Notas Taquigráficas
30/08/2022 - 22ª - Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor
| Horário | Texto com revisão |
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| R | O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE. Fala da Presidência.) - Sob a proteção de Deus, eu declaro aberta a 22ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor da 4ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura. A presente reunião tem por finalidade debater o conflito de opiniões sobre o Inquérito 4.781 e também a violação do devido processo legal, dos direitos e garantias individuais e do sistema acusatório, em atendimento aos Requerimentos 40 e 43, 2022, de nossa autoria. A audiência pública será realizada em caráter interativo, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania na internet, em www.senado.leg.br/ecidadania - repito: www.senado.leg.br/ecidadania, tudo junto -, ou pelo telefone da Ouvidoria do Senado Federal, 0800 0612211. Repito o número: 0800 0612211. Hoje, nós recebemos os seguintes palestrantes, aos quais eu agradeço por aceitarem o nosso convite: o Dr. Sérgio Fernando Raimundo Harfouche, Procurador de Justiça do Mato Grosso do Sul; César Dario Mariano da Silva, Procurador de Justiça do Ministério Público de São Paulo; Deltan Martinazzo Dallagnol, ex-Procurador da República; Dr. Valmir Pontes Filho, advogado e jurista; e Dr. Ives Gandra Martins, advogado e jurista. |
| R | Nós tivemos aqui também a confirmação da presença do Dr. Bruno Bianco Leal, que é Advogado-Geral da União. Daqui a pouco estará chegando aqui à sessão no Senado Federal. Nós tivemos também aprovados alguns outros convidados que até o momento não chegaram. Depois eu quero ver com a Secretaria se já se manifestaram, deram alguma resposta: o Sr. Ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes; o Sr. Procurador-Geral da República atual, Dr. Antônio Augusto Brandão de Aras; a ex-Procuradora-Geral da República, a Sra. Raquel Elias Ferreira Dodge. São alguns nomes que eu não tive... O Dr. Augusto Aras parece que respondeu que não viria, é isso? (Pausa.) Ah, está aqui a definição. Então, vamos lá: um ofício que nós recebemos aqui, que a Comissão de Transparência, Fiscalização e Controle recebeu, no dia de ontem, do gabinete do Procurador-Geral da República, tá? Prezados(as), boa tarde. De ordem, informo que o Procurador-Geral da República, Augusto Aras, agradece o convite para a audiência pública abaixo e anuncia a impossibilidade de comparecimento em virtude de compromisso institucional anteriormente assumido. Na oportunidade, parabeniza a iniciativa e deseja pleno êxito no referido evento. Essa é a manifestação do Procurador-Geral da República atual, Dr. Augusto Aras. Também a Mesa recebeu aqui da Assessoria Parlamentar do Ministério Público Federal: Cumprimentando-o cordialmente [...] para conhecimento, cópia do e-mail enviado a esta Assessoria [...] pelo Procurador da República Dr. Cleber de Oliveira Tavares Neto, no qual informa a impossibilidade de comparecimento na audiência pública do dia 30/08 [na Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle do Senado]. Então, a justificativa também do Dr. Cleber. A última justificativa aqui, do Ministério Público Federal, da Procuradoria-Geral da República: Em atenção ao seu ofício [...], venho comunicar-lhe da impossibilidade de comparecimento da Subprocuradora-Geral da República Raquel Elias Ferreira Dodge na audiência do dia 30 de agosto de 2022, promovida pela Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor. |
| R | Então, a justificativa da Dra. Raquel Dodge, só para fazer aqui o contraponto para quem está nos acompanhando entender. Nós estamos aqui com a sala repleta de estudantes de Direito. Eu quero cumprimentar a todos vocês aqui de Brasília. Depois eu queria até receber o nome da universidade para citar. É só para entender por que nós chamamos os Procuradores-Gerais - o atual e a anterior: porque, nesse Inquérito 4.781, das fake news, chamado, batizado de inquérito das fake news, essa instituição importante do Brasil, a Procuradoria-Geral da República, o Ministério Público Federal, teve dois pareceres conflitantes. A Dra. Raquel Dodge, logo no início desse inquérito, pediu o arquivamento; e o Procurador atual, Dr. Augusto Aras, permitiu, teve uma aquiescência para que esse inquérito continuasse. Então, a gente queria entender o porquê do conflito interno da posição dos dois Procuradores. Eu queria começar aqui, antes de ouvir os nossos palestrantes - vejo que o Dr. Ives Gandra já está conectado, o Dr. César Dario Mariano da Silva também já devidamente conectado, agradeço a presença dos dois, o Senador Styvenson Valentim, diretamente do Rio Grande do Norte, já aqui também conectado -, com uma frase de Mahatma Gandhi, um grande humanista, pacifista que marcou uma época, que reverbera até hoje com a sua cultura da paz, da não violência. O Mahatma Gandhi dizia o seguinte: "No olho por olho e dente por dente, a humanidade vai acabar cega e sem dentes". Nós estamos vivendo um momento no nosso Brasil muito delicado, de uma polarização na área da política muito forte. Eu acredito que, em tudo isso, não há um mal que não venha para um bem. Então, nós estamos sendo expostos a uma provação muito grande, cada um de nós. A pandemia mostrou muito isso, nos trouxe uma reflexão profunda a todos do que é importante na vida, que é estarmos com as nossas famílias, ajudarmos ao próximo. Isto é o verdadeiro sentido da existência: aprender a amar, a perdoar. Mas a gente está vivendo um momento em que as entranhas... A gente está sendo colocado a teste para paciência, para que a gente tenha tolerância e resiliência. Esse inquérito tem incomodado muito os brasileiros. A gente tem conversado com as pessoas - eu e outros Parlamentares também -, e, com todo o respeito a quem pensa diferente, existe uma indignação em muitos brasileiros com relação a esse inquérito. Segundo juristas, pessoas que entendem do Direito - nós vamos ouvir aqui algumas dessas pessoas, renomados juristas -, é um inquérito que não tem amparo na Constituição do Brasil. E isso é preocupante, porque a gente está vivendo esse momento de polarização, e o direito à liberdade de expressão é algo fundamental, uma base, um pilar da nossa democracia. Esse equilíbrio é fundamental. |
| R | Eu aproveito aqui para citar o estadista francês François Pierre Guizot, que diz o seguinte... E é aí que fica a pergunta. Ele falou isso, uma frase marcante já usada em editoriais de jornais, e eu estou com um aberto aqui de O Globo, por exemplo, que diz o seguinte: "Quando a política penetra no recinto dos tribunais, a justiça se retira por alguma porta". Será que essa cegueira que a gente está vivendo no Brasil está fazendo com que a política de alguma forma também entre nos tribunais? Vem aquele questionamento: os fins justificam os meios? Então, é um momento de serenidade que a gente precisa resgatar, de humanidade. Ninguém é melhor do que ninguém, todos nós temos nossas limitações e imperfeições. E nós estamos aqui para aprender uns com os outros. E é um momento em que precisa de paz, de calma, ninguém aguenta mais briga. É isso que a gente vai avaliar sobre esse inquérito tão controverso, tão polêmico, tão questionado pelos brasileiros, sejam de direita, de linha ideológica de esquerda, de centro, sejam contra governo, sejam a favor de governo. É uma preocupação muito grande. Eu quero saudar aqui o Senador Luiz Pastore, que está aqui na nossa Comissão. Muito obrigado por prestigiar. Nós vamos já iniciar aqui. Vamos ouvir os palestrantes. Na hora em que os Senadores quiserem se manifestar, a palavra está à disposição. O Senador Styvenson Valentim já está pedindo a palavra, e eu queria ouvi-lo. Senador Styvenson, muito obrigado pela sua presença. O senhor pode fazer uso da palavra. O SR. STYVENSON VALENTIM (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - RN. Para discursar. Por videoconferência.) - Bom dia, Senador Eduardo Girão, todos os Senadores, todos que assistem, todos os presentes que compareceram, a convite, a esta sessão importantíssima, que é de transparência e defesa do consumidor e de fiscalização, que é um papel importante do Senado também. Primeiro, quero dizer que a sua determinação, resiliência em insistir e persistir, com diálogo, para trazer os Poderes para poderem esclarecer não só ao Senado, mas à população é louvável. Lembro, Senador Eduardo Girão, que nós estamos num período de campanha, a 34 dias aproximadamente de uma eleição. Seria bom que os eleitores, seria bom que todos eles perguntassem qual era a posição, o posicionamento em relação a essa invasão muitas vezes ou, no meu ponto de vista, a essa exorbitação dos Poderes acima dos demais, no caso do STF. Estar fazendo o que a população brasileira faz... E a população brasileira está entendendo, percebe tudo isso. |
| R | Então, seria uma forma de querer saber, porque a gente precisa de um número substancial, dentro do Senado, tanto para aprovar um PGR quanto para aprovar um Ministro do STJ, que, sempre que buscam os votos, vão aos nossos gabinetes, percorrem os corredores do Senado, vão ser sabatinados, mas, em momentos posteriores, depois de eleitos, fazem o que a maioria dos políticos brasileiros fazem: não retornam, não voltam mais, não prestam mais contas, não dão a mínima satisfação àquele Poder que o elegeu. Então, seria um momento agora de reflexão para isso também: dentro do que o senhor vai discutir, dentro da divisão dos Poderes, da harmonia, o que os pretensos candidatos - não só do meu Estado do Rio Grande do Norte - pensam a respeito disso e qual atitude deveria ser tomada se houvesse, dentro da legislação, uma capacidade moral de alguns candidatos de tomá-las. Parabenizo, mais uma vez, o senhor, Eduardo Girão. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Senador Styvenson Valentim, que é titular desta Comissão de Transparência, Fiscalização e Controle e a quem eu agradeço, porque nós votamos - e faço aqui uma referência especial ao Senador Reguffe, daqui, do Distrito Federal, porque é o Presidente desta Comissão, e ele permitiu que os requerimentos... Não é o primeiro requerimento em que a gente tenta falar sobre esse suposto ativismo judicial que está acontecendo no Brasil, e a gente conseguiu aprovar esses requerimentos graças à coragem e à ousadia do Senador Reguffe em colocar para pautar. É algo inédito. Pelo menos pelo que eu tenho conhecimento aqui, na história do Senado Federal, foi algo inédito o convite feito a Ministros do Supremo para tratar desse assunto. O convite está sendo feito. O Senado, pelo menos nesse aspecto, na Comissão de Transparência, Fiscalização e Controle, está cumprindo o seu dever de ouvir, de buscar o diálogo, de buscar o entendimento, de buscar uma rearmonização entre os Poderes, uma verdadeira independência. Eu queria chamar para a mesa aqui, para já se colocarem nos seus devidos lugares, para fazer a apresentação, os convidados que estão presencialmente conosco. Então, eu chamo aqui, à mesa, o Dr. Valmir Pontes Filho, que é Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, Mestre em Direito Constitucional pela PUC de São Paulo, Procurador do Estado do Ceará aposentado, ex-Procurador-Geral do Município de Fortaleza, Professor Titular da Universidade de Fortaleza (Unifor), Professor Assistente da Faculdade de Direito da UFC, ex-Presidente da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da OAB Federal, onde foi Conselheiro por dois mandatos, ex-Presidente e atual membro do Conselho Superior do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo (IBDA), autor de diversos artigos, ensaios jurídicos, bem como do livro Poder, Direito e Constituição, palestrante em diversos congressos jurídicos. Muito obrigado, Dr. Valmir Pontes Filho. |
| R | Ele é cearense. Eu também tive a benção de nascer no Ceará, e é uma honra muito grande conhecer o Dr. Valmir há muitos anos, uma pessoa muito respeitada não apenas no Ceará, mas em todo o país. Então, muito obrigado pela sua presença. Chegamos hoje bem cedinho aqui juntos - você vai ser o primeiro a falar por causa disso, não é, doutor? Chegamos aqui à Comissão quando ainda estavam organizando. Eu queria também chamar o Dr. Sérgio Harfouche. O Dr. Sérgio Harfouche é Procurador do Ministério Público, Promotor de Justiça da Infância, licenciado, um homem de bem que desenvolveu aí vários trabalhos com repercussão nacional na área da disciplina nas escolas do Brasil; teve matérias aí nos grandes veículos de imprensa com um trabalho muito corajoso, um trabalho inédito, pioneiro no Brasil - se você puder depois, mais para o final, compartilhar essa experiência, embora o tema seja outro, seria muito importante, porque a disciplina é algo fundamental na sociedade, não é? E ele conseguiu junto com os pais, com as famílias, estabelecer isso junto com os professores e os alunos nas escolas. Estamos aguardando o Ministro Bruno Bianco Leal, Advogado-Geral da União, que já confirmou presença e está vindo. Antes de passar a palavra para o Dr. Valmir, o primeiro que vai se pronunciar aqui, durante 15 minutos, eu queria fazer um breve histórico do que a gente está tratando aqui. No meu modo de ver, e entendo e respeito quem pensa diferente, nós estamos vivendo no Brasil um flagrante ativismo judicial imposto por algumas instâncias do nosso Poder Judiciário, principalmente a nossa Corte Suprema, que é um pilar para a democracia, e ninguém discute isso - é importantíssimo o nosso Supremo Tribunal Federal -, mas, de alguma forma, com algumas decisões, eles têm interferido em outros Poderes da República; decisões questionáveis à luz da legislação vigente no Brasil. Verificam-se, rotineiramente, atitudes que têm ferido de morte o sagrado princípio da imparcialidade e que têm promovido uma clara violação dos mais básicos ditames que regem o devido processo legal. A presente audiência pública requerida por nós se reporta ao inquérito destinado a investigar o suposto uso de fake news para atacar membros do Judiciário, esse da relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, que foi convidado a estar presente nesta sessão, mas não veio. O fato é que a instauração do Inquérito nº 4.781, aberto de ofício por decisão do Ministro Dias Toffoli, também do Supremo Tribunal Federal, foi uma clara violação dos mais básicos ditames que regem o devido processo legal no âmbito do seu regular sistema acusatório. Na prática, a mais Alta Corte de Justiça passou a ser a vítima, o investigador e o juiz no caso, já que vai decidir sobre fake news, ataques e ofensas a ele próprio. |
| R | Está pacificado, no nosso ordenamento jurídico, que cabe ao Ministério Público a iniciativa exclusiva para promover a ação penal pública na forma da lei. Porém, tal órgão acusatório foi, no âmbito do Inquérito nº 4.781, totalmente impedido de exercer a sua incumbência pública. A ex-Procuradora-Geral da República Raquel Dodge - também convidada para esta audiência, e não veio - tentou impedir a continuidade dessa investigação por considerá-la, abro aspas, "ilegal", fecho aspas, encaminhando ao STF um documento informando que arquivou o inquérito porque só o Ministério Público poderia abrir e conduzir uma investigação criminal. Porém, tal decisão foi totalmente desconsiderada pelo Ministro Alexandre de Moraes. Eu quero saudar aqui também o irmão, colega nosso de Senado, o Senador Guaracy Silveira, que é do Estado de Tocantins e está aqui conosco prestigiando esta sessão. Muito obrigado pela sua presença. Ocorre que, em manifestação que colide frontalmente com a da sua antecessora, o atual PGR (Procurador-Geral da República) Augusto Aras, em que pese alertar para que o STF fixasse balizas para a investigação, defendeu a regularidade do inquérito de fake news que tramita na Suprema Corte. Tamanho dissenso entre os maiores representantes do Ministério Público Federal mostra uma preocupante desarmonia numa das instituições mais importantes da nação e que tem como atribuições, entre outras, fiscalizar o efetivo cumprimento de todas as leis editadas no país, zelar pelo Estado democrático de direito e promover a defesa e proteção do cidadão. O fato é que, mesmo atrelado a vícios de enorme gravidade, que seguem na contramão dos princípios que norteiam o devido processo legal, esse inquérito continua a produzir efeitos deletérios. Ocorre que, nas mais recentes decisões que envolvem esse Inquérito 4.781, o mesmo Sr. Ministro Alexandre de Moraes mais uma vez extrapola sua função judicante para importunar quem pensa diferente de suas posições políticas. Sim, porque, a meu ver, esses últimos mandados de busca e apreensão, com bloqueio de contas de redes sociais de oito empreendedores do Brasil que coincidentemente têm uma linha de pensamento político conservador, bem como a devassa ampla e irrestrita determinada por ele nas contas bancárias de pessoas jurídicas e físicas desses empreendedores - isso ontem, é notícia de ontem a decisão - visam intimidar e calar aqueles que pensam diferentemente, numa afronta explícita à Constituição no que tange ao princípio da livre manifestação do pensamento e da liberdade de expressão. |
| R | O pior é que todas essas medidas desproporcionais foram tomadas sem embasamento legal e pautadas - ontem, ele liberou o sigilo, e ficou claro isto - única e exclusivamente em uma matéria de um site, de um portal aqui de Brasília, ou seja, é uma violência contra empreendedores que geram empresas, que geram riquezas para o Brasil. Isso se justifica? É uma pergunta. É por isso tudo e pela urgente necessidade de esclarecimentos atinentes aos fatos acima descritos, bem como para suscitar uma profunda reflexão na sociedade brasileira sobre o lado negativo do ativismo judicial, mais especificamente o que promove a violação do devido processo legal, dos direitos e garantias individuais e do sistema acusatório, é que estamos reunidos nesta audiência pública com a honrosa presença de tantos juristas de renome, os quais nos ajudarão a entender melhor este momento atribulado, este cenário por que passamos no âmbito da relação entre os três Poderes da República e da expressa violação aos direitos básicos dos cidadãos brasileiros, em especial os direitistas. Eu agradeço a atenção e a paciência de vocês sobre esse aspecto. E, imediatamente, eu já passo a palavra aqui para o nosso primeiro orador, o meu querido Dr. Valmir Pontes Filho. O SR. VALMIR PONTES (Para expor.) - Bom dia a todas e a todos! Que as minhas primeiras palavras sejam de agradecimento, primeiro, a Deus e, depois, ao Senador Eduardo Girão, que honra o Ceará com seu excelente desempenho nesta Casa senatorial e que dignifica o nosso Estado do Ceará. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE. Fora do microfone.) - Obrigado. O SR. VALMIR PONTES - Cumprimento respeitosamente os Exmos. Srs. Senadores aqui presentes, o Dr. Sérgio Harfouche, o Dr. Deltan Dallagnol e o Prof. Dr. Ives Gandra, que está a participar por via remota - ambos, aliás, tanto o Dr. Dallagnol quanto ele. O Dr. Ives é um paradigma de advogado, que por nós todos é admirado. Eu vou procurar me conter no tempo que me foi designado. O tema central, como todos sabem, é o Inquérito 4.781 e assuntos correlatos a ele. Buscarei fazer uma análise serena, objetiva e jurídica do assunto, embora lembrando que, segundo Kelsen, o ato de interpretar o direito não é apenas um ato de cognição ou cognoscitivo, é também um ato de vontade, um ato volitivo, porque, dentre as possíveis interpretações que cada norma jurídica tem, você escolhe e o juiz julga segundo aquele sentimento de justiça que se tem, mas o farei, movido pelo sentimento da humildade e da minha pequenez tanto intelectual quanto espiritual, a exercer a minha liberdade de expressão, o direito de pensar e de dizer o que penso, sem causar injúria, difamação ou ofensa a quem quer que seja, muito menos cometer o crime de ameaça. Portanto, estou me valendo das prerrogativas que me outorgam a Carta Magna da República, arts. 5º, inciso IV e XIV, e 220 da Constituição. |
| R | Eu faria, na linha do que me foi recomendado pelo Senador Eduardo Girão, indagações ao Sr. Ministro Alexandre de Moraes, caso ele estivesse presente, mas, enfim, espero que ele, algum dia, ainda nesta encarnação, ouça e, se possível, responda. Primeira pergunta: conversas pelo WhatsApp entre amigos e familiares estão proibidas ou apenas determinados temas nelas sugeridos estão proibidos? O que podemos ou não pensar e expor? O meu direito de pensar é um direito que está ínsito à minha própria existência. Descartes já dizia: "Cogito, ergo sum" - penso, portanto, existo. Se eu não posso pensar, eu não existo. O inquérito é um procedimento investigatório. E eu faço de já uma outra pergunta: por que sigiloso para os advogados? Ora, onde ficam os direitos do indiciado ao contraditório e à ampla defesa, direitos que devem ser exercidos desde o começo? Qualquer pessoa sabe, qualquer advogado sabe que o cliente deve ser acompanhado desde o inquérito policial, não apenas quando do julgamento pelo Judiciário. Outra pergunta: o inquérito foi aberto, como já salientado pelo Senador, por um ministro do Supremo, o Ministro Toffoli, e conduzido por outro ministro, designado por delegação - é um delegado, portanto, na acepção genérica da palavra. Não houve sorteio entre os ministros, como determina expressamente o art. 43 do Regimento Interno do Supremo. Por que essa escolha e como é que isso permaneceu? O órgão máximo do Judiciário abre, comanda, instrui e julga o mesmo processo. Estamos, por acaso, Exmo. Sr. Ministro, em época medieval? E a imparcialidade do Judiciário como fica, se o órgão que acusa é o mesmo que julga? O delito, o suposto delito, foi cometido nas dependências do Supremo? Isso está no Regimento Interno do Supremo. "Não [disse ele] nas dependências [ou seja, no prédio do Supremo ou dos seus anexos], mas na jurisdição do Supremo." Ora, o Supremo tem jurisdição em todo o território nacional, mas a lei é clara: "nas dependências". E interpreta-se aí dependências físicas do Supremo. Portanto, não haveria por que instituir esse inquérito, a não ser por iniciativa do Ministério Público. |
| R | Os indiciados nesse inquérito, que já são dezenas - tanto neste inquérito quanto em outros que correlatamente correm -, têm prerrogativa de foro, ou seja, devem ser julgados pela Suprema Corte? Ou, em não tendo, os processos deveriam ser apreciados pela primeira instância? Essa é outra pergunta nodal que há de ser respondida. O crime que se investiga o que é? Fake news? Ou um crime de opinião? Ou uma coisa se confunde com a outra? O direito de opinar todos temos, de dizer o que pensamos, o que nos vem à mente. Uma fake news, digamos, fica clara se, por exemplo, alguém denunciar nos jornais que eu e o Senador Girão, agora, às 10h36 da manhã, fomos vistos assaltando uma agência bancária lá em Fortaleza. Ora, nós estamos aqui neste momento. Isso claramente é uma notícia falsa. Então, compete a nós, Senador Girão e eu, entrar com uma queixa, provocar, e o Ministério Público, então, endossa aquela queixa e abre a ação penal. E, depois de instruído o processo, é que se vai ao Judiciário. O que se investiga, repito, é um crime de opinião, inexistente no ordenamento jurídico brasileiro? Outra pergunta. As decisões tomadas no âmbito desse inquérito são duras e profundamente impactantes não só sobre os indiciados como sobre suas famílias. Não é nada agradável alguém, às 6h da manhã, ter a visita não desejável - não pelas pessoas deles, mas pela instituição - de policiais federais. Ora, elas são tomadas monocraticamente, sem ouvida do Plenário. Um ministro só despacha lá o que quer, manda fazer busca e apreensão, manda bloquear contas bancárias, contas na internet, nas redes sociais... E mais do que monocráticas... Certa vez, ouvi uma expressão de uma repórter de uma dada estação de televisão - não vou citar o nome, porque eu não quero constranger ninguém - que disse que as decisões eram "monocromáticas". Claro que está errada a expressão, mas no fundo ela está certa, porque essas decisões do Exmo. Sr. Ministro são do mesmo tom, da mesma cor, portanto, monocromáticas também, além de monocráticas. As competências do Ministério Público foram suprimidas? Pode o Judiciário atuar à revelia do Procurador-Geral da República? A ex-Procuradora-Geral Raquel Dodge assinalou que não era possível e, portanto, requereu o arquivamento, mas o arquivamento foi recusado pelo Supremo em sua anterior composição por 10 a 1. O único que votou contra foi o Ministro Marco Aurélio Mello, que chegou a afirmar que aquele inquérito era "o inquérito do fim do mundo", uma expressão que ficou famosa. Algumas observações que de certa forma eu já fiz. |
| R | Os crimes de injúria, calúnia e difamação são de ação privada; há necessidade de queixa do ofendido. E o crime de ameaça, que está no art. 147 do Código Penal, é uma ação penal condicionada a uma representação do ofendido. Há ausência, portanto, no caso... A ausência é clara, na espécie que estamos a tratar, de legitimidade ativa do querelante, ou seja, do Ministro. Qual o tipo penal? Eu gostaria de citar um texto de um parecer belíssimo - um artigo, na verdade - do eminente Prof. Adilson Abreu Dallari, meu amigo pessoal: "Trata-se de apurar a autoria de críticas, deboches e supostas ameaças aos ministros, num conjunto designado popularmente como 'fake news'. Há algo determinado a ser apurado? O procedimento tem por um objetivo vasculhar a vida de um considerável contingente de pessoas, pra ver se existe algum desvio de poder ou de finalidade". Pois bem, o Sr. Ministro, hoje Presidente do TSE, disse que nesse papel fará uma perseguição implacável a fake news. O que significa isso? Perseguição não é uma palavra que me pareça - e eu digo com todo respeito e humildade, repito - adequada para a voz e a boca de um membro do Poder Judiciário. Que eu serei rigorosamente cumpridor da Constituição e das leis, tudo bem, mas implacável parece aquelas coisas de filme de faroeste: "Eu vou ser implacável com o bandido!". Enfim, não me parece - com todo respeito, repito - adequada a afirmação. Segundo ponto. A censura é permitida no Estado brasileiro? Porque a censura não se dá apenas mediante ordem a um órgão de imprensa para que não publique isto ou aquilo, mas no silenciamento e desmonetização de contas em redes sociais. Eu gostaria, embora fosse despiciendo, de reproduzir o art. 220 da Constituição da República: A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. §1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. §2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. Mais clara que isso a Constituição não poderia ser. No caso dos empresários, mencionado também pelo Senador Eduardo Girão, com busca e apreensão e bloqueio de contas, esses senhores - um deles eu conheço pessoalmente, pelo menos, que é lá do Ceará, uma pessoa de reputação intocável, um grande empresário que dá milhares de empregos pelo país inteiro - estavam juntando dinheiro - com o bloqueio de contas, supõe-se isso - para comprar armas para dar um golpe de Estado? Isso é uma fantasia! Não há golpe em curso. Aliás, se houvesse golpe, seria contra quem? É uma pergunta. |
| R | Há nesse ato, como em outros praticados ao longo do processo, desvio de poder e de finalidade. Novamente eu me reporto a uma citação do Prof. Adilson Dallari: Se no âmbito do Poder Executivo já é difícil apurar decisões tomadas com desvio de poder ou desvio de finalidade, essa dificuldade é imensamente potencializada quando se trata de decisões administrativas [as decisões no curso de um inquérito são administrativas e não jurisdicionais] tomadas por magistrados. A instalação do inquérito não é uma atividade jurisdicional, de dizer o direito, mas uma atividade administrativa. Pois bem, o pedido de arquivamento, já lembrei, foi arquivado, atos no inquérito de natureza administrativa, volto a dizer, sindicáveis pelo próprio Judiciário. Mas aí nós encontramos... Disse-me um colega de trabalho lá em Fortaleza que essa situação é vexatória. A quem recorrer diante de atos ilegais - ou supostamente ilegais - e inconstitucionais do próprio Supremo Tribunal Federal? Bom, a opção do descumprimento me parece desarrazoada, ofensiva, mas fica a pergunta no ar. Dada a minha liberdade religiosa, que espero seja mantida por quem for eleito, eu posso recorrer a Deus? Ser-me-á permitido recorrer ao Criador - para quem nele acredita, claro; respeito os agnósticos? Suas sentenças, as sentenças de Deus, são sempre justas, mas não possuem eficácia reforçada, como as sanções criminais, as sanções legais, a não ser no plano espiritual, no plano consciencial. Você é punido pela sua própria consciência. Inevitavelmente, todos nós, mesmo que não tenhamos religião alguma, sabemos no último da alma quando fazemos algo errado, algo que extrapola os limites, e nos condenamos. E a pior pena que se pode sentir é o arrependimento ou, então, em outra existência, para quem nela acredite, como eu e o Senador também. Eu perguntaria ao Sr. Ministro: a sua jurisdição tem a amplitude do Oceano Pacífico e a profundidade do Lago Baical, na Rússia, este com um 1,7km do espelho até o fundo? É uma pergunta que faço diante da amplitude das decisões por ele tomadas. Eu, antes de terminar, gostaria de ler, primeiro, um trecho de um artigo que escrevi - acho que artiguinho - que eu intitulei: "Os medos que ainda tenho, as coisas que ainda me assustam". Em determinado trecho, eu digo que me vem à alma, enfim, o sincero receio, e autêntico, de que a sociedade brasileira se veja submetida à vontade autocrática de certas figuras togadas que a si mesmas outorgaram o privilégio de ditar para todos o que é certo e errado à margem da lei e da Constituição. |
| R | Também me refiro a um trecho, a uma mensagem pelo WhatsApp. Quando falo essa palavra, eu já me tremo todo. Eu já não sei o que fazer. Um amigo meu, Wellington, que é com quem eu corto o cabelo - quero dizer, eu quase não tenho, mas ainda precisa -, mandou uma mensagem aqui e não foi à toa. Acabei de receber, Senador: "Pelo exemplo, tolere quem convive com você, mesmo quando ele faça ou ela faça alguma coisa errada. Quando você falha, você espera que os outros compreendam e lhe desculpem. Então, perdoe e ensine como deve ser feito pelo próprio exemplo. Deixe a crítica e a fofoca de lado. Procure ser franco, porque a franqueza também é caridade. É preciso que você entenda que ninguém é mau em sua essência. Existem enfermos e ignorantes perante o conhecimento espiritual que não entendem a lei de ação e reação, que tudo feito de bom ou de mau terá uma resposta de igual teor". Muito obrigado ao Senador, aos Senadores aqui presentes, à plateia, por me tolerarem por esses minutos. Muito obrigado e fiquem com Deus se puderem. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito bem! Eu quero agradecer a presença e essa exposição do nosso querido Prof. Dr. Valmir Pontes Filho, que veio do Ceará especialmente aqui para o Senado Federal para participar desta sessão, que eu considero mais uma sessão histórica aqui do Senado, cumprindo o seu dever nesta Comissão de Transparência, Fiscalização e Controle. Eu quero saudar já a presença aqui... Em instantes, vai falar o nosso Ministro Dr. Bruno Bianco Leal, Advogado-Geral da União. Muito obrigado ao senhor, à sua equipe, ao Daniel. Eu sei o quanto Ministro tentou, de alguma forma, mudar a sua agenda, com muita atenção a esta Comissão, para poder estar aqui. Então, eu lhe agradeço muito. Já lhe passo a palavra, porque eu sei que a sua agenda hoje, durante o dia, não é fácil. Eu só queria cumprimentar também os alunos aqui da Faculdade Filos. Muito obrigado pela presença de vocês. É uma honra estar aqui os recebendo. Eu fico feliz, Senador Luiz Pastore, Senador Guaracy Silveira. Como o brasileiro tem acompanhado a vida política do seu país! Isso é algo que dá uma esperança tão grande, um otimismo, porque nas audiências que nós fizemos - e estão disponibilizadas no YouTube do Senado -, além de terem tido recorde de visualizações, o auditório estava cheio. Ou seja, as pessoas vieram, compareceram. Eu recomendo para quem não tenha ainda assistido às outras sessões desta Comissão sobre esse assunto, tangenciando esse assunto, que procure lá no YouTube do Senado. Uma foi sobre ativismo judicial, e a outra foi sobre segurança e transparência nas eleições. Ao longo desta audiência, eu vou passando os convidados que vieram aqui participar. E foi, assim, de altíssimo nível, um debate esclarecedor. |
