01/06/2023 - 29ª - Comissão de Educação e Cultura

Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Fala da Presidência. Por videoconferência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 29ª Reunião da Comissão de Educação, Cultura e Esporte da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura, que se realiza nesta data, 1º de junho de 2023.
Objetivo e diretrizes da nossa reunião.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública com o objetivo de instruir o PL 88, de 2023, de autoria do Senador Flávio Arns, que dispõe sobre a responsabilidade educacional na garantia de oferta e de padrão de qualidade na educação básica pública, em atenção aos Requerimentos 49 e 52, desta Comissão, de minha autoria e de autoria do Senador Arns.
Participarão desta audiência de hoje, de forma remota, os seguintes convidados e convidadas: Sra. Andressa Pellanda, Coordenadora Geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação - boa tarde Andressa, obrigada pela presença -; Sr. Romualdo Luiz Portela de Oliveira, Professor Titular da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) e Diretor de Pesquisa e Avaliação do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec) - bem-vindo, Professor -; Sr. Gabriel Corrêa, Diretor de Políticas Públicas do Movimento Todos Pela Educação - é um prazer, Gabriel -; e a Sra. Jade Beatriz, que ainda não chegou, salvo engano meu, Presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes).
Antes de passar a palavra aos nossos convidados, eu comunico...
Chegou a Jade. Tudo bem?
Antes de passar a palavra aos nossos convidados, comunico que esta reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania na internet, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800 0612211.
O relatório completo, com todas as manifestações, estará disponível no portal, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos expositores.
Na exposição inicial, nossa proposta é que cada convidado poderá fazer uso da palavra por até dez minutos, podendo ser prorrogado esse tempo, caso necessário, por mais cinco minutos. Ao fim das exposições, a palavra será concedida aos Parlamentares que se inscreverem para suas perguntas ou comentários e também eu farei a apresentação do que nos chegou pela internet.
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Então dando muitas boas-vindas a todos e a todas, sem mais delongas, nós vamos passar a palavra para as exposições iniciais, na ordem do que eu apresentei.
Portanto, a Sra. Andressa Pellanda, Coordenadora da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, será a primeira a fazer o uso da palavra.
Boa tarde, Andressa. Seja muito bem-vinda.
A SRA. ANDRESSA PELLANDA (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde, Senadora, agradeço muito o convite para estar aqui hoje representando a campanha nesta audiência. Queria também saudar e parabenizar o trabalho que a Senadora vem fazendo no Senado, que tem sido de luta pelo direito à educação. Também queria saudar Romualdo, Gabriel, Jade, que tenho certeza de que vão trazer belas contribuições para esta discussão, que não é a primeira, também pude acompanhar a anterior e espero não ser tão repetitiva, ainda que concorde com algumas questões que já foram discutidas.
Eu já peço desculpas de antemão, que eu vou ter que sair, porque eu estou num grupo de trabalho aqui do Plano Nacional de Educação, na Capes, e não vou conseguir ficar até o final, porque as agendas se sobrepuseram.
Primeiro eu queria dizer que a gente precisa, sim, pensar em mecanismos de implementação da legislação brasileira de forma geral - aí tem várias que são citadas no projeto de lei -, seja o próprio Plano Nacional de Educação, sejam os planos estaduais, o plano distrital, municipais, como também outras legislações, mas a perspectiva que a gente quer reforçar é que a gente não pode produzir uma legislação que gere processos de perseguição, de punição ou de apontar grandes culpados numa cruzada aí contra, sejam gestores, sejam profissionais da educação, professores, entre outros, não é?
O que a gente defende para essa perspectiva é que a responsabilidade educacional, até pela própria Constituição Federal, é uma responsabilidade que é compartilhada. Então, a própria Constituição já coloca que a responsabilidade com o direito à educação é do Estado e da família, então de forma compartilhada, com colaboração da sociedade. Então, é preciso pensar também que não é só o Estado, a instituição educacional que deve se responsabilizar por essa educação, e isso precisa ser olhado com maior cuidado e com maior complexidade em relação a esse aspecto.
A outra questão da responsabilidade compartilhada, que penso que precisa ser mais bem refletida também, é sobre a corresponsabilidade federativa em relação à educação. É claro que a Constituição traz as responsabilidades específicas para a educação básica, para a educação infantil, para as diversas etapas e também até para o ensino superior, mas essa responsabilidade também segue compartilhada. A gente tem a necessidade de uma ação colaborativa, supletiva inclusive, de alguns entes federados para com, por exemplo, municípios e estados. Então, isso também precisa ser tido em conta.
E a terceira questão sobre essa responsabilidade compartilhada é sobre a responsabilidade compartilhada no interior das próprias instituições educacionais, aí vem descendo para o micro, não é? A gente não tem só a responsabilidade, por exemplo, da Secretaria da Educação, da diretoria regional de ensino, a gente tem também dos diretores de escola, dos orientadores pedagógicos, professores, até chegar aos demais educadores que estão na escola, como por exemplo a própria merendeira, que está na escola e também tem uma responsabilidade sobre esse direito à educação.
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Então, existem vários níveis de responsabilidade sobre o direito à educação. Toda essa responsabilidade é compartilhada e, justamente por isso, é muito complexa a discussão sobre uma lei de responsabilidade educacional.
A educação não acontece de forma linear e dentro de caixinhas para que se possa justamente fazer esse apontamento de culpados.
O outro ponto que eu queria ressaltar é que a gente não tem como cobrar uma responsabilidade pontualmente sem a gente ter condições para que esse direito à educação seja garantido e que essa responsabilidade possa ser executada.
