09/12/2021 - 24ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Fala da Presidência.) - Bom dia a todos e a todas que nos acompanham nesta 24ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado.
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Quero agradecer a presença dos Senadores e Senadoras que até o presente momento registraram o seu comparecimento. Peço aos demais que assim o façam. Nós estamos aqui pendentes ainda do quórum de dois Senadores para fazermos a deliberação.
Quero, então, declarar aberta a 24ª Reunião, Extraordinária, da Comissão permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura.
Proponho a dispensa da leitura e a aprovação das Atas das 21ª e 23ª Reuniões da CDH.
Os que aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovadas.
O expediente.
A Secretaria da Comissão de Direitos Humanos recebeu os seguintes documentos.
Primeiro, do Conselho Nacional dos Direitos Humanos: "Apresenta ao Senado Federal recomendações a respeito do encerramento das atividades da Ford Motor Company Brasil Ltda.".
Todas elas, após esta leitura, ficam disponíveis no portal da CDH.
Do Conselho Nacional de Justiça: comunica que realizou, de abril a junho deste ano, o curso "Marco Legal da Primeira Infância e suas Implicações Jurídicas". Essa ação integra o projeto Justiça começa na Infância, fortalecendo a atuação do sistema de Justiça na promoção do desenvolvimento integral. Esse curso foi destinado a magistrados e serventuários da Justiça e integrantes do sistema de Justiça brasileiro.
Da Assessoria Internacional da Defensoria Pública da União: encaminha o relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre a situação dos direitos humanos no Brasil.
Da Vara Regional da Infância e da Juventude do Tribunal de Justiça de Pernambuco: solicita alterações legislativas no Estatuto da Criança e do Adolescente, para que os conselhos tutelares de todo o País sejam compostos por técnicos da área da assistência social, psicologia, pedagogia e advocacia, bem como com uma equipe multidisciplinar com estes profissionais e outros, quando da aplicação das medidas protetivas. Também se sugere, entre outras aplicações, que seja criado o piso salarial para estes conselheiros.
Da Procuradoria-Geral da República: encaminha nota pública da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão - Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal, a qual apresenta um balanço da política indigenista implementada pelo Estado brasileiro no último ano e reitera seu compromisso institucional de defender os direitos dos povos indígenas.
Do Juiz Federal de Minas Gerais Flávio da Silva Andrade, que encaminha sugestões para a reforma administrativa.
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Do Supremo Tribunal Federal: encaminha o acórdão do referendum na medida cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 738/DF, em que se decidiu referendar a liminar concedida, para determinar a imediata aplicação dos incentivos às candidaturas de pessoas negras nos exatos termos da resposta do TSE à Consulta 600306-47, ainda nas eleições de 2020, nos termos do voto do Relator vencido, o Ministro Marco Aurélio.
Da Comissão Especial de Direito Penal da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional São Paulo: após reunião ocorrida em 26 de junho passado, na qual o tema e sua gravidade foram amplamente debatidos com especialistas da área, vem ressaltar a imperiosa necessidade e urgência da edição, pelo Congresso Nacional, de lei específica que tutele penalmente, de maneira eficaz, a população LGBTQIA+ de cidadão que alega ter sido vítima de abuso de autoridade e solicita a esta Comissão que inspecione a perseguição injusta que sofreu por parte de juiz e promotor de Justiça na Comarca de Jaraguá de Goiás.
Informo que, nos termos da Instrução Normativa da Mesa Diretora do Senado Federal nº 12, de 2019, os documentos lidos ficam disponíveis no portal da CDH e também nesta Secretaria, para manifestação dos membros desta Comissão, pelo período de 15 dias. Terminado o prazo, os documentos serão arquivados.
Aviso ainda que, nesses termos, os documentos lidos na 18ª Reunião desta Comissão serão arquivados.
Bem, só um momento...
Esta reunião está dividida em duas partes: a primeira parte, deliberativa, e a segunda, uma audiência pública.
O item 1 é um requerimento elaborado por mim, mas, no presente momento, nós ainda não temos o quórum necessário.
Esse requerimento trata de realização dessa audiência pública, "A pandemia sob a ótica da defesa dos direitos humanos".
A outra é de autoria do Senador Randolfe Rodrigues, que requer, nos termos do art. 40, do Regimento Interno do Senado Federal, seja autorizada a missão de Parlamentares que representam a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa e a CPI Covid, já finalizada, para entregar oficialmente ao Tribunal Penal Internacional, em Haia, na Holanda, o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia, em período a ser definido, com ônus para esta Casa.
A composição da missão será definida pelo Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, Senador Humberto Costa. A autoria é do Senador Randolfe Rodrigues.
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O Senador Renan Calheiros confirma a sua presença nessa reunião. Pode confirmar aí? (Pausa.)
Bom, neste momento, nós temos um pedido do Senador Paulo Paim e da Senadora Zenaide, a quem concedo a palavra - primeiro ao Senador Paulo Paim, depois à Senadora Zenaide.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Pela ordem. Por videoconferência.) - Presidente Humberto Costa, eu aproveito esta oportunidade em que V. Exa. me concede a palavra, enquanto a gente tem o quórum para as votações, para pedir a possibilidade de que fosse colocado, extrapauta, o requerimento de nossa autoria, que eu acho fundamental para esta Comissão, porque foi nesta Comissão que fizemos o grande debate do Estatuto da Pessoa com Deficiência. Eu fui o autor, mas outros três Senadores - o Romário, Mara e Flávio Arns - foram Relatores.
Eu vou fazer uma rápida justificativa, em defesa do requerimento, e daí, no momento adequado, V. Exa. poderá já encaminhar à votação, se assim entender.
Esse requerimento, Sr. Presidente, quer um debate sobre a avaliação biopsicossocial. E por que é importante essa avaliação? A avaliação irá impactar na vida de mais de 17 milhões de pessoas com deficiência em todo o Brasil. Muda o modo de avaliar a deficiência, que deixa de ser apenas um atributo do corpo. Passa a considerar as barreiras no ambiente, como a falta de acessibilidade nas cidades, seja por falta de tecnologia assistiva, em razão da arquitetura, adaptação dos transportes ou mobiliário urbano, por exemplo.
As entidades representativas das pessoas com deficiência clamam por um debate amplo e transparente acerca do relatório final, produzido pelo Grupo de Trabalho Interinstitucional sobre o Modelo Único de Avaliação Biopsicossocial da Deficiência.
Ninguém é contra. Somos a favor. Entendemos que, no debate nesta Comissão, poderemos inclusive melhorar o resultado final.
Então, achamos salutar, lembrando sempre de uma frase que eu ouvi muito durante os 15 anos do Estatuto da Pessoa com Deficiência... A frase é a seguinte - é o lema das pessoas com deficiência -: nada sobre nós sem nós.
Então, Presidente, a solicitação é essa.
O requerimento que está na mão de V. Exa. tem aí também o nome dos convidados... É uma preliminar que eu faço, e, se V. Exa. entender que dá para votarmos... Sem data, claro, ainda - estamos chegando ao fim do ano -, para se fazer o debate, mas que a sociedade saiba que nós faremos o debate aqui na Comissão de Direitos Humanos.
É isso, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Sr. Senador Paulo Paim, agradeço a fala de V. Exa. e informo que já está aqui à disposição da Mesa o requerimento de V. Exa. Assim que nós tivermos o quórum, votaremos todos os requerimentos, inclusive esse que V. Exa. sugere e que eu entendo que é extremamente relevante.
De imediato, eu passo a palavra à Senadora Zenaide Maia.
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A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - RN. Pela ordem. Por videoconferência.) - Sr. Presidente Humberto Costa, Paulo Paim e colegas, eu já quero pegar a carona de Paulo Paim e falar sobre pessoas com deficiência.
Nesse final de semana que passou, eu estive no interior do Rio Grande do Norte, em Apodi, e é impressionante, Paulo Paim, a quantidade de pessoas com deficiência cujo benefício de prestação continuada foi cortado, a que eles não têm acesso. Nós temos 1,8 milhão de pessoas na fila da previdência para tentar conseguir um benefício, que é um direito deles, e não estão conseguindo.
Eu vi que vieram para a minha presença várias crianças e adolescentes cadeirantes com deficiência definitiva, Presidente. Aí eles trouxeram que isso começou sistematicamente... Lembram-se daquela medida provisória do pente-fino? Há gente que está desde aquela época. Resolveu cortar o benefício, e as pessoas que corram atrás. Sem acesso, não conseguem marcar. É uma tristeza muito grande.
Então, essas pessoas estão tendo os benefícios cortados indiscriminadamente e sendo mandadas para a fila do SUS, porque, quando vão para o perito, ele pede vários exames, mesmo vendo a criança tetraplégica, paraplégica. Eles estão fazendo isso sistematicamente. Passam oito meses, um ano numa fila da previdência para provar uma patologia, uma incapacidade que já foi mostrada não só para um médico, mas para uma junta médica, para eles poderem conseguir isso.
Isso é de uma crueldade, gente, que eu acho em que a gente aqui, no Senado Federal, deve unir todos para ver como vamos resolver.
Eu vi ao vivo a Ana Júlia, lá em Apodi: é uma menina intelectualmente normal, mas tem uma cadeirinha de roda, desse tamaninho os membros. E ela estava me pedindo por ela, mas principalmente pelas colegas, que foram cortadas e que não têm acesso, para resolver.
Isso é muito grave, porque, mesmo quando eles conseguem a perícia, a previdência exige mais exames; uma ressonância magnética é de seis meses a um ano para conseguir pelo SUS. Isso é, eu acho, uma crueldade, uma falta de respeito às pessoas com deficiência deste País, e já quero dizer aqui que vou apoiar o requerimento de Paulo Paim. Nós vamos fazer, sim, vamos debater esse estatuto.
E também aqui, Presidente, eu já queria pedir licença para atestar sobre o requerimento do Senador Randolfe. Sou a favor, sim. Esse Presidente intencionalmente deixou - e continua deixando - milhares de brasileiros morrerem de morte evitável com essa história de não apoiar a vacinação.
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E eu queria dizer que eu vi a entrevista do Ministro da Saúde, médico, nosso colega, dizer que é preferível a morte a perder a liberdade. Eu queria lembrar ao Ministro da Saúde do Estado brasileiro que ele não está cumprido nem o juramento de Hipócrates, cuja parte eu vou citar aqui: "Lutar contra o que está provocando a enfermidade", ele está lutando a favor da enfermidade, quando ele se recusa a exigir o comprovante de vacina, o passaporte de vacina para entrarem as pessoas.
Então, é mais do que necessário entrar no Tribunal de Haia contra isso. Acho que é essencial, sim.
Já digo meu apoio ao requerimento do Senador Paim e também ao do Senador Randolfe.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigado, Senadora Zenaide Maia.
Estamos aqui no aguardo de apenas mais um Senador para que nós possamos ter o quórum da reunião para aprovação dos pedidos de audiência pública, inclusive a audiência pública no dia de hoje.
Eu queria fazer um pequeno informe e também falar um pouco sobre a temática do nosso encontro de hoje, que é extremamente importante.
Bom, o pequeno informe é que, como todos têm conhecimento, o Congresso Nacional tem representação, tem participação no Parlamento do Mercosul, o chamado Parlasul. Nesse final de semana, tivemos mais uma assembleia do Parlasul ainda no sistema semipresencial, mas com uma boa participação, e lá nós tivemos a oportunidade de, na condição de Parlamentar, revelar aos demais Parlamentares de outros países e reafirmar junto aos nossos Parlamentares a situação que ora vivemos no nosso País, particularmente do ponto de vista do agravamento das condições sociais da população brasileira: o aumento da fome, o aumento significativo, expressivo, atingindo uma quantidade de pessoas muito, muito grande e muito significativa, e, ao mesmo tempo, um processo que se agrava de desemprego, de fome e de miséria.
Hoje, no Brasil, são 20 milhões de pessoas que estão passando fome. O Brasil já teve um momento em que foi referência mundial por tirar 36 milhões de famílias da fome, da miséria, por intermédio do Programa Bolsa Família, recentemente extinto pelo Governo do Presidente Jair Bolsonaro, e agora esse mesmo Brasil voltou ao Mapa da Fome. Hoje são 116 milhões de pessoas que vivem em situação de insegurança alimentar, com consequências nefastas, especialmente para as crianças. É o reflexo de um Governo absolutamente insensível, que se preocupa muito mais com o acesso das pessoas a armas, enquanto isso brasileiros e brasileiras disputam restos do lixo e ossos descartados dos supermercados.
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Isso produz uma tristeza gigantesca para todos nós, porque esse tipo de situação vitimará gerações e aí agravará sequelas irreversíveis em milhões do nosso povo, principalmente nas crianças. E o que é absurdamente paradoxal é o fato de que o Brasil é um país rico, é um dos maiores produtores de alimentos do mundo, um dos maiores exportadores de proteína animal, no entanto a fome está campeando junto à nossa população.
Esperamos que a criação do chamado benefício emergencial, ou auxílio emergencial, ou que nome tenha - Auxílio Brasil -, enfim, possa minimizar esse quadro, mas isso só será possível superar se nós tivermos um projeto de crescimento e desenvolvimento econômico para o nosso País, o que não é a prioridade do atual Governo.
