o mais proativo nesse processo negociador, e os demais parceiros - Argentina, Paraguai e Uruguai - estão on board. E agora, com esse novo Governo, acredito que teremos uma etapa mais conclusiva dessa negociação.
Aí entra a etapa muito importante de apreciação legislativa, de um fast-track, digamos assim, que vocês mencionaram aí no Congresso e eventualmente nos demais Congressos nacionais do Mercosul e aqui no Líbano.
Então, isso é quanto ao acordo de livre comércio, em linhas muito genéricas.
Depois houve uma menção à telemedicina, que, evidentemente, nos dias de hoje, com todas as facilidades que temos da informática, é uma questão que tem que ser examinada no plano técnico. Nós precisamos ter clareza do que estamos falando aqui, em termos de atores no Brasil e contrapartes que nós certamente encontraremos aqui no Líbano, para ensejar, para propiciar esse tipo de colaboração.
Eu tenho anotada também uma sugestão, evidentemente, para a questão de medicamentos e alimentos como prioritária. Já é uma temática que está concretamente na agenda da nossa Agência Brasileira de Cooperação. Houve menção aqui à próxima chegada já da primeira carga das 4 mil toneladas de arroz prometidas quando da visita do Presidente Temer e que vão se materializar - já em outubro haverá o primeiro embarque. Então, em alimentos, nós temos uma coisa muito concreta que vai acontecer em quatro etapas - chegarão quatro navios, que trarão 4 mil toneladas de arroz -, e nós já temos uma estrutura, aqui do lado libanês, para receber isso. E em remédios, evidentemente, existe a ação do lado do Governo e a ação do lado não governamental, que também tem se revelado extremamente intensa; e por vezes a embaixada é chamada para facilitar o despacho aduaneiro de determinadas doações que chegam por entidades brasileiras.
Então, a disposição nossa do lado de cá é permanente, e o que eu percebo é que haverá um viés de alta - para usar, assim, uma expressão de economista - no processamento, no andamento e na cooperação nessa matéria de alimentos e de medicamentos, mas isso é uma agenda que o Embaixador Ruy Pereira poderá detalhar com muito mais precisão. Temos calendários muito claros de entrega, por exemplo.
Eu tenho a impressão de que existe alguma coisa que eu deixei aqui de fora, mas que também eu acho que não ficou muito clara para mim, que é a questão do visto. Eu não entendi bem qual é a formulação que foi feita.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Visto permanente, Embaixador, para libaneses - foi a proposta pelo e-Cidadania, do Presidente da Fundação Libanesa de Minas Gerais.
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O SR. HERMANO TELLES RIBEIRO - Isso. Perfeito.
Então, existe uma legislação com os critérios que se aplicam para visto permanente com vários requisitos. Essa é uma legislação que tem sido aplicada por reunião familiar, etc. Então, essa é uma prática que, digamos, faz parte da nossa prática consular ordinária. Por isso que eu perguntei se haveria algum outro tipo de nível de ambição em termos de liberalizar, de modificar a legislação - aí, é preciso ver com o Ministério da Justiça - em matéria de concessão de visto permanente. A modalidade de visto permanente, evidentemente, existe, e há vários critérios que são atendidos, e não há nenhum entrave quanto a isso, evidentemente, no momento atual.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Significa que os libaneses, quando requisitam, têm visto permanente para o Brasil?
O SR. HERMANO TELLES RIBEIRO - Sim, caso atendidos os requisitos da legislação. Então, há alguns requisitos que precisam ser atendidos, e o setor consular processa esses vistos. A pessoa chega por um período, chega ao Brasil, faz o registro...
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Embaixador, é a mesma liberalização que os americanos têm para entrar no Brasil e que nós não temos em contrapartida? É essa a liberalização que os libaneses têm para cá? É a mesma que os americanos têm, que foi concedida em 2019?
O SR. HERMANO TELLES RIBEIRO - Não, é uma modalidade bem diferente. A concessão que foi feita a nacionais americanos e de outros três países foi uma concessão unilateral para ingresso de turistas, não necessariamente para visto permanente de residente. Aqui, nós estamos falando de visto permanente, e, evidentemente, é um tema em que o nosso Itamaraty, pela área jurídica, poderá examinar os critérios que hoje são utilizados para a concessão que é feita natural e ordinariamente de vistos permanentes para estrangeiros no Brasil.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Embaixador. Obrigada.
