15/06/2023 - 17ª - Comissão de Meio Ambiente

Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 17ª Reunião da Comissão de Meio Ambiente da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura, que se realiza nesta data, 15 de junho de 2023.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública com o objetivo de debater e destacar o papel da mulher no enfrentamento à crise climática.
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A audiência é parte da programação do Junho Verde, do Senado Federal, em atenção ao Requerimento nº 41, de 2023, CMA, de minha autoria.
Convido para tomar lugar à mesa a Sra. Aline Sousa, Diretora da Central de Cooperativas de Materiais Recicláveis do DF e Entorno. (Pausa.)
Ela está a caminho, está chegando.
A Sra. Ana Toni, Secretária de Mudança do Clima, do Ministério do Meio Ambiente; a Sra. Samanta Pineda, advogada especialista em direito ambiental, Vice-Presidente do Ibrades e membro do Ubba.
Sejam bem-vindas.
A Sra. Vandana Shiva, filósofa, física, ecofeminista e ativista ambiental indiana.
Welcome. Nice to meet you, Miss Shiva.
E a Sra. Txai Suruí, líder indígena.
Informamos que foram ainda convidadas para essa reunião a Sra. Izabella Teixeira, ex-Ministra do Meio Ambiente e co-Presidente do International Resource Panel, da ONU, e a Sra. Mônica Sodré, CEO da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade. Por estarem em viagem, não puderam participar dessa sessão. Mas agradeço a atenção a toda nossa equipe aqui da Comissão de Meio Ambiente.
Esta reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania, na internet, no endereço senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800 0612211.
O relatório completo, com todas as apresentações e manifestações, estará disponível no portal, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos nossos expositores.
Na exposição inicial, cada convidada terá o uso da palavra por até 15 minutos e, ao fim das exposições, a palavra será concedida aos Parlamentares inscritos para fazerem suas perguntas ou comentários.
É com alegria e comprometimento que damos início a mais uma audiência pública do nosso Junho Verde, no Senado Federal, que este ano se integra à Virada Parlamentar Sustentável. As informações e a programação da virada podem ser acessadas no endereço eletrônico viradaparlamentar.org.br.
Hoje eu tenho a honra de conduzir essa audiência pública ao lado de mulheres que dedicam suas vidas em prol da vida humana, do desenvolvimento sustentável e da redução das desigualdades socioeconômicas no Brasil e no mundo.
Nós mulheres sabemos da importância de nos mantermos firmes e nos fazermos ouvir em um mundo onde historicamente a voz masculina é predominante. Sabemos da importância de nos mantermos em lugares de poder, da luta e do desenvolvimento da ciência, para que possamos garantir, para outras que virão.
Como primeira mulher a presidir esta Comissão de Meio Ambiente, não poderia deixar de promover um encontro como esse, do papel da mulher no enfrentamento ao cenário de emergência climática que enfrentamos. Lembro que está entre os objetivos para o desenvolvimento sustentável alcançarmos a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas.
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As mulheres desempenham um papel fundamental no enfrentamento à crise climática em várias frentes. Primeiramente, as mulheres são frequentemente as mais afetadas pelo impacto das mudanças climáticas. Em muitas comunidades, são elas que carregam o fardo das secas, inundações e desastres naturais, já que são as responsáveis pela segurança alimentar, pela água e pelo bem-estar de suas famílias.
Além disso, as mulheres têm um profundo conhecimento ecológico e estão intimamente ligadas às práticas sustentáveis. Elas têm sido guardiãs do meio ambiente, passando de geração em geração o conhecimento sobre o uso sustentável dos recursos naturais. É crucial valorizar esse conhecimento ancestral e incluí-lo nas estratégias de enfrentamento à crise climática.
As mulheres, historicamente, têm liderado pesquisas, empresas, grandes grupos e importantes decisões. No entanto, apesar de sua importância vital, as mulheres, muitas vezes, enfrentam desafios adicionais ao participar ativamente desses processos. Elas sofrem com a desigualdade de gênero, a falta de acesso a recursos, a discriminação e a exclusão dos espaços de tomada de decisão. Essas barreiras precisam ser superadas para que as mulheres possam contribuir plenamente para a solução da crise climática.
Devemos promover a igualdade de gênero e garantir o empoderamento das mulheres em todas as esferas da sociedade. E isso inclui a inclusão de mulheres em cargos de liderança política, a promoção de sua participação nas negociações climáticas internacionais e a criação de oportunidades econômicas que valorizem suas habilidades e conhecimentos.
Precisamos investir em educação e capacitação para que as mulheres tenham acesso às ferramentas necessárias para enfrentar os desafios da crise climática. Isso envolve a promoção de alfabetização ambiental, o desenvolvimento de habilidades em tecnologia limpa e a criação de programas de empreendedorismo sustentável voltados para as mulheres.
Ao fortalecer o papel das mulheres no enfrentamento à crise climática, estaremos construindo uma sociedade mais justa e resiliente. Estaremos promovendo um futuro sustentável onde todas as pessoas tenham oportunidades iguais de prosperar e contribuir para a proteção do nosso planeta.
Não posso deixar de citar aqui e homenagear a Mbeni Waré, fotógrafa e ativista de causas indígenas, filha de Ailton Krenak e da indigenista Rosa Costa, que nos deixou, na última segunda feira, aos precoces 38 anos.
Aqui as minhas condolências, não só as minhas, como Presidente desta Comissão, mas de todo o Senado Federal à família.
Também não posso deixar de citar o caso das crianças da etnia indígena uitoto, que sobreviveram ao trágico acidente aéreo na Colômbia. O conhecimento, a coragem e resiliência da menina Lesly Mucutuy, de apenas 13 anos, conduziu seus irmãos por 40 dias dentro da mata amazônica. A menina amazônida, indígena, com seus conhecimentos tradicionais, sobreviveu, assim como seus irmãos. Nós temos certeza de que não foi sorte. Nessas crianças há um conhecimento ancestral que lhes possibilitou a vida.
Somos muitas e diversas. Estamos em diferentes frentes, buscando espaços para sermos ouvidas, convocadas, e assim possamos seguir deliberando com a bagagem que só as mulheres têm, que é diferente, e não superior à bagagem do homem - nossas lutas, nossas pesquisas, nossa política, nossas famílias e tudo o mais que estiver em nosso caminho. Mais uma vez, eu agradeço o tempo e a disponibilidade de todas as mulheres que aqui estão presentes.
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Aproveito para anunciar que a TV Senado fará a transmissão em inglês desta audiência no YouTube e o link estará na nossa página da internet, já citada.
Eu vou passar a palavra agora para a nossa primeira expositora, a Sra. Vandana Shiva, que é Filósofa, Física, Ecofeminista e Ativista Ambiental indiana.
Welcome, miss Shiva! Nice to meet you.
A SRA. VANDANA SHIVA (Para expor. Por videoconferência. Tradução simultânea.) - Muito obrigada. Muito obrigada, Senadora Presidente da Comissão de Meio Ambiente.
Às irmãs e irmãos do Brasil que estão aqui, eu envio o meu amor para vocês.
As mulheres claramente são desproporcionalmente afetadas pela crise climática. E, já em 1992, a Cúpula da Terra já sabia que o problema era severo. E é por isso que o Brasil sediou (Falha no áudio.) ... facilitou os acordos legalmente, protegendo a biosfera do planeta na (Falha no áudio.) ... mantendo os direitos soberanos dos países e comunidades (Falha no áudio.) ... e, ao mesmo tempo, a Convenção da ONU sobre Mudanças Climáticas.
Lembro que foram os países (Falha no áudio.) ... objetivo de proteger boa parte (Falha no áudio.) ... de todos os desastres climáticos. E a minha região no sul da Ásia tem os piores (Falha no áudio.) Agora temos um que está chegando à costa oeste da Índia. Temos neve no Ártico e no Himalaia, mas a neve no Himalaia (Falha no áudio.) ... à medida que a mudança climática muda os ambientes, ela muda o derretimento dos (Falha no áudio.) E o clima está... Em 2013, nós perdemos 12 mil pessoas que sofreram com as enchentes. Os anos 2020 e 2021 foram muito difíceis, uma tragédia, por causa do derretimento das capas de gelo, que levou a outra enchente - a enchente levou 200 pessoas. Mas fizeram com que as mulheres se inspirassem para proteger as (Falha no áudio.) ... como foi no início dos anos 70, e foi aí que o movimento começou. E isso está desestabilizando as comunidades. Está sendo pedido a elas para se mudarem. Enquanto as mulheres também são afetadas, elas também têm o conhecimento, as respostas dos valores da cooperação, da solidariedade, do cuidado, do amor, que são as respostas para quando se mora, se vive em tempos de colapso. As mulheres nunca esqueceram o fato simples de que somos parte da terra. Não somos mestres, donas da terra e não podemos estragar e destruir nossos recursos e sistemas frágeis, como se a terra fosse inerte e um material bruto para ser extraído. Mas o mesmo pensamento pensa sobre as mulheres como objetos também: que podem ser manipuladas, que podem ser controladas e que podem
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(Falha no áudio.) ... e que são sujeitas às dificuldades econômicas e sociais, assim como, nas catástrofes ecológicas, as mulheres nunca esqueceram que a ganância não é a natureza humana, porque o nosso potencial é o do cuidado. Elas têm mostrado que a justiça do clima é a justiça social. O sistema patriarcal capitalista começou com a globalização. Eu me lembro do representante de comércio do Brasil durante as negociações do WTO, que disse: "Vocês, os países ricos, estão nos dando a escolha de perguntar a nós, as galinhas, com qual molho gostaríamos de ser comidos. Essa é a escolha que vocês estão dando. Vocês querem nos devorar e aos nossos ecossistemas". Esse apetite sem limites por recursos está concentrado na mão de 1%, e esse 1% está afetando a mudança climática. E agora, depois de 30 anos do Tratado do Clima, quando tudo isso deveria ter sido evitado, tudo isso vem do 1% mais rico do globo, porque para eles o que importa é o fluxo de finanças e de lucros. Eles não vêm a fragilidade dos ecossistemas, a vitalidade da Amazônia, que é o pulmão e o fígado do planeta. As pessoas têm habitado a Amazônia por milhares de anos. Eles têm estilos de vida que se adaptam aos limites desse ecossistema como também às possibilidades desse rico ecossistema. Eu já viajei pelo Brasil, porque o Brasil queria ficar livre dos GMOs, e isso começou a ser modificado, mas aí chegou a soja que era geneticamente modificada e foi legalizada. Eu percebi que a soja geneticamente modificada é chamada "a Maradona da soja", mas a agricultura não é um jogo de futebol, nem essa é a vida na Terra.
