25/05/2023 - 12ª - Comissão de Meio Ambiente

Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 12ª Reunião da Comissão de Meio Ambiente da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura, que se realiza nesta data, 25 de maio de 2023.
Comunicados.
Comunico que foi apresentado à Comissão o seguinte documento: mensagem eletrônica da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) em apoio ao PL 1.459, de 2022, na qual a entidade solicita a apreciação da matéria pelo Plenário.
Nos termos do art. 261, §2º, o ofício será anexado ao processo da matéria.
A presente reunião destina-se à realização da segunda audiência pública com o objetivo de instruir o PL 412, de 2022, que regulamenta o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões, previsto pela Lei 12.187, de 29 de dezembro de 2009, e altera as Leis nºs 1.284, de 2 de março de 2006; 12.187, de 29 de dezembro de 2009; e 13.493, de 17 de outubro de 2017, e demais matérias que tramitam nesta Comissão: PL 2.122/2021, PL 1.684/2022, PL 4.028/2021, PL 3.606/2021 e PL 2.229/2023.
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E em atenção aos requerimentos: Requerimento 21/2023 - CMA, de autoria do Senador Confúcio Moura; Requerimento 30/2023 - CMA, de autoria dos Senadores Carlos Portinho e Marcio Bittar; Requerimento 37/2023 - CMA, de autoria do Senador Luis Carlos Heinze e de minha autoria; Requerimento 44/2023 - CMA, também de minha autoria.
Convido para tomarem lugar os seguintes convidados: Sra. Aline Ferreira, Coordenadora do Grupo de Trabalho de Crédito de Carbono da Anbima (Palmas.); Sra. Cristina Reis, Subsecretária de Desenvolvimento Econômico e Sustentável do Ministério da Fazenda (Palmas.); Sra. Viviane Romeiro, Diretora de Clima do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) (Palmas.).
Coincidência ou não, fico superlisonjeada de estar rodeada de mulheres incríveis aqui, que vão nos ajudar muito hoje nesta audiência.
Participam também, por videoconferência, o Sr. Davi Bomtempo, Gerente Executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria (CNI), e o Sr. Luciano Rodrigues, Diretor de Economia e Inteligência Setorial da União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica).
Também convidamos, mas infelizmente não pôde comparecer em função dos compromissos, a Sra. Mônica Sodré, Diretora Executiva da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps). Mando um abraço para ela e reitero o convite para estar conosco nas próximas audiências.
Antes de passar a palavra aos nossos convidados, eu comunico que faremos outras audiências públicas, mais uma vez, reiterando, sobre o tema, para necessário aprofundamento da coleta de subsídios para finalizarmos o nosso relatório.
Esta reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados, por meio do Portal e-Cidadania, na internet, no endereço senado.leg.br/ecidadania ou pelo telefone 0800 0612211.
O relatório completo com todas as manifestações estará disponível no portal, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos nossos expositores.
Na exposição inicial, cada convidado poderá fazer uso da palavra por até 15 minutos, e, ao fim das exposições, a palavra será concedida aos nossos Parlamentares inscritos para fazerem as perguntas ou os comentários.
Já aproveito para dar o meu bom-dia ao Senador Confúcio, que foi um dos requerentes da audiência.
Bom dia, Senador!
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Bom, antes de começarmos a nossa fala, eu acho que todos repararam a cor do meu blazer - eu estou rindo, mas, enfim, hoje é um dia em que nós não temos muito o que comemorar nem celebrar -, que é uma forma de me manifestar com relação às decisões que foram tomadas ontem pela Câmara Federal acerca do esvaziamento da pasta do meio ambiente e da MP que libera a exploração da Mata Atlântica. Nós sabemos que é um dos biomas que estão sendo mais afetados em termos de exploração, de desmatamento. Nós aqui, enquanto Senadores, fizemos o nosso trabalho - não é, Senador Confúcio? -, mas infelizmente houve essa reviravolta dentro da Câmara. E aí a gente fica na expectativa, como Presidente desta Comissão, como integrante e membro desta Comissão, porque o trabalho agora está com o Governo Federal, está com o Poder Executivo.
Lembro que, para o Governo, isso é uma pauta prioritária. Eu acho que o Brasil sinaliza de forma muito negativa - o Brasil, digo, o Congresso, não é? - de que lado está. E esta Comissão vai sempre, digamos, levar em consideração o poder de diálogo. Nós temos uma bancada ruralista forte dentro da Comissão, mas também temos pessoas que entendem a importância de nós preservarmos e defendermos aqui as pautas que são importantes para o meio ambiente.
Então, um apelo que eu faço ao Governo, aos Líderes dos partidos, principalmente aqui no Senado, é para que comecemos a repensar e termos bom senso com relação às decisões que estão sendo tomadas e que atingem diretamente essa pauta, que é importante e prioritária para o Governo - e o mundo inteiro está de olho no Brasil com relação a essas decisões. Temos COP no Brasil, temos vários eventos acontecendo. Então é muito importante, neste momento, que tenhamos a capacidade, Senador Confúcio, de dialogar - de dialogar! -, o Governo Federal, os demais setores e, acima de tudo, a Casa. A Casa tem diversos interesses, mas a pauta do meio ambiente é fundamental para o nosso país, não só por questões óbvias de sobrevivência, pelo aquecimento, pelas mudanças climáticas, mas, acima de tudo, pensando o futuro, sempre o futuro das próximas gerações. Eu acho - estou do lado de mulheres - que nós entendemos o quanto, para nós, os nossos filhos, as futuras gerações... A gente está aqui com este intuito, com esta missão de trabalhar. Então, vamos seguir trabalhando e nos manifestando, nos indignando, mas sempre firmes, com um propósito melhor de entregarmos o melhor para a nossa sociedade.
Então, hoje, na data do aniversário de 11 anos do Código Florestal, daremos continuidade ao ciclo de debates sobre as matérias que tramitam neste Colegiado sob minha relatoria que tratam da regulamentação do mercado brasileiro de emissões - ou do mercado de carbono.
Na manhã de ontem, tivemos a primeira audiência pública sobre o tema. Na ocasião, representantes do Governo Federal comunicaram que estão organizando um grupo de trabalho entre dez ministérios para detalhar sua visão sobre o tema. Assim como o Governo, esse será o nosso esforço. Nós aqui, nesta Comissão, estamos concentrando esforços para unir diferentes visões sobre esse tema. E, reforçando o que coloquei no início da reunião de ontem, queremos trazer em nosso relatório uma proposta que atenda, de uma forma ou de outra, as diferentes visões apresentadas.
Hoje, portanto, damos seguimento a essa discussão.
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Pergunto ao Senador Confúcio se quer...
Posso continuar?
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Então, eu vou começar já a nossa audiência dando a palavra à Sra. Viviane Romeiro, que é Diretora de Clima do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável.
Seja bem-vinda, Viviane.
A SRA. VIVIANE ROMEIRO (Para expor.) - Muito obrigada, Senadora. Bom dia a todas e todos. Gostaria de cumprimentar a Senadora, agradeço o convite, e também cumprimentar meus colegas presentes aqui. Fico contente com este grupo de mulheres, de lideranças femininas para uma agenda tão importante, como a Senadora colocou. É uma honra participar deste debate em nome do Cebds, que é o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável.
Nós representamos mais de cem empresas associadas no Brasil, que representam em torno de 50% do PIB brasileiro, então trabalhamos com as grandes empresas em capacitação, advocacy, conexão, colaboração, e a gente entende que essa pauta é extremamente importante. O Cebds lidera, desde 2016, iniciativas de construção de consensos; nós já publicamos cartas de posicionamento, entregamos aos candidatos à Presidência da República, nos últimos anos, propostas concretas desse projeto, de como a gente entende que seria um mercado regulado; também já apresentamos, juntamente ao Projeto PMR, do Ministério da Fazenda, quais seriam sugestões construídas com as associadas, com o setor empresarial brasileiro. E um ponto também em que o Cebds trabalha bastante é no fortalecimento dessa governança climática multinível, em que a gente fortalece a interação do setor privado, dos governos subnacionais, da sociedade civil. Então, a gente trabalha conjuntamente com as empresas, com entidades de classe, também com parceiros: o iCS, IBGC, BCG, Tozzini, Graça Couto, Laclima, Clima e Desenvolvimento, várias iniciativas.
Eu represento também... Sou uma Colíder da Força-tarefa de Mercado de Carbono da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, e a gente entende que essa construção de consensos e trazer as divergências também é pauta extremamente, é um caminho extremamente importante para esse processo. Agenda de mercado de carbono é complexa, o instrumento de precificação de carbono é muito sofisticado, então requer, de fato, discussões técnicas e políticas muito condizentes. E a visão do Cebds, a visão do setor empresarial, é que essa é uma agenda muito importante de vantagem comparativas, competitivas, no âmbito do pacote verde que o Ministério da Fazenda está elaborando - a gente reconhece a importância. Um dos eixos elementares desse pacote é justamente o mercado de carbono e instrumentos econômicos - minha colega aqui do Ministério da Fazenda certamente vai falar algo sobre. E eu acho que a gente está num momento muito propício da política dessa transversalidade, num caminho já colocado hoje para a COP 30 - potencialmente em Belém, no Brasil -; um momento tão rico para a gente ter o mapa do caminho efetivamente, aproveitando essa janela de oportunidade para a gente ter um marco regulatório robusto para a COP 28, ano que vem a gente tem G20 no Brasil, então temos um road map, um mapa do caminho muito importante para a gente trazer essa agenda estratégica para o Brasil.
E eu vou trazer, muito rapidamente, também alguns dos desafios do setor empresarial nessa agenda. No Cebds a gente está trabalhando com um hub de mercado de carbono, via plataforma NetZero, que é uma iniciativa para apoiar as empresas para acelerar a descarbonização, seus processos de neutralidade climática, e um dos pontos muito colocados é a incerteza regulatória - então, como aprimorar, como aumentar a segurança jurídica. O tema traz muita complexidade, ainda há confusão em torno de mercado voluntário, mercado regulado.
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Então, é uma questão muito importante para trazer na tecnicidade, mas também de traduzir para o contexto político, porque acho que a gente esbarra muito em algumas complexidades técnicas somadas à complexidade política e como a gente traduz todo esse conhecimento para que a percepção pública esteja mais alinhada entre as oportunidades e os desafios referentes ao mercado voluntário e ao mercado regulado, que são complementares, mas que trazem nuances muito específicas.
E aqui, muito rapidamente, a gente traz também a defesa, o que já foi colocado ontem pelo Aloísio e por outros colegas, da modalidade cap and trade, que é justamente um sistema de comércio de emissões que limita, define um limite, que é o cap dessas emissões, e que a gente entende que a experiência internacional tem colocado como boa prática. É um conjunto de setores a serem regulados, então são metas absolutas, integradas, e não há uma meta individual, necessariamente, nesse caso. E essa é a boa prática que vem sendo colocada e que exige uma série de arcabouço para que a gente delimite natureza jurídica, questões tributárias muito importantes, e dialogando com a experiência internacional com outros mecanismos também que possam viabilizar no mercado global, como o art. 6.4 do Acordo de Paris, o Corsia também, dentre outros.
E a nossa proposta, na Cebds, a gente traz alguns elementos basilares para um marco regulatório. Um deles é a implementação gradual, então trazendo aí principalmente os setores mais maduros na questão de mensuração, relato e verificação. No caso, a gente está trazendo o setor de indústrias e parte de energia.
E aí entra uma questão bem emblemática também de outros setores. Eu vou falar daqui a pouco em relação aos projetos sobre isso, mas é um princípio muito importante.
Há previsibilidade e segurança jurídica, então, que um mercado regulado venha através de um projeto de lei, não por um decreto, para que tenha essa segurança jurídica: proteção à soberania e à competitividade, mecanismos de estabilidade de preço, governança robusta e um processo participativo. Então, é muito importante esse tipo de iniciativa no Senado para trazer, de fato, as diferentes visões.
Ontem, a gente percebeu, na audiência, alguns pontos que foram colocados e construindo, também trazendo divergências, mas porque é rico o processo, porque acho que é justamente de construir os principais elementos entendendo que o feito é melhor que perfeito. Eu acho que o que a gente está vivendo hoje com a tramitação de diversas iniciativas para essa agenda é justamente de trazer o que é esse básico relevante para trazer a segurança jurídica e alguns pontos que podem ser regulamentados posteriormente.
E aí, por fim, a questão de créditos de offset, os créditos compensatórios também, fundamental para que o Brasil também movimente ainda mais o mercado de créditos de carbono. Diferentemente do perfil dos outros mercados globais, como já foi colocado ontem também, o cap and trade no Brasil tem uma característica diferente pelo perfil das emissões de gás de efeito estufa, em que, majoritariamente, a gente vende emissões, em torno de 50%, de desmatamento, e a maior parte disso de desmatamento ilegal. Então, as emissões provenientes da indústria têm características, o perfil da matriz de emissões no Brasil é diferente comparativamente aos demais países.
Então, isso nos traz uma conexão com o mercado voluntário muito importante de ser discutida, e, por vezes, muito confusa também. O que se trata, efetivamente, de um mercado voluntário, um mercado regulado.
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E é interessante verificar que a maioria das iniciativas hoje em tramitação consideram a inclusão de créditos compensatórios, o que é muito importante, e é a nossa recomendação, inclusive, desde que, com alguns requerimentos, com alguns cuidados para que, de fato, a gente tenha a integridade climática, salvaguarda socioambientais... Então, requerimentos importantes para que um registro de créditos compensatórios possa, de fato, garantir essa integridade.