Então, para que o direito à educação seja garantido e que a gente tenha essas condições, isso diz respeito diretamente às condições para o trabalho educacional ser feito. E aí a gente vai se remeter a todo o diagnóstico sobre falta de valorização dos profissionais da educação, sobre falta de formação, carreira, falta da própria infraestrutura nas instituições educacionais em todo o Brasil, que dizem respeito muito fortemente ao financiamento da educação, financiamento esse sobre o qual a gente teve grandes vitórias na aprovação do Fundeb, em 2020, mas que tem sido ameaçado por diversos outros aspectos, não só da falta de regulamentação finalizada desse Fundeb - a gente precisa terminar várias legislações para que ele possa ser implementado na sua plenitude -, como também do teto de gastos da Emenda 95 e, agora, com o novo arcabouço fiscal, que, infelizmente, foi aprovado na Câmara, inserindo o Fundeb dentro desse arcabouço, pressionando o financiamento da educação como um todo. E isso vai impedir, inclusive, que essas condições sejam garantidas para daí se cobrar alguma responsabilidade.
E, claro, um dos pontos mais importantes, que inclusive já foi citado na outra audiência por mais de uma pessoa, é sobre o próprio Custo Aluno Qualidade, que é um mecanismo que faz parte do Fundeb, que pressionaria o financiamento para cima, para a gente ter maior financiamento em relação ao que é hoje o Fundeb, e ele acaba sendo também um mecanismo muito importante de monitoramento, de gestão, de fiscalização, e ele não foi ainda regulamentado e sequer, claro, implementado para que a gente possa também avançar nessa discussão não só das condições de ofertas de infraestrutura como também de como melhorar esses mecanismos de avaliação e monitoramento.
E aí, falando de avaliação e monitoramento, é claro que a gente também tem que lembrar a regulamentação do Sinaeb (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica), que é um dos indicadores para uma parte do financiamento do Fundeb e que também serve para outros debates para além do financiamento, que dizem respeito à própria avaliação.
E aí penso que a avaliação precisa, assim, digo, essa questão mais ampla de responsabilidade está relacionada a três grandes elementos que não podem ser considerados de forma apartada. O primeiro deles é a questão da avaliação diretamente. A gente já tratou aqui do Sinaeb - eu acho que o Romualdo tem também muitíssimo a acrescentar sobre isso -, mas a avaliação numa perspectiva de diagnosticar, e não nessa perspectiva de punição, de apontar culpados. O segundo elemento é um elemento de monitoramento que diz respeito muito diretamente a esse diagnóstico, mas no sentido de atualização, de ajuste constante da política pública, de forma que a gente possa redirecionar casos que não estão indo bem, etc., para prevenir o não cumprimento da legislação. E, por fim, o terceiro elemento de controle social, que é essencial para garantir que haja essa corresponsabilidade, inclusive da família e da sociedade, mas também para que seja efetiva a legislação; sem controle social a gente não garante nenhum diagnóstico preciso, nem a efetividade das políticas públicas dessa gestão democrática.
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Aí tem um último ponto que é bem específico sobre o que traz a legislação, o projeto de lei, que fala no art. 5º de bonificação, caso se melhore. A gente já teve um debate enorme na época da tramitação do Fundeb, sobre esse assunto, que garante mais recursos, por exemplo, para quem melhorar os indicadores, como uma espécie de incentivo, mas a gente foi terminantemente contra esse tipo de processo, porque acaba gerando um aprofundamento maior das desigualdades em vez de o contrário. A própria Diane Ravitch, que é uma das grandes autoras sobre o tema, no livro Vida e Morte do Grande Sistema Escolar Americano, como os Testes Padronizados e o Modelo de Mercado Ameaçam a Educação, fala sobre esse tipo de ação que ela mesma implementou e que deu muito errado e aprofundou as desigualdades, porque aqueles que conseguem melhorar mais são aqueles que já têm melhores condições. Então, você acaba distribuindo recurso de forma menos equitativa, não é? Então, essa questão a gente desincentiva que permaneça no documento.
E aí, para acabar, eu queria dizer que esse é um tema sobre o qual eu acho ótimo que estejam tendo audiências, que isso esteja sendo debatido com maior profundidade, que tragam esses atores importantes do debate educacional para traduzirem as discussões, mas todo esse projeto de lei, se ele for para frente, ele vai ter que ser modificado após a discussão do Sistema Nacional de Educação, do Sinaeb, do CAQ, do novo Plano Nacional de Educação. Então, também não aconselhamos que ele seja votado às pressas ou logo, porque a gente precisa ainda amadurecer vários outros aspectos da legislação para aí chegar a essa discussão de forma mais azeitada.
Era um pouco isso que a gente queria trazer.
Agradeço imensamente e fico à disposição para os próximos debates. (Pausa.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Ai, meu Deus! (Pausa.)
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Eu caí, mas já voltei!
Muito obrigada, Andressa. Eu quero lhe dizer que é exatamente essa sua fala final que nos ensejou a fazer essas audiências públicas. É um projeto realmente complexo, tem alguns pontos polêmicos, o Senador autor foi muito aberto para que a gente pudesse fazer esses debates para contextualizar o projeto e, em havendo necessidade, se farão emendas, substitutivos, de acordo com o que os nossos parceiros e parceiras estão nos aconselhando a fazer.
Muito obrigada pela sua intervenção. Fique à vontade para quando for a sua hora de sair. Não se preocupe, que a gente depois fará a socialização de toda esta audiência.
Então, vamos passar agora para o Prof. Romualdo Luiz Portela de Oliveira, Professor Titular da USP e Diretor de Pesquisa e Avaliação do Cenpec.
Pois não, professor, os seus dez minutos. Precisando de mais, ampliaremos com cinco minutos.
O SR. ROMUALDO LUIZ PORTELA DE OLIVEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde a todas e a todos! Particularmente à Senadora Teresa Leitão, eu queria agradecer o convite, saudar a realização do evento. A gente ter a oportunidade de discutir mais amplamente projetos de lei em geral, e em particular na área de educação, é sempre muito importante, porque isso enseja aperfeiçoamentos, enseja ouvir as contribuições de diferentes atores sociais.
