Notas Taquigráficas
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| R | A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Fala da Presidência. Por videoconferência.) - Bom dia a todos e a todas presentes na nossa videoconferência, como também a todos os que nos assistem pela TV Senado e pelo e-Cidadania. Havendo número regimental, declaro aberta a 16ª Reunião da Comissão de Educação, Cultura e Esporte da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura, que se realiza nesta data, 5 de maio. Agradeço ao Presidente Flávio Arns a oportunidade de presidir e coordenar esta reunião. Esta reunião é a terceira de um ciclo de debates sobre violência nas escolas. A presente reunião, destina-se, portanto, à realização de audiência pública com o objetivo de debater propostas de melhoria da segurança escolar e de prevenção a ataques contra instituições de ensino à luz do exame do Projeto de Lei 2.257, de 2019, que altera a Lei 9.394, que é a LDB, para dispor sobre normas gerais de segurança escolar. Essas audiências servem para instruir esse projeto, que é de autoria do Senador Wellington Fagundes. Esse requerimento, além de mim, tem autoria conjunta dos Senadores Flávio Arns, Magno Malta, Damares Alves, Paulo Paim, Esperidião Amin, Astronauta Marcos Pontes e Wellington Fagundes. |
| R | Nós vamos proceder da seguinte maneira: vamos ouvir os nossos convidados e convidadas, que já estão todos, creio, na tela. Antes de passar a palavra, pela ordem, a cada um deles, que são seis, eu comunico que esta reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados e das interessadas por meio do Portal e-Cidadania na internet, no endereço senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800 061 2211. O relatório completo, com todas as manifestações, estará disponível no nosso portal, assim como algumas apresentações que porventura sejam utilizadas pelos expositores. Queria pactuar com os senhores e as senhoras um tempo de dez minutos. Depois, a gente passa para as inscrições e, na devolutiva, os senhores e as senhoras terão mais cinco minutos. Pode ser assim? Então, já agradecendo a presença de todos e todas, pela ordem, eu passo a palavra para a Sra. Kátia Maria Barreto Souto, Coordenadora-Geral de Equidade e Determinantes Sociais em Saúde do Ministério da Saúde. Agradecendo a sua presença, passo a palavra para a sua exposição de dez minutos. A SRA. KÁTIA MARIA BARRETO SOUTO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todas, "todes" e todos. Agradeço o convite, Senadora. É uma honra estar aqui e poder contribuir com este debate que tanto nos inquieta, digamos assim, a sociedade brasileira, o nosso Governo e, com certeza, o Poder Legislativo - eu aqui expresso hoje nos Senadores e Senadoras. Eu trouxe assim, para a gente poder refletir e conversar, porque esse é um tema que, vamos dizer assim, já está há algum tempo no nosso radar da saúde... Nós temos o Programa Saúde na Escola. É um programa intersetorial. É um programa que nasceu em 2003, no primeiro Governo do Presidente Lula, cuja semente era o Saúde e Prevenção nas Escolas, lançado, inclusive, na época do então Ministro da Saúde Humberto Costa, hoje Senador, e também pelo Cristovam Buarque, Ministro da Educação na época, que também já foi Senador. Então a gente tem, assim, pessoas que tiveram uma trajetória que inclusive foram ou são membros desta Casa Legislativa. O que a gente já tinha naquele período era o grande desafio de trabalhar. E em 2007, o Presidente Lula, na sua segunda gestão, fez um decreto presidencial, instituindo esse Programa Saúde na Escola, com essa articulação entre os dois ministérios: o Ministério da Saúde e o Ministério da Educação. Desde então a gente procurou institucionalizá-lo. E grande parte desse programa se baseia também em estudos e evidências que nos trazem. Nós já tínhamos, naquela época, parcerias como a Unesco, o Unicef, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, a Pastoral da Criança; parceiros importantes fazendo a compreensão não apenas dessas temáticas, mas do ambiente escolar, para promovermos debates temáticos que seriam importantes pensando saúde na lógica que vem desde a Alma-Ata, de 1978, da conferência, e que passa também pelas grandes diretrizes da nossa 8ª Conferência Nacional de Saúde, que é entender saúde como qualidade de vida e que, intersetorialmente, saúde não é só tratamento, saúde também é a cultura de paz, saúde também é emprego, saúde é moradia, saúde é educação. |
| R | Então, por essa compreensão, esse programa instituiu como ações temáticas a serem debatidas não apenas as temáticas da saúde, diríamos assim - a saúde bucal, a saúde ocular, a prevenção das ISTs -, mas também temos a promoção da cultura e da paz e a prevenção de violências e acidentes. Esses dois temas também foram temas desenvolvidos ao longo desse período por esse programa. Teve um certo silenciamento nos últimos quatro anos, mas a gente retoma, neste momento, com esses parceiros, a rearticulação dessas temáticas que tão caras são para nós neste momento de se promover uma cultura de paz dentro das escolas. A Unesco, por exemplo, nos apresenta que está intrinsecamente, vamos dizer assim, ligado a pensar a prevenção, a resolução da não violência, de não conflitos a gente trazer princípios fundamentais como solidariedade, respeito à vida, respeito aos direitos individuais, aos direitos humanos, às diferenças. E hoje, quando a gente pensa em violência nas escolas, ela não se dá apenas do campo externo para o campo interno. Nós temos, infelizmente, uma cultura que acabou promovendo o que hoje é mais conhecido, e tem estudos que já apontam isso, de diferentes pesquisadores, como bullying nas escolas, que vai desde, por exemplo, a questão da obesidade, que é um dos nossos temas - alimentação saudável e prevenção da obesidade -, porque, pelos indicadores tanto para criança quanto para adolescente, uma vida sedentária e muitas vezes na frente das telas tem promovido uma obesidade que nos preocupa, enquanto saúde pública, nas nossas crianças e adolescentes. Mas elas sofrem não só essa questão, elas sofrem o bullying da gordofobia, principalmente na adolescência. As crianças com deficiência, seja essa uma deficiência física ou mental, também sofrem bullying. As crianças que, diríamos assim, têm uma outra diferença, seja no campo da orientação sexual, seja no campo da sua identidade de gênero, então essas sofrem bullying que muitas vezes as levam a saírem das escolas. Eu costumo dizer que elas são expulsas pela discriminação e pelo preconceito, pela violência invisibilizada da intolerância à sua condição de gênero, à sua condição de orientação sexual. Colocamos aí uma outra discriminação, uma violência que tem sido também grande no ambiente, que é o racismo. Então nós temos, infelizmente, várias expressões do racismo nos nossos ambientes escolares e nós precisamos também enfrentar. Então, acho que a violência passa não apenas pela chamada violência da arma ou da violência externa chegando às nossas escolas. Chocam-nos, com certeza, tragédias como a de Blumenau e outras, não tenho dúvida disso, mas nós precisamos pensar para além desse lugar. Nós precisamos pensar a violência para a gente trabalhar na perspectiva de uma cultura de paz, de promoção de valores, de retomada de valores da solidariedade, de valores humanos, em que a gente possa desenvolver ações educativas na comunidade escolar. |
| R | A escola não é uma redoma que está bloqueada por aquilo que a sociedade organiza lá. Se nós temos uma cultura de ódio dentro da sociedade, ela vai ser refletida no ambiente escolar. Se nós temos um processo de questionamento de valores ou de desvalorização, por exemplo, das mulheres, das pessoas negras, ele vai se repercutir dentro do ambiente escolar. Nós temos um feminicídio que cresceu mais de 50% no nosso país nos últimos seis anos. Nós temos um genocídio da juventude negra no nosso país. Isso repercute dentro da escola, no ambiente. Isso cria o que eu chamo do simbólico cultural. Mas, ao mesmo tempo que essas vulnerabilidades se expressam no ambiente escolar, é nesse mesmo ambiente escolar que nós temos a possibilidade da transformação e da construção de uma nova cultura, de uma cultura de paz. E aí acho que a gente tem que beber na fonte do nosso grande educador Paulo Freire, que nos traz a reflexão de que esse caminhar se faz caminhando e, ao mesmo tempo que ele faz, ele também reconhece e coloca entre os seus ensinamentos que nós somos eternos aprendizes. É uma troca. A educação não vai por si só transformar, mas ela transforma mentes e corações e, por isso, ela transforma a possibilidade de nós transformarmos uma sociedade. Então, há uma correlação de reconhecer a sociedade que nós temos e questionar. E o ambiente escolar faz isso. Todos nós aqui ainda somos eternos aprendizes. Então, para concluir, eu queria trazer que a cultura de paz nas escolas e na sociedade nada mais é do que o ensino da vida democrática; nada mais é do que o ensino de nós vivenciarmos no dia a dia a democracia, o resgate da ética, o resgate da igualdade, o resgate dos direitos humanos, da cidadania, do respeito às diferenças, da resolução pacífica das divergências e dos conflitos, da construção de um ambiente sustentável, saudável, onde a liberdade de expressão tenha, vamos dizer assim, como linhas orientadoras, o respeito ao outro, a empatia, o reconhecimento das diferenças e a construção de um ambiente democrático, onde os estudantes, os educadores e todos os trabalhadores daquele ambiente, da saúde, da educação e da sociedade, os seus responsáveis, pais e mães, tenham de fato um ambiente expresso de democracia, de um debate construído que se faz dentro da sociedade. Eu não tenho dúvida nenhuma - para concluir - de que, quanto mais nós avançarmos nos pilares da nossa democracia, e eu digo não só da democracia representativa, mas da democracia participativa, do direito à participação social nesses ambientes, entre eles no ambiente escolar, mais nós vamos de fato construir um ambiente de congruência. É isso, para a gente começar o debate. Agradeço a oportunidade. |
