Notas Taquigráficas
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| R | A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Fala da Presidência. Por videoconferência.) - Declaro aberta a 11ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da 4ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura. A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para instruir a Proposta de Emenda à Constituição nº 34, de 2021, que altera o inciso I do art. 56 da Constituição Federal e para prever que a investidura de Parlamentar no cargo de Chefe de Missão Diplomática de caráter permanente não dá ensejo à perda de seu mandato. |
| R | Conforme o Requerimento nº 7, de 2022, para a CCJ, de iniciativa desta Senadora Mara Gabrilli, a presente reunião será semipresencial, sendo permitida a participação remota das Sras. e Srs. Senadores e convidados, por sistema de videoconferência, para exposição e debate. Esta reunião é realizada em caráter interativo, com possibilidade de participação popular. Eu vou pular tudo isso, porque demorou demais o início, devido a uma questão técnica do próprio Senado, da própria Comissão, e os convidados têm horário. Então, vou direto ao assunto. Antes de apresentar as convidadas e os convidados, só gostaria de fazer minha descrição. Eu sou uma mulher de pele clara, cabelos castanhos claros, semilongos, estou com um vestido de oncinha, estou numa sala clara e tem um quadro, atrás de mim, com um arco-íris e um horizonte. Eu quero dar boas-vindas e apresentar: a Sra. Glivânia Maria de Oliveira, que é Diretora do Instituto Rio Branco e está aqui conosco representando o Ministro de Estado das Relações Exteriores, Carlos Alberto Franco França; o Sr. Marcelo Calero Faria Garcia, que é Deputado Federal; a Sra. Maria Celina de Azevedo Rodrigues, Presidente da Associação e Sindicado dos Diplomatas Brasileiros (ADB/Sindical); o Sr. Aloysio Nunes Ferreira, ex-Ministro de Estado das Relações Exteriores e ex-Senador; o Sr. José Alfredo Graça Lima, Vice-Presidente do Conselho Curador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), representando a Sra. Julia Dias Leite, Diretora-Presidente do Cebri; o Sr. Guilherme Stolle Paixão e Casarões, Cientista Político e Professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas; e o Sr. Mathias Alencastro, Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). Muito obrigada pela presença de todos. Justificou a ausência o Sr. Celso Lafer, ex-Ministro de Estado das Relações Exteriores, Professor Emérito da Universidade de São Paulo, mas que nos enviou uma mensagem que lerei daqui a pouco. Desde o dia em que a PEC nº 34, de 2021, entrou na pauta da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, que eu fui procurada por diversas organizações preocupadas com os impactos da proposta. Para dar voz aos segmentos da sociedade interessados em debater o projeto e favorecer o diálogo com os Senadores da Comissão, eu apresentei um requerimento para realização desta audiência pública e para que a gente tenha a oportunidade de aprofundar a discussão sobre o tema, já que alterar a nossa Constituição Federal não é algo trivial e merece nossos melhores esforços, ainda mais em se tratando de uma matéria como essa, que visa a alterar a previsão constitucional de perda do mandato quando houver a nomeação de um Deputado ou de um Senador para ser Chefe de Missão Diplomática permanente. Na própria justificativa da PEC, o Senador Davi Alcolumbre ressalta que as Constituições brasileiras, desde a de 1937, preveem perda do mandato parlamentar quando da nomeação para a função de Embaixador. Atualmente, a Constituição permite que Parlamentares chefiem missão diplomática temporária sem perda de mandato, ou ainda que assumam os cargos de Ministro do Executivo ou de Secretário de Estado ou do Distrito Federal ou de Prefeito de capital. |
| R | Como essa proposta não poderia passar por esta Casa de forma açodada, reunimos algumas autoridades estudiosas para ponderação entre os nobres colegas Senadores e a sociedade. A representação diplomática permanente do país sempre foi fundamental para a preservação de nossa soberania e para a qualidade de nossa inserção e nossa atuação no cenário internacional. Ela historicamente vem sendo exercida com maestria por profissionais que são submetidos a um dos mais rigorosos concursos públicos do país e a uma rígida hierarquia existente no serviço exterior, que estão organizados em carreiras e que são submetidos a constante processo de capacitação. Por isso, sempre que eu tenho oportunidade - e esta é uma delas -, eu adoro enaltecer as preciosas contribuições dos servidores do Itamaraty pelo permanente diálogo, respeito e defesa dos interesses brasileiros na arena internacional. Isso demarcou uma histórica credibilidade nas relações do Brasil e nas intervenções do Brasil no exterior, ainda mais nesses tempos tão difíceis que a gente atravessa. E, apesar de reconhecermos o papel desempenhado pelo Congresso Nacional em prol da política externa brasileira, é preciso estarmos atentos a um fato: não podemos misturar interesse político-eleitoral e políticas de governo com políticas de Estado. A tradição brasileira herdada do avô da nossa Diplomacia, que era o Alexandre de Gusmão, e sedimentada pelo nosso Patrono, Barão do Rio Branco, é de uma política de Estado que exige pragmatismo e racionalidade. E a PEC 34, de 2021, parece ir na contramão desses princípios. Sabemos que o art. 52, inciso IV, da Constituição, atribui privativamente ao Senado Federal a competência de aprovar previamente, por voto secreto, a escolha dos Chefes de Missão Diplomática de caráter permanente e que essa prerrogativa constitui a materialização de mecanismo de freios e contrapesos. Muito nos preocupa um possível desequilíbrio nesse sistema, sobretudo diante do número expressivo de embaixadas brasileiras distribuídas pelo mundo e que poderiam se tornar objeto de negociações pelo Executivo em busca de apoio político do Congresso Nacional. Assim, mais uma vez, eu agradeço a presença de todos e gostaria de dar início às intervenções dos nossos convidados, que com certeza vão enriquecer este debate. Lembro que cada um terá dez minutos para as suas considerações. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - Senadora Mara Gabrilli, é o Esperidião Amin. A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Eu sei. Bom dia! O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Pela ordem.) - Mesmo a senhora sem aquela aura, sem aquela aura marcante, em recente sessão, eu gostaria de cumprimentá-la por presidir esta reunião, que estarei acompanhando, mas não posso deixar de enunciar aqui a minha posição. Eu concordo com todas as suas palavras e gostaria de acrescentar três brevíssimas reflexões, se a senhora me permitir, querida amiga e vizinha de Plenário. Número um: considero esta iniciativa inadequada do ponto de vista constitucional - incongruente, como a senhora mesma revelou ao comentar sobre as autonomias e sobre as peculiaridades das funções. |
| R | Segundo, não vejo interesse público nela. Portanto, constitucionalmente, em termos de interesse público, acho que ela não atende à melhoria do serviço que se presta. Pelo contrário, tende a comprometer a qualidade. Na primeira questão constitucional, trata-se da separação entre os Poderes e da não subordinação do Parlamentar a quem não é eleito; na segunda, repito, do interesse público. Mas eu quero acrescentar um terceiro fator, pedindo perdão se considerarem chula minha observação. O terceiro comentário é de boteco. Eu milito na vida pública, sem abrir mão de frequentar boteco; boteco tem uma sabedoria muito respeitada no Brasil. E, nos botecos do Brasil, o que se comenta é que o objetivo desta proposta de emenda à Constituição é arrumar mais uma boquinha para o Parlamentar. Portanto, pelas três razões - constitucional, interesse público e papo de boteco -, eu quero manifestar minha absoluta contrariedade ao objetivo desta PEC e vou continuar aqui acompanhando os subsídios que nos serão apresentados. Muito obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Senador Esperidião. Eu gostaria de passar a palavra para os convidados. Eu ia começar com a nossa convidada que está presencialmente, mas eu quero pedir autorização e começar pelo nosso ex-Ministro de Estado das Relações Exteriores e ex-Senador, Sr. Aloysio Nunes Ferreira, para trazer as suas considerações. Muito obrigada, Aloysio, por participar aqui com a gente. O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senadora Mara Gabrilli. É uma honra atender a esse convite da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, especialmente para participar de uma sessão que foi requerida por V. Exa. e é presidida por V. Exa. Eu quero cumprimentar os Senadores, os convidados, a todos aqueles que assistem à nossa audiência pública. Eu teria muito pouco a acrescentar, Senadora, ao que a senhora disse na sua introdução, com o brilhante complemento constitucional, de mérito e de boteco que foi aduzido pelo Senador Amin. Não é uma novidade essa iniciativa; essa iniciativa tem um precedente histórico. Segundo a nota que foi elaborada pela Consultoria do Senado, a pedido, aliás, do Senador Amin, já na Assembleia Nacional Constituinte de 1988, houve uma tentativa de facultar a designação de um Parlamentar de ocupação de uma embaixada ou de uma representação permanente no exterior por um Parlamentar sem licença no mandato. Essa tentativa contrariava uma história constitucional brasileira que vem continuamente desde 1937, quando começaram, aliás, sob a égide da ditadura do Estado Novo, a se estruturar as carreiras públicas da União. O argumento foi mais ou menos semelhante àquele apresentado pelo prezado amigo e ex-colega Alcolumbre, de que esse impedimento representaria uma discriminação contra o Parlamentar, porque o Parlamentar tem toda a qualificação de discernimento e de experiência para ocupar essas funções. |
| R | A PEC, a proposta desses Constituintes, foi fulminada pela argumentação do Constituinte, o grande Deputado, jurista, que foi o que acabou por liquidar essa discussão, Egídio Ferreira Lima, na Constituinte, de tal maneira que o Constituinte originário manteve esse impedimento. E o argumento de Egídio Ferreira Lima é o mesmo, aliás, em essência, do que foi desenvolvido pela Senadora Gabrilli e pelo Senador Amin. A política, eu acho, minha opinião, é uma carreira, e digo isso com a autoridade e experiência de quem percorreu muitos cargos na vida política. É uma carreira que permite um acúmulo de experiências - tem razão o Senador Alcolumbre -; experiências que permitem que você possa distinguir um conjunto de árvores da floresta, distinguir o que é um técnico competente de um simples medalhão, saber quando é preciso dar dois passos atrás para poder dar um passo adiante. Isso somente com a experiência da vida política, que você aufere na carreira política! Aliás, os antigos romanos, nos primeiros dois séculos da República Romana, instituíram por costume aquilo que se chamava de cursus honorum. Quer dizer, é um percurso a ser percorrido para que o Senador, alguém pertencente à classe senatorial, pudesse chegar ao topo do Estado, à função de Cônsul. Ninguém chega a ser cônsul sem ter sido antes edil, questor, pretor, tribuno, para depois chegar a cônsul. Ora, é uma carreira que obedece ao princípio democrático; uma carreira que permite, aliás, ao longo do acúmulo da experiência e de prestígio, que advêm da ocupação de cargos públicos, a aquisição de autoridade, que confere, inclusive, independência ao titular do mandato eletivo - independência que permite, por exemplo, ao Senador Serra votar contrariamente à orientação da Liderança da Bancada do PSDB nesta PEC, chamada pela imprensa de PEC camicase. Votou contra, atendendo à sua convicção, a partir da experiência que ele acumulou e do prestígio e da autoridade que acumulou. Ora, a carreira diplomática é uma carreira burocrática, organizada no Estado, segundo regras estatutárias rígidas. Tem-se acesso a ela por concurso público; um concurso, como disse a Senadora Mara Gabrilli, duríssimo. É uma carreira na qual se ascende pouco a pouco, mediante provas, cursos, experiências funcionais, em que o mérito e o conhecimento são aferidos. De tal maneira que a pessoa pode, depois de pelo menos 20 anos de exercício, de ingresso na carreira, ocupar a relevantíssima função que é de falar em nome do Estado brasileiro. E falar em nome do Estado brasileiro significa falar em nome daquele que é o porta-voz do Estado brasileiro, que hoje é o Presidente da República. Isso significa uma submissão hierárquica, uma submissão de disciplina, como é própria de todas as carreiras. |