Em particular, esse projeto trata a meu ver de dois temas, que talvez fosse mais adequado serem tratados separadamente e não no bojo de um único projeto, quais sejam: o da responsabilização e o da garantia da oferta de padrão de qualidade, que não me parece estarem tratados de modo equilibrado no projeto. Então, eu vou desenvolver minha fala tratando deles separadamente: vai ter uma primeira parte em que eu vou tratar do padrão de oferta, que me parece o aspecto mais importante desse projeto, ainda que o outro também o seja, mas eu priorizaria a definição do padrão de oferta; depois, tratarei da responsabilização e procurarei evidenciar alguns aspectos que me parecem equívocos que estão presentes no projeto.
E também nessa introdução eu queria chamar atenção para um problema que está embutido aqui, que é o fato de ele, na verdade, não ser terminativo, quer dizer, com a aprovação desse projeto, nós vamos ter a necessidade de outra legislação que estabeleça os indicadores, etc., que vão contemplar alguns aspectos aqui mencionados.
Eu acho ruim esse procedimento. Eu tenderia a ser favorável a um projeto que já avançasse nos indicadores, porque senão a gente fica num processo de elaboração legislativa sem fim.
Na mesma linha, eu acho que existe um problema - são observações que depois no ponto específico eu vou ressaltar - entre condicionantes e indicadores, porque se põe um monte de condicionantes, mas não se diz qual é o caráter que eles têm.
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Eu acho que em geral cria confusão ficar pondo esses condicionantes, como aconteceu no caso do Fundeb, que criou um labirinto em torno do Vaar, que eu acho que provavelmente vai levar a uma impossibilidade de regulamentação decente, porque cria um conjunto de condicionantes que são muito difíceis de pesar entre si, de ver como vão ser medidas, e eu acho que acabam desvirtuando o objetivo da lei. Quer dizer, é um jabuti, levanta questões que não são questões do objeto da lei. Mas eu vou tentar explicitar isso no momento oportuno.
A outra coisa que eu acho que é saudável, porque gera a perspectiva do aperfeiçoamento com a experiência, é um prazo de validade da lei. Eu acho que nós aprendemos muito com a validade do Fundeb - a do Fundef e depois a do Fundeb -, até nós termos amadurecimento suficiente para constitucionalizá-los. Ou seja, se não tivesse havido a avaliação do Fundef após dez anos, não tivesse havido o Fundeb avaliado depois de dez anos, nós não teríamos criado condições políticas para aperfeiçoar a lei. E aí sim, à luz de uma experiência mais consolidada, a gente estabeleceu uma legislação mais definitiva.
Então, eu gosto da ideia de a gente ter um prazo de validade, sei lá, de cinco anos, dez anos - isso é uma discussão -, para se avaliar e se fazer um balanço do que se fez à luz da experiência prática, porque tem muito de idealização na hora em que se faz o projeto de lei, mas, quando ele é submetido ao teste da prática, às vezes aparecem problemas para os quais a gente não se dá conta.
Muito bem, quanto ao padrão de oferta, que é o primeiro ponto da lei, eu acho que é importante a gente ressaltar que ele é regido pela lógica da igualdade, ou seja, é justo que busquemos que a oferta - o padrão de oferta educacional ofertada a cada cidadão brasileiro - seja igual, ou seja, o menos desigual possível. Por isso é que vem a ideia da equidade: se não é possível a igualdade, que pelo menos as diferenças sejam minimizadas.
Eu acho que isso é importante a gente não perder de vista, porque, por exemplo, no debate do Fundeb, o Fundeb é orientado por esta ideia da redução da desigualdade entre as redes na perspectiva de que nós tenhamos mais justiça social no país, do ponto de vista das políticas públicas. Nesse sentido, a gente misturar padrão de oferta, ou seja, aquilo que nós temos que buscar que seja o mais igual possível, com elementos e indicadores que desequalizam e, mais, têm um componente regressivo muito grande, isso distorce a lei. É a crítica que eu faria ao Vaar, porque, se eu distribuo recursos com base em resultados que já são condicionados pela disponibilidade prévia de recursos, eu aumento a desigualdade e, portanto, eu corrompo o ponto de vista inicial que sustenta a lei. Eu acho que tem um pouco disso aqui. E acho que, no caso do Vaar, fica bastante evidente que a mistura de condicionantes com indicadores cria um problemão para a regulamentação, que eu acho que é o buraco em que a gente está metido.
Bom, no que diz respeito ao padrão de oferta, eu acho que é necessário avançarmos para a igualdade desse padrão de oferta no nível escola e no nível aluno. Por exemplo, o debate do Fundeb foi todo feito em termos de redes - igualdade, administrando a desigualdade entre as redes. O problema é que isso passa por cima da desigualdade existente numa mesma rede. Quanto maior é esta rede, maior é a desigualdade intrarrede, fundamentalmente determinada por uma diferença de número de alunos por sala. Quando a gente faz o cálculo de custo aluno, isso gera desigualdades muito grandes entre centro e periferia e, quando a gente pensa no gasto por aluno, nós vamos ter diferenças muito grandes do ponto de vista das condições concretas que são ofertadas para cada aluno. Então, de toda maneira, eu acho que tem que se trabalhar com isso.
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Uma resposta, que eu acho que é uma resposta boa, mas ela é uma resposta do ponto de vista do dever ser, é o CAQ. O CAQ trabalha com a ideia de que nós temos que reduzir a desigualdade de gasto por aluno, garantindo o mínimo para todos. O problema é que isso é o dever ser e, para a gente avançar nesse debate, nós temos que introduzir a medida do gasto por aluno no nível escola, para a gente perceber quão longe nós estamos do CAQ ou do padrão que nós queremos para todos. O CAQ avança inclusive nos tipos de despesa.
