28/09/2021 - 11ª - Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 11ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para instrução do Projeto de Lei nº 2.505, de 2021, que altera a Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, que dispõe sobre a improbidade administrativa, conforme o Requerimento nº 3, de 2021, da CCJ, de iniciativa do ilustre Senador Alvaro Dias.
A presente reunião será semipresencial, sendo permitida a participação remota das Sras. e dos Srs. Senadores e dos convidados, por sistema de videoconferência, para exposições e debates. O acesso à sala de reunião estará restrito às Sras. e aos Srs. Senadores, aos convidados, aos servidores da Secretaria de Comissões e das áreas de tecnologia do Senado Federal, no estrito exercício de suas atribuições. Caso necessário, um assessor poderá adentrar a sala de reunião para atender demanda do respectivo Senador, retirando-se imediatamente após a finalidade cumprida.
As regras e os procedimentos para a reunião foram definidos para fins de prevenção da transmissão da covid-19, no âmbito do Senado Federal e no que couber, estando de acordo com as normas exaradas pela Casa, já conhecidas. Esta reunião será realizada em caráter interativo, ou seja, com a possibilidade de participação popular. Dessa forma, os cidadãos que querem encaminhar comentários ou perguntas poderão fazê-lo por meio do portal e-Cidadania no endereço www.senado.leg.br/ecidadania ou pelo telefone da ouvidoria: 0800-0612211.
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São convidados desta reunião: o eminente Ministro do Superior Tribunal de Justiça, professor Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin; o eminente Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo e Presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, Dr. Roberto Livianu; o eminente Dr. Manoel Galdino, economista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo e Diretor-Executivo da Organização Transparência Brasil; o eminente Prefeito Municipal de Jacareí, Sr. Izaías José de Santana, do Estado de São Paulo, Doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo; Dr. Lucas de Castro Rivas, advogado; e o Professor Dr. Marçal Justen Filho, advogado e doutor em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Peço aos convidados que irão participar presencialmente desta audiência pública para tomarem seus lugares, por gentileza, na bancada.
Senador Alvaro Dias, por gentileza, com a palavra V. Exa.
O SR. ALVARO DIAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR. Pela ordem.) - Presidente Anastasia, enquanto V. Exa. organiza o início da reunião, eu gostaria de fazer um apelo e um registro. V. Exa. não preside a Comissão, mas é o Vice-Presidente e obviamente tem grande influência nas decisões desta Comissão de Constituição e Justiça, especialmente no que diz respeito à sua condução.
Primeiramente, nós fazemos uma indagação: se há já definição da data para a sabatina a fim de que possamos cumprir o rito, cumprir o nosso dever constitucional e sabatinar o indicado pelo Presidente da República para o preenchimento da vaga existente no Supremo Tribunal Federal desde a aposentadoria do ministro Marco Aurélio, que se deu no dia 12 de julho. Portanto, já tivemos tempo suficiente, aliás, exageradamente suficiente para deliberarmos sobre a indicação do Presidente da República. É bom sempre lembrar que é prerrogativa exclusiva do Presidente da República, no sistema vigente, fazer a indicação e que nos compete apenas sabatinar o indicado e deliberar em Plenário sobre essa indicação. A gaveta não é o melhor lugar neste momento, até porque criamos um impasse no Supremo. Eventualmente é possível o empate nas decisões importantes da Suprema Corte.
Eu sei, Presidente, que muitos de nós - e eu me incluo entre eles - não concordamos mais com esse sistema, que é o sistema da indicação política, do chamado apadrinhamento político, e que nós queremos substituí-lo pelo sistema da meritocracia. V. Exa. é Relator de um desses projetos aqui no Senado Federal e apresentou um substitutivo. Está chegando neste momento, inclusive, o autor desse projeto, Senador Lasier Martins. Esse projeto, com o substitutivo de V. Exa., com as alterações que o aprimoram, certamente nos conduziria a um sistema de meritocracia que valorizaria o Supremo Tribunal Federal, restabelecendo o seu conceito diante da sociedade. Que há desgaste, todos nós sabemos; que a Suprema Corte sofre tremendo desgaste neste momento, todos nós sabemos. Evidentemente, as razões também são sobejamente conhecidas. A suspeição que pesa sobre decisões do Supremo Tribunal Federal tem origem nesse sistema da indicação política. Se nós queremos eliminar ou minimizar a suspeição, devemos mudar o sistema.
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E é preciso, para aqueles que nos acompanham, destacar que a proposta fala em eleição: a magistratura elegeria um, o Ministério Público outro, a advocacia outro, teríamos uma lista tríplice submetida ao Presidente da República, ele escolheria o da sua preferência e submeteria a esta Comissão e, posteriormente, ao Plenário do Senado Federal. Certamente a suspeição que vigora hoje seria eliminada, uma vez que não haverá apadrinhamento, e apenas a valorização do talento, do preparo, da qualificação técnica e profissional. Esse é o caminho, Presidente.
Hoje nós estamos sob a égide de um sistema diferente, que é o da indicação política, e só nos cabe sabatinar e deliberar. Por essa razão, o nosso apelo a V. Exa. de que é preciso determinar a data da sabatina do Dr. André Mendonça. Esperar que o Presidente da República retire esta indicação eu creio que é exagerar em relação ao conceito que se tem do Presidente da República. Não imagino o Presidente da República retirando o nome do Dr. André Mendonça, que ele escolheu, por certo, cuidadosamente. E, de outro lado, esperar que o Dr. André Mendonça renuncie a essa indicação também seria esperar demais, seria desacreditar do indicado de forma definitiva. Nós não pensamos assim, Presidente, e queremos cumprir o nosso dever, queremos deliberar sobre essa indicação. Por isso o nosso desejo de que V. Exa. e o Presidente Davi Alcolumbre, que não está presente, possam determinar uma data para a sabatina.
Esse é o apelo, Presidente Anastasia.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Muito obrigado, eminente Líder Senador Alvaro Dias. Cumprimento V. Exa., que tem sempre o coração generoso e atribui a este Vice-Presidente mais força do que ele tem. Eu já indaguei do Presidente Davi também sobre a questão da data, em coro com o que V. Exa. coloca, e ele me disse que fará a marcação. Mas, como V. Exa. sabe, a minha função de Vice é tão somente substituí-lo no momento da sua ausência.
Com referência à proposta de emenda à Constituição de autoria do eminente Senador Lasier Martins, que aqui se encontra, e da qual eu sou Relator, eu também já pedi ao Senador Presidente Davi que paute a matéria. Acho, de fato, que nós avançamos bem. E, se me permite V. Exa., eu acresço, além da exposição que V. Exa. coloca, que também na proposta há a figura do mandato, o mandato de dez anos. Nós fizemos um estudo muito detalhado do Direito comparado, das estruturas comparadas, e acolhemos o modelo europeu, que se dá exatamente pelo processo de indicações de organismos, como V. Exa. aqui, de maneira muito clara, arrolou; e, ao mesmo tempo, o mandato, claro, com vigência futura e não afetando os atuais Ministros do Supremo. Então, estou aguardando também essa votação, porque fiz o parecer com muito gosto e tenho muito entusiasmo, igualmente, como V. Exa., por essa proposta.
Vou reiterar ao Presidente Davi, que se encontra no seu Estado natal, essa ponderação de V. Exa., que registro com muito gosto.
O SR. ALVARO DIAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - É porque, Presidente, vai ficando muito mal para o Senado, como instituição, essa omissão. Lamento a ausência do Presidente Davi Alcolumbre, mas é preciso preservar esta instituição de desgastes dessa natureza. Nós não podemos pedir para apanhar da sociedade nestas circunstâncias. Temos o dever de trabalhar para recuperar o conceito de uma instituição que é essencial ao Estado de direito.
Obrigado, Presidente.
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O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Eu que agradeço, eminente Senador Alvaro Dias.
De acordo com o art. 94, §§2º e 3º do Regimento Interno, a Presidência informa que adotará as seguintes normas. Os convidados farão as suas exposições e, em seguida, abriremos a fase de interpelação pelas Sras. Senadoras e Srs. Senadores inscritos. A palavra a Senadoras e Senadores será concedida na ordem de inscrição. Os Senadores interpelantes disporão de três minutos, assegurado igual prazo para a resposta do interpelado, sendo-lhe vedado interpelar os membros da Comissão.
Eu queria agradecer muito a presença dos convidados. Nós temos aqui a ilustre presença física - presencialmente, como se diz atualmente - do Dr. Manoel Galdino, do Dr. Izaías José de Santana, do Dr. Roberto Livianu e do Dr. Lucas de Castro Rivas. Remotamente, estão presentes o eminente Ministro Herman Benjamin e o eminente Professor Marçal Justen Filho, que vejo aqui, virtualmente. Agradeço muito a presença de todos os senhores, como também dos eminentes Senadores que aqui se encontram presencialmente - já saudei o Senador Alvaro Dias, o Senador Lasier e o Senador Oriovisto - e também daqueles que se encontram remotamente presentes.
Nós vamos começar e adotaremos aqui um critério, alternando entre os convidados apresentados pelo Senador Alvaro Dias e pelo eminente Senador Weverton, que é o Relator. Então, convidaremos, em primeiro lugar, para sua exposição, remotamente, o eminente Ministro Herman Benjamin, em seguida, o Prefeito Izaías José de Santana; depois, o Dr. Manoel Galdino, em seguida, o Dr. Lucas de Castro; depois o Dr. Roberto Livianu e, ao final, o Professor Marçal Justen Filho.
Chegou o Relator. (Pausa.)
Tome assento onde V. Exa. achar melhor. Caso queira ficar aqui, terá o prazer desta Presidência.
Então, com a presença do Relator, vamos dar início a nossa audiência pública.
Eu convido para a sua exposição... Nós vamos fixar o prazo de até 15 minutos, e eu peço de fato a compreensão, porque certamente teremos muitas perguntas, os Senadores já se inscreveram e nós temos os prazos a serem cumpridos. Então, eu convido, remotamente, o eminente Ministro do Superior Tribunal de Justiça Herman Benjamin para sua fala, não sem antes cumprimentar a presença da Ministra Eliana Calmon, que vejo aqui que se encontra na nossa audiência.
Ministro Herman, a palavra está com V. Exa. Mais uma vez agradeço a gentileza da sua participação.
O SR. ANTONIO HERMAN DE VASCONCELLOS E BENJAMIN (Para expor. Por videoconferência.) - Muito bom dia. Eu queria inicialmente agradecer, Senador Antonio Anastasia, a possibilidade de retornar ao Senado virtualmente. Pelas minhas contas, eu já participei de mais de cem audiências públicas desde o período imediatamente após a Constituição de 1988, no Senado e na Câmara dos Deputados, sempre para discutir projetos de lei e iniciativas as mais diversas dos eminentes Parlamentares das duas Casas.
Saúdo, inicialmente, V. Exa., que é uma das referências jurídicas e éticas do nosso País e do nosso Parlamento; saúdo o nosso Relator, Senador Weverton Rocha, das terras de Imperatriz, no Maranhão, e que certamente vai fazer um trabalho extraordinário no seu relatório; o Senador Alvaro Dias; o Senador Lasier Martins. Vejo aqui o Senador Nelsinho Trad, das terras do Pantanal, também o Senador Luiz do Carmo, Senadora Rose de Freitas, o Senador Lucas Barreto e o Senador Marcos do Val.
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E eu peço desculpas porque eu não consigo enxergar os eminentes Senadores que estão fisicamente no Plenário da CCJ. Queria também saudar os meus colegas de Mesa que serão expositores hoje e muito especialmente, se me permitem, V. Exa., Presidente, e o eminente Relator Weverton Rocha, saudar a Ministra Eliana Calmon, que é uma referência no nosso País no que se refere à ética, à probidade, e uma vida dedicada efetivamente à Justiça. Ela fez escola e deixou muitos alunos.
Presidente, eminente Relator, eminentes Senadores, toda lei, quando é promulgada, naquele dia começa o seu envelhecimento. E, a partir daí, evidentemente que se impõe o processo parlamentar de fiscalização da sua implementação e, a partir daí, busca-se a sua atualização, principalmente numa área tão cambiante como é a da improbidade administrativa e do combate à corrupção.
Eu queria já adiantar que eu vou fazer os meus comentários apenas com os olhos postos no texto que chegou da Câmara, porque o eminente Senador Weverton Rocha ainda está trabalhando com a sua assessoria e com sua larguíssima experiência no texto que S. Exa. finalmente apresentará ao Senado e ao País.
Queria também mencionar que, normalmente, diante de um projeto legislativo, a minha postura é a seguinte: primeiro, tentar identificar o espírito e os objetivos da proposição; segundo, verificar se os dispositivos que lá estão apostos alcançam aqueles objetivos - às vezes, alcançam, mas vão muito além. Existe aquilo que na linguagem militar se chama de efeitos colaterais. Não são efeitos intencionais; são efeitos que ocorrem, às vezes, por faltar uma vírgula, uma palavra a mais, para delimitar aquele dispositivo -; e, finalmente, buscar colocar este projeto de lei ou proposição legislativa na lógica do ordenamento jurídico brasileiro.
Eu começo exatamente pela lógica do ordenamento jurídico brasileiro, que é: os tipos penais e as sanções penais recebem a maior constrição possível prevista no ordenamento jurídico. Em segundo lugar, vêm os tipos sancionatórios e as sanções de natureza civil e administrativa. E, em terceiro lugar, os negócios jurídicos, os contratos etc. Ou seja, na lógica do ordenamento, considerando que o combate à corrupção é uma prioridade absoluta, não parece lógico que as normas de combate não penal à improbidade administrativa e à corrupção possam ser mais protetórias do investigado, do réu, do que aquelas que se aplicam no processo penal. E o que eu vou aqui levantar são alguns exemplos em que isso aqui, certamente por efeitos colaterais, está ocorrendo, ou seja, algo será crime e poderá propiciar que alguém seja preso, mas não permitirá que, no âmbito não penal, essa mesma pessoa possa eventualmente ser processada e, se for o caso, condenada pelo mesmo fato, ou seja, cria-se um regime jurídico mais estrito para o combate não penal da improbidade administrativa do que aquele previsto na própria legislação penal.
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E eu começo com a questão da transformação de todos os ilícitos da Lei da Improbidade Administrativa em ilícitos dolosos. A lógica aqui do ordenamento, e é legítima, e da própria proposição que chegou da Câmara é que a Lei da Improbidade Administrativa juntava alhos com bugalhos, e é correto isso, ou seja, é correto que a lei o fez de forma incorreta. É verdade, mas no sistema que nós temos agora e de que certamente, eu não tenho dúvida, o eminente Relator, o Senador Weverton Rocha, terá já feito seus estudos e as suas proposições a respeito, o que nós temos é que certas condutas continuarão sendo crime de forma culposa e não serão improbidade administrativa ou atos de corrupção. Então, aqui é a quebra da lógica. De novo, não retira a justiça da proposição inicial, de que a Lei da Improbidade não separava condutas mais graves de condutas mais leves.
E eu dou o exemplo com o art. 312, §2º, do Código Penal, que é o peculato culposo: "Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem" e aí vem a sanção penal. Pois bem, essa mesma conduta que é apenada com restrição de liberdade, prisão, de maneira culposa, não será admitida como causa petendi, como fundamento para ação de improbidade administrativa. E eu poderia citar vários outros exemplos em que, para mandar o acusado de improbidade ou de corrupção para a cadeia, é possível a forma culposa, mas, para processá-lo ou processá-la com base na Lei da Improbidade Administrativa, só de maneira dolosa e, mais ainda, com dolo específico; não é dolo genérico. São inúmeros os tipos penais que, embora não prevendo a forma culposa, preveem o dolo genérico.
Essa, então, a primeira observação que deixo.
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Poderia também mencionar tipos penais que não são estritamente relacionados à administração pública ou ao combate à corrupção e à improbidade administrativa. Por exemplo, o médico que resolve fazer experimentos com novos tratamentos no hospital público, sem informar aos seus pacientes, contrariando as regras da Organização Mundial da Saúde e dos seus pares, se há uma lesão grave, a pessoa fica, por hipótese, paralisada, ou vem a morrer, esse médico poderá ser processado por homicídio ou lesão corporal culposa, mas não poderá ser processado com base na Lei de Improbidade Administrativa. Tudo isso tem solução e, certamente, repito, o eminente Relator Weverton Rocha encontrará a fórmula correta, basta separar o joio do trigo e deixar exatamente para essas hipóteses em que é possível a culpa, no âmbito penal, que elas permaneçam por equiparação também por formas culposas e outras que sejam extremamente graves.
Passemos agora ao art. 11, que, de novo, é um dispositivo que foi muito criticado e creio que havia mesmo a necessidade de se encontrar formas e fórmulas de fechamento ou de redução da abertura do dispositivo como nós temos hoje na Lei de Improbidade Administrativa. O que ocorre, no entanto, é que esse dispositivo hoje, em que permaneceu o texto vindo da Câmara dos Deputados, inviabiliza o combate à corrupção e à improbidade administrativa em hipóteses que são gravíssimas.
Em vez de aqui se apresentarem figuras teóricas, cerebrinas, eu vou trazer precedentes do Superior Tribunal de Justiça de vários Relatores. E são precedentes que os meus colegas de Mesa todos conhecem, inclusive o Professor Marçal Justen Filho, que tem uma prática muito intensa de advocacia no nosso tribunal nessa matéria.
Bem, desaparece o inciso I, na versão que veio da Câmara, e o inciso II do art. 11. O que diz o inciso I? "Praticar ato visando a fim proibido em lei ou regulamento, ou diverso daquilo previsto na regra de competência". É fazer algo que é proibido na lei ou então que vai além da competência estabelecida. E o inciso II? "Retardar ou deixar de praticar indevidamente ato de ofício". E nós sabemos que há figuras penais para essas duas hipóteses que desaparecem.
Então, vamos ver alguns exemplos de condutas que foram confirmadas como de improbidade administrativa, pelo Superior Tribunal de Justiça, com base no art. 11, e que eu não vejo como, ou dificilmente, se encaixarem, seja no atual art. 11 como veio da Câmara dos Deputados, ou nos artigos 9º e 11.