| R | A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Dra. Kátia, Profa. Kátia, por essa explanação tão bonita. Aqui em Pernambuco, nós vivenciamos o Saúde e Prevenção nas Escolas. Terminei me envolvendo, porque era Presidente da Comissão de Educação aqui na Assembleia Legislativa, no período em que fui Deputada Estadual, e foi realmente muito exitoso. Eu espero que ele volte. Então, passo a palavra, agora, para a Profa. Catarina de Almeida Santos, Professora da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília. Em seguida, pela ordem, será a Sra. Paula Fontana Fonseca. Profa. Catarina, muito obrigada pela presença, dez minutos. A SRA. CATARINA DE ALMEIDA SANTOS (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, Senadora Teresa Leitão! Bom dia a todas as pessoas que nos acompanham; à Profa. Kátia, que me antecedeu; e a todas as demais e os demais companheiros ou parceiros de atividade aqui! Queria muito agradecer o convite. Esse é um debate extremamente necessário que façamos nas nossas Casas Legislativas; não só no Parlamento federal, mas também nas demais Casas Legislativas e que esse debate se expanda para todos os outros espaços da sociedade também - não é? -, porque eu acho que é extremamente relevante. A gente já produziu o relatório para o Governo de Transição, falando dessa questão. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação produziu um guia também pensando nessas questões. O Ministério da Educação já produziu cartilha falando dessas questões para um ambiente escolar seguro. E, até pensando na exposição que a Profa. Kátia fez aqui, antes de mim, eu queria que a gente pensasse, inclusive, no que a gente está propondo, no que está sendo proposto nesse projeto. E, pensando muito na escola, trazendo aqui um debate que o Prof. António Nóvoa faz muito que é pensar a escola como um espaço público comum em que as diferenças se encontram, é nas diferenças que a gente se educa, é nas diferenças que a gente se constitui, se constrói, pensando, inclusive, no que diz o art. 205 da nossa Constituição. E a escola é esse espaço não para que a gente se feche no que já somos, mas para aprendermos o que ainda não somos e a importância dessa relação das diferenças no ambiente escolar. E, quando a gente faz o debate sobre essa questão do ambiente escolar seguro, pensando especialmente no PL e em quando o PL propõe inserir como princípio da educação nacional a questão da garantia da segurança escolar, pensando, inclusive, em tudo que a Profa. Kátia já trouxe aqui, é bom nos perguntarmos: é necessário inserir, fazer essa alteração na Lei de Diretrizes e Bases, ou, se nós implementarmos os princípios já estabelecidos na lei, se nós garantirmos as condições para que a escola seja realmente esse espaço de combate às violências e de garantia ou construção da cultura da paz, que refletem na escola, as violências que se produzem fora dela também, e aí a gente falar da importância de que a escola tenha as condições, tenha a liberdade de ensinar e aprender, o que é um princípio da nossa Constituição... E ensinar e aprender nas diferenças, na adversidade, esse é um elemento fundamental para que a gente garanta... Quando a gente está falando das violências nas escolas - violência contra as escolas, violência no interior da escola -, tem a ver também com os ataques que a escola sofre, as perseguições que a escola e os seus professores e professoras sofrem quando tentam trabalhar os temas afetos à diversidade, os temas que constituem a diversidade. |
| R | Então, a gente precisa se perguntar: precisamos alterar a Lei de Diretrizes e Bases nesse sentido ou precisamos garantir condições para que a escola e a sociedade encarem esses elementos, trabalhem essas questões e possam seguir adiante? Essa é uma questão muito importante para a gente entender o que está trazendo aqui. É importante, inclusive, pensar, neste momento em que cada vez mais se discute o encarceramento das instituições educativas, o encarceramento da população brasileira, a questão do armamento: o que significa um ambiente escolar seguro? Porque a gente coloca o ambiente escolar seguro como princípio, mas o que é isso? Se a gente vai para a proposição de alteração no art. 4º, que é essa questão do ambiente escolar seguro, a gente precisa definir o que é isso. Hoje, no debate da questão da segurança nas escolas, fala-se muito em colocar segurança armada nas escolas, em colocar artefatos de identificação facial, catracas eletrônicas, aumentar muros. Isso é segurança ou isso diz que nós estamos com as nossas escolas ameaçadas e que transformar os espaços escolares nesses ambientes cerceados, nesses ambientes encarcerados tornará a escola não um espaço de construção da cultura da paz, mas um espaço de produção de mais violência, porque essa escola estará sempre sob tensão? A escola, para construir a cultura da paz, não precisa ser uma escola com outra infraestrutura, com outras possibilidades de construir? Os ministérios públicos, os tribunais de contas publicizaram dados, na semana passada, que são dados com que nós brigamos a vida inteira - inclusive, por isso debatemos tanto a questão do Custo Aluno Qualidade, não é Senadora? -, que dizem que as estruturas das nossas escolas são estruturas que não podem ser chamadas de escola, porque elas não oferecem estrutura. Aí a gente está falando de ambiente seguro, escola segura... O que a gente está chamando de ambiente seguro e de escola segura? Quando nós vamos... A alteração do art. 12, proposto no PL, vai falar de implementar regras gerais de segurança escolar. Novamente nos preocupa muito pensar: de que estamos tratando sobre essas regras gerais de segurança escolar? O nosso imaginário, quando se fala de segurança, está muito vinculado à área de segurança, que, para a maior parte da população brasileira, significa violência. Então, esse ambiente escolar seguro é o quê? A gente não deveria aqui estar pensando em como garantir ambientes com condições para que profissionais da educação, para que outros profissionais das outras áreas, como assistência social, como psicologia, pudessem desenvolver projetos para identificar os adoecimentos, as violações, os comportamentos? Não só para identificar, mas para evitar que esse adoecimento acontecesse nos nossos espaços escolares ou em qualquer espaço da sociedade, mas aqui pensando as instituições educativas. Então, nos preocupam muito esses processos. Quando a gente olha o art. 86-A do PL, aí a gente começa a ficar mais preocupada ainda, porque, quando se fala de controle de entrada e de saída... As nossas escolas fazem controle de entrada e saída. Aliás, um dos elementos é que nós temos figuras públicas e Parlamentares que acham que podem adentrar a escola e fazer as piores coisas: filmar professores, denunciar coisas que a escola está fazendo, que deveria fazer ou que, na sua perspectiva não podem fazer, mas as nossas escolas e os nossos profissionais têm muita responsabilidade com quem entra e com quem sai da escola. E aqui o que se fala é: por meio de recursos tecnológicos. O que é isso? O que são esses recursos tecnológicos a serem utilizados? |
