24/05/2023 - 15ª - Comissão de Assuntos Sociais

Horário

Texto com revisão

R
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Fala da Presidência.) - Boa tarde a todas e a todos, a todos os presentes e a todos que nos acompanham visto que esta audiência é interativa.
Havendo número regimental, declaro aberta a 15ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Assuntos Sociais da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A presente reunião atende ao Requerimento nº 1, de 2023, CAS, de nossa autoria, para a realização de audiência pública destinada a debater o enfrentamento ao câncer de colo de útero.
Informo que a audiência tem cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado, da Rádio Senado e contará com o serviço de interatividade com o cidadão e Ouvidoria, através do telefone 0800 0612211, e do e-Cidadania, por meio do portal www.senado.gov.br/ecidadania, que transmitirá ao vivo a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos expositores via internet.
R
A nossa justificativa para esta reunião se prende muito à situação do Brasil. No Brasil, excluídos os tumores de pele não melanoma, o câncer de útero é o terceiro tipo de câncer mais incidente entre as mulheres, apesar de ser prevenível. Embora seja uma doença de alta mortalidade, com diagnóstico e tratamento simples e de baixo custo, o câncer do colo de útero permanece com alta prevalência.
Nós sabemos que há muito trabalho, que há muitos programas de rastreamento, mas, a despeito dessa situação, os países em desenvolvimento abrigam cerca de 80% dos casos de mortes decorrentes dessa neoplasia. Achamos por bem analisar os dados com especialistas na área e ouvir uma das instituições, ao lado das instituições mais gerais do Ministério da Saúde, que trata essa questão com eficácia, porque nós também não podemos descolar, apartar a situação do câncer de colo de útero de outras situações da população feminina.
O câncer de colo de útero tem relação direta com as condições socioeconômicas da população feminina. O maior índice se dá nos países de média e baixa renda, em termos comparados, pois tem uma característica importante, analisada em todas as regiões do mundo, que é a incidência com relação direta à vulnerabilidade social. Esses estudos realizados em Pernambuco apontam que mulheres brancas têm sobrevida maior do que as mulheres negras.
Nós queremos tratar de todas essas questões com o objetivo de que o Senado possa também se posicionar a partir dos dados que serão aqui apresentados, que, com certeza, nos trarão muita luz.
Então, sem mais delongas, eu chamo para compor a mesa os nossos convidados: Dr. Marcos Vinicius Soares Pedrosa, Diretor do Departamento de Gestão do Cuidado Integral da Secretaria de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde. Estou chamando o Marcos primeiro, ele é o único homem da mesa, para dar uma canchazinha à cota. (Risos.)
É porque eu estou chamando na ordem, estou chamando na ordem de fala.
Dr. Jurema Telles, Médica Oncologista, Coordenadora do Programa Útero é Vida, do Imip, um programa inspirador do nosso Estado de Pernambuco, que a gente deseja que seja conhecido, através desta audiência pelo Senado Federal; Dra. Mariana Seabra, que vai entrar por videoconferência, que é Enfermeira, Coordenadora de Projetos do Grupo de Atenção à Saúde da Mulher do Bloco A; e a nossa querida companheira Rose Santos, Gestora de Política de Saúde da População Negra do Recife.
Agradeço muito a presença de todos e de todas. Acho que a maioria veio especialmente para esta audiência, o que nos alegra muito, e vamos pactuar dez minutos iniciais com uma prorrogação, se necessário, de mais cinco minutos.
R
Temos duas perguntas do e-Cidadania, que posso deixar para depois das exposições. A gente faz uma rodada inicial da exposição de vocês, depois a gente vê se tem alguma pergunta além dessas duas, e aí a gente volta para a finalização, está certo?
Então, pela ordem, nós vamos passar a palavra ao Dr. Marcos Vinicius Soares Pedrosa.
O SR. MARCOS VINICIUS SOARES PEDROSA (Para expor.) - Meu boa-tarde a todos e todas!
A isso eu já estou me acostumando me acostumando, viu, Senadora? Nos espaços da saúde, da gestão, lá no departamento, a gente tem uma presença que... Se, na saúde, já é predominante as mulheres nos espaços de gestão, em um departamento que envolve as questões relacionadas a direitos sexuais e reprodutivos, a presença feminina, em geral, eu sou o único ou um dos únicos homens nos espaços. Mas é muito bom ser minoria assim.
Então, não sei se a gente está, se a equipe já conseguiu a nossa apresentação...
O Departamento de Gestão do Cuidado Integral integra a Secretaria de Atenção Primária à Saúde. Então, é importante colocar que a Secretaria de Atenção Especializada do Ministério possui uma coordenação geral de oncologia, e a nossa perspectiva aqui vai ser trazer a parte que toca na atenção primária à saúde. A gente vai poder falar um pouquinho ao longo. (Pausa.)
A Senadora já trouxe um pouco dos dados, de estimativa, que ele, no mundo, é considerado o quarto câncer mais frequente em mulheres no mundo, com uma estimativa de 604 mil novos casos por ano, e representa cerca de 6,5% de todos os cânceres em mulheres. É importante lembrar que as neoplasias, apesar de a gente dar um nome genérico, cada apresentação, cada tipo, cada perfil vai ser uma doença diferente, e então você vai ter uma pulverização grande na apresentação desses cânceres.
E esse valor corresponde a um risco estimado de 13,3 casos para cada 100 mil mulheres, com faixas de incidência mais elevadas, estimadas, nos países do continente africano.
Além disso, tem esse perfil, como já colocado anteriormente pela Senadora, que tem um destaque também para países em desenvolvimento ou países com maior desigualdade e em situações socioeconômicas mais graves.
A estimativa de incidência e de mortalidade, se a gente for pegar os dados do Inca, a gente tem uma informação de que, para o triênio de 2023-2025, tem uma estimativa de 17.010 casos de câncer, correspondente a um risco estimado de 15 casos para cada 100 mil mulheres. Então, no Brasil significa o terceiro câncer mais frequente quando a gente exclui os tumores de pele, os não melanoma.
E é interessante colocar essa questão da estimativa, que a gente consegue projetar para a frente, porque, diferentemente de outras neoplasias, o câncer de colo do útero é, talvez, a neoplasia que tem o comportamento mais conhecido na sua relação com a infecção pelo HPV e que tem bastante conhecido o seu curso, o seu desenvolvimento, com o passar dos anos. Então, é uma forma de a gente dimensionar essa projeção.
R
Em termos de mortalidade, se a gente pegar os dados de 2020, foram 6.627 óbitos e a taxa de mortalidade bruta é de 6,12 a cada 100 mil mulheres.
Como dito anteriormente, se a gente considerar que é uma doença para a qual a gente possui estratégias estabelecidas de rastreamento, de realização de exames em pessoas assintomáticas, de forma periódica, e que são bem estabelecidos tratamentos precoces pouco invasivos, com taxas de cura elevadas e que se dispõe, ainda, da possibilidade de imunização, a gente olha esse dado com bastante pesar, porque em boa parte são mortes evitáveis. Isso é importante a gente colocar.
Nessas estimativas...Isso é de uma nota técnica que a Saes (Secretaria da Atenção Especializada) publicou - a outra secretaria do Ministério -, com a estimativa para o ano de 2023 de novos casos de câncer por unidade da Federação. Então, lógico que aí tem números absolutos. A gente sabe que os estados vão ter uma quantidade de população diferente, então para a gente ter uma ideia melhor da magnitude, é importante que a gente tenha uma razão para o tamanho da população, mas dá um panorama por estado do que a gente tem já de estimativa para este ano.
Para a gente falar do papel da atenção primária no enfrentamento a esse câncer, acho que a gente pode falar de três questões: 1º) a questão da prevenção, que vai estar tanto relacionada à educação e às práticas de educação no campo da sexualidade, no campo dos direitos sexuais e reprodutivos, para que as pessoas possam ter clareza quanto à importância do uso de métodos de barreira, para que possam se cuidar e exercer a sua sexualidade com cuidado e autonomia; 2º) garantir o acesso da população a esse primeiro contato, a esse exame, que é o Papanicolau, um exame preventivo que é uma forma de detecção precoce ou de diagnóstico precoce e de possibilitar o tratamento, considerando que esse tratamento vai se dar ao longo do que a gente chama de uma linha de cuidado. Em geral, ele é identificado, há um diagnóstico, quando é um caso, por exemplo, de menor gravidade.
Eu vou partir da premissa de que a gente está falando com o público em geral, então eu estou me policiando para evitar os termos mais médicos, mais técnicos, para facilitar o entendimento.
Sempre vamos contar, para que seja efetivo, com outras estruturas de saúde para além das unidades básicas, que são a atenção primária. Então é preciso, para que esse tratamento possa acontecer adequadamente, que a gente possa contar com serviços de média complexidade, que contem com exames de apoio, como a colposcopia, com capacidade de realizar os procedimentos que são localizados nessas cauterizações, que são curativos, podemos dizer assim. E também, para os casos que são identificados de forma avançada, precisamos contar com o restante dessa estrutura de saúde, dessa linha de cuidado, que vão ser os centros de oncologia de maior porte, que vão estar aptos a oferecer outros tipos de procedimento.
Mas é importante ressaltar que como a gente está falando de uma doença que tem uma evolução bem estabelecida de uma década, 15 anos, é uma evolução lenta. Se a gente consegue que as pacientes tenham acesso ao exame periódico, a possibilidade de isso ser identificado num quadro ainda precoce, em que o tratamento vai ser menos invasivo, é alta, se a gente conseguir dar acesso às pessoas.
R
Então, quando a gente está falando da prevenção, além do que a gente já colocou, o tema da educação, da conscientização em relação à importância que essa doença tem na mortalidade e para a saúde das mulheres, também na identificação de fatores de risco e na oferta de imunização. A gente sabe que a imunização para o HPV é uma das vacinas que conta com o que a gente chama de hesitação vacinal, ou seja, uma recusa, um adiamento da decisão de oferecer a vacina ou de se tomar a vacina, relacionado ou a medos ou a concepções que são equivocadas.
Por exemplo, imaginar que é uma vacina que vai prevenir a infecção pelo HPV, e que também vai reduzir a incidência, por exemplo, de verrugas genitais. Estes não produzem morte, mas produzem grande desconforto e custo para o serviço de saúde para que esse cuidado aconteça. Então, é importante ressaltar que oferecer essa proteção na faixa etária que é sugerida, que é recomendada pelo Ministério da Saúde, se trata de proteger e não se pode confundir isso com o estímulo à prática sexual precoce.
A gente no ministério, no nosso departamento, quando a gente tem falado de gravidez entre jovens, a gente tem deixado de forma muito clara inclusive a separação, quando a gente analisa os dados, das meninas acima de 15 anos, 15 a 19 anos, e as meninas entre 10 e 14 anos, que sempre vão ser resultado de um crime: sempre vai ser resultado de violência, de estupro de incapaz, estupro de vulnerável, que a lei define como um crime. Então, é importante que a gente possa falar abertamente sobre isso.