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Primeiro, a prática, por agentes policiais, de tortura, prisão manifestamente ilegal e justiçamento. Há três precedentes no Superior Tribunal de Justiça nesta matéria. Eu não vejo como nós vamos encaixar - eu digo nós, coletivamente, a comunidade jurídica - a prática de tortura aqui, nesses dispositivos como eles chegaram da Câmara dos Deputados.
A prática da rachadinha. Há precedentes aqui, mais de um, em que um Parlamentar, Vereador, neste caso, obrigou os seus servidores a repassarem uma parte dos seus salários para o próprio. Vejam, os servidores trabalhavam; então, nós não vamos poder encaixar nas outras categorias. Era uma apropriação indevida dos valores desses pobres servidores. Há precedentes tanto da Primeira Turma quanto da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça.
Policiais que se deslocam a um show e disparam com armas de fogo sete vezes, sendo que um dos disparos atingiu uma criança, que veio a óbito. Esse é um precedente da Segunda Turma, e eu não sei como se encaixará nas hipóteses que remanescem do art. 11. Todos esses casos que eu estou mencionando são do art. 11.
Nomeação pelo Parlamentar de seu caseiro, cuja qualificação profissional é de pescador, para o exercício de cargo de assessor de informática na Assembleia Legislativa do seu Estado. Esse é um precedente da Primeira Turma. Há, inclusive, um dispositivo novo, acrescentado na Câmara dos Deputados, dizendo que simplesmente nomear não caracteriza improbidade administrativa, mesmo que faltem as qualificações. Esse é um exemplo que ficará, a meu juízo, sem uma resposta com base no art. 11.
Conselheira titular que mantém contato telefônico com o namorado preso através de telefone clandestino, inclusive durante o horário de trabalho. Procurou testemunhas e jurados que participaram da sessão do júri que seria na comarca, além de passar ao réu informações sobre os jurados. Esse é um precedente da Segunda Turma, que também ficará sem fundamento ou base, parece-me, nesse novo art. 11.
Médico pertencente ao SUS que cobra honorários de pessoas pobres. Isso é feito com base no art. 11 também. É um precedente da Primeira Turma.
Servidor público, ou melhor, auditor fiscal, que, ciente de que a empresa interessada tinha sua esposa e o sobrinho dela como sócios, atua no processo fiscal, encaminhando o caso para o reconhecimento de prescrição fiscal. Outro precedente.
Serventuário da Justiça entrou como ocupante do cargo de Diretor do Serviço de 1ª Vara Judicial de uma cidade do interior de São Paulo fazendo advocacia administrativa, precedente daqui, da relatoria de uma eminente Ministra que vem do Estado do eminente Senador Antonio Anastasia.
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Prefeito que, além de não prestar contas dos recursos recebidos do Ministério da Saúde, em quatro anos do exercício do seu mandato, deixe de entregar ao seu sucessor a documentação necessária para viabilizar a prestação de contas do exercício. Os dois eminentes Senadores que estão sentados à mesa sabem que quem assume um novo mandato precisa ter a regularidade ou pelo menos a documentação, mesmo que não finalizada, para poder continuar recebendo recursos federais da educação e da saúde. Sumiu com os livros. E o Município com o novo administrador vai ficar negativado, sem condições... E são os mais pobres do País.
São exemplos que eu trago, e outros tantos, que eu passarei às mãos de V. Exa., eminente Presidente desta reunião, Antonio Anastasia, e do eminente Relator, não menos eminente, o Senador Weverton Rocha.
Eu termino com a questão das sanções. E aqui a preocupação e, se quiserem, a perplexidade é muito grande, porque os cientistas políticos - e acho que nenhum cientista político vai falar hoje - certamente têm uma visão diferente de nós da área do direito. É que o corruptor pode ter um comportamento muito mais grave do que o, aspas, "corrompido", que, não raras vezes, herdam o sistema podre. Nós temos visto isso no decorrer da história do nosso Brasil, especialmente com as empreiteiras.
Então, aqui nós não podemos, ao estabelecer mecanismos de proteção do administrador que não tem apoio técnico, que desconhece a legislação, simplesmente criar uma superproteção para as empreiteiras, que são historicamente as mães, as avós e avôs, os pais da corrupção no nosso País. E são muitos os dispositivos aqui - eu vou passar às mãos dos eminentes Senadores - que têm o intuito não de proteger este coitado do administrador que está perdido nos confins de um Catolé do Rocha da vida, mas de proteger as grandes empreiteiras, que têm uma história de ataque aos cofres públicos e aos administradores do nosso País.
Os administradores têm um processo eleitoral a cada quatro anos; no caso dos Senadores, a cada oito anos. Passam pelo novo crivo das eleições. As grandes empresas não; mudam os administradores, e as práticas continuam. E onde que há as dificuldades aqui? Primeiro com a criação - e é para essas grandes empreiteiras, não é para o pequeno administrador - da chamada improbidade continuada. Isso está no art. 18-A, que diz o seguinte:
Art. 18-A. A requerimento do réu, na fase de cumprimento da sentença, o juiz unificará eventuais sanções aplicadas com outras já impostas em outros processos, tendo em vista a eventual continuidade de ilícito ou a prática de diversas ilicitudes, observado o seguinte:
I - no caso de continuidade de ilícito, o juiz promoverá a maior sanção aplicada, aumentada de 1/3 (um terço) [...]
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Em várias dessas investigações, na época em que eu estava no Tribunal Superior Eleitoral, o que se viu, o que eu vi eram empresas que dedicaram a sua existência à prática de ilícitos. Então, a continuidade é permanente, os contratos não são de dois anos, de seis meses, são contratos de quinze anos, de dez anos, de vinte anos. Então, essas grandes empresas praticarão todo tipo possível de ilicitude no Brasil e, a partir da pena maior e um terço, todo o resto é grátis. Então, eu entendo o que se quis aqui colocar, que foi proteger o Vereador que não tem conhecimento jurídico, o Presidente da Câmara, o Prefeito municipal, mas nós não podemos criar para esses pais e mães da corrupção no nosso País nenhum benefício que não existe no Direito Comparado.
Eu termino com a questão da absolvição criminal e da indisponibilidade.
Na indisponibilidade de terceiro, veja, nós estamos aplicando aqui, cuidando fundamentalmente de pessoas jurídicas. A indisponibilidade para essas empresas se torna praticamente impossível. E, ainda no caso de fusão e incorporação, o que surge depois, ou seja, a soma do podre com o não podre, é que o podre acaba absolvido. Isso está dito expressamente no texto que veio da Câmara dos Deputados.
Minha última consideração é sobre a absolvição criminal, art. 21, §4º. Isto está na folha 29 do texto que veio da Câmara dos Deputados: "A absolvição criminal em ação que discuta os mesmos fatos, confirmada por decisão colegiada, impede o trâmite da ação da qual trata esta Lei, havendo comunicação com todos os fundamentos de absolvição previstos no artigo 386...". Então, agora, será o único caso do ordenamento jurídico brasileiro em que alguém - isso vale para as pessoas jurídicas ou para os integrantes de pessoas jurídicas - é absolvido por falta de prova, e uma prova que é analisada com muito mais rigor no processo penal, é absolvido no âmbito criminal e não é absolvido por negativa do fato ou negativa da autoria. Isso se transplanta para o juízo cível e não se permite um aprofundamento das investigações, que, muitas vezes, envolvem contas no exterior, bancos criados no exterior, sistemas extremamente complexos de informática que estão também no exterior. Como nós podemos ver em vários episódios, não é de um governo, mas de muitos governos, de muitas administrações do nosso País, sobretudo, no que se refere às grandes corporações.
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Minha última palavra, Presidente, eminente Senador Weverton Rocha, é a de que, e eu não tive tempo aqui de analisar outros dispositivos, a serem mantidos, como estão, esses dispositivos, os mais críticos do texto que veio da Câmara dos Deputados, nós teremos pessoas ímprobas e corruptas punidas no crime, mas não passíveis de punição no âmbito não penal, no âmbito da Lei da Improbidade Administrativa.
Segundo, nós teremos pessoas punidas no exterior, com base, por exemplo, na legislação norte-americana do Foreign Corrupt Practices Act - eu acho que troquei as palavras aí, mas, enfim, é a lei de combate à corrupção federal nos Estados Unidos -, mas que não poderão ser processadas aqui com base na Lei da Improbidade Administrativa.
E, terceiro, se nós analisarmos o sistema dos países da OECD - e o Brasil quer fazer parte da OECD, e as missões da OECD vêm ao Brasil -, nós não vamos encontrar precedentes naquilo que está sendo colocado aqui, em alguns casos com o intuito louvável de evitar punições rigorosas para um administrador que é simplesmente relapso, que não tem conhecimento, mas que nós temos, no texto, como resultado direto ou indireto, a construção de uma superproteção não para o corrupto, mas para o corruptor, em particular para as grandes empresas que usam e continuam a usar, mesmo no período de pandemia, como se investiga hoje no Senado Federal, de práticas condenáveis de improbidade administrativa e também de corrupção.
Agradeço mais uma vez o convite que me foi feito.
Desejo ao eminente Relator, Senador Weverton Rocha, muito sucesso no seu trabalho, que certamente trará benefícios para o Brasil como um todo.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Muito obrigado eminente Ministro Herman Benjamin. Agradeço muito a V. Exa. pela colaboração a esta Comissão de Constituição e Justiça, certamente faço o agradecimento também em nome do eminente Relator, Senador Weverton.
Extrapolou um pouquinho o prazo, sete minutos, eu controlei aqui, mas o Ministro falando remotamente, a campainha é dada aqui na sala, então, a tolerância sempre se dá e é sempre bom ouvir o Ministro Herman.
Mas, de todo modo, eu encareceria aos nossos convidados que pudessem ficar no prazo, porque são seis os convidados.
Agradeço muito, portanto, a participação do Ministro Herman Benjamin, certamente muito elucidativa, e convido, agora, o próximo convidado, o próximo interlocutor, que será o Prefeito Izaías José de Santana, Prefeito de Jacareí, do Estado de São Paulo, que também é doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo.
Indago ao Dr. Izaías se ele prefere falar da bancada ou se desejaria falar aqui de frente? Está bem aí?
Então, por gentileza, Prefeito Izaías, com a palavra V. Exa.
O SR. IZAÍAS JOSÉ DE SANTANA (Para expor.) - Exmo. Sr. Senador Antonio Anastasia, Exmo. Sr. Senador Weverton, Exmo. Sr. Senador Alvaro Dias, que convocou esta audiência pública, em nome dos quais cumprimento todos os Senadores da República, quero aqui citar, primeiro, a minha gratidão ao nosso Presidente da Frente Nacional de Prefeitos, Prefeito Edvaldo, pela confiança a mim delegada de estar aqui representando os Prefeitos da frente e dizer das nossas angústias.
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A primeira grande questão sobre a qual precisamos refletir é quanto ao núcleo da Lei de Improbidade e as sanções da Lei de Improbidade.
A Lei de Improbidade não é a única legislação que combate a corrupção. Ela não revoga nem substitui o Código Penal, ela não revoga nem substitui a legislação de combate à corrupção, ela não afasta a aplicação da lei de responsabilidade, ela não afasta os diversos estatutos que regem a vida funcional, mas ela tem um núcleo essencial: ela quer afastar da vida pública o ímprobo, o desonesto, o corrupto, e ela atinge direitos fundamentais. Ela atinge a soberania popular, porque ela afasta do mandato, impõe a perda do cargo para quem foi eleito pelo povo, ela exclui da vida pública quem prestou concursos, ela suspende direitos políticos - que são direitos fundamentais -, ela coloca em disponibilidade o patrimônio, seja ele adquirido pela prática de ato ilícito ou seja ele anterior, e, mais do que isso, ela atinge de forma mortal quem tem honra e é acusado injustamente.
Então, é nesse prisma que nós devemos pensar que uma lei com essa gravidade precisa ser o mais específica possível. E, se nós já avançamos em nível de civilidade no Direito Penal, no Direito Tributário, garantindo princípios fundamentais, como, por exemplo, a individualização da responsabilidade, a lei de responsabilidade, a Lei de Improbidade, hoje em vigor, não garante a individualidade da responsabilidade. Se nós já avançamos no Direito Tributário inclusive, para impedir a retroatividade, a lei de responsabilidade, de improbidade administrativa, hoje, como interpretada e aplicada, não garante a irretroatividade sancionatória. Porque uma tese jurídica que se desenvolve, uma tese jurídica que é construída na doutrina ou na jurisprudência pode alcançar fatos e atos que, quando praticaram, sobre eles não havia nenhum questionamento.
E eu vou citar aqui o exemplo mais claro: nós ficamos 30 anos discutindo, neste País, o nepotismo. Não há legislação; há uma súmula. E até hoje nós temos Prefeitos que são cassados, à luz da Lei de Improbidade Administrativa, por nepotismo. Mas, se nós digitarmos o sistema mais simples de busca, a jurisprudência do Brasil, o STJ, o Tribunal de Justiça de Minas, o Tribunal de Justiça de São Paulo, nós vamos encontrar: ora nepotismo é improbidade, ora nepotismo não é improbidade; ora a súmula vinculante se aplica a agentes políticos de primeiro escalão, ora não se aplica. E, enquanto as teses, as discussões, os conceitos jurídicos indeterminados, os princípios imprecisos - cujo rol sequer conhecemos - alimentam a vaidade de alguns juristas, alimentam a teses e mais teses de doutorados, os Prefeitos e agentes municipais, secretários em especial, ficam nessa incerteza.
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Pode ser que, daqui a cinco anos ou daqui a dez anos, quem hoje praticou um ato sobre o qual não há nenhuma discussão jurisprudencial ou doutrinária de sua ilicitude... Por exemplo, amanhã, alguém pode construir uma tese de que se ofende o princípio da eficiência. O que é o princípio da eficiência?!
Se nós avançamos na legislação penal e na legislação tributária para garantir previsibilidade de conduta, para garantir que a pessoa saiba, com antecedência, do que poderá vir a ser acusada, até para lhe assegurar o direito de defesa e do contraditório, isso é negado na Lei de Improbidade Administrativa, como praticada hoje nos nossos tribunais. Sem a individualização subjetiva da conduta, sem a definição clara e precisa dos fatos e dos negócios do mundo jurídico, sem a segurança jurídica definindo os conceitos, definindo com precisão esses conceitos, a legislação delega aos acusadores e ao Poder Judiciário a função de construir o Direito no caso concreto. Isso é o que é mais absurdo no mundo das inseguranças jurídicas, porque, a pretexto de se combater a corrupção, abre-se, escancara-se uma discricionariedade criativa dos órgãos judiciais. É praticamente uma negação da função legislativa. Normas sancionatórias: ou as fazemos com precisão fática, ou as fazemos com elementos que permitam ao seu destinatário saber, de antemão, do que ele pode vir a ser acusado, ou caímos na barbárie da discricionariedade, da incerteza jurídica, da loteria jurídica.
Quantos Prefeitos deste País não foram acusados de improbidade por nomearem parentes de primeiro grau para cargos de agentes políticos? A súmula é expressa ao dizer que aos agentes políticos isso não se aplica, mas os tribunais se avocam o direito de perquirir se o caso concreto é ou não nepotismo. E alguns dizem que nepotismo é improbidade, outros dizem que nepotismo não é improbidade por falta de previsão legal.
Eu não vou pegar apenas o caso do nepotismo para convidar os senhores à reflexão. E o décimo terceiro de agentes políticos? Ficamos dez anos discutindo se Prefeitos e secretários, depois da mudança da emenda administrativa que transformou os vencimentos deles em subsídios, teriam direito ou não ao décimo terceiro. E, finalmente, a jurisprudência pacificou no sentido de que, se havia lei estabelecendo, eles podiam recebê-lo, mas o que a gente faz com a honra daqueles que foram afastados dos seus cargos e tiveram seus direitos políticos suspensos por terem recebido décimo terceiro? O que a gente faz com aqueles que foram acusados injustamente de se apropriarem de recursos públicos - e aí estamos no art. 9º -, porque se discutia a tese jurídica de que subsídio é incompatível com o décimo terceiro salário?
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Aprofundando mais as discussões, discutimos o conceito de culpa grave. O que é culpa grave? Qual é a régua? Quais os critérios? Quais os parâmetros? É o efeito sobre o orçamento? É o grau de conhecimento do agente político? É a consciência da ilicitude da conduta? Culpa grave, no mundo que é a administração pública, em que os gestores públicos - Prefeitos, secretários municipais, Governadores, secretários estaduais - precisam tomar decisões sobre todas as áreas de conhecimento afetas à administração pública... E deles é exigido que se conheçam planilha de custo e método construtivo de engenharia; e deles é exigido que conheçam questões técnicas de eletrônica, de internet, de serviços complexos. Em uma concessão, em uma licitação de uma concessão, como é que eu posso dizer para os servidores concursados, efetivos, que ocupam comissões de licitação neste País, que são ordenadores de despesa: "Fiquem tranquilos; se a sua culpa for leve, vocês não serão ímprobos"? O que é isso? É novamente a insegurança; é novamente legislar com conceitos indeterminados; é novamente legislar sem precisão capaz de garantir segurança jurídica, previsibilidade da conduta e, mais do que isso, capacidade de o cidadão comum que se aventura a ser Prefeito, que se aventura a disputar um mandato eletivo saber do que pode vir a ser acusado.
E aí nós temos dois elementos que resolvem: o dolo e o fato objetivo, descrito no art. 9º. Ninguém neste mundo, ninguém neste País pode se desculpar de ter enriquecido ilicitamente. Ninguém! É um fato objetivo: todos sabem quanto merecem, quanto ganham e qual é o seu salário; se recebeu a mais, não há desculpa. E não há desculpa também se agiu dolosamente. Agora, quando eu trago para o conceito a culpa, eu estou exigindo que o Prefeito, que o Governador seja onisciente, seja onipotente, porque, a título de culpa, ele vai responder pela improbidade de um funcionário de terceiro escalão. O Governador de Estado vai responder por improbidade cometida por um dirigente de uma sociedade de economia mista, porque ele foi culposo, agiu com culpa, foi negligente, foi imprudente e deveria saber que aquele cidadão que ele escolheu e nomeou era corrupto - nós não temos esse dom!
