22/06/2023 - 43ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Declaro aberta a 43ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A audiência pública será realizada nos termos do Requerimento nº 43 desta Comissão, de minha autoria e de outros Senadores e Senadoras, para debater o tema: o Dia Mundial da Conscientização sobre a Doença Falciforme.
Ele só veio me cumprimentar, é o nosso Líder Contarato. Esse é, eu diria, um dos melhores Parlamentares da história do Parlamento, e não só do Senado. Peço uma salva de palmas para ele. (Palmas.)
Ele veio aqui para prestigiar este momento que ele trata com muito carinho, que é a questão da doença falciforme. Obrigado por ter vindo.
Eu vou dar um rápido informe de como foi ontem, aqui, no Congresso, aproveitando esse horário em que a TV Senado está ao vivo para todo o Brasil.
Ontem foi um dia muito importante para o povo brasileiro. O Senado aprovou o Dr. Cristiano Zanin para ocupar a vaga de Ministro do Supremo Tribunal Federal. (Palmas.)
Foi uma expressiva votação, como eu falei, lá na CCJ, só como exemplo, uma das votações mais expressivas de ministros indicados pelo Governo do Presidente Lula. O placar, na CCJ, foi de 21 votos contra cinco; no Plenário, foi de 58 a 18. Isso demonstra que até Senadores da própria Oposição reconheceram a história bonita do Dr. Cristiano Zanin.
Além do Ministro Zanin, que também foi aprovado no Plenário, como eu já disse, o Plenário aprovou o arcabouço fiscal, muito importante para a economia e para o olhar dos mais pobres, como é a linha de atuação do Governo Lula e Alckmin. Nós todos, claro, estamos nessa caminhada.
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O arcabouço fiscal aqui aprovado fez três mudanças mediante acordo com todo o Senado da República e também com o Executivo: o Fundo Constitucional de Brasília se manteve como é hoje; o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) foi mantido também, não entrou no arcabouço, e ainda despesas com ciência, tecnologia e inovação.
Como disse o Líder Jaques Wagner no Plenário, um outro setor que queria sair do corpo do arcabouço pode ficar tranquilo que não terá nenhum prejuízo - palavra do Líder do Governo Jaques Wagner.
Dando essa primeira informação da importância da votação do arcabouço, eu sou um daqueles que - inclusive dei entrevista agora - não tem nenhuma dúvida de que o Presidente Lula está certo e de que a taxa de juro vai ter que cair neste país. Nós temos a taxa de juro mais alta do mundo. O arcabouço vai ajudar, a economia está avançando, a inflação está caindo, o dólar está caindo, o número de emprego está voltando e os programas sociais estão todos já sendo tocados.
Fizemos muito, mas podem crer que nós vamos fazer muito mais.
Parabéns a todos que estão nessa luta aí. (Palmas.)
As palmas não são para mim não; são para todos que estão peleando para alterar tudo neste país, para avançar e para melhorar a qualidade de vida do povo brasileiro.
Vamos à nossa audiência.
Como faço sempre, eu faço uma pequena introdução sobre o tema.
O Dia Mundial de Conscientização sobre a Doença Falciforme foi instituído pela Organização das Nações Unidas, em 2008, como forma de chamar a atenção para a doença, que é genética, hereditária e caracterizada por alterações no sangue entre os glóbulos vermelhos, que se tornam rígidos e assumem o formato de foice, dificultando a passagem do oxigênio para o cérebro, pulmões, rins e outros órgãos.
Conforme dados do Ministério da Saúde, a doença não tem cura e pode provocar o comprometimento das principais funções do organismo caso o portador não receba a assistência adequada. Por isso, nós todos estamos aqui solidários a eles.
Entre as complicações da doença não tratada, estão a anemia crônica, crises dolorosas associadas ou não a infecções, retardo do crescimento, infecções e infartos pulmonares, acidente vascular cerebral, inflamações e úlceras.
O diagnóstico precoce da doença falciforme é feito na triagem neonatal, com a realização do teste do pezinho.
As doenças em que ocorre alteração na produção de hemoglobina constituem um grupo de doenças de origem genética, em que mutação nos genes que codificam a hemoglobina leva à alteração na sua produção.
Uma das doenças mais frequentes diante dessas alterações genéticas é a anemia falciforme, que é um tipo de alteração dos glóbulos vermelhos no sangue, tornando-os parecidos com uma foice, como dizia, daí vem o nome da anemia falciforme. Essas células têm sua membrana alterada e rompem-se mais facilmente, causando, então, a anemia.
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A hemoglobina, que transporta o oxigênio e dá a cor aos glóbulos vermelhos, é essencial, é fundamental para a saúde de todos os órgãos do corpo.
Essa condição é mais comum entre a população negra. A anemia falciforme pode se manifestar de forma diferente em cada indivíduo. Os sintomas geralmente aparecem na segunda metade do primeiro ano de vida das crianças. Um dos sintomas mais frequentes são as crises de dores causadas pela obstrução de pequenos vasos sanguíneos e glóbulos vermelhos, como dizia, nesse formato aqui descrito.
No Brasil, entre tantas propostas que já foram apresentadas para essa luta, eu fui o autor da Lei 12.104, de 2009, que instituiu o Dia Nacional de Luta pelo Direito das Pessoas com Doenças Falciformes, celebrado anualmente no 27 de outubro. Vamos hoje debater a importância da prevenção e do tratamento para as doenças falciformes.
Vejam bem como é a vida, não é? Eu tenho uma tendência a ser magrinho, pode ver que eu estou elegante, não é? Tenho uma tendência a ser gordinho. Então, eu faço, um dia sim, um dia não, de segunda a sexta, no caso, segunda, quarta e quinta, um alongamento, exercício, até porque eu tenho pressão alta e dizem que eu sou pré-diabético, só que os médicos dizem que não tem pré-diabético. É médico ou não é? Eu digo: "Sim, doutor, mas eu prefiro usar o termo pré-diabético". E para a profissional que vai, um dia sim, um dia não, hoje eu falei que ia ter essa audiência. Ela disse que não sabia: "Mas eu vou lhe informar, então, Senador: eu tenho anemia falciforme". E ela me descreveu o que ela passou desde pequena. Claro que eu não vou entrar em detalhe aqui, não vou citar o nome dela, mas é uma profissional muito, muito competente e ela tem anemia falciforme desde o berço. Aí me contou um pouco de como foi a vida dela, a dificuldade e tal, mas está bem, tanto que ela é uma profissional muito, muito competente.
Já falei bastante. Eu sempre digo que o lugar de Presidente de Comissão não é falar, é convidar para que os painelistas exponham o seu ponto de vista.
Então, vamos à primeira mesa. Primeiro, sejam todos bem-vindos.
Clarisse Lobo, médica, hematologista, membro do Comitê de Glóbulos Vermelhos e do Ferro da Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia, está aqui conosco. Uma salva de palmas. (Palmas.)
Obrigado, doutora, pelo seu trabalho e por estar aqui nesse momento nos dando a oportunidade de ouvi-la.
Vanessa Fenelon da Costa, médica, ginecologista, obstetra e especialista em pré-natal de alto risco. Muito obrigado também, doutora. (Palmas.)
Obrigado, doutora. Parabéns pelo seu trabalho.
Teresa Cristina Cardoso Fonseca, médica, clínica geral, hematologista e hemoterapeuta. Seja bem-vinda, doutora. (Palmas.)
Leandro Fonseca, Diretor de Relações Corporativas e Sustentabilidade da Novartis. Dr. Leandro, por favor. (Palmas.)
Parabéns também pelo seu trabalho, sua história, em defesa daqueles que mais precisam.
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Então, de imediato, eu passo a palavra à Dra. Clarisse Lobo. Só vou repetir: médica hematologista, membro do Comitê de Glóbulos Vermelhos e do Ferro, da Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia.
São 15 minutos para cada convidado.
A SRA. CLARISSE LOBO (Para expor.) - Está ótimo!
Muito obrigada, Senador. Obrigada a todos.
Senhoras e senhores, eu estou muito orgulhosa de podermos estar aqui debatendo uma questão que permeia a vida de todos vocês e que também tem permeado a nossa vida na luta em relação à melhoria da atenção, no Brasil, às pessoas com doença falciforme.
Eu passo por aqui ou você passa aí?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Quem é que a auxilia? (Pausa.)
O.k!
A SRA. CLARISSE LOBO - Bem, eu participo, como membro da ABHH e também sou Presidente da Câmara Técnica, desde abril, do Ministério da Saúde, para o enfrentamento as questões relacionadas à doença falciforme.
Você vai passar? O senhor vai passar? (Pausa.)
Sim; esses são meus conflitos de interesse. Eu não tenho nenhum conflito de interesse em relação a essa apresentação.
Próximo, por favor.
Vou falar um pouco... O Senador já falou quase toda a minha fala, mas eu vou falar um pouco... (Risos.)
... sobre a origem e a frequência da doença falciforme.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ela vai aprimorar, melhorar... Mas só esqueça os erros; só fala o que é bom daqui para a frente.
A SRA. CLARISSE LOBO - Na verdade, é uma doença autossômica recessiva. Traduzindo isso: um casal que tem só o traço falciforme, é assintomático e não sabe que tem a alteração, tem 25% de chance, em cada gestação, de gerar um bebê com a doença falciforme.
Próximo, por favor.
A mutação teve origem na África Equatorial. Existe uma vantagem evolutiva de pessoas que têm o traço falciforme com a malária. A malária, então, protege a destruição dessa célula, porque... A doença falciforme, desculpe, protege a destruição da célula da malária. Então, pessoas com o traço faziam uma malária mais branda e, por isso, ela virou uma vantagem evolutiva, tanto que nós temos uma prevalência do traço de até 25% em algumas regiões da África Equatorial.
Próximo.
Da África, ela migrou, através do tráfico escravo, para todo o mundo - a migração forçada dos nossos antepassados -, e, no Brasil, ela é bastante prevalente por questões óbvias.
O próximo, por favor.
Essa era a composição da nossa carga genética durante os séculos pós-descobrimento. Nós podemos ver que, em 1855, 50% da população era de africanos imigrados forçadamente e, portanto, a miscigenação permeou o início da nossa colonização.
O próximo, por favor.
A prevalência da doença é tanto maior quanto maior a influência da comunidade africana em cada população, tendo influência de até um caso para cada 6650 nascidos vivos na Bahia e um caso para cada 13 mil em Santa Catarina, onde a presença do africano, ali no Sul do Brasil, é menor.
O próximo.
A alteração, como o Senador falou, é uma mutação.
Próximo, por favor.
Que é uma troca única de um aminoácido dentro da cadeia de hemoglobina. Entretanto, essa troca tem uma característica: quando a hemácia perde oxigênio, que é uma coisa que ela faz o tempo inteiro no nosso organismo, ela endurece, ela forma um polímero, em vez de ela ser uma coisa diluída.
Próximo, por favor.
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Esse polímero vai levar à perda de água da hemácia, à diminuição da deformabilidade e ao aumento da vaso-oclusão o que leva à lesão crônica dos órgãos ao longo dos anos e à hemólise crônica. Ambos são a fisiopatologia básica da doença.
Próximo, por favor.
Próximo.
Apesar de a crise vaso-oclusiva ser um evento catastrófico, porque atrapalha a vida de cada uma das pessoas com doença falciforme, fazendo com que elas dependam do sistema de emergência e urgência do nosso país, ela não é o iceberg inteiro, ela é só a ponta do iceberg. Na verdade, quanto mais crise vaso-oclusiva, mais lesão crônica de órgão ao longo da vida, encurtando a sobrevida desse indivíduo.
Próximo.
Essas complicações variam de acordo com a idade. Nas crianças temos as infecções; o sequestro do sangue dentro do baço, fazendo com que o indivíduo tenha um risco de morte iminente por anemia aguda - sendo que o sangue não saiu do corpo, está dentro de você; o acidente vascular cerebral, que é um evento catastrófico e que muda toda a história da vida da pessoa para frente; as dores nas mãozinhas e nos pezinhos das crianças, que é dactilite falciforme; e alterações no desenvolvimento e no crescimento.
Próximo.
A adolescência não é um período menos crítico, no qual, além daquelas alterações vistas na infância, nós temos a mudança de atendimento do pediatra para o internista, sendo considerado um período extremamente grave, potencialmente grave, levando ao aumento de número de óbitos e diminuição da ida a procedimentos médicos, como transfusões e uso de medicamento. Essa fase merece nossa atenção, e que a gente está começando a se debruçar sobre isso agora.
Próximo, por favor.
Na idade adulta, nós temos lesão de órgãos em qualquer local onde exista sangue circulando. Eu vou chamar a atenção de que a gravidez é uma condição de alto risco materno e fetal. A Dra. Vanessa vai falar um pouco sobre isso depois, mas a pessoa vai ter toda a sua vida modificada quanto mais crises de dor ela tiver ao longo da vida. Entretanto, a crise de dor isoladamente não é o único olhar que nós devemos ter para a doença.
Próximo, por favor.
Todas as modificações que foram feitas na história natural, como a triagem neonatal, o uso de vacinas, a penicilina oral, a triagem por doppler e a educação dos pais, modificaram bastante a sobrevida das crianças. Esse trabalho é americano, e nos Estados Unidos, a sobrevida das crianças, a mortalidade de crianças é menor que 2% na primeira infância. Entretanto, mesmo lá, a mortalidade de adultos ainda não foi modificada, conforme a gente pode ver nesse gráfico. Nas três faixas de tempo, a mortalidade não se modificou muito.
Próximo, por favor.
No Brasil, o que nós temos é uma diminuição da expectativa de vida em relação à população geral, de 37 anos aproximadamente, com 5% a 10% das nossas crianças com doença falciforme morrendo até os cinco anos de idade ainda. Sendo que, como eu falei antes, nos Estados Unidos, 2%; e na Europa, 2% das crianças apenas até os cinco anos falecem de doença falciforme.
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Por favor, pode seguir.
E essa daí é a linha do tempo dos nossos trabalhos em doença falciforme. Nós começamos, então, em 2001 no programa de triagem neonatal. Desde 2002 a gente tem um protocolo clínico que coloca os medicamentos que nós devemos usar. Em 2005, o Governo Federal lança a política de atenção integral a pessoas com doença falciforme. Os estados tinham o dever de casa de construir as linhas de cuidado. O transplante de medula óssea em 2015.
E, desde 2018, nós temos pelo PCDT (Protocolo Clínico de Diretrizes Terapêuticas do Ministério da Saúde) um protocolo clínico bastante inclusivo. E nós trabalhamos muito de 2005 a 2018 na implementação da política de atenção. Entretanto, desde 2018 até agora, no início de 2023, muito pouco aconteceu.
Próximo, por favor.
Essa é a política de atenção integral.
Próximo.
Ela tem quatro pernas. Ela tem, podemos dizer que ela tem duas pernas e dois braços. Foi a universalização do diagnóstico precoce através da triagem neonatal, a utilização do protocolo clínico, transplante de medula e a profilaxia de algumas complicações com uso de penicilina oral, programas de transfusão crônica, vacinas, quelação de ferro e doppler transcraniano para prevenção do acidente vascular cerebral.
Na triagem neonatal nós temos aproximadamente, depois da triagem, a visibilização da doença falciforme. Ela deixa de poder ser colocada debaixo da mesa. Ela entra em cima da mesa do gestor, onde são identificadas atualmente aproximadamente entre 60 e 100 mil pessoas com a doença falciforme no Brasil. Variando a prevalência, como eu falei, de acordo com a maior ou menor influência da colonização africana em cada região do Brasil.
Próximo, por favor.
A despeito de a triagem neonatal ser universal pelo Governo Federal, ela tem que ser aderida pelos estados e o Governo Federal precisa monitorar. E aí, o que a gente tem de dificuldade? A qualidade do programa está bastante comprometida. A fragmentação do programa, ou seja, a criança pode ser triada e pode não chegar na unidade de assistência. E o que a gente quer? Que crianças triadas sejam iguais a crianças assistidas num primeiro ano.
Próximo.
Em relação a protocolo clínico inclusivo, o uso da hidroxiureia, que é o medicamento mais utilizado na doença falciforme, é o padrão ouro para doença falciforme, entretanto, ele não atende a 100% das pessoas. Nós precisamos de novos medicamentos e novas formulações de hidroxiureia.
Entretanto, esse protocolo clínico, apesar de ele ser garantido, existe extrema irregularidade na prescrição e dificuldades no acesso. Então, nós temos dificuldade da prescrição médica, dificuldade da adesão do paciente e algumas barreiras de acesso. Os pacientes necessitam de vários exames, com idas e vindas, e com dificuldades nas pactuações intermunicípios.
A manipulação excessiva de cápsulas em crianças é uma outra dificuldade. Nós precisamos de formulação em que a criança possa ser contemplada com mais conforto para a família e mais garantia de que a dose correta esteja sendo utilizada.
O resultado das nossas dificuldades é que apenas 50% das crianças e 40% dos adultos utilizam hidroxiureia no Brasil. Esse número é bastante pequeno, uma vez que a hidroxiureia é o único modulador daquelas dificuldades todas que a gente colocou, que está disponível e que é padrão ouro.
Próximo, por favor.
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Em relação à Política Nacional de Transplantes, ela é bastante inclusiva também.
O próximo, por favor.
Entretanto, ela tem dificuldades no acesso a exames HLA; uma fila de transplantes que compete com a fila de malignidades, fazendo com que fique extremamente difícil o acesso dessa pessoa ao transplante; e nós temos pouco envolvimento dos médicos hematopediatras para indicar o transplante de medula óssea.
O próximo, por favor.
Essas linhas de atenção integral, que é o autocuidado em crianças e adultos, o uso de antibiótico, vacinação, transfusão e doppler transcraniano, também têm várias dificuldades.
O próximo, por favor.
Nós temos falta ocasional de penicilina oral; nós temos falta de inclusão de algumas vacinas, como Pneumo 13, que é liberada para vários grupos, mas não é oficialmente liberada para pessoas com doença falciforme; nós temos uma falta de política de vacinação para adultos e uma dificuldade de acesso ao doppler transcraniano na maioria dos estados.
O próximo.
Para finalizar, eu digo que, apesar dos avanços obtidos, nós retrocedemos muito nos últimos anos e a nossa taxa de mortalidade é extremamente elevada. Nós retornamos, em 2023, junto com o Ministério da Saúde, trabalhando muito e com muito trabalho pela frente. O protagonismo do Poder Legislativo é muito importante na retomada das ações. Nós precisamos de acesso, pactuação tripartite, que também passa por vocês, de vacinação para crianças e adultos e incorporação criteriosa de novos medicamentos.
Para finalizar, deixando na mão do Senador, os Parlamentares são agentes importantes que podem contribuir para modificar essa realidade atual.
É só isso. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Meus cumprimentos à Dra. Clarisse Lobo, médica hematologista, membro do Comitê de Glóbulos Vermelhos e do Ferro da Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia.
Parabéns pela exposição!
A audiência está no início ainda e está um pouco tumultuada.
A SRA. CLARISSE LOBO (Fora do microfone.) - É verdade.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Aceite minhas desculpas aqui.
O pessoal está chegando.
Mas a sua fala, além de ficar circulando por uma permanente via do sistema de comunicação aqui do Senado, também é remetida para os Senadores da Comissão, está bem?
Passamos a palavra, de imediato, para a Dra. Vanessa Fenelon da Costa, médica ginecologista-obstetra e especialista em pré-natal de alto risco.
A SRA. VANESSA FENELON DA COSTA (Para expor.) - Primeiro eu gostaria de agradecer o convite.
É um grupo de pacientes pelo qual eu tenho muito carinho. Trabalho com elas desde 2007, quando eu fui chamada pela Zenó, da Dreminas, para fazer acompanhamento de paciente com doença falciforme. Era um grupo de pacientes que não eram cuidadas. A gente não sabia como cuidava e acreditava que a gente tinha que transfundir todo mundo. Se a gente pensar que foi uma doença que foi a primeira vez diagnosticada no início do século passado, quando é descrita... Os estudos de anemia falciforme na gravidez só vão surgir no meio do século passado, quando a gravidez era contraindicada. As pacientes com anemia falciforme não poderiam engravidar e, no final do século...
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - A senhora deixe-me fazer um pedido para o plenário? A Dra. Clarisse sentiu e eu também senti.
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Se o plenário não ficar em silêncio, repercute nos microfones que estão ligados e prejudica a fala da convidada ou do convidado. Então, faço um apelo: o silêncio só nos ajuda, inclusive a quem está assistindo pelo sistema de comunicação do Senado.
A SRA. VANESSA FENELON DA COSTA - Então, alguns estudos mostraram, no final do século passado, que essas pacientes poderiam engravidar, mas a taxa de mortalidade dessas pacientes era muito grave, e alguns estudos falavam que a gente tinha que fazer a transfusão profilática em todo mundo, até que a Profa. Mabel Koshy, nos Estados Unidos, fala que não, a gente não teria que fazer a transfusão profilática, a gente faria transfusão profilática por indicação.
Na mesma época, em 2001, quando a gente começa a ter o teste do pezinho, o número de mulheres diagnosticadas com anemia falciforme aumenta, e a gente tem um número grande de pacientes ainda não diagnosticadas. Em 2007, em Minas Gerais, a gente começa com um projeto de cuidado para as pacientes com anemia falciforme durante a gravidez, quando a gente faz um protocolo de assistência a essas pacientes. O que a gente observava até então? Que muitas das patologias que essas pacientes desenvolviam durante a gravidez a gente desconhecia, a gente não sabia, nós obstetras não tínhamos contato próximo com os hematologistas, então, havia uma distância entre eles. Às vezes, a paciente fazia uma síndrome torácica aguda, a gente achava que era uma TEP, não tratava, a paciente vinha a óbito. A dor da paciente muitas vezes não era uma dor reconhecida. A gente colocava essas pacientes para o trabalho de parto.
Com esse estudo e com esses protocolos, a gente passa a vivenciar que todos aqueles eventos vaso-oclusivos, que a Clarisse falou, durante a doença vão surgir na gravidez de uma maneira muito mais intensa, com todas essas complicações, e isso nos remete também a que tudo aquilo que a cliente apresentava na infância, as formas SC, sequestro esplênico, crise álgica, começam a surgir na gravidez também. Então, a gravidez não era mais aquele momento de a gente tranquilizar em relação às pacientes com hemoglobinopatia SC ou SS. A gente observa que as duas formas são extremamente graves e que a gente tem que reconhecer essas formas clínicas e as complicações delas.
