02/05/2023 - 15ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, Comissão de Segurança Pública, Comissão de Educação e Cultura

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Fala da Presidência.) - Boa tarde a todos e todas.
Declaro aberta a 20ª Reunião da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal, conjunta com a 11ª Reunião da Comissão de Segurança Pública (CSP), com a 9ª Reunião da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), e com a 15ª Reunião da Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE), da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A audiência pública será realizada nos termos dos Requerimentos nº 22, de 2023, da CDH; nº 11, de 2023, da CSP; e nº 4, de 2023, da CCJ, de autoria do Senador Fabiano Contarato, para a primeira reunião do ciclo de audiências públicas com o objetivo de debater as políticas necessárias à prevenção e à repressão da violência em estabelecimentos de ensino.
A reunião será interativa, transmitida ao vivo, e aberta à participação dos interessados por meio do portal e-Cidadania na internet, em www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria 0800 0612211.
Foram expedidos os convites para as seguintes pessoas: Sr. Celso Francisco Tondin, Conselheiro Regional de Psicologia de Minas Gerais e Coordenador da Comissão de Orientação em Psicologia Escolar e Educacional, representante do Conselho Federal de Psicologia, a quem eu convido para compor esta mesa; (Palmas.) a Sra. Carolina Campos, representante da consultoria Vozes da Educação, por participação remota; a Sra. Ana Carolina Fonseca, especialista em educação e proteção do Unicef no Brasil, a quem eu convido para compor a mesa; (Palmas.) a Sra. Thallita de Oliveira, Assessora Política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), a quem também eu convido para compor a mesa; a Sra. Anna Karla da Silva Pereira, Chefe da Assessoria de Participação Social e Diversidade, representante do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, que também convido para compor a mesa; e, por fim, a Sra. Suely Melo de Castro Menezes, Vice-Presidente da Câmara de Educação Básica, representante do Conselho Nacional de Educação, participação remota nesta audiência pública.
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Mais uma vez, quero agradecer o comparecimento dos debatedores e desejar uma ótima audiência pública num tema de tamanha relevância por que nós estamos passando.
Estamos iniciando o ciclo de audiências públicas com o objetivo de debater as políticas necessárias à prevenção e à repressão da violência em estabelecimentos de ensino.
A horrível escalada de violência contra escolas, estudantes e educadores tem crescido assustadoramente nos meses mais recentes.
Entre outras atrocidades, em Aracruz, cidade situada na região metropolitana de Vitória, no meu Estado do Espírito Santo, um adolescente de 16 anos entrou atirando em duas escolas da cidade, deixando 4 mortos e 13 feridos, uma cena aterradora que tem tido consequências psicológicas danosas tanto para os meus concidadãos quanto para todos os brasileiros e brasileiras que receberam mais essa estarrecedora notícia.
Pergunta-se: como um pai ou mãe pode ter sossego de deixar o respectivo filho ou filha voltar à escola? Como um trabalhador da educação se sente todos os dias desde então, temerosos por possíveis ataques? E por que tanto rancor é direcionado às escolas?
Somos pela racionalidade, buscamos os estudos científicos, as análises dos especialistas. Esses não têm dúvida de que ataques com uso de armas de fogo contra escolas estão associados a históricos de violência, a exemplo de antecedentes de bullying, exposições durante longos períodos a violências, acesso a conteúdo inapropriado veiculado em rede social e aplicativo.
Entre tantas violências, inclui-se a negligência parental. Uma das consequências para os que estão vulneráveis é a possibilidade de cooptação pela extrema direita, essa extrema direita que, no Brasil, tem propalado o uso de armas de fogo, depredação ao patrimônio público, entre outras práticas fascistas. Por isso, é impossível não fazer conexão entre o discurso de ódio dos anos mais recentes e a escalada da violência contra escolas, estudantes e educadores. De maneira escancarada desde a campanha, infelizmente o Governo anterior propagou o uso de armas de fogo, inclusive utilizando crianças nessas imagens.
Será que a solução está na ampliação do policiamento nas escolas? Mas podemos ver que um desses modos de prevenção da violência é a política de desarmamento iniciada desde o primeiro dia do atual Governo.
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A escola é para ser um ambiente de paz. Para se construir uma cultura de paz na escola é necessário saber que o conflito em si é um instrumento de mudança social. O conflito oferece às crianças e adolescentes, pais e educadores oportunidade para aprender a construir relacionamentos, e esse aprendizado será no sentido de formar pessoas cidadãs dentro de um clima de respeito e dignidade para alcançar a paz social.
Sou o Relator do Projeto de Lei 236, que institui o novo Código Penal. Estarei atento para que sejam incluídas no texto medidas para garantir a segurança nas escolas e, consequentemente, a punição daqueles que praticam crimes dessa natureza. Como eu tenho fé em Deus, tenho certeza de que soluções virão a contento para proteger o ambiente escolar de forma pacífica, de forma a entender que a escola é um ambiente que deve ser protegido - não se utilizando de instrumento de violência, mas, sim, de pacificação social.
Eu quero mais uma vez agradecer o comparecimento de todos os meus colegas Senadores. Faço aqui o registro também da minha querida Senadora Nilda Gondim, que muito abrilhantou e abrilhanta este Senado, meu querido Senador Paulo Paim, meu querido Senador Esperidião Amin. Tenho fé em Deus de que vamos ter uma boa audiência pública.
Eu pediria ao Senador Paulo Paim que pudesse fazer a gentileza de presidir essa audiência.
Eu agradeço e conto com a colaboração dos colegas e dos expositores. Mais uma vez, registro aqui o meu agradecimento pelo comparecimento para debater nessa Comissão de Direitos Humanos um tema de tamanha relevância. Muito obrigado.
Desejo uma excelente audiência pública a todos e todas. (Pausa.)
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Presidente Paim, o senhor me concede a palavra por dois minutos?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Com certeza absoluta, pelo tempo que for necessário. Senador Esperidião Amin, sempre presente.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Pela ordem.) - Eu explico. Eu não posso é ficar ausente e não posso também deixar de registrar que nós teremos agora, às 15h - e eu terei que sair antes disso -, a sessão de instalação da nova Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência, que agora é presidida por um Deputado Federal, na regra do rodízio.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Que tem tudo a ver com esse debate.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Sim! E eu fui o seu último Presidente, então tenho que, inclusive, cumprir esse dever. De sorte que eu gostaria, em primeiro lugar, de me congratular com a iniciativa do Senador Fabiano Contarato, autor dos três requerimentos que nos unem, os representantes das três Comissões - aliás, quatro, eu integro três delas: CDH, Segurança Pública, CCJ e Comissão de Educação; eu integro essas três últimas -, para um debate com pessoas que têm vivência do problema, vivência do assunto, e poder iluminar um pouco mais a ideia de que muros, ou seja, meios físicos poderão dissuadir novas agressões. Esse é o testemunho que eu quero trazer.
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A paz não é a ausência do conflito e da guerra, é muito mais do que isso. Paz é empatia, é fraternidade, solidariedade acima das nossas diferenças e disputas. Então, é lógico que hoje nós temos que nos valer da tecnologia. O senhor disse muito bem que fazem parte da atividade de inteligência, prospectar, detectar. Não é à toa que ontem foi divulgado... aliás, hoje foi divulgado um relatório, que o próprio Ministro da Educação detalhou, que nos traz números como 356 presos, 3,5 mil investigados por sinalizarem perspectiva de agressão.
Então, nós precisamos de muito mais do que isso e terá que ser dentro de um espírito de solidariedade, de fraternidade, de desarmamento de espírito que nós poderemos evoluir.
Concluo utilizando aqui uma expressão que eu considero muito inteligente, adotada por um Consultor Legislativo desta Casa, Claudio Demczuk de Alencar, que diz que nós não podemos apelar pura e simplesmente para o, aspas, "terrorismo penal legislativo", que seria imaginar que podemos amedrontar com leis quem usa da malícia ou está sendo impulsionado pela maldade.
Então, estamos em boas mãos. Como o senhor mesmo se confessou hoje, se confessou em público, na Comissão de Educação: V. Exa. viveu a fase do maior arroubo, e é hoje um homem sereno, respeitado por todos nós. Acho que a nossa Senadora eterna concorda. E é dentro desse espírito que nós queremos ser presididos por V. Exa., prezado amigo PP, Paulo Paim.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Esperidião Amin, deixa eu só cumprimentá-lo, antes de eu passar a palavra para os convidados, pelo projeto que V. Exa. aprovou hoje pela manhã, na Comissão de economia, da aposentadoria especial. Eu queria estar lá, não pude estar. Mas assim mesmo...
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Estava tão fácil que V. Exa. nem foi requisitado, mas inspirou o projeto.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Mas eu fiquei feliz porque depois minha assessoria me informou que - não integralmente - V. Exa. acatou inclusive uma série de emendas, não é? E o projeto agora vai em regime de urgência para o Plenário.
Eu sei do esforço que fez V. Exa. Quero que as categorias entendam: todos gostariam de ter aposentadoria especial, mas para todos não daria. V. Exa. foi até aonde conseguiu para conseguir o apoio à votação daquela matéria. Claro, a matéria ainda vai para o Plenário, ainda vai para a Câmara e pode, se assim entender a maioria, ter alterações. Mas eu sei do esforço que fez V. Exa. V. Exa. procurou dialogar com todos, todos, todos e atender dentro do possível. Então, cumprimento V. Exa.
De imediato...
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - ... de alguém com a sua trajetória, com o seu conhecimento, é uma medalha que eu não vou ostentar, mas me orgulho e me conforta.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E pior que ele me chama de PP, porque é Paulo Paim e o partido dele é o PP. "Diz aí, PP, como é que está? Tudo bem?".
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Mas vamos lá.
Eu vou, de imediato, passar a palavra para os nossos convidados.
Quero dizer que a Senadora Nilda Gondim está aqui conosco e ela vai poder usar a palavra também sobre um tema em que, no período em que ela esteve no Senado, ela foi sempre muito firme, muito corajosa, eu diria, agindo com o coração, a alma e a mente para defender as nossas crianças, a nossa juventude e contra todo tipo de violência, como essa que vem acontecendo no Brasil em que estão matando as nossas crianças. Por isso, os convidados estão aqui e vão falar sobre o tema.
A Senadora Nilda Gondim pede a palavra. No momento em que V. Exa. entender necessário...
A SRA. NILDA GONDIM (Para expor.) - Primeiro, eu quero cumprimentar o Presidente Paulo Paim, que é uma referência nacional e do Senado da República, uma pessoa com quem eu tive o prazer de conviver por dois anos aqui e ver a forma abnegada, a doação dele a tudo que representa o social: a educação, a saúde, a família, as crianças, os adolescentes. Enfim, nós trabalhamos juntos nisso.
Paulo Paim é uma referência, como também o é nosso querido Amin, que eu já conheço há muito tempo porque nós fomos colegas. Quando fui Deputada Federal, ele foi, no meu tempo também, Deputado Federal, e sempre tive esse carinho por ele, que é uma pessoa amiga, cordata, uma pessoa que convive com a gente brincando. Eu tenho essa referência muito grande dos dois.
Quero cumprimentar também Fabiano Contarato, que teve essa iniciativa brilhante de chamar todas as autoridades aqui que convivem e lidam com a criança, com a educação, com as escolas, porque esse é um assunto, Paim, que deve ser muito discutido, abordado com muita veemência e ver as providências que podem ser tomadas, porque é tanta violência, tanta angústia por que os pais passam e sofrem e tantas dificuldades e tantos enfrentamentos e tanta crueldade que a gente fica perguntando: "Meu Deus! O mundo está contaminado por guerra, ódio, vingança?". E a gente não pode deixar isso passar em brancas nuvens. Tem que haver uma solução, uma forma de frear tanta violência, tanta maldade, tanta crueldade, e que os pais e as crianças tenham segurança, porque a escola, minha gente, é a continuação da casa da gente e, quando a gente leva uma criança para a escola, é consciente de que ali vai receber abrigo, vai receber educação, vai receber acolhida, vai receber carinho. E é disto que a gente precisa: ter segurança nas escolas e oferecer às crianças essa tranquilidade.
Obrigada, Paim, por essa oportunidade que você está me dando de falar e de reencontrar esses amigos tão queridos.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Querida Senadora Nilda Gondim, V. Exa. é unanimidade, V. Exa. faz uma falta enorme aqui no Senado, pela sua forma meiga, respeitosa, carinhosa, e vai convencendo com esse jeitinho a todos, não é?
Por isso, quebrando o protocolo - eu peço que nossos convidados que estão aqui também entendam -, vamos bater uma salva de palmas para ela? Quem sabe ela esteja aqui conosco amanhã ou depois. (Palmas.)
Eu tenho uma pequena fala, mas a farei em um dos intervalos, viu?
Vamos, de imediato, ouvir os nossos convidados.
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De imediato, eu passo a palavra para o Sr. Celso Francisco Tondin, Conselheiro Regional de Psicologia de Minas Gerais e Coordenador da Comissão de Orientação em Psicologia Escolar e Educacional, representante do Conselho Federal de Psicologia.
O tempo é seu, vai ser de 15 minutos para cada um, e serei tolerante se necessário for.
O SR. CELSO FRANCISCO TONDIN (Para expor.) - Boa tarde.
Quero saudar o Senador Paulo Paim, meu conterrâneo, gaúcho, e também o Senador Amin, já que constituí residência por doze anos e meio em Chapecó e em Florianópolis.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. CELSO FRANCISCO TONDIN - E também em Florianópolis, inclusive próximo à sua residência atualmente, mas hoje estou vinculado a Canasvieiras.
Então, saúdo, na pessoa dos senhores, as demais e os demais presentes.
Hoje estou vinculado, então, à Universidade Federal de São João del-Rei, onde eu sou professor, em Minas Gerais, ao Conselho Regional de Psicologia de lá e, na ocasião, hoje representando o Conselho Federal de Psicologia.
Esse tema da violência e o da psicologia estão muito vinculados atualmente. Eu diria que, além da segurança pública, além dos serviços de policiamento e segurança pública em geral, a psicologia tem sido também muito convocada para esse debate.
Embora convocados neste momento para esse debate, nós temos uma história muito longa, que vem desde o início da constituição da nossa ciência, a ponto de os historiadores da psicologia dizerem que não é possível falar da construção da psicologia sem falar da educação, porque sempre estivemos estudando os processos de aprendizagem e desenvolvimento humano.
Portanto, nós sempre estivemos ligados aos processos educacionais, assim como a educação também, como um campo complexo, sempre contou com a psicologia e reconhece a participação dela na constituição do trabalho escolar e pedagógico.
Enquanto autarquia, o Conselho Federal de Psicologia, os Conselhos Regionais de Psicologia e demais entidades - nós somos mais de 20 entidades nacionais que compomos o Fórum de Entidades Nacionais da Psicologia Brasileira - sempre estivemos na defesa da educação pública, gratuita, de qualidade, laica e de caráter emancipatório, tanto que, a título de exemplo, atualmente fazemos parte do Fórum Nacional Popular de Educação e estivemos ativamente presentes no processo de construção da Conferência Nacional Popular de Educação, que culminou com o encontro nacional na cidade de Natal, em julho passado, onde se expediu uma carta maravilhosa, chamada Carta de Natal, que eu acho que é uma pauta para a educação nacional. E também temos participado, portanto, da construção da educação como política pública.