Bom, para o dia de hoje, a nossa temática é a temática da pandemia sob a ótica da defesa dos direitos humanos.
Enquanto aguardamos aí o quórum para votação, eu vou aqui antecipar algumas observações que nós preparamos, para que sirvam de subsídio àqueles que terão a oportunidade de se manifestar aqui, os nossos convidados que estão no aguardo do início da reunião.
Sras. Senadoras, Srs. Senadores, convidadas e convidados, já são quase 270 milhões de pessoas afetadas pelo novo coronavírus no mundo. Em nosso País, mais de 22 milhões de brasileiras e brasileiros foram acometidos por essa doença, sendo que 616.018 foram vítimas fatais. São números assustadores e que jamais poderão ser naturalizados. Aliás, não podemos reduzir as vítimas desta pandemia a números, a estatísticas. São pessoas que têm um nome, uma história, que deixaram familiares, amigos; pessoas queridas que foram duramente impactadas; pessoas que tiveram sua saúde física e emocional abalada; pessoas que perderam o direito ao trabalho, à moradia; pessoas que sofreram com o descaso do Governo Bolsonaro. São repercussões sociais e econômicas gravíssimas e sem precedentes na história recente.
Isso nos mostra que esta doença não se restringe às questões sanitárias e biomédicas. Pelo contrário, sua destruição atinge também a situação social das famílias brasileiras, notadamente aquelas minorias esquecidas e desassistidas pelo Estado. Assim, a pandemia provocada pelo novo coronavírus é uma pauta de direitos humanos e cidadania.
Esta Comissão já debateu as consequências desta doença na vida de brasileiras e brasileiros, daqueles que constantemente precisam gritar para que seus anseios sejam ouvidos pela sociedade. Mas o nosso trabalho não se encerra com o fim da CPI da Pandemia ou com o encerramento dos trabalhos legislativos deste ano, até porque a pandemia ainda não acabou e as mazelas causadas pelo coronavírus, somadas ao descaso, o despreparo e o desinteresse do Governo Federal ao lidar com esta crise sanitária, demorarão anos para cicatrizar.
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Esta Comissão de Direitos Humanos continuará se debruçando sobre as consequências desta pandemia na vida das brasileiras e dos brasileiros. É a nossa obrigação regimental, é a nossa obrigação legal, é a nossa obrigação acima de tudo moral.
Esta audiência pública que pretendemos fazer, daqui a pouco, é o início de um ciclo de atividades que se estenderão ao longo do ano de 2022. O objetivo é aproximar este Colegiado das pessoas e identificar as principais necessidades daqueles que são vítimas dessa pandemia e principalmente dos atos negacionistas deste Governo ao meu ver genocida.
Faremos reuniões nos Estados e nos Municípios, como forma de ausculta e de buscar, juntamente com as Câmaras de Vereadores e Assembleias Legislativas, alternativas para reduzir os impactos da pandemia na vida da população. Abriremos espaço, sempre que possível, para que sejam apresentadas as demandas da sociedade, bem como daremos voz aos pesquisadores que tanto trazem luz para nossas dúvidas.
Agradeço, portanto, a todos e a todas. Questiono se podemos... (Pausa.)
Só um instante. (Pausa.)
Pois bem, então, nós vamos dar início à nossa reunião de hoje, à nossa audiência pública...
Ah, o Senador Paim pediu a palavra, e, logo em seguida, eu darei a palavra ao nosso primeiro convidado.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Pela ordem. Por videoconferência.) - Presidente Humberto Costa, eu iria fazer uma solicitação a V. Exa., porque estão me chamando para votação nominal na Comissão de Educação. Se eu pudesse ler o meu requerimento... E daí, no encerramento, creio eu que V. Exa. poderá colocar em bloco até a votação dos requerimentos.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Sim. Pode fazê-lo.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Por videoconferência.) - Então, farei de forma muito rápida, Presidente.
1ª PARTE
EXTRAPAUTA
ITEM 3
REQUERIMENTO DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E LEGISLAÇÃO PARTICIPATIVA N° 41, DE 2021
Requer realização de Audiência Pública para debater o relatório sobre avaliação biopsicossocial PCD.
Autoria: Senador Paulo Paim (PT/RS).
Sr. Presidente, requeiro, os termos do art. 58, §2º, II, da Constituição Federal e do art.93, II, do Regimento Interno do Senado Federal, a realização de audiência pública com o objetivo de debater a regulamentação biopsicossocial prevista no Estatuto da Pessoa com Deficiência.
Proponho, para a audiência a presença dos seguintes convidados: Sra. Izabel Maria Loureiro Maior, Professora da UFRJ; Sr. Wederson Rufino, representante do INSS; Sra. Ana Cláudia Figueiredo, Rede Brasileira de Inclusão, Rede In; Dr. Ricardo Tadeu, Desembargador do TJ-PR; Sra. Maria Aparecida Gurgel, representante da Associação do Ministério Público.
Duas frases só. A audiência pública se faz necessária, importante para avaliar, debater o resultado final do relatório sobre a avaliação biopsicossocial, prevista no art., 2º do Estatuto da Pessoa com Deficiência.
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Segunda frase. O relatório em questão faz parte do estudo realizado pelo grupo de trabalho, mas carece de um debate maior com a sociedade, principalmente com as pessoas com deficiência.
Era isso, Sr. Presidente. Já agradeço, então, pela leitura do Relatório.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Agradeço, Senador Paim. E, no momento em que nós tivermos o quórum, esse requerimento será votado. Creio que não haverá qualquer óbice, pelo fato de ser um requerimento extrapauta e dada sua importância. Com toda certeza, nós iremos aprovar.
Antes de passar a palavra ao primeiro convidado, que é a Dra. Maria Helena Machado, o Senador Randolfe Rodrigues pede a palavra. Quero aproveitar aqui para parabenizá-lo pelo recebimento da maior comenda concedida pelo governo francês, a medalha da Legião da Honra. Isso nos engrandece a todos nós. É um reconhecimento do trabalho que V. Exa. vem desenvolvendo há dez anos como Senador nesta Casa e é hoje uma referência como Parlamentar, não somente em nível nacional, mas, com esse reconhecimento internacional, também o que nos orgulha a todos.
Passo a palavra ao Senador Randolfe Rodrigues.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PDT/CIDADANIA/REDE/REDE - AP. Pela ordem. Por videoconferência.) - Caríssimo Presidente, Senador Humberto, o que me orgulha e me honra muito é estar nesta Comissão e a relação de amizade que construímos, sobretudo nesses últimos seis meses de companheirismo na luta contra a tragédia que está em curso no País, e na atuação especial, na Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia, a minha relação com o senhor, que sobretudo tem sido em defesa dos interesses brasileiros - isso que me honra muito.
Sr. Presidente, da mesma forma que o Senador Paim, eu peço a V. Exa. a devida vênia para que nós possamos, no momento oportuno, fazer a apreciação do requerimento de que gostaria de fazer a leitura, para o senhor e para os membros desta Comissão.
Trata-se de requerimento, nos termos do art. 40 do Regimento do Senado, para que seja autorizada, Sr. Presidente, missão de Parlamentares que representam a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa e a anterior, CPI da Covid, daqui deste Senado Federal, já finalizada, para entregar oficialmente ao Tribunal Penal Internacional, em Haia, na Holanda, o relatório final desta Comissão Parlamentar de Inquérito, no período, obviamente, a ser definido por esse Tribunal Penal Internacional, e, no âmbito deste requerimento, nós estamos estabelecendo que a composição da missão será definida por V. Exa., Senador Humberto Costa, Presidente desta Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa.
1ª PARTE
ITEM 2
REQUERIMENTO DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E LEGISLAÇÃO PARTICIPATIVA N° 40, DE 2021
- Não terminativo -
Requer seja autorizada a missão de parlamentares que representam a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa e a CPI COVID já finalizada, para entregar oficialmente ao Tribunal Penal Internacional, em Haia, na Holanda, ...
Autoria: Senador Randolfe Rodrigues (REDE/AP).
Só para adiantar, Sr. Presidente, os termos, a necessidade desse requerimento, uma das conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito, um dos encaminhamentos, melhor dizendo, foi para que o relatório fosse entregue ao Tribunal Penal Internacional, em decorrência de eventual crime de lesa-humanidade, que foi diagnosticado nos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito.
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Pois bem, os procuradores do TPI já sinalizaram para esta Comissão, ou melhor, para a Comissão, ou melhor, para a Comissão de Direitos Humanos e para os membros do Observatório da Pandemia, anterior CPI da Covid, a sua disposição em receber os membros representantes da CPI da Covid, obviamente representantes desta CDH também, para a entrega do relatório em data a ser definida no mês de janeiro.
Portanto, Sr. Presidente, a data inclusive já está estipulada pelo próprio Tribunal Penal Internacional, faltando (Falha no áudio.)
... da parte do Senado Federal e desta Comissão de Direitos Humanos, para autorização desta delegação.
É nestes termos, Sr. Presidente, que peço que nós possamos apreciar este requerimento, aprovar e posteriormente V. Exa. ad referendum da Comissão, definiria os membros que participarão dessa comitiva para entrega do relatório, que cumpre também um dos objetivos, não só da anterior CPI da Covid, mas também desta Comissão de Direitos Humanos.
Mais uma vez agradeço as palavras de V. Exa. e o regozijo da nossa relação pessoal, da nossa amizade que muito me honra, e requeiro, nos termos regimentais, a apreciação, no momento oportuno, deste requerimento.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Pois não, Senador Randolfe. Agradeço a V. Exa.. Lamento apenas não ter tido o prazer, a honra de participar dessa homenagem recebida por V. Exa. junto à Embaixada da França no nosso País. E gostaria de pedir a V. Exa. uma gentileza, que assumisse durante um espaço de tempo curto a Presidência desta Comissão, para que eu possa fazer a leitura do requerimento que apresentei para esta audiência pública de hoje. E aí nós já teríamos todos os requerimentos de hoje lidos e assim que houver o quórum, poderíamos votar todos eles em bloco. Será que V. Exa. poderia assumir rapidamente?
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. PDT/CIDADANIA/REDE/REDE - AP. Por videoconferência.) - Perfeitamente. Com imensa honra. Com todo prazer, Sr. Presidente.
Com a palavra, então, de imediato, o Senador Humberto Costa, Presidente desta Comissão, para leitura de requerimento.
1ª PARTE
ITEM 1
REQUERIMENTO DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E LEGISLAÇÃO PARTICIPATIVA N° 39, DE 2021
- Não terminativo -
Requer, nos termos do art. 58, §2º, II, da Constituição Federal e do art.93, II, do Regimento Interno do Senado Federal, a realização de audiência pública, com o objetivo de discutir o tema: a pandemia sob a ótica da defesa dos Direitos Humanos.
Autoria: Senador Humberto Costa (PT/PE).
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Bem, o Requerimento nº 39, de 2021, requer, nos termos do art. 58, §2º, II, da Constituição Federal e do art.93, II, do Regimento Interno do Senado Federal, a realização de audiência pública, com o objetivo de discutir o tema: a pandemia sob a ótica da defesa dos Direitos Humanos.
A autoria é de nossa parte e o requerimento é este.
Então, assim que nós tivermos o quórum, nós iremos fazer a votação.
Agradeço a V. Exa.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. PDT/CIDADANIA/REDE/REDE - AP. Por videoconferência.) - Devolvo a Presidência ao titular.
Eu que agradeço, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Pois bem, de imediato, eu passarei a palavra à Dra. Maria Helena Machado. Quero informar também que como eu disse nas minhas palavras iniciais, a Comissão de Direitos Humanos vai organizar, a partir... Aliás, agora em dezembro já terei a oportunidade de atender a um convite do movimento de Familiares de Vítimas da Covid-19 para participar de dois eventos, em Salvador, um com a Câmara Municipal, outro com a Assembleia Legislativa e com o movimento de familiares, para discutirmos essa temática e especialmente os projetos de lei que estão aqui no Senado Federal aguardando a sua discussão e votação. E pretendemos fazer isso na maioria dos Estados brasileiros, no ano que vem.
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De imediato, pedindo desculpas a todos os nossos convidados pelo atraso na nossa reunião, eu concedo a palavra à Dra. Maria Helena Machado, pesquisadora titular do Daps e coordenadora da pesquisa "Condições de trabalho dos profissionais de saúde no contexto da covid-19 no Brasil".
Ela é pesquisadora da Fiocruz. Tive a honra de trabalhar com ela no período em que fui Ministro da Saúde. Ela foi responsável pela elaboração da política que trata da temática de recursos humanos no SUS no período em que lá ele eu estava.
E concedo a palavra por dez minutos, com alguma tolerância, para que V. Sa. possa nos trazer um pouco das informações sobre essa pesquisa que é tão relevante para o nosso País.
A SRA. MARIA HELENA MACHADO (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Senador Humberto Costa, um abraço.
Quero também aqui cumprimentar todos os Senadores da República presentes e responsáveis por esta importante Comissão.
