Notas Taquigráficas
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| R | O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Fala da Presidência. Por videoconferência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 18ª Reunião da Subcomissão Temporária para Acompanhamento da Educação na Pandemia, criada pelo Requerimento n° 1, de 2021, da Comissão de Educação, Cultura e Esporte. Realizaremos hoje a 16ª audiência pública desta Subcomissão, com a finalidade de debater o seguinte tema: conectividade - garantir acesso a dispositivos com conexão à internet de alta velocidade aos estudantes e professores da rede pública de ensino. A audiência será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania na internet, em www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria, que é o 0800 0612211. Eu quero destacar, antes de iniciar, que a Subcomissão, como já foi dito, está realizando a sua 16ª audiência pública, e foram apontadas, nessas 16 audiências públicas, seis eixos temáticos relacionados a medidas que devem ser tomadas em função da pandemia e em função, também, dos desafios que a educação apresenta. Rapidamente, eu relembro o primeiro eixo, que é o acesso dos alunos à escola. Isso significa, entre outras coisas, busca ativa dos alunos. Inclusive, este é o ano nacional da busca ativa dos alunos, para que ninguém desista da escola, para que o aluno vá para a escola. E está incluído aí, inclusive, que foi muito levantado, o transporte dos alunos, como na Região Norte, por exemplo, com barcos, na Região Sul com ônibus, ou seja, ter o transporte, o acesso do aluno à escola, entre outras coisas. O segundo eixo é a permanência do aluno nas escolas, permanência que significa uma escola acolhedora, boa, bonita, para que o aluno se sinta bem na escola e, inclusive, o que também foi muito levantado, a necessidade de se cuidar da saúde mental dos alunos, dos professores, das famílias, enfim, de toda a comunidade escolar. Inclusive, esse esforço tem que ser feito em parceria com o Ministério da Saúde também. O terceiro eixo é a infraestrutura. Para o aluno permanecer na escola, a infraestrutura deve ser boa em termos de saneamento, de água, de energia elétrica, de biblioteca, enfim, toda uma infraestrutura que deve ser sempre aprimorada no decorrer dos anos. |
| R | O quarto item, o quarto eixo temático se relaciona a algo que é essencial, que é a valorização de quem faz a educação, a valorização do professor, do pedagogo, do profissional, da educação, ter uma carreira atraente. É, assim, chamar pela valorização de modo que muitos jovens se interessem, porque poderão ver que podem ter uma vida boa, digna, salário adequado, uma carreira assim importante. O quinto item... Os itens não são necessariamente nessa ordem, mas o quinto eixo abordado nas audiências foi a questão da recomposição da aprendizagem. Nós temos uma diversidade tão grande no Brasil: escolas rurais, urbanas, quilombolas, indígenas, da periferia, de centros urbanos do Norte do país, do Sul do país. Então, seria olharmos a situação de aprendizagem de cada aluno, particularmente em relação àquilo que se perdeu na pandemia e recompor isso. E há instrumentos bons, inclusive, à disposição pelo próprio MEC, com trabalhos em parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora, onde se pode ver a situação de cada aluno, a dificuldade e a facilidade de cada um. Então, é um instrumento colocado à disposição. E o sexto item ou sexto eixo - e não é o último eixo em absoluto -, um eixo que se mostrou cada vez mais importante e evidente na pandemia, um instrumento essencial, é o que vamos debater hoje, que é a conectividade, ou seja, aquilo que foi falado, garantido o acesso a dispositivos com conexão à internet de alta velocidade aos estudantes e professores da rede pública de ensino. Então, esse acesso aos equipamentos necessários eu costumo dizer, inclusive, que é o acesso para o aluno na escola, mas o acesso para o aluno na casa dele também, para ele fazer pesquisas, os trabalhos, a família se interessar, e a gente poder ter, assim, uma ferramenta de alto valor à disposição da comunidade escolar. Esse é o objeto da nossa audiência de hoje. Eu, inclusive, destaco que as perguntas podem ser feitas pelos meios de comunicação que eu já mencionei. E já recebemos algumas perguntas, que eu vou ler antes de passar a palavra, em primeiro lugar, para a Ariana Britto. Mas já recebemos perguntas: Atilio Alves, de Goiás: "Quais os principais impactos negativos causados pela [pandemia de covid] na educação?" Luis Lago, de São Paulo: "Como os governos estão se preparando para outros eventos desse porte? [e sempre relacionando isso ao tema de hoje que é a conectividade] O que foi aprendido/feito para não parar o sistema?" Anderson Rosa, do Espírito Santo: "Qual o caminho para solucionar problemas de conectividade ou acesso a recursos tecnológicos [...]?" Arllys Salgado Silva, do Maranhão: "Um dos principais problemas causados na educação foi a evasão de muitos alunos. Como reverter [...] [essa] situação?". |
| R | Emily Gabriela, do Ceará: "A taxa de matricula durante a pandemia aumentou ou reduziu?" Sempre pensando em como a conectividade pode contribuir em relação às perguntas que estão sendo feitas. Lincoln Rodrigues, do Distrito Federal: "Quais foram os principais impactos na educação infantil?" Quero inclusive lembrar, mas, antes, eis a última pergunta de Estephane Oliveira, do Rio de Janeiro: "Como tornar possível o acesso à internet para estudantes em situação de vulnerabilidade?" Isso, sem dúvida, é um grande desafio. Eu quero lembrar a todos e a todas que nos acompanham com perguntas de que todo o material de todas as audiências públicas está disponível no site da Comissão de Educação, na página da Comissão, assim como vai estar o material da audiência pública de hoje. Com isso, todos poderão também acessar, refletir, contribuir e, inclusive, enviar à Comissão, a esta Subcomissão da Comissão e Educação, Cultura e Esporte, as contribuições que desejarem fazer, em função do que já foi falado, do que foi dito. Nós vamos fazer um relatório agora, no mês de outubro. Estamos indo para o final do mês de agosto e tudo isso me parece... Pelo menos a mim, que sou professor também e já fui secretário de educação, estão muito claros, através de todas as audiências públicas, os caminhos que devem ser percorridos, entre outros. Mas os principais deles, pelo menos, fruto dessas audiências públicas. Então, eu vou passar a palavra às expositoras e ao expositor, que participam desta reunião por meio de videoconferência: Sra. Ariana Britto, Coordenadora de Produção de Conhecimento do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais (Ceipe); Sra. Yasmim Melo, pesquisadora em equidade na educação, doutoranda em Administração Pública e Governo e Pesquisadora-Consultora na Vanderbilt University; e o Sr. Romualdo Portela de Oliveira, Diretor de Pesquisa e Avaliação do Centro de Estudos e Pesquisa em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec). Agradeço, então, as presenças novamente. Quem bom que estamos juntos para um tema tão importante, tão desafiador e tão atual que é a conectividade para educação e para a cidadania de uma maneira geral. Então, iniciando as exposições, passo a palavra à Sra. Ariana Britto - seja bem-vinda de novo! -, Coordenadora de Produção de Conhecimento do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais. Com a palavra, Ariana. A SRA. ARIANA BRITTO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, Senador Flávio Arns! Bom dia a todos! Bom, primeiro, quero agradecer o convite. É um prazer dividir a mesa com o Romualdo Portela, que é uma pessoa com quem tenho trabalhado bastante - talvez tenhamos, inclusive, sinergia em algumas das nossas falas hoje. E, Yasmim Melo, é um prazer também dividir hoje este espaço com você. |
| R | Bom, eu vou compartilhar a minha tela, com uma breve apresentação, na verdade, para organizar um pouco as ideias para vocês e abrir o assunto pra essas duas pessoas incríveis que vão falar depois de mim. Então, só um minutinho. Vou compartilhar com vocês e aí vocês me dizem se estão vendo e em modo apresentação. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Por videoconferência.) - Estamos vendo. A SRA. ARIANA BRITTO (Por videoconferência.) - Que bom! O nosso tema hoje é conectividade. Para começar a minha fala, quando eu vejo o tema de conectividade e especificamente do objetivo da nossa fala aqui hoje, a gente tem algumas palavrinhas-chave dentro dessa frase: garantir acesso a dispositivos com conexão à internet de alta velocidade a redes públicas de ensino. Então, a gente tem primeiro a palavrinha-chave "acesso"; uma segunda palavrinha-chave "dispositivos", e aqui eu talvez use a expressão, que é como eu costumo falar hoje nos projetos que eu coordeno, relacionados à conectividade e uso de tecnologias na educação, que são recursos educacionais digitais, e a gente está falando de uma terceira palavrinha, "alta velocidade". A educação pública perpassa todas essas três palavras: acesso, recursos educacionais e uma internet de qualidade. Uma breve contextualização, na verdade, de onde que eu parto nessa minha fala, ou de onde eu parto para a gente começar a pensar a conectividade na educação e, sobretudo, o uso de tecnologias na educação. Aqui dentro do Ceipe a gente está partindo de um marco conceitual, que é conhecido em inglês como four in balance, mas aqui a gente está falando da expressão em português, quatro em equilíbrio. Esse marco conceitual está dentro do Piec, o Programa de Inovação Educação Conectada, que começou lá em 2017. É um programa