25/04/2023 - 2ª - Comissão Mista da Medida Provisória n° 1164, de 2023

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. PT - ES. Fala da Presidência.) - Boa tarde a todos e todas.
Havendo número regimental, declaro aberta a 2ª Reunião da Comissão Mista destinada a emitir parecer sobre a Medida Provisória 1.164/2023. Neste momento, a presente reunião destina-se à realização de audiência pública para debater a matéria.
Eu agradeço, imensamente, o comparecimento de todos os convidados. Conto com a compreensão de V. Exas. no que tange ao tempo estabelecido, porque serão duas audiências públicas e nós estamos aqui tentando trabalhar para um melhor texto da melhor forma possível e, neste momento, eu conto com a colaboração de vocês todos.
Quero aqui registrar a participação do meu querido Senador, sempre Senador Eduardo Suplicy. Senador Eduardo Suplicy, o senhor sempre foi uma referência na minha vida. O senhor não me conhecia, mas eu acho que todos aqui que me conhecem um pouco sabem disto: eu não tenho histórico de vida política, de mandato; eu fui eleito Senador e este é o meu primeiro mandato. Amo ser delegado de polícia e ser professor de Direito Penal e Processo Penal. Estou como Senador, mas sempre, à distância, lá do meu Estado do Espírito Santo, eu olhava para a atuação do Senador Suplicy e falava: "Nossa, a política vale a pena, existem pessoas que dignificam, e muito, a honrada classe dos políticos". E, para essa pessoa, eu não tenho dúvida ao falar do meu carinho, da minha deferência, do meu respeito e admiração. Bem-vindo novamente a sua Casa, esta Casa é sua, é de todos vocês que aqui estão: a Sra. Elisabetta Gioconda Iole Giovanna Recine, que é Presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional; o Sr. Renato Carvalheira, Vice-Coordenador da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional; o Sr. Leandro Teodoro Ferreira, Presidente da Rede Brasileira de Renda Básica; o Sr. Edison João Costa, Presidente da Associação Nacional dos Profissionais e Empresas Promotoras de Crédito e Correspondentes no País; a Sra. Eutália Barbosa, representante do Conselho Nacional de Assistência Social; a Sra. Aldaíza Sposati, representante do Conselho Federal de Serviço Social; e o Sr. Jefferson Nascimento, Coordenador de Justiça Social e Econômica da Oxfam.
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Esta audiência pública será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania, na internet, em senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria, 0800 0612211.
De acordo com as normas regimentais, cada convidado terá para sua exposição o tempo de cinco minutos e, em seguida, abrigaremos a fase de interpelação pelos Parlamentares inscritos.
Antes de passar a palavra aos nossos convidados, faremos a leitura de perguntas e comentários enviados pelo Portal e-Cidadania para que os pontos levantados possam ser abordados durante as exposições. (Pausa.)
Eu vou pedir à Comissão que disponibilize as perguntas para cada convidado e, aí, no momento oportuno, aquele que se sentir melhor para responder uma delas... É uma forma de a gente prestigiar essa interação pelo Portal e-Cidadania, e vocês ficariam à vontade para se manifestar e responder a pergunta com a qual se sentirem mais confortáveis para responder.
Quero, de antemão, agradecer a participação do Guilherme Marques, de São Paulo; do Jeffersonn da Silva, do Rio de Janeiro; da Simone Aparecida, de São Paulo; do Ginaldo Teixeira, da Paraíba; da Rivanne Silva, do Estado do Rio de Janeiro. Surgindo mais perguntas, serão disponibilizadas para cada participante.
Quero aqui também enaltecer e agradecer a presença do Relator, meu querido Deputado Dr. Francisco, que tenho certeza de que vai estar atento para acolher as sugestões e, na medida do possível, integrá-las ao relatório que irá disponibilizar.
Também quero, no mesmo sentido, agradecer e falar que é com bastante alegria que tenho como Vice-Presidente o Deputado Dorinaldo Malafaia. Já usando da minha atribuição como Presidente, eu o convidaria para presidir esta Comissão, neste momento, tendo em vista que eu estou também em outras Comissões e estarei aqui, vindo aqui, se V. Exa. não se sentir, de alguma forma, incomodado com esse meu pedido.
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No mais, eu desejo a todos uma ótima audiência pública. E eu tenho certeza de que tanto o Vice-Presidente como o Relator serão solícitos naquilo que for possível para o debate. É claro que a gente estabelece um prazo regimental aqui, mas nada que seja de forma tão objetiva e cumprida no rigor. Nós sabemos que temos vários convidados. Todos merecem e terão a oportunidade de falar e falarão, na medida do possível, naquilo que for aqui estabelecido.
Muito obrigado. Mais uma vez, uma excelente audiência pública para todos nós.
Neste momento, transfiro a Presidência para o Deputado Dorinaldo Malafaia.
O SR. PRESIDENTE (Dorinaldo Malafaia. PDT - AP) - Boa tarde a todos e todas. Quero agradecer mais uma vez a presença nesta importante Comissão, também agradecer ao Presidente, porque todos nós aqui estamos num processo de ritmo muito intenso nas duas Casas, todos compartilhando Comissões. Eu também faço parte da Comissão da Amazônia e dos Povos Originários.
Meu nome é Dorinaldo Malafaia, em primeiro mandato também como Deputado. Sou do Amapá, extremo norte do país, onde o Bolsa Família exerce também um papel muito importante na estratégia de sobrevivência das pessoas e das famílias.
Portanto, queria agradecer a presença de todas as autoridades. Informar que são cinco minutos para que cada autoridade, cada representante de entidade possa falar.
Também quero seguir o mesmo raciocínio do nosso Presidente e, no mesmo raciocínio, também fazer referência ao Deputado Eduardo Suplicy, porque, mesmo lá no extremo norte do país, a gente acompanha desde o movimento estudantil o seu trabalho, a sua experiência. Parabéns por inspirar muitos de nós em todo o país. Então, sigo a mesma conduta do nosso Presidente também nessa deferência a sua pessoa.
Bem, queria então transmitir ao Deputado a palavra, para que ele pudesse utilizá-la agora neste momento.
Deputado Eduardo. (Pausa.)
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O SR. EDUARDO MATARAZZO SUPLICY (Para expor.) - Caro Deputado Dorinaldo Malafaia, muito obrigado por suas palavras. Minha consideração também ao Senador Fabiano Contarato. Agradeço muito a sua atenção, inclusive de me convidar. Ao Deputado Dr. Francisco, Relator dessa medida provisória, que teve a gentileza de me receber hoje pela manhã, juntamente com Aldaíza Sposati, Professora na Pontifícia Universidade Católica, que tanto tem contribuído, junto com o Presidente Leandro Ferreira, que é Presidente da Rede Brasileira da Renda Básica.
Tivemos uma conversa muito construtiva hoje, assim como também, após um ótimo diálogo com o Relator, Deputado Dr. Francisco, com o Vice-Presidente da República, hoje Presidente em exercício, Geraldo Alckmin, que nos recebeu. Ele vem acompanhando passo a passo a tramitação, primeiro do programa de Governo, do programa de Governo de transição, e agora, sobretudo, essa passagem do Bolsa Família até que tenhamos a renda básica incondicional e universal.
Então eu quero, primeiro, agradecer. Sinto-me honrado de estar aqui outra vez, depois de 24 anos, desde 1991 a janeiro de 2015, nesta Casa, onde tanto aprendi. E muito tem a ver com a história a respeito de que estamos hoje trabalhando. Mas fico feliz de retornar ao Senado, hoje como Deputado Estadual.
E eu gostaria de brevemente contar aqui passos que foram dados ao longo dessa história da renda básica, da renda mínima, dos programas de transferência de renda. Em 1991, apresentei um primeiro projeto de garantia de renda mínima, através de um imposto de renda negativo. Toda pessoa adulta que não recebesse ao menos 45 mil cruzeiros da época, US$150 da época, passaria a ter o direito de receber 50% da diferença entre aquele patamar e o nível de renda da pessoa. Então recebeu parecer entusiástico, favorável do Senador Maurício Corrêa, foi aprovado por consenso praticamente, com dois ou três Senadores que tinham dúvidas a respeito, mas numa sessão memorável, de quatro horas e meia, em 16 de dezembro de 1991.
E daí foi para a Câmara dos Deputados e recebeu parecer favorável de Germano Rigotto, do MDB, entusiástico também.
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Mas aconteceu em agosto de 1991, quando Walter Barelli, coordenador do programa de governo paralelo de Lula, que havia perdido a eleição para Collor de Mello...Havia um encontro de aproximadamente 50 economistas para debater propostas pelo PT. E quando eu apresentei a sugestão, junto com Antonio Maria da Silveira...
(Soa a campainha.)
O SR. EDUARDO MATARAZZO SUPLICY - Já acabou?
O SR. PRESIDENTE (Dorinaldo Malafaia. PDT - AP) - Pode continuar, por favor.
O SR. EDUARDO MATARAZZO SUPLICY - Eis que José Márcio Camargo falou que seria bom começar a garantia de renda mínima com as famílias carentes, desde que estivessem frequentando a escola, porque um dos maiores problemas brasileiros era um número tão grande de crianças em idade escolar que os pais colocavam, desde os 7, 8 9, 10 anos, para trabalharem precocemente. Se providenciássemos uma garantia de renda às famílias carentes, desde que as crianças estivessem indo à escola, iríamos cortar um dos principais elos do círculo vicioso da pobreza. E ele escreveu sobre isso, na Folha, em 1991 e em 1993.
Eis que, em 1995, aqui no Distrito Federal, o Governador Cristovam Buarque, do PT, então eleito, iniciou o chamado programa Bolsa Escola e, lá em Campinas, o Prefeito José Roberto Magalhães Teixeira, iniciou um projeto de garantia de renda mínima social da educação. Aí, Ribeirão Preto, Jundiaí, Belo Horizonte, Belém, Mundo Novo, Caxias do Sul, dezenas de municípios iniciaram projetos naquela direção. Aqui na Câmara e no Senado apareceram seis projetos, todos para que a União financiasse os municípios que adotassem programas naquela direção.
Nessa época, em 94, em conheci o criador da Basic Income European Network, depois Earth Network, Prof. Philippe Van Parijs, que veio ao Brasil. Em 96, solicitei que o Presidente Fernando Henrique recebesse Philippe Van Parijs, que então argumentou com o Presidente: "É muito bem começar a garantia de renda relacionada à educação porque é um investimento em capital humano, mas o objetivo maior será um dia chegarmos à renda básica incondicional".
Eu, mais e mais, venho interagindo e estudando com todos os que propõem a renda básica universal e, em dezembro de 2000, apresentei um novo projeto para instituir uma renda básica universal. O então Relator, Francelino Pereira, ex-Governador de Minas, ex-Presidente da Arena, do PFL, me disse: "Olha, Eduardo, eu estou com 81 anos, não vou mais ser candidato, mas quero estudar com atenção a sua proposta". Eu, então, dei a ele o meu livro, a 1ª edição, publicado em 1992, "Renda de Cidadania: a saída é pela porta".
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Ele leu e disse: "Olha, Eduardo, é uma boa ideia, mas você precisa torná-la compatível com a Lei de Responsabilidade Fiscal, pela qual, para cada despesa, precisamos ter a receita correspondente". E eu achei de bom senso, aceitei e, graças a isso, tanto o Senado, em dezembro de 2002, quanto a Câmara, em novembro de 2003, aprovaram o projeto, que foi para o Presidente sancioná-lo ou não. Numa belíssima cerimônia, em 8 de janeiro de 2004, ele o sancionou.
A propósito, eu agradeço muito se puder, depois de ouvir os demais, aqui falar ainda sobre algo que é essencial, sobre quais são as vantagens da renda básica universal em relação ao programa Bolsa Família, que teve excepcionais resultados em termos de contribuir para diminuir a desigualdade, diminuir a pobreza absoluta e extrema no Brasil, a ponto de, em 2014 e 2015, a ONU ter declarado o Brasil como em situação de fome zero.
Mas, então, falta eu falar, Sr. Presidente, sobre por que a renda básica de cidadania será ainda melhor e por isso que temos propostas para a constituição de um grupo de trabalho do Governo Federal e do Congresso Nacional misto, para estudar as etapas em direção à universalização da renda básica.
O Brasil, que, infelizmente, perdeu a Copa do Mundo de futebol, pode, perfeitamente, ganhar a copa do mundo da renda básica de cidadania, porque é o primeiro país do mundo que aprovou uma lei nesta direção. Agora, depende muito do Deputado Dorinaldo Malafaia, para que o tenhamos o quanto antes.
O SR. PRESIDENTE (Dorinaldo Malafaia. PDT - AP) - Muito obrigado, Deputado Suplicy, mais uma vez, por essa abertura da nossa audiência, sempre com uma referência histórica importante nesse campo.
Quero aqui agradecer, também, a presença do Deputado Capitão Alberto Neto, que está aqui conosco - seja bem-vindo, Deputado! -, da Deputada Fernanda Pessoa, do União do Ceará, também presente - cadê a Deputada? Ali, no cantinho. Seja bem-vinda!
E, dando continuidade, nós chamamos a Sra. Elisabetta Gioconda, Presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.
A SRA. ELISABETTA GIOCONDA IOLE GIOVANNA RECINE (Para expor.) - Muito bem.
Boa tarde a todas, a todos, a "todes".
Agradeço o convite em nome do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.
Eu gostaria de fazer algumas observações mais gerais a respeito da importância dessa medida provisória e de, finalmente, dar mais um passo na qualificação desse processo da garantia de renda da nossa população.
Certamente, alguns aspectos que eu vou levantar aqui vão ser detalhados pelo Renato, pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, e também pela minha companheira, representante do Conselho de Assistência Social.
Bom, acho que é absolutamente senso comum a importância da renda em relação à segurança alimentar e nutricional. Não é à toa que nós temos 33 milhões de pessoas em situação de fome no Brasil e mais da metade da nossa população que enfrenta desafios diários para garantir a sua alimentação mínima. São amplas as referências dessa relação e a importância dessa combinação da garantia de renda via outras políticas, como valorização de salário mínimo e programas de transferência de renda.
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Foi essa articulação de programas específicos em relação à renda, mas outros programas de garantia de serviços públicos básicos, de acesso a direitos humanos básicos, que fez com que o Brasil saísse do famoso Mapa da Fome em 2014. E foi exatamente o desmantelamento dessas ações que fizeram o Brasil estar de volta a esse mapa.
Nós talvez estejamos numa situação muito mais complexa do que estivemos antes de 2003, dada a situação de desagregação do ponto de vista social, mas também do ponto de vista do que aconteceu com as políticas públicas nos últimos anos. É importante recordar que os dados que Renato vai trabalhar de maneira mais precisa mostraram que o inquérito de insegurança alimentar e nutricional que aconteceu por dois momentos durante a pandemia mostrou o grau de deterioração das condições de vida da nossa população a ponto de chegarmos a esses 33 milhões de pessoas em situação de fome.