Além disso, no art. 10, nós também estamos resolvendo: é dano efetivo. E aí se postula que se volte a consagrar o que se está tornando realidade na jurisprudência: dano presumido, presunção de dano ao Erário. Como é que eu posso presumir um dano?! Presumir um dano ou acatar a tese do dano presumido é dispensar o órgão acusador do ônus de acusar, do ônus de demonstrar qual é o dano; é colocar no art. 10 o direito de o Poder Judiciário fazer escolhas políticas menos danosas ao Erário, porque, se o dano é presumido, basta alegar.
E aí a Lei de Improbidade fica com menos garantia que o Código Penal. Ela já é hoje, porque, pelo menos no Código Penal, existe suspensão da pena. Às vezes, é até melhor ir para o inferno - porque, pelo menos, tem chance de ir para o purgatório - do que quem tem honra responder por improbidade administrativa, pois acabou sua carreira política!
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O art. 11 era um desafio para todos que se debruçavam. Poucos defendiam ou defendem a manutenção do art. 11 tal como hoje está em vigor, porque ele é simplesmente um leque para todo e qualquer abuso. Todo e qualquer ato administrativo, negócio e contrato que se praticam no dia a dia das administrações pública cabem no art. 11. Se o Ministério Público requisita uma informação que o Prefeito atrasa, ofendeu o princípio da publicidade e deixou de cumprir um dever legal, e será improbidade no dia seguinte. E aqueles que só se interessam pela manchete? E aqueles que só se interessam pela denúncia? Ou não há? Ou o cargo coloca sobre seres humanos uma auréola de santos?
Quando nós conseguimos minimamente que se restrinja a aplicação do art. 11 às hipóteses taxativamente fixadas, nós estamos reduzindo esta avenida da discricionariedade que é o atual art. 11...
(Soa a campainha.)
O SR. IZAÍAS JOSÉ DE SANTANA - ... esta avenida da irresponsabilidade de se acusarem pessoas de bem.
Em todo ordenamento jurídico - os negócios jurídicos, os vícios dos atos, os vícios dos negócios - se corrige o negócio. O atual art. 11 é o único caso em que um vício de forma, um vício de procedimento ou uma diferença na execução orçamentária atinge direitos políticos indisponíveis, soberania popular, indisponibilidade de bens e patrimônio e, mais grave, a honra e a dignidade de quem não tem...
Se nós podemos legislar com objetividade fática, com precisão, não podemos sancionar, porque, se quisermos permanecer com legislações sancionatórias, com conceitos jurídicos indeterminados e normas abertas, nós estamos delegando ao aplicador da lei o poder de criar o Direito. Isso é insegurança jurídica em seu grau máximo!
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Muito obrigado, Dr. Izaías Santana. Agradeço muito a gentileza da participação de V. Exa. Igualmente a Comissão lhe agradece os insumos trazidos pelos conhecimentos como Prefeito e como doutor em Direito, que certamente serão sempre úteis ao nosso eminente Relator. Agradeço muito a participação de V. Exa., que se enquadrou no tempo que lhe foi destinado, o que agradeço também, portanto.
Dando sequência ao rol dos expositores, convido agora o nosso Dr. Manoel Galdino, economista, doutor em Ciência Política na Universidade de São Paulo, Diretor-Executivo da organização Transparência Brasil. Agradecendo também a sua presença, passo a palavra a V. Sa.
Dr. Manoel Galdino, por gentileza.
O SR. MANOEL GALDINO (Para expor.) - Bom dia!
Queria cumprimentar o Senador Anastasia, Vice-Presidente da Comissão; o Exmo. Senador Weverton Rocha, Relator do projeto aqui no Senado; os demais presentes; e todas e todos que estão assistindo à audiência pública.
Eu vou falar aqui hoje - tentar apontar - sobre o que na nossa visão são alguns dos principais retrocessos na Lei de Improbidade Administrativa, do que está presente no relatório do Senador Weverton.
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A gente entende completamente a necessidade de modernizar a lei, há vários pontos positivos, e eu acho que é uma questão de ajustar alguns pontos específicos que têm solução, uma solução já apresentada na forma de emenda que pode virar destaque. Então, vou passar para alguns pontos para dizer o nosso pleito: façam esses reajustes que a lei irá deixar de cometer alguns erros muito grandes, muito graves, e vai caminhar numa direção muito melhor.
Próximo eslaide, por favor.
Eu, como Diretor-Executivo da Transparência Brasil... Nós somos uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos, fundada em 2000, com o propósito de combater a corrupção e promover a transparência. Então, eu falo aqui na condição de alguém que não é servidor público, não é político, não é do Ministério Público, não é do Judiciário, que é da sociedade civil e que trabalha com controle social. Então, se o fundamento da democracia brasileira é o povo e a soberania popular, eu não sou representante do povo - vocês que são Senadores são -, mas eu sou alguém da sociedade civil que não tem cargo. Então, é uma perspectiva que eu creio que vale a pena considerar.
Próximo eslaide.
O que a gente faz, fundamentalmente? Revelar as falhas no sistema público que desencadeiam a corrupção. Então, é isto que eu vou fazer aqui hoje: revelar quais são as falhas no projeto de lei que está sendo apresentado aqui no Senado que vão desencadear mais corrupção, que vão desencadear problemas que a gente pode corrigir facilmente.
Por favor, próximo eslaide.
O primeiro ponto que eu queria destacar é a transparência. Todos sabem e todas sabem que a transparência é um pilar fundamental da democracia. Sem transparência, não há como ter democracia, porque a gente não vai conseguir fiscalizar o poder público, não vai ter informação sobre o que o poder público faz. E a Lei de Acesso à Informação - uma lei pela qual a Transparência Brasil lutou muito para que fosse aprovada, nós redigimos a minuta do que viria a ser a Lei de Acesso à Informação, ela é muito cara para nós, e tenho certeza de que é muito cara para o Congresso, para o Senado, vocês têm defendido a Lei de Acesso à Informação de uma maneira muito aguerrida - é muito clara. O art. 32 da LAI diz que poderá o agente público responder por improbidade administrativa, com uma série de situações, de que eu destaco uma: quando se recusar a fornecer informação requerida nos termos dessa lei, retardar deliberadamente o seu fornecimento ou fornecê-la de forma incorreta, incompleta ou imprecisa. Então, a Lei de Acesso à Informação tipifica com segurança jurídica quais são as condutas em que cabe improbidade administrativa. Só que qual é o problema? A Lei de Improbidade Administrativa, no seu art. 11, §§1º e 2º, vai dizer que, nos tipos em leis especiais, em leis específicas, que falem de improbidade administrativa, vai se aplicar o que está exposto no §1º e no §2º. E o que diz lá? Você só vai poder processar alguém por improbidade administrativa se você comprovar que foi para obter um benefício indevido ou vantagem indevida para si ou para outrem. Então, se você faz um pedido dessa informação e fica seis meses sendo ignorado, é descumprimento claríssimo da Lei de Acesso à Informação, o que hoje se coíbe com a improbidade administrativa. É a nossa guardiã da transparência. Não vai poder mais ser assim.
Próximo eslaide, por favor.
Isso é um grave retrocesso na transparência. Uma solução muito simples: supressão dos §§1º e 2º do art. 11. Voltamos a poder aplicar a improbidade administrativa para quem descumpre a Lei de Acesso à Informação. Vamos garantir a transparência no Brasil sem... Não cabe o argumento de segurança jurídica, são coisas tipificadas na LAI. É só isso que a gente está pedindo. E hoje não vai mais poder.
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Próximo eslaide.
O segundo ponto que a gente pede: isonomia entre os partidos políticos e a sociedade civil. A lógica da Lei de Improbidade Administrativa é permitir que a improbidade alcance entes privados, como, por exemplo, ONGs e organizações sociais que recebam recursos públicos, ainda que possuam regime jurídico próprio, como é o caso do Mrosc. Só que a nova proposta que está aí na mesa vai excluir os partidos políticos da aplicação da Lei de Improbidade Administrativa no que tange aos recursos públicos que eles recebem do fundo partidário e do fundo eleitoral. Só que os partidos são de elevado interesse público, e a gente precisa promover a integridade do sistema político. A gente vai passar um péssimo sinal para a sociedade se, em nome da segurança jurídica, em nome de modernizar a Lei de Improbidade - o que é preciso, a gente está de acordo -, sem fundamento, sem justificativa, destacar os partidos políticos e dizer: "O que vale para ONGs, o que vale para organizações sociais que recebem recursos públicos não vale para os partidos políticos". Por quê? "Ah, porque eles têm lei específica." As ONGs também têm. Então, isonomia. Não vamos passar uma mensagem de que o sistema político não tem que ser dirigido de acordo com as regras da Lei de Improbidade Administrativa. Vai ser um péssimo sinal para a sociedade. Ninguém vai acreditar que o propósito é modernizar e trazer segurança jurídica; o propósito vai ser isentar o sistema político da Lei de Improbidade Administrativa.
Próximo eslaide.
Há uma emenda também, a Emenda 39, que exclui as verbas dos partidos políticos da Lei de Improbidade. A gente resolve o nosso problema nesse ponto específico.
Próximo eslaide.
Perda de função pública. O Exmo. Izaías, Prefeito, falou sobre muitos pontos importantes, mas, por exemplo, não endereça essa questão aqui, que é uma solução simples também. Então, queremos punir os casos mais graves e aí condenamos na nova legislação só o dolo, sei lá o quê, etc. Por exemplo, em relação a alguém que não pode mais ser Secretário de Educação, porque desviou recursos da merenda escolar, as crianças ficaram sem comida na creche e na escola, pelo projeto de lei proposto aqui no Senado, essa pessoa vai poder ser Prefeito. Ela perde o cargo de Secretário, mas pode ser Prefeito, porque a lei vai dizer que só da mesma natureza e da mesma qualidade, o §1º do art. 12. Se a gente quer punir os casos mais graves, se a gente quer garantir segurança jurídica, a gente quer previsibilidade para o cidadão, se a gente quer que o cidadão tenha confiança no sistema político, como é que a gente vai dizer que uma pessoa que desviou a merenda escolar não está apta a ser Secretário de Educação, está proibida, está vedada pela lei, mas pode ser Prefeito, pode ser Governador, pode ser Deputado? Eu não vejo lógica.
Próximo eslaide.
Também há uma solução simples. Há duas emendas que suprimem o §1º do art. 12. Vejam que não estamos falando de revogar e impedir a aprovação da Lei de Improbidade Administrativa. São correções pontuais que vão sanar alguns dos seus maiores vícios na forma com que está sendo tramitado.
Próximo eslaide, por favor.
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Prazo para inquérito do Ministério Público. O Exmo. Izaías falou aqui - e eu estou me referindo, porque foram bons exemplos... Não queremos acusar pessoas por coisas muito pequenas, por erros bobos, por questões formais. Improbidade é uma coisa grave. Então, vamos caracterizá-la para aqueles casos em que mais realmente vale a pena aplicarmos, vamos direcionar os esforços para isso. E existe uma limitação para que o Ministério Púbico tenha 180 dias para encerrar o seu inquérito, renovável por uma vez mais, mediante justificativa. Agora, vamos ponderar: quando vai ser possível concluir uma investigação em 180 dias? Nos casos mais simples, pequenos, os irrelevantes, que a gente não quer que se faça, ou nos casos graves, nos casos em que a gente tem que fazer cooperação internacional para obter documentos, que você tem que tentar informações em paraísos fiscais, como a gente sabe que foram os casos envolvendo, por exemplo, a Odebrecht e coirmãs? E mais: não existe mais força-tarefa no Ministério Público Federal no Brasil, ou seja, procuradores dedicados exclusivamente a um caso; eles vão fazer vários casos de muitas coisas e também aquela investigação complexa. E a gente, que está dizendo que tem que punir os casos mais graves, que a palavra "ímprobo" tem que ser para corrupção, para as coisas graves, etc., vai limitar em 180 dias?! Como a gente concilia uma coisa com a outra? O que a gente vai estar fazendo é inviabilizar o trabalho do Ministério Público para os casos mais graves. Os incentivos que vocês estão dando são para o Ministério Público... Se ele quer manchete, como não vai dar manchete nos casos graves, vai para os pequenos - é o contrário do que vocês estão querendo. Vai ser ruim para a gente da sociedade civil e ruim para vocês políticos.
Próximo eslaide, por favor.
Também há uma solução, a Emenda 23, do Senador Telmário Mota, que dá uma nova redação para o §2º. Vamos dar um prazo, para haver segurança jurídica? Vamos dar um prazo, mas um prazo razoável de um ano, renovável por mais um, mediante justificativa.
Próximo eslaide.
Eu vou já encerrando.
O eminente Relator propôs uma emenda em que o art. 4º vai ter a seguinte redação: "Em benefício dos réus [aqui há grifos meus] aplicam-se, desde logo, as disposições desta lei aos processos em andamento". Assim, muda-se a lei - tudo bem - e vai se aplicar retroativamente. Onde está a segurança jurídica e a previsibilidade desse dispositivo? Quais são as consequências que a gente pode esperar? Primeiro, uma enxurrada de ações no Judiciário, que vão exigir resposta do MP.
Vão alegar mudança na prescrição, porque a gente está alterando os prazos prescricionais: "então, o meu caso está prescrito, a lei se aplica para mim", o que já isenta aquela pessoa.
A questão de que o Ministério Público fez uma denúncia por algum caso que não envolvia dolo. Vão pedir uma anulação ou a absolvição, porque isso vai se aplicar. Os casos de violação da Lei de Acesso à Informação, de que eu falei, todos eles - sabe-se que isso vai gerar impunidade.
Inquéritos em andamento com prazo superior a 180 dias. O Ministério Público se planejou, porque não existia esse prazo, está trabalhando, está ali há um ano e dois meses, mas, com mais três meses de trabalho, vai conseguir concluir o trabalho, ou daqui a seis meses. Porém, o prazo é de 180 dias. Ele não cumpriu o prazo. E aí? Vai haver discussão até pacificar se pode ou se não pode, se é dali para frente ou se não é...
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E os partidos políticos? Todos os casos de improbidade administrativa?
E, nos casos de tortura policial, todos os policiais vão entrar com ação na Justiça.
Perda de função pública: "Ah, eu era Secretário, a Agora eu só estou impedido como Prefeito" ou "Perdi o cargo como Prefeito, perdi o cargo como Governador, mas agora não é a mesma qualidade, e eu quero voltar ao cargo em que eu estava antes". Vai acontecer!
Absolvição por falta de provas em casos penais: "Ah, mas faltou prova, eu fui absolvido". Aí aplica para cá agora.
Olhem o tamanho! Vão paralisar os processos de improbidade administrativa só para rever tudo que estava andando. Não se inicia mais nada. O Ministério Público vai ficar completamente tomado por isso, porque vai ser uma enxurrada de ações, vai ser o caos. E isso não é uma mensagem boa que a gente quer passar neste momento para o País. Falo isso enquanto representante da sociedade civil.
É muito ruim também que a gente possa pensar em ter retrocesso na questão do nepotismo.
(Soa a campainha.)
O SR. MANOEL GALDINO - Muito ruim mesmo. Os casos que foram ajuizados pela Advocacia-Geral, por exemplo, vão aplicar para trás? Vai ser anulado tudo isso? Todos esses casos? Todos, todos, todos, todos? Você vai beneficiar réus que, às vezes, cometeram atos e que vão ser julgados daqui a pouco, e não havia isso antes. Como que você vai passar essa mensagem para a sociedade brasileira? Vamos aplicar a impunidade?
Eu acho que a gente pode também não aprovar essa emenda do Exmo. Senador Weverton, que fez um trabalho fantástico, realmente concordo com o Ministro Herman Benjamin. São pedidos da sociedade civil para que a gente corrija esses pequenos erros. São coisas muito pontuais - eu já vou encerrar a minha fala - para que a gente não passe uma mensagem de impunidade na reforma da Lei de Improbidade Administrativa.
E eu queria finalizar parabenizando o Senado brasileiro, porque, desde que o substitutivo do Deputado Zarattini foi apresentado na Câmara dos Deputados, não houve uma audiência pública a que entidades da sociedade civil fossem convidadas para debater e dar nossa opinião. Nós somos uma parte especial, porque a gente está na sociedade civil. Então, hoje a gente está aqui com esta oportunidade. Queria parabenizar muito a iniciativa da Comissão de Constituição e Justiça, seguro de que vocês estão nos ouvindo, de que, com esta oportunidade de debate, a gente vai conseguir corrigir esses erros e de que a lei que vai ser aprovada vai ser uma lei boa para o País. Pode haver discordância aqui e ali, pode haver controvérsia aqui e ali, mas a gente vai poli-la para que fique redonda - minimamente redonda - e a gente possa dizer que não houve retrocessos à Lei de Improbidade Administrativa que desconfigurem as possibilidades de punir todas essas questões graves, que são de imensa preocupação para a sociedade civil brasileira.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Muito obrigado, Dr. Manoel Galdino. Agradeço muito a participação de V. Sa., que representa uma instituição respeitada, séria, conhecida de todos nós. Parabenizo-o. E certamente também as ponderações trazidas a lume por V. Sa. vão sempre colaborar com o eminente Relator e com esta Comissão. Muito obrigado pela presença de V. Sa.
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Dando sequência ao nosso rol de convidados, tenho o prazer de passar a palavra agora ao Dr. Lucas de Casto Rivas, eminente advogado, que tem, portanto, a palavra pelo tempo consignado. Por gentileza.
