10/08/2023 - 54ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Horário

Texto com revisão

R
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a 54ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A audiência pública será realizada, nos termos do Requerimento 60, de 2023, de nossa autoria e de outros Senadores, para debater o tema: "Os benefícios fiscais para agrotóxico e a violação de direitos humanos".
A reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania, na internet, em senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria, 0800 0612211.
R
Como já me informaram que os participantes da primeira mesa já estão no plenário, eu vou convidá-los e farei a minha fala de abertura do tema para dar uma visão para todos que estão nos assistindo pelo sistema de comunicação do Senado. Refiro-me, claro, à TV, e também à Rádio Senado e Agência Senado.
Convido, de imediato, Ana Paula Carvalho de Medeiros, Procuradora da República, Ministério Público Federal. Seja bem-vinda, Ana Paula! (Palmas.)
Paula Johns, ACT Promoção da Saúde - sistema tributário 3S. Está aqui a Paula.
Seja bem-vinda! (Palmas.)
Marcelo Firpo Porto, Coordenador do Neepes (Núcleo Ecologias, Epistemologias e Promoção Emancipatória da Saúde) e pesquisador do Cesteh/ENSP/Fiocruz. Está aí?
Seja bem-vindo! (Palmas.)
Deputado Estadual Marcos José Abreu, Presidente da Comissão de Turismo e Meio Ambiente da Alesc e representante do Fórum Catarinense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos.
Seja bem-vindo, mestre! (Palmas.)
Eu vou fazer uma fala de introdução do tema. Naturalmente o meu pronunciamento foi construído pela nossa consultoria e assessoria do gabinete. Vocês podem ajustar, naturalmente, porque a intenção aqui é das melhores, mas nem sempre a gente acerta. Vamos lá.
Sejam todos bem-vindos. Esta audiência pública da Comissão de Direitos Humanos é uma parceria com a Frente Parlamentar Ambientalista e a Frente Parlamentar Mista de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional e de Combate à Fome.
Há um impacto enorme do uso dos agrotóxicos na violação dos direitos humanos. À medida que exploramos essa conexão entre saúde e meio ambiente, torna-se evidente que nossas ações têm consequências diretas sobre a qualidade de vida das pessoas e sobre o equilíbrio do ecossistema.
De acordo com os dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), as intoxicações causadas pelo uso de agrotóxicos totalizam cerca de 13 milhões de casos anuais, sendo 2,1 milhões deles registrados apenas em países em desenvolvimento. Cerca de 20 mil mortes ocorrem a cada ano em todo o mundo, com a maioria dessas tragédias atingindo países de terceiro mundo. Um levantamento realizado pela Agência Pública e Repórter Brasil, com base em dados do Ministério da Saúde, entre 2019 e março de 2022, revelou que aproximadamente 14 mil pessoas foram intoxicadas por agrotóxicos durante esse período, resultando tristemente em 439 mortes. Devemos destacar que entre as vítimas estão principalmente homens e mulheres negros. As circunstâncias que levaram a essa intoxicação variam desde tentativas de suicídio até acidentes e a exposição decorrente do uso constante de pesticidas.
R
Os estudos científicos conduzidos em várias partes do mundo têm associado o uso do agrotóxico a uma série de doenças preocupantes, incluindo leucemias e outros tipos de câncer. Mal de Parkinson, além de lesões em órgãos vitais, como fígado, pele e pulmões, alergias, desequilíbrios hormonais e problemas de comportamento de saúde mental estão entre as consequências - são algumas delas.
É inegável que o debate sobre o uso de agrotóxicos transcende questões meramente técnicas ou econômicas. Envolve, por óbvio, os direitos humanos, pois esses produtos comprometem a saúde e a qualidade de vida das pessoas, especialmente as mais vulneráveis.
Não podemos negligenciar o impacto ambiental, pois o uso indiscriminado de agrotóxicos resulta na contaminação do solo, da água, do ar, afetando diretamente a biodiversidade e a sustentabilidade como também o ecossistema.
A lembrança do livro Primavera Silenciosa, de Rachel Carson, publicado em 1962, nos Estados Unidos, ecoa em nossos corações e mentes. Esse livro pioneiro alertou sobre os perigos do pesticida DDT, que estava causando danos irreparáveis aos ecossistemas, à saúde humana e à vida em geral.
Hoje, enfrentamos desafios semelhantes e temos a responsabilidade de agir de forma decisiva para evitar mais danos irreversíveis.
Nossa missão é clara: defender a justiça e os direitos humanos, garantindo que o meio ambiente seja respeitado e protegido.
Devemos perseguir um desenvolvimento sustentável em que o crescimento econômico não ocorra às custas da saúde humana e da vitalidade do nosso planeta.
Cada um de nós desempenha um papel fundamental neste debate. Por isso estamos, aqui, na busca de soluções que equilibrem as necessidades da sociedade com a preservação da natureza.
Essa é a introdução para começarmos o debate.
O político sempre é um generalista. Eu não sou diferente. Fala de tudo, mas fala no amplo e no geral.
A partir deste momento, vamos ter, então, a opinião de especialistas, de altos conhecedores do tema.
De imediato, eu passo a palavra à Procuradora da República, do Ministério Público Federal, Dra. Ana Paula Carvalho de Medeiros.
Vamos dar dez minutos, com mais cinco, porque são diversas mesas.
Mas eu serei tolerante para que cada um possa expressar livremente o seu pensamento.
A SRA. ANA PAULA CARVALHO DE MEDEIROS (Para expor.) - Bom dia a todas e a todos.
Muito obrigada, Senador Paulo Paim.
Agradeço o convite para participar. Agradeço à Comissão de Direitos Humanos e à Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida.
Pretendo respeitar os dez minutos que me foram dados.
Pedi uma apresentação, não sei se ela já está sendo colocada. (Pausa.)
R
Acho que podemos ir passando.
Bom, vou falando já sobre a primeira tela, então.
Temos ali uma conceituação de agrotóxicos, uma conceituação legal, e só lembrando que eles são, então, produtos cuja finalidade é alterar a composição da flora e da fauna para preservá-la da ação danosa de seres considerados nocivos.
Então, naturalmente, são produtos que agridem o meio ambiente, provocando contaminação do solo, da água, perda da biodiversidade, mortandade de abelhas, e que provocam danos à saúde e contaminação de produções agroecológicas e de outras culturas agrícolas sensíveis, dentre outros danos.
Embora alguns grupos estejam mais vulneráveis e expostos, sujeitos a violações de direitos humanos causadas por esses produtos, toda a população está exposta, sujeita à exposição pelo consumo de alimentos contaminados e de água contaminada, assim como pelas pulverizações, que geram a dispersão desses produtos pelo ambiente, atingindo quilômetros, como pesquisas já apontam.
Podemos ir para a próxima lâmina.
O Inca aponta que, dentre os danos à saúde, nós temos os efeitos agudos, que são aqueles que ocorrem imediatamente após a exposição, e temos os efeitos crônicos que são aqueles que vão ocorrendo após exposições repetidas a pequenas doses ao longo do tempo.
Dentre esses efeitos crônicos, nós podemos salientar: impotência, aborto, depressão, problemas respiratórios graves, problemas no funcionamento do fígado e dos rins, anormalidade na produção de hormônios, incapacidade de gerar filhos, malformações, problemas no desenvolvimento intelectual e físico das crianças. Estudos apontam grupos de agrotóxicos como prováveis e possíveis carcinogênicos. Esses são os efeitos crônicos, que são efeitos que não são registrados. Não tem nenhum sistema de captação das doenças causadas por agrotóxicos.
Os efeitos agudos: quando a pessoa tem uma intoxicação aguda, ela é registrada, deve obrigatoriamente ser registrada no Sinan. Na próxima tela, nós temos um relatório do Ministério da Saúde, a partir dos dados extraídos do Sinan onde se vê que, de 2007 a 2015, conforme as observações do Ministério da Saúde, possivelmente em decorrência do aumento da comercialização dos agrotóxicos, que nos deixaram hoje no patamar de maior consumidor do mundo, e também pela melhoria da atuação da vigilância e da assistência à saúde para identificar esses casos e notificar, nós tivemos nesse período um pouco mais de 84 mil casos de intoxicações agudas notificadas, uma parte delas resultando em óbito.