Então, apesar de sermos chamados neste momento, temos uma história, temos uma luta, a ponto de termos aprovado, em 2019, a Lei nº 13.935, que obriga a constituição de equipes multiprofissionais de psicologia e de serviço social. E aí tenho que saudar com muita alegria e veemência as nossas colegas e os nossos colegas do serviço social. Há essa obrigatoriedade dessas equipes nas redes públicas de educação básica de todo o país. Essa lei já tem mais de três anos e meio, então, de vigor, e a gente vai tratar sobre ela aqui, inclusive.
E começo por aí, para chegar, depois, ao fenômeno das violências.
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Nós temos muitas dificuldades na implementação dessa lei. Se nos convocam para atuar neste momento - e eu digo que não é só neste momento, que foi durante toda a história da nossa profissão, da nossa ciência que estivemos juntos à educação -, nós precisamos providenciar as condições adequadas para a plena implementação dessas equipes multiprofissionais de psicólogas, psicólogos e assistentes sociais. Nós temos algumas dificuldades e as elencamos como de duas ordens: uma dificuldade de ordem conceitual... Muitas vezes, nós somos compreendidos como profissionais apenas da saúde, e não também como profissionais da educação. E...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Celso, me permita, porque a Dra. Anna Karla chegou, em nome do Ministério dos Direitos Humanos, um ministério que está de bandeira em punho, uma bandeira mesmo da paz nas escolas. O Silvio esteve aqui - permita-me que eu diga assim -, o Ministro Silvio, e foi brilhante. Então, uma salva de palmas ao Ministério dos Direitos Humanos. (Palmas.)
Volto a palavra para você.
Se os colegas que estão mais atrás puderem se sentar aqui na frente, isso nos ajuda e ficamos mais próximos todos na união contra a violência e pela paz nas escolas.
O SR. CELSO FRANCISCO TONDIN - Então, eu vinha dizendo que, na implementação da Lei 13.935, de 2019, que obriga a criação de equipes multiprofissionais de psicologia e serviço social nas redes públicas de educação básica, temos dois problemas na sua implementação que as entidades nacionais de ambas as profissões têm percebido. O primeiro é de ordem conceitual. Nós somos reconhecidos como profissionais da saúde. Sim, somos profissionais da saúde também, não apenas. Nós somos profissionais da educação, como somos profissionais também da segurança pública e profissionais de outros setores quando lá atuamos com a psicologia. Ela é muito complexa e ela está em muitos lugares. Em cada lugar, ela leva os seus conhecimentos gerais, mas também trabalha com os conhecimentos específicos daquele campo, daquela área, daquela política. Então, a gente precisa entender que, se a gente trabalha com saúde mental na escola, isso não vai tirar a especificidade de sermos trabalhadores da educação, porque o que é saúde mental na escola? É o aluno, é a aluna se desenvolver e aprender de forma integral, porque uma criança que aprende e se desenvolve na escola produz saúde mental e o contrário também. Professores, professoras, demais profissionais da educação, se em condições de trabalho adequadas, que se desenvolvem integralmente, que se realizam no trabalho, são pessoas que também têm um fator ali de produção de saúde mental e o contrário também, de adoecimento quando não têm essas condições adequadas. Portanto, se trabalhamos com saúde mental em todos os campos, não somos necessariamente um profissional da política de saúde apenas, mas, sim, no caso da educação. Fica compreendido? Porque essa é uma dificuldade muito comum que a gente tem no debate.
E uma outra dificuldade para a implementação da lei federal é de ordem do financiamento. Então, por não sermos entendidos como profissionais da educação, como é que vamos alocar recursos da educação num serviço que está sendo prestado dentro da educação? Nós estivemos na luta, que foi imediatamente posterior à nossa conquista da Lei 13.935, pela aprovação do novo Fundeb. Estivemos com os movimentos da educação, com os sindicatos, com as professoras, com os professores, com os Parlamentares, que fizeram um movimento muito lindo de aprovação do novo Fundeb, num momento em que havia um risco muito sério de descontinuidade do financiamento das políticas de educação neste país. E aí foi aprovada, então, a emenda constitucional que estabeleceu o Fundeb como definitivo.
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E, depois, também na sua regulamentação, nós tivemos a lei de 25 de dezembro de 2020, logo em seguida à aprovação da emenda constitucional, a Lei 14.113, que, então, inicialmente, estão regulamentando. O novo Fundeb colocou os serviços de psicologia e serviço social, o pagamento desses serviços no campo dos 70% das verbas destinadas ao pagamento de trabalhadoras e trabalhadores da educação lá no art. 26. No entanto, na revisão dessa regulamentação, já em dezembro de 2021, nós fomos retirados dos 70% do percentual mínimo de investimento, então, nos honorários dos profissionais da educação, e fomos colocados nos 30% restantes, lá no art. 26-A, que vai dizer, então, que nós vamos ser colocados na mesma condição que outros serviços e outros investimentos da educação. Então, a gente, nessa nova regulamentação, saiu de um status de profissional da educação para outras despesas. No final, vou apresentar uma proposta em torno disso inclusive.
Então, se nós temos esses dois problemas, fragilizamos, então, a entrada dos profissionais psicólogas, dos profissionais psicólogos e das e dos assistentes sociais como política pública e, ao mesmo tempo, somos chamados para discutir a violência.
Aí vamos tratar um pouco sobre o tema da violência.
Nós temos a violência... Nós poderíamos entrar aqui num debate das violências às escolas, das violências nas escolas, das violências das escolas. Nós vamos focar hoje no fenômeno mais recente, que é o ataque, a violência às escolas como um fenômeno social que é atravessado, marcado por uma cultura de medo e ódio sistematicamente difundida na nossa sociedade, nos ataques ideológicos sistemáticos às escolas e às professoras, a ponto de querer esvaziar a função docente, até chegando ao ponto de criminalizar, muitas vezes, a prática pedagógica. E há uma falta de regulamentação das redes sociais, que são um grande fomento desses discursos de medo, de ódio e de ataques sistemáticos às escolas e aos professores.
Nós temos duas formas de abordar a questão do...
Senador, prazer!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Um destaque: o Senador Humberto Costa é muito chamado, viu, para tudo quanto é Comissão e Plenário, e ele fez questão de estar aqui, para prestigiar este debate de paz na escola, contra a violência. Humberto, Presidente da Comissão de Assuntos Sociais. (Palmas.)
O SR. CELSO FRANCISCO TONDIN - Então, nós temos aí, no enfrentamento a essa situação da violência às escolas, dois aspectos importantes - e um não é mais importante que o outro, eles são complementares, um não é superior ao outro.
Então, um deles é a questão de tratar no âmbito da segurança pública, tanto que o próprio Ministério da Justiça e Segurança Pública criou o Programa Nacional de Segurança nas Escolas para apoio às rondas escolares. Nesse âmbito, nós precisamos, sim, contar com serviços de inteligência que vão monitorar e prevenir esses ataques. Isso de fora da escola, claro que, muitas vezes, com denúncias que venham de dentro da escola, mas que vão atuar no externo à escola.
No interior da escola, a gente precisa de um outro trabalho, que é, então, esse trabalho que é complementar e que é tão importante quanto o de segurança pública, que é o trabalho educacional, que é o trabalho da cultura de paz, já citada aqui, na abertura da sessão. Nessa cultura de paz, entram fortemente mesmo não só os profissionais que já estão lá, desde sempre, na escola - as professoras, os professores, os coordenadores pedagógicos, as coordenadoras pedagógicas, merendeiras, porteiras, porteiros, etc. -, mas também se agrega não como algo novo em termos de estar na escola, porque eu falei que, historicamente, sempre estivemos, mas como algo novo em termos de lei, de obrigatoriedade, que é a nossa Lei, repito, 13.935, de 2019, que são, então, esses dois atores, atrizes: as psicólogas e os psicólogos, as e os assistentes sociais. Então, uma escola que vai trabalhar... E, aí sim, poderíamos aqui falar horas sobre o trabalho de ambos os profissionais nas escolas, mas nós temos recursos para o trabalho no enfrentamento dos preconceitos e das desigualdades, que são fomentadores dos processos de violência.
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As violências, sempre que acontecem, têm uma historicidade e sempre remetem a vários aspectos, e um deles é o modo como as pessoas subjetivam as desigualdades históricas do nosso país, das suas comunidades especificamente, os preconceitos de toda ordem, que diversos segmentos populacionais vivenciam e que vão, quando saem do campo da palavra, do campo do diálogo, do campo do intercâmbio, "entram no ato", como a gente chama na psicologia, e vão então para a ação violenta.
Então, criação de espaços de interlocução na escola, para a gente poder falar desses processos de desigualdades, de preconceitos, de como as pessoas sofrem, o sofrimento psíquico que as pessoas passam por sofrer, e eu diria também não só os alunos e as alunas, mas também as profissionais e os profissionais, porque, dadas as condições que normalmente se têm de trabalho nas escolas, as nossas professoras estão num processo de sofrimento muito grande. Então, o psicólogo, a psicóloga, o assistente social e a assistente social vão trabalhar, como diz a Lei 13.935, na mediação das relações sociais institucionais, visando à melhoria do processo de ensino-aprendizagem. Ou seja, o nosso trabalho vai ser ajudar a escola a contribuir para a sua função social, que é a transmissão do conhecimento historicamente acumulado. Que aqui o conhecimento seja assimilado por todos os segmentos, especialmente os mais vulnerabilizados, que precisam mais do que ninguém da escola para visar a uma ascensão social, para visar a uma inclusão social.
Então, nós vamos trabalhar - o assistente social - com a questão social, a psicóloga, com a dimensão da subjetividade, e vamos então contribuir nesses processos de mediação das situações de dificuldades, de conflito, e mesmo de potencialização do que a escola tem feito, porque a gente fala muito de violência, gente, mas tem muita coisa bacana acontecendo na escola, tem muita potência na escola, tem muita resistência e reexistência no campo da escola. E, aí, acho que a gente é chamado a contribuir com algumas ações que o Ministério da Educação define agora, nesse período atual, que coincide, então, com este novo Governo e também com esses processos de acirramento dos ataques à violência nas escolas, porque, se eles acontecem nos últimos 20 anos, eles se tornaram mais frequentes nos últimos meses - isso é fato. O Senador Contarato citou o de Aracruz, não é, e depois desse nós tivemos tantos outros: São Paulo, Goiás, Paraná, Blumenau, outros estados que tivemos aqui... Posso estar errando aqui na lista, mas, na intensidade dos ataques mais recentes, com certeza não.
E o MEC então fala das ações integradas de proteção social do ambiente escolar e também fala da justiça restaurativa no ambiente escolar, o Programa Territórios de Convivência e Cultura de Paz.
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Então, a psicologia e o serviço social - acho que estou no tempo, não é? - se colocam, como sempre estiveram, à disposição da construção de uma política pública e de políticas públicas de educação, que visem à valorização das diferenças, que visem à igualdade e que visem especialmente, com tudo isso, à democratização do acesso ao conhecimento científico, que sabemos, até pela cultura negacionista que tem tentado se arraigar, o quão importante ele é para a gente pensar os processos sociais...
(Soa a campainha.)
O SR. CELSO FRANCISCO TONDIN - ... e a mudança das mentalidades em prol realmente da construção de uma cultura democrática e igualitária neste país. Então, estamos nesse processo.
Apresentamos, por fim, que, se há uma dificuldade conceitual de compreendermos a nós mesmos, psicólogos e assistentes sociais, como profissionais da educação e que isso vai resultar numa dificuldade de financiamento, que a gente pode pensar então um projeto de lei que altere a LDB e nos compreenda lá no art. 61 também como profissionais da educação. Essa é uma demanda que a gente traz como contribuição a esse debate.
Espero ter contribuído e me coloco à disposição para a continuidade. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Celso Francisco Tondim, representante do Conselho Federal de Psicologia.
Eu quero registrar, com satisfação, agora a Senadora Teresa Leitão.
Já estão conosco então a ex-Senadora Nilda Gondim, o Senador Esperidião Amin, o Senador Fabiano Contarato, o Senador Humberto Costa e a Senadora Teresa Leitão. (Palmas.)
Sempre lembrando que esse é um trabalho de quatro Comissões para discutir a violência nas escolas; tempo de paz é o que nós perseguimos.
Quero dizer que o Ministro Camilo hoje pela manhã falou... (Risos.) Olha que nós estivemos toda a manhã com ele, não é? O Camilo foi muito bem, fez uma bela explanação inclusive do compromisso do ministério interagindo com outros ministérios nesse mesmo sentido. Parabéns!
Então eu diria aos Senadores que quiserem falar que a gente vai intercalando. Fiquem bem à vontade.
Eu passo a palavra agora para Dra. Ana Carolina Fonseca, especialista em Educação e Proteção do Unicef no Brasil.
A palavra é sua, por quinze minutos.
A SRA. ANA CAROLINA FONSECA (Para expor.) - Muito obrigada.
Primeiramente, boa tarde a todos e a todas. Cumprimento todos aqui, cumprimentando o Senador Paulo Paim. Agradeço o convite para este debate tão importante e parabenizo a iniciativa conjunta das Comissões deste que é um debate urgente e é um debate que precisa ser feito realmente com os diferentes setores para que a gente possa pensar nas diferentes camadas envolvidas quando a gente pensa nas relações entre educação e violência. Então, é realmente muito importante esse ciclo de debates e que outros espaços como esse possam acontecer.
Eu começo, então, contextualizando rapidamente de onde eu falo. Eu sou Ana Carolina, não sou doutora, Senador...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É doutora pelo conceito de entender do tema como ninguém.
A SRA. ANA CAROLINA FONSECA - Ah, gostaria, mas estou aqui inclusive para aprender cada vez mais.
Eu falo então aqui em nome do Unicef, que é o Fundo das Nações Unidas para a Infância. O Unicef, que faz parte da ONU, foi criado em 1946, tem por missão garantir os direitos, garantir o bem-estar de crianças e adolescentes e hoje está presente em mais em 190 países.
O Unicef está presente no Brasil desde 1950 e, nessas últimas décadas, felizmente, pôde participar de transformações muito importantes na vida das crianças e dos adolescentes no Brasil, mas a gente sabe que tem uma parcela que ainda tem ficado para trás; então, nos últimos anos, o Unicef tem concentrado os esforços justamente nos meninos e nas meninas mais excluídos, mais vulneráveis. Dentro disso, a gente tem olhado bastante para as crianças e para os adolescentes que são vítimas de violência.
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Um dos eixos de atuação do Unicef no Brasil - isso já desde 2019 - é a estratégia Educação que Protege. Essa ação no Brasil, com esse tema, vem num marco, num movimento global, que tem sido feito para a gente construir uma educação que efetivamente protege.
O Unicef tem alavancado essa agenda nas suas plataformas de trabalho, principalmente em contato com municípios, grandes capitais e os municípios do Semiárido da Região Amazônica, que fazem parte da plataforma Selo Unicef.
Mais do que nunca, esses casos recentes de violência nas unidades de ensino do país nos convocam, justamente, a reiterar a importância do direito de estar na escola, protegido e aprendendo. Então, a escola precisa ser um espaço de proteção de crianças e adolescentes, a escola não pode ser um espaço em que haja medo de estar lá, como o colega muito bem mencionou.
