Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
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| R | O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 13ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Assuntos Sociais da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura, em conjunto com a 22ª Reunião da Comissão de Educação, Cultura e Esporte. A presente reunião atende aos Requerimentos nºs 21, 26, 34, 39 e 40, de 2023, da CAS, de minha autoria e de autoria da Senadora Mara Gabrilli, e aos Requerimentos nºs 20, 26 e 35, de 2023, de minha autoria e também da Senadora Teresa Leitão, para a realização da segunda audiência pública destinada a debater o papel e as condições das escolas e instituições especializadas no atendimento educacional aos estudantes com deficiência, na perspectiva da inclusão. Informo que a audiência tem cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado, da Rádio Senado e que contará com o serviço de interatividade com o cidadão, através do telefone 0800 0612211 e do e-Cidadania, por meio do portal www.senado.gov.br/ecidadania, que transmitirá ao vivo a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos expositores via internet. |
| R | Bem, respeitando as regras de acessibilidade... (Interrupção do som.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - ... eu vou falar fora do microfone para que as pessoas com deficiência visual me localizem melhor. Sou o Senador Izalci Lucas. Estou sentado no centro da mesa com duas pessoas, uma à direita e outra à esquerda. (Fora do microfone.) Boa tarde a todos. Sejam bem-vindos! Com muita alegria, temos a sociedade presente e a sala cheia, com alguns, inclusive, em outra sala de audiência. Farei aqui a minha audiodescrição. Tenho a pele morena, cabelos lisos e ralos, rosto redondo e uso óculos. Estou com um terno marrom, uma gravata também, listrada, marrom. Nesta tarde, nós vamos dar continuidade ao ciclo de debates que está sendo feito de forma conjunta com as Comissões de Educação e de Assuntos Sociais, para debater o papel e as condições das escolas e instituições especializadas no atendimento educacional aos estudantes com deficiência, na perspectiva da inclusão. Somos plenamente favoráveis à educação inclusiva, respeitando as escolhas, de forma democrática e entendendo o lema "Nada sobre nós, sem nós", que significa, entre outras coisas, o inegociável protagonismo das pessoas com deficiência. O estudante com deficiência tem direito a uma educação de qualidade que atenda a todas as suas necessidades com igualdade de condições e de participação com os demais estudantes. A inclusão dos estudantes com deficiência é um ponto de convergência comum de todos. A forma de fazê-la precisa ser fruto da construção coletiva, em que as opiniões e os diferentes pontos de vista sejam colocados, ouvidos e respeitados. Eu já agradeço, imensamente, ao Presidente, nosso querido Senador, competente e conhecedor de tudo o que acontece na Comissão de Educação, na área social. O Senador Arns para nós é uma referência aqui no Congresso Nacional. Mas, antes de passar a palavra aqui para os nossos convidados, eu quero registrar a presença... Eu não sei se, porque tem, na outra sala, que participou também da nossa reunião, o Sr. Fernando Cotta, que é o Presidente de Honra do Movimento Orgulho Autista; a Sra. Viviani Guimarães, também, Vice-Presidente do Movimento Orgulho Autista; o Prof. Iury Moraes, mestrando aqui da UnB; as Profas. Elen Regina Moraes, Neylliane dos Santos e Alyne Oliveira; a Profa. Gilcileide Ferreira de Oliveira, que é Diretora do Centro de Ensino 01 do Guará - estivemos lá, inclusive, vários Senadores. Na pessoa dela, eu quero aqui cumprimentar todos os diretores e diretoras dos Centros de Ensino Especial daqui do Distrito Federal presentes nesta audiência. Cumprimento, também, a Denise Braga, que é Presidente da Associação Brasiliense de Deficientes Visuais; a Sra. Amazônica Brasil, membro do Instituto Ísis; o Sr. Charles Jatobá, Presidente do Instituto Blind Brasil; o Pedro Gustavo Fernandes Matias Ferreira, representante aqui da Apae-DF; a equipe do Centro Educacional de Audição e Linguagem Ludovico Pavoni, o Ceal; a equipe, também, do Centro de Ensino e Reabilitação do DF (CER); os educadores; os representantes de várias instituições que atendem pessoas com deficiência; os familiares; e os estudantes, que nos honram aqui com as suas presenças nas duas salas disponibilizadas pelo Senado Federal; e todos os que participam de modo virtual pelo canal da Comissão de Assuntos Sociais no YouTube e também pelo e-Cidadania; além, também, de registrar a presença de Messias Ramos Costa, que é representante da Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos. |
| R | Bem, já passo então, após a fala do nosso Presidente... Agradeço por estar presidindo esta audiência pública ao nosso querido Senador Flávio Arns. Eu vou passar já a palavra para os nossos convidados. Vou passar, primeiro, para... Porque nós estamos com um probleminha aqui no YouTube. (Pausa.) Tá! O.k! Estávamos com um probleminha aqui no virtual, mas já foi resolvido. Eu vou passar, primeiro, para a Profa. Vera Lucia Ribeiro de Barros, que é Subsecretária de Educação Inclusiva e Integral, da Secretaria de Educação aqui do Distrito Federal. Com a palavra, Profa. Vera. A SRA. VERA LUCIA RIBEIRO DE BARROS (Para expor. Fora do microfone.) - Muito obrigada, Senador Izalci e a todas as autoridades. Eu até estou falando assim, fora do microfone, para que realmente os nossos participantes com deficiência visual possam perceber onde é que eu estou. Eu quero dizer que é uma alegria imensa estar aqui. Quero agradecer por esta oportunidade de poder chegar e colocar, de forma bastante clara, todas as nossas atividades, as ações pedagógicas realizadas na rede de ensino do Distrito Federal. O meu cabelo é castanho, na altura dos ombros. Eu tenho pele clara. Estou com um vestido estampado, assim com verde, lilás. Eu estou à esquerda aqui do Senador Izalci. Dizem que eu sou muito simpática - eu acho que esse é um outro dado assim importante - e muito risonha, tanto é que um dos meus sinais... Os deficientes auditivos exatamente colocam na altura da boca, assim, porque falam que eu sou muito risonha. Na verdade, para mim, poder vir aqui hoje está sendo uma alegria muito grande mesmo, porque eu tenho muito prazer em falar sobre a inclusão que é trabalhada e apresentada no nosso Distrito Federal, na nossa rede de ensino, que é totalmente inclusiva. Eu tenho, inclusive, nos nossos Centros de Ensino Especial... Eu vou colocar para vocês as nossas atividades pedagógicas. Pode ir passando. Nossas atividades pedagógicas... E vou falar com vocês também sobre todas as atividades, quer dizer, nós... Pode passar. (Falha no áudio.) Está tendo um... (Pausa.) Ah, então, está bem! Então, olha só, o importante para eu falar com vocês... Eu queria só pontuar em termos de número de estudantes que nós temos na rede. Nós temos em torno de 472 mil estudantes matriculados em nossa rede de ensino. Como é que vai passando aqui? (Pausa.) Ah, esse aqui é para frente. Está bom! E, com relação aos nossos estudantes com deficiência, nós temos um total estimado em 27, 28 mil, que são 5,7% do nosso número total de estudantes na rede; e, nos nossos Centros de Ensino Especial, nós temos em torno de 3,9 mil, o que dá um total de 0,8% do que nós temos em termos totais dos estudantes que estão matriculados na nossa rede de ensino. Deixe-me ver se foi. Pronto! |
| R | Com relação aos nossos Centros de Ensino Especial, nós temos 12 Centros de Ensino Especial, que estão com as nossas coordenações regionais. Nós temos Brazlândia, Ceilândia, Gama, nós temos o nosso Centro de Ensino Especial para Deficientes Visuais - maravilhoso! - no Plano Piloto, nós temos Guará, Planaltina, Samambaia, Santa Maria, Sobradinho e Taguatinga. Quer dizer, os Centros de Ensino Especial são uma oferta de atendimento especializado bastante importante em todo o nosso processo de inclusão que é realizado na nossa rede pública de ensino. Bom, em termos de atendimentos, eu vou fazer uma geral com vocês desde o início, quer dizer todos os atendimentos que são desenvolvidos pela nossa rede. Assim que o nosso bebê nasce, nós já temos o nosso programa de educação precoce, que, inclusive, até a nossa parceira Viviane, na reunião anterior, até comentou sobre o nosso programa de educação precoce, que é para os nossos bebês de 0 a 3 anos e 11 meses, e é um trabalho muito bonito, que, na verdade, é todo um processo de estimulação para que os nossos bebês consigam chegar à próxima etapa com o seu desenvolvimento, com toda a equidade de oportunidades de aprendizado. Nós temos outros atendimentos, que são as nossas classes especiais, nós temos as turmas reduzidas, nós temos as nossas turmas inclusivas, mas o mais importante é dizer o seguinte: a oferta do atendimento vem depois de todo um trabalho de avaliação que nós temos estudos de caso de cada estudante. A partir dessa avaliação, desse trabalho multidisciplinar - até mais lá na frente vou apresentar os profissionais -, nós ofertamos o atendimento que venha a ser mais adequado para o nosso estudante. Então, dentro disso nós temos estudantes que vão para a turma reduzida, temos outros estudantes que vão para a classe especial e estudantes que vão para o nosso Centro Ensino Especial, que é um outro braço da nossa inclusão extremamente importante para que a gente consiga fazer com que todos tenham as mesmas oportunidades, que a acessibilidade, que é a garantia da inclusão, seja ofertada de maneira plena para cada estudante em função da sua especificidade. Nos Centros de Ensino Especial, nós temos programas de atendimento especializado maravilhosos, onde na verdade nós temos oficinas pedagógicas, nós trabalhamos com atendimentos complementares. Olha só, eu tenho nessas salas inclusivas inclusive estudantes que vão para os centros, no contraturno, para participar de grandes projetos; porque, na verdade, o que é o aprender? O aprender é uma soma de busca de conhecimento. E no nosso Centro de Ensino Especial tem um trabalho extremamente importante, junto com os nossos estudantes, em relação até o próprio protagonismo desse estudante. Deixe-me ver se eu consigo aqui. Esperem aí. (Pausa.) Pronto. Porque na verdade nós seguimos até o que está muito claro na própria política. A política diz assim: todos os alunos devem ter as suas especificidades atendidas. Se vocês me perguntarem assim: "Ah, mas tem problemas que eu já escutei da rede?" Não, claro que sim. Nós temos dificuldades, nós temos problemas, sim. A nossa rede é imensa, mas nós estamos prontos para tentar resolver pontualmente todas as dificuldades e problemas que forem surgindo, e até preciso muito de todos vocês. Essa oportunidade de eu estar aqui hoje, de poder falar do nosso trabalho, é uma oportunidade que nós temos, inclusive, de poder trocar informações e de saber: "Olha, isso está muito bem, isso não está, a gente precisa melhorar a parte da oferta". Nos nossos Centros de Ensino Especial, se vocês me perguntarem... Vocês acham que o centro está todo sem nenhum problema, que está tudo certinho? Não! É uma oferta, como as outras também, de que nós precisamos melhorar, está certo? Aqui eu coloco de uma maneira bastante importante que os nossos centros têm que ter entrada e saída. A gente tem que ter entrada e saída nos nossos centros. |
| R | Então, uma das coisas que nós colocamos muito este ano na nossa subsecretaria, na Subin, e eu coloquei até para a Renata, que é minha diretora e está logo ali na frente, é que nós teríamos assim duas metas muito importantes nesse ano de 2023, que seriam: valorizar, fortalecer as nossas salas de recurso, que é a garantia da inclusão plena, junto com o nosso estudante, que trabalha as adequações curriculares - isso é muito importante; e o fortalecimento também, a valoração dos nossos centros de ensino especial, pela excelência de trabalho que é realizado com os nossos estudantes. E por que eu coloco que tem que ter a saída? Porque, quando se trabalha com estudo de caso, nas nossas avaliações que estão ali acontecendo, nós temos um trabalho individualizado. Os nossos estudantes que vão para o centro são os estudantes que passaram por um estudo de caso e se percebeu que esse estudante tem que ter um atendimento individualizado. Então, dentro dessa especificidade, o Centro de Ensino Especial é maravilhoso, porque exatamente ele traz esse protagonismo, essa possibilidade de desenvolvimento para os nossos estudantes. Nós trabalhamos a parte das competências, das habilidades. Quando nós falamos em protagonismo é o protagonismo do próprio estudante, a partir de um trabalho que é realizado pelos nossos professores, de ele conseguir determinar o caminho, um tipo de ação importante, um tipo de atividade que ele entende e se sente mais feliz. É a parte da qualidade da vida. A inclusão, minha gente, não é inclusão só do estudante: é inclusão da família, é inclusão do ambiente onde ele está, aonde ele está inserido. Essa é a inclusão. É a inclusão de todos! É a inclusão de todos! É assim que a gente entende o nosso trabalho na nossa rede. Precisamos melhorar? Precisamos, sim. Estamos aqui hoje exatamente para troca, para esse contraditório. Até eu estava conversando com a Ana Beatriz sobre o contraditório - viu, Senador? Eu falei assim: eu acho extremamente saudável, porque é o contraditório que nos permite ficar melhor, nos fortalecer, buscar caminhos às vezes até bem melhores, mais assertivos, mais efetivos do que os que gente vem realizando. Uma coisa importante que eu quero colocar para vocês é a acessibilidade. A acessibilidade é o que garante a inclusão. Se você não tem acessibilidade, você não permite a equidade entre as pessoas que estão ali com especificidades assim distantes. Inclusive até eu estava colocando para vocês com relação à saída do centro. Eu acho que - e até a gente estava conversando - deveria existir uma ação de Estado mesmo, com envolvimento de todas as secretarias, Senador, para que a gente pudesse criar um centro de referência e inclusão aqui no nosso Distrito Federal, para que a gente pudesse ofertar todos os nossos atendimentos especializados, modalidade de desenvolvimento, inclusive inclusão no mundo do trabalho, porque essa inclusão no mundo do trabalho também é realizada nos nossos centros de ensino especial, através de uma série de oficinas, que são desenvolvidas nos nossos centros. Deixe-me eu andar aqui. Espera aí. Deixe-me ver se eu consigo aqui mais um. O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Eu só quero lembrar, pois acho que eu não falei no início, que nós vamos dar dez minutos para cada... A SRA. VERA LUCIA RIBEIRO DE BARROS - Já passaram dez? O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Havendo necessidade, a gente prorroga um pouquinho. Mas eu quero, só para... Porque são vários expositores. Mas fique à vontade, porque é importante. O SR. FLÁVIO ARNS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Eu só quero lembrar à expositora que o relógio está lá no fundo. Tem um relógio no fundo e um relógio aqui na frente para as pessoas. A SRA. VERA LUCIA RIBEIRO DE BARROS - Ah, agora que eu vi! Está bom! Está certo. |