| R | Outro ponto: desenvolvimento de instruções e procedimentos sobre segurança voltados para toda a comunidade escolar. A gente está vendo aí uma onda de querer treinar professores para isso, treinar alunos para fuga. Então, são as propostas mais "incondizentes" possíveis com aquilo que se espera que seja um ambiente escolar. Nós temos que pensar políticas que garantam o desenvolvimento dessa sociedade, políticas que garantam processo de armamento, políticas que garantam a livre circulação de drogas na nossa sociedade, e, aí, você aponta a escola como se a escola fosse o espaço em que isso está sendo produzido e acontecendo? Então, quando nós estamos numa sociedade em que precisamos garantir a diversidade, o respeito à diversidade, o desenvolvimento... A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Dois minutos. A SRA. CATARINA DE ALMEIDA SANTOS (Por videoconferência.) - ... a gente começa a entrar num processo que parece que é de inibir esse desenvolvimento que ainda não conseguimos no ambiente escolar. Então, o que está em jogo aqui, na verdade, é a gente pensar políticas públicas que atuem no problema. As questões de violência escolar... A Profa. Kátia falava aí da questão do bullying, e eu sempre me pergunto o quanto o bullying não tem a ver com uma lógica de uma sociedade que padronizou tipos de corpos, de comportamentos, de cabelo, qual é a escultura idealizada dos corpos, e, a partir disso, isso também se manifesta na escola, mas o bullying não é um fenômeno simplesmente da escola. Ele se manifesta dentro da escola porque as diferenças se encontram nesse ambiente escolar, e a gente precisa de uma escola que seja capaz de combater isso, de trabalhar, de desnaturalizar o próprio bullying, de trabalhar esse bullying no ambiente escolar, mas em parceria com a sociedade, que também precisa lidar com essa padronização de como todos nós deveremos ser. Então, o que está em jogo é: quais são as políticas públicas que nós vamos desenvolver para combater todas as formas de violências que também se manifestam na escola? Então, não dá para você achar que cercear a escola, instalar na escola todos os mecanismos e artefatos possíveis que não deixam a escola ser mais escola - ao contrário - será o caminho. E, aí, também falando também da importância de Paulo Freire, quando Paulo Freire diz que a escola precisa ser feita... A escola de gente, feita por gente, para as pessoas, no sentido de que a gente possa se complementar. Obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Nós é que agradecemos, Profa. Catarina, por uma exposição tão cheia de simbolismo. E digo a todos vocês que essas audiências são justamente para subsidiar o PL, que é de 2019. Se ali já era uma situação difícil... E lembro que a medida do Governo do Presidente Lula foi justamente uma medida intersetorializada. A comissão é interministerial, e isso realmente é bom para a gente cuidar de uma coisa tão complexa. Passo a palavra agora para a Paula Fontana Fonseca, Psicóloga no Serviço de Psicologia Escolar do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Em seguida, João Brant. Obrigada pela presença, Paula. Dez minutos para a sua exposição. A SRA. PAULA FONTANA FONSECA (Para expor. Por videoconferência.) - Muito bem. Obrigada. Bom dia, Senadora; bom dia, demais Senadores e Senadoras que estão aqui presentes; Catarina, Kátia, demais convidados, pessoas que estão aí assistindo a esta audiência pública. Eu queria, primeiro, claro, começar agradecendo o convite. Eu entendo que esse convite se deu tendo em vista um texto recentemente produzido por mim e por minha colega, aqui no Serviço de Psicologia Escolar do Instituto de Psicologia da USP, a Profa. Adriana Marcondes Machado. |
| R | Escrevemos esse texto por ocasião desses dois recentes eventos de ataque às escolas, um ocorrido aqui em São Paulo - inclusive aqui mais ou menos próximo da Universidade de São Paulo, que é onde eu estou -, em uma escola de ensino fundamental, e outro ocorrido em uma creche em Blumenau. É claro que foram eventos que nos assombraram, nos preocuparam e nos entristeceram demasiadamente. E, nesse texto, o que a gente tentava recuperar era uma possibilidade de pensar esses acontecimentos e tentar fazer alguma análise, recuperar uma possibilidade de pensamento diante desse primeiro impacto que produziu medo e pânico. E a gente adotou uma linha de discussão, que foi justamente enfatizar que esses ataques eram ataques contra a escola. E é sobre isso, então, que eu vou falar um pouco aqui, tendo em vista o meu percurso: eu sou formada em Psicologia; atuo na área da educação, mas a partir da psicologia. O primeiro ponto que eu gostaria de ressaltar é justamente este: os ataques são contra a escola. E que a gente entende, o que eu entendo quando a gente fala que o ataque é contra a escola? Ele é contra a vida diversa e o direito comum. Isso tem relação com o sentido histórico da instituição escolar e com a sua função na nossa sociedade. Quando eu falo do sentido histórico, eu queria retomar que a escola é a instituição que foi criada para que o destino das crianças e dos jovens não fosse mera decorrência do lugar que suas famílias ocupavam previamente em uma determinada sociedade. Tem aí, no sentido histórico da escola, a intenção de produzir uma disjunção entre origem e lugar social; esse lugar social que cada um pode ocupar em uma sociedade. As coisas não estão marcadas no nascimento; essa é uma vocação da escola. Ela visa tornar possível a experiência de igualdade em que alunos, alunas e "alunes", com suas diferenças, sejam elas étnico-raciais, religiosas, culturais, diferenças de corpos, que nem a gente estava ouvindo agora também, e outras tantas - não vou enumerar todas aqui -, para que esses alunos com as suas diferenças tenham direito ao estudo, à formação e a usufruir de um tempo compartilhado em torno do mesmo objeto de conhecimento, que pode ser matemática, pode ser educação física, pode ser literatura. É a partir desse princípio comum que as diferenças terão lugar na escola. Então, a escola é lugar de igualdade e de diferença ao mesmo tempo, e uma coisa não vai contra a outra. Então, todos têm acesso ao mesmo ambiente escolar, e, por sermos diferentes, diversos, a aprendizagem de cada um não ocorrerá necessariamente da mesma forma. Ainda que existam maneiras que preponderem, não é todo mundo que aprende da mesma forma diante do mesmo contexto. E disso decorre um ponto que eu acho importante destacar: a experiência escolar não é toda mensurável. Algo disso a gente consegue medir, aferir, e algo disso está fora da possibilidade de mensuração, porque se trata justamente de uma experiência formativa nesse espaço comum. Uma escola é responsável por produzir um espaço de pertencimento, em que a empatia por aquilo que o outro vive é um valor. E é um valor que, é claro, impacta também a construção da sociedade, mas não é só por isso que ela é importante; ela é um valor em si, ela é um valor de experiência formativa, em que eu posso me sensibilizar e experimentar lugares outros que não aqueles que me foram dados de partida, vamos dizer assim. A escola é o lugar onde se pode experimentar outras possibilidades que não aquelas que me são imediatas, quanto à experiência de um indivíduo. Em outras palavras, o que eu estou querendo dizer é que tanto a escola quanto a família têm o dever de educar, ambas têm o dever de educar, mas na escola essa educação ocorre em um ambiente que é público, que permite uma experiência formativa de partilha do conhecimento nesse espaço comum, coletivo e diverso. Portanto, a experiência escolar passa pelo par ensino-aprendizagem, mas não se reduz ao par ensino-aprendizagem. A experiência educativa acontece na família e na escola. São perspectivas diferentes, mas ambas as instituições têm responsabilidade pela educação das crianças e dos jovens. Um ataque à escola é um ataque ao direito comum e à vida diversa. Fortalecer aquilo que cabe à escola implica contemplar essa vida diversa. E aí eu vou falar na possibilidade de isso ser contemplado nos currículos - porque esse é um documento escolar bastante trabalhado, atualizado e refletido -, nos currículos escolares, de modo a possibilitar que uma criança possa ter contato com realidades distantes da sua. |
| R | Nesse sentido, eu compreendo que o currículo escolar... E pensar uma escola segura é pensar uma escola em que essa diversidade e essa diferença estejam contempladas no currículo, quando a gente aborda temas como antirracismo, anticapacitismo, e temos que falar também da questão do machismo estrutural na nossa sociedade, que tem uma ligação muito direta inclusive com esses eventos recentes. A função da escola tem relação com esse princípio histórico de servir ao bem comum e também com certa ideia de finalidade. Esse é um tema um pouco mais complexo, porque daí a gente teria que pensar: será que é possível falar de uma utilidade da escola? Eu não vou me aprofundar nisso, mas eu acho que vou marcar talvez algum ponto de limite aí para a gente pensar numa utilidade da escola. No meu entendimento, ela não deveria servir a lógica de mercado. Ela não deveria reproduzir o funcionamento da sociedade, sobretudo de uma sociedade desigual como a nossa, pelo menos não intencionalmente. Que isso eventualmente aconteça, claro, é um espaço da experiência, é um espaço dos acontecimentos. Eventualmente situações não esperadas e não desejáveis acontecem, mas elas não são produzidas intencionalmente. O modelo de vida e convivência que tem gerado isolamento, individualismo e competitividade em nossa sociedade é um problema que merece atenção, inclusive - não só, mas inclusive - por ter adentrado os territórios escolares e educacionais. Enfrentar isso requer criar um espaço de pertencimento - já falei do pertencimento -, que favoreça que estudantes se reconheçam e possam se afetar pela experiência de vida diversa dos seus colegas bem como por realidades que são distantes, seja historicamente, culturalmente, geograficamente. Então, enfrentar isso também requer que os estudantes pensem sobre as coisas do mundo sem uma adesão automática à lógica do mercado. É por isso que a gente sempre fala muito desse tempo e espaço escolar, como uma possibilidade de diferença em relação ao que a gente vive no cotidiano do mundo e do trabalho. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Dois minutos. A SRA. PAULA FONTANA FONSECA (Por videoconferência.) - A escola, então, é esse tempo e espaço de pensamento acompanhado. E, aí, por "acompanhado" a gente pode pensar que a gente está acompanhado de livros de autores e autoras, de professores e professoras e também de colegas. |