É mostrado também que, apesar de, durante a pandemia, o Congresso ter aprovado um auxílio emergencial, as condições como esse auxílio foi desenvolvido e foi implementado na nossa sociedade não garantiram a proteção das famílias em situação de maior vulnerabilidade. Tanto que os dados do inquérito mostram que parte das pessoas que recebiam esse auxílio continuavam em situação de insegurança alimentar mesmo grave.
Isso tem algumas explicações. Primeiro, como nós entramos na pandemia enquanto sociedade brasileira. A sociedade brasileira, na sua grande maioria, já se equilibrava em situações muito desafiadoras para garantir as suas condições de vida, seja pela precarização do trabalho, seja por uma fila que já existia no Bolsa Família que não era atendida, seja a fila dos benefícios do INSS. Enfim, a população brasileira entrou na pandemia com muito poucas condições de resistir ao grave cenário que se configurou.
Fora isso, a configuração do auxílio emergencial se deu de uma maneira absolutamente paralela à rede de proteção social. A gente já sentia uma deterioração das ações ligadas ao sistema de assistência social com orçamento absolutamente deteriorado, equipes enfraquecidas. Mas também outros programas como o apoio à agricultura familiar, o apoio à assistência técnica, etc. E é o que aconteceu também em termos da atenção básica.
Qual é o grande valor que retoma o Bolsa Família nos moldes em que ele existia e com aspectos melhorados? Primeiro, é essa articulação essencial das condicionalidades de saúde e educação. A gente não pode pensar... e logicamente a transferência de renda é essencial, mas a ampliação da oferta de serviços públicos de saúde, educação e assistência social são primordiais nesse momento. Isso cria uma rede de sustentação, uma rede de apoio às famílias.
Outro aspecto também é que, a partir do momento em que as famílias e as pessoas têm acesso a esses serviços básicos, elas se colocam também muito mais permeáveis, e os serviços conseguem dar orientações em relação à saúde, a todo o processo... (Pausa.)
Já estou acabando. (Risos.)
Bom, e os serviços de saúde nesse aspecto são muito importantes. A rede capilarizada da atenção básica... Os dados que a gente tem que analisaram os resultados do Bolsa Família mostram que as crianças das famílias que tinham acesso à atenção básica, via Bolsa Família, eram crianças que estavam tanto protegidas de excesso de peso - o que também é um problema de má nutrição - como também de baixo peso e baixa estatura. Também essas famílias tinham muito mais acesso a condições de informação e de orientação à saúde, o que fazia com que a disponibilidade de alimentos saudáveis dentro dessas casas era muito maior.
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Então, a importância dessa medida provisória, nesse momento, é que ela traz a recuperação de uma rede de proteção social que vai muito além da transferência de renda e traz um outro elemento importante também, que é a recuperação do Cadastro Único.
Sobre o Cadastro Único, poucos países do mundo têm um instrumento como esse, que faz com que as políticas públicas tenham muito mais capacidade de chegar aonde elas chegam, aonde elas devem chegar, e ter uma eficácia e uma eficiência muito maiores.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Dorinaldo Malafaia. PDT - AP) - Quero agradecer à Dra. Elisabetta.
Chamo o Sr. Renato Carvalheira, Vice-Coordenador da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.
O SR. RENATO CARVALHEIRA (Para expor.) - Boa tarde a todas e a todos!
Não vai dar para, obviamente, falar de todos na apresentação, mas fica registrado aqui que a Rede Penssan se sente honrada e agradecida pelo convite por um importante programa, que é o Programa Bolsa Família, historicamente um sucesso.
O próximo, por favor.
Isso é um inquérito - o próximo, por favor - dos antecedes aqui da rede. Eu não vou comentar, mas saiu, inclusive dentro do Consea, um grupo de pesquisadores e professores que trabalham com esse tema.
Deixem-me ver se eu acerto aqui... Isso.
Isso foi então o nosso relatório, a nossa pesquisa. Fizemos dois, e esse é o segundo. É um projeto e um relatório que saíram do apagão, diga-se de passagem, do apagão de dados, que tinha sobre isso, em um país onde vergonhosamente a gente parece que sabe mais de gado do que de pessoas. Então, num momento em que não havia dados, em plena pandemia, a Rede Penssan, muito corajosamente, com um grupo de professores, fez o que foi possível. E fizemos com um conjunto de parceiros.
Eu não estou muito acertando isso daqui...
Muito bem, com um conjunto de parceiros.
Acho que vou preferir ir falando.
O próximo, por favor.
E a gente fez, então, também uns dados sobre os estados.
O próximo, por favor.
Aí a equipe - o próximo, por favor - e os parceiros que a gente fez.
O próximo, por favor.
Não vou comentar também, mas obviamente houve o método, o público entrevistado...
Primeiro a gente teve 2 mil entrevistas, numa metodologia que é a mesma do IBGE, a mesma. Inclusive, o grupo de pesquisa foi responsável, dentro da Rede Penssan, de colocar a escala brasileira dentro do IBGE. Portanto, saiu da gente. Não é verdade dizer que nós não somos Governo e "portanto, os dados não são válidos". Muito pelo contrário: é uma metodologia bastante robusta.
O próximo, por favor.
Aí são as perguntas que a gente faz.
O próximo, por favor.
É um conjunto de perguntas em que a família, o morador, o chefe de família vai responder se ele está em segurança alimentar - eis a medida das perguntas que ele vai respondendo - ou se ele está em insegurança. E existem graus: insegurança leve, moderada e grave.
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A grave, portanto, é quantitativamente: falta comida naquela família!
Próximo, por favor.
Aí a amostragem pelas regiões. Inclusive, temos os dados dos estados.
Próximo, por favor.
A síntese.
Próximo, por favor.
Brasil Rural e Urbano.
Obviamente, em termos percentuais, o rural é muito pior do que a população urbana - próximo, por favor -, embora, obviamente, a população urbana seja absolutamente maior, em termos absolutos.
Números vergonhosos que a gente encontra neste País: são 33 milhões de pessoas que estão em insegurança alimentar grave e 125 milhões que estão com alguma insegurança - leve, moderada ou grave. Portanto, é mais do que a metade da população deste país.
Próximo, por favor.
Não vou comentar, também, exatamente as questões do Norte e Nordeste, enfim, tem piores dados.
Próximo, por favor.
A renda familiar. Aí já interessa um pouco mais. Vejam que a questão de renda tem um impacto muito grande na questão da fome. Quanto mais, obviamente, a família consegue ter recurso, ter dinheiro, efetivamente, a fome tende a diminuir, tende a desaparecer.
Próximo, por favor.
A situação do trabalho.
Obviamente, quem está desempregado... Quem tem trabalho, obviamente, é diferente. Neste país também há algo absolutamente paradoxal, o produtor rural ter uma questão de passar muita fome...
Próximo, por favor.
A questão de homem e mulher, a questão de gênero, é muito impactante. Quando a família é chefiada por mulher, sofre mais fome.
Próximo, por favor.
Não vou adentrar na relação de gênero, com relação a emprego e endividamento. Obviamente, quando temos homem e mulher, sempre as mulheres têm uma pior situação.
Próximo, por favor.
A mesma coisa com relação à raça, quer dizer, cor da pele. Preto e pardo sofrem muito mais fome do que quando é um chefe de família de cor branca.
Próximo, por favor.
Com relação à Bolsa Família, quando a gente fez, estava passando pela questão do Auxílio Brasil, Bolsa Família, depois veio o Auxílio Brasil, enfim...
Nessa virada, a gente percebe que, quando as famílias, obviamente, estão sendo atendidas, tende a diminuir a questão da fome, mas alguns programas de transferência de renda condicionada, como esses, não são por si suficientes. Não é suficiente, para você acabar com a fome neste país, um só programa. É um conjunto de programas.
Próximo, por favor.
A questão da água também. Quem tem sede, tem fome.
Próximo, por favor.
Inclusive estão fazendo uma pesquisa sobre segurança hídrica neste país, que ainda não existe.
A questão da escolaridade. Obviamente, quem tem menor escolaridade também sofre fome.
Próximo, por favor.
Renda, enfim...
Próximo, por favor.
A questão do Pnae.
As crianças... É um sofrimento terrível dizer isso, mas quem tem criança em seu lar sofre mais fome. Não deveria ser. Deveria ser o contrário. Mas, enfim, neste país, se é mulher o chefe de família, se é negro, se é de baixa escolaridade, se tem pouca renda, etc., alguns outros fatores, isso é sinal de que a fome bate à porta daquela família.
Próximo, por favor.
As pessoas passam, inclusive, pulam as refeições, e a que mais pulam é o jantar - próximo, por favor. As pessoas vão dormir com fome.
A gente viu também a questão da qualidade. A gente tem diminuído a questão do feijão, do arroz, das carnes... A gente sabe que tem a fila de ossos, troca por ovo etc., uma série de problemas com relação a isso, que também têm a ver com a questão da obesidade.
Próximo, por favor.
A evolução dessa questão.
E, obviamente, a gente coloca isso com os dados do IBGE, da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio), da POF, que foi a última, em que foi aplicada a Ebia, a escala, e vejam que o azulzinho, que é a segurança alimentar, vinha subindo e, de repente, vem caindo, que é o que a gente está vendo atualmente.
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O próximo, por favor.
Próximo.
Aí a relação dos estados.
Próximo, por favor, porque eu já passei do meu tempo.
Somente algumas questões.
A importância de se aprovar esse programa, a importância que tem. Obviamente, como eu disse, não basta só esse programa, as questões de desigualdades se retroalimentam, como causa e efeito dos sistemas alimentares não saudáveis. Embora a gente tivesse o auxílio emergencial, a fome persistiu, e persistiu por causa disso também, por causas, também, por exemplo, como a alimentação, que tem subido muito o seu preço, a questão da inflação, enfim, a questão das políticas públicas - como já colocou a Elizabetta aqui - com relação à destruição e desarticulação dos programas que existiam.
Vale lembrar que o MDA simplesmente foi extinto em 2016, quer dizer, o apoio à agricultura familiar.
A necessidade de monitoramento que a gente percebe da saúde das famílias, principalmente das crianças.
Deve-se associar esse programa com a alimentação saudável. Não basta o dinheiro em si, é preciso ter uma alimentação que garanta, que tenha programas específicos para isso.
Por fim, eu coloco - próximo, por favor - à disposição, a pesquisa está aí, a Rede está à disposição para um debate tão importante quanto esse de um programa tão importante, histórico, que tem e teve muito efeito com relação à fome neste país.
Muito obrigado e fico à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Dorinaldo Malafaia. PDT - AP) - Obrigado, mais uma vez, ao representante, Vice-Coordenador da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, o Sr. Renato Carvalheira.
E, agora, com a palavra, o Sr. Leandro Teodoro Ferreira, que é Presidente da Rede Brasileira de Renda Básica.
O SR. LEANDRO TEODORO FERREIRA (Para expor.) - Tenho uma apresentação também.
Já está no modo apresentação? (Pausa.)
Pronto.
Boa tarde. Obrigado pela participação de todos, todas e todes aqui na audiência, é um prazer estar aqui.
É uma honra poder participar desse debate, especialmente para a Rede Brasileira de Renda Básica, que, na figura do Suplicy, que é o nosso Presidente de honra inclusive, tem uma luta já de uma longa jornada em prol do aperfeiçoamento do Programa Bolsa Família na direção de uma renda básica de cidadania.
Então, eu quero trazer aqui algumas contribuições que a Rede Brasileira de Renda Básica tem feito ao debate da MP 1.164. Ela se concentra no texto da MP, na medida em que fomos indutores de algumas das emendas que foram apresentadas. Das 256 emendas que foram apresentadas, temos um conjunto de 14 que se repetem algumas vezes, como contribuição do que nós fomos capazes de articular com alguns Deputados.
A avaliação da nossa rede é a de que o Governo Jair Bolsonaro foi desastroso para as políticas públicas, para a administração pública e a democracia em geral. Nós não diferimos disso, mas nós temos também uma avaliação de que foi durante o Governo Bolsonaro que os recursos destinados ao Programa Bolsa Família se elevaram em grande medida. O entendimento que nós temos é que isso se deu em função justamente de uma pressão da sociedade civil e dos próprios usuários dos programas de transferência de renda, no caso o auxílio emergencial, para que os valores dos R$600, os famosos R$600, não baixassem em relação ao que vinha sendo pago na pandemia. Então, o orçamento sai de aproximadamente R$34 bilhões, antes da pandemia, para um valor hoje superior, com a PEC da transição, a R$177 bilhões. Mas a gente considera isso uma conquista que a sociedade teve justamente sobre o Governo Bolsonaro e entendemos que o próprio auxílio emergencial, muito se fala do papel da Câmara, mas foi também resultado da campanha Renda Básica que Queremos, que buscou fazer aí uma proposta de garantia de renda no período da pandemia.
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O Governo Lula deve usar essa oportunidade para desenhar um aperfeiçoamento do Programa Bolsa Família, de forma a torná-lo o mais próximo possível de uma renda básica de cidadania, e aqui estão algumas razões do porquê.
Em primeiro lugar, porque esse caminho vai significar a preparação do sistema de produção social brasileiro para o futuro e vai cumprir algumas determinações legais. Além da Lei 10.835, aprovada aqui no Congresso e sancionada pelo Presidente Lula em 2004, temos também alguns desdobramentos do período da pandemia, como, por exemplo, a decisão do Supremo Tribunal Federal no Mandado de Injunção 7.300, que determinou a regulamentação dessa lei, que é de autoria justamente do Suplicy.
Essa lei determina, portanto, que uma primeira etapa do Programa Bolsa Família, levando em conta os patamares então definidos de pobreza e extrema pobreza, deve significar uma regulamentação da renda básica de cidadania.
Então, são necessárias modificações no texto da MP que institui o PBF, para que sua conversão incorpore na prática as diretrizes de uma renda básica, de forma a fortalecer a dignidade e a liberdade real para todos.
Então, o Bolsa Família pode ser concebido como um primeiro passo na direção da renda básica universal e incondicional, conforme defendemos, embora com diferentes níveis de repercussão do que são as condicionalidades, uma vez que o esquema de renda mínima massivo como o que nós temos no Brasil pode ser um primeiro passo para a renda básica. E isso é um debate mundial. Esses autores que o Suplicy cita, como, por exemplo, o Philippe Van Parijs, citam isso.
Muitas vezes a gente vê experiências de renda básica. "Ah, na Finlândia está tendo uma experiência de renda básica, 2 mil pessoas". "Ah, Stockton, na Califórnia, está tendo uma experiência de renda básica, 135 pessoas...".
