22/06/2023 - 20ª - Comissão de Meio Ambiente

Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 20ª Reunião da Comissão de Meio Ambiente da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura, que se realiza nesta data, 22 de junho de 2023.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública com o objetivo de debater o ordenamento territorial do Distrito Federal e o impacto na produção e disponibilidade de água à população.
A audiência é parte da programação do Junho Verde do Senado Federal e busca destacar o trabalho do coletivo Grito das Águas do DF, em atenção ao Requerimento nº 39, de 2023, da CMA, de minha autoria.
Convido para tomar lugar à mesa os seguintes convidados: a Sra. Lúcia Mendes, do Fórum de Defesa das Águas do Distrito Federal; (Palmas.) a Sra. Alba Evangelista, ex-servidora aposentada da Secretaria de Estado da Agricultura, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (Seagri) e da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento do Distrito Federal (Adasa); (Palmas.) a Sra. Flavia Carneiro da Cunha Oliveira, Superintendente de Planos, Programas e Projetos da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - seja bem-vinda, Sra. Flavia! -; (Palmas.) e a Sra. Maria Silvia Rossi, ex-Coordenadora do Zoneamento Ecológico-Econômico do Distrito Federal.
Ela está a caminho. (Palmas.)
Participam remotamente a Sra. Liza Andrade, Professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de Brasília (UnB); e a Sra. Juliana Pinheiro Gomes, Superintendente Substituta de Recursos Hídricos.
Por favor. (Palmas.)
Informo também que foram convidados o Sr. Felipe Fritz, Procurador da República do Ministério Público Federal, que não pôde comparecer a esta audiência; e representante da Companhia Imobiliária de Brasília.
Antes de passar a palavra aos nossos convidados, eu comunico que esta reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados, por meio do Portal e-Cidadania, na internet, no endereço senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800 0612211.
O relatório completo, com todas as manifestações, estará disponível no portal, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos nossos expositores.
Na exposição inicial, cada convidado poderá fazer o uso da palavra por até 15 minutos, e, ao final das exposições, a palavra será concedida aos Parlamentares inscritos para fazerem suas perguntas ou comentários.
Mais uma vez, eu gostaria de agradecer-lhes a participação e por terem aceitado o nosso convite para fazermos um debate tão importante não só para o nosso Distrito Federal, mas para o nosso país.
Eu tenho um pequeno momento aqui de uma introdução, que eu gostaria muito de fazer, porque eu acho muito importante.
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Hoje eu me reúno diante de vocês para abordar uma questão de extrema importância que afeta não apenas o Distrito Federal, mas todo o nosso país: a preservação e a valorização do Cerrado como fonte vital de água.
O Cerrado é um verdadeiro tesouro natural, uma riqueza que se estende por mais de 2 milhões de quilômetros quadrados em nosso território brasileiro. É uma das maiores áreas de savana do mundo e abriga uma biodiversidade única, com uma grande variedade de espécies vegetais e animais. No entanto, a sua importância transcende os limites da biodiversidade biológica.
O Cerrado é um dos biomas mais ricos e diversificados do mundo. Com a sua vegetação característica e sua ampla biodiversidade, ele é conhecido como a caixa d'água do Brasil. A importância desse bioma para a produção de água é inquestionável. Suas nascentes e lençóis freáticos são fundamentais para o abastecimento de rios, represas e aquíferos, que, por sua vez, fornecem águas para o consumo humano, a agricultura e também a indústria.
No entanto, nos últimos anos, temos testemunhado um uso e ocupação desordenados do solo do Distrito Federal que comprometem seriamente a capacidade do Cerrado de cumprir sua função vital de produção de água. A urbanização acelerada, a expansão agrícola descontrolada e a exploração desenfreada dos recursos naturais têm levado a uma fragmentação e degradação do Cerrado, resultando na perda da sua capacidade de reter água doce, tão necessária para a nossa sociedade.
Em 1981, os autores de nossa Política Nacional de Meio Ambiente já previam a importância de garantir a ocupação ordenada dos nossos territórios considerando avaliações estratégicas e o zoneamento ecológico-econômico. Esses princípios têm fundamento e estão em nossa legislação para serem considerados e cumpridos.
Nesse contexto, é imprescindível que adotemos uma abordagem mais responsável em relação ao uso do solo e à ocupação não apenas no Distrito Federal, mas em todo o Cerrado e em todo o território brasileiro. Devemos buscar um equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a proteção ambiental, reconhecendo que a destruição do Cerrado é uma ameaça direta à nossa segurança hídrica e à qualidade de vida das futuras gerações.
Uma ótima audiência para todos nós, e, mais uma vez, obrigada a todos os presentes. (Palmas.)
Vou passar a palavra agora para a primeira expositora, que está no remoto e que parece que já tem uma agenda na sequência, já agradecendo por sua presença, à Professora Liza Andrade, Professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), da Universidade de Brasília, nossa querida UnB.
Seja bem-vinda, Profa. Liza!
A SRA. LIZA ANDRADE (Para expor. Por videoconferência.) - Olá!
Agradeço muito, Senadora Leila Barros, agradeço também ao Movimento Grito das Águas, ao Fórum das Águas, do DF, em nome da Lúcia, e cumprimento todos aí da mesa.
Eu vou compartilhar uma apresentação.
Eu vou direto ao assunto. Foi muito boa a introdução da Senadora sobre a questão do Cerrado e a preocupação que a gente tem no Distrito Federal, sobre a situação em relação à urbanização.
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Eu estudo sobre cidades sensíveis à água já tem quase 20 anos, enfim, e nossa preocupação... Nós temos um observatório, o Brasília Sensível à Água, e aqui também os doutorandos Diogo e Natália, e a gente tem trabalhado diretamente com os movimentos sociais muito preocupados em cima dessa situação do Cerrado, como bem colocou a Senadora. Então, nós estamos com uma situação de 60% de desmatamento já no Distrito Federal ou mais, e a gente tem essa preocupação.
O que é o ciclo da água? Então, seria a atmosfera, a vegetação e o solo. Então, na medida em que a gente vai ocupando esse solo vai interrompendo esse ciclo da água. E aí nós temos aqui toda a situação da ocupação urbana do Distrito Federal, a evolução, o desmatamento pela urbanização e também pelo agronegócio, pela monocultura.
E, por outro lado, nós, temos, como bem colocado, o berço das águas, a caixa d'água do Brasil, as Águas Emendadas. A questão das três grandes bacias, que estão inseridas aqui, no Distrito Federal. E nós temos um alerta quanto às mudanças climáticas, porque nós estamos em uma região, em que, segundo o IPCC, estamos em alerta. Nós vamos ter períodos de muita seca e também de chuvas torrenciais.
Então, a retirada da vegetação do Cerrado, que é uma floresta invertida, que precisa ser mantida para infiltrar, e considerar as águas subterrâneas, porque nós temos a questão de estreitamento dos rios, com poucas águas superficiais, e temos mais águas subterrâneas. Então, isso é muito importante.
Nós temos aqui as bacias, no Distrito Federal e as ocupações irregulares. A gente vem estudando as injustiças hídricas e ambientais. Essas ocupações ocorrem porque não são contempladas com planejamento habitacional adequado. Então, a gente precisa também ter esse movimento de moradias adequadas em todas as áreas do Distrito Federal, para que essas pessoas não precisem ocupar essas áreas. Então, isso está diretamente ligado a esse planejamento.
Aqui, é a Bacia do Rio Descoberto, de onde nós temos 60% do abastecimento do Distrito Federal, onde a gente tem o maior número de ocupações, a gente detectou 165 ocupações. Então, é preciso fazer um planejamento também, ter esse acesso à água, o direito à água, ao saneamento. Nós tivemos a Conferência da ONU neste ano em defesa dessas populações, e elas precisam ser incluídas com moradia nessas áreas, porque senão a gente tem também a possibilidade de ocupações que não tem grandes taxas de infiltração. Então, aqui é um cenário que nós temos aqui no Distrito Federal de variações de tipos de ocupações que interferem no ciclo da água. Nós temos as áreas de população mais rica com maior absorção de água por ter mais áreas verdes, mas que também tem alto consumo de água. O Lago Sul chega a 600 litros/habitante/dia - com a crise hídrica, a gente conseguiu baixar isso para 400. Mas, por outro lado, a Candangolândia, que tem uma taxa de permeabilidade muito menor, tem um consumo de água muito menor. Então, há essa relação que tem que ser considerada nessas questões do projeto urbanístico.
E aqui, pelo Zoneamento Ecológico Econômico, nós temos regiões de combate à grilagem. Então, é preocupante porque são áreas de mananciais, são áreas de proteção de mananciais. Então, temos empreendimentos sobre nascentes do Ribeirão Sobradinho; a situação do Rio Melchior, que já está na classe de enquadramento 4, quase que um esgoto a céu aberto. Então, nós temos também preocupação com as áreas próximas e a monocultura próxima às Águas Emendadas. A região da Serrinha do Paranoá, do Movimento Preserva Serrinha - que vem cuidando dessas águas há mais de 20 ou 30 anos -, é uma área muito estratégica para o Distrito Federal. Temos aí um projeto de expansão urbana muito, muito complicado. A questão da ponte, que está sendo direcionada, pensada para essa região... Então, nós temos que preservar essas áreas, caso contrário nós teremos um problema sério na região do Lago Norte, pode secar esse braço do Lago Norte.
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Aqui, a comunidade que preserva essas águas mapeou mais de 120 nascentes. É região de abastecimento da Caesb que precisa ser cuidada. Então, nesses termos das bacias hidrográficas, a gente tem essa região da Bacia do Lago Paranoá, e essa previsão de expansão urbana é muito, muito preocupante. Então, as áreas mananciais.
A região da Serrinha precisa ser preservada. Os núcleos rurais são o que preservam essa região. Se isso for parcelado, se for regularizado de forma urbana, vai complicar. Tem que ser regularizado na questão rural, manter os núcleos rurais, porque eles é que estão preservando essas águas. É muito fácil de perceber aqui, olhem: aqui está o braço do Lago Norte, se essas áreas forem parceladas com expansão urbana, a gente terá sérios problemas.
Aqui eu vou mostrar um pouco do panorama da questão do Ribeirão Sobradinho. Tem o movimento SOS Ribeirão Sobradinho. São regiões onde a ocupação urbana já está realmente deixando essas águas bem poluídas. Então, o Ribeirão Sobradinho sofre. A questão do Rio Melchior - já tem um movimento também para preservação -: recebe 40% dos esgotos do Distrito Federal; foi tema de debate na Câmara Legislativa do DF. Então, é uma região que também precisa ser muito cuidada.
Aqui, a região do Sol Nascente, que foi considerada a maior favela do Brasil. Se vocês observarem aqui, a questão da infiltração de água é muito complicada. A tendência é secar os córregos, se a gente não trabalhar com soluções baseadas na natureza. As obras de drenagem não são adequadas nessa região; com as chuvas fortes, teve problemas aqui de desmoronamento dessas bacias, a população está correndo risco.
Então, nós temos um movimento no Distrito Federal, o Grito das Águas, o Fórum permanente de Defesa das Águas, que deveriam ser, como se diz, premiados e certificados como Guardiões das Águas do Distrito Federal. A gente faz um apelo à Senadora nesse sentido. A gente trabalha com a visão das cidades sensíveis à água, porque a gente precisa trabalhar a água potável, as águas servidas, as águas de chuva e as comunidades sensíveis à água. A forma urbana também é muito importante a gente trabalhar, tanto no planejamento como no projeto urbanístico, junto com a comunidade.
Então, a gente vem trabalhando com a Serrinha do Paranoá já tem 14 anos, tem muitos estudos da Universidade de Brasília. A gente conseguiu mostrar que, além dessa comunidade que vem como guardiã, a gente, associado à Universidade de Brasília, vem mostrando formas de ocupações mais adequadas, que podem retornar o ciclo da água. Então, qualquer empreendimento que for feito tem que ser com muito cuidado e muito sensível à água. Então, aqui, homenagem à Serrinha do Paranoá, a todos esses anos de dedicação desses movimentos ambientalistas, das ONGs, nas audiências públicas. E, junto com a Universidade de Brasília, a gente vem enfrentando as audiências públicas desde a escassez hídrica de 2017, junto ao Ministério Público do Distrito Federal. O Fama, a gente sediou o Fama (Fórum Alternativo Mundial da Água). Então, a gente tem conseguido levar documentos que permitam que o Ministério Público possa embargar esses empreendimentos, tirar a licença de instalação nos trechos, principalmente o Trecho 2, que agora está sendo visado pela Terracap.
Então, a gente faz esse alerta. Temos aí o livro disponível, na página da Universidade de Brasília - Serrinha do Paranoá sensível à água -, e deixamos aqui um apelo. A gente está muito preocupada com o que possa vir a acontecer em Brasília. Muito obrigada. Desculpa eu ter que falar rápido e sair correndo, porque eu tenho um evento internacional agora me esperando. Muito obrigada.
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A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Imagina, professora. (Palmas.)
A senhora deixou muito bem o seu recado e o seu alerta, que, de fato, é muito preocupante, 60% de desmatamento e ameaça real a todas as nossas reservas hídricas aqui, não é? Enfim, é muito sério o que está acontecendo.
E eu quero até agradecer, porque quem nos provocou aqui foi a Lúcia, que veio aqui ao gabinete, junto com outros representantes das instituições, das ONGs que trabalham, o fórum, todo o Fórum das Águas, que vieram aqui falar da realidade. Muitas vezes, nós ficamos aqui envolvidos com tantas pautas, com tantos temas, e muitas vezes, deixamos de lado.
Mas graças a Deus, dentro desta Comissão, tem uma pessoa que, de fato, tem uma preocupação, ainda mais por ser do Distrito Federal, entendendo todo o impacto que trará, não só para a nossa cidade, mas para todo o país. É muito sério o que nós estamos debatendo hoje.
Eu quero agradecer muito, porque foi dado o recado.
E certamente, mais uma vez, olha a coincidência, uma mesa repleta de mulheres, não é? (Palmas.)
Assim, quer dizer que cada vez mais a mulher vem para esse front, preocupada. Somos mães e temos uma preocupação real, não só com o que está acontecendo hoje, mas com o que deixaremos para as futuras gerações, nossos filhos, nossos netos.
E é um orgulho estar aqui ao lado de todas vocês. Muito obrigada.
Bom, eu vou passar a palavra agora para a Lúcia. Lúcia, que é do Fórum de Defesa das Águas do Distrito Federal, que esteve no meu gabinete, juntamente com outros representantes de outras ONGs, para falar um pouco dessa realidade. Seja muito bem-vinda, Lúcia. Obrigada pela provocação.
A SRA. LÚCIA MENDES (Para expor.) - Obrigada, Senadora. Quero agradecer demais esta oportunidade. Abrir este espaço para nós da sociedade civil é muito importante, porque temos muito pouco espaço para fazer ecoar as nossas vozes, as nossas pautas. E encontrar uma parceria tão aberta, tão acolhedora no seu gabinete foi uma alegria.
Então nós estamos aqui, eu queria só reforçar, mostrar minha camiseta aqui, olha. A mesa é feminina, a terra é feminina, as águas são femininas. Então, assim, a gente tem uma força, uma energia aqui, que, como você bem falou, é do feminino que vem essa energia, que é de criação, de nascedouro, de berço, de cuidado exatamente.
