Notas Taquigráficas
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| R | A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO. Fala da Presidência.) - Bom dia a todos. Declaro aberta a 3ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da 4ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura. A presente audiência pública tem como objetivo receber como convidado o Exmo. Sr. Ministro de Estado das Relações Exteriores, Carlos Alberto Franco França, acompanhado do Senador Collor de Melo, que foi fazer a recepção - por favor, Embaixador - para prestar informações no âmbito de suas competências, conforme disposto no art. 103, §2º, do Regimento Interno, em atendimento ao Requerimento nº 2, de 2022, da CRE, de minha autoria, aprovado no dia 24 de março último. |
| R | Quero agradecer a presença dos Srs. Senadores e Senadoras, cumprimentar e dar bom dia ao e-Cidadania, a todos aqueles que estão nos acompanhando. É uma das Comissões com maior audiência na Casa, isso nos alegra muito. A reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados, por meio do Portal e-Cidadania, na internet, em senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria 0800 0612211. Quero registrar a presença - e agradecer-lhes - de todo o corpo diplomático, todos os que acompanham o nosso Chanceler. Esclareço a todos as diretrizes que seguiremos. Inicialmente, será dada a palavra ao Exmo. Sr. Ministro, pelo tempo que julgar necessário, para a sua exposição inicial. Em seguida, abriremos a fase de interpelações pelas Sras. Senadoras e Srs. Senadores inscritos, pelo prazo de cinco minutos, em bloco de até cinco interpelantes. O Embaixador terá, em seguida, o prazo de cinco minutos para a resposta. Poderá ser concedida réplica e tréplica. Dando continuidade à iniciativa de um debate em torno da crise da Ucrânia, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional tem o prazer de receber hoje o Ministro de Estado das Relações Exteriores, Embaixador Carlos França. Na verdade, não é crise da Ucrânia; hoje é uma crise do mundo inteiro, que reflete no mundo inteiro. Quero relembrar que o Senado Federal é, por sua própria natureza, um espaço democrático e plural, onde convivem diferentes vozes e opiniões. Tenho muita satisfação em dizer que a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional cultiva e respeita essas diferenças, que são parte integrante de nosso convívio democrático. O objetivo desta sessão é o de acrescentar elementos que permitam à sociedade brasileira ampliar a compreensão das questões em jogo, levando em conta as perspectivas e preocupações de cada uma das partes envolvidas e dos interesses nacionais. Ontem tivemos o Embaixador da Federação Russa e, logo mais à tarde, na parte da tarde, ainda hoje, teremos o Encarregado de Negócios da Ucrânia, apenas para esclarecer àqueles que nos seguem no e-Cidadania que nós não temos a figura do embaixador da Ucrânia no Brasil. Nesse caso, quando não há o embaixador, é sempre o encarregado de negócios que representa a embaixada, assim como a Embaixada dos Estados Unidos também ainda não tem embaixador e está representada pelo encarregado de negócios. Observo com satisfação que o Executivo e o Legislativo brasileiro apresentam visões estritamente convergentes em defesa do cessar fogo imediato e de negociações que conduzam a uma paz duradoura e sustentável. Em pleno século XXI, nenhum motivo pode justificar uma guerra. Em que pesem todas as diferenças, só há espaço para que prevaleça a diplomacia e o diálogo como mecanismos de solução de controvérsias. A morte de populações civis e indefesas, crises humanitárias e ameaças à paz e à segurança internacional são intoleráveis nos dias de hoje. De igual, a ação dos estados no concerto das nações deve ser pautada em favor do desenvolvimento econômico, da busca da prosperidade com justiça social, do fortalecimento da segurança alimentar e do pleno funcionamento dos setores financeiros e de serviços. |
| R | Esperamos que durante esta sessão o Ministro de Estado das Relações Exteriores possa nos trazer informações atualizadas sobre as negociações pela paz e sobre a maneira como o Brasil se associa a essas negociações, sobre a retirada e o apoio a cidadãos brasileiros da região, sobre outras ações de ajuda humanitária e sobre os impactos econômicos que essa crise impõe ao nosso país. Mais uma vez, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional cumpre com empenho sua missão de proporcionar debates que melhor informem brasileiros e brasileiras, permitindo, assim, o bom fluxo de informações sobre os mais importantes acontecimentos do mundo, mas que são de interesse de todos. Bom debate! Dando continuidade, concedo a palavra ao Exmo. Sr. Carlos Alberto Franco França, Ministro de Estado das Relações Exteriores, pelo tempo que julgar necessário. Com a palavra, Embaixador. O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA (Para expor.) - Muito obrigado, Presidente Kátia Abreu, Senadora Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal. Cumprimento também aqui, na pessoa do Presidente Fernando Collor de Mello e do Senador Esperidião Amin, os Senadores e as Senadoras que integram esta Comissão. Agradeço também aos diplomatas que aqui estão presentes. Eu o faço em nome do Ministro Paulo Uchôa, que agora integra os quadros da Comissão, e do nosso Embaixador Bruno Bath, Assessor de Relações Federativas e Parlamentares do Itamaraty - se o nome não for esse exatamente é porque eu ainda não decorei o novo organograma que foi anunciado no dia 31 de março e que entra em vigor no dia 20 de abril, Dia do Diplomata. Antes de mais nada, eu gostaria de agradecer o convite para falar novamente na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal. Esta sessão praticamente coincide com o transcurso de um ano de minha gestão no Ministério das Relações Exteriores após o honroso convite do Presidente Bolsonaro e também de minha primeira visita a esta Comissão na qualidade de Chanceler. Se meu calendário estiver certo, hoje realmente faz um ano que tomei posse e acho que a primeira visita aqui foi no dia 25 de maio - posso estar enganado, mas acho que foi em 25 de maio, portanto há cerca de um ano. Antes de passar aos temas que motivaram minha vinda hoje a esta Casa, eu não poderia deixar de aproveitar a oportunidade para fazer um breve balanço desses doze meses em que tive a honra de estar à frente do Itamaraty. O diálogo permanente entre o Itamaraty e o Congresso Nacional é essencial, sobretudo com esta Comissão. Esta é a quarta vez que me dirijo a esta Casa, com a qual eu tenho mantido interlocução constante e muito proveitosa. Proveitosa não apenas para a formulação da política externa, que deve responder aos anseios e necessidades da sociedade brasileira, mas também para o Ministério das Relações Exteriores como instituição do Estado brasileiro. Como todos sabemos, esses últimos doze meses foram um período particularmente desafiador para o mundo e, naturalmente, também para o Brasil. Como indiquei em meu discurso de posse, o Presidente Bolsonaro instruiu-me a enfrentar três urgências internacionais, de ordem sanitária, de ordem econômica e de ordem climática. Em suma, tivemos que concentrar nossos esforços no combate à pandemia de covid-19, na promoção da recuperação da atividade econômica e nas questões relativas ao desenvolvimento sustentável. A esse contexto, por si só desafiador, vieram somar-se mais recentemente os desafios resultantes da crise na Ucrânia, com todos os seus impactos geopolíticos, econômicos e humanitários. |
| R | Apesar dessa conjuntura excepcional em que vivemos, o Governo brasileiro foi capaz de mobilizar recursos diplomáticos, econômicos e humanos de maneira a responder a esses desafios com êxito em benefício do Brasil e dos brasileiros. Eu me permito registrar, Presidente Kátia Abreu, Sras. e Srs. Senadores, algumas das principais realizações do Brasil neste período, muitas das quais com o concurso e apoio direto desta Casa e muito especialmente desta Comissão. Por meio da diplomacia da saúde, trabalhamos para assegurar, junto a atores centrais das cadeias de produção de vacinas, como China, Estados Unidos, Índia e Reino Unido, o fornecimento de imunizantes e ingredientes farmacêuticos ativos (IFAs). Tais insumos foram essenciais para a bem-sucedida campanha de vacinação da população brasileira que está hoje entre as que apresentam maiores taxas de imunização no mundo. Em paralelo, envidamos esforços, no âmbito da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Organização Mundial do Comércio (OMC), para aprimorar as suas capacidades e para remover barreiras ao comércio de imunizantes e insumos. Ao mesmo tempo, coube à Agência Brasileira de Cooperação (ABC) do Ministério das Relações Exteriores coordenar a recepção pelo Brasil de doações internacionais para o combate à pandemia - equipamentos, medicamentos, vacinas e insumos - em benefício do SUS e de estados e municípios. A ABC também administrou as doações do Brasil a mais de 20 países da América Latina, África e Ásia, em linha com a nossa tradição de cooperação humanitária e de solidariedade no enfrentamento de emergências globais. No âmbito de nossa diplomacia econômica, eu destacaria, em primeiro lugar, o convite formalizado em janeiro último pela OCDE para que iniciemos o processo de adesão à organização, uma das prioridades da política externa do Presidente Jair Bolsonaro. Trata-se, sem sombra de dúvida, de passo de grande significado que confirma as credenciais diplomáticas e econômicas do país e ratifica o nosso compromisso com os princípios do livre mercado, os nossos objetivos de modernização econômica e os nossos valores de fortalecimento da democracia e da proteção do meio ambiente e dos direitos humanos. No G20 e na Organização Mundial do Comércio, defendemos o fortalecimento do sistema multilateral de comércio mediante a valorização dos três pilares da OMC: negociações, solução de controvérsias, monitoramento e transparência. Temos nos empenhado pela adoção de normas mais rígidas contra medidas de caráter protecionista e contra subsídios distorcivos ao comércio de bens agrícolas, bem como pela adoção de acordos de facilitação de investimentos, entre outros. Em nossa região, empreendemos o esforço de modernizar o Mercosul por meio de redução gradativa da Tarifa Externa Comum (TEC) e da celebração de novos instrumentos que aumentarão a previsibilidade e a segurança jurídica nas transações entre os parceiros do bloco. No Brics, que esteve sob a Presidência da Índia em 2021, o Brasil teve participação ativa e contribuiu para os principais resultados alcançados no período, dentre os quais se destacam a ampliação do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), além de outros avanços em áreas como cooperação em saúde, contraterrorismo e ciência e tecnologia. Nas nossas relações com a Ásia, que têm passado por um processo de expansão, formalizamos, no ano passado, nossa adesão ao Banco Asiático de Investimentos em Infraestrutura (AIIB, na sigla inglês). |
| R | Trata-se de uma instituição financeira com forte potencial para ampliar a carteira de investimentos no Brasil, sobretudo na área de conectividade física. Apresentamos, ademais, nossa candidatura a parceiro de diálogo setorial com a Asean (Associação das Nações do Sudeste Asiático). No caso das relações com a China, principal destino de nossas exportações, trabalhamos conjuntamente com os parceiros chineses para adotar um novo plano estratégico que oriente as relações bilaterais nos próximos dez anos e o novo plano executivo, que serão aprovados na próxima reunião plenária da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (Cosban), programada, em princípio, para o primeiro semestre deste ano. As visitas do Senhor Presidente da República em novembro de 2021 aos Emirados Árabes Unidos, Catar e Bahrein constituíram um marco importante no estreitamento das relações bilaterais com os países do Golfo. O foco da visita não foi apenas comércio e investimentos: incluiu também novas frentes de cooperação, como defesa, energia, agricultura, ciência, tecnologia e inovação. Marcamos presença ativa na Expo Dubai, o maior evento do planeta em termos de duração e de público, encerrado na semana passada. O pavilhão do Brasil, pelo qual passaram cerca de 2,5 milhões de visitantes, mostrou ao mundo um país moderno, aberto, sustentável e pleno de potencialidades. Estima-se que a agenda de negócios coordenada pela ApexBrasil resulte em US$500 milhões em exportações, US$10 bilhões em investimentos estrangeiros e na geração e na manutenção de 120 mil empregos diretos. Na terceira urgência de nossa atuação externa, a do desenvolvimento sustentável, devo destacar ativa participação do Brasil na COP 26, em novembro passado, que representou um marco importante para o regime multilateral de mudança do clima. Na ocasião, anunciamos a determinação de levar a ambição dos nossos compromissos em matéria climática: antecipamos de 2060 para 2050 a nossa meta de neutralidade de carbono; elevamos de 43% para 50% a nossa Contribuição Nacionalmente Determinada (iNDC) até 2030; aceleramos em dois anos, de 2030 para 2028, nossa meta de eliminação do desmatamento ilegal; e nos somamos ao compromisso global para redução das emissões de metano, bem como à Declaração sobre Florestas e Uso da Terra. Eu até me permitiria, Presidente Kátia Abreu, aqui fazer o registro da contribuição: tudo isso aconteceu graças ao trabalho feito pelo Presidente Fernando Collor de Mello em 1992, quando permitiu que o Brasil lançasse na Conferência do Rio o conceito de desenvolvimento sustentável. Nossa estrada começou ali, Presidente. E também, ao ler aqui e falar da antecipação da nossa meta de Contribuição Nacionalmente Determinada, me lembro muito, Presidente Kátia Abreu, dos inúmeros telefonemas que recebi de V. Exa., sempre muito preocupada com essa questão, dando uma contribuição muito positiva do Congresso ao Executivo na formulação dessas políticas. Saiba que a voz da senhora foi sempre muito ouvida pela minha casa, pelo Ministério do Meio Ambiente, pelo Ministério da Agricultura. Sras. Senadoras e Srs. Senadores, embora o combate à pandemia, a recuperação econômica e o desenvolvimento sustentável tenham estado no topo das prioridades de nossa agenda externa neste último ano, outros temas continuaram ou passaram a ser relevantes para a nossa política externa. |
