Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
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| R | O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a 26ª Reunião da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura. A audiência pública será realizada nos termos do Requerimento nº 8, de 2023, da CDH, de minha autoria e de outros Senadores e Senadoras, para debater o tema do Estatuto do Trabalho com foco na terceirização da atividade fim. Claro que aqui se vai discutir a questão também do meio ambiente no trabalho. A reunião será interativa e transmitida ao vivo e aberta à participação de interessados por meio do Portal e-Cidadania, na internet, em www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria: 0800 0612211. Nós teremos uma primeira mesa presencial. Eu já convido, depois eu faço uma falinha rápida de introdução, o Renan Bernardi Kalil, Procurador do Trabalho - Representante Plataforma e Teletrabalho e Vice-Coordenador Nacional da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho (Conafret). Meus cumprimentos. Seja bem-vindo, doutor. Está aqui conosco. Vamos lá. (Palmas.) Ana Luiza Horcades, Auditora Fiscal do Trabalho e Representante do Sinait. Seja bem-vinda também, Ana Luiza. (Palmas.) Dr. Henrique Mandagará de Souza, Diretor do Departamento de Segurança e Saúde do Trabalhador do Ministério do Trabalho e Emprego. Seja bem-vindo, Dr. Henrique. (Palmas.) E por fim - ela está se deslocando, creio que está chegando, mas vamos ter nessa Mesa também - a Ministra Delaíde Alves Miranda Arantes, do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Lembro que a Ministra Delaíde lançou na última quinta-feira o livro de sua autoria com o título Trabalho Descente. Eu farei, agora no início, como é de praxe, uma pequena introdução do tema. Essa é a terceira audiência pública que a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa realiza para debater o novo Estatuto do Trabalho. Ou seja, eu considero, até porque sou um grande defensor da CLT, que seria uma CLT atualizada. |
| R | Ela completa, este ano, 80 anos. Acho que todos nós defendemos a história bonita da CLT. Sabe que eu recebi, esta semana, em mãos, porque já estava, há muito tempo, encaminhada para mim, uma cópia original da primeira versão atualizada da CLT? Acho que, se não me engano, é de 1959 a primeira versão atualizada. Então nós aqui, como fiz lá no Tribunal Superior do Trabalho, defendo a CLT e vou continuar defendendo sempre. E também todas as instituições, o Tribunal Superior do Trabalho, que atuam nessa área. Então, quando a gente fala no novo Estatuto do Trabalho, é uma atualização na CLT, retirando todas aquelas maldades que as reformas retiraram e atualizando-a aos novos tempos, não é? Vocês vão falar muito disso hoje. É fruto da Sugestão Legislativa nº 12, de 2018, ainda, que tramita nesta Comissão, e eu tenho a honra de ser o Relator. Estamos ouvindo representantes dos trabalhadores, empregadores, movimento social, sindical, especialistas, advogados, juristas, entidades, professores, sociedade civil. Nosso objetivo é um texto que eleve as condições de vida do povo brasileiro e de crescimento e desenvolvimento do país, um relatório final que contemple a todos de forma equilibrada, atualizando a nossa CLT, mas dando um passo à frente, não o retrocesso que houve nas reformas que foram feitas recentemente pelos Governos anteriores. Alguns tópicos do novo Estatuto do Trabalho vamos aprofundar e estamos aprofundando. É nossa intenção visitar os 27 estados. O primeiro vai ser o Rio Grande do Sul, vai ser nesta sexta-feira já. Teremos um evento na Assembleia Legislativa, sexta-feira próxima, lá no Rio Grande do Sul. Jornada de trabalho, terceirização, salário, trabalho intermitente, fiscalização, discriminação, combate ao trabalho escravo, igualdade salarial entre homens e mulheres, direito a um ambiente de trabalho decente, seguro, saudável, ou seja, a defesa do ambiente do trabalho, prevendo medidas que assegurem a saúde física e mental do trabalhador. O Brasil é um dos países do mundo que mais tem acidentes de trabalho. Entre 2002 e 2021, foram registrados 51.837 acidentes fatais no Brasil. Isso representa uma taxa de mortalidade de seis óbitos a cada 100 mil vínculos empregatícios e confere ao país, como eu dizia antes, o segundo lugar em mortalidade no trabalho entre os países do G20 e das Américas, ficando somente atrás do México. Registro que o Projeto de Lei nº 304, de 2023, visa diminuir o número de acidentes fatais no trabalho, estresse, ansiedade, depressão, insônia, assédio moral, entre outros. Conforme a OMS (Organização Mundial da Saúde), uma a cada cinco pessoas no trabalho pode sofrer algum problema de saúde mental. Dados da previdência social apontam que, no Brasil, em 2021, mais de 75 mil pessoas se afastaram do trabalho por conta de depressão. O estatuto é uma alternativa ao processo que quiseram fazer - e infelizmente fizeram já a maldade, em grande parte - da flexibilização das leis trabalhistas, ou seja, da nossa tão querida CLT, que, apesar de tudo, continua viva. |
| R | E com essa discussão, que nós chamamos um debate do século XXI, o novo Estatuto do Trabalho - ou poderíamos também dizer a atualização, dando um passo à frente, e não o retrocesso que houve recentemente -, queremos que o Brasil volte a respeitar sua classe trabalhadora, que gere emprego e renda, com salários dignos. Não há felicidade quando a dignidade da pessoa humana é atingida. Direitos sociais e trabalhistas são fundamentais em todo o processo de garantias civilizatórias, de políticas humanitárias. Palavras do Papa Francisco, abro aspas: "Trabalho quer dizer dignidade, trabalho significa trazer o pão para casa, trabalho quer dizer amar!". Fecho aspas. Ele é um peregrino, um caminhante, pela dignidade para os trabalhadores e pelo respeito aos direitos conquistados. Fala em um novo pacto social humano. Um novo pacto social para o trabalho, também diz o Papa. Ainda fala o Papa sobre trabalho precário: "É uma ferida aberta para muitos trabalhadores". Fecho aspas. Eu fiz um comentário rápido da fala dele, inclusive sobre o trabalho escravo, que infelizmente avança no Brasil. Só neste ano, mais de mil trabalhadores foram libertos no Brasil, sob trabalho escravo ou análogo ao trabalho escravo. Esta Comissão de Direitos Humanos não vai se calar. Sempre vamos nos manifestar em defesa da vida, do trabalho digno, dos mais humildes, vulneráveis, pobres, crianças, trabalhadoras e trabalhadores, mulheres, quilombolas, negros, brancos e indígenas. Defenderemos sempre a diversidade do povo brasileiro. Era uma introdução rápida, que aqui faço neste momento. E quero ainda, antes de passar a palavra para os nossos convidados, fazer um registro, que eu recebi aqui, lamentando, mas o faço em homenagem ao meu querido amigo, Dr. Hugo Cavalcanti. O convidado, Dr. Hugo Cavalcanti Melo Filho, Juiz do Trabalho e Presidente da Associação Latino-Americana de Juízes do Trabalho, nos informou hoje cedo que não poderia comparecer a esta audiência, em razão do falecimento do amigo e também Juiz, Theodomiro Romero dos Santos, aposentado em 2012, depois de quase 20 anos atuando como magistrado. Em nome desta Comissão de Direitos Humanos, esta Presidência mostra aqui toda a nossa solidariedade com familiares e amigos do inesquecível Dr. Theodomiro. Vamos agora, neste momento, nesta mesa, passar a palavra para o Dr. Renan Bernardi Kalil, Procurador do Trabalho, representante da Plataforma e Teletrabalho e Vice-Coordenador Nacional da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho (Conafret). A palavra é sua. São 15 minutos para cada um, neste momento. Dr. Renan, com a palavra. Sejam todos bem-vindos! Eu ainda nem tinha cumprimentado... Dr. Renan, fique bem à vontade para discorrer sobre o tema. O SR. RENAN BERNARDI KALIL (Para expor.) - Bom dia a todas e a todos. Gostaria, primeiramente, de fazer uma saudação à mesa, na pessoa do Senador Paulo Paim, agradecendo o convite. O Ministério Público do Trabalho entende que essas conversas, esses debates sobre modificações na legislação trabalhista, para avançarmos no arcabouço jurídico protetivo para o trabalhador, são fundamentais, e é uma honra estarmos aqui para podermos contribuir e tratar de alguns temas que são do nosso dia a dia, que nos causam preocupação. Um tratamento legislativo pensando no motivo pelo qual o direito do trabalho existe - não é, Senador? -, que é reconhecer a desigualdade econômica que existe entre o empregador e o trabalhador e pensar em formas de intervir nessa relação para proteger a parte mais fraca economicamente dessa relação, é fundamental e retoma o motivo pelo qual o direito do trabalho existe. |
| R | Para contribuir com o debate de hoje, a minha intervenção vai focar na questão das plataformas digitais e das conexões que existem com o teletrabalho. Quando a gente fala em trabalho via plataforma digital, geralmente a gente já imagina as atividades que motoristas e entregadores realizam, que são as que mais a gente verifica no nosso dia a dia. Porém - eu vou tratar disso aqui hoje, Senador, mas eu acho que é importante a gente frisar e eu vou abordar um pouquinho disso também -, o trabalho via plataforma digital não se limita a esse tipo de atividade. Existe uma série de outros setores econômicos que têm se utilizado dessa forma de trabalho, inclusive trabalhos que a gente não visualiza com grande facilidade, mas eu vou tratar primeiramente do que a gente verifica com mais frequência no nosso dia a dia. Essa primeira atividade, o trabalho que motoristas e entregadores - que são os grandes exemplos que a gente identifica - realizam, é o que a gente vai chamar de trabalho sob demanda por meio de aplicativos. Para a gente conseguir pensar que tipo de intervenção legislativa seria adequada de fazer, para a gente compreender o que é esse trabalho, a primeira questão que eu acho que é importante fazer, para limpar o terreno desse debate, é caracterizar o que, de fato, essas empresas são. Essas empresas se colocam perante a opinião pública, perante o Judiciário, perante uma série de outros atores econômicos e sociais, como se elas fossem empresas de tecnologia. Elas se colocam como empresas que realizariam meramente uma combinação entre demandas de seus clientes e a disponibilidade de pessoas que realizam entregas e, enfim, fazem condução de veículos. Porém, quando a gente se debruça um pouco mais sobre o que essas empresas fazem, elas não são empresas de tecnologia. O fato de uma empresa adotar uma inovação tecnológica avançada no seu processo produtivo não a transforma, automaticamente, em uma empresa de tecnologia, porque, caso contrário, qualquer empresa seria uma empresa de tecnologia. Ninguém abre o celular e pega o aplicativo para chamar um carro, para ir de um ponto "a" para um ponto "b", ou para receber um alimento, querendo uma solução tecnológica avançada. Ela quer aquele serviço específico, de transporte ou de entrega, que ela está pedindo. Então, isso eu acho fundamental para a gente conseguir identificar como esse trabalho acontece. Segundo, Senador - e eu acho que isso é importante verificar porque, em diversas investigações que o Ministério Público realizou, isso foi detectado -, essas empresas, muito embora se coloquem perante a opinião pública como empresas de tecnologia, quando a gente vai verificar no INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial), elas registram as suas marcas como se elas fossem empresas de transporte, como se elas fossem empresas de entrega. Elas não colocam que são empresas de tecnologia. Então, para o que de fato importa, que é proteger o seu direito de propriedade industrial - a sua marca, no final das contas -, elas se colocam como de fato são. Isso é importante para a gente começar a fazer esse debate. |
| R | O segundo ponto é compreender a dinâmica das relações de trabalho, principalmente das de motoristas e de entregadores. Essas empresas se colocam como se fossem intermediárias. Elas vão dizer que os trabalhadores têm liberdade para gerenciar os seus horários e para administrar os seus ganhos. Vão dizer que os sistemas de avaliações que utilizam são meros elementos de conveniência tanto para os seus clientes como para os trabalhadores poderem assegurar que só aqueles que realizam uma atividade devida e adequada possam permanecer na plataforma digital. Porém, de novo, quando a gente vai além da superfície e olha de uma forma mais detida como esse trabalho acontece, a gente vai verificar que essas empresas vão realizar um amplo controle sobre o que os trabalhadores vão fazer. Então, atividades que, anteriormente, eram realizadas por gerentes, por encarregados, por computadores, por trabalhadores que atuam nos setores de recursos humanos das empresas, atualmente são automatizadas. Os algoritmos - uma palavra que está na moda atualmente - de que todo mundo se utiliza para justificar uma série de questões... O que são os algoritmos? Os algoritmos são um conjunto de ordens que são pré-programadas. O conteúdo que o algoritmo vai estabelecer para que alguma coisa tenha que acontecer dentro da plataforma digital, esse conjunto de ordens vai ser programado por quem é dono do algoritmo, por quem é proprietário da empresa, da plataforma digital. O algoritmo não é um ente abstrato que tem vontade própria e que surge do nada. O algoritmo detém uma série de ordens e de políticas que vão refletir como o seu proprietário vai querer organizar a atividade econômica. Isso é importante a gente identificar, para ver como os trabalhadores vão ser, de alguma forma, controlados por essas empresas. Então, questões que, anteriormente, como eu estava mencionando, eram atribuídas a gerentes e tudo mais, hoje, são os algoritmos que fazem, como: distribuição de ofertas de trabalho, precificação da atividade, como que o trabalho tem que ser realizado, aplicação de punições, verificar se os trabalhadores estão realizando as suas atividades como as empresas querem que eles realizem. Tudo isso é possível de ser acompanhado a partir desse acompanhamento que as empresas fazem, o que acontece tanto pelo feedback que os seus clientes dão em relação a como o trabalho é prestado, como por informações extraídas em tempo real, dadas as atividades que esses trabalhadores fazem. Dentro desse contexto de como o algoritmo vai funcionar e vai determinar como o trabalho é feito, é fundamental também a gente olhar para o sistema de avaliações e ver como isso influi na distribuição de trabalho e na permanência do trabalhador dentro da plataforma. As empresas, em geral, estabelecem uma quantidade mínima de ofertas de trabalho que motoristas e entregadores devem aceitar para eles poderem receber ofertas de trabalho com mais frequência. Geralmente, essa taxa, que as empresas chamam de taxa de aceitação, é de 96% de trabalho aceito. Quanto à permanência na empresa, de novo, os trabalhadores, quando estão logados na plataforma, também têm que ter um grau de aceitação de atividades alto, porque senão a empresa não consegue dar vazão às demandas dos seus clientes. Então, se os trabalhadores, em geral, têm uma taxa de cancelamento de corridas maior do que 90%, eles podem sofrer uma série de punições, que vão desde a suspensão por alguns minutos até o bloqueio definitivo da plataforma digital. Então, a gente vê que essa liberdade, enfim, que é tão propagado que o trabalhador tem dentro da plataforma, é muito mitigada quando a gente se aprofunda em como que o trabalho é feito. |
| R | Um outro elemento que eu também acho que é importante de mencionar é que essa flexibilidade de horários - que, enfim, é algo que é disseminado que os trabalhadores gostam, que é algo positivo para a classe trabalhadora como um todo e que muitos motoristas e entregadores apontam como um dos grandes elementos que tornam esse trabalho positivo para eles -, essa flexibilidade é muito mitigada, na medida em que os trabalhadores dependem dessas atividades para sobreviver. Então, existe uma série de pesquisas que mostra que, quanto mais dependentes esses trabalhadores são, do ponto de vista econômico dessas empresas, menor a capacidade que eles vão ter de escolher os seus horários de trabalho e de poder, enfim, realizar a atividade como eles querem. Por último, em relação ao trabalho sob demanda por meio de aplicativos, um aspecto que eu acho importante de mencionar também: algumas empresas de entrega adotam um sistema de pontuação, Senador, em que os trabalhadores, para poderem atuar em determinadas áreas das cidades em determinadas faixas de horário - que seriam horários mais exclusivos, em que teria uma maior demanda e eles conseguiriam tirar mais dinheiro ou fazer mais dinheiro -, só é possível atuar nessas faixas de horário e nessas áreas da cidade conforme uma pontuação que eles obtêm na semana anterior do trabalho realizado; pontuação que leva em consideração, veja só, a quantidade de ofertas de trabalho que esses trabalhadores aceitam. Então, para eles poderem atuar nos melhores horários, para poderem receber mais dinheiro, eles vão ter que trabalhar mais em horários em que poucas pessoas vão estar disponíveis para fazer essas atividades. Então, existe uma espécie de círculo vicioso para levar o trabalhador a realizar muito trabalho para essas empresas. Para além disso - eu estou vendo que eu estou aqui nos meus quatro minutos finais -, para além desse caso do trabalho sob demanda por meio de aplicativos, tem um outro aspecto, que não é muito debatido e que eu gostaria de explorar aqui nos meus minutos finais: o que é chamado de crowdwork ou, se a gente for fazer uma tradução literal, "trabalho de multidão". O que é esse crowdwork? O crowdwork é uma espécie de trabalho que é realizado por meio de plataformas digitais. Só que, diferentemente do trabalho sob demanda por meio de aplicativos, em que você solicita um trabalho de uma forma virtual - online - no seu celular e o trabalho é realizado na sua presença, fisicamente - então tem alguém realizando a entrega e você está recebendo a entrega, tem alguém dirigindo o carro para te levar do ponto "a" ao ponto "b" -, no crowdwork você faz a solicitação desse trabalho por meio virtual, por meio de uma plataforma, só que o trabalho é realizado online também. Então, você não tem contato com a pessoa que está executando essa atividade. Existem algumas pessoas que vão também chamar essa atividade de "terceirização online". E, geralmente, o que é que as empresas vão fazer? Uma parte do processo produtivo delas, que era internalizada, elas vão colocar nessas plataformas, para que trabalhadores, que vão estar espalhados pelo mundo, que vão, por meio de uma chamada geral e indefinida... |