| R | Hoje um Parlamentar, se fosse investido dessa função sem se licenciar, poderia simplesmente desconsiderar uma determinação do Presidente. E o que aconteceria com ele? Provavelmente seria demitido dessa função e voltaria para o seu mandato. Já o diplomata, não. Ele teria seriíssimos prejuízos se, porventura, viesse a descumprir uma orientação, uma determinação da sua chefia. Eu digo isso como alguém que já chefiou, com muita honra, o Ministério das Relações Exteriores, tive convivência com diplomatas que me enriqueceram com informações preciosíssimas. Os telegramas diplomáticos que eu recebi nos diferentes postos são verdadeiras lições de análise de conjuntura nos países em que eles eram acreditados, não só nos países como Estados Unidos, Argentina, França, Inglaterra, mas também na Coreia do Norte. O nosso encarregado de negócios que estava na Coreia do Norte, o Cleiton Schenkel, me mandava telegramas preciosos, que resultaram num livro que ele publicou sobre a vivência dele na Coreia do Norte, onde nós temos representação diplomática há muito tempo iniciada pelo grande Diplomata Arnaldo Carrilho, difusor do cinema nacional, amigo de Glauber Rocha e de Bernardo Bertolucci. Bom, mas eu quero dizer o seguinte: o diplomata tem que seguir a hierarquia, a obediência hierárquica, pouco importa se ele é de direita ou de esquerda. Eu convivi com grandes diplomatas de direita, de esquerda e até mesmo com um velho diplomata que é um dos astros da carreira, hoje aposentado, que é monarquista e que, no entanto, seguiu escrupulosamente as determinações do Presidente. Caso contrário, nós teríamos uma confusão, uma cacofonia na política externa. Ora, à medida que você introduz na carreira diplomática o salto de barreiras que levam a que a pessoa ocupe esse posto com pelo menos 20 anos de exercício, você cria realmente uma enorme confusão dentro da carreira, você cria o desestímulo aos diplomatas. Esse que serve hoje na Coreia do Norte deve ter a expectativa de um dia servir um posto mais atraente. Você estaria tirando esse estímulo, você estaria diluindo - o que me parece mais grave - uma competência fundamental do Presidente da República que é a de falar pela sua voz em nome do Brasil, falar pessoalmente e mediante representantes seus nomeados por ele e acreditados por ele. É claro que o Senado tem enormes competências. E, vejam, a disciplina constitucional da indicação do embaixador mostra como é delicada essa questão. Ele deve ser submetido, depois da indicação do Presidente, a uma sabatina, no texto da Constituição, em sessão secreta da Comissão de Relações Exteriores - eu creio que esse sistema já caiu em desuso e há uma iniciativa do Senador Anastasia que eu penso que foi aprovada -, e é submetido depois ao voto secreto para evidentemente blindar essa indicação dos interesses políticos que são contingentes e que podem de alguma maneira comprometer a execução de objetivos políticos permanentes, de longa duração. |
| R | São processos de longa duração, como, por exemplo, esse do ingresso nosso na União Europeia ou na OCDE e as negociações entre o Estados Unidos e o Brasil para a utilização da Base de Alcântara para lançamento de satélites comerciais. Isso começou faz 20 anos. São processos de longa duração que não podem ser submetidos a interesses políticos que são, por sua própria natureza, contingentes. Eu acompanho com muita tristeza um certo desmonte de estruturas do Estado brasileiro, de políticas públicas na saúde, na educação, no meio ambiente, nos direitos humanos. Direitos humanos, aliás, foi um tema que a Senadora representou temporariamente nas Nações Unidas por indicação do Presidente Temer, em uma conferência sobre direitos humanos. Agora, o fato é que essas coisas todas podem ser corrigidas. Foram resultado de uma conjuntura de um Presidente, na minha opinião, despreparado para o cargo que exerce, com uma pauta, com o repertório político restrito a obsessões ideológicas, sem um projeto para o país e que acabou se rendendo a interesses de sobrevivência imediata. Há muitos Parlamentares eleitos por partido sem nenhuma consistência programática ou ideológica; meras siglas, cujo significado nem os próprios membros conseguem decifrar qual seja. Então, vivemos hoje isso, essa conjuntura. E nessa conjuntura houve um avanço sobre as prerrogativas do Presidente. Com Presidente fraco, o Congresso ocupa. O mais grave, no meu entender, é em matéria orçamentária. E começa com a Presidente Dilma, que, diante do esfarelamento da sua presença política, acabou por ceder à execução obrigatória de emendas individuais. E, hoje, nós estamos prestes a ver, com base no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias, o esvaziamento completo ou quase completo da prerrogativa presidencial no gasto público. Mas, enfim, essas são coisas que podem ser corrigidas; serão corrigidas se houver alternância no poder. Agora, uma mudança condicional dessa natureza cria um dano permanente na política externa brasileira e um dano permanente a uma prerrogativa essencial do Presidente da República, que é falar com plena autoridade, em nome do Brasil. Por isso, meus amigos, eu concordo com tudo aquilo que foi dito no mérito e quanto à constitucionalidade. Acho que essa diluição de fronteiras entre Poderes não deve ser admitida pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado e eu faço votos de que esta Comissão possa detidamente se aprofundar nos aspectos constitucionais desta PEC para que depois, na Comissão de mérito, na minha opinião, ela possa ser rejeitada. Muito obrigado, Senadora; muito obrigado, meus caros companheiros. A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Obrigada, Senador Aloysio. É uma honra ouvir suas palavras. Só para lembrar, eu ainda estou representando o Brasil por aquela indicação do Presidente Temer. O meu mandato só termina em janeiro do ano que vem. Muito obrigada, Aloysio. Agora eu quero passar a palavra para a Diretora do Instituto Rio Branco, a Sra. Glivania Maria de Oliveira, que representa o nosso Chanceler, Carlos Alberto França. |
| R | A SRA. GLIVANIA MARIA DE OLIVEIRA (Para expor.) - Muito obrigada, Senadora Mara Gabrilli; Sras. Senadoras; estimada Senadora; Ministro Aloysio Nunes, que tivemos a grata satisfação e o privilégio de ter no Itamaraty e com quem tive a oportunidade de estar duas vezes nos Estados Unidos, ao meu tempo, como Cônsul-Geral do Brasil em Boston. Tivemos uma reunião importantíssima convocada pelo Sr. Ministro Aloysio Nunes para tratar da questão das crianças na fronteira, da questão das imigrações. Também tivemos uma proveitosa e importantíssima reunião de coordenação e orientação para as chefias de postos naquela região e em Washington também, por volta de 2018. Eu queria dizer que é uma grande honra estar aqui hoje. Eu gostaria, inicialmente, de transmitir a V. Exas. as saudações do Ministro de Estado das Relações Exteriores, que, em razão de compromissos fora do país, não pôde hoje aqui estar. Incumbiu-me, no entanto, de representá-lo nesta audiência pública da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, o que faço com muita honra e com a noção, creio, correta da grande responsabilidade que aqui trago neste momento. Estamos aqui debatendo a Proposta de Emenda à Constituição nº 34, de 2021, que tem especial relevância não apenas para o Itamaraty, como instituição de Estado, mas também para o futuro da diplomacia brasileira e, creio eu, portanto, para a defesa dos interesses do Brasil no cenário internacional. É sempre motivo de satisfação ter esta oportunidade. Eu gostaria de mencionar que a nossa estimada Relatora esteve no Panamá. Eu retornei do Panamá há pouco menos de três meses, onde tive também o privilégio de exercer funções como representante plenipotenciária do Brasil, do nosso Presidente da República. E, nessa condição, acompanhei as atividades do Parlatino. Tivemos uma oportunidade de uma breve interlocução no momento em que eu já estava, na verdade, me preparando para assumir as minhas responsabilidades em Brasília como Diretora-Geral da academia diplomática brasileira. É, portanto, uma grata satisfação aqui voltar e poder também relembrar esse episódio da minha carreira diplomática recente. Talvez, se me permitem, antes de entrar na matéria, eu acho que as questões constitucionais, as questões legais que foram suscitadas pelo Senador Esperidião Amin, pela Senadora Mara Gabrilli e pelo Ministro Aloysio Nunes são aspectos que eu, em representação do Ministro de Estado, corroboro integralmente. Portanto, tenho a certeza de que não faria com igual competência, se fosse revisitar todos esses pontos. Mas, de fato, temos sérias preocupações quanto a aspectos constitucionais relacionados à iniciativa, inclusive no que diz respeito a algumas cláusulas pétreas da Constituição Federal. Nós sabemos que esse tema foi objeto de debate no nosso esforço constituinte em 1987, em 1988. E consideramos... Com todo o respeito ao Exmo. Sr. Senador Davi Alcolumbre e à relatoria, com esse respeito, eu me permito também transmitir a posição do nosso chefe, que é a posição da nossa Casa, quanto aos aspectos sensíveis e possivelmente problemáticos, na nossa opinião, quanto a elementos de constitucionalidade. |