O SR. LUCAS DE CASTRO RIVAS (Para expor.) - Senador Anastasia, Sr. Relator, Srs. Senadores, colegas participantes do debate, a minha missão aqui é menos de dar uma contribuição propositiva para o debate e mais para, talvez, fazer alguns esclarecimentos para sanar alguns quid pro quo, algumas confusões que parecem ocorrer, decorrentes do texto da lei.
A primeira delas, sobre a qual eu queria ponderar, considerando as alegações do colega da Transparência, diz respeito à emenda do Senador Dário Berger, Senador Anastasia, que foi acolhida pelo Relator, a emenda que diz que as disposições serão aplicadas imediatamente. Nesse sentido, Senador Anastasia, V. Exa. sabe muito bem que as disposições de Direito material, quando são benéficas ao réu, por força constitucional, se aplicam retroativamente, e as disposições de matéria processual regem-se pela regra do tempus regit actum, que é a regra, inclusive, do Código de Processo Civil, de maneira que, em última análise, a emenda acolhida pelo Relator é uma mera redundância legislativa, inclusive para sanar qualquer dúvida com relação à aplicação da lei.
Há outros pontos que também são importantes de consideração.
O primeiro é desfazer uma confusão, que, inclusive, é objeto de emenda do ilustre Senador Lasier Martins, que diz respeito ao nepotismo. Tecnicamente, a Lei de Improbidade torna mais rígido o controle do nepotismo. Por quê? Porque ela simplesmente reproduziu a redação da Súmula Vinculante nº 13, do Supremo Tribunal Federal, no corpo da lei. Não obstante, a própria jurisprudência do Supremo tem superado a súmula em casos em que não há ascendência ou projeção funcional. Então, a jurisprudência tem sido, com a devida vênia, mais leniente do que o que a lei está fazendo. E o dispositivo que trata das indicações políticas, por sua vez, obviamente não se aplica nas hipóteses em que o suporte fático de incidência da regra jurídica é a regra do nepotismo. É muito importante fazer essa ponderação, inclusive com relação à projeção funcional. A jurisprudência do Supremo tem evoluído nesse sentido, e a lei se torna mais rígida com relação a isso.
Com relação a algumas ponderações que o Ministro Herman Benjamin fez, com todas as vênias, com toda deferência, veiculando todas as homenagens, é importante dizer que, com relação a todas as condutas descritas pelo Ministro Herman - tortura, "rachadinha", disparo de arma de fogo, excesso de exação -, todas as condutas descritas pelo Ministro Herman com base na jurisprudência tratam de condutas que já são sancionadas pelo Direito Penal. E, nesse caso, de fato, não faz sentido, pelo menos pela melhor doutrina, tipificar essas condutas como improbidade administrativa se já estão sendo tipificadas como matéria criminal - como peculato, disparo de arma de fogo, crime de responsabilidade de Prefeito, prevaricação -, sob pena de se esvaziar o próprio conteúdo normativo do Direito Penal, que é o que o Professor Bernd Schünemann - o Dr. Roberto Livianu deve conhecer - chama de caráter de overkill do Direito Penal. Então, se tudo que é matéria penal é também de improbidade, não faz sentido ter improbidade e penal ao mesmo tempo.
Além disso, também é importante ponderar, o que foi uma preocupação que o Ministro Herman externou - acredito que ele ainda esteja no debate virtualmente - e que também tem sido objeto de outras preocupações, com relação ao fechamento do rol do art. 11, de violações a princípios. É objeto de várias emendas, acredito que do Senador Lasier também.
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E, nesse sentido, na verdade, é possível argumentar que hoje nós já vivemos um grave quadro de estado de inconstitucionalidade que, como o Prefeito Izaías colocou, doutor pela USP também, hoje não se sabe exatamente qual é a conduta que será responsabilizada pelo art. 11, porque não existe densificação normativa dos princípios que podem ser increpados como responsabilidade... como improbidade administrativa - perdão. E isso acaba gerando hoje verdadeiras sanções do que se conhece na doutrina americana como sanções ex post facto, ou seja, são sanções que surgem depois da ocorrência do fato.
Outro ponto relevante também diz respeito à questão que foi suscitada pelo colega da Transparência Brasil com relação à perda do cargo alargada, vamos dizer assim. É importante colocar que a legislação como está... melhor dizendo, que o projeto da Câmara como está colocado prevê a possibilidade de alargamento da perda do cargo, mas na hipótese de enriquecimento ilícito. Por quê? O que o legislador da Câmara fez? Fez um juízo de ponderação. Não é adequado se fazer a perda do cargo automática e afastar imediatamente o agente público de qualquer função pública, em determinadas hipóteses, sendo possível em outras. Então, é realmente uma questão de individualização da pena, que é direito fundamental, inclusive.
Nesse sentido, é importante ponderar uma questão de constitucionalidade. A Constituição trata a demissão e a perda do cargo de maneira igual, de sorte que essa distinção, Senador Anastasia, entre perda do cargo e demissão que foi feita pela jurisprudência está na liberdade de conformação do legislador ordinário. De fato, foi uma opção política e que parece sem dúvida razoável quando faz esse juízo de proporcionalidade acerca da aplicação da sanção.
Outro ponto muito importante que merece uma consideração mais profunda e questão também foi abordado pelo Ministro Herman Benjamim diz respeito à questão da culpa grave. O próprio STJ hoje só considera hipótese de culpa grave no caso do art. 10, ou seja, de prejuízo ao Erário. E, nas hipóteses de violação a princípios e de enriquecimento ilícito, por conta da própria natureza do ato ímprobo, é necessária a configuração do dolo. Então, o projeto não está, como se tem falado, criando algo tão novo ou simplesmente acabando com as ponderações de culpa.
Além disso, é preciso considerar que a própria jurisprudência tem vacilado com relação à descrição da culpa. Ora se fala em má-fé, ora se fala em erro, em erro crasso, erro grave, ora se fala em culpa grave, ora se fala em violação da boa-fé. Então, o projeto, quando transforma todas as condutas puníveis como dolosas, realmente ultrapassa esse tipo de problema, de vício legislativo.
É importante colocar também que essa consideração veio da Comissão de Juristas. Então, o próprio Ministro Mauro Campbell Marques e os demais juristas, o Dr. Rodrigo Mudrovitsch, o próprio Professor Marçal Justen Filho, fizeram essa proposta de que a improbidade passasse a ser punida apenas pelo dolo, e não pela culpa.
Com relação a mais outro ponto relevante a ser colocado, diz respeito ao que foi abordado pelo Ministro Herman Benjamin, à indisponibilidade de bens. O que o Ministro Herman Benjamin está colocando - com a devida vênia, posso estar absolutamente equivocado na interpretação das suas palavras - diz respeito à limitação do confisco com relação ao patrimônio que é ou não é, teoricamente, objeto de ato ímprobo. E, nesse caso, nós estaríamos nos aproximando mais ou menos da ideia de confisco alargado, que existe no Direito Penal, de inspiração americana, o for feature, nos Estados Unidos.
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Então, nesse caso não parece muito adequado - e essa é a ponderação que talvez precise ser feita - que, em processo de improbidade administrativa, dadas as limitações de natureza cível, do próprio processo civil, que se avance essa faixa realmente, ao contrário do que propõe o substitutivo da Câmara, que limita ao capital que foi efetivamente produto de ato ímprobo.
Outra consideração também muito importante a ser colocada, Senador Anastasia, diz respeito - e isso foi ponderado diversas vezes, inclusive pelo colega da Transparência Internacional - à questão da interdependência das instâncias.
Em primeiro lugar, eu acredito que é preciso ter um juízo de proporcionalidade para compreender o texto, porque, se hoje se defende prisão em segunda instância, se a Lei da Ficha Limpa considera inelegibilidade em segunda instância, e todas essas são decisões condenatórias, por que não estabelecer a absolvição como objeto de produção de efeitos para a improbidade administrativa quando há uma absolvição criminal de segunda instância?
Então, realmente é preciso talvez um juízo de coerência mais forte para defender esse tipo de racionalidade da legislação. Na verdade, o que se demonstra por isso é que a tendência da legislação é justamente essa, se se pretende implantar execução da pena em segunda instância e considerando o exemplo da ficha limpa também.
Além disso, não há problema de inconstitucionalidade nisso. Isso está sujeito à opção política do legislador, porque o que a Constituição proíbe, no §4º do art. 37, é que as ações de improbidade prejudiquem as ações penais, e, nesse caso, o que está acontecendo - e aqui falo de prejudicialidade, Senador Anastasia, no sentido técnico - é que as ações penais é que prejudicam as ações de improbidade. Portanto isso está plenamente no âmbito de liberdade de conformação do legislador ordinário.
E, com relação mais especificamente à falta de provas, à absolvição por outros elementos do art. 386 do Código de Processo Penal, como falta de provas, ausência de provas suficientes para condenação, isso é um juízo do legislador, que está sujeito à discricionariedade legislativa, mas que faz parte de uma racionalidade. Tanto, que, por exemplo, a própria jurisprudência, em alguns casos o Superior Tribunal de Justiça, embora de maneira muito constrangida não reconheça a interdependência entre as instâncias, acaba em última análise reconhecendo, por exemplo, a ausência de dolo, porque o Tribunal de Contas não promoveu a condenação do Prefeito.
Então, de fato, hoje já existe um sistema de vasos comunicantes realmente na jurisprudência, que pode ser aproveitado para a legislação, como tem feito o projeto da Câmara.
Outros dois pontos polêmicos, que foram tratados, talvez pela limitação de tempo, com alguma brevidade, dizem respeito, primeiro, à prescrição retroativa, que é objeto de inúmeras emendas, e também à questão do prazo do inquérito.
A questão do prazo do inquérito foi abordada. Vou, por conta de limitações temporais, me restringir à questão da prescrição retroativa.
O Professor Roberto Livianu costuma citar o Professor Kai Ambos, que diz que o Brasil é o único País do mundo que tem prescrição retroativa, mas o Professor Kai Ambos mora em Göttingen, e nós temos a nossa realidade brasileira, que é a de convivência com o que a doutrina chama de strepitus judicii - os professores devem se lembrar disso -, que é o escândalo da acusação.
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Então, na verdade, o que se constata é que as ações de improbidade andam de dois em dois anos, nos períodos eleitorais, de maneira que a solução do legislador de estabelecer uma prescrição retroativa - o Professor Livianu fala sempre muito bem - e não uma prescrição intercorrente, como o Dr. Moro falou em artigo recente, porque não se trata de inação do Ministério Público, mas realmente de uma prescrição no curso do processo de improbidade, é uma medida que o legislador adota para atender, primeiramente, as prescrições constitucionais da razoável duração do processo e também tutelar a própria presunção de inocência, para que aquela pessoa não seja sujeita a um processo de improbidade administrativa escandaloso.
Em última análise, é importante ponderar também que essa alteração do legislador é uma medida que atende, na verdade - embora passe uma impressão à primeira vista de que se trata de uma medida de impunidade, como tem a preocupação o colega da transparência -, na verdade, o interesse público. Por quê? Porque o interesse público não é que as ações de improbidade passem oito, dez anos ou prazo indeterminado, como acontece hoje, sendo processadas. Na verdade, o interesse público é que o gestor ímprobo seja rapidamente investigado e punido - por isso, o prazo de 180 dias, prorrogáveis por mais 180 - em tempo hábil, que é o prazo de quatro anos. É importante colocar que não é o prazo de quatro anos para toda a ação, é o prazo de quatro anos para cada instância atuar, o que é um prazo... Se o Ministério Público se adequar, o CNJ adotar medidas de prioridade de metas, os tribunais se organizarem e realmente o processamento de improbidade for uma prioridade das instituições brasileiras, realmente é possível se fazer uma condenação de improbidade em quatro anos.
Aliás, são muito citados os números do Conselho Nacional de Justiça de que as ações de improbidade duram em média quatro anos e meio, Senador Anastasia. É um estudo desatualizado de uma pesquisa entre 2010 e 2013...
(Soa a campainha.)
O SR. LUCAS DE CASTRO RIVAS - ... mas que serve de parâmetro - para concluir, Senador Anastasia. De maneira que, se hoje, com todas as dificuldades, fazem em quatro anos e meio, por que não fazer em quatro anos? Este é o interesse da sociedade: ver condenações de improbidade administrativa devidamente processadas e julgadas.
Senador Anastasia, o tempo realmente é muito curto, mas eu acredito que essas eram as ponderações técnicas com as quais acredito que eu possa contribuir para esclarecer algumas confusões que realmente existem na própria interpretação e na leitura do texto.
Agradeço, Senador Anastasia.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Muito obrigado, eminente Dr. Lucas de Castro Rivas, pelas contribuições e por aquiescer ao convite desta Comissão. Certamente, como disse aos seus colegas, são observações sempre muito lúcidas, fruto de seu trabalho, que o Relator certamente levará em consideração. Muito obrigado pela participação de V. Sa.
Dando sequência à nossa audiência, eu tenho o prazer de convidar agora o Dr. Roberto Livianu, Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo e Presidente do Instituto Não Aceito Corrupção. Agradeço também a presença do Dr. Livianu. Convido V. Sa. para a sua exposição, também na atenção do tempo que lhe é destinado, agradecendo de antemão a presença física do Dr. Livianu.
Por gentileza, com a palavra V. Sa.
O SR. ROBERTO LIVIANU (Para expor.) - Muito obrigado.
Primeiro, eu quero cumprimentar o Senador Anastasia pela condução dos trabalhos, pela Presidência serena, republicana, democrática, sempre um traço que marca V. Exa. aqui nesta Comissão. Obrigado pelo convite desta Comissão e parabéns por realizar esta audiência.
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Quero cumprimentar o Senador Weverton pela relatoria e quero dizer que tenho absoluta fé de que, de hoje para os próximos dias, será possível construir uma solução positiva para essa discussão. Tenho certeza absoluta de que aqui no Senado se encontrará uma boa solução para a proteção do patrimônio público e se encontrará um bom caminho para que a Constituição seja respeitada, porque, afinal de contas, o grande e principal princípio é o da prevalência do interesse público, e tenho certeza absoluta de que esse é o principal norte do caminho de V. Exa. Eu o respeito muito e tenho certeza de que esse é o principal norte que conduz V. Exa.
Quero saudar também a Ministra Eliana Calmon, que está presente nesta reunião, símbolo maiúsculo de coragem e integridade da Justiça do nosso País, assim como o Deputado Roberto de Lucena, autor do projeto que estamos debatendo hoje aqui, inicialmente de nº 10.887, de 2018, assim como os demais Parlamentares, o Senador Alvaro Dias, autor do requerimento que resultou nesta audiência, Senador Lasier, autor do magnífico voto que também é objeto desse debate, e todos os demais que estão aqui presentes.
Há muita matéria para nós discutirmos e pouco tempo, não é?
Nós não podemos deixar de levar em conta, caros Senadores, que hoje é o Dia Internacional do Acesso Universal à Informação, e o Brasil, infelizmente, não tem tantos motivos para comemorar. Nós precisamos construir motivos doravante, para que possamos comemorar o acesso universal à informação. E como nós construímos isso? Modernizando a Lei de Improbidade, não enfraquecendo a Lei de Improbidade, porque o Datafolha acaba de divulgar uma pesquisa segundo a qual, para 61% dos brasileiros, a corrupção vai aumentar, e, com essa percepção, nós precisamos estar atentos.
Eu tenho certeza absoluta dos bons propósitos do Prefeito Izaías Santana na condução de Jacareí porque conheço a sua caminhada como administrador público, sei da sua boa intenção, mas nós não podemos, Prefeito Izaías, jamais, jogar fora a água do banho e o bebê junto. Alguns promotores às vezes exageram no manejo da Lei de Improbidade, e eu digo isso com a experiência de quem está no Ministério Público há quase 30 anos. Eu estou afirmando isto: há promotores que exageram no manejo da lei. E não é porque os promotores exageram que nós vamos esmagar a Lei de Improbidade. Existem erros no projeto aprovado na Câmara e neste que está aqui.
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Caro Lucas, o senhor falou: "Isso que veio da Comissão de Juristas...". Não, me desculpe, caro Lucas, não é o que nós estamos debatendo aqui. Isso que nós estamos debatendo aqui não é o que veio proposto pelo Deputado Roberto de Lucena, é outra coisa.
Caro Senador Weverton, que eu tenho certeza de que pretende construir uma melhoria na Lei de Improbidade, não houve 14 audiências públicas em relação ao projeto Roberto de Lucena, desculpe-me, com todo o respeito: 14 audiências foram realizadas em relação ao projeto Roberto de Lucena, nenhuma audiência se realizou em relação ao projeto aprovado na Câmara. Aquele projeto teve urgência de votação aprovada em 8 minutos e um substitutivo que foi apresentado aos 45 minutos do segundo tempo e que foi aprovado por 408 votos. Esta versão, Senador, não tem nada a ver com aquela que veio da Comissão de Juristas, caro Lucas, que foi desfigurada. Essa que chegou aqui é uma outra versão, que contém uma série de problemas.
Schünemann, eu conheço Schünemann. A realidade da Alemanha de Schünemann e de Kai Ambos é diferente da nossa. Aqui no Brasil, 5% dos crimes se punem. Quando Herman Benjamim fala de tortura, fala de tantos crimes, ele se preocupa de maneira justa, caro Lucas, porque, nesse Direito Penal do qual ele diz, no Brasil os crimes não se punem. Então preocupar-se que a Lei de Improbidade também alcance certas condutas é uma preocupação justa. Aqui não é a Noruega, não é a Dinamarca, não é a Finlândia, não é a Islândia, não é a Nova Zelândia, aqui é o Brasil da impunidade, caro Lucas. Por isso que a preocupação de Herman Benjamin é justa e devida. Que tenhamos proteção jurídica ampla para todas as condutas. Aqui é o Brasil da impunidade, em que as mulheres são desrespeitadas todos os dias e todas as horas, inclusive aqui, dentro deste Parlamento. Infelizmente, o Brasil é o País da impunidade. Por isso a preocupação de que a Lei de Improbidade seja uma lei que seja um instrumento jurídico amplo, também para punir situações que criminalmente são relevantes. A preocupação dele é justa, sim.