(Soa a campainha.)
O SR. LEANDRO TEODORO FERREIRA - Você chega ao Brasil, a gente tem 55 milhões de pessoas no Bolsa Família, que servem muito melhor com uma proxy para o que pode ser uma renda básica universal do que essas próprias experiências.
Isso será possível na medida em que o programa garantir uma ética interna mais próxima dos valores da renda básica, que acreditamos que seja o motivo que embasa aí as propostas das emendas.
Quais são essas emendas? São 14. Aqui eu coloquei em primeiro lugar as que são efetivamente urgentes e que, em alguns casos, estão dialogadas, como disse o próprio Suplicy também, com o próprio Governo. Por exemplo, a criação de um GT da renda básica para discutir a transição do Programa Bolsa Família para Renda Básica Universal.
Essa ideia do GT é justamente para inclusive evitar a judicialização de não cumprimento da decisão do STF, que tem até, no §1º do art. 1º da medida provisória, uma previsão de que a lei do Bolsa Família será uma etapa de cumprimento da Lei 10.835 e do que está disposto no art. 6º da Constituição, recentemente incorporado por uma emenda constitucional.
Agora, esse é um ponto que foi introduzido na lei do Auxílio Brasil pelo Governo Bolsonaro, não pelo Governo Lula. Esse §1º do art. 1º está lá como uma tentativa do Governo Bolsonaro de justificar o cumprimento da decisão do STF. O Governo Lula repetiu o procedimento. Agora vai caber implementar na prática, para que isso não seja letra morta, como foi no Governo Bolsonaro, por uma série de outras razões que levaram às ineficiências que já foram tratadas aqui em torno do Auxílio Brasil.
Segundo lugar, canais de informação e escuta de beneficiários.
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Acho que já passou da hora de a gente sair do recibinho, que sai na hora em que o cara saca o dinheiro no caixa eletrônico, para uma administração mais moderna. A Colômbia, por exemplo, acompanha rede social para saber o que está dando de problema na hora de pagar os benefícios, antes de o problema estourar e virar uma coisa impressionante - como a gente viu nas filas da Caixa Econômica - e o Governo poder antecipar as ações e corrigir os problemas.
Um ponto importantíssimo, que é a exclusão do BPC do cálculo da renda familiar.
Eu acho que ninguém aqui discorda de que uma família com uma pessoa com deficiência ou uma família com uma pessoa idosa tem necessidades adicionais em relação àquilo que pesa sobre sua renda. Então, eu não vejo razão para a gente considerar que um benefício socioassistencial deva ser incluído no cálculo de renda de um benefício de superação da miséria.
A obrigatoriedade de atualização dos valores e impedimento de formação de filas.
Viu, Elisabetta? Aqui nós temos um ponto crítico. Se você perguntar para qualquer pesquisador neste país o que precisava melhorar no Bolsa Família, ainda durante o Governo Lula e Dilma, seria isto: obrigatoriedade de atualizar os valores periodicamente e o impedimento de formação de filas.
A medida provisória não corrige isso. A medida provisória impede a atualização de valores a cada 24 meses. Precisa tornar obrigatória a atualização de valores a cada 24 meses e, evidentemente - ou 12 meses, não é? -, o impedimento da formação de filas. Uma das nossas emendas diz que ninguém deve ficar sem o benefício dentro de 40 dias, se for identificado como elegível para ele, dentro dos critérios estabelecidos na futura lei.
Equidade de crianças e adolescentes dependentes do Imposto de Renda de pessoa física, combinada com a Emenda nº 6 - fazer com que o valor de 150 seja pago não só para o zero a seis, mas também dos 7 aos 18 anos, uma vez que, dos 7 aos 18 anos, é uma idade crítica. Ela é crítica porque, como a gente viu na apresentação aqui do Renato, usuários com até dez anos de idade têm maior insegurança alimentar; ela é crítica porque, a partir dos dez anos de idade ou até antes, os seus membros em idade inferior a 14 anos iniciam o processo de entrada no mercado de trabalho - e a gente sabe que o trabalho infantil voltou nessa saída do Brasil dos patamares que a gente tinha de renda.
Então, é importante a gente fazer com que essa renda chegue também para adolescentes, para que as crianças não entrem no mercado de trabalho. Muita gente fala assim: "Ah, o Bolsa Família tem um efeito preguiça. As pessoas vão deixar de trabalhar para poder receber Bolsa Família". As únicas pessoas que deixaram de trabalhar para receber Bolsa Família, durante os Governos Lula e Dilma, foram crianças e adolescentes. E esses a gente quer que parem mesmo de trabalhar! Então, é importante garantir renda suficiente, para que o custo de oportunidade de se transferir para o mercado de trabalho não seja tão grande.
Então, a possibilidade de pagar os benefícios por bancos comunitários em moedas sociais, algo que o Deputado Francisco deve conhecer bem, porque tem lá no Estado do Piauí alguns bancos comunitários. Esse foi feito em conjunto com a Rede Brasileira de Bancos Comunitários, que é o modo como Maricá hoje, que é a principal experiência de renda básica no mundo, realiza os seus pagamentos, e acho que o Governo Federal precisa permitir que os municípios façam isso também.
A suspensão de bloqueios e cancelamentos por não cumprimento de condicionalidades.
Aqui a Eutália não vai gostar muito dessa parte, mas é especialmente em caso de indisponibilidade de serviços.
Como é que pode alguém chegar num posto de saúde para tomar vacina, não ter a vacina, e ter o benefício do Bolsa Família cancelado por conta disso? É um absurdo! Ou como é que pode uma família, na cidade de São Paulo, ser despejada da ocupação onde mora, perto da escola para aonde vão os filhos, tem que ir para o outro lado da cidade, começa a ter falta na frequência escolar e se bloqueia o Bolsa Família? Isso está agravando a vulnerabilidade...
(Soa a campainha.)
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... você não está facilitando a progressão daquela família.
O fortalecimento do Sistema Único de Assistência Social.
Essa eu tenho certeza que a Aldaíza vai explorar com todo o seu conhecimento, mas diz respeito à necessidade de maior financiamento para a rede.
O detalhamento de unipessoais e o respeito à autodeclaração.
Nós bloqueamos, este Governo bloqueou, automaticamente, o benefício das famílias unipessoais, que são as pessoas sozinhas, e o que não foi levado em conta é que essa autodeclaração, na lei anterior, é que determinava o direito da pessoa, ilegibilidade. O Governo é que tem que fazer o batimento das informações, para ver se aquela pessoa se encontra inadequadamente no programa.
Adequação do benefício de renda de cidadania.
Esses R$142 estão na medida provisória. Eu estou para ver alguém que explique melhor o que significa. Acho que tem algo aqui que nós não podemos deixar que incorra...
(Soa a campainha.)
O SR. LEANDRO TEODORO FERREIRA - ... e se transforme numa rede federal de fiscalização que pode significar um lawfare contra pobre. Nós não podemos deixar que a vigilância socioassistencial, desenvolvida a duras penas neste país pelo SUS, se transforme numa rede de fiscalização que vai ter Ministério Público Federal pedindo bloqueio de benefício, que vai ter TCU decidindo sobre averiguação cadastral dos beneficiários e assim por diante, órgãos que não têm competência como tinham, por exemplo, no primeiro Bolsa Família.
Estabelecimento de um parâmetro de linha de pobreza sobre o qual os valores devem se basear.
Os R$218 - estou acabando, Deputado - que estão lá como linha de pobreza precisam ainda de uma melhor explicação e uma explicação que diga respeito mais sobre em que se está inspirando e, por sugestão, inclusive, do Suplicy, a ideia de um plebiscito, como ocorreu no Alasca, sobre a implementação de uma renda básica universal.
Quais são os desafios imediatos do MP? A recuperação da lógica aditiva do Bolsa Família, que é estar aberto às pessoas que dele precisarem para sempre serem incluídas; a recuperação da lógica entregadora de direitos, porque saúde e educação devem ser assim compreendidos; a recuperação da lógica de agenda do Bolsa Família que se perdeu no Auxílio Brasil.
Por fim, os desafios pós-medida provisória que precisam estar preparados para, dentro da MP agora, serem acolhidos num futuro muito breve, muito próximo.
Em primeiro lugar, a devolução do IVA, Imposto de Valor Agregado, que está na PEC 45. É preciso lei complementar, e esse recurso não pode ser baseado na devolução pelo CPF. Senão, o cara que é mais pobre, lá no interior do Nordeste, não vai ter nota fiscal para lançar o CPF, não vai ter devolução. Nós temos que garantir que esse dinheiro seja apropriado pela rede de proteção e pago de forma linear no Bolsa Família. Isso já foi o que aconteceu no governo do Eduardo Leite, lá no Rio Grande do Sul.
O SR. PRESIDENTE (Dorinaldo Malafaia. PDT - AP. Fora do microfone.) - Concluindo.
O SR. LEANDRO TEODORO FERREIRA - Qual a regra fiscal? Precisa acolher possibilidade de adequação do Orçamento. Para acabar com as filas, o mínimo existencial que está na Lei de Defesa do Consumidor... Inclusive, em diálogo que precisamos fazer com as associações de crédito para que não comprometam a renda das pessoas, isso sim, pode ser uma boa linha de pobreza.
E a uniformização do trato de cidadania.
E assim concluo, Deputado Dorinaldo, dando o exemplo pessoal do meu filho de seis anos, que é lançado como meu dependente no Imposto de Renda. Ele tem um benefício de uma dedução de R$190 por mês da renda que deve ser tributada de mim, o que significa que, mesmo multiplicado pela alíquota efetiva do Imposto de Renda, o meu benefício, pelo meu filho de seis anos, é maior do que uma mãe, no Bolsa Família, vai ter pelo seu filho, vivendo com menos de R$218 por mês.
Então, a uniformização do trato de cidadania é indispensável para a melhoria do Programa Bolsa Família daqui para frente.
Muito obrigado.
E agradeço pela elasticidade do tempo.
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O SR. PRESIDENTE (Dorinaldo Malafaia. PDT - AP) - Tudo bem. Muito obrigado.
É importante agradecer aos dois palestrantes iniciais e todo esse relato feito aqui. Consultei aqui o nosso Deputado Dr. Francisco, que é o Relator da MP, e muito do que foi apresentado aqui já está agregado nas emendas. Logicamente, nós vamos recepcionar a apresentação dos senhores como parte dessa reflexão, desse amadurecimento.
Quero também agradecer a presença da Deputada Geovania de Sá, que está aqui conosco - ela acabou de sair; então, fica o registro da sua presença -, e chamar agora para fazer uso da palavra Edison João Costa, Presidente da Associação Nacional dos Profissionais e Empresas Promotoras de Crédito e Correspondentes no País.
Então, são cinco minutos. Por favor, dentro do tempo, vou pedir a gentileza, porque nós estamos nesse processo de outras Comissões também.
O SR. EDISON JOÃO COSTA (Para expor.) - Sim, vou tentar acelerar o máximo possível.
Boa tarde a todos.
Antes de mais nada, eu agradeço pelo convite. Eu acho muito importante a participação, e a gente fica lisonjeado de poder colaborar com algumas informações e tudo mais.
Diferentemente dos outros expositores, a gente não vai falar aqui sobre a renda mínima, o Bolsa Família ou qualquer outro desses programas de benefícios. O objetivo da nossa vinda aqui está focado na questão do BPC/Loas, que é o benefício de prestação continuada da Lei Orgânica da Assistência Social, que foi - de uma maneira, talvez, digo, equivocada - incluído com a medida provisória aqui neste assunto, e a gente entende que precisa ser alterado.
Então, vamos lá.
Antes de mais nada, rapidamente, eu não posso deixar de falar sobre a Aneps. Nós somos uma entidade que existe há 21 anos em defesa dos profissionais de créditos e correspondentes no país. A gente é uma atividade complementar não exclusiva de instituições financeiras - ou seja, a gente exerce os serviços que não são feitos por elas. A gente é prestador de serviços e, ao contrário do que, muitas vezes, as pessoas falam ou colocam aí na mídia, a gente não é intermediário nem atravessador nem nada. A gente é o segundo canal de distribuição de produtos financeiros mais econômico do sistema financeiro. O primeiro deles é a distribuição digital ou eletrônica; o segundo é o correspondente; e o terceiro é a agência bancária.
Nós respondemos, hoje, por mais de 50% de todos os pagamentos de benefícios e recebimento de contas de pequeno porte no Brasil inteiro, em qualquer canto, a mesma coisa na distribuição de produtos financeiros. Todo esse público que não entra numa agência sofisticada e tudo mais é atendido pela gente. A gente está, hoje, no lugar onde os bancos já estiveram e não estão mais e onde eles nunca estiveram também. Então, isso equivale a tudo que é ponto remoto, seja ele num centro urbano, seja ele lá no Amazonas, numa comunidade ribeirinha.
Somos 400 mil CNPJs, segundo o Unicad do Banco Central - muita empresa pequena, média e micro que trabalha lá e algumas unifamiliares - e respondemos por 1,7 milhão de postos de trabalho.
Então, para passar rapidamente aqui, essa é a Aneps.
Bom, sobre o que a gente vai falar hoje? A gente vai falar sobre o BPC/Loas, que está amparado pela Lei Orgânica, do qual participam 5,257 milhões de beneficiários - a base é de fevereiro de 2023 e me foi fornecida pela Dataprev.
O que acontece com relação ao dispositivo que foi incluído na medida provisória, para o qual foram apresentadas algumas emendas? A gente quer focar aqui que o controle equivocado estreita o melhor caminho e piora a situação.
R
O fato de você tirar o beneficiário do BPC/Loas do consignado, como foi o caso colocado, não extingue a necessidade dele. Ele continua precisando de algum dinheiro, continua precisando de crédito. E, nesse sentido, na ausência desse caminho, que hoje é o melhor, do empréstimo consignado, porque estabelece alguma proteção em relação a custo e tudo mais, ele vai procurar os caminhos mais caros, os mais difíceis e vai acabar sendo sacrificado para isso.
Então, uma coisa em que a gente bate sempre é para evitar confundir as palavras proteção e tutela, porque proteger é você manter e oferecer...
(Soa a campainha.)
O SR. EDISON JOÃO COSTA - ... as melhores condições para o consumidor, e tutelar é diferente.
Bom, no caso, o caminho que acabou sendo adotado com a suspensão do empréstimo consignado é empurrar o beneficiário do BPC/Loas para taxas dez vezes maiores, de 20% a 25%, porque você não proibiu de tomar empréstimo, você só fechou o melhor caminho.
Estou acabando aqui já.