Há a possibilidade de garantir a proteção antes do início da vida sexual, que é fundamental para que a imunização ofereça a melhor proteção possível.
A detecção precoce se dá a partir do que a gente chama de rastreamento, que consiste basicamente hoje na oferta periódica do exame preventivo, o citopatológico de câncer de colo de útero, também chamado de Papanicolau, e que é oferecido para as mulheres a partir de 25 anos, conforme a recomendação do Inca. E com uma periodicidade que também é definida nos documentos do Ministério da Saúde. Esse acesso é importante que seja garantido na atenção primária. E aí, a gente já tem um primeiro desafio. Aliás, mais um desafio, que é a ampliação da nossa cobertura, da nossa rede de serviços de atenção primária nas Unidades Básicas de Saúde.
Hoje as equipes de saúde da família vão ter uma cobertura em torno de 60% e uma população cadastrada, que vai passar de 100 milhões de habitantes. Isso ainda é pouco para um sistema de saúde que se define como universal na nossa Carta constitucional.
Então, para que a gente possa garantir essa proteção adequadamente, a gente precisa ampliar essa rede de serviços. E é incontornável debater o financiamento da saúde, o arranjo dessas equipes e inclusive o dimensionamento dessas equipes, que hoje têm a responsabilidade de cuidar de uma população que não é só feminina, é a população em geral, recomendada pela Política Nacional de Atenção Básica como em torno de 3,5 mil pessoas por equipe, mas que não é difícil encontrar equipes com mais do que isso.
E é um desafio para uma equipe que consiste em um médico ou uma médica, um enfermeiro ou uma enfermeira, um técnico de enfermagem e agentes de saúde garantir a oferta de todos os cuidados para todos os segmentos do curso de vida - crianças, adultos, idosos, homens e mulheres -, com toda a complexidade que, hoje, a saúde demanda que essas equipes trabalhem.
R
É importante colocar que a própria expectativa da sociedade em relação à resposta que o SUS deve dar tem se alargado com o tempo. Então, se eu imaginar o que se esperava que uma equipe de saúde da família resolvesse, no seu próprio local de trabalho, 15 anos atrás, é bem menos do que, hoje, se tem por expectativa que essas equipes resolvam.
Hoje, uma equipe com boa resolutividade, bem formada, a gente espera que ela inclua, por exemplo, procedimentos como inserção de dispositivo intrauterino, realização de pequenos procedimentos cirúrgicos, como pequenas suturas, retirada de sinais ou nevos, cantoplastia, que é o procedimento que trata unha encravada... Isso em uma visão de um cuidado integral e resolutivo na atenção primária, para garantir que esse cuidado aconteça perto da casa do cidadão e da cidadã e que eles não tenham que se deslocar sempre para um outro serviço e lidar com barreiras de acesso, de deslocamento para garantir o seu atendimento e que seu problema seja resolvido.
E quero frisar, como coloquei anteriormente, que o tratamento precoce, ou seja, ofertar o rastreamento e garantir que esse resultado chegue em tempo oportuno, chegue às mãos da equipe, às mãos do paciente, que as condutas sejam tomadas em tempo oportuno, é algo que aumenta as chances de cura.
As diretrizes brasileiras possuem, hoje, dois documentos base na atenção primária: o Sumário Executivo para a Atenção Básica, e as Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento do Câncer do Colo do Útero. Elas vêm se desenvolvendo ao longo do tempo, desde os anos 80. Nos anos 90, vamos ter o programa Viva Mulher, em 1996, e é uma prioridade, dentro da agenda de saúde do país e integra o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas e Agravos não Transmissíveis para a década 2021/2030.
É importante colocar que o SUS, além de universal, também se define como um sistema de saúde que garante cuidado integral, ou seja, ele tem um rol de procedimentos, uma abrangência de procedimentos que deve dar respostas a todas as necessidades de saúde, das mais simples às mais complexas, das mais imediatas às mais estruturantes, do ponto de vista de pensar o longo prazo. E é preconizada, no caso da oferta do diagnóstico e tratamento de todos os tipos de câncer, especificamente do câncer de colo de útero, essa estratégia do diagnóstico precoce, incluindo uma ampla divulgação para conscientização em relação aos sinais de alerta, tanto para a população quanto para os profissionais de saúde, para que a gente possa garantir acesso imediato aos procedimentos de diagnóstico dos casos suspeitos e acesso aos tratamentos adequados e de forma oportuna.
Aqui, nos eslaides, estão os resumos. Eles vão ficar disponíveis para registro dos trabalhos...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS VINICIUS SOARES PEDROSA (Para expor.) - ... da Comissão, mas reúnem as portarias do Ministério da Saúde que vão regulamentar a área, algumas relacionadas à atenção primária, outras à atenção especializada.
Existe, por exemplo, dentro da atenção especializada, atualmente, toda uma preocupação em relação à qualidade do teste de Papanicolau. Há programas relacionados a isso. Infelizmente, por ser algo mais específico de outra secretaria, eu não vou conseguir dar detalhes, mas eu sei que é algo que é uma preocupação da Secretaria de Atenção Especializada à Saúde, e, nessa perspectiva de estar aqui como Ministério da Saúde, é importante trazer também o que a outra secretaria está pensando.
R
Então, acho que é basicamente isto: temos esse desafio da imunização, da ampliação do acesso às equipes de saúde da família; tivemos, nesta semana, alguns lançamentos importantes para a atenção primária e para o SUS; foi lançado, no último domingo, o edital do Programa Mais Médicos, que tem como um dos objetivos fazer com que a gente saia de 13 mil para 28 mil médicos nas equipes de saúde da família, relacionados ao programa. E a gente espera que isso possa se somar a outras equipes.
Lembro que o Programa Mais Médicos tem um corte que prioriza municípios com maior vulnerabilidade, onde justamente vão estar essas mulheres que vão ter mais dificuldades em acessar os serviços de saúde; as periferias, os grandes centros urbanos, os pequenos municípios do interior do país, que são a imensa maioria dos municípios brasileiros - sempre é importante frisar isso -; e também os territórios, os distritos sanitários indígenas, que são áreas importantes que estão dentro do escopo do programa.
Então, é isso.
Agradeço o convite. Fico à disposição para maiores questionamentos.
Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Obrigada, Dr. Marcos.
A gente está funcionando com tempo corrido. Quando os dez minutos iniciarem e não derem, automaticamente a gente passa para os cinco complementares.
Então, vamos passar a palavra, agora, à Dra. Jurema Telles, médica oncologista, coordenadora do Programa Útero é Vida, do Imip, que é o Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira, localizado no Estado de Pernambuco.
A Dra. Jurema também pertence à Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco.
A SRA. JUREMA TELLES DE OLIVEIRA LIMA (Para expor.) - Boa tarde.
Gostaria de agradecer este espaço, em nome de toda equipe. Eu estou aqui com a Dra. Letícia Katz, nossa coordenadora técnica, nosso guia da citopatologia e desse cuidado com as mulheres e cuidadora deste programa, que é uma política, Útero é Vida.
Registro que o Dr. Mozart já coordenou esse projeto. A gente está dando continuidade, com toda a equipe, que é grande, porque o esforço precisa não só de nós, mas de nós todos e mais todos os setores, porque são mortes e sofrimento evitáveis.
Eu digo que não tenho conflito de interesse, mas tenho todos os conflitos de interesse como mulher, como profissional de saúde, como cidadã.
A cada dois minutos, morre uma mulher no mundo; a cada dia morrem 20 brasileiras de uma doença que é 95%, 99% evitável com o conhecimento e com os recursos que a gente tem disponíveis no SUS: a vacina e o exame preventivo feito de forma adequada e correta.
R
Câncer, hoje, é um grande problema no mundo todo, mas não é mais luxo e nem um problema só de países de primeiro mundo, que vivem hoje uma diminuição de incidência e mortalidade, enquanto países como o nosso vão ter 75% dos casos, 70% das mortes, e um aumento de 50 a 75% nos próximos dez, vinte anos. Então a gente precisa estar conversando sobre isso, evitando o que seja evitável e prevenindo o que seja prevenível para poder aguentar um aumento tão grande, ainda mais impactado pós-pandemia.
Se vidas não importam, às vezes recursos também entram no jogo. Para cada um real ou um dólar... Com R$1 bilhão que a gente gaste em prevenção, a gente está salvando cem bilhões, então é muito mais barato prevenir. Tem situações em que isso não é possível, mas, no caso do câncer de colo de útero, é, e o mundo já provou: países que fizeram isso de forma organizada já estão colhendo os frutos.
Então, como foi dito, é o quarto no mundo e vem tendo uma concentração nos países de baixo e médio desenvolvimento, como o nosso. No país ele está em quarto, mas, se você for para o Nordeste, verá que ele está em terceiro e, em alguns estados, chega a ser o primeiro mais frequente em mulheres, mostrando essa iniquidade e essa diversidade no próprio país.
Em Pernambuco, a gente tem uma dor que fez o caminhar, fora o dia a dia de a gente ter às vezes metade da enfermaria ocupada por essas mulheres com câncer de colo de útero, correspondendo a 40% dos atendimentos emergenciais de um hospital de câncer. Em Pernambuco, esses casos eram três vezes mais frequentes do que feminicídio, que é outra chaga que deve ser também prevenida.
Diante desse montante, pensando em morte evitável, a gente pensou que era muito importante a gente conversar e juntar forças porque, num trabalho que a gente fez no Imip Hospital do Câncer, que atende 75% das mulheres, vimos que 60% das mulheres nunca tinham feito ou fazia mais de 5 anos que não faziam um preventivo. Não é que fosse bom ou era ruim, não fizeram. Aí, 84% das mulheres em Pernambuco chegam com a doença em estágio 3, 4, inoperável. Em 2022, havia 50 mil mulheres sendo atendidas pelo SUS devido a câncer de colo de útero, e 19 mil mulheres chegaram a ser internadas por câncer de colo de útero.
Não funcionou... Mas a imagem era para mostrar que a taxa do Brasil é maior do que a do mundo; a taxa do Nordeste é maior do que a do Brasil; a de Pernambuco é maior do que a do Nordeste. Se a gente for para o Norte, essa realidade é muito parecida. E se a gente imaginar que na pandemia a gente teve metade das admissões, 50 a 52% do número de preventivos realizados em 2020/2022, o nosso desafio, que já era enorme, ficou ainda maior e precisando de proatividade.
A gente está falando de pessoas, mas a gente está falando muito de iniquidade, de uma doença que está realmente associada à vulnerabilidade. A gente vai conversar um pouquinho mais sobre isso, mas se trata da perda de oportunidades evitável e de recursos, recursos humanos. A gente aumentou... Tem um trabalho do TCU que mostrou que os gastos em oncologia, em quimioterapia e radioterapia aumentaram 143%, mas nós não diminuímos mortalidade. Então, não basta só gastar; a gente precisa gastar bem, gastar direito.