Por que a gente tem falado tanto disso? A escola, a educação, têm um papel decisivo para romper com ciclos de violência. É muitas vezes na escola que as violências sofridas em casa ou na comunidade vão ser percebidas pela primeira vez. Muitas vezes, inclusive, é para um professor ou para uma professora que uma criança ou um adolescente rompe o silêncio e vai fazer um relato ali de alguma experiência sofrida nesse sentido.
A escola também é justamente um espaço muito oportuno e que tem por missão o fortalecimento das meninas e meninos em competências, em habilidades, em fatores que são decisivos para a gente romper com as violências. A gente está falando aqui da autoestima, da autoconfiança, da construção de relações afetivas protetivas, e tudo isso ancorado no currículo, na Base Nacional Comum Curricular. Então, o que a gente tem a dizer é que a escola tanto é um espaço em que essas violências muitas vezes se manifestam quanto de fato é importante agir quando elas se manifestam; a escola tem essa missão de construir uma educação que protege, a partir ali também da própria abordagem pedagógica, do projeto pedagógico.
Para isso, a primeira coisa que é preciso é estar na escola. Então, estar na escola é fundamental, a gente tem que reforçar o direito de estar na escola como o direito de cada criança, cada adolescente, neste país. Estando na escola, é preciso se sentir efetivamente parte dessa escola, incluído, fortalecido, pertencente, engajado em um projeto de vida. Então, compreender essa escola como um fator que está ali justamente como parte desse processo de construção de autonomia, de emancipação. E é preciso que a comunidade escolar atue de forma intencional e planejada para prevenir e romper os ciclos de violência. É muito importante que a escola possa atuar de forma planejada e estruturada para agir quando essas violências se manifestam.
É nessa perspectiva que eu posiciono aqui a contribuição do Unicef a esse debate, na perspectiva de uma educação que protege.
A gente compreende uma educação que protege como uma educação que garante a cada menino e a cada menina o acesso e a permanência na escola, e a gente precisa pensar e mobilizar todos os esforços e recursos necessários para que isso aconteça. A educação que protege é aquela que garante a efetiva inclusão e o fortalecimento para a vida e a proteção contra as violências que se produzem e se manifestam na escola.
É importante destacar que, nesse sentido, quando a gente olha para esses três eixos, obviamente, há a proteção das crianças e dos adolescentes no caminho da escola, nos arredores e dentro do espaço escolar. Ela é uma pauta que precisa ser um compromisso dos governos e da sociedade.
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A violência impacta o acesso, impacta a permanência, impacta o desenvolvimento, impacta o aprendizado. E a gente precisa discutir um modelo de proteção e de segurança pública em uma perspectiva territorial, em uma perspectiva em que cada ator tem um papel a cumprir dentro do seu lugar, dentro das suas atribuições. Ao fazer isso, é fundamental a gente olhar para a educação também na missão que ela tem diante disso, então, pensar educação enquanto um fator de proteção.
A gente precisa falar de prevenção - então, reforçando -, a gente precisa falar de quebrar os ciclos de violência a partir das escolas, como parte do projeto pedagógico e sempre com a articulação e a atuação de todo o sistema de garantia dos direitos de crianças e adolescentes.
A gente está falando aqui, hoje, neste ciclo de debates, que surge no contexto de uma discussão de episódios de violência contra as escolas - como o colega destacou -, mas é importante a gente pensar que a violência contra as escolas está muito conectada às violências que se manifestam nas escolas, às violências que crianças e adolescentes sofrem em casa, sofrem no caminho, sofrem com seus pares, e está muito conectada às violências que são produzidas também pelas escolas.
Então, quando a gente olha para os indicadores de distorção idade/série e quando a gente olha para os indicadores de abandono escolar, essas crianças e adolescentes que mais são reprovados e que mais abandonam a escola têm cor, têm endereço, e a gente sabe quem são. Falar de violência contra as escolas nos convoca a falar de violência das escolas e dessa violência que se manifesta nas escolas, mas que é construída nesses outros espaços.
O Unicef tem desenvolvido metodologias e ferramentas e trabalhado muito próximo aos governos, justamente para que os governos possam tomar decisões que promovam ações nesses três eixos. Então, faço aqui o destaque para a busca ativa escolar, uma estratégia que o Unicef tem implementado junto com a Undime. Hoje, mais de 50% dos municípios brasileiros já aderiram a essa convocação.
Então, ressalto a importância de a gente fortalecer a busca ativa escolar. Uma criança ou um adolescente que está fora da escola é um fator de desproteção para essa criança, para esse adolescente e para toda a comunidade escolar. A gente precisa ir atrás de cada menina e cada menino que está fora da escola e, para isso, a gente vai ter que enfrentar os fatores de exclusão escolar, que são múltiplos, que demandam o engajamento de todas as áreas, sabendo que muitos desses fatores são, sim, também associados à violência. A gente precisa olhar para esses fatores e, de fato, agir nas causas que levam à exclusão escolar.
A gente tem trabalhado também apoiando os governos para que, dentro das escolas, promovam trajetórias de sucesso escolar para cada menino e cada menina. Esse é um direito de cada menino e cada menina. Isso passa por fortalecer projetos de vida, isso passa por permitir que cada estudante possa sonhar, possa projetar futuros, enfim, possa fazer escolhas e possa ter uma rede apoiando esses sonhos e essas escolhas.
A gente precisa ampliar oportunidades para que crianças e adolescentes sejam reconhecidos em suas diversidades, para que possam valorizar suas diversidades e estar em um contexto, em uma comunidade escolar, que reconhece e valoriza diversidades, para que possam construir essas relações afetivas protetivas dentro da escola com seus pares, com suas famílias, na sua comunidade.
A gente precisa ampliar oportunidades para que conheçam seus direitos e para que saibam quando estão em risco, como buscar ajuda, com quem contar nessas situações. Dentro disso, a promoção do seguro da internet é uma pauta urgente. A gente precisa trabalhar com educação para o uso das mídias. Eu acho que essa é uma pauta que a gente já traz há bastante tempo, não só a da internet, mas que fica muito forte, agora, com a questão da internet, e a convivência no ambiente escolar, que precisa ser considerada como parte do projeto pedagógico. Então, pensando aí nos eixos de garantir acesso, permanência, inclusão e fortalecimento para a vida.
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E, quando a gente olha para a questão dos ciclos da violência, a gente também tem apoiado os Governos para que desenvolvam os mecanismos, os protocolos necessários para que as escolas saibam agir diante de situações de violência.
Então, a gente tem a Lei 13.431, de 2017, que trata do papel de cada agente público ali. Se estiver diante de uma criança ou um adolescente vítima de violência, diante de uma suspeita de violência, a lei e o decreto que regulamenta a lei fazem um destaque para a educação. Então, convocam a educação mais uma vez para esse papel. E é fundamental que a escola esteja preparada para agir e acionar a rede de proteção desde as primeiras manifestações de que uma criança ou um adolescente esteja sendo vítima de violência ou seja autor de violência.
Então, é importante que a gente possa agir desde o início. Aquela criança que está se afastando do convívio escolar e que você percebe sinais de que pode estar sendo vítima de agressão dentro de casa, toda rede precisa olhar desde os primeiros sinais e saber como agir, e esse é um papel da educação também. Mas para isso precisa de canais de comunicação, precisa de protocolos, de fluxos. O Unicef tem construído um trabalho já bastante potente com o Ministério dos Direitos Humanos, justamente fomentando a implementação da Lei 13.431 nos municípios e fomentando o lugar que a educação deve ter na implementação da Lei 13.431.
Por fim, ressalto que na verdade a gente tem colocado muito essas expectativas, mas é importante a gente reconhecer que há muitas escolas construindo uma educação que protege, há muitas escolas que protegem, no Brasil, e a gente precisa valorizar esses esforços, jogar luz nessas escolas, conhecer o que tem feito a diferença nessas escolas que estão efetivamente conseguindo proteger crianças e adolescentes. A gente precisa aprender com essas experiências. Até aqui, alguns pontos para a gente ficam muito fortes. Escolas que protegem, agem com a intenção de proteger, enfrentam o debate da violência, isso é super importante; elas contam com rede. As escolas que protegem contam com o apoio do território.
Um último ponto fundamental que é um componente estruturante da Convenção sobre os Direitos da Criança é a efetiva participação de crianças e adolescentes nas decisões que afetam sua vida. Então, escolas que protegem escutam seus estudantes, estão muito conectadas aos modos de ser criança e ser adolescente no mundo online, no mundo offline, na transição entre esses dois mundos. Então, a gente precisa conhecer mais essas experiências, valorizar mais essas experiências.
Fecho reforçando a convicção que o Unicef traz da necessidade de a gente aprofundar esse debate. Mais uma vez parabenizo a iniciativa desse espaço. E o Unicef segue à disposição para a gente poder construir, enfim, novas estratégias, valorizar as que já existem e conhecer as que já existem, para que cada criança e cada adolescente tenham direito de aprender em uma escola que protege.
A gente precisa valorizar as escolas, a gente precisa estar dentro das escolas, junto com as escolas. A convivência e a integração protegem todos e todas. Então, essa é a nossa convocação.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Ana Carolina Fonseca, especialista em Educação e Proteção do Unicef no Brasil.
Já aproveito para cumprimentar o Unicef. Nessa mesma sala, o Unicef esteve aqui com 50 jovens que deram um show, nessa visão de...
A SRA. ANA CAROLINA FONSECA - Há poucas semanas.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Há poucas semanas.
A SRA. ANA CAROLINA FONSECA - Exatamente.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Foi um espetáculo.
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Agora, eu vou passar a palavra, de forma remota, à Sra. Carolina Campos, representante da consultoria Vozes da Educação.
Disseram-me que ela já estava na tela.
A SRA. CAROLINA CAMPOS (Por videoconferência.) - Só um segundo. Vocês me ouvem?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Sim, perfeitamente.
A SRA. CAROLINA CAMPOS (Por videoconferência.) - Só um segundo.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Estamos te ouvindo, mas não estamos te vendo.
A SRA. CAROLINA CAMPOS (Por videoconferência.) - Olá. Boa tarde a todos, boa tarde a todas. Conseguem me ver?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Pronto.
A SRA. CAROLINA CAMPOS (Por videoconferência.) - Conseguem me ouvir? (Pausa.)
Bom, primeiro quero agradecer muito o convite e dizer que para a gente é uma honra estar aqui com todos os senhores e com todas as senhoras, todos os...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O Plenário está pedindo se você tem condições de levantar o volume.
A SRA. CAROLINA CAMPOS (Por videoconferência.) - Só um minuto, Senador. Consegue me ouvir agora? Consegue me ouvir melhor, Senador? Está melhor?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Melhorou um pouquinho.
A SRA. CAROLINA CAMPOS (Por videoconferência.) - Só um pouquinho? Vou tentar falar mais alto, está bom?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Isso. Vamos lá.
A SRA. CAROLINA CAMPOS (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde a todos os Senadores e Senadoras. É um prazer estar aqui com os senhores. Hoje eu quero falar um pouco sobre o assunto que está nos trazendo aqui e, lamentavelmente, a gente só tem condição de falar sobre esse assunto hoje, porque, enquanto sociedade, escolhemos falar disso depois de muitas tragédias.
Nós - dentro do Vozes da Educação - vimos já, há mais de um ano, tentando alertar a sociedade e falar que violência nas escolas é um problema que já existe há muito tempo, violência nas escolas é algo que tem uma linha no tempo, existem ações que precisam ser tomadas antes do ocorrido, durante o ocorrido e após o ocorrido. E lamentavelmente no Brasil não tem ainda os protocolos que a gente precisa ter.
Os protocolos funcionam como uma forma de fazer com que as pessoas tenham algo para seguir numa situação de emergência, mas não se constroem protocolos da noite para o dia, os protocolos precisam ser construídos com muita antecedência, os protocolos precisam ser específicos para a realidade das escolas, mas é importante que haja um protocolo nacional, por quê? Porque todo aluno vai saber que, se ele sair de uma escola e for para uma outra escola, ele vai ter que seguir aqueles protocolos. Então, os protocolos funcionam, sim, eles são uma alternativa para que a gente não precise se desesperar e agir de uma forma atabalhoada, sem orientações muito específicas. Essa é a primeira coisa que eu gostaria de dizer.
Eu também gostaria de dizer que é muito importante a gente acolher os nossos educadores. Enquanto educadora, a gente não é formada para ter que lidar com determinadas situações que entram não escola. O trauma, Senadores e Senadoras, não para na porta da escola, o trauma entra junto com a criança, junto com o adolescente. Nós educadores somos traumatizados e retraumatizados de diversas formas, porque nós educadores recebemos uma série de obrigações que caem no nosso colo sem que nós tenhamos o preparo para isso. De modo que trabalhar com uma escola sensível ao trauma; trabalhar com uma escola que compreenda a importância de a gente rediscutir, por exemplo, as normas internas da escola; trabalhar com a formação de educadores para que eles saibam classificar os comportamentos inadequados em leve, moderado e grave; fazer com que os educadores consigam endereçar esses comportamentos inadequados e, além de tudo, fazer com que os educadores sejam formados para trabalhar com ações restaurativas e não práticas punitivas é de enorme importância.
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Existem evidências que mostram que os educadores são retraumatizados muito mais do que os alunos e, sem dúvida nenhuma, a pandemia no mundo inteiro contribuiu para o esfarelamento da saúde mental de alunos e educadores.
Não é nenhuma novidade dizer para os senhores e senhoras que a internet é um grande fator de preocupação. No entanto, a internet não causa; ela é consequência, ela amplifica o problema. Ela sozinha não é o problema. O problema está no esfarelamento da saúde mental desses jovens, o problema está na fragilidade da relação com os educadores, o problema está na falta de formação dos educadores para lidar com o trauma, para lidar com os seus próprios traumas e com os traumas dos alunos.
Enquanto educadora, eu já vivi situações, dentro da sala de aula, dentro da escola, dentro de uma secretaria de educação que são questões éticas acima de tudo. E a gente, lamentavelmente, não traz isso para os nossos educadores, a gente não oferta aos nossos educadores esse tipo de formação, que são formações absurdamente importantes.
Eu gostaria de me colocar à disposição para responder algumas questões que as senhoras e os senhores têm. Mas o meu recado para V. Exas. e para toda a nossa comunidade, para toda a nossa sociedade é: escola precisa ser um espaço de cura, escola precisa ser um lugar sagrado. Não adianta a gente colocar guarda armada, cerca elétrica, detector de metal na porta das escolas; o que adianta é a gente construir cidadania. Na hora em que nós, enquanto sociedade, deixamos de acreditar na instituição escola, nós, enquanto sociedade, estamos deixando de acreditar no nosso futuro, porque a nossa escola constitui o futuro das pessoas, o futuro deste país.
Então, enquanto educadora, eu clamo e rogo aos senhores e às senhoras que, por gentileza, reflitam sobre a possibilidade de termos um protocolo nacional que enderece questões de saúde mental, de termos um protocolo que enderece questões de violências, porque não estamos falando de uma violência única. Precisamos falar de racismo, intolerância religiosa, xenofobia, LGBTQIAP+fobia e tantas outras violências, como o bullying, que estão acometidas dentro das escolas diariamente.