Bom, para a gente concluir esta apresentação, a gente tem que estabelecer um termo de comparação. Hoje, nós temos 13,7 milhões de aposentados que recebem apenas um salário mínimo. Desses 13,7 milhões de aposentados, 50% deles, quase 50%, 6,124 milhões têm empréstimo consignado em folha de pagamento, ou seja, no benefício. Então, eles têm assegurado esse direito e são cidadãos como qualquer outro. Já no caso do BPC/Loas, que tem a mesma renda, uma renda assegurada por lei de um salário mínimo para todos aqueles que tenham mais de 65 anos de idade ou que tenham alguma deficiência, nós temos 5,2 milhões de beneficiários. Até fevereiro, 1,6 milhão tomavam empréstimo consignado e agora não podem tomar mais. Nós suprimimos uma situação de crédito que era extremamente favorável para esse cara e, com isso, vamos empurrá-lo para o endividamento desnecessário e muitas vezes impagável.
Esses são os pontos principais que a gente queria colocar. E o que a gente tem a favor da emenda são esses pontos que estão aí. São cidadãos, na sua maioria, do mesmo perfil social dos aposentados regulares com até uma renda, da mesma faixa de renda. As faixas etárias são muito similares, porque, a partir de 65 anos, eles têm as mesmas demandas dos pensionistas regulares do INSS. A opção de crédito que foi fechada é a melhor e mais segura - não que a gente queira dar crédito para ninguém, mas, se você fecha o caminho bom, ele vai para o caminho ruim -, porque com isso a gente mitiga, reduz o endividamento dele nos meios mais onerosos. Esses são os pontos que a gente tem para argumentar em função disso.
Acho que estourei só um pouquinho tempo.
O SR. PRESIDENTE (Dorinaldo Malafaia. PDT - AP) - O senhor foi o mais disciplinado entre os nossos convidados.
O SR. EDISON JOÃO COSTA - Muito obrigado a todos.
O SR. PRESIDENTE (Dorinaldo Malafaia. PDT - AP) - Muito grato pela sua apresentação.
Mais uma vez quero aqui registrar a presença também do Deputado do PDT, meu colega de bancada, Márcio Honaiser, do Maranhão, que está presente - muito grato -, que também coordena a frente em defesa do serviço social, do Suas. Então, quero lhe agradecer pela presença.
Quero chamar agora... Teve uma pequena alteração aqui na ordem, mas chamamos a Sra. Aldaíza Sposati, representante do Conselho Federal de Serviço Social.
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A SRA. ALDAÍZA SPOSATI (Para expor.) - Boa tarde a todos.
Realmente, houve uma mudança aqui e eu não estava pronta.
Então, eu quero agradecer e cumprimentar esta possibilidade de uma audiência pública sobre essa medida provisória, sobretudo porque a construção dela não foi discutida anteriormente. Então, eu penso e pediria aos senhores que até mais audiências sejam feitas, porque, se nós notarmos, nós não temos representação, nesta discussão, dos próprios beneficiários e penso que a nossa construção democrática exige, efetivamente, ouvir os cidadãos, os próprios usuários.
Então, o que eu colocaria aqui - eu estou representando o Cfess, que é o Conselho Federal de Serviço Social, e, dentro dele, o projeto ético-político de seguridade social - é que o nosso entendimento, assistentes sociais que somos, é que a assistência social é parte da seguridade social brasileira e, efetivamente, nós estamos discutindo não um programa de governo isolado, mas nós estamos discutindo uma política de proteção social - e acho que isso precisa ficar muito claro. Por quê? Depois que a Constituição, inclusive, no seu §1º, instituiu que há o direito à renda, nós não podemos dizer que isso é um programa de Governo. Nós estamos discutindo um direito de cidadania e, como tal, eu diria que, na verdade, o texto, a narrativa da medida provisória está mais próxima de um Estado fiscal do que, efetivamente, de um Estado social.
Então, tem várias questões relativas à população que não estão colocadas devidamente. Por exemplo, nós assistentes sociais temos sido convocados, nos municípios, para ir à casa das pessoas para verificar se o que elas dizem é, de fato, o que ocorre. Isso é não só uma distorção profissional - profissionais que se negarem têm levado punição - como é uma distorção na medida em que a declaração de renda - isto está em lei - é livre e tem que ser livre, como é para nós o Imposto de Renda, é livre.
Então, existem distorções como se, na verdade, as pessoas que são beneficiárias não chegassem a ser cidadãos ou cidadãs. A maioria dos beneficiários - dos 55 milhões - são mulheres, mães, pardas, negras, isso mais de 67%. Portanto, as punições que são feitas atingem mais diretamente a mulher e as crianças.
Então, o que nos parece... Inclusive, quando o Renato aqui nos falou sobre todas as pesquisas da rede Penssan, temos analisado muito, sou também pesquisadora e professora titular da PUC São Paulo sênior. E o que acontece? Veja, nós temos 55 milhões de beneficiários, e os 30 milhões que estão, vamos dizer assim, em situação infranutricional, certamente, estão aí, não estarão fora, até pelo recorte que tem. Todavia, nós não temos isso analisado. Nós nunca analisamos a nutrição dessas pessoas. Então, elas levam punição pela condicionalidade, elas levam punição por serem...
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(Soa a campainha.)
A SRA. ALDAÍZA SPOSATI - Não, agora, espera aí. Eu não vou levar punição. (Risos.)
Então, elas levam punição, mas, na verdade, há um conjunto, efetivamente, de condições que tem que ser assegurado. E o que nós entendemos? Que se, como diz, na verdade, a legislação ou a Constituição, a transferência de renda é um passo para a renda básica, a garantia de direitos tem que estar posta desde já na transferência de renda. Se nós fizermos uma leitura, na verdade, da medida provisória, nós vamos notar que não fica absolutamente claro qual é o lugar de manifestação das pessoas. Não tem sistema de presença e participação. Não tem lugar de escuta e de diálogo. Não existe isso. Há uma gestão de números, fundamentalmente. Então, há uma gestão de números e uma gestão que não é encarnada na vida real das pessoas. Eu acho que isso tem que ser superado. Nós temos que entender que nós estamos tratando de direitos de cidadania. Já foi colocado pelo Leandro aqui a questão de condicionalidade, mas o sistema que nós temos de avaliação não considera as condições objetivas de vida das pessoas.
Então, veja, tem um conceito de família que tem que ser superado. Como é que família são aqueles que vivem sob o mesmo teto? Isso não é família. Viver sob o mesmo teto não é uma relação, efetivamente, de, digamos, provedor e dependente, nem uma relação de consanguinidade. Então, eu acho que o próprio conceito que nós temos, o próprio conceito do Suas, o conceito que temos de assistência social não é que família são pessoas sob o mesmo teto. Isso quase chega a nos fazer pensar que, então, população de rua é tudo família, porque eles estão sob o teto do céu - é o mesmo. Então, são outras relações que estão colocadas e que têm que ser, efetivamente, consideradas.
Então, há uma outra questão: mexe, como o senhor dizia, a medida provisória mexe na Loas. E mexe em duas questões, Deputado, que não dá para entender.
Primeira questão: tira a obrigação do georreferenciamento. Mas como tirar georreferenciamento? Essa é uma ferramenta principal de localização, de agregação das pessoas. Por que tirar isso da Loas? Depois, tira, na verdade, da Loas a consideração de pobreza para substituir por uma questão... Tira baixa renda para substituir por vulnerabilidade. Para que isso? Não entende. Por que você, de alguma coisa que é concreta, vai para uma abstrata?
Então, penso que o que nós temos aqui, e acho que as emendas favorecem muito, nós precisamos discutir seriamente, entendendo que nós não estamos mais num programa de governo, nós estamos num direito de cidadania, e, como direito de cidadania, nós temos que incorporar na medida provisória elementos que deem segurança de permanência para as pessoas. Eu acho que nisso... Então, o que nós estamos aqui... O Conselho Federal de Serviço Social, que luta pela justiça, que apoia a renda básica, não aceita exatamente esse tratamento indigno, porque toda legislação fala realmente em garantias e dignidade, e não aceita que os assistentes sociais sejam usados como ferramentas de vigilância no pior sentido da palavra. Mas não, na verdade, como aqui já foi dito, é aquilo que sabemos fazer também, porque nós defendemos direitos, fazemos proteção social e fazemos também, evidentemente, a vigilância socioassistencial. Então isso tem que ser compreendido efetivamente num outro patamar.
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Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Dorinaldo Malafaia. PDT - AP) - Muito obrigado, Sra. Aldaíza.
Antes de passar a palavra à representante do Conselho Nacional de Assistência Social, Sra. Eutalia Barbosa, eu queria também repassar a Presidência ao nosso Deputado Dr. Francisco, Relator, e, antes disso, apenas posicionar a nossa opinião nesse debate.
Nós temos consenso em torno da necessidade de reformulação desse projeto, porque, de fato, concordo plenamente com a senhora, estamos aqui com tempo muito reduzido, de 120 dias, para aprovar, e nós estamos recebendo, como todos sabem, uma medida provisória e um programa que vieram num processo de desmonte. Essa é a percepção nossa. O CadÚnico está defasado, há toda uma estrutura flexibilizada, então, por tudo isso, nós precisamos entender que o momento é de reconstrução.
Eu sou também, junto com o próprio Deputado Dr. Francisco, muito otimista no sentido de que a gente poderá avançar também para um projeto de renda mínima mais consistente, mas nós precisamos criar instrumentos a partir de agora. Para nós, a importância da velocidade de aprovação com o máximo de consenso é o fundamental neste momento. Logicamente, nós temos que apontar para um processo de reconstrução também da política de serviço social e de assistência social neste país. Para nós está muito claro isso.
Eu gostaria de agradecer a presença de vocês. Tenho que ir para a Comissão da Amazônia e dos Povos Originários, onde estamos discutindo também o que foi que representeou a ditadura militar para essas populações. Eu faço parte dessa Comissão e, por isso, queria pedir licença e transmitir mais uma vez aqui a Presidência ao Dr. Francisco, nosso Deputado Federal, e agradecer mais uma vez ao Deputado Suplicy, que pediu a reinscrição, e acredito que é consenso...
O SR. EDUARDO MATARAZZO SUPLICY - Eu gostaria de ter alguns minutos a mais para completar minha exposição, por favor.
O SR. PRESIDENTE (Dorinaldo Malafaia. PDT - AP) - Perfeito.
Muito obrigado.
Transmito, então, ao Dr. Francisco.
A SRA. ALDAÍZA SPOSATI (Para expor.) - Por favor, Deputado, eu esqueci aqui que pediram para a gente responder perguntas, e tem duas questões aqui... A pergunta é: "Quando o pagamento dos benefícios será desbloqueado?". São duas perguntas.
Então, não se pode fazer isto: cassar um benefício; quando a pessoa chegar lá ele não estar, porque houve uma decisão unilateral do Estado - não se pode fazer isso. Então acho que nós temos que fazer uma cura do que está colocado aqui no texto da medida.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Agora gostaria de convidar a representante do Conselho Nacional de Assistência Social, Eutalia Barbosa, para a sua apresentação.
A SRA. EUTALIA BARBOSA (Para expor.) - Boa tarde a todas as pessoas que compõem aqui esta importante audiência pública!
Quero cumprimentar todos os meus parceiros e parceiras de fala nesta audiência pública, convidados para esta audiência pública de escuta das entidades.
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Quero parabenizar o Senador Contarato, que preside esta Comissão, e também o Relator, Dr. Francisco, pela iniciativa de chamar este debate.
Eu estou no Conselho Nacional de Assistência Social representando o Ministério do Desenvolvimento Social, sou Conselheira, representante governamental. Fui designada pela Presidente do CNAS para fazer esta fala e gostaria, inicialmente, de fazer as seguintes considerações.
Primeiro, gostaria de dizer que o Conselho Nacional de Assistência Social é um órgão de controle social, instituído pela Lei Orgânica da Assistência Social, um órgão de controle social no campo da política da assistência social. Então, ele se coloca como guardião da Loas, como o órgão que deve cuidar dos interesses dessa política. E, obviamente, o Programa Bolsa Família, que é um programa de transferência de renda, situa-se como um direito de assistência social, um direito socioassistencial do direito à renda. Então, requer-se a esse conselho também o acompanhamento da implementação desse programa de transferência de renda.
O Conselho Nacional de Assistência Social tem várias comissões que analisam as matérias que chegam para sua discussão. E, dentro do Conselho Nacional, nós temos a Comissão de Benefícios, e é exatamente nesse lugar que o conteúdo referente à medida provisória e o conteúdo referente à implantação do Bolsa Família estão localizados. Essa comissão não conseguiu ainda concluir o seu parecer final, aprovado em Plenário, referente à medida provisória, mas ela já se debruçou sobre alguns assuntos importantes e também tem um plano de ação previsto para esse processo. Dentro desse plano de ação, uma das duas questões importantes que se referem ao processo de implementação do Bolsa Família trata da ação em que o conselho se propõe a debater e fazer proposições sobre critérios de concessão, monitoramento e manutenção do Programa Bolsa Família. E, para isso, o Conselho Nacional já se adianta, solicitando à Secretaria Nacional de Assistência Social um balanço mensal do Programa Bolsa Família, incluindo as suas conquistas e os seus desafios.
Uma outra ação importante que essa comissão apresenta ao Plenário do Conselho Nacional é que ela se propõe a acompanhar a decisão do STF referente à determinação constitucional de instituir uma renda básica no país. Então, a tarefa dessa comissão dentro do Conselho Nacional é observar se a implantação de um programa de transferência...
(Soa a campainha.)
A SRA. EUTALIA BARBOSA - ... de renda se traduz numa caminhada escalonada para uma perspectiva de transferência de renda. Então, essas duas ações estão colocadas para o Conselho Nacional.
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E uma outra decisão importante também, sobre a qual o Conselho Nacional já se pronunciou, já desde o antigo programa de transferência de renda, e ele repete esse posicionamento agora para a MP do Bolsa Família, que é a sua posição contrária... Aliás, ele se posiciona contrária à permissão do empréstimo consignado vinculado aos benefícios de transferência de rendas ligadas à assistência social, especificamente o BPC e o Programa Bolsa Família.
A sua manifestação se pauta no entendimento de que nós estamos tratando de uma população que acessa a transferência de renda na perspectiva da proteção social. Não na perspectiva do acesso à renda numa relação monetarizada, mas numa relação de proteção social e de enfrentamento à pobreza. Então, você permitir que essa população comprometa 40% da sua renda de proteção social, vinculado ao sistema financeiro, ao sistema bancário, isso traz mais vulnerabilidade, mais desproteção do que proteção.