Eu queria começar dizendo para vocês o que foi que amanheci refletindo hoje, porque a gente precisa conhecer para proteger, proteger para preservar, preservar para não perder a chance de sobreviver e garantir o futuro.
Porque quando a gente vê pontes, novos setores habitacionais em áreas de nascentes e recarga de aquífero na Serrinha do Paranoá, em Sobradinho, como a Profa. Liza já pontuou; projeto de duplicação de rodovia ao lado de área de proteção em Águas Emendadas; licenciamento para a construção sobre nascentes e córregos do Lago Sul e Quinhão 16; outorgas e falta de fiscalização, provocando poluição e morte no Rio Melchior; o avanço da grilagem, por falta de fiscalização, na região do Caub 1, lá no Riacho Fundo; parcelamento irregular e falta de água para produtores em Brazlândia, onde está a Represa do Descoberto; terras rurais da União transformadas em terras para expansão urbana do DF, no Lago Oeste, ameaçando a Chapada da Contagem, que é rica em nascentes e que contribui demais para os nossos recursos hídricos; projeto imobiliário em área que deveria ser de expansão do Parque das Garças, no Lago Norte, que hoje está conflagrado, a população do Lago Norte está em pé de guerra em defesa de um parque.
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Quando a gente se junta, e quando nos juntamos no Fórum de Defesa das Águas, com dezenas de entidades e coletivos que preservam e protegem as águas do DF, nós começamos a perceber que os nossos problemas são os mesmos.
Áreas produtoras de água, com nascentes, milhares, estão sendo ameaçadas, todos os dias. Muitas já foram soterradas pelo crescimento desordenado, pelo crescimento planejado sem critério. É assustador quando a gente escuta histórias de bairros, como Vicente Pires — e eu ouvi outro dia, Deputado, um Deputado Distrital me dizer que, em Vicente Pires, mais de 700 nascentes foram soterradas. Em Águas Claras, foram mais de mil.
Quem conhece Águas Claras sabe que lá tem, às vezes, duas, três bombas na garagem, bombando água o dia inteiro. Isso para mim é uma coisa que eu acho difícil de compreender.
Nós tivemos, agora, na oficina do PDOT em Vicente Pires, e eu ouvi um chacareiro contando que, há pouco tempo, há uns dez anos, ele cavava 5 metros e achava água para fazer um poço artesiano. Hoje ele já cavou quase 100 metros e não achou água.
Essa é uma realidade lá onde eu moro, no Núcleo Rural do Palha, também, onde eu tenho um vizinho que já cavou 150 metros e não achou água de qualidade. E nós estamos falando de regiões produtoras de água, onde existem nascentes, e que são áreas de recarga de aquífero.
O que mais me assusta é isso. Esses projetos sobre nascentes, recarga de aquífero e lençol freático continuam, por toda a cidade. Mas, quanto mais a gente conhece a cidade e a sua importância como produtora de água, porque nós somos parte do bioma Cerrado, onde as águas nascem, mais nós aprendemos sobre os riscos que nós estamos correndo, e não apenas para essas áreas, mas o risco de impacto e danos ambientais que podem chegar muito mais longe.
Se não pensarmos, por exemplo, no risco que estamos trazendo para a vereda de Águas Emendadas, cuja água caminha para o norte e para o sul do país, contribuindo para as bacias imensas do Rio Tocantins, ao norte, e do Rio Paraná, ao Sul - e colocamos essa estação ecológica em risco, quando não se fiscaliza o parcelamento irregular, e ainda se propõem projetos de duplicação de rodovia ao lado dessa estação ecológica -, nós estaremos comprometendo um futuro que não é só o nosso aqui do DF. Como já disse, os problemas são os mesmos: parcelamento irregular, grilagem sem fiscalização, projetos planejados sem critério e licenciamento ambiental incompreensível.
Eu tenho muita dificuldade de compreender como é dado um licenciamento ambiental, com estudos da década de 90, para a implantação de condomínios, agora, em regiões onde se sabe de toda a sensibilidade ambiental que tem ali, como é o caso da Serrinha do Paranoá.
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Lá querem colocar condomínios que chegam a 300 mil novos habitantes, numa área de recarga, onde tem mais de cem nascentes que contribuem para os nove córregos que compõem aquele braço do Lago Paranoá em que chega a água limpa e onde hoje está sendo captada água para abastecimento e estão duplicando essa captação. É uma conta que não fecha, porque, se você impermeabiliza a Serrinha, você seca as nascentes, você seca os córregos. Então, essa contribuição de água limpa naquele braço ali do lago vai ser comprometida. E como é que nós vamos ficar com o abastecimento de água? Então, essa conta não fecha.
Como eu já disse, os problemas são os mesmos e nós estamos aqui convivendo com a omissão do Estado nas regiões onde quem está preservando são os moradores. E não existe um diálogo real com essas comunidades que hoje preservam e garantem ainda o pouco de Cerrado em pé que a gente tem em várias regiões da cidade. Brazlândia, Serrinha do Paranoá, Quinhão 16, Caub I, Lago Oeste, Chapada da Contagem, Lago Sul, em todas as regiões do DF, os problemas são os mesmos.
Como eu disse no início, nós precisamos conhecer para proteger, preservar para não deixar morrer. Falamos de garantir o futuro num território que tem sido objeto de ganância imobiliária, inclusive do Estado, porque o Distrito Federal é o único que tem uma imobiliária oficial - Senadora, eu não consigo entender por que nós precisamos de uma imobiliária oficial -, com o descaso e a omissão de governantes e gestores que agem como se não houvesse consequências, como se não houvesse um amanhã, que vai chegar cobrando a conta. Continuar derrubando o Cerrado significa promover falta de água aqui e em todas as regiões do país que recebem nossas águas.
A discussão do PDOT, que está em curso, é fundamental para redefinir a forma como ocupamos esse território. E eu quero aproveitar aqui para denunciar, gente! Essa discussão do PDOT, que deveria estar tendo uma ampla participação da população, não tem não é por falta de interesse da população, não tem porque não há divulgação. Na oficina de que eu participei em Vicente Pires, tinha cerca de 40, 45 pessoas, uma cidade que tem mais de 100 mil habitantes. No Paranoá, foi a mesma coisa, cerca de 60 pessoas. No Lago Norte, teve mais de 200, porque nós mobilizamos, nós fomos atrás das lideranças do Lago Norte, fizemos uma reunião preparatória e, na hora - foi uma coisa que até surpreendeu os organizadores -, tiveram que abrir mais salas porque tinha muita gente. E todos os grupos de discussão da oficina no Lago Norte foram unânimes em defender a preservação da Serrinha, ser contra projeto de ponte, contra projeto imobiliário de Taquari e pela expansão do Parque das Garças e não a colocação ali de outro empreendimento, que não tem necessidade alguma.
Hoje nós sabemos que nós estamos falando não mais de um problema só de Brasília ou só do Distrito Federal. Por isso, nós trouxemos este debate para o Senado Federal, porque é urgente que todos os órgãos federais que têm alguma alçada sobre a questão ambiental do Distrito Federal possam se posicionar, porque nós temos diversas APAs (áreas de proteção ambiental), onde, toda vez que se fizer um empreendimento, é necessário ouvir o ICMBio, por exemplo, é necessário ouvir as instâncias federais que foram criadas para proteger esse território, porque, se não proteger, o impacto será no país inteiro, não é só aqui.
Então, eu queria agradecer demais esta oportunidade de a gente abrir este debate de forma mais ampla, não ficar discutindo só no nosso quadradinho, como eles chamam Brasília, que a gente possa trazer outros atores para essa discussão.
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E, se a Senadora me permitir, nós temos aqui representantes das quatro regiões que participaram do Grito das Águas, que inclusive estiveram com a senhora no gabinete, que são o Marcelo, de Águas Emendadas; temos o Guilherme Jaganu, do Lago Sul; o Nilton, do Rio Melchior; e, se for preciso, temos também a Regina, do Lago Oeste, aqui. São essas quatro regiões, e está faltando só o pessoal do Descoberto, mas esses que estão aqui, se for possível, gostaria de a gente poder ouvi-los ao final aqui das falas da mesa e dos Senadores, para que este seja um espaço também em que essas pessoas possam trazer suas pautas.
E eu queria pedir, por último, sem querer abusar... A gente trouxe um vídeo lá da nossa região da Serrinha, das crianças de uma escola que eu acho que dão uma medida muito boa de como a questão local tem impacto global. Eu não sei para quem eu peço para passar o vídeo...
E assim eu encerro a minha fala. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Muito obrigada.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Lindo! Bom, eu não vou falar muito, senão eu me emociono... Muito lindo! E quero visitar a escola, hein? Já estou aqui me comprometendo que eu vou lá conhecer a escola, os alunos, os professores enfim. Realmente, acho que é por isto que a gente está aqui: pensando já no futuro, trabalhar as próximas...
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(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - É, construir hoje o futuro, preparar as futuras gerações. É lindo esse trabalho!
Eu vou passar a palavra agora para a Flávia Carneiro da Cunha Oliveira, Superintendente de Planos, Programas e Projetos da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA).
Seja bem-vinda, Flávia!
A SRA. FLÁVIA CARNEIRO DA CUNHA OLIVEIRA (Para expor.) - Obrigada.
Exma. Sra. Presidente da Comissão de Meio Ambiente, Senadora Leila, Sras. e Srs. Senadores e demais presentes, nós agradecemos o convite à Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico. Para nós, é sempre um prazer estar aqui.
Bom, aqui a gente está tratando da missão da ANA definida no planejamento estratégico da agência, que é garantir a segurança hídrica para o desenvolvimento sustentável. Eu queria aproveitar também o que a Lúcia disse. Em cima da sua fala, Lúcia, ficou evidente a conexão entre políticas de meio ambiente, uso e ocupação do solo e recursos hídricos. Elas não existem de forma dissociada.
Eu gostaria... Eu tinha feito uma apresentação. Se for possível... (Pausa.)
Obrigada.
Como eu passo? (Pausa.)
Pode passar, por favor. (Pausa.)
Beleza. Obrigada.
Bom, é um senso comum que a água é um recurso limitado, é essencial à vida, ao funcionamento dos ecossistemas e é um recurso que tem importância estratégica no desenvolvimento e na expansão dos povos. Não tem como a gente pensar em desenvolvimento sem pensar em recursos hídricos. A água é essencial para a indústria, para a irrigação, enfim, para a nossa sobrevivência, para o abastecimento humano. Então, ela é um elemento que é limitador, ela é um elemento limitador! Então, o uso sustentável da água é fundamental para que nós consigamos avançar no desenvolvimento, mas preservando esse recurso que é tão importante para a vida do planeta e que é altamente influenciado tanto pela dinâmica de uso do solo quanto pelas mudanças climáticas.
Enfim, eu trouxe só uma... Acho que, em toda apresentação em que a ANA vem aqui, nós trazemos o ciclo da água. Também é um ciclo fechado. A água - todos conhecem - vem de precipitação. Tem alguns processos dentro dos rios de evapotranspiração. Então, a água também é perdida por evaporação, especialmente nos reservatórios; tem perda de 30%, 35% dentro de um reservatório de evapotranspiração. Todo uso que é feito ao redor do corpo hídrico influencia na qualidade daquele recurso através dos rejeitos que são lançados pela indústria, do que é lixiviado dentro do setor de agricultura, os fertilizantes que são utilizados. Tudo aquilo acaba indo para o corpo hídrico.
E, no caso de ocupação de solo, especialmente quando há um problema grande que existe nas cidades relacionado ao uso irregular do solo, à ocupação irregular do solo, trazem-se consequências seriíssimas para os recursos hídricos, porque vão ser moradias, vão ser unidades habitacionais que não vão estar conectadas com a rede de saneamento. Então, muito provavelmente vão ter poços perfurados. Com essas perfurações, essa água não vai entrar dentro de um cálculo de disponibilidade hídrica para que a outorga seja dada, a autorização de uso seja dada com segurança. Também não vai ter um saneamento básico, um tratamento adequado do esgoto. Aquilo tudo vai para o corpo hídrico. E, como já foi dito aqui também, é importante essa preservação também das áreas de preservação tanto do DF quanto de todos os lugares.
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O DF enfrenta um problema que vimos em todas as grandes cidades: foi uma expansão desordenada. Nos últimos anos, nas últimas décadas, procurou-se dar uma lógica, que fosse tomado um cuidado; o componente ambiental entrou com bastante peso a partir da década de 90 principalmente; mas, como toda grande cidade, ela foi planejada para uma determinada população e hoje tem três, quatro vezes mais, mas a quantidade de água continua a mesma. E cada vez mais uma água de pior qualidade, o que aumenta muito os custos de tratamento para que nós possamos consumi-la. E cada vez mais a nossa conta de água vai aumentar. Isso é toda uma cadeia. Com a água não existe milagre, a água passa pelo ciclo. Aqui, em Brasília, os corpos hídricos não têm capacidade suficiente de depuração. Então, cada vez mais, se nós não cuidarmos do que chega aos recursos hídricos, mais cara vai ser a nossa conta de água no fim do dia e menos água teremos disponível também.
Podemos passar. Eu falo muito, então desculpe, Senadora. É um assunto assim... Eu estou na ANA já tem mais de 12 anos, então é um assunto apaixonante, como servidora da agência.
Bom, enfim, vamos para a base legal.
A Lei das Águas traz como fundamento, então, a bacia hidrográfica como unidade territorial de implementação da política de recursos hídricos. E, dentro das diretrizes de ação que a Lei das Águas nos traz, há a importância da articulação do planejamento de recursos hídricos com os setores usuários e com os planejamentos regionais, estaduais e nacional. Uma grande dificuldade na gestão de recursos hídricos é a dupla dominialidade. Nós já temos recursos hídricos que são de dominialidade federal, da União, e recursos hídricos de dominialidade estadual - isso falando de corpos superficiais. Quando nós falamos de água subterrânea, a dominialidade é do Estado. Mas todo esse planejamento que afeta os recursos hídricos é municipal. No caso do Distrito Federal, o Distrito Federal tem esse duplo papel. Então, em teoria, a gestão até seria mais fácil, porque é só um ator decidindo, é mais centralizada a gestão.
A lei traz como instrumentos os planos de recursos hídricos, o enquadramento, a outorga, a cobrança e o sistema de informações de recursos hídricos. A ANA trabalha com todos esses instrumentos nos corpos hídricos de domínio da União, que são os corpos hídricos transfronteiriços, são os corpos hídricos que passam por mais de um estado.
Se a gente puder passar, por favor, eu vou entrar um pouquinho mais nisso.
Um dos principais instrumentos que a política nos trouxe são os planos de bacia. Os planos de bacia servem como instrumento norteador do que vai acontecer em toda aquela bacia. Dentro dos planos de bacia, eles precisam considerar o uso do solo, uma previsão de expansão da população, tudo aquilo que poderia impactar nos recursos hídricos, para que a gente possa tomar as melhores decisões e garantir esse recurso para gerações futuras. Neles sempre são apresentados: um diagnóstico de como estão os recursos hídricos; análise de alternativas, em que vários cenários são elaborados; um balanço entre a disponibilidade que existe e a demanda, e uma projeção de demanda futura, considerando o aumento populacional - se eu não me engano, a taxa de crescimento do DF nos últimos anos foi de 2,2 vezes; é muito alta em comparação com outras cidades -; metas de racionalização, quando necessário, aumento da quantidade - buscando, não é? - e melhoria da qualidade dos recursos hídricos; medidas a serem tomadas, programas; prioridades para a outorga - lembrando que as prioridades de uso de recursos hídricos estão definidas na Lei das Águas, lá atrás: em caso de escassez, abastecimento humano e dessedentação animal -; diretrizes e critérios para cobrança.
