Notas Taquigráficas
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| R | O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO. Fala da Presidência.) - Sob a proteção de Deus, iniciamos nossos trabalhos. Declaro aberta a 9ª Reunião da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária da 4ª Sessão Legislativa Ordinária, da 56ª Legislatura do Senado Federal. Antes de iniciar os nossos trabalhos, proponho a dispensa da leitura e a aprovação da ata da reunião anterior. As Sras. e os Srs. Senadores que as aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.) Aprovadas. A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para debater a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, em atendimento ao Requerimento nº 10, de 2021, e nº 10, de 2022, da CRA, de iniciativa desta Presidência. Esta audiência pública é interativa, por meio do Portal e-Cidadania, no site do Senado, e pelo telefone 0800 612211. Antes de convidar para a palavra os nossos convidados, faço uma pequena abertura. Mesmo com o aumento exponencial da produção de alimentos no nosso país, nos últimos cem anos, a fome continua a ceifar vidas humanas todos os dias, não só no Brasil, mas no mundo inteiro. Isso ocorre porque as pessoas não possuem acesso aos alimentos produzidos: não conseguem coletar na natureza, não plantam ou não possuem dinheiro para comprar os alimentos nas feiras e nos mercados. Quando isso ocorre, a fome se transforma num grave problema de insegurança alimentar para as pessoas e populações, relacionando-se diretamente com a questão econômica e a miséria das pessoas e dos países. Atualmente, a ONU estima que 1 bilhão de pessoas passam fome em todo o mundo. A fome ocorre em muitos lugares, geralmente em países enfraquecidos economicamente, mas não é um problema exclusivo de países ou regiões pobres. A fome também se manifesta nas periferias das cidades de países ricos ou emergentes, como o Brasil. O Brasil, que tinha saído do Mapa da Fome da ONU em 2013, está de volta. É triste, mas é verdade. É lamentável que o Brasil tenha ficado fora do Mapa da Fome por apenas cinco anos, de 2013 a 2018, quando voltou a ultrapassar a marca de 5% da população com fome. O relatório mais recente da Organização da ONU para a Alimentação e a Agricultura (FAO) estima que 23,5% da população brasileira tenha vivenciado insegurança alimentar moderada ou severa entre 2018 e 2020, um crescimento de 5,2% em comparação com o último período analisado entre 2014 a 2017. |
| R | Isso significa que 49,6 milhões de pessoas, entre elas crianças, deixaram de comer por falta de dinheiro ou tiveram uma redução significativa na qualidade e na quantidade de alimentos ingeridos. É uma situação preocupante. É por conta disso que a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária realizará uma análise da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, criada pelo Decreto Presidencial 7.272, de 25 de agosto de 2010, para sabermos o que está causando todo esse retrocesso que estamos vivenciando no nosso país. A situação econômica no Brasil e no mundo impacta o problema da fome. A pandemia também agravou a fome em muitos países, mas nem a economia nem a pandemia são as principais causas do aumento da fome no nosso país. A inflação sobre os produtos básicos da alimentação corroeu o poder de compra dos brasileiros, é verdade, obrigando as pessoas mais vulneráveis a comerem menos e a optarem por alimentos de menor qualidade nutricional. A fome alcançou novamente muita gente que se achava livre desse mal. Essa inflação poderia ter sido controlada pelo Governo com uma política econômica voltada para a geração de emprego e renda e para o apoio ao setor produtivo, à agricultura, com mais investimentos em infraestrutura, não apenas voltada para o mercado financeiro especulativo, com base apenas na elevação de taxas de juros. A ampliação do Bolsa Família ou do Auxílio Brasil, como queiram chamar, é importante para a redução da fome e da pobreza e até mesmo para a inclusão das pessoas no mercado de trabalho, mas a redução da fome e da pobreza só acontece de fato quando essas pessoas conseguem um emprego, conseguem trabalhar, quando fazem um curso técnico e melhoram sua posição no mercado de trabalho. Estes são os mecanismos que fazem a roda da economia girar e melhorar a qualidade de vida das pessoas: educação, saúde, emprego e oportunidades. O aumento abusivo no preço do gás de cozinha, que já é vendido a R$180 em alguns estados brasileiros, e no preço da gasolina e do diesel também poderia ter sido freado por uma política de Estado para o setor energético de petróleo e gás. Mais do que isso, o retrocesso na segurança alimentar poderia ter sido evitado se fossem mantidas as políticas públicas construídas ao longo dos anos pela sociedade civil e se tivessem mantido os programas governamentais, como o Programa de Aquisição de Alimentos, o nosso PAA, e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), bem como a articulação em rede do Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional) em todo o nosso território nacional. Essa é uma percepção que tenho como Presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, sendo que acompanho de perto essas políticas públicas desde 2010, quando passei a integrar esta Comissão. |
| R | O avanço no debate e na institucionalização da Política de Segurança Alimentar e Nutricional foi um dos mais expressivos ganhos observados nas políticas sociais brasileiras. Foi em torno do tema da fome, da possibilidade concreta e da urgência ética de sua superação que o Brasil começou a desenhar os seus mais importantes programas de combate à pobreza e passou a ser um país emergente. Por meio do compromisso do Estado brasileiro com a universalização de políticas públicas de combate à pobreza e com a garantia de acesso à alimentação, conseguimos melhora expressiva nas condições sociais de nossa população, o que gerou impactos positivos na segurança alimentar e na economia de todo o país. Portanto, é de fundamental importância que façamos uma análise dessa política pública com base técnica, sustentada em dados e números, mas também com sensibilidade política para apontarmos os erros e acertos e os novos caminhos que teremos que tomar para não agravarmos o problema da fome, para que possamos ampliar a produção de alimentos, mas, principalmente, para que possamos colocar alimentos na mesa de todos os brasileiros. É importante nós aumentarmos a produção de alimentos no Brasil, é evidente, para que a gente possa continuar exportando e conseguir tornar sempre a balança comercial brasileira positiva em função daquilo que nós produzimos, mas também é importante nós levarmos esses alimentos à população brasileira. É um contrassenso nós sermos um dos países que mais produz alimentos e termos pessoas passando fome no nosso país. É uma questão de política de Estado, é uma questão de investimento no nosso povo, na nossa população, para fazer com que todos tenham acesso a uma alimentação de boa qualidade e que chegue a toda população brasileira. Nós vamos fazer nossa audiência pública para debater a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, para que a gente possa dar a nossa contribuição a programas de governo, a ações governamentais no sentido de ajudar a população brasileira. Os nossos convidados são: Dr. Sergio De Zen, Diretor-Executivo de Informações Agropecuárias e Políticas Agrícolas da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab); Rafael Zavala, representante da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura no Brasil (FAO-Brasil); e Rodrigo Afonso, Diretor-Executivo da Ação da Cidadania. Neste momento, passo a palavra ao Dr. Sergio De Zen, Diretor-Executivo da Conab. V. Sa. tem a palavra... (Pausa.) Antes de passar a palavra para os nossos convidados, o Senador Esperidião Amin, sempre presente na nossa Comissão, pede pela ordem. |