Eu tenho chamado a atenção para esse debate porque é necessário a gente introduzir a ideia do gasto por aluno, gasto pedagógico por escola, gasto pedagógico por aluno. Eu vou dar um exemplo muito simples: muitas vezes, quando se faz a contabilidade do gasto por aluno no nível da escola, se põe nessa conta reforma. Reforma não é gasto pedagógico. É na verdade a reposição das condições de funcionamento da escola, o que seria equivalente à construção, portanto não entra nesta discussão de custeio. Então, eu acho que tem que se fazer a discussão do gasto por aluno naquilo que efetivamente impacta as atividades pedagógicas stricto sensu.
De alguma maneira, isso está contemplado no projeto no inciso II do art. 2º e, de alguma maneira, é detalhado no parágrafo único do art. 4º. O que não está dito aí? Não está dito qual é a fonte desses recursos, se são recursos do Fundeb, de onde virá esta complementação da União para garantir esse gasto. Então, acho que aqui nós temos que avançar no detalhamento disso porque, se a gente não diz de onde vêm esses recursos, de novo a gente joga um debate para frente.
Eu acho que é importante a gente... A minha sugestão seria tomar como eixo desta parte do padrão de oferta a ideia do CAQ e, a partir daí, redigir o texto, ou seja, se diz que este é o desejável e, a partir daí, se faz um conjunto de considerações que nos leve até chegar lá.
De toda maneira, se a gente está entendendo que isso é um debate... Estou tratando isso como um debate em torno do padrão de oferta. Agora, se nós estamos entendendo que isso é um indicador de qualidade, eu certamente tenderia a incluir elementos de resultados, que nós temos de dispor quais sejam, e de processos, porque eu acho que é importante a gente avançar no debate sobre qualidade para além de uma polarização entre insumos e resultados, ou seja, existem componentes do processo educacional que são elementos indicativos de qualidade.
Vou dar um exemplo bem simples: é parte da qualidade da educação que todo estudante seja submetido a uma educação antirracista, antissexista, da pluralidade, e isso tem que estar incorporado nas nossas medidas de qualidade, senão nós corremos um risco de empobrecer o debate sobre qualidade. Só para dar um exemplo, se o Ideb é um indicador de qualidade, ter boas notas em Matemática e Português é tudo que nós queremos da escola. Isso é uma visão... É necessário que se ensine Português e Matemática, mas entender que a escola só sirva para fazer isso é obviamente empobrecer o conteúdo da educação. Portanto, a nossa concepção de educação tem que estar manifesta e expressa nos indicadores de qualidade que nós queremos instituir no sistema, senão nós corrompemos as práticas educacionais a ponto de poder se distorcer e achar que aqueles sistemas que educam para o teste e afunilam o currículo são bons exemplos para o Brasil, que é uma coisa que nós vemos aí Brasil afora. No que diz respeito à responsabilização, eu acho que o projeto tem mais problemas. Tem também problemas... Por quê? O primeiro aspecto, que eu acho que é importante, é que nós temos já um dispositivo na Constituição Federal, no §2º do art. 208, que é um dispositivo constitucional poderosíssimo que nós usamos pouco: é aquela ideia de que a oferta irregular da educação obrigatória implica a responsabilização do gestor. Só que aí eu acho que, se a gente está falando em responsabilização no sentido mais amplo, nós temos que distinguir responsabilização do Estado e responsabilização do gestor, porque a responsabilização do gestor é uma responsabilização por omissão, por crime administrativo, etc., cuja sanção é sobre o indivíduo, mas nós temos que ter também uma sanção sobre a administração pública no sentido geral com um caráter reparatório.
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Por exemplo, ele deveria gastar tanto em educação e não gastou: tudo bem, tem um nível de responsabilização que é para o indivíduo; agora, tem uma responsabilização do Estado em que ele tem que reparar esse gasto que ele não fez nos exercícios seguintes. Se ele não cumpriu a legislação de garantia da escolarização obrigatória: perfeito, tem uma dimensão que é responsabilidade do gestor, mas tem um ônus, uma dívida que o Estado contrai com a sua população que tem que ser garantida na legislação. Portanto, eu acho que se tinha que ser muito cuidadoso nessa questão da responsabilização porque, como já foi dito em várias das falas, tanto na fala de hoje da Andressa quando nas da semana passada, só é possível a gente avançar neste debate se a gente garantir condições mínimas de funcionamento para todos. Portanto, eu acho que, até a gente chegar a uma coisa de responsabilização, por exemplo, do diretor da escola, é bastante complexo e bastante discutível o que está, por exemplo, no art. 6º.
Eu, de toda maneira, teria uma sugestão nessa questão da responsabilidade do sistema que é travar os investimentos. Na LDB, tem alguma coisa assim. Nas versões que se debateram na época em que se debateu a LDB, existia uma coisa que era, por exemplo: se você não garante a oferta de educação infantil e você tem que recorrer a vagas conveniadas, você fica obrigado a ter como prioridade de gasto dos exercícios seguintes o investimento na expansão da rede própria para atender a essa responsabilidade. É alguma coisa que faça o seguinte: se o Estado não cumprir este ano, no ano que vem, a prioridade do seu investimento na área tem que ser satisfazer essa responsabilidade, antes de investir em outras coisas. Você vai criando um amarramento para que não tenha jeito de fugir com o não cumprimento, quer dizer, se você não cumprir num determinado ano, que venha a cumprir nos anos seguintes.
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Por último, eu queria falar do que me parecem equívocos que estão presentes no projeto e que têm que ser retirados, simplesmente porque eles, primeiro, não tratam do objeto do projeto e, segundo, eles são equívocos.