Quando se fala em meio-termo em relação às improbidades culposas, Senador Weverton, em passar a régua e não punir mais improbidades culposas porque promotores exageram, promotores agem com abuso de poder, o Congresso, em 2019, aprovou a Lei de Abuso de Autoridade para punir os promotores que exageram, que agem com abuso de poder. Já há um instrumento para isso. Então, uma boa solução pode ser subir a régua e punir com culpa grave. Houve culpa grave, exige-se ao menos a culpa grave. Essa pode ser uma boa solução, a solução do meio-termo, culpa grave, e assim você encontra o meio caminho, a justiça salomônica, e você não fica nem no extremo de não punir, nem na situação de ter o exagero, as situações abusivas que nós temos hoje e que nós não queremos.
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Em segundo lugar, uma questão que não se falou aqui: sucumbência, caro Senador Weverton. O que é a sucumbência? É um instrumento jurídico que existe no ordenamento para coibir propositura de ações temerárias, descabidas.
Vamos imaginar que um vizinho seu... O senhor é palmeirense e o seu vizinho é corintiano.
O SR. LUCAS DE CASTRO RIVAS (Fora do microfone.) - Corintiano.
O SR. ROBERTO LIVIANU - Vamos supor, por hipótese - eu não sei qual é o seu time. E ele resolve azucrinar a sua vida e propõe uma ação...
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - Ele já se defendeu e disse que é corintiano, então o senhor não o acuse de novo.
O SR. ROBERTO LIVIANU - ... propõe uma ação sem pé nem cabeça contra o senhor, está certo? Para isso existem os honorários de sucumbência. O juiz o condena para justamente ter um seguro. É uma punição para as ações que não têm pé nem cabeça. O juiz manda pagarem sucumbência particulares que propõem ações temerárias. Não tem o menor sentido condenar uma instituição pública a pagar sucumbência. Por que quem vai pagar isso, no fim das contas, é o contribuinte. Se você condena o Ministério Público a pagar sucumbência, quem paga essa conta é o contribuinte. Não tem sentido condenar o Ministério Público a pagar sucumbência. Isso precisa ser retirado.
Com todo o respeito, Senador Weverton - com todo o respeito -, não se pode condenar o Ministério Público a pagar sucumbência. Isso é instrumento para prevenir ações temerárias. Não se pode condenar o Ministério Público a pagar sucumbência. Isso é instrumento para particulares. Isso tem que ser retirado do relatório. Não faz sentido isso. É injusto, é indevido, assim como o prazo, como bem colocou o Manoel, que, aliás, foi promovido a transparência internacional. Tamanho é o relevo dos argumentos do Manoel, que o caro Lucas elevou-o à condição de transparência internacional. Os argumentos foram internacionais - parabéns, Manoel! Tamanho é o peso da sua argumentação, que o Lucas já o elevou ao parâmetro internacional. Tamanhos são os argumentos do Manoel, que falou que 180 dias são totalmente inviáveis... E são mesmo, porque como é que o Ministério Público, Lucas, pode investigar 50 suspeitos, colher prova em 50 países, quebrar sigilo bancário, fiscal, telemático, tributário, em 180 dias? Fica a impressão de que se está querendo garantir a impunidade por lei. E não é isso que o Senador Weverton pretende. É um homem justo. Está procurando melhorar a Lei de Improbidade.
Portanto, o que é razoável? A emenda Telmário: um ano, prorrogável sucessivamente, desde que o membro do Ministério Público justifique a necessidade de prorrogações por escrito com a chancela do Conselho Superior do Ministério Público. Se ele mentir, pratica crime. Se o Conselho Superior não chancelar, não há motivo de prorrogar essa continuidade da investigação, ou seja, tudo tem que ser devidamente justificado. Não há como você falar em apenas seis meses para uma investigação.
Prescrição, caro Lucas. É um instrumento, Lucas... Para você ter a espada, tem que haver um limite para o exercício do poder do Estado. A prescrição não pode ser um instrumento que gere impunidade. Kai Ambos, que é um dos juristas mais respeitados do mundo, esteve no Brasil e disse: "não é um país sério". O Brasil é o único do mundo que tem prescrição retroativa. Só existem dois tipos: a prescrição da pretensão punitiva e a prescrição da pretensão executória. Retroativa ou intercorrente só o Brasil tem. Por isso é que leva de 7 a 1 da Alemanha, Senador Esperidião Amin. Por isso é que o Brasil não pode ser levado a sério. Um país que tem prescrição retroativa... Por isso é que leva de 7 a 1 da Alemanha. Aí se coloca no projeto estender a prescrição retroativa ao campo da improbidade. Nós vamos ser motivo de piada, por quê? Por quê? "Ah, não, porque tem que ser razoável...".
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Isso me parece... Acabou de terminar a Olimpíada de Tóquio. Existe aquela prova de 110m com barreiras, em que você tem mais chão e menos obstáculo. Parece que se está colocando um monte de obstáculo, tornando a prova impossível. É tanto obstáculo que a prova fica impossível de ser completada. Não é possível!
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO LIVIANU - Prescrição... Não dá para você punir ninguém!
Senador Weverton, o senhor é um jovem e brilhante político. É perfeitamente possível melhorar a Lei de Improbidade, modernizar. O espírito do Deputado Roberto de Lucena foi bom, positivo, modernizante.
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO LIVIANU - Incluir os acordos de não persecução, modernizar aos novos tempos, mas não é plausível que a lei seja um instrumento de aumentar essa expectativa, esse pensamento da sociedade no sentido de que a impunidade prevalece. Não é isso que se quer; que a prescrição prevaleça, que a não punição prevaleça. Então, eu penso que tem que se encontrar o caminho do meio-termo: culpa grave, prorrogação das investigações no tempo necessário...
Nessa questão do art. 11, com todo o respeito ao Lucas, veja, eu acho que tem que se encontrar... Eu entendo a queixa, a preocupação em relação ao art. 11, mas será que não se encontra uma maneira de prever essas condutas para não se ter essa sensação de impunidade? Todas as carteiradas, os desvios de vacinas... O Manoel apontou com muita propriedade a questão da transparência pública. Do jeito que está colocada ali, a transparência pública fica desprotegida. Hoje é o Dia Internacional do Acesso Universal à Informação. Que leitura nós vamos fazer disso? Desprotege-se a transparência pública? Que leitura se faz para o mundo? Em vez de o Brasil proteger a transparência pública, nós simplesmente passamos a faca: "Não, não, o art. 11...".
Eu entendo a reclamação de que "não, tem uns promotores que exageram". Eu sou promotor e estou criticando. Eu não tenho problema com isso. Quando se criou o Conselho Nacional do Ministério Público, eu vim a público e defendi que quem tem poder tem que ser controlado; promotor tem que ser controlado. Não tem sentido ter poder e não ser controlado. Agora, vamos ter o cuidado de não sermos injustos.
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A Lei de Improbidade, Senador Weverton, é a mais importante lei anticorrupção em vigor no Brasil; não se pode mudar sem cuidado, tem que haver cuidado. Está aqui um representante legítimo da sociedade civil com apontamentos muito cuidadosos sobre isso, dados públicos. O Brasil é signatário do Pacto dos Governos Abertos - acabamos de fazer dez anos do pacto -, o Brasil assumiu compromissos internacionais de ser o difusor dos dados abertos. Que exemplo nós estamos dando para o mundo ao agir dessa maneira? Hoje é o Dia Internacional do Acesso Universal à Informação. Que exemplo nós vamos passar agindo desta forma?
Eu tenho certeza absoluta, o senhor é um homem inteligente, é um político da nova geração, inteligente: vamos construir uma solução adequada para isso, justa, correta, que dê a prevalência do interesse público, e fazer uma construção...
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO LIVIANU - ... justa, democrática e cidadã.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Muito obrigado, Dr. Roberto Livianu. Agradeço igualmente a V. Exa., o cumprimento pela participação rica. V. Exa. tem sido um cruzado nesse tema há tanto tempo e certamente também colabora muito com esta douta Comissão.
Eu quero agora convidar o nosso derradeiro convidado - e é com imensa alegria e satisfação pessoal, dada a estima que tenho pelo convidado -, o Professor Marçal Justen Filho, meu Professor de Direito Administrativo, um grande nome da área com que eu tenho também a felicidade de atuar, que é o sexto e derradeiro convidado desta nossa palestra.
Então, convido S. Exa. o Professor Marçal Justen Filho, para a sua exposição remotamente.
É um prazer revê-lo, ainda que virtualmente, Professor Marçal.
O SR. MARÇAL JUSTEN FILHO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia! Eu saúdo a todos. Na pessoa do ilustre Senador Antonio Anastasia, eu saúdo todos os integrantes do Parlamento brasileiro e todos os membros deste debate. Reitero, de minha parte, também reciprocamente, a satisfação que é estabelecer contato, estar nesses tempos com V. Exa.
Eu vou compartilhar uma apresentação relativamente ao tema objeto da minha exposição.
A esmagadora maioria dos casos de punição e de processamento por improbidade administrativa é de agentes públicos, de agentes públicos do Poder Executivo que nem ocupam cargos de maior hierarquia. Isso no setor é normal, eis que não cabe à Lei de Improbidade Administrativa como função primordial promover a punição de empresas privadas. A corrupção das empresas privadas é objeto de uma legislação específica; a punição por corrupção praticada por empresas privadas, no âmbito da improbidade administrativa, é algo decorrente, é acessório.
A Lei de Improbidade Administrativa destina-se a punir, também no âmbito extrapenal, as condutas que são ofensivas e basicamente violadoras da corrupção.
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O que é corrupção? Corrupção é uma conduta desviada praticada por um agente público que envolve necessariamente um elemento subjetivo inafastável, que é a consciência da ilicitude e a vontade de praticar um ato infringente do Direito. Ou seja, em termos de definição de corrupção, não existe corrupção culposa. A conduta imprudente, negligente ou imperita pode gerar danos, acarreta a eventual punição do sujeito em diferentes órbitas, mas não configura a corrupção. O sujeito que dirigiu um automóvel descuidadamente, colide contra outro, sendo ele um agente público, obviamente isso não tem como ser tratado como corrupção à medida que haja uma ausência do elemento subjetivo reprovável orientado a uma obtenção de uma vantagem indevida, à lesão dos cofres públicos ou, afinal, a uma violação sobre valores fundamentais.
Portanto, há um primeiro equívoco insuperável na afirmativa de que a eliminação do sancionamento por improbidade à conduta culposa favorece a corrupção, porque há uma violação à adequação. Somente condutas dolosas configuram corrupção. Portanto, eliminar a punição por conduta dolosa nunca teria o efeito lógico de produzir o favorecimento à corrupção.
E vai se dizer, então: "Não, mas, se nós eliminarmos os dados subjetivos culposos, vai haver uma impunidade no Brasil". Argumentação é, data venia, defeituosa, porque existe um conjunto muito amplo, muito significativo no Direito brasileiro de institutos orientados a promover o combate à corrupção, e a Lei de Improbidade é apenas um desses instrumentos. Há a repressão penal, crimes contra a administração pública; a repressão administrativa, infrações administrativas e seus sancionamentos, inclusive a perda do cargo público; a repressão civil, indenização por perdas e danos; e a Lei Anticorrupção, que tem a responsabilização objetiva, objetivada, dos sujeitos privados que atuam no campo da corrupção. Com o devido respeito, não é possível se dizer que, eliminando a figura culposa no âmbito da Lei Anticorrupção, determinadas condutas praticadas pelas grandes empreiteiras, pequenas empreiteiras ou qualquer sujeito privado, seriam puníveis no exterior, e não no Brasil. A Lei 12.846, de 2013, a Lei Anticorrupção, assegura uma punição talvez tão severa e tão ampla quanto aquela prevista na legislação de Direito comparado. Portanto, o sujeito vai ser punido no estrangeiro, e vai ser punido no Brasil, e eventualmente, tal como está previsto no tocante à Lei Anticorrupção, pode ser punido no Brasil por condutas praticadas de corrupção contra a administrativo pública estrangeira. Ou seja, o Brasil tem uma legislação extremamente severa, que foi aprovada depois, muito depois da Lei de Improbidade Administrativa e que é um dos motivos pelos quais a argumentação de que o sujeito privado será beneficiado por essa alteração é absolutamente improcedente, porque quem afirma isso ignora a existência da Lei Anticorrupção.
E existem mecanismos específicos para combater os danos acarretados pela atuação culposa do agente. Se o sujeito promove um dano ao patrimônio público ou se ele obtém e colabora de algum modo para práticas defeituosas, há outros mecanismos que não a Lei de Improbidade: há a repressão administrativa, há a repressão civil. Em última análise, a eliminação do sancionamento por conduta culposa não impede a punição penal, administrativa ou civil, promovidas fora de uma ação de improbidade.
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Portanto, há um outro equívoco insuperável, a eliminação do sancionamento por improbidade à conduta culposa impede a punição do administrador negligente, tem sido dito. Não, não impede! Impede a punição por improbidade, mas não impede a punição mediante todos os mecanismos que existem no Direito brasileiro. E isso envolve, em última análise, uma discussão sobre qual é o conteúdo essencial da punição por improbidade.
O conteúdo essencial da punição por improbidade não é a repressão penal, não é a repressão administrativa propriamente dita e não é a repressão civil por indenização por perdas e danos. O núcleo essencial da improbidade é a execração pública a que é submetido um sujeito por ter cometido, como agente público, uma conduta infringente violadora, reprovável e isso acarreta uma sanção extremamente grave, que é a sua expulsão da vida pública. Trata-se de restringir o exercício do mandato eletivo, outros direitos políticos, excluir o sujeito, enfim, da comunidade civil política.
Por questão de eficiência, utiliza-se a ação de improbidade também para promover outros sancionamentos, não apenas o político. Se você verifica que o sujeito infringiu os seus deveres de cidadania, e esse é o núcleo da improbidade, ele infringiu os seus deveres de cidadania atuando de modo a produzir dano ou violar os seus deveres administrativos, pune-se tudo dentro do mesmo processo, mas a finalidade essencial da improbidade é reprimir esta conduta, que é execrável. E, por isso, é o risco de instaurar um processo por ação de improbidade de alguém que possa ter infringido alguns deveres de convivência, seja no âmbito civil, seja no âmbito administrativo, mas não merece essa execração, não merece essa restrição de direitos fundamentais, porque não atuou dolosamente, ou seja, a consagração da improbidade culposa gera, inclusive, efeitos negativos porque produz uma sanção muito grave dissociada na prática de corrupção. Nós não estamos punindo quem praticou corrupção, nós estamos punindo o sujeito que infringiu eventualmente um dever que não é punível no âmbito político, mas que vai acabar sendo punido por isso. E, mais ainda, há uma generalização de sancionamento muito severo para condutas dotadas de graus distintos de gravidade.
Qual é a questão concreta? Por que todo esse debate sobre culpa e dolo? Porque é muito difícil e trabalhoso provar o dolo, esta é a questão essencial. Como é fácil você imputar ao indivíduo uma conduta objetiva dizendo: "De algum modo isso refletiu a sua vontade?" Eu não preciso, se existir improbidade culposa, verificar se o sujeito efetivamente é culpado mesmo por dolo, basta a negligência, a imperícia ou a imprudência, é simples provar a culpa.
E qual o resultado prático? A multiplicação dos processos de improbidade, a ausência de descrição precisa e exata das condutas reprováveis, a desnecessidade de um mínimo de prova da reprovabilidade dolosa da conduta do sujeito para que seja instaurado o processo, para que seja iniciada uma ação que, muitas vezes, permanece no trâmite do Poder Judiciário por longas décadas.
Logo, alguém diria: "Não, isso é um exagero de sua parte". Não é um exagero, porque é comprovado pela simplificação crescente que vem sendo verificada na aplicação do próprio art. 10 da Lei de Improbidade, que é a eliminação da prova efetiva quanto ao dano.
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Não se trata simplesmente da consagração de uma presunção, trata-se da consagração de uma ficção. E por quê? Porque imputada ao particular, ao agente público, a prática do ato de improbidade, é lhe negada a faculdade de produzir prova da sua inocência, ou seja, não se trata apenas de inverter o ônus da prova, trata-se de proibir que o sujeito mostre que a sua conduta não produziu dano algum para a administração.
O resultado é muito simples e muito fácil. O resultado da improbidade culposa, tal como previsto na lei de hoje, e uma quantidade gigantesca de sujeitos conhece isso de um modo muito intenso na sua vida pessoal, é a instauração de um processo, o prosseguimento desse processo por décadas e, eventualmente, a sua condenação sem produção de prova, sem que lhe seja facultado o direito de produzir prova porque existe a ficção do dano. É muito simples e é muito fácil. O que gera, invocando-se a supremacia do interesse público, o sacrifício dos direitos fundamentais que são garantidos pela Constituição e que se constituem em um obstáculo ao argumento de que o interesse público pode gerar a destruição individual de um único sujeito no Brasil. A partir da Constituição de 1988, essa interpretação é absolutamente descabida, ela poderia existir no cenário anterior, num Estado totalitário.
O descabimento de reprodução do sancionamento penal e da punição por improbidade é outro ângulo, ou seja, se, porventura, todo o caso de Direito Penal, toda a hipótese de infração justificaria a condenação por improbidade, então, bastaria acrescentar no Código Penal a sanção de improbidade para os crimes contra a administração pública. Não é assim! Ou seja, todos os exemplos referidos usualmente como hipótese de impunidade são punidos por outra lei, especialmente pelo Código Penal. Tortura!
Existe a Lei de Abuso de Autoridade, e dizem: "Mas a Lei de Abuso de Autoridade é uma lei ineficiente, ineficaz". Ora, este é um outro problema. Se as leis brasileiras são ineficientes e ineficazes, obviamente isso se aplica também à Lei de Improbidade e nós temos uma situação que deve ser resolvida por outra via.