Passo a palavra, por cinco minutos, ao Sr. Embaixador Ruy Pereira, Presidente da ABC, Agência Brasileira de Cooperação.
O SR. RUY CARLOS PEREIRA - Se a senhora me permitir, Sra. Senadora, vou passar rapidamente pela lista de Senadoras e Senadores que manifestaram curiosidades ou fizeram alguma observação sobre a questão de cooperação humanitária e cooperação técnica...
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Embaixador, pela urgência da hora e outros agendamentos que nós temos posteriormente, cinco minutos, por favor. Eu gostaria que o senhor pudesse resumir, porque me ajudaria muito.
Obrigada.
O SR. RUY CARLOS PEREIRA - Sim.
Por favor, a senhora me interrompa quando considerar necessário, Sra. Senadora.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - A campainha tocará antes dos 15 últimos segundos.
Obrigada.
O SR. RUY CARLOS PEREIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado à senhora.
Então, rapidamente, começando pela sugestão do Senador Tasso Jereissati, que mencionou, se não me equivoco, num diálogo com o Senador Esperidião Amin, realizar uma reunião para aprofundar, digamos, o exame das ideias e sugestões que apareceram durante a presente sessão.
Eu gostaria de dizer à senhora que a Agência Brasileira de Cooperação está à sua disposição e à disposição do Senado Federal para, se for considerado útil, participar dessa reunião ou oferecer subsídios a essa reunião.
Por que falo em oferecer subsídios a essa reunião? Porque o Senador Esperidião Amin mencionou a questão do conhecimento como base das novas parcerias com o Líbano. Entendi a transferência de conhecimento...
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Ele chegou a mencionar, por exemplo, a questão da Medicina, fazendo referência a médicos de origem libanesa e hospitais no Brasil - e a senhora também mencionou isso quando se referiu à telemedicina - que são centros importantes de atenção médica e que poderiam colaborar com o Líbano.
O que eu gostaria de dizer é que justamente a base do sistema brasileiro de cooperação técnica e humanitária, sobretudo de cooperação técnica internacional, é a transferência de conhecimento. Portanto, hoje, na minha apresentação - a senhora se recordará -, eu mencionei quatro projetos que têm a ver com transferência de conhecimento. O primeiro, tipicamente de cooperação técnica, que trata de agroecologia e aqueles outros três que derivaram da visita do Presidente Temer a Beirute, no ano passado, como enviado especial do Presidente da República, que especialistas brasileiros identificaram como possíveis de serem desenvolvidos por projetos de cooperação técnica humanitária, que nós devemos estar começando, a partir de outubro próximo, na área de ortopedia e traumatologia - aí, estamos com a hipótese de reconstrução de um centro cirúrgico de um hospital especializado nesse segmento no Líbano -, na área de gestão de riscos pós-desastre e também na área de recuperação de áreas afetadas por grandes desastres, que é toda a área que está em volta do porto de Beirute.
Então, essa questão do conhecimento, para nós, é absolutamente essencial, e essa transferência de conhecimento é o que caracteriza os nossos projetos, e nós estamos prontos para colaborar no que for possível nesse sentido.
Aliás, eu gostaria de mencionar que, naquela videoconferência de que participamos no início desta semana, de que falei, a comunidade libanesa tem uma espécie de núcleo duro de especialistas que está trabalhando justamente na identificação de novas fórmulas de parceira e de auxílio ao Líbano, e já coloquei aqui a Agência Brasileira de Cooperação em contato com esse núcleo para identificarmos quais projetos poderiam ser desenvolvidos com a participação da comunidade libanesa no Brasil.
Com relação à sua ideia de fundo de curto prazo, parece-me que é plenamente justificável, alimentos, medicamentos e combustíveis, como mencionou o Senador Chico Rodrigues, e nós teríamos aí que trabalhar também na verificação de como fazer para superar os óbices que hoje a legislação brasileira oferece, por exemplo, à remessa de recursos de natureza privada sob forma de doações para o exterior.