| R | Mas eu gostaria... Eu aqui estou e entendo que o Ministro me concedeu essa honra de representá-lo nesta ocasião, até porque ele não pôde aqui estar hoje, porque eu assumi com grande satisfação a Diretoria-Geral da academia diplomática do Instituto Rio Branco, uma instituição criada, enfim, em 1945, 1946 - estamos aí há quase 80 anos formando diplomatas. Portanto, eu falo em nome dos alunos do Instituto Rio Branco, falo também em nome dos mais de 2 mil diplomatas que foram formados por aquela instituição, num processo absolutamente criterioso, rigoroso de seleção, de formação e de aperfeiçoamento. Eu também creio aqui representar a percepção e os sentimentos dos nossos mais de 1,5 mil diplomatas que, ao longo dessas décadas, tanto se empenharam por levar adiante o nosso trabalho diplomático, conforme determinações do Chefe do Executivo, transmitidas, coordenadas e acompanhadas por nós no Itamaraty, sob as ordens do nosso Ministro de Estado. Temos uma carreira hierárquica, uma burocracia bastante estruturada e, sobretudo, temos um enorme compromisso, como funcionários, como uma burocracia administrativa, em constante treinamento e aperfeiçoamento, um compromisso absolutamente sério, como representantes de Estado, na defesa e na consecução das políticas que nos são determinadas pelas mais altas autoridades. Nesse processo, cumpre ressaltar o papel fundamental do Senado Federal, que tem o papel de acompanhamento, o papel de monitoramento e, inclusive, em última instância, o papel no que diz respeito aos tratados internacionais, às convenções - o papel definitivo em termos da aprovação ou não aprovação das decisões que o Brasil, através dos seus agentes plenipotenciários, através dos seus diplomatas, dos seus embaixadores, assina, contrata, participa de negociações e traz à deliberação desta casa. Então, esta Casa tem este papel e este papel é o papel fundamental. Eu vejo, estimados Senadores e estimadas Senadoras, por exemplo, na proposta, na justificativa, eu notei algo, uma observação muito importante, muito correta que diz: os Parlamentares conhecem como poucos as reais necessidades do Brasil e do seu povo. Não há como, é evidente e é uma grande, uma grande verdade, por toda a riqueza do trabalho que se realiza nesta Casa, por toda a dedicação que se vê, por toda essa representação variada, relevante e essencial que temos no Congresso Nacional e no Senado Federal. Eles são os representantes diretos e eleitos do povo e a possibilidade de exercer a chefia de missões diplomáticas seria forma de concretização do princípio da soberania popular. A possibilidade de exercer chefias diplomáticas existe, ela é prerrogativa do Chefe do Executivo. |
| R | Há uma possibilidade de que os mandatos, uma vez... Abrindo-se mão do mandato, essa possibilidade existe e essa contribuição é relevante. Nós não estamos, estimada Relatora, questionando esse aspecto. O aspecto que nos preocupa é o exercício, é assumir uma missão diplomática no exercício de um mandato parlamentar. E aí entramos na questão da separação dos Poderes, entramos na questão inclusive do processo de designação de um agente, de um chefe de embaixada, de uma chefe de embaixada, que será aqui submetido à apreciação do Senado, passando pela Comissão de Relações Exteriores. Então, como eu disse, não vou me estender muito porque já tivemos brilhantes e abrangentes manifestações aqui, mas eu queria dizer que eu trago também da nossa área jurídica no Itamaraty uma preocupação bastante acentuada com essa questão. Eu acho que eu devo, talvez, dizer, portanto, que nós concordamos quanto a esse aspecto, concordamos também quanto ao aspecto de que o mundo mudou, de que os temas chegam com cada vez maior velocidade e que todos nós... Hoje o mundo está todo conectado, e quando falamos dos mais altos representantes da República, quando falamos nos Srs. Senadores, Sras. Senadoras, Srs. Deputados, nós estamos falando de pessoas que, ungidas pelo voto popular, direto, secreto, representantes altamente capacitadas, certamente acompanham esses temas da agenda internacional. No entanto, nós acreditamos, com todo respeito, que há papéis determinados - e papéis determinados na Constituição Federal. O nosso papel como agentes, como ferramentas, como instrumento... Como mencionou recentemente o Exmo. Presidente do Senado Federal, nós somos o instrumento, nós somos a ferramenta para implementar as políticas que são decididas, as instruções que nos são impartidas através do Ministro das Relações Exteriores e que têm na sua origem o Chefe do Executivo - é claro, com acompanhamento e com monitoramento e, como eu disse, no caso dos tratados internacionais, das convenções, dos compromissos que assumimos, passando pelo crivo necessário, fundamental desta Casa. Mas nós temos o papel de ir, de negociar em processos que são longuíssimos, em processos que são complexos, em processos que permitem que, interagindo com os vários atores da cena internacional, nós, como diplomatas dedicados a este ofício, possamos trazer para casa, para os nossos mais altos representantes, inclusive os Srs. e as Sras. Senadoras o resultado desse esforço que cumprimos - cumprimos com muita honra e cumprimos com muito, muito empenho. Eu diria que, como Diretora-Geral do Instituto Rio Branco... E eu sei que a nossa estimada Relatora também é pedagoga, então aqui eu falo com o meu papel também de diretora, de professora, de quem na semana passada deu posse a 36 novos terceiros-secretários na carreira, um dos momentos mais gratificantes, em que senti com mais intensidade a responsabilidade do meu cargo. |
| R | Também concluímos recentemente, além de dar posse a esses novos jovens secretários que vieram... Eu diria que são números impressionantes. Participaram deste certame 6.464 brasileiros das mais diversas procedências. Quando nós tivemos a fase inicial do concurso, todos os estados brasileiros estavam representados. E fizemos essas provas em todos os estados de origem, como tem sido a prática já há alguns anos, nesse esforço de ter o Brasil em nível federal, como representação federal, mas com a sua origem nos diversos estados, permitindo que todos possam fazer parte e dar essa contribuição para o país. De 6.464, nós chegamos ao resultado de que passarão a estudar em bases, por um ano e meio - com estágios, com formação bastante abrangente, profissionalizante e também teórica -, 36 alunos. Eu me permito dizer que estou muito feliz, e o Itamaraty e as nossas chefias temos a satisfação de dizer que alcançamos um número recorde de mulheres: desta vez, temos 44,11% de mulheres neste grupo, o que é a nossa melhor marca nos últimos 40 anos. Então, é uma satisfação, e eu pretendo dar o melhor de mim, sob a orientação das minhas chefias, nessa tarefa. Eu falo por essas pessoas, eu falo por esses jovens, eu falo pelos jovens que concluem agora em fevereiro o seu curso de formação. Então, nós teremos no Rio Branco... Enfim, eu terei o maior prazer em convidá-la um dia para estar conosco, para falar para esses jovens, porque nós precisamos inspirá-los para o sentido que eles já têm, porque é uma inspiração participar de um concurso que demanda tanto, que tem tantas fases, que leva meses e que exige tanto sacrifício pessoal, tantas esperanças depositadas. Eles têm muita inspiração, mas eu acho que a gente sempre pode reforçar isso. E acho, se me permitem, nesse sentido, que esses jovens, quando eu retornar ao Rio Branco hoje, vão me olhar e vão me perguntar: qual será o nosso futuro? Qual é a previsibilidade que nós temos? Porque, quando nós entramos nessa carreira... Claro, nós temos uma carreira hierárquica, nós temos uma carreira que tem processos muito rigorosos, com muito estudo e muita avaliação do trabalho, que nos leva um dia, a depender do nosso desempenho, àquela posição almejada de representar o nosso país, conforme autorizado pelo Senado Federal e conforme indicado pela chefia do Executivo, lá fora e fazer o trabalho conforme as prioridades aqui determinadas, mas sempre procurando trazer de volta o melhor que nós pudermos e sempre procurando desempenhar o nosso papel da melhor forma. Eu devo dizer, eu vou fazer... Enfim, eu não costumo falar tanto de mim e das minhas origens, mas eu sou uma diplomata com 38 anos de carreira. Então, 38 ou 39 anos atrás, eu era um daqueles jovens. Eu tenho a satisfação de ser Ministra de Primeira Classe, como nós chamamos, há cerca de nove ou dez anos. Eu fui chefe de duas missões diplomáticas: no Consulado-Geral do Brasil em Boston, onde eu tive a oportunidade de ter uma das experiências mais enriquecedoras, o melhor aprendizado da minha vida, em Boston; e, depois, eu estive no Panamá. Mas queria dizer que eu sou uma daquelas jovens que, hoje, estão esperando e que vão me perguntar: "O que será do nosso futuro, Embaixadora? A força da nossa carreira se mantém?". Há essa preocupação. E eu diria que eu sou uma daquelas jovens, vinda do interior de Minas, vinda com um sonho e muito feliz que o Brasil, as nossas leis, a solidez institucional me permitiram chegar. E eu estou lado a lado com os meus colegas e com os alunos do Instituto Rio Branco. |
| R | Por isso, peço, com muito respeito, com muita humildade, que os nossos argumentos jurídicos e também práticos da nossa realidade, do nosso papel na sociedade brasileira sejam levados em conta nesta importante reflexão que está sendo feita hoje, da qual eu tenho a honra de participar.,Muito, muito obrigada. Desculpem ter me estendido, mas eu agradeço muitíssimo a oportunidade. Muito obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Embaixadora Gilvania, eu fiquei emocionada. Eu quero dar os parabéns para esses 39 novos terceiros-secretários. Maravilhoso! Acho que você deu exatamente o exemplo, a evolução daquilo que a gente tanto admira e precisava ouvir nesta audiência. Muito obrigada. E parabéns pelo seu trabalho! Agora, a gente vai ouvir as considerações do Deputado Marcelo Calero, que é também Diplomata de carreira. Eu agradeço muito a sua participação aqui conosco hoje, Deputado Marcelo Calero. O SR. MARCELO CALERO (PSD - RJ. Para expor.) - Senadora Mara Gabrilli, muito obrigado pelo convite. Todo convite de V. Exa. é uma convocação não apenas pelo trabalho de excelência e brilhante que exerce, mas pela minha profunda admiração pessoal. Então, agradeço muito por ter se lembrado do meu nome. Eu queria dizer que é uma alegria, uma honra, uma satisfação também estar aqui com os demais Senadores, com a eminente Relatora desta PEC, a Senadora Daniella. Eu queria também cumprimentar a Embaixadora Gilvania, a nossa Diretora-Geral do Instituto Rio Branco, e a Embaixadora Maria Celina, que é a Presidente da Associação dos Diplomatas Brasileiros (ADB). Eu queria também fazer um cumprimento especial a todos os meus colegas que estão aqui nos acompanhando, de acordo com as suas funções no Ministério das Relações Exteriores. As pontuações que eu gostaria de fazer não são muito diferentes daquelas que já foram indicadas aqui, mas eu gostaria de fazer algumas pontuações que eu acho relevantes, fazendo talvez um apanhado do que já se falou e dando ênfase a algumas questões. Para começar, o que eu acredito é que esta proposta... E aí, Senadora, eu falo como Deputado e, claro, como Diplomata de carreira, mas também como alguém que já, inclusive, se valeu - e eu preciso falar aqui com toda a transparência - do que está disposto na atual redação deste artigo constitucional, porque eu estive recentemente, embora no exercício do meu mandato de Deputado Federal, como Secretário de Governo da Prefeitura do Rio, da prefeitura de uma capital. Então, eu tenho a exata noção de que, quando nós avançamos para permitir que um Deputado ou um Senador também assumam a chefia de uma missão diplomática sem que percam o seu mandato, nós estamos nos baseando no pressuposto equivocado de que o cargo de Secretário, seja municipal, seja estadual, e o cargo de chefe de missão diplomática permanente se equivalem em termos políticos, quando, na realidade, não há essa equivalência. Esse é o primeiro pressuposto que nós precisamos enfrentar, que está na origem dessa PEC e que, no meu entender, no meu sentir, está equivocado. |