E a Organização Mundial de Saúde estima que, para cada caso notificado, existam outros 50 não notificados. Então, a gente tem uma ideia, pode ter uma ideia da dimensão do problema de saúde que esses produtos causam.
Próximo, por favor.
Nesse cenário, então, de graves danos, de mortandade de abelhas, que tem sido um problema crucial, e de danos gravíssimos à saúde, nós temos a desoneração fiscal desses produtos.
R
Atualmente, no Brasil, o ICMS tem redução de 60% da base de cálculo em operações estaduais, isso em virtude de um convênio firmado em 1997, que vem sendo renovado anualmente pelos Governadores dos estados. Esse mesmo convênio autoriza a isenção do ICMS nas operações internas. O meu estado, que é o Rio Grande do Sul, é um que tem a isenção, e acredito que quase todos tenham.
A Cofins tem alíquota zero; a contribuição para o PIS-Pasep, alíquota zero; Imposto de Importação, alíquota zero para os grupos listados; e o IPI, também alíquota zero.
No próximo eslaide consta um relatório da Abrasco. Segundo um levantamento feito pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva, no ano de 2017 essas desonerações geraram uma perda de receita de R$9,85 bilhões para os cofres públicos do país; e os principais beneficiários dessas desonerações são os produtores de commodities, porque quase 80% desse agrotóxico consumido no país e que leva a todos esses danos à saúde e ao ambiente são utilizados nas culturas de soja, milho, algodão e cana, e grande parte dessas culturas é exportada.
Portanto, os preços são estabelecidos pelo mercado internacional. Não se pode nem dizer que há um impacto significativo da desoneração no preço no mercado internacional porque são outras formas de fixação.
O próximo, por favor.
Agora, então, na PEC 45, que altera o Sistema Tributário Nacional, o cenário que nós temos.
Primeiro, ali no art. 145, ele prevê que o Sistema Tributário deve observar, entre outros princípios, a defesa do meio ambiente.
Depois, vêm, então, as alterações, basicamente, no que importa aqui para este tema.
Vai ser instituído o imposto sobre bens e serviços, a contribuição sobre bens e serviços, e é previsto, também, pela Constituição, o imposto seletivo, que é exatamente para reduzir o uso de substâncias danosas; é um imposto que incide sobre a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, nos termos da lei.
Prevê, ainda, a PEC que a lei complementar que vai instituir esses impostos e a contribuição vai definir as operações sobre as quais as alíquotas desses tributos - IBS e CBS - serão reduzidas em 60%, referentes a insumos agropecuários e aquícolas, alimentos destinados ao consumo humano e produtos de higiene pessoal.
Então, a nova proposta da PEC... Porque até pouco tempo atrás, quando estava na Câmara ainda, ela previa, diretamente, a imunidade dos agrotóxicos, mas, devido à celeuma que ocorreu, foi feita essa alteração e está sendo deixado o caminho aberto para, em lei complementar, vir essa redução da tributação, do imposto e da contribuição sobre bens e serviços.
O que me parece um fato mais grave é que o imposto previsto no art. 153, VIII, que é exatamente um imposto seletivo, que existe exatamente para diminuir o uso de bens e produtos que causam danos à saúde e ao meio ambiente, não vai incidir sobre bens e serviços cujas alíquotas sejam reduzidas pela lei complementar, em que podem ser incluídos os agrotóxicos. Então, isso eu acho que é o ponto principal que exige atenção.
R
Ainda na próxima tela, nós temos ali um dos argumentos ou o maior argumento dos defensores da desoneração dos agrotóxicos, a alegação principal, que é de que, no momento em que fossem tributados, haveria um aumento no custo da cesta básica, prejudicando, então, os consumidores mais vulneráveis. Mas para isso a própria PEC já tem uma solução, que fica criada a cesta básica nacional de alimentos, e uma lei complementar vai definir que produtos vão compor essa cesta básica, e sobre esses produtos os tributos IBS e CBS terão alíquota zero. Então, esse principal argumento fica excluído, e aí a importância, então, desse art. 8º.
Por que são um contrassenso os benefícios fiscais para agrotóxicos? Incentivar o uso de agrotóxicos através de benefícios fiscais vai na contramão do que se espera de um país que prevê o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, que impõe o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações, vai na contramão do direito constitucional à saúde, fere o princípio da prevenção, o princípio da precaução, o princípio do poluidor pagador, o princípio da seletividade tributária, dentre outros.
E, também, o Brasil, no momento em que desonera os agrotóxicos, está na contramão da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, agenda da ONU que tem em seu preâmbulo: "plano de ação em favor das pessoas, o planeta e a prosperidade".
Dentre os objetivos dessa Agenda 2030 nós temos a Meta 2.4, pela qual o Brasil assumiu o compromisso de garantir até 2030 o acesso de todas as pessoas a alimentos seguros, além de sistemas sustentáveis de produção de alimentos e práticas agrícolas resilientes que aumentem a produtividade e a produção, que ajudem a manter os ecossistemas, que fortaleçam a capacidade de adaptação às mudanças climáticas, as condições meteorológicas extremas - secas, inundações e outros desastres - e que melhorem progressivamente a qualidade da terra e do solo.
O Tribunal de Contas da União já fez uma análise, que consta ali na próxima tela, e identificou os desalinhamentos nas ações governamentais nas principais políticas públicas relacionadas à Meta 2.4, dando um especial destaque ao incentivo à utilização de agrotóxicos no setor agrícola brasileiro.
Isto constou do acórdão do TCU:
Ao reduzir a tributação, o governo brasileiro fomenta o uso desses produtos e atua de forma contraditória e contraproducente aos objetivos das políticas que buscam garantir sistemas sustentáveis de produção de alimentos, a exemplo da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica - PNAPO e do Plano Agricultura de Baixo Carbono - ABC.
Constatou também o Tribunal de Contas da União que não há acompanhamento e avaliação das desonerações fiscais. É um requisito para que seja mantida a desoneração acompanhar e ver se realmente isso está trazendo um ganho para a sociedade. O que justifica uma desoneração é um ganho social, e não vem sendo avaliado.
Então, como considerações finais, eu diria que os produtos que geram injustiças sociais sanitárias e ambientais não deveriam ter benefícios fiscais de qualquer natureza.
R
A tributação dos agrotóxicos geraria, no médio prazo, uma redução do uso desses produtos, e isso está muito bem avaliado no relatório da Abrasco, que eu imagino que vai ser apresentado. O sistema tributário atual não diferencia os agrotóxicos em razão de seu grau de toxicidade para a saúde e sua periculosidade para o meio ambiente - agrotóxicos extremamente tóxicos e extremamente perigosos têm a mesma carga tributária de agrotóxicos menos nocivos à saúde e ao meio ambiente. Isso também é um ponto em que a proposta da reforma tributária não evolui também, no sentido de estimular a adoção de alternativas menos nocivas.
Por fim, a PEC 45, de 2019, abre o caminho para desoneração dos agrotóxicos por lei complementar. Então, acho que nós precisamos, enquanto sociedade, definir se nós queremos a manutenção desse modelo agropecuário dependente de agrotóxicos que impactam o meio ambiente, a saúde e causam uma série de violações a direitos humanos, ou se nós queremos migrar para modelos mais sustentáveis. Acho que este é o momento em que este debate está sendo muito bem...
(Soa a campainha.)
A SRA. ANA PAULA CARVALHO DE MEDEIROS - ... iniciado aqui no Senado.
Muito obrigada. E estou à disposição pelo e-mail ali.