| R | E aí acho que tem uma marca muito específica do que é próprio à educação na escola, diferentemente do que eu falava antes do espaço da família. O isolamento, o individualismo e a competitividade impedem o ato educativo. Eu entendo que a gente não vai sair desse momento de fragilidade e temor se a gente não tiver investimentos condizentes com a valorização da profissão docente, se a gente não tomar de frente esse assunto das métricas competitivas com que vêm avaliando as nossas escolas e se a gente também não tomar de frente o problema do fortalecimento da autonomia das próprias comunidades escolares. As escolas têm muito a dizer sobre os seus processos e sobre as suas realidades, e isso nos interessa. Então, na verdade, e já concluindo aqui, o que eu pretendia falar hoje vai numa direção de uma defesa da escola - eu gosto dessa expressão - como instituição formadora. É uma defesa de que a escola possa recuperar o seu vigor, e para isso ela vai precisar de iniciativas como essas, de debate público, que possam restituir sua dignidade - isso vem sendo afrontado sistematicamente - e também que a gente possa fazer valer o que já está na lei que alicerça a escola no Brasil. Enfim, eu agradeço muito o convite e enalteço essa ocasião de estar aqui com vocês nesse debate. Obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Nós é que agradecemos, Paula. Essa tem sido uma tônica em todas as audiências. Duas coisas estão se repetindo, felizmente: que esses apetrechos de uma pseudo-segurança não nos interessam e não resolverão os nossos problemas e - a mesma coisa - que o professor, a professora, elementos centrais do projeto pedagógico, são indispensáveis, portanto, mas são insuficientes. Nós - eu, como professora, posso dizer - precisamos desse apoio, dessa relação psicossocial para ajudar a compreender e, como você disse, valorizar nossa prática docente. Muito obrigada, Paula. Passo de imediato ao Sr. João Caldeira Brant Monteiro, que já está aí conosco, Secretário de Políticas Digitais da Presidência da República - e viva o PL das fake news. Dez minutos, João. O SR. JOÃO CALDEIRA BRANT MONTEIRO (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senadora. Obrigado às demais participantes. É um prazer estar na Comissão de Educação aqui hoje. Eu vou dividir minha fala... Primeiro, eu queria agradecer e saudar as falas que me antecederam, que eu acho que vêm com densidade e ao mesmo tempo com compromisso com a escola como um ambiente de transformação e de vivência. E acho que parte do que foi dito pela Paula - e eu queria agradecer por ela ter citado Adriana Marcondes, que é também uma referência para mim - significa a gente não aceitar a derrota da tomada do ambiente escolar por uma lógica da segurança. Para mim, e antes de eu entrar nos pontos específicos, a gente precisa ao mesmo tempo combinar segurança das nossas crianças... E acho que nós temos feito vários passos importantes para isso; o Ministério da Justiça tem atuado nessa direção, o Ministério da Educação tem atuado nessa direção, e nós aqui - e vou falar rapidamente - temos atuado nessa direção. E que determinadas escolas possam contar com medidas diferentes e particulares eu acho que também é aceitável dentro de um contexto local. |
| R | Transformar as nossas escolas em definitivo num ambiente pautado por uma lógica do trancamento e da segurança a partir de uma dimensão policialesca, eu vou chamar assim, é uma derrota para nós como civilização, como sociedade. Então, nós precisamos saber combinar essas coisas, porque não tem passo para trás. A depender dos avanços, depois que você dá determinados passos no sentido do trancafiamento e da securitização, ou melhor, do policiamento como regra dentro do ambiente escolar, você não consegue voltar para trás. Bom, isso configuraria uma derrota, não é? Nesse sentido, eu acho que o que tem sido muito importante é o conjunto de ações que o Governo tem feito desde as ações imediatas até o planejamento que está sendo feito e coordenado pelo MEC, pela Secadi, nesse espaço, com o planejamento da escola mais segura, mas não apenas da segurança como a lógica mais tradicional. Então, eu queria passar rapidamente aqui duas frentes sobre isso, uma que está trazendo alguns dados do Ministério da Justiça e outra de ações nossas de educação midiática e relativas ao PL 2.630, o PL das fake news, porque eu acho que elas apontam esforços - e isso tem muito a ver com o papel que a Secom deve cumprir - na direção de, sim, aumentar a proteção e a segurança das nossas crianças, dos nossos adolescentes, mas resguardar um ambiente de troca viva e com potência e capacidade de preservar as dimensões que Catarina, Paula e Kátia levantaram aqui. Muito rapidamente, vou começar pelas nossas próprias ações. Nós estamos, no ponto de vista da Secom, avançando, em parceria com organizações da sociedade civil e especialistas na temática de educação midiática, em algumas campanhas de comunicação voltadas a famílias, a professores, a alunos para que as pessoas possam, em primeiro lugar, abordar o tema da violência nas escolas de forma segura, crítica e sensível tanto em casa quanto em sala de aula. É um tema hiperdelicado que nem pode ser considerado um tabu, nem pode ser naturalizado sem entender como é que o preparo psíquico das nossas crianças para lidar com isso é diferente nas diferentes faixas etárias. Nós temos um segundo ponto que é identificar notícias falsas ou discursos de incitação à violência e saber o que fazer diante dos conteúdos relacionados à violência nas escolas - não só dos conteúdos, mas dos ambientes. A gente vê como determinados ambientes digitais te convidam para uma armadilha. Acho que a reportagem do Fantástico sobre o Discord, no domingo, deve servir de alerta para nós como sociedade sobre como é que determinados ambientes digitais estão completamente fora do escopo de percepção e de leitura dos pais e das famílias sobre o que as crianças e os adolescentes estão fazendo. E nós temos uma dimensão de conhecer e aprender a utilizar mecanismos de denúncia oficiais do Governo e das próprias plataformas em caso de exposição a conteúdos violentos, ou seja, também nós precisamos entender que há caminhos. E esses caminhos de denúncia foram essenciais para a Operação Escola Segura, que o Ministério da Justiça vem realizando. |
| R | Então, a nossa perspectiva é que, nessa condição, os pais e as famílias possam receber orientações assertivas sobre o que fazer diante do recebimento de conteúdo sobre possíveis ameaças de ataques a escolas, obter informações sobre o que acontece com as denúncias realizadas, sobre como contribuir para não disseminar pânico e ajudar a promover de fato um ambiente seguro e tranquilo nas escolas. Talvez até esse binômio de segurança e tranquilidade ajude a atenuar algumas perspectivas mais duras que a gente vem acompanhando. Aqui também a nossa perspectiva é disponibilizar uma série de materiais que vão poder ser utilizados por professores, por toda a comunidade escolar para abordar, nas salas de aula e em outros ambientes, o tema da violência nas escolas, dos discursos violentos nas redes sociais, com linguagem adequada, sensibilidade, voltada para promover um ambiente seguro e tranquilo, para que a gente possa retomar a normalidade sem deixar de incorporar os aprendizados que esses momentos difíceis nos trazem. Então, essa é a perspectiva que a gente vem trabalhando na linha de educação midiática. Na questão do PL 2.630, o PL das fake news, é muito importante destacar que o PL avança muito na capacidade de proteger crianças e adolescentes no ambiente online. Ele estabelece um dever de cuidado para as plataformas em relação aos temas e aos crimes que estão previstos no ECA, mas também em relação a qualquer caso de incitação ou apologia à violência contra crianças e adolescentes. Ou seja, o que é o dever de cuidado? É um dever de ações preventivas que não significa nada de filtragem de conteúdo nem nada, é você poder dizer: o meu sistema, a minha arquitetura está entregando sistematicamente conteúdos que geram essa incitação à violência? Geram essa apologia a criminosos ou a crimes contra crianças e adolescentes? Nós vimos, por exemplo, no caso do último período, como algumas plataformas estavam com materiais frequentes sobre isso, o que significa que os seus algorítimos, os seus sistemas de recomendação, as suas regras de comunidade não estavam adequadas para proteger crianças e adolescentes no ambiente online. O que a gente quer não é ter que ficar lidando com leites derramados, com casos em que você já tem a violação, já tem o caso de desproteção, em que você entra para remover conteúdo; nós queremos que as plataformas tenham ambientes seguros para as crianças e os adolescentes, nós queremos que as plataformas estejam preparadas para resguardar o direito e dar prioridade absoluta, como diz o art. 227 da Constituição sobre proteção de crianças e adolescentes. É nesse sentido que a gente precisa atuar, a fim de que tenhamos condição realmente de conseguir equilibrar direitos, criar ambiente mais seguro sem entrar - como eu posso dizer? - numa fetichização da segurança, que de certa maneira se estabelece a partir de símbolos, de portais, catracas ou detectores de metal, determinados símbolos que no fundo nos geram passos, como eu estava dizendo no começo, porque não tem como gerar passos para trás. Nós precisamos conquistar a normalidade de novo nas nossas escolas, nós precisamos garantir que os aprendizados que a gente tenha nesses processos sejam incorporados sem que isso signifique uma derrota de um modelo democrático em um ambiente saudável para as crianças em termos de desenvolvimento psíquico e social. Obrigado, Senadora, pela oportunidade. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Nós é que agradecemos, João. Mais uma vez a gente percebe a intersetorialidade, a relação interministerial, e isso nos dá uma certa segurança e tranquilidade para usar sua analogia com as medidas que estão sendo tomadas. |