R
Eu queria não estar aqui. Mas, falando com o Eugênio Vilaça, eu disse que é uma coisa que tem que ser resolvida na prevenção, no preventivo. E ele falou: "Mas temos que juntar a força e contar essa história e juntar, porque não adianta só os recursos, a gente precisa gastar bem esses recursos".
Essas são as metas para a Europa, que tem a sua iniquidade também. Mas eles têm uma meta que se diz que é 70/35. Eles querem que, em 2035, 70% das pessoas que venham a ter câncer vivam mais de dez anos.
Qual é a nossa meta? Temos que ter uma meta para chegar. E se a gente vir as dez coisas que eles escolheram, fala muito com o que a gente pensou em Pernambuco, e com que o rastreamento organizado fala.
Está ali um quadradinho: HPV, é o segundo, HPV-Ação. Vamos evitar o que pode ser evitado, vamos eliminar o que possa ser eliminado para gente poder tratar as coisas que vem com o envelhecimento, com as doenças crônicas. Então, ter uma ação proativa de prevenção, ter uma política de saúde, ter um cuidado de mais qualidade, ter pesquisa, começar a usar a saúde digital, olhar para o profissional.
Eu estava lendo um trabalho, uma série nos Estados Unidos. Eles descobriram na pandemia que determinantes sociais e saúde primária... Existem e são a solução do mundo, mas a saúde primária pode ser destruída por tanta coisa administrativa e tão pouco apoio para poder fazer o que ela precisa fazer de forma organizada. E eles enxergaram a iniquidade, eles viram que, naquele bairro, realmente a saúde dos negros afro-americanos era diferente, e eles morreram desproporcionalmente. Botou-se uma lupa, e isso tem mostrado uma necessidade...
O impacto do covid...Tem ali a Ucrânia. Não sei se vocês sabem, a gente está sem iodo para fazer tomografia e estadiar esses pacientes. Está a maior dificuldade para fazer tomografia: há um ano que a gente não consegue, há um ano que a gente não tem BCG. Então, essa pandemia afetou de várias formas.
E a iniquidade, como a gente falou, a cobertura e a mortalidade. A menor cobertura do citopatológico - a gente não bate a meta com a citologia -, também proporcional, conversa com a maior mortalidade: onde tem menor cobertura, tem menor mortalidade.
E o estadiamento - como eu falei, 84% são em estados avançados - conversa com mortalidade. Então, essas mulheres chegam com muito mais chance de precisar de tratamentos mais agressivos, mais caros e menos eficientes. E essa proporção... Hoje, o nosso resultado de sobreviver cinco anos - longe daquela meta dos 70 - é a metade da dos países de primeiro mundo.
Isso quer dizer - eu vejo com otimismo - que é possível dobrá-la, é possível alcançá-la, não é meta ineficiente. Mas aí ele também mostra como se gasta pouco em pesquisa, como se gasta pouco em pesquisa de câncer de colo de útero, como se gasta pouco em pesquisa de prevenção.
E, falando em pesquisa, a gente também precisa resgatar, na pandemia, essa importância da ciência, da evidência científica e de fazer a coisa com mais qualidade. Ele coloca que essa é uma série que de 23 trabalhos. Um grupo europeu de pesquisa fala de salvar 27 milhões de anos de vida, com 23 trabalhos em 10 anos. Falando mais de iniquidades, num registro de câncer do Brasil tem 108 mil óbitos por câncer na década de 2010. Está errado ali, de 2010 a 2020. Quando a gente vai olhando e botando a lupa para a população, a gente fala: "Não, a gente é toda misturada. Não tem isso". Mas a gente vê que a chance de morrer é maior realmente para a população negra, comparada com a branca. E a que mais cresceu nessa década foi a dos índios, que chega a ser três vezes maior, aumentou 82% numa década a chance de uma indígena morrer por câncer de colo de útero. Então, enxergar a iniquidade e a vulnerabilidade é dar mais proteção.
R
E, nessa questão do programa Útero é Vida, que é bem desenhado - com o Dr. Mozart, a Dra. Letícia e toda uma equipe -, ele traz aqui a importância de deixar de fazer o rastreio oportunístico, que é o que a gente faz: se a paciente aparecer, a gente colhe; se ela se interessar, a gente faz até várias vezes. Porque é outro problema que a gente tem: a gente não tem o número de mulheres, a gente tem o número de exames. Mas quem adoece é quem não foi. Aqui é não aderente. Então, o programa Útero é Vida se baseia no rastreio organizado, que é garantir a cobertura para 70% da população e, com base num território, chamando, oportunizando, conversando, criando formas. Está previsto fazer 10%, 20% de autocoleta, conversar com aquele território sobre qual oportunidade de fazer. A gente conversou com as pacientes que adoeceram. A unanimidade foi que nem os maridos, nem o mundo do trabalho facilitava a pessoa a fazer a prevenção.
Acho que tem um outro eslaide - não é, Letícia? - que mostra que teve gente que foi 14 vezes para conseguir fazer o preventivo na unidade da família e pegar o resultado. Isso é realmente incompatível com o mundo do trabalho. E as que adoeceram, 86% não voltaram para o mundo do trabalho, com uma média mesmo de 50 anos essas mulheres.
Então, com essa realidade, aqui as 14 vezes em que foi, a baixa cobertura, o exame que está no descrédito, porque às vezes passam seis meses e esse resultado não chega às mãos da paciente - e, quando chega, é insatisfatório. Isso faz com que venha um sofrimento a mais e uma não percepção da proteção que aquele exame... O exame papanicolau é um exame bom, salvou muitas vidas. A gente vê dentro do bairro, dentro da cidade diferenças entre o sistema suplementar e o sistema público, no que diz respeito à questão da educação. A gente vê que isso realmente é uma doença associada à vulnerabilidade, e enxergar a vulnerabilidade é proteger e tentar fazer o melhor.
Isso era a linha de cuidados que sumiu, a linha de tudo que foi feito desde 2019, toda a linha de ir para o território, ouvir as mulheres, ouvir as mulheres que adoeceram, a que percorreu todo o percurso, fazer...
A OMS coloca para não fazer um rastreio organizado, não diagnosticar o que você não pode tratar. A Dra. Letícia se preocupou em adquirir o CAF, treinar o ginecologista, porque tinha vários lugares em que não tinha como tratar essas lesões precursoras. O Dr. Marcos falou que passa 10 anos - de 8 a 10 anos - de uma doença inflamatória até virar um câncer. Então, nós temos 10 anos para ter uma chance de não deixar que essa mulher tenha câncer. Em todo esse caminho e esse desenho, a pandemia trouxe oportunidades, fora a dificuldade. Começamos a fazer exame de PCR neste país. Não tínhamos nem máquina nem pessoas. O que é que nós vamos fazer com essas máquinas adquiridas de teste de PCR? Vamos fazer teste de colo de útero. O exame ficou mais barato. Essas máquinas de alto volume conseguem fazer até 6 mil - tem partes da Fiocruz em que conseguem fazer 30 mil, não é?
R
(Soa a campainha.)
A SRA. JUREMA TELLES DE OLIVEIRA LIMA - Então, essa oportunidade é que fez com que o ministério lançasse, junto com o programa da fome, com tudo a ver, esse programa de eliminação do câncer de colo de útero, começando em Pernambuco, com uma primeira fase de fazer, sim, um rastreio organizado, em 400 mil mulheres, para a gente tentar, em 5 anos, chegar a essa cobertura de 70%.
Mas não é só o teste, é ter um sistema de informação que acompanhe a mulher para o próximo passo, para a gente não perder, para a gente... Essas que são HPV de alto risco positivas, a gente está vigiando mais de perto. Treinar as pessoas, capacitar, sensibilizar - a gente escutou que, na sobrecarga de fazer tudo, às vezes é uma tarde só que se tem para fazer prevenção, porque tem coisas que são mais cobradas e mais importantes dentro desse cuidado, mas a gente sabe que se precisa mudar também o processo de trabalho. E essa questão de, também, fortalecer a capacidade do nosso país de produzir testes e produzir tecnologia para resolver seus reais problemas de saúde.
Então, tem a linha de tempo que foi parar aí. Muito trabalho aí no meio e, realmente, é preciso todo um... Para ser um rastreio organizado, a gente precisa ter governança, precisa ter financiamento, precisa ter comprometimento e precisa...
E a meta, que é a meta do OMS - a que a gente está aderindo - é 90% das meninas vacinadas. Para se ter uma ideia de como é importante fazer a educação: em Pernambuco, faz três meses que se está vacinando na escola; em três meses, ele já vacinou três vezes mais do que no ano de 2019. Onde se conseguiu bater essa meta, a vacina era oferecida para essas crianças e adolescentes na escola, com 90% tendo acesso das lesões - a gente não pode deixar de tratar as pessoas que estão adoecendo - e 70% fazendo um exame de alta tecnologia, como esse teste do HPV.
É o cuidado de toda a linha de cuidado, precisamos de todo mundo. Isso são as questões. Antes era Recife e região metropolitana, agora é todo o Pernambuco, como a primeira etapa de a gente conseguir aprender rápido, errar rápido, para isso realmente ser disponibilizado para o Brasil todo.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigada, Dra. Jurema.
A gente partiu da atenção básica - a quem chegou agora -, a gente já ouviu o Diretor do Departamento de Gestão de Cuidado Integral, do Ministério da Saúde, para a experiência vivenciada no Imip, Útero é Vida.
Registro a presença do Dr. Mozart Sales, hoje assessor da Secretaria de Relações Institucionais; do Senador Rogério Carvalho, Primeiro-Secretário da Mesa Diretora; e do Senador Humberto Costa, que é, inclusive, o Presidente desta Comissão.
R
Agora, nós vamos passar a palavra para a Dra. Mariana Seabra, que vai falar por videoconferência. Mariana Seabra é Enfermeira e Coordenadora de Projetos do grupo de Atenção à Saúde da Mulher. Vamos conectá-la.
A SRA. MARIANA SEABRA (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde a todas e todos!
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Boa tarde!
A SRA. MARIANA SEABRA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada pela oportunidade.
Queria parabenizá-los por esse tema trazido para o Senado, pela sua importância, e parabenizá-los, na pessoa da Senadora Teresa Leitão, porque, finalmente, estamos conseguindo avançar nesse tema, que é um problema na saúde das mulheres.
Hoje, eu estou coordenadora de uma ONG que trabalha com direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, mas já estive, durante quatro anos, à frente da Coordenação da Política de Saúde da Mulher, no Recife, onde pude acompanhar o projeto-piloto Útero é Vida. Então, parabenizo a equipe da Opas e do Estado de Pernambuco, que conduziram esse trabalho junto com a Secretaria de Saúde do Recife.
Acredito muito, já antecipando um pouco a minha fala, na potência da reversão do modelo de atenção a essas mulheres através do programa Útero é Vida. A gente defende, enquanto organizações da sociedade civil, que a gente consiga garantir a melhor forma de prevenção do câncer de colo de útero e tratamento para aquelas mulheres que já foram acometidas. O programa Útero é Vida contempla essa integralidade do cuidado e direciona esforços para que a gente consiga reverter o que a gente está vivendo hoje.