| R | A chefia de uma missão diplomática é inerente a esse cargo, a esse posto, com uma série de funções e de atribuições que são intrinsecamente incompatíveis com uma atividade política. A gente pode falar de alguns aspectos um pouco mais práticos. Por exemplo, cabe ao chefe da missão diplomática organizar as eleições no país onde ele está servindo. Então, imaginemos aqui um Deputado Federal que esteja licenciado do seu mandato e que enfrente uma eleição. Nós podemos dizer que a condução daquele processo será isenta, será imparcial? Porque aquele Deputado que está lá investido do cargo de embaixador, de chefe de uma missão diplomática, afinal de contas, é filiado a um partido e representa um recorte da sociedade em termos ideológicos. Senadora Daniella, mal comparando, é como se nós estivéssemos aqui... Eu acho que, às vezes, essas comparações um pouco no extremo ou um pouco, talvez, absurdas são importantes para nós visualizarmos a encrenca que nós estamos arrumando aqui, para usar uma linguagem bastante acessível. É uma encrenca, porque basicamente o que nós estamos fazendo aqui é dizer que um Deputado ou um Senador podem, da noite para o dia, se tornar almirantes ou generais ou chefes de uma organização militar sem perder a sua função de Deputado ou de Senador. É basicamente o que nós estamos falando aqui. A mesma incompatibilidade que eu acho que a gente consegue visualizar de uma maneira mais simples na função militar, que, talvez, esteja mais presente no nosso cotidiano e na nossa sociedade do que a função diplomática, a mesma imagem absurda de nós termos um Deputado ou um Senador investido na condição de almirante ou de general nós podemos comparar com o texto que propõe essa PEC, porque, da noite para o dia, um Deputado e um Senador se tornam, portanto, chefes de uma missão diplomática, que, como os que me antecederam já bem pontuaram, tem todo um arcabouço profissional, como eu falava, de atribuições e competências que são incongruentes, incompatíveis com uma função política como é a de Deputado e a de Senador. |
| R | Imaginemos aqui uma questão funcional. O chefe da missão diplomática se reporta ao Ministro das Relações Exteriores. Imaginem a bagunça hierárquica institucional que nós criaríamos quando um chefe de missão diplomática, digamos, um embaixador do Brasil em Roma, ao mesmo tempo em que tem que responder ao Ministro de Estado das Relações Exteriores, ele tem autonomia pelo fato de ser Deputado ou Senador. Afinal de contas, essa linha hierárquica institucional, sejamos francos, funcionaria nesse caso? Esse Senador respeitaria o seu chefe, o Ministro das Relações Exteriores, ou ele estaria mais preocupado em atender ao seu grupo político, em atender aos interesses daqueles que colaboraram, patrocinaram a sua nomeação? Porque, gente, é a vida como ela é. Nós precisamos ser claros aqui. Qualquer nomeação de natureza política... Como eu falei, eu já tive cargos de natureza política bastante importantes, já fui Ministro de Estado da Cultura, já fui Secretário de Cultura do Rio de Janeiro, Secretário de Governo. Em qualquer cargo de natureza política - e isso é absolutamente normal, não vai aqui qualquer, enfim, crítica, isso faz parte da dinâmica política, graças a Deus, e da democracia - tem relação aquele que é nomeado para o cargo com o grupo político que patrocinou a sua nomeação. Isso é normal. Isso faz parte, inclusive, da nossa maturidade democrática. Agora, imaginar, portanto, que nós tenhamos cargos na diplomacia loteados segundo essa dinâmica política é algo também que acaba sendo incompatível - e o Senador Esperidião Amin falava muito bem disso - com aquilo que nós genericamente conhecemos como interesse público e aqui, mais no particular, no sentido de que nós precisamos prestigiar os serviços públicos brasileiros que têm a sua base de profissionalismo - e não são muitos infelizmente. Nós estamos aqui diante de uma carreira de Estado. Carreiras de Estado são aquelas que, a despeito dos governos de plantão, permanecem como sinais vivos do interesse público e da necessidade de que certas políticas sejam perenes, independentemente do governo de plantão. Nós estamos aqui com essa PEC dando uma mensagem bastante equivocada, seja para a opinião pública, seja para o serviço público, de uma fragilização de uma das carreiras mais importantes que nós temos no Estado brasileiro. De novo, são poucas as carreiras no Brasil, infelizmente, que têm esse histórico de perenidade, que têm esse histórico de contundência nos seus resultados, que têm esse histórico de dar ao Brasil uma imagem e, mais do que isso, uma reputação que vai além de muitas gerações. E aqui, Senadora, eu me preocupo também com a mensagem que nós passamos para o mundo, conhecedor que é desse profissionalismo da diplomacia nacional. Nós passamos, com essa PEC, a sua própria tramitação já manda uma mensagem bastante equivocada de que o Brasil estaria disposto a fragilizar um dos seus maiores ativos em termos de função pública, que é a diplomacia, quando, nesse momento de tanta polarização inclusive, nós precisaríamos passar mensagem diametralmente oposta a essa: de que a sociedade brasileira fez uma escolha, por meio da sua Constituição, de que há cercas carreiras que, independentemente dos movimentos políticos, precisam ser preservadas, em nome do interesse público. E sem dúvida alguma, a carreira diplomática se inscreve nesse rol. |
| R | Então, apenas para fazer, Senadora Mara Gabrilli, uma perspectiva do que eu já falei. Em primeiro lugar, o pressuposto em que se baseia essa PEC é um pressuposto equivocado de que a chefia de missão diplomática permanente se equipara a outros cargos de natureza eminentemente política, como por exemplo o de secretário municipal de capital ou de secretário de governo. Não se compara. Depois, não podemos deixar de levar em conta a fragilização institucional que essa PEC representa. Vai contrariamente àquilo que nós buscamos, que é uma diplomacia profissional, que é inclusive essa perspectiva que os jovens diplomatas têm de um dia alcançarem o posto de embaixadores. Isso é absolutamente legítimo e importante, para inclusive atuar como um dos atrativos dessa carreira. O jovem tenente tem a perspectiva de virar general, de se tornar general um dia. Da mesma forma, o jovem diplomata tem a perspectiva de se tornar embaixador. Nós precisamos levar em conta também uma perspectiva histórica e de longo prazo. Essa questão... Já houve uma análise dessa questão pelo Constituinte originário. Em 1987, houve um debate exatamente sobre esse tema. E o Constituinte, em boa hora, entendeu exatamente aquilo que eu falava, que a chefia de uma missão diplomática permanente não poderia ser equiparada aos outros cargos que estão no rol elencado por esse artigo da Constituição. Mas aí, eu pego essa perspectiva histórica, Senadora Mara Gabrilli, e vou para o longo prazo. Os efeitos deletérios dessa proposta no longo prazo. É para isso que eu gostaria de chamar atenção e concluir. Nós estamos dando um passo, com a discussão dessa PEC ... Sinceramente, com todo respeito ao Senador Davi Alcolumbre e aos demais membros desse Colegiado, da CCJ do Senado, a própria discussão dessa PEC, como eu falava, já envia uma mensagem bastante ruim, bastante negativa. |
| R | Eu gostaria de chamar atenção para a responsabilidade que nós temos nesta discussão. Com os efeitos desta PEC a longo prazo - de novo, colocar cargos de embaixador na bacia das almas, permitindo que esses cargos sejam objeto das discussões da política pequena, da divisão de cargos, do loteamento, do toma lá dá cá -, eu acho que esse movimento não será tolerado, em primeiro lugar, pela opinião pública e, em segundo lugar, pelas gerações futuras, que nos cobrarão a respeito de uma medida dessa natureza, porque, de novo, o que nós estamos fazendo é atuar, discutindo esta PEC e eventualmente a aprovando - coisa que eu espero que realmente não aconteça -, na contramão da história e das necessidades que nós temos, como Brasil, como país, de fortalecer as nossas instituições. Senadora Mara Gabrilli, Presidente, eram as contribuições que eu teria a dar. Muito obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Deputado Marcelo Calero. Muito importante sua contribuição. Eu quero passar a palavra agora para a Presidente da Associação e Sindicato dos Diplomatas Brasileiros, a Sra. Maria Celina de Azevedo Rodrigues. Também quero chamar a atenção dos convidados para a gente tentar se ater aos dez minutos, para a gente conseguir fazer com que todos os convidados possam se pronunciar. Por favor, Presidente Maria Celina. A SRA. MARIA CELINA DE AZEVEDO RODRIGUES (Para expor.) - Muito obrigada, Senadora Mara Gabrilli, Presidente desta audiência pública. Eu queria cumprimentar também, evidentemente, o Senador Esperidião Amin, a Senadora Daniella Ribeiro, Relatora da PEC, e dizer o quanto eu me sinto honrada por estar aqui presente e poder me dirigir a vocês e explicar um pouco as nossas posições como associação. Talvez valesse a pena dizer, antes de mais nada, que eu sou Embaixadora aposentada e talvez eu seja a senior aqui não só pelo cargo, mas pela idade: tenho 80 anos. Há quatro anos... (Intervenção fora do microfone.) A SRA. MARIA CELINA DE AZEVEDO RODRIGUES - Muito obrigada, Senadora! Eu ouvi esse comentário, então... (Risos.) Há quatro anos, vieram me procurar na minha aposentadoria e me perguntaram se eu não queria ser Presidente da Associação dos Diplomatas Brasileiros. E, por uma questão quase que de amor e de tentar retribuir um pouco daquilo que eu recebi, que foi muito, desta carreira, que me realizou muitíssimo, que me deu uma visão de mundo extraordinária, que me deu uma experiência de vida excepcional e que me deu amigos e colegas absolutamente extraordinários, eu decidi aceitar o reto, o desafio. Era por dois anos; me reconduziram; e agora já me declararam que eu sou a Angela Merkel da ADB... (Risos.) ... e que querem que eu continue por outros tantos. Eu vou ter que mudar esse estatuto para evitar a reeleição ad infinitum, porque, realmente, senão, eu vou ser enterrada com uma bandeira, que não existe, da ADB sobre o meu caixão, se eu continuar nesse ritmo. Eu queria, sobretudo, recordar aqui as palavras do Ministro e ex-Senador Aloysio, que falou de experiência de carreira. E acho que foi uma tônica muito importante, porque a experiência que eu tive, como Embaixadora na Colômbia, evidentemente, me permitiu coisas que não estão nos livros e não estão na minha experiência de vida: eu visitei guerrilheiro em cadeia; eu viajei em avião que podia ter sido abatido pelos guerrilheiros e que, por isso, teve escolta de jatinhos. Tudo isso faz parte de uma vida de diplomata. Acho que o Ministro Aloysio falou de 20 anos. Não, não leva 20 anos! Essa média é absolutamente otimista, Ministro! A média é de 30 a 35 anos de formação. |
