24/03/2022 - 9ª - Comissão de Assuntos Sociais

Horário

Texto com revisão

R
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Paz e bem. Bom dia a todos vocês.
Havendo número regimental, declaro aberta a 9ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Assuntos Sociais da 4ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura.
A presente reunião atende aos Requerimentos nºs 10 e 24, de 2020, da CAS, e nºs 10, 14 e 16, de 2022, também da CAS, de minha autoria e de autoria do Senador Sérgio Petecão, para a realização de audiência pública destinada a debater sobre constelação familiar e cura sistêmica.
Informo que a audiência tem a cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado, da Rádio Senado e contará com os serviços de interatividade com o cidadão, através do telefone 0800 0612211 - repito, 0800 0612211; quem quiser participar, mandar perguntas, comentários, é muito bem-vindo -, e também através do e-Cidadania, por meio do portal www.senado.leg.br/ecidadania, que transmitirá ao vivo a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos expositores via internet.
R
Eu, mais uma vez, agradeço a presença aqui da nossa Comissão, porque tradicionalmente funciona aqui a CDH, que é a Comissão de Direitos Humanos, e hoje este plenário recebe a CAS para um debate muito importante nesta audiência pública. Eu fico muito feliz em ver, praticamente, o plenário bem ocupado pela população. Esta Casa importante está aberta para todos participarem. Vejo aqui que há palestrantes que vieram pessoalmente e também pessoas, palestrantes que vão participar de forma remota, já com este novo sistema que a pandemia fez com que avançasse. Foi algo que afligiu muito - esta pandemia - todos os brasileiros e as pessoas do mundo inteiro, mas que trouxe também uma evolução na forma de se relacionar, e não há mal que não venha, de alguma forma, para o bem.
Eu queria fazer uma ligeira abertura aqui, antes de começarmos a ouvir os palestrantes, e dizer da minha enorme alegria porque a gente está iniciando o dia de hoje com um momento histórico no Congresso Nacional, quando teremos a primeira audiência pública a respeito das constelações familiares e curas sistêmicas no Senado Federal do Brasil, onde teremos a grata satisfação de ouvir especialistas no assunto a fim de elucidar o que é esta prática, como está sendo utilizada e os benefícios que vem trazendo para a população brasileira.
Desenvolvido por Bert Hellinger, na década de 80, este conhecimento terapêutico, relativamente novo no país, chegou ao Brasil na década de 1990, tendo iniciado uma forte expansão do início de 2010 para cá. Sua grande eficácia é relatada por milhares de pessoas que vêm buscando especialistas nessa prática com aplicação em diferentes áreas do conhecimento, mais notadamente na área terapêutica de saúde em empresas e organizações e na Justiça brasileira.
Devido ao seu grande apelo e repercussão na sociedade, é natural que nós, enquanto representantes da população brasileira nesta Casa, que é a Revisora da República, desejemos conhecer e esclarecer aspectos fundamentais inerentes à prática das constelações familiares e suas aplicações, além também de ouvir todos num ambiente democrático como este em que estamos. Como é uma audiência pública, não uma sessão especial, nós temos que ouvir os dois lados. Então, há posições divergentes, e nós vamos, aqui, com muito respeito, porque a regra da boa convivência é o respeito, ouvir, de forma justa, equilibrada, todos que quiserem se manifestar.
R
É nesse intuito, com essa motivação, que, nesta manhã, convidamos representantes notáveis ligados à prática das constelações familiares, com destaque especial para a presença da Sra. Sophie Hellinger, esposa de Bert Hellinger, que já partiu para o mundo espiritual.
Sophie, experiente consteladora familiar, acompanhou o marido por mais de 20 anos, apoiando-o no desenvolvimento das constelações familiares tais como são conhecidas atualmente. Ela também é fundadora da Escola Hellinger, que também no Brasil vem se dedicando a formar e treinar profissionais com o critério e a qualidade fundamentais à postura terapêutica responsável.
Bert Hellinger desenvolveu e sistematizou os princípios que dão base à prática e à teoria das constelações familiares. Teólogo, filósofo e pedagogo, é conhecido mundialmente por sua grande experiência na observação e no estudo das dinâmicas que regem as relações humanas e na aplicação terapêutica desses conhecimentos. Com isso, auxiliou milhares de pessoas em mais de 50 países a encontrar uma visão mais ampla, leve e conciliadora a respeito de suas próprias histórias de vida.
Vale ressaltar que Bert Hellinger foi um padre missionário por 25 anos e atuou por muito tempo na África do Sul, durante o período do apartheid, trazendo conhecimentos da cultura zulu e sua forte ligação e postura de reverência aos antepassados como uma das bases fundamentais desse campo de conhecimento.
Durante a década de 80, Bert Hellinger, com seu modelo de terapia breve, passou a ser convidado por diversas escolas e áreas profissionais da ajuda, como psicólogos, psiquiatras, terapeutas, médicos, entre outros, para demonstrar suas descobertas a respeito das dinâmicas que atuam na alma humana. Formou terapeutas em diversos lugares do mundo, e hoje este conhecimento é aplicado na Alemanha, na Espanha, na Inglaterra, em Portugal, nos Estados Unidos, tendo se expandido para diversos outros países do mundo, inclusive o Brasil.
Na década de 90, por meio do Dr. Renato Bertate, médico e constelador familiar, que hoje também está aqui conosco, foi organizado o primeiro evento de constelações familiares, tendo a alemã Sra. Mimansa Erika Farny como a primeira facilitadora da técnica em solo brasileiro.
R
Desde então, esse campo do conhecimento tem se desenvolvido por meio de diversos profissionais que buscaram sua formação junto a Bert Hellinger e seus multiplicadores de diversas nacionalidades, que passaram a vir ao Brasil todos os anos desde então.
Nesse período, o Dr. Renato Bertat, o Dr. Décio Oliveira, também aqui presente, e outros médicos passaram a adotar essa postura sistêmica em suas práticas, alcançando expressivos resultados, uma vez conjugados os princípios da Medicina tradicional, sempre como um complemento, e não como um substituto desta.
Mais tarde, especificamente no ano de 2018, a aplicação das constelações familiares no âmbito da saúde foi reconhecida pelo Ministério da Saúde e passou a compor o rol das Práticas Integrativas e Complementares, as chamadas PICS, no Sistema Único de Saúde do Brasil (SUS).
Os expressivos resultados das constelações familiares na história de cada pessoa que foi profundamente transformada por essa prática fomentaram o surgimento de diversas escolas, consolidando, assim, sua expansão no país. Esse conhecimento foi também fortemente aplicado junto a empresas, com a visão sistêmica organizacional.
Nesse ínterim, na década de 2000, o Juiz de Direito Sr. Sami Storch, também aqui presente, conheceu esses fundamentos e passou a aplicá-los em sua postura na magistratura. Em audiências junto a requerentes na Justiça, passou a adotar visualizações, frases e explicações sistêmicas, obtendo resultados impressionantes. Com o passar do tempo, o magistrado constatou, por meio de pesquisas, que as constelações familiares, quando aplicadas dentro dos termos da lei, são um valioso caminho de acordo entre as partes ali representadas, chegando a alcançar a marca de mais de 90% de conciliação em seus processos na vara da família das comarcas em que já atuou e segue atuando no Estado da Bahia. Ele vai compartilhar um pouco desse conhecimento hoje conosco aqui, desses resultados.
Por tais experiências, outros operadores do Direito, entre eles advogados, defensores públicos, promotores e juízes, passaram a buscar formações para se capacitarem na aplicação desses conhecimentos em suas respectivas áreas de atuação, em muitos casos, conseguindo resultados semelhantes.
Como em toda área do conhecimento que surge em algum tempo da história da humanidade, a franca expansão das constelações familiares hoje demanda atenção e cuidado para garantir a formação dos profissionais que a utilizam em suas áreas de atuação e a segurança na forma como está sendo aplicada em todas as áreas da sociedade.
R
Por se tratar de um trabalho inerente à alma humana, é fundamental promover o estudo, o treino, a ética e a formação contínuas para que seja possível garantir o que recomenda o renomado psiquiatra suíço Carl Gustav Jung, abro aspas: "Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas, ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana.", fecho aspas.
Assim, o meu desejo é o de que esta manhã, que deve entrar pela tarde, seja muito proveitosa para todos nós, para todos que estamos aqui nesta Comissão do Senado Federal do Brasil e para todos que estão em casa. Por isso, vai ficar registrado nos Anais e nas redes sociais do Senado Federal, e as pessoas vão poder consultar, assistir. Foi assim em outras reuniões que nós realizamos por aqui, sobre outros temas.
Eu espero que, de alguma forma, esse diálogo pacífico, equilibrado, ouvindo os dois lados com respeito, seja esclarecedor para todos nós, para que esse campo do conhecimento possa continuar sendo aplicado de forma cuidadosa e responsável em nosso país.
Eu me sinto, particularmente, muito honrado de ter esta grata satisfação de propor que esse tema seja conhecido e apreciado por esta Casa e, particularmente, de presidir esta audiência. Eu demonstro aqui também a minha gratidão - é um testemunho - por ter já participado de várias constelações. Sou muito grato, sou muito grato porque vi a eficácia, porque percebi nas pessoas, em centenas com quem eu tive contato, que realmente é uma ferramenta que tem ajudado em todos os aspectos, inclusive no autoconhecimento.
Nós estamos aqui para conduzir. A partir de agora, nós vamos ouvir, com muito respeito, todos, quem pensa a favor e quem pensa contrariamente. Eu tentei aqui fazer algo alternado - um a favor, um contrário -, mas foi solicitado que os contrários, por eles mesmos, falassem em sequência. Então, respeitando aqui alguns voos de pessoas que estão aqui neste recinto e que vão ter de voltar, no começo da tarde, para os seus Estados, tomo a liberdade de fazer uma sequência inicial dos favoráveis; logo depois, a gente entra na sequência dos que são contra; e a gente encerra com dois que não têm problema de voo e que podem fazer o encerramento aqui.
É importante deixar claro que nós teremos dez minutos - a título de procedimento - de fala para todos os participantes. Nós vamos dar uma tolerância de dois minutos, no máximo. Eu peço a compreensão de todos vocês.
R
Como nós temos aqui dois a mais que são favoráveis, nós vamos compensar um pouco no tempo daqueles que são contrários. É justo que seja feito assim. Então, a gente vai dar uma tolerância um pouco maior para quem é contrário. Em vez de uma tolerância de dois minutos, quem é contrário pode ir até 15 minutos, está certo? Dá para fazer mais.
No final, depois de a gente ouvir todos os palestrantes, nós vamos abrir para perguntas. Muitas a gente já recebeu ao longo desses dias aqui, muitas manifestações, para você ver como esse assunto desperta a atenção do brasileiro cada vez mais. Nós recebemos muitas manifestações, mas também vamos abrir, durante a sessão, para dúvidas que sejam suscitadas por você que está nos assistindo aí em casa, no trabalho, enfim, para que você possa fazer perguntas pelo e-Cidadania e pelo Alô Senado, que são canais que vão estar online aqui, abertos, para que a gente possa, depois, transmitir para todos os palestrantes. E vamos ter uma fala final de cada um por cinco minutos para responder àquelas perguntas que sejam direcionadas a ele, ao palestrante, ou sobre o que ele se sinta, de alguma forma, confortável para responder dentro da sua abordagem.
Antes de passar a palavra para a nossa primeira palestrante, que é a Sophie Hellinger, que já está conectada diretamente da Alemanha - agradeço muito a disponibilidade dela -, eu vou passar agora aqui os contatos do e-Cidadania novamente, para que as pessoas possam fazer perguntas. Então, vamos lá! O telefone direto, gratuito: 0800 0612211 - repetindo: 0800 0612211. E também pode ser pelo e-Cidadania, que é o portal. Você vai lá na internet e coloca www.senado.leg.br/ecidadania. Lá você pode fazer tanto pelo telefone, porque aqui vamos ter pessoas pegando as perguntas, como pelo sistema, vai lá, cadastra e faz a pergunta. A gente vai procurar encaminhar aqui, no final deste debate histórico, emblemático que a gente está fazendo, nesta audiência pública sobre constelação familiar no Senado Federal do Brasil.
No meu Instagram também - eu estou recebendo a informação aqui -, nós estamos colocando essa possibilidade, no meu Instagram oficial, que é @eduardogiraooficial. Você pode acessá-lo e fazer perguntas, porque a equipe aqui vai pegar. Eu agradeço aí, eu não estava nem esperando por essa. Obrigado à equipe aqui da CAS (Comissão de Assuntos Sociais) do Senado Federal.
R
Então, passo a palavra, por 10 minutos, com a tolerância de dois - e nós teremos um tradutor, que está online e vai fazer a tradução simultânea -, à Sra. Sophie Hellinger.
Por favor, já está conectado? Dá para colocar na tela aqui? (Pausa.)
Pronto!
Então, já pode começar, Sophie.
Welcome here!
A SRA. SOPHIE HELLINGER (Para expor. Por videoconferência. Tradução simultânea.) - Exmas. Sras. Senadoras e Srs. Senadores, professores, doutores e participantes que estão em casa, na telinha, é para mim um prazer, uma honra imensa falar diante de V. Exas.
Meu nome é Sophie Hellinger e eu sou a esposa e parceira de longa data do fundador das constelações familiares, Bert Hellinger, que faleceu em 2019. Juntamente com meu marido, desenvolvemos a constelação familiar ao longo das últimas décadas.
Com relação ao meu marido, Bert Hellinger, gostaria de destacar que ele trabalhou ativamente, de forma bem sucedida, durante décadas nos campos da psicologia e da pedagogia. Como ex-padre, ele foi o chefe de uma escola de elite na África do Sul; foi um dos melhores e primeiros praticantes europeus de dinâmica de grupo; ele teve o reconhecimento estatal e licença estatal como psicanalista, formando-se em terapia primária com Arthur Janov, nos Estados Unidos. Além disso, ele se formou em hipnoterapia, seguindo Milton Erickson; programação neurolinguística e análise transacional, conforme Eric Berne. Só para citar apenas algumas de suas formações.
A constelação familiar desenvolvida por meu marido, Bert Hellinger, é frequentemente confundida com o termo internacionalmente usado family constelation, o que é um erro de tradução. Esse termo tem origem nos anos 20, quando a constelação familiar, como criada pelo meu marido, nem sequer existia.
Em uma constelação familiar, os membros da família de origem ou da família atual do cliente e, muitas vezes, o próprio cliente são representados por participantes.
Eu estou fazendo esses comentários porque eu não sei quem está ouvindo ou participando desta reunião, se essas pessoas conhecem a constelação familiar, se elas vivenciaram a constelação familiar.
Esses representantes se sentem e se movem de forma surpreendente e incrível, como se fossem as pessoas que estão representando. Elas estão sentindo o que as pessoas que estão representando sentem. A razão dessa conexão é o campo morfogenético, descoberto pelo renomado biólogo britânico Rupert Sheldrake.
R
O que é decisivo sobre a constelação familiar é que, embora inicialmente fosse um método de psicoterapia - pelo menos era isso que o meu marido acreditava no começo -, logo ele percebeu que suas descobertas também poderiam oferecer ajuda na vida de pessoas que não sofriam de um distúrbio mental diagnosticável.
Uma vez que provavelmente cada pessoa tem pelo menos um problema pessoal importante em sua vida para ser resolvido e lidado, na maioria das vezes este está diretamente relacionado ao próprio sistema familiar, entretanto, de forma inconsciente.
As leis básicas da vida que são universalmente válidas, descobertas por meu marido, formam a base da constelação familiar. As leis básicas da vida obedecem a certas ordens muito precisas e por isso foram chamadas por ele de ordens do amor.
As duas ordens mais importantes na família e na constelação familiar são o direito ao pertencimento e todas as participantes... E outro ponto importante é a hierarquia na própria família. Se o pertencimento e a hierarquia não forem respeitados, isto pode, muitas vezes, levar a sérios problemas psicológicos e também físicos para alguns membros da família, mesmo gerações mais tarde, podendo levar até a morte.
A constelação familiar reconhece o funcionamento dessas dinâmicas ocultas que sobrecarregam os sistemas que estão sendo constelados e trazem à tona os seus emaranhamentos. Em trazer à tona o reconhecimento está o caminho que leva à solução, trazendo paz e cura a todos os envolvidos, que age profundamente na alma, isso durante muitos anos, mesmo após o término da constelação.
Eu posso imaginar que esses processos, esses procedimentos sejam estranhos para quem nunca tenha participado de uma constelação, que para alguém que nunca tenha sido um representante numa constelação esses procedimentos possam não ser entendidos.
E por isso eu gostaria de lhes dar um exemplo. Cada um de vocês certamente conhece uma criança que, em seu ambiente, se comporte de maneira incompreensível, de maneira extremamente inadequada. E, geralmente, é só uma criança em uma família, apesar de a família ter vários filhos, mas esta criança em especial tem algo de diferente.
R
Nem broncas nem punições têm sucesso e não mudam o comportamento errado dessa criança.
E agora eu gostaria de usar um exemplo que, infelizmente, acontece várias vezes, muitas vezes.
Uma jovem menor de idade engravida. Seus pais acham que ela é muito jovem para se tornar mãe ou não gostam do pai da criança ou a filha foi talvez até violentada e, por causa dessa violência, engravidou. Os pais insistem em um aborto, para que a honra deles não fique manchada e para que o respeito pela família continue. Essa jovem mulher segue o conselho dos seus pais. E o que acontece anos depois? Essa jovem mulher vai se casar por amor e tem um ou mais filhos. A criança abortada, lá no passado, já foi esquecida e a memória desse acontecimento foi reprimida por todos. A criança que nasceu depois começa a ter um comportamento estranho: é agressiva, por exemplo; recusa-se a aprender ou se recusa a ir à escola; e, quando na escola, muitas vezes, tumultua as aulas. Apesar de todos os esforços, os pais não conseguem uma conexão com a criança que eles tanto amam, o que mostra uma constelação familiar, neste caso. A criança sente que está em primeiro lugar na linha dos irmãos e é preciso que se dê o lugar certo, correto a ela.
Mas, mesmo as crianças abortadas, as falecidas e até as natimortas contam no sistema da família como plenos membros da família. Ser sonegado, dentro da hierarquia, o seu devido e legítimo lugar se torna perceptível através do comportamento estranho da criança que tomou o seu lugar. A criança viva sente-se ligada ao irmão morto num nível completamente inconsciente e se sente conectada pelo coração e segue o desejo interior de lhe dar o seu devido lugar.
Em uma constelação familiar, esse problema é trazido à tona e, ao mesmo tempo, resolvido. A criança viva recebe o seu lugar de direito, ou seja, o segundo lugar; e a criança morta, nesse caso, recebe o primeiro lugar na linha dos irmãos.
R
Muitas vezes, eu vi que, depois desse tipo de constelação, o rebelde da classe se tornou o representante da classe, no bom sentido. Essa solução ainda pode, naturalmente, ocorrer na vida adulta. Para as pessoas que não ocupam o seu devido lugar no sistema familiar, muitas vezes, falta uma base sólida na vida, o que se reflete na vida em uma especial falta de vontade de viver, se mostra em depressão e, muitas vezes, também se mostra em várias doenças e até mesmo em pensamentos suicidas. Só esse exemplo já mostra o nível de responsabilidade que o constelador familiar tem que ter.
Em uma constelação familiar, podemos observar como os limites do espaço e do tempo são virtualmente abolidos, mas, assim como as coisas que foram, são e serão, aparecem de uma vez e são mostrados a todos.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Marcos, peço à Sophie...
A SRA. SOPHIE HELLINGER (Por videoconferência. Tradução simultânea.) - Mas, como não existem duas pessoas idênticas, não existem duas constelações idênticas.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Eu queria só pedir ao Marcos, que é o tradutor - não sei se ele está nos ouvindo; agradeço demais o seu trabalho aqui -, que peça para concluir.
Quero conceder mais um minuto.
Infelizmente, a gente gostaria de ouvir mais, mas há um limite aqui.
Se puder concluir em um minuto, eu agradeço.
A SRA. SOPHIE HELLINGER (Por videoconferência. Tradução simultânea.) - Independentemente da área de trabalho, a constelação familiar pode ser uma ferramenta auxiliar, seja com professores, seja com trabalhadores da área social, seja com juízes, seja com advogados, seja até com pessoas da política e com empresários.
Quero dar e oferecer a minha experiência como consteladora, estando à sua disposição, mas é importante mencionar que a constelação familiar, como todas as áreas de conhecimento, se desenvolve constantemente, o que, numa regulamentação dessa profissão, precisa ser considerado também. Uma regulamentação não deve ser um espartilho rígido, mas deve ser sempre adaptada às novas descobertas e deve se adaptar às novas eras, assim como todo trabalhador certificado da constelação deve se sentir obrigado a acompanhar os desenvolvimentos futuros e a participar, regularmente, de cursos e de treinamentos adicionais.
Muito obrigada pelo tempo que vocês me deram.
Quero, mais uma vez, dizer que todos vocês têm uma parceira, uma companheira respeitosa em mim. Como esse tempo de hoje foi tocado a curto prazo, infelizmente, não pude mudar as minhas obrigações, que seguem.
R
Por isso, preciso me despedir agora com um grande abraço a todos que conhecem a constelação familiar e aqueles que não conhecem ainda a constelação familiar. Talvez seja deste instrumento que vocês precisam para que sejam felizes, tenham sucesso e passem pela vida com saúde, não só vocês, mas toda a sua família.
Um grande abraço, da Alemanha.
Estou conectada a todos vocês, de coração a coração, e fico feliz em vê-los todos.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado. Nós que agradecemos à Sophie Hellinger e também ao Marcos, que fez a tradução. Foi muito importante.
Eu peço desculpas por ter que interromper. A gente sabe que a Sophie é uma referência também mundial nesse assunto, mas nós teremos, se Deus quiser, outras oportunidades para ouvi-la mais. Nós temos outros palestrantes aqui que vão poder complementar algum pensamento dela, que não pode ser concluído, mas a gente tem que sequenciar aqui. Nós temos um roteiro e precisamos cumpri-lo de forma justa e equilibrada.
Então, eu agradeço.
Um abraço, do Brasil, carinhoso, com muita gratidão, Sophie Hellinger, para você. Muito obrigado por participar, de forma remota, mas estando aqui conosco, nesta reunião de debates. Na verdade, é uma audiência pública no Senado Federal brasileiro sobre esse tema tão importante.
Então, vamos sequenciar aqui, agora ouvindo imediatamente o Sr. Renato Shaan Bertate, que é médico e Presidente do Instituto Brasileiro de Constelação Familiar.
O senhor tem dez minutos, com a tolerância de dois. A gente tem que ser rígido com relação a isso. Eu peço desculpas. Eu sei que é muito difícil, mas te desejo uma boa palestra também.
Muito obrigado.
O SR. RENATO SHAAN BERTATE (Para expor.) - Bom dia a todos. É um grande prazer estar aqui com vocês neste momento, que, como diz o Senador Eduardo Girão, é um momento histórico.
Para que estejamos aqui significa que a constelação, que chegou há 25 anos no Brasil, ganhou voz. Isso significa que ela se expandiu. E, desde aquele primeiro grupo que organizei aqui no Brasil, com a Sra. Mimansa, amiga pessoal do Bert, há 25 anos, eu jamais imaginei que esse trabalho, em tão pouco tempo, pudesse ter-se expandido em todas as áreas, algo que a gente nem podia imaginar naquela época, em que a constelação estava dentro do universo das terapias apenas. E eu me interessei pelo assunto como cliente, como paciente, alguém que buscava compreensões sobre mim mesmo, curas pessoais, e nunca imaginava que isso poderia ser utilizado no meu trabalho profissional como médico para ajudar as pessoas. Assim como eu nunca imaginei que esse trabalho associado à Medicina como um recurso extra que pudesse ajudar os médicos, os terapeutas a tratarem sintomas de doenças que, às vezes, só os remédios não são o suficiente, pessoas que sofrem muito. E também jamais podia imaginar que esse trabalho pudesse alcançar a área das organizações, das empresas, das escolas, do Judiciário, como o Sami Storch levou.
R
Portanto, se hoje estamos aqui falando sobre tudo isso, eu acredito que é porque isso ganhou voz, e se isso ganhou voz é em função de todos os benefícios que milhares e milhares e milhares de pessoas vêm tendo com esse trabalho.
Eu entendo que, assim como na Medicina, existem pessoas que cometem erros às vezes, assim como em qualquer área da vida. Todos somos seres humanos e, às vezes, podemos cometer erros, e pessoas estarem insatisfeitas e saírem até mesmo magoadas ou até agredidas, não importa. Portanto, eu acredito que, se estamos aqui, é porque esse trabalho ganhou voz, e é um momento muito especial porque aqui temos a possibilidade de, todos juntos, ouvir os dois lados.
É intrínseco da vida, para aqueles que já se debruçaram nas compreensões ou na tentativa de compreender a vida, que tudo que surge na vida tende a se expandir, a crescer, e, ao mesmo tempo, outra força se movimenta ao contrário, fazendo um contraponto. Então, aqueles que se debruçaram e olharam para o ser humano dentro de uma amplitude maior também já perceberam que os conflitos que nós como indivíduos vivemos, que instituições vivem, é algo maravilhoso, porque está a serviço da vida, a serviço da evolução, a serviço da ampliação, a serviço do crescimento. O Bert mesmo falava sobre isso. As crises são aquela máquina que movimenta a evolução e força todos a sair de um lugar de conforto ou de um lugar já congelado que não tem mais vida. Portanto, eu vejo este encontro como uma oportunidade maravilhosa para que se coloque todo esse trabalho num movimento mais profundo do que ele já vive.
Como médico, eu comecei a perceber que esse olhar sistêmico se apresentava de forma muito profunda em muitos sintomas, em muitas doenças. Subitamente, eu comecei a perceber que a constelação ajudava essas pessoas a ter clareza de determinados sintomas ou mesmo de determinadas doenças que emergiam como dinâmicas profundas inconscientes, e isso ajudava as pessoas a lidar com suas questões, desaparecendo os sintomas e, muitas vezes, curando doenças que até então a gente não conseguia ajudar apenas com as medicações.
R
Eu mesmo utilizo os remédios, mas a gente sabe, como o nome diz, "remédio", "remediar", muitas vezes ele é um suporte para tratar determinados sintomas, mas não promove a cura. Muitas doenças não têm cura.
Desde a época em que eu fazia faculdade de Medicina, eu me interessava em entender o que existia por trás e, formado há mais de 30 anos, no Brasil, não tínhamos muito conhecimento sobre isso. Então, eu parti para muitos países do mundo na tentativa de compreender o ser humano nas suas questões psicológicas, com várias técnicas, assim como entender a alma, a leitura corporal. E, nessas formações todas, encontrar a constelação para mim foi aquilo que uniu todos esses conhecimentos do ser humano na sua integralidade. Portanto, tudo que o ser humano vive é importante para a vida dele: o seu trabalho, as suas relações afetivas, a sua relação com a religião, com a sua etnia; tudo isso é importante, podendo determinar muitos conflitos.
Teria tantos exemplos aqui para dar a vocês, mas me ocorreu agora um, quando a Sophie falou, de uma criança. Uma mãe, certa vez, me procura no consultório, porque a filha dela de sete anos tinha parado de ir à escola, tinha parado de se alimentar e parado de brincar; todos os exames não apresentavam nada. E essa mãe estava desesperada, porque a criança começou a definhar. E, por um acaso, eu disse: "O.k., vamos olhar para isso, temos um grupo amanhã e vamos olhar para isso. Vamos ver se a constelação nos revela alguma dinâmica de que não se tem consciência".
Quando se colocou a constelação, colocamos um representante para a criança, um representante para o pai e para a mãe; se mostrou claramente que a representante da mãe tinha um problema sério com o pai e a família do pai. Portanto, essa mãe começou a impedir o movimento da criança em relação aos avós. Ela não achava que a casa dos avós era um ambiente adequado para a sua filha, ou seja, os avós por parte de pai. E com isso ela começou a impedir que a criança tivesse acesso a esses avós. Só que isso foi feito de uma forma muito sútil, não declarada: "Você está proibida" era disfarçado: "Não, filha, hoje, não. Não, deixa para a semana que vem. Outra hora, hoje você não pode", era assim. Isso ficou muito claro ali nessa situação.
Quando isso veio à tona, a mãe levou um choque, porque ela não tinha se dado conta desse movimento de impedir a criança em relação aos avós, ela não fazia isso de maldade. Como os avós e o tio estavam passando por uma situação difícil, ela acreditava que não era adequado essa criança estar lá e que a família dela era muito melhor do que a família do marido, e, portanto, tudo que a criança precisava estava na família dela, e não na família do pai. Quando tudo isso foi vindo à tona, essas dinâmicas invisíveis, ela chorava profundamente ao ver o sofrimento da criança que amava os avós e que estava impedida de ter acesso a esses avós.
R
Então, a mãe, nesse momento, reconheceu que os avós, os pais e o marido tinham direito à filha dela, à neta, assim como os seus pais. Ela ficou muito emocionada e tomou consciência de algo que ela fazia, não por maldade, e assim ela ficou de acordo e reconheceu que ela não deveria fazer isso. Passados dois dias, assim ela foi embora. Passados dois dias, ela disse... Ela me ligou de volta e disse: "Eu cheguei em casa; naquela mesma tarde a criança começou a brincar, naquela mesma tarde a criança começou a se alimentar e ela está ótima. Eu não tenho como agradecer tudo que você fez. Você salvou a minha filha". E eu disse: "Não, eu não salvei a sua filha: na verdade, você salvou a sua filha quando você pôde reconhecer algo, porque você estava violando uma das leis naturais da vida que é aquela primeira [de que até a Sophie falou], que é a da pertinência". Ou seja, todos que pertencem ao sistema têm igual direito de pertencer. Se é negado a alguém esse direito, alguém vai sofrer as consequências disso. Isso era algo que nós não tínhamos como acessar antes das constelações, porque isso as constelações nos revelam ali. São dinâmicas invisíveis que estão dentro do campo.
Portanto, é uma honra estar aqui e um prazer poder compartilhar esse presente que o Bert nos deixa, porque é um presente para a vida, é um presente de como olharmos para a vida.
Então, eu me despeço aqui e agradeço a todos a oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Renato Shaan Bertate, que é médico e Presidente do Instituto Brasileiro de Constelação Familiar.
Eu também já presenciei vários exemplos desses, que realmente ficam bem à vista e nos emocionam - não tem como não se emocionar. Mas é interessante esse exemplo prático que foi dado aqui. Eu te agradeço por isso, porque as pessoas que estão em casa e não têm contato ainda com a constelação, ou não tiveram ou não sabem o que é que significa... Às vezes na teoria aquela coisa fica muito maçante, não é? Eu acho que o exemplo assim abre e comunica com todo mundo. Eu te agradeço por ter dado esse exemplo aqui.
Eu quero aproveitar, antes de passar a palavra para o Inácio Junqueira, que é o Diretor da Faculdade Innovare, e registrar a presença de algumas pessoas que estão aqui conosco participando - fizeram questão de vir aqui ao Senado Federal. São muito bem-vindas! Eu quero registrar a presença: do Fabrício Nogueira, que é do Instituto Brasileiro de Inteligência Espiritual, representado por Carla Santana; da Dra. Ninon Rose de Calasans, advogada, membro da Comissão de Direito Sistêmico aqui do Distrito Federal; da Salete Moreira, da Comissão de Direito Sistêmico, também do Distrito Federal, é professora sistêmica; a Isabela Romina Diniz, representante da Hellinger Brasil; a Germana Magalhães Carsten, consteladora familiar formada pela Hellinger. É isso mesmo, não é? Hellinger Schule Innovare. Germana, seja muito bem-vinda, todos vocês. É uma honra uma alegria muito grande estar recebendo aqui vocês.
R
Vamos passar imediatamente agora para Inácio Junqueira fazer a sua palestra, em dez minutos, mais dois de tolerância. Agradeço ao Renato por ter observado aí o tempo.
Inácio, muito obrigado pela sua presença.
O SR. INÁCIO JUNQUEIRA (Para expor.) - Agora está funcionando? Está.
Bom dia a todos e a todas. Muito obrigado pelo convite.
Eu, ao contrário do Renato, não estava procurando nada, porque eu achava que a minha vida estava boa, que estava tudo resolvido e que eu era feliz. Mas eu tinha um incômodo na minha vida, e esse incômodo estava guardado dentro de mim. E aí, um belo dia, encontrando as constelações no meu caminho, eu, como de uma faculdade que é o modelo de faculdade diferenciado, que é uma faculdade onde os professores são donos da faculdade, é uma cooperativa educacional... E a gente trabalhando com vários tipos de formações novas, diferentes, a gente também buscava coisas que pudessem ajudar o próximo. E como um projeto que começa com "Leis do amor e leis da ajuda" não pode ser algo bom? Amor e ajuda e constelação familiar significam família. Então, é uma coisa que o povo brasileiro perdeu, essa questão de família. É família bagunçada, complicada. E, quando você fala "honrar pai e mãe", isso é um dos primeiros preceitos dentro desta questão da constelação familiar.
Então, antes de ser diretor da faculdade, eu sou uma pessoa que foi criada por mãe e por vó, que eu tinha o meu pai como uma pessoa que faleceu quando eu tinha seis anos, mas aquela questão que muita família vive, em que o pai era isso, que o pai era aquilo, que o pai era aquilo outro. E aí eu vim com uma questão para a minha vida de que eu não tinha pai, queria ser o melhor pai do mundo, e eu nunca reencontrava com meu pai. Aí, numa constelação o encontrei, e minha vida mudou por completo. Então, foi através das constelações que eu consegui mudar a minha vida, reencontrar com meu pai, reencontrar com a minha história, com os meus ancestrais e colocar a minha vida no eixo.
E foi através disso que a gente viu que isso funciona. Se funcionou para mim, por que não pode funcionar para os outros? Então, uma coisa que eu prego muito dentro dessa história das constelações é que, para eu ser um bom constelador e ajudar o próximo, primeiro, eu tenho que ajudar a mim. A primeira pessoa sou eu. Então, eu resolvo o meu problema, coloco e faço.