| R | V. Exa. tem a palavra, Senador Esperidião Amin. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Pela ordem. Por videoconferência.) - Muito brevemente - um bom dia para todos -, é só para informar e deixar consignado em ata que ontem eu iniciei uma conversa, e logo após o início o Senador Carlos Fávaro dela participou, com o Senador Jaques Wagner no sentido de que aquela audiência pública sobre o PL 6.299, que tem tudo a ver com o objetivo desta reunião da segurança alimentar, seja conjunta. Ele não deu uma palavra definitiva, mas posteriormente eu soube que houve um atravessamento de informação: que eu teria mencionado que a tramitação do projeto seria conjunta nas duas Comissões. Não é a mesma coisa. Isso deixou o Senador Jaques Wagner um pouco assustado e preocupado. O que eu falei foi estritamente a respeito daquele assunto que nós combinamos na manhã de ontem, a propósito desse assunto e do assunto geral segurança alimentar, ou seja, que a audiência pública seria mais eficiente se for conjunta. Como há o requerimento lá na CMA e coexiste um propósito nosso também, fazer a audiência pública em conjunto eu acho que é, de maneira muito singela, o instrumento mais eficaz para se tratar do assunto. Posteriormente, quanto à tramitação, aí é uma questão que diz respeito à Mesa e ao conjunto das diretrizes do Senado. Era essa a intervenção que eu queria fazer, resumindo, sugerindo que V. Exa. entre em contato com o Senador Jaques Wagner para esclarecer o assunto. Muito obrigado. Um bom dia. E vamos ao trabalho! O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Esperidião Amin. Nós vamos fazer um requerimento à Mesa para que o Presidente da Casa possa despachar a tramitação em conjunto nas Comissões desse projeto, assim como aconteceu com a regularização fundiária e com o licenciamento ambiental. Foi muito mais produtivo nós fazermos as audiências públicas todas em conjunto, uma vez que quase todos os membros da Comissão de Agricultura também são membros da Comissão de Meio Ambiente. Se nós fizermos em conjunto, vamos otimizar o tempo e tornar o debate sempre mais produtivo. Muito obrigado pela sua sugestão, Senador Esperidião Amin. Vamos, então, fazer esse requerimento à Mesa para que o Presidente possa designar ou despachar para que seja a tramitação feita em conjunto, como foi com os dois projetos que acabei de citar e como foi também com a reforma do Código Florestal, que foi amplamente debatido em 2012 - este ano fará dez anos. Naquela época, eram três Comissões: a Comissão de Ciência e Tecnologia, a CMA e a CRA. E o resultado foi muito positivo. Vamos fazer da mesma forma com esse projeto dos pesticidas, que é muito importante para a produção de alimentos no nosso país. Agora, sim, passo a palavra ao Dr. Sergio De Zen, da Conab, para fazer as suas colocações, já agradecendo a sua participação, a sua presença junto conosco. |
| R | O SR. SERGIO DE ZEN (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, Senador. Bom dia, Srs. Senadores e Senadoras. É um prazer poder estar aqui com vocês. Eu pedi para fazer a apresentação logo, justamente porque, às 9h, nós vamos anunciar os números da safra em andamento no Brasil. Senadores, é muito importante a gente separar em dois blocos, em dois problemas distintos a questão da segurança alimentar. Um problema central é a produção: se a gente não gerar alimentos, nós não temos o que distribuir ou como alimentar a população. E o outro problema é a questão da renda. Então, dentro do Ministério da Agricultura, nós temos que resolver o problema da oferta do produto, do abastecimento. O problema da renda foge à competência e foge ao... As ferramentas que nós temos não são suficientes para nós resolvermos. Então, são dois problemas distintos. O Brasil resolveu muito bem o seu problema de oferta de alimentos, quer dizer, a agricultura brasileira é uma das mais eficientes do mundo. Por exemplo, agora, pouco antes de falar com vocês, eu estava explicando justamente a safra brasileira a agentes internacionais. O que a gente produz em pouco mais de 51 milhões de hectares a gente planta entre 64 milhões e 68 milhões de hectares de lavoura. O que significa isso? Nós produzimos na mesma terra duas lavouras, duas safras dentro da mesma terra. Também há a questão dos fertilizantes. Nós estamos descobrindo que nós teremos reservas de fertilizantes dentro do próprio solo, à medida que somos eficientes no uso disso. E muito se fala de estoques para abastecer, para segurança alimentar. Na realidade, hoje - e esse hoje começando há 27 anos mais ou menos -, o mundo reduziu drasticamente os seus estoques. Por que isso aconteceu? Justamente porque nós, no passado, tínhamos uma safra só, era uma safra que a gente produzia... Era principalmente o Hemisfério Norte, que respondia por mais de 60%, 70% da produção de alimentos no mundo. Ele produzia no segundo semestre, e esse alimento tinha que ser armazenado até o ano seguinte, a próxima safra. Hoje, o Hemisfério Sul, que já responde por 45%... Principalmente o Brasil, que é o grande player desse mercado, que tem uma oferta de alimento muito grande, entra no mercado no início do ano, e o Hemisfério Norte entra no final do ano. Então, a gente tem um ciclo. E existem produtos de que nós temos várias safras ao longo do ano. É o caso específico do milho. Antigamente, a gente ofertava milho só no final de janeiro e início de fevereiro; hoje essa primeira safra responde por 25%; a segunda safra, que vai entrar no mercado em junho e julho, representa 70% a 71%; e a terceira safra, que entra na Região Nordeste, de 2,5% a 3%. Então, essa distribuição ao longo do ano mostra que nós temos um ciclo produtivo que se alterou ao longo dos anos. |
| R | Outro produto que serve de exemplo é o feijão. Do feijão a gente tem três ou quatro safras. E ele responde instantaneamente a incentivos de preço. Então, se eu aumento o preço, eu vou ter produção embaixo de pivô ou em outras áreas verdes, eu desloco a produção ao longo do país, já que a dimensão continental nos possibilita produzir o feijão em várias regiões. Então, a gente sempre tem oferta. O arroz ainda tem uma concentração muito grande no Sul e é produzido em algumas regiões aí do Centro-Oeste, mas pouca coisa, a concentração forte é no Sul. Eu estou explicando isso para os senhores, porque, na realidade, nós temos quatro pontos, quatro eixos principais para garantir a oferta de alimentos. Um deles é a posse da terra, porque o agricultor pequeno ou grande pode ter acesso a crédito, acesso a políticas públicas na medida em que tem a posse da terra garantida, o título dela. O segundo alicerce - para ter o segundo eu preciso do primeiro - é você respeitar o Código Florestal, que é um dos mais avançados em termos de legislação mundial; e, se nós cumprimos, a gente está muito bem calçado. Para que a gente tenha o cumprimento desses dois, sem prejuízo para o produtor rural, pequeno, médio, grande, todos eles, a gente tem que ter disponibilização de tecnologia. Para que a gente tenha esses três funcionando e aí possa garantir a segurança alimentar, nós temos que ter informação, informação com assertividade, com agilidade e com acurácia. Quando eu tenho informação com agilidade e acurácia, eu posso fazer previsões. Então, eu posso ter a combinação de fatores climáticos, solo e desenvolvimento de planta e antever onde é que eu vou ter problema ou não. O exemplo que eu vou dar aos senhores: nós vamos anunciar a expectativa de safra de milho daqui a alguns minutos. Ela vai ser grande - não vou dizer o valor, porque eu estaria quebrando um código de ética da companhia, mas ela vai ser grande. Como que a gente chegou a esse número? A gente chegou com dados de campo, a gente chegou cruzando esses dados com os dados climáticos, principalmente de disponibilidade da água do solo, com as expectativas que a gente tem de clima nas próximas semanas, semanas e meses. Então, quando a gente combina tudo isso, a gente tem uma assertividade. A gente vai falar um número e vai pontuar... Nós temos no dia 15 uma expectativa de geada? Temos. Ela vai atingir a zona de produção? Não. A gente vai ter chuva em algumas regiões em que a planta ainda está em desenvolvimento? Não. Então, a gente tem essas informações que dão segurança para todos. E, para terminar, é importante a gente pontuar o que a gente vem tentando mostrar, através dos estoques, não só do estoque, mas do balanço de oferta e demanda do produto, no qual eu tenho a produção, eu tenho as exportações, eu tenho o consumo interno, eu tenho o destino desse consumo interno e eu tenho os estoques. Então, quando eu tenho esse quadro atualizado, mês a mês, mostrando-o, eu tenho a segurança do que está acontecendo e do que vai acontecer. Então, a gente tem feito isso com muito afinco. Por que a gente tem trabalhado com muita assertividade nisso? Porque é daí que advém a segurança de que temos os alimentos. Esse é o primeiro ponto. E aí, em cima disso, a gente traça a previsão futura. |