São pontos importantes que se colocam também como possibilidades para os entes não regulados.
Não é uma tentativa de regular o mercado voluntário, mas, dentro do mercado regulado, que esse registro de crédito compensatório traga esses mecanismos, requerimentos metodológicos, para que os créditos considerados dentro desse mercado regulado garantam, assegurem, essa integridade.
Bom, já falei que não significa regular o voluntário, e esse é um ponto de muita complexidade. Inclusive, na visão dos diferentes projetos de lei que eu vou colocar aqui, hoje, a gente tem visto como grandes desafios para essa agenda, em termos de avanços técnicos e, por vezes, de cunho político, um ponto de natureza jurídica, que já foi mencionado aqui ontem, mas, enfim, como as licenças ou permissões e também como os créditos de carbono, dentro desse âmbito, considerados no mercado regulado, seriam entendidos em relação à natureza jurídica, como ativo financeiro ou ativo intangível, título mobiliário... Então, isso ainda é uma discussão que requer mais consenso, maior construção, porque ainda há muita divergência. E eu não digo isso somente pela visão do setor empresarial, mas, trabalhando com várias coalisões também, com juristas...
Um outro ponto é em relação à implementação gradual, especificamente em relação à agricultura. Então, também há uma necessidade de avanços nessa construção para entender o papel estratégico, qual é a melhor forma de incluir ou não incluir? E isso também está em aberto e já foi colocado aqui ontem como um desafio.
Questões tributárias, isenção tributária, se entraria ou não. Quais seriam esses tributos?
A governança. Os entes regulados, o agente regulador, o agente implementador...
E, por fim, se o sistema seria único ou independente. As propostas apresentam contextos distintos. Alguns, sistemas únicos, com um sistema de comércio de emissões e um registro de créditos compensatórios, ou créditos de carbono; outros já entendem que seriam sistemas independentes.
Então, a gente tem aqui alguns pontos muito importantes para continuar esse avanço na discussão, lembrando que o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE) está previsto na PNMC (Política Nacional sobre Mudança do Clima), de 2009, e a gente vê um hiato - desde 2009, por alguns anos, essa agenda não estava na pauta e, a partir dos últimos anos, principalmente em 2021, a gente vê um conjunto de iniciativas no Legislativo e, agora, mais recente, no Executivo também.
Então, é muito bom, essa sinalização é muito importante, de que a agenda climática está deixando de ser uma agenda ambiental, e, sim, uma agenda de desenvolvimento. Esse desacoplamento do crescimento do PIB do Brasil versus o crescimento das emissões de gases de efeito estufa é importantíssimo para que a gente tenha mais condições para uma economia verde com empregos, com geração de renda, de empregos. E que a gente consiga movimentar, através desse pacote de transição ecológica, todas essas iniciativas importantes.
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A gente tem aqui algumas iniciativas do Executivo e do Legislativo. Eu trago, muito rapidamente, só para a gente ter esse contexto: o PL 528, de 2021, que foi apensado ao 2.148, de 2015, na Câmara dos Deputados; o PL 412, aqui no Senado; em seguida ao PL 412, de 2022, a gente tem o Decreto 11.075, também, de 2022, que está para ser revogado; o PL 3.100, de 2022, que foi apresentado no final do ano perto do recesso legislativo e que traz um contexto muito similar ao conteúdo do 528, da Câmara dos Deputados - ele foi retirado agora, recentemente, e no lugar dele, agora, está o PL 2.229, que tem características diferentes, que não é necessariamente um cap and trade; e, por fim, uma minuta do Governo Federal, como já foi colocado aqui ontem pelo Secretário Rodrigo Rollemberg, uma iniciativa do MDIC, que agora está em construção do colegiado com esse grupo de trabalho informal interministerial no Governo e que traz uma compilação, uma análise, desses diferentes projetos de lei, consultando com empresas, com entidades, com organizações, para ver, de fato, qual seria o melhor caminho.
Então, a gente tem um cenário complexo, de várias iniciativas. Eu acho que a pauta é muito urgente, então é uma sinalização dessa celeridade. O setor empresarial tem se movimentado e se posicionado para que a gente, de fato, tenha essa celeridade até a COP 28, essa agenda tão estratégica.
O cap and trade predomina na maior dessas iniciativas, exceto no Decreto 11.075 e no PL 2.229 - mencionado há pouco -, alguns com abordagens diferentes sobre sistema integrado ou sistema único, mas eu acho que o principal, aqui, é que cada um desses PLs apresenta pontos relevantes, mas eles ainda não estão completos no sentido de trazer todas essas discussões para maior segurança jurídica que eu coloquei previamente, como esclarecimento de natureza jurídica, implementação gradual.
Então, acho que a gente tem um momento, agora, muito oportuno de trazer todos esses elementos à tona, construir consensos.
Que a gente tenha, de fato, um projeto que não vai ser, necessariamente, o mais completo, mas que ele abranja o mínimo suficiente para que a gente tenha essa ambiência política e, ao mesmo tempo, uma segurança jurídica para atrair investimentos, para reorientar a economia no âmbito desse pacote verde.
Então, mais uma vez, saudando e reconhecendo essas diversas iniciativas, reforço que o feito é melhor que o perfeito, neste caso. Eu acho que a gente deve trazer o que é possível efetivamente, e me coloco à disposição aqui para continuidade desse engajamento do setor empresarial, para participação dos diversos fatores dessa governança climática multinível.
Muito obrigada, Senadora. Obrigada a todos.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Grata pela explanação da Sra. Viviane Romeiro, representante do Cebds.
Eu vou passar, agora, a palavra ao Sr. Davi Bomtempo, por videoconferência, que é o Gerente Executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria.
Seja bem-vindo.
O SR. DAVI BOMTEMPO (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Senadora.
É um prazer estar aqui, mesmo que distante, e poder falar da estratégia da indústria para uma economia de baixo carbono. Com certeza, a parte de mercado de carbono vem assumindo um papel muito importante dentro dessa estratégia.
Queria cumprimentar também o Senador Confúcio Moura, que vem se inteirando e endereçando vários consensos e considerações sobre o assunto.
Gostaria aqui, já, de iniciar falando que é um tema que já vem sendo discutido há algum tempo. Conforme a minha apresentação e a minha fala, a gente vai notar que já tem muito ponto de sinergia entre vários atores da sociedade e, com certeza, eu vou reforçar alguns pontos que foram colocados pelo Cebds, de forma a mostrar que já existe um consenso em torno de um melhor modelo quando se fala de mercado de carbono.
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Inicialmente eu queria falar um pouco sobre a representatividade da própria CNI. Acho que mostra também a capilaridade em termos de sistema e oportunidade que se tem de a indústria ser parte da solução, principalmente gerando emprego e renda a partir do tema em discussão.
Hoje representamos 27 federações de indústria, 1,3 mil sindicatos e, também, cerca de 1 milhão de empresas cadastradas, então, isso mostra a capilaridade do sistema e a importância que o mercado de carbono vem assumindo dentro da agenda industrial.
Recentemente também divulgamos um documento que vai promover a neoindustrialização do Brasil, um documento muito bem construído, voltado e orientado por missões, ou seja, tem um impacto também no social, mas a ideia é a de que a descarbonização seja o pilar central, e é nisso que a gente vem, de certa forma, mobilizando todos os atores para que a gente possa convergir para essa agenda.
Eu vou compartilhar aqui a minha apresentação de uma forma rápida.
Senadora, você poderia me sinalizar se já estaria vendo a apresentação?
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - O.k.
Já está pronta.
O SR. DAVI BOMTEMPO (Por videoconferência.) - Perfeito.
A estratégia é importante e sempre gosto de iniciar por essa parte porque mostra um pouco do papel do mercado de carbono e da interação com os outros eixos, com os outros pilares. A CNI vem trabalhando numa estratégia para transição de baixo carbono, numa estratégia que contempla quatro grandes eixos. O primeiro sobre a transição energética e, nele, a gente fala sobre programas e projetos de eficiência energética como o próprio Aliança 2.0, um programa mais recente, na expansão de renováveis como solar, eólica, biomassa, na atração de novas tecnologias como hidrogênio verde, captura de carbono e também fortalecimento da política nacional de biocombustíveis.
Um outro pilar sobre economia circular, no qual a gente traz toda uma discussão em nível doméstico, por meio de um PL mais incipiente, mais inicial, que vai tratar do assunto sobre o qual, com certeza, a CNI também tem se mobilizado e também participado de todas as discussões, inclusive um projeto que nasceu dentro do Senado. Trabalhamos também a parte de compras públicas sustentáveis e agendas também mais fragmentadas, mas que têm uma grande contribuição para a economia circular, que é a agenda de reciclagem, de logística reversa, tão importante dentro da política nacional.
Um outro pilar sobre conservação florestal. Claro que o Governo tem um papel muito importante de comando, controle, fiscalização, mas abre oportunidades também para o setor privado a partir da bioeconomia. Era só para dar uma ideia.
Hoje saiu um relatório novo do Banco Mundial, que informou que hoje um quarto das emissões já são cobertas por instrumentos de especificação de carbono, então, isso também coloca a importância desse item dentro da agenda de redução de emissões. Claro que, também, no caso brasileiro, a gente não vai considerar só o mercado de carbono, é preciso que a gente olhe principalmente a questão do desmatamento ilegal, a expansão de renováveis e também políticas de biocombustíveis, para que a gente possa ter um cumprimento muito mais estruturado e pavimente esse caminho rumo ao cumprimento das NDCs.
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Aqui a gente já entra com a proposta da CNI.
É uma proposta e um posicionamento que foram construídos com vários setores industriais e, também, compartilhados e discutidos com outros atores da sociedade.
O que a CNI hoje defende é um mercado regulado de carbono sob a ótica do cap and trade, como uma forma de contribuir para as metas estabelecidas no Acordo de Paris. É claro que a base de construção desse posicionamento vem de longa data, ou seja, vem sendo construída a partir do PMR que foi colocado aqui pelo representante do Cebds, um projeto que compartilhou um entendimento com vários atores da sociedade, mas, também, em que a CNI utilizou um estudo no qual a gente procurou investigar oportunidades e barreiras em vários mercados internacionais já estabelecidos, mas que eu vou explorar um pouquinho mais a frente.
Temos também, de forma a contribuir e de forma mais estruturada, um GT de carbono, do qual participam todos os setores regulados na Política Nacional de Mudança Climática, ou seja, cimento, aço, alumínio, papel e celulose, químico e vidro. São setores responsáveis por grande parte das emissões do setor industrial, mas temos também a participação do setor de energia, petróleo e gás e setor elétrico, mas, principalmente, olhando para um modelo de sistema de comércio de emissões, como eu falei anteriormente, sob a ótica do cap and trade.
Aqui é apenas um resumo. É importante a gente ter ciência do que precisa estar dentro de uma estrutura geral do sistema de comércio de emissões. A gente fala aqui muito da parte de planejamento, ou seja, com aquelas funções mais voltadas para a parte regulatória, mas a gente não pode esquecer também de outras etapas tão importantes quanto, principalmente quando a gente olha para a mensuração relato e verificação e também para a parte do mercado de comercialização. É claro que esses três itens são considerados a espinha dorsal, mas, como a gente vai ver um pouco mais a frente, a gente pode adicionar alguns outros elementos para que a gente possa considerar um modelo adequado quando se fala do modelo proposto.
Aqui a gente defende uma governança robusta e, principalmente, que o setor privado esteja inserido dentro dessa governança. Isso é bastante importante, até porque é o setor que vai ser regulado, o setor industrial que vai ser regulado, então, é importante que ele esteja presente nas decisões estratégicas, nas tomadas de decisões e nas avaliações também para que a gente possa ter um modelo mais eficiente, manter os recursos financeiros aplicados dentro do sistema, trabalhar de forma compartilhada com a questão dos offsets, ou seja, compor a sistemática não só com allowances, mas promover também a inserção dos offsets como um estímulo também a um mercado voluntário de carbono. É claro que precisa atender alguns critérios para que possa fazer parte do sistema e, mais do que isso, que tenha também uma equidade quando se fala de geração de crédito. A gente defende também que sejam gerados créditos não só na parte florestal, mas, também, em projetos de eficiência energética, energias renováveis, resíduos, entre outros. Implementação de um sistema robusto de MRV, ou seja, a gente já precisa estar trabalhando esse item dentro do Poder Executivo de forma a pavimentar o caminho para quando a lei for aprovada e um sistema de compensação de créditos, muito ligado aí ao offset, como eu comentei anteriormente.
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Aqui, é importante ressaltar que a CNI acessou vários mercados para que pudesse ter aí argumentos qualitativos bastante eficientes na hora da discussão do modelo ótimo quando se falasse de mercado de carbono. Então, acessamos mercados mais maduros, mercados que foram faseados, mas que já estão caminhando dentro da sua estrutura, como o mercado europeu, o mercado também da Califórnia e do Canadá, mercados mais parecidos com o Brasil, como o México, mercados menores, como o da região metropolitana de Tóquio, e mercados também que já tinham colocado para dentro vários setores regulados, como a Coreia do Sul. E é importante não só para a indústria; é importante para outros setores.
Então, hoje, o que se defende, em termos de mercado regulado, não é só uma solicitação do setor industrial, vários outros setores econômicos vêm se beneficiando, como aí descrito nesse eslaide. Então, aqui, eu posso citar o setor de edificações, o setor de transportes, o setor de combustíveis e, claro, também o setor industrial. Mas é uma convergência de setores no entendimento de que um mercado regulado de carbono é, sim, importante e vai fomentar alternativas para que possamos reduzir as emissões.