| R | Nós que viemos do chão da escola e ainda estamos nele temos essa confiança de que as coisas serão tratadas não para resolver apenas o momento presente, mas também para fincar condições de segurança para superar e expandir aquilo que a gente deseja para as nossas escolas. Muito obrigada. Vou passar agora para Naine Terena, Diretora de Educação e Formação Artística do Ministério da Cultura. Já agradeço pela presença, Naine, e lhe passo a palavra para seus dez minutos de exposição. O SR. NAINE TERENA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia. (Falha no áudio.) ... que a cultura é muito importante, visto que tínhamos algumas iniciativas em anos anteriores que envolviam a educação e a cultura, como o programa Mais Cultura nas Escolas e o Mais Cultura na Universidade. Inclusive estamos retomando agora o diálogo com o Ministério da Educação e em breve estaremos novamente instalando esse tipo de trabalho dentro das escolas, o que para a gente é uma felicidade. Eu acho que eu gostaria de começar falando sobre a proposição do projeto de lei, em que a gente pensa que, em primeiro momento, essa garantia da segurança física da comunidade escolar a partir dessas medidas preventivas de acesso ao ambiente seja algo que acalme a população; pensar que o uso de determinada força vai conter esse tipo de violência, mas a gente sabe que esse tipo de ação surge de outros campos, que são campos das relações sociais e que afetam também os campos que envolvem as subjetividades. Por isso, a gente tem confiança e acredita que existem etapas anteriores a essa proposição de monitoramento físico, que não resolve a situação, que são justamente entender esses contextos em que a comunidade escolar vive, o ambiente biopsicossocial em que estamos todos nós inseridos. Temos que pensar também nas construções coletivas, nas dimensões com que estamos lidando das relações que se estabelecem, principalmente essas relações que envolvem os contextos virtuais, não é? Temos grande parte hoje da nossa população, e não vou dizer que só jovens e crianças e adolescentes estão dentro do ambiente virtual, porque nós estamos também enquanto adultos, e vivendo, de certa forma, esse mundo paralelo, que traz outras dimensões de realidade e de convivência que afetam as nossas relações nesse mundo real, que é o mundo que depara com essa diversidade, com as diferenças e com a necessidade de reconstruir repertórios e subjetividades tanto nos nossos alunos quanto nos pais e em nós mesmos. Então a gente entende que a inserção das atividades de arte dentro das escolas, dentro das unidades de educação formal são essenciais para que a gente possa reforçar a ideia da construção de repertórios de bem viver, de socialização comunitária e de entendimento das nossas culturas. |
| R | Nós precisamos usar, neste momento principalmente, as artes como mecanismos de comunicação para que a gente possa reconstruir a ideia de que a gente vive em uma sociedade diversa e que essa diversidade precisa estar em todos os lugares de maneira respeitosa, de maneira empática e de maneira que a gente possa se mobilizar, enquanto seres humanos, em torno de uma convivência saudável. A nossa ideia, enquanto Ministério da Cultura e, em especial, Secretaria de Informação, Livro e Leitura, que também participa desse GT contra a violência nas escolas, é justamente fomentar, através da arte, o que a gente vem chamando de educação dos sentidos para fazer sentido. A gente precisa voltar a expressar nossas condições humanas, de memória, de coletividade, de construção cultural, para evitar o vazio, um vazio que abre espaço para que se instaure a violência, para que pensamentos negativos tomem conta de todo um contexto, de toda uma comunidade, de todo um processo de vida. Devemos examinar, também, os nossos ambientes escolares, a sobrecarga dos pais e dos professores. Nós temos a ideia de que, se a gente pensar no viés da educação do sentido e da arte como um mecanismo de comunicação, nós podemos fortalecer essas relações e também resguardar para o futuro que nossos jovens e nossas crianças tenham condições de viver de maneira harmoniosa e, como todo mundo aqui já citou, entendendo que nós temos relações muito complexas dentro da nossa sociedade. E eu vou ressaltar uma fala da Profa. Ana Mae Barbosa em que ela enfatiza justamente essa presença da arte nas escolas. Ela diz que a arte na escola tem uma importância muito grande, porque você tem arte na escola para ter intimidade com o processo de criação e com a significação cultural da arte; você tem a arte na escola para mobilizar o pensamento integral; e, nesse contexto, devemos ter a arte na escola para que ela seja um mecanismo de comunicação sobre os temas que nos afetam, que nos afetam de todas as formas, desde a criação dos afetos, do bom sentimento, até essas afetações que as violências psicológicas e físicas têm gerado na sociedade em que vivemos. Então, a minha fala é bastante breve, mas dizendo que nós, neste momento, atuamos dentro do GT, pensando maneiras de, novamente, alcançar as unidades escolares através da arte, da valorização da disciplina de artes também, dentro do contexto escolar e de toda e qualquer manifestação artística e cultural que possa fortalecer os vínculos humanos. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Naine. O Programa Mais Educação foi muito responsável também por essa integração. Era um programa que acontecia no contraturno, além de gerar um pertencimento identitário muito grande da escola com a comunidade. Isso gera também uma participação mais efetiva, e eu espero que dê certo. |
| R | Então, nós concluímos as intervenções, porque a nossa última convidada não conseguiu chegar - seria a Jade Beatriz, da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas. Tentamos o tempo todo contato, mas deve ter ocorrido alguma coisa, e não foi possível ouvi-la. Nós vamos passar agora, antes de eu devolver a palavra, para o que nos chegou pelo e-Cidadania, que é um sistema de participação da sociedade. Então, nós temos dois comentários: Eliézer Barbosa, de São Paulo: "Melhorar a segurança escolar é simples: combater o desvio de dinheiro público e investir nos salários dos profissionais escolares!". Seriam duas formas muito diretas. Marta Tiffany, de Goiás: "Já está mais que na hora de implantar portas com detector de metal nas escolas para evitar a entrada de qualquer tipo de armas". Isso já foi abordado, não é? E duas perguntas: Samara Passos, de Minas Gerais: "Qual é a eficácia das medidas de segurança adotadas pelas escolas na prevenção de ataques e garantia da segurança dos alunos?". E Eduardo Witter, de Goiás: "Existe alguma proposta para a criação da Semana Nacional de Segurança Escolar?". Eu posso dizer que no Senado não tem tramitado nada nesse sentido. Então, eu devolvo a palavra para cada um de vocês... Estou vendo aqui que Jade Beatriz entrou na sala. Podemos, então, interromper, dar os dez minutos à Jade, e depois a gente volta já diretamente para as conclusões. Jade, dez minutos. A SRA. JADE BEATRIZ (Para expor. Por videoconferência.) - Oi, gente, bom dia! Primeiro, quero parabenizar a Profa. Teresa Leitão... A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Pode abrir o vídeo? A SRA. JADE BEATRIZ (Por videoconferência.) - Eu não consigo ligar a câmera agora. Eu só consigo usar o áudio. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Está bem. A SRA. JADE BEATRIZ (Por videoconferência.) - Primeiro, quero parabenizar a organização desse espaço, que é tão importante não só para poder formular e ver estratégias das possíveis saídas a curto, a médio e a longo prazo para conseguir resolver estes grandes problemas, que é a violência nas escolas e os ataques, mas também para ser um espaço de escuta, um espaço de troca por tudo o que a gente está passando. E me apresentando para as pessoas que estão aqui, eu me chamo Jade Beatriz, sou Presidenta da Ubes (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas), uma entidade que representa mais de 40 milhões de estudantes de ensino médio, técnico, ensino pré-vestibular e ensino de jovens adultos. Essa questão da paz nas escolas e do enfrentamento à violência nas escolas é um grande desafio que a gente já trava há bastante tempo, que só acabou se agravando mais com a disseminação de discurso de ódio nos últimos quatro anos. Então, a gente não pode desvincular a relação que isso tem - a relação do que foi o Governo Bolsonaro nos últimos quatro anos, o próprio finalzinho ali do Governo Temer - com o resultado concreto que hoje a gente tem nas escolas: grupos supremacistas, que acabam se articulando dentro da internet, dentro das plataformas, seja Twitter, Facebook, a própria deep web, para conseguir organizar esse tipo de ataque e ser homenageados por isso. |