Eu estava lendo os dados. No ano de 2022 e 2023, o Brasil produziu 15 mil toneladas de soja, 21% a mais do que antes. As pessoas da Amazônia precisam dessa soja? As pessoas no Brasil comem essa soja? A maioria, 90%, é para exportação, para a ração animal. Isso levou a uma cadeia de crise climática, onde é importado também, porque, em vez de terem os animais livres, eles têm as fábricas agrícolas, e esse não é o tipo de economia que a Terra pode aguentar. As mulheres estão mostrando o caminho de como podemos criar melhores economias, que podem cultivar mais comida, que podem mitigar a crise climática e adaptar-se a ela. Eu acho que o legado da Cúpula do Clima em 2022 não poderia ser esquecido, e eu tenho certeza de que o Brasil vai honrá-lo e aprofundá-lo não apenas para o Brasil, mas para toda a humanidade. Um dos princípios principais que nós trabalhamos no Rio é que os poluidores precisam pagar. É muito claro: as emissões são poluição, e quem polui deve pagar. O que estamos testemunhando nesses 30 anos são novas formas de como o poluidor quer ser pago tanto por experimentos... Os cientistas africanos dizem que nós não somos um experimento no seu laboratório climático. Vocês não podem fazer experimentos conosco, com a nossa comida em laboratório. A comida é a moeda da vida, é o que nos conecta, é o nosso microbioma intestinal, é a nossa cultura. Não conseguimos enganar o nosso microbioma intestinal - trilhões de bactérias. Muitas das soluções que estão sendo oferecidas são soluções falsas para alimentar a máquina do dinheiro. E, em vez de escutar a Terra, escutar as mulheres que estão liderando o caminho, em vez de escutar tudo isso, estamos apenas escutando os lucros, para tentar dominar o que resta do nosso planeta. A biodiversidade da Terra está nas mãos dos indígenas, que são apenas 22% da terra que resta. Eu sei que há um grande conflito no Brasil. Eu voei por cima da Amazônia com a Marina Silva, que me mostrou as fazendas ilegais.
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Essa economia não é para as pessoas do Brasil, ela não é a economia feita pelas mulheres, é uma economia para o comércio exterior, que são os fundos de gestão financeiros que controlam as corporações. E eu sei que o Brasil tem a força para criar outra visão. As mulheres e os povos indígenas do Brasil, se juntando em solidariedade com movimentos ao redor do mundo, estão mostrando que nós temos outras epistemologias.
A ideia de uma Terra morta que pode ser usada infinitamente é da época de Descartes, de Francis Bacon, a ideia de que a Terra não está viva. A epistemologia de uma Terra viva vem das mulheres, e isso vai nos dar o futuro. Nós sabemos que a economia globalizada, que está permitindo que o mundo seja reduzido a poucas espécies de plantas e de animais, que reduz tudo isso a uma comorbidade, como a soja, isso não é uma economia. Economia quer dizer a arte de viver e nutrir a terra. E a terra não aguenta mais essa brutalidade. Economias locais nós as mulheres temos nutrido e temos aprofundado. Na Índia, em vez de intensificar os químicos, os pesticidas, nós temos intensificado a biodiversidade. E as nossas pesquisas têm mostrado que, ao intensificar a biodiversidade, você começa a regenerar o processo da terra que pode curar. Nossas pesquisas mostram que temos aumentado os fungos em 600% nas nossas fazendas ecológicas. Nós temos conseguido, por meio da agricultura orgânica, colocar muito mais nitrogênio e carbono na terra, enquanto que as fazendas que usam químicos têm perdido esses nutrientes. Nas leis da terra e no conhecimento das mulheres dessa terra temos as respostas. Novas pesquisas mostram que, quanto mais você intensifica a biodiversidade, mais fungos temos, mais micronutrientes temos, e isso segura mais de um terço das emissões. E isso já começa a mostrar a solução, esses solos ecológicos. Eu escrevi um livro sobre isso para a Cúpula de Copenhague, que foi destruído como um tratado legalmente vinculante. O meu livro mostrou que a civilização industrial colonial movida ao petróleo está na raiz do problema climático, e trabalhar com a biodiversidade é a solução climática. Nós esquecemos que a Terra está viva. Nós esquecemos que, ao longo dos 4 bilhões de anos, a Terra abaixou sua temperatura de 290 graus para 30 graus, ela diminuiu o dióxido de carbono de 98% para 0,03%. Esse é o poder com o qual estamos trabalhando, esse é o poder da força criativa, a força da regeneração. Ao intensificar... Primeiro proteger a biodiversidade, depois regenerar a biodiversidade e transformar isso na economia, mas mudar as nossas medidas: nós não medimos a quantidade dos plantios, nós medimos a saúde das comunidades, das plantas. E aí nós vemos que a renda das comunidades sobe em dez vezes quando não machucamos a terra. A disponibilidade de nutrição aumenta quando você não destrói a biodiversidade do solo.
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Essa é a mudança que as mulheres podem fazer. É uma mudança necessária para toda a humanidade. E tudo o que é preciso é parar a negação de que a Terra é viva, parar de negar que poucas pessoas são responsáveis por essa destruição e parar de negar que as mulheres são pessoas produtivas, inteligentes, cuidadosas, são mulheres que podem mostrar o caminho para nós para que nós sigamos outro caminho, para que possamos trabalhar pela justiça climática ao melhorar a equidade de gênero, ou vamos ter um futuro em que as mulheres lideram para que façamos as pazes com a terra ou não teremos nenhuma terra.
Quando eu falo isso hoje, eu enfatizo a importância disso e espero que o Senado considere que houve uma tentativa no Oriente Médio, numa Comissão lá, que se tornou uma questão de segurança militar. E eu falo: "Não, é uma questão ecológica, ambiental, precisamos achar soluções ambientais". A mudança climática não pode encontrar uma solução na militarização do planeta, porque isso mostra uma guerra contra o planeta, e as mulheres têm encontrado uma forma de fazer a paz com o planeta.
Eu fico feliz de partilhar um manifesto que nós escrevemos sobre como, das múltiplas crises que nós temos, que têm ficado com o Governo do patriarcado, as mulheres podem transformar a terra em uma terra para todos mais sustentável, mais igual, para que todos os seres e povos possam prosperar, para que todas as espécies possam prosperar e não permitamos a extinção de culturas diversas, que cuidam da terra. A extinção não é uma solução, a militarização não é uma solução. O cuidado, o amor e a regeneração são as soluções que estamos procurando e são formas de atender `as necessidades de todos enquanto cuidamos da terra. Podemos criar mais alimentos em todo o mundo, no Himalaia, no Brasil, em todo o mundo.
Os meus cumprimentos e amor a todos. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Quero agradecer as palavras da Dra. Vandana Shiva que, enfim, são inspiradoras, e toda a sua história. É uma honra para nós aqui do Senado e, em especial, desta Comissão e das nossas expositoras, tê-la aqui conosco nesta audiência pública.
Muito obrigada.
Eu vou passar a palavra para a próxima expositora, mas, primeiro, quero agradecer porque tivemos agora tanto a Aline quanto a Ana chegando. Nós sabemos que está difícil o trânsito, o acesso à Casa está bem cheio, então, quero agradecer a presença das duas também.
Eu vou passar a palavra, agora, para a Aline Sousa, da Central das Cooperativas de Trabalho de Materiais Recicláveis do Distrito Federal e Entorno (Centcoop/DF).
Seja bem-vinda.
A SRA. ALINE SOUSA (Para expor.) - Bom dia.
Agradeço a oportunidade de poder estar aqui participando desta plenária tão importante para a gente.
O meu nome é Aline Sousa, sou catadora de materiais recicláveis, dirijo, junto com parte da equipe que está aqui presente, a central das cooperativas de catadores, que realiza um belíssimo trabalho, um importante trabalho na Cidade Estrutural, no Complexo Integrado de Reciclagem, que representa 11 cooperativas e 400 catadores. A gente faz o tratamento de 40% dos resíduos gerados provenientes da coleta seletiva do Distrito Federal, a nossa central tem 21 organizações e nós temos mil catadores associados a essas organizações.
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Quero agradecer, Senadora, pela oportunidade de ter nos convidado para estar aqui. É um tema importante para a gente, enquanto cidadão, enquanto trabalhador, e quero parabenizá-la também pela iniciativa e cumprimentar toda a mesa e todas as companheiras aqui presentes.
A questão climática é um tema que, para muitos catadores, distancia-se da atividade que a gente exerce, mas a gente sabe que ele está tão próximo quanto o resultado que a gente tem com o nosso trabalho, que é o resultado final da economia circular. E, como catadora, a gente vê que a gente precisa ainda mudar um pouco o entendimento das pessoas, da sociedade, em relação ao resultado principal de toda essa atividade que é exercida em nosso Brasil com tanta força, garra e importância. Nada mais, somos um milhão de trabalhadores neste país, e 80% desse quantitativo são mulheres catadoras. Só na Centcoop nós temos 72% de mulheres no complexo e a reciclagem passa pelas mãos dessas mulheres.
Aqui a gente tem a Leide Laura, que é nossa Diretora Administrativa, catadora da Nova Superação; a Keisiane, que deu uma saída, mas é a nossa Diretora Social de Projetos lá da Central, catadora da Coopercap; e o Sinomar aqui, que é o nosso Diretor, catador, trabalhou no Lixão da Estrutural por 30 anos e é nosso Diretor de Comercialização, catador da Construir.
E aí a gente vê que a reciclagem passa pelas mãos das mulheres. Oitenta e dois milhões de resíduos foram gerados em nosso país só no ano passado, e grande parte desse percentual recuperado passou pelas mãos dessas mulheres, desses 80%. E a nossa preocupação é que a gente trabalha em contramão a muitos entendimentos da sociedade com relação a um tipo de economia que a gente fomenta, porque não dá mais para a gente aceitar que a economia linear, esse modelo de economia linear, seja aceitável e seja entendida como algo benéfico para as nossas gerações, porque não é. O nosso tipo de economia trabalha dentro dos parâmetros praticados dentro dos pactos nacionais e internacionais, que é a economia circular.
A gente precisa se preocupar com isso aqui, a gente precisa se preocupar com o uso do plástico único, então, não dá mais para a gente achar que isso aqui é irrisório, que isso aqui não tem comprometimento na vida humana, e a gente não trabalhar na contramão a isso. Então, o nosso trabalho, o da reciclagem, trabalha nesse viés, de a gente se preocupar com a mudança do comportamento social da sociedade com relação aos resíduos. Não dá para achar que há um processo de ineficiência com quase 3 mil lixões que a gente tem no país, que isso seja da ponta dos catadores, muito pelo contrário, se a gente ainda tem bilhões fomentados na economia da reciclagem é por conta do resultado do trabalho dessas guerreiras que pagam a conta na ponta para isso acontecer.
Hoje, no país, a gente está vivendo uma das piores crises na reciclagem para os catadores, que é a crise de importar resíduos de outros países, trazer para o país afetando todo o mercado de compra, fazendo com que os catadores não consigam ter o pão de cada dia através do trabalho. É inadmissível importar resíduos para o nosso país! E o que vai acontecer com os resíduos que estão sendo gerados aqui? Será que esses 82 milhões que foram gerados no ano passado ou neste ano vão duplicar porque está havendo mais resíduos de outros países e a reciclagem está sendo impactada dessa forma?
Então, a gente está hoje praticamente indo para o mapa da fome novamente porque no mercado, nem com o nosso trabalho, a gente está conseguindo sustentar por conta desse impacto. Essas são questões que impactam, que são temas da questão climática, porque, se não reciclam, para onde esses resíduos vão? Que são considerados pela Política Nacional de Resíduos como bens econômicos, para onde eles vão? Para o aterro. E vai se pagar para coletar, vai se pagar para quebrar todos os maquinários que a gente ainda tem nas cooperativas, sucateados pela qualidade do resíduo, e vai se pagar para aterrar. Então, a gente precisa mudar isso.