Então, o meu apelo, eu rogo aos senhores e às senhoras que, por favor, reflitam sobre a possibilidade da construção de um protocolo nacional para que a gente consiga fazer com que as escolas cumpram esse protocolo. E, muito mais do que isso, protocolo é um papel; protocolo sozinho não resolve o problema. A gente precisa dar formação e orientação para os educadores.
Então, eu deixo esse recado agradecendo muito o tempo dos senhores e das senhoras por nos ouvir e nos colocando à disposição para responder quaisquer questionamentos.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Sra. Carolina Campos, representante da consultoria Vozes da Educação, que falou muito em formação, cidadania, protocolo, prevenção, reeducação. Parabéns!
Passo a palavra agora à Thallita de Oliveira, Assessora Política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).
A SRA. THALLITA DE OLIVEIRA (Para expor.) - Boa tarde a todas, a todos e a "todes".
Como o Senador disse, meu nome é Thallita. Eu sou Assessora Política do Instituto de Estudos Socioeconômicos, que é o Inesc.
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Atuo na análise de políticas públicas, na área de infância e adolescência e também sou educadora, então eu atuo diretamente com meninos e meninas, estudantes de escolas públicas do Distrito Federal - de escolas públicas de periferia aqui do Distrito Federal. Já estive aqui nesta Casa como adolescente, inclusive, quando fui participante desse projeto do Inesc, quando eu ainda era adolescente, e hoje estou lá como assessora política.
Uma das reflexões que quero trazer é justamente a importância da participação política na promoção da autonomia de meninos e meninas. Que eles participem dos processos decisórios tanto na escola quanto em outros espaços da sociedade, para que eles não sejam cooptados por esses grupos extremistas, pelas redes sociais, como se eles estivessem sendo acolhidos, na ilusão de que estão sendo acolhidos por esses grupos. A gente precisa tomar esse espaço de acolhimento e dar importância para esses sujeitos.
Então, quero iniciar aqui dizendo que, sem dúvida, no que tange às violências contra as escolas, estamos vivendo resultados de uma articulação intensa, antidemocrática, de extrema-direita, pautada no ultraconservadorismo e no ataque aos avanços sociais, principalmente no que diz respeito à diversidade de gênero, raça e sexualidade. Têm-se utilizado fortemente as redes sociais e as plataformas digitais para fortalecimento dessas ideias. E as violências acometidas contra as escolas nos últimos anos são também uma resposta de uma classe dominante, fundamentalista à ampliação de olhares e à luta pela equidade de raça, de gênero que temos travado no dia a dia. Então, isso é uma resposta à luta que a gente tem conseguido travar e que nem todos os grupos aceitam, porque não querem perder esse lugar de poder.
Essas violências não se resumem aos ataques armados à escola. Eu também consideraria como uma violência, por exemplo, o Movimento Escola sem Partido, que quer nos silenciar na escola de ter um pensamento, inclusive, crítico ao falar sobre política, enfim, falar sobre diversidade, respeito às diversidades, porque elas existem independentemente de a gente falar ou não delas. A militarização nas escolas também tem sido uma forma de violentar e de silenciar meninos e meninas; o novo ensino médio, que tira a obrigatoriedade de discutir o estudo da história, geografia, filosofia e sociologia, que são disciplinas que pressupõem um pensamento crítico, enfim, e que propõem pensar a história a partir de outras perspectivas que não somente as hegemônicas.
As raízes desse fenômeno são diversas e potencializam a cooptação de meninos para esses grupos extremistas. Aí a diferença do que estamos chamando de "violência nas escolas" para as "violências contra as escolas", porque existem esses dois tipos de violações que acontecem nas escolas e que também têm gerado esses ataques frequentes contra a escola. A maioria dos meninos que são cooptados e cometem os ataques vivenciaram grande sofrimento na própria escola, então precisamos nos atentar a essas relações vivenciadas nesse espaço.
Na minha experiência como educadora, foi perceptível como os estudantes voltaram depois da pandemia, do isolamento social por conta da pandemia: muito mais dispersos, inseguros, desmotivados, desanimados, com menos perspectiva de futuro e se relacionando de forma mais agressiva. Eu até brinco muito com eles nas oficinas, dizendo: "Gente!". Porque, para eles, tudo é brincadeira. Falam batendo, falam xingando, mas dizem: "Não, tia, mas é brincadeira!". Não é brincadeira, só que a gente, muitas vezes, por não saber lidar, naturaliza isso, que é também violência.
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As gestões escolares dos professores - muitas gestões; não todas - estão muito perdidas no que fazer, mas têm tentado pensar mil formas de mudar, mudar essa realidade, mas isso demanda um trabalho que não depende apenas da escola - a gente tem responsabilizado às vezes muito a escola.
E eu até coloquei também que, em 2019, foi aprovada a Lei 13.935, que prevê psicólogos e assistentes sociais na escola, mas não tem financiamento suficiente. Então, não virou realidade para todas as escolas.
E aí eu queria contribuir, tentar contribuir, a partir de duas perspectivas - não sei se vai dar tempo -, porque eu queria trazer a questão da participação, da importância da participação, e a outra é entender que muito dessa problemática que cresceu exponencialmente nos últimos anos é consequência das múltiplas violências perpetradas contra crianças e adolescentes todos os dias no nosso país, desde o período em que o Brasil começou a ser chamado de Brasil inclusive - não é? -, quando a gente teve nossa terra e nosso povo violentado aqui. Então, até os avanços que a gente conquistou no final do século passado e no início deste século foram perdidos principalmente nos últimos seis ou quatro anos, o que ampliou as desigualdades e as violações contra essa população.
Então, aqui eu vou mostrar um pouco de um panorama do financiamento do Governo nesses últimos anos para a política da infância e adolescência, para a gente refletir sobre como isso afeta e também impacta a vivência dos meninos dentro da escola, porque a gente tem que pensar a escola dentro de uma comunidade, dentro de um sistema de garantia de direitos. Se a gente pensar a escola isoladamente, a gente não vai conseguir transformar, nem erradicar, enfim, nem acabar com essas violências que têm acontecido lá dentro.
Ah, sou eu que vou passar. Perdão.
Aqui é só para dizer o tanto que a gente, principalmente nos últimos quatros anos, no último Governo, simplesmente desmontou a política para a infância e a adolescência. Então, o Plano Plurianual, por exemplo, que previa um programa que falava de promoção, proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente, que era muito mais abrangente, incluía ali várias ações, se resumiu, no PPA de 2020 a 2023, que é o que está ainda em vigência, a um programa que é de atenção à primeira infância, mas de atenção à primeira infância que também está se resumindo ao Programa Criança Feliz - e aqui não vai dar para a gente discutir o Programa Criança Feliz, mas é importante a gente fazer uma avaliação séria desse programa para ver se, de fato, tem gerado resultados positivos na vida dos meninos e das meninas, não é? Então, a gente perde esse programa principal, e a partir... É, já falei, só existe esta ação, este programa que é de desenvolvimento integral na primeira infância.
Aqui eu fiz um gráfico para mostrar... Porque a gente analisa no Inesc o orçamento de políticas específicas para a infância e a adolescência. Então, tem uma categoria no orçamento público que é uma subfunção que agrega algumas várias ações, inclusive de vários ministérios, de várias áreas, e a categoria que existe hoje que diz respeito à criança e ao adolescente é a assistência à criança e ao adolescente. Então, eu quis mostrar um pouco quais ações ou quantas ações existiram nos últimos anos voltadas, direcionadas especificamente para esse grupo. E aqui é mais para a gente visualizar como a política foi desmontada, como as ações foram sumindo nos últimos anos.
Então, em 2003, nós tínhamos 19 ações voltadas para esse público dentro dessa categoria. É óbvio que tem outras categorias, mas essa é a que abrange mais essa população. Em 2005, a gente chegou a ter 27, até que vai descendo e, em 2016, a gente já tem uma baixa muito grande de ações voltadas para esse público. Em 2020, já com o novo PPA, de 2020 a 2023, a gente tem apenas duas ações direcionadas especificamente para esse grupo.
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Então, se tem orçamento público direcionado para criança e adolescente para o enfrentamento das violências, como, por exemplo, o enfrentamento do trabalho infantil, não está sendo mostrado no orçamento público, no financiamento do Governo.
Aqui é só para demonstrar um pouco as ações que existiam antes. Aqui tinha várias ações de enfrentamento à violência nas escolas, em 2003. Não vou entrar em detalhe por conta do tempo. Aqui, já em 2019, a gente ainda tinha uma ação específica para o enfrentamento das violências contra crianças e adolescentes, por exemplo. Aqui, em 2020, não existe mais nenhuma ação específica para isso. E aqui, para vocês verem, em 2020, as duas únicas ações: construção, reforma, equipagem e ampliação de unidades de atendimento socioeducativo e o Programa Criança Feliz, que vai se reverberando também nos outros anos, que inclui ali também só a ação que é financiada pelo Fundo Nacional dos Direitos da Criança. Em 2023, só se manteve o Criança Feliz.
Então, aqui é só para a gente visualizar como também, em termos de recurso, essa subfunção vai perdendo recurso. Em 2017, tem novamente um aporte, quando entra o Criança Feliz, quando o Criança Feliz começa a existir. E aí, de 2017 para cá, mais de 90% dessa subfunção dizem respeito ao Programa Criança Feliz.
Aqui traz ações de enfrentamento do trabalho infantil, para vocês visualizarem nitidamente o quanto a gente perdeu de recursos. A gente não quis mais financiar o enfrentamento dessa violência contra crianças e adolescentes. Em 2020, 2021, 2022, o que existe é uma ação do Tribunal Superior do Trabalho para sensibilizar, enfim, para fazer trabalhos de prevenção ao trabalho infantil, mas a política mesmo de enfrentamento ao trabalho infantil deixa de ser apoiada pelo Governo Federal.
Aqui eu trouxe só alguns exemplos de políticas que existiam. Então, tinha a concessão de bolsas para famílias que tinham crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil, que também deixa de existir. A gente já teve uma ação de desenvolvimento e difusão de metodologias de empoderamento e participação cidadã de crianças e adolescentes, que é superimportante que não seja um trabalho feito apenas pela sociedade civil, mas que as escolas também, enfim, e as políticas como um todo pensem na criança e adolescente como esse sujeito ativo nos processos de decisão.
Na execução financeira da política de atenção à saúde do adolescente e jovem, tem um item importante aqui que é o da saúde mental também. A gente perde muito recurso no decorrer dos anos. Tem um aporte, em 2021, para uma ação de prevenção à gravidez na adolescência e, em 2022, esse recurso diminui. E essa execução que aparece em 2022 ali, laranjado, foi um repasse para a Organização Pan-Americana da Saúde, que ela também não usou, mas é para a sensibilização de profissionais também em relação ao adolescente. Então, não teve um trabalho específico, pelo menos que esteja aqui visível, apoiado pelo Governo Federal para a saúde do adolescente.
Na execução financeira da função educação, a gente vê que, em 2022, tem uma diferença ainda de R$3,8 bilhões de recursos que foram executados em relação a 2019. E aqui a gente vai ganhando um pouco por conta do novo Fundeb também, nos últimos anos.
Educação infantil.
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Eu vou passar um pouquinho mais rápido só para a gente poder visualizar esse programa que é superimportante também, execução financeira do apoio à alimentação escolar por parte da União, que perdeu muito recurso nesses últimos anos de Governo. Teve um aporte agora, em 2023, com o aumento das per capitas.
E isto aqui que eu já disse: a gente tinha programas específicos de enfrentamento à violência contra crianças e adolescentes até 2018, 2019. Inclusive, a gente, até um período, tinha diferença das violências como um todo e da violência... do enfrentamento da violência sexual. A gente perdeu isso do orçamento do Governo Federal.
Então, quero trazer que os meninos e as meninas estão sendo violentados diuturnamente, não só na escola, mas eles levam as suas vivências para a escola. E aí a gente tem responsabilizado apenas a escola, muitas vezes, pelos sofrimentos que os meninos estão levando para aquele espaço. Então, como a gente lida com esses meninos, com essas meninas nesse espaço? A escola não consegue, apenas com o processo de aprendizagem formal, dar conta dessa demanda, não é? A gente vai precisar da relação com a comunidade, com os outros atores do sistema de garantia de direitos, inclusive com a polícia, mas com a polícia fora da escola, fazendo a segurança fora da escola, porque dentro da escola a polícia também vai restringir direitos.
E eu queria que a gente refletisse, junto, aí vou trazer algumas questões da minha experiência como educadora, para a gente pensar nos nossos filhos, vocês pensarem nos filhos de vocês. Eu não tenho filhos, então eu posso pensar nos meus primos, mas os meus primos e sobrinhos são todos de escola pública. Mas aqui, quem tem seus filhos em escolas particulares ou mesmo em escolas públicas do centro, eu queria ouvir, queria que a gente pensasse junto aqui se os filhos de vocês, os sobrinhos ou até vocês mesmos, se vocês ou os filhos de vocês foram impedidos de correr e de brincar correndo dentro da escola. Você já pensou uma escola em que os meninos não podem gritar e não podem correr, não podem brincar correndo? Os filhos de vocês ou os sobrinhos já foram revistados por algum policial dentro da escola? A escola dos filhos de vocês tem papel higiênico no banheiro? Porque as diversas escolas públicas de periferia do DF não têm papel higiênico no banheiro, e tem meninas que ficam o dia todo na escola, nas escolas de ensino integral.
Os filhos de vocês ou as filhas ou os sobrinhos já foram impedidos de repetir o lanche ou o almoço na escola? Porque... E às vezes os gestores não fazem isso por maldade, porque não querem oferecer a comida, é porque não tem recurso suficiente para permitir que todo mundo lanche. Então, para garantir que todo mundo coma alguma coisa, a gente não deixa repetir.
Os filhos de vocês já foram impedidos de participar da aula caso não tomassem o remédio psiquiátrico? A gente vivenciou isso numa escola que tem um adolescente que faz uso de remédio psiquiátrico, e, quando ele não toma, ele fica do jeito que ele é, na estrutura dele, do jeito que ele funciona na realidade, mas com a forma de ele funcionar a escola não dá conta.
E vocês já tiveram na escola dos filhos de vocês alguma história de que algum aluno desmaiou de fome? É uma realidade que aconteceu também em vários municípios e periferias do DF e municípios do Brasil.
Esses são alguns exemplos de violência na escola também, e aí, se a gente não pensar isso como violência, a gente está muito perdido.
(Soa a campainha.)
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A SRA. THALLITA DE OLIVEIRA - Então, a gente nunca vai resolver o que tem preocupado mais, que são os ataques - hoje a gente tem pensado sobre os ataques contra a escola -, porque, onde os meninos não se sentem dignos, onde não têm dignidade, um espaço de onde eles não se sentem parte, onde não podem opinar ou serem acolhidos ou onde não têm afeto e cuidado, há bem menos possibilidade de respeito ao outro, respeito ao território, à vida, não é? Tanto que em muitos casos o autor se entrega ou se suicida, porque ele não vê importância naquelas vidas ou na sua própria vida.
