16/11/2021 - 5ª - Subcomissão Temporária para Acompanhamento da Educação na Pandemia

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR. Fala da Presidência.) - Bom dia!
Havendo número regimental, declaro aberta a 5ª Reunião da Subcomissão Temporária para Acompanhamento da Educação na Pandemia, criada pelo Requerimento nº 1, de 2021, da Comissão de Educação, Cultura e Esporte.
Realizaremos hoje a quarta audiência pública desta Subcomissão, com a finalidade de: um, avaliar os impactos da pandemia na educação básica; dois, discutir o planejamento e as ações quanto ao retorno das aulas presenciais na educação básica; e, três, muito importante também, debater uma agenda estratégica educacional para os próximos anos, com vistas a recuperar as perdas acontecidas durante a pandemia e avançar na garantia do direito à educação em nosso País.
Como de hábito, a audiência será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania na internet, em senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da auditoria, 0800-612211.
Eu quero lembrar a todos e todas que nos acompanham que, na primeira audiência pública, tivemos a presença de dois movimentos importantes no Brasil que fizeram uma radiografia dos três aspectos mencionados: movimento Todos pela Educação e Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Na segunda audiência, tivemos a presença da CNBE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação) e também da Uncme, que é a União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação.
Na semana passada, a presença da UNE (União Nacional dos Estudantes) e da Ubes (União Brasileira de Estudantes Secundaristas), muito importante, porque com três temas do ponto de vista dos estudantes, dos alunos e estudantes.
E hoje temos, então, a quarta audiência pública. Nós temos, com muita honra... E quero acolher e saudar os expositores, dar as boas-vindas, agradecer pela presença e nos colocarmos sempre à disposição também, seja nesta Comissão de Educação, Cultura e Esporte ou em qualquer outra Comissão. Mas temos os expositores: a Sra. Clarice Santos, Coordenadora do Fórum Nacional de Educação do Campo (Fonec), extremamente importante; o Frei David Santos, que já esteve, por inúmeras vezes, também no Senado, a quem a gente agradece de novo pela presença, que é Diretor-Executivo da Educafro; e o Sr. Gersem José dos Santos Luciano Baniwa, Coordenador do Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena. Então, também extremamente importante - todos os três. E são populações - quero antecipar, antes do início desta reunião - que merecem de todos nós, comunidades, um olhar muito especial, concentrado, uma história de marginalização, de segregação também, para cujas comunidades temos que trabalhar em harmonia, todos nós, juntos, para que o direito à educação de qualidade aconteça.
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Nós vamos conceder o prazo de 20 minutos para cada convidado fazer a exposição. Em seguida, a gente passa a palavra também aos Srs. Senadores e às Sras. Senadoras que, porventura, desejarem fazer a sua intervenção.
E quero também dizer que todos são convidados a fazerem perguntas, comentários, através dos meios que a gente já colocou à disposição.
Eu, inclusive, tenho algumas perguntas aqui já, das pessoas que acompanham.
Andreia Ferraz, de São Paulo: "Quais ações estão sendo planejadas para promoção da saúde mental dos alunos e professores nesta retomada pós-pandemia?". É uma pergunta, um comentário que vem se repetindo nas audiências públicas, que é muito importante.
Beatriz Santana, de Sergipe: "Como estabelecer limites entre o uso recreativo da tecnologia e seu auxílio como ferramenta pedagógica?". Também é um tema recorrente nos debates, não sob este enfoque, mas em várias outras possibilidades.
Vinícius Rolim de Oliveira, de São Paulo: "Como fica o jovem que era para ter se formado aos 18 anos e quer prestar o serviço militar?". Essa é uma primeira pergunta que surge nessa área.
Elinadja Targino, de Alagoas: "Quais planejamentos e ações para atenuar os impactos da pandemia na educação básica?".
Patricia Boquady, do Distrito Federal: "Com a pandemia, ficou evidente na educação [...] a desigualdade social e de acesso a tecnologias". Um comentário; não é uma pergunta.
E também um outro comentário, de Valéria Sá Guerra, do Rio de Janeiro: "[...] não há segurança para que tenham aulas presenciais, realmente há seletividade classista em relação a este assunto".
Então, são vários comentários e perguntas.
Eu quero ainda esclarecer, para que todos e todas saibam: nós estamos na Comissão de Educação, Cultura e Esporte, que é presidida pelo Senador Marcelo Castro e vice-presidida pela Senadora Leila.
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Dentro da Comissão, foi criada a Subcomissão Educação na Pandemia. Eu tenho o prazer de presidir essa Subcomissão, a Senadora Zenaide Maia, do Rio Grande do Norte é a Vice-Presidente, e são mais três Senadores - são cinco Senadores -: o Senador Confúcio Moura, que é uma pessoa que batalha também muito na área da educação, mas está de licença e vem sendo substituído pela sua suplente, a Senadora Maria Eliza; também o Senador Anastasia; e o Senador Wellington Fagundes, que, inclusive, é Relator da educação na Comissão Mista de Orçamento. Então é uma Subcomissão que vai funcionar até o final deste ano, porém nós cremos que possa ser aprovado o requerimento para continuidade da Subcomissão para, pelo menos, o primeiro semestre do ano que vem. Nós já vamos apresentando os relatórios e as sugestões à medida que os debates vão acontecendo. Isso pode auxiliar o Senado, o Congresso, o Executivo e a sociedade sobre os caminhos a serem tomados.
O Senador Wellington Fagundes, inclusive, já está com a gente também, e, como ele participa da CPMI, como eu falei, da Comissão Mista para... Aliás, é da Comissão Mista de Orçamento, não é da CPMI - fala-se tanto de CPIs, de CPMIs, mas não é de CPMI, é da Comissão Mista de Orçamento. Ele é Relator da Comissão de Educação, e eu sei que as reuniões se desenvolvem bastante... E é membro da Subcomissão. Então, eu passo em primeiro lugar, com os expositores me permitindo, para o Senador Wellington Fagundes.
O SR. WELLINGTON FAGUNDES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - MT. Para discursar.) - Bom dia, Senador Flávio Arns.
Bom dia à Clarice Santos, ao Frei David Santos - hoje é o dia dos Santos, não é? (Risos.)
Então, quero trazer aqui a minha felicidade de poder falar um pouco.
Eu gostaria, Sr. Presidente, de ler já as perguntas que eu tenho aqui, porque com isso a gente já adianta e talvez eles já possam também fazer suas falas em cima dessas perguntas.
Eu quero, antes ainda, Sr. Presidente, anunciar que, também como Relator da Comissão da Covid, nós já temos definido agora, no dia 22, uma visita ao instituto Fiocruz, no Rio de Janeiro - estivemos na semana passada com o Senador Styvenson Valentim lá no Butantan -, e tudo isso nos traz muitas boas perspectivas de que o Brasil, então, já está hoje praticamente pronto, com vacinas 100% brasileiras, com tecnologia 100% brasileira. Inclusive, até o final do mês agora, nós estaremos em Salvador para aplicar as primeiras doses experimentais, já com a autorização da Anvisa, e isso não deixa de ser uma grande perspectiva, principalmente porque um país com mais de 220 milhões de habitantes, tendo vacina suficiente para vacinar todos e agora, inclusive, já com a dose de reforço, isso vai garantir muito mais ainda um retorno às aulas, com segurança, às nossas crianças.
Quero cumprimentar o Senador Izalci Lucas também, que já está conosco.
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Eu vou ler aqui, Sr. Presidente, as questões, bem objetivamente.
A paralisação de atividades letivas presenciais decorrentes da pandemia da covid-19 em 2020 e 2021 evidenciou a extrema desigualdade social existente no nosso País - claro, inclusive nos longínquos rincões do País.
Nesse contexto, a crise sanitária teve, a nosso ver, o aspecto positivo de trazer à luz a situação de desvantagem educacional que é causada pela pobreza material e que atinge uma parcela expressiva da nossa população em idade escolar.
Não é demais concluir ainda, Sr. Presidente, que a maior parte dessa juventude é constituída principalmente por crianças e adolescentes afrodescendentes, que perfazem a maioria dos brasileiros vivendo na linha de pobreza.
Diante desse quadro, perguntamos: como a pandemia da covid-19 afetou os direitos educacionais em termos de aprendizagem e de perspectivas de sucesso acadêmico dos estudantes e integrantes dos segmentos étnicos e sociais e também das populações representadas pelas entidades presentes a esta audiência? Particularmente, que programas, ações ou projetos de interesse desses grupos que eventualmente tenham sido interrompidos precisam ser restabelecidos, e com qual urgência? Ainda, para que mudanças ou possibilidades de novas formas de acesso ao conhecimento essas comunidades despertaram na direção da realização dos seus direitos à educação?
E a última, Sr. Presidente Flávio Arns: que lições a pandemia deixou acerca da importância da instituição de um sistema educacional ou escolar efetivamente indígena? Como deve funcionar um sistema com essas orientações? Eu falo principalmente porque, no meu Estado, o Estado de Mato Grosso, temos muitas etnias indígenas, uma população bastante grande, e também os ribeirinhos, os quilombolas, que às vezes ficam em comunidades isoladas. Por isso eu gostaria de ouvir dos especialistas esses comentários.
Encerrando, Sr. Presidente, agradeço muito, mais uma vez parabenizando o Senador Flávio Arns pela sua competência, um homem muito dedicado principalmente à questão da educação, mas também às causas sociais. Então, eu quero aqui registrar, Senador Flávio, que o senhor tem aqui um fã incondicional, principalmente pelo seu caráter e pelo seu trabalho.
Muito obrigado!
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Eu agradeço ao Senador Wellington Fagundes.
Eu quero destacar que é importante a gente ter o Senador justamente na Subcomissão como membro titular e, ao mesmo tempo, ele ser o Relator na área de educação na Comissão Mista de Orçamento. Então, isso é fundamental.
O Senador Izalci Lucas, certamente, na sequência vai querer falar também. Ele é o Vice-Presidente. Não sei se quer se manifestar agora, Senador Izalci Lucas.
O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Não, Presidente, vou ouvir mais.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Está bom, então. Na sequência? (Pausa.)
Isso, na sequência. Está bem.
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Então, em primeiro lugar, obrigado, Senador Wellington, pelas perguntas. Aliás, em todas as audiências, V. Exa. está colocando perguntas extremamente importantes e necessárias para os encaminhamentos.
Eu passo, em primeiro lugar, para a Sra. Clarice Santos a palavra. Ela é coordenadora do Fórum Nacional de Educação do Campo (Fonec).
Com a palavra então.
A SRA. CLARICE SANTOS (Para expor.) - Bom dia, Senador Flávio Arns! Bom dia, Senador Wellington Fagundes e Senador Izalci, aqui presentes, Senadores, Senadoras, participantes.
Quero cumprimentar e agradecer a esta Subcomissão do Senado em nome do Fonec o convite. Espero realmente contribuir com esta Comissão desde as nossas análises, desde as nossas ações desenvolvidas desde o início da pandemia.
Senador Wellington Fagundes, anotei aqui as suas questões e espero tratá-las ao longo da minha exposição. O que não for, depois a gente pode responder especificamente, porque acho que são questões, além daquelas que foram lidas pelo Senador Flávio, muito bem-vindas. Acho que são as questões fundamentais que estão colocadas para todos nós que atuamos nessa frente da educação no Brasil neste momento.
Quero cumprimentar também os meus companheiros de Mesa. Frei David, é um prazer conhecê-lo pessoalmente. Já o conheço lá do canal Conhecimento Liberta. Assisto bastante ao senhor lá com o Eduardo Moreira. Gosto dos programas sobre espiritualidade. Ajudaram muito no período da pandemia aquelas lives que vocês fizeram. Foi muito importante não só para mim, mas para muita gente. Agradeço.
E cumprimento o Gersem, que, embora não tenha chegado ainda, a gente espera que chegue, porque será muito importante a participação e a intervenção aqui também do Gersem, pelas questões da educação indígena.
Tenho 20 minutos, que espero cumprir - são 10h18; até as 10h38.
O Fonec (Fórum Nacional de Educação do Campo) é um coletivo de articulação, de mobilização e de elaboração da educação do campo, que congrega um conjunto de movimento sociais e sindicais do campo, organizações populares, universidades, institutos federais, professores da educação básica e da educação superior no Brasil em torno do tema da educação da população que vive no campo - e dizemos no campo, nas águas e nas florestas no Brasil.
Como já antecipou o Senador Wellington Fagundes, nós também consideramos importante falar de alguns pressupostos gerais sobre a crise da pandemia que vivemos na educação, associado àquilo que nós consideramos a uma já presente crise da educação no Brasil como um projeto.
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Nós entendemos que, mesmo atingindo toda a sociedade brasileira e mundial, a pandemia, sim, revelou um quadro dramático em escala global, mas os seus efeitos não afetam todas as pessoas, todas as populações da mesma forma. As populações mais vulneráveis são obviamente mais gravemente atingidas, e as consequências ainda são impossíveis de serem mensuradas.
Entre esses coletivos, incluem-se os que vivem em situação de pobreza extrema, os que vivem na informalidade ou com contratos temporários e precarizados de trabalho, os idosos, a população em situação de rua ou em privação de liberdade, os refugiados, os povos indígenas, os quilombolas, os extrativistas, os ribeirinhos, os assentados e acampados da reforma agrária, a população que vive da agricultura familiar, dentre outros que historicamente ficaram à margem da prioridade do Estado no atendimento ao direito. Então, nesse cenário, a educação do campo, a educação indígena, a educação escolar e quilombola e a educação das populações afrodescendentes são, na nossa concepção, a parcela mais precarizada da classe trabalhadora em relação às condições de acesso, de permanência, mas também em relação a um projeto pedagógico escolar no Brasil.