do MEC que, em 2021, se tornou uma política, política inovação conectada. Esse marco conceitual é hoje o que a gente entende como ponto de partida para se pensar o melhor uso de tecnologias na educação, sobretudo educação básica, que é o nosso foco aqui. Em rápidas palavras, de que que se compõe esse modelo de quatro em equilíbrio, que são essas quatro dimensões? É o nosso ponto de partida do que quer dizer uma escola conectada e sobretudo para a gente usar a tecnologia de forma mais efetiva, mais eficiente, com qualidade e de forma justa. Essas quatro dimensões - depois vocês vão entender um pouquinho melhor porque eu estou falando sobre elas - pressupõem atuar em equilíbrio. Então, é por isso que a gente tem esse circulozinho, que é a nossa escola. E o que é esse equilíbrio, e quais são essas quatro dimensões? A gente está falando de uma primeira dimensão, que é a visão. Essa dimensão pressupõe que o uso efetivo de tecnologias na educação seja compartilhado por todos os atores das escolas, todos os atores das redes educacionais. Eu estou falando aqui de gestores educacionais - secretários, subsecretários - eu estou falando de diretores escolares, eu estou falando de professores e eu estou falando de alunos. Então, todos os atores escolares, para que a gente tenha um uso efetivo de tecnologia - e aí a conectividade faz parte desse uso adequado de tecnologia -, têm que compartilhar o potencial pedagógico do uso dessas tecnologias na educação. Para além da dimensão, a gente tem que formar os nossos atores escolares no uso de tecnologias da educação. |
| R | Então, a gente está falando de um conjunto de formações, sobretudo, continuadas. A gente não vai entrar no mérito aqui, mas a gente tem, enfim, toda uma discussão sobre o currículo dos professores, sobre o currículo dos cursos que formam professores. Como eles não atendem este tema como um todo, a gente precisa incluir isso numa formação continuada. Então, a gente está falando aqui que precisamos, sim, pensar formações incluindo competências e habilidades para esses atores escolares que estão dentro da sala de aula. Ou seja, nós estamos falando aqui, sobremaneira, do professor que vai fazer o uso pedagógico dessa tecnologia. Isto é importante: a gente está pensando aqui no uso pedagógico. E essa formação parte do pressuposto de que a gente tem professores nos níveis mais distintos de conhecimento digital, professores que já fazem uso de tecnologias da educação e professores que estão começando a entender como a tecnologia pode fazer parte do processo pedagógico. A partir daí a gente está falando da incorporação de recursos educacionais digitais dentro do processo pedagógico. É importante deixar muito claro que, quando a gente fala do uso de tecnologias da educação, você abrir um vídeo sem nenhuma contextualização, você abrir uma ferramenta como o Google ou como qualquer buscador sem nenhuma contextualização não pressupõe o uso de recursos educacionais digitais. Então, a gente tem que sempre deixar claro que é a incorporação dentro do processo pedagógico. Por fim, a gente pode compartilhar a percepção, a gente pode formar professores, a gente pode identificar todos esses recursos educacionais, mas, se a gente não tiver uma infraestrutura que garanta as instalações físicas para a conectividade, para o uso dessas tecnologias na educação, isso tudo não faz sentido. Então, esse modelo do Four in Balance, esse modelo do Quatro em Equilíbrio pressupõe que pensar o uso de tecnologias na educação, no que a gente acredita, dentro do Ceipe, que faz parte da política hoje de inovação conectada, são essas quatro dimensões funcionando em equilíbrio. Bom, essa é a contextualização em que a gente está hoje. Já respondendo algumas perguntas que foram trazidas no contexto da conectividade - eu vou pedir que, quando eu estiver no finalzinho do meu tempo, vocês me avisem porque, como professora, a gente sai falando e se esquece do horário -, eu vou trazer alguns breves indicadores de como a gente está. Bom, a minha ideia em mostrar alguns desses números foi pensando o seguinte: um primeiro dado que a gente tem hoje para construir um diagnóstico de adoção de tecnologias vem do Cieb, que é Centro de Inovação para a Educação Brasileira, a partir do Guia EduTec. Eu participei da produção do Guia EduTec lá atrás, há mais ou menos quatro anos. O Guia EduTec é um instrumento de diagnóstico para uso de tecnologias na educação, considerando três atores: gestores, professores e alunos. Ele é respondido pelos gestores das escolas. Ele está sendo respondido neste momento, porque o Guia EduTec hoje é incorporado ao PDDE. Então, todas as escolas que tenham interesse em fazer parte e em receber algum recurso do PDDE precisam preencher o Guia EduTec. Este dado é de ontem à noite. A gente tem até o momento cerca de 15 mil escolas que preencheram o Guia EduTec, mais ou menos 2,7 mil escolas da rede estadual, quase 12 mil escolas da rede municipal e algumas escolas da rede privada que também preenchem. Ele não é condicional, mas é um diagnóstico. E quando eu falar, lá no finalzinho, como a gente faz para melhorar a conectividade, um dos passos essenciais é realização de diagnóstico. |
| R | Isso está previsto na Política de Inovação Conectada, mas pressupõe apoio técnico e financeiro paras as redes educacionais, para que elas possam, não só preencherem o diagnóstico, mas saberem o que fazer com esse diagnóstico a partir daí. E aqui é um dado, só para vocês terem ideia da situação hoje, quando a gente olha o nível de adoção de tecnologia considerando as quatro dimensões. Então, o Guia EduTec foi construído a partir do modelo teórico de quatro em equilíbrio. Ele é todo tabulado, todo organizado, em termos de dados estatísticos, a partir do equilíbrio entre as quatro dimensões. Se a gente olhar aqui — eu acho que eu não tenho o pointer — mas, aqui no nível básico, o que a gente vê? Que, em média, a gente está falando de 46% das escolas que responderam com uma infraestrutura no nível básico; 29% com recursos educacionais digitais nesse nível básico; 26% das competências, da formação dos professores, também em nível básico, e, em visão, só 15% dessas escolas estão no nível básico. Quando a gente está falando de nível básico o que a gente quer dizer aqui? Que essa tecnologia é usada de forma muito simplificada pelos professores e alunos dentro da sala de aula. Quando a gente fala de gestores, por exemplo, eles utilizam apenas alguma produção de planilha em Excel, algum documento em Word, ou seja, uma utilização muito simplificada do que é possível fazer com o uso de tecnologias na educação, partindo do pressuposto de que o uso de tecnologias compreende tanto o processo de gestão educacional, quanto o processo pedagógico e o desempenho do aluno ali no final, que é o nosso objetivo. Então o que a gente consegue ver é que a gente já tem algumas escolas, aqui, no nível intermediário... O Guia EduTec é construído, é um instrumento que permite que a escola identifique em que nível ela está, para cada uma das dimensões, e o que ela precisa fazer para subir um degrauzinho e entrar no nível intermediário, entrar no nível avançado. Quando a gente pensou, lá atrás, o guia, a gente entendeu que essa construção numa forma de escadinha facilitaria o entendimento dos gestores para saberem: "Bom, o que eu preciso fazer e, sobretudo, em quais dimensões eu preciso focar, com um pouquinho mais de urgência ou um pouquinho menos de urgência?". O que a gente vê aqui, por exemplo, é que, em termos de infraestrutura, o nosso nível básico é de quase metade. Se a gente juntar aqui emergente, é basicamente o nível zero, é ausência de tecnologia nas escolas e nas redes educacionais. Então a gente está falando aqui, isso é um dado agora, de ontem, de 2022, quase 50% das escolas, sobretudo da rede municipal, declaram a quase inexistência de infraestrutura tecnológica. Ou seja, para a gente pensar em educação, a gente, na verdade, tem que dar um passinho atrás e pensar: "Bom, primeiro, como que a gente garante a infraestrutura?". Por que esse modelo é importante? Porque durante muito tempo a gente pensou o uso de tecnologia na educação apenas como infraestrutura. E ter um computador em sala de aula não garante o uso pedagógico das tecnologias. Bom, alguns outros dados mais recentes. A gente está falando - esses são dados do Censo Escolar 2021, que é o que a gente tem disponível -, por exemplo, a gente está falando que 23% das escolas não têm acesso à internet e que 58% não possuem wi-fi. Então, quando a gente está pensando em conectividade, a gente pode olhar pelo copinho mais cheio: "Ah, mas eu estou falando de 75%, 74% das escolas com acesso à internet", mas eu estou falando de duas a cada dez escolas sem acesso. Eu estou falando de cerca de 24% de professores apenas que consideram a qualidade da internet adequada dentro das suas escolas, eu estou falando de apenas 31% dos estudantes do ensino fundamental que possuem acesso à internet. Ou seja, eu estou falando que sete em cada dez estudantes do primeiro ao quinto ano não têm acesso à internet. Esse dado vai subindo um pouquinho no ensino médio, mas a gente também está partindo do pressuposto de que todos os alunos em todas as etapas escolares, e isso inclui pré-escola, a gente está falando... Ou seja, a inclusão de conectividade, inclusão de tecnologias, inclusive para a pré-escola. E aqui a gente está falando que 21% dos municípios que declaram possuir um conselho municipal de educação para a discussão de questões educacionais não têm acesso à internet. |