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Um dia desses, eu andei lendo em alguns lugares - porque agora, como estão dizendo que eu estou famosa, tenho que ler muito, não é? - que tem um grupo do instituto de pesquisa da ONU, o IPCC, um grupo de especialistas que tem metas ambiciosas para 2050. Eles fazem essas discussões em relação à questão da temperatura. E aí eles disseram que estão preocupados porque hoje a gente está em 1,09ºC de temperatura no planeta e que, se isso chegar a um 1,5ºC, será o fim de várias espécies da biodiversidade e que, se os países não trabalharem com metas não voluntárias, mas obrigatórias para gente trabalhar na mitigação e neutralização da emissão de CO2, será o nosso fim. E o nosso fim não é uma questão... Quando se fala em nosso fim, é futuro, mas o que é o futuro? Hoje não era o futuro de ontem? Então, a gente precisa trabalhar para ontem, para que amanhã as nossas futuras gerações tenham garantia de pelo menos ter vida - e trabalhar a pauta climática é vida.
Eu te parabenizo por trazer essa temática, porque é uma questão que precisa ser discutida, principalmente, neste Parlamento. A gente precisa trabalhar projetos de leis que atuem, que fomentem justamente essas metas ambiciosas de forma obrigatória. É mudar um sistema de coleta, é orientar a sociedade de forma contínua em todos os veículos de comunicação para que mais da metade desses 82 milhões de toneladas de resíduo não sejam de resíduo reciclável aterrado. É mudar o uso de produtos que são danosos à saúde pública e à saúde da nossa fauna e da nossa flora, como a questão de a gente comer microplástico.
Então, se a gente investe menos no saneamento básico, que também tem a pauta de resíduos, com certeza a gente vai gastar mais com saúde pública, porque questão de resíduo é questão de saúde pública. Se nós catadores sabemos disso, por que as autoridades não sabem disso? Por que é difícil compreender isso? Então, a gente precisa hoje trabalhar tudo isso que os especialistas estão dizendo, trabalhar com leis em que a gente consiga provocar essa obrigatoriedade de hábitos, de repensar o consumo.
Hoje a gente está vivendo também a era da nomenclatura "recuperação energética". A nossa Política Nacional de Resíduos traz o entendimento de recuperação energética para tratamento do passivo e não para tratamento do ativo, ou seja, trabalhar com recuperação energética, com a parcela reciclável. Ela traz toda uma hierarquia de erres que tem que ser feita antes. Infelizmente, há um entendimento - eu ainda não sou advogada, ainda vou me tornar porque quero voltar para a minha faculdade de Direito - que é muito errôneo relacionado ao que, de fato, é recuperação energética do nosso país.
Então, está se falando muito de resíduos, de CDRU, que é o combustível derivado de resíduos urbanos, mas, se a gente pensar, hoje a gente tem uma produção de plástico que entra lá na central e, de 1,3 mil toneladas/mês que entram, 30% de todo esse volume é plástico que não tem reciclabilidade ou tem baixa reciclabilidade por conta de um processo errôneo na origem, de design, que tem uma pigmentação, que tem um envelopamento que prejudica e inviabiliza o seu tratamento na indústria. Se a gente pensar em dar alternativa para esse plástico virar combustível, o que a gente vai estar fomentando? A gente vai estar fomentando mais ainda a continuidade da produção desses plásticos para eles serem queimados. Então, que tipo de sustentabilidade tem num processo desses? Claro que também há um processo de ganho com esse tratamento com relação aos processos de queima das sementeiras, porque vai estar se utilizando um plástico que é rejeito para fazer isso, mas a gente não pode achar que isso é a solução final. A gente precisa de ter alternativas. Esse plástico tem que ser pensado no seu início, no seu princípio, na sua fabricação, porque aí a gente fere a nossa logística reversa, inclusive. A nossa política é usada no país afora.
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Eu mesma viajei para vários países e levei a nossa Política Nacional de Resíduos Sólidos como um ganho, uma vitória para o nosso país, desde 2010, por mais que ainda a gente esteja engatinhando para o cumprimento dela com relação ao encerramento dos lixões. Ainda temos 2,7 mil lixões a serem fechados no país com a inclusão dos catadores, mas a gente ainda precisa também trabalhar o antes de fechar o lixão. A gente precisa mudar o comportamento das pessoas com relação à destinação dos resíduos. E aí é priorizar a coleta seletiva, é trabalhar a educação ambiental, é entrar com a educação ambiental relacionada a resíduos, que é comportamento, e trabalhar dentro dos espaços de educação, trabalhar nas escolas.
O nosso projeto hoje da Centcoop, a nossa prioridade, é entrar nas escolas, é entrar nas universidades, porque é lá que a gente vai tentar corrigir o pensamento de quem ainda vai gerar resíduos e vai tomar essa escolha, lá na frente, que são as nossas crianças, e elas vão corrigir a gente dentro de casa. Olha que constrangimento o nosso filho corrigir a gente dentro de casa: "Mamãe, você está destinando resíduo na lixeira errada". É aí onde a gente tem foco, a gente quer atuar aí. E a gente queria que isso entrasse como matéria curricular, porque hoje, nas escolas particulares, tem crianças que já aprendem sobre o que é sustentabilidade, mas, nas públicas, não se fala disso. Então, a gente precisa trazer isso para dentro das escolas, a gente precisa trazer isso para dentro das universidades, onde as pessoas podem mudar esse rumo dos resíduos, porque só a gente, 1 milhão de catadores, para muitos, não tem credibilidade para falar o que está certo e o que está errado. A gente não é doutores dentro de certificados da matéria curricular, mas a gente é doutor dentro do nosso trabalho que a gente exerce dentro das nossas cooperativas. A Lúcia é nossa catadora, trabalhou no lixão também. A senhora a conhece - a senhora visitou nosso complexo lá - e sabe que a Lúcia tem propriedade com o que fala.
Então, é isso.
Eu não quero me alongar, porque eu também quero ouvir todas as companheiras aqui da mesa, mas quero dizer que não dá mais para a gente não ter metas ambiciosas e obrigatórias relacionadas a resíduos.
Eu quero fechar porque eu estive, na semana passada, lá na Califórnia, com a missão do lixo zero, que eu acho que é uma meta que a gente precisa já começar a ter como norte, começar a atuar e trabalhar cidades lixo zero. Inclusive Brasília tem que entrar no grupo C40, a gente precisa entrar no Grupo C40. Já que é uma cidade tão planejada, então vamos trabalhar o planejamento também para os resíduos e entrar no C40.
Então, lá na Califórnia, eu pude ver um sistema de coleta que funciona, e a geração de resíduos lá é similar à nossa, de Brasília. Então, dá para mudar o sistema de coleta para corrigir todo um resultado final. E lá eu vi que eles fomentam a economia circular por meio das embalagens, eles precificam dentro da embalagem. Eu comprei uma garrafinha de água lá, e aí, lá no rótulo, estava escrito alguns países e as siglas. Quando a pessoa compra a embalagem no mercado, ela já paga, no valor embutido, US$0,05; em outros países, ela paga US$0,10. A pessoa pode ir a um ponto a que ela vai ser orientada, entregar aquela embalagem e receber de volta aqueles US$0,05 ou US$0,10, mas muitas pessoas não vão devolver essa embalagem. Para onde vão esses US$0,05 ou esses US$0,10? Vão para um fundo. E lá eles têm a CalRecycle, que é uma agência reguladora de resíduos que fomenta a economia circular, e ela que é responsável por toda essa gestão. E esse recurso, que são milhões captados por essas embalagens - e isso aqui também é rastreado, e uma coisa de que a gente precisa é rastrear os resíduos -, fomenta a economia circular, financia toda a economia circular na Califórnia. Por isso, eles alcançam 83% de eficiência no tratamento de todos os resíduos gerados pela população.
Então, eu acho que a gente tem caminhos a seguir. A gente tem experiências que nossos gestores municipais, de prefeituras, podem ser levados a visitar e verem que funcionam. A gente só precisa ter coragem para enfrentar, e mudar, e aceitar que a gente tem a solução nas nossas mãos e que não precisa trazer essas plantas faraônicas de países que não têm aterros para aterrar resíduos, que não têm catador para reciclar seus resíduos e têm uma planta que queima resíduos, porque é a solução que eles têm. Aqui a gente não aceita queimar resíduo porque é considerado como bem econômico e gera trabalho e renda para catadores. Muito obrigada.
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(Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Nós que agradecemos, Aline, a sua presença aqui, assim como todos os representantes da Centcoop, e mande o meu beijo para a Lúcia.
E queria dizer que é inspiradora a sua fala, mas, ao mesmo tempo, é um "puxão de orelha" para nós aqui, principalmente desta Casa, em que diariamente recebemos vários depoimentos, vários relatos, e nós sabemos o quanto nós estamos atrasados nessas iniciativas. Então, eu já estou saindo desta audiência com outro olhar, já pensando nos projetos que tem na Casa, porque realmente o que você falou é certo. Não é a questão do diploma. Para nós, vocês, os catadores, são importantíssimos, são importantíssimos e respeitamos, sim. Uma parte talvez não reconheça, mas certamente nós que estamos aqui e as futuras gerações, como você falou... Eu já levei muito "puxão de orelha" do meu filho, com torneira aberta, já não tem mais o copo de plástico, ele não aceita... Então, assim, existe, nas escolas particulares, como você falou, um processo de educação ambiental, a questão da sustentabilidade. Mas, na escola pública, nós temos o dever aqui de fazer esse debate, e nós o faremos, viu? Muito obrigada.
Eu vou passar a palavra agora para a Sra. Ana Toni, que é a Secretária de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente.
Seja muito bem-vinda, Ana.
A SRA. ANA TONI (Para expor.) - Muito obrigada, Senadora Leila Barros. É um prazer estar aqui. Quero parabenizá-la, não só por ser a primeira Presidente da Comissão de Meio Ambiente aqui do Senado, mas pelo trabalho incrível que você tem feito aqui nesta Comissão. Estive ontem aqui e a gente vem acompanhando muito, muito de perto.
Mas eu também quero agradecer muito pelo privilégio de estar nesta mesa com mulheres incríveis, com a Dra. Vandana Shiva, que foi uma das pessoas que me formou. Quando eu comecei ali, há muitos anos, antes da ECO 92, a Dra. Vandana Shiva e eu tivemos muita relação. Ela sempre fez parte de um grupo chamado Rede do Terceiro Mundo - Third World Network -, de que eu também fazia parte. E a gente vê esse mundo circular, como foi colocado; agora, por estar junto com a Dra. Vandana Shiva, uma mulher inspiradora, ter outras mulheres, como Leila, que foram inspiradoras, a gente aprende muito. E acho que é isto; mulheres no clima, mulheres na área ambiental tem um pouco essa característica de a gente estar sempre aprendendo uma com a outra, sempre trazendo umas com as outras - tentando, pelo menos - essa coisa de a gente poder perceber que nós sozinhas não vamos mudar nada, tem que ser nós juntas. E acho que tem uma certa solidariedade no que a gente chama desse ecofeminismo de trazer todas as mulheres juntas. Não só as mulheres brancas: as mulheres negras, as mulheres indígenas, as jovens, as idosas. Temos que estar todas juntas nesta toada.