Agora, é preciso declarar que antes da pandemia nós já vivíamos uma grave crise da educação, com efeitos que a nosso ver serão medidos no médio e longo prazo sobre o direito à educação para os trabalhadores e para os pobres no Brasil.
A marca principal desse período que nós vivemos é essa radicalização das desigualdades. Numa realidade social tão desigual como é a brasileira, o acesso à educação tem sido um dos poucos caminhos para os setores mais precarizados da classe trabalhadora alcançarem condições de vida mais decentes. Então, numa realidade social como essa, no contexto geral da educação, que na nossa análise é marcado por uma desestruturação atual do sistema educacional brasileiro, o Estado brasileiro cumpriu nesse período, sobretudo, um papel negativo, de desmonte do sistema educacional, o que na nossa análise potencializa a criação de espaços para o setor privado, um aprofundamento da mercantilização da educação e aquilo que os analistas também chamam de um parasitismo corporativo sobre a educação, porque, ao contrário do que propaga esse ideário neoliberal, que vê o Estado como problema, as grandes corporações educacionais nesse período se beneficiaram enormemente da estrutura do Estado, das suas políticas e dos seus recursos. Então, esse contexto da pandemia também favoreceu o incremento dessa mercantilização da educação, o incremento de novas modalidades de parcerias público-privadas em todas as esferas do ensino. E onde mais cresceu esse setor foi exatamente na prestação de serviços de tecnologia digital, aluguel de plataformas, métodos para as modalidades de ensino remoto. Então, cada vez mais, na nossa análise, o interesse dessas grandes corporações passa por essa captura das tecnologias de informação e comunicação, que conectam hoje as escolas públicas. E os efeitos disso ainda deverão ser analisados mais profundamente. Um levantamento recente mostra que aquilo que se chama de Gafam - acrônimo de Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft - controla a maior parte desses serviços no Brasil. Então, a nossa avaliação é de que a pandemia funcionou também, nesse caso, como um catalizador que contribuiu para agravar um conjunto de desigualdades preexistentes.
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Nós analisamos também que esse período agravou um outro aspecto da educação brasileira nesse movimento geral de desterritorialização, de individualização e de submissão daquilo que os especialistas estão também chamando de pedagogia do algoritmo. Esses três movimentos são complementares e vão no sentido de esvaziar do conteúdo comunitário, que tem o processo educacional, o processo de ensino-aprendizagem, que, para a educação do campo, é muito caro. E esse movimento reforça essas tendências individualistas do ensino que se faz pelo ensino remoto, pela educação a distância.
O Fonec tem avaliado que, ao longo desses dois anos de pandemia, o território escolar ficou sob suspensão. Enfraqueceram-se essas relações dos educadores entre si, dos estudantes entre si, as relações entre educadores e educandos. Ou seja, essa comunidade acadêmica, essa comunidade do conhecimento se enfraqueceu enquanto comunidade, e o mesmo vale para a função social que as escolas, no nosso ponto de vista, desempenham nos territórios onde elas estão inseridas, como a sociabilidade - a escola não é só ensino, na sociedade, tem uma função social nos territórios, tem a função da sociabilidade -, a alimentação saudável e regular, a prática de atividades desportivas, o combate a informações falsas, a prevenção de doenças, a prevenção de violências, de tal forma que, no regime remoto, essa atividade educacional se resumiu a uma tentativa de ensino de diversos conteúdos, e ainda assim de maneira muito precária.
Ao mesmo tempo, houve uma tendência de substituição desse papel integrativo do território pelas tecnologias digitais. Nós temos no Brasil, segundo o Censo Escolar de 2019, mais de 55 mil estabelecimentos de ensino da educação básica no meio rural - isso representa mais de 23% do total de escolas no Brasil em 2019 -, com cerca de 5,5 milhões de estudantes. Nesse cenário todo de calamidade pública que nós vivemos na pandemia, o Fórum Nacional de Educação do Campo, que é integrado por fóruns e comitês estaduais, regionais e municipais de educação do campo - nós temos fóruns e comitês estaduais em 25 Estados brasileiros -, movimentos e organizações sociais dos povos tradicionais e camponeses, que participam, universidades e as redes de ensino, organizações governamentais e não governamentais, nós do Fonec, já em junho de 2020, publicamos um documento referência do nosso posicionamento ante a pandemia, especialmente em relação a uma resolução publicada pelo Conselho Nacional de Educação. Naquele documento, a gente afirmava se manter em permanente vigilância e assumindo uma posição firme em defesa da vida em condições dignas essenciais à manutenção da existência humana. Para nós, a prioridade sempre foram as vidas humanas, e o processo escolar deveria considerar isso em primeiro lugar, a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da nossa República e pedra angular do nosso Estado democrático de direito.
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Os povos do campo, das águas e das florestas, que estão inseridos em tudo aquilo que nós chamamos de educação do campo, que estão nas nossas diretrizes operacionais para educação básica, educação do campo, que estão no decreto que institui a política nacional de educação do campo, nós consideramos que, ainda que invisibilizados, tanto nas medidas econômicas quanto nas medidas sanitárias e educacionais adotadas durante o enfrentamento da pandemia, cumpriram nesse período um papel histórico na defesa da natureza e dos direitos humanos.
Estes povos que vivem no campo, com seus saberes, com suas formas de trabalho e de produção, com suas práticas culturais ancestrais de organizações sociais, ensinaram o valor dos processos ecológicos que sustentam a continuidade da vida e reafirmam a importância da terra, da água, da floresta e da biodiversidade como bens comuns em prol da saúde, da educação e da produção de alimentos saudáveis.
Essas populações do campo garantiram a segurança alimentar de suas próprias comunidades e das crianças nesse período em que não tiveram a devida consideração nas políticas desenvolvidas pelo Estado, pelo Governo brasileiro. Um exemplo disso foi um projeto aprovado na Câmara dos Deputados e vetado pelo Presidente da República que garantia uma política especial de atendimento a essas populações que produzem comida, que produzem alimentação para as suas próprias comunidades.
E, no campo da educação, o que nós temos acompanhado é que esses grupos que hoje são hegemônicos no campo educacional, que são grupos privados, que são hegemônicos nos sistemas de ensino estaduais e municipais e também sobre o Ministério da Educação, têm atuado e determinado que, durante a pandemia, as redes públicas e privadas de ensino devessem cumprir prioritariamente os objetivos que estão lá definidos na Base Nacional Comum Curricular, que adotassem o ensino remoto com o uso de tecnologias diversificadas, com ou sem mediação tecnológica.
O que as diversas análises têm demonstrado é que essas medidas têm servido somente, nada mais do que somente, para o cumprimento formal das 800 horas exigidas pela legislação, através do compartilhamento de conteúdos isolados das relações sociais que nós comentamos anteriormente, que está demarcado por essa desterritorialização, por essa individualização, não é? Pouco contribuem, na nossa concepção, para a formação humana dos estudantes e uma formação digna, que todos os estudantes, em qualquer lugar onde vivam, merecem e têm como um direito assegurado.
E essas medidas acabaram criando uma cortina de fumaça, no nosso entendimento, sobre os reais problemas das redes de ensino das escolas e das famílias. Em nosso entendimento, essa orientação não dá conta de um processo educativo de qualidade. E por que não dá conta? Primeiro, porque ela desconsidera o fato de que esse modelo proposto promove a exclusão social e educacional dos estudantes em face das desigualdades com relação ao acesso às tecnologias para realização das atividades, muitas vezes responsabilizando os próprios estudantes, que são excluídos dos direitos e das políticas pela sua condição de exclusão.
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Os dados demonstraram que nos territórios urbanos 74% da população têm conexão à internet, enquanto nos territórios rurais esse número alcança apenas 49%. Então, em todo o País, 43% das escolas rurais ainda não têm acesso à internet. Segundo a Agência Brasil, tomando como base dados da pesquisa TIC Kids Online 2019, 4,8 milhões de crianças e adolescentes em todo o Brasil não têm acesso à internet e há um amplo contingente com acesso muito precário ou falta de equipamento necessário, a exemplo de um computador ou até de um celular. Nós vimos casos e situações em que uma casa com cinco crianças tinha apenas um equipamento, um celular, e elas tinham que se revezar durante o dia para atender as atividades enviadas e cobradas pelas escolas.
Segundo, pela restrição do direito à educação à simples aprendizagem de conteúdos essenciais. Nós compreendemos que o direito à educação envolve muito mais do que conteúdos essenciais, porque nós temos uma concepção de formação humana que envolve todas as dimensões, que a educação tem que compreender todas as dimensões humanas, todos os sentidos humanos, uma concepção de educação omnilateral, e não apenas conteúdos essenciais que estão determinados pela Base Nacional Comum Curricular.
E, terceiro - e eu queria dar um destaque muito grande aqui -, há uma intensificação da precarização do trabalho docente nesse período. Os professores estão sobrecarregados de exigências que desconsideram uma realidade objetiva imposta pela pandemia para todas as pessoas. E a situação no campo se agrava muito mais ainda pelo fato de que os professores não possuem os equipamentos tecnológicos necessários ou mesmo até um conhecimento mais profundo do uso dessas tecnologias para dar aulas. Na maioria dos casos, os professores fazem uso dos seus próprios equipamentos, uma vez que não têm subsídio dos governos para essa garantia.
Eu acho muito importante o que o Deputado Wellington Fagundes colocou sobre ações e programas. Nós entendemos que um programa que deveria ser desenvolvido e entrar no orçamento federal é que todos os professores e professoras deste País recebessem dos governos federal, estadual e municipais o equipamento tecnológico necessário, um notebook, e acesso à internet para poderem atender, porque essas tecnologias são também um direito dos povos do campo, elas não são apenas uma necessidade por conta desse período; elas são tecnologias e, como tecnologias, atuam contribuindo para o acesso que todos os estudantes devem ter a todos os bens produzidos pela humanidade. E essas tecnologias são um desses bens. Na maioria dos casos, os professores fazem uso dos seus equipamentos, da sua própria internet. Além disso, os professores tiveram uma carga horária triplicada, uma carga horária excessiva de trabalho, que contribuiu muito para o adoecimento docente, para o adoecimento físico e mental, que decorre tanto desse excessivo tempo em tela, como da necessidade de, além de atender os estudantes por este meio aqui, preparar atividades para entregar nas casas dos estudantes que não tinham acesso às tecnologias, imprimindo-as nas suas próprias casas ou nas escolas, fazendo essas entregas com seus próprios carros ou motos ou de carona ou da forma que fosse possível, com gastos do seu próprio salário. Nós conhecemos casos aqui, em escolas do Distrito Federal, em uma escola do campo do Distrito Federal, em que as professoras fizeram vaquinha para pagar motoboy para entregar atividades nas casas das crianças.
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Então, aqui, vale um destaque para os professores, que, junto com os profissionais de saúde, foram os grandes heróis e heroínas nesta pandemia.
Então, em relação... Como meu tempo está indo para o final, eu gostaria de apresentar um pouco aquilo que nós entendemos que seriam as pautas para esse pós-pandemia, porque, além das questões dos professores, do trabalho excessivo, do trabalho precário... A grande maioria dos professores das escolas do campo é de professores com contratos temporários. O trabalho é precário. Eu gostaria muito de chamar a atenção para ações que deverão ser desenvolvidas de apoio a esses docentes. Mas também nós tivemos grande dificuldade por parte dos próprios estudantes e das suas famílias em acompanhar os estudantes nesse período. Ressalto as dificuldades que os pais enfrentaram, com o acúmulo de trabalho, para garantir a sobrevivência da família; as dificuldades que as famílias tiveram para acompanhar as tarefas escolares via remota; as idas e vindas na busca por material na escola, ampliando o risco de contágio.
Em relação aos estudantes, os relatos dos estudantes apontam para uma sobrecarga de tarefas encaminhadas, para terem que cumprir as horas, uma situação que se complica para os estudantes, especialmente os do ensino médio, que já são trabalhadores e que estão envolvidos na produção de alimentos, trabalhando na roça, que é uma atividade absolutamente essencial à existência de todos no período da pandemia.
Então, em síntese, em relação às nossas pautas, como manifesto do Fonec, nesta mesma nota, nós nos manifestamos... Embora a oferta de atividades remotas possa ser considerada importante para manter os estudantes ativos nos casos onde isso é possível, nós defendemos, à época, que essas atividades não deveriam ser contadas como dias letivos nem deveriam ser objeto de avaliação das escolas, porque entendemos que isso fere frontalmente o princípio da igualdade de condições de acesso e permanência na escola, que está garantido na LDB.
Nós entendemos que a LDB dá o suporte legal necessário para que o Conselho Nacional de Educação normatize a reorganização do calendário escolar e o cumprimento das horas e dias letivos flexíveis de acordo com as realidades, no caso de pandemias e no caso de calamidades. Acho que essa é uma tarefa a ser feita pelos legisladores para o pós-pandemia.
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Nós precisamos pensar porque, assim como tem indicado os especialistas e científicos, esta não será a última pandemia. Pelas condições gerais do Planeta, nós ainda sofreremos outras tantas pandemias e calamidades. O sistema escolar tem que estar preparado e normatizado para esses casos. Há amparo na LDB para isso, como a reorganização do calendário escolar e tantas outras.