A comunidade libanesa, no ano passado, fez com que se fizesse uma remessa para o exterior, que nós auxiliamos nas nossas medidas máximas possíveis, que pagou, de impostos, algo perto de 30% para fazer essa remessa. Eu acho que esse é um ponto que deve merecer a atenção, sim, do Senado Federal e também da Administração Pública Federal.
E, finalmente, eu queria mencionar, porque não posso me estender mais, a sugestão do observatório da assistência humanitária ao Líbano feita pelo Senador Nelsinho Trad.
Eu gostaria de dizer que nós estamos prontos a discutir e examinar quais seriam as informações desejáveis para que pudéssemos estruturar esse observatório, que, aliás, devo dizer, poderíamos estender ao conjunto da assistência humanitária brasileira. Na América Latina, por exemplo, o Haiti, que foi aqui mencionado, é um grande recipiendário da assistência humanitária brasileira há muito tempo. Depois do terremoto de 2010, nós investimos US$40 milhões em hospitais no Haiti. O sistema público de saúde do Haiti, por exemplo, hoje tem como base três hospitais construídos pela cooperação técnica brasileira, construídos, equipados e gerenciados, e que hoje estão de posse do Governo haitiano.
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Eu por aqui termino então, Sra. Senadora.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Embaixador, muito obrigada.
O SR. RUY CARLOS PEREIRA - Coloco-me à inteira disposição da senhora, da Comissão e do Senado Federal.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Muitíssimo obrigada pela sua informação, inclusive com relação ao imposto, caso o fundo faça a transferência, com relação aos impostos de doação. Muito útil, e agradeço bastante.
Eu vou passar a palavra agora para a nossa Embaixadora Carla Jazzar e depois para o Senador Esperidião Amin, para encerrar.
Por favor, por cinco minutos, Embaixadora, com a palavra.
A SRA. CARLA JAZZAR (Para expor.) - Obrigada, Sra. Abreu, muito obrigada por esta oportunidade, pela sua liderança excepcional da audiência.
Queria agradecer também a presença dos Senadores Esperidião Amin, Tasso Jereissati, Simone Tebet e Chico Rodrigues, e pelas intervenções muito entusiásticas e interessantes. Agradeço.
Eu não diria mais, porque, Sra. Abreu, você entende tudo. Eu sabia que você e eu pensávamos da mesma maneira. Obrigada, muito obrigada.
Uma coisa para se lembrar é que todas as transferências no Líbano precisam ser liberadas de impostos e custos. É uma coisa em que devemos trabalhar, para aliviar os custos e impostos.
Obrigada. Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Muito obrigada.
Essa informação é muito importante. O Líbano já se preparou para isentar de impostos qualquer doação que chegue até lá. E isso é uma coisa muito justa.
Muitíssimo obrigada, Embaixadora, pelas suas palavras e por tudo.
Passo a palavra ao Senador Esperidião Amin, mas antes eu quero nomeá-lo coordenador do grupo de trabalho, ele, o Nelsinho Trad e os membros, Simone Tebet e Tasso Jereissati, justamente para que esse checklist de hoje, a nossa Embaixadora Eliana fará esse checklist, pontuará tudo bem descrito, bem claro, esse checklist para V. Exa., que não tem o direito de recusar. Claro, eu tenho certeza de que não recusará essa coordenação, a terá e pegará com muita alegria, você como coordenador, e o Nelsinho como vice-coordenador desse grupo de trabalho. E eu quero estar muito próxima, ao lado de vocês, em todo momento que necessitarem da Presidente desta Comissão, para articular, em qualquer área que acharem necessário.
Consulto o Senador Chico Rodrigues se gostaria também de fazer parte desse grupo de trabalho. (Pausa.)
O Chico Rodrigues também gostaria de contribuir, pela experiência que o Estado dele tem com imigração e com tudo mais.