Aqui, é um resumo de tudo que a gente falou. É importante notar que a ideia aqui é aproveitar o que a gente já tem definido, o que a gente já tem rodando em termos de atores e em termos de sistemas. É importante aqui verificar o sistema de governança, uma governança participativa entre setor privado e setor público, principalmente olhando para a necessidade e importância de um plano de alocação estabelecido por um órgão regulador, que precisa ser definido, mas também olhando para a parte de mensuração, relato e verificação, a partir das estruturas já existentes, sistemas. Enfim, é tentar aproveitar ao máximo para que a gente ganhe tempo também na regulamentação após a publicação da lei. E, claro, também, não esquecendo da parte de mercado de permissões e, principalmente, compondo com a questão das RVEs ou os chamados offsets.
Então, Senadora, eu fico por aqui. Agradeço, mais uma vez, a oportunidade. Desculpo-me novamente por não estar aí presencialmente, mas eu precisei entrar em uma missão e, dessa forma, não pude estar presente.
Muito obrigado a todos e fico aí à disposição.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Obrigada, Davi Bomtempo, representantes da CNI. Nós que agradecemos a sua disponibilidade. Todos entendemos a agenda. A agenda de todos nós aqui é bem puxada.
Bom, eu vou passar a palavra, agora, para a Sra. Aline Ferreira, Coordenadora do Grupo de Trabalho de Crédito de Carbono da Anbima.
Seja bem-vinda, Aline!
A SRA. ALINE FERREIRA (Para expor.) - Muito obrigada, Senadora. Mais uma vez, obrigada pelo convite e pela oportunidade de a gente estar aqui debatendo esse tema, que é tão importante para a pauta nacional.
A Anbima é uma associação que representa integrantes do mercado de capitais no Brasil e a gente procura sempre alinhar também muitos dos nossos entendimentos com os reguladores, Banco Central, CVM, e muitas instituições financeiras, fundos; então, a pauta aqui que estou trazendo procura refletir o pensamento que a gente tem dentro do mercado de capitais atualmente existente.
Em linha com o que muitos dos colegas aqui disseram, a gente tem uma preocupação bastante voltada para a questão da liquidez do mercado de carbono. Acho que a gente tem uma pauta muito clara da necessidade de esse mercado ser pungente, líquido e trazer a possibilidade de uma diminuição das emissões, ao longo do tempo, mas a preocupação que a gente tem aqui é de como a segurança jurídica, em volta desse assunto, pode facilitar as emissões e o trade desse ativo.
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Então, para o mercado financeiro poder contribuir com os emissores e com o mercado global em que a gente está inserido, a gente pensou em algumas alternativas relacionadas, especificamente, ao PL 412, que a gente tem acompanhado, desde o começo.
A gente também defende muito essa estratégia do cap and trade e entende que ela é a que tem se mostrado mais bem-sucedida, nos mercados que a gente tem visto, globalmente. Até por conta disso, a gente tem aquela preocupação de como é que eu consigo inserir esses ativos no arcabouço regulatório nacional, para possibilitar não só a emissão segura, com o lastro efetivamente existente, mas também que intermediários possam ajudar a dar liquidez a essa circulação dos ativos.
Então, uma percepção que a gente tem visto, em alguns mercados, é o tratamento desses ativos emitidos de carbono como commodities. A gente tem visto isso em diversas jurisdições e nos parece que, dentro do arcabouço nacional, isso seria o que facilitaria mais a liquidez e a robustez desse ativo. Por quê?
Tratando um ativo como esse como commodity, hoje, a gente já tem um arcabouço que acaba acolhendo a commodity, então, eu consigo instituições financeiras que podem operar commodities, a gente tem players, no mercado, já em registradoras e tudo mais, que estão prontas para tratar das commodities. Então, se o ativo de carbono for uma commodity, na essência, no momento da emissão, já existe um mecanismo para acolher a commodity e facilitar a sua negociação.
Existem também - a gente tem conversado, um pouco, com reguladores e, inclusive, com a CVM - aqueles projetos dos créditos não performados. A gente, talvez, precise pensar em estruturas mais complexas, envolvendo securitização, e talvez tratar isso como valor mobiliário, o que, obviamente, traz todo um arcabouço regulatório, um custo para o Brasil, mas que a gente entende que estaria inserido dentro de um contexto que possibilita financiamentos desse mercado e facilitaria o acesso de novos emissores, de novos investidores. Isso ajudaria.
Só que vocês falaram de um ponto que eu acho que é muito relevante que é a diferença entre mercado regulado e mercado voluntário. O mercado regulado, necessariamente, precisa de parâmetros. A gente precisa ter os parâmetros bem estabelecidos, para gente ter a certeza de que estamos atendendo o que é necessário para as contas nacionais - o que precisa ser emitido, o que precisa ser aposentado - e acompanhar esse inventário. Mas existe um mercado voluntário que a gente não pode desprezar, até porque o Brasil tem o potencial de ser um dos maiores mercados de emissores dentro desse cenário.
Então, uma das coisas importantes que aparece no PL 412 é: como é que eu faço o mercado voluntário conversar com o mercado regulado? Uma das coisas que aparece, nesse PL, que para nós é muito relevante, é o certificado, a certificação. Quando a gente tem o certificado, eu consigo trazer créditos de um mercado voluntário que, não necessariamente, estão padronizados da mesma maneira, não necessariamente têm a mesma fonte, mas eu consigo criar parâmetros tais que, se atendidos os requisitos do certificado, eles ficam equivalentes aos créditos do mercado regulado. E eu consigo com isso gerar uma certa fungibilidade.
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Como a minha colega Viviane falou um pouco mais cedo, a gente, no Brasil, tem um mercado que é um pouquinho diferente dos de outras jurisdições. Nós temos um mercado que tem um potencial de ser muito ativo, e a transferência entre o mercado voluntário e o mercado regulado vai gerar uma liquidez, a nosso ver, muito significativa. Mas para que isso funcione, eu preciso dessa padronização para que a gente consiga trasladar o crédito emitido no mercado voluntário para o mercado regulado. E não só isso: é preciso fazer isso de uma maneira que globalmente a gente consiga achar fungibilidade, achar transferibilidade nos ativos. Então, quando a gente tem o certificado que aparece no PL 412, é muito importante que a gente não só estabeleça os parâmetros para essa certificação, mas leve em consideração critérios que hoje já globalmente são aceitos para essa certificação acontecer.
Hoje, a gente já tem um mercado muito ativo de carbono no mundo. Então, se a gente puder sempre ir fazendo as adaptações para o arcabouço regulatório brasileiro, porque são necessárias... Nós temos aqui sistemas de registro, nós vamos ter que ter o acompanhamento do inventário, isso tudo vai precisar acontecer. Mas se nós pudermos fazer isso da maneira mais simples possível, sem perder a eficácia e a robustez, como vocês mesmo falaram um pouco antes, eu acho que isso é o que vai trazer para nós não só uma liquidez no mercado local, mas também a possibilidade de a gente se inserir no mercado global, que já existe. Então, essa preocupação da certificação é muito importante para nós.
Ele está hoje no PL sendo tratado como um ativo financeiro. A gente tem algumas preocupações, algumas observações com relação a tratá-lo assim, porque quando a gente chama de ativo financeiro, a gente acaba trazendo a reboque toda a regulamentação de ativo financeiro que hoje tem um custo relacionado à robustez do nosso sistema jurídico, porque daí eu posso começar a criar problemas quando eu for comparar. É mais fácil emitir no Brasil ou emitir fora do Brasil? E hoje esse é um mercado global suficiente para que o emissor cogite ter essa dúvida.
E se ele tem essa dúvida, por que a gente não cria um aqui - já que estamos pensando juntos, como vocês falaram; é um momento de diálogo, de tentar fazer um projeto abrangente - um sistema que, embora robusto, embora adaptado ao nosso arcabouço, viabilize tanto a emissão local quanto a emissão fora.
Então, é pensar um pouco se a gente consegue - eu acho que um diálogo aberto é muito importante para isso - entender um pouco como é que isso já funciona em mercados em que isso já está ativo para tentar importar para cá.
Então, ativo financeiro funciona? Desde que a gente conseguisse adaptar alguns conceitos. Hoje a gente já tem esses ativos custodiados em algumas... na Verra, lá fora, e em outras entidades lá fora. Daria para a gente utilizar essa custódia como alguma coisa semelhante à custódia que a gente tem no Brasil?
E aqui eu vou entrar em muita tecnicidade jurídica, mas eu acho que é muito importante. A questão da natureza jurídica é o que eu acho um grande definidor do sucesso desse mercado, a ver da Anbima.
Então, acho que é um ponto que a gente vai precisar depurar ainda mais. Acho que não existe total consenso, ainda tem muitos trabalhos sendo feitos, é um tema muito dinâmico, mas eu acho que é um tema em que a gente tem que se concentrar, assim que possível, porque ele é o que vai gerar não só a segurança para quem emite, a segurança para quem compra para fazer a compensação do carbono, mas a segurança para quem vai fazer essa intermediação - achar investidores, procurar gente no Brasil e fora, fundos que estejam dispostos a contribuir com o financiamento desse mercado. Acho que esses são os aspectos mais relevantes aqui.
Uma das coisas que eu gostaria de não deixar de mencionar é que para que isso tudo funcione, como eu falei antes... A gente tem um mercado que é global e nesse mercado global a gente tem já o que a gente chama em português de acompanhamento, mas seria o traceability, que é você conseguir identificar quem detém o crédito ou por onde ele passou, quem comprou, para a gente ter lastro e ter certeza da robustez do crédito de carbono.
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Nisso daí seria importante a gente pensar um pouquinho em interoperabilidade, com sistemas já existentes. Então, se o Brasil criar um sistema, qualquer que seja ele - de registro, de inventário -, esse sistema precisa conversar, de certa forma, com sistemas globais que mostrem onde estão custodiados esses ativos, onde eles estão circulando e onde eles estão sendo comercializados, porque essa interoperabilidade é o que vai trazer a segurança para que o investidor, não necessariamente local, possa também ajudar a financiar o mercado de carbono brasileiro.
E tem muito interesse. Nós que estamos nesse mercado sabemos que o Brasil é olhado como um grande potencial gerador desses créditos e o mundo inteiro tem muito interesse nisso. Então, se a gente viabilizar essa interoperabilidade, os investidores estrangeiros também enxergarem essa robustez no Brasil e fique fácil de eles operarem tanto aqui quanto fora, a gente consegue aumentar ainda mais a liquidez disso para poder financiar, de maneira mais eficiente, esse mercado.
Acho que era isso que eu tinha para falar aqui um pouquinho.
Eu queria, mais uma vez, agradecer.
E estou à disposição para dúvidas.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Obrigada pela sua participação, Aline, que é representante da Anbima.
Vou passar agora a palavra para a Sra. Cristina Reis, Subsecretária de Desenvolvimento Econômico Sustentável do Ministério da Fazenda.
Seja bem-vinda, Cristina!
A SRA. CRISTINA REIS (Para expor.) - Olá! Bom dia a todas e todos!
Eu gostaria de cumprimentar a Senadora Leila e de agradecer muito o convite, em nome do Ministério da Fazenda. Cumprimento as minhas colegas de mesa e também os colegas que estão online.
É uma satisfação muito grande participar desta audiência.
Eu vou aqui frisar as palavras da Senadora, no início dessa sessão, da importância de a gente dialogar. Todo mundo aqui frisou isso bastante. Ainda que haja divergências, a gente consegue, sim, trazer convergências a essa matéria, que é o mercado brasileiro de comércio de emissões. A gente já tem boa base para isso. As falas demonstram o amadurecimento das discussões. Todas as falas foram bastante densas, técnicas, qualificadas e eu fico muito satisfeita delas participar.
Quero parabenizar a todas e todos e, na figura da Senadora, saudar todos os presentes aqui e também quem nos acompanha.
Bom, como foi citado o pacote verde da Fazenda, eu acho que cabe eu começar a minha fala situando a discussão de mercado de carbono nas atividades atuais do Ministério da Fazenda.
Então, como todos sabem, o arcabouço fiscal está em tramitação. Ele foi votado, ele está evoluindo. A reforma tributária é outro tema muito importante fazendário, que vem aqui para o Legislativo e também está em amplo diálogo. E o pacote verde, que na verdade se chama transição ecológica, é uma outra prioridade no Ministério da Fazenda, que é complementar às demais.
A transição ecológica é uma visão de país, de Brasil desenvolvido com inclusão e sustentabilidade. Eu também vim com o meu colarzinho verde aqui, como a Senadora veio. Bom, verde é a minha cor preferida, apesar de eu ser muito corintiana, tá? (Risos.)
Mas é porque a sustentabilidade, entendida num conceito profundo de não só sustentar a dinâmica econômica baseada na proteção, na conservação dos nossos biomas, numa economia robusta, com inovação, tecnologia e pesquisa que desenvolvam tecnologias para que a gente lide melhor com o meio ambiente e, ao mesmo tempo, gere empregos qualificados, numa dinâmica de renda positiva, que garanta a melhoria da qualidade de vida da população - que eu acho que todos nós queremos.
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Então, a transição ecológica é essa visão de mudanças de paradigmas de produção, de tecnologia, em que a nossa matriz de atividades econômicas será voltada para a sustentabilidade. É mais do que uma transição, pois considera todos os setores de atividade econômica e valoriza a natureza e as pessoas.
Dentro do pacote de transição ecológica, à semelhança um pouquinho do que apresentou a estratégia da CNI, nós temos seis eixos.