| R | Então, são dados muito simplificados, muito gerais, mas para a gente entender em que contexto a gente está para pensar a conectividade. Outro dado. A gente está falando de... Aqui é um dado da pesquisa da qual eu faço parte. O Romualdo também apoia nessa pesquisa. A gente está falando de pouco mais de metade das escolas que possuem conectividade adequada. Para a conectividade adequada tem uma medida internacional que pressupõe que cada aluno tenha, no mínimo, 100 kbps - e a gente tem hoje o Medidor Educação Conectada - para garantir essa conectividade nas escolas. E a gente está falando hoje de um pouco mais da metade das escolas nos territórios aqui da iniciativa que possuem essa conectividade adequada. Daqui a pouquinho eu vou fechar com o que é essa iniciativa. Esse é um número que sempre também me abala um pouquinho, mas é um número bem recente, de 2022, que é o número médio de alunos por computador nos territórios da iniciativa. São seis territórios, seis estados e 11 municípios. Com 60 alunos por computador, obviamente, não é possível fazer nada, nenhuma ação pedagógica, mas é só para a gente entender qual é a dimensão dessa desigualdade de que a gente está falando em termos de permitir esse uso pedagógico das tecnologias na educação. Esse último dado aqui é da TIC Educação, um dado de 2020, que mostra a qualidade da conectividade brasileira para a pandemia. E, incrivelmente, o que a gente olha, só com esses dois indicadores, a velocidade de download e um dado de latência, ele é um dado que está aberto por região... E, basicamente, o que a gente olha - isso aqui é ao longo de 2020, ou seja, o auge da pandemia - é que todas as regiões, à exceção da Região Norte, que é essa roxinha, melhoraram a sua velocidade de download, que é a rapidez com que você consegue baixar um arquivo da internet. Então, por exemplo, a Região Sudeste saiu de 17,4, de antes da pandemia, janeiro e fevereiro, e chegou a 23,3. A gente está falando aqui da Região Centro-Oeste, que saiu de 9,5 e chegou a 11,8 em Mbps. Isso de 1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2020. Ou seja, em termos de como a gente conseguiu se adequar àquele momento em que houve o auge do uso das tecnologias no ambiente em casa, a gente percebe que, à exceção da Região Norte, todas as regiões conseguiram manter alguma qualidade de conexão, lembrando que - isso é superimportante - essa avaliação da TIC só vale para quem tinha acesso à rede antes da pandemia. Então, só para vocês terem uma ideia: em 2019, um a cada quatro brasileiros não acessavam a internet; entre os mais pobres, quatro em cada dez. Então esse dado só fala para parte da população brasileira. Esse é um outro dado de latência, é um dado que, quanto mais alto, mais desigual. O que a gente está falando aqui? Que à exceção... Todas as regiões basicamente mantiveram o seu grau de latência ao longo de 2020. Então, por exemplo, a Região Nordeste saiu de 57,1 para 57,5; a Região Sudeste, de 23,5 para 23,6. De novo: à exceção da Região Norte, que saiu de um tempo de latência de 100,2 para 116, todas as outras regiões conseguiram manter uma infraestrutura minimamente adequada durante o principal ano da pandemia. Por que esse dado é importante? Porque foi um ano em que a gente não estava preparada para o que ia acontecer e, de repente, a gente precisou muito da infraestrutura da internet brasileira. E o que esses dados mostram é que a infraestrutura conseguiu minimamente responder; a infraestrutura que nós já tínhamos, as operadoras de tecnologia conseguiram minimamente responder à urgência do uso de tecnologias. Aqui entra tanto o home office, obviamente, tanto o trabalho quanto a educação. É só para a gente ter uma ideia, para responder a esta pergunta: será que a nossa infraestrutura deu conta? Aparentemente ela deu conta; para quem já tinha acesso, não houve uma perda significativa na qualidade da informação. |
| R | Ah, só corrigindo: a medida de latência é o tempo para a mensagem ir e voltar, então é o congestionamento na rede. A gente imaginava que, com a pandemia e o uso excessivo da internet, a gente teria um congestionamento maior na rede, mas a gente percebe que não, basicamente em todas as regiões, à exceção, de novo, da Região Norte, que, sim, tem um pequeno aumento de congestionamento. Senador, abriu o microfone? O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Por videoconferência.) - Não, eu só queria dizer, Ariana, que está muito interessante. Mais 5 minutos estaria bem? A SRA. ARIANA BRITTO (Por videoconferência.) - Ótimo! O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Por videoconferência.) - Está muito bom, parabéns! Muito didático e interessante. Parabéns! A SRA. ARIANA BRITTO (Por videoconferência.) - Obrigada! Bom, esses pequenos e breves indicadores dão uma ideia para a gente em vários contextos, não só para a educação em geral. Essa pesquisa da TIC Educação foi feita em 2020 também, então os dados foram divulgados no ano passado. Aqui, no final da minha apresentação, tem todos os links de onde esses dados foram retirados, todas as informações que eu coloquei aqui para vocês vão estar no finalzinho da apresentação que eu compartilho depois. Bom, e onde a gente quer chegar quando a gente pensa em conectividade e uso de tecnologias na educação de forma eficiente? A meu ver - e aí é como eu vou fechar a minha fala -, a gente tem três passos, que são os pontos de partida essenciais. |
| R | Primeiro, não tem como a gente pensar - isto é algo que provavelmente o Romualdo divide comigo e a Yasmim também - qualquer tipo de política pública sem produção de evidência científica, qualquer tomada de decisão, lembrando aqui que sou economista também: recursos públicos são escassos e têm que ser usados de maneira eficiente e equitativa, e, para isso, a gente tem que produzir evidências científicas. Segundo, tem muita coisa no Brasil que está dando certo, inclusive em termos de uso de tecnologia na educação e conectividade. Então, um segundo passo é como a gente reconhece - e isso está associado ao item um -, como que a gente dissemina o que já está dando certo, o que vem sendo feito de maneira interessante no Brasil e também o que deu errado, para a gente não replicar, para a gente não seguir esse caminho. Então, às vezes, a gente fala de boas práticas; as boas práticas incluem o que deu errado também, porque alguém já tentou, alguém já testou e viu que esse caminho não, e, então, vamos descartar. Tendo essa informação, o que hoje a gente sente mais falta dentro do Ceipe, trabalhando com rede de educação, é... O primeiro passo é a gente saber qual é o meu cenário. Então, eu estou falando de municípios, estou falando de estados, estou falando de redes educacionais, que precisam elaborar o seu diagnóstico sobre conectividade. Qual é a situação da conectividade no meu município? Porque - e vou reforçar - só a partir da elaboração de um diagnóstico é que eu vou poder entender qual é o meu retrato de problemas, aí vou olhar e conversar sobre qual é o meu orçamento disponível, para saber que não vou conseguir tratar todos esses problemas, mas quais problemas eu vou conseguir tratar e como organizar minha agenda para os problemas que não consigo tratar neste momento, mas que vão precisar ser direcionados ao longo dos anos. É óbvio que tem vários outros passinhos aqui, mas o meu primeiro olhar é produzir evidência, disseminar o que a gente já sabe e elaborar o diagnóstico para o passo seguinte, que é construir política pública de qualidade e equitativa. Em termos do que a gente já tem hoje de produção de evidências, não tinha como não falar sobre isto. Dentro do Ceipe, eu coordeno a IEC-BNDES (Iniciativa Educação Conectada). Lá no início, eu falei para vocês que, em 2017, o MEC lançou o Programa de Inovação Educação Conectada, que veio a se tornar política. A expectativa era que se tornasse política em 2022, não sei por que foi antes, prefiro não entrar no tema, mas se tornou política em 1º de julho de 2021, quando o Piec virou uma política. E qual o meu papel dentro disso tudo? O Ceipe, junto com diversos parceiros que estão aqui, foi convidado para fazer o monitoramento e a avaliação do Piec. Então, essa iniciativa foi criada com o objetivo de prototipar o Piec e gerar evidência científica, gerar uma série de aprendizados para formulação de políticas públicas. A iniciativa começou em 2018, então, logo depois que o Piec foi implementado. Nós obviamente não esperávamos, assim como todos vocês, uma pandemia no meio do caminho. Isso fez a gente mudar bastante o nosso caminho. A IEC está falando desses territórios aqui. Então, a iniciativa, ou seja, o que a gente está prototipando hoje, se divide nestes seis estados: Tocantins, Paraíba, Sergipe, Bahia, Paraná e Rio Grande do Sul, incluindo 100% das escolas da rede estadual, 50% das escolas da rede municipal. |