| R | Então, olha só, gente, eu queria colocar um vídeo que eu trouxe. Aliás, não foi um só. Nós fizemos diversos vídeos. Este vídeo é do nosso Centro de Ensino Especial de Sobradinho, que apresenta as atividades pedagógicas que nós desenvolvemos. Eu acho que já me estendi na minha fala, porque, na verdade, o prazer que eu tenho em trabalhar, em falar sobre a inclusão é imenso. E é uma coisa que me fortalece a cada dia, em função dos próprios resultados que a gente consegue vivenciar no nosso dia a dia, na nossa Secretaria de Estado de Educação. Uma coisa importante, que também não posso deixar de dizer: enquanto nós tratarmos o diferente com diferença e não como igual, a gente nunca vai conseguir a inclusão. A inclusão é tratar com acessibilidade o diferente, para que todos tenham as mesmas oportunidades, para que todos possam participar de todos os ambientes com equidade, Um dado importante, que cheguei até a conversar com a Viviane, rapidamente, com relação ao entretenimento: a gente não consegue entender. Até um Deputado perguntou: será que a gente deve ter mais leis? (Soa a campainha.) A SRA. VERA LUCIA RIBEIRO DE BARROS - Eu falei: não, a gente precisa fazer cumprir as leis. Por exemplo, por que o autista, por exemplo, ou alguém com outra deficiência tem, no cinema, uma sala azul, por duas horas ou três horas? Por quê? Eu acho que a oportunidade da escolha tem que ser dada de forma igual para todos. E nós já temos lei, não é, Senador? Nós já temos lei que diz que nós precisamos ofertar essa acessibilidade para todas as pessoas com deficiência, para que possam participar desses ambientes. Agora, vamos ver o nosso vídeo. Eu espero que a gente consiga. Eu acho que tem um tempo curtinho, mas esse vídeo é extremamente pedagógico, esclarecedor e bastante emocionante também. Como a gente fala muito em acessibilidade, eu não poderia deixar de trazer, porque não tivemos tempo de colocar na parte tecnológica, a audiodescrição. Então, a nossa Profa. Gabriela, maravilhosa, do CDV, inclusive, veio fazer a audiodescrição enquanto o vídeo vai ser passado, para que a oportunidade de compreensão do vídeo seja igual para todos. (Procede-se à exibição de vídeo.) (Palmas.) |
| R | A SRA. VERA LUCIA RIBEIRO DE BARROS - Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado, Profa. Vera. Eu vou passar, imediatamente, para o nosso próximo expositor, nosso querido César Magalhães, que é membro da Associação Brasiliense de Deficientes Visuais (ABDV). O SR. CÉSAR ACHKAR MAGALHÃES (Para expor.) - Senador, eu peço um pouquinho de paciência da mesa e dos convidados, porque hoje eu vou fazer uma leitura sombreada, e é um processo, uma técnica, que eu estou aprendendo há cerca de 15 dias. Então, talvez ultrapasse um pouquinho o tempo, bem pouquinho, porque eu treinei, e é uma forma semelhante a uma tradução simultânea. Eu vou estar ouvindo o meu texto, o texto de minha autoria, enquanto leio para vocês. Boa tarde a todos. Vou fazer, primeiro, minha autodescrição. Falando aqui, primeiro, fora do microfone para os meus colegas. Sou um homem branco de 59 anos de idade; cabelos grisalhos; sou uma pessoa com deficiência e tenho baixa visão. Minha formação é de arte-educador, mas minha fala aqui será do ponto de vista de uma pessoa com deficiência, e de um ex-aluno de uma escola especializada. Farei uma breve contextualização antes de entrar nesse tema aqui da Comissão. Tenho deficiência visual há 30 anos. Praticamente, metade desse tempo eu não sabia o que realmente era ser uma pessoa com deficiência e o verdadeiro conceito de deficiência. Então, vou dividir esses 30 anos em dois períodos: os primeiros 14 anos de deficiência e os anos subsequentes. Nesse primeiro período, eu tinha 28 anos quando surgiu minha deficiência, comecei a bater o carro e já não conseguia ler direito. Isso progrediu rapidamente e, logo, nem conseguia ler mais manchetes de jornal. Na faculdade, já não conseguia mais ler ou escrever qualquer coisa. Eu era um inválido: o cara que não conseguia dirigir, que não podia trabalhar e que teve que abandonar a faculdade porque não podia ler nem escrever. Eu era um artista que já não podia mais desenhar nem pintar. Meu cotidiano era ficar em casa. |
| R | Então, vamos ao segundo período desses anos de deficiência até que, 14 anos depois, fiquei sabendo que existia uma escola para pessoas como eu, o CEEDV (Centro de Ensino Especial de Deficientes Visuais), uma escola pública de Brasília. O meu computador parou de falar, gente. Ali eu aprendi muitas coisas, aprendi a ler por áudio, aprendi a ler com a lupa, aprendi a digitação e os meus primeiros passos no uso de um computador ainda com duas voxs, aprendi a usar a bengala e as técnicas de orientação em mobilidade e ainda dei a sorte de, com uma professora voluntária, aprender uma técnica de escultura em argila adaptada para pessoas cegas. No ano seguinte, já estava de volta à faculdade, seis meses depois. Também me tornei Presidente da ABDV (Associação Brasiliense de Deficientes Visuais), entidade que represento aqui hoje. As minhas esculturas, junto com as esculturas dos meus colegas, ganharam muita visibilidade naquela época. Fizemos tantas exposições, em tantos lugares, inclusive aqui no Senado, que não lembro e nem dá para contar. Também na faculdade, que eu havia abandonado, retornei, me destaquei como aluno e me formei. Fui o criador e o coordenador do programa educativo Brasília Tátil, um projeto que me orgulho muito e que ganhou reconhecimento e respeito de todos. Fui conselheiro de direitos humanos aqui no DF por várias vezes e me tornei o militante que sou hoje. Hoje inclusive sou um dos conselheiros do Conade, o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, no qual represento uma entidade nacional, a Retina Brasil, de que também me orgulho. Então, esse foi o segundo período desses meus 30 anos de deficiência. Será que, sem a passagem por aquela escola, eu estaria aqui hoje? Dito isso, vamos, então, para o tema da audiência. De que instituições estamos falando? Eu contei essa minha história para que as pessoas reflitam justamente para fazer um paralelo entre aqueles 14 anos de deficiência, anteriores à passagem por um centro de ensino especial, e os 15 anos que vieram depois, até os dias de hoje. Só para contextualizar de que instituição estamos falando: estamos discutindo o papel e a situação de escolas, não de manicômios. E aí cabe uma reflexão conceitual. Qual desses dois momentos se aproxima mais do seu conceito de inclusão? Qual é o verdadeiro conceito de inclusão? Vejo, no meio acadêmico, pessoas atacando muito essas escolas, atribuindo muitos estereótipos de serem espaços de segregação, espaços de exclusão, e normalmente são pessoas que nunca visitaram uma escola especializada, que não convivem conosco e que nunca nos ouviram a respeito desse tema. Por isso, vou frisar novamente, estamos falando de escolas e não de manicômios. Sinto muito por aqueles que esperavam de mim uma história diferente, uma história de segregação, mas não dá para mudar a minha história. A convivência com os meus pares é outro absurdo que ouço. Ouço que a gente precisa conviver com outras pessoas, as pessoas sem deficiência, reduzindo a discussão da educação especial e inclusiva ao simples direito de frequentar as mesmas escolas dos demais. Primeiro, como se nós não estivéssemos convivendo com as outras pessoas ou como se conviver entre nós fosse prejudicial para nós. |
| R | Eu falei de dois momentos da minha deficiência, em ambos eu convivi com outras pessoas, eu não estava em outro planeta. A convivência não se resume aos espaços das escolas, convivemos com todos, em todos os lugares e inclusive nas escolas, e a minha convivência com os meus colegas de deficiência foi imprescindível para o meu aprendizado e para quem eu sou hoje. Passei a ter uma melhor compreensão do que é ser uma pessoa com deficiência e de quem eu sou hoje, minhas limitações, mas também as minhas possibilidades, a minha autoimagem, a minha autoaceitação, tudo tem a ver com isso. Aprendi muito com os meus pares e aprendo até hoje, inclusive a técnica que eu estou usando aqui para ler aprendi com a Sara Bentes, a quem eu mando um abraço e agradeço. Quem me socorre no meu celular, no meu computador, são pessoas cegas como eu. Quem diz que a convivência entre nós é prejudicial ou vê isso como uma convivência menor não sabe do que está falando, isso apenas revela o seu preconceito. Esses estereótipos são a própria manifestação de preconceito inclusive. A luta pela inclusão e a nossa luta pela educação inclusiva não são apenas pelo direito de frequentar os mesmos espaços das escolas, esse é um dos direitos que lutamos muito para conquistar como direito e não abrimos mão e que, inclusive, não se limita aos espaços das escolas, mas a todos os ambientes sociais. Não estamos trocando um direito pelo outro, continuamos lutando pelo direito de aprender e não só os conteúdos gerais oferecidos a todos os alunos, mas, também, os conteúdos específicos relacionados à nossa deficiência, pois não existe inclusão se não houver equidade, eu ouvi isso hoje. (Intervenção fora do microfone.) O SR. CÉSAR ACHKAR MAGALHÃES - E equidade não é tratar igual os que são diferentes. (Soa a campainha.) O SR. CÉSAR ACHKAR MAGALHÃES - Existem lacunas na política de educação e nós lutamos para que todas as escolas sejam inclusivas, mas as escolas não são caixinhas onde se colocam as pessoas, são espaços de aprendizado. E, no nosso caso, não dá para ignorar as necessidades específicas de cada deficiência e de cada aluno inclusive, senão seremos apenas estatísticas de matrícula nas propagandas de governo. Existem muitas lacunas sobre esse assunto e uma delas eu venho repetindo e sempre sem resposta, a questão da educação dos cegos adultos, que seguramente são a maioria das pessoas cegas, que ficam cegas no decorrer da vida e não nascem cegas. Estamos falando da grande maioria deste público, segundo os próprios dados da OMS. E, desde 2008, eu questiono sem resposta: o que está previsto na política de educação para este público? E aí eu abro um parêntese, na política pública do DF eu fui atendido como adulto, mas aqui nós somos exceção. Concluindo, eu faço um elogio a esta Comissão pela iniciativa de se visitarem escolas inclusivas e escolas especializadas e principalmente pela abertura deste espaço de escuta das pessoas com deficiência, muito diferente de outros, que saem criando estereótipos e preconceitos, decidindo o que é melhor para nós, sem sequer ouvir a gente. Então, gostaria de agradecer aos Senadores e, em especial, ao Senador Izalci, por entender o verdadeiro significado do "nada sobre nós, sem nós". |
| R | Obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado, César. O SR. CÉSAR ACHKAR MAGALHÃES (Fora do microfone.) - Desculpe se ultrapassei o tempo. O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Não, foi importante a sua fala. Vou passar imediatamente à Anna Paula Feminella, que acabou de chegar. (Pausa.) Vou passar, então, para os convidados que estão aí virtualmente. O Guilherme de Almeida Prazeres, que é o Presidente da Associação Nacional para a Inclusão de Pessoas Autistas. Guilherme, dez minutos. O SR. GUILHERME DE ALMEIDA PRAZERES (Para expor. Por videoconferência.) - Olá, boa tarde a todos e a todas. É uma honra para mim ter a oportunidade de falar em tão nobre Casa como o Senado. É a primeira vez que eu tenho uma chance como esta. Então, peço que vocês relevem um certo nervosismo e ansiedade. O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Guilherme, está muito baixo. Aproxime-se um pouco mais do microfone, Guilherme. O SR. GUILHERME DE ALMEIDA PRAZERES (Por videoconferência.) - Vocês conseguem me ouvir agora? O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Isso, mais próximo do microfone. Obrigado. O SR. GUILHERME DE ALMEIDA PRAZERES (Para expor. Por videoconferência.) - Perfeito. Bom, agradeci a oportunidade de estar nessa nobre Casa e eu gostaria de me autodescrever. Eu sou um homem branco, tenho cabelos castanhos curtos, estou usando um headphone, nariz médio, olhos pequenos, boca média, barba por fazer e estou usando uma camiseta branca. Eu sou pesquisador na Unicamp, na área de Educação e Direitos Humanos, na área de educação inclusiva, e eu sou autista. A minha experiência sendo autista, muito embora remonte ao início da minha vida - as pessoas autistas nascem assim, ao contrário de outras deficiências que podem ser adquiridas ao longo da vida -, eu tive o diagnóstico tardio. Eu tive o diagnóstico aos 37 anos. Independentemente desse diagnóstico, eu tive muita sorte - e eu sempre coloco isso, tento deixar de uma forma muito clara -, eu tive muita sorte de, nos lugares que eu estudei, ter sido acolhido, ter sido recebido, ter minhas potencialidades desenvolvidas de acordo. Eu lembro que eu sou nascido em Curitiba e, quando eu era criança, frequentava uma escola que nem existe mais, chamada Mariaté, da Professora Juciara Rodrigues. Nessa escola, chamada Mariaté, eu tinha um colega chamado André. O André era surdo e era um desenhista brilhante. Eu tinha um outro colega chamado Luiz Guilherme. Ele tinha uma deficiência intelectual severa. E eles eram meus colegas de classe. Eles eram meus colegas de turma. Naquele momento, 30, 35 anos atrás, não existia a conscientização que existe hoje, os protocolos que existem hoje, mas existia já uma preocupação com o acolhimento das diferenças no ensino regular. |
| R | Então, a minha fala vem no sentido de entender que é muito complicado. Assim como colocou o colega anteriormente, percebo que, da mesma forma que existe muita oposição a alguns espaços de educação especial, há também muita oposição à inclusão, à educação especial sobre a perspectiva da educação inclusiva no ensino regular. E essa oposição muitas vezes se dá por falta de experiência, até mesmo dos educadores, enquanto crianças, adolescentes, ou na sua formação, de que essa modalidade de ensino funciona. Hoje, eu presido uma associação voltada para o público autista. Nós temos, dentre nossos associados, autistas de nível 1, 2 e 3. E, majoritariamente, esses autistas têm conseguido alcançar o ensino superior, têm conseguido ter a sua autonomia, têm conseguido se desenvolver adequadamente, e isso por meio do ensino regular. A gente vê, principalmente quando a gente vai falar sobre esse recorte da pessoa com deficiência e, analogamente, os autistas, uma vontade de se olhar muito mais para a deficiência do que para as potencialidades dessas pessoas. Eu acredito que ninguém mais do que nós, que temos algumas particularidades, compreende as nossas limitações e, mesmo se fosse possível eliminar todas essas barreiras, o sofrimento que algumas condições nos trazem permaneceria. Então, mesmo que todo o ambiente social estivesse preparado para nos receber, o que não está, as nossas dores permaneceriam. Então, a minha intenção aqui é provocar em vocês uma reflexão acerca da compreensão de que só por meio da educação regular, que pela nossa experiência e nossa experiência, a minha experiência de vida, Guilherme, a experiência de colegas como o Silvano, que faz Direito na Faculdade de Direito da USP, que é autista, o Arthur, que faz faculdade de Medicina na Unimes, na Baixada Santista e é autista, o irmão do Arthur, que é autista, nível 2 de suporte, e faz faculdade de TI. Então, é só por meio da educação regular que a gente consegue alçar esse nível de suporte, esse nível de autonomia. A gente consegue fazer isso com o suporte adequado. E o suporte adequado é aquele previsto pelo - perdão, estou um pouquinho ansioso - Pneepei de 2008. A gente entende que isso, quando aplicado da forma como foi pensada, como foi concebida, funciona. O que existe ao não funcionar são as desvirtuações do Pneepei, as alterações que se faz nesse processo, a falta de interpretação correta, porque muitas vezes a gente percebe que, infelizmente, as pessoas nem se dão ao trabalho de ler essa política. E sem a gente ler e se ambientar com o que prescreve a política, vai ser realmente difícil a gente aplicá-la. |