Os eixos são: o primeiro, finanças sustentáveis; o segundo, adensamento tecnológico, que inclui a nova industrialização, por exemplo, mas também entende o setor agropecuário e o de serviços como muito importantes, centrais para a estratégia, porque trazem um componente de intensidade tecnológica - a gente sabe que a gente tem uma agropecuária de intensidade tecnológica robusta e também serviços industriais que participam dos processos industriais. Então, o segundo eixo é o adensamento tecnológico -; o terceiro é transição energética; o quarto, bioeconomia; o quinto, economia circular; e o sexto, uma nova infraestrutura econômica e social.
O pacote de medidas é uma visão de que a Fazenda entrega diversos instrumentos financeiros, econômicos, regulatórios, de fiscalização e monitoramento. Então, nós não propomos, por exemplo, os grandes objetivos da bioeconomia. Há outros ministérios envolvidos nisso, mas a Fazenda tem a obrigação de contribuir com os instrumentos econômicos e os incentivos para a consecução desses objetivos e é por isso que eles precisam estar muito bem alinhados.
Dentro de finanças sustentáveis, a gente tem alguns instrumentos já desenhados - acho que o Senador está pedindo uma palavrinha ali - e esses instrumentos têm, em primeiro lugar, o mercado regulado de carbono. Tem também os títulos verdes sustentáveis e insustentáveis, que o Tesouro está planejando. E tem uma outra matéria que é de interesse dos senhores e das senhoras, que é a taxonomia sustentabilidade - a definição de conceitos, de entendimentos em torno de ativos e atividades econômicas sustentáveis.
Pensando nessas prioridades da Fazenda, entra a Subsecretaria de Desenvolvimento Econômico Sustentável, que eu coordeno e que faz parte da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda. A subsecretaria é nova, é uma contribuição do atual Governo. E eu sempre digo que a nossa missão principal é promover e contribuir para a ponte entre o regime macrofiscal e as demais políticas de desenvolvimento, sejam elas industriais, comerciais, de inovação etc. Então é necessária essa coerência entre o regime macroeconômico e as políticas de desenvolvimento, e nós estamos aqui para isso.
Tendo essa missão em vista, assumimos, há cerca de algumas semanas, a função, a liderança do dito grupo de trabalho formal das discussões técnicas sobre mercado regulado de carbono.
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Então, a nossa subsecretaria está coordenando esse grupo técnico, que tem ao menos dez ministérios envolvidos. E é claro que a gente entende a importância desse tema. É a nossa prioridade, como eu expressei aqui, e também nos colocamos em defesa do cap and trade e do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões.
Por quê? Bom, tem vários motivos para isso. Vou elencar aqui alguns. Ele vai ser um instrumento essencial, como foi bem-dito aqui, da PNMC. Ele vai ser coerente com as nossas metas para redução de emissões. Ele tem, conforme a literatura e a experiência de outros países também demonstram, maior efetividade do que, por exemplo, a tributação; e uma flexibilidade maior também, apesar da maior complexidade. E é por isso que exige de fato uma governança muito bem realizada, um planejamento bastante estratégico, mas isso não quer dizer que ele é demorado, vai ter que ser demorado. Ele pode ser célere, mas com a profundidade necessária.
Eu sou uma pessoa bastante exigente. Eu gosto de buscar a perfeição, mas o feito mesmo é melhor que o perfeito. E a gente está trabalhando nessa proposta para que o texto que chegue ao final dos trabalhos desse grupo técnico seja bastante completo. E chegue aqui ao Legislativo bastante completo para a sua reflexão.
Além disso, esse mercado, também foi frisado aqui, tem efeitos mais dinâmicos sobre a inovação, sobre a eficiência mesmo da produção e da gerência, da administração do portfólio de ativos das empresas e da competitividade. A gente não deve sonhar, a gente deve ter certeza de que o nosso sistema brasileiro não é um sonho, é uma meta. Pode ser uma grande, senão a maior, referência mundial. Eu tenho convicção disso.
O Brasil, nem vou entrar aqui porque eu acho que todos já disseram, tem muito talento para isso. O nosso sistema vai ser muito bem-feito. E, além disso, ele pode ainda por cima gerar receitas para o financiamento de outras políticas nessa visão de descarbonização e de sustentabilidade para o futuro.
Agora entrando um pouquinho no que a gente está imaginando e no que a gente está trabalhando nesse texto, em total consonância com os demais que falaram aqui, a gente tem como referência o PMR, que é o Partnership for Market Readiness, do Banco Mundial.
E no PMR há uma proposta de estruturação desse mercado e de como a lei deve ser construída, estruturada; quais são os elementos dessa lei. Então, lá no PMR tem uns dispositivos gerais, com características, com definições que precisam estar muito claras: o que é o crédito de carbono, o que são as instalações, o que é o registro. Então, tem todo um preâmbulo de definições muito necessário.
Na natureza jurídica dos artigos certamente precisa constar uma descrição de como será e o que deve constar no plano nacional de alocação para as emissões; o tratamento de dados e MRV (Monitoramento, Relato e Verificação).
Então, a gente precisa deixar claro o custo agregado para alcance dessas metas; também um componente de infrações - prever o que acontecerá caso haja infrações -; aspectos organizacionais em geral e dispositivos finais.
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A gente, além disso, recebeu muitos materiais, inclusive o da CNI, do Cebds. Estamos por dentro da literatura, participando de eventos nacionais e no exterior para nos municiar, o máximo possível, de tecnicidade para a construção desse texto.
Então, é isso que eu posso assegurar a vocês. Deixo, aqui, a mensagem de que a nossa Subsecretaria está à disposição para dialogar, e nós estamos com o objetivo principal de ter uma coerência nessa proposta e de agregar as discussões que estão já em tramitação, aqui, no Legislativo.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Excelente, Sra. Cristina.
Obrigada pela presença, representante aqui do Ministério da Fazenda.
Eu vou passar, agora, a palavra para o nosso último expositor desta audiência, o Sr. Luciano Rodrigues, que é o representante da Única.
Seja bem-vindo, Luciano.
O SR. LUCIANO RODRIGUES (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Senadora.
É um prazer participar aqui. Já agradeço de antemão o convite feito para que a Única participasse desta audiência. Parabenizo a Senadora, os componentes desta Comissão e toda a equipe técnica. Também gostaria, aqui, de cumprimentar os meus colegas que participam desta audiência.
Bem, a Unica representa os produtores de bioenergia. A indústria de que a gente está falando aqui é uma indústria que ultrapassou a fronteira tradicional do setor agrícola como provedor de alimentos já no início da década de 30, com mais intensidade na década de 70, e é a indústria que era a indústria do etanol, da cana-de-açúcar no passado; há uns 15 anos, também se tornou a indústria da bioeletricidade; e, hoje, nós temos, além de etanol de cana-de-açúcar, etanol de segunda geração, produzida a partir de biomassa, etanol produzido a partir do milho de segunda safra, bioeletricidade produzida a partir do bagaço, bioeletricidade produzida a partir do biogás, biometano para substituir o gás natural e o diesel, créditos de descarbonização - que eu acho que é um tema em que a gente vai se aprofundar um pouco aqui, pelo menos eu vou fazer isso na minha fala -; e temos aí uma série de perspectivas para o uso e produção de combustível sustentável de aviação e hidrogênio baseado em matéria-prima renovável.
O fato é que nós estamos falando de uma indústria que usa, hoje, menos de 1% da área disponível no país e é responsável por quase 20% de toda a energia primária ofertada no país, é a segunda principal fonte de energia no Brasil e a primeira fonte de energia renovável.
Então, nós estamos conversando aqui sobre um setor que está muito envolvido nos temas relacionados a bioeconomia - bioenergia faz parte -, transição energética, mercados de carbono e economia circular. Dito isso, eu acho que o tema e a proposta do PL são muito interessantes e corroboro aqui com a visão dos meus colegas de que, de fato, a gente precisa avançar nesse assunto. Então, é superpertinente e importante para o país.
O que eu queria colocar aqui - eu sei que esse assunto foi discutido bastante na audiência de ontem, então colocar aqui com um certo cuidado - é que nós temos hoje, como todos conhecem, a Política Nacional de Biocombustíveis; foi aprovada em 2017 e já está, digamos, em funcionamento há mais de três anos E nessa política existe também o crédito, o tal do Cbio (Crédito de Descarbonização). Só para a gente ter grandes números, nesses três anos foram emitidos cerca de 90 milhões de Cbios, ou seja, 90 milhões de toneladas em termos de redução de emissão. É um mercado que movimentou nesses três anos R$6,5 bilhões.
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Eu acho que a gente tem aqui alguns elementos e talvez algumas lições que foram aprendidas ao longo desses anos que podem ser úteis na estruturação em diferentes etapas desse novo mercado.
Quando a gente olha o processo de certificação do RenovaBio, entendo que a metodologia pode ter algum tipo de discussão técnica, análise de ciclo de vida ou não, discussão sobre linha de base, adicionalidade, questões de não permanência. Enfim, assim como nós temos essas discussões com os diferentes programas ou os diferentes modelos de certificação, não só no Brasil, fora também, mas eu acho que a estrutura de validação e auditoria foi muito bem construída.
Nós estamos falando de um programa em que se tem a auditoria de uma empresa externa, de uma Price, de uma KPMG. Depois, no segundo momento, nós temos a auditoria feita pela sociedade. Os dados de todos os produtores de biocombustíveis que queiram participar do programa ficam expostos por 30 dias para que qualquer um possa questionar os números que lá estão. E, por fim, tem o último layer, que é a auditoria feita pela agência reguladora, pela ANP, pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis.
O fato é que nós emitimos 90 milhões de Cbios ao longo desses três anos, quase três anos e meio do programa, e não existe absolutamente nenhum questionamento sobre qualquer tipo de fraude ou qualquer tipo de falha nesse processo.
Então, foi, digamos assim, optou-se por um processo, digamos, um pouco mais robusto, ainda que demore mais, mas, com isso, se evitou qualquer tipo de questionamento em relação à autenticidade daqueles dados.
O programa também foi além em termos de uso do solo, além do que exige a legislação. Então, desde 2018, quando a norma foi publicada, os produtores que participam do programa se comprometem com o desmatamento zero, ainda que desmatamento legal.
Então, eles têm que fazer monitoramento de todas as áreas que fornecem matéria-prima para biocombustível, com imagem de satélite com resolução de 30m. Esse monitoramento é feito todo ano e, a cada três anos, também tem que passar esse processo de certificação com uma empresa de auditoria externa, a sociedade e a ANP. Então, esse é outro elemento importante.
Um outro ponto que eu acho que foi superimportante aqui e que também evitou qualquer tipo de fraude foi a emissão do crédito. A gente foi na época entender como funcionava fora do país, viu problemas, por exemplo, nos Estados Unidos e em outros órgãos e optou-se também por uma estrutura mais robusta, ainda que traga um pouco mais de custo.
Então, hoje os produtores que querem emitir pagam para que o Serpro valide as notas fiscais que geram lastro para emissão desses créditos. Então, todo crédito é lastreado em nota fiscal que foi validada pelo sistema de processamento federal.
Então, eles checam se essa nota fiscal existe no banco de dados da Receita Federal, se não teve, se o comprador daquele biocombustível deu um o.k. que recebeu esse biocombustível. E aí a gente tem segurança e certeza de que essa operação aconteceu.
A partir daí, autoriza-se uma instituição financeira. Então, foi colocada uma instituição financeira dentro do processo, que faz a geração propriamente desse título, e a comercialização é registrada na B3 no final de cada dia.
Então, quer dizer, tem um envolvimento e uma robustez. A colega da Anbima participou de forma muito ativa também na construção desse arcabouço. Então, a gente tem hoje um mercado aqui que também representa uma tonelada de carbono que deixou de ser emitida ou que foi capturada mais adiante e que, hoje, ou pelo menos nas versões preliminares do texto, foi sumariamente excluída do mercado, desse novo mercado de carbono, do qual a gente está aqui discutindo a sua criação.
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Então, dos elementos que eu queria deixar aqui sob os pontos de vista do setor de bioenergia do Brasil, o primeiro deles é relacionado a essa exclusão sumária de uma possibilidade, no futuro, de integração, seja dos programas, seja do instrumento, do crédito da tonelada de carbono entre o RenovaBio e o mercado de carbono que se está criando.
Entendo que a lei vai trazer critérios, conceitos, premissas, diretrizes, e todos os títulos que atenderem a esses critérios, premissas, esses conceitos e diretrizes deveriam ter a possibilidade de participar. Eu confesso que, neste momento, não faz sentido a gente discutir, para dentro da lei - pelo menos essa é a minha visão -, uma integração desses programas, porque são programas que, aparentemente, têm conceitos diferentes, tem níveis de maturidade diferentes - nós estamos falando de um que vai começar e outro que já está em funcionamento e que tem estrutura de governança distinta -, mas é importante que o instrumento legal não vede essa possibilidade no futuro.
Nós vamos ter aqui um tempo longo de regulamentação, uma discussão grande sobre metodologia de certificação, de mensuração de carbono e, mesmo mais adiante, de comercialização. Então é importante que isso fique aberto para que, ao longo dessa discussão, ainda que com ajustes, seja na política vigente - o RenovaBio -, seja naquela que está sendo criada, que a gente possa ter a possibilidade de avaliar se faz sentido para o país, ou seja, se a gente traz mais eficiência, mais liquidez, como foi colocado, eventualmente poderemos ter algum tipo de integração, de fungibilidade, entre esses ativos no futuro.
Então, nos preocupa quando a gente vê no texto um artigo excluindo, de maneira sumária, um título sem nenhum tipo de justificação, de justificativa adequada.