Segundo, nesse conjunto de pautas, nós entendemos também que é fundamental que esta Comissão especial aponte ao Estado brasileiro, através do Ministério da Educação, e que seja assegurada, evidentemente com a contrapartida dos Governos estaduais e municipais, uma política de financiamento aos sistemas de ensino para a garantia de acesso dos estudantes e professores às tecnologias da informação e comunicação. Computador e internet de qualidade em todas as escolas do Brasil - em todas as escolas - como uma condição primeira. Acho que essa é uma pauta possível e necessária.
Colado a essa necessidade, nós entendemos que é preciso que a política de financiamento amplie o seu alcance para dar garantia de que os sistemas de ensino preparem as escolas para esse ensino presencial pós-vacina, porque os dados que nós temos de infraestruturas sanitárias nas escolas, especialmente nas escolas do campo, das águas e das florestas, são extremamente precárias e não há segurança. Mas nós queremos também apresentar à sociedade que o modelo de escolas do campo e das áreas indígenas já existentes em nossos territórios, assim como o seu projeto de escola nem sempre é respeitado, é, do nosso ponto de vista, um adequado modelo para a organização escolar pós-pandemia: escolas pequenas e médias, localizadas nas próprias comunidades, grande parte dos educadores são das próprias comunidades, com projetos pedagógicos e planejamentos discutidos com a comunidade. Dessa forma, nós entendemos que, por exemplo, evita-se aglomerações de grandes massas de estudantes em grandes escolas, evita-se aglomeração no transporte escolar, no qual estudantes, especialmente do campo, passam horas, um ambiente fechado perfeito para circulação e contágio por patógenos.
Por fim, nós chamamos a atenção para que os gestores dos sistemas educacionais procurem dedicar especial atenção aos dados concretos da realidade das suas redes de ensino, dos professores e dos alunos, trazendo-os para serem problematizados com as instâncias governamentais: Município, Estado, União, conselhos, Ministério Público e Congresso Nacional. Nós entendemos que, uma vez que os problemas enfrentados nesse período sejam expostos, eles apontam para essas instâncias de que há necessidade de um conjunto de políticas estruturantes que estão para além das políticas de educação, mas que têm efeito sobre as escolas. A ausência dessas políticas nos Municípios é responsabilidade do Estado e, com a sua garantia, não podem ser negligenciadas por esse imediatismo de resultados ilusórios produzidos apenas para criar um marketing, às vezes, de uma boa gestão, quando, na verdade, se amplia o processo de marginalização dos sujeitos e das sujeitas.
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É uma responsabilidade que os gestores públicos têm sobre si e, em nossa concepção, devem exercê-la sob o compromisso ético dos princípios e dos fins das funções que eles ocupam em defesa dos interesses da população. Devem chamar as comunidades para o planejamento, chamar esses sujeitos e sujeitas - a população do campo - para o planejamento dessas atividades nesse período pós-pandemia.
Por fim, Sras. e Srs. Senadores, nós temos ainda dois pedidos especiais a fazer. Nós pensamos que a sociedade brasileira, durante a pandemia, avançou em consciência em relação à importância do Estado contra essas bobagens neoliberais que não têm correspondência nenhuma com a realidade. Se nós não tivéssemos o SUS, se nós não tivéssemos servidores públicos do SUS, o número de mortos teria sido muito maior. Se não houvesse professores e servidores públicos, não teria havido aula nas periferias, nas comunidades do campo, das águas e das florestas. Então, nós achamos que o Congresso Nacional poderia fazer uma sessão solene em homenagem aos educadores, todos os educadores e educadoras das escolas no País; uma menção honrosa a todos esses educadores e educadoras que nas piores ou nas melhores condições - especialmente nas piores - levaram adiante a educação nos ombros, por sua própria vontade, porque acreditam na educação.
Em nome disso, nós pedimos também que os Senadores e as Senadoras votem contra a PEC 23, que, na nossa concepção, é uma PEC do calote dos precatórios, porque grande parte dos credores desses precatórios são professores e professoras deste nosso País, e que votem contra a PEC da reforma administrativa, porque ela é também a destruição desses serviços públicos que asseguraram, nesse período crítico da pandemia, que as nossas crianças, adolescentes e jovens tivessem educação na forma possível. E eles é que vão garantir que nesse período pós-pandemia se recupere, na medida do possível, dentro das escolas, de todas as nossas escolas, aquilo que nós perdemos durante o período da pandemia, assegurando, assim, um mínimo de garantia de futuro a essas populações.
Fico por aqui e agradeço. Desculpe ter extrapolado um pouco tempo. Estou à disposição para seguirmos nesse diálogo.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Eu é que agradeço, Clarissa Santos, a palavra, sem dúvida, de uma grande educadora e de uma grande liderança. Parabéns! Todas as colocações são extremamente importantes, pertinentes. Inclusive tudo isso está sendo acompanhado pela Consultoria do Senado, pela assessoria. Temos que, inclusive, nos aprofundar em alguns dos itens, com seu apoio, com a sua participação e do movimento.
A SRA. CLARICE SANTOS - À disposição, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Passo, em seguida, a palavra ao Frei David Santos, novamente dizendo da alegria de tê-lo no Senado. Já tantas vezes participamos de eventos juntos no decorrer dos anos. E é uma alegria tê-lo novamente no Congresso Nacional.
Frei David Santos, que é Diretor-Executivo da Educafro.
Com a palavra, Frei David.
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O SR. DAVID RAIMUNDO DOS SANTOS (Para expor.) - Obrigado, Senador Arns.
Se o senhor me permite, o nosso sonho é ter muitas mulheres Senadoras brancas e negras e ter muitos negros homens Senadores. De modo que, em frente à esta frase inicial, eu quero saudar a todos vocês Senadores, na pessoa da Senadora Zenaide Maia, com que a gente está aí participando ativamente. Então, eu saúdo a todos, mas quero destacar o meu irmão Senador Izalci Lucas, o Senador Anastasia, o Senador Wellington Fagundes e, lógico, o Presidente deste trabalho, o Senador Flávio Arns.
E quero dizer que o que trouxemos aqui para o debate nós temos certeza de que vocês Senadores, independentemente de qualquer grupo - de direita, de centro ou de esquerda -, vão abraçar, juntos, essa demanda que estamos trazendo quanto a negros e negras, que já vivem uma exclusão histórica desde a escravidão, exclusão essa que se ampliou muito com a pandemia. Então, nós queremos esse carinho especial de vocês para o que vamos falar aqui agora.
Primeiro, gostaria de dizer para vocês que, na pandemia, pesquisa feita por alguns órgãos que depois vou citar revelou que a criança da 5ª série branca teve um desempenho bom em Português; bom, não, teve um desempenho em Português razoável, 70% delas tiveram desempenho razoável, enquanto, em relação às crianças negras, só 51% tiveram desempenho razoável. Motivo: falta de equipamento para estudar online. Isso é gravíssimo!
No ensino médio, quanto às matrículas dos nossos irmãos brancos e negros: os brancos, 75,4% matriculados no ensino médio; e os negros, só 64,3%, ou seja, o Brasil continua a não criar estratégia para garantir ingresso e permanência do negro no ensino médio. Desses daí, só 55% dos jovens negros conseguiram concluir ensino médio no Brasil. E isso é uma bomba para o futuro da Nação enquanto País forte.
Então, nós queremos que vocês, enquanto equipe pensante, eleita para pensar um Brasil melhor, apresentem propostas concretas para enfrentar esse problema que é o abandono escolar do jovem negro. E, de imediato, a proposta nossa é que para todo jovem negro que esteja, há mais de um ano afastado do ensino médio, vocês, Senadores, aprovem uma lei garantindo um salário mínimo para todos aqueles que retornarem e passarem de ano, ou seja, quem retornou começa a ter meio salário mínimo de apoio e, se passar de ano, então, passa a ganhar os outros meio salários mínimos de uma só vez, no final do ano, por ter passado. A gente entende que, sobre esses jovens que abandonaram, não é por malandragem, não; é porque foram para a rua trabalhar nos sinais de trânsito ou outras realidades, ou seja, a comunidade negra está cada vez mais caindo em frente aos direitos nobres e direitos constitucionais.
Essa pesquisa de que eu estou falando vem do Banco Mundial e do Instituto Geledés.
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Em 2020, a pandemia prejudicou três vezes mais as crianças negras, indígenas e do campo do que as crianças brancas. Volto a dizer: em 2020, segundo o Banco Mundial, as crianças negras, indígenas e do campo foram três vezes mais prejudicadas do que as crianças brancas.
A Unicef também fez pesquisa sobre pandemia e o negro e revela que a situação do negro está uma verdadeira calamidade, e um país tão rico, tão poderoso como o Brasil não pode deixar isso sem ter uma alternativa verdadeiramente madura, séria e responsável. E aí falo para meus irmãos todos, Senadores, que qualquer alternativa não é séria se não tiver verba garantida para fazer a coisa acontecer; sem verba, a coisa não vai.
E aqui já abro para uma denúncia que acabou de chegar para mim, que é uma pesquisa de uma assessoria da Educafro, mostrando que o Governo Bolsonaro cortou todas as verbas para a saúde da população negra. Existia um grande programa, aprovado na Câmara e no Senado, sobre a saúde população negra, e o Governo Bolsonaro cortou essa verba. Já solicito aos Senadores aqui presentes que, em conjunto, assinem um requerimento de audiência pública para avaliar unicamente a saúde da população negra, indígena e do campo. Então, uma audiência pública assinada por todos os irmãos Senadores que estão aqui, para avaliar a saúde da população negra, indígena e do campo agora, no Governo Bolsonaro.
Inclusive, o Fantástico de domingo, agora, mostrou a realidade da saúde indígena, o que me deixou totalmente estarrecido, que não consegui dormir frente ao drama que é a saúde indígena, sem contar a saúde do negro e da população do campo.
O problema de fundo, Senadores, é a falta de equipamento. E aqui eu tenho uma denúncia a fazer, e pediria também... Olha só, desculpa, mas eu vou pedir a vocês a solução, e uma das soluções que vocês têm, como ferramenta, são audiências públicas para oficializar as denúncias e encaminhar soluções. Aí eu denuncio aqui que o Governo Bolsonaro só aplicou 15% da verba destinada a dar equipamento de internet para as crianças de ensino fundamental e médio. De todo o dinheiro previsto, Bolsonaro só aplicou 15% via MEC. Então, também solicito uma audiência pública para discutir para onde foi esse dinheiro, esse dinheiro que era para investir, para dar equipamentos às crianças e adolescentes com referência ao acesso à internet e aos equipamentos de computação.
Bem, também, Senador e Senadora, peço... Veja só: eu estou apavorado. Peço outra audiência pública para avaliar a exclusão do Enem de 3,1 milhões de jovens negros, jovens do campo, jovens quilombolas e jovens pobres em geral, brancos. Então, 3,1 milhões foram eliminados do Enem. Foi uma jogada do MEC que falou: "Todo jovem que não prestou o Enem durante a pandemia está proibido de prestar o novo Enem". E aí a Educafro e mais 11 partidos e entidades sociais entraram no Supremo contra essa decisão do MEC. O Supremo obrigou o MEC a reabrir as inscrições do Enem e fazer uma grande divulgação. E o MEC maldosamente apenas reabriu a inscrição, mas não fez divulgação.
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Então, Senador Arns e Senadora Zenaide, dos 3,1 milhões de jovens que foram proibidos de prestar o Enem agora, com a nossa briga no Supremo, que reabriu e o MEC não fez divulgação, então, dos 3,1 milhões, apenas 280 mil jovens tiveram conhecimento dessa oportunidade reaberta e se inscreveram. Então, 2,8 milhões estão até agora jogados ao léu, sem nenhuma proteção do Estado, e, vocês que são os guardiães do Executivo, vocês são os guardiães que devem puxar a orelha do Executivo. Solicito mais uma audiência pública, mas, por favor, a cidade em conjunto com todos vocês, Senadores de todos os partidos, de todas as tendências, porque aí, sim, a gente vai ver que é algo assumido pela Casa, a querida Casa Senado brasileiro.
Nessa linha ainda, Senador, continuo dizendo que cresceu, na pandemia, o trabalho infantil. O número de crianças... Só na cidade de Porto Alegre, numa certa semana, a Fundação Fasc fez uma pesquisa em que havia 1,1 mil crianças pedindo nos sinais de trânsito, crianças que não estavam antes na rua - não na rua em si, morando, mas usando a rua como meio de trabalho. E isso é só um sinalzinho do que aconteceu no Brasil inteiro.
Continuando a dizer para vocês da nossa preocupação, o Centro de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação tem mostrado que, nas escolas particulares, 9% dos alunos, durante a pandemia, não tiveram acesso a equipamento de internet. É lógico que, nas escolas particulares, os 9% que não tiveram acesso à internet são os bolsistas pobres, brancos e negros. Já nas escolas públicas, 39% ficaram sem ter acesso a internet.
Outra denúncia também que o Banco Mundial está fazendo é que, até setembro de 2021, só 11% dos 5.570 Municípios do Brasil fizeram ensino a distância para compensar e não deixar a pandemia prejudicar os estudos. Os demais Municípios não fizeram nada. Isso é grave, muito grave!