| R | (Intervenções fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vou pedir ao Dr. Renan... Eu já anunciei, inclusive, o seu livro, eu já falei do seu livro, o pessoal vai aprofundar. Eu queria aqui, com satisfação, registrar a presença já conosco, ao vivo, da Ministra Delaíde Alves Miranda Arantes, Ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Eu fiz aqui a defesa da CLT e da nossa Justiça do Trabalho. Uma grande salva de palmas. (Palmas.) O SR. RENAN BERNARDI KALIL - Então, essa terceirização online é uma forma que as empresas, em relação a atividades que anteriormente eram internalizadas, colocam para serem feitas por meio dessas plataformas digitais a partir de uma chamada geral e aberta de trabalhadores cadastrados nessas plataformas. Em geral, os trabalhadores que vão realizar essas atividades não têm conhecimento do todo do processo produtivo que eles estão realizando, o que vai impedi-los de entender o motivo pelo qual vão estar executando uma microtarefa e também de valorar o que vão estar fazendo. Em geral, existem três tipos de trabalho que acontecem por meio dessas plataformas de crowdwork, que são projetos, competições e microtarefas. A maior quantidade de atividades que são realizadas nessas plataformas de crowdwork são microtarefas que vão durar de minutos a segundos e, em geral, vão... (Soa a campainha.) O SR. RENAN BERNARDI KALIL - ... ter uma relação com classificação de informações, verificação e validação de dados. Então, para verificar se um perfil é autêntico ou não é numa rede social; criação de conteúdo; transcrição de áudio é um exemplo que a gente pode ter disso. Enfim, é uma série de tarefas que são de muito curta duração. Existem alguns problemas em relação a isso. O primeiro é: em geral as plataformas têm um sistema de remuneração que paga muito pouco, porque são atividades que são realizadas em espaços de tempo muito pequenos, mas que dão uma margem de manobra para os solicitantes desses trabalhos terem um grau de arbitrariedade muito grande em relação aos trabalhadores. Então, vamos supor que, para realizar uma atividade de três minutos, alguém ofereceu R$10. O produto dessa atividade é enviado de volta para quem solicitou a atividade e, em geral, as plataformas dão a possibilidade de quem solicitou esse trabalho rejeitar o trabalho sem dar grandes justificativas pelas quais está rejeitando. E, no geral, o solicitante fica com o produto desse trabalho e não faz o pagamento, o que cria uma situação de trabalho não pago, de retenção indevida de salário. Uma outra situação que vai acontecer é que algumas plataformas vão realizar o pagamento em espécie só para trabalhadores de determinadas nacionalidades e, para trabalhadores do resto do mundo, elas vão dar cupons para esses trabalhadores poderem gastar dentro do site delas. Então existe esse outro problema também: como é realizada a remuneração dos trabalhadores. Estou tentando dar um panorama muito breve aqui de como funciona o crowdwork porque existem alguns desafios em relação a isso. Quais? A gente tem geralmente três grandes atores envolvidos nessa relação de trabalho: o trabalhador, a empresa proprietária da plataforma digital e os solicitantes desses trabalhos. E o problema, Senador, é que, em uma parte considerável desses trabalhos, cada um desses trabalhadores está num local do mundo, então, para se conseguir verificar que lei deve ser cumprida e como fazer com que essa lei seja cumprida, a gente está diante de um desafio bem considerável. |
| R | Existe uma quantidade razoável de trabalhadores envolvidos nisso, apesar de ser difícil quantificar. Uma plataforma que é muito conhecida, a Amazon Mechanical Turk diz que tem 500 mil trabalhadores cadastrados na plataforma que realizam essas atividades de microtarefa. Então eu acho que, essas questões que tratam do crowdwork, é importante dimensionar, porque é uma questão de trabalho, primeiro, de plataforma digital que não é muito debatida, que é invisibilizada, em que eles alimentam grandes estruturas, Senador, de inteligência artificial. Então uma parte considerável das atividades colocadas nessa plataforma de crowdwork é o que vai se chamar de trabalho cultural. O que é o trabalho cultural? É a classificação em processamento de um grande volume de dados que se relacionam com imagens, sons, linguagem que, em inteligência artificial, pelo menos até o momento, não é capaz de identificar o padrão humano que advém dessas formas de manifestação dos seres humanos e de fazer correlações com outros pontos que eles gostariam. Recentemente, faz um mês mais ou menos, saiu uma notícia de que o ChatGPT, que está na moda impressionando todo mundo, em relação ao que esse instrumento opera, saiu uma reportagem, um mês atrás, num meio de comunicação britânico, não lembro exatamente qual, em que milhares de trabalhadores africanos estavam alimentando o ChatGPT, porque todas aquelas informações que o ChatGPT é capaz de operar para nos dar aquelas respostas que causam assombro em todos nós, tudo aquilo, de alguma forma, teria que ser classificado, catalogado, processado, para que tudo aquilo aconteça, não é uma mágica que vem do nada, e são trabalhadores em geral localizados no sul global, extremamente mal remunerados, que estão fazendo isso, que estão alimentando, treinando e customizando essas informações que são... (Soa a campainha.) O SR. RENAN BERNARDI KALIL - ... gerenciadas por esses grandes instrumentos. Enfim, estou falando um pouco do crowdwork porque se relaciona com o teletrabalho, porque é uma forma de teletrabalho, todo mundo à distância, são trabalhadores que têm menos visibilidade do que motoristas e entregadores, não têm nenhum tipo de proteção social atualmente. O Ministério Público do Trabalho chegou a ajuizar até contra uma plataforma de crowdwork que atua no Brasil, que se chama Ixia. A gente teve procedência na primeira e na segunda instância, mas é um debate que ainda está num segundo momento. E eu acho que quando a gente fala de plataforma digital é fundamental olhar para essa forma de trabalho cada vez mais, para que a gente não olhe só para entregadores e motoristas, o que é relevante de ser tratado, mas para que não se deixe esses outros trabalhadores que também estão atuando e que a gente tem uma dificuldade de visibilizar no nosso dia a dia laboral. Finalizando a minha exposição, Senador, é isso que eu gostaria de deixar registrado. Agradeço mais uma vez o convite e a oportunidade de estar neste debate. Obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Nós que agradecemos, Dr. Renan Bernardi Kalil, Procurador do Trabalho e representante da Plataforma e Teletrabalho, e Vice-Coordenador Nacional da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho. |
| R | Olha, meus cumprimentos, Dr. Renan, porque você conseguiu, de forma simples, dar uma situada no mundo do trabalho em termos modernos, querendo ou não, porque tudo está mudando. Esse debate nós começamos aqui bem devagar em 2018. Bem devagar, discutindo trabalho intermitente, discutindo terceirização, mas vamos avançando. E a sua exposição, muito trabalhador, a gente fala todo dia: ah, algoritmos, novas plataformas, quem é o empregador, é na outra parte do mundo. É um aprendizado. E a sua exposição entrou muito nesse tema, como tem que entrar. Nós temos que enfrentar esse debate. Temos que entender o que está acontecendo. Por isso que o debate da atualização da CLT, a gente chama de Novo Estatuto do Trabalho, mas é a nova CLT, atualizar a CLT. Então, meus cumprimentos aqui. V. Exa. deu aqui uma pequena aula. Nós queremos outras aulas, em outros momentos, sobre esse tema. Eu sei que ele é complexo para todos nós, não só para nós que estamos aqui. Calcule o trabalhador. Eu sou do tempo de fundição. Ou lá da marcenaria ou lá da fundição, lá da construção civil. De repente, ele está vendo que tudo está mudando. Só vou dar um exemplo para vocês. Quando eu comecei na metalurgia, depois de me formar no Senai, lá que eu fiz o curso técnico, eu fui trabalhar numa fundição. Mas eu era um modelista. Sabe o que era um modelista? Era um bam-bam-bam. Eu aprendi com conhecimento e desenho. Nunca me esqueço aqui do Sr. Bodini. Ele que me ensinou a fazer modelos. Fazer o molde. Pega um desenho, faz o molde na madeira, depois transforma isso e aquilo e produz o motor de um carro. Dali que surgia o motor do carro. Hoje é tudo no computador. Se eu voltar hoje para o emprego onde eu estava naquela época, porque eu ganhava já um salário de uns R$7, R$8 mil. Eu era um técnico. Eu estou desempregado, nem entro na porta. Naquele tempo lá, em que se fazia um molde para fazer o motor do carro, fazer uma peça fundida. Então, sinto muito, mas os tempos mudaram aqui. Só se eu entrar para segurança, porque eu entendia um pouco de segurança no trabalho. Só para mostrar como os tempos mudam. Se eu voltasse para a minha empresa, não teria espaço. E nós temos que discutir isso no mundo do trabalho, é o que nós estamos fazendo aqui hoje. Então, parabéns a V. Exa. Eu vou passar a palavra de imediato, porque ela tem um outro compromisso às 10h30 e já conversei com os nossos painelistas e todos concordaram, Ministra. A senhora tem muito prestígio, viu? Sim, sim. A Ministra está em primeiro lugar. Foi unânime aqui. Foi ou não foi? Fiz uma pequena pergunta e todos disseram: "Não tem problema, Paim". Então, eu passo a palavra à nossa querida convidada também, como todos os outros, a Ministra Delaíde Alves Miranda Arantes, Ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST) aqui conosco neste momento para usar o seu... São 15 mais 5, com a tolerância devida. A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES (Para expor.) - Quero cumprimentar o Senador Paim e agradecer a honra do convite, e cumprimentar o Renan, que acabou de fazer sua fala - são duas mesas, não é, Senador? -; a Ana Luiza Horcades, do Sinait; o Henrique Souza, do Ministério do Trabalho; aí, na segunda mesa, o Rosildo - o Rosildo é Coordenador Regional do Mati -; a Cirlene Zimmermann, que é Procuradora do Trabalho; e o nosso professor de todos, Guilherme Guimarães Feliciano, que também faz parte da segunda mesa. |
| R | Quero cumprimentar a Senadora Zenaide, que é a Vice-Presidente desta importante Comissão. Eu participei de debates aqui da reforma trabalhista e também, logo depois, quando V. Exa. apresentou o Código do Trabalho. Quero cumprimentar todos os presentes aqui na pessoa da nossa assessora do TST, a Sary, que está aqui presente, e também os assessores parlamentares que me acompanham. Senador, é muito importante essa iniciativa do Código do Trabalho, e não é para justificar o meu atraso, não, mas eu me dei conta de que eu precisaria trazer uns dados que foram colhidos pela minha assessoria de última hora. Este ano de 2023 é um ano muito especial: é o ano dos 80 anos da CLT, é o ano dos 35 anos da Constituição Federal e é o ano da reconstrução da nossa democracia. A nossa abalada democracia... (Palmas.) ... não é à toa que estou sempre com esse bóton do Supremo Tribunal Federal. É o ano da reconstrução, da reconstrução social, a reconstrução na política, a reconstrução econômica. É a reconstrução do Brasil. Então, é um ano muito especial. E o Código do Trabalho adquire uma importância muito grande nesse contexto. Eu trago aqui para a gente contextualizar alguns dados: a CartaCapital desta semana traz uma matéria escrita inclusive por uma advogada que é da comissão de defesa do trabalho: "Escravidão, ainda". E o que me chamou mais atenção na matéria: "A lei dos senhores. Como a Justiça perpetua a escravidão moderna". Então, são questões assim... A Valena Jacob, que é advogada no Pará, ela e a Camila Lourinho Bouth escreveram essa matéria muito bem colocada. Trago aqui para nossa reflexão, para reforçar a importância do Código do Trabalho, os prejuízos e o retrocesso, que foi a reforma trabalhista, aprovada há seis anos, não gerou emprego, não modernizou a legislação trabalhista, fez foi aumentar o número de trabalhadores informais, que hoje chega a quase 50% dos nossos trabalhadores. E o papel da reforma trabalhista no enfraquecimento da representação sindical, na tentativa de enfraquecimento da Justiça do Trabalho, do Direito do Trabalho, do Processo do Trabalho e o objetivo da reforma de excluir a proteção do trabalhador. A proteção do trabalhador é a razão de ser da CLT, que completa 80 anos neste ano. E também, para registrar, a falta de cultura de aplicação das normas internacionais pelo Judiciário brasileiro. O Senador falava muito gentilmente sobre o livro que lancei. Eu nem falo aqui do livro, falo da minha pesquisa que deu origem a um livro. Eu fiz uma pesquisa, pesquisando a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho num período de 10 anos. Eu concluí a minha pesquisa, que foi o meu mestrado na UnB, em março de 2022, março do ano passado, e pesquisei mais de 2 mil decisões do TST, e cheguei à conclusão, na minha pesquisa, de que pouquíssimas decisões têm, nos seus fundamentos, o trabalho decente da agenda da Organização Internacional do Trabalho. |
| R | Então, o diretor da OIT, o Vinícius Pinheiro, que falou no dia do lançamento do meu livro, disse: "Não deixa de ser um puxão de orelha no Tribunal Superior do Trabalho". É porque eu tinha que fazer um recorte, eu fiz a pesquisa no TST, mas isto se aplica também à Justiça do Trabalho: a falta de cultura de aplicação de normas internacionais. Uma vez publicada a reforma trabalhista naquela conjuntura, naquele contexto, nós tínhamos as normas internacionais do trabalho, a jurisprudência da Corte Interamericana e, mais ainda, a Recomendação nº 123, do Conselho Nacional de Justiça, que recomenda a todo o Judiciário brasileiro aplicar as normas internacionais. Na prática, pesquisas - não só a minha, mas tem outras também - provam que isso não acontece. Além disso, a jurisprudência da Corte Interamericana também não é aplicada. E, de acordo com os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, todos os juízes nacionais têm obrigação de fazer o controle da convencionalidade, ou seja, controlar as normas internas para ver se elas passam pelo crivo das normas internacionais. Estou trazendo tudo isso, Senador Paim, para a gente ver, porque eu sei que milhares de pessoas vão assistir a esta nossa audiência pública... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Estão assistindo. A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES - ... estão assistindo e ainda vão assistir, porque ela é replicada... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Permita-me que eu diga, Ministra. Nas audiências públicas, não somos só nós que estamos aqui, mas são milhões de pessoas, uns que estão assistindo, como V. Exa. disse, e outros que vão assistir. Daí a importância da exposição de vocês aqui. E meus cumprimentos pela sua exposição e pela ousadia já. A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES - Existe uma outra questão, que se reveste da maior importância, ainda, que é a elitização da advocacia trabalhista perante os tribunais superiores, os mais de um milhão de advogados em proliferação, de cursos jurídicos sem qualquer preocupação com a formação para a carreira da advocacia. E os inúmeros verbetes do TST, a aprovação da transcendência... Eu vou, depois, explicar, rapidamente, o que tudo isso significa, que são os obstáculos ao conhecimento dos processos na segunda e na terceira instâncias, e o prejuízo que isso tem para os jurisdicionados. Eu manuseei o Código do Trabalho, estou ainda na leitura do projeto, de todo o projeto, mas vi a importância que tem os Capítulos... e V. Exa. também abre um amplo diálogo. A Convenção nº 144, da Organização Internacional do Trabalho, nunca foi tão atual sobre a necessidade desse diálogo social. Eu vejo aqui contribuições que são enviadas pela ANPT. Na Justiça do Trabalho, também nós estamos à disposição. Eu trago aqui alguns dados para o senhor ver, Senador Paim: o Tribunal Superior do Trabalho tem 463 Súmulas; tem 421 OJs da SDI-1; tem 89 OJs Transitórias; 158 OJs da SDI-2; e 38 OJs da SDC. Tudo isso são verbetes do TST, que são aplicados nos julgamentos, tanto do ponto de vista procedimental, quanto do ponto de vista do direito material. Então, são informações que nós precisamos ter em mente, para que haja uma valorização maior da importância de um código do trabalho. |
| R | E na reforma trabalhista diziam que o Brasil - numa formulação muito errada, que a gente discutiu muito - é campeão de ações trabalhistas. Primeiro que não é verdade. E, segundo, o Brasil é um país com vários brasis. E quem pegar o Relatório Justiça em Números, do CNJ, vai chegar à conclusão de que o Brasil é um país de transgressores da legislação trabalhista e não campeão de reclamações trabalhistas, porque o número de ações de descumprimento da legislação trabalhista.... E a gente pode ver pelos maiores devedores. Quem são os maiores devedores? As instituições financeiras encabeçam a lista dos maiores devedores. Eu peguei um dado aqui que foi o mais atualizado que eu encontrei, que é de 2021: o TST tem um total de 421.732 processos. É quase um milhão de processos para julgar. O Tribunal do Rio de Janeiro tem 227 e o Tribunal de São Paulo tem 479 - 479 mil processos para julgar. E - pasmem! - na execução, quando o processo transita em julgado, que não cabe mais nenhum recurso, apenas 33% são efetivamente executados, ou seja, 33% dos trabalhadores recebem efetivamente os seus direitos trabalhistas depois de transitado em julgado. Então, são questões sobre as quais nós precisamos nos debruçar. Eu tive acesso também a uma outra notícia. Essa notícia não é tão recente. Ela é de julho de 2019, mas depois da reforma, não é? Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia compõem o grupo de 12 nações em que violação de garantia dos trabalhadores é apenas esporádica. É um sonho de consumo de nós brasileiros, não é, Senador Paim? E aí, diz mais... Esse levantamento foi feito em 135 países por uma entidade, a Confederação Sindical Internacional (ITUC), na sigla em inglês. A entidade é a maior união de sindicatos do mundo. Nós precisamos tomar iniciativas. Quando eu falo nós é tanto o Parlamento, quanto o Poder Executivo, quanto o Judiciário, quanto a sociedade brasileira, para a valorização das representações sindicais. Esse diálogo tripartite, com o movimento de trabalhadores fortalecido, é da maior importância. E aqui o que eu... Não vou ler a matéria toda. É uma matéria curta, que diz o seguinte sobre a questão da valorização do direito coletivo nesses países, onde o descumprimento dos direitos dos trabalhadores é muito pequeno, que diz o seguinte: |