| R | Por fim, não quero me alongar muito, mas eu queria trazer também duas experiências que eu tive. A primeira delas foi que, em uma determinada oportunidade, eu tive a chance de trabalhar no gabinete do Secretário de Educação, no interior de São Paulo, e muitos pais, muitos familiares... A gente tinha um problema sério quanto à questão de vagas de creche. Não sei como está essa situação hoje, mas naquele momento era uma situação que chamava muito a atenção. E os pais e os familiares iam buscar a vaga de creche dos seus filhos e falavam: "Eu preciso dessa vaga de creche porque eu trabalho". Eu acho que a grande questão e a falta de compreensão de boa parte da população é que o direito à educação não se vincula a um direito trabalhista, e ele não é um direito dos pais; ele é um direito das crianças, dos adolescentes, que são cidadãos de direito. E ao contrário de uma pessoa adulta que tem toda autonomia social e jurídica para fazer as suas escolhas, uma criança precisa dessa tutela do Estado para ter os seus direitos fundamentais, ou seja, constitucionalmente garantidos. Então, a grande preocupação é em não tolher o direito das crianças e dos adolescentes de frequentar uma escola regular com o devido suporte do AEE, que a gente só vai conseguir um aperfeiçoamento desse trabalho por meio das formações continuadas, especificamente nas redes públicas. Eu acabei de buscar aqui um dado do Censo 2022. No Brasil, a gente tem 47,4 milhões de estudantes na educação básica. Praticamente 40 milhões estão no ensino público. Se a gente quer realmente atender ao comando constitucional, criar uma sociedade igualitária, democrática, sadia, a gente precisa entender que é pela transformação, é por tocar a vida desses quase 40 milhões de jovens, crianças e adolescentes que estão na educação básica, a partir da conscientização, do convívio, da troca, é que a gente vai alcançar a inspiração constitucional. Um outro exemplo que eu trago para vocês, e vou ser bem breve, é uma experiência que eu tive com uma escola particular em Poços de Caldas, no interior de Minas Gerais. É uma escola particular e fui conversar, como professor que tenho minha pesquisa voltada para a questão da educação especial sob a perspectiva da educação inclusiva. Então, mesmo nas minhas férias, eu gosto de visitar algumas escolas que têm algumas ações diferenciadas. Era uma escola particular de ensino regular. Eu fui visitar, conhecer esse espaço, e a diretora dessa escola estava me contando que chegou uma família a fazer a matrícula do seu filho, ou da sua filha, nessa escola, e essa criança era surda. Então, essa família já chegou se posicionando da seguinte forma: "o meu filho, a minha filha, precisa ter um intérprete de libras o tempo inteiro com ele. Precisa que essa pessoa esteja a todo momento com ele para ele poder se comunicar". Conversando com essa diretora, eu falei: "O que a senhora acha sobre isso?". E ela falou assim: "Eu acho que não é certo". Quando ela falou "eu acho que não é certo", eu já preparei meu espírito para que viesse uma questão provocativa no sentido de negar esse direito para essa criança. Daí ela continuou: "Eu acho que não é certo, porque todas as crianças têm que ter o direito de conversar com essa criança surda. Essa criança surda tem que ter o direito de interagir com todas as outras crianças na sua sala. Colocar essa figura com ela para fazer todas as mediações dos seus diálogos é, de alguma forma, criar uma barreira". E essa diretora, então, instituiu na escola que todos aqueles alunos da turma daquela criança teriam aulas de libras. Teriam aulas de libras para que aquela criança pudesse se comunicar plenamente com os colegas, os colegas com ela, e em pouco tempo toda a escola, de alguma forma, tinha a libras no seu repertório e podia se comunicar plenamente. Para mim, essa é a ideia de inclusão. É uma questão possível, é uma questão tangível, realizável e que deve ser implementada, concretizada, de modo como a Pneepei prescreve em 2008. |
| R | Eu agradeço a oportunidade de estar com vocês. Essa é a minha realidade, é a minha experiência, é a experiência de colegas meus no espectro autista com maior e com menor nível de suporte, nós que tivemos a oportunidade e tivemos, efetivamente, o nosso direito fundamental, constitucional, abarcado por uma série de legislações nacionais e por tratados internacionais de direitos humanos. Eu digo para vocês que toda criança, todo adolescente tem o direito de estar em uma escola regular, tem o direito de ter essa experiência. Se a escola regular não tem atendido aos anseios da sociedade, aos anseios da família, aos anseios dos professores, essa escola tem que ser revista. Não é a gente criando variações que vão excluir as pessoas desses ambientes que a gente vai alcançar uma plenitude democrática. Então, eu acredito que, se a gente tem que trazer o olhar para alguma questão, é para essa questão do ensino especial dentro da escola regular. Eu acredito que a gente tem aguardado - toda a nossa comunidade - o posicionamento da Secadi do Ministério da Educação. A gente tem aguardado um plano de ação - já estou finalizando -, um plano de ação que, dentro das promessas feitas e concretizadas já de alguma forma pelo Presidente Lula, nos primeiros dias do seu Governo, se realize no formato da inclusão plena de todas as pessoas, iniciando, sim, pela educação, não limitado a ela, mas com o envolvimento social completo. Eu agradeço a oportunidade. Até breve. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado, Guilherme. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Daqui a pouco. Neste momento, não. Eu vou obedecer o roteiro, depois a gente vê mais no final. Eu vou conversar, com a autorização do nosso Presidente. Eu vou seguir aqui a programação, e, na sequência, a gente vai discutir isso, porque tem outras pessoas querendo falar, mas nós vamos conversar aqui com o Presidente. Eu vou passar para a Viviane Fernandes Faria, que está também virtualmente, que é Conselheira do Conselho Estadual de Educação do Estado do Piauí. (Pausa.) Viviane, tente ficar bem próxima do microfone. (Pausa.) Acho que está desativado o seu som. (Pausa.) Libere seu áudio, acho que seu áudio está... (Pausa.) Viviane. A SRA. VIVIANE FERNANDES FARIA (Para expor. Por videoconferência.) - Melhorou? Melhorou o som? Ótimo. São os percalços da tecnologia. Eu quero começar me audiodescrevendo. Eu sou uma mulher de meia-idade, de pele clara, cabelos pintados de loiro. Estou usando óculos com aros pretos e uma camisa bege. E no meu fundo tem uma pintura do Dom Quixote. Eu inicio a minha fala agradecendo a oportunidade de estar aqui, nesta Casa, cumprimentando os Srs. Senadores e os meus colegas de fala neste momento. Não tem como não se emocionar com a fala do Guilherme, uma fala potente, uma fala tranquila e uma fala que diz muito do lugar em que eu estou agora. Eu sou uma mulher com deficiência também, que vivi já, tenho vivido desde o início da década de 1990, vários paradigmas quando a gente fala de educação especial neste país. |
| R | Eu comecei trabalhando em escolas e classes especiais em 1994, em 1995, até que a vida me levou ao Estado do Piauí. Eu não sou piauiense, mas me tornei piauiense. E desde 2006 eu tenho vivenciado o que significa educação inclusiva, educação especial na perspectiva da educação inclusiva. E, falando de política pública, é uma política pública que, até 2008, com a promulgação da Pneepei, não existia no país como política universal, como uma política que garantisse o direito de todos. Por que eu digo isso? Porque, nos dados que nós temos, em 2008, nós tínhamos cerca de 78% de beneficiários do BPC com deficiência fora da escola, não estavam em escola especial, não. Então, aquelas crianças e jovens até 18 anos não estavam em escola nenhuma. Por quê? Porque não tiveram o acesso. Já existia a lei para acesso, mas não tiveram a oportunidade de frequentar uma escola, uma escola perto das suas casas, uma escola em que estudassem também os seus irmãos, os seus colegas, uma escola nos seus territórios, no empoderamento dessas famílias, com o direito de essas crianças estarem onde todos os seus estão. E por que será que essas crianças não estavam ou alguns estavam em classes especiais ou escolas especiais? Aqui eu vejo uma questão: as mães não confiavam, não confiavam em deixar os filhos em escolas regulares, porque uma das barreiras que mais existiam e que ainda existem até hoje é a barreira atitudinal. E essa barreira existe em qualquer lugar não só na escola regular, não. Quando a gente tem a escola especial, muitas crianças estão lá, porque essa barreira impede o acesso dessas crianças ao ensino regular. Nós sabemos que escola é lugar de convivência, escola é lugar de trocas, escola é lugar de aprendizagens. E eu posso dizer para vocês que - falando aqui enquanto Conselheira Estadual do Piauí - atualmente o Piauí hoje não tem escolas e classes especiais mais. De todas as nossas crianças com deficiência, a deficiência não está à frente das crianças. Estão os nossos jovens e crianças à frente de qualquer estigma ou paradigma. Eles estão incluídos em salas regulares, porque o Conselho Estadual de Educação definiu seguir o que a nossa legislação prevê, que são escolas inclusivas, escolas regulares para todos. E, para isso, em todas as autorizações de funcionamento ou renovações de autorização de funcionamento que chegam ao Conselho de Educação, nós exigimos que a escola tenha o atendimento educacional especializado, como é previsto na Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. E a minha fala aqui hoje com vocês é para dizer como funciona. Isso dá certo, Viviane? Dá. Nós temos que identificar as barreiras. Barreiras existem para todos os estudantes, ainda mais para as pessoas com deficiência. |
| R | Então, o foco do AEE é identificar, dentro das salas de aula, quais são as barreiras que estão impedindo a participação e a aprendizagem das crianças. Criança tem que estar na escola aprendendo; é socializando também, mas é aprendendo. Nós temos, numa falante capacitista, várias formas de aprender. Não existem formas únicas e é esse o trabalho do AEE. Eu, ouvi agora o Sr. César relatar o que o AEE faz. Quando ele diz que aprendeu a usar os recursos de tecnologia assistiva para ler, não precisa ir para uma escola especial para aprender isso. Nós aprendemos, o AEE faz esse trabalho. Muitas vezes, as pessoas também confundem a sala de recursos multifuncionais com o Atendimento Educacional Especializado. O que é o AEE, basicamente? É o professor especialista dentro da escola regular. É isso que a política trouxe. E esse professor especialista, junto com a família, junto com os professores e junto com os profissionais da saúde, vai estudar o que é o melhor para aquele estudante. Junto com todos, nós vamos fazer um plano de atendimento educacional especializado. E, a partir desse plano, são desenvolvidas ações que garantam essa aprendizagem e essa permanência na escola. Nós tivemos um avanço muito grande com a dupla matrícula no Fundeb, com o per capita específico para a educação especial. Então, essa dupla matrícula traz o quê? O aluno ser atendido no contraturno da escola. Nesse contraturno, aí sim, nós vamos trabalhar as funcionalidades necessárias que esse aluno precisa para estar em sala de aula. Vamos ver quais são as barreiras que precisamos remover. Por exemplo, uma criança que não lê. A gente não tem só uma forma de ler; existem várias formas de aquisição do que está escrito para a criança. A criança que não escreve; nós temos várias maneiras de escrever. Hoje, nós temos os recursos de tecnologia assistiva que nos dão esse suporte. Agora, o que nós não podemos deixar é que esse atendimento seja substitutivo ao currículo. A criança segue o mesmo currículo. O que nós fazemos é o acesso ao currículo. Não é justo a criança, na escola regular, fazer um currículo diferenciado: todos vendo um assunto, e a criança estar lá pintando, ou fazendo bolinha, ou fazendo colagem. Independentemente das suas condições, ela tem o direito à participação no que a sala de aula está proporcionando. Eu falo aqui para vocês não só como conselheira, mas eu, atualmente, acompanho no AEE várias crianças dentro do espectro do autismo, com deficiências múltiplas, cegas, com deficiência auditiva, com as quais nós desenvolvemos uma série de trabalhos. |
| R | Eu até pensei que poderíamos trazer aqui exemplos vivos, mas não vamos expor as nossas crianças. Cada criança é única, e ela tem o direito a esse aprendizado dentro da escola, a essa participação plena. Então, tudo o que o AEE faz, a forma do ensino organizado nas salas de recurso, as estratégias, os equipamentos, eles precisam ser incorporados nas salas de aulas comuns também. E é um equívoco achar que o professor do atendimento educacional especializado vai ficar só no contraturno, fazendo atendimento clínico, não é? Isso não é verdade. O atendimento não é clínico. O professor do AEE tem que ir à sala de aula regular observar como esse estudante está, conversar com o professor, discutir com o professor as suas práticas, ver se as suas práticas pedagógicas são acessíveis. É essa a nossa grande função. Ou seja, quando nós falamos de uma política de educação inclusiva na perspectiva da inclusão, da educação especial na perspectiva da inclusão, nós estamos falando na possibilidade de participação efetiva, nós estamos falando em direito de convivência, nós estamos falando em direito dos seus objetivos de aprendizagem. E hoje a BNCC traz como habilidades gerais, como competências gerais várias competências que nos colocam a importância de respeitar a diversidade dentro de sala de aula, a importância de todos participarem com plena igualdade de condições. Nós temos vários estudos, temos várias pesquisas que demonstram a importância disso. E eu quero aqui destacar uma pesquisa da Profa. Rosângela Machado, que foi, na verdade, a sua dissertação de mestrado. Ela fez uma análise dos serviços de educação especial numa rede municipal de educação. E o que ela conclui nos seus estudos? Ela conclui que a inclusão é um processo, é um processo que exige atenção e atualização constante. Porém, a tarefa de receber todos os alunos na escola regular constitui dever de todos e não deve ser postergado. No Piauí nós já temos esse avanço - educação inclusiva, educação para todos, não à segregação e uma educação de qualidade. Assim, agradeço a participação e parabenizo aqui novamente o Guilherme, o Senado e também o Ministério da Educação por ouvir e por nos dar a oportunidade de fala neste momento. O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado. Gente, deixe-me só esclarecer aqui: para as audiências públicas que acontecem no Senado é votado nas Comissões um requerimento. Hoje mesmo votamos - esta é a segunda audiência e vamos fazer a terceira - na Comissão de Educação a inclusão de mais duas pessoas na próxima audiência. Então, tem essa questão. O objetivo nosso - e eu disse sempre aqui, e o nosso Presidente também - é ouvir todos. Ninguém vai chegar aqui e definir nada. O que nós queremos é ouvir todos. Nada sobre nós sem nós. Então, precisamos ouvir todo mundo. Não quer dizer que nós vamos concordar com um com o outro. Nós estamos ouvindo exatamente. Então, eu só peço, assim, um pouquinho de paciência. É lógico que a gente tem que ter organização. Por isso que tem a aprovação dos requerimentos. Na medida do possível, a gente coloca um ou outro para falar, mas ainda tem uma sequência de expositores e tem um tempo. Daqui a pouco tem a Ordem do Dia, então a gente precisa... Quero registrar aqui a presença da nossa Senadora Damares. Esteve conosco aqui também o Deputado Pedro Campos. |