Um segundo elemento, que eu entendo que talvez não caiba no texto e no instrumento que se está discutindo, porque ele pode ter vício, está relacionado à estrutura tributária. Nós estamos criando uma estrutura tributária diferenciada nesse novo mercado em relação à estrutura tributária que existe para o crédito de descarbonização. Hoje esse crédito paga quase 25% de tributo entre PIS-Cofins e Imposto de Renda.
Então, é importante que a gente preserve, para frente, que qualquer título que tenha previsão legal, que represente uma tonelada de carbono que deixou de ser emitida, ou uma tonelada de carbono capturada, tenha estrutura tributária isonômica, para que a gente não crie nenhum tipo de distorção entre esses diferentes títulos.
Então, esses seriam os dois elementos aqui que eu gostaria de trazer. Acho que o tema é super-relevante. É importante que, de fato, a gente avance nessa área, e acho que os dois pontos que eu queria trazer são essa possibilidade da legislação, deixar aberta a possibilidade de a gente estudar uma eventual integração, ainda que de forma paulatina. É preciso entender se isso integra de forma total, ou se a gente vai integrar os instrumentos, e se os instrumentos têm estrutura de tributo isonômico.
E aqui, para fechar, nós não estamos propondo nenhuma jabuticaba, nenhum abacaxi. O Brasil tem, de fato, uma condição diferenciada, e nós já temos lá fora, seja na Califórnia, seja no Canadá, programas muito parecidos com o que a gente tem aqui, que tratam de intensidade de carbono no setor de combustível e que estão conectados, de alguma forma, com o sistema de cap and trade. Então não é algo exclusivo do Brasil.
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Mais uma vez, gostaria de agradecer o tempo aqui que nos foi dado. Não quero estourar muito mais aqui do que eu já tinha. E estou obviamente à disposição para que a gente possa conversar e discutir eventuais perguntas sobre o tema. Mais uma vez, muito obrigado pelo convite feito aqui pela Senadora para a participação da Unica nesta audiência.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Grata pela exposição, Luciano, que é Diretor de economia e Inteligência Setorial da União da Indústria de Cana-de-açúcar e Bioenergia (Unica).
Bom, feitas as considerações iniciais pelos nossos convidados, eu passo agora a palavra para os Senadores que estão presentes na audiência. O Senador Confúcio primeiro, pediu e é requerente da audiência.
Com a palavra, Senador. Bom dia.
Senador Zequinha também gostaria de falar depois? O.k.
O SR. CONFÚCIO MOURA (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - RO. Para interpelar.) - Sra. Presidente, convidados, palestrantes, parabéns a todos pela riqueza de informações e conhecimento apresentados aqui. Eu acho até difícil a gente consolidar todas essas ideias maravilhosas dentro de um projeto de lei que está tramitando aqui no Senado Federal.
Temos o tempo dos projetos. Tem projeto que demora 20 anos, 30 anos para poder sair da Casa. Ele sai daqui do Senado, desta Comissão, vai para outra Comissão, depois vai ao Plenário, depois vai para a Câmara, da Câmara, inicia todo o procedimento, e termina que, às vezes, a gente não tem data de conclusão desses projetos e todas as alterações que eles sofrerão no decorrer dessas andanças por inúmeras Comissões.
O certo é que o Brasil está atormentado com o desmatamento. Isso tem, assim, deixado o Brasil exposto nesses últimos seis anos, ou mais tempo em que o desmatamento é gradativamente aumentado, e a gente gostaria muito de segurar o desmatamento. E a única maneira de segurar o desmatamento seria uma compensação para os produtores, principalmente para o bioma amazônico e outros biomas importantes, terem fontes de recurso para deixar realmente a floresta em pé. E tendo uma compensação que viesse dessas fontes outras, como o crédito de carbono, nas suas mais variadas modalidades.
Então nós aqui temos certa pressa de que ele saia, o projeto saia daqui do Senado. E não é uma pressa que seja, assim, um fator que o projeto saia não completo, porque eu vi, pelas observações dos palestrantes de ontem e de hoje, a riqueza das informações das entidades. Por exemplo, as entidades das empresas, as entidades do crédito, da parte financeira, do Governo, da CNI e outras tantas, apresentando os seus pontos de vista.
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Assim, o que me atormenta muito... E eu até sou um dos autores desses requerimentos de audiência pública, para dar à Senadora Leila as condições de ela ouvir tudo e consolidar ou enriquecer o seu relatório, que está na mão dela para poder ser despachado.
E nós ficamos assim pensando que é muita coisa, o tema é palpitante. O mundo está, assim, eufórico com tudo isso, com a política ambiental, está no cenário do debate internacional em tudo, mas nós precisamos fazer o nosso dever de casa.
O Brasil oferece ao mundo o que tem de melhor, que são as florestas em pé, mais de 55% de florestas em pé. Isso é um ativo, é um ativo ainda... Eu não posso falar que seja um ativo financeiro, mas é um ativo, assim, posso dizer, importante, que o país guardou para que as gerações futuras pudessem obter algum benefício.
O Zequinha, do Pará, deve ter conhecido vários professores da Universidade do Pará, dentre eles a Profa. Nazaré, que faz mais de 30 anos que eu conheci. Ela já vinha estudando a pobreza e o meio ambiente na Amazônia. Ela estudou muito isso na Universidade do Pará. O projeto dela se chamava Poema (Programa Pobreza e Meio Ambiente na Amazônia), justamente mostrando o contrassenso de uma região potencialmente rica ambientalmente e a população muito pobre, onde estão os piores indicadores que há no mundo. Então, esse crédito de carbono, essa legislação, é muito importante que realmente aconteça.
A gente tem perambulado por muitos ministérios. Hoje, para a minha surpresa, eu vi a Dra. Cristina Reis demonstrar, representando o Governo, um conhecimento bom. Porque eu andei em alguns ministérios e o pessoal não entende nada. Eles não sabem de nada, zero quilômetro. A gente conversa, conversa, e falam: "Rapaz, eu não sei como fazer, nós estamos ainda estudando, vamos observar". Estão inda em um ponto das conjecturas. Eu vi aqui já as outras entidades demonstrando um conhecimento maior, uma robustez de dados, já falando uma linguagem mais fluente, dominada pelo conhecimento, que eles debatem, todos que falaram aqui têm um conhecimento comprovado.
O meu tormento aqui é justamente colaborar com a nossa querida Senadora Leila para ela produzir esse relatório, que foi originalmente relatado pelo Tasso Jereissati e que está aqui conosco, para andar.
O tema é importantíssimo. As empresas e as entidades do crédito voluntário têm trabalhado há mais de 15, 20 anos, trabalhando, batendo, como água mole em pedra dura, para ver se a coisa acontece. Mas não acontece, não acontece. Os negócios são pequenos e no mercado voluntário os valores são muito baixos, quase que não compensam essas negociações, são muito baixos. Logicamente, o regulado daria uma segurança jurídica muito maior.
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Então, dessa forma, eu quero, assim, parabenizar todos. Eu acho que agora a Senadora Leila tem muitos parceiros para ajudá-la no fechamento do seu relatório final. Desejo a ela muito sucesso!
E eu quero, também, fazer coro aqui à Leila quando da introdução, na abertura deste trabalho, ela, indignada e emocionada sobre o que aconteceu ontem no Brasil, no fechamento de uma medida provisória do Governo sobre cargos. Por exemplo, a dos povos originários, foi criada agora, recentemente, está lá uma Deputada indígena, no Ministério, e foi sacado dela a demarcação das terras indígenas, para o Ministério da Justiça. Então, ficou, ali, ela, somente com um cocar na cabeça, como uma fantasia e sem nenhum poder, assim, de exercer o seu ministério, o seu poder como uma Ministra, efetivamente, para a demarcação das terras indígenas. Quem é mais competente do que uma indígena e o Ministério novo para demarcação das terras indígenas?
Então, vai lá para o Ministério da Justiça... Faz parte do fundo penitenciário, faz parte de outras questões. Muito mais difícil.
E, também, a Marina Silva... A Marina Silva é uma figura emblemática para o mundo. Ela tem a fisionomia frágil, a Marina, mas aquela fragilidade dela é uma fragilidade aparente, porque a Marina Silva tem a força dos monges, uma holística, uma espiritualidade, que ela adquiriu no Acre, na floresta. Ela veio do seringal. Então, ela encerra toda essa dinâmica até da ayahuasca, todas essas coisas que só a floresta entende.
Ela representa, também, um poder de respeito internacional muito grande - muito grande. E eu lembro da Marina Silva, anos atrás, eu era Deputado na década de 90, e ela enfrentou, com todas as dificuldades, no Brasil, os debates e audiências litigiosas gravíssimas, ameaçadoras para implantar o Código Florestal brasileiro. E ela conseguiu.
Então, ela representa o que há de mais nobre hoje na política ambiental brasileira. Só a presença dela ali, calada, já fala muito.
Então, essa questão do respeito, ninguém é contra a exploração do petróleo lá na foz do Amazonas não, de jeito nenhum, mas se está precisando é de evitar acontecimentos trágicos, como aconteceu em Brumadinho. Ninguém dava bola para os moradores do entorno do Rio Doce. Ninguém dava bola para eles lá, que moravam lá. Quando veio aquele desastre, que saiu arrastando tudo, é que mostrou, realmente, a complexidade de uma construção de mineração, ou outras equivalentes, do risco que ela causa para o meio ambiente, para o rio, para os peixes, para a sobrevivência e para os moradores do entorno.
Ela estava cuidando para que lá, no Amazonas, se tenha os mesmos cuidados, os mesmos cuidados com os moradores tradicionais da floresta. Os mesmos cuidados com os acidentes de vazamento de gás e de petróleo no Rio Amazonas ou no oceano. O que ela quer é isso! É estudar detalhadamente essas coisas. Ela não é contra nada de construção de uma base petrolífera, de extração de petróleo lá não, de maneira nenhuma! Ela só quer que o Ibama seja respeitado, porque o que aconteceu com esses órgãos ambientais foi um desmonte trágico. Se a gente continuar dessa maneira, a boiada vai continuar passando naturalmente no Governo Lula, que é um governo que assumiu compromissos ambientais internacionais e está viajando pelo mundo vendendo essa imagem. Então, é isso que nós queremos.
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Eu quero parabenizar... Já chega de discursos - não é, doutora? Chega de discursos! E quero parabenizar a vocês todos. Foram realmente maravilhosas, um sucesso. Eu não sabia que vocês sabiam tanto. Maravilhosas mesmo! E os dois meninos também, extraordinários. Parabéns a todos vocês!
Eu vou pedir licença, gente, porque tem um pessoal ali me esperando e eu tenho que ir lá. O telefone já tocou aqui e eu vou lá, mas saio daqui muito satisfeito com a audiência pública.
Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Senador, o senhor tem o tempo que o senhor quiser para falar. É muito bom ouvi-lo e, ainda mais, porque foi um dos requerentes dessas audiências, tamanho o conhecimento e a experiência de Senador Confúcio, entendendo que era importante trazermos à Casa todos os players para ouvirmos sobre essa temática. Então, assim, por toda a experiência, é sempre bom ouvi-lo. Obrigada, Senador.
Senador Zequinha, bom dia!
Eu vou passar a palavra para o senhor e, depois, eu gostaria que o senhor assumisse aqui a Presidência, porque eu tenho que relatar, gente - e peço até desculpas aos nossos expositores -, na Comissão de Relações Exteriores a mensagem do embaixador que está sendo indicado para a Embaixada da Eslovênia. Então, estão me chamando para ler o relatório, mas eu volto, tá? Eu volto! Nós temos alguns questionamentos.
Inclusive, depois da sua fala, Senador, se o senhor puder, temos todos os questionamentos aqui, que são importantes, até porque a nossa equipe toda aqui da Comissão preparou essas perguntas muito baseada na primeira audiência e na fala de vocês. Então, gostaria de ouvi-los. E volto.
Obrigada. (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA) - Bom dia a todos!
Nós vamos dar sequência aqui, enquanto a Senadora Leila relata ali na outra sala, na outra Comissão. Eu estaria usando a palavra ali da bancada, mas daqui mesmo a gente conversa.
Quero cumprimentar a Viviane pela exposição e também a Aline, de uma maneira muito especial, sentindo que essas organizações que vocês representam já amadureceram bastante, como se diz lá no meu interior, já estão dobrando a esquina, já foram, e isso é muito bom, é muito saudável.
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Aqui, na questão institucional, ainda a gente está procurando se firmar, procurando estabelecer uma legislação que possa atender essa demanda, esses mercados que não são...
Ontem a gente estava aqui, estava até brincando, num determinado momento, quando disse que esse é um assunto para profissional, não cabe muito a amador. Eu queria dialogar um pouco com todo mundo, mas especialmente com a Dra. Cristina Reis. Você vem do lugar certinho para a gente poder fazer alguma coisa.
Tem muita coisa em governo que não é só lei. O governo precisa, ao pensar, ao conceber alguma coisa, naturalmente tem que ter o guarda-chuva legal. Não dá para ninguém, nem o governo, nem ninguém trabalhar sem esse guarda-chuva, sem essa legalidade.
Eu sou de um Estado que tem um arquipélago - não vou falar o nome aqui para não criar fuxico - que é um desafio, os piores IDHs e tal, aquele negócio todo, com mais ou menos 600 mil habitantes, 16 municípios. E os governadores, os candidatos, aliás, quando discursam sobre aquela região, fazem um negócio assim que a gente diz: agora vamos resolver o problema. Mas quando o Governador chega na cadeira, aquele candidato se elege, chega lá e vai comandar o orçamento do estado, a gente não acha uma rubricazinha que diga: isso aqui é para se investir naquele assunto lá na região do discurso. Então, por isso que eu estava dizendo que você vem do lugar certo para a gente poder fazer alguma coisa, entendeu?