E os nossos Embaixadores. Embaixador Hermano, em momento algum nós queremos demonstrar que não esteja sendo feito nada, absolutamente. Esse não foi o objetivo da nossa Comissão. Nós sabemos que o Brasil está fazendo, que é um grande amigo, que é um grande parceiro, que o senhor tem trabalhado bem, com bastante força aí no Líbano, mas nós queremos mais do que isso. Nós queremos ajudar ainda mais, por decisão da nossa Comissão e especialmente dos nossos Senadores descendentes de libaneses, que têm todo o nosso apoio nesse pleito.
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Então, por favor, Senador Esperidião Amin, para encerrar a nossa Comissão, com a palavra.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Para discursar. Por videoconferência.) - Sra. Presidente, não sei se estou sendo ouvido. (Pausa.)
Sim.
Quero reiterar aqui meus cumprimentos pela forma objetiva, generosa como a senhora conduziu esta reunião, cumprimentar a nossa Embaixadora Carla Jazzar e todos que participaram do encontro.
Eu até gostaria de ter aparteado, mas fica melhor assim, as palavras do Embaixador Hermano Telles Ribeiro, quando ele fez a especificação, a pedido de V. Exa., Senadora Kátia, dos tipos de visto, em função do pedido de visto permanente que foi encaminhado pela Federação Mineira.
E a propósito, eu tenho um requerimento apresentado aí para convidar os Ministros do Turismo e das Relações Exteriores, em função de um problema emergente, que decorre da não reciprocidade. O que o Embaixador Hermano nos explicou foram as características de reciprocidade e as especificações dessa reciprocidade. O meu requerimento, que eu já mencionei na reunião de anteontem, diz respeito à iminente abertura dos Estados Unidos para os brasileiros e os prazos para renovação e concessão de vistos, que discrepam da situação que o Governo brasileiro inaugurou, a partir de março de 2019, ao dispensar o cidadão americano de visto para visitar o Brasil, visto da modalidade turística, ou seja, nós temos que negociar para que não fique tão, digamos, constrangedoramente desequilibrada a natureza do tratamento.
Nós também temos interesses nos Estados Unidos. E se concedemos essa dispensa de visto, queremos pelo menos que os nossos vistos, os nossos pedidos de visto sejam apreciados num prazo menor do que o que está sendo anunciado, por exemplo, pelo Consulado em São Paulo, que é de 355 dias de espera.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO. Fora do microfone.) - É pouco, está bom. (Risos.)
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - É o famoso... Naquele tempo da Confederação Nacional da Agricultura, a gente dizia que era "prazo de égua", não é verdade? Então, só para pedir um equilíbrio, não é nenhuma declaração de guerra, não, é apenas uma tentativa de composição.
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Mas eu queria voltar para o assunto da nossa reunião para dizer o seguinte: além das medidas emergenciais, certamente nós temos que usar da criatividade para procurar novas formas e formas novas de apoiarmos o esforço, tanto do Embaixador Ruy Pereira quanto do Embaixador Hermano, e usar a inteligência e a oportunidade que o debate pode propiciar para que seja esclarecido.
Então, mais uma vez os meus cumprimentos, Senadora Kátia Abreu. Quero agradecer a todos que participaram e cumprimentá-los.
Eu não entendi bem se esse grupo de trabalho, que vai ser presidido pelo Senador Nelsinho Trad, pode aceitar sugestões, mas queria dizer que aquele pedido, a sugestão do Senador Tasso Jereissati deve se incorporar a isso aí. Eu vou promover, junto com ele, uma reunião. Vamos convocar outros talentos levantinos que nós temos aqui.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Isso.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - Por exemplo, Omar Aziz.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Isso. Ótimo.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - Não é um sobrenome dinamarquês - não é. É levantino. E procurar construir uma sinergia possível para colaborar com o esforço que o Itamaraty, com muita competência, demonstrou que está desenvolvendo, e V. Exa. e a Comissão sabem reconhecer e ressaltar.
Quero agradecer, mais uma vez, ao Embaixador Achilles, que me encorajou nesse pedido. Ele que vivenciou a realidade lá no Líbano e na Síria, em momentos igualmente muito difíceis e delicados. Eu acho que nós estamos acentuando ou dando relevo à resposta, em termos de solidariedade, que o Brasil sente, mas precisa materializar.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Esperidião. Também faço o meu cumprimento especial ao Embaixador Achilles, que sempre nos atende com muita atenção.