| R | Na sequência, vamos passar para os Senadores, a não ser que eles queiram se pronunciar antes, o Senador Arns e a Senadora Damares. A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Presidente, só para registrar a presença da Deputada Estadual Mical. Ela é do Maranhão, acompanha esse debate e está aqui hoje para acompanhar um pouco da audiência pública. Acho que depois a gente pode até caminhar por algumas assembleias legislativas do país levando o debate, conversando com os legisladores estaduais também. O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado. Seja bem-vinda, Deputada. Vou passar a palavra, também ainda virtual, à Mariana Lúcia Costa e Rosa, que é do Instituto Cauê. Mariana. A SRA. MARIANA LÚCIA AGNESE COSTA E ROSA (Por videoconferência.) - Sou eu. Estão me ouvindo? (Pausa.) Muito bem. Boa tarde a todas as pessoas... O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Se você puder ficar bem próxima do microfone... Está um pouco baixo. A SRA. MARIANA LÚCIA AGNESE COSTA E ROSA (Por videoconferência.) - Está me ouvindo agora? Melhorou? O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Está bom. A SRA. MARIANA LÚCIA AGNESE COSTA E ROSA (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde a todas as pessoas que estão aí assistindo e também a quem está online. Agradeço pela oportunidade de poder compor o debate na mesa hoje. Começo me audiodescrevendo. Sou uma mulher com deficiência, tenho baixa visão, tenho pele branca, cabelos castanhos cacheados, abaixo das orelhas. Estou usando óculos de armação vermelha e uma blusa preta, e estou sentada. Para não repetir o que os colegas já disseram, vou tentar fazer a minha fala trazendo alguma coisa de um depoimento pessoal e também de pesquisa. Como o Guilherme disse, e o próprio César, a deficiência tem sido percebida como uma coisa triste, ou mesmo ruim, como algo infeliz que pode acontecer a nós, uma tragédia, uma falha. A minha experiência até aqui tem sido majoritariamente nessa direção de "consertar" o corpo, me tornar "mais normal", "menos deficiente" - entre aspas - e sobretudo a minha filha. Sou mãe de uma criança com deficiência, além de ser uma mulher com deficiência. Minha filha tem nove anos, tem paralisia cerebral, e é uma criança considerada por muitos, pelo que pude ouvir até aqui, ineducável. É uma criança que não se comunica oralmente, que usa cadeira de rodas, que precisa de mediação para todas as atividades cotidianas. Então, como eu ia dizendo, a minha experiência até aqui tem sido majoritariamente sobre "consertar" a minha filha. É isso que a sociedade comunica para a gente. As mensagens sempre se resumem à compreensão da deficiência como algo errado, indesejável, algo que precisa ser superado, como se o corpo com deficiência fosse o desvio, e o sem deficiência fosse o padrão ouro que a gente tem que perseguir, fosse o ideal no qual a gente tem que se inspirar. Isso faz com que, muitas vezes, uma criança com deficiência não tenha com quem conversar sobre a sua experiência vivida, seja porque ela é desacreditada, seja porque ela está imersa em um universo permeado por adultos sem deficiência, por terapias, por profissionais da saúde que muitas vezes só lhe dirigem a palavra para dizer como um bom paciente deve ser, qual é o tipo certo de criança com deficiência, que seria aquela que precisa ser vista tentando consertar a si mesma, tentando não parecer uma criança com deficiência. Enquanto eu preparava os meus comentários para hoje aqui, eu senti uma certa tristeza por pensar em tantas crianças e jovens que ainda hoje vivem isolados, isolados pela estrutura capacitista que organiza nossa vida em sociedade, que faz crer que essas crianças, esses corpos é que são errados, não os espaços que a gente tem construído para viver aquilo que deveria ser o comum. |
| R | O direito da minha filha de acessar a escola é muito recente. Historicamente, a nossa sociedade tem muito mais experiência em segregar, em excluir, do que em incluir. Se ela tivesse nascido há 30 ou 40 anos, como alguns dos senhores, ela não só seria totalmente desacreditada pelo mundo, como estaria reclusa em casa, como tantas pessoas com deficiência que não tiveram nem mesmo o direito à escola, quanto mais à vida pública. Na minha infância, por exemplo, eu morei em um bairro muito tranquilo em uma cidade no interior de São Paulo. A gente brincava na rua, todo mundo se conhecia - todo mundo, menos um, o Rodolfo, que era um vizinho que vivia atrás da grade da sua casa e sacudia com muita força essa grade para se comunicar com a gente enquanto nos olhava lá de longe, e a gente brincando na rua. Era uma grade que separava a vida pública do campo doméstico, quem podia brincar na rua e quem não podia, quem iria para a escola e quem nunca iria. O Rodolfo nunca brincou com a gente e ele também nunca foi à escola, e eu nunca me esqueci do que a gente não teve o direito de viver junto. São 30 anos que separam o Rodolfo da Alice, a minha filha. Trinta anos é um piscar de olhos quando a gente pensa em uma perspectiva histórica, 30 anos em que a sociedade vem tentando avançar, em que os movimentos sociais têm reivindicado que as pessoas com deficiência sejam compreendidas como sujeitos de direito, 30 anos em que as escolas vêm sendo pressionadas a avançar por muitas razões, inclusive porque as pessoas com deficiência começaram a acessar esses espaços. E aí, ao chegarem outros corpos, outras formas de expressão, outras maneiras de estar no mundo, a escola precisou, tem precisado, se atualizar, se ampliar, para caber mais mundo, mais gente, mais vida. Esse, obviamente, não é um processo que está pronto e acabado. Ele só começou, no entanto, porque houve lá atrás um encontro, porque as pessoas com deficiência puderam se mover da vida privada para a vida pública. E como qualquer mudança social, leva tempo e ainda existem barreiras, inúmeras, diárias. Eu, por exemplo, tive diversas negativas de matrícula para a minha filha. Preciso dizer também que os ônibus aqui da cidade onde eu moro, em Belo Horizonte, são conhecidos por dar "janeladas", que é o jeito que a gente chama quando o motorista acelera e não para no ponto porque vê que tem uma pessoa com deficiência aguardando. A nossa herança é esse mundo da porta fechada, da porta estreita, um mundo em que a gente pensa ou afirma que essas pessoas são falhas e que a gente precisa dizer que têm direitos, que a gente precisa dizer que as coisas é que precisam de conserto, de reparo, e não as pessoas. É nisso que a escola entra. Nisso a escola tem um papel fundamental. A minha filha hoje está na escola, uma escola regular, comum, com todas as barreiras para acesso ao currículo, que não são poucas. Ela está lá, e ela não está lá num cantinho desenhando, ela não está isolada dos colegas. Porque ela está lá, a escola está transformando seu projeto político-pedagógico, a sua estrutura física, a sua arquitetura, as suas relações, a tecnologia, os seus serviços. Até o tempo do recreio está sendo revisto por conta da presença da minha filha nessa escola. |
| R | Um dia, em pleno processo de alfabetização, a professora falou sobre diferentes formas de escrever: com lápis, na mão, com máquina de escrever, com computador, com pranchas de comunicação alternativas. Os alunos já sabem que existem diferentes formas de expressão e que, quando eles entram na sala, eles podem e fazem isto: dialogam com a minha filha com muita naturalidade. Eles se comunicam oralmente, e ela responde usando comunicação alternativa ou o próprio corpo. Quais dessas mudanças estruturais pedagógicas, tecnológicas, de percepção de mundo se instalariam se a minha filha não estivesse na escola? Quais debates aconteceriam se ela não estivesse lá? Quais transformações ficariam pelo caminho? E mais, quais cidades a gente construiria a partir daí? Nenhuma sociedade deveria abrir mão de ter a contribuição das crianças e dos jovens com deficiência e de todos os demais para refazer o mundo a partir da escola. Os espaços segregados foram a única resposta que nós pudemos produzir durante um período, por muito tempo, até as décadas de 70, 80, quando o Estado não tomava para si a responsabilidade que era dele. Eles foram acolhimento num tempo em que a alternativa a isso era nada, mas esse tempo passou. A legislação hoje responsabiliza o Estado por garantir o acesso à escola, à saúde, à assistência social. Se isso não tem funcionado como deveria, como disse o Guilherme ou como disse a Viviane, as razões não têm a ver com os corpos com deficiência; têm a ver com um projeto de segregação e exclusão, que não tem deixado que o dinheiro público chegue até a escola, que o dinheiro do Fundeb chegue à escola, não permite que os investimentos na sala de recursos multifuncionais aconteçam, que a implementação do serviço de Atendimento Educacional Especializado aconteça. É o projeto de segregação e exclusão que está lotando as salas de aula, que não paga salário decente aos professores, que não investe na sua formação. A escola está ruim para todo mundo, mas a gente só pede aos estudantes com deficiência que se retirem de lá. Quais são os interesses que sustentam a segregação e fazem com que as pessoas com deficiência e suas famílias, ao invés de terem o direito por uma vida digna garantido, precisem depender de favor de instituição filantrópica? Essas instituições fazem um trabalho que é estimado por muitas famílias - não há dúvida -, mas isso não é escolarização; são serviços de outra natureza. Nós - e agora eu falo aqui como mãe, já caminhando para a conclusão, falo como mãe, principalmente, e me dirijo às mães que eu sei que estão aí presentes - não estamos em campos opostos, como querem fazer acreditar. Nós queremos que os nossos filhos sejam cuidados, que vivam com dignidade, mas a gente não vai conseguir isso na base da caridade, da filantropia, do assistencialismo, da gratidão a qualquer político que seja. Nós também sabemos que os nossos filhos são capazes, são capazes de aprender, que eles precisam que a sua capacidade, que a sua inteligência encontre o currículo da escola. É nosso direito ter amparo, ter acesso a serviço público de qualidade, é direito também dos nossos filhos. Se é um direito, ao Estado, aos Parlamentares - com todo o respeito - que estão aqui presentes só resta cumprir: garantir a escola pública, garantir o SUS, garantir o Suas, para que essas instituições não sejam, essas segregadas, o único lugar ao qual recorrer e recolher também, e que as crianças não sejam privadas dos seus direitos. |
| R | A supremacia dos corpos sem deficiência faz vocês aí presentes acreditarem que a escola é um lugar naturalmente preestabelecido para vocês. E, no seu privilégio de pessoa sem deficiência, você não precisa ouvir pessoas com deficiência ou aprender sobre capacitismo ou implementar novos jeitos, novas práticas, novas relações na escola ou no mundo, ainda que não possam dizer nada sobre nós sem nós. Isso surte pouco efeito se a gente não vê a prática. Isso faz com que as pessoas com deficiência sejam reiteradamente, diariamente marcadas pelo isolamento imposto pela falta de acessibilidade material, social, cultural, pelo estigma, pelo medo, pela violência, pela vergonha. Vocês, sem deficiência, entendem que a resposta da segregação é a melhor, porque isso faz com que vocês não tenham que se mexer, não tenham que mudar suas vidas, mas esse tempo acabou. Segregação nunca mais! As escolas vão ter que se transformar para além da garantia das matrículas, e a gente vai precisar de investimento e não de abandono, a gente vai precisar do dinheiro do Fundeb, a gente vai precisar de que os espaços se refaçam, os professores sejam remunerados, a escola vai precisar de nós. E eu gostaria, já concluindo, que cada uma das crianças que estão aí hoje nessa audiência, e todas as outras, tantas outras, inclusive a minha filha... Quero pedir licença para me dirigir a essas crianças, a vocês que estão aí. Eu estou aqui na tela, mas eu os vejo, eu vejo vocês e estou falando com vocês, não estou falando de vocês e nem para vocês - estou falando com vocês. Eu quero que vocês saibam que tem gente muito séria e muito competente se dedicando a pensar em uma escola boa para todas as pessoas, a incrementar os serviços de saúde e de assistência social e construir um mundo justo, um mundo bom, um mundo para a gente viver junto. Eu quero que vocês saibam que a maioria esmagadora de crianças com ou sem deficiência é melhor menos porque puderam acessar tratamentos, terapias para poder andar, falar, ou ter o seu corpo considerado normal, e mais porque tiveram acesso à moradia, à casa, à água tratada, com boas condições sanitárias, com alimentação adequada, tiveram oferta de cuidado, tiveram escola. Eu penso que a gente sustentar essas condições para que nós possamos criar esse mundo é necessário para que essa conversa seja traduzida em novos jeitos, novos modos, e que isso sustente uma nova convivência, que as pessoas que estão aqui se envolvam, se afetem, se transformem a partir do que está sendo aqui compartilhado. A segregação não é mais uma alternativa, ela é uma ilegalidade, ela é um crime! E, para que essa página seja definitivamente deixada para trás, a gente precisa - precisa - que os senhores Parlamentares façam o seu trabalho, protejam as crianças e cuidem das escolas, provendo projetos de lei que fortaleçam a escola pública e não retirem recursos dessas escolas. A gente tem a responsabilidade de deixar um legado melhor do que aquele que a gente recebeu. Não é possível que o legado dos senhores seja o mesmo de 1970, que os senhores receberam. Nós queremos deixar histórias poderosas de como a gente tem sido capaz de superar e curar não os corpos, mas o isolamento, a segregação, o desamparo que vem sendo imposto a nós, pessoas com deficiência, a nossos filhos e filhas. É assim que eu espero que a gente possa praticar confiança, pertencimento e esperança, e eu conto com os senhores para que isso aconteça. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado, Mariana. Só lembrando que, desde o início, acho que é unanimidade aqui, todos estão trabalhando com a escola inclusiva. Não tem ninguém trabalhando, defendendo aqui, em nenhum momento, a segregação de nada. (Palmas.) |