Não é só... Eu não queria pensar apenas no problema relacionado à questão do crédito de carbono, porque isso é um ativo ambiental que vira financeiro e que é muito bom e que vai ajudar efetivamente. Mas isso é apenas uma parte, uma parte muito, digamos assim, considerada grande. Eu sou da Amazônia e claro que tem outras regiões no Brasil que vão entrar nisso também, mas lá é a principal região do Brasil que se vai discutir essa questão do carbono.
Nessa região toda, nós temos 450 mil famílias colocadas pelo Governo Federal nos seus projetos de assentamento do Incra. Devem existir mais ou menos umas 50 mil esperando ser regularizado. Então, fecha 500. Aí você tem aqueles que não foram assentados nem pelo Governo Federal nem pelo Governo do estado, mas que são independentes e estão ali. Então, você tem uma multidão de gente muito grande impactando o meio ambiente pela sua forma de produzir e isso tem que estar no bojo da preocupação de quem governa, no bojo da preocupação de quem governa.
Sei lá... Digamos que você tenha do Governo Federal 500 mil e independente você tenha outras 500, ou de Governo de estado, mais ou menos isso, um pouco menos esse outro. O que fazer com essa gente? E essa gente é muito pobre. A renda per capita do caboclo da Amazônia é mais baixa do que a do nordestino. Entendeu? Se você pegar dados, você vai ver que pela pobreza nessas regiões, onde há um potencial extraordinário de crescimento econômico, disso, daquilo, aquele limão não foi ainda transformado em limonada, entendeu?
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E onde o bicho pega é que a pobreza atrapalha, correto? Atrapalha essa vontade de fazer um meio ambiente sustentável. O cara não pensa em meio ambiente com fome. Não se engane com isso, não pensa. A prioridade número um dele, acima de qualquer coisa, é a sobrevivência, é a sobrevivência. Ele precisa colocar comida em casa e para isso ele se vira como pode, com os instrumentos que pode, que estiverem ao alcance dele, é a lei da sobrevivência. E aí, depois, ele vai satisfazendo outras necessidades até que: "Ah, sim, o meio ambiente... é importante, é importante".
Mas a gente precisa entender o modo de vida dessas populações, e é uma região imensamente graúda: é muita gente e a região é muito grande.
Então, aqui, deixando esse aspecto que nos preocupa muito, a gente precisa tirar dessa questão do crédito de carbono, de poder ter isso no mercado, dinheiro que possa influenciar na vida dessas pessoas que estão lá, não é?
Agora, vamos para alguns dados que eu acho que são importantes para a gente ter aqui. Como eu mudo a forma de produzir de um cidadão pobre, de um cidadão carente, que trabalha ainda para plantar os legumes e as verduras da sua subsistência com o braço, com a mão, usando enxada, usando o bendito machado, porque nem a motosserra tem?
Eu tenho que levar tecnologia para tirar esse cara dessa situação, sem isso ele vai continuar operando da forma como estava operando.
O que ele usa? Qual é a ferramenta, qual é o instrumento que ele usa para poder limpar a área? Fogo, que é um velho companheiro, um velho aliado da humanidade, mas um fogo descontrolado é um desastre. E, muitas vezes, esse camarada não é muito zeloso para fazer a varrida, o aceiro, como a gente chama lá, para queimar só ali o pedacinho que ele quer para fazer sua produção.
Aquilo quando escapa queima um mês e vai devastando todo mundo, terras e terras que estiverem pela frente; florestas e florestas que estiverem pela frente ele vai destruindo. Fogo em uma época complicada como é o tempo da estiagem - lá a gente chama de verão quando não está chovendo - é muito perigoso.
Então, eu preciso investir nessa população imensa, pobre, algum recurso que lhe dê condição de mudar a forma de produzir. Sem isso, nós estaremos aqui sonhando apenas, e é por isso que eu estou dizendo: a política de governo para mudar essas coisas precisa nascer dentro de onde se faz o Orçamento.
"Ah, vou mudar tudo isso!". Está bem, então vamos mudar. A primeira coisa que se tem que fazer: substituir o machado, a enxada, não sei o quê pelo trator. Quanto custa um tratorzinho com alguns implementos agrícolas? Prepara aí R$400 mil, R$380 mil... Como é que um cidadão carente compra isso?
Então, o Governo precisa pensar: "Eu preciso baratear o custo do equipamento". Como é que Governo barateia custo de equipamento? Tira a carga tributária - não é? - e faz um programa; faz um programa para as regiões com essas características, onde aquilo que custa R$400 mil pode cair aí para duzentos e poucos, porque a carga tributária agiganta o preço de uma maneira absurda. Bom, é isso? É isso. O combustível que ele usa também, que é muito. E o que mais ele usa? Tem que usar, a partir dali, insumos, defensivos. Tudo é importado, não é? E a importação é dólar. Quer dizer: se o Ministério da Fazenda, na sua casa, não tiver uma visão holística disso, uma visão do todo, desse universo para produzir uma política pública, a lei é muito bonita - coitada! -, mas não vai ter força para resolver o problema.
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Então, é uma reflexão que se faz nesse momento.
Estou feliz por ver o avanço, cumprimentando aqui as duas moças, mas preocupado com a efetividade daquilo que nós temos. Vamos fazer a lei na questão do carbono? Vamos! Vamos ver se a gente consegue, a partir daí, tirar algum recurso para resolver esse outro problema, pelo menos devagar. Correto? Pelo menos devagar. Porque, se não fizermos isso, essa luta... "Ai, a Marina Silva..." A Marina Silva vai, daqui um tempo, estar impedida - coitada! -, velhinha, sem poder continuar trabalhando, e o problema não vai ser resolvido.
Eu sou caipira. Eu sou do interior, nascido e criado. Vim para a cidade e já estava "erado" para ir para a escola. Então, eu conheço isso por dentro e por fora, correto? Por que essas arrancadas do Governo às vezes não dão muito certo? Porque a gente começa e pinça apenas a questão ali, e o efeito aqui, de onde nasce o problema, a gente corre dele. Não é por aí! A gente, se quiser resolver o problema como um todo, vai lá de onde sai o oxigênio e põe o dedo na respiração. E ali você resolve a questão.
Faço votos de que...
Eu estava ouvindo aqui, quando você estava falando sobre o Brasil desenvolvido, de forma sustentável e parece que elencou seis pontos, não é isso?
A SRA. CRISTINA REIS - Os eixos da transformação ecológica.
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA) - Os eixos...
A SRA. CRISTINA REIS - Da transformação ecológica.
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA) - ... da transformação ecológica.
Muito legal! Muito, muito mesmo!
Então, mas essa transição aí, se nós quisermos abraçar isso como um todo, de uma vez, nós vamos ter que gastar dinheiro ou parar de ganhar dinheiro, se tiver que fazer incentivo fiscal.
Às vezes, uma políticazinha para ficar ali...
Eu sou empregado de um banco federal lá na minha região, lá na Amazônia, onde o banco está há 80 anos fazendo o seu trabalho; fazendo o seu trabalho, está emprestando e tem o fundo constitucional, blá, blá, blá. Mas ele se limita apenas ao papel de banco. E quando você mede o problema da desigualdade regional, em termos de desenvolvimento, a gente vê que aquele banco ainda não conseguiu desenrolar ou desincumbir-se da sua missão, razão pela qual foi criado. Ele existe para aquilo.
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A Sudam também, que já foi pujante lá, muito forte, muito articulada, batalhou, batalhou, teve um momento lá em cima, e depois caiu, e está lá a região Amazônica todinha precisando de ajuda, de socorro, porque a qualidade de vida é uma das mais baixas. Quando a gente perde para a região nordestina, perde para outras, você vai ganhar de quem?
Renda per capita lá em baixo... Nós não conseguimos agregar valor àquilo que a gente produz. Quando catamos as coisas na floresta, juntamos, o cara pesa aquilo ali e a rendinha é muito baixa, porque não tem valor nenhum, aquilo só consegue pegar algum valor a partir da industrialização. Aí ele começa...
Então, a gente precisa pensar isso como um todo. E eu vejo, nessa questão do carbono, a chance que a região vai ter, e que o Governo vai ter, com relação à região, para, de repente, ganhar algum dinheiro.
Eu ainda não tive a oportunidade de discutir - e aí os setores representados aqui - sobre a questão da precificação. O que vale isso? O que isso vai trazer? Por mais que não tenha uma promessa muito grande, mas depois esse mercado pode se ajustar, não é Aline? E, dependendo das coisas, dar um retorno financeiro, porque, por exemplo, na Amazônia, Cristina, é 80/20. Você compra uma área, tem que preservar 80% dela e usar 20%. É como você comprar um apartamento de 100 m², isolar 80m e morar em 20m.
Então, a noção de como é esse drama. Essa conta nunca fecha, nunca se consegue avançar.
O Governo até hoje nunca criou... O Governo do Pará, um tempo, criou um negócio que eu achei inteligente, prático, que era o Zoneamento Ecológico-Econômico. Nessa região aqui não se pode mexer. Ela tem isso, isso e isso. Então, pronto, bloqueia para sempre. Aquilo é questão ecológica da pesquisa, da ciência...
Enfim, essa outra região aqui, a ciência constatou que é produtiva, que é adequada para a produção. Então, libera essa outra aqui para produzir. Coisa prática, coisa bem profissional.
Lamentavelmente, dois anos depois que se fez isso lá, o Governo Federal, e era o próprio Governo Lula, criou uma série de reservas ambientais, de florestas nacionais, de reservas biológicas, parques, etc., etc., congelou tudo isso com o povo lá dentro. E o cara hoje é um cidadão maravilhoso, todo correto, aí, de noite, sai no Diário Oficial, criando uma reserva ambiental lá. Amanhã, aquele cidadão maravilhoso amanhece um marginal, invasor de reserva ambiental. A reserva foi criada de noite, mas de manhã ele já amanhece desse jeito. Essa é a realidade da Amazônia; realidade que não se sabe o que fazer.
O Governo às vezes cria uma unidade de conservação em que se precisa tirar as pessoas que moram ali, que nasceram por ali, para irem para outra região. Ele não tira, não indeniza as benfeitorias daquela pessoa; se tiver título da terra, também não indeniza a terra... Aí começam as operações de comando e controle para o cara correr dali! Não é assim que se faz. Não é por aí a vida. As coisas têm que ser planejadas, responsáveis, bem boladas, de modo que não fica aquele negócio, aquela lenga-lenga, anos, décadas, igual nós estamos vivendo lá: "Ah, mas se criou a reserva aqui". O cara diz assim: "Criou a reserva, mas eu já morava aqui, meu pai morreu, me deixou aqui". E aí? É direito adquirido, ele só tem aquilo ali, ele vive - come, mora - daquilo. Como é que ele vai embora amanhã? Para onde, sem indenizar? Então, a gente tem problemas demais.
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Mas a minha esperança é que a gente consiga fazer as coisas corretas, e eu queria só que a Dra. Cristina - de forma bem rápida, a nossa Senadora chegou - avivasse esses itens sobre a questão ecológica, que são muito importantes, para a gente levar em conta. Agora, a gente precisa raciocinar: o que é que significa isso? Quanto o Governo vai ter que fazer, que sacrifício, que renúncia tem-se que fazer para isso aqui acontecer efetivamente, porque, só por força da lei, a experiência, ao longo de décadas, mostra que não funciona - ou não tem funcionado, pode ser que mude daqui para frente. Correto?
Quero aqui agradecer à Senadora Leila pelo retorno e dizer que a Presidência está aqui.
Gostaríamos de ouvi-la sobre aqueles tópicos que comentamos.
A SRA. CRISTINA REIS (Para expor.) - Pois não. É com satisfação que eu vou responder quanto a esses tópicos.
Agradeço muito a fala do Senador Zequinha e também a fala do Senador Confúcio, ambas foram muito pertinentes e eu acredito que trazem um ponto essencial.
É isso mesmo, não só da letra da lei funciona uma sociedade. A gente precisa de toda - por isso que eu usei a palavra "paradigma" - uma mudança de paradigma de vida. Ele é cultural também, ele é econômico, ele é financeiro, ele é tecnológico. O desenvolvimento, a mudança da forma como produzimos, as atividades econômicas que são realizadas, a participação do país nas diferentes atividades e tarefas das ditas cadeias produtivas ou cadeias globais de valor, cada vez com maior valor adicionado, requer um planejamento muito integrado.
É por isso que eu disse que a Subsecretaria vem com essa missão de alinhar e aliar o regime macroeconômico fiscal ao desenvolvimento sustentável, e é por isso, também, que as prioridades fazendárias são o arcabouço fiscal, a reforma tributária, que vão conferir a legitimidade e a responsabilidade para lidar com o orçamento, o entendimento da evolução das receitas tributárias para a gente efetivamente fazer todo esse planejamento de transformação ecológica.
O mercado de carbono não é a solução para o nosso problema ecológico. A gente precisa manter a floresta em pé, isso é uma prioridade de Governo. O mercado de carbono contribui, mas isso não é só uma questão de regulação nesse âmbito.
E eu concordo plenamente que a gente precisa cuidar dos incentivos econômicos para que a pobreza, que é estrutural, não seja um elemento limitante a nossas estratégias de sustentabilidade. Ao contrário, as estratégias de sustentabilidade podem e devem contribuir para a redução da pobreza.