Primeiro, eu quero agradecer muito o convite e dizer que para a Fiocruz é uma oportunidade ímpar para que todos os senhores e as senhoras e os nossos Senadores da República poderem conhecer um pouco a realidade da força de trabalho em saúde no Brasil.
Eu é que digo que foi uma honra trabalhar com o Senador Humberto Costa, uma pessoa tão séria, tão comprometida com o Sistema Único de Saúde.
Eu quero também cumprimentar a todos que vão me acompanhar nesta manhã...
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Dra. Maria Helena, posso lhe pedir uma gentileza?
A SRA. MARIA HELENA MACHADO (Por videoconferência.) - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Desculpe-me, mas, como nós conseguimos o quórum e estamos pendentes desta...
A SRA. MARIA HELENA MACHADO (Por videoconferência.) - Fique à vontade.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - ... votação, em um minuto eu coloco em votação e devolvo a palavra a V. Exa.
A SRA. MARIA HELENA MACHADO (Por videoconferência.) - O.k. Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Portanto, estão em discussão os requerimentos já lidos: o item 1, aquele apresentado por mim, que é exatamente esta nossa audiência pública de hoje; o item 2, o do Senador Randolfe Rodrigues, que trata da formação de comissão que irá encaminhar ao Tribunal Penal de Haia os resultados da nossa CPI - esse será votado na condição de um requerimento fora da pauta, extrapauta; e o requerimento do Senador Paulo Paim, que trata da temática da regulamentação biopsicossocial prevista no Estatuto da Pessoa com Deficiência.
Em discussão os requerimentos, em globo. (Pausa.)
Não havendo quem queira discutir, declaro encerrada a discussão.
Em votação.
Aqueles que apoiam e concordam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovados.
Agradeço muito a todos os Senadores que participaram do nosso quórum na reunião de hoje.
Devolvo a palavra a V. Exa. Começo iniciando seu tempo agora.
A SRA. MARIA HELENA MACHADO (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigada.
Então, como eu disse, é um prazer muito grande estar aqui.
Antes de falar um pouco sobre a pesquisa, sobre os resultados da nossa pesquisa, eu gostaria de apresentar aqui, muito rapidamente, como estava essa força de trabalho em saúde no pré-pandemia, ou seja, antes da pandemia, e aí nós estamos falando do início de 2020. Essa força de trabalho já se colocava e se mostrava com um índice elevado de profissionais com baixos salários, mal remunerados, gerando multiemprego; um nível alto de condições precárias e vínculos precários no trabalho, gerando a instabilidade desse profissional; crescente aumento do multiemprego, gerando cansaço, esgotamento e desgaste profissional; presença crescente do subemprego, da subjornada e do subsalário, que configuram o trabalho precário; o percentual elevado de licenças médicas, gerando severos sinais de adoecimento físico e psíquico desses profissionais, queixa de estresse, cansaço, desgaste profissional, pensamento suicida e suicídios.
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Por fim, a questão da adoção, pela gestão pública e privada do nosso País, pelo Sistema Único de Saúde, de contratação de trabalho prestado por uma situação que a gente chama de "ganha-se pelo que produz". Nós estamos falando aqui da pejotização, da uberização, da terceirização e da precarização do trabalho.
A OIT aponta sete dimensões do trabalho precário: insegurança do mercado de trabalho; insegurança do trabalho; insegurança do emprego; insegurança da integridade física, psíquica e da saúde; insegurança pela falta de educação permanente da força básica; insegurança de renda, salário; e insegurança do sindicato para representá-lo junto a essa situação.
O Brasil contabiliza, como o Senador já expôs, mais de 22 milhões de contaminados e mais de 616 mil óbitos e, entre os profissionais de saúde, não temos uma conta fechada, mas em torno de 5 mil profissionais de saúde foram a óbito até o momento.
O Brasil tem, hoje, mais de 3,5 milhões de trabalhadores e trabalhadoras profissionais de saúde: médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, assistentes sociais, farmacêuticos e uma legião de milhares e milhões de trabalhadores e trabalhadoras invisíveis, invisibilizados pela condição de vida, pelas condições socioeconômicas, invisibilizados na equipe, invisibilizados pela equipe, pelos gestores, pelos usuários, pela sociedade. Aqui nós estamos falando dos auxiliares e técnicos de saúde da enfermagem, da radiologia, da saúde bucal, de análise clínica, os ACS, os ACEs, todo o pessoal da recepção, segurança, segurança dos hospitais e ambulatórios, limpeza, higienização, cozinha, copeiro, maqueiro, condutores de ambulância, ambulanchas, motolâncias.
Na pandemia também se viu e se realçou o trabalho dos mais invisibilizados, Senador, no sistema de saúde. Nós estamos falando dos sepultadores, aqueles que executam a tarefa final do insucesso da assistência e do resultado positivo em tempos de covid. Aqui estamos falando de milhares de trabalhadores que sequer têm o reconhecimento da atividade como atividade de saúde. É muito importante que o Senado saiba disso. De um modo geral, é um profissional de saúde, estamos falando de profissionais sem cidadania profissional, desprovidos de cidadania e de direitos humanos, mergulhados, submersos no cenário do mercado de trabalho.
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Também estamos incluindo aqui todo o contingente de mais de 20 mil profissionais de trabalhadores da saúde indígena, esquecidos, entregues à própria sorte para dar assistência aos nossos povos do Brasil. Invisíveis os que cuidam e os que são cuidados: indígenas e trabalhadores de saúde indígena no Brasil. Aqui eu quero dizer que nós estamos falando de três pesquisas, Senador. Nós estamos falando das condições de trabalho dos profissionais de saúde, dos trabalhadores invisíveis da saúde e estamos falamos - estamos iniciando agora a pesquisa - dos trabalhadores da saúde indígena. E, com isso, a gente acredita poder, de fato, ter um cenário e um diagnóstico bem próximos da realidade.
Falarei de alguns dados da pesquisa. Eu tenho uma apresentação que eu já disponibilizei para a assessoria desta Comissão e que podem utilizar à vontade. Lá estão os dados e mais explicações.
Então, aqui, rapidamente, quero dizer que a maioria - mais de 77% daqueles que hoje atendem na pandemia, no nosso País, são mulheres - é constituída de mulheres. A maioria são jovens, sendo que 38% têm menos de 35 anos; 44% têm entre 35 e 50 anos; 40% desses trabalhadores são pretos e pardos e 50% são brancos, assim eles se definem. Um terço trabalha em hospitais públicos; um quarto na atenção primária; 11%, no setor privado; 5%, no setor filantrópico. Ou seja, o setor público do Brasil, o Sistema Único de Saúde foi responsável e é responsável por toda a assistência da pandemia, isso é muito importante dizer aqui.
Quase metade desses trabalhadores têm outro emprego, porque, como eu disse, o multiemprego é comum, por conta dos salários baixos e da insegurança desses profissionais, que se sentem sobrecarregados. Quase metade desses trabalhadores têm jornada de trabalho acima de 41 horas; 25%, ou seja, um quarto tem comorbidades, problemas de saúde já adquiridos anteriormente.
E aí a pesquisa pergunta: o que é que mudou, significativamente, na sua vida? Resumidamente, aqui eu trago as questões mais graves, as variáveis mais graves, eu não vou dizer os percentuais, para não os cansar, mas vou dizer que é a população maior. Eles apontam que 95% dessa situação ocorreu após o início da pandemia. A pandemia trouxe para esses profissionais: perturbação do sono, personia e insônia; choro frequente; pânico; irritabilidade; distúrbios mentais e, de um modo geral, psíquicos; incapacidade de se relaxar, incapacidade e muito estresse, ou seja, voltam para casa e não conseguem relaxar, pensando no que vai acontecer no dia seguinte; perda da satisfação na carreira, tão grave, e o Senador, como foi Ministro da Saúde, sabe muito bem o que significa nós termos uma carreira e acreditarmos no futuro. Uma coisa muito importante é a vontade e o arrependimento de ter escolhido trabalhar na saúde, então, há tristeza e apatia, e muito grave é a sensação e o sentimento de pensamento negativo, de não acreditar no futuro, pensamento suicida, e, no caso, muito se agravou o quadro de suicídios, que já é grave, na área da saúde no País. A força de trabalho na pandemia, durante a pandemia, e ainda estamos na pandemia, eu diria que é uma força de trabalho adoecida, física e mentalmente. Então, é muito importante e muito grave a situação.
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E o que mudou na sua rotina? No ambiente, várias coisas. O mais importante eu cito aqui: eles estão no limite da exaustão, trabalho extenuante, onde se trabalha por dois ou três colegas, de forma intensa, concentrada, sem parar e sem solução desse problema imediato. Ou seja, o adoecimento, a morte, o afastamento de colegas o leva a trabalhar não só por si, mas por outros, e também trabalhe num volume maior por conta da pandemia.
A biossegurança e as contradições dessa biossegurança. Exige-se que cumpra o uso de máscara, de EPI, mas a própria instituição, de modo geral, é a denúncia grave de que faltaram esses equipamentos de biossegurança, passando pela falta desse EPI, e hoje a gente tem - infelizmente, continuamos tendo esse problema -, agora mais grave, a escassez desse equipamento, o racionamento desse produto ou, pior, a distribuição desses kits com baixa qualidade, baixa segurança, e há denúncias muito grandes por conta da negação de EPI para esses profissionais e uma hierarquização desses EPIs. Então, aqueles que não têm cidadania profissional definida, muitas vezes, não recebem EPI. Nós estamos falando de ACS, condutores de ambulância, sepultadores, o pessoal da faxina, da limpeza, da recepção. Maior exigência e rigor na confiança, muito medo de morrer, de se contaminar e morrer, e a perda substantiva da cidadania profissional, com riscos graves e objetivos dos direitos trabalhistas por conta da reforma que está aí sendo feita mesmo sabendo da pandemia e da situação. Há depoimentos graves de condutores de ambulância, de ACS, de sepultadores, de todo esse pessoal, de que eles não são vistos. Eles dizem: "Nós não existimos".
Por fim, eu queria dizer que hoje temos mais de 1,8 mil trabalhadores que foram a óbito em duas profissões: médicos e a equipe de enfermagem. Extremamente grave. E nós não temos dados das outras profissões, porque o Estado não disponibiliza esses documentos, não disponibiliza para nós. É importante dizer que a pandemia trouxe agravos muito grandes a esses profissionais.
Por fim, quero dizer que quatro Estados são campeões da mortalidade desses profissionais e, certamente, dos demais profissionais de saúde: Rio de Janeiro, São Paulo, Pará e Amazonas, sendo que Pará e Amazonas são dois Estados com baixíssimo percentual de profissionais da força de trabalho. Menos de 5% da força de trabalho dessas duas categorias encontra-se nesses Estados, e, infelizmente, nesses Estados nós tivemos déficit de pessoal com o óbito.
E, por fim, eu queria deixar aqui algumas lições da pandemia.
Primeira: reafirmação da democracia e da participação social, reinstalação imediata e recondução da Mesa Nacional de Negociação, Senador, no Conselho Nacional, Senador, no Conselho Nacional de Saúde, que foi extinta pelo Governo Federal atual em 2019. Na pré-pandemia, a Mesa Nacional de Negociação foi extinta pelo Governo Federal. Fortalecimento do SUS e do financiamento, valorização e proteção dos trabalhadores e trabalhadoras, EPI para todos, com qualidade e quantidade, implantação de um programa de saúde mental que garanta o atendimento regular desses profissionais. Queremos, também, capacitação permanente e vigilante da força de trabalho; promoção da saúde do trabalhador e da trabalhadora como premissa de que um ambiente de saúde não pode provocar angústia, sofrimento e adoecimento de nossos trabalhadores e nossas trabalhadoras; reposição da força de trabalho frente às perdas de milhares de profissionais que não só perderam a vida, mas estão adoecidos e, muitos deles, sequelados pela covid; estabelecimento da carreira SUS, nós insistimos que a carreira SUS seja para todos os trabalhadores e trabalhadoras; direitos humanos assegurados; trabalho decente, com remuneração suficiente para si e para o domicílio desse profissional; respeito, gratidão, reconhecimento de sua essencialidade; o cumprimento imediato da Lei 14.128, dos direitos dos profissionais da saúde vítimas da covid e suas famílias; reconhecimento do Estado, por meio do Congresso Nacional, como bem público, patrimônio do SUS, patrimônio do nosso País, assegurando prerrogativas especiais, como, por exemplo, aposentadoria especial, piso salarial para esses trabalhadores, carreira profissional, segurança do trabalho e educação permanente e regular.
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Desculpe-me se passei minutos do horário, mas era o recado que eu gostaria de passar para todos desta Comissão tão importante do nosso País.
Muito obrigada, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigado, Dra. Maria Helena Machado. Muito boa a sua explanação. Eu solicito que nos encaminhe essa apresentação das três pesquisas. Nós vamos distribuir a todos os integrantes da Comissão de Direitos Humanos, bem como a todos os ex-integrantes da CPI da Covid e deixaremos à disposição também de todos os Senadores e Senadoras da nossa Casa.