| R | Eu quero passar imediatamente, ainda virtualmente, a palavra para o Rodrigo Hübner Mendes, que é Presidente do Instituto Rodrigo Mendes. Bem próximo do microfone, Rodrigo, para... Está fechado. Libere o microfone. O.k. O SR. RODRIGO HÜBNER MENDES (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senador. Boa tarde a todas e a todos. Agradeço o convite para participar deste ciclo de debates sobre a condição de atendimento aos estudantes com deficiência nas escolas e aproveito para cumprimentar as Senadoras Mara Gabrilli, Teresa Leitão, o Senador Izalci Lucas e todos os presentes na mesa. Sou homem branco de cabelos castanhos e estou usando uma camisa branca e um paletó cinza escuro. Bom, nos últimos 15 anos, eu tenho viajado para todas as regiões do mundo em busca das melhores práticas de educação inclusiva, e o que eu tenho observado, o que se apresenta como um fato recorrente? Em 2012, por exemplo, eu representei o Brasil em um evento da Agência Europeia para as Necessidades Especiais e a Educação Inclusiva, um organismo que congrega 30 países e tem um papel de criar diretrizes para todo o continente europeu sobre como viabilizar um modelo educacional inclusivo, e, ao longo da conferência, tive a chance de conversar com várias autoridades, com o objetivo de aprender com um grupo tão significativo de especialistas. Segundo o diretor da agência, essas múltiplas experiências registradas na Europa ao longo dos últimos anos indicam que as intervenções introduzidas nas escolas com a finalidade de beneficiar estudantes com deficiência funcionam também como fonte de melhoria para os demais estudantes, quer dizer, vários outros estudos, além dessas constatações que eu tenho acompanhado, reforçam essa minha percepção. Outra experiência que me marcou muito foi uma participação que eu tive numa conferência da ONU cujo tema era pessoas com deficiência intelectual que conseguiram concluir o ensino superior e hoje usufruem de uma vida independente. Eram todas as histórias focadas no processo de inclusão escolar de várias partes do mundo. E o que existia de comum entre elas? Todas as pessoas que tinham estudado em escolas comuns manifestavam, expressavam a experiência de conseguirem construir sua autonomia, enfatizando que a participação na escola comum foi um elemento decisivo para a sua emancipação. E como é que a gente está hoje no Brasil? Será que a educação inclusiva que a gente almeja, a educação inclusiva de qualidade é tão rara de se encontrar? Pelo contrário: a gente dispõe no Brasil, ao contrário do que muita gente pode eventualmente imaginar, de centenas de exemplos de todos os níveis de ensino, de todas as regiões do país, ouvindo todos os tipos de deficiência, experiências que se mostram consistentes, inovadoras e que vão se perpetuando pela forma ampla e sistêmica com que se estruturaram e se planejaram ao longo do tempo. Esses exemplos, para quem tiver curiosidade, estão disponíveis em um portal que a gente mantém chamado Diversa, uma plataforma aberta que vem sendo alimentada desde 2011. Semanalmente, a gente publica referências de escolas que estão se transformando a partir das diretrizes, dos princípios da educação inclusiva, e que ilustram como isso é possível de ser feito. |
| R | Depois de ter estudado e de ter registrado pessoalmente todos esses casos, eu posso afirmar, no papel de um pesquisador, que a escola comum que se transforma e que se repensa representa o caminho necessário para que a gente avance no processo de inclusão escolar. Não há dúvidas de que precisamos investir muito ainda na formação dos nossos professores. A participação das crianças com deficiência nas salas de aula comuns é um fato relativamente novo na história da educação. Os próprios professores têm declarado que esse é um dos temas mais desafiadores do seu ofício. No entanto, essa escola que se dispõe a reorganizar o seu projeto pedagógico, a introduzir dentro da sua rotina mudanças de forma que haja tempo para o planejamento pedagógico, de forma que os professores possam ampliar o seu repertório, oferecendo serviços de apoio e abrindo as portas para que as famílias possam participar das discussões é o caminho de acesso à construção da autonomia. O modelo da escola segregadora, da escola especial, foi testado já por décadas e se mostrou ineficiente. O resultado pode ser observado nas várias gerações de crianças que não foram suficientemente desafiadas, que não tiveram a chance de alcançar o seu melhor, o que pressupõe convívio, interação, estímulo continuamente. Então, para que sigamos evoluindo, para que os professores recebam os serviços de apoio necessários, para que a acessibilidade seja uma premissa, as nossas atenções, os recursos públicos precisam ser canalizados para essa escola que tem as portas abertas a qualquer perfil de estudante. No final do dia, o que se percebe, por meio de pesquisas não só no Brasil, mas em várias partes do mundo, é que todos os estudantes saem ganhando com essa preciosa oportunidade de aprender com a pluralidade, de aprender com o convívio, com essa experiência de estar constantemente trocando, aprendendo, usufruindo de um ambiente heterogêneo desde a primeira infância. |
| R | Reforço vários dos argumentos colocados aqui pelos colegas Guilherme, Mariana, Viviane. E, para não ser repetitivo, só gostaria de encerrar lembrando que isso que se propõe como uma escola que aprende, uma escola que constantemente coloca seus professores para pensar coletivamente, uma escola que assume o desafio de trabalhar com a incerteza e que investe na diversificação de estratégias pedagógicas sabendo que esse desafio é um contínuo que demanda esforço representa, de fato, um modelo de instituição de ensino que favorece a aprendizagem de qualquer estudante e que faz mais sentido para o mundo contemporâneo, um mundo que exige novas habilidades no sentido de a gente saber se colocar no lugar de quem é diferente, no sentido de a gente estabelecer cooperação, de a gente mediar conflitos e de a gente romper com visões equivocadas, visões ultrapassadas que acreditavam que, separando certas partes da população, seja no âmbito da educação, do trabalho, da cultura, das diversas dimensões da cidadania, isso serviria como um mecanismo de solução daquilo que a gente tem como exclusão. É por meio, de fato, da participação coletiva, é por meio do debate, do diálogo, da disposição para mudar padrões carregados que a gente vai conseguir dar saltos, que a gente vai conseguir avançar na educação, que a gente, como muitos aqui falaram, vai conseguir garantir esse direito de a criança, seja qual for a sua origem, sua particularidade, alcançar o seu melhor como ser humano, de, de fato, se desenvolver, de perseguir seus sonhos e não ter seu destino traçado, seu ponto de chegada já predefinido por outras pessoas antes mesmo da largada na corrida da vida. Então, agradeço pela oportunidade. Coloco a nossa equipe, a equipe do Instituto Rodrigo Mendes, à disposição, para que nossos representantes possam usufruir desses subsídios técnicos, do conhecimento que a gente vem produzindo e do que a gente tem oferecido às lideranças no Congresso e nos órgãos do Poder Executivo. Acho importante essa colocação da Mariana de que não estamos aqui fazendo nenhum tipo de colocação restritiva ou que prejudica o diálogo ou que representa algum tipo de conflito, mas, pelo contrário, a gente se coloca aberto à conversa, aberto ao processo contínuo de reflexão, num âmbito que deve colocar, acima de tudo, esse objetivo da garantia do direito, o objetivo do respeito às crianças e adolescentes, o objetivo do cumprimento das nossas... (Soa a campainha.) O SR. RODRIGO HÜBNER MENDES - ... responsabilidades como pessoas a quem é delegada essa responsabilidade de definir a educação do país acima de tudo. Então, mais uma vez, obrigado aos Senadores, aos colegas, às autoridades presentes. Seguimos abertos para que possamos construir redes de ensino, de fato, que estejam alinhadas com o que se acredita como uma concepção inclusiva e que a gente, de fato, almeje e invista em avanços que se desprendam de visões equivocadas do passado. Muito obrigado. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado, Rodrigo. Bem, eu só vou registrar a presença da Rosemary Melo, Secretária da Inclusão, do PSB do DF; a Cleonice Bohn de Lima, que é Presidente da Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down; Michel Platini, do Centro Brasiliense de Defesa dos Direitos Humanos, do gabinete aqui da Deputada Erika; do Bruno Ribeiro, turismólogo do Recife, autodefensor da Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down; Helena Ribeiro, Coordenadora da Autodefensoria Nordeste da FBASD; e o Pedro Lucas Costa, assessor de educação - do PSB também - de inclusão, mestre e professor de educação especial. O último palestrante virtual... Está inscrita ainda a Renata, Renata Tibiriçá, que é Defensora Pública do Estado de São Paulo. A SRA. RENATA TIBIRIÇÁ (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde a todos e todas. Eu primeiramente quero agradecer o convite e também cumprimentar os demais Senadores na pessoa da Senadora Mara Gabrilli, que fez a sugestão para estarmos presentes nesta audiência. Eu quero fazer minha breve autodescrição: sou uma mulher branca, de 47 anos, de cabelos e olhos castanhos. Eu sou uma mulher com doenças raras e estou vestindo uma blusa preta de manga comprida, e atrás de mim eu tenho algumas estantes de livros. Eu, no momento, estou Coordenadora do Núcleo Especializado dos Direitos da Pessoa Idosa e da Pessoa com Deficiência da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, e eu também sou membra da Comissão de Direitos da Pessoa com Deficiência, da Anadep, e Pós-Doutoranda em Educação Especial pela UFSCar. Eu queria primeiro começar falando que nós, defensores, acabamos tendo um papel de receber as reclamações das famílias, especialmente de mulheres, mulheres periféricas, que vivem sozinhas, que têm que sustentar seus filhos sozinhas, cujos filhos e filhas estão em escolas públicas municipais e estaduais. Elas trazem reclamações sobre a falta de apoio, a falta de um atendimento adequado para as crianças e adolescentes, e isso não é uma reclamação só que eu ouço na Defensoria Pública do Estado de São Paulo; é uma reclamação constante em todas as defensorias dos estados, conforme colegas que são da Comissão de Direitos da Pessoa com Deficiência, da Anadep, que são defensores públicos em outros estados também recebem. Então, faltam profissionais de apoio, falta transporte... E a gente também recebe reclamações de escolas especiais. |
| R | Então, a gente recebe reclamações daquilo, de fato, que não está adequado. Mas o que a gente tem percebido - assim como na pesquisa que eu fiz também no pós-doutorado - é que a gente está tendo um aumento, de fato, na judicialização da educação especial, especialmente nos pedidos de profissionais de apoio. E isso mostra que a gente precisaria aprimorar a política pública. Portugal fez isso. Tinha uma política em 2008 - eu estudei essa política quando fiz o doutorado - e, depois, fez uma atualização, em 2018. E a gente percebe que a gente precisa - até porque já se passaram vários anos aí, mais de uma década -, de fato, garantir esse aprimoramento. E aí o Comentário Geral nº 4 do Comitê da ONU, que faz a interpretação autêntica da convenção, traz a importância de a gente, de fato, proporcionar a professores, funcionários uma estrutura de criação de ambientes educacionais adaptáveis, enfatiza a necessidade de fornecer planos educativos individualizados - isso está escrito expressamente no comentário - que possam identificar adaptações razoáveis, apoio específico necessário para cada aluno, incluindo o fornecimento de ajudas de apoio compensatórios, também professor de apoio, até mesmo exclusivo, a depender da necessidade do aluno - isso está expresso também no próprio comentário -, fala do desenho universal de aprendizagem e também dispõe que essas medidas têm que ser de acordo com o objetivo de incluir, então, devem ter o objetivo de fortalecer oportunidades para os alunos com deficiência participarem, em sala de aula, de atividades extracurriculares junto com seus colegas. Então a gente tem que garantir não só acesso e permanência, mas também participação e, principalmente, aprendizagem. Só que fazer esse aprimoramento não significa a gente retroceder. Isso é muito importante que se diga porque a gente não pode pensar que pode acontecer o que se tentou fazer em 2020, com o Decreto 10.502, em que houve uma tentativa, inclusive, de financiar e, na verdade, ampliar um sistema segregado. A própria convenção proibiu o retrocesso nos direitos, a exemplo do que já também faz a Constituição Federal; o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e o Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ou seja, não pode haver um retrocesso no sentido de a gente incentivar e também aumentar esse sistema segregado. E aqui eu falo, porque foi trazido isso na primeira audiência, que haveria possibilidade de uma interpretação daquele "preferencialmente", do atendimento educacional especializado, de uma forma a permitir uma substituição da escolarização comum. Isso não é possível, porque essa interpretação viola a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. A única interpretação possível do termo "atendimento educacional especializado" para compatibilizar com a convenção é que ele signifique todos esses apoios, todos esses recursos de acessibilidade que são necessários para poder enfrentar as barreiras dentro da escola comum. E isso está absolutamente de acordo com o que próprio comitê também traz no comentário de uma eficácia progressiva desse direito à educação. |