E a violação dos princípios? A violação dos princípios importa, implica uma indeterminação da conduta infracional. Os incisos I e II da atual Lei de Improbidade, que são objetos de retirada, envolvem normalmente condutas que não são dotadas de relevância significativa no âmbito da improbidade e que são objeto de repressão relativamente a outros ramos do Direito, especialmente do Direito Penal, mas do Direito Administrativo também.
Em último caso, a grande dificuldade é a indeterminação que impede a definição precisa e que acarreta a multiplicação dos processos de improbidade. Como não existe uma descrição precisa e exata das condutas reprováveis, o Poder Judiciário está cheio de processos que são exercitados com base nessa solução.
Em conclusão - eu ficarei dentro dos meus 15 minutos, Exmo. Senador Anastasia -, a disciplina legislativa da improbidade precisa de aperfeiçoamento. É necessário que se reduza a quantidade gigantesca de processos de improbidade que levam dezenas de anos para conclusão. E mais ainda, o combate à corrupção, que é algo que se constitui em tema essencial da preocupação da Nação brasileira, exige a definição precisa e exata do que seja a corrupção. Não é possível que nós estejamos atacando a todos os agentes públicos com uma ameaça de punição por condutas que somente são reveladas como reprováveis num momento posterior por uma avaliação, por uma escolha, em última análise criando uma figura de crime de hermenêutica. Ou seja, é indispensável aprovar a reforma proposta, ainda que alguns temas possam merecer discussão.
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Eu agradeço à Comissão e manifesto a minha permanente disposição de colaborar com o aperfeiçoamento das instituições jurídicas.
Era o que eu tinha para falar. Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Muito obrigado, eminente Professor Marçal Justen Filho. É um prazer revê-lo, ainda que virtualmente, e ouvi-lo. Meus cumprimentos. Agradeço muito a presença também de V. Sa., a participação, o enriquecimento. Certamente contribuirá muito para o nosso Relator.
Encerradas as exposições, eu quero mais uma vez agradecer a presença voluntária, graciosa, cívica dos nossos convidados num tema que é complexo. É um tema importante e que tem sido objeto dessas discussões. Eu fico muito feliz de poder presidir esta reunião, porque vou aprendendo e vejo como o Direito é rico nos seus desdobramentos e nas suas várias vertentes.
Muito bem. Nós vamos dar a palavra primeiro, conforme o regimento, ao autor do requerimento, pelo prazo de três minutos. Eminente Líder Senador Alvaro Dias, com a palavra.
Depois daremos a palavra ao Relator e à lista de inscritos. Já estão inscritos, para conhecimento, o Senador Lasier Martins e o Senador Esperidião Amin.
Com a palavra o Senador Alvaro Dias.
O SR. ALVARO DIAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR. Para interpelar.) - Obrigado Presidente. O objetivo da minha participação neste momento é mais para o agradecimento a todos os que, atendendo o convite, compareceram. Agradeço ao Ministro Herman Benjamin, ao Manoel Galdino, ao Roberto Livianu, ao Izaías Santana, ao Lucas Rivas e ao Dr. Marçal Justen Filho, que certamente não perderam o tempo aqui, porque o nosso Relator Weverton, muito atencioso e certamente muito interessado em oferecer à sociedade um projeto de lei que possa atender às suas expectativas e não passar a impressão de que estamos abrindo as portas para a impunidade, para a corrupção impune.
O objetivo da modernização, que foi a razão da apresentação do projeto pelo Deputado Roberto Lucena, nosso companheiro de partido, não pode ser desvirtuado. A modernização da legislação não implica, não pode implicar retrocesso. Aliás, nós estamos vivendo alguns retrocessos no combate à corrupção. A percepção que há na sociedade - Roberto Livianu falou em pesquisa, 61% têm a percepção de que a corrupção se alargará - é exatamente em razão dos retrocessos que nós estamos vivenciando a partir de 2019, quando geramos uma expectativa extraordinária de avanços em 2018, no pleito eleitoral. Por isso, Sr. Presidente, nós temos que cuidar da imagem do Congresso Nacional, deste Parlamento. Muitas vezes, somos acusados de legislar mal. Por isso, essa estratégia de partilharmos a responsabilidade com especialistas é o melhor caminho que se pode caminhar na direção dos objetivos maiores, do avanço na legislação que se propõe.
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Eu imagino, Senador Weverton, que esta audiência pública, que veio tardiamente, obviamente, porque há uma pressa, nós estamos verificando. Mesmo antes da hora, já se estava prevendo a votação na tarde de amanhã no Plenário do Senado Federal. A matéria ainda não estava instruída, mas ela já estava pautada. Antes da instrução da matéria, ela já estava na Ordem do Dia anunciada para votação amanhã à tarde no Plenário do Senado.
É por essa razão que esta audiência pública é fundamental. Eu tenho convicção de que o Senador Weverton... Eu faço referência a ele porque certamente o seu relatório será essencial para a finalização desse processo.
Eu poderia fazer um resumo das principais preocupações. Sei que o Senador Relator também deve estar atento para esses itens. A proposta, da forma como está elaborada, dificulta a condenação; gera insegurança jurídica; aumenta o risco de prescrição da punição; extingue a ação administrativa; reduz para 360 dias o prazo para a investigação; exclui os partidos políticos e suas fundações de responder por improbidade, mesmo que desviem recursos públicos; impede o afastamento por mais de 180 dias do acusado de improbidade no cargo. Portanto, esses são alguns dos pontos que eu acho que merecem uma atenção especial do nosso Relator.
Para fazer uma pergunta apenas, já que o primeiro a falar foi o Ministro Herman Benjamin, eu faria então uma indagação a ele. Grande parte dos avanços da Lei de Improbidade Administrativa no combate à corrupção se deu por consolidação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Eu cito alguns pontos: aplicação da lei para responsabilização de agentes políticos sem prejuízo das sanções políticas e criminais; o julgamento nas instâncias ordinárias, independentemente do foro privilegiado; a possibilidade de quebra de sigilo bancário e a suficiência do dolo genérico para a condenação por atentado contra os princípios da administração. Considerando inclusive o tempo que leva até se sedimentar a jurisprudência, como o Ministro Herman Benjamin vê a proposta de mudança da lei vinda da Câmara em confronto com essa jurisprudência do Tribunal de Justiça? A indagação é sobre a existência de harmonia ou desarmonia entre a jurisprudência já conhecida e a proposta que nós estamos discutindo hoje e que provavelmente terá deliberação no dia de amanhã.
Essa é a indagação então, Sr. Presidente, que eu faço ao Ministro Herman Benjamin, mais uma vez agradecendo a participação de todos que vieram para esta audiência pública.
Muito obrigado, Presidente.
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O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Muito obrigado, Senador Alvaro Dias. Eu mais uma vez cumprimento a iniciativa de V. Exa. na realização desta audiência. Aliás, eu já disse, mais reitero: uma audiência muito rica no seu conteúdo, com a participação brilhante dos seis convidados, uma audiência de fato sólida no conhecimento aqui apresentado.
Eu vou dar a palavra ao eminente Relator, antes de pedir ao Ministro Herman que responda à indagação de V. Exa., porque depois colocaremos em bloco os três inscritos.
Com a palavra S. Exa., o Relator, Senador Weverton.
O SR. WEVERTON (PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - MA. Para interpelar.) - Sr. Presidente, colegas Senadores, senhores convidados, imprensa e toda a sociedade que está acompanhando esta audiência pública, eu queria primeiramente só agradecer a todos os palestrantes e parabenizá-los, que, sem dúvida, ajudaram a dar contribuição, fazer esclarecimentos e dar seus pontos de vista. Eu vou aprendendo e a cada dia que passa nós vamos aprendendo que sempre nosso ponto de vista deve ser respeitado, mas ele não pode ser apenas a única referência que você o tenha como a verdade absoluta. Então, obviamente, quando você vai tendo a opção de ter outros pontos e outras análises, você vai amadurecendo e você vai construindo para que a gente possa chegar num objetivo comum.
O mais importante: percebo que todos que são a favor integralmente ou que não são a favor integralmente da discussão desse projeto, desse relatório, todos têm aqui um ponto comum - a gente já parte aqui para um grande avanço, Presidente -, que é a necessidade de modernização da lei. Isso é muito importante porque essa autoculpa, ou a definição que é dada aqui para muitas injustiças que foram cometidas ao longo dos últimos anos com os ex-gestores e com os atuais gestores é preciso, sim, ser levada muito a sério porque nós temos aqui vários exemplos de que não dá para a gente levar simplesmente para o rol da culpabilidade, para o rol da improbidade, gestores. Nós temos exemplos de vários que se dedicaram ou se dedicam a tentar dar sua contribuição na vida pública e muitas das vezes são manchados, muitas das vezes são desonrados por um mero erro formal administrativo que não levou nenhum tipo de prejuízo ao Erário, nenhum tipo de prejuízo à administração pública. Dezenas são os casos que nós levamos aqui para a leitura aqui do nosso relatório no diálogo aqui com os Líderes. Amanhã também o faremos.
Não é possível imaginar na atual legislação, por exemplo, você pegar um ex-gestor que recebeu dinheiro para fazer uma ponte de madeira na sua cidade, ele pega aquele dinheiro, aproveita para fazer uma de concreto, melhor, maior do que ele recebeu, e o promotor vai lá e o processa por improbidade, porque ele tinha que ter feito a de madeira.
Não tem razoabilidade um negócio desse, imaginar que um gestor teve que contratar seis médicos na sua cidade e aí lá o Prefeito depois contratou os seis. Ele fez de forma errada a contratação, mas os médicos estavam lá, estavam trabalhando, então ele jamais pegou aquele dinheiro para se locupletar, e aí esse gestor hoje responde e está prestes a perder os seus direitos políticos.
Eu tenho aqui o caso de uma pessoa do nosso partido, concreto. Quem conhece aqui no Pernambuco o Queiroz, ex-Prefeito de Caruaru, pai do Deputado Wolney Queiroz. Um empresário respeitado no Pernambuco, probo, foi ser Prefeito da sua cidade. Ele inaugurou a sua obra e colocou durante 24 horas um outdoor: "promessa cumprida". Ele não sabia que aquilo era ato improbo. Na hora em que o Ministério Público o acionou, ele, na mesma hora ele mandou derrubar o outdoor. Está lá. Perdeu lá na primeira instância, perdeu na segunda e está aqui no STJ. Um homem desse é improbo porque colocou um outdoor dizendo que cumpriu uma promessa de campanha? Então, assim, o objetivo maior é que é preciso que a gente coloque... Eu fiz questão aqui de pegar os dados ponto a ponto, só para deixar esclarecida essa questão da tramitação legislativa, porque eu já vivi isso em outros momentos, Dr. Roberto, e nós vamos estar... Eu já combinei aqui com V. Sa. para à tarde a gente voltar a conversar. E se o Manoel Galdino quiser participar, não vai ter problema nenhum. Eu sou do diálogo e nós vamos conversando, e a gente vai, se Deus quiser, evoluindo, e vamos aí avançando em alguns pontos, que eu acredito que dá sim para a gente construir. Mas é importante que essa questão da tramitação legislativa seja esclarecida, porque eu já vi esse filme acontecer aqui na Casa.
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Quando chegou aquela... O projeto do combate à corrupção, as dez medidas, ela chegou como sugestão. A tramitação e a votação são do Poder Legislativo. É Deputado e Senador que votam. Quando já chegou e você dá sugestões a ela - e eu me lembro muito bem porque participei diretamente do debate do abuso de autoridade - naquele momento, o Ministério Público Judiciário veio para cima da gente, com tudo. Por quê? Porque disseram que nós queríamos desfigurar, ou tínhamos desfigurado um projeto no qual se incluía também a responsabilização de que vocês falaram aqui, dos juízes e promotores, dizendo: "Tem poder, tem que responder, tem que ter mais controle".
E naquele momento, o argumento que eles utilizavam, o maior, era justamente que em um dos artigos que tratavam o abuso de autoridade, falava-se que ficava muito aberto. Eles não podiam... E ficava temerário o seu trabalho, porque estava muito aberto quanto às tipificações sobre do que se tratava, o que era abuso ou não de autoridade. E pediram que fechasse. Tanto que houve esse diálogo e depois se fechou e colocou claramente o que era abuso de autoridade. Quando vai para o gestor, para o Prefeito, para o Governador e se coloca lá fechado para saberem o que é um ato improbo, aí não, está errado porque tem que ficar aberto, porque há outras tipificações que devem ser discutidas. O problema é que o chicote muda de mão.
Quando é para um, uma corporação ou um grupo que interessa, aí é muito boa aquela leitura. Quando é para o outro lado, não é. E nós não podemos fazer com que a pretexto de dizer que não se quer punir os ímprobos, não se quer combater a corrupção no Brasil, nós vamos desestimular as pessoas de bem, do bem, a entrar na boa política e na política. Por quê: Porque do jeito que está hoje, ninguém mais vai querer entrar, porque a pessoa que tem o seu nome a zelar vai dizer: Eu vou entrar, porque sei que devo sair da minha gestão com no mínimo 30 a 50 processos de improbidade. Está aqui o estudo, o CNJ... No STJ, 85% das ações de improbidade que chegam aqui, a maioria não tinha razão de ser e são extintas ou são arquivadas, ou não andam para frente, porque nasceram já de forma equivocada.
Então, é só essa ponderação e essa análise que eu queria fazer sobre essa questão da tramitação legislativa, quando se fala que se votou em oito minutos na Câmara. Vejam só. Oito minutos o projeto de urgência, o pedido de urgência. A sessão que tratou da Lei de Improbidade na Câmara dos Deputados... Vamos deixar aqui bastante claro que isso aqui... Eu pedi para puxar todo o trâmite que estava lá dentro e foram três horas e meia de deliberação. Vamos deixar claro isso para não acharem que foi assim: Pá! Oito minutos. Aprovou e manda para o Senado. Você pede urgência, inclui na pauta, em três horas e meia você discute o projeto. E 408 Deputados votaram a favor. Então, não dá para dizer que foi um projeto atropelado e a toque de caixa. E essa alegação de que o substitutivo não foi discutido em audiência pública, repito, essa deliberação é dos Deputados, ela não é da sociedade civil. Então, você colhe as informações, você prepara seu substitutivo e leva para os Deputados, no caso da Casa de origem, de onde iniciou o projeto. Nessa Comissão de Juristas, do que foi proposto nessas audiências públicas, porque houve 14 audiências públicas, três em Porto Alegre, três em São Paulo, em Recife, além da sessão de debates que foi presidida aqui pelo Nelsinho Trad, foram ouvidas cerca de 70 autoridades desses especialistas, dentre professores, pesquisadores, profissionais de Direito. O Ministro Mauro Campbell presidiu essa comissão, o Desembargador Ney Bello foi o Relator dela. Fiz questão de ligar para eles, para pegar mais informações e ouvisse algumas impressões que eles tiveram.
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Então, assim, é só para a gente não desconstruir. Nós vamos melhorar, vamos avançar, mas para não desmerecer, porque: "Ah, não é do meu jeito, então não presta, foi desfigurado e foi feito para atender improbo e corrupto". Não é verdade! Eu não vou desacreditar no trabalho desses juristas de quem eu acabei de falar o nome e no trabalho de 408 Deputados, e todos nós que estamos construindo aqui, para utilizar apenas argumento que desmereça tudo isso que foi construído, detalhe, ao longo dos anos, porque todos sabem que isso não foi construído da noite para o dia.
Então, eu tenho certeza, volto a repetir... Hoje, às três e meia, vou sentar com vocês novamente, já vamos sentar para avaliar alguns pontos. O Senador Alvaro já me deu ali algumas sugestões. Estava olhando ali algumas sugestões do Telmário e do Lasier, e a gente vai avançar. No que nós não avançarmos, e isso faz parte da democracia, a gente vai ter aqui oportunidade, na CCJ, de votar esses destaques e ver os pontos de vista, o Senador Esperidião vai nos ajudar na construção, e ainda temos... Meu colega e dileto amigo Styvenson, ainda temos o Plenário. Então, assim, haverá todo o processo legislativo para que a gente possa evoluir e ter o sentimento da Casa.
No caso, a maioria vai dar a sua opinião e claro vai dar a sua posição, lembrando, e isso eu quero fazer de forma clara, como vou falar hoje, que nós estamos aqui apenas na condição de revisores. Então, também, nós estamos sempre tendo esse cuidado de dialogar lá na Câmara, porque não adianta nada, colega Senador Lasier, a gente fazer um novo substituto, mudar tudo, e aí quando voltar, eles têm a opção de voltar para o seu texto original. Ou seja, nem melhoramos e ficamos no zero de novo, porque se já veio criticado o texto de lá, você tem que dar pelo menos uma arrumada para que também a gente não rompa essa possibilidade de manter o que for votado aqui no Senado. Não sei se vocês estão me compreendendo.
Então, eu estou tendo esse cuidado, porque nós estamos revisando. Se tivesse saído daqui e lá as alterações não tivessem sido de acordo com o que nós queríamos, nós teríamos a opção, dileta e sempre aqui reconhecida por esta Casa e por todos que acompanham essa luta do combate à corrupção no Brasil, Ministra Eliana Calmon... Se tivesse saído daqui da Casa originária o projeto, nós teríamos até mais condições de trabalhar e mais condições de propor. Agora, nessa questão de revisão, vocês sabem, na hora da votação da Câmara, vai ser texto da Câmara ou do Senado. Eles não vão aproveitar artigos nossos. Ou vão aproveitar o que a gente mandar, ou não. Então, eu estou tendo esse cuidado, para a gente não prejudicar tudo e ficar só o que veio de lá.