| R | Agora em 2022, a gente finaliza. Vou colocar primeiro trimestre de 2023, não é, Romualdo? É melhor. A gente finaliza a estratégia de monitoramento e avaliação do Piec, com a produção de resultados de efetividade sobre o que foi implantar esse programa, o que foi passar esse programa por uma situação de pandemia durante dois anos e qual é a situação hoje do Programa Inovação Conectada, que agora é uma política. Aqui eu só estou dando uma ideia para vocês do que foi que a gente produziu em termos de evidências científicas ao longo desses três - 2019, 2020, 2021 e 2022 - ou quatro anos de projeto. Então, nós aqui dentro do Ceipe - e eu coordeno a estratégia de monitoramento e avaliação - produzimos evidências científicas, e elas estão à disposição de qualquer pessoa que queira acessar o site otec.net.br, com informação de relatório de boas práticas, informações de relatórios de implementação da iniciativa. Hoje, a gente já sabe o que deu certo, o que dá errado em termos de conectividade, quais são os principais gargalos. E eu vou fechar: um dos principais gargalos para a gente, que a gente identifica nos territórios, é aquisição de infraestrutura. Os territórios têm muita dificuldade de lidar com os editais de compra de equipamentos. E isso pressupõe um vai e volta nos editais, que aí, dentro daquele modelinho de quatro em equilíbrio, se a infraestrutura trava, todas as outras dimensões, ainda que tenham andado, que foi o que aconteceu com a gente, não têm tecnologia. Então, isso tudo vai estar aqui, todos esses links aqui são clicáveis. Então, todas as informações que eu coloquei vocês podem acessar por aqui, para entender o que é que a gente tem hoje sobre conectividade e sobre tecnologia da educação. E eu agradeço esse tempinho, agradeço por ter falado sempre demais, mas é assim mesmo que a gente faz, a gente fala pra caramba. Aqui tem o meu contato; se alguém tiver alguma pergunta, quiser saber de mais alguma informação, por favor, eu estou à disposição. Agradeço muito, Senador, pelo convite e pela oportunidade de falar sobre este tema que me é tão relevante. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Por videoconferência.) - Agradeço, Ariana Britto. Você foi muito didática, competente. Parabéns pelo trabalho desenvolvido. Não poderia ter sido mais clara. Pena que o tempo seja limitado, mas você está colocando à disposição não só nossa, mas de todos que nos acompanham todo o material. E isso é muito importante. Eu acho que, a partir de uma reflexão dessas, a gente pode ampliar os horizontes, mas foi muito claro, muito interessante. Parabéns pelo trabalho todo. A SRA. ARIANA BRITTO (Por videoconferência.) - Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Por videoconferência.) - Em seguida, eu passo a palavra à Sra. Yasmim Melo, que é Pesquisadora em Equidade na Educação, Doutoranda em Administração Pública e Governo e Pesquisadora-Consultora na Vanderbilt University. Com a palavra, Yasmim. A SRA. YASMIM MELO (Para expor. Por videoconferência.) - Olá, bom dia a todas e todos. Gostaria de cumprimentar o Senador Flávio Arns, Presidente desta Subcomissão, pela condução dos trabalhos, assim como as demais Senadoras e os demais Senadores que compõem a Subcomissão. Gostaria de cumprimentar também meus colegas de mesa, a Ariana Britto e a Romualdo Portela, e as cidadãs e os cidadãos brasileiros que estão acompanhando a gente nesta audiência pública. |
| R | É uma honra estar hoje aqui nesta Casa para debater os desafios da educação no contexto da pandemia da covid-19, em especial relacionados à conectividade. Agradeço imensamente o convite desde já, Senador Flávio. Muito obrigada. Eu gostaria de iniciar a minha fala destacando que a educação possui um conjunto de sentidos e funções sociais. O Prof. Fernando Abrucio sintetiza quatro sentidos para a educação: primeiro, a socialização dos indivíduos; a formação dos cidadãos; a formação de capital humano - e aí a Ariana falaria muito bem disso -; e a promoção da equidade. A partir das duas primeiras funções, a socialização dos indivíduos e a formação dos cidadãos, a gente entende que as escolas não são apenas um espaço de transferência de um saber formal, mas um espaço de construção de valores democráticos, de competências, de habilidades, de valores e atitudes que são necessários para uma vida em sociedade. No sentido da formação do capital humano, a gente entende que o investimento em educação é essencial para o desenvolvimento econômico sustentável de uma nação. No sentido da promoção da equidade, a gente entende que a educação é um instrumento essencial para uma sociedade mais justa e igualitária. É nesse sentido que eu quero focar hoje, como pano de fundo, para discutir o nosso tema da conectividade. Ao longo das últimas audiências e agora com a exposição da Ariana, a gente está vendo vários dados alarmantes sobre o cenário da educação no Brasil e também sobre a conectividade. A nossa educação tem vários desafios que foram ampliados e potencializados com os efeitos da pandemia. Neste momento, neste contexto em que a educação à distância e remota foi uma alternativa para a continuidade, para assegurar a oferta da educação diante de um cenário de fechamento das escolas para a redução da transmissão de vírus, a gente teve que esse cenário e essa solução se mostraram insuficientes. Complementando os dados que a Ariana já apresentou, cito aqui um estudo da conectividade das escolas públicas que foi conduzido pela MegaEdu, uma instituição do terceiro setor, que afirma que 25% das escolas públicas no Brasil, cerca de 35 mil escolas, não possuem acesso algum à internet. Das escolas conectadas, cerca de 50% não utilizam a internet para uso pedagógico, porque não têm uma velocidade adequada para isso. Apenas 9% das escolas conectadas têm uma velocidade adequada para uso pedagógico. Nesse contexto, o problema de conectividade é mais forte no Norte e no Nordeste, que possuem mais escolas rurais e municipais. E aí tem esses desafios todos, técnicos, citados, na última audiência, pelo Ministério das Comunicações, e também alguns enfatizados aqui pela Ariana, como esse da dificuldade de cobertura de internet e de todas as especificações técnicas de infraestrutura. No contexto brasileiro, a gente tem várias políticas educacionais - inclusive o Plano Nacional de Educação, que tem a estratégia de prover equipamentos e recursos tecnológicos digitais para a utilização pedagógica - que buscam assegurar um padrão mínimo de qualidade da educação, independentemente de qual estado, município ou área esse estudante está. No entanto, os dados do Censo Escolar nos mostram que ainda existe uma enorme desigualdade entre escolas de uma mesma rede que estão situadas em área rural ou urbana e escolas de diferentes redes. A gente sabe que os dados educacionais são mais frágeis nas escolas municipais, de maneira geral, que possuem maiores desafios de provisão de recursos, de capacidade técnica e todos esses fatores. |
| R | Além disso, os programas educacionais de conectividade têm uma tendência a focar, inicialmente, em escolas urbanas, excluindo duplamente as escolas rurais que têm todos esses desafios técnicos de infraestrutura que a gente já discutiu aqui hoje e que também já foram discutidos na última audiência. Se a gente considerar o caso, por exemplo, do Programa Banda Larga nas Escolas, que surgiu em 2008, focando nessa provisão de recursos para uso pedagógico de uma conectividade adequada, esse programa foi lançado em 2008, focando nas escolas urbanas, mas, apenas em 2012 e com previsão de ser implementado apenas em 2014, é que surgiu um programa similar para pensar na conectividade das escolas rurais. Atualmente, a gente tem que cerca de 65% das escolas rurais são atendidas pelos programas de conectividade nas escolas, e acho que aí a fala da Ariana é superimportante: a gente pode olhar pelo copo cheio de que 65% das escolas rurais têm conectividade, mas a gente também precisa entender que 35% dessas escolas estão sem internet em um contexto em que o acesso à internet foi essencial e foi o único caminho para a garantia do direito à educação no contexto de pandemia, no contexto de escolas fechadas. As desigualdades entre escolas urbanas e rurais em itens de infraestrutura são gritantes, em especial no item de conectividade. No meu Estado do Rio Grande do Norte, por exemplo, uma pesquisa realizada pela universidade federal identificou que, em relação a laboratório de informática, apenas 41% das escolas municipais no estado possuem laboratório; nas escolas rurais, esse quantitativo cai para 28%. Se a gente falar de acesso à internet, apenas 49% das escolas rurais possuem acesso à internet. É importante ressaltar que nós sabemos que existem vários desafios para prover o acesso à internet para escolas rurais, ribeirinhas, indígenas e quilombolas, mas isso não pode ser um argumento para que essas escolas continuem sem esses itens de infraestrutura. Dados do Censo Escolar também mostram para a gente que não só em relação a acesso à internet e a laboratórios de informática e de ciências, mas em relação a itens de infraestrutura básica, essencial, como banheiros para pessoas com deficiência, quadras e bibliotecas, essas escolas também possuem uma defasagem de recursos de infraestrutura. Diante disso, o argumento que eu coloco aqui, utilizando todos os dados que a gente está discutindo, os que a Ariana apresentou nesta audiência e os que foram apresentados na audiência anterior, é que a gente precisa pensar em políticas educacionais para corrigir desigualdades sociais. As pesquisas recentes mostram que o fechamento das escolas gerou um efeito nefasto de exclusão. Em 2019, cerca de 1 milhão de crianças estavam fora das escolas; em novembro de 2020, esse quantitativo subiu para 5 milhões de meninas e meninos sem o direito à educação. A pandemia também, como o Senador já citou no início, gerou efeitos no desenvolvimento socioemocional e na saúde mental da comunidade escolar e uma perda de aprendizagem de ampla dimensão, isso tudo potencializado nas famílias e nos grupos mais vulnerabilizados em que as desigualdades educacionais se sobrepõem as de classe, de gênero e de raça e criam um efeito perverso no desenvolvimento das crianças. |