| R | Antes de passar para o doutor e para o ministro, o Senador Guaracy pediu a palavra. O senhor fique à vontade. O SR. GUARACY SILVEIRA (AVANTE - TO. Para interpelar.) - Bom dia a todos. Primeiro, pegando a palavra do Dr. Valmir Pontes: fiquem com Deus, se puderem, ai do homem, ai do ser humano se não tiver a presença de Deus! Nós fomos criados, doutor, para sermos à imagem e à semelhança moral de Deus. Se não as tivermos, nós perdemos toda a dignidade. O ser humano só tem alguma dignidade se realmente procurar assemelhar-se ao Criador. Bonitas palavras. Meu caro Senador Girão, eu acho que você merece todos os parabéns, como um grande brasileiro, por ter convocado esta reunião. Dr. Bruno... Aliás, nós temos dois doutores brunos: Bruno Luiz Dantas e o Bruno Bianco. Eu queria começar o meu pronunciamento com a citação de uma declamação de Martin Niemöller, em que ele dizia o seguinte: Quando os nazistas vieram buscar os comunistas, eu fiquei [quieto] em silêncio; [afinal] eu não era comunista. Quando eles prenderam os sociais-democratas, eu fiquei em silêncio; eu não era um social-democrata. Quando eles vieram buscar os sindicalistas, eu não disse nada; [afinal] eu não era um sindicalista. Quando eles buscaram os judeus, eu fiquei em silêncio; [afinal] eu também não era um judeu. Quando eles me vieram buscar, já não havia ninguém que pudesse protestar. Essa talvez seja uma das frases mais interessantes de um pastor evangélico, Martin Niemöller, um alemão que, no princípio, até concordou com os princípios da Alemanha, depois revoltou-se contra eles e foi extremamente perseguido pelo regime nazista. Há também uma frase, meu Senador, muito discutida e muito falada, que diz: "Não me preocupa o grito dos revoltados, mas o silêncio dos inocentes, o silêncio das pessoas de bem". Então, quando clamamos aqui, clamamos, Dr. Valmir, por quê? Afinal, eu tenho 71 anos, mas tem uma geração que está sendo construída. Quero um Brasil de liberdade, quero um Brasil de livre iniciativa e de justiça social. É esse Brasil que eu acho que todas as pessoas de bem, todos que temem a Deus querem. |
| R | O senhor citou muito bem o art. 220 da Constituição, que garante a nossa liberdade, nossa liberdade de expressão, nosso direito de nos comunicar e a nossa liberdade de opinião, Senador Girão - liberdade de opinião. Afinal, eu, por exemplo, nasci sendo monarquista, sou démodé. Sou démodé, mas eu admiro as monarquias. Vejo as estabilidades das monarquias, vejo a estabilidade no Império do Japão, da Grã-Bretanha, ao final, é tudo estabilidade. Sou contra o nosso regime porque admiro a monarquia? De maneira nenhuma. Sou um brasileiro que jurei cumprir a Constituição. Mas, como eu jurei, todos nós juramos, todos os ministros juraram. Mas nós temos visto essa Constituição - eu fui Constituinte -, uma Constituição que nós dissemos... Muita gente vê o preâmbulo e acha, Dr. Valmir, que é uma grinalda. Não é, não. O preâmbulo da Constituição foi plenamente discutido, talvez uma das coisas mais discutidas. Quando nós pusemos: "sob a bênção de Deus" - os Constituintes - não foi uma grinalda, não. Não seria o art. 1º; seria o 001, seria o início de tudo. Para isso nós fizemos essa Constituição. Não cabe aqui... Aqui é como se fosse o preâmbulo da Constituição. Nós pensamos... Naquela época, o Dr. Ulysses chamou de Constituição Cidadã. Vínhamos de um regime um pouco fechado e procuramos garantir muita coisa na Constituição, mas procuramos garantir coisas boas, entre elas: a livre expressão, o direito de cultuar, o direito de ter fé. Essa Constituição foi feita para isso. E todos que assumem um cargo público, principalmente político, têm que jurar cumprir essa Constituição, que é sagrada. Mas nós temos visto essa Constituição sendo violentada constantemente. Isso nos agride, isso nos machuca. Vejo alunos jovens, que cremos ser a esperança do Brasil... Meus companheiros, meus amigos, Dr. Bruno, não estamos bem, não. A tirania está sendo instalada no Brasil quando direitos dos mais sagrados nos são tirados. Afinal, o que é fake news? É uma piada que eu lhe mando? Ou quando grandes redes de televisões publicam notícias falsas, aí, não é fake news? Aí, é notícia? Semana passada, nós comemoramos no Senado o aniversário do Grupo Itatiaia, grupo de comunicação de muita responsabilidade, responsabilidade com notícia. Meu colega Senador, eu digo que eu sou vaidosamente um caipira paulista criado na Amazônia; natural do interior de São Paulo, mas criado na Amazônia. Mentem tanto sobre a nossa Amazônia, difamam tanto o Brasil - difamam tanto o Brasil! - pessoas que não conhecem a nossa realidade, que não a conhecem! "Estão desmatando tudo. Tacaram fogo na Amazônia." Existe tanta mentira. Vocês não estão aqui diante de um que quer destruir a natureza, não, mas de um conservador que refloresta, que cuida, que preserva as beiras dos rios. Fui construtor, trabalhei na construção da Transamazônica, da Cuiabá-Porto Velho, da Porto Velho-Manaus e da própria Belém-Brasília, talvez conhecendo a Amazônia como poucos. |
| R | Nós ouvimos falar, meu caro Girão, constantemente: "Há tantos focos de incêndio na Amazônia". Vamos ver o que é foco de incêndio. E quero justamente falar para os mais jovens que estão aqui. Grande foco de incêndio... Nós precisamos defender, sim, o meio ambiente para nossos netos, para a geração do porvir, nós não podemos dar um mundo feito de plástico para essa próxima geração, mas grande parte dos focos de incêndio na Amazônia, que existem nessa época, são os chamados fogos de defesa. O lavrador, o agricultor, o pecuarista queima 10m para preservar 10 mil metros, é o fogo de defesa. "Não, estão tacando fogo na Amazônia." Lembro-me de um filme: Mississipi em Chamas. Meus companheiros, meus amigos, nós temos o dever de falar a verdade. Quando mentimos, nós estamos destruindo o futuro. E eu tenho medo. Quando o Judiciário, que jurou como nós juramos... Mas nós temos mandatos, a cada quatro anos ou oito anos o povo diz "não" para nós ou "sim". Continuamos ou deixamos nossas castas de Vereador, Deputado Estadual, Federal, Governo, Presidente, Senador. Nós temos mandato, somos escolhidos. Nós estamos pondo deuses no olimpo, no Supremo. Tudo bem, se a Constituição fosse totalmente respeitada, que ficassem cem anos lá, mas não está sendo. Nós tivemos a prova mais viva aqui, que foi no tempo da cassação da Presidente Dilma. Rasgou-se um artigo pela metade, rasgou-se um artigo pela metade: "Essa parte vale, essa parte não vale". Ah, meus irmãos! Onde vamos parar com isso? Esta Constituição foi feita por Constituintes, Deputados e Senadores, homens brilhantes trabalharam nela, como Covas, Jarbas Passarinho e outros grandes pensantes e homens de bem que trabalharam para construí-la, como Ulysses Guimarães, que trabalharam para fazer uma Constituição chamada de Constituição Cidadã, mas vemos esta Constituição sendo destruída hora a hora, momento a momento. Vejam, dão fake news quando eu falo... Quando eu vejo essas notícias falsas infelizmente publicadas pelas grandes redes de comunicação, isso não é fake news? É, de maior alcance do que eu pegar aqui o meu celular e mandar uma mensagem para alguém. Isso é fake news que prejudica o Brasil, a nossa imagem no exterior. Nós somos uma nação em que ninguém preserva tanto o meio ambiente como nós. Nós preservamos as margens dos rios, os nossos banhados, os nossos encharcados, as nossas margens de rios, nós preservamos a nossa mata. A pessoa na Amazônia, o proprietário de terra na Amazônia de selva densa só pode usar 20% da terra - só pode usar 20%; se tiver mil hectares, só pode usar 200. |
| R | O final, senhores. Parece que se trabalha, neste Brasil, contra quem produz. Eu vejo, meu Senador Girão, oito empresários que, muitas vezes, até comunicando, brincando... Quantas vezes, em mensagem entre amigos, a pessoa não fala algum impropério, alguma coisa que não deveria falar, brincando? E, daqui a pouco, é censurado. Dinheiro preso. Felizmente, eu vejo aqui as pessoas mais jovens. Creio que nós dois talvez sejamos os mais experientes aqui, um pouquinho, em vida, mas não vimos nenhum Brasil que tentasse nos condicionar a tudo. Eu vivi plenamente a revolução de 1964, do início até o fim. Nunca houve tamanha ousadia de querer tirar totalmente os nossos direitos. Vamos viver uma ditadura do Judiciário? Não, meus irmãos, não. Nós temos que ter responsabilidade. Nós juramos, todos nós juramos cumprir esta Constituição. Nosso apelo, não de um Senador apenas, mas de um brasileiro que pensa no futuro: que nós construamos um Brasil em que a liberdade de expressão seja sagrada, que o direito de comunicar seja sagrado, em que o direito de opinião seja sagrado. Afinal, esses dias, eu estive vendo... Eu sou um cristão, como o Senador Girão bem sabe - cristão. Sou a quinta geração, a família evangélica é a mais antiga do Brasil, mas eu vi, esses dias, fizeram no Brasil a igreja satânica. Tá, a Constituição disse que pode haver. Eu discordo, vou morrer discordando, sempre vou discordar dessa religião, mas é direito de eles existirem. Eu vou continuar sendo cristão; isso não vai modificar. Então, eu me lembro da Ministra Damares, há algum tempo passado, numa reunião que teve conosco, ela disse o seguinte: "Eu não vou aceitar - ela dizendo - que nenhum centro de umbanda ou quimbanda no Rio de Janeiro seja perseguido". Ela disse: "Eu mesma vou defender, se for o caso". É o direito de cada um existir, trabalhar, defender aquilo em que crê. |
| R | Então, Senador, precisamos garantir - eu estou com 71 anos - democracia, liberdade e que a Constituição seja cumprida para a geração do porvir, para que o Estado de direito seja preservado. Eu conheço bem a Venezuela, trabalhei lá, fui exportador para a Venezuela. Vi o mais belo e talvez o mais rico país da América Latina, com potencialidade, porque a potencialidade da Venezuela não se resume apenas a petróleo, é muito maior. Têm uma das maiores riquezas do mundo, que é o fósforo, que sequer é explorado, porque o petróleo é tão fácil. Enquanto nós vamos 7 mil metros abaixo da lâmina d'água, eles tiram com um balde lá, então, é um negócio completo também. Mas esse país, conseguiram destruí-lo por falta de democracia e de respeito ao ser humano. Quando não se respeitam as leis, quando se não se respeita a livre iniciativa, quando não se respeita o empresariado, o empreendedor, vai ser desgraça, vai ser desgraça. Olha, Senador Girão e Dr. Bruno, se a pessoa quer fazer qualquer besteira com a sua vida pessoal, que o faça, mas nós não temos direito de prejudicar a nação do futuro; nós não temos o direito de prejudicar o Brasil do futuro. Nós temos que procurar construir um Brasil melhor. É isso que nós esperamos. Se querem censurar os nossos celulares, vão violar o art. 220, mas vão censurar também o art. 1º da Constituição, que são as garantias dos direitos individuais, que diz: "construir uma sociedade livre"; parágrafo primeiro, o senhor sabe melhor do que eu, construir uma sociedade livre! Nós juramos isso, por isso nós vivemos, por isso nós lutamos e por isso nós morremos. Construir uma sociedade livre é tudo de que o Brasil precisa, é tudo de que o Brasil precisa. Vamos, meu caro Girão, parabéns. E pedir ao nosso Judiciário que seja menos político, menos ativista, mais patriota e verdadeiros guardiões da Constituição - verdadeiros guardiões. Isto é o que nós queremos, guardiões! Não emendadores ou remendadores da Constituição, mas que guardemos o que o constituinte fez em 1988. É isto que nós esperamos: um Judiciário extremamente zelador, cumpridor, que cumpra e que faça cumprir. É isso que esperamos. Sem perseguir ninguém, sem oprimir ninguém, mais dando segurança jurídica a todos nós. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito obrigado, muitíssimo obrigado, Senador Guaraci Silveira, sempre muito atuante aqui no Senado e um grande defensor do Brasil, de causas nobres como a que o senhor tem muita dedicação, que é a luta contra as drogas, que devasta famílias, e eu sou um admirador do seu trabalho. O senhor falou... Antes de passar a palavra para o Dr. Bruno, o Senador Lasier está pedindo a palavra diretamente do Rio Grande do Sul. E, se me permite, Ministro, eu vou passar a palavra para o Dr. Lasier. |
| R | Mas só vou fazer uma colocação sobre o que colocou o Senador Guaracy, aquela rasgada na Constituição que houve na época do impeachment da Dilma. Na época, se eu não me engano, foi o Ministro Lewandowski que veio ao Senado conduzir tudo, que presidiu a sessão. E olhem as coisas, por ironia do destino - a sociedade ainda não se atentou para isso -, na próxima sexta-feira, hoje é terça, vai ter mais uma reunião da Comissão de Impeachment, uma Comissão que está analisando o processo de impeachment aqui para refazer a Lei do Impeachment no Brasil. Quem é que está conduzindo isso? O Ministro Lewandowski. O nosso Presidente Rodrigo Pacheco montou essa Comissão, e o Ministro Lewandowski é que está à frente disso. Precisamos estar atentos, porque até agora esta Casa não deu nenhum passo em direção a sequer analisar pedidos de impeachment de alguns Ministros do Supremo, que, na opinião de alguns Parlamentares e juristas, têm extrapolado a sua prerrogativa, a sua competência, com desvios de conduta. Até hoje, o Senado não procedeu ao que é uma demanda inclusive da sociedade que a gente percebe nas ruas, nas feiras, nos mercados. São mais de 52 pedidos de impeachment engavetados, fora a CPI da Lava Toga. Mas um dia isso vai acontecer naturalmente. É o processo de despertar da sociedade. Como bem colocou o Senador Styvenson Valentim, muito passa pela escolha dos novos representantes que tenham pautas firmes com relação à reforma do Judiciário, aos mandatos para os Ministros do Supremo também, à disciplina da questão dos pedidos de vista, de decisões monocráticas. Isso precisa de um regramento, o Senado realmente nesse aspecto está omisso, e a sociedade tem cobrado. Mas eu gosto de ver o lado bom. Esta Comissão está cumprindo o seu papel. Um debate desse aqui esclarece, faz... E eu acredito muito na capacidade de reflexão do ser humano, Ministro. Eu acredito muito na capacidade de reflexão do ser humano. Então, como o senhor bem colocou, esperamos que os Ministros do Supremo Tribunal Federal, mesmo diante dessa inércia do Senado nesse aspecto de equilibrar as forças, de barrar certos abusos, percebam, junto com a sociedade, junto com os seus familiares, junto com outros juristas, que algo está errado em nosso país. Essa questão dos empreendedores é algo... Você ter um empreendedor que tem milhões de seguidores, 5 milhões de seguidores, que impacta na vida cada postagem, cada coisa, ser censurado, calado, por nada? Não é por nada, não é? Na verdade, tem um viés político aí. Eu até discordo de algumas postagens dele, porque eu penso diferente de algumas pautas do Luciano Hang, por exemplo, mas ele tem o direito de se manifestar, de mostrar o seu pensamento, a sua ideologia. Ou isso já está proibido no Brasil e a gente não sabe? Estamos já vivendo uma ditadura da toga? |
| R | Senador Lasier Martins, muito obrigado pela sua participação aqui, nesta Comissão. O senhor tem a palavra. O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - RS. Para discursar. Por videoconferência.) - Muito bom dia, meu prezado Senador Eduardo Girão! Eu é que me sinto honrado. Eu sinto uma afinidade de pensamento muito grande com você, meu prezado Girão, desde que começamos a nos encontrar, logo que você foi eleito, em 2018, naquelas memoráveis reuniões, das quais eu sinto uma saudade imensa, naquela nossa luta junto ao Muda Senado, Muda Brasil, um movimento que, lamentavelmente, foi esvaziado pouco a pouco, mas que teve um papel preponderante até para nos conhecermos e sabermos quem é quem dentro do Senado Federal. Eu o cumprimento, meu prezado Girão, pela iniciativa de mais esta audiência pública. Você tem sido persistente e incansável nessa luta. Eu gostaria muito de estar aí, junto, não fosse a necessidade de percorrer o Rio Grande do Sul em busca de votos, porque agora sou candidato a Deputado Federal. Nesta audiência pública, que venho acompanhando - ouvi o depoimento brilhante do Dr. Valmir Pontes Filho, agora o do Senador Guaracy e as suas próprias manifestações -, estou percebendo que é uma audiência da Comissão de Transparência que prima pelo sentido de despertar a opinião pública e de desmistificar os enganos que nos vêm sendo impostos por ministros do Supremo Tribunal Federal. O meu intuito de entrar aqui, Girão, é para enfatizar, realçar bem por que estamos procurando insistentemente demonstrar à opinião pública e aos brasileiros de modo geral o quanto vem sendo enxovalhada a nossa Constituição Federal. Muito tem sido dito, mas eu agora quero apresentar os artigos que vêm sendo atropelados principalmente pelo Ministro Alexandre de Moraes. O art. 5º da Constituição, inciso IV, diz: "É livre a manifestação do pensamento [...]". Ora, isso foi atingido duramente há poucos dias, dentro daquele famigerado inquérito criado em abril, em março, aliás, de 2019, por iniciativa do então Ministro Toffoli, o "amigo do amigo de meu pai", conforme foi definido num depoimento em um processo da Lava Jato. Já se lá vão três anos e meio com este famigerado Inquérito 4.781. Lembrem-se do que vem sendo cometido de infração exatamente por esse inquérito. Art. 5º, repito, inciso IV: "É livre a manifestação do pensamento [...]". Outro é o art. 53, por demais repisado nos últimos tempos: "Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer [é dito "quaisquer", e isso envolve tudo] de suas opiniões, palavras e votos". Art. 129 da Constituição: "São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, ação pública na forma da lei; [...]". Isso vem sendo também atropelado. O próprio inquérito do Supremo Tribunal Federal vem sendo atacado nesse princípio. |
| R | Art. 220 da Constituição: "É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística", isto é, é vedada toda e qualquer censura ideológica. Enfim, são muitos os dispositivos que vêm sendo atacados, e há muito tempo. E, por fim, meu prezado Senador Girão, a quem reiteradamente cumprimento pela perseverança... Atualmente não há, no Senado Federal, um Senador mais perseverante, mais insistente, mais responsável por seu mandato em defesa da Constituição - a qual ele jurou e nós juramos - do que o Senador cearense Eduardo Girão. Eu queria ainda relembrar esse inquérito - esse inquérito, não -, esse projeto à margem do trabalho legislativo e pelo qual deveríamos responder com exclusividade; uma comissão nomeada para mudar, para alterar a lei do impeachment, exatamente presidida pelo Ministro Lewandowski, o primeiro a pisotear na Constituição quando presidiu a sessão de cassação da Presidente Dilma. Pois ele, e em livre escolha, com nomes devidamente calculados, estão tentando reformar a lei do impeachment, que jamais na história, desde que surgiu a Lei 1.079, jamais foi usada para processar ministros do Supremo, por mais arbítrios que tenham cometido. Então, integrantes dessa comissão são escolhidos a dedo e exatamente estão lá fazendo um trabalho que muito possivelmente - vamos conferir lá adiante - vai proteger mais uma vez os ministros do Supremo Tribunal Federal. Isto é, é aquele velho e popular provérbio de que é a raposa cuidando do galinheiro. É impossível que se dê importância, e eu espero ainda estar no Senado para verberar contra essa coisa que vai sair do trabalho dessa comissão. Era a intervenção que eu queria fazer, congratulando-me com os seus convidados, congratulando-me com o seu pronunciamento e - por que não? - com todos os telespectadores que estão nos acompanhando, porque é uma audiência desta Comissão de esclarecimento, de elucidação sobre a triste realidade que estamos vivendo no Brasil, de atropelamento da nossa Lei Maior. Muito obrigado, Girão, e siga o seu belo trabalho. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado pelas referências ao meu trabalho, meu querido Lasier. Você é suspeito para falar, porque nós somos amigos, e eu que, na verdade, me inspiro muito no seu trabalho. Desde a legislatura passada que V. Exa. tem insistido, tem mostrado essa escalada autoritária que a gente tem visto no Brasil, a partir da nossa Corte Suprema, que, eu digo e repito, é importantíssima para a nossa democracia. Eu passo imediatamente a palavra, já pedindo desculpa, ao Ministro Bruno Bianco Leal, Advogado-Geral da União, que fez aí um malabarismo, mas um malabarismo saudável, para estar aqui conosco, prestigiando esta reunião. Muito obrigado pela sua presença. O senhor tem 15 minutos para a exposição. O SR. BRUNO BIANCO LEAL (Para expor.) - Senador Girão, eu que agradeço. Agradeço o convite. Eu, a bem da verdade, tomo esse convite quase que como uma convocação e vou explicar por quê. Porque, quando uma Comissão de Transparência, Governança e Fiscalização do Senado Federal convoca um servidor público, ele tem, na minha ótica, uma missão institucional a cumprir. Então, sempre que chamado aqui, eu virei com grande prazer e entregarei, com toda certeza absoluta, os mais sinceros pensamentos e as minhas mais sinceras conclusões. |
| R | Na prática, de fato, é um tema complexo. A minha missão de Advogado-Geral da União me coloca numa posição até mais complexa do que eventualmente a de um profissional liberal ou a de um próprio Senador da República, já que eu tenho todas as restrições impostas pelo cargo, mas, por óbvio, todas essas restrições se apequenam quando estamos diante de um interesse público. E o comparecimento ao Senado Federal é, de fato, algo inerente à missão de um servidor público. Eu prestei concurso público há quase 15 anos, e a minha missão é única: é servir ao público. E eu não tenho como servir ao público de maneira diferente a não ser vindo ao Senado, por uma convocação de V. Exa., para que eu possa expor um pouco as minhas convicções, seja qual caso for. Isso é, de fato, repito, uma missão que eu tenho para com a sociedade, e assim o faço de coração aberto. Faço, sim, entre aspas, "todos os malabarismos possíveis" para estar aqui e sempre estarei, Senador, e por isso eu lhe agradeço. Eu o parabenizo pelos convidados, todos eles, inclusive aqueles ausentes, e eu gostaria que todos tivessem vindo. Compreendo as ausências obviamente, mas sempre é importante debater, sempre é importante que possamos ouvir e ser ouvidos. Acho que, de fato, o senhor usou uma palavra muito pertinente: o senhor acredita na boa-fé das pessoas, nessa possibilidade de mudança de posicionamentos. Não tenho dúvidas de que uma audiência pública como esta proporciona o debate, nos permite ponderações e faz com que todas as pessoas que nos escutam e nós também que escutamos os outros possamos ponderar as nossas atitudes. Eu espero que as minhas palavras breves possam repercutir de uma maneira absolutamente positiva e de boa-fé. Então, essa é minha primeira ressalva. O segundo ponto, Senador, que eu faço questão de deixar muito claro: eu não venho aqui criticar o Supremo Tribunal Federal e nem mesmo qualquer um dos seus ministros. Eu venho aqui, enquanto Advogado-Geral da União, repito, cumprir uma missão e explicar à sociedade qual o nosso ponto de vista, o ponto de vista da Advocacia-Geral da União, o ponto de vista institucional aqui representada por mim, e o ponto de vista pessoal, enquanto advogado e jurista, muito benfeito também já pelo Prof. Valmir. Então, o primeiro ponto fundamental, Senador, que eu acho que eu tenho que tratar nesse inquérito é que a Advocacia-Geral da União atua e atuou especialmente em duas ações, duas arguições de descumprimento de preceito fundamental, as conhecidas ADPFs, que tratam desse inquérito. E nós também pontualmente atuamos representando autoridades que são investigadas nesse inquérito. Agora, nas primeiras atuações... Repito, nas ADPFs o nosso conhecimento é amplo: uma delas, diga-se de passagem, proposta pelo próprio Presidente da República - então, de fato, a atuação é direta da Advocacia-Geral da União -; e a outra, uma ADPF proposta pelo Partido Rede. E aqui eu vou explicar eventuais mudanças de posicionamentos que vieram com ambas as ADPFs. |
| R | Enquanto atuamos como representantes de autoridades... E aqui eu deixo muito claro que a Advocacia-Geral da União judicialmente representa os três Poderes. A AGU é um órgão de Estado com acento constitucional, uma função essencial à Justiça, e ela atua para os três Poderes. Portanto, na nossa atuação como representação de autoridades, nós representamos o Executivo e seus servidores, o Legislativo e seus membros, e também o Judiciário. Então, para quaisquer dos servidores, inclusive magistrados, Senadores, Deputados e também membros do Executivo que queiram a representação da AGU, nós o faremos. E, nesse caso específico, nós representamos o Presidente da República e alguns servidores que estão investigados nesses inquéritos. No entanto, meu querido Senador Presidente desta Comissão, em grande parte dos casos o primeiro ponto que eu gostaria de deixar claro com total isenção é que nem mesmo a Advocacia-Geral da União tem acesso aos autos, em que pese termos feitos já reiterados pedidos nesse sentido. E eu vou repetir: isso não é crítica. Não tome isso como crítica a um ministro ou ao Supremo. Isso é uma constatação fática - e aqui é mais grave ainda, no meu ponto de vista, porque acho, ou melhor, tenho convicção de que, para que possamos exercer devidamente o contraditório e o direito à mais ampla defesa, que são pilares no Estado democrático de direito, é fundamental que tenhamos acesso aos autos. Esse é o primeiro ponto fundamental, Senador, que eu tenho uma missão institucional de trazer ao senhor. E trago, repito - e a expressão é esta -, de coração aberto, sem receios, sem qualquer tipo de medo, o que é uma palavra da moda, já que eu sou servidor público e preciso trazer à sociedade essas realidades. Como tudo isso começa? - e me parece, eu preciso ser muito justo, que o começo disso é muito correto do ponto de vista jurídico, na minha ótica jurídica. Começa com o art. 43 do Regimento do Supremo Tribunal Federal, já submetido ao crivo do Supremo Tribunal Federal porque ele é anterior à Constituição Federal de 1988; ele é recepcionado. Ele diz o seguinte - o nosso querido Prof. Pontes também explicitou -: quando estivermos diante de uma afronta a alguma pessoa que tenha jurisdição perante o Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, o Presidente do Supremo Tribunal Federal abre o inquérito. E aí, sim, abriu-se o inquérito. E, no momento, quando se abre o inquérito, se interpreta a expressão "no âmbito do prédio" como algo mais elastecido, e assim esse inquérito começa e há designação de um relator. Quando se designa esse relator, já há uma análise por parte do Supremo sobre a constitucionalidade do inquérito. Nesse momento, a Advocacia-Geral da União - e aqui eu separo a figura da Advocacia-Geral da União da figura do Advogado-Geral da União -, numa função de Estado, pois é um órgão de Estado, uma função essencial à República, representa judicial e extrajudicialmente os Poderes, mas o Advogado-Geral da União assessora o Executivo e também faz esse crivo de constitucionalidade, fala pela constitucionalidade das normas. E aí o Advogado-Geral da União à época falou: "Não. De fato, esse artigo foi recepcionado e nesse caso concreto ele é correto, pode-se entender como correto". E a Advocacia-Geral da União, pelo Advogado-Geral, reconhece a constitucionalidade do inquérito. |
| R | E por que esse ponto é crucial, Senador? E eu espero que toda a população nos entenda. Porque esse artigo é anterior à Constituição Federal e não trata, não condiz, na sua ampla acepção, com o princípio acusatório. Ele é um artigo que tem reminiscências ou, como eu quero dizer, ele é oriundo de um sistema que não tinha as garantias do nosso sistema acusatório atual. É por isso que nós precisamos fazer um crivo. Ele está ou não de acordo com a Constituição Federal? Por que isso? E aí o ponto fundamental, Senador, que muito me preocupa: é porque ele confunde as figuras do investigador, do acusador e do julgador. Esse artigo, por si só - e eu repito que ele teve sua constitucionalidade reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal com ressalvas -, deve ser aplicado de maneira absolutamente excepcional, porque ele confunde as figuras do acusador, do investigador e do julgador. É bom que se repita isso. E, a partir do momento em que nós temos a utilização desse artigo de maneira ampla e irrestrita, ainda que ele tenha sido reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal à época, a extrapolação da sua utilização me parece inconstitucional. E falo isso como estudioso do direito e vou dizer por quê. É porque, por princípio, o Judiciário deve ser inerte; por princípio, o titular da ação penal não pode ser ninguém além do órgão acusador, que é o Ministério Público. E, quando nós extrapolamos os limites no inquérito e começamos a incutir nesse inquérito outras questões e outros fatos para além daqueles excepcionalmente previstos no Regimento e também excepcionalmente reconhecidos pelo Supremo Tribunal Federal, nós temos um grande problema: nós violamos frontalmente o princípio acusatório. E aqui um dado fundamental: tudo isso que eu estou dizendo já foi dito na arguição de descumprimento de preceito fundamental ajuizado pela Advocacia-Geral da União. É por isso que eu faço questão de dizer isso aqui, na Casa do Povo, na Casa dos Estados, no Senado Federal. Eu tenho essa missão institucional. Eu não venho aqui fazer política, eu não venho aqui instigar ninguém contra o Supremo Tribunal Federal, mas eu faço questão de trazer o ponto fundamental da Advocacia-Geral da União. E o que acontece? Temos o Inquérito 4.781, instaurado nessas bases, e, uma vez instaurado esse inquérito, com pedido de arquivamento pelo titular da ação penal, esse pedido na verdade não é um pedido - nós temos aqui um Promotor de Justiça, um Procurador. Quando o Ministério Público o faz, ele promove o arquivamento. E é absolutamente em casos excepcionais que o Supremo Tribunal Federal, o Judiciário não o reconhece, mas, quando o membro do Ministério Público ou o órgão do Ministério Público diz que está promovido o arquivamento, tem que estar promovido o arquivamento. E, nesse caso, não foi arquivado. |