Obrigada, Senador. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Nós que agradecemos à Dra. Ana Paula Carvalho de Medeiros, Procuradora da República, do Ministério Público Federal, pela sua exposição, que tenho certeza de que está sendo um alerta ao povo brasileiro - não só a sua fala, tenho certeza de que a dos outros convidados também - deste momento em que estamos vendo, infelizmente, o avanço do agrotóxico contaminando todo o ecossistema e a própria alimentação de todos nós.
Vamos em frente.
Passo a palavra à Dra. Paula Johns, da ACT Promoção da Saúde, Sistema Tributário 3S.
A SRA. PAULA JOHNS (Para expor.) - Bom dia. Bom dia a todos, a todas. Bom, é um prazer estar aqui.
Primeiro, gostaria de parabenizar o Senador Paulo Paim. Prazer revê-lo depois de tantos anos.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Pandemia, pandemia.
A SRA. PAULA JOHNS - É, é.
E parabenizo pela iniciativa. Eu acho fundamental a gente discutir isso aqui nesta Casa; nas duas Casas. Aliás, agora a reforma tributária está aqui e é muito...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - (Fora do microfone.) ... os louros indevidos, a iniciativa é de vocês. Eu só abri as portas.
A SRA. PAULA JOHNS - Sim, mas você abraçou a iniciativa. Gratidão.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Então, uma salva de palmas para vocês. (Palmas.)
Eu só abri as portas - viu? -, o que é a minha obrigação. Mas eu agradeço pelo...
A SRA. PAULA JOHNS - Claro.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - ... elogio que deu por estamos aqui.
A SRA. PAULA JOHNS - A Casa é nossa, mas alguém precisa abrir para a gente poder entrar. Então, agradecemos por isso também.
Bom, pode passar, o próximo.
Rapidamente, a ACT é uma organização da sociedade civil que trabalha com fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis, principalmente tabaco, álcool, alimentação, e atividade física, também promovendo os objetivos de desenvolvimento sustentável, principalmente na área da saúde, fazendo advocacy por políticas públicas, entendendo que elas têm muito maior impacto na saúde da população como um todo, tirando um pouco a responsabilidade exclusivamente do indivíduo para que a gente, como sociedade, aprove leis e políticas públicas que facilitem o acesso ao que é saudável para a gente, ao que é bom para a gente. O Estado tem essa responsabilidade.
Pode passar.
E eu estou aqui hoje representando a Reforma Tributária 3S, que é um coletivo ainda maior de organizações que trabalham não só na área da saúde, mas na área da justiça social, na área da sustentabilidade.
R
Quem não conhece a iniciativa eu convido - essas tecnologias maravilhosas - a pegar ali o QR code para conhecer mais detalhadamente o conjunto de propostas, que, de forma sintética, dialoga muito com o tema que está sendo discutido aqui hoje. Acho que, principalmente nesta fase da reforma tributária, a gente está falando muito da questão de ser saudável, de ser sustentável.
Eu estou muito contemplada pela fala da Ana Paula, que trouxe várias explicações técnicas que já nos dão embasamento aqui e já facilitam a administração do tempo, porque já está me apavorando aquele relógio lá...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É tranquilo, porque é aquele tempo lá, mais cinco e mais cinco se necessário, aí dá vinte.
A SRA. PAULA JOHNS - Não, não, acho que 15 está bom.
Mas, enfim, a gente defende, enquanto Reforma Tributária 3S, que a reforma tributária, também nas suas próximas fases, dê conta das enormes desigualdades que existem no Brasil. Isto tem que ser tratado também na reforma tributária: o nosso sistema é absolutamente regressivo. A gente não tributa renda, por exemplo, não tributa patrimônio, a gente só tributa consumo. Mas a gente precisa também discutir o que a gente está tributando mais e o que a gente está tributando menos. Então, vamos navegar fazendo essa conexão com o tema dos agrotóxicos.
Pode passar.
Num contexto geral, acho que é um pouco para nos dar... Acho que é um momento muito complexo. Quando a gente olha para a situação atual, o que o Estado brasileiro está financiando? A gente está financiando aquilo que faz mal à saúde, aquilo que faz mal ao meio ambiente e aquilo que gera mais desigualdade, mas a gente pode fazer diferente, porque o que existe aqui hoje é fruto de escolhas que fizemos no passado, é fruto de políticas públicas que foram e vêm sendo adotadas. Então, acho que o momento agora é uma enorme oportunidade de a gente plantar as sementes do que a gente quer ver, porque também demonstra o poder das políticas públicas. Quando a gente quer e existe vontade política... As evidências existem, elas estão mais do que colocadas. Então, a gente precisa desse conjunto de setores.
E a gente está falando aqui de uma sindemia global - pode passar -, que é um sistema incapaz de garantir o direito humano a uma alimentação adequada e saudável porque ele fala... É um conceito que foi lançado no relatório da revista The Lancet, em 2019, e basicamente o que ele fala é que a pandemia global da desnutrição está ligada à obesidade, porque a má qualidade da alimentação, o tipo de alimento que a gente está consumindo hoje, as mudanças climáticas e seus impactos ambientais e esse conjunto de fatores têm soluções parecidas também. Acho que a tributação, o que a gente tributa, é uma chave muito importante para a gente conseguir mudar esse cenário para outra direção.
Pode passar.
A gente está sofrendo hoje com a má nutrição e a gente tem um cenário periclitante de fome. Conforme dados de 2022, são mais de 30 milhões passando fome e mais de 120 milhões em situação de insegurança alimentar.
A gente tem como guia o nosso Guia Alimentar para a População Brasileira, que fala também da questão da sustentabilidade, da comensalidade, da regionalidade, de você adquirir acesso a alimentos da sociobiodiversidade. Enfim, ele traz uma orientação muito importante para a gente fazer esse desenho de políticas que precisam estar em torno disso para garantir o direito humano a uma alimentação adequada e saudável.
Pode passar.
E esses sistemas alimentares... Volto ao que eu já trouxe anteriormente. Esse estágio que a gente tem hoje é uma estratégia que foi construída nos anos 60 e 70, foi um esforço do Estado e da sociedade brasileira. Esse cenário de exportação de commodities foi construído e é fruto de uma série de mecanismos: redução ou isenção de tributos sobre os insumos, como, por exemplo, os agrotóxicos também. Houve uma série de benefícios, uma série de políticas públicas estruturantes para as agroindústrias, para as indústrias de alimentos, na exportação - a gente não tem imposto de exportação.
R
E a soja é uma cadeia produtiva junto com o milho também, que a Ana Paula trouxe - milho e algodão, salvo engano. Mas, enfim, a soja... A gente acabou de fazer um estudo específico sobre a cadeia da soja - então, eu a trago aqui como exemplo -, é a cadeia que mais se beneficiou desse conjunto de políticas públicas, de decisões que foram tomadas na sociedade brasileira e que estão causando impacto gigantesco, seja na nossa saúde, como indivíduos, como pessoas, seja no meio ambiente, gerando mais desigualdade no campo e na sociedade.
Pode passar.
Esse dado... Eu peço desculpa, o Marcelo vai poder me atualizar, porque já aumentou. A soja é a cadeia agrícola com maior utilização de agrotóxicos. Isso aqui é de 2013. Se a gente já tinha um valor muito alto em 2013, passados dez anos, a gente sabe que a produção aumentou ainda mais e esse número é ainda mais grave do que trago aí como ilustração.
Pode passar.
Para a gente pensar: que lógica a gente precisa pensar para dar prioridade nas políticas públicas? A gente precisa olhar para essa intersecção entre esses três elementos. Quais são os alimentos mais consumidos pela população brasileira, inclusive nas discussões relativas à cesta básica? É uma reflexão importante olhar para a cesta básica não deixando de ver essa perspectiva que traga a questão ambiental e a questão da saúde pública, além da questão do acesso a uma alimentação adequada e saudável para toda a população brasileira. Então, a gente precisa olhar... Do ponto de vista da saúde pública, a gente sabe que o consumo de ultraprocessados é um dos grandes elementos dessa transição na dieta brasileira, a gente está deixando de comer arroz e feijão para comer mais alimentos ultraprocessados. Isso é gravíssimo, isso tem impacto direto na saúde da população.