Como eu disse, eu participei desde o Prepcom lá, desde a ECO 92. Foi um momento único para nós brasileiras e principalmente para nós mulheres. Tinha a aldeia das mulheres durante a ECO 92. Eu sei que muitas aqui não estavam nem vivas naquela época, mas foi um momento muito único, porque foi um momento em que pelo menos uma parte do movimento de mulheres, principalmente as mulheres brancas, naquele momento, e os grupos ambientalistas, se uniram e começaram cada vez mais a trabalhar juntos. Isso foi virado de ponta a cabeça com a demanda e a vinda das mulheres negras, dos movimentos das mulheres negras, quando a gente teve a capacidade de começar a aprender com elas outro olhar para o ambientalismo, que a gente não tinha. Acho que trazer os temas que foram colocados, de consumo, por exemplo, foi muito esse outro olhar que trouxeram as mulheres negras.
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Então essa relação de gênero, do feminismo, do ambientalismo, do racismo, da luta antirracista, esse caldo que permeia essa luta do clima, é muito importante para todos nós. Tenho honra, eu sempre trabalhei com a sociedade civil, hoje eu estou Secretária de Mudanças do Clima no Ministério da Ministra Marina Silva, que é a terceira vez, ela também, como mulher negra, já está a terceira vez como Ministra, traz o seu olhar. Tivemos a excelente performance da Ministra Izabella Teixeira, também com esse olhar. Infelizmente não é em todos os lugares. Eu vi recentemente que as mulheres, em termos de ocupação de ministérios de meio ambiente no mundo, estão ao redor de 30%. Então ainda somos minoria até como ministras de meio ambiente, secretárias de meio ambiente. Eu estava vendo dados da Abema, secretárias estaduais no Brasil estão ao redor de 40%. Imagino que nas secretarias municipais de meio ambiente...
Estou vendo a nossa querida Tainá de Paula aqui, Secretária de Meio Ambiente do Rio de Janeiro, aqui conosco, a quem já agradeço pela presença.
A gente começa a perceber que o tema meio ambiente, e também nas empresas, acho que o tema ASG, que a gente vem colocando, também é uma porta de entrada para muitas mulheres, que começam a entrar pela porta de meio ambiente. E não é à toa que nós mulheres estamos entrando assim nessas relações de poder, as Senadoras que aqui vejo também estão liderando a Comissão de Meio Ambiente, a gente percebe que não é só esse olhar que se traz para a sustentabilidade, mas também uma porta de entrada em que quase ainda é vista a área ambiental como uma área menor e, por isso, as mulheres têm assento e começam a ter poder nesta área, porque ainda é vista como uma área menor.
Também quero prestar muita homenagem a muitas servidoras públicas. Hoje, aqui no Governo Federal, como vocês sabem, o tema clima e meio ambiente é uma prioridade para o Presidente Lula, que vem falando desse tema, trazendo os catadores e as catadoras, os jovens também para esse embate do combate às mudanças do clima, desde sempre, mas a gente tem e percebe que em muitos outros ministérios, o tema clima está ao redor de 20 ministérios aqui na Esplanada, muitos deles têm secretaria ou coordenação geral, ou diretoria, e, por incrível que pareça, nesses outros ministérios quem ocupam esses cargos são mulheres: Tatiana Rosito na Fazenda, Cristina Reis também na Fazenda, Tatiana Prazeres no Mdic e muitas outras que não vou lembrar o nome agora, mas são mulheres que, apesar de estarem em outros ministérios, cuidando de outras pastas, trazem o mesmo olhar que nós. Eu acho que é essa a importância nessa colocação, deste olhar. A gente não precisa estar só sentada no tema ambiental, é o olhar que a gente traz para qualquer tema pelo qual a gente esteja responsável. Agora, eu acho que é muito importante que a gente perceba que o tema clima, para muitos, é visto como um tema de carbono, é o olhar de carbono para a sociedade, vamos tirar ou não o carbono. Quando a gente fala de transição energética ou de transição de agricultura é quase como se fosse simplesmente uma escolha tecnológica: vou tirar da tecnologia de combustíveis fósseis e passo para a tecnologia de renováveis ou saio de uma tecnologia de monocultura da agropecuária para uma mais de agroecologia. Para nós mulheres, quando a gente olha para o tema de mudanças do clima, a gente olha para uma transformação muito mais profunda do que uma escolha tecnológica. A escolha tecnológica existe, mas o que a gente está falando é de uma transformação talvez ecológica profunda, olhando para os temas de consumo, de valores, de modelo de desenvolvimento que a gente vai ter, que não é fácil, não são escolhas fáceis. A gente tem certeza, como mulheres, a gente sabe as escolhas difíceis porque a gente faz essas escolhas no nosso dia a dia, a gente faz dentro de casa, como tomadoras de decisão, a gente sabe que as escolhas são dificílimas.
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E a gente não deveria dourar essa pílula como fácil, porque construir esse novo modelo de desenvolvimento, essa transformação ecológica que a gente quer e sonha não é fácil, e não é fácil porque a gente nunca teve uma crise mundial, global como a que a gente está vivendo, a crise climática. Ela faz com que a gente repense os nossos modelos. A gente não tem modelos econômicos, estruturas sociais que nos baseiam. Eu acho que as mulheres, principalmente as mulheres indígenas, as mulheres quilombolas, as mulheres catadoras, estão nos ensinando é que a resposta não está só olhando para cima, ao contrário, as respostas já estão territorializadas, já estão no local. Esse talvez seja o olhar das mulheres para a questão ambiental e climática, que é sempre ligar o problema global a um problema local. É localizar as soluções na base. Para encontrar essas soluções, que não serão soluções mágicas, tecnológicas, que vão salvar o planeta, são as soluções sociais que a gente encontra na base.
É com esse olhar que a gente está lá na Secretaria de Mudanças do Clima, tentando agora, com a volta do Comitê Interministerial de Mudanças do Clima, de que todos os ministérios farão parte, a gente vai começar a redesenhar as metas brasileiras de mudança do clima em todos os setores, energia, transporte, agricultura. Vamos, através da liderança da Ministra Marina Silva, construir o Conselho Nacional de Segurança Climática, que, muito inspirado pelo Consea, falando de alimentos, que a Dra. Vandana Shiva trouxe, esse olhar do Consea Alimentos, a gente se inspirou na governança da segurança alimentar do Consea para pensar o Conselho Nacional de Segurança Climática, em que a gente vai olhar para soluções locais, com conferências municipais, estaduais e, aí sim, chegando ao federal, para trazer o tema clima de baixo para adiante. Acho que o tema clima no Brasil, no mundo, sempre veio, logicamente, de cima para baixo, porque a ciência nos mostra a necessidade de ser tratado globalmente e, agora, as soluções têm que vir de baixo para cima. Então a gente está construindo uma governança que vá dar oportunidade para o Brasil vir de baixo para cima. Só quero mencionar dois outros pontos aqui. Um é lembrar que a gente tem agora, no mundo, a oportunidade de, pela primeira vez, eleger uma mulher Presidente do IPCC, que foi mencionado aqui que é a instituição de pesquisa global sobre mudanças do clima, a nossa querida cientista Thelma Krug, que é Vice-Presidente já do IPCC, que reúne as melhores ciências de mudanças do clima. Ela está competindo para ser a Presidente do IPCC e seria uma honra imensa para o Brasil tê-la nessa posição. A eleição vai ocorrer agora, em julho, então a gente espera muito que a gente tenha mais uma mulher brasileira liderando a ciência do clima.
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Por fim, não poderia deixar de falar da COP 30, que vai se dar na Amazônia, em Belém, em 2025. Acho que vai ser um momento de inflexão importantíssimo no Brasil, servirá para a gente tentar mostrar outro olhar, soluções climáticas baseadas no local e dirigidas para o global. Já convido todos e todas, principalmente todas neste caso, para fazer parte também... Criamos também um comitê, e espero que aqui no Senado...
Foi criada na Câmara uma frente parlamentar de fortalecimento à COP 30. Não sei como é que o Senado vai se juntar a esse esforço, mas vai ter que ser um esforço da sociedade brasileira como um todo. Então já convido todas a fazerem parte desse nosso sonho de fazer a transformação ecológica de que precisamos, tendo as mulheres na liderança; não só as mulheres, mas o olhar feminino certamente na liderança dessa transformação.
Então agradeço muito e parabenizo a mesa.
Obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Nós é que agradecemos a sua presença, Ana, e por suas palavras, também pelo trabalho que vocês estão executando no Ministério do Meio Ambiente. A gente sabe das dificuldades orçamentárias, mas a gente percebe, digamos, o Governo como um todo entendendo a importância dessa pauta.
E nós estamos nessa luta aqui nesta Casa, não é, Ana Paula? Aproveito para agradecer à Senadora Ana Paula Lobato, que está aqui...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Gente, um pedido de desculpa. Eu falei para a assessoria agora... Gente, eu estive com ela num jantar ontem, eu tenho certeza... É que você é muito parecida com a Ana Paula!
Desculpa, tá? É papo de mulher!
Mas, assim, Augusta, perdão! Senadora Augusta, é um prazer tê-la aqui conosco. Você quer fazer uso da palavra?
A SRA. AUGUSTA BRITO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE. Fora do microfone.) - Rapidamente.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Sim, por favor, e agradeço mais uma vez, Ana - e dou um puxão de orelha na assessoria! (Risos.)
A SRA. AUGUSTA BRITO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE. Para interpelar.) - De forma rápida, peço desculpas porque atrasei, estava também acompanhando agora, lá no Plenário, a nossa Ministra da Saúde...
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF. Fora do microfone.) - A Nísia...
A SRA. AUGUSTA BRITO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Exatamente.
Ela fez uma grande menção à importância da vacinação, e eu, como enfermeira, tinha que estar lá.
Queria estar aqui antes, mas a ideia é muito mais parabenizar nossa Senadora Leila, que está presidindo esta Comissão, e hoje está fazendo um ótimo debate, um maravilhoso debate. Quando chego aqui e vejo mulheres aqui à frente, jovens, enfim, mulheres negras, a gente fica muito feliz em perceber que este espaço também pode ser usado por nós, e nós temos total legitimidade, como aqui também se mostrou por cada uma que falou da importância, realmente, de a mulher participar em todos os debates, inclusive na questão do meio ambiente, que tem tudo a ver com a saúde, que tem tudo a ver com a vida, na sua totalidade. Não é, simplesmente, uma questão de plantar uma árvore. A gente sabe muito bem que não é só isso, é muito mais.
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Eu fico feliz quando eu vejo que a juventude, diferente talvez de muitos anos atrás, hoje se preocupa muito em estar nesses debates, não só do meio ambiente, mas também, especialmente, de tudo o que diz respeito à preservação, envolvendo-se, realmente, com os grandes temas que influenciam a questão climática, no que a gente pode contribuir como mulheres, como jovens, como sociedade como um todo.
Então, parabenizo a nossa Senadora Leila por estar aqui tão bem representando, há mais tempo do que eu, que sou novata. Parabenizo todas as que aqui já falaram. Eu vejo aqui a nossa querida que acompanhou o nosso Presidente Lula, na subida... Eu vou pegar aqui o seu nome.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. AUGUSTA BRITO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Aline Sousa.