| R | E se instaurou outro inquérito - mais um ponto fundamental que eu preciso trazer aqui. No caso concreto, duas investigações se instauraram em paralelo. Era o caso de uma live do Senhor Presidente da República. O órgão ministerial, o Ministério Público, a Procuradoria-Geral da República pede a promoção do arquivamento ou promove o arquivamento, dizendo o seguinte: esse caso já está sendo investigado pelo Ministério Público. No caso concreto, o relator não promove o arquivamento e dá um habeas corpus de ofício. E é o primeiro caso que eu conheço de habeas corpus de ofício contra os interesses do paciente. Então, é um habeas corpus de ofício contrário ao titular ou àquele que é o paciente do habeas corpus. A investigação do Ministério Público é arquivada, e abre-se um novo inquérito para se continuar com a investigação. E esse novo inquérito também é com base no art. 43 da Regimento Interno, que, eu repito, teria que ser absolutamente excepcional. Para além desses casos, nós temos também outro caso, que já é público - e eu repito: não falo em tom de crítica, mas em tom informativo -, em que há uma suposta acusação de vazamento de dados sigilosos. O Ministério Público promove o arquivamento, dizendo que não houve qualquer tipo de vazamento sigiloso; o delegado do caso, o delegado que fornece o inquérito, no caso o inquérito policial, o faz dizendo que o inquérito não era sigiloso. O inquérito é fornecido a um Parlamentar para utilização em audiências públicas e em Comissões com caráter amplamente público; o inquérito é utilizado em uma Comissão da Câmara dos Deputados. A discussão sobre o caráter ou não sigiloso do inquérito é submetida à Corregedoria da Polícia Federal, e a corregedoria diz que o inquérito não é sigiloso. Eu repito: há uma promoção de arquivamento, ou melhor, duas promoções de arquivamento por parte do Procurador-Geral da República, e, não obstante essas promoções, o inquérito não é arquivado. E o que acontece com isso? É mais um princípio que, para mim, fica ultrajado, com todo respeito, no caso concreto: temos prolongamento de investigações por períodos absolutamente não razoáveis. Cito aqui que o "inquérito mãe", entre aspas - o Dr. Pontes bem lembrou que o Ministro Marco Aurélio o chamou de "inquérito do fim do mundo" -, já se perdura há mais de três anos! Então, são pessoas que são submetidas a investigações por períodos posteriores a três anos. Lembro que o Código de Processo Penal e todo o nosso arcabouço processual penal colocam um período ali para conclusão de inquérito em torno de 30 dias, justamente para que as pessoas possam ter segurança jurídica. Ninguém pode ficar com espada na sua cabeça por período tão longo. Então, é mais uma constatação interessante. |
| R | Eu sigo aqui, querido Senador, parabenizando-o mais uma vez por esta iniciativa, dizendo que o primeiro ponto que me parece que nós temos que discutir - e o Senado Federal é o órgão, em conjunto com a Câmara, mais especificamente o Senado, para essa discussão, e mais do que toda a sociedade - é o cotejo entre esse Regimento Interno, no art. 43, que foi recepcionado, sim, pela Constituição Federal, e como ele deve ser interpretado à luz do nosso sistema acusatório. E como eu vejo, Senador e demais Senadores aqui presentes, o sistema acusatório? O sistema acusatório, para mim que sou advogado há alguns anos, é o pilar do nosso Estado democrático de direito, meu querido jurista Valmir Pontes. E por que ele é o pilar do Estado democrático de direito? Porque é ele que diz que não pode ter confusão entre acusador e julgador; é ele que diz que a Justiça, o Judiciário tem que ser inerte, tem que ser provocado; é ele que segrega essas funções de acusar, investigar e julgar, para que não haja contaminação. Entendeu-se, quando se concebe, se aplica no Brasil como pilar, repito, do sistema democrático o sistema acusatório, que, quando o julgador colhe provas, ele pode se tornar parcial. E a parcialidade é algo absolutamente nefasto para o julgador e para o julgado, porque quem colhe provas acaba tendo uma postura proativa. Essa proatividade é muito bem-vista no Senado Federal, no Legislativo lato sensu, no Executivo, também nos advogados públicos e privados, mas ela não é boa no Judiciário. Ela, na prática - e eu vou usar uma palavra forte, eu entendo assim, e é por isso que eu o faço -, é proibida ao juiz, porque o juiz tem que ser imparcial, o juiz tem que ser inerte. E é por isso que o sistema... E aqui eu trago os freios e contrapesos, que também contrabalanceiam as relações entre Executivo, Legislativo e Judiciário, justamente para que um Poder não faça intervenção no outro. O sistema de freios e contrapesos, conhecido como checks and balances, porque oriundo da expressão em inglês, é justamente a maneira pela qual os três Poderes se contrabalanceiam para que não haja sobreposição de um em relação ao outro e para que nós possamos viver em harmonia. E aí que nós temos, Senador, o que chamamos de funções típicas e funções atípicas. Por óbvio, o Senado Federal tem a missão de legislar, junto com a Câmara, e essa é uma função típica, mas obviamente que a Mesa, por exemplo, do Senado exerce funções administrativas e aí, sim, executa, só que isso é uma função atípica. Quando sua função atípica extrapola os limites da sua função típica, temos aqui algo para ponderar, temos algo para pensar. |
| R | E é por isso que esta audiência pública, Senador, nos coloca a ponderar. E o objetivo por que aqui eu estou - e fiz questão de estar -, repito, por convocação, é porque esta Casa é a Casa do controle, é a Casa da transparência, é a Casa que nos faz mais sérios em nossas missões, pois nós temos que prestar contas ao Senado Federal e à Câmara. E eu o faço dizendo o seguinte: vamos ponderar, vamos discutir. Nós estamos cumprindo o princípio acusatório? Eu, meu querido Senador, que não faço nada de errado, às vezes, tenho medo - e tenho medo pelas minhas filhas, tenho medo pelos meus familiares -, porque eu preciso cumprir e fazer cumprir os pilares do Estado democrático de direito. A missão que nós exercemos não é simples. Quando buscamos e quando nos aventuramos em uma missão pública - isto o senhor muito bem lembrou, Senador -, nós abdicamos de algumas coisas boas da vida. E a primeira delas é: nossa vida vira transparente, nós temos que prestar contas do que fazemos. E a minha prestação de contas é justamente no seguinte sentido: eu vou trabalhar todos os dias para que sejam cumpridos os pilares do Estado democrático direito. E é isso que eu faço aqui. E eu pondero: será que esses inquéritos, não obstante o conteúdo deles, de muitos dos quais eu, como cidadão, discordo... Por exemplo, quanto à questão que envolveu os empresários, eu discordo do conteúdo. Mesmo não sendo advogado dos empresários, não tendo procuração deles, eu digo: eu discordo do conteúdo. Pode ser que ocorram ou que apareçam outras coisas, mas, pelo que eu vi e vi pela imprensa, eu discordo do conteúdo, porque, na prática, conversa privada tem que ser conversa privada. E medidas drásticas, como busca e apreensão, como restrições financeiras e restrições em redes sociais, são destinadas para atos graves. E ali, repito, pelo que vi na imprensa, pelo que tive contato, eu não vi nada que justificasse condutas como essas. E vou além: também tenho ressalvas quanto à própria origem desses inquéritos, seja por questão de foro por prerrogativa de função, já que esses empresários não têm foro, seja também pela própria origem do inquérito, o que eu já citei, que ultraja muitos princípios em relação aos quais nós, brasileiros livres e que vivemos em um Estado democrático de direito garantido pela harmonia dos três Poderes, não queremos ver ultrajados. E vou citá-los. O primeiro deles: sistema acusatório, o que eu já disse. A segregação de funções deve ser sagrada. Muito me assusta quando nós temos a mistura de figuras dentro de um inquérito. E, repito, neste caso, ele é tão peculiar, Senador, tão peculiar... Porque a própria Polícia Federal, quando nesse inquérito atua, não atua, pelo menos na minha ótica, como Polícia Federal. E as ADPFs, quando julgadas pelo Supremo Tribunal Federal, são expressas ao reconhecerem: o ministro relator, no caso concreto, atua como presidente do inquérito. Não é isso? Ele preside o inquérito. Então, o ministro relator, quando diante desse inquérito, preside o inquérito e não a autoridade policial. |
| R | Por isso, muito me preocupa o presidente do inquérito - e isso não sai da minha cabeça, isso está expresso na decisão pública do Supremo Tribunal Federal nas ADPFs, uma delas ajuizada pela Rede Sustentabilidade, outra ajuizada pelo Presidente da República, o Supremo foi expresso ao dizer: "O ministro relator atua como presidente do inquérito" -, se ele atua como presidente do inquérito, ele colhe provas, ele investiga, para mim, não poderia julgar; se ele investiga, para mim, ele não poderia acusar. No caso concreto, na minha ótica de jurista, esses casos deveriam, sim, ainda que possam ser investigados ou presididos, seja um inquérito ou qualquer tipo de Pet, que é como a gente chama petição, no Supremo Tribunal Federal, presidida por um ministro relator, deveria ser objeto de acusação pelo Ministério Público, deveria ser objeto de julgamento por outro ministro ou eventualmente pelo Plenário. Aí, sim, nós conseguiríamos contemplar, na sua expressa acepção, o princípio acusatório. E, nesse ponto também, Senador, trago outro princípio, que é o princípio da impessoalidade. É outro ponto que trago à ponderação. No caso concreto, como o ministro ou os ministros que presidem esse inquérito - e eu falo sempre em tese, não estou usando nenhum inquérito como base, mas estou falando, em tese, no art. 43 -, quando há a indicação por um ministro presidente de outro ministro para ser o presidente do inquérito, isso deveria ser objeto, para mim, de distribuição dentro do Supremo Tribunal Federal; primeiro ponto. E, obviamente, esse ministro relator não será, na prática, o investigador. Então, ele precisa contar com a mão, a gente chama de longa manus, de algum órgão de investigação. Isso é o correto. Quem o faz nesses casos, no mais das vezes, é a Polícia Federal. Nesse caso, eu pondero: é a Polícia Federal que está fazendo isso ou é o próprio ministro que está presidindo o inquérito? É o ministro que está presidindo o inquérito. Por isso que, às vezes, nos deparamos com a própria indicação por parte do ministro relator do delegado a presidir o inquérito. Isso é um ponto também para o qual eu gostaria de chamar a atenção para que nós ponderássemos nesta Casa se isso está ou não de acordo com o princípio da impessoalidade, também princípio que nos inspira, que nos conduz dentro da Constituição Federal e, mais do que tudo, dentro do sistema que orienta o serviço público e os servidores públicos. Outro ponto importante: o art. 43 é expresso ao dizer que quem abre o inquérito única e exclusivamente é o Presidente do Supremo Tribunal Federal. E nesses casos, não obstante os peticionamentos - e aqui há alguns da Advocacia-Geral da União, outros de advogados e muitos outros também do Ministério Público -, o próprio relator tem aberto inquéritos. E nesses inquéritos, que a gente chama de inquéritos filhos, gravitam os outros inquéritos, muitos deles com investigados que não têm foro por prerrogativa e outros deles com casos já com pedidos de promoção de arquivamento por parte do Ministério Público. |
| R | Portanto, também ponderaria se isso não fere o princípio da inércia, por exemplo, que eu já disse, do Supremo Tribunal, de todos os magistrados, do próprio Judiciário, e se isso não fere também a titularidade da ação penal e, claro, do Ministério Público - no caso concreto, do Ministério Público Federal. Então, no caso, nós temos o quê? Uma pretensa vítima que, de fato, o ministro, que é o presidente do inquérito, pode ou não ser pretensa vítima, porque os atos são contra ministros, os atos que se alegam são contra ministros ou contra o próprio Supremo Tribunal Federal. Repito: atos contra ministros e atos contra o Supremo Tribunal Federal devem, sim, ser investigados. Eu não critico o teor, eu não critico o fato, repito, não critico o Supremo Tribunal Federal, mas eu critico a maneira, eu critico a questão processual, com todo o respeito e isenção e, acho, com toda a liberdade que tenho de falar, como servidor público - mais do que liberdade, me parece até que eu tenho o dever. Um ponto fundamental, Senador - me perdoe por estar me alongando -, um ponto interessante que eu também gostaria de citar, e nós já citamos isso em algumas oportunidades, é o seguinte: será que o prolongamento desses inquéritos por três anos e essas investigações, primeiro, não causam uma insegurança aos investigados, que teriam o direito de se defender? Porque, na prática, sequer têm acesso aos autos. E, mais do que tudo, será que não se está buscando - isso é uma ponderação - o que nós chamamos de fishing expedition, que é uma busca por investigações sucessivas até se encontrar algo que possa ser objeto de uma investigação? Isso me parece um pouco, também, no mínimo, ponderável. E é basicamente o quê? Ficar buscando ligações. Ontem acompanhei pela mídia alguns - a gente chama de aranha - gráficos que acabam ligando uma pessoa a outra e vão se buscando interceptações telefônicas, vão se buscando conversas de WhatsApp, quebra de sigilo telemático, e não se encontra nada. Daí se buscam outras pessoas, e vai se buscando até que se encontre algo. Obviamente, eu quero que algo seja encontrado se errado for, eu quero que se investigue ao máximo qualquer tipo de coisa contrária à lei. Eu não falo que eu sou o maior, porque eu acho pretensão falar que sou o maior, e não sou o maior, mas eu me entendo um grande defensor da lei, e a minha fala aqui é clara, simples e objetiva, traz aos senhores e às senhoras uma interpretação da lei. Eu, como Advogado-Geral da União, tenho uma missão, também sou um dos intérpretes da lei, e aqui eu o faço. E o que eu busco com isso? Eu busco, com isso, trazer à ponderação desta Casa pontos que, na minha ótica, não me parecem a boa ou a melhor interpretação da legislação, especialmente no que toca à origem de inquéritos que deveriam ser excepcionais e excepcionalíssimos - e o foram no início, quando instaurados pelo Ministro Dias Toffoli, eu repito, me parecem corretos e, dentro das suas atribuições, dentro das ressalvas -, mas, a posteriori, se extrapola a missão, ou se extrapolam os limites da sua instauração. |
| R | Chegamos a um ponto em que nós temos, na minha ótica aqui, repito, como advogado: impossibilidades de defesa; uma afronta, ou melhor, uma dificuldade enorme ao duplo grau, porque não há a quem se recorrer, basta uma resignação com a decisão; um alijamento total do órgão ministerial, já que não é ele que promove a ação penal, já que não é ele que tem a titularidade para promover o arquivamento e já que, muitas vezes, ele promove o arquivamento expressamente por não existir justa causa e, não obstante essa promoção, abre-se outro inquérito e se prorrogam as investigações. Então, eu me coloco no lugar das pessoas que são investigadas, e me parece que não é algo, pelo menos na minha concepção, humilde. E, repito, com todo o respeito aos atores envolvidos nisso e com o mais amplo respeito ao Supremo Tribunal Federal, não é algo que me pareça condizente com o nosso Estado democrático de direito atual, não me parece. É por isso que nós temos que ponderar, temos que chamar as pessoas para a discussão, uma discussão leal, uma discussão franca, uma discussão republicana. E eu tenho certeza de que todos aqueles que, eventualmente, se acharem citados na fala de V. Exa. ou de qualquer um que aqui participou ou participará entenderá que nós estamos fazendo isso com o mais amplo espírito republicano. Eu estarei amanhã no Supremo Tribunal Federal fazendo minhas sustentações orais, atuando, enquanto Advogado-Geral da União, buscando a aplicação da lei, defendendo as leis, a constitucionalidade das normas, defendendo políticas públicas, defendendo, eventualmente, as próprias prerrogativas dos ministros, mas não posso me furtar de tecer críticas. E que essas críticas sejam entendidas única e simplesmente como críticas dentro de uma discussão republicana, dentro da Casa da República, sem ofensas pessoais, é isso que nós queremos. E, nesse ponto, que todos aqueles que eventualmente se entenderem atores do caso concreto discutam conosco, conversem conosco, porque nós, Senador, o senhor, eu, todos os Senadores que nos acompanham - eu não posso falar aqui pelo Presidente de República, mas eu posso até, eventualmente, me arvorar e dizer que não tenho dúvidas de que ele também -, os Presidentes das duas Casas do Congresso Nacional e os ministros do Supremo Tribunal Federal, todos estão abertos à discussão. Vamos ponderar, vamos repensar esses fatos e recolocar todas essas ações, para mim, dentro de uma ponderação constitucional. Eu tenho certeza absoluta de que nós vamos ter eco em todos os atores, Senador, é por isso que eu o parabenizo. |
| R | E encerro com outro ponto que me preocupa, que, por exemplo, envolve aqui alguns Senadores. Eu quero ser muito franco e não é crítica também a nenhum Senador: não me parece também, dentro desse cenário do nosso princípio republicano e do nosso princípio acusatório, do sistema acusatório, que se peticione diretamente ao relator nesses casos específicos, buscando investigações em casos narrados pela imprensa ou em casos discutidos dentro do Senado Federal. E, não obstante essas ponderações, reiteradamente nós temos visto atores políticos que não concordam com o rumo das discussões políticas nestas Casas buscando que o Supremo Tribunal Federal revisite a política pública. Eu acho que a política pública deve ser feita dentro do Executivo e dentro do Legislativo. Por exemplo, sobre fake news, eu sou contra a difusão de notícias falsas, terminantemente contra, qualquer que seja o autor da divulgação, pequeno, médio ou grande, num grupo ou numa grande rede de TV. Agora, preciso reconhecer que o combate a fake news não me parece que seja algo hoje criminal, não obstante eu pense que deva ser, mas daí cabe ao Congresso Nacional essa discussão. Por quê? Porque não há crime sem lei anterior que o defina, temos que ter fato típico, antijurídico e punível. Então, repito, é um absurdo a difusão de fake news, tem graves consequências à sociedade; agora, vamos tratar desse combate na seara correta. "Bruno, você está dizendo que o Supremo é a seara correta?" Não. Eu acho que o Supremo é a seara correta, eu acho que o TSE é a seara correta e louvo as iniciativas de combate a fake news. Agora, não podemos fechar os olhos e dizer que, sem a intervenção do Congresso Nacional, fake news se tornaram crimes. Podem e devem ser punidas, mas também temos que ponderar. E, com essa ponderação também, eu encerro no seguinte sentido, Senador: agradecendo a minha participação, louvando essa convocação a mim feita, louvando o seu trabalho. Eu acho que sem críticas pessoais ao Supremo Tribunal Federal, eu acho que sem promoção de conflitos entre os Poderes, eu acho que enaltecendo o pacto federativo e a separação de Poderes nós temos muitos meios para discutir essa questão. Eu estou e continuarei atuando como advogado e aqui eu o faço como advogado. O advogado - e aqui temos muitos estudantes - não pode se resignar quando vir o seu cliente com o direito contrariado e o advogado não pode deixar de lutar pelo direito que acha correto. |
| R | Então, agradeço a minha oportunidade de fala. Vou ser repetitivo. Mas quero repetir: eu trouxe aos senhores e às senhoras fatos concretos, trouxe aos senhores e às senhoras interpretações da lei, nada além disso. Não quero que isso seja interpretado como crítica nem ao Supremo, nem a determinado ministro - eu não o faria -, mas, sim, críticas a alguns inquéritos que, na minha ótica, estão afrontando princípios constitucionais caríssimos aos brasileiros e ao nosso Estado democrático de direito. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Ministro Bruno Bianco Leal, Advogado-Geral da União. A sua postura republicana aqui ficou evidente, bem como o seu equilíbrio, a sua sensatez. É disto que a gente precisa, de disposição para o diálogo, para o diálogo franco, sem críticas pessoais, sem ofensas, mas buscando o bem do Brasil, buscando entender o que é que está na lei, eventuais excessos. Todo mundo pode errar, não é? Eu quero aproveitar e cumprimentar também o Dr. Bruno Luiz Dantas de Araújo Rosa. Não sei se gostaria de fazer algum complemento. Está tudo o.k.? Muito obrigado pela sua presença. Nós vamos continuar aqui fazendo o nosso trabalho, com inúmeras limitações e imperfeições. Hoje, eu aprendi muito aqui. Eu não sou da área do direito, mas a palestra do Dr. Valmir Pontes Filho, a do Dr. Ministro Bruno Bianco Leal e a que a gente vai ouvir agora, daqui a pouco, a do Dr. Ives Gandra Martins, são referências também muito grandes. Então, o espírito é esse. A gente gostaria muito que, da mesma forma que o Executivo já veio, toda vez que foi chamado, a esta Comissão... Na questão da segurança e transparência nas eleições, veio aqui o Ministro General Paulo Sérgio Nogueira. Também sobre o ativismo judicial, nós tivemos a presença aqui de Parlamentares, de juristas. Toda vez que o Executivo é convidado, ele tem vindo para o diálogo; isso é um fato. Infelizmente, nós tivemos ausências dos ministros do Supremo, o que acaba prejudicando essa busca de entendimento, não é? O interesse, eu acho, de todos nós é pelo Brasil. Este é o interesse nosso: o da paz no Brasil, o de que a nossa Carta Magna seja respeitada, o de que haja harmonia, o de que haja independência. Todos são capazes, todos são importantes em cada local em que estão, todos os atores, como bem se colocou aqui. Agora, eu confesso que fiquei estarrecido - eu não sabia disto - porque nem mesmo a Advocacia-Geral da União teve acesso aos autos. Isso, para mim, foi uma surpresa. O Senador está pedindo a palavra. O Senador... Desculpa, o Dr. Bruno quer fazer uma... O SR. BRUNO BIANCO LEAL - Eu vou ter que pedir licença. Eu não queria ser indelicado. (Intervenção fora do microfone.) O SR. BRUNO BIANCO LEAL - Pois não, pois não! O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - O Dr. Guaracy está com a palavra, o Senador Guaracy. |
| R | O SR. GUARACY SILVEIRA (AVANTE - TO. Para interpelar.) - Sua explicação foi realmente com base científica, jurídica, mas eu gostaria de um esclarecimento. Nós temos, na Constituição, as cláusulas que nós dizemos pétreas - embora nada é pétreo, porque é feito por humanos que podem mudar -, e, entre as cláusulas pétreas lá do art. 60, vemos a separação dos Poderes - e nós temos visto um Poder muito se imiscuindo no outro - e também nós vemos os direitos e garantias individuais, lá no inciso IV. Entre esses direitos individuais, a Constituição diz: "Ninguém será privado dos direitos por motivo de crença religiosa, por convicção filosófica, política". Diz também: "É livre a expressão [inciso IX] da atividade intelectual, científica e de comunicação". E depois diz: "É inviolável o sigilo da correspondência, das comunicações telegráficas [que nem existem mais, praticamente], de dados das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses da forma a ser estabelecida por lei". Dr. Bruno, há muito eu o admiro, ouvindo-o pela televisão, nas suas interferências. Infelizmente, não quero ser dramático, mas parece que o tribunal da Santa Inquisição, de Gregório IX, estabelecida lá em 1233, parece que está restabelecido, infelizmente, no nosso país. E, quando nós vemos todas essas violações lá do art. 60, conjuminado aqui com o art. 5º das garantias individuais, nós não estamos sendo violados por essas interferências de um Poder no outro e nas garantias individuais? Eu sei que V. Exa. tem que sair, mas, se possível... O SR. BRUNO BIANCO LEAL (Para expor.) - Senador, se fosse questão de responder... Agradeço a sua pergunta, agradeço pelo seu trabalho. Gostei de ouvir uma palavra aí, "conjuminado", que isso mostra que, de fato, o senhor é do interior de São Paulo, eu também sou - sou de Marília... O SR. GUARACY SILVEIRA (AVANTE - TO) - Ah... Somos caipiras. (Risos.) O SR. BRUNO BIANCO LEAL - Isso aproxima, não é? O SR. GUARACY SILVEIRA (AVANTE - TO) - Exatamente. O SR. BRUNO BIANCO LEAL - Meu pai dizia isso. Eu fiquei feliz de ouvi-lo. Senador, como é que eu acho... Eu vou separar em dois pontos a resposta à sua pergunta. Nós temos que separar o direito que a gente chama de mérito com a questão processual e procedimental. Nós temos, sim, direitos, a Constituição nos prevê, e nós vamos lutar - eu, pessoalmente, vou lutar todos os dias - para que esses direitos sejam garantidos, e o senhor bem citou uma passagem maravilhosa, em relação à qual eu assino embaixo, mas veja: ainda que tenhamos essas garantias, e vamos pressupor que haja excessos, e os excessos possam ocorrer e ocorrem todos os dias, mas eu quero e eu luto para que, ainda que haja excessos, eles sejam investigados, denunciados e julgados pelo procedimento correto... O SR. GUARACY SILVEIRA (AVANTE - TO. Fora do microfone.) - Pelo processo legal. O SR. BRUNO BIANCO LEAL - Pelo devido processo legal. Esse é o ponto que inspira a vida de um advogado, e eu acho que tem que inspirar a vida de um cidadão. Isso tinha que ser ensinado nas escolas. Porque é o seguinte: pode haver excesso? Pode. Pode ser que alguém esteja extrapolando os limites em todos esses casos que eu citei? Pode. Pode ser que, no âmbito dos inquéritos que eu não conheço - repito, não tenho acesso -, haja crime? Pode ser que haja crime, e, se houver, que seja investigado, denunciado e punido. Agora, o que não pode é se investigar, julgar e punir de uma maneira que não garanta o devido processo legal, que não dê à pessoa o direito de defesa, que não dê à pessoa a possibilidade de um recurso, que não dê à pessoa a possibilidade do contraditório. E que promova, dentro desse sistema, todos os meios que a Constituição também garante e também coloca como princípios, essa sua ampla defesa. Esse é o problema. |
| R | Para mim o grande problema não é o mérito, em que pese eu já tenha dito sobre fake news e também sobre os empresários, o qual, em relação ao que eu vi, não faz sentido. E aqui é uma opinião pessoal. Medidas drásticas como as que vimos têm que ter proporcionalidade, razoabilidade, outro princípio constitucional. Mas mais grave ainda é quando elas são tomadas sem o respaldo do devido processo legal, com um problema de origem, num inquérito instaurado de ofício, sem distribuição, após promoção de inquérito pelo Ministério Público, sem que se ouça o Ministério Público - e aqui também estou dizendo o que eu ouvi da imprensa, o que eu li na imprensa. Então, é isso que eu defendo. O senhor está correto. Claro que nós vamos defender sempre os nossos direitos, o mérito, e eu vou sempre lutar por ter liberdade. Eu estou exercendo aqui minha liberdade. Muitos vão dizer: "Bruno, você não devia ter ido lá. Por que que você foi lá expor a sua opinião?". Porque para mim seria muito mais cômodo ficar quieto. Sou Advogado-Geral da União, falo nos autos e, desde que eu entrei, há um ano e um mês praticamente, nunca falei em público sobre isso, estou vindo falar em consideração ao Senador Girão e ao Senado Federal, porque para mim, repito, é uma convocação, mas eu nunca falei em público sobre isso. Eu falo nos autos, porque o advogado, o juiz, o promotor e o procurador têm que falar nos autos. Agora, a partir do momento em que eu sou questionado e estou vendo acontecer no Brasil questões ou procedimentos com os quais eu não concordo, eu tenho o dever de falar. Como é que eu olho depois para as minhas filhas, uma de quatro e uma de nove anos, dizendo: olhem, o Senador me chamou para falar, me questionou e eu não fui? Eu estou vendo tudo que eu não concordo, mas eu não vou falar. Eu tenho que vir falar, o Senado Federal me pediu. E eu virei. Agora, defendo o mérito, os princípios e, mais do que tudo, os procedimentos. Ainda que eventualmente façamos algo errado, e somos seres humanos, e vamos errar, que a nós seja garantido o devido processo legal, senão estaremos vivendo um processo que chamamos de processo kafkiano, que vem de Franz Kafka, que é quando as figuras inquisitivas são marcadas. E nós já passamos dessa fase. Hoje nós vivemos o processo acusatório, e não o processo inquisitório. E, se eventualmente eu errar ou alguém quiser me investigar, que me investigue com o devido processo legal, que eu tenha as garantias, porque é isso que a Constituição prevê. Esse é o ponto para mim. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Ministro Bruno Bianco Leal. Muito obrigado pela sua consideração a esta Casa, o seu respeito a vir aqui. Eu tenho duas filhas também pequenas, mais ou menos da idade da sua, e eu penso todos os dias nisto de cumprir o nosso dever, de fazer o que estiver ao nosso alcance. Eu acho que aqui faz surgir reflexões positivas para o Brasil. Então... O SR. BRUNO BIANCO LEAL - E, Senador, tem mais um ponto que eu preciso trazer, que tem a ver com a sua atuação. Para além de tudo isso, eu já viria à Casa pela minha deferência ao Congresso Nacional, mas, mais do que tudo, pela sua isenção. Eu tenho visto que o senhor está conduzindo isso com isenção. Então, o senhor conduz em prol do país e não se vale disso para fins eleitorais, e isso para mim é o ponto fundamental de toda essa discussão. Parabéns! O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito obrigado. O senhor tem outros compromissos, e a gente compreende que o senhor se ausente, mas eu acho que ficou muito evidente aqui uma passagem, Senador Guaracy, que diz o seguinte... (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Um grande abraço, muito obrigado, viu? Tudo de bom. Obrigado, viu, Bruno? ... uma passagem que diz o seguinte, Prof. Valmir - já passando a palavra em instantes aqui para o Dr. Ives Gandra Martins -: "O que me incomoda não é o grito dos violentos: é o silêncio dos bons". Sabe quem foi que falou isso? Foi Martin Luther King, pastor, grande humanista. E o que a gente vê hoje é muito silêncio sobre esse assunto, não é? O SR. GUARACY SILVEIRA (AVANTE - TO. Fora do microfone.) - Assassinado em Memphis. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Assassinado em Memphis, exatamente. E o que a gente vê hoje é um silêncio muito grande sobre esse assunto. É um assunto quase que um túmulo. Você não pode falar, não é? Então isso é muito preocupante, e o papel... O Senado está abrindo este espaço aqui nesta Comissão, que eu acho muito saudável. Uma expressão que o Ministro usou aqui, Dr. Ives, que me tocou profundamente é que ele falou que é a espada... Eu já imaginei a espada do símbolo que é ali em cima da cabeça durante três anos. Durante três anos nesse inquérito aqui, que completou três anos, é um estado permanente de investigação; ou seja, é correto isso? Está certo isso? Vem o questionamento assim do fundo da alma e do coração mesmo, não é? Coloque-se no lugar: se você se colocar no outro lugar de quem não tem o poder, de quem não está com a caneta na mão, de quem não tem um cargo vitalício, que ninguém pode recorrer porque é a última instância, como dizia o Ruy Barbosa. O grande patrono do Plenário do Senado dizia o seguinte: a pior ditadura é a ditadura da toga, porque a ela não tem a quem recorrer. Então, se você se colocar no lugar do mais fraco - aí vem uma questão do senso de justiça -, do que não está nesse pedestal, nessa posição, vamos dizer assim, melhor dizendo, como é que a pessoa se sente com a espada na cabeça o tempo inteiro sendo julgado por suas posições políticas? Gente, se é a favor do Governo, paciência, que seja - paciência, que seja! Por exemplo, eu vou voltar aqui para o caso brutal - desculpe-me, Senador Guaracy - desses empreendedores. Eu concordo com o Ministro que falou há pouco: se erraram, têm que pagar. Se tem alguma coisa... Mas, pelo que a gente viu na imprensa, foi uma matéria de um portal que autorizou isso tudo, que fez essa decisão. E aí você pegar um cidadão que tem, não vou nem dizer a imagem dele de empreendedor, de gerador de emprego, de riqueza no Brasil, que a gente tinha era que estimular, como outras culturas fazem, como a dos Estados Unidos... No Brasil, empresário, empreendedor é malvisto, não é? Imagine a mentalidade, como a gente precisa reverter; a gente tinha que dar prêmios. E aí a gente faz um negócio desse e tira a rede social. É a voz. É como se colocasse uma mordaça, que ele não pudesse expressar. E ele lá nas páginas dele - eu acompanhava - questionava, comparava o governo atual com o governo anterior de uma forma saudável, colocando os pontos, colocando os fatos, os dados, os números. Será que foi isso? Será que, na verdade, esse é o pano de fundo para incomodar tudo? Se fosse o outro lado, seria o mesmo ou a coisa está pendendo para o mesmo lado apenas, só uma balança desequilibrada? Isso é correto? Essa é a pergunta. |
| R | Senador Guaracy Silveira, você queria fazer uma palavra. O Dr. Ives Gandra já está ali aguardando. O SR. GUARACY SILVEIRA (AVANTE - TO) - O.k. Vai ser um grande prazer nós ouvirmos a sabedoria do Dr. Ives Gandra. Mas me preocupa. Nós vemos que, quando se quer calar quem nós não concordamos, se institui um tribunal do Santo Ofício, como aconteceu com a inquisição de 1233, que durou 600 anos, porque muitas vezes as pessoas gostam dessa força de mandar os outros ficarem quietos. Agora o que eu questiono, e o Dr. Ives vai poder nos responder muito bem: por exemplo, mandam que eu fique quieto com o meu celular, com os senhores, com as senhoras, com os presentes; e fake news das grandes redes de comunicação têm corrido à solta. Para isso não tem patrulhamento. Ou é só para pessoa física, e a jurídica não? São dois pesos e duas medidas. Olha, sempre coisas desse tipo terminam em coisas muito ruins. O Tribunal do Santo Ofício, vamos lembrar bem, terminou com o Dezoito de Brumário. São coisas muitas vezes trágicas na história. Então, gostaria de pensarmos nisso daí para que realmente o nosso direito de liberdade, de fraternidade, de igualdade, de Deus, pátria e família nós pudéssemos garantir a todos nós brasileiros, e que a lei e a ordem deem estabilidade a todos nós. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito obrigado, Senador Guaracy. O Dr. Valmir Pontes Filho pede um minutinho para uma citação, antes de eu passar, imediatamente, a palavra ao Dr. Ives Gandra Martins, diretamente de São Paulo. Eu queria avisar ao auditório também que, se alguém quiser fazer algum tipo de pergunta, algum comentário, nós vamos abrir a palavra. Aqui é uma Casa democrática, e a gente está aqui aprendendo uns com os outros. Dr. Valmir Pontes Filho. O SR. VALMIR PONTES (Para expor.) - Senador Girão, assim como V. Exa., eu estou ansioso por ouvir o professor, o eminente mestre Ives Gandra, mas será um segundo só. |
| R | Eu queria dizer ao Senador Guaracy Silveira, que infelizmente não está aqui agora, que fiquei muito feliz, com a alma lavada, com as suas palavras. Quero dizer que, como ele, eu sou cristão também, cristão espírita. E ele se referiu à umbanda. Num recente escrito modesto que fiz, eu lembrei, em notas de rodapé, que o espiritismo é uma doutrina cristã, moral, filosófica e científica, que se funda basicamente na caridade e no amor ao próximo. A umbanda é uma religião monoteísta e afro-brasileira surgida em 1908, que se baseia em três conceitos fundamentais: luz, caridade e amor. A palavra umbanda pertence ao vocabulário quimbundo de Angola e quer dizer arte de curar. Eu, como o Senador Guaracy, tenho também 71 anos, já estou dobrando o Cabo da Boa Esperança, mas meu espírito continua jovial. Agora, ele tem uma coisa que eu não tenho. Um amigo me disse: "Valmir, pense mil vezes antes de dizer alguma coisa, porque hoje está perigoso". Eu tenho 71 anos, como o Senador, mas não tenho uma coisa que ele tem, graças a Deus, que é a imunidade parlamentar. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Dr. Valmir Pontes Filho. Eu passo agora a palavra para o nosso querido amigo Dr. Ives Gandra Martins, que está um pouco triste comigo. Desde domingo, ele está meio assim, sem querer falar comigo, porque o São Paulo, um dos amores da vida dele - a família em primeiro lugar sempre e Deus -, mas é são paulino desde o início, é referência... O Fortaleza foi lá à casa dele... Eu peço desculpas aí, Doutor! Nem eu esperava isso - confesso! O SR. IVES GANDRA MARTINS (Para expor. Por videoconferência.) - Em primeiro lugar, Senador Girão, quero cumprimentá-lo por mais esta audiência pública a fim de podermos realmente refletir um pouco sobre este momento do Poder Judiciário no Brasil. Quero cumprimentar a todos que aí estão. Gostei imensamente das perguntas do Prof. Valmir e das observações do Senador Styvenson, de quem eu sou coestaduano por adoção do Estado do Rio Grande do Norte pela Assembleia Legislativa. Lembro que, em relação ao Ceará, meu sogro era cearense, portanto, todos os meus filhos são netos de cearenses, de Massapê, perto de Sobral. E, Senador Guaracy, lembro que eu tenho sido um defensor permanente do Governo do Amazonas, sempre com vitórias em relação à Zona Franca de Manaus contra, muitas vezes, visões incorretas, sem perceberem que a Zona Franca de Manaus foi aquilo que levou gente, desenvolvimento industrial e econômico para a Amazônia. Com o que disseram tanto o Sr. Valmir quanto o Ministro Advogado-Geral da União, o Dr. Bruno, eu concordo em gênero, número e classe. E gostaria de apresentar apenas alguns adminículos a tudo que eles disseram, para não repetir as suas observações. |
| R | Em primeiro lugar, a observação do que eu queria saber: qual o dispositivo real de se falar em fake news quando agora estamos preparando uma legislação para fake news? Fake news são boatos, aquilo que sempre houve na legislação. Basta dizer que, na observação daquilo que apresentou o Ministro Alexandre de Moraes, o que ele alegou em relação aos empresários foi que se aplicaria o art. 359 do Código Penal, que declara: "Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais". Então, há dois aspectos neste artigo: tentar, com emprego de violência - é evidente que uma conversa através de WhatsApp não representa nenhum emprego de violência - ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício de poderes constitucionais. Em rigor, nós não encontramos na conversa privada entre empresários a não ser uma observação. Como disse o Senador Girão, num estádio de futebol, nós, muitas vezes, ouvíamos a torcida gritar "juiz ladrão", apesar de sabermos que o juiz não é ladrão. Muitas vezes, pretenderam homenagear a mãe de juízes de futebol; e todos sabemos que aquelas mães são honestas. Vale dizer que, num momento de raiva, de desconfiança, de descontentamento com determinadas posições, as expressões não representam efetivamente aquilo que se pretende, até porque não houve nenhum gesto, nenhum ato que pudesse representar grave perigo ao Estado democrático de direito. E aqui eu quero fazer uma segunda observação. Quando eu vejo fake news por parte - como dizia o Senador Guaracy, respondendo ao Senador Guaracy -, fake news em relação à imprensa, que tem colocado que o Presidente seria golpista ou que há movimentos de golpes em São Paulo e no Brasil, eu diria o seguinte: em nenhum lugar do mundo há possibilidades, em governos democráticos, de golpes sem Forças Armadas. Eu não posso imaginar os oito empresários comprando tanques, aviões que entrassem pelas fronteiras do Brasil para poder aí realmente colocar uma grave ameaça à democracia. Por outro lado, as Forças Armadas brasileiras, eu conheço. Eu sou Professor emérito da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército há 33 anos, emérito há 29, mas Professor da escola há 33 anos. Quase todos os generais do Brasil tiveram que tolerar as minhas aulas de Direito Constitucional, porque eles foram naqueles cursos em que eles, desde 1989... Após a Constituição, criou-se, nas três forças, um curso para preparar aqueles que iriam para o generalato para ficarem aprendendo problemas, estudando problemas, se aprofundando em problemas próprios de um país, de economia, de direito, de política, brasileiros e internacionais, para que, quando fossem generais, soubessem, inclusive, dialogar com os Poderes. E em todas as aulas que dei, em todos os momentos em que estive em contato, nos debates, que tínhamos no fim do curso com todos aqueles coronéis, quase todos foram generais... Eu diria que mais de 90% dos generais do Brasil nos últimos 33 anos tiveram que ouvir as minhas aulas, toleraram as minhas aulas, e todos eles demonstraram sempre ser escravos da Constituição, obedientes à Constituição. Sem Forças Armadas não há golpe, e, se não há golpe, como é que se pode falar em atentado com oito empresários que conversavam pondo em grave risco o Estado democrático? Mais do que isso, fizemos, pelo Conselho Superior de Direito da Fecomércio, uma declaração, uma carta em contraposição à carta que foi colocada pela Universidade de São Paulo, da qual fui aluno, onde fiz um curso de pós-graduação na época em que não havia mestrados, especializações, embora depois tenha feito minha carreira toda por ter sido o primeiro doutor da Universidade Mackenzie, onde também sou emérito. Tudo o que nós tínhamos na carta é que estavam montando uma declaração contra o golpe. Golpe que não existe, não havia possibilidade, porque, em nenhum momento, as Forças Armadas aceitariam um golpe no país, o que equivale a dizer fake news, porque, indiscutivelmente, sem Forças Armadas não há golpe. Perigo há por aqueles que alegam que vão dar golpe, movimento golpista, movimento golpista, sabendo que as Forças Armadas, em nenhum momento - eu digo como professor emérito, como tendo lecionado para mais de 90% de todos os generais brasileiros durante todo esse período -, que não há risco nenhum, zero sobre zero, multiplicado por zero e dividido por zero. Isso, sim, é fake news. |
| R | Por isso, a nossa declaração do Conselho Superior de Direito da Fecomércio foi no sentido que não há possibilidade de golpe, que a democracia tem que se defender, e a maior forma de defender a democracia é combater a corrupção. Esta, sim, contamina a democracia no que há de mais profundo, que é o respeito ao dinheiro público, ao dinheiro do cidadão que é levado através de impostos para lá. Então, se nós analisarmos a base do inquérito do Ministro Alexandre de Moraes, deveria ser feito às avessas. Quem está pondo são aqueles que dizem que o Governo quer ser golpista. Quem está querendo são aqueles que dizem que qualquer movimento que vá às ruas é um movimento golpista, como se o povo não pudesse se manifestar contra as preferências que a mídia possa ter para esse ou para aquele candidato, a preferência que tem sido demonstrada. Eu me sinto muito constrangido em falar isso sobre o Supremo Tribunal Federal, porque tenho livros escritos com certos Ministros, sou amigo deles, respeito-os como juristas, mas não tenho reconhecido os grandes juristas que são, nas últimas decisões de natureza política. Eu entendo certas interpretações inadmissíveis: essa do CP, 359-L, de empresários que conversaram, como se estivessem pondo em risco, em grave risco a democracia. E a argumentação é a de que eles têm dinheiro, têm dinheiro para comprar tanques, para comprar aviões, para fazer forças paramilitares maiores do que as Forças Armadas, que impediriam qualquer golpe. |
| R | Isso é delirar, isso é estar fora da realidade, com todo o respeito e admiração que tenho - e todos sabem que é muita - pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal e principalmente pelo Alexandre de Moraes, com quem participei de bancas. Muitas vezes, nós brincávamos sobre o ativismo judicial, na época em que ele não era Ministro, em bancas de doutoramento na USP; e livros que escrevemos juntos, quando fui membro da Comissão de Reforma Política, que eu presidi na Ordem dos Advogados de São Paulo. Ministro que tem na publicação do livro de comentários à Constituição um verdadeiro best-seller. E eu brincava com ele: o senhor é o Jorge Amado do direito constitucional, seus comentários de direito constitucional são superiores à venda dos livros de Jorge Amado. Mas eu não posso aceitar essa interpretação, esse inquérito de fake news. Há um dado que eu gostaria também de colocar aos senhores, para também não me prolongar muito, já que concordei com todos eles. Diz a Constituição no art. 129, inciso I, que são funções constitucionais do Ministério Público promover privativamente ação pública, na forma da lei. A expressão privativa ou exclusiva na Constituição, quando se dá esta competência privativa ou exclusiva a uma determinada instituição ou autoridade, tem sido discutida, se representaria a mesma coisa, sendo que Fernanda Menezes, por exemplo, e eu mesmo defendemos que tem o mesmo sentido. Mas muitos distinguem que a exclusiva não admitiria delegação, mas a privativa admitiria delegação. Usa muito o Constituinte a expressão "compete privativamente a ação penal", iniciar a ação penal, ao Ministério Público. O art. 43 do Regimento Interno, escrito pelo próprio Supremo Tribunal Federal, não pelo Legislativo, declara que, quando a violência à lei penal é feita dentro do próprio tribunal, é função do tribunal, do Presidente indicar, como disse muito bem o Prof. Valmir. Mas eu esperava primeiro que, quando é fora, ele poderá ou encaminhar ao Ministério Público ou fazer o próprio a investigação. |
| R | Entendo que não pode. Eu entendo que não pode, porque a Constituição diz que é privativa do Ministério Público. Se a privativa fosse delegável, caberia ao Ministério Público delegar, e não se autoautorizar, como um delegado sem ter recebido a delegação, o Supremo Tribunal Federal para fazer. Equivale a dizer, em outras palavras, que eu entendo, apesar de o Supremo Tribunal dizer que é constitucional, que esse inciso do art. 43 do Regimento Interno é inconstitucional, porque essa função da ação penal, de que a investigação só pode desembocar numa ação penal, é típica do Ministério Público. Se o Ministério Público manda arquivar, como a Procuradora-Geral da República Raquel Dodge mandou, não caberia ao tribunal fazer outra coisa, porque, na prática, tudo isso não é feito dentro das dependências do Supremo Tribunal Federal, mas fora das dependências do Supremo Tribunal Federal. Por fim, para não tomar muito mais tempo, já que há ainda outros a se manifestarem, a observação que me parece a mais importante: nós temos uma Constituição em que todo o poder vem do povo. O art. 1º é claríssimo: os dois poderes que vêm do povo são o Poder Legislativo e o Poder Executivo, aqueles que o povo escolhe, que 150 milhões de brasileiros escolhem. O Poder Judiciário vem em terceiro lugar entre os poderes porque a função dele é fazer a lei ser respeitada, uma lei de um regime democrático, de um Estado democrático de direito, de um Estado em que, depois de um regime de exceção, fez-se com que o cidadão fosse o grande responsável, o grande detentor da democracia brasileira, aquele que efetivamente define os destinos do país através dos seus representantes, cabendo ao Poder Judiciário garantir os representantes. Agora, quando nós vemos, dentro do processo que se faz perante a Justiça, o devido processo legal, o inciso LIV e vemos o inciso LV, o que encontramos lá? Que se garante a ampla defesa administrativa e judicial. Esse adjetivo "ampla", em "ampla defesa", num regime democrático de direito tem uma densidade monumental. Ampla defesa é aquela defesa em que o Constituinte pretendeu, ao dar esse adjetivo, não apenas a defesa, mas a ampla defesa, para garantir a cidadania, a segurança jurídica, em que não poderia haver abusos à dignidade, em que caberia ao Poder Judiciário garantir a ampla defesa dos cidadãos. |
| R | Quando nós vemos, em inquéritos de fake news, oito empresários que geram emprego, que geram desenvolvimento, que têm sido úteis ao país pelo desenvolvimento que têm permitido, com os empregos criados e com aquilo que se produz, por mera troca de informações, ter tudo proibido e sem ampla defesa, porque só agora foi disponibilizada a decisão, parece-me que isso violenta, fragmenta, macula de forma inaceitável a nossa Constituição. Nós temos que levar em consideração que, se o Constituinte colocou, no campo do Poder Judiciário, de um lado o Poder Judiciário, um poder neutro e imparcial, um poder que deve deixar os acusadores que representam a sociedade e os defensores que representam a advocacia, porque o direito de defesa é um direito fundamental das democracias, que não existe nas ditaduras, nós não podemos ter o Poder Judiciário dizendo o que é a democracia no lugar do povo, o que é a democracia no lugar do Senado e da Câmara dos Deputados, o que é a democracia em relação àqueles que representam 150 milhões de eleitores, dizendo que democracia é aquilo que nós entendemos que seja democracia e que, nas funções essenciais de administração da Justiça, que são o Ministério Público e a advocacia, façam com que inquéritos que deveriam ser feitos exclusivamente pelos delegados de polícia, de acordo com o art. 144, §4º, da Constituição, e ações penais que deveriam ser privativas do Ministério Público passem, por um regimento interno por eles escrito, por uma declaração de que poderão aquelas infrações à lei fora das dependências ou se decidirem por Ministros ou encaminhar ao Ministério Público, às autoridades competentes. Parece, com todo o respeito e admiração que tenho, e reitero mais uma vez, até pela amizade, pelos livros escritos, pelas bancas de doutoramento que tivemos juntos, pelas inúmeras conferências que demos juntos, com quase todos os Ministros da Suprema Corte, parece que no Estado democrático de direito em que nós vivemos isso é inaceitável. Como a única Casa capaz de examinar a conduta da Suprema Corte é o Senado Federal, eu gostaria que realmente isso fosse examinado pelos Srs. Senadores, não para condená-los, mas que eles, que são convidados permanentemente, venham para esclarecer ao tribunal em que podem ser julgados, que é o Senado Federal, por que esse comportamento. Eu estou convencido, sendo os elementos que eles são, competentes e bons juristas, de que nós poderíamos voltar um dia a ter um Supremo do Moreira Alves, do Sydney Sanches, do Ilmar Galvão, do Cordeiro Guerra, dos Galottis, aqueles que fizeram do Supremo uma das instituições mais respeitadas desta República. Era, meu caro Senador Girão, o que eu gostaria de trazer. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, meu querido irmão, Dr. Ives Gandra Martins, uma referência nossa, do nosso país, de sabedoria, não apenas de conhecimento, mas de temperança, de muita temperança. O senhor engrandeceu muito aqui, como os outros convidados também, mas essa sua fala traz muita luz e ajudou muito esta sessão do Senado Federal. |
| R | Muito obrigado. Desculpe a demora, porque a gente acabou demorando um pouco para entrar. Eu já vou pedir licença para chamar imediatamente o ex-Procurador Deltan Dallagnol. Ele já está conectado aqui, diretamente do Paraná. E o senhor está com a palavra, Dr. Deltan. Perdão também pela demora. O SR. DELTAN MARTINAZZO DALLAGNOL (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde, Senador Eduardo Girão. Boa tarde, autoridades, Dr. Ives Gandra Martins, pessoa por quem eu tenho profunda admiração, não só pelo seu conhecimento jurídico, mas por sua postura pessoal, como ser humano, como cristão, e pelo cuidado que tem de criticar, de modo firme, as decisões, mas ao mesmo tempo defender as instituições. E essa é a linha de postura que, guiado por líderes, por pessoas que nos inspiram, como o Dr. Ives Gandra, é a mesma linha que eu adoto aqui. E, Senador Eduardo Girão, gostaria de agradecer esta oportunidade para trazer algumas considerações sobre uma situação que me assusta muito, que me preocupa muito. E eu vou ser bastante objetivo. Eu vou trazer, aqui nesta minha breve fala, 11 breves preocupações. Nesse inquérito dessa mordaça dos empresários, o Supremo Tribunal Federal ultrapassou a linha da Constituição e atacou as forças ligadas ao Presidente da República, num procedimento ilegal, sem provas, em relação a opiniões que não são criminosas, segundo a nossa lei, e determinando medidas ilegais. É um caso de abuso de poder assustador. Eu vou explicar isso em 11 pontos, mas é importante deixar muito claro: instituições são absolutamente essenciais para a nossa democracia, e, além disso, toda pessoa, não importa se é Ministro do Supremo ou qualquer outro brasileiro, toda pessoa merece respeito e merece dignidade. Toda mudança, ainda que deva ser feita, na nossa ordem legal, constitucional, deve respeitar e seguir a Constituição. Agora, o respeito à Constituição vale também para o Supremo Tribunal Federal, que não é supremo; ele está debaixo da Constituição, como os demais Poderes. Esse inquérito que foi instaurado, esse inquérito da mordaça dos empresários não poderia ser instaurado pelo Supremo Tribunal Federal, e sim pela primeira instância, porque os empresários não têm foro privilegiado. Esse é um caso de incompetência manifesta do Supremo Tribunal Federal. Está lá no art. 102 da Constituição, para quem quiser ver. O Supremo Tribunal Federal não pode julgar, não tem poder para investigar e julgar esse tipo de caso. É um caso claro de incompetência manifesta. Esse é o primeiro ponto. O segundo ponto: essa investigação foi instaurada por dependência, por correlação com o inquérito original. O inquérito original, que é o inquérito das fake news, foi instaurado pelo próprio Supremo Tribunal Federal, violando o sistema acusatório. A investigação deveria ser instaurada, se fosse o caso, pela polícia ou pelo Ministério Público, e jamais pelo julgador. Agora eu vou para o terceiro ponto. O inquérito foi distribuído para o Ministro Alexandre de Moraes sem um sorteio prévio e sem que tenha sido demonstrada a conexão com os casos anteriores de responsabilidade dele. Aliás, os casos anteriores também não foram submetidos a uma distribuição prévia. O que a gente tem aí é uma distribuição direcionada. É aquilo que se chama de tribunal de exceção. |
| R | Tem uma violação clara ao princípio do juiz natural, que é o princípio de que alguém deve ser julgado por um juiz competente, que é escolhido aleatoriamente ou que já é responsável por um caso prévio com o qual o novo caso se relaciona. O quarto ponto. Medidas de investigação - como buscas, apreensões e bloqueios - só são determinadas depois de ouvido o Ministério Público. E ele não foi ouvido previamente. Isso viola a lei. Viola qual lei? A Lei Complementar nº 75, de 93. Em quinto lugar: o Supremo Tribunal Federal não deu acesso aos autos para os investigados, em violação a uma súmula vinculante, que é a Súmula Vinculante 14, do próprio Supremo Tribunal Federal. Isso viola, também, o art. 5º da Constituição Federal, que o Supremo deve proteger, do qual ele é guardião. E até hoje - fui surpreendido ao ouvir aqui nesta sessão - a Advocacia-Geral da União não tem acesso aos autos. Em sexto lugar. As medidas que foram decretadas - as buscas e os bloqueios - foram decretadas pelo Supremo Tribunal Federal com base em notícias de jornal. Eu nunca vi isso em 18 anos de Ministério Público, nunca vi isso. Quaisquer medidas, como buscas e bloqueios, que envolvam uma constrição da liberdade, uma constrição do patrimônio ou uma invasão na esfera de privacidade da pessoa, precisam de um mínimo de evidências que embasem essas medidas. O que a gente viu é que essas medidas - buscas e bloqueios - foram decretadas pelo Supremo com base em notícia de jornal, sem comprovação mínima dos fatos. A lei de abuso de autoridade prevê como crime a instauração de investigação sem indícios da prática de crimes. Isso está lá no art. 27 da Lei 13.869, de 2019. Não pode acontecer, não pode acontecer para nenhuma autoridade, não pode acontecer para o Supremo Tribunal Federal. De novo, o Supremo Tribunal Federal não é supremo, ele está abaixo da Constituição e não acima. Em sétimo lugar. Não existe ainda qualquer indicação de que aqueles prints das conversas são fidedignos. Também não há qualquer indicação de como eles foram obtidos pelo jornalista. Não está satisfeita a demonstração daquilo que a gente chama, no Processo Penal, de cadeia de custódia da prova. Isso é previsto lá no art. 158, do Código de Processo Penal, art.158-A. Então, na Lava Jato, quando a gente queria fazer uma busca e apreensão em relação a alguém, eu tinha de apresentar provas. Uma conta no exterior, eu tinha de mostrar como é que aquele extrato daquela conta veio para o Brasil, como é que ele chegou aos autos, que ele saiu de um banco na Suíça, foi para uma autoridade da Suíça e, de lá, foi remetido para o Departamento de Cooperação Jurídica e Recuperação de Ativos. De lá, ele veio para o Ministério Público. Eu junto aos autos. E você tem toda a cadeia de custódia dessa prova, toda a corrente que permite a você reconstituir como essa prova chegou aos autos. E você não tem nada disso nesse caso, de novo. É assustador, assustador! Em oitavo lugar. Não existe ainda uma indicação da legalidade dessa prova, de como ela foi obtida. De novo, na Lava Jato, sempre que se queria usar uma prova, você precisava demonstrar a legalidade. Se você junta um extrato bancário...Se eu juntasse um extrato bancário sem uma quebra de sigilo prévia, eu ia ser processado e expulso do Ministério Público, eu ia ser preso. E o que a gente tem ali é a juntada de conversas de telefone sem uma quebra de sigilo judicial, sem a indicação de que a fonte disso é lícita, que é legal. Então, é uma violação básica de direitos fundamentais, sem uma comprovação de origem lícita, de que isso aconteceu de modo regular e legal. Esses prints foram divulgados por um terceiro, que é um veículo jornalístico, e não por um interlocutor das conversas, não por um participante das conversas. |
| R | Isso viola o art. 5º da Constituição. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça já derrubaram casos de corrupção gravíssima por muito menos. E aqui eu concordo, concordo com o nosso mestre Ives Gandra da Silva Martins. Eu concordo com ele quando diz que a corrupção mina a democracia. Tem muita gente agora posando contra a democracia, mas, quando viu aqueles imensos escândalos de corrupção, silenciou. Aquela corrupção mina a democracia ao subverter a própria vontade popular, porque o Brasil pode estar cheio de apartamentos de Geddel Vieira Lima com R$50 milhões em espécie, em malas de viagem e em caixas de papelão, que vão ser derramados nessas eleições para comprar os votos, para comprar Vereadores, para comprar apoio de Prefeitos e para comprar os votos dos eleitores, subvertendo a democracia ou, ainda, produzindo campanhas e programas televisivos de alto alcance que vão manipular a vontade e o voto do eleitor com base no dinheiro da corrupção, com o objetivo de perpetuar o poder daquelas pessoas que praticaram esses esquemas. Várias pesquisas já demonstraram que o número de reais investidos na campanha tem uma correlação com o número de votos recebidos. Então, a corrupção subverte a democracia e o Supremo Tribunal Federal não está julgando os casos da Lava Jato. Não está colocando na cadeia os corruptos. Não está lutando para defender a democracia contra a corrupção dos poderosos. Não tem a mínima efetividade nesse sentido. E agora o que a gente vê é que o Supremo está levando adiante um caso com base numa série de provas, desculpa, com base na ausência de provas e sem cadeia de custódia, com base numa série de ilegalidades, de ausência de provas, de irregularidades, caso instaurado de ofício, quando o próprio Supremo e o Superior Tribunal de Justiça, de novo, derrubaram casos de corrupção por muito menos, por filigranas, por formalidades, por nada perto das assustadoras violações do Direito que estão acontecendo nesse caso. E, se superado tudo isso, se você superar todas as ilegalidades do procedimento, se você superar toda a ausência de prova, ausência de demonstração de legalidade da prova, ausência de cadeia de custódia da prova, ainda que se supere tudo isso, ainda que existissem, então, provas dos fatos, ainda que o procedimento tivesse sido legal, ainda que as provas fossem lícitas e autênticas comprovadamente - o que não é o caso -, ainda assim, os fatos, simplesmente, não são previstos na nossa lei como crime. Esses fatos são opiniões. Não há nem incitação ali. E a lei criminal não pune os atos que são chamados de preparatórios, quando não se iniciou a execução dos crimes. Em décimo lugar, crimes contra o Estado democrático de direito exigem violência ou grave ameaça. Está expresso, está previsto na lei, nos arts. 359-L e 359-M do Código Penal. O crime de incitação que também foi invocado no Supremo Tribunal Federal exige que alguém incite, estimule um crime. Isso está lá no art. 286 do Código Penal. E, quando se examinam as mensagens dos empresários, fica claro que não houve incitação. O que houve ali foi opinião. Houve avaliações, houve análises, mas não houve incitação. Ninguém incitou outros. As pessoas expressaram a sua própria opinião, mas sem incitar, sem dizer: "Faça! "Não faça!, Aja assim. Vamos fazer isso. Vamos fazer aquilo". |
| R | Não tem nada disso! Vão lá, revejam as mensagens. Não existe uma incitação. Em décimo primeiro lugar, eu olhei a decisão, eu olhei a reportagem original e vejam a situação de um dos empresários: ele não trocou nenhuma mensagem, ele só está lá no grupo e ele foi alvo das medidas, incluindo bloqueio de contas e bloqueio de conta do Instagram. É crime estar em um grupo de WhatsApp? Agora é crime você estar em um grupo de WhatsApp? O Dr. Ives Gandra não vai me deixar mentir. Não é crime a conivência no nosso direito. Conivência, você saber de um crime e você não fazer nada não é crime! É crime agora estar em um grupo de WhatsApp? E se ele estivesse, se ele tivesse trocado alguma mensagem no grupo de WhatsApp, essa pessoa pode ter a conta do Instagram bloqueada, a conta bancária bloqueada, quando não tem nenhuma correlação uma coisa com a outra, não tem qualquer indicativo de que estava usando recursos para fins criminosos, não tem qualquer indicativo de que estava usando a sua conta do Instagram para fins criminosos? E, aí, essa pessoa tem a conta bloqueada. Cadê o Estado de direito? Cadê o império da lei? Cadê a democracia? Cadê a Constituição? E cadê os garantistas de ocasião que criticavam a Lava Jato e que, agora, silenciam? Cadê os garantistas de ocasião que, na verdade, estavam movidos ideologicamente para proteger os seus corruptos de estimação e criticavam uma operação que seguiu a lei? E, agora, quando você tem evidentes transgressões à lei, de novo, com respeito às instituições, com respeito aos Ministros, silenciam! Cadê? A conclusão que eu tenho, Senador Girão, a conclusão, ao analisar esse caso, é de que essas medidas decretadas expressaram um exercício de poder, mas não um exercício e não uma expressão do nosso direito. Não é uma expressão da nossa Constituição. A ausência de uma base fática ou jurídica aponta que o objetivo das medidas, na verdade, não é investigar crimes; é, sim, coibir a manifestação política de 7 de Setembro com base em uma representação feita pelo PT e pelo PSOL. E com isso eu não posso concordar nem ninguém que defenda a democracia e o Estado de direito no Brasil. Senador Eduardo Girão, muito obrigado pelo espaço, pelo tempo e que a gente possa caminhar para construir instituições mais fortes, uma democracia mais forte, um Estado de direito para todos, inclusive para o Supremo Tribunal Federal, inclusive para pessoas de qualquer posição político-partidária, que a gente possa caminhar para um Estado de direito em que as pessoas respeitem a lei, em que não exista qualquer tipo de abuso, inclusive nenhum tipo de corrupção política avassaladora, como existe no Brasil, que a gente possa minar essa corrupção política sistêmica e que a gente possa construir, juntos, um país mais justo, mais próspero e melhor. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Olha, quem tem que agradecer, Sr. Deltan Dallagnol, somos nós aqui do Senado Federal por termos uma palestra, uma exposição assertiva como a que o senhor nos fez aqui. Eu, particularmente, sou muito grato, como cidadão, ao senhor e a um grupo de servidores públicos que, acredito, mudaram a história do país com a Operação Lava Jato, que é um símbolo positivo, um símbolo de enfrentamento à corrupção, à impunidade, como jamais visto na história deste país e com repercussão internacional. |
| R | Eu peço até desculpas, porque não falei aqui no início. Ele foi Procurador da República, de 2003 a 2021, coordenou a força-tarefa do Ministério Público Federal na Operação Lava Jato, que investigou crimes de corrupção na Petrobras e em outras estatais. Aí, o que já foi devolvido para o Brasil, pelo último número que eu tinha, já chegou perto de 20 bi, R$20 bilhões de dinheiro do povo brasileiro desviado. Então, é um cidadão jovem - você vê que é jovem - que coloca a sua visão sobre esse inquérito das fake news, que realmente tem deixado os brasileiros de cabelo em pé. Está tudo de cabeça para baixo no Brasil, não é? Assim, é a inversão dos valores e de algumas medidas em relação à nossa Constituição. Eu queria, antes de passar a palavra para o Dr. César, que é o último palestrante - Dr. César Dário Mariano da Silva -, eu queria passar a palavra para o Senador Guaracy, que pediu para fazer uma breve apresentação. O SR. GUARACY SILVEIRA (AVANTE - TO. Pela ordem.) - Senador Girão, nós aqui ouvimos sábios hoje, é a mensagem de V. Exa.: Dr. Valmir, o Dr. Ives, e agora o Deltan, sábios que a todos nos enriquecem e multiplicam o nosso conhecimento. Quanto ao Dr. Ives, falar dele e falar do Deltan é como uma frase que eu uso sempre: é como falar de Pelé e Carlos Alberto na seleção de 70: dispensa comentários. O Dr. Ives poderia estar no livro de Francis Bacon, se fosse atualizado, A Sabedoria dos Antigos. E vejo, no Deltan, nesses dois senhores do Direito, o quanto o Brasil lhes deve. Recebam, em nosso nome, em nome do que representamos no Senado, um agradecimento do Brasil. A esses dois senhores nós devemos muito. A nacionalidade brasileira, o país, a instituição deve muito a esses dois homens. Só a história pode contar e fazer justiça, porque, muitas vezes, no momento da vivência, são injustiçados. Mas eu queria deixar, para encerrar, porque eu tenho um compromisso agora e peço licença para sair, ao Dr. Valmir - a você mesmo... E quero pedir desculpa ao Dr. Sérgio, porque eu tenho um compromisso agora -, ao Dr. Deltan e ao Dr. Ives um versículo bíblico que diz: Mas a sabedoria que vem do alto é, primeiramente, pura, depois, pacífica, moderada, tratável, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade e sem hipocrisia (Tiago 3:17). Com essas palavras eu encerro, agradecendo pela presença de todos e pedindo que Deus abençoe a todos os presentes, pedindo licença para me ausentar porque tenho um outro compromisso agora. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Amém, amém, Senador Guaracy! Muito obrigado pela sua presença, desde o início desta sessão, acompanhando, anotando, participando... |
| R | Nós estamos nos encaminhando para o final e eu cometi um pequeno equívoco aqui. Eu disse que o Dr. César vai falar agora, o Dr. César Dario Mariano da Silva e, depois do Dr. César, quem vai encerrar, quem ficou aí com a missão de encerrar este evento é o Dr. Sérgio Harfouche, que veio do Mato Grosso do Sul especialmente para esta sessão. O SR. WILDEMAR FELIX ASSUNÇÃO E SILVA - Pela ordem, Sr. Presidente. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - O senhor quer a palavra? Pronto. Vou passar depois para o Professor e para quem quiser aqui, de alguma forma, fazer a colaboração. Eu agradeço ao Professor Wildemar Felix. Eu vou passar agora a palavra para o Dr. César Dario Mariano da Silva. Muito obrigado pela sua paciência e por estar aqui conosco participando desta sessão. O senhor tem a palavra. O SR. CÉSAR DARIO MARIANO DA SILVA (Para expor. Por videoconferência.) - Exmo. Sr. Dr. Eduardo Girão, digníssimo Presidente em exercício desta Comissão, na sua pessoa saúdo os demais Senadores presentes. Dr. Ives Gandra Martins, novamente é um prazer participar de um evento com V. Exa., o grande jurista brasileiro da atualidade, na pessoa de quem saúdo os demais participantes, operadores do direito, juristas, professores, senhores funcionários e senhores telespectadores. Esse tema é de suma complexidade. Confesso que o estudo desde que foi instaurado o famigerado inquérito da fake news. Escrevi diversos artigos, dei diversas entrevistas, participei de diversas lives e, desde o seu nascedouro, eu digo que ele é um inquérito natimorto, é um inquérito que já nasceu morto. Ele não deveria, de maneira nenhuma, ter sobrevivido. Ele é morto porque a prova produzida desde o nascedouro é inadmissível processualmente. E por que eu digo isso? Ele foi instaurado de ofício e com distribuição dirigida a determinado ministro. E é o próprio Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal que diz que essas distribuições devem ser feitas da forma correta, da forma prevista no Regimento, que é o sorteio, e não por meio de nomeação. Então, nós já temos um procedimento que viola o próprio princípio do juiz natural, porque nós tivemos um direcionamento da sua distribuição. Segundo vício dele. Ele foi instaurado para apurar fatos incertos. Toda investigação é instaurada para apurar fatos certos. Parte-se dos fatos para as pessoas, nunca das pessoas para os fatos. O que nós temos aqui me parece muito mais com uma auditoria, porque esse inquérito está aberto há três anos e meio, quase quatro anos, e, à medida que esses fatos vão surgindo, a conta-gotas, são colocados dentro desses inquéritos, que acabam dando cria para outros inquéritos. Não é assim que se faz numa investigação, até porque toda investigação tem um tempo razoável para terminar. Ela não pode ficar constantemente em aberto, de forma nenhuma, o que parece, é muito parecido até, com um tribunal de exceção, porque é um inquérito em que as pessoas que estão sendo ali investigadas ou, muitas vezes, até acusadas no processo penal não têm prerrogativa de foro. Foi criada uma espécie de prerrogativa pela qualidade da vítima, porque, até então, as pessoas que estavam sendo ameaçadas - a fake news que era endereçada - eram Ministros do Supremo Tribunal Federal. Então, criou-se um monstrengo jurídico nunca visto dentro do nosso sistema judicial que impôs a investigação no Supremo Tribunal Federal pela qualidade da vítima, ao passo que a prerrogativa de foro é pela qualidade do cargo. São determinadas pessoas que, pela importância das suas funções, devem ser julgadas nos tribunais, e, no caso do Supremo Tribunal Federal, são os Parlamentares federais e outras autoridades, altas autoridades do Governo. O que deveria ter sido feito, e não haveria problema nenhum, era requisitar, o Ministério Público ou a polícia judiciária federal ou estadual, a depender do crime, a instauração dessas investigações, porque é o que diz a Constituição. Quem investiga esse tipo de fato é a polícia judiciária, é o Ministério Público, mas nunca, de maneira nenhuma, uma Suprema Corte, que deveria, sim, estar muito mais preocupada em julgar ações constitucionais em recursos extraordinários, e não fazer investigações violando a regra do juiz natural. |
| R | Outra coisa muito interessante é que foi empregado o art. 43 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal para justificar a instauração desse procedimento. Esse dispositivo do Regimento Interno, que não foi recepcionado pela Constituição Federal, é de 1980. Em 1980, o Ministério Público ainda não era o titular exclusivo da ação penal pública. Naquela época, existia até o procedimento judicialiforme: o delegado de polícia poderia iniciar uma ação penal nas contravenções penais. Era até nomeado promotor ad hoc nas comarcas onde não existia membro do Ministério Público. O sistema, naquela época, não era ainda o acusatório de processo. A partir de 1988 e de acordo com a grande maioria das democracias existentes pelo mundo, aqui nós temos o sistema acusatório de processo, típico do sistema do civil law, não do sistema do common law, em que, muitas vezes, nós poderemos ter uma sistemática de investigação diferente. Mas aqui, não. Aqui, quem investiga ou é a polícia judiciária ou é o Ministério Público, os dois com a capacidade de investigação. Magistrado não investiga em primeiro grau. Não é possível fazermos uma investigação, termos uma investigação por aquela pessoa que vai julgar depois, que pode julgar depois. Então, no sistema acusatório puro, que é o nosso caso, nós temos uma divisão muito clara de quem acusa, de quem defende e de quem julga. |
| R | E o que é interessante é que o art. 3º-A, que está suspenso por decisão do Supremo Tribunal Federal, em uma liminar do Ministro Fux, deixa muito evidente isto: ele acaba trazendo para o direito objetivo o sistema acusatório de processo e diz, de forma muito evidente, que “o processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação”. E esse dispositivo está suspenso por liminar. Então, quer dizer, se esse dispositivo já estivesse em vigor, todas essas investigações seriam nulas, porque uma portaria interna do Supremo Tribunal Federal não pode se contrapor nem a esse dispositivo legal e muito menos à Constituição Federal, que é que traz o sistema acusatório de processo de acordo com as interpretações das normas existentes. E a Súmula 405 do Supremo Tribunal Federal diz que: "Denegado o mandado de segurança pela sentença, ou no julgamento do agravo, dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da decisão contrária". Isso quer dizer que, quando esse dispositivo entrar em vigor... E vai entrar em vigor, porque essa decisão do Ministro Fux do Supremo Tribunal Federal, essa ação foi proposta para que fosse suspenso o juiz de garantias e acabou também entrando no pacote esse dispositivo. Então, uma hora vai ser julgado, vai ser dito que esse dispositivo é constitucional, a liminar desse mandado de segurança vai ser cassada e, nos termos da Súmula 405 do próprio Supremo Tribunal Federal, vai ter que retroagir a ilicitude probatória a partir da entrada em vigor dessa lei. Então, o Supremo Tribunal Federal vai ter que determinar a anulação de todos os atos, desde a entrada em vigor desta lei. É a própria Súmula 405 do Supremo Tribunal Federal que diz isso, e nós poderemos interpretar - essa súmula fala em mandados de segurança, que é liminar - também numa ação cautelar em que há a concessão de liminar. Então, o Supremo Tribunal Federal vai ficar numa situação muito difícil, porque vai limitar esse dispositivo apenas a fake news, inquéritos de fake news, só que o sistema acusatório de processo já existe antes da entrada em vigor das alterações do Código de Processo Penal. Quer dizer que ninguém pode, o juiz não pode substituir a atividade acusatória do Ministério Público e a atividade investigatória, seja do Ministério Público ou da polícia judiciária. E, mesmo que nós fossemos entender que esse dispositivo foi recepcionado pela Constituição Federal, o que não foi, porque sabemos que a norma deve ser interpretada de acordo com a Constituição Federal... Norma infraconstitucional, seja lei ordinária, seja lei complementar, seja um regimento interno, deve ser interpretada de acordo com a Constituição, e não a Constituição de acordo com o regimento interno. Então, evidentemente, não foi recepcionado pela Constituição Federal, mas, mesmo que tivesse sido recepcionado, esse dispositivo diz que será instaurada essa investigação, esse procedimento, por determinação do Presidente do Supremo Tribunal Federal para crimes praticados no interior, na sede do Supremo Tribunal Federal contra ministros ou pessoas sujeitas à sua jurisdição. |
| R | Então, seria desacato, lesões corporais, homicídio, incêndio doloso. Não poderemos levar isso para o Brasil inteiro porque determinados supostos crimes teriam sido praticados por meio de internet - em 1980, nem existia internet. Então, de qualquer forma, nós interpretamos esse dispositivo... Primeiro porque não foi recepcionado e, mesmo que tivesse sido recepcionado pela Constituição Federal, ainda assim, crimes cometidos fora do recinto do Supremo Tribunal Federal não poderiam dar azo a uma investigação interna, tanto que foi promovido o arquivamento pela Dra. Raquel Dodge, entendendo pela ilicitude probatória, e depois, posteriormente, esse arquivamento, o Supremo Tribunal Federal não fez como deveria, pela sua própria jurisprudência, que era simplesmente arquivá-lo, porque não há revisão de arquivamento de inquérito promovido pelo Procurador-Geral da República - não há essa previsão. Para todos os demais procuradores - dos estados, do militar - há essa revisão de promoção de arquivamento para o Supremo Tribunal Federal. Para o Superior Tribunal de Justiça, quando é promovido pelo Procurador-Geral da República, não há. E, como o Ministério Público, só ele, pode promover a ação penal, não pode o magistrado se negar a arquivá-lo, até porque o arquivamento do inquérito policial, de um procedimento de investigação criminal fica no âmbito do próprio Ministério Público. O Judiciário não pode impor seja ao Procurador-Geral, seja a qualquer membro do Ministério Público que promova a ação penal, porque isso daí é atribuição exclusiva do membro do Ministério Público. De forma nenhuma pode ser determinado ao membro do Ministério Público que promova uma ação penal, e muito menos o magistrado pode investigar, principalmente na fase inquisitiva, porque ele está violando a própria imparcialidade dele. Ele passa a ser uma pessoa interessada no feito e, com isso, ele deve ser afastado do processo. Outra coisa interessante é que a excelsa Corte viola a própria Súmula Vinculante 14 do Supremo Tribunal Federal, que diz que os documentos que constem do processo, aquelas diligências que já estão dentro da investigação, não podem ser sonegados aos advogados, muito menos ao Ministério Público. Então, não está sendo observada a própria Súmula 14 do próprio Supremo Tribunal Federal, haja vista que provas estão sendo sonegadas. Não pode existir no Estado democrático investigação secreta. Ela pode ser sigilosa, mas, a partir do momento em que não há mais necessidade do sigilo e as provas são juntadas ao procedimento investigatório, os advogados, por força da própria legislação que rege a Ordem dos Advogados do Brasil, o seu estatuto, por conta da própria Constituição Federal, têm direito de acesso aos autos. E muito mais o Ministério Público, que é o titular da ação penal pública e o responsável pela propositura da ação penal. |
| R | Outra coisa importante que eu não poderia deixar de dizer é que não há no direito penal objetivo definição do que seja fake news, não há, não há nenhuma norma dizendo do que se trata notícia falsa. E, sem uma norma penal incriminadora que a defina, ninguém pode ser investigado e muito menos processado. A única definição para fake news é um crime eleitoral, previsto no art. 323 do Código Eleitoral, que só vige durante a propaganda eleitoral ou durante a campanha eleitoral, que é quando alguém divulga fatos que sabe serem inverídicos em relação a partidos ou a candidatos, e que têm potencial de influir os eleitores. É a única situação em que há definição de fake news. Esse dispositivo só tem eficácia agora, durante a propaganda eleitoral ou durante a campanha eleitoral. No mais, não há definição no nosso direito penal do que seja fake news e ninguém pode ser processado quando não há essa definição, porque não há uma norma penal que diga que esse fato de divulgar fake news é crime. Outra coisa interessante também é que no direito penal não se pune a fase de cogitação do crime. Isso quer dizer o seguinte: se eu hoje resolvo planejar, eu penso, eu vou fazer um planejamento para tratar de um golpe de Estado - eu faço esse planejamento, coloco lá na lousa, faço cálculos -, mas eu não saio dos atos preparatórios, eu não executo nenhuma ação, esse fato é impunível no direito penal. No direito penal nós temos quatro fases do caminho do crime, chamado de iter criminis: cogitação, que a pessoa imagina, a pessoa pensa, a pessoa quer; preparação, que ela planeja, que ela adquire um carro, que ela furta um carro. Só a partir dos atos preparatórios, só a partir da execução, é que o direito penal entra em cena. Então, nós teremos depois a execução e a consumação do crime. Se fica apenas na execução, é uma tentativa. Se há consumação, é crime consumado, exceto se a própria legislação punir os atos preparatórios, que ocorre no crime de associação criminosa, no art. 288 do Código Penal, no crime de incitação ao crime, do art. 286 do Código Penal. Só que essas normas possuem elementares próprias. No art. 286 do Código Penal, só como exemplo, três ou mais pessoas têm de se reunir para a prática de crimes, indefinidamente. Tem que ser uma reunião estável e permanente para a prática de indeterminados tipos de crimes, não crimes momentâneos. E o induzimento à prática de crime tem que ser feito publicamente. Então, no seio familiar, se alguém fala qualquer coisa - "seria bom matar aquele cara, aquele cara não presta" -, isso em um grupo de WhatsApp, isso não é público. Isso não é público e não pode ingressar no art. 286 do Código Penal. Então, tanto o crime de associação criminosa quanto o crime de incitação ao delito têm especialidades próprias que devem ser observadas. Outra observação que eu faço é que o nosso sistema processual não admite as provas obtidas por meio ilícito. Todo mundo sabe disso. Mas por que eu estou falando? No que diz respeito a essas mensagens que foram hackeadas dos empresários, se elas foram indevidamente interceptadas, se elas foram hackeadas, ou se elas foram indevidamente obtidas e divulgadas, essas provas são ilícitas. Se essas provas são ilícitas, elas não podem dar azo a uma investigação, porque todas as provas decorrentes da prova ilícita são contaminadas. É a chamada teoria dos frutos da árvore envenenada. Essas provas passam a ser imprestáveis, principalmente quando vão ser empregadas para acusação. |
| R | Isso quer dizer que se essas provas são ilícitas, elas não podem justificar, primeiro, uma quebra de sigilo e, segundo, uma busca e apreensão, porque o que decorrer dessa quebra de sigilo, dessa busca e apreensão é contaminado pela ilicitude da prova original. E, para que nós tenhamos a determinação dessas medidas constritivas invasivas profundamente a direitos e garantias fundamentais, principalmente à intimidade das pessoas, há necessidade das fundadas razões da prática de crime. Se está apenas na fase de cogitação, se está apenas na fase de preparação, nem crime há. E, além disso tudo, se houve uma indevida invasão por hackeamento, interceptação ou gravação dessas mensagens, mesmo que existisse crime, essas provas não poderiam ser aproveitadas porque elas são oriundas de uma prova ilícita e a prova ilícita é inadmissível em nosso direito. E não se pode de maneira nenhuma, já finalizando, determinar medidas invasivas a direito fundamental para peneirar mensagens e documentos a fim de se buscar alguma ilicitude. O inquérito policial, uma investigação, ela não é auditoria, ela visa a fato certo e determinado, aquilo que nós vamos buscar, e nós não partimos de pessoas para o fato, nós partimos do fato para as pessoas, é o chamado direito penal do fato e não direito penal do autor. Então, não se pode de maneira nenhuma, primeiro, determinar a quebra de sigilo sem nenhum tipo de suporte e, determinada essa quebra de sigilo, começar a fisgar, pescar para ver se busca alguma coisa como se fosse uma auditoria. Isso daí é inadmissível processualmente, isso daí viola todo o nosso sistema processual. Imaginem, senhores telespectadores, se alguém pegasse o nosso aparelho celular e fosse analisar o que nós falamos nesses grupos de WhatsApp. Nós falamos patacoadas, bravatas, destemperos emocionais, nós falamos um monte de coisa que nunca vai sair do imaginário e, se essas mensagens são levadas à público, parte-se de uma investigação para dizer se nós praticamos um crime de racismo, de homofobia, quando nós estamos num ambiente privado, simplesmente falando bobagens, besteiras, jogando conversa fora. Transmudando isso para o que aconteceu com os empresários, é exatamente isso que aconteceu, uma série de patacoadas e besteirol. Até poderia ter alguma menção a golpe de estado pelo que eu li, mas aquilo fica apenas no imaginário, isso se chama bravata, que principalmente quando as pessoas estão grupos de WhatsApp fazem. Crime contra o Estado democrático de direito tem que ter na conduta o potencial de desestabilizar o Estado democrático de direito, de desestabilizar uma eleição, de desestabilizar um poder constituído, potencial de derrubar efetivamente o Governo eleito e, além disso tudo, esses crimes exigem violência à pessoa ou grave ameaça, que são duas elementares indispensáveis, o que não há. Então temos que tomar muito cuidado para que o sistema processual existente não seja empregado para perseguir politicamente ou determinada ideologia. Muito obrigado e desculpe se eu me estendi. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - O que é isso, Dr. César Dario Mariano da Silva? Muitíssimo obrigado por sua participação aqui! O Dr. Dario tem especialização em Direito Penal pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo e atualmente é Procurador de Justiça Criminal naquele estado. Eu agradeço demais a sua participação e a sua paciência. Nós estamos com 1,8 mil brasileiros aí, cerca de 1,8 mil brasileiros, assistindo online só no YouTube, fora a TV Senado, que está transmitindo esta sessão - desde o início, pelo menos o YouTube está transmitindo; a TV Senado entrou, acho, da metade para cá. Então eu agradeço às pessoas que estão nos assistindo - eu falei que o brasileiro está gostando, está acompanhando a política; isso é muito bom! Ouvindo a palestra do Dr. Dario, eu estava imaginando aí... Eu não sei se tem potencial, porque, conforme o que até agora chegou a público - ontem foi aberto o sigilo, não é? -, toda essa ação, essa decisão, foi em cima de uma matéria jornalística sobre um grupo de zap - teve um que deu uma curtida e já entrou nesse inquérito. Eu não sei se tem potencial de fazer, mas sou contra, totalmente contra, golpe. Como bem colocou o Dr. Ives Gandra Martins, teria que ter as Forças Armadas aliadas para, de alguma forma, conseguir esse feito. Mas uma coisa eu posso dizer - viu, Dr. Dario? -, uma coisa eu posso dizer da sua brilhante palestra também. Se tem potencial ofensivo para atentar contra a democracia... Pelo que eu vi, não, a não ser que apareça alguma coisa nesse estado permanente de investigação, mas que tem potencial para calar a posição política que, de alguma forma, pode levar um candidato a se fortalecer, isso aí tem, isso aí tem, porque você pegar uma pessoa que tem 5 milhões... Eram 5 milhões, não é, que o Luciano tinha de seguidores? Eu era um dos seguidores - repito -, mesmo discordando de algumas pautas, de algumas bandeiras políticas, mas ele tem direito de ter essas bandeiras, e eu tenho direito de discordar. Mas o que mais me deixa preocupado nisso tudo é que ele estava ali mostrando dados, comparando o governo anterior com o governo atual, dando a sua opinião, e isso foi tirado dele, isso foi usurpado dele, e é um homem que influencia multidões. Eu nunca vi nenhuma atitude violenta dele, nada parecido com isso; pelo menos como seguidor nas redes sociais, eu nunca vi nada fora das quatro linhas. Aí se tira esse direito? Isso, de certa forma, influencia, sim, do meu ponto de vista influencia, o pleito que a gente está vivendo. Será que é esse o objetivo? Fica a pergunta. Trata-se de enfraquecer quem está de um lado? Fica a pergunta. Passo imediatamente a palavra para o Dr. Sérgio Harfouche, que é Procurador de Justiça Criminal do Mato Grosso do Sul licenciado. Eu imediatamente já passo a palavra para o senhor, agradecendo a paciência. |
| R | O SR. SÉRGIO FERNANDO RAIMUNDO HARFOUCHE (Para expor.) - Prezado Senador Eduardo Girão, que preside esta Comissão, ainda que eventualmente, na sua pessoa me permita cumprimentar todos os demais Parlamentares que se manifestaram, que aqui estiveram; na pessoa também do Professor Doutor Ives Gandra Martins e do Dr. Deltan Dallagnol, permitam-me cumprimentar os operadores do direito, aqueles que aqui estão como quem se formando e aqueles que têm contribuído neste momento tão especial e único, como eu concordo, histórico; também o Professor Valmir Pontes, Advogado eminente, que aqui, na verdade, compartilhou comigo, a cada aula que recebemos, os pontos que eu havia destacado para compartilhar neste momento. Eu vejo quase como esvaziada qualquer outra abordagem. Eu aproveito este tempo e este momento para incentivar você, acadêmico de direito, alvo dessas aulas, que você seja incentivado a resgatar aquilo que se perdeu ao longo dessa nossa Constituição Federal. Eu ingressei no Ministério Público em 1992, com uma Constituição novel, que veio como Constituição Cidadã porque vencia exatamente distúrbios entre os Poderes. A equalização desses Poderes veio muito bem expressa na vontade do Constituinte, e isso para voltar, antes de tudo, a atender a vontade do povo, daí porque a Constituição tem no seu art. 2º a definição de que todo poder emana do povo e que o exerce por meio de representantes eleitos. E é por isso que a ordem das distribuições das competências, que aliás o Constituinte também se ocupou de detalhar entre os arts. 44 e 135, inicia exatamente com o Poder Legislativo como representante do povo, e estas duas Casas que compõem o Congresso Nacional, tanto a nossa Câmara Federal quanto o nosso Senado Federal, composto por eleitos pelo povo. E aqui vem o questionar de alterações que, para mim, fragilizam a nossa Constituição Federal e a vontade originária do Constituinte, em se permitir guindar às cadeiras do Congresso Nacional quem não foi eleito diretamente pelo povo ou quem venha na sua bagagem com contas a prestar, por improbidade administrativa ou prática de qualquer outro desvio. É evidente que tanto o Senado quanto a Câmara Federal são fragilizados por elos frágeis, por esses representantes que, mais uma vez eu digo, não foram eleitos pelo povo, vieram por um sistema permissivo e por serem alvo de ações, por terem demandado mal nas suas atividades que preexistiram à representatividade aqui na Câmara, eles se tornam elos frágeis, e um elo frágil é tudo que basta para romper toda uma corrente. |
| R | Hoje eu vejo o Senado muito bem representado pelo senhor, Senador Girão. Eu declaro que vejo no senhor um modelo de Parlamentar, que me inspira. E que seja modelo para os demais, que seja, inclusive, para que tenhamos resgatado o perfil de cidadãos que não devem nada, que tenham uma história de vida, de prestação de serviços à comunidade, como acompanhei de V. Exa. esse tempo todo que até antecedeu o seu mandato. Não faço isso aqui como retribuição, da gratidão que sinto por ter sido convidado para compor esta mesa tão seleta. Com certeza, o senhor tem outros nomes de muito maior conteúdo e envergadura para compor essas mesas, e eu me vejo aqui do lado do Dr. Valmir Pontes, com o seu currículo. Mas eu preciso dizer para você, acadêmico de Direito, que você é essa esperança de trazer de volta um Moreira Alves para o nosso Judiciário. Como bem destacou o Prof. Ives Gandra Martins, que o Supremo é o guardião da Constituição, mas Moreira Alves era o guardião do Supremo. Eu vejo, na fala do nosso eminente professor, o desejo de ver esses exemplos que guardam o próprio Supremo, para que ele não desvie uma só letra da Constituição. E nós não estamos aqui em devaneio. Ouvimos professores, juristas que se debruçaram diante dessa questão. Eu também procurei estudar bem esse Inquérito 4.781 e eu resgato, então, cada um dos 11 pontos trazidos pelo nosso Prof. Deltan Dallagnol, preciso, cirúrgico, extremamente didático, que não merece qualquer acréscimo, não haveria um 12º ponto para trazer. O que não podemos é estarmos silentes e inertes. Eu vejo que chegamos aqui, nessa perplexidade, ferindo até um ícone da bandeira do nosso Tribunal Superior do Trabalho, que diz, replicando a fala de Isaías 37:12, "o efeito da justiça será a paz, e o fruto da justiça, repouso e segurança para sempre". O que nós estamos observando é uma sociedade perplexa, desde um leigo até o mais eminente professor de Direito, operador do direito, porque não há mais segurança jurídica. Estamos vendo as lições trazidas aos bancos escolares esquecidas nos tribunais, por muitas vezes. E isso não pode acontecer, porque a preservação da Constituição Federal é um dos elementos que preservam a vida social e a paz social, sobretudo. Por isso, cabe a você buscar, trazer de volta exatamente esses elementos e valores que trazem segurança. Se nós temos uma Constituição, ela precisa ser cumprida. No entanto, nós estamos vendo a Constituição preterida, como foi bem destacado aqui. Não há possibilidade de se trazer segurança jurídica quando uma função essencial da Justiça, como o Ministério Público, é esquecido, é preterido. E o que é pior, contrariado. |
| R | Por uma Portaria, a de nº 69, foi instaurado, em 14/3/2019, esse inquérito, que foi denominado por um Ministro do Supremo como inquérito do fim do mundo, um relator. Quando instado o Ministério Público para se manifestar, foi dito que não havia elemento que se sustentasse, daí o pedido de arquivamento pela Procuradoria-Geral da República. É o suficiente para que isso se faça, mas transpondo e desprezando não só um parecer de arquivamento, mas toda uma instituição ali representada. Como explicar, em uma aula de Direito, que nós devemos observância à Constituição se uma decisão dessa pretere a própria Constituição? Não bastasse, na sequência, logo no dia 26 de maio de 2020, o Relator dá uma sequência de determinações, inclusive designando quem seria o delegado que deveria dar sequência e receber todas aquelas informações, incluindo investigação de Parlamentares. Como eu, um simples cidadão, posso me sentir seguro se um Parlamentar, que tem imunidade para se manifestar, também não é respeitado? Se essa Constituição é cidadã, já depois das suas mais de 115 emendas, seria ainda uma Constituição cidadã? Será que realmente o povo é quem está no alvo dessas garantias constitucionais? As pernas dessa Constituição estão sobre dois fundamentos que são a harmonia e a independência dos Poderes e os direitos e garantias individuais, e esses dois elementos foram trucidados nesse inquérito. Não há respeito aos Poderes, não há sequer respeito ao Senado, que, de uma forma fidalga e gentil, convida para que aqueles que estão no protagonismo dessa questão compareçam. E nem sequer, parece-me, que se deu resposta dizendo a justificativa. Eu estou aqui trazendo a necessidade de se fazer esses esclarecimentos por quem os deve. No entanto, nós nos valemos daqueles que aqui se dispuseram. Senador Girão, eu vim, fiz questão de vir pessoalmente, justamente em homenagem a esse modelo que o senhor tem desenvolvido, desempenhado. Eu sei que isso é por direção de Deus, porque eu vi o senhor se dispondo a fazer a sua parte mesmo antes deste mandato. Eu quero que a minha presença aqui, que a minha fala, já esgotada, seja tida como a minha declaração de admiração por todo o trabalho que o senhor vem desenvolvendo. A minha esperança é a de que a renovação que se tem, agora de um terço do Senado, seja de homens com esse perfil, que não têm o que dever a ninguém e que venham prontos a fazer com que o Senado cumpra o seu papel constitucional. É o único órgão que tem condição de avaliar as condutas de um Ministro do Supremo Tribunal Federal, por exemplo. Nós estamos perplexos porque vemos... Olha, estamos aqui desde as 9h da manhã discutindo uma violação, uma prova produzida, porque agora que foi retirado o sigilo... O sigilo foi decretado desde - eu tenho a data - 26 de maio de 2020. Ninguém sabia de onde vinha, nem por que vinha. Agora, com esse incidente envolvendo esses oito empresários, parece que foi como uma tentativa, ainda, de soprar sobre as cinzas de um inquérito já falido, como foi bem destacado aqui pelo Prof. Dr. César Mariano, meu colega. No entanto, novamente se incide na violação de direitos individuais, uma das pernas da Constituição Federal, porque, se essas pessoas tiveram o seu WhatsApp devassado, qualquer um de nós estamos sujeitos a sofrer o mesmo e a qualquer momento. Não podemos tolerar nem permitir tal coisa e a minha esperança é de que haja, no coração de quem se propõe a decidir, o mínimo de observância daquilo que resta da Constituição Federal. |
| R | Meu pai foi o meu grande modelo também para a vida jurídica. Eu decidi estudar Direito por ver no meu pai o grande advogado que ele era, o grande orador que ele era e o zeloso operador do direito. E ele já dizia naquele tempo: "Meu filho, decisões do Supremo não se discutem, se cumprem". Eu nunca mais o ouvi falar isso depois de uma composição, quem sabe, aí dos últimos 20 anos do Supremo; quem sabe, desde os dias de Sydney Sanches ou de Moreira Alves, como destacou o Prof. Ives Gandra, porque se tinha ali, no Supremo, pessoas totalmente isentas. E eu olho agora, mais uma vez, com todo o respeito à instituição Supremo Tribunal Federal e ao Senado, e sem qualquer intenção de ataques que sejam: a perplexidade que se tem acerca desse inquérito vem porque, enquanto nós estamos vendo a quebra de sigilo de um grupo de WhatsApp, e, com isso, gerando consequências graves, danosas a pessoas que oferecem centenas de milhares de empregos aí para cidadãos do Brasil inteiro, que incentivam a economia. Essas pessoas estão abaladas com essa intervenção. Na quebra, agora, na abertura, depois de tanto tempo, do sigilo, não se vê qualquer elemento novo, Senador, não há qualquer elemento novo que justifique a manutenção desse inquérito, a continuidade e a prorrogação dele, como foi feita agora, recentemente. Mas perplexidade mesmo vem quando homens de bem que trabalham e produzem no Brasil têm a sua privacidade violada, um Presidente da República tem o seu celular devassado por uma denúncia vazia, um celular funcional, enquanto que um Adélio Bispo, que tentou matar o Presidente da República quando ainda candidato, tem preservada a sua privacidade e os vínculos que ele gerou. O Brasil precisa saber. A perplexidade vem enquanto a nova Constituição repudiou esse sistema penal inquisitorial que trazia violação de Poderes entre Poderes por conta de um novo sistema penal acusatório, alterando a persecução penal. |
| R | E, agora, nós nos vemos voltando ao século passado por quem deveria dar o exemplo em preservar a Constituição. Eu quero encerrar porque, como eu já disse, fui esvaziado em cada uma das falas e me sinto gratificado. Eu ganho, eu saio daqui muito mais acrescido do que pude contribuir. O meu desejo era que eu realmente pudesse contribuir, mas os que me antecederam, Senador, fizeram isso de forma magistral. Eu quero só deixar uma exortação respeitosa registrada no livro de Crônicas, o segundo livro de Crônicas, 19:6 e 7. Eu sempre usei desse texto quando fazia juris. Os júris, compostos por cidadãos como nós, comuns, eram sempre alertados, e eu creio que cabe a qualquer um que se põe nessa posição de julgar, especialmente quando estamos falando da nossa Corte Suprema. II Crônicas 19 diz: 6. E disse aos juízes: Vede o que fazeis, porque não julgais da parte do homem, e, sim, da parte do Senhor; e, no julgardes, Ele está convosco. [Ao julgardes, Ele, o Senhor, está convosco]. 7. Agora, pois, seja o temor do Senhor convosco; tomai cuidado e fazei-o, porque não há no Senhor, nosso Deus, injustiça nem parcialidade, nem aceita ele suborno. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Dr. Sérgio Harfouche, pela sua consideração com esta Casa, respeito, por ter vindo de tão longe, lá de Mato Grosso do Sul, para participar desta audiência, que é um instrumento democrático para a gente tentar aqui, o Senado Federal tentar dialogar na democracia. Uma coisa que me chamou muito a atenção, Dr. Valmir, lembrando um pouco.... Rapaz, foi tanta informação boa, está sendo tanta informação boa e, até o final, nós teremos algumas outras surpresas, mas o Ministro Bruno Bianco falou aqui uma coisa interessante: como é que pode Parlamentares, Senadores irem direto lá na fonte, direto no Ministro, que é a vítima, que é o julgador, que é tudo - não é? -, o instrutor, enfim, tudo, e, aí, já entregam a matéria do jornal, já pedem, já peticionam, já fazem e ele já... O que é isso? É um bypass que está acontecendo? E Senadores da oposição. Nada contra a oposição, isso é importante. Em alguns momentos, eu também sou oposição aqui a ideias do próprio Governo Federal, mas é algo injusto - Injusto! - acontecer esse tipo de coisa, com interesses, no meu modo de entender, respeito quem pensa diferente, mas por interesses politiqueiros, por projeto de poder. Esse é o grande problema: por um projeto de poder vale tudo. O Dr. Valmir pediu um minutinho antes de a gente começar aqui uma rodada... E, olha, a quantidade de perguntas que tem chegado aqui desde o início desta audiência não é brincadeira. Os brasileiros participando, fazendo comentários... Eu vou ler todos aqui e, depois, vou passar a palavra para quem queira se manifestar. Eu já tenho os inscritos aqui. Dr. Valmir. O SR. VALMIR PONTES (Para expor.) - Senador, em primeiro lugar, eu quero dirigir meus efusivos parabéns ao Dr. Sérgio por suas precisas e candentes palavras. Em segundo lugar, eu quero lembrar que a democracia, como disse bem o Senador Girão... Aliás, se o Dr. Sérgio veio de longe, eu vim de mais longe ainda. (Risos.) |
| R | Bom, a democracia, como dizia Pinto Ferreira, notável constitucionalista pernambucano, é o regime em que prevalece a vontade da maioria, mas garantidos às minorias os direitos de representação, participação e crítica. Sem isso não há democracia. Muito bem. Finalmente, uma última pergunta que eu quero formular à plateia, aos espectadores: Diante desse quadro - não sei se dantesco, mas, pelo menos, preocupante - com o qual nos deparamos, onde está a nossa querida Ordem dos Advogados do Brasil? Cadê a OAB? Cadê o Conselho Federal da OAB, que não se pronuncia? Era importantíssimo ter um representante da Ordem, desse conselho, ao qual honrosamente pertenci em dois mandatos, mas que se queda silente diante de uma situação tão grave. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito bem. Boa pergunta! Inclusive, temos aqui a Ordem dos Advogados Conservadores do Brasil, que pediu a palavra e daqui a pouco vai falar. Mas da OAB a gente sente realmente falta nesse momento, embora, aqui, diga-se de passagem, não convidamos oficialmente... (Pausa.) Deixem-me eu dar mais um tempinho para mim aqui. (Risos.) Fui tão condescendente... O SR. VALMIR PONTES - É o próprio Ministro Relator. (Risos.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Mas olha, deixando claro que a gente não fez um convite oficial ao Presidente da OAB, isso é verdade. Mas é claro que, como muitos estudantes estão aqui, advogados e tudo, ela seria muito bem-vinda, como sempre será, independentemente de eventuais posições políticas do seu comando. Nós vamos fazer a última rodada aqui. Todos os palestrantes já falaram, só que a gente vai deixar depois uns três minutos para as considerações finais e para que eles possam responder as perguntas que vieram aqui do público que está em casa, que está participando, ou aqui do auditório, está certo? Então, aquele palestrante que se sentir confortável para responder, fique à vontade. O Dr. Ives Gandra pediu para sair, o Dallagnol também, porque já tinham compromissos previamente assumidos e não vão poder responder. Mas os nossos palestrantes que estão aqui, os oradores podem, se quiserem, nos três minutos finais, responder alguns desses questionamentos. Eu queria passar a palavra agora, antes de ler as perguntas, já encaminhando para o encerramento, à Dra. Mariane Andréia Cardoso dos Santos, que é Secretária-Geral da Comissão de Direito Constitucional da OAB de Minas Gerais e também advogada do Deputado Federal Daniel Silveira. Todos aqui acompanharam o que aconteceu com esse jovem Parlamentar, e nós vamos relembrar um pouco. Ele é parte integrante disso tudo, é uma vítima, no meu modo de entender, dessa perseguição política. Embora eu não concorde com os termos que ele usou em alguns momentos, discordo da forma dele - já falei isso para ele -, mas o direito está garantido. |
| R | A imunidade parlamentar é clara: voto, opinião; palavras e votos. É muito claro. Onde é que a gente perdeu a aula de que isso não vale mais? Em um crime de opinião, se ele ofendeu alguém, tinha que ter o devido processo legal para que ele fosse punido, e não dessa forma que eu considero, repito, com todo respeito a quem pensa diferente, inconstitucional. Então, nós vamos passar a palavra aqui, numa Casa democrática, para a advogada do Deputado Federal Daniel Silveira, que é a Dra. Mariane Andréia Cardoso dos Santos. A SRA. MARIANE ANDRÉIA CARDOSO DOS SANTOS (Para expor.) - Senador Girão, muito obrigada. É uma honra falar aqui para V. Exa. e para esta douta Casa. Realmente eu me sinto muito honrada, porque o senhor é um dos Parlamentares que me faz ter orgulho de ser brasileira. Nesta Casa, principalmente no Senado, é possível olhar pelo que está acontecendo e pelo objeto desta audiência de hoje. Em primeiro lugar, eu gostaria de ressaltar essa questão do acesso aos autos. Está consagrado na Constituição que a advocacia é indispensável à administração da justiça. Então, se nós, enquanto advogados, temos nossas prerrogativas violadas, isso viola a própria essência do Estado democrático de direito. Ainda que não se concorde com uma conduta de uma pessoa a ou b, todas as pessoas têm direito ao devido processo legal. Elas podem ou não ter cometido algum crime. Quem tem que verificar isso é um juiz isento, imparcial. Não pode ser um juiz relacionado aos fatos. Essa é a premissa de qualquer processo democrático, não só no Brasil, mas em qualquer lugar do mundo. A premissa da existência de um juiz imparcial é inclusive consagrada na própria Declaração Universal dos Direitos Humanos Então, aqui a gente está tendo uma violação de preceitos constitucionais e preceitos de direito internacional, inclusive, não só em relação ao caso Daniel, mas em relação a todos os outros que são objeto desse tipo de processo. Pois bem, em relação ao acesso aos autos, existem várias prerrogativas de advogado sendo violadas. Para ser bem objetiva, o acesso aos autos não é um problema só no Inquérito 4.781; ele é só o caso mais famoso. Em nenhum caso, no Supremo Tribunal Federal, nós temos acesso aos processos sigilosos in loco; a gente recebe um envelope com cópias. Quem escolhe as cópias que são entregues para os advogados são servidores. Nós não temos acesso, Dr. Valmir. Realmente é uma honra também estar aqui na sua presença. Nós não temos acesso a nenhum processo. Não é ao 4.781, não; é a nenhum processo. O Supremo Tribunal Federal viola o Estatuto da OAB, viola as prerrogativas, viola a Súmula Vinculante 14, emanada pelo próprio Supremo Tribunal Federal, que garante o acesso. Não é garantir cópia, é garantir acesso. Quem tem que dizer o que é ou não interesse do meu cliente sou eu advogada; não são os servidores, com todo o respeito aos servidores. O SR. VALMIR PONTES - Às mãos o que chega é apenas aquilo que o Supremo manda para a senhora. A SRA. MARIANE ANDRÉIA CARDOSO DOS SANTOS - Exatamente. Nós não temos acesso aos autos originais, doutor, de nenhum processo. Não é aos do 4.781; é aos de nenhum processo. O modus operandi do Supremo Tribunal Federal simplesmente é sempre indeferir vista, mediante peticionamento. Então, quando eu chego no balcão e peço acesso ao processo sempre me é negado. E eu não estou falando isso só com base na minha experiência; estou falando isso com base em auto de constatação de violações de prerrogativas, que eu solicitei à Ordem dos Advogados que lavrasse. Há duas semanas, eu fui impedida inclusive de entrar no prédio do Supremo Tribunal Federal, porque disseram que eu só poderia subir com autorização da secretaria do gabinete ao qual eu estava me dirigindo. |
| R | A Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Distrito Federal, esteve lá para me auxiliar e também foi impedida de entrar. E isso está em auto de constatação, que já foi encaminhado para a OAB Nacional. Os pedidos feitos à OAB federal foram inúmeros. E eu tenho a honra de integrar a Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Minas Gerais, cujo Presidente tem a coragem de tomar providências. Essas providências começaram a ser tomadas recentemente. Então, a Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Minas Gerais, de forma inédita, peticionou, junto ao 4.781, solicitando que me fosse dado acesso, e essa petição até agora, até o presente momento, foi ignorada. Então eu trago, bem objetivamente, essa questão, porque a gente fala muito de 4.781 como se ele fosse o único problema. Ele é só o problema mais grave, porque não se tem acesso, de fato, a nada dele. Mas nos outros processos, os senhores hão de convir comigo, quem tem que escolher o que é ou não pertinente ao meu cliente sou eu, que tenho que olhar. Não pode ser o servidor que vai olhar o processo e vai me entregar as cópias que ele acha que são pertinentes. Eu preciso conseguir olhar na íntegra. Pois bem, eu queria chamar a atenção também, corroborando o que os outros colegas aqui falaram, para a literalidade do dispositivo, que está sendo sempre utilizado, que é o seguinte, é o art. 359-L, do Código Penal, crime de abolição violenta do Estado democrático de direito, que diz o seguinte: "Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício de poderes constitucionais [...]". Aqui eu quero chamar a atenção para o seguinte. Primeiro, o exercício de violência ou grave ameaça é elementar do tipo. Então, se for uma coisa meramente leve, ou se for uma crítica, isso jamais seria conduta típica. Em segundo lugar, tentar "abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo", ou seja, tem que ter impedimento ou restrição efetiva de um dos poderes. E aqui eu vou ter uma fala que vai ser, digamos, corajosa, no sentido de dizer o seguinte. Falar sobre fechar Supremo Tribunal Federal não é crime do Brasil, não é uma conduta tipificada. Por quê? Aqui eu deixo muito claro. O art. 92 da Constituição diz o seguinte. São órgãos do Poder Judiciário: o Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça, o Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal Superior do Trabalho, etc. Ou seja, o Supremo Tribunal Federal é um órgão do Poder Judiciário. A estruturação do Poder Judiciário não é elementar ao Estado democrático de direito. O elementar é a existência do Poder Judiciário. E aqui eu não estou defendendo que o Supremo Tribunal Federal deva ser fechado. O que eu estou defendendo é que quem diz isso não está cometendo um crime, senão estaria cometendo um crime, Senador Girão, quem vem nesta Casa defender, por exemplo, parlamentarismo, porque quem vem nesta Casa defender parlamentarismo está defendendo suprimir a Presidência da República e, ainda assim, não está cometendo crime. Por quê? Porque alterar o funcionamento de um dos poderes, democraticamente, dentro dos preceitos legais, não é crime do Brasil. E aqui eu me conecto com uma questão, que eu acho elementar, que é a seguinte. Muitos Ministros do Supremo Tribunal Federal talvez discordem das condutas típicas e entendam necessário um tipo penal diferente do que a gente tem no Código Penal. Se eles acham isso, eles têm duas opções. Eles têm a opção de mandar um projeto de lei para esta Casa, para que esta Casa examine esse projeto de lei, ou eles têm também o condão, a possibilidade, de tirar a toga e submeter o nome à eleição, para que eles sejam Parlamentares e possam ser eleitos para poder produzir as leis. Quem tem que produzir as leis, Senador Girão, é o senhor, não é o Ministro do Supremo Tribunal Federal. O Judiciário, como um todo, seja o Supremo Tribunal Federal ou não, tem o poder apenas de aplicar a lei, nunca de inovar. Não é papel do Poder Judiciário. E isso precisa ser dito de uma forma firme, porque a gente está vivendo um momento em que o Poder Judiciário está inovando, está criando dispositivos penais. |
| R | E aqui eu me conecto, para encerrar, com o caso concreto do Deputado Daniel Silveira e da esposa dele, Paola, pelo seguinte: ao Daniel está sendo aplicada uma multa diária de R$15 mil que não existe no Código de Processo Penal como medida cautelar. Essa é uma medida que está fundamentada com base no Código de Processo Civil e que nunca foi solicitada pelo Ministério Público. Além disso, Dr. Sérgio, o Ministério Público Federal, por meio da Procuradoria-Geral da República, com muito custo, concordou com os agravos regimentais que foram apresentados por mim a título de defesa do Daniel nos autos da ação penal movida contra ele suscitando a extinção da punibilidade em razão da existência de um decreto presidencial. O Ministério Público concordou com essa petição em junho. Desde então, o Ministro Relator já proferiu diversas decisões ignorando um pedido expresso do Ministério Público de reconhecer e declarar a extinção da punibilidade em razão de decreto presidencial e de revogação retroativa das medidas cautelares, como titular da ação penal, e único titular da ação penal, e não é a conduta de nenhum ministro que vai alterar a estrutura acusatória do processo penal. Então, quando tem uma conduta de um ministro que viola a estrutura acusatória do processo penal, o que a gente tem é um processo que não é o devido processo e que não é um processo legal dentro da nossa estrutura constitucional. A gente não tem nunca uma alteração das leis em razão da conduta de um só. Com isso, eu queria agradecer pela oportunidade e reiterar a necessidade de que todos nós ouçamos mais o Senador Girão para que todos nós sejamos aqui alicerce, Senador, para que o senhor continue desempenhando seu corajoso papel, que imagino que não é fácil, mas que é fundamental para a nossa democracia, e espero que o senhor seja exemplo não só para todos os brasileiros, mas, especialmente, para os colegas aqui da sua Casa, porque a gente está vivendo o que está vivendo em razão da omissão de muitos colegas do senhor, porque é o Senado Federal que deveria estar olhando pela nação brasileira em relação aos abusos e às violações como instrumento de freios e contrapesos previsto na Constituição. Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Dra. Mariane Andréia Cardoso dos Santos, que é Secretária-Geral da Comissão de Direito Constitucional da OAB-MG e advogada do Deputado Federal Daniel Silveira, que foi, nesse inquérito e nos outros, filhotes - você até chamou mais cedo de filhotes ou crias... Essa palavra "filhote" me lembra aquela história do filhote da ditadura, não é? Mas o trabalho da senhora ser ignorado solenemente não me surpreende, porque o nosso trabalho aqui, no Senado, está sendo ignorado solenemente também pelos ministros que são convidados, que, muitas vezes, nem dão satisfação "olha, não posso ir, vamos marcar outra data, vamos ver". Então, nós estamos vivendo realmente uma crise institucional no país, e o objetivo nosso aqui, com muita vontade de acertar, com muita disponibilidade para o diálogo, é tentar equilibrar, tentar dialogar pela democracia. Então, o Deputado Daniel da Silveira... Inclusive, eu fui informado aqui de que ele está online - eu queria confirmar -, porque o caso dele é muito emblemático. Dá a impressão clara de uma perseguição, uma perseguição não apenas a ele, mas à família dele também, à sua esposa... Até sua mãe, em algum momento, recebeu intimação ou alguma coisa nesse sentido. E aí, quando entra nessa coisa pessoal, sai de uma esfera mais institucional, a coisa fica mais difícil, porque é aquela coisa: o ódio cega, e a gente tem que ter muito cuidado com isso, porque aí perde o equilíbrio, a noção da razão. |
| R | Então, o Deputado Daniel Silveira está aqui. Ele está conectado. Você queria fazer mais uma colocação? Fique à vontade. A SRA. MARIANE ANDRÉIA CARDOSO DOS SANTOS - Queria só dar uma informação, que é a seguinte: o Daniel e a esposa dele tiveram o sigilo bancário deles quebrados de ofício, sem solicitação do Ministério Público, nessa fishing expedition, ou seja, nessa expedição de pesca, e a única coisa que foi pega foi transferência de um para o outro. Eles são um casal. Isso é natural entre casais. Mas, mesmo assim, se quebrou, de ofício, o sigilo dele, e as contas dos dois estão bloqueadas até hoje, mesmo com o pedido expresso do Ministério Público para revogação, ou seja, inclusive a subsistência da família dele estaria colocada em risco por meio de uma decisão que está ignorando o Ministério Público. E aí, Dr. Sérgio, eu queria convocar, se fosse possível, o Ministério Público para se insurgir contra isso, porque ele está sendo absolutamente descredibilizado. Era só isso. Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - E um detalhe importante também - vamos ouvir o Deputado Daniel Silveira -, mas um detalhe que a gente não pode esquecer neste momento, Professor, é: onde é que isso vai parar? Porque é uma escalada. A preocupação é onde isso vai parar. Ele foi preso, foi cassado, foram multas em cima de multas aí. Houve uma graça presidencial. Até que ponto isso está sendo respeitado? Ou está sendo ignorado também? Então, o que valem as leis do país? O problema é a insegurança jurídica. Esse é o cerne da questão que afeta a cada um de nós, à dona de casa, a quem está numa farmácia fazendo o seu negócio. Esse é o problema. Então, vamos ouvir o Deputado Daniel Silveira. O senhor tem a palavra. Obrigado por estar acompanhando esta audiência. (Pausa.) Acho que o senhor tem que ligar o microfone. Está ligado? Pronto. O SR. DANIEL SILVEIRA (Bloco/PTB - RJ. Para expor. Por videoconferência.) - Pronto. Senador Eduardo Girão, muito obrigado pelo espaço. Cumprimento a todos os presentes nesta audiência pública de suma importância. Eu não vou me ater muito à formalidade de apresentação, acho que está muito bem dado o recado. Esta audiência - parabéns, Senador! - é muito importante porque ela trata de um inquérito, o Inquérito 4.781, e de qualquer outro que seja, por osmose ou sendo simbiótico, assim como foi dito. Esclareço que também sou operador do direito. Então, não vou falar nenhum tipo de invencionice aqui e corroboro principalmente as palavras dos grandes juristas que me antecederam como palestrantes, como, por exemplo, Ives Gandra e o próprio Deltan Dallagnol, que foi uma das principais peças na Operação Lava Jato, que foi anulada sem nenhum tipo de teor jurídico concreto, porque foi um grande golpe - isso sim, um golpe à democracia -, tendo sido o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva condenado por nove juízes - um federal, três desembargadores e cinco Ministros do STJ - e, de repente, um único Ministro do STF ter anulado essa questão, que é extremamente volátil para toda a nação. E foi desconsiderada toda uma operação, inclusive o Deltan tendo que indenizar e até mesmo ressarcir os custos da investigação, do que foi empenhado nessa investigação aos cofres públicos. Ou seja, você vê uma dicotomia entre o certo e o escalabro - não é nem o errado; é o escalabro contra o arcabouço jurídico. Dito isso, não é novidade para os Senadores que esse inquérito foi aberto de ofício em 2019 pelo Dias Toffoli, que, então, presidia a Suprema Corte, e foi escolhido a dedo o Relator, o Ministro Alexandre de Moraes, que, inclusive, ignora, reiteradas vezes e de forma categórica, o próprio Senado, que tem a prerrogativa para poder trazer o Ministro, a convite. Ainda não tem, infelizmente, a convocação, mas tem o poder para impichar um ministro como o Alexandre de Moraes, que toma decisões - e aqui falo seguramente - que são decisões à margem da Constituição, que, inclusive, violaram as prerrogativas e imunidades dos Parlamentares. Isso para mim foi o ápice de todo esse processo com a minha prisão, mas não vou me ater aqui a me defender, a defender a minha causa, porque essa causa abrange o coletivo. |
| R | Esse processo, os Senadores - eu tenho certeza - não têm acesso aos autos. Eles não imaginam todos os crimes que estão sendo cometidos deliberadamente e reiteradamente pelo Ministro Alexandre de Moraes, que fere a Lei de Abuso de Autoridade, fere o tempo todo. Ela alcança todos os membros do Judiciário, como do Legislativo, do Executivo ou de qualquer órgão público. E parece que ele não consegue compreender o que está acontecendo. A história vai nos mostrar, talvez, um desdobramento infeliz. E aqui o Senador Eduardo Girão perguntou onde isso vai parar. Eu respondo, Senador: vai parar como a Venezuela. Em 2017, a Venezuela teve o Congresso, a Assembleia Legislativa de lá dissolvida pela Suprema Corte de lá, quando eles decidiram que eles defendiam a democracia e não mais os interesses do povo através do Parlamento. Isso é gravíssimo! Aqui no Brasil, hoje nós temos ministros que não são convidados ao Congresso, mas têm o disparate de fazer lobby - isso aí eu falo com testemunho - sobre, por exemplo, serem contrários ao voto auditável, o voto secreto, mas que possa ser auditado, ou seja, o voto impresso que já é lei e que eles ignoraram. Dentre todos esses fatores, o mais importante é, Senadores e Senadoras, o respeito à legitimidade popular no Parlamento. Um Deputado Federal... Vocês estão diante de um impossível: um Deputado Federal preso por palavras em rede social verificada, ou seja, em conformidade com o mandato, totalmente ligado, conectado ao mandato, portanto carregando a inviolabilidade tanto material quanto formal do Parlamentar, mas, ainda assim, fui preso, às 23h20, dentro da minha casa por uma polícia quase stalinista, parecendo a NKVD da União Soviética, de Stalin, a mandado de prisão em flagrante, instrumento jurídico que não existe em nenhum lugar do planeta, criado pelo Alexandre de Moraes. O que mais me surpreende - e venho aqui dizer isto e alertar para o perigo - é que o Ministro Alexandre de Moraes ainda não teve nenhum tipo de análise do Senado pelo Presidente Pacheco. E deixo aqui todas as críticas abertas pela inércia em cumprir o papel como Presidente do Senado, logo também, Presidente do Congresso, em colocar à análise do Plenário, que é de suma importância... Senadores como o Eduardo Girão e pouquíssimos têm lutado de forma aguerrida para pautar o pedido de impeachment que tem a materialidade e, claro, um teor jurídico aceitável que tipifique a conduta desses ministros que vêm atuando fora da lei, para que eles possam, sim, ser ouvidos e, claro, se necessário, impichados, processados e outros ministros nomeados. Isso é um papel para que se mantenha a ordem e a estabilidade jurídica do país, e não tem acontecido. Amanhã - convido a todos que estão aí presentes - teremos na Câmara dos Deputados uma audiência similar a esta sobre também o ativismo judicial e os Inquéritos 4.781 e 4.828, também das milícias digitais, todos abertos de ofício por ministros que simplesmente dizem que afetam a honra, a honorabilidade dos membros da Suprema Corte, que, repito, não têm a base em todo o país. Eles têm a jurisdição em nível nacional - isso também está preconizado no art. 92 da Constituição -, mas a dependência, a sede é na capital. Então, eu peço aos Srs. Senadores e Sras. Senadoras que, independentemente do viés político, que vocês tenham a noção do que vai acontecer com esse desdobramento do ativismo judicial aqui no Brasil. O Legislativo representa legitimamente o povo e está sendo solenemente ignorado por alguém que foi catapultado ao cargo de ministro, indicado por um Presidente, e não respeita aquilo que deveria ser preconizado: as leis constitucionais, que estão acima de tudo. Então, termino aqui este meu apelo para que vocês abram os olhos. Parafraseio o saudoso e brilhante jurista Ruy Barbosa: a pior ditadura é a do Judiciário, pois contra ela não há a quem recorrer. Peço a vocês atenção ao que está acontecendo no Brasil, para que possam, sim, ser processados os ministros que incorrerem em crimes aqui no Brasil. O que está acontecendo é extremamente assustador. |
| R | No mais, muito obrigado Senador, obrigado Senadores que acompanharam e convidados. (Falha no áudio.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado. No finalzinho aí houve um congelamento, está congelada a imagem dele aqui para mim. Deputado Daniel Silveira, eu até lhe peço desculpa, porque olha só o imaginário como está: no imaginário ele está como um Deputado zumbi, um Deputado cassado. Ele não foi cassado. Mas olha a que nível nós chegamos: um Parlamentar eleito diretamente pelo povo, no exercício de seu mandato. Se eu quiser convidá-lo para ir para uma palestra lá no Ceará, ele não pode. Pela decisão, ele só pode ir ao Rio de Janeiro e a Brasília... e estava Petrópolis. Pouco tempo atrás, parece que mudou para o Estado do Rio, mas no início, ele só podia da terra dele, da cidade natal dele, Petrópolis-Brasília-Petrópolis. Olha a simbologia disso: Petrópolis. Como a gente sabe que nada acontece por acaso - não é, Dr. Valmir? -, nós estamos nos 200 anos da Independência do Brasil. Essa parte do império já passou. Precisamos honrar o nosso passado, mas já passou. Nós estamos em uma república. É realmente muito preocupante o que está acontecendo. Quer dizer que rede social, Dra. Andréia, ele não tem? Ele não tem manifestação em rede social, foi proibido isso em decisão... (Pausa.) Não está saindo o som. A SRA. MARIANE ANDRÉIA CARDOSO DOS SANTOS (Para expor.) - Foi proibido cautelarmente, mas o processo dele foi definitivamente julgado em abril. O Dr. Sérgio e o Dr. Valmir sabem, com certeza. As cautelares, Senador, só podem persistir até o julgamento definitivo. Isso aconteceu no dia 20 de abril. No dia 21, foi proferido um decreto presidencial que extinguiu a punibilidade por meio do perdão, da graça. Desde então, não poderia subsistir nenhuma restrição à liberdade do Daniel, seja ela nas redes sociais, seja ela liberdade como um todo. E a gente está vendo exatamente o contrário: o acúmulo de medidas que vão sendo proferidas num processo em que a extinção da punibilidade já se deu há muito tempo. Então, a gente está vendo um desrespeito à Presidência da República, um desrespeito ao Ministério Público, um desrespeito à advocacia, um desrespeito até ao próprio Poder Judiciário, porque está na mente das pessoas assim: "Não adianta peticionar, não adianta falar nada não, porque o ministro faz o que quer". Não, o ministro não faz o que quer. O ministro tem que cumprir a lei. Mas aí a gente precisa resgatar essa convicção nas pessoas, porque senão a gente fica no descrédito, e as pessoas perdem a esperança. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito bem. O Dr. Valmir pediu para fazer uma observação. O SR. VALMIR PONTES (Para expor.) - Três observações rapidíssimas. Primeiro, que eu ainda me orgulho de ser advogado, mas eu estou já derrapando nessa convicção. |
| R | Mas eu queria lembrar - o Dr. Sérgio me oportunizou - o que diz a Lei 8.906, de 1994, que é o Estatuto da Advocacia. Segundo o texto expresso dessa norma nacional: "Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos". Assim como o senhor, Dr. Sérgio, eu aprendi e me tornei o que humilde e modestamente sou com o meu pai, também advogado, e que se separou corporalmente de mim em 1981, mas com quem ainda mantenho íntima relação. Para finalizar, eu quero lembrar uma frase que uma criança, filha de um estimado amigo, espírita como nós, Wayne, que teve uma filhinha falecida muito precocemente e ela, em comunicação psicográfica, usou de uma frase que eu jamais deixei de observar. Nós não devemos, diante desse cenário, nutrir ódios, rancores, jamais, devemos alimentar em nosso coração essa frase que essa garotinha falou, hoje já crescida, quer dizer, crescida em outro plano: "Meu pai, o perdão deixa a alma mais leve". Então, devemos manter a nossa alma leve e perdoar. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Porque o perdão no papel é muito importante, uma graça presidencial... O SR. VALMIR PONTES - Essa graça presidencial é insindicável pelo Judiciário. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - É algo que tem que ser respeitado, mas o perdão do ser humano para com o outro, e eu sei o quanto é difícil nessas querelas pessoais... Mas eu sempre falo que toda autoridade é constituída por Deus e a gente precisa orar pelas autoridades, todas elas: Ministro do Supremo, Presidente da República, Senadores, Deputados, Vereadores. É importante, muito importante essa oração, porque não é fácil estar sentado na cadeira também, a gente precisa se colocar no lugar das pessoas, nós somos seres humanos, somos falíveis, estamos aqui para aprender. Então, é muito fácil a gente julgar, a gente tem que ter esse cuidado, mas é importante o desenvolvimento... Jesus nos ensinou, o nosso grande Mestre, Jesus nos ensinou para inclusive orarmos pelos nossos inimigos. Eu sempre tenho repetido aqui nesse momento de polarização do Brasil que a gente vive que nós podemos ser adversários no campo da política, no campo das ideias, adversários, é um querendo ganhar do outro nas ideias, tentando mostrar que a sua... Mas jamais nós seremos inimigos. Então, que a gente possa orar por essas autoridades que de alguma forma podem ter deixado esse sentimento fluir para o lado pessoal e isso pode estar travando toda uma República, deixando os seus cidadãos numa pátria que tem a maior nação católica do mundo, a segunda maior nação evangélica do mundo, a maior nação espírita do mundo, todo mundo se relacionando bem, em paz, e a gente está tendo esse problema hoje institucional, no meu modo de entender, no Brasil por alguns exageros, podemos dizer assim, de algumas autoridades do nosso país. Eu vou passar a palavra agora... Olha, professor... O Prof. Wildemar Felix Assunção e Silva, que está aqui, é funcionário desta Casa. Inclusive, eu peço sua permissão para lhe alçar aqui a estar como um palestrante nosso, para ajudar a responder essas perguntas aqui, porque o senhor já participou da primeira audiência pública, que foi do ativismo judicial. Fez uma belíssima explanação. |
| R | O Dr. Wildemar Felix, que eu chamo de Prof. Wil, possui graduação em História e Direito pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB), mestre pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos, pós-graduado em Docência do Ensino Superior pela Ucam e em Direito Constitucional pelo IDP. Atualmente, é professor universitário na graduação e pós-graduação, professor em cursos preparatórios para concursos e doutorando pela Unisinos, consultor jurídico nas áreas de meio ambiente, resíduos sólidos, eleitoral, constitucional e administrativo. No serviço público, exerce o cargo de Assessor Parlamentar do Senado Federal. Antes de passar a palavra para o senhor... É claro que o senhor terá um pouco mais de tempo, não os três minutos do encerramento que cada palestrante vai fazer, para responder essas perguntas. Há aqui também algumas pessoas que querem fazer uma participação breve. Tem até uma pergunta da Alexia Portugal. Ela quer fazer uma pergunta. Eu vou só ler, Alexia. Você faz a pergunta, e aí a gente abre para as considerações finais, começando com o professor que está comigo agora aqui. A Ilana Rosa, de Goiás, pergunta: "Qual o embasamento para configurar qual site ou rede de notícias é confiável? Como diferenciar das fake news?". Aí vem aquela história - aproveitando a pergunta da Ilana - dos checadores. Vocês já ouviram falar dos checadores, não é? É um negócio que a gente não entende, porque um dia desses estavam mostrando que na Argentina, a inflação lá... O próprio checador dizendo que não sei quem foi que cometeu uma fake news. Parece que até o Presidente falou isso, não sei. Aí o checador lá: fake news. Aí ele vai comparar o que o Presidente tinha falado da Argentina, com outro país, com o Brasil, e aí o próprio checador dá informação errada. O próprio checador diz uma coisa que era mensal e colocou anual. Então, fica essa história: checador, onde é que tem isso? A Taiche Carneiro, de Sergipe, pergunta: "Existe algum website para denúncia sobre fake news e de ataques que internautas sofrem nas redes sociais? [Se sim,] Quais os contatos?". O Paulo Henrique, da Bahia: "[...] [Como] as fake news podem influenciar nas eleições?". A Tatiane Stal, de Santa Catarina: "Existem propostas efetivas que proporcionem à população um filtro maior na hora de julgar informações falsas e verdadeiras?". |
| R | Comentário aqui, do Haroldo José, do Paraná: "Meios oficiais de comunicação (sobretudo [...] [as concessionárias]) deveriam ser obrigados a explicitar o que é fato [...] e que é opinião.". Perguntas. Do Sr. José Pedro, do Distrito Federal: "A legislação penal é adequada para dissuadir as fake news?". Da Clarissa Saraiva, lá do nosso Ceará, Dr. Valmir: "Quais as penalidades para quem divulga fake news?". Do Nicolas Barros, do Paraná: "O inquérito das fake news respeita o sistema acusatório e as atribuições do Ministério Público?". Do César Rodrigues, do Rio Grande do Sul: "Quais as restrições ou impedimentos legais de o STF conduzir investigação sobre fake news, especialmente diante de ataques contra si?". Do João Gabriel, da Paraíba - rapaz, participação aqui de todo o país -: "Como [...] [diferenciar] se é fake news ou se é uma opinião[...]?". Do João Holanda, do Maranhão: "Quais normas os investigados transgrediram para figurarem no inquérito das fake news?". Vejam que há muitas dúvidas aqui. Do Reginaldo Noronha, do Amapá: "Qual é o limite do ativismo judicial, quais os impactos sobre a segurança jurídica e quem é responsável por limitar tal ativismo?". Do Eliezer Barbosa, de São Paulo: "Como o Ministério Público pode exercer sua autonomia diante das fake news de autoridades acima do Procurador-Geral da República?". Do Orly Gonçalves, de Santa Catarina: "Quais ferramentas digitais ou tecnologias que o Governo tem utilizado para uma análise mais isenta e inteligente na validação de fake news?". Do Lázaro Gomes, do Espírito Santo: "Como combater o aparelhamento, visto que as agências de checagem fazem um escrutínio somente nas postagens de ideologias [...] [da] direita?". Olha aí o Lázaro. De Michael Tavares, do Piauí: "O combate à tão falada fake news não deve servir de pretexto para censurar, calar quem pensa diferente.". Dra. Alexia Portugal, fique à vontade para formular a sua pergunta e aí e gente abre e depois fecha com as manifestações de quem pediu inscrição. A SRA. ALEXIA PORTUGAL (Para expor.) - Boa tarde, Senador! Boa tarde, convidados! Inicialmente eu gostaria de agradecer ao Senador Eduardo Girão pela iniciativa desta audiência. Nós sabemos da responsabilidade desta Casa com a harmonização dos Poderes, e os Srs. Senadores que participaram aqui demonstram compromisso com o país e a seriedade que o tema demanda. Bom, em 2021, a 6ª Turma do STJ, em casos de corrupção ativa, manteve entendimento de que os prints de tela do aplicativo WhatsApp não serviam como único meio de prova lícita em razão da dificuldade de se atestar a veracidade das informações e o rastreamento de vestígios. Ademais, a 2ª Turma do STF decidiu que é ilícito o acesso a mensagens do WhatsApp do investigado sem autorização judicial, invocando os direitos do sigilo das comunicações, à intimidade e à vida privada, além da efetivação do direito à não-autoincriminação. |
| R | Agora, em decisão recente, Ministro do STF instaura inquérito questionável, com base em prints obtidos em matéria jornalística, restringindo o direito dos acusados de ter acesso aos autos, à sua conta bancária e até mesmo às suas redes sociais, calando suas vozes. Dessa forma, eu indago aos convidados: ao agir de tal forma, além de atingir os indivíduos a quem os inquéritos se dirigem, não impõe o Supremo à sociedade um estado generalizado de temor e medo ao livre exercício da liberdade de expressão, um direito que é muito caro à democracia? A mera crítica aos Poderes e seus membros deve ser enquadrada como atentado ao Estado de direito? Os senhores acreditam que já se vive sob a ditadura do Judiciário, incluindo a perseguição política? Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Eu que agradeço a sua participação, Dra. Alexia Portugal, desde o início da sessão aqui assistindo, acompanhando. Muito obrigado. Eu já passo imediatamente a palavra ao Prof. Wildemar Felix Assunção e Silva. O SR. WILDEMAR FELIX ASSUNÇÃO E SILVA (Para expor.) - Boa tarde a todos. Sr. Presidente, primeiro, é uma grande satisfação estar novamente aqui participando deste debate. Eu me recordo quando vislumbramos tudo isso na sessão do dia 14 de junho, quando, no Plenário do Senado Federal, estávamos conversando e surgiu exatamente essa coragem de trazer ao povo brasileiro, de trazer a todos essa preocupação. Como servidor desta Casa, como aquele que está investido não só de um cargo para contribuir para a nação, mas acima de tudo como cidadão, nós estamos abrindo um caminho onde apenas a porta foi destravada para que de fato uma ação efetiva possa ocorrer. Nesta Casa, V. Exa., desde quando chegou aqui, nós já começamos a conversar e, a partir daí, nos tornamos amigos, e, a partir daí, comungamos com as mesmas premissas, os mesmos princípios, os mesmos valores, os mesmos ideais para o que é melhor para a nossa nação. E, nesse viés, quando o assunto é ativismo judicial, quando eu comecei a estudar Direito... Eu não pensava em nenhum momento em fazer Direito, meu primeiro curso de graduação foi História, e um aluno em sala de aula, quando eu era professor de História, me incentivou a fazer Direito quando simplesmente me ameaçou: "Professor, o senhor não vai me dar meio ponto?", e mostrou o cabo da arma. Eu falei: "Você tem meio ponto de participação". E, a partir dali, esse aluno me motivou a frequentar o curso de Direito, mas ainda não foi o momento. Eu me lembro, quando estava me preparando para o concurso do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, entrei numa sala de aula de Direito Constitucional e falei "Meu Deus, isso é maravilhoso!". A vida de todos nós perpassa esse livro. E entrei para o curso de Direito. À época em que fiz minha graduação, nós estávamos nos períodos áureos do Supremo Tribunal Federal, com ilustres nomes que aqui o Prof. Ives Gandra citou, que cada um de nossos nobres palestrantes também citou, e o Supremo era algo que todo estudante de direito à época tinha como referência absoluta. |
| R | Espelhávamo-nos nos ministros. Eu me lembro de quando assistia aos votos, acompanhava os votos de Ilmar Galvão e falava assim, meu Deus, eu quero ser igual a esse homem. Prof. Inocêncio Mártires, de quem tive a honra de ter sido aluno. Eu disse assim: professor, eu quero ter 1% do seu conhecimento. Ele me disse assim: "quando você estiver da minha idade, você vai ser melhor do que eu". E participar, àquela época, da vida do Supremo Tribunal Federal, no qual também tive a oportunidade de trabalhar, naquela Casa, justamente a essa época, eu estava simplesmente vivendo um êxtase, em que o conhecimento, em que a aplicação da lei e em que a competência originária daquela Suprema Corte estavam, de fato, sendo respeitados. Lembro-me de que, à época, tinha-se a discussão das instituições que todos respeitavam no Brasil. Em primeiro lugar, saiu a pesquisa, as Forças Armadas. Em segundo lugar, o povo acreditava no Supremo Tribunal Federal. E quando se falava em Supremo, todo mundo respirava fundo. Era sentido de orgulho para o brasileiro ter juristas que realmente faziam respeitar a Constituição. O Supremo Tribunal Federal, com todas as vênias a todos os ministros, com os quais, muitos deles, nós temos um bom relacionamento, e infelizmente hoje, quando eu me vi, já no mestrado, obrigado a escrever sobre a tragédia que estamos vivendo no âmbito do Poder Judiciário, eu nunca imaginei, na minha vida, que um dia eu fosse produzir um texto, fosse escrever contra atos de um Poder de que eu jamais duvidei, da sua envergadura, da sua posição, não só no texto constitucional, como na vida de cada um dos brasileiros. Como citou o Dr. Sérgio, a gente sempre ouviu dizer dos nossos pais, professores, que decisão judicial não se discute e se cumpre. E esse também foi um mandamento que eu ouvi durante muitos anos da minha vida: decisão judicial não se discute e se cumpre. Mas infelizmente o que nós observamos hoje... Eu tive a oportunidade, eu diria, não só a oportunidade, mas eu tive o desprazer de estar naquela fatídica sessão do dia 31 de agosto de 2016, no impeachment da Presidente Dilma. Eu estava no Plenário aqui do Senado Federal. Quando o Presidente do Supremo, presidindo aquela fatídica sessão, rasgou a Constituição, naquele momento, eu falei bem assim, meu Deus, por que é que eu me dediquei tanto estudando a Constituição, eu estando aqui nesta Casa que faz as leis, presenciando essa usurpação? Eu vou dizer, na minha sala de aula, para os meus alunos, a Constituição agora não é rígida, não, ela é flexível. É flexível. E quem flexibiliza a Constituição é o próprio Supremo Tribunal Federal, que deveria guardar a Constituição, e não simplesmente rasgar. |
| R | Quando nos deparamos, hoje, com a flagrante situação dos inquéritos, não só da fake news, mas com as atrocidades que estamos vendo, dia após dia, de decisões tomadas por meio de mensagens de WhatsApp, de decisões tomadas por meio de reportagens jornalísticas, meu Deus, meu Deus! Como pesquisador do ativismo judicial, como professor e agora doutor na área... O ativismo judicial foi criado exatamente com o seguinte objeto: vamos interpretar em busca do melhor para o bem de todos. Quando, no caso desse inquérito da fake news, houve a interpretação lasciva do art. 43 do Regimento do STF, nós tivemos, de fato, ali constituída materialmente a usurpação de um instrumento constitucional básico que é a obediência ao princípio da legalidade, ao princípio da imparcialidade e a todas as diretrizes do Estado de direito. Nessa premissa, meu Senador Luiz Pastore, do qual tenho orgulho de ser assessor, hoje, nesta Casa, e, com certeza, na próxima legislatura também... Uma coisa que me chama a atenção, dentro de todo esse viés, é que é inadmissível, impossível, nós testemunharmos que a nossa Constituição está sendo ultrajada, violada, por meio, simplesmente, de intromissão, de invasão de competência. Não cabe a ninguém fazer um juízo de valor daquilo que não lhe compete. Esta Casa, que é uma Casa política, é para discutir ideias, discutir caminhos, estes todos que foram legitimados pelo povo para o bem comum. Aqui, sim, eu posso ter uma opinião divergente, um Parlamentar poder ter uma opinião divergente do outro sem problema algum. Se discordamos nesse tema, vamos para o voto, e que vença o melhor. E sempre na busca do bem comum. No Poder Judiciário não há possibilidade de discutir porque a decisão tem que ser cumprida, não há possibilidade de discutir. Quando falamos de decisões de uma Suprema Corte estamos fazendo referências à decisão de um instrumento normativo que ali se constitui e não cabem mais recursos. Então, recorrer a quem? Como os nossos doutos palestrantes, hoje, fizeram referência: recorrer a Deus? Na época de minha graduação, quando falávamos em Ministros do Supremo falávamos que eram deuses. Eu me recordo muito bem do Ministro Marco Aurélio de Mello, um grande amigo, saudoso Ministro. Ele falava bem assim para mim: "Sabe por que nos chamam de deuses?" Eu perguntei: "Por quê?". "Porque nós somos, aqui, a voz final de tudo no Brasil" - olha só o detalhe, a voz final de tudo no Brasil. |
| R | E eu disse assim: "Então, senhor absoluto do céu e da terra, o que V. Exa. vai decidir hoje?". Ele disse assim: "Eu vou decidir o que é melhor para o bem comum no que eu entendo dentro dos limites da Constituição". Ele foi amplamente criticado durante o seu período como ministro por decisões totalmente controversas frente ao que a grande maioria pensava, mas uma posição ele resguardou. Como ele disse no seu último ato, na sua última sessão: "Eu resguardei a Constituição e não a violei por mero casuísmo político". Hoje nós estamos numa flagrante situação. Qual flagrante situação? A dimensão política está invadindo esferas que não deveria estar invadindo e não poderia estar invadindo. A nossa Constituição, desde o impeachment da Presidente Dilma, vem sendo rasgada página a página, e pasmem - e pasmem - por quem deveria resguardar a sua aplicação, infelizmente. Não estou aqui - não estou aqui - me colocando contra qualquer disposição de uma instituição que eu respeito, que eu admiro, que está no nosso ordenamento jurídico, é consagrada no nosso ordenamento jurídico e merece todo o respeito de todos nós, mas, infelizmente, como disse Thomas Hobbes: O homem é mau por natureza e, muitas vezes, a decisão do homem é equivocada e o homem erra. O homem pode errar. O que é preciso hoje e o que nós clamamos hoje a todas as autoridades deste país, em qualquer dos Poderes, é que tenham consciência do reflexo daquilo que está sendo efetivamente apresentado, está sendo decidido, está sendo definido. Responsabilidade. E uma responsabilidade com quem? Com toda uma nação - com toda uma nação. Uma decisão judicial não se discute; cumpre-se. Isso é um fato - isso é um fato. Mas nós não podemos, em hipótese nenhuma, em circunstância alguma, deixar que hoje nós estejamos diante de uma situação única, eu diria um câncer generalizado nos Poderes. Falam muito em questão de golpe de Estado. Eu digo que o maior golpe está sendo dado na violação do nosso preceito da nossa Carta Maior. É o maior golpe, é o maior golpe que nós temos, que foi feito nesta Casa, em 2016, com o processo de impeachment da Presidente Dilma e que está sendo feito por, infelizmente, vários membros do Poder Judiciário. Errar é humano. Eu erro, qualquer autoridade erra, qualquer pessoa erra, mas o que nós não podemos fazer é prejudicar - prejudicar - vidas por meio do nosso erro. Isso nós não podemos fazer de forma nenhuma. Nós devemos ter caráter dignificado para que as nossas decisões sejam decisões corretas e sempre exímias para o bem comum. E quem detém esse poder, seja por meio de uma indicação política, no caso de ministros, seja pelo povo, no caso de eleitos, tem a responsabilidade e o zelo do juramento de respeitar a nossa Carta Maior e resguardar a dignidade da pessoa humana. Porque todos nós, como brasileiros, temos o desejo de que, de fato, os objetivos fundamentais da República e os direitos fundamentais sejam efetivamente cumpridos em sua plenitude, mas cada um exercendo com zelo, solicitude e dignidade o seu papel. |
| R | Então, Sr. Presidente, agradeço novamente o convite, agradeço a oportunidade de ter aberto os trabalhos no dia 5 de julho. Ao meu Senador Luiz Pastore, agradeço a sua presença, agradeço por estar aqui nos prestigiando. Aos alunos do curso de Direito, que passaram aqui o dia se deleitando com o conhecimento que aqui foi apresentado, o meu agradecimento. E espero que juntos possamos construir um país melhor, o que, tenho certeza, é o objetivo de cada um aqui. Independentemente da posição em que cada um de nós estejamos aqui, construir um país melhor é um desejo mútuo e da responsabilidade de todos. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Dr. Wildemar Felix Assunção e Silva. O Senador Luiz Pastore pede a palavra, e eu agradeço a sua presença e por estar conosco colaborando sempre, buscando, eu acho, no fundo - não é, meu querido Senador? -, defender o Brasil, defender algo que é justo, que é correto, nada mais do que isso. Eu agradeço a sua presença aqui. Com a palavra o Senador Luiz Pastore. O SR. LUIZ PASTORE (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - ES. Para discursar.) - Primeiro, Senador Eduardo Girão, quero dizer que hoje eu fiquei encantado. Eu sou empresário, eu vim aqui para contribuir com o nosso país no que eu sei. Eu não tenho essa qualidade que o senhor tem, que o Wil tem, que me assessora, um extraordinário assessor. Eu estava voltando do almoço e eu vi que o Wil estava falando aqui. Eu saí correndo do gabinete para lhe dar um abraço, Wil. Tenho o privilégio de ter um cidadão como você, que pensa no Brasil, que pensa na sua filha, que pensa em todos nós e tem essa qualidade de ter esses alunos a quem você se dedica a dar aulas e pensar em um Brasil melhor, a sua igreja, em que você confia tanto... E este país múltiplo dá o direito a todas essas religiões de fazerem o que quiserem, e você é um exemplo fiel disso. Mas eu preciso dizer uma coisa de coração: eu não tinha o entendimento desta Comissão. Senador Girão, parabéns! Parabéns de coração! Parabéns de um empresário, parabéns de uma pessoa que não é um Senador. Eu sou um suplente que estou aqui exercendo, por poucos meses, esse privilégio de poder fazer alguma coisa pelo seu país. É assim que eu vejo. Eu vejo isso como uma missão, e o senhor sabe que essa missão é dura, porque, quando você se expõe, você leva porrada. (Risos.) |
| R | Mas é verdade, Pontes, não é fácil você sair da sua casa, do seu... Eu tenho 73 anos, fui rock and roll, adoro as artes, brinco com a vida, sou empresário desde os 16 anos. Trabalhei... A tribuna onde eu discurso no Senado, onde o senhor discursa foi feita pelo meu pai, o senhor entende? Móveis Pastore. Eu vim a Brasília pela primeira vez em 1958. O Juscelino - eu queria até citar isso aqui -, ele sabe do orgulho que eu tenho da minha família, uma família de imigrantes, imigrantes italianos que vieram e que sempre me ensinaram só uma coisa: palavra e trabalho. Hoje, nos Estados Unidos, tem uma pequena palavra que chama grit. Grit quer dizer correr atrás. Correr atrás é quem vai, quem faz, e isso eu vejo em muitos dos senhores. E, Girão, estou encantado com esse privilégio que eu tive hoje aqui. Eu não tenho o dom da palavra, não consigo expressar qualidade de pensamentos como vocês, mas eu queria dizer que hoje vocês trataram de um tema fundamental. Quando eu vi que um empresário... Vamos ser claros, eu não... Várias das ideias dele, como você bem falou aqui, não têm nada a ver com as minhas ideias, mas eu respeito a diversidade, e mesmo o Presidente Lula, outro dia, falou uma coisa muito bonita: nós não somos inimigos, nós somos adversários de pensamento. Nós temos que ter, mesmo com aquele em quem você não vai votar ou não; você tem que respeitar as coisas que ele fala e que cabem consigo, não é isso ou não? Pouco importa a cor, o que importa é um pensamento, e nós só vamos unir esta nação se nós tivermos o quê? Se nós tivermos gente que se senta à mesa com dificuldades, com adversidades, com pensamentos diversos, com um bem comum. Eu tenho um amigo, que você sabe bem que é um sujeito extraordinário, que é o Chiquinho Brandão, dono da FSB. Ele tem um lema que, Wil, é o seu também: a gente põe tijolo para ponte, não põe para muro. Para ponte! E, de repente, demora para você pôr esse tijolo, mas esse é o Brasil que eu quero. E hoje o senhor fez aqui uma coisa pelo que eu tenho orgulho de estar no Senado da República, Senador. Muito obrigado por me fazer melhor, por me fazer compreender melhor o Brasil. Eu não tive o privilégio... Eu vi a sua explanação, gostei de suas perguntas. Foi um momento dos momentos mais importantes que eu tive ao estar nesta Casa. Muito obrigado a vocês, muito obrigado, meu querido Wil, e parabéns. Esta Comissão merece palmas, e todos vocês, alunos que aqui estão. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Senador Luiz Pastore. A gente já pôde conviver juntos nesses três anos e meio por duas oportunidades, em que o senhor veio aqui e fez grandes relatorias - eu sou testemunha disso -, fez um desempenho ali, todo dia no Plenário, presente, dedicado, sempre aberto ao diálogo, sempre ouvindo, perguntando. É isso que a gente precisa, e o senhor engrandece aqui o Senado Federal. Conte conosco, aqui estamos aprendendo juntos. Eu aprendo muito com o senhor também, e a gente está nessa jornada pelo Brasil. |
| R | Então, eu agradeço demais ao senhor por ter participado desta sessão. É uma sessão histórica no Senado Federal. Eu acho que aqui tem que pegar... Já dá o quê? Quatro horas e ainda vamos ter mais uma meia horinha aqui. Mas são quatro horas de sessão e com conteúdo, com algo assim realmente muito forte. Eu queria já passar a palavra imediatamente, para a gente concluir. Depois eu faço as apresentações finais. O SR. WILDEMAR FELIX ASSUNÇÃO E SILVA - Só um minuto, Senador, pela ordem. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Está bem. Vamos lá. O SR. WILDEMAR FELIX ASSUNÇÃO E SILVA (Para expor.) - É um testemunho que eu quero deixar aqui - não só para quem está aqui presente, mas para o povo brasileiro - do caráter desses dois Parlamentares. Senador Pastore, você me inspira a cada dia, pelo seu caráter, pela sua palavra, pela sua honradez. Não só esta Casa, mas o Brasil precisa disso. Senador Girão, o que V. Exa. faz por este país, com coragem e determinação! Porque muitos não têm essa coragem de chegar ali no Plenário e defender o que o senhor defende: um Brasil justo e melhor para todos. Parabéns! Eu tenho orgulho de estar nesta Casa e muito mais de caminhar com vocês, de ter vocês na minha vida. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Obrigado, Professor. Também a gente tem que dar um desconto. Eu tenho que dar um desconto, porque eu gosto muito dele e ele gosta muito de mim. Mas eu não estou cumprindo mais do que a minha obrigação e o meu dever. Eu sei das inúmeras limitações e imperfeições, de verdade, mas estou procurando, no limite das minhas forças, ajudar de alguma forma, para os nossos filhos e para os nossos netos terem um horizonte cada vez melhor, porque este país é fantástico. Disso aí ninguém tem dúvida, não é? O nosso país é para estar no protagonismo do mundo. Ele já está, mas vai subir mais ainda. A gente precisa só aparar algumas arestas normais, procurar dialogar e procurar buscar alternativas aí para que tenhamos segurança jurídica, para que tenhamos investidores cada vez mais vindo para o país e que a gente possa... O Brasil é querido, não é, Senador? A gente anda pelo mundo, é impressionante como o brasileiro é querido por todas as nações. Então, isso aqui é muito especial. É uma terra que tem tudo para estar no topo - e vai estar, se Deus quiser! Eu vou concluir agora. Eu quero iniciar as considerações finais com o Dr. César Mariano da Silva. Muitíssimo obrigado ao senhor por estar aqui conosco até esta hora. Eu queria combinar se a gente pode em três - no máximo cinco - minutos, devido ao adiantado da hora, fazer as suas considerações. Se o senhor quiser responder alguma das perguntas que foram colocadas aqui pelos participantes, tanto no auditório, como pelos internautas, o senhor fique à vontade. De antemão, o Senado Federal agradece a sua participação diretamente de São Paulo, não é isso? Muito obrigado. O SR. CÉSAR DARIO MARIANO DA SILVA (Para expor. Por videoconferência.) - Sim, de São Paulo. Infelizmente, não pude comparecer pessoalmente a Casa. Por motivo de trabalho, não deu. Senador Girão, caros Parlamentares, colegas aqui presentes, fico muito triste hoje de ver o medo que impera nas pessoas. As pessoas têm medo de falar, as pessoas têm medo de simplesmente curtir alguma publicação nas redes sociais. Agora, com essa invasão da privacidade, por meio de indevida intromissão num grupo de WhatsApp, até mesmo dentro desses grupos as pessoas vão ficar com medo. |
| R | Em um Estado democrático de direito um dos pilares da democracia é a livre manifestação do pensamento. A pessoa tem o direito de falar o que quiser, contra quem quiser, de tecer críticas, dentro dos limites da razoabilidade. O que ela não pode é violar um outro direito fundamental, como a honra, praticar crime contra a honra e a tranquilidade social, praticar ameaça, incitar a prática de crime... Ou seja, há uma linha tênue entre livre manifestação de pensamento e uma conduta que extrapola esse limite e que vai ensejar uma infração penal. Só que não se pode, de maneira nenhuma, a pretexto de se calar, por algum motivo qualquer, dizer que a pessoa está praticando um crime, quanto mais invadir a privacidade. Foi feita aqui uma pergunta no que diz respeito aos prints. Já é assente na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, e até do Supremo Tribunal Federal, que print de conversa em WhatsApp não tem valor nenhum, porque pode ser montado, pode ser adulterado, fraudado e tirado do contexto. Há necessidade, numa situação dessa, de se fazer uma ata notarial - levar até um cartório, o cartorário vai verificar se é aquilo mesmo e vai lavrar uma ata notarial - ou de submeter uma mensagem, um celular, a um programa de computador que vai chancelar e vai dizer que aquela conversa realmente é correta, vai autenticar essa conversa. Outra coisa que não se pode fazer de maneira nenhuma é empregar qualquer tipo de intromissão indevida na intimidade das pessoas. Ora, para se invadir uma conversa de WhatsApp há necessidade de ordem judicial. Essa conversa nada mais é do que uma correspondência eletrônica. Sem ordem judicial, essa prova é absolutamente ilícita. Quer dizer, pegar algo de uma revista e, por meio disso, instaurar um procedimento e determinar medidas constritivas, viola a própria jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, mas estão sendo empregados prints de mensagens e violada a intimidade sem ordem judicial. Sem sabermos a origem dessas mensagens, vai estar havendo uma invasão à intimidade. Foi o que eu disse, daqui a pouco ninguém vai falar mais nada, todas as pessoas vão ter medo. Parece que nós estaremos punindo a chamada crimideia, de 1984, um livro muito famoso do George Orwell, porque, quando o Estado não tinha algo para punir alguém, punia as ideias. Daí vem o termo crimideia. Isso não pode, de maneira nenhuma, porque viola o nosso Estado democrático de direito. E todas as pessoas, principalmente as pessoas públicas, muito mais elas, não estão imunes a críticas. O que não se pode é extrapolar essas críticas e adentrar a um crime a uma infração penal. Espero ter, pelo menos, respondido à pergunta, ou parte da pergunta, que foi feita aqui em Plenário. |
| R | Então foi uma honra estar aqui, Senador Girão. Essa oportunidade realmente foi ímpar. Parabéns por esse evento, porque a sociedade precisa saber, precisa saber que existem direitos - e esses direitos devem ser observados -, que nós temos uma Constituição Federal que nos dá esses direitos. A partir do momento em que a livre manifestação do pensamento deixa de existir, passa-se ao Estado totalitário, haja vista que é o primeiro direito a ser suprimido nas ditaduras. Muito obrigado por tudo. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Olha, quem tem que agradecer somos nós aqui, pela sua presença, pela sua participação. Muitíssimo obrigado, Dr. César Dario Mariano da Silva. Dando sequência aqui, caminhando realmente para o fim - daqui a pouco, nós teremos sessão no Senado Federal, no Plenário, para analisar e votar medidas provisórias -, eu já passo a palavra para o Dr. Sérgio Harfouche. Muito obrigado, mais uma vez, de antemão, pela sua presença. O SR. SÉRGIO FERNANDO RAIMUNDO HARFOUCHE (Para expor.) - Reitero minha gratidão a V. Exa., Senador. Eu gostaria de me reportar à pergunta do Eliezer Barbosa, de São Paulo. Eu não sei se compreendi direito, mas ele queria saber, acima do Procurador-Geral da República, quem poderia intervir no que diz respeito ao dominus litis ou, então, à oportunidade de oferecimento de ação penal. Ninguém mais. A Constituição Federal preserva, no art. 129, a oportunidade tão somente de o Ministério Público promover ação penal, no caso da pública. Uma vez que o Procurador-Geral da República tenha se manifestado, como o fez, pelo arquivamento, não há como o Supremo Tribunal Federal ou quem quer que seja prosseguir ou sequer delegar a quem quer que seja. Até um promotor de Justiça... O art. 28 do CPP diz que, caso um promotor de Justiça não promova a ação, não ofereça a denúncia, ainda pode o Judiciário encaminhar ao Procurador-Geral de Justiça. Mas, uma vez que o Procurador-Geral da República já se manifestou pelo arquivamento e pelos fundamentos que trouxe, pelas violações que se apresentaram nesse Inquérito 4.781, não caberia mais ao Supremo seguir, insistir. Inclusive, recentemente, nós vimos também a Subprocuradora Lindôra assim se manifestar. Isto agora, recentemente até. Espero, então, Eliezer, ter respondido a sua pergunta. Ninguém mais deveria, ninguém mais pode, constitucionalmente, sem que haja violação da Constituição, ter condição de legitimidade para propor ação penal ou coisa assim. Inclusive, isso foi bem mencionado no julgamento do Ministro Celso de Mello fazendo referência a vários outros julgados dizendo que o próprio Supremo Tribunal Federal ressalta a impossibilidade de recusar o pedido de arquivamento quando isso manifesto pelo Procurador-Geral da República. |
| R | Então, eu, como membro do Ministério Público, ainda que na condição em que me encontro, ressalto e destaco, juntamente com as funções essenciais da Justiça, que nós precisamos resgatar esse respeito, e eu espero que haja sensibilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal para que preservem o que resta ainda de credibilidade desse órgão. Quero, então, encerrar agradecendo. Faço menção aqui ao meu amigo Alex Canuto, professor também e um paladino dentro das ações que nós temos visto. Não sei se vai ser aberto para mais alguma questão, mas eu gostaria muito de ouvi-lo falar. Eu tenho certeza de que você é uma das pessoas que eu sei que estaria aqui talvez trazendo muito mais conteúdo do que eu tive a oportunidade de fazer. Por fim, meu agradecimento ao nosso Senador Girão. Como eu disse, para mim, é um modelo para os próximos Senadores que hão de compor esse novo terço. Senador, eu peço a Deus que o senhor tenha pessoas com esse perfil, com essa imparcialidade com que o senhor lida com cada questão nesse próximo terço que há de compor a Casa. Que Deus nos ajude! O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MG) - Amém! Muito obrigado. A gente já tem aqui, Dr. Sérgio, bons Senadores, atuantes e que estão conosco nessa caminhada - os que participaram aqui desta sessão são exemplos -, e eu acredito que essa renovação vai trazer mais nomes para fazer frente a essa demanda da sociedade que a gente está vendo. Eu gostaria de passar a palavra... Já que o senhor deu a deixa, eu vou pedir três minutos aqui, porque aí eu vou deixar a palavra final para encerrar a sessão para essa grande referência jurídica do Brasil, não apenas do Ceará. Eu tenho aqui os inscritos. Nós vamos começar pelo Alex Canuto. Eu só pediria três minutos, porque vai começar uma sessão dentro de pouco tempo, e a gente precisa já encaminhar para o fim. As pessoas estão cansadas, a equipe, muita gente sem almoçar. Ainda temos umas barrinhas aqui que, de vez em quando, seguram as pontas. Mas vamos lá: agora, Alex Canuto; depois, a gente vai para a Dra. Roberta Lacerda; depois, para o Sr. Petrônio Omar Querino Tavares; e a gente encerra com a participação, com a palavra final do Dr. Valmir Pontes Filho. Dr. Alex Canuto é o Coordenador da Ordem dos Advogados Conservadores do Brasil. O senhor tem a palavra por três minutos, por favor. O SR. ALEX CANUTO (Para expor.) - Muito obrigado, Senador Girão. A gente se inspira no Dr. Enéas. Então, três minutos é uma eternidade para a gente falar, mas a gente se esforça para falar rapidinho aqui. Cumprimento o Senador e, na sua pessoa, cumprimento todos os palestrantes desta audiência, que foi muito importante, que vem numa sequência de audiências convocadas por V. Exa. Já discutimos aqui o ativismo judicial, as fragilidades no sistema eleitoral. E aí foi apontado, nessas sequências de audiências públicas, que, reiteradamente, são feitos convites a Ministros do STF que não comparecem. Então, nós temos que analisar esse conjunto de audiências que é importante para pautar esse tema na sociedade. Falamos do ativismo judicial: de quando Ministros do STF ocupam o lugar de legisladores produzindo leis; de quando ocupam o lugar de políticos, de Parlamentares articulando projetos de lei ou contra projetos de lei, contra PECs; ocupam o espaço da diplomacia fazendo reuniões com embaixadores; ocupam o espaço do Presidente da República querendo nomear o Diretor da Polícia Federal; e agora ocupam o espaço de membros do Ministério Público e de delegados de polícia ao instaurar e presidir inquéritos. Vai havendo esse abuso. |
| R | Hoje a audiência pública é para tratar especificamente do Inquérito 4.781, que puxa, é claro, outros assuntos que foram aqui tratados. E por que a gente está tratando desse abuso hoje, de tudo isso que foi levantado, desses abusos que aconteceram nesse inquérito? Porque não houve uma trava lá atrás. Quando começou um abuso pequenininho, ninguém travou. Essa artimanha é muito clara. Se você produz uma jurisprudência num caso sem importância, aí depois você aplica esse mesmo entendimento num caso um pouquinho maior, depois num pouquinho maior, num pouquinho maior, aí você chega à situação que a gente chegou hoje. Esses pequenos abusos começam na jurisprudência e já invadiram a área dos inquéritos. Hoje há um inquérito com base em fake news. Fake news foi uma expressão criada pelo ex-Presidente Donald Trump. E isso hoje está gerando crime no Brasil - crime! Já tivemos, no caso, crimes criados por jurisprudência. O mais famoso é o caso da homofobia. Essa palavra não aparece no Código Penal e em nenhuma outra legislação correlata, mas o Supremo deu interpretação extensiva à lei penal, coisa que qualquer estudante de Direito de primeiro ano sabe que não pode acontecer, mas foi feito e equiparou-se um crime, a conduta de homofobia, ao crime de racismo, feito por jurisprudência. Isso já foi um estágio avançado em que não houve travas. Agora, como não houve trava, está sendo mais uma expressão... Essa expressão "homofobia" foi criada por um setor da oposição ao atual Governo. Agora, cria-se um crime baseado numa palavra criada por um ex-Presidente dos Estados Unidos - e não se cria nem por jurisprudência; é por inquérito, porque ainda não há jurisprudência definindo o que é homofobia, é um inquérito, simplesmente um inquérito, dizendo que você vai responder esse inquérito por fake news, e esse inquérito durou aí três anos e fica essa pressão sobre as pessoas. E, além da usurpação de competências, acontecem os abusos no interior do inquérito, o que já foi falado. Não houve ali incentivo a atos antidemocráticos, não houve financiamento de atos antidemocráticos. Mesmo assim, as pessoas estão lá respondendo por isso. Então, o Supremo hoje está criando insegurança jurídica e desarmonia entre Poderes. E aí nós vemos comprometido o art. 2º da Constituição, quando diz que o Brasil é composto por três Poderes independentes e harmônicos entre si. Hoje está havendo desarmonia. Essa desarmonia é apontada por uma parte do Poder Legislativo e pelo Chefe do Poder Executivo. Está havendo desarmonia! A própria Constituição prevê... O único instrumento para resolver essa desarmonia entre Poderes talvez esteja previsto no art. 142, quando diz que compete às Forças Armadas a garantia dos Poderes constitucionais. Isso hoje não há... Se existe um Poder coator e Poderes coagidos, existe desarmonia entre Poderes. E por que há essa coação? Porque também começou o entendimento, um tempo atrás, num caso sem importância, de que o que o Supremo dizia valia mais do que o que os outros Poderes diziam. Isso permitiu que fosse avançando, avançando, avançando e cada vez houvesse mais coação de um Poder sobre os outros. Mas não está escrito em lugar nenhum da Constituição que o STF, que o entendimento do STF prevalece sobre os outros Poderes. Então, cabe ao STF guardar a Constituição, nos termos do art. 102, e não extrapolar os Poderes constitucionais. Para concluir, chegamos a esse ponto de desarmonia entre os Poderes. E, se não houver travas, essa desarmonia vai continuar. É preciso que haja essas travas, porque, senão, a população hoje já começa a passar para o lado da especulação: qual será o próximo abuso a ser cometido por um dos Poderes, pelo Poder que está coagindo os outros dois? Será na apuração das eleições? Será no Sete de Setembro? Não se sabe. Então, é preciso que haja essa harmonia. Eu faço votos de que a gente encontre um diálogo - o caminho para encontrar essa harmonia é o caminho do diálogo - para que não seja necessário aplicar dispositivos constitucionais que possam causar instabilidade no Brasil. Todo mundo quer estabilidade e harmonia, que só devem ser construídas na base do diálogo. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito bem. Muito obrigado pela sua participação, Sr. Alex Canuto, que é o Coordenador da Ordem dos Advogados Conservadores do Brasil, que está desde o começo aqui, participando. Eu agradeço muito a sua presença. O senhor já participou das outras duas, não é? (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Do ativismo judicial ou da segurança e transparência das eleições? |
| R | O SR. ALEX CANUTO - Na do ativismo judicial, (Fora do microfone.) ...quando o senhor me concedeu a palavra, eu falei. No ativismo eu só acompanhei... Aliás, perdão, a da urna eletrônica eu só acompanhei. E agora tenho a honra de ter a palavra concedida mais uma vez. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito obrigado. Eu é que agradeço. Inclusive, foi boa essa observação que o senhor fez, porque muitas pessoas me perguntam: por que o Senado não convoca os ministros do Supremo? Porque a gente já fez aqui... Ó, vamos relembrar: já tivemos duas audiências em que faltaram o Ministro Barroso e o Ministro Alexandre de Moraes, na do ativismo judicial; e, na da segurança e transparência nas eleições, faltou o Ministro Fachin. Então, as pessoas dizem: "Olha, vocês não estão compreendendo que eles não vão? Que eles não têm respeito pelo Senado? Que eles não querem saber de conversa?". Eu disse: "Olha, um erro não justifica um outro, não é? Se de uma certa forma eles não estão tendo essa consideração...". Mas eu ainda espero que tenham, eu tenho outros convites aqui já aprovados para ministros do Supremo que a gente espera... Nós vamos insistir, fazendo o nosso papel, não é? Aí cada um tem a decisão, toma a decisão que lhe convier. E a população está vendo o que está acontecendo, as pessoas estão percebendo quem quer dialogar, quem não quer dialogar. Então, nós não podemos convocar, gente. A Constituição - vou deixar isto muito claro - não nos dá esse direito, esse poder, na verdade, de convocar ministros do Supremo Tribunal Federal. O que a gente poderia fazer seriam pedidos de impeachment, que estão aí mais de 52, como já foi falado. Em 133 anos da República, nunca foi deliberado um pedido de impeachment. E a gente está na expectativa de que isso possa vir a acontecer em algum momento. Tem também a CPI da Lava Toga. Veja bem que ironia do destino: o próprio Supremo Tribunal Federal mandou, no ano passado - e todo o Brasil viu -, determinou que se abrisse uma CPI aqui. Foi o Supremo. A gente não pode esquecer: eles determinaram que o Senado abrisse uma CPI, e a gente viu que foi uma politicagem na CPI, não é? Eu acho que todo mundo percebeu o jogo: era antecipando este ano. O ano que a gente está vivendo agora de eleição foi antecipado para o ano passado com o objetivo, no meu modo de entender - e eu tenho críticas fortes a este Governo atual e deixei claro no meu relatório da CPI, apontando erros. Mas não justifica você fazer política no momento em que as pessoas estão morrendo, com interesse de projeto de poder para desgastar um governo. Isso é jogar contra o Brasil. Se quer tirar o Governo? O.k. Vai para as urnas, tira no voto, faz a campanha, mas não pode interferir na campanha - não pode interferir na campanha! -, não pode pegar um dos maiores mobilizadores de um candidato, um dos empreendedores enquadrados, e tirar a palavra dele, tirar a mobilização dele, que não era uma mobilização ilegal, gente! Ou seja, os fins não justificam os meios. Se a gente não entrar por aí, não tem como. Então, muito obrigado, Alex Canuto. Eu passo imediatamente a palavra para a Dra. Roberta Lacerda, do Rio Grande do Norte, agradecendo a presença dela aqui, no Senado Federal. |
| R | A SRA. ROBERTA LACERDA (Para expor.) - Caro Senador Eduardo Girão, na pessoa de quem eu levo a palavra a todos os representantes desta digníssima mesa e desta audiência pública que eu diria histórica, eu aqui me apresento meramente como uma cidadã brasileira, a exemplo de outros tantos cidadãos, profissionais liberais, médicos, empresários, pesquisadores, políticos, cientistas, acadêmicos, que tiveram a sua vida devassada por um conjunto de fatores que varreu a nossa sociedade e limitou a nossa capacidade de usar o raciocínio crítico. Eu diria que a gente tem alguns pontos que eu gostaria de frisar. A palavra nos diferencia como espécie. O desenvolvimento do cérebro permitiu a capacidade de raciocínio, linguagem e inteligência. Foi exatamente o desenvolvimento da linguagem simbólica que possibilitou a maravilha do pensamento humano. E aí chegamos ao mundo, ao homem moderno de hoje, que vive em sociedade e que precisa da comunicação para construir o que se chama cultura. O que é uma nação se não um conjunto de pessoas que congregam os mesmos valores, as mesmas crenças e a mesma cultura? É neste momento que eu lembro aos senhores que, como espécie, nós somos Homo sapiens sapiens, os homens que sabem o que sabem ou que raciocinam e criticam aquilo que acham que sabem, porque tolo é aquele que acha e julga que tem controle total da verdade e da razão. Em grego, a verdade chama-se alétheia, que significa aquilo que não está oculto, não está escondido, manifestando-se aos olhos e ao espírito tal como é, ficando evidente à razão. Em latim, verdade, de veritas, é aquilo que pode ser demonstrado com precisão, referindo-se com rigor e exatidão. Se não podemos falar em nome da verdade, como viveremos em sociedade? Como grande amante da filosofia, eu gostaria de voltar a atenção de todos os senhores aqui para a figura da pessoa que, com maestria, é chamada de Patrono dos Advogados do Brasil. Estamos na Casa de Ruy Barbosa, esse brilhante jurista que, como jornalista, diplomata, político, Deputado, Senador, duas vezes candidato a Presidente e ministro, teve o privilégio de exercer aqui o que a gente chama de mérito à honra e à ética. Nas palavras dele, o privilégio divino da palavra é a espontaneidade, a sinceridade e a liberdade em ação. Em 1907, na Assembleia de Paz em Haia, o nosso ilustríssimo Ruy Barbosa já dizia: A palavra não faz mal, ainda às vezes transbordando. [...] Nos países onde se desconfia da palavra, e onde a proscrevem, é que nunca se logra chegar a acordo e os antagonismos são irredutíveis. Onde, porém, incessantemente se aceita a discussão, como na Inglaterra e nos Estados Unidos, sempre se acaba por estabelecer a concórdia e não há problemas insolúveis. |
| R | Aqui fica uma questão. Nunca na história da humanidade a censura serviu senão à mentira, senão jogando a verdade no poço e trazendo as suas vestes para que a mentira andasse por aí, muito mais eloquente e mais bem vista do que a verdade nua e crua. Já nos mostram os grandes mestres da propaganda de Goebbels a Chomsky e Gramsci, que escreveu obras importantes sobre a mídia e a manipulação de massa, ensinando como instigar a população a reconhecer um inimigo, a representação como realidade, criando o medo coletivo, que poderia ser muito e tão somente um vírus mortal do qual nós tivéssemos que nos abnegar das nossas liberdades em que, por medo de morrer, deixamos de viver. O cortejo aos inimigos, a percepção seletiva e a criação de slogans vazios, como "todo movimento deve ser guiado pela ciência" ou "fique em casa, a economia a gente vê depois", são instrumentos de manipulação das massas, para criar uma narrativa que limita a sua percepção e o que me leva a um último questionamento: quem checa os checadores de notícias da verdade e das evidências científicas? Muitos, por razões de conflitos ideológicos ou interesses financeiros, são inclusive patrocinados pelos mesmos que fazem e estudam os medicamentos que procuram uma evidência melhor. Nas palavras do nosso Prof. Dr. Hector Carvallo, um grande pesquisador de medicamento reposicionado na Argentina, hoje há evidência científica para se garantir que o uso de um medicamento nesta pandemia foi inversamente proporcional ao seu valor de compra: quanto mais barato um medicamento, maiores eram as exigências das evidências científicas; e, quanto mais caro e maior o lobby da indústria farmacêutica, mais rasas eram as evidências, mais fraudadas eram as metodologias desses estudos para enganar uma população. Eu finalizo aqui com as palavras de Lord Salisbury. Três vezes Primeiro-Ministro no Reino Unido, esse político conservador nos ensina que, já do século XIX a hoje em dia, doa a quem doer, a força está com a palavra, com os que sabem falar. E nós conclamamos a todos os brasileiros e cidadãos deste país que não incorram no erro da neutralidade, porque, já dizia Dante, o sétimo círculo do inferno está resguardado para aqueles que nos momentos de crise escolheram a neutralidade da ação. Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Dra. Roberta Lacerda. Eu acolho a sua emoção e inclusive esse tópico em que a senhora tocou aí, quando falou sobre a questão desses tempos sombrios que a gente está vivendo. No ano passado, nós tivemos algo, assim, surreal acontecendo na medicina, na forma de as pessoas encararem o que a gente viveu. Eu acho que talvez a gente não tenha entendido. |
| R | E nós vimos, Prof. Wil, aqui no Senado, médicos e renomados cientistas, convidados a participar de uma CPI, e Parlamentares se levantando, deixando-os falarem sozinhos, porque discordavam previamente do que eles iam dizer, ou seja, não queriam nem ouvir aquelas palavras, não queriam ter acesso ao conhecimento, já julgaram que não é isso, que é aquilo. É muito estranho. É sempre bom ouvir os dois lados, não é? É sempre importante ouvir os dois lados. Muito obrigado, Dra. Roberta. Eu estou com o Senador Esperidião Amin aqui presente, pedindo a palavra. Eu concedo a palavra ao Senador Esperidião Amin, diretamente de Santa Catarina. Muito obrigado, Senador. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Para discursar. Por videoconferência.) - Senador Eduardo Girão, eu quero cumprimentar o prezado amigo e todos aqueles que participaram, compreender a posição daqueles que não puderam participar e dizer que o Brasil ainda vai reconhecer a sua perseverança e a minha, que, mesmo não sendo tão ostensiva, é igualmente sincera. Nós estamos vivendo tempos estranhos, isso que o amigo falou sobre o que vivemos quando profissionais da medicina, da ciência trouxeram, em meio à tragédia da pandemia, versões que contraditavam aquelas dominantes, mas não necessariamente corretas, lembra a inquisição. Eles eram até achincalhados por quem não concordasse com o conteúdo do seu conhecimento e da sua convicção. Ou seja, este monopólio da verdade é agravado quando, na vigência da constituição do Estado de direito, nós vivemos essa longa exceção deste inquérito que temos abordado, iniciado em março de 2019, sem um objeto definido, com uma porta fácil de abrir, mas que só um tem a chave, só exatamente a pessoa que julga e que, portanto, determina quem deve ser investigado, quem deve ser abordado, quem deve ter a sua vida submetida ao escrutínio da polícia ou do Ministério Público sem que haja um processo formal. Este momento estranho a menos de 40 dias da eleição faz com que muitas pessoas não queiram ir à janela para saber o que está acontecendo. V. Exa. tem sido um guardião da liberdade e da Constituição. E eu quero ser solidário com essa busca, não para acusar este ou aquele, mas para defender o Estado democrático de direito, que não se compadece com esse procedimento que vem avançando ao longo do tempo. Tenho certeza de que nós estamos do lado certo, Senador Girão, mesmo que demore, como diz a bandeira de Minas Gerais, não é? Liberdade, direito, ainda que tarde. |
| R | E nós vamos conquistar com a sua perseverança e de acordo com aquilo que acontece sempre quando as pessoas acordam, percebem o que estamos perdendo e aí acorrem para vir para este lado certo que V. Exa. lidera, com, acima de tudo, muita coragem cívica. Não é coragem no sentido físico da palavra, é coragem cívica, coragem moral. Eu, num gesto de admiração, fiz questão de participar, ainda que de maneira muito rápida, desta sessão, que é histórica tanto pelas presenças quanto pelas ausências. Parabéns! Um grande abraço a todos. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, meu querido irmão Senador Esperidião Amin, que sempre participou aqui, em todo assunto relacionado a esse caso do Inquérito 4.781, assim como de outras demandas que a gente percebe que precisa de um equilíbrio. O Senador Esperidião Amin é uma referência, para todos nós aqui, de sabedoria. É um homem experimentado e muito justo em tudo que faz, e eu fico muito feliz com a sua participação, para fechar com chave de ouro esta sessão aqui no Senado Federal. Eu passo a palavra, para as considerações finais, ao Dr. Valmir Pontes Filho, que veio também abrilhantar esta sessão no Senado Federal. Muito obrigado. O SR. VALMIR PONTES (Para expor.) - Senador Girão, eu começo por fazer uma breve apreciação sobre a fala do Prof. Wil. Disse o eminente participante desta sessão que ele temia que a Constituição estivesse a ser violada. Eu vou um pouco além, Professor: talvez a Constituição esteja a ser liquefeita. Quanto à insegurança jurídica, Senador, ela só nos pode levar ao caminho da barbárie, e isso é muito preocupante. Mas eu quero cumprimentar não só V. Exa. por essa histórica - repito as palavras do Senador Amin - sessão, dirigindo-me à - não vou dizer conterrânea, mas vizinha - nobre participante deste evento lá do Rio Grande do Norte, Dra. Roberta, que falou com a emoção própria dos nordestinos. Eu diria à senhora, Dra. Roberta, primeiro, que, além de Ruy, há um outro advogado que precisa ser lembrado. Aos jovens, sugiro que pesquisem na internet - cuidado, é claro, com a internet, mas pesquisem - sobre Heráclito Fontoura Sobral Pinto, um grande advogado. E as perguntas... Sim, em penúltimo lugar, eu diria que nós estamos às vésperas de um momento político brasileiro inédito. Nós estamos diante de uma eleição que tem cunho plebiscitário. Cada um vote com a sua consciência. Por falar nisso, a minha consciência me checa; é o único checape que eu admito. |
| R | Por fim, eu digo a todos os que formularam perguntas o que disse Fernando Pessoa: "Se eu te pudesse dizer o que nunca te direi, tu terias que entender aquilo que nem eu sei". Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muitíssimo obrigado, Dr. Valmir Pontes Filho. Eu cometi um equívoco, mas é aquela coisa: é sempre bom o Roberto Lasserre aqui, que nos ajudou muito na organização desta reunião. Muito obrigado. O Roberto me lembrou da sua fala, que foi comprometida. Eu quero passar a palavra para o Sr. Petronio Omar Querino Tavares, que é Presidente do Instituto Brasileiro Pró-Cidadania. Ele, que é amigo... Deixe-me dar mais um tempinho aqui para mim - eu garanto que é o último. Ele que é amigo do... Nós temos um amigo em comum, que é o Josué Fermon, que está ali, participando - amigo do meu pai também - desta reunião desde o início. Então, eu passo a palavra para o Sr. Petronio Omar Querino Tavares. Só peço três minutos, porque a gente chegou realmente ao limite. Muito obrigado. O SR. PETRONIO OMAR QUERINO TAVARES (Para expor.) - Senador Eduardo Girão e demais integrantes da mesa, todos os presentes, eu diria que, aos 78 anos - minha idade -, quis o Grande Arquiteto do Universo me proporcionar este momento. Há 60 anos, fui liderança estudantil. Acompanhei a trajetória... Eu sou "paraibuco", que é uma nova classificação de nordestinos: mamãe, da Paraíba; papai, de Pernambuco. Aos 18 anos, acompanhei a trajetória política de minha mãe, que, em 1955, foi a primeira mulher eleita vereadora em toda a Mata Sul de Pernambuco. Quando estava no terceiro mandato, pelo Golpe Militar de 64, ela teve interrompida sua trajetória. Mas me honra muito ter herdado dela a impetuosidade. Em 1988, eu fui presidente do Fisco de Pernambuco por dois mandatos e do nacional por dois mandatos. Em 1990, presidindo o Fisco Nacional, nós produzimos um documento importante em um seminário aqui em Brasília, intitulado: "Sonegação, fraudes e corrupção, como combater?", que entregamos em mãos ao Presidente Fernando Collor de Mello. Iniciamos uma grande trajetória de luta por essa transparência. Eu sou auditor aposentado da Fazenda de Pernambuco. Eu vim a Brasília - por isso eu digo que é um privilégio este momento - para divulgar, na CGU - estivemos hoje na Ouvidoria do Senado -, na Câmara dos Deputados, em várias instituições, um seminário que vamos fazer em novembro, nos dias 28, 29 e 30, em São Paulo, que é o 15º, intitulado Seminário Nacional "Ouvidores & Ouvidorias", com o tema "Direitos da Cidadania, Proteção de Dados e Controle Social". E por que eu aproveito este momento aqui e o considero ímpar e oportuno, dentro dos três minutos? É porque eu temo até falar aqui, o direito de falar. |
| R | Não é possível um negócio destes: nós estarmos na Casa que representa a nacionalidade, que é o Senado, em que cada estado não se sobrepõe ao outro porque cada um tem três Senadores, três representantes, e temermos falar. E este é um momento muito importante também, Senador Eduardo Girão, porque eu voltar para casa tendo tido esta oportunidade rara, vou chegar em casa e minha esposa vai perguntar se eu dei um abraço no Senador Eduardo Girão. Se não, eu acho que não entro em casa, porque ela assiste todos os dias à TV Senado e, quando o Senador Eduardo Girão está falando e eu vou falar algo, ela diz: "Espere aí, espere aí, espere aí. Um minutinho". Não é possível um negócio desses! O senhor é diferenciado, Senador. Se o senhor fosse candidato a Senador pelos estados, teria votos em todos os estados, inclusive em Pernambuco e lá em casa. Muito obrigado pela oportunidade. Continue firme, Senador, não abra mão. Nós precisamos ter uma renovação no Senado brasileiro para ter homens com a estirpe, com o DNA de V. Exa. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Muito obrigado. É muita generosidade sua, Sr. Petronio. Como é o nome da sua esposa? O SR. PETRONIO OMAR QUERINO TAVARES - Rízia Cavalcanti Tavares, de Serra Talhada, Sertão de Pernambuco. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Um abraço grande na senhora sua esposa, dona Rízia. Que Deus a abençoe! Muito obrigado pelo carinho, pela confiança e, sobretudo, pelas orações, que eu sempre peço, porque a guerra que a gente vive aqui não é uma guerra entre os homens, longe disso. O SR. PETRONIO OMAR QUERINO TAVARES - É uma batalha espiritual. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - É uma guerra espiritual. É isso mesmo. É isso mesmo. O SR. PETRONIO OMAR QUERINO TAVARES - Sou presbítero da Igreja Presbiteriana e pai do Pr. Petronio Tavares Filho, Professor do Seminário Presbiteriano do Norte. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - Maravilha. Vai dar tudo certo, eu não tenho a menor dúvida. Agora, a gente precisa de muita calma nessa hora, não é? Muita calma nessa hora. O tempo é o senhor da razão. O SR. PETRONIO OMAR QUERINO TAVARES - Muito bem. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - CE) - O tempo é o senhor da razão. Eu queria encerrar esta reunião agradecendo a todos os convidados, palestrantes, também aos estudantes que aqui vieram nos dar a honra da sua presença. Foi um aprendizado para todos nós. Eu aprendi muito aqui hoje com esse debate de alto nível. Infelizmente, não tivemos a presença do Ministro Alexandre de Moraes nem também do Dr. Augusto Aras e da Dra. Raquel Dodge. Sentimos essa ausência, mas compreendemos. Esperamos, em outro momento, ter essa oportunidade de trocar uma ideia, de dialogar, sempre com muito respeito às autoridades. Independente de qualquer coisa, a gente precisa ter respeito, compreensão e abertura, o canal do diálogo aberto para tentar encontrar soluções para o país. Eu encerro esta sessão com uma frase de Martin Luther King, que diz o seguinte: "A injustiça num lugar qualquer é uma ameaça à justiça em todo lugar". Deus abençoe a nossa nação! A reunião está encerrada. Muito obrigado. (Iniciada às 10 horas e 05 minutos, a reunião é encerrada às 15 horas e 52 minutos.) |