A gente sabe que atualmente a maioria dos estados não tem um serviço de pré-natal de alto risco especializado e atento a essas mulheres, que talvez sejam o grupo de pacientes mais graves quando a gente pensa em gestação de alto risco. É o grupo que mais vai se complicar, com que a gente tem que ter uma atenção mais cuidadosa. Se a gente for um pouquinho mais em relação à violência obstétrica, talvez seja o grupo de pacientes que mais sofre violência obstétrica, porque muitas vezes a gente não reconhece a dor da paciente e coloca nelas a questão de se elas têm que ter um parto normal ou um parto cesariano.
Na verdade, qual a melhor via de parto para essas mulheres? A melhor via de parto para essas mulheres é a melhor via de parto para elas, é o que elas desejarem, com o que elas estiverem tranquilas, confortáveis. Parto normal não vai ser talvez o melhor parto para elas, talvez seja uma cesariana programada, com reserva de sangue. Às vezes não, às vezes, a paciente entrou em trabalho de parto, vamos acompanhar esse trabalho de parto, vamos garantir que essa paciente tenha analgesia precoce, que ela não sinta dor, vamos reconhecer que essa paciente sente dor.
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Isso é uma coisa que... Se a gente fala em violência obstétrica na população em geral, imaginem na população negra com doença falciforme, em que, na maioria das vezes, os médicos, e eu me coloco como obstetra, não acreditam na dor da paciente. O nosso maior desafio hoje, no serviço em que eu trabalho, é acreditar que a dor da paciente existe e é forte, vamos respeitar e não vamos julgar. Então, é muito importante que a gente tenha esse cuidado com as pacientes.
Saindo da questão do parto, nós temos que lembrar também do puerpério e nós temos que assegurar a essas pacientes que elas engravidem quando quiserem, no momento que for melhor para elas, e temos que garantir a elas o melhor método contraceptivo. Qual é o melhor método contraceptivo para elas? É o Mirena, é o DIU de levonorgestrel. Ele é melhor que a laqueadura, porque, se eu faço a ligadura nessas pacientes, eu posso aumentar o sangramento, aumentar a dor, e isso pode ser um fator desencadeante de evento vaso-oclusivo. No caso do Mirena, alguns estudos sugerem que ele aumenta a hemoglobina fetal: eu não vou ter dor, eu não vou ter sangramento, então, eu vou diminuir as possibilidades de essas pacientes terem evento vaso-oclusivo no pós-parto ou durante a vida.
É preciso lembrar que o DIU Mirena é caro e não é fornecido pelo SUS. Às vezes, a gente consegue doações. A gente deveria colocar o DIU Mirena nas pacientes na adolescência. Eu tenho que garantir que essas adolescentes engravidem quando elas quiserem, no melhor momento da doença delas. E a gente tem que lembrar que, se uma paciente engravida em um momento da doença dela com vários eventos vaso-oclusivos, isso vai complicar a gravidez. Então, a gente tem que orientar essas mulheres a engravidarem no melhor momento possível, da melhor maneira possível, quando elas quiserem, quando elas desejarem. Não é contraindicado gravidez para a paciente com anemia falciforme, as pacientes com anemia falciforme podem engravidar; o ideal é que elas engravidem quando a doença estiver mais controlada, mas nós, como obstetras, temos a obrigação de saber cuidar dessas pacientes, de saber identificar as suas complicações durante a gravidez e tratá-las.
Outra coisa muito importante: quando a gente está no pronto atendimento diante de uma paciente com anemia falciforme, elas têm que ter prioridade no atendimento: é obrigatório que a gente classifique essas pacientes como ficha laranja ou até com ficha vermelha, dependendo da dor dessas pacientes. A gente sabe que, na gravidez, eu tenho mais evento vaso-oclusivo, eu tenho mais crise de dor, quanto mais rápido eu começar o tratamento para essas pacientes com anemia falciforme, mais rápido a crise de dor delas melhora o resultado. Eu tenho dois pacientes, talvez seja a única especialidade em que eu vou ter dois pacientes: eu vou ter o feto e eu vou ter a mãe. Tudo que eu fizer para essa mãe, eu vou ter que contrabalançar entre a mãe e o feto. E todas as complicações que eu deixar que essa mãe tenha durante a gravidez, ela vai levar para o resto da vida dela. Então, na gravidez da paciente com anemia falciforme, eu tenho que cuidar dela o máximo que eu puder, de modo que ela não leve intercorrências para a vida dela ao longo dos próximos anos.
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Então, tem que tratar dela para que ela não desenvolva necrose avascular de cabeça de fêmur; eu tenho que ficar atenta à função renal dessa paciente; eu tenho que ficar atenta à função hepática dessa paciente; eu tenho, quando transfundir essa paciente, transfundi-la com o sangue mais adequado para ela. Esses cuidados a gente tem que ter, e a gente só consegue ter esses cuidados se eu conhecer a doença e souber como dela cuidar.
Então, o que eu gostaria? Acho que é o meu principal objetivo aqui realmente: é o DIU Mirena para essas mulheres, que seria, assim, a possibilidade de elas engravidarem no melhor momento possível e garantir, ou tentar diminuir a gravidez da adolescência, que ainda é uma coisa muito frequente, e tentar, dessa maneira, diminuir a taxa de mortalidade materna, que a gente sabe que está aumentando muito. Em 2022, quando saiu a taxa de mortalidade materna, nós estamos em quase 100 para 100 mil nascidos vivos - não em doença falciforme, mas em população em geral, mas a gente sabe que a mortalidade materna na doença falciforme chega a ser 40 vezes maior do que na população em geral.
Então, se a gente não cuida dessas mulheres, a gente aumenta a taxa de mortalidade.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
Meus cumprimentos à Dra. Vanessa Fenelon da Costa, médica ginecologista-obstetra, especialista em pré-natal de alto risco. (Palmas.)
Pode. Só... Só um minutinho.
Nós organizamos da seguinte forma: as quatro falam; se tiver algum complemento, fala, daí, no encerramento da mesa. Daí, eu vou chamar a segunda mesa.
E quero dizer que, para a alegria de todos nós... Confesso que eu estava preocupado. Se não tivesse aqui uma representante do meu Governo, eu não ia reclamar no microfone, mas, fora, eu ia reclamar. Mas ela avisou que estava chegando e chegou já. Vai ficar na mesa durante as próximas três mesas, e quero dar uma salva de palmas para ela: Dra. Joice Aragão de Jesus, Coordenadora de Sangue e Hemoderivados do Ministério da Saúde. (Palmas.)
Ela é uma das responsáveis pela organização, inclusive, desse evento - porque já virou um evento!
Está faltando cadeira aí - ouviu, pessoal? Se o pessoal puder ajudar e conseguir algumas cadeiras, o pessoal da minha equipe, lá da Comissão e do gabinete, para que as pessoas possam se acomodar melhor para ouvir as palestras.
Mas vamos lá, vamos em frente!
Passo a palavra...
Primeiro, eu agradeço às duas painelistas do primeiro momento, que deixaram sugestões, já, que vão ser encaminhadas para os órgãos competentes e para os próprios Senadores.
E a senhora vai poder complementar, com certeza absoluta.
Dra. Teresa Cristina Cardoso Fonseca. Dra. Teresa é médica hematologista, pediatra, em Ilhéus e em Itabuna, Bahia.
Ela já mandou ajustar aqui o currículo dela: "Esse currículo está errado aí. Ajusta aí". (Risos.)
E é professora do curso de Medicina.
Está com a palavra.
A SRA. TERESA CRISTINA CARDOSO FONSECA (Para expor.) - Vocês estão me ouvindo? (Pausa.)
Gente, eu queria dizer que, para mim, até, assim, é muito emocionante... É muito emocionante estar aqui. É muito emocionante ver esta sala cheia. É muito emocionante a gente ver Parlamentares nos ouvindo. E eu fiquei muito emocionada pelo convite. Confesso que eu não sabia que a gente podia ter uma apresentação e acabei adaptando, rapidamente, aqui, porque acho que é importante a gente ter uma visualização de algumas coisas. E eu sou médica do Centro de Referência de Doença Falciforme de Itabuna, no sul da Bahia, e do Programa da Doença Falciforme de Ilhéus, no sul da Bahia. E aí vocês vão entender um pouco a minha fala baseada nisso.
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Eles passam? Você pode passar?
Outra coisa: quero parabenizar as minhas colegas que vieram antes, falar depois delas fica mais fácil. Depois da sua fala e da fala das minhas colegas ficou muito mais fácil.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Tem uma frase de um amigo meu que diz: "O Paim é auxiliar de feiticeiras". As feiticeiras são elas e ele. Elas é que são as nossas mestras aqui.
Vai lá, Doutora.
A SRA. TERESA CRISTINA CARDOSO FONSECA - Então, como Clarisse já tinha citado, eu moro na Bahia, que é o estado que tem o maior número de pessoas com doença falciforme. Mas se tem uma característica, é que eu sou do sul da Bahia, do interior da Bahia. É importante a gente frisar isso porque existe uma diferença de quando a gente está nos grandes centros, nos grandes centros de referências, e de quando a gente está no interior, a realidade é um pouco diferente.
Pode passar.
Eu quero que vocês enxerguem essa foto e respondam. Vocês conseguem me enxergar? Vocês conseguem enxergar a minha dor? Não é a dor física somente, é a dor na alma, é a mágoa de não ser reconhecida como uma doença. É a mágoa de não ter acesso àquilo que mereço. Quem sou eu?
Eu acho que essa é a primeira questão que nós temos aqui. Como Clarisse colocou anteriormente, a doença falciforme é a doença hereditária mais comum no mundo e no Brasil. Como a gente não consegue enxergar essas pessoas? Como demoramos tanto tempo para poder enxergar essas pessoas?
Pode passar.
Eu vou falar aqui... Obviamente, não identifico nenhuma pessoa, mas quem sou eu? Eu sou Maria, uma criança que tem dificuldade escolar, mas a escola não enxerga que ela tem doença falciforme e que pode ter essa dificuldade escolar, que ela precisa de um apoio de psicopedagogia, que tem que ter um entendimento, que nas suas ausências tem que ter um atendimento domiciliar.
Eu sou Deise, uma mulher negra que mora na periferia de uma cidade ou na zona rural, muitas vezes de população quilombola, que tem uma úlcera maleolar. Para lidar com a sexualidade, às vezes, é difícil, porque se quer esconder essa úlcera maleolar e sempre se visualiza a gravidez como uma ameaça. E os profissionais de saúde, muitos deles, falam isso: "Você não deve engravidar. Você quer morrer?". E ela sente essa faca no pescoço o tempo todo.
Eu sou João, um homem negro, morador de periferia ou de zona rural, que, por conta do não entendimento do gestor da parte educacional, acaba tendo uma baixa escolaridade. Ele tem uma lesão osteoarticular e não consegue emprego.
Eu sou a adolescente Joana, que está com dor. Ela vai procurar a emergência, e na emergência sempre a olham com desdém, porque dizem que é uma viciada em morfina; não conseguem enxergá-la e não conseguem priorizar esse atendimento.
Apesar de eu não identificar uma pessoa aqui, eu tenho certeza de que todos vocês identificaram várias pessoas nessa condição.
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Eu, há 30 anos, acompanho pessoas com doença falciforme, no interior da Bahia, e esta é a minha vivência diária: na minha consulta, a maior parte é eu escutar a dor das pessoas com doença falciforme; escutar que elas não são visíveis para os gestores; que elas têm dificuldade de acesso aos exames para poderem entrar no programa de hidroxiureia; que elas têm dificuldade de fazer exames para poder prevenir uma sequela, como a sequela ocular; que elas têm dificuldade de um tratamento para uma lesão osteoarticular, para uma necrose de cabeça de fêmur ou para uma lesão da retinopatia.
E aí a gente ouve o quê? Não tem dinheiro. Nós não temos dinheiro para isso. Nossa cidade não é pactuada. Nós não temos esse profissional.
Como é que a gente não tem dinheiro para essa população que é a maioria do nosso país? Isso é despesa? Isso é um investimento! E não é um investimento só na saúde, é um investimento social! (Palmas.)
Essa pessoa, se ela for bem cuidada e falar do cuidar, ela vai conseguir ter a escolaridade dela, vai conseguir ter a sua inserção na sociedade, vai conseguir ser uma pessoa com voz ativa na sociedade, vai ser uma pessoa producente, vai ser uma pessoa feliz. Então, isso não é despesa! Isso é investimento na população, no cidadão brasileiro, nas pessoas que têm essa doença!
A gente não está tratando uma doença. Nós estamos falando de pessoas, de histórias de pessoas que ainda não conseguem ser enxergadas! (Palmas.)
Pode passar.
Aí a gente vê as perguntas. Quantos nós somos? Agora, a doença falciforme tem notificação compulsória, mas será que isso está ocorrendo realmente? E a mortalidade? Quantas vezes a pessoa morre com a doença falciforme, mas, no atestado de óbito, isso não está lá escrito. Então, quantas vezes a gente não sabe nem quem nós somos? O teste de triagem neonatal trouxe uma visibilidade maior, mas quantos existem que já são adultos e que não são notificação compulsória?
Na semana passada, eu atendi uma pessoa de 60 anos que nunca tinha feito o diagnóstico de doença falciforme, que foi internado, diversas vezes, com dor, que já tem lesão osteoarticular, que já tem lesão cardíaca, que já tem lesão renal, e ninguém o enxergou! Morador de uma cidade ao lado de Ilhéus - Itacaré -, que tem um centro de referência do lado. Essas falas que eu coloco são exemplos, mas não são exemplos raros. Eles são os exemplos diários que a gente vivencia.
Onde nós estamos? Essas pessoas estão na periferia da cidade. Essas pessoas estão na zona rural. São populações quilombolas. Você sabe o que elas passam para terem acesso a um atendimento? Quando a gente visualiza o nosso Brasil, este país continental e lindo que nós temos, tão grandioso pela nossa diversidade, nós, então, conseguimos enxergar a necessidade de aquela pessoa ter todo o apoio para ter acesso ao nosso serviço, que vai fazer um atendimento especializado.
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Eu vejo meus pacientes que saem com lesão osteoarticular, com baixa visão: às vezes, eles vão andando até uma cidade, às vezes, vão em cima de um animal até uma cidade para daí poderem pegar um carro e esse carro levá-los a um centro de referência. E quantas vezes o motorista fica: "Vai demorar? Ah, não. Ó, se você não estiver aqui, eu vou embora". São ameaças diárias que a gente vê, são humilhações que essas pessoas passam para poderem ter acesso a esse tratamento.
Como é que está esse acesso? Obviamente, aqui, na presença de Joice, eu digo emocionadamente que foi uma das primeiras pessoas que foi ao interior visualizar a nossa realidade e que batalhou por uma mudança dessa realidade no país, mas a gente ainda tem, justamente por ser tripartite, essa questão. Como é que está o acesso? Como é que está o acesso a esse atendimento especializado? Como é que está o acesso aos exames necessários? Quantas vezes eu faço e refaço pedidos de exame? Mapeamento de retina: "Não conseguimos", "Não, não está fazendo". Ou eu vejo que tem uma lesão retiniana que tem ser tratada para não se perder a visão, mas não conseguimos, não temos acesso. Então, como é que está esse acesso? Se a gente já tem um programa e uma câmara técnica que já construiu tudo que é necessário para um atendimento ideal para uma pessoa que tem doença falciforme, como é que não garantimos a essas pessoas esses exames, esses tratamentos, esse acesso? Eu nem estou falando de novas medicações, mas de medicações que já estão na portaria ministerial. Apesar de nós termos isso, é como se a gente dissesse: "Eu vou lhe dar medicação, mas, para você ter essa medicação, eu preciso que você tenha esses exames, mas esses exames eu não estou conseguindo lhe dar". Automaticamente, eu não tenho medicação. A gente tem que começar a encarar isso de frente, porque, quando isso acontece, eu não estou ofertando a medicação para ela. Se eu não estou ofertando os exames necessários para ter a medicação, eu não estou ofertando a medicação.
E a gente tem que entender que essa é a realidade do interior do Brasil, daquelas pessoas que não estão nos grandes centros e nos grandes serviços do Governo, e saber que o olhar para a pessoa com doença falciforme não é só um olhar médico. Eu bato muito nisso. Esse olhar não é um atendimento de saúde, médico, com uma policlínica somente; é um olhar social; é um olhar integral. Não adianta só dizer assim: "Eu olhei, examinei você, está aqui, você vai fazer isso. Volte aqui para mim daqui a um mês". Se eu não souber como é que ela passa para conseguir isso, quais as dificuldades que ela tem, se é uma criança que não está conseguindo acompanhar a escolaridade, se é um adulto que não está inserido no mercado de trabalho, o que eu posso fazer para ter um cuidado melhor para esse paciente?
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Eu acho que essa mudança de paradigma é urgente! A gente tem que encarar a doença falciforme não apenas como uma doença, não apenas como uma questão médica, mas como uma questão social, uma questão integral dessas pessoas.
Pode passar.
E a gente tem que entender... E às vezes eu bato nessa tecla, porque muitas vezes o gestor pensa: "Eu vou deixar um hematologista na policlínica e pronto, já dei o atendimento". Não. O atendimento de uma pessoa com doença falciforme é um atendimento integral, a gente tem que olhar o biopsicossocial dessa pessoa. Ela não é uma doença, não é um corpo que tem uma doença; ela é uma pessoa que tem uma história, que tem questões sociais, e nós precisamos desse cuidar mais amplo.
Pode passar.
Esse cuidado tem que estar centralizado na pessoa, não na doença. A gente deve ter um atendimento centralizado na pessoa com doença falciforme.
Pode passar.
Então, para finalizar, a gente conclui que a assistência ao paciente com doença falciforme permanece ainda...
(Soa a campainha.)
A SRA. TERESA CRISTINA CARDOSO FONSECA - ... um grande desafio com múltiplas variáveis, com vários atores, com as esferas governamentais; passa pelas equipes de atendimento, pela universidade, pelos Parlamentares, pelos pacientes, pelas pessoas, pelos seus familiares e todo mundo. E a gente tem que pensar sobre qual o papel de cada um de nós nessa história, para que a gente garanta o atendimento integral, às pessoas com doença falciforme, que elas tanto merecem.
Então, aqui essa é a grande pergunta que fica. Qual é o papel do Parlamentar? Qual é o papel do gestor? Qual é o papel do profissional da saúde? Qual é o papel da pessoa que tem doença falciforme ou que tem um familiar com doença falciforme? Qual é o papel da universidade? Qual é o papel da comunidade em geral, para garantir a cidadania dessas pessoas que tanto merecem?
Eu vou finalizar por aqui. Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Teresa Cristina Cardoso Fonseca, médica, hematologista e pediatra, em Ilhéus e Itabuna, Bahia. É também Professora do curso de Medicina. Parabéns também pela sua fala.
Eu vou só dar um depoimento, mas não vou citar dados. Depois, acho que o Ministério dos Direitos Humanos e o da Igualdade Racial poderão ajudar. Sabe que aqui no Congresso tinha o tal de orçamento secreto. Felizmente, no nosso Governo, acabou. No orçamento secreto, você dava quantidades de muito volume para um ou outro Parlamentar; agora, acabou com isso e é uma divisão equitativa, igual para todos. Então, eu peguei o que veio, quando a gente pegava, mas veio, e eu disse: "Eu vou mandar para as comunidades quilombolas", para o Rio Grande do Sul, naturalmente; vou mandar para o meu estado. Daí, surpresa minha: quem é o Presidente da associação dos quilombolas? Não consigo descobrir. Na sua respectiva cidade. Aí, ligo para o Prefeito, que disse: "Não, aqui não tem quilombola". Aí pego um militante do movimento negro, que disse: "Senador, lá tem quilombola sim". Veja a dificuldade. Aí descobri, numa certa cidade, cujo nome eu não vou citar - olha a gravidade da sua fala! -, botei o gabinete para correr atrás e descobrimos que lá havia uma comunidade quilombola. Aí conseguimos falar com o líder de lá. Diz ele: "Paim, olha...". Essa emoção que a senhora sentiu eu vou dividir com vocês, mas a emoção é sua, eu estou firme aqui. Eu disse: "Qual é a maior necessidade de vocês?". "É banheiro para fazer necessidades; é água para tomar". Então, neste país, se tem assim no meu estado, não é diferente em muitas outras regiões.
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Resultado: eu consegui mandar 500 mil para cada comunidade. É pouco, mas foi o que eu consegui dividir entre as que tinha. Até o momento tem algumas a que eu não consegui fazer com que o dinheiro chegue. Veja a dificuldade que a gente tem.
Então, eu vou pedir para a Fundação Palmares ajudar, mas o que mais me chocou foi isto: "Sim, mas necessidades básicas! Nós temos que ir para o mato". Calcule uma menina ou um menino com a doença falciforme nessas condições. Essa é a realidade do Brasil, e nós temos, todos juntos, num esforço enorme, claro, que enfrentar, mas é de chorar mesmo.
Por isso que todos vocês aqui, na mesa, com muito conteúdo falaram dessa doença que atinge principalmente a comunidade negra. Falei aqui, ao vivo, para todo o Brasil. Então, se alguém achar que eu não tenho dados adequados, é só me ligar que eu mostro onde, em que cidade foi, porque me disseram que não tinha quilombola, e o movimento negro me passou que tem: "Tem, sim, Paim. Pode dizer para ele que tem". Damos até o mapa para ele, se o problema for falta de localização.
Nós vamos em frente. Parabéns a todos!
Agora fala o Dr. Leandro Fonseca, que é Diretor de Relações Corporativas e Sustentabilidade da Novartis.
O SR. LEANDRO FONSECA (Para expor.) - Bom dia a todos. Acredito que o convite para a participação da Novartis aqui tem a ver com o histórico da empresa em relação a soluções para a doença falciforme, mas eu vou pedir licença, Senador, em homenagem aqui à fala da Dra. Teresa, que trouxe muita emoção aqui para este debate. Eu fiquei muito emocionado com este debate. Senti a emoção aqui, na plateia, senti a emoção de todos aqui, na mesa.
Quero trazer também um pouco da história pessoal, de por que eu também estou aqui.
Minha história começa em 2003, quando eu fui para o Governo. Resolvi trabalhar no Governo e, em 2003, fui para o Governo. Tive uma história de 16 anos de serviço público. Terminei minha história de serviço público com o final do meu mandato, em 2019, na ANS. Então, apesar de ser um economista engravatado aqui, representando uma empresa, tenho aí também uma história de trabalhar pelo setor de saúde no setor público.