| R | A gente até pode ter, durante um período, um sistema segregado e um sistema inclusivo, mas esse sistema segregado tem que ir desaparecendo aos poucos, como, inclusive, os dados do censo escolar demonstram. Isso vem acontecendo paulatinamente, tanto que, em 2022, a gente chegou a 1,372 milhão de alunos com deficiência em classes comuns e 154 mil alunos com deficiência em classes exclusivas. Então, a gente já tem praticamente 90% dos alunos com deficiência em classes comuns. O Brasil vem garantindo o acesso a esse sistema inclusivo de forma, então, progressiva. É importante que a gente também ressalte aqui que a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência tem status de emenda constitucional. Então, a gente não pode simplesmente fazer de forma contrária ao que está na convenção. O Brasil assinou um tratado internacional, comprometeu-se, tem obrigações a cumprir em relação a esse tratado, apresenta relatórios para a ONU e não pode retroceder nesse direito que tem que ser garantido de forma progressiva. E isso implica em alocar o máximo de recursos disponíveis em relação à educação inclusiva, ampliando, garantindo tudo que é necessário para os alunos com deficiência. E uma informação que é importante que a gente diga aqui é que a recusa dessas adaptações dentro das escolas comuns não tem eficácia progressiva. O que significa dizer isso? Significa que as famílias podem, sim, e devem exigir os apoios necessários para que os alunos estejam nas salas comuns. Então, a Defensoria Pública recebe essas demandas, e a gente tem que continuar buscando garantir, de fato, que o aprendizado aconteça na escola comum com os apoios necessários. Não é para o aluno estar lá excluído; é para o aluno estar lá incluído de fato, aprendendo como os demais pares. É evidente que nós temos situações de adultos - e a gente também recebe essas questões na Defensoria Pública - que, por serem vítimas de uma exclusão do passado, ficaram anos nessas escolas especiais, nessas instituições especiais. Então, o que a gente precisa é pensar que papel estão exercendo essas instituições especializadas. E elas estão exercendo, principalmente para os adultos, um papel de assistência social. A gente não tem, de uma forma ampla, Centros-Dia, Centros de Convivência da Pessoa com Deficiência, e precisa investir nesse sentido de que a gente garanta nos municípios esses espaços, porque esses espaços são importantes para aqueles alunos que foram vítimas de uma exclusão, que não conseguiram ter oportunidade como os demais alunos, que talvez hoje já consigam entrar e consigam ter os apoios necessários. E a gente tem que permitir que a famílias também tenham o seu espaço para poder garantir, porque a gente tem que lembrar que normalmente a mãe fica sozinha, ela fica com o filho com deficiência, muitas vezes, vivendo de um Benefício de Prestação Continuada, sem apoio, sem nenhuma rede de apoio, e isso tudo é muito difícil. Então, a assistência social tem um papel importantíssimo, inclusive, para evitar uma institucionalização, e a institucionalização é algo muito grave em relação às pessoas com deficiência porque leva efetivamente a uma segregação de tudo. |
| R | Então, diante disso, eu acho que isso está expresso, este Legislativo precisa, de fato, trabalhar para poder alocar o orçamento e, então, identificar. Se nós estamos tendo dificuldades, a gente precisa aprimorar essa política da educação inclusiva. Se precisamos, então, vamos priorizar o orçamento para garantir os recursos adequados para tornar acessíveis os ambientes educacionais num prazo definido; o investimento em formação inclusiva de professores; a disponibilização de adaptações razoáveis; o fornecimento de transporte acessível para a escola - isso tudo está no próprio Comentário Geral nº 4 -; a disponibilização de livros didáticos, materiais de ensino e de aprendizagem que sejam acessíveis e apropriados; o fornecimento de tecnologias assistivas em línguas de sinais; e a implementação também de iniciativas de conscientização para enfrentar o estigma e a discriminação, especialmente o bullying, nos ambientes educacionais. Não pode haver uma alocação de orçamento para incentivar os espaços segregados. A gente precisa, então... Se não está funcionando adequadamente, não devemos ampliar os espaços segregados, mas melhorar esses espaços, investindo mais dinheiro nos espaços, de fato, inclusivos, para que a gente garanta que os alunos com deficiência possam estar em todos os espaços em que todo mundo está e também ter as mesmas oportunidades que qualquer outra pessoa, ter a oportunidade de ser quem quiser. Então, eu agradeço mais uma vez a oportunidade aqui. A gente continua, a Defensoria Pública, à disposição das famílias para que possa garantir de fato uma educação verdadeiramente inclusiva. Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado, Renata. Quero registrar a presença aqui da Senadora Mara. Passo a palavra agora para a Anna Paula Feminella, que é Secretária Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Com a palavra, Anna Paula. A SRA. ANNA PAULA FEMINELLA - Boa tarde a todos e todas. Estou falando fora do microfone. (Fora do microfone.) Para quem não me enxerga, estou aqui no palco ao lado do Senador Izalci. Agradeço a oportunidade desse diálogo tão fundamental para a nossa sociedade, pelo direito ao acesso à educação e aos direitos humanos. Em nome do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, saúdo aqui, na pessoa do Senador Izalci Lucas, a Senadora Mara Gabrilli, a Senadora Damares, o César, que estava aqui do nosso lado, e também todas as pessoas que participaram virtualmente. Saúdo cada um e cada uma pessoa que está aqui, presencialmente, atento a este debate, a esta necessidade de diálogo social com muita tranquilidade, para que a gente pense a política pública não a partir da sua própria experiência, mas como um diálogo a respeito do presente e com um olhar para o futuro, que pense em que sociedade nós queremos e de que forma a gente vai chegar até lá. Faço uma breve autodescrição. Eu sou uma mulher branca de 50 anos, de cabelo escuro curto e liso. Estou de blazer preto, uso cadeira de rodas - preto ou, sei lá o que é isso, azul escuro -, um lenço azul e um vestido preto com uns florais. |
| R | Meu lugar de experiência aqui. Quero dizer que sou uma ativista, defensora dos direitos humanos, desde os anos 90, lá em Florianópolis; iniciei como uma educadora popular do Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua, nos anos 90; fui professora da rede pública municipal de Florianópolis, também nos anos 90, comecei em 1995; e sou especialista em gestão pública pela Enap, servidora também de carreira da Enap (Escola Nacional de Administração Pública). Nessa especialização, escolhi avaliar e analisar a burocracia de nível de rua, ou seja, como é que a política pública de educação especial, na perspectiva da educação inclusiva, acontecia a partir da perspectiva daquelas pessoas que trabalham diariamente com a população, com os estudantes nas escolas regulares de Florianópolis. Com essa experiência, a gente conseguiu identificar que, quando há condições de trabalho, quando há um projeto político pedagógico, estrutura para que os profissionais da escola consigam se formar, ter recursos didáticos, acessibilidade, o devido atendimento especializado, quando não fica na sobrecarga do professor individualmente a responsabilidade sobre a educação de uma criança com deficiência, a gente tem então uma realidade onde o desenvolvimento de todas as crianças acontece, e esse aprendizado é favorável, importante para todos os profissionais, para toda a comunidade escolar nesse espaço. Então, a Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência se coloca no compromisso da plena implementação da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que, como já aqui foi muito bem dito, é texto da nossa Constituição, muito embora muitos de nós ainda não o conheçamos - a população brasileira ainda desconhece grande parte desse conteúdo, que é texto constitucional, que é o nosso grande contrato social. Acerca da temática, o direito à dignidade da pessoa humana é o que nos coloca o desafio de garantir e promover os direitos das pessoas com deficiência em equidade, em igualdade de oportunidades e de direitos. Nesse sentido, a grande barreira que encontramos para participar em igualdade de oportunidades, com equidade social, é a barreira da discriminação, uma discriminação construída socialmente, secular, que nos coloca na condição de pessoas com menos direitos ou menos valores ou numa condição de ainda não superação da perspectiva caritativa de deficiência ou da perspectiva biomédica de deficiência. Muito embora a gente tenha ratificado a convenção em 2008 e tornado texto constitucional em 2009, chegamos a 2023 ainda sem abordar a temática da deficiência da perspectiva da política pública, da perspectiva dos direitos humanos e daquilo que está na nossa Constituição, da deficiência como uma construção social, um conceito em evolução que pressupõe não só o corpo neurodiverso, o corpo com diversidade funcional, mas dele em contato com as barreiras construídas pela sociedade, barreiras de ordem arquitetônica, urbanística, comunicacional, tecnológica, de transportes. As barreiras atitudinais é que nos impedem a plena participação social em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. |
| R | Então, é com esse compromisso que a gente vem aqui alegremente - e com a responsabilidade também - construir essa plena implementação da convenção. E não se faz essa implementação achando que o direito de um vai poder ser barreira para o direito do outro. Então, o direito humano à educação é fundamental e à dignidade também. Nesse sentido, a gente tem também... Eu queria... Eu só queria fazer uma leitura pequena sobre o compromisso da própria convenção. Já que eu falei que, muitas vezes, a gente não lê esse texto, eu vou ler um pedaço muito pequeninho daquilo com que se compromete o Brasil, assim como mais de 180 países do mundo: efetivar os direitos da pessoa com deficiência. Estou apanhando aqui do microfone, gente. 1. Os Estados Partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência à educação. Para efetivar esse direito sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades, os Estados Partes assegurarão sistema educacional inclusivo em todos os níveis, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida, com os seguintes objetivos: a) O pleno desenvolvimento do potencial humano e do senso de dignidade e autoestima, além do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos, pelas liberdades fundamentais e pela diversidade humana; b) O máximo desenvolvimento possível da personalidade e dos talentos e da criatividade das pessoas com deficiência, assim como de suas habilidades físicas e intelectuais; c) A participação efetiva das pessoas com deficiência em uma sociedade livre. 2. Para a realização desse direito, os Estados Partes assegurarão que: a) As pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do ensino primário gratuito e compulsório ou do ensino secundário, sob alegação de deficiência; b) As pessoas com deficiência possam ter acesso ao ensino primário [...] c) Adaptações razoáveis de acordo com as necessidades individuais sejam providenciadas; d) As pessoas com deficiência recebam o apoio necessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva educação; e) Medidas de apoio individualizadas e efetivas sejam adotadas em ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social, de acordo com a meta de inclusão plena. Então, a gente tem um compromisso... Para que o direito humano seja efetivado, a gente tem esse compromisso com a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. (Soa a campainha.) A SRA. ANNA PAULA FEMINELLA - E o Governo brasileiro, o Estado brasileiro tem que prestar contas dessa implementação da convenção - inclusive, a Senadora Mara Gabrilli é também integrante do comitê de monitoramento da convenção -, mas o Brasil está devendo o último relatório de implementação da convenção. Essas questões todas são de nossa responsabilidade, da responsabilidade de todos. |
| R | A gente reconhece que tem, sim, muitas experiências negativas na educação quando, na educação, não há condições efetivas da plena inclusão das pessoas com deficiência na escola regular. Mas a solução não é, do meu ponto de vista, retirá-los da escola, porque os problemas e as barreiras não são construídos por nós, pessoas com deficiência nem por nossas famílias. As barreiras são construções sociais. As barreiras sociais é que precisam ser superadas, enfrentadas, e não é retirando as pessoas com deficiência que isso se resolve. O que acontece? É que o decreto de 2020 ainda surte um efeito muito negativo na nossa sociedade. Ele foi potencializado por manifestações... (Soa a campainha.) A SRA. ANNA PAULA FEMINELLA - ... de discriminação, informando que pessoas com deficiência atrapalham a sala de aula, e ainda sofremos esse efeito, ainda sofremos a discriminação quando vamos nos inscrever na educação regular. Então, novamente dizendo, a gente precisa pensar em como fazer política pública de forma inclusiva e prevendo orçamento, prevendo planejamento, prevendo as condições efetivas dessa inclusão na educação, não negando os direitos, as diversidades e as especificidades das pessoas com deficiência. Não há uma solução única para todo mundo. Então, por isso, nossa secretaria também tem a responsabilidade de implementar a regulamentação da Lei Brasileira de Inclusão em um aspecto que impacta diretamente todas as políticas públicas, que é a avaliação unificada da deficiência. A gente precisa de um Sistema Unificado da Avaliação Biopsicossocial da Deficiência, precisa avançar na construção, na finalização do Índice de Funcionalidade Brasileiro, que vai, então, não só localizar a deficiência como os impedimentos do indivíduo, mas também o contexto social desse indivíduo e quais os recursos de acessibilidade, quais os suportes, quais as necessidades específicas desse indivíduo naquele território. Então, o desenvolvimento de políticas públicas baseado em um sujeito de direitos pressupõe uma ampla implementação dessa avaliação biopsicossocial da deficiência, conforme está previsto na Lei Brasileira de Inclusão, e que estamos em mora legislativa, Senador. Então, temos esse compromisso. No dia 1° de junho, vamos lançar, será feita a inauguração do Grupo de Trabalho de Avaliação Biopsicossocial da Deficiência, que tem como compromisso a finalização desse índice, atendendo também às especificidades da infância e adolescência e prevendo, então, etapas de implementação, de implantação desse Sistema Unificado de Avaliação Biopsicossocial da Deficiência. E isso vai impactar a educação, vai impactar todas as políticas públicas. Diretamente, ele impacta 35 programas federais. Então, é algo que altera o paradigma da deficiência, e o foco do debate social é fundamental. |