| R | Destaco, nesse contexto, a eleição do Brasil, com votação expressiva, para assento não permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas no biênio 2022/2023, e eleições que foram realizadas na Assembleia Geral em junho de 2021. A eleição, eu penso, é fruto do reconhecimento das credenciais do Brasil como ator relevante do sistema internacional e de nossa histórica contribuição para a manutenção da paz e da segurança internacionais. A nossa presença desde 1º de janeiro deste ano no principal órgão das Nações Unidas para a paz e a segurança internacionais nos dá, mais uma vez, a oportunidade de contribuir com nossa voz, nossos princípios e nossa visão de mundo frente a uma das mais graves crises do passado recente, sempre em favor de um encaminhamento negociado e da solução pacífica de conflitos, conforme preconizado em nossa Constituição Federal. Ainda sobre a nossa presença em organismos multilaterais, logramos eleger candidatos brasileiros para importantes cargos: o Dr. Rodrigo Mudrovitsch, como Juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos, foi o candidato mais votado; o Embaixador Santiago Mourão para a Presidência da Conferência-Geral da Unesco; e o Prof. George Galindo, Consultor Jurídico do Ministério das Relações Exteriores, como membro da Comissão de Direito Internacional da ONU. No campo dos direitos humanos, além da eleição à Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Brasil ratificou a Convenção Interamericana contra o Racismo, contra a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância da OEA, em cuja elaboração tivemos papel destacado. Também aderimos à Aliança Internacional em Memória do Holocausto, num sinal inequívoco de nosso compromisso com o combate a todas as formas de racismo, intolerância e xenofobia, inclusive o antissemitismo. Gostaria de dizer uma palavra muito especialmente sobre a prestação de serviços às nossas comunidades no exterior, pilar fundamental do Serviço Exterior Brasileiro. Neste período recente, iniciamos a implementação do e-consular, plataforma que permite o atendimento totalmente digital em 75 embaixadas e consulados. Além dessa inovação, que trouxe sensível melhora nos serviços prestados a nossos concidadãos, estamos ampliando nossa rede de postos consulares com abertura dos consulados-gerais em Edimburgo, na Escócia, em Chengdu, no centro da China, em Marselha, no sul da França, e dos vice-consulados em Orlando, nos Estados Unidos, e Cusco, no Peru, além da embaixada em Manama, no Bahrein, esta última já em pleno funcionamento. Sei da atenção muito especial que os membros desta Comissão dedicam ao fortalecimento institucional do Ministério das Relações Exteriores e agradeço o empenho de todos, de cada um das Sras. Senadoras e Srs. Senadores pelo nosso Itamaraty. Por esse motivo, eu desejo registrar neste breve balanço alguns dos importantes avanços na gestão e na modernização do Ministério. O objetivo tem sido não apenas conferir maior eficácia à nossa atuação em todas as nossas vertentes de ação, mas também proporcionar melhores condições de trabalho aos membros do Serviço Exterior Brasileiro. A maioria dessas realizações, eu devo frisar, não teria sido possível sem o decidido apoio do Congresso Nacional, sem o apoio que recebi também do Ministro Ciro Nogueira, da Casa Civil. |
| R | Sem querer ser exaustivo, eu me permito citar: - a recomposição do orçamento do ministério, que permitirá uma melhor atenção às comunidades brasileiras no exterior; - a organização de ações de promoção comercial, investimentos e cultura; - o fortalecimento da cooperação técnica e da assistência humanitária; - a reformulação de nossa estrutura organizacional, com a recriação do importante Departamento de Promoção Comercial, com o reforço da área de mudança do clima, com a criação do Instituto Guimarães Rosa, que congregará todas as ações culturais do Itamaraty, numa justa homenagem ao grande escritor e extraordinário diplomata, e com a reorganização de nossa unidade de Planejamento Diplomático, responsável pela reflexão estratégica, fundamental neste contexto de grandes transformações da ordem internacional; - a reforma do Palácio Itamaraty, no Rio de Janeiro, que é um inestimável exemplo de nosso patrimônio histórico e artístico nacional; e - a reestruturação da carreira diplomática, que permitirá superar gargalos persistentes na progressão funcional. Nesse particular, eu gostaria de registrar o empenho do Secretário-Geral das Relações Exteriores, o Embaixador Fernando Simas Magalhães, e, por intermédio dele, o de toda a área de administração do Itamaraty nesse esforço de reorganização de nossa casa. Devo até dizer, Presidente Kátia Abreu, que, ontem, à noite, eu falei com o Secretário-Geral, o Embaixador Fernando Simas Magalhães. Ele queria vir aqui, e eu pedi que ele ficasse trabalhando no ministério. Mas ele estava com muita vontade de vir. Eu sempre digo, repito a cada dia e gostaria de fazê-lo aqui, em público: é um privilégio para esta administração do Itamaraty contar com o concurso do Embaixador Fernando Simas Magalhães como Secretário-Geral das Relações Exteriores. A ele, em público, meu muito obrigado neste dia em que completamos um ano de gestão. Sra. Presidente Kátia Abreu, sei do seu empenho pessoal e da liderança de V. Exa. no que diz respeito à igualdade e equilíbrio de gênero. Neste período de minha gestão, tenho me empenhado pessoalmente nessa questão. Como sabemos, trata-se de situações históricas estruturais que, obviamente, não poderiam ser resolvidas no curto período de um ano. Estamos de acordo, no entanto, que o que importa é avançar. Temos tido sensibilidade e atenção crescentes, por exemplo, no que tange à promoção nas diversas carreiras do ministério, a começar pelas classes superiores da carreira de diplomata. E tenho tido a satisfação de contar com o talento de mulheres diplomatas na chefia de importantes áreas do Itamaraty. Eu me permito citar, particularmente, e com isso estender meu reconhecimento ao conjunto das mulheres que integram o Serviço Exterior Brasileiro, as chefias do nosso Instituto Rio Branco, da Fundação Alexandre de Gusmão e do Instituto Guimarães Rosa. São órgãos fundamentais para o Itamaraty, responsáveis pela formação dos nossos diplomatas, pela difusão e aprofundamento de estudos sobre a política externa brasileira e, no que toca ao novo instituto, pela promoção de nossa língua e de nossa cultura no exterior. Sras. Senadoras, Srs. Senadores, feito esse balanço, passo agora à nova urgência no cenário internacional: a crise na Ucrânia e seus desdobramentos políticos, econômicos e humanitários. Em meu discurso ao Plenário do Senado em 24 de março passado, eu já havia tido a ocasião de apresentar a posição do Brasil perante o conflito, bem como as medidas tomadas pelo Governo com vistas a mitigar os impactos econômicos e a prestar auxílio aos nossos cidadãos que se encontravam em zona conflagrada. Desde então, o Brasil teve a oportunidade de se manifestar na Assembleia Geral e no Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre o tema da situação humanitária na Ucrânia. |
| R | Reiteramos, em ambos os fóruns, nossa grave preocupação com os impactos humanitários do conflito. Defendemos, em linha com nossa tradição diplomática, a imediata cessação de hostilidades com vistas a uma desescalada e a uma solução negociada que busque a paz duradoura. E recordamos as obrigações de todos os Estados perante o direito internacional humanitário, inclusive a proteção de civis e da infraestrutura civil e a garantia do acesso à assistência humanitária. Nas Nações Unidas, bem como em outros fóruns, temos alertado para os efeitos deletérios e indiscriminados de sanções unilaterais e seletivas, em consonância com os princípios escritos na Constituição. Além de serem ilegais perante o direito internacional, as sanções podem agravar os efeitos econômicos do conflito e impactar as cadeias de suprimento de produtos essenciais, como alimentos e insumos básicos. Por sua seletividade, as sanções tendem a preservar os interesses imediatos de um pequeno grupo de países, prejudicando, ao mesmo tempo, a larga maioria sobretudo do mundo em desenvolvimento, em geral mais dependente da importação de alimentos e outros insumos básicos, e, claro, com uma menor capacidade financeira para suportar as medidas econômicas restritivas que foram impostas por outros países. No caso específico dos interesses do Brasil, preocupa-nos, em particular, assegurar o fornecimento contínuo de fertilizantes, que são indispensáveis para a nossa agricultura e para a segurança alimentar de nossa população - eu diria para a segurança alimentar do mundo. Temos monitorado atentamente as sanções e outras medidas restritivas, de modo a avaliar seus potenciais impactos e definir novos custos de ação. Ao mesmo tempo, temos buscado identificar fontes alternativas e sustentáveis para o fornecimento de fertilizantes naquilo que a então Ministra Tereza Cristina qualificou como diplomacia dos fertilizantes. Temos, por exemplo, mantido diálogo com diversos países produtores, como Arábia Saudita, Canadá, Irã e Nigéria. O Presidente Jair Bolsonaro empenhou-se pessoalmente nesse tema, inclusive em telefonema que manteve com o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, país que é um grande exportador de fertilizantes. Eu também conversei por telefone com o Secretário de Estado dos Estados Unidos da América, Antony Blinken, e exploramos a possibilidade de emissão de uma licença especial para importação de fertilizantes de países sob sanção, como o Irã e como a própria Rússia. Não temos poupado esforços para equacionar essa questão de importância vital, de forma a preservar o nosso agronegócio dos efeitos da crise e garantir a segurança alimentar de nossa população. Por último, mas não menos importante, eu gostaria de atualizar as Sras. Senadoras e os Srs. Senadores sobre a assistência prestada a cidadãos brasileiros no contexto do conflito. Ao todo, o Itamaraty já auxiliou 230 brasileiros a deixarem a Ucrânia; destes, 43 retornaram ao Brasil no voo da Força Aérea Brasileira que partiu da Polônia no último dia 9 de março, operação que tive orgulho de acompanhar pessoalmente. Ainda há 17 brasileiros na Ucrânia, dos quais 11 manifestaram a intenção de, por enquanto, permanecer por lá. Os demais são jornalistas que cobrem o conflito. Para nosso grande alívio, foi possível localizar a cidadã brasileira que estava desaparecida na cidade ucraniana de Mariupol. Ela se encontra com saúde, em segurança e deverá retornar em breve ao Brasil. |
| R | Eu tenho orgulho de dizer que não deixamos nenhum dos nossos concidadãos para trás. Todos aqueles que desejaram encontraram, nos postos avançados do Itamaraty na região, o apoio e a assistência necessários para uma partida em segurança e para o retorno para casa. Finalmente, sobre os vistos de acolhida humanitária que o Brasil instituiu em benefício de nacionais ucranianos afetados pelo conflito, foram emitidos, até o dia 4 de abril, um total de 81 vistos. Essa política de acolhida coaduna-se com a tradição brasileira de solidariedade e de defesa dos direitos humanos, a exemplo de iniciativa de Parlamentares, empresas e cidadãos brasileiros em prol não apenas de nossos conacionais, mas também das populações afetadas pelo conflito, as quais merecem nosso apoio e o nosso reconhecimento. Agradeço, uma vez mais, às Sras. Senadoras e aos Srs. Senadores a oportunidade, que muito me honra, de voltar a esta Comissão. Coloco-me, Presidente Kátia Abreu, à disposição para responder as questões de V. Exa. e de S. Exas. os Srs. Senadores e, sobretudo, para intercambiar ideias que possam servir ao contínuo aperfeiçoamento da política externa e da ação diplomática brasileiras. Muito obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Chanceler França, pelas suas exposições. Eu gostaria que, se fosse possível, passasse o seu pronunciamento. Apesar de estar gravado, facilita-me muito o arquivo físico. Vamos iniciar as questões, a participação dos colegas Senadores. Lembro que ontem, Chanceler, durante a audiência com o Embaixador russo, 350 pessoas estiveram presentes na sala, através do e-Cidadania, e, de ontem até agora, houve 5 mil visualizações desta audiência. Isso demonstra o quanto o povo brasileiro, a sociedade, está atento e acompanhando os desdobramentos desta questão tão vital para a Europa, para a Ucrânia e para o Brasil. Então, iniciamos pelo Senador Esperidião Amin... Desculpe-me, o Senador Presidente Fernando Collor, primeiro, e, depois, o Senador Esperidião Amin. Com a palavra. O SR. FERNANDO COLLOR (PTB - AL. Para interpelar.) - Exma. Sra. Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, Senadora Kátia Abreu; Exmo. Sr. Ministro das Relações Exteriores, Carlos França; Exmo. Sr. Senador Esperidião Amin; Exmas. Sras. Senadoras; Exmos. Srs. Senadores; todos os caros telespectadores desta audiência de hoje, as minhas palavras são, em primeiro lugar, de me congratular com S. Exa. o Sr. Ministro Carlos França, que hoje completa um ano no exercício da função honrosa de Ministro das Relações Exteriores do Brasil, com uma série de êxitos. Aqui já foram relatados vários deles no seu discurso introdutório desta nossa audiência pública, mas eu realçaria as grandes vitórias alcançadas nas tratativas de sermos aceitos, na sua primeira fase, para membro efetivo da OCDE. |
| R | Temos o outro largo passo que foi dado, qual seja, a indicação do Brasil para membro do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Num momento em que alguns diziam que o Brasil estava isolado do resto do mundo, utilizando até um termo pejorativo como "pária no mundo", a imensa maioria dos membros da Assembleia Geral das Nações Unidas, para não dizer a quase unanimidade, referendaram o nome do Brasil como membro integrante desse Conselho de Segurança, graças ao trabalho exercido sob o seu comando, de acordo com a diretriz do Presidente Jair Bolsonaro para que isso pudesse acontecer. O episódio da atuação do Ministério das Relações Exteriores junto com os ministérios coordenados pela Defesa do Brasil foi também de extremo êxito. A prova aí está: o Brasil hoje está em terceiro ou quarto lugar em termos de vacinação da sua população, o que demonstra a preocupação e o trabalho efetivo exercido por esses dois ministérios e pelo nosso Brasil. Passando da pandemia, nós temos agora esse novo evento que conturba a vida planetária, com essa desinteligência havida entre líderes, ou entre ou a partir de um líder específico, qual seja, a crise criada pela invasão da Rússia ao território ucraniano. A participação do Ministério das Relações Exteriores, novamente em conjunto com o Ministério da Defesa, foi fundamental para o resgate dos cidadãos brasileiros que estavam dispostos e desejosos de voltar em segurança ao seu país. E isso foi providenciado graças às iniciativas tomadas com presteza pelo Ministério das Relações Exteriores, criando postos avançados na região do conflito, de modo a trazer de volta todos aqueles que assim desejassem. Lembra-me esse fato algo ocorrido também em 1990, quando exercia eu a Presidência da República e tivemos um problema parecido quando o Iraque invadiu o Kwait. E, naquela oportunidade, uma centena de brasileiros morava, estava trabalhando no Iraque - mais de uma centena, eram várias centenas de brasileiros -, trabalhando com empresas brasileiras que atuavam no território iraquiano, e havia também várias pessoas dedicadas ao desporto, sobretudo futebol. E nós tivemos, graças às providências tomadas pela Casa de Rio Branco, que tinha à frente, à época, o Ministro Francisco Rezek e que teve no então Embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima o seu principal ator no teatro do conflito, a possibilidade de repatriar todos esses brasileiros que lá estavam, desejosos também de voltar. |