O nosso desafio é imenso. Nós precisamos - segundo as metas da Organização Mundial de Saúde e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável -, até 2030, reverter, em um quarto, o número de casos de câncer de colo de útero no Brasil. Então, nós temos um grande desafio, e a pandemia não colaborou com esse período, afinal de contas a gente teve baixa realização de exames, aumento do número de casos de câncer de colo do útero e, por consequência, um maior número de mulheres precisando desse tratamento.
Eu queria dizer que o jeito que a gente trabalha o rastreio, no Brasil, hoje, é considerado defasado, ou seja, essa noção do rastreio oportunístico, como a Dra. Jurema já trouxe, em que as mulheres vão à unidade de saúde quando podem e, muitas vezes, não podem... Aquelas que se disponibilizam a ir são aquelas que, durante uma consulta de atendimento com a enfermeira, muitas vezes, tem a sua coleta realizada. Então, o que a gente tem é a maior parte das mulheres, que já realizam os exames periodicamente, fazendo novamente a citologia.
As campanhas, por exemplo, como o Outubro Rosa, muitas vezes não contribuem para aquelas que a gente, realmente, precisa atingir, aquelas que nunca fizeram citologia ou aquelas que, há muito tempo, não fazem citologia. Queremos que elas realmente façam, porque, afinal de contas, a gente sabe que tem o chamado "sobre-rastreio", no Outubro Rosa. Então, nós temos um número elevado de mulheres que já fazem aquele exame e não precisariam fazê-lo novamente. Isso acontece também com o rastreio do câncer de mama, só que, no caso do câncer de mama, você tem uma exposição ao raio-X indevida. No caso da citologia, você não tem uma exposição ao raio-X, mas você tem um desconforto e uma situação não necessária, um gasto de insumo não necessário, até achando alterações que vão dar seguimento e gerar heterogenia sem necessidade.
R
Então, o que a gente tem no Brasil: nós nunca, nos últimos 10 anos, atingimos a meta de rastreio. Isso é muito sério; ou seja, é uma política que nunca funcionou, porque, se você nunca consegue atingir mais de 80% das mulheres realizando rastreio, você não consegue atingir aquelas mulheres que precisam, então, evitar o desenvolvimento de uma lesão de alto grau ou, ao perceber que existe uma lesão de alto grau, tratar de forma oportuna. Então, o que a gente tem é que 80% das mulheres que têm lesão de alto grau, que são as mulheres que necessitam de intervenção, pois são lesões pré-cancerígenas ou muitas vezes lesões já cancerígenas, são dessas que 80% não participaram do rastreio, ou seja, essa política que a gente tem hoje de rastreio oportunístico não funciona.
Então, o que a gente defende, o que o Televida, inclusive, defende é a necessidade de um rastreio organizado. O que é um rastreio organizado? Não é eu, enquanto enfermeira, estar na unidade de saúde, aguardando um dia, fazendo uma campanha, e um dia vem uma mulher, faz a citologia, ou quando eu estiver durante uma consulta ginecológica, durante uma consulta de atenção à saúde da mulher, eu vou ofertar esse exame. Não é dessa forma que a gente vai reverter esse modelo. A gente precisa, então, que o rastreio se dê de forma organizada. O que é rastreio organizado? É quando eu sei quem é a população que necessita do exame, ou seja, mulheres na faixa etária de 25 a 64 anos - e quiçá a gente consiga diminuir essa faixa etária quando a gente implementar o teste de HPV para 30 a 60 anos, como alguns países, como Austrália, Holanda, enfim, já conseguiram fazer, e é assim que eles fazem. A Holanda, inclusive, é um país que conseguiu reverter esse cenário com a migração do programa para o teste de HPV e para o rastreio organizado, porque as coisas andam juntas. Então, é preciso que você tenha como saber quem são as mulheres que precisam realizar o exame e convocá-las para realizar o exame; convocá-las no melhor sentido, no sentido de dizer que aquilo ali é uma oferta do sistema de saúde para você fazer esse rastreio.
Mas, antes de eu continuar falando de rastreio, eu queria também frisar muito a importância da vacina do HPV, porque, afinal de contas, é uma das vacinas mais caras que a gente tem, que o SUS comprou em 2014 e conseguiu incorporar no seu calendário vacinal, e é a única vacina que nós temos que previne câncer, então é quase um contrassenso nós termos uma baixa cobertura vacinal. A gente também não tem a cobertura vacinal necessária para, nos próximos anos, a gente erradicar, por exemplo, a circulação do HPV. Então, a gente também precisa incidir na promoção dessa vacina. E como é que a gente rompe a barreira, que o Dr. Marcos trouxe, da hesitação vacinal? O que é, o que significa essa hesitação vacinal? Por que é que nós temos uma vacina que previne contra o câncer e nós não temos as meninas adolescentes e os meninos adolescentes tomando essa vacina? Nós temos uma sensação "fantasmagórica" - a gente vai utilizar esse conceito na população - de que a vacina induz ou promove a iniciação sexual precoce, o que é uma falácia, porque, na verdade, é óbvio que a vacina do HPV pretende prevenir de uma lesão futura quando for iniciar a vida sexual, porque, afinal de contas, o HPV, sim, é um vírus que se passa por via sexual. Mas isso não quer dizer que a vacina vai promover essa iniciação, e isso a gente precisa desconstruir. Além disso, existe também uma falácia, assim como existe para outras vacinas, de que há um chip na vacina. Enfim, há uma série de tabus e crenças que precisam ser desmistificados, o que só pode ser feito através de campanhas de promoção dessa vacinação, em especial nas escolas.
R
Queria dizer que a gente teve um desmonte nos últimos anos - nos últimos quatro anos, especialmente -, do Programa Saúde na Escola, que a Senadora Teresa, com certeza, conhece pela sua grande atuação na área da educação, mas que é um tema extremamente relevante, porque, afinal de contas, esse programa era o programa que unia a educação e a saúde, a educação na escola e a unidade de saúde na escola, ou seja, são várias interfaces extremamente necessárias para que a gente possa mobilizar os estudantes para tomarem essa vacina e, claro, dialogar com a comunidade em torno dessa escola.
Então, é muito necessário que nós avancemos em termos de campanhas, em termos de resgate da promoção dos direitos sexuais reprodutivos, dentro do Programa Saúde na Escola e de outros programas interseccionais, como o Saúde do Adolescente, a Caderneta do Adolescente, etc., e também campanhas a nível nacional que façam esse debate, o debate de símbolos, o debate que consegue romper a barreira do mito - você consegue, então, colocar ali de fato o que é a informação de verdade e o que precisa chegar à população.
Então, voltando para os desafios de que eu estava falando, do rastreio, de como ele se dá hoje, eu também queria dizer que a gente tem - além de um baixo rastreio dessa população - um problema no segmento. Uma vez que você tem uma mulher com lesão de alto grau, muitas vezes há um desconhecimento das diretrizes por parte das equipes, o que impossibilita que as mulheres avancem nos níveis secundários e terciários, ou que, muitas vezes, ao invés de a mulher seguir para um ambiente ambulatorial em que ela poderia realizar o tratamento, ela acaba indo para um hospital quaternário, um hospital que deveria estar tratando, fazendo quimioterapia, radioterapia, etc., quando aquela mulher, na verdade, precisa de uma colposcopia ou precisa de um tratamento, uma exérese de zona de transição - o CAF, como é falado.
Então, a gente tem uma reversão de modelo e um hiato entre o rastreio e o tratamento quimioterápico, então você precisa ter uma rede que, de fato, dialogue com esses níveis de cuidado e que se responsabilize pelo seu ponto de atenção, pelo seu nível de cuidado. E, na verdade, o que a gente encontra hoje são diferentes estratégias em cada estado, mas muitas vezes desarticuladas.
R
A gente teve uma experiência em Recife, inclusive, que conseguiu fazer um grande avanço, tornando dois centros de referência, onde a gente conseguiu, com o Programa Útero é Vida, fazer o que hoje é mais recomendado, que o Dr. Mozart tanto fala, que é o ver e tratar.
Então, você tem ali, já no nível de atenção da média complexidade e alta complexidade, porque no caso, o ambulatório era dentro de um hospital que tinha condições de fazer o tratamento, então você tinha o resultado da lesão de alto grau, ou seja, só as mulheres que têm resultado com lesão de alto grau vão para esse serviço - não todas -, fazem a colposcopia e ali mesmo já começa o tratamento. Nesse aspecto, nem vai necessitar dos serviços dos hospitais quaternários, porque você vai conseguir incidir naquela lesão no momento em que ela ainda é pré-cancerígena, ela ainda não é cancerígena.
Então é necessária a articulação entre os pontos de atenção, e nisso nós temos algumas dificuldades; uma delas é o próprio Siscan, que é o Sistema de Informação, em que você não o tem integrado com a atenção básica e a gente também não tem uma informatização da atenção hospitalar e ambulatorial no Brasil, e precisamos avançar para que isso ocorra. O sistema do Siscan também precisa avançar na sua qualidade para que a gente consiga minimizar a burocracia do cotidiano dos profissionais e consiga emitir alertas para aqueles profissionais para que sinalizem quando as mulheres realmente precisarem de alguma intervenção. Seja a atenção básica, alertando quando é que está na hora de realizar o exame, seja na média complexidade, integrando os resultados dos exames com a necessidade do tratamento, ou seja na necessidade do seguimento, uma vez que a mulher fez o tratamento, ela precisa voltar para a atenção básica e continuar fazendo a sua citologia ou o teste de HPV de rotina. Então é necessário a integração dos sistemas e que esses sistemas tenham mais robustez e extingam a burocracia atrelada ao processo de trabalho. O processo de trabalho é fundamental, mas ele se constitui como uma barreira real e que precisa ser enfrentada para a gente conseguir reduzir.
Outro aspecto importante, do porquê que a gente não consegue reduzir, é a baixa qualidade laboratorial. Dos 27 estados, apenas 10 estados conseguiram atingir níveis de qualidade aceitáveis nos seus laboratórios. Então, mesmo que implante o Útero é Vida, a gente vai precisar trabalhar a qualidade diagnóstica. Claro que a metodologia do Útero é Vida é totalmente diferente, você faz o teste de HPV e a leitura não é humana, a leitura do exame é feita numa máquina, mas você ainda assim vai precisar de resultados de citologia caso você tenha uma lesão alterada para confirmar. Então você ainda assim vai precisar desses laboratórios e o que a gente tem hoje são vários estados que têm o seu laboratório central, mas vários estados não têm e acabam os municípios contratualizando com laboratórios menores e com laboratórios, muitas vezes, de qualidade duvidosa. Então é necessário fazer uma gestão desses laboratórios e nesse processo apoiando os municípios para que eles consigam contratualizar ou fazer algum tipo de gestão que garanta a qualidade.