Também a gente pede a vocês... Por favor, eu vou pedir tudo a que eu tenho direito, e vocês Senadores me falem o que vocês podem fazer em caráter emergencial. O Plano Nacional de Educação criou toda uma estratégia para garantir a educação para nosso povo negro, indígena e do campo. No entanto, não está sendo levado a sério pelo atual Governo, pelo Executivo, quase nada do Plano de Educação. A previsão é de que, de 2014 a 2024, não cheguem a ser colocados em prática 15% do Plano Nacional de Educação. E esse assunto precisa de uma audiência pública já, e que bom que está aqui o Vice-Presidente da Comissão de Educação para poder ouvir esses nossos apelos urgentes. De tudo aquilo que falou a nossa querida Clarice Santos e de tudo que eu estou falando aqui, um trabalho que precisa ser feito pelo Brasil - e aí é um trabalho do Executivo a ser provocado por vocês, do Legislativo - é um plano de busca ativa do aluno, um plano de busca ativa do grande número de alunos negros, do campo, indígenas e quilombolas que evadiram do ensino, porque o ensino está totalmente quebrado.
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Também, como proposta, é que vocês estudem imediatamente que o MEC organize para o Brasil inteiro uma recuperação. Olha só: que o MEC organize para o Brasil inteiro uma recuperação do ensino via TV e via rádio para atingir todo o Brasil. Então, que haja um plano em que todo mundo que se inscrever e fizer a recuperação do estudo via TV e via rádio tenha diploma, uma vez fazendo as provas necessárias da aprendizagem. Portanto, eu acho que é um crime do Brasil ainda focar a educação no cuspe e no giz. Então, a educação brasileira ainda é cuspe e giz, e nós temos meios de comunicação excelentes, que são a televisão e o rádio, para pegar as aldeias, e não estão sendo usados com seriedade esses dois instrumentos. E é também mais um tema de audiência: eu peço a vocês uma audiência para discutir como acelerar o uso da TV e do rádio para educar, com o propósito de recuperar a perda da pandemia, para acelerar o ensino, segundo o Plano Nacional de Educação.
Também... Eu vou pular alguns pontos aqui.
Eu quero dizer para meus irmãos Senadores e Senadoras que a situação do nosso povo negro, nosso povo do campo, nosso povo indígena e quilombola equivale a um atleta que teve um acidente e se lesionou. A pandemia foi para nós um acidente, e o povo negro, o povo do campo, os quilombolas e os indígenas estão lesionados. Portanto, todo atleta lesionado precisa fazer terapia começando do zero. O nosso problema é que negros, população do campo, indígenas e quilombolas precisam de uma terapia de recuperação do saber, começando do zero, para dar os primeiros passos com pessoas bem preparadas. E volto a dizer: como o Brasil é um continente, precisamos usar a TV e o rádio para refazer a recuperação do ensino.
Também é bom encontrar uma solução para o alto índice de depressão das mães, cujas crianças estão sofrendo a depressão da mãe, bem como o alto índice de depressão dos professores e da equipe de ensino. A doença da depressão está fazendo um grande estrago na educação brasileira.
Também não dá para vocês, que são fiscalizadores do Executivo, permitirem que continue essa palhaçada chamada de aprovação automática. Vocês não podem permitir.
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Também solicito audiência pública, assinada por vocês, Senadores, sobre a crítica, a denúncia e a proibição da aprovação automática no Brasil.
Eu sei que a Comissão aqui é focada mais no ensino básico, mas eu não posso me privar, porque a Educafro trabalha especialmente com ensino superior. Então, eu quero partilhar com o Senador Arns, com a Senadora Zenaide e demais Senadores presentes uma dor. Não há pesquisa, mas a percepção da Educafro, que está envolvida com adulto no ensino universitário, é muito dura, muito sofrida. Antes da pandemia, Senadores, 30% - não há pesquisa; é percepção da Educafro - dos universitários que entraram nas universidades pelas cotas já haviam abandonado a universidade por falta de bolsa moradia e bolsa alimentação. Olhem que absurdo!
O Pnaes, o programa que tinha missão de garantir bolsa moradia e alimentação para os universitários, foi desviado para outras funções, inclusive para pagar hotel e pagar ônibus para time de basquete da classe média das universidades públicas, como para sair do Rio Grande do Sul e ir disputar basquete em Recife. É uma fortuna que se vai fazendo isso, não priorizando a bolsa moradia e a bolsa alimentação dos estudantes. O dinheiro do Pnaes foi usado, inclusive, para consertar ar condicionado quebrado do laboratório de biologia em várias universidades. Eu estou mostrando alguns exemplos de como o dinheiro do Pnaes, que era para atender à bolsa moradia e à bolsa alimentação, foi desviado. Então, eu peço também uma audiência pública, pelo amor de Deus, nessa querida Casa, Senado, para discutir o Pnaes. O Pnaes fez um estrago grande ao não dar, ao não garantir a bolsa moradia e alimentação.
Volto a dizer: antes da pandemia, a percepção da Educafro era de que 30% dos jovens negros, brancos pobres, do campo, indígenas e quilombolas já haviam abandonado as universidades públicas federais por falta de bolsa moradia e alimentação. Com a pandemia, a nossa estimativa é que dobrou para 60%. De cada cem jovens do campo, negros, indígenas, quilombolas, 60% já abandonaram as faculdades públicas. Então, há um investimento alto com professores, luz, água e todo o equipamento, mas o número de alunos que estão sendo beneficiados está lá embaixo, por falta de uma coisinha simples: a garantia da bolsa moradia e alimentação.
Então, eu peço outra audiência pública para discutir o Pnaes e como recuperar, levar de volta todos os jovens universitários negros, do campo, indígenas e quilombolas que abandonaram as faculdades por falta de apoio governamental do Executivo.
E aí, Senadores, eu peço que vocês façam um projeto conjunto, deem entrada em um projeto conjunto, obrigando toda universidade pública abrir inscrição para as vagas remanescentes; que todas as universidades públicas abram inscrições para as vagas remanescentes, do segundo semestre ao último semestre. Por quê? Porque, se você vai a universidades federais no Brasil, você vê professores dando aula para quatro, cinco alunos, quando deveriam ser 40 alunos na sala. E os demais todos evadiram.
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Ora, com o mesmo professor, você pode reincluir esses alunos, fazer uma chamada nacional, para todo e qualquer aluno que abandonou qualquer faculdade pública ou qualquer faculdade particular ter o direito de voltar para as universidades federais no segundo, terceiro, quarto, quinto, sexto, sétimo, oitavo semestres da universidade, e, assim, otimizar nossa universidade pública.
Meu irmão querido, Flávio, meu irmão Vice-Presidente da Comissão de Educação e demais Senadores, não dá para aceitar isso! Você vai para uma universidade pública e vê as salas vazias. Pergunto aos professores, pergunto ao diretor daquela unidade, e ele diz: "Os alunos abandonaram". E aí? E, aí, o que vocês estão fazendo de política proativa para trazer de volta esses alunos? Nada! Porque, segundo eles, o Congresso Nacional tem de garantir bolsa moradia e bolsa alimentação, que Bolsonaro cortou - Bolsonaro cortou a bolsa moradia e a bolsa alimentação. Então, você vê nos quatro cantos do Brasil, um sucateamento das universidades públicas.
Nos últimos seis anos, 40% das verbas das universidades federais foram cortadas de uma hora para outra. E, aí, as universidades, talvez por falta de total amor para o povo do campo, para o povo quilombola, para o povo indígena, para o povo negro, as universidades que tiveram esses cortes de verba primeiro cortaram as bolsas. Então, é vergonhoso saber que uma universidade seleciona 2,5 mil jovens com perfil de receber bolsa, mas só tem 500 bolsas. O que faz a universidade? Faz sorteio - faz sorteio! Entre os 2,5 mil que têm direito à bolsa moradia e alimentação, ela sorteia 500 bolsas.
E aí acontece o que eu vi na Universidade Federal de Sergipe - aqui está uma denúncia -: jovens universitários que acreditavam na educação, por serem de famílias muito pobres... Senadores e Senadoras, é gravíssimo o que vou falar agora: jovens da Universidade Federal de Sergipe, por acreditarem na educação e não terem nenhuma maneira de conseguir bolsa moradia e bolsa alimentação, estavam se prostituindo para ter dinheiro para pagar o alojamento, a república, e para pagar sua alimentação. Jovens, rapazes e moças, estão se prostituindo para garantir dinheiro. Que país é este, meu Deus? Que vocês, irmãos Senadores, não permitam uma coisa dessas acontecer! Ajudem-nos pelo amor de Deus! Vocês foram eleitos para pegar as feridas do Brasil e botar remédio. Vocês não podem deixar o povo assim. Não podem! Vocês não podem. É missão de vocês!
Também... (Pausa.)
Já concluindo, vou fazer outros pedidos. É o seguinte: a Lei 12.711, de 2012, que é a lei de cotas para jovens pobres do campo, indígenas, quilombolas e negros, foi assinada por dez anos. Então, nós pedimos a vocês que assinem o requerimento de audiência conjunta emergencial para debater a melhor estratégia para resolver esse problema.
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E, para a Educafro, a melhor estratégia é você fazer o seguinte. Segundo o Ipea, se essa lei fosse botada em prática com qualidade, em 56 anos o equilíbrio entre jovens brancos e negros nas universidades seria atingido - em 56 anos, se a lei fosse colocada em prática com seriedade. Foram dados só dez anos para a lei. Então, agora o que a Educafro quer é unicamente que vocês, Senadores, aprovem a ampliação da lei por mais 30 anos, porque nós sabemos que o que falta é levar a sério a lei; e a lei não está sendo levada a sério como deveria. Que lei é essa? É a Lei nº 12.711, de 2012, que foi aprovada por dez anos, vence o ano que vem, a lei que garante a universidade para jovens do campo, jovens quilombolas, jovens indígenas, jovens negros, deficientes e brancos pobres. Olha só, é uma lei que não exclui ninguém. E a maldade aí do pessoal contrário dizia que essa Lei nº 12.711 era lei só dos negros. Mentira. É uma lei que atinge todos os pobres no seu direito sagrado de ingresso à universidade.
Também, meu irmão Senador Arns, lembrando do seu tio, querido Cardeal Arns, com quem convivi pessoalmente, e a energia dele atua em mim pela energia franciscana, meu querido Cardeal Arns era muito sensível à questão da exclusão.
E eu peço a vocês outra audiência pública só para discutir o Cebas. Cebas é a lei de filantropia, que foi desmontada recentemente e está prejudicando muito a todos nós, negros, indígenas, pessoas do campo, etc. Olha só que absurdo: ofendendo a Constituição e ofendendo as decisões do Supremo Tribunal Federal, a lei do Cebas proíbe - proíbe! - que as escolas tenham qualquer plano de ingresso de excluídos na filantropia, no ensino fundamental e ensino médio. Ou seja, uma luta da Educafro, que é criar um "prouninho" no ensino fundamental e médio, a lei do Cebas proibiu isso. O Prouni, que é para universidades federais, está dando tão certo, é uma política bonita, boa, eficiente; e a lei do Cebas proibiu fazer o "prouninho" para o ensino fundamental e ensino médio. Proibiram! Vocês, Senadores, que são do bem, não podem permitir isso! Tem que se fazer uma revisão urgente da lei do Cebas, e eu peço uma audiência pública sobre isso.
Também eu sei que outra demanda é: estado das coisas inconstitucionais. O volume de coisas que estão ofendendo a Constituição é grande, especialmente no campo da educação. Então, eu também peço a vocês, Senadores, que façam um requerimento conjunto de uma audiência pública para vocês debaterem o estado das coisas inconstitucionais do mundo da educação. O Supremo Tribunal Federal já definiu, na ADPF 347, de 2015, que todas as coisas que são consideradas inconstitucionais têm que ter uma ação imediata para obrigar o Executivo a executar. E aí, a vocês que são fiscalizadores do Executivo, solicito que vocês façam uma audiência pública para discutir estado das coisas inconstitucionais no mundo da educação, uma vez que vocês são da Comissão de Educação.
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E aí, concluindo, vocês estão vendo e acompanhando neste exato momento todo o problema do Inep. Vocês estão vendo e acompanhando todo o problema do Inep! O Inep teve uma intervenção do Bolsonaro, fazendo grandes estragos no Inep, com grandes prejuízos, com 37 funcionários-chave, estratégicos, do Inep pedindo demissão. Portanto, estão comprometidos os ENEMs futuros, está comprometido o Enade, está comprometido o Censo Escolar.
Portanto, nós queremos que vocês façam uma audiência pública emergencial sobre a realidade do Inep e como enfrentar esse problema, porque o prejuízo para o Brasil vai ser incalculável. Você pegar 37 funcionários que há vinte anos trabalham em um programa fantástico que é a demanda política do Inep, e de uma só vez saírem todos esses e Bolsonaro colocar pessoas sem nenhuma qualificação, mas unicamente voltados para o mundo político-ideológico dele, isso é um estrago que vocês Senadores da Comissão de Educação não podem permitir.
Então, essa é a oitava audiência pública emergencial que eu peço a vocês com referência à situação do Inep e ao prejuízo ao nosso povo afro-brasileiro.