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E eles são elaborados por bacia. Então, nós temos o instrumento na bacia federal, temos o instrumento da bacia estadual e temos o Plano Nacional de Recursos Hídricos, que está acima disso tudo.
Qual é uma grande dificuldade que existia? Os primeiros planos de recursos hídricos que foram elaborados... O Conselho Nacional de Recursos Hídricos tem uma resolução, que é a Resolução 145, que traz que, quando não existe um comitê de bacia instituído, não existe agência delegatária, a responsabilidade é do órgão gestor de recursos hídricos. Os primeiros planos das bacias federais foram elaborados pela ANA, já há muitos anos, e agora nós estamos vivendo um processo de aperfeiçoamento, porque, quando elaboramos os primeiros planos, eram para a calha principal - nós hidrólogos olhávamos para a calha principal -, mas existe uma grande influência de todos os afluentes. Não adianta a gente só fazer gestão de recursos hídricos na calha principal. Os afluentes interferem demais. E a gente vai ver aqui que o DF está justamente num arco de nascentes. O DF tem contribuição para três grandes regiões hidrográficas do Brasil. Enfim, hoje a gente trabalha numa atuação muito mais focada também em planos de ação para os afluentes, porque nós entendemos, com a evolução de todo o sistema, de todo o trabalho que já tem sido feito pela agência, que, sem trabalhar planos de ação para os afluentes, não tem como a gente chegar a uma meta de enquadramento que seja estabelecida para a calha principal; não tem como melhorar a gestão da calha principal sem todo um trabalho também com os comitês estaduais, que são os comitês dos afluentes. Inclusive, o plano do Paranaíba está passando por um processo de revisão agora em que todos os comitês dos afluentes - a Alba pode falar sobre isso - estão sendo envolvidos, ouvidos desde o início, porque a gestão de recursos hídricos, também traz a Lei das Águas, é descentralizada e participativa.
Pode passar, por favor.
Bom, então, os planos consideram os múltiplos usos. Nossa missão é garantir os múltiplos usos, lembrando as prioridades estabelecidas em lei em casos de escassez. Então, são estudados os usos de: pesca, navegação - todos os usos -, indústria, setor elétrico... E o foco dos planos são as ações de governabilidade do Singreh focadas na Agenda Água, mas considerando todos os outros elementos que interferem nos recursos hídricos.
Pode passar, por favor.
Eu vou correr aqui para não... Desculpa.
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A própria Lei das Águas também traz como atribuição do Poder Executivo estadual e do Distrito Federal a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental, Lúcia - a importância de a gestão ambiental estar junto com a gestão de recursos hídricos. E a lei também traz a integração das políticas locais de saneamento básico, porque a gente aqui está falando de uso e ocupação do solo, mas, como eu já falei, existe uma relação muito grande entre o uso e ocupação do solo, o saneamento e a poluição das águas. Então, não temos como dissociar esses três fatores, especialmente se a gente pensa em uso irregular de solo. Enfim, a integração das políticas de saneamento básico, de uso, ocupação e conservação de solo e de meio ambiente com as políticas federais e estaduais e recursos hídricos. Então, cabe aos municípios e, no caso, ao Distrito Federal, fazer toda essa harmonização. Os planos federais dão as diretrizes tanto de meio ambiente, quanto de outros setores envolvidos e deve ser seguido pelos estados e municípios.
Por favor. Obrigada.
Para isso, então, desde 2000, foi criada a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico, agora. Eu deixei como estava na lei: num primeiro momento, a Agência Nacional de Águas era responsável pela coordenação e implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, e, mais recentemente, nós temos o desafio da elaboração das normas gerais de referência nacionais para o saneamento, para a regulação dos serviços de saneamento. Como eu já falei também, não tem como a água andar separado de saneamento.
Por favor.
Temos muitos desafios, e, como eu falei também já, a política é descentralizada e participativa. Então, estamos aqui para debater e tentar achar, em conjunto, uma solução, caminhos possíveis, para que a gente possa garantir a oferta e o acesso à água. Existem os instrumentos na política pelos quais nós fazemos isso, só que existem as diferentes competências, mas nós temos que lembrar que a gestão precisa ser integrada. A gestão de recursos hídricos com a gestão de política de saneamento, de meio ambiente, de território - entre muitas outras -, a gestão das águas superficiais com as águas subterrâneas, porque hoje nós vivemos um contexto do aumento da demanda com o aumento populacional, com a necessidade de mais alimentos, de maior produção de alimentos, mais indústrias.
Hoje vivemos um cenário que a professora da UnB já colocou também de mudanças climáticas. O El Niño foi confirmado agora há poucos dias. Na projeção mais moderada, nós teremos secas intensas na Amazônia. Quando a gente fala de Amazônia, nós pensamos imediatamente em abundância de água, e a situação que a população já vive lá não é essa. No ano passado, mais de 50 municípios entraram em estado de atenção no Estado do Amazonas. Isso era algo impensável há 20 anos. Então, nós temos várias evidências de que precisamos melhorar, a gestão precisa melhorar, o nosso comportamento enquanto cidadão também precisa melhorar, porque cada um também tem a sua responsabilidade individual.
Hoje eu estava lendo até...
(Soa a campainha.)
A SRA. FLÁVIA CARNEIRO DA CUNHA OLIVEIRA - Acabou o meu tempo, não é?
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF. Fora do microfone.) - Não, pode ir, por favor.
A SRA. FLÁVIA CARNEIRO DA CUNHA OLIVEIRA - Desculpa, tomei um susto. Meu Deus! Não, estou acabando. Hoje eu estava lendo uma reportagem aqui sobre Brasília, que o consumo per capita, no Lago Sul, de água é duas vezes e meia maior do que o recomendado pela ONU. Então, também tem uma questão de conscientização social. A educação ambiental é muito importante também nesse processo.
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Mas, rapidinho aqui, só mostrando: o DF está dentro do contexto. Eu falei do plano do Paranaíba. Aqui eu trouxe a Bacia Hidrográfica do Paranaíba como um todo e um mapinha do Brasil também para que todos consigam georreferenciar, geolocalizar onde fica a Bacia do Paranaíba.
Eu já falei demais, vou adiantar. Pode passar, por favor.
Nos planos, então, nós identificamos quais são os principais conflitos em todas as regiões. E, no caso ali do DF, se a gente olhar, tem uma região ali, do Pipiripau, que é questão de irrigação e abastecimento urbano, onde existe um conflito que está sendo trabalhado.
Aqui em Brasília também há a questão do abastecimento urbano e qualidade da água. A qualidade da água tem piorado muito também nos últimos anos. Como eu já coloquei também, nós estamos no arco das nascentes. São três regiões hidrográficas brasileiras: Paraná, São Francisco e Tocantins-Araguaia. Brasília guarda, tem nascentes que são extremamente relevantes para essas regiões hidrográficas.
Por favor, vamos passar.
Aqui, um mapinha do Distrito Federal, mas como a colega da Adasa vai falar na sequência, eu acredito que ela vai entrar nesses detalhes.
Podemos passar.
Lembrando da importância da cobertura vegetal e do ciclo hidrológico.
(Soa a campainha.)
A SRA. FLÁVIA CARNEIRO DA CUNHA OLIVEIRA - Quando não temos vegetação, a água passa de uma vez para o corpo hídrico. Com isso, provoca erosão no terreno ou assoreamento do corpo hídrico. Não deixa infiltrar, não há infiltração suficiente no aquífero. E a vegetação vai contribuir para a redução dos picos de cheia.
Pode passar, que eu mostro isso num próximo gráfico rapidamente.
A linha de cima é um período de cheia, período chuvoso. Esse pico é o período chuvoso. E abaixo dela, o comportamento de um corpo hídrico quando não temos vegetação. Então, você vê claramente que o corpo hídrico se comporta de acordo com a variação da chuva: se chove muito, está cheio o rio; se seca, o rio seca. Com cobertura vegetal, o comportamento abaixo é o que nós vimos.
Bom, com isso, a ANA faz uma série de atividades de conservação de água e solo. Tem o Programa Produtor de Águas, que aqui no Pipiripau nós fizemos. E também atuamos em conflitos, em processos de alocação negociada de água, estabelecendo marcos regulatórios com os estados ou o Distrito Federal. No próximo, tem o marco regulatório do Pipiripau, justamente, e foi identificado aquele conflito no diagnóstico do plano de bacia. Isso foi trabalhado pela ANA de duas formas diferentes: conservando o solo, em ações de conservação de água e solo pelo projeto Pipiripau, e marco regulatório com resolução conjunta com restrições de uso.
Muito obrigada e desculpa por me exceder. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Eu quero agradecer a Flávia Oliveira, representante da ANA, e dizer que a sua exposição foi... A ANA, toda vez que participa aqui das nossas audiências, sempre traz boas informações, sempre complementa o nosso trabalho aqui. Eu quero agradecer, vocês são grandes parceiros aqui da nossa Comissão. Obrigada.
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Vou passar a palavra agora, na sequência, já para complemento de todas essas explicações feitas pela Flávia, para a Sra. Alba Evangelista, que é ex-servidora, aposentada, da Secretaria de Estado de Agricultura, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, a Seagri, e da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento do Distrito Federal, a Adasa.
Seja bem-vinda, Alba. Obrigada.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - E agora é Presidente do Comitê de Bacias - desculpe, Alba!
A SRA. ALBA EVANGELISTA (Para expor.) - Bom dia a todas e a todos!
Eu quero agradecer à Senadora Leila Barros pelo convite para participar desta audiência.
Eu só queria fazer alguns pequenos reparos. É que não eu sou ex-servidora, eu sou servidora aposentada!
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Olha, eu vou falar uma coisa: é a mesma coisa que eu falo quando falam "ex-atleta": a gente sai do esporte, mas ele não sai da gente! É a mesma coisa no seu caso: com uma vida dedicada ao serviço público, não tem como você sair, não é? Peço até desculpas, viu, Alba?
A SRA. ALBA EVANGELISTA - Eu sei que é uma... É só que eu achei engraçado.
Eu continuo servidora aposentada da Secretaria de Agricultura do DF, passei um tempo na Adasa, assim como também passei, no início da carreira, no Jardim Botânico de Brasília.
Quinta-feira agora, da semana passada, a gente teve a reunião de eleição do Comitê de Bacia Hidrográfica dos Afluentes do Rio Paranaíba no Distrito Federal, e eu fui eleita Presidente do Comitê. Está fazendo hoje uma semana que estou nesse cargo e já vim aqui para falar sobre os problemas de água no Distrito Federal!
Eu vou começar mostrando esses dados - viu, Flávia? Eles diferem um pouquinho do que você falou, você me desculpe, mas eu peguei uma bibliografia, Lima e Silva, de 2007.
É que o Conselho Nacional de Recursos Hídricos definiu doze regiões geográficas para o DF, e esses pesquisadores da Embrapa fizeram um estudo e demonstraram que oito dessas regiões hidrográficas recebem água do Cerrado. Daí a relevância desse bioma - está marcado ali no mapa em linha vermelha, ocupando a grande região central, região de planalto -, a importância dele não só para a região do Cerrado, mas também para outras regiões hidrográficas que estão recebendo água do Cerrado.
Paralelamente a isso, a gente tem um processo de ocupação muito grande, e hoje já se fala que é o bioma mais ameaçado do Brasil. Isso é muito preocupante, porque a gente está esquecendo que ele tem mais de 12 mil espécies de plantas, tem 5% da fauna mundial, 3 em cada 10 espécies vegetais estão no Cerrado, 3 em cada 10 espécies de vida estão no Cerrado, e muita coisa está indo embora sem que a gente ao menos conheça.
Recentemente a gente viu uma matéria de pesquisadores lá da Universidade do Rio que estão estudando uma planta aqui do Cerrado, a Trema micrantha, que apresenta canabidiol. Então, assim, olha quanta coisa que a gente não sabe desse bioma tão rico, e a gente o está mandando embora sem sequer dar oportunidade de a academia e os institutos de pesquisa o estudarem!
Eu botei esse mapa para relevar isso - pode passar o próximo por favor - e eu fiz um recortezinho lá naquele pontinho onde há o encontro da Bacia do Rio São Francisco, do Paranaíba e Tocantins-Araguaia para mostrar o Distrito Federal, que é o que está no mapa à direita. E o que é que a gente vê nesse mapa à direita? A gente separou aí as regiões que contribuem com água para as bacias que eu mencionei. A leste, a Bacia do Rio Preto, que vai verter águas para o São Francisco. E essa bacia, no planejamento de ocupação do DF, foi destinada à atividade agrícola.
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A gente tem a agricultura altamente tecnificada, 300 pivôs centrais trabalhando na produção de grãos, produção de genética de sementes e de animais. Então, o point do agronegócio aqui no DF é a Bacia do Rio Preto.
Eles têm problemas sérios de escassez hídrica a ponto de terem que reduzir a área plantada ou então perder culturas por causa da falta de água. Então, esse é um problema sério, e a gente tem projetos de governo para melhorar essa dificuldade como, por exemplo, a questão de tubulação de canais de irrigação para evitar as perdas. Então, tem projetos acontecendo para ver se se auxilia a produção de água e a produção agrícola da bacia.
Na parte norte a gente tem, em verde, o Rio Maranhão, que vai contribuir com o Tocantinzinho, o Tocantins e, portanto, a Bacia do Tocantins-Araguaia. Essa região, no DF, a gente ainda considera como a última fronteira, ainda não muito explorada. Aí a gente tem a APA de Cafuringa, tem um relevo bastante movimentado com aquelas cavernas, então tem um potencial de turismo muito grande. Tem agricultura também - pequena agricultura -, tem atividades de criação de animais também e o valor principal... tem rios importantes, o Rio do Sal, por exemplo, que já foi cogitado para ser uma fonte de água para abastecimento - tem essa pequena reserva lá nessa região.
Essa grande área central que parece uma cabecinha de elefante - a tromba lá no Norte e no Nordeste - é a Bacia dos afluentes do Rio Paranaíba, no DF. Essa bacia engloba, na verdade, cinco sub-bacias: São Marcos, São Bartolomeu, Paranoá, Corumbá, ali embaixo, e Descoberto - é a principal área que é ocupada hoje em dia, a maioria das cidades estão aí. Se não me engano, 27 das 31 RAs estão integralmente ou parcialmente dentro dessa bacia.
Essa bacia é importante porque ela tem os três principais reservatórios de água que abastecem o Distrito Federal, ainda tem o Pipiripau, que a Flávia falou, que é uma área bem crítica. E, nessa bacia, dentro desse mapa, vocês podem ver que os rios são rios finos, não tem nenhuma... exceto a hidrografia dos lagos, são traços finos indicando que são rios pequenos, de baixa vazão, que é a característica desses rios que estão na região mais elevada do terreno em que nós estamos aqui no Planalto Central, e daí está vertendo água para as demais bacias, mas estão nascendo por aqui.