| R | Isso me dá a possibilidade de comparar o esforço que foi feito agora, sob a coordenação de V. Exa., para que, de forma tão positiva, pudesse chegar a concluir essa missão com o êxito que foi alcançado. Temos ainda algumas dificuldades a enfrentar, sobretudo na questão que ocorre entre a Rússia e a Ucrânia, com uma dificuldade muito grande de solução. Nós, lamentavelmente, estamos vendo que as Nações Unidas, infelizmente, estão podendo muito pouco realizar para a solução desse conflito, em função do voto ou do veto que um dos cinco com direito a esse mesmo veto tem no Conselho de Segurança, que é a Federação Russa. Então, qualquer tentativa com vistas a um cessar fogo e a voltar a inteligência e o bom senso a prevalecerem numa negociação para a cessação desse conflito de forma imediata, com essa crise humanitária que vem sendo criada, vem sendo colocada com muita dificuldade dentro das Nações Unidas, apesar dos esforços meritórios que o Secretário-Geral António Guterres tem feito para que alguma coisa possa ser realizada. Acredito que o Brasil, sempre chamado como ator nos processos de conciliação entre desiguais, num processo de busca de acordos, de consensos em áreas em conflito - o Brasil sempre foi um grande mediador -, poderia participar desse processo, naturalmente, com a ajuda, se fosse possível, do governo americano, que, no meu entender, vem também, por intermédio do seu Presidente, Biden, prejudicando bastante toda e qualquer possibilidade de se sentarem à mesa os principais atores do lado do Ocidente, especificamente aqueles que fazem parte da Otan, e, aí, ressalte-se a posição absolutamente majoritária dos Estados Unidos em relação aos outros países que fazem parte dessa organização. Mas o nosso Presidente Biden não vem ajudando com essas suas declarações absolutamente intempestivas, fora de hora, fora de momento, extremamente agressivas. Não é com esse linguajar que nós haveremos de conseguir avançar num processo, que todos nós desejamos, de cessar fogo e de busca do estabelecimento da paz entre as partes em conflito. Naturalmente, é uma situação extremamente difícil, extremamente complicada, que nos dá muito pouca possibilidade de vislumbrarmos, num horizonte de curto e médio prazos, uma solução, um início de solução para acabar com esse fragor que vem atingindo aquela região. Mas o Brasil, eu tenho certeza, sempre estará se colocando ao dispor das partes e ao dispor de todos aqueles que buscam a paz para ser um interlocutor positivo, proativo, no sentido de nós ajudarmos a trazer de volta à normalidade o que está acontecendo naquela região da Europa e da Ásia. |
| R | Enfim, Sr. Chanceler, eu queria deixar aqui o meu abraço e o meu reconhecimento à Casa de Rio Branco pelo trabalho excepcional de todos os seus integrantes na defesa dos interesses nacionais, na defesa dos interesses do Brasil, sobretudo agora nesse período em que, como foi aqui relatado por V. Exa., temos dificuldades na importação de produtos absolutamente essenciais, sobretudo para o nosso agronegócio. É de fundamental importância que nós consigamos substituir o percentual elevado que temos de importação da Rússia, no caso de fertilizantes, por outros países produtores desses insumos, do que V. Exa. já está tratando, conforme também relatado aqui no seu pronunciamento, e fazer com que o Brasil possa superar essas dificuldades também no plano econômico, além de superar, sobretudo em solidariedade ao planeta, à questão humanitária, no nosso caso específico, superar também as dificuldades econômicas que se avizinham. Portanto, o meu reconhecimento e os meus cumprimentos a V. Exa. pelas suas palavras e que este ano de exercício à frente da Casa de Rio Branco se repita por outros anos a seguir. Muito obrigado a V. Exa. Muito obrigado, Sra. Presidente Kátia Abreu. A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Collor de Mello. Passo a palavra ao Senador Esperidião Amin. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Para interpelar.) - Sr. Ministro, eu gostaria de reiterar as minhas boas-vindas. Cumprimento a Senadora Kátia Abreu, que preside sempre com muito dinamismo a nossa Comissão. Saúdo os Senadores, Senadoras e demais participantes tanto remotos quanto presencialmente. Eu também quero me perfilar ao lado do Presidente, do Senador Fernando Collor, ao me congratular com este ano de seu aniversário, que é um aniversário de boas iniciativas e boas atitudes tomadas pelo nosso Ministério das Relações Exteriores. Eu disse ainda hoje, em uma outra reunião de caráter internacional, que eu tenho muito orgulho do nosso Instituto Rio Branco. Acho que a evolução da nossa diplomacia... Até para comparar com o período a que se referiu o Presidente Collor, dos anos 90 para cá é perceptível a modernização da atitude da nossa diplomacia, especialmente em relação a questões como meio ambiente, como desenvolvimento comercial sustentável e o interesse do Brasil. Eu gostaria de extrair do pronunciamento do Presidente da Ucrânia de ontem, perante o Conselho de Segurança da ONU, uma frase para a nossa reflexão: "Vocês querem fechar a ONU ou querem salvá-la?". O que nós fizemos nos últimos 30 anos foi fechar a ONU. Cresceu a Otan e decresceu o Conselho de Segurança da ONU, que, como falou o Senador Collor, vale tanto quanto um veto, porque basta que um dos cinco sócios preferenciais vete para que não aconteça nada. E ainda se apregoa que a Assembleia da ONU vai tirar a Rússia do Conselho de Direitos Humanos. Não há piada de mau gosto maior do que essa. Isso é um embuste que os proponentes estão passando para o mundo. Isso não vale nada e não representa nada. Isso é uma retaliação. E essa política de mandar mais armas para Ucrânia é coisa de vampiro. É para que a guerra se prolongue. |
| R | Senadora Kátia Abreu, não é só o Embaixador da Rússia, que ontem falou que só vão parar... O que ele disse aqui ontem? Só vão parar quando ganharem. O Embaixador da Rússia disse isso aqui ontem, com outras palavras. Mas o sentido é esse. Quando é que os senhores vão parar? Foi a pergunta que eu fiz. "Vamos parar quando ganharmos". E vai se prolongar porque, segundo o Presidente Biden, vamos dar 1 bilhão de armas, US$1 bilhão em armas para a Ucrânia. Então, não vai faltar combustível dos dois lados. Isso é o legítimo apaga incêndio com gasolina de alta octanagem, que é para fazer explosões também, não só incêndio. Então, nós estamos colhendo o saldo disso, mais Otan e menos ONU. A Otan se expandiu, os países que faziam parte do Pacto de Varsóvia estão sendo seduzidos para ingressar na Otan. Para quê? Para amedrontar a parte que se fragilizou com a erosão da União Soviética. É isso que está acontecendo. Cão danado, todos a ele! Esta é a política que já nos levou a isto: que já nos levou ao desmantelamento do Iraque como país, à destruição do Iraque. Até o Tom Zé já disse isso em música. Destruíram o país, o norte da África, a Síria, que eu visitei em 2018. O Senador Fernando Collor também visitou, no mesmo ano. Então, é uma política para a guerra. Eu ontem trouxe aqui um dado que eu quero me permitir repetir: essa fuga de ucranianos - viu, Senador Fernando Bezerra? - mexe muito comigo, porque os meus avós maternos fugiram da Itália durante a Primeira Guerra Mundial, passaram por um "morrinho" chamado Alpes, do norte da Itália para a Suíça. E a minha mãe nasceu em Aadorf, que é a primeira cidade do abecedário suíço. Chegaram de bicicleta a Aadorf. A minha mãe, no útero da sua mãe, e a irmã mais velha, o pai e a respectiva mãe. Então, essa cena que nós estamos presenciando eu não vi, mas consigo sentir. E também nisto a nossa ética está sendo acossada, porque a nossa maneira de enxergar o êxodo dos ucranianos não é a mesma de enxergar o êxodo dos africanos, dos orientais e do Oriente Médio. Nós somos mais sensíveis para os europeus que estão emigrando. A ONU já detectou isso. |
| R | Então, eu gostaria de me congratular com a posição que o senhor tem defendido na ONU e que o Ministério das Relações Exteriores tem defendido na ONU, que é pela paz; não é pela vitória de um lado e pela humilhação de outro nem vice-versa, e muito menos pela destruição da vítima. Acho - e a Senadora Kátia, para alegria minha, concorda - que Presidente Putin, é meu modo de achar, tinha muita razão para defender a posição russa até dar o primeiro tiro. Depois do primeiro tiro, não existe mais razão. Acho que as palavras do Presidente Biden, como já disse o nosso Senador Collor, não ajudam, porque elas fulanizam a agressão quando atacam a pessoa. Isso vale na política também: quando eu quero desqualificar o oponente, eu entro numa outra. E as retaliações, além de onerosas, são de um radicalismo brutal. Nós já vínhamos sofrendo com retaliação ao Irã e não podíamos sequer abastecer navio que trazia ureia para o Brasil. A Petrobras ficou com medo de abastecer, no largo da costa de Santa Catarina, um navio iraniano que transportava ureia, de que necessitamos, com medo da retaliação da Bolsa de Valores de Nova York sobre as ações da Petrobras. Medo! Nós estamos sofrendo a interdição de portos da Bielorrússia há muito mais tempo do que a guerra e estamos nos defrontando agora com a perda de outros 24% de suprimentos de fertilizantes - 19% da Bielorrússia, 24% da Rússia -, e nosso plano de fertilizantes é para daqui a 30 anos reduzir em 50% a nossa dependência. Então, nós temos é que correr, como V. Exa. já relatou, atrás de substitutos imediatos. Sobre retaliação, eu quero dizer o seguinte: tão séria quanto a guerra é a retaliação a uma nação, a um povo. Eu cheguei a escutar que devíamos retaliar o Balé Bolshoi. É sério ou ninguém escutou isso? Foram suprimidas apresentações artísticas de cantores e, casualmente, Santa Catarina, por iniciativa do ex-Governador Luiz Henrique da Silveira, justiça seja feita, tem a única filial, digamos assim, do Balé Bolshoi do mundo - em Joinville, Santa Catarina. Então, essa, entre aspas, "guerra total contra a Rússia" não é o melhor caminho para se chegar ao equilíbrio. |
| R | Por isso, eu enalteço mais uma vez a posição do Itamaraty, repito o que falei em outras ocasiões, inclusive hoje, que eu não coloco uma vírgula a mais e não retiro nenhuma vírgula das atitudes, votos e declarações que o Brasil, por meio tanto do Presidente da República, quanto especialmente do Ministério das Relações Exteriores, tem proclamado no cenário internacional. Não tenho nenhuma pergunta a lhe fazer. Só peço: prossiga neste caminho. A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Com a palavra, inscrito pela ordem de chegada, Senador Francisco Rodrigues. Obrigada. O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RR. Para interpelar.) - Obrigado, Sra. Presidente Kátia Abreu, Sr. Ministro Carlos França, Sras. e Srs. Senadores presentes, nós acompanhamos parte da apresentação do Ministro e algumas ponderações feitas aqui pelo Senador Fernando Collor de Mello e pelo Senador Esperidião Amin. Na mesma linha, nós gostaríamos de fazer alguns questionamentos ao Sr. Ministro, até porque o Ministro tem ganhado aqui no Congresso Nacional uma medalha de competência, pela sua ação na diplomacia brasileira, de atendimento ao Congresso de uma forma plena, e isso na verdade nos alegra e demonstra exatamente essa capacidade que V. Exa. tem de entender a importância e o poder político como instituição moderadora. Eu gostaria de fazer quatro perguntas a V. Exa., mais ou menos na linha do que já havia falado, mas talvez pormenorizando essas questões. A primeira é qual o papel do Itamaraty na chamada diplomacia do fertilizante, que objetiva assegurar o fornecimento de fertilizantes para o agronegócio brasileiro? Inclusive, num momento extremamente importante em que vivemos, porque graças aos quase 70 milhões de hectares cultivados no nosso país, mesmo assim nós sabemos das dificuldades que poderão advir com a carência desses fertilizantes, disponibilizados no tempo próprio. A agricultura tem o seu tempo. Então, em função de toda essa crise, nós verificamos que é importante que esse insumo, fundamental para o desenvolvimento da agricultura, esteja disponibilizado. A segunda pergunta é, considerando a dura realidade da geopolítica e da geoeconomia global, em que cada país busca assegurar seus interesses, de que forma a alta cúpula do Ministério das Relações Exteriores, comandada por V. Exa., considera o redesenho das relações internacionais no mundo pós-guerra da Ucrânia e de que maneira se daria a inserção do Brasil nesse contexto? Ainda, retornando à questão anterior, o Governo brasileiro tem conversado com o governo americano com relação à licença especial para que possa importar de países com sanções. No caso especificamente, do Irã, que tem realmente abundantes reservas minerais que nos interessam, quais são essas negociações atualmente se V. Exa. acha que haverá êxito. |
| R | Tendo em conta o drama humanitário da guerra da Ucrânia e considerando a bem-sucedida missão coordenada por V. Exa. de resgate de brasileiros fugidos do conflito, queria saber, no plano do Governo, quais as articulações que estão sendo feitas para além dos que já foram trazidos para o Brasil, qual é o trabalho que a embaixada em que Kiev está articulando para que, nesse momento de extrema preocupação, os brasileiros tanto os da embaixada, quanto os diplomatas, os funcionários e os brasileiros que ali vivem, possam realmente ser transportados para o nosso país ou outro país da Europa que possa abrigá-los? E a quarta e última questão - gostaria até de dizer para V. Exa., talvez, talvez, não, é a terceira vez que trato sobre ela e V. Exa. já sabe exatamente a que eu me refiro - é com relação à importância com que vemos, nós que somos o Estado de Roraima, a abertura da embaixada em Caracas, na Venezuela, porque, na verdade, como já disse antes, nós temos mil quilômetros de fronteira com a Venezuela, nós dormimos todos os dias com os nossos irmãos venezuelanos ali, apenas afastados por uma linha imaginária de fronteira. E, sobre o comércio entre o Brasil... Eu digo sempre que a China está para o Brasil, em termos de comércio, assim como a Venezuela está para o nosso estado. São mais de 3 mil carretas de 40 toneladas que entram naquele país para atender exatamente à demanda de alimentos. E, com essas dificuldades, sem a nossa embaixada, sem os nossos consulados, realmente dificulta-se a vida de mais de 25 mil brasileiros que ali estão. Entendo que até os Estados Unidos estão quebrando os embargos contra a Venezuela, então, o Brasil não pode ficar a reboque dessa discussão. Eu acho que isso é fundamental, é questão política, mas, de qualquer forma, entendo que, quanto à Venezuela, por ser um país irmão, por ser um país nosso vizinho e parceiro estratégico de economias complementares, poderia realmente ser trabalhada, o mais brevemente possível, essa nossa proposição para que realmente nós pudéssemos voltar a conviver de forma diplomática, independentemente do regime que seja, mas a diplomacia existe para isso. Então, eram essas perguntas Sr. Ministro. Muito obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Francisco Rodrigues. Passo a palavra ao Chanceler França e, na medida do possível, para dinamizar um pouco mais a nossa reunião, a brevidade nas respostas. Muito obrigada. Nós estamos sendo acompanhados por 480 brasileiros pelo e-Cidadania, online. O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA (Para expor.) - Muito obrigado, Presidente Kátia Abreu. Antes de mais nada, eu gostaria - talvez faça pela ordem aqui dos comentários e perguntas - de agradecer a generosidade dos seus comentários, Senador Presidente Fernando Collor de Mello, é o papel que temos desempenhado. E, sim, posso garantir que a Casa de Rio Branco toda está realmente empenhada em conduzir a nossa política externa sob a orientação do Presidente Jair Bolsonaro, dentro das melhores tradições daquela casa. Quando eu tomei posse um ano atrás, eu terminei meu discurso dizendo que eu tinha consciência do imenso desafio de sentar naquela cadeira, cadeira que foi do Barão do Rio Branco, mas eu dizia, e eu acho que eu estava certo em dizer, que, maior do que os desafios, era a nossa vontade coletiva de acertar. E nisso eu tenho o apoio de muitos embaixadores e, realmente, de todos os diplomatas mais jovens e dos outros funcionários e integrantes do Serviço Exterior Brasileiro. |