Ao final do meu mandato, em 2019, ao resolver ingressar, então, no setor privado, procurei buscar um alinhamento em termos de valores. No caso, na Novartis, encontrei esse alinhamento perfeitamente. Por quê? Porque a empresa vem tendo um compromisso, há muito tempo, com uma série de doenças negligenciadas, incluindo aqui anemia falciforme, mas não só essa.
Vou dar um exemplo aqui de hanseníase. Com a hanseníase a empresa faz, por exemplo, doação dos medicamentos à OMS, e a OMS faz, então, a distribuição desses medicamentos para todos os países que efetivamente precisam. Com a malária a gente também tem uma série de iniciativas. Com a doença de Chagas, que também afeta muito a população brasileira, há vários trabalhos executados junto à comunidade e ao ministério também, em parceria, para soluções da doença de Chagas.
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No caso da anemia falciforme, a história da empresa começa lá atrás, em 2006, com projetos sendo desenvolvidos para a prevenção de AVC em crianças com o uso de doppler. Mais tarde, foram feitos milhares de doações de doppler transcraniano para centros de referência e se fez também um projeto itinerante para diagnosticar vários pacientes de alto risco pelo Brasil. E o projeto, Senador, foi tão bem-sucedido que o Governo encampou em 2012 e, a partir daí, o Governo criou um código no SUS para financiar o exame e avançar, então, no diagnóstico e no tratamento dos pacientes com doença falciforme.
Eu acho que a minha fala aqui e a minha chegada também na empresa trouxeram uma mudança de forma de pensar: a Novartis não quer ser mais entendida como apenas uma fornecedora de medicamentos; a gente quer ser entendido como parte do sistema de saúde e, portanto, como a gente contribui para a gente ter um sistema de saúde melhor, que entregue melhores resultados em saúde. Portanto, para a gente, foi espetacular estar aqui ouvindo vocês, ouvindo as doutoras, ouvindo os pacientes, para a gente realmente procurar entender como a gente pode contribuir nessa jornada do paciente em outros aspectos que incluem aí uma qualidade de vida melhor para os pacientes de anemia falciforme.
Nesse sentido, eu louvo muito a iniciativa aqui do Senador Paulo Paim, que traz esse tema em discussão, que coloca esse tema na agenda pública de debate, abrindo esse espaço aqui para todos nós, para que a gente consiga inclusive também, Senador, sensibilizar o Poder Executivo, para que esteja, então, aberto à construção dessas soluções.
A minha mensagem principal é que esse é um desafio muito grande para a sociedade brasileira. E não é um desafio apenas do Poder Executivo; é um desafio da sociedade, como a Dra. Teresa colocou. Cada um tem o seu papel aqui - não é, Dra. Teresa? - de tentar contribuir.
E a mensagem é: poxa, vamos construir parcerias público-privadas também, vamos olhar...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Totalmente favorável, totalmente favorável à parceria público-privada para atender os que mais precisam. (Palmas.)
Tenho certeza de que o Governo Lula e a Dra. Joice aqui vão endossar essa proposta.
O SR. LEANDRO FONSECA - Exatamente. Vamos fazer essa discussão, vamos construir conjuntamente, mais mentes pensando, mais soluções sendo pensadas. Com as dificuldades de orçamento que a gente sabe que tem no Governo, no setor público, talvez a gente consiga pensar soluções em conjunto. Portanto, a gente está aqui à disposição para esse debate e para essa contribuição para a sociedade brasileira.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Obrigado, Dr. Leandro Fonseca, Diretor de Relações Corporativas e Sustentabilidade da Novartis.
Eu, de fato, acredito nas parcerias público-privadas, porque são políticas humanitárias que poderíamos construir juntos para o bem de todo o povo brasileiro.
A Dra. Joice, que eu já vou em seguida convidar para a mesa, me trouxe uma informação que para mim é positiva. É positiva, só que tem que resolver, não é só elogiar, não é? Ela me disse que havia um certo bloqueio de mais convidados nossos para chegarem a esta Comissão para acompanharem o debate, enfim, e eu já falei com a assessoria da mesa, o Christiano já providenciou e falou com o pessoal da segurança da Casa que pode liberar todos para virem para cá, que eu assumo total responsabilidade e assino embaixo. (Palmas.)
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Então, já foi liberado. Já foi liberado.
Eles estão vindo. Não é, Christiano?
Então, agradeço aí a sensibilidade que a Casa teve do convite, para que eles possam vir.
Eu peço a essa mesa que retorne, mas vou primeiro dar à Dra. Clarisse - não me esqueci -, que pediu só um minuto aí para uma consideração final.
Todos falarão no encerramento, viu? Todos os painelistas falarão no encerramento.
A SRA. CLARISSE LOBO (Para expor.) - Eu queria fazer um adendo à fala da Vanessa, que é tudo o que a gente precisa ter, mas que, na verdade, nós não temos em nenhum, praticamente, dos estados, fora Minas Gerais. Assim, a gente não tem uma Vanessa em cada um desses estados e a gente não tem o olhar dos outros especialistas voltados para a doença falciforme. (Palmas.)
E aí é o olhar do oftalmo, do neurologista, do otorrino, de todos os especialistas de onde a doença se manifesta e que é também uma grande carência que a gente tem.
Só isso que eu queria complementar.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu convido vocês a voltarem para o plenário e eu agradeço: uma salva de palmas a toda essa mesa aqui, qualificada, competente. (Palmas.)
E vamos para a segunda mesa.
Para a segunda mesa, eu convido de imediato a Dra. Joice Aragão de Jesus, representante do Governo Lula nesse debate, Coordenadora de Sangue e Hemoderivados do Ministério da Saúde. (Palmas.)
Já convido...
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS (Fora do microfone.) - É à esquerda?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Você escolhe. Você vai escolher. Escolha.
Ela vai ficar todo o tempo agora na mesa. Ela teve um probleminha, resolveu e veio correndo para cá. Muito obrigado, viu, Dra. Joice? Você nos ajudou a fazer com que essa audiência já seja um sucesso pela primeira mesa, e vai só melhorar a partir das mesas do debate que faremos junto com todos os painelistas.
Então, de imediato, convido também para a segunda mesa a Dra. Maria Zenó Soares, Presidente da Federação Nacional das Associações de Pessoas com Doença Falciforme. (Palmas.)
Convido também, na sequência, a Dra. Saide Maria Sarmento Trindade, hematologista, pediatra, hemoterapeuta, coordenadora de atendimento ambulatorial. (Palmas.)
E também a Dra. Sheila Ventura, representante da Aprofe. (Palmas.)
A Aprofe depois ela decifra aqui, que eu não soube explicar o que é a Aprofe.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS (Fora do microfone.) - Associação de Pessoas com Doença Falciforme de São Paulo.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, pronto! (Palmas.)
A doutora virou minha assessora direta aqui, viu? Viu que eu não sabia, já leu aqui. Sabe tudo, não é?
Mas vamos lá, para ganhar tempo, então, para a segunda mesa.
De imediato, eu passo a palavra... (Pausa.)
Pode falar agora ou falar no final da mesa.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS (Fora do microfone.) - A hora em que vocês quiserem.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Então, você manda aqui.
Então, de imediato, Dra. Joice Aragão de Jesus, Coordenadora de Sangue e Hemoderivados do Ministério da Saúde.
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A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS (Para expor.) - Bom dia a todos e todas.
Eu não posso nem... Não sei como dimensionar a minha emoção neste momento. A frase mais bonita que eu ouvi hoje foi "representante do Governo Lula"... (Palmas.)
... porque foi isso que aconteceu.
Quando, após um ano árduo de campanha, no Rio de Janeiro, momentos muito difíceis que nós passamos para encarar o desafio de fazer a campanha na rua - o Rio de Janeiro tem uma situação especial -, nós trabalhamos muito nos comitês populares, nós criamos, no bairro em que eu moro, a Tijuca, o comitê, que aconteceu na pracinha onde o pessoal se reúne com os cachorros, e criamos o Cachorros pela Democracia, e o meu cachorro, o Café, faz parte desse grupo do comitê popular.
Foi uma experiência muito intensa e, logo no dia seguinte, terminada a eleição, a Maria Zenó me ligou e disse: "Como é que é? Voltamos?" Aí, eu falei: "Zenó, precisa de renovação e eu tenho 73 anos, estou aposentada. Desde de o golpe de 2016, eu parei de trabalhar". E, aí, a Zenó disse: "É, o Lula tem 77 e eu não tenho ninguém".
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Que idade você tem?
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Tenho 73.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Mas, sobre isso que a senhora ouviu - e o meu gabinete está lá ouvindo -, eu digo: "Olha, já fiz a minha parte, vou passar agora o bastão". Aí, eles me responderam isso: "Engraçado, não é? O Lula de 77 e está aí. Tu, com 73, estás com esse discursinho aí".
Então, uma salva de palmas para a senhora, que voltou, aceitou o desafio e voltou. (Palmas.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - O Brasil voltou, então...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Temos que voltar, não é?
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Então, eu disse à Zenó que eu tinha vontade de estar com gente jovem que estivesse enfrentando esse desafio. E ela disse: "Então, você vai me deixar sozinha". E eu falei: "Não; está bom, Zenó! Não vou fazer isso nunca". Aí, voltei! E, com a sensibilidade das pessoas que estavam fazendo a seleção, eu fui convidada para ficar na coordenação e não mais só com a doença falciforme.
A Coordenação de Sangue tem as coagulopatias, a hemofilia, que é a mais importante das coagulopatias; tem outra, a talassemia, Senador, que nós vamos precisar trabalhar, outra doença, outra hemoglobinopatia, a talassemia; e temos a doença falciforme. E, agora, estamos criando uma área de uma patologia de prevalência em homens afrodescendentes, que é a deficiência de G6PD12, que, graças ao empenho e ao apoio da Dra. Clarisse Lobo, nós vamos normatizar, porque ela não é exatamente uma patologia que precise, mas ela precisa ser normatizada para que essa população não fique desamparada.
E, lá, temos toda a cadeia da segurança do sangue, uma questão de soberania nacional. O sangue seguro, no Brasil, tem uma história, uma história de luta da reforma sanitária do nosso querido e saudoso Antonio Sergio Arouca e da Dra. Beatriz MacDowell, aqui de Brasília, que trabalharam para tornar o sangue seguro, para que ninguém mais se contaminasse, que ninguém mais tivesse que vender o sangue para sobreviver.
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E isso foi um trabalho desenvolvido no primeiro Governo Lula, com muita competência na gestão do Dr. Guilherme Genovez, do Hemocentro de Santa Catarina, que foi quem possibilitou todo o trabalho da doença falciforme.
Eu tenho uma gratidão imensa - particular minha - como pessoa e como profissional por um colega com quem eu pude trabalhar e que foi respeitoso e sensível e disse assim para mim: "Os 'pretinho' é com você." Sabe? E pronto.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E o que você disse?
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - É meu.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ela disse: "Tudo bem, é comigo mesmo." (Palmas.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - É comigo mesmo. E essa foi a história que desenvolvemos na gestão específica mesmo do Dr. Genovez. E durante 11 anos trabalhamos na coordenação.
O Senador Paim esteve conosco em outras audiências nessa época, participando do trabalho, e agora ele voltou também, claro, para estar junto num processo que tem que ser efetivamente um marco histórico nosso, já criado no dia 19 de junho, quando estivemos nas Nações Unidas, criando esse dia mundial. Estávamos eu e o Dr. Paulo Ivo, que não pôde estar presencialmente aqui, mas deve estar assistindo, Paulo Ivo Cortez, do Rio de Janeiro. Nós fomos com o Dr. Aderson, do Hemocentro de Pernambuco, para Nova Iorque como protagonistas no mundo de ter uma política nacional de doença falciforme, que serve de referência para o mundo. (Palmas.)
Eu queria abrir, neste momento, um espacinho para um agradecimento muito especial à Dra. Clarisse Lobo, com quem eu trabalhei na política do Rio de Janeiro. (Palmas.)
Ela trouxe para nós um personagem que dia 26 completa um ano do seu memorial: Kwaku Ohene-Frempong, ganense, radicado nos Estados Unidos no Hospital da Pensilvânia, especialista em doença falciforme. Ele foi trazido pela Dra. Clarisse num evento do Rio de Janeiro, quando eu estava iniciando com ela - a Dra. Kátia, diretora nessa época do Hemorio - o trabalho da doença falciforme.
Foi um africano que esteve conosco de uma forma como eu nunca imaginei num processo de trabalho. Primeiro, a delicadeza da criatura e, depois, o carinho com que ele atuou quando veio aos simpósios junto aos usuários. Para mim, foi inesquecível o encontro do Dr. Frempong com as famílias brasileiras com doença falciforme num auditório com tradução simultânea, naturalmente. E, no dia 26, tivemos, eu e Clarisse, a honra de participar online do encerramento do funeral dele, em que me foi pedida uma fala de oito minutos, e eu disse: "Essa fala não é minha, essa fala é de Clarisse Lobo, que o trouxe e que deu todo o respaldo para a criação dos nossos protocolos e da nossa política". (Palmas.)
Tenho uma saudade imensa do Frempong. Ele me faz muita falta neste momento.
Queria também aproveitar o momento para agradecer a uma pessoa que se foi recentemente, a Dra. Kátia Machado da Motta, Diretora por 12 anos - foram 12 anos, não é, Clarice? - do Hemorio e teve um papel importante no Sistema Único de Saúde, tornando o Hemorio uma referência em hemoterapia e atenção hematológica. (Palmas.)
A Dra. Kátia Motta estava adoentada e, todo o tempo desse processo de minha vinda para cá, eu dialogava com ela o tempo todo sobre a responsabilidade, porque ela era uma hemoterapeuta, uma hematologista que abraçou, como o Hemorio abraçou, todo o processo de atenção no Rio de Janeiro.
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Ela se foi. Na última vez em que eu falei com ela, ela não conseguiu nem conversar comigo, ela me passou uma mensagem dizendo que não estava bem. Eu chorei o dia todo pensando: que história e que pessoa preciosa. Podia ficar mais entre nós, mas isso não está na nossa governabilidade. Essas duas pessoas foram um marco histórico nesse processo.
E vou pedir uma licença particular para dedicar esse momento à minha sobrinha com doença falciforme, que se foi exatamente no dia em que eu tomava posse aqui de volta à coordenação. Adriana Santos... (Palmas.)
... muito bem cuidada pela Dra. Clarisse Lobo. E foi um momento simbólico, porque eu estava vindo para tomar posse quando eu recebi a notícia da própria Clarisse dizendo que não tinha sido possível. E ela se foi. Então, peço essa permissão particular minha aqui e desculpa a emoção porque não dá.
Bem, para a gente fechar rápido, é o seguinte. Estamos num processo intenso de trabalho no ministério. Eu não almocei ontem, e é uma coisa que eu não posso deixar de fazer porque eu tenho diabetes. Então, eu não posso abrir mão desse momento solene, que é me alimentar meio-dia. Por quê? Porque o trabalho está intenso.
Nós temos muitos obstáculos. O SUS foi muito destruído. A doença falciforme foi muito destruída, sabe? Foi muito destruída. E a triagem, onde está diagnosticada a doença falciforme, também muito destruída.
Então, nós passamos esses três meses, nós fizemos uma avaliação de cem dias de gestão nossa também interna e nós vimos o quanto nós trabalhamos tanto na relação da segurança do sangue, na defesa da doação altruísta do sangue, do não retorno à comercialização de plasma e na defesa da Hemobrás, que agora foi decretada de soberania nacional.
A Tânia, da hemofilia, com quem o Senador tem um processo de trabalho muito bom, deve estar muito feliz porque a gente está agora trabalhando para garantir que 33 mil pessoas com coagulopatias no Brasil continuem tendo acesso aos seus medicamentos, porque somente o SUS pode bancar os custos de manter 33 mil pessoas atendidas, tratadas neste país.
Isso é uma coisa inédita, isso não existe em outro local...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Permita que eu diga: vida longa ao SUS, eterno! (Palmas.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Então, também, agora nessa ampliação, ontem tivemos uma reunião com o grupo da talassemia, que é um grupo pequeno. É uma doença rara que acomete a população franco, greco, italiana, enfim, europeia. A gente tem nessa população aqui um cadastro em torno de 2 mil pessoas, digamos. E nós vamos também contar com o Senador aqui para ajudar a gente a trabalhar o processo. Uma reunião muito proveitosa, de muito avanço.
E a doença falciforme, a equipe está quase toda aqui. Eu queria, por favor, cadê nossa equipe de doença falciforme?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Pode levantar o braço aí.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Solange. Tiago, da Bahia. E a Dra. Miranete, por gentileza. Helena Pimentel. Margareth, cadê? Carmen já suspendeu.
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Miranete, por favor. Essa senhora - Miranete, a gente tem que falar -, com 75 anos, disse para mim que também tinha 75 anos e não podia vir. Aí eu falei a mesma frase: 77 tem o Lula. Ou a gente vai ou não vai. Ela agora está à frente da equipe da doença falciforme na nossa Coordenação Geral de Sangue. Tem 20 anos de experiência, em Pernambuco, de gestão no SUS, com todo o conhecimento, porque trabalhou conosco desde 2004 e continua trabalhando. Acabou de se aposentar recentemente, no Governo passado, mas se desaposentou, porque está conosco trabalhando com toda a equipe.
Toda a equipe que veio, Senador, é uma equipe muito experiente. A que está ao lado dela era do Conselho Nacional. Ela estava lá e eu puxei para nós. Nós precisamos muito manter o diálogo com os segmentos sociais com os quais a gente precisa pactuar a nova política de doença falciforme, certo?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
Uma salva de palmas a toda a equipe aí. (Palmas.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Maria da Conceição foi gestora do programa da cidade de Olinda - Ó linda cidade! (Risos.)
Entendeu? Temos a Margarete, que já estava na equipe lá. Temos a Carmen Solange, que cuida bem de todos os usuários da nossa equipe.
A Helena está aqui? (Pausa.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - É porque ela é da triagem neonatal.
A Helena... Achei ali.
Eu não sei porque tem um bocado de baiano nesse negócio de doença falciforme. (Risos.)
E a Teresa, a minha querida Teresa.
Então, o cenário nosso agora é de muito trabalho, gente. A gente este ano não tem orçamento para desenvolver algumas ações, porque o orçamento é da gestão passada, e ele foi contingenciado para interesses que é melhor a gente nem imaginar, e nós estamos sem o orçamento deste ano aplicado. Nós estamos pagando as coisas do ano passado. Então, a gente está impossibilitado de fazer algumas coisas, mas tem muita coisa que a gente já está fazendo e que a gente vai fazer.
Eu queria dar uma notícia. É porque tem uma pessoa muito sorridente aqui na plateia. Ela não para de sorrir.
(Soa a campainha.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - É a Simone Bruna, para encerrar, que acabou de passar pela terapia celular para a recuperação de lesão óssea em doença falciforme.
Rapidamente, a doença falciforme acomete o úmero, a cabeça do úmero, e o fêmur - eu parei de ser médica e esqueço -; o fêmur e o úmero. O Dr. Gildasio Daltro é o pioneiro disso na UFBA. Nós estamos viabilizando recursos para que ele possa continuar, enquanto a gente faz a inserção no SUS.
Ela foi submetida ao tratamento e me ligou, dizendo...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Pode levantar a mão aí.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Pode-se levantar. (Palmas.)
Ela é do Paraná, é tratada lá no SUS do Paraná. Então, a gente está com a Simone recém-operada.
Nós estamos agora viabilizando com o que pudemos nesse orçamento, o que sobrou - migalhas - a gente aplicou para pesquisa todo na UFBA. Nós estamos esperando que o Dr. Gildasio faça tudo para a gente ter um recurso até que a gente consiga oficializar dentro do Sistema Único de Saúde, porque é muito simples o trabalho: retiram-se as células-tronco da pessoa e as colocam no lugar da lesão, e a lesão se reconstitui. A experiência foi num trabalho em parceria com a França, com o Hôpitaux Henri Mondor, então o Dr. Gildasio está radiante.
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Espero que tudo corra bem no processo do repasse do recurso, mas a gente precisa colocar e ter próteses especiais para aquelas pessoas cujas lesões não conseguem mais se recuperar.
Bem, eu acho que esse dia 19, lá e aqui, nós temos evidenciado todo um processo de trabalho com um plano de ação comum em que nós vamos trabalhar. A equipe da doença falciforme vai estar trabalhando, eu não estou à frente da política porque eu não preciso, estou só marcando os espaços políticos de atuação, estarei cuidando dos outros. Fico muito contente por este momento aqui e por saber que, no Senado, contamos com o Senador. Isso é muito importante porque a gente precisa ter em quem confiar. Atualmente - desculpe-me, Senador -, o nosso Parlamento, para uma boa parte da população, principalmente a pobre e vulnerável, não é confiável, em boa parte, e isso impacta muito o nosso trabalho, por exemplo na questão da triagem neonatal.
Então, muito obrigada ao Senador por ter acolhido esse processo de trabalho, por ter acolhido a gente da doença falciforme. Esperamos contar com seu apoio nesse processo de trabalho e estamos disponíveis para o diálogo no momento em que for necessário para dar continuidade ao nosso trabalho.
Muito obrigada pelo seu carinho, pela sua atenção e pela sua parceria. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Nós é que agradecemos, Dra. Joice Aragão.
No Governo de Luiz Inácio Lula da Silva e Alckmin... Sabem o que ela disse baixinho aqui para mim, baixinho, mas vocês ouviram: repete outra vez. Então vou repetir: Dra. Joice Aragão de Jesus, representante do Governo Luiz Inácio Lula da Silva e Alckmin, ela que é médica, Coordenadora de Sangue e Hemoderivados do Ministério da Saúde. (Palmas.)
Muito obrigado. A exposição dela foi brilhante, com exemplos, citando inclusive pessoas, em grande parte neste Plenário, e apontando caminhos.
O que eu posso dizer, humildemente, como Senador e Presidente desta Comissão, é que nos demandem, no bom sentido, nos pressionem, porque nós queremos que a Comissão de Direitos Humanos, na hora de decidir os recursos que passam por esta Comissão, tenha um olhar - já prometi outra vez, vou repetir aqui - para a comunidade quilombola, para as políticas humanitárias, e essa questão do debate de hoje é de política humanitária e tem que ter um olhar desta Comissão.
Conte com a gente. (Palmas.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Muito obrigada, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Tem um pedido aqui, ela estava inscrita para falar, mas está com outras agendas, está virtualmente, então a Deputada Estadual Macaé Evaristo, de Minas Gerais.
O tempo é seu para fazer a sua fala por videoconferência, são 15 minutos.
A SRA. MACAÉ EVARISTO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, bom dia, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Bom dia.