Por exemplo, o que está no art. 5º sobre bônus é uma barbaridade, porque o bônus é uma barbaridade, não é? E aí eu tenho três argumentos para sustentá-lo. Primeiro, não têm sustentação teórica. Uma revisão séria de literatura internacional sobre o assunto vai mostrar que esses bônus, essas bonificações, não produzem efeitos equalizadores; ao contrário, eles aumentam a desigualdade. Eles não incidem sobre o aperfeiçoamento do sistema como um todo. Para isso, eu sugeriria, por exemplo, a dissertação de mestrado de Nathalia Cassettari, que foi defendida no Programa de Pós-Graduação em Educação da USP, que fez uma extensa revisão da literatura internacional sobre bonificação de professores. Eu acho que ilustra bastante isso.
Segundo, as medidas de bônus são complexíssimas. Por quê? Porque se nós estamos entendendo que a bonificação é por um resultado expressivo do professor, por exemplo, ou da escola, você não consegue controlar a diferença entre os alunos de um professor. Por exemplo, você pode ter uma classe excepcionalmente boa num ano e seu resultado ser excepcional; no ano seguinte, isso não é verdade. Ou seja, é muito difícil você estabelecer elementos de comparabilidade para medir essas coisas.
E o terceiro elemento é que as políticas de bonificação induzem seleção e exclusão. Veja, a escola também faz gaming. Se a escola sabe que ela vai ser avaliada e vai receber mais dinheiro por ter bons resultados, é óbvio que ela vai selecionar alunos na entrada, de maneira informal e perversa. Portanto, a bonificação é uma estupidez. É uma estupidez tão grande que, uns 15 anos atrás, quando isso era moda no Brasil, não resultou em nenhuma melhoria na educação brasileira, e alguns, envergonhadamente, pararam de falar no assunto, mas eles tinham que vir dizer: "Eu estava errado. É uma bobagem fazer bônus". Então eu proporia simplesmente retirar o art. 5º.
A outra coisa: eu retiraria as condicionalidades e iria direto para os indicadores. As condicionalidades contaminam o debate. São, na verdade, uma tentativa de resolver nesta lei outros problemas que não são objeto da lei. Ainda que algumas delas sejam defensáveis, elas poluem o debate aqui e criam complicação. Eu pergunto: como é que vai se medir isso aqui depois? Como é que você vai pesar todas as condicionalidades? Quer dizer, você cria um monstro, como, aliás, criamos no Vaar, que está mostrando a sua inutilidade.
Por último, eu já falei do período de avaliação da lei, mas eu acho que tem que ficar claro como é que nós vamos avaliar o cumprimento tanto do padrão quanto da responsabilização. Vai ser anual? Vai ser depois de um mandato? Tem que estar explícito isso, porque senão, de novo, nós fazemos a coisa pela metade, vai ter a necessidade de se fazer alguma coisa depois para dizer como é que vai ser ou vai se criar espaço para a judicialização. Nenhuma delas me parece saudável.
Eu espero que essas minhas observações contribuam para o aperfeiçoamento do projeto e desejo sucesso na sua tramitação no futuro.
Muito obrigado.
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A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Nós que agradecemos, Professor, sem sombra de dúvida, contribuíram bastante.
Só queria dar um esclarecimento sobre a tramitação legislativa. Esse projeto é terminativo no âmbito da Comissão de Educação, enquanto projeto, o que não significa que ele possa suscitar, no futuro, alguma outra legislação. Por isto que nós estamos com tanta preocupação, com tanto cuidado, para que ele seja bastante discutido: primeiro, para nos enriquecermos com todo o aporte que está sendo trazido pelos nossos convidados; e, segundo, porque dá mais legitimidade, evidentemente. Pode ter certeza de que tudo que está sendo dito aqui nas nossas audiências será muitíssimo considerado.
Então, vamos para o nosso terceiro convidado, que é o Sr. Gabriel Corrêa, Diretor de Políticas Públicas do movimento Todos pela Educação.
São dez minutos iniciais, precisando de mais cinco, serão automaticamente concedidos.
O SR. GABRIEL CORRÊA (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde, Senadora. Obrigado pelo convite. Obrigado pela Presidência aqui da nossa audiência. Queria saudá-la também pelo trabalho que vem fazendo no Senado, como pude, pessoalmente e presencialmente, comentar ontem com a senhora.
Cumprimento também o Senador Flávio Arns, que tem, junto com a senhora, conduzido essa discussão, e agradecer pelo convite; o Prof. Romualdo, a Andressa, que fizeram, a meu ver, ótimas contribuições aqui para o projeto; e a Jade, não estou a vendo aqui, mas acho que breve também trará ótimas contribuições.
Em primeiro lugar, Senadora, eu gostaria de reforçar que é muito meritória essa discussão que o Senado está puxando, até lembrando que esse é um tema que consta no Plano Nacional de Educação. O Plano Nacional de Educação previa que até 2015 o Brasil tivesse uma lei de responsabilidade educacional e, desde então, nos últimos oito anos, estamos com esse atraso, assim como infelizmente estamos atrasados em muitas das metas e das estratégias do plano.
Mas também já houve algumas outras iniciativas legislativas ao longo desse tempo. Teve um projeto de lei na Câmara dos Deputados, em 2006, se não me engano, da então Deputada Federal Raquel Teixeira, que depois virou Secretária, hoje é a Secretária do Rio Grande do Sul inclusive. Enfim, esse é um tema que vem sendo discutido no debate educacional brasileiro há alguns anos e parte do nosso diagnóstico aqui, no Todos pela Educação, de por que não avança é porque esses projetos trazem no seu âmbito algo que, tanto Andressa quanto o Prof. Romualdo já criticaram, e aqui a gente endossa essa crítica, é a questão da responsabilização do gestor por uma série de indicadores ou de parâmetros de qualidade que não necessariamente estão bem definidos, em primeiro lugar e, mais do que isso, fogem da sua responsabilidade única, entendendo que na educação a gente não tem essa ideia de corresponsabilização, de corresponsabilidade, que vai desde os profissionais de educação, lá na escola, até, sim, a gestão pública e os atores políticos. Acho que isso, esse elemento realmente e o risco de, vou até usar um termo que Andressa usou, uma cruzada de perseguição ou de uma judicialização excessiva, como o Prof. Romualdo trouxe, a gente enxerga como muito perigoso. E, a nosso ver, o projeto e essa ideia não avançam muito por conta desse parâmetro.