Oi? Eu não escutei.
R
Bom, eu vou finalizar, então. Estou entendendo que foi um alerta para finalizar.
Então, uma série de desafios mais está colocada, mas para dizer um pouco dos horizontes.
Eu realmente acredito que o teste de HPV possa ser o futuro do Brasil, a política futura para o Brasil, e isso também empodera as mulheres, uma vez que você consegue que elas possam realizar a autocoleta, que é uma coleta muito menos invasiva do que um exame especular, do que um espéculo, e também por conta de o resultado vir com menor tempo possível. Isso é muito importante para a credibilidade também daquele exame, e não levar as mulheres para o setor privado e fazer citologia, por exemplo.
Também, como eu disse, a informatização é muito importante, a integração entre os níveis de atenção, o controle do estado sobre os centros diagnósticos, o ver e tratar o diagnóstico da lesão integrado com o local de tratamento, uma forte coordenação da política nacional e alinhamento das diretrizes com os profissionais e o convencimento da população, além de outras estratégias que a gente deve beber da fonte, como outros países fizeram, como uma figura da navegação do cuidado; ou seja, você ter uma figura que consiga acompanhar essa mulher que tenha uma lesão de alto grau ou que já tenha um câncer e que consiga fazer a gestão desse cuidado costurado entre os níveis de atenção, sem deixá-la percorrer a rede enfrentando inúmeras barreiras de acesso. Você destacá-las. Vão ser poucas mulheres que vão ter essa necessidade, mas, quando você tem uma desorganização da rede, o número dessas mulheres aumenta, mas, se você consegue fazer um rastreio organizado, você tem o menor número de mulheres e consegue fazer a gestão, então, desse cuidado, a navegação desse cuidado de forma organizada.
Então, eu queria agradecer a oportunidade da fala e dizer que nós, enquanto organização social, a ONG Bloco A, estamos à disposição também para contribuir para esse debate público e para avançar na melhoria do cuidado da saúde das mulheres.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Somos nós que agradecemos, Dra. Mariana Seabra.
Nós temos ainda Rose Santos e, depois, passaremos para as perguntas do e-Cidadania e para alguém que queira também se posicionar.
Então, eu vou passar agora para Rose Santos, que é Gestora de Política de Saúde da Mulher Negra, no Município do Recife.
A SRA. ROSE SANTOS (Para expor.) - Boa tarde a todas, todos e "todes".
Então, eu sou Rose Santos.
Eu queria começar aqui a minha participação, a minha contribuição agradecendo a toda a minha ancestralidade, que está aqui presente comigo, de mulheres negras, da população negra. Aqui eu falo em nome de toda uma coletividade, que eu estou representando, e dedico a fala desta tarde a uma companheira sanitarista, profissional de saúde, uma das grandes referências em saúde da mulher negra, que é a Sony Santos.
Eu queria também agradecer o convite da Senadora Teresa Leitão, desta Casa e de toda a assessoria e já os parabenizar por a gente também estar trazendo essa temática e pensar também num processo de iniquidades raciais a partir desse dado, desse indicador.
R
E aí minha participação aqui, enquanto mulher negra, enquanto ativista, enquanto profissional de saúde e gestora, é justamente para trazer algumas reflexões e algumas provocações a partir do que a gente tem do cenário do câncer do colo uterino no Brasil.
Então, a Dra. Jurema e o Dr. Marcos trouxeram um cenário... O Dr. Marcos, mostrando a rede dentro do Ministério da Saúde, o que a gente tem dos processos do acesso, a importância de a gente reconhecer as políticas públicas de saúde no cenário do Sistema Único de Saúde. A Dra. Jurema trouxe um panorama da sua pesquisa do Útero é Vida, do projeto que, lá em Pernambuco, se deu de forma muito intensa. Inclusive, no Município do Recife, eu, enquanto gestora, participei de alguns momentos em algumas unidades de saúde, em alguns territórios. A importância de a gente ampliar esse rastreamento, a linha de cuidado, o diagnóstico precoce, e a importância dessa ampliação de oferta...
Mas quando a gente vai fazer uma análise da nossa sociedade brasileira, quando a gente olha para Recife, para Pernambuco, uma população em sua maioria negra autodeclarada, segundo o quesito raça/cor, nós temos um dado importante e que a gente precisa levar em consideração: essas mulheres negras estão dentro dessa linha de adoecimento e morte.
A gente está falando apenas de câncer no colo uterino, mas nós temos vários indicadores onde as mulheres negras, infelizmente, ocupam o topo desses indicadores, das morbidades, das mortes e mortalidade no Brasil e em Pernambuco.
Então, quando vamos analisar qualquer projeto, qualquer programa e também além da implantação e implementação, é preciso reconhecer o racismo como um elemento que determina a qualidade de vida das pessoas no Brasil e, principalmente, no Estado de Pernambuco. Quando a gente não reconhece o racismo como um elemento estruturador, a gente também vai desconsiderando todo o fator social, sociológico, de iniquidades sociais e raciais que essa mulher vivencia dentro desse território.
Então, o câncer de colo uterino é uma patologia, vamos dizer, que tem suas complexidades, que é importante. Todo o processo de cuidado, de linhas, de protocolos, mas a gente também precisa trazer esse debate entendendo aquela mulher que está dentro da periferia, que está dentro das comunidades, que, muitas vezes, tem a oferta, mas não tem acesso.
Então, é a importância de a gente ampliar o acesso dessas mulheres. Como é que essa mulher chega até a unidade de saúde para fazer a prevenção, rastreamento, a testagem, a vacinação? Então, se a gente não pensa nesse processo do acesso, de como a gente consegue garantir essa micropolítica dentro das comunidades, a gente vai ter ainda algumas dificuldades de resultados positivos, de resultados de bem viver e de qualidade para essas mulheres, porque, segundo várias pesquisas - e aqui eu pesquisei várias instituições no Brasil, como o Inca entre outras instituições e pesquisadores que trabalham com a temática -, todas elas, que levam em consideração as iniquidades em saúde e, principalmente, as iniquidades raciais, trazem a mulher negra como a mulher que mais está dentro da linha do adoecimento e da morte, principalmente quando a gente se refere ao Sul, Sudeste e ao Norte-Nordeste.
Então, o Nordeste está sempre acima, com os casos mais alarmantes. E aí a Dra. Jurema trouxe um pouco desse cenário, pensando no Nordeste, pensando em Pernambuco, do quanto a gente tem aí também... E quando a gente vai analisar o processo histórico de Pernambuco, a rota canavieira do processo, como foi difícil para a gente. Aí não tem como discutir uma problemática, como um câncer de colo de útero, se a gente não leva em consideração o nosso processo histórico, o nosso processo ancestral, as nossas heranças ancestrais. Isso é saúde, isso é saúde pública.
R
Então, eu queria também trazer para que a gente pudesse refletir sobre esses dados, entendendo que se tem toda uma organização da rede e que, além de Pernambuco, outros estados têm enfrentado o câncer de colo de útero e outras neoplasias de forma séria. Mas a gente ainda precisa avançar, quando a gente vai pensar e quando a gente vai discutir, de fato, essas políticas públicas, fazendo as suas interseccionalidades, trazendo o processo antirracista, anti-LGBTfóbico e anticapacitista. E aí a gente vai entendendo que essa mulher negra, que é lésbica, que tem deficiência, essa mulher vai sofrendo, vai acumulando, no seu curso de vida, cada vez mais pesos e herdando essa dificuldade. Então, quando ela vem para esse cenário e adquire um câncer, como o de colo uterino, ela vai ter desafios diversos dentro do seu curso.
Então, discutir o câncer do colo uterino é fazer uma discussão biológica, é fazer uma discussão patológica, mas também - e principalmente - é fazer uma discussão socioeconômico-cultural-racial ideológica. Então, não tem como a gente discutir e trazer esse debate para cá, se a gente não pensa e não traz de forma equânime.
Então, a gente tem um princípio do SUS, e eu acredito que foi a preocupação também da Senadora Teresa Leitão em nos convidar, como mulher negra representando todo esse coletivo, como política da população negra, porque nós temos um princípio básico norteador que é a equidade. Então, se a gente não discute a equidade dentro desses fatores, a gente vai continuar ainda com indicadores que não são indicadores satisfatórios para a população brasileira, porque as questões de iniquidade não só dizem respeito às populações em vulnerabilidades; elas falam de toda uma população brasileira. Não é só sobre população negra. Aqui é sobre população brasileira. Se a gente não parte para o enfrentamento do racismo, das LGBTfobias, do capacitismo, do idadismo, a gente não vai avançar enquanto sociedade, enquanto povo, enquanto nação.
E aí, falando sobre essa questão da prevenção e dos sintomas, a Mariana também trouxe o dado de toda a pesquisa, a partir do lugar em que ela esteve e está, com o teste do HPV para toda a população, do rastreamento, da importância também desse diagnóstico precoce. Mas aí eu volto, novamente, para que a gente reflita: só há um diagnóstico precoce se a gente dá acesso a essa população. Se a gente consegue com que aquela mulher que mora numa área aonde ela não tenha acesso, porque ainda a unidade de saúde não faz a cobertura, porque ela tem suas complexidades. Se a gente não garante esse acesso a essa mulher, nós não vamos ter um resultado esperado, enquanto população e pessoas comprometidas com o bem viver das nossas mulheres.
R
E também refletir que o câncer de colo uterino... É interessante que, quando a gente vai para Recife, nós temos lá uma comunidade chamada Ilha de Deus, que fica próximo a Imbiribeira, que, na verdade, é uma ilha, uma comunidade, em sua maioria, de pescadoras, marisqueiras, dentro de um contexto em que as mulheres lideram as famílias, na sustentabilidade econômica também, mas, quando a gente vai olhar os dados da unidade de saúde que está dentro da Ilha de Deus, a gente tem um grande índice de câncer de colo uterino. É interessante!
Isso me despertou a curiosidade para entender. Porque o dado chega de forma quantitativa e a gente precisa qualificar esses dados, desagregar esses dados: Quem é essa mulher? De que forma esse dado chega? E, quando eu fui me debruçar nos estudos, junto com algumas pessoas, com alguns pesquisadores, a gente começou a perceber que essas mulheres tinham uma atividade - a maioria é marisqueira - em que a posição de sentar, muitas vezes no chão, para fazer todo o processo da sua atividade profissional e ocupacional, também é um fator que indica uma propensão e uma maior vulnerabilidade para o câncer de colo uterino.
Isso reflete um processo ocupacional, um processo de atenção. E, pensando nessa questão da empregabilidade, é preciso entender que a maioria das mulheres que têm, que estão dentro do cenário do câncer de colo uterino, são mulheres de baixa renda e que têm uma escolaridade bem abaixo do desejado.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. ROSE SANTOS - São as chefes das famílias.
Justamente.
E vai-se somando fatores emocionais, psicológicos, o próprio roteiro e o percurso que essas mulheres enfrentam dentro desse cenário.