| R | E todos os setores da produção agropecuária brasileira são igualmente importantes nesse momento, porque cada um deles tem seu ponto forte e ponto fraco. Lembro aos senhores que nós atravessamos uma pandemia em que houve um choque de demanda de alimentos sem precedentes. Não foi Brasil, não foram Estados Unidos, não foi Europa, não foi África. Todos os países que tinham um nível de organização econômica aceitável entraram com programas de segurança alimentar do ponto de vista de renda. Isso fez, como você não tinha dispêndios como lazer e bens duráveis, o consumo de alimentos no mundo todo crescer, especialmente nos países de baixa renda, onde o consumo de proteínas teve um crescimento maior. Isso gerou um desequilíbrio, porque eu tenho um choque de demanda e eu não consigo no mesmo ritmo ter um choque de oferta. Embora o Brasil e os Estados Unidos, que são os grandes players, tenham aumentado sua produção, os demais players do mundo não conseguem acompanhar esse ritmo. Então, a gente vê que nesse... Principalmente o Brasil tem espaço para crescimento, e alguns países da América Latina também têm espaço para crescimento, mas não é o que a gente tem em países europeus, nos Estados Unidos, no Canadá, que não têm essa possibilidade. Então, a gente teve esse choque. Passado isso, agora nós temos um choque de oferta. Qual é o choque de oferta? Nós temos uma guerra, que prejudica a produção de um país que produz 100 milhões de toneladas de grãos. Quais são os grãos que eles produzem em maior quantidade? Trigo, milho e, depois, girassol, cevada, canola, que são produtos que impactam o mercado de proteínas, porque temos os farelos que são derivados e são essenciais à produção de ovos, leite e carnes, e temos o impacto no trigo, que é um alimento que vai direto. Então, essa pressão inflacionária de alimentos vem muito em decorrência desse choque internacional, muito mais do que um fator de quebra de safra, de falta de produtividade, de falta de produção. Essa pressão sobre os alimentos existe derivada desses dois choques. E a gente olha - é uma apresentação que vamos fazer hoje - que alguns produtos tendem à estabilidade e até a um retorno da produção. E, para os senhores terem uma noção, a diferença do ano passado... Na safra 2020-2021, nós tivemos uma quebra muito acentuada da produção de milho, segunda safra, em que o Brasil ofertou em torno de 83 milhões de toneladas no total, e eram esperados 108. Essa quebra de safra que ocorreu teve um impacto no mercado todo também, esse foi um fator pontual. Agora, este ano, nós vamos produzir em torno de 115 milhões - o número exato só daqui a pouco, mas em torno de 115 milhões. Esse aumento da oferta de milho, de 83 milhões para 105 milhões, quase que - não digo que é total - compensa toda a produção de milho que a Ucrânia ia colocar no mercado. |
| R | O Brasil não só na sua oferta está conseguindo abastecer o mercado nacional, mas também está tendo um importante papel na segurança alimentar do mundo, quando consegue, através de produção e produtividade, lembrando que isso é produzido na mesma terra da soja, ofertar ao mundo uma quantidade de alimentos que ajuda a mitigar os problemas que são dessa guerra e desses conflitos. Muito obrigado, Sr. Senador. O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Nós é que agradecemos, Sergio De Zen, pela sua participação. De fato, a produção de milho nesta safra será recorde em função de vários setores, climáticos principalmente. E o importante é fazer chegar esses alimentos até a população. Essa não é a sua função, nós sabemos; é a política pública voltada realmente a essa questão. Agradecemos a sua presença, sabemos do seu compromisso, deixamos V. Sa. à vontade para dar sequência ao seu trabalho. Passo a palavra agora ao Dr. Rafael Zavala, representante da FAO no Brasil. V. Sa. tem a palavra, Dr. Rafael. O SR. RAFAEL ZAVALA (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado. Prezado Senador e Presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, Acir Gurgacz, primeiro, eu gostaria de agradecer o convite para participar desta audiência pública da avaliação da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSan). Em sua pessoa, também cumprimento as demais autoridades presentes nesta sessão e registro meu apreço aos colegas Rodrigo Afonso, da Ação da Cidadania, e Sergio De Zen, Diretor-Executivo de Informações Agropecuárias e Políticas Agrícolas da Companhia Nacional de Abastecimento do Ministério da Agricultura, que aqui representam essas duas instituições tão importantes para a segurança alimentar do Brasil. Em março deste ano, a FAO esteve na Câmara de Deputados para falar sobre a fome e sobre a gravidade do contexto que vivemos atualmente em consequência principalmente das mudanças climáticas, da pandemia da covid-19 e da guerra na Ucrânia. O Índice de Preços de Alimentos da FAO alcançou em abril a sua maior marca em 32 anos, 159,3 pontos, um avanço sem precedentes, após aumentar 12% em 30 dias. Os últimos dados da pesquisa Vigisan de 2020 já mostravam um cenário complicado para os brasileiros: mais da metade dos domicílios - 55% - conviviam com algum grau de insegurança alimentar no final de 2020, um aumento de 54% desde 2018. Segundo a Vigisan, em 2020, a fome afetou 9% dos domicílios, o equivalente a 19 milhões de brasileiros. Essa proporção representa uma volta a um nível observado em 2004, um retrocesso de quinze anos em apenas cinco. |
| R | Infelizmente, estamos enfrentando o que a FAO chama de tempestade perfeita para a segurança alimentar, resultado das mudanças climáticas, da pandemia da covid-19 e do aumento da inflação puxado pela pandemia e pelo aumento dos preços de gás e de petróleo, devido à instabilidade causada pela invasão da Ucrânia pela Rússia. No caso do Brasil, o maior impacto será, além do aumento dos preços dos grãos ao consumidor, o aumento no preço dos fertilizantes produzidos na região da Bielorrússia e da Ucrânia, o que afeta seriamente os custos de produção agrícola. Esse cenário nos traz a um momento administrável da crise econômica, mas uma situação de crise alimentar depende de uma série de fatores externos e da incerteza de como a guerra continuará. Pela primeira vez em nossa história recente, vivemos um momento em que as fragilidades de nossos sistemas alimentares estão duramente expostas e temos uma oportunidade única de olhar para as principais lacunas e trabalhar em conjunto. É hora de agir para fortalecer as instituições e suas políticas de alimentação saudável. Diante desse contexto, será realmente difícil alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 em todo o mundo. No entanto, a partir de suas experiências, a exemplo da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSan), acreditamos que o Brasil tenha as ferramentas e o conhecimento necessário para caminhar rumo ao cumprimento das metas dos ODS, sobretudo o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 2, a erradicação da fome. Recentemente, a FAO fez um apelo aos países da América Latina e do Caribe para que os governos mantenham seus programas de proteção social, inclusive aqueles que foram implementados durante a pandemia. Eles não podem ser completamente retirados até que essa grande quantidade de pessoas em situação de insegurança alimentar consiga recuperar pelo menos os níveis de renda que tinham antes. No Brasil, o auxílio emergencial oferecido para mais de 69 milhões de pessoas bem como o Auxílio Brasil e o benefício de prestação continuada (BPC) ajudaram a reduzir a extrema pobreza, mas a continuidade desses benefícios é o que fará diferença para 1,8 milhão de famílias em situação de pobreza extrema no Brasil. Para além desses auxílios, o Brasil também possui, no nível federal, essa PNSan, que é o tema pelo qual estamos nesta audiência pública. |
| R | Desde 2013, a FAO trabalha com o Ministério da Cidadania e com o Ministério das Relações Exteriores, através de sua Agência Brasileira de Cooperação (ABC), para aprimorar a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), através de metodologias específicas para a efetivação do modelo de gestão descentralizada do sistema, envolvendo os entes federados e a participação social, promovendo estratégias para o fomento, a estruturação e a promoção de alimentos produzidos pela agricultura familiar e povos e comunidades tradicionais e também apoiando a construção de metodologias que subsidiem a implantação do programa Alimenta Brasil, antigo Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), e também desenvolvendo estratégias para a qualificação e a ampliação dos serviços ofertados pelos equipamentos de abastecimento, alimentação e nutrição, além da elaboração de materiais educativos e programas de capacitação e formação para a qualificação de beneficiários, gestores públicos e representantes da sociedade. Um exemplo bem-sucedido foram as ações de fomento de adesão de estados, incluindo o Distrito Federal, e municípios ao Sisan, a este Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional, seus planos de segurança alimentar e nutricional, os planos dos estados e dos municípios. Hoje todas as unidades da federação e alguns municípios já aderiram ao sistema. Além disso, foi possível implementar o mapeamento