A SRA. MACAÉ EVARISTO (Por videoconferência.) - Bom dia, Zenó, que está aí na mesa, nossa representante. Quero cumprimentar a Dra. Joice, dizer da minha alegria pela realização desta audiência, mas principalmente a minha alegria pela volta do Brasil e pela possibilidade da construção dessas políticas.
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Eu sou professora de formação e assistente social. Trabalhei, há muitos anos, em sala de aula e muito do que eu aprendi sobre a doença falciforme eu aprendi com o Movimento Negro, com o Movimento Negro Educador, e aí eu posso dizer dessa pessoa que está aí do seu lado, Senador, a Zenó, que é a minha grande mestra no atendimento às pessoas com doença falciforme.
Eu não sou da área de saúde, sou professora, e o primeiro ponto que eu venho trazer aqui é o desconhecimento da maioria dos professores, trabalhadores em educação no Brasil, sobre a doença falciforme, e, pensando na condição das crianças, dos jovens, e mesmo das pessoas idosas com doença falciforme, a minha participação aqui é muito no sentido de a gente trazer um debate sobre os diferentes direitos.
Algumas pessoas que me antecederam falaram da cidadania, e a gente pensa... Aí a saúde eu acho que avançou muito na perspectiva de uma política integral à pessoa com doença falciforme, mas eu venho aqui trazer um pouco essa reivindicação de como é que a gente avança para que essa política integral incorpore outras áreas, por exemplo: a área de educação.
As crianças com anemia falciforme têm muita dificuldade, primeiro pelo desconhecimento dos profissionais de educação de coisas básicas, por exemplo: que essa criança precisa beber água com mais frequência e que, por isso, essa criança precisa ir ao banheiro com mais frequência; que, numa atividade de educação física, ela pode ficar exausta, e isso não significa que essa criança é uma criança, eu vou dizer assim, preguiçosa, como muitas vezes pode ser rotulada; que os olhos amarelos dessa criança não é hepatite ou nenhuma doença hepática; ou que o que ela tem não é uma doença contagiosa. Então, eu quero dizer aqui da importância de a gente ampliar este debate e trazer aqui algumas propostas.
Em Minas Gerais, vamos dizer assim, com o cutucão da Dreminas, eu preciso dizer isso, a Secretaria de Estado de Educação, com secretarias municipais, e o Cehmob, que é o Centro de Educação e Apoio para Hemoglobinopatias - não vou conseguir falar essa palavra, enfim... - desenvolveram um projeto que eu pude acompanhar, que é o Saber para Cuidar, que tinha a perspectiva de formar professores sobre a doença falciforme e produzir um contexto de uma prática escolar que fosse capaz de incluir esses estudantes. É um programa de formação muito importante, uma iniciativa muito nova, que eu acho que precisa ser incorporada pelo Ministério da Educação. A questão é que é preciso ampliar a formação de professores, mas não basta ampliar a formação de professores; nós precisamos construir uma ação interdisciplinar, para garantir o monitoramento e o acompanhamento da trajetória escolar dessas crianças e desses estudantes.
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Então, pela minha experiência, eu penso que nós, no Ministério da Educação, já vivemos algumas experiências, como, por exemplo, com o Programa Bolsa Família: fazia-se o monitoramento escolar de todas as crianças que eram beneficiárias, e a gente precisa estender esse olhar para as crianças e adolescentes com anemia falciforme, porque muitas vezes são tidos como infrequentes, mas a escola não compreende o motivo dessa ausência e também não garante para essas crianças um atendimento domiciliar, que é fundamental, um plano de estudo e um plano de atendimento individualizado, professores que possam acompanhar a trajetória escolar desses estudantes. E aí a gente deslocar também, sensibilizar-nos para a gente deslocar o olhar para essas crianças e esses adolescentes somente do ponto de vista de pacientes, mas compreendê-los como sujeitos, como sujeitos de direitos, e trabalhar para o seu desenvolvimento e para que eles tenham uma trajetória escolar sem interrupção.
Então, a minha participação aqui é muito nesse sentido, de uma chamada a uma ação interssetorial, que articule o Ministério da Saúde, o Ministério da Educação e o Ministério do Desenvolvimento Social para o desenvolvimento de um programa integrado de acompanhamento, de aporte, de atenção integral às crianças com doença falciforme. E aí reforçar, assim, uma rede de diálogo entre gestores, famílias, estudantes, para que a gente possa garantir, efetivamente, o direito à educação para esse público.
Então, assim, a minha contribuição, Senador, é essa. Eu sou professora, mais de 20 anos ali de magistério, e eu olho para a minha trajetória e penso em quantas vezes eu não compreendi o que acontecia com os nossos estudantes por não saber, por não ter a compreensão e por não ter esse entendimento.
E é preciso reforçar que a gente precisa alcançar as comunidades quilombolas, mas eu dou aqui um exemplo de Minas Gerais, das nossas periferias urbanas. Com o teste do pezinho, nós sabemos a incidência, nessas nossas comunidades - que são comunidades negras que são quilombos urbanos -, da prevalência de traços e, portanto, a gente sabe do número de crianças com anemia falciforme que nascem aí a cada ano. E a gente deveria fazer, vamos dizer assim, uma notificação automática, não só para efeito do acolhimento nos serviços de saúde, mas também garantindo a prioridade no atendimento na creche e pré-escola e o acompanhamento aí de toda a sua trajetória escolar.
Eu agradeço, parabenizo vocês pela realização dessa audiência...
Quero dizer que aqui, na Assembleia de Minas, apresentamos um PL que trata de uma política de atendimento integral às pessoas com anemia falciforme e querendo, também, dizer que a gente pode avançar numa visão de atendimento integral, que articule outras áreas da política pública para fortalecer uma rede interssetorial que, efetivamente, garanta direitos.
Bom dia, Senador. Um grande abraço aí para todos os presentes.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, querida Deputada Estadual Macaé Evaristo. (Palmas.)
Deram-me aqui o currículo dela, eu não vou poder ler todo ele, mas é lindo o currículo. Mas eu digo que vou resumir isso.
Além de uma série de atividades que ela teve, inclusive, no Governo, ela foi também Secretária Estadual de Educação em Minas Gerais. Acho que isso mostra todo o potencial dela, essa guerreira, essa lutadora, que é um orgulho para todos nós. (Palmas.)
Pode, pode. Você pode sempre aqui.
Só para dizer que Dra. Joice perguntou se ela pode falar. Eu disse: aqui a senhora manda e fala quando quiser. E eu obedeço.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS (Para expor.) - Não se fala isso para um baiano, uma baiana. (Risos.)
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É para avisar que o primeiro manual a ser lançado, em breve, é o da educação. É um material que a gente já tinha feito no Hemorio e no qual a gente fez uma adequação, e os cuidados das crianças com doença falciforme já estão no manual.
Eu queria saber se pode ser lançado aqui. (Palmas.)
É um material muito bonito, feito de forma coletiva com o grupo do Rio de Janeiro, que foi o pioneiro ao fazer esse material. Ele está conosco, nós só vamos agora fazer, se a gente precisar adequar e tal, mas está pronto e vai ser o primeiro que a gente vai... E aí, Conceição, Evaristo, vocês precisam ler e dar também uma contribuição sobre esse material.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Deixa só... Eu já vou responder aqui a uma pergunta que me fizeram...
Quero dizer para a Dra. Joice que, na verdade, ela me fez uma provocação. Eu aprendi na vida e nunca vou esquecer: manda quem pode e obedece quem for inteligente. Então, eu estou obedecendo porque eu quero ser inteligente.
Já está aceita aqui a sua indicação. Com muito orgulho, a Comissão de Direitos Humanos vai participar nesta audiência pública sob a sua orientação.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Com o lançamento dessa cartilha.
Olha, quando eu vinha chegando ao corredor, duas senhoras me pediram para tirar uma foto, e é claro que tiramos. Abraços, só abraços... Vou parar por aqui - viu? -, para não comprometer. Não, mas foi um abraço muito carinhoso, muito respeitoso, de ambas. "Mas, se o senhor não citar o nosso nome lá, o senhor vai sofrer as consequências". Eu, como disse, sou bem mandado, então aqui fica o meu carinho à Sra. Yone Gonzaga, Professora da UFMG, e à Neusa Maria da Rocha Carvalho, da Associação Gaúcha de Doença Falciforme. (Palmas.)
Cumpri minha missão aqui.
Agora é com... Não sei se é minha eleitora, mas, se eu não cumprisse, eu ia me dar mal.
Elas estão aqui as duas, não estão?
(Intervenções fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Missão cumprida? Tá bom então.
Agora eu passo a palavra, de imediato, à Maria Zenó Soares, Presidenta da Federação Nacional das Associações de Pessoas com Doença Falciforme.
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES (Para expor.) - Bom dia a todas, todos e "todes"!
Quero falar da minha alegria deste momento tão importante, tão necessário, deste espaço que é o nosso espaço legítimo de estar, de falar, mas eu não poderia deixar de agradecer ao Paim. Desculpe-me a intimidade, mas é porque é o Paim mesmo. É um paim mesmo, gente! Sabe? É paim!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - E, quando eu vou à Bahia - porque eu adoro a Bahia - me chamam de "painho" ainda. E eu gosto.
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - O Paim é um cara que tem um compromisso com a população negra do Brasil, ele tem um compromisso com a doença falciforme... Como a Joice coloca, é muito raro.
E não poderia deixar de agradecer à Macaé pela grande fala. Macaé é "parceiraça" nossa lá.
Eu coordeno a Federação Nacional das Associações de Pessoas com Doença Falciforme, Paim, e coordeno também a Dreminas. A Dreminas é a primeira associação do Brasil, em Belo Horizonte, e eu e minha equipe acolhemos 10.106 famílias de todo o Estado de Minas Gerais. (Palmas.)
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Dentre elas, nós temos 4.009 quilombolas, 1,3 mil ribeirinhos e 206 indígenas. Ademais, 95% das pessoas com doença falciforme são negras, 92% são mães solo, 93% dos pacientes adultos não concluíram o ensino fundamental e 98% são beneficiários do Bolsa Família. Então, na fala da Dra. Tereza, eu me emocionei bastante, porque ela estava falando de mim; ela estava falando para mim; e estava falando para muitos que estão aqui. Hoje nós estamos aqui representados, Paim, por 40 associações de todo o Brasil. Então, são pessoas que gritam por aqueles que não têm força para gritar.
Estamos aqui também com o Altair Lira.
Fique de pé, Lira.
Eu sou sucessora do Altair na Fenafal. (Palmas.)
Sou a primeira mulher a assumir. O Lira foi da luta, e o Gilberto, que está presente aqui, com certeza.
Eu não gosto de apagar a história de ninguém, porque cada um tem um papel e um capítulo importante.
Eu vou passar um vídeo e depois eu continuo falando.
Pode passar.
(Procede-se à exibição de vídeo.) (Palmas.)
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A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - Eu quis fazer uma pequena apresentação do que é a federação, porque, se eu fosse pedir a todo mundo para falar, talvez a gente não tivesse tempo.
A doença falciforme na ótica do usuário é totalmente diferente, é lógico, porque só sabe a dor do sofrer quem sofre.
E nós ainda estamos aqui hoje - eu com 56 anos - para contar minha história para você, Paim, porque, antes de nós, existem anjos sem asas: Clarisse Lobo, Vanessinha, Teresa, Paulo Ivo, Rodolfo Cançado, Joice Aragão... Eu não posso nem ficar falando, pois vou esquecer alguém, mas, sem eles, hoje, com certeza, eu não estaria aqui para ter o meu lugar de fala, para conseguir falar. A gente não tinha acesso a nenhuma política pública e, então, a gente morria muito cedo. Não se viam pessoas da minha idade, da idade da Sheilinha, não se viam, porque as pessoas morriam!
Ainda assim, com todo o avanço que nós tivemos no Governo Lula, que perdemos a partir do golpe de 2016 - perdemos praticamente todas as conquistas que adquirimos naquele período -, ainda assim, falta um olhar diferenciado. Sabemos que o SUS é tripartite. Sou da defesa do SUS e tenho muito orgulho quando olho para aquela lista de presença da 8ª Conferência de Saúde, pois eu estava lá, na construção do SUS, que eu tanto defendo, mas os estados e os municípios... Nada adianta o Governo Federal fazer se os estados e os municípios não assumirem.
Nesse sentido, eu gostaria de passar um outro vídeo de dois minutos. (Pausa.)
Não, não é esse, não! É um outro. Salvaram errado! Esse nem pode aparecer! (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - A Dra. Joice está aqui ajudando. Não se preocupe. É um vídeo para o evento da tarde que não pode passar aqui agora, porque é outro momento. É de outro evento também muito produtivo.
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - Gente, é o seguinte. É porque esse vídeo... Hoje, a gente também vai ter um seminário à tarde no Ministério da Saúde e, então, a gente preparou coisas para outros eventos.
É este aí. Eu gostaria que vocês prestassem muita atenção a este vídeo - muita!
(Procede-se à exibição de vídeo.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ela vai complementar, é claro, vai continuar falando. Só queria dizer, para quem não sabe, que essa voz é dela; é ela, fazendo esse relato.
Então, eu diria, mais uma salva de palma para você, por essa história bonita e triste ao mesmo tempo. (Palmas.)
Eu perguntava, ela vai falar agora... Eu disse: "Mas esses todos morreram?". Ela: "Todos morreram".
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - A gente não quis colocar porque a gente iria ficar aqui quatro horas mostrando fotos de óbitos. Já tem muito tempo que eu não faço um vídeo de óbito e havia jurado para a Dra. Célia que eu não faria mais...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - ... porque mexe muito com a estrutura, mas, infelizmente, num país extremamente racista em que nós vivemos, você precisa usar essa dor tamanha para sensibilizar as pessoas de que nós somos cidadãos de direito, que nós precisamos viver e que, mais difícil do que isso, pior do que isso é você saber que existem novas drogas com grandes possibilidades de a gente viver bem.
Aí, Paim, eu não estou aqui para fazer apologia de nenhuma indústria farmacêutica, porque eu sei qual é o papel da indústria e sei qual é o meu papel enquanto mulher preta com doença falciforme que sou. Se a indústria visa o lucro é problema da indústria; eu viso viver, e viver bem.
A dificuldade que há para uma mãe pegar uma cápsula de hidroxiureia, tirá-la, porque não tem condições de pagar para manipular, pôr na água e dar à criança não é fácil. A gente está com um processo na Conitec que é possível resolver. Eu conto, Paim, com você, sim. Já contava; agora eu conto mais ainda. Eu quero que esse vídeo chegue no Lula, e você vai levá-lo para o Lula.
É isso, e eu quero agradecer aqui. Eu quero que todo mundo das associações fique de pé. (Palmas.)
Nós estamos aqui com 40 associações que vivenciam a mesma dor que eu vivencio. Eu olho para cada rostinho chorando, para a Mírian, do Piauí, chorando porque o Piauí está há quase três anos sem hidroxiureia, e paciente morre todo dia - todo dia morre no Piauí. É um clamor. Quando eu falei no vídeo que é um clamor, é um clamor. Nós precisamos viver. É uma droga barata. Se não for racismo a dificuldade de adquirir a droga, eu gostaria de ter outra resposta, porque, para mim, não tem outro nome, a não ser racismo institucional.
Eu estou, sim, extremamente... Não queria ter feito esse vídeo, mas se fez necessário. Eu quero agradecer a todo mundo das associações que estão aqui, eu quero agradecer aqui à Yone Gonzaga, à Maria Inês, querida, que vai vir para a mesa, e dizer para vocês que a doença falciforme nada mais é... Porque não é só a dor física; você ser chamado de viciado em morfina, "você não está com dor, está viciado em morfina" todo dia. A sua dor é emocional, pode ser que o meu estado emocional desencadeou uma dor e naquele momento eu estou com dor. A dor física a morfina tira, Paim, mas a dor da alma é essa que eu carrego. (Palmas.)
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E, antes de encerrar a minha fala, eu queria chamar aqui na frente a Simone Bruna. Eu quero que o Paim autorize... Você defere que ela fale um minuto?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É claro.
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - A Simone Bruna...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ela pode falar, sim.
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - ... na hora em que nós chegamos ali fora, fez uma fala em que ela disse assim: "Que bom que eu sobrevivi para chegar aqui".
Então, Simone, a fala é sua.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Isso. Ela fala mais bem acomodada. Pode pedir para ela falar, pode tocar.
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - Simone, pode falar.
A SRA. SIMONE BRUNA DE OLIVEIRA (Para expor.) - Bom dia.
Esta fala realmente é muito sincera. Foi muita luta. Eu estou no movimento social desde 2007, quando se fundou a associação do Estado do Paraná. Para a gente, foi um trauma o rompimento de tudo isso.
Para mim, pessoa com doença falciforme - a Dra. Joice já falou -, eu fui diagnosticada com necrose e eu vivenciei algo que eu convido o Sr. Senador a conhecer, que é o ambulatório do Dr. Gildasio Daltro, em Salvador, em que ele desenvolve um trabalho fantástico de acolhimento não só da dor física, mas da dor emocional. Lá ele faz milagre, a gente fala, porque há falta de recurso e é inexplicável o porquê - se não for o racismo, que digam o porquê. É um tratamento barato; se não feito a tempo, as pessoas precisam de próteses; e é um sofrimento muito grande até chegar essa prótese, as pessoas não vão conseguir andar. Limita-se esse movimento.
(Soa a campainha.)
A SRA. SIMONE BRUNA DE OLIVEIRA - As pessoas ficam totalmente impossibilitadas e não têm o porquê. Então, isso é só uma parte do que as pessoas com doença falciforme passam, e é uma parte muito dolorosa que acometeu a minha vida. Lá eu tive a experiência de conhecer muitas pessoas que já passaram da oportunidade de ter a terapia gênica, o que é dramático; elas só vão resolver com prótese. Então, também eu preciso fazer este pedido: que isso não aconteça mais, que isso pare, que essas pessoas tenham essa oportunidade de ter a terapia gênica, de ter a sua fisioterapia, que o SUS inclua essas pessoas que são invisíveis. E elas estão no país todo, e só o Dr. Gildasio que está acolhendo esse tratamento. Isso tem que parar. Todas as regionais...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Diga, repita para mim, de novo, o nome dele.
A SRA. SIMONE BRUNA DE OLIVEIRA - Dr. Gildasio de Cerqueira Daltro, em Salvador, Universidade Federal da Bahia. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Essas palmas vão para ele. Que outros sigam o exemplo dele.
A SRA. SIMONE BRUNA DE OLIVEIRA - A equipe dele...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Toda a equipe.
A SRA. SIMONE BRUNA DE OLIVEIRA - ... é fundamental para o acolhimento. Eles fazem... Você vê o trabalho de dedicação, sem recursos, porque ele fica, como a Dra. Joice diz, com o pires na mão, tentando verbas para viabilizar esse trabalho, tanto é que ele relatou para mim que, na porta dele, você pode ver que está como ambulatório humanitário. Então, ele nem busca o tratamento sobre a doença falciforme, porque é difícil de conseguir, porque é doença de preto. A necrose pode acometer qualquer pessoa, não só a falciforme, mas, como ela é mais incidente, não se consegue o recurso. Então, ele está fazendo um trabalho solitário, e eu espero que agora seja um novo tempo - a Dra. Joice já tem as boas-novas -, mas que ele tenha apoio, que cada unidade da Federação talvez tenha um hospital de referência para acolher os pacientes, para que não tenham que ir até Salvador. Eu precisei do TFD, é todo um recurso a mais para levar gente para Salvador, ocupar a vaga de uma outra pessoa da Bahia, sendo que isso pode ser feito em cada estado.
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Então, essa é a minha demanda. Quero agradecer a oportunidade e dizer que eu estou muito feliz de estar aqui.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Parabéns, parabéns! (Palmas.) (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vocês duas podem falar...
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - Eu vou só encerrar aqui rapidinho...
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Não precisa encerrar, não. Eu vou fazer um adendo e você encerra.
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - Está bom.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS (Para expor.) - É o seguinte: queria falar um pouco sobre essa questão da hidroxiureia. Ao longo do tempo, os estudos multicêntricos dos quais a Dra. Clarisse Lobo participou e trabalhou intensamente para que a hidroxiureia se tornasse um medicamento fundamental no tratamento... Nós participamos desse processo todo com os estudos, acompanhamos, incentivamos, e a hidroxiureia passou a ser evidenciada no tratamento, só que não existindo uma participação ativa do Ministério da Saúde junto aos estados, porque o processo de compra da hidroxiureia é feito pelos estados.
Os estados é que têm os pacientes cadastrados, compram, e ela é ressarcida pelo Ministério da Saúde. No ressarcimento, nós temos a noção de quanto está sendo usado. E a Dra. Clarisse fez esse levantamento e é evidente a queda do uso. Por quê? Porque o estado não está ofertando e porque uma das questões que envolvem o tratamento da hidroxiureia é ela ter um acompanhamento dos exames laboratoriais. E se o estado não compra e não facilita o acesso a esses exames, o hematologista não tem como continuar acompanhando, não é, Teresa, que está lá no interior da Bahia? Então, esse processo caiu assustadoramente, caiu assustadoramente o uso, e isso impacta significativamente a vida das pessoas, quando eles consomem, que atendem ao protocolo. Todo medicamento tem um protocolo. Esse protocolo tem que ser seguido, e isso fez a diferença muito grande.
Nós tínhamos um problema: começou o uso da hidroxiureia... Se eu não me engano, é uma portaria inicial de 1988... De 1988? Foi feita pela Anvisa, porque é bom lembrar que a doença falciforme só entrou no SUS oficialmente em 2005. O SUS já estava funcionando, o SUS já existia, mas não existia nada protocolado para a doença falciforme. Foi em 2005 que saiu a portaria e nós começamos o trabalho. Então, não tinha, e era um medicamento que já estava caminhando em todo o mundo - se tem doença falciforme no mundo todo -, a diáspora africana toda contemplada com essa situação.
Então, o que aconteceu? Nós oficializamos esse protocolo dentro do ministério, uma equipe, porque nós temos uma equipe de hematologistas muito competentes pelo Brasil, muito dedicados e que trabalharam intensamente na construção da primeira etapa. Então, a hidroxiureia hoje, com o abandono das políticas públicas, com o abandono da população mais vulnerável nos governos anteriores ao nosso aqui, o que aconteceu? Houve um abandono total. Então, os estados não compram, os laboratórios não estão acessíveis, e aí a situação de completo caos se instala.