| R | Então, acredito que a gente tem que ter bastante cautela com o que é também o debate da defesa, do enfrentamento ao racismo, à LGBTfobia, ao próprio assédio dentro das escolas, porque a ausência desse debate dentro da sala de aula também é uma coisa resultante desse processo que está acontecendo. Então, já falando aqui o que a gente tem feito, a Ubes desenvolveu um documento - eu posso, inclusive, encaminhá-lo para vocês - sobre a questão da paz nas escolas e as possíveis saídas. Na primeira semana, quando aconteceu o caso mais recente na Escola Thomazia, com a Profa. Elisabete, um dia depois, a gente se reuniu com o Ministro Flávio Dino e entregou esse documento a ele. E lá estava escrito, inclusive, a questão da vigilância na internet e nas redes sociais. Foi uma das primeiras medidas tomadas. Todavia, eu acredito que a gente tem que ir para além disso tudo, entendendo que, quando a gente faz o debate sobre a paz nas escolas, sobre o enfrentamento à violência, abre-se o esgoto na política que fala sobre redução de maioridade penal, fala sobre o homeschooling, fala sobre militarização de escola, e a gente sabe que esse não é o caminho que nós precisamos seguir para garantir a segurança nas escolas e a cultura de paz nesse ambiente. Então, eu acredito que, para além disso tudo, nós precisamos falar quais são os modelos pedagógicos que hoje a gente tem dentro da escola, dentro da sala de aula: se a gente tem acesso à cultura e à arte dentro do ambiente escolar, porque isso acaba contando muito. Para além de combater, eu acredito que nós deveríamos ter formas de evitar o combate; para além de combater, deveríamos impedir que isso precise ser remediado. Então, eu acredito que avaliar o modelo pedagógico que hoje a gente tem no país é muito importante; avaliar o que a gente tem de acesso dentro das escolas é muito importante para além da vigilância na internet. E eu acredito que mais uma ajuda seria - inclusive, a gente também chegou a se reunir com o Ministério da Saúde para poder falar sobre isso, para entender um pouco a opinião deles e ver como o Ministério da Saúde pode contribuir para garantia do enfrentamento à violência nas escolas - parcerias das UBSs de bairro, do local, o que seria bastante importante, com as escolas que são próximas ali. Além de a gente falar sobre o que é a rota, a vigilância da escola e tudo mais, eu acredito que ter profissionais de saúde dentro do ambiente escolar seria bastante importante, entendendo que a qualquer momento poderia acontecer alguma coisa. Eu acredito, gente, que tudo isso perpassa... E isso é um grande problema político, porque não é um caso isolado, são vários casos. E, nesse último mês, a gente teve esse grande problema de serem inúmeros ataques, inúmeros atentados, inúmeras ameaças em diversas escolas do Brasil, em diferentes lugares. Teve em São Paulo, teve no Rio de Janeiro, teve na Paraíba, teve no Maranhão, teve na Bahia. |
| R | Então, não é um caso isolado e isso precisa ser resolvido o mais rápido possível. Só que eu acho que precisa ser feita uma investigação mais profunda para entender qual a ligação desses grupos supremacistas que tem dentro desses fóruns da internet, qual a ligação que tem com grupos armamentistas e com o próprio "gabinete do ódio", porque, assim, eu não vou muito longe para falar sobre a questão que isso pode ter dentro da violência nas escolas. Mas eu acredito que, no mais, e aí vou disponibilizar o documento que hoje a gente tem na Ubes, nós precisamos fazer caravanas em escolas que garantam que isso não aconteça mais, isto é, caravanas não só para poder falar sobre isso, porque eu acredito que isso não se resolve apenas com palestra, mas com ações efetivas que sejam contínuas e que continuem acontecendo para além daquele momento - no caso, eu acredito que projetos seriam bastante importantes para conseguir impedir que isso aconteça novamente, projetos culturais, projetos artísticos - e tentar enterrar de vez o que é esse discurso de colocar policiamento dentro da escola, que a gente sabe que não dá resultado; só aumenta a questão da violência. No mais, gente, eu coloco aqui a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas à disposição para a construção de um projeto que, de fato, seja eficaz e que, de fato, consiga enterrar o que é a violência dentro das escolas para, de fato, a escola ser um ambiente de paz, ser um ambiente seguro, onde a gente vai conseguir contribuir para o desenvolvimento do país e contribuir até mesmo no nosso próprio território, porque a gente sabe que a escola não pode ser esse ambiente onde a gente se sente inseguro, se sente mal; a escola é para você estar lá e se sentir feliz. Então, eu acredito que seja isso. Eu peço desculpa também, inclusive, por ter chegado um pouco atrasada, mas é porque, por essa questão da violência nas escolas, reforma do ensino médio, então, estão acontecendo várias atividades, várias reuniões ao mesmo tempo. Eu estou tendo que me deslocar de um lado para o outro, por isso eu não estou conseguindo ligar a câmera, mas a Ubes está à disposição para a construção seja institucional, seja no movimento social, seja na rua. Nós estamos aqui para poder acrescentar. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Jade. É muito importante a gente ouvir também a palavra dos estudantes, do movimento estudantil, que são o nosso principal foco. Então, já fiz a leitura dos comentários e devolvo a palavra, pela mesma ordem, por cinco minutos no máximo, para a gente encerrar no prazo regimental. Então, Dra. Kátia Souto. E, em seguida, Profa. Catarina. A SRA. KÁTIA MARIA BARRETO SOUTO (Para expor. Por videoconferência.) - Eu já começo agradecendo novamente, porque eu acho que é uma riqueza ouvir todos e todas que aqui estiveram falando, contribuindo para essas reflexões - não é, Senadora? - desse grande desafio. Diante disso, eu acho que, inclusive agora, com a contribuição da Jade, da representante, é tão importante a participação social. Eu sempre digo que o slogan do nosso Governo, do Presidente Lula, é união e reconstrução com participação social, porque é isso que vai fazer a diferença. |
| R | Eu acho que está em disputa... A violência nas escolas, que foi abordada aqui por diferentes ângulos, não está fora da violência que está na sociedade; ela reflete essa violência e ela vem imbuída dos valores. E esses valores nós estamos em disputa. O Brasil está em disputa sobre qual é o projeto político de sociedade que nós queremos, desejamos, com que sonhamos e que estamos dispostos a construir. Nessa temática, eu acho que está em disputa isto: um projeto político que envolve democracia e civilização e um outro projeto político que fala de uma cultura do ódio. Nós precisamos entender que o ambiente escolar está refletindo isso, e ele não é só externo, como eu coloquei; ele também vende violências que já têm, ao longo do tempo, uma construção a partir de preconceitos, de discriminação ou, como disse a professora, de um modelo estrutural. Que modelo é esse que nós temos que incita e estimula esses preconceitos, essa discriminação? Então, eu queria colocar isso num primeiro momento e trazer agora como nós traduzimos isso num grande plano nacional que possa envolver as diferentes instituições democráticas. Acho que esse projeto de lei e a proposta desse substitutivo... Claro que a grande maioria aqui presente não vê isso como uma saída; ao contrário: nós entendemos que a construção de um ambiente saudável e de não violência passa pela construção de uma sociedade não violenta, e esses valores precisam permear o conjunto. Concretamente, nós temos que sair dessa ideia do vigiar e punir - já nos colocava isso Foucault com muita clareza - e avançar em políticas públicas inclusivas. Acho que esse é o esforço que temos feito. Quando o Presidente Lula apontou esse grupo interministerial - e eu estou lá, junto com a Ministra e uma outra colega, a Taia, representando o Ministério da Saúde, com vários atores e atrizes aqui presentes, o Ministério da Igualdade Racial, o Ministério da Educação, o Ministério da Cultura e Esporte -, eu acho que a gente está falando desse lugar de reconstrução. Não é uma reconstrução de uma política pública; é uma reconstrução de políticas públicas que marchem, caminhem na perspectiva dessa sociedade democrática e de inclusão social. Por fim, eu acho que a gente precisa pensar nesse plano intersetorial e interfederativo, porque nós precisamos envolver estados e municípios. Não é à toa que o Presidente Lula, de imediato, também reuniu Governadores, Prefeitos, sociedade civil, pesquisadores e organismos internacionais para dar uma resposta. Então, o desafio que a gente tem no grupo interministerial não será bem-sucedido sem essas parcerias. Inclusive essa iniciativa que a Senadora traz é uma iniciativa riquíssima de a gente discutir qual é a lei que vai nos nortear. Acho que a LDB, já por si só, orienta e tem diretrizes macro que caminham no que nós desejamos: construir, nas nossas escolas, ambientes saudáveis, de promoção de uma cultura de paz, de promoção de uma cultura de respeito, onde a saúde seja vista não só no seu aspecto de tratamento, recuperação e assistência; inclusive, a atenção psicossocial é vista numa dimensão para além disso, ela é vista inclusive nesses preconceitos e discriminações que adoecem os nossos corpos e as nossas almas. Acho que cultura e esporte, por exemplo, que compõem também o GT interministerial, são, diríamos assim, políticas públicas que foram, inclusive, destruídas no último desgoverno, que agora a gente retoma, não só na sua expressão de ter os ministérios, mas nas buscas de trazer essas políticas públicas como um lugar de cidadania e de garantia de direitos. |