Um outro posicionamento do Conselho com relação a isso é inclusive dizer que, se, porventura, esses beneficiários perdem esse benefício - porque ele não é um benefício vitalício -, quem assumiria essa dívida com a qual esses beneficiários se comprometem junto ao sistema financeiro e ao sistema bancário? Então, parece-me que... Parece-me não: o Conselho Nacional considera que essa concessão é muito mais um prejuízo para a vida dos mais pobres e beneficia o sistema financeiro e o sistema bancário do que necessariamente promove proteção social para a vida dos mais pobres.
Então, o Conselho Nacional mantém o seu posicionamento tanto em relação ao que foi permitido no antigo Programa Auxílio Brasil e mantém o seu posicionamento também agora na MP do Bolsa Família.
Bom, em nome do Conselho Nacional, eu quero dizer que, agora em maio, a comissão de benefício vai se reunir e a pauta específica vai se debruçar sobre os pontos da medida provisória, inclusive considerando alguns itens relativos às emendas apresentadas a essa MP, para emitir um posicionamento. Eu já havia falado com o Relator da possibilidade de o Conselho Nacional ainda ter tempo de encaminhar o seu posicionamento com relação a alguns pontos da MP.
E aí, já fazendo coro aqui com algumas falas, o Conselho Nacional pretende se debruçar sobre a questão do BPC incluído na composição da renda familiar.
O Conselho Nacional também se dispõe a discutir sobre a questão do entendimento do que é família unipessoal. O Conselho Nacional entende que família unipessoal existe, mas entende o posicionamento do ministério nesse momento de apresentar uma proposta de revisão cadastral. Inclusive, o Programa de Revisão Cadastral, o Procad, foi apresentado no Conselho Nacional, mas ele não pode deixar de entender que família unipessoal existe.
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Às vezes, tem pessoa que mora com uma planta, com um gatinho, com um animal, e ela é uma família e se declara como família. Então, o Conselho Nacional não se exime de discutir, de reconhecer que existe, sim, família unipessoal.
Então, são dois assuntos importantes a serem discutidos na Comissão, e a manutenção da posição do Conselho Nacional contrária à permissão da... O Conselho Nacional considera que é uma forma de endividamento da população mais pobre para beneficiar um setor da economia que nem sempre olha para os mais pobres, que é o sistema financeiro e o sistema bancário.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Quero agradecer aqui a participação da Eutália.
Agora, para encerrar aqui esta primeira participação, convido o Coordenador de Justiça Social e Econômica da Oxfam, Jefferson Nascimento.
O SR. JEFFERSON NASCIMENTO (Para expor.) - Olá, boa tarde a todos e a todas.
Antes de mais nada, gostaria de cumprimentar os integrantes da mesa, a oportunidade de estar neste importante diálogo, o Presidente, Senador Fabiano Contarato, o Relator, Deputado Dr. Francisco, que preside, neste momento, a reunião, e também cumprimentar todas e todos os companheiros que estão aqui, colegas e lutadores que estão na sociedade civil, atuando por um Brasil melhor.
Bom, meu nome é Jefferson Nascimento. Eu represento a Oxfam Brasil, uma organização da sociedade civil brasileira que atua na erradicação da pobreza e da miséria, da fome e no combate às desigualdades.
Eu vou fazer uma apresentação, tentando ficar dentro do tempo. Muitos dos pontos que eu traria já foram muito bem apontados pelos meus companheiros. Estávamos ao lado da Rede Penssan no relatório a respeito dos dados a respeito da fome, junto com a Rede Brasileira de Renda Básica, também no debate, durante toda a pandemia, a respeito da importância desse programa social e de outros componentes que estão aqui.
Então, vou destacar alguns pontos nesta minha apresentação, pedindo já desculpas caso algum elemento ainda continue redundante.
Muito rapidamente falando, o nosso mandato, a nossa atuação dentro da organização se refere especificamente ao combate às desigualdades. Então, trazendo alguns elementos, os resultados dos programas de transferência de renda, alguns deles já foram muito bem trazidos anteriormente, mas apenas destacando elementos relevantes, a questão do impacto do Bolsa Família na redução de desigualdades, frente a outros programas de transferência de renda, isso na versão que perdurou aí durante quase 18 anos, o impacto que teve, mesmo tendo recursos orçamentários muito menores do que outros programas sociais... Todas essas informações também estão fundamentadas ali com estudos que apontam esse impacto.
Quero mencionar a questão do impacto do Bolsa Família entre 2004 e 2017 na redução da taxa de pobreza em 1,6 ponto percentual, pensando aí na linha da pobreza administrativa do programa inicialmente, no programa original.
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Aqui a importância também, na redução - do programa de 2004/2015 - do Coeficiente de Gini, que é um indicador de concentração de renda, sendo que, no começo da implementação da primeira versão do Bolsa Família, esse impacto foi de quase 17% na redução da concentração de renda, que é um bom indicador da redução de desigualdade.
Falando aqui também na questão da redução da pobreza extrema, de 2012 a 2019, de 2,7 pontos percentuais. E esse impacto não foi continuado e, de certa maneira, foi um pouco prejudicado, pelos impactos da crise econômica, a partir de 2014, e também da pandemia.
Temos aqui um gráfico muito rápido mostrando um pouco o impacto do programa de transferência de renda, do Bolsa Família, desde 2012 até 2019, e a taxa de pobreza antes e depois do programa de transferência de renda. Então, é muito claro que, mesmo tendo essa queda, a partir do momento da crise econômica iniciada em 2014, a gente tem esse impacto significativo benéfico do Programa Bolsa Família.
Aqui temos alguns detalhes também de outros impactos do Programa Bolsa Família, como a diminuição da mortalidade na infância, principalmente a mortalidade associada à pobreza, por diarreia, desnutrição... Um impacto, por exemplo, na redução da mortalidade infantil, mais ainda, mais intensificado...
(Soa a campainha.)
O SR. JEFFERSON NASCIMENTO - ... em crianças nascidas de mulheres negras; a contribuição, também, para o aumento da escolarização de crianças e adolescentes; o impacto positivo na participação escolar e progressão de estudantes mulheres.
E também há aqui alguns estudos que apontam a ampliação dos círculos sociais de mulheres beneficiadas; o afrouxamento da dependência de relações conjugais violentas e abusivas e também o rompimento dessa percepção da miséria como destino inexorável, imutável.
Então, é um pouco esse patamar, e acho que aqui foi muito bem trazida a importância desse programa, do seu fortalecimento e de algumas questões que também foram muito bem trazidas.
Eu destacaria, principalmente, alguns pontos que o meu companheiro Leandro destacou de emendas que foram apresentadas, como o dispositivo do art. 7º, §4º, da proposta de medida provisória, que restringe o período de reajuste do benefício em 24 meses. Isso é algo que tem que ser aprimorado, inclusive nesse contexto inflacionário que a gente tem vivido.
E aí, para ficar dentro do tempo, trago um dado para mostrar, pegando também um pouco as perguntas que foram apresentadas nesta audiência participativa e também o que uma outra companheira havia mencionado, esse aspecto relevante da importância desse diálogo e da importância, também, de ouvir as pessoas que são beneficiadas por esse programa, que é uma ausência. Então, tentando não suprir, obviamente, a ausência das pessoas que deveriam estar aqui também discutindo esse tema, quero mostrar qual é a base de apoio para esse programa.
Essa é uma pesquisa que a Oxfam Brasil faz desde 2017, com o Datafolha, de percepção a respeito de desigualdades no Brasil. E, na pesquisa mais recente que a gente realizou, no ano passado, em 2022, o número mais impactante de toda a pesquisa - é uma bateria de mais de 20 perguntas e 20 temas que são tratados nessa pesquisa -, as duas perguntas que tiveram maior apoio, que tiveram maior base de concordância por parte das pessoas que foram pesquisadas - é uma pesquisa de âmbito nacional, realizada presencialmente -, foram essas duas questões. A primeira delas é que 96% da população concordam que é obrigação dos governos garantir recursos para programas de transferência de renda e assistência social, principalmente para quem mais precisa. Então, 96% concordaram. Nenhuma outra questão, de vários temas perguntados, teve um apoio tão grande quanto essa pergunta.
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E a segunda pergunta que teve maior apoio foi, justamente, "o programa de transferência de renda deve atender todas as pessoas em situação de pobreza".
Então, muito se fala que o Brasil está numa condição de um país polarizado nesse sentido, mas, com relação a esse tema específico, não existe nenhum tipo de polarização. Mesmo quando a gente faz recortes relacionados à renda. E esses daqui são dados de estratificação desses dados que o Datafolha apresentou nessa pesquisa que a gente publicou no ano passado.
Mesmo quando a gente faz esse recorte de renda, em todas as faixas de renda a gente tem um amplo apoio tanto sobre a obrigação de os governos garantirem recursos orçamentários para programas de transferência de renda, principalmente para quem mais precisa - podem ver, em todas as faixas, desde até um salário mínimo a até mais de cinco salários mínimos, a variação é pequena -, quanto sobre a pergunta relacionada também ao Auxílio Brasil, ao programa de transferência de renda ter que atender a todas as pessoas em situação de pobreza.
Isso também se vincula, um pouco, a um ponto trazido aqui da importância desse projeto e de o aprimoramento desse projeto lidar com o debate a respeito da fila do programa de transferência de renda.
Então, todo mundo que tem, enfim, que atende aos requisitos, deveria ter direito a receber esses benefícios. Deveria ter uma constrição, uma limitação orçamentária a que as pessoas que estejam dentro dos critérios determinados possam atender, possam receber esse benefício. E aí a gente tem esse número aqui, 95% da população brasileira concordando com essa visão dessa garantia desse benefício como um direito.
Termino aqui minha apresentação e mais uma vez agradeço essa oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Quero agradecer aqui a participação de todos.
E gostaria, agora, neste momento, de deixar aberto aqui, franqueado para os Parlamentares - aqui, já, o Deputado Capitão Alberto Neto -, para fazerem algum questionamento aos presentes ou proferirem seu posicionamento.
Na sequência, eu gostaria de propor para ler aqui essas perguntas que apareceram e colocar para quem se considerar mais apto a responder essas perguntas que foram aqui disponibilizadas, que possam respondê-las e, aproveitando, fazerem, já, suas considerações finais.
Então, eu gostaria de, primeiro, permitir aqui ao Deputado Capitão Alberto.
O SR. CAPITÃO ALBERTO NETO (PL - AM. Para interpelar.) - Obrigado, Presidente da audiência, mas Relator. Eu tenho certeza de que V. Exa. vai construir o melhor texto e aprimorar o texto que veio do Governo Federal em relação à renda mínima, em relação ao Bolsa Família.
Quero cumprimentar o Deputado Eduardo Suplicy, que foi o grande idealizador do nosso país em relação à renda mínima.
Deputado, eu estava vendo a entrevista, agora, do Elon Musk. Ele foi questionado sobre este momento que o mundo vive, da inteligência artificial. Cada vez mais, nós vamos reduzir o número de trabalhadores, a questão do emprego vai ficar sempre com uma interrogação, e ele disse que uma das soluções para acabar com a fome no mundo - porque ele sempre é questionado pelos bilhões que tem na sua conta, chegando aos trilhões... Ele disse que a renda mínima seria uma solução viável para o mundo inteiro.
Então, nós estamos fazendo aqui o dever de casa.
Eu acho que isso aqui não é uma questão de governo, se é Bolsa Família, se foi Auxílio Brasil, mas ficou muito claro: quando nós aumentamos o Bolsa Família para R$600, a redução da pobreza foi, assim, notória. Nós temos que alguns números chegam a 23%. Então, quanto maior o valor desse auxílio, menos pobreza nós vamos ter no nosso país.
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Lógico que é um sonho que a gente consiga alguns gatilhos para ligar esse Bolsa Família ou Auxílio Brasil - no caso, agora, Bolsa Família -, que se torne uma rampa social, que ele não fique apenas como Bolsa Família para sempre, mas que ele tenha gatilhos, condições e estímulos para entrar no mercado de trabalho, para o município se desenvolver, para o nosso país se desenvolver, para levar mais dignidade para o seu lar, porque ele quer ter um salário melhor.
Eu tenho certeza de que a gente precisa discutir mais sobre isso, não é uma tarefa simples, eu acho que não tem uma resposta fácil, mas que precisa de mais estudos, de alguns experimentos - muitas vezes a gente vai testar, não vai dar certo, mas podemos mudar depois e construir.
Eu queria citar o assunto do qual eu fui o Relator no Congresso - trabalhei na legislatura passada -, que é essa questão dos consignados. Então, eu recebo... As minhas redes sociais são inundadas por esse público. Não tenho nenhum vínculo com rede bancária, eu vim da segurança, sou Capitão da Polícia Militar, mas esse assunto acabou chegando até mim - trabalhei durante a legislatura e me aprofundei muito nesse dado.
Então, não vou entrar na questão do Bolsa Família, por ser mais polêmica e o tempo ser muito curto para a gente, de repente, chegar a alguma conclusão, mas o BPC-Loas... E esse público vem me questionando muito a retirada dele do acesso ao crédito mais barato do mercado.
Se o BPC-Loas não tivesse nenhum acesso a crédito, faria sentido. "Não, realmente, esse recurso é apenas para o benefício das suas condições primárias". O.k. Mas isso não é verdade. Quem recebe o BPC-Loas tem uma conta bancária, quem recebe o BPC-Loas tem acesso a diversas instituições financeiras, inclusive a instituição financeira que tem o maior juro do mercado - que recebe geralmente as pessoas negativadas -, que chega a cobrar juros de 20% ao mês. Isso é muito cruel.
Então, quando eu coloquei e trabalhei para colocar o BPC-Loas também no acesso ao consignado, era para retirar essa pessoa que tem algum tipo de deficiência, que precisa comprar um equipamento, que precisa ter acesso a crédito - porque todo mundo precisa ter acesso a crédito, da menor renda até a maior renda, isso faz parte da nossa vida. Então, retirar essa pessoa dessa instituição financeira, que está cobrando 20% ao mês, e dar acesso - caso ela queira, caso ela tenha uma necessidade - aos juros mais baratos do mercado, que nesse caso, no nosso país, são os consignados.
Então, peço ao Relator... Eu tenho uma emenda em relação a isso, que a gente... Infelizmente, eu não consegui trazer uma pessoa para falar sobre isso, mas, nas minhas redes sociais, eu tenho várias pessoas beneficiárias do BPC-Loas, tanto deficientes como idosos, acima de 65 anos, que estão reclamando e que precisaram ter o acesso a crédito e tiveram que tomar crédito com juros de 20% ao mês. Isso, sim, é muito cruel.
Então, essas são as palavras. Parabenizo a todos os expositores.
Aprendi muito aqui na tarde de hoje.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Quero agradecer ao Deputado Capitão Alberto.