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Quando a gente pensa em mercado de carbono, é importante falar que, nesse caso específico do regulado, as unidades que participam são unidades que emitem muito. Tem um mínimo para a participação, que é alto. A gente não pode imaginar um pequeno seringueiro, atuando na Amazônia, como alguém que está participando do mercado regulado sozinho, individualmente. A gente está falando de grandes instalações, sejam estacionárias ou não estacionárias, isso é uma coisa a ser definida.
Sem dúvida, esse desenho da carga tributária e dos incentivos econômicos para o combate ao desmatamento é a nossa prioridade.
Participamos do grupo PPCDAm, esse projeto de proteção e combate ao desmatamento da Amazônia; participamos, por exemplo, também do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial, que vem com as missões estratégicas para a indústria; participamos de uma série de órgãos colegiados - eu, pessoalmente, estou também no colegiado da ABDI, por exemplo, a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial -, de forma a dialogar e manter essa coerência. Essa coerência é muito difícil. Não é fácil, é um alinhamento grande, profundo, necessário, mas a busca de sinergias é uma solução, sim, para que a gente consiga pôr esses projetos em andamento.
Então, resumindo, eu estou de pleno acordo e entendo que a regulação do mercado de carbono é um dos caminhos em busca dessa sustentabilidade, mas há diversos outros. Eu sei que esta Comissão está atuando e tem muita experiência na busca desses caminhos.
Mais uma vez, coloco-nos à disposição, para a gente construí-los conjuntamente.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Obrigado, Cristina.
Bom, já fui à CRE e retornei, agora, à CMA. Gostaria de agradecer ao Senador Zequinha, por ter comandado, por esse período, a audiência.
Eu tenho várias perguntas da nossa assessoria. Eu vou fazer as cinco primeiras. Vou fazer pergunta a pergunta, até para ouvir a posição dos nossos expositores. As demais... Depois eu quero passar às dos nossos internautas, que estão acompanhando também. Acho que é importante a gente mostrar, porque eles realmente participam - e eu quero agradecer a participação de todos.
Eu vou fazer a primeira pergunta e passo a palavra para quem queira responder essa pergunta, uma a uma. Eu acho legal, porque aí escutamos a opinião de todos os expositores.
Senhoras e senhores, afinal de contas, qual é a participação do Brasil no cenário global de emissões? Quais são as metas acordadas e o que precisa ser feito para atingi-las?
Na audiência de ontem e de hoje, falou-se muito de divergências. Eu gostaria de perguntar a vocês, pois temos aqui representantes de vários setores, quais são essas divergências. Porque se fala em divergências: "Existem divergências, mas podemos contemporizá-las". Eu gostaria de ouvir de vocês quais seriam essas divergências.
Quem gostaria de responder primeiro? (Pausa.)
Por favor, Viviane.
A SRA. VIVIANE ROMEIRO (Para expor.) - Muito obrigada, Senadora.
Bom, o Brasil representa hoje em torno de 3% das emissões de gás de efeito estufa globais, do mundo. É importante colocar que, por um lado, há o argumento do princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, que tem sido muito colocado no âmbito das negociações climáticas do multilateralismo na UNFCCC, mas, por outro lado, a gente vê também um salto tecnológico que não nos coloca mais no patamar de assumir esse princípio e persistir nele.
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Eu acho que é importante ter um equilíbrio, uma consideração sobre isso, mas a gente hoje também dispõe de soluções tecnológicas, de conhecimento. A ciência avançou muito nos últimos anos e isso nos coloca num papel também de ter mais parcerias entre os países, inclusive para que o Brasil receba recursos, a partir dos seus ativos, principalmente os ativos florestais, para que continue com as florestas em pé e aproveite essas oportunidades, vantagens comparativas e competitivas, como já foi colocado.
Então, ao mesmo tempo que a gente, sim, tem um espaço importante para o desenvolvimento, a ideia é que haja esse desacoplamento que eu tinha mencionado entre o crescimento do PIB versus o crescimento das emissões de gás de efeito estufa, a partir dessas técnicas de baixo carbono - que justamente eles não prossigam, que haja esse desacoplamento.
A gente tem alguns exemplos. Por exemplo, na agricultura de baixo carbono, o Plano ABC e o Plano ABC+ colocam aí algumas medidas que já mostram, efetivamente, que essas técnicas de agricultura de baixo carbono podem aumentar a efetividade, a lucratividade, a produtividade e, ao mesmo tempo, reduzir as emissões, melhorar a ambiência climática ali e a qualidade do produto final. Então, a gente tem aí vários estudos; a ciência tem avançado muito para mostrar essas oportunidades da economia verde.
O Brasil assumiu, no longo prazo, uma meta de neutralidade climática que era para 2060 e que, na COP 26, em Glasgow, foi antecipada. Inclusive, o setor empresarial, o Cebds, apoiou muito, fez uma convergência com outras entidades para que houvesse essa antecipação para 2050. Então na COP 26 isso foi anunciado - e é muito importante que a gente tenha agora uma meta, um objetivo de longo prazo. O que a gente precisa ter agora é uma estratégia para chegar lá; essa estratégia de longo prazo, porque não é de uma hora para outra. A ideia não é emitir deliberadamente e chegar a 2049 e fazer um corte, mas fazer uma rota de qual seria esse mapa do caminho.
E o mercado de carbono é um instrumento de transição, como a gente coloca. Ele não é um instrumento para sempre. Nesse desafio da descarbonização, ele traz uma eficiência econômica, como já foi colocado, e ele também pode internalizar elementos superimportantes, como as salvaguardas socioambientais.
Então quando a gente fala do mercado regular, das licenças e permissões, considerando os créditos de carbono também, para que os agentes regulados usem esses créditos dos agentes não regulados, é importante que um registro traga requerimentos que corroborem essas salvaguardas, a integridade climática. Então, a gente tem uma oportunidade de, através de uma opção mercadológica, trazer esses outros elementos tão importantes para a agenda de sustentabilidade.
Eu concordo aqui que a agenda de precificação é muito, como já foi colocado, desafiadora. Já foi muito debatido se, no Brasil, a precificação viria por tributação, taxação de carbono ou por instrumento de mercado. Em decorrência da carga onerosa - do excesso da carga tributária - e também por entendimento de que a versão do mercado seria mais eficiente, hoje a gente já está efetivamente num momento muito mais maduro de discussão. Então, a ideia é seguir para aprimorar esse instrumento.
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Importante também dizer que o Acordo de Paris traz, no Artigo 6, opções não mercadológicas também. Justamente nessa visão mais abrangente, a gente tem os Artigos 6.2 e o 6.4, mercadológicos, e o 6.8, que traz capacitação, transferências de tecnologia. Então tem outros meios de implementação também que são supercomplementares e muito importantes. Eu acho que a agenda de mercado de carbono abre uma janela de oportunidade para trazer vários outros elementos, trazer os setores à mesa e internalizar, de fato, a agenda, como um todo, da transversalidade climática.
O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA. Para interpelar.) - Doutora, permita-me... Posso dialogar com ela, Presidente, rapidinho? (Pausa.)
Hoje acho que é possível mensurar - por exemplo, se eu fabrico celular, um iPhone 14 e tal, não sei o quê - quanto eu emito por unidade. No global depois eu devo dividir isso, então eu sei quanto estou emitindo. Tudo o que essa empresa faz ela joga para o consumidor - o consumidor, coitado, é o que paga a conta. A tendência não seria, por exemplo, embutir no preço do produto uma compensação à compra de carbono para zerar a emissão, para poder... "Eu estou emitindo, estou produzindo, estou industrializando, mas em compensação também eu estou compensando, eu estou comprando no mercado e compensando as minhas emissões, tentando zerar minha conta". Isso é possível um dia acontecer, de forma bem prática?
A SRA. VIVIANE ROMEIRO (Para expor.) - Bom, vou responder "sim e não". Hoje, no mercado regulado, a ideia é que a gente tenha as emissões... as metas absolutas, as licenças, então, olhando para as unidades, para os setores regulados. No mercado voluntário é possível, sim, essa comercialização de crédito de carbono de uma pessoa física ou pessoa jurídica que tenha o interesse, voluntariamente, em compensar as suas emissões, a partir de produtos menos carbono intensivos, a partir de investimentos em outros negócios.
É importante, que essa discussão traz um elemento-chave, que são os escopos 1, 2 e 3 das emissões de gás de efeito estufa, em que a gente está colocando os escopos 1 e 2 dentro da área de produção e o escopo 3 na cadeia. E esse é um desafio muito grande da agenda, porque, por exemplo, na agricultura, na pecuária, no escopo 3 é fundamental o engajamento das fornecedoras ao longo desse ciclo. Não adianta somente as unidades que estão ali, a indústria de base, as unidades produtoras neutralizarem as suas emissões, via escopos 1 e 2, sem considerar essa cadeia, que está mantendo essa demanda efetiva por esses produtos.
Então, o desmatamento, por exemplo, é um grande exercício de olhar para essa rastreabilidade da cadeia. Várias empresas estão se comprometendo justamente a olhar esse encadeamento e na indústria, como um todo, também. Então, o escopo 3, que são essas emissões para além das unidades de produção, é fundamental para essa discussão. Há uma complexidade metodológica também, mas, no mercado de carbono efetivamente, no mercado regulado, a ideia são as grandes empresas, os grandes setores econômicos e com metas absolutas seguirem os princípios do método do cap and trade. Há possibilidades, por exemplo, via Decreto 11.075, já mencionado, com metas individuais das empresas, mas a ideia que a gente defende no Cebds e majoritariamente o que a gente vem colocando é isto: essas metas absolutas, trazendo as licenças e permissões para cada setor.
Então, é importante que, por um lado, o consumidor também entenda o seu papel de demandar produtos menos carbono intensivos, menos energointensivos, porque isso também é uma demanda importante, um driver, um indicador importante para a empresa.
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A demanda do consumidor também é uma orientação de investimento muito importante. A gente tem aí políticas de comando e controle importantes para o desmatamento, incentivos de mercado, como esse para a agenda da precificação, mas também há a ciência comportamental. O próprio IPCC, Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas, coloca que a ciência comportamental tem um papel muito importante - pela primeira vez se reconhece no relatório do IPCC o papel dessa mudança comportamental.
Então a gente vê esse crescimento da agenda muito transversal e holística, o que é fundamental para dar celeridade a essa...
O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA) - Peço que me conceda mais uma vez...
O desmatamento, a gente vai conseguir. Todos os dias os governos estão monitorando melhor, tendo mais eficiência, as ações são muito fortes, então vai segurar isso aí, mas eu estou me referindo aqui à questão industrial. É que você precisa de bens, e a indústria vai, com certeza, adequar boas práticas e tal, vai reduzir significativamente, mas nunca vai fazer um produto que não vá emitir, essa é uma verdade.
Eu estava lendo a respeito da Alemanha um dia desses. Pesquisando lá, vi que a Alemanha, que gosta de dar pitaco na vida dos outros... Como é a vida na Alemanha? Eles estão usando muito carvão mineral para produzir energia. Com o problema da guerra entre Rússia e Ucrânia, essas coisas se complicaram, e vi que cometeram dois crimes ao mesmo tempo. Primeiro, devastando uma floresta. E por que devastar floresta? Porque nessa área tem muito carvão, quer dizer, você tira vegetação e ainda escava, pega o carvão para produzir uma energia suja. Só de carvão lá, dá mais de 20% de toda a matriz energética. Então esse tipo de procedimento, eu acho, é duplamente errado, não é? E a gente precisa...
Por exemplo, o Brasil. Eu já vejo o Brasil discutir meio ambiente aqui, correr atrás aqui mesmo. A gente precisa abrir um pouco mais a cabeça com relação às questões externas, para que o esforço não seja um esforço do Brasil, mas do mundo, porque todo mundo precisa alcançar a bendita sustentabilidade, senão o futuro do planeta, o futuro da humanidade, começa a se comprometer. Quando você compara o Brasil com o resto do mundo, o que tem acumulado na atmosfera? A China domina, vai lá em cima; depois vêm os Estados Unidos; União Europeia; Índia e não sei quais outros. Quando você chega ao Brasil, é aquilo que a Senadora colocou... E aí? Não dá 3%. Quem somos nós perto da União Europeia ou quem somos nós...
Onde é que mais se emite o bendito CO2? Na indústria. Essa indústria precisa ser tão trabalhada quanto se trabalha a questão do desmatamento e outras ações que não são sustentáveis aqui em nosso país, em outras atividades.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Quer concluir?
A SRA. VIVIANE ROMEIRO - Bom, excelente, Senadora.
Só para complementar, reforço que globalmente o perfil das emissões vem majoritariamente de combustíveis fósseis, quase 80%, e, no Brasil, esse perfil é muito diferenciado, como já foi colocado. Embora 3% aparentemente não seja um número chamativo em termos quantitativos, o que a gente coloca é que o Brasil, por seu perfil de emissões, tem um potencial gigantesco de ser um país ofertante de crédito de carbono com qualidade, com integridade, com salvaguardas ambientais, aproveitando a oportunidade de restauração florestal.
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Ele tem um potencial gigantesco de trazer justamente, de ser um país ofertante de crédito de carbono com qualidade, com integridade, com salvaguardas ambientais, aproveitando a oportunidade de restauração florestal. Então a gente tem uma possibilidade de protagonismo nessa agenda muito grande, muito mais do que neutralizar suas emissões, mas justamente ser esse provedor de créditos que tragam geração de renda, que de fato tragam essa valorização da floresta em pé e da justiça climática, essa transição justa que a gente vem tanto colocando e que finalmente está chegando às discussões de ponta, então é muito bom.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Obrigada, Viviane.
Eu vou para a segunda pergunta, porque acho muito importante.