| R | O estudo está em sua sexta edição. Ao lado do Zimbábue, o Brasil apareceu na lista dos dez piores pela primeira vez [Isso em 2019]. Ambos os países receberam avaliações piores neste ano porque, segundo a ITUC, adotaram leis mais restritivas, reprimiram greves e protestos com violência e registraram ameaças e intimidação a líderes sindicais. O grupo dos piores tem ainda Arábia Saudita, Argélia, Bangladesh, Cazaquistão, Colômbia, Filipinas, Guatemala e Turquia. O Brasil está medito aí. A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES - Então, é muito lamentável, mas eu quis trazer. Aqui fala que o ITUC avalia 97 indicadores previstos na convenção da Organização Internacional do Trabalho para fundamentar essa pesquisa. É uma pesquisa de peso. Então, eu creio que tudo isso nós precisamos levar muito em conta e valorizar a iniciativa que é de um código do trabalho. É só nós pesquisarmos o Direito Comparado para ver que países mais avançados no mundo ou têm código do trabalho ou o equivalente a um código do trabalho. Eu estive em um evento em Campinas... (Soa a campainha.) A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES - ... palestrando, e tinha um palestrante português. Ele falou das medidas que Portugal está tomando. Portugal, em 1º de maio, aprovou uma série de medidas, dentre as quais penalização com prisão de empregadores domésticos que não fizeram um registro dos trabalhadores domésticos. Está em vigor desde 1º de maio deste ano, dentre outras medidas. E ele dizia: "Não tem outra forma: pena de prisão". Empregador doméstico que não fizer o registro, que permitir, contribuir para que o trabalho... Isso é um processo criminal; naturalmente, vão ser apuradas as consequências, mas hoje... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vida longa a essa lei de Portugal! Que venha para o Brasil, porque o trabalho escravo e essa situação... (Palmas.) A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES - E a reforma trabalhista contribuiu para aumentar a exploração do trabalho infantil e o trabalho escravo. Eu tenho falado muito sobre isto: a reforma trabalhista, a terceirização ampla, os contratos precários, introduzidos pela reforma trabalhista, todo esse contexto contribuiu enormemente para a piora desses indicadores, ou seja, está sendo muito violado o trabalho digno da nossa Constituição Federal, que é o mesmo trabalho decente da Agenda da OIT e da Agenda 2020 da ONU, que tem também o objetivo de implementação do trabalho decente. Eu quero dizer, Senador, que eu preparei uns eslaides. Vou até pedir para colocar, mas eu não vou me deter nos eslaides, não; eu só quero... Se V. Exa. tiver como disponibilizar um link, para que as pessoas possam consultar... Eu falo aqui sobre - vou passar muito rapidamente - o trabalho digno da Agenda 2030, o Objetivo 8; algumas normas internacionais da OIT, que contribuem para a implementação do trabalho decente; o que diz a Agenda 2030 da ONU; a importância do seu cumprimento, o que ficou muito esquecido nesses nossos últimos quatro anos principalmente, mas depois da reforma trabalhista, de uma forma geral, agravado pelas políticas do poder central dos últimos quatro anos, inclusive com a extinção do Ministério do Trabalho, que agravou ainda mais o retrocesso social. |
| R | Eu falo aqui da proteção na agenda do trabalho decente, aqui enumerando muito rapidamente; e dos direitos humanos e sociais no Estado democrático de direito. Eu quero reforçar que nós só podemos falar em direitos humanos, na defesa dos direitos humanos, em código do trabalho, em CLT, de 80 anos, no Estado democrático de direito. Então, nós precisamos trabalhar diuturnamente para o reforço da nossa democracia. Sobre o trabalho decente nas normas internacionais, nós temos inúmeras - que é o próximo - normas internacionais de proteção dos direitos humanos, de proteção do trabalho digno. Ali começa com a Declaração Universal dos Direitos Humanos. A Organização Internacional do Trabalho é uma entidade já centenária, completou cem anos em 2019 e tem inúmeras normas internacionais, inclusive ratificadas pelo Brasil. E, para nós aplicarmos normas internacionais - eu falo nós julgadores -, elas nem precisam ser ratificadas. Se ela tiver conteúdo de direitos humanos, ela pode ser aplicada independentemente de ratificação. E trago aqui, para a nossa visualização rápida, o nosso cenário brasileiro. Nós temos que saber em que cenário nós estamos defendendo um código do trabalho, não é? Nós convivemos com o aprofundamento do neoliberalismo, ataques ao Estado democrático de direito - e não pensem que esses ataques acabaram, eles continuam, inclusive com uma insurgência contra o projeto do Deputado Orlando, que é de normatização... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - De combate às fake news. A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES - ... de combate às fake news -, o aumento da violência doméstica, a precarização do trabalho e tantos outros... (Soa a campainha.) A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES - ... sobre os quais, inclusive, eu já falei. Esse cenário brasileiro fez com que o Brasil retornasse ao Mapa da Fome da ONU e houvesse os ataques ao Supremo Tribunal Federal. Sempre que nós falamos nisso, nós precisamos reforçar aqui: ditadura nunca mais!, 8 de janeiro nunca mais! - essa precisa ser uma meta nossa. As normas protetivas, a redução das normas protetivas do Direito do Trabalho, que vêm reforçar também a importância do código do trabalho. Sobre as convenções e ratificação também já falei. O princípio da proteção estabelecido na Constituição Federal, que é da maior importância, nós precisamos reforçar no marco dos 35 anos. O Senador Paim é subscritor da nossa Constituição Cidadã, como o meu marido também, o Deputado Aldo Arantes. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Grande Aldo Arantes! Eu já estou com 35 anos... A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES - Trinta e cinco... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - ... de Constituinte. (Risos.) Eu quis brincar só: 35 anos de Constituinte. A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES - De Constituinte. A desconstrução do trabalho digno. Aí a gente tem alguns cenários de desconstrução. Eu trago, no próximo, uma reflexão: "O que nós precisamos fazer?". E eu respondo, em meio a todas essas questões de reflexão, que sempre deve prevalecer a norma mais favorável, que é pro homine, que é da nossa legislação nacional e internacional. |
| R | E quero finalizar lendo aqui uma afirmação retirada de um artigo da Ministra Kátia Magalhães Arruda, minha colega Ministra do Tribunal Superior do Trabalho, que é dirigida mais a nós julgadores, mas eu acho importante, numa sessão da magnitude desta, falar. Leio em aspas: É essencial que haja uma mudança de mentalidade nos aplicadores das normas inerentes aos direitos fundamentais, visto que a interpretação formal do direito e a aplicação estática da lei não são condutas compatíveis com o papel do Judiciário como representante de um poder constitucional [...]. Acho muito importante. Quero disponibilizar esses eslaides com esses dados que eu trago. Se V. Exa. puder disponibilizar em link... Quero agradecer aí a oportunidade e dizer que o Tribunal Superior do Trabalho estará a postos para discutir o Código do Trabalho. E meus parabéns pela apresentação do projeto! - e que ele seja prioridade. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Ministra Delaíde Alves Miranda Arantes, Ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST)! (Palmas.) Já está assegurado, viu? Já está disponível a partir deste momento, totalmente disponível. E quando... A intenção nossa é fazer esse debate nos estados. A senhora nos dá este direito? Quando nós formos para lá, vamos pedir para que todos entrem na sua palestra aqui, na Comissão de Direitos Humanos. A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES (Fora do microfone.) - Cedido, com honra. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ah, muito obrigado! Mas veja, Ministra Delaíde, a sua fala pega exatamente como tal a situação do Brasil - como diz o outro, em pleno século XXI discutindo trabalho escravo -, e, ao mesmo tempo, o Procurador do Trabalho, Dr. Renan Bernardi, mostrou todo este mundo da inteligência artificial e o mundo do trabalho - estou resumindo, aqui, não é? Veja a importância desse debate. Nós vamos colocar toda esta audiência pública à disposição da população. Por favor, Dra. Ana Luiza Horcades, Auditora-Fiscal do Trabalho, representante do Sinait. A SRA. ANA LUIZA HORCADES (Para expor.) - Bom dia a todos! Quero começar agradecendo pelo convite para participar desta audiência, agradecendo ao Senador Paim, que vem promovendo, desde 2018 pelo menos, este espaço de construção de diálogo social que é tão importante para a gente, de fato, chegar a uma norma, a um código, a um estatuto que represente as relações de trabalho que a gente vive, de fato, no Brasil. Quero cumprimentar o tribunal, na pessoa da Ministra; cumprimentar o Ministério Público do Trabalho, na pessoa do Procurador Renan, que fez uma fala muito importante, que eu vou aproveitar e comentar um pouquinho também. Quero cumprimentar todos os meus colegas auditores-fiscais do trabalho, na pessoa do meu chefe, Dr. Henrique Mandagará de Souza, que tive o prazer de conhecer hoje pessoalmente - agora é que a gente está voltando a conhecer as pessoas em pele e osso, não é? E quero cumprimentar também todos os meus colegas do sindicato, do Sinait, que é o Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho, que, ao longo desse tempo todo, tem sempre feito questão de ocupar esse espaço que o Senador Paim vem promovendo. |
| R | O tema que me pediram aqui para discutir hoje é dentro dessa discussão que a gente começou lá em 2018, do Estatuto do Trabalho, quando eu estive aqui, fazendo parte dessa discussão, é falar um pouco sobre as normas regulamentadoras: qual seria o papel dessas normas regulamentadoras num cenário em que o Estatuto do Trabalho saia do papel, que ele realmente venha a ganhar vida aqui, no nosso meio jurídico. Pode passar para mim, por favor. Tem como eu mesma passar daqui? Não, não é? Acho que não. Então, lá em 2018, quando a gente começou a pensar no Estatuto do Trabalho e ocupar este espaço aqui, discutir o que a gente quer em matéria de legislação - não, de fato, o que a gente quer, mas do que a gente precisa em matéria de legislação -, a gente pensava em... (Intervenção fora do microfone.) A SRA. ANA LUIZA HORCADES - Obrigada. A gente pensava em criar uma lei que, de fato, servisse para regular, de forma eficiente, de forma positiva, de forma equilibrada as relações de trabalho, e que ela fosse - que ela trouxesse obrigações, obrigações para todos, e era um Estatuto do Trabalho, e não um "Estatuto do Emprego" - um Estatuto do Trabalho que trouxesse obrigações que todos nós, enquanto operadores do direito, pudéssemos, de fato, converter em um meio ambiente de trabalho seguro e saudável para todos. Eu estou falando da parte de meio ambiente do trabalho porque foi a parte de que eu participei aqui da construção, mas, com certeza, esse era o princípio em todas as partes do Estatuto do Trabalho. Mas, com relação ao meio ambiente de trabalho, a gente pensava isto: como construir um texto que trouxesse obrigações que a gente pudesse materializar na transformação do meio ambiente de trabalho para garantir a segurança e a saúde de todos dentro desse Brasil - que são vários brasis - que a gente conhece, que tem uma grande desigualdade. A gente não precisa nem ir para muito longe; a gente pode estar dentro do Rio de Janeiro, que é o meu estado. Mesmo dentro do Rio de Janeiro, e mesmo do nosso lado, dentro de um prédio, você ainda encontra o trabalho em situação análoga ao de escravo, você ainda encontra todo tipo de mazelas com que a gente não esperava que hoje, em 2023, a gente ainda estivesse convivendo. Eu, antes até de entrar nessa parte da fala, vou... Eu sou chefe de fiscalização de segurança e saúde no trabalho no Estado do Rio de Janeiro. Enquanto chefe de fiscalização, a gente tem a obrigação de pensar e executar políticas públicas relacionadas ao trabalho. Então, a gente tem a obrigação de contribuir com a construção de um planejamento em nível nacional e executar esse planejamento em nível regional - no meu caso, no Estado do Rio de Janeiro. Essas obrigações são também no sentido - esse planejamento - de, de fato, construir um estado onde as pessoas não morram e não adoeçam no desenvolvimento de suas atividades laborais. Até complementando a fala do Senador, que começou citando um número absurdo e inimaginável de mortes no trabalho, só lembrando, essas mortes, esse número, é um número que não diz tanta coisa, porque são as mortes daqueles empregados que foram notificadas ao sistema; ele não representa, de fato, o número de pessoas que morreram em razão do desempenho da sua atividade laboral, porque - e aí, também, complementando com a fala da Ministra - a gente tem uma informalidade que não nos permite nem sequer conhecer, de fato, quantas pessoas estão morrendo no Brasil em função do desempenho das suas atividades laborais |
| R | E quando a gente pensa em políticas públicas em matéria de trabalho, a gente pensa de uma forma que, além desses que são empregados, que são só aquela pontinha da pirâmide, a gente possa atingir e promover a saúde de todas as pessoas que trabalham no Brasil. Esse é o trabalho que a Auditoria Fiscal do Trabalho busca fazer, pensar, em Brasília, com a contribuição dos estados, executar de forma capilarizada em todos os estados, tomando por base o quê? Justamente a legislação. Então, lá em 2018, quando a gente teve a oportunidade valiosíssima de sentar aqui, produzir conhecimento técnico em matéria de legislação trabalhista e pensar numa lei, a gente pensava - e a gente enquanto auditor fiscal do trabalho - em uma lei que nós pudéssemos de fato executar; não uma lei que nascesse para ficar no papel, mas uma lei que a gente pudesse, lá no ambiente de trabalho - porque a gente vai às empresas fazer a fiscalização, a gente conversa com os empregadores, a gente conversa com os trabalhadores -, utilizar como uma ferramenta de promoção de dignidade e de equilíbrio nas relações de trabalho. Não é uma lei que busque simplesmente proteger o trabalhador; é para proteger as relações de trabalho, e a importância que isso tem numa sociedade que quer andar para frente, que quer evoluir. Então, era para ser uma proposta de uma lei eficiente, uma lei completa, que tratasse realmente da regulamentação das relações de trabalho em sentido amplo, que fornecesse ferramentas para que todos os atores sociais que atuam nessa seara de fato pudessem promover sua implementação, para que os trabalhadores pudessem de fato desfrutar daquilo que está escrito naquela lei. Só que isso foi em 2018, e, de 2018 para cá, a gente tem um outro planeta. São cinco anos; para mim é como se fosse até outra encarnação, porque tudo que a gente conhecia em matéria de atuação - e aí atuação, por exemplo, da auditoria - precisou ser reinventado para buscar conquistar uma eficiência. Então, cinco anos, em matéria de tempo para uma lei, é ontem, porque a lei demora bastante tempo para produzir seus efeitos, mas, nesse caso, a velocidade empurrou de tal forma as relações de trabalho, a realidade do meio ambiente de trabalho, que aquilo que a gente estava pensando com muita dedicação lá em 2018, com muita pesquisa... Porque a gente pesquisou profundamente a legislação daqueles países que são o que a gente quer ser, que têm relações de trabalho equilibradas e saudáveis; foi com base nessas legislações que já estão dando certo que a gente construiu aquele texto do Estatuto do Trabalho. Só que essas transformações que foram acontecendo ao longo desses cinco anos... E eu não vou nem discutir se elas são positivas ou negativas, porque nós tivemos transformações positivas, que realmente nos permitem melhorar a forma como a gente executa os direitos do trabalho, e outras negativas. Não importa, eu não vou entrar nessa avaliação agora. O fato é que essas transformações foram reais. |
| R | A gente passou por situações, por exemplo, como essa da foto, que eu não consigo desver, que foi acho em abril de 2021, naquele pior pico da pandemia, em um pronto-socorro, no Piauí. Naquele cenário de caos, essa técnica de enfermagem que se chama Polyena - também não vou me esquecer porque essa matéria viralizou - está desolada, sentada no chão, depois de tentar reanimar um paciente que já chega ali, enfim, em estado gravíssimo, vem a falecer no chão e fica ali no chão. Isso não foi um caso isolado. A gente passou por uma série de situações dessas que, talvez, por mais que os trabalhadores do serviço público já tenham visto bastante coisa, o que se viu, ali na pandemia, foi tudo inovação, em matéria de atuação desses profissionais. Então, a pandemia, por si só, já nos faria repensar tudo aquilo que a gente escreveu no Estatuto do Trabalho, em 2018. A pandemia trouxe uma necessidade de revisão de tudo o que a gente pensa sobre o trabalho, para os trabalhadores de uma forma geral, porque muita gente morreu porque trabalha. A gente tem número enorme e um número que a gente não consegue, de fato, conhecer, em função, principalmente, da informalidade, de pessoas que morreram porque tinham que trabalhar. A gente tem um número enorme de pessoas que morreram, por exemplo, em função de falta de trabalhadores em determinados serviços. E a gente tem que considerar também um número enorme de pessoas, principalmente nos serviços de saúde, que teve uma contaminação altíssima e que carrega sequelas decorrentes dessa contaminação que a gente ainda não conhece, porque a doença covid-19, que é fruto da contaminação pelo agente biológico SARS-CoV-2, essa doença nasceu ontem e ainda vai produzir muitos efeitos sociais, e a gente tem que estar preparado para isso. Então, essa legislação que a gente estava pensando, que não nasceu ainda, não pode nascer velha e precisa ser revista. É para isto que a gente está aqui: para repensar tudo aquilo que estava moderno, mas que, em função de tudo o que aconteceu, precisa ser repensado. Um outro fato que aconteceu e também precisa estar transparente, estar transcrito no texto do nosso Estatuto do Trabalho, é que, agora, a Organização Internacional do Trabalho declarou que segurança, hoje, no trabalho, é um direito fundamental. Será que isso já está, de fato, transparente no nosso Estatuto do Trabalho? Ou será que a gente precisa rever a forma como a segurança e a saúde do trabalho estão escritas e reescrever, para dar este peso à segurança e saúde do trabalho no nosso Estatuto do Trabalho? Então, o nosso objetivo agora é este: reavaliar tudo aquilo que a gente escreveu para que, de fato, os objetivos iniciais se mantenham atingidos. Quanto a essa questão da velocidade nas transformações sociais, que é um fato - isso não vai voltar para trás, a gente não vai voltar ao ritmo de transformação que tinha há dez ou há vinte anos -, também a nossa legislação, o nosso estatuto tem que estar pronto para isso. Tem que estar pronto para um mundo que é muito mais dinâmico do que era, há cinco anos, quando a gente estava ali escrevendo. Então, esse estatuto tem que continuar eficiente, tem que continuar executável e tem que continuar atual, o que também justifica a gente estar aqui discutindo tudo de novo. Eu até usei essa imagem que fala com a fala do Dr. Renan, porque, se eu quero o Estatuto do Trabalho, eu não posso deixar ninguém de fora. Eu preciso de um estatuto que traga, que permita ou desfrute desse direito fundamental à segurança e à saúde do trabalho para todos os trabalhadores. Eu não posso deixar ninguém de fora. E esse pessoal, que não são nem dez, nem vinte pessoas - a gente tem um volume quase que desconhecido de pessoas envolvidas direta ou indiretamente nesse tipo de atividade - têm que estar dentro do nosso texto, devem estar abraçados e previstos no texto que vai sair aqui desse estatuto. |