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A questão é que, com esse protocolo inicial, era usado inicialmente a partir dos 12 anos - não é, Clarisse? -, começou com o uso a partir dos 12 anos; depois, foi aumentando, aumentando e hoje... A Clarisse tem uma imagem - eu brinco com ela, porque eu sou pediatra -: "Tem que usar hidroxiureia desde a mamadeira". Aí, ela fala: "Mas dentro da mamadeira não, não é? Aleitamento materno". Bobagem nossa, de médico. É, mas tem que tomar na mamadeira, porque, no peito, não tem hidroxiureia. Então, desde bebezinho. Então, ela está preconizada a partir dos nove meses. E aí, agora, a fórmula o laboratório está trabalhando, para a gente aprovar na Conitec essa nova apresentação a partir de nove meses. Foi dado entrada mês passado a um processo que, normalmente, pelo tipo de processo, é autorizar a nova apresentação... Não é, Amaro? O responsável por isso está aqui. E, aí, a gente autorizar.
Nós estamos esperando que, em agosto, já estejamos com esse processo terminado, e, aí, seria um outro momento, quando cabe ao movimento social organizado, com a ajuda dos Parlamentares, para a proposta, que Zenó tem, de centralização. Agora, não adianta nada também a gente ter a hidroxiureia e a gente não ter profissionais qualificados para prescrever, sabe? São vazios que esse espaço deixou, porque, no primeiro momento que a gente iniciou o protocolo, que a portaria ficou pronta, o avanço de compra nos estados está registrado nas compras do ministério. E o que acontece? Se os profissionais da hematologia não estiverem qualificados para prescrever, para seguir o protocolo, também a gente não tem, tá? Então, não é somente o medicamento.
Assim, a gente vai partir para um processo de capacitação. Nós estamos em um trabalho, inclusive, internacional, com uma plataforma dos... É um serviço de referência mundial muito credenciado, que é o Hospital St. Jude, no Memphis, onde a gente tem uma brasileira, que é parceira nossa, e lá se criou uma plataforma para que a gente possa fazer capacitações à distância. O Brasil entrou, foi convidado, a Ministra Nísia recebeu o convite, a que nós, claro, aderimos, e vamos ter, então, disponibilizado. E um dos trabalhos que a gente precisa desenvolver é qualificar os nossos profissionais para prescreverem hidroxiureia.
(Soa a campainha.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Vai ser um trabalho que a gente vai fazer intensamente. Agora, precisamos também que se finalize, na Conitec, esse processo, para que a gente possa trabalhar.
Então, isso é fundamental para a sobrevivência das pessoas, já que o medicamento está consagrado, porque - e quem está aqui e usa hidroxiureia sabe, talvez alguns não saibam - ele reduz as crises intensamente. Viver com dor... Porque todos os momentos com dor, que é a vida das pessoas com doença falciforme, podem ser atenuados, a vida pode ser outra. Assim como o Dr. Gildasio, lá na Bahia, agora está recebendo um suporte - e espero que tudo corra bem, que chegue o recurso e que ele possa trabalhar -, viver a dor da vaso-oclusão sanguínea e a dor coxofemural, a dor do úmero, é uma situação que eu acho que quem não tem dor, que passa com Dorflex, como eu, não pode imaginar como seja essa vida. Então, isso com relação à hidroxiureia.
A segunda batalha, Zenó, é a questão do quelante de ferro, que nós precisamos trabalhar - e o pessoal da Novartis estava aqui, o rapaz da Novartis estava aqui - também para que o Estado adquira um medicamento... Olha, uma caixa de hidroxiureia custa em torno de R$200, tá? E não me importa se são R$200 ou quanto seja, o SUS tem obrigação de ter esse remédio disponibilizado para toda a população que precisa. É o SUS que tem que prover.
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E o segundo tempo é o seguinte: o quelante. O quelante é um preço muito maior, em torno de R$7 mil por caixa. E a gente precisa se debruçar sobre isso para que seja viabilizado no SUS. E também, em relação à quelação de ferro, já teve um momento em que trabalhamos, inclusive em parceria com a Novartis, que financiou capacitações para profissionais, nossos profissionais, trabalhando para que os profissionais aprendam a usar - também tem esse componente. E eu espero que a gente possa nessas parcerias - e vocês estão presentes aqui... É do nosso interesse, a gente tem uma plataforma e a gente está criando todos os mecanismos para acelerar, principalmente porque depois da covid a gente ficou trabalhando online. A gente está trabalhando muito online.
Então, não é somente a hidroxiureia, o quelante de ferro também está em carência nos estados, carência de profissionais. Tem uma coisa que são as mudanças que ocorrem nos estados quanto às formas de contratação de profissionais. Há um interesse enorme na parte hematológica pela oncologia, porque a oncologia é uma especialidade que dá dinheiro. Então, há um interesse grande em se aprender, em estar nos espaços, mas a doença falciforme não tem tanto essa possibilidade no setor privado. A maioria da população negra é do SUS. Ela tem que ser assistida no SUS, porque a população negra não consegue pagar planos de saúde, gente. Não tem essa possibilidade.
Nós temos hoje em torno de 30 milhões de pessoas que têm plano de saúde numa população de 220 milhões. A faixa de famílias que ganham até R$3 mil - eu gosto de falar em torno, porque sempre tem uns números que eu esqueço -, em torno de R$3 mil até, é de 74% da população brasileira. O compromisso de tratar e viabilizar tratamentos é para população brasileira. Desses 35 milhões, em torno, porque caiu muito nos últimos tempos as pessoas podendo pagar plano de saúde, o que aconteceu? O que que a gente pode ver? A maior parte dessas pessoas, são pessoas que têm um emprego cuja empresa pode pagar um plano de saúde. O restante tem plano de saúde e o restante é o SUS que tem que prover.
A maior parte da população brasileira não tem condição de pagar planos de saúde. E a gente sabe que a Constituição diz: "Saúde é direito de todos e dever do Estado". (Palmas.)
E nós, no âmbito da população negra, somos 55% da população. População que ocupa os segmentos sociais de maior vulnerabilidade, com menos acesso à educação, menos acesso à educação de qualidade, à saúde de qualidade, ao transporte de qualidade. Essa luta da doença falciforme é a luta do povo brasileiro, é a luta da população brasileira.
Imagine o que acontece... Eu tenho um carinho especial pela Teresa, primeiro porque ela é baiana como eu e a gente tem aquele bloco que a gente tem de baiano. Estávamos no interior, na ABHH, no último encontro da Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia, que é parceira nossa nos processos de trabalho, e a Dra. Clarisse apresentou, fez uma mesa em que apresentou três experiências de acesso à hidroxiureia. São diferentes profissionais que têm acesso à hidroxiureia. É uma coisa escandalosa, é escandalosa no interior. E é olhar para a Teresa e dizer: como é que você sobrevive a tanto impedimento.
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E, para a gente encerrar, eu queria falar uma coisinha. A Dra. Vanessa Fenelon tem uma importância enorme para as mulheres com doença falciforme. Nós tínhamos uma história de que não tinha mulheres que chegassem à gestação com doença falciforme, que nascesse. E eu, no meio daqueles confrontos, perguntava: "Cadê os números? Onde estão? Como é que a gente sabe disso?".
Tinha uma experiência em Campinas. E, aí, em Campinas, mostrava que havia sim. Nós tivemos que encarar, e aí eu relembro o outro Presidente da Fenafal, além do Altair Lira, que começou, nosso trabalho começou com ele como Presidente: o Gilberto, que não está mais presencialmente aqui.
E, aí, a gente encarou. Nós queremos a Rede Cegonha à eletroforese. E fomos lá e foi uma batalha porque não entra. Como não entra? A gente precisa disso. Feita a Rede Cegonha, o que aconteceu? As primeiras oito mulheres diagnosticadas na Bahia morreram durante o parto. Por quê? Porque estavam diagnosticadas, mas não tinha infraestrutura para dar conta das necessidades.
E a gente trabalhou e ficou na Rede Cegonha. E, aí, aparece Zenó com doença falciforme, com três filhas e diagnosticada na terceira gestação. Então, a Vanessa vem nesse bojo de Minas Gerais, está conosco e disse: "Precisamos criar um serviço em que a gente pesquise, em que a gente trabalhe e em que a gente chegue à conclusão de qual é a situação das mulheres que têm filhos. Elas podem ter filhos? Sim, como toda e qualquer outra mulher. Maria tem direito, como toda e qualquer mulher". E aí, os mineiros pegaram e criaram o serviço. Esse serviço mostrou que a qualidade da atenção, com o acompanhamento adequado, a gente zera a mortalidade infantil. E eu tenho um carinho, um apreço enorme pelo trabalho da Vanessa. Está bom?
São coisas da doença falciforme que a gente precisa retomar. Outros centros de atenção especial para mulheres grávidas, mulheres com doença falciforme, gestação, parto e atenção à vida reprodutiva porque a vida reprodutiva das mulheres com doença falciforme... Elas têm o direito de ter filhos, sabia? Elas têm o direito de engravidar. Elas têm o direito, como a Zenó, de ter quantos filhos quiserem.
Então, isso é uma questão superimportante. Questões que temos que retomar. Não sou só eu que tenho que ter filho, não! Não sou só eu que tenho direito não. A Zenó também tem, como mulher, e todas as mulheres brasileiras de todo o mundo, negras ou não, têm direito a uma vida reprodutiva digna, com apoio do Estado e do SUS, que é direito de todos e dever do Estado. (Palmas.)
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES (Para expor.) - Eu entendo um pouco de SUS. Graças a Deus. Eu entendo um pouco de SUS. Sei mais ou menos a Lei 8.080, de cima para baixo, debaixo para cima, e a 141, a 151. Graças a Deus.
Quando eu coloco, e aí eu entendo todas essas questões que a Joice colocou. Entendo, mas não aceito de forma nenhuma porque a vida não espera.
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - Eu não estou aqui falando de novas pessoas, estou falando de pessoas que tomam hidroxiureia e estão sem. É delas que eu estou falando.
Eu estou falando da Míriam, do Piauí, que está há três anos sem hidroxiureia, e toda semana eu tenho que ficar pedindo doações para mandar para ela. Eu estou falando é disso. É disso que eu estou falando. Eu não tenho tempo para capacitar o profissional. Eu sei muito bem que o SUS é tripartite: que o Governo Federal tem o seu papel, que o governo estadual tem o seu papel e que o município tem o seu papel com seus munícipes. Eu sei disso. Mas nós sabemos que os estados não estão comprando a hidroxiureia. Nós sabemos que não é responsabilidade do município. E nós sabemos que o Governo Federal tem governança para fazer a compra emergencial. Para isso, se eu precisar bater na porta do Lula, eu vou bater.
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A compra emergencial da hidroxiureia eu não abro mão dela.
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - Também não abro mão da capacitação. Também não abro mão dos profissionais que não querem passar. Não abro mão. Só que, nesse momento, a gente perde 200 pessoas numa semana, porque os estados não estão comprando hidroxiureia, gente! É isso o que está acontecendo. Eu não posso esperar que o estado compre, porque o Piauí tem três anos que não compra! Eu não posso esperar que capacite o profissional lá, não. Eu não posso, porque o meu compromisso é com vida. Eu milito vida! Eu milito dor humana, e é essa dor humana que eu sinto aqui! (Palmas.)
Eu a sinto aqui!
Eu não tenho filho com doença falciforme, porque eu sei que eu ia morrer de sofrer de ele passar o que eu passo. Mas eu tenho a doença falciforme. E é uma dor que faz você esquecer que você tem pai, que você tem mãe, que você tem filho, que você ama alguém. Você fala: "Deus, me mata agora, para eu ficar livre dessa dor". Eu não posso esperar. Eu não tenho tempo para esperar, porque eu posso ser a próxima...
Em Minas Gerais, desde 2015, não falta hidroxiureia.
Eu estou falando dessas pessoas que estão aqui chorando porque perderam um filho, porque perderam irmã, porque perderam fulano. Por que perdeu? Porque o estado não comprou. Saber que é responsabilidade do estado comprar eu sei. Eu sei. Agora, saber que o Governo Federal pode, se ele quiser... E se a gente se unir, Paim, com a força política que nós temos, porque nós temos força política... Nós não estamos brincando de movimento social.
Quarenta associações presentes num evento desses em Brasília é porque é de luta. É luta! (Palmas.)
A doença falciforme ou é luta ou é luto.
Como diz a companheira Sheila, a gente precisa lutar para diminuírem os lutos. Não temos tempo a esperar para que se convença o médico lá a passar hidroxiureia. Não tenho tempo a esperar para que se capacite o profissional. Eu preciso da hidroxiureia, pois sua falta está matando crianças de um ano até dez anos, está matando jovens de 14 a 29 anos. É o genocídio do povo com doença falciforme. É isso que nós estamos vivenciando.
Então, eu tenho muito orgulho, Paim. Sou uma mulher preta, nordestina, do interior da Bahia, com muito orgulho. Tenho muito orgulho de ser. Tenho muito orgulho de fazer parte do Partido dos Trabalhadores, porque eu acredito que esse partido pensa no pobre e é com ele que eu conto. E eu tenho certeza de que esse vídeo vai chegar no Luiz Inácio Lula da Silva e que a compra descentralizada da hidroxiureia vai sair. Eu tenho certeza disso.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Certo. (Palmas.)
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES - Tenho o maior carinho, tenho o maior carinho pela Joice. Tenho o maior respeito pela Joice.
A Joice... A gente tem duas histórias de doença falciforme no Brasil: uma antes de Joice; outra depois de Joice. (Palmas.)
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Nunca, nunca, nunca ninguém, ninguém neste país se doou tanto para que nós vivêssemos igual a essa mulher. E a minha pressão aqui não é em cima dela, porque eu sei que tem que vir de cima, tem que ter vontade política para fazer política para preto neste país racista.
Muito obrigada. (Palmas.)
(Manifestação da plateia.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Dra. Joice tem uma resposta para dar para um senhor que encaminhou um bilhete à mesa. E ela, como é imediata: "Posso responder?". Claro.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS (Para expor.) - É só porque é importante a gente falar que, com a volta do Governo Lula, as cooperações internacionais voltaram. A gente já começou com Angola, que veio aqui, foi uma experiência boa. Tem Benin, Tanzânia e Angola - não é? -, as três que nós estamos retomando. É só para dizer isso.
E que, nesse discurso da Zenó, com relação à hidroxiureia, eu pensaria mais longe. Se o Brasil já cooperou com aids, suprindo países da África, eu tenho também o sonho de que a gente possa não só resolver nossa questão com a hidroxiureia mas também nas cooperações com esses países. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Parabéns à querida Maria Zenó Soares, que é Presidenta da Federação Nacional das Associações de Pessoas com Doença Falciforme. Emoção, garra, busca de justiça, coragem foi o discurso dela, um misto de tudo aquilo que a gente gostaria de ver sempre nas pessoas que têm espaço público para isso mesmo, para dizer o que está pensando. Meus cumprimentos.
Passo de imediato à Dra. Saide Maria Sarmento Trindade, que é Hematologista-Pediatra-Hemoterapeuta, Coordenadora de Atendimento Ambulatorial do Hemocentro do Pará, porque só está a sigla, e ela já leu para mim.
A SRA. SAIDE MARIA SARMENTO TRINDADE (Para expor.) - Bom dia. É muita emoção, primeiro por estar aqui com vocês, lá da Região Norte. Eu agradeço ao Senador, à Dra. Joice, à Zenó, às pessoas todas, são 40 associações que estão aqui, pela luta em que a gente está, pelo trabalho, à minha equipe do Ministério da Saúde, à equipe que trabalha com doença falciforme no Brasil.
Eu trabalho no Pará, em Belém, no Centro de Hemoterapia do Pará, Hemopa. Estou trabalhando há 22 anos com doença falciforme, para dar melhor qualidade de vida para todos. Trabalhamos com todos os protocolos do Ministério da Saúde. Tivemos desabastecimento e tivemos que ter recursos para suprir a necessidade emergencial, para que a gente não perdesse os nossos pacientes.
Nós demoramos com a habilitação do teste do pezinho. O teste do pezinho, no Pará, começou em 19 de abril de 2010, porque nós tínhamos muita dificuldade de colocar todos os municípios, de acordo com os critérios necessários, na habilitação.
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No Pará, começou em 19 de abril de 2010, porque nós tínhamos muita dificuldade de colocar todos os municípios, como era necessário, nos critérios da habilitação. Com essa habilitação, nós fomos de município em município levando a capacitação para as pessoas terem condições de ler o teste do pezinho, saber dar o diagnóstico e encaminhar esse paciente para o centro de referência do estado, para chegar à referência que é o Hemopa, para o tratamento adequado dessas crianças. Então, nós caminhamos com a profilaxia, a penicilina, que chegou a todos e está sendo descentralizada.
Tenho uma coisa muito importante para falar sobre o doppler itinerante: nós tivemos todo o apoio para o nosso paciente quando começou o apoio do doppler itinerante para os pacientes com doença falciforme. Quando terminou o doppler itinerante, eu fiquei sem ninguém e eu tenho que falar que eu tenho um neurologista que é especialista em doença falciforme, o Dr. Fernando Paschoal. Ele é do Hospital da Aeronáutica atualmente e foi humildemente buscar o trabalho, que era trabalhar com o doppler transcraniano com falciforme sem ônus. Ele até hoje realiza para a gente o trabalho e nós acabamos de ter o recurso necessário para comprarmos o nosso equipamento do doppler para funcionar no Hemopa. A hidroxiureia é que muda a vida das pessoas com doença falciforme. Sem ela, realmente, eles perdem a qualidade de vida.
Fomos mais além: transplante de medula óssea. Fui parceira, fui discípula da Dra. Belinda Simões, e participei, Senador, da pesquisa clínica dela para a doença falciforme encaminhando nossos pacientes que estavam dentro dos critérios para o transplante de medula óssea. E hoje eu tenho, dentro da pesquisa da Dra. Belinda, três pacientes, com mais de sete anos de transplantado, sem dor, com vida normal, procriaram. Você pode transplantar e ficar estéreo, porém, graças ao nosso bom Pai, nosso paciente é pai, tem uma criança. Também temos cuidados muito, antes do transplante de medula, tanto de pegar o óvulo da menina como o espermatozoide do rapaz para congelar para uma possível posterior concepção.
Hoje nós temos a portaria, que foi liberada em 2015, para transplante aparentado 100% compatível. Eu tenho mais três pacientes contemplados, porque é pai, é mãe, mas o nosso HLA difere. Então, hoje eu tenho um paciente que tem 50%, mas não está dentro do critério para transplante 100% compatível. Aqui eu clamo pela pesquisa clínica, clamo por Ribeirão Preto, que está fazendo a pesquisa de haploidêntico. O haploidêntico é quando o transplante de medula óssea é 50% compatível, ou do irmão, ou do pai, ou da mãe. Então, estamos buscando esse trabalho. Parou o trabalho em Ribeirão Preto porque não tem o recurso necessário para usar pós-transplante de medula óssea, que é um medicamento muito caro. Então, eu clamo pelas pesquisas. Eu clamo pela pesquisa do Dr. Daltro. Em 2015, ele esteve no Pará, convidei-o para uma grande jornada de capacitação, convidei os nossos ortopedistas do Pará e, com isso, nós começamos uma parceria na pesquisa, Senador. Eu tenho seis pacientes tratados, recuperados, através da terapia celular. É muito importante relatar, porque a gente fica tão emocionada...
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Eu atendo como médica, porque eu acho que é muito importante, eu, como gestora, atender, para eu entender o sofrimento de cada um, a dificuldade de cada um para chegar no tratamento. E eu estava atendendo e ouvi gritos de criança, chorando. Eu saí do consultório e fui ver o que era. Era uma criança de 12 anos, Senador, numa cadeira de rodas, com uma osteonecrose, com dor. E... O que é que eu faço? Liguei para o Dr. Gildasio e eu sei que consegui que essa criança, com a pesquisa do Dr. Gildasio, chegasse à terapia celular. Hoje, Doutor, ela está com 16 anos e dança, ela é bailarina, Doutor - ouviu? (Palmas.)
Então, eu clamo para que o trabalho do Dr. Gildasio se torne um programa de tratamento e também referência. Nós temos centros tratadores em outro estado. Eu estou esperando no Norte, lá em Belém, para nós termos nossos centros de referência, mas nós temos que ter recursos.
Isso é muito importante. Uma vida melhor para todos, parar de se estar fazendo prótese, parar de estar com cadeira de rodas. Nós temos condições de cura. Nós temos que começar a avaliação de terapia celular a partir de dez anos de idade, quando os ossos estão bons, para, quando ele começar a dar sinal de falência, fazer a terapia. E essa criança, essa pessoa, esse rapaz vai ter uma vida saudável.
Eu clamo para novos tratamentos com novas drogas. Eu sou da pesquisa do crizanlizumabe. Eu estou vivendo e digo assim: Gente, vale a pena, tanto a pesquisa clínica, como a do acesso expandido.
Eu vou falar só, rapidinho, porque a irmã da minha paciente que está em uso do tratamento do acesso expandido falou para mim: "Doutora, eu não tenho palavras para lhe agradecer. A vida da minha irmã mudou. Antes, só era hospital [ela é formada em Enfermagem], casa, hospital. Doutora, a minha irmã passou na residência em São Paulo para Enfermagem. A minha irmã está feliz, Doutora!".
Então, gente, vamos fazer com que outras drogas cheguem até as pessoas com doença falciforme, que os programas, as pesquisas tenham recursos para caminhar! Eu espero, Doutor, estar nesta batalha até a terapia gênica. Eu espero concluir a minha missão como médica, missão de cuidadora da pessoa com falciforme, com a terapia gênica. E, para isso, a gente precisa de recursos.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Excelente, Doutora!
Dra. Saide Maria Sarmento Trindade é hematologista, pediatra, hemoterapeuta e deu aqui depoimento do seu dia a dia com os pacientes, esse mundo tão difícil e, com essa invisibilidade que alguns dão a ele, só com recurso, com mais postos, com mais médicos, com mais especialistas e tendo o tratamento que, como foi dito aqui, para outros setores.
Sabe que... Eu acho que foi você que citou uma doença que dá no sangue... Fizemos aqui uma audiência pública, a representante é do Rio Grande do Sul e ela fez um agradecimento em público, aqui, ao Governo Lula. Não sei se ela vota no Lula, mas ela fez um agradecimento aqui, em público, pelo atendimento que o Ministério da Saúde está dando... (Pausa.)
É essa mesmo.
Tânia.
Ah, eu tive covid. Ela não teve, porque ela está me ajudando aqui, lembrando. (Risos.)