Que emoção, não é? Toda vez que eu vejo, eu fico emocionada de novo, por entender que a simbologia daquela entrada é muito mais do que ter uma mulher negra que veio e que está fazendo muito por nós, por toda a sociedade. É uma catadora que tem o maior orgulho disso. É muito mais do que isso, é abrir os espaços, é a representatividade real de que o povo está ali, de que a grande maioria está ali. Então, eu fico sempre muito feliz e que bom que, agora, nós temos o prazer de estar aqui para ouvi-la, com toda a sua experiência, e para aprender. A gente está sempre aprendendo.
Fui Deputada Estadual e a gente lá teve um projeto do Governo, na época, com o Governador... Aliás, com o atual Ministro, o Senador Camilo Santana, em relação a uma bolsa, o Auxílio Catador - eu era Líder do Governo, na época, e foi um dos maiores projetos que eu tive que defender, com o maior, eu diria, entusiasmo.
A gente foi conhecer várias associações e vê a importância que teve aquele projeto, não só pelo auxílio, mas pelo incentivo que deu, especialmente no interior do estado, para as associações se organizarem, para poderem também entender que aquilo ali, para além da renda extra, era a questão do meio ambiente que estava sendo construída, a preservação, com aquele trabalho maravilhoso. Então, eu fico muito feliz.
Quero aqui cumprimentar também, rapidamente, porque, infelizmente, eu tenho outra audiência agora, sobre a questão do novo - agora mudou -, não é mais arcabouço fiscal não, é o novo regime fiscal sustentável, não é? Daqui a pouco, a gente vai ter uma reunião sobre isso e eu também não posso faltar, mas eu queria aqui cumprimentar a Aline Sousa, de quem eu já falei; a Samanta, que foi virtualmente... Estou toda errada... Porque a Leila errou, aí eu não podia deixá-la errando só... (Risos.)
É só para equilibrar, não é, Leila? Eu não podia deixá-la errando só, aí eu também estou errando de propósito! (Risos.)
Brincadeira!
Mas a Ana também, que aqui está, uma outra Ana, a Ana Terra, que é jovem. Daqui deu para eu ler melhor. Mas, fora a brincadeira, é muito bom e muito importante a gente ter esses debates. Parabéns, de novo, à nossa Senadora Leila e a todas que aqui estão, porque, com certeza, contribuem e vão contribuir, ainda mais, para o nosso país continuar se desenvolvendo de uma forma menos desigual em relação à nossa participação em todos os setores.
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Então, parabenizo-as e peço desculpas, porque eu já vou ter que ir para essa outra reunião, mas aqui é bem assim, não é, Senadora? A gente tem que estar em todos os locais e a gente não consegue, mas parabenizo-as e digo que é muito importante esta audiência pública.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Augusta, nós que agradecemos a sua presença. Mais uma vez, peço desculpas pelo ato muito falho.
Eu acho que todos que estão aqui e que vivenciam muito esse dia a dia, na Casa, sabem das nossas demandas, principalmente terça, quarta e quinta, quando temos várias outras Comissões e reuniões, mas fique à vontade. Agradeço mesmo a sua participação aqui, como membro da nossa Bancada Feminina. Somos poucas, mas aguerridas, viu? Nós somos aqui leoas.
Obrigada!
Vou passar, agora, a palavra para a Samanta Pineda. É isso?
A SRA. SAMANTA PINEDA - Isso.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Advogada especialista em Direito Ambiental, Vice-Presidente do Ibrades e membro da Ubaa, seja muito bem-vinda.
A SRA. SAMANTA PINEDA (Para expor.) - Obrigada, Senadora Leila. Quero parabenizá-la pela coragem, porque Senador trata de todo tipo de projeto de lei, de saúde, educação, esporte, que seria a sua causa, mas o que a senhora tem feito, ouvindo as pessoas de todos os lados, de todas as vertentes, acho que, para todo mundo, para todos os legisladores, é um exemplo de como deve ser construído um projeto. Então, parabéns! Eu estou muito feliz.
Eu milito na área da advocacia ambiental há 22 anos e para mim é uma satisfação, porque a gente está vendo que, de fato, está entrando aqui um aprimoramento da legislação que a gente vê acontecer e que vai parar lá na ponta, não é, Aline? Vai parar lá na ponta. Então, primeiro, obrigada e parabéns!
Agradeço às minhas parceiras de mesa aqui. Ana Toni, obrigada e parabéns pelo trabalho que você tem feito.
Não ouvi ainda a Ana Terra, mas sua fama a precede, quero ouvi-la, porque parece que tem bastante coisa que que você tem para agregar.
Aline, gostaria de dizer que é muito gostoso ouvi-la, porque, no Senado Federal, a gente trazer o problema aqui, onde ele está, onde ele precisa ser resolvido, é muito eficiente. Então, estou muito feliz de estar aqui.
As instituições que eu estou representando são o Ibrades, o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável, e a Ubaa, a União Brasileira de Advocacia Ambiental, que reúne grandes nomes de advogados, porque, na verdade, nós que militamos o direito, onde a gente vê o problema? Na Ferrogrão, que está embargada por um problema ambiental; no Projeto Jari, que não leva irrigação para tantos pequenos produtores rurais, por conta de problemas ambientais legais; na questão da Política Nacional de Resíduos Sólidos, que, lá em 2010, disse assim: o município que não tiver seu plano de gerenciamento de resíduos não vai acessar recurso federal em quatro anos. Deu quatro anos, a partir de 2010, para os municípios se adequarem. Nós estamos em 2023 e isso ainda não aconteceu.
Então, a lei, muitas vezes, não corresponde àquilo que precisa chegar na ponta. A gente precisa da Ferrogrão! Quanta emissão de gases de efeito estufa nós temos pelos caminhões que transportam toda a nossa produção até os portos? Quanto a Ferrogrão ia diminuir de emissão de gases de efeito estufa, contribuindo para a questão climática e quanto a gente está discutindo, na minha opinião, sexo de anjo, porque vai passar em um canto de uma unidade de conservação e a discussão é se podia ter sido modificado por medida provisória ou não?
Então, a gente precisa começar a olhar os problemas com um pouco mais de realidade, para que a gente consiga olhar para a questão climática com essa realidade que a Aline trouxe para a gente.
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Eu sou também diretora do canal Agro+, que é um canal agro do Grupo Band, e, como advogada, eu resolvi aceitar esse desafio porque eu acho que a gente precisa comunicar também o que o nosso agro vem fazendo, a transformação que a gente vem tendo no nosso agro, de um agro que, muitas vezes, tinha uma escala industrial e tinha um jeito diferente de produzir para um agro que, além de ter áreas de preservação permanente, que são as únicas no país... Isto é superimportante a gente valorizar: o planeta todo não tem uma lei onde cada lugar ambientalmente relevante - como são as margens de rios, o entorno de nascentes, as encostas, os topos de morro, que são as nossas áreas de preservação permanente - é protegido. Nenhum outro país do planeta tem uma lei que exija do particular essa proteção, e nós temos. Isso é um motivo de orgulho para nós.
Além disso, nós temos as reservas legais, que são áreas obrigatoriamente conservadas dentro das propriedades rurais, que têm que atingir uma porcentagem de 20%, de 35%, se for no Cerrado da Amazônia, ou de 80%, se for na floresta da Amazônia, de conservação. Essa área não pode ser usada para produção. Mas a gente precisa também olhar, dentro da própria ONU, Secretária, e do IPCC o que a FAO nos diz. A FAO, que é a parte, o segmento da ONU para alimentos, diz que o Brasil vai ter que aumentar, pelo menos, em 40% a sua produção de alimentos para que o planeta não passe fome. E quando a gente fala de mudança climática e quando a gente fala bem-estar e de qualidade de vida, a gente não escolhe entre comer ou respirar; nós temos que fazer os dois.
Então, acho que o grande desafio é encontrar esse equilíbrio entre a produção, entre o desenvolvimento, a qualidade de vida das pessoas e a segurança alimentar, a segurança climática, o bem-estar do meio ambiente, o respeito a todas as formas de vida. Isso não é fácil, porque a gente tem que ficar equilibrando esses pratinhos.
Então, eu entendo que um olhar para o agro brasileiro de hoje em que 80%... E eu ouvi a Vandana Shiva falar "quem come soja", "exportam soja...", etc. Quando a gente olha para a produção do Brasil, nós temos 80% do nossos produtores pequenos e médios produtores rurais, e estes, aqui, de um jeito diferente, conseguem ser exportadores, porque eles estão, todos, ali associados em cooperativas, em associações, em sindicatos que facilitam a operação de exportação. Mas, quando a gente olha para a forma de produzir do Brasil, além de termos reservas legais e áreas de preservação permanente, onde se produz nós usamos hoje, estamos com uma alta alto uso, graças também ao Governo...
E eu quero homenagear aqui uma outra Senadora mulher, que é a Senadora Tereza Cristina, ex-Ministra da Agricultura, que fez muito pelo meio ambiente, porque fez convênios com órgãos para fomentar o uso de títulos verdes, para financiar o custeio da produção brasileira, que apostou fortemente em agricultura de baixo carbono, que conseguiu fazer com que o uso de bioinsumos fosse fomentado através do ministério, e nós hoje somos grande utilizadores de bioinsumos. Onde nós produzimos nós temos técnicas tropicais de produção, E vai ser muito bom ter uma brasileira no IPCC, porque as técnicas tropicais de produção de comida são mais sustentáveis do que as temperadas, por exemplo.
A regra vem da Europa e dos Estados Unidos, mas aqui a gente usa sistemas integrados de produção, lavoura-pecuária-floresta, nós usamos plantio direto, que não ara a terra e não expõe a terra a formas diferentes de emissões de gases de efeito estufa, contém ali a biodiversidade daquele solo, mantém o solo diferente do que se faz com terras aradas. No Brasil, nós temos duas ou três produções por ano, diferente de climas temperados, nos quais temos uma produção por ano e daí neva. Aqui não, aqui 300ha de produção de comida são, ao longo do ano, 600ha ou 900ha de produção de comida. Então, essa sustentabilidade precisa ser olhada, precisam ser corrigidos os sistemas que ainda não são tão sustentáveis.
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Temos, sim, pastagens degradadas, temos, sim, o enfrentamento de um grave problema brasileiro, que é o desmatamento ilegal. Isso é crime, precisa ser combatido como crime e precisa acabar! Isso não é um pleito só do Ministério do Meio Ambiente, isso é um pleito do próprio agro, que leva uma culpa que muitas vezes não é dele, porque 2% do que está lá é para expansão agrícola, mas o restante é tráfico de madeira, é tráfico de minério, é tráfico de animal silvestre. Isso precisa ser combatido!
Então, quando a gente olha o que a gente precisa fazer dentro do país, a gente precisa olhar com uma tropicalidade para que a nossa vocação, que é produzir, seja uma produção de alimento de fibra e de energia sustentáveis.