Isso não significa que o tema não deva ser debatido e não deva ser avançado. Inclusive, o Plano Nacional de Educação, quando traz a ideia de uma lei de responsabilidade educacional, não traz essa ideia de crime de responsabilidade, essa responsabilização, como esse atual PL, como outros já discutiram.
Então, eu vou trazer bem brevemente, Senadora, na minha fala, algumas preocupações sobre o atual projeto de lei, mas também algumas ideias que temos para que esse tema avance, para que a gente possa, como a própria justificativa do atual Projeto de Lei (PL) 88 traz, aperfeiçoar o controle social, avançar, usando os termos do próprio PL, na aderência de práticas mais responsáveis na educação.
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Acho que esse é um caminho importante para a gente discutir, ou seja - o que eu quero trazer aqui em resumo -, um projeto de lei ou uma lei de responsabilidade educacional não necessariamente, a nosso ver, deveria incidir ou deveria induzir crimes de responsabilização de gestores públicos por um ou outro elemento.
Então, essa é a nossa principal preocupação, como eu já trouxe.
Tem - o Prof. Romualdo trouxe isto - uma série de parâmetros não definidos. Então, na atual redação, você avançar com isso significaria não dar um passo no sistema de ensino brasileiro, porque uma série de parâmetros precisam ainda ser definidos. Por exemplo, o que é o CAQ? A legislação traz, em vários elementos, em vários documentos, em várias leis, o Custo Aluno Qualidade, mas ninguém sabe, não se tem definido ainda o que é isso. Então, como é que a gente vai criar parâmetros de responsabilidade e responsabilização a partir disso?
Na questão da bonificação não vou me estender, mas concordamos plenamente: achamos que é um erro esse tipo de política, especialmente quando feita de forma isolada, obrigatória em lei nacional, para todo mundo. Então, não enxergamos aqui, no Todos pela Educação, que é algo que deva ser avançado em lei.
Há a própria questão da evolução dos indicadores de aprendizagem. A gente tem que lembrar... A gente trabalha muito aqui também com a ideia do direito dos estudantes, então, às vezes, você pode ter uma rede que conseguiu uma evolução, mas que está tão distante ainda de garantir esses direitos, enquanto outras já estão muito mais avançadas e tiveram alguma redução ou alguma estagnação de um ano para o outro nos seus índices de aprendizagem, e isso não significa que deixou de garantir direito dos estudantes. Então, acho que essa questão de evolução de resultados, com muitas críticas, inclusive, a como o Vaar tem sido implementado - o Prof. Romualdo já trouxe -, a gente também endossa e nos preocupa muito.
E mesmo a ideia de que, é claro, a gente tem que avançar, e essa legislatura vai ter oportunidade imensa de discutir o novo Plano Nacional de Educação e, na sequência, os planos estaduais, os planos municipais, mas a gente não pode esquecer que, como eles são planos de estado e são planos decenais, às vezes você tem uma gestão que já pega uma situação de um sistema educacional muito distante do cumprimento do plano que foi estabelecido muito tempo antes, e aí você vai punir aquele gestor por não cumprir a meta do plano, sendo que ele já pegou uma situação muito mais complexa. Então, a gente tem sempre que ponderar essa questão da temporalidade da gestão pública, dos mandatos políticos, com os planos decenais, que são muito importantes. E a gente precisa discutir como ter mais indução, como ter mais força para que eles sejam cumpridos.
Agora, como eu falei, Senador, tem temas meritórios quando a gente fala de avançar em uma lei de responsabilidade educacional voltada para o controle social, voltada para a aderência de práticas de mais responsabilidade.
O atual projeto de lei traz, na sua redação, a ideia de ter, no começo das gestões, um documento, um relatório das gestões do Poder Executivo que traga um diagnóstico e traga um plano de ação para o mandato. Isso é feito por algumas gestões. Isso é feito especialmente em grandes cidades, nos estados, mas tem muitas secretarias de educação que começam e terminam o seu trabalho sem dar nenhuma visibilidade para a sua população, para a sua rede de ensino, de qual é o plano que vai ser seguido. Claro, sempre mirando para o plano municipal, sempre mirando para o plano estadual, mas como eu disse, também é importante que se tenha, a partir desse plano de estado, um plano de gestão.
Então, eu acho muito meritório que o projeto de lei tente avançar nesse sentido para dar transparência, para dar visibilidade para a população do que se pretende seguir.
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E essa questão das metas, dos indicadores, da visibilidade e transparência para a população sobre os principais indicadores que já temos hoje - e aí, ao longo do tempo, com certeza, a gente vai avançar nisso, com o Sinaeb, com o avanço de padrões de qualidade, mas hoje a gente tem indicadores de acesso, de permanência, de aprendizagem dos estudantes que, infelizmente, ainda precisamos avançar muito na transparência que é dada a esses indicadores, mas sem a ideia da punição, na ideia, como a senhora mesmo falou, Senadora, nas audiências passadas, na ideia de acompanhamento, de monitoramento, de até apoiar a rede de ensino no que precisa melhorar. Então, esse é um olhar que a gente precisa dar para as avaliações e não o olhar punitivo de punir a gestão ou punir a escola, pior ainda, punir os profissionais de educação.
E aí termino, só com uma questão que - eu sei que há outras discussões no Congresso sobre isso -, mas talvez esse projeto de lei também possa avançar na ideia da responsabilidade educacional, olhando para o controle social, que é a ideia dos dados educacionais brasileiros que nos últimos anos sofreram um imenso revés no Governo Bolsonaro, um imenso problema de transparência pública.