| R | Como a Jade falou, para finalizar e agradecer, a estratégia nossa da atenção primária em saúde, que tem essa capilaridade da saúde, é exatamente trabalhar a saúde na perspectiva de garantias de direitos de cidadania. E a gente se coloca à disposição para continuar dialogando, contribuindo com isso, e entendemos que o contraponto a essa proposta do projeto de lei é a construção, de fato, de uma sociedade democrática, inclusiva, um Estado de direito, um Estado laico, um Estado de respeito às diferenças, e queremos contribuir com isso e nos colocamos à disposição do Senado, na pessoa da nossa Senadora Teresa Leitão e de todos aqui presentes - e à sociedade -, para que a gente possa, de fato, construir esse contraponto e construir essa sociedade de igualdade social, de igualdade racial e de respeito. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Dra. Kátia, pela presença, pela explanação. Passo, a seguir, para a Profa. Catarina de Almeida Santos, por cinco minutos. A SRA. CATARINA DE ALMEIDA SANTOS (Para expor. Por videoconferência.) - Bom, eu também começo... Antes que eu fale demais e não agradeça no final, começo agradecendo, Senadora Teresa, pela possibilidade de estar aqui. É sempre um momento de aprendizado, e eu aprendi muito ouvindo todos os convidados. E, para ir à questão colocada para nós, que é sobre qual é a eficácia das medidas adotadas na segurança escolar, essa é uma pergunta ampla e que a gente pode avaliar de diferentes aspectos. Acho que o João trouxe aí já alguns aspectos e poderá trazer mais dados sobre isso, mas eu acho que o conjunto das medidas adotadas já fez, por exemplo, com que a gente passasse pelo 20 de abril, que era o grande marco da coisa, sem nenhum ataque objetivo às escolas, se a gente pensar nessa perspectiva. Então, eu acho que o trabalho da área de segurança e das outras áreas, esse trabalho intersetorial que está sendo feito tem surtido efeito, e a gente precisa continuar, porque essa segurança passa, inclusive, por um processo de formação crítica para as mídias, não só pelo controle daquilo que chega às redes, mas também a gente fazer uma formação crítica da sociedade para não veicular, para não compartilhar os absurdos que estão nas redes - para denunciar as redes, mas também não compartilhar. Grande parte do pânico que se construiu nos últimos dias, nas últimas semanas, no país, não tinha a ver com as ameaças reais, mas com um projeto articulado de produção do pânico, através de disseminação de falsas ameaças de ataque às escolas. Então, esse é um processo que a gente precisa fazer de crítica, de formação crítica para as mídias. O processo de construção dessa escola passa, inclusive, pelos desencarceramentos dos nossos currículos. Esses currículos voltados para avaliação de larga escala que não consideram o processo de formação nos levam também. A gente precisa pensar que nós temos que fazer desconstruir o que nos trouxe até aqui, o que desencadeou o que nós estamos vivenciando, e não adotar medidas que possam exacerbar tudo isso que nós estamos vivendo. E a Jade falou aí, inclusive, sobre a lógica da militarização das escolas. Ontem foi publicizado inclusive um dossiê da Retratos da Escola, da CNTE, que nós coordenamos, exatamente discutindo o debate da militarização. E eu acho que o João trouxe elementos importantes para a gente pensar isso, porque, assim, a área de segurança tem um papel, mas esse papel da área de segurança não é ir para dentro da escola fazer a gestão das nossas instituições. |
| R | Então, a gente precisa ver qual é o papel... E, quando a gente está falando da área de segurança, nós estamos falando de uma área que tem princípios opostos aos da área de educação e que tem a sua finalidade, os seus princípios, o que a gente pode discutir, mas eles são opostos àquilo que estabelece o art. 206 da Constituição em relação à área da educação. Então, a gente ter a parceria com a área de segurança para que ela garanta as condições na cidade, na sociedade para que a escola possa funcionar não tem a ver com que esses profissionais vão atuar no ambiente da escola, fazendo gestão da escola. Muito pelo contrário, não é? Se a área da segurança cumprir a sua função, as escolas terão todas as condições de funcionar naquilo que a segurança, em tese, poderia desenvolver nos ambientes escolares. Então, a gente precisa pensar em currículos outros. Quando a gente está falando desse desencarceramento da escola, a gente está falando de uma questão muito mais ampla. Eu acho que já trouxemos aqui vários elementos para dizer que a escola que a gente precisa construir é o inverso dessa que nos trouxe até aqui. E isso voltado para um debate na questão da sociedade. Precisa-se falar de educação, debater políticas educacionais com participação e construídas por quem faz educação, por quem compreende educação, por educadoras e educadores, por estudantes. E aí lembro como os estudantes se organizaram lá em 2016, dizendo que queriam uma reforma no ensino médio, mas não uma reforma feita em gabinete, uma reforma com a participação deles e dos educadores. E estamos na batalha em relação à questão dessa reforma, da revogação desse ensino médio que não traz a possibilidade da construção dessa escola no sentido que nós queremos. Então, eu acho que nós temos um amplo debate para fazer - e este momento aqui é fundamental, Senadora Teresa - com tantas áreas aqui. A gente precisa construir esta escola que tenha arte, que tenha cultura, que tenha esporte, uma escola que possa ser escola e não uma escola que se transforme em prisão. Então, quero só agradecer mesmo a possibilidade e nos colocar sempre à disposição para debater. Acho que nós que somos professores somos muito apaixonados por educação e estamos sempre dispostos a construir a melhor educação que este país possa ter, junto com educadores e estudantes - e educadoras. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Obrigada. Profa. Catarina. Bela exposição! Passo agora para Paula Fontana, da USP. A SRA. PAULA FONTANA FONSECA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom, também queria começar agradecendo. Foi bastante enriquecedor poder acompanhar este debate, ouvir a fala dos colegas, poder pensar junto com as pessoas que estão presentes aqui hoje. Eu queria também endossar as falas da Kátia e da Catarina, neste momento de comentários finais. Acho que elas apontam temas bastante relevantes para a gente pensar o tema da segurança nas escolas. Vou fazer, talvez, um ou dois destaques, porque me sinto bastante contemplada nas falas que me antecederam. Eu entendo que a gente não pode abandonar a escola à sua própria sorte, desrespeitar a sua autonomia, tirar sua dignidade de diversas formas. E a gente assistiu a isso de maneira bastante preocupada e aflita, sem dúvida nenhuma, mas também sem conseguir muitas entradas para mudar esse cenário de ataque às escolas, vamos dizer, em certo nível simbólico - estou fazendo uma diferença com a violência dos massacres, vamos dizer assim. A gente não pode viver tudo isso e depois culpar a escola pela sua insuficiência. |