das políticas de segurança alimentar e nutricional, o MapaSAN, que consiste na identificação e levantamento da situação das ações nos estados e municípios para monitorar a construção da política de segurança alimentar e nutricional no Brasil. Inclusive, neste momento, o mapeamento está aberto, e reforço o convite do Ministério da Cidadania para que os estados e municípios cadastrem suas ações de segurança alimentar e nutricionais até o dia 2 de julho. Quanto mais informações forem conectadas, maior será a nossa capacidade de tomar decisões assertivas com base em evidências. Sabemos que melhorar os dados sobre insegurança alimentar e fome no Brasil é um grande desafio, mas é um ponto muito importante para avançarmos na redução deste grave problema. Neste sentido, fica claro para a FAO que, considerando a abrangência da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e seu objetivo de promover acesso universal à alimentação adequada e saudável, e considerando também o cenário crítico de tempestade perfeita que vivemos, é ainda mais imperativo fortalecer esta política nacional e o Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional. Sabemos que temos um grande desafio à frente, mas ainda temos a chance de reverter este cenário, e o Brasil já provou uma vez que sabe como fazer. Contem com a FAO para que novamente possamos avançar e alcançar a meta de acabar com a fome, a insegurança alimentar e todas as formas de má nutrição até 2030. Quero finalizar citando uma feliz coincidência: hoje, no jornal Valor Econômico, há uma entrevista, e nesta entrevista destacamos que o Brasil é o celeiro do mundo, a cesta de pão, e que o aumento da fome no Brasil é inadmissível. A única cifra aceitável da fome é zero. Esperamos verdadeiramente que este seja mais um momento em que o Brasil dará uma lição ao mundo. Obrigado. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Nós é que agradecemos, Dr. Rafael Zavala, pela sua participação. V. Sa. disse muito bem: o Brasil já mostrou que sabe combater a fome através de programas governamentais. Infelizmente, tivemos um retrocesso de quinze anos em cinco, como V. Sa. muito bem colocou, mas sabemos o caminho para reforçar e refazer tudo aquilo que foi feito. Agradeço a sua participação, a sua presença e a sua fala junto conosco. Passo a palavra agora ao Dr. Rodrigo Afonso, Diretor Executivo da Ação da Cidadania. V. Sa. tem a palavra. O SR. RODRIGO AFONSO (Para expor. Por videoconferência.) - Senador Acir, muito obrigado pelo convite. Quero agradecer a fala do Rafael Zavala, da FAO, parceiro na luta contra a fome não só no Brasil, mas no mundo todo - é um trabalho incrível que é feito -, agradecer a todos os outros Senadores que estão presentes e dizer que eu acho que é um papel superimportante essa abertura para que organizações da sociedade civil possam se manifestar e colocar suas posições, opiniões em um espaço democrático, coisa que, infelizmente, a gente não tem tido nos últimos anos em relação ao Governo Federal, que extinguiu, no seu primeiro dia de mandato, o Conselho de Segurança Alimentar, que era exatamente o espaço de participação da sociedade civil para discussão da questão da segurança alimentar no país. A gente fica muito feliz de estar aqui para poder dar essa visão diferente. Eu considero, ouvindo a fala do caro Sergio De Zen, da Conab - peço até desculpas pela forma como eu vou dizer - que eu não sei em que Brasil o Sergio De Zen vive, porque não é a realidade que a gente enxerga, com todos esses dados e informações que ele passa, como se a segurança alimentar brasileira estivesse no rumo certo - e, obviamente, não está. Quando a gente olha para um país onde a gente sai do mapa da fome, em 2014, e, apenas quatro anos depois, volta ao mapa da fome, em 2018, e dobra praticamente esse número, em 2020, alguma coisa não está funcionando. Enquanto isso, a produção de alimentos cresce cada vez mais. Mas que produção de alimentos é essa? E eu vou falar um pouco sobre isso. Eu só queria comentar algumas falas que foram colocadas pelo Dr. Sergio para que as pessoas possam compreender um pouco essa realidade. Ele falou muito na questão de que precisamos de informação, não é? Os estoques reguladores eram um instrumento essencial para a questão da segurança alimentar. A gente vê isso claramente pelo aumento dos preços de todos os alimentos - como exemplo, nós da Ação da Cidadania doamos, no ano passado, quase 10 mil toneladas de alimentos por todo o Brasil. Sabe da onde nós compramos o nosso feijão? Compramos da Argentina o feijão preto, que nem é consumido na Argentina. A gente é obrigado a comprar o feijão preto da Argentina para conseguir manter os preços acessíveis para a distribuição do alimento. Que país é esse, continental, mas que não consegue dar conta da produção de feijão para o seu próprio povo, em que, para conseguir comprar um alimento para distribuir, a gente tem que ir à Argentina, um país que não consome feijão preto? |
| R | Então, a realidade não é essa, obviamente não é essa. Quando a gente olha para um país que não tem nenhum planejamento estratégico em relação à segurança alimentar, em que, nos últimos anos, a Petrobras simplesmente extinguiu suas áreas de fertilizantes, pergunta: que país é esse que não olha para um planejamento estratégico de segurança alimentar? É um país que não trouxe a sociedade civil para opinar nessas questões. Eu trouxe aqui um texto para falar, mas queria comentar esses pontos antes. Acho que boa parte do que o meu texto traz responde a diversas questões colocadas pelo Dr. Sergio, mas eu os convido, Senadores - eu sei que é uma comissão de agricultura -, a fazer uma reflexão sobre esse texto que eu vou citar, a ouvir os dados e números para que a gente possa pensar juntos uma forma de melhorar a produção de alimentos brasileira, a fim de que, de fato, o celeiro do mundo seja um celeiro para o Brasil também. Porque hoje nós temos um celeiro mundial de produção de alimentos que é muito falado, mas que faz o nosso povo brasileiro, infelizmente, passar fome. É claro que tem 400 outras causas, mas uma das causas é a produção de alimentos no Brasil. Por isso eu vou ler esse texto que produzi para tentar esclarecer um pouco essa questão. Durante os últimos anos, a fome claramente voltou a assombrar o mundo inteiro - o Rafael vivencia isso no mundo inteiro. Uma série de tragédias, como a covid e, agora, a guerra da Ucrânia, contribuíram, obviamente, para o aumento da fome. Poderia ser diferente no Brasil? Claro que poderia. Um dos principais produtores de alimentos do mundo ter quase 60% da sua população em insegurança alimentar, como bem citou o Rafael, não pode ser aceitável, não pode! A gente ser o maior produtor e ter essa quantidade da população brasileira passando fome ou com insegurança alimentar é inaceitável. E há uma clara relação da fome no nosso país com o modelo adotado para a produção de alimentos no Brasil, em especial, com esse termo que é usado e de que é um tabu falar: o agronegócio, com o modelo que foi idealizado para o agronegócio brasileiro. Não que ele não seja importante, não que ele não seja importante para a balança comercial, como a gente vai citar aqui, mas é importante entender que, nos outros aspectos, há muito a ser melhorado, há muito a ser modificado. E é importante entender que quando a gente fala do agronegócio a gente está falando dos grandes produtores. Agronegócio não é aquele pequeno produtor, o agricultor familiar. Estamos falando do grande produtor, que são as corporações - e muitas nem brasileiras são mais, já foram compradas por fundos internacionais, são propriedades desses fundos e enviam os seus lucros para outros países, para paraísos fiscais, etc., ou seja, nem o lucro fica no nosso país. O agronegócio é o maior exportador do país. De todos os itens que nós exportamos, o agronegócio é o maior exportador do país, por isso ele é tão importante para a nossa balança comercial. Ele é o "motor da economia", entre muitas aspas, e a gente vai entender isso nos números, não porque o agronegócio é a coisa mais incrível do mundo no Brasil, mas porque o resto da nossa produção, de outras áreas, é totalmente pífio comparado ao resto do mundo. Só como exemplo, eu quero trazer isto: a nossa primarização, a nossa desindustrialização nas últimas décadas, em especial, é elemento claro e que mostra por que o agronegócio hoje é tão importante para a balança comercial. A China, durante a covid, de março a setembro de 2020, exportou, de um único produto, US$40 bilhões. Sabe que produto é esse? Máscaras! O Brasil poderia claramente ter uma indústria que produzisse máscaras, e nós compramos as nossas máscaras da China. |