| R | Então, abordar a deficiência pela perspectiva do modelo social, do modelo de direitos humanos, da convenção é um compromisso nosso também, o de divulgar o que é capacitismo, porque nossa sociedade ainda nunca ouviu falar, muitos de nós nunca ouvimos falar sobre capacitismo, muito embora seja um conceito já em uso desde os anos 80, não é? A gente escolheu - os movimentos de defesa dos direitos das pessoas com deficiência, os movimentos protagonizados por pessoas com deficiência e por pessoas que defendem o protagonismo das pessoas com deficiência na sociedade - esse termo "capacitismo", porque constantemente somos subestimados em nossas capacidades. Mesmo aquelas pessoas sem intencionalidade, ao subestimar, estão nos discriminando. Então, até o fato da... Então, fica aqui o convite para este Congresso, para a sociedade civil aqui presente, para os movimentos e gestores públicos acompanharem, participarem deste debate que a gente faz no Conade - não é, César? - e que se está fazendo para que a gente amplie direitos. É esta a perspectiva: ampliar direitos - ampliar e planejar. Dialogar com a sociedade é fundamental. Quero dizer daqui que agradeço a oportunidade, estou à disposição. Nós temos muito a fazer. O Vice-Presidente da República lançou, na semana passada, Senador, um despacho vice-presidencial que compõe, chama dez ministérios para construírem um novo Plano Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Então, observar que todas políticas públicas precisam... (Soa a campainha.) A SRA. ANNA PAULA FEMINELLA - ... funcionar com acessibilidade, com inclusão, com políticas valorizadoras da pessoa com deficiência; com políticas formativas, para que o agente público saiba atender devidamente as pessoas com deficiência, que os serviços públicos estejam acessíveis a todas as pessoas; com políticas públicas afirmativas, para garantir a nossa presença em todos os espaços; e também com políticas repressivas, porque a lógica da impunidade ante às discriminações em razão de deficiência acaba favorecendo e incentivando a manutenção de todo tipo de violação de direitos humanos e de violência, inclusive. Então, é nessa perspectiva do diálogo, do refundar a pauta e a agenda de direitos humanos na inclusão das pessoas com deficiência na sociedade, em qualquer espaço. A gente já tem avançado um pouco para além do "nada sobre nós sem nós": a gente quer "nada sem nós". Está bom? A gente sabe falar sobre política, sobre todos os temas econômicos. Temos pessoas formadas, profissionais formados em todas as áreas e precisamos garantir a acessibilidade para tudo. Eu estou aqui identificando que, muito embora, pelo YouTube, tenha interpretação de libras, aqui não foi possível - teve um problema com a equipe que foi contratada para fazer interpretação em libras. Se nós tivéssemos uma pessoa surda aqui, na plateia, ela ia ter dificuldade de conseguir participar efetivamente, em igualdade de oportunidades, com as demais pessoas. A gente está falando sobre direitos fundamentais que ainda não chegam para grande parcela da nossa população brasileira e que impactam não só as pessoas com deficiência, mas as suas famílias, e o ônus, o custo desse capacitismo, muitas vezes, recai sobre as famílias - famílias, muitas vezes, que são desfeitas pela perspectiva cultural de que a deficiência ainda seja uma tragédia. |
| R | (Soa a campainha.) A SRA. ANNA PAULA FEMINELLA - Muito embora sempre haja, ao longo da história da humanidade inteira, pessoas com deficiência em todos os territórios, nós ainda não somos visibilizados na política. A política ainda é um território hostil - a Senadora que o diga, não é? E a presença da nossa participação em todos os espaços é uma presença que altera a realidade. Ela tem esse potencial de mobilizar, para que a gente entenda que não se faz democracia deixando outras pessoas para trás; não se faz uma sociedade justa, solidária, sem olhar, sem planejar, identificando a superação de todas as opressões e injustiças sociais. Acho que a gente precisa se desarmar para a pauta. Acho que a gente não precisa polarizar. Nós estamos num outro momento, num momento de construir juntos, de construir a política pública de forma efetiva, funcionando, considerando as nossas especificidades, considerando a imensa diversidade de corpos e funcionalidades e jeitos de ver e viver a vida. E, inclusive, aqui no espaço da política, é necessário que a gente tenha políticas afirmativas, políticas de incentivo e fomento às experiências de educação e inovação, porque a nossa presença, a presença das pessoas com deficiência... Elas têm, sim, a capacidade de impactar e trazer mais esperança e mais alegria, gente. Não é uma tragédia não. Eu, quando me acidentei, quando eu tinha 31 anos, achava que tinha que... Ainda assim vivenciei aquela coisa: "E agora? O que será de mim?". Era professora de educação física e, mesmo tendo trabalhado com educação inclusiva, ainda nunca tinha me visto nessa condição de pessoa com deficiência. E essa necessidade é importante... O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Anna... Só para concluir, Anna. A SRA. ANNA PAULA FEMINELLA - Eu acho que a oportunidade de diálogo, de solidariedade pressupõe também o reconhecimento de que alguns espaços são hostis mesmo. Então, ficar muito tempo aqui discutindo é algo que exige uma disciplina muito grande, e a gente precisa ter ambientes acolhedores para todas as pessoas. E, muitas vezes, aqui realmente não é um espaço acolhedor para uma criança, e qualquer criança... Porque se a minha filha, que não tem deficiência, estivesse aqui, ela também estaria correndo e berrando. Não tem problema. Mas a gente precisa conversar sobre o tema, tratar sobre a deficiência como um tema de interesse estratégico, e é para isso que o Vice-Presidente Alckmin está nos chamando. Temos 120 dias para fazer esse diálogo com participação social, com respeito às diferenças, e é nessa perspectiva que a gente vem aqui conversar solidariamente, muito tranquilamente, com todos vocês. Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado, Anna. Eu quero - viu, Mara... A maioria dos convidados foi requerimento de V. Exa... É porque tem um ônibus que está saindo agora e tem duas mães que gostariam de falar. Posso, rapidamente, dar dois minutinhos para cada uma, antes de passar para V. Exa.? |
| R | A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP. Fora do microfone.) - Com certeza. Até mais. Não tem problema. O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado, Mara. Quero registrar a presença aqui da nossa querida Professora Dorinha. Obrigado, Dorinha. É só a mãe da aluna, que é a Jaqueline Viana, e também a Maria das Graças de Freitas. Jaqueline Viana. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Pode usar esse microfone. Pode auxiliá-la aqui? (Pausa.) Ah, sim. A SRA. JAQUELINE VIANA (Para expor.) - Boa tarde. Meu nome é Jaqueline, eu sou mãe da Luma, vocês viram aqui que na semana passada eu fui constrangida porque foi pedida a retirada da minha filha porque ela estava atrapalhando, entendeu? Eu concordo que realmente os gritos dela, na hora da fala, prejudicam. Agora imaginem, dentro de uma sala de uma escola regular, o que a minha filha vai causar e o que ela vai sofrer. Eu não quero a minha filha numa escola regular, num cantinho da sala, cercada de cadeiras, porque ela está atrapalhando. Eu não quero a minha filha numa escola regular, levando balde d'água igual foi noticiado essa semana. Uma professora de uma escola regular jogou um balde d'água num autista porque ele estava atrapalhando. Então eu quero a minha filha num centro de ensino especial. Eu tenho esse direito. Quem quiser colocar a filha numa escola regular, esteja à vontade, mas eu quero o direito da minha filha de estar numa escola especial. Lá ela é muito bem acolhida. Eu tive o acolhimento de todo o corpo docente, diretora, professoras, porque eu passei por um momento muito delicado em relação à saúde da Luma. Eu fui chamada na escola, a Leide me tratou superbém - professores, psicólogos - e assim eu consegui. Então eu vim aqui hoje para estar defendendo a minha filha estar numa escola especial. Inclusão para mim é chegar a um posto e poder pegar o remédio dela, o que eu não estou conseguindo; eu estou tendo que pagar. Inclusão para mim é poder chegar ao hospital e ela poder ser atendida. Uma vez ela passou mal e eu não pude ser atendida, a princípio. Ela estava desmaiada no meu colo, mas ela não foi considerada vermelha. Foi colocada uma pulseira amarela. Eu tive que sair entrando dentro do Hran para ela poder ser atendida, pedindo pelo amor de Deus. Então, isso para mim é inclusão. É igual o César estava falando: não é porque ela não está numa escola regular que ela não convive com outras pessoas. Ela convive, sim. Eu levo minha filha a shopping, ela gosta. Eu a levo em aniversário, até uma certa hora ela fica; depois, ela quer ir embora para casa. Então estou lutando e vou lutar. E, se não for feita essa vontade minha e de muitas mães aqui, de os nossos filhos estarem numa escola especial, em toda audiência pública que tiver, eu vou trazer a Luma, e ela vai ficar aqui gritando, atrapalhando, não deixando ninguém falar. Eu vou trazê-la, podem ter certeza, porque, se ela não pode ter uma escola que vai acolhê-la, então que ela venha para cá. Eu quero ver... (Intervenção fora do microfone.) A SRA. JAQUELINE VIANA - Quero ver... Com licença, eu escutei a senhora. Agora, por favor! Eu quero ver se o seu microfone vai ser mais forte do que a minha voz e a da minha filha, porque ela não fala, mas eu posso falar por ela, e ela vai gritar. Obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigada, Jaqueline. Só um minuto. Eu fui solicitado pelo Presidente - eu também reafirmei aqui - para que a gente pudesse ouvir. O objetivo da audiência é ouvir todos e, evidentemente, com muito respeito. Antes de passar para a Mara e, depois, para a Professora Dorinha, vou passar a palavra para a Maria das Graças de Freitas, representando o Conselho Escolar do Centro de Ensino Especial do Guará. |
| R | A SRA. MARIA DAS GRAÇAS DE FREITAS (Para expor.) - Boa tarde a todos! Eu já nem sei mais o que dizer, porque dois minutos são nada diante do que necessito dizer, mas eu vou tentar sintetizar. Eu sou representante do Conselho Escolar, no segmento pais, do Centro de Ensino Especial do Guará, no DF, na escola em que a filha dela estuda. A minha filha tem 27 anos, é deficiente intelectual. Quero dizer que, desde a primeira audiência de que participei, eu me senti num mundo imaginário, eu me senti em Nárnia, porque é tudo muito maravilhoso, é tudo muito lindo, é tudo perfeito, porque existe apenas no papel. Outra coisa: os alunos, os exemplos explanados em todas as falas que eu presenciei, são maravilhosos e são dignos, realmente, da inclusão, que eu sei que é um direito da minha filha, que é um direito de todos. Dos direitos nós entendemos. Nós queremos, apenas, que eles sejam atendidos em ambientes específicos às necessidades deles. Não é segregar - não é segregar! O aluno ter uma aula de cozinha experimental para ele aprender, além do "a", do "b", do "c", do um, do dois e dos três, a fazer um bolo, não é segregação; o aluno aprender a plantar um pé de alface não é ser segregado. Então, a palavra segregação está em alta aqui hoje e esteve na primeira audiência, mas o ensino especial não é segregação. Segregar é colocar o meu filho, a minha filha, de 27 anos, que só escreve o nome dela, Camila, mas que sabe muitas coisas, numa sala regular de 20, 30, 10 ou 15 alunos... (Soa a campainha.) A SRA. MARIA DAS GRAÇAS DE FREITAS - ... numa caixinha, lá no final, sendo um bibelô da sala, porque ela é linda. Mas não é só isso que eu quero, eu quero que ela aprenda. A inclusão é, sim, maravilhosa, perfeita, aceitável e absolutamente necessária, porém, não é de um dia para o outro que se faz. Temos que preparar todo o contexto: escolas, professores, pais, alunos, espaços físicos, educadores sociais, governos, verbas, etc. "Nada sobre nós sem nós": nós precisamos e somos a parte mais importante e mais interessada a ser ouvida. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado. Vou passar para a Senadora Mara. A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP. Pela ordem.) - Muito obrigada, Presidente Izalci, pela oportunidade dessas audiências... Ô mães, vocês já vão? (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - É porque eles têm os ônibus. Mas depois eu vou passar para eles, Mara o... Está sendo gravado. É porque tem um ônibus saindo agora, por isso eu pedi que eles falassem primeiro. Dá para esperar um pouquinho para ouvir a Senadora Mara? (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - O.k. Vou passar depois. Está gravado, filmado. É só depois observar. (Intervenção fora do microfone.) |
| R | A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Jaqueline, eu sei que você tem que ir embora. Eu só queria falar uma coisa para você. Na verdade, falar de amor mesmo, sabe? A sua filha não é uma pessoa que atrapalha, e me incomodou você tratar a sua filha como uma pessoa que atrapalha. A sua filha está aqui, neste momento, ensinando-nos a ter tolerância, coisa que falta demais hoje em dia. Então, às vezes, as pessoas têm comportamentos diferentes, e a gente tem, às vezes, dificuldade de aceitar esse comportamento diferente. É claro que, numa discussão dessas, a pessoa mais aceita aqui só podia ser a sua filha! A gente está falando disso. (Intervenção fora do microfone.) A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Mas para chegar... (Intervenção fora do microfone.) A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Então, mas a gente não pode... Porque essa integração é importante para ambos. Talvez a sua filha grite menos, talvez o outro aluno aproxime-se da sua filha... (Intervenção fora do microfone.) A SRA. JAQUELINE VIANA - Mas, lá na escola, ela é muito bem-querida. Ela tem muitos amigos lá! A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Sabe o que eu estou... A SRA. JAQUELINE VIANA - Ela não está longe das pessoas, não. Ela convive! Eu só não quero... O que acontece? A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Eu não estou nem entrando no fato, eu só estou falando da situação que eu vi. A SRA. JAQUELINE VIANA - Nas escolas da via regular, tem bullying, tem violência, e eu não quero a minha filha passando por isso. Não quero! Se eles lá se desrespeitam entre eles, o que é que vai ser da minha filha lá dentro? A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Porque, na verdade, você, mãe, a sociedade, o Estado, todo mundo é responsável por isso, entendeu? É preciso fazer com que a gente consiga juntar essas pessoas nas escolas regulares. A SRA. JAQUELINE VIANA - Não sei se você ouviu, Mara, mas, na semana passada, eu fui pedida para sair: "Você não quer sair e dar uma voltinha?". Porque ela estava gritando! (Intervenção fora do microfone.) A SRA. JAQUELINE VIANA - Mandou sair! Teve gente que estava perto e viu! "Você não quer sair e dar uma voltinha com ela?". Por quê? Se aqui foi desse jeito, eu vou deixar a minha filha sozinha numa escola onde ela não fala, ela não entende? Eu vou deixá-la lá? Não vou! A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Ai, mas eu posso só contar uma coisa para você? Aproveitando até a fala da Anna Paula sobre capacitismo, que são armadilhas em que a gente cai. Olha só, eu sou cadeirante, há 28 anos, quando eu quebrei o pescoço. Eu fui... Estou tentando deixar isso mais leve, porque a gente é feito da mesma coisa. Sabe? Assim, eu sou feita da mesma coisa da sua filha... A SRA. JAQUELINE VIANA - Não, a minha filha não tem o mesmo cognitivo que o seu. Você é perfeita! A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Eu não estou falando de cognitivo. A SRA. JAQUELINE VIANA - Você fala, você entende, a minha filha, não! A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Eu estou falando de ser humano! A SRA. JAQUELINE VIANA - Não tem ninguém por ela! Ela só tem a mim! A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Eu estou falando de ser humano! Só termina de ouvir. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Jaqueline... A SRA. JAQUELINE VIANA - Eu não estou falando disso, não! Eu quero a minha filha na escola... (Tumulto no recinto.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Gente, se me permitem, só um minuto? A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Posso só terminar o meu raciocínio, Jaqueline? O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Jaqueline, você falou, e a gente entendeu bem. Eu queria que a Mara falasse, senão vai ficar um debate aqui. A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Eu queria contar... Sabe por quê? Eu tenho empatia com você. Imagino que doa muito, sabe? Porque eu também já senti dor. Eu vi já outras pessoas sentindo dor e eu só queria lhe contar uma coisa. Parece que eu saí do contexto, mas eu não saí. Eu fui às Paralimpíadas, Jaqueline, assistir aos nadadores de 100m rasos lá. E, quando eu olhei os meninos chegando para mergulhar na piscina, eles se ajeitando, entrou um cadeirante, entrou outro cadeirante, entrou um amputado, mas entrou um menino que não tinha braço, não tinha nem o coto do braço. E, assim, olhando, ele era na minha cabeça totalmente desprivilegiado, se comparado aos outros, e até achei que alguém que tivesse avaliado aquilo teria colocado aquele menino na categoria errada, porque como é que ele iria competir com os outros que tinham quase todos os membros e tinham uma condição muito melhor? É óbvio que ele iria perder e iria ficar chateado. Eu fiquei meio revoltada. |