Eu acredito que esse grupo de trabalho, unido por esses Parlamentares descendentes de libaneses, tenho certeza, Esperidião, Tasso, Simone, Nelsinho Trad, saberá coordenar os trabalhos. Eu não sou descendente, mas sou admiradora. De coração, também sinto-me descendente e gostaria de ajudar bastante.
Passo aqui ao requerimento do Senador Esperidião Amin, a que ele se referiu agora há pouco e sobre o qual já havia falado comigo ontem.
Propõe audiência pública com os seguintes convidados: Exmo. Gilson Machado, Ministro do Turismo, pessoalmente e sem representação - é o que nós esperamos; assim como o Exmo. Sr. Alberto França, o nosso Chanceler, Ministro das Relações Exteriores - os dois. Eu acrescento a SAE (Secretaria de Assuntos Estratégicos). Assim nós poderemos discutir não só o visto americano, mas que o Governo possa colocar estrategicamente o que pensa a respeito dessas relações com outros países no que diz respeito a esses vistos para o turismo.
Então, em discussão. (Pausa.)
Não havendo quem queira discutir, em votação. (Pausa.)
Aprovado.
O segundo requerimento é de minha autoria.
A Senadora requer à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional - nº 18 o meu requerimento - a instituição de grupo de trabalho, nos termos de ato da Presidência desta Comissão, com a participação de instituições tais como a de comércio exterior, acadêmicas, Poder Executivo, Legislativo, Judiciário, além de especialistas na matéria, com apoio técnico, administrativo e financeiro dos órgãos da Casa, assim como o MRE, para elaborar proposta de projeto de lei de consolidação da legislação de comércio exterior brasileiro, com vistas à sua harmonização, racionalização e simplificação.
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Então, nós ficaremos em aberto para a indicação dos Senadores - eu farei isso pessoalmente -, e o MRE (Ministério das Relações Exteriores) poderá indicar também um representante para esse grupo de trabalho. Nós queremos finalizar antes do recesso Parlamentar. Até o dia 5 de dezembro nós queremos entregar ao Brasil, aos exportadores, aos brasileiros, aos países irmãos, a consolidação dessa legislação tão importante que deverá ter o apoio não só do MRE, mas também da equipe da Camex. São pessoas da maior capacidade que se encontram no Ministério da Economia nessa área e que poderão nos ajudar a agilizar esse complexo de leis. Aliás, no Brasil há tantos milhares de leis em todos os setores que, se a gente conseguisse consolidar, por áreas - agricultura, meio ambiente, comércio exterior, trabalho -, nós daríamos um grande ganho aos advogados do País e a todo o Judiciário, que vivem perdidos nesse emaranhado de leis. São mais de 10 mil leis que este País tem.
Então, em discussão. (Pausa.)
Não havendo quem queira discutir, passo à votação.
Em votação.
As Senadores e os Senadores que aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovado esse requerimento.
Proponho a dispensa da leitura e aprovação das atas anteriores referente às 7ª e 13ª reuniões.
As Senadoras e os Senadores que as aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovadas.
As atas aprovadas serão devidamente publicadas nos termos regimentais.
Sra. Embaixadora Carla, assim que o nosso checklist ficar pronto, que nós o daremos aos nossos colegas Senadores, nós também enviaremos à senhora cópia desse checklist para que possa acompanhar, junto conosco, os nossos trabalhos. A Comissão de Relações Exteriores, em toda audiência, em todo objetivo, em todo assunto debatido aqui, tem sempre um checklist com respostas, que nós ficamos devendo e temos a obrigação de responder.
Agradeço, mais uma vez, a todos os participantes, aos Embaixadores, ao jornalista Guga Chacra, ao Professor Hussein, agradecendo, mais uma vez, a participação, inclusive, dos Senadores e Senadoras pelo prestígio da presença, às autoridades aqui presentes e aos nossos convidados do e-Cidadania.
Agradecendo a todos pela presença, declaro encerrada esta importante reunião.
Boa tarde a todos!
(Iniciada às 10 horas, a reunião é encerrada às 13 horas e 11 minutos.)