Eu queria dizer, inclusive, que a escolha dos temas desta audiência pública de hoje foi feita levando-se em consideração que a própria CPI não teve condições de abordar todo o leque de questões envolvidas no enfrentamento à pandemia. E um dos mais importantes foi exatamente esse que diz respeito aos profissionais de saúde e como vivenciaram todo esse processo de enfrentamento à pandemia da covid-19.
De imediato, passo a palavra ao Dr. Renato Simões, representante da Associação Nacional Vida e Justiça em Apoio e Defesa dos Direitos das Vítimas da Covid-19.
V. Sa. dispõe de dez minutos, com alguma tolerância.
O SR. RENATO SIMÕES (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senador.
Quero cumprimentar todos os Senadores e Senadoras presentes.
Vou referenciar minha intervenção aqui num documento já encaminhado ao Senado Federal pela Associação Nacional Vida e Justiça, durante os trabalhos da CPI, justamente as contribuições, sob a perspectiva da aliança estabelecida entre vítimas, familiares de vítimas e entidades da sociedade civil que constituem a Vida e Justiça, para o relatório final da CPI.
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Nós queremos agradecer em particular ao Senador Humberto Costa, à Senadora Zenaide, ao Senador Randolfe, com os quais nós diretamente tratamos desses assuntos que foram contemplados, em sua maioria, no relatório final aprovado pela CPI. Ele constitui, com certeza, um guia para ação das entidades da sociedade civil nesse próximo período, porque, ainda que seja verdade, como disse o Senador Humberto, que a CPI que não teve condições legais e de tempo para tratar de todos os temas envolvidos na administração ruinosa da pandemia em nosso País, tudo que está lá nós queremos e pelo que não está lá nós vamos continuar lutando para que seja incorporado pelas instituições que têm compromisso com a vida, diante dessa política genocida que nos atinge a todos e todas.
Então, o nosso documento, já encaminhado mês passado à CPI, que sintetiza os reclamos que nós temos sob o ponto de vista das vítimas, parte da ideia de que é necessário construir a verdade histórica desse período. Portanto, memória, verdade e justiça são prioridades fundamentais neste momento de naturalização e de busca de rebaixamento do horizonte histórico, a partir do qual avaliar uma pandemia que, no Brasil, é um caso sui generis no mundo. Aqui o principal mandatário do País se associou ao vírus para uma expansão e contaminação em massa do povo brasileiro, visando comprovar uma das teses anticientíficas da extrema direita mundial, que é a imunidade coletiva do rebanho sem vacina. Arcou-se, por isso, com o custo da contaminação de 22 milhões de pessoas no País, com a morte de quase 620 mil pessoas, e isso caracteriza, como o relatório da CPI bem situou, um conjunto de crimes contra a humanidade, cuja cadeia de responsabilidade estava inclusive fora do escopo constitucional da própria CPI. Ainda que a responsabilização do Presidente Bolsonaro seja inequívoca, há uma cadeia de comando que se estendeu por ministérios, secretarias, governos estaduais e municipais, Parlamentares da base de apoio, propagadores de fake news em escala nacional, meios de comunicação, empresas que se beneficiaram em esquemas criminosos de corrupção e de venda de medicamentos e insumos ineficientes para combater a covid, que precisa ser apurada.
Nós saudamos a constituição do Observatório do Senado Federal para avaliação do andamento das propostas da CPI, mas nós continuamos insistindo na ideia de que é necessária uma comissão nacional da verdade que passe a limpo esse período trágico da história do Brasil. É necessária uma justiça de transição em que a voz da vítima desempate as várias narrativas fantasiosas e científicas sobre o que aconteceu no Brasil.
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Quando a gente vê fake news de um lado e teóricos da saúde pública, da comunidade científica do outro, pode ficar alguma dúvida na cabeça da população. Quem vai desempatar isso é a justiça testemunhal, é a voz da vítima, porque ali está configurada efetivamente qual é a verdade histórica. Pessoas foram submetidas a crimes, e esses crimes vão marcar a sociedade brasileira pelos próximos anos e décadas. Nós não estamos falando aqui de um período simples que vai passar, de um novo normal que está logo ali depois da vacinação, dessa primeira fase da pandemia; nós estamos falando, como nas experiências europeias de genocídio do século XX, como nas experiências de países africanos que foram submetidos a guerras genocidas, de um esforço de recuperação de uma identidade nacional sob bases democráticas na perspectiva dos direitos humanos.
Então, neste momento em que nós nos preparamos, no dia 10, para comemorar o Dia Universal dos Direitos Humanos, nós precisamos entender que os direitos das vítimas serão construídos pela luta das próprias vítimas e de todos aqueles e aquelas que são solidários e solidárias com a sua luta. Daí a importância, Senador Humberto, dos depoimentos das vítimas na fase final da CPI e da disposição de V. Exa. de realizar audiências públicas sobre os direitos das vítimas da covid em todo o País, porque é essa memória perigosa de quem traz na carne e na alma a marca do que foi a gestão ruinosa e criminosa da pandemia que vai convencer a sociedade brasileira da importância de nós construirmos um futuro diferente deste.
E aí, além da memória, da verdade e da justiça, nosso documento foca no tema das políticas públicas, porque os arautos do mercado, nessa fantasiosa versão de que a ideologia neoliberal dá conta de todos os dilemas de uma sociedade, caíram por terra durante a pandemia. Foi necessário que o Congresso Nacional aumentasse os limites de investimento público e de gastos públicos no orçamento de guerra, na votação do auxílio emergencial, contra a vontade do Governo, no financiamento extraordinário do SUS e do SUAS, para que nós pudéssemos minorar os efeitos dessa estratégia dramática adotada pelo Estado brasileiro diante da pandemia.
Isso significa que nós precisamos reorganizar as políticas públicas para dar conta da assistência à saúde mental de milhões de pessoas que ficaram afetadas na sua alma por aquilo que aconteceu, a começar pelo direito ao luto, porque nem esse direito sagrado tiveram, mas passando também por todas as consequências das pessoas com deficiência, com doenças raras, das pessoas idosas, das pessoas que ficaram sob isolamento social austero durante todo esse período. É preciso repensar o SUS para lidar com milhões de sequelados, que vão demandar novos profissionais que vão ser necessários para assistência à saúde dos que vivem as consequências, muitas delas ainda indeterminadas na sua evolução no seu próprio corpo. É preciso trazer visibilidade para as vítimas invisíveis, como disse a Professora Maria Helena, aqueles que não são vistos pela sociedade, porque não há números, porque os dados objetivos são impedidos de serem conhecidos pela sociedade brasileira.
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Quantos órfãos e órfãs da covid existem? Serão mesmo 170 mil, previstos nos estudos publicados pela comunidade científica, na revista Lancet? São mais, são menos? Quem são essas pessoas? Quem são os profissionais invisíveis da saúde, objeto de pesquisa da Fiocruz? Quem são as pessoas com deficiência que morreram porque não foram priorizadas na vacinação, as pessoas com doenças raras, as pessoas cujos óbitos não foram devidamente registrados no início do processo da pandemia? Quem são esses milhões de vítimas que a pandemia deixou para trás na sociedade brasileira e que são, portanto, os construtores dos novos direitos?
Eu concluo, Senador Humberto, dizendo que uma das questões mais caras a nós, defensores e defensoras de direitos humanos, é que direitos humanos são noções historicamente construídas. Hoje nós vivemos os direitos que nos foram legados por gerações de sem direitos que lutaram para que nós tivéssemos o que temos hoje no arcabouço constitucional e legal de direitos humanos no Brasil e no mundo. Nós não podemos abrir mão de nenhum desses direitos, para honrar a luta dos que vieram antes de nós.
Mas nós também não podemos negar que estamos construindo os direitos que as futuras gerações vão viver. Direitos ambientais, para uma sociedade que não gere pandemias como essa que nós vivemos hoje; direitos sociais, econômicos e culturais de um povo que foi massacrado, um povo que está passando fome, um povo que está passando dificuldades econômicas brutais, um povo que está lidando com mazelas que a pandemia impôs, porque o povo brasileiro levou um grande "se vira" do Governo Federal: se vira para viver, se vira para sobreviver, se vira para cuidar da sua sanidade mental, se vira para construir um futuro.
Daí a importância de audiências como essas e dessa disposição importante do Senado Federal de não deixar cair no vazio aquilo que produziu e continuar estimulando a sociedade brasileira a produzir aquilo que ainda não foi produzido, de reflexão e de ação coletiva sobre os crimes da pandemia.
Obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Agradeço ao Dr. Renato Simões, que representa aqui a Associação Nacional em Apoio e Defesa dos Direitos das Vítimas da Covid-19 - Vida e Justiça.
Quero dizer a V.Sa. que a participação dessa associação é muito importante para esse complemento de trabalho que nós estamos querendo fazer, via Comissão de Direitos Humanos, em relação a esse acompanhamento.
Obviamente, nós criamos o Observatório da Pandemia. É uma frente parlamentar e tem, como frente parlamentar, uma série de limitações. Por essa razão, nós temos procurado fazer com que a Comissão de Direitos Humanos possa, do ponto de vista formal, legal, jurídico, ser o escoadouro dessas necessidades pós CPI, de acompanhamento de tudo que foi trabalhado.
Inclusive, a nossa ideia é que aqui nós possamos receber as autoridades que receberam o relatório final da CPI, que elas possam prestar contas ao Senado Federal neste espaço e em outros espaços aqui do Senado Federal.
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Não tenha dúvida de que a Associação Nacional Vida e Justiça exerce um papel muito importante para que todos nós possamos avançar nesse processo de acompanhamento.
Eu cedo a palavra ao terceiro convidado, Dr. Lincoln da Costa Valença.
Eu vi que a Senadora Zenaide Maia pediu a palavra, mas eu peço a ela que tenha só um pouquinho de paciência, para nós ouvirmos a todos, e aí abriremos a discussão e a participação, está certo?
Então o Dr. Lincoln da Costa Valença, doutorando da Fiocruz, do Programa VigiFronteiras, epidemiologia em saúde pública. V.Sa. tem dez minutos, com um grau de tolerância para a sua manifestação.
O SR. LINCOLN COSTA VALENÇA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia! Bom dia a todos!
Em primeiro lugar, quero dizer que é de grande felicidade poder conversar com os senhores Senadores e trazer um pouco do que a gente tem estudado.
Eu, enquanto continuidade dos meus estudos, tive a oportunidade, no meu mestrado, de estudar as populações migrantes. E isso dialoga muito, a relação de saúde é muito evidente nesse lugar. E aí, chego a este debate para tentar trazer um pouco de esclarecimento do que é que a gente pensa enquanto pandemia e direitos humanos.
É importante dizer que para a gente, enquanto pesquisador dessa população de vulneráveis e hipervulneráveis, é muito importante dar continuidade a esse papo de acesso, a esse papo de o que é que ocorreu, o que é que está ocorrendo e quais são as legislações vigentes que podem cooperar ou não com o desenvolvimento da pandemia ou o estancamento da pandemia.
Eu queria trazer aqui, como tópico para a gente pensar, que de fato, o Sistema Único de Saúde do Brasil já vivia um estrangulamento, estrangulamento esse muito relacionado a como se financia e como historicamente o sistema de saúde do Brasil foi financiado. Apesar de haver uma expansão da rede SUS, que aconteceu com a velocidade da pandemia, a gente sabe também que, em diversas áreas, a gente teve recuo de financiamento. Então, apesar de a gente ter um crescimento de necessidade, a gente também acompanha um período de graves cortes no financiamento da saúde. Mas o que eu quero trazer aqui para a gente pensar é sobre o acesso ao Sistema Único de Saúde por populações vulneráveis ou hipervulneráveis.
Primeiro, o acesso ao Sistema Único de Saúde do Brasil, de acordo com a lógica do nosso sistema, é através da atenção básica. Porém, existem diversas barreiras invisíveis. Isso já foi trabalhado por alguns colegas. Existem barreiras invisíveis que estão interferindo no processo de entrada, porque vejam só, se a gente pensa nesse espaço territorial brasileiro, nele cabem diversos tipos de população.
Mas eu queria trazer que em diversas regiões do País, por exemplo, as pessoas ainda não têm o Cartão SUS. Em diversas regiões do País, por exemplo, as unidades de saúde não têm sequer um computador que possa dar continuidade ao atendimento dessas pessoas.
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Então, a grande questão é até que ponto essa realidade da dificuldade de acesso pode ser ampliada. Se a porta de entrada do nosso sistema de saúde é dificultada para um cidadão que tem a sua casa, que tem a sua alimentação, que tem o seu emprego, ela é muito maior, mais aumentada, para esse cidadão que não tem casa, que não tem emprego, que é refugiado, que chegou ao País ou então que vive em situação de pobreza ou de extrema pobreza. A gente vê o Brasil agora, infelizmente, com o atual Governo, retornando ao Mapa da Fome.
Então, as questões de aumento de realidade que trago aí são: quando não tem internet, quando não tem comunicação, quando não se tem sequer um computador na unidade de saúde como é que a gente dá continuidade ao acesso à saúde dessa população hipervulnerável?