| R | Considerando tudo isso, a gente tem que botar no estatuto, atribuir à lei aquilo que é matéria da lei... (Soa a campainha.) A SRA. ANA LUIZA HORCADES - ... mas considerando que nem tudo é matéria de lei. Determinadas especificidades não precisam estar previstas na lei; elas podem estar previstas em regulamentos técnicos, como é o caso das normas regulamentadoras. Eu posso continuar contando com regulamentos técnicos que tenham o objetivo de complementar aquilo que está previsto em lei. E, para saber o que vai para a lei e o que vai para o regulamento, eu tenho que considerar, por exemplo, essa questão da velocidade das relações em comparação com a velocidade, por exemplo, do processo legislativo, que tem um tempo natural para correr. Não se muda uma lei de um dia para o outro; então, a gente tem que conhecer, por exemplo, essa questão da velocidade. A gente tem que conhecer quais são as forças políticas que, de fato, interferem no resultado de uma lei ou de um regulamento técnico, porque isso também vai continuar acontecendo independentemente do momento em que a gente estiver vivendo, e principalmente a importância do diálogo social, porque não existe uma lei que saia da cabeça de um monte de homens brancos de gravata no ar condicionado. Essa lei não vai, de fato, ser implementável, essa lei não vai, de fato, refletir aquilo que a gente precisa para poder regular as relações de trabalho. A gente precisa de toda a sociedade participando, discutindo e se colocando de igual para igual nesse ambiente de discussão para criar seja a lei, seja qualquer outra forma de regulamento, e é o que a gente está fazendo aqui inclusive. E hoje, na nossa legislação, a gente tem a CLT, a gente tem uma série de outras leis que tratam de matéria trabalhista, como por exemplo a Lei 6.019, e a gente tem as normas regulamentadoras que são publicadas por meio de portaria. O que é uma portaria? Para começar, a portaria atua secundum legem, ela atua de forma a complementar mesmo algo que está previsto na lei com fins executivos, com fins de otimizar, de facilitar, de melhorar a execução daquela lei pela sociedade, e ela tem que ter um cunho técnico e científico. Então, entendo que hoje as normas regulamentadoras... Claro que tem toda aquela discussão de que no mundo perfeito elas não precisariam nem existir, mas hoje a gente, de fato, precisa das normas regulamentadoras e as usa da forma como elas foram pensadas para ser, porque está lá na CLT, no art. 200, que: Art. 200 - Cabe ao Ministério do Trabalho [no momento em que foi escrito era do trabalho, já teve vários nomes, hoje Ministério do Trabalho e Emprego] estabelecer disposições complementares às normas de que trata este Capítulo, tendo em vista as peculiaridades de cada atividade ou setor de trabalho [...] Enfim, então é para isso que a gente tem hoje as normas regulamentadoras por uma opção do nosso país - não só uma opção, porque o Brasil é signatário da Convenção 144, que já foi falado aqui pela Ministra, que aliás é da década de 60, mas hoje a gente está aqui lutando para fazer valer. Essas normas regulamentadoras, então, devem ser construídas de forma tripartite. |
| R | Está lá no art. 2º da Convenção 144, está escrito "procedimentos que assegurem consultas efetivas". Eu não vou nem dar ênfase para a palavra "consultas", porque esse é um texto, como e falei, de 1960 e traduzido. Não é que simplesmente se consulte; tem que ter participação de fato. Eu quero dar ênfase para a palavra "efetivas". O tripartismo não serve apenas para dizer que foi feito. Não basta você colocar representantes para discutir, em situações desiguais de participação. Em função principalmente das opções tomadas em 2017, na reforma trabalhista, com o enfraquecimento das representações sindicais, será que esse tripartismo, hoje, está sendo efetivo? Será que a que a gente está conseguindo, de fato, dar o mesmo peso para representações de trabalhadores e de empregadores? Será que isso, de fato, está sendo refletido nas nossas normas? Qual vai ser a nossa opção, a partir daqui, para seguir construindo normas? A gente precisa entender que o tripartismo e a participação social são importantes para o desenvolvimento da nossa sociedade, para poder casar, por exemplo, esse progresso social com o crescimento econômico. Não é possível escolher um ou outro. (Soa a campainha.) A SRA. ANA LUIZA HORCADES - A gente precisa conseguir integrar esses dois interesses, que não são opostos, mas que são tratados como interesses opostos. Concluindo, para a gente seguir nesse projeto de atualizar e melhorar a efetividade do nosso Estatuto do Trabalho, entendo que a gente poderia optar por trazer para o texto do estatuto, incorporar, aspectos relativos às questões macro, como o gerenciamento de riscos ocupacionais. Toda a discussão sobre a NR-1 não era por discordar ou concordar que as organizações têm que gerenciar seus riscos. Elas eram em função da forma da norma, do texto da norma, da interpretação e da implementação, mas todo mundo sabe que as organizações têm que gerenciar riscos ocupacionais. Então, isso, por exemplo, é um aspecto que pode ser trazido para o Estatuto do Trabalho, deixando o seu detalhamento técnico, esse, sim, para o texto de uma norma. A gente tem que, de fato, estudar o que tem que ficar no regulamento técnico, que seria esse detalhamento das obrigações, tomando por base uma construção efetivamente tripartite; e, a partir daí, a avaliar o que a gente tem nas nossas normas. Lembro que, por exemplo, fazer saúde e segurança no trabalho não é apenas implementar a CLT, o estatuto ou NR. A gente tem um arcabouço extenso que precisa ser integrado de forma harmônica e construído de forma harmônica com aquele objetivo, que é o objetivo de um meio ambiente de trabalho seguro e saudável para todos. Claro, não adianta nada a gente ter a melhores normas do mundo se a gente não tem quem fiscalize. Então, não há que se falar em estatuto efetivo e normas regulamentadoras, o que quer que tenha no texto das normas regulamentadoras se a gente não tiver, de fato, uma auditoria fiscal do trabalho empoderada, equipada, presente, em número suficiente por todo o Brasil, promovendo a verificação da implementação de tudo isso que estiver disposto nas normas. Claro, também não posso deixar de falar e, agora, como chefe de fiscalização, da importância de valorização não só de serviço público, mas das chefias de fiscalização, que estão ali pensando na execução, pensando nessas políticas públicas em matéria de segurança no trabalho nas pontas, nos estados. |
| R | A gente tem que lembrar que, por exemplo, em uma organização qualquer, a chefia tem responsabilidade com os seus chefiados e com o seu chefe dentro da organização. Nós, chefes no Serviço Público, temos responsabilidade com os nossos chefiados, com o meu chefe, com toda a estrutura, mas também com a sociedade, porque aquilo que a gente está pensando e executando vai se refletir em qualidade de vida, em dignidade para as pessoas. Então, é isso que a fiscalização se propõe a fazer. Então, muito obrigada. Mais uma vez, agradeço de coração pela oportunidade de estar aqui fazendo o diálogo social e por todo o trabalho que, ao longo da vida toda, o Senador vem lutando para manter vivo, que é a questão da discussão do trabalho digno. Então, obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem! A SRA. ANA LUIZA HORCADES - Ah, desculpa. Só mais uma rápida observação com relação à fala da Ministra sobre as condenações por trabalho escravo. A gente tem menos de 1%... Menos de 1% das organizações que foram, inicialmente, flagradas em situação de trabalho análogo ao de escravizado, que lá, no final do processo, foram, de fato, condenadas. E isso também faz parte do que a gente tem que pensar em matéria de efetivar os direitos dos trabalhadores. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem! Meus cumprimentos, mais uma vez, à Auditora Fiscal do Trabalho, representante do Sinait, Ana Luiza Horcades, que conseguiu, rapidamente, unir as duas falas, a do Renan e a da Ministra - não é, Procurador? Ela falou da importância de atualizar e ampliar, mas sem deixar de falar do trabalho escravo, só como sua fala final aqui. Então, meus cumprimentos... Pois não, Ministra! A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES (Para expor. Fora do microfone.) - Conclua, por favor. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não; a Ministra aqui fala em primeiro lugar sempre. A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES (Para expor.) - Senador, primeiro. (Risos.) Eu quero pedir licença. Eu vou precisar me retirar. O resultado do alto índice de descumprimento da legislação trabalhista... Nós somos 27 ministros, e só eu tenho em torno de 13 mil processos no acervo do meu gabinete. E, há alguns anos, eu vim ao Senado, em uma solenidade, receber o Prêmio Bertha Lutz e postei no Instagram. E alguém postou: "Para isso a senhora tem tempo, não é? Para julgar meu processo, não". Então, o jurisdicionado cobra, e com razão, não é? Nós somos servidoras e servidores públicos, e eu... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Era em sua homenagem. Nós também temos razão em homenagear o seu trabalho. A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES - Obrigada, obrigada! Então, eu vou pedir licença, com muito pesar, para me retirar e atender lá a correria da segunda-feira, mas quero me colocar à disposição, Senador. Quero pedir a V. Exa. que não repare a minha saída. Eu vou continuar assistindo lá, pela transmissão ao vivo, e quero agradecer muito pela oportunidade e me colocar à disposição. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito obrigado, Ministra Delaíde Alves Miranda Arantes, Ministra do Tribunal Superior do Trabalho, pela sua bela contribuição. E quero dizer que já está convocada: em alguns estados a senhora vai ter que estar lá. A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES (Fora do microfone.) - Que bom! O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É sempre na Assembleia Legislativa. |
| R | A SRA. DELAÍDE ALVES MIRANDA ARANTES - No que a gente não puder ir presencialmente, hoje a gente tem essa facilidade do híbrido. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Isso, eu tenho pensado muito nisso. Obrigado, Ministra. Por favor, passamos a palavra agora ao Diretor do Departamento de Segurança e Saúde do Trabalhador do Ministério do Trabalho e Emprego, fundamental no nosso ministério para tudo isso que estamos falando aqui. Eu quero dizer ao meu querido Ministro Marinho do respeito e do carinho pela sua trajetória, pela sua história e pelo que está fazendo no ministério. Como a gente usou, em outro dia, em relação à Cultura, usamos aqui: o Ministério do Trabalho voltou, voltou para o interesse coletivo de todo o povo brasileiro. E qualquer discussão da nova CLT - uns falam que vai ser a CLT do século XXI o novo Estatuto do Trabalho - é sempre na linha de fortalecer a CLT e sempre em parceria direta com o Ministério do Trabalho. O SR. HENRIQUE MANDAGARÁ DE SOUZA (Para expor.) - Com certeza. Bom dia. Eu começo cumprimentando o Sr. Presidente, na pessoa de quem eu cumprimento todas as Senadoras e todos os Senadores desta Comissão. Cumprimento também o Procurador Renan Kalil, do Ministério Público do Trabalho, uma instituição tão importante nessa rede de proteção ao trabalhador. Por um tempo, houve briga entre instituições, e, no final, isso era só para enfraquecer o trabalhador. Eu venho aqui representando o Ministro Luiz Marinho e já reafirmando a disposição do Ministro em se aproximar de todas as instituições que representam o mundo do trabalho e, sobretudo, o trabalhador. Infelizmente, a Ministra Delaíde Arantes teve que sair, mas também cumprimento, na pessoa dela, todos os membros da Justiça do Trabalho; a minha colega auditora fiscal do trabalho Ana Horcades, na pessoa de quem cumprimento todos os meus colegas auditores fiscais - somos poucos, sim, mas somos valorosos, a exemplo da colega Ana -; todos do povo brasileiro que estão acompanhando esta Comissão pelas mídias do Senado; e todas as pessoas presentes nesta audiência. Sr. Presidente, eu acho que tudo o que foi falado aqui dá uma dimensão do desafio que o Ministro Luiz Marinho tem. Ele pega um ministério para reconstruir num cenário do mundo que está mudando muito rapidamente, porque, ao mesmo tempo, ele tem desafios como o teletrabalho, como o trabalho em plataformas, agora o crowdworking, que é até uma novidade para mim aqui, e com a inteligência artificial também trazendo risco; por outro lado, ainda tem o Brasil que resgata trabalhadores em condições análogas à de escravo no trabalho rural da mesma forma que ocorria lá em 1996 e até na década de 80. A gente continua afastando crianças e adolescentes de trabalhos proibidos. Então, tudo isso tem que ser trabalhado. É muito trabalho a fazer, e o caminho - e aí eu saúdo e agradeço este espaço - é através do diálogo, que é algo a que o Ministro sempre se propõe. E esta Casa está se propondo a fazer esse diálogo, o que é muito importante. Falando em diálogo, é importante aqui o que salientou a Ana: a OIT preconiza o diálogo social, sim, mas ela põe os requisitos para que o diálogo social aconteça e lá ela diz que as três partes têm que estar fortalecidas de igual forma para que o diálogo efetivamente aconteça. Então, Presidente, eu acho que o auxílio que a gente queria pedir aqui - vocês estão conversando e tudo mais - é no sentido de a gente pensar formas de fortalecer as representações dos trabalhadores, para a gente conseguir dar efetividade nesse diálogo. |
| R | E eu não falo só de financiamento. Como a Ana trouxe aqui, essas novas formas de trabalho dificultam a própria organização dos trabalhadores em sindicatos como a gente conhece até hoje, seja a terceirização irrestrita, seja o caso extremo que é o crowdworking. Como esses trabalhadores vão se organizar e vão ter a consciência coletiva, se ele está lá e não conhece nem o cliente dele, quem dirá o colega de trabalho dele? Então, são desafios muito complexos. Ainda falando em Organização Internacional do Trabalho, em que pese a Ministra ter colocado que as convenções que versam sobre os direitos humanos não precisam estar ratificadas para valer, o Ministro Luiz Marinho já encaminhou quatro convenções para o Congresso Nacional para serem ratificadas, porque, ainda assim, é importante que isso esteja no papel, pois nos ajuda. Na minha área de segurança e saúde do trabalhador, nós estamos trabalhando a Convenção 190, que versa sobre o assédio e a violência no trabalho, e a Convenção 187, sobre o marco promocional de saúde e segurança no trabalho. Nós temos o desafio de revisar a Política Nacional de Saúde e Segurança do Trabalhador, o Plano Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho. É uma série de desafios que vêm por aí. Sobre desafios, um dos principais que trazem essas novas formas de... Não é que sejam novas formas; na verdade, as formas são antigas, mas é a tecnologia é que traz desafios novos. Para nós da área de segurança e saúde do trabalhador, por exemplo, é muito complicado o próprio teletrabalho. Como a gente protege esse trabalhador que está no teletrabalho? Mais ainda: o Dr. Renan falou com muito propriedade sobre a subordinação por algoritmos. E, agora, a gente tem mais o desafio da inteligência artificial. A inteligência artificial, em princípio, ainda não tem consciência nem empatia. Então, você tem um chefe que sequer é uma máquina, que está só vendo os números. E isso traz muitos riscos psicossociais, que é o que o senhor trouxe na primeira fala. Aliás, a campanha do Ministério de Trabalho e Emprego que é a Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes do Trabalho deste ano versa sobre riscos psicossociais exatamente. A gente quer trabalhar esse tema, porque é um tema em que, além, claro, do sofrimento do trabalhador, há o impacto que isso traz para nós como sociedade. Se a gente for ver os afastamentos, que não são reconhecidos como ocupacionais, mas a quantidade de pessoas que estão adoecendo mentalmente, isso é muito importante, assim como aqueles números que foram trazidos de acidentes que são subnotificados, como a Ana muito bem destacou. Eu destaco um ponto ainda superior, que é o adoecimento ocupacional. O adoecimento ocupacional é mais subnotificado ainda, porque, mesmo entre os trabalhadores formais, ele é subnotificado. Por exemplo, quanto ao câncer ocupacional, a gente tem pouquíssimos registros, mas a gente tem a convicção, pelas condições de trabalho que a gente encontra, de que ele está aí, está presente; só não é feito o vínculo entre ocupação do trabalhador e o câncer. O que tudo isso traz para a sociedade? Eu acompanho o seu trabalho, Senador, porque sou um conterrâneo do senhor, sei da sua preocupação com a previdência social. Além do peso na previdência social que isso traz, há também o peso que traz na saúde. Quanto do SUS é utilizado por essa coisa que a Ana traz e que é importante estar lá, eu acho, no novo Estatuto do Trabalho? O dono do risco é o empregador. Então, ele tem que gerenciar esse risco. Esse risco não pode ser repassado para a sociedade. Tem uma série de desafios que a gente tem que olhar. Há mais uns pontos que eu queria destacar. Fugindo dessa parte mais moderna e voltando lá, porque ainda estamos vivendo num Brasil atrasado, até o início deste mês, para dar o dado atualizado, são 1.127 trabalhadores resgatados em condições análogas à escravidão. E a gente vê que a maior parte desses trabalhadores resgatados são na zona rural, no trabalho no campo, ainda naquela ótica que a gente tem de duas classes de seres humanos. |