| R | Eu penso que o senhor, que V. Exa., Presidente Collor, comentou aqui aspectos muito importantes, que vão na direção da modernidade que o Brasil busca. O processo de ascensão à OCDE é o êxito do Brasil na eleição para o Conselho de Segurança das Nações Unidas, onde nós tivemos, penso que, de 190 votos, 181 ou 182, mais uma abstenção. Um voto, acho que há outro país candidato, mas foi realmente uma votação bastante expressiva. Quero dizer que pudemos, realmente, nos unir ao Ministério da Saúde e ao Ministério da Defesa na garantia, no ano passado, da chegada do insumo farmacêutico ativo, para que pudéssemos ter a produção de vacinas aqui, seja sob licença, seja agora, através do que eu chamo de uma produção soberana e independente de vacinas, feita pela Fundação Oswaldo Cruz, dependente do Ministério da Saúde, que produz, da célula mãe, ao insumo farmacêutico ativo, até o produto final, que é a vacina., a vacina licenciada para a AstraZeneca. Recordando que é curioso o mundo global, porque o Brasil faz um acordo, celebra um acordo de produção de vacinas, mais do que isso, de transferência de tecnologia, da anglo sueca, Oxford/AstraZeneca, para descobrir que o insumo farmacêutico ativo estava na índia e na China, não estava nem no Reino Unido, nem na Suécia, muito menos no Brasil. E foi preciso então nos empenharmos numa verdadeira diplomacia da saúde para garantir o fluxo normal e intenso naquele momento desse material. Hoje eu acho que nós temos muita vacina norte-americana sendo aplicada, mas, naquela ocasião, não havia. Nós começamos com a vacina chinesa, depois com a Coronavac, a Oxford/AstraZeneca, mas para isso dependemos desse fluxo regular intenso, naquela ocasião. E nisso o Itamaraty, realmente, se somou ao Ministério da Saúde, aos esforços do Ministério da Defesa, para garantir que nós tivéssemos esse êxito da política de vacinação brasileira, mas acho que o Governo Bolsonaro distribuiu, penso eu, mais de 600 milhões de vacinas, ou adquiriu mais de 600 milhões de vacinas, e está em processo de entrega, de modo que eu penso que, realmente, é um êxito do qual eu me orgulho de ter dado uma modesta contribuição. Eu não poderia deixar de comentar o episódio de 1990, sob a Presidência de V. Exa., o resgate dos brasileiros, das várias centenas de brasileiros, do Iraque: engenheiros, operários, atletas, numa operação cujo brilhantismo se deveu ao Chanceler Francisco Resek e ao engenho e simpatia do Embaixador Paulo Tasso Flecha de Lima e D. Lúcia Flecha de Lima, que o acompanhou a Bagdá naquela ocasião, sob circunstâncias muito complicadas; ao Embaixador Amaral Sampaio, infelizmente já falecido, e ao então Ministro Sérgio Tutikian, um dos maiores especialistas em Oriente Médio que tinha o Itamaraty, hoje dando aulas em Porto Alegre, já aposentado, mas é uma equipe... O trabalho que eu fiz em Varsóvia não se comparou, realmente, com a grandeza desse episódio, mas seguiu essa tradição e foi um modelo inspirador, o senhor tenha certeza sobre isso. Aqui o senhor menciona sobre o papel da ONU. Eu me permitiria comentá-lo aqui quando for comentar as observações do Senador Esperidião Amin, e o farei agora. Eu agradeço a menção, Senador Esperidião Amin, ao trabalho que temos realizado no Itamaraty. Seguramente ele não é isento de erros, mas, como eu disse, há uma vontade imensa e uma vontade coletiva de acertar. |
| R | A menção que o senhor faz ao Instituto Rio Branco é muito importante porque, desde 1945, a única maneira de se ingressar na carreira de Diplomata é através do Instituto Rio Branco, com um muito seletivo exame de provas, onde depois, no Instituto Rio Branco, o diplomata tem a sua competência aferida. Na minha ocasião foram em dois cursos; agora são três cursos: o Curso de Aperfeiçoamento de Diplomatas; depois um segundo, que fará o diplomata agora quando estiver no nível de Primeiro Secretário, o que equivale, mais ou menos, a tenente-coronel nas Forças Armadas; e depois o Curso de Altos Estudos, que é um curso que tem nível de doutorado e que é a condição necessária para a promoção a Ministro de Segunda Classe e, portanto, ao acesso ao mais alto escalão da carreira, que é a classe de Embaixador. E eu me permito fazer essa menção aqui porque, realmente, foi no Instituto Rio Branco que eu fui pela primeira vez, muito tempo atrás, em 1990, enfim, submetido a essa questão da igualdade de gênero. Talvez ela não fosse tão comum como é hoje - e a Senadora Kátia Abreu me ensina muito a esse respeito -, mas eu tive uma diretora, uma diretora mulher, a Embaixadora Thereza Quintella, que foi a primeira mulher diplomata formada pelo Instituto Rio Branco a chegar a Embaixadora. Ela teve uma carreira brilhante, foi Embaixadora em Moscou e até hoje deixa uma marca. O Embaixador Labetskiy, que esteve aqui ontem, era o Terceiro Secretário, cuidava dos assuntos do Brasil e me disse da admiração que ele tinha, naquela ocasião, pelo trabalho que foi feito pela Embaixadora Quintella e por como a Embaixadora Quintella, como Embaixadora do Brasil na Rússia, pôde naquele momento ajudá-lo a entender o que era o nosso país. E, naquela ocasião, ela foi Embaixadora também em Viena, foi Cônsul-Geral em Los Angeles, foi Diretora da Fundação Alexandre de Gusmão, e tinha já essa preocupação com a questão da participação das mulheres na carreira. O concurso é um concurso de provas, ele não é um concurso identitário. Então, nós encontramos até alguma dificuldade para poder fazer esse equilíbrio dentro das carreiras - há estudo sobre isso. Como eu disse, desde o início da carreira eu já era sensibilizado por essa questão, e a Senadora Kátia Abreu realmente me trouxe ainda mais sensibilidade. Temos estudos sendo feitos. Conseguimos agora substituir no Instituto do Rio Branco a direção, que era da Embaixadora Maria Stela e que agora é nosso Cônsul no Porto, por outra mulher, a Embaixadora Glivânia, que também, com grandes credenciais acadêmicas e grandes experiências como Embaixadora, ela que foi Embaixadora no Panamá e foi Cônsul-Geral em Boston, fará, tenho certeza, um grande trabalho. Senador Esperidião Amin, o senhor, ao comentar aqui a exposição do Presidente da Ucrânia nas Nações Unidas, por videoconferência, e tendo feito perguntas de que queriam fechar a ONU, queriam que a ONU funcionasse, eu acho que nós temos que ter aqui neste momento uma autocrítica talvez - ou pelo menos uma constatação - de que o conselho de nações parece ter falhado nas Nações Unidas ao não resolver a crise da Ucrânia, quando ela poderia ser resolvida - e eu me refiro a 2015 - com a celebração dos Acordos de Minsk. As Nações Unidas emitiram duas resoluções - e aparentemente no Conselho de Segurança e digo o mesmo na Assembleia Geral - e aí eu acho que não eximo o Brasil, que faz parte do conserto das Nações, desse exercício. Vejo que deveríamos ter insistido com as partes, Rússia e Ucrânia, com apoio naquela ocasião muito importante da Alemanha e da França no chamado Formato da Normandia, a que se sentassem à mesa essas partes e pudéssemos, então, fazer um plano muito concreto de implementação desses acordos. |
| R | No entanto, parece que o concerto de Nações entendeu que a celebração do acordo, por si só, era suficiente, a ponto de os compromissos de integridade territorial serem lidos pelas duas partes, por ser, de um lado, a Ucrânia, e, de outro, de maneira diferente. Isso talvez devesse ter servido, Presidente Kátia Abreu, de alerta para que nós pudéssemos realmente insistir no diálogo. Então, esse momento passou. E eu acho que, hoje, o que o Conselho de Segurança não pode é abdicar do seu papel primordial na manutenção da paz e da segurança mundiais. É por isso que nós insistimos, no Itamaraty, em que aquele é o fórum, por excelência, para tratarmos dessa questão. É lá que, pelo estatuto da ONU, nós temos que tratar. É complicado tratar desse assunto na OCDE, na Unesco, na OMC, como se tem insistido. O importante é que se faça isso lá, porque eu acho que lá é que estão dadas as condições. É preciso ter coragem de atacar esse problema no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Por fim, o senhor falou aqui das retaliações e sanções. Eu entendo o uso de sanções pela Europa e pelos Estados Unidos - realmente, entendo. Eram, vamos dizer assim, o instrumento, a arma que eles tinham naquele momento para se contrapor ao conflito. No entanto, eu não posso deixar de estranhar o fato da seletividade das sanções e os comentários de embaixadores europeus, aqui mesmo no Brasil, que dizem que, se o Brasil aderir logo às sanções, como os outros países, nós vamos ter o fim mais rápido do conflito. A própria Alemanha sofre, hoje em dia, com a possibilidade de, por exemplo, deixar de contar com energia, com o combustível russo para as suas indústrias, para o aquecimento da sua população, para a geração de energia. De modo que eu penso que, se até esses países têm dificuldade, que dirá um país como o Brasil, que depende dos fertilizantes para manter girando o motor muito pujante do agronegócio. Eu acho, realmente, lamentável que essas retaliações cheguem ao campo da cultura e dos esportes. V. Exa. mencionou aqui a escola Bolshoi em Joinville. Está de parabéns Santa Catarina. Eu me recordo de que, em 1998, Terceiro-Secretário, pude acompanhar o Presidente da República da ocasião em uma viagem que, para mim, foi uma aula de diplomacia, porque: ele veio de Brasília; pousou em Navegantes, onde encontrou o então Senador Bornhausen, acho que era o Governador, e inauguraram um trecho da rodovia; fomos até Joinville, o Presidente dormiu lá, era Prefeito o Luiz Henrique, que tinha sido Parlamentar, inaugurou o Centreventos Cau Hansen e se anunciou ali a Escola Bolshoi, a primeira, única fora da Rússia; depois, no dia seguinte, era um sábado, ele acordou, foi a Jaraguá do Sul, onde, na presença de V. Exa., Senador Esperidião Amin, participou de uma solenidade e a presidiu na associação comercial e industrial daquela cidade, naquele ano de 1998, quando V. Exa. foi eleito Governador do Estado de Santa Catarina. Então... O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Fora do microfone.) - Da memória não foi apagado. Não foi a coisa mais importante, não, mas foi muito bom. O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA - Foi muito importante. Senador Chico Rodrigues, de Roraima, muito obrigado pelas quatro perguntas que V. Exa. me fez. Qual o papel do Itamaraty na chamada diplomacia do fertilizante? É uma situação muito grave. A Presidente Kátia Abreu, que vem de um Estado como o Tocantins, que também é líder no agronegócio, poderia falar muito melhor do que eu sobre a importância desse produto para o agro. Não é um produto - infelizmente eu descobri - que se pode comprar ali na prateleira, quer dizer, é preciso que venha o produto, têm que vir os nitrogenados, os fosfatados, a ureia, a amônia. Isso vem ao Brasil, tem que ser misturado, tem que ser embalado, tem que ser distribuído. |
| R | Parece que nós temos muito tempo para repor os nossos estoques, mas, na verdade, o tempo é contadinho, sobretudo num momento em que as retaliações e as sanções à Rússia e à Bielorrússia impedem uma logística mais eficiente no transporte dessa importante matéria-prima. O papel do Itamaraty aqui é ser o braço longo desse grupo que inclui a Secretaria de Assuntos Estratégicos, do meu amigo Almirante Flávio Rocha, e o Ministério da Agricultura, que a meu ver deve ter a liderança desse assunto, porque ninguém entende mais de fertilizantes do que o Mapa, agora com o Deputado Marcos Montes na sua chefia. E o papel do Itamaraty é buscar oportunidades, e nós temos capilaridade, nós estamos no mundo todo. Então me liga o Embaixador Julio Bitelli, do Marrocos, e me diz "olha, há aqui a oportunidade de um excedente". Nós, então, entramos em contato. Quer dizer, recebo da Nigéria informação de que se está criando lá uma nova planta de fertilizantes do grande homem de negócios, o grande trader da África, o nigeriano Aliko Dangote. Procurei-o, e tivemos uma videoconferência com ele e sua equipe: há possibilidade de vir o excedente. Estamos buscando aqui, junto ao Departamento do Tesouro norte-americano, e esse foi o objeto da minha conversa com o Secretário de Estado Antony Blinken, a possibilidade de conseguir um waiver para que nós, os importadores brasileiros, possamos fazer negócio com segurança com o Irã, que tem muitos produtos para nos enviar. Nesse sentido - no Canadá também temos trabalhado -, trata-se de apoiar, na verdade, as iniciativas que tem tido esse grupo liderado pelo Ministério da Agricultura com a participação da Secretaria de Assuntos Estratégicos e, também, às vezes até identificando alguma oportunidade que não se enxergou. O caso da Nigéria era claro, não se havia tido ainda essa possibilidade. Então, esse é o nosso papel. Como a alta cúpula do Itamaraty considera o redesenho da política internacional do mundo? Essa é uma pergunta que eu teria dificuldade de responder para o senhor na sua totalidade, porque é uma pergunta que demanda uma reflexão que nós ainda estamos fazendo. É uma pergunta complexa, mas nós temos já algumas certezas, e uma delas já havia surgido quando nós estávamos já nos preparando para sair da pandemia. Há um movimento que se iniciou na pandemia da covid-19 e que eu acho que o conflito na Ucrânia exacerba, que é o fato de que nós vamos ter uma alteração na geografia das cadeias produtivas, nas cadeias integradas de valor, com possível ganho para o continente sul-americano e para o Brasil. Há um movimento agora, que nos Estados Unidos é chamado de nearshoring, que é para atrair para o hemisfério ocidental a produção de ativos como, por exemplo, semicondutores, insumos farmacêuticos e outros. Então, eu penso que, se nós formos nesta ocasião, aqui e agora, capazes de entender e aproveitar essa oportunidade de ampliar aqui a nossa atuação econômica nesses setores, nós vamos poder contribuir para a segurança na produção desses bens, quer dizer, desses insumos, inserindo o Brasil de uma forma muito mais dinâmica e positiva nas cadeias integradas de valor. Nesse sentido, eu volto à observação do Presidente Collor de Mello de que é muito importante a inserção do Brasil na OCDE, pelo que ela traz de melhoria de ambiente de negócios, de aumento na transparência, dos valores de combate à corrupção, na melhoria da governança pública, mas também privada, na adoção das melhores práticas e no incremento da competitividade. Para nos incluirmos nessas cadeias produtivas com êxito - aí não podemos nos enganar -, não é preciso só estar aqui na localização que temos, num continente que por si só é autossuficiente em energia, que por si só é exemplo no desenvolvimento sustentável, que por si só tem o orgulho de poder ostentar a credencial de continente livre de armas nucleares e, portanto, muito seguro. |