E aí surgiu o Sami na minha vida. E o Sami surgiu de uma maneira que acho que os astros que dizem "vamos unir essas pessoas". A coisa se encontrou e eu fiz uma primeira constelação familiar na Alemanha, com Sophie Hellinger. Tive o prazer de conhecer Bert Hellinger. E, naquela época já, seis, oito anos atrás, já existia esse crescimento. E, quando algo cresce em qualquer atividade, seja na Pedagogia, seja na Contabilidade, porque eu sou contador, seja no Direito, cresce às vezes desordenadamente. E há muita gente que não faz as coisas adequadas às vezes por falta de conhecimento e às vezes por empolgação: "pô, vamos fazer que o negócio é bom". Então a gente decidiu fazer um curso de pós-graduação nessa área de constelação familiar e a gente já partiu para a oitava turma, já formamos mais de mil pessoas no Brasil. Trouxemos professores das mais diversas atividades.
R
Eu tenho grandes amigos pesquisadores, cientistas, neurocientistas, grandes amigos, e a gente vê que, quando a ciência vem e fala que isso não está... A gente é a favor da ciência, a gente quer que a ciência esteja conosco e a gente faça da melhor forma possível. Nós estamos aqui de corpo e alma para poder fazer o melhor, porque quem mais tem sucesso com as constelações é a população, e isso faz e muda a vida de muitas pessoas. Na área do Direito, muitas ações maravilhosas e também muitas ruins, porque faz parte desse crescimento. Em toda profissão há aqueles bons e maus profissionais. Então eu acredito que as constelações familiares dependem de tudo isso aqui, de um debate, de uma união de forças, de a gente poder se unir, de a gente estudar, de a gente ir à parte científica, em tudo isso, porque, se fez bem para mim, se fez bem para milhares de pessoas, por que não pode fazer bem para outras pessoas?
Vamos separar o joio do trigo. Não é a constelação familiar que é ruim. São algumas pessoas que, em nome da constelação familiar, fazem coisas erradas. E são poucas. É a minoria; a minoria. Só que, infelizmente, o que mais se propaga, como tudo na vida, é a parte ruim, e a parte boa acaba não se propagando. Então, eu vejo que quando a gente fala de honrar pai e mãe, de família, de ordens do amor, ordem da ajuda, o nosso papel é estar aqui para ajudar as pessoas, ajudar a população, ajudar os consteladores, ajudar as pessoas a fazer algo melhor, porque, em toda profissão como a minha - eu sou contador de formação, sou diretor de uma faculdade - eu quero ser o melhor profissional. Então, dentro das constelações familiares eu acredito nisso também, de que há excelentes consteladores, excelentes projetos na justiça, projetos maravilhosos.
Eu participo, como voluntário, de um projeto na Justiça e é uma coisa assim que também está mudando a minha vida. A gente podendo auxiliar o próximo, auxiliar as pessoas que têm dificuldade, como eu tive de reconhecer meu pai durante anos na minha vida. E aí vem a história da sequência da vida, e isso se propagou, de que eu quis ser o superpai, o pai protetor, tive dois filhos gêmeos, agora tenho um filho de nove anos, tenho dois netinhos, e hoje um faz um ano de vida, e a família se une através da constelação familiar. As famílias estão destroçadas no nosso país, as famílias estão totalmente complicadas. Você vê tanta gente que não fala com o pai, não fala com a mãe, não fala eu te amo o papai, eu te amo mamãe, e é isso que a gente aprende aqui.
Constelação familiar vem de família, de vida. E o que a gente prega aqui e o que a gente quer é isso. Quanto mais a gente puder fazer o melhor, o nosso melhor papel... Então, nós estamos procurando parcerias com diversas universidades, faculdades, pesquisadores, cientistas, para fazer a nossa lição de casa também, porque a gente entende que cresceu e agora está na hora de organizar, seja através de uma regulamentação, seja do que quer que seja. E nós estamos dispostos a dialogar, nós estamos dispostos a poder achar o que for melhor para o cidadão, para a população, que é o maior usuário dessas constelações, é a pessoa que mais necessita disso, reencontrar a família, reencontrar o pai e a mãe, reencontrar a vida. A gente vive com pessoas maravilhosas e a gente fica até sem querer discutir essa parte muito técnica porque eu vejo que, como o Renato falou e a Sophie falou, cresceu, expandiu, está no mundo inteiro, e como um projeto que está no mundo inteiro ajudando tanta gente pode ser ruim? Ele pode ter necessidades de ajustes e alinhamentos, e tudo isso faz parte da evolução de qualquer atividade, qualquer profissão. Então, a gente acredita, como educador, que a gente tem que dar o melhor para o nosso aluno. Nós não queremos ser... Como a Innovare diz no próprio nome, nós queremos ser uma faculdade inovadora, formada por professores que queiram o bem, que queiram formar cidadãos, formar consteladores e formar os melhores profissionais do mercado. E é isso que a gente acredita que toda escola - e há várias escolas que fazem um trabalho maravilhoso no país - tem que pregar, porque não adianta a gente entrar num projeto desse pelo dinheiro. A gente entra pelo coração, a gente entra pela razão, a gente entra pela propagação de algo que fez bem para mim e para várias pessoas.
R
Hoje eu posso falar que eu amo meu pai, que eu amo minha mãe, que eu amo meus filhos, que eu amo a família e que todo mundo faz parte, todo mundo pertence, mesmo aquele pai que só gerou o filho e por qualquer necessidade da vida teve que tocar a sua vida, ele pertence. As pessoas estão aqui porque têm um pai e uma mãe. Então, quando a gente reencontra com essa origem, como a gente pode fazer mal para o próximo? A gente só quer que... É que às vezes, na empolgação, a gente quer para todo mundo, "vamos lá, que isso é fantástico", porque fez bem para a gente.
Eu acredito que nessa parte educacional a gente está aberto ao diálogo, à conversa, à união de forças, a estudar, a trazer a parte científica, a fazer o melhor que for para todos, para a constelação familiar, para os profissionais de constelação familiar e para os usuários, para a população que, como eu, precisa muito de coisas que possam ajudar na vida. Aqui não é nada assim... Tudo isso são anos e anos de trabalho, como o Renato tem anos e anos de trabalho. O Sami, como juiz, foi um desbravador, ele foi corajoso. E nesta prática, a própria Justiça busca várias alternativas, e a constelação familiar é uma alternativa. Também na faculdade a gente trabalha com outras práticas, que são os MASCs, os meios adequados de solução de conflitos, porque a gente vê que o que tiver de modernidade para a população... Eu acho que a gente tem que estar atento a tudo isso.
Então, a minha fala, que eu vou encerrar dentro do tempo, é: a gente está aberto, a gente está propenso, a gente quer estudos científicos, quer pesquisa, quer estar sendo ajudado por profissionais das mais diversas... E fica uma dica para as pessoas que não conhecem: procurem pessoas qualificadas no seu estado, no seu município, porque com certeza há grandes profissionais de constelação aí no Brasil, excelentes profissionais que mudaram a vida de muitas pessoas; procurem sempre os melhores profissionais, as melhores pessoas. A gente está aqui à disposição para colaborar nesse início de uma nova jornada. Com certeza, a partir desta audiência, isso vai tomar um rumo, e é necessária essa regulamentação. É isso, Senador.
R
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito bem, muito obrigado, Inácio Junqueira, Diretor da Faculdade Innovare. Agradeço também por ter ficado dentro do tempo, porque é sempre constrangedor a gente interromper - não é? -, mas a gente tem que seguir o nosso rito.
Esta audiência pública, é importante que se diga, serve, de alguma forma também, para termos ideias, ouvindo aqui os pontos de vista, para medidas legislativas sobre este tema: Constelação Familiar.
Olhem só o que a gente já recebeu aqui de manifestações de vários lugares do Brasil: Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais, Ceará, Distrito Federal, Goiás, Santa Catarina, Pernambuco, Mato Grosso, Bahia. É impressionante a participação das pessoas nesse tema, é crescente!
E eu gosto muito, assim, de perceber - a gente já fez outras audiências públicas, sessão temática de debate -, é muito bom a gente poder ouvir os pontos de vista contraditórios. Nós vamos ter, daqui a pouco, esse momento. É importante que se diga que nós vamos ouvir o outro lado, que questiona, que busca mais evidências. E eu acho muito bacana porque é como o grande pedagogo francês, pesquisador também, cético, lá atrás, Allan Kardec dizia: mede-se a importância de uma ideia pelo acontecimento, pelo nível da reação que ela encontra. Então, é muito interessante isso.
Eu, particularmente, hoje quero ouvir muito atentamente o outro lado, porque eu só ouço falarem bem de constelação familiar, confesso para vocês. Quero ouvir com atenção, porque, andando pelo país, eu só vejo experiências, até agora, pelas quais as pessoas são muito gratas, por curas que ocorreram, sistêmicas, não é nada de milagre, de fé, de religião.
Eu mesmo sempre fui muito cético e fui para uma constelação, primeiro, com os dois pés atrás e vi acontecendo... Quando eu entrei na constelação - não queria nem entrar, mas me chamaram -, eu estava ali para ver, com olhar cético mesmo, e foi interessante o que eu senti, sempre questionando o tempo todo. Então, existe alguma coisa que a gente precisa analisar, verificar, porque eu presenciei, testemunhei, não apenas comigo, centenas de casos de pessoas se livrando de amarras, de pessoas que estavam com problemas de droga, e uma série de outras situações, e que encontraram um caminho mais sereno na vida, mais feliz. A constelação foi uma ferramenta ou uma das ferramentas importantes em que eu vi ali um desabrochar de um novo ser humano naquele momento.
R
Eu queria imediatamente passar a palavra agora... Já está conectada a Sra. Rose Militão? (Pausa.)
Então, vou passar a palavra para a Dra. Rose Militão, que é fundadora da Escola de Constelação Familiar do Ceará, na minha terra, psicóloga clínica e atua há mais de 15 anos como consteladora.
A Dra. Rose Militão está conectada conosco e tem dez minutos, com a tolerância de dois, para fazer aqui a sua exposição.
Muito obrigado. Seja muito bem-vinda, Rose Militão. (Pausa.)
Está sem som, Dra. Rose. Está sem som aí.
A SRA. ROSE MILITÃO (Por videoconferência.) - O.k.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Agora ligou, está aí.
A SRA. ROSE MILITÃO (Por videoconferência.) - Está bom, vou tirar aqui o meu...
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Diretamente de Fortaleza.
A SRA. ROSE MILITÃO (Por videoconferência.) - É isso, muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Vamos lá.
A SRA. ROSE MILITÃO (Para expor. Por videoconferência.) - Caríssimo Senador Luis Eduardo Girão, muito obrigada pelo privilégio de fazer parte deste momento, de estar aqui nesta bancada falando sobre constelação familiar, mas falando sobre mais do que isso, e, à medida que eu ouvia os colegas, eu fiz algumas anotações.
Antes, primeiro, eu quero dizer que recentemente eu lancei um livro chamado Exercícios Sistêmicos. Quando eu lanço um livro ou qualquer autor faz isso, nós perdemos a dimensão e aquilo não nos pertence mais. Estava pensando em relação a Bert Hellinger: a técnica já não pertence mais ao Hellinger, à Sophie; essa técnica está aqui sendo discutida, ganhou o mundo. E acho maravilhoso nós termos o ponto e o contraponto.
Então, eu sou a Rose Militão, sim; sou psicóloga, conforme já foi apresentado; nós temos uma escola de constelação, formamos consteladores também - dez turmas, abrindo agora a 11ª turma de especialização em constelação familiar -; e, sim, eu gosto da técnica, utilizo há algum tempo e estou muito honrada para fazer algumas considerações sobre ela.
A primeira coisa que eu quero definir é que o austríaco Capra, no livro dele, O Ponto de Mutação, diz o seguinte, e eu vou ler aqui. Ele diz que a natureza é dual, a diferença que o observador faz no sistema que observa, uma vez que os resultados que ele obtém dependem muito do que se propõe procurar.
R
E a pergunta aqui é: o que a gente procura? Se eu não estiver aberta ao contraditório, a coisas que possam servir de muito aprendizado com a técnica das constelações familiares, isso aqui, para mim, não vai valer muito. E o outro lado também, o grupo de pessoas maravilhosas que, preocupadas com a técnica, resolveram também estudar, resolveram também se pronunciar sobre constelações familiares.
A primeira pergunta é: sim, a constelação familiar não faz parte da ciência clássica, e não adianta a gente tentar organizar isso, porque não faz parte, porque a ciência clássica busca o conhecimento objetivo da realidade através do pensamento analítico, e isso não cabe para as constelações familiares. Então, essas constelações fazem parte do quê? De uma nova maneira de pensar, com o novo domínio linguístico das ciências.
Eu gosto muito quando a escritora Maria José Esteves, através do livro dela Pensamento Sistêmico: O Novo Paradigma da Ciência, diz que acontece um novo domínio linguístico das ciências. E eu preciso aqui, Senador Eduardo Girão, falar um pouco sobre isso, porque os exemplos são inúmeros, mas eu acredito que a questão aqui talvez seja qual é o lugar de pertencimento da técnica, se ela faz parte da ciência clássica ou, se ela não faz parte, faz parte do quê?
Então, eu queria que vocês acompanhassem comigo que, quando a Maria José Esteves fala que há uma nova linguística das ciências através do novo paradigma que o pensamento sistêmico estabelece, ela diz que existem três pressupostos: o da complexidade - e é aí que a constelação familiar se situa: no pressuposto da complexidade em todos os níveis da natureza -; o da instabilidade - a gente está ainda tentando sair da covid, que pegou todo mundo -; e o da intersubjetividade, ou seja, existem sujeitos subjetivos, e a gente não vai dar conta de organizar isso.
As constelações familiares fazem parte do pensamento sistêmico, e é preciso estudar um pouco mais sobre isso. As constelações familiares nascem em todo o bojo do início da terapia familiar, ali no final da Segunda Guerra Mundial, anos 50, quando as terapias de um para um já não funcionavam mais. Então, é necessário que muitos pensantes se organizem para ajudar e para chegar até a família, que estava destroçada. Depois do pós-guerra, a família estava completamente diferenciada. Um homem chamado Gregory Bateson, biólogo e antropólogo, ficou à frente desse trabalho, e, a partir daí, muita coisa aconteceu.
As constelações familiares são uma técnica para o trabalho com a família, para o trabalho com pessoas. Nunca vejo constelação familiar como uma terapia; o foco dela é direcionado: nós não podemos misturar, não faz sentido fazermos essa mistura.
R
Portanto, como psicóloga, eu trabalho como consteladora também. Eu não sou uma psicóloga consteladora; eu sou psicóloga. Os meus pacientes, quando vêm me procurar, encontram a psicóloga, e, quando ou se encontramos uma necessidade de constelar, nós temos, no outro dia, um outro momento. Como psicóloga, eu tenho vários recursos, porque a vida humana não é linear, é extremamente subjetiva.
Nesse sentido, eu concordo com o autor maravilhoso Alexander Loyd, que é um PhD. O livro dele O Código da Cura fala das cinco eras da cura. A primeira era é a dos chás; depois a gente vem para a reza, para a oração - todo mundo tem um chá, uma oração, "Põe a mão aqui na minha cabeça" -; aí as coisas foram evoluindo e vieram as indústrias farmacêuticas, com as pílulas - "Tome remédio, tome comprimido" -; depois veio o corte do corpo, as cirurgias; e finalmente ele fala da era da energia. E como a gente vai quantificar a energia nesse ser humano extremamente subjetivo?
Sendo assim, eu quero colocar mesmo as constelações familiares como um recurso extraordinário para a terapeuta Rose Militão, porque as pessoas que chegam precisam da terapia e da psicologia, precisam da Rose que trabalha com reiki, precisam da Rose consteladora, precisam da Rose que trabalha com as cartas do Instituto OH-Cards, do Instituto Alemão, que a gente chama de cartas terapêuticas; às vezes, precisam da indicação de um livro, de um filme. Eu uso todos os recursos para que eu possa ser um instrumento de cura.
Nesse sentido, onde é que a constelação familiar se situa? Ela é uma abordagem pragmática de intervenção, com foco na solução de problemas. E é claro que ela precisa de boas escolas, de boa fundamentação. Quando você é um constelador, isso não faz de você um terapeuta de família. Assim como os colegas já mencionaram, existe gente utilizando práticas, técnicas de todas as formas, e tudo isso é comum.
Eu quero terminar minha fala dizendo o seguinte: será que a psicologia dá conta, ou a psiquiatria dá conta, ou a medicina sozinha dá conta de tanto adoecimento? Será que nós damos conta de nós, os brasileiros, sermos os campeões de ansiedade no planeta Terra? Será que damos conta? Será que damos conta de, a cada quatro segundos, uma pessoa se suicidar no mundo? Será que damos conta? Enquanto a gente fica dizendo se é ciência, se não é, se é charlatanismo, se é pseudociência, deve-se olhar para esses números das depressões. Ao mesmo tempo que o Brasil é, na América Latina - nós somos os felizes -, o primeiro lugar na felicidade, também nós somos o primeiro lugar nas depressões. Há um adoecimento endêmico, sistêmico e sistematizado.
Eu acredito que o foco das constelações, assim como o de tantas outras terapias, saindo desse lugar das terapias alternativas para as complementares integrativas, fazendo parte das Pics, é um lugar que veio para ficar. Precisamos estudar mais, e isso precisa acontecer nas universidades; precisamos olhar para essas técnicas com mais seriedade e nos apropriarmos disso, porque realmente o adoecimento é endêmico e uma abordagem só, um aspecto só não vai dar conta nunca disso.
R
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito bem, Dra. Rose Militão, diretamente de Fortaleza, no Ceará.
A Dra. Rose é psicóloga e constela há mais de 15 anos. Ela fundou a Escola de Constelação Familiar do Ceará.
Muito obrigado pela sua participação aqui nesta audiência pública, diretamente de Brasília, aqui no Senado Federal, na Comissão de Assuntos Sociais.
É importante também a gente fazer um anúncio aqui. Antes da fala da Dra. Rose, eu fui informado de que nós temos mais de 600 mensagens só durante esta audiência, fora as que foram recebidas aqui nos últimos dias. No total, nós temos 600 mensagens. Eu dei uma olhada agora no YouTube aqui do Senado, está sendo transmitido ao vivo pelas redes sociais do Senado, e há quase 5 mil pessoas assistindo simultaneamente. É muito bacana isso. Eu acho que é papel desta Casa ouvir sem julgamentos uma demanda legítima da sociedade. Eu fico muito feliz com essa participação. Acho que será a primeira de muitas sessões que nós teremos aqui no Senado Federal sobre esse assunto.
Eu passo imediatamente a palavra para a Daniela Migliari, que é terapeuta aqui do Distrito Federal, de Brasília.
Passo a palavra por dez minutos, com tolerância de dois. Fique à vontade.
Muito obrigado pela presença aqui, Daniela.
A SRA. DANIELA MIGLIARI (Para expor.) - Bom dia a todos os presentes e aos que estão nos ouvindo pela internet.
Agradeço pelo espaço ao Senador Eduardo Girão e a toda sua equipe, que de forma tão aberta e tão democrática vêm criando espaços de escuta, de fala. Que a gente possa entrar em contato com a diversidade, um assunto de que nós já tratamos aqui: sobre o quanto é importante conseguir conviver com aquilo que é caro e que é fundamental a tantas pessoas e, ao mesmo tempo, poder ouvir o diverso, ouvir o que pensa diferente e que, obviamente, vai nos enriquecer, vai nos fazer crescer e melhorar.
Muito antes de ser terapeuta, eu sou jornalista de formação, sou escritora e procurei a formação de consteladora familiar por necessidade própria. Eu não tinha a intenção de me tornar terapeuta. Durante muitos anos eu atuei no jornal Correio Braziliense justamente na área de jornalismo científico, porque a minha grande paixão é a área da ciência. Tenho irmãos engenheiros, sou casada com um cientista da computação e sempre tive um especial carinho pela área da ciência. Então, eu me formei nessa área. Hoje em dia, eu tenho uma agência de assessoria de imprensa que atua nessa área de jornalismo científico - a gente atende a grandes instituições aqui no Brasil, no Distrito Federal, locais também. Então, a ciência, para mim, é algo que é incontestável. Eu não estaria aqui hoje se não fosse a ciência médica, que tantas vezes já me apoiou. Eu passei por situações de quase morrer e fui salva pela ciência. Então, eu tenho um olhar muito caro e muito cheio para esse tema.
R
Ao mesmo tempo, na minha alma, há um espaço muito grande para a filosofia, para uma expressão diversa também de hipersensibilidade, de poesia, de arte, de literatura - sou escritora, tenho quatro livros publicados -, e eu não me sentia capaz de cindir isso dentro de mim. A minha vontade era de juntar essas partes. Então, naturalmente, eu fui percebendo, inclusive com a citação que o senhor fez, Senador, de Allan Kardec, que nos dizia claramente que a fé raciocinada é aquela que olha frente a frente a ciência a cada momento durante o seu tempo. Então, eu não acredito numa perspectiva de que é isso ou aquilo. Eu acredito que, se tudo está aí, é porque é isso e aquilo. E como que a gente pode cooperar?
E, naturalmente, nessa minha busca, inclusive por questões de vários sintomas que eu tinha de sofrimento mesmo, eu busquei e continuo buscando diversos médicos aos quais eu sou imensamente grata, mas percebi, inclusive ouvindo de alguns deles: "Olha, não há explicação isso que você está sentindo. Precisa olhar algo além". Busquei também psicólogos, terapeutas e tenho um profundo apreço pela Psicologia, pela Psicanálise, pelas diversas escolas que vêm e, como todos os colegas aqui hoje já falaram, por aquelas pessoas que praticam essas frentes com responsabilidade, com presença e com cuidado. Então, naturalmente, quando eu me deparei com isso, eu percebi que essas duas coisas poderiam se unificar e fui tendo grandes ganhos físicos, mentais, emocionais e espirituais, frutos desse encontro, depois, sem precisar me desfazer de um ou de outro, conjugando Medicina, Psicologia, porque a gente sabe que a constelação familiar não implica uma relação de vínculo, uma vinculação que vai ali toda semana, como um psicólogo vai. São histórias diferentes que não querem substituir, não querem suplantar, não querem se dizer maior, não querem se dizer menor; querem se dizer cada uma no seu lugar. E eu gostaria de que as pessoas que veem isso como uma ameaça que ampliem o olhar e que vejam que, na verdade, é uma soma, é algo que vai cooperar para o bem de todos.
E, como escritora e jornalista, eu passei, desde 2015 para cá, a publicar esses textos a respeito dessa visão sistêmica da vida, porque Bert Hellinger foi um filósofo muito dedicado à área a que eu gosto muito de me dedicar também, e, ao escrever sobre isso, Senador, simplesmente escrever sobre isso, as pessoas, ao lerem algo, já se sentiam, entre aspas, "consteladas".
R
Ao ler um poema como os de Rilke, que era o poeta favorito de Bert, ler um conto, uma história, ver uma imagem que Bert criava por meio das suas imagens e das suas metáforas, e ele ia auxiliando a pessoa que estava ouvindo ali do outro lado da poesia, daquele texto, a construir uma imagem, uma imagem curativa, porque a constelação se dá por meio dessas imagens. Então, se isso podia acontecer por meio de um texto, eu comecei a me dedicar a escrever sobre isso, mas principalmente focada nesse "a começar em mim", pela minha necessidade. E, sendo uma jornalista da área de jornalismo científico e trabalhando com isso e tendo um profundo respeito e apreço pelo processo científico, eu me vejo muito aberta a essa iniciativa, porque isso só vai nos enriquecer para que a gente possa melhorar os nossos caminhos. Eu acho que é importante, como todo conhecimento novo que vem, acontecer esse tipo de questionamento.
E eu quero contar uma história de uma vez que eu escrevi um texto que conjugava a minha visão espírita e espiritualista e a visão das constelações familiares. Era um texto chamado "Todos Pertencemos". E aí uma pessoa, uma psicóloga, viu esse texto - ele está em vídeo também -, me escreveu e falou assim: "Dani, eu vi esse seu texto, eu o achei tão bonito, mas me explica uma coisa: como assim 'todos pertencemos'? Eu sou psicóloga, eu estou atendendo a uma criança de nove anos que passou por uma tragédia familiar terrível, cujo pai assassinou a mãe. E esse menino não está falando, esse menino não está brincando, ele não sorri. E como que esse pai pertence? Que história é essa?". Foi uma mensagem pelo Facebook que eu recebi. E na hora eu falei para ela: bom, essa justiça da Terra... A justiça divina, muitas vezes, a gente gostaria de puxá-la para as nossas mãos, mas é algo que não contribui de forma específica, porque não estamos naquele lugar. Então, para o pai dessa criança há um juiz da Terra que já atuou, há a justiça divina que certamente atua e é muito além da nossa compreensão... Então, dentro do seu coração, o que eu acho que você pode experimentar é simplesmente entrar no não saber. Eu não sei o que moveu esse homem a fazer isso com essa mulher. Está preso? Está passando pelo que passa? Mas no seu coração você pode se abster de ser aquela que vai julgar, porque ele já foi julgado como deveria pela Justiça da Terra, a divina se encarrega, mas no seu coração você pode se recolher e dar um lugar a ele simplesmente como pai do seu paciente. Abster-se de julgar nesse "não saber" não é dar razão para esse pai que assassinou a mãe - entendam bem -, é simplesmente dar um lugar e não julgar, e você continuar atuando com essa criança. Você não precisa falar nada sobre isso com o seu paciente de nove anos.
R
E se passaram duas, três semanas, e ela me escreveu, e foi algo que simplesmente ela leu. Não foi... Foi assim, dentro de um texto, de uma poesia, e ela me falou que a criança tinha feito um desenho da família e que tinha finalmente conseguido colocar o pai, sem ela sugerir nada, e ele tinha voltado a falar, porque ele estava sem falar há muitos meses, e voltado a sorrir simplesmente pela mudança na postura dela, no coração dela. Nunca, não é dar razão àquele assassinato, óbvio que não, mas se recolher nessa sistêmica, porque, com aquela criança, que é feita de metade desse homem e viveu já uma violência tão gigantesca dentro da família, só de ele estar próximo de alguém que se abstém de julgar essa metade biológica dele, digamos assim, que se abstém de julgar essa metade que o compõe, ele se sentiu acolhido ali, sabe? E, como esse exemplo, há tantos outros.
Então, eu acabei me formando para me constelar em mim mesma, na minha própria família, vi os efeitos disso no meu coração e continuo precisando muito dessa filosofia, dessa técnica. E, conforme eu vou vivendo, até o último dia da minha vida, eu vou compartilhando e vou falando, mas sempre com esse lugar de profundo respeito a todas as profissões, à ciência, a cada coisa em seu lugar, que podem, sim, colaborar juntas.
E eu vejo com ótimos olhos essa iniciativa de hoje, de a gente poder ouvir os nossos colegas; o Daniel Gontijo, que está aqui, infelizmente só ele presencialmente. E é sempre uma área de respeito, porque todos pertencem a ela, e a gente tem essa possibilidade de crescer juntos.
Era só isso que eu queria falar.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado. Eu agradeço em nome da Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal, Daniela Migliari, pela sua presença aqui.
Imediatamente, eu já quero passar aqui a palavra para o nosso querido irmão Juiz de Direito Sami Storch. E eu já lhe passo a palavra, com dez minutos para sua apresentação e dois de tolerância, mais uma vez agradecendo a todos os que estão aqui no Senado Federal, presencialmente, e também aos que não puderam vir e estão de forma remota. Inclusive, há muitas, estão se acumulando perguntas. Eu não vou conseguir fazer todas, eu quero pedir a compreensão aqui de todos vocês, no final, que se manifestaram, mas há muitas perguntas sobre a pandemia, o impacto sistêmico que há, as pessoas que vivenciaram em casa. Foi um momento de muita reflexão, de muito medo, de muita dor; foram mais de 600 mil brasileiros que faleceram nessa pandemia. E como a constelação familiar pode ajudar nisso? Essa é uma pergunta que tem se repetido muito, aqui, das pessoas que estão nos assistindo.
Então, já passo a palavra para o Dr. Sami Storch, que é Juiz de Direito e que gentilmente atendeu ao nosso convite para vir fazer a sua exposição.
Muito obrigado.
O SR. SAMI STORCH (Para expor.) - Bom dia a todos!
Senador Eduardo Girão, quero inicialmente agradecer a oportunidade, parabenizá-lo pela iniciativa de trazer esse tema para o foco aqui no âmbito do Senado.
E, examinando as falas e a presença também, a participação de cientistas, em nome da ciência, eu quero saudar os cientistas. Eu lembrei agora que meu pai, que faleceu no ano passado, participou ativamente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Ele era amigo pessoal do Miguel Nicolelis, e eu tenho em alta conta os cientistas. E eu mesmo me considero um cético: eu, para acreditar numa coisa, não é assim só por ouvir dizer não, sabe? Eu gosto de comprovar, ainda mais quando uma coisa parece meio fantástica: é aí que eu quero ver mesmo, porque eu também não duvido, porque eu sei que existem coisas impressionantes, não é?
R
Então, foi assim que eu conheci as constelações também: falaram-me maravilhas das constelações, e eu fui para um workshop com o Renato - minha primeira experiência com constelação - e vi dinâmicas que existiam na minha família, e aquilo me causou um impacto profundo e melhorou muito meu relacionamento com meus pais, e a minha vida ganhou assim uma nova dinâmica a partir do estreitamento do vínculo com os meus pais, do respeito, e eu fiquei maravilhado e comecei a estudar. Eu advogava na época e logo percebi também o impacto que isso poderia ter no tratamento de questões jurídicas, porque o Direito é um campo um tanto emaranhado, em que muitas questões perduram por anos e anos e anos sem uma solução, e, às vezes, dependendo de como lidam com isso, as pessoas sofrem ainda mais por conta do tratamento dado na Justiça pelos advogados, pela perpetuação de dinâmicas de violência, de agressão, de rompimento de vínculos, não é? E, na constelação, eu vi conciliações em um nível profundo dentro de famílias, entre pessoas que se sentiam agredidas por pessoas próximas que tinham vínculo de amor por trás, e a constelação tem esta capacidade de trazer à luz, trazer à tona esse amor e de mudar a dinâmica das relações.
Quando eu ingressei no Judiciário, em 2006, imediatamente percebi as incoerências entre as práticas judiciais tradicionais - algumas, não é? -, entre o processo como era até algum tempo atrás - porque isso já vem mudando -, mas a incoerência entre essas práticas e as leis sistêmicas que trazem harmonia nos relacionamentos, e comecei gradualmente a trazer as leis sistêmicas para a minha prática e comecei a observar resultados maravilhosos, assim, conflitos longos, de dez, quinze anos, inventários em que irmãos não se falavam, brigas entre pais e filhos, e eu via na minha frente, na sala de audiência, as pessoas se reconciliando, abrandando os corações e se compreendendo, compreendendo quem é que estava agindo de forma inconsciente, assumindo um papel que não lhe cabia e se libertando da dinâmica de conflitos.
Então, isso foi com práticas que não exigiam aplicar constelação propriamente dita, mas exercícios, algumas visualizações, algumas falas, algumas... Então, isso foi me encorajando, e, como nunca tinha sido feito isso, depois de alguns anos me capacitando, fazendo formações, eu resolvi... Eu tive que fazer um interrogatório de uma menininha sobre a guarda em relação a ela. Era a mãe e a avó brigando pela guarda da menina, e o interrogatório dela foi uma constelação na sala de audiência. E ela expressou de um jeito puro, inocente, de quatro anos de idade, o amor que ela sentia pela mãe e pela avó, e isso as sensibilizou.
R
Elas estavam aguerridas, pedindo perícias, brigando, sem se falar, e, quando elas viram aquela constelação, elas imediatamente perceberam o que que estava por trás e elas mesmas se aproximaram. E o processo acabou, assim, perdeu a razão de ser aquele conflito. E, depois, eu comecei com dinâmicas coletivas, juntando grupos de pessoas com processos com temas comuns. E observei, assim, alguns resultados impressionantes, como um casal que, em decorrência de um divórcio, tinha 25 processos, entre ação de alimentos, execução de alimentos, denúncias criminais por fraude e outros. E, depois de uma constelação em que eles viram a origem oculta, o que que estava impedindo a compreensão do casal... Eu não me lembro qual que era o caso. Talvez eles nem tenham constelado o caso deles, tenham participado de uma constelação de outra pessoa. Mas, quando vem à luz algo, por exemplo, uma criança que morreu, algum drama que não foi expressado, que não foi dito, que não foi olhado, uma dor que não foi adequadamente sentida, aí aquilo ficou prejudicando o desenvolvimento do relacionamento... E aí, quando eles viram aquilo, quando chegaram à audiência, algumas semanas da depois, eles eram amigos. Estavam numa postura carinhosa, imediatamente fizeram acordo em todos os processos, nos que não cabia acordo eles pediram para os respectivos juízes para extinguir e, algum tempo depois, todos os processos foram extintos.
E assim há muitos outros exemplos. Uma pessoa que era reincidente, vivia frequentando a delegacia de polícia numa cidade pequena, era conhecida na cidade, e, depois de frequentar as constelações, houve um que virou frequentador e ele percebeu o vínculo que ele tinha com os filhos, o vínculo que ele tinha com a mulher, como ele projetava as questões dele com os próprios pais e tornava-se violento e viciado. E aí depois ele largou as drogas, arrumou emprego... Houve um impacto tão impressionante na comunidade, que, por conta desse rapaz, me deram o título de cidadão dessa cidade, porque ele era conhecido.
Então, as poucas pesquisas que nós temos - são poucas, porque a gente não tem tanta estrutura e cada juiz não tem tantos processos assim - vêm mostrando um índice em ações de família de mais de 90% de conciliações, em que as próprias pessoas se resolvem. Não é que eu decido com base na constelação; naturalmente as relações se harmonizam em grande parte dos casos. E, depois que isso ganhou mais visibilidade, outros juízes vêm replicando a prática, cada um com algumas adaptações e obtendo índices semelhantes. Foram feitas pesquisas também com adolescentes envolvidos em atos infracionais. Eu sei de duas pesquisas, e ambas obtiveram em torno de 90% de não reincidência, é um índice bastante alto. Outras medidas socioeducativas não obtêm esse índice de êxito.