| R | Com relação ao trabalhador rural, já ouvi, num diálogo, digamos assim, com um representante, ele dizer que não se ia colocar banheiro químico para dois dias de trabalho, como se dois dias... Eu não sei, mas eu não imagino que nós aqui, nesta reunião, já que vai ser só por uma manhã, não usemos o banheiro, então. A gente ainda tem um pensamento que eu acho que... Além de a gente fazer cumprir a lei, por a gente ser tão descumpridor, há essa cultura ainda que está muito presente na gente. Essa cultura traz também um dado relevante sobre o trabalho análogo ao escravo ainda que é o trabalho escravo doméstico. A gente teve 31 trabalhadores resgatados no ano de 2021 no trabalho escravo doméstico; e 30, em 2022. E a gente está caminhando para esses dados novamente. E também sempre foi vista a pessoa trabalhadora doméstica, sobretudo a trabalhadora, mas também a gente resgata trabalhadores, caseiros... Há outras situações, mas ainda a violação é maior em relação às mulheres. A gente tem todo esse desafio para cumprir. O Ministro está disposto a ampliar esses espaços de diálogo. Ele está aproximando tanto as organizações de trabalhadores quanto de empregadores num grande pacto para resolver esse problema. Aqui, dou um exemplo: nos próximos dias, ele está indo à Serra Gaúcha para assinar um pacto que vai ser selado com empregadores e trabalhadores para melhoria das condições de trabalho na cultura da uva. Para nós como sociedade, eu acho que esse caso do trabalho análogo a escravo em Bento Gonçalves mostrou o consumidor norte-americano e o consumidor europeu muito preocupados com as práticas sustentáveis, assim como o consumidor brasileiro. Isso revelou muito isso. Eu, como sou do Rio Grande do Sul, esse assunto, lá, eu ouvia. Eu estava almoçando, e, na mesa ao lado, estava-se debatendo esse assunto, com muita gente repelindo aquela prática. Então, só se resolve pelo diálogo. Esta Casa é o caminho mesmo, mas que todos estejam fortalecidos para fazer esse diálogo de qualidade. Eu queria ainda ressaltar um desafio novo que foi citado da inteligência artificial. Eu acho que, agora, como a Ana falou, em cinco anos, tudo mudou, e, agora, a gente tem um fator novo. Estão lá na nossa Constituição a garantia e a proteção às novas formas de trabalho. A inteligência artificial tem potencial para substituir muitos postos de trabalho. Um exemplo que eu dou aqui é o trabalho de teleatendimento. Muitos de nós, às vezes, falamos com uma máquina sem nem sabermos que estamos falando. Também é importante que a gente pense formas de proteger e de qualificar esses trabalhadores, para ver como a gente vai inseri-los, porque, hoje, é uma mão de obra grande que trabalha nisso. E é uma mão de obra que também migrou muito para o teletrabalho, de que a gente também tem que cuidar. Como esse trabalhador, essa trabalhadora está conseguindo lidar no seu ambiente doméstico? Para muitos, é um tipo de trabalho que é uma porta de entrada no mercado de trabalho. São muitos jovens, às vezes, que não têm nem condições de se estruturar, com uma internet adequada, com um mobiliário adequado, também querendo produzir muito, porque está atrás do dinheiro e está com saúde para isso, mas a gente tem que cuidar também dos riscos psicossociais nesse trabalho, sobretudo, no marketing ativo. São metas que se têm que atingir. E ele tem um robô que está concorrendo com ele, com metas, que têm um algoritmo que mostra o que a pessoa quer ver. Então, é realmente um ambiente muito desafiador. |
| R | Por último, eu queria só concluir aqui agradecendo o espaço e colocando o Ministério do Trabalho e Emprego, na pessoa do nosso Ministro Luiz Marinho, sempre à disposição. Ele, infelizmente, não pôde vir hoje, mas o Senador conhece muito bem o Ministro e sabe da satisfação que ele teria em estar aqui promovendo este debate. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Nós que agradecemos ao Diretor do Departamento de Segurança e Saúde do Trabalhador do Ministério do Trabalho e Emprego, Dr. Henrique Mandagará de Souza. E daqui eu quero que você leve o nosso abraço ao Ministro Luiz Marinho. Por aqui já passaram inúmeros ministros, e eu queria muito que ele passasse por aqui também, para ele fazer uma exposição de como é que está o seu trabalho. E já elogio a ida dele ao Rio Grande do Sul. Ele foi não somente a Porto Alegre, mas foi também a Caxias do Sul, onde fez todo aquele roteiro para ver o trabalho escravo lá e apontou caminhos. Todos os que participaram da caravana dele vieram elogiando muito. Eu não pude ir, porque eu tinha audiência no mesmo dia aqui, no Senado. O SR. HENRIQUE MANDAGARÁ DE SOUZA - E é só para concluir, porque eu esqueci um detalhe também nessa linha. O Ministro está a par de todos esses desafios também. Quero só ressaltar o grupo técnico que ele criou para pensar o trabalho por plataformas digitais também, que já tem pessoal designado e já está trabalhando nas discussões em relação a esse tema. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Henrique! Eu que agradeço muito. Um abraço ao Ministro. E diga a ele que eu o estou esperando aqui. O convite já... Já foi o convite, Leandro? Se não foi, vai, não é? (Pausa.) Muito bem! Vamos ver quem é que está agora na plataforma digital. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Como? (Pausa.) Todos estão presentes? (Pausa.) Pode falar. (Pausa.) Se tu me passares aí a lista da plataforma digital, porque eu só estou com a da primeira mesa... (Pausa.) E o Dr. Renan vai ter que sair neste momento. O Dr. Renan voltará... É aquela frase: "voltaremos". O SR. RENAN BERNARDI KALIL (Para expor.) - Voltaremos, Senador. Eu tenho um compromisso agora, às 11h, lá na Câmara. Vou pedir licença para me ausentar, mas, enfim, eu sigo à disposição. O Ministério Público do Trabalho está aberto para participar não só dos espaços aqui, em Brasília, mas também nos estados. A gente também tem uma estrutura nacional e tem colegas que podem também fazer parte dessa discussão, para tratar, enfim, de todos os temas que o Estatuto do Trabalho vem colocando, mas também do trabalho via plataforma digital. Gostaria de deixar também um agradecimento novamente aqui pelo convite, Senador. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O agradecimento é nosso. Nós o esperamos em novos momentos não só aqui, mas também nos estados, quando a gente começar a montar as reuniões em cada estado. Muito obrigado. (Pausa.) Vamos agora para a segunda... Depois teremos as considerações finais. Se puderem ficar até o fim, eu agradeço. Vamos convidar agora o Sr. Rosildo Bomfim, coordenador regional e representante do Movimento da Advocacia Trabalhista Independente (Mati). Por favor. O SR. ROSILDO BOMFIM (Por videoconferência.) - Bom dia... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Nós o estamos ouvindo já. O SR. ROSILDO BOMFIM (Por videoconferência.) - Já estão me ouvindo? O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Perfeito. |
| R | O SR. ROSILDO BOMFIM (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos, todas e "todes"! Primeiramente eu gostaria de agradecer o convite, na pessoa do Senador Paulo Renato Paim, para participar desta importante audiência pública que trata de tema tão relevante. Eu sou professor de Direito, sou advogado, sou mestre e doutorando em Serviço Social e, na linha de pesquisa, eu trabalho políticas públicas e sujeitos coletivos - eu digo a formação para discutir as questões e mostrando que estão sendo discutidas sobre um prisma técnico. Estou aqui representando o Mati, que é o Movimento da Advocacia Trabalhista Independente, na qualidade de coordenador regional. Ouvir os colegas presenciais e, depois, eu falar como palestrante de forma telepresencial é muito bom, porque me faz trazer elementos dos próprios colegas para usar na minha fala. Vejam, o Dr. Renan disse que nós teríamos que verificar qual é a natureza jurídica das empresas de plataforma para verificarmos que trabalho esses trabalhadores exercem, se são subordinados ou se são, de fato, autônomos. A Ministra Delaíde falou que nós temos quase 50% de trabalhadores, no Brasil, em trabalho informal. A Auditora Fiscal Ana Luiza falou do meio ambiente do trabalho, e a gente tem que pensar que, com esses teletrabalhos, nós transferimos o meio ambiente de trabalho para a residência de cada trabalhador. Então, nós temos milhares de meios ambientes de trabalho, que precisam também ser investigados e analisados pelos auditores fiscais. E aí vem a complexidade de como investigar meio ambiente de trabalho quando esse meio ambiente de trabalho foi transferido para a residência de cada trabalhador. Eu mesmo sou professor, dou aula presencial, mas também dou aula telepresencial, como professor empregado. Então, minha residência virou o meio ambiente de trabalho, e creio eu que o Estatuto do Trabalhador tem também que fazer uma abrangência nesse tema: como fica a fiscalização do meio ambiente de trabalho quando esse meio ambiente é transferido para as milhares de residências dos trabalhadores que trabalham através de teletrabalho? E, por último, pegando a fala também do representante do Ministério Público do Trabalho, lembro que ele disse: as formas de trabalho são antigas, a tecnologia que mudou o instrumental. Baseado nessas falas, eu começo a minha fala específica sempre utilizando o art. 170 da Constituição Federal, inciso VIII, que trata da ordem econômica e da livre iniciativa, para, a partir dali, nós desenharmos como deveria, efetivamente, ser esse Estatuto do Trabalhador, respeitando as premissas da Constituição Federal quando trabalha com liberdade econômica. E eu leio para os senhores, tamanha a importância. O art. 170 diz: "A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa..." Logo, a livre iniciativa que essas empresas, por exemplo, de plataformas digitais têm para atuar no Brasil é condicionada à valorização do trabalho humano. E continua o texto: "... e tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] Inciso VIII - busca do pleno emprego". Vejam que a Constituição adotou, politicamente, o critério de busca de pleno emprego, e não busca de pleno trabalho. A preferência é buscar o pleno emprego. Se é buscar o pleno emprego, nós temos que analisar, como disse o Dr. Renan, que tipo de relação existe entre essas plataformas e os trabalhadores para ver que normatividade será dada no novo estatuto do trabalhador que estamos discutindo aqui. |
| R | Pelas minhas pesquisas - e eu digo "minhas pesquisas" porque o objeto da minha pesquisa eram justamente esses trabalhos plataformizados, que deram origem a um livro que publiquei este mês, chamado a Plataformização do Trabalho Subordinado, em que me debrucei sobre os termos de uso de todas essas grandes empresas que atuam no Brasil -, cheguei à conclusão de que nós estamos vivendo uma era chamada capitalismo de plataforma. O que é o capitalismo de plataforma? Na verdade, é uma forma, já que o Senador começou falando que vamos dar foco na terceirização... O capitalismo de plataforma, na verdade, é uma nova forma de terceirização das atividades. As empresas trazem as suas atividades para dentro das plataformas e terceirizam essa prestação de trabalho a milhares de pessoas. Vamos pensar especificamente, como disse o Dr. Renan, do Ministério Público do Trabalho, as empresas de transportes individuais. Essas empresas dizem que são empresas de tecnologia. A lógica - não precisa nem ser jurídica -, a lógica comum, é que, se eu sou empresa de tecnologia, a minha remuneração tem que vir da tecnologia, pois essas empresas são remuneradas em percentual das corridas que os motoristas fazem. Diga-se de passagem que a maior empresa que atua no Brasil, que veio para o Brasil, precisamente São Paulo, em 2014, embora se diga empresa de tecnologia, está lá, no termo de uso dessa empresa, no item 5.1, que a utilização das plataformas é de graça. Não se cobram royalties, porque a forma de remuneração é outra. Logo, ela não é empresa de tecnologia. Na verdade, nós vivemos - volto a dizer - um capitalismo de plataforma, onde nós estamos migrando as atividades físicas para as plataformas e terceirizando essas atividades. Esses motoristas, na verdade, são terceirizados das empresas de tecnologia que atuam no ramo de transporte, embora dizendo que são empresas de aplicativos, que são empresas de tecnologia. Entendo que o estatuto, lá no art. 253, quando trata de trabalho não subordinado, tem que se debruçar sobre esse tema, para a gente saber e ficar normatizado quando essas empresas têm trabalhos autônomos e quando essas empresas têm trabalhos subordinados. E quem vai dizer isso - vários colegas já falaram - é verificar como esses algoritmos, como essas plataformas são utilizadas: se elas são plataformas horizontais, ou seja, aquelas que apenas colocam em contato quem quer prestar serviço e quem quer utilizar o serviço, sem ingerência sobre esta relação; ou plataformas verticais, hierarquizadas, onde a empresa intervém nessas relações, de modo que ela comande o trabalho desses trabalhadores. Logo, esses trabalhadores passam a ser trabalhadores terceirizados dessas empresas. Digo isso porque a própria CLT, alterada em 2004, quando estava a prever este avanço tecnológico, já nos disse que poderíamos comandar, subordinar trabalhadores a distância. Podemos supervisionar trabalhadores a distância. Então, a investigação é: essas empresas estão subordinando trabalhadores a distância? Para a gente responder isto, é óbvio que a gente tem que analisar os termos de uso e privacidade dessas plataformas. No meu livro que lancei este mês, sobre a plataformização no trabalho subordinado, debrucei-me sobre vários termos de uso de empresas de plataformas que atuam no Brasil. Sem dizer o nome, mas uma das empresas, que vou dividir aqui com os senhores, é empresa de transporte coletivo. Pasmem: ela diz no termo de uso, no item 8.1, onde se diz que esses trabalhadores são autônomos, daí a necessidade do art. 253 do estatuto ser redesenhado. Ela diz - eu estou lendo para os senhores: o motorista parceiro que contrata a empresa X, à sua livre discrição, poderá aplicar multa, suspender ou cancelar a utilização de serviço em que situações? Tem várias. Eu relato para os senhores duas: um, pelo resultado de sua avaliação; e pela análise da taxa de cancelamento. Ora, se eu multo o motorista, se eu suspendo o motorista pela taxa de cancelamento, meu algoritmo é um gerenciador da atividade desses trabalhadores. Logo, senhoras e senhores, ele não pode estar compendiado dentro da moldura do art. 253 do Estatuto do Trabalho, como trabalhador autônomo. E há necessidade, ao meu sentir, que fique normatizado o que é trabalhador autônomo nas plataformas digitais e o que são trabalhadores subordinados também nas plataformas digitais para evitarmos uma fraude, para evitarmos um crime contra a organização do trabalho. |
| R | Vou mais longe. Essa mesma empresa diz que também multa os trabalhadores - no inciso 7º, diz - por inatividade da conta por um longo período de tempo. E aí, a minha fala converge com a fala do Dr. Renan. É balela, é falácia, quando a gente lê ou vê na mídia que esses trabalhadores trabalham quando querem. Não, eles não trabalham quando querem. Eles são pressionados a trabalhar, inclusive constando nos termos de uso uma multa, uma suspensão, ou um cancelamento desses trabalhadores nos aplicativos quando eles não querem trabalhar. É óbvio que não precisa ser um expert de direito, ou de direitos sociais, para saber que uma empresa que tem como sua receita o trabalho de um motorista vai forçar para que esse motorista trabalhe a maior quantidade de tempo possível para que essa empresa tenha mais lucro. |
| R | Por isso é que eu não gosto desse termo "trabalhadores de aplicativo", porque você some com a figura do empregador. Na verdade, são trabalhadores de empresas, de startups, que entram em contato, se comunicam com essas empresas através das plataformas, mas eles não trabalham para as plataformas. A plataforma é mecanismo de intermediação, e, muitas vezes, mecanismo de subordinação. Eu volto a insistir na necessidade de isso ser normatizado. Por quê? Vou de novo, agora, falar, complementar o que a auditora Ana Luiza falou. Há necessidade de investigar os meios ambientes de trabalho, mas, se eu digo que esse trabalhador é, de fato, um trabalhador empregado, nós temos uma dificuldade monstruosa de investigar esses meios ambientes de trabalho. Qual é a solução? Temos que pensar. Agora, se são empregados, esses meios ambientes têm que ser investigados. Não há outra opção, uma vez que a CLT, no art. 154, diz que que todo - e ela fala "todo"- meio ambiente de trabalho tem que ser investigado. Algumas empresas chegam ao requinte - estou aqui falando, agora, de uma outra que atua no Rio de Janeiro, que é de entrega de mercadoria - de cronometrar a entrega que esses trabalhadores têm que fazer; e mais, dar um plano de onde eles têm que passar, qual é a entrega que eles têm que fazer em primeiro lugar, em segundo, em terceiro, em quarto lugar; e pune esses trabalhadores quando eles não atuam da forma que está no termo de uso dela. O que é que nós temos vivido, o que é que nós estamos presenciando e, assustadoramente, passivos - não o Congresso, senão nós não estaríamos nessa audiência pública, mas a população assiste passiva. Nós temos algoritmos gerenciais, que são algoritmos que gerenciam a atividade desses trabalhadores. E quais são as características desses algoritmos? Monitoramento do comportamento do trabalhador; avaliação da performance constante desses trabalhadores; processo automatizado de decisões; e, o que é mais grave, interação realizada apenas virtualmente através de um sistema de baixa transparência. Quando o representante do Ministério Público, o Dr. Henrique, nos fala que são novos instrumentos, é verdade. A teoria é a mesma -a teoria é a mesma: o capital tem que produzir lucros e conseguiu, saindo do sistema normativo e indo para as plataformas, aumentar sua taxa de lucro com a superexploração do trabalhador, inclusive afrontando a legislação brasileira. Vejam o que aconteceu recentemente com a Uber com a PL da fake news. É a ciência que resolve esse problema. Como o Supremo decidiu contra a Uber quando se afrontou a soberania do Estado brasileiro? Com a LabNet, com o órgão de pesquisa - com o laboratório de pesquisa da UFRJ. |
| R | Ora, essas empresas têm que, nessas relações que envolvem esses trabalhadores, dizer quais são as regras, inclusive para as autoridades, inclusive para o Congresso Nacional, para que eles possam bem legislar. Nós temos que prestigiar o princípio da transparência dos algoritmos. Se nós não prestigiarmos, vai acontecer o que aconteceu com a Google e, recentemente, com o Telegram. Nós nos socorremos da UFRJ, do LabNet, para entender como funciona o sistema, porque a transparência não existe, e não nos enviam como isso é feito, não obstante o art. 20, §1º, da LGPD assim o determine. Por isso, acho que, entre as questões que nós temos que pensar nesse estatuto do trabalhador, está o redesenho do art. 253 e também o redesenho do art. 16, que trata precisamente do meio ambiente de trabalho, para que a gente coloque ali também normas sobre o meio ambiente de trabalho virtual, e não só os plataformizados; aqueles que trabalham em teletrabalho, onde todas as regras de segurança do trabalho também têm que ser obedecidas, ainda que esse meio ambiente de trabalho seja um meio ambiente de trabalho virtual. O que nós criamos com esse fenômeno da tecnologia? Nós criamos dois meios ambientes de trabalho: o físico, ao qual já estávamos acostumados; mas o meio ambiente de trabalho virtual, quando essa atividade é transferida para a casa do trabalhador, através de teletrabalho, para os carros das empresas de transporte coletivo. Então, veja, essa é a minha contribuição, no sentido de a gente repensar, entre vários dispositivos, esses dois. Agradeço a possibilidade de estar discutindo um tema que é tão caro para a sociedade brasileira, porque nós somos constituídos como seres humanos através do trabalho. Nada deixa de existir passando pelo trabalho. Então, agradeço ao Senador e estou aqui à disposição para eventual questionamento, agradecendo também o Mati, que é o Movimento da Advocacia Trabalhista Independente, de me permitir estar aqui representando-o para discutir esses temas. Obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito obrigado, Dr. Rosildo Bomfim, pela sua contribuição. Ele, que é Coordenador Regional e representante do Movimento da Advocacia Trabalhista Independente, falou de plataforma, de aplicativos, de terceirização e levantou aqui as suas preocupações e a atualização que vamos ter que fazer dentro do estatuto - naturalmente, eu falo "estatuto", uma forma também sempre da nova CLT. Por favor, Dr. Henrique. O SR. HENRIQUE MANDAGARÁ DE SOUZA (Para expor.) - Quero só me despedir. Infelizmente, tenho um compromisso agora aqui. Mas reiteramos, então, a disposição do Ministério do Trabalho e Emprego para colaborar nas discussões e para se chegar a um ponto comum de melhorar as condições de todos. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu que agradeço, Dr. Henrique, a sua contribuição. E lembre ao Ministro Marinho que, se o convite não foi, vão dois agora então. Parabéns pela sua contribuição! O SR. HENRIQUE MANDAGARÁ DE SOUZA - Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vamos passar a palavra neste momento à Procuradora do Trabalho Dra. Cirlene Luiza Zimmermann, representante da Codemat - trabalho digno, teletrabalho e NRs -, Substituta Eventual da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, da Procuradoria-Geral do Trabalho. A palavra é sua, por favor. |