Mas você não teve essas sequelas de lembrança.
Ela lembrou o nome da pessoa. Tânia, Rio Grande do Sul, Presidente da...
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Da Federação. É controle social, gente, eu tenho que saber.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ela sabe tudo, está sendo simples aqui. Ela sabe tudo.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Deixa eu lhe mostrar uma coisa linda.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Então, é isso que vocês estão pedindo aqui.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Sabe aquele rapaz ali atrás de camisa? Por favor, Elvis. É um transplantado, curado da doença falciforme. (Palmas.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - No SUS do Brasil.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - No SUS do Brasil. Foi tudo feito...
É Elvis Magalhães. Deixa ele dar uma palavrinha só.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Olha, aqui elas mandam. Uma manda daqui; a outra manda dali e eu fico olhando para todo lado. Mas essa é a beleza de uma audiência pública, é para que as painelistas interajam com o Plenário e participem da coordenação do evento.
O SR. ELVIS MAGALHÃES (Para expor.) - Senador, o senhor sabe que... O senhor se lembra da audiência pública que nós fizemos? Então, foi em 2012 a nossa primeira aqui.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu me lembro, eu me lembro.
O SR. ELVIS MAGALHÃES - Um dos temas era a questão de incluir a doença falciforme no rol de doenças passíveis de transplante de medula óssea.
Graças a Deus, a gente conseguiu, em 2015. (Palmas.)
Ele veio com restrição de idade. A Fenafal, com a Maria Zenó, e muita gente, como Belinda Simões e um monte de pesquisadores, o movimento social da doença falciforme, conseguimos ampliar a idade e ficou sem limite de idade.
Então, o que me dá satisfação, gente, é que, assim... Essa portaria... Qual que era a importância dela? Muitos médicos, quando a gente falava em transplante de medula óssea para a doença falciforme... Porque eu tenho 18 anos de transplante, nunca mais entrei num hospital. São 18 anos sem tomar morfina, porque eu nunca mais tive dor. Então, eu não era viciado, eu tinha dor e, com dor, a gente precisa de medicações e, muitas vezes, a morfina era necessária. Então, o que aconteceu foi que essa portaria de 2015, reformulada em 2018, trouxe mais tranquilidade para que os médicos hematologistas pudessem indicar seus pacientes complicados, os pacientes que estavam nos critérios de indicação.
A Dra. Saide falou uma coisa que me dá muita satisfação, Senador: é que toda essa luta nossa - e eu digo do movimento social, viu gente. Fico muito feliz de ver vocês de novo, muito mesmo, de verdade, e emocionado de saber que nós estamos, depois de tantos anos, aqui novamente reunidos.
Então, o que aconteceu? Quando essa portaria foi publicada, ela deu aos os médicos um documento para que encontrassem, entre os pacientes, aqueles para quem era necessário o transplante de medula óssea. Muitos deles não tinham um doador compatível. Por isso é que nós vimos com muita satisfação - inclusive já mando isso como demanda para a Joice Aragão, para a própria Federação -, porque já existem transplantes no Brasil, aliás, vários, mas só estão acontecendo no particular, e nós precisamos incluí-lo também na tabela SUS, o transplante com 50% compatível, ou seja... (Palmas.) ...o paciente que tiver uma mãe, um pai ou um irmão 50% compatível pode ser muito bem indicado. Temos visto com muita, mas muita satisfação, as terapias gênicas que já estão acontecendo, e isso vai se ampliar.
Nós só precisamos, como movimento social, como pessoa e como sociedade, que a ciência continue avançando, de verbas, e, como disse a Simone Bruna lá para o Gildasio, capacitar os médicos. Nós precisamos acreditar na ciência, apoiar a ciência e a pesquisa brasileira. O Brasil não perde em número de transplantes, de êxito em transplantes de medula óssea em falciforme para nenhum país do mundo - nós temos mais de 90% de êxito - e me dá muita muita felicidade saber que, em 2009, nós começamos a encampar essa luta para incluir mais pessoas.
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(Soa a campainha.)
O SR. ELVIS MAGALHÃES - Como eu fico feliz de ver mais e mais pessoas, irmãos, com doença falciforme, sendo curados, apesar de toda a resistência que nós enfrentamos.
Maria Zenó, minha irmã, quando ela chega, ela chega metendo o pé na porta. Conversou com o Chioro e nós conseguimos, Senador Paulo Paim, com a sua ajuda, com as audiências na Câmara, com o acolhimento, dentro do Ministério da Saúde, a gente conseguiu mudar a história. Hoje, a gente tem visto irmãos nossos de falciforme tendo a realidade da cura.
Dezoito anos curado não é para qualquer um. Há cinco anos eu transplantei também o fígado, porque a doença falciforme, de vez em quando, manda uma fatura, então, há cinco anos, eu transplantei o fígado também, mas estamos aqui, vivos, lutando mais do que nunca, e acreditamos que nós podemos mudar a realidade dessas pessoas.
Irmãos de luta das associações, muitíssimo obrigado por tudo, vocês sabem que vocês estão aqui no meu coração! Fiquem com Deus. Obrigado.
(Manifestação da plateia.) (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Elvis, você não sabe o quanto é importante o depoimento que você deu aqui.
Falando de audiência pública, fizemos tantas lá em 2012... Infelizmente, dentro do Parlamento - não vou citar o nome de ninguém -, nem todo mundo gosta de audiência pública. Eu poderia dizer que, com audiências públicas, nós formatamos muitas e muitas leis que surgiram de audiências públicas.
O seu depoimento mostra... Eu poderia aqui falar de mais de 50 leis que foram debatidas em audiências públicas - eu estou aqui desde a Constituinte - e se transformaram em leis, leis efetivas! Inclusive as que tratam da aids, dos estatutos que vieram de audiências públicas; todos vieram de audiências públicas. Ninguém inventa lei, o povo é que tem que falar!
Então, eu queria aproveitar este momento para fazer um apelo aos Senadores e Deputados para que permitam que o povo venha falar em momentos como este, para que o Congresso entenda, que o Executivo entenda, que o Judiciário entenda que as melhores propostas de lei são aquelas que vêm da população. É o que vocês estão apresentando aqui hoje.
Eu digo que nós estamos aqui de passagem. Eu, casualmente, por culpa de vocês, estou aqui há quase 40 anos. Entrei e nunca mais saí, mas eu diria, com muito carinho, independentemente de quem esteja aqui no Parlamento, seja esse ou aquele Deputado ou Senador: vida longa - sim - às audiências públicas! Elas dão oportunidade para que o povo possa se manifestar, como está, nesta beleza de audiência pública, hoje, ao vivo, para todo o país! (Palmas.)
Passamos a palavra para Sheila Ventura, representante da Aprofe. É isso? (Pausa.)
Pode falar a sigla toda.
A SRA. SHEILA VENTURA (Para expor.) - Nossa, gente, falar depois desta turma aqui está puxado, porque a gente fica com a voz embargada. A Zenó tem o dom, quando ela faz esses vídeos...
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A gente ainda carrega esta cicatriz, não é, Zenó?, da dor do luto! São irmãos, pais, pessoas que... A gente luta e, lá na ponta, dentro de casa, a gente não consegue evitar essa dor do luto. Mesmo para quem não tem filhos, quem não perdeu entes da família, tem as pessoas que a gente cuida dentro das nossas associações. No dia a dia, você conhece as pessoas, cresce com elas, conhece a história...
E esse é o trabalho das associações. Eu parabenizo a todos aqui. Estou muito emocionada, porque sei o que nossos irmãos e irmãs de foice que estão aqui presentes passam lá na ponta. Muitas das vezes com a sua dor, têm que cuidar da dor do outro, mas a gente está vendo o resultado.
Senador, muito obrigada por esta oportunidade. Estas audiências públicas realmente são o que nos dão resultado (Palmas.) porque a gente grita na ponta, a gente briga com secretaria de saúde, Ministério Público e a gente chega, muitas vezes, a se sentir incapaz, quando nos dizem que fulano morreu, que sicrano morreu...
O nosso trabalho, o trabalho das associações, que, muitas vezes, é voluntário, colocando sua vida, muitas vezes, em risco, porque eu posso deixar de ir à minha consulta para acompanhar um caso de uma pessoa com doença falciforme, a nossa luta, muitas vezes, não é vista. São guerreiros. Eu falo que a luta com a doença falciforme é resistir e persistir sempre, porque, muitas das vezes, nós somos discriminados, temos sempre que estar comprovando que podemos.
Eu me identifiquei muito com a fala da Dra. Tereza. Eu falo muito que eu não sou uma doente, eu sou uma mulher preta vivendo com patologia. Hoje, eu tenho uma formação, sou formada em Assistência Social e Presidente da Aprofe (Associação Pró-Falcêmicos).
E essas associações são formadas por pessoas que vivem com a patologia. O que a gente traz não é pesquisa, não é Google; é a realidade da vida das pessoas com doença falciforme.
Muitas das vezes, nós não conseguimos trabalhar com a prevenção; a gente trabalha com as sequelas. Quantos de nós aqui não temos as necroses da cabeça do fêmur? Muitas vezes, são limitados o seu dia a dia e o seu trabalho. É um eterno recomeço a vida da pessoa com doença falciforme. Ela trabalha, ela perde o emprego; se ela está estudando, ela reprova; se ela faz faculdade... Até mesmo a família, muitas das vezes, acredita: "Para que você vai fazer faculdade? Você não vai aproveitar isso". Quantos de nós aqui não recebemos que a expectativa de vida...? No meu caso, o médico falava para minha mãe que eu não passaria dos 15 anos. Dia 10 de junho, eu completei 44 anos. (Palmas.) É uma grande vitória, porque, de oito irmãos, eu perdi seis. E a gente luta para que a gente diminua os lutos. Há uma coisa com que fiquei muito emocionada. A gente tem a Joice, a Dra. Clarisse Lobo e outras médicas que estão aqui e que tiveram o que a gente sempre pede: a empatia com a dor do outro. É este é que o problema: a gente sente falta da empatia com a dor do outro.
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A doença falciforme impacta na nossa questão social, no nosso emocional, psicológico. Quantos pacientes não suportaram a dor e cometeram suicídio?
E aí eu aproveito para trazer uma pauta muito importante também, Joice, porque a gente fez esse trabalho e tem que puxar novamente, que é sobre a saúde do homem.
Senador, nós temos homens com priaprismo. Além de sofrerem com a doença falciforme, sofrem com o priaprismo, que é aquela dor peniana que, muitas vezes, leva o jovem a ter que colocar uma prótese peniana, e ele já passa por várias situações: a questão emocional, a questão do preconceito... Quando ele chega a uma unidade básica ou a um pronto-atendimento, no auge da crise... A gente já teve casos, em São Paulo, de a equipe chamar a polícia, porque ele estava tomando morfina, um conhecido drogado, e tomando a morfina, e aquela dor não passava. Então, é um paciente com atentado ao pudor, e isso não pode!
Muitas vezes, a gente passa de paciente a meliante; de paciente a drogado; e é essa a luta das associações.
Eu fico muito feliz com a luta da Zenó, com o retorno da Joice, porque realmente ela pegou a luta e todas as pessoas com a doença falciforme, quando ela começou com as mulheres, levava as mulheres a todos os estados, para ouvirem a nossa história, porque ela entendeu que, antes de ter uma doença, eu sou uma mulher, eu tenho desejos... Um homem, que pode ter também filhos e ser trabalhado.
A doença falciforme impacta nessa questão socioeconômica. Mais de 80% das pessoas não conseguem chegar à previdência social, porque perdem ali, no meio do caminho, não conseguem um registro, um trabalho, um registro na carteira. Nós precisamos fazer o diálogo "intersecretarial", trazer a previdência social, trazer as secretarias de educação, porque lá na ponta essas informações não chegam, e há o impacto na qualidade de vida.
Quando tem a evasão nos hospitais, não é porque o paciente é preguiçoso, é irresponsável e não vai às consultas; é porque ele não tem dinheiro para ir à consulta, e a doença falciforme ainda não nos dá direito à isenção tarifária, que é mais uma pauta que a gente sempre coloca.
Nos estados, a gente sempre conversa com as secretarias de saúde, com a Câmara Municipal, com a Alesp, levando essa pauta, porque a gente não se encaixa ali como deficiência. E, aí, quando esse trabalhador - antes de ser uma pessoa com a patologia, é um trabalhador - começa a ter os problemas dentro do emprego, ele é mandado embora. Já teve caso de ter sido mandado embora por justa causa, porque no mês levou oito, nove atestados. "Ah, é o preguiçoso". E até a própria família acaba colocando essa pecha no paciente.
Então, nós temos que conversar com o INSS, conversar com as empresas, fazer um diálogo mais amplo; sair das nossas caixinhas da saúde e trazer as outras secretarias para que ouçam as nossas demandas também, porque, muitas vezes, eu posso ter uma qualidade de vida, mas eu não consigo trabalhar. Somente se eu apresentar, no meu exame técnico, no meu exame de admissão, que eu tenho a doença falciforme, já não sou aceito. Num concurso público, eu posso ter passado como todos, mas, se apresentar no meu exame que eu tenho a doença falciforme, eu não sou aceita.
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Então, nesse diálogo, eu fico muito feliz por nós também estarmos com a Secretaria dos Direitos Humanos, que é o que a gente precisa que trabalhe nessa questão socioeconômica, porque a doença falciforme é uma questão social de grande impacto e, muitas das vezes, é o que determina a vida e a sobrevida das pessoas com doença falciforme lá na ponta.
Quando eu não tenho ideia, a mãe não vai ter R$200 para comprar. E, se ela tiver, ela vai ficar é dividida entre levar o filho à consulta e trazer o alimento para dentro de casa.
Então, são assuntos que, muitas vezes, não são debatidos.
Nós não somos só uma doença; nós somos mulheres que trabalham, homens, chefes de família, que têm filhos, e isso não é visto.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dra. Sheila Ventura, representante da Aprofe, que aqui demonstrou... Com essa frase final, disse tudo: "Querem que a gente seja invisível. Nós somos crianças, somos jovens, somos adultos, somos pais, somos mães, somos avós e queremos um olhar como aqui foi dito por todos vocês".
Eu pediria que vocês retornassem para o Plenário. A representante do Governo Lula fica na mesa, e do Ministério da Saúde.
Eu vou convidar, então, a nossa terceira e última mesa.
Convido Yone Gonzaga, Doutora e Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação Conhecimento e Inclusão, da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). (Palmas.)
Essa é uma das duas que pediram para eu registrar. Ela e a outra que está ali, à nossa direita. Yone Gonzaga.
Já está aqui a Yone.
Agora é a Maria Inês Barbosa, médica do trabalho, Especialista em Gestão de Serviços de Saúde, Mestre em Educação Médica com Ênfase em Saúde da Família. (Palmas.)
(Intervenção fora do microfone.)
Fique à vontade. Aqui, nesta mesa, vocês mandam, até porque as mulheres, aqui, são maioria. Em todas as mesas isso aconteceu aqui hoje.
Agora Ana Paula Pinheiro Chagas Fernandes, pediatra, Professora Adjunta 3 do Departamento de Saúde da Criança e do Adolescente da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais. (Palmas.)
O pessoal só lembra aqui - e achei importante - que foi de uma audiência pública que surgiu a lei dos autistas. Veio uma delegação aqui de 30 a 40 pais, e eu me lembro de que uma mãe do Rio de Janeiro foi quem encabeçou. Ela disse: "Senador, viemos aqui para essa audiência pública como última esperança. Já percorremos o mundo quase". Ela quis dizer o Brasil. E fizeram uma bela audiência pública.
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Quando terminou, nós encampamos que iria ter, então, a lei dos autistas, produzida por eles - não é que a gente produziu não. Eles produziram, eles indicaram depois autor e Relator, mas tudo surgiu numa audiência pública.
E, como foi 18 de junho o Dia Mundial do Orgulho Autista, o Senador Flávio Arns, que é o Presidente da Comissão de Educação, presidiu, em nome da Comissão de Direitos Humanos, esse evento.
Eu queria dar uma salva de palmas a essa luta vitoriosa que foi lembrada aqui, com o Dia Mundial do Orgulho Autista. (Palmas.)
Por favor, Dra. Yone Gonzaga, Doutora e Mestra em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Conhecimento e Inclusão Social em Educação, da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais.
A SRA. YONE GONZAGA (Para expor.) - Bom dia a todas e todos.
Eu gostaria de começar agradecendo e cumprimentando a mesa, o Senador, a Dra. Joice, a Dra. Maria Inês, a Dra. Ana Paula, cumprimento cada uma e cada um que está aqui.
Quero dizer que, para mim, este momento é de muita emoção também.
Primeiro, quero dizer que eu fui uma das mulheres que pediu para tirar foto com o Senador, pelo que significa ter um Senador da República negro neste país... (Palmas.)
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. YONE GONZAGA - Exatamente.
Pelo que significa um Senador da República negro, que se compromete com a luta de mulheres e homens, milhares de famílias negras neste país, com doença falciforme ou não; pelo que significa uma audiência pública promovida nesta semana, em que nós estamos discutindo os direitos das pessoas com doença falciforme.
Estou emocionada também porque é a minha primeira vez no Senado Federal.
Eu sou Yone Gonzaga, sou filha de um pedreiro, Raymundo, e de uma ex-empregada doméstica, depois técnica em enfermagem, Margarida Gonzaga. Ambos não estão fisicamente entre nós, mas é deles que eu trago a força de dizer que hoje eu cheguei a um lugar a que os meus não chegaram. (Palmas.)
E eu quero estar aqui para dizer desta alegria e para dizer que, enquanto professora da rede pública, enquanto professora formadora, a doença falciforme não me foi ensinada. Eu aprendi sobre doença falciforme fazendo ó...
Em 2015, eu assumi, no Governo do PT, em Minas Gerais, na Secretaria de Estado de Direitos Humanos, com o Secretário Nilmário Miranda, a Superintendência... (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O Nilmário foi Parlamentar, colega...
A SRA. YONE GONZAGA - Sim, sim.
Eu assumi a Superintendência de Políticas Afirmativas e Articulação Institucional na secretaria, e uma das pautas era, de fato, pensar as políticas afirmativas. E a Zenó, com esse jeito que todos nós conhecemos, uma vez foi atrás de mim e disse: "Olha, nós não podemos deixar de pensar nas pessoas com doença falciforme". E aí começamos a fazer um trabalho de pensar o racismo institucional e a doença falciforme.
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Como já foi dito aqui na mesa, o racismo determina os nossos modos de viver. O racismo determina os nossos lugares ocupacionais. Por isso que nós temos um Senador negro, poucas professoras universitárias doutoras negras. Nós temos poucos médicos, poucos odontólogos e poucos hematologistas negros. O racismo determina a nossa condição de vida.
E, aí, eu assumi esse trabalho de conversar sobre o racismo institucional numa perspectiva de falar sobre os direitos e hoje eu me dou conta de que é necessário ampliar todas essas reflexões para o campo da educação.
Tenho atuado como formadora de docentes e de gestoras e gestores, e, também por causa do racismo - nós já sabemos -, nós temos a Lei 10.639, que fala da obrigatoriedade da inclusão da história e da cultura negra nos currículos, e este conteúdo chega de forma ainda muito incipiente aos conteúdos. E nós sabemos que isso é resultado do racismo. E nós sabemos que é resultado do racismo institucional.
Recentemente, foi divulgada uma pesquisa realizada pelo Geledés - Instituto da Mulher Negra, de São Paulo - e Instituto Alana, que fala que 70% dos municípios pesquisados não implementaram esta legislação. Então, ainda hoje, a história e a cultura africana e afro-brasileira chegam de forma muito incipiente aos currículos.
Ainda nesses currículos, professores e professoras pensam, Senador, que, tratando no mês de maio dos processos de escravidão, estão nos representando, que estão trazendo as nossas histórias. Ainda hoje, professores e professoras pensam que falar que existe a lei ou que o 20 de novembro é o Dia da Consciência Negra é suficiente, e nós sabemos que não é suficiente. Nós sabemos que esse "desconhecimento", entre aspas, de professoras e de gestores e gestoras da educação tem a ver com racismo institucional. E, ao não conhecer a nossa história negra, os nossos legados, os nossos conhecimentos produzidos desde África e em todas as diásporas, nós estamos legando um processo de invisibilidade para o negro e a negra brasileiros. E esse processo de invisibilidade só se torna mais agudo quando nós falamos de pessoas com doença falciforme.
Se a nossa corporeidade negra já é invisibilizada... Professores, professoras e todos nós presentes temos acompanhado, principalmente nas mídias, os ataques racistas a várias pessoas e nós sabemos que, independentemente das condições econômicas, o racismo nos torna todos desumanizados.
É isso que o racismo faz conosco, ele nos desumaniza, e esse processo de desumanização acontece para a manutenção do que a gente chama - Cida Bento fala - de "pactos da branquitude", para que nós, negras e negros, não queiramos assumir outros lugares; para que nós, negros e negras, não possamos lutar pelos nossos direitos; para que nós, negros e negras, não reivindiquemos que estar numa audiência pública é direito nosso, porque nós sabemos das nossas dores, nós sabemos das nossas competências e nós sabemos das nossas potencialidades.
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E, aí, quando a gente trata das pessoas com doença falciforme, há um agravamento, como já foi dito aqui. Na semana passada, eu desenvolvi um processo de formação em um município lá de Minas Gerais, e, numa sala com 60 gestoras e gestores, eu perguntei aqueles e aquelas que conheciam a doença falciforme. Menos de 15 pessoas na sala levantaram a mão. Basicamente, todos têm em torno de 15 a 20 anos de docência. Então, vejam bem: quando profissionais de educação, que atuam há tanto tempo, desconhecem essa doença e trabalham numa periferia em que os estudantes, o corpo discente é majoritariamente negro, esses profissionais estão me dizendo que eles não conhecem os seus alunos, que eles não olham para os seus alunos, que eles não respeitam as trajetórias desses estudantes e as vozes desses estudantes. Isso porque, como também já foi dito aqui, a doença se manifesta desde a mais tenra idade, não é? E nós sabemos, assim os estudos vêm mostrando, que as crianças negras, desde as creches, são as menos cuidadas. Eliane Cavalleiro já dizia isso lá nos anos 90; Fabiana de Oliveira diz isso agora. O Prof. Luiz Alberto, que faleceu recentemente, dizia que o silêncio em torno das questões raciais é uma estratégia para a manutenção do racismo e para a manutenção das desigualdades educacionais.