E, nos questionários que vêm sendo submetidos às pessoas que participam, a aprovação é ampla; não é unânime, mas é ampla. Grande parte das pessoas percebe como isso vem melhorando os seus relacionamentos, além de melhorar na solução dos processos. Casos de inventário, como eu mencionei, dez, quinze anos, que, depois de uma constelação, em que se mostra uma ordem que não foi reconhecida anteriormente, por exemplo, a ordem entre os filhos... Os filhos que vieram de um primeiro casamento, que precederam o segundo casamento, e aí, no segundo casamento, às vezes os filhos conviveram mais com o pai e se sentem mais merecedores, e, quando eles percebem que houve quem veio primeiro e houve quem pagou um preço para que a mãe tivesse uma outra família e eles pudessem existir, isso traz um reconhecimento, uma humildade, coloca cada pessoa no seu lugar e traz uma harmonia. E aí o processo se desenvolve e se desemaranha, não é? Então, questões antigas que se desemaranham. As pessoas se libertam de um sofrimento antigo. Então, além dessas práticas, eu observei, a gente tem observado como as leis sistêmicas podem influenciar na visão do Direito à dignidade da pessoa humana; a gente olhar para esse ponto, a dignidade da pessoa humana, com maior amplitude, reconhecendo que a dignidade de alguém é a dignidade de ser como é, ser filho de quem é e ter a origem que tem. E não há um superior a outro; não se precisa fazer gambiarras ou ficções para dizer que uma pessoa é digna, ela é digna assim como é. Então, reconhecendo o lugar do pai dessa pessoa, o lugar da mãe dessa pessoa, o lugar de eventualmente quem vem depois dos pais, no caso de adotantes. Esse é um dos pontos que, às vezes, é polêmico nas constelações, como se os adotantes não fossem importantes. Mas não é isso. Trata-se de reconhecer o lugar de cada um. Uma criança se sente mais digna sendo quem é quando ela pode reconhecer que o seu pai biológico, sua mãe biológica têm o seu lugar, vieram primeiro; depois, há os adotantes nos seus lugares. Ela se sente preenchida. Cada pessoa importante na sua vida ocupa o seu lugar, e ela cresce.
R
Há outras questões que às vezes provocam alguma polêmica, como o aborto. A constelação mostra o quanto o aborto impacta as famílias. Então, é uma realidade. Quem trabalha com constelação vê isso com frequência. Um aborto abala a estrutura familiar, e a gente percebe também que quanto mais abala quanto mais não é falado, quanto mais é um tabu, é proibido. Não por ser proibido, mas por ser um segredo. Quando é um segredo, as pessoas banalizam, às vezes fazem como se não fosse nada e não tocam no assunto porque, no fundo, elas sabem que existe uma dor envolvida nisso. E muitas vezes isso tem consequências nos irmãos que vêm depois, no próprio casal; o relacionamento de casal sofre um abalo depois que existe um abordo. Não é só a constelação que vê isso, os terapeutas podem observar isso também. Isso pode ser comprovado. É possível verificar nas pesquisas, na sociedade o que é verdadeiro e o que não.
Acho importante falar nesse tempo que me resta que, para os consteladores que trabalham na área pública, é importante reconhecer a importância dos outros campos profissionais, não abrir mão do auxílio de um médico quando precisar, quando a questão for médica; não abrir mão de um terapeuta quando for uma questão... Eu não digo para uma pessoa que constela: "Larga mão do seu psicólogo". Eu falo: "Você está fazendo acompanhamento psicológico? Que bom! Enquanto você sentir que é necessário, continue fazendo". Não é para substituir um remédio, substituir outra abordagem, é auxiliar.
Dentro do âmbito estatal, saber que o Estado é laico. Quem for trabalhar no âmbito estatal é importante ter essa postura laica, de respeito às compreensões, às religiões. A constelação não entra em conflito com isso. Nas constelações nós não lidamos com dogmas, isso é importante também, nem do que o Bert Hellinger falou. Nós aprendemos muito com o que Bert Hellinger falou, mas ele nunca falou: "Repita o que eu falo, porque é isso e pronto". Ele falava: "Observe". E, às vezes, ele não falava nada. "Eu vou demonstrar", e demonstrava uma dinâmica. É isso que vale.
Então, para quem conhece, para quem quer conhecer a constelação, eu recomendo que procure se expor a um trabalho e observar. O que faz sentido faz sentido, a gente percebe. Não é porque alguém disse que é ou porque alguém disse que não é. Vamos estudar. Então, mais uma vez eu louvo os cientistas e convido os cientistas a nos ajudar nessas pesquisas para observar o que se traz de benefícios. É uma ciência social no âmbito do Judiciário, então a pesquisa não se dá da mesma forma. Não é laboratorial, nós observamos o comportamento das pessoas, o desenvolvimento dos relacionamentos, o que acontece com os processos, a postura das pessoas na vida, a reincidência em questões judiciárias, e isso é passível de pesquisa, sim. Eu acredito muito nisso e acredito que algo com tanto potencial precisa mesmo de mais olhar, de mais estudo. Grato pela oportunidade. Vamos em frente para buscar também conhecer mais dos potenciais, dos limites, conhecer também onde não é adequado, onde é adequado e em prol da pacificação da sociedade.
R
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Dr. Sami Storch, Juiz de Direito que veio aqui trazer as experiências. É importante isso que o senhor colocou, a questão de que essa ferramenta da constelação familiar veio para auxiliar, não veio para anular outras ferramentas. Ela veio para somar e não para diminuir. Essa consciência é bem interessante. Aliás, essa palavra consciência tem tudo a ver, o despertar de consciência tem tudo a ver com o que a gente está conversando aqui.
Mas vamos ouvir o outro lado também, porque, além de nós estarmos num ambiente democrático, nós estamos aqui para buscar a verdade. Ninguém é dono da verdade, e a gente sabe que fazemos parte de um sistema, todos. Então, há o lado que pensa divergente, e a gente precisa olhar, analisar, e nós estamos juntos aqui para, de alguma forma, aprendermos uns com os outros. Eu, a pedido das pessoas que, vamos dizer assim, pensam de forma diferente sobre a constelação familiar, nós vamos fazer uma sequência agora dos que são contrários. E, como eu disse aqui no início, por termos um número de duas pessoas a mais do que os que são favoráveis, nós vamos dar um tempo maior. Então nós vamos dar 12 minutos de tempo base - já peço a equipe para colocar 12 minutos -, chegando a 15 na tolerância. Foi isso, não é Daniel? Dar 12 chegando a 15.
Então, vamos começar aqui pela sequência com o Dr. Marcelo Takeshi Yamashita, que é professor e está nos dando aqui a honra de participar pela videoconferência. Muito obrigado, Dr. Marcelo Takeshi Yamashita, o senhor tem 12 minutos com a tolerância de 3, totalizando 15. Muito obrigado.
O SR. MARCELO TAKESHI YAMASHITA (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Senador Eduardo Girão. Eu vou pedir licença para fazer uma apresentação de eslaides aqui. Eu gostaria de pedir para os técnicos aqui habilitarem o compartilhamento.
Todos conseguem ver a minha tela?
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Sim.
R
O SR. MARCELO TAKESHI YAMASHITA (Por videoconferência.) - O.k.
Bom, então boa tarde, Senadores e Senadoras. Eu gostaria de agradecer ao Senador Sérgio Petecão pelo convite e dizer que é uma grande honra poder falar nesta Casa.
Meu nome é Marcelo Yamashita, eu sou físico, e provavelmente vocês devem estar se perguntando por que um físico foi convidado para falar em uma audiência pública que vai tratar de um assunto primordialmente da área de psicologia. Essa foi também uma das perguntas que eu fiz ao Senador quando ele me dirigiu o convite, mas quando me foi encaminhado, então, o requerimento para a instauração dessa audiência pública, um dos motivos da minha presença está colocado no eslaide seguinte: eu extraí um trecho da justificativa do requerimento do Senador Eduardo Girão para a realização desta audiência. Então, vou passar para o próximo eslaide.
Esse é o trecho que eu extraí da justificativa do requerimento. Está escrito: "Esta terapia impressiona por sua ação no nível anímico [...]. Isto ocorre porque forma-se um campo quântico no qual a telepatia atua como resultado da interconexão entre os níveis energéticos das mentes humanas". Eu destaquei a parte que diz respeito especificamente à física: campo quântico e níveis energéticos.
Então, caso você, Senador, Senadora, ouvinte aí que nos acompanha pelo YouTube, pela TV Senado, não tenha entendido direito o que está escrito aqui nessa justificativa, mas você ficou com a sensação de que a culpa é sua por desconhecer conceitos complexos, então parte da missão do texto já foi cumprida: ao misturar de maneira incorreta e imprecisa diversos termos da física, o texto se fantasiou de ciência. Você colocou, você agregou valor a esse texto utilizando termos da física, mesmo que eles não façam sentido.
Eu não tenho a pretensão aqui de explicar de maneira detalhada o que é a mecânica quântica em menos de dez minutos, mas eu vou tentar dar uma ideia de por que isso que está colocado aqui não faz sentido. Eu não vou entrar na questão específica da constelação familiar. Eu não sou especialista, há psicólogos que falarão depois de mim que podem tratar mais especificamente sobre esse assunto. Eu vou me ater à questão da física, do que foi colocado aqui.
Bom, e essa tal de mecânica quântica, que todo mundo fala? A mecânica quântica começou no final do século XIX, começo do século XX como uma série de hipóteses. Então eu vou frisar bem a palavra aqui: uma série de hipóteses que descreviam muito bem alguns trabalhos, alguns resultados experimentais que haviam surgido na época e que não podiam ser explicados através da física que se conhecia na época e que hoje nós chamamos de clássica, aquela física que vemos no colégio, a física do Isaac Newton. O nome "quântica" é derivado da palavra quantum, que foi utilizada para se referir a quantidades físicas que não podem assumir qualquer valor.
R
Vou dar um exemplo aqui: lembrem daquele seletor antigo, das televisões antigas, onde você podia escolher um determinado canal, um canal 0, 1 ou 2, e você não tinha a posição 0,5 ou 1,5. Isso é o que a gente chama de quantizar; era 0, 1, 2, 3 e assim por diante.
Agora, a mecânica quântica é aceita e utilizada hoje em dia... Algo da ordem de 30% do PIB dos Estados Unidos, por exemplo, é baseado em tecnologia que utiliza a mecânica quântica, mas ela é aceita e utilizada porque as pessoas disseram que é assim que a natureza funciona? A resposta é um sonoro "não". Experimentos bem feitos e reproduzidos por diferentes grupos do mundo mostram que ela funciona. Então, não foi porque alguém falou que ela funciona que ela está sendo usada, não foi porque alguém escreveu um livro por aí que foi publicado que as pessoas a usam. Não, é porque experimentos bem feitos foram reproduzidos por diferentes grupos no mundo. A mecânica quântica é uma das teorias mais testadas na física, e ela tem dado certo até hoje, não encontraram falhas na mecânica quântica. Então eu gostaria de enfatizar aqui que, quando eu digo "experimentos", eu estou me referindo a investigações cuidadosas que levam em conta um desenho adequado do experimento, ou seja, o número de dados é suficiente, a amostra é adequada, e o tratamento estatístico de dados é bem feito; não estou falando de qualquer experimento feito por aí.
Nessa linha de experimentos bem feitos, eu queria dizer que os relatos individuais de casos, como apareceram tanto aqui nas falas que me antecederam, esses relatos individuais não têm nenhum valor científico. Não adianta eu dizer que na minha casa eu tenho um moto-perpétuo quântico, algo que funcionaria eternamente sem injetar energia, mas que esse moto-perpétuo só funciona quando eu estou sozinho. Isso é um relato de caso, é um relato individual, eu posso dizer que funciona para mim, mas, se ninguém consegue reproduzir, esse é um relato de caso e não tem valor para a ciência. Não adianta eu dizer que, porque a vizinha da minha avó ou do meu tio deu um depoimento sobre a geringonça, ela funciona. Isso não tem nenhum valor científico. Fatos científicos não são definidos com depoimentos, como não se define o formato da Terra em um plebiscito por exemplo; então não é um balanço entre as pessoas que acham que a Terra é redonda menos as pessoas que acham que a Terra é plana.
R
Desculpa, eu passei aqui.
Então, a mecânica quântica pode ser estendida automaticamente para o nosso cotidiano, como foi dito em uma das falas que me antecedeu aqui? Eu posso dizer que seres humanos se comportam como átomos e moléculas? Novamente a resposta é não. Essa foto que eu coloquei para ilustrar aqui do lado desse eslaide é um experimento de aprisionamento de átomos a baixíssimas temperaturas, em condições hiperdelicadas. Por que eu digo hiperdelicadas e a temperaturas baixíssimas? Porque, se eu colocar tudo isso no nosso ambiente, no dia a dia, isso aí é destruído. Então, ela foi colocada somente para ilustrar o nível de sofisticação necessário para podermos observar as propriedades quânticas dos sistemas e para elas não serem destruídas pelo nosso ambiente. A própria temperatura ambiente destrói todos esses fenômenos aí, que são muito delicados e que as pessoas às vezes gostam de mencionar, de emaranhamento quântico. Isso é destruído no nosso ambiente.
Então, o mundo macroscópico em que vivemos, apesar de nele nós usarmos diversas tecnologias baseadas na física quântica, na mecânica quântica - e aí eu cito o laser, ressonância magnética, radioterapias -, o nosso mundo no dia a dia é clássico, ou seja, eu consigo descrever muito bem os fenômenos do meu dia a dia usando aquela mecânica, aquela física criada por Isaac Newton, antes mesmo do surgimento da mecânica quântica. Então, essa transposição automática dessa lógica, desse conjunto de regras que funcionam para átomos, moléculas e núcleos não pode ser simplesmente transposta para o nosso mundo ou para o nosso dia a dia.
Então, vamos voltar novamente àquilo que está colocado no requerimento, campo quântico e telepatia. Qual é a relação entre a mecânica quântica e a telepatia? Aqui eu gostaria de fazer uma menção a um termo que foi cunhado pela médica Harriet Hall, que cunhou essa expressão, que é a ciência da fada do dente. O que é a ciência da fada do dente? A ciência da fada do dente é uma expressão utilizada para designar o estudo de um fenômeno antes de estabelecer se ele existe. Por exemplo, eu posso medir a quantidade de dinheiro que a fada do dente deixou sob o travesseiro, eu posso investigar se o pagamento é maior para o primeiro ou o último dente ou se a recompensa é maior para um dente embalado em plástico ou em um lenço de papel. Eu posso coletar esses dados de diversas crianças, para ter uma estatística razoável sobre o comportamento e as preferências pessoais da fada. Só há um detalhe: a fada do dente não existe e é uma explicação muito mais plausível para os resultados experimentais. Então, da mesma maneira que não existe a fada do dente, também não existe nenhum experimento controlado bem-feito demonstrando a existência da telepatia. Como a mecânica quântica produz alguns resultados diversos da física newtoniana ou clássica, pessoas que acreditam em fenômenos que não podem ser explicados pelas regras clássicas gostam de apelar para o jargão quântico para dar a impressão de que suas crenças são plausíveis, mas isso não procede. Cada alegação precisa ser avaliada em seus próprios méritos, em experimentos adequados.
R
Já estou finalizando a minha apresentação.
Qualquer raciocínio que derive de premissas absurdas não deve ser levado a sério. Se eu aceito, por exemplo, que um é igual a dois, eu posso concluir qualquer absurdo a partir daí.
Então, finalizando a minha apresentação, eu só gostaria de dizer que o trecho que consta na justificativa é um caso típico de pseudociência, é algo que se fantasia de ciência para tentar justificar algo. A referência à mecânica quântica na justificativa do requerimento não tem nenhum respaldo científico.
Muito obrigado pela atenção.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito obrigado, Prof. Marcelo Takeshi Yamashita, que participou diretamente conosco, de forma virtual, desta audiência pública aqui no Senado Federal.
Deixo muito claro que a gente está ouvindo os dois lados com muito respeito. A questão suscitada aqui sobre o requerimento que deu origem a esta sessão é apenas uma forma de se formalizar o início de um debate. Eu não sou cientista, eu não sou constelador, apenas quis introduzir o debate aqui. A gente não deve ir atrás do mensageiro, e, sim, buscar a verdade sobre a mensagem. A gente está ouvindo especialistas aqui hoje, de um lado e de outro, e a população que está nos assistindo vai tirar suas próprias conclusões.
Eu repito: este, acredito, será o primeiro de uma série de debates que esta Casa vai realizar sobre este assunto para efetivamente avançar num tema que interessa, sim, à população brasileira. Nós, que, de alguma forma, estamos em contato, representando a população brasileira, sentimos isso nas ruas, nos mercados, nas conversas, e não podemos nos omitir em algo que tem feito muito bem às pessoas. Nós temos que ouvir os dois lados, mas, ao mesmo tempo, atender os anseios da sociedade sobre esse tema e procurar, de alguma forma, dar respostas, avançar, para que outras pessoas possam ser beneficiadas com relação a isso.
Então, nós vamos passar, imediatamente, agora, a palavra para o Daniel Gontijo, que também está aqui conosco, presencialmente, que é professor. (Pausa.)
Ele está pedindo aqui que o Tiago Tatton fale primeiro. O.k. Ele é Diretor Científico da Iniciativa Mindfulness do Brasil.
Tiago Tatton, eu agradeço desde já a sua participação, a sua presença nesta sessão do Senado Federal, da Comissão de Assuntos Sociais. Muito obrigado.
R
O senhor tem doze minutos, com a tolerância de três, para concluir.
Aliás, já agradeço aqui, por ter ficado dentro do tempo, ao Sr. Marcelo Takeshi Yamashita. Muito obrigado pela participação.
O SR. TIAGO TATTON (Por videoconferência.) - Obrigado.
Vocês me escutam?
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Perfeitamente, Tiago.
O SR. TIAGO TATTON (Por videoconferência.) - Eu peço a autorização para o compartilhamento de tela. Deixe-me ver se já está, para daí, por gentileza, começar a contar meu tempo a partir do momento do início da minha fala também, se possível.
Eu tenho que alternar para meu documento escrito. Preciso saber se a minha tela está com os senhores aí. (Pausa.)
Correto? Um PowerPoint?
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Está aparecendo, Tiago.
O SR. TIAGO TATTON (Para expor. Por videoconferência.) - Então, está bem. Obrigado. Vou iniciar a minha fala, então.
Senhoras e senhores, autoridades presentes, Exmo. Senador Girão, Exmo. Senador Petecão e assessores, boa tarde.
Muito obrigado pelo convite. É uma honra e um privilégio estar entre vocês. Agradeço ao meu colega Prof. Marcelo pela fala e aos demais colegas pelas falas proferidas até o momento.
Eu admito que estou um pouco assombrado com o que ouvi até agora: campos morfogenéticos, era da energia, cura da alma, despertar de consciência, telepatia, foi citado Allan Kardec, fé raciocinada como modelo de pesquisa. Foi insistido também em honrar pai e mãe, que é um mandamento bíblico, correto? O que soa um pouco estranho para mim, para algo que se pretende política pública em um Estado laico.
Se as constelações familiares não fazem parte da ciência clássica, seja lá o que isso signifique, como foi dito por uma nobre colega consteladora hoje aqui, então as constelações familiares não deveriam estar na vida pública, com dinheiro público, deveriam estar tão somente dentro de lugares privados, clínicas, instituições. Políticas públicas ao redor de todo o mundo não podem se furtar de pesquisas experimentais ou ciência clássica, esse neologismo que foi replicado aqui pelos colegas.
Eu confesso que estou um pouco consternado. Não se faz política pública também através de testemunhos emocionados ou apelo à emoção. Isso, aliás, é uma falácia conhecida e que, em geral, demonstra falta de argumentação. Não se faz política pública se esquivando e criando novos conceitos de ciência para, daí então, encaixar opiniões pessoais que violam a própria filosofia da ciência. Eu entendo que opiniões são importantes, impactantes, mas ciência não se faz com opiniões, nem de cem, nem de mil pessoas. Fazer isso beira o irresponsável, o antiético e até mesmo é perigoso. É a boa ciência, em diálogo permanente com a sociedade, quem atua como fio condutor, como marca de segurança para o estabelecimento de políticas públicas eficazes, com alocação responsável de dinheiro público. É assim em qualquer lugar do mundo.
Vimos durante o auge da pandemia o quanto a boa ciência salvou vidas, mas também o quanto a má ciência fez estragos. Imaginem, senhores e senhoras, as meras opiniões emocionadas e permitam-me dizer aqui, com todo o respeito, que testemunhos, como vimos seguidamente até aqui, alguns até emocionados, são vistos usualmente em igrejas, mas estamos no Senado Federal, senhoras e senhores, discutindo política pública em um Estado laico.
Surpreendentemente, no Brasil, contra todo o bom senso, as chamadas constelações familiares e também esse termo cura sistêmica, prática sem validação científica e com forte marca de pseudociência, já são parte da vida pública na saúde e no Judiciário.
R
Mas por que a validação científica é importante, senhoras e senhores? O que ela é? Do que se trata?
Validação científica é quando após anos de pesquisas benfeitas, publicadas em jornais acadêmicos, revisadas por pares e não apenas números soltos, o meu excelentíssimo colega, Dr. Sami, citou aqui alguns números. Essas pesquisas, em grande número, aprovadas em comitês de ética, centenas de estudos experimentais controlados, um bom número de revisões sistemáticas benfeitas, estudos feitos no próprio país onde a intervenção ocorre com brasileiros, por exemplo, somente, então, conseguimos afirmar que esta ou aquela prática se apresenta como uma opção segura, eficaz e eficiente para determinada condição.
O meu colega Marcelo falou um pouco sobre isso. É somente após esse apanhado de anos de pesquisas que podemos dizer com clareza quais os benefícios e riscos de uma intervenção, para quem realmente funciona, se existem contraindicações, somente assim podemos falar em alguma validação científica.
O próximo passo, talvez, seria sugerir tal e qual prática como política pública, mas, nas constelações familiares, não bastassem os seus pressupostos duvidosos, que talvez até impeçam de se realizem pesquisas, campos quânticos, telepatia, intuições, ordens do amor, não preenchem nem de longe esses critérios de validação científica. As poucas pesquisas que temos são estudos insuficientes, de baixa qualidade, majoritariamente teóricos e qualitativos.
Um estudo de revisão recente, datado de 2021...
E, por favor, vejam se a minha tela alterou para os senhores. Eu tentei colocar o estudo na tela.
O estudo está na tela? Só para eu saber.
Sim?
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Está na tela, sim.
O SR. TIAGO TATTON (Por videoconferência.) - Esse estudo, datado de 2021, eu creio que ele será citado aqui, é uma das revisões mais recentes em que os autores encontraram 4 mil estudos possíveis sobre constelações, mas pasmem, apenas nove estudos puderam afirmar algum tipo de suposto benefício. Os demais, 3.991 estudos, não tinham qualidade mínima para serem avaliados. E mesmo esses novos estudos que encontraram supostos benefícios não eram delineamentos controlados, não tinham grupos de comparação adequados, ou seja, esses benefícios poderiam ser devido a outras condições, como simplesmente a pessoa ter recebido atenção, estar em grupo, estar podendo se expressar. Por isso, precisamos de estudos controlados, é assim que se faz.
Essa revisão mostrou também que as constelações familiares são uma intervenção que oferece risco. Nesses nove estudos, até 8% dos participantes tiveram algum efeito negativo; em mil pessoas, seriam 80 pessoas com efeitos negativos.
Isso precisa ser melhor compreendido e é só a boa pesquisa que vai nos mostrar. Não adiantam opiniões e testemunhos, senhoras e senhores.
Reparem que nessa revisão os autores viram que um participante inclusive teve uns escores de psicopatologia, de adoecimento mental elevado de maneira extrema após receber a intervenção constelação familiar. Sabemos de outras pesquisas que alterações dessa forma podem levar a desfechos extremos como depressão e até mesmo risco de suicídio.
Queremos isso no Brasil? Pergunto à sociedade brasileira.
Por fim, os autores desse mesmo estudo concluem que são necessários mais estudos, mais pesquisas para quaisquer conclusões. E eles alegam, está na tela dos senhores, infelizmente em inglês apenas, que existe uma vala imensa entre a teoria e as evidências, esses relatos e testemunhos.
R
Existe uma vala entre essa teoria, o que os outros dizem e os dados de pesquisa. Os dados de pesquisa não mostram nada do que as pessoas afirmam neste momento.
Esse estudo de revisão nos aponta que seguimos sem realmente saber se constelações familiares são seguras, eficazes, eficientes, mas, no Brasil, parece que é política pública. Como entender isso?
Em verdade, sua presença neste âmbito, sob qualquer ângulo, é, portanto, perigosa e injustificável. E os simpatizantes das constelações familiares se defendem alegando: "Mas nós estamos fazendo mais estudos, nós estamos nos organizando, nós criamos comitês e institutos". Uma espécie de nota promissória.
Senhores, isso é uma postura antiética, pois as constelações familiares já estão em pleno vapor na saúde e no Judiciário, inclusive dentro de universidades federais. Assombra que além da não evidência científica, teórica e experimental aumenta o número de relatos em jornais, podcasts e outras mídias de pessoas que se sentiram invadidas, invalidadas e violadas pelas constelações familiares, particularmente mulheres.
Mas, é claro, algo que adentra a vida pública com recursos públicos, avançando casas para além da ciência pode e irá trazer toda a sorte de efeitos. Não se enganem, senhores e senhoras, vejam por si sós e perceberão que em lugar algum do mundo essa prática faz efetivamente parte das políticas públicas de um país. Nada em sua concepção, nem mesmo possíveis benefícios pragmáticos para enfrentar a morosidade da justiça ou problemas na saúde pública devem atropelar, ignorar, violar os benefícios que séculos de avanço de ciência nos proporcionaram.
Escutem com atenção o que temos a dizer. Não se deixem encantar por depoimentos isolados de autoridades que alegam eficiência das constelações familiares baseados tão somente em suas experiências pessoais ou pessoas da família ou de onde trabalham. Quem mede segurança e eficiência de algo de modo confiável é a ciência. Afinal, quando você vai medir a dose do remédio que você vai tomar, você confia no seu médico ou nos seus vizinhos?
Nessa hora, esqueça o depoimento dos seus parentes, de artistas ou de autoridades. Quem relata eficácia, com todo o respeito, não são milhares de pessoas, mas a ciência. Não sejam fisgados pelo lado emocional ou pelo mero pragmatismo. Não é assim que se constroem políticas públicas sérias.
E, por fim, vocês podem me dizer: "Tiago, mas foi maravilhoso para mim. Eu fiz, eu conheço centenas de pessoas que se beneficiaram. Por que isso não vale, Tiago?". É claro que isso vale, o seu depoimento tem valor, é óbvio, mas, em ciência, nós trabalhamos com grande representatividade. Como o meu colega, o Prof. Marcelo, falou, nós usamos estatística e um método para isso, para além da observação pessoal.
A validação científica de intervenções como constelações familiares, senhoras e senhores, só é feita através de grandes números e um método por detrás disso, que vai além das centenas de pessoas que eu conheço, que vocês conhecem. A ciência sistematiza, percebe as falhas de observação, os vieses e extrai desses grandes números de modo sistemático o que realmente precisa ser visto.
Além disso, para finalizar, esses resultados são apresentados, os resultados de pesquisa são apresentados por uma comunidade de outros cientistas que vão tentar descobrir o que escapou ao meu olhar, à minha opinião. Mesmo em pesquisas muito benfeitas, aliás, é isso que faz delas benfeitas.
Se não fosse assim, bastariam as nossas opiniões ou testemunhos. Em termos de ciência, sobre as constelações familiares, tudo o que temos hoje são opiniões. Elas podem ser respeitadas, mas são opiniões.
R
Não há ética ou ciência que sustente e justifique sua presença dentro de espaços públicos, com dinheiro público. Se é para ouvir opinião, com todo respeito, Senadores, Senadoras, autoridades, leiam os comentários escritos no chat desta transmissão na página do Senado. O povo vem demonstrando fortemente a sua indignação. Leiam, por favor. A opinião do povo é preciosa. O povo não aceita, o povo não quer, ao menos neste momento, constelações familiares nos serviços públicos. O povo brasileiro é muito, muito inteligente. Ele não quer ser enganado.
Essa é a minha fala, agradeço o carinho e o respeito de todos vocês.
Muito obrigado. Passo a palavra para o meu estimado colega Daniel Gontijo.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito obrigado, Tiago, pela sua participação, por ter dedicado o seu tempo a vir a esta sessão da Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal. É muito importante a gente perceber aqui... E repito que vai ser a primeira de muitas, acredito, sessões para tentar se buscar a verdade. A gente vê que há cientistas que pensam diferentemente. Então, é um assunto que a gente precisa tirar das sombras e esse papel esta Comissão está fazendo e vai continuar a fazer aqui dentro do Senado Federal. A gente sabe, de um lado e de outro, que a busca pela verdade existe, por alguns com mais contundência... A gente sabe que isso envolve conflito também de interesses. Eu estava olhando os comentários aqui e percebo, pelo menos os que chegaram até a mim, que está muito dividido. A gente não pode dizer que tende para um lado ou para o outro. Há muitas pessoas que se dizem gratas, beneficiadas, pessoas participando do chat aqui... A gente percebe que existe um clima de participação, o que é muito importante no processo legislativo.
Então, eu fico feliz com essa audiência e acho que a gente tem um longo caminho a percorrer para buscar fatos, cada vez mais fatos com base na ciência, e procurar, de alguma forma, encaminhar para ajudar mais pessoas.
Imediatamente, eu já passo a palavra para o Sr. Daniel Gontijo, que está conosco aqui no Plenário do Senado Federal. Ele é membro fundador da Associação Brasileira de Psicologia Baseada em Evidências.
O senhor tem doze minutos, com uma tolerância de mais três, para fazer a sua exposição. Muito obrigado.
O SR. DANIEL GONTIJO (Para expor.) - Obrigado, Senador Girão. Quero agradecer também ao Senador Petecão pelo convite de participar desta discussão, e ao Alexandre, seu assessor, que foi e tem sido muito atencioso. Obrigado, Alexandre, também.
Bom, minha fala aqui hoje vai se focar no argumento de que a constelação familiar é uma pseudociência. E por que isso é tão problemático, ainda mais quando a gente pensa em sua inserção nos órgãos públicos, como no SUS e no Judiciário?
O que é uma pseudociência? Eu trago aqui a definição de um filósofo da ciência que é o Sven Ove Hansson, que, em 2021, estabeleceu três critérios. O primeiro desses critérios é que uma pseudociência é uma prática ou uma doutrina que aborda um tema que é de domínio da ciência, como, por exemplo, a saúde mental. Então, a gente tem a Psicologia e a Psiquiatria, que trabalham cientificamente com a saúde mental.
R
Para começar, uma pseudociência precisa falar de um tema de que outras ciências já falam. O segundo critério é que, diferentemente da ciência, a pseudociência carece de confiabilidade. Então, os seus métodos são ruins e não há evidências de qualidade que corroborem essas suas teses e a eficácia de uma prática, por exemplo. Este é um grande ponto: diferentemente da ciência, uma pseudociência não fornece confiabilidade. Em terceiro lugar, uma pseudociência possui proponentes que alegam ou passam a impressão de que essa sua prática ou essa sua tese é confiável, que funciona, que é algo que é corroborado por evidências. Exemplos de pseudociência, inclusive que estão no próprio SUS, sendo oferecidos lá, são o reiki, a terapia de florais e a quiropraxia. Não há evidências científicas de que essas práticas de fato curam ou ajudam pessoas.
E por que é importante a gente discutir isto: se é ou não é uma pseudociência a constelação familiar? Lá no livro Ciência e Pseudociência, do Prof. Dr. Ronaldo Pilati, que é professor aqui da Universidade de Brasília, ele lista alguns exemplos, alguns pontos problemáticos quando a gente fala de pseudociência. As pseudociências, por não terem aquela confiabilidade que eu mencionei, acabam iludindo a população, passando a impressão de que aquilo ali é verdadeiro e funciona, ainda mais - o que pode ser até mais complicado - trazendo promessas de cura; e desestimulam a pesquisa, porque muitas vezes chegam com respostas prontas ou com ideias que não são falseáveis. E o que é não ser falseável? É não ser testável, não ser passível de teste na ciência, o que é um grande problema, ou, como o Ronaldo Pilati também coloca, muitos de seus proponentes não estão abertos a testar isso aí, não estão indo atrás, não estão fazendo a pesquisa ou, às vezes, atropelam as etapas, querendo, por exemplo, como o Marcelo falou, testar a eficácia de uma terapia ou de uma intervenção sem se certificar de que existem pressupostos teóricos válidos, não é? Isso é queimar etapa na ciência também, muito perigoso, muito complicado.
As pseudociências também podem levar pessoas a abandonarem práticas baseadas em evidências, tratamentos que funcionam e também podem ser diretamente nocivas, porque a gente não tem essa confiabilidade de pesquisas para ver a sua segurança, então podem trazer riscos à população.
A questão, então, é: constelação familiar é uma pseudociência?
Bom, em primeiro lugar, pensando naquele critério colocado pelo Hansson, ela aborda, sim, tema da ciência, que são as relações familiares e relações sociais, ajudando supostamente as pessoas a terem insights e mudanças relativas às suas experiências conflitivas. Então, esse tópico está, sim, inserido na disciplina científica da Psicologia. Então, esse é um primeiro critério que a gente precisa considerar para avaliar se é uma pseudociência.
O segundo critério: será que carece de confiabilidade? Como o Tiago já colocou aí para a gente, previamente, os métodos e influências teóricas da constelação familiar são pouco confiáveis do ponto de vista científico.
Exemplificando com a perspectiva do Bert Hellinger, ele parte de bases teóricas que já são cientificamente problemáticas, como a programação neurolinguística, a análise transacional e a terapia primal. São disciplinas que não têm credibilidade científica, evidências robustas de que funcionam. Além disso, ele usa muito de suas intuições - usava, perdão - e insights para poder elaborar ou especular como as coisas funcionam, e isto não é um método confiável na ciência: simplesmente intuições, insights. Ele também alega ter feito várias descobertas, mas, pelo menos nas leituras que eu fiz de uns três livros dele, ele não descreve como chegou a essas descobertas, ou, pelo menos quando menciona, ele não faz referência a nenhum estudo científico. As experiências e observações pessoais dele são abundantes, e os meus colegas já haviam falado do problema disso, do ponto de vista científico, para se concluir qualquer coisa. E alguns autores, por exemplo, se não me falha a memória aqui, Marino e Macedo, num artigo de 2018, defendem que o Bert Hellinger também sofreu grande influência de sua visão meio espiritual ou religiosa, e um de seus colegas até falou que ele nem misturava muito espiritualidade e ciência. Então, existe esse questionamento também: até que ponto uma espiritualidade, uma religiosidade está interferindo ali em algumas ideias da constelação familiar? O que não seria uma postura aí muito científica.