Só lembrando aqui, eu trago até uma referência de estudo, vamos lembrar que ultraprocessado também tem agrotóxico. A gente acaba, na discussão com a população em geral: "Ah, não vamos comer mais verduras e legumes porque eles estão cheios de agrotóxicos". Os ultraprocessados ainda mais, porque a base de produção dos ultraprocessados são essas commodities que estão acabando com a nossa saúde. Então, é para lembrar que a gente precisa ter um olhar muito atento para essa intersecção.
Pode passar.
Tem esse estudo, que foi um levantamento, já tem duas publicações, que revela a presença de agrotóxicos nos alimentos ultraprocessados. Acho muito relevante trazer isso aqui, trazendo assim, acho que a Ana Paula já trouxe alguns elementos de como é o sistema tributário hoje, daí essa oportunidade de a gente mudar. A gente tem hoje isenção para uma série de produtos ultraprocessados, como a gente faz a utilização do IPI. E aí um exemplo que acho muito gritante, que é uma concorrência desleal entre a produção orgânica e a produção convencional, é que você chega, em todo o sistema tributário...
(Soa a campainha.)
A SRA. PAULA JOHNS - ... em toda a cadeia da produção do alimento, chega lá ao final, o suco de uva integral orgânico paga muito mais tributo do que o néctar de uva, que é um ultraprocessado. Quer dizer, às vezes o alimento da produção orgânica acaba saindo mais caro para o consumidor lá na ponta, além de o produtor ver uma concorrência desleal, porque ele não vai poder botar Roundup na lavoura dele. É mais trabalhoso você plantar, você tem tecnologias para isso, mas você não pode incentivar aquilo que é ruim para a gente.
Pode passar.
R
Então, a gente precisa... O imposto seletivo precisa, para esses produtos comprovadamente negativos para saúde e meio ambiente, como tabaco, álcool, ultraprocessados e agrotóxicos, olhar obviamente para as evidências. Eu sei que isso vai ser discutido mais tarde, mas a Ana Paula já trouxe um elemento gravíssimo que está ali no texto para ser votado, que é uma inversão de lógica que não faz nenhum sentido.
A lógica do imposto seletivo devia ser inversa, porque colocaram aquele jabuti lá dentro, que o que tem benefício tributário não pode ter imposto seletivo. A lógica do imposto seletivo é inversa: o que tem imposto seletivo comprovadamente nocivo à saúde e ao meio ambiente é que não pode ter benefício tributário.
A gente não pode, de forma alguma, inverter essa lógica em um texto de uma emenda constitucional. Isso, assim, é um absurdo. Eu acho que é um escândalo que tinha que estar na primeira página do jornal, na minha opinião, esse parágrafo estar ali dentro dessa forma, com uma inversão de lógica tão absurda. Então, eu acho que isso é muito grave e eu acho que é importante que esta Casa esteja muito atenta para isso.
Pode passar.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu vou garantir seu tempo, mas essas questões, como as duas painelistas que falaram primeiro estão colocando, é importante que vocês também nos apresentem como sugestão de emenda. A gente se coloca à disposição, e isso que você fala agora, por exemplo, me preocupou muito. Inverteu a lógica com prejuízo à alimentação...
A SRA. PAULA JOHNS - E à saúde, ao planeta e ao Brasil, ao desenvolvimento sustentável no Brasil.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Como eu te roubei um minuto, vou te dar de volta.
A SRA. PAULA JOHNS - Obrigada.
Bom, aí eu trago até uma recomendação do Conselho Nacional de Saúde, que foi passada recentemente, agora no dia 20 de julho. Eu só destaquei a parte do texto que pede a supressão desse art. 9º, que faz essa inversão de lógica.
Pode passar.
Tem outra recomendação também do Conselho Nacional de Saúde específica relacionada aos agrotóxicos, a mitigação dos seus impactos na saúde, considerando todas as evidências também falando sobre isso. Ou seja, são duas recomendações recentes que eu acho importante a gente estar aí disseminando.
Pode passar.
E aí, eu acho que é importante trazer isso também porque, com a publicação desse estudo do Ministério da Fazenda relativo às estimativas dessas alíquotas, toda essa discussão, se vai ter benefício, a gente vai ter que aumentar a alíquota geral e tal... Então, vamos olhar para isso. Quais os benefícios que realmente trazem para a população?
Pode passar para o próximo.
No próximo está ali. Quando a gente olha justamente naqueles grupos agro, cesta básica e regime específico, em pontos percentuais, é um dos maiores impactos. Então, a gente tem que olhar com muito cuidado para aquilo exatamente para a gente não estar dando benefício para agrotóxicos ali dentro dos insumos agropecuários ou para os ultraprocessados dentro dos insumos agropecuários.
Ultraprocessados não podem estar, de forma alguma, dentro da cesta básica. Tem que ser uma cesta básica nacional saudável e sustentável. Então, assim, vamos olhar para isso. Então, a gente não pode aumentar a alíquota geral para estar dando benefícios para um setor que hoje já é extremamente beneficiado.
Hoje a gente tem uma oportunidade de corrigir as distorções tributárias que existem no Brasil hoje. E ali tem essa da cesta básica. Então, é um momento muito importante fazer essa discussão, colocar todos esses elementos na mesa para a gente conseguir chegar à melhor solução possível para todos nós.
Pode passar.
E aí, eu já vou fechar com algumas...
R
A gente vem fazendo levantamentos regulares, seja dentro do próprio Congresso ou em institutos de pesquisa de opinião. Esse foi o Parlamento Socioambiental, que a gente fez em parceria com o IDS, sobre a opinião dos próprios Parlamentares: quais os produtos devem ter seus tributos aumentados pela reforma tributária? Vocês vão ver que há álcool, tabaco... Porque a gente ouve falar, até quando se fala em imposto seletivo, a primeira coisa que se lê na imprensa é álcool e tabaco, mas eu acho que tem outros produtos, como os ultraprocessados, e a gente vê ali o apoio, o aumento de tributo para agrotóxico, de mais de metade dos Parlamentares.
Essa foi uma pesquisa que já tem um pouco mais de tempo. Vou trazer agora uma de março de 2023, também.
Pode passar.
Esse aumento de tributos... Essas foram menções espontâneas. O agrotóxico está com um número menor ali, mas foi uma outra pergunta um pouco diferente. A concordância do Congresso, em geral, em relação ao subsídio com recurso público para produtos prejudiciais à saúde, é de mais de 60% - eu não estou enxergando nada, mas é aquele número lá na ponta, acho que são 63%.
Também há uma concordância muito grande de que a gente vincule esses impostos arrecadados com produtos nocivos à saúde...
(Soa a campainha.)
A SRA. PAULA JOHNS - ... de volta à promoção da saúde, para se poder vincular o Fundo Nacional de Saúde. Enfim, existe uma série de possibilidades.
Pode passar.
Só para fechar aquele ali, eu acho que tem um elemento... A gente precisa tentar minimamente mitigar as externalidades negativas causadas por esses produtos na sociedade, é o mínimo que a gente pode fazer.
E outra coisa que a gente monitora regularmente, anualmente é a opinião da população sobre essa questão da reforma tributária. Também há um grau de concordância muito grande em relação a tributar coisas que fazem mal à saúde e ao meio ambiente.
Pode passar.
Nove a cada dez acham que tem que ter... Essa daí é uma que acabou de sair do forno, a gente não divulgou ainda, aqui eu estou mostrando... É inédito, acabou de chegar o resultado dessa: nove de dez brasileiros desejam aumento de tributos para nocivos à saúde. A população, na maioria, acredita que eles deverão ser aumentados para produtos que são nocivos para a saúde e para o meio ambiente. Também seis a cada dez são contrários a que o Governo conceda incentivos para fabricantes de produtos fazem mal à saúde.
Pode passar.