| R | E essa experiência que a gente vai adquirindo me permitiu... Por exemplo, quando foi celebrada a conclusão do acordo Mercosul-União Europeia, me perguntaram: "Então, vai sair esse acordo? Finalmente foi celebrado". Isso foi há alguns anos. Eu parei e disse assim: "A minha experiência como ex-Embaixadora na Comunidade Econômica Europeia é de simplesmente dizer que não é amanhã. Isso não vai dar, porque a opinião pública pesa muito, e, nesse momento, a nossa imagem não vai permitir que eles assumam essa responsabilidade, os Deputados e a Comissão, perante a sua opinião pública". Isso é experiência, isso é uma coisa que a gente adquire, não é por falta, digamos, de instrução, não é no livro, não é só no Instituto Rio Branco, que foi apontado; é o acúmulo de contatos, de experiências de vida, de conversas de bastidores que se sedimentam. E aí eu faço mea-culpa, a culpa do desconhecimento realmente talvez do que esteja por trás desta PEC. Eu reconheço a enorme cultura, a sabedoria, a experiência de vida dos Senadores e Deputados - não há a menor dúvida, não sou eu que vou questionar -, mas é em outro diapasão, é em um outro nível. A nossa experiência, a ótica, a visão, o modus faciendi do diplomata é totalmente diferente. Ele conjuga várias coisas que obviamente eu, como Senadora ou Deputada, não saberia fazer, mas que, se você é diplomata, você administra muito bem. Então, não são necessariamente experiências intercambiáveis, esse é que é o "x" da questão. A culpa é nossa? É, a culpa é da pouca divulgação, do pouco conhecimento que se tem do que é realmente a função do chefe de missão, que, como eu disse, vai desde visitar guerrilheiro na cadeia, porque o Presidente da República e outros Presidentes, numa reunião, encarregaram três ou quatro embaixadores para irem lá conversar com eles, para mandar mensagem... São coisas que eu, inclusive, quando decolei naquele avião, indo ao encontro desse guerrilheiro, parei e disse assim: "Eu devo ter perdido essa aula, porque eu não me lembro de ter assistido, no Rio Branco". Uma falha total, Embaixadora Glivania, de não terem me ensinado o que você diz a um guerrilheiro que está na cadeia, como que você se dirige a ele, sequer como é que você cumprimenta, se dá um beijo, se dá um abraço, se você sorri, se você é sério. Não, nada disso, mas é a tal história: a vivência me ensinou a poder enfrentar isso a tal ponto que os meus colegas, quando saímos de lá e fomos abordados pela imprensa, me puseram de porta-voz do encontro. O que já é outra experiência também: o que você diz, o que você não diz, quais são as sensibilidades que podem ser feridas e qual é a sensibilidade do Governo colombiano para aquilo que você vai dizer. Isso tudo é uma questão de feeling. Então, eu acho que a gente tem que pensar muito bem se é intercambiável. |
| R | Discriminação não existe. Isonomia eu questionaria até o princípio, porque eu aplicaria talvez esse conceito teoricamente, então, isonômico aos Ministros do Supremo, que têm um mandato. Por uma questão de isonomia, por que eles não poderiam ser chefes de missão também? Seria na base de "eu deixo o meu mandato durante algum tempo, vou ali e volto já", quer dizer, não tem problema. É um conceito isonômico. Eles não poderiam reclamar esse tratamento também? É de se perguntar se realmente nós estamos falando da mesma isonomia. Agora, eu queria também lembrar que o que nós estamos trabalhando aqui não é um atentado, reconheço, frontal à cláusula pétrea de separação dos Poderes, mas nada pior do que a gente ir atacando as bases dessa separação e fazendo intercâmbios. Eu queria lembrar que ser secretário-executivo de ministério é vedado ao Parlamentar - secretário-executivo. Ele pode ser ministro; ele não pode ser secretário-executivo. Então, vamos projetar o seguinte: o Presidente da República dá a pauta, nomeia o embaixador, ele é sabatinado, ele vai e se subordina ao ministro de Estado, que é, evidentemente, o ministro, e o embaixador o que vira? Uma espécie de secretário-executivo, porque está subordinado a um outro Poder, para começo de conversa, e ele está em um nível inferior ao de um ministro de Estado. Nenhum embaixador é ministro de Estado. E nem ele é o Presidente da República. Ele é o representante do Presidente da República. Ele passa a estar num nível que eu diria equivalente a um secretário-executivo, o que é vedado pela Constituição sem a perda do mandato. Resultado: acho que essas considerações foram todas levadas em conta, embora o relato não nos seja apresentado, no debate de 1988, na última Constituinte. Foram cinco Constituintes que estabeleceram que missão temporária era permitido, mas missão permanente não era. Antes, até não havia essa distinção, mas desde 1938 eles estabeleceram essa distinção entre missão temporária e missão permanente. Eu, inclusive, me questiono muito ao pensar que nós, em um nível menor - não inferior, mas mais reduzido em termos de tamanho -, estamos debatendo questões que foram resolvidas por Constituintes que estavam ali só para isso e que pesaram e se especializaram em cada um dos aspectos, em cada uma das frases, em cada uma das cláusulas que iam constituir a nossa nova Carta Magna. Será que nós somos mais sábios do que eles? Será que nós temos mais condições? E eu entendo que a gente reforme a Constituição com aspectos técnicos - evidentemente questões de saúde, de atendimento, de educação, etc., que são tangíveis -, mas conceitos como este não são tangíveis, nem o mundo mudou tanto que precise mudar essa cláusula. Eles acharam por bem manter essa separação, acharam por bem que não deveria haver esse trânsito de um lado para o outro entre dois Poderes. Será que eles não tinham razão? Eu me questiono. Eu acho importante a gente ver isso. |
| R | E é curioso, porque, alguns anos atrás, eu estava em um almoço, e tínhamos dois embaixadores de fora da carreira. O Presidente na época era o Presidente Lula. Era um almoço de trabalho, depois de uma reunião internacional, e ele decidiu dar a instrução ao Ministro de que ele não queria mais embaixadores de fora da carreira, porque a experiência o havia levado a comprovar - são palavras dele - que quem fazia esse trabalho benfeito eram os embaixadores de carreira. E ele tinha dois de total confiança dele - até, eu diria, de alinhamento de pensamento político. No entanto, ele estava disposto e deu essa instrução - e realmente saíram - de que ele não queria continuar com essa prática. Desde então, ele manteve isso. Então, é muito curiosa a experiência de uma pessoa no cargo que teve ocasião de conviver com embaixadores de fora da carreira, inclusive, como eu disse, da mesma linha de pensamento que ele, e que, no entanto, não estava disposta a reconduzir isso. Eu acho que isso também é uma questão de a gente pensar, e pensar muito, sobre as experiências como a do Presidente, como a do Ministro Aloysio, que teve experiência de vida, que é, acho, essencial para gente poder julgar esta matéria. A política externa é nacional. Eu acho que isso já foi ressaltado aqui. Ela não é estadual e não pode ser. E ela é muito menos partidária. O diplomata executa as instruções do Governo e, se ele não for capaz, ele pede demissão do cargo por uma questão de consciência, evidentemente - eu sei por experiência, porque eu sou filha de um diplomata que pediu demissão do seu cargo, porque ele não foi capaz, em 1964, de executar as instruções. Eu acho que este aspecto é muito importante: entendermos qual é a função do embaixador, qual é a função do chefe de missão, qual a função de representar a nação. Eu, como Conselheira, tive ocasião... E eu trago de novo uma experiência pessoal, porque me ensinou muito e me ajudou muito a entender um pouco melhor as limitações de uma PEC como esta. Eu era Chefe da Divisão de Produtos de Base, que tratava de coisas banais, de produtos: cacau, café, petróleo, etc. e tal. Naquela oportunidade, fizemos, como sempre, no Itamaraty, uma reunião com os ministérios envolvidos na Esplanada, e decidiu-se não voltar mais ao Acordo Internacional do Cacau, porque os preços-gatilho que os países desenvolvidos, que eram outra contraparte, estavam dispostos a nos pagar pelo produto eram muito baixos, e nós estávamos muito mais interessados, evidentemente, em estimular o processamento da fava de cacau ou do cacau em fava, pois é ali que reside o benefício maior para o produto. É na manteiga de cacau, é no chocolate que se ganha dinheiro; não é exportando fava de cacau. Então, se íamos pagar para exportar um produto barato, e eles iam lucrar mais ainda, não interessava ao Governo. Resultado: fechamos a posição. |
| R | Evidentemente e compreensivelmente, a Bahia foi contra. A Bahia era totalmente contra! E eu tenho uma pergunta: como é que um Senador chefe de uma missão diplomática, que fosse baiano, iria defender essa posição? Com que empenho, com que objetividade ele iria defender uma posição que representava para o estado dele, evidentemente, naquela época sobretudo, a essência da produção deles, que era cacau? Ou ele estaria disposto a perder o mandato, porque ele nunca mais poderia voltar para a Bahia, evidentemente; ou ele simplesmente iria cumprir mal a instrução ou cumprir com menos empenho. E aí a coisa começa... Qual é o limite que ele se impõe? Até onde ele vai poder fazer isso? Com qualquer Senador de estado de fronteira, voltando aos produtos de base, por exemplo, com Uruguai, Paraguai, etc., começa a complicar, porque há interesses estaduais que se misturam, que se mesclam. E é muito difícil você separar isso. Você jamais vai deixar de ser Senador, você vai voltar para o Senado. Então, como é que você vai agir? Em benefício do seu estado, em benefício da nação? Eu não estou questionando a seriedade e a lealdade, mas é, inclusive, constranger o próprio Senador a tomar posições que não necessariamente atendem ao que ele sente. É um constrangimento difícil. Aí é complicado a gente colocá-lo numa situação como essa. Tem um outro aspecto também que me chamou atenção. É que o número de cargos disponíveis para negociar dá ao Presidente um poder de ingerência dentro do Congresso absolutamente assustador. (Intervenção fora do microfone.) A SRA. MARIA CELINA DE AZEVEDO RODRIGUES - Sim? Dois minutos só, acabando. Então, resultado: essa ingerência no Congresso vai tirar um pouco da liberdade, porque ele passa a poder até influir em maiorias para aprovar ou não aprovar projetos determinados que ele queira. Acho que esses elementos todos, trazidos assim de uma forma mais prática, mais pragmática, nos dão condições de refletirmos sobre se realmente uma PEC como esta é construtiva, se ela é positiva, se ela vai melhorar a Constituição. Na minha opinião, como representante da associação... E lembro que eu faço um trabalho totalmente pro bono; então, eu tenho trabalho, não tenho emprego, o que faz uma diferença... Não falo em defesa da corporação, eu falo em defesa do país, daquilo que nós vemos, cada um dentro da sua área de influência, como coisa importante. Muitíssimo obrigada, Senadora. E desculpe o tempo. |