R
Alguns pressupostos teóricos são bastante controversos também. Representantes sentiriam o mesmo que familiares, mesmo estando ausentes no momento de uma constelação? Que evidência a gente tem disso? No máximo, uma evidência anedótica - não é? -, esses casos que a gente tem ouvido por aqui, que não têm valor científico.
Soluções de constelações familiares afetariam misteriosamente a Família Real - muito estranho isso aqui. Essa ideia de ordens do amor, do pertencimento, ordem, por exemplo, essa precedência, níveis de importância, eu acho isso muito estranho. Gostaria de, quem sabe um dia, ver pesquisas apontando se isso realmente bate ou não bate, ou se é um achismo.
Mortes, abortos e exclusões impactariam gerações posteriores. Evidências? Doenças graves, como câncer e dores nas costas, poderiam decorrer de desordens sistêmicas. São muitas alegações extraordinárias, fora o campo quântico morfogenético também, que é uma ideia que é quase uma lenda urbana esse negócio de campo morfogenético. Há vários autores já problematizando isso daí, basta dar uma googlada que vocês vão ver muitos problemas disso. Telepatia, interconexão energética entre mentes... Não vou me delongar aqui.
E as evidências insuficientes, que também apontam para a insuficiência dessa confiabilidade: evidências anedóticas, que são esses casos que não têm valor científico; experiências pessoais, "eu me senti bem"; e uma escassez tremenda de evidências científicas a respeito de seus pressupostos e da eficácia da prática. O Tiago mencionou aqui, agora, uma revisão sistemática que conclui isso, que não existem evidências ainda suficientes. Os estudos são de qualidade muito baixa, não dá para a gente ter uma garantia de que existe segurança e de que as constelações funcionam no cuidado à saúde mental. Os próprios autores mencionam isso aí.
E há as experiências pessoais. Vocês contaram casos... Deixem-me contar uma história, então, rapidamente. Eu tinha quase 20 verrugas no meu joelho esquerdo, quando eu era criança, e aquele negócio me atormentava, porque eu jogava muito bola, queria ser jogador de futebol e me machucava para danar. Meu pai me levou a um benzedeiro, que fez lá uma oração para mim. Dali a algumas semanas, foram embora. É claro que meu pai até hoje acredita que foi o benzedeiro, só que ele se esquece de que eu também estava fazendo tratamento médico.
Então, existem muitas variáveis confundidoras que podem passar a impressão de que um procedimento como uma oração, ou um procedimento como uma constelação familiar funcionam, mas talvez outros fatores estejam envolvidos ali para passar essa impressão, como, por exemplo, viés de confirmação, viés de memória - não vou falar sobre todos detalhadamente, eu não tenho tempo -, efeito placebo, conformidade social, história natural da doença, regressão à média. As coisas melhoram por diversos motivos. O que garante que é uma constelação familiar que está ajudando essas pessoas que trazem esses relatos? Então, esse é um ponto muito importante, e a ciência está aí, para separar o joio do trigo, para ver se uma intervenção funciona ou está sendo explicada por outro tipo de processo.
Ela é apresentada no terceiro critério como científica ou pelo menos como muito confiável. O próprio Hellinger escreveu um livro em que ele fala que a Hellinger Sciencia é uma ciência do amor e do espírito. Então, é aquela pretensão, aquela forma de se expressar trazendo aquela credibilidade científica para a sua ideia. O Hellinger já foi visto como uma autoridade, até mesmo como dogmático, por algumas pessoas; ou um vidente, como Weber comenta lá na introdução de um dos seus livros; também como detentor da verdade, como também Beaumont também escreveu, se não me engano, em O Amor do Espírito, lá no prefácio. E ela é apresentada como científico-confiável, pelo menos a gente vê aqui na Portaria 702, do Ministério da Saúde, a forma como ela é apresentada:
R
[...] [Essa] constelação familiar [...] [seria] uma abordagem capaz de mostrar [...] a raiz, a origem, de um distúrbio de relacionamento, psicológico, psiquiátrico, financeiro e físico, [...] [Olha o que está escrito aqui: indicando] uma solução prática e amorosa [...] podendo ser indicada para qualquer pessoa doente, em qualquer nível e qualquer idade [...].
Que pretensão! Como se garante isso aqui? E está aqui numa política pública. Olha o que está escrito aqui, de 2018, nessa portaria.
Portanto, a constelação familiar aborda um tema de domínio científico, que está dentro da ciência, que são essas relações sociais, os conflitos, que é da área da Psicologia, da disciplina da Psicologia. Em segundo lugar, ela carece de confiabilidade, métodos e evidências são muito ruins. E, em terceiro lugar, seus proponentes passam a impressão de que suas ideias e práticas são confiáveis. Isso tudo, então, como muitos cientistas vêm dizendo, corrobora essa análise que eu propus aqui para vocês, de que, sim, a constelação familiar é uma pseudociência.
No requerimento desta audiência - só para começar a finalizar - é descrito que essa terapia impressiona por sua ação no nível anímico, sua cura da alma e por sua dinâmica extraordinária, mas, como a gente que está na área da ciência e gosta de divulgação científica aprende lá atrás, cedo, alegações extraordinárias requerem evidências extraordinárias, como o saudoso Carl Sagan nos ensinou.
Então, para fechar, diante disso tudo que a gente tem exposto aqui hoje - não só eu, mas também meus colegas e outros que vão falar depois de mim -, eu deixo aqui essa pergunta para cada um refletir, os presentes e quem está assistindo aí a gente na internet: será que seria uma atitude ética oferecer uma prática tão controversa, uma pseudociência, conforme essa análise que eu apresentei, à população em órgãos como o SUS e o Judiciário, se a gente não tem essas garantias que são importantes, e que a ciência ajuda a estabelecer, a respeito de práticas? Será que é ético?
Com isso, eu concluo. Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito bem. Muito obrigado, Daniel Gontijo, que é membro fundador da Associação Brasileira de Psicologia Baseada em Evidências, pela sua apresentação aqui.
É um assunto que suscita realmente muito interesse das pessoas. É fundamental que a gente possa debater, que a gente possa ouvir os dois lados dentro dessa premissa democrática.
Eu queria já chamar imediatamente aqui para participar a Gabriela Bailas, que é pesquisadora. Ela vai participar de forma remota, virtual. Eu queria convidá-la, agradecendo a presença dela, para que possa fazer a sua apresentação, por 12 minutos, com a tolerância de 3 minutos.
Agradeço desde já ao Daniel pelo cumprimento do prazo. Deixou até um crédito aí. (Risos.)
Obrigado.
A SRA. GABRIELA BAILAS (Para expor. Por videoconferência.) - Olá! Boa tarde a todos!
Eu vou fazer uma apresentação de eslaides também, mas, antes da minha apresentação, eu gostaria de pontuar algumas coisas que eu julgo muito importantes aqui.
Primeiro, para quem não me conhece, eu sou Ph.D. em Física Teórica. Eu moro no Japão, mas atualmente estou de férias aqui no Brasil. Então, é um prazer poder participar desta audiência.
R
Quero já agradecer o convite do Senador Eduardo Girão, do Senador Sérgio Petecão e agradecer a fala de todas as pessoas aqui presentes. Vimos muitos depoimentos emocionantes, depoimentos e até mesmo de histórias que quase nos fazem chorar. Mas a pergunta que fica é: quando estamos falando de políticas públicas, nós devemos estar focados na emoção ou em evidências científicas, em fatos? O que eu conto para uma pessoa não é uma evidência científica: é uma evidência anedótica. E, como disse Natalia Pasternak na CPI da covid, um conjunto de evidências anedóticas não forma uma evidência científica.
Então, antes da minha fala e da minha apresentação, eu vou responder a algumas perguntas que ficaram, como, por exemplo: como algo que pode estar no mundo todo pode ser ruim? E eu já peço desculpas pelas palavras que eu vou falar, mas estupro está no mundo todo e é ruim; o racismo está no mundo todo e é ruim; o machismo, o sexismo está no mundo todo e também é ruim. Então, coisas que estão no mundo todo também podem ser coisas ruins.
Também vou comentar aqui que, em diversos momentos, as pessoas que estão falando sobre constelações familiares trouxeram muito falas que envolvem mães, mulheres. Eu sou ativista pelo direito das mulheres, pelos direitos humanos, e, assim como eu sei que o Senado luta no combate à violência de gênero - e ontem mesmo outorgou o Diploma Bertha Lutz para uma pessoa muito importante, Flávia Cintra -, eu confio que o Senado também como eu quer acabar com a violência de gênero. Então, nós trouxemos falas como: o aborto de uma criança pode gerar uma outra criança com pensamento suicida; ou uma mulher com problemas com o marido e proibindo os avós paternos de ver uma criança gera uma criança com problemas. Bem, suicídio e transtornos mentais são regulamentados, são explicados pela Organização Mundial de Saúde e possuem tratamentos específicos.
Uma família bagunçada... O que seria uma família bagunçada? Como é a organização das famílias brasileiras? O que seria uma família organizada? Nós ouvimos muito "pai e mãe", mas nós sabemos que no Brasil existem inúmeras famílias que são compostas apenas por mães, avós; famílias homossexuais também - e o relacionamento homoafetivo é autorizado no Brasil -; famílias em que os pais assassinaram mães... Então, no final a gente sempre tem a mulher como elemento central. E isso é muito bem registrado na obra de Bert Hellinger, que fala muito sobre a sociedade conservadora, sobre o pai estar acima da mãe.
Nesta reunião eu trouxe aqui algumas informações, que são reflexões muito importantes que eu quero trazer para vocês, sobre um tema que eu estudo há muitos anos.
Eu sou física, mas tenho muito interesse no assunto constelações familiares. Assim como meus colegas que falam a favor das constelações, temos juízes, temos administradores, temos jornalistas, e por que não físicos que também se interessam pelas constelações familiares? No próprio requerimento desta audiência encontramos a palavra "quântica", que é uma palavra da física, como o meu colega Marcelo Yamashita já explicou. Então, eu vou trazer alguns pontos específicos.
O primeiro deles é o que a população brasileira diz. Então, o meu colega que vai falar posteriormente, o Mateus França, lançou ano passado uma ideia legislativa que atingiu, em quatro dias, 20 mil apoios para banir a prática de constelação familiar das instituições públicas. Hoje, nós somos a consulta pública, Sugestão nº 1, de 2022, que vai ser julgada pela Comissão de Direitos Humanos. E já contamos com mais de 23 mil apoios para banir as constelações familiares. No evento interativo desta audiência, mais de 90% dos comentários, para não dizer 95%, uma estatística por alto, as pessoas são contra as constelações.
R
E, vejam bem, eu não estou falando para banir as constelações do mundo. Eu estou falando que as constelações familiares não devem estar no poder público. Existe uma diferença. Se a pessoa gosta muito de constelação, ela pode pagar de forma privada por uma constelação, ir a um grupo de apoio, ou fazer da forma que ela achar mais interessante, mas políticas públicas necessitam de evidências científicas.
Eu vou falar um pouquinho da base das constelações, porque eu já li grande parte da obra de Bert Hellinger, bem como inúmeros artigos científicos falando de constelação familiar.
Então, nós temos no livro As Ordens do Amor, p. 152, o Bert Hellinger comentando sobre o incesto. Em diversos momentos da sua carreira e da sua obra, ele fala sobre isso. Ele explica que, quando uma mulher fala sobre abuso - e, nesse caso, uma criança que sofreu o abuso... Incesto com criança é estupro, é pedofilia, para deixar bem claras as palavras - desculpem os termos. Quando um pai ou um padrasto abusa sexualmente de uma criança, a criança tem que dizer: "Mamãe, por você eu faço isso; papai, pela mamãe eu faço isso". Ou seja, existe um desequilíbrio no sistema, e essa criança é estuprada pelo seu pai, porque a sua mãe não deu amor o suficiente. Isso se repete na obra de Bert Hellinger - ele tem quase 90 livros. Eu já li boa parte da obra de Bert Hellinger, para citar, inclusive, as páginas da obra - está bem?
Então, nós temos este ponto muito importante: a base da constelação familiar.
Depois, outro ponto interessante é uma palestra que Bert Hellinger fez em Quioto, em 2001, em que explica que um assistente social o procurou em termo de uma adolescente que foi agredida sexualmente. E Bert Hellinger falou: "Se você levar o agressor à Justiça, esta vítima espiará o que for feito ao agressor". Ou seja, a vítima vai sofrer pelo que acontecer com o agressor. E, supostamente, depois, esse assistente social disse que essa vítima estava querendo pular pela janela. E Bert Hellinger disse: "Esse foi o resultado da ação justiceira dele". Não será que essa menina foi violentada e, por isso, ficou traumatizada e não tenha nada a ver com a ação justiceira? E, não, vocês podem estar pensando: "Mas isso Bert disse há muito tempo!". Mas notícias na mídia recentemente alertam para as mulheres denunciando que a Justiça reabre feridas com método que reencena agressão de conflitos.
Então, existe um debate muito grande no CNJ sobre revitimização. O que é isso? Quando uma mulher, sim, como eu... Porque, se vermos os índices de abusos de mulheres, feminicídios no Brasil, estupros de crianças, violência doméstica, eles são altíssimos. Revitimização é fazer a vítima viver novamente o trauma. E é isso que a constelação familiar faz dentro de um tribunal. Faz a mulher relembrar tudo o que aconteceu com ela - mulheres hostilizadas nos tribunais por juízes. Na notícia do Metrópoles - para quem quiser ler, está lá -, uma juíza hostilizou uma mãe que se recusou a participar de uma constelação familiar, supostamente um convite, e não uma obrigação.
R
Então, uma palavra muito usada na constelação, que inclusive vimos nos discursos anteriores, é honrar. Será que eu tenho que honrar agressores? Será que eu preciso honrar estupradores? Essa é uma pergunta que fica para todo mundo que está aqui assistindo.
O Conselho Estadual dos Direitos das Mulheres (Cedm) do Rio de Janeiro publicou uma nota inteira sobre constelação familiar, na qual diz: "Essa prática é ilegal, de acordo com a Lei Maria da Penha". A responsabilidade de atuar na prevenção, atenção e punição dos atos praticados contra mulheres e violência de gênero é dever exclusivo do Estado, que não pode privatizar esses crimes para soluções domésticas como constelação familiar.
E, falando em privatização no Brasil, diversas pessoas que atuam em constelações familiares possuem suas próprias marcas, suas próprias empresas, suas próprias universidades. Deixaríamos então o poder público à margem de um empresário, de uma pessoa ou o Estado não pode depender de marcas registradas? Essa é uma outra questão que fica.
Bert Hellinger não só falou sobre estupros. Ele também falou sobre câncer, que pacientes com câncer querem morrer, e que mulheres com câncer de mama possuem problemas com suas mães. Mais uma vez, a mãe é o centro de todos os problemas supostamente; a mulher é o centro dos problemas, e o homem fica sempre superior.
A gente sabe que a OMS, que as autoridades de saúde explicam de onde vem câncer de mama. É multifatorial. Não podemos afirmar que uma mulher que tem um problema com sua mãe vai desenvolver um câncer de mama. Isso é errado, para não dizer antiético e anticientífico. E pessoas que têm câncer desejam morrer? De onde veio essa informação? Como vamos culpabilizar pacientes com câncer, uma doença terminal muitas vezes, uma doença que gera um trauma psicológico em muitas pessoas? Como a gente vai falar que essa pessoa teve câncer porque queria morrer? Onde estão as evidências científicas?
Depois temos também os centros de constelações familiares sistêmicas e diversos consteladores explicando que pessoas com esquizofrenia, bipolaridade ou possivelmente autismo teriam esse "problema", entre aspas, decorrente de pessoas de uma linhagem passada, alguém que sofreu um assassinato na família. Aqui a gente fala de uma técnica supostamente terapêutica ou de reencarnação, espiritismo, vidas passadas? Cada um de nós tem uma crença, uma fé, uma religião, e isso não pode estar acima do Estado, não pode estar no poder público, porque o nosso Estado é laico. Imagina se eu colocar a minha religião, a minha crença acima dos demais! O Brasil é um país plural. Temos umbandistas, espiritualistas, kardecistas, como falamos aqui nesta palestra inúmeras vezes, católicos, evangélicos e por aí afora, judeus... Então, a gente vai colocar uma prática que é religiosa?
Constelação familiar não é aceita internacionalmente. A própria Alemanha, berço da constelação familiar, emitiu uma nota dizendo que considera a prática de constelação familiar segundo Hellinger eticamente injustificável e perigosa para os afetados. A Ordem dos Psicólogos Portugueses também não aceita constelação familiar.
E aqui nós temos que o método científico segue passos exatos. Saímos da observação, passamos por diversos passos até a conclusão. A constelação familiar saiu da observação e foi para a aplicação em órgãos públicos. Como pulamos todo o método científico?
R
Então, não é que cientistas não têm interesse, é que a constelação familiar pulou todas as etapas, já foi aplicada e, agora, supostamente, faz maravilhas. Se a gente quiser fazer pesquisa científica, voltamos do começo. Como o Berti disse, tudo isso é baseado na observação, não há teoria sobre isso, e a gente pulou tudo. Constelação familiar ignora o método científico, não é ciência e não possui evidências científicas. Causa danos irreparáveis para inúmeras vítimas. A pergunta que fica é: por que estamos usando isso no sistema público brasileiro? Por que constelação familiar está sendo aceita? Por que estamos discutindo se a constelação familiar deve ser aceita ou não, quando parte da população não quer constelação familiar? E, se um dia pensarmos em colocar constelação familiar no poder público, a gente tem que voltar tudo, até o primeiro ponto do método científico, que é a observação.
E, para mim, a constelação fere os direitos das mulheres, os direitos humanos e, sim, dentro da Justiça já temos inúmeros relatos que revitimizam mulheres e corroboram com a violência de gênero. Podem assistir, podem ler os artigos nos jornais. Eu trabalho com constelação familiar no meu canal do YouTube, onde eu faço comunicação científica, e recebo diversos relatos. Só que o ponto aqui é que evidências anedóticas não são evidências científicas. Precisamos de pesquisa científica, se quisermos usar o dinheiro público, o dinheiro de impostos, o dinheiro de todos os brasileiros em uma prática que, como já foi provada aqui pelos meus colegas, é pseudociência e não deveria estar nos órgãos públicos.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado pela sua participação, Gabriela Bailas, que é pesquisadora.
Nós vamos ter a oportunidade de ouvir depois aqui, obviamente o contraponto, vamos ter outros palestrantes aqui que vão falar. Inclusive foram citados pela Gabriela alguns pontos aqui da obra do Bert Hellinger que eu acredito que devam ter algum tipo de contraponto ao longo desta reunião, até porque nós teremos agora a participação do Mateus Cavalcante de França, depois do Paulo Almeida, que são duas pessoas que vão também falar contra a constelação familiar. Depois nós temos o Décio Fábio, o Mateus Santos, que são a favor, podem ter essa oportunidade ou deixar para o final, porque no final a gente vai ter cinco minutos para cada participante. Eu acho que há pontos que precisam ser esclarecidos sobre algumas colocações que foram feitas e que necessitam de esclarecimento sobre a obra, vamos dizer assim.
Eu passo imediatamente a palavra agora para Mateus Cavalcante de França, que é pesquisador. Agradeço a participação dele, deixando claro que ele tem 12 minutos para fazer a sua exposição e mais três de tolerância, dentro do que a gente combinou aqui no início, para dar um equilíbrio e para ser bem democrático com relação a esta reunião.
Muito obrigado.
O SR. MATEUS CAVALCANTE DE FRANÇA (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde, muito obrigado, Senador Eduardo Girão. Estendo também meus agradecimentos ao Senador Sérgio Petecão pelo convite.
R
Vou me apresentar um pouco, certo? Inicialmente, creio que vai ser importante pegar um pouco da minha área e o que minha área tem a dizer sobre o tema de constelações familiares, especialmente no sistema de Justiça, no Judiciário.
Eu sou Mateus França, eu sou pesquisador de Sociologia do Direito, e um dos assuntos, um dos temas que são caros à Sociologia do Direito é a compreensão de como o Direito, como o campo jurídico interage com outros campos da sociedade, e um deles é o campo acadêmico, naturalmente. Então, em minha base de pesquisa nós contamos com pesquisas sobre a interação entre o campo jurídico e o campo científico, o campo acadêmico, para justamente entender como é essa permeabilidade. E foi discutindo esse tema, foi discutindo esse tipo de relação que chegamos, eu cheguei e outros colegas chegaram ao tema da constelação familiar, que vem sendo implementada como meio alternativo de resolução de conflitos em diversas comarcas no Brasil.
Mas o que chamou a atenção é que a constelação familiar, apesar de algumas afirmações que tentam dar um verniz científico, tentam dar um caráter científico, enfrenta várias fragilidades nessa tentativa. Eu acho que o exemplo mais evidente, que foi trazido aqui por mais de uma fala, é o conceito de campo morfogenético, um conceito de fato proposto por um biólogo, só que ele mesmo não chama de descoberta, ele chama de hipótese. Ele reconhece que é uma hipótese e que, portanto, não há comprovação, não há evidências que sustentam a afirmação da existência desse tal campo morfogenético.
Então, o que chamou a atenção nessa história, nessa relação entre a constelação familiar e o campo jurídico foi: como é que a gente está pegando uma prática que não tem base em evidência - então a gente precisa acreditar nela para que ela faça sentido na nossa cabeça, então isso depende de uma crença -, como é que a gente está pegando isso e colocando no poder público? Porque naturalmente, no poder público, uma pessoa que não compactua daquela crença pode estar inadvertidamente sendo submetida àquilo.
Eu entendo os argumentos de que são feitos convites, são feitas propostas, mas uma outra contribuição que a Sociologia do Direito pode trazer a isso é que a relação entre o Judiciário e o cidadão é desigual. Se uma pessoa recebe um convite de um juiz, se a pessoa recebe uma proposta de um juiz, ela não está se sentindo convidada, ela não está se sentindo exatamente na possibilidade de recusar. Inclusive, posso já mencionar de antemão uma das denúncias feitas na mídia, se eu não me engano está em uma matéria publicada pelo Metrópoles, de uma mulher que havia recusado a participação numa sessão de constelação familiar no Judiciário e disse que, quando chegou à audiência perante a juíza, ela foi constrangida. No relato dela, ela afirma que foi constrangida pela juíza, que falou algo do tipo: "Muito bonito... Ao invés de vir aqui para a constelação familiar, a senhora estava passeando no shopping". Então, será que tem mesmo esse caráter opcional?
A gente precisa rever algumas afirmações que são feitas, porque um dos pontos da Sociologia do Direito é que o Direito fala de como as coisas devem ser, mas muitas vezes elas não se comportam como elas deveriam. Então, o que é supostamente um convite nem sempre é percebido pelo sujeito como um convite, certo? Então, a gente tem que ter essa visão crítica quando faz alguns tipos de afirmação.
Então, foi isto que me chamou a atenção: qual foi o caminho, o que levou, o que que leva uma prática que depende de que você acredite nela a ser implementada enquanto política pública em órgãos públicos?
R
Então, eu e a colega Marina Guagliariello começamos essa pesquisa. Essa pesquisa está em andamento, temos uma publicação de alguns resultados preliminares, que foram revisados por pares, mas também queremos levar mais resultados para que também sejam revisados por pares, porque é assim que funciona no campo acadêmico. E nós decidimos então fazer uma análise dos argumentos que são levantados por agentes do campo jurídico que defendem o uso de constelações familiares nesse campo, nas práticas do Direito. Nós analisamos esses discursos em plataformas públicas. Eram discursos publicados em plataformas como o YouTube, o Spotify, enfim, plataformas audiovisuais de acesso público. Nós partimos inclusive do pressuposto de que essas pessoas podem estar querendo ajudar, podem ter boas intenções, na verdade. Então, quando fizemos essa decisão a princípio, a gente decidiu dar esse benefício e só considerar os argumentos que estão sendo dados.
Quando analisamos os argumentos, eles são vários, inúmeros, e vários deles correspondem ao que se chama, na teoria da argumentação, de falácia.
Há falácias como o apelo à multidão: muitas pessoas usam, está em toda parte, está em tantas comarcas, está em tantos países... Isso é um argumento de apelo à multidão. É um argumento que impressiona, claro, mas a gente tem que percebê-lo criticamente também. Será que algo, por estar disseminado, é intrinsecamente positivo? Será que algo, por estar disseminado, efetivamente funciona? São perguntas que não são feitas quando esse tipo de argumento é levantado.
Outro argumento comum que também é uma falácia é o apelo ao oculto. O apelo ao oculto é quando a gente faz referência àquilo que não foi descoberto, àquilo que ainda está para ser entendido, àquilo que está oculto, que está inconsciente, que está escondido. Isso também é problemático, porque, se a gente fala de algo que não foi descoberto, como a gente afirma que foi, como a gente afirma que existe? Algo que não foi descoberto não é necessariamente algo real.
E também é comum o uso de evidências anedóticas. As evidências anedóticas já foram levantadas aqui em mais de uma fala dos meus colegas. As evidências anedóticas são esses relatos pessoais.
Eu acredito, na verdade, que uma pessoa que se submeteu a constelações familiares possa se sentir bem, ela pode sair feliz, ela pode se sentir bem atendida. Isso é possível, assim como uma pessoa pode ir a um culto religioso e se sentir bem atendida. Ela pode sentir que aquele culto religioso a ajudou a resolver seus problemas. E eu acredito que isso acontece, eu acredito que isso acontece. Como o meu colega Daniel Gontijo contou, isso pode acontecer por inúmeros motivos. Então, se eu vou, como eu já fui, a templos religiosos e saí me sentindo bem, eu não posso afirmar, com base nisso, que aquelas divindades cultuadas naquele templo existem. A gente entra em outras afirmações que são também perigosas quando a gente trabalha apenas com evidências anedóticas. As evidências anedóticas não permitem que a gente faça um controle de variáveis.
Então, por que é que essas pessoas se sentiram bem? Foi necessariamente por causa daquela intervenção ou outras coisas podem ter acontecido? Nas ciências sociais, a gente também trabalha com controle de variáveis. Isso é importante, porque, quando a gente faz afirmações generalizáveis, que é o tipo de afirmação que é feita quando se fala em constelação familiar, a gente precisa de métodos de coleta de dados, de análise de dados, que permitam afirmações generalizáveis. As evidências anedóticas não são esse caminho.
R
E, quando a gente trabalha com esse tipo de metodologia, com esse tipo de investigação, a gente também não pode ficar preso a frequências, a gente não pode ficar preso ao que a gente chama de estatísticas descritivas, como acontece, por exemplo, em alguns questionários de satisfação: "Você se sentiu bem?" "Você gostou?", "Foi bom para você?", "Você sente que isso o ajudou com seu problema?". Claro que aquilo fala quantos por cento afirmaram cada coisa, quantos por cento afirmaram "sim" ou "não", é um resultado, mas a gente tem que entender as limitações desse resultado. Isso é o que a gente faz na ciência, em cada trabalho que a gente faz; em cada pesquisa que a gente faz, a gente aponta as próprias limitações, e isso não é feito nas pesquisas que envolvem constelações familiares. Então, a gente tem fragilidades e comportamentos que fogem à prática do campo acadêmico, que fogem à prática do campo científico.
Quando a gente quer dialogar com nossos pares, a gente precisa desse tipo de controle, a gente precisa descrever como esses dados foram coletados, o que muitas vezes não é feito. Quem aplicou esse questionário? Foi enviado por quem? Assinado por quem? E repito: quando a gente usa frequência descritiva, quando a gente fala em um percentual de pessoas que responderam "sim" ou "não", a gente não está considerando outras variáveis, e existem testes estatísticos que permitem que a gente considere outras variáveis para investigar fragilidades naquela afirmação.
Também é frágil a afirmação de só comparar essa frequência descritiva com outro percentual de outra técnica, de outra prática, de outro meio de resolução de conflitos, por exemplo. A gente não faz esse tipo de teste só olhando uma frequência, olhando outra frequência e dizendo que uma é maior do que a outra; as amostragens podem ser diferentes, a coleta pode ter sido diferente. A gente precisa juntar tudo em um modelo estatístico que possa afirmar que é diferente. Se a gente não fez isso, a gente não pode fazer essa afirmação, essa afirmação não pode ser feita, e são afirmações assim que normalmente são utilizadas para falar da pretensa, da suposta eficiência da constelação familiar.
Portanto, a gente não tem justificativa para trabalhar a constelação familiar enquanto política pública. Eu repito, como outros colegas disseram: a própria ideia legislativa fala de instituições públicas, então nada impede que alguém procure uma constelação familiar no âmbito privado, assim como nada impede que alguém procure uma igreja, um centro espírita, um templo de umbanda no setor privado, em seu âmbito privado. A gente não vai trazer médiuns, não vai trazer confessionários para o Judiciário porque alguém se sentiu bem, porque alguém sentiu que aquilo o ajudou a resolver seus conflitos, não concordam? A gente precisa trabalhar com evidências antes de inserir, não é depois; a gente trabalha com essas evidências antes da inserção enquanto política pública.
Outra questão que nós percebemos e, no avanço da nossa pesquisa, isso foi evidenciado é que os discursos são dispersos. Os discursos que justificam o uso de constelação familiar no Judiciário não são unânimes, não são unificados. Como é que a gente usa? É com boneco? É com boneco na água? É com pessoas representando outras pessoas, representando sentimentos, enfim, o que for? A gente usa para que tipo de caso? Será que a gente usa para casos de violência doméstica ou não? Será que a gente usa na Judiciário? Ou será que a gente só usa em outro tipo de instituição pública? Não existe consenso! Nem mesmo nesses discursos existe um consenso. Então, a gente tem que também cuidar - já estamos encerrando - de como essas afirmações são levantadas, e essas afirmações são levantadas em conjunto, como se estivessem sempre tratando do mesmo tipo de afirmação.
R
E aí eu queria só voltar à questão das denúncias. Depois que meu trabalho foi divulgado, que meu trabalho com a Marina Guagliariello foi divulgado - eu sou coautor da Marina Guagliariello -, eu recebi muitos comentários: alguns comentários bem hostis, para ser sincero, e também denúncias, denúncias de vítimas, de pessoas que se sentiram humilhadas em uma constelação familiar, especialmente no Judiciário. E por que elas não falam? Por que elas não falam por aí? Porque elas têm medo. Voltamos àquele ponto inicial, que é a desigualdade da relação entre o Judiciário e o cidadão. O Judiciário, por mais que ele não queira necessariamente assustar, assusta, assusta o cidadão. Então, algumas denúncias foram mobilizadas na imprensa, elas podem ser consultadas na imprensa com facilidade, mas muitas não são feitas, muitas denúncias não são feitas. Claro que as denúncias são também evidências anedóticas, elas são relatos de experiências. Eu não posso, com base nas denúncias, dizer que todas as pessoas passaram por aquela experiência, mas elas evidenciam uma coisa, que é o perigo de a gente trabalhar com a prática que não tem base alguma em evidência no poder público. A gente está expondo a população a esse tipo de risco, porque não se investigaram os cuidados, não se investigaram os riscos e não se investigou sequer se isso tem uma base lógica em seu funcionamento.
Muito obrigado pelo tempo, peço desculpa se extrapolei o meu limite e boa tarde a todos.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo boa tarde. Muito obrigado pela sua participação aqui, Paulo Almeida, que é Diretor-Executivo do Instituto Questão de Ciência, não é isso? Questão de Ciência. Muitíssimo grato pela sua participação e...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Opa, perdão, perdão, já estou aqui, já estou aqui na... É Mateus Cavalcante de França, que é pesquisador, e eu lhe agradeço demais a sua participação.
Agora, sim, a gente vai ouvir o Paulo Almeida, que é Diretor-Executivo do Instituto Questão de Ciência e que vai fazer uma exposição para a gente agora em 12 minutos. É o tempo de fala, mas a gente, já de antemão, deixa aí consignados três minutos de tolerância.
Então, já passo imediatamente a palavra para o Sr. Paulo Almeida. Muito obrigado.
O SR. PAULO ALMEIDA (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde a todos.
Agora eu estou com vídeo.
Queria agradecer ao Senador Girão e agradecer também o convite feito pelo Senador Sérgio Petecão para que eu pudesse conversar com vocês aqui um pouquinho sobre constelação familiar nesta audiência pública.
Quero falar bem rapidamente sobre o meu currículo.
Eu sou psicólogo e advogado, sou mestre em psicologia também e estou fazendo doutorado em Administração Pública agora, sou Diretor-Executivo do Instituto Questão de Ciência e sou o principal organizador, o pesquisador principal do Observatório de Políticas Científicas, que está no âmbito do Instituto Questão de Ciência. Por isso, então, até um pouco pelas minhas formações, por onde eu transitei acadêmica e profissionalmente até hoje, esse tema das constelações familiares me afeta bastante, porque envolve políticas públicas, envolve Psicologia, envolve Direito, e vou tratar um pouquinho disso logo a seguir.
Antes de entrar especificamente nas constelações familiares no Judiciário, eu quero trazer uma questão um pouquinho mais ampla, que é discutir um pouco sobre quais são as condições que permitem que as pseudociências tenham relevância no Brasil. E a discussão sobre constelações familiares é um fenômeno aparente desse outro fenômeno maior que é como práticas pseudocientíficas conseguem ganhar espaço, ganhar relevância e se tornar grandes onde deveria haver um debate técnico que não permitisse que elas chegassem a esse tipo de destaque.
R
Então, aqui, no Brasil, dá para pontuar muito claramente que as pseudociências que não conseguem se sustentar, não conseguem pautar o debate científico, estão à margem dos consensos científicos, estão à margem do escrutínio correto pelo método científico buscam se utilizar de uma excessiva permeabilidade institucional que existe no Brasil para se tornarem oficiais. Na ausência de filtros institucionais que criam um crivo pelo qual uma prática, uma técnica, uma terapia devesse passar para que pudesse ser discutida - e não é nem aprovada; para ela pudesse ser discutida -, a gente tem uma porta aberta para que todo tipo de prática de pseudociência, em última instância, de alguma coisa que é muita picaretagem propriamente dita seja inserida oficialmente dentro do ordenamento jurídico ou dentro da prática de algum órgão do Executivo, dentro de um trâmite legislativo.