E, aqui, eu gostaria de fazer uma leitura sobre alguns questionamentos que chegaram e, logo na sequência... Gostaria que todos ficassem atentos, os expositores, porque eu vou relacionando aqui para fazer as considerações finais, e se, em algum desses questionamentos, alguém se sentir à vontade para se posicionar, que contribua.
Aqui, o Guilherme Marques, de São Paulo, questiona: "Estabelecer uma renda per capita inferior a R$500 para recebimento do benefício não seria algo equivocado?".
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Jefferson da Silva, do Rio de Janeiro: "Quando o pagamento do benefício será desbloqueado? Tem muitas pessoas que precisam desses recursos".
Simone Aparecida, de São Paulo. "Qual medida vai ser tomada em relação a quem perdeu o Bolsa Família, está sem emprego e mora sozinho? O que o Governo tem a oferecer?".
Ginaldo Teixeira, da Paraíba: "Gostaria que fosse mantido o crédito consignado para os beneficiários do BPC".
Rivanne Silva, do Rio de Janeiro: "Não acho coerente que uns recebam o Bolsa Família no começo e outros, no final do mês".
João Victor de Lima Alves, Maranhão: "Quais os futuros projetos para o Programa Bolsa Família?".
Raquel Cristina Serranoni da Costa, São Paulo: "É preciso rever o conceito de família adotado no CadÚnico e a apuração de renda versus despesa quando do uso para definir per capita para o Programa Bolsa Família".
Raquel Cristina Serranoni da Silva, outra pergunta: "É urgente interromper esse bloqueio de benefícios à revelia, que somente serve ao 'agudizamento' da vida desprotegida das famílias beneficiadas".
Também a própria Raquel faz outro questionamento: "As emendas da Rede Brasileira de Renda Básica são fundamentais para o cumprimento da transição do programa de transferência de renda para a renda básica. A renda básica é a grande política de enfrentamento à pobreza e da garantia de dignidade humana".
Fabrícia Carvalho da Silva, Maranhão: "O Bolsa Família deve ser associado a outros programas sociais que visem à soberania e segurança para as pessoas em situação de vulnerabilidade".
Ainda a própria Fabrícia: "Qual o valor máximo que cada família pode receber e qual será a periodicidade e atualização dos cadastros?".
Paulo de Tarso, São Paulo: "Como que o Programa Bolsa Família, enquanto programa de transferência de renda com condicionalidades, pode ser a transição para a renda básica universal?".
E a Jéssica Xavier Pinheiro Costa, Paraná: "Será um valor determinado mais outro valor por filho?".
Então, foram esses aqui os questionamentos.
Eu gostaria aqui... Para a gente seguir uma ordem, permitam-me deixar o Deputado Estadual, Senador Eduardo Suplicy, aqui para o final.
Eu acho que a Elisabetta não está mais. Assim, eu gostaria de convidar aqui o Renato Carvalheira para as suas considerações.
O SR. RENATO CARVALHEIRA (Para expor.) - Quero agradecer, antes de mais nada.
Aproveitando as perguntas, eu acho que a Fabrícia colocou a questão do programa sem ter... No caso da fome, que é um fenômeno que não se acaba exatamente apenas com o Programa Bolsa Família; são necessários outros programas. Mas é fundamental este programa, que requer a sua qualificação, a sua melhora, mas é um programa, repito, que deve continuar, que deve voltar, inclusive, aos patamares de antes, o Bolsa Família, no seu original, com relação ao Cadastro Único fortalecido, com relação a essas questões das condicionalidades...
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Vejam, a melhor condicionalidade que tem é a questão, por exemplo, da educação com relação às crianças estarem na escola; a terem a sua capacitação e a sua formação completa para que possam ter uma vida plena.
Então, a grande porta... eu vejo muita discussão sobre isso: qual é a porta de saída? A porta de saída é a educação; educação, que a gente viu e mostrou aqui: quando a família tem a maior escolaridade, a presença da fome vai diminuindo.
Então, as minhas questões são essas. Eu coloco a Rede Penssan à disposição para o debate - ficamos muito honrados com o convite - e à disposição para continuar.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Quero agradecer ao Renato Carvalheira e à Rede Penssan pelas contribuições aqui nesta audiência pública e convidar o Leandro Teodoro, Presidente da Rede Brasileira de Renda Básica, para suas considerações.
O SR. LEANDRO TEODORO FERREIRA (Para expor.) - Obrigado, Deputado Dr. Francisco.
Eu quero responder à pergunta do Guilherme, que fala do per capita de R$500. Eu acho que essa foi, inclusive, uma referência próxima do que foi o auxílio emergencial, que era de meio salário mínimo. Na época, girava em torno dos R$500.
Então, de fato, parece-me que isso fez com que a elegibilidade crescesse bastante, e eu considero que a perspectiva de meio salário mínimo é bastante adequada para a gente começar um debate e, inclusive, contemplar, na sequência do Programa Bolsa Família, famílias que se encontram em uma condição de baixa renda, que são, inclusive, um volume expressivo do que está no Cadastro Único, assim como os dados da Pnad e qualquer outro que estabeleça a projeção de pobreza no Brasil são capazes de encontrar também.
Então, isso tem a ver, inclusive, com o Decreto da Regulamentação do Mínimo Existencial em relação à Lei de Defesa do Consumidor, porque é essa que implica a questão do crédito, que é uma questão do Ginaldo a respeito disso também, para os beneficiários do BPC.
Eu acho que aqui tem um debate a ser feito, capitão, a respeito do que o senhor colocou - também ao Edson, que fez uma exposição a respeito disso - que é o seguinte: eu acho que toda pessoa tem que ter o direito a receber o dinheiro que é de seu direito da forma como desejar. Então, algumas experiências comparam a renda básica com a dotação básica, que é pegar o dinheiro que o cara receberia no ano inteiro e pagar na forma de uma dotação básica em vez de pagar mensalmente.
De repente, isso pode ser um meio de caminho. Para uma parte do BPC, você fala: "Eu quero receber adiantado três meses". Se isso vai estar associado a um mecanismo de crédito ou não, independe. Agora, precisa estar devidamente regulamentado...
(Soa a campainha.)
O SR. LEANDRO TEODORO FERREIRA - ...para que os juros não impliquem perdas estratosféricas, como o senhor colocou, para os usuários da política. Então, eu acho que é um debate a ser feito sobre alternativas de desenvolvimento econômico.
O senhor colocou aqui bastantes questões relativas ao desenvolvimento local, o dinheiro que chega às cidades, às prefeituras... A gente sabe que qualquer cidade que tem um volume expressivo de beneficiários do Bolsa Família, se você passa na casa lotérica às vésperas do pagamento ou nos dias de pagamento, tem fila antes de abrir.
Então, eu acho que seria importante encontrar alternativas que potencializem esses programas como estratégia de desenvolvimento também. E o que eu quero dizer com isso? Vai lá em Maricá - do ex-Prefeito Washington Quaquá, Deputado Federal hoje aqui - e dá uma olhada em como o banco comunitário fez com que todo o custo do crédito no município caísse e ainda paga o benefício na forma de uma moeda social, que faz com que aquele dinheiro fique mais tempo circulando no município. Então, essas alternativas têm que ser combinadas. Se for dessa forma, a gente pode avançar na direção de entender isso como um elemento de desenvolvimento.
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Então, lá em Maricá, isso faz com que o dinheiro circule 1,7 vezes ou 1,8 vezes antes de sair do município. Isso, associado com o efeito multiplicador que o Bolsa Família tem, já conhecido há muito tempo nos estudos do Marcelo Neri e do Pedro Herculano, mostra que, para cada R$1 investido no Programa Bolsa Família, você tem um retorno de 1,78 para o PIB. Agora, se esse retorno de 1,78 para o PIB é relevante, ele inclusive tem que ter uma relação com a regra fiscal, que vai chegar aqui, daqui a pouco, também para o Congresso Nacional avaliar com bastante intensidade. Se ele tem esse tamanho efeito multiplicador, talvez ele deva, portanto - inclusive por conta das suas regras de atualização e impedimento de formação de fila -, ficar de fora de qualquer tipo de teto. Este é o discurso que está preocupado com o desenvolvimento econômico: é o discurso de que investir esse dinheiro nos programas sociais gera uma capacidade de desenvolvimento bastante expressiva.
E aí tem as perguntas da Raquel, que eu agradeço e que focaram bastante na renda básica. Eu acho que é por aí mesmo. O Paulo de Tarso fala de o PBF se transformar na renda básica. Eu acho que é uma oportunidade única essa da medida provisória e é por isso que a gente está aqui fazendo essas sugestões.
A associação com outros programas, que a Fabrícia perguntou, acho que tem que ser na perspectiva de garantir direitos e não na de tornar isso uma obrigação dos beneficiários. Inclusive quando se fala assim: "Ah, criar um monte de novas coisas associadas, relacionadas ao trabalho especialmente", eu acho que isso não pode se tornar uma obrigação, tem que se tornar um direito do beneficiário.
Mas fico por aqui.
Eu quero dialogar mais com vocês a respeito dessas alternativas, lá em São Paulo também.
Estou à disposição para continuar esse debate.
Eu agradeço ao Dr. Francisco, que nos recebeu gentilmente em seu gabinete, hoje pela manhã. Agradeço também a participação do Consea e do CNAS, que são muito importantes para esse debate, porque o Governo, no final das contas, vai ser quem vai operar tudo isso daqui para frente.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Quero agradecer aqui ao Leandro Teodoro pelas suas contribuições.
Agora quero permitir aqui ao Edison João Costa fazer as suas considerações finais.
O SR. EDISON JOÃO COSTA (Para expor.) - Bom, mais uma vez, eu gostaria de agradecer pelo convite e pela oportunidade da exposição.
Eu vou focar aqui rapidamente na pergunta do Ginaldo, que quer que o benefício volte a receber o empréstimo consignado.
(Soa a campainha.)
O SR. EDISON JOÃO COSTA - O nosso objetivo aqui é esse mesmo, em fazer essa defesa.
Mas eu não posso deixar de mencionar algumas coisas importantes que foram ditas pela Sra. Aldaíza.
Toda vez que a gente fala nesse tipo de Programa - e o BPC/Loas é um programa, assim como o Bolsa Família e tudo o mais... Eu acho que o ponto de que ela falou e me tocou - e eu gostaria até de continuar participando de debates de outros... não só para BPC/Loas - é que uma coisa como essa, que está prevista lá, é um programa de Estado e não como um plano de governo. Isso para mim é fundamental. Sinceramente, eu gostaria de ver sair dessa medida provisória um programa que não fosse nem Bolsa Família, nem Auxílio Brasil, nem bolsa gás, nem nada disso, mas que fosse um programa efetivo, de médio e longo prazos, que todo e qualquer - estou falando como cidadão agora - governo seja obrigado a cumprir e ceder, sem palpites e sem opiniões, porque não se pode, no momento que está o governo A, achar que isso é bom; no momento que vem o B, achar que é ruim, e vice-versa. Em relação ao Loas/BPC, eu acho assim: nós estamos aqui um pouco como cidadão e um pouco como quem atende esse público lá. A gente está lá no campo, falando com eles, humanizando essa relação, e nós não somos instituições financeiras. A gente é prestador de serviço. Existimos desde o tempo das diligências. O Wells Fargo famoso, que a gente via lá, era um correspondente chamado de agente bancário, para prestar serviço para a população. E a gente sente. No momento em que suspendeu o BPC/Loas, todo mundo foi para o crédito mais caro. Ora, que tipo de proteção é essa, que empurra o sujeito para pagar 25%?
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(Soa a campainha.)
O SR. EDISON JOÃO COSTA - Por uma questão de ponto de vista? Perdoe-me, não é bem assim.
Outra coisa é que a gente tem que aprender nesses programas, eu acredito, é que não pode confundir proteger com tutelar. Se é para tutelar, tira do sujeito o direito de ele fazer o que ele quiser, e nós aqui, do gabinete, com nosso sapatinho sem gastar a sola, vamos tomar a decisão por eles - você não pode fazer isso, você não pode fazer aquilo -, como se fosse um bicho numa jaula ou como a gente - desculpe falar - trata os indígenas aqui, porque acha que o cara não é capaz de pensar por si só.
A coisa passa pelo processo de educação, como ele colocou lá. Se a gente quer sair desse enrosco, tem que ser um projeto de Estado, com foco em educação, curto, médio e longo prazos. E nós não estamos aqui para disputar se beneficia A, B ou C. Nós somos parte de uma cadeia produtiva que faz todo esse mecanismo andar. Então, o que eu tenho para manifestar, em favor do BPC/Loas aqui, e em favor até dos programas sociais de governo, agora, como cidadão, é que isso tem que sair daqui até com outro nome - me perdoe -, para não ser programa de governo nenhum. Isso é um projeto de Estado e está claro e cristalino, na linha do tempo, para quem estuda e tudo mais, que vai ser necessário que as populações tenham programa de auxílio mesmo, de complementação de renda e tudo mais.
Desculpem a minha manifestação excessiva, mas eu não podia deixar de ser cidadão aqui também, além de defender a minha questão.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Tudo bem, Edison. Agradeço a sua participação.
Gostaria de convidar também para as considerações finais a representante do Conselho Nacional de Assistência Social, a Eutalia Barbosa.
A SRA. EUTALIA BARBOSA (Para expor.) - Quero agradecer pela oportunidade, mas acho que a gente precisava fazer um debate aqui franco e sincero. Primeiro, pensar transferência de renda é uma responsabilidade societária. Então, muitas vezes a gente fala sem entender o que está falando. Nós precisamos criar programas de transferência de renda porque nós vivemos numa sociedade extremamente desigual, num mundo onde prevalece um sistema econômico que garante privilégios para uns e pobreza e miséria para outros. Então, a gente precisa falar de que modelo econômico e de que modelo de sociedade nós estamos pensando.
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O Governo tem uma responsabilidade, e o CNAS tem a responsabilidade de acompanhar essas políticas geridas pelo Governo, sejam políticas universais - que devem ser universais, políticas públicas universais... mas esse debate transcende o Governo. Inclusive, ele coloca uma responsabilidade para este Parlamento, porque é este Parlamento quem aprova o Orçamento, e a gente sabe muito bem o que foi aprovar um orçamento para garantir mais de 170 bilhões a serem pagos para um programa que nós, aqui, ainda estamos dizendo que não dá conta do que a população precisa, não é?
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. EUTALIA BARBOSA - Exatamente. Isso.
O modo como ele está organizado e a forma... O modo como ele está organizado tem relação, obviamente, com o impacto financeiro que ele traz também. Então, eu penso que esse é um debate que envolve todos nós, esse é um debate mais societário do que institucional ou de governo. Então, eu penso que essa é uma tônica que o Conselho Nacional pensa também, a de que nós estamos lá para defender uma política pública que seja cada vez mais universal e que garanta o atendimento do conjunto da população, que necessita desse direito, e o direito à renda é um direito universal.