Então, grande parte da classe política e midiática, inclusive, tem se preocupado muito mais com a economia financeira do Governo, por exemplo, com o superávit primário, do que com a garantia de vida e dignidade das pessoas. Enquanto a gente não priorizar esse público, as pessoas, a população a terem acesso a seus direitos sociais, a gente não vai erradicar nenhum tipo de violência.
Era essa a reflexão que eu queria fazer.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dra. Thallita de Oliveira, Assessora Política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), que nos mostrou um visual aí também, que muitas vezes... Eu tenho cinco filhos, tenho netos, tenho bisneto. E muitas vezes a gente não observa com esse olhar que você deu aqui.
A SRA. THALLITA DE OLIVEIRA - Senador, eu não sei se daria tempo, mas eu trouxe um vídeo de um jovem cantando. Ele participou dos processos formativos e é uma letra dele. Ele também fez entrevista com outros jovens da comunidade dele, falando, na perspectiva deles, o que seria uma escola dos sonhos. A gente pergunta um pouco isso para os meninos, para as meninas, não é? A gente está discutindo aqui escola, violência nas escolas...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Se todos concordarem, no encerramento nós passamos o vídeo, o.k.? Pode ser?
A SRA. THALLITA DE OLIVEIRA - Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu passo a palavra agora à Dra. Anna Karla da Silva Pereira, Chefe da Assessoria de Participação Social e Diversidade, representando o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
Dra. Anna Karla.
A SRA. ANNA KARLA DA SILVA PEREIRA (Para expor.) - Boa tarde a todos, todas e "todes". Queria agradecer a presença dos Senadores e das Senadoras e cumprimentá-los, na pessoa do Senador Paim, e agradecer o convite. E também saúdo os demais que estão compondo a mesa com muita maestria.
Falar de direitos humanos e da questão da violência nas escolas é uma perspectiva que não tem como desassociar. Não tem como a gente falar de enfrentamento às violências que têm acontecido na escola, à escola e também da escola sem a gente pautar direitos humanos.
Quero fazer uma reflexão de como os direitos humanos têm sido atacados nos últimos anos e de que a gente tem visto o aumento da violência nos espaços de educação. Então não são coisas desassociadas. A gente passa por essa perspectiva do ataque aos direitos das pessoas e o índice de violência naturalmente aumenta em todas as camadas da sociedade. Na escola não seria diferente, já que é parte desse contexto social.
Quero falar também um pouco aqui dessa perspectiva das redes. Nas redes sociais, o que a gente acaba entendendo é a perda do filtro. Nas nossas relações, no cotidiano, nós temos os nossos filtros para falar com as pessoas, para interagir com as pessoas, e as redes sociais têm feito com que esse filtro se perca. Num primeiro momento é um filtro que se perdia apenas na rede social, mas o que a gente percebe é que isso extrapolou as redes sociais. Esse filtro que deixou de existir na rede social passa também a não existir nas nossas relações do cotidiano, afetando diretamente as relações nesse contexto.
A violência na escola não pode ser compreendida como um fenômeno isolado. O Brasil vive uma explosão de ataques violentos nos últimos anos. De 2022 a 2023, a gente supera o número de ataques ocorridos em 20 anos. Então, a gente tem um aumento muito grave do que tem sido essa violência. É óbvio que isso foi agravado pela pandemia, por todos esses contextos, mas a gente não pode deixar de levar em consideração o acirramento e a polarização política que tomou conta do nosso país, fazendo com que a gente passasse a se tratar de outra forma. As pessoas passaram a se tratar de outra forma, e essa polarização, esse avanço da extrema direita mesmo, da falta do contexto de humanização do outro passa a ser visto nas demais formas de violência que acabam culminando com tudo isso.
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Os estudos de perfil de autores de ataques também têm demonstrado um perfil muito específico: são jovens, em sua maioria, do sexo masculino, brancos, com baixa sociabilidade em ambiente presencial, ou seja, com pouca vivência coletiva. E aí a gente também tem que passar a tratar sobre como a escola cidadã, a escola aberta, a escola que ouve a comunidade, que tem participação social ativa é um caminho para a diminuição, para a redução da violência.
A violência escolar também tem suas particularidades e contornos dentro das características brasileiras. Não adianta também a gente trazer ou importar protocolos dos Estados Unidos, porque muito já se viu que não funciona, que os ataques continuam acontecendo em larga escala; ou seja, protocolo que traz militarização, colocar a escola como lugar de armamento, colocar cerca elétrica, câmera de segurança já é mais do que comprovado que não funciona. A gente tem outros protocolos no mundo que tratam, a partir da sociabilidade e da garantia de direitos humanos, o caminho para essa melhora na qualidade da convivência. E, sim, a gente está tratando da construção de alguns protocolos, mas nesse sentido, junto com o Ministério da Saúde, o Ministério de Direitos Humanos e o MEC. A gente tem construído reuniões a partir do GT interministerial para tratar sobre esses temas e subtemas. Afinal, problemas complexos não são tratados com soluções simplistas, porque cabe a nós também ter essa responsabilidade de tratar a urgência, mas de tratar o problema de fato.
O Brasil, como bem disse a minha colega que falou anteriormente, é constituído e construído na base da violência. A construção histórica deste país se dá a partir da colonização, da morte dos povos originários, do assassinato e do abuso sexual também de povos originários e de pessoas negras escravizadas neste país. Com muita dificuldade, a gente vem tentando romper essas violências e construir novos marcos civilizatórios. Porém, isso só se dá a partir do contexto do envolvimento de toda a sociedade, inclusive dentro das nossas Casas, do Congresso e do Senado, onde o senhor muito bem tem construído referências de luta antirracista. Essas formas de violência precisam perpassar pelo enfrentamento de uma organização do Estado.
O ataque à democracia e às instituições também são pilares fundamentais da violência que a gente vivencia hoje. As organizações são fundamentais para esse enfrentamento.
É necessário também que a gente faça uma reflexão profunda envolvendo gestores, comunidade escolar, profissionais da educação - profissionais da educação, desde aquela pessoa, geralmente mulher e negra, que está ali na merenda e daquele homem que está ali no portão da escola. Toda a comunidade escolar precisa estar inserida, porque esse é um papel coletivo, não é apenas do professor essa responsabilidade. Toda a gestão e a comunidade escolar precisa ser envolvida, e a gente precisa trazer respostas sistêmicas, mas preventivas, ou seja, que a gente não espere mais acontecerem situações para atuar no campo imediatista; que a gente consiga fazer a prevenção desses processos.
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Nós estamos construindo algumas respostas no campo interministerial, e aí o Ministério dos Direitos Humanos, ainda em fevereiro, antes dessa onda de ataques, já tinha construído o grupo de trabalho contra o discurso de ódio, que vem pautando sistematicamente essas temáticas para construir indicadores e para que a gente possa, a partir disso, com especialistas e organizações da sociedade, pautar caminhos, mas de forma sólida e de forma responsável, que traga indicadores reais para problemas nessa complexidade, ou seja, de como a gente vai lidar com intolerância religiosa nesses espaços, de como a gente vai lidar com as questões de gênero. E tudo isso tem sido discutido nesse GT, que tem um prazo de 180 dias e que vai entregar um relatório.
A gente está com a plataforma do Participa + Brasil, onde a gente vai colocar o material para contribuição também, e estamos recebendo da sociedade via e-mail, que está disponível lá na plataforma, materiais e conteúdos que as pessoas queiram encaminhar para o GT.
Quero reforçar também que o Ministério dos Direitos Humanos tem comprometimento e apoia, obviamente, as medidas jurídicas no campo da identificação dos grupos radicais, de cooptação de jovens e crianças, que, pelas pesquisas, começam a partir dos 11 anos de idade a serem cooptadas nas redes sociais por esses grupos extremistas.
Então, é necessário que, de fato, a gente veja uma investigação e que exista, de fato, um processo de enfrentamento a grupos neonazistas que têm se espalhado através de células no Brasil. A gente não pode fechar os olhos e achar que é um problema simples de se resolver. A gente precisa fazer um enfrentamento sério a essas células neonazistas que têm cooptado crianças para esse ambiente, e crianças que estão, muitas vezes, fragilizadas tanto pelo fim da pandemia como pela situação econômica que o nosso país atravessou. A gente tem aí um agravamento da fome, da miséria, da falta de emprego e de oportunidades, e isso tudo influencia na dinâmica social em que essas famílias estão inseridas. Então, esse é, de fato, um problema a que a gente precisa estar atenta.
E devemos cada vez mais também comunicar à sociedade que nós temos canais de denúncia e que, cada vez mais, a gente tem construído e estabelecido processos para entender os melhores caminhos. Hoje, o Ministério dos Direitos Humanos tem o Disque 100, que está amplamente conectado com essa responsabilidade de dar continuidade às denúncias e tem toda uma estrutura para acolhimento dessas denúncias, com informação qualificada e conectada com os estados e municípios.
Contudo, é imprescindível pensarmos que essas ações emergenciais e reativas têm um poder limitado. Então, a gente dá essa resposta imediata, mas a gente sabe que ela tem um poder limitado e que é preciso essa construção de longo prazo e de médio prazo, especificamente em relação às escolas, mas que sejam sustentadas em princípio de justiça restaurativa e não punitivista.
Esses adolescentes precisam também de acolhimento e de a gente entender como é que a gente chegou até aqui enquanto país e o que a gente vai fazer daqui para a frente. Por isso, um passo essencial é construir esse percurso de acolhimento, escuta e participação significativa na escola. A gente tem, de fato, diversas experiências exitosas de escola aberta, de escola comunitária, que fazem esse processo, de organizações sociais que participam ativamente, junto com a gestão escolar, construindo saídas para minimizar a violência nesses espaços e formas também de ouvir e garantir a participação das crianças e da juventude.
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É um período em que a gente precisa ouvir essas pessoas, em especial os jovens, que não querem mais que as coisas sejam decididas sem que eles façam parte dessa escuta. E isso tem sido muito recorrente nesses momentos que a gente tem feito de diálogo, a participação promotora nesse sentido de contribuir com um ambiente escolar mais saudável em que, com toda a participação dos jovens, a gente consegue construir soluções do ponto de vista territorial, porque a gente, no Brasil, um país de tamanho continental, tem especificidades. Então, essa escuta também precisa ser regionalizada para que a gente consiga também fazer a promoção e a defesa da vida como centro de reconstrução da política nacional.
É preciso que a gente pense que esse processo de escolas também garante uma janela de oportunidades para que a gente reveja o que a gente quer ser enquanto país e enquanto nação. É necessário colocar a defesa da vida no centro do debate, porque, por muitos anos, ela foi negligenciada. Ninguém quer mais ouvir: "E daí? Eu não sou coveiro". A gente precisa pautar essas relações a partir da defesa da vida, e é com esse compromisso que o Ministério dos Direitos Humanos reafirma estar empenhado.
Eu trouxe algumas ações. E eu também queria falar um pouco sobre a recomposição do conselho e das políticas públicas que foram apresentadas há pouco.
Até 2023, a gente tem o orçamento do Governo anterior, então a gente está trabalhando com isso, e foram feitas algumas suplementações este ano - pedi aqui os dados para passar direitinho. Então, quanto aos defensores, foi de 9 milhões para 23 milhões a suplementação do programa de defensores; o PPCaam vai ser suplementado em 19 milhões; e há 51 milhões de suplementação para mais três programas ligados à Secretaria da Criança e do Adolescente, enfim, à política de direitos humanos. Quero dizer que a gente está trabalhando muito, inclusive no PPA, para garantir a participação social, mas também as políticas de defesa e garantia da vida das crianças e adolescentes, e dizer que, no âmbito do ministério, também a gente está atuando com uma força-tarefa junto à educação midiática com a Secom para entender como é que a gente constrói uma comunicação efetiva e direcionada.
Cito, ainda: a atuação no GT Interministerial contra a violência nas escolas; a contratação de consultoria especializada para ajudar no processo todo de acolhimento no Disque 100 - então, também será ampliada essa rede -; a atuação na equipagem e sistema de garantia da criança e adolescente, em especial em municípios que sofreram ataques. Então, a gente entende que há uma rede de proteção. É preciso que a gente entenda que a garantia de direitos da criança e do adolescente não se dá, por fim, tão somente na escola: a gente tem os conselhos tutelares, enfim, todo esse processo que precisa ser fortalecido; o atendimento a familiares e comunidades atingidas por ataque - a gente tem pensado em como se conectar com essas famílias e fazer um processo de acolhimento e acompanhamento -; capacitação dos atendentes do Dique 100; parceria também com a Cruz Vermelha para cooperação técnica; e muitos diálogos com as plataformas digitais, tanto para divulgação das ações do próprio ministério em relação ao Dique 100 e canais de denúncia, como para a construção e instituição de protocolos que não permitam a amplificação de discursos de ódio e ataques em especial a crianças e adolescentes. E cito também a criação de fluxos integrados entre os ministérios para que isso seja, de forma contínua, um trabalho de acompanhamento de médio e longo prazo.
Além disso, o Ministro também está na construção do projeto de Cidadania Digital para que a gente possa fazer isso de forma mais sólida, para que a sociedade, de fato, tenha uma resposta efetiva e a gente não venha mais a ter casos que nos indignem tanto...
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(Soa a campainha.)
A SRA. ANNA KARLA DA SILVA PEREIRA - ... como os que a gente vivenciou nos últimos meses. Também, como mãe, tenho essa preocupação - acredito que toda a sociedade tenha se unido nesse propósito - e espero que, muito em breve, a gente traga respostas ainda mais positivas, porque esse é o propósito do Ministério dos Direitos Humanos e do Ministro Silvio Almeida.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dra. Anna Karla da Silva Pereira, Chefe de Assessoria de Participação Social e Diversidade, que falou em nome do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania. Parabéns pela sua fala bem didática e que complementou aqui o que os outros painelistas falaram.
Agora, de forma remota, Suely Melo de Castro Menezes, Vice-Presidente da Câmara de Educação Básica, representante do Conselho Nacional de Educação.
Por favor, de forma remota.
A SRA. SUELY MELO DE CASTRO MENEZES (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde a todos. Agradeço o privilégio de representar o Conselho Nacional de Educação neste encontro. Parabenizo a iniciativa das nossas Comissões de Direitos Humanos, de Educação e de Segurança, entrelaçando as suas missões para buscar, exatamente, promover o diálogo sobre a prevenção da violência nas escolas.
Quero saudar os Senadores presentes na pessoa do nosso Senador Paulo Paim, porque eles compareceram, porque eles estão participando e porque se importam com o tema. Isso, para nós, é fundamental nesse processo.
Saúdo também os profissionais que participam desta audiência, com os quais aprendi muito hoje, pelos vários olhares, pelas várias percepções sobre o tema. Fico até pensando se ainda temos algo a falar sobre o assunto, sendo a última a me posicionar.
Entretanto, a provocação para participar desta audiência remete meus pensamentos para o Artigo 1 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em que ela define que todas as pessoas "nascem livres e iguais em dignidade e direitos [...] e devem agir em relação [...] [umas às outras] com espírito de fraternidade". Ora, é muito relevante que, nessa declaração, a educação não seja referendada apenas como um direito, mas também como um meio para que se alcancem os objetivos propostos pelo próprio documento.