Consigo dar exemplos muito práticos disso. A homeopatia, por exemplo, tem um consenso científico absoluto sobre sua ineficácia. E isso é endossado, há décadas, pelo Conselho Federal de Medicina, muito porque existe um lobby de médicos homeopatas que ganham a vida com esse tipo de prática - e é uma prática absolutamente pseudocientífica. Num passado muito recente, a ponto de a gente conseguir resgatar facilmente pela memória, houve o caso da fosfoetanolamina, que teve um projeto de lei aprovado pelo Congresso, a pílula do câncer, uma panaceia que curaria todo tipo de câncer que pudesse existir, absolutamente ineficaz, criada por um professor da USP que claramente não sabia do que estava falando. A gente oficializou uma prática sem respaldo nenhum, à revelia da Anvisa, por um projeto de lei. Não houve um mecanismo no meio do caminho que bloqueasse isso. E lembro que isso foi um projeto de lei proposto pelo Bolsonaro e sancionado pela Dilma, o que quer dizer que está completamente disperso no espectro político. Isso não é um fenômeno localizado, é um fenômeno global. Também de maneira relativamente recente, a gente teve a criação da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, que existe a partir de um decreto do ministro da saúde. O que essa política faz? Ela insere, no âmbito da atenção à saúde básica do SUS, coisas como dança circular, ozonioterapia, lamaterapia, reiki e mais um monte de coisas - são 29 no total - que não têm o menor respaldo científico e já estão sendo utilizadas dentro do contexto do SUS. E o que está lá no meio também? Constelações familiares.
Então, existe um caminho pelo qual muitas pseudociências driblam o debate técnico-científico e usam de uma abertura que existe em outros caminhos para ir se inserindo e ganhando relevância. Hoje, especificamente, eu consigo citar nominalmente constelação familiar e ozonoterapia como duas dessas práticas que estão tentando obter relevância, aceitação, adoção e oficialização por essas exatas mesmas vias, e não pelo debate técnico e científico.
Existe por trás dessas práticas, dessas teorias, dessas pseudoterapias, não um interesse efetivo em aperfeiçoar o conhecimento sobre saúde, porque, senão, o debate estaria ocorrendo em outra esfera. Existem por trás disso, primordialmente, interesses financeiros e corporativos. E como isso se dá? Se há uma oficialização por lei, por decreto, se há uma autorização por um órgão de classe, isso é o primeiro passo que vai endossar alguns outros passos futuros, que são, dentre alguns, vários: a regulamentação da profissão, que é algo que acontece, que está acontecendo - existem projetos de lei para regulamentar a prática de constelador e a prática de ozonioterapeuta -, o que leva, uma vez que está criada essa demanda, por um lado, à criação de cursos de ensino superior e a uma consequente reserva de mercado, que, por sua vez, vai retroalimentar a dispersão disso na comunidade e uma pressão para que isso ganhe mais espaço. Isso é um mecanismo que precisa ser combatido. Constelação familiar é uma cabeça da Hidra, a gente precisa enfrentar o monstro inteiro. Então, falando especificamente sobre o Legislativo, que é o contexto que eu estudo mais, que eu estou enfrentando de maneira mais frontal na minha pesquisa, a ciência não é vista e deveria ser, por princípio de eficiência da administração pública, um pilar importante de análise de projetos de lei, e ela não é. A gente tem constitucionalidade, tem orçamento e o resto tramita por diferentes Comissões. Então, rotineiramente a gente vê questões de fundo técnico, questões de fundo científico tramitando em rito terminativo, ou seja, sem deliberação em Plenário, cujo mérito é analisado, por exemplo, em Comissão de Seguridade Social e Família, em instâncias que não deveriam ser as instâncias ideais para discutir temas tecnicamente complexos. E isso, determinando o ritmo terminativo, vai para sanção e invariavelmente a gente empurra muita coisa que não deveria existir pela via oficial. Isso é muito preocupante. Então, o meu olhar está no pontual, mas também está no institucional e como isso é um fenômeno a partir dessa questão global.
R
E aí falando um pouco na prática, nas instituições, alguém trouxe aí que "Ah, está sendo aplicada em empresas. Vejam que maravilha!", empresas estão utilizando constelação familiar. Vamos lembrar que o uso, no contexto privado, não é endosso de qualidade. Muito pelo contrário, a gente está cansado de ver empresa promovendo capacitação de gestores a partir de programas de programação neurolinguística, de gerenciamento quântico, de toda variedade de coaching pseudocientífico que vocês conseguirem imaginar. Então, utilização no contexto privado não é endosso de sucesso e de eficácia de uma prática.
E, deixando muito claro e reforçando o que os colegas já falaram, nós não queremos banir a existência de constelação familiar. No ambiente corporativo, como eu acabei de citar, no ambiente privado, isso pode ser usado sem problema nenhum, lógico que desde que esse uso privado esteja dentro dos limites da lei e que os praticantes que excederem estejam sujeitos a eventuais sanções penais e civis. Mas nós não temos nada, a princípio, quanto ao uso disso dentro do contexto privado.
O problema é a hora em que a gente começa a transmitir isso para dentro do setor público. E aí eu vou focar principalmente no jurídico, mas não sem antes mencionar a pedagogia sistêmica, que é uma proposta de uso disso dentro do ambiente escolar, que não tem relevância acadêmica alguma e não tem respaldo comparativo no mundo, é uma jabuticaba. Espero que esse debate não cresça, porque, por enquanto, ainda é marginal, é residual.
Agora, dentro do ambiente jurídico, a coisa é um pouco diferente. Começou numa esfera federal, dentro de uso em comarcas, dentro de uso em juízos, e rapidamente ganhou um endosso acrítico pelo CNJ, lembrando que o CNJ é o Conselho Nacional de Justiça, que teria como função, enquanto instituição pública, aperfeiçoar o trabalho do sistema judiciário brasileiro. Eu não consigo compreender como o endosso de uso de constelações familiares de maneira acrítica, de maneira pouco estudada, de maneira pouco fundamentada pode aperfeiçoar o sistema judiciário nacional. Mas não só isso tem o endosso do CNJ, que tem esse poder de modulador de políticas dentro do Judiciário, como houve uma multiplicação absurda dentro da OAB, pareada à criação de um monte de cursos. Então, invariavelmente a gente tem comissões de direito sistêmico espalhadas Brasil afora, cujo representante que trouxe o assunto à tona é um capacitador que tem um CNPJ e está ganhando algum dinheiro treinando pessoas no entorno disso. Não há problema nenhum oferecer capacitação e ganhar dinheiro. O problema é quando isso toma de assalto uma organização que representa os operadores do Direito do tamanho da OAB.
Eu fui procurar a informação de como estão dispersas essas comissões. O dado é um pouco difícil de conseguir pela própria OAB, mas a própria turma da constelação familiar diz que há em torno de 200, se não mais, instâncias, comissões de direitos sistêmicos espalhadas Brasil afora. E, na minha pesquisa, que durou um certo tempo, eu encontrei um total de zero, nenhuma comissão científica dentro da OAB vigente e de pé. Então, isso mostra - senão um desinteresse geral da OAB em levar essas considerações como fundamentais para a discussão e para a formação de bons operadores do Direito - um fenômeno que não é simplesmente um interesse orgânico pelo assunto. Existe pressão, existe lobby e existem interesses pessoais e corporativos envolvidos nessa pressão. Essa própria reunião que a gente está tendo aqui agora talvez seja um reflexo disto, de o quanto isso está ganhando corpo, independentemente de ser algo que não tem o menor cabimento de estar dentro do ordenamento jurídico nacional, dentro da própria estrutura do Judiciário. À luz disso, a gente está vendo várias instituições vendo o mercado crescendo e oferecendo esse tipo de curso também - eu já mencionei um pouco disso agora há pouco. Mas o mais importante de tudo, para tirar dessa parte de inserção no Judiciário, é que acontece uma coisa muito complicada que é a tentativa de tornar a constelação familiar o meio oficial pelo qual se discute resolução não jurídica de conflitos - como você propõe mediação e conciliação dentro do Judiciário não enquanto regra propriamente dita, mas enquanto disseminação e lobby da prática -, torná-la quase que uma disciplina obrigatória dentro de cursos de graduação para que as pessoas usem isso dentro de sua prática jurídica, o que é um absurdo e precisa ser enfrentado. Foi trazido, em algum momento também, que a constelação familiar é uma ciência social que estuda comportamentos e precisa ser vista à luz disso. Isso é falso, ela não é uma ciência. Ciências sociais que estudam comportamentos são: Filosofia, Sociologia, Antropologia e, primordialmente, a Psicologia. Se você entra em conflito frontal em qualquer uma dessas, você não está só somando em um diálogo, você está colidindo frontalmente com o que existe de consolidação de conhecimento há muito tempo. A função dos operadores do direito não é realizar terapia, não é realizar cura, não é melhorar dinâmicas familiares, mas aplicar o direito ao caso concreto para resolver um problema legalmente. Eventualmente, um conflito quer ser mantido e quer uma resolução judicial. Não é papel do juiz decidir isso em nome das partes.
R
E eu queria fazer com vocês, a partir disso, um exercício, e o exercício vai levar a questão absurda. Vamos imaginar que um juiz resolva aplicar astrologia como uma ferramenta para uso em audiências de varas de família a partir dos escritos de um filósofo alemão que resolveu falar sobre amor, sobre família, e ele propõe a existência da astrologia familiar. Ele alega, sem dados objetivos, sem metodologia clara, que ele tem obtido uma grande taxa de sucesso com o uso dessa intervenção da astrologia familiar. E ele vai usar relatos de caso, ele vai usar um monte de dado anedótico para falar que essa astrologia familiar deveria ser expandida dentro do Judiciário porque ele vem obtendo sucesso com isso.
Então, eu estou propondo, com esse exercício mental, que utilizar a constelação familiar no Judiciário é absolutamente análogo a uma proposta de utilizar astrologia no Judiciário. E aí vamos fazer um ponto a ponto disso? São pseudociências essa prática que existe de verdade e essa que eu estou propondo? São claramente pseudociências pelos critérios que os meus amigos já apontaram agora recentemente. Elas falam em constelações como entidades etéreas que influem magicamente sobre o mundo? As duas falam. Alegam haver provas científicas sobre utilidade? As duas. Essas provas são de má qualidade e amplamente desacreditadas pela comunidade científica? São. São proposital e intrinsecamente subjetivas, apelando a emoções, utilidade individual e evidências anedóticas? Sim. E não deveriam, sob hipótese alguma, serem utilizadas em esferas públicas? Aí é um sim do tamanho de um outdoor.
R
E se parece absurdo é porque é absurdo. Existe um motivo pelo qual é necessário ter amplo escrutínio técnico e científico de uma prática antes do uso dela na esfera pública. Então, essa prática que está sendo realizada livremente por juízes Brasil afora é inaceitável - inaceitável! A gente está utilizando práticas de efeito desconhecido previamente a uma análise séria sobre o assunto.
E, para terminar, alguns pontos gerais de discussão que eu queria trazer é que nenhum de nós seis aqui que estamos falando sobre pontos complicados, pontos de crítica sobre constelação familiar tem interesse financeiro no assunto, em falar a favor ou contra. Nenhum de nós tem steak nenhum, não tem empresa que lucra com isso, não tem nada. Nosso interesse é técnico e científico.
O uso de pseudociências na esfera pública, como eu comentei agora há pouco, fere frontalmente princípios da administração pública, com principal ênfase no princípio da eficiência. Se a gente tem uma teoria que está comprovada e consegue atender melhor ao interesse da maioria, é absolutamente inaceitável a gente ir atrás de algo que carece de comprovação técnica. Falar em amor, honrar pai e mãe, família, pela emoção não são, de forma alguma, argumentos válidos para endosso oficial de uma prática no espaço público e, consequentemente, a gente não pode permitir que gurus tenham voz dentro dessa discussão em saúde e educação.
Se essas práticas quiserem ter respaldo científico, elas precisam se submeter, como os meus amigos já falaram muito melhor do que eu, ao método científico. Então, eu não quero só ficar na questão da constelação familiar, porque a gente vai encontrar muitos problemas nela. Ela é muito séria e precisa... Já estou encerrando, há mais duas frases. O problema é o uso em abstrato de pseudociências em ambientes oficiais. E o Instituto Questão de Ciência, junto com parceiros que a gente está encontrando, vai fazer todo o possível para garantir que o PNPIC seja derrubado, essa Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, e que nada que esteja em seu entorno consiga chegar a um ambiente público. Eventualmente a gente vai a Judiciário, faz Adin, faz o que for necessário para enfrentar isso.
Então, constelação familiar é errado, é perigoso, é machista, potencializa a violência contra a mulher, oficializa uma abordagem pseudocientífica e que é muito lucrativa para alguns dentro do Judiciário, e nenhum contraponto que suceder a minha fala pode ignorar esses pontos que nós seis levantamos.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Sr. Paulo Almeida, que é Diretor-executivo do Instituto Questão de Ciência.
A gente encerra essa etapa, a pedido aqui dos que são contrários à constelação. Eles pediram que fossem engatados um a um para um complementar o outro, dentro de uma sequência. E agora a gente... Só deixando muito claro que é muito importante e eu estou muito feliz com o objetivo que a gente está atendendo nesta sessão, porque a gente está vendo aí reações fortes nas falas, que, de alguma forma, mostram um incômodo. E o nosso papel é este: ouvir, tentar buscar, de alguma forma, o encaminhamento correto que possa beneficiar a população brasileira, sem julgamentos, sem sermos os donos da verdade, mas nós temos que cumprir o nosso papel, buscando realmente sempre evoluir, sempre melhorar. E, desde o início, eu não percebi, absolutamente, pessoas aqui querendo ganhar dinheiro, querendo fazer algum tipo de...
R
Pelo contrário, eu vi aqui humanidade em algumas falas, pessoas buscando ajudar as outras. A gente sabe que interesses aqui são contrariados. Há categorias, há uma série de situações que veem uma ameaça forte nessa prática, como há outras também, acupuntura, tantas outras que fazem parte do PICs, em que os relatos são muito mais de ajuda, muito mais de efeitos benéficos do que maléficos. Mas faz parte da vida a gente procurar sempre encontrar um ponto, aprender, como a gente aprende com um lado e com o outro, e tentar, de alguma forma, fazer o nosso papel de busca do melhor para as pessoas.
Eu já vou passar aqui a palavra para o Sr. Décio Fábio de Oliveira Júnior, que é médico. Ele vai participar agora, por videoconferência. E eu peço que ele tenha dez minutos, vamos voltar aos dez minutos, porque ele é favorável, é isso? (Pausa.)
Ele é favorável à constelação familiar e ele vai ter dez minutos, com a tolerância de mais dois minutos aqui, como a gente havia combinado no início desta reunião.
O SR. DÉCIO FÁBIO DE OLIVEIRA JÚNIOR (Por videoconferência.) - Podem me ver? Podem me ouvir? (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Estamos lhe ouvindo muito bem, Dr. Décio Fábio.
O SR. DÉCIO FÁBIO DE OLIVEIRA JÚNIOR (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado pela oportunidade de estar aqui, com vocês.
Peço desculpa pelo fato de eu chegar aqui... Fui convidado de chofre, e não me preparei, creio, o suficiente para poder enfrentar esse debate de uma maneira tão bem embasada, como foi pelas pessoas que estão aqui, no contraponto do que supostamente as constelações têm a oferecer para a população brasileira.
Eu devo me apresentar: eu sou médico, mas eu já não atuo como médico há, mais ou menos, uns 12 anos. Eu fui professor universitário, eu fui cirurgião infantil e eu me dediquei, durante 20 anos, a trabalhar com crianças e operar crianças.
Eu estou, assim, um pouco assustado com algumas acusações muito sérias sobre o que as constelações podem causar às pessoas, porque eu trabalho com isso, embora não seja a minha única atividade, há muitos anos, e eu não presenciei, na minha prática pelo menos, esse tanto de efeito danoso que as pessoas estão relatando aí, o que somente corrobora o fato de que as evidências anedóticas, seja para um lado, seja para o outro, são sempre enviesadas, não é? Esse é um viés da confirmação, porque, assim, quando eu quero que uma coisa seja, eu procuro buscar as evidências que apoiam o meu ponto de vista e refutar as evidências contrárias.
Fora isso, eu quero parabenizar o brilhantismo de todas as pessoas que falaram no seu contraponto: o Dr. Takeshi, o Tiago, o Daniel, a própria Bailas, o Mateus e, por último, o Paulo. Eu concordo com 80% talvez do que vocês disseram e, na maior parte, são observações minhas desde o início.
R
Eu fundei a Associação Brasileira de Consteladores Sistêmicos, muitos anos atrás, fui seu primeiro Presidente e saí de cena muito chateado com os desdobramentos que as constelações tiveram de um certo ponto para a frente. Basicamente, eu também concordo que a velocidade com que isso foi introduzido em muitas instituições não teve, vamos dizer assim, o tempo de maturação necessária para que a sociedade pudesse compreender os impactos e necessariamente os benefícios que esse método possa vir a trazer para as pessoas.
Devo confessar que a minha própria experiência pessoal é fortemente enviesada para o lado de que isso ajuda as pessoas, mas acho estranhíssimo que nenhuma das pessoas que estiveram aqui antes de mim falando a favor da utilização desse método tenha falado sobre alguns dos princípios mais elementares do trabalho, principalmente sobre aquilo que Bert Hellinger chamou de postura básica. Basicamente, como todo método que se propõe a investigar a alma humana, nós temos que olhar um pouco para trás e ver o que acontece nos relacionamentos humanos. Eu falo muito aos meus alunos ou a outras pessoas que me conhecem que, nos relacionamentos humanos, nós temos que olhar com muito cuidado para as ideias de causalidade, que são tão queridas à ciência cartesiana.
Na primeira página do livro do Descartes Discurso sobre o Método - recomendo a leitura para todos as pessoas que querem se aprofundar nas constelações, para que elas não fazem bobagem, como eu estou vendo aí que algumas pessoas estão fazendo -, ele fala o seguinte: O bom senso deve ser a coisa mais bem distribuída sobre a face da terra, posto que ninguém parece querer mais do que o tanto que já possui. Todo mundo já parece estar satisfeito com aquilo que tem. Mas observando o que acontece na minha vida e na vida de outras pessoas, não me parece que eu, baseado somente em bom senso, tenha chegado a melhores conclusões ou decisões do que os meus pais.
Então, por causa disso é que o Descartes propõe o método científico. E esse método pressupõe quatro etapas básicas: a primeira delas é fazer acionar a realidade num pedaço que seja digerível, compreensível pela pessoa que está investigando; a segunda é propor uma hipótese a respeito do funcionamento desse pedaço; o próximo passo é fazer experimento a respeito disso; e chegar a uma conclusão que valide ou refute a hipótese original. Se você validou a hipótese, você cresceu o conhecimento da humanidade um pouquinho. Se você refutou, você também cresceu, porque, por exemplo, no século retrasado, nós tínhamos epidemias de cólera em Londres e pressupunha-se que era transmitida pelo ar ruim, um vento, qualquer coisa. E houve um cientista que paulatinamente identificou que as fontes de água de cada bairro guardavam uma relação com o número de casos de cólera. Depois ele estabeleceu uma relação entre o número de casos de cólera e o ponto no Rio Tâmisa onde a captação dessa água era efetuada. Então, ele estabeleceu que alguma coisa na água causava a cólera e que, portanto, nós não podíamos misturar esgoto com água potável, com água que ia ser bebida. Isso levou à construção dos esgotos de Londres muito antes que a identificação do germe tivesse acontecido.
R
Também posso contar para vocês a história de Ignaz Semmelweis, um famoso caso que - a gente como cirurgião - todos temos que relembrar: o de um homem que descobriu que a mortalidade entre as mulheres que eram parturientes da enfermaria dos médicos, que eram tratadas pelos médicos, morriam mais do que as que eram tratadas pelas parteiras. E ele tentou, então, identificar o que causava essas coisas. Ele foi fazendo modificações e chegou a mudar o crucifixo de uma sala onde as parteiras o punham e a colocar o crucifixo na sala dos médicos na mesma posição. Ele não conseguia entender, até que um amigo dele machucou o dedo, fazendo uma autópsia de uma paciente que morreu de febre puerperal, e faleceu. Então, ele começou a pressupor a existência de algo que era invisível para ele e que consequentemente transmitia uma doença e obrigou os alunos de Medicina a lavarem as mãos antes de tocar as pacientes. Ele foi chamado de louco, não é? E depois ele acabou morto, preso, chamado de louco, porque, as afirmações dele, ele não conseguia provar.
Então, o que nós evoluímos de lá para cá foi em estabelecer um método para aferir essa verdade. E disso eu estou totalmente a favor. Eu não teria me tornado cirurgião e atuado tantos anos se eu não dependesse totalmente da Ciência. Isso é absolutamente verdadeiro e útil. Então, eu também coaduno com que muitas das políticas públicas que se propõem tenham que estar baseadas em princípios científicos. Isso está corretíssimo! E me estranha o fato de, por exemplo, aqui nesta Comissão, neste momento, não estarem presentes pessoas que vêm praticando, pelo menos da maneira limitada, como os orçamentos no Brasil permitem, algum tipo de pesquisa nesse sentido. Por exemplo, o Dr. José Miguel e a esposa dele, a Dra. Vânia Meira, que trabalham na Universidade Federal de Goiás, que tem um grupo com mulheres com dor pélvica crônica já, mais ou menos, creio eu, há uns oito anos, atendendo mais de 1,5 mil pacientes, e ele tem mostrado benefícios na redução da dor e no bem-estar dessas pacientes num número considerável - eu não tenho o papel aqui. Mas eu acho que ele é uma pessoa que devia ser chamada a contribuir nesse sentido. Ou o meu amigo, um Juiz de Direito aqui em Belo Horizonte, o Dr. Clayton, que é de uma comarca da vara da família, onde também eles estão aplicando o método, com melhorias nas relações - as pessoas relatam que estão melhores etc. É lógico que isso é um relato de caso e, portanto, tem uma força de valor científico reduzida, mas toda vez que vamos introduzir uma coisa nova, nós temos que ter essa tolerância de introduzir isso como um balão experimental e estudar isso nos passos devidos, exatamente como a Gabriela Bailas falou antes - e eu concordo.
O ponto aqui talvez que eu gostaria de frisar é que as constelações se baseiam basicamente numa abordagem filosófica, e essa abordagem filosófica não foi tratada aqui em momento nenhum. Quer dizer, nós não discutimos Filosofia, e a Medicina, como a Ciência, também começa através de evidências empíricas, e essas evidências empíricas - pelo menos na minha experiência pessoal - são muito favoráveis.
Eu acho que a gente poderia, então, dessa forma criar uma Comissão, alguma coisa que pudesse implementar esse estudo dentro das instituições, para que não houvesse, de fato, desperdício dos escassos recursos públicos para a implementação dessas políticas dentro da estrutura do Poder Judiciário ou dos outros Poderes. Quero dizer que a base filosófica daquilo que Bert chamou de postura fenomenológica não foi tratada aqui, e ela só fala sobre como a gente faz. Basicamente, o que ele dizia é o seguinte: se eu olho para uma determinada situação e eu espero que alguma coisa vai acontecer, essa coisa afeta o resultado. Ele propunha uma revisão dessa postura, expondo o cliente, através dos representantes, a uma nova visão, neutra - porque os representantes são neutros -, daquilo que atuava dentro do sistema. Acredito que também, nesse caso, isso não foi tratado e deveria ter tido um espaço maior aqui; esse tempo não é suficiente para tratar disso, mas eu acredito que essa é uma ótica que deveria ser revisitada.
R
Eu convido as pessoas aqui a comemorar esse momento, porque realmente nós temos que trabalhar sempre para aumentar a cooperação entre as pessoas. É isso que ajuda cada um de nós a ser um ser humano melhor. E me coloco à disposição para poder participar de eventuais estudos subsequentes. É um prazer estar aqui com todos vocês, os que são contra, os que são a favor.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Que bom. Muitíssimo obrigado, Dr. Décio Fábio de Oliveira Júnior, que é médico, participando aí diretamente de Belo Horizonte, pelo que eu pude entender. Muito obrigado pela sua participação, por ter cumprido aí o tempo que a gente combinou.
Eu já passo, agora, aqui a palavra ao último palestrante. Depois, a gente faz uma rodada novamente dos que já falaram aqui de cinco minutos, não é? Eu acho que foram feitas muitas colocações aqui que alguns vão se sentir aptos para responder. E a gente vai dar esses cinco minutos.
Então, eu passo a palavra agora para Mateus Santos, que é biomédico. E fique à vontade. Você tem dez minutos, mais dois de tolerância, já que você vai falar a favor.
O SR. MATEUS SANTOS (Para expor.) - Boa tarde a todos. Meu nome é Mateus Santos, sou biomédico de formação acadêmica, tenho algumas especializações em circulação extracorpórea e assistência circulatória, sou membro da Extracorporeal Life Support Organization (Elso). E tenho uma prática com uma máquina que funciona como coração, pulmão, durante a cirurgia cardíaca, dos transplantes e, com isso, uma prática viva dentro da medicina baseada em evidência.
Também sou constelador. Conheci as constelações familiares em 2005 e, desde então, com essa mesma vontade de conhecer a verdade imbuída em todas as pessoas que reverenciam e reconhecem a ciência, eu continuo pesquisando, porque conheci as constelações e, como algumas pessoas aqui relataram, eu também me considero um cético. Eu também me considero um cético, mas eu também preciso comprovar.
E eu conheço que existem metodologias científicas. Uma das que mais foi frisada aqui é essa metodologia científica cartesiana, que tem o seu papel fundamental, principalmente dentro da área da saúde, e tem salvado inúmeras vidas.
R
Mas uma das coisas que eu ressalto aqui é que não é absoluta, e nós vemos isso na prática diária em uma UTI, onde pacientes com a mesma equipe, com as mesmas medicações, com a mesma dedicação têm destinos diferentes, acontecem coisas diferentes. Mas nós temos salvado muitas vidas com isso, e isso merece, sim, reconhecimento e respeito.
Ainda não temos uma metodologia capaz de ser melhor que isso dentro da área da saúde, porém um dos aspectos que me chama a atenção dentro disso é que, muitas vezes, esse tipo de pesquisa é baseado em números, e perdem-se de vista as pessoas. E um dos aspectos importantes dentro da construção do conhecimento em algumas áreas é o olhar para a pessoa. Isso vai longe dentro de algumas áreas de pesquisa, que é, por exemplo, a importância ou não da presença da consciência como variável, da mente humana como variável. Aqui, durante as falas de ambos os lados, foi bem notável, quando a fala é imbuída de emoção, o quanto que isso afeta, o quanto que isso nos toca. Isso é uma variável. Isso é uma variável na leitura dos resultados, isso é uma variável na contraposição de uma tese, de uma antítese, e isso cria um viés. Isso invalida o que a pessoa pensa ou ela cria ainda mais valor? São coisas fundamentais de a gente avaliar, porque, em algumas falas, seja contra ou a favor, citaram-se casos anedóticos dos dois lados - dos dois lados! E alguns desses cientistas... Eu me considero um cientista também, porque eu continuo, junto com vocês... E acho que isso nos une, acho muito interessante isto, perceber que diferentes pontos nos unem na busca da verdade, daquilo que é bom. Isso eu acho interessante porque ambos estamos olhando para o mesmo objetivo de lados diferentes.
Eu me lembro de um dia no carro com os meus filhos. O meu filho menor, de seis anos, chegou em casa e falou: "Lalá... " A minha filha chama Estela, e a gente chama de Lalá. "Lalá, você sabia que o dente é um osso?" A minha falou: "Não. Dente é branco." "Não, é um osso!". E ficaram discutindo quando ambos podem ter razão de ser. O importante é querer conhecer mais.
E aí, ouvido essas falas, eu me lembrei de uma parábola budista que existe. Eu não sou budista, eu não religioso nesse sentido, mas acho interessante porque ela fala dos cegos que não conheciam o elefante - não sei se vocês conhecem. E chegou naquela região um elefante, e os cegos falaram: "Vamos conhecer o elefante". Cada um tocou o elefante com os instrumentos que tinham, que era o tato, para conhecer o elefante. E aquele que tocou a perna disse: "O elefante é um pilar"; o outro tocou a orelha e disse: "O elefante é um leque"; outro tocou o rabo e falou: "Não, o elefante é uma corda"; o outro tocou a barriga e falou: "Não, o elefante é uma parede". E eles começaram a discutir, cada um com a sua razão de ser.
R
E eu, pesquisando isso, fui buscar, porque eu quero entender como é que funciona isso. Eu vejo que relatos de pessoas que têm benefício com a constelação, por mais que não passem por um processo científico, não invalidam a experiência da pessoa e não invalidam a experiência da técnica ou do método. Carecem, sim, de um estudo, carecem, sim, de um desenvolvimento, e a constelação familiar tem se desenvolvido. Quem busca conhecer... Eu fui fazer formações dentro das bases. Por mais que se diga que são pseudociências, eu fui buscar isso aí, porque eu quero conhecer de onde é que o Bert tirou isso aí.
Eu pude conhecer o Bert Hellinger, o acompanhei por um tempo, ouvi coisas que realmente são muito fortes, e me chama a atenção, dentro dessas falas, respeitosamente falando, pinçar casos específicos citados nos livros como verdades absolutas ditas pelo Bert. Quem conhece o Bert Hellinger sabe que ele citava casos, assim como nós citamos - são as ditas anedotas -, mas são casos.
Uma das coisas que me chamou atenção nesse conhecimento da constelação familiar - e eu não estou tirando o valor disso ao dizer que é uma pseudociência, porque dizer que é uma pseudociência para mim não a invalida... Por exemplo, nós temos a psicanálise, que é uma pseudociência e auxilia milhões de pessoas há muitos anos, talvez um século já - eu imagino que já deva ter passado de um século -, os auxilia e tem a sua função, e ela não é depreciativa dessa forma, mas carece, sim, de uma estrutura baseada em ética. E eu, pela minha formação, não só formação acadêmica, não só formação de estudo, mas pela minha formação familiar, prezo por ética, prezo por valores morais.
Claro que, se uma pessoa chega com uma queixa, uma das posturas da constelação é justamente eu não colocar a minha verdade sobre a pessoa, da mesma forma como é na psicanálise; é a gente usar um método fenomenológico, como bem disse o Dr. Fábio. E isso é um método relativamente novo, que precisa ser mais conhecido e que, de uma certa forma, nos remete ao princípio do conhecimento, até o conhecimento filosófico, quando aquilo que nos movia - "nos movia", como se eu estivesse lá na época, não é? -, quando aquilo que movia as pessoas era o querer conhecer. E este é um princípio básico da constelação: querer conhecer usando um instrumento - sim, foi falado aqui de uma maneira às vezes até um pouco depreciativa -, utilizando um fenômeno. E o que é esse fenômeno? Nós precisamos investigar, mas que o fenômeno é real ele é, porque senão a constelação familiar não seria conhecida.
A primeira vez que eu fui ver uma constelação familiar, eu, por ser cético, nas primeiras constelações que eu vi, eu falei: "Isso aqui é teatro, isso aqui é dinâmica de grupo, não tem cabimento". Quando eu pude perceber por onde eu sentia, eu falei: "Rapaz, esse negócio aqui é estranho, eu tenho que estudar". E nisso já são 17 anos que eu venho estudando para entender o que é isso. E eu sei que existem teorias dos campos mórficos, da ressonância mórfica, eu sei, mas ainda são teorias. Da mesma forma que o Big Bang é uma teoria e não tem comprovação. É um axioma. Mas nós baseamos muito do que nós vemos dentro disso. A Teoria da Evolução é uma teoria, já diz no nome Teoria da Evolução. Existem indícios que trazem de que pode ser verdade? Existem.
R
Então, conhecer as constelações e trazer os seus benefícios carece, sim, de estudo, eu concordo plenamente, ou com até uns 80%, porque, uma vez que a verdade é dita com tamanha emoção, cria-se um viés que para mim perde um pouco a razão de ser, porque ali se demonstra a dor daquela pessoa ao dizer a sua verdade com a sua dor. E isso é notório. Quem estuda as ciências da alma, as ciências da mente, a neurociência percebe o quanto isso afeta a percepção da realidade, e a percepção da realidade é fundamental para a gente usar no conhecimento da constelação familiar - inclusive aquele livrinho vermelho do Bert, chamado Constelações Familiares, que é uma entrevista, em alemão se chama Annerkennen, was ist, que significa "reconhecer aquilo que é". E este é um princípio básico da constelação: não dizer que a família fez isso ou fez aquilo, mas que a pessoa reconheça que aquilo existe dentro dela, aquilo a afetou, e é daqui para a frente. A constelação não existe para olhar o passado, existe para investigar a sua história, mas daqui para a frente, para que você se solte do que aconteceu e encontre recursos.
Eu não coloco a constelação familiar na minha prática como uma verdade absoluta ou tábua de salvação para a humanidade, e sim como um recurso, assim como diversas outras terapias. E eu vejo que pode se desenvolver mais, desde que nós, com essas visões contrárias, nos coloquemos a favor de pesquisar. "Espera aí, acontece mesmo? Tem benefício? Vamos olhar!". E não depois você falar "isso aqui é errado, isso aqui é machista". Eu vi generalizações que deixam claro que as pessoas não estão conhecendo verdadeiramente o que é ensinado. Então, busquem pessoas que são referências e estudam isso com seriedade - e eu me coloco à disposição dos senhores - para que possamos, juntos, buscar a verdade para trazer esse benefício para as pessoas, e não invalidar como uma coisa assim, como se fosse bruxaria, uma inquisição contra uma coisa. Vamos lá, vamos conhecer, porque existe benefício sim. Agora, como mostrar, como comprovar, juntos, eu acho que nós somos mais fortes. E eu acredito, pela clareza, pela inteligência que vocês demonstraram ter, que nós precisamos uns dos outros. Então eu acho que é muito novo isso. Vamos juntos conhecer.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Mateus Santos, biomédico, obrigado aí pela sua presença aqui no Senado Federal, na Comissão de Assuntos Sociais, para debater esse tema, que mobiliza as pessoas. E como o senhor mesmo colocou, a gente precisa estar aberto, tem que ter a humildade. Essa palavra é muito importante para estar aberto a buscar os dados, buscar verdades, sem julgamentos, sem viés de militância ideológica, e buscar com muita serenidade isso tudo. É muito importante isso.