Hoje, por exemplo, o Prof. Romualdo trouxe a importância de acompanharmos indicadores das diferenças etnicorraciais dos nossos estudantes. Hoje a gente não consegue fazer esse acompanhamento, porque os dados do Inep não nos permitem. Então acho que avançar nisso - e foi trazido por outros representantes aqui na audiência passada -, avançar nessa transparência dos dados educacionais brasileiros nos parece, aqui no Todos pela Educação, fundamental para que possamos ter mais controle social, para que possamos ter mais transparência e avançar na responsabilidade educacional, conforme prevê o atual Plano Nacional de Educação.
Obrigado mais uma vez pelo convite.
Foi um prazer compartilhar aqui com vocês algumas ideias. Estamos à disposição.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Nós que agradecemos.
Acho que foram bastante complementares as falas, ao mesmo tempo, evidenciando as dificuldades, os pontos de atenção que a gente precisa dar a essa legislação para ela continuar a sua tramitação e coisas novas... O bom da dinâmica da educação e do debate é isso, porque os estudos não param, a dinâmica, à medida que ela vai se tornando mais complexa e desafiadora, ela também vai para nós trazendo espaços de investigação, de novas propostas, não é? Se tem uma coisa que na educação é importante é isto: a gente nunca envelhece, vai tudo sempre ampliando, não é?
Então vamos agora ouvir a voz da jovem estudante - não que não sejamos jovens, todos nós somos -, mas vamos ouvir agora a voz de Jade Beatriz, Presidenta da União dos Estudantes Secundarista (Ubes).
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Eu estou sendo informada aqui pela nossa assessoria que o sistema de Jade caiu, e ela não voltou mais.
Então, encerramos com nós três, com vocês três. Vou ler o que chegou do e-Cidadania, ao mesmo tempo em que complemento essa minha rápida abordagem, evidenciando que um dos principais pontos de atrito da leitura dos nossos três palestrantes, nossos três expositores, é a bonificação, não é? A bonificação para professores, o que ela enseja, o que ela envolve e quais as consequências dessa bonificação. Eu digo a vocês que não são boas.
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Nós vivenciamos, lá no nosso estado... Eu, inclusive, fiz várias emendas à lei. É o famoso BDE (Bônus de Desempenho Educacional), que gerou uma bola de neve, porque aí, depois, os policiais também queriam - bônus de desempenho policial -, os médicos também queriam - bônus de desempenho médico -, porque todo mundo quer ampliar o seu salário.
Mas essa bonificação, apesar de ela ser coletiva - ela não é individualizada por servidor ou servidora, ela é coletiva -, criou situações, Prof. Romualdo, tão esdrúxulas que, às vezes, o professor não tinha tempo de preencher a planilha e aí o diretor dizia: "Deixe que eu preencho. O importante é a nossa escola não perder o BDE". E você artificializa, artificializa demais um processo.
Então, eu evidencio como um dos principais pontos de atenção essa questão da bonificação e os vínculos que essa lei, naturalmente, enseja, principalmente com o Plano Nacional de Educação.
Vamos, então, para as quatro intervenções do e-Cidadania. Na verdade, são quatro perguntas.
A primeira é de Taylor Pedro, do Distrito Federal: "Como podemos fortalecer a responsabilidade educacional para assegurar oferta e padrões de qualidade na educação básica pública?".
Acho que isso já fez parte das exposições todas.
Carlos Silva, do Rio de Janeiro: "Quais serão os agentes responsáveis pela fiscalização e qual será o método estabelecido para avaliar a efetividade das medidas tomadas?".
Lucineide Alessandra, do Distrito Federal: "Como conseguir nas escolas o comprometimento com a responsabilidade e qualidade educacional?".
Fred Almeida, do Pará: "Como o PL [projeto] pretende lidar com as desigualdades regionais e socioeconômicas que afetam a qualidade da educação?".
Então, eu vou devolver a palavra... Agora somos dois - não é? -, porque a Andressa tinha já dito que não podia ficar até o fim.
Pergunto se tem algum Senador online. Não vi ninguém se inscrevendo. (Pausa.)
Aí retorno para o Prof. Romualdo e, depois, para o Gabriel, perguntando se cinco minutos são suficientes para essa abordagem final. (Pausa.)
Então, Prof. Romualdo.
O SR. ROMUALDO LUIZ PORTELA DE OLIVEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Eu vou começar de trás para frente. Eu acho que a pergunta do Fred tem que ser objeto no projeto, na hora em que se define o padrão de oferta.
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Eu fiz a minha primeira intervenção trabalhando com a ideia de igualdade de gasto ou de busca da igualdade de gasto, mas eu não sou contra uma desigualdade reversa, ou seja, que você identifique regiões vulneráveis, que atendem populações mais vulneráveis, notadamente regiões mais pobres, periferias das grandes cidades, para que recebam mais recursos, exatamente porque temos que ter consciência de que a distribuição espacial da população é regressiva. Quer dizer, as escolas da periferia atendem a população mais pobre, têm professores menos experientes, porque, em geral, os professores começam o seu exercício pelas escolas da periferia, conforme eles vão tendo condições, eles vão migrando para regiões mais centrais, portanto, não têm estabilidade de corpo docente, enfim, muitas vezes, as escolas são mais precárias, as salas são mais lotadas, ou seja, eu não tenho problema de que o gasto seja desigual numa perspectiva de redução de desigualdade, mas, num primeiro momento, é razoável e é didático a gente trabalhar com a ideia da redução das desigualdades, porque vai no mesmo sentido, porque, nessas escolas que atendem os mais vulneráveis, os gastos são menores. Mas eu acho que esse é um dos objetos importantes a serem equacionados num projeto de lei que trate de padrão de oferta, porque essa é uma das questões: você tem que garantir o mínimo. Então, eu acho que é uma questão bastante importante.