| R | Um estudo recente da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal sobre educação infantil em Sobral - um caso de sucesso na educação em nosso país - estimou que crianças de nível socioeconômico mais baixo aprenderam quase metade do que as crianças de nível socioeconômico mais alto aprenderam no contexto da pandemia. Esse resultado é feito de uma sobreposição das desigualdades sobre os grupos mais vulnerabilizados. Eu gostaria de pedir licença aqui para até a gente refletir que a gente está falando de educação e de conectividade num cenário em que 33 milhões de brasileiros não têm o que comer, conforme matéria publicada recentemente. Conforme uma matéria publicada ontem no Estadão, apenas 26% das crianças, de dois a nove anos de idade, fazem três refeições por dia. Como é que as nossas crianças aprenderão se elas estão com fome? Se a gente pensa em acesso à educação, em recursos que garantam o aprendizado, um acesso à educação com qualidade, um desenvolvimento integral dessas crianças, a gente percebe o quanto o nosso cenário é assustador, o quanto essa insegurança alimentar impacta no desenvolvimento dessas crianças e adolescentes e reduz oportunidades educacionais e, no futuro, oportunidades de melhores colocações no mercado de trabalho e de acessos a postos importantes em nossa sociedade. Então, para corrigir essas desigualdades é necessário adotar uma visão sistêmica da educação para a política educacional e princípios equalizadores como norteadores da política pública. O Projeto de Lei Complementar 235, de 2019, que instituiu o Sistema Nacional da Educação, de autoria do Senador Flávio Arns e relatoria do Senador Dário Berger, aprovado de forma unânime nesta Casa, é um primeiro passo de grande importância para ressignificar a maneira como a política educacional é gerida no Brasil, equilibrando atribuições e competências entre os entes federados para uma oferta mais equitativa de educação, independentemente do local onde o estudante resida e estude, em todas as áreas. Isso impacta em todos os eixos que a gente está discutindo nas audiências, inclusive a conectividade. É preciso formular e implementar políticas educacionais e programas articulados de uma maneira intersetorial e articulados com outros programas de proteção social que considerem esses contextos de cada estudante. A gente não pode tratar os estudantes em situação de vulnerabilidade da mesma forma como a gente trata estudantes que estão situados em outras áreas. Os nossos modelos de avaliação educacional precisam também considerar essas desigualdades. É importante que a gente corrija essas desigualdades sobre grupos historicamente excluídos e vulnerabilizados a partir de uma distribuição proporcional de recursos visando a uma promoção de justiça social e inclusão no ambiente escolar. Então, pensando nisso tudo, eu gostaria de encerrar a minha fala - desculpem-me se eu estou me alongando - com cinco diretrizes, cinco medidas que a gente pode pensar para que a educação cumpra totalmente a sua função social nos seus diferentes segmentos. O primeiro deles é promover uma igualdade real de oportunidades para além de uma igualdade formal, a partir de uma alocação prioritária de recursos para as escolas localizadas em áreas de vulnerabilidade social e que atendam a grupos historicamente excluídos, visando a garantir uma infraestrutura adequada para todas e todos os estudantes e profissionais de educação; prover bibliotecas, laboratórios de ciência, informática e internet para todas as escolas da rede pública de ensino. |
| R | Acho que é importante que a gente pense nessa alocação prioritária de recursos para essas escolas que não possuem acesso a esses itens de infraestrutura básica, que são essenciais para o desenvolvimento dos estudantes; realizar parcerias com o Ministério das Comunicações e atores do segmento de telecomunicações - iniciativa privada e terceiro setor - visando a garantir o acesso à internet de qualidade em todas as áreas da rede pública de ensino, inclusive em áreas que atualmente estão sem cobertura; assegurar o acesso de todas e todos os estudantes brasileiros a equipamentos de conectividade, inclusive para além do ambiente escolar, pois é necessário pensar conectividade e acesso a dispositivos eletrônicos não apenas na escola mas fora dela, visando a mobilizar esses recursos para uso em atividades extraclasse para recomposição de aprendizagem e também para o desenvolvimento integral desses estudantes; e continuar a mobilização para aprovação do Sistema Nacional de Educação, continuar a articulação, pensando na sua implementação em todos os estados e municípios brasileiros, visto que essa é uma política pública de governança que tem um potencial enorme para corrigir as desigualdades educacionais no nosso país. Eu agradeço, desde já, a oportunidade, o convite, e fico à disposição para eventuais esclarecimentos. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Por videoconferência.) - Agradeço a você, Yasmin Melo, que é pesquisadora e, inclusive, pesquisadora consultora na Vanderbilt University, que é muito importante também, além do trabalho desenvolvido no Brasil. Muito interessante, muito boa a sua intervenção, apontando inclusive para a importância... Realmente, a gente pensar que estamos discutindo conectividade e 33 milhões de brasileiros estão passando fome. Quer dizer, qual seria a prioridade, o que fazer e como tomar essa decisão? O Sistema Nacional de Educação é uma ferramenta interessante, importante, histórica, necessária, mas já vamos, assim, até discutir um pouco mais sobre isso também. Obrigado, Yasmin, e parabéns! Continue firme na sua caminhada como pesquisadora e consultora, que é muito importante. Obrigado, por enquanto, pela participação. Passo a palavra ao Sr. Romualdo Portela de Oliveira. Bem-vindo, Romualdo! Ele é Diretor de Pesquisa e avaliação do Centro de Estudos e Pesquisa em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec). Com a palavra. O SR. ROMUALDO PORTELA DE OLIVEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, Senador. Eu queria, inicialmente, cumprimentar pela iniciativa, saudar os demais Senadores presentes, saudar a Yasmin e a Ariana, com quem nós temos trabalhado, no Cenpec, na avaliação das experiências de educação conectada no Rio Grande do Sul e no Paraná, e queria também agradecer o diagnóstico apresentado pela Ariana e pela Yasmin, que torna a minha apresentação mais fácil, e eu vou tomar ambas como ponto de partida, porque me parece que elas trouxeram elementos muito importantes para a reflexão que nós estamos fazendo aqui. Eu queria abordar a questão de um ponto de vista macro e, depois, chegar especificamente à questão da conectividade, porque os problemas da educação... Não existe bala de prata, não é? Nós temos que pensar em uma abordagem sistêmica, em um conjunto de ações, e eu vou tentar sistematizar as reflexões que nós temos feito no Cenpec a respeito e que permitem a gente colocar essa discussão sobre o aumento da conectividade em um contexto mais amplo. |
| R | Eu entendo que a pandemia trouxe três consequências que são importantes para a gente pensar as políticas educacionais daqui para frente. A primeira delas é que ela aumentou a exclusão escolar. Então, o percentual da população brasileira de quatro a 17 anos que está em idade de educação compulsória fora da escola se ampliou com a pandemia. Nesse particular, nós realizamos, em 2021, junto com o Unicef, uma publicação sobre a evasão e sobre o acesso à educação no Brasil e, com os dados da Pnad Covid-19, de novembro de 2020, já ficava evidente, na ocasião, que a pandemia estava ampliando essa exclusão - e, portanto, o percentual da população fora da escola -, mas com uma novidade absolutamente preocupante, porque entre os que estavam sendo excluídos da escola havia um percentual crescente de crianças do ensino fundamental 1 e do ensino fundamental 2; e isso é particularmente preocupante porque é uma reversão de tendência. Sempre que a gente discute a educação no Brasil, a gente fala: "nós temos muitos problemas, mas nós temos tido sucesso na inclusão dentro do ensino fundamental". E a pandemia reverteu esta trajetória. E isto, portanto, traz de volta problemas que, de alguma maneira, nós estávamos equacionando, provavelmente num ritmo mais lento do que deveríamos, mas, digamos, a reversão de expectativa é muito pior... de tendência. E também nesse trabalho nós constatamos que a evasão, quer dizer, que a parcela da população fora da escola está altamente correlacionada com pobreza. Noventa e um por cento das crianças e adolescentes fora da escola em idade de escolarização obrigatória viviam, na ocasião desse dado - praticamente não deve ter sido alterado -, em famílias com renda per capita de até um salário mínimo. Como a pandemia representou um empobrecimento da população brasileira, essa exclusão da escola aumenta correlacionada com esse empobrecimento. Portanto, o primeiro elemento que eu queria trazer à discussão - que de alguma maneira a Yasmim já mencionou - é que as políticas de busca ativa que o Senador mencionou no início e a necessidade de criarmos políticas para trazer de volta para a escola essa população afastada da escola tem que estar associada, claro, com políticas de geração de renda e de melhoria das condições de vida da população brasileira, mas também com programas bastante ousados de renda cidadã. Ou seja, essa é uma receita de sucesso que nós tivemos no passado recente que tem que ser intensificada e que me parece ser o primeiro ponto de consequência da pandemia ao qual devíamos estar atentos. A segunda dimensão é que o acesso à escola, quer dizer, o funcionamento do nosso sistema escolar durante a pandemia foi bastante precário. |