Eu acho que a gente precisa somar as nossas convergências e diminuir, procurar diminuir... Eu acho que há fraternidade até no respeito em falar: às vezes você fala de forma educada, mas magoa com colocações, com julgamentos. E eu acho que a gente está num caminho aqui de fraternidade. É disso que o mundo precisa hoje? Do que o mundo precisa hoje? É de julgamento? É de apontar o dedo? Ou o mundo precisa hoje de diálogo? Ou o mundo precisa hoje de pacificação? Ou o mundo precisa hoje exatamente que a gente procure encontrar alternativas juntos?
R
Um ponto pacífico aqui entre nós - e eu anotei certas situações, vamos ter uma rodada agora - é a necessidade cada vez mais de buscar a ciência. Há alguma coisa acontecendo - há alguma coisa acontecendo! Quem se abre para isso percebe. Você anda pelo Brasil e vê o impacto positivo que isso está tendo na vida das pessoas.
Algumas pessoas que se sentem magoadas por isso, invadidas têm que ser acolhidas, com muito respeito, e a gente tem que ver exatamente o que fazer para não passar do ponto. A gente teve grandes gênios ao longo da história, pessoas que abriram portas da medicina, que conseguiram ajudar, revolucionar o nosso modo de viver e que estavam à frente do seu tempo. Jogaram pedras neles, julgaram, apontaram o dedo, mas o tempo é o senhor da razão. A gente tem que estar aberto, sem julgamentos, sem querer ser dono da verdade ou melhor que os outros, para querer dizer realmente o que a gente quer.
Eu queria, neste momento... Eu acho que a dinâmica de como a coisa foi acontecendo aqui... Eu acredito que, já que a gente não vai ter um debate direto - talvez a gente possa ter em outro momento - de perguntas e respostas, foram colocadas situações pelos palestrantes presentes e pelos que estão de forma remota que, de alguma forma, um lado e o outro gostariam de esclarecer.
É impossível conseguir ler as mensagens aqui. Já passaram de mil as participações das pessoas.
Agora, foram colocados temas aqui, foram colocadas afirmações, foram feitas colocações em que eu acho que cabe, para as pessoas que nos assistem, ouvir o outro lado, com base no que foi afirmado aqui por alguns participantes, aos quais eu agradeço - agradeço a todos - pela acolhida.
Aqui, a gente procurou e está procurando fazer de forma justa, democrática. A pedido das pessoas que são contra a constelação familiar, colocamos na sequência ideal para eles a solicitação feita. O tempo a gente compensou: como há dois a mais, a gente deu e até suplantou para ficar bem equilibrado.
Agora, eu acho que a gente pode fazer uma sequência... É a mesma sequência? Pode ser a mesma sequência?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Vamos seguir assim. Já que começamos assim, vamos fazer a mesma sequência.
R
Eu não sei se a Sophie Hellinger, que foi a primeira que falou... Ela está conectada? (Pausa.)
Não, até porque o fuso horário lá na Alemanha é outro, ela até avisou que não poderia.
A gente pode dar um tempo, para ser justo aqui... Se todos os contrários forem participar, a gente, para ser justo, pode dar um tempo maior para alguém que possa desenvolver o assunto de um palestrante que não pôde participar, que já foi, que está embarcando. Então, a gente pode fazer essa compensação, esse malabarismo, para atender todo mundo de forma correta.
O segundo que participou, depois da Sophie, foi o Renato Schaan Bertate, que é médico e Presidente do Instituto Brasileiro de Constelação Familiar. Ele está conectado? Ou já embarcou? (Pausa.)
Está no avião. Então, esse tempo também a gente pode destinar aqui para outra pessoa que queira defender a constelação.
Inácio Junqueira. (Pausa.)
Também em voo.
Então temos Rose Militão. Está presente? (Pausa.)
Está online. Então, Rose, vamos fazer aqui o seguinte. Vamos colocar, já que outros não puderam participar, sete minutos. Pode ser?
A SRA. ROSE MILITÃO (Por videoconferência.) - Pode ser.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - São dois minutos a mais, sete minutos agora nesta rodada, e eu vou tentando equilibrar aqui - vamos ver se eu sou bom de matemática - para não ser injusto na cronometragem, na contagem do tempo.
Dra. Rose Militão, a senhora tem sete minutos para falar nesta segunda rodada.
Muito obrigado.
A SRA. ROSE MILITÃO (Para expor. Por videoconferência.) - Estou num molho absoluto aqui, mas ouvindo os colegas, e eu estou tão apaixonada por isso que está acontecendo aqui que eu quero sugerir um outro momento para a gente poder conversar mais apropriadamente sobre a visão sistêmica da vida, o pensamento sistêmico, o pensamento analítico.
Sabe, Luís Eduardo Girão, acho que ficamos nos devendo um fechamento e um tempo para voltarmos, até com esses mesmos autores, porque eu penso que esse assunto foi apenas aberto, e ele precisa ter prosseguimento.
Deixem-me falar uma coisa: eu tenho que, de novo, citar Capra, porque, à medida que os colegas falavam, eu percebi que teria que voltar a essa fala. Ele disse da diferença que o observador faz no sistema que observa, uma vez que os resultados que obtém dependem um monte do que se propõe a procurar. E acho que cada um veio procurando aquilo que queria achar e, nesse sentido, eu tenho a sensação de que se aprendeu pouco aqui, sabe? Houve muitas falas emocionadas, outras mais aguerridas, mais críticas, mas eu acredito que estamos em dois blocos aqui: a ciência clássica, mecanicista, analítica, versus a visão sistêmica da vida, e estou lamentando não poder ter condição de organizar isso melhor aqui.
A visão sistêmica da vida emergiu na Europa na década de 20, então ela especialmente se processa fazendo uso de novos temas, como conectividade, relações, padrão, contexto e isso tudo que os colegas e eu também falamos e que a vivência com as constelações familiares nos traz.
R
Os sistemas vivos não podem ser compreendidos por meio de análise, quantificadamente. O pensamento sistêmico é contextual, é diferente do pensamento analítico. Eu estou percebendo que a gente entra no pensamento sistêmico, vai para o pensamento analítico, ciência clássica, ciência novo-paradigmática do pensamento sistêmico e eu penso que a gente deveria ter um tempinho melhor depois, noutro momento, se surgir oportunidade e se Deus nos permitir estarmos aqui, os mesmos atores representando as suas ideias, obviamente que de forma formulada, porque eu acho que a gente sai... Quem passou por essa experiência acho pouco provável que saia da mesma forma com que entrou - pouquíssimo provável.
Eu quero aqui chamar atenção para a saúde como uma experiência subjetiva, cuja qualidade pode ser intrinsecamente, intuitivamente conhecida. Ela está ali dentro da experiência de cada pessoa. A saúde é um estado de bem-estar que surge quando o organismo funciona de uma certa maneira. Ora, constelação familiar e as outras técnicas que fazem parte do programa das PICs (Práticas Integrativas e Complementares) devem ou não devem? O que acontece com elas? Será que permanecem?
Na visão sistêmica - de novo vou trazer a visão sistêmica da vida -, o Capra fala que a saúde é um estado de bem-estar, resultante desse equilíbrio dinâmico que envolve os aspectos físicos, psicológicos do organismo, bem como suas interações sociais com seu ambiente natural e social. Se a saúde é uma experiência subjetiva, a nossa compreensão da saúde sempre estará ligada à vida. Mas qual é a vida? Na ciência cartesiana, ela necessita ser medida, mensurada, metrificada, qual é o método, qual é a métrica, quando foi que isso aconteceu. E é interessante que, quando a gente fala de saúde, tem que falar também da doença, que é uma consequência de desequilíbrio, de desarmonia, que pode surgir em vários níveis do organismo e pode gerar sintomas de natureza física, psicológica, social. E é interessante que, quando a gente olha agora, eu digo...
Mas o que acontece para essas técnicas, as constelações e tantas outras, terem entrado - e acredito que até meio que precipitadamente; quando eu penso que não, já estavam lá - no SUS? Porque o SUS está falido. O SUS não dá conta de 99,3% da população brasileira ansiosa, não dá conta dos suicídios, não dá conta das obesidades. O mundo está absurdamente falido, e a ciência, a ciência cartesiana, medida matematicamente, que os colegas aqui tão brilhantemente defendem, está carecendo de alma. Isso não é conversa de carochinha, porque nós somos quatro dimensões: a dimensão emocional, a dimensão intelectual, a dimensão física e a dimensão espiritual. Como medir a espiritualidade? Como vocês querem que a gente viva um mundo sem espiritualidade? Como? Mas isso não se mede. Como se mede? Mas isso faz parte da essência do ser humano.
R
Nesse sentido, eu digo que estamos discutindo aqui um modelo biomédico, e sabe que modelo é esse? É aquele da metade do século XIX, que dizia que, como modelo predominantemente usado por médicos no diagnóstico de doenças, ele se caracteriza por ser individualista, curativo, centralizado na figura do médico especialista, fragmentado e hospitalocêntrico: "Vamos internar, vamos fazer isso em nome ciência". A gente precisa rever aqui, e não só rever - eu estou falando para os colegas consteladores: não só rever -, a nossa forma de abordar as constelações familiares - e eu concordo com o Décio - e o aspecto filosófico da técnica. A gente precisa parar, rever, olhar para isso de uma forma mais dogmática. Assim como os colegas das ciências, esses colegas das ciências clássicas...
Eu quero terminar dizendo que eu gosto de ver o homem com alma. Eu gosto de estar inserida no aspecto ecológico da vida. Quando a gente fica tomado por um covid e a ciência não soube, e ainda não sabe direito, o que fazer, eu acho que a gente tem aí um bocado de coisa para parar e refletir sobre ser humano. Ele não pode ser apenas quantificado, cortado, metrificado. Assim como nas questões das constelações e de outras tantas técnicas, a gente precisa, sim, aprender a quantificar, a falar com mais propriedade sobre esse homem tão subjetivo, tão pensado sistemicamente.
Muito obrigada pelo privilégio da tarde, obrigada pelo privilégio deste momento com vocês.
Eu amei este debate. Isso me aquece muito para que eu possa dar conta e ser uma consteladora bem melhor.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Olha, Dra. Rose Militão, quem tem que agradecer somos nós pela sua participação, por ter dedicado seu tempo para colocar a sua visão sobre esta reunião, esta audiência pública da Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal.
A Dra. Rose Militão é fundadora da Escola de Constelação do Ceará, psicóloga, atua há mais de 15 anos como consteladora. Ela estava falando dessa questão de que é difícil se fazer a métrica, e eu estava recebendo aqui também outras participações e frases de pensadores. A gente sempre procura se nortear em muitas coisas da vida, e há uma frase que chegou aqui por uma pessoa que está participando, que diz o seguinte - essa frase é de Manoel de Barros, que é escritor -: "A importância de um evento não se mede com fita métrica ou com balanças; ela há que ser medida pelo nível de encantamento que produz em nós".
Então, nós já vamos passar, imediatamente, agora, a palavra, dando sequência, também por sete minutos - estou colocando aqui na balança o que que dá para a gente fazer bem, de forma objetiva e direta, para comparar, para ficar todo mundo com tempo ideal igual no final. Então, eu peço para a Daniela...
Pode ser, Daniela?
A SRA. DANIELA MIGLIARI - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Daniela Migliari, que é terapeuta, que é jornalista - passou isso para a gente aqui...
Você tem sete minutos para suas considerações finais, para fazer algum contraponto do que você viu aqui.
Muito obrigado.
A SRA. DANIELA MIGLIARI (Para expor.) - Obrigada novamente, Senador Girão. Agradeço a todos que falaram aqui até este momento.
R
Olhando para a história da humanidade, muitas vezes a gente sabe de quantos cientistas que hoje tiveram a sua ciência provada, seja pelo método cartesiano, seja pelo método mais humanista, digamos assim, e que isso foi se confirmando com o tempo. Técnicas milenares, como acupuntura e outras práticas, de fato são questionadas, e a gente sabe que, ao longo do tempo, foram se firmando com resultados incríveis.
E uma coisa que me chama a atenção é que todo cientista tem uma postura de abertura, uma postura de perguntas, uma postura filosófica. O que é filosofar? É fazer perguntas. Então, quando a gente se coloca nessa postura de fazer perguntas, a gente se coloca, sobretudo, como um aprendiz da vida. Bert Hellinger era, sobretudo, um filósofo, tinha essa postura de se expor e conseguia um nível tal de recolhimento, que ele se expunha àquilo que aparecia e observava esse fenômeno. E, muitas e muitas vezes, ele fez referências aos cuidados de não tornar algo total e fechado, de pegar aquilo que foi observado e transformar aquilo num ponto, porque aí a gente perde o fenomenológico, a gente perde essa abertura, essa exposição a algo novo que surge, porque a vida caminha para a frente.
A ciência mostra para a gente a segurança. Ela vai confirmando, vai averiguando, vai quantificando e, de verdade, tornando tudo muito mais seguro. Ao mesmo tempo, o novo vem, e aí a gente começa a observar como outros cientistas observaram, e muitos foram queimados por conta disso - e a gente sabe o quanto é difícil, porque não se via o magnetismo, não se via a eletricidade, não se via a gravidade - e foram ridicularizados no seu tempo.
E aí eu fui buscar e, como escritora e jornalista que sou, fui procurar, no Dicionário Aurélio e no Dicionário Houaiss, a definição da palavra ciência. Eu não estou debatendo com os respeitáveis cientistas que estão aqui, porque eu não sou uma cientista nesse sentido, estou mais para uma poeta e filósofa, mas peço licença que me escutem. No Aurélio diz assim: a palavra ciência é "um saber que se adquire pela leitura e meditação, instrução, erudição e sabedoria". Também pode ser interpretada como um "conjunto de conhecimentos socialmente adquiridos ou produzidos, historicamente acumulados, dotados de universalidade e objetividade que permitem sua transmissão e estruturados com métodos, teorias e linguagens próprias, que visam a compreender e, possivelmente, orientar a natureza e as atividades humanas". Aí eu fui para o Houaiss também: é um "conjunto de conhecimentos teóricos, práticos ou técnicos, voltados para determinado ramo de atividade".
R
Então, dentro dessa postura fenomenológica que Bert Hellinger ensinou as pessoas a adotar na hora em que se expõem a uma constelação familiar, eu vi um movimento de imensa humildade e de se retirar para poder observar esse olhar sistêmico: aquele que vai olhar aquela dor difícil de ser vista, a dor, muitas vezes, da vítima, a dor, muitas vezes, do agressor.
Nós todos somos um sistema que se autocompensa e que se comunica o tempo inteiro. Estamos aqui, em dois lados, buscando nos comunicar e buscando esse encontro que Mateus comentou e que eu comentei um pouquinho lá atrás, porque a gente está aqui nesse mesmo planeta, que é redondo, gira, gira, gira, e a gente pode cooperar uns com os outros. Por que que a premissa ser eliminar, exterminar, se sobrepor um sobre outro, e acabou? Eu me pergunto isso. Por que que a gente não pode também se enriquecer junto, lógico, tomando cuidado com os excessos, com os problemas que vêm acontecendo?
E eu escuto a fala da Bibi Bailas - não sei se falei o nome corretamente - e, quando ela diz da proteção a mulheres, isso fala comigo, porque eu sou mulher; isso me toca profundamente, porque eu já vivi violências de diversos tipos. E eu gostaria que ela soubesse que existem tantas outras mulheres que se sentiram justamente reconhecidas na sua dor dentro das constelações. Eu mesma, algumas vezes, não sabia que tinha sido agredida ou passado por uma situação superdelicada e eu só pude ver nas constelações que isso aconteceu. E eu falo isso, gente, em nome de muitas mulheres. Eu tenho mais de 900 horas de constelação familiar em que eu vi mulheres que finalmente puderam olhar para isso num lugar de segurança e de paz. Eu falo isso de coração e agradeço a ela por estar ouvindo essas mulheres que se sentiram do outro lado, porque toda essa dor precisa ser acolhida.
Ao mesmo tempo, eu convoco nos senhores uma postura de abertura para se exporem também, talvez, a esse campo, não como algo que vai virar política pública - eu não vou entrar nesse aspecto das Pics agora, porque nem era até o motivo desta audiência pública. Esta audiência pública era um momento para apresentar as constelações, e aí veio à tona a história da votação e se trouxe essa discussão das Pics -, mas a postura filosófica, fenomenológica é extremamente humilde do Bert para ele ser reduzido a esses trechos que, de fato, fora de contexto, parecem ser uma grande violência. Mas pessoas muito inteligentes, pessoas muito... Eu sou também bastante questionadora, eu me expus, eu questionei, eu briguei com alguns livros dele, e depois, em algum momento, eu pude respirar e perceber que esse olhar sistêmico... Às vezes, é difícil olhar para a dor do agressor, e é mais difícil ainda para algumas pessoas olhar para a dor da vítima.
Então, o que que eu sinto, para finalizar a minha fala? Nós, seres humanos, somos filhos da matéria, das questões objetivas, dos números, do que pode ser quantificado? Sim. Mas nós também somos filhos desse grande mistério que alguns chamam de Deus e que, às vezes, é ridicularizado, porque é uma religião, porque o Estado é laico... Eu não estou falando... até porque a constelação familiar não entra nesse espaço religioso. Nos momentos em que a gente fez referência aqui a uma ou outra questão, era fora desse princípio. Dentro das constelações familiares, não há viés religioso. Existem pessoas totalmente ateias que fazem, que sentem e que se percebem. Mas todo ser humano é filho desse grande mistério, desse desconhecido que a gente ainda não viu, a gente não entendeu. E a gente também é filho daquilo que a gente já observou tanto que a gente pôde quantificar e, com grande alegria, trazer uma segurança aí. E eu tentar ser filha de um ou de outro é como eu querer ser só filha da minha mãe ou ser só filha do meu pai. Eu sou filha dos dois. Eu sou filha da ciência, eu sou filha desse grande mistério. E eu acho que todos nós podemos nos expor. Eu convido os senhores também a se exporem, a nos ensinar a fazer ciência na nossa área - entendem? -, a procurar evidência, porque o que eu falo é o seguinte: se cresceu desse tanto, alguma coisa tem aí de muito linda, de muito maravilhosa. De fato, algumas violências têm ocorrido, às vezes, por pessoas que estão fazendo práticas indevidas, mas exterminar é algo que... A gente sabe que, se a gente tivesse feito isso com alguns princípios científicos que hoje embasam toda a argumentação dos senhores, não estariam aqui.
R
Então, eu acho que a gente precisa aprender a se suportar, no sentido de dar suporte e de somar e de crescer juntos.
E eu agradeço esta oportunidade de estar aqui. Não foi muito fácil, mas, ao mesmo tempo, eu cresci muito nesta manhã e agradeço a todos.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Gratidão a você, Daniela Migliari, pela participação aqui nesta reunião de debates da Comissão de Assuntos Sociais. A gente fica muito feliz em estar tirando esse assunto de baixo do tapete, trazendo-o à tona. Eu acho que todos temos a ganhar com isso. E a presença tanto dos que são favoráveis como dos que são contrários é importantíssima, e a gente tem que louvar e agradecer, até pelo tom respeitoso que a gente tem tido - eu repito: um tom respeitoso -, que a gente tem percebido aqui na reunião até o momento. E é importante que a gente siga assim, porque daqui nós somos exemplo para muita gente. E eu acredito que a regra da boa convivência é o respeito e é disso que a sociedade precisa cada vez mais.
Eu vou passar agora a palavra, dentro da sequência que a gente combinou, para o Dr. Sami Storch.
Como esse assunto jurídico, da constelação no meio jurídico, permeou grande parte das colocações feitas aqui pelos que são opositores da constelação familiar, eu gostaria, mas dentro de uma justiça, dentro de um cálculo que foi feito aqui pela assessoria da Comissão, de propiciar dez minutos, até porque muitos faltaram, e a gente vai fazer aqui milimetricamente, para ser justo. Eu vou passar a palavra, por dez minutos, para o Dr. Sami poder fazer as suas colocações agora nessa rodada final.
Muito obrigado, Dr. Sami, pela sua presença. O senhor tem dez minutos.
O SR. SAMI STORCH (Para expor.) - Obrigado, Senador.
Eu achei muito interessantes as falas, que me proporcionaram alguns pensamentos aqui. E eu, talvez por ser juiz, estou acostumado: ouve um lado, ouve um outro, e eu não tomo partido. E nem nesse debate eu considero que eu estou de um lado ou de outro. Eu quero é ver o que que faz sentido, o que que está certo, o que que me conduz para o mais, para o crescimento.
R
Bert Hellinger mesmo observou que, por trás das dinâmicas de violência, existe o desejo de extermínio daquele que é diferente, daquilo que não se quer olhar, e que é verdadeiro também. Então, por trás de um assassino ou de um agressor, existe uma profunda dor de alguém que foi assassinado na sua ancestralidade. Por trás de alguém que agride a mulher, por exemplo, um homem que agride a mulher, às vezes existe uma mãe que morreu cedo, aquele sentimento infantil de ter perdido a mãe com dois anos de idade: "Minha mãe não está aqui!", e ele quer segurar, ele quer possuir as pessoas. As constelações mostram esse tipo de dinâmica.
E, quando isso é revelado, a pessoa percebe e fala: "Meu Deus, eu estava confuso; inconscientemente, eu estava agindo em defesa de uma criança". E aí a pessoa olha para a pessoa que foi agredida e fala: "Eu sinto muito, eu não conseguia enxergar", e agora o agressor tem condição também de assumir a sua responsabilidade, porque isso não implica deixar de responsabilizar a pessoa que cometeu um dano que causou um mal, mas sim aumentar a responsabilidade, aumentar a consciência, para ela perceber o mal que fez, a dinâmica inconsciente em que ela estava emaranhada.
Então, ao me posicionar aqui neste debate, eu procuro também acolher, olhar, inclusive para as manifestações mais raivosas. O que que está por trás disso? Que dores que podem estar? Eu não sei que dores são, mas eu sei que elas existem e eu vejo que elas têm um sentido também que precisa ser visto.
Muito bem...
Agora, entre as críticas, chamaram-me atenção alguns pontos: um cuidado, uma atenção que foi dada quanto às despesas públicas com constelação, quanto ao orçamento. Então, eu quero contribuir para essas observações, para as críticas e também para as pesquisas em relação a isso. Eu desconheço investimentos no Judiciário em consteladores. Até onde eu sei, até agora, os consteladores são voluntários. Eu não acho que isso esteja correto, mas, até agora, essa é a realidade.
Por outro lado, também tem que se pesquisar quanto se economiza usando as constelações, não é só se criticarem as despesas. É como comprar um medicamento para distribuir pelo SUS: há um gasto, mas há uma economia, há uma vantagem. Quanto se economiza com audiências desnecessárias, tempo de juiz, estrutura do Poder Judiciário, advogados, Ministério Público, processos intermináveis, demorados? Então, isso também precisa ser considerado. Se se for avaliar numa pesquisa, é preciso a gente observar os efeitos que uma constelação tem ao reduzir a necessidade de tantas despesas.
Quanto aos efeitos negativos que foram relatados, eu acredito que existam casos também que não constituem amostra científica relevante; a não ser que sejam verificados, existem. Mas também, para pesquisar, de forma cética, sem a emoção, é preciso comparar com o que acontece num processo judicial tradicional: a demora de um processo judicial, um surto que a parte sofre durante os dez anos em que o processo anda, as despesas que ela tem com recursos, o sofrimento, a ineficiência que acontece hoje na máquina pública...
A Rose Militão falou do SUS, mas no Judiciário é a mesma coisa. A gente não está partindo de um ponto em que está tudo perfeito, todo mundo feliz e, de repente, chegam os consteladores para atrapalhar. Não. É uma situação de crise. No Judiciário, nós lidamos com crise; nós lidamos com situações de violência, de pessoas que estão sendo ameaçadas, de pessoas que estão sofrendo, que estão com a vida paralisada, ou indo por água abaixo; existem situações de injustiças. Então, nós também precisamos olhar para isso e procurar fazer algo de bom.
A revitimização é delicada. É um cuidado que se precisa ter mesmo, na constelação e sem a constelação. Como é que é sem constelação? Como é que é numa audiência judicial, quando se vai escutar a vítima de violência e ela tem que narrar o caso? Isso não é revitimização? Tem que ter cuidado. Como é que é lidar com crianças, adolescentes, a escuta dos adolescentes com dois advogados, o Ministério Público colocando a pessoa contra a parede, testemunhas, acuadas? Está certo? Não está, mas está sujeito a acontecer. Atividade humana. Somos seres humanos.
R
Foi mencionado o caso de uma juíza que constrangeu uma pessoa porque não participou da constelação. Olha, eu acredito que todos os dias está sujeito a algum juiz constranger alguém indevidamente, mas não é por isso que tem que acabar com os juízes. Nós precisamos aperfeiçoar a nossa humanidade, aprender a lidar com o ser humano. Isso com constelação ou sem constelação. Não está certo fazer constrangimento. Obrigar as pessoas a constelar será que funciona? Pela minha experiência, eu não obrigo, eu procuro deixar as pessoas bem à vontade. Só participa quem quer, e eu vejo que isso melhora os resultados do trabalho, inclusive para quem não quer. Todos se sentem melhor, isso pacifica o campo. Sei de experiências que já foram feitas de obrigar a pessoa a participar, de convocar as pessoas, intimar; e, pelo que chegou até mim, os resultados não foram tão bons. As pessoas modificaram o procedimento e aí melhorou. Então, não é algo fechado, quadrado. Nós temos que aperfeiçoar os métodos em tudo. Isso não é só na Justiça, isso é na segurança pública, na saúde. O fato de ter um medicamento com eficácia comprovada não significa que não se possa desenvolver medicamentos melhores ou ajustar a dose ou aperfeiçoar o uso. As pesquisas servem para isso, e nem toda pesquisa dá certo.
Nós não somos contra, eu pelo menos não sou contra, o orçamento público destinado a pesquisas. Eu acho que o Governo deve investir em pesquisas, em universidades, mesmo que não vá dar certo, porque tem que testar, tem que pesquisar. Então, espera aí, nós estamos começando.
E, diante dessa situação de crise do Judiciário, que o Judiciário já se deu conta há bastante tempo, vem havendo uma transformação muito significativa. O Judiciário há muito tempo deixou de ser simplesmente aquele que aplica a lei perante o fato concreto. Não que o Judiciário não faça isso, mas hoje é adotado o conceito de Justiça multiportas. Os meios adequados de solução de conflito já tão consolidados no Judiciário, independentemente da constelação. Há a Justiça restaurativa, mediação. O Judiciário tem uma visão interdisciplinar. Na formação continuada dos juízes, incluem-se conhecimentos que não são propriamente jurídicos, mas que podem ajudar na nossa visão, na nossa compreensão, no trato com mulheres vítimas de violência, no trato com crianças que são vítimas de abuso. Então, isso deve continuar acontecendo.
E eu entendo, assim, que mexe com as pessoas, acho que é uma sensação de insegurança de que o Judiciário não vá cumprir o seu papel. Poxa, a pessoa vítima vai lá, procura o Judiciário, e o Judiciário coloca a vítima de frente para o agressor? As pessoas se indignam com isso. Então, é importante esclarecer que constelação não é isso. Eu não acho que a constelação deva ser utilizada contra a lei ou deva deixar de ser aplicada a lei. Para mim é uma segurança de que a lei continue sendo aplicada, que a constelação seja aplicada dentro da lei e respeitando os limites da lei, respeitando a presença do advogado. O advogado assiste o direito da parte. Ele não vai deixar a parte se sujeitar a um abuso, não é? Então, eu sempre convido os advogados a participar, na presença do Ministério Público. O Ministério Público tem a missão constitucional de ser o fiscal da lei. Na minha comarca há um promotor: ele é sempre convidado e, às vezes, ele participa; e aí, se ele encontrar alguma ilegalidade, algum abuso, alguma violação à lei, ele está no papel dele. Então, existe uma estrutura no sistema judiciário que favorece que as coisas caminhem relativamente bem - "relativamente" porque as pessoas estão sujeitas a erros, não é? Mas o Judiciário está buscando soluções, e aí eu falo por mim, mas eu falo o que eu vejo da reforma do Judiciário, das inovações, essa abertura para inovações, porque a situação é de tanta carência, é de tanto sofrimento que as pessoas passam a não se sentirem atendidas com eficiência, com a rapidez desejada no Judiciário, e nós não podemos nos dar ao luxo de rechaçar inovações. Nós temos que olhar com bons olhos as inovações, temos que observar os efeitos que elas têm, temos que buscar aquilo que nos traz melhora, aperfeiçoamento. Isso parece ser um consenso, inclusive na OAB, com as mais de 130 Comissões de Direito Sistêmico de advogados, que estão vendo os benefícios para os seus clientes. Os advogados não representam o Judiciário, eles representam... Eles têm o contato direto com o cliente. Então, é um advogado que zela pelo direito do seu cliente, que olha querendo ajudar e vai buscar recursos que lhe ajudem nisso. E, quando ele tem contato com as ordens do amor, com essas leis sistêmicas, ele pode ajudar muito melhor, pode ajudar o cliente a como se posicionar diante de um conflito, como se posicionar diante de alguém que está acusando o cliente de algo - ou de alguém que que lhe está causando algum dano -, de uma forma mais eficiente. Então, ao fazer pesquisas, temos que olhar para quem está fazendo esses projetos, não é? Para juízes, para advogados, promotores, cidadãos que estão sendo atendidos, e observar como é que isso está acontecendo.
R
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Por favor, Dr. Sami: para concluir.
O SR. SAMI STORCH - Tá.
Então, quero dizer... Alguém falou de consenso - não é? -, que não existe consenso entre os consteladores. Não há e nem deve existir. Não pode existir consenso. Na Medicina também não há consenso. E aí eu me remeto ao Décio: eu também sinto falta da fala de outros consteladores, de pessoas que estão desenvolvendo pesquisas, estão trabalhando de outras formas, sinto falta da interdisciplinaridade, de psicólogos, para encontrar formas melhores de se trabalhar.
Então, também estou à disposição. E eu vejo essa pluralidade de trabalhos e formas de trabalhar com muito bons olhos e acredito que estamos no caminho.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Dr. Sami Storch, por ter vindo aqui a Brasília, aqui no Senado Federal, participar deste evento, porque eu considero aqui esta sessão, a audiência pública, histórica - histórica, não é? -, quebrando paradigmas! É mais uma iniciativa do Senado Federal que vai ao encontro do que a sociedade quer: ouvir os dois lados de forma democrática e buscar, cada vez mais, avançar para ajudar as pessoas.
Eu já vou passar a palavra agora, dentro da linha que a gente combinou, nos cálculos que a própria assessoria aqui da Comissão de Assuntos Sociais fez. Nós vamos ter 7 minutos e 30 segundos para os que são contrários, começando agora pelo Marcelo Takeshi Yamashita.
R
Dr. Marcelo Takeshi Yamashita, para a segunda rodada aqui, considerações finais e alguma observação que queira fazer.
O SR. MARCELO TAKESHI YAMASHITA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado pela palavra, Senador Eduardo Girão.
Eu volto novamente a um ponto que eu fiz na minha fala e que, na segunda rodada de discursos, houve uma citação novamente a um autor, que foi o Capra, não é? Eu vou enfatizar que não existe nenhum embasamento teórico ou experimental que possa conectar qualquer coisa da mecânica quântica ou da física com essa questão do campo quântico, do campo morfogenético, da telepatia que foi dita aqui. Capra é um autor que pode ser citado nos meios exotéricos. Você não cita Capra para um físico. Capra não é reconhecido ou tem publicações relevantes no meio da física. Então, ele não é uma pessoa que deva ser tomada como uma autoridade da área. Ele escreveu livros, livros que podem se encaixar dentro do contexto exotérico; não no contexto da ciência.
Para mim ficou muito claro, através das falas - eu estou repassando o que foi dito pelos colegas, pelos outros palestrantes aqui... E para mim ficou claro que a constelação familiar, no estágio em que está, é baseada primordialmente em relatos de casos. Então, assim como não existe uma conexão forte entre a questão toda da física, da telepatia e da constelação familiar que foi dita, não existe nenhum embasamento experimental ou teórico, do ponto de vista da psicologia, que embase essa prática.
A conclusão a que eu chego e que eu coloco aqui é que colocar uma prática dessa, sem nenhum embasamento, nem teórico nem experimental, como parte de uma política pública, além da questão do gasto com o Erário, você tem a questão da sinalização para a população de que essa técnica recebe um endosso do Estado, não é? Então, se a pessoa individualmente gostaria de procurar esse tipo de terapia utilizando seus recursos próprios, não há nenhum problema. Nós não estamos reivindicando o banimento da prática como um todo, mas simplesmente da inclusão dela como parte de uma política pública endossada pelo Governo.
Na linha do que foi dito pelo colega Paulo Almeida, que a mencionou, a mesma coisa acontece com outras PICs, no rol das práticas integrativas e complementares. Há terapias que estão incluídas no rol dessas práticas, o que não é uma questão, como foi dito aqui, de exterminar de princípio essas terapias. Não quer dizer que elas não tiveram o tempo suficiente para serem descobertas ou para serem estudadas. Não, é um caso muito diferente. Elas vão de encontro ao que se conhece muito bem, não é? Então, você pegar uma prática, por exemplo, como homeopatia e dizer que a água possui uma memória, isso vai de encontro às coisas que nós conhecemos da física. É você pegar alguma coisa prática, como a imposição de mãos, e falar que a imposição de mãos vai curar enfermidades, além do perigo que está atrelado à pessoa abandonar uma terapia séria para se submeter a esse tipo de prática, isso não possui nenhum embasamento. Então, não é uma questão que se descarta a priori.
R
Algumas coisas se descartam a priori, coisas que, de fato, vão de encontro daquilo que a gente conhece bem, daquilo que em que já existe consenso científico. Então, quando você faz uma hipótese na ciência, ela a priori, de princípio, não pode confrontar aquilo que é bem conhecido. A princípio, você pode pensar que, grandes cientistas ao fazerem uma hipótese... Aquilo foi aceito depois de aquela hipótese ser testada muitas vezes. Galileu, Isaac Newton, Einstein fizeram hipóteses, e essas hipóteses são testadas, mas, de princípio, essas hipóteses não podem, por exemplo, ir contra algo bem conhecido. Você não pode assumir, de princípio, que dois é igual a um e aí você desenvolve essa teoria em cima desse absurdo. Uma teoria que é baseada em dois é igual a um, essa, sim, já é descartada de princípio. E isso acontece, por exemplo, com a homeopatia que eu citei, que usa como princípio memória da água, por exemplo.