| R | É preciso que nós sejamos, no Brasil, competitivos. E, por isso, me preocupa tanto, Presidente Kátia Abreu, a questão dos fertilizantes, porque ela está ligada - a senhora sabe muito melhor que eu - à questão da produtividade no campo e, então, afeta a nossa competitividade. Então, temos que melhorar a logística, tudo isso precisamos fazer, mas eu penso que, nesse sentido, como redesenho, essa seja talvez a consequência, que temos neste momento aqui, principal. A operação de resgate dos brasileiros, o que está sendo feito para continuar a dar apoio. Nós mantemos nosso posto avançado na cidade de Lviv, que fica cerca de 50km, 60km da fronteira com a Polônia. A Embaixada do Brasil em Varsóvia continua com a lotação reforçada, acho que eu tenho hoje aqui pelo menos oito funcionários do Serviço Exterior Brasileiro apenas cuidando da emissão de vistos humanitários. Estamos nos preparando para, agora, do dia 10 até o dia 12, receber um voo com 250 pessoas que devem sair de lá, trazidos aqui por um movimento evangélico, um movimento cristão. Então, estamos dando todo o apoio. O Embaixador Norton está na Moldova, mas já se preparando, dadas as condições em breve, para retornar a território ucraniano - penso que, a princípio, em Lviv -, de modo que ele continuará fazendo as análises dele, trará os equipamentos de comunicação e os arquivos mais sensíveis da Embaixada para o território ucraniano, porque ele está na Moldova, onde ele também é Embaixador credenciado. E por que Varsóvia? Por conta do apoio que nos deu o Governo polonês e porque, naquela região, é a única Embaixada onde nós temos adido militar. Nós não temos adido militar na Romênia, não temos adido militar na Moldova, não temos adido militar na Hungria, não tínhamos adido militar na Ucrânia. O viés talvez seja também uma consequência dessa mudança geopolítica. Nós achamos que, tendo na Polônia e tendo na Rússia, se podia cobrir, o conflito mostrou que não. Eu até já comentei, na ocasião, com o Ministro Braga Netto, não tive oportunidade de fazê-lo ainda com o novo Ministro da Defesa... Eu sei que os recursos investidos na Defesa são... Enfim, o cobertor é curto, os recursos são escassos, mas seria muito importante se nós pudéssemos ampliar a presença dos nossos adidos militares no exterior, não apenas para o que eles fazem ali, com o trabalho de conversar com seus pares, de nos sensibilizar por essa dimensão militar das relações internacionais, da diplomacia, mas também para poder, em um momento deste, nos ajudar. Para o senhor ter uma ideia, na Ucrânia, quem cuidava ou quem fazia o apoio militar era a nossa Embaixada na Turquia. Foram eles que ajudaram a fazer o plano de contingência. Eu ficaria mais tranquilo se nós pudéssemos ter ali um adido militar, mas isso eu entendo, há um planejamento, é lento mesmo, porque nós lutamos aqui com recursos, temos o teto de gastos. E, por fim, sobre a Venezuela - com isso, vou terminar, Presidente Kátia Abreu, muito obrigado pelo tempo e pela paciência de V. Exa. -, no momento em que os Estados Unidos analisam uma exceção ao embargo às exportações venezuelanas de petróleo, realmente, me parece que nós poderíamos pensar em reavaliar essa questão do relacionamento diplomático. O normal é ter relações diplomáticas, V. Exa. está coberto de razão, no entanto, há questões... E eu já tive oportunidade de conversar com V. Exa. a respeito e colher a sua opinião da importância que tem a relação da Venezuela, da Guiana e do Suriname com o seu Estado de Roraima. Eu acho que nós temos a ganhar quando pudermos normalizar essas relações. Seria muito importante também que houvesse de parte do Governo Maduro uma sinalização de que vamos ter maior liberdade de imprensa, de que vamos ter liberdade de imprensa, de que vamos poder liberar os presos políticos e poder assumir um compromisso inequívoco com eleições livres e com democracia. |
| R | Sem isso, fica realmente muito, muito complicado. Então, nós temos com o Presidente Guaidó as relações hoje, mantemos com ele, nós não conversamos mais com o Governo Maduro. Se, em algum momento, for possível, acho que nós podemos começar pelo restabelecimento das relações consulares, mas eu realmente tenho dúvida de que isso seja possível. É um grande drama humanitário que a Venezuela hoje nos coloca, pressiona o Estado de Roraima. O Brasil dá um exemplo com a Operação Acolhida, interiorizando depois nossos irmãos venezuelanos que buscam refúgio, buscam um novo início de vida aqui no Brasil. Sei, como disse, da imensa importância. Hoje a Venezuela realmente é um foco de desestabilização, porque o crime organizado, pessoas, realmente grupos, enfim, dedicados a ilícitos transnacionais encontram abrigo no território venezuelano, porque o Governo Maduro já não controla mais a inteireza do território daquele grande país. Desse modo, eu penso que, sim, é uma questão que nos preocupa e é objeto de reflexão, tenha certeza, Senador, diária sobre esse respeito. Integração, eu tive oportunidade de dizer a V. Exa., e aqui eu concluo: nós no Itamaraty, no Governo do Presidente Jair Bolsonaro, fazemos na prática. Não é apenas aqui no Mercosul, com Uruguai, com Paraguai, com Argentina, mas também com o Suriname, que o Presidente visitou recentemente, e a Guiana, país que o Presidente agora, com a aquiescência das autoridades guianenses, eu posso aqui já dizer, visitará agora no dia 6 de maio. Há um imenso leque de oportunidades, e ganha o Brasil se estiver integrado a esses países no chamado Arco Norte. Muito obrigado, Senador. A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Chanceler. Eu gostaria agora de dar continuidade e passar a palavra para o Senador Zequinha Marinho. O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA. Para interpelar.) - Muito obrigado, Presidente. Eu quero aqui cumprimentar o Ministro Carlos França e começar agradecendo, porque, todas as vezes que a gente precisa, nos recebe muito rapidamente, de maneira muito pronta, atendendo as demandas mesmo que no varejo. Gratidão sempre. Ministro, primeiro faço minhas as palavras do Presidente Collor, também do Senador Esperidião Amin, com relação à questão do conflito entre Rússia e Ucrânia, porque a situação não é confortável. E aí eu me junto aqui ao Senador Chico Rodrigues com relação à preocupação na questão dos fertilizantes, que são essenciais ao agro brasileiro. Aqui na Casa, sou o Vice-Presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária e estamos trabalhando diuturnamente para que se evite o pior. V. Exa. já respondeu praticamente ao que eu gostaria de perguntar, mas lá atrás, quando tivemos algumas reuniões aqui com a Secretaria de Agricultura, Senador Acir Gurgacz, nós combinamos alguns grupos de trabalho, entre eles pedindo à Ministra e também ao Itamaraty e a V. Exa. que fizessem um trabalho junto com outros países que são fornecedores também, como o Canadá, China. Eu só queria que V. Exa. comentasse como andam essas negociações no sentido de aumentar a cota para o Brasil da importação de mais fertilizantes. |
| R | Canadá, por exemplo, e tantos outros, como é que está indo esse entendimento ou esses entendimentos com países que também nos vendem ou poderiam nos vender mais fertilizantes? Minha pergunta basicamente é exatamente esta: onde V. Exa. tem conversado com a Ministra Tereza, que saiu, e agora com o Marcos, que entrou, para que a gente possa ir saindo dessa dependência da confusão ali da Rússia e buscando alternativas para que a agricultura brasileira não seja tão penalizada, até que a gente possa ter, num futuro próximo - se Deus quiser, eu sou otimista -, o Brasil recomeçando a sua exploração e saindo, pouco a pouco, da dependência da importação de fertilizantes e também de pesticidas que possam nos ajudar aqui a tocar, de forma tranquila, o agro brasileiro? Muito obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Senador Zequinha Marinho, eu gostaria de complementar com algumas perguntas do e-Cidadania. Thiago Vilella, do Mato Grosso: "Qual é a visão de outros países quanto ao posicionamento do Brasil sobre o conflito entre Rússia e Ucrânia?". Pedro Henrique Paiva Araújo, de Pernambuco: "Nós vamos assumir algum protagonismo na mediação e promoção da paz?". Matheus Alcides de Araújo, de São Paulo: "Como estão as relações exteriores do Brasil com os dois países em guerra, Rússia e Ucrânia?". João Alcântara, do Distrito Federal: "Existe algum plano para suprir o grande déficit de servidores do Ministério das Relações Exteriores?". Já é uma questão administrativa. Com a palavra o Chanceler. Gostaria que pudesse abreviar nas respostas para mais dinamizar a nossa audiência. Obrigada. O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA (Para expor.) - Muito obrigado, Senadora. Senador Zequinha Marinho, eu queria agradecer. O senhor menciona aqui que a minha disposição, como o senhor disse aqui, abre aspas, "é de atender o Congresso no atacado e no varejo". Para mim é um prazer, viu? A porta da casa está aberta. Eu falei no meu discurso de posse e repito sempre: o Itamaraty, eu julgava, estava com os canais de contato com o Congresso não vou dizer interrompidos, mas eu acho que ainda precisavam ser alargados. Eu acho que, talvez, eu tenha conseguido ampliá-los e meu desejo é ampliar ainda mais. O senhor sabe que, em Ribeirão Preto, eu era criança - eu fui criado em Ribeirão Preto, apesar de ter nascido em Goiânia, sou conterrâneo da Senadora Kátia Abreu -, a gente ouvia rádio, não tinha internet. E tinha lá uma loja chamada Boa Compra, que era de um gaúcho, cujo lema era o seguinte: "preço justo no atacado e no varejo". Então, no atacado e no varejo, o Congresso pode sempre contar comigo. O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA. Fora do microfone.) - Muito bem, obrigado. O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA - Bom, sobre a preocupação dos fertilizantes - e o senhor recomenda bem aqui sobre a questão da Frente Parlamentar da Agricultura. Qual o trabalho que nós temos feito? Eu tenho desenhado... O Presidente Bolsonaro, num primeiro momento, instrui o Governo a formar um grupo multidisciplinar. O grupo é formado por Economia, pela SAE, pelo Ministério da Agricultura, Meio Ambiente e outros tantos. E eu advoguei, naquele momento - quer dizer, foi até um trabalho de médio e longo prazo, mas também com uma ação no curto prazo feita pela Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos, do Almirante Flávio Rocha -, eu advogo, advoguei ali... |
| R | É importante, eu acho, a agricultura ter a liderança, porque a agricultura tem contato direto com o agro e consegue captar realmente as necessidades, as carências. Eles têm os tempos, e acho que, sem o Ministério da Agricultura, é muito difícil a gente seguir nessa linha. Mas, aí, eles dão o lead e todos correm atrás. Qual é o papel do Itamaraty? É justamente alinhavar o trabalho que tem sido feito pelo Mapa e por outras autoridades do Governo na busca de excedentes de fertilizantes, firmando contratos e identificando oportunidades. Então, por exemplo, a Ministra Tereza Cristina esteve no Canadá. O Canadá tem pouco excedente para mandar para a gente, ainda que, na verdade, qualquer excedente neste momento seja importante. Mas a verdade é que o Canadá está direcionando a sua produção para a Europa. Então, com isso, sobra muito pouco excedente para o Brasil. Há empresas ali com as quais nós temos contratos, e os contratos estão sendo honrados, justiça seja feita, mas ali não há espaço, penso eu, Senador Zequinha Marinho, para uma busca de muito excedente. O Irã mereceu a visita, no ano passado, da Ministra Tereza Cristina. Lá há um grande excedente. Qual é o problema? É que os importadores brasileiros têm dificuldade para fazer negócios, porque não se pode enviar recursos, fazer câmbio. Há uma conta de escambo, que na verdade tem o nome técnico de barter, dos incoterms, que no fundo é uma conta em que se deposita o dinheiro aqui em reais - dólares convertidos em reais no Brasil -, e o governo iraniano usa esse dinheiro para compra, aqui no Brasil, de insumos médicos, de equipamentos médicos e de alimentos, porque isso está fora do embargo. O que eu pedi ao Governo dos Estados Unidos através do Secretário Antony Blinken? Que nós pudéssemos ter um waiver do Departamento do Tesouro, porque eles têm lá um escritório que cuida desses ativos e penaliza empresas que furam o embargo. Então, o que eu pedi a ele foi o seguinte: eu queria uma garantia, eu queria um waiver, de que a empresa pode fazer negócio com uma empresa iraniana e não ser sancionada depois. É que os negócios com o Irã normalmente são mínimos em relação a essas empresas; elas querem, todas, poder fazer negócio com a Europa e com os Estados Unidos e têm receio... Acho que aqui foi o Senador Esperidião Amin que comentou a dificuldade que a Petrobras tinha de abastecer - imagina! - de diesel um navio iraniano. Então as pessoas preferem, porque o volume de negócio ainda é reduzido, não fazer negócio com o Irã para não serem penalizadas amanhã por seu compliance. Eu acho que essas regras são talvez muito rígidas, e eu pedi ao Governo americano, através do Secretário Blinken, que analisasse a possibilidade de conseguirmos um waiver, uma licença, para, neste momento extraordinário, poder atuar nessa área. O Irã, sim, tem muito excedente para nos exportar, porque o mercado deles é hoje fechado. Na Nigéria nós temos um mercado basicamente privado, e há uma ampliação em Lagos na fábrica desse grupo Dangote, grande trader da Nigéria. Eu fiz uma videoconferência... O Aliko Dangote, um homem de negócios realmente muito atarefado, teve a gentileza de me atender. Pudemos fazer ali nessa videoconferência, com apoio do Ministério da Agricultura, uma boa conversa, e ele também garantiu que tem excedentes para nos exportar. Marrocos e Argélia. Os nossos embaixadores trabalham também na busca de uma pouco mais de produto. Esses países já têm uma exportação relativamente grande para o Brasil, e, com isso, nós pensamos que vamos poder, vamos dizer assim, diminuir esse fosso entre a demanda e a oferta. |