O Distrito Federal tem essa maravilha, que são as Águas Emendadas. A gente fala que o Distrito Federal tem Águas Emendadas - até usei esse título na palestra - porque a gente tem, dentro da Estação Ecológica de Águas Emendadas - córregos que vertem, lá da Vereda Grande, para o sul, o Corguinho e, portanto, a Bacia do Paraná, e ao norte o córrego Vereda Grande, que vai dar no Rio Maranhão e, portanto, na Bacia do Tocantins. E, logo à direita, na Bacia do Preto, há nascentes ali da Bacia do São Francisco.
Então, realmente, o Distrito Federal é o encontro das águas das três maiores bacias hidrográficas do Brasil. E, com isso, eu digo que nós temos a responsabilidade de cuidar dessas águas, porque essas águas não são só para o DF. A gente está alimentando outras bacias do Brasil, pelo menos oito regiões hidrográficas, conforme eu falei dos estudos dos pesquisadores da Embrapa.
Próximo, por favor.
Aqui eu vou falar do Comitê de Bacia, porque eu acho que foi por isso que eu vim aqui, não é?
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Então, o Comitê de Bacia é um ente do Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos, é um órgão de Estado e é um órgão em que a sociedade tem voz.
Por quê? Ele é chamado "Parlamento das Águas" não é à toa. Em sua composição, a gente tem representação do poder público, da sociedade civil e dos usuários de água. Ali, naquela foto ali, naquela imagenzinha que eu peguei de um caderno da ANA, a gente tem uma mesa representando uma bacia hidrográfica e, à volta dela, todos os membros do comitê, usuários da sociedade civil, discutindo sobre... Ali tem irrigação, tem indústria, tem escola, tem lazer, todas as atividades que ocorrem dentro de uma bacia hidrográfica, e isso é - vamos dizer assim - sediado no Comitê de Bacia, um local onde você recebe as demandas, você analisa, você conversa muito e, no final, você tenta tirar algum consenso.
Numa reunião de comitê, a gente nunca sai muito feliz nem muito triste. A gente sempre busca o meio, porque sabe que tem que compartilhar com todo mundo.
Então, à direita, as competências do comitê. Entre elas, eu vou destacar a primeira: arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos pelo uso da água. Essa é uma pauta muito importante dos Comitês de Bacia, porque são eles que a sociedade vai buscar para reclamar que está faltando água, que a água está poluída, que teve que deixar de plantar em alguma região porque a água não está suficiente. Então, eles sempre acabam levando, e a gente tem que tratar isso no comitê, chamando todos os atores e começando a encaminhar possíveis soluções.
Aqui, eu destaquei a Bacia do Paranaíba/DF, que é a bacia na qual eu estou presidindo agora o comitê, para mostrar que, nessa região grande, a gente tem de tudo dentro, nas cinco sub-bacias.
Próximo.
Próximo, por favor.
Aqui, só para mostrar o que a gente tem dentro dessa bacia: a gente tem várias cidades, tem produção agrícola, tem geração de energia, a gente tem lazer, tem muitas coisas acontecendo nessas bacias e que são objetos de acompanhamento do comitê.
Próximo.
O Comitê de Bacia do Paranaíba elaborou, junto à Adasa e outros parceiros, em 2020, o Plano de Recursos Hídricos dessa área toda, que corresponde a 64% do território do Distrito Federal.
Ali à direita, eu passei rapidamente os temas que o plano aborda, e que a Flávia já tinha falado muito bem. Nesse documento, estão várias informações importantes que podem nortear outras políticas, principalmente a política de ocupação territorial.
Próximo, por favor.
Aí a gente tem - voltando para a política, quando a gente analisa - a questão das causas de estresse, vamos assim dizer, de escassez. Então, a gente tem lá que é preciso assegurar, determina-se que se tem que assegurar água em qualidade e quantidade para os usos atuais e futuros - olhe aí a responsabilidade nossa com o futuro.
O que acontece no Distrito Federal, por exemplo? A gente já tem a questão da escassez quantitativa. Nós passamos por uma crise hídrica. Nós temos o Rio Preto, o Pipiripau em estresse hídrico todo ano na questão agrícola; a gente tem a necessidade de a Caesb interligar o sistema para bombear de um setor para outro, para não deixar nenhuma RA sem água; e a gente tem, também, RAs que nem isso têm - na Fercal, por exemplo, a gente tem um atendimento muito, muito, muito pequeno pela rede pública e a gente tem ruas e ruas que não recebem água, que passam mais de um ou dois dias sem água.
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Então, a gente tem a questão da escassez quantitativa e tem a escassez qualitativa. Ou seja, a qualidade das águas do DF tem uma tendência a estar piorando.
Nós fizemos a escolha, lá quando discutimos o enquadramento, de que o Rio Melchior e o Ribeirão Sobradinho teriam corpos receptores de afluentes das ETEs. Isso foi uma escolha que a sociedade fez, mas a comunidade hoje não está aceitando isso. Quem mora em Sobradinho tem lembrança de tomar banho nas cachoeiras, lá na Geladeira... O pessoal do Melchior, que está nessa campanha aí, a mesma coisa. É um rio lindo, todo encachoeiradinho, bem bonitinho, mas você não consegue ficar do lado do rio muito tempo porque o mau cheiro é muito grande.
Próximo, por favor.
Aqui, só uns exemplos. Escassez quantitativa. A Bacia do Descoberto começou com uma bacia agrícola. Aquele Projeto Integrado de Alexandre Gusmão, o Picag, foi implantado lá. Aí, um tempo depois, veio a empresa de saneamento e fez o barramento do Rio Descoberto para formar o Lago Descoberto, que hoje abastece mais de 60% do DF.
Aí, o que acontece? Aí a gente tem uma situação interessante, porque, ao mesmo tempo em que a empresa de saneamento precisa da área rural para poder ter área de infiltração de água para o reservatório, tem também o quê? A restrição de água para a produção agrícola. Eles reclamam muito da redução das outorgas, dos problemas de infraestrutura lá na região.
A gente esteve lá recentemente - não é, Lúcia? -, e eu ouvi lá um produtor de frutas dizendo que tinha perdido um hectare de morango, porque não teve água para irrigar o hectare de morango. Então, tem esse problema.
E lá no Pipiripau, que é do lado - esse aí é o canal Santos Dumont -, a mesma coisa. Foi implantado um projeto agrícola no Núcleo Rural Santos Dumont, são três núcleos rurais lá na Bacia do Pipiripau... Então, no Núcleo Santos Dumont implantaram esse projeto, que era um canal a céu aberto, com condução por gravidade, que, ao longo do tempo, deixou de receber manutenção e começou a ter perdas consideráveis. E, um tempo depois, a Caesb foi lá embaixo e fez uma barragem para captar água. Aí, estabeleceu-se o conflito, conflito que já gerou até morte. Em 2005, teve uma briga por conta de água, e morreu uma pessoa lá nessa briga do Santos Dumont.
Aí, o Comitê de Bacia... Aí vem a importância do instrumento da gestão, a cobrança pelos recursos hídricos no nível federal, onde a Caesb, a principal usuária de água aqui nos rios federais do Distrito Federal, paga por esse uso lá. E esse dinheiro retornou para o Distrito Federal e foi aplicado na tubulação desse canal. Então, foram tubulados 18km de canal no Pipiripau, o que melhorou bastante, mas, no ano passado, como você bem falou, foi preciso entrar...
(Soa a campainha.)
A SRA. ALBA EVANGELISTA - ... com um marco regulatório forte para poder garantir a água do abastecimento, mas também não inviabilizar a produção rural, porque, se você inviabiliza, vai haver parcelamento e venda de terreno, e aí vai impermeabilizar o solo e não vai ter água para você abastecer.
Por favor, o próximo. Acho que já estou acabando.
Aqui, a escassez qualitativa. A questão do Ribeirão Sobradinho, que eu já adiantei, o conflito do saneamento com a sociedade. A sociedade não aceita mais ter um rio receptor de efluente dentro da cidade. E aí, hoje em dia, tem um movimento crescendo pedindo para mudar o enquadramento em alguns trechos desse rio.
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Por exemplo, a parte que está acima da ETE - tem uma ETE no Ribeirão Sobradinho -, por que não se muda para classe 2 para a população poder usar? O monitoramento está mostrando que a água tem qualidade para isso. Então, isso faz parte da revisão do enquadramento, que é um desafio que temos no comitê, para 2030. A gente está construindo isso, para, em 2030, a gente atualizar a resolução do conselho que estabeleceu o enquadramento. No Melchior, temos problemas também, porque, além da questão da ETE, ainda temos a questão do SLU e a questão do... acho que é frigorífico - esqueci agora o nome, mas acho que é um frigorífico.
Então, é escassez de qualidade, e a população não está aceitando mais, e intervenção aí custa muito dinheiro, porque você teria que melhorar o tratamento de água para um nível, sei lá, por membrana, por osmose reversa, alguma coisa mais complicada e mais cara.
E aí o Comitê de Bacias tem acompanhado essas discussões todas. Sempre que chamam, o Comitê de Bacias vai lá.
Próximo.
A gente já teve a preocupação, inclusive, de fazer um seminário sobre subsídios à integração dos planos de recursos hídricos das bacias hidrográficas...
(Soa a campainha.)
A SRA. ALBA EVANGELISTA - ... e ordenamento territorial do DF. E a gente vê o quê? Que tem a revisão do Pdot, a gente tem instrumentos importantes. O Estatuto da Cidade diz que o ordenamento territorial tem que obrigatoriamente conversar com o plano de bacia, com o Plano de Recursos Hídricos. Tem o ZEE, um material maravilhoso, que diagnosticou muito bem a situação, mostrando... a Maria Silvia vai falar, não vou adiantar, e a gente precisa fazer essa conversa, e não é só com esses, tem o Plano Nacional de Saneamento Básico, tem o zoneamento das unidades de conservação, tem outros documentos que o Governo paga para fazer e parece não querer usar quando vai fazer o planejamento. Então, isso aí é uma coisa preocupante, e a gente tem que buscar essa integração das políticas, não só essa com o meio ambiente.
E para finalizar eu peguei Águas Emendadas, para encerrar, dizendo que o que sobrou de fontes possíveis de água está muito impactado. Em Águas Emendadas, a gente tem um trecho do anel viário passando lá que vai contribuir para o secamento...
(Soa a campainha.)
A SRA. ALBA EVANGELISTA - ... Serrinha do Paranoá tem um megaprojeto imobiliário e viário lá em cima. Vão aterrar cerca de cem nascentes.
Então, a gente está num momento em que a gente tem que pensar que o Distrito Federal hoje tem 60 e poucos anos, mas ele vai chegar a cem. O que a gente vai ter quando ele tiver cem anos? A gente ainda vai ter água aqui ou a gente vai estar mandando buscar lá no Rio Araguaia, sei lá onde. Essa reflexão fica aí para gente fazer.
Muito obrigada e desculpem por ter passado o tempo. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Excelente exposição!
Muito obrigada pela sua participação, Alba.
Bom, é alarmante realmente a situação. Nós ficamos até assim... é uma pena que não tenhamos aqui mais Parlamentares acompanhando, mas fica aqui meu compromisso de estar provocando ainda mais debates a respeito dessa situação, que é, de fato, alarmante.
Eu vou passar a palavra agora para Maria Silvia Rossi, que é ex-coordenadora do Zoneamento Ecológico-Econômico do Distrito Federal, representa aqui a sociedade civil e é parceira técnica do Fórum das Águas.
Seja bem-vinda, Maria.
A SRA. MARIA SILVIA ROSSI (Para expor.) - Bom dia a todos.
Quero agradecer o convite e, agradecendo o convite à Senadora e à Lucinha, eu queria cumprimentar todos os presentes.
Até fevereiro, eu ainda era Subsecretária de Gestão Ambiental e Territorial aqui do Governo local. Eu fiquei nessa posição 13 anos. Lá no começo, em 2011, nós tivemos o desafio: eu vim do Ibama, do federal, e vim reconstruir a Secretaria de Estado do Meio Ambiente, porque ela tinha sido colocada como uma subsecretaria do Planejamento Urbano, o que foi um grave equívoco, na minha visão. Nessa reconstrução, nos primeiros quatro anos - 2011 a 2014 -, eu tive a oportunidade de presidir, na reconstrução, o Conselho de Recursos Hídricos e o Conselho de Meio Ambiente, e foi onde a gente fez os principais esforços de avançar com os instrumentos da Lei 9.433, buscando a integração prática no município-estado. Aqui é o Distrito Federal, mas a gente tem uma dinâmica de município na tomada de decisão, Senadora. A senhora conhece bem, foi Secretária de Estado também; fomos colegas.
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Então, o que eu queria ponderar é que, em que pese o fato de a gente ter leis e o marco legal brasileiro estar avançado, a Lei 9.433 é uma referência, ela se inspirou em outros grandes e bons exemplos internacionais. A implementação é que é complexa, e ela é complexa porque - aí eu vou falar um pouco da... ponderar, dialogando aqui com as falas da mesa - ela tem algumas lacunas importantes, e essas lacunas viram conflitos na gestão. A gente só consegue mediar esses conflitos com transparência e participação social.
Vou dar um exemplo prático da fala aqui. Foi falado pela Flavia que a gente tem prioridade estabelecida na lei, em situação de escassez, para quem a água... qual é o público que consome, na dessedentação humana e animal. Veja, isso aconteceu em 2017 e 2018 aqui. Qual foi a posição dos órgãos técnicos, da Adasa e da Caesb? Prioridade para a gente trabalhar ali o racionamento de água. Obviamente, a gente tinha uma média de consumo alto em todo o Distrito Federal, e nós da área ambiental fomos à Casa Civil negociar isso - na época o Governador era o Rollemberg -, ponderando a injustiça dessa decisão. Por quê? Porque iria entrar em racionamento o eixo oeste do DF, que pega de Ceilândia... Brazlândia, Ceilândia até Gama, Santa Maria. Observe que são as cidades de menor IDH, são as cidades mais pobres do DF. Era essa bacia, por causa do nível do reservatório ali do Descoberto, que iria entrar em racionamento.
E nós ponderamos que existia uma estrutura, porque a Caesb tem uma das estruturas mais bem interligadas, a Caesb é uma referência nacional em termos de provimento de serviços públicos, em que pesem os últimos muitos anos sem o investimento necessário. Então, mesmo a Caesb tem perdas de água, por exemplo, de 40% - fora o furto de água -; 40% em alguns poucos trechos, a média aqui é 12%, 15%. Você vai em alguns municípios e é de 60%. Então, a Caesb é uma instituição robusta, historicamente. Mesmo assim, a discussão que se fez ali era da justiça social, da justiça no acesso ao bem comum. Por que é que populações que consomem menos de 80 litros de água por pessoa por dia deveriam consumir menos ainda, sendo que a OMS estabelece 110 litros por pessoa por dia para um consumo digno? E era essa a população que iria entrar em racionamento.
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Então, nós fizemos todo o movimento na área ambiental pensando na justiça climática, na justiça ao acesso ao bem comum - que muitos chamam de capital natural e que nós preferimos chamar de bem comum -, para que o racionamento, se existisse, fosse de todo o DF; principalmente da outra bacia, que é a do Paranoá, que hoje se integrou ao Paranaíba e que tinha consumos, por exemplo, no Lago Sul, de 600 litros por pessoa por dia - 600 litros por pessoa por dia. Por pessoa, não é por casa, por pessoa, dentro da casa, por dia. Então a gente estaria legalmente, do ponto de vista formal, cumprindo 100% do que a 9.433 diz, mas é imoral você cobrar de quem não tem água que tenha menos e que o uso perdulário, o desperdício de água seja valorizado.