Houve em outras falas a questão de que cientistas são fechados para o novo. Não, cientistas não são fechados para o novo, a gente gosta do novo, mas o novo precisa ser testado. Isso aí precisa ser testado; as coisas não são aceitas simplesmente porque alguém falou.
Houve outras confusões nas falas, com contraposição de que teoria da evolução seria somente uma teoria, que a teoria do Big Bang seria simplesmente uma teoria. Não! Existem observações que corroboram essas teorias. Na verdade, elas se tornaram teorias porque existem comprovações experimentais da validade delas. Então, o conceito que foi utilizado de teoria foi um conceito errado.
Com algumas coisas em ciência a gente tem que tomar muito cuidado. Foi dito também que, em algumas coisas, houve viés de confirmação por causa de opinião. Não! Em ciência, o que nós temos são fatos. Em muitas situações existe, sim, a escolha de resultados que favorecem alguma conclusão e outras que favorecem outra conclusão, mas, via de regra, no que foi colocado aqui hoje nas palestras, pelo pessoal que foi colocado como contrário às constelações familiares, não houve nenhuma situação de opinião; houve situações, de fato, experimentais, ou, a inexistência de fatos experimentais que validem a constelação familiar. Então, sobre aquela ideia de que tudo é uma questão de opinião, aquela questão de que há duas pessoas olhando, e uma fala que é seis e a outra fala que é nove, e as duas podem estar certas ao mesmo tempo, não, uma está errada; ou é seis ou é nove, senão seis não é igual a nove. Então, há algumas situações em que existem claramente situações de fato; e situações de fato não são questões de opinião.
R
Eu vou terminar a minha fala aqui, porque eu já estourando no tempo. Eu gostaria de agradecer ao Senador Eduardo Girão por ter aceitado aquele requerimento do Senador Sérgio Petecão pela inclusão dos nossos nomes na audiência pública de hoje, mas deixar muito claro que, a princípio, desta audiência de hoje nós soubemos somente em cima da hora. Nós não havíamos sido convidados de princípio e essa audiência seria uma audiência simplesmente com as pessoas que falariam favoravelmente à constelação familiar. Então, eu agradeço ao Senador Sérgio Petecão, que entrou em contato conosco e nos incluiu nessa audiência pública para colocar o contraditório e o que, de fato, se conhece a respeito da constelação familiar.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito obrigado, Sr. Marcelo Takeshi Yamashita, pela sua participação, por ter vindo aqui fazer esse debate, mesmo que de forma virtual, deixando muito claro para o senhor, para quem está nos assistindo que eu aprovei, participei da aprovação dos nomes dos senhores, de quem é contrário, e é importante que haja o contraditório. Até então, a gente, pelo menos aqui, de informações que temos recebido... Eu digo que eu não sou apenas do Estado do Ceará, eu ando pelo Brasil conversando, e eu não tinha visto um posicionamento contrário. A gente via um movimento a favor, mas é bom saber disso, porque eu acredito que isso vai ensejar outros debates e agora eu já tenho os nomes dos senhores para que a gente possa chamar e tentar abrir o leque também, porque eu acho que a gente vai encontrar o ponto de equilíbrio, vai encontrar realmente a busca dessa verdade a partir do momento que a gente vai avançando, ouvindo diversas correntes de pensamento, de opinião, enfim.
Vamos aqui agora, dando sequência, para o Sr. Tiago Tatton, que é diretor científico da iniciativa Mindfulness Brasil. Então eu já o convido para fazer uma nova rodada aqui, as suas considerações finais, observações, por 7 minutos e 30 segundos.
O SR. TIAGO TATTON (Por videoconferência.) - Escutam?
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Sim, perfeitamente.
O SR. TIAGO TATTON (Para expor. Por videoconferência.) - Bom, então queria agradecer, assim como o Marcelo, pelo convite, a todas as autoridades envolvidas, agradecer a participação de todos os envolvidos, principalmente da sociedade brasileira. As falas dos colegas da constelação ao final, agora, e agora neste momento, apesar de serenas, educadas, elas escondem um grave desconhecimento, talvez até mesmo algumas imposturas, não é, na minha humilde opinião. O próprio colega Décio, no início da sua fala, disse que não conseguiu se preparar adequadamente. E a gente percebe um tipo de argumento do tipo nota promissória: "no futuro, algum dia veremos, precisamos fazer mais, não sabíamos que existia eletromagnetismo e agora sabemos, no futuro veremos sua potência". Falaram até mesmo alguns colegas de mistério, não é? Abro aspas: "Precisamos viver esse mistério, pois não é só a ciência que sabe tudo". Geralmente é um tipo de conversa que a gente tem muitas vezes tomando um café com os colegas e filosofando sobre a vida. Mas para o propósito com que estamos aqui, esse tipo de argumento não leva a lugar nenhum. A gente não pode viver de apostas, como os colegas das constelações estão colocando. A gente está falando de uma intervenção que já está na vida pública do país, na saúde, no Judiciário. Então não é uma conversa sobre algo que pode acontecer, é sobre o que já está acontecendo.
R
E também me assusta, assim como o meu colega Prof. Marcelo falou, em pleno 2022, a gente estar falando de Fritjof Capra num debate sobre ciência e políticas públicas, algo que ficou ali nos anos 70 em geral. Esse tipo de conversa sobre ciência cartesiana versus uma ciência mais humana ou a gente falar da ciência através do dicionário, a ciência saiu dos dicionários já desde Newton, não é? Então a gente sabe que existe apenas o fazer científico, seja das ciências sociais, com seus métodos específicos, pesquisas etnográficas, métodos qualitativos, seja da ciência biomédica, com pesquisas experimentais, e em nenhuma forma de ciência válida... Porque essa conversa sobre ciência cartesiana é uma coisa meio anos 80, isso não deveria estar posto aqui. A gente tem a ciência válida, sejam os métodos de ciências sociais, sejam os de ciências biomédicas. A gente precisa avançar para além desse tipo de argumento.
Citar seguidamente o que Bert Hellinger falou ou pensava também não acho que ajuda os colegas das constelações. Em ciência a gente não fica repetindo palavras de um líder como fonte de sabedoria ou de verdades. Isso pode incorrer no risco até de parecer muito mais uma seita ou algo parecido do que uma prática voltada para as políticas públicas. Então, é um alerta que eu faço. Por isso que psicanálise - alguém falou de psicanálise - não é política pública, e nem Freud é referência de boa ciência, pelo contrário.
Os gastos com PICs - o meu colega Dr. Sami falou aí disso - chegam a quase três milhões, três milhões que poderiam estar sendo empregados com práticas baseadas em evidência. Existem diversas intervenções familiares, intervenções inclusive sistêmicas em psicologia, com um número infinitamente maior de evidências do que constelações familiares, terapia com lama ou terapia com picadas de abelhas. No Judiciário pode até não haver gasto público, eu não sei exatamente, mas se cria uma demanda e se supre essa demanda com formações caríssimas de consteladores em institutos privados.
Na medicina falaram que não há consenso, mas converse com qualquer médico ou médica sobre como se deve conduzir um tratamento para pressão arterial elevada e verá que há consenso sim, porque existe ciência. Nas constelações familiares, não, nenhum tipo de ciência. Não tem ciência o que faz com que a ética possa ser constantemente ferida.
Convido a amiga consteladora Rose a ler o Handbook of Religion and Health, do Prof. Harold Koenig, e ela vai ver que existem várias pesquisas sobre espiritualidade com métodos experimentais. Ou os professores brasileiros Wellington Zangari, da USP, Alexander Moreira de Almeida, da Universidade Federal de Juiz de Fora, ou Letícia Alminhana, diretora do Unusual in Psychology. Há várias pesquisas experimentais sobre espiritualidade. A gente não precisa criar uma outra ciência, um outro tipo de ciência para pesquisar coisas subjetivas. Não precisamos separar em ciências cartesianas ou alguma outra coisa. São falácias isso, são sinais graves de despreparo para o debate, na minha humilde opinião.
R
Como o meu colega Marcelo falou, nós estamos abertos, sim. A ciência é um empreendimento aberto. A gente busca e mostra os dados, eles estão aí. A gente apresentou uma revisão com 4 mil estudos, na qual 3.991 foram excluídos, porque eram fracos, eram ruins. Então, a gente está aberto, sim.
Falaram do método fenomenológico, um recurso que usam seguidamente, mas o método fenomenológico criado por Edmund Husserl... E um colega falou, inclusive, que é novo, mas eu aviso a ele que não é novo: as investigações lógicas de Husserl são de 1901. Então, ele pode começar, de repente, procurando ler Husserl ou Merleau-Ponty, que é um autor antigo também. As constelações familiares usam uma visão distorcida e enxertada da fenomenologia original, mas pincelam, colocam em um balaio de gatos, em que entram quântica, nova era, psicanálise e a apropriação cultural do conhecimento zulu.
E, sobre ter outros métodos em ciência, eles existem já. Pesquisa qualitativa, apesar de não tão popular no campo médico, existe. Pesquisem! Há várias bases de dados. Os senhores são médicos, são pessoas instruídas, conhecem as bases de dados, elas são públicas. No campo acadêmico da enfermagem, em particular, existem centenas de pesquisas e metanálises sobre investigação de casos únicos, usando abordagens qualitativas, como grounded theory, análise de conteúdo e o próprio método fenomenológico, que vocês parecem desconhecer ou distorcer. Essas pesquisas olham para fatores subjetivos, como espiritualidade, perdão, gratidão, mas é através da ciência, a única ciência que existe e que me parece, com todo o respeito, que é desconhecida pelos consteladores familiares.
O que não existe nas constelações são pesquisas benfeitas de qualquer natureza. As premissas teóricas e o estado da arte sobre constelações familiares neste momento parecem, sim - me perdoem a franqueza -, muito mais próximos de uma prática oracular ou bruxaria do que de ciência. Isso, na minha opinião, para a sociedade brasileira é gravíssimo.
Muito obrigado, Senador Girão, Senador Petecão e sociedade brasileira, pela oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Tiago Tatton, Diretor Científico da Iniciativa Mindfulness no Brasil, pela sua participação, por dedicar seu tempo aqui para colaborar com esta audiência pública da Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal.
Imediatamente, eu já passo a palavra para o Daniel Gontijo, que é membro fundador da Associação Brasileira de Psicologia Baseada em Evidências. O senhor tem sete minutos para as considerações finais, para alguma observação, desde já lhe agradecendo pela presença.
O SR. DANIEL GONTIJO (Para expor.) - Obrigado, Senador.
Quero fazer um gancho com o que o Tiago falou. E, a respeito do comentário da nossa colega de profissão que é a Rose, acho que eu não tinha falado antes, mas eu sou psicólogo também e tenho doutorado em Neurociências pela UFMG, no qual eu estudei justamente a espiritualidade e sua relação com saúde mental, de forma científica. Eu desenvolvi uma escala que mede o nível de crença das pessoas na existência de seres sobrenaturais. Então, às vezes, a gente ouve o argumento de que o que é subjetivo não pode ser mensurado ou não pode ser abordado por esses métodos cartesianos ou por esse positivismo, que é outra palavra que aparece por aí às vezes. Eu não sei se é por um desconhecimento de ramos da psicologia que trabalham com essa proposta baseada em evidências de mensuração, mas a gente tem na psicometria várias ferramentas que nos possibilitam medir, sim, processos psicológicos, experiências, até mesmo o amor. Vocês falam muito sobre o amor, e existem escalas psicométricas com as quais você pode medir as expressões do amor em diferentes dimensões, comportamentais, afetivas, cognitivas. Então, eu não sei se é um desconhecimento, mas, em breve, inclusive, vou receber o Bruno Damásio, que foi orientador do meu doutorado no meu canal do YouTube, onde eu faço divulgação científica, e a gente vai falar um pouco sobre isto: a importância da psicometria e da avaliação psicológica para a cientificidade da psicologia, principalmente quando a gente pensa nas pesquisas e na pesquisa clínica também, onde é muito importante também o assunto da saúde mental.
R
Então, eu vejo um pouco... Concordo com o Tiago, que acho que comentou isso, quando diz que existe uma confusão aí ao diferenciar essas ciências, como se, então, a ciência clássica não funcionasse para esse tipo de coisa. Eu compartilho dessa visão de que parece uma confusão.
A Daniela fez um comentário sobre ter a mente aberta, e eu superconcordo: na ciência a gente tem que estar com a cabeça aberta para aprender coisas novas, para a gente se surpreender com dados diferentes e tudo, mas, usando uma frase, que eu não me lembro se é o Sagan ou se ele citou outro autor, ressalto que a gente tem que ter a cabeça aberta, mas não tão aberta a ponto de o cérebro cair, senão a gente começa a acreditar em qualquer coisa! É preciso sempre ter o filtro que a gente chama de ceticismo, o pensamento crítico, um pé atrás: "espera aí, será que é isso mesmo?". O Einstein chegou lá com esse negócio de relatividade e tudo... E esse negócio da física quântica? Será que existe esse negócio mesmo, que contrastava com a física newtoniana? Então, a comunidade científica tem um ceticismo natural, mas que é saudável. Caso contrário, deixa de ser ciência, porque a gente tem que ter muito rigor antes de adotar qualquer tipo de ideia sobre o mundo.
E é com esse rigor que a gente está aqui hoje conversando com vocês, não é uma coisa - vamos pensar assim - a priori: não, não podemos aceitar que alguma coisa da constelação familiar seja verdadeira ou que ela funcione. Não é isso. Olha, pra gente aceitar a constelação familiar tendo ali algumas premissas verdadeiras, que possam nos levar a dizer "o.k., funciona", a gente tem que ter pesquisas de qualidade sendo conduzidas - e eu acho que a gente mencionou isso; a Gabriela Bailas também falou sobre isso -, mas sem pular todas as etapas, não é? Vamos começar do básico: será que aquelas premissas teóricas fazem sentido mesmo na realidade? Aqueles insights, as descobertas meio controversas do Hellinger realmente se sustentam depois de uma pesquisa bem conduzida? É que a gente tem instrumentos, ou pode desenvolver instrumentos, para medir boa parte desses processos que estão sendo discutidos nas constelações. Não sei se todos os conceitos aí, como o do campo morfogenético... Algumas coisas talvez não sejam passíveis de verificação e, se não são, se a própria física não consegue capturar algumas dessas frequências aí, talvez elas nem existam. Então fica essa possibilidade aí para vocês considerarem.
Há um comentário importante do Mateus, e eu concordo com ele: uma coisa é a ciência, o que ela tem demonstrado, aquilo que ela tem trazido pra gente de dados; outra coisa é a experiência pessoal, da pessoa que participa de uma constelação familiar ou de qualquer outro tipo de procedimento, de terapia. Eu concordo, não é que as pessoas não estejam tendo essas experiências de bem-estar, de repente de uma mudança de percepção sobre a própria família, sobre um abusador, sobre um pai, sobre uma mãe, eu não duvido que possa haver alguns tipos de experiências ali. Eu sou um cético de carteirinha, até mesmo sobre o sobrenatural, que é um dos temas que eu mais gosto de estudar e de falar a respeito, mas eu já tive várias experiências que a maioria das pessoas nunca teve: de sair do meu corpo, de mover um copo com a força do meu pensamento, embora eu estivesse com o dedinho lá em cima... (Risos.)
Eu já tive várias experiências sobre as quais as pessoas diriam "isso é sobrenatural, é de outro mundo, não é?". Mas, graças aos meus estudos em psicologia e em neurociências, eu aprendi a ter uma visão um pouco diferente sobre isso, mais cética: será que existe uma explicação alternativa para isso?
R
Deixo essa questão para vocês: será que pode haver uma explicação alternativa para as aparentes mudanças, ou um bem-estar, ou uma melhora que esses participantes das constelações, às vezes, relatam que não tem nada a ver com talvez pressupostos teóricos que o Hellinger e outros levantaram? Eu, lendo um pouco os livros nas partes sobre constelação, a prática mesmo, ficava levantando várias hipóteses: poxa, mas será que é a forma como a pessoa foi posicionada aqui? "Realmente eu estou de costas aqui, estou desconfortável". E uma outra pessoa: "Eu não consigo me mover, eu estou me sentindo acuado, porque havia duas pessoas aqui". Uma coisa totalmente talvez espacial de uma experiência psicológica pela configuração espacial ali e talvez nada a ver com a conexão com que o parente realmente estaria vivenciando lá. Eu acho que existem tantas coisas que podem ser testadas do básico ali dos processos que de repente explicariam melhor do que essas especulações que, às vezes, apelam até para uma metafísica, que a gente não consegue testar ou que talvez realmente sejam, com o perdão aí do termo, um pouco de "viagem na maionese". Não sei, mas vai que. Eu acho que esses processos básicos têm que ser testados também.
E aí, para finalizar, eu queria só comentar uma fala do Sami a respeito de benefícios da constelação familiar, inclusive no Judiciário, para desempacar um pouquinho as coisas, desafogar um pouco aí as demandas de processos e coisas do tipo. Eu entendo o que você traz nesse argumento, mas eu acho um pouco complicado, diante de tudo que a gente já falou, quando a gente não consegue garantir, mais uma vez, a eficácia em termos de saúde mental, de resolução de conflitos. A gente não sabe se aquilo ali vai se estender no tempo, o que vai ser depois daquilo ali, daquela resolução e tudo. E aí fica uma analogia aqui para a gente pensar também. Imagina que a gente não está conseguindo disponibilizar vacina para a população contra a covid, e aí o pessoal está fazendo campanha, está brigando, está acumulando a fila ali. Eu quero a minha vacina e tudo. É por isso que a gente vai prescrever a cloroquina contra a covid-19 desde antes, quando a gente não tinha evidência de eficácia? Era uma questão em aberto, porque saiu um estudo que depois se mostrou totalmente mal conduzido. E, mesmo depois, agora, com as pesquisas, a gente sabe que ela não ajuda contra a covid-19.
Então, a gente não sabe exatamente que riscos que a constelação oferece e se é que ela oferece algum benefício. E é para desencalacrar um pouquinho aí, desafogar um pouco essas demandas no sistema jurídico que vai ser justificada a sua inserção em políticas públicas ou mesmo no SUS, que alguém mais comentou aqui? Será que a psicologia dá conta de tudo? Mas é por causa de uma deficiência, de um problema que a gente vai oferecer alguma coisa sobre a qual a gente não tem evidências de validade? Eu acho que essa é uma questão importante para a gente pensar também. Às vezes é melhor a gente suspender nosso julgamento, dizer não sei se funciona, se não funciona, se é perigoso ou não é e não fazer muita coisa a respeito em termos de uma política pública do que a gente acabar dando um passo maior do que a perna, podendo, quem sabe, até comprometer a população.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Sr. Daniel Gontijo, que é membro fundador da Associação Brasileira de Psicologia Baseada em Evidências.
Imediatamente eu já passo a palavra aqui para Gabriela Bailas, que é pesquisadora e que vai participar de forma remota, já agradecendo também a presença dela. Tem sete minutos e trinta segundos para fazer considerações, outras observações nessa participação final.
Muito obrigado.
A SRA. GABRIELA BAILAS (Para expor. Por videoconferência.) - Bom, quero agradecer novamente pelo convite, por aceitar a inserção dos nossos nomes nesta sessão de hoje.
R
Acho que foi um exercício muito interessante, principalmente para mim, que trabalho muito com pensamento crítico, consciência, faço ciência de base também em física de partículas, trabalho muito com métodos estatísticos, leituras de artigo.
Eu tenho algumas considerações para fazer sobre ciência. Primeiro, o meu colega Marcelo Yamashita já falou claramente que teoria não é apenas uma teoria. Para algo se tornar uma teoria, a gente precisa de toda a experimentação necessária. Então, o Big Bang e a evolução não são apenas uma teoria, são teorias consolidadas dentro da ciência.
Outra fala interessante foi: "A ciência não possui consenso". Sim, a ciência possui consenso. O aquecimento global é um consenso. Nós temos a teoria da evolução, como eu já falei, a teoria dos germes, nós temos o consenso das vacinas. Nós sabemos que a vacina para poliomielite, para febre amarela, para o próprio covid são consensos. Então, falar que a ciência não possui consenso, que os cientistas não estão abertos ou que não queremos fazer ciência sempre acaba colocando os cientistas como uma figura da pessoa que não quer fazer ciência, que só quer seguir o que acredita, e não é isso que a ciência faz. Na física, a maior alegria é a gente descobrir coisas novas, é a gente entender que algumas não funcionam e outras começam a funcionar. Isto é a beleza da ciência: mudar. Então, a comunidade científica possui consenso sim.
Outro ponto que eu gostaria de falar é que existe uma diferença entre evidência anedótica e denúncias ou relatos. Muitas evidências anedóticas foram trazidas: "Eu vi, funcionou, na minha vida deu certo, para a minha vizinha, para a garotinha que eu conheci". Isso se chama evidência anedótica. Agora, o que eu trouxe, que foi denunciado oficialmente para os meios de comunicação, são denúncias de mulheres que sofreram dentro do Judiciário. Por exemplo, desculpem a palavra, se uma mulher foi estuprada e vai até a delegacia registrar, traz o relato dela, o que aconteceu com ela não é uma evidência anedótica. Falar: "Na minha prática deu certo" também é uma evidência anedótica. Se hoje eu apresentar aqui para o Senado que veneno de cobra cura câncer porque eu vi que funciona, a gente não vai implementar no SUS, a gente não vai implementar no Judiciário, porque não existem evidências científicas. O método, seja ele de saúde mental, seja de outro tipo de problema, de saúde física, de um problema de química, biologia, a gente tem o método científico. E o método científico fala tanto do qualitativo das pessoas quanto do quantitativo, dos números. Então, com pesquisa quantitativa, com números, a gente tem psicologia, a gente tem medicina... Senão, como os tratamentos de câncer e o tratamento das vacinas funcionariam, se simplesmente não desse para testar pessoas? Como hoje a gente sabe que existem terapias psicológicas que funcionam muito bem, como a terapia cognitiva comportamental para a ansiedade? Porque fizemos pesquisas científicas.
A constelação familiar, como eu bem mostrei, pulou da observação para o Judiciário. E uma fala muito interessante que o Juiz Sami trouxe diz respeito a que precisamos de aperfeiçoamento, que o agressor, muitas vezes, o estuprador passou por uma situação muito ruim no passado. Só que há um ponto interessante - e aí é uma pergunta, vou deixar em aberto: o Judiciário é o lugar para aperfeiçoar algo? As vítimas que estão dentro do Judiciário são cobaias? Porque, quando a gente faz uma experiência científica envolvendo pessoas, a gente tem um ambiente hipercontrolado, duplo-cego, triplo-cego, para não existir viés. Então, quando a gente fala que a constelação já está no Judiciário, mas precisa de aperfeiçoamento, seriam as vítimas cobaias? Essa é uma pergunta que eu vou deixar em aberto.
R
Segundo ponto, existe uma diferença muito grande entre narrar o que aconteceu e encenar: revitimização. Quando uma vítima de estupro ou de abuso sexual narra o fato, ela não o revive como uma encenação, que é o que propõe a constelação familiar. Ela também pode pedir para que o agressor não esteja na sala. E já existem métodos claros de mediação, métodos aceitos. A constelação familiar não é um método de mediação aceito perante todos os órgãos.
Outra pergunta... Uma discussão interessante também seria com o Ministério Público. O Ministério Público poderia estar aqui também, nesta audiência ou numa próxima audiência, e eu, inclusive, estaria superdisposta a conversar, como cientista, como estudiosa das constelações há mais de dois anos, participei de inúmeras reuniões de consteladores também. Então, eu trago este ponto: o Ministério Público também é um agente importante nessa discussão.
Outro ponto: em diversas falas, eu ouvi a questão anticientífica, ao se colocar em dúvida o trabalho dos cientistas, em dúvida o trabalho do SUS, ao se questionar. Essa é uma postura muito típica de pseudociências que querem, de alguma forma, descredibilizar o que os cientistas falam. Então, esse é um ponto importante.
E, respondendo à minha colega jornalista, poeta e filósofa, nós não queremos eliminar as constelações; queremos apenas que elas não façam parte do Judiciário sem que existam evidências de que elas funcionam - nem do Judiciário, nem do SUS, nem do público. Não é eliminar do mundo, a gente não está pedindo isso.
Eu vou falar outra coisa: a constelação familiar é uma técnica que cresceu muito. Minha colega disse que, se cresceu muito, é porque é uma coisa maravilhosa que existe. O feminicídio cresceu muito, a violência doméstica cresceu muito, o nazismo foi uma prática horrenda que cresceu muito. Crescer muito não significa ser bom ou que, de fato, seja uma coisa justificável para que a gente use com pessoas.
Inclusive, como estudiosa das constelações, existem movimentos contrários, as chamadas novas constelações, que são contra Bert Hellinger pelas suas posturas. Inclusive, Bert Hellinger tem um poema, uma ode em homenagem a Hitler, em que ele diz: "Hitler não foi melhor nem pior do que qualquer homem". E essas novas constelações tentam combater esse tipo de pensamento. Então, se nem dentro da constelação existe consenso, como a gente vai botar uma coisa que não tem consenso dentro do Judiciário, dentro do SUS e submeter mulheres à revitimização? E não são ideologias aqui, são simplesmente fatos. A gente não pode submeter mulheres à violência de gênero, crianças à revitimização, e a gente não pode vitimizar o agressor. O estuprador estuprou, ele não é uma vítima. A vítima é a mulher estuprada. Não podemos justificar porque, no passado, aconteceu isso ou aquilo, não! O papel da Justiça não é o de ajudar alguém a entender por que ele é um estuprador, não. É fazer valer a lei.
O Código Penal... A Constituição Federal é clara: "Todos são iguais perante a lei". Então, a gente não pode misturar as coisas aqui, a gente não pode criar uma rivalidade entre ciência e anticiência, não. A ciência ajuda nossa vida todo dia: se a comunicação remota é possível, é porque a ciência existe; se a covid está sendo combatida, é porque a ciência existe; se hoje em dia as mulheres têm quimioterapia para o câncer de mama e não precisam arrancar mama e costela, é porque a ciência evoluiu. E hoje temos quimioterapia, hoje entendemos o DNA, a genética. Isso é ciência. A ciência evolui todos os dias através de um método claro e específico. Não podemos pular partes do método e colocar esse método para desafogar o sistema. Nós queremos desafogar o sistema ou resolver e oferecer justiça para crimes hediondos? Esse é o meu questionamento. Eu agradeço muito por essa participação e estou aberta para outras participações.
R
Senador Eduardo Girão, muito obrigada pela oportunidade, obrigada a todo o Senado. Muito obrigada. Boa tarde.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Somos nós que agradecemos a sua participação, Gabriela Bailas, que é pesquisadora e participou conosco aqui, por via remota. Mais uma vez, muito obrigado.
Imediatamente, a gente já passa a palavra para Mateus Cavalcante de França, que é pesquisador e também vai participar de forma remota. O senhor tem sete minutos e trinta segundos, desde já lhe agradecendo pela participação.
O SR. MATEUS CAVALCANTE DE FRANÇA (Para expor. Por videoconferência.) - Eu gostaria de iniciar agradecendo o convite ao Senador Eduardo Girão, ao Senador Sérgio Petecão por também propiciar este momento, que eu acho que é um momento importante de diálogo também com a sociedade.
Já antecipo minhas escusas porque provavelmente vou ter que sair um pouco antes de a audiência se concluir, porque sou um pesquisador e tenho que trabalhar - vou trabalhar na pesquisa em que trabalho, a partir das 4 horas. Então, vou ter que me retirar.
Eu gostaria de iniciar... Vou ter que me repetir em algumas coisas que eu afirmei, porque algumas afirmações foram feitas como se eu não as tivesse dito, sobre as denúncias ou sobre as experiências negativas serem também evidências anedóticas.
O que faz de algo uma evidência anedótica é o tipo de afirmação que a gente faz dela, certo? Então, eu não afirmei... Inclusive, eu afirmei o contrário: eu disse que o fato de existirem denúncias não significa que todas as pessoas que passaram por uma constelação familiar, todas as pessoas que foram consteladas tiveram aquela experiência. Ou seja, eu não estou fazendo essa afirmação. Ao contrário, quando se defende a implementação ampla, enquanto política pública, de constelação familiar, baseiam-se em evidências anedóticas para dizer que ela funciona. Ela funcionou nesses casos, portanto ela será muito útil para a sociedade como um todo, certo?
Eu queria também aproveitar e falar um pouco - já que também se falou de pesquisa com pessoas, já que também se falou de ciências sociais, de outros métodos de coleta de dados, e está-se entrando na minha área como sociólogo do Direito -, eu queria também explicar algumas coisas, deixar algumas coisas um pouco mais nítidas. Existem métodos quantitativos de coleta de dados - e esses dados quantitativos serão analisados de uma forma - e existem métodos qualitativos de coleta de dados - e esses dados serão analisados de outra forma. Uma pesquisa quantitativa busca generalização. Uma pesquisa qualitativa busca ser replicável, ser transferível, de repente. É claro que uma pesquisa quantitativa também é replicável, tem que ser replicável - isso é muito importante na metodologia científica -, mas uma pesquisa qualitativa também tem suas preocupações e suas limitações.
Quando a gente trabalha com qualquer pesquisa - eu trabalho com pesquisa qualitativa -, a gente tem que falar das limitações do que a gente está afirmando. Se eu estou fazendo um estudo de caso, como eu já fiz estudos de caso, eu sei que as afirmações que eu vou trazer daquele caso não são generalizáveis a todos daquele universo a que o caso pertence. Então, é um tipo de afirmação que é muito perigosa, principalmente quando se está tentando legitimar uma política pública. Entendem meu ponto? O que eu quero dizer aqui não é que o qualitativo é desprezível. Claro que não! Ele é muito importante inclusive para compreender aqueles pontos fora da curva numa pesquisa quantitativa. Então, se a gente observa uma tendência numa pesquisa quantitativa, aqueles pontos fora da curva precisam ser estudados - por que estão fora da curva? E uma pesquisa qualitativa vai ajudar com isso. No entanto, uma pesquisa qualitativa não produz dados generalizáveis. E esse é um problema, em parte, das pesquisas, em uma parte significativa de pesquisas sobre constelação familiar, inclusive no Judiciário.
R
Eu tive acesso a algumas pesquisas, por exemplo, cuja metodologia, a metodologia de coleta de dados, envolvia entrevistas com experts - era essa a palavra que havia no próprio desenho metodológico -, ou seja, com consteladores. Quando a gente faz isso - claro que eu não estou dizendo que a palavra dos consteladores não tem validade, claro que tem -, quando a gente trabalha com isso, a gente tem que considerar quais são as limitações dos meus dados. Se eu estou fazendo uma pesquisa cujas fontes são lideranças ativistas de um movimento social, por exemplo, eu tenho que considerar as limitações das informações que aquelas pessoas vão me dar, porque aquelas pessoas vão estar falando a partir da própria realidade.
Então, quando a gente extrapola as limitações da própria pesquisa, a gente também não está seguindo, como se espera, o método científico. E daí eu volto a uma questão que meus colegas já falaram, sobre abertura: "Ah, os cientistas não são abertos a essas outras práticas, a essas outras possibilidades!". Não, pelo contrário, nós somos muito abertos. Mas sempre que a gente vê algo novo, a gente precisa investigar, a gente vai trabalhar as limitações do que a gente está investigando, as possibilidades do que a gente está investigando, e essa pesquisa será replicada por outras pessoas até que a gente chegue a um consenso para fazer afirmações de uma maneira categórica.
Então, quando a gente fala - certas afirmações foram feitas aqui sobre a eficácia, sobre os benefícios da constelação familiar -, quando eu falo que essas afirmações não podem ser feitas, eu não estou dizendo que elas são falsas, eu não estou dizendo que aquelas pessoas não sentiram benefícios, mas sim que a forma como elas são afirmadas não pode ser feita, porque a gente precisa de estudos que sistematizem esses casos para entender por que essas pessoas se sentiram beneficiadas, em que medida essas pessoas se sentiram beneficiadas. E aí escalas, como as que o Daniel Gontijo falou também, são muito importantes para daí a gente poder trazer resultados, quiçá resultados generalizáveis.
Então, como meus colegas já falaram, o que está sendo feito é um salto de etapas, o que, de certo modo, foi reconhecido quando os colegas que estão aqui defendendo a implementação de constelações familiares disseram que faltam pesquisas. Então, se faltam pesquisas, a gente não oferece para o público amplo.
E aí eu volto, mais uma vez, ao ponto das divergências, certo? Sim, eu apontei que existem divergências entre os proponentes de implementação de constelação familiar, seja no Judiciário, seja na saúde, na pedagogia, em que área for. Existem divergências. Só que, quando você oferece uma política pública, isso não é exatamente bom. Eu vou explicar. Existem medicamentos que são oferecidos para tratar determinadas doenças, e, quando você está estudando a eficácia desses medicamentos, você consegue descobrir em que casos esses medicamentos não têm eficácia ou em que casos eles podem ser perigosos, em que pessoas podem sofrer mais malefícios do que benefícios com o uso de determinado medicamento. Isso é importante na pesquisa científica, e não é só na área da saúde, não é só nas ciências naturais, isso é importante quando a gente fala de política pública, portanto, ciências sociais.
R
Existem revisões sistemáticas, com metanálise, sobre políticas públicas, sobre constelação familiar no Judiciário? Não. Então, a gente tem, mais uma vez, afirmações que estão sendo feitas sem poderem ser feitas com base em evidências. Não estou dizendo que elas são intrinsecamente falsas, que elas são necessariamente falsas, mas a gente afirmar algo, principalmente algo grandioso, como algo que pode ser?! "Nossa, pode funcionar para questões de finanças, para questões de negócios, para questões de saúde física, de saúde mental e de resolução de conflitos", isso é uma afirmação imensa, é uma afirmação para a qual não existem evidências grandiosas, também citando o que o meu colega Daniel Gontijo já falou.
Eu queria fazer só mais um último comentário sobre a dimensão espiritual.
A espiritualidade faz parte da vida de várias pessoas; várias pessoas se relacionam com o espiritual de alguma forma. Isso é estudado por antropólogos, é estudado por sociólogos, por psicólogos, por uma série de pesquisadores, em especial na área das humanidades. No entanto, essas pesquisas também seguem metodologia e essas pesquisas também encaram as próprias limitações. Entender como alguém se relaciona com uma divindade não implica a existência dessa divindade; entender como a pessoa se relaciona com a espiritualidade não implica descrever como é a espiritualidade, ou como seria a espiritualidade, de fato. Então, a gente também tem que pensar nas limitações das afirmações que podem ser feitas, e isso é muito importante no fazer científico.