Eu peço desculpas porque eu me alonguei, mas eu estava aqui com tudo engasgado. Eu joguei para fora com emoção. E vocês, espero que o Wellington, a Senadora Zenaide, o Flávio, o nosso irmão, e demais Senadores me compreendam, me perdoem, mas atendam as nossas demandas. Essa é a nossa grande questão.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Eu que agradeço, Frei David. Muito importante a sua participação, a sua exposição, assim como já tinha sido a da Clarice Santos. E a gente, inclusive, tinha dito na abertura desta audiência pública que nós iríamos debater hoje três áreas habitualmente marginalizadas, discriminadas, colocadas de lado, que não recebem importância de vida, não recebem escuta de vida. Eu, inclusive, digo que bastaria se sentar com o Frei David, com a Clarice, que teríamos os encaminhamentos para as dificuldades que são apresentadas, seja no ministério, no conselho, no Congresso. Mas eu também peço que a Consultoria, que está acompanhando, a nossa assessoria também, coloquem já num documento para que a gente possa também dar continuidade àquilo que foi colocado, com certeza. Não é, Frei Davi? Não é, Clarice?
Eu, antes de passar para a Zenaide, que está aí atenta e acompanhando, a nossa Vice-Presidente, tão batalhadora, eu passo a palavra para o Gersem José dos Santos Luciano Baniwa, que é Coordenador do Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena. Então, foi campo, Educafro, quilombolas, populações negras... Aliás, tudo que o Frei David levantou eu até fui anotando aqui também e dizendo: "olha, o Brasil seria muito melhor se tudo isso estivesse acontecendo", e coisas simples, não são coisas de outro mundo.
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Então, eu passo a palavra a você, Gersem José dos Santos, que é da área da educação escolar indígena. Com a palavra.
O SR. GERSEM JOSÉ DOS SANTOS LUCIANO BANIWA (Para expor.) - Bom dia, Senador Flávio Arns! Bom dia, demais Senadores e Senadoras! Bom dia a todos e a todas!
Agradeço o convite, a oportunidade de falar neste momento, de cumprimentar a todos e a todas e parabenizar por esta iniciativa.
Da perspectiva indígena, tenho algumas rápidas considerações.
Primeiro, trago como foi esse tempo de pandemia com relação aos nossos alunos e alunas, nossas escolas indígenas no Brasil e, de modo muito particular, aqui na Amazônia, onde eu vivo, moro - falo aqui de Manaus - e onde eu conheço melhor, embora também conheça bastante outras regiões do Brasil.
Em primeiro lugar, dizer que o enfrentamento da pandemia, no caso das comunidades indígenas, principalmente amazônicas, foi baseado muito no seu protagonismo, na sua grande diversidade de conhecimentos, de saberes, de fazeres, tradicionais e atuais, e assim por diante. A pandemia não foi tão desastrosa graças exatamente, eu diria, aos conhecimentos tradicionais. Eu moro aqui no Estado do Amazonas, e a capital é a única... O Estado do Amazonas é praticamente um continente. É o maior Estado, de rios, florestas imensas. E a única cidade com hospital para média e alta complexidade - e é o caso da pandemia - é a cidade de Manaus, é a capital. Então, podemos imaginar como as comunidades, as aldeias indígenas estiveram absolutamente distantes, à própria sorte, nesse período da pandemia. E a tragédia, então, não foi maior... O Amazonas tem o maior número de óbitos indígenas de todo o Brasil, o índice é altíssimo, ultrapassa mil óbitos só o Estado do Amazonas, para uma população de 170 mil a 180 mil indígenas, para se ter uma ideia. Ainda assim, podemos dizer que não foi tão trágico por conta desse sistema de conhecimento.
E por que eu estou falando isso? Porque ao falar, ao pensar a partir da educação indígena, da educação escolar indígena, é importante levar sempre em conta a importância desse sistema de educação, desse sistema de conhecimento, desses saberes que são, sim, ancestrais, tradicionais, mas são saberes atuais, saberes vivos, saberes dinâmicos, saberes que estão sendo praticados, vividos, vivenciados. E esses saberes foram fundamentais nesse tempo. Eu costumo dizer, Senador Flávio, que, nesse período, os povos indígenas aproveitaram esse confinamento, esse recolhimento físico, social para dar um mergulho nesses conhecimentos tradicionais, e isso todas as gerações: de crianças a adultos, anciãos. Todo mundo teve que mergulhar nessa ancestralidade, nessas tradições até em busca de equilíbrio, em busca de cura, em busca de tratamento para essa doença, exatamente na ausência do Estado, na ausência da saúde pública - pelo menos na ausência da saúde pública adequada, porque algumas aldeias até têm pequenos postos de saúde, alguns agentes de saúde, mas sem qualificação, sem condições inclusive operacionais, de medicamentos e exames para isso. Acho que isso é importante ser dito.
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A outra realidade, Senadores, que estamos enfrentando, e que continuamos a enfrentar... Eu acho até que a mídia e a sociedade já não falam tanto disso, talvez porque, nos grandes centros, isso já diminuiu em força, já perdeu força. Mas imaginem que, em muitas aldeias aqui da Amazônia, continuam muito vivas, muito fortes, as influências nefastas, criminosas, porque fatais, de missionários e políticos negacionistas da vacina. Isso é muito preocupante. Isso, é claro, passa pela discussão da educação.
Eu sou do Alto Rio Negro, do Município de São Gabriel da Cachoeira. São Gabriel da Cachoeira está com um surto de epidemia do covid-19. Nesses últimos 15 dias, 20 dias, houve a multiplicação em três vezes do número de casos e a volta de óbitos, porque percebemos, de forma muito triste, que menos de 57% conseguiram se vacinar com a segunda dose, o que é grave para um público que é prioritário, e é prioritário no primeiro nível! Não há nenhuma justificativa, nenhuma explicação para esse elevado número de pessoas, de indígenas sem vacinação, a não ser, de fato, a lavagem cerebral proferida por missionários e, é claro, por políticos, além de garimpeiros e madeireiros, que já vão com maldade para isso. Eu acho que isso é muito importante, porque as pessoas continuam morrendo, indígenas continuam morrendo. Na semana passada, perdi dois amigos, colegas anciãos, no Rio Negro, de forma muito triste, para a pandemia.
Então, esse segundo aspecto é importante, porque pouco já se fala nisso. Muitas vezes, já falamos como se estivéssemos quase no pós-pandemia. Se isso é verdade em outras regiões, em muitas regiões indígenas isso não é verdade, pois a pandemia ainda continua sendo a maior preocupação.
O terceiro aspecto que eu queria considerar é que, como eu já disse, o período da pandemia foi um momento pedagógico, didático, interessante, por conta desse mergulho na tradição. Isso é para dizer o seguinte: embora as escolas indígenas tenham fechado - eu diria que a educação escolar indígena esteve meio suspensa -, houve um revigoramento da educação tradicional. Então, o ensino-aprendizagem continuou nas aldeias de forma muito forte, porque as crianças, embora não estivessem nas escolas com seus professores, estavam agora com muitos dos seus professores, pais, mães, tios e avós, nas suas casas, nas suas aldeias, até porque o isolamento familiar nas aldeias praticamente não aconteceu. O que houve foi um certo isolamento das aldeias, mas não das pessoas, porque isso é cultural e socialmente quase inaceitável. Então a educação tradicional foi muito vibrante, foi muito forte. As crianças aprenderam muito nesse período da pandemia por conta disso. Acho que é importante que isso seja dito.
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Agora, o que nós enfrentamos como problema? Primeiro, problema para a sobrevivência das pessoas, sobrevivência das famílias das pessoas.
Eu queria destacar aqui, Senador Flávio Arns, com muita tristeza, porque eu fiquei muito triste, pois aqui, pelo menos no Estado do Amazonas, nossos professores indígenas sofreram muito e sofreram problemas além da pandemia, mas, sobretudo, sofreram problemas de alimentação, a fome. A fome afetou muito os nossos professores indígenas. Por quê? Porque assim que foi decretada calamidade pública e praticamente tudo fechou, os Municípios cancelaram os contratos dos professores. Simplesmente os Municípios cancelaram os contratos, que são aqueles contratos temporários.
Aqui, no Amazonas, 90% dos professores indígenas, que são quase 4 mil professores indígenas, são eternamente contratos precários, eternamente, porque eu, pelo menos, há 40 anos acompanho e isso não muda - não muda. Os contratos temporários são anuais, então, os contratos foram suspensos. E como os professores sobreviveram? Praticamente de solidariedade, mas com necessidades, foi muito ruim porque não puderam receber auxílio emergencial porque no sistema eles apareciam como funcionários públicos, só que com contrato suspenso, portanto, com salários suspensos. Foi muito triste, muito sério, para mim foi muito grave, isso é muita desumanidade.
Por exemplo, eu, aqui na Universidade Federal do Amazonas, tenho alguns alunos do curso de formação de professores indígenas que são professores nas aldeias. Nós tivemos que, para eles, fazer campanha de solidariedade, juntar mesmo cesta básica, pedir esmola de pessoas para poder mandar para os nossos alunos que eram professores nas aldeias, porque estavam sem contratos e sem salários. Isso por mais de um ano e meio! Estou dizendo isso porque eu acho isso muito sério, muito grave.
Será que este nosso País um dia vai resolver esse drama da educação escolar indígena? Um dos dramas, que são os contratos temporários dos professores indígenas? Eu fico imaginando, será que o Congresso Nacional não pode fazer alguma coisa? Uma lei que ampare esses professores? Por que o professor que está há 40 anos dando aula, Senador Flávio Arns, um professor que já dedicou uma vida, 40 anos dando aula, todo ano com contrato temporário? Será que ele não adquiriu o direito de pelo menos ser efetivado? Não é possível! Em nome, inclusive, da moralidade, da humanidade.
Eu conheço vários professores com mais de 50 anos, que já dedicaram mais de 30 anos de vida como professor, sem amparo nenhum e, nesse momento, passando fome. Então, é muito sério, para mim isso é muito grave e continua porque, como ainda não parou, então, não foram contratados, continuam com muita dificuldade.
Aqui eu acho que é um elemento muito sério, que deveria ser pensado. Não dá para pensar o futuro da educação escolar indígena sem resolver essa questão dos professores, esses contratos temporários, precários, porque, para mim, é a pior vergonha que nós temos aqui no Brasil. É desumano isso, além de imoral, pensar essa forma.
Por que, então, não pensar em concursos públicos urgentes? Eu acho que o Congresso deveria criar uma lei determinando, em curtíssimo prazo, a realização de concurso público para tirar esses professores em dívida dessa situação humilhante, desumana, que vem aí há anos, e anos, e anos; décadas e décadas. É muito sério. Para mim, é muito triste isso. Eu fico muito triste com isso.
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A pandemia revelou as precariedades nas aldeias. Essa questão, por exemplo, da internet. Muitos Municípios e Estados insistiram em aulas remotas. Como? Que tipo de aula remota? Eles só não disseram como que essas aulas iam acontecer, não é? Eles nem sequer mandaram pesquisar para ver se os indígenas podiam dar aula por telepatia. Só seria por meio de telepatia, porque eles não têm acesso à internet. Como é que vai funcionar? E houve imposição de aulas remotas. Quase todos os Municípios e Estados impuseram aulas remotas. Que tipo de aula remota, gente? Eu fico pensando: correio não funciona. Eu sou da época dos telecursos via correio, mas não há correio nas aldeias nem para entregar apostilas. Isso não podia... Se estava todo mundo isolado, como transportar via fluvial, via aérea?
Então, essa precariedade nos ajuda logo a pensar: precisa disponibilizar internet aos indígenas, tem que acabar com esse preconceito ou racismo de que índio não precisa de tecnologia. Precisa sim. São cidadãos iguais. São cidadãos iguais. Então, direito a isso. Já aproveito para dizer isso.
Uma terceira questão. Bom, aqui no Amazonas estamos com previsão para, a partir de janeiro, todo mundo voltar a atividades presenciais, na educação básica e, inclusive, ensino superior. Agora, depois de quase dois anos com todo mundo confinado, gente, há muito problema de alimentação nas aldeias. Para os alunos, a alimentação escolar será fundamental. Já deveria estar sendo fundamental a alimentação escolar, mas é bom lembrar que aqui na Amazônia a merenda escolar é quase um sonho, é quase um desejo, porque não chega, não chega às escolas distantes. Chega a algumas escolas que existem próximas das cidades,
De novo, o Município de São Gabriel da Cachoeira, por exemplo, estava terminando o segundo semestre. Nenhuma escola, até este momento, recebeu alguma alimentação escolar deste semestre atual, de 2021, embora as atividades estejam acontecendo de forma híbrida, aquela forma reduzida de alunos. As escolas estão funcionando, mas não têm alimentação escolar.
Olha, depois de dois anos, deixaram as comunidades com uma fragilidade muito grande na alimentação, porque, de alguma maneira, reduzindo a sua capacidade de construção de roça, de cuidar de roça, precisam da alimentação escolar, e é exatamente o que não funciona, pelo menos aqui na região da Amazônia. Então acho que a alimentação escolar é uma necessidade também que precisa ser vista.
Quanto à infraestrutura, continuo lembrando: é outra vergonha do Brasil. Um terço das escolas indígenas sequer tem prédio, ou seja, mais de cem mil alunos do Brasil estudam debaixo de árvore, no barranco, numa igreja, em algum lugar da igreja. Quando chega a hora da missa ou do culto, todo mundo é colocado para fora. Um terço são mais de cem mil alunos. É bom lembrar destes números: cem mil crianças indígenas que não têm lugar para estudar todos os dias. E isso também décadas, e décadas, e décadas, e nada muda. Então, agora, aqui na Amazônia, inicia-se período de inverno; muita chuva. Até as escolas que tinham prédio - imagina dois anos fechadas; vem temporal, vem chuva; destelharam muitas escolas, paredes se deterioraram -, essas escolas estão em péssimas condições, mesmo aquelas que tinham... Em que condições que vamos retomar agora as aulas? E, todo dia, eu só vejo o Governo Federal cortando os recursos da educação. Quando é notícia nacional sobre a educação, é só notícia ruim; é só corte daqui, é só corte de lá, ciência, educação e assim por diante. Que triste, que vergonha, não é? Que País é esse, não é? Que País é esse que estamos tendo agora?