Aí eu quero trazer... Eu vivo no Estado de Roraima. É um grande prazer trazer a pesquisa do Norte para esse espaço e dizer que aqui é o Estado com maior densidade populacional indígena do Brasil, comparativamente. A gente traz esse grande desafio, também, de cuidar da atenção indígena. Hoje, por exemplo, eu queria trazer para vocês... O Ministério da Saúde traz indicadores que devem ser acompanhados. Existe uma grande muralha, porque a gente não teve capacidade ainda de dialogar, sobre como é que a saúde indígena, como é que a Sesai dialoga com o Ministério da Saúde e como é que esses dados podem colaborar com o desenvolvimento da população.
Sem nenhum medo de errar, eu posso dizer que grande parte dos Municípios brasileiros não têm a mínima condição de atingir os indicadores do Previne Brasil. Quando você vem - e estou trazendo esse debate da realidade aumentada -, por exemplo, para Estados como o Estado de Roraima, a gente tem Municípios com 98% de população indígena sobre a qual a gente não faz troca de dados. Então, a saúde indígena atende essa população, o Município é obrigado a devolver esses dados ao Ministério da Saúde, podendo ser penalizado por não ter financiamento. Até hoje, historicamente, a gente não conseguiu fazer o Ministério da Saúde dialogar com a Sesai. Então, a gente tem distritos especiais indígenas espalhados no Brasil e, simplesmente, a essa população, com o advento da saída do Mais Médicos - mais uma decisão do atual Governo -, simplesmente inexiste o acesso à saúde em diversas comunidades do Brasil. De novo, trago esta pergunta: até que ponto essa realidade pode ser aumentada?
A gente tem uma grande dificuldade de hierarquização dos sistemas de saúde. Estados como onde eu vivo, Estados como o de Roraima, têm uma hierarquização 100% concentrada na capital. Então, o SUS de Roraima, efetivamente, acontece dentro de um carro porque, a partir da atenção básica eu não tenho mais nenhum lugar para recorrer em nenhuma outra situação; se quiser exames de laboratórios, você tem que descer até a capital. Então, a gente retrocedeu mais ainda no Norte sob a perspectiva de dizer que a gente não consegue ampliar, a gente não consegue crescer, a gente não tem políticas públicas que garantam o acesso à população, a essa população urbana. Essa realidade é muito aumentada quando a gente vai discutir o migrante, para acessar o sistema de saúde, quando a gente vai discutir o refugiado, para acessar o sistema de saúde, quando a gente vai discutir os indígenas, para acessarem o sistema de saúde.
Olha, trago aqui um dado, por exemplo, sobre o espalhamento da pandemia na Região Amazônia. Ela tem uma velocidade maior do que nas grandes capitais, apesar de o povo viver em situação de isolamento. A gente tem cerca de 25% a mais de mortalidade entre indígenas comparado a não indígenas. Esses são dados do próprio Ministério da Saúde que refletem, também, essa falta de atenção, esse espaço vazio do Sistema Único de Saúde na atenção aos povos indígenas, como hipervulneráveis. Era o que eu queria trazer aqui.
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A gente vê uma resposta nas grandes capitais, com aparelhamento tecnológico, com aporte de equipes, mas isso vai se pulverizando, vai se fragmentando a partir do momento em que você se afasta dos grandes centros. A população brasileira não está, definitivamente, somente nos grandes centros urbanos.
Eu queria dizer que não existem soluções simples para problemas sistêmicos, isso precisa ser uma coisa clara. A gente necessita implantar políticas públicas de financiamento, um financiamento claro e que não seja punitivo ao sistema de saúde, que colabore com o desenvolvimento do sistema de saúde. A gente tem muitos Municípios brasileiros com uma densidade populacional pequena e, logo, com um aparelhamento tecnológico na saúde muito pequeno.
Esse recuo de financiamento agrava a situação da pandemia. Por exemplo, sobre o espalhamento da covid na Amazônia. Ele aconteceu de uma forma muito mais grave do que nos grandes centros pelo fator da transmissibilidade. Uma pessoa, hoje... Você pega um barco; se você está transmitindo a covid, você viaja 24 horas compartilhando esse ambiente para chegar em um dado Município, como é a realidade dos Municípios da Amazônia. É importante a gente ter capacidade de olhar para esse recuo de financiamento e para essa possibilidade de os Municípios serem punidos por uma situação que ele, definitivamente, não tem em conta.
Se o Ministério da Saúde não conseguir amadurecer junto ao sistema de saúde indígena, pela representação da Sesai, o Município não pode ser penalizado por não atingir, por exemplo, a quota de captação de gestantes, a quota de captação de primeira consulta odontológica, quando o trabalho desenvolvido deveria ser coordenado pelo Município. Mas o que se percebe é uma grande rivalidade na atenção entre o Município, que desenvolve as políticas públicas, com o dinheiro do Ministério da Saúde, e essa atenção especial indígena que desenvolve a saúde a partir de um outro tipo de financiamento. Então, a gente sabe que no Brasil existe uma grande cobertura populacional de saúde, que em lugares se soma e em outros lugares ela simplesmente inexiste.
Então, o que eu queria trazer para os senhores é que essa realidade é muito aumentada nas periferias dos grandes centros urbanos e nas periferias do País. Se eu puder dizer alguma coisa aos Senadores, eu gostaria de colocar que a gente precisa fazer dialogar a saúde especial indígena com a saúde desenvolvida pelos Municípios brasileiros.
A gente não tem mais tempo para continuar invisibilizando esses dados ou não compartilhando esses dados e punindo Municípios sob financiamento. Então, a gente piora a realidade quando a gente não tem internet, a gente piora a realidade quando a gente não tem uma equipe qualificada, a gente piora a realidade quando a gente não consegue acompanhar as nossas fronteiras, quando a gente não consegue dar um regime de seriedade e implantar políticas públicas que possam desenvolver o nosso sistema de saúde.
Encerro aqui a minha a fala e me coloco à disposição para a continuidade dos trabalhos desta Comissão.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigado a V. Sa., Dr. Lincoln Costa Valença. Sua abordagem é extremamente importante.
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Nós tivemos, o tempo inteiro, a preocupação de registrar, durante essa pandemia, o processo que terminou resultando numa resposta, digamos, mais lenta do Sistema Único de Saúde, além da orientação, além da estratégia estabelecida pelo Governo Federal para o enfrentamento da pandemia, também as condições de subfinanciamento do Sistema Único de Saúde, que se agravaram fortemente a partir de 2016. E foi graças ao Congresso Nacional que, em 2020, durante a pandemia, nós tivemos um incremento significativo de recursos para o SUS que, lamentavelmente, já para o Orçamento de 2021, voltou a ter uma redução significativa; assim como, também, a abordagem quanto às demandas de recursos humanos, à necessidade de ampliação da complexidade de serviços particularmente nessas regiões mais remotas.
Então, a contribuição de V. Sa. é muito importante também para esse trabalho a que nós pretendemos dar continuidade.
De imediato, eu passo a palavra ao Dr. Arthur Pinto Filho, Promotor de Justiça de Direitos Humanos, Saúde Pública, do Estado de São Paulo.
O Ministério Público de São Paulo tem feito um trabalho muito importante nessa área da pandemia, especialmente em alguns casos bem específicos, entre eles, a temática do que ocorreu junto à Prevent Senior, e, para nós, é uma enorme satisfação poder receber o Dr. Arthur Pinto Filho, que tem dez minutos, com a devida tolerância, para fazer a sua exposição.
O SR. ARTHUR PINTO FILHO (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado.
Cumprimento todos na pessoa do Senador Humberto Costa. É um prazer e uma honra estar participando desta reunião.
Queria cumprimentar o Senador por uma razão específica. Aqui, quando o Senador era Ministro da Saúde, nós tivemos um problema gravíssimo em São Paulo da aprovação pelo então Governador de uma lei que entregava 25% dos hospitais públicos para os planos de saúde. Nós precisamos criar uma briga muito forte, entramos com uma ação, e o Ministério da Saúde soltou uma nota nos apoiando, e essa nota foi muito importante para que a gente ganhasse a ação e, posteriormente, o Governo recuasse e tirasse a lei do ordenamento jurídico.
Então, eu lhe agradeço, embora a destempo, por essa ajuda importantíssima na ocasião.
Eu sou Promotor da Saúde Pública daqui de São Paulo e nós recebemos, em maio deste ano, uma representação falando de problemas do kit covid que seria distribuído pela Prevent Senior sem nenhum tipo de controle, e nós tivemos, Senador, muita dificuldade na investigação. Nós pedimos uma vistoria do Cremesp, o Cremesp fez a vistoria, mas o relatório não confirmava as primeiras informações. Pedimos, também, a vistoria do Coren, que não confirmava as informações.
Os médicos começaram a nos dar informações em off, porque tinham muito medo de falar em on, mas a prova estava muito ruim para entrar com uma ação ou mesmo para buscar um TAC.
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Isso se clareou somente como o advento da CPI, da Comissão Parlamentar de Inquérito que desvendou gravíssimas situações da Prevent. E, com base nas investigações e nas provas que foram produzidas pela CPI, juntadas ao nosso inquérito civil público, nós conseguimos caminhar muito e chegar a um TAC que me parece um TAC importantíssimo. E digo com toda franqueza: sem a CPI, nós não chegaríamos a esse TAC, porque o TAC é um acordo, e, portanto, a Prevent teve que concordar com esse TAC. E é evidente que, sem a CPI, ela não concordaria, porque o TAC é duríssimo em algumas situações.
Esse TAC foi feito com a parceria, com a anuência da Associação Paulista de Medicina, que nos ajudou demais. A Associação Paulista de Medicina fez um documento técnico falando da impropriedade da utilização do kit covid para o tratamento da moléstia. Também tivemos a anuência do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) e do Sindicato dos Médicos de São Paulo, e negociamos com a Prevent durante um bom tempo esse TAC, que afinal foi assinado, e muitas das cláusulas dele já foram cumpridas pelas Prevent.
O TAC tem dois grandes eixos com dois grandes objetivos. O primeiro objetivo, o primeiro eixo... O primeiro objetivo era o seguinte: de ela alertar a população brasileira de que não há tratamento precoce por meio do famigerado kit covid. Está mais do que comprovada a ineficácia do kit, e, mais do que comprovada a ineficácia, há prova de que ele pode ser problemático para quem o usa. E também, como objetivo, era evitar que as pessoas que são beneficiárias da Prevent continuassem a receber esse kit em casa.
Então, com base nesse objetivo, nós fizemos cinco itens nesse TAC, que buscavam isso. O primeiro item era o seguinte: a Prevent se comprometeu a não entregar, a não distribuir, a não enviar, a não promover, a não incentivar e estimular, por qualquer meio, a prescrição do determinado kit covid. E nós estabelecemos quais os medicamentos que eram do kit covid - e era um rol de medicamentos realmente incrível! Além da cloroquina, da hidroxicloroquina, nós tínhamos flutamida, etanercepte, azitromicina, ivermectina, colchicina, zinco, corticoides, anticoagulantes, quer dizer uma coisa... Uma aberração esse kit que era entregue às pessoas!
Então, o item 1 impedia a distribuição desse kit para os seus beneficiários. Isso tinha entrada imediata em vigor e está sendo cumprido rigorosamente - até onde a gente sabe, não houve nenhuma reclamação ao contrário - pela Prevent.
O segundo item desse eixo maior é que a Prevent revogasse imediatamente os protocolos internos ou orientações feitas, inclusive por zap, por Telegram ou afins, relacionados ao kit covid. Por quê? Porque a Prevent mandava zaps para os seus médicos, orientando que eles se utilizassem desse kit covid nas mais variadas situações. Então, a ideia era que revogasse não só os protocolos clínicos, como essas informações que eram disseminadas por meio do WhatsApp. Isso também foi já cumprido pela Prevent.
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Um outro item era atualizar os protocolos internos para adequação e recomendações da Sociedade Brasileira de Infectologia, da Associação Paulista de Medicina, da OMS e da Associação Médica Brasileira. Então, a ideia era não só revogar, como atualizar os protocolos clínicos para tratamento da covid sem o kit covid, sem nada do kit covid. Isso também foi feito. Eles tinham 15 dias para fazer essa atualização, fizeram, encaminharam para o Ministério Público, nós encaminhamos para os nossos anuentes, que concordarem. E, portanto, desse momento para frente, nada do kit covid é utilizado para o tratamento da moléstia.
Um outro tema, que me pareceu muito importante e que também já foi cumprido pela Prevent, era o seguinte: eles se obrigavam a publicar e divulgar nos órgãos de imprensa, três jornais e em cinco portais e, inclusive, colocar nos seus órgãos internos de comunicação, um documento que tivesse quatro itens, em que eles reconhecessem que, primeiro, os resultados divulgados pela empresa ou por terceiros acerca da eficácia da cloroquina não correspondiam efetivamente a uma pesquisa científica, limitando-se a dados obtidos internamente para fins estatísticos, sem qualquer tipo de viés científico; número dois, a Prevent reconhece que não obteve autorização do Conep para a realização de nenhum tipo de estudo científico envolvendo a cloroquina; terceiro, a Prevent reconhece que inexiste a conclusão de qualquer pesquisa científica realizada por ela que conclua pela eficácia da cloroquina ou demais medicamentos do denominado kit covid; e, em quarto lugar, ela se comprometia também a afirmar que inexiste qualquer pesquisa científica realizada pela Prevent que ateste a eficácia de algum tipo de tratamento precoce ou preventivo. Ela cumpriu já esse item e publicou na Folha, no Estado e, salvo engano, no Globo esse documento, reconhecendo isso.