Eu vou deixar uma última fala agora, sobre a questão da abertura. Como eu disse, depois...
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Só para concluir, por gentileza, dentro do prazo.
O SR. MATEUS CAVALCANTE DE FRANÇA (Por videoconferência.) - Claro, vai ser minha fala de conclusão.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Claro.
O SR. MATEUS CAVALCANTE DE FRANÇA (Por videoconferência.) - Obrigado, Senador Girão.
Quando se fala de abertura, eu deixo essa reflexão também: será que, quando a gente está aplicando algo sem base em evidências, no poder público, a gente está sendo aberto ao contraditório, a gente está fazendo autocrítica, a gente está tentando ouvir o que outras pessoas e pesquisadores, e mais, não só pesquisadores, o que pesquisas têm a dizer sobre isso?
Eu deixo essa reflexão e, mais uma vez, ressalto a importância de evidências para se pensar em qualquer política pública, ainda mais de maneira ampla para a população.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito obrigado.
Eu queria só... Essa última pergunta eu não ouvi. O senhor poderia repetir, por favor, Sr. Mateus Cavalcante de França, esse último questionamento que o senhor fez? Eu não ouvi aqui.
O SR. MATEUS CAVALCANTE DE FRANÇA (Por videoconferência.) - Naturalmente, eu falei... O último questionamento era sobre justamente a implementação, de forma ampla, de algo como política pública, em serviços públicos dentro de instituições do poder público...
Eu peço perdão pelo cachorro de algum vizinho, um cachorro que está latindo. (Risos.)
Quando é apontado que nós pesquisadores não estamos abertos, eu reflito se, nessas afirmações, e mais, nas afirmações sobre a eficácia, sobre o funcionamento de uma prática, como a constelação familiar, está sendo aberta a divergência, se está sendo aberta a crítica, se está sendo feita a autocrítica. Como eu disse, todo pesquisador critica o próprio trabalho e o submete à crítica dos pares para que, daí, a gente chegue a qualquer tipo de afirmação.
E eu deixo esta reflexão: será que isso está sendo feito? Será que isso foi feito para se aplicar uma prática dessas no poder público, seja no SUS, seja no Judiciário, seja nas escolas? Deixo essa reflexão.
Então, mais uma vez, muito obrigado.
E boa tarde!
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - O.k., muito obrigado ao Sr. Mateus Cavalcante de França, que é pesquisador.
Da parte desta Comissão de Assuntos Sociais, deixo muito claro que o objetivo aqui é a gente ouvir, de forma justa, as partes; isso é muito importante. Esse assunto, às vezes, incomoda, porque pessoas não querem debate, porque é um assunto que... "Ah, não!". Mas a gente faz o debate.
R
Já tivemos aqui recentemente, no ano passado, uma Comissão Parlamentar de Inquérito em que até hoje existem divergências entre cientistas e médicos renomados, dos dois lados, sobre, por exemplo, tratamento. Desde que medicina é medicina, você deve usar tudo que tem a favor do paciente, e existe a autonomia médica, mas algumas pessoas querem botar goela abaixo e dizer: "Não, não pode nem debater esse assunto". Como não pode debater esse assunto? Este aqui é o Congresso ou não é? Cadê as evidências? Foram mostradas as evidências, de um lado e de outro. Até hoje há pesquisas mostrando que, se você está numa guerra, você tem que usar todos os instrumentos para poupar vidas.
A gente sabe que há lobbies poderosos aqui dentro do Congresso - lobbies poderosos. Muitas indústrias, inclusive a farmacêutica, com outros objetivos. Vai usar? Vai usar! Agora, não pode evitar que outras pessoas que queiram se beneficiar, como médicos, repito, pessoas que estudaram o assunto e que se posicionaram... Mas há gente que não gosta do debate, por isso que esta Comissão está fazendo diferentemente.
Nessa CPI, por exemplo, Senadores se levantaram desta mesa aqui, quando médicos e cientistas renomados começaram a falar de um posicionamento divergente deles, da verdade absoluta que os donos da verdade querem impor, levantaram-se e foram embora: deixaram médicos e cientistas falando sozinhos. A população que está em casa viu - a população que está em casa viu.
Eu acho muito interessante isto aqui: que as pessoas tomem as suas conclusões, até do ponto de vista... Eu acho que tudo vai cair no homem. A gente roda, roda, e tudo vai cair na questão do homem. O grande detalhe é o homem. Qual a sua verdadeira intenção? É ajudar ou a sua intenção muitas vezes pode ser segurar o seu mercado? É o egoísmo nosso, a história da humanidade mostra isso. Quando o homem evoluir - e isso aí vai de cada um -, as coisas vão melhorar; quando a gente começar a compartilhar e a querer o bem do próximo. Isso aí é muito importante.
Eu vejo um traço interessante. Eu repito: essa vai ser a primeira, nós vamos fazer várias. Esse assunto nós vamos debater, nós vamos debater à exaustão, e nós vamos ouvir, como nós estamos ouvindo aqui, bem claramente. Por que um cientista é melhor do que o outro? Quem é que diz isso? Quem é que diz isso? Não! Vamos ouvir. Existe uma divisão entre cientistas com relação a esse assunto, é claro. E vamos ouvir. Enquanto isso, a gente vai evoluindo aqui.
Eu já passo a palavra agora para o Sr. Paulo Almeida, Diretor Executivo do Instituto Questão de Ciência, para as suas considerações finais, observações.
Desde já, Sr. Paulo, agradeço a sua participação aqui. O senhor tem sete minutos e trinta segundos para fazer as suas observações e colocações finais.
R
O SR. PAULO ALMEIDA (Para expor. Por videoconferência.) - Perfeito.
Muitíssimo obrigado, Senador Girão, por esta oportunidade de falar mais um pouquinho.
Eu vou retomar alguns dos pontos que foram apresentados aí ao longo do dia. E um deles é o que o Marcelo Yamashita trouxe há pouco sobre o fato de que esta reunião iria acontecer sem a presença do contraditório, não é? Então, os representantes da ciência não foram convidados a princípio. Eles pediram para participar e, com muito... Agradecemos muitíssimo ao Senador Petecão ter feito o requerimento para que a gente pudesse participar da sessão, mas ela aconteceria, a princípio, apenas com os representantes da constelação familiar, e isso geraria uma reunião que teria apenas loas à constelação familiar. Então, posteriormente isso poderia ter sido utilizado pelos defensores para mencionar que, inclusive, uma Casa do Legislativo tinha um apreço por isso e, então: "Olha como são relevantes, existe um debate público sobre isso". E isso reforça um pouco o ponto que eu trouxe, de que existe - já que a gente estava falando sobre lobbies - o lobby da indústria farmacêutica, mas existe o lobby das pseudociências também, e o lobby da pseudociência gosta muito de utilizar instâncias oficiais para promover uma relevância artificial.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Paulo Almeida, só um minutinho. O senhor está com a câmera fechada.
O SR. PAULO ALMEIDA (Por videoconferência.) - Perdão.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - O senhor pode abrir?
O SR. PAULO ALMEIDA (Por videoconferência.) - Claro, claro! Perdão.
Dando seguimento aqui, então, sobre um ponto muito importante - e eu agradeço a você ter levantado, Senador Girão -, a gente não fala que um cientista é melhor que o outro cientista. De fato, não é uma coisa personalista. O que a própria ciência faz é discutir o trabalho. Então, é a ciência que um cientista faz, e é a ciência que o outro cientista faz, e isso, de fato, é passível de um crivo objetivo, e o consenso científico consegue fazer isso, inclusive nas questões que estavam sendo debatidas previamente na CPI, onde claramente havia um lado que tinha o respaldo da ciência e um outro que não tinha. Mas vamos adiante.
Boa parte dos representantes da constelação familiar que falaram aqui sugeriram que a gente levasse isso para um debate acadêmico, para a gente realizar mais pesquisas, para a gente trazer mais informações. Então, a minha sugestão é que, em vez de a gente fazer vários debates nesse ambiente - e eu tentei trazer um pouco da dificuldade de a gente debater ciência num ambiente que está discutindo políticas públicas -, a gente se propusesse a fazer um debate acadêmico então. Vamos trazer as pessoas para que a gente discuta no contexto adequado essas questões e vamos produzir documentos. Esses documentos vão ser lastreados por evidências, e aí, sim, a gente pode colocar essas coisas em nível de comparação, em que a gente está comparando argumentos de ambos os lados e, aí sim, chegando a um consenso. Eu já convido de antemão a um debate desse que a gente pode promover na academia, para o qual a gente pode chamar moderadores que sejam neutros e de mútuo acordo entre os dois lados, e a gente pode chegar à produção de documentos e fazer um debate científico em relação ao assunto.
E aí, dentro do debate acadêmico, uma coisa que é muitíssimo importante e consta de todo documento científico no qual alguém é financiado pela área em que está sendo realizada a pesquisa é a declaração de conflito de interesse. Então, quando a gente for ter esse debate acadêmico, seria muito importante que quem estiver se posicionando favoravelmente ou contra declarasse abertamente - só isso - se tem conflito interesse - inclusive, se for o caso, quanto e como ganha com a prática de constelação familiar. Isso não é juízo de mérito, isso não quer dizer que seja bom ou ruim: é uma abertura de declaração de interesse, porque é prática de boa ciência a pessoa indicar quais são os seus conflitos.
Foi aludido, em algum momento, que as pessoas que são críticas podem ser críticas por motivos de insegurança ou por motivos inconscientes - que eu estou imaginando aqui que poderiam ser até constelados, quem sabe? -, mas isso é característica de teorias sobretudo onde a crítica é patologizada e reinserida dentro do contexto da mesma teoria. Isso é clássico de pseudociência. Então, não é por insegurança ou motivos inconscientes que a gente está fazendo esse tipo de crítica; é por motivos objetivos que a gente consegue colocar no papel e demonstrar.
R
Puxando um outro ponto de algo que foi levantado, alma não é assunto de política pública; encantamento não é critério de análise. Estado laico é uma conquista civilizatória que a gente teve. Então, espiritualidade é uma questão de esfera privada. Então, se a gente tem um método científico que permite a vida moderna e em que existe um consenso de que, se a gente vai apertar o botão da luz, ele vai acender, o que está fora disso não cabe dentro de uma discussão que vá promover a criação de uma política pública, simplesmente porque o objeto que a gente está discutindo não é passível de escrutínio científico. Eu falo disso um pouquinho mais à frente.
E aí foi levantada a questão de que "ah, magnetismo, eletricidade, gravidade são coisas que não são visíveis a olho nu", mas, não sendo visíveis a olho nu, são observáveis, respeitam leis universais e são sujeitos, sim, a escrutínio científico. A gente consegue formular hipóteses de mundo em que esses fenômenos são consistentes e se repetem. Em constelação familiar, objeto de estudo, não há um consenso entre as próprias pessoas que estão apresentando. Ele é etéreo; não há, por impossibilidade de objeto, como fazer ciência produtiva em cima disso.
Já caminhando para o fim, porque eu imagino que esteja todo mundo bem cansado também, não é papel nem competência do Judiciário investigar seja dinâmicas familiares, desvelar motivações inconscientes de atos ou fazer recuperação de pessoas. Está fora do escopo do que o Judiciário deveria fazer, e, se está acontecendo hoje, está errado. E vamos fazer o possível para que isso não aconteça mais.
E ainda falando sobre o recorte necessário que existe, o crivo necessário para a gente adotar algo como política pública ou não, ciência é o melhor que a gente tem; senão, qualquer coisa vale. Então, exemplos esdrúxulos, mas que cabem no caso, como beber uísque, ter um pet, jogar tênis, são coisas que também fazem bem. Mas qualquer coisa que faz bem faz sentido que a gente discuta como política pública? Senão, a abertura é infinita. O recorte precisa existir. O melhor recorte que existe, que atenda à maior quantidade de pessoas e que cumpra à risca os princípios da administração pública é a ciência.
Foi trazido também como ponto importante a solicitação para que a gente entendesse inovações no Judiciário. Então, que a constelação familiar seria uma inovação e que não pode haver resistência à inovação. Eu acho que inovação no Judiciário brasileiro é a gente limitar as benesses infinitas da toga, é a gente criar mecanismos mais eficientes de tramitação processual, usando mecanismos eletrônicos mais eficientes, tornando o processo de tramitação, e seguindo exemplos bem-sucedidos no exterior de transformar a Justiça em célere e funcional, e não colocar técnicas que não têm respaldo técnico e científico nenhum em atuação antes que elas tenham sido debatidas à exaustão dentro da área científica.
Sobre Bert Hellinger, os contrapontos da constelação familiar foram feitos, no sentido de que o que ele escreveu precisa ser levado em contexto e nem tudo que está escrito lá representa exatamente o que é a constelação familiar, mas é meio contraditório que, se por um lado existe um culto à personalidade muito forte do Bert Hellinger, como o Tiago trouxe, por outro, existe esse descrédito a posicionamentos claros dele que são machistas, que relativizam estupro, incesto, que são racistas e que estão inseridos nas obras dele.
R
Então, não dá para, ao mesmo tempo, existir, quanto à personalidade, a relevância do guru que propõe o assunto e, por outro lado, relativizar, desqualificar falas que claramente têm esses apontamentos e que não podem ser lidas seletivamente, pinçando ali o que se quer e o que não se quer extrair dessa teoria.
Encerro falando que eu, como representante do Instituto Questão de Ciência, e nossa rede ampliada que está crescendo, de comunidade cética, de promoção do uso de evidências em políticas no Brasil, vamos lutar diuturnamente para que as Pics estejam fora de qualquer esfera pública, principalmente do Judiciário, que é onde a gente encontra hoje em dia de maneira mais disseminada.
Agradeço a oportunidade e me despeço.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - O.k., Paulo Almeida, nós é que agradecemos a sua participação. Ele, que é Diretor Executivo do Instituto Questão de Ciência, fez a sua exposição e as suas considerações finais aqui.
É importante a gente respeitar a opinião de todos, mesmo que discorde. Se foi feita uma afirmação, é uma opinião. Opinião todos nós temos, mas é muito claro dizer que nós não somos donos da verdade. Então, você desconsiderar, como nós vivenciamos aqui ultimamente, até em respeito às pessoas que estão participando, posicionamentos científicos de pessoas que estudaram o assunto não me parece algo razoável, porque eu acho que a ciência caminha junto, e ninguém pode definir o que é e o que não é. A gente precisa ter métodos, claro. Eu acho que nós vamos cada vez mais avançar, chamar novos atores aqui. Foi muito bem colocada a presença de outros organismos, como o Ministério Público, que nós precisamos chamar, e o próprio Ministério da Saúde. É importante esse passo. Que os tenhamos aqui para colocar e outras autoridades que queiram, de alguma forma, se manifestar. Eu acho que está aberto esse debate. E é importante que ele haja, para a gente não ficar nos subterfúgios do assunto e não o encarar de frente.
Então, eu quero passar a palavra agora, dentro da sequência que a gente combinou, para o senhor... O Sr. Décio não está conectado. Então, nós teremos o Mateus. E o tempo, Mateus, do Décio, que seriam sete minutos, você pode utilizar, está certo?
E, por fim, o tempo restante, já que a Sophie não pôde participar e outros palestrantes favoráveis à constelação familiar, a Germana, que está aqui presente, vai utilizar. Está bom?
Obrigado.
O SR. MATEUS SANTOS (Para expor.) - Então, agradeço a oportunidade ao senhor, Senador Girão, e agradeço a todos a presença.
Vejo como muito benéfica essa discussão, porque mais uma vez demonstra o quanto nós, enquanto seres humanos, ainda temos para crescer. Houve falas que, em algum momento, me deixaram um pouco consternado, porque, na comunicação, a gente precisa ter muito cuidado com distorções, com suposições, generalizações e deleções, porque, em uma fala de dez minutos, uma pessoa pressupor o que que eu conheço ou deixo de conhecer é muita presunção. Vamos com calma! É importante a gente se conhecer para saber o que que eu conheço.
R
Eu não vou mostrar em dez minutos o que eu estudo há 17 anos. E eu nem faço essa presunção a respeito das pessoas. E, dentro disso, eu acho interessante o que o Dr. Marcelo falou, professor, a respeito de que as falas que foram feitas foram fatos. Todas as falas, quando imbuídas de narrativas, são histórias contadas e têm, dentro de si, o viés da consciência e da mente de cada um, dos valores. Isso não consegue ser atrelado. A observação científica de resultados pode ser mensurada, sim, mas nós sabemos que existem pesquisas em que o olhar de interpretação de quem analisa o resultado tem diferença. Nós sabemos que há pesquisa assim. Então, dizer que a fala de cada um aqui são fatos também é uma pressuposição. É uma presunção. É preciso haver cuidado dos dois lados.
Eu acho que eu preciso melhorar minha comunicação, porque eu não fui claro em algumas coisas dentro da fala do que falaram, porque eu não disse que o Big Bang é só uma teoria; eu disse que é uma teoria; porque eu dizer só uma teoria parece que eu estou depreciando uma coisa tão grandiosa. E aí a pessoa ouve do jeito que ela quer e fala assim com um tom de superioridade, dizendo que a ciência não pode ser contestada. E, olha, eu também me considero um cientista e acho que a contestação da ciência é fundamental para a evolução.
Fatos não podem ser contestados? Podem. E, aí, uma coisa que o Tiago falou que me chamou a atenção foi do consenso na medicina. Eu não sei que medicina que ele conhece. A medicina que eu conheço é diferente, porque é a medicina que se pratica no dia a dia. E não há consenso nem para pressão arterial que ele diz que há; não há, porque existem medicações diferentes que se adaptam a cada pessoa. Agora, a quantidade de pressão, quanto é que tem também não há consenso, porque cada pessoa se adapta de um jeito. A pressão arterial varia de cada ser humano para sentir bem ou não. E ainda há algumas variáveis, que seriam se a carótida tem oclusão ou não, se o coração... Há diversas variáveis.
Então, assim, me consternou e me senti, assim, que preciso melhorar, preciso melhorar minha clareza na minha fala.
E o pedido de união para que a gente pesquise não foi no sentido de sentir que a constelação é fraca ou precisa de defesa, não é isso; é dizer que vamos olhar junto para a nossa população. Existe aí uma ferramenta. Pode ser que o campo não exista, talvez o campo não exista, mas talvez a gente não tenha medida suficiente ou não tenha um instrumento para medir ainda, como aconteceu com o magnetismo, que foi falado: "Ah, nós podemos comprovar hoje". Hoje se pode comprovar. Mas porque se pode comprovar hoje quer dizer que nunca existiu ou só existiu a partir do momento que nós pudemos comprovar? Então, são coisas que chegam a ser filosóficas.
E acho que a nossa postura diante disso precisa ser centrada e respeitosa com cada um, porque nós somos aqui adultos, humanos, profissionais. Como eu disse, eu não vou aplicar um charlatanismo numa pessoa para tirar dinheiro dela. E aí eu me sinto ofendido numa fala desse tipo, porque parece que, assim, está atacando a minha inteligência, que é uma coisa que eu também prezo tanto quanto alguns dos senhores que eu vi falando aqui. E eu respeito a inteligência de vocês e reconheço isso. Então, por isso que eu estou chamando a atenção nesses assuntos, porque eu acho que o caminho de unir e esclarecer não é atacar e defender, é justamente trazer uma hipótese, uma tese, uma antítese, e assim a gente construir o conhecimento lá do tempo dos gregos.
R
Então, são pensamentos que me vieram durante essas falas e que eu deixo aqui ressaltados, porque, ao ouvir dessa forma, para mim, isso também já é... Olha só como a narrativa é importante, não são fatos, mas é como eu escuto: para mim também há um viés ideológico aí, e aí se perde a função de ciência.
Então, os senhores, que se autodenominam como os... Falaram assim: "Nós, da ciência". Se vocês são da ciência, eu não sou? Porque parece que a constelação está indo contra. Calma aí. Vamos nos conhecer, não é? Esse derradeiro que falou, Paulo, eu o senti muito centrado, muito esclarecido. Eu sei que ele tem aí um embate de querer diminuir ou retirar as PICs, mas vamos lá, vamos conhecer, porque o que a gente conhece hoje pode ser que não seja o suficiente para o que se conheça amanhã. Isso já aconteceu tantas vezes dentro do mundo acadêmico, de coisas serem execradas e, lá na frente, serem reconhecidas, e hoje há um monumento à pessoa, um monumento reconhecendo a pessoa.
Então, vamos investigar. Esta é a postura científica. Vamos investigar, e não refutar sem ter embasamento científico a não ser denúncias, que, quando contadas aqui, são anedotas. São denúncias lá, mas aqui são anedotas.
Então, são pontos que eu acho muito importantes de a gente esclarecer, porque, quando essas falas são faladas assim, com tanta emoção, e alguns assim, com um aspecto tão... com uma boa oratória, que merece respeito, parece que desvaloriza aquilo que a gente está dizendo, e eu não vejo cabimento para isso aqui, neste âmbito, porque o dia de hoje não foi para discutir a inclusão das constelações familiares na política pública, foi para ouvir o que que são as constelações familiares, e eu nem consegui falar, porque eu estou tendo que esclarecer outras coisas dentro dos próprios vieses daqueles que falaram contra. Então, assim... Vocês têm meu respeito.
E aí eu destaco aqui uma frase de um físico chamado Freeman Dyson, que morreu em 1996, é um físico: "Sou relutante em entrar em discussões do significado da teoria quântica porque vejo que os experts dessa área têm uma tendência de falar com uma certeza dogmática, cada um deles convencido de que uma solução particular do problema tem a alegação de ser a última verdade. E, como físico, sou muito mais impressionado por nossa ignorância do que por nosso conhecimento".
Isso é uma coisa muito forte. Eu tinha trazido, mas não tinha objetivo de usar, mas eu quero trazer isso em relação à constelação também, porque eu sou muito mais impressionado pela nossa ignorância do que pelo nosso conhecimento. Só que não é por isso que eu estou desvalorizando. Eu acho que nós temos que construir. E não é porque a gente não conhece tanto que isso perde o valor, entende?
E há mais uma fala aqui, de um outro físico chamado Andrei Linde, que é professor de Física de Stanford. Ele tem alguns livros. E ele diz assim: "O atual modelo científico das leis da física no mundo material é tão bem-sucedido que nós esquecemos o ponto inicial, como observadores conscientes, e concluímos que a matéria é a única realidade e que a percepção só serve para descrever a realidade, mas, em fato, nós estamos substituindo a realidade da experiência do nosso universo pela concepção de que nós podemos tentar viver independentemente de um mundo material existente. É possível que a consciência, da mesma forma que o tempo e o espaço, tenha seus próprios gradientes da liberdade intrínseca? Negligenciar isso pode levar a uma descrição de que o universo é fundamental incompleto?" Olhem só um ponto em que nós podemos ter a concepção... Será que esse universo é realmente incompleto? E a importância da consciência. E isto é uma das bases da constelação: a investigação da consciência. Qual é a função da consciência no sistema familiar, no indivíduo, nas relações humanas? É fundamental perceber a importância do ser relacional, que pode ser medido... Grato, eu não sabia disso, aprendi algo novo hoje. Quero conversar com você a respeito disto de medir algumas coisas, que são importantes. E perceber... Isso em terapia comportamental, no conhecimento da necessidade das relações humanas dentro do comportamento, do fortalecimento da psique do indivíduo, é fundamental.
R
E as constelações familiares também estão a serviço do mesmo sentido, só que numa outra abordagem, que elas podem, sim, encontrar e fortalecer.
Eu estudo algumas linhas e vejo, sim, que há coisas que se misturam com a psicologia, que tocam a psicologia. E eu admiro a psicologia, não só porque a minha mãe é psicóloga e é junguiana... E eu não sei o quanto isso tem de pseudociência, mas ali há algumas abordagens interessantes do inconsciente. O inconsciente é algo que ainda não se consegue medir, ele só é estudado. Ainda não conhecemos quase nada do inconsciente, mas ele existe. E é possível experimentá-lo quando a gente está dirigindo, por exemplo, vê o tempo passar e, de repente, se vê em outro lugar. Onde é que a gente estava? É uma das manifestações do inconsciente.
São coisas que a gente pode conhecer, o que depende de nós mesmos, enquanto cidadãos brasileiros, nos unirmos não contra uma coisa ou outra, mas a favor do desenvolvimento da ciência, do conhecimento. A ciência não no sentido cartesiano - que foi colocado como se fosse uma coisa destacada, mas existe -, mas a ciência no sentido do conjunto de conhecimentos que é desenvolvido desde que o ser humano existe.
Muito grato a todos, grato pela oportunidade.
E eu desejo que todas essas falas tenham soado com respeito, porque esse é o meu objetivo.
Forte abraço.
Até a próxima.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito bem. É isso aí. Muito obrigado, Mateus Santos, que é biomédico. Muito obrigado pela sua participação, por estar aqui conosco nesta sessão.
Eu queria só fazer um esclarecimento aqui que é sobre a questão do Estado laico. A gente tem que ter muito cuidado, porque muita gente, às vezes, não tem conhecimento e pode interpretar a coisa como narrativa. Hoje, a gente vive numa guerra de narrativas muito grande. A gente está procurando aqui ser o mais objetivo possível dentro de uma realidade. Então, o Estado laico é aquele que não adota religião oficial, mas que promove liberdade religiosa e protege igualmente aqueles que não optarem por nenhuma crença. Então é muito importante dizer que este assunto aqui tem zero de religião, não sei por que alguns se manifestaram com "estado laico, estado laico...". A gente não vê aqui... A gente vê uma técnica, uma técnica que não é nem do Brasil, que foi desenvolvida na Europa e que hoje está em vários países. É uma técnica, é uma ferramenta que não tem base religiosa nenhuma, pelo menos é assim pelo que ouvi aqui de quem a defende; eu não vi ninguém defendendo argumento religioso aqui neste recinto. Então a gente precisa... Às vezes a questão ideológica acaba ofuscando o debate, neste assunto e em outros também a gente vê essa questão ideológica acabando por confundir as pessoas que estão aí. Então, estamos aqui muito centrados.
R
Eu passo, para encerrar as falas antes do fim deste evento, à Germana Magalhães Carsten, dentro da divisão que a própria assessoria da Comissão de Assuntos Sociais fez. Como faltaram vários, a gente compensou o tempo, e a Germana vai falar por sete minutos.
Está bem assim, Germana? Você, que está desde o início, faça a sua participação. Muito obrigado por estar aqui conosco.
A SRA. GERMANA MAGALHÃES CARSTEN (Para expor.) - Eu, primeiro, peço desculpas se eu não conseguir ser muito clara, porque às 16h25 sem almoço... (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Eu acho que o seu microfone não está aberto. Tem que falar mais próximo aqui... Isso, obrigado, Germana.
A SRA. GERMANA MAGALHÃES CARSTEN - Então, eu estava dizendo, Sr. Senador, Excelência, que eu não sei se minhas ideias vão ser muito claras, porque, às 16h25min sem almoço... Eu acredito que aqui ninguém esteja fisicamente na sua maior vitalidade para poder discorrer sobre algo, mas isso demonstra, com grande alegria, que hoje é um momento de celebração, Senador, e muito me alegra que novamente esteja eu diante de ti numa frente do bem, do bom, do belo, por valores nobres, como estivemos na luta, neste mesmo lugar, contra a aprovação do aborto. Então, como eu vejo, V. Exa. está sempre no lugar certo, na hora certa, conduzindo os assuntos que são essenciais para a vida.
Eu peço desculpas aos cientistas, porque eu vim aqui pra falar de constelação familiar, eu realmente não sabia que a gente teria aqui os eméritos cientistas falando. Nossa, que aula, que aprendizado! Falaram de vários métodos aí, e eu me senti enriquecida e, ao mesmo tempo, ignorante. Sou ignorante quanto a tudo o que foi dito aqui em termos de métodos e fiquei encantada com o companheiro que está ao seu lado - desculpem, o nome dele é... Mateus!
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. GERMANA MAGALHÃES CARSTEN - É o...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. GERMANA MAGALHÃES CARSTEN - Ah, o Daniel Gontijo. Desculpem, mas é que foram tantos nomes citados, não é? Quando a gente chega aos 61, a memória não está tão perceptiva.
Ele citou aí experiências fantásticas que podem medir a emoção, a alma. Olha, meu amigo, eu não sou uma cientista, mas eu busco, faço votos e peço passagem para a ciência. Que ela encontre um método, uma forma de fazer uma tomografia que diga onde está o inconsciente, onde está a consciência, onde está a alma. Que ela possa fazer uma tomografia de uma pessoa que sai de um campo da constelação reluzente; entrou como um zumbi, parecendo que não tinha uma energia na alma, e saiu alegre, feliz e nos manda um relato imenso sobre a alegria do que ela viveu. Ó, que a ciência chegue lá. Que a ciência possa fazer essa tomografia, para que a gente possa dar para todos os cientistas que aqui falaram e todos os outros do mundo uma comprovação do que a gente não pode tocar, do que a gente não pode segurar, do que a gente não pode medir. E falaram aqui em pesquisas qualitativas e quantitativas. Que venham elas! Que se sentem ao lado do Sami humildemente, como todo cientista deve ser, humilde, porque o cientista tem que ser humilde, tem que começar a olhar para aquilo e falar: "O que mesmo há aqui?". Eu preciso de ver o que está acontecendo nisso aqui e que eu não compreendo, que não cabe lá na cama de Procusto, da mitologia grega, que cortava a cabeça e os pés para caber naquela cama. Que o cientista venha com humildade, olhe com benevolência, se sente ao lado do Sami e de todos juízes e fique ali: como foi para você? E pesquise, e faça questionário, e use os métodos que quiser até ser aberto a um novo método, porque talvez as constelações familiares, como tantas outras, estejam exigindo que exista um método novo que possa medir esse elemento chamado alma, que possa falar, Daniel, do que a gente sente quando sai de uma constelação, quando está constelado e, dois anos depois de quando a gente constelou, do movimento que nos levou até lá. A gente vê com clareza aquilo que nos levou, que nós chamamos de emaranhado, àquele momento de constelar e, dois anos depois, quem nós nos tornamos. Sim, sim! Temos, sim!
R
Por isso que eu digo que nós temos que celebrar este momento, porque há um sábio que disse: "A força contrária a uma ideia é proporcional à sua importância". Essa força que eu estou presenciando aqui é tão forte. Vieram tantas ideias maravilhosas dos cientistas e daqueles outros que falaram aqui, que mostram o quanto a constelação tem força, porque senão não teria esse contraditório.
Então, que possamos... E peço desculpas ao cientista que aqui falou que é pobre a gente citar pessoas, mas, sinto muito, eu vou ter que, sim, citar Bert Hellinger. Eu sou consteladora, eu não sou uma cientista. E ele um dia disse, quando perguntaram para ele: "Bert, o que significa para você viver essas experiências?". Ele falou: "O que mais me move é unir o que estava separado". O que é esta sessão aqui, Senador, senão unir o que estava separado, aqueles que são contraditórios com aqueles que encontram um caminho que faz sentido ao essencial da alma? Estamos unidos. Então, podemos dizer que Bert Hellinger aqui estaria muito feliz, contente, porque estamos unindo o que estava separado.
R
Com certeza, Senador, por este movimento que hoje o senhor inicia, nós chegaremos a algo que vai nos mover para algo maior, para algo muito melhor do que onde nós estávamos. Então, aqui a gente tem que celebrar este momento.
Que possamos permitir que realmente continue dentro das varas de família e que observem o que está acontecendo lá. Com certeza, não teremos 4 mil pessoas falando contra; talvez teremos 6 mil, 7 mil falando a favor. Que possamos agora realmente registrar, para que estatisticamente se prove o que a gente vem vivendo há tantos anos.
Obrigada. Agradeço todos os colegas.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Germana Carsten. É bom reencontrá-la aqui. A gente, em momentos anteriores, em outras causas, à luz da ciência e de estatísticas sociais, como na questão do aborto, em que, a cada dia que passa, cientificamente, mostra que a vida começa na concepção - com 18 dias, o coração batendo -, mostra que não é só aquele bebê que é eliminado, mas que a mulher que pratica o aborto fica com consequências, com sequelas de ordem emocional, psicológica, mental e física. A ciência vem mostrando isso. Quando a gente discutia isso, há 15 anos, 20 anos, nesta Casa, diziam: "Ah, esses são fundamentalistas; não têm base nenhuma na ciência; isso é de cunho religioso". Hoje e a cada dia que passa, com o avanço da ciência, vemos criança com 24 semanas nascer, prematuramente - e com 24 semanas o aborto foi legalizado na Colômbia! -, e conseguir sobreviver a um parto prematuro, com 24 semanas. Isso é realmente interessante.
Essa sua fala me lembrou muito aquele debate - quem tiver curiosidade assista -, que é muito marcante, entre o materialista e o Dr. Bezerra de Menezes, há dois séculos, um grande humanista e pacifista brasileiro, um dos responsáveis pela abolição da escravatura, que estava naquele momento ali do Brasil Império. É muito marcante aquele debate entre os dois naquela época.
Fico muito feliz com a participação de todos aqui, dos contrários e também dos favoráveis. Acho que foi um momento de aprendizado mútuo. Eu aprendi muito aqui com os dois lados. E fico muito feliz de a gente ter dado esse pontapé aqui no Congresso Nacional. Parece que é um assunto em que, de uma certa forma, havia um tabu. E a gente tem que cumprir o nosso papel aqui com todas as nossas limitações e imperfeições, que são muitas. Eu considero que tenho muitas limitações e imperfeições, que procuro melhorar a cada dia, mas a gente tem que trabalhar no limite das nossas forças para seguir o caminho, buscar a verdade.
R
Até há uma frase aqui que a Erydan enviou para mim, no WhatsApp, em que ela diz o seguinte: "Toda verdade passa por três estágios. No primeiro, ela é ridicularizada. No segundo, é rejeitada com violência. No terceiro, é aceita como evidente por si própria".
Então, eu agradeço mais uma vez a presença de todos que palestraram conosco e declaro essa sessão, depois de seis horas... Olhem só, a gente não imaginava que fosse tanto, seis horas, hein?
Eu declaro encerrado este momento. Que depois a gente possa fazer outros!
Muito obrigado. Tudo de bom!
(Iniciada às 10 horas e 36 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 39 minutos.)