Quando a gente fala da parte de energia também, o que você citou aqui Aline, é um absurdo a gente queimar resíduo... queimar o que não é resíduo - não é? -, queimar recurso. Não se pode aceitar o que a China vem trazendo como solução de produção de gases de efeito estufa, que seja a queima de recurso que pode ser recurso que sustenta famílias. Essas soluções aqui no Brasil podem ser diferenciadas.
Então, a gente precisa olhar com realidade, e aqui falando da parte legislativa: não dá para romantizar a questão ambiental. É uma questão que provoca paixões, mas é uma questão que precisa ser olhada tecnicamente. Se nós não tivermos uma inteligência tributária que premie aquele que faz direito e que traga prejuízo, multa, qualquer prejudicialidade de fato, aplicando o princípio do poluidor pagador, daquele que faz errado, nós não vamos resolver o problema.
O mundo é capitalista, vamos enfrentar isso. É uma visão que precisa ser olhada com amor, com carinho, com aquela sensibilidade que a mulher tem, mas precisa ser olhada tecnicamente. Então, os smartax, os impostos inteligentes que premiam processos produtivos limpos, a questão da multa ao poluidor pagador. Não separou o resíduo? Tem que ter multa, não só para grandes geradores, mas para a população em geral.
Vamos fazer seis meses, um ano de educação ambiental e daqui para frente é multa. Foi assim que se começou a usar cinto de segurança, era para a própria segurança do passageiro, mas ninguém usava. Quando passou a ser matéria obrigatória e passou-se a multar aquele que não usava o cinto de segurança, a coisa pegou.
Nos municípios, a gente precisa olhar de novo sem romantismo, Aline, porque existe máfia de lixo em tudo que é município. Vamos tirar esse véu e vamos olhar que, de fato, as administrações municipais têm vantagens quando fazem o negócio do lixo, porque se ganha por tonelada, então, quanto mais for para o aterro, melhor. Essa política é nociva, tem que ser ao contrário, quanto menos for para o aterro, melhor. Primeiro se reduz - aqueles todos erres que você não quis dizer -, depois a gente reusa, depois a gente recicla, no final a gente vai mandar para o aterro.
E, ao contrário do que se pensa, Senadora, o grande vilão de emissão de gás de efeito estufa aqui no Brasil é parte do desmatamento ilegal, que precisa ser combatido, mas nós temos ainda uma obrigação humanitária de conversão de vegetação nativa naquilo que é possível para a produção de alimentos. Então, a gente precisa fazer esse equilíbrio. Mas o grande vilão aqui no Brasil é falta de saneamento e destinação inadequada de resíduos. Primeiro, falta de saneamento. Cem milhões de brasileiros não têm acesso a esgoto tratado. Problema de saúde pública é problema ambiental na veia, porque esse esgoto não tratado vai para o rio, que vai para o mar, que é o grande pulmão do planeta. Somos 70% água, 54% do oxigênio vêm dos oceanos, e nós não podemos aí colocar a culpa no lugar errado. Então, a gente precisa tratar da parte de saneamento e esgoto. E a segunda parte é de saneamento do que é resíduo. Quando a gente leva resíduos que não são adequados - e não resíduos, tecnicamente -, mas, quando a gente leva recurso econômico que poderia ser reciclável para o aterro, a gente agrava o problema climático.
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Então, a minha sugestão - e a fala da gente aqui para tratar de assunto que está há 20 anos aqui engasgado é pouco tempo - é: primeiro, nós precisamos aprimorar a legislação - e eu sei que está nesta Comissão a Política Nacional sobre Mudança do Clima. A nossa lei é de 2009, só o Acordo de Paris já é de 2015. Então, a gente está muito atrasado. Precisamos aprimorar a legislação da Política Nacional sobre Mudança do Clima e ter, finalmente, a nossa legislação de mercado de carbono e de emissão de gases de efeito estufa.
E não, Secretária Ana, querendo resumir a questão climática ao carbono, mas, se nós tivermos um mercado eficiente de carbono, a gente vai começar a agregar outros serviços ambientais: biodiversidade, água, solo, a questão social aliada a isso. O nosso carbono vai ser o mais caro do planeta, se tiver um rating, se tiver um ranqueamento mundial, porque ele tem uma qualidade muito diferente. Então, precisamos fazer uma legislação de carbono em que o Brasil tenha confiabilidade. Precisamos ter um cadastro geral aqui no Brasil dessa questão dos contratos de serviço ambientais, e isso precisa ter o crivo do poder público, para que a gente tenha a confiança do planeta em adquirir os créditos gerados aqui.
Os projetos têm que passar por uma questão que possa ser transparente, aferível, que esteja na rede mundial de internet para que todos possam acessar e dizer: "Não, esse projeto é mensurável, foi registrado, é verificável e pode ser adquirido aqui fora".
E, por fim, nós precisamos, para fazer chegar essa lei à ponta, da questão educacional. Não dá mais para a gente...
Vou citar aqui, por último, só para encerrar.
Existe um movimento que começou com mães indignadas, que se chama De Olho no Material Escolar, que foi um movimento que começou assim e hoje ele é um instituto que faz a verificação do material escolar das crianças. Em relação ao agro, foi encomendada para a FIA-USP uma pesquisa a respeito da veracidade e do fundamento científico das informações que estavam nesses livros didáticos. Senadora, 60% são inverídicos e negativos, e estão lá nos livros didáticos das nossas crianças, fora o que não está, que é a parte boa e que é a parte que pode transformar o comportamento dessas crianças em comportamentos exemplificativos e corretivos dos pais, com relação à separação de resíduo, com relação ao uso de água, com relação ao consumo de alimentos saudáveis e provindos de uma agricultura sustentável.
Então, a gente precisa fazer, além de instrumentos legislativos eficientes, com que as políticas públicas possam chegar à ponta. Qual a punição, que não foi aplicada ao município, desde 2010, de não ter o seu sistema nacional de tratamento de resíduos e o sistema municipal de tratamento de resíduos? A de não acessar recurso. É um mundo capitalista? Então, a gente vai funcionar cortando recursos de município que não tiver o tratamento.
E eu acho que, dessa forma, a gente consegue contribuir.
Agradeço, de novo, o espaço.
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Falo que 15 minutos, infelizmente, é sempre muito pouco, mas eu fico totalmente à disposição desta Casa para a Ubba e o Ibrades, que são o corpo técnico-jurídico de fornecimento de informações, poder ajudar no que for necessário.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Nós que agradecemos a presença, Samanta, e a fala também.
Eu vou passar rapidamente novamente para a Secretária Ana Toni, ela quer fazer um complemento de sua fala a respeito dos projetos. É isso, Secretária?
A SRA. ANA TONI (Para expor.) - Não, eu ia só comentar que você está absolutamente certa em termos do mercado de carbono. Todo mundo está sabendo, o Governo Federal já tem um texto muito baseado no que, aqui no Senado, se vem conversando sobre o mercado de carbono. Então, acho que estamos totalmente de acordo que a segurança jurídica, para a gente assegurar a integridade ambiental do mercado de carbono, é fundamental. Infelizmente, o vilão continua sendo o desmatamento; é o desmatamento. A gente, hoje em dia, tem uma pegada de carbono no Brasil, que é de 2,6 gigatoneladas. Dessas, 45% vem da mudança de uso da terra. Então, infelizmente, o nosso grande vilão é o desmatamento; e 26% vem da agricultura. Então, a gente ainda tem um trabalho grande da descarbonização e das outras partes aí, com uma coisa menor.
Mas acho que o mais importante, como você mencionou, Samanta, é a gente rever a Política Nacional sobre Mudança do Clima. Vai ser fundamental, e esperamos a liderança da Senadora Leila nesse processo. O Governo Federal agora começa a se debruçar sobre uma proposta da mudança dessa legislação, e vamos trabalhar muito, muito próximos aqui com o Senado para isso.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Por nada, Ana.
Quero agradecer mais uma vez, Samanta. Muito obrigada pela sua participação.
Vou passar agora a palavra para a Ana Terra Santana, que é do coletivo Jovens pelo Clima. Seja muito bem-vinda, Ana.
A SRA. ANA TERRA SANTANA (Para expor.) - Olá. Bom dia, gente. Eu sou a Ana Terra, do Jovens pelo Clima Brasília.
Gostaria de agradecer o convite de poder compartilhar com essas mulheres esta mesa e falar desta pauta tão importante que é a questão das mulheres no clima. Eu tenho 21 anos, sou estudante de Sociologia pela Universidade de Brasília e eu sou filha de dois ambientalistas, dois engenheiros florestais, que passaram a vida trabalhando com comunidades tradicionais do meio ambiente. Minha mãe, especialmente, trabalha há dez anos no sul da Bahia com uma comunidade quilombola que produz utensílios da fibra de piaçava, que é uma palmeira nativa, endêmica do Brasil, que não precisa ser morta para oferecer a fibra, que captura CO2 e garante a subsistência de várias famílias quilombolas.
Eu cresci ouvindo essas coisas, cresci nesses espaços, então eu não tenho uma grande história de virada da minha vida em que a pauta ambiental se torna o centro. Ela sempre esteve ali e sempre foi muito importante. Mas eu tenho muitas histórias de tomada de consciência, e a entrada no Jovens pelo Clima é uma dessas. Sete anos atrás, eu tive a oportunidade de fazer um estágio agrícola com a Fabiana Peneireiro, aqui de Brasília. Ela tem uma CSA no Altiplano Leste. As CSAs são comunidades que sustentam a agricultura, que é um movimento internacional - ele é mundial - da sociedade civil que procura estabelecer esse contato entre os agricultores e o consumidor de produtos orgânicos. Eu passei uma semana com a Fabi, e, com 14 anos de idade, eu comecei a perceber que era importante essa conexão com a terra. E, anos depois, durante a pandemia, foi cultivando alimentos na minha casa - eu moro em uma casa com quintal grande - que eu consegui estabelecer uma rotina saudável no meio das problemáticas que o isolamento trouxe para muitas pessoas, inclusive jovens.
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E durante a pandemia também eu conheci o Jovens pelo Clima e decidi me tornar militante. Eu entrei em 2021 e o que eu encontrei não era o que eu esperava nem imaginava. Eu acho que nunca pensei seriamente sobre o que é ser militante, sobre o que é construir um movimento social e, naquela época, eu só queria estar com pessoas que consideravam a crise climática algo tão importante quanto eu, queria estar com jovens e com pessoas que eu já conhecia e admirava. Eu queria ter oportunidade de ter essa experiência, mas não imaginava que seria tão transformadora e que acabaria sendo o centro da minha vida.
O Jovens pelo Clima é um movimento socioambiental da juventude construído por jovens entre 14 e 25 anos. Nós nascemos em 2019, como núcleo regional do Fridays, mas, para além de tudo isso, nós somos um coletivo de pessoas que sonham com e agem para a superação da crise climática numa perspectiva anticapitalista, em nome da justiça social e ambiental.
Para nós, a crise climática e ambiental é uma das crises do sistema, assim como a econômica, a política e a humanitária que vivemos hoje. Ao mesmo tempo em que entendemos que todas essas crises se relacionam e se influenciam, costumamos dizer que a pauta socioambiental é o nosso guarda-chuva, é o que as pessoas veem primeiro, é o que está por cima, mas embaixo existem outras causas sociais que nos são caras.