Eram essas as minhas considerações, Presidente Anastasia. Agradeço a V. Exa., agradeço ao Senador Alvaro e a todos que fizeram aqui a sugestão da realização desta audiência, que eu tenho certeza de que só fez enriquecer ainda mais essa possibilidade, esse sentimento que nós temos de melhorar essa legislação e dar aos Prefeitos, ex-Prefeitos, Governadores, todos os gestores a garantia de que eles, se tiverem boa-fé, vão poder, sim, se dedicar à vida pública e ajudar este País, que está precisando, e muito. Todos sabem aqui a minha posição, a minha história de luta, que não foi fácil. E aqui a nossa realidade na vida real... Quem se elegeu a primeira vez na vida pública e já veio para o Senado ainda não está no mundo real, mas eu já fui lá debaixo, da ponta, já fui gestor e quero dizer a vocês que, diferentemente aqui do Ministério Público, quando se passa no concurso, vira-se ali a corporação, eles brigam entre eles, mas a gente sabe como funciona, é um time. Juiz, a mesma coisa: eles não têm mais disputa entre si da forma como têm os políticos. Prefeitos, Deputados, você que milita na política, nós acumulamos adversários, nós acumulamos até inimigos lá na ponta. Então, é um trabalhando todo o tempo contra o outro para desconstruir, para tentar fazer de tudo para derrubar o seu adversário. Basta ver que a maioria das confusões, dos escândalos que saíram aqui no Brasil - não digo nem escândalos, mas as confusões políticas - foram autodestrutivas, foram de políticos contra políticos. Do impeachment da Dilma para cá, quem foi para cima de verdade foi um outro partido político que era contra, e começou essa confusão toda no Brasil. Agora, está aí do mesmo jeito.
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Então, assim, não é outra corporação brigando com os políticos. São, na verdade, eles que têm essa capacidade de se autodestruir, de sempre se autodenegrir. E isso é ruim, porque, no final, a gente acaba ficando dessa forma totalmente aberta e vulnerável, e não é o que a sociedade quer, até porque a boa política, ela sendo praticada, é garantia de boas ações e política pública acontecendo na ponta.
Eram essas as considerações, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Muito obrigado, Senador Weverton. Eu cumprimento V. Exa. pelas ponderações muito lúcidas e equilibradas. E temos certeza de que o tirocínio de V. Exa. como Relator levará a bom termo o tema, que não é um tema fácil. Como sabemos, V. Exa. está empenhado, dedicado, estudando a matéria, com sua experiência, ouvindo várias partes e, certamente, esta audiência, juntamente com os seus desdobramentos, vai facilitar o seu trabalho.
Antes de dar início à ordem dos inscritos, eu solicito, então, a gentileza do Ministro Herman Benjamin, a quem peço escusas, que está ali nos acompanhando virtualmente já desde as 9h, e já é quase meio-dia, para, se ele puder, declinar a resposta à indagação do Senador Alvaro Dias. Eu só peço ao eminente Ministro a gentileza de se pautar ao tempo previsto de três minutos para a resposta, que temos quatro inscritos ainda aqui para formular indagações.
Com a palavra o Ministro Herman Benjamin.
O SR. ANTONIO HERMAN DE VASCONCELLOS E BENJAMIN (Para expor. Por videoconferência.) - Presidente Anastasia, em primeiro lugar, eu peço desculpas, porque deste lado de cá nós não escutamos a campainha. Então, eu estava me fiando em que a campainha ia funcionar. Pelo menos eu não a ouvi aqui. E, por isso, me estendi por sete minutos a mais do meu tempo, como V. Exa. generosamente e com muita elegância apontou. Então, as minhas desculpas, porque eu não consegui ouvir, e não se ouve.
Agradeço as observações do Senador Alvaro Dias. E o que eu tenho a dizer é o óbvio: juiz cumpre a lei aprovada pelo Parlamento, a Constituição aprovada pela Assembleia Constituinte e as emendas constitucionais. Claro que o STJ tem um papel - e está aí a Ministra Eliana Calmon, que é uma das precursoras desses leading cases que nós estamos aqui... vários deles, inclusive, eu mencionei -, o STJ foi construindo uma jurisprudência diante da lei que tinha diante de si, mas é verdade que vários dos dispositivos colocados nesse texto que veio da Câmara dos Deputados desfazem e negam frontalmente precedentes, e precedentes já pacificados, vamos dizer assim, da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Mas isso é muito próprio do Estado democrático de direito, que o legislador diga: "Não estou satisfeito com a jurisprudência; vamos mudar a lei".
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Mas há dois pontos que eu gostaria aqui de realçar desta jurisprudência. O primeiro... E aqui é muito mais como um cidadão do que evidentemente como estudioso da matéria. Eu não posso conceber uma Lei de Improbidade Administrativa, que cuida do bolso do contribuinte, dos recursos do Erário, e se ponha fora desta lei a proteção dos direitos humanos. Para mim, isso é incompatível com o Estado de direito que nós temos no Brasil e no mundo. Direitos humanos vêm antes. Tortura é inadmissível! É mais do que improbidade administrativa, mas também é improbidade administrativa. E o fato de ser prevista como crime, se for esta a régua, boa parte dos dispositivos da Lei de Improbidade Administrativa podem sair, e esses dispositivos podem sair, porque várias dessas condutas estão previstas como crime, seja no Código Penal, seja na legislação especial.
Finalmente, depois eu posso dizer alguma coisa, mas não nesse momento, sobre a segurança jurídica dos textos normativos, o Direito Penal está cheio de normas, ou normas penais em branco ou conceitos jurídicos indeterminados, mas eu não tenho tempo neste momento.
Minha última observação no contexto da pergunta do Senador Alvaro Dias tem a ver com as empresas. Da mesma forma que o Estado de direito não pode conceber uma lei de combate à corrupção e de combate à improbidade sem colocar os direitos humanos na frente do patrimônio econômico, também não pode ser uma lei de improbidade administrativa que olhe o pequeno Prefeito, olhe o pequeno Vereador e deixe de fora os agentes principais que são as grandes empresas que historicamente vêm sendo protagonistas - e aí, sim, isso é um escândalo - dos maiores escândalos de corrupção no nosso País.
Eu cito um único exemplo. Foi mencionada aqui a Lei Anticorrupção. E a Lei Anticorrupção tem um dispositivo expresso, é o art. 27... Aliás, eu estou aqui, e não consigo encontrar o dispositivo, mas há um dispositivo expresso dizendo que as sanções e o sistema daquela Lei de Improbidade, Anticorrupção não impedem a aplicação da Lei de Improbidade Administrativa. Pois bem, aqui se cria um novo art. 3ª, §2º, que diz o seguinte, e para mim é um dos dispositivos mais graves de toda a lei, o texto vindo da Câmara dos Deputados: "As sanções desta lei não se aplicarão à pessoa jurídica, caso o ato de improbidade administrativa seja também sancionado como ato lesivo à administração pública de que trata a Lei 12.846", a chamada Lei Anticorrupção.
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Ou seja, nós estamos revogando um dos principais dispositivos da Lei Anticorrupção em favor de quem? Dos Prefeitos? Não, porque os Prefeitos nem os Vereadores são objeto dessa Lei Anticorrupção. Nós estamos aqui com um dispositivo na Lei de Improbidade Administrativa que só tem um objetivo, que é proteger as grandes empresas, sobretudo as empreiteiras, da aplicação da Lei de Improbidade Administrativa. É há outros dispositivos que só têm esse objetivo; não é ponte de madeira que se transformou em ponte de concreto ou aquelas situações mencionadas pelo Prefeito Izaías, é não. Nós estamos tratando aqui das grandes empresas, das grandes empreiteiras, aquelas que levaram o Brasil à situação que nós enfrentamos hoje e que vimos enfrentando historicamente. É uma corrupção histórica que passa de avô para pai e para filho e, por isso, nós não podemos permitir, como cidadãos - e aqui é a opinião de um cidadão -, que objetivos legítimos sejam apropriados para enfraquecer aplicação da Lei de Improbidade Administrativa perante essas grandes empresas.
A Lei de Improbidade Administrativa não pode ser uma lei saci-pererê, só de uma perna, olhando para o pequeno administrador público e deixando de fora as grandes questões de direitos humanos e deixando de fora os grandes corruptores privados do nosso País.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Muito obrigado, Ministro Herman Benjamin. V. Exa. não tem nada a desculpar. Nós que sempre agradecemos a colaboração que V. Exa. dá a este Senado em várias audiências. Cumprimento-o e agradeço a resposta dada ao Senador Alvaro Dias.
Nós temos quatro Senadores inscritos: Senador Lasier Martins, Senador Esperidião Amin, Senador Styvenson e Senador Vanderlan. Se todos estiverem de acordo, os quatro fazem as suas indagações, são três minutos cada, e depois as respostas, caso sejam dirigidas a cada convidado da audiência pública.
Desse modo, o primeiro orador inscrito para suas indagações, Senador Lasier Martins.
Com a palavra V. Exa.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - RS. Para interpelar.) - Muito obrigado, Presidente.
Presidente Anastasia, eu queria primeiro ponderar que, sendo o tema tão amplo como é, é muito escasso o tempo de três minutos. Como somos apenas quatro inscritos, eu quero apelar a V. Exa. que amplie para cinco minutos.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Cinco minutos.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - RS) - Muito bem. Agradeço muito a compreensão do Presidente dos trabalhos, ilustre Antonio Anastasia.
Saúdo o Senador Weverton, que já me tranquilizou bastante quando disse que está disponível para uma reunião hoje com o Dr. Galdino e com o Senador Alvaro, o que já pressupõe que será sensível para algumas mudanças neste projeto que veio da Câmara e que, perdoe a dureza da palavra, mas é muito ruim; ele atenta contra os princípios constitucionais.
Quero saudar também a Ministra Eliana Calmon, que pacientemente acompanha esta reunião, Senador Anastasia, e a sua presença sinaliza a sua permanente preocupação com ordem jurídica do País. Ela que foi uma brilhante Ministra do STJ, Corregedora do Conselho de Justiça, uma patriota na verdadeira acepção da palavra e que está aqui vigilante, porque, se não houvesse questionamentos a esta lei, ela não estaria aqui; ela está porque ela sabe que esta lei não pode prosperar.
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Eu quero, primeiro, fazer uma lembrança com relação à definição de improbidade. Podemos recorrer a uma definição gramatical: improbidade administrativa é todo ato que atenta contra os princípios da administração pública. Ora, o que diz a administração pública no mais importante preceito da nossa Constituição?
Art. 37 A administração pública [...] [em qualquer de suas áreas ou instâncias] obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...].
Ora, se nós seguíssemos os princípios da Constituição, o Brasil seria outro. E essa Lei de Improbidade precisa se cingir a esses princípios. Isso é elementar.
Eu queria fazer uma pergunta ao Dr. Herman Benjamin, se ele ainda estiver conectado, porque me chamou a atenção quando o Dr. Herman, brilhante Ministro, falou no dolo específico, porque esse me parece, com todo respeito ao nosso prezadíssimo Senador Weverton, o cerne da questão. Ele é o problema crucial dessa matéria que veio para nós e que precisamos corrigir, porque limita a improbidade ao dolo específico, isto é, é preciso, quando houver uma representação, demonstrar a materialidade do dolo específico, e isso elimina as hipóteses de culpa grave, do dolo genérico. Então, restringe tudo, abre inúmeros caminhos para todo tipo de infração.
O Senador lembrou o caso da ponte de madeira. Eu quero usar a mesma figura de uma ponte. Se um prefeito ou um governador for advertido de que determinada ponte, numa rodovia municipal ou estadual, está por cair e ele não liga para isso, não toma providências e o tempo passa e aquela ponte cai, morre gente e há danos materiais, etc., o que é isso? Isso é dolo? Não. Isso é culpa grave, isso é negligência, indolência.
(Soa a campainha.)
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - RS) - Então, eu quero perguntar ao Dr. Herman Benjamin uma palavra a mais sobre essa restrição perigosa que diminuiu demais a Lei de Improbidade, tachando no seu art. 1º, §1º, contra o qual eu me insurjo quando apresento o voto em separado e proponho que se admita a culpa grave. Dr. Benjamin, poderia me responder um pouquinho mais sobre esse perigo, sobre a inconveniência dessa limitação ao dolo específico?
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Senador Lasier, as respostas serão dadas em conjunto.
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O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - RS) - Perdão, me desculpe.
O que mais eu precisava dizer aqui?
Na minha fala na semana passada, no Plenário do Senado, eu falei em muitas facilidades dessa lei, e fico tranquilo quando o Senador Weverton está disposto. Por que tem muitas facilidades? Já o Senador Alvaro mencionou alguns itens, e eu me permito repetir ou acrescentar mais alguns.
Por exemplo, a negação a processo civil quando houver absolvição no criminal. Isso é um absurdo. O ressarcimento pode e deve ser buscado na ação cível, não é?
A questão da prescrição retroativa; isso vai absolver um monte de infratores.
O prazo de inquérito de 180 dias; isso é um absurdo, mesmo que se dobre para 360, conforme discorreu muito tem o Dr. Roberto Livianu, há certas circunstâncias, número de testemunhas, localização, quebra de sigilo, e isso demanda muito tempo. É impossível fazer uma instrução em 180 dias.
(Soa a campainha.)
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - RS) - Outro item: restringe a competência, deixando tudo ao Ministério Público. Nós temos de admitir a advocacia pública, que tem direito de participar, e obrigação e necessidade, para que haja uma vigilância mais assídua às infrações.
A exclusão aos princípios de prestar satisfação quando os partidos trabalham com dinheiro público; é um absurdo essa exclusão, não é?
Permitir o retorno a uma função: o funcionário público que foi afastado em processo de culpa ou processo de responsabilização sai daquele cargo e pode entrar em outro; isso não é coerente.
E eu poderia discorrer muito mais, mas, como apresentei, Sr. Presidente, o voto em separado - e peço encarecidamente que o eminente Senador Weverton considere -, ali eu apresento nove retrocessos, eu deixo uma pergunta, para finalizar, que depois será respondida pelo Dr. Livianu, com relação à imprescritibilidade da ação e omissão nessas ações de improbidade.
É a minha participação. Agradeço a tolerância.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. PSD - MG) - Muito obrigado, eminente Senador Lasier Martins. Eu o cumprimento. As respostas serão feitas ao final.
Nesse meio tempo, antes de dar a palavra ao Senador Esperidião Amin, que é o próximo orador inscrito, eu tomo a liberdade de passar a Presidência ao Senador Weverton, conforme havia combinado com ele, para conclusão desta audiência pública.
Quero pedir escusas pela minha ausência, mas cumprimento muito todos os convidados e agradeço.
Depois, teremos Amin, Senador Styvenson Valentim, Senador Vanderlan e as respostas. Agradeço muito. Com licença.
Senador Amin, me desculpe. Com a palavra V. Exa.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Para interpelar.) - Sr. Presidente, eu serei tão breve quanto possível, mas quero celebrar, Senador Alvaro Dias, o fato de termos realizado esta reunião. Portanto, ela não teve caráter procrastinador, ela teve caráter esclarecedor. Todos nós sabemos um pouco mais hoje do que sabíamos na semana passada.
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E essa deliberação de V. Exa., Senador Weverton, de se reunir com pessoas que se preocuparam com a realização dessa reunião é um grande gesto que eu quero cumprimentar de público, porque ouvir razões como foram expressas aqui, todas fundamentadas, algumas talvez até apaixonadas, como, por exemplo, as do Dr. Roberto, que quase ofendeu a nós todos corintianos ao impor a torcida - desculpe a expressão - "aos porcão"... Mas isso é um outro gênero. A nossa busca de esclarecimento aqui acho que foi objetiva. Os exemplos contestados ou não também foram objetivos. Eu acho que todos contribuíram aqui presencialmente, e o Ministro Benjamin remotamente, mas com muita dedicação. O fato de a Dra. Eliana Calmon estar acompanhando é uma demonstração de preocupação. Eu não estou tranquilo, eu estou certo de que fizemos o certo. Agora, o que vai acontecer doravante faz parte do processo legiferante. Agora, que ele está mais iluminado do que estava eu não tenho dúvida.
Finalmente, Presidente, só vou informar à Mesa que eu estou apresentando um requerimento, que será lido provavelmente amanhã, no sentido de informar a Comissão de Constituição e Justiça acerca de um outro tema. É o tema centralização do cômputo de votos. Ontem eu tive a honra de presidir uma sessão de debates temáticos a respeito deste assunto.
Todos se lembram de que, no dia 18 de novembro, ainda dois dias depois do primeiro turno das eleições, a Comissão de Constituição e Justiça manifestou o seu apoio e solidariedade ao povo brasileiro por aquele retardamento - lembram? - na apuração dos votos do primeiro turno da eleição municipal, atraso este que se deveu à centralização.
Este processo de centralização está contrariando, pelo menos, ao Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, que ontem participou da reunião. Eu acho que esse assunto é meu dever trazer ao conhecimento da Comissão de Constituição e Justiça, como já veio à nossa colação no ano passado.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - MA) - Obrigado, querido amigo Senador Esperidião Amin.
Eu concedo a palavra ao Senador Styvenson por três minutos, prorrogável para cinco.
O SR. STYVENSON VALENTIM (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - RN) - Sr. Presidente, Senador Weverton, eu não acho justo e nem pela ordem sequencial eu tomar o lugar do Senador que é titular - eu não sou membro. Então, o Senador Vanderlan fala; eu falo após a fala dele. Pode ser? Porque ele é titular.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - MA) - Senador Vanderlan, o Senador Styvenson, com a sua sempre gentileza, passou a palavra a V. Exa.
O SR. VANDERLAN CARDOSO (PSD - GO. Para interpelar.) - Sr. Presidente, meus cumprimentos, nosso Relator. Cumprimento os meus pares aqui presentes.
Quero cumprimentar os nossos convidados: Sr. Antonio Herman de Vasconcellos, Ministro do Superior Tribunal de Justiça; Roberto Livianu, Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo; Sr. Manoel Galdino, economista e Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo; economista e Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo; Marçal Justen Filho, advogado e Doutor em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Izaías José de Santana, Prefeito Municipal de Jacareí, São Paulo, e Doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo.
Prefeito atual?
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(Intervenção fora do microfone.)
O SR. VANDERLAN CARDOSO (PSD - GO) - Certo. Então, já quero comunicar a V. Exa. que o senhor vai sair da prefeitura e a prefeitura não vai sair do senhor, viu? O senhor já está sabendo.