| R | A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Ah, Maria Celina, nossa Embaixadora, Presidente da Associação e Sindicato dos Diplomatas Brasileiros, muito, muito obrigada pela sua fala muito esclarecedora. Eu quero passar a palavra... E quero lembrar aos nossos convidados que o tempo está correndo e que, se vocês pudessem se ater a dez minutos, seria muito importante. A SRA. DANIELLA RIBEIRO (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - PB) - Senadora Mara... A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Quero passar a palavra ao Vice-Presidente do Conselho Curador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais, o Sr. José Alfredo Graça Lima. A SRA. DANIELLA RIBEIRO (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - PB. Pela ordem.) - Senadora Mara, é só lembrando, minha querida, de deixar minha inscrição rapidamente aí, para poucas palavras, após os convidados. A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Ah, Senadora Daniella, eu não tinha conseguido vê-la. Com certeza, com certeza. Estou muito feliz de vê-la aqui. A SRA. DANIELLA RIBEIRO (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - PB) - Obrigada. O SR. JOSÉ ALFREDO GRAÇA LIMA (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Senadora Mara Gabrilli. Meu nome é José Alfredo Graça Lima, e, em nome do Centro Brasileiro de Relações Internacionais, de cujo Conselho Curador eu exerço a função de Vice-Presidente, eu gostaria, em primeiro lugar, de agradecer o honroso convite para participar desta audiência pública destinada à instrução da PEC nº 34, de 2021, que tem como objetivo alterar o inciso I do art. 56 da Constituição Federal. O Cebri, criado em 1998 por um grupo de intelectuais, empresários, diplomatas, acadêmicos, é uma organização da sociedade civil de interesse público, independente, multidisciplinar, apartidária e tem como objetivo promover estudos e debates acerca de temas prioritários da política externa brasileira e das relações internacionais em geral. Inteiramente desvinculado de governo, o Cebri tem exitosamente servido como plataforma de discussões e geração de conteúdo sobre relações internacionais, tendo desenvolvido projetos que resultam em policy papers, relatórios, e realizado palestras, conferências, seminários, mesas-redondas em torno de temas que compõem a agenda global. Ora, os participantes que me antecederam já ofereceram exaustivos e bem fundamentados argumentos em favor da manutenção da redação atual do referido inciso I do art. 56 da Constituição do Brasil. O que me cabe, portanto, nesta curta intervenção é reiterar o entendimento de que, ao promover a confluência entre o Poder Legislativo e o Poder Executivo, que é típica de regime de governo parlamentarista, a PEC 34, conforme, inclusive, pareceres das mais doutas fontes, vai de encontro ao sistema constitucional vigente e fere o princípio básico da separação de Poderes que caracteriza o regime de governo presidencialista. José Cretella Júnior, por exemplo, sublinha que, abro aspas, "a representação diplomática constitui tarefa ou atribuição de cunho tipicamente executivo, [...], só podendo ser exercida por parlamentar em caráter excepcional, o que ocorre precisamente na investidura em Chefia de missão diplomática temporária". |
| R | Assinala Pontes de Miranda que, sendo permanente a missão diplomática, exige-se a autorização prévia do Senado Federal, e, onde se exige essa, "não pode ser escolhido Deputado ou Senador" - fecho aspas. Não se trata, Senadora, por conseguinte, como de resto prevê o texto constitucional, de negar a figuras públicas de relevo a chefia de representação diplomática em caráter permanente, mas de forma excepcional, atendendo às circunstâncias internas e externas da inserção internacional do país. No exercício da chefia permanente de missão diplomática, um não diplomata de carreira vai contar sempre com o apoio, com a assessoria de um corpo de funcionários diplomáticos qualificados, e sua embaixada se comunica com a Secretaria de Estado das Relações Exteriores pelos chamados canais competentes. Não é razoável que o chefe de missão diplomática permanente tenha compromissos com o Poder Legislativo, sob pena de desvirtuamento, ao mesmo tempo, da representação parlamentar e da diplomática. Para finalizar, eu gostaria apenas de recordar o preceito bíblico de que não se deve servir a dois senhores. No caso em tela, há dois Poderes, quanto mais não seja para evitar conflitos de interesses e outras distorções indesejáveis no sistema constitucional vigente. Muito obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Muito obrigada, José Alfredo Graça Lima, que é o Vice-Presidente do Conselho Curador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais. Muito obrigada por ter aceitado o convite e pela sua intervenção! Agora vamos ouvir o Professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas Sr. Guilherme Stolle Paixão e Casarões. O SR. GUILHERME STOLLE PAIXÃO E CASARÕES (Para expor. Por videoconferência.) - Senadora Mara, bom dia. Na pessoa de V. Exa., eu saúdo todos os Parlamentares e embaixadores presentes nesta sessão. É um prazer e uma deferência estar aqui contribuindo para o debate público em um tema que é muito sensível a mim e a nossa sociedade. Eu venho na condição de cientista político, de Professor de Relações Internacionais, com uma formação muito específica de Ciência Política - eu passei quase duas décadas da minha vida estudando política externa brasileira. Então, eu quero trazer alguns aportes que não são propriamente corporativos, ou seja, eu não quero aqui repisar e repetir os argumentos que os embaixadores e Parlamentares já colocaram, mas eu quero trabalhar com algumas nuances aqui - dentro do meu tempo, claro, de dez minutos -, pensando sobre as consequências do que esta proposta de emenda à Constituição pode trazer e também as implicações sobre o processo político por trás desta PEC. Na ciência política, a gente se ocupa basicamente de dois fenômenos políticos, olhando, sobretudo, para as instituições: a gente se ocupa dos processos e a gente se ocupa das consequências. Eu não quero aqui nem discutir as causas, porque uma das perguntas... Depois que souberam que eu participaria desta audiência, muita gente veio me perguntar: "Guilherme, por que os Senadores, os Parlamentares hoje estão querendo passar esta PEC?". Isso não me interessa. A gente discutir as causas hoje é contraproducente. O Senador Esperidião Amin comentou no começo, referindo-se ali ao papo de boteco, que talvez fosse uma coisa pouco republicana, digamos assim, mas isso, pelo menos para mim, não vem ao caso. Eu quero focar nos processos e nas consequências, a partir, sobretudo, de uma perspectiva comparada. Este também é um cacoete da ciência política: a gente acaba comparando com exemplos que a gente observa ao redor do mundo, e o mundo tem muito a nos ensinar neste caso. Eu quero comentar também a respeito disso. |
| R | Do ponto de vista dos processos, a PEC, pelo menos na minha forma de ver, traz três grandes problemas, três grandes ruídos ou três grandes desequilíbrios. O primeiro deles diz respeito - isto já foi dito, e eu não vou me alongar - ao desequilíbrio ou à desarmonia fundamental na separação de Poderes. Não se trata, como a Embaixadora Maria Celina já frisou, de uma ideia inconstitucional, mas, certamente, se trata de uma espécie de enfraquecimento do princípio básico da separação de Poderes. Agora, o ponto dentro do processo que mais me preocupa é o do duplo papel do embaixador legislador. O Embaixador Graça Lima acabou de voltar a esse ponto, fazendo, inclusive, uma referência bíblica. É muito complicado, dentro do processo político, principalmente em se tratando de política externa, que o chefe de uma missão diplomática do Brasil no exterior seja subordinado ao Ministério das Relações Exteriores, ao Ministro das Relações Exteriores e, ao mesmo tempo, tenha o seu mandato parlamentar e seja, portanto, subordinado ao povo que o elegeu. Então, essa dupla finalidade gera um problema de natureza de lealdade, se a gente quiser colocar dessa forma, ou seja, o Parlamentar vai ter uma dificuldade muito grande de pensar a política externa a partir das noções do interesse nacional, das noções de longo prazo, porque ele vai estar sempre circunscrito ali a interesses paroquiais, a interesses particulares, específicos de quem o elegeu, e, ao mesmo tempo, ele vai ter o problema da representação atendendo aos interesses de Estado, como previsto pelas linhas de governo ou pelo ministro de Estado, naquele momento. Então, esse duplo papel me parece, talvez, o maior problema do ponto de vista procedimental que esta PEC traz. E aí existe um terceiro problema. E eu queria também frisar o que a nossa história, a nossa própria história nos ensina. Colocar Parlamentares na chefia de missões diplomáticas brasileiras gera ou tem o potencial de gerar - não estou falando de determinismo - uma grande imprevisibilidade na representação diplomática. E eu me explico, dando dois exemplos. A gente já viu, na nossa história recente, vários casos de Parlamentares que, no exercício de mandatos de ministro, por exemplo, se ausentaram do cargo de ministro, foram para o Parlamento dar o seu voto em alguma PEC, em algum projeto de lei crítico e voltaram. Isso, que já foi muito criticado na nossa história recente, que é uma espécie de dupla lealdade também, tem um potencial ainda mais disruptivo quando a gente pensa em representações diplomáticas. Imaginem, por exemplo, Parlamentares voltando para o Brasil para darem um voto em um projeto de lei, para, depois, voltarem a servir na sua missão no exterior. Isso, para mim, pelo menos, como estudioso deste assunto, não faz muito sentido. E a história tem um exemplo, que me parece muito ilustrativo, muito elucidativo, que é o do ex-Senador, ex-Presidente, já falecido, Itamar Franco, meu conterrâneo, inclusive, que foi, por duas vezes, Embaixador brasileiro no exterior. Ele foi Embaixador do Brasil em Portugal, em Lisboa, e foi representante do Brasil junto à OEA (Organização dos Estados Americanos). Em Lisboa, ele ficou rigorosos 137 dias à frente da Chefia da Embaixada. Na OEA, ele ficou um pouco mais de um ano. Isso gera problemas, isso gera descontinuidades, isso gera um certo caráter errático na representação, que eu, pelo menos, vejo como altamente problemático. Além da dimensão procedimental, existem, claro, problemas ligados às consequências relativas à PEC. A primeira delas tem a ver com o tema que a gente, na ciência política, estuda todo dia, que é o famigerado presidencialismo de coalizão. A gente sabe - esse é um dado da Nova República, esse é um dado inaugurado ali em 1988 - que a governabilidade de qualquer governo está subordinada à distribuição de cargos a partidos ou a Parlamentares aliados. A gente vê isso acontecendo em todos os governos. Isso é uma parte, é um dado natural do nosso sistema político multipartidário, presidencialista, mas me preocupa muito pensar em embaixadas sendo utilizadas como moeda de troca no sistema do presidencialismo de coalizão. Isso, a meu ver, geraria uma banalização da representação brasileira no exterior, geraria problemas, como eu falei, de inconstância e traz um certo componente - acho que foi o Deputado Marcelo Calero que falou - do toma-lá-dá-cá, que eu vejo muito prejudicial em se tratando da política externa. |