Não queremos e nem vamos discutir crise climática e meio ambiente sem fazer os recortes necessários e sem interseccionalidade. Raça, gênero, classe e nacionalidade são alguns recortes sociais imprescindíveis para qualquer atuação transformadora e revolucionária da realidade.
Nós gostamos de uma frase muito simples: as pessoas que menos contribuem para a crise climática são as que mais sofrem suas consequências. Existe uma profunda conexão entre as desigualdades sociais e os processos de degradação ambiental. Os efeitos dos desastres ambientais recaem principalmente sobre pessoas não brancas, os mais pobres, mulheres e crianças, agricultores familiares e assentados, atingindo de forma desproporcional a periferia e o território de povos tradicionais e indígenas.
Quando pensamos no recorte de gênero e na realidade das mulheres, é fato que toda a estrutura sexista e machista da nossa sociedade cria barreiras e as submetem a situações perversas. A vulnerabilidade das mulheres diante das consequências da crise climática e das injustiças ambientais é socialmente construída, seja por questões econômicas, culturais, de acesso à informação ou de insegurança constante.
As mulheres sofrem por não conseguirem assegurar o seu direito à terra. A maioria das famílias brasileiras é chefiada por mulheres, e muitas dessas famílias sofrem com a insegurança alimentar, com a falta de saneamento básico e água potável, com poluição, com doenças. Essas mulheres não podem desfrutar de uma cidade segura com o meio ambiente saudável, que seja acolhedora com seus filhos e com seu maternar. Essas mulheres se veem desamparadas em desastres naturais, essas mulheres não acessam espaços de poder e decisão para a construção de políticas públicas, pesquisas e investimentos que possam garantir seus direitos.
Por outro lado, mas de uma forma não tão antagônica assim, as mulheres são protagonistas na defesa pela vida. Diante de um momento crucial da humanidade, com a intensificação da crise climática, num momento chave em que podemos escolher tomar decisões para reverter essa crise ou sofrer suas duras consequências, são as mulheres as figuras importantes na construção de alternativas possíveis, são elas que lideram iniciativas sociais com novas perspectivas para as relações sociais. Falando da importância do trabalho e do cuidado e da reprodução social, elas reafirmam a importância que a natureza e os recursos naturais têm para a nossa sobrevivência. Elas são detentoras de conhecimentos tradicionais da floresta, conhecedoras da fauna e da flora, são chefes de família que cuidam da alimentação, bem-estar e saúde de comunidades inteiras, são mulheres que sentem, sofrem e ficam para transformar as suas realidades. Elas são a prova de que já existem alternativas, que as respostas para a crise são diversas.
É um dever e é uma responsabilidade pensar em um projeto de país pela perspectiva das mulheres. Eu sou uma mulher negra e jovem, sei que ocupar espaços não é tão simples assim. Sexismo e machismo me perseguem, estão por aí no meio político e no meio militante e também criam uma barreira pessoal, um sentimento constante de sofrer essas violências, com medo de não ser bem-vinda, de machucar e ainda assim ter que permanecer porque é o meu papel enquanto militante. Isso, misturado com outro discurso de que talvez eu seja nova demais para opinar em tal assunto, para construir alguma atividade, para pegar responsabilidades e fazer do meu jeito, e para debater as questões ambientais de maneira radical.
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O Jovens pelo Clima me deu oportunidade de estar e construir um espaço essencialmente diferente. Nós somos um movimento feminino, sem que essa nunca tenha sido uma intenção racional, apenas é o que é. Somos maioria dentro do movimento, organizamos atividades, escrevemos textos e manifestos, lemos e discutimos livros, criamos conteúdo para as redes sociais, somos presentes em mutirões, em assentamentos, em escolas e nas ruas. Nós fazemos questão de ter um movimento mais acolhedor, inclusive seguro. Somos jovens que não temos medo de errar, pois, para nós, importante é agir para transformar a realidade e superar o capitalismo. Somos mulheres radicais em movimentos jovens felizes, revoltados, sonhadores e comprometidos.
E, diante dos sacrifícios pessoais que cada militante faz quando entra em uma organização, diante das incertezas, das inseguranças futuras, da ansiedade de não saber como o mundo vai estar daqui a dez anos, eu sei que só continuo porque tenho essas mulheres incríveis comigo, que me apoiam, inspiram e realizam atividades. Elas são minhas amigas e minhas companheiras e sei que, de certa forma, sou apoio e inspiração também.
Por fim, não posso perder a oportunidade de estar nesta Casa, neste espaço, sem falar, por mim e pelo movimento, que nós precisamos nos unir pelas causas comuns ao povo brasileiro. Somos contra o marco temporal, que será votado pelo Senado como o PL 2.903. O marco temporal nega a presença indígena no território brasileiro, é inconstitucional e é um projeto de genocídio que transita na Casa do Povo.
É coletivamente, no compartilhamento de sonhos, que encontramos a força para lutar por vida digna e sem exploração de qualquer tipo. O que não serve ao povo, o que não serve à natureza, o que não serve à vida não serve para nada.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Recado bem dado, Ana Terra. Parabéns pela fala e muito obrigada por estar aqui conosco.
Temos que trazer mais os jovens para esta Casa, para ouvi-los.
Antes de finalizarmos a nossa audiência, que foi incrível, eu queria dizer que a Txai Suruí não conseguiu se conectar, infelizmente. Mas deixo a ela aqui o meu abraço, os meus agradecimentos pelas sucessivas tentativas de entrar na audiência, mas nós não conseguimos.
Quero agradecer mais uma vez as falas aqui.
Vou repassar rapidamente para a nossa Vereadora do Rio de Janeiro, Secretária Municipal de Meio Ambiente e Clima, que quer fazer uma breve intervenção aqui, a Tainá de Paula. Seja muito bem-vinda, Vereadora, Secretária.
A SRA. TAINÁ DE PAULA (Para expor.) - Obrigada, Senadora Leila.
É uma honra estar aqui a convite da nossa Secretária Ana Toni. Tão bom encontrar, reencontrar mulheres da pauta climática, da justiça ambiental, de longa, ou não tão longa data quanto a querida Ana Terra, essa jovem combativa, tão importante para o cenário nacional dessa discussão.
E falar do compromisso do Rio de Janeiro também com uma discussão neste novo momento de Brasil. É importante falar que o Brasil se reconecta com a discussão da justiça ambiental e climática, o Presidente Lula é um sujeito que se alinha e que, sem dúvida alguma, vai ser um aliado importante para a nossa discussão aqui hoje.
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Nós temos desafios de curto, médio e longo prazo, a gente já posicionou aqui o mercado de carbono, a pauta da logística reversa, que é algo central para o Rio de Janeiro, porque enterra, faz questão de enterrar, em outro município periférico, popular, o seu lixo de forma integral e negligencia o combate aos seus lixões clandestinos. Essa é a realidade das favelas e periferias da cidade do Rio de Janeiro.
Eu sou a primeira mulher negra Secretária de Meio Ambiente e Clima de favela e de periferia. Talvez eu seja retrato e extrato, como outras mulheres desta mesa, do sul global deste mundo que negligencia a nossa vida, nossa soberania energética, nossa soberania alimentar e os possíveis mundos que nós teimamos em construir como mulheres dessas cidades todas que combatem o racismo e a injustiça ambiental e, claro, constroem um novo devir, uma outra cosmovisão de mundo e um outro ser, como tão bem diz a nossa Ministra Marina Silva.
Obrigada mais uma vez, Senadora Leila.
Vida longa a essa Presidência. Que traga frutos, novas regulamentações na pauta ambiental e climática e, mais uma vez, obrigada pelo convite e pela audiência.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Nós que agradecemos. (Palmas.)
Digamos que estar aqui é um grande desafio para mim nesses próximos quatro anos, os dois, que estarei aqui.
Eu também tenho uma... Como história de vida, eu sempre fui a primeira: a primeira filha, a primeira neta, a primeira geração medalhista, a primeira Senadora e agora estou a primeira Presidente desta Comissão, que muito me honra, e tenho absoluta consciência do meu papel e da minha responsabilidade ao estar comandando esta Comissão. Mas é uma característica minha como, talvez, uma libriana, de que sou de ouvir a todos, e assim será aqui dentro desta Comissão.
Então, eu agradeço demais a participação de todos vocês.
Esta aqui é a Casa do Povo, e assim ela sempre será.
Dentro desta Comissão, nós não teremos restrição nenhuma de fala. Ouviremos a todos, porque é assim que a gente consegue construir um juízo comum, e os nossos trabalhos impactam menos, não serão perfeitos, mas serão, de alguma forma, atendidos, na medida do possível, naquilo que compreendemos enquanto legisladores - porque nós não somos perfeitos, não somos os donos da palavra - do que de fato seja o melhor, naquele momento, porque as leis se atualizam também para a sociedade.
Antes de finalizarmos, eu gostei muito da minha assessoria, porque eles me fizeram uma pergunta - as falas aqui foram tão inspiradoras, eu quero agradecer a todas vocês -, mas tem uma pergunta que eu vou fazer e deixo todas à vontade para responder e, então, finalizamos a nossa audiência, da qual já vou ficar com saudade. Já vou sair daqui com saudade.
Pergunto às nossas ilustres convidadas: que caminhos as senhoras identificam que devemos seguir, como sociedade, em todos os setores, para trazer todo esse olhar da mulher e, enfim, conseguirmos trocar, tratar, o cenário de emergência climática que vivemos, sobretudo considerando o papel do Poder Legislativo neste momento?
Deu para entender? Então, está bom.
Eu gostaria de saber se vocês, até finalizando a fala, podem entrar, também, um pouco nessa pergunta, eu agradeço.
Vou dar, para cada uma, três minutinhos, porque eu acho que é importante ouvi-las neste encerramento da audiência.
Obrigada.
Quem começa?
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - A "responsa", hein, Ana?
A SRA. ANA TERRA SANTANA (Para expor.) - É bom que elas falam e já vão esquecer minha fala, enfim, e vão acrescentando mais coisas.
Eu acredito que a gente, de fato, não tem mulheres em espaços de poder, mas as mulheres estão aí na sociedade construindo alternativas em todos os espaços.
O fato de o Poder Público não chegar a muitos lugares da sociedade, de fato, e de não estar nas casas dessas mulheres, a gente ter esse grupo marginalizado, como eu falei, a gente não tem acesso à cidade, mulheres do campo não têm acesso à terra, a gente sofre com a insegurança alimentar e a gente sofre com todas essas mazelas que fazem parte também da questão ambiental.
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Eu costumo dizer que o problema não está na natureza; o problema se expressa também na natureza, mas é um problema social, é um problema conjunto, que fala, sim, sobre o nosso sistema e sobre a forma como nós estamos nos organizando há muito tempo.
Então eu acredito que a gente precisa abrir espaço para que mulheres negras da periferia estejam aqui. A gente precisa fazer chegar lá também, não só exigir que as pessoas cheguem até aqui, porque não é tão simples chegar até aqui, não é?
Você falou da questão do trânsito, e eu já tive dificuldade de estacionar o carro, porque eu fui convidada, mas eu não tinha lugar para estacionar o carro no Senado, porque todos os lugares estão reservados para os Senadores, para quem trabalha aqui. Então a Casa é aberta ao povo, mas o povo não consegue chegar tão fácil assim.