| R | Então, acho que a sociedade civil, os políticos, enfim, os professores, todos nós temos muito o que dizer e pensar e temos que nos ocupar dessa escola que temos e de que projeto a gente vai investir daqui para frente. A Profa. Catarina relembrou esse receio tão intenso que a gente viveu no dia 20 de abril. Eu tive a oportunidade de estar em uma escola de ensino fundamental nesse dia, participar de ações que aquela comunidade escolar tinha pensado como uma forma de habitar e cuidar desse espaço escolar. E eu queria retomar uma fala dela quando ela disse que, se a área de segurança cumprir sua função, isso é bastante importante para que uma escola possa ser uma escola. De novo, a gente não pode atribuir à escola uma deficiência que não é própria ao ambiente escolar. Claro, a gente está falando de violências, e aí acho que tem diferenças quando a gente fala de violência. Algo é uma violência que acontece no âmbito escolar e tem algo de pedagógico e educativo que incide nessas relações. Então, eu não estou imaginando uma escola em que não haja conflito nem disputa entre os pares. Isso acho que é um âmbito da violência e a gente precisa fazer essa distinção. Outro âmbito da violência é essa violência que se dirige à instituição escolar. Claro que elas, somadas, trazem um contexto bastante complexo para a gente. Por isso que essa comissão intersetorial é bastante bem-vinda, porque, se o problema de segurança fosse um problema passível de ser resolvido de maneira circunscrita, a gente talvez nem estivesse aqui tendo essa conversa, porque todos nós queremos uma escola mais segura e harmônica. Isso é um denominador comum. Todos nós queremos uma sociedade mais segura e harmônica. E é um preço muito alto que a gente paga, cotidianamente, tanto em termos financeiros, de dinheiro mesmo, objetivos, como em termos subjetivos, em viver numa situação de insegurança. Então, todos nós trabalhamos essa ideia de construção de uma escola que seja um ambiente saudável e harmônico, isso nos interessa como linha de horizonte. Acho que é isto que eu entendo quando a gente fala de segurança: é a construção de uma escola saudável e harmônica. Eu acho que talvez para mim seria suficiente apenas esclarecer isso e dizer que aqui nós do Serviço de Psicologia Escolar também estamos muito comprometidos com a educação e com essa construção. Estamos à disposição do Senado Federal e do Governo, claro. Obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Paula. Mantendo a ordem, o próximo é o Prof. João Brant; em seguida, Naine; e, depois, Jade. Cinco minutos. O SR. JOÃO CALDEIRA BRANT MONTEIRO (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senadora. Acho que a Jade destacou alguns elementos que vale a pena focar de novo neste momento final. Nós de fato estamos vivendo um cenário de muita gravidade na falta de capacidade de compreensão sobre os ambientes de sociabilidade digital das nossas crianças e adolescentes e do impacto da capacidade desse espaço com uma série de problemas, que inclusive têm a ver com o próprio modelo de negócio das plataformas, de capturar subjetividades, discutir e, de certa maneira, reforçar ambientes de promoção da violência e do ódio, inclusive numa lógica competitiva, enfim, é uma lógica bastante perversa em que a extrema-direita organizada no Brasil, inclusive grupos neonazistas, faz uso de uma dinâmica quase lúdica desses ambientes para captar pessoas para as suas organizações, mas também para impactar e criar esses jogos de disputas de glorificação da violência. |
| R | Nesse sentido, e reforçando o que algumas que me antecederam falaram, eu acho que nós precisamos entender que a polícia tem um papel central aí, e o Ministério da Justiça conseguiu criar um ambiente de articulação das polícias civis em que é possível se trabalhar, a partir do Laboratório de Operações Cibernéticas que eles mantêm, buscando fazer um monitoramento adequado, focado, obviamente com a preocupação de equilíbrio com a questão de privacidade dos jovens, mas para enfrentar esses temas onde eles estão. De pouco adianta você não entender que tem hoje um ambiente paralelo de sociabilidade, com ao mesmo tempo oportunidades incríveis, mas também uma dimensão bastante perversa. E a sociedade precisa ter capacidade de enfrentar os problemas que estão ali. Uma boa parte do que se conseguiu evitar de ataques nos dias seguintes e até o dia 20, inclusive, se deu por conta dessa operação no Ministério da Justiça e da capacidade de antecipação, a partir da movimentação de determinados atores nas redes sociais e alimentada pelo conhecimento que pesquisadoras e pesquisadores que leem essa questão da extrema direita têm. Essa combinação de inteligência do Governo com a sociedade civil foi capaz de evitar mais tragédias como a gente viu. Então, me parece que esse tipo de ação contra o discurso de ódio, uma ação articulada, voltada e pensada com combinação de informação e inteligência, é que precisa ganhar mais reforço, mais foco, e isso ajuda a tornar também o ambiente da escola um ambiente mais seguro. Acho que é isso. Eu agradeço muito o convite, a oportunidade de estar com vocês aqui nessa manhã, e nos coloco também à disposição para novos diálogos com o Senado Federal. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Nós é que agradecemos a participação, as abordagens, que, é claro, muito nos enriquecem. Passo a palavra para a Naine Terena, do Ministério da Cultura, e em seguida para a Jade, para encerrarmos esse momento. O SR. NAINE TERENA (Para expor. Por videoconferência.) - Eu vou reforçar o que eu disse: nos parece que, num primeiro momento, o policiamento, todo o mecanismo de segurança seja a solução para essa nossa questão, mas na realidade não é, porque se pode mudar o cenário dos ataques, por exemplo. A gente protege as escolas, e esses grupos, que são grupos organizados, investem em outros lugares. A questão é muito maior, envolve muitos outros elementos, além de simplesmente o ambiente ou o território da escola. A gente sabe que tem todas as questões psicológicas e traumáticas se a gente traçar também o perfil dessas pessoas, das comunidades escolares, do ambiente de vida. Então, enquanto pensamento de GT constituído pelo Governo, cada ministério, dentro da sua designação enquanto ministério, vem trabalhando para que as políticas possam ser desenvolvidas de maneira plena. Cabe a cada ministério e a cada agente, a cada cidadão, de maneira geral, pensar como é que se insere dentro desse contexto para que isso deixe de acontecer realmente. O que eu gostaria de dizer é nesse sentido de que a gente pode pensar que num primeiro momento apenas as forças de segurança vão resolver o problema, mas não vão. Isso muda de foco, muda de contexto, muda de lugar. O que nós precisamos é melhorar a sociedade, melhorar o entendimento de diversidade, melhorar as questões das relações e melhorar, sobretudo, a qualidade de vida e o entendimento do que é vida, porque tudo isso está bastante machucado, está bastante balançado, e a gente acaba tendo que refazer todos os repertórios, todos os caminhos, todas as memórias que nós temos e que, às vezes, esquecemos que temos. |
| R | A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Obrigada, Naine. Muito obrigada pela presença, muito obrigada pelas abordagens. Passo a palavra agora, para encerrar a fala dos nossos convidados e convidadas, para a Jade Beatriz, da Ubes. A SRA. JADE BEATRIZ (Para expor. Por videoconferência.) - Gente, eu acredito, depois de ouvir todas as falas, todas as contribuições, que a gente tem um desafio em comum, que é conseguir garantir que a escola pública cumpra a sua função na sociedade, que é a de combate à desigualdade social, combate à fome, construção e reconstrução do nosso país, do desenvolvimento nacional e da soberania do Brasil. E, para que isso aconteça, nós precisamos garantir, além do combate à violência nas escolas, que a escola seja esse espaço. A gente tem vários desafios fortes, inclusive a própria revogação do novo ensino médio. Acredito que seja muito importante falar inclusive sobre a valorização da saúde mental dentro da sala de aula. E eu acho que isto também é muito importante e não pode ser ignorado: a valorização da saúde mental e como o SUS pode contribuir para que isso seja uma coisa efetiva na sala de aula, nas escolas públicas do nosso país, entendendo que, mesmo com muitos avanços, hoje uma psicóloga e a assistência psicológica e psiquiátrica ainda são bastante distantes de muitas pessoas, da realidade de muitas pessoas. Então, como é que a gente pode fazer isso? Como o SUS pode contribuir com isso para que se consiga tornar alguma coisa maior e que seja de fato resolvida a longo prazo? Porque, para além disso, nós precisamos entender que os nossos jovens têm uma vida, têm família, têm problemas, muitos vivem em situação de risco. Então, é uma coisa muito maior, não é? E aí, para garantir que a escola cumpra esse papel, acredito que a gente tem estes desafios postos: combater a violência nas escolas, combater discurso de ódio dentro e fora da internet e dos fóruns digitais e garantir que o nosso país seja soberano porque isso também perpassa pela defesa da democracia. No mais, a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas seguirá na linha de frente da luta em defesa da educação, da vida e dos nossos estudantes. Obrigada, gente. Obrigada pelo espaço. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Jade. É sempre bom ouvir, e a gente, na Comissão, tem sempre essa preocupação de privilegiar a fala dos estudantes. Eu quero, em nome da Comissão, agradecer a presença de todos e de todas. Com certeza, fechamos esse ciclo de três audiências públicas com chave de ouro. "Sextamos", não é? Hoje é sexta. Foi um "sextou" bastante produtivo, muito agradável, de muito enriquecimento, de muitas aprendizagens. Agradeço a presença de todos e de todas. |
| R | Não havendo mais nada a tratar, agradeço a presença e declaro encerrada a presente reunião, passando os movimentos finais ao nosso pessoal de apoio da Comissão de Educação. (Iniciada às 10 horas e 02 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 32 minutos.) |