| R | Mas nós não desistimos também da Rússia não. A Rússia e um produtor com o qual temos contrato, e o que nós estamos tentando fazer agora é vencer as dificuldades logísticas e garantir também ao importador brasileiro que nós não teremos problema, quer dizer, eles não terão problema em negociar com a Rússia, apesar das sanções. Eu entendo que, assim como alimentos, assim como energia para a Alemanha é fundamental, fertilizantes para o Brasil é fundamental. E não é fundamental apenas para o Brasil, Senador, é fundamental para que nós possamos combater a insegurança alimentar no mundo. O Brasil hoje é o supermercado do mundo. Em nossa produção, se houver uma quebra, afeta inclusive os contratos internacionais. Há um receio hoje no mundo de que grandes exportadores de alimento, até porque a Ucrânia deve sair de linha nessa primeira safra aqui, tenham, enfim, dificuldade de honrar os compromissos, porque, claro, as pessoas vão primeiro abastecer seu mercado interno e depois o mercado dos outros países. Então, nesse sentido é que eu acho que o Governo americano entendeu... O Secretário Blinken foi muito gentil comigo, positivo e assertivo, na nossa conversa que nós tivemos coisa de 15 dias atrás, de que eles vão tentar achar uma solução. Nisso eu tenho também o apoio do Ministro Paulo Guedes. Ele se comprometeu e se ofereceu a falar com a Secretária do Tesouro norte-americano, de modo que esse esforço é integrado. Então, é isso aí. Presidente Kátia Abreu, sobre as perguntas que a senhora me passa aqui pelo e-Cidadania, eu agradeço aqui. "Qual visão os outros países têm sobre a posição do Brasil?". Nós temos recebido elogios. Eu recebi lá um comentário muito positivo do Presidente de Portugal sobre o voto. Ele tinha lido o voto do Brasil no Conselho de Segurança e elogiou a postura do Brasil de, vamos dizer assim, repulsa a automatismos, de evitar repetir no Conselho de Segurança a lógica da guerra fria e uma preocupação sempre baseada no direito internacional e nos princípios que nós temos aqui de solução pacífica de controvérsias. O ataque imediato que nós precisamos ter agora eu acho que é cessação das hostilidades, é o cessar fogo. Há, sem dúvida alguma, uma tragédia humanitária que precisa ser mitigada, precisa ser, enfim, a todo custo evitada. Então, acho que esse tem que ser o nosso objetivo número um, primeiro; e depois, claro, tratar de trazer de novo à mesa de negociação as partes, para que nós possamos encontrar uma solução que seja duradoura, uma solução que possa dar condições àquela região para voltar a viver em paz. Nessa questão humanitária, temos tido inclusive o voto ontem... No discurso ontem nas Nações Unidas, fui muito elogiado pela Cruz Vermelha, que identificou no Brasil os elementos justamente de independência das investigações, de necessidade que as duas partes permitam a entrada de grupos de apoio de monitoramento, mas também de atenção à população civil, que, de novo, é lamentável isso, é uma verdadeira tragédia, que a população civil naqueles países sofra, sobretudo da Ucrânia, os efeitos desse conflito. Acho que isso é que tem que ser evitado. Pergunta-se aqui também se o Brasil poderia ser um país mediador. O Brasil tem essa tradição. Do ponto de vista econômico e financeiro, a guerra hoje - a Senadora Kátia Abreu tem razão - é um conflito global, ainda que o teatro de operações, o que os norte-americanos chamam de guerra cinética, ocorra no território da Ucrânia. Mas o Brasil tem, sim, credenciais: nós somos membros do Brics, nós somos um ator global, nós estamos aqui no hemisfério ocidental, temos uma identidade de valores com países como, por exemplo, os Estados Unidos. Sem dúvida alguma, aqui se cultiva uma tradição democrática. Esta Casa é um exemplo claro aqui e muito valoroso disso. E temos, eu acho, uma diplomacia que se construiu ao longo desses 200 anos como uma formadora de consensos e como uma voz sempre respeitada, penso eu, nas Nações Unidas. "Como está a relação do Brasil com os dois países?". |
| R | Eu penso que está bem, e isso aqui talvez me dê uma possibilidade, Senadora Kátia Abreu, de falar sobre a visita que o Presidente Bolsonaro fez a Moscou neste ano. Foi uma visita que foi planejada no ano passado. Foi uma visita de três Ministros de Estado: eu mesmo, a Ministra Tereza Cristina e o Ministro Bento, de Minas e Energia. Havia sido precedida da do Comandante da Marinha, em seguida à minha visita, em dezembro do ano passado, e à do Secretário Especial de Assuntos Estratégicos, o Almirante Flávio Rocha. Desse modo, as visitas não ocorrem por impulso. Nós temos um planejamento. Achávamos que era um momento maduro. Fazia tempo que os Presidentes não se encontravam em um encontro bilateral. Achávamos que era importante. E ela aconteceu uma semana ou dias antes desse conflito. Não obstante, eu me recordo de que, no dia em que embarquei para a Rússia acompanhando o Presidente da República, eu tive um contato com o Chanceler da Ucrânia. Antes disso, eu já tinha tido três contatos telefônicos com o Chanceler americano, em janeiro. Desse modo, a nossa posição é concertada. Nós conversamos com os dois lados, conversamos com a Ucrânia. Havia, naquele momento - é importante que se diga -, sinais tranquilizadores do lado da Ucrânia, que julgava que era um exagero retórico do Ocidente a possibilidade de um conflito local, um conflito militar, eu digo, que atingisse o território. Esse era o discurso ucraniano. O Encarregado de Negócios da Ucrânia, que será ouvido hoje à tarde aqui, como me diz a Senadora Kátia Abreu, nesta Casa - e é bom que o faça, porque é importante dar voz a todos os atores -, outro dia, numa declaração pública, disse: "É verdade o que o chanceler falou no Plenário do Senado. Nós ali não tínhamos ideia de que isso fosse acontecer. Nossa visão era, naquele momento, outra, pelo menos naquele momento". Não estou dizendo que não houvesse uma preocupação deles em relação a um possível conflito. Mas assim foi feito naquela ocasião. Há um fato interessante que a imprensa noticiou, a imprensa mundial - não sei se, no Brasil, foi muito noticiado: o chefe da Inteligência do Governo alemão estava, no período de 23 a 25 de fevereiro, em Kiev, na Ucrânia, e se disse surpreendido com o conflito. É claro que, se ele soubesse que ia haver o conflito, ele não estaria ali naquele momento. Então, eu acho que, realmente, houve uma grande dose de imprevisibilidade. A história olhada pelo retrovisor parece sempre mais clara, muito mais cristalina. No entanto, naquele momento, nós não tínhamos nenhuma indicação de que pudéssemos ter... E achávamos até que a presença do Presidente Bolsonaro lá, nesse diálogo, seria importante para reforçar justamente estes valores brasileiros de defesa da paz e de respeito ao direito internacional. A última pergunta aqui, Senadora - com isso, eu vou concluir -, é sobre se o número de funcionários no Serviço Exterior é adequado. Eu não o acho adequado. Nós vamos até tentar agora, no próximo orçamento, conversar com o Ministro Guedes, da Economia. Há o desejo do Itamaraty de renovar aqui, porque nós temos muitos claros de lotação, com um novo concurso para Oficial de Chancelaria e/ou Assistente de Chancelaria, que são duas carreiras que integram o Serviço Exterior Brasileiro. E nós temos represado aqui o número de 400 diplomatas. Nós somos hoje cerca de 1,4 mil. E com esses 400... Eu pretendo também conversar com o Ministro Paulo Guedes. Eu acho que nós não teríamos condição de absorver isso da noite para o dia, de abrir um concurso para 400 vagas, mas, de alguma maneira, podemos ampliar esse número, de modo que nós possamos ter, a cada ano, um número um pouquinho mais elevado de alunos no Instituto Rio Branco, de modo, então, a poder ampliar os quadros da diplomacia brasileira, do Serviço Exterior Brasileiro. O mundo parece que, de uma hora para a outra, ficou grande demais. Então, é preciso que a gente tenha presença nele, e presença adequada. A Presidente Kátia Abreu já fez - com isso, vou concluir mesmo - um esforço aqui muito interessante de ver, por exemplo, até interesses comerciais e lotação de embaixada. |
| R | Eu tenho vontade, se o tempo me for possível... Não sei se conseguiremos neste ano, mas eu acho que nós precisaríamos duplicar ou triplicar o número de funcionários na embaixada na China, na nossa embaixada em Pequim. Nós precisaríamos realmente até ter uma nova sede lá, e há lugares onde eu gostaria de poder encontrar as condições materiais para adotar maiores recursos humanos, postos que são sempre muito importantes. Tomara Deus que sigamos nessa linha. Muito obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO. Para interpelar.) - Obrigada, Chanceler. Eu apenas reitero que a Ásia - modestamente, é a minha contribuição - deveria ser o nosso foco para a lotação da diplomacia brasileira em primeiríssimo lugar. Hoje, as possibilidades, as perspectivas, o mundo real de comércio com a Ásia já é muito maior do que com todos os países da Europa. E nós temos um déficit impressionante em todos os países, principalmente na China. Ministro, eu gostaria de fazer alguns questionamentos agora de minha própria autoria. Eu sou a autora do requerimento que convida V. Exa. para o dia de hoje. Chanceler, a guerra foi considerada pela Assembleia Geral da ONU como uma agressão, e o Brasil assinou junto e tem todo o meu aplauso. Inclusive, eu disse aqui ontem - se a sua assessoria acompanhou - que o Itamaraty se postou adequadamente, na minha visão, em todos os dois votos que deu no Conselho de Segurança e na Assembleia Geral da ONU. Então, foi um ilícito internacional, que é considerado por todos os países inadmissível, inclusive pelo Brasil. Ao mesmo tempo, o senhor disse aqui, por várias vezes, não só uma, que está havendo sanções seletivas. Então, num momento, o senhor dá um grito alto contra a invasão, concorda com o fato de que é um ilícito internacional - a Corte Internacional de Justiça já estabeleceu isso -, e depois o senhor acha... "Não, ele cometeu um crime, mas não precisa ser preso. Vamos só colocar a tornozeleira", algo desse tipo, certo? Cometeu um crime hediondo que é matar pessoas, jogar bomba nas cidades, destruir tudo... E depois achar que sanções seletivas estão sendo feitas. Então, eu queria só que o senhor explicasse para todos nós e para a nossa audiência que nos acompanha como se convive com isso? Eu respeito muito a posição brasileira de que nós temos delicadezas para resolver. Nós somos grandes importadores da Rússia, de fertilizantes... Então, é um no cravo e outro na ferradura? Ou é um bate e o outro assopra? Eu acho que, por essa posição que aparenta dubiedade, é que veio a pergunta do e-Cidadania: "O que o mundo pensa do Brasil sobre a posição com a guerra?". Então, o senhor respondeu adequadamente do ponto de vista técnico: acudiu, fez, tirou os brasileiros, assinou, participou das assembleias, assinaram tudo, mas, por outro lado, verbalmente manifesta-se de forma, às vezes, dúbia. É por isso que está causando, às vezes, uma má interpretação em boas atitudes do Itamaraty. E, de repente, vocês mesmos trabalham contra essa atitude boa que o Itamaraty teve. A outra questão, parecida com o que nós dissemos agora nesse início, é a seguinte: nós iniciamos o processo formal de adesão do Brasil à OCDE. É um sonho brasileiro entrar na OCDE. O Brasil, inclusive, não assinou a quebra de patentes da vacina temendo ser excluído ou mal visto pela OCDE. Também é um sonho meu o Brasil entrar na OCDE. |
| R | Agora, em que pesem todas essas posições, que eu acabei de dizer, na Assembleia Geral da ONU e no Conselho de Segurança - cessar-fogo, início imediato de ligações de paz -, o Brasil se absteve de votar no âmbito da Unesco na condenação dos ataques russos. Então, é essa a questão que, novamente, o Brasil, os brasileiros têm o direito de entender, de compreender essa posição dúbia: por que não assinou junto à Unesco a condenação aos ataques russos? Ontem, aqui, nós dissemos - e eu pessoalmente - que a Rússia tinha todos os motivos do mundo para vencer essa batalha, antes de ter dado o primeiro tiro. Depois que deu o primeiro tiro, depois que avançou, agrediu, descumpriu acordos internacionais gravíssimos, para mim, ela perdeu toda a razão. E, antes disso, a minha tendência era compreender melhor a situação da Rússia. Então, ela perdeu a batalha publicamente, a batalha de comunicação, que é uma batalha importante, não é uma batalha sangrenta, mas, causada pela batalha sangrenta, a Rússia está acabando por perder a batalha de comunicação. É realmente uma pena que tenha tomado essa atitude. Sr. Ministro, essa abstenção levou, inclusive, o Secretário-Geral da OCDE a dirigir uma carta ao representante brasileiro junto ao organismo em Paris, cobrando uma definição do Brasil sobre de que lado nós estamos. Então, nós não podemos deixar de discutir, com clareza, aqui, no Congresso Nacional, Sr. Ministro, o que, mais uma vez, deixa o Brasil em posição dúbia. O que fazer? De que lado estamos? Queremos a OCDE, levamos uma bronca na OCDE, porque não assinamos o pedido de cessar-fogo na Unesco. E ainda nós precisamos não tomar uma decisão... Quem toma decisão é juiz, a diplomacia justamente é para tentar articular e, com maestria, que é o grande segredo da diplomacia - embora não seja uma, infelizmente, diplomata, tenho uma admiração profunda pela diplomacia -, justamente fazer esse jogo sem sair chamuscado e ferido dele. Então, nós somos um bloco anti-Rússia ou nós somos do Bric, que é outra aliança poderosíssima para o Brasil? Não espero aqui que o senhor vá dizer - não tenho a inocência - nem deve dizer de que lado nós estamos com um tiro certeiro. É apenas para reflexão. Então, o que pesa mais para o povo brasileiro? O que me interessa é o povo brasileiro em primeiro lugar. É claro que todos os povos do mundo que estiverem sendo agredidos, mortos, atacados devem interessar a toda a humanidade. São reflexões importantes. O Brasil vai sofrer a médio e a longo prazo. É a OCDE? É anti-Rússia? É Otan? É Brics? Então, eu acho que esse é um ponto de fundamental importância para que o senhor possa esclarecer para toda a audiência. Em seguida - acabou sendo uma pergunta só em todos esses comentários -, com relação ao que disse o Senador Francisco Rodrigues, dos embargos, da questão da Venezuela, os Estados Unidos estão pensando em tirar o embargo à Venezuela, porque estão interessados no petróleo da Venezuela. Eu pergunto se, graças a isso, também não se pode flexibilizar o embargo contra o Irã. |
| R | Nós não temos embargo contra o Irã, mas nós sabemos das ameaças às empresas que negociarem com um país embargado. Então, nesse afã de resolver os problemas e salvar a sua pele, os americanos estão querendo baixar os embargos. E eu pergunto se não poderia ter a mesma atitude numa negociação, numa questão, num questionamento brasileiro sobre os embargos com o Irã, que é um potencial vendedor de fertilizantes para o Brasil. Então, seria uma belíssima troca de cada um salvar sua pele, e nós temos aqui os nossos interesses. Nós sabemos, Chanceler - o senhor mais do que todos nós aqui -, que os Estados Unidos e a Rússia, acho, estão na pior, segunda li de alguns especialistas. Eu não sou especialista em nada disso; apenas na roça, eu sou até um pouquinho entendida nas questões do campo. Mas os Estados Unidos e a Rússia nunca tiveram uma crise tão grave igual a que nós estamos vivendo hoje, e atiçado o fogo por ambos; Biden, de forma mais educada, mais sorridente, mas tão truculento como o ex-Presidente, na forma de tratar essa questão. É um país muito importante, uma grande potência mundial que não pode, na minha avaliação, para tentar amenizar um conflito de vulto internacional, prejudicando principalmente os países em desenvolvimento, partir para essa agressividade, como se não tivesse nenhuma noção de diplomacia. Então, desde Kennedy e Kruschev, acho que é pior do que naquela época, por conta daqueles mísseis que eles queriam, aquela crise dos mísseis na época do Presidente Kennedy. Então, eu pergunto a V. Exa.: será que a China, talvez a Alemanha, a Turquia e o nosso próprio Brasil não seriam os países adequados para propor uma grande concertação em torno desse conflito que não é de Rússia e Ucrânia, ninguém aqui é criança; esse conflito é entre Rússia e Estados Unidos? Então, será que nós não poderíamos, esses países ou outros, eu imaginei aqui, escrevi esses nomes China, Turquia, pensei em Alemanha, e por que não o Brasil a mediar uma grande concertação? Alguma coisa precisa ser feita, e o Brasil tem tradição, o Brasil tem um exército de diplomatas que, às vezes, podem até não ser reconhecido por muitos, mas eu reconheço o trabalho da diplomacia brasileira, que é de excelência. Nós não perdemos em nada para a diplomacia desses países aqui que eu mencionei. Então, por que não um protagonismo em direção a essa concertação? Esperar que os americanos se aproximem dos russos e os russos se aproximem dos americanos é o mesmo que sonhar com o quê? Não sei... Ganhar na Mega-Sena sozinho, talvez, mais de R$100 milhões. É muito difícil! Então, nós precisamos tomar atitude, nós precisamos sair desse conforto de esperar as coisas acontecerem sozinhas. Eu acho que o Brasil pode tomar essa iniciativa de convidar; não é acabar com a guerra. Nós não estamos aqui com essa ousadia e com essa prepotência, mas pelo menos precisamos ter a consciência tranquila de que alguma coisa se tentou fazer, porque nós brasileiros estamos sendo altamente afetados por isso. Quanto ao preço dos alimentos, dos fertilizantes, vocês ainda aguardem a próxima safra sobre o que vai acontecer com o Brasil e com o mundo. Então, eu penso que alguma coisa deve ser feita. No episódio da covid, eu falei até com o Papa; até para o Papa eu mandei uma cartinha de próprio punho, porque eu quis fazer alguma coisa, eu precisava fazer alguma coisa como cidadã, como Presidente da CRE. A gente não pode se acomodar: "Não, isso aqui não é para nós; isso aqui é para gente grande". Nós somos gente grande, Chanceler. |