Por que isso é importante? Porque me parece que um dos grandes males que aconteceram no País foi o Presidente da República se utilizar de um documento que não era pesquisa científica como tal e espalhar à sociedade que havia uma pesquisa científica, promovida pela Prevent, que dizia que esses medicamentos eram eficientes para o tratamento precoce. Até hoje, o Presidente fala em tratamento precoce, e, evidentemente, a fala do Presidente tem força. O Presidente é a autoridade máxima do País, de maneira que a fala do Presidente atinge toda a população.
Não há dúvida alguma, pelo menos pra mim, de que muitas das mortes que aconteceram no País foram em decorrências dessa fraude, dessa mentira de que havia um tratamento precoce. Muita gente, inclusive conhecidos meus, se utilizaram desses medicamentos e, ao se utilizarem desses medicamentos, diziam: "Olha, eu estou protegido. Para mim, não vai acontecer nada". Muitos morreram; alguns amigos, inclusive, morreram por conta disso.
Então, a ideia de se publicar um documento em que a Prevent reconhece que isso não é correto me pareceu absolutamente fundamental. E esse TAC também tem que ser encaminhado - e já foi encaminhado - para todos os beneficiários da Prevent.
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O segundo eixo, que me parece fundamental - e já vou encerrar -, é um eixo que procura criar mecanismos de democratização de um sistema hierarquizado. Vejam, a Prevent criou um sistema em que ela tem o beneficiário e tem os hospitais. São delas os hospitais. São vários, inúmeros hospitais espalhados pelo País inteiro. Pois muito bem; a relação dos médicos com ela é uma relação muito fluida. Os médicos não são contratados pela CLT; os médicos são contratados pela pejotização, como já foi dito aqui. Então, a relação deles, médicos, com a Prevent é muito incerta; eles não têm direito a nada.
Então, os médicos me informaram - e está no procedimento - que, se eles não se utilizassem, naquela ocasião, do kit covid, eles recebiam menos plantões, eles começavam a ser punidos, punidos no sentido de que, quanto menos plantões recebiam, menos dinheiro recebiam e, portanto, essa era uma questão central para eles. E muitos se utilizaram do kit covid, mesmo sabendo que o medicamento era ineficaz, porque tinham medo de serem mandados embora ou de perderem plantões.
Então, num sistema hierarquizado, se você não tiver controle democrático, a tendência é essa: a tendência é que o proprietário desborde e passe a se utilizar dos médicos como correia de transmissão de uma determinada maneira de enxergar uma doença e tratar a doença.
Então, nós criamos um controle... Na verdade, queríamos criar dois, mas não houve possibilidade de acordar com relação ao primeiro. Nós criamos o seguinte controle: nós criamos a figura do ombudsman externo, que vai ser contratado da Prevent. Ele será indicado pela Prevent, mas terá que ter a aquiescência do Ministério Público e dos anuentes. Eles têm apresentado nomes muito importantes e muito respeitados. Estão negociando com esses nomes. Vamos ver se alguns deles topam esse múnus, porque é um múnus mesmo ser ombudsman da Prevent neste momento.
O ombudsman, então, teria como missão receber as reclamações dos beneficiários ou de qualquer pessoa, encaminhar para os setores competentes essas reclamações e exigir solução. Se a solução não for dada, o ombudsman encaminha isso para o Ministério Público, para a ANS, enfim, para os órgãos de controle.
O segundo mecanismo, que me fundamental e eu sugiro que os Senadores e Deputados pensem a respeito, para que mudem a Lei dos Planos de Saúde, é a ideia que tem no SUS, que é uma ideia maravilhosa, do controle social, e o controle social, no SUS, se dá também pelos conselhos gestores dos hospitais. E, pela minha experiência aqui de muitos anos na área da saúde pública, hospital que tem um conselho gestor atuante é um bom hospital; hospital que não tem conselho gestor atuante sempre é problemático. Então, a ideia era criar um conselho gestor, adaptado, evidentemente, para uma área privada, mas isso não foi possível ser acordado entre as partes. Continuamos em negociação, mas esse é um problema de difícil solução pelo acordo.
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Então, essa ideia do TAC, que foi assinado e muitas das cláusulas já foram cumpridas... Há que se reconhecer que a Prevent está sendo correta no cumprimento das cláusulas. Nós temos o acompanhamento do TAC, e não chegou nada que diga que eles não o estão cumprindo. Então, na questão do TAC, isso me parece resolvido.
O que está agora em discussão é um valor que a Prevent terá que pagar a título de dano moral e social coletivo, porque a Prevent, ao deixar o Presidente da República se utilizar de uma pesquisa que não era pesquisa, ela gerou um dano social imenso no País, tá? E é muito difícil se definir um valor - tem que ser um valor muito alto, mas também tem que ser um valor que não inviabilize a empresa -; então, nós estamos nesse processo de discussão. Saiu o acordo, "ah, fizemos um novo TAC"; não saiu acordo, entramos com uma ação civil pública.
Nós aqui da saúde pública recebemos nesse inquérito documentos de duas pessoas que morreram na Prevent e que não constou das suas certidões de óbito que elas morreram por conta da covid, e também não constava que elas se utilizaram do kit covid. Portanto, isso é um crime de falsidade ideológica, e assim que nós recebemos aquele documento - se eu não me engano em julho - nós pedimos a instauração de inquérito policial, que está andando pelo DHPP, aqui de São Paulo.
Muito bem, de maneira que nesse momento, na área da saúde pública, o que está em debate é a questão do dano moral coletivo. O Procurador-Geral criou um grupo de trabalho de promotores criminais e do júri para verificar a questão criminal.
Eu não faço parte desse grupo, embora a gente sempre se reúna para passar informação. Sei que esse grupo está ouvindo muita gente, as investigações estão andando muitíssimo bem, e penso que teremos boas novidades daqui para frente.
Eu queria agradecer profundamente pelo convite, queria agradecer a todos pela oportunidade, queria agradecer novamente ao Senador Humberto e reafirmar que, sem a CPI da Covid, nós não chegaríamos a esse bom termo.
Muito obrigado a todos.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigado, Dr. Arthur Pinto. Muito importante aqui o seu testemunho.
Nós tivemos conhecimento desse Termo de Ajustamento de Conduta por matérias que surgiram nos jornais e, vendo a explicação de V. Sa., nós ficamos, assim, muito sensibilizados no sentido que realmente o Ministério Público do Estado de São Paulo está cumprindo com a sua responsabilidade, e acredito que essas decisões, inclusive, terão um valor além do valor concreto, mas também um componente pedagógico importante para que, em momentos que nós venhamos a viver posteriormente - e, certamente, essa não será a última emergência sanitária que o nosso País vai viver - isso tenha um papel muito importante, não é?
Por outro lado, uma das perguntas que eu iria fazer, que era justamente no que diz respeito às ações por danos morais, há também essa preocupação da parte do Ministério Público, e eu gostaria, tão somente, de pedir a V. Sa. que, se possível, nos encaminhasse uma cópia desse TAC aqui à Comissão de Direitos Humanos. Nós vamos também enviar a todos os Senadores e a todos aqueles que fizeram parte da CPI.
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Bom, e, finalmente, eu passo a palavra ao Dr. Vinícius Ximenes Muricy da Rocha, que é membro da Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares, para que ele possa também prestar aqui o seu depoimento. Não sem antes dizer que, ouvindo o próprio depoimento do Dr. Arthur Pinto, eu creio que muitas coisas terão que ser novamente discutidas aqui na própria Comissão de Direitos Humanos, dizendo respeito a tudo isso que aconteceu durante o processo da pandemia, até porque é óbvio que a Prevent Senior foi um caso à parte, não é? Ela se prestou a um serviço profundamente equivocado, anticientífico, inclusive, desrespeitoso em termos de direitos humanos, mas é importante dizer que ela não foi a única instituição de prestação de serviços à saúde que distribuiu kit covid, que mandou para as pessoas...
Nós tivemos outras experiências com seres humanos que foram feitas, e nós precisamos ter uma resposta, particularmente no Estado do Amazonas e no Rio Grande do Sul, em que houve hospitais que fizeram experiências com um outro medicamento; de modo que esse tema, nesta Comissão de Direitos Humanos, tem que ser recorrente, nós não podemos deixar esse assunto cair no esquecimento.
Mas, sem mais delongas, eu passo a palavra ao Dr. Vinícius Ximenes.
Dez minutos, com a tolerância devida.
O SR. VINÍCIUS XIMENES MURICY DA ROCHA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senador.
Bom, primeiramente, quero parabenizar a Comissão de Direitos Humanos por proporcionar este debate e, primeiramente, queria colocar aqui eu faço parte da Rede Nacional de Médicas Populares. Nós somos um movimento social de médicos e médicas que atuam junto a movimentos populares e boa parte de nós trabalha na ponta, ou em serviço de urgência ou em serviço de atenção primária, e tivemos uma vivência do ponto de vista da pandemia no dia a dia, do ponto de vista das portas de entrada do sistema de saúde.
As falas que me antecederam me tocaram profundamente: a fala da Maria Helena, a fala de todos os outros convidados. Eu trabalhei durante quase esses quase três anos em que nós estamos vivendo a pandemia, na ponta; tive a situação de ver irmão, pai e mãe terem formas graves da doença; eu tive o covid duas vezes - da segunda vez fiquei potencialmente grave também, com 50% de lesão pulmonar -, doente e ainda vendo a minha esposa grávida, doente também. E a gente, obviamente, sabe que essa doença é como uma bomba relógio na cintura, quando a gente vivencia esse processo.
Então, posso dizer tranquilamente que quem vive esse processo, seja enquanto paciente, seja estando na ponta, nós não somos mais a mesma pessoa, seja do ponto de vista mental, subjetivo, seja mesmo físico - não é a mesma coisa.
Agradeço por estar aqui com vocês hoje, possivelmente, por ter tomado a vacina - duas doses -, porque, pela lesão pulmonar que eu tive, possivelmente, sem vacina talvez eu não estaria nem aqui neste debate junto com vocês hoje.
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Eu acho que é importante a fala do Dr. Arthur, que traz uma provocação para a gente do ponto de vista dos fatores de confusão: que atores institucionais atuaram com pseudociência, com trabalhos científicos inconsistentes, com posturas políticas equivocadas, para produzirem esse efeito de confusão coletiva na nossa população? Então, que elementos institucionais provocaram isso? E há um elemento institucional que eu acho que é importante, porque talvez, se ele tivesse tido uma atividade mais prudente, do ponto de vista da sua atuação institucional, em face da pandemia, talvez até outros fatores de confusão derivados não teriam se espalhado, do ponto de vista da lógica sanitária neste País. Então, eu acredito que uma entidade sobre a qual a gente precisa refletir profundamente sobre o papel deletério, o papel antidemocrático que cumpriu, dentro da pandemia, foi infelizmente o nosso Conselho Federal de Medicina. Eu queria discutir um pouco isso e aproveitar a minha fala para conversar um pouco sobre os elementos relacionados com isso. O nosso Conselho Federal de Medicina, como várias instituições da nossa sociedade, é marcado pela temporalidade de uma época. Os conselhos de Medicina, por exemplo, nos anos 70, tiveram um papel de colaboração com a ditadura militar. Então, por exemplo, houve o escândalo, em 1979 denunciado, do Hospital Colônia lá em Barbacena, em Minas Gerais. Para vocês terem ideia, dois psiquiatras, jovens psiquiatras da época - o Francisco Paes Barreto e o Antônio Soares Simone - denunciaram aquele processo terrível, que eu acho que a Daniela Arbex, mais recentemente, tratou no Holocausto Brasileiro, em que havia ocultamento e tráfico de corpos e várias outras irregularidades. Esses profissionais quase foram cassados pelo Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais. Então, os conselhos de Medicina são muito sensíveis a essas questões políticas de determinados momentos e de quem está no poder. Ao mesmo tempo também já tiveram contribuições importantes do ponto de vista das pautas democráticas, como na construção da institucionalidade democrática no nosso País.
A atuação dos conselhos de Medicina, por exemplo, nos anos 90, relacionados a denunciar e a buscar punir médicos que colaboraram com sessões de tortura durante a ditadura militar é algo também que é louvável. E isso aconteceu, durante os anos 90, com um trabalho muito importante com alguns conselhos de Medicina, como os do Rio de Janeiro e os de São Paulo. Há uma publicação que foi feita em 2017 pelo pessoal da Universidade Federal do ABC, que é o livro Medicina e Contextos de Exceção, com uma pesquisa fantástica em relação a isso. Contudo, o atual momento do Conselho Federal de Medicina não surgiu ao acaso, Senador. Isso é um ponto histórico. E a gente tem que entender esse processo histórico.