Nós vivemos numa sociedade capitalista em que, se você não acessa a renda, você não vive. Então, ele deveria ser inclusive um princípio, e não deveria ser um estranhamento.
Eu gostaria de dizer, principalmente para os Parlamentares e até para os dois expositores que falaram sobre a questão do consignado - não é uma questão pessoal, obviamente -, que os beneficiários do Bolsa Família sofrem um preconceito social muito grave dentro da sociedade, sobretudo as mulheres. Nós ouvimos comentários dos mais pejorativos sobre as famílias que acessam o Bolsa Família. As pessoas acham que as mulheres vão passar a engravidar porque, a partir de agora, vão receber R$150 por criança. É esse modelo de sociedade conservadora que acha que pobre acessar transferência de renda é um favor que o Estado está fazendo e que essas pessoas são cidadãos ou cidadãs de menor direito na sociedade.
Então, acho que, antes de muita coisa, a gente precisava, inclusive, debater concepção, não é? O que nós defendemos? Por que nós estamos defendendo um programa de transferência de renda e por que o Suplicy, desde a década de 80, luta...
O SR. CAPITÃO ALBERTO NETO (PL - AM) - Presidente, só para deixar claro. A senhora se referiu a mim em relação a essa fala dos 150?
A SRA. EUTALIA BARBOSA - Não, é porque a gente estava falando sobre acessar renda, a partir do crédito consignado.
O SR. CAPITÃO ALBERTO NETO (PL - AM) - Porque em nenhum momento eu falei sobre a questão de crianças.
A SRA. EUTALIA BARBOSA - Não, não, não, não.
O SR. CAPITÃO ALBERTO NETO (PL - AM) - É só para deixar claro, porque de repente quem ouviu acha que eu sou contra quem recebe esses 150 reais.
A SRA. EUTALIA BARBOSA - Então eu vou refazer a minha fala.
O SR. CAPITÃO ALBERTO NETO (PL - AM) - Porque em nenhum momento eu falei sobre isso.
A SRA. EUTALIA BARBOSA - Está bem, eu vou refazer a minha fala.
Eu quero dizer que nós estamos falando de acesso à renda, e você fazer um acesso secundário à renda a partir do crédito consignado não é a saída para se combater pobreza, não é a saída para se proteger família em situação de desproteção social pela ausência de renda. Esse é o posicionamento do Conselho Nacional.
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Então acho que a gente precisa... Senão a gente confunde o debate. Eu acho que não é tutelar, mas ao autorizar um benefício de transferência de renda, seja pela pecúnia do BPC ou pelo Bolsa Família, você secundariza uma necessidade, autorizando o acesso ao crédito consignado num país onde os juros ultrapassam 13%. E quando o Governo quer debater ou a sociedade quer debater uma mudança no arcabouço e o mercado fica nervoso, a gente precisa discutir outras coisas. Então, é como se a gente estivesse enxugando gelo.
Nós defendemos transferência de renda como uma alternativa de proteção social, dentro de uma sociedade desigual, de altíssima concentração de renda, em que nós precisamos proteger os que mais precisam.
Nós não podemos misturar o debate do crédito consignado com proteção social. Nós precisamos encontrar outra forma para que as famílias consigam suprir e se proteger, a partir de um acesso à transferência de renda.
É isso que eu quero deixar claro quanto ao posicionamento mais concreto que o Conselho Nacional já tirou mediante a MP.
E, para finalizar, Deputado, eu quero deixar aqui registrado o posicionamento do Conselho Nacional de que, no mês de março, a gente pretende apresentar, não sei se vai dar tempo... (Fora do microfone.)
Aliás, no mês de maio, um posicionamento do Conselho Nacional, sobre alguns pontos da MP, que são absolutamente importantes para nós.
E o Conselho Nacional defende a existência do programa de transferência de renda, com o nome de Bolsa Família, para resgatar o seu histórico de 18 anos de uma alternativa absolutamente importante para a vida da população brasileira que precisa de programa de transferência de renda.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Obrigado, Eutalia Barbosa, pelas contribuições.
Gostaria agora de permitir à representante do Conselho Federal de Serviço Social, Aldaíza.
A SRA. ALDAÍZA SPOSATI (Para expor.) - Pois não, Deputado.
Eu queria dizer que eu gostei muito desta audiência. Não só pelo fato de ela existir em si, mas por um conjunto de discussões que foram levantadas. E, no cruzamento delas, a gente vê que faltam coerências e consistências.
Vamos lá.
Primeiro, definir salário mínimo no Brasil em 1932 foi feito a partir de uma pesquisa do que comiam os lixeiros na cidade de São Paulo - Samuel Lowrie. Porque ele dizia: aquilo que come os que menos ganham é aquilo que deve ser o mínimo, do ponto de vista da existência.
Então, eu acho que, nesse diálogo aqui com a Rede Penssan, isto mostra que nós temos realmente que fazer uma parceria com a Rede Penssan para poder ver o que comem as pessoas que estão na transferência de renda. E são pessoas, são cidadãos, embora não se considere dessa forma nos seus direitos.
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Então, veja, o salário mínimo foi baseado nisso e ainda, na América Latina, é a canastra básica, ou seja, a cesta básica que rege o custo que é, digamos, o mínimo. Nós não usamos nada disso, nós usamos valores que não têm significado nenhum. O que é R$218? O que se compra, por mês, com R$218? A cesta básica estava sendo entregue com 5kg de açúcar e 1kg de arroz. Quer dizer, essa questão da qualidade nutricional é fundamental e isso é condição de vida.
Eu acho que esse é um ponto que... Nós não podemos abraçar um número, ainda que a medida tenha sido escrita, em grande parte, num diálogo com a Fazenda ou com o Tribunal de Contas, mas não pode se usar esse critério. Então, há uma questão orçamentária, sim, mas não é porque o orçamento está limitado que nós vamos precarizar a escola ou que nós vamos precarizar o hospital. Se não serão possíveis tantas escolas o.k., mas elas não poderão ser precarizadas. Nós não podemos ter um raciocínio de precarização porque a luta orçamentária é difícil. Claro, nós temos que ter, realmente, um raciocínio de uma outra justiça tributária, não tenho dúvida nenhuma, mas nós não podemos achar que, entre nós, alguém possa viver com R$142 por mês. Isso é alguma coisa que é afrontosa a qualquer um. O que você compra por mês para comer - não estou dizendo para mais nada - com R$142?
Então, eu acho que essa consistência e coerência são fundamentais. E eu concordo plenamente com os preconceitos, mas os preconceitos exigem também que o Governo não ache que é propaganda pegar o cartão do Bolsa Família e trocar por uma carteira de trabalho. Quem está no Bolsa Família, quem está na transferência, não é porque não trabalha, ninguém vive sem trabalhar, então, não dá para fazer esse raciocínio, entende?
Acho até que a única divergência que eu tenho é que, na verdade, o gatilho do Bolsa Família é para o trabalho, mas o senhor veja, o salário-família, que nós temos estipulado pelo INSS, é de R$57 para o trabalhador que ganha até R$1,7 mil. Qual é a criança que a gente consegue cuidar com R$57?
Então, nós temos essas incoerências, entende? Quer dizer, então, não adianta eu dizer vai para cá, se depois você não tem uma atenção efetiva, uma qualidade. Por quê? Para quem ganha menos não tem peso financeiro? Claro, a mercadoria tem o mesmo custo. Nós temos que, então, criar nisso acessos que sejam de um outro valor, mas não no mesmo valor de mercado.
Eu queria só insistir, nós temos que parar de falar que Bolsa Família é um programa, não é! Não é um programa, é um direito de cidadania. Nós temos que aprender a falar de um outro jeito. Não dá mais para continuar porque programa foi dito: muda? Muda!
Veja o que, na verdade, nós temos na população. A população quer ter certeza, porque as pessoas que fazem as perguntas aqui estão dizendo: "Eu cheguei lá para retirar o benefício e não tinha nada". Eles não têm certeza, isso pode estar ou não estar de um dia para o outro. Isso não é proteção social, proteção social significa contar com, ter certeza de. E eu me sinto protegido, porque proteção é de fora para cá, não é de mim mesmo; proteção não é o suor do rosto, proteção é vir de fora para dentro.
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Então, eu acho, Deputado, que é fundamental a gente usar os termos com os seus significados. Não adianta enfeitar de um lado e enfeiar do outro. Eu penso que foi muito importante. Embora a medida tenha que ser resolvida em curtíssimo tempo, não creio nem que haja tempo para que o CNAS se pronuncie, porque o tempo é curtíssimo. E eu queria pleitear que, por favor, o CNAS incluísse na sua discussão também família extensa. O Estado não tem o direito de dizer que quem está sob o mesmo teto tudo que ganhar tem que ser dividido por todos. Isso não é competência do Estado. Isso é uma invasão. Quer dizer, as pessoas, mesmo sob o mesmo teto, elas não têm que dividir o que ganham. Não é um cofrinho para que cada um ponha a sua moedinha. Então, existem conceitos que são conceitos que não se usam para outros segmentos de classe, mas se usa para a população que menos tem, porque ela deveria ser solidária, ela deveria ser diferente, sendo que ela, para viver o cotidiano, é muito difícil.
Desculpem aqui alguns desabafos, mas eu lido com isso há muitos anos, pesquiso e estudo. Nós temos toda a condição para ir adiante.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Quero agradecer à Profa. Aldaíza a sua participação.
Convido o Jefferson Nascimento, Coordenador de Justiça Social e Econômica da Oxfam, para as suas considerações finais.
O SR. JEFFERSON NASCIMENTO (Para expor.) - Muito obrigado, Presidente.
Vou ser breve, porque vários pontos já foram tratados. Mas, fazendo uma menção direta à fala que me antecedeu, à excelente fala que me antecedeu, da importância de tratar o Bolsa Família, tratar o programa de transferência de renda não como um programa, mas como um direito. Mais uma vez, lembro um número que eu trouxe: 95% da população apoia que haja programa de transferência de renda. Todo mundo que atenda aos critérios tem que ter acesso ao programa de transferência de renda. Há um amplo apoio das pessoas, independente... Não tem polarização política, é um amplo apoio. Então, as condições estão dadas para que isso aconteça.
E aí eu trago um outro elemento, tentando ser muito breve, ao que foi mencionado aqui. Além dos elementos próprios do texto da MP, acho que tem uma questão anterior, uma questão que foi tratada aqui, que é a questão orçamentária. Então, há diversos elementos, aspectos relacionados, por exemplo, à própria fila, que estão atrelados a esse debate orçamentário, que é um debate que está acontecendo neste Congresso, que é um debate que vai acontecer com relação ao PPA Participativo, é um debate que se iniciou com relação ao novo marco fiscal. É importante que esses debates estejam conjugados e é importante também conjugar com outro debate importante que acontece neste Congresso nesse momento, que é o debate relacionado à reforma tributária.
Semana passada, eu tive oportunidade de estar na audiência no GT de Reforma Tributária e o debate que se faz naquele espaço é justamente de que há um limite para o que se pode fazer com relação à redução de desigualdade via receita. Então, óbvio, é importante que o sistema tributário se torne mais progressivo. Estamos trabalhando para isso, mas no limite...
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Aqueles atores falam: "não, tudo bem, mas não dá para fazer redução de desigualdade somente pela receita. Há um limite do que você consegue fazer aí." Uma parte importante é feita pelo gasto. Então vamos tornar o sistema tributário mais simples para você poder ter uma arrecadação maior, poder ter uma receita maior e o próprio marco fiscal novo é baseado no aumento da receita. Perfeito.
E aqui estamos falando justamente do gasto, desse investimento social. Então a gente não pode fazer o debate pela metade. Do debate que eles trazem de lá, eles falam: "não, a gente vai tratar isso em outro momento". Se redução de desigualdade é via gasto; a gente está falando aqui de gasto. Então falar de gasto e conjugar com esse debate importante que a gente está fazendo é começar a tratar o programa de transferência de renda, o Bolsa Família, como direito. E que base tem isso? Base nesses estudos, base nesse amplo apoio popular que a gente tem com esse tema. Então, conjugar esses debates.
É muito importante que a gente não trate as coisas atomizadas. Não trate o debate a respeito da redução de desigualdade via gasto e perca a oportunidade que a gente está fazendo aqui. Vamos continuar fazendo um aprimoramento do programa do Bolsa Família e trabalharemos também em conjugação com esse dado.
Acho que uma coisa importante que foi mencionada, por exemplo: a cesta básica. O debate que está sendo feito justamente com relação à reforma tributária é tirar todos os incentivos tributários a itens da cesta básica. Então como que a gente vai fazer esse debate a respeito de combate à pobreza, combate à fome, se uma parte do debate lá está sendo feito nesses termos?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. JEFFERSON NASCIMENTO - Exatamente. A gente tem que fazer as coisas de forma conjugada. Então é só, enfim, para também não passar muito do meu tempo. E outra vez agradeço esta oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Quero agradecer aqui ao Jefferson e, para finalizar os oradores, permitir ao nosso sempre Senador Eduardo Suplicy, Deputado Estadual pelo Estado de São Paulo, fazer as suas considerações finais.
O SR. EDUARDO MATARAZZO SUPLICY (Para expor.) - Muito obrigado, Presidente e Relator, Dr. Francisco.
Primeiro, quero cumprimentá-los por estarem realizando esta audiência pública sobre a medida provisória que leva em consideração, primeiro, o estágio do que vai ser o Bolsa Família.
O Presidente Bolsonaro tinha extinto o Bolsa Família, mas esta medida provisória reinstitui o Bolsa Família e acaba com o Auxílio Brasil, o que acredito que possa ser aperfeiçoado. E o que eu tinha me proposto a aqui fazer é: por que a renda básica de cidadania universal e incondicional será ainda melhor do que o Bolsa Família, que tantos benefícios trouxe para o Brasil, e para a resolução de seus principais problemas sociais, como o da desigualdade, da erradicação da pobreza?
A renda básica de cidadania tem algumas vantagens sobre os processos de transferência de renda com condicionalidades, seja a do nível de renda a partir do qual as pessoas venham a ter o seu benefício, seja por condicionalidades relacionadas à educação, à saúde ou outros.
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Primeiro, eliminamos, totalmente, qualquer burocracia envolvida em se ter que saber quanto cada pessoa ganha no mercado formal, na carteira de trabalho assinada ou em qualquer atividade que se faça. Se uma mãe toma conta das crianças da vizinha e recebe um trocado no dia seguinte, não precisa declarar. Eliminamos qualquer estigma ou sentimento de vergonha da pessoa precisar dizer: "Olha, eu só recebo tanto, por isso, mereço tal complemento de renda".