| R | Nesse mesmo período, de março a setembro, a exportação somada de soja, bovinos e cana foi de 35 bilhões; ou seja, a China, só com máscaras, no mesmo período, exportou mais do que as nossas principais exportações do nosso agronegócio, que é o maior exportador do Brasil. Há algo errado - obviamente, há algo errado. Isso não quer dizer, claro, que o agronegócio não é importante na nossa economia, mas a gente precisa desmistificar, esclarecer alguns pontos que tornam o modelo do agronegócio brasileiro muito pouco benéfico para a segurança alimentar do país. O agronegócio hoje representa em torno de 5% do nosso PIB, enquanto a indústria, mesmo precária, mesmo com todos os problemas que tem, representa quase 22%. Já o setor de serviços, que é o verdadeiro motor da economia do país, de praticamente todos os países do mundo, representa quase 56% do nosso PIB. Ao contrário dos outros setores, o agronegócio conta com subsídios como nenhum outro. Em tributos, a contribuição do agronegócio é pífia. Foram R$6 bilhões arrecadados em 2019, enquanto atividades jurídicas, de contabilidade e de auditoria, só esse segmento arrecadou R$13 bilhões, mais que o dobro. Se você olhar a área de educação, que era a área que deveria ser mais subsidiada no nosso país, porque a gente tem um déficit educacional gigantes, só a área de educação pagou, em impostos, no mesmo período, R$60 bilhões, dez vezes mais que o agronegócio neste país. A educação paga mais impostos que o agronegócio. Acho que isso explica muita coisa no nosso país. Outro absurdo nesse modelo é que há uma completa isenção de ICMS para o agronegócio exportador. Praticamente todos os insumos para exportar alimentos são isentos de ICMS no Brasil: tratores, caminhões, diesel, insumos, tudo é praticamente isento. Esses recursos, os estados que abrigam essas corporações deixam de arrecadar e são obrigados a manter as rodovias, a infraestrutura, tudo o que possa escoar as safras e desenvolver essas corporações. Então, não só os estados - São Paulo, Minas, todos os grandes produtores -, não recebem os tributos como têm que investir em infraestrutura para o escoamento desses alimentos que são usados para exportação, e, fica muito claro, na sua grande maioria. Esses estados, em tese, deveriam receber o ressarcimento desses recursos pelo Governo Federal, ou seja, o Governo Federal pagando para os estados além dos subsídios que estão sendo dados para o agronegócio, que se estima que deveria ser algo em torno de R$28 bilhões por ano, pela Lei Kandir, para os estados, e só 12% disso efetivamente é colocado, na prática, para esses estados recomporem os investimentos que tiveram que fazer por conta do investimento em infraestrutura e da falta de arrecadação de impostos do agronegócio. Mas não é só o ICMS; estamos falando de IPI, PIS/Pasep, Cofins, Imposto de Exportação, importação e exportação. Foram US$96 bilhões de exportações, em 2019, pelo agronegócio. No país, repetindo, foram US$96 bilhões em exportações pelo agronegócio em 2019, um total de R$16 mil de imposto de exportação pagos. Nós exportamos US$96 bilhões, e pagaram R$16 mil de imposto. É este mesmo o número: R$16 mil. Com todos esses subsídios, esses grandes latifúndios se expandem com o apoio do Governo e provocam uma grande especulação no valor da terra, como foi falado pelo Senador Acir. Com esse aumento do valor da terra - o próprio Zen falou sobre isto durante a sua fala -, esses pequenos produtores estão cada vez mais estrangulados, porque há subsídios e financiamentos subsidiados para que esses grandes produtores comprem as terras. E os pequenos produtores, com menos acesso a esses subsídios, a esses financiamentos, vão parando de produzir. |
| R | Se não bastassem todas essas renúncias fiscais, que contam com empréstimos subsidiados do Governo, o Plano Safra de 2019/2020 teve a seguinte divisão: R$27 bilhões para pequenos produtores, R$29 bilhões para médios produtores e R$135 bilhões para grandes produtores. Segundo dados do Banco Central, a pecuária foi a atividade que recebeu mais créditos, quase R$75 bilhões, seguida pela soja, com R$61 bilhões; pelo milho, com R$26 bilhões; pelo café, com R$15 bilhões; e pela cana-de-açúcar, com quase R$14 bilhões. Não precisa ser um expert para saber que todos esses itens privilegiam a exportação, não a alimentação do povo brasileiro. Com todo esse subsídio, com a renúncia fiscal, com o envio de lucros para fora do país, com custos do Estado para manter a infraestrutura para o que chamam de "motor da economia", ao menos a gente imagina que eles devem empregar muito bem e pagar bem os seus funcionários. Errado! O agronegócio está estagnado, com 1,4 milhões de empregos; desde 2009, não sobe a quantidade de empregados no agronegócio. Para efeito de comparação com os cinco maiores segmentos da economia, a construção civil emprega 5 milhões; a indústria, 8 milhões; o comércio, 9,5 milhões; e a área de serviços, o verdadeiro motor da economia, 28 milhões de pessoas. Mas ainda pode piorar a situação. A gente olha para tudo isso e fala: "Poxa, de fato, algo não está certo!". Mas, infelizmente, a média de remuneração desses segmentos... Adivinhe qual desses setores paga menos para o seu funcionário! Enquanto a média da indústria gira em torno de R$3 mil, a média do agronegócio gira em torno de R$1,8 mil, quase a metade. E não podemos esquecer que, infelizmente, esse é um dos segmentos com as maiores acusações de trabalho análogo à escravidão. O Censo Agropecuário de 2017 mostra que, dos mais de 5 milhões de agricultores do nosso país, só 100 mil são grandes produtores. Mesmo sendo poucos, eles detêm 53% da nossa área plantada no Brasil. Os outros 4,9 milhões detêm o restante, os 47%. São 3,9 milhões de agricultores familiares que detêm 23% das terras. Porém, esses pequenos produtores empregam 10 milhões de pessoas, enquanto os grandes produtores, que detêm 53% da terra, empregam 1,4 milhões. Com menos da metade das terras, eles têm sete vezes mais empregados. Em 1985, a gente tinha 23 milhões de trabalhadores no campo; hoje, temos 15 milhões. Com tudo isso posto, o Brasil chegou a quase 60% da população em insegurança alimentar, com quase 20 milhões de brasileiros em situação de fome. E os dados, certamente, vão piorar. Os preços dos alimentos estão inacessíveis para boa parte da população, e a causa principal não é a covid e não é a Ucrânia, mas, sim, um modelo que privilegia a exportação de commodities enquanto pequenos que produzem o que chega às nossas, os 70% que chegam às nossas mesas, recebem cada dia menos apoio do Governo. É importante lembrar um fato recente: no Pronaf desse ano, que é o programa de apoio ao pequeno produtor ou à agricultura familiar, foi cortada a última linha de financiamento, congelada a última linha de financiamento, enquanto o agronegócio continua recebendo os seus recursos para poder manter a exportação e a balança comercial. Quando a gente olha... Será que a gente precisa, de fato, olhando um modelo que privilegia a exportação de commodities enquanto os pequenos produtores recebem cada dia menos apoio, será que, de fato, a gente precisa subsidiar tanto a soja, a cana, que são usados para exportação, enquanto a gente deixa de lado quem alimenta de fato o Brasil, quem produz o alimento? |
| R | Contradizendo frontalmente o que o Zen falou, da Conab, em dez anos, a área plantada de arroz e feijão no Brasil foi reduzida em 70%. Por quê? Porque não há apoio, não há incentivo para produção desses alimentos. Não há um planejamento de segurança alimentar que olhe que arroz e feijão é o prato principal do brasileiro. Esses itens que compõem a cesta básica perdem cada dia mais espaço para as commodities de exportação, que têm subsídios, financiamento e o poder financeiro para comprar terras e cooptar esses pequenos produtores a mudarem suas lavouras para serem fornecedores de commodities dolarizadas para o mundo e para nós mesmos. Vide o que estamos vivendo na Petrobras. A gente hoje paga um preço de gasolina dolarizado enquanto a gente é um dos maiores produtores do mundo. A mesma coisa está acontecendo com o alimento. A gente está virando o maior produtor do mundo, e pagando o preço europeu no que a gente produz aqui. Mesmo sendo o maior produtor de soja do mundo, o preço do óleo de soja em 2020, muito antes da guerra da Ucrânia, já no início, no primeiro ano da covid, subiu 100% - o preço de óleo de soja - no país. Isso não tem nada a ver com a Ucrânia. Tem pouco a ver com a covid. Tem a ver com a dolarização desse modelo de claro investimento no agronegócio como modelo único e exclusivamente de geração de lucro sem nenhum planejamento de segurança alimentar. A gente produz em real, com subsídios, mas paga o mesmo preço em dólar