Então, desde o final dos anos 90, mais especificamente a partir de 1999, se estabelece um pacto conservador. Existe uma mudança de orientação no Conselho Federal de Medicina e um pacto conservador entre as três grandes entidades médicas, que configura aquilo que nós chamamos de Movimento Médico: o Conselho Federal de Medicina pelo Movimento de Conselhos, a Associação Médica Brasileira pelas associações científicas e a Fenam pelas entidades sindicais. Dentro desse pacto conservador, uma série de agendas foram trazidas para a ordem do dia e uma dessas agendas que foram colocadas foi a questão da Lei do Ato Médico.
Em 2002, o Conselho Federal de Medicina apresentou uma proposta para a sociedade, que era praticamente um cheque em branco, em que o Conselho Federal de Medicina ia definir o que era diagnóstico e tratamento no nosso País. Essa proposta foi rechaçada pela 12ª Conferência Nacional de Saúde e, desde então, começa a haver alguns problemas em relação ao Conselho Federal de Medicina. Haver uma orientação conservadora no conselho não é problema; isso faz parte, do ponto de vista da vida democrática. Agora, um certo aparelhamento da vida de uma instituição do Estado é algo que tem que ser claramente analisado e claramente identificado.
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Então, a partir de toda a década de 2000, a partir dessa derrota que houve na 12ª Conferência Nacional de Saúde, do ponto de vista das entidades médicas, começou um processo em que essas entidades começaram a utilizar a sua máquina de comunicação, a sua máquina econômica para difundir determinadas ideias, determinados conceitos e determinadas imprecisões para o conjunto da comunidade médica. Então, houve um certo ataque a pautas publicistas, do ponto de vista da saúde pública e do Sistema Único de Saúde, de forma um pouco mais explícita e um pouco mais velada pelas entidades médicas. Por exemplo, eu fiz parte, nos anos 2000, da Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina. Nós votamos na época, em 2002, na 12ª Conferência Nacional de Saúde, contrários à questão daquela proposta de Lei do Ato Médico, proposta pelo Conselho Federal de Medicina; e, simplesmente durante toda a década de 2000, uma entidade estudantil foi perseguida por um conselho profissional. Imagine que loucura é esta: uma entidade do Estado, uma autarquia corporativa utilizar o seu poder para perseguir uma entidade estudantil. Isso aconteceu durante os anos 2000. E esse processo político se tornou mais agudo a partir de 2013. Com a aprovação do Provab, que era um provimento ao acesso à residência médica, médicos brasileiros que trabalhassem no interior, durante um período de dois anos, receberiam uma bonificação para participarem de seleções médicas. E, com a implantação do Projeto Mais Médicos para o Brasil, isso se torna verdadeiro incêndio conservador (Falha no áudio.) ... reacionário (Falha no áudio.) ... com perspectivas neofascistas. Então, se torna um verdadeiro incêndio. E isso começa a ter repercussões do ponto de vista da vida política no nosso País e da vida institucional. O Governo Dilma tentou mediar a situação em
(Falha no áudio.) ... que aprovou uma Lei do Ato Médico, mas isso não foi capaz de aplacar os ânimos das entidades médicas. E aí nós chegamos agora, no momento da pandemia, em que, num prazo que já vem há mais de dez anos, ou seja, praticamente é um mesmo grupo há vinte anos à frente do conselho e há dez anos, há mais de dez anos aparelhando a entidade Conselho Federal de Medicina, a gente começa a perceber detalhes da perversidade que vem a partir de um projeto político como esse, que se apropria de instituições democráticas. Então, para ter uma ideia, no ano de 2020, o Presidente do Conselho Federal de Medicina, o Sr. Mauro Ribeiro, no dia 7 de maio, participou de um evento no Conselho Regional de Medicina de Goiás, em que claramente ele fez uma defesa de cloroquina, hidroxicloroquina, de uma série de medidas sem a menor evidência, do ponto de vista científico, da eficácia, inclusive colocando abertamente que tinha uma (Falha no áudio.)
... Bolsonaro, etc. e tal, algo que... Imagine você se um juiz ou se um promotor se pronuncia dizendo que ele é favorável a um determinado Governo. Não é o papel de uma entidade corporativa do Estado. O Conselho Federal de Medicina não é uma associação privada. Ele é um ente do Estado brasileiro com características próprias. Então, foi uma questão muito grave aquele evento que houve do Conselho Federal de Medicina junto ao Conselho Regional de Goiás, em maio 2020. A partir daquilo que o Presidente Mauro colocou, as atitudes do conselho foram muito coerentes com a fala dele.
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No dia 26 de junho de 2020, o Vice-Presidente do Conselho Federal de Medicina, o Emmanuel Fortes, participou de uma reunião do chamado gabinete paralelo - a CPI do Senado apurou bem a formação desse gabinete paralelo - e claramente colocou que havia um posicionamento, do ponto de vista das entidades médicas, no caso, do Conselho Federal de Medicina, de que médicos que não prescrevessem tratamento precoce teriam maior risco de, digamos, circunstâncias de enfrentamento legal ou ético-profissional junto a conselhos profissionais. Abertamente, ele confessou que o Conselho Federal de Medicina tentou induzir os médicos brasileiros a uma prescrição desse tipo de conduta, sem nenhuma validação do ponto de vista científico. Como já foi colocado no texto pelo Dr. Arthur, muita gente deixou de ter um tratamento oportuno por conta desse tipo de lógica terapêutica que se estabeleceu do ponto de vista da população e do mundo médico.
O que não contava o Conselho Federal de Medicina é que, durante o ano de 2020, houve uma queda desse pacto conservador que havia entre Conselho Federal de Medicina, Associação Médica Brasileira e Fenam, porque ficou tão absurda a postura das entidades médicas frente à pandemia apoiando esse tipo de posição que várias entidades científicas começaram a colocar, claramente, que era um absurdo essa lógica de tratamento precoce, até lógicas mais sérias de tratamento profilático, gente. Isso está acontecendo na população de forma disseminada como fator de confusão. E, a partir desse movimento de várias associações científicas, mudou-se a orientação da Associação Médica Brasileira do ponto de vista de ter um papel mais comprometido com aquilo que é a função dela, que é a ciência - é uma associação voltada para a questão da ciência.
E, aí, gente, vários dados começam a acontecer. No dia 15 de outubro de 2021, o Imperial College, de Londres, que é uma instituição universitária prestigiada do ponto de vista de epidemiologia, trouxe para gente que, no Brasil, ainda sem a gente estudar os impactos da vacina, se algumas medidas claras tivessem sido tomadas, como evitar a disseminação do kit covid, não querer relativizar máscaras, não querer fazer boicote à medida de distanciamento social; e, se as autoridades públicas, principalmente a autoridade federal, tivessem tido uma postura mais prudente em relação a isso, possivelmente 329 mil mortes, gente, teriam sido evitadas do ponto de vista da pandemia. E não estamos discutindo ainda os impactos da vacina; estamos discutindo os impactos das medidas de proteção individual e de saúde pública.
Poderíamos até falar: "Mas o Conselho Federal de Medicina teve essa postura no começo da pandemia, quando as coisas eram muito confusas, e fez uma legislação ainda no momento em que não havia tantas evidências científicas". Contudo, o Conselho Federal de Medicina, mesmo após, aliás, no transcorrer da etapa final da pandemia, continuou tendo a mesma postura nesse processo a que aderiu no início da pandemia.
No dia 21 de outubro de 2021, nós tivemos uma reunião da Conitec, que é um conselho importante para aprovar as normas técnico-científicas do ponto de vista do Sistema Único de Saúde ou para a votação relacionada ao relatório que discutia a questão do kit covid, e novamente a posição do Conselho Federal de Medicina, acompanhando as Secretarias do Ministério da Saúde, foi votar favoravelmente à questão do kit covid, gente. Então, são muito sérias essas questões que estão acontecendo.
O Conselho Federal de Medicina tem uma grande responsabilidade nesses fatores de confusão coletiva que foram produzidos. Há um processo claro de aparelhamento de uma instituição do Estado por interesses privados, por interesses políticos e ideológicos que não dizem respeito à natureza daquela instituição.
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E, nós, da Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares, seguindo um pouco uma série de posicionamentos que outras entidades, inclusive entidades institucionalizadas do Estado, têm apresentado diante dessa situação, queríamos trazer alguns elementos para esta Comissão para que possam ser encaminhados para providência junto aos órgãos competentes.
A primeira questão é que, dentro do Conselho Federal de Medicina, os acusados tanto pelo relatório da CPI do Senado da covid-19, como pela Defensoria Pública da União sejam rigorosamente investigados. Essa é uma questão bastante importante. Segunda questão: que, durante esse período de investigação, no decorrer da apuração dos fatos, eles estejam afastados. Essa é uma questão muito importante. E digo mais: não é somente o Presidente do Conselho Federal de Medicina. Há uma clara colaboração de outros diretores, de outros cargos da diretoria do Conselho Federal de Medicina que participaram desse processo de negligência, omissão e oportunismo político. Então, que sejam afastados dos seus cargos. Que o próprio Conselho Federal de Medicina esteja sob supervisão do Ministério Público Federal e do Tribunal de Contas da União, com o intuito de os conselheiros remanescentes e a burocracia dos conselhos não buscarem interferir no andamento de investigações, utilizando-se do seu peso institucional.
Já há ruídos... Como sou de um movimento social, posso falar isto muito tranquilamente: já há ruídos circulando no meio médico de que o Conselho Federal de Medicina vai tentar produzir constrangimentos para entidades científicas e médicos que se colocaram contra a questão dos kits covid. Já há notícias colocadas de que existe uma onda de perseguição velada aos colegas médicos que se posicionaram diante desse grande ocaso institucional.
Então, é importante um acompanhamento do Conselho Federal de Medicina, além de uma supervisão direta pelos órgãos de controle. Que esse mesmo acompanhamento pelos órgãos de controle seja estendido aos Conselhos Regionais de Medicina, que são estruturas ligadas ao CFM e também podem interferir no andamento dos processos.
E, ao se confirmar a veracidade dessas acusações, que haja uma intervenção no Conselho Federal de Medicina e a dissolução completa da atual diretoria. Sem esse tipo de medida, vão continuar acontecendo arbitrariedades, vão continuar acontecendo oportunismos, vão continuar acontecendo medidas que levaram milhares de brasileiros...
Eu digo para vocês isto: apesar desse debate da liberdade, desse discurso falacioso em relação à liberdade, as mais de 600 mil pessoas que morreram não tiveram a liberdade de escolher se queriam continuar aqui - elas não tiveram essa opção. E nós temos que ter o respeito por essas pessoas que se foram. Não é porque as pessoas que se foram não votam que, obviamente, a gente não vai se lembrar delas e do peso de tantas famílias brasileiras que vivem o sofrimento por conta do que aconteceu do ponto de vista desse ocaso da saúde, da condução da saúde pública no nosso País. Então, eu queria trazer esses elementos para vocês.
Senador Humberto, quanto ao que eu relatei para vocês, nós temos um documento da Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares um pouco mais esmiuçado em relação a esses dados e gostaríamos que esta Comissão pudesse dar os melhores encaminhamentos possíveis, se assim achar pertinente, em relação aos pleitos e às questões que colocamos de forma fundamentada.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Dr. Vinícius Ximenes, muito obrigado pela sua participação muito importante, muito esclarecedora.
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Aguardo, com muita expectativa, esse documento. V. Sa. sabe que eu fui um dos integrantes da CPI que mais batalhou para que a ação do Conselho Federal de Medicina na pandemia pudesse ser investigada. Infelizmente, nós não conseguimos ter sucesso em trazer integrantes da direção para as audiências públicas da CPI, mas nada impede que nós possamos, tanto os Parlamentares como a Comissão de Direitos Humanos, aprofundar essa investigação e fazer essa cobrança. De modo que eu peço que nos encaminhe esse documento.
Todos os documentos que foram aqui citados e que foram encaminhados pelos palestrantes a esta Comissão, desde que não tenham qualquer caráter sigiloso - se algum deles tiver, eu peço que as pessoas ou as entidades comuniquem a esta Comissão -, além de serem distribuídos aos Senadores, serão disponibilizados na página da Comissão na internet, bem como encaminhados a todos os membros do Senado Federal.
Eu quero também fazer uma comunicação. Amanhã, a partir das 9h da manhã, no Plenário do Senado Federal, nós teremos a comemoração do Dia Internacional dos Direitos Humanos, atendendo a um requerimento apresentado pelo Senador Fabiano Contarato, que é Vice-Presidente desta Comissão de Direitos Humanos. Essa sessão será presidida pelo próprio Senador Contarato, e eu aqui convido a todos os Senadores, a todas as Senadoras e também a todos os militantes, a todas as entidades da área de direitos humanos para que possam participar desse evento, quando o Senado reafirmará seu compromisso com a defesa dos direitos humanos no nosso País.
Eu pergunto aos Senadores presentes - Senadora Zenaide, Senador Paulo Paim e outros que estejam aqui na nossa reunião remota - se querem fazer alguma manifestação no espaço de cinco minutos. (Pausa.)
Eu passo a palavra à Senadora Zenaide.
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - RN. Para interpelar. Por videoconferência.) - Bom dia a todos!
Quero cumprimentar aqui o Presidente da Comissão de Direitos Humanos, meu colega Senador e médico Humberto Costa.