Uma outra questão, também, que eu estava lendo, pensando, refletindo - junto com um cenário real no processo de como essas mulheres chegam na unidade -, muitas vezes a gente tem toda uma dificuldade, que o racismo institucional na saúde traz. De que forma essa mulher é acolhida nas unidades de saúde?
Então, enquanto profissionais de saúde, muitas vezes se faz um exame de rastreamento, e o profissional sequer para um momento para explicar. O preconceito... E essa não informação vai gerar um processo de complicação; essa mulher, muitas vezes, não volta mais na unidade. Talvez o dado, quando a gente vai olhar para as pesquisas, esse não retorno, é o não retorno refletido a partir da forma como essa mulher é tratada dentro das nossas unidades, dos nossos serviços de saúde.
Então, a importância de se ampliar os debates, a importância do conhecimento dentro dos grupos de mulheres, nas comunidades, nas associações, dentro daquele cenário que elas vivenciam. Temos que sair da nossa caixinha, eu, enquanto gestora, sair da minha mesa e ir para a comunidade para discutir com essas mulheres, na comunidade, sobre temáticas como o câncer do colo uterino.
R
E, por fim, eu queria também trazer uma reflexão sobre essa temática da questão do acesso, sobre a importância de esse acesso ser ampliado, a importância de institucionalizar e interseccionalizar esse debate, para que essas mulheres negras, indígenas, essas mulheres periféricas, possam ter um acesso equânime, de qualidade; para que a gente possa garantir um local livre de racismo, de LGBTfobias, de etarismo, de capacitismo, enfim, de todas as formas de violações e violências que essas mulheres que estão no território possam sofrer.
No mais, eu queria deixar essas provocações para que a gente pudesse refletir.
Quero agradecer também à Secretaria de Saúde do Recife e a todos os colegas pelo compartilhamento dos dados, porque aqui eu estou representando essa coletividade.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigada, Rose.
Com Rose, nós concluímos a primeira exposição, a exposição inicial da mesa. Começamos com o Dr. Marcos Vinicius Soares Pedrosa, que tratou das questões referentes à atenção primária à saúde. Ele é Diretor do Departamento de Gestão do Cuidado Integral da Secretaria de Atenção Primária; depois, a médica oncologista, Coordenadora do Programa Útero é Vida, do Imip, Dra. Jurema Telles; em seguida, a enfermeira, que foi coordenadora desse projeto e agora está coordenado a ONG, Mariana Seabra, e, por fim, Rose Santos, Gestora de Política de Saúde da População Negra do Recife.
A nossa intenção foi justamente fazer um apanhado geral.
Pernambuco tem muita mania de grandeza. Vocês me desculpem, mas a gente precisa... (Risos.)
Tem grandeza; não tem só mania, não é?
A gente precisa mostrar ao Brasil o que está dando certo lá; o que está dando certo e os nossos desafios para podermos ampliar.
Não queremos que fique só para a gente, não é, Jurema? A gente quer ampliar.
A SRA. JUREMA TELLES DE OLIVEIRA LIMA (Fora do microfone.) - De Pernambuco para o mundo, não é?
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - De Pernambuco, para o mundo. Queremos ampliar.
Então, eu tenho duas perguntas que vieram pela internet. Vou fazer também algumas considerações. Pergunto se alguém do Plenário quer se inscrever, para a gente já ir para a conclusão.
Fernanda Carvalho, do Rio de Janeiro, pergunta o seguinte: "Como o acesso à saúde e programas de rastreamento do câncer de colo de útero estão sendo ampliados, especialmente em áreas rurais e pobres?".
Tudo a ver com a abordagem que foi feita aqui.
Vitória Rodrigues, de Roraima. "Existem meios mais eficazes de enfrentamento além da conscientização quando versamos sobre uma pauta tão forte da saúde pública?".
Eu quero fazer só dois comentários muito rápidos, que foram coisas também vivenciadas por mim. Com relação ao Projeto Saúde e Prevenção nas Escolas, eu representei a Assembleia Legislativa, na época, no Conselho Gestor. Eu era Presidente da Comissão de Educação, a Assembleia tinha um assento no Conselho Gestor, e eu representei a Assembleia.
E digo que esse programa deu certo enquanto existiu. Infelizmente, ele foi extinto, no Governo passado. Já colocamos inclusive para o MEC, para a Secadi, a importância do retorno desse programa, em consórcio, evidentemente, com o Ministério da Saúde, porque a escola é um ambiente de muita capilaridade. E eu vi que, lá em Pernambuco, deu também muito certo, porque houve um envolvimento do sindicato da categoria.
R
A Secretaria de Educação se envolveu, a Secretaria de Saúde se envolveu, mas os processos mais cotidianos eram coordenados, dentro do Conselho Gestor, pelo Sintepe, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Pernambuco.
E vocês falaram - acho que foi Mariana quem falou - de rastreio organizado. Na educação, a gente chama isso, Mozart, de busca ativa. A gente vai atrás do aluno naquela faixa etária para combater o abandono escolar. Eu acho que é algo parecido, não é? É algo parecido. A gente localiza a idade, localiza a comunidade, porque que a gente sabe que, nas comunidades vulneráveis, isso é mais difícil, o abandono se dá também nessa mesma dimensão.
E é verificar - porque é esse, também, o nosso intuito aqui - o que é que o Senado, como Casa Legislativa, pode fazer para dar alguma consequência a esta pauta.
Nós estamos fazendo isso hoje, quarta-feira, dia 24. Domingo é o Dia Internacional de Luta pela Saúde da Mulher. Então, essa temática que a gente está discutindo hoje é uma temática específica nossa, é sobre nossos corpos, é sobre nossa vida, é sobre nossa saúde.
Então, para além do que a gente vai fazer com essa capilaridade que uma audiência pública aqui no Senado tem - vocês viram que ela está sendo transmitida em vários canais, eu vou fazer um pronunciamento logo mais também sobre ela e sobre o dia de domingo -, o que é que a gente pode ir amadurecendo e transformar em resolução, em projeto de lei, em atuação, como o Senado pode ajudar nas campanhas. Eu acho que isso também nos soma. Nos soma vocês a nós e nós a vocês.
Quero parabenizar por toda a exposição de cada um e de cada uma que aqui se apresentou.
Então, passo a palavra para a Dr. Mozart Sales.
O SR. MOZART JULIO TABOSA SALES - Senadora, eu pedi aqui para falar antes de a mesa responder, porque eu vou ter que sair. Vou para o Ministério da Saúde, inclusive, numa pauta, lá, importante.
Primeiro, eu queria parabenizar a Senadora Teresa Leitão, autora do requerimento que baseou aqui a audiência pública, pela importância do tema e pela magnitude desse debate.
Nós tivemos a oportunidade, na condição de médicos, de coordenar esse projeto de cooperação no Estado de Pernambuco, entre 2019 e 2022, com a possibilidade de, junto com a Organização Pan-Americana da Saúde e vários e vários profissionais, técnicos e gestores, contribuir para que essa temática fosse levada adiante, dentro de uma realidade, inclusive, muito adversa no momento da pandemia, com dificuldades de implantação dessa política, para poder compreender como é que nós poderíamos fazer um salto de qualidade a partir dessa realidade de pouca cobertura do exame preventivo, de uma doença totalmente evitável e que vitima tantas mulheres.
Lá em Pernambuco, nós chegamos aos dados, que são aterradores, de uma mulher e uma morte por dia. Uma mulher morre, em Pernambuco, por dia dessa doença, o que é uma coisa que é totalmente inadequada.
Eu acho que a grande questão é que o Brasil, dentro da condição difícil que teve da pandemia, fez um investimento, o país todo, que foi um investimento na área de biologia molecular, chamado Parque de Exames de RT-PCR. Todos os estados, a Fiocruz, investiram em máquinas de RT-PCR, que são as máquinas para fazer esse diagnóstico mais precoce ainda do vírus, que é a lesão precursora, ou é a situação, digamos assim, carcinogênica, para que a lesão cancerígena se desenvolva. Ao fazer isso, deixou condições de se poder mudar a lógica do rastreio para iniciar pelo teste de PCR e de RT-PCR do HPV, ou seja, o Brasil passou a ter condições de fazer isso.
R
Aí tinha que ter a questão de um kit nacional que pudesse ser utilizado nas máquinas e que tivesse um preço adequado. Foi um investimento do Estado de Pernambuco, junto com a Opas e o IBMP, da Fiocruz, o Lika, da Universidade Federal de Pernambuco, a Prefeitura do Recife e o Governo do estado, que construíram - o Imip também - essa tecnologia. Está aqui a Dra. Leticia Kats, que coordenou tecnicamente esse projeto.
Então, isso tudo é um arcabouço colocado e positivo para um projeto, digamos, piloto, de cunho nacional, que teve lançamento com a Ministra Nísia Trindade, lá em Pernambuco, agora em março, com o Presidente Lula, para testar, inicialmente, 375 mil mulheres no Estado de Pernambuco.
Essa questão está orçamentada. Faltam ainda alguns pequenos detalhes para o seu início. Eu imagino que, nos próximos 45, 60 dias, no máximo, deve se iniciar toda essa testagem no âmbito do estado.
Mas, falando e propondo aqui, para a Senadora Teresa Leitão, que, eu não tenho dúvida, vai ser uma defensora, uma guerreira desse tema, aqui nesta Casa, e ela perguntando o que é que o Senado pode fazer, eu acho que uma das coisas importantes, Senadora, é, no momento da discussão da Lei Orçamentária Anual, da LOA de 2024, poder a Senadora trabalhar, muito fortemente, recursos, no âmbito da saúde, que possam ser alocados para a ampliação desse projeto em nível nacional. Isso eu acho que é uma questão muito importante, fazer disso uma bandeira da Senadora Teresa Leitão, para que esses recursos sejam incluídos e garantidos, para a ampliação desse projeto no âmbito de 2024.
Nós estamos no limiar da aprovação do arcabouço fiscal e há uma visão de que haverá uma descompressão do orçamento da saúde com a questão da Emenda 95 e isso vai ser importante. No momento em que vão ser carreados esses novos recursos da saúde, a Senadora, deve ser uma guerreira e porta-voz, para garantir esses recursos e poder realizar a ampliação dessa tecnologia e desse teste, já com um custo muito mais baixo do que, teoricamente, era antes, no mercado privado, porque nós vamos ter um kit, desenvolvido aqui no Brasil, com tecnologia nacional da Fiocruz e não vamos precisar de investimento em máquina, porque o Parque de Biologia Molecular já existe nos Lacens e na própria Fiocruz. Então, é o momento adequado. Eu faria essa sugestão para um estudo pormenorizado; para a Senadora Teresa Leitão ser uma defensora intransigente, mas, ao mesmo tempo, muito positiva, dessa política pública e da implantação dela no Brasil; e para dar continuidade, no Estado de Pernambuco, no ano de 2024.