| R | Podemos até ter complexo, mas nós somos gente grande e poderíamos, sim, articular um grande encontro para dar o primeiro passo para essa concertação e acabar com essa monstruosidade dessa guerra, que até agora não entendi quem é que está ganhando. Conflitos especiais, próprios, individuais estão pautando o mundo com egoísmo hipócrita, que não faz bem a ninguém. E ainda encerro, Chanceler, dizendo que eu fico por vezes chocada com a hipocrisia com relação a fertilizante. Eu fico impressionadíssima, Presidente Collor. O Brasil tem água, solo, temperatura, tecnologia de ponta para produzir uma das melhores agriculturas do planeta, e não pode produzir fertilizantes, certo? Não podemos produzir fertilizante, absolutamente. Nós temos que impor, estamos impondo a nós mesmos uma insegurança alimentar monstruosa, quando nós não temos o principal insumo, que é jogar tudo na terra maravilhosa, com a tecnologia maravilhosa, sem os fertilizantes. Então, agora, eu vejo alguns ambientalistas - e muitos são importantíssimos para o Brasil e para o meio ambiente - desconsiderarem a possibilidade de nós sermos autônomos na produção de fertilizantes onde quer que ele esteja. O alimento é mais importante do que tudo. O meio ambiente é muito importante, mas sem comida não se vive. Sem comida, não se vive. E o Brasil não pode fazer de conta de que não está acontecendo nada. É um absurdo nós, que fazemos parte de uma elite política neste país, permitirmos que o povo brasileiro fique à deriva sem fertilizantes e sem agroquímicos. Isso eu debato em qualquer fórum do mundo inteiro. É porque é terra desse, é porque é terra daquele, tecnologia existe é para isso, para você contornar os danos e, quando o dano é impossível de ser praticado, você compensá-lo em outro lugar; agora, ficar sem adubo não podemos, não. Isso não podemos. Toda a guerra, todo o mal vem às vezes para o bem. Então, espero que esse seja o grande alerta. E o pior de tudo é que esses que querem proibir a produção de fertilizantes no Brasil nem perguntam de que jeito está sendo produzido na Rússia. Em que condições ambientais? Nunca vi ninguém perguntar: "Vamos lá ver? Vamos lá ver se é na mesma exigência que é feita no Brasil?". Não, mas a gente pode comprar. "Compra. Não olha, não. Vamos ver como é que eles estão produzindo, não. Compra, compra, compra de qualquer lugar do mundo". Só Deus sabe o que foi destruído ambientalmente para produzir esse fertilizante. E nós, os maiores compradores do mundo... É falta de estratégia, é falta de planejamento, é falta de inteligência um país ficar à mercê de outros países - de qualquer um, não importa - do insumo mais importante da economia nacional, que é o fertilizante para produzir essa gigante agropecuária brasileira. Obrigada. Com a palavra o Chanceler. O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA (Para expor.) - Presidente Kátia Abreu, ouvindo a senhora agora, eu queria agradecer de novo o convite, a oportunidade de estar aqui. Esse debate aqui, os pontos que a senhora levanta são de suma importância. E quero dizer que sua voz é sempre ouvida e fica aqui na mente da gente quando eu saio daqui. Fica ali quando tomo as decisões. Eu concordo com a senhora que nós precisamos de mais diplomatas na Ásia. É por isso que nós estamos nos aproximando como parceiro de diálogo da Asean, é por isso que nós estamos abrindo um consulado no centro da China focado em ciência e tecnologia. A China hoje é uma potência na área de ciência, tecnologia e inovação, na cidade de Chengdu. Para minha tristeza, dos cinco consulados que eu abri, o que mais demorou a nos responder foi a China, o Governo chinês, mas eu entendo lá as condições; talvez por conta da pandemia. |
| R | Então, talvez seja o último consulado a abrir neste ano. Nós abriremos antes o de Orlando, o de Cusco, o de Edimburgo, o de Marselha, mas eu espero, na minha gestão, ainda poder inaugurar pessoalmente esse Consulado em Chengdu. É uma diretriz nossa poder acentuar as relações que nós temos com a Ásia. Eu, como disse aqui, fui criado em Ribeirão Preto. E Ribeirão Preto tem um grande jurista, que já não está mais conosco e que, apesar de ter nascido em Brodowski, dizia-se que era de Ribeirão Preto: Saulo Ramos, que foi Consultor-Geral da República e um brilhante advogado. Conta-se uma história em Ribeirão. Não sei se é verdade, Presidente Collor, mas parece que ele foi convidado a ser Ministro do Supremo Tribunal Federal e teria dito: "Olha, eu prefiro declinar do convite, porque eu sou um advogado, minha alma é de advogado. Quando vejo uma causa, quero logo assumir um lado e não posso ser juiz, não posso ser magistrado". Dizem até que ele teria indicado ao Presidente que queria nomeá-lo o nome do Ministro Celso de Mello, a que o Presidente então teria dito: "Olha, eu acho que ele é muito jovem". E Saulo Ramos com a verbe que só ele tinha, disse assim: "Não, mas isso o tempo resolve". (Risos.) Foi também o Ministro Celso de Mello um excelente Ministro, como tenho certeza de que seria o Ministro Saulo Ramos. Eu, que sou advogado e até hoje tenho minha carteira da OAB Seccional de Ribeirão Preto, desde 1990, antes até de entrar no Itamaraty, advogava. Vim para o Itamaraty e cheguei um pouco com essa alma de advogado, eu olhava as questões e queria achar um lado. De que lado tem que estar aqui? Então, me dei conta de que não, de que o trabalho que nós temos que fazer ali é justamente, primeiro, ter um lado muito claro, que é o lado do Brasil. E, no caso desse conflito, nós temos um lado claro, que é a paz mundial. V. Exa. tem razão, Presidente Kátia Abreu, a agressão é inadmissível. No momento em que há o conflito armado, a invasão do território, nós entendemos que a Rússia cruzou uma linha vermelha. Quanto a isso não há dúvida em relação à posição do Brasil. Eu acho que não pode ficar a impressão, porque ela seria errônea, de que nós temos ali uma dubiedade. Eu penso que tanto isso é verdade que, nesta manhã, falando à Frente Parlamentar da Agricultura, o Encarregado de Negócio norte-americano - a senhora até mencionou o nome dele aqui -, Douglas Koneff, me mandou a apresentação que ele fez ali, o discurso inicial em português. Ele elogia - até generosamente o faz na minha pessoa - a posição do Governo brasileiro nas Nações Unidas e no Conselho de Direitos Humanos da ONU; ele elogia. O Secretário Blinken, com quem eu falei há menos de 15 dias, também agradeceu o apoio que o Brasil tem dado. Então, eu acho que o lado do Brasil está muito claro: é a defesa do interesse nacional e a busca pela paz. E essa, eu penso, é uma posição que é respeitada aí fora. A senhora me perguntou: por que nós nos abstivemos na resolução da Unesco? Por que nós não assinamos essa ou aprovamos aquela resolução? Por que não foi aprovado com o nosso voto? Por que essa resolução foi aprovada? Porque, na verdade, era uma matéria estranha àquela organização. Nós estávamos tratando de um assunto que era ligado à arte, à educação, à Ucrânia, sem dúvida alguma, mas nenhum dos temas relacionados ali ao mandato da Unesco justificava a inclusão de alguns parágrafos. Eu queria dizer que nós tivemos uma resolução que foi aprovada por 33 votos, mas que teve um grande número de abstenções, 24 abstenções. Quer dizer, 23 países pensaram como o Brasil. |
| R | Qual o melhor fórum para cuidar do conflito da Ucrânia? É o Conselho de Segurança. Por que isso? Primeiro, porque eu acho que é muito perigoso o sistema multilateral em que as organizações passem a tratar e a legislar sobre matérias que são estranhas à sua competência, porque, senão, amanhã, talvez, não sei, a Organização Mundial do Trabalho ou a Organização Mundial da Propriedade Intelectual podem querer fazer também uma resolução condenando o Brasil no meio ambiente. Eu não acho que seja justo e, mais que isso, não acho que isso seja produtivo. Do que nós não podemos nos afastar, penso eu, Presidente Kátia Abreu, é do compromisso que temos de ter agora com a construção da paz mundial. E nisso há um fórum em que, graças a Deus, o Brasil tem hoje uma presença, com assento não permanente, que é o Conselho de Segurança. Eu acho que é lá a arena em que nós temos realmente de trabalhar essa questão com um foco muito claro: cessar fogo e tratar da questão humanitária, em primeiro lugar; depois, claro, conseguir encontrar soluções duradouras para a construção da paz e do acordo naquela região. Em relação à OCDE também aconteceu isso. Nós tivemos uma reunião agora de meio ambiente em que havia ali uma condenação à Rússia em relação ao conflito com a Ucrânia. Eu penso que isso acaba desvirtuando o mandato da OCDE. De novo, tem que ficar claro para a OCDE, porque, se nós votamos duas ou três vezes no Conselho de Segurança - uma vez na Assembleia Geral e no Conselho de Direitos Humanos -, a nossa posição é clara, e a OCDE deveria entendê-la, porque o nosso compromisso neste momento em que nós não somos membros plenos não pode ser de exceção política; tem que ser primeiro de exceção econômica. E, no momento em que nós, então, fizemos parte do clube, nós podemos falar de valores, mas os valores que o Brasil compartilha são conhecidos de todos e são valores defendidos nesta Casa: respeito à democracia, liberdade de imprensa, que aqui é total no Brasil, é a postura do Brasil de independência nas relações exteriores de rejeitar o automatismo ou de replicar - e aí teremos de tomar um lado - uma lógica de guerra fria que nos desobrigaria de manter um juízo crítico. A política externa, eu penso, é uma linha de continuidade por conta dos valores e princípios que nós reconhecemos no Ministério das Relações Exteriores, mas que nós precisamos atualizar de tempo em tempo. Se eu faço um automatismo, como eu vou atualizar? Há países aqui na região que adotaram uma moeda estrangeira - o dólar, por exemplo - como moeda nacional. Por que o Ministro Paulo Guedes não faz isso aqui também? Porque ele quer manter a independência da política econômica. Então, se amanhã eu deixo de ter o real para ter outra moeda que eu atrelo a outro país, esse país passa a ter o controle da política monetária. Então, na verdade, eu acho que é por isso que nós aqui também não podemos nos alinhar a um automatismo no Itamaraty, porque estaríamos abdicando - e esse patrimônio não é meu; é do Estado brasileiro, da nação brasileira, do povo brasileiro, do Congresso - da condução da política externa. Eu acho que isso nós não podemos fazer. Eu concordo com V. Exa. O Brics é uma organização poderosa, é uma posição que nós temos do Brasil como global player para poder justamente, nesse novo jogo geopolítico que se redesenha, influir. Estamos ao lado da China, ao lado da Índia, estamos ao lado da África do Sul, estamos ao lado da Rússia. Podemos, sim, ter uma posição de ponderação para poder participar. Da Otan eu já tenho alguma dúvida, porque... Eu gostaria de lembrar... Muito se fala que o Brasil poderia ceder a ser um parceiro chave, um key partner, como eles dizer em inglês, da Otan. |
| R | Eu queria lembrar que o Iraque e o Afeganistão eram key partners, e aquilo não ajudou esses países no momento em que eles precisaram ali resolver essa questão... (Intervenção fora do microfone.) O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA - Talvez, muito pelo contrário. Qual o desafio que eu acho que nós temos aqui? Realmente é partir do momento, enfim, dessa posição do Brasil como um conciliador e como facilitador de consensos para uma postura, vamos dizer assim, mais proativa ou mais, enfim, decidida, vamos dizer assim, para uma concertação. Era preciso um pouco mais de diálogo com a China, com a Índia, com a Turquia. Eu vou ter, ainda este mês, a alegria de receber o Chanceler da Turquia aqui. Eu havia estado com ele em outubro do ano passado, em Roma, e acertamos a vinda dele aqui. Nesse caso, é uma vinda que vem, inclusive, em bom momento, porque ele vai poder me contar aqui qual o papel da Turquia, brilhante nessas negociações, e talvez nós possamos ali, eu possa falar com ele, se tiver autorização do Presidente Bolsonaro - tenho certeza de que ele não me a negará -, para poder também colocar a diplomacia brasileira a serviço da paz. Esse seria o maior sonho que pode ter o Brasil. Eu estive na Europa, na Polônia, recentemente, no voo, passei em Portugal. Ouvi - estive lá com altas autoridades, como o Presidente também do Governo húngaro - que as negociações continuam. A França, pelo que eu sei, tem feito o seu trabalho de mediação. Sobre a Alemanha, eu não tenho dados, mas eu imagino também que estejam fazendo e estarão sempre dispostos a um trabalho de articulação com os dois lados nesse momento ali do conflito. E, por fim, sem prejuízo que a senhora me inquira mais vezes aqui sobre esses temas ou outras questões, realmente V. Exa. está coberta de razão: o ambientalismo foi a outra vítima desse conflito. Invadiu-se a Ucrânia e se abateu o ambientalismo. Hoje, a geração de energia no mundo desenvolvido desconsidera as fontes renováveis. A transição energética sofrerá o processo, porque hoje existe uma desaceleração. Não haverá como evitar esse tipo de movimento, quer dizer, haverá esse retardo ali no avanço desse processo e também na questão agrícola, porque até áreas que já estavam protegidas na Europa vão ser utilizadas para a produção de alimentos tamanho é o medo de que a fome volte ou a insegurança alimentar volte a atingir o mundo. E isso vai acontecer se nós não tivermos acesso a fertilizantes. É por isso que nós estamos tratando com os Estados Unidos para conseguir um waiver na relação, por exemplo, com o Irã, que tem muito excedente de produto para nos passar, porque nós estamos também buscando outras fontes. Para terminar aqui, Presidente, eu quero dizer que concordo também com V. Exa. No agro - e eu disse isto no meu discurso de posse -, quem compra alimentos do Brasil compra tecnologia. Nós temos que ter muito orgulho do trabalho feito pelos nossos agricultores, na agricultura familiar, os grandes, imensos produtores que nós temos aí no Mato Grosso, no Mato Grosso do Sul, no seu estado, no seu Tocantins, no Maranhão, no Piauí e em outros tantos, no sul do país; a Embrapa é realmente uma líder; o trabalho do nosso povo, a inventividade, a engenhosidade do brasileiro; os recursos naturais que nós temos aqui de água e sol, que ajudam muito, mas realmente era preciso trabalhar nessa questão dos fertilizantes. Isso é tão fundamental. Nós temos muita plantação no Cerrado. São terras que não são férteis, que precisam de correção do solo - a senhora sabe disso melhor do que eu, pois a senhora é produtora. Então, era preciso nós realmente avançarmos sobre isso aí. Em 2015, a Petrobras tomou a decisão de fechar ou descontinuar duas plantas: uma, inclusive, é em Três Lagoas. |