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E formação de professores, o que mais afeta essas reduções de recursos orçamentários para a educação é a formação de professores. Nós precisamos ainda muito investir na formação de professores indígenas, inclusive na educação básica, o magistério indígena, que é a maior parte do alunado indígena, mas também na formação superior, formação inicial em nível médio. Então, precisa de recurso. O MEC faz dois anos que não repassa nada para as instituições formadoras, tanto em nível de ensino médio, quanto de ensino superior; dois anos sem nada, sem um tostão! Os cursos estão praticamente paralisados. Não tem como pensar educação sem a formação de professores.
E, por último, o que, de um jeito ou de outro, tem relação com isso, mas eu queria concluir com essa questão, Senador Flávio, e com muita tristeza, muita tristeza - acabei de chorar aqui -, tem a ver com a educação, porque para mim a educação é a base de uma sociedade, base de uma civilização, que é a situação do povo ianomâmi, Senador; nós precisamos fazer alguma coisa pelo povo ianomâmi. O povo ianomâmi está escancaradamente, aos nossos olhos, na nossa frente, sendo literalmente massacrado; está sendo exterminado um por um, velho por velho, criança por criança. Não tem como o ser um humano digno ficar quieto diante do que se conhece, inclusive, nacionalmente, por meio do Fantástico dessa semana, não tem como! E não é por ser o Fantástico, não, porque se passa concretamente. Nós sabemos, eu moro aqui do lado, eu visito a área ianomâmi; é muita tristeza.
Eu fico me perguntando: que sociedade é essa que nós temos? Eu nem sei se tenho, se posso abrir a boca e chamar essa nossa sociedade ainda de uma sociedade humana; não sei onde está a humanidade, não! Começo a me perguntar onde está a humanidade dessa nossa sociedade, dessa nossa sociedade! Não é? Não sei. Que civilização é essa que deixa isso acontecer, gente, com um povo inteiro? Acho que é um desafio de todos, de todos! Não é só o que se chama de povos do bem, não; na humanidade, não tem essa, é a humanidade. O problema de um é o problema de outro. Não existem duas ou três humanidades; é uma humanidade. Se uma humanidade permite isso acontecer, é um problema, sim, da civilização humana.
Então, queria concluir, com muita tristeza mesmo, e pedir a todos aqui, Senadores, Deputados e todos aqui - ouvi agora o Frei David falando - colaboração, apoio de todos. Nós precisamos fazer alguma coisa pelo povo ianomâmi. E tem que ser rápido, tem que ser rápido! A sociedade precisa fazer alguma coisa, gente, precisa fazer alguma coisa!
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Então, queria concluir isso, mais uma vez, Senador Flávio, agradecendo o convite, a oportunidade, parabenizando-o. Vou na linha do Frei David: que tenhamos outras audiências públicas, porque, vejam, há tantos assuntos, tantas questões que a gente não consegue esgotar, não consegue esclarecer, detalhar, embora esses 20 minutos sejam preciosos, são muito importantes.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Além de tudo, queremos agradecer a você - eu esqueci de acionar o som - que é o Coordenador do Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena. Eu considero o seu depoimento também extraordinário, apontando, dizendo o que fazer, o que está acontecendo, os problemas, os desafios e, principalmente, uma mensagem de humanidade também. Quando você coloca, por exemplo, que os professores foram dispensados, dizendo que é desumano, imoral, eu ainda colocaria a palavra ilegal. Ilegal porque talvez a escola estivesse fechada, mas a educação não foi suspensa. Então, você tinha que ter a participação dos profissionais da educação.
Só que são várias denúncias que foram feitas, e eu até pediria, falando com o Thiago, que é o secretário da nossa Comissão de Educação, Cultura e Esporte, o Edmar, que é da Consultoria, e o Diogo, que é da nossa assessoria, que estão acompanhando, que a gente colocasse tudo isso no papel, porque o Frei David, inclusive, havia solicitado que a gente colocasse nas audiências públicas, mas eu vou pedir ao Frei David que a gente organize esse assunto e que, até segunda-feira, quando a gente tem a próxima audiência pública, os encaminhamentos tenham sido feitos, de hoje para segunda-feira.
O que a Gersem trouxe são outros tipos de encaminhamentos, inclusive judiciais, que nós temos que ver com o Ministério Público, com a Procuradoria da República, com os Senadores do Amazonas, sempre lembrando que podem ser situações... Não é, Gersem? Você, como coordenador nacional trouxe a situação do Amazonas, mas que isso sirva de alerta para os outros Estados também, onde situações parecidas devem estar acontecendo. A gente sabia que essa audiência pública seria de extrema relevância, não é? Eu acho que é obrigação da sociedade, do Congresso, de você e de todos nós nos debruçarmos sobre tudo o que foi falado hoje, para que a gente possa tomar posição, tomar iniciativa, fazer encaminhamentos, porque não se pode conviver com esse tipo... com esses problemas que foram levantados. Vamos juntos nessa tarefa.
Eu passo, em primeiro lugar, a palavra à Senadora Zenaide. Em seguida, para o Senador Wellington.
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - RN. Para interpelar.) - Sr. Presidente, Senador Flávio Arns, parabéns por uma audiência pública com um assunto tão importante: educação básica e planejamento.
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O que fazer para recuperar nos próximos anos o que foi retirado principalmente...? Aqui nós falamos de toda a população mais carente deste País, e entre eles devem entrar esses 20 milhões que estão com fome, não é?
A gente, na verdade, quando o Congresso aprovou com o meu voto contrário à Emenda 95, que congelou, proibiu investimentos nos gastos básicos... Eu não sou contra você estar numa situação, como se diz, sem dinheiro e não limitar, mas limitar os gastos primários - primários! - como saúde e educação? E este Governo, apesar desse congelamento, conseguiu ser mais cruel ao não gastar. Eu queria citar aqui uns dados que a gente conseguiu, mas, primeiro, parabenizando Clarice Santos, Frei David e Gersem, pois vocês nos enriqueceram com esse conhecimento de quem está na ponta, de quem vê mais de perto, e, com esta audiência pública, nós estamos dando visibilidade ao povo brasileiro do que realmente está a acontecer. Isso aqui não é fake news, isso é a verdade. Conhecimento é poder. Nós estamos empoderando o povo brasileiro para saber que necessariamente... É claro que não é necessária essa decisão de tirar recursos da educação, com essa população, principalmente como foi mostrada, população negra, indígena e todos os da escola pública.
Eu sei que o Senador se lembra de que, com tudo isso, ainda levaram um projeto de lei para a gente aprovar em que não seria obrigado prestar conta quem não usou o recurso porque disse que não teve tempo. Então, segundo dados do Censo Escolar de 2020, 10.105 escolas não possuem água potável, 10.808 não possuem energia elétrica e 8.650 não possuem sistema de esgoto. Cerca de 52% das escolas públicas não possuem laboratório de informática e nem biblioteca. E, para essa informática, a gente aprovou o uso daquele fundo que era de R$3,5 bilhões, para informatizar as escolas públicas. Ele vetou, nós derrubamos o veto, e ele veio com uma medida provisória - porque a moda agora é esta: o Congresso eles querem desmoralizar a toda hora. Mais da metade dos estudantes da rede pública de ensino básico não possuem computador e muito menos acesso à internet. Mais da metade das escolas rurais, que são as mais penalizadas, e as escolas dos povos indígenas não possuem também acesso à internet.
Então, não tenham dúvida de que essa população foi a mais foi esmagada na parte da educação, mais do que as outras. Ao mesmo tempo, os dados mostram que o Governo Federal não vem cumprindo a contento o seu papel constitucional de dar assistência técnica e financeira às escolas públicas - art. 211, §1º, da Constituição Federal -, ou seja, é inconstitucional.
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O ano de 2020 foi aquele no qual o Ministério da Educação teve o menor orçamento e a menor execução orçamentária da década. Mesmo o mínimo que já tinha com a Emenda 95, ele ainda não fez o favor de ajudar essas escolas. A etapa fechou 2020 com 10% menos em comparação a 2019, e o MEC executou em 2020 apenas 47% das despesas livres, discricionárias para educação básica. Isso é decisão política. Decidiu que os mais carentes e vulneráveis deste País não é para terem educação, porque educação é poder, informação é poder e é tudo. Isso aqui não é uma questão de ser do partido A, B ou C; é tudo que a gente está vendo, um olhar discriminando os mais carentes deste País e as nossas populações originais.
Até dia 20 de agosto agora, o MEC não usou um centavo sequer dos R$220 milhões destinados ao Programa de Educação Conectada, em busca de levar internet às escolas, porque ele não gastou nada até agosto. Até 15 de junho de 2021, a pasta não havia pagado um centavo sequer do R$1,2 bilhão disponível para infraestrutura da escola da educação básica. Os recursos deveriam ser empregados para, por exemplo, preparar escolas para uma volta às aulas segura. Pelo contrário, ele mandou um projeto de lei para os gestores justificarem que não tiveram como gastar esses recursos. Poderia ter transferido. Eu, o Senador Flávio Arns e outros tentamos não aprovar isso, mas fomos votos vencidos - não é, Flávio? Na verdade, essa ação orçamentária chamada Apoio à Infraestrutura para a Educação Básica tem se desidratado desde 2009. Não foi só a pandemia, como a pobreza não é só na pandemia. A pandemia escancarou, piorou, mas, em dezembro de 2019, a gente já tinha 13 milhões de brasileiros em extrema pobreza. Então não foi só a pandemia. Os recursos que deveriam ter sido empregados para preparar escola para uma volta à aula depois da pandemia... Na verdade essa ação orçamentária chamada Apoio à Infraestrutura para a Educação Básica tem sido, como eu estava dizendo, desidratada, quando apenas 1,83% dos R$2,7 bilhões da dotação inicial foi pago. Em 2020 a pasta desembolsou apenas 10% de R$1,1 bilhão disponível.
Diante do que a gente está vendo, eu costumo dizer, porque, quando o Governo toma decisões políticas... E ele sabe que somente através da educação pública de qualidade, com acesso a todos, ele vai diminuir a criminalidade, ele vai aumentar o número de crianças e jovens que cheguem a ter uma profissão e que não precisem mais desse recurso da assistência social, como eles ficam reclamando do Bolsa Família, que agora estão mexendo.
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Para finalizar - eu não vou nem perguntar, porque vocês já me responderam -, como vocês avaliam a gestão do MEC para o suporte técnico e financeiro da educação básica?
Pelas informações que nos enriqueceram, eu quero mais uma vez parabenizar por esta audiência pública o nosso Senador Flávio Arns e dizer de um governo que sabe que a educação é a base de tudo e é um direito. Eles estão tirando da educação, da creche, até das universidades federais. As universidades federais aqui do meu Estado eles não estão... Eles deixaram 8% do custeio de manutenção das universidades para os institutos federais. Então, eles não querem que se eduque; é um governo que resolveu matar as pessoas não só de fome, mas de conhecimento. E a gente sabe que estas audiências públicas mostram, tiram a máscara de que é favor da educação. É claro que não é a favor da educação.
E eu até questionei, Flávio, o Ministro da Educação, quando esteve aqui, que não entendia porque ele não se preocupava em angariar mais recursos para a sua pasta, porque o normal é cada Ministro querer recursos para sua pasta, solicitar do Parlamento isso. Então, é um governo que não respeita a vida. E não é só a vida humana; todas as formas de vida. Como a gente diz, a vida das nossas florestas, dos nossos animais.
É difícil lidar, mas eu gostei quando o Frei disse que tinha uma esperança na gente. E eu acho que a gente tem de conjugar o verbo esperançar, mas o desmonte que está havendo da educação, ciência e tecnologia deste País, que é justamente quem faz o País... O mundo todo faz isso. Quem educou e investiu em ciência e tecnologia levantou-se. Nós temos o exemplo da Finlândia. Quando eu era Deputada, a Ministra da Educação veio de lá e mostrou que foi através da educação, ciência e tecnologia que eles cresceram. E não há como a gente crescer aqui, se já se poda o direito de quem não pode pagar uma escola privada ter o direito à educação pública de qualidade.
Obrigada, Flávio Arns.
Queria dizer, mais uma vez, aos nossos convidados que foi uma aula e que a gente tem de correr contra o tempo. Eu costumo dizer que quatro anos de atraso na educação são 50, na maioria das vezes, para se recuperar. O menos grave são os prédios abandonados, isso e aquilo. Educação é que fica difícil medir. Isso a gente media, a gente sabe que vai fazer um apartheid social cada vez maior entre as nossas crianças e jovens.
Mas nós não estamos aqui para abaixar a cabeça. Eu costumo dizer que sou uma mulher de fé, e fé para mim é insistir, persistir e nunca desistir de lutar por aqueles que mais precisam e que, hoje, são uma população muito grande. Quem precisa... Esse fosso entre os mais pobres e os mais ricos está ficando cada vez mais alargado, e a gente tem que correr atrás disso.
Obrigada, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Eu que agradeço, Senadora Zenaide Maia.
Só para os expositores e para a expositora terem conhecimento, a Senadora Zenaide Maia é Vice-Presidente desta Subcomissão da Educação na Pandemia, e a atuação dela vem sendo pautada sempre por uma defesa forte da educação, da saúde, das causas sociais e dos desafios em geral.