| R | E percebam que eu não estou aqui lidando com a política externa como algo completamente fora da realidade da política pública, do debate público; muito antes, o contrário. Mas a política externa tem uma natureza muito peculiar, a sua maneira de ser pensada, a sua maneira de ser produzida tem traços singulares que tornariam, por exemplo, essa banalização da representação no exterior muito prejudicial aos resultados, às consequências da política externa. Uma segunda consequência que eu acho deletéria seria o emprego do posto - o emprego dessa posição de chefe de missão ou chefe de embaixada - para interesses paroquiais, particulares. A gente pode tornar, infelizmente, a nossa política externa, a nossa representação, junto a certos países ou organizações, um espaço de negociação de interesses privados, de lobby, de práticas pouco republicanas, práticas eleitoreiras. Isso também acarretaria um problema na própria configuração da política externa brasileira. A capacidade de fazermos política externa depende, em larga medida, de se pensar o interesse nacional, e não interesses paroquiais, como fatalmente poderia ocorrer caso essa PEC seja aprovada e caso o governo de turno resolva nomear Parlamentares como chefes de embaixada. Por fim, e aqui eu trato de uma consequência que, a meu ver, é a mais problemática no longo prazo, há as incertezas para a política externa brasileira. A gente viu neste Governo, nesses últimos quatro anos, duas tentativas malfadadas de indicações eminentemente políticas para a chefia de cargos diplomáticos. A primeira delas, o Deputado Eduardo Bolsonaro, que foi aventado como um possível embaixador do Brasil nos Estados Unidos, e o ex-Senador Marcelo Crivella, que tinha acabado de perder a eleição no Governo do Rio, para a Embaixada brasileira em Pretória, na África do Sul. Em ambos os casos, ficava muito claro o interesse paroquial, a natureza do interesse paroquial que estava sendo ali colocada. E isso, do ponto de vista da representação do Brasil no exterior, também gera um ruído indelével, eu diria, à imagem exterior do Brasil. Então, eu acredito, como cientista político - eu não tenho nenhuma relação com a diplomacia apesar de admirar e ser amigo de muitos diplomatas, mas, como cientista político -, eu vejo que tanto os processos quanto as consequências dessa PEC poderiam ser muito prejudiciais à natureza e à condução da política externa brasileira, razão pela qual eu acredito que ela traga mais problemas, neste momento, do que soluções. Obrigado, Senadora Mara. Agradeço novamente a oportunidade. |
| R | A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Sr. Guilherme. Obrigada mesmo pelas considerações. Eu quero passar a palavra para o pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, o Sr. Mathias Alencastro. O SR. MATHIAS ALENCASTRO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, Senadora Mara! Bom dia a todos! Eu queria agradecer muito esse convite que me deixa imensamente honrado, especialmente à equipe da Senadora Mara, que também viabilizou o convite. Quero saudar todos os outros participantes, meu colega Guilherme e também, em especial, o Ministro Aloysio Nunes Ferreira, com quem eu tive muitas trocas republicanas e extremamente interessantes quando ele servia como Ministro, e eu estava como colunista na Folha de S.Paulo. Eu acredito que esta audiência é extremamente importante pelos argumentos que foram apresentados e vou tentar ser o mais sucinto possível, mais sintético, trazendo alguns complementos aos pontos que foram feitos. Eu gostaria, rapidamente, de enfatizar que eu sou totalmente a favor do maior envolvimento de todos os atores da República e da União na política externa. Eu acho que a política externa tem um papel cada vez mais importante no destino nacional, ela precisa ser debatida por todos os atores e executada pelas unidades subnacionais. A gente viu, nos últimos quatro anos, um esforço notável do Consórcio de Governadores do Nordeste, do Consórcio de Governadores da Amazônia, e nada disso seria possível sem o esforço e a dedicação dos Parlamentares. Então, todos poderão sempre contar comigo na defesa de formas para ampliar a atuação da política externa, além da diplomacia tradicional, tanto na sociedade civil, no setor privado como os Parlamentares, mas certamente não pelo caminho ensejado nessa proposta de lei que me parece profundamente equivocada por uma série de razões. O primeiro argumento - eu acho que já foi colocado várias vezes, mas eu vou tentar reformular um pouco - é interno à lógica do Itamaraty e ao corpo de diplomatas. Eu acho que esse debate tem sido injustamente taxado de corporativista, primeiro porque nós estamos falando de uma das carreiras mais exemplares, mais aprimoradas e mais antigas do Estado brasileiro, mas também, sobretudo, porque é uma das carreiras mais conhecidas e - eu não sei se é a palavra certa - mais desejadas pelos mais jovens. Eu dou aulas na Universidade Federal do ABC. Eu perguntei, uns dias atrás, o que os meus alunos gostariam de fazer, e muitas das minhas alunas disseram que queriam ser diplomatas. E elas querem ser diplomatas porque um dia elas querem exercer a função de embaixadora; elas querem representar o país; elas querem fazer política. A medida que está sendo debatida aqui tem como primeiro e único objetivo decapitar a carreira do diplomata. E o fato de você cortar a possibilidade desses jovens um dia se tornarem embaixadores, se entrarem na carreira de diplomacia, desestrutura toda a vocação da carreira. Eu acho que a gente tem que levar isso em consideração quando debate essa lei também. A embaixada é o destino das pessoas que entram na carreira da diplomacia. E essa lei sinaliza a todos que querem prestar concurso e a todos que querem ser diplomatas que a carreira não tem mais esse objetivo, que é uma carreira muito mais burocrática do que política. |
| R | Eu acho que, neste momento de dificuldade das nossas instituições e de abalo, nós temos que preservar o elemento de magia também, e ele depende muito do Itamaraty, da carreira do Ministério das Relações Exteriores e da imagem que o embaixador tem para a sociedade. Eu pude captar isso porque eu solicitei aos meus alunos uma opinião sobre essa lei, e foram eles que me trouxeram essa ideia, que eu achei forte. O segundo ponto que me parece absolutamente central, no qual eu toquei em um texto meu recente e no qual foi tocado aqui de forma muito melhor e muito mais convincente durante a audiência, é esse conflito de interesse, é esse risco, essa ameaça à integridade nacional quando o embaixador também exerce o cargo de Deputado ou exercer o cargo de Senador. O Brasil é um país de fronteiras, é um país totalmente integrado na América do Sul. Todas essas fronteiras são estratégicas e têm desafios específicos e cruciais de migração, de trânsito comercial, de infraestrutura. Parlamentares, Senadores e Deputados eleitos por esses estados fronteiriços e indicados para capitais de países vizinhos teriam, necessariamente, de escolher entre as prioridades locais e nacionais na hora de atuar como embaixadores. Eu não vou dar exemplos específicos, mas me parece evidente que uma crise de refugiados... Existem estudos acadêmicos sobre isto. A percepção de uma crise de refugiados e a reação política em relação a uma crise de refugiados variam muito do local para o nacional. A visão de acolhimento do Estado brasileiro, às vezes, é difícil de ser abraçada em nível local. E eu tenho dificuldade de ver como um embaixador que também representa os interesses de um estado na fronteira, que está no coração desse problema, conseguiria tomar a decisão certa. Eu acho que esse conflito... Rapidamente, teríamos alguns casos em que haveria uma contradição que inviabilizaria a própria função de embaixador e a função de Parlamentar. Eu queria sublinhar, no final, que todos os exemplos que nós temos de liberalização do cargo de embaixador no mundo são, em geral, negativos. Eu uso o termo "liberalização" abertamente. Talvez, isso não seja o ideal, mas eu acho que as senhoras e os senhores conseguem entender o meu ponto, porque tem de haver uma forma pensada e regulada, e tem de se tomar muito cuidado com a forma como nós manejamos esse cargo. Na capa de hoje do The New York Times, há uma história de como um embaixador político do Governo Biden chamado Ken Salazar, que foi também Senador e foi Secretário de Estado, perdão, responsável pelo Departamento de Infraestrutura... Ele, agora, é o Embaixador dos Estados Unidos no México e está politizando demasiadamente a relação, aproximando-se demasiadamente do Governo mexicano e causando um problema para o Governo Biden, mais um. O Governo Biden tem sido caracterizado pela sua incapacidade de nomear embaixadores, inclusive aqui, no Brasil. E isso - todas as análises concordam com esse caminho, pelo que eu pude consultar - está ligado à extrema politização do cargo de embaixador. |
| R | Os Estados Unidos se acostumaram a indicar não apenas, primeiro, Parlamentares; depois, membros da sociedade civil; e, depois, muitas vezes doadores das campanhas presidenciais. E a banalização do cargo de embaixador levou à sua politização no Senado. Agora é praticamente impossível, nos Estados Unidos, no Senado americano você aprovar indicação de embaixadores, que era alguma coisa muito mais rápida décadas atrás. E a gente vê o problema que isso tem sido para a diplomacia americana, sobretudo na nossa região. A França, que fez também uma tentativa de reforma profunda das relações exteriores no Governo Macron, também está num impasse político. Há muitas tensões entre diplomatas e servidores públicos e a classe política, que tem impedido também uma reação coerente do Estado francês durante a crise no Leste Europeu. E não me parece nada oportuno que, em tempos de pandemia e de guerra, a gente tente mais uma vez mexer, fazer um pouco de experimentalismo dentro do ministério que nos representa no mundo. Eu queria concluir apenas com um ponto muito rápido sobre... Na apresentação da PEC fala-se de discriminação contra os Parlamentares. Eu acho que usar esse termo no momento em que a sociedade brasileira está debatendo o racismo estrutural denota ou pode ser interpretado como a manifestação dessa distância das prioridades dos Parlamentares e da sociedade civil. E eu acho que isso é símbolo, porque está na primeira frase dessa PEC. A discriminação dos Deputados eu acho que é muito simbólico e mostra que talvez não seja o momento certo. É absolutamente consenso nacional que a diplomacia brasileira passou por um ataque brutal sob o comando do Chanceler Ernesto Araújo. Eu acho que todos nós deveríamos estar focados na reconstrução do nosso prestígio institucional e na preservação, na reconstrução desse pacto entre a política e a sociedade. Eu acho que essa PEC, na primeira linha, mostra que ela vai no sentido contrário desse objetivo. E, como representante da sociedade, eu gostaria muito de enfatizar esse ponto no final. Muito obrigado a todos. Perdoem-me por falar rapidamente. Eu não queria tomar o tempo das senhoras e dos senhores. Obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Obrigada, Mathias Alencastro. Você foi perfeito no horário. Obrigada, Mathias Alencastro, que é pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. E eu quero agradecer a presença de todos os nossos convidados, que trouxeram reflexões para melhor elucidar essa matéria, não é? Muito obrigada pela presença de vocês. Antes de passar, que eu quero muito passar a palavra para a Relatora da PEC 34, a Senadora Daniella Ribeiro, que está aí atenta, eu gostaria só de ler um fragmento da carta escrita pelo nosso ex-Chanceler, o Prof. Celso Lafer, endereçada ao Senador Davi Alcolumbre, autor da PEC. Infelizmente, o Prof. Lafer não pôde estar hoje conosco nesta audiência, mas me permitiu que eu lesse o seu ofício, do qual selecionei apenas alguns trechos. A matéria da PEC nº 34 merece muita atenção, especialmente de minha parte, à luz da minha experiência na condução do Itamaraty, na condição de um estudioso das relações internacionais que não é um diplomata de carreira. Da experiência de Ministro das Relações Exteriores, guardo a lembrança viva da alta qualidade dos quadros profissionais do Itamaraty, com os quais trabalhei e que integram uma carreira de Estado lastreada no sistema de mérito. Daí a minha convicção de que a chefia permanente de uma missão diplomática por um não diplomata de carreira deve ser uma exceção justificada pelas circunstâncias internas e externas da inserção internacional do nosso país, como, aliás, prevê a Constituição. |