que qualquer outro país. De que adianta, sinceramente, Senadores, de que adianta para as famílias brasileiras sermos o maior produtor do mundo? Nada! Não estamos gerando nada na questão da segurança alimentar para a nossa população. Para se ter uma ideia do absurdo - e esse dado para mim é chocante -, o Japão, que tem pouco mais de 4% do tamanho do Brasil, tem mais hectares plantados de legumes e hortaliças frescas do que o Brasil. O Japão produz mais hortaliças e legumes do que o Brasil. Dessas hortaliças em geral, 83% são produzidas pela agricultura familiar no Brasil, que não tem apoio nenhum. Isso explica claramente por que o Japão produz mais do que a gente. Um país muito pequeno, praticamente sem área para plantar, é muito mais eficiente que a gente nisso. Já estou concluindo, Senador. Desculpa pelo texto longo, mas eu acho importante trazer esses dados. Entre 2006 e 2021, os preços dos alimentos tiveram, em média, um aumento de 38% acima do IPCA. As frutas aumentaram 89% acima do IPCA. Enquanto isso, os refrigerantes ficaram, relativamente, no mesmo período, 43% mais baratos. Comer de forma saudável no país ficou caríssimo. Além do desenvolvimento econômico do país, que é impactado já que boa parte da população gasta a maior parte da sua renda para algo básico, que é comer - e comer mal, porque os alimentos saudáveis ficam cada vez mais inacessíveis -, piora a sua saúde, piora a saúde pública e a sobrevida da população em geral. Quem não come não trabalha; quem não come não estuda; quem não come não sobrevive. A gente precisa entender essa questão. Por fim, como se não bastasse isso tudo, que já é uma tragédia, há pesquisas que estimam que o agronegócio deva quase R$1 trilhão de Imposto Territorial Rural, que é de uso indevido das terras não legalizadas, e com a completa falta de fiscalização do Governo Federal, pelos órgãos do Governo, que cada dia mais estão precarizados. Então, se o Brasil quiser de fato acabar com a fome e declarar a independência alimentar da sua população, é preciso pensar em mudar os rumos do planejamento da segurança alimentar do país, o que passa necessariamente pela mudança de foco: de olhar apenas para a balança comercial, passar a olhar para as necessidades reais do povo brasileiro, em especial dos mais humildes. Sem segurança alimentar não há desenvolvimento, saúde, educação e dignidade. Isso só não pode demorar, porque quem tem fome tem pressa. Muito obrigado, Senadores. É um prazer estar aqui podendo falar e trazer a nossa opinião. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Nós é que agradecemos, Rodrigo, pela sua fala, pela sua exposição. De fato, sermos o maior produtor de alimentos do planeta é importante. Agora, se nós não utilizarmos essa produção para levar alimentos à mesa da população brasileira, de pouco adianta para a população sermos o maior produtor de alimentos do planeta. Termos um saldo positivo da balança comercial através da exportação é importante? É evidente que é muito importante. A produção do agronegócio é importante para o Brasil, mas não o é para o brasileiro que não está tendo na sua mesa os alimentos para alimentar a sua família. Realmente, esse é um dos grandes problemas que nós temos. E já estamos debatendo isso aqui, Rodrigo, Dr. Rafael, há algumas sessões, há algumas reuniões, exatamente nesta posição: é importante nós produzirmos alimentos, mas mais importante do que produzirmos e exportarmos é levarmos esses alimentos à mesa da população brasileira. É inaceitável nós sermos um dos maiores produtores de alimentos no mundo e termos brasileiros passando fome - e aumentando, e muito, nos últimos anos. Eu faço aqui uma pergunta tanto para o Dr. Rafael quanto para o Rodrigo: quais as medidas imediatas que nós poderíamos fazer para combater a fome no Brasil neste momento? Como já foi dito, a fome tem pressa, a fome não espera; ela precisa ser combatida urgentemente. Nas suas opiniões, o que deveria ser feito no Brasil imediatamente para nós podermos ajudar a população brasileira? Com a palavra o Dr. Rafael Zavala. O SR. RAFAEL ZAVALA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senador. Eu saúdo o Rodrigo. |
| R | São duas caras da moeda. A primeira é a inclusão: a inclusão social, mas também a inclusão econômica, a geração de empregos, porque a fome é um problema da renda, de acessibilidade a uma vida saudável. A maior parte da renda familiar vai para a alimentação e o custo dos alimentos foi acrescentado. Então, estamos garantindo uma má alimentação, uma alimentação não saudável. Temos que continuar com os programas de proteção social, mas também por outro lado gerar investimentos para criação de empregos. E também, no prazo mais longo, que fique muito claro que temos que diminuir a dependência, por exemplo, de fertilizantes, que são produtos produzidos a 12 mil quilômetros de distância. Eu acho que o produto dessa situação é que vamos ver uma nova versão da globalização, uma globalização mais regionalizada, mais em blocos regionais. Então, temos que depender menos dos insumos estratégicos que estão muito afastados. O fósforo está em Marrocos, no Egito. O potássio é da Ucrânia e da Bielorrússia a ureia. Os insumos estratégicos têm que ficar mais perto da agricultura. Então, são duas caras, a cara de menor dependência e de uma maior estratégia regional, porque aconteceu o mesmo com Argentina e com Chile. Uma maior estratégia regional e ao mesmo tempo continuar com as políticas públicas de inclusão, tanto social como econômica. O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito bem. Muito obrigado, Dr. Rafael. Também passo ao Rodrigo, para fazer as suas colocações, e já fazendo uma outra pergunta: quais as suas sugestões estruturais para que a gente possa apoiar o pequeno produtor? Quais seriam as medidas? Eu gostaria de receber as suas contribuições, se não agora, mas posteriormente. Tecnicamente, como nós podemos ajudar o pequeno produtor nessa produção de alimentos? Porque a mesa da população brasileira, os alimentos da população brasileira são produzidos pela agricultura familiar. Todos nós realmente sabemos disso. A agricultura em grande escala é para exportação, são commodities, etc. Mas a produção da maioria dos alimentos que vão à mesa da população brasileira é produzida pela agricultura familiar. Então, quais são as suas sugestões quanto às medidas imediatas para combater a fome, e como nós podemos ajudar o pequeno agricultor ou a agricultura familiar, Rodrigo? O SR. RODRIGO AFONSO (Para expor. Por videoconferência.) - Caríssimo Senador Acir, obrigado pela pergunta. Eu acho que a gente tem duas ações: o Quem Tem Fome Tem Pressa, em que a gente precisa agir agora, a gente não pode esperar que a solução chegue. A gente sabe que a solução é emprego, é renda, é educação, e isso demora tempo para chegar. É difícil construir e fácil destruir, como a gente viu nos últimos anos, mas ela precisa ser feita, ela precisa ter um olhar de longo prazo. |
| R | No Quem Tem Fome Tem Pressa, a sociedade civil já está atuando desde 2016, distribuindo alimentos e tentando, de alguma forma, fazer com que a população que está com fome receba alimento. Só que é importante saber: enquanto diversas áreas recebem subsídios, o apoio para que as pessoas físicas e pessoas jurídicas doem para a segurança alimentar é zero no Brasil. Então, nenhuma empresa e nenhuma pessoa física hoje, quando doa para a segurança alimentar, para a assistência social, como ações que a gente faz, recebe qualquer tipo de incentivo. Isso poderia ser uma ação que desbloquearia uma série de recursos que hoje talvez pudessem ser utilizados para que o apoio do setor privado, que apoiou muito fortemente nos últimos anos, se alavancasse mais ainda. Eu acho que, de imediato, a gente precisa entender que o que resolve é entregar dinheiro para a população, com programas de transferência de renda. O Bolsa Família agora virou o Auxílio Brasil. Ainda não entendemos muito bem as mudanças e a clareza disso, mas é importante entender que há uma fila de milhões de pessoas esperando para entrar no Auxílio Brasil, assim como tinha no Bolsa Família. A gente precisa zerar essa fila, isso a curto prazo, de imediato. É o auxílio emergencial que foi cortado e jogou 22 milhões de brasileiros na miséria imediatamente. Então, a gente precisa entender que a ação imediata é transferência de renda, enquanto a gente constrói as soluções. E as soluções, olhando o pequeno produtor, são simples: use o mesmo esforço, use a mesma vontade de apoio ao agronegócio exportador para o pequeno produtor, aumente os subsídios, aumente a capacitação técnica, aumente o apoio dos órgãos, como Embrapa, para que eles possam produzir, melhorar a sua produção e