Aí tem o dado da cesta básica. Só destaco, também, que 64% da população mencionaram agrotóxicos com relação aos produtos nocivos à saúde que devem ter seus impostos aumentados, logo atrás de bebida alcoólica, produtos responsáveis por altas taxas de emissão de carbono. Acho que a gente está vendo de forma muito forte como é que a população está vendo essa questão da sustentabilidade.
Pode passar.
É isso. Acho que eu fechei com a opinião pública para a gente saber que existe esse respaldo da população.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dra. Paula Johns, ACT Promoção da Saúde, sistema tributário 3S.
Como eu a interrompi para dizer, vou repetir agora...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - ... que essas contribuições remetam para nós, para que nós possamos transformá-las em emendas. O importante da audiência pública, além da visibilidade do tema, que é fundamental - o de hoje, como tantos outros que esta Comissão já patrocinou - são os encaminhamentos posteriores, que a gente combine com vocês o que a Comissão deve fazer nesse campo da importância da defesa da saúde, da vida, enfim, do planeta.
Agora vamos em frente.
Marcelo Firpo Porto, Coordenador do Neepes (Núcleo Ecologias, Epistemologias e Promoção Emancipatória da Saúde) e pesquisador Cesteh/Ensp/Fiocruz.
R
O SR. MARCELO FIRPO PORTO (Para expor.) - Bom dia a todas e a todos aqui presentes.
Agradeço o convite e cumprimento a mesa, a plenária e a todos que nos assistem.
Já que eu tenho um pouquinho mais de tempo do que eu pensava, vou fazer esta introdução para dizer que, na última vez em que...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Repito: dez minutos mais cinco minutos; se necessário, mais cinco minutos.
O SR. MARCELO FIRPO PORTO - Acho que não vou passar desse tempo, não.
Na última vez em que eu estive para uma audiência pública, aqui no Congresso Nacional, foi em um contexto bastante diferente do de agora.
Colocaram-me para debater o pacote do veneno, o chamado pacote do veneno, com uma pessoa da Embrapa, indicada pelo agronegócio. E haviam me dito que haveria Parlamentares que também estariam no nosso campo na defesa da saúde, do ambiente, da agroecologia, da produção orgânica, mas estava tendo uma outra pauta, e aí eu fiquei sozinho. Presidindo a mesa - e eu sentado ao lado -, numa hora, o Deputado Federal ligado à indústria do agrotóxico; em uma boa parte do tempo, a mesa foi presidida pela Senadora, que foi Ministra da Agricultura, nos últimos anos do Governo anterior; e a plenária inteira totalmente diferente da coloração desta plenária.
Quando eu sabia que isso vai acontecer, eu sempre faço isto: apesar de ser um cientista muito dedicado à produção de argumentações de confiabilidade e à qualidade das pesquisas que eu realizo, eu sempre peço para a minha mãe - na época, ela já tinha partido - e para os meus amigos de diferentes perspectivas espirituais e religiosas para criarem uma proteção de energia para quando eu entrar num ambiente, porque, quando você vem a Brasília, ao Congresso e a outros ambientes também, nem sempre o ambiente é muito favorável; é preciso criar realmente muita proteção. E eu tive realmente muita proteção naquele dia, porque, no final das contas, as pessoas que estavam discutindo comigo diziam: "Não, concordamos com a visão do pesquisador, que é um utópico e deseja um mundo maravilhoso, com que eu também compartilho, mas a realidade e a necessidade do superávit fiscal, etc. exigem que a gente vá devagarzinho para isso. Isso é um horizonte certamente para os nossos netos, para os nossos filhos e para aqueles que, neste momento, podem comprar alimentos mais saudáveis, mas que realmente podem ser, eventualmente, mais caros, mas para a gente sustentar a nossa balança fiscal e produzir alimentos mais baratos, precisamos dos agrotóxicos ou dos defensivos agrícolas".
Então, hoje o contexto é bem diferente.
Começo nessa introdução, que eu não pretendia fazer, dizendo também que eu me sinto muito bem, não somente porque o Senador Paulo Paim é uma referência na história da luta trabalhista, social e pela democracia neste país, mas, porque, quando eu olho o Senador, eu me lembro muito do meu pai e de pessoas da minha família. Eu sinto, assim, uma intimidade, apesar de a gente não se conhecer. (Palmas.)
Então, sinto-me muito bem e vejo aqui pessoas muito queridas na luta contra os agrotóxicos.
R
Então, com isso, eu faço essa iniciação para dizer que eu sou um dos autores dos dois relatórios - sou membro do GT Saúde e Ambiente, da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) -, junto com o meu querido companheiro e amigo de pesquisa Wagner Soares, do IBGE. Desde 2005, até antes, a gente vem trabalhando sobre os impactos econômicos dos agrotóxicos. Ele é um economista, e a gente vem discutindo, produzindo artigos internacionais e nacionais. Existe muito pouca gente trabalhando nisso.
Então, a gente produziu, em 2020, dois relatórios. O primeiro relatório para, justamente, dizer por que a isenção fiscal acaba gerando esse número que é muito complexo e difícil de calcular: algo em torno de 10 bilhões; tem incertezas envolvidas, mas é muito alto. E, num segundo relatório, depois que o agronegócio pagou uma consultoria e publicou um relatório dizendo que isso iria afetar a cesta básica, a gente fez um segundo relatório para contra-argumentar isso e dizer que isso não tinha nada a ver.
Então, em vez de eu apresentar os detalhes hoje meio chatos desses números, eu preferi me dedicar aos princípios e argumentos fundamentais que estão em debate neste momento. Por que a reforma tributária não pode ou não deveria cometer o absurdo de defender um veneno em vez do remédio de promover o que alguns economistas chamam de paraíso da poluição, ou seja, radicalizar e dar continuidade ao que a Paula, inclusive, acabou de mencionar: as externalidades negativas da economia?
Dito isso, eu quero dizer que eu sou, desde 1986, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública - que tem esse belo nome - Sergio Arouca, uma liderança da reforma sanitária. Eu vou tentar ser breve, a partir de agora, para falar sobre quais são as questões fundamentais que eu vou trabalhar.
A gente tem buscado contabilizar os danos. Eu trabalho com uma agenda diversa para pensar, atualmente, a questão da promoção emancipatória da saúde, mas isso é um outro tema. Além da justiça social, ambiental e sanitária, a gente tem falado da justiça cognitiva, que é muito importante para pensar a diversidade e a democracia, e onde estão os quilombolas, os indígenas, as periferias urbanas, que também produzem conhecimentos; não é só a ciência que produz conhecimento. Mas isso é uma outra história, fundamental para o nosso país e para o futuro do planeta.
O que eu quero falar aqui para vocês é, basicamente, responder a três perguntas. Primeira: por que os agrotóxicos não podem ser tratados como insumos agropecuários? As falas da Procuradora Ana Paula e também da Paula já me ajudaram muito. Por que eles não podem ser tratados como enxadas e tratores? Ou, ainda, como medicamentos - que é o argumento recorrente? Segunda pergunta - as três estão interligadas: por que uma tributação diferenciada e menor para os agrotóxicos atrasa a transição em direção ao modelo mais sustentável e saudável de agricultura, tão fundamental para o planeta e para a vida das pessoas, e reforça essa ideia de sermos um trágico paraíso da poluição? E, por fim: por que a cesta básica, a agricultura familiar e o próprio agronegócio não necessariamente serão prejudicados por uma taxação maior de agrotóxicos? Pelo contrário.
Eu vou falar desses três temas, rapidamente, para dialogar com a plenária, com a mesa e deixar mensagens estratégicas para este debate.
R
Vamos, então, à primeira questão. É óbvio que a gente não precisa discutir que enxada, trator e outros insumos agropecuários são importantes e geram muitos benefícios. Claro que possuem também riscos, mas aqueles que usam são supostamente capacitados. São riscos controlados, localizados e restritos àquele ambiente e aos agricultores que utilizam, e que, por exemplo, são capacitados para evitar riscos de acidentes, por exemplo.