Nós temos aqui, além do conjunto de projetos encabeçados pelo PL 412, de 2021, eu também sou Relatora do 2.229, de 2023, que é do Senador Rogério Carvalho, que traz ao texto o conceito de cadeia de valor do crédito de carbono, tratando inclusive da regularidade da posse e propriedade da terra que gera o crédito, buscando evitar fraudes, buscando ainda proteger os direitos das comunidades tradicionais. Eu queria conhecer a opinião dos convidados sobre essas questões.
Quem gostaria? Aline? (Pausa.)
A SRA. CRISTINA REIS (Para expor.) - Vou aproveitar e pegar um ganchinho no final da pergunta inicial, porque acho que tem relação.
Primeiro, a Viviane já arrasou na resposta. Ela trouxe bem a importância da participação, o peso do Brasil no cenário mundial de emissões, e a Senadora, como é superobjetiva, perguntou claramente quais são as divergências. Quando a gente confronta esse PL do Senador Rogério Carvalho com o 412, de sua autoria, e também com outros que estão em tramitação no Legislativo, a gente percebe que eles têm diferentes focos, vou simplificar dessa maneira. E quando a gente pega os blocos temáticos do PMR, que é esse programa do Banco Mundial que é a principal referência para a regulação do mercado de carbono, a gente entende o que não pode faltar no texto. Então, não vou entrar em detalhes, mas alguns vão mais para um caminho, outro vão mais por outro caminho, essas são as divergências de texto. As divergências objetivas, eu também sou bem direta aqui: a gente está pensando em quais setores vão estar regulados, se essa regulação é mais horizontal ou se ela é setorial, a gente tem diferentes esquemas de governança, se ter autoridade competente ou não, qual a participação da sociedade através do comitê consultivo, qual é o conselho deliberativo da governança desse mercado - é importante que ela seja muito bem construída, como eu já frisei -, qual é o cap, qual é o teto, porque é uma análise técnica, qual é a base dos setores e quais serão os planos nacionais de locação, como será montado, os percentuais de offset também são divergências, mas a boa notícia é que há muitas convergências também. E a gente viu aqui, pelo menos na mesa, a defesa do mercado regulado de carbono.
Desculpa, Aline, na minha primeira fala, eu não frisei o bastante; ela falou uma coisa muito importante, que é a coerência com o mercado voluntário, Viviane também falou isso. Precisa estar claro na letra da lei e a natureza jurídica dos ativos também está claro que precisa constar.
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O gradualismo, a gente não pode esperar que, uma vez a lei votada e aprovada, já vamos resolver tudo, tem todo um período de implementação, de teste, vamos dizer assim, e, depois, de funcionamento até a montagem dessa governança e definição dos aspectos técnicos e infralegais. É um conjunto de normativos muito grande para ser montado, mas, então, esse gradualismo acho que também é um consenso e é, sem dúvida, uma grande oportunidade para a nossa nação estabelecer um mercado regulado.
Quanto à questão dos direitos dos povos tradicionais que estão em áreas concessionadas de florestas - essa segunda pergunta, eu não perdi, não, do Rogério Carvalho -, também é importante a gente cuidar, tomando esse cuidado da ponte entre o mercado voluntário e o mercado regulado. A gente entende que isso é uma questão a ser normatizada e esclarecida para evitar problemas, para que esses povos que estão atuando, os povos tradicionais, os indígenas e os quilombolas, não sofram qualquer tipo de pressão não conveniente e ilegal em seus territórios.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Deseja falar, Aline? (Pausa.)
Por favor.
A SRA. ALINE FERREIRA (Para expor.) - Só quero comentar também que, no aspecto de fraude, que você mencionou na segunda pergunta, acho que tem uma questão muito importante de definição clara de parâmetros legais, porque isso ajuda muito a gente a evitar a fraude, então, na medida em que a gente tem qual a parametrização, como é que isso vai ser acompanhado e o sistema de governança definidos na regra, a certificação, o acompanhamento do crédito, desde o momento em que ele nasce até o momento da sua aposentadoria, tudo isso faz com que, tendo um sistema robusto por trás, a fraude seja evitada.
Não sou a pessoa mais adequada para falar dos povos originários e das terras demarcadas, mas eu acho que com relação à questão da fraude em si, a preocupação tem que ser muito clara com relação a mecanismos de governança e parâmetros claros para o estabelecimento do mercado, que passa pelas questões de natureza jurídica e certificação, o que a gente estava comentando quando discutiu o projeto antes.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Não, perfeito.
Eu deixo a palavra para quem quiser sempre complementar a resposta do outro, nós agradecemos.
Eu vou fazer só mais duas, porque já estamos no avançado da hora.
Eu tenho dúvidas, desde ontem, sentando até com a minha equipe, sobre o volume das vendas de crédito de carbono no mercado voluntário, especialmente para o mercado externo.
Existe alguma projeção de quanto poderíamos gerar de crédito de carbono no mercado voluntário, sem comprometer os nossos compromissos com o Acordo de Paris?
A SRA. VIVIANE ROMEIRO (Para expor.) - A gente tem alguns dados que apontam números crescentes, alguns falando em US$70 bilhões, a partir dessa oferta do mercado voluntário, e outros números, como foi colocado ontem, de até mais de US$100 bilhões. Então, eu acho que a gente tem um aporte muito importante.
Algumas notícias, por exemplo, em janeiro, da Verra, sobre o questionamento da integridade desses créditos, nos colocam, hoje, num lugar de maior objetividade e efetividade na regulamentação do mercado porque, novamente, não é tentar regular o mercado voluntário, mas um mercado regulado trazendo elementos, esse letramento em relação ao registro do sistema compensatório, uma metodologia para a inclusão dos créditos de carbono que pode facilitar e pode aprimorar, estimular a qualidade dos créditos, valorizar essa qualidade efetivamente.
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Então, a gente tem cenários aí com números muito atraentes. A agenda de mercado de carbono é muito atraente, pelo potencial que o Brasil tem de vantagens comparativas e competitivas, não somente para a floresta, mas para a indústria também, que já é considerada de baixo carbono.
Se a gente pensar no setor energético globalmente, a gente tem uma matriz energética com uma predisposição aí de combustíveis fósseis. Enquanto a nossa, em torno de 47% do perfil da matriz energética vem de fontes renováveis.
E, se a gente compara a matriz elétrica, esse número é ainda maior. Em torno de 80% da matriz elétrica no Brasil vem de renováveis, muito diferentemente da média global. Então, a gente já traz essas oportunidades de manter e ainda aumentar, porque a gente tem condições, por fontes solares, eólica. O Brasil é um dos países com maior abundância em recursos naturais.
E a gente está aprendendo a se comunicar com as florestas, com esse ativo, com a bioeconomia. Em trazer um ativo que olhe efetivamente para a floresta em pé, mas não somente como foi colocado aqui pelo Senador também. Você comprar um apartamento de 100m e 80m deles ficarem ali parados, você só ter direito aos 20m. Mas de olhar esses 80% de uma maneira que a gente está valorizando, está conservando, para além de preservar, está conservando e fazendo bom uso desses recursos. Então, a gente tem uma oportunidade gigante aí para aumentar essa oferta de créditos de carbono com essa integridade e, ao mesmo tempo, fazendo essa relação com o mercado regulado.
Então, eu acho que é muito importante nessa tramitação que a gente tenha clareza sobre os limites e oportunidades para cada mercado e também para o mercado global. Como já foi falado aqui, Corsia, Artigo 6 do Acordo de Paris e outros também possíveis.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Eu vou para a minha última pergunta aqui para a equipe. E as demais perguntas nós vamos encaminhar para os nossos expositores para que vocês possam, enfim, enviar para nós as respostas.
Falando em RenovaBio, eu gostaria de saber o que pensam os convidados sobre o programa e o que acham de o RenovaBio fazer parte do novo mercado de carbono. É possível e conveniente adaptá-lo para que possa integrar o novo mercado?
Quem deseja? Luciano. (Pausa.)
O SR. LUCIANO RODRIGUES (Para expor. Por videoconferência.) - Agora sim. Eu não conseguia tirar o mudo aqui para poder falar.
Bom, acho que é um pouco do que eu mencionei. Eu entendo que são programas diferentes, um é o programa setorial que já está funcionando...
(Interrupção do som.)
O SR. LUCIANO RODRIGUES (Por videoconferência.) - Ah, o.k. Meu áudio tinha sido fechado aqui.
Então, entendo que não dá para a gente pensar na compatibilização desses programas nesse momento, dentro da lei. Eu acho que a gente deveria trazer a previsão de que isso possa acontecer no futuro.
Nós vamos ter um período de discussão, seja do mercado regulado, que está sendo criado, do mercado voluntário. E essa discussão densa de toda a parte regulatória, que passa desde metodologia e critérios de certificação, procedimentos, etc., até geração dos créditos mais adiante. Depois nós vamos ter que discutir também como é a governança, a divisão dessas, digamos assim, obrigações entre as partes obrigadas.
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Então, tem aí uma discussão bastante intensa, terá nos próximos meses, e talvez anos, para tentar especificar todos os detalhes do mercado de carbono. E eu acho que, ao longo dessa discussão, faz sentido também a gente avaliar um pouco essa integração, ou não, do RenovaBio. Como eu mencionei, na Califórnia e no Canadá nós temos o Low Carbon Fuel Standard que é algo parecido com a lógica do RenovaBio, com a meta de reduzir intensidade de carbono no setor de combustíveis, e também o sistema de cap and trade para os demais setores da economia.
Então, vale a pena, até, explorar um pouco a lógica e as experiências que estão acontecendo lá fora. No caso do RenovaBio, eu acho que tem uma estrutura de governança diferenciada, nós estamos falando em redução de intensidade de carbono e não em redução de emissão total. A lógica de mensuração do Cbio é ciclo de vida, entendo que o mercado que a gente está discutindo aqui, o cap and trade, o ETS, não vai ser ciclo de vida.
Então, tem uma discussão técnica para ser feita mais adiante. Para mim parece muito claro que o instrumento legal não deveria vedar essa possibilidade, mas também não criar nenhum tipo de obrigação para que ela aconteça, de forma que, ao longo da discussão, a gente possa avaliar - o poder público, o Executivo, e temos representantes da sociedade que participarão dessa discussão - se faz sentido integrar os programas, se faz sentido ter algum tipo de fungibilidade entre o instrumento, o crédito de carbono com o crédito de descarbonização, se isso tem que ser mais rápido, se isso tem que ser mais lento, ou se, de fato, lá na frente, a gente terá um guarda-chuva mais amplo e os dois programas aconteçam de maneira segregada.
Então, acho que essa discussão passa por uma análise técnica mais detalhada, que deve ocorrer ao longo da regulamentação do programa.
Eu entendo que a gente não deveria vedar, mas, hoje, são programas e características diferentes que podem, sim, ser integradas, podem ter algum nível de fungibilidade mais adiante, mas isso vai depender muito de como a gente vai regulamentar e, eventualmente, ter alguns ajustes de um lado ou de outro para que isso aconteça.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Excelente Luciano, obrigada pela sua participação.
Eu vou ler aqui pelo menos três perguntas aqui do e-Cidadania e pedir desculpas aos nossos internautas porque, pelo avançado horário, a gente não vai ter as respostas dos nossos expositores, mas já entregamos a eles as perguntas, e eles irão nos responder, assim como para a minha assessoria, que está aqui, já, de "cabelo em pé" porque de pelo menos 11 ou 12 perguntas, eu só fiz três, mas também temos o compromisso dos nossos expositores de enviarem essas respostas.
Então, a Nathaly da Silva, de Pernambuco, pergunta: "Quais são as medidas previstas no PL 412/2022 para promover a transparência e a prestação de contas no mercado de carbono [...]?".
Cézar Coimbra, do Rio de Janeiro: "[...] [O art. 13 do] PL 412/2022 faz menção à entidade certificadora independente. [...] [Como essas entidades atuariam]?". Essa é a nossa grande missão aqui, Cézar, justamente como fazer com que elas, de fato, cumpram a sua missão.
Yuri Fazion, de São Paulo: "[...] [Esse projeto] deve focar apenas no crédito de carbono de GEE [gases do efeito estufa]. Os créditos de sustentabilidade e biodiversidade são necessários, mas [devem ser tratados] separadamente".
Pessoal, eu gostaria muito de agradecer a todos que estiveram conosco nesta segunda audiência dessa primeira semana. Teremos pelo menos mais duas ou três audiências.
Quero agradecer a participação dos nossos expositores, Aline Ferreira, da Anbima... (Pausa.)
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Eu ainda não peguei o time, viu, gente? Quando chega a assessoria, eu tenho que interromper.
Quero agradecer à Aline Ferreira, Coordenadora do Grupo de Trabalho de Crédito de Carbono da Anbima; quero agradecer à Cristina Reis, Subsecretária de Desenvolvimento Econômico e Sustentável do Ministério da Fazenda; também à Viviane Romeiro, Diretora de Clima do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds); por videoconferência, ao Davi Bomtempo, Gerente Executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria (CNI), que teve que sair por causa da agenda; e ao Luciano Rodrigues, que ficou conosco até o final, Diretor de Economia e Inteligência Setorial da União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica).
Quero agradecer a todos pela participação e dizer que estamos começando a nossa caminhada, como foi falado aqui, iremos ouvir a todos e estamos dispostos, também, a receber materiais e conversarmos, não só em audiências, mas fora, no gabinete.
Nada mais havendo a tratar, eu declaro encerrada a presente reunião.
Obrigada.
(Iniciada às 9 horas e 19 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 37 minutos.)