Nós sabemos que muitas crianças, adolescentes e jovens têm um número de evasão muito grande ou de distorção idade-série, e a gente não indaga essa evasão, essa distorção idade-série a partir desse olhar para as doenças falciformes, para as pessoas que são acometidas por essa doença. Nós falamos, os indicadores trazem: as pessoas negras são as que mais se evadem. A distorção idade-série é maior entre os negros. Mas e esse monitoramento desses dados para a gente saber por que essas pessoas se evadem? O que leva a essa evasão?
Então, pensar o racismo institucional no campo da educação e o racismo institucional como um fenômeno que precisa ser vencido é urgente. (Palmas.)
É urgente porque, uma vez não tendo condição de estudar, a vida dessa pessoa também será prejudicada, porque o acesso ao mercado de trabalho será diminuído. Também não tendo acesso ao mercado de trabalho, não tendo acesso a uma profissão digna, essa pessoa terá menos chances de viver.
Então, eu trago como reflexão a necessidade de uma articulação institucional entre os Ministérios da Saúde, da Educação, dos Direitos Humanos, da Igualdade Racial, para que, na realidade, a formação docente também incorpore essa temática, não como uma temática en passant. "Ah, este ano nós vamos ter...". Não! Isto precisa estar nos currículos também. Quando nós pensamos a história e cultura negra e afro-brasileira, nós precisamos entender quem somos nós nesse processo. Entender quem somos nós significa também trazer uma reflexão sobre a doença falciforme.
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Sugestões aqui para esta audiência pública: a questão do monitoramento das evasões, da distorção idade-série na idade escolar, contemplando este olhar para as pessoas com doença falciforme. É esta política que precisa ser interligada. Nós não podemos deixar que somente os números digam que nós somos isso ou aquilo, nós precisamos dizer o que somos. E ao dizer o que somos, nós vamos dizer: "Nós somos pessoas negras, nós temos direitos e nós temos uma infinidade de legislações que garantem esse direito". Mas essa infinidade de legislações, hoje, muitas vezes é apenas repetida no seu teor, mas não trabalhada para que, de fato, as pessoas negras, com doença falciforme ou não - aqui no caso, estamos trabalhando com as pessoas com doença falciforme -, possam ser vistas na sua condição de sujeitos, cidadãs e pessoas de direito.
Para finalizar, é importante também que a gente entenda que esses processos formativos precisam se dar com essas pessoas. A Zenó disse aqui da dor, e nós sabemos que quem vivencia determinado problema consegue falar sobre ele com maior propriedade. E nós temos aqui professoras e professores de vida, professoras e professores que não estão somente nesta condição de pessoa com a doença falciforme, porque é uma outra coisa que precisa ser pensada. São pessoas com direitos, com sonhos, com desejos e com possibilidades.
Em 2017, num evento em que a Zenó me convidou, uma moça disse uma frase, quando estava sendo homenageada, que ficou na minha cabeça, e eu vou repeti-la: "Eu sei que eu vou morrer porque não tenho hidroxiureia, mas eu tenho tantos sonhos!". (Manifestação de emoção.) E aqui eu falo desses sonhos, dessas pessoas que tiveram suas vidas ceifadas e que estes sonhos que não puderam ser vividos, possam ser vividos por quem tem a doença falciforme...
(Soa a campainha.)
A SRA. YONE GONZAGA - ... possam ser vividos por nós pessoas negras, que lutamos por direitos, por dignidade.
Finalizando mesmo, destaco que o Senador Paulo Paim é o autor do Estatuto da Igualdade Racial, daí a minha emoção também de estar falando sobre isso. Durante muito tempo, trabalhei com os Conselhos de Promoção da Igualdade Racial, e, no estatuto, os direitos das pessoas negras, os direitos das pessoas e o direito à educação e o direito à saúde estão também garantidos, não só na Constituição, mas também no estatuto, a Lei n° 12.288, de que eu acho que é importante nós trazermos a referência aqui.
Muito obrigada pela oportunidade de estar aqui conversando, dialogando com vocês nesta manhã, que é histórica para a minha vida, e eu espero que seja histórica também nos processos de incorporação dessa temática na formação de professoras e professores e gestoras e gestores da educação.
Muito obrigada. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Nós é que agradecemos, Dra. Yone Gonzaga, a senhora que é Mestra em Educação pelo Programa de Pós-Graduação Conhecimento e Inclusão da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais.
Nossos cumprimentos mesmo, viu? E uma simplicidade quando eu a encontrei no corredor! Posso tirar uma foto com o senhor, Senador? Ela é que é mestra, ela que é doutora. Eu sou um simples Senador que aqui chegou. Muito orgulho de ouvir a sua fala aí!
E você, me permita que eu diga isso, você citou a Lei 10.639. Eu confesso que eu sou um apaixonado por essa lei. Todo ano eu tento lançar uma campanha para divulgação da lei, porque não se chega a 25% dos municípios brasileiros que adotam efetivamente na sala de aula a importância da lei, que quer contar só a história verdadeira de negros e índios na formação do povo brasileiro. Vejam a dificuldade.
Eu apresentei até um prêmio aqui no Senado para premiar as cidades do Brasil que realmente adotam a 10.639. Que a gente pudesse, simbolicamente, eu cheguei a dizer, lançar uma grande campanha. E falamos no Governo, e o Governo, todo ele, simpático à ideia, muitos encampando a ideia.
Não é porque eu estou falando. A lei existe há 20 anos, não é? Há 20 anos. E a gente sempre tentando, nós todos tentando, e a dificuldade de fazer com que ela realmente cole - cole que eu digo não é colar na sala de aula, senão vão me dar zero aqui já -, que a lei pegue mesmo e a gente possa, então, mostrar que de fato a educação liberta. Paulo Freire, se não me engano, não é? A educação liberta.
E a importância dessa lei para mim é muito grande. Eu vou voltar no tempo. Muito tempo atrás, como eu venho de outros tempos, eu apresentei essa proposta na Câmara. A Câmara aprovou, veio para o Senado. Nós não estávamos aqui, estávamos lá. Ela foi simplesmente engavetada e não foi votada.
Felizmente, depois, na frente, Esther Grossi, nunca vou esquecer, e Ben-hur apresentaram de novo a lei na Câmara dos Deputados. Eu estava lá ainda. Veio para o Senado e o Senado aprovou. Então, Esther Grossi, gaúcha de quatro costados, e Ben-hur foram aqueles que, conjuntamente, apresentaram essa lei.
Ela é uma realidade, mas só que tem que ser implantada de fato, não é, Doutora? E você, como doutora, como mestra, sabe mais do que ninguém, mas estamos conversando com os ministérios, para que nós todos, junto com a parceria público-privada, como foi dito aqui, que a gente possa lançar essa campanha.
Mas não é só dizer que vai lançar, dizer que vai lançar eu venho falando há muito tempo, mas tornar realidade, para que a gente tenha um prêmio, dois prêmios, dez prêmios, vinte prêmios, oxalá mais de 5 mil prêmios, para as prefeituras que realmente assumam a responsabilidade de fazer com que se conte na sala de aula a verdadeira história do povo negro e índio.
Pode ser por aí, Doutora? Muito bem. Meus cumprimentos.
Passamos de imediato a palavra a Maria Inês Barbosa. (Palmas.)
Deixe-me ler aqui, deixe-me ler o resto.
A SRA. MARIA INÊS BARBOSA - Está errado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Está errado? Assessoria, diz que o roteiro que chegou aqui está errado.
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A SRA. MARIA INÊS BARBOSA - Acontece.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Faça sinal aí para nós.
Pode falar.
A SRA. MARIA INÊS BARBOSA (Para expor.) - Tá! Está com som.
Então eu vou iniciar fazendo a minha apresentação.
Sou Maria Inês da Silva Barbosa. Eu sou formada em Serviço Social. Serviço Social é uma área e atividade da saúde. Normalmente, por eu estar muito envolvida com as discussões das políticas de saúde, ou eles colocam que eu sou enfermeira ou colocam que sou médica, e eu sou assistente social com trabalho em periferia, trabalho em hospital. Então, eu tenho toda uma trajetória de trabalho e de docência na área da saúde.
Eu sou professora aposentada do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Mato Grosso, onde lecionei nas áreas de formação - Nutrição, Medicina, Enfermagem - e na Pós-Graduação em Saúde Ambiente e Saúde.
Eu fui autora da primeira tese sobre racismo e saúde no Brasil, focando no tema do racismo em si. Já se vão alguns anos.
Isso posto, eu também gostaria de me apresentar para aqueles não videntes.
Eu sou uma mulher negra, idosa, de cabelos grisalhos. Estou portando um brinco de palha nas cores de Oxum, que remetem a Oxum. Eu estou vestida de branco com um lenço colorido. Sou filha de uma mãe trabalhadora doméstica, que, aos nove anos, foi apartada de sua família para trabalhar numa casa de família em São Paulo. E eu tenho toda a minha família, por parte da minha mãe, dispersa. Eu devo ter parentes que eu desconheço, porque minha mãe fazia referência que um irmão dela havia ido para o Rio de Janeiro. Mas essa mesma fonte, essa mesma base foi que me deu essa força para estar em movimento. A minha mãe tinha até o segundo ano primário, que era quando ela vai para casa de família, ela tinha o segundo ano primário. E ela alfabetizou o meu pai, para que meu pai tivesse uma profissão. O meu pai era motorista e formou a mim e a minha irmã já falecida.
Eu quero saudar a nossa ancestralidade, história de amor, dor e resistência. Saúdo aquelas e aqueles que, apesar da dor, oferecem amor para nos debruçarmos sobre a dor e gestar um novo dia.
Quem sabe faz a hora.
Saúdo aqueles e aquelas - filhas, filhos, esposas, esposos, amigas, amigos - que se foram. Suas dores não serão inúteis. Estreitam laços, compromissos. Aqui estamos fazendo o presente, honrando a história de amor e dor.
Saúdo afilhado querido com doença falciforme, que, aos 28 anos de idade se suicidou, em 30 de dezembro de 2022. Nossos mortos não morreram; nos guiam nos caminhos de consolidação do direito pleno à saúde, nos caminhos da complexidade do sistema. Sistemas complexos requerem pensamentos complexos. Sua morte aponta para questões afeitas à saúde mental e, por que não dizer, ao processo de formação e à LDB, porque são aspectos - e as mesas anteriores mencionaram - da formação para além do hematologista. Eu venho percebendo que tem crescido o suicídio entre jovens negros e a gente não tem feito uma leitura do quanto isso afeta a juventude negra com doença falciforme.
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É outro aspecto, porque meu afilhado se suicida depois de um longo processo de vivência, de cuidados e descuidados, conhecimentos e desconhecimentos. Então quando a gente fala em conhecer para cuidar, nós estamos ao mesmo tempo falando que não conhecemos, que não cuidamos, que não temos consciência, por isso a necessidade do Dia Mundial de Conscientização sobre a Doença Falciforme.
Saúdo aqueles e aquelas que se dedicaram em todos os níveis para nos debruçarmos sobre o conhecer, cuidar, ter consciência sobre a doença falciforme. Quem sabe faz a hora.
Saúdo aqueles e aquelas invisibilizados, "invisibilizades", invisibilizadas que limpam, preparam o alimento, recepcionam, cuidam do som, nos dão apoio, enfim, possibilitando que aqui estejamos. Se aqui chegássemos e a sala estivesse suja, lembraríamos das pessoas responsáveis por limpá-la, como a gente chega e está tudo em ordem, dá a impressão que surge do nada. Essas pessoas chegam muito antes de nós e chegam depois de nós, elas estão neste momento aqui conosco.
Saúdo também aqueles e aquelas a quem são negados e usurpados os direitos de acessarem espaços de reflexão e deliberação acerca dos seus direitos, ainda que garantidos constitucionalmente. A essas pessoas sobre as quais falamos foi negado o acesso de estarem aqui discutindo num espaço de poder, é um dos três Poderes. Então, ao estarmos aqui, está tudo aqui, e a gente tem que sentir a presença dessas pessoas aqui (Palmas.), sob pena de ficarmos na retórica. E a gente vive um momento muito desafiante no país, neste momento, porque a retórica do racismo foi incorporada - a retórica -, e vai exigir de nós - negros, brancos, indígenas, seja quem for - uma radicalidade nessa postura, porque, ao se incorporar retoricamente, o sistema... Porque é isso, quem está no poder, o sistema não vai se deixar abater, ele incorpora e ressignifica para manter o poder, e por isso nós precisamos estar preparados, preparadas e "preparades". Essa é uma questão: somos negras, negros, indígenas, ciganas, ciganos, brancos, brancas, LGBTQIAP+ e tantas letras quantas se somarem, porque são expressões de vidas, vozes silenciadas. E vão aparecer. Estou dizendo LGBTQIAPN+, mas já tem outras letras que se somaram, e não são letras: são vidas, são vozes negadas. Pessoas com deficiências, somos tantas, tantos, "tantes", somos diversos, diversas, "diverses" e não aceitamos mais sermos desiguais em direitos.
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Mas eu vou me ater, neste momento... Até por experiência, eu também fiz parte do primeiro Governo Lula, quando se cria a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial e os desafios que vínhamos enfrentando desde então. Mas, já que tocamos na questão da formação, e eu sou totalmente favorável à educação como um ponto básico, porque muito do desconhecimento vem da não formação, e eu falo como pessoa que foi professora, por exemplo, na faculdade de Medicina. Dei aula no curso de Medicina. Então, eu sei de como essas questões se dão... Inclusive, na ocasião, lá, em Mato Grosso - e eu amo aquela cidade, a cidade e o estado -, eu fui uma professora que, num projeto de extensão, passou, de iniciação científica, a fazer com que os alunos começassem a se dedicar ao tema. Então, aqueles que participaram do projeto de iniciação científica tiveram a oportunidade de adensar o tema, porque isso não está presente na formação. Eu estou falando da Medicina, mas nos outros cursos da área de saúde também, como já foi aqui mencionado.
Só que tem um ponto, e eu vou focar neste momento na questão da formação mesmo, que é quando a gente fala da 10.639 e 11.645, porque a 11.645 já incorpora o tema, ela avança, porque incorpora os povos indígenas, mas, na realidade, não são essas duas que não estão sendo implementadas. Na realidade, a LDB não está sendo cumprida. É mais profundo. (Palmas.)
E, quando a gente não menciona que a imensa maioria das instituições de formação neste país não cumpre com a lei maior de educação neste país, é muito mais profundo, e isso, enquanto este espaço aqui do Senado... Porque, se a gente não foca no ponto... Porque quem não cumpre a lei... O que deve ser feito com quem não cumpre a lei?
Então, falta uma supervisão, um monitoramento e um "arrochamento", como dizem, e nós estamos na época do arrocha nas festas de São João... (Risos.)
É isso! Sob pena de nós mesmos nos atrapalharmos nesse processo. A LDB não está sendo cumprida neste país, em toda a extensão do país. Isso é sério, porque, em função do racismo, permite-se cumpri-la ou não cumpri-la. E quais são os papéis dos três Poderes nesse sentido?
Então, eu me sinto privilegiada de estar aqui, neste momento, debatendo, porque o Congresso tem um papel, inclusive, de acompanhar, com o Executivo, de monitorar, de supervisionar, de exigir, e tem a vontade política para fazê-lo.
Então, na realidade, quando nós estamos tratando desses temas, nós estamos tratando das questões de fundo deste país, de como este país foi formado, do quanto nós excluímos diversos grupos e povos.
Poucos de nós sabemos que existem, neste país, mais de 300 povos indígenas - povos! Falam-se mais de 270 línguas neste país. Isso não é parte do nosso processo de formação.
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Então, nós estamos falando de um país e estamos falando de "nucleozinhos". Nós não estamos falando deste Brasil intenso, imenso! Ou seja: a tarefa de fazer garantir os direitos das pessoas com doença falciforme é uma tarefa de grande monta, porque ela está inserida num contexto que reproduz e nega isto. Ela está inserida num contexto, tanto nacional como internacional, em que a lógica é dada pelo sistema financeiro e no pensamento único, através das diversas plataformas e redes de comunicação. Ou seja: temos que estar preparados e preparadas e "preparades".
A população negra... E quero fazer só um parêntese rápido em relação aos povos ciganos: eles estão no Brasil, porque degredados foram da Europa, de Portugal, desde os idos de 1500. Para nós, isso, e para o Sistema de Saúde, passa ao largo. Veja como o tema do racismo é profundo!
Eu costumo perguntar lá, para a gente fazer referência a Salvador, à Bahia, onde estão aquelas ciganas que ficam no Mercado Modelo. Onde é que elas moram? O que é que elas fazem? Como é que elas acessam ou não... Isso só para dizer da profundidade do que nós estamos debatendo e de que isso se trata de nos transformarmos, de uma maioria - porque lutamos para ser reconhecidos como maioria -, em força política.
Por quê? A população negra foi quem elegeu este Governo... (Palmas.) ... e este Congresso. E eu estou falando mais por conta de toda a questão do Lula e o contexto, a conjuntura. Foi o Nordeste que o elegeu, foi a população negra. (Palmas.)
Agora, isso precisa se traduzir em poder.
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA INÊS BARBOSA - Só que esta é uma luta, e não dá para discutir todos esses temas que a gente está discutindo sem discutir o tema do que é ser branco, o que isso implica da ideologia da supremacia racial branca. É isto.
Nós rodeamos os temas e não tocamos na sua radicalidade. É preciso romper com essa sociedade capitalista, com sua cultura, seus valores, que são excludentes por sua gênese, porque, no mais, nós vamos estar fazendo medidas que são importantes.
E avançamos. Eu quero, também, deixar o quanto nós avançamos, mas a gente só está aqui hoje, como estivemos em outras audiências, por conta da pressão política e de pessoas envolvidas com o tema, como a Joice bem levantou e fez referência às parceiras, companheiras lá, às médicas do Rio de Janeiro. É por isso que nós temos uma política, porque, do contrário, não teríamos. E a manutenção e ampliação...
Então, quando a gente está discutindo hidroxiureia, nós estamos discutindo uma questão muito para além da hidroxiureia. Nós estamos discutindo os laboratórios, nós estamos discutindo o que se paga... Tudo isso está em jogo.
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E finalizo... Apesar de - não vou me debruçar sobre isso, e o meu tempo também já se esgotou -, da... O quanto o SUS, nesse projeto neoliberal... Eu costumo dizer: ele está sendo comido pelas beiradas. Temos que nos aprofundar sobre a abertura do SUS ao capital estrangeiro, que está lá, parado, no Supremo, desde 2015. É a inconstitucionalidade, porque, ao falarmos sobre isso, sobre os princípios do SUS, sobre a territorialização, a promoção da saúde, como é que eu vou fazer isso numa gestão voltada para o lucro comercial?
Nós não estamos falando de direitos humanos. Nós estamos falando de contratos que dizem que vamos ter tantas consultas, tantos atendimentos. Como é que nós vamos fazer com que o SUS realmente vigore num contexto desse, com um sistema financeiro pautando a vida? E é um sistema, um projeto, fracassado, de alta concentração de recursos e aumento da pobreza, nacional e internacionalmente.
Então, é sobre barcos que afundam. Essa é uma geopolítica, isso implica em reparações, e, dentre essas reparações, vou usar o exemplo da tal coroação...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA INÊS BARBOSA - ... do Charles. O diamante que ele usa na coroa foi extraído sob sangue e dor da África do Sul. É disso que nós estamos falando.
Que bom que estamos juntas, juntos e juntes, dizendo que nós vamos barrar isso. Mas, para barrar isso, a gente precisa ter consciência de onde estamos e do que queremos.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
Meus cumprimentos, Dra. Maria Inês Barbosa, como ela se identificou, assistente social. Mas ela é mestre em política. Por isso que dá aula em universidade.
A SRA. MARIA INÊS BARBOSA - E Doutora em Saúde Pública.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E Doutora em Saúde Pública ainda. Então, ela tem muita história para contar e muito para apontar. Pode ver que a fala dela toda, se me permite, aponta também para a questão política.
A SRA. MARIA INÊS BARBOSA - Essencialmente.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Nós elegemos o Presidente Lula, correto? Nós elegemos o Congresso Nacional. Vocês estão percebendo as articulações políticas que o Presidente Lula tem feito para aprovar matérias aqui dentro. Então, nós temos que ter esse olhar, e eu concordo, para a geopolítica, mas, ao mesmo tempo, temos que ter Deputados, Senadores, Vereadores, Prefeitos, Governadores comprometidos por um mundo melhor para todos, negros, brancos, indígenas, enfim, tudo o que a senhora citou, e muito bem.
Então, a responsabilidade é muito grande, inclusive em cima de nós, que estamos mais na frente, para que o nosso povo, cada vez mais, entenda que não é só eleger o Presidente, que as outras instâncias são instâncias de poder. E aqui não passa!
Sabe quantos anos eu peleei com o Estatuto da Igualdade Racial?
A SRA. MARIA INÊS BARBOSA - Eu sei porque eu estava na Seppir, na época.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Lembra-se? Em que ano foi?
A SRA. MARIA INÊS BARBOSA - Na Seppir eu comecei em 2003.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Então, em 2003. Já faz o quê? Faz 20 anos. O Estatuto da Pessoa com Deficiência, 15 anos; o Estatuto do Idoso, 18 anos. Foi nesse período que começamos a travar o embate, para depois aprovar.
A Lei dos Autistas tem, no mínimo, dez anos.
E aqui, se eu fosse falar de tantas peleias... Não sou eu. Nós que travamos aqui dentro.
A política de cotas tem quantos e quantos anos? Começou lá com o Abdias! O grande debate aqui dentro começou com o Abdias.
Eu tenho, no Abdias, uma grande referência de luta e de bom combate.
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Eu estou somando, com a senhora, sobre as dificuldades que passam pelo mundo da política.
De imediato, passo a palavra para a Dra. Ana Paula Pinheiro Chagas Fernandes, pediatra, Professora Adjunta 3 do Departamento de Saúde da Criança e do Adolescente, da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais.
A SRA. ANA PAULA PINHEIRO CHAGAS FERNANDES (Para expor.) - Bom dia.
Eu queria cumprimentar a mesa: Dra. Maria Inês, Dra. Joice, Dra. Yone. A gente já se encontrou em outros momentos, não é?
Quero cumprimentar o Senador Paulo Paim e a plateia, agradecendo a oportunidade de estar aqui e dizer da minha alegria e do meu respeito pelo que está acontecendo aqui hoje.
Eu acho que é uma retomada, uma nova apropriação de um caminho que foi interrompido por um tempo, e eu senti falta da força que eu vejo aqui.