No caso dos agrotóxicos, a situação muda. Eles são essencialmente perigosos. Por definição, agro é tóxico, agrotóxico. Ele foi produzido para... Desculpem a expressão, essa palavra, num clima cada vez mais difícil, de tanto ódio, tanto negacionismo, tanta falta de gentileza e capacidade argumentativa, mas os agrotóxicos foram feitos, originalmente, para matar plantas, fungos e insetos, em defesa da planta ou do que deveria ser protegido. Mas, ao mesmo tempo e por extensão, eles afetam a saúde, adoecem e matam os seres vivos ao redor.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO FIRPO PORTO - Não é casual que os agrotóxicos tenham sido produzidos como tecnologia bélica na Primeira Guerra Mundial. Os agrotóxicos modernos surgem daí. Portanto, eles são muito perigosos e causam uma série de problemas sanitários, ambientais etc.
Diferente de ambientes fechados, como tratores, quem segura uma enxada ou fábricas, os agrotóxicos são utilizados ao ar livre. Afetam não apenas os trabalhadores agrícolas que os aplicam e que são muito afetados, mas as casas ao redor, as creches de crianças e de cidades afetadas pelas pulverizações aéreas de aviões, que deveriam ser proibidos no país, como o são em outros países, de dispersar agrotóxico na atmosfera. Eles contaminam solos, rios, águas, ar e, por consequência, todos os seres vivos.
A poluição pode ir tão longe que afeta mesmo urso polar no Ártico, que são afetados pela existência da primeira geração de agrotóxicos, os organoclorados, que são os poluentes orgânicos persistentes, os chamados POPs. Nesse sentido, a propaganda tem alguma razão: agro é POPs.
Seguindo o mesmo raciocínio, é um absurdo comparar agrotóxico aos medicamentos. Isso é trágico, e tem muita gente que fica repetindo isso. Os medicamentos são feitos para ser, localizadamente, aplicados a doenças humanas; passam por uma forte regulamentação, em especial aqueles mais perigosos, que dependem de um controle e um acompanhamento, uma indicação estrita de médicos especialistas. Eles estão circunscritos ao corpo do paciente. Já os agrotóxicos contaminam todo, como chamam as nossas guerreiras indígenas, o corpo território, todo o ambiente ao redor, todas as plantas e alimentos, que também eles dizem que querem proteger, mas que acabam sendo consumidos pelas pessoas depois.
Por isso, há uma enorme contradição na reforma tributária, como já foi dito e vai ser repetido durante todo o tempo: há uma enorme contradição, porque ao mesmo tempo, ela acertadamente isenta medicamentos que vão curar inclusive o câncer ou combater os efeitos colaterais, mas, no mesmo momento, no parágrafo subsequente, isenta insumos agropecuários, com a perspectiva de incluir os agrotóxicos, que provocam um câncer.
R
Como a gente vai explicar isso para qualquer ser humano razoável, com uma capacidade de raciocínio e de coração minimamente razoável? É isso o que a gente tem que fazer: relembrar que devemos simplesmente ser razoáveis, defender a ciência e a compaixão. Mais do que um defensivo, seria mais razoável comparar os agrotóxicos, na verdade, a uma droga que gera dependência química, pois, no caso do paciente doente, que deveria ser tratado, o caso dos agrotóxicos é um modelo de agricultura químico-dependente que se expressa nas commodities agrícolas, pautadas em monocultivos de grande extensão que não podem viver sem agrotóxicos, porque não podem cultivar os agroecossistemas. Eles precisam eliminar a biodiversidade em prol de agroquímicos que vão orientar aquele território, aquele ambiente, para uma única produção específica, negando dessa forma a própria produção da vida e da perspectiva fundamental de convivência com os diferentes ecossistemas e grupos que neles vivem, indígenas, agricultores, quilombolas etc.
Portanto, do ponto de vista tributário, os agrotóxicos, como já foi dito e será sempre repetido, devem ser tratados na lógica do que alguns economistas chamam de tributo do veneno: cigarros, bebidas alcoólicas, alimentos nocivos etc.
Bom, eu vou tentar ser mais objetivo para falar das duas questões que me restam.
A segunda questão é: por que uma tributação diferenciada e menor para os agrotóxicos atrasa a transição para um modelo mais sustentável e saudável de agricultura? A resposta é relativamente simples. Do ponto de vista econômico e ambiental, a gente...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO FIRPO PORTO - ... quando reduz impostos de agrotóxicos, distorce a relação custo-benefício de outros métodos mais saudáveis e sustentáveis que combatem pragas e doenças na agricultura. É isso o que os economistas chamam de externalidades negativas, esses impactos desses outros métodos. Em vez de a gente, então, mitigar ou neutralizar as externalidades negativas, a redução de impostos incentiva mais o veneno do que o remédio. E os países são chamados, por economistas que adotam essa perspectiva, de paraísos da poluição, o caminho contrário à sustentabilidade e ao futuro do planeta saudável. Fazem isso, muitas vezes, em nome do desenvolvimento, do emprego - inclusive pessoas de esquerda.
Sabe-se lá mais de Deus, em nome do quê, onde está a sabedoria dessa decisão? Então, os agrotóxicos mais baratos, na verdade, influenciam a decisão de agricultores no curto prazo, porque, muitas vezes, quando faltam a eles incentivos, informação, políticas públicas, inclusive consciência ecológica e política, organização política, eles acabam sendo despreocupados com o futuro e a falta de solidariedade. Naquele momento, mais individualistas adotam agrotóxicos em vez de reduzi-los e caminharem em uma direção mais orgânica.
A literatura especializada indica que, mesmo países com muito mais controle, como os Estados Unidos, têm muita externalidade negativa. A indicação é de algo em torno de US$12 bilhões de custos ambientais, sociais e sanitários nos Estados Unidos.
R
A nossa perspectiva, embora não haja cálculos precisos, estudos sobre isso no Brasil, é de que não deve ser diferente, porque a gente usa mais agrotóxico, mais perigoso que os dos Estados Unidos e com muito mais vulnerabilidade institucional, com muito mais problema de regulação e controle na aplicação e no uso.
Isso vai bater no SUS. Nossa companheira do Ministério da Saúde vai falar sobre isso. Vai bater na sociedade como um todo.
Então, os dados censitários também de 2006 e de 2017 mostram que, inexoravelmente, há uma tendência de quem usa agrotóxicos de sempre comprar mais agrotóxicos e pagar mais, porque quanto mais usam, mais dependentes ficam e mais difícil é matar as pragas e é preciso se utilizar mais e mais, até que os agrotóxicos se tornam insustentáveis e vem uma nova geração de agrotóxico. Parece até uma mudança de droga para uma outra droga.
O problema, então, do incentivo ao veneno, também não é novo. Eu não vou falar sobre isso. Já foi falado aqui sobre o que já vem acontecendo com a isenção da tributação desde 1997 - um absurdo! Mas, agora, o que a gente vai fazer com a tributação é uma situação mais complicada, ou seja, a gente, atualmente, está pagando algo em torno de R$10 bilhões, pode ser um pouco mais, talvez. Sem contar outros efeitos, como, inclusive, a exportação ou a redução do imposto de exportação etc. Mas, se a reforma atual for aprovada do jeito que está, a situação pode se manter ou se agravar. E essa é uma questão que a gente vai ter que acompanhar com muito cuidado nos anos seguintes, caso a tragédia do nosso país continue.
Finalmente, então, só para concluir, eu quero dizer que a pergunta é: será que a cesta básica vai aumentar? A agricultura familiar e o agronegócio também vão se prejudicar? E a resposta que a gente indica é que não. Podem ser, no curto prazo, em diferentes setores, prejudicados. Mas por quê? Quando a gente vai ver quem usa agrotóxico, 85% dos agrotóxicos vão para as grandes commodities - soja, milho, café, açúcar, cana-de-açúcar etc.