| R | A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada. Bom dia! Bom dia a todos e a todas. Inicio aqui fazendo minha audiodescrição, em respeito a todas as pessoas que não podem ver: sou uma mulher branca, tenho cabelos castanhos, pele clara, olhos verdes, o cabelo na altura dos ombros, hoje visto uma blusa preta com detalhes amarelos e também um casaco preto, ao meu fundo o painel do Ministério Público do Trabalho. Eu saúdo inicialmente o Senador Paulo Paim, Presidente dessa Comissão, na sua pessoa, os demais debatedores e debatedoras desta mesa; mas também, na pessoa da servidora Fabriciane, da Secretaria de Assuntos Legislativos do MPT, eu cumprimento as pessoas que nos acompanham nesta audiência pública agora, ao vivo, mas que também vão assisti-la depois, justamente porque esse é um momento de diálogo sobre essa sugestão legislativa relativa ao Estatuto do Trabalho, em especial no que se refere a essa temática do meio ambiente do trabalho, da saúde do trabalhador e da trabalhadora. É importante registrar aqui, Senador, que V. Exa. sempre foi um grande apoiador do Projeto Segurança e Saúde nas Escolas, do trabalho do Dr. Orlandino dos Santos, por meio da iniciativa Cipa nas Escolas. essa iniciativa que busca inserir a temática segurança, saúde e meio ambiente do trabalho nos projetos pedagógicos, justamente porque precisamos formar cidadãos que tenham essa cultura da prevenção de doenças e acidentes relacionados ao trabalho como um valor, um valor que é sempre inalienável. Então, esse projeto busca atuar na formação integral, na qualificação para o trabalho, exatamente como prevê a nossa Constituição, mas não para qualquer trabalho, o trabalho decente, seguro e saudável, esse sobre o qual nós estamos discutindo e dialogando aqui. A partir desse ano o MPT, a OIT e a fiscalização do trabalho estão se unindo para fortalecer esse projeto, isso também nos enche de esperança, sobretudo de esperança. Então, a condução desse debate por V. Exa. é muito simbólica, porque esse diálogo sobre o Estatuto do Trabalho tem como principal propósito - e isso já foi deixado muito claro aqui - recuperar a centralidade do trabalho decente nas nossas vidas, buscar essa valorização, a melhoria da condição social dos trabalhadores e das trabalhadoras, nessa exata perspectiva que a Constituição nos estabelece - o Prof. Rosildo muito bem lembrou - dos valores sociais que o trabalho precisa representar, porque é isso que está na nossa Constituição, mas também observando essa dinamicidade do mundo do trabalho, como bem lembrou o meu colega aqui, como bem expôs o meu colega Renan Kalil, e também como muito bem pontuou a auditora fiscal Ana Luiza Horcades, que eu admiro muito e fez uma excelente fala, sem deixar ninguém de fora. Eu acho que é isso que a gente precisa lembrar e ponderar todo o tempo em que nós discutirmos o Estatuto do Trabalho: sem deixar ninguém de fora. O nosso trabalho - eu acho que a gente sempre precisa lembrar, compreender - é a nossa segunda identidade, não é? Então, como segunda identidade, ele não pode ser um trabalho que acidenta, que adoece, que causa dor, sofrimento, ele precisa ser um trabalho digno, um trabalho sustentável, seguro, saudável, realmente sinônimo de vida. E não por outro motivo, como também já foi referido aqui, em 2022, a OIT alçou, dignificou a questão dos ambientes de trabalho saudáveis e seguros como um princípio e direito fundamental. Vejam que importância isso tem em nível global. |
| R | E, no mesmo ano, de forma interessante, a Assembleia das Nações Unidas também trouxe a questão do meio ambiente limpo, saudável e sustentável. E, sempre que a gente fala em meio ambiente, a gente tem que lembrar que, em todas as suas perspectivas, incluindo a do trabalho, esse meio ambiente saudável é um direito humano fundamental. Então, no mesmo ano, a OIT e a ONU nos trazem essas referências tão importantes e necessárias sobre o meio ambiente, em todas as suas perspectivas, como sendo essencial nessa definição do processo saúde-doença. Lembro também da nossa definição de saúde, que a OMS nos traz, esse completo estado de bem-estar físico, social e mental. E é nesse sentido que realmente nós precisamos trabalhar e discutir aqui, quando tratamos de meio ambiente do trabalho. E ele tem que ser completo, porque falamos, lembramos aqui da reforma trabalhista, no início deste debate. A reforma trabalhista trouxe um paradoxo ao expor, ao querer expor ali que o tempo de trabalho, que a jornada de trabalho não era uma questão relativa à saúde e à segurança no trabalho, quando na realidade a Convenção 155, aprovada em 1981, vigente no Brasil desde 1993, deixa claro que tempo do trabalho é um dos elementos que são definidores das questões de saúde e segurança do trabalho, assim como a organização do trabalho, o maquinário, todos os componentes que estão ali, as relações interpessoais... E todos eles precisam se adaptar a essa capacidade, física e mental, dos trabalhadores, e não o contrário. Tempo de trabalho é, sim, questão de saúde e segurança do trabalho, e isso, de forma perfeita, este estatuto busca retomar e nós precisamos de fato assegurar. Nós tivemos, recentemente, um estudo da OMS e da OIT, foi um estudo conjunto, divulgado em 2022, mas que teve por base um estudo de estimativas globais de doenças e lesões no local de trabalho, de 2000 a 2016. Foi, portanto, um período bastante longo de análise. O que esse estudo demonstrou? Que 81% das mortes relacionadas ao trabalho decorrem de doenças - doenças não transmissíveis. Entre os fatores de risco que foram analisados nesse estudo, o principal fator de risco para mortes relacionadas ao trabalho, como por exemplo doenças pulmonares, doenças coronarianas e acidente vascular cerebral, o principal fator de risco, segundo esse estudo, foi a exposição a longas jornadas de trabalho, com mais de 750 mil mortes associadas. E, nesse aspecto, eu até lanço um desafio aqui, que encontrem uma CAT, uma Comunicação de Acidente de Trabalho, no Brasil, que tenha como causa uma doença decorrente de exposição a longas jornadas de trabalho. É um fator de risco que acaba nem sendo considerado, assim como tantos outros, e como tantas outras doenças, tantas outras mortes, que são invisibilizadas no Brasil. Esses adoecidos no trabalho não aparecem nos números. E eu afirmo isso, justamente, porque já falamos aqui nesta manhã sobre subnotificação. Se nós buscarmos os dados do perfil das comunicações de acidentes do trabalho, nós temos ali um pouco mais de 26 mil óbitos registrados entre 2012 e 2022. Desses 26 mil, apenas 2% são doenças relacionadas ao trabalho. |
| R | O Auditor Fiscal Henrique até lembrou a situação dos cânceres, por exemplo, relacionados ao trabalho. Quantos cânceres temos registrados? Pouquíssimos. Nós temos pouco mais de 500 CATs, 500 óbitos registrados que envolvem doenças do trabalho, em 11 anos de pesquisa. Se nós aplicássemos o percentual que está ali no estudo da OIT - 81% de óbitos relacionados ao trabalho decorrem de doenças -, nós estaríamos falando, no mínimo, de 140 mil óbitos nesse período, de mais de 112 mil óbitos decorrentes de doenças relacionadas ao trabalho. E falo um pouco dessas estatísticas justamente porque esses milhões de adoecidos no trabalho, esses milhares de mortes decorrentes de doenças relacionadas ao trabalho não são identificadas na seara da saúde ocupacional. Essas notificações não aparecem nas CATs. Por consequência, os ambientes de trabalho que causaram esses adoecimentos continuam causando agravos à saúde dos trabalhadores. As empresas acabam não assumindo a sua responsabilidade, porque é como se não notificar o agravo fosse o mesmo que não reconhecer que há necessidade de alguma melhoria. As empresas nessas situações acabam se limitando justamente a transferir o ônus do seu negócio, a sua responsabilidade, antes mesmo que o trabalhador talvez até adquira alguma estabilidade, por exemplo, junto à Previdência Social. E o que faz com esse trabalhador adoecido? Entrega-o à sociedade, aos cuidados da sociedade por meio do SUS, e contrata pessoas sadias que estão no mercado de trabalho, mas que em breve também estarão doentes. E, nesse aspecto, falamos aqui sobre a questão do trabalho escravo e temos que lembrar também a questão da lista suja do trabalho escravo, da consciência que aos poucos vem sendo despertada nos cidadãos quanto a identificar essas empresas e evitar que elas continuem prosperando com o uso de trabalho análogo à escravidão. Da mesma forma, é um apelo que também se faz ao Ministério do Trabalho para que volte a publicar a listagem dos acidentes discriminada por CNPJ. É preciso que a sociedade, os investidores, os consumidores conheçam quais são as empresas que mais acidentam e mais adoecem. Ainda que haja subnotificação - ainda que haja subnotificação -, os números são tormentosos e precisam ser divulgados com essa sinalização para a sociedade, para que o consumidor, o investidor saiba quem é efetivamente a empresa em que ele está investindo e de quem ele está consumindo. Então, vejam, o que se traz aqui, esse cenário de adoecimento, mostra que saúde do trabalhador e da trabalhadora é, em verdade - se não é um problema de saúde ocupacional, porque tudo isso não aparece -, um problema de saúde pública. A gente precisa de fato reconhecer, e o Estatuto do Trabalho é o momento para isso, que o trabalho é um determinante, um condicionante social desse processo saúde-doença, e a gente precisa lidar com as questões de meio ambiente do trabalho, de segurança, saúde no trabalho, nessa perspectiva da vigilância em saúde e da promoção da saúde coletiva. Se o Estatuto do Trabalho está se propondo - e isso é digno de elogio - a regular o meio ambiente do trabalho, nós temos que lembrar onde está o meio ambiente do trabalho na nossa Constituição. Onde está o meio ambiente do trabalho na nossa Constituição? Ele está no capítulo da Seguridade Social, mais especificamente na saúde, lá no art. 200, em que ele atribui ao SUS o cuidado do meio ambiente, a proteção do meio ambiente na perspectiva, inclusive, do trabalho, justamente porque o meio ambiente, quando não é cuidado, quando não é preservado, pode, sim, ser determinante nesse processo de adoecimento e de morte das pessoas. |
| R | Nessa perspectiva, é muito importante que a gente consiga contemplar no capítulo, no título do meio ambiente do trabalho do nosso estatuto a questão da observância das normas ambientais e sanitárias para além das normas regulamentadoras, que merecem um aprimoramento - a Ana Luiza já falou muito bem disso -, precisam ser cumpridas, mas, para além delas, também as normas ambientais e sanitárias. Também quanto às autoridades em saúde do trabalhador, com a atribuição para atuar no local ali do estabelecimento, justamente porque se tem, em termos de saúde e meio ambiente, uma competência comum e concorrente, nós precisamos que essas autoridades sejam atendidas pelas empresas, porque o gestor do meio ambiente do trabalho precisa assegurar ali um ambiente de trabalho digno, seguro e sadio para todos os que estão ali, independentemente do tipo de vínculo, inclusive no que se refere, por exemplo, a exames de saúde ocupacional. Há alguns previstos nas normas regulamentadoras, mas, se a vigilância em saúde do trabalhador do município identificar um perfil epidemiológico de adoecimento naquela empresa, outras normas podem ser impostas, outras medidas podem ser impostas, e isso precisa estar previsto de forma muito clara, para que a gente tenha essa transversalidade, essa integralidade da saúde do trabalhador bem prevista e assegurada no nosso estatuto exatamente da forma como a Constituição se propôs. E nessa linha, por demais que respeito a inspeção do trabalho, é muito importante que a gente tenha essa previsão alargada, de forma que não seja a inspeção do trabalho a exclusiva responsável por atender e manter ambientes de trabalho seguros e saudáveis. Que a gente consiga de fato ter essa amplitude dessas atribuições, com todas as instâncias - saúde, previdência e fiscalização do trabalho - valorizadas e fortalecidas. Todas atuando para que o Estado brasileiro de fato consiga atuar de forma estratégica e eficiente na promoção da saúde das pessoas que trabalham, na promoção do trabalho decente. Muito obrigada, Senador. O Ministério Público do Trabalho se mantém à disposição não apenas nesse debate, mas também nos estados, para que de fato se consiga construir o melhor Estatuto do Trabalho possível. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dra. Cirlene Luiza Zimmermann, Procuradora do Trabalho, representante da Codemat, trabalho digno, teletrabalho. Meus cumprimentos. Falou muito bem da doença no trabalho. Eu fui supervisor de segurança do trabalho e comecei com a Cipa. A gente olhava muito para o acidente do trabalho. E ela enfatizou, percebi inúmeras vezes, que a maioria dos números que não aparecem são de doença do trabalho. Se eu não me engano, ela falou que 70%, 80% das mortes são por doença no trabalho. Meus cumprimentos pela sua exposição, brilhante também, como todos os convidados, e vamos ter no final as considerações finais. Agora, terminando a segunda mesa, eu convido o Dr. Guilherme Guimarães Feliciano, Professor LD Associado, representante do Núcleo de Pesquisa e Extensão O Trabalho Além do Direito do Trabalho e do Grupo de Pesquisa Meio Ambiente do Trabalho. Meus cumprimentos. Seja bem-vindo. O tempo de 15 minutos agora é seu. |
| R | O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO (Para expor. Por videoconferência.) - Senador Paulo Paim, espero que estejam me ouvindo e me vendo bem. É uma satisfação e uma honra estar aqui, como disse ao Leandro, como disse a todos os demais envolvidos nessa importante iniciativa. Eu quero registrar também a minha particular satisfação em voltar a este convívio, ainda que telepresencialmente, nós que tantas vezes estivemos juntos - não, Senador? - quando eu ainda presidia... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Dezenas de vezes, com certeza. O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO (Por videoconferência.) - Exatamente. ... a gloriosa Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho). E sou testemunha das suas lutas e do seu empenho para que a legislação trabalhista atenda à sua função promocional e intuitiva e não se torne simplesmente um elemento de barganha nas relações entre capital e trabalho, como infelizmente foi o enfoque dado ao tempo da reforma trabalhista, especialmente de 2017 até pelo menos o ano passado. Tratar dos direitos sociais do trabalhador, da sua segurança, da sua saúde, é tratar de temas que estão umbilicalmente relacionados com a dignidade da pessoa e, portanto, não é algo que possa se movimentar para patamares mais ou menos protegidos conforme a economia caminhe melhor ou pior. São condições que têm que ser garantidas em qualquer circunstância, especialmente nos momentos de crise. É para isso que existem os direitos fundamentais. Então, registrando a minha alegria de estar aqui mais uma vez com V. Exa., com toda a sua alegria e, desde logo, já me colocando à disposição, falando hoje aqui como Professor Associado da Universidade de São Paulo, também como Coordenador dos Núcleos de Pesquisa e Extensão O Trabalho, além do Direito do Trabalho e Meio Ambiente do Trabalho, eu inicio igualmente com a minha audiodescrição. Sou um homem branco, de cabelos castanhos claros, olhos verdes, estatura mediana. Estou com um terno azul, uma gravata vinho; e, atrás de mim, há a persiana da sala do Departamento de Direito do Trabalho, da Universidade de São Paulo, que é de onde falo. Infelizmente, não pude estar em Brasília como gostaria, mas já estive aí, na semana passada, por três dias, e os meus compromissos aqui não me permitiriam ficar mais tempo em Brasília. Então, optei por falar à distância, mas teria muita honra em estar aí. Este tema, Senador Paim, desde que estivemos debatendo isso quando V. Exa. lançou esta importante iniciativa do Estatuto do Trabalho, sempre teve o apoio e o olhar atento dos juízes do trabalho. Tanto é que o projeto original é apresentado à comissão de iniciativas da sociedade civil pela própria Anamatra, pela ANPT (Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho), pelo Sindicatos dos Auditores-Fiscais e pela ALJT (Associação Latino-Americana de Juízes do Trabalho), se não me falha a participação de nenhuma outra entidade. E V. Exa. esteve conosco em todos os momentos, e discutimos isso da maneira mais republicana e democrática possível. E, agora, felizmente, os ventos políticos sopram em outra direção, e, quem sabe, podemos retomar esta discussão com perspectiva de futuro, e não apenas com a preocupação de assegurar minimamente as conquistas que vêm de lutas das classes trabalhadoras no curso dos séculos. |