O que deve nos incomodar e talvez nos mobilizar é que essa declaração está em vigor há 66 anos, e a Constituição de 1988, que abordou esse tema, há mais de 30 anos, e muitos direitos consagrados por esses dois documentos permanecem desconhecidos, incompreendidos ou ignorados. Esse cenário é demonstrativo da inexistência de uma cultura de respeito a esses direitos humanos, mesmo reconhecendo que há movimentos de difusão da agenda deles no Brasil, mas que, lamentavelmente, não se materializam em práticas e em ações efetivas como nós gostaríamos.
Dessa forma, a primeira questão que eu quero colocar em destaque é que educação em direitos humanos, gente, é muito importante para difundir, para sensibilizar e fortalecer a ideia de que são os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais que, em conjunto indivisível, asseguram o desenvolvimento de cada um de nós, de cada indivíduo, e também da sua integração integral, articulando as diversas dimensões da nossa vida.
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Vale refletirmos num momento como esse, entretanto, que não é suficiente o fortalecimento do respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais. As instituições de ensino devem investir nessa questão de muitas formas, não bastando tratar a questão como disciplina ou tema transversal para a garantia da escola como espaço de valorização, de humanização e de promoção desses direitos humanos.
Nesse diapasão, é imprescindível que pensemos no desenvolvimento de uma cultura de paz por meios educacionais. Precisamos admitir que a realidade do mundo está marcada pelo fenômeno da violência, a partir das incipientes políticas de inclusão pelas quais tanto esta Casa tem lutado, dos direitos básicos não reconhecidos, potencializando a necessidade de vivência da cultura da paz pautada na ética, que induza ao reconhecimento dos outros e dos muitos diferentes contextos como dimensões que dialogam com os seres em evolução e em transformação, nossas crianças e nossos jovens.
A educação para a paz, ao basear-se em valores morais, não admite perspectivas de neutralidade. Nós não podemos ter medos; nós temos que ter lado. Temos que ter propostas. Temos que ter objetivos e metas a alcançar, exigindo atitude social aberta, dinâmica, mas clara intencionalidade nas áreas de interação social que queremos da nossa sociedade.
Em outro ângulo, podemos concordar que a educação para a paz, até o pensamento de Santos, ao se justificar como a defesa... A educação para a paz como defesa da dignidade humana, a defesa da igualdade dos direitos ou defesa da democracia, entre outras questões, pressupõe um olhar atento aos valores, às crenças, às representações. Quem somos nós, de que lado nós estamos, quem nós representamos? As experiências e as vivências da sociedade. São as relações com essa multiculturalidade, este país imenso, diverso, intercultural.
Vale ressaltar que a educação permite desenvolver a paz, tendo como propostas o desenvolvimento de ideais pacifistas. Entretanto, pensar em educação para a paz no Brasil nos remete a um fundamento relevante, referente à adoção de posicionamentos críticos a respeito da nossa democracia, de como ela está sendo conduzida, e dos direitos sociais vivenciados pelos nossos diversos grupos.
Esse movimento exige um amplo exercício de proposições de futuro, de progresso, de mudanças, de acompanhamento dessa evolução mundial, o poder de orientar essa pedagogia nas práticas de cidadania participativa.
Hoje nós já vimos muitas das nossas pessoas da mesa falarem sobre a necessidade de participação cidadã, desenvolvendo subjetividades que reconheçam o outro como um sujeito de direito. Enfim, eu não posso romper a violência se nós não tivermos a consciência de que o outro é um sujeito de direitos, de que o outro é capaz de participar de uma vida coletiva e que a sua integridade, a integridade do outro, é responsabilidade de cada um de nós e também de todos nós juntos.
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A partir dessa reflexão, a educação para a paz... no pensamento de Freire, por exemplo, de que eu gosto muito, ele diz que a pedagogia se propõe a desenvolver a consciência de realidade - e a nossa realidade como está? - e, ao mesmo tempo, não adianta só ter consciência da realidade; eu preciso produzir ações que transformem essa realidade, que transformem essa sociedade, mesmo diante de muitas contradições, de um cotidiano social, de uma realidade evidenciada, que nem sempre é aquela desejada.
Outro ponto crítico para o desenvolvimento de uma educação para a paz no Brasil reside nas manifestações diretas sofridas pelos alunos e pelas minorias sociais, nossos grupos formados de pessoas vulneráveis. Esses coletivos são marcados pela exclusão em muitas dimensões, exclusões de toda forma, e por estigmas (estigmatizados por preconceitos); também pela marginalização no cotidiano das suas vidas, na articulação com estruturas cheias de valores morais que terminam por fortalecer posturas que, de uma forma geral, ferem, reduzem, exterminam, achincalham o outro. Quer dizer, essa convivência produz aprendizagem.
É muito constrangedor admitir que nossa sociedade silencia, pactua de forma consciente diante de agressões sofridas por uma grande parte da sociedade: violência, discriminação, desvalorização de gênero, de cor, de formação, de trabalho - questões sobre o trabalho.
As demais manifestações da violência direta direcionada aos grupos de minorias sociais revelam um ranço incompreensível. De onde vem esse ranço? Como adquirimos esse ranço? De fatores culturais que representam uma violência estrutural que nós precisamos romper, revelando o não reconhecimento, o não cumprimento dos direitos sociais, fatores que impulsionam a violência direta sobre o outro. Se eu não respeito, se eu não reconheço; a violência não tem limite.
Outro ponto crítico é a convivência direta com o racismo, com a homofobia e com outras manifestações. É a face da violência cultural apoiada nas ideologias beligerantes radicais, propalando o medo, visando a aumentar a dominação, reduzir liberdade, produzir posturas ou conservadoras ou progressistas, mas sempre radicais, colocando lados da sociedade contra ou em detrimento do outro. Tudo isso gera exemplo, tudo isso gera ensinamento. Essa tendência manifesta-se, por exemplo, muitas vezes falada hoje, nas redes sociais, produzindo conteúdos informativos falsos, desenvolvendo o culto à mentira, alteração de verdade de forma irresponsável.
As redes sociais - nós sabemos - precisam de mais controle para combater o que muito foi falado hoje: as formas de projeção de discursos de ódio. Nossas crianças e jovens, aliás, todos nós, eu e vocês convivemos cotidianamente com esse mal-estar moral, um mal-estar moral subjacente da notícia de violência generalizada, da confecção de narrativas falsas, enviesadas.
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No dizer Bauman, por exemplo, ele diz que aprendemos a conviver com essa sociedade dita moderna que manipula e coisifica os outros, hierarquizando culturas, valores e princípios. Concordo com Bauman. Lamentavelmente, nós somos levados a isso.
É preciso um enfrentamento predisposto à neutralização da violência cultural, que legitima a dominação de alguns e produz simulacros de discursos que têm como objetivo direcionar uns contra os outros, de acordo com o interesse de um ou de um grupo.
Mas quero dizer que uma política, para ter força, para ser fortalecida, precisa ter uma base legal. Eu diria que as nossas Casas legislativas, tanto o Senado quanto o Congresso, de um modo geral, têm trabalhado, têm feito o seu dever de casa. Em alinhamento com muitos países e as próprias Nações Unidas, o nosso país tem produzido muitas leis de promoção da cultura da paz.
Só algumas, por exemplo: a LDB, no seu art.12, inciso X, propõe estabelecer ações destinadas a promover a cultura da paz nas escolas. Ela é explícita, está na lei. Então, só precisa cumprir.
O PNE garante políticas de combate à violência nas escolas - olha só a delicadeza -, capacitando os educadores para a percepção da violência doméstica e da violência sexual para a adoção de providências adequadas. Não é só capacitar o professor, mas capacitar o professor para enxergar aquilo que ele está olhando.
A Lei 13.185, no art. 4º, define: "VII - promover a cidadania, [...] a terceiros, nos marcos de uma cultura de paz e tolerância mútua;".
E ainda a Lei 13.663, de 2018, bem recente, estabelece a promoção de medidas de conscientização de prevenção de combate a todos os tipos de violência, especialmente o bullying nas escolas, e o desenvolvimento de ações destinadas a promover a cultura de paz nas escolas. É explícita, é explícita!
E ainda podemos referendar que no PNE em Direitos Humanos, a PNE dos Direitos Humanos, ressalta-se a importância da cultura da paz. Esse plano, inclusive, ressalta a necessidade - foi até falado, eu estou em dúvida de quem falou - de termos tratados, protocolos, convenções, enfim, instrumentos que protejam a sociedade. O arcabouço legal brasileiro, na proposta de desenvolvimento da cultura da paz, já estabelece esses padrões culturais.
Esta Casa legislativa tem alguns PLs em discussão; o conselho nacional está debruçado, Conselho dos Direitos Humanos, conselho de... Praticamente todos os ministérios de educação estão discutindo essa questão. Será necessário, entretanto, um pacto nacional para que nós possamos reunir escola, família e sociedade, realizando ações intencionais na busca de mecanismos não violentos para a solução de problemas. Enfim, nós estamos todos mobilizados na busca de reflexão dessa temática.
E é importante considerarmos que a escola é um espaço multicultural e que pode, criativamente, trabalhar de muitas formas para desenvolver a cultura da paz.
Obrigada. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dra. Suely Melo de Castro Menezes, Vice-Presidente da Câmara de Educação Básica, representante do Conselho Nacional de Educação.
V. Exa. tem toda razão. O silêncio, ao não se posicionar em um momento desses, alguém já disse que a gente é cúmplice, e ninguém quer ser cúmplice de um filme de terror como esse que eles estão patrocinando com ódio. Muito obrigado.
De imediato, eu passo a palavra, agora, à Senadora Teresa Leitão. Depois, cada um dos senhores convidados terá cinco minuto para as considerações finais.
A SRA. TERESA LEITÃO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para interpelar.) - Obrigada, Presidente, Senador Paulo Paim.
Quero saudar a todos os representantes das instituições que atenderam ao convite desta audiência coletiva, conjunta, não é? Eu também estou participando de um ciclo de audiências na Comissão de Educação. O Ministério de Direitos Humanos participou da segunda e, sexta-feira, nós vamos ter a terceira.
Com muita satisfação, Senador, eu vejo que as falas de todos os convidados das instituições têm alguns pontos em comum muito importantes: primeiro, a escola não é imune ao que se passa na sociedade. A importância de a escola dialogar com a sociedade, inferir na sociedade, interferir na sociedade é muito importante, sendo - como para alguns segmentos, algumas comunidades periféricas, sobretudo -, muitas vezes, o único equipamento cultural disponível.
Então, o senso de pertencimento, Thallita, que você externou - permita-me chamá-la assim, acho que você tem idade de ser minha filha -, o senso de pertencimento, a identidade, tudo isso é importante, tanto na preservação do prédio em si quanto naquilo que se produz, ali dentro, em termos de conhecimento, de saberes, de trocas, de enriquecimento cultural.
Essa questão da violência, na dimensão que ela tomou, realmente, precisa ser tratada, porque violência dentro da escola sempre houve, mas era uma violência autorizada. Uma vez mesmo - eu fui professora durante 30 anos e comecei com pequenininhos -, uma mãe, Senador, disse assim a mim: "Como é que ele está hoje? Muito impossível?". Eu disse: "Ele sempre está impossível, mas parece que é da natureza dele". Aí ela disse assim: "Faça como eu, professora: amarre-o ao pé da mesa". Eu disse: "Olha, aqui a gente nem tem mesa de professor". A nossa escola era uma escola mais avançada, uma escola modelo, inclusive. "Aqui, a professora se senta nas mesmas mesinhas em que as crianças se sentam. Então, você não me autorize a isso e, se você me permite, não faça isso em casa, não, porque aí, quando chega na escola, ele sente os laços totalmente rompidos e não tem limite. Ele próprio não se impõe limite". Era uma criança de seis anos.
Então, era autorizada a palmatória, eram autorizados os castigos, mas, felizmente, a sociedade avançou. Avançou e tem muita regulação de direitos - evidentemente não cumpridos, infelizmente -, mas eu noto que há um movimento muito forte de que segurança requer proteção. Segurança na escola não é metralhadora, não é soldado dentro da escola. Hoje, o Ministro da Educação deu uma resposta muito boa sobre as escolas cívico-militares. Não é disciplinamento puro e simples. Disciplinamento é pacto, não é? São pactos de convivência que você faz com o estudante. Então, eu quero parabenizar nesse aspecto, e acho que a Casa, Senador Paim, vai dar uma boa contribuição com esse volume de escutas que nós estamos fazendo de maneira muito proativa.
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Só queria trazer uma questão específica para Dr. Celso Francisco, que é uma questão que também me apreende muito: o espaço dos outros profissionais dentro da escola. Eu fui sindicalista, antes de ser Deputada e depois Senadora, e o primeiro debate que nós tivemos foi sobre a identidade dos profissionais de educação. Majoritariamente são os professores. Magistério é a esmagadora maioria. Mas começamos a discutir com os outros: porteiro, secretário, merendeira, serviços gerais. E instituímos um programa chamado Pró-Funcionário, de formação profissional para esses funcionários, porque um porteiro de escola não é um porteiro de um cinema; uma merendeira de escola não é uma cozinheira de um restaurante. Há perspectivas pedagógicas que nós trabalhamos muito. E nós nos unificamos no mundo sindical, e nos denominamos de trabalhadores da educação. Começamos a discutir essa unificação profissional, a passos lentos sim, mas começamos a discutir nesse programa, que nos Governos Lula e Dilma foi bastante ativado - suspendeu-se, e agora a gente quer que ele volte -, que é o programa de profissionalização dos funcionários, em multimeios didáticos, em infraestrutura escolar, em alimentação escolar, que é o conteúdo para saber o que você está fazendo, e não simplesmente fazer, porque o diretor manda e porque a professora requer.
Os outros profissionais que agora estão sendo muito requeridos, que são principalmente os da área psicossocial, sobretudo depois da lei, são os psicólogos e os assistentes sociais. Nós temos uma consciência muito grande, Dr. Celso, de que nós somos indispensáveis no processo pedagógico, mas somos insuficientes. A gente precisa do apoio de outros profissionais. Qual é o dilema? A manutenção! É esse o dilema, principalmente depois do Fundeb. Até para inserir esses outros que estão dentro da escola há anos não é fácil. A primeira formulação do financiamento da educação dava direito - e ainda dá - ao piso só ao magistério. Os demais nem piso têm; são pagos não pelos 70% do Fundeb, mas pelos 30%, onde estão todas as rubricas de manutenção e desenvolvimento do ensino. Então, esse é o dilema. Eu acho que não é uma rejeição - ninguém poderia ter, não é? - ao psicólogo, ao assistente social.