Então, a gente espera que o impacto dessa tributação não vá, inclusive, gerar muito impacto no aumento de preços, porque ele é regulado pelo mercado internacional, a ingerência é menor, mas, sim, vai afetar a lucratividade do setor. Aí podem falar assim: "Coitados, são tão pobres! Pobre coitado o agronegócio!". Na verdade, o setor agropecuário faturou, em 2022, quase R$1,2 trilhão. Não vou dizer que tudo isso é do agronegócio especificamente, tem várias outras cadeias, mas tem muita gordura e muita riqueza, inclusive para controlar a Deputado e bancada no Congresso e o processo decisório e propaganda em televisão.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO FIRPO PORTO - Então, só para concluir - já estou acabando -, eu vou dizer que a gente... Não vai deixar o agronegócio de ser competitivo. A agricultura no Brasil... Já dizia Jorge Ben: a gente mora num país tropical, abençoado por Deus. A gente tem terra agricultável, a gente tem clima, apesar das mudanças climáticas que estão mudando isso - é um outro problema -, mas ainda capaz de proporcionar safra com previsão de colheita todo ano e mesmo disposição de força de trabalho de agricultores e elevada mecanização.
Portanto, não vai ser afetado. Pelo contrário, é uma tendência inevitável no planeta, mesmo com a crescente participação da China, uma crescente seleção de produtos e commodities agropecuárias, agrícolas, que respeitem o meio ambiente e o planeta. Então, isso é inevitável.
R
Os impostos podem ser vistos como uma transição para uma agricultura mais agroecológica. Só para concluir rapidamente, se o Senador me permite.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Tem dois minutos ainda.
O SR. MARCELO FIRPO PORTO - A questão do combate à fome. Vocês devem saber que cerca de três quartos dos agricultores familiares nos censos agropecuários - se não sabem, eu estou informando - informam não utilizar agrotóxicos ou utilizar muito pouco agrotóxicos. Então, na verdade, não existe problema em relação à agricultura familiar, inclusive para fazer a transição, porque eles têm agroecossistemas para poder plantar. A questão... Isso já é demonstrado... Um estudo feito em Santa Catarina mostra que o impacto em produtos como mandioca, como banana e em outros produtos da cesta básica vai ser muito pequeno. A estimativa era de 0,4% na época do aumento da atual isenção.
Então, a questão fundamental é: pelo bem do futuro, pelo bem da nossa humanidade e do planeta, que as pessoas defendam certos interesses políticos, ideológicos, mas abram as suas capacidades de raciocínio e de pensamento a uma forma mais solidária e de coração, porque os cidadãos e o futuro do planeta clamam e esperam por uma decisão responsável do Congresso Federal. É isso.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, muito bem. (Palmas.)
Parabéns, Dr. Marcelo Firpo Porto.
Parabéns pela sua exposição, que mostra ao Brasil todo as enormes preocupações com o que está acontecendo, o que pode acontecer, e a importância da própria agricultura familiar e dos alimentos sem agrotóxicos. Não só o alimento, mas todo o ecossistema.
Vamos em frente.
Deputado Estadual Marcos José Abreu, Presidente da Comissão de Turismo e Meio Ambiente da Alesc e representante do Fórum Catarinense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos no nosso sistema.
O SR. MARCOS JOSÉ ABREU (Para expor.) - Muito obrigado.
Queria, inicialmente, dar um bom-dia a todas as pessoas que estão aqui nos acompanhando. Quero agradecer o espaço, Senador Paulo Paim, por este momento também de convergir com as duas Frentes Parlamentares, a de Segurança Alimentar e também a Ambientalista. A importância dessas Frentes Parlamentares é porque são espaços em que a gente encontra a sociedade civil organizada também se esforçando para se manifestar e construir as políticas públicas em conjunto com o Legislativo.
Eu queria me apresentar rapidamente, assim, só para também contextualizar. Eu sou engenheiro agrônomo de formação. Sou formado pela Universidade Federal de Santa Catarina e atuei como extensionista por dez anos numa organização não governamental que atua na promoção da agroecologia lá na região do Estado de Santa Catarina. Fui coordenador adjunto durante toda a formação do Fórum catarinense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos, que teve a coordenação-geral da Promotora Dra. Greicia Malheiros, inicialmente; depois, do Dr. Paladino e agora retornou a coordenação à Dra. Greicia Malheiros. Por isso, eu também quero estar aqui contando um pouco da história da atuação desse fórum.
R
Fui Vereador em Florianópolis e agora sou Deputado Estadual pelo PSOL. A gente, em Florianópolis, aprovou uma legislação muito importante, que foi tornar a Ilha de Santa Catarina uma zona livre de agrotóxicos, de aplicação e armazenamento de agrotóxicos naquela região ecossistêmica definida, que é uma ilha, uma ilha que é 97% do território da cidade.
Então, esse trabalho na promoção da agroecologia, no aprofundamento em relação ao fórum também nos deu essa capacidade, essa condição de poder atuar. E agora, no Parlamento estadual, a gente protocolou, em conjunto com outros Deputados, a lei - foi uma articulação nacional - da proibição da pulverização aérea, que começa a tramitar.
Não é um espaço fácil, pode ter certeza, e eu vou contar porquê. Eu vou explicar, inclusive, a iniciativa que o fórum teve em conjunto com o Governo do Estado de Santa Catarina, lá pelos idos de 2019 - 2018, 2019, 2020 -, e o esforço que foi feito para romper a decisão do Confaz e tributar de ICMS os agrotóxicos lá no estado, muito numa linha do que a gente vinha falando aqui, na tentativa de reconhecer a toxicidade - que também é algo, se a gente aprofundar, a ser discutido sobre essas faixas de toxicidade - e num esforço de aplicar uma tributação verde, como foi chamada.
Eu queria passar para o próximo eslaide, por favor, porque aí eu conto um pouco desse esforço, não é?
Então, o fórum discutiu isto - achou, como 90% da população brasileira acha, um absurdo entender que um produto reconhecido, em que as evidências científicas vêm acumulando historicamente o impacto causado por ele na saúde urbana e no meio ambiente... -: por que não o taxar para que esses tributos retornem em serviços para mitigar ou minimizar pelo menos os impactos causados, vamos dizer assim - sendo muito justo e muito reto nessa proposta?
E foi feita uma informação sobre a tributação ao Governo do estado. O Governo do estado discutindo, obviamente, o esforço de tentar arrecadar mais, considerou essa provocação do fórum e criou uma comissão, um grupo de trabalho que realmente identificou essa isenção, que era muito significativa. Um estado como Santa Catarina, com mais de 8 milhões de habitantes, que tem uma agricultura familiar muito potente, com poucos latifúndios, mas com muitos minifúndios... Mas são esses agricultores e agricultoras os mais diretamente afetados. Tem uma diferença enorme entre você aplicar um agrotóxico dentro de uma máquina, totalmente protegido, em centenas de hectares, milhares de hectares e você aplicar um agrotóxico que tem a capacidade de atacar o seu sistema nervoso central, assim como ataca diretamente o de um inseto - que nas suas relações de sinapse tem uma muita relação muito próxima com a nossa, só que o nosso volume corpóreo tem uma diferença enorme -, com uma bomba costal amarrada como uma mochila. Esse trabalhador está altamente exposto a esses produtos químicos sintéticos com alto impacto a sua saúde humana. Então, essa é a realidade do Estado de Santa Catarina na sua grande maioria. E, quando aplicam motorizados, são ainda pequenos tratores com ampla exposição também. E, por ser minifúndio, quando aplicado com aplicação aérea, aí a gente entra na perspectiva das derivas, na perspectiva do impacto indireto já também comprovado. Então, essa é a realidade de Santa Catarina, com uma estrutura muito bem organizada das suas cooperativas e associações, que também são instrumentos, hoje, da grande indústria da agricultura, obviamente, e que conduz esse processo.