| R | E aí, quando eles pularam na piscina, esse menino parecia um míssil. Ele largou todos lá atrás. E aí, eu vi e falei assim: "Meu Deus, olha há quantos anos eu trabalho com isso!". E eu fui capacitista, sabe? Eu olhei para o menino e julguei o menino por uma coisa que estava dentro da minha cabeça. E eu não estou falando nem de você nem da sua filha. Eu estou lhe falando o que acontece muitas vezes com o gestor de RH, que não aceita aquela pessoa com deficiência dentro da empresa; muitas vezes acontece com um professor, que julga que aquele aluno pode ou não ser capaz de fazer alguma coisa; e muitas vezes acontece até com a mãe, de não imaginar a potência que seu filho pode ser. Eu não estou fazendo julgamento porque eu acho que, assim, a educação tem que ser de qualidade. É o que está na Lei Brasileira de Inclusão, é o que está na convenção, e já faz oito anos que a gente continua discutindo. E eu acho que a gente devia mudar até os nomes porque não importa se a educação é feita na igreja, na praça, no Congresso, na escola, mas tem que ser uma educação de qualidade. E, para que ela seja uma educação de qualidade - e eu admiro muito o Izalci porque você está aqui tocando essas audiências; a gente está na segunda, ainda teremos outras -, a gente precisa valorizar os nossos professores. E, para isso, os nossos professores, para que eles aprendam, têm que ter muita humildade para poder aprender para poder ensinar. Aprender como cada um funciona, aprender o que irrita cada criança, o que tira cada criança do prumo e faz com que ela tenha um comportamento que seja ruim para ela, na verdade. Então, assim, de repente o grito da sua filha é um grito de felicidade. Se é um grito de felicidade... (Intervenção fora do microfone.) A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Então. Então, você estava sentindo que ela estava incomodada, e isso dói em você... (Intervenção fora do microfone.) A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - SP) - Não, mas eu não estou falando dela, eu estou falando, assim, que, às vezes, o comportamento das pessoas a gente tem que aprender. Assim como o professor, não importa em que escola você esteja, ele tem que ter essa empatia de entender o que faz a sua filha se sentir melhor, para poder prover isso a ela. Eu não sei se você está percebendo que eu saí dessa questão de escola especial e ensino regular, mas eu estou falando de amor mesmo, sabe? Eu acho que a gente tem que exercitar mais. Aqui está todo mundo falando do mesmo assunto, então a gente não pode se digladiar um com o outro. E às vezes o contraditório não é ser inimigo, não é ser contra os princípios do outro, mas é saber que o mundo tem muitas facetas, as pessoas têm muitas facetas, e é um exercício. A filha dela fazendo esses gritinhos é um exercício de tolerância para todos nós que estamos aqui - entendeu? -, porque tem gente que tosse, tem gente que se sente mal. Eu, por exemplo, cheguei e já fui lá me colocar naquele lugar em que estou acostumada, de repente vi que estava de costas para quem estava falando e ainda atrapalhando a tradução ali. De repente eu me dei conta do entorno em que eu estava e que tinha que sair dali. |
| R | Então eu acho muito importante, quando a gente fala de inclusão, entender essa fala da Anna Paula sobre capacitismo, que é uma coisa que acontece. Não acontece com os outros, acontece muito com a gente, e muitas vezes a gente olha para o outro e faz pouco do outro, muitas vezes a própria Jaqueline pode ter feito pouco do tamanho do nosso coração e do tamanho da nossa capacidade de entender o outro. É só uma lembrança de que, indubitavelmente, independentemente de qualquer coisa, a gente tem que investir nos nossos professores, a gente tem que investir nos espaços escolares mesmo, a gente tem que investir nas tecnologias assistidas, mas a gente tem que investir na saúde mental de todos nós, porque todos nós cometemos erros e temos barreiras de atitude. Eu não vejo problema nenhum em perceber que a gente comete erros e que a gente tem barreiras de atitude, mas a gente não pode deixar isso passar e não querer derrubá-las. Então é isso que eu trago aqui. Todos nós somos iguais sim. Eu posso não ter uma deficiência intelectual, mas eu tenho uma deficiência física, eu tenho as minhas questões, eu tenho as minhas dificuldades, eu tenho as minhas facilidades. Por isso que a gente fala tanto de inclusão na escola desde o princípio, porque a criança que convive com outra, que grita, que fala de forma diferente, que caminha de forma diferente, que raciocina de forma diferente, que ouve de forma diferente, que se expressa de forma diferente, isso é um ganho para toda a sociedade, isso é uma coisa que faz com que a gente tenha uma capacidade maior de enxergar essa diversidade do mundo e, quando a gente enxerga, a gente percebe que ninguém consegue fazer inclusão se não se sentir incluído. Se a Jaqueline não se sentir incluída, ela vai ter dificuldade de incluir alguém. Por isso que estou fazendo esta fala. Cabe a todos nós começar a refletir de trás para frente e não só na casinha da escola especial ou da escola regular, mas na nossa casinha mesmo, no nosso coração, na forma como a gente trata o outro, na nossa tolerância em lidar com essas diferenças. Então, Izalci, eu fiz essa fala, não era o que eu tinha programado, mas eu queria... Se por acaso alguém pediu para que ela saísse da sala na outra reunião, eu peço desculpas por ela, porque não sei o comportamento adequado para o tipo de discussão que a gente está tendo aqui. |
| R | E quero lembrar que todos nós cometemos esses erros, e a gente tem que aceitar, mas a gente não tem que aceitar se a gente não quiser derrubar esses preconceitos. Isto a gente tem que fazer, se reconhecer, reconhecer o outro e tentar ser maior. Isto faz com que a gente tenha, realmente, muito mais facilidade de conseguir ser feliz, de conseguir se relacionar. Afinal de contas, o que mais a gente tem na vida senão poder dar e receber amor? O que tem de mais importante? Então, eu trouxe o amor aqui como palavra de ordem para a gente continuar nossas audiências, e que ele não falte, Izalci, nas nossas discussões. Obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado, Mara. Começou a Ordem do Dia. Dorinha, você quer fazer alguma colocação? Porque eu vou fazer o encerramento, e V. Exa. é uma referência para nós também na educação. O SR. EDINALDO DA SILVA (Fora do microfone.) - Senador, seria possível eu só fazer uma fala? Eu sou deficiente visual. O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Com certeza. Deixe-me só passar para a Professora Dorinha. Aí eu passo para o senhor por dois minutinhos, porque eu tenho que encerrar, porque já estão chamando. A Ordem do Dia já foi aberta. Dorinha, por favor. A SRA. PROFESSORA DORINHA SEABRA (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO. Pela ordem.) - Boa tarde a todos! Eu quero só me colocar à disposição, Izalci. Eu fui Deputada por três mandatos e fui Secretária de Educação do Estado do Tocantins por quase dez anos. Por que eu estou me colocando de onde eu falo? Porque eu acho que a gente precisa... Eu acompanhei o Plano Nacional de Educação no formato que nós demos para o Plano Nacional de Educação. Então, eu acho que a gente precisa avançar muito para colocar e preparar a escola para a inclusão, professores, espaço físico, é responsabilidade nossa, mas, ao mesmo tempo, eu defendo muito que a gente precisa olhar todas as situações. Eu compreendo tanto a fala apaixonada da Mara quanto a da Jaqueline, do desejo, porque eu sou mãe também e eu queria e quero que as pessoas sejam acolhidas, que tenham, realmente, a oportunidade, e acho que a gente não pode ficar querendo encaixotar como se fosse um único modelo de atendimento. Tenho certeza de que, sem amarras e, ao mesmo tempo, cobrando sempre do investimento adequado, da formação adequada, dos espaços adequados na escola pública regular, na minha leitura, não inviabiliza a criação de escolas especializadas, quer seja para fazer o atendimento paralelo, quer seja para esse atendimento de acordo com o desenho, com as necessidades e até com o estágio de atendimento. Então, eu acho que a gente pode muito construir esse caminho, e o Brasil tem essa obrigação, e nós temos essa obrigação de fazer esse acolhimento com qualidade e com respeito às diferenças, mas, acima de tudo, garantindo o direito de aprender. Isso significa que, às vezes, eu preciso de um espaço diferenciado ainda que momentâneo, ainda que paralelo. Eu não estou dizendo que tem que ser, mas eu acho que a gente precisa avançar sem amarras, sem obrigações, porque parece que a gente fica amarrado, como se a gente só pudesse fazer uma defesa sem ouvir quem está precisando, quem tem direito... Não é nem quem está precisando, mas quem tem o direito, desculpem-me, mas quem tem direito a um atendimento de qualidade. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Obrigado, Dorinha. Como é o seu nome? |
| R | O SR. EDINALDO DA SILVA (Fora do microfone.) - Edinaldo. O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Edinaldo. O SR. EDINALDO DA SILVA (Para expor.) - Edinaldo da Silva. Gente, eu tenho 53 anos. Aos 29 para 30 anos, eu me tornei pessoa com deficiência visual. Eu venho de uma escola... (Soa a campainha.) O SR. EDINALDO DA SILVA - Eu venho do ensino especializado, o CEEDV. Hoje eu faço parte também da direção da ABDV (Associação Brasiliense de Deficientes Visuais). Faço parte do projeto De Olho no Lance, que é um projeto que leva as pessoas com deficiência visual... Somos o primeiro da América Latina que, dentro do nosso grupo teatral, tem surdo, cego contracenando junto com pessoas cegas. Tudo isso vem de um ensino especializado. Eu faço uma pergunta: estamos este ano fazendo 15 anos, se ainda não fizemos. Há 15 anos que se fala da política inclusiva, de escola inclusiva, e, dentro desses 15 anos, a gente não vê nada entre as escolas regulares para que possam atender e receber as pessoas com deficiência. Eu vejo as pessoas da margem, eu vejo as pessoas jogadas em determinada situação. Sorte daqueles que estão em escolas que dão qualidade - é sorte daqueles. Dentro desses 15 anos, a gente não viu o melhoramento de professores, com qualidade, para que possam receber, atender essas pessoas. A gente não vê melhoramento de acessibilidade junto às escolas. Eu venho de um ensino especializado, que as pessoas dizem que é segregador. Eu tenho meus pares, eu convivo com a minha família, eu convivo com os professores, eu convivo com meus colegas - seja lá fora, seja nas escolas, seja onde for -, graças a uma escola de ensino especializado. Obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Eu só vou registrar aqui, do e-Cidadania: Marcos Vinícius, do Rio de Janeiro: "Já não seria hora de olhar com mais empatia para os deficientes físicos e implementar políticas públicas úteis para o melhor aprendizado deles?"; Lucineide Alessandra, aqui do Distrito Federal: "Na Base Nacional Comum Curricular, consta o compromisso com práticas pedagógicas inclusivas e de diferenciação curricular aos alunos. Como isso será realizado?"; Josianne Pantoja, do Amazonas: "As escolas têm que ter estrutura para receber pessoas deficientes, um local aconchegante, que gere conforto, bem-estar e segurança"; e Sandra Cristina, aqui de Goiás: "Não há como a criança precisar de tratamento diferenciado e se sentir incluída em meio às que não necessitam". Eu quero mais uma vez agradecer. Eu fiz questão de a gente promover esse debate e fiz questão de levar os Senadores para conhecerem a escola, porque muitas vezes nós que temos o poder de decidir alguma coisa e legislar alguma coisa, muitos de nós não conhecem o mundo real. Nós temos o mundo virtual e o mundo real. Então é por isso que a gente está insistindo em ouvir todos, para a gente ter realmente uma política pública que atenda de acordo com as necessidades e também com a capacidade do Governo. A gente precisa cobrar, e ninguém defende isso mais do que nós, que participamos da Comissão de Educação - está aqui a Dorinha, o Prof. Senador Arns -, todos nós defendemos. Eu fui o Relator do Fundeb, entrei aqui na política pela educação, mas, de fato, no Brasil, educação ainda é muito discurso, porque realmente não tem aquilo que é necessário: investimento nos professores, na formação, na infraestrutura, infelizmente não tem. E a gente está aqui para ajudar nisso. |
| R | Então, Dorinha, obrigado. A SRA. CLÉO BOHN (Fora do microfone.) - Desculpe, posso falar só uma coisa? O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Sim. A SRA. CLÉO BOHN (Fora do microfone.) - Fora do microfone? O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Pois não. A SRA. CLÉO BOHN (Fora do microfone.) - Eu sou Cléo... (Interrupção do som.) A SRA. CLÉO BOHN (Para expor.) - ... pessoas com síndrome de Down. O colega falou que tem 15 anos que não vê resultados. Nós temos vários, estão nas nossas redes sociais várias pessoas formadas com as mais variadas deficiências e, na síndrome de Down, sim. Então vamos debater recursos, vamos debater a condição das escolas em vez de a gente pensar nos centros. Ninguém é contra centro, gente! Ninguém, de forma nenhuma, mas nós precisamos discutir educação inclusiva, que está na lei e é uma questão de humanidade. E, se a minha filha não vê, que outros possam ver esse resultado. Muito obrigada, Senador. Desculpe. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PSDB - DF) - Vamos promover isso, Dorinha, na Comissão Mista de Orçamento. É muito importante isso. Bem, nada mais havendo a tratar, eu declaro, então, encerrada a presente reunião. Obrigado a todos pela presença. (Iniciada às 14 horas e 05 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 50 minutos.) |