| R | [E, ainda, do ex-Chanceler Celso Lafer] também penso, como estudioso do Direito, que a Constituição estabelece a divisão dos Poderes em um regime presidencialista, elencando as atribuições próprias do Executivo e do Legislativo, inclusive no tocante à política externa e à atuação diplomática do nosso país. Não se trata, portanto, de um regime parlamentarista, no âmbito do qual existe a confluência entre o Legislativo e o Executivo. Se o nosso país fosse um regime parlamentarista, a alteração proposta pela PEC 34 seria até válida, pois permitiria a associação e a representação diplomática a continuidade da representação parlamentar. O Brasil, no entanto, não é parlamentarista, mas presidencialista. Assim, no meu entender [do ex-Chanceler Celso Lafer], cabe manter a redação atual do inciso I do art. 56 da Constituição do Brasil. Muito obrigada ao ex-Chanceler Celso Lafer por nos trazer essa contribuição. Agora eu quero passar a palavra para a nossa Senadora Relatora da PEC 34, Senadora Daniella Ribeiro. A SRA. DANIELLA RIBEIRO (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - PB. Como Relatora.) - Bom dia, Senadora Mara Gabrilli, autora do requerimento para esta audiência pública sobre a PEC 34. Quero cumprimentar a todos que aqui, tanto presencial como remotamente, participaram desta audiência pública. Aqui eu não vou nominá-los para não me alongar no meu tempo, apesar de que serei muito concisa, até porque estou aqui muito mais para ouvir do que para falar. Eu queria só fazer algumas considerações, aproveitando para parabenizar a Senadora Mara pelo requerimento, pela audiência pública, bem como a todos que trouxeram a sua contribuição, mas algumas considerações aqui faço pela importância dela, e, até, não só pela importância, mas também a título de esclarecimento e de contribuição nesta manhã. Primeiro, ressalto que sempre me mantive muito aberta, completamente aberta ao diálogo não só como Parlamentar, mas dentro desse processo inclusive, da PEC 34, pela importância dela e principalmente pelo meu comprometimento e valorização dos diplomatas, dos nossos diplomatas brasileiros - e faço isso com muita tranquilidade. E é por isso mesmo que aproveito para ressaltar o meu estranhamento por parte, inclusive, do nosso Ministério das Relações Exteriores, nosso representante maior, pela falta de interesse em busca da discussão aqui, com esta Relatora, desde o dia 25 de maio, quando fui designada Relatora dessa PEC, quando, por parte do ministro - e aqui parabenizo e cumprimento mais uma vez a querida Glivania, que aqui representa o Ministro das Relações Exteriores, o Sr. Carlos Alberto Franco França -, não posso deixar de dizer que, mais uma vez, sentimos, sim, a falta dele, mesmo estando em missão, porque, em nenhum instante, desde que fui designada Relatora, fui procurada presencialmente - a não ser um telefonema muito rápido por parte do Ministro - em defesa da diplomacia brasileira, inclusive numa discussão mais acunhada acerca do tema. E isso muito me estranha. |
| R | E aqui eu falo por quê? Eu estou aberta para os argumentos. E tanto é assim que fiz questão de estar aqui presencialmente; não só virtualmente, mas presencialmente justamente para ouvir esses argumentos. E eu faço questão de dizer isso por essa falta de empenho do Itamaraty, porque necessariamente há a necessidade de fortalecer os argumentos no sentido de defender a diplomacia brasileira. E eu faço questão de deixar isso aqui registrado para que fique nos Anais da Casa e que fique registrado também na mente de cada um dos diplomatas como tem se comportado o Itamaraty sobre esse tema aqui, na Casa. Mas a Relatora se comporta de forma diferente. Eu fiz questão de estar aqui para ouvir os argumentos, para que a gente possa cumprir com o nosso mister de uma relatoria de um projeto como esse e para que a gente possa ouvir os argumentos também que são em defesa e os que são contrários. Com todo respeito, anotei todas... Fiz questão de fazer anotações, apesar de a gente ter a gravação, de eu ter acesso para ouvir de novo - e assim faço questão. Fiz anotação de cada participante acerca do que foi colocado como argumento contrário à PEC. Então, quero dizer para vocês que esta é minha fala, Senadora Mara Gabrilli e todos aqui que participaram, que estão nos assistindo e nos acompanhando: com toda certeza tenho todo o interesse em coletar, sim, o maior número de argumentos em defesa da diplomacia. E, mais uma vez, quero dizer que estou completamente aberta para que a gente possa construir o melhor relatório possível em defesa - mais uma vez, ressalto - e, mais uma vez, dizer de público aqui, para todo o nosso país, a todos que nos escutam fora do país que se preocupam, inclusive esses alunos, sobre os quais foi ressaltado aquilo que esperam do futuro, para que fique bem claro o posicionamento do Itamaraty acerca desse tema. Desde o princípio, quando fui designada Relatora, não houve interesse algum de defender a diplomacia do nosso país. Então, isso nos causa estranhamento também. Estou dizendo que aqui o posicionamento é que eu não vou entrar como pensa o Relator, então, como o juiz, a gente vai ouvir as partes. Então, sobre a questão do posicionamento, isso posteriormente vai ser feito. Agora, como estou para escutar, estranha-me muito que o lado que deveria estar aqui realmente defendendo... Não só estar aqui, porque a querida Embaixadora Glivania está aqui, fazendo o seu papel, cumprindo um papel para o qual foi designada, de estar representando, mas me estranha muito que, até este momento, realmente não houve, por parte do Ministério das Relações Exteriores, nenhum tipo de manifestação ou de procura para que pudéssemos sequer ter uma conversa presencial. Então, quero deixar isso aqui muito claro, para que os diplomatas possam compreender o meu comportamento, o meu posicionamento acerca do diálogo. Quero dizer também que outras pessoas muito mais comprometidas com vocês, com a diplomacia tiveram o entendimento de fazer a defesa. Dentre eles eu faço questão de dizer do Prof. Hussein Kalout, que é um amigo e que realmente tem defendido a diplomacia e tem chegado perto de mim para que possa ouvir argumentos bastante plausíveis com relação à defesa da diplomacia. Se ele achar ruim eu ter mencionado o nome dele, não me faço de rogada, porque eu acho que é dever de justiça a gente dizer o que realmente acontece, inclusive, nos bastidores. Então, eu faço questão de dizer a realidade dos fatos. |
| R | Deixo aqui, mais uma vez, o meu comprometimento, Senadora Mara Gabrilli, como Relatora. V. Exa. sabe muito bem o nosso trabalho dentro desta Casa. No que diz respeito a qualquer relatório, a qualquer projeto ou PEC que venham a chegar às nossas mãos, a nossa responsabilidade é com o Brasil e com o nosso povo, principalmente com o nosso país, no que diz respeito ao nosso trabalho dentro desta Casa. Então, quero agradecer-lhes e parabenizá-los e, mais uma vez, manifestar o meu comprometimento com o nosso país e com a nossa diplomacia brasileira. Muito obrigada a todos e a todas. A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Obrigada, Senadora Daniella. Obrigada mesmo pela sua presença, pela sua dedicação. Eu quero pedir desculpas para a Glivania, porque eu acabei chamando a Glivania de Gilvânia, porque o nome estava mal escrito aqui. Então, Glivania, desculpe-me por ter trocado o seu nome. Eu quero agradecer, mais uma vez, todas as contribuições tão relevantes que esta audiência pública trouxe não só à Comissão de Constituição e Justiça, mas também ao Senado, ao Brasil. Quero desejar uma ótima semana a todos e a todas. Muito, muito obrigada. A SRA. GLIVANIA MARIA DE OLIVEIRA - Senadora Mara... A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Oi, oi, oi! A SRA. GLIVANIA MARIA DE OLIVEIRA - Perdão! Se eu pudesse, talvez, fazer um comentariozinho muito rápido... Não sei se, pelo tempo, ainda me permite. A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - É claro! É claro! A SRA. GLIVANIA MARIA DE OLIVEIRA (Para expor.) - Muito obrigada. Com relação ao meu nome, não se preocupe, porque, quando me chamam de Glivania, eu estranho. (Risos.) Isso é normal. É a questão da sonoridade do interior, como eu comentava. Eu gostaria, enfim, em nome do Ministro Carlos França, em nome do Ministério das Relações Exteriores e de todos de que tenho, de certa forma, a honra e o privilégio de ser porta-voz, de agradecer muito à Senadora Daniella Ribeiro, à Senadora Mara Gabrilli e a todos os demais que aqui estiveram hoje e contribuíram. Eu fiquei extremamente feliz, de verdade, Senadora, com o seu comentário sobre o seu interesse genuíno de ouvir os nossos argumentos, de compartilhar conosco informação. Eu queria dizer que levo essas considerações ao ministério com o maior critério. E, no que diz respeito, à minha experiência e ao meu papel como Diretora-Geral da instituição, a gente tem muito o histórico da formação. Inclusive, se a senhora me permitir, eu gostaria, depois, de compartilhar com a senhora e com os demais integrantes da Comissão o nosso Anuário do Instituto Rio Branco. Felizmente... Ele é de 2020. Então, só tem dois aninhos. Houve a pandemia. A gente vai atualizar, para incluir o novo grupo, mas aqui há um pouco também do que é a história, inclusive os decretos-leis, o que criou o Instituto Rio Branco, qual é a visão do papel do diplomata no contexto de uma ideia de fortalecimento institucional. Então, se for útil... Este aqui está com as minhas anotações. Eu posso compartilhá-las, mas posso também mandar uma cópia limpa depois. Talvez, seja melhor? Não sei. Posso? A SRA. DANIELLA RIBEIRO (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - PB. Fora do microfone.) - Talvez, com as anotações, seja melhor. A SRA. GLIVANIA MARIA DE OLIVEIRA - O.k.! Está certo. Então, muito obrigada. De novo, estamos à disposição. Agradeço a sua atenção e me coloco às suas ordens sempre. Temos uma paraibana na nova turma. Eu enviei uma foto para a senhora: Adriana Gabinio, que acaba de entrar, uma jovem diplomata de um dos estados... |
| R | A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Da Paraíba... A SRA. GLIVANIA MARIA DE OLIVEIRA - Da Paraíba. Está bom? Muito obrigada. Muito obrigada, Senadora. Desculpe tomar um pouquinho mais de tempo. Está bom? A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - SP. Por videoconferência.) - Obrigada a você, Glivania! Obrigada mesmo. Eu queria aproveitar e agradecer a todos que nos enviaram perguntas, comentários, pelo e-Cidadania. Eu já ia falar e-Democracia, que é da Câmara... Pelo e-Cidadania. Muito obrigada a todos vocês. Obrigada, mais uma vez, Glivania; obrigada a todas; obrigada, Senadora Daniella. Obrigada à equipe aí da Comissão de Constituição e Justiça. Eu sei que a gente teve problemas no começo, mas, graças a Deus, resolvemos. Então, parabéns à Comissão por ter conseguido resolver os problemas técnicos. Muito obrigada e boa semana para todo mundo. (Iniciada às 09 horas e 47 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 46 minutos.) |