Acho que o aprendizado que vocês nos dão - e eu falo isso deste meu lugar de fala de médica, doutora, pesquisadora em doença falciforme.... O aprendizado que a gente tem com vocês a gente não encontra em nenhum banco de universidade, em nenhum livro, em nenhum artigo, em nada.
Eu venho aqui, hoje, e estava ouvindo vocês todos e refletindo se, realmente, não é a hora de a gente, no bom sentido, invadir os nossos espaços acadêmicos, as universidades, os cursos da área de saúde e da área de assistência social, com fóruns que levam para dentro da universidade a força e o lugar de fala que vocês têm, porque não adianta a gente tentar ensinar isso que eu aprendi aqui hoje. As pessoas, os estudantes merecem ter contato com isso, precisam ter contato com isso, é urgente que tenham. E é por isso que, vendo aqui representantes de vários estados, eu peço a vocês que reflitam sobre esse papel social também tão importante de buscar as universidades, para que isso seja colocado dentro da academia.
Bom, também queria dizer que eu procurei uma frase para terminar a apresentação - isso é comum, e depois eu achei que não, que a frase era, talvez, minha mesmo. E eu ouvi aqui, tantas vezes, a palavra sonho, sonhar...
Eu acho que alguém aí... Eu li, em alguma literatura, que, quando a gente sonha, sonha muito, sonha grande, pode ser que a realidade escute e providencie. Então, eu acho que começa com um sonho mesmo, e a gente vai trabalhar para que a realidade providencie.
Bom, a pauta minha hoje, aqui, vão ser alguns apontamentos sobre atendimento de urgências na doença falciforme.
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Eu vou começar - pode passar - dizendo que existe, sim, uma doença no sangue que causa uma série de problemas, mas existem pessoas envolvidas em tudo que se conversa sobre doença falciforme, e a gente já viu isso aqui hoje e em outros momentos. Cada pessoa tem a sua história. Então, a gente nunca pode deixar a doença tomar o papel principal dessa conversa. O papel principal dessa conversa são as pessoas.
Pode passar.
E aí, para começar a fala sobre urgências, eu extraí duas situações do meu trabalho de mestrado. Ele foi um trabalho qualitativo e quantitativo sobre mortalidade em doença falciforme. Ele já está um pouco antigo, mas, como a parte qualitativa foi entrevista às famílias que tinham perdido crianças com doença falciforme, e os relatos eram muito contundentes, eu achei que seria bom a gente começar por eles, para a gente entrar no tema do atendimento às urgências.
Então, nessa entrevista - aqui é um pedaço dela -, a mãe disse:
Mãe: ... no pronto socorro a gente chega, por exemplo, ele já vai direto pra consulta. Aí, a gente chega lá, aí eles passam a gente pra medir a febre. Mas demora quase duas, três horas pra ser atendido. Quando eu falo que ele tem anemia, aí já é mais, aí eles já correm com ele. Aí eles já correm, já dá um tratamento melhor pra ele, mas, até que eles entendam que o menino tá com anemia, que tem que ser tratado depressa, aí é demorado. Ah, o que eu tenho que reclamar mesmo é só do pronto-socorro, porque às vezes a gente não tem condições de pagar uma consulta, porque eu não tenho mesmo [...]. Aí, às vezes, chega lá, eles fazem um pouco caso com os filhos da gente, porque não é [o filho] deles né? Aí, o pouco caso ali é muito grande.
Essa foi a mãe de uma criança que faleceu aos oito meses de idade.
Pode passar mais um.
Este é o segundo relato. A mãe disse:
Mãe: Eu levei ela numa segunda-feira no pronto socorro. O médico lá não sabia...
Ana Paula: O pronto-socorro de onde?
Mãe: Daqui mesmo. O médico não sabia como resolver o assunto. Ele não conhecia a doença. Ele não sabia nem o que era anemia falciforme... Mas, aí, ela tinha que fazer transfusão de sangue, porque a rapidez da febre, da infecção, é rápido demais.
Essa é a mãe de uma criança que faleceu com 11 meses.
Então, a gente não compreende que uma doença que tem pelo menos quatro situações que justificam que ela seja o holofote de um problema de saúde pública... Ela tem incidência alta na população brasileira; ela tem prevalência na população afrodescendente; ela tem a possibilidade de um diagnóstico precoce por uma ação universal regulamentada pelo SUS, que é o teste do pezinho; ela tem uma mortalidade elevada, principalmente em crianças; ela tem morbidade alta em todas as faixas etárias; ela acomete uma população caracterizada por vulnerabilidades sociais; as pessoas com doença falciforme são quase que todas elas usuárias do SUS; e existe a necessidade de cuidados integrais e da participação de uma equipe multiprofissional no planejamento das ações.
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Então, se a gente tem ali pelo menos oito justificativas para que ela seja conhecida por todos, a gente precisa pensar muito bem no que está faltando, qual é o nosso problema e por que depois de quase 30 anos... A gente fez tanto material, o ministério fez, nós escrevemos e nos debruçamos, pesquisamos, tentamos entender, tentamos ouvir, ouvimos, fizemos eventos, e ainda estamos aqui tratando de uma questão de direitos, depois de quase 30 anos... Em 1998 a triagem, quase 30 anos, 25 anos a 30 anos da triagem.
Houve um trabalho que continuou, o meu, de mestrado, e eu trouxe só dois eslaides desse trabalho da Alessandra - pode passar -, que também estudou a mortalidade. Um deles é que o tempo decorrido entre o início dos sintomas e o atendimento médico, na ocasião do evento que motivou o óbito, entre crianças da triagem, de 2005 a 2012, em Minas Gerais, foi ali de cerca de 24 horas, em 70%. E o tempo decorrido entre o início dos sintomas e o óbito beirou ali 24 horas em 40%.
Então, se a gente sabe que a doença é rápida e que os óbitos acontecem em 24 horas - a maioria em até 24 horas - após o início dos sintomas, o pronto atendimento é crucial, é crucial! Está provado que ele é crucial e que é um ponto de atenção dessa linha de cuidado que merece uma atenção especial.
Próximo.
Aí as crianças. Nas entrevistas, 62% das famílias dizem que não foram sequer esclarecidas em relação àquilo que causou o óbito da criança. Mas por que morreu? Elas não se sentiram esclarecidas. Ninguém informou o que aconteceu.
Próximo.
Aí, quando a gente vai ver o percurso para atenção às urgências em doença falciforme que vai até o pronto atendimento, a gente pode pensar que seja simples. Uai, chegou no pronto atendimento... Mas não é tão simples assim. Se a pessoa sair da UBS, ela vai precisar de um contato que vai chamar uma ambulância, essa ambulância vai fazer o contato com o hospital e o hospital vai acionar a equipe médica. Olha quantos pontos que nós temos para uma coisa dar errado, demorar, atrasar, não é? Se saiu de casa, essa pessoa ligou para alguém, talvez um call center, se tiver, e falou: "O que eu faço? Meu filho está ali com febre e tal". A pessoa que atende o telefone, se for esse o caso, vai dizer: "Ou vai à pé, ou vai por vias próprias, ou vai de ambulância". Agora, a pessoa também pode sair de casa e ir por vias próprias até o hospital. Então, são muitas vias, são muitos pontos.
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Chegando ao hospital, a pessoa tem que explicar o que ela tem; o hospital, o recepcionista, quem está fazendo a classificação de risco tem que entender, compreender o que a pessoa está falando, entender o que é doença falciforme, classificar o risco da pessoa com doença falciforme pelo menos na classificação amarela. Se tiver doença falciforme mais sinal de alerta, ela será laranja ou vermelha e será encaminhada diretamente, imediatamente à sala de urgência. Isso tudo depende de tantos pontos de atenção que eu acho que só isso já é uma situação de cuidado nosso para que o atendimento de urgência seja mais eficaz.
Eu coloquei ali... Olhe para você ver: a gente tem prontuários, a gente tem prontuário eletrônico, a gente tem formulário, manual, cartaz, celular, ChatGPT, o escambau, certo? Ainda assim, as pessoas não estão sabendo o que é a doença falciforme no PA, não estão sabendo sobre a dor da doença falciforme. Os nossos prontuários, sistemas de prontuário eletrônico, gente, hoje, sinceramente... Eu não sei quantos médicos estão aqui, se atuam com prontuário eletrônico. Eu, nos meus três pontos de atenção, em Belo Horizonte - nos três: na Prefeitura, na Unimed e na faculdade -, atendo com sistema MV. Ele é um grande campeão de prontuários eletrônicos.
Poxa, o sistema MV tem 1 milhão de recursos para avisar o médio e avisar a recepção como são as bandeiras de que aquela pessoa está em uma situação especial.
(Soa a campainha.)
A SRA. ANA PAULA PINHEIRO CHAGAS FERNANDES - A gente clica em cima da bandeirinha, e aparece. Aparece pessoa com deficiência visual, pessoa com deficiência auditiva. Por que a gente não cria uma bandeirinha, poxa, se a gente tem um cadastro dos meninos da triagem? Eles têm o número do SUS; já cadastrem todos - todos. Em todo o percurso vai estar a sinalização: no posto de saúde vai estar, no agendamento, na regulação vai estar, no prontuário da urgência vai estar. Pode ser uma solução. Nós ainda não tentamos, mas isso é possível e é simples. Certo?
Aí, você fica pensando... O que acontece: as pessoas não estão sabendo sobre os eventos agudos ocasionados pela doença falciforme? Ou eles não estão sabendo sobre os sinais de alerta que definem um quadro mais urgente, ou será que é a classificação de risco, que não entende que a doença falciforme deve ser priorizada, que não compreende a dor, que não aplica os protocolos assistenciais, que não tem a informação de alerta no prontuário? O que é que está acontecendo? Será que é a equipe de urgência que não sabe o sinal de alerta, que trata a dor daquele jeito ali, "você não vê, mas eu sinto", não entende isso? Será que não sabe aplicar a escala de dor? Será que o Samu é demorado? Que os protocolos não são aplicados? Que a sala de urgência não é bem equipada? Qual é o mapeamento das unidades de urgência que atendem as pessoas com doença falciforme no SUS? E é interessante...
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Volta só um pouquinho, porque, no meio desse eslaide, eu pus um olho e um ouvido. Aí eu venho, por uma coincidência, trazer a mesma ideia da Dra. Teresa: as pessoas estão enxergando os outros? Elas se enxergam mutuamente? O olhar nesse momento é treinado para aquilo que se faz? As pessoas se escutam? Elas escutam a dor? Elas escutam a queixa? Elas escutam que aquele paciente tem anemia falciforme? Ou aquilo vira uma miscelânea no meio de um plantão caótico do PA, e é por isso que as coisas não acontecem?
Vamos lá, próximo.
Ou, por trás disso tudo que eu estou falando, tem uma base, que é o racismo institucional, estrutural? Ele, por si, sozinho, já determina um caos nesse atendimento de urgência às pessoas com doença falciforme.
A minha fala fecha aqui sem respostas, não tem resposta. Nós temos que procurar juntos - procurar juntos - o que está acontecendo nos PAs, nos hospitais em relação à atenção de urgência às pessoas com doença falciforme. Talvez seja a hora de a pesquisa agora se direcionar para isso, para responder. Como a pesquisa da Vanessa respondeu o que acontecia com as mulheres grávidas, agora nós estamos precisando saber aqui, no Brasil, o que acontece em relação à atenção às pessoas com doença falciforme num pronto atendimento.
Era isso que eu tinha para falar. Quero agradecer a vocês. Não tenho as respostas, mas a gente pelo menos pode ter o compromisso de procurar junto. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dra. Ana Paula Pinheiro Chagas Fernandes, Pediatra, Professora Adjunta 3 do Departamento de Saúde da Criança e do Adolescente da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais.
É isso. Os problemas são muitos, mas é a frase final: somente coletivamente, pensando juntos, é que podemos encontrar os caminhos, conversar com todos para governar para todos.
Meus amigos e minhas amigas, como diria um amigo meu nas assembleias que eu fazia quando era sindicalista, já são 10 para as 13h. Muitos já me disseram que têm o horário do almoço. Eu conversei aqui com a Dra. Joice, que é uma das articuladoras deste momento tão bonito para a história do Parlamento brasileiro, que eu só daria alguns informes, que eu tenho que dar, e ela faria o encerramento em nome das três mesas que formatamos.
Pode ser?
(Manifestação da plateia.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Já vi que está todo mundo com fome. Foi um "pode" bem rápido, hein? (Risos.)
Votação simbólica rapidamente.
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Eu queria só informar rapidamente aqui que, segunda-feira, temos nesta Comissão audiência pública sobre o racismo no futebol. Todos que puderem acompanhar... Claro que o caso do Vini trouxe à tona tudo isso. Já fizemos uma na Frente Parlamentar Mista Antirracismo, que eu coordeno no Senado e a Dandara coordena na Câmara.
Quarta-feira é sessão deliberativa.
Quinta-feira vai ser uma grande audiência pública, importantíssima. Vamos discutir aqui marco temporal, povos indígenas, para debatermos a questão do marco temporal, que aprovaram lá, e aqui não vai ser bem assim. Nós vamos resistir ao máximo, inclusive a audiência pública tem esse objetivo. Vocês sabem o que é, não é? Traz um prejuízo enorme para os povos indígenas. (Palmas.)
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E quilombolas, exatamente, indígenas e quilombolas.
Sexta-feira, teremos duas agendas aqui na Comissão de Direitos Humanos. A primeira, instruir o PL 1.944, de 2022, que altera a Lei 4.327, de 13 de abril de 2022, que dispõe sobre os requisitos mínimos de segurança para a fabricação, construção, instalação e funcionamento de obras, piscinas e similares, sobre a responsabilidade em caso de seu descumprimento, para dispor sobre a prevenção. Está morrendo muita gente em piscinas. No caso aqui é exatamente isso. É em piscinas, afogamento infantil. E teremos, em seguida, uma reunião da Frente Parlamentar Mista Antirracismo.
Sábado, eu vou preparar as audiências de segunda e o domingo eu vou tirar para almoçar. Para descontrair... (Risos.)
Pessoal, é importante lembrar só isso aqui - o último aviso que me lembraram -, que vai ser no dia 3 agora de julho, às 10h da manhã, aqui na CDH, o debate sobre a Lei 10.639; não o debate sobre a lei, mas como nos mobilizar para a grande campanha sobre o tema, com a participação já de órgãos, como de ministérios do Governo Lula.
Agora, então, a palavra final, o discurso de encerramento desta importante audiência pública, para a Dra. Joice Aragão de Jesus, Coordenadora de Sangue e Hemoderivados do Ministério da Saúde.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS (Para expor.) - É muito emocionante tudo o que foi construído: a parceria com a Fenafal, toda a iniciativa de Maria Zenó no sentido de promover, produzir este momento, com o apoio do Senador, desde a audiência com a hemofilia, que foi também muito emocionante, muito importante.
E eu já estou convidando para uma outra audiência, a da talassemia, tá, Senador?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vocês concordam?
Eu vou botar em votação já.
Vocês que concordam com essa audiência pública batam palmas - para ela, não para mim. (Palmas.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Então, pronto. Está amarrado. (Risos.)
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Então, foi um momento muito importante, porque o Brasil voltou. O Brasil voltou para ser da população que efetivamente precisa de um SUS funcionando, de um SUS dando atenção de qualidade, dando aos nossos aguerridos profissionais... Porque nós temos muitos profissionais que seguem protocolos do Ministério da Saúde, que apoiam a ciência, que tomaram vacinas e vacinaram seus familiares também.
A ciência tem trabalhado no sentido de descobertas, da promoção das inovações tecnológicas, para que a gente possa dar qualidade de vida principalmente às pessoas com patologias e que têm uma vida muito difícil, com as doenças crônicas, que precisam ser vistas sob o aspecto dos cuidados científicos, mas, sobretudo e acima de tudo, sob os aspectos sociais das pessoas com elas envolvidas, tanto os cuidadores como os tratadores.
Nós estamos num trabalho intenso, em parceria com as associações de pessoas com doença falciforme, como fizemos no passado, agora ampliado para as demais patologias existentes na Coordenação de Sangue, e com um papel muito importante, que é uma questão de segurança nacional, que é a segurança do sangue, da hemoterapia. A Hemorrede está sendo mobilizada. Estamos em reuniões com cada hemocentro, vamos partir para reuniões regulares para a gente fortalecer a Hemorrede brasileira, onde a segurança do sangue, os tratamentos hemoterápicos e as patologias são tratadas.
Este momento é muito importante. Nós estamos trabalhando com a possibilidade de altos recursos, via PAC inclusive, como já foi anunciado tanto pelo Secretário Helvécio Miranda como pela própria Ministra Nísia Trindade, em vários espaços. São recursos que estão sendo articulados para que a gente possa promover a Hemorrede com obras, reformas e equipamentos. Então, temos muito trabalho pela frente.
Agora, existe uma outra coisa que é muito mais importante: a Coordenação de Sangue recebe os usuários, a sociedade civil organizada, os profissionais, os gestores para o diálogo, para a conversa. Nós conversamos, recebemos. O meu celular, o celular da Coordenação de Sangue e o e-mail do sangue estão disponíveis para todos e todas que precisarem falar conosco. Nós não somos autoridades invisíveis; nós somos visíveis, nós somos responsáveis. Não estamos na Coordenação de Sangue por qualquer outro interesse que não seja, como profissional de carreira que fui do Ministério da saúde e da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o meu compromisso com a vida, o meu compromisso com o povo brasileiro, agora que estou aposentada, que não estou mais oficialmente trabalhando no SUS como trabalhei a minha vida inteira até quando me aposentei.
Foi neste século? Sim, foi neste século que eu me aposentei. (Risos.)
Então, gente, eu quero agradecer muito ao Senador Paim pela sua parceria, que não é de hoje, vem de longe, vem de lá da África, não é? A gente tem um pé lá...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Com certeza...
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - A gente tem um pé lá. A gente tem essa parceria, e é um trabalho para o qual eu, pessoalmente, conto com o apoio dele para estar conosco, para a gente encarar as necessidades que nós temos, muitas, principalmente no que diz respeito aos avanços e inovações tecnológicas, para que a gente possa, do lado do tratamento, do lado do cuidado, oferecer, dentro do SUS, atenção de qualidade.
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E a gente vai trabalhar muito para que a empatia, o amor, o respeito que muitos profissionais aqui demonstraram, Ana Paula, Vanessa, Teresa, Clarisse, tem mais alguém? Tem Júnia. Deixe-me ver...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Ana Paula já falei.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Falei, está aqui na frente. Todas essas pessoas e, pelo Brasil afora, muitos profissionais comprometidos com a vida.
Senador, muito grata por esse momento, que mexe muito emocionalmente com todos e todas que estão aqui. Ninguém está aqui à toa com as pessoas com doença falciforme, com quem nós estamos comprometidos.
Eu não sei quanto tempo eu tenho de vida ainda, porque, quando a gente chega a uma certa idade...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vida longa.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - Sim, mas, quando a gente chega a certa idade, os filhos, os netos, tudo, a gente tem que estar preparado para esse momento, não é mais quando eu tinha 20, 30, 40, 50. Eu não sei, mas, enquanto eu tiver energia e tiver condições, nós estaremos juntos e juntas. Como você também tem a minha idade, então... (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - A mesma idade.
A SRA. JOICE ARAGÃO DE JESUS - A mesma idade.
Quero agradecer a confiança que me foi depositada pela Ministra Nísia Trindade, pelo Secretário de Atenção Especializada à Saúde, Helvécio Miranda, de terem me convidado, me trazido para esse trabalho.
Espero que a gente vá se encontrar com frequência e que a gente possa trabalhar intensamente. Conto principalmente com as pessoas com doença falciforme nos seus espaços locais. O acesso é livre, a fala, as queixas, as reivindicações são livres para chegarem até nós. O Brasil voltou e, quando eu falo que o Brasil voltou, nós voltamos, porque nós somos povo brasileiro e gestores.
Muito obrigada a todos vocês que sempre cooperaram e estiveram juntos desde que eu vim para cá, em 2004. Eu agradeço muito o apoio e uma coisa muito importante é o respeito e a confiança. Eu espero que eu atenda e responda com toda a intensidade.
Muito obrigada a cada carinha que eu conheço aqui. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Calma que não terminou. Eu achei que ia terminar, mas não terminou. Só um minutinho. Já vou dar para você, mas eu vou dar um outro aviso que eu tenho que dar.
Pessoal, quando eu falei aqui das minhas emendas individuais que eu estou mandando para o povo quilombola, para o Rio Grande do Sul, já começaram ligando. É um recurso extra que veio do Governo e eu estou mandando para o povo quilombola.
Quanto àquele rodízio - estou falando para o meu estado, pessoal, vocês me dão um segundinho aqui - que eu tenho de mandar para os 497 municípios de dois em dois anos, todos continuarão contemplados. Esse é o recurso especial que veio e nós estamos mandando para os quilombolas. Então, qualquer município do Rio Grande que tenha comunidade quilombola, por favor, entre em contato com o seu Prefeito, porque vai via prefeitura.
E depois o secretário aqui me lembrou que eu falei aqui da semana que vem, mas não falei de amanhã. Ele disse: "Você não vai trabalhar amanhã?". Claro que vou. Então, amanhã temos audiência pública para discutir, com a participação do Governo, que já indicou os convidados da sua visão, a questão dos idosos aposentados do Brasil. Começa amanhã às 9h e vai ser uma agenda...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vamos falar de nós. (Risos.)
Por favor, doutora, a senhora que manda ali agora. Eu ia encerrar. Pode encerrar a senhora aqui, depois ela complementa.
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É um aviso para nós todos, inclusive para a senhora, pelo que eu sei.
A SRA. MARIA ZENÓ SOARES (Para expor.) - Finalizando, não vou agradecer ao Paim mais uma vez, porque eu vou estar sempre agradecendo, como a Yone falou, pela pessoa que você é, por tudo que você representa neste país tão sofrido, onde a população negra ainda se encontra em desvantagem em todos os quesitos que a gente não vai ficar aqui falando.
Continuo na guerra, continuo na luta, mas eu não poderia deixar de falar dessa mulher negra, baiana, virginiana, que eu amo muito. E pode passar o vídeo. (Palmas.)
Enquanto vai colocando o vídeo, gente, tem o seminário e a Carmen vai conduzir para o almoço. E nós vamos fazer uma foto todo mundo aqui na frente com o Paim.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Está encerrada a audiência pública de hoje. Amanhã tem mais e na semana que vem também. Vamos tirar uma foto coletiva.
Está encerrada a audiência de hoje.
(Iniciada às 9 horas e 01 minuto, a reunião é encerrada às 13 horas e 07 minutos.)