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Eu quero lembrar novamente que o Senador Wellington Fagundes, que vai se manifestar agora de novo, é o Relator da educação na Comissão Mista de Orçamentos; e o Senador Izalci Lucas, que na sequência vai se manifestar também, é o coordenador da Frente Parlamentar Mista - Senado e Câmara dos Deputados - a favor da educação, pela educação.
Todos esses debates naturalmente vão ser levados - o Senador Izalci Lucas é uma grande liderança também. E vocês podem ter certeza de que vão ter uma acolhida muito grande no Senado Federal para tudo que foi dito hoje. Eu diria que a audiência pública foi contundente, e temos de nos debruçar sobre o que foi dito e colocado.
Senador Wellington Fagundes, por favor.
O SR. WELLINGTON FAGUNDES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - MT. Para interpelar.) - Mais uma vez, Senador Flávio Arns, eu gostaria de agradecer a V. Exa., à Senadora Zenaide e ao Senador Izalci, que aqui esteve conosco também desde o início; à Clarice Santos, que é a Coordenadora do Fórum de Educação do Campo; também ao Gersem José dos Santos, que é Coordenador do Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena; e ao Frei David Santos - quero registrar, Frei, que tenho uma irmã mais velha franciscana, então toda a minha família também foi educada no catolicismo.
Sr. Presidente, eu aqui quero deixar os meus sinceros agradecimentos pela presença de todos. A exposição que fizeram e as respostas que nos deram são importantes contribuições a esse debate tão fundamental ao Brasil, que se inter-relaciona diretamente com o futuro das nossas crianças, das futuras gerações.
Sr. Presidente, antes de encerrar, eu queria dizer que tivemos hoje uma notícia extremamente animadora: a de que o Brasil ultrapassou os Estados Unidos no percentual de vacinados contra a covid-19. Segundo publicação do jornal Folha de S.Paulo, com base em dados do Our World in Data, vinculado à Universidade de Oxford, na Inglaterra, o nosso País, Sr. Presidente, se uniu a outras 55 nações que superaram os índices norte-americanos.
Esse dado mostra duas situações muito claras: a correção dos rumos que o Poder Legislativo ajudou a empreender no nosso País, na defesa intransigente da ciência; e, ao mesmo tempo, o desejo do povo brasileiro pelas vacinas. O povo brasileiro, mais de 95% da população deseja se vacinar. Já estamos agora, inclusive, nas vacinas de reforço. Se tivéssemos hoje 200 milhões de doses de vacina disponíveis, com certeza, absoluta certeza, estaríamos vacinando mais e mais compatriotas, a ponto de considerar a população imunizada em toda a sua extensão. Tivéssemos hoje 200 milhões de doses de vacina disponíveis, estaríamos com todas as chancelas necessárias à retomada normal do curso das nossas vidas em todos os segmentos, principalmente das nossas crianças, voltando com segurança às escolas.
Como disse em outras ocasiões, infelizmente nos falta vacina em quantidade, mas chegaremos lá, e num tempo mais breve do que se possa imaginar, como eu disse aqui no início desta reunião.
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É importante ressaltar o trabalho desenvolvido para construir um cenário amplamente favorável e otimista. A essa notícia de que superamos em percentual uma das maiores potências mundiais, que são os Estados Unidos, agrega-se outra que me causa regozijo, e penso que seja motivo de orgulho para toda a nossa Nação: a de que estamos muito perto também de ter a nossa própria vacina - vacina 100% nacional. A expectativa, Sr. Presidente, é de que, até o final deste mês, lá em Salvador, na Bahia, seja aplicada a primeira vacina desenvolvida com tecnologia própria, a RNA MCTI Cimatec, do Senai, que conta com o valioso apoio do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. E eu falo isso, faço questão, até porque, como V. Exa., Sr. Presidente Flávio, já repetiu, sou o Relator, na Comissão de Orçamento, da pasta da educação e eu quero exatamente, Senadora Zenaide, Senador Izalci, propiciar que façamos um orçamento conjunto com o Ministério da Ciência e Tecnologia. É importantíssimo para a retomada da nossa economia estarmos baseados na ciência, na tecnologia e principalmente na educação. Por isso, a partir desse cenário, é possível afirmar que o Brasil terá, em pouco tempo, vacinas suficientes para imunizar toda a população, aproveitando as indústrias de saúde animal, como autorizado pela Lei 14.187, de 2021, sancionada a partir de um projeto de minha autoria aqui no Senado.
Creio, Sr. Presidente, sinceramente, que no ano que vem teremos condições de produzir até 400 milhões de doses de vacina contra a covid em apenas 90 dias. Com a experiência em campanhas de imunização pelo Sistema Único de Saúde, não tenho dúvida em afirmar que seremos uma referência mundial, auxiliando, inclusive, os nossos irmãos dos países sul-americanos e até africanos. Em suma, deixaremos de ser importadores para sermos exportadores de vacina contra a covid-19. Seremos grandes produtores de imunizantes até que sejamos livres desse terrível vírus.
E é com alegria com essas notícias que me fazem mais otimista do que já sou costumeiramente que me manifesto, agradecendo o tempo concedido por V. Exa. E ainda, Sr. Presidente, quero dizer mais uma vez, com insistência até - e temos falado muito sobre isso -, do papel dos nossos professores. Agora, na saúde, no momento da covid, os protagonistas, como diz o Ministro da Educação, foram os profissionais da saúde, os hospitais, os médicos. Agora, no pós-pandemia, os protagonistas serão as escolas, os profissionais da educação e, acima de tudo, os nossos professores. Nós temos que fazer um verdadeiro mutirão, envolvendo também a família brasileira, porque a grande responsabilidade da escola é ensinar, mas a família não pode abrir mão do seu papel principal, que é educar os nossos filhos.
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Eu só queria aqui, Sr. Presidente, com a sua tolerância, ainda me permitir registrar um importante acontecimento, e especialmente falo como filho de Rondonópolis, a minha cidade, e falo com tristeza, que foi o falecimento do Sr. Hélio Cavalcanti Garcia, ocorrido agora, no último dia 11, lá em São Paulo. Ele estava fazendo um tratamento há muitos meses e ele tinha 89 anos. O Dr. Hélio, Sr. Presidente, governou a minha cidade natal de 31 de janeiro de 1967 a 30 de janeiro de 1970. Ele exerceu também por várias décadas o ofício de tabelião e oficial do 1º Tabelionato de Registro de Imóveis da minha cidade, Rondonópolis. Era ainda um dos grandes proprietários rurais da região sudeste de Mato Grosso, ajudando no desenvolvimento do agronegócio do Estado e também do Brasil.
O Dr. Hélio sempre foi considerado um visionário, inovador, estando sempre à frente do seu tempo, tendo por isso contribuído muito com o início do desenvolvimento da minha querida Rondonópolis.
Aliás, a sua biografia é marcante. Como Prefeito, realizou o primeiro calçamento com paralelepípedo do quadrilátero central de Rondonópolis, que vivia sufocado pela poeira, e foi considerado um grande avanço naquela época. O Sr. Hélio Garcia também foi o responsável pela implantação da primeira rede telefônica da minha cidade, inaugurada em 1969, Sr. Presidente, em que foram disponibilizados somente 200 aparelhos de apenas três números de identificação.
Por tudo o que fez o nosso tão trabalhador e competente Hélio Garcia, deixo aqui o testemunho do legado para aqueles que vierem a seguir: sempre fui admirador do seu trabalho e por isso quero externar aqui os meus sentimentos a toda a família do Dr. Hélio. Com certeza, a história de Rondonópolis saberá honrar esse nome, e falo aqui em nome dos meus conterrâneos e meus contemporâneos também, que são o Hélio Garcia Filho, a Rosângela, a Rosana e o Édson Garcia, além da viúva Metran Garcia. E também ele deixa ainda dez netos e nove bisnetos.
Por isso, eu agradeço imensamente a paciência de V. Exa., mas se trata de uma referência na minha cidade, e eu não poderia deixar, neste momento em que estamos falando da vida, estamos falando da educação, estamos falando da volta às aulas das nossas crianças com segurança... É extremamente importante para mim, como filho de Rondonópolis, fazer esse registro.
Muito obrigado, Senador Flávio Arns.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Agradeço ao Senador Wellington Fagundes. Quero me associar a V. Exa. na solidariedade à família, esposa, filhos, netos, bisnetos, ao Município de Rondonópolis, à cidade de Rondonópolis. E é importante a gente destacar as pessoas que são referência, não há dúvida alguma.
Eu passo, em seguida, a palavra ao Senador Izalci Lucas, lembrando que é Coordenador da Frente Parlamentar pela Educação, batalhador na educação, na ciência, na tecnologia, em tantas coisas importantes, não é? E quero dizer, Senador Izalci Lucas, que a audiência de hoje foi realmente marcante, eu diria, contundente; porém, realista e com apresentação de caminhos para soluções.
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Eu acho que isso que tem que nos unir agora, para enfrentarmos juntos o que foi apresentado.
Com a palavra, Senador Izalci.
O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF. Para interpelar.) - Senador Flávio Arns, primeiro, eu quero parabenizar V. Exa. pela iniciativa desta audiência e cumprimentar também os convidados. Eu estava vendo aqui, acompanhando pela televisão e, ao mesmo tempo, no telefone. Quero cumprimentar a Clarice e o Frei David também. Foi emocionante a participação dele, dando um depoimento do mundo real. A gente vive muito no mundo virtual. Muitas vezes, muitas pessoas não conhecem o que está acontecendo lá na ponta. As pessoas passam muita dificuldade em todo o País, inclusive, as daqui do Distrito Federal. E cumprimento o Gersem também.
Essa questão da pandemia nos trouxe um pouco de luz. As desigualdades nós já conhecíamos, mas a gente pôde perceber que, de fato, elas se tornaram muito maiores com a impossibilidade de atender à parte tecnológica dos nossos alunos. Aqui em Brasília mesmo, 30% dos alunos sequer tiveram acesso ao computador durante a pandemia. Então, foram dois anos perdidos. Na prática, isso acaba prejudicando muito a questão da formação.
Com relação ao interior deste País, aos indígenas, principalmente aos quilombolas, realmente a gente precisa ter uma atenção especial.
Eu quero cumprimentar o meu querido amigo Wellington, que vai ser o Relator da subcomissão setorial da educação. Nós fizemos um ajuste, para que eu pudesse participar da Vice-Presidência e ele da relatoria. Então, acho que a gente precisa corrigir um pouco isso. Essa questão de leis que pegam e outras que não pegam é muito ruim, porque, de fato, o que não falta é lei. Nós precisamos executar isso. Não se faz educação apenas com discurso; tem que ter recurso. Então, acho que a participação do Wellington é fundamental para a gente poder corrigir um pouco isso na Comissão de Educação.
Na Ciência e Tecnologia, todo dia a gente mata um leão com relação a isso. Pelo menos, na LOA de 2022, está previsto honrarem o PLN 177, do Fundo Nacional de Ciência e Tecnologia, que agora não pode ser contingenciado, passa a ser um fundo financeiro. Então, acho que, pelo menos, a gente melhorou um pouquinho a situação da ciência e tecnologia.
No caso da educação, também, com a aprovação do Fundeb. Nós tivemos o privilégio de relatar o projeto do Fundeb agora, e eu espero que a gente possa ampliar cada vez mais os recursos para a educação e para a ciência e tecnologia.
Fico triste porque nós tínhamos aqui um PLN de 400 milhões para os testes da vacina nacional. O Brasil tem várias vacinas já adiantadas: da Universidade da Bahia, de Minas, de São Paulo, mas, infelizmente, cortaram o orçamento para a execução dos testes.
O Wellington teve um papel fundamental na questão da infraestrutura da produção de vacina na estrutura da produção animal. Nós temos uma bela estrutura. A gente conseguiu aprovar o projeto do Wellington, que eu tive o privilégio de relatar também, para ampliar essa infraestrutura e poder produzir a vacina aqui, mas a Anvisa não liberou a tempo, e acabaram cortando do orçamento deste ano os quatrocentos e poucos milhões que nós tínhamos aprovado para o teste dessas vacinas.
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Mas é uma luta em que, a cada dia, a gente percebe que mais pessoas se envolvem. Esse depoimento do Frei David, para mim, foi muito emocionante, porque, de fato, ele vive lá na ponta.
As associações e entidades filantrópicas que nós conhecemos têm um papel fundamental. Acho que, se não fossem elas, se não fossem as associações e as entidades do terceiro setor, nós teríamos muito mais dificuldades ainda, porque as pessoas estão passando fome.
Nós somos totalmente favoráveis à aprovação do auxílio emergencial e vamos discutir isso hoje, inclusive, daqui a pouco, na Comissão Mista e também na bancada. Nós concordamos com o auxílio emergencial, e acho até que é pouco o valor que está sendo colocado para nós, mas a fonte, a origem dos recursos denota muita irresponsabilidade fiscal. Eu acho que a gente precisa debater essa questão da fonte.
Eu ia fazer algumas colocações, mas todas foram abordadas durante a audiência. Mas eu quero aqui me somar aos nossos colegas que, de fato, se preocupam com essa questão, que é muito importante.
Então, eu quero... (Falha no áudio.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Acho que houve algum problema com a conexão do Izalci Lucas. Se ele voltar, a gente retorna a palavra para ele.
Estão me escutando bem?