Então, que a gente consiga chegar aos lugares, que a gente respeite também a soberania dos povos, das mulheres indígenas, dos povos indígenas.
Tem aqui uma pergunta, perguntaram qual o papel dos povos indígenas no enfrentamento da crise climática, e eles são responsáveis por proteger 80% da biodiversidade do mundo em seus territórios. Então pense: os povos indígenas, em quantitativo, não são um número tão grande no mundo inteiro, mas eles são responsáveis, só eles, por proteger 80% da biodiversidade. O que significa? Que nós falhamos enquanto sociedade e não conseguimos proteger o meio ambiente. E isso é um problema muito grave. E as mulheres são parte importante nesse processo, as mulheres indígenas.
Então eu acho que é como a gente consegue pensar uma forma de fazer com que o poder esteja em outros espaços, e não só centralizado na capital do Brasil ou neste lugar aqui, no Senado, na Câmara.
Obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Nós que agradecemos, Ana.
Vou passar agora para a Ana Toni, que é nossa Secretária de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente.
A SRA. ANA TONI (Para expor.) - Obrigada. De Ana para Ana.
Vamos lá. É uma pergunta muito boa, porque eu acho que a nossa habilidade, acho, Senadora Leila, que já está exercendo muito do que precisa. Então, pensando assim rapidamente, primeiro é o escutar. A gente nunca viveu uma crise, na humanidade, do tamanho da que a gente está vivendo agora. A crise climática é a mais complexa crise que a humanidade já enfrentou ou está enfrentando coletivamente.
E como eu disse, não vai ter respostas fáceis. A gente não consegue olhar só para o passado e ver como é que a gente fez no passado, como normalmente a ciência faz, não é? Ah, quais são os melhores sistemas de educação? A gente vai lá e estuda todos, do mundo inteiro, e daí tenta replicar. Não dá para fazer isso nas mudanças do clima, porque nunca teve um aquecimento global da maneira...
Carbono, até uma das perguntas, o que é a tal da crise global? A crise global é isso, carbono é bem-vindo num limite, para deixar o planeta na temperatura em que os humanos consigam viver. A gente está passando dessa temperatura. Então o que está em jogo não é o planeta. O planeta vai viver muito bem sem os humanos. Quando a gente luta no combate às mudanças climáticas, a gente está lutando pela humanidade. Nunca a gente teve que lutar pela humanidade desta maneira.
Então a primeira coisa é escuta, e acho que esta Casa, esta Comissão já está exercendo muito, com muita humildade de aprender.
Segundo, é olhar para as soluções locais, porque eu acho que isso é absolutamente fundamental, olhar para essas soluções locais. Olhar para a ciência, respeitar a ciência sempre. A ciência é esse direcionamento. Acreditar, sim.
Das perguntas aqui, a crise climática é reversível? Sim, ela é reversível. Nós, os humanos, já fizemos tantas coisas, a gente consegue ir à lua e não vai conseguir resolver os temas, a mudança. Lógico que vamos, mas a gente precisa querer.
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Para isso, acho que a coisa mais importante é a gente ter coragem e ousar. Só porque a gente nunca trouxe jovens para audiências públicas, só porque a gente nunca ousou mudar a nossa sociedade em termos de consumo... Vamos ousar, sem ousadia e sem coragem, acho que a gente não vai conseguir, porque não é olhando para o que a gente já fez, é olhando para o novo e, a partir desse local, com o conhecimento que a gente tem. Então, acho que é a ousadia. E tenho certeza que não vai faltar para a Senadora a ousadia que já demonstrou nesta Comissão.
Obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Mais uma vez, obrigada, Anas.
Vou passar agora a palavra para a Samanta Pineda.
A SRA. SAMANTA PINEDA (Para expor.) - Olha, resolver o problema... Aprendi muito hoje, quero agradecer às minhas companheiras de mesa porque, mesmo militando há 22 anos com a questão ambiental, a gente sempre aprende. Esse olhar novo é muito bacana.
Na minha opinião, eu acho que parte da solução é não romantizar questões que nos despertam paixão. Quem não é apaixonado por um tema como o tema ambiental? Mas se nós não olharmos com realidade para criarmos soluções e ferramentas que, de fato, vão fazer sentido, nós não vamos pelo altruísmo de países e de pessoas jurídicas. Pessoas jurídicas são empresas que nos sustentam, elas nascem para ter lucro. Então, se nós não tivermos um mecanismo de fazer com que isso seja o tripé mesmo da sustentabilidade, o ambiental, o social e o econômico conversando, a gente não vai conseguir.
É muito bonito defender, é muito bacana dizer que a gente quer defender o meio ambiente, mas se a nossa sustentabilidade não virar um valor agregado do nosso produto, um retorno que tenha uma vantagem econômica, isso não vai virar. Porque as pessoas, as empresas, os países não são altruístas. Eu participo das COPs, das conferências do clima, há alguns anos, e a gente percebe, desde lá de Copenhague, que os países mais poluentes - os maiores emissores são China, Estados Unidos, União Europeia e Índia - e desenvolvidos deveriam criar um fundo que deveria ter lá hoje US$200 bilhões. E não tem, não colocaram, ora é por causa da guerra da Ucrânia, ora é por causa da pandemia. Então, as questões econômicas precisam permear as soluções ambientais, senão nós não vamos chegar, isso é um ponto.
O segundo ponto. Eu vou aqui concordar com a secretária Ana e, de novo aqui, render minha homenagem a você, Aline. Se a gente não começar de baixo para cima, não funciona. Então, essas grandes soluções de COPs, que são grandes fundos e grandes coisas, se não criarmos soluções locais que sejam adequadas... E vou entrar na questão indígena, Ana Terra, permita-me, porque, muitas vezes, aquela comunidade indígena pode escolher não viver de coleta e de caça. Ela pode escolher plantar, colher, ter tecnologia, ter caminhonete, ter celular. Só que a gente precisa respeitar os povos originários na sua vontade, sem atingir a sua cultura, até se eles quiserem fazer coisas que parecem que para a gente não atingem aquele ideal de um indígena. Então, a gente tem que olhar para isso com humildade e construir, fazendo conversar o tal do ASG, o ambiental, o social e o econômico juntos, para que a solução seja efetiva.
Obrigada. (Palmas.)
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A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Passando a palavra agora para Aline Sousa.
A SRA. ALINE SOUSA (Para expor.) - Eu acredito - sem romantismo, mas para ser bem direta, porque, como a gente está na ponta, a gente sabe a resposta - que a crise somos nós mesmos. Acho que, para muito das crises, a gente se torna o grande vilão, o autor delas, porque elas estão baseadas em escolhas.
Se a gente falar de capital, o capital se alimenta em cima das escolhas da sociedade. Por exemplo, se eu não fosse catadora... vou dar só um exemplo para responder e tirar muitas dúvidas sobre escolhas. Por que eu bato sobre um novo comportamento social nas escolhas? Se eu não fosse catadora, eu tinha cometido um erro. Quando eu fui ao supermercado... porque como eu tenho poucos filhos - só sete. (Risos.)
Eu fui comprar leite e na prateleira tinha as embalagens do leite na garrafinha e na caixinha. Se eu não fosse catadora, e por questões econômicas, a garrafinha estava mais barata e eu ia levar a garrafinha e ia deixar a caixinha - que é a Tetra Pak -, mas como eu sou catadora e eu sei que aquela garrafinha de leite não tem reciclabilidade e eu prejudicaria todo o sistema da cadeia produtiva com a minha escolha de decidir comprar aquela garrafinha, eu a teria levado se eu não fosse catadora, como milhões de pessoas no país não têm essa informação e cometem sem querer esse erro.
Só foi gerada aquela embalagem de leite que não tem reciclabilidade porque a sociedade achou bonitinho, porque está dentro da garrafinha, e vai consumir e aumentar o consumo daquela embalagem, e vai levá-la. Então, as crises estão muito atreladas às escolhas e à falta de informações também. As informações precisam chegar na ponta. Eu vendo a fala aqui da Ana Terra - nossa! - eu me lembrei dos meus 21 anos, quando eu estava entrando na Centcoop, e ali toda ingênua, tentando entender todo um contexto que já estava no sangue da terceira geração. Meu pai, já falecido, era catador, e meu pai era falante, e eu sem entender nada. E eu vendo você aqui... eu voltei, e hoje estou com 33 anos, voltei à minha adolescência, quando eu estava querendo me intrometer no assunto, com tão pouca idade, como ela falou: "A credibilidade por conta da idade". Então, são escolhas, e eu fico feliz quando a gente já tem o entendimento da parcela da juventude, da população, que é a juventude, que está se posicionando. E tudo está baseado no posicionamento.
Aqui nós tivemos o entendimento jurídico da Dra. Samanta, colocando... da Secretária Nísia, de todas as ações que no âmbito do Executivo estão implementando, e o interesse do Legislativo, da nossa Senadora, de trazer a pauta. Então, é tudo baseado em escolhas e essas escolhas estão baseadas nos entendimentos sociais. Se hoje a gente tem uma crise climática, é porque está se escolhendo caminhar para o rumo dessa crise, porque lá não veio com crise. Quando a gente chegou aqui, não tinha crise. Alguém gerou essa crise. Então, a crise somos nós. E essa crise só vai ser sanada quando a gente tomar escolhas corretas. Isso está baseado no consumo, isso está baseado também no sistema econômico do nosso país. Vamos trabalhar no sentido de só pensar na lucratividade, no capital, e pensar que lá na frente o próprio capital que a gente escolheu é o que vai nos matar. Tirar nossas vidas e ameaçar as nossas vidas futuras dos nossos filhos.
E ainda deixo uma mensagem final: se a mudança para a questão dos resíduos, de separar ou não, de destinar no local correto ou não, não for por nós catadores que somos um milhão no nosso país, somos pais e mães de família, se não for pela sensibilidade de que vai gerar trabalho e renda, que seja pelos seus filhos, que seja pelos seus netos, que seja pelas suas futuras gerações.
Obrigada. (Palmas.)
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A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Mais uma vez, eu quero agradecer pela presença à Aline, Samanta, Ana Terra, Ana Toni, enfim, Dra. Vandana e à Txai Suruí, que não conseguiu entrar, mas, enfim, fica aqui o meu abraço, o meu beijo, o meu "até logo", porque nós teremos dois anos aí com muitos debates na Casa.
Antes de nós finalizarmos aqui os trabalhos, eu submeto à deliberação do plenário a dispensa da leitura e aprovação da ata da reunião anterior.
Então, as Sras. Senadoras e os Srs. Senadores que aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
A ata está aprovada e será publicada no Diário do Senado Federal.
Mais uma vez, quero agradecer pela presença de todos, dar o meu "até breve", agradecer também a quem nos acompanhou aqui na Comissão, que está sempre aqui, e também aos nossos internautas e a todos... Enfim, a todos que acompanham esta Comissão, os trabalhos da Comissão. Quero agradecer também à assessoria, dando um puxão de orelha depois...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - ... Senadora Augusta - calma gente, eu chego lá -, mas é isso.
Nada mais havendo a tratar, eu declaro errada a nossa sessão, a nossa audiência pública de hoje.
Um grande abraço a todos. (Palmas.)
(Iniciada às 9 horas e 15 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 01 minutos.)