Há uma necessidade grande de um trabalho integrado, inclusive. O que os sistemas precisam fazer e que acho que o Plano Nacional de Educação, na sua revisão, deve fazer é dizer onde incluir esses profissionais na organização escolar dos sistemas. E o Sistema Nacional de Educação também pode apontar para isso. Quem será responsável pelos concursos desses profissionais no serviço público? No meu estado tem no Plano de Cargos e Carreiras. Agora, psicólogo escolar tem que ter a formação em psicologia escolar. De que maneira isso vai ser traduzido na burocracia mesmo exigida para ingresso nas carreiras de serviço público? Acho que esse é o nó. Não é que a gente não queira ou não precise. Precisamos mais do que nunca. A complexidade da dinâmica social, os patamares a que o adoecimento mental chegou em nossas vidas, o pós-pandemia... Tem um conjunto de fatores pelos quais a gente precisa. A gente precisa muito uns dos outros e precisa dessas questões mais específicas para que a educação e o processo do projeto pedagógico possa fluir com mais rapidez, afirmando sempre direitos e cidadania. Muito obrigada e desculpe-me por ter me alongado tanto, Senador.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não; foi brilhante como sempre, Senadora Teresa Leitão. (Palmas.)
Casualmente a pergunta é para o Celso, e ele é o primeiro mesmo agora. (Risos.) Eu vou lhe dar os cinco minutos, que vou dar para todos, mas terá uma tolerância para responder à Senadora.
Então, Celso Francisco Tondin, representante do Conselho Federal de Psicologia, para as considerações finais e para já responder à pergunta da Senadora.
O SR. CELSO FRANCISCO TONDIN (Para expor.) - Profa. Teresa, se me permite, vou tratá-la pela sua identificação primeira, não é? Com certeza eu acompanho o seu trabalho, apesar de morar na Região Sudeste e ser natural do Sul. Eu vou iniciar por outras considerações, mas chego à sua fala.
Abordei na minha primeira intervenção, e depois foi aqui adensando, a contribuição das psicólogas, dos psicólogos, das e dos assistentes sociais, na constituição não só do trabalho interno da escola, de uma escola que protege - eu até me lembrava de algum projeto que existia nos governos passados, da Escola que Protege, do Programa Nacional de Direitos Humanos -, mas também da formação de redes de proteção social, do trabalho intersetorial.
Essa é uma vantagem que a gente tem hoje. A gente tem o serviço social e a psicologia também nas outras políticas do SUS, por exemplo, e a gente pode compor essa rede intersetorial com essa rede de proteção social, trabalhando no território - como foi dito aqui -, com as famílias, porque a mesma família que está sendo atendida lá no Programa Bolsa família está sendo atendida pelo Programa Saúde da Família e está sendo atendida na escola, por meio dos seus filhos que lá estudam, não é? Porque, quando uma criança vai para a escola, vai a família junto, ou pelo menos deveria ir, porque a escola deve ser um lugar de acolhimento das famílias.
Nós falamos aqui da vertente participativa, não é? Do protagonismo infantojuvenil e também, portanto, das famílias. Esse trabalho não é para as crianças, adolescentes e suas famílias, é com as crianças, os adolescentes e suas famílias. E também esse trabalho do serviço social e da psicologia nas escolas é um trabalho que deve ser com a escola e não na escola. Não é uma prestação de serviço para a escola. Diferentemente, por exemplo, de quando você vai fazer um programa ocasional lá na escola, em que você vai lá e praticamente presta um serviço, ou seja, você está na escola. É uma outra concepção. Como profissional da educação, a gente vai estar vivendo a escola, vivendo o chão da escola e compondo a equipe, elaborando e participando do projeto político-pedagógico da escola, participando da construção dessa rede intersetorial, como eu disse. E aí temos essa condição privilegiada, porque estamos fora da sala de aula, e conseguimos fazer isso - privilegiada no sentido de ter tempo de poder fazer reuniões com os outros equipamentos públicos, com Cras, Creas, Unidades Básicas de Saúde etc. É um trabalho, então, em que nós não vamos ser um especialista atendendo a escola, mas mais um ator, atriz da escola, trabalhando com a escola.
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E aí, quando a senhora começou a sua fala, eu pensei que você ia dizer nesse sentido, de um dos temores que a gente tem ouvido, que é substituir o profissional da escola. Não. Você não tocou nisso, mas a gente ouve isso pelos municípios em que temos circulado para trabalhar com a implementação dessa lei - a gente tem ouvido muitas vezes isso. Então, acho que a gente já está começando a superar esse espaço de substituição, não é?
E há também um discurso salvacionista, como se a gente fosse salvar, porque antes as professoras diziam também: "Eu era um assistente social, eu era uma psicóloga sem formação porque tinha que lidar com as questões sociais subjetivas dos meus estudantes, dos meus alunos, alunas, das suas famílias". Também não é essa perspectiva salvacionista, porque também, se não nos derem boas condições de trabalho, nós vamos ter os mesmos problemas que a escola já tem hoje, não é? Se não tiver um piso, se não tiver condições adequadas de trabalho, se não tiver uma relação respeitosa, se não tiver políticas de respeito à função docente, à função da psicóloga também... Porque a gente tem casos de assédio, projetos parlamentares que surgem em Câmaras, em Assembleias e até aqui de ataque, como foi dito, à escola, ataques ideológicos que não querem contribuir com a qualidade da educação; querem colocar justamente a educação mais fragilizada, porque combater a educação é combater o acordo civilizatório, é voltar à barbárie. E interessa a muitos a barbárie. Um ataque à escola é sempre um ataque à civilização.
Então, respondendo exatamente a sua pergunta, nós temos uma história, uma identidade que nos coloca diferentemente de outros profissionais. Então, por exemplo, vamos pensar... Em certa ocasião, num debate, colocaram assim: tem até projetos para colocar capelão em escola, militares na escola. Se eles começam a ser considerados profissionais da educação, o Fundeb vai abarcar um espectro cada vez mais amplo. Não se trata disso. Temos acordo de que profissionais são aqueles que estavam lá e mais as assistentes sociais e as psicólogas. E aí eu acho que a questão não é... Eu fico pensando na retomada das grandes fontes de financiamento da educação.
(Soa a campainha.)
O SR. CELSO FRANCISCO TONDIN - Como é que está a discussão do PIB? Como é que está a discussão do pré-sal? Como estão essas discussões? Porque a gente é parceiro na luta pela implementação do piso salarial do magistério e para que ele também se estenda aos demais profissionais da escola, inclusive nós.
Então, como disse na minha primeira fala, essa saída dos 70% para os 30%, essa mudança na regulamentação do Fundeb, que teve do final de 2020 para o final de 2021, de sair dos 70% para os 30%, isso foi um problema realmente. Então, eu coloquei como proposta, no final da minha fala, justamente retomar a discussão, inclusive da alteração do art. 61 da LDB, para sermos considerados profissionais da educação e para a gente participar de todas as lutas sociais da classe trabalhadora do magistério e, enfim, dos Parlamentares que assim querem para o aumento do financiamento da educação como um todo. Nós estamos juntos aí nessa luta, não é?
(Soa a campainha.)
O SR. CELSO FRANCISCO TONDIN - Eu acho que o meu tempo está encerrado.
E é isso. Eu acho que é compreender, então, a gente como profissional que não é da saúde, que é da educação, e que vai promover saúde mental, sim, mas que isso tem a ver com aprendizagem e desenvolvimento integral tanto de alunos e alunas quanto de seus professores, professoras e famílias.
Queria só terminar com uma fala que é a seguinte. O discurso da prevenção é muito forte, voltado tanto a prevenir lá na segurança pública, como eu falei, quanto à psicologia e ao serviço social para prevenir as violências. Só que, antes de tudo, gente, a violência é muito mais resultado do que causa. Então, a gente deve atuar cada vez mais nos fatores determinantes dos processos de violência, que aqui foram muito bem citados.
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É isso, então. Encerro, dizendo que quero entregar, na figura do Senador aqui, para toda a mesa - depois a gente faz chegar às colegas; inclusive estávamos cochichando aqui sobre isso - um material do Conselho Federal de Psicologia, que é a "Pesquisa Violência e Preconceitos na Escola: Contribuições da Psicologia"...
(Soa a campainha.)
O SR. CELSO FRANCISCO TONDIN - ... uma pesquisa feita de 2013 a 2015, por solicitação do Ministério da Educação, na gestão do Aloizio Mercadante, feita pelo Conselho Federal, outras entidades nacionais e dez universidades federais do país; as referências técnicas para atuação das psicólogas na educação básica - nós temos o Centro de Referências Técnicas em Psicologia e Políticas Públicas (Crepop), que construiu essas referências -; e trago também dos nossos parceiros e parceiras de trabalho subsídios para atuação de assistentes sociais na política de educação.
Quero agradecer e colocar aí mais uma vez a psicologia brasileira a serviço da cultura de paz, que é muito mais que a escola, é uma sociedade de paz. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Celso Francisco Tondin, do Conselho Regional de Psicologia, representante do Conselho Federal de Psicologia nesse debate. Parabéns! Recebo com alegria os livros, que ficarão na Comissão para todos aqueles que quiserem fazer a leitura.
De imediato eu passo a palavra para a Sra. Carolina Campos, representante da Consultoria Vozes da Educação. (Pausa.)
Se ela não se encontra...
A SRA. CAROLINA CAMPOS (Por videoconferência.) - Eu estou aqui.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É com a senhora.
A SRA. CAROLINA CAMPOS (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde. Boa tarde, Sr. Senador.
Bom, para finalizar, o que eu gostaria de dizer para os senhores e para as senhoras é que, muito embora a gente tenha muitas legislações já, como foi mostrado aqui, a gente ainda não tem formação dos professores para poderem compreender o significado de trauma. A gente ainda não consegue formar os nossos professores para entenderem a importância de lutar contra o bullying. Nós fazemos algumas campanhas que não resultam em questões diretas, como, por exemplo: a gente fala mais do mesmo - "diga 'não' ao bullying", "diga 'não' à violência" -, mas não explica como fazer isso. E isso só vai acontecer quando a gente tiver formações muito específicas para poder ensinar aos nossos professores como lidar com essas situações.
Não podemos esquecer que a pandemia tem uma relação direta com tudo que está acontecendo. Isso que a gente está vendo é decorrência da pandemia também. Foram dois anos fora das escolas e, depois, uma perda de aprendizagem avassaladora; não conseguimos processar nossos lutos nem enquanto educadores nem enquanto alunos, porque não nos foi dada a oportunidade disso; não conseguimos, além de tudo, falar sobre saúde mental no ambiente escolar; ficamos fingindo que nada estava acontecendo, e tudo começou a escalar. A violência nas escolas significa um escalonamento do que a gente deixou de falar. O elefante branco segue dentro da sala; a gente simplesmente não fala sobre ele. E, enquanto a gente não fala, as coisas não mudam. Por isso, é tão importante - e eu louvo a iniciativa dos senhores e das senhoras, de V. Exas. - fazer uma audiência pública, porque é muito importante que as pessoas falem sobre o que está doendo dentro do ambiente escolar.
E eu posso dizer, Sras. Senadoras e Srs. Senadores, que o que dói dentro do ambiente escolar é que, embora a gente tenha uma legislação que determine a contratação de psicólogos, não tem recursos nos municípios para que isso aconteça.
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Embora tenha uma legislação que determina a contratação de psicólogos e assistentes sociais, essa lei não pegou, como muitas no Brasil, e a gente precisa de fiscalização para que essa lei pegue. A gente precisa de recurso para que os municípios possam implementar essa lei, e, sobretudo, a gente precisa que os municípios trabalhem de uma forma ativa para formar seus profissionais, para que a lei possa funcionar.
Dentro da escola, os psicólogos não têm que fazer tratamento clínico, eles têm que identificar os casos. O aluno que está calado ou o aluno que está portando uma arma precisa ser visto, compreendido e entendido, para a gente poder fazer um encaminhamento, e não um tratamento. Escola não vai ser o lugar do tratamento, mas a escola é o lugar, primeiro, em que eu consigo identificar as situações e fazer os encaminhamentos corretos.
A escola precisa identificar quem é sua rede de apoio. Para isso, a gente precisa, senhores e senhoras, Senadores e Senadoras, de conselhos tutelares atuantes. Os conselhos tutelares precisam ser revistos no Brasil. Os conselhos tutelares têm um papel fundamental de não só proteger as infâncias e as adolescências, mas, sobretudo, de atuar contra essas violências e apoiando a saúde mental desses alunos e dessas alunas. Mas, hoje, o que se vê no Brasil, lamentavelmente, são conselhos tutelares que não conseguem cumprir seus papéis institucionais por muitas razões, inclusive porque alguns conselheiros tutelares não estão conseguindo entender a profundidade e a magnitude disso e mudam o seu comportamento de acordo com suas aspirações pessoais, de acordo com suas crenças pessoais, melhor dizendo.
Então, os conselhos tutelares no Brasil, ele é um órgão central do ponto de vista de apoio da escola, mas hoje em dia não está tendo o mesmo cuidado que deveria ter. É muito importante que a população se engaje nas eleições dos conselhos tutelares para que a gente possa ser representada de verdade nessas instituições e não, pura e simplesmente, que a gente seja ignorada, porque muitas escolas se queixam de que os conselhos tutelares não agem como deveriam.
Então, eu gostaria de deixar, por fim, o meu recado de que a formação é essencial. Entender que existem três momentos: momentos de prevenção, antes do acontecido; momento durante o acontecido, durante um evento preciso, de um fluxo; e um momento final. Num caso de uma violência, com o que a gente pode lidar? Como é que a gente vai lidar com isso? Como eu vou reabrir a escola? O que eu vou mudar no meu protocolo que não funcionou? Como é que eu vou trabalhar essas questões todas, isso é muito importante.
E, por fim, a gente tem que entender que racismo, xenofobia, intolerância religiosa e todas essas demais violências acontecem na escola, sim! A escola é uma esponja, ela absorve tudo o que acontece na comunidade, e quando a gente não olha para isso, quando a gente não tem dado disso... Eu não consigo saber se uma escola teve mais ou menos casos de racismo de um ano para outro porque a gente não trabalha com os encaminhamentos disso para a Secretaria de Educação.
Então é muito importante que a Secretaria de Educação receba os encaminhamentos desses dados, para que elas possam compilar e saber se houve alguma melhora ou alguma piora em determinada unidade escolar com relação a casos que são violências - que acontecem todos os dias, mas que a gente simplesmente não olha para elas. E, obviamente, essas violências tendem a escalar e chegam ao ponto de tirar vidas de pessoas.
Eu agradeço muito, mais uma vez, o fato de vocês me ouvirem. E seguimos à disposição de todos e de todas aqui.
Muito obrigada e uma boa tarde! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Boa tarde! Parabéns, Sra. Ana Carolina Fonseca, especialista em educação e proteção do Unicef no Brasil!
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Agora é a Ana, não é? Eu agradeci à Carolina Campos, que falou pela consultoria Vozes da Educação.
É com você agora, Ana.
A SRA. ANA CAROLINA FONSECA - Muito obrigada.
Mais uma vez quero agradecer a oportunidade...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - As duas são Carolina.
A SRA. ANA CAROLINA FONSECA - As duas são Carolina.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Para não dizer que eu fiz confusão.
A SRA. ANA CAROLINA FONSECA (Para expor.) - Não, nenhuma. (Risos.)
Agradeço novamente a oportunidade de participar deste momento, dessas reflexões. Agradeço ao Senador e também aos demais Senadores e Senadoras que estiveram aqui, acolhendo essas reflexões. De tudo o que foi dito, acho que fica muito forte a necessidade de um trabalho integrado, de um trabalho em rede.