Então, assim, existe uma questão de justiça, de democracia em cada decisão que se toma no Executivo, na administração pública. E isso só pode ser balizado com transparência, porque o discurso da autoridade técnica vem, muitas vezes, encobrindo injustiças sociais. E, portanto, a água talvez seja um exemplo mais claro que a gente tem desse tipo de conflito em todas as decisões.
Qual foi nossa decisão, Senadora? Foi de gastar R$400 mil e comprar uma válvula de pressão para interligar e fazer transposição de bacia. E isso garantiu que a gente fizesse um racionamento mais equitativo, pensando que a população de mais baixa renda já não tem a água que deveria receber e que não é ela a sustentar o racionamento de um território tão assimétrico, desigual, com tanta riqueza como é o Distrito Federal.
Então isso é para mostrar que o fato de melhorar a lei não garante uma implementação com justiça. O que garante a implementação com justiça é outra coisa. É o compromisso, é a transparência e é o controle social. As pessoas precisam se capacitar, precisam compreender, precisam se apropriar das leis.
As leis não podem ser tão complicadas na forma de escrita, como é o PDOT. Aqui no DF, o Plano Diretor de Ordenamento Territorial é uma das peças mais complexas na legislação distrital. E é proposital. Ele é uma barreira de avanço no pertencimento, ele é uma barreira muito conveniente na forma de apropriação.
A ZEE foi construído em outra lógica. A nossa lógica, e nós trabalhamos 23 órgãos juntos, inclusive três federais, Ibama, ICMBio, nós tivemos apoio da Embrapa, nós tivemos apoio do IBGE, nós tivemos vários apoios grandes para compreender que território era esse. Por quê? Porque é uma implementação do que diz nossa Constituição Distrital, que é a lei orgânica.
A lei orgânica, essa Lei do Zoneamento Ecológico-Econômico, veio 23 anos atrasada, porque não havia vontade política de fazê-la. E nós, em 2011, com a reconstrução da Sema, demos início a isso. Isso implicou um arranjo de governança, que passou por três gestões, foi sancionado no começo da gestão passada do atual Governador, felizmente, e nós temos agora o desafio da implementação.
Ocorre que essa lei instituiu, de uma forma coordenada, então a gente estava numa mesa de negociação, do jeito que é o Parlamento das Águas, as discussões mediadas pela Casa Civil, toda semana, todos os dirigentes do DF, com um decreto instituindo oito secretarias de Estado, que respondiam diretamente ao Governador. Então nós elevamos o patrocínio dessa discussão, que é qual é a infraestrutura ecológica que a gente tem no Distrito Federal? Onde estão os elementos centrais do bem comum, que alguns chamam de capital natural? Quais são as formas de uso e de apropriação e as vedações e restrições? Não de uso, mas na gestão do estoque dos recursos naturais. Isso foi, por um lado, o ecológico do ZEE. O econômico foi como, com tanta riqueza - mal distribuída, mas muita riqueza -, a gente garante uma prevenção, uma ação preventiva e inovadora no sentido da redução das desigualdades aqui do Distrito Federal? Porque você vê uma renda, uma população como o Varjão, como a Fercal, que foi citada na mineração ali, um pouco no norte, mesmo o Recanto das Emas, a Expansão do Sol Nascente - já tem uma expansão ali, são 70 mil famílias morando lá - e, por outro lado, salários altíssimos. A discrepância aqui do Distrito Federal.
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A gente está falando de um PIB de 63 mil por pessoa, maior do que o de São Paulo, PIB médio, per capita. Eu não ganho 63 mil, nunca ganhei. Alguém está ganhando o meu e muito mais, certo? Porque eu ganho bem, eu sou servidora pública.
Então, assim, essa simetria tem que estar muito clara no radar, quando a gente vai para a implementação da política pública, e não é o que geralmente acontece.
Então, aqui no zoneamento, nós fomos para esse tipo de disputa. Uma outra disputa era traduzir o Distrito Federal para a população. Melhorar a linguagem...
Então, tem uma sugestão aqui, na fala, de como é que a gente pode ter uma melhor divulgação. É fundamental. A população que não se apropria do seu território, está sujeita a qualquer decisão arbitrária. A gente viu isso, enfim, nos últimos anos, com bastante clareza.
Então, no caso do Zoneamento Ecológico e Econômico, para a gente não ter conflito de normas e harmonizar a ordem de elaboração, nós colocamos o zoneamento como a base primeira, que traduz a Lei Orgânica, como base territorial. Então, nós trabalhamos, não com usos... Quais são os instrumentos de uso? Na Política Nacional do Meio Ambiente, a gente tem vários. Zoneamento de unidade de conservação, por exemplo. Definir usos. Qual uso eu vou ter aqui e qual uso eu vou ter ali. Mas o instrumento do Estatuto da Cidade tem vários. Tem o Plano Diretor de Ordenamento Territorial, tem as diretrizes urbanistas, tem uma série de outros, que também decidem: aqui é urbano e vai ter tais usos econômicos.
No ZEE a gente procurou fazer a construção das bases, para poder subsidiar a decisão. Então, isso foi possível pelas geotecnologias. O avanço tecnológico nos permitiu usar as melhores bases.
Pode passar.
Então nós trabalhamos com zoneamento de risco. Risco de quê? Risco de perda desse estoque de recursos naturais, de riquezas naturais, e trabalhamos com risco de empobrecimento da população. Nós traduzimos o ecológico dessa forma e o econômico dessa forma, espacializando e trabalhando com as principais legislações para ver como elas reverberam, inclusive os planos de bacia.
Então, nesse esforço de integração dos instrumentos, que hoje é a base formal, explicitamente determinada para a revisão dos instrumentos urbanísticos, art. 52 dessa lei, a revisão dos instrumentos urbanísticos deve ser feita a partir da lei da sustentabilidade que institui o Zoneamento Ecológico-Econômico, art. 52.
Então, nós temos hoje, para isso, no art. 1º fizemos a engenharia legal de amarrar o zoneamento, tanto à política de meio ambiente, à Lei Orgânica, mas também ao Estatuto da Cidade, que coloque ali a Lei 10.257, é o Estatuto da Cidade. Hoje um dos principais desafios é a visão dos muito mais arquitetos do que urbanistas, infelizmente.
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Qual a diferença que a gente vê na ação da gestão? O arquiteto vê o lote para dentro, ele é autoral: "É o meu prédio, é Niemeyer. É autoral, eu assino, eu tenho orgulho de assinar - e eu também tenho orgulho de assistir e de ver", mas isso não faz com que a gente olhe ao redor. Quem olha ao redor do lote é urbanista; e esse falta, esse olhar falta.
Então, a gente tem muito arquiteto e pouco urbanista, o que faz com que eu trate um novo parcelamento de solo ou uma regularização fundiária olhando para dentro. Eu olho como arquiteto e eu não consigo consagrar que isso juntando com isso dá um tecido urbano em que as pessoas têm que ir e vir. O encanamento da solução de saneamento perpassa esses lotes.
A gente não consegue, com muita dificuldade... E isso é uma realidade do Brasil, agora especialmente presente na administração pública do Distrito Federal. A gente tem uma secretaria muito fortemente com foco de arquiteto e muito pouco de urbanista, integrando muito pouco com as outras secretarias. Eles percebem como uma questão autoral, e não o é.
Quando eu formulo uma lei como o PDOT, que vai definir usos, que tem poder econômico associado a isso e que tem custo de transação para a sociedade lidar com esse planejamento e executar esse planejamento, ele não pode absolutamente ser fechado. Ele tem que ser um porta-voz a serviço do público, o verdadeiro servidor público, e isso falta, aqui falta, especialmente nessa secretaria. Tenho vários amigos lá. Não é uma questão pessoal, é uma questão de visão do papel da secretaria de como fazer o trato da coisa pública, e é isso que a gente está discutindo.
Então, o zoneamento estabeleceu ali duas grandes zonas. Grande parte do que foi citado e hachurado, ali mais em cinza, são as três áreas núcleo da Reserva da Biosfera, o que mostra que transformar em unidade de conservação foi a estratégia mais acertada que o Distrito Federal teve na sua construção, porque senão já tinha acabado tudo, como acabou em várias áreas.
Nessas três áreas, em que pese todo o impacto que já foi relatado, por exemplo, pela Alba, de rebaixamento do lençol freático e de mudança de fitofisionomia dentro da própria ZEE - e os guardiões estão aqui para reiterar o que eu estou dizendo; o Marcelo e outros colegas estão aqui -, a gente está tendo uma mudança no Cerrado, digamos assim - a gente fala da savanização da Amazônia -, a gente está tendo uma rarificação dos volumes de biodiversidade a partir da escassez crescente de água, que pode ser por qualidade ou por quantidade - e a Alba já nos ensinou.
O fato é que esse eixo amarelo e laranja - pode passar ao próximo - tem focos complementares.
A gente está focando no verde, num acordo muito inovador - o ZEE-DF foi o primeiro a fazer uma audiência pública de diagnóstico, instituindo o risco de perda de serviço ecossistêmico, do Brasil; em 2015, nós o fizemos na Câmara Legislativa -, que é o conceito daquilo que serve a todos, daquilo que é a base da vida e do desenvolvimento econômico também dos territórios. Perder o ciclo da água e rebaixar o lençol freático significam que o Lago Paranoá e o Lago do Descoberto vão estar em risco na época da seca, porque eu vou rebaixar. É igual a uma esponja, é exatamente isso aqui: imagine que tem uma esponja aqui dentro e que tem um canudo, que é a que outorga de água aqui, puxando água por baixo. Certo? Eu vou rebaixar, a esponja vai secando. Se tiver água de lago aqui, ela vai secando também, a coluna d'água toda desloca para baixo, e é disso que a gente fala nos padrões de construção de resiliência.
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Pode voltar ao anterior ainda.
Então, a parte debaixo - pode voltar, por favor, ao anterior -, essa parte debaixo, o foco é porque ele pega... Esses pontinhos pretos são a base censitária do IBGE para o DF. Nós ligamos com a base censitária do IBGE para ver. Nas áreas mais escuras ali tem Águas Claras, que é quase um borrão preto, sem pontinho, é a densidade de pessoas vivendo em prédios. A gente tem Ceilândia aqui mais a oeste, nesse eixo que a gente vai ver que é o principal, o de recarga, onde tem justamente a população que mais precisa, em termos de volume de população. A gente está falando que esse eixo aqui, Senadora, pega 60% da população do DF; e, desses 60%, 60% têm o menor IDH. A gente está falando de 1,8 milhões de pessoas dos 3 milhões. Então, tratar a pão de ló esse segmento na administração pública significa trazer qualidade de vida, significa trazer resiliência...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA SILVIA ROSSI - ... significa ter condições para a gente trabalhar uma sociedade mais democrática, mais justa, com direito à vida, com direito ao acesso.
Pode passar o próximo.
A partir desse zoneamento, que foi feito com base hidrográfica, o norte desse planejamento são as águas... E a gente sempre brinca com a ANA: é Agência Nacional de Águas, mas fala de recursos hídricos. Por que não fala de água, não é? Porque para a gente não é só recurso - não é só recurso -, é vida em si dentro do rio, não é? Então, esse tipo de questões conceituais é grave. É por isso que instrumentos como vazão mínima, vazão ecológica não avançam no Brasil. Eu não entendo que o rio precisa ter vida. Eu entendo que ele é um recurso e, como ele é um recurso hídrico, eu uso até esgotar, mas eu não consigo nem entender que precisa de um volume mínimo de água naquele rio para que aquela vida se expresse, não é? Então, tem questões conceituais muito profundas em cada coisa que está dita e em cada elemento da lei.
Pode passar esse. Eu ia dar alguns exemplos, mas não precisa. Pode passar.
Então, a gente tem aqui, por exemplo, uma imagem de satélite do Distrito Federal.
Pode passar.
Essa imagem está disponível, gratuita, essa e tantas outras - pode passar mais um -, no site do Sisdia, que foi um site que foi construído com dinheiro do Fundo Global para o Meio Ambiente, num projeto de seis anos, que se encerra agora. A gente conseguiu - não, pode voltar - disponibilizar para a população um dos maiores bancos de dados do DF de acesso público e gratuito. Está ali o endereço, eu vou deixar depois aqui, Senadora. É o Sisdia (Sistema Distrital de Informações Ambientais). Nós temos hoje 159 cidades do mundo usando esse ferramental, porque eu posso colocar qualquer imagem de satélite por trás e usar as mesmas ferramentas. Então, a gente popularizou agressivamente o geoprocessamento, que também é uma barreira de entrada. Então, consultem e vejam depois os recursos lá do sistema do SIG.
E aqui eu coloquei do lado um dos mapas mais importantes da Lei do ZEE, que é o risco de perda de recarga de aquífero, com a localização, de novo, daquele eixo principal. Vocês veem que tem um anel e, à nordeste, tem a área que foi citada que é o Pipiripau. São duas áreas que são absolutamente críticas. O que isso quer dizer? Quer dizer que a máquina do solo está programada para botar água para dentro.
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Então, a gente tem um grau de infiltração em solos do tipo latossolos, que são os predominantes aqui no DF, Senadora, absolutamente interessante. E a gente recarrega esses aquíferos - e o melhor: com quantidade -, e a água sai filtrada. Esse é um solo poroso, ele filtra, e ele tem uma condutividade hidráulica maravilhosa. E é por isso que a água entra e vai deixando os poluentes até 40m de profundidade. Então, qual é a máquina humana que vai conseguir fazer isso sem custo? - que é o que o sistema natural faz nesse anel laranja.
Nesse anel laranja, o que nós pleiteamos é que as cidades tenham um padrão urbano compatível, porque a gente não vai impermeabilizar tudo e selar o acesso da água. É o padrão de Ceilândia, é o padrão de Samambaia, é o padrão de Recanto das Emas, mesmo com o Minha Casa, Minha Vida. Então, esse padrão urbano de que a Liza Andrade falou - que também é companheira de jornada muitos anos, Professora - é isto, padrão urbano.
A gente não está falando que não pode ocupar, isso é uma falsa polêmica. Não é isso, mas é como ocupar, onde e como ocupar. Por que o Minha Casa, Minha Vida - eu me lembro de 2013 - tinha que ser verticalizado, arrancando toda a vegetação, tudo, e botando casinha do lado de casinha?
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA SILVIA ROSSI - Naquele momento, a gente fez um grande esforço de verticalização: ocupar menos áreas, mais compactas, para liberar a área para infiltração, para arborização, para uma série de coisas, não é? Então, toda decisão tem pressupostos e conceitos muito claramente.
Nesse anel de recarga, mostrando ali as cidades...
Pode passar mais um, por favor, que é o zoneamento do PDOT (Plano Diretor de Ordenamento Territorial).
Passe mais um, por gentileza.
De novo, a mesma imagem que eu coloquei ali do anel de recarga e os usos. Esse verde claro e esse verde quase azulado - é que tem um verde escuro que são as unidades de conservação -, esses dois verdes são as zonas rurais do PDOT, usos rurais. Quando a gente...
Passe mais um, por favor.
Aqui, de novo, do Sisdia. Se a gente retomar ali os usos que a gente tem...