| R | Nós tivemos que recorrer emergencialmente ao ensino remoto e nos deparamos com dois níveis do problema. O primeiro deles é que uma parcela grande da população, algo em torno de 50%, pelos dados que a Ariana apresentou, não teve acesso à internet e portanto não teve acesso às tentativas mais ou menos bem-sucedidas que as redes de ensino empreenderam durante esse período. E isso traz consequências para o aprendizado nesse retorno. Então, nós temos aqui dois problemas. O primeiro deles é que a pandemia acelera a incorporação das tecnologias à educação. É um processo que tinha, digamos, um crescimento quase vegetativo, e que foi brutalmente acentuado com a pandemia. E não tem volta. Portanto, é necessário nós criarmos condições para que toda a população brasileira em idade escolar tenha acesso a meios remotos de ensino-aprendizagem. É claro que isso não substitui o ensino presencial, mas se torna uma ferramenta importante de combinação da ação remota e presencial ou o que seja que poderia se chamar de ensino híbrido. Isso significa, em primeiro lugar, conectividade e equipamentos para as escolas. Os dados apresentados mostram que nós estamos absolutamente defasados das necessidades deste momento. Mas representa também conectividade e acesso para os estudantes. Portanto, nós temos que pensar na retomada de programas como, por exemplo, a do computador de US$100. Podia ser outro valor em dólares, mas, de toda maneira, eu entendo que as tecnologias, do ponto de vista de equipamentos, incorporaram-se, com a pandemia, ao kit de material didático a que todo estudante tem que ter direito. Nós não podemos mais pensar que é possível, em pleno século XXI, um estudante que não tenha o acesso à internet como parte do seu material escolar quotidiano, que ele vai usar em casa, na escola, etc. Então, nós temos aqui o desafio de aumento da conectividade da garantia tanto de acesso à rede quanto de equipamentos. E me parece que esse é outro ponto importantíssimo. A terceira consequência da pandemia foi que nós tivemos prejuízos inegáveis no aprendizado e que nós ainda não temos condições de aquilatar as suas dimensões. Nós não tivemos nenhuma prova nacional que mostrasse isso. As provas localizadas, como a Yasmim citou e a Unesco tem divulgado estudos sobre o assunto também, já nos mostram que a situação é assustadora, no sentido de que nós teremos um desafio grande, que deve ser compreendido como uma ação nos próximos anos. Acho que esse é o terceiro ponto, que parece absolutamente importante. E aí eu queria recuperar os pontos que a Comissão tem desenvolvido para trabalhar, que me parecem muito importantes, particularmente aqueles que dizem respeito às condições de trabalho dos professores, de carreira. É ponto de partida para a gente enfrentar o problema da qualidade a necessidade de termos equacionado a questão de salário e de condições de trabalho dos professores. Mas, em particular, no que diz respeito ao aprendizado dos alunos, eu queria enfatizar a necessidade de a gente pensar que essa é uma ação para os próximos anos, ou seja, não é possível a gente pensar que vai recuperar os prejuízos ocorridos durante a pandemia em um semestre, em um ano, ou seja, que no ano que vem vai estar tudo normal. Isso significa que nós temos que ter uma reestruturação dos planos curriculares das escolas e dos sistemas de ensino e nós temos que pensar que esta tarefa de garantir a todos o aprendizado implica também no repensar das condições de funcionamento das escolas e do objetivo de garantir o aprendizado para todos. Ou seja, nós continuamos tendo taxas de reprovação, que são essencialmente excludentes, muito altas, e índices de defasagem série-idade muito grandes. Portanto, isso tem que ser enfrentado. E a incorporação das tecnologias pressupõe também a formação de professores. E aí eu queria chamar atenção para um aspecto que me parece que é evidente que isso tem que ser incorporado aos cursos de formação de professores, mas tem que ser incorporado também à formação continuada dos docentes que estão em exercício, porque uma coisa é nós pensarmos que estamos discutindo os cursos de formação de professores e esses conteúdos têm que ser incorporados à formação de novos docentes. O problema é que esses novos docentes só vão se tornar docentes em alguns anos, e nós temos este problema para hoje. Portanto, nós temos que pensar na formação continuada para os docentes atualmente em exercício, o que significa a necessidade de desenvolvermos programas de formação continuada que abranjam o conjunto do magistério no Brasil de hoje. |
| R | A outra consequência para a qual eu queria chamar a atenção, que me parece importante nós pensarmos, é que o atendimento a essas populações mais vulneráveis também tem que ser objeto de políticas públicas. Já foi citada a Região Norte, e eu queria incorporar o Semiárido, que é também uma região onde nós temos índices de exclusão bastante grandes, e é onde se concentram os bolsões de pobreza, de um lado; e de outro, as regiões periféricas das grandes cidades, o que também impacta a necessidade de termos políticas específicas para esses grupos. Eu queria chamar atenção que o Fundeb, aprovado no ano passado, teve uma importância muito grande nessa perspectiva de redução das desigualdades, mas dentro do Fundeb nós introduzimos um dispositivo que me parece essencial neste momento, que é a ideia do custo aluno/qualidade, que é a ideia de que você tenha condições de funcionamento mínimas, que sejam capazes de garantir qualidade, no nível de cada escola, porque o problema que nós temos no Brasil hoje, do ponto de vista de financiamento e da redução da desigualdade, é que nós temos pensado muito numa redução da desigualdade entre redes, o que certamente é uma coisa muito importante. O problema é que numa rede muito grande - quanto maior a rede, esse problema é maior -, há uma desigualdade de financiamento por aluno no nível escola. Por exemplo, uma rede como a de São Paulo, onde nós temos, nas regiões centrais, uma concentração menor de alunos por classe, tem um custo por aluno muito maior do que o custo por aluno nas regiões periféricas, que atendem em geral as populações mais vulneráveis. Portanto, nós temos que incorporar essa ideia do combate à desigualdade no nível escola. É um patamar a mais do que nós temos feito no combate às desigualdades tomando como referência as redes de ensino. Isso me parece um outro aspecto importante para a gente considerar no próximo período. |
| R | Por último, eu queria chamar a atenção porque essa experiência que a Ariana relatou - uma experiência piloto de educação conectada, que está trazendo uma série de aprendizados, que são desafios que nós vamos enfrentar quando nós pensarmos em escalar essas iniciativas pelo Brasil todo - tem que ser incorporada. Essa preocupação de a gente fazer as nossas ações baseadas em evidências, em resultados de estudos sistemáticos é muito importante para nós pensarmos a generalização dessas políticas em nível nacional. Aí eu queria finalizar chamando a atenção para a necessidade de reforçarmos a criação ou a ampliação das plataformas públicas de acesso à internet. Nós temos tido um crescimento disso, mas muito ancorado em plataformas privadas, que têm a instabilidade, têm o problema dos custos e têm o problema da democratização. Portanto, eu acho que um componente importante para a gente pensar a conectividade em nível nacional é nós reforçarmos as plataformas públicas de acesso à internet. Parece-me que é outro ponto que deveria ser contemplado nos trabalhos da Comissão. Eu pararia por aqui, para a gente ter um tempo para conversar e interagir. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Por videoconferência.) - Agradeço, Romualdo Portela de Oliveira. Muito adequado, muito bom. Destaco, inclusive, a sua tranquilidade, a sua segurança, a paz que transmite no seu argumento. Isso é muito importante também. O senhor é Diretor de Pesquisa e Avaliação do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária, um órgão de alto prestígio, Cenpec. Muito bom. Eu penso que, de fato, tendo audiências públicas, audiências se somando e podendo todos nós convergirmos para caminhos e indicadores de caminhos, realmente fica clara a situação do que deve ser feito: transformar a realidade, transformar o argumento em realidade. Isso é muito importante. Eu vou passar de novo a palavra para a Ariana, para a Yasmim e para o próprio Romualdo apontando só algumas coisas. Muitas coisas poderiam ser ditas. Inclusive, a Ariana apontou, de maneira, assim como tudo, muito adequada, mostrando a necessidade da evidência científica para os trabalhos e também a disseminação de práticas que ocorreram pelo Brasil, inclusive apontando até as práticas que não deram certo, porque, às vezes, a pessoa teve a intenção, se organiza e não deu certo. Mas o fato de não ter dado certo vai conduzir à prática de alguma coisa que possa dar certo. Então, nunca devemos nos interiorizar pelo fato de alguma coisa não ter dado certo. Por que não deu certo? Deve-se fazer uma reflexão em cima disso. |