Um abraço e parabéns a Jurema, Marcos Pedrosa, Rose Santos, Mariana, a todos que estão aqui e aos que nos ouvem e nos assistem pela TV Senado.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigada, Mozart. Pode ficar certo de que isso estará na nossa planilha, com muita convicção, com muita vontade de acertar.
Foi muito bem lembrada por você a presença da Ministra da Saúde para fazer o lançamento desse programa lá no estado para dar essa dimensão nacional que a gente sabe que é necessária e é possível. A gente pode conjugar as duas coisas no encaminhamento da questão.
Vou devolver a palavra para a mesa para as considerações finais. (Pausa.)
Desculpe, Dra. Letícia. Pode usar da palavra.
R
A SRA. LETICIA MARIA CORREIA KATZ - Boa tarde a todas, todos e todes!
Eu sou Leticia Katz e estou na coordenação técnica do Programa Útero é Vida e gostaria de iniciar, quando você diz onde o Senado pode nos ajudar, ele já está nos ajudando, porque um dos pilares é a comunicação. A gente precisa comunicar o que a gente está fazendo, por que a gente está fazendo e como vai ser feito.
Eu acho que um dos problemas que foram trazidos por Rose é o acesso, e isso sempre foi a pauta primordial de que o acesso seria quando a gente for para um rastreio organizado. Ou seja, que eu não tenha feito nenhuma mudança, se o rastreio já for organizado, a gente vai estar incluindo dentro do nosso rastreio outro ponto importante que são pessoas com útero. No momento em que a gente vai juntar esses dados da atenção primária do e-SUS AB, que é o sistema de informação da atenção primária, com o Siscan, por faixa etária, por localidade, a gente vai dar esse acesso, a gente não vai esperar que elas venham até nós.
E como é que isso vai dar, talvez já ajudando na resposta, na primeira pergunta que veio, como o acesso está sendo pensado? Está sendo pensado através de um sistema de informação que vai ter esse cadastramento dessas mulheres para que a gente tenha essa comunicação. Isso vai ser dado através do sistema de informação Jordana, que está sendo pensado para que ele possa fazer a interoperabilidade de todos esses sistemas SUS que o projeto, desde o começo utilizou todos os sistemas SUS, não foi um sistema extra, e o Jordana vai fazer essa interoperabilidade.
E o que o é mais importante para a gente é que não adianta você dissociar as ações, não adianta eu só fazer a comunicação e não fazer o resto, eu fazer só o rastreio organizado e não ter um teste de qualidade, e a citologia tem qualidade, mas é sempre nas mesmas mulheres. Às vezes, não são os laboratórios que não têm qualidade, mas, se eu faço sempre na mesma mulher, eu não vou encontrar a doença, eu não vou encontrar a lesão que eu preciso encontrar. Então, a gente tem a plena consciência de que tem que ser um contínuo. Então, é desde a educação em saúde, a vacina, toda uma preparação para o uso de camisinha feminina e masculina, é a vacina, é o rastreio organizado, através do teste do HPV, que, quando positivo, vai ter a citologia e que, quando for depois, a gente possa ter todo um conjunto de tratamento, que é o que a gente tem feito, que é comprar equipamento, educar...
Nós capacitamos 75 médicos. A gente sabe que a renovação de médicos é sempre constante e que a gente precisa atualizar. Às vezes, eles não têm essa formação ainda de forma adequada na residência médica, e a gente está trazendo essa capacitação. E, como foi dito por Mariana, é a navegação do cuidado, é a continuidade que esse sistema de informação vai começar na atenção primária, até a terciária.
Então, eu quero agradecer a oportunidade, e, após 35 anos de formada, eu continuo com o mesmo entusiasmo e acreditando que a gente pode mudar quando a gente tem essas oportunidades.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Nós é que agradecemos e a parabenizamos também. Entusiasmo profissional é tudo de que a gente precisa.
A SRA. JUREMA TELLES DE OLIVEIRA LIMA (Fora do microfone.) - É contagiante. (Risos.)
É contagiante, e não tem vacina.
Então, vamos fazer a devolução para a Mesa, com a mesma ordem.
Cinco minutos fica bem?
Então, vamos começar com o Dr. Marcos, para as considerações finais ou transitórias. (Risos.)
O SR. MARCOS VINICIUS SOARES PEDROSA (Para expor.) - Não, eu queria, primeiramente, agradecer o convite da Senadora e elogiar a iniciativa.
R
Acho que não tem como a gente querer enfrentar um problema dessa magnitude somente a partir do Poder Executivo, nem somente considerando os Poderes - é um tema da sociedade. São as mulheres, são as pessoas com útero que estão adoecendo e morrendo, sem ter acesso adequado a um atendimento, e é preciso uma ampla mobilização.
Eu acho que este é o momento em que a gente pode recuperar a liderança, e eu acho que - importante colocar - o Ministério da Saúde tem retomado esse papel de liderança no campo da saúde, e é só com liderança que a gente incentiva e produz outras lideranças. No caso das equipes de saúde, precisam ter clareza e protagonismo para ver e tratar, para ver e cuidar, para ver e coordenar o cuidado.
A gente tem muito o que avançar ainda no campo da integração dos sistemas. O prontuário eletrônico do Cidadão da Estratégia Saúde da Família, que é o PEC (Prontuário Eletrônico do Cidadão), que a gente - os trabalhadores da saúde - chama mais de e-SUS do que de PEC, tem muito o que avançar. E quando a gente pega recursos que hoje já são triviais, do ponto de vista da solução tecnológica... E acho que no Ministério da Saúde, neste momento, a gente está debruçado, dentro da Secretaria de Atenção Primária, nesse desenvolvimento.
Imaginamos, por exemplo, que certos cuidados que são programados... o próprio sistema automaticamente pode programar os retornos ou alertas - entende? -, dispensando a ação humana, para que a ação humana se concentre no que tem que ser, que é na tomada de decisão. Então, imaginar, por exemplo, que a gente possa... Uma gestante vai iniciar o pré-natal; a gente não tem já um protocolo do tempo de consulta entre uma e outra? Então, marcou a primeira consulta, o e-SUS pode automaticamente programar todo o pré-natal. E aí, se tem falta à consulta, isso poupa trabalho das equipes.
Eu acredito que nesse tipo de iniciativa, como nas estratégias de enfrentamento ao câncer do colo do útero, a gente não pode abrir mão de nenhuma das experiências. Tivemos uma contribuição - não me recordo agora se foi pela internet ou por qual canal - que perguntou sobre o que a gente pode fazer além da conscientização. Eu acho que, diante da gravidade do problema, a gente não pode abrir mão de nenhuma estratégia. Então, a gente precisa, a partir desse espaço, mobilizar trabalhadores e trabalhadoras, mobilizar os movimentos de mulheres, a sociedade em geral, para que conversem com os seus familiares, que possam, a partir deste programa, quem está nos assistindo, está nos ouvindo, poder falar sobre isso em casa, falar sobre isso no seu bairro, e também com as iniciativas do poder público.
A ideia de que a gente possa avançar para um sistema de acompanhamento dessa ação, de forma mais estruturada, é muito bem-vinda; em que a gente possa, de fato, ter um indicador de acompanhamento que não seja baseado no número de exames, como acontece também no caso da imunização, em que é o número de vacinas aplicadas, mas que a gente possa ter o número de pessoas elegíveis para realizar o exame e quantas fizeram. Aí você tem noção da cobertura real do que a gente está buscando e pode ter clareza. Sabemos que, diante das inúmeras barreiras de acesso, você imaginar que, hoje, querer que uma pessoa vá ao serviço de saúde um dia, presencialmente, para buscar uma consulta, ter que voltar no outro dia porque não tem vaga, e num terceiro para buscar outra vaga...
A SRA. JUREMA TELLES DE OLIVEIRA LIMA (Fora do microfone.) - Para prevenir.
O SR. MARCOS VINICIUS SOARES PEDROSA - E num quarto dia para...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS VINICIUS SOARES PEDROSA - Então, assim, isso não tem mais sentido, na verdade, no atual ponto de vista das soluções tecnológicas que a gente tem e do que é popularizado nos termos da comunicação por meio digital. Então, acho que a gente precisa avançar nessa direção e acho que o Ministério da Saúde precisa estar atento. Estamos aqui juntos, acho que...
R
Estava ouvindo o Mozart falando. Hoje cedo a gente entrou na fase quantitativa da Ploa - viu, Senadora? -, justamente a discussão que o ministério faz internamente. A gente já fez a parte qualitativa e estamos avançando para a proposição do Executivo. Então, tanto ações relacionadas a essa linha de cuidado... Imaginar que esse legado, industrial mesmo, de apoio diagnóstico, da estrutura que hoje a gente tem de realização de exame de RT-PCR para além da covid, isso é algo que pode ter grande uso no enfrentamento de outras doenças, basta a gente incorporar essa tecnologia. Tem outras doenças que a gente tem fronteira também para o diagnóstico e onde o RT-PCR é uma técnica que traz diagnóstico com muita precisão. Por exemplo, debater... E é óbvio que isso passa por uma discussão na saúde, qualquer incorporação de tecnologia passa pela Conitec, tem as instâncias adequadas, mas que a gente possa dar uso, para além da covid, do SARS-CoV-2, para toda a sociedade a partir do investimento que foi feito, do esforço que o país fez, os estados e a rede de LACENs para implantar o diagnóstico durante a pandemia.
É isso. Agradeço o espaço. A gente está à disposição, contem conosco para outras audiências e para outros debates em que a gente possa contribuir para que a política pública se aperfeiçoe. Temos uma rotina no ministério em que a gente é convidado a emitir pareceres para as proposições legislativas, então é uma rotina esse contato com o Parlamento a partir desses pareceres que a gente faz em relação a mérito. Enfim, contem conosco para que esse programa, que é exitoso e que está sendo piloto, que foi lançado em Pernambuco, possa render frutos e se difundir para todo o Brasil.
Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Nós é que agradecemos, Dr. Marcos. E pode vir a Ploa, viu? Ela chega aqui em agosto e estaremos a postos!
Dra. Jurema.
A SRA. JUREMA TELLES DE OLIVEIRA LIMA (Para expor.) - Mais uma vez quero agradecer. Eu acho que está aqui um bocado de tarefinhas de casa, ideias inspiradoras, compromissos que botam a lente da necessidade de a gente aprofundar essa questão das determinantes sociais e dizer que esse espaço e essa construção são uma coisa que a gente aprendeu dentro de casa. A gente tem especialista, o pessoal da atenção básica, a pessoa do diagnóstico, o cientista da bancada, a Opas, conversando com pessoas que já fizeram isso em outros países, que já aprenderam e podem nos ensinar a fazer isso melhor. E uma das coisas... Onde deu certo foi onde os setores conversaram e onde o poder público de forma ampla abraçou a ideia e deu a governança capaz de transformar e fazer a gestão da mudança.