Eu retomo a provocação que a Thallita nos trouxe sobre algumas situações que acontecem nas escolas e no contato com professores. É muito recorrente também quando nos trazem os relatos de "Olha, eu percebi que uma criança está sofrendo violência. Eu não sei o que fazer. Eu tenho medo de fazer uma comunicação e isso também se voltar na forma de violência contra mim".
Então, acho que é muito importante a gente pensar nesses casos, que se somam aos demais que a Thallita nos trouxe, porque as discussões que a gente está fazendo de metodologias, de recursos, de ferramentas, que são necessárias para construir uma educação que protege, não são sobre a educação apenas. Elas estão para muito além do setor educação. Acho que isso fica muito claro. Então, a gente só vai conseguir garantir acesso e permanência na escola se a gente tiver saúde, assistência social, cultura, lazer, todos os outros segmentos juntos, se a gente tiver agentes comunitários de saúde que, ao fazerem uma visita domiciliar e se depararem com uma criança fora da escola, se tiverem informação e ferramenta, possam gerar esse alerta de que tem uma criança fora da escola, para que a rede possa ir atrás.
Então, os exemplos que a Thallita nos traz e os exemplos das situações de violência que são percebidas nas escolas, enfim, mostram a importância de os outros setores estarem também fortes e engajados para que a gente tenha uma educação que protege.
Acho que reforçar... A gente tem leis, tem bases sólidas para avançar: a gente tem a própria BNCC, a gente tem a Lei 13.431, a gente tem, enfim, outras legislações, iniciativas que foram mencionadas. Acho que a gente tem que ampliar mais o debate para que a gente de fato tire do papel todas essas leis e todas esses desejos. Então, a gente precisa ter saúde, assistência, as outras áreas juntas nesse debate com a gente, mas a gente tem muito que aprender ainda.
Então, finalizo a fala com este chamado: vamos seguir aprendendo. Vamos seguir aprendendo com a sociedade civil, com iniciativas de governos locais, com iniciativas de organismos internacionais, com todo mundo que está se dispondo a refletir, a trabalhar com esse tema. Vamos seguir aprendendo com as escolas. A gente precisa dar mais espaço para as escolas, ouvir as escolas. Então, deixo essa provocação. Quem sabe o ciclo de audiências possa também incorporar aqui essa voz das escolas, trazendo suas experiências. E a gente precisa seguir aprendendo com as crianças e adolescentes.
Os relatos que a Thallita nos traz - eu, por muito tempo, trabalhei mais diretamente na ponta também, ouvindo relatos de jovens que vivenciam todo tipo de violência - não nos deixam perder o senso de urgência do debate. Por isso que estar com eles é muito importante, porque isso nos faz entender que é urgente, que a gente não pode descansar um minuto, que a gente tem que seguir construindo esse trabalho.
Então, finalizo, assim, realmente reconhecendo a importância deste espaço. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Ana Carolina Fonseca, Especialista em Educação e Proteção do Unicef. Muito obrigado.
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Agora, Thallita de Oliveira, Assessora Política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).
A SRA. THALLITA DE OLIVEIRA (Para expor.) - Também gostaria de agradecer pela possibilidade de participarmos desse debate e estarmos aqui construindo, juntos, possibilidades para esse enfrentamento.
Eu queria fazer coro com a Carol, porque foi uma das coisas que eu coloquei também: a gente precisa chamar os gestores, os professores, os estudantes, que estão no chão da escola, para conversar, para esse ciclo de debates, porque tem muitas escolas realmente com experiências muito exitosas de acolhimento dos adolescentes, de acolhimento das diversidades, de enfrentamento do racismo, do machismo, da homofobia, da transfobia nas escolas, e seria muito interessante chamá-los para fazer esse diálogo.
A gente tem até uma experiência com uma escola da Bahia, de Salvador, que é o Colégio Estadual Polivalente de Amaralina, em que a gente fez oficina com as meninas, e 70% das meninas dessa escola disseram das violências, principalmente raciais - elas falam muito de bullying, mas grande parte das violências foram violências raciais, racismo -, que elas vivenciaram no ensino fundamental. E hoje, no ensino médio... E elas odiavam a escola, odiavam ir para a escola. E no ensino médio, com essa escola que acolhe, que incentiva a participação política - lá tem grêmio -, em que as meninas podem opinar sobre seu processo escolar, elas amam a escola, e a escola nem tem uma estrutura muito boa, é uma estrutura que precisa melhorar bastante, mas elas acham a escola linda e incrível porque é um lugar de que elas se sentem parte, não é?
E aí também quero propor: acho que a gente tem que ter aporte de recursos específicos para planejar estrategicamente, de forma organizada, essa convivência, essa promoção da convivência escolar e a promoção de participação política na escola, discussão, e discussão para promover também respeito às diversidades, e aí envolvendo toda a comunidade escolar.
Também eu acho - a Deputada trouxe muito bem - que a gente precisa focar nisto: a educação precisa estar sempre no diálogo com a cultura e com o lazer. E aí a gente tem meninos e meninas sendo cooptados por essas plataformas digitais, por esses grupos extremistas, porque o espaço em que eles estão sendo acolhidos são esses, como eu já tinha dito, e não tem na comunidade espaços de que eles possam participar, ser felizes e sentir prazer. Nos espaços que a gente promove, enquanto sociedade civil, pelo projeto em que a gente atua no Inesc, o Projeto Onda, os meninos ficam o dia todo sem celular e estão felizes porque estão brincando, porque estão interagindo, porque estão se sentindo importantes naquele processo e não sentem falta das redes sociais. Mas, no momento em que eles vão para casa e não têm uma outra possibilidade, uma outra política na comunidade para que eles se sintam bem felizes, eles procuram as redes sociais como forma também de prazer, e são facilmente cooptados nesse sentido.
Eu posso passar o vídeo para finalizar a minha fala? (Pausa.)
A SRA. THALLITA DE OLIVEIRA - Vamos ver se vai funcionar o áudio. (Pausa.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Se quiser ir tentando, a gente passa... (Pausa.)
Vocês vão dando uma olhada e a gente vai avançando.
Passo a palavra agora para Anna Karla da Silva Pereira, Chefe da Assessoria de Participação Social e Diversidade do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
A SRA. ANNA KARLA DA SILVA PEREIRA (Para expor.) - Gostaria de iniciar essa minha fala ou finalizar essa fala reforçando, primeiro, a importância da participação social em todos os âmbitos. No Ministério dos Direitos Humanos a gente tem feito muitas escutas. Eu gostaria de trazer um relato importante. Nós recebemos uma comitiva do Complexo da Maré, com diversas entidades e organizações sociais preocupadas com o discurso de ódio em relação as favelas e periferias, o que atinge diretamente crianças nesses territórios.
Quero reforçar a necessidade de que esse debate também se paute por essa participação social e pelas diversas camadas que a violência consegue alcançar, não é? Foi um compromisso nosso levar essa pauta também para o GT e para todos os debates, para que essa fala fosse sistematicamente pautada a partir dessa diversidade e das necessidades específicas.
Um dos relatos é: operações policiais que culminam com morte de crianças dentro das escolas; como essas ações do Estado acabam promovendo violência dentro desses espaços; como essas crianças são invisibilizadas nos seus territórios, a partir de um corpo majoritariamente preto e empobrecido nessas regiões; e como a sociedade, por muitas vezes, negligencia e invisibiliza a dor dessas famílias, pais e mães que acabam perdendo essas crianças, muitas vezes, ou a caminho da escola ou na própria escola. Então eu quero deixar esse registro porque foi um compromisso do ministério com essas organizações sociais que têm nos procurado.
Quero falar também um pouco sobre a questão do conselho tutelar. No site do Ministério dos Direitos Humanos a gente já tem algumas informações sobre essa pauta, o GT, grupos de trabalho para acompanhar, articular, propor estratégias e fortalecimento dos conselhos tutelares. Então está à disposição no site do Ministério dos Direitos Humanos. Lá também tem outras informações necessárias para que a gente fortaleça... Nas eleições, agora em outubro, é muito importante que a sociedade se engaje para que a gente tenha o fortalecimento das políticas de proteção à criança e ao adolescente.
Então finalizo agradecendo o convite, colocando o ministério novamente à disposição quantas vezes o Senador achar necessária e oportuna nossa presença. Reforço a participação do ministério em outras audiências, como a convite da Senadora Teresa Leitão. Quero dizer que nós estamos abertos à sociedade para toda e qualquer contribuição que venha a garantir mais e mais a amplitude da garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes, que são, de fato, o futuro do país - e a gente não pode negligenciar de forma alguma.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dra. Anna Karla da Silva Pereira, que falou em nome do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
Agora, por favor, Suely Melo de Castro Menezes, Vice-Presidente da Câmara de Educação Básica, representante do Conselho Nacional de Educação, de forma virtual.
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A SRA. SUELY MELO DE CASTRO MENEZES (Por videoconferência.) - Muito obrigada, Senador Paulo Paim. Quero agradecer a oportunidade muito rica de participar de um evento que trouxe muitas luzes a essa temática.
Saio daqui convicta de que é uma ação educativa, que precisa reunir na escola para que sejam compartilhados aprendizagens coletivamente. Precisamos mobilizar a comunidade, revisar os saberes éticos e morais que comandam a nossa vida, resgatar os valores humanos para um enfrentamento digno e efetivo da violência.
A gente precisa criar as redes dentro das escolas, criar parcerias. Por exemplo: criar práticas de convivência pactuadas, ações sociais conjuntas, engajamento dos alunos em projetos, projetos positivos de pacificação, desenvolver estratégias, por exemplo, de educação crítica da mídia, das redes sociais. O nosso aluno, muitas vezes, mesmo no ensino fundamental, consegue avaliar, consegue compreender essa mídia para poder combatê-la.
Nós podemos também desenvolver o fortalecimento das oportunidades dessas abordagens antirracistas, emancipadoras, éticas, usando as redações, dramatizações, projetos em prol de grupos, que façam esse aluno se engajar em projetos e não só falar e, mas também viver essa questão; oportunizar o diálogo dos alunos tanto com adultos quanto com seus próprios pares, valorizando boas práticas sociais positivas; trocar experiências, saberes, compartilhar soluções exitosas. Às vezes, uma situação vivida numa escola pode ser uma solução exitosa, que dê ânimo para outra escola.
E, finalmente, construir coletivamente os protocolos, as diretrizes, as orientações das práticas de prevenção à violência na escola. Quando a gente constrói junto, pondo o aluno para discutir e fazer esses protocolos, essas normas, geralmente a possibilidade de vivê-las fica muito maior.
Muito obrigada a todos. Parabéns pela maravilhosa iniciativa e de tão bons resultados!
Obrigada, Senador. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) - Muito bem, Suely Melo de Castro Menezes, Vice-Presidente da Câmara de Educação Básica e representante do Conselho Nacional de Educação. Meus cumprimentos.
Eu tinha que fazer uma fala no início, quando sentei aqui, em nome das quatro Comissões. Farei uma fala rápida, e o vídeo da Thalita vai encerrar, no que seria o último momento. Então, bem rápido.
Quero também dizer que todas as sugestões que aqui foram colocadas serão encaminhadas para as quatro Comissões.
Então, esta audiência pública conjunta foi da CDH, que eu presido; da Comissão de Segurança Pública, Presidente Sérgio Petecão; Comissão de Constituição e Justiça, Presidente Davi Alcolumbre; Comissão de Educação, Presidente Flávio Arns. E o requerimento foi do Fabiano Contarato, que abriu esta sessão.
Então, bem rápido, aqui em nome das quatro Comissões.
A violência nas escolas é preocupante e tem sido tema de discursos e debate, nas redes digitais, nos veículos de comunicação, na comunidade escolar, na sociedade.
Diversos fatores contribuem para a ocorrência de violência nas escolas, incluindo problemas sociais e econômicos, desigualdade, falta de investimento, orçamento, falta de políticas públicas efetivas para prevenir e combater a violência nas escolas.
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Especialistas apontam que é preciso investir mais na educação de forma a proporcionar um ambiente mais seguro e saudável para os estudantes. Outras vezes que esta Comissão tratou do tema, foi apontada a importância de trabalhar a questão da violência de forma mais ampla, trabalhando a conscientização sobre os seus efeitos negativos na sociedade como um todo.
Há falas também sobre trazer para o debate as causas mais profundas da violência nas escolas, como a desigualdade social, a falta de oportunidade, a exclusão social. Pesquisa da Associação dos Professores do Estado de São Paulo mostra que a violência no ambiente escolar é espelho de graves problemas da própria sociedade, como desemprego, racismo, discriminação, preconceito, fome, políticas de ódio, brigas em casa, atendimento de saúde precário, bullying, miséria, pobreza, desigualdade, concentração de renda, discursos ofensivos, provocativos e violência nas redes sociais.
Penso que a violência nas escolas - nós pensamos - é uma questão complexa que envolve vários fatores, que aqui vocês colocaram com a profundidade devida. Requer um tratamento amplo e integrado por parte do Estado brasileiro, da sociedade como um todo. O fato é que o Brasil precisa investir na educação de forma mais ampla, promover a conscientização sobre os efeitos negativos da violência, trabalhar na prevenção - palavra que ouvi muitas vezes colocada aqui - e combater a violência em todas as suas formas. O debate precisa ser permanente. Não podemos tratar apenas quando acontecerem essas situações.
Vários projetos que tratam desse assunto tramitam no Congresso Nacional. Registro o PL 7.157, de 2010, já aprovado no Senado. Ele define ações para estimular a cultura da paz nas escolas e seus entornos. Ninguém diz aqui que o projeto é perfeito. Ele pode ser palco de debate com o devido aperfeiçoamento. Estabelece atuação para disseminar o respeito, a solidariedade e a solução pacífica de conflitos no ambiente escolar, promovendo, assim, ações educativas orientadas para a construção de uma cultura de paz.
Pensar nos jovens estudantes, professores, funcionários de escolas é pensar não só no presente, mas num futuro de dignidade, de não violência, de não política de ódio.
Agradeço a todos pela presença aqui. Eu fico com a fala de vocês. A nossa só é um complemento para o debate. Mas a fala dos convidados é que nos educa, inclusive, para, cada vez mais, aprender a tratar, como aqui foi dito, os nossos filhos, netos e bisnetos, e colaborar com toda a sociedade.
Então, neste momento, para encerrar, e aí eu vou pedir palmas, vai ser com o vídeo da Thallita de Oliveira. Está pronto o vídeo?
(Procede-se à execução de vídeo.)
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(Procede-se à exibição de vídeo.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem! Esse foi o vídeo da Thallita. (Palmas.)
E, assim, encerramos.
O vídeo mostra a realidade do nosso povo.
Eu agradeço aqui também os livros que recebi, que recebemos, que vão ficar para a Comissão, esses três livros.
Pessoal, está encerrada audiência pública de hoje, mas, segundo os idealizadores, aqueles que projetaram este debate de hoje, eles querem fazer um ciclo de debates. Então, teremos outras audiências públicas com o mesmo objetivo para termos uma conclusão de tudo aquilo que aqui vocês formularam.
Muito obrigado a todos.
Está encerrada a audiência pública. (Palmas.)
Vocês do plenário, que ficaram aí, até este momento, vamos tirar uma foto coletiva!
(Iniciada às 14 horas e 13 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 47 minutos.)