A questão do comprometimento das escolas tem um elemento sempre objetivo e tem um elemento subjetivo. O elemento objetivo é um pouco o que a lei pode tratar, de garantir condições de funcionamento das escolas adequado à remuneração dos professores, enfim, todo aquele conjunto de coisas que dizem respeito ao compromisso do poder público com a educação. O elemento subjetivo tem a ver muito com a dinâmica das escolas, a dinâmica política da sociedade, e isso é uma questão que a gente tem que construir.
Eu acho que é importante a gente criar no Brasil uma consciência social da importância da educação. Isso não é muito claro, porque eu diria que, do ponto de vista do discurso, não há muita divergência sobre a importância da educação no Brasil; agora, do ponto de vista objetivo, há. Eu tenho ficado sempre estarrecido quando, em todo começo de ano, se recalcula o piso nacional do salário dos professores. Você tem marcha de Prefeitos a Brasília para dizer que não vão cumprir, ou que não podem cumprir. Isso é estarrecedor, porque é o seguinte: isso desmonta qualquer discurso que venha a dizer que a educação é importante. Os caras não acham que é importante, porque eles não querem nem gastar o mínimo como se o piso do salário dos professores fosse um negócio exorbitante - é o contrário! Se nós compararmos isso com os salários de outros setores da administração pública, são vergonhosos; se nós compararmos internacionalmente, o Brasil paga muito mal aos seus professores, ou seja, quando se trata de efetivamente gastar mais em educação, é que nós sentimos que essa prioridade não existe, ela é só retórica.
Isso eu acho que é um elemento também subjetivo, porque existem estudos que mostram o seguinte: se a população como um todo não reivindica mais e melhor educação, a educação não muda. Se essa tarefa ficar restrita aos profissionais de educação onde ela existe, ela sempre vai ser acusada de corporativa e de defender interesses menores, que não são, mas, de toda maneira, nós temos que transformar, de fato, a educação numa prioridade nacional - esse é um elemento subjetivo da nossa política no Brasil -, nós temos que transcender os limites da escola para defender a importância da educação.
E eu acho que a pergunta do Carlos, sobre a fiscalização da efetividade das medidas, eu acho que ela tem que estar presente na lei, dizer como é que elas vão ser fiscalizadas, como é que vai se garantir isso. Então, eu acho que esse é o objeto da lei mesmo.
Eu pararia por aqui, eu acho que é suficiente para as perguntas que foram encaminhadas.
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A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Muito obrigada, professor, foi mais do que suficiente. Acho que os nossos internautas estão contemplados também.
Passo, então, a palavra para Gabriel, para fazer as suas considerações.
O SR. GABRIEL CORRÊA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senadora. Acho que o professor respondeu muito bem às perguntas feitas pelos participantes aqui.
Destaco só um ponto sobre responsabilização, que já trouxe na minha fala inicial. Se achamos... Que foi a pergunta do Taylor: "Como é que fortalece a responsabilidade?". Eu acho que os gestores precisam, podem e precisam ser responsabilizados por aquilo que for de direta responsabilidade deles. A aplicação dos 25% em MDE, por exemplo, esse é outro absurdo que muitas gestões ainda não cumprem e ainda colocam gastos de aposentados aí dentro. Então, acho que isso é um ponto específico que é de responsabilidade direta e que deveria ser mais cumprido e punido, inclusive, quando não acontece. Também as aplicações, as novas regras de aplicação do Fundeb: tem regras de aplicação na educação infantil, tem o pagamento de 70% para profissionais da educação... A alocação de recursos é função direta do gestor público, e eles devem, sim, ser responsabilizados por isso. O que é diferente de a gente olhar a nota de aprendizagem de português e matemática e ver se evoluiu ou não, que eu acho que tem na lei também.
E aí, em relação à questão das disparidades regionais, isso é muito importante. Acho que as falas aqui foram muito convergentes na linha de se preocupar com a equidade, com as desigualdades, e nisso aqui, no Todos pela Educação, a gente sempre se preocupa em estabelecer padrões únicos, especialmente quando a gente olha para insumos no Brasil inteiro. Mas temos, sim, como já foi dito aqui, que avançar nessa equalização de gastos por aluno. O Fundeb... Começando, lá em 1996, com o Fundef; depois, em 2007, o Fundeb; e agora o novo Fundeb, a gente vem avançando nisso, mas ainda tem um caminho imenso a ser percorrido para a gente conseguir equalizar os gastos por aluno no Brasil. Não adianta a gente ficar só olhando as médias, mas também temos que olhar para essas diferenças que são brutais e que, em muitos lugares, ainda impedem qualquer gestão de qualidade, qualquer garantia do direito à educação das crianças e jovens.
Então, obrigado, Senadora! Obrigado, Senador Arns, também! Foi um prazer estar aqui com vocês e poder contribuir.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Eu que agradeço, agradeço aos nossos três convidados - dois convidados e uma convidada: a Andressa Pellanda, representando a Campanha Nacional pelo Direito à Educação; o Prof. Romualdo Luiz Portela, da USP e do Cenpec; o Gabriel Corrêa, Diretor de Políticas Públicas do Movimento Todos Pela Educação. E lamento o problema de rede de Jade Beatriz, da Ubes, mas a Ubes também sempre está participando das nossas audiências.
Avalio que foi bastante enriquecedor. A lei, de fato, foi, digamos assim, dissecada pelos nossos palestrantes, destacando seus pontos positivos, seus pontos que podem contribuir com a melhoria da qualidade, destacando e nos alertando também sobre os limites e com aquele pontinho de atrito maior, que é o art. 5º, que trata da bonificação.
Quero agradecer muito a presença de todos vocês, as grandes contribuições.
Não havendo mais nada a tratar, declaro por encerrada a presente reunião.
(Iniciada às 14 horas e 29 minutos, a reunião é encerrada às 15 horas e 28 minutos.)