Eu vou falar dos pernambucanos. A Clarice Lispector, que não era pernambucana, mas morou lá e se achava pernambucana, dizia que a coisa mais difícil é tornar simples o complexo. Acho que o maior desafio da gente é tornar simples o que é esse teste HPV, o que é essa mudança, o que a gente está falando, e dar essa visão dessas mortes que não são percebidas, valorizadas. É aquela coisa: "Mas não tem um teste? Não tem um exame? Não tem a vacina?". Não basta ter - e aí vou falar dos meus três eslaides.
R
E o outro pernambucano, nessa questão além da saúde pública, dessa coisa do enfrentamento, essa coisa que a Dra. Letícia nos ensinou de ir para o território, ver a realidade, aprender com as pessoas, trocar, a gente viu que, dentro do Recife, uma realidade é diferente da outra. Isso não vai acontecer se a gente não acolher essas diferenças. No final são pessoas cuidando de pessoas - era o eslaide que não apareceu, que é uma turma grande misturada. Então, quero agradecer a todas as pessoas em nome de Letícia. A gente sabe o esforço disso.
O outro era uma charge genial do Laerte, que é assim: um quebra-cabeça, aí chega uma pessoa com mais uma pecinha e faz assim: "Chegando!". E quantas estão encaixadas? Nenhuma. Então, eu faço questão de dizer que não é um teste. E junto, quando vocês falaram, tem um texto que diz assim: se a desigualdade é evitável e injusta, a gente está dentro de uma iniquidade. Então, não tenho dúvida de que é injusta e evitável, a gente está diante de uma iniquidade. E, se para combatê-la for preciso cinco frentes, então a gente vai precisar das cinco frentes: do teste, do sistema, das pessoas capacitadas, do processo de trabalho, do sistema de informação, da governança. Então não se vai conseguir mudar essa realidade sem juntar isso tudo - tem um poder muito grande isso. Dar ênfase à prevenção: tem algumas políticas que são indutoras, que a gente pode induzir. Só 5% dos gastos são em prevenção. Que a gente dê essa ênfase porque é um investimento que dá retorno. E dar voz, dar espaço, dar oportunidade a muitas pessoas que têm a perda de vida e a perda de uma pessoa importante, o que é evitável. (Manifestação de emoção.)
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigada.
Ninguém solta a mão de ninguém, não é? Vale muito também neste momento de articulação, de solidariedade e de identidade, de sororidade que a gente tem umas com as outras.
Vou passar para a Dra. Mariana, por videoconferência.
A SRA. MARIANA SEABRA (Para expor. Por videoconferência.) - Eu acredito que realmente, dando sequência às falas que já aconteceram, é um problema complexo e precisa de diferentes estratégias para enfrentá-lo, não só de diferentes estratégias, mas dialogando com as especifidades regionais locais. Então, esse é o grande desafio.
Eu acredito inclusive que o ministério está atento a isso. Recentemente lançou uma portaria que resgata o núcleo de atenção à saúde da família, que agora se chama eMulti, que dialoga com a necessidade do adensamento de tecnologias na atenção básica, e eu acho que isso foi um avanço. O ministério sinaliza nesse sentido, que há um horizonte. Então, você tem a necessidade de expansão da cobertura da atenção básica, uma necessidade de adensamento de integração entre os pontos de atenção, de um pensar coletivo sobre a política de diretrizes, realinhadas então com a chegada de um novo projeto. Você precisa da conquista do debate via sociedade. A sensibilização é uma estratégia, mas a gente sabe que muitas vezes, de fato, a gente consegue chegar a essas mulheres, pessoas com útero, através da comunidade mesmo. Então, quem são essas mulheres, onde elas estão, de que lugar elas estão entendendo essa problemática.
R
Então, muitas vezes, quando a gente passa um carro do ovo, que nem tem lá em Recife, verbalizando onde é que tem, como procurar, quem são as mulheres elegíveis, nós estamos usando essa técnica inclusive com o Carro do Óvulo, fazendo um paralelo, no Rio Grande do Sul, através da frente de enfrentamento à descriminalização das mulheres e pelo aborto, lá Rio Grande do Sul usa essa técnica como uma técnica de mostrar para as mulheres seus direitos sexuais reprodutivos, os lugares de acesso.
Então, isso é uma estratégia inovadora. Então, vai ser necessário ter mais estratégias inovadoras e que dialoguem com o território. A gente sabe que nos estados do Norte a gente tem lugares, os pontos de informação são mais rarefeitos. Como é que dali se torna o acesso viável e a conscientização dessas mulheres e pessoas com útero da necessidade.
E eu acho que a grande sacada é entender que vão ser diferentes estratégias, não vai ser uma só, e tentar endossar as estratégias locais. Eu acho que esse é o grande papel de cada um de nós: é perceber que existem essas estratégias, reconhecer, endossar, financiar por parte do Executivo e, enquanto movimento social, a gente fazer esse convencimento das mulheres também - apoiar nesse convencimento.
Mas eu vou dizer, as mazelas são tantas e as iniquidades, como a Rose ilustrou muito bem, são tantas que é literalmente entrar na fila das prioridades. E o que a gente está dizendo aqui é que essa prioridade tem que estar entre as principais prioridades do cuidado da saúde das mulheres e pessoas com útero.
O que a gente está dizendo é: essa prioridade importa porque tem uma grande possibilidade de prevenção, mas também tem uma grande possibilidade de, se evolução da doença, vir a óbito. Então, eu acho que, quando a gente fala do subfinanciamento do SUS... Esse é o cenário que a gente está vivendo há muitos anos, de subfinanciamento do SUS, de empobrecimento da população, de perda de renda da população, da população passando fome novamente, de você ter um debate ideológico muito forte e aí, por isso, a gente não consegue avançar nas questões da vacina. Você tem uma série de fatores que prejudicam que essa simples sensibilização ocorra.
Então, eu acho que respondendo aí, tentando trazer elementos para complexificar a resposta da segunda pergunta, é dizer que a gente, primeiro, precisa tentar. E eu acho que neste novo Governo nós temos mais perspectiva de avançar nesse sentido de tirar a população do lugar de extrema vulnerabilidade e colocá-la como central no seu processo de cuidado e de garantia de direitos. Aí, a gente começa a fazer um debate mais legítimo.
Então, os desafios são imensos, mas tenho certeza de que esta audiência dá o pontapé aí para avançar nesse debate.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Nós é que agradecemos, Dra. Mariana. Realmente vamos usar a criatividade, não é?
Para quem não sabe o que é o carro do ovo, é um carro que passa vendendo ovos. Geralmente é um carro pequeno: "venham comprar, venham comprar, venham comprar, está passando na sua porta o carro do ovo".
R
E tem também um que é o do sorvete: "tragam suas tigelas, tragam suas tigelas", "uma bola é tanto, duas bolas é tanto", e a população já sabe, é usar a criatividade - respondendo também, um pouco, à pergunta de Vitória Rodrigues -, porque a conscientização não se dá de um dia para o outro, de uma hora para a outra. É preciso, também, termos muita intencionalidade para atingir aquelas pessoas.
Mas, assim como a Dra. Mariana, eu acho que a gente está vivendo outros ares, outros ares em que as nossas possibilidades também aumentam.
Vou passar a palavra agora para Rose Santos, para as suas considerações finais.
A SRA. ROSE SANTOS (Para expor.) - Já começo a minha fala saudando e fortalecendo esses novos ares, esse cenário de novas esperanças, de "esperançar", de fato. Isso é muito importante.
E também comungo, Leticia, desse encantamento, enquanto profissional, dentro do Sistema Único de Saúde há 17 anos, e a gente precisa estar se reencantando.
E este momento é um momento em que a gente, embora esteja falando de dores, de processos de adoecimento, de morte, a gente se reencanta na esperança de perceber que nós temos estratégias, nós temos resultados e nós temos, também, projetos que dão certo. E a gente está falando de Pernambuco - sendo bem pernambucana -, Pernambuco é esse estado que é grande, embora tenha suas complexidades.
Finalizando este momento, eu queria agradecer principalmente aos profissionais de saúde que estão dentro do território. Não temos saúde sem falar desses profissionais que estão na base, que são os agentes comunitários de saúde e as agentes comunitárias de saúde. Esses profissionais e essas profissionais que alimentam os bancos, que também fortificam e fortalecem os fluxos e sistemas dentro da atenção primária e da atenção básica.
Então, aqui eu agradeço fortemente a essa categoria e a outras categorias, também, que estão dentro da estratégia de saúde da família ou dentro do escopo, que é a atenção primária.
Também, fiquei aqui com uma tarefa de casa: fortificar esse olhar na integralidade do cuidado, esse cuidado dentro dos formatos que o sistema traz, que a Rede de Atenção à Saúde traz, e pensar como é que a gente vai trabalhar essa integralidade de acordo com a nossa diversidade e com os processos que se dão dentro dos nossos territórios.
E fortalecer essa Rede de Atenção à Saúde é urgente. Essa rede, que em cada território do Brasil, assim como em Pernambuco... Então, a gente está em Recife, capital, quando a gente para Olinda, para Jaboatão, já muda, já vai mudando.
Então, essa diversidade de estratégias... Isso que Mariana e Leticia trazem: a importância de perceber o quanto dá certo também a gente olhar e ter esse olhar multiampliado - isso é saúde pública e o entendimento dos fluxos.
Também, trazer um caminho que é a Educação Permanente em Saúde. A Educação Permanente em Saúde fortalece a educação na saúde, que engloba educação permanente, educação continuada, educação popular, enfim. A educação na saúde também é um caminho de fortalecimento para a gente pensar de que forma esse acesso se dá. E essa conversa, dentro da educação na saúde, da educação permanente, com os profissionais, com a sociedade civil, com os movimentos, com as organizações, também é uma mola propulsora e um caminho potente para a gente estar discutindo a temática sobre o câncer do colo uterino.
R
Também quero agradecer aqui a todos os colegas, em especial à equipe de Saúde da Mulher do Recife, que há muitos anos a Política de Saúde da Mulher do Recife é uma política que tem resistência e que tem profissionais que trabalham de forma equânime. Então, eu queria agradecer às meninas, que também me trouxeram alguns dados e a gente fez essa conversa, porque é isso, nós...
(Soa a campainha.)
A SRA. ROSE SANTOS - ... trabalhamos na coletividade, na integralidade e não estamos sozinhas.
Então, esse olhar, que é um olhar ampliado, que vai para além da saúde, que é intersecretarias, que envolve a Secretaria da Educação, a Secretaria de Cultura, de Direitos Humanos, então, esse olhar ampliado é o caminho pelo qual a gente tem optado e acredito que é um caminho que dá certo.
Então, no mais, quero agradecer e dizer que nossos passos vêm de muito longe.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) -
Muito obrigada, Rose.
Renovo meus agradecimentos a todos os participantes desta audiência, às nossas convidadas e aos nossos convidados, e a todos vocês que ficaram nos assistindo pela rede Senado, a quem aqui esteve também no nosso auditório.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião.
(Iniciada às 14 horas e 19 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 10 minutos.)