| R | Naquela ocasião, eu tinha acabado de chegar da Bolívia e via que havia ali o gás natural que podia servir de matéria-prima para esta planta ali, em Três Lagoas. Não foi assim que aconteceu, e hoje talvez nós precisemos realmente repensar. E que tempo vai tomar, se vai dar para a próxima safra, possivelmente não, pelo que a senhora me conta. Mas são esforços que nós não podemos, agora, numa estratégia de médio e longo prazo, desconsiderar. Muito obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Chanceler, por suas respostas. Eu acho que isso é importante, o Brasil se colocar nas oportunidades que tem, o porquê disso e o porquê daquilo. Então, são essas explicações que nós queremos ouvir do Chanceler, para esclarecer o povo brasileiro a respeito de uma possível dubiedade. Ele fez as suas explicações para reflexão de todos, para tirarem as suas conclusões se realmente essa é a posição correta. Eu me sinto satisfeita com sua resposta. E fertilizante é simples: é licença ambiental e recurso, crédito para financiar o setor privado. Não tem outra coisa a fazer. Uma licença ambiental correta, certa, protetora, mas não impeditiva de exploração. Ela tem que proteger o meio ambiente, e não impedir a produção de fertilizantes. Algum dos dois colegas Senadores ou dos que estão remotamente tem mais alguma questão a respeito de Ucrânia e Rússia? (Pausa.) Eu gostaria, Chanceler, se o senhor me permite... Não está no arcabouço da nossa audiência, mas é uma preocupação, se o senhor quiser responder ou talvez mandar depois algum comentário: eu tenho lido e acompanhado algumas questões sobre a comercialização da energia de Itaipu e eu vi algumas críticas a respeito da posição brasileira sobre essas negociações, como se não houvesse outra oportunidade, que o senhor terá, para explicar ao povo brasileiro o que de fato está sendo feito. Porque há controvérsias, dizendo que o Brasil não está levando muito a sério essas negociações com Itaipu. O que acontece? Só para lembrar os que estão nos acompanhando, a energia produzida é metade brasileira, metade paraguaia. O Brasil usa os seus 50% e ainda compra 30% do Paraguai. É o direito de preferência. E o Paraguai usa 20%. Então, caso o Brasil não quisesse comprar, aí o Paraguai poderia vender para outros países. Qual é o clamor do Paraguai? Eles acham que esses 30% vendidos ao Brasil estão a preço de banana e que eles estão tendo prejuízos. O que significa Itaipu para o Brasil? Do ponto de vista do PIB é pouco. Do ponto de vista de energia, é muito: Itaipu representa 10% do consumo da energia brasileira. Mas, do ponto de vista do PIB, para o Paraguai, significam 7% esses recursos; então, é muito! A gente tem que entender a angústia do outro país, que isso tem um peso, essa comercialização tem um peso, e eles cobram essa defasagem nos preços e querem uma atualização e o direito de vender para outros países com um preço mais elevado. E ainda cobram uma dívida de quase US$4 bilhões dessa defasagem de preços. |
| R | Então, eu gostaria de lhe dar a oportunidade... Isso tudo está no tal do acordo de Anexo C. É uma coisa técnica, que não importa muito. Inclusive, eles contrataram um dos maiores economistas do mundo para defendê-los, e esse economista, de Columbia, não quer nem cobrar do Paraguai, porque tem a convicção de que o Paraguai está do lado da razão, que é o Jeffrey Sachs. Então, nós precisamos ouvi-los, se for possível hoje ou, se quiser, em uma outra oportunidade, não gostaria de pegá-lo de surpresa nem de constrangê-lo, mas gostaria que pudesse nos falar alguma coisa que possa diminuir a nossa preocupação com relação a essa negociação. Obrigado, Ministro. O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA (Para expor.) - Presidente Kátia Abreu, é muito importante esse tema. Itaipu é um motivo de orgulho para os paraguaios e para os brasileiros. Em certo sentido, é a vitória da cooperação sobre a rivalidade. O que havia ali sobre um possível conflito de limites foi superado com o engenho, a determinação e a coragem de dois países que, díspares no seu desenvolvimento naqueles anos 60, souberam se unir para construir esse portento que é a Itaipu. Quem não conhece Itaipu, eu recomendo que faça uma visita. Há lá um turismo guiado. Realmente é algo que nos enche de orgulho. É uma usina cuja engenharia é tão poderosa... Ela tem um fator de carga, quer dizer, a quantidade que gera de energia a partir da capacidade instalada, que é muito difícil de se superar. Diziam-me os barragistas, que são os engenheiros que constroem as usinas: aqui, na Venezuela, a Hidrelétrica de Guri, muito bem construída; Itaipu vem em seguida, com fator de carga que passa dos 92%; e mesmo Três Gargantas, que foi feita ali a partir de visitas que os chineses fizeram, hoje não tem a capacidade de produção, a eficiência energética que tem em Itaipu. Isso tudo eu digo para dizer que eu tenho absoluta convicção de que, se nós fomos capazes de construir Itaipu há tanto tempo, sem ter recursos, com financiamento externo, sem ter um arcabouço jurídico que nos permitisse entender como que era a binacional, porque ela não é só uma usina, é um empreendimento binacional, e toda a regulação, e estender linhas de Foz do Iguaçu até Furnas, num momento em que não se sabia direito como fazer linhas com aquela extensão geográfica... Hoje nós temos aí o Linhão do Rio Madeira até Araraquara, que são quase 2 mil quilômetros. Hoje já se tem a tecnologia, mas naquela ocasião não havia. Quando a gente conversa com os engenheiros de Furnas, eles contam a verdadeira epopeia técnica que foi, naquele momento, fazer aquele empreendimento. Então, eu tenho certeza de que, se os dois países conseguiram construir a hidrelétrica, não será agora que nós vamos deixar de encontrar um acordo. As negociações são realizadas pelo Ministério de Minas e Energia. Eu tenho uma familiaridade porque o Itamaraty tem um assento no Conselho de Itaipu, não como conselheiro, mas como representante da alta parte brasileira, que é o Estado brasileiro; então, o Itamaraty tem, por força do tratado, um assento lá. E eu trato com a chancelaria Paraguaia sobre a questão do Anexo C, que vence agora em 2023. Em 2023, então, nós vamos já iniciar a negociação, já respondi ao Chanceler paraguaio nesse sentido. Houve, no ano passado, um desejo paraguaio de iniciar as negociações, nós dissemos que queríamos fazer de forma presencial, porque as negociações são realmente delicadas e intrincadas. O Paraguai achou, então, que ainda não era o momento, mas aí, quando se abrem as fronteiras pelo fato de a pandemia ter sido superada, nós vamos dar início, agora, à negociação. |
| R | No momento, o que nós estamos tratando - e aí quem conduz as negociações é o Almirante Risden, que é o Diretor-Geral brasileiro, junto com o Embaixador Manuel Cáceres, que é o Diretor- Geral paraguaio - é da questão da tarifa. E essa negociação é uma negociação... É um problema bom, e o senhor sabe por que, Presidente Collor? Porque significa que nós conseguimos pagar o empréstimo e agora nós temos um custo financeiro muito menor, o que vai se refletir na tarifa. Então, nosso objetivo agora é conseguir a tarifa do tratado, que é mais justa, e portanto será mais baixa, porque agora nós já amortizamos praticamente todo o empréstimo internacional e sem descuidar daquilo que Itaipu tem que fazer, que são os impactos positivos que ela tem que gerar no desenvolvimento regional. Uma segunda ponte com o Paraguai foi feita com recursos de Itaipu, está praticamente concluída, eu acredito que agora em maio ela estará 100% feita, e houve o lançamento da pedra fundamental, com recursos também de Itaipu, de uma ponte que vai ligar Carmelo Peralta, no Paraguai, a Porto Murtinho, no Mato Grosso do Sul. Tudo isso é com dinheiro de Itaipu, dinheiro fruto do trabalho dos brasileiros. Nesse sentido, eu acho que há muitas possibilidades de acordo. O Presidente Bolsonaro fala frequentemente com o Presidente Mario Abdo sobre o assunto. Eu estive com o Presidente - acho que foi na quinta-feira da semana passada -, e ele mesmo me havia dito que havia conversado. Há um interesse tanto do lado paraguaio quanto do lado brasileiro de chegar a um bom acordo, e eu não tenho dúvida de que isso acontecerá. Agora, tudo isso é feito dentro do marco legal. O Ministério de Minas e Energia tem realmente uma posição bastante técnica sobre o assunto, são contas muito complicadas de se fazer. Eu sei que o Presidente Limp, da Eletrobras, também tem um diálogo muito fluido com a estatal paraguaia de eletricidade, que é a Ande, e tudo isso precisa se ajustar para que nós possamos chegar a esse acordo. Eu não tenho dúvida de que nós vamos fazê-lo, e, ainda que isso não tenha acontecido, Itaipu segue funcionando, há um acordo operativo, as diretorias têm muita comunhão no trabalho - a cada dois meses há uma reunião do conselho -, e no dia a dia a usina é muito bem tocada. Houve um relatório realmente, Senadora, do economista Jeffrey Sachs, mas eu tenho dúvida de que isso tenha sido feito pelo Governo paraguaio. A imprensa deu muita divulgação a esse resultado, e o que eu posso dizer à senhora é que há esse estudo, mas ele não é utilizado como base das negociações. A base das negociações é o tratado e esse trabalho técnico de formiguinha que têm tocado os engenheiros e técnicos da Eletrobras e os economistas do Ministério de Minas e Energia. A diretoria de Itaipu neste momento tem toda a confiança... Aos paraguaios que me procuram, eu sempre digo "olha, o mandato agora é do Almirante Risden, que ouve sempre o Ministro de Minas e Energia, consulta-se com o Itamaraty e recolhe, é claro, do Presidente Bolsonaro as orientações maiores". Itaipu é um exemplo de êxito e de sucesso. Nós temos que nos orgulhar dele, e ele continuar sendo assim. Obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Ministro, por todas as suas manifestações. É sempre uma oportunidade que V. Exa. tem não de explicar, mas de contextualizar a situação para o país e para nós, Senadores da República. |
| R | Eu gostaria de colocar três requerimentos extrapauta, aproveitando o quórum, depois nós passamos ainda para o sistema à distância. Aí eu preciso de outra audiência para aprovar requerimento, para nós fazermos as audiências online. A primeira delas é uma audiência conjunta com a Comissão de Meio Ambiente, com a Comissão de Agricultura e com a CRE sobre a produção própria e importação de fertilizantes no Brasil. A minha ideia seria a de nós fazermos uma audiência pública conjunta para encontrar uma solução viável para fazer uma forma especial de licenciamento e de financiamento dos empresários nessa área, para, junto com o Ministério do Meio Ambiente, com a Comissão de Meio Ambiente do Senado, com a Comissão de Agricultura, com o Ministério da Agricultura e com o das Relações Exteriores, nós encontrarmos uma forma especial, um capítulo ou um anexo emergencial - não é feito às pressas, mas é emergencial, pela questão estratégica -, para debatermos sobre a produção própria de fertilizantes e sobre os riscos da ausência de produtos para a importação. 2ª PARTE EXTRAPAUTA ITEM 1 REQUERIMENTO DA COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL N° 8, DE 2022 Requer, com fundamento no disposto no art. 58, §2º, inciso II, da Constituição Federal, combinado com o art. 90, inciso II, do RISF, audiência pública nesta Comissão, em conjunto com a CMA e CRA, para tratar sobre os principais desafios, restrições e condicionantes ambientais da produção doméstica e importação de fertilizantes por parte do Brasil. Autoria: Senadora Kátia Abreu (PP/TO). Eu o coloco em discussão. (Pausa.) Não havendo quem queira discutir, em votação. (Pausa.) Aprovado. O segundo requerimento seria justamente sobre o Anexo C do Tratado de Itapu, para que nós pudéssemos convidar o Ministro de Minas e Energia e também o Ministério da Economia, os representantes de Itaipu e do Paraguai, da Embaixada do Paraguai no Brasil, ou autoridades de lá, para que pudéssemos debater e mostrar para os brasileiros e para o Paraguai que nós estamos acompanhando de perto a reformulação desse acordo, que, em 2023, vence. Na verdade, faz aniversário de 50 anos. Esse acordo Itaipu e Brasil não tem vencimento, mas o Anexo C, sim, faz 50 anos de aniversário e pode ser reformulado. 2ª PARTE EXTRAPAUTA ITEM 2 REQUERIMENTO DA COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL N° 9, DE 2022 Requer, com fundamento no disposto no art. 58, § 2º, inciso II, da Constituição Federal, combinado com o art. 90, inciso II, do RISF, audiência pública para tratar do anexo C do Tratado de Itaipu. Autoria: Senadora Kátia Abreu (PP/TO). Então, eu o coloco em discussão, deixando em aberto autoridades e especialistas, caso os Senadores queiram sugerir, para participarem dessa audiência pública. Eu o coloco em discussão. (Pausa.) Não havendo quem queira discutir, em votação. (Pausa.) Aprovado. E, no terceiro e último, deixamos ainda em aberto as discussões sobre a guerra da Ucrânia e Rússia e todo o envolvimento mundial e brasileiro, para que possamos continuar acompanhando. Os colegas Senadores podem sugerir novos nomes de acordo com o andar da guerra, com os novos passos e expectativas, e espero que as melhores possíveis possa haver. Mas que a CRE fique habilitada a fazer novas audiências públicas, como a que estamos fazendo aqui, até mesmo com os mesmos participantes ou com novos participantes, para atualizar o Senado e o povo brasileiro sobre a guerra. 2ª PARTE EXTRAPAUTA ITEM 3 REQUERIMENTO DA COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL N° 10, DE 2022 Requer, com fundamento no disposto no art. 58, §2º, inciso II, da Constituição Federal, combinado com o art. 90, inciso II, do RISF, audiência pública para atualizar o cenário mais recente sobre o conflito entre Rússia e Ucrânia e os seus desdobramentos no âmbito nacional e internacional. Autoria: Senadora Kátia Abreu (PP/TO). Em discussão. (Pausa.) Não havendo quem queira discutir, em votação. (Pausa.) Aprovado. Agradeço, mais uma vez, a participação das Sras. Senadoras e Senadores e das autoridades aqui presentes, em especial o Exmo. Sr. Ministro Carlos Alberto Franco França, pela sua presença. Quero cumprimentar e dar as boas-vindas ao Ministro Paulo Uchoa, da nossa diplomacia, do Itamaraty, que hoje nos assessora aqui, nesta Comissão. Muito obrigado pela confiança. Muito obrigado ao Chanceler pela cessão desse técnico, desse diplomata de altíssimo nível. Agradecendo a todos pela presença, declaro encerrada a presente reunião. Às 14h, teremos, então, audiência com o Embaixador da Ucrânia no Brasil. Muito obrigado a todos. Estão todos convidados. (Iniciada às 10 horas e 10 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 36 minutos.) |