| R | Sobre o terceiro item, que eu penso que está muito relacionado com o que o Dr. Romualdo falou, que é o diagnóstico e a construção de soluções locais, eu penso muito nisso, porque observo, às vezes, as pessoas pensando na conectividade, em termos nacionais, por satélite, por isso, por aquilo, e a gente vê, às vezes, o provedor local, pequenininho, com fibra ótica, fibra ótica às vezes muito melhor do que a solução por satélite, ou regiões montanhosas, que têm que ser ajudadas a fazer a rede de conexão também.... E depois eu penso que essa não é uma tarefa que não possa ser abordada, porque nós temos 5.570 necessidades de planos no Brasil, que é o número de municípios. E como que isso poderia ser feito em relação a essa necessidade local? Como é que os municípios podem ser orientados a fazerem isso? O Dr. Romualdo, inclusive, apontou nesse sentido também, que às vezes o Custo Aluno Qualidade, no centro, na periferia, na zona rural... Quer dizer, as necessidades são diferentes. A equidade, eu sempre penso em equidade como a justiça no caso concreto. Equidade é a justiça no caso concreto. Então é o aluno da periferia, de zona rural, de centro urbano, de uma região mais desenvolvida ou menos, é tudo assim, algo que as pessoas precisam ser orientadas a fazer para que os resultados sejam alcançados. A Yasmin levantou a questão, muitas questões importantes, a gente poderia se debruçar sobre elas, mas a criação é prevista inclusive na Constituição. Então estamos muitos anos atrasados no Plano Nacional de Educação quanto à criação do Sistema Nacional de Educação. E a palavra que eu gosto sempre de usar... Às vezes as pessoas dizem: "Não, mas nós estamos fazendo reuniões, e tal, Governo Federal, governos estaduais e municipais". Isso não é sistema nacional de educação, em que você estabelece objetivos, diretrizes e usa uma palavra: "pactuação". Na conectividade, o que nós vamos pactuar? O que o Governo federal vai fazer, ou os governos estaduais, municipais? Essa palavra "pactuação" é uma palavra forte, no meu ponto de vista. Vamos abordar juntos, como um sistema nacional, e depois um sistema estadual de educação, em que estados e municípios têm que pactuar. Às vezes a gente pensa, Ariana, e Yasmim também, em termos de Região Norte, Região Nordeste, mas eu sou do Paraná e a gente observa dentro do estado, também, regiões extremamente empobrecidas, vulneráveis. Então as pessoas não podem esquecer isso, quer dizer, o Estado do Paraná, um estado aparentemente bem desenvolvido, porém com regiões altamente empobrecidas e vulneráveis. Citando, por exemplo, o Vale da Ribeira, a divisa com São Paulo, o sul do Paraná, o norte pioneiro, até o centro do Paraná, dentro de programas internacionais de desenvolvimento, como o lá de Guarapuava, que é um município próspero, assim, um centro empobrecido. E, às vezes, até é interessante observar, para a gente pensar nessa vulnerabilidade, que temos regiões extremamente prósperas no estado, como Cascavel e Toledo, aí no sudoeste, cooperativas fortes, mas, às vezes, ao lado de um município rico há um município extremamente empobrecido. Então, nós temos... Isso, aqui, dentro de um sistema estadual de educação, teria que ser abortado. Sistema nacional é uma coisa, o sistema estadual... A pactuação para o desenvolvimento harmônico. Quem é próspero, rico, que continue, eu acho que é importante, mas alavancarmos a possibilidade também de termos esse acesso dentro de... Não termos essa disparidade de possibilidades dentro do próprio estado. |
| R | Então, eu gostaria, sim, de passar a palavra novamente aos três para essa condução final, e, depois, no relatório final também a gente, inclusive, vai procurar mandar para vocês, se nos permitirem, para lerem e verem as indicações, e isto já vai acontecer agora em outubro também. Então, Ariana, passo a palavra novamente a você, com muita alegria, e, depois, à Yasmim e ao Dr. Romualdo. A SRA. ARIANA BRITTO (Por videoconferência.) - Obrigada, Senador. Vocês me ouvem? O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Por videoconferência.) - Ouvimos, sim. A SRA. ARIANA BRITTO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom, muito obrigada por esta fala final e por ter resumido de forma tão brilhante tudo que foi falado aqui, de uma forma extremamente rápida e sensível, da questão da conectividade, da questão da equidade no uso de tecnologias na educação. Vou falar especificamente do ponto que você sugeriu, que está relacionado ali ao meu terceiro passo. Em termos de elaboração de diagnóstico e planos locais, isso vem da própria necessidade... E, na verdade, nesse ponto, eu não estou criando nada, não estou falando algo que, inclusive, é desconhecido, porque isso faz parte do Piec. Dentro da Política de Inovação Educação Conectada, está colocada lá como passo para se pensar a garantia à universalização do acesso de tecnologias na educação a construção de diagnósticos e planos locais. Você colocou muito bem a questão desse pacto e do que a gente olha quando está falando de um sistema nacional de educação, de um sistema estadual de educação. Então, às vezes, os municípios, quando a gente fala de elaboração de diagnóstico, olham como algo, como se a gente estivesse falando de algo extremamente complexo, ou como se a gente estivesse falando de algo em que eles não necessariamente - isto é superimportante - dispõem das informações... Muitos dos dados que eu apresentei aqui, como o Censo Escolar, por exemplo, são dados produzidos pelas próprias redes. Então, o que eu sinto hoje, já nessa atuação com redes educacionais é que - talvez este seja o passo zero que a gente tenha que dar -, muitas vezes, o corpo técnico das secretarias tem uma certa dificuldade de entender "bom, o que significa elaborar um diagnóstico?" E aí você pensar "tá, mas a gente já tem um outro passinho, que é o guia EduTec". |
| R | O guia EduTec foi construído para gerar informações desse diagnóstico e ele está disponível para todas as redes educacionais brasileiras. É um instrumento público, é um instrumento em que os dados - aí vou falar uma palavrinha -, os microdados, a partir do preenchimento, já são disponibilizados pela própria plataforma. E, a partir daí, o que a gente tem que fazer? Bom, aí sim, a gente tem um exercício enorme: vamos olhar esses dados com cuidado, vamos entender onde estão os nossos gargalos para, então, preparar esses planos locais. Quando a gente fala dos planos locais e, dentro da iniciativa, a gente participou muito disso, naqueles onze municípios, naqueles seis territórios que eu mostrei para vocês... Aí, dentro do Paraná, a gente tem Guarapuava e Campo Mourão, e a gente percebe como você colocou: são onze municípios em seis territórios com contextos muito diferentes, pensando que a entrada na iniciativa em muitos deles aconteceu no mesmo período, os recursos financeiros disponibilizados foram recursos contextualizados, então eles foram recursos disponibilizados para atendimento das necessidades desses municípios. E uma das coisas que hoje acende uma luzinha aqui para a gente é: por que a adesão, inclusive ao programa, aconteceu de forma tão distinta quando você leva apoio técnico e apoio financeiro? E foi isso que aconteceu e é o que a gente está avaliando em termos de iniciativa. Os municípios receberam apoio técnico, os municípios receberam apoio financeiro, e o que a gente tem percebido é como o contexto importa e, para além do contexto, como as relações, a criação desses sistemas, desses microssistemas, ou seja, de grupos de trabalho, de redes municipais que conversem com as redes estaduais, de redes... Como você mesmo colocou: eu tenho um município que faz algo muito legal próximo do meu; por que é tão difícil criar essa conectividade entre as pessoas, de eu poder pegar o secretário de educação de um município e conversar com outro secretário de educação de outro município? Trata-se de entender o que aquele município está fazendo certo e o que não está dando tão certo assim. Então, pensar esses planos locais pressupõe que, sim, a gente vai ter que sentar e, a partir do diagnóstico, a gente vai construir: bom, o que a gente precisa fazer, como a gente precisa fazer e em que tempo a gente precisa fazer? Esse tempo - e aí eu fecho a minha fala falando algo que talvez nós, pesquisadores, se canse de falar, e a gente ainda vai ter que continuar falando disso um tempinho -, o tempo da melhoria da educação, é muito diferente do tempo político, muito, muito, muito, e ele vai continuar sendo muito diferente por algum tempo. Então, essa construção desses grupos de trabalho, essa construção dessas falas para pensar o diagnóstico e, a partir daí, olhar para a questão do uso de tecnologia na educação, pressupõe que cada um desses atores entenda que, com certeza, ele não verá naquele momento os frutos desse seu esforço, mas ele vai ver, sim, daqui a quatro anos, daqui a dez anos, e ele vai lembrar que "eu coloquei a primeira pedrinha lá atrás, eu participei dessa construção". |