Só quero saber se aqui está bem, para ver se o problema não ocorreu na minha conexão. Ele ocorreu na conexão do Senador Izalci Lucas. Mas, se ele retornar, a gente dá a palavra de novo a ele.
Izalci, está me escutando? Está voltando aí.
O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Senador Arns, caiu a conexão.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Isso!
O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Esta tecnologia funciona, mas estou no celular, e, a cada ligação que entra - às vezes, entram duas ou três -, acaba caindo a conexão.
Mas eu quero parabenizar V. Exa. e me colocar à disposição. Vamos atuar juntamente com o Wellington nesse relatório da educação, assim como no da ciência e tecnologia, para realmente colocarmos recursos para amenizar essa situação que a gente vem enfrentando.
Olhem que trazer esses alunos, principalmente os do ensino médio, de volta para a escola não vai ser fácil, porque, de fato, as nossas escolas precisam muito ainda de investimentos em infraestrutura, em laboratórios, em refeitórios. Foi falado aí sobre a questão da alimentação. Nós temos um potencial incrível para fazer uma bela merenda escola, a alimentação na escola. Em um país como o nosso, que é maior produtor de alimentos, há gente passando fome. É um negócio muito triste para nós!
Mas olha: parabéns! Eu me coloco à disposição de todos vocês. Vamos brigar agora no orçamento, para ampliarmos esses recursos e para amenizarmos a situação caótica com relação principalmente aos indígenas, aos quilombolas, às pessoas da área rural, que não têm as mesmas oportunidades das pessoas que vivem na área urbana e que também carecem de investimentos.
Parabenizo-o, Senador, pela iniciativa.
Obrigado pela participação.
O SR. DAVID RAIMUNDO DOS SANTOS (Para expor.) - Meu irmão, Senador Izalci, das audiências públicas... Considerando que o senhor é o Presidente da Comissão Mista de Senado e Câmara, das audiências públicas que a Educafro Brasil solicitou, qual delas o senhor pode assumir enquanto Presidente da Comissão Mista no Senado e na Câmara?
O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Eu acho que a gente pode fazer na Comissão de Educação uma reunião para discutir, inclusive, a questão do Cebas, que o senhor colocou muito bem.
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Eu acompanho essa questão da educação há anos, conheço o Brasil todo com relação a isso e acho que vocês prestam um serviço relevante e importante. Temos que corrigir essas distorções para que a gente possa, de fato, chegar aí. Então, eu acho que na educação é o mais adequado, para a Comissão, para resolver a questão do Cebas.
Com relação ao orçamento, a melhor Comissão, e que a gente precisa fazer mais audiências, é a Comissão de Orçamento, onde se definem de fato os recursos. Então, vou dar uma olhada, agora, na Comissão Mista para ver se a gente ainda consegue fazer uma audiência com a participação do Wellington também, que é o Relator setorial da educação, se a gente consegue fazer uma audiência pública na Comissão Mista do Orçamento para ver de que forma a gente pode ajudar nisso.
Comprometo-me, junto com o Wellington, para a gente poder trabalhar na Comissão Mista do Orçamento, que eu acho que, também, é mais importante porque trata de recursos.
Conte comigo, Senador Flávio Arns, onde você achar melhor.
O Senador Arns é uma referência para nós. O que ele disser que tem de fazer nós faremos aqui.
Senador Arns, conte comigo.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Agradeço, de novo, ao Senador Izalci.
Como eu coloquei antes, as exposições foram extremamente importantes, válidas, necessárias, realistas, contundentes e apontando caminhos, tanto que eu já solicitei para a própria Comissão. O Thiago e a Secretaria da Comissão têm sido extraordinários também na questão da organização, da consultoria, da assessoria.
Vamos, até segunda-feira, organizar as várias proposições, Frei Davi e também Clarice e Gersem, para que a gente possa fazer os encaminhamentos e acompanhamentos também. Então, eu diria que foi muito importante.
Eu quero só dar a palavra de novo a vocês para fazerem a despedida e dizer novamente, reforçar sempre, agradecer a presença de vocês também.
Clarice, se quiser também se manifestar.
A SRA. CLARICE SANTOS (Para expor.) - Sim.
Obrigada, Senador Flávio, Senador Wellington, Senador Izalci, Senadora Zenaide, que esteve aqui, aos consultores, a toda a equipe do Senado, obrigada Frei David e Gersem.
Eu quero fazer aqui publicamente um reconhecimento ao Gersem. Quando membro do Conselho Nacional de Educação, ele foi uma pessoa fundamental para a aprovação das diretrizes da alternância no ensino superior, que, para nós, é uma política fundamental. Isso precisava ser regulamentado para os nossos cursos de formação de educadores em educação do campo, que são em regime de alternância.
Queria fazer esse reconhecimento público, esse agradecimento ao Gersem pelo papel fundamental que teve ali no Conselho Nacional de Educação, no seu parecer, o que garantiu a aprovação. Claro que a alternância demanda bolsa permanência, não é, Frei David? Depende de um conjunto de condições que as universidades precisam ter para garantir.
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Nós temos, hoje, 41 cursos de licenciatura em educação do campo nas instituições de ensino superior, que demandam orçamento para garantir essa continuidade dos cursos, que hoje as universidades não têm. As universidades estão esticando o cobertor de um lado para outro. Então, todas as questões que foram colocadas aqui pelo Gersem, pelo Frei David e por mim são questões que estão todas interligadas: nós estamos tratando das condições gerais de assegurar o direito à educação dos povos todos, das crianças, dos jovens e dos adolescentes, onde quer que elas vivam e tenham o direito de viver.
Então acho que para nós também foi um momento importante de ter esse diálogo com o Senado Federal, com os nossos internautas, que estão acompanhando e nos assistindo neste momento. Nós, do Fórum Nacional de Educação do Campo, permanecemos à disposição para o que for necessário. Apresentamos algumas propostas aqui que nós consideramos que são plenamente viáveis, desde que haja essa força-tarefa que envolva Congresso, que envolva as organizações e movimentos sociais e os sistemas de ensino para que sejam implementadas.
Quero agradecer, então, rapidamente aqui por essa oportunidade de fazermos esse diálogo muito rico e esperamos que seja efetivamente produtivo para toda a sociedade brasileira, porque não interessa só ao campo, só às comunidades afrodescendentes, só aos quilombolas ou só aos indígenas, nós estamos tratando da sociedade brasileira, que é diversa, que é pluridiversa e deve ser entendida dessa maneira também em relação às políticas e ao direito.
Muito obrigada. Tenham todos um bom dia!
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Obrigado, Clarice Santos. Lembro que a Clarice é coordenadora do Fórum Nacional de Educação do Campo.
Passo - me permita chamar assim, porque eu faço com muito respeito - ao amigo Frei David para as considerações.
O Wellington falou agora da irmã franciscana. Eu só quero dizer que eu tenho dois tios franciscanos. Um deles mencionado, que é o Dom Paulo Evaristo Arns, a quem homenageamos pelos cem anos. Faria aniversário em setembro. E o outro é o Frei João Crisóstomo Arns, que era o primogênito dos treze. Mas não é só isso, eu tenho três tias freiras, da ordem das Irmãs Escolares de Nossa Senhora.
Então, o pessoal se dedica muito à educação também. Uma delas, viva ainda, indo para os seus 95 anos, uma tia muito querida.
Então, com a palavra, Frei David.
O SR. DAVID RAIMUNDO DOS SANTOS (Para expor.) - Excelente. Eu fico muito feliz em saber que o Senador Arns assumiu encaminhar para sua equipe todas as demandas colocadas por nós, convidados, para fazer a reflexão e já dar o retorno segunda-feira. Então eu vou trazer para a audiência de segunda-feira uns 30 jovens negros das universidades para verem, com alegria, os encaminhamentos.
Também fiquei muito feliz com o Senador Izalci, que vai já encaminhar na Comissão Mista, que abarca Senado e Câmara e da qual ele é Presidente, essa questão, bem como a questão orçamentária.
Quero dizer, Senador, como mensagem final, uma coisa não muito agradável: os universitários negros, indígenas, quilombolas, antes da pandemia, já tinham problema em ascensão, em crescimento; com a pandemia, ampliou muito o número de jovens negros, indígenas e quilombolas em depressão, e, com muita dor, falo para vocês, o número de jovens negros, indígenas e quilombolas se suicidando - se suicidando!
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Imagine o senhor um jovem receber uma vaga na universidade e, lá na universidade, ficar cinco meses, oito meses e depois voltar humilhado para a sua aldeia, voltar humilhado para o seu quilombo, voltar humilhado para a sua favela, dizendo que o País não deu a ele moradia e alimentação mínima para que ele pudesse levar adiante o seu estudo para ajudar o Brasil a ser melhor. Então, Senador, como falou a nossa querida Clarice, pelo amor de Deus, vamos ver, com carinho especial, a questão da bolsa-moradia e bolsa-alimentação de todos esses beneficiados pelas cotas, que são os negros, indígenas, quilombolas, pessoas do campo, deficientes e brancos pobres em geral; a Lei de Cotas contempla isso daí.
Também estou muito cheio de expectativa para a reunião conjunta com referência à garantia da a Lei de Cotas nas universidades, que foi aprovada por dez anos. Considerando que o Ipea falou que essa lei, para ter resultado, se não melhorar, para ter resultado, serão precisos 56 anos de trabalho com a lei, então, que se amplie a lei por mais de 30 anos e vamos para frente tentando fazer, aqui e ali, outros trabalhos para garantir que o nosso jovem negro, indígena, quilombola e do campo não abandone as vagas.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Muito bom, Frei David, que bom nos encontrarmos, de novo, assim como a Clarice!
O Gersem está conectado ainda, Gersem? (Pausa.)
Está aí. Que bom, Gersem!
O SR. GERSEM JOSÉ DOS SANTOS LUCIANO BANIWA (Para expor.) - Senador, só para, mais uma vez, agradecer a oportunidade, o convite e, na linha do Frei David, também convidar e nos disponibilizar a fazer uma frente nacional em defesa da educação brasileira, principalmente dos nossos segmentos historicamente marginalizados e excluídos. Nós estamos vivendo, Senadores, um momento muito triste, muito triste, porque vínhamos, pelo menos no mundo indígena - mas acho que assim também nas questões afro-brasileiras, quilombolas e do campo -, vínhamos três décadas, embora de forma gradual, lenta, avançando em conquistas, vínhamos em uma ascendência de conquistas de direitos, de garantia de direitos. Mas o que nós percebemos com muita tristeza é que, nesses últimos anos, vimos esses direitos serem reduzidos e, no nosso caso indígena, serem cassados mesmo, dia a dia. Infelizmente, os primeiros dados já estão aí comprovando isso que estamos falando; não é só um discurso, é realidade. Por exemplo, no ensino superior indígena, nós já tivemos 18% de redução de matriculados indígenas nos últimos dois anos; já tivemos uma considerável redução.
Eu acho que a ausência dessas políticas, ou até a fragilização, mas sobretudo o abandono de algumas políticas, como essa, por exemplo, de bolsa permanência, enfraquecimento, diminuição, tem provocado estragos muito grandes. Só para terem uma ideia, acabou de sair um levantamento da UnB no caso indígena. É muito triste perceber, por exemplo, que, entre os alunos indígenas no ensino superior da UnB, há mais alunos com evasão, há mais desistentes do que aprovados. Eu nunca pensei ver isso. É muito grave e muito triste isto: dos que entram, dos que acessam a UnB, há mais gente evadindo, desistindo, do que os que conseguem concluir. É de 40% para 44%; 44% desistem no caminho e 40% conseguem concluir.
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Acho que isso representa um dado significativo para a gente pensar o presente e o futuro do nosso País, da nossa sociedade; a educação é o reflexo disso.
Então, mais uma vez, obrigado, gratidão e que a gente continue firme nessas trincheiras para defender os direitos básicos, e educação é um direito humano. Por isso, acho que é um dever de cada um de nós defender, com todas as nossas forças esse direito.
Aproveito para agradecer a Professora Clarice Santos pelo reconhecimento. De fato, foi uma batalha difícil, e o que saiu - não é, Clarice? - poderia ter sido melhor em outras épocas do nosso País, mas é o que foi possível.
A SRA. CLARICE SANTOS - Nas condições em que estamos, foi uma grande conquista.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR) - Muito bem!
Então, Frei David, Diretor-Executivo da Educafro; Gersem, que é o Coordenador do Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena; Clarice, Coordenadora do Fórum Nacional de Educação no Campo (Fonec), eu repito de novo, porque, para mim, foi uma manhã e um início de tarde extraordinários, muito bons. Apesar de se apontar para os problemas, eu penso que todo esse debate trouxe muita clareza para aquilo que está acontecendo e para o que deve ser feito.
Então, vamos nos unir, vamos fazer aquilo que foi sugerido, vamos organizar o assunto, vamos mostrar esses materiais a vocês para que haja sintonia entre aquilo que a gente está colocando no papel e aquilo que vocês consideram essencial e vamos em frente.
Quero deixar um abraço grande, dizer que estamos à disposição e, independentemente desta audiência, vamos nos falar mais ainda, sem dúvida alguma, mas a Comissão de Educação, Cultura e Esporte e esta Subcomissão da Educação na Pandemia estão totalmente à disposição.
Então, nada mais havendo a tratar, dou por encerrada esta reunião.
Obrigado aos internautas também. Um grande abraço!
(Iniciada às 10 horas, a reunião é encerrada às 12 horas e 30 minutos.)