Pode colocar mais um; e depois mais um, são dois.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. MARIA SILVIA ROSSI - Eu não sabia que demorava a animação.
Então, a gente tem aqui, por exemplo, a definição das diretrizes urbanísticas. Por que a gente tem definição de diretrizes urbanísticas em áreas rurais se são diretrizes urbanísticas? Mas tem. Por que a gente tem no PDOT parcelamento urbano isolado? - que vai ser um núcleo-enclave contra o qual a gente luta desesperadamente na revisão desse PDOT e que foi um tumor, um câncer que passou na outra. É assim: eu faço reserva de mercado do meu condominiozinho, da minha área, e depois eu urbanizo: "Show! Comprei em hectare e vou vender em metro quadrado. Vou ficar rico, eu vou ficar rico, não é?".
Então, quanto a esse enclave, a gente tem as subzonas.
Pode passar mais dois, por favor.
A gente tem a identificação das diretrizes urbanísticas, isso tudo disponível para todo mundo gratuitamente, lá no Sisdia. E a gente tem os parcelamentos urbanos isolados, que estão em roxo. Observe o que eles estão fazendo ali. Que jabuti é esse no PDOT atual? - que vai se expandir se a gente deixar na revisão do próximo, adentrando áreas estratégicas de bem comum que não estão previstas no plano. O plano de que fala a Alba é outra proposta, é um uso consensuado, pactuado, negociado com bases técnicas, e não isso.
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Então, para a revisão do PDOT, Senadora, a gente vai precisar da sua ajuda, e de todos os Parlamentares, e de todos os peritos de Ministério Público, e de todos os especialistas desta Casa e de todas as outras casas, e das universidades, e da... Já está convidada, Flávia, você é moradora do DF. A maioria do pessoal do Governo Federal pouco conhece o DF. Vocês moram aqui, precisamos de vocês, precisamos! Certo?
Pode passar para o próximo.
Então, são os jabutis que tem na lei vigente que a gente, nessa revisão, tem que enfrentar.
É uma das últimas. Pode passar.
Ceilândia, Arie JK, Serrinha do Paranoá, Esecae são exemplos de áreas sob forte conflito pelo uso da água, forte conflito; movimento social contra projeto do Governo e, às vezes, grilagem de terra, que é outro câncer no Distrito Federal, com leniência do Governo durante muitas gestões. Então, a gente tem hoje padrões urbanos do DF - pode só retroceder a uma - que são os maiores indutores da falta de sustentabilidade. Os desenhos das diretrizes urbanísticas vão contra aquilo que é o ZEE. E aí a gente briga com a Terracap, que é a imobiliária do DF, mas a Terracap está obedecendo à diretriz da Seduh. Ela está estritamente dentro da legalidade, ela está dentro da legalidade! Então, a gente vai perder todas essas ações judiciais.
Minha proposta, Senadora, é a gente fazer aqui, criar condições aqui no DF de chamar para discutir um pouco mais os instrumentos urbanísticos, particularmente as diretrizes urbanísticas, porque esse refinamento do marco legal é que vai possibilitar menos conflito na aplicação da norma federal sobre o território, que emana lá do Estatuto da Cidade. É essa forma de juntar as coisas. No território, os conflitos acontecem nos mesmos locais, com diretrizes e comandos federais vindos discrepantes ou com lacunas.
Então, esse era o convite. Vamos dar uma olhada no PDOT? Vamos dar uma olhada nas diretrizes urbanísticas, nas diretrizes, nas DIUPEs, que é a nova forma, porque, sem a gente considerar a qualificação desses instrumentos que, via de regra, não têm audiência pública, são formulados pela burocracia da administração pública em todos os locais, e aqui não é diferente, a portas fechadas...
Recentemente a gente conseguiu algumas audiências públicas dessas diretrizes, mas muito mais pro forma do que de fato processos participativos, inclusive pela barreira da linguagem técnica, o tecnicismo como barreira, como exercício de poder.
Então, eu acho que hoje, no DF, na revisão do PDOT e pensando aqui nas estratégias do Grito das Águas, dos fóruns das lideranças, a primeira coisa é conhecer. Entre no Sisdia, entre em todo sistema que tiver público e gratuito e se aproprie. Faça seus ensaios, junte lé com cré, veja que mapa dá esse, mude a imagem de satélite! A gente tem um recurso de coleção de imagens de satélite do DF de 2014 até agora, e vai continuar. Eu posso comparar como era em 2014 e em 2023, está tudo lá disponível. Então, eu comparo com aquela mudança da barrinha. Assim, comparando, eu vejo nitidamente o que tinha antes e como está agora, que é um instrumento de monitoramento.
Então, esse é o convite, Senadora, que a gente agora esteja de mãos dadas mais do que nunca, que a gente junte as forças, que a gente traduza esse tecnicismo. Eu trabalho muito com hidrologia, sou engenheira agrônoma de formação.
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A parte de solos é uma parte que todo engenheiro agrônomo tem muito forte, é 60% do nosso curso, mas com a sensibilidade para a democracia, justiça social, justiça climática, porque, juntos, e com transparência, e com engajamento social, a gente vai conseguir abrir todas as lacunas, os pontos cinzentos e construir, com método e perseverança, um território resiliente e mais democrático.
Obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Nós que agradecemos, Maria. A sua exposição foi fantástica.
Aliás, eu quero agradecer por essa manhã rica, com tanta informação importantíssima. E o convite está aceito.
Eu gostaria só de citar as entidades que estão aqui presentes, os representantes que também estiveram lá no meu gabinete junto com a Lúcia: a Muna Ahmad Yousef, da Academia Planaltinense de Letras, Artes e Ciência; o Newton Vieira, do Salve o Rio Melchior - sejam bem-vindos -; Marcelo Benini, que é da Guardiões de Águas Emendadas; a Regina Célia Pereira Fernandes de Souza, da Asproeste; Guilherme Jaganu, da Associação Colina e Fórum de Defesa das Águas.
Ao final aqui dos expositores, eu gostaria que vocês sentassem aqui à frente, porque eu vou querer ouvi-los. Vou dar três minutos para cada um de vocês, para que vocês possam também passar um pouco para nós o cenário e a luta de vocês, junto com a Lúcia e todos aqui presentes do fórum.
Muito obrigada. Sejam bem-vindos.
Por favor, uma salva de palmas para esses guerreiros aí também. (Palmas.)
Eu vou passar agora a palavra para a nossa última expositora, que é a Juliana Gomes, representante da Adasa.
Seja bem-vinda, Juliana.
Muito obrigada.
A SRA. JULIANA PINHEIRO GOMES (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada, Senadora.
Bom dia a todos que compõem a mesa e a todos aqueles que acompanham a audiência, seja presencial ou virtualmente.
Primeiramente, em nome do nosso Diretor-Presidente, Dr. Raimundo, gostaria de agradecer o convite pela oportunidade de explanação.
Então, como já foi dito nas falas anteriores das minhas colegas, muito bem apresentadas, acho que já ficou bem caracterizado o diagnóstico, a caracterização hidrográfica do DF. Então, eu vou me ater, na minha fala, à atuação da Adasa como órgão gestor dos recursos hídricos do DF, para a gente entender um pouco mais o campo de atuação da Adasa no que tange a essa questão da disponibilidade hídrica, seja aí na gestão qualitativa ou quantitativa dos recursos hídricos.
A Adasa tem como missão institucional a regulação dos usos das águas e também dos serviços públicos do Distrito Federal, com o intuito de promover a gestão sustentável dos recursos hídricos e a qualidade dos serviços de energia e de saneamento básico em benefício da sociedade. A regulação compreende especialmente as atividades de outorga dos recursos hídricos, de regulamentação, de fiscalização, de ouvidoria, de dirimição de conflitos e de sanção administrativa.
Dentre os objetivos fundamentais da Adasa previstos em lei, destaco o compromisso de assegurar à atual e às futuras gerações essa necessária disponibilidade de água em padrões de qualidade e quantidade que sejam adequados aos respectivos usos e promover a utilização racional e integrada dos recursos hídricos com vista ao desenvolvimento sustentável.
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Assim, algumas atribuições da Adasa são: outorgar o direito de uso dos recursos hídricos, sempre observando o disposto na legislação e nos planos distritais de recursos hídricos; instalar e operar a rede de monitoramento, a rede hidrometeorológica do Distrito Federal; organizar e implantar o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos (Sirh); e regulamentar, fiscalizar e controlar, com poder de polícia, o uso qualitativo e quantitativo dos recursos hídricos. Então, a outorga, como um dos instrumentos da Política de Recursos Hídricos do DF, garante esse controle qualitativo e quantitativo dos recursos hídricos, já que qualquer uso que venha a alterar o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo hídrico dependerá previamente de outorga.
Diante da relevância desse instrumento, o instrumento de outorga, a Adasa possui um amplo arcabouço de normativos e de procedimentos gerais e específicos para a obtenção de diferentes tipos de outorga. Dentre as normativas, posso destacar aqui: a Resolução Adasa 350, de 2006, que estabelece os procedimentos gerais de obtenção da outorga; temos também a Resolução nº 18, de 2020, que estabelece valores de referência para a determinação de demanda de água por atividade para fins de outorga; a Resolução nº 16, de 2018, que define as disponibilidades dos aquíferos das diferentes unidades hidrográficas do DF; e a Resolução 6, de 2016, que estabelece um regime diferenciado para concessão de outorga em áreas urbanas e rurais classificadas como áreas de parcelamento irregular, com o objetivo de prevenir, coibir práticas ilícitas afetas ao uso do solo, à ocupação ou ao parcelamento irregular do solo e proteger áreas de interesse ambiental.
Enfatizo que, no processo de emissão de outorgas, é considerada uma série de requisitos técnicos, entre eles o balanço hídrico, ou seja, a existência ou não de disponibilidade hídrica para o atendimento da demanda solicitada pelo usuário, tendo um olhar atento à preservação dos usos múltiplos da água.
Atualmente, a Adasa possui uma ampla rede de monitoramento qualitativa e quantitativa dos recursos hídricos do DF, sendo que hoje nós temos 55 pontos de monitoramento quantitativo e 77 de monitoramento qualitativo das águas superficiais do DF; além disso, contamos com 84 postos de monitoramento de águas subterrâneas, distribuídos também por todo o DF. Os dados monitorados por essas redes citadas podem ser consultados no Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos do DF, um sistema que pode ser acessado diretamente pelo site da Adasa. Entre os dados divulgados, destaco ainda a transparência na disponibilização à sociedade de indicadores e dados de qualidade da água, cuja série histórica contempla desde a implementação do enquadramento dos corpos hídricos até o corrente ano.
Assim, as ações de fiscalização da Adasa são realizadas em todo o DF, em relação aos diferentes usos dos recursos hídricos, como captações superficiais, captações subterrâneas, barragens, lançamento de águas pluviais, lançamento de efluentes, entre outros usos outorgáveis. A atuação da Adasa se dá por meio de ações de fiscalização programadas, previstas no seu Plano Anual de Fiscalização, mas também ocorre pelo atendimento de denúncias que são encaminhadas por diversos órgãos, como o Ministério Público, a própria ANA, vários órgãos públicos.
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Quanto aos aspectos de regulação, além do estabelecimento de resoluções, a Adasa realiza a implementação de marcos regulatórios para o gerenciamento de conflitos com o intuito de garantir de forma regulada os usos múltiplos, como já foi citado anteriormente nas falas dos nossos colegas, na região do Preto e do Pipiripau, sendo, assim, esses marcos regulatórios um meio de dirimir conflitos e de garantir a manutenção de atividades agrícolas em determinada bacia, mesmo nos períodos críticos de estiagem, corroborando para impedir a transformação acelerada ou indiscriminada e sem controle de terras rurais em urbanas.
Baseado nessas amplas redes de monitoramento que abrangem todo o território do DF e que monitoram tanto os aspectos quantitativos quanto os aspectos qualitativos, considerando todo o arcabouço normativo de referência de valores limites de disponibilidade hídrica, de valores limites de demanda de uso, pode-se afirmar que o DF tem um conhecimento amplo para a gestão dos seus recursos hídricos, tem procedimentos instituídos e, como já bem colocado nas falas anteriores, estando evidente o desafio de integração entre os diversos planos: integração do Plano de Gerenciamento Integrado de Recursos Hídricos com o Plano Distrital de Saneamento Básico, com o Plano de Drenagem Urbana, com o PDOT.
Então, eu vejo que, realmente, como já bem colocado, por mais que a gente tenha todo esse conhecimento, que a gente tenha todos esses procedimentos instituídos, a gente tem esse desafio de articulação, de integração das ações de todos os planos.
Obrigada, Senadora.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Obrigada pela participação, Juliana Pinheiro, representante da Adasa.
Bom, hoje nós teremos, agora às 11h, sessão plenária, mas, como eu falei, nós vamos dar a oportunidade aqui, três minutos - eu peço desculpas pelo adiantado da hora e tudo -, para que possamos ouvir os representantes das entidades que fazem parte do Fórum das Águas.
Eu vou passar, primeiro, para o Marcelo, representante da Guardiães de Águas Emendadas.
Por favor, Marcelo, seja bem-vindo, prazer em revê-lo.
O SR. MARCELO BENINI (Para expor.) - Bom dia, Senadora Leila...
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Bom dia.
O SR. MARCELO BENINI - ... bom dia a todas e todos. É um prazer estar aqui.
Rapidamente, de Águas Emendadas, muito se falou aqui, é um símbolo nacional, é um símbolo da integração nacional e sul-americana. São águas que vertem no território do Distrito Federal e chegam ao norte até o estuário do Marajó, na Bacia Amazônica, e, ao sul, até o estuário do Rio da Prata, na região de Montevidéu e Buenos Aires. Trancou-se e protegeu-se esse fenômeno dentro de uma unidade de conservação de proteção integral em 1968 e, depois, em 1988. São os dois decretos distritais que criaram e gerem Águas Emendadas. E há o Plano de Manejo do Ibram.
Ocorre, Senadora, que a realidade, como foi muito bem dito aqui - os planos são excelentes -, é medieval. O entorno de Águas Emendadas hoje está dominado pela monocultura, principalmente a soja, pelo parcelamento irregular de terras nas áreas de núcleos rurais, pelo uso sem outorga da água e pelas ampliações de rodovias. Então, nós perguntamos: como um Governo pode permitir que seja plantada soja ao redor de uma unidade de conservação? É estarrecedor. Eu vou ler aqui um trecho, rapidamente, de um estudo feito por sete pesquisadores da Universidade de Brasília, no campus de Planaltina.
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Evidências da pressão antrópica na Esecae (Estação Ecológica de Águas Emendadas). O mercúrio é um metal volátil altamente tóxico, e a sua concentração nos solos é um indicador ambiental da sua disponibilidade para entrar na cadeia alimentar e contaminar os consumidores, vida selvagem e seres humanos. Nossos estudos sobre as concentrações de mercúrio nos solos da Estação Ecológica Águas Emendadas apontam que o interior, e o subsolo da reserva natural já estão ameaçados pelas rodovias próximas. Isto é devido à proximidade e ao tráfego intenso das rodovias adjacentes à Esecae, os solos da estação estão sendo contaminados, atingindo patamares recordes em comparação com outras regiões poluídas no mundo.