ampliar os seus programas de recursos, de transferência de recurso para essas entidades. Você vê que o PAA e o Pnae são programas essenciais para os pequenos produtores, não só para a segurança alimentar das crianças nas escolas, não só para os programas sociais que eles atendem, mas porque eles são essenciais para os pequenos produtores, uma vez que é dos pequenos produtores que esses programas compram. Quando você reduz a compra desses programas, você diretamente afeta o pequeno produtor. Então, se não há um olhar em relação a isso, mesmo o Governo dizendo: "Olha, temos aqui tantos bilhões no Pronaf", quem negocia esse recurso com o pequeno produtor é o banco da ponta. Você acha que o banco da ponta prefere negociar com quem? Com o agronegócio multimilionário ou com um pequeno produtor que tem uma terrinha ali, uma lavourinha dele. É óbvio que esse recurso, por mais que seja liberado, não chega ao pequeno produtor. Então, a gente precisa ter o mesmo afinco, a mesma vontade de apoiar o pequeno produtor como a gente tem para apoiar o grande negócio. E é importante entender que os dois são importantes, mas é mais importante para a segurança alimentar que o pequeno produtor hoje receba um apoio de forma direta, efetiva e imediata. A gente não pode esperar mudar o Governo: as pessoas estão morrendo de fome hoje! Vamos ter informações em breve de novos dados da fome. A gente precisa entender que a segurança alimentar é uma situação de calamidade que a gente está vivendo hoje no Brasil. E, se a gente não tomar medidas extremas neste momento, medidas de transferência de renda, de apoio às entidades da sociedade civil que estão lutando para fazer os alimentos chegarem à ponta, se a gente não fizer isso agora, a gente vai relegar uma geração de jovens, crianças que não estão se alimentando corretamente, a viverem com as consequências da fome, as chagas que causam malformação, deficiências cognitivas para o resto da vida. É uma geração de dezenas de milhões de brasileiros que está sendo relegada à fome e à indignidade humana porque a gente está esperando uma eleição acontecer, esperando que as coisas aconteçam. É preciso mudar o Brasil, olhar para essa população e tomar medidas corajosas neste momento. |
| R | E eu acho que, infelizmente, Senador - o senhor me perdoe por isso -, o Legislativo nesses últimos anos pecou. Falei isto na Câmara e venho aqui falar isto no Senado: pecou nessa temática. Nós estamos alertando desde 2016 sobre a volta da fome, e nada foi feito de forma efetiva. Precisamos ter essa coragem agora, mesmo em ano eleitoral, de tomar medidas que possam, de fato, ajudar essa população que precisa hoje de comida, não daqui a seis meses. Obrigado, Senador, mais uma vez. O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Obrigado, Rodrigo. Pede a palavra pela ordem o Senador Izalci Lucas. V. Exa. tem a palavra, Senador Izalci. O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF. Pela ordem. Por videoconferência.) - Presidente, eu só quero, primeiro, parabenizar aí pela iniciativa, mas colaborar um pouco também com essa pergunta que foi feita. A gente que acompanha a agricultura familiar sabe das dificuldades. V. Exa. sabe da questão da regularização fundiária: não existe. Quem não tem escritura, quem não tem o título não tem financiamento, não é? Nós temos uma burocracia imensa para executar os programas, como foi dito aí, da educação, da compra da agricultura familiar. Nós temos diversos assentamentos que não têm água, que não têm semente, que não têm estrutura, que não têm estrada, em que a burocracia é muito grande para você cumprir as exigências burocráticas dos estados e municípios. Então, essa é a realidade. Eu concordo plenamente que há falta de iniciativa, de apoio ao pequeno agricultor. Nós precisamos, de fato, ampliar rapidamente essa questão dos assentamentos, precisamos de estudar. Não é para eles, porque eles não têm capacidade e condição de contratar técnicos para saber qual é a agricultura ideal naquela área, não é? Então, eu agora, inclusive, coloquei recursos lá no Mapa, no Incra, para ver se apoiam um pouco mais, no sentido de dar condições técnicas e capacitação para o pequeno agricultor, e exigir realmente que se tenha estrada, que se possa exercer o seu direito de compra do Estado, exatamente para alimentar aí as escolas, os hospitais, a segurança pública. Isso ajuda muito. Era só essa contribuição, Presidente. O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Izalci. Do que foi falado aqui até agora, nós já tivemos várias audiências públicas e debates com relação a fertilizantes, que é de antes, muito antes de acontecer a guerra da Ucrânia; sobre a regularização fundiária; e sobre licenciamento ambiental também. São três temas que chegam a essa questão de produção de alimentos, de termos um alimento mais barato e que esses alimentos cheguem à mesa da população brasileira. Dr. Rafael pede a palavra. V. Sa. tem a palavra. O SR. RAFAEL ZAVALA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senador. Somente três pontos em relação à intervenção do Sr. Senador que me precedeu, somente uma pequena comparação. As duas regiões mais atrasadas em questões de regularização fundiária são a Região Norte e a Região Nordeste, precisamente onde se concentra a maior pobreza, o.k.? Há uma clara linha. |
| R | Por outro lado, dois pontos muito importantes: se fizermos uma pesquisa de traçabilidade das políticas públicas para a agricultura familiar na América Latina e Caribe nos últimos 20 anos, a maior parte dessas políticas desses países está inspirada na experiência brasileira. Então, o Brasil sabe como fazer, sim, desde o Programa Nacional de Alimentação Escolar, com a intenção de promover compras públicas da agricultura familiar, o Programa de Aquisição de Alimentos, o Pronaf. A experiência de política pública da agricultura familiar do Brasil foi um exemplo mundial, medalha de ouro. Então, tem as ferramentas e já tem que fazer uma abordagem regional, sim, mas fica muito claro que a maior parte das experiências bem-sucedidas de políticas públicas de agricultura familiar na América Latina está inspirada nos casos bem-sucedidos brasileiros. Finalmente eu gostaria de comentar: a realidade brasileira é uma realidade distinta da maior parte dos países da América Latina. Eu sou mexicano, e a maior parte da população fica concentrada em três grandes metrópoles. No caso do Brasil, é diferente. O Brasil é mais parecido com a Europa, os Estados Unidos e o Canadá, onde a maior parte da população não mora em grandes cidades. Aqui no Brasil, mais de 60% da população mora em cidades pequenas e médias, e é nessas pequenas e médias cidades que é muito importante ter o equilíbrio nos sistemas alimentares e a promoção de circuitos curtos, a promoção de logística. Distribuir, prover alimentos dos pequenos produtores a essas pequenas cidades é um ponto para trabalhar. Que haja a promoção desses temas alimentares de circuitos curtos, de baixa pegada de carbono, de baixa pegada hídrica, e que fique mais perto, que tenha menos distância da fazenda à mesa, ao prato. Concordo também com a riqueza regional do Brasil. A cultura agroalimentar tem que ser promovida, e precisamente a agricultura familiar na indução econômica dará estabilidade nesses territórios, na perspectiva de cidade, região, em um país com 2 mil cidades pequenas e médias, onde mora a maior parte da população. E, neste Senado, neste Congresso, podemos fazer muitas forças para promover essa política para as cidades verdes e os circuitos curtos de sistemas agroalimentares. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, Dr. Rafael. Esta audiência pública tem o objetivo de receber informações, contribuições para que possamos fazer um projeto de lei sugerindo ao Governo alternativas no sentido de nós levarmos alimento a toda a população brasileira. A segurança alimentar e nutricional é da maior importância para o nosso país. Então, nós estamos fazendo a primeira audiência pública. |