| R | Nesse contexto, a contribuição que eu tenho a dar é especialmente no campo do meio ambiente do trabalho ou, se preferirmos, da saúde e segurança do trabalhador, que é o meu principal objeto de pesquisa no âmbito da Universidade de São Paulo, como já era também um objeto recorrente das nossas atividades, inclusive junto ao Parlamento. E aqui, Senador Paim, eu peço licença para referir o PLS 304, de 2023, apresentado por V. Exa., que na verdade, retoma os esforços que nós fizemos, no meu tempo de Anamatra e até antes disso, a partir do PLS 220, de 2014. E exatamente esse é o meu ponto de partida. Para tratar de meio ambiente do trabalho e repensar a legislação trabalhista, inclusive no âmbito do Estatuto do Trabalho ou mesmo fora dele, por iniciativas como essa do PLS 304, nós precisamos mudar o foco. Lamentavelmente, conquanto o discurso se construa em torno de tutelas preventivas e da preservação da integridade psicossomática do trabalhador, o que nós que estamos, digamos, no front percebemos - e falo aqui por juízes do trabalho, advogados trabalhistas, procuradores do trabalho, auditores fiscais - é que a cultura ainda se apega imensamente à ideia de indenizar as perdas, que é uma ideia basicamente civilista, que aqui não tem cabimento. Eu posso falar da minha experiência. Sou titular da 1ª Vara do Trabalho de Taubaté, interior do Estado de São Paulo, onde inclusive tivemos a experiência da Autolatina, porque ali tínhamos a planta da Volkswagen e da Ford quando houve aquela unificação. Portanto, eu diria que pelos menos 40% a 45% da minha demanda anual, Senador Paim e caros espectadores, digam respeito a questões de saúde e segurança do trabalho; muito particularmente, questões ligadas à insalubridade ou à periculosidade, a acidentes de trabalho e a doenças ocupacionais. Pois bem. Taubaté tem uma grande demanda. Geralmente, fechamos os anos com médias que variam entre 2 mil e 2,5 mil processos trabalhistas novos por ano. Então, é uma vara com um bom volume, muito movimentada. E eu sou capaz de separar nos dedos das mãos, e eventualmente nos dedos de uma mão, o número de ações judiciais que, nesse volume todo e considerando aquele percentual reservado às questões de saúde e segurança do trabalho, realmente discutem prevenção no campo de saúde e segurança do trabalho: prevenção a acidentes, prevenção a doenças, etc. A cultura ainda é basicamente indenitária. Mesmo os sindicatos muitas vezes buscam a indenização, e não a prevenção. Tive casos em que os sindicatos ingressavam com ações coletivas pedindo adicional de insalubridade a todos os trabalhadores, quando tínhamos uma fonte de ruído que poderia ser isolada acusticamente, e, portanto, neutralizaríamos o risco, preservando a saúde dos trabalhadores, evitando que desenvolvessem, com o tempo, a surdez profissional, a surdez bilateral neurossensorial, a perda auditiva bilateral neurossensorial. No entanto, repito, o sindicato optava por monetizar essa discussão. Isso é cultural, também está na cultura dos juízes do trabalho, dos advogados trabalhistas, e isso precisa ser refundado, ressignificado. |
| R | O PLS 304, de 2023 cumpre esse papel. Ele inicia - e faço esta referência por importante - definindo o que é meio ambiente de trabalho como um microssistema de condições, leis, influências e interações de ordem física, química, biológica e psicológica que incidem sobre o homem no seu local de trabalho - vejam, portanto, que o conceito é um conceito funcional, não é um conceito espacial -, ou, em razão de sua atividade laboral, esteja ou não submetido ao poder hierárquico de outrem. O direito ao meio ambiente do trabalho equilibrado não é um direito exclusivo de empregados. Ele alcança qualquer trabalhador, seja autônomo, cooperativado, eventual, que esteja submetido aos riscos criados pela organização empresarial. E, a partir disso, no art. 161-A, como é proposto no projeto de lei, passamos a integrar na legislação, por exemplo, os cuidados de prevenção e precaução envolvendo os riscos psíquicos e ergonômicos, que hoje não são referidos na legislação federal, na nossa CLT, decreto-lei recepcionado como lei federal, e que merecem este cuidado, como o próprio Procurador Renan Kalil disse: "Precisamos nos debruçar sobre os riscos psicossociais". Há que se pensarem essas questões na perspectiva da prevenção e da precaução. Detalhe: a precaução é um conceito que vem antes da prevenção. A prevenção atua nos lindes da certeza científica. A precaução garante proteção ao meio ambiente e à pessoa, mesmo nos contextos de incerteza científica. E não estamos falando de sexo dos anjos, não. Hoje há trabalhadores e trabalhadoras sujeitos e sujeitas aos riscos da nanotecnologia. E nós ainda não dominamos com plenitude os efeitos nefastos que as nanopartículas podem ter no organismo humano. Hoje há trabalhadores e trabalhadoras expostos à biotecnologia. Outros palestrantes falaram hoje sobre a inteligência artificial, que ainda não está regulada no Brasil. Temos projetos de lei discutindo o marco legal da inteligência artificial. Nesses contextos, quando há uma situação de dúvida em que se coloca na balança o interesse da empresa em eventualmente investir sem maiores riscos, sem maiores dispêndios, e o interesse em se proteger à integridade psicofísica do trabalhador, o meio ambiente do trabalho, este segundo elemento precisa prevalecer. In dubio pro natura: na dúvida, em favor da natureza, dizem os jus ambientalistas. O que isso significa para nós, no campo trabalhista? In dubio pro operario, in dubio pro persona: na dúvida, protege-se a pessoa. Se nós tivéssemos esse raciocínio, Senador Paulo Paim - e me permitam esta crítica científica -, o Supremo Tribunal Federal talvez não tivesse levado mais de dez anos para finalmente decidir que a produção industrial com amianto crisotila não poderia ter espaço no Brasil. Se, na origem, quando do ajuizamento da ADI 4.066, a Anamatra e a ANPT à frente, a questão houvesse sido pensada com a perspectiva do princípio da precaução, mesmo no ambiente de dúvida, haveria uma decisão cautelar impedindo imediatamente aquela atividade, e seriam dez anos de trabalhadores poupados da exposição à crisotila, que é carcinogênica, como hoje todos sabemos. Da mesma maneira, trabalhar com a informação, com o princípio da adaptabilidade. O meio ambiente é que se adapta ao homem, o meio ambiente humano, o meio ambiente do trabalho é que se adapta ao homem, e não o contrário, até porque o contrário é impossível. |
| R | A responsabilidade civil objetiva em caso de danos sofridos pelo meio ambiente ou pelo trabalhador em razão de desequilíbrio do meio ambiente de trabalho também está no projeto, decorrendo da própria fixação de jurisprudência no STF no Tema 932, de repercussão geral, e por aí vai. É preciso seguir esse caminho. E, nos mínimos minutos que me restam, vou rapidamente, Senador Paim, falar dos demais temas desta audiência pública e me lembrar do seguinte. Quando eu estava na Anamatra e começava a circular nos corredores do Parlamento em função do projeto de lei que o então Governo Temer havia enviado para a reforma trabalhista - e eram poucos artigos -, tive um encontro com o então Deputado Rogerio Marinho, que seria o Relator da reforma trabalhista e transformaria esse projeto de lei de dez artigos em uma reforma de mais de cem artigos da CLT, como todos nós sabemos. E o então Deputado, hoje Senador, me dizia: "Dr. Guilherme, nós queremos pensar na modernização das relações de trabalho". E eu disse a ele, a uma altura: "Muito que bem, vamos pensar então". Mas modernizar é exatamente olhar adiante de si e ver o que surge no horizonte diante da evolução do estado da técnica e que não está sob o regramento da lei. Isso é que é modernizar. Modernizar não é olhar para trás, ver o que já foi regulado, ver o que já estava protegido e começar a desconstruir uma proteção historicamente conquistada. Isso não é modernizar. E, nessa perspectiva, o que tínhamos diante de nós? Teletrabalho; trabalhadores plataformizados; inteligência artificial; proteção de dados e da privacidade do trabalhador - só para citar quatro pontos. Desses todos, na reforma trabalhista, só entra o teletrabalho e entra da pior maneira possível, para dizer que teletrabalhador não tem direito a horas extraordinárias, algo que nunca esteve em discussão. E os outros temas não ingressaram na regulação. Então, agora, como eu dizia, sob novos ventos, que possamos de fato buscar esta dita modernização, olhando para estas novas realidades que despontam no horizonte e que precisam de uma regulação que proteja o homem na perspectiva da sua dignidade - e não o interesse do lucro empresarial, que tem a sua relevância, mas nessa balança não pode ser o elemento mais relevante. |
| R | Então, precisamos discutir a regulação dos trabalhadores em plataforma, sim. Há vários projetos tramitando, alguns com os quais eu contribuí, mas a maioria deles, Senador, padece de um vício de origem factual, que é o mesmo vício que esteve presente lá no 442, parágrafo único, da CLT, quando se quis dizer que, nas cooperativas de mão de obra, nas famigeradas cooperativas de mão de obra, jamais haveria vínculo de emprego, fosse com a cooperativa, fosse com o tomador. Isso não é possível afirmar pela lei. Cabe ao juiz natural da causa, que é o juiz do trabalho, dizer se há ou não há vínculo de emprego. Infelizmente, há projetos de lei tramitando. Por exemplo - vou citar apenas este exemplo -, o da Deputada Tabata Amaral, que tinha as melhores das intenções, mas abre seu projeto dizendo que não haverá vínculo de emprego entre o trabalhador plataformizado e a empresa de plataforma. Por que não? E se o juiz do trabalho constatar concretamente subordinação, não eventualidade, onerosidade e pessoalidade? Não reconhecerá o vínculo de emprego? Terá de reconhecer, ou a lei será inconstitucional por violar a isonomia. Afora a possibilidade de vínculo de emprego - que, em algumas arquiteturas de plataformas, deverá ser a regra -, mesmo que empregado não seja, há que se reconhecer a esses trabalhadores direitos sociais mínimos pela sua dependência econômica, direito a uma remuneração mínima diária, direito a uma duração máxima de jornada diária, direito a descansos remunerados. Nós trouxemos aqui uma dessas plataformas, o nosso núcleo de pesquisas. Falamos da questão da duração de jornada, e eles responderam: "Estamos resolvendo isso". Em determinado momento, será desligado da plataforma automaticamente, porque foi o limite máximo da sua jornada. Não resolve, porque ele migra para uma outra plataforma e continua trabalhando, diante da sua necessidade e dos parcos valores que são pagos. É preciso garantir, mesmo que ele não seja empregado, remuneração no descanso, descansos remunerados nesse caso. É preciso garantir o direito de greve. Hoje, trabalhadores de aplicativos de transporte estão em greve, e não há regulação para isso - regulação que proteja o grevista, e não que o oprima. Há que se reconhecerem os direitos sindicais e os direitos previdenciários desses trabalhadores. Há que se reconhecerem os direitos relativos à saúde e à segurança no trabalho desses plataformizados. Eu paro por aqui. Falaria alguma coisa de inteligência artificial apenas para dizer que, mais uma vez, caminha um projeto de lei, que é o PL 21, de 2020, que tem propriamente tratado das questões trabalhistas - há apenas referências à preocupação com os direitos trabalhistas -, mas o ideal é que se abra um capítulo para discutir as relações de trabalho na perspectiva da inteligência artificial, como também não se fez na Lei Geral de Proteção de Dados - e haveria que se fazer. Eis um outro ponto a ser pensado pelo Congresso Nacional. Termino, Senador, já que falávamos de futuro, lembrando Jean de la Fontaine, um célebre fabulista, poeta francês, com cuja obra pôde comunicar às gerações pósteras - a todos nós, portanto - a ideia de que as pessoas, muitas vezes, encontram os seus destinos nas estradas que tomaram para evitá-los. Vamos ter isto em mente: não vamos evitar esses temas, porque eles estão nos nossos destinos; vamos tratar deles com todo o cuidado que merecem. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Meus cumprimentos ao sempre juiz Guilherme Guimarães Feliciano, que já foi Presidente da Anamatra. Hoje é Professor da L.D. Associado, representante do Núcleo de Pesquisa e Extensão O Trabalho Além do Direito do Trabalho e do Grupo de Pesquisa Meio Ambiente do Trabalho, todos vinculados ao Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. |
| R | De fato, foi uma série de entidades que apresentaram o projeto. Confessamos nós que primeiro reunimos, acho, que umas dez entidades, calculo, e, daí, como é que a gente ia apresentar a proposta - e pode crer que o Sinait estava junto -, como é que íamos apresentar a proposta? Chegamos ao entendimento de que as entidades apresentariam, e eu, como Presidente da Comissão, avocaria a relatoria. E assim o fizemos, e o projeto está tramitando, para satisfação nossa, já acolhido por grande parte da sociedade. Como foi dito hoje aqui, de todos os eventos que nós realizamos e vamos realizar, sempre aprimorando. A Dra. Ana Luiza mesma disse que o que foi colocado há cinco anos hoje nós vamos ter já que modificar. Mas assim caminha a humanidade - tem um filme que diz isso, não é? Assim caminha a humanidade, e nós todos vamos adaptando para produzir o melhor possível. E o Dr. Guilherme ali, quando fala em prevenção, tem muita segurança de que o fundamental para evitar a doença do trabalho, o acidente no trabalho, é a prevenção. A prevenção é a palavra-chave. Eu me lembro de que, quando eu estava na Cipa ainda, eu era Presidente da Cipa... Embora o presidente de Cipa quem indique seja o empregador, mas eu fui eleito, viu? Eu exigi eleição na fábrica. Eu fui eleito presidente, tinha um outro foi eleito vice. E eu sempre dizia que essa história de ato inseguro e condição insegura, na Cipa - só vão mexer no Estatuto do Trabalho, se possível, e representantes do empregado, empregador... Eu acho um absurdo enorme. Tem que ter um grupo de pessoas que estão ali preocupadas em combater as doenças e os acidentes no trabalho, e não quem defende ali o empregado e o empregador, todos eleitos e que, naturalmente, vão contribuir para que isso não aconteça, pois o Brasil é o segundo país do mundo em acidentes e doenças no trabalho. Nós vamos agora para as considerações finais dos nossos convidados. Eu recebi aqui algumas perguntas do e-Cidadania. Vou fazer as perguntas, como é de praxe, e, nas considerações finais... A Dra. Ana Luiza, que está aqui, vai ficar para o final, e os nossos outros convidados terão o tempo de cinco minutos para as considerações finais. Algumas perguntas. Kathleen Leite, de Goiás: "O [que o] teletrabalho pode facilitar para o empregador em relação à responsabilidade civil da empresa?". Bruna Taísa, do Paraná: "Como garantir a responsabilidade civil das empresas?". É quase na mesma linha. Vinícius Teixeira, da Bahia: "Quais os limites da jornada de trabalho a respeito do home office?". Ray de Jesus, de Goiás: "Como o Estatuto do Trabalho aborda a relação entre trabalho remoto e vida pessoal no mesmo ambiente?". Henrique Francisco, do Rio de Janeiro: "Como garantir que tal iniciativa sugerida será assegurada pela mão estatal?". |
| R | Sarah Vilanova, do DF: "Quais possibilidades existem para assegurar a fiscalização na implementação das normas da segurança do trabalho?". Nathaly da Silva, de Pernambuco: "Como o Estatuto do Trabalho aborda a relação entre trabalho digno e proteção ambiental?". Pedro Sippli, do Rio de Janeiro: "Como garantir a responsabilidade civil das empresas sobre os empregados e seus respectivos direitos?". Newton Valentim, de Rondônia: "Quais são as diferenças entre o teletrabalho tradicional e o trabalho em plataformas digitais em relação à proteção e garantia de direitos?". Eu vou voltar, por uma questão só de rito, à primeira mesa. O Dr. Renan Bernardi Kalil teve que sair. A Ministra Delaíde Alves Miranda Arantes também teve que sair. A Ana Luiza Horcades está conosco. Ana Luiza Horcades, Auditora Fiscal do Trabalho e Representante do Sinait. Eu vou deixar para a fala final. O Sr. Henrique Mandagará de Souza, que representou o Ministério do Trabalho também já teve que se retirar. Aí voltamos para a segunda mesa. O Rosildo Bonfim não sei se encontra ainda... (Pausa.) Então, eu convido o Dr. Rosildo Bonfim, Coordenador Regional e Representante do Movimento da Advocacia Trabalhista Independente, para as suas considerações finais. São cinco minutos, Dr. Rosildo Bonfim, até porque eu estou correndo atrás do tempo. Nós teremos, hoje, a partir das 14h, uma fala no Plenário. Depois, voltamos para cá, para uma audiência pública para discutir o uso de agrotóxicos e os danos à saúde e ao meio ambiente, que se inicia às 14h, nesta mesma Comissão. Dr. Rosildo Bonfim, por favor. O SR. ROSILDO BOMFIM (Para expor. Por videoconferência.) - Inicialmente, mais uma vez, eu reitero o agradecimento por participar desta Comissão, para tratar de temas tão importantes ao Direito do Trabalho, ou seja, à vida da sociedade como um todo, porque a gente não vive sem trabalho. Eu queria colocar como considerações finais que não há uma demonização da tecnologia, até porque, se eu estou aqui, no Rio de Janeiro, falando com vocês, agradeço à tecnologia, mas temos que separar o que são empresas plataformizadas em que há, de fato, apenas trabalhos autônomos, e, como disse o Prof. Guilherme, mesmo trabalhos autônomos têm que garantir a proteção do trabalhador de empresas que usam essas plataformas como mecanismo para fraudar o sistema. O que a gente não pode fazer é transformar o trabalhador em objeto de mercadoria do capital. Trabalhador não é objeto de mercadoria de capital. Também gostaria de pedir aos Congressistas - e uso, de novo, um pedaço da fala do Prof. Guilherme, que também, professor, muito me impressionou - o cuidado com esses PLs que tratam da plataformização, porque eu fiz um estudo muito grande sobre quase todas esses PLs, Professor, e quase todos os PLs foram no sentido de presumir que o trabalho é autônomo e transferir uma competência que, a meu sentir, é do Poder Judiciário, ao analisar os casos concretos, transferir para o legislador determinar quando há e quando não há trabalho subordinado, porque isto é casuísmo, e casuísmo, quem tem que analisar, caso a caso, é o Poder Judiciário. |