E cumprimento também Lucas de Castro Rivas, advogado e Mestre em Direito pelo Centro Universitário de Brasília.
Sr. Presidente, eu tenho acompanhado atentamente esse projeto e as discussões. Acho que todo projeto, quando ele vem, vem primeiro ao debate, às discussões e vem para aperfeiçoar. Foi assim com o projeto de improbidade administrativa à época. Nós pensávamos que iríamos atingir o objetivo de pegar quem? Aqueles corruptos; punir aqueles que não aplicavam bem o recurso público, que desviavam. E o que nós vimos, ao longo desses anos, foi que essas pessoas que têm esse pensamento de usufruir da coisa pública foram se aperfeiçoando bem mais do que a lei - bem mais do que a lei. Tanto é que... Veja só como é interessante. Eu fui Prefeito, por dois mandatos, da cidade de Senador Canedo. Para você fazer um convênio...
(Soa a campainha.)
O SR. VANDERLAN CARDOSO (PSD - GO) - Para você fazer um convênio, primeiro você tem o parecer da procuradoria do Município. O parecer foi favorável, Senador Styvenson, vai para a Câmara Municipal para dar autorização. A Câmara autoriza. Onde houver Tribunal de Contas dos Municípios, que é o caso de Goiás, o tribunal aprova também. Depois de tudo isso feito, se o Ministério Público entender que não é correto, ele tem direito ali a colocar um processo de improbidade, e nada disso vale. Mas os excessos por essa lei são com relação aos administradores públicos bons. Quero citar aqui... Eu não tenho pergunta para ninguém, mas eu quero dar esse testemunho aqui como Prefeito que fui, Styvenson e Oriovisto.
Nas nossas empresas no Município de Senador Canedo, todo ano nós fazíamos ali a festa do Dia das Mães. Chamávamos todas as mães. E numa dessas, se eu não me engano no ano de 2006, sobrou ali umas 50... E ali a minha esposa, que fazia essa festa, dava um botão de rosa com chocolatezinho. E sobraram uns 50, 60 desses botões de rosa. E ali ela tinha um evento da prefeitura com as mães idosas e levou, Sr. Presidente, e distribuiu para as mães. Resumindo: processo de improbidade administrativa, perda de direitos políticos, mais condenação disso... Onze anos - onze anos! Veio acabar agora, esses dias, esse processo. Ao passo que aqueles que destroem, que roubam o dinheiro público, que têm processos, que são cassados, que recebem ali as penalidades, esses - infelizmente isto acontece - conseguem eliminar nos tribunais superiores e vão disputar as eleições. Vão de novo, como é o caso que aconteceu, na cidade que eu citei, do ex-Prefeito que está supercondenado e voltou com a liminar e destruiu novamente o Município. Então, acho que nós temos que rever esses pontos.
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Essa discussão aqui... Eu quero parabenizar o Senador Alvaro por essa iniciativa.
Sr. Presidente, eu tenho aprendido tanto aqui no Senado Federal, no meu primeiro mandato, através das audiências públicas. Foi assim quando eu fui Presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia, quando a gente debateu ali assuntos importantes. E quanto nós aprendemos.
Então, eu creio que esse ajuste que está sendo feito, esse aperfeiçoamento venha a corrigir esses absurdos e essas distorções.
E, já finalizando minhas palavras, eu quero falar para V. Exas. que estão aqui: os homens de bem, aqueles que prezam compromisso com a moralidade e com a coisa pública, não querem mais disputar a eleição para o Executivo, porque a lei hoje infelizmente está punindo os bons administradores. Porque os ruins administradores, os péssimos administradores não têm compromisso com nada, não têm nada no nome deles, não têm família, não querem saber de nada. Essa é a realidade.
Então, Sr. Presidente, passei meu tempo. Obrigado pela oportunidade.
Só queria também aqui, Sr. Presidente, agradecer à Eliana Calmon, que está aqui presente. A Eliana Calmon, quando fui Prefeito da minha cidade e houve uma injustiça tão grande cometida com os Município do Estado de Goiás, estava ali Corregedora do CNJ. Levamos o problema para ela. Imediatamente ela detectou o problema, viu que ali tinha coisa errada e mandou corrigir. Estou dando esse testemunho aqui, porque pessoas como essa senhora têm que ser exaltadas por este País inteiro, aonde ela for, porque é uma pessoa de bem.
Obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - MA) - Sem dúvida. As palavras do Senador Vanderlan, Ministra Eliana Calmon, são de toda a Casa, de todos os nossos colegas, pares, Senadores.
Senador Styvenson, V. Exa. está com a palavra.
O SR. STYVENSON VALENTIM (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - RN. Para interpelar.) - Agora sim, Sr. Presidente, estabelecida a ordem das coisas.
Primeiro, quero parabenizar o Senador Alvaro, agradecer por essa audiência não só de interesse dos Senadores, mas de interesse da população. O dado já foi dito: 61% acreditam que haverá uma fragilização no combate à corrupção neste País.
Mas eu fico seguro, Senador Weverton, e fico feliz com o que o senhor manifestou, porque eu sei que está em boas mãos. O senhor não é uma pessoa injusta. Sei que o senhor vai se aproximar o máximo possível de fazer uma boa relatoria para que Senadores como eu, como outros que querem um País melhor, votem com segurança, sem a gente ter aquela incerteza do que está voltando.
Eu ouvi atentamente todos os palestrantes. Agradeço a presença de todos. Como o senhor disse, eu não tenho experiência de gestão pública. Não fui Prefeito, não fui Governador. O primeiro cargo político que eu assumi foi este de Senador da República. Mas eu venho de uma sociedade que está cansada, Senador Vanderlan, cansada mesmo de ser roubada, cansada de não ter obras concretizadas, cansada de não ver nem a ponte de madeira, nem a de concreto, cansada de ver rua esburacada.
É difícil o nosso sistema de fiscalização... Através da transparência, qualquer brasileiro que queira entrar... Quanto a isso eu parabenizo o Senado Federal, porque o nosso Portal da Transparência é claro, é transparente de verdade: mostra, em tempo real, tudo que nós gastamos, fazemos aqui. Ele deveria ser um modelo, Senador Weverton, para todos os outros, já que existe esse Portal da Transparência, ao qual eu faço tanta referência e elogios, porque eu tento entrar no portal do meu Estado e não consigo. Não consigo entender. Não sei nem por onde entrar. Eu peço a gente que trabalha com isso, assessoria especializada nisso, e não consegue ter informação dos gastos públicos, com o que se gasta.
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Se a gente for para qualquer Município, Sr. Prefeito Izaías José de Santana, é a mesma situação. E eu tenho certeza de que, para combater a corrupção, Senador Vanderlan, a melhor arma é a transparência. É como está sendo feita esta audiência aqui, em que um projeto, como o senhor explicou claramente, acho que de forma bem didática, pedagógica, como é que funciona o processo legislativo, tem que ter acompanhamento público, porque depois a gente vai ter que explicar o voto.
E eu não quero acreditar que essa mudança da Lei de Improbidade venha a servir só aos ruins, Senador Vanderlan, porque eu não acredito. Eu estou pegando aqui uma analogia do Roberto Livianu, da bacia, a água e o bebê: fora o sabão e a sujeira, joga tudo fora.
Eu acredito que, neste País, há muita gente queira fazer a coisa boa e a coisa certa. Agora, não dá para a gente pegar uma lei e apenas privilegiar aqueles que fazem ou que são, como o senhor explicou e disse claramente em alguns casos, o do outdoor e o da ponte... Esses, que são injustiçados; esses, que estão realmente sendo perseguidos, aí, sim, parece ser uma minoria. Parece. É o meu ponto de vista. É só um ponto de vista meu, porque parece que o que prevalece no nosso País, Senador Weverton, e o senhor é Relator, são os maus mesmo, são os que desviam, são os que roubam, são os que levam a gente para o mesmo rol deles. E eu sei que o senhor não compactua com isso. Sei que o senhor não tolera isso e não vai aceitar isso, mas chega ao ponto, hoje, de o político ter até vergonha de ser político neste País, pelo nível a que chegou a política brasileira. Parece que todos que entram aqui ou que passam por aqui querem o enriquecimento; querem, através do nepotismo... Aí eu não fui Prefeito, não fui secretário, não fui nada, porque as pessoas alegam que o nepotismo seria um cargo de confiança, e quem melhor de confiar do que a família? Mas talvez não sejam competentes para ocupar aquele cargo. É uma coisa que eu combato também.
Então, só falando isso e dizendo para o senhor que eu estou mais tranquilo, mais calmo por estar na mão do senhor essa relatoria. Sei que o senhor é uma pessoa que ouviu e está aqui até agora e vai ter a resposta no momento de apresentar esse relatório. Não é que agrade, é que faça o justo. O agradar talvez não seja o justo para todos os Senadores ou para todos os políticos ou para a população brasileira, mas que se aproxime disso.
Eu tenho uma pergunta específica ao Dr. Roberto Livianu. Gostei da explanação dele. Fiquei curioso para saber, na visão dele, qual seria o aproveitamento da absolvição criminal para o campo da improbidade.
Hoje eu perguntei um dado estatístico, acho que o Alvaro me mostrou aqui, não sei se o senhor tem... Quantos políticos, vamos dizer gestores - como o senhor já foi -, passam por esse processo? Mesmo que sejam... Acho que o senhor falou 85%, mas quantos são condenados de fato? Quantos realmente chegam a ser punidos pelo que fizeram ou pela omissão ou pelo desejo de realmente não concretizar?
Eu tenho certeza, Senador Weverton, de que, se nós evoluirmos nessa legislação e desmotivarmos os políticos ruins, os que querem se elucubrar, os que querem tirar proveito dos cargos que ocupam, a gente vai estar dando uma grande contribuição para a população para baixar para muito menos esse número de 61% de confiabilidade em nossos políticos brasileiros.
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Então, eu tenho certeza de que o senhor vai fazer esse bom trabalho. Por isso é que vim e eu estou aqui calmo. Não sou membro desta Comissão, mas gostei do posicionamento de todos aqui. A gente tem que olhar para todos os lados para poder avaliar e medir.
Obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - MA) - Obrigado, Senador Styvenson.
Eu vou passar aqui a palavra ao Ministro Herman Benjamin. Foi feita uma pergunta a ele. Dos que estão remotamente, foi apenas para ele; dos que estão aqui, para o Dr. Roberto Livianu.
O Dr. Herman Benjamin está com a palavra.
Logo em seguida, o Dr. Roberto Livianu, e nós partiremos para o encerramento dos trabalhos.
O SR. ANTONIO HERMAN DE VASCONCELLOS E BENJAMIN (Para expor. Por videoconferência.) - Agradeço, Presidente.
Eu agradeço todas as observações feitas pelos eminentes Senadores.
Especificamente à pergunta emergida pelo Senador Lasier quanto à culpa, eu repito o que eu afirmei no início da minha apresentação de hoje, da minha contribuição. Nós vamos, a prevalecer o texto que veio da Câmara dos Deputados, terminar com uma lei de improbidade que não prevê culpa para condutas que são consideradas, por exemplo, de corrupção, enquanto o Código Penal, que manda para a cadeia, prevê culpa. E eu cito o peculato:
Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio [...]
...................................................................................................................................................................................................................................................
§2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem [...]
Então, veja, não é nem culpa na sua própria conduta, é culpa em relação à conduta do terceiro. Então, penso que é possível encontrar alguma fórmula que excepcione as condutas em que, no Direito Penal - inclusive no exercício da própria Medicina existem tipos específicos -, a figura culposa esteja prevista.
Termino insistindo com a observação a respeito desse dispositivo que eu não vi ninguém mencionar e que, para mim, é um dos mais graves incluídos na lei - talvez tenha passado despercebido -, que é o art. 3º, §2º, que revoga o art. 30 da Lei Anticorrupção, ou seja, nós não estamos apenas alterando a Lei de Improbidade Administrativa, estamos alterando também a Lei Anticorrupção.
O dispositivo art. 3º, §2º, diz o seguinte: "As sanções desta Lei não se aplicarão à pessoa jurídica, caso o ato de improbidade administrativa seja também sancionado como ato lesivo à administração pública de que trata a Lei nº 12.846...", que é a Lei Anticorrupção. E o artigo da lei, que aqui não está sendo revogado expressamente, mas implicitamente, ou seja, não há transparência, diz o seguinte...
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O art. 30 da Lei Anticorrupção, que é a lei que se aplica às pessoas jurídicas e, sobretudo, às grandes empresas... Não é ao Prefeito, não é ao Vereador, não é ao Deputado, ao Senador, ao juiz, ao membro do Ministério Público, é às grandes empresas principalmente.
Art. 30. A aplicação das sanções previstas nesta Lei [Lei Anticorrupção] não afeta os processos de responsabilização e aplicação de penalidades decorrentes de:
I - ato de improbidade administrativa [...];
II - atos ilícitos alcançados pela Lei nº 8.666 [...].
Esta aqui é a tese que está sendo, neste momento, advogada nos tribunais: de que uma lei afasta a outra. Evidentemente aqui não é dispositivo que vem para fortalecer a lei; pelo contrário, é para criar uma blindagem, como se não bastasse a blindagem de fato que essas grandes empresas e, sobretudo, as empreiteiras tinham e ainda têm perante a corrupção, e transformar, juntamente com a exclusão das graves ofensas a direitos humanos, como a tortura, a Lei de Improbidade Administrativa em, como eu chamo, uma lei Saci-Pererê, é só uma perna. E é uma perna para olhar o administrador público, mas não aqueles que estão por trás desses grandes atos de corrupção e que se beneficiam, repito, de avô para pai, de pai para filho, com os benefícios econômicos dessas práticas que são odiosas.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - MA) - Muito obrigado, Ministro Herman Benjamin.
Passo a palavra ao Dr. Roberto Livianu.
O SR. ROBERTO LIVIANU (Para expor.) - Obrigado, Senador.
Houve duas questões, uma feita pelo Senador Lasier e outra pelo Senador Styvenson.
Primeiro, eu queria cumprimentar todos os Senadores que fizeram intervenções: Senador Alvaro Dias, Senador Lasier, Senador Esperidião Amin, que não está mais aqui, e Senador Vanderlan também.
Todo o espírito desse debate, Senador Weverton, com certeza, contribuiu muito, aperfeiçoou muito essa discussão em relação a esse projeto.
Quero dizer, dar meu testemunho do quanto eu acredito na política e na importância da política, do quanto eu não integro o grupo daqueles que criminalizam a política, do quanto eu não penso na generalização da criminalização da política. Não penso que esse seja um bom caminho. Eu respeito a legitimidade dos políticos no seu campo e penso que todos podemos construir essa solução, que é o que nós estamos fazendo hoje aqui. E isso é extremamente positivo e importante.
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Em relação a essas questões específicas que foram colocadas - primeiro, a questão do dolo específico que o Senador Lasier levantou e o Ministro Herman começou a responder -, eu quero trazer uma contribuição. Parece-me importante deixar claro um ponto. No projeto, do jeito que está, Senador Weverton, está se exigindo um elemento subjetivo para responsabilizar pelos atos dolosos por improbidade. Ou seja, não basta simplesmente comprovar que houve dano ao patrimônio público. Não, tem que se comprovar que houve intenção de querer produzir aquele ato doloso. Se o indivíduo diz: "Não, não, eu quis ajudar um irmão, um primo que estava com dificuldades, ele estava passando necessidades, ou ele não viajava para Miami fazia dois anos, estava deprimido". "Está absolvido." "Ele estava triste." "Está absolvido." Nós não podemos dar margem a esse tipo de coisa, Dr. Lucas. Não podemos exigir dolo específico para punir por ato doloso contra a administração pública. Esse tipo de brecha não é razoável, não é admissível. Nós queremos esse tipo de capricho legislativo da lei... Não é razoável.
A questão da reparação que o Senador Lasier colocou, segundo a informação que o senhor me dá, é necessária uma leitura atenta, mas de fato, só com emenda à Constituição, nós podemos desfazer uma construção que já está consolidada no Supremo, no sentido de que ações reparatórias por dano ao patrimônio são imprescritíveis; é uma construção referente ao art. 37, §5º, é um entendimento consolidado, e o projeto aprovado na Câmara desrespeita isto. Segundo o que o senhor me informa, o relatório consolida isso. Ainda bem, não é?
Sobre a questão do Senador Styvenson, eu acho muito importante ficar claro isso. Acho saudável que decisões absolutórias criminais que adentram o mérito e consagram a inocência do acusado - examinei o mérito, ele foi inocentado -, isso seja aproveitado no campo da improbidade, desde que o mérito seja enfrentado.
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO LIVIANU - Quando a absolvição foi por insuficiência de provas, não tem sentido aproveitar, isso é improbidade. E, se as provas apareceram um mês depois, como é que eu vou aproveitar isso no campo da improbidade? Isso é você consagrar a insegurança jurídica. Com todo respeito, Senador Weverton, não é possível.
E, só para fechar a minha intervenção, o senhor comparou com a questão da Lei de Abuso de Autoridade, me permita, a Lei de Abuso de Autoridade, Senador Wellington, é uma lei de caráter criminal. Tipos abertos são inadmissíveis em leis penais. Esta não é penal; esta é administrativa. A estrutura legislativa é totalmente diferente. Não se pode ter tipos abertos em leis penais. O Direito Administrativo trabalha com tipos exemplificativos. No Direito Penal, não é possível enumeração exemplificativa. A tipificação é exaustiva no Direito Penal. No Direito Administrativo, a enumeração é exemplificativa. São leis totalmente diferentes. Por essa razão é que, lá na Lei de Abuso de Autoridade, é necessário fechar os tipos. Na lei de improbidade, os tipos são exemplificativos. Com todo respeito ao senhor, são situações diferentes.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - MA) - Eu agradeço, Dr. Roberto Livianu.
Nada mais havendo a tratar, eu encerro a presente reunião.
(Iniciada às 9 horas e 16 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 24 minutos.)