| R | Acho que, se a gente conseguir só começar a colocar essa luzinha de que esses tempos são diferentes e que, portanto, talvez o meu passo aqui seja produzir o diagnóstico e pensar um plano de trabalho e que talvez outros atores conduzam esse diagnóstico, a gente já sai ganhando bastante em termos de política pública. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Por videoconferência.) - Muito bom. Obrigado, Ariana. Depois, leia as conclusões do relatório para, antes de publicarmos, você também contribuir ainda mais. E continue feliz e alegre como você é na apresentação. O pesquisador tem que ser uma pessoa extremamente feliz também, e você tem essa característica. Obrigado. Yasmim Melo, que é Pesquisadora em Equidade na Educação - equidade é uma palavra, sempre digo, tão forte -, Doutoranda em Administração e Pesquisadora-Consultora na Vanderbilt University. Com a palavra, Yasmim. A SRA. YASMIM MELO (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Senador, muito obrigada pelas palavras finais. Também quero agradecer à Ariana e ao Romualdo pela parceria. Aqui, foi uma troca bastante interessante. Acho que as nossas falas se complementaram bem para tentar trazer um pouco da complexidade deste tema de maneira breve e acessível. Focando no tema sugerido, Senador, o SNE, como o senhor falou, a pactuação, de fato, é uma palavra forte, e acho que o SNE tem justamente essa busca para garantir os efeitos que um modelo de federalismo cooperativo, que as cooperações vertical e horizontal entre estados e municípios e a União pode trazer de benefício para a política educacional, como já traz em outras áreas de política social, como o SUS e o Suas. Então, eu gostaria de destacar um dos objetivos do SNE que é de garantir, inclusive, uma relação adequada entre aluno e equipamentos educacionais, como laboratório de ciência, de informática, de internet. Acho necessário que a gente pense, quando eu faço questão aqui de enfatizar esta palavra equidade, nas escolas que atendem aos grupos mais vulneráveis, que estão localizadas em áreas periféricas, ribeirinhas, rurais, quilombolas e indígenas, e que a gente consiga pensar uma provisão, uma distribuição igualitária de tratamento e de recursos pedagógicos para esses estudantes, para que eles consigam receber uma educação de qualidade, alcançar seu pleno desenvolvimento e ter acesso a oportunidades educacionais e a outras oportunidades. Acho que, quando a gente consegue trazer como princípio, como diretriz focar nessas escolas que têm um histórico de falta de provisão desses recursos, a gente pode, sim, pensar numa educação de fato para todas e todos os estudantes. Acho que o SNE ou tenho certeza de que o SNE - vou fazer como a Ariana - é um instrumento que tem muito potencial para que a gente consiga atender a esse objetivo. São importantes as nossas discussões aqui sobre as melhores formas de alcançar essas áreas, considerando todos os desafios técnicos que exigem provisão de banda larga, de cobertura, qual o melhor tipo... Acho que a gente tem caminhado nessa discussão, e podemos continuar. Sigo à disposição para ajudar no que for necessário, mas a gente precisa, sim, continuar pensando nessa distribuição proporcional de recursos para esses grupos a partir dessa priorização. Acredito que as cooperações vertical e horizontal podem nos ajudar muito para conseguir alcançar esse objetivo. |
| R | Agradeço, mais uma vez, a oportunidade. Fico à disposição. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Por videoconferência.) - Nós é que agradecemos a você, Yasmim. Sucesso no curso de doutoramento também. Envie para a gente depois a pesquisa em que você está envolvida para concluir o doutorado. E, no que depender da Comissão de Educação, Cultura e Esporte, vamos depois divulgar também o resultado da sua pesquisa. Obrigado pela participação. E passo a palavra ao Dr. Romualdo Portela de Oliveira, que é Diretor de Pesquisa e Avaliação do Centro de Estudos e Pesquisa em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec). O SR. ROMUALDO PORTELA DE OLIVEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Eu queria agradecer ao Senador o convite. Para nós do Cenpec, é uma honra participar desta atividade. Agradeço a partilha com a Ariana e a Yasmim. E queria retomar dois pontos que eu falei, que me parece que são importantes para a gente pensar o futuro. O primeiro deles, que a gente costuma falar no Cenpec, é que o combate à desigualdade, no caso da educação, pressupõe o combate à exclusão da escola e à exclusão na escola. A exclusão da escola é que nós temos que olhar para parcela grande da população brasileira até os 18 anos - a mais velha também, mas, no caso, é aquela coberta pela educação compulsória - que está fora da escola. Nós temos que criar políticas públicas para trazer essas crianças e esses adolescentes para a escola e para não permitir que se repita o processo de exclusão a que eles já foram submetidos, porque os que estão fora da escola no Brasil, na grande maioria, tiveram alguma experiência não bem-sucedida na escola. Então, isso implica criar as condições materiais para que eles voltem - aí eu estava pensando nos programas de renda cidadã - como também mudar as políticas, no interior da escola, que tenham gerado, no passado, a exclusão. E isso implica nós termos uma educação que respeite as diferenças, que seja uma educação antirracista, uma educação antissexista, uma educação que garanta a todos o direito de aprender. E isso é outro aspecto importante. Eu acho que o aumento da conectividade, a disponibilização de meios eletrônicos de aprendizado tem que estar inserida dentro dessa ideia de que a educação é um direito de todos. Nós costumamos dizer que, se tem um fora, se a um não é garantido esse direito, ele já não é um direito, porque o direito é para todos ou não é. E, portanto, a preocupação das nossas políticas educacionais tem que ser garantir o aprendizado a todas as crianças e todos os adolescentes do país. E, para isso, eu acho que já foi destacada aqui a importância do Sistema Nacional de Educação. A Ariana lembrou a diferença dos tempos, os tempos da educação e os tempos dos governos. E a resposta que nós historicamente temos tentado construir para isso é a ideia dos Planos Nacionais de Educação, quer dizer, seriam planos que transcenderiam os limites de um único governo. Nós temos aprendido com os planos. Eu costumo dizer que, se a gente pegar o primeiro Plano Nacional de Educação lá de 1963, ele só tinha metas. Em 2001, nós aprendemos que as metas têm que vir junto com a provisão dos recursos. |
| R | Em 2014, nós aprendemos que não bastava ter metas e a provisão dos recursos, tínhamos que ter os organismos capazes de acompanhar a execução, eventualmente ajustar ritmos, fazer um ajuste de metas etc. O problema é que nós continuamos sem ter planos nacionais de educação. Portanto, eu acho que o desafio do próximo período é a gente criar as condições para que os planos não possam ser objeto de arbítrio dos governos cumprirem ou não cumprirem. Eu acho que é esse o desafio. A ideia é a de que a gente tem que ter políticas de Estado para a educação e não políticas de governo. Exatamente porque os tempos da educação não são os tempos dos governos. Nessa perspectiva, acho que pensarmos como é que nós criamos políticas educacionais que não possam ser destruídas pelo desejo ou pela falta de desejo dos governos é absolutamente fundamental. E é nessa perspectiva que eu acho que a gente teria de pensar os planos de ampliação da conectividade e do acesso para o conjunto da população brasileira. Queria, mais uma vez, agradecer a oportunidade e cumprimentar o Senador pelo excelente trabalho na Comissão de Educação do Senado. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PR. Por videoconferência.) - Nós é que agradecemos. Eu quero, inclusive, aproveitando a fala do Dr. Romualdo, dizer, repetir, reforçar que esta é uma Subcomissão da Comissão de Educação, Cultura e Esportes, que é presidida pelo Senador Marcelo Castro, que dá todo o apoio ao trabalho da Subcomissão. Essa Subcomissão, Yasmim - você que é do Rio Grande do Norte, como mencionou -, tem como Vice-Presidente a Senadora Zenaide Maia, que é Senadora do seu Estado, do Rio Grande do Norte, e também a participação do Senador Confúcio Moura, que também se dedica muito à área da educação dentro dos debates do Senado Federal; do Senador Wellington Fagundes. E tínhamos a participação - que agora está TCU -, uma participação muito importante do Senador Anastasia. Quero lembrar a todos e todas que nos acompanham que o Plano Nacional de Educação tem a sua vigência de 2014 a 2024. Inclusive tivemos, há cerca de um mês mais ou menos, uma audiência temática - por isso acontece no Plenário - para discussão, reflexão e avaliação das metas. Foi um momento importante, mas toda a sociedade já deve começar - já está mobilizada, muita gente - a se mobilizar para a elaboração do novo Plano Nacional de Educação. Eu só quero dizer, também, que eu tenho utilizado uma frase que foi mencionada pelo Presidente do Congresso Nacional, Senador Rodrigo Pacheco, quando ele disse o seguinte, referindo-se à educação: "Dos 0 aos 18 anos [ele queria dizer em relação à educação básica] nada pode faltar". Se a gente pensar, é o apoio, o acesso, a permanência, o custo aluno-qualidade, conectividade, valorização do professor. Se nós conseguirmos cumprir isso, eu diria, em 18 anos - porque não é um governo, é o compromisso de vários governos - nós poderemos ter um país muito melhor, com merenda, banheiro, saneamento, biblioteca, nada pode faltar. |
| R | "Ah, mas nisso vai ser necessário investir 40 bilhões, 50 bilhões." É muito melhor investir nisso do que em prisão, em segurança, em falta de apoio, em fome, porque essa criança e esse adolescente estariam na escola também com alimentação, que é a merenda escolar, com o livro, com a conectividade, com programas para a família desse aluno também, para haver a promoção social não só do aluno, mas da família. Então, nós teríamos um país diferente em 18 anos, desde que fizéssemos isso. Eu agradeço muito a participação novamente da Ariana Britto, da Yasmin Melo e do Dr. Romualdo Portela de Oliveira. Quero agradecer a todos e todas que nos acompanharam pelos meios de comunicação e dizer que todo esse material está disponível na página da Comissão de Educação, Cultura e Esporte. Agradeço aos próprios meios de comunicação do Senado, que acompanharam e tornaram possível a interatividade no decorrer desta audiência pública. Agradeço ao pessoal aí da Comissão de Educação. Hoje o Thiago, o Secretário, não está presente, mas está sendo substituído pela Fernanda e por todo o pessoal da Comissão. Quero dizer que foi um bom momento para, em conjunto, refletirmos sobre a educação e, particularmente, sobre a conectividade. Obrigado novamente. Nada mais havendo a tratar, declaro, portanto, encerrada a presente reunião. (Iniciada às 10 horas, a reunião é encerrada às 11 horas e 38 minutos.) |