É estarrecedor. É a prova cabal da falência da gestão do Distrito Federal a esse maravilhoso fenômeno hídrico, que é de todos os brasileiros, de todas as brasileiras. Ao norte, as águas de Águas Emendadas vão para Goiás, Tocantins, Pará e Maranhão. Ao sul, nós interagimos com Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Paraná.
Ou seja, esta Casa, que é a Casa dos estados da Federação, precisa trazer a discussão de Águas Emendadas para dentro do Senado Federal. E é um apelo que eu deixo a V. Exa., para que se faça uma audiência pública específica para Águas Emendadas, que se chamem os Estados de Goiás, de São Paulo, Minas Gerais, todos eles, Tocantins, Pará e o GDF presente, para que se discuta o que está sendo feito na região de Águas Emendadas.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO BENINI - Porque não basta proteger o fenômeno dentro de uma unidade de conservação, é preciso pensar o entorno, a área de amortecimento e de impacto ambiental. E as leis que temos não estão sendo suficientes para proteger Águas Emendadas.
O Governo do Distrito Federal, hoje, em uma matéria para a Rede Globo, onde nós levantamos esses problemas, deu uma resposta sobre a DF-128 - que é uma das grandes causas desse problema do mercúrio - e a resposta foi que está sendo um projeto de duplicação da DF-128. É o único projeto que o Governo do Distrito Federal tem atualmente para a região de Águas Emendadas. É lamentável.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Nós que agradecemos a sua participação, Marcelo, e vamos fazer essa provocação aos demais colegas aqui no Senado Federal.
Vou passar a palavra agora para o Newton. Newton é representante do Salve o Rio Melchior.
Seja bem-vindo, Newton.
O SR. NEWTON VIEIRA (Para expor.) - Muito obrigado. Bom dia a todas e todos!
O Rio Melchior é visto pela população, por parte da população do DF, como o Tietê do Distrito Federal. E, por parte dos cientistas, ele é visto como um paciente na UTI. E, como um paciente na UTI, ele precisa de um monitoramento paralelo e intensivo, o que não acontece hoje.
Hoje, o monitoramento é feito pelas próprias empresas que usam o rio. Não é feito por elas, mas elas contratam empresas, e as empresas são subservientes a elas. É tanto que uma dessas empresas, a empresa que é abatedora de frango, no início do ano, nós descobrimos que a estação de tratamento dela, de tratamento dos resíduos, está quebrada. E aí ela está mandando para a Caesb. As estações de tratamento da Caesb não têm condições de tratar esgoto industrial. E, mesmo assim, eles estão recebendo esses resíduos de lá.
Fora isso, a situação do Rio Melchior é totalmente degradante. Ele recebe o esgoto de 46% da população do DF. O esgoto de 1,4 milhão pessoas é despejado no Rio Melchior.
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Além disso, tem uma concessão da Adasa... Atualmente ele recebe 100 milhões de litros de esgoto por dia, mas a Adasa concedeu uma outorga para que ele receba 200 milhões de litros de esgoto por dia, aumentou 100%!
Fora isso, ele recebe chorume. Em 2019, ele recebia 400 metros cúbicos por dia, mas aí ele recebeu uma outorga, de 2019 a 2021, e aumentou mais de 450%. Hoje ele pode receber 2.210 metros cúbicos de chorume.
Somados a isso, ele recebe ainda mais 12 mil metros cúbicos dos resíduos da indústria abatedora de frango.
A Secretaria de Meio Ambiente, antes de tudo isso, informou que o Rio Melchior recebe três vezes mais esgoto do que a sua capacidade de vazão.
(Soa a campainha.)
O SR. NEWTON VIEIRA - Isso sem contar o chorume, sem contar o resíduo de frango e sem contar o esgoto clandestino.
No início deste ano, em janeiro, uma equipe de pesquisadores da UnB, coordenada pelo Prof. José Francisco Júnior, foi até o Rio Melchior, analisou as águas e encontrou material pesado, encontrou cobre nessas águas. Por esse motivo, eles estão sendo retaliados de forma escondida, mas estão recebendo muita pressão, estão sendo extremamente criticados.
Fora isso, militar em defesa do Rio Melchior é algo extremamente perigoso. Eu, juntamente com um colega, já sofremos cinco atentados com arma de fogo. Em um desses atentados a imprensa estava presente no local e também foi vítima. E nós recebemos várias ameaças, ameaças como uma que vou tentar achar aqui para mostrar. (Pausa.)
Então é uma situação... A gente fica se perguntando... Os professores foram ao local, fizeram essas análises e, por isso, estão sendo prejudicados. Qual é o cientista que vai lá analisar essa água de forma independente, se o que foi lá está sendo retaliado?
E as ameaças são como esta aqui.
(Procede-se à reprodução de áudio.)
O SR. NEWTON VIEIRA - Esta é a situação no Rio Melchior: além da poluição degradante, existem essas ameaças, existem esses atentados, tanto que o número de pessoas que vão é super-reduzido, por conta dessa situação.
E o pedido que a gente faz para a senhora... É que esses professores elaboraram um sistema de monitoramento. O que acontece hoje é que essas empresas podem jogar o que quiserem lá porque não há um laudo que aponte o quanto elas estão jogando, o quanto elas estão poluindo o rio. Não se sabe quanto cada uma dessas empresas polui o rio, o quanto cada uma delas contribui para a degradação do rio.
E esses professores fizeram um estudo que é capaz de apontar o quanto cada empresa contribui para a degradação do rio, para que elas possam ser responsabilizadas por isso e também pela proteção do rio, porque elas destroem e não são responsabilizadas por nada. Não se tem nenhum tipo de compensação ambiental no Rio Melchior, nunca teve e não tem nenhum projeto para isso. Foi previsto pelos especialistas que, entre 2028 a 2030, ele será considerado um rio morto.
Então, agradeço bastante a todos pela oportunidade e agradeço à senhora por essa disponibilidade em defesa das águas do DF.
Muito obrigado a todas e todos. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Obrigada, Newton, obrigada pela sua participação.
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É difícil, não é, gente?
Olha, uma manhã bem difícil aqui, mas vamos trabalhar - o que interessa é isso.
Vou passar agora a palavra para o Guilherme Jaganu, que é da Associação Colina e Fórum de Defesa das Águas, e que representa também o Lago Oeste.
Seja bem-vindo, Guilherme.
O SR. GUILHERME JAGANU - Lago Sul.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Ah, está aqui Lago Oeste.
O SR. GUILHERME JAGANU - É Lago Sul. Lago Oeste é...
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Eita. (Risos.)
É Lago Oeste, está certo.
Desculpe-me.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. GUILHERME JAGANU - Se eu falar Lago Oeste, o pessoal do Lago Oeste vai brigar comigo.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - É. Desculpa.
Não sei de onde eu tirei esse Lago Sul, mas tudo bem, é porque eu li aqui em cima.
Não, aqui.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Não li errado, não.
Mas tudo bem, Guilherme, seja bem-vindo.
Prazer em revê-lo.
O SR. GUILHERME JAGANU (Para expor.) - Primeiro, bom dia a todos.
Obrigado, Senadora, obrigado aos participantes. As exposições de vocês foram maravilhosas. Nós aprendemos sempre, o tempo todo, com vocês.
Hoje em dia, nós temos 37 milhões de pessoas no Brasil sem água potável, sem acesso à água potável.
Como disse a Maria Silvia, o uso perdulário da água é uma questão que existe no Lago Sul, no Lago Norte e no Park Way.
Nós não somos contra piscina em casa, contra nada disso, mas esse preço tem que ser pago, o preço dessas pessoas usarem muito mais água do que a maioria da grande população brasileira - tem que ter um custo disso, e a lei brasileira não permite esse tipo de coisa.
O Lago Sul, o Lago Norte e o Park Way têm reservas de águas - aquíferos, nascentes, córregos - que abastecem o Lago Paranoá e que estão constantemente ameaçadas.
Há pouco tempo, foi construído um colégio na beira do Córrego Mata Gado - meus amigos já não aguentam mais eu contar essa história, mas eu vou continuar contando -, foi construído, na beira do Córrego Mata Gado, um colégio de alto custo, um colégio da elite brasiliense, e esse colégio tem cinco mil alunos que jogam esgoto dentro do Córrego Mata Gado.
A Caesb diz...
(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME JAGANU - ... que não tem outro lugar para se jogar esgoto a não ser o rio ou o córrego. Brasília não tem rio, Brasília tem córrego. Um dos maiores rios que tem é o Rio Melchior, e vivem dizendo que não tem outro lugar. Tem sim, tem soluções inovadoras.
Outra coisa que meus amigos não aguentam mais ouvir: tem os biodigestores, tem captação de água das residências, das indústrias, dos comércios, das clínicas, dos hospitais, que pode ser tratada ali mesmo e depois jogada dentro dos córregos.
Isso não existe no Brasil, não existe esse estudo, esse planejamento, essa vontade política de fazer esse tipo de coisa.
O meu amigo Genaro, o Prof. Genaro, me passou uma importante informação: as microbacias do Córrego Manoel Francisco estão sendo ilegalmente drenadas nos últimos 25 anos, incluindo suas nascentes. Mais de 95% das casas não tem Habite-se, para usar esse tipo de coisa. Os rios de asfalto no entorno do Rio das Antas, bem como a extensão do Lago Sul, demonstram construções de infraestrutura urbana, residências sob microbacias, incluindo soterramento e construções de nascentes, rios e lagos.
Só mais um minuto, Senadora.
A Escola das Nações foi construída em cima de uma lagoa, a Lagoa do Jacamim, como todo mundo já está sabendo.
R
No Lago Sul, existem centenas de nascentes sendo impactadas totalmente, fora as áreas verdes que estão sendo utilizadas como estacionamento, então com a absorção de água sendo absolutamente prejudicada em todas essas regiões, do Lago Sul, do Lago Norte e do Parkway.
O Lago Sul e o Lago Norte foram idealizados por Lúcio Costa e por Niemeyer como jardins do Plano Piloto, e hoje em dia são usados de forma absolutamente arbitrária e inconveniente.
Muito obrigado, Senadora, muito obrigado a todos pelo tempo de fala. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Nós é que agradecemos. Desculpa, viu, Guilherme? Realmente, é representante do Lago Sul aqui.
Vou passar agora para a Regina, agora sim, representante do Lago Oeste. Desculpa.
Tem que apertar o botão vermelho.
Isso, ficou amarelinho...
A SRA. REGINA CÉLIA PEREIRA FERNANDES DE SOUZA - Aqui, assim?
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Isso.
A SRA. REGINA CÉLIA PEREIRA FERNANDES DE SOUZA (Para expor.) - Bom dia, obrigada pela oportunidade e obrigada por ver tantas amigas, aí na mesa, de longa data, não é?
Nós moramos numa região privilegiada, chamada Núcleo Rural Lago Oeste. Ele fica ao lado do Parque Nacional de Brasília.
Ele é uma ilha de biodiversidade conservada, o Parque Nacional de Brasília, Rebio da Contagem... o Parque Nacional nos abraça de um lado e a Rebio da Contagem nos abraça de outro; e tem um projeto do parque da borda, de que a Senadora foi Relatora - Parque da Chapada, não é? -, que inclui as nossas encostas do Lago Oeste, onde existe bastante água, bastantes riachos pequenos que abastecem a Bacia do Maranhão e que têm uma biodiversidade muito grande.
Então, nós somos mais ou menos 1,3 mil chácaras, que tentamos manter conservadas, numa terra que voltou a ser - não, se mostrou ser - da União. Nós fizemos lá todo o trabalho de licenciamento ambiental, durante dez anos, mais ou menos. Foi um longo caminho. Essa licença ambiental está parada há cinco anos no ICMBio por falta de um pagamento de uma taxa da SPU.
Então, o que é que acontece? O Lago Oeste é uma região privilegiadíssima e ele está sob o foco do PDOT, de ser transformado em área de expansão urbana, pela segunda vez. No PDOT passado, houve já essa tentativa e ela, felizmente, foi barrada, mas agora as tratativas nesse intuito são muito fortes.
Existe um termo de conciliação assinado...
(Soa a campainha.)
A SRA. REGINA CÉLIA PEREIRA FERNANDES DE SOUZA - ... em março do ano passado, pelo então Presidente da República com o então Governador do DF, passando as terras da União para a Terracap, o que nos sinaliza fortemente que o Lago Oeste vai entrar no PDOT com uma característica de propriedade da Terracap.
Então, a gente tem fortemente se debatido contra isso, porque nós somos uma região muito preservada, importante para as águas e importante para a fauna - importantíssima para a fauna devido à nossa vizinhança.
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Então, o nosso apelo mesmo, forte, é que nos destravem essa licença ambiental. Basta um pequeno pagamento da GRPU - da SPU atual - no valor de R$42 mil, que nós não podemos pagar por força de lei - temos o recurso -, mas para nos garantir que a nossa característica continue a ser rural e que a gente continue a preservar a região, que nós não estamos conseguindo preservar por conta de grilagem e parcelamentos que não são fiscalizados. É uma estratégia bastante comum essa.
Então, agradeço a atenção de todos, e esperamos ajuda.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Eu que agradeço, Regina.
Vou passar a palavra agora para a Rosário, representante do Caub 1.
A SRA. MARIA DO ROSÁRIO ALMEIDA (Para expor.) - Bom dia! Obrigada pela oportunidade.
Eu represento a Associação dos Produtores Rurais do Caub 1. Nós estamos localizados ali na Região Administrativa do Riacho Fundo II e estamos na Zona Amortecimento da Arie da Granja do Ipê. Lá nós estamos em cima de um grande aquífero, que é o manancial Ponte de Terra, e na Granja do Ipê nós temos a nascente de dois importantes córregos, que são o Ipê Coqueiros e o Capão Preto, classificados pela Adasa como Classe 1.
Eu fiz um documento, que depois eu vou entregar para a Senadora, com todos os nossos pleitos.
Na Arie estão nascentes dos córregos Capão Preto e Ipê Coqueiros, que contribuem para o abastecimento da Bacia do Paranoá. Lá na nossa região existem várias fisionomias do Cerrado, como matas de galerias, campos úmidos, cerrado rupestre, cerrado típico, mas a região tem sofrido ataques recorrentes de grilagem. Na última ação desses grileiros, eles suprimiram lá mais de 4 mil metros de mata nativa. Então, é uma situação bastante grave.
Eu fiz algumas propostas sobre as quais eu espero, Senadora, que depois a gente tenha a oportunidade, mesmo em outros encontros, de falar, mas o Caub 1 e a Arie da Granja do Ipê pedem socorro. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Muito obrigada, Rosário. Então, eu agradeço ao Marcelo, representante das Águas Emendadas, ao Newton, do Rio Melchior.
Desculpe-me, professor.
O SR. GENARO RIBEIRO DE PAIVA (Para expor.) - Se eu puder me pronunciar...
(Soa a campainha.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Por favor. É porque não me deram o seu nome aqui. Perdão! Por favor.
O SR. GENARO RIBEIRO DE PAIVA - Sou o cidadão Genaro Ribeiro de Paiva.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Sim. Por favor.
O SR. GENARO RIBEIRO DE PAIVA - Atuei no Senado algumas vezes, como assessor de Senadores, elaborando o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, a propriedade intelectual e a Lei de Biossegurança. Então, é um prazer retornar a esta Casa.
"Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende". Assim nos ensinou Guimarães Rosa.