Eliminamos também o fenômeno da dependência, que acontece quando se tem um sistema que diz que quem não recebe até certo patamar tem o direito de receber tal complemento. A pessoa está por decidir: "Vou ou não iniciar essa atividade que vai me render tanto, mas se eu iniciá-la e receber esse tanto, aí vem o Governo e me retira o que eu estava recebendo naquele programa". Eu talvez desisto e entro na armadilha da pobreza ou do desemprego...
Mas se todos iniciarmos da renda básica em diante, sempre haverá o estímulo ao progresso? Será mesmo? Será que não vamos estimular a ociosidade? O que é que vamos fazer com aquelas pessoas que tenham eventual tendência à vagabundagem? Será mesmo?
Pensemos um pouco em nós, seres humanos. Todos nós amamos realizar uma série de atividades, mesmo sem qualquer remuneração no mercado: as mães, quando estão amamentando seus nenês, a qualquer hora do dia, da noite ou da madrugada, com todo o carinho e amor; nós, pais e mães, da mesma forma, com nossas crianças e adolescentes; nas igrejas de todas as denominações; nas associações de bairros; nos centros e diretórios acadêmicos; quantos de nós realizamos uma série de atividades porque nos sentimos úteis perante a comunidade?
A Constituição brasileira assegura o direito à propriedade privada, o que significa que aquela pessoa que detém a propriedade de uma fábrica, de uma fazenda, de um banco, de títulos financeiros, de propriedades imobiliárias, de hotéis e restaurantes, essa pessoa tem o direito de receber os rendimentos do capital, na forma de lucro, juros, aluguéis, e eu lhes pergunto: por acaso, para receber tais rendimentos, esta pessoa precisa, necessariamente, comprovar que esteja trabalhando e que suas crianças e adolescentes estejam indo à escola? Não.
Então, se asseguramos aos mais ricos o direito de todos participarem da riqueza daquelas formas de propriedade do capital sem aquelas exigências, por que não estendermos a todos - ricos e pobres - o direito de todos partilharmos da riqueza comum de nossa nação como um direito à cidadania?
Ainda mais, quando pensamos em certos aspectos da nossa história, o fato de que, por mais de três séculos, milhões de pessoas foram arrancadas de sua terra natal, na África, para vir ao Brasil ajudar no enriquecimento de tantas famílias, sem que lhes fosse dado qualquer remuneração que não fosse viver em uma senzala e receber uma alimentação, o que fazia com que os escravos tivessem uma expectativa de vida pouco superior a 30 anos de idade.
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Mas qual é a principal vantagem da renda básica de cidadania universal, para todos? "Mas como assim? Até os mais ricos também vão receber?". Sim. Para nós todos, Parlamentares também. Obviamente, os que temos mais vamos colaborar para que nós próprios e todos os demais venham a receber.
Qual a principal vantagem?
É do ponto de vista da dignidade e da liberdade do ser humano, de que nos fala, por exemplo, o grande Prêmio Nobel de Economia Amartya Sen, hoje na Universidade de Harvard, que diz, em Desenvolvimento como Liberdade, que desenvolvimento para valer precisa significar maior grau de liberdade para todos na sociedade. E ele exemplifica com o que aconteceu quando ele tinha dez anos de idade.
Morava em Daca, hoje capital de Bangladesh, mas era a Índia. Seu pai era um bom professor, e moravam numa boa casa. E eis que, certo dia, ele, brincando no jardim da sua casa, de repente, entrou um homem gritando por socorro, Kader Mia, esfaqueado nas costas. Ele, então, chamou por seu pai, que logo veio, e acompanhou seu pai levando aquele homem para o hospital.
No caminho, esse homem disse "bem que minha mulher tinha me avisado para não vir a esse lugar tão perigoso, caracterizado por lutas étnicas, mas eu não tive outra alternativa senão aqui, nesse bairro, encontrar um trabalho que pudesse dar o sustento da minha família".
Mas, ao chegar no hospital, Kader Mia teve uma forte hemorragia e veio a falecer.
Conclui Amartya Sen: Kader Mia não tinha liberdade real. Na verdade, precisou colocar a sua saúde e vida em risco para conseguir o sustento da sua família.
Ora, para aquela mãe, às vezes em Teresina ou em São Paulo, no Parque da Luz, por exemplo...
Certo dia, uma freira de uma ordem italiana, de origem italiana, que cuida sobretudo das prostitutas, veio ao meu gabinete. Eu resolvi ir até lá na Casa de Chá do Parque da Luz conversar com aquelas mulheres, e eu citei este caso: se houvesse a possibilidade de essa mãe, com a renda básica, sustentar a si e todos membros da sua família, aquele rapaz que, às vezes, não tendo alternativa para auxiliar no orçamento da sua família, resolveria se tornar o aviãozinho da quadrilha de narcotraficantes, personagem dos Racionais MC's, do meu amigo Mano Brown?
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Um homem na estrada recomeça sua vida
Sua [...] [dignidade], a sua liberdade
Que foi perdida, subtraída
E quer provar a si mesmo que realmente mudou
Que se recuperou e quer viver em paz
[...]
[E] Dizer ao crime "nunca mais!"
O dia em que houver para si e para cada membro da família uma renda suficiente para atender às suas necessidades vitais, essa pessoa vai ganhar o direito de dizer: "Não, agora eu não preciso aceitar essa única alternativa que me surge pela frente. Eu, agora, quem sabe, posso fazer um curso aqui na minha cidade, numa instituição, com o Prof. Edison João Costa ou com a Profa. Eutália Barbosa, até que surja uma oportunidade mais de acordo com a minha vocação, com a minha vontade".
É nesse sentido, pois, que a renda básica de cidadania vai elevar o grau de dignidade e liberdade real para todos, e é por isso que eu acredito tanto nessa proposta e acho que depende muito agora do Dr. Francisco e de todos vocês. Que bom, Eutália, que você, que representa as entidades de assistência social, diz que está inteiramente aberta para caminharmos na direção da renda básica universal.
Você sabe, uma das maiores personalidades hoje no mundo, quem sabe o chefe de Estado que o Dr. Francisco mais admire - eu tenho essa admiração por ele -, o Papa Francisco, no seu último livro, Vamos sonhar juntos, diz que agora está na hora de nós implementarmos a renda básica universal, para que se possa propiciar a cada pessoa maior liberdade de poder escolher a sua atividade de trabalho sem se sujeitar necessariamente a condições que fazem lembrar a escravidão.
São muitos os que estão, não apenas Elon Musk, mas também o Mark Zuckerberg, Presidente do Facebook... O Barack Obama, na homenagem prestada por ele a Nelson Mandela perante um estádio de Joanesburgo lotado, em 2017, disse algo muito semelhante: que agora, com a velocidade do progresso da inteligência artificial, com o número crescente de robôs, com os automóveis que começarão a ser guiados sem motoristas e tal, mais e mais nós vamos ter que pensar em alternativas como a renda básica universal. E o Papa Francisco conclama todos os chefes de Estado, todas as nações a colocarem em prática aqueles instrumentos de política econômica que possam elevar o grau de justiça na sociedade, para que, então, possa haver a paz dentro de cada país e dentre os países.
Lá na Rússia e na Ucrânia, eu acredito que, o dia em que houver uma renda básica universal ali, para toda aquela região da Europa, a probabilidade de haver guerras a que a todo dia estamos assistindo, destruindo edifícios, pontes, usinas, matando pessoas...
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É uma coisa que não podemos mais admitir. Como o bom senso indica, precisamos fazer o quê? Que bom que o Presidente Lula... Eu hoje, quando visitei o Vice-Presidente e Presidente em exercício, Geraldo Alckmin, eu até falei: "Que bom que Lula e Alckmin estão até pensando em como ajudar a acabar com aquela guerra!".
Um dos maiores problemas que temos aqui, nas três Américas, é o número tão significativo de pessoas que estão atravessando a fronteira lá entre os Estados Unidos e o México. O dia em que houver, do Canadá até a Argentina, lá do Alasca até a Patagônia, uma renda básica de cidadania, nós iremos mudar o estado de coisas e ficaremos muito mais próximos da paz.
Edison João Costa, posso lhe perguntar: você já esteve no local onde se paga uma renda básica para todas as pessoas e sabe quais são os seus efeitos após 40 anos de experiência? Já esteve lá?
O SR. EDISON JOÃO COSTA (Fora do microfone.) - Não, nunca estive num lugar onde se paga renda básica para todos.
O SR. EDUARDO MATARAZZO SUPLICY - Mas conhece todo o procedimento?
O SR. EDISON JOÃO COSTA (Fora do microfone.) - Sim, conheço, claro!
O SR. EDUARDO MATARAZZO SUPLICY - Você também conhece?
O SR. EDISON JOÃO COSTA (Fora do microfone.) - Aqui no Brasil, sim.
O SR. EDUARDO MATARAZZO SUPLICY - Não, aqui no Brasil, em Maricá, está começando. Até o final do ano que vem, todos os habitantes que estejam lá há três anos ou mais estarão recebendo a renda básica paga em mumbucas.
Posso contar para concluir?
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Só para concluir, porque aqui tanto eu quanto o Deputado estamos sendo chamados ao Plenário.
O SR. EDUARDO MATARAZZO SUPLICY - Está bem.
No início dos anos 60, o prefeito de pequena vila de pescadores, como tantas existem no Brasil, observou que de lá saía grande riqueza sob a forma de pesca, mas boa parte da população continuava pobre. Ele, então, disse: "Vamos criar um imposto de 3% sobre o valor da pesca para instituir um fundo que a todos pertencerá". Mas o imposto encontrou enorme resistência, demorou cinco anos para persuadir a comunidade. Uma vez instituída, deu tão certo que, dez anos depois, ele foi eleito Governador do Estado do Alasca, que descobrira uma enorme reserva petrolífera na Baía de Prudhoe, ao norte do Alasca. Ele, então, disse aos seus então 300 mil habitantes, hoje 732 mil: "Nós precisamos pensar não apenas na geração presente, mas na vindoura, porque o petróleo não é renovável. Então, vamos separar pelo menos 25% dos royalties decorrentes da exploração dos recursos naturais para instituir um fundo que a todos pertencerá". Ele quis que todos debatessem e votassem: 76 mil disseram sim; 38 mil, não - 2 para 1. Venceu. Aqueles recursos passaram, então, a ser investidos em títulos de renda fixa, ações de empresa do Alasca, contribuindo para diversificar a sua economia dos Estados Unidos internacionais, inclusive de mais de 200 empresas brasileiras - podem ver no Alaska Permanent Fund site - e empreendimentos imobiliários.
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E o fundo passou de US$1 bilhão, no início dos anos 1980, para hoje US$78 bilhões. Cada pessoa que tivesse realizado o seguinte procedimento. Vamos supor que a Sra. Eutália Barbosa estivesse residindo no Alasca há um ano ou mais; ela preencheria um formulário: "Sou Eutália Barbosa, vivo neste endereço, viajei no ano passado, mas estou aqui de volta". Responde por suas crianças até 18 anos, por elas recebe igual para todos. "Trabalho em tal instituição". Não precisa dizer qual a sua remuneração nem o patrimônio acumulado. Duas pessoas que lhe conhecem dão o testemunho de se a declaração é verdadeira.
Se assim ela tivesse procedido, residindo no Alasca, teria recebido nos primeiros anos US$300, depois US$400, US$500. Em outubro do ano passado, US$3.284 por pessoa. Uma família pai, mãe e quatro crianças mais de US$13 mil por ano. E qual foi a consequência? Alasca, 1980, o mais desigual dos 50 estados norte-americanos; hoje, Alasca, o mais igualitário, com o coeficiente de Gini de 0,42 e constitui suicídio político para qualquer liderança propor o fim desse sistema.
Eu acredito muito. Só quero lhe dizer aqui que estou pedindo a Deus para que me dê boa saúde porque eu gostaria de ver ainda, durante a minha vida e nesses quatro anos do Presidente Lula, a implantação da renda básica de cidadania. O Papa Francisco vai ficar muito feliz.
Muito obrigado a todos. Parabéns a vocês todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Dr. Francisco. PT - PI) - Agradeço, na oportunidade, a participação de todos; de modo muito especial, aqui ao nosso sempre Senador Eduardo Suplicy. Sabemos aqui da sua vida dedicada a estudar, pesquisar sobre a renda básica, conhecer, visitar várias experiências internacionais, alguns municípios que já estão trabalhando nessa linha. A gente fica feliz com as suas contribuições e de todos que aqui participaram.
Agradecer também ao Deputado Capitão Alberto, que pôde ficar aqui até o final. Está todo mundo com a agenda muito extensa. O nosso Presidente da Comissão, Senador Fabiano Contarato, esteve aqui no início, mas teve que sair porque também outras agendas. Assim como o nosso Vice-Presidente, o Deputado Dorinaldo, e outros Deputados que aqui participaram, mas agradeço aqui as contribuições de todos.
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Acho que o debate foi muito bom, enriquecedor. Acho que ajuda, e muito, a nos direcionar sobre a finalização, o trabalho que teremos após outras audiências que ainda vamos ter aqui, tratando da Medida Provisória 1.164, para que cheguemos ao relatório final.
Acho que todas as contribuições foram muito pertinentes, embora saibamos que a discussão sobre a renda básica pode ter já alguns gatilhos, alguma coisa na medida provisória que já possa direcionar nesse sentido, mas precisamos, naturalmente, aperfeiçoar esse trabalho, porque como todos aqui entendem, existem várias outras variáveis também que precisam ser discutidas. O marco fiscal, que já está colocado, a discussão, que também em breve chegará aqui, sobre a reforma tributária.
E que a gente possa aperfeiçoar, já no PPA, nos outros instrumentos orçamentários, para que a gente consiga caminhar, buscando realmente algo que já é constitucional, que já tem lei. Não dá também para o Parlamento se esquivar de que não tem que discutir esse conteúdo, trabalhar naturalmente a sua regulamentação, não é? Então, parte poderá já, através da Medida Provisória 1.164, ter algumas sinalizações, alguns gatilhos que possam fazer.
Vejo que esse debate estimula a muitos, vejo aqui o entusiasmo do Vice-Presidente, que saiu, já procurando saber como está a discussão sobre a frente que trata, que cuida da renda básica, como também está buscando essa temática.
Eu acho se que precisa realmente de um grupo de trabalho aqui, também da Câmara, do Senado, que possa realmente aperfeiçoar, e a gente avançar nessa direção.
Mas para finalizar, agradeço realmente a presença de todos aqui que participaram, que se deslocaram. E também, não havendo mais nada a tratar, declaro encerrada esta audiência pública. Muito obrigado. (Palmas.)
(Iniciada às 14 horas e 57 minutos, a reunião é encerrada às 17 horas e 29 minutos.)