| R | Faremos outras audiências públicas nesse sentido para recebermos sugestões para um projeto de lei, a fim de que a gente possa contribuir. Recolho a fala do Rodrigo de que o Legislativo pode fazer mais para contribuir. É exatamente nesse sentido, Rodrigo, que nós estamos fazendo esta audiência pública, ouvindo aqueles que queiram falar e contribuir para que a gente possa fazer projetos de lei - um, dois, três ou mais - no sentido de ajudar a produção de alimentos e de principalmente ajudar para que as pessoas recebam alimento nas suas residências, nas suas casas, na sua mesa. É claro que a grande solução, como muito bem colocou o Dr. Rafael, é a questão de renda. Alternativa eficiente é a geração de emprego e renda no Brasil para que nós possamos ter as pessoas não dependentes de receber Bolsa Família, não dependentes de receber cesta básica. É claro que isso é importante e se tem que fazê-lo imediatamente, porque a fome não espera, a fome tem pressa, mas, em curto-médio prazo, a geração de emprego é a solução para resolvermos essa questão da fome. Imediatamente, são os programas governamentais, como o Auxílio Brasil, agora assim denominado, o auxílio através da doação de cestas básicas, que é fundamental. E temos que ter um planejamento de Estado, não de governo, com relação à produção de fertilizantes no país, à regularização fundiária, às obras de infraestrutura, que geram emprego, geram renda. Não adianta nós querermos terceirizar as obras de infraestrutura no Brasil. Daqui a pouco, nós vamos estar terceirizando a construção de casas populares. De que forma? É complicado isso. Nós precisamos que o Governo faça os investimentos necessários para ajudar a gerar emprego no Brasil. O maior sistema de fomento de empregos é através do Governo. É o Governo que tem a condição de gerar emprego no nosso país, através de incentivos, obras diretas, obras indiretas. Se o Brasil não investir no seu país, se nós não investirmos no nosso país, nas obras de infraestrutura, quem vai investir? Quem virá aqui, ao Brasil, investir nas nossas obras de infraestrutura, obras necessárias? Quando falamos de infraestrutura, são obras em todos os sentidos, não apenas de transporte, de estradas, de rodovias, de ferrovias, mas obras de esgotamento sanitário, por exemplo, que é uma necessidade grande, obras para cuidar do meio ambiente, obras estruturantes. Dessa forma, nós aguardamos aqui sugestões dos nossos colegas, dos Senadores, para que a gente possa produzir um projeto de lei para avançar na segurança alimentar e nutricional no país. A Laudice Albuquerque, de Sergipe, faz uma pergunta: "Quais as estratégias para tirar o Brasil da rota do mapa da fome?". Essas estratégias, Laudice, são exatamente o que nós estamos debatendo aqui. A geração de emprego e renda é a solução definitiva para isso. Agora, são os programas governamentais para que a gente possa atender a população brasileira. |
| R | Tayline Silva, do Rio de Janeiro: "Quais as contribuições da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional para a sociedade?". As contribuições são exatamente levar alimento a toda a população brasileira, e esse é o debate que estamos promovendo. Todas as sugestões que vocês tiverem mandem para a gente, para que a gente possa colher todas as informações e fazer dessas informações e sugestões projetos para que a gente possa auxiliar o Executivo a levar alimentação a toda a população brasileira e acabar com a fome no Brasil. Volto a dizer: é um contrassenso nós sermos um dos países que mais produzem alimentos no planeta e termos pessoas passando fome neste mesmo país, que é o maior produtor de alimentos do planeta. Então, é nesse sentido que este debate acontece. Eu pergunto ao Dr. Rafael: gostaria de dar suas considerações finais, para que nós possamos encerrar a nossa audiência? V. Sa. tem a palavra para suas considerações finais, já, mais uma vez, agradecendo a sua presença junto conosco. O SR. RAFAEL ZAVALA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senador. Eu saúdo o Rodrigo e os demais Senadores que nos acompanham. Eu somente confirmo que o Brasil sabe como fazer, já tem uma experiência muito bem-sucedida de lição mundial: a estratégia de inclusão, não somente inclusão social, mas inclusão econômica. E, sobretudo no contexto das pequenas cidades, de um país de pequenas cidades, é ainda mais importante assegurar a estabilidade da agricultura familiar nesses territórios. Temos o grande exemplo do Programa Nacional de Alimentação Escolar, que está imbricado no sistema alimentar de cada uma das regiões do Brasil, que está gerando emprego, que está gerando renda, que são demandas estáveis praticamente em todo o ano, com a estratégia das cozinhas, onde também se geram empregos, principalmente para as mulheres. O Programa Nacional de Alimentação Escolar é um programa de política pública virtuosa, é política de Estado virtuoso por tudo o que envolve. Não somente envolve o desafio da alimentação saudável, mas também a inclusão dos pequenos produtores, a elaboração de comida, o segmento dos pais, além de nutricionistas, que tem FNDE. É excelente, é um grande exemplo. E também há as outras experiências que aconteceram e que poderíamos recolher, sobretudo com um olhar de melhoramento, de como podemos aprimorar. O Brasil sabe como fazer. E também há a importância do Legislativo para impulsionar políticas públicas permanentes e não somente temporárias. Muito obrigado. E contem conosco, contem com a FAO e com todas as agências da Nações Unidas. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, Dr. Rafael Zavala, pela sua participação, pelas suas contribuições. Foi importante a sua presença junto conosco. Certamente estaremos juntos em outras audiências públicas para continuar este debate. Oxalá possamos também nos reunir para comemorar a melhora da questão nutricional no nosso país. Para suas considerações finais, passo a palavra ao Dr. Rodrigo Afonso. O SR. RODRIGO AFONSO (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Senador Acir. Mais uma vez, congratulo-me com o senhor e com todos os Senadores presentes por este momento de democracia, tão difícil nos últimos anos. Eu fico muito feliz de a gente poder estar aqui falando e trazendo essas questões importantíssimas para o povo brasileiro. Quero agradecer a honra de estar aqui com o Rafael, querido parceiro da Ação da Cidadania e cujo trabalho a gente admira muito; e agradecer ao Senador Izalci pela fala. Acho que tem uma questão muito importante mesmo, que precisa ser colocada e tratada de forma rápida. Estou muito contemplado com a fala do Rafael. E queria dizer que há um único cuidado que a gente precisa ter, até nessa questão dos fertilizantes, de que a gente precisa trazer isso para o Brasil e fazer essa produção ser local: é tomar cuidado para que não aconteça a mesma coisa que aconteceu com o agronegócio, em que a gente subsidia, investe, apoia, constrói, e aí depois tudo é exportado, vai para fora, e nada fica no Brasil. O Brasil precisa aprender que subsídio, apoio a setor privado requer contrapartidas. Essas contrapartidas têm que estar muito claras quando se pega dinheiro do Estado para que se possa gerar recursos e ganhar dinheiro no Brasil. Então, eu acho que é importante olhar para o apoio, sim, na questão do fertilizante, mas entender como isso vai gerar, de fato, uma melhora significativa para o Brasil, porque, se a gente produzir fertilizante em real, subsidiar e vender em dólar para o próprio Brasil, aí não adiantou de nada; a gente só está enriquecendo grupos e não está fazendo nenhuma diferença para a segurança alimentar brasileira. Então, é importante sempre nas legislações entender que a gente precisa olhar as contrapartidas que interessem ao povo brasileiro, pois é dinheiro do povo brasileiro, e a gente precisa fazer com que isso se reverta em melhorias para a população. Muito obrigado mais uma vez. Foi uma honra estar aqui. O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, Rodrigo. Agradeço ao Senador Izalci pela sua participação e ao Senador Esperidião Amin também. Antes de encerrarmos, temos um requerimento a ser votado, de autoria do Senador Chico Rodrigues, que eu passo a subscrever. 2ª PARTE EXTRAPAUTA ITEM 1 REQUERIMENTO DA COMISSÃO DE AGRICULTURA E REFORMA AGRÁRIA N° 11, DE 2022 Requeiro, nos termos do art. 58, §2º, II, da Constituição Federal e do art. 93, II, do Regimento Interno do Senado Federal, a realização de audiência pública, com o objetivo de debater as recentes pesquisas da Embrapa sobre a tropicalização da cultura do trigo, seus resultados e as perspectivas de expansão da produção para estados das regiões Norte e Nordeste. A Audiência Pública contará com a participação dos seguintes convidados: • Celso Moretti, Presidente da Embrapa; • Júlio Albrecht, Pesquisador do Trigo Tropical da Embrapa Cerrado; • Edvan Alves, Chefe-geral da Embrapa Roraima; • João Martins, Presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) ou representante; • Geraldo Falavinha, Produtor do Estado de Roraima. Autoria: Senador Chico Rodrigues (UNIÃO/RR) e outros. Em votação o requerimento. As Sras. e os Srs. Senadores que o aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.) Aprovado o requerimento. Vou encerrar a nossa audiência pública. |
| R | Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada. (Iniciada às 8 horas e 04 minutos, a reunião é encerrada às 9 horas e 36 minutos.) |