Eu vou tentar em poucos segundos passar o que eu entendo ser a mensagem principal.
O Brasil é riquíssimo em atributos naturais e tem uma legislação também de grande precisão e riquíssima. O que fragiliza a nação não é a ausência da lei, mas a prevaricação quanto à sua aplicação, por todas as instâncias, cidadão e poder público. Como resolver essa matéria é o nosso desafio, particularmente considerando que a grande inovação da Constituição de 1988 foi o art. 225. Ele criou o direito intergeracional. É esse direito que nós estamos debatendo aqui.
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Brasília tem 11 mil nascentes e córregos, grande parte dos quais, se procurarmos nos belíssimos instrumentos gerenciais do Distrito Federal - e tem um trabalho belíssimo feito nessa área -, grande parte desses rios são chamados... Senadora, a senhora tem um título de eleitor, a senhora tem uma identidade, a senhora tem um número. Os rios de Brasília, mais de 99% deles são chamados "rios sem nome". Ora, quem não tem nome não tem identidade. Como assegurar a proteção de quem não tem identidade?
Existe um método na capital federal - e eu não gosto de demonizar; aprendi com a vida, não se demoniza, criam-se interlocuções -, a Terracap foi criada em 1974 a partir da Novacap. A Terracap foi criada em 1974 como uma empresa com fins pecuniários, especulativa. Ela faz a gestão de um território coletivo a partir da ótica do lucro. Há que se disciplinar essa matéria. É facultado a qualquer um de nós aterrar nascentes, aterrar córregos, lotear, permitir nacional e internacional operar na violação à Constituição Federal? É fundamental que o Supremo, com grande humildade...
(Soa a campainha.)
O SR. GENARO RIBEIRO DE PAIVA - ... mas com autoridade, olhe para essa matéria.
O método - eu estudei longamente imagens satelitais nacionais e internacionais - que existe na especulação imobiliária hoje na capital federal usa da drenagem integral de microbacias hidrográficas. Eu não começo num determinado ponto, eu ataco a microbacia com uma ciência, um método, objetivando sempre a especulação e o maior lucro.
De que me vale a Constituição Federal e o Código Penal se eu não protejo a Constituição Federal? Eu estou quase acabando.
Eu sou muito precoce, porque eu fui acusado por grandes escritórios e advocacia de Brasília e por gestores do Distrito Federal de praticar grilagem, construção, montar resistência armada a partir de 1960 - eu nasci em 28 de setembro de 1959, eu tinha três meses.
E eu vivia num ambiente belíssimo. A senhora, toda vez que ultrapassar a Ponte JK, olhe a 45 graus e veja uma mata entre a QI/QL 26 e a QI/QL 28. Ali é a microbacia do Rio das Antas, ali morava a comunidade mais antiga do DF, uma das mais antigas. Eram descendentes de índios e negros. E a minha família - eu voltando da UCLA - comprou um imóvel, duas nascentes e protegia aquilo maravilhosamente bem até que a Terracap... eu tenho um croqui presenteado por um funcionário da Terracap que se revoltou, veio a mim e disse: "Cara, isso é um grande absurdo! Está aqui a proposta da Terracap de estabelecer sobre as nascentes, sobre o dossel dessas florestas que vocês protegem [eu abro parênteses] 'áreas de parcelamentos futuros'". Pode o particular ou o público planejar parcelamentos futuros sobre nascentes e sobre o dossel de árvores?
Aqui acabando, a nação aplaude o STF e os dois outros Poderes quando fizeram frente à tentativa de golpe de estado, que maravilha o que nós podemos eventualmente herdar como decisão dos três Poderes. A minha dúvida: quem protege a cidadania quando o criminoso é o Estado?
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Aqui é uma denúncia formal. O Estado brasileiro, federal... E aqui eu chamo atenção: a Terracap tem como acionistas, com 50,5%...
(Soa a campainha.)
O SR. GENARO RIBEIRO DE PAIVA - ... o Governo distrital e, com 49,5%, o Governo Federal. Quem nos protege quando as instâncias federais e distritais optam por violar a Constituição Federal?
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Nós que agradecemos a participação.
Eu passo agora para a Muna Ahmad Yousef, que é da Academia Planaltinense de Letras, Artes e Ciências.
Seja bem-vinda, Muna.
A SRA. MUNA AHMAD YOUSEF (Para expor.) - Obrigada. Obrigada pela delicadeza de me conceder este tempo.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF. Fora do microfone.) - Sim.
A SRA. MUNA AHMAD YOUSEF - E que mesa brilhante, que orgulho de ser mulher e estar aqui hoje, neste momento, ouvindo essas mulheres tão competentes!
E há uma coisa que - eu vou ser breve - eu quero deixar registrada aqui, Senadora Leila. Primeira coisa: é um convite para a senhora conhecer a Estação Ecológica de Águas Emendadas, que é uma ilha de Cerrado no nordeste do Distrito Federal, pressionada ao sul pela cidade de Planaltina (DF); e ao norte pela cidade de Planaltina, de Goiás; e a leste por soja; e a oeste também por soja, pela Embrapa, por assentamentos e sem contar...
A senhora conhece Planaltina, não é? Planaltina é porta de entrada do Nordeste brasileiro, cresce ano a ano e, ao mesmo tempo, tem um potencial incrível. A gente tem ali o Vale do Amanhecer; a gente tem ali um dos maiores espetáculos teatrais do Brasil central, que é a Via Sacra; a gente tem 24 núcleos rurais, 64 escolas públicas; e é uma cidade que tem um marco geodésico, que é a pedra fundamental; tem uma zona rural rica e propícia para o turismo rural. Então, assim, se for em nome do desenvolvimento, a gente tem muitos argumentos para barrar esse avanço, essa sanha que está destinada para o território norte. Porque os grileiros não dormem, não descansam e nem dormem cedo, e Águas Emendadas agora, o entorno dela... Porque o problema é o entorno; a unidade em si está protegida, mas, assim, ambientalmente não existe “fora”, o que acontece fora impacta o dentro. Então, assim, o nosso apelo...
(Soa a campainha.)
A SRA. MUNA AHMAD YOUSEF - ... vai neste sentido: vamos conhecer, vamos formar uma comissão de Senadores e Deputados Federais, já que Águas Emendadas contribui para águas continentais, influencia o Cone Sul, influencia a Região Amazônica, então vamos formar um grupo de pessoas, de políticos, de Senadores e Deputados para conhecer essa região? Porque importa ao Tocantins, importa ao Maranhão, importa ao Paraná, importa ao Cone Sul. Então, a gente podia fazer essa força-tarefa, porque está muito rápido, sabe? Todo dia nasce um grande atacadão, todo dia nasce um novo condomínio na região de Águas Emendadas. Então, é isso.
E é uma das últimas fronteiras, não é? É uma ilhazinha - a gente viu aqui vários mapas aéreos do Distrito Federal -, é uma ilha de Cerrado, é permanentemente impactada por esse fluxo e é a primeira cidade de quem chega do Nordeste brasileiro. E o Brasil olha para a capital. Então, se Brasília e as outras cidades crescem, pensem em como Planaltina cresce de um ano para o outro.
É isso.
Muito obrigada e parabéns pela iniciativa. (Palmas.)
R
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Nós que agradecemos, Muna.
Gente, olha, foi muito rica esta audiência agora pela manhã. Teremos mais. Agora vamos provocar o Governo Federal, o ICMBio - nós estamos precisando -, o Ministério Público. Acho que é importante trazermos aqui para o debate o Governo, as instituições federais, para aprofundarmos melhor sobre esse debate.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - E distritais, claro.
No momento certo, nós vamos fazer, mas eu acho que é importante vermos visões distintas e depois juntarmos os grupos, enfim, para não constranger ninguém e para que consigamos trazer o máximo de subsídios para o nosso trabalho aqui.
Eu tenho uma pergunta que vou deixar aqui para as nossas expositoras, coisa bem rápida, mas eu não tenho como deixar de fazer esta pergunta aqui, que foi feita até pela nossa Consultoria, a nossa assessoria aqui: as exposições aqui postas deixam claro para o Senado e o Distrito Federal, quando do ordenamento territorial, que o impacto na segurança hídrica à população é deveras grave. Soma-se a isso o cenário de emergência climática que vivemos, ou seja, o debate de hoje está intimamente ligado às questões relacionadas à justiça climática. Nesse sentido, eu gostaria de perguntar objetivamente às nossas convidadas: quais são os próximos passos? Com o que nós aqui do Poder Legislativo podemos contribuir em termos de aprimoramento da nossa legislação? O que devemos fazer junto à sociedade civil? Quais são as ações emergenciais a serem adotadas pelo poder público, sobretudo o Governo Federal, aqui representado pela ANA, e o Governo do Distrito Federal?
Eu gostaria, rapidamente - não é preciso necessariamente que todas respondam -, se alguém quiser responder essa pergunta, porque nós temos a assessoria aqui, e eu acho interessante.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Pode ser, Lúcia.
A SRA. LÚCIA MENDES (Para expor.) - Eu vou dar uma pequena contribuição. Eu comecei a minha fala mais cedo...
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Eu vou dar dois minutos para a resposta aqui, porque o povo já está quase me puxando a orelha aqui, a TV Senado.
A SRA. LÚCIA MENDES - Não, é rápido, é rápido.
É que eu comecei a minha fala hoje...
(Soa a campainha.)
A SRA. LÚCIA MENDES - ... falando o seguinte: conhecer para proteger, proteger para preservar, preservar para não perder a chance de sobreviver e garantir o futuro.
A Muna trouxe um dos próximos passos, Senadora, em que eu acho que a gente pode investir, que é exatamente conhecer melhor essas realidades, fazer visitas a campo e promover isto que a senhora também já ventilou: uma nova audiência ou um novo encontro, em que a gente possa trazer outros protagonistas, outros atores para essa discussão, que é principalmente o ICMBio, que está a cargo da fiscalização nesses territórios das APAs, o Ibama, o Ministério Público Federal, o Ministério Público Distrital, para a gente tentar construir um entendimento comum, alinhar as informações e poder sugerir efetivamente algumas ações para o Distrito Federal, como a gente pode dialogar com isso.
(Soa a campainha.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Obrigada, Lúcia.
Por favor, Maria.
A SRA. MARIA SILVIA ROSSI (Para expor.) - Acho que essa pergunta é muito grande, ela é muito grande. Então, eu vou abordar só dois aspectos com que eu queria contribuir e deixar em aberto para a gente aprofundar depois. Estou assumindo que este é o começo de uma longa jornada, em que a gente não larga mais a mão de ninguém - certo? -, que todos que estão aqui vão trazer mais, e outros e outros, e assim a gente consegue trazer o tema, dar vida a este tema.
R
Senadora, eu acho que, além de conhecer, que é o primeiro passo... Como disse a Lúcia, a gente não protege o que não conhece. Então, a sua ida e a da equipe, mais gente conhecendo, isso é fundamental.
No topo disso, eu queria ver se a gente conseguiria tomar duas ações muito objetivas. A primeira é a estratégia em relação ao Pdot. O Pdot é o instrumento mais potente que cada município e estado têm...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA SILVIA ROSSI - ... para decidir o grau de impacto que a gente vai ter sobre os usos; ele é o principal e o mais nobre elemento que a gente tem, do ponto de vista do marco legal; ele que tem mais impacto, é o mais potente. É sobre ele que a gente tem que agir agora. Ele está em revisão. Não está clara a metodologia de revisão. Os grupos de trabalho que foram instituídos - na época, eu era do Governo - evoluíram no diagnóstico. O central é esclarecer como é a estratégia do prognóstico, da proposição, para não vir um pacote fechado, daqui a pouco, e a gente debater em termos de fato consumado. Acho que esse é o ponto.
O segundo ponto, permita-me só acrescentar: um dos instrumentos que ainda é muito uma caixa-preta é a outorga de direito de uso de água. A gente tem licenciamento ambiental e licenciamento urbanístico. A Adasa, em conselho... A Caesb, em conselho, disse: "Não consigo trazer água para esse empreendimento". Crixá é um, e tem vários outros. A Caesb diz: "Não consigo prover água potável". Aí a Adasa vai lá e diz: "Não tem problema. Perfura aí e usa água subterrânea". Para empreendimento de 35 mil pessoas, empreendimento de 40 mil pessoas. E a gente não tem sequer transparência no enquadramento das águas superficiais, qual o padrão de qualidade que a gente quer, em 20 anos, das águas, nem em quantidade, nem no enquadramento de qualidade.
Então, uma das caixas-pretas é chamar a Adasa e a gente decidir aqui, com transparência, como é que isso vai trabalhar em favor da população, abrindo a base de dados, porque a base de dados hoje da Adasa é um dado morto. A gente trabalha nele com o PDF. Ele não é interoperável, não é um dado vivo, que a gente consegue integrar com outros bancos do Governo. Então esse é um outro ponto. Mas, principalmente, quais são as estratégias que a gente tem de outorga do direito de uso nos próximos vários anos? Esse é um planejamento existente. E como isso corrobora ou não para o desenho de um Pdot sustentável?
São as duas sugestões que eu queria dar.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Pois não. Só lembrando, Maria, que a questão do Pdot eu vou na condição de acompanhamento e tudo, porque o Pdot nós não tratamos aqui - todos sabem -, mas é importante termos Parlamentares...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - ... exatamente - representantes da bancada federal fazendo esse acompanhamento. E assim nós o faremos.
Obrigada pelas sugestões.
Por favor, Alba.
A SRA. ALBA EVANGELISTA (Para expor.) - Cada uma falou um pouquinho da pergunta gigante, e eu vou falar um pouquinho da questão de mobilidade.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Está certo.
A SRA. ALBA EVANGELISTA - A gente está falando de mudança climática e nós temos inventário de gases de efeito estufa no DF, que já é o segundo inventário. Esse inventário mostra o seguinte: que o setor que mais emite gases de efeito estufa é o setor de energia - e, dentro do setor de energia, é o transporte rodoviário.
Então, se a gente quer trabalhar mudanças climáticas, acho que precisamos ter uma mudança de paradigma no planejamento do sistema de transportes. Parar de incentivar a matriz de combustível fóssil e priorizar outras mais limpas, energias mais limpas: o trem, o VLT, seja o que for. Então, isso eu acho que é uma coisa que precisa avançar na cabeça dos planejadores. Brasília não pode ficar vivendo no século passado, não é?
R
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - DF) - Bom, eu quero agradecer a participação de todos, inclusive dos representantes das entidades e coletivos que compõem o Fórum das Águas. Mais uma vez, agradeço também aos nossos expositores e também, remotamente, a participação da Juliana Pinheiro, representante da Adasa, e da Profa. Liza Andrade, da UnB.
E quero dizer que é isto: nós estartamos um processo aqui e nós vamos começar, através do que foi exposto aqui, a tratar de alguns encaminhamentos.
Agradeço-lhes porque foi uma aula para nós, principalmente do cenário da realidade, informações riquíssimas do cenário realmente preocupante em que vivemos com relação a essa questão dos nossos recursos hídricos aqui na região, no Distrito Federal.
Nada mais havendo a tratar, eu agradeço a presença de todas e de todos.
Nós não temos quórum para aprovar a ata; não tem problema, deixamos para a próxima reunião.
Meu muito obrigada a todos vocês.
Até a próxima. (Palmas.)
(Iniciada às 9 horas e 16 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 45 minutos.)