| R | O último PL que eu analisei, recentemente, do Senador Rogério Marinho, no art. 3º, §2º, chega-se a dizer "quais são as características dessa plataforma em que não se considera subordinado". Todas aquelas características são justamente o que se considera trabalho subordinado. Então, a gente tem que tomar cuidado, porque, como disseram os outros palestrantes, reforma é para melhorar; reforma é para pegar trabalhadores, por exemplo, que estão fora do sistema protetivo e colocá-los dentro do sistema protetivo. Eu gosto muito de usar uma metáfora: a gente não faz reforma na nossa casa para piorá-la. A gente faz reforma para melhorar. Então, a gente tem que tomar cuidado com esses PLs, e aqui é um pedido que eu rogo ao Parlamento brasileiro, para dar uma reolhada nesses PLs, para não transferir ao legislador uma competência exclusiva do Poder Judiciário, porque, se a gente mantiver esses PLs do jeito que estão, na sua grande totalidade, somente atravessando a Constituição Federal é que os juízes do Trabalho poderão colocar o trem no trilho, e aí é uma longa caminhada até chegar ao Supremo Tribunal Federal. Então, nas minhas considerações finais, eu reitero que os Congressistas reanalisem, especificamente, este ponto de não transferir para o Legislativo a análise pontual de caso a caso quando há ou não trabalho subordinado. Bom, essas são as minhas considerações, reiterando o agradecimento pelo convite para estar aqui, tanto do Senador Paim, do Senado, enquanto instituição, e também do Mati, por me escolher como representante do Movimento da Advocacia Trabalhista Independente. Obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito obrigado, Dr. Rosildo Bonfim. Suas contribuições são preciosas e vão, com certeza, nos ajudar muito. Convido agora a Procuradora do Trabalho, Dra. Cirlene Luiza Zimmermann A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada, Senador Paim. Vou aproveitar este meu espaço de considerações finais, observando um pouco as preocupações trazidas por quem assistiu a esta audiência pública, que está bastante focada na questão da responsabilidade civil, seja naquela decorrente do teletrabalho, quanto em outras questões de como o Estatuto do Trabalho, de fato, enfrentaria essa questão. Nesse aspecto, já que o nosso tema central foi a questão da saúde e da segurança dos trabalhadores e das trabalhadoras, é importante que se diga que, de fato, o título do meio ambiente do trabalho no Estatuto foi perfeito, ao trazer este aspecto de que o tipo de contratação, o tipo de vínculo que estava sendo formado entre o gestor do meio ambiente do trabalho, o dono do negócio e o trabalhador, ele não importava para fins de garantia do meio ambiente do trabalho seguro, salubre e saudável. Então, isso está disposto lá no título do meio ambiente do trabalho. O que nós verificamos, isso talvez até seja um vício da nossa atuação trabalhista, é trazer para o capítulo da responsabilidade civil do Estatuto a expressão "empregador", a quem, em vários momentos, em todos os momentos, a responsabilidade é imposta, quando, na realidade, nós deixamos claro, lá no título do meio ambiente, que a responsabilidade era de quem estava gerindo o meio ambiente do trabalho. |
| R | Então, esse é um cuidado que temos que ter na questão da definição da responsabilidade civil, para que, de fato, esse capítulo também reflita, ainda que a gente não queira, ao final, ficar discutindo indenizações ou ficar discutindo direitos aos adicionais, e assegure um ambiente de trabalho digno e salubre. É importante que a gente assegure que, em caso de danos, em caso de violação a esses direitos, de fato, aquele que era o responsável por assegurar o ambiente de trabalho digno e seguro seja também o responsável por eventual indenização que seja necessária naquele cenário. Tanto o título de responsabilidade civil quanto o de teletrabalho comportam essas conformações justamente com as novidades, com o que se trouxe, com o que se pretende trazer, que estão também refletidas no PL nº 304, assim como a responsabilidade por assegurar esse ambiente de trabalho seguro e salubre. Então, a troca dessa expressão "empregador" por "contratante", por "gestor do meio ambiente de trabalho", por "responsável pelo meio ambiente de trabalho", é algo que realmente viria para acomodar essa nova conformação que se pretende dar aqui. Um outro aspecto a se considerar, e que é importante que se destaque aqui, é que o estatuto virá com esse propósito de evoluir nas relações de trabalho sim, assegurar um ambiente de trabalho seguro, assegurar crescimento econômico sustentável, mas com saúde e segurança. E, nesse aspecto, é importante que se diga que a gente quer manter as empresas no ambiente de trabalho, no ambiente de negócios, nas empresas que queiram cumprir esses princípios mínimos. Algumas iniciativas, e aí eu me reporto à Norma Regulamentadora nº 1, que trouxe, nessa última revisão, um aspecto no sentido de definir a responsabilidade quanto a adotar medidas de segurança e saúde no trabalho relacionadas ao porte da empresa. Se é microempresa, empresa de pequeno porte, ela estaria dispensada de adotar medidas nesse sentido. E aí me traz preocupação a tramitação de PLs, nesse mesmo sentido, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, que trazem a questão da proteção, da prevenção e da precaução no meio ambiente do trabalho relacionados ao porte econômico da empresa, quando, na realidade, o que traz o risco é a atividade, o negócio que é desenvolvido. (Soa a campainha.) A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - Então, precisamos desvincular questões que não possuem vinculação alguma. Então, esse é um cenário também de preocupação e que merece esse registro nessas considerações finais. Mais uma vez eu agradeço a disponibilidade e esse espaço, colocando-nos à disposição para a continuidade do diálogo. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito obrigado, Dra. Cirlene Luiza Zimmermann, Procuradora do Trabalho. As suas contribuições naturalmente serão olhadas com muito carinho para nós irmos aprimorando a ideia da nova Consolidação das Leis do Trabalho. Dr. Guilherme Guimarães Feliciano, por favor. Juiz e um dos que ajudou a apresentar aqui o projeto. O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado mais uma vez, Senador. Eu, como a Dra. Cirlene, também vou tentar atender um pouco ao pessoal de casa que está nos acompanhando e que tão gentilmente nos dirigiu questões, e é importante que tenham aqui alguma resposta. Eu anotei algumas das questões, Senador Paim, que V. Exa. apontou e vou responder àquelas que eu acho que são mais pertinentes à abordagem que eu fiz, à parte que me coube nesse "latifúndio", se me permitem a expressão, imaginando um Brasil que, no futuro, já não tenha latifúndios, pelo menos improdutivos. |
| R | Primeiro, a questão da responsabilidade civil da empresa. Como fazer para que as empresas percebam a sua responsabilidade, o seu papel, e efetivamente estabeleçam, no seu âmbito corporativo, políticas efetivas de prevenção de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais? Vale lembrar que temos tido, inclusive, algumas evoluções nesse particular. Vamos dizer muito claramente - faço aqui coro também com a Dra. Cirlene: no período dos Governos Michel Temer e Jair Bolsonaro, as alterações que nós tivemos nas normas regulamentares do Ministério do Trabalho, na nossa visão, na visão do Grupo de Trabalho Meio Ambiente do Trabalho da Universidade de São Paulo, não foram alterações interessantes nem benfazejas e, francamente, em alguns casos, sequer constitucionais. Foram alterações - por exemplo, a NR-1, que era referida aqui - que procuram criar um modelo de autorresponsabilidade envolvendo a empresa, para que a empresa indique os riscos e faça o gerenciamento a partir do seu próprio ponto de vista, diminuindo a atuação de agentes externos, que são fundamentais aqui, como os próprios auditores fiscais do trabalho. Essas coisas todas precisam ser repensadas. O nosso próprio núcleo de pesquisa e extensão deve iniciar algum tipo de trabalho, no sentido de fornecer ao Ministro Marinho, Senador Paim, algumas alternativas para revisão destas normas regulamentadoras. De todo modo, o mais importante é que se tragam para esse debate - exatamente como eu dizia - princípios que são próprios do direito ambiental, como, por exemplo, o princípio do poluidor pagador. Como é que funciona, em geral, no Direito Ambiental? Se eu estou poluindo, na verdade, até do ponto de vista da concorrência capitalista, Senador, significa que eu não estou fazendo os devidos gastos com a filtragem, por exemplo, dos meus rejeitos, e, nesse sentido, o meu produto final fica mais barato, o que significa que eu concorro no mercado com um produto mais barato do que o do meu concorrente. Eu tenho uma vantagem relativa de mercado. E esta vantagem, quem paga por ela, na verdade, é a população, porque eu estou poluindo, vamos imaginar, um rio, recursos hídricos, lençóis freáticos, enfim, e depois serão os dinheiros públicos, os valores arrecadados com tributação que serão gastos para despoluir o que eu estou sujando. A ideia do princípio do poluidor pagador é internalizar isso. Então, se haverá esse custo, a empresa deverá pagar por isso e fará isso independentemente de culpa; é apenas pelo fato de que ela obteve um ganho a partir da criação de um risco ambiental, este risco ambiental trouxe um dano externo, e agora ela terá de pagar por isto. A mesma coisa vale para as relações de trabalho: o empregador precisa começar a pagar por esses acidentes e essas doenças que decorrem do desequilíbrio engendrado no seu meio ambiente de trabalho, e isso independentemente de discussões em torno de culpa. E, paulatinamente, será percebido que o investimento em saúde e segurança do trabalho é imprescindível para que, inclusive, ele não tenha, depois, despesas maiores perante o Poder Judiciário, por exemplo. E isso também organizará melhor a concorrência entre os elementos que estão naquele mesmo segmento de mercado. |
| R | Há outras questões, mas o meu tempo já foi. A questão do trabalho remoto foi dita aqui... De fato, eu cheguei a ouvir, Senador, em uma escola judicial, a ideia de que o teletrabalho era o futuro porque o trabalhador agora passava a ter autodisciplina, mas que autodisciplina é possível se esse teletrabalhador é cobrado a todo momento, a todo segundo, às vezes por um aplicativo de WhatsApp, e já não tem tempo para se dedicar à sua família estando dentro da própria casa? O teletrabalho, na verdade, rompe com este véu histórico e sagrado que separava o trabalho da família. Nós entendemos bem isso a partir dessa ideia de modernidade líquida. Nós já não temos mais essa divisão clara entre o tempo de trabalho e o tempo pessoal. É tudo a mesma coisa. O teletrabalho é a cereja deste bolo. Eu preciso de uma regulamentação forte, e não imaginar que a autodisciplina do trabalhador vai resolver alguma coisa. Mas eu termino dizendo que, diante de tudo que eu ouvi, e eu elogiava aqui no grupo de WhatsApp, especialmente o Leandro, que está aí nos ajudando com toda essa organização... E é claro, Senador Paim: deixo aqui os meus efusivos elogios à sua iniciativa e à sua coragem de sempre, de nos trazer para falar essas coisas. E, diante de tudo dito e de tanto futuro pela frente, agora visível e palpável, eu terminaria com São Paulo. Sejamos como Paulo, em Timóteo 4:7: vamos combater o bom combate, vamos completar esta carreira e, até lá, vamos guardar a fé. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito obrigado. (Palmas.) Sempre juiz, Guilherme Guimarães Feliciano, hoje é Professor da L.D. Associado, representante do Grupo de Pesquisa e Extensão do Trabalho Além do Direito de Trabalho e do Grupo de Pesquisa Meio Ambiente do Trabalho. Ele faz questão de destacar, e eu o faço nesse momento também, ambos vinculados ao Departamento de Direito do Trabalho e de Seguridade Social da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Na sua fala, Dr. Guilherme, amigo de tantos anos, de todos nós, eu vi que você falou não só em prevenção, mas também em precaução. Antecipar-se à prevenção, também à precaução, e agora termina aqui, mais uma vez, apontando caminhos positivos para todos nós, para melhorar a vida dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiras. Eu passo agora para o encerramento, para a Dra. Ana Luiza Horcades, auditora fiscal do trabalho, representante do Sinait. Ela foi das primeiras a chegar e aqui ela falaria em nome da Mesa, já que os outros três deram aqui brilhantes contribuições também, e tiveram que se retirar. Então, Doutora, a senhora terá dez minutos, com mais cinco, se necessário. A SRA. ANA LUIZA HORCADES (Para expor.) - E vou buscar não utilizar todo esse tempo, em função da hora do almoço de todos, que já está se aproximando. O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Enquanto eu tomei uma batida aqui, todo mundo ficou firme. |
| R | A SRA. ANA LUIZA HORCADES (Para expor.) - Não, mas... Bom, enfim, eu quero aproveitar... Eu vou finalizar com os meus agradecimentos, mas antes disso vou fazer alguns comentários, buscando avaliar tudo o que foi discutido aqui e este momento e esta oportunidade e espaço que a gente está tendo de, de fato, discutir os aspectos que nós precisamos discutir, para construir esse mundo melhor, onde a gente quer viver e onde os meus filhos vão trabalhar, em breve. Com relação ao Estatuto do Trabalho ou qualquer outra proposta técnica, proposta normativa, que a gente venha a discutir e a criar... Acho que o aspecto mais importante para que a gente possa, de fato, ter uma lei nascendo que não seja feita para a Suíça é a gente se lembrar de que a gente não está na Suíça e que a gente não quer regular relações de trabalho na Suíça, com as características da Suíça. A gente precisa, de fato, conhecer quais são os problemas que existem hoje nas relações trabalhistas, e conhecer esses problemas passa desde conhecer o meio ambiente de trabalho até avaliar o que é que está sendo julgado e discutido em todas as outras instâncias, mas conhecer o que, de fato, está dando problema, adoecendo e matando os trabalhadores. Essa avaliação, para que seja real, para que seja eficiente - como está lá na Convenção 144 -, precisa da participação de todos os atores envolvidos, como nós estamos fazendo aqui. A parte da participação dos trabalhadores, que são o objeto que a gente busca - não estou falando objeto no sentido inanimado, mas que são o alvo do que a gente está discutindo -, precisa ser efetiva, precisa ser capacitada. O trabalhador e a representação dos trabalhadores não podem estar presentes apenas para ocupar um espaço, mas eles têm que estar presentes de forma ativa e com capacidade de entrar nessa queda de braço que é natural do processo legislativo. Não é possível a participação desses trabalhadores sem que eles tenham representações fortes e representações que estejam ali preparadas para entrar nessa briga e para fazer com que os próprios direitos desses trabalhadores estejam resguardados dentro dessa discussão. Então, a gente precisa, para discutir o Estatuto do Trabalho, discutir também a questão sindical, como é que esses trabalhadores vão poder estar nessa queda de braço e poder participar efetivamente da construção dessa legislação. E além, mais uma vez, de reforçar a questão da importância de a gente discutir a representação sindical, a representação do Estado ali dentro. A gente precisa do conhecimento dessas situações de trabalho, a partir do fortalecimento do serviço público. Não há, também, utilidade em ter a melhor lei do mundo... E só um parêntese: o problema no Brasil, o problema da gente, não é falta de lei; a gente tem uma série de leis, a gente tem uma série de normativos, como, por exemplo, de normas regulamentadoras que já seriam suficientes se nós tivéssemos uma cultura de valorização do indivíduo. O que a gente precisa aqui é atuar na construção de uma cultura prevencionista, uma cultura que não aceite a presença do trabalho análogo ao do escravizado, como a gente, infelizmente, ainda tem aqui do nosso lado, em todos os lugares, e trazendo um desequilíbrio a esse mercado, trazendo um desequilíbrio às relações de mercado. |
| R | Bom, o combate a essa situação de precariedade precisa também ser discutido aqui dentro desse ambiente de discussão do Estatuto do Trabalho. A gente ouve, vem ouvindo ao longo dos anos, muitas críticas às normas regulamentadoras, críticas, enfim, até de agentes públicos, falando que é um absurdo a gente ter que botar num texto de norma que tem que dar papel higiênico para o indivíduo. Eu também acho um absurdo a gente ter que botar isso, escrever que tem que dar água para o indivíduo. Mas, infelizmente e surpreendentemente, a gente autua isso pra caramba. Por quê? Porque essa é uma violação que a gente ainda encontra no meio ambiente de trabalho. Então, é uma pena eu ter que ter isso: em 2023, eu ter que botar, por escrito, a obrigação de que se dê água para o indivíduo trabalhar ou um banheiro para esse indivíduo fazer suas necessidades fisiológicas. Mas, infelizmente, se nós não tivermos isso numa norma técnica, a gente, enquanto inspeção e enquanto Estado, não tem como resguardar esse direito. Então, vamos conhecer, de fato, quais são essas relações de trabalho. Vamos ampliar... Como disse, acho, o Dr. Guilherme Feliciano: não adianta eu querer fazer uma reforma que não seja para trazer mais gente para esse ambiente de proteção. E, a partir daí, vamos sentar e enfrentar esses problemas que, de fato, a gente está encontrando no meio ambiente de trabalho. Então, é para isso que nós estamos aqui, enquanto Auditoria Fiscal do Trabalho, para trazer essa questão técnica para a discussão, para trazer o que a Auditoria Fiscal do Trabalho, de fato, enfrenta no meio ambiente de trabalho e em todos os estados do Brasil. O meu cenário, no Rio de Janeiro, é completamente diferente do cenário que o meu colega, que é chefe de Sergipe, encontra por lá, completamente diferente. Então, a gente precisa, de fato, botar para dentro desse texto a realidade de todos os estados do Brasil, para poder promover uma melhora na qualidade de vida dos trabalhadores, trabalhadores em sentido amplo, que a gente busca resguardar. Então, mais uma vez, Senador, muito obrigada. Que essa discussão... Que a gente se lembre de que está discutindo um direito fundamental, que essa discussão possa ser fomentada e que a gente, de fato, consiga avançar bastante com o texto do nosso Estatuto do Trabalho. Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito, muito obrigado, Dra. Ana Luiza Horcades, Auditora Fiscal do Trabalho, representante do Sinait, pela sua exposição, do início ao fim. E nós concluímos hoje mais uma sessão do ciclo de debate do mundo do trabalho. O título é o Estatuto do Trabalho, como poderia ser a CLT do século XXI, como poderia ser a modernidade no campo do trabalho, mas sempre na linha que todos colocaram, ampliando, garantindo direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras, do campo e da cidade, para o trabalho digno. Hoje, o eixo foi o meio ambiente do trabalho, e todos colocaram com muita clareza esse tema. Eu queria convidar a todos para que, dentro do possível - as entidades todas que estiveram nesse ciclo de debates, aqueles que estão aqui neste momento ainda e que estão nos assistindo -, para que, quando a gente tiver os eventos nos estados, possam estar de forma presencial ou virtualmente. Claro, no Rio Grande do Sul eu vou estar presencialmente, porque é o meu estado e é natural que eu esteja lá, mas pode ser que em muitos estados a gente vá fazer daqui; vamos formatar uma mesa e, lá no estado, aproveitando os novos tempos da comunicação, nós teremos um Plenário debatendo a nova CLT, o novo estatuto do trabalho, enfim, ampliando e garantindo o direito dos trabalhadores. |
| R | Era isso, está encerrado agora de manhã. Não esqueçam: às 14h nós voltamos aqui para discutir o uso de agrotóxicos e os danos à saúde e ao meio ambiente. Obrigado. Está encerrada a audiência pública de hoje. (Iniciada às 9 horas e 00 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 08 minutos.) |