Agradeço a presença de cada um.
As exposições que os senhores fizeram foram esclarecedoras até demais.
Vou me dirigir ao Vinícius, último participante, que é representante e membro da Rede Nacional. Vinícius, a tudo que você falou aí a gente assistiu. Eu não fui membro da CPI, mas, quando eu vi o Conselho Federal de Medicina se manifestar dizendo que o médico, em nome de uma autonomia médica, poderia prescrever medicamentos sem nenhum eficácia terapêutica comprovada, aí foi que eu, mesmo sem ser membro, disse: isso está mais grave do que se possa imaginar.
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E isso, como você mostrou, se capilarizou. Uma grande parte dos Conselhos Regionais de Medicina deram o aval, como aqui no Rio Grande do Norte. Então, as pessoas recebiam.
O pior que eu achava não eram os prováveis efeitos colaterais desses pacientes que vinham tomando doses enormes de ivermectina, mas a falsa segurança, pois eles diziam que quem tomasse não teria. E se tivesse, era grave. Para mim, gente, eu não tenho nem dúvida, isso matou muito mais gente do que o próprio medicamento com cloroquina, com hidroxicloroquina.
Por isso, no último dia, eu tive o cuidado de dizer, porque a CPI acabou, Humberto, quando a gente encerrou aquele momento, na hora em que ela chegou às vítimas. Até então, a gente sabia que estavam morrendo milhares de pessoas por omissão e ação de Presidente irresponsável, genocida, como se diz, mas a gente não tinha ouvido ainda a parte, a família.
Quando eu vi aquela investigação da Prevent Senior, senhores, o Promotor Arthur mostrou aí, aquilo era difícil de a gente entender: o convencimento da família, daquelas menos esclarecidas, para que deixassem morrer.
Isso é uma coisa que a população não ficou...
Então, eu digo: hora de criar um observatório, uma frente parlamentar com esse observatório para passar a ouvir as famílias, as vítimas.
Mas achei bastante interessante quando o Sr. Renato Simões falou sobre a comissão da verdade, porque isso tem muitos desdobramentos, pessoas que ficaram. Há famílias que morreram inteiras.
Mas sabem o que eu acho grave, e a gente não pode calar este Senado? É que eles continuam com a mesma opinião.
Deixou-me indignada ver o Ministro da Saúde, médico, dizer que, para as pessoas, é melhor morrer do que não ter a liberdade; e o Presidente da República, proibindo de se cobrar, para entrar neste País, o cartão de vacina, enquanto os países do mundo fazem isso. Ou seja, as pessoas que não estão vacinadas e que são mal-intencionadas vêm para o Brasil, porque, no Brasil, podem fazer isso.
Quando se falou aqui em epidemiologia, da variante de Manaus, eu fiquei calada, porque é uma questão humana. Mas como se pega uma variante diferente em um Estado, e, em vez de se dar todo o suporte para manter as pessoas ali, se contrataram aviões no Governo e saíram distribuindo-as para todos os Estados? E quem se recusasse a receber era desumano e não queria ajudar os irmãos.
Aquela variante, que foi letal demais, Humberto, foi distribuída para a maioria dos Estados brasileiros e poderia ter sido contida dentro dos hospitais e das UTIs. E os profissionais médicos e enfermeiros foram vítimas demais disso aí.
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Só para encerrar, quero dizer o seguinte: vamos, sim, tentar apurar tudo. Isso não é uma história que termina agora. Isso é uma história que vai continuar, porque, como foi falado aqui, há o número de vítimas, a quantidade de pessoas que ficou sem pai e sem mãe. E a gente sabe que a maioria morreu de morte evitável, sim!
E a Presidência da República ainda achava gente. Os Ministros que não concordavam com essa matança, como a gente diz, saíram. E ele botou exatamente aqueles que concordaram. E mais grave: o que está lá hoje está concordando, mesmo a Anvisa tentando mostrar. A Anvisa, que tem uma credibilidade nacional e internacional grande, a está perdendo agora.
Obrigada, mais uma vez, por nos esclarecer, por nos encher de conhecimento real, cada um com a sua visão. Estamos dando visibilidade à população. Não fiquem calados! Denunciem quem matou seu familiar, mesmo sabendo que as drogas não tinham eficácia ou para economizar recursos dos planos de saúde!
Não pensem que é só a Prevent Senior. A gente sabe que é muito mais gente, viu, Humberto, muito mais seguro de saúde para economizar.
Obrigada. Muito obrigada, mais uma vez, aos palestrantes, porque a gente fica falando muito só, e, de repente, vocês vêm aqui e mostram aquilo que a gente sabia, mas vocês, mais apuradamente, olharam, presenciaram e estão documentando.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Obrigado à Senadora Zenaide Maia.
Eu pergunto se mais algum Senador deseja fazer uso da palavra.
Quero aqui registrar que esta reunião de hoje, esta audiência foi extremamente importante. Eu quero, inclusive, pedir aos que dela participaram que possam estar disponíveis para, em outros momentos, nós aprofundarmos estas questões.
Vejam a fala, por exemplo, do Dr. Vinícius. Em que pese o CFM ser uma entidade que regula o trabalho profissional e as eventuais mudanças que devam ser feitas no seu Conselho Dirigente sejam fruto da mobilização dos próprios profissionais médicos, aquilo que aconteceu, as atitudes, eu diria, em muitos casos, criminosas, que caracterizaram a participação não só do Presidente, mas de outros integrantes, precisam ser investigadas. A CPI promoveu a indicação do aprofundamento dessas investigações.
E nós temos o poder, como Senado Federal, de aprofundarmos essa discussão, de convocarmos os representantes dessas entidades, para que eles possam, aqui, explicar o seu posicionamento, de ouvirmos o contraditório por parte de associações científicas que questionaram essa postura. Sem dúvida, é uma questão que não pode ficar sem resposta para a sociedade brasileira.
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Lamentavelmente, nós estamos no final deste período legislativo. Provavelmente, a partir da semana que vem, nós não vamos ter continuidade nos trabalhos do Senado, pois haverá o recesso, mas no começo de fevereiro nós voltaremos aos nossos trabalhos. E essas pessoas podem ter certeza de que nós não vamos parar, pelo menos aqui na Comissão de Direitos Humanos e no Observatório da Pandemia, com o trabalho para que o Brasil tenha realmente as respostas necessárias quanto à responsabilidade daqueles que tinham a obrigação de promover esse enfrentamento.
Lembro que hoje nós aprovamos a nossa ida ao Tribunal de Haia. Possivelmente, isso vai acontecer ainda no mês de janeiro. Vamos definir a comissão que irá, já temos o aval do Presidente do Senado, e esse será um outro momento importante, em que nós iremos apresentar, ao Tribunal, uma comunicação quanto à atitude do Sr. Presidente da República, de vários de seus auxiliares e, inclusive, de agentes privados, que cometeram crimes contra a humanidade, nesse período de enfrentamento à pandemia.
Eu pergunto se algum dos expositores gostaria de fazer um pequeno complemento da sua fala. Se não houver, nós vamos concluir.
Alguém deseja fazer uso da palavra?
Dr. Renato Simões, eu peço, se possível, em dois minutos.
É possível?
Vamos lá.
O SR. RENATO SIMÕES (Para expor. Por videoconferência.) - Perfeitamente possível. Apenas para cumprimentar o Dr. Arthur e agradecer a sua exposição.
Nós constituímos um grupo de trabalho, de vítimas da Prevent Senior, aqui na Associação Vida e Justiça. Até, por coincidência, hoje, às 18 horas, temos reunião e fizemos uma análise dos encaminhamentos do Ministério Público Estadual, inclusive do TAC. E estávamos justamente discutindo uma audiência com o Procurador-Geral, para que as vítimas pudessem expor o seu ponto de vista e as suas contribuições. Então, eu gostaria de deixar aqui consignada a nossa intenção de procurá-lo, para esse diálogo.
Para nós é muito importante que as vítimas sejam ouvidas, também, sobre os processos de natureza criminal, que estão andando. Algumas delas já foram ouvidas em procedimentos formais, do Ministério Público, dessa força-tarefa. Então, para nós foi muito importante sua exposição.
Eu queria trazer, Sr. Senador, ao conhecimento desta Comissão, a pedido do Condepe, o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, aqui de São Paulo, um apelo para que a Comissão de Direitos Humanos do Senado, bem como a da Câmara, possa acompanhar o processo de indicação da lista tríplice para a ouvidoria das polícias do Estado de São Paulo, que é conduzida, constitucionalmente e legalmente, pelo Condepe.
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Há um impasse, neste momento, na indicação pelo Governador do Estado, desse órgão de controle social da ação das polícias, e aproveitando a oportunidade da fala, nós decidimos trazer ao conhecimento e pedir o apoio desta Comissão, para que essas políticas de participação social, no controle social das polícias, sejam mantidas no Estado de São Paulo.
Vou encaminhar, posteriormente, o pedido do Condepe para que a Comissão possa analisar e, se possível, atuar na mediação desse conflito entre sociedade civil e Governo de São Paulo.
Obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Pois não.
Dra. Maria Helena, dois minutos.
A SRA. MARIA HELENA MACHADO (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada.
Eu quero aproveitar a oportunidade, Senador, para pedir apoio a todos e a todas que estão nos assistindo e ao Senado, com certeza, para a pesquisa que nós estamos iniciando, tão importante, tão sensível e tão necessária, no Sistema Único de Saúde, no sistema especial de saúde indígena, que é a pesquisa dos trabalhadores da saúde indígena no contexto da covid, condição de trabalho e saúde mental.
Então, esse é o meu pedido, esse é o meu apelo. Que, em algum momento, a gente possa, com os resultados, trazer a esta Comissão um resultado tão delicado, tão necessário e tão estratégico para os nossos povos indígenas e para aqueles que atuam e assistem os nossos povos em todo o País. É isso.
Muito obrigado pela oportunidade, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Agradeço à Dra. Maria Helena.
De imediato, eu passo a palavra ao Dr. Vinícius, que também a pediu.
Em dois minutos, faça a sua complementação.
O SR. VINÍCIUS XIMENES MURICY DA ROCHA (Para expor. Por videoconferência.) - Perfeito.
Senador, uma sugestão: se esta Comissão puder refletir sobre ela, é, eventualmente, abrir um canal para que os médicos que viveram esse processo de constrangimento pelos planos, seguradoras de saúde e seguros privados, de prescrever kit covid, tratamento precoce e todas essas medidas sem validação científica possam ter um canal, do ponto de vista ou desta Comissão ou do próprio Senado, para receber a demanda dos profissionais.
Muita gente no nosso País teve situações como essa. E eu concordo com as falas que foram colocadas, não foi uma situação pontual da Prevent Senior. São várias situações. Não vou falar aqui o nome de empresas, porque eu acho que expõe de forma desnecessária e o trabalho tem que ser criterioso, de investigação, mas existem muitos colegas no País que foram constrangidos, vivendo situações como estas: plantões cortados, constrangimentos com direções clínicas...
Então, eu acredito que seja uma medida muito importante para a gente dar vazão a isso, porque, na verdade, como as nossas entidades de conselho estão num lado de defender essas questões, os profissionais ficam se sentindo às vezes inseguros de fazer esse tipo de posição, desamparados.
Então, eu acho que haver um canal institucional republicano para isso pode ter um impacto muito significativo.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Sim, com certeza.
Aliás, nós já temos, aqui na Comissão de Direitos Humanos, uma espécie de ouvidoria para recebermos uma série de denúncias que tratam do desrespeito aos direitos humanos, em várias esferas. Mas, especificamente nessa questão, como eu entendo que ela é muito delicada, eu vou, na primeira reunião que nós tivermos da Comissão, talvez definir alguém da Comissão que possa funcionar como uma espécie de ouvidor para o tema pandemia, já que essas denúncias devem estar muito marcadas, necessariamente, pelo sigilo, porque as pessoas podem ser prejudicadas. E vou ver de que maneira nós podemos fazer isso. Mas aqueles que queiram já apresentar essas denúncias podem...
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O SR. VINÍCIUS XIMENES MURICY DA ROCHA (Por videoconferência. Fora do microfone.) - Já há um e-mail e eu já passei o chat.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Já colocamos aí no chat o e-mail da Comissão e nós...
O SR. VINÍCIUS XIMENES MURICY DA ROCHA (Por videoconferência. Fora do microfone.) - E podem também divulgar esse e-mail.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Pronto! E vocês todos podem divulgar esse e-mail a quem quer que seja que deseje apresentar essas denúncias aqui à Comissão de Direitos Humanos.
Pois bem, nada mais havendo a tratar nesta reunião, eu agradeço penhoradamente aqui ao Dr. Lincoln Costa Valença, à Dra. Maria Helena Machado, ao Dr. Renato Simões, ao Dr. Arthur Pinto Filho e ao Dr. Vinícius Ximenes Muricy da Rocha, bem como agradeço a todos os Senadores e Senadoras que participaram desta reunião, e declaro encerrada esta audiência pública.
Muito obrigado a todos e a todas.
(Iniciada às 9 horas e 28 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 49 minutos.)