R
Então, o agricultor familiar que entra numa cooperativa, numa agropecuária para adquirir o seu insumo agrícola, ele não entra numa agropecuária e encontra duas estantes: uma com produtos químicos sintéticos e outra com produtos de base biológica. Hoje, os agricultores e as agricultoras não têm essa opção. Quando entram num centro de aquisição de insumos, não conseguem ter essa opção. Essa é uma realidade. E isso é por conta de como estão instrumentalizados os incentivos, o acesso, a pesquisa e a disponibilidade, e assim por diante.
Em 2019, então, confecciona-se uma carta com 101 organizações, grande parte delas relacionadas ao fórum que assinou em favor da tributação dos agrotóxicos. O ex-Governador Moisés, através do seu Secretário de Fazenda, banca essa proposta - de forma muito corajosa, inclusive - e atende essas 101 entidades que levam a proposta na mão, em conjunto com todos os estudos - e nós temos aí uma equipe de cientistas muito qualificados: Prof. Nodari, Profa. Sonia Hess, Profa. Larissa Bombardi, o Dr. Pablo Moritz, que é do Centro de Informações e Assistência Toxicológica, um dos cem pesquisadores do mundo que discutem as doenças crônicas não transmissíveis e as novas doenças glandulares especialmente, na perspectiva da correlação com o uso e a exposição aos agrotóxicos -, que dão um embasamento para esses tomadores de decisão, como o Governador. E ele apresenta uma medida provisória na Assembleia Legislativa para tornar os agrotóxicos tributáveis, com ICMS proporcional. A tributação tinha taxas variantes com a classe toxicológica dos agrotóxicos.
O que acontece quando chega na Assembleia Legislativa? Ela é rejeitada por unanimidade. Quando chega na Assembleia Legislativa, ela é rejeitada por unanimidade. As cooperativas, as associações e a federação de agricultura catarinense mobilizam, organizam ônibus de agricultores, e lotam o Plenário, a Casa como um todo, para os agricultores irem lá defender a isenção de agrotóxicos em Santa Catarina.
Estou colocando isso porque é uma realidade que a gente está vivendo aqui. Viveu no Congresso Nacional.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS JOSÉ ABREU - Inclusive a Bancada do PSOL apresentou um voto em separado em relação a esse item, especialmente, aos agrotóxicos. E a gente precisa ampliar agora essa garantia de justiça nessa perspectiva.
Eu falo isso porque, primeiro, tenho muita segurança e muita tranquilidade porque fui formado para ser engenheiro agrônomo e para receitar os agrotóxicos, conheço os princípios ativos e toxicidades, conheço o que as escolas de agronomia e os técnicos agrícolas aprendem em relação a isso. E a gente sabe que é uma negligência imensa. Não existe responsabilidade direta na perspectiva desse processo.
R
Então, quero dizer que isso se aprofunda.
Pode passar o próximo, por favor.
Isso se aprofunda porque a gente tem muita disputa de narrativa. E quanto a gente está disputando essa propaganda! Aí aparecem os mitos e verdades sobre a questão dos agrotóxicos, dos produtos agroecológicos e da produção agrícola.
Eu não vou passar todos os mitos e verdades porque meu tempo já está esgotado, mas eu quero aqui apresentar para vocês que foi construída uma cartilha, em parceria com o Centro de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo, o Fórum Catarinense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos e o Idec, em conjunto com a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida. Ela está disponível e conta com muita ciência, os mitos e verdades sobre os agrotóxicos.
Eu quero falar sobre um mito, que é a questão do aumento do custo dos produtos ou do custo de produção para os agricultores.
Houve um estudo em Santa Catarina que não foi publicado. Eu não vou poder falar neste momento porque ele não está publicado, mas ele demonstra que, na produção de alimentos, a gente não passa de um impacto de mais do que 2,5%. Não passa de 2,5% no aumento no custo de produção.
Se quiser tirar o eslaide, pode tirar.
Eu queria enfatizar para vocês que os agricultores e as agricultoras, quando produzem seu alimento e quando lançam a nota de produtor, eles recolhem ICMS, eles recolhem tributos. Então, a tributação para os agricultores está lá pelo ato de se fazer agricultura e não pelo ato de utilizar um insumo agrícola de agrotóxico, que é um insumo de uma grande indústria.
Então, isso está comprovado. Tem ciência, tem pesquisa mostrando. Eu acho que é importante este momento. O grande momento que nós temos é a reforma tributária, para rever essa que é uma das maiores injustiças tributárias que nós temos neste país.
É inaceitável que um produto como esse, que é comprovado que traz as suas externalidades, os seus impactos diretos, comprovados cientificamente, que ele seja isento de PIS-Cofins, que ele seja isento de ICMS nos seus estados, que ele não pague a taxa de importação.
As indústrias dos agrotóxicos... Mais de 80% deles são produzidos fora deste país. A gente está deixando de desenvolver uma indústria de insumos de base biológica, a gente está deixando de desenvolver uma indústria fundamental para o país porque a gente está dando todas as condições de isenção para essa indústria, que tem um domínio enorme.
Agora, eu vou dar um exemplo do que está acontecendo no Estado de Santa Catarina. Maricultores que produziam ostras e mariscos estão deixando de produzir para produzir algas para serem insumos agrícolas para as fazendas de soja no Centro-Oeste brasileiro. Como a gente faz essa avaliação? Primeiro, é um insumo de base biológica. Segundo, é um desenvolvimento industrial no país, com tributação no país, com recursos que ficam no país.
Então, é fundamental que a gente crie esses critérios, primeiro, pela saúde humana e pelo meio ambiente; segundo, porque a gente está estancando a possibilidade deste país diverso, com as capacidades que temos, de desenvolver uma outra indústria, uma outra capacidade industrial e de desenvolvimento agrícola para o nosso país, de acordo com as características que nós temos.
Por fim... Desculpa, Senador...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Está dentro do seu tempo, ainda tem dois minutos.
O SR. MARCOS JOSÉ ABREU - Eu quero dizer que a gente precisa fazer este debate com responsabilidade.
R
A correlação política, a gente já perdeu. A gente sabe disso.
Não vamos aqui...
A correlação política não está fácil, para enfrentar esse tipo de iniciativa. Agora, é fundamental que a gente tenha uma responsabilidade, neste momento, científica, técnica e de soberania nacional, que é uma coisa que a gente precisa falar.
(Soa a campainha.)
A gente está hoje, por conta da lixeira química - e eu estou aqui utilizando as palavras da Dra. Sonia Hess - a lixeira química em que o Brasil se transformou...
Porque nós temos aqui produtos químicos sintéticos e formulações químicas de uso de agrotóxicos que já são proibidos em muitos lugares do mundo e nós ainda continuamos usando. Pior, eles são proibidos nos países que originaram essas formulações químicas e nós continuamos usando, isentando, deixando disponível para os agricultores. E quero alertar para um ponto ainda mais alarmante: muitas dessas substâncias ou desses princípios ativos estão disponíveis fora da classificação de agrotóxicos. Eles são classificados como domissanitários, ou de uso doméstico, ou de uso sanitário. E aí a gente está exposto, todos nós, e as nossas crianças, porque a gente bota uma coleirinha no nosso gato doméstico que lança fipronil diariamente. E fipronil é um produto sistêmico, que ataca o sistema nervoso central, diretamente, dos insetos e, consequentemente, o nosso.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS JOSÉ ABREU - A gente entra em um supermercado e tem acesso a um Mata Mato, que na verdade é um herbicida, o mesmo herbicida utilizado, só que já diluído.
A gente está exposto aos K-Othrine, que são piretroides disponíveis para uso doméstico.
Então, esse debate é muito mais profundo, e a gente o descobriu porque a gente aprovou a lei da Zona Livre de Agrotóxico, e a saída para o uso de agrotóxico foi ser classificado como de uso doméstico ou domissanitário.
Então, eu acho que a gente tem um momento oportuno, e não é uma tarefa fácil do ponto de vista político, mas é o momento para a gente fazer esse debate com qualidade. E a gente se coloca aqui à disposição.
Quero também parabenizar todo o trabalho do Fórum Catarinense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos e agradecer a participação.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Deputado Estadual Marcos José Abreu, que dