Notas Taquigráficas
18/11/2022 - 6ª - Comissão de Juristas responsável pela elaboração de anteprojeto de lei para atualização da Lei nº 1.079, de 1950
| Horário | Texto com revisão |
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| R | O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Bem, esgotados os 20 segundos, a sessão se tornou pública, e eu então declaro que, havendo número legal, está aberta a 6ª Reunião da Comissão de Juristas responsável pela elaboração do anteprojeto de lei para atualização da Lei 1.079, de 10 de abril de 1950, que define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento. |
| R | Esta Comissão foi criada pelo Ato do Presidente do Senado Federal nº 3, de 2022, e prorrogada pelo Ato do Presidente do Senado Federal nº 18, de 2022. Antes de iniciarmos os trabalhos, eu proponho a dispensa da leitura e aprovação da Ata da 5ª Reunião. Aqueles que concordarem permaneçam em silêncio. (Pausa.) Nada havendo a objetar, está aprovada então a ata da reunião anterior. Agradeço a todos. Eu então, com a permissão dos presentes, após umas observações rapidíssimas que farei, daria a palavra à nossa Relatora, a Dra. Fabiane Duarte, para que faça suas considerações. Apenas gostaria de dizer, de informar ao público que já estamos com um texto bastante amadurecido e que esse texto foi fruto de um trabalho intenso de duas subcomissões: uma subcomissão de tipologia dos crimes de responsabilidade e outra subcomissão que se encarregou dos aspectos processuais e procedimentais. Após isso, ambos os textos produzidos pelas duas subcomissões foram entregues a uma comissão de redação que foi eleita por todos nós. Essa comissão de redação trabalhou intensamente - intensamente - nas últimas semanas para apresentar um texto condensado, que discutiremos hoje nesta reunião virtual e mais uma vez, pela última vez, na segunda-feira próxima, numa reunião presencial que será realizada no Senado Federal. Após isso, vamos acordar com o Sr. Presidente do Senado Federal, Senador Rodrigo Pacheco, uma data apropriada para S. Exa. receber formalmente o texto final elaborado pela Comissão. Então, são esses esclarecimentos iniciais que eu queria fazer para que depois os membros da Comissão apresentem as suas sugestões ou façam as observações que julgarem pertinentes. Mas, antes disso, passo a palavra à nossa Relatora, Dra. Fabiane. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Por videoconferência.) - Presidente, boa noite. Boa noite a todos os integrantes desta Comissão. Primeiro eu preciso externar a minha alegria de realmente ter integrado esta Comissão. Sou testemunha do trabalho intenso. E agora, na reta final, subdividimos a nossa Comissão, que como um todo tem 12 integrantes, e criamos a comissão de redação com cinco integrantes que realmente se dedicaram de corpo e alma para que nós tivéssemos esse primeiro projeto, esse grande esboço ao qual o senhor já se referiu. Por uma sintonia com o destino, esse nosso anteprojeto está com 81 artigos, como a lei original. E eu também sou testemunha de que em nenhum momento a Comissão se ateve à lei original, muito ao contrário. A Comissão esteve sempre atenta à Constituição Federal, que apresenta uma série de sujeitos dos crimes de responsabilidade que estavam esquecidos após a ordem constitucional, como, por exemplo, magistrados. Muito se fala sobre os Ministros do Supremo Tribunal Federal, mas a nossa Constituição também apresenta como autoridades sujeitas à lei os ministros dos tribunais superiores, os magistrados como um todo, desembargadores. Então, realmente foi um trabalho de fôlego para trazer a tipologia de todas essas autoridades previstas na Constituição Federal. |
| R | Essa comissão específica, Presidente, a de redação, foi uma comissão que trabalhou por oito encontros - e é preciso deixar isso de registro, a público - e contou também com a participação de um consultor legislativo, a quem eu quero também externar o agradecimento, e tenho certeza de que o faço em nome de toda a Comissão, o João Trindade, um professor constitucionalista. Todos nós ficamos muito contentes com a sua presença. Ele sabe a Constituição de cor e muito nos ajudou também no encontro rápido dos artigos dos dispositivos constitucionais. Nesses oito encontros, Presidente, nós tivemos 30 horas de trabalho presencial. Nós tivemos, por exemplo, num sábado, o trabalho de duas da tarde às oito da noite, sem parar. E eu me lembro de que todo mundo comentava: "Gente, o Presidente não se cansa? Porque nós já estamos exaustos". Mas, realmente, o Ministro Lewandowski tem um vigor, tem um entusiasmo que é contagiante, e todos nós ficamos muito felizes com esse trabalho final. Então, Presidente, eu precisava trazer, inicialmente, essas palavras também de agradecimento a todos os outros membros que confiaram no trabalho da comissão de redação, que realmente ficou atenta a aspectos muito delicados de redação, para que não houvesse uma dubiedade ou uma interpretação falha. Tudo isso é muito importante, e eu quero deixar aqui, de público, o meu agradecimento também por ter feito parte dessa comissão. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Dra. Fabiane. O trabalho da senhora foi excepcional, realmente muito bom. A lembrança do Dr. João Trindade foi muito feliz, porque foi um dos nossos braços direitos e também, incansavelmente, noite a dentro, participava das reuniões em nosso gabinete, tomando café com bolachinhas para animar, não é? Mas foi realmente um trabalho bastante produtivo. Dito isso, eu abro a palavra aos prezados e eminentes membros da Comissão para que façam as observações que entenderem pertinentes, sem prejuízo de que, se quiserem, enviem para a nossa Relatora ou para todos nós da comissão da redação as eventuais sugestões que ainda tiverem durante este final de semana. Claro, agora sempre do ponto de vista formal, do ponto de vista conceitual, do ponto de vista da consistência jurídica, porque o momento de contribuições materiais se encerrou agora. Foi um momento anterior muito rico, em que ambas as subcomissões trabalharam intensamente e apresentaram um texto extremamente denso. Então, está aberta a palavra a quem dela queira fazer uso. Antes da sessão, o Dr. Prof. Pier tinha feito uma pequena observação. O senhor quer fazê-la agora, de viva voz? O SR. PIERPAOLO CRUZ BOTTINI (Por videoconferência.) - Sim, Ministro, eu gostaria. |
| R | Primeiro, eu queria agradecer e parabenizar a Comissão, em especial a comissão de redação, que foi presidida pelo senhor, evidentemente, mas composta pela Dra. Fabiane e todos os demais, que fizeram um excepcional trabalho, como eu disse anteriormente, no sentido de organizar todas aquelas ideias que tinham sido apresentadas pelos membros da Comissão, numa linguagem, eu acho, muito mais elegante, muito mais sofisticada e, mais importante que isso, muito mais segura do ponto de vista jurídico. Então, antes de qualquer ponderação, só queria deixar aqui, consignar meus parabéns e meu orgulho de fazer parte desta Comissão, com pessoas, com personagens que contribuíram, de corpo e alma, para que esse projeto saísse da forma com que saiu. Então, essa era a minha primeira consideração. E a segunda, Ministro... Como eu disse, eu até recebi aqui algumas sugestões do Dr. Maurício Campos - que está no exterior e pediu para justificar a ausência dele, pois não pôde comparecer hoje -, somando às minhas... São questões pontuais de redação, que eu submeto à Comissão, até para consideração, para análise e, eventualmente, para acolhimento. São questões muito, muito simples mesmo, e, se o senhor me permitir, eu as faria e, eventualmente, depois, em alguma outra oportunidade, poderiam ser discutidas, mas são realmente bem pontuais aqui. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Eu sugeriria que o senhor fizesse uma explanação verbal delas rapidamente e depois nos enviasse o texto, para que nós o encaixássemos no local adequado. O SR. PIERPAOLO CRUZ BOTTINI (Por videoconferência.) - Muito bem, Ministro. São bem rápidas e sintéticas. Então, em primeiro lugar, no art. 3º, quando se trata ali de estabelecer a conexão dos crimes de responsabilidade, a redação que foi apresentada é: "consideram-se como conexos os crimes, quando praticados em concurso de agentes ou para tentar encobrir o crime cometido por um destes personagens". A nossa sugestão aqui, também de redação, é só para que isso ficasse harmônico com o art. 62 do Código Penal. Então, nós estabeleceríamos que a definição de conexão aqui seria quando o crime é praticado em concurso de agentes, ou para facilitar a ocultação, ou a vantagem decorrente de crime cometido por um destes. É mera redação. É porque, como aqui a expressão é "tentar encobrir", como veio originalmente, isso poderia se confundir com a tentativa do crime. Então, só para deixar isso mais claro, muito pontual... O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Tá. O SR. PIERPAOLO CRUZ BOTTINI (Por videoconferência.) - E, em segundo lugar... O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - O Professor tem um minuto. O SR. PIERPAOLO CRUZ BOTTINI (Por videoconferência.) - Tá. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Eu, pessoalmente, acho muito boa a sua contribuição. Consulto os eminentes pares, para saber se têm alguma objeção quanto a isso. Se não houver objeção, peço à Dra. Fabiane que já a incorpore no texto, mas, claro, peço aos eminentes pares que se manifestem, se quiserem, e, se não se manifestarem, nós poderemos considerar aprovada essa sugestão. (Pausa.) Já vi que está aprovada. Prof. Pier, por favor, mande isso por escrito para nós. Estará incorporado. Dr. Bandeira está presente, Fabiane? Não o estou vendo... A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Por videoconferência.) - Ele estava em trânsito... O SR. LUIZ FERNANDO BANDEIRA DE MELLO FILHO (Por videoconferência.) - Estou aqui, sim. Estou aqui, sim. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - É um prazer tê-lo aqui entre nós. O SR. LUIZ FERNANDO BANDEIRA DE MELLO FILHO (Por videoconferência.) - O prazer é todo meu, Ministro. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Então, o Dr. Pier traz uma colaboração muito interessante, e eu acho que... Da minha parte, acho correto, tecnicamente adequado que nós a incorporemos. Como parece que não há objeção, peço à Fabi que anote isso, por gentileza. Outra sugestão, Prof. Pier? |
| R | O SR. PIERPAOLO CRUZ BOTTINI (Por videoconferência.) - Bem pontual também, Ministro: no art. 6º, nos crimes de responsabilidade quanto à soberania nacional, há o inciso VII: "Revelar fato ou documento de que teve ciência em razão do cargo em desacordo com determinação legal ou regulamentar comprometendo a soberania nacional". Aqui é uma proposta do Dr. Maurício, e eu também acho pertinente: em vez de "comprometendo", "capaz de comprometer" a soberania nacional - porque o "comprometendo" exigiria o resultado efetivamente afetar a soberania nacional. Então, colocar a potencialidade aqui talvez fosse mais interessante. Esse seria o segundo ponto que submeto a V. Exas. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Pois não. Olha, eu peço vênia para, como Presidente, me manifestar em primeiro lugar. Desde logo, acho extremamente adequado, do meu ponto de vista, este tópico agora sugerido pelo Prof. Pier, mas ouço os colegas. Se estiverem de acordo, permaneço em silêncio. Se quiserem se manifestar, obviamente, a palavra está aberta. O SR. LUIZ FERNANDO BANDEIRA DE MELLO FILHO (Por videoconferência.) - Veja, contribui muito. Contribui muito, na verdade, Presidente. Permita-me só fazer esse rápido comentário. O Prof. Maurício havia me mandado também as mesmas sugestões que o Prof. Pier está aqui relatando. De fato, eu acho que elas aperfeiçoam pontualmente o texto, transmitindo um tipo ainda mais preciso do que o que já nos esforçamos para fazer. Então, acho que realmente é um exemplo de um... É fruto de um trabalho coletivo que nós temos vivenciado aqui na Comissão. Apoio integralmente. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Vejo que a Comissão não tem nenhuma objeção. Então, essa alteração está aprovada também, com os nossos agradecimentos. Fabi, por gentileza, anote. O SR. PIERPAOLO CRUZ BOTTINI (Por videoconferência.) - A última, Ministro - é só mais uma última e aí eu encerro aqui as sugestões -, seria no art. 10º, crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária, no inciso VII. A redação é: "Descumprir dolosa e sistematicamente a legislação orçamentária e de responsabilidade fiscal". A nossa ponderação aqui é que o doloso já está previsto na parte geral, no início, certo? Então, seria retirar o "doloso" e, eventualmente, deixar o "sistematicamente", porque eu entendo que aqui a ideia é que um único ato não seria o suficiente para a gravidade do impeachment, mas a sua reiteração. Então, seria a retirada do termo "doloso" porque ele já estaria contemplado lá em cima, no primeiro ponto. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Perfeito. Até porque, Prof. Pier, como nós só estamos contemplando, digamos assim, os crimes que sejam dolosos - nós não estamos, enfim, considerando os crimes culposos -, mantendo o "doloso" aqui, poderia parecer que, enfim, em outras situações, a culpa pudesse eventualmente ser considerada. Da minha parte, acho que é um aprimoramento do texto. Agradeço. E agradeço também a sua compreensão em manter o "sistematicamente" porque quem foi administrador público - e eu vejo que o Ministro Anastasia foi um excelente administrador público; em diversas ocasiões, teve grandes responsabilidades - sabe que, por vezes, até por um erro dos subordinados, pode haver, enfim, um escorregão técnico na execução orçamentária, mas, para que caracterize o crime de responsabilidade, é preciso que haja uma intenção de praticar, enfim, esse ilícito de forma sistemática e reiterada. Consulto... O SR. MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO (Por videoconferência.) - Presidente... O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Pois não. O SR. MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO (Por videoconferência.) - Primeiro, também gostaria de fazer minhas as palavras de todos os que já destacaram, o trabalho de todos, das duas Subcomissões, como também o trabalho da Comissão de Redação, também presidida por V. Exa. e relatada pela Dra. Fabiane. Mas sobre o aspecto em discussão, justamente ouço da proposta do Pier a ideia da "reiteração". E agora, também de V. Exa., a ideia da "sistematicamente e reiteradamente". |
| R | Parece-me que o "reiterado" é algo que deveria constar no texto, ou substituindo o "sistemático" ou ao lado do "sistemático" - "de forma sistemática e reiterada" ou, pelo menos, "reiterado" -, porque o "reiterado" dá a ideia do que se quer comunicar, que é que não é um fato isolado, mas um fato que se seguiu sendo praticado de forma reiterada, de forma repetida. Então, há a ideia de constar também na redação o "reiterado", ou ao lado de "sistematicamente" ou o substituindo. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Olha, Prof. Dr. Marcus Vinicius, professor também de Direito, eu acho que é muito oportuna a sua intervenção, extremamente oportuna - o senhor tem razão. O que é um sistema? É um todo integrado. E a palavra sistematicamente talvez não traduza a intenção que nós, elaboradores desse anteprojeto, queríamos transmitir: essa ideia exatamente de reiteração. Então, acho que tirarmos do texto o "dolosa" para evitarmos, enfim, qualquer ideia de que outros tipos pudessem ser praticados a título de mera culpa e substituirmos o "sistematicamente" por "reiteradamente" nos permitirá avançar bem e trabalhar de uma forma mais técnica. Eu ficaria apenas com o "reiteradamente", mas ouço os colegas sobre isso. O SR. LUIZ FERNANDO BANDEIRA DE MELLO FILHO (Por videoconferência.) - Valeria a pena, Ministro, falar em "reiterada e sistematicamente" ou ficamos apenas no "reiteradamente"? Só me ocorreu essa dúvida. Não sei se o Prof. Heleno pode também nos elucidar isso, porque existe um aspecto da reiteração, que é a repetição do delito, e o "sistematicamente" dá uma noção do sistema orçamentário, dos diversos dispositivos que regem a normativa orçamentária brasileira. É só um palpite: não caberia colocar o "reiterada" no lugar de "dolosa" e ficaria "reiterada e sistematicamente"? Mas eu prefiro ouvir o Prof. Heleno, que certamente terá uma opinião mais abalizada sobre isso. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - O Prof. Heleno está presente? O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Sim, estou aqui, Ministro. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Então, professor... Desculpem não cumprimentá-los um a um, é porque o meu computador aqui não me permite a visualização de todos, mas, muito prazer em tê-lo entre nós, Prof. Heleno. O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Imagine, Ministro. É uma honra também integrar essa Comissão. Eu queria cumprimentá-lo, cumprimentar todos os membros aqui presentes, reconhecer também aqui, em forma pública, esse trabalho incansável e muito comprometido de V. Exa., que se debruçou sobre a matéria ao longo de todos esses meses de elaboração, acompanhando tudo o que estava sendo feito por cada um de nós. Então, isso é um testemunho que faço questão de evidenciar. Ao mesmo também, quero ressaltar esse importante trabalho da Comissão de Redação Final, porque permitiu justamente a integração dos textos das duas Subcomissões de forma muito harmoniosa. Quero realmente dar os parabéns. Quanto a esse assunto, eu acho que o Prof. Pier chama atenção para um aspecto realmente relevantíssimo. |
| R | O que acontece? O Ministro Antonio Anastasia pode até nos secundar nesse aspecto. Temos dois pilares de discussão nesse assunto de leis orçamentárias. A primeira é um descumprimento reiterado sobre uma hipótese que esteja definida na lei orçamentária. Então, esse descumprimento logicamente tem que ser avaliado pela conduta de não dar cumprimento a esse dispositivo. Isso é uma coisa. E há uma outra questão, que é aquela quando as contas são julgadas pelo Congresso Nacional, porque, nas contas apresentadas pelo Presidente da República, o Tribunal de Contas apresenta um parecer prévio, em seguida há uma Comissão no Congresso Nacional, que é a Comissão Permanente de Finanças Públicas, que elabora um outro parecer para que o Relator no âmbito do Congresso Nacional, ao julgar as contas, de posse desses dois relatórios - um do Tribunal de Contas e o outro da Comissão Mista Parlamentar Permanente -, possa, então, apresentar o seu relatório em Plenário. Ou seja, aonde eu quero chegar? Nesse caso, então, se houvesse descumprimento daquela decisão do Congresso Nacional, é que nós podemos falar efetivamente da caracterização dessa situação de descumprimento, digamos assim, objetivo da lei orçamentária. Mas o que nós estamos entendendo aqui é que - e daí a importância desse "reiterado" - logicamente não podemos ficar na espera desse julgamento do Congresso Nacional, porque muitas vezes esses julgamentos vêm a destempo, levam-se muitos anos para concluir. Então, é preciso evidenciar aqui que, às vezes, gosto de quando as leis são repetitivas, porque a repetição nada mais é do que um reforço. É preciso que se entenda se esse "reiterado" tem um caráter intencional. Então, eu até gosto da redação original e, em vez de "sistematicamente", talvez, eu pudesse pensar em "dolosa e reiteradamente", porque o sistemático aqui pode ser um ponto específico... O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Prof. Heleno, me permite um aparte? O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Sim. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Eu acho muito valiosa a sua contribuição, como sempre, um especialista em orçamento, e talvez possamos conciliar a sua intervenção com a do Prof. Pier, que quer, a meu ver, evitar a expressão dolosa, que já está constelada genericamente. Talvez nós pudéssemos dizer "reiterada e intencionalmente", em vez de ter intencionalmente. O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Isso. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Não é? Aí, acho que contempla a sua ideia também. O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - É que a ideia é essa, não é? Acho que a ideia de todos nós é esta: é de identificar a intenção de não cumprir o orçamento, de não achar o destino de uma verba, por exemplo, destinada a um órgão específico, que, uma vez com recursos... Vamos imaginar aqui um órgão dedicado, por exemplo, ao meio ambiente. |
| R | Então, o sujeito deixa de, intencionalmente, entregar aqueles recursos àquele órgão; o órgão, então, não cumpre a sua função constitucional - usando apenas a título de exemplo, sem nenhuma significância a mais. Então, nesses termos me parece que haveria aí uma razão justificadora para o intencional. Eu também acompanho obviamente a observação do Prof. Marcus Vinicius, que foi muito oportuna, mas eu acho que o caráter intencional é importante para ser evidenciado, mas, enfim, essas são contribuições apenas para o bom debate do tema. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Eu acho que foi uma excelente intervenção, Prof. Heleno, muito oportuna. Eu acho que nós podemos, então - se me permitem -, condensar e acolher as três observações. Falaríamos, então... Tiraríamos o "dolosa", que é o que deseja o Prof. Pier e incorporaríamos o "reiteradamente", que é a observação do Dr. e Prof. Marcus. E agora, quanto à sua, Prof. Heleno, falar intencionalmente... Então, descumprir "intencional e reiteradamente", tiramos o "dolosa e sistematicamente" e substituímos por essas duas expressões. Tudo bem assim? O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Sem problema. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Se estiver de acordo, eu peço à Dra. Fabiane que, por favor, faça essa anotação. Captou, Dra. Fabiane? A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Por videoconferência.) - Está anotado, Presidente. O SR. MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO (Por videoconferência.) - Presidente... Presidente... O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Pois não, Dr. Marcus. O SR. MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO (Por videoconferência.) - Desculpe o excesso de preciosismo... O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Não, não, à vontade! O SR. MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO (Por videoconferência.) - ... mas é que me parece que a ideia de se retirar desse dispositivo a expressão "dolosa" ou mesmo o sinônimo "intencional" é para não passar a impressão de que os outros tipos penais, o elemento subjetivo do dolo ou da intenção fosse desnecessário, já que ele consta nesse, apenas, de forma expressa. Parece-me que talvez essa fosse a ideia do Prof. Pier. Não seria isso? O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - É isso. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Por videoconferência.) - Porque realmente o art. 4º, Presidente, o art. 4º tem a seguinte redação proposta: "Os crimes previstos nesta lei são dolosos e praticados na forma consumada ou tentada". Então, a intencionalidade talvez... Aí também eu não posso dizer, Heleno, porque eu não sou especialista, mas a gente imagina que a intencionalidade já esteja abarcada por esse dispositivo do art. 4º. Não? O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Não. Vamos lá... O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Mas é que aí, Dra. Fabiane, como o Prof. Heleno entendeu que, sobre a gravidade do crime, o orçamento só se caracteriza se houver realmente uma vontade do agente de produzir o resultado e para que nós não repitamos a palavra "dolo", que já está no art. 4º e que abarca todos os tipos, mas reforcemos esta vontade de produzir o resultado que o Prof. Heleno acha importante, eu data venia incluiria esta intencionalidade aqui e acolheria também essa reiteração, que é agora mais técnica, a meu ver, que foi proposta pelo Dr. Marcus, e tiraríamos o "sistematicamente". O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Só um aparte, eu pediria licença aqui ao meu querido amigo Bandeira, para só fazer um acréscimo. Eu concordo perfeitamente, Vinicius. O problema aqui é o seguinte: uma lei orçamentária é uma lei de inúmeros artigos, não é? São centenas de páginas. Como é que você vai caracterizar dolo o descumprimento de uma... E uma lei orçamenta tem contas, tem a designação de créditos. |
| R | E uma lei orçamentária tem contas, tem a designação de créditos, então, é uma lei repleta de aspectos contábeis, não é? A questão dolosa logicamente estará dentro do intencional, mas é preciso evidenciar que houve, por parte daquele agente público, a intenção de não dar cumprimento à lei naquele caso concreto, naquela situação concreta. A intenção do agente precisaria ser demonstrada; o dolo, que me parece obviamente subjetivo, é que vai evidenciar a culpabilidade. E aí eu diria que ele é um complemento relevante para a punibilidade. Eu acho que a reiteração aqui ficaria, como disse muito bem o Prof. Marcus Vinicius, excessiva. Mas aqui, Marcus, a busca e, pelo menos, a minha preocupação é de ver a intenção de não destinar recursos para aquele crédito específico, por exemplo, para aquela hipótese ali da despesa pública que tenha um crédito atribuído no orçamento, ou numa situação qualquer em que um determinado fundo foi criado pelo Congresso Nacional, deveria receber certos recursos e não está recebendo para que aquela função seja cumprida adequadamente. Então, há uma intenção de não execução, uma omissão, por exemplo, ou talvez o uso indevido dos recursos de uma determinada despesa pública. Então, dada a amplitude do que é uma lei orçamentária, eu acho que é melhor caracterizar o intencional para não deixar espaços vazios, ou criações, ou ilações do que é culpa. Vou dar um exemplo: quando você tem contingenciamentos de despesas. Ora, contingenciamento de despesa não é vontade deliberada, é uma necessidade de fazer uma redução. Estamos aqui diante de um dos maiores, se não o que melhor tratou de orçamento público no Senado da República, que é o Ministro Antonio Anastasia, que sabe disso. Quando estamos falando de contingenciamento, não houve receita suficiente, não é que o agente público deixa de destinar o recurso, é porque não tinha dinheiro. Então, ele não está descumprindo a lei do orçamento, ele a está adaptando. E, nesses momentos, há, Ministro, muitas vezes, uma seleção de certas despesas que irão ser reduzidas, outras que serão mantidas. É o espaço da alocação política do agente público. Ora, eu não posso dizer que houve um dolo. Agora, eu preciso avaliar também se há uma intenção do sujeito de não aplicar a lei. E essa eu acho que é a questão. Desculpe se estou sendo longo demais. Porém, é melhor ficar claro para que entendam bem a posição que eu estou usando, dada a especificidade desse tipo de lei que é a lei orçamentária. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Se me permite uma rapidíssima intervenção, eu acho que há um consenso de que coloquemos no texto a intencionalidade, descumprir intencionalmente. Agora tiramos o "sistematicamente" e colocamos o "reiteradamente". A única consulta que eu faço aos pares é a seguinte, porque aqui nós temos que ter uma conduta conjugada: ela teria que ser, pela redação que nós estamos elaborando, intencionalmente, simultaneamente e reiteradamente. Mas eu vejo que, pela argumentação do Prof. Heleno, ela pode ser intencional, tópica, mas não precisa ser necessariamente reiterada. |
| R | Talvez nós possamos dizer: "Descumprir intencional ou reiteradamente". Quer dizer, são dois comportamentos distintos, seja a intenção pura, seja um outro comportamento, que é o comportamento interativo. E talvez isso satisfizesse, digamos assim, as propostas que foram apresentadas pelos eminentes colegas especializados. Pergunto aos pares se estão de acordo. O SR. FABIANO AUGUSTO MARTINS SILVEIRA (Por videoconferência.) - Presidente! O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Pois não. O SR. FABIANO AUGUSTO MARTINS SILVEIRA (Por videoconferência.) - Presidente, posso fazer um pequeno aporte aqui para esse debate, que estou acompanhando aqui com atenção? Que é o seguinte, nós recorremos a um conceito que é um conceito do direito penal e que é o conceito de dolo. Quando você coloca "intencionalmente"... O dolo, quando numa classificação muito simplória, mas amplamente aceita, ele pode ser dividido em dolo direto e dolo eventual. Quando nós colocamos "intencionalmente", a consequência prática disso é que a gente afasta o dolo eventual, a gente fica no dolo direto. Então, a palavra "intencional" ou quando você troca "intencionalmente" por "dolosamente", isso não é uma troca, digamos assim, infrutífera, quer dizer, ela reforça o elemento do dolo direto - e está aqui o Prof. Pier que pode também trazer alguma luz para esse debate. Quando você coloca a partícula "ou", o meu receio é que a gente passe uma ideia diferente: de que o reiterado pode ser, afinal de contas, ou intencionalmente ou reiteradamente, que a reiteração pode ser uma reiteração culposa. É um pouco essa a minha preocupação e, enfim, só a deixo aqui como uma, assim... No meu debate, eu até digo que talvez eu preferisse mesmo essa combinação "intencional e reiteradamente", para acentuar realmente esse aspecto. E, o argumento de que a lei orçamentária tem mil labirintos, eu acho até que reforça isso - não é? -, porque, afinal de contas, para que haja uma expressão de gravidade, a pessoa tem que saber, tem que haver uma conduta reiterada e intencional. Então, é... O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Aí você levaria a mais de dois exercícios, não é? O SR. FABIANO AUGUSTO MARTINS SILVEIRA (Por videoconferência.) - Oi? O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Você levaria a mais de dois exercícios, porque só se reitera... O SR. FABIANO AUGUSTO MARTINS SILVEIRA (Por videoconferência.) - Não, você pode ter várias práticas dentro do mesmo exercício. Você pode ter vários descumprimentos - vários, não é? O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Mas aí, Dr. Fabiano... Eu acho que o senhor estava presente numa das nossas reuniões quando nós cogitamos que um Presidente, em final de exercício, ele não poderia ser... O SR. FABIANO AUGUSTO MARTINS SILVEIRA (Por videoconferência.) - Responsabilizado. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - ... enfim, inserido neste dispositivo, porque ele não teria como reiterar o comportamento, não é? O SR. FABIANO AUGUSTO MARTINS SILVEIRA (Por videoconferência.) - A reincidência. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Porque ele estava, digamos assim... Ainda que intencionalmente, mas se ele tivesse que ser também reiterado, quer dizer que, no próximo exercício, quando ele já não é mais Presidente, no final do seu mandato, ele não incidiria nesse dispositivo. Por isso é que, data venia, eu acho que nós estaríamos criando dois comportamentos autônomos. Eu sei que o senhor, Dr. Fabiano, está preocupado, como todos nós estamos, em não banalizar o crime de responsabilidade. O SR. FABIANO AUGUSTO MARTINS SILVEIRA (Por videoconferência.) - Sobretudo neste terreno - não é? -, um terreno com tanta dificuldade interpretativa, com tanta... É preciso que a conduta sobressaísse de uma forma... Mas eu entendo... O SR. MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO (Por videoconferência.) - Mas daí o "intencional", Dr. Fabiano. Daí a importância do "intencional". O SR. FABIANO AUGUSTO MARTINS SILVEIRA (Por videoconferência.) - Pois é, mas aí pode ser "ou", não é? Com "ou reiteradamente", você descartaria o "intencional". O SR. MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO (Por videoconferência.) - Não... O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Porque o reiterado vai evidenciar a conduta dolosa. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - É... O SR. ANTONIO AUGUSTO ANASTASIA (Por videoconferência.) - Presidente! |
| R | O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - O dolo vem lá do art. 4º. Ele estará sempre nesses tipos. E o reiterado aqui, digamos assim, é como se fosse um crime continuado - não é o caso, porque vai se repetir, mas é como se houvesse a continuidade dolosa, não é? O SR. ANTONIO AUGUSTO ANASTASIA (Por videoconferência.) - Sr. Presidente, me permite uma observação? Porque o tema é polêmico mesmo. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Pois não, Prof. e Ministro Anastasia. O SR. ANTONIO AUGUSTO ANASTASIA (Por videoconferência.) - Obrigado, Presidente. Eu acompanho aqui este debate. É de fato um debate de difícil solução, porque tanto (Falha no áudio.) ... o outro acabam abrindo brechas, naturalmente, a exceções. O Prof. Heleno coloca bem a questão do reiterado. Mas veja bem: e se porventura, Prof. Heleno, houver só uma única infração mas de tal gravidade que ela não foi reiterada? Vamos supor: o Chefe do Executivo tomou uma medida, abre um crédito extraordinário por um decreto, sem autorização legislativa, no valor de bilhões de reais. É um gravíssimo crime orçamentário e não foi reiterado. Foi uma... O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Mas daí é o "intencional" e daí o "ou". Essa é a importância do "ou" e do "intencional" presentes. O SR. ANTONIO AUGUSTO ANASTASIA (Por videoconferência.) - Mas o "ou" eu acho que o Dr. Fabiano (Falha no áudio.) ... impressão no "ou" que poderia ser culposo. Então, de fato, confesso que aí os penalistas na questão do dolo ou da intenção têm muito mais condições do que eu de apurar. E talvez o sistemático fosse mais amplo, mas é a dificuldade da língua para nós fotografarmos uma situação que de fato permita (Falha no áudio.) ... me parece de toda a Comissão no sentido de punir tão somente os atos cuja gravidade, ou por ser intencional ou por ser sistemática ou por ser reiterada, de fato faça um desrespeito à Lei Orçamentária e de Responsabilidade Fiscal, porque sabemos que, eventualmente, pequenos equívocos ou atos que porventura possam ferir, mas sem nenhuma gravidade na sua consequência, podem ocorrer e que não gerariam, evidentemente, a abertura do processo. É a ponderação só que trago aqui aos senhores. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski) - Obrigado, Prof. Anastasia. Eu gostaria de ouvir o Ministro Schietti, que é um penalista também, um processualista penal, e, mais uma vez, o Prof. Pier, se quiserem nos dar a honra da palavra. Ministro Schietti. O SR. ROGÉRIO SCHIETTI MACHADO CRUZ (Por videoconferência.) - Obrigado, Presidente, muito obrigado. Inicialmente, queria reforçar o que já expus um pouco antes da reunião: da minha satisfação de integrar um grupo liderado por V. Exa. e com tamanho comprometimento coletivo e individual. Nós tivemos duas subcomissões - uma tratando da parte substantiva; a outra, da parte processual procedimental - e, por último, uma comissão de redação que se debruçou durante 30 horas na consolidação das ideias até então encaminhadas para as duas subcomissões. Então, é um privilégio fazer parte desse grupo. Quanto a essa questão, Presidente, eu compreendi bem a preocupação de todos, em particular a última, do nosso colega Dr. Fabiano Silveira, de que tudo na língua portuguesa tem um significado, não é? E, quando se trata de previsão de uma conduta típica, uma palavra pode denotar uma situação diferente da que foi objeto da previsão, digamos assim, ou da intenção do legislador, da mens legis, da vontade da lei. Eu vejo que, de fato, se nós colocarmos a expressão "intencionalmente", nós estaremos excluindo uma possibilidade de que o crime tenha sido cometido não com uma vontade dirigida a tal conduta, mas com um comportamento que poderia até ser culposo, mas que, pela circunstância em que há a previsão do resultado, passa a ser doloso quando a autoridade assume a ocorrência do resultado; não o deseja, mas assume. |
| R | A gente saber a diferença entre culpa consciente e dolo eventual é uma questão técnica e que é muito difícil em situações concretas divisar, mas eu acho que nós precisamos de definir se iremos propor a responsabilização da autoridade pela simples conduta de violar a Lei Orçamentária de tal modo culposo que poderá ser, inclusive, compreendido como ação dolosa, porque se anteviu o resultado e ainda assim se houve naquele comportamento - aí seria dolo eventual - ou se, ao contrário, nós entendermos que a única forma de responsabilizar seria por meio de uma conduta dirigida ao resultado, conscientemente dirigida ao resultado, aí sim seria um dolo direto, e a palavra "intencionalmente" traduziria essa vontade de realmente praticar o ato com plena consciência do resultado. Então, acho que é uma questão de definição, Sr. Presidente, como nós pretendemos qualificar essa conduta, se incluiríamos essa modalidade de dolo eventual - e aí a palavra "intencionalmente" não seria boa - ou se realmente queremos punir tão somente a conduta de quem dolosamente, intencionalmente pratica a conduta prevista como típica. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Aí, Ministro Schietti, é porque como o crime doloso, ou seja, há previsão de que todos os crimes só podem praticados ou punidos a título de dolo, se isso já está no art. 4º, aqui isso seria uma espécie de um bis in idem e poderia eventualmente levar a equívocos, imaginando que outros tipos poderiam ser praticados a título de mera culpa. Uma coisa que eu gostaria de ouvir do senhor também, Ministro, é se concordaria, caso essa expressão "intencionalmente" prevalecesse, se essa partícula "ou" seria mantida ou se nós, enfim, manteríamos a redação original do conectivo "e". Ou seja, a conduta teria que ser intencional e reiterada ou apenas reiterada e apenas, de outro lado, intencional, se os dois comportamentos seriam, digamos assim, apenados. O SR. ROGERIO SCHIETTI MACHADO CRUZ (Por videoconferência.) - Na minha opinião, Sr. Presidente, como até foi destacado, é possível que uma única conduta seja intencionalmente dirigida ao resultado. Não precisaria haver reiteração, especialmente nos casos de iminência do término do mandato. Então, se a conduta é reiterada, talvez a reiteração já denote o dolo, mas ela pode ser praticada em um único ato e aí o "intencionalmente" seria apropriado para uma situação isolada. O SR. PIERPAOLO CRUZ BOTTINI (Por videoconferência.) - Posso tentar complementar, Ministro? O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Pois não. O SR. PIERPAOLO CRUZ BOTTINI (Por videoconferência.) - Talvez pensando aqui na ideia - e até perguntar para o Heleno e para o senhor - da forma como foi proposta, substituindo aqui o dolo pela intenção com a partícula "ou", se eu não me engano, se eu não estou equivocado aqui, surgiram duas situações. A primeira: nós admitiríamos uma infração isolada, desde que só fosse admitido o dolo direto, ou seja, para essa não se admite dolo eventual, ou uma infração reiterada e para essa, sim, nós admitiríamos o dolo eventual ao lado do dolo direto. Se essa for a ideia e se todos com ela concordarem, a gente poderia talvez pensar em uma redação que deixasse isso um pouco mais claro e eventualmente a gente poderia se sentar - eu posso me sentar com o Ministro Schietti e com mais alguém - para pensar em uma redação que deixasse isso mais claro, excluindo o termo "dolo" para não ter bis in idem, mantendo o termo "intencional", porque eu entendi que o Heleno quer dar esse peso de dolo direto quando ela for isolada, mas, quando ela for reiterada, me parece que seria admissível o dolo eventual. Então, nós pensaríamos em dar uma redação que deixasse isso mais claro, se foi isso que eu entendi da proposta. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Prof. Pier, eu vou pedir a todos que façamos um esforço de tentarmos fechar o texto agora. Eu acho que não estamos em face de dificuldades intransponíveis. A nossa proposta aqui é a seguinte: "descumprir - tiramos o 'dolosamente' - intencionalmente ou reiteradamente", ou "intencional e reiteradamente". Vamos tentar, enfim, se for o caso, trazer uma palavra mais técnica ou vamos aprovar, então, uma redação provisória até segunda-feira para que possamos, então, na segunda, substituir essa expressão. O SR. PIERPAOLO CRUZ BOTTINI (Por videoconferência.) - Isso. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Por videoconferência.) - Presidente, o Prof. Gregório levantou a mão também. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Ah! Pois não, desculpe. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Por videoconferência.) - Acho que ele gostaria de... O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Vai me ajudando aí, Fabi, porque eu estou com o computador... A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Por videoconferência.) - Sim, eu imaginei que o senhor não tivesse visto. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Então, Prof. Gregório com a palavra. O SR. GREGÓRIO ASSAGRA DE ALMEIDA (Por videoconferência.) - Boa noite a todos e a todas. Presidente, parabéns pelo trabalho incansável e exemplar para todos nós, coordenando toda a Comissão! Parabéns à Comissão de Tipologia, à Comissão do Processo, e agora a esse trabalho maravilhoso da Comissão de Redação! Eu acho que nós devemos realmente deliberar sobre esse assunto. Uma sugestão singela aqui seria de que talvez poderíamos resolver substituindo o "intencionalmente" por "descumprir deliberadamente ou de forma reiterada a legislação orçamentária de responsabilidade fiscal". Então, acho que "deliberadamente"... O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - É "e" ou "ou"? "E" ou "ou"? O SR. GREGÓRIO ASSAGRA DE ALMEIDA (Por videoconferência.) - Não, "deliberadamente ou de forma reiterada", porque "deliberadamente" daria a entender que pode ser numa só situação, não é? O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Agora, se nós tirarmos o "forma", ganharíamos, enfim... Teria uma economia. O SR. GREGÓRIO ASSAGRA DE ALMEIDA (Por videoconferência.) - É. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Poderia ser "deliberada ou reiteradamente". O SR. GREGÓRIO ASSAGRA DE ALMEIDA (Por videoconferência.) - Isso mesmo. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Consulto os pares. O SR. FABIANO AUGUSTO MARTINS SILVEIRA (Por videoconferência.) - Presidente... Presidente, eu havia defendido inicialmente o "intencional e reiteradamente", mas, diante da colocação do Ministro Anastasia, que trouxe realmente esta questão de que seria um problema também para o sistema, uma agressão única, porém grave, não teria consequências, eu acho que a ideia do "ou" casa bem. Acho que o Pier sintetizou muito bem a nossa discussão aqui e eu até parabenizo o Pier porque ele colocou de uma forma do ponto vista técnico, não é, Pier? Acho que ele sintetizou muito bem e eu não veria dificuldade de a gente avançar com a partícula "ou". O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Está bem. Eu consulto, então, o Prof. Heleno se ele se satisfaria em trocar o "intencional" ou "intencionalmente" pelo "deliberadamente". |
| R | O SR. HELENO TAVEIRA TORRES (Por videoconferência.) - Presidente, eu não vejo, não tenho oposição. A única coisa que eu queria mesmo era isso: identificar um descumprimento pontual de um caso concreto de uma despesa, uma verba destinada, ou, de alguma forma, prevista em orçamento, ou quando acontece uma reiteração daquela conduta que leva à ação dolosa de não cumprir a lei orçamentária, não é? O que está em discussão aqui, na verdade, é o descumprimento da decisão legislativa da lei orçamentária. Então, equivale a todas as demais, só que, na lei orçamentária, nós temos essa especificidade, ou seja, muitas vezes é um ato concreto, uma despesa ali isolada, ou, muitas vezes, é uma destinação continuada, ou um esforço de financiamento específico continuado. Então, para esses casos, nós precisamos ter um termo, e eu acho que o reiteradamente funciona muito bem. Agora, para os casos individualizados, o deliberado ou intencional, eu acho que o deliberado também é usado como um bom termo - e parabenizo aqui o Dr. Gregório pela eleição desse termo - porque, de fato, denota também o intencional, contempla perfeitamente. O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Perfeito. E eu acho que essa contribuição do Dr. Gregório... Quer dizer, o intencional também tem um significado no Direito Penal, e o deliberado é algo neutro. Então, eu proponho, para que avancemos um pouco, se estiverem de acordo, que esse inciso fique com a seguinte redação: "descumprir, deliberada ou reiteradamente, a legislação orçamentária e de responsabilidade fiscal. Estão todos de acordo? Sem prejuízo de, eventualmente, no final de semana, ou, eventualmente, até na segunda-feira, se houver uma objeção com mais argumentos, nós estaremos abertos a alterar. Tudo bem? Passamos então adiante, obrigado. O SR. LUIZ FERNANDO BANDEIRA DE MELLO FILHO (Por videoconferência.) - Presidente, se me permite. Essa ocasião que tivemos aqui de debater um inciso específico do anteprojeto ilustra como foram os debates na Comissão de Redação; foi exatamente assim. Aos que, eventualmente, não nos acompanharam nessa fase, em cada inciso nos debruçávamos sobre essa palavra ou sobre aquela palavra; se se invertia o período; se se tirava a vírgula para tentar transmitir realmente a preocupação que se pretendia alcançar. Fico muito feliz também, Presidente, de ver na Comissão completa, esse mesmo cuidado, essa mesma preocupação. Inclusive, uma coisa que eu queria destacar, e que foi fruto também do trabalho da Comissão de Redação, foi a integração das duas partes do texto. Nós tivemos, como sabemos bem, um trabalho de uma subcomissão na parte de tipologia, uma outra de processo, que tinham linguagem diferentes, que tinham estilos diferentes, e isso, naturalmente, levou a um cuidado e a um trabalho a mais da Comissão de Redação para tentar uniformizar o texto numa linguagem mais pura, mais simples e direta possível. E trago um exemplo disso: o parágrafo único do art. 10, que foi uma sugestão do Ministro Anastasia no grupo de processos, acabamos, ao longo do debate, percebendo que se encaixava melhor na tipologia do que propriamente no processo, e isso nos fez trazer esse dispositivo para a primeira parte do projeto. Então, observem que essa construção manual mesmo, quase artesanal do projeto de lei denota esse cuidado. Eu acho que essa última construção, deliberada ou reiteradamente, atende perfeitamente ao objetivo, e parabenizo a todos. Realmente é uma satisfação muito grande participar desses debates. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Ricardo Lewandowski. Por videoconferência.) - Que bom. Então, considero aprovado o inciso VII do art. 10 da redação agora acordada por todos. Muito obrigado pela participação muito técnica e pessoalmente dedicada a essas minúcias que são minúcias que realmente devem traduzir o conceito que nós queremos que a legislação expresse. Muito obrigado. Vamos adiante. Pergunto aos eminentes integrantes da Comissão se têm mais alguma sugestão a fazer. (Pausa.) Bom, ficamos satisfeitos, não é Dr. Bandeira, Dra. Fabiane, Dr. Fabiano, Dr. Frazão? Olha, podemos dar o debate de hoje por encerrado? Pergunto. (Pausa.) Está bem. Olha, então eu agradeço muitíssimo o comparecimento de todos a esta reunião virtual. Eu sei do trabalho intenso que todos desenvolvem, o tempo precioso que estão dedicando a esta Comissão. Acho que realmente nós avançamos bastante e vamos dar uma contribuição muito importante para a sociedade brasileira no que diz respeito ao aperfeiçoamento da Lei do Impeachment. Então, vamos encerrar esta sessão de hoje, sem prejuízo de recebermos eventuais sugestões durante o final de semana. E talvez, então, como proposto e se todos concordarem, na segunda-feira nós faremos a reunião presencial, basicamente presencial, alguns a farão virtualmente, e aí, quem quiser fazer o uso da palavra evidentemente fará. A minha ideia é que nós aprovemos capítulo por capítulo e, se houver eventual objeção a um ou outro item, que o objetor faça essa objeção por escrito, se for o caso. Mas eu espero que, se houver alguma aresta ainda, que nós possamos arredondá-la durante esse final de semana. Então, muito obrigado a todos, bom final de semana, até segunda-feira, se Deus quiser! Obrigado a todos. (Iniciada às 18 horas e 23 minutos, a reunião é encerrada às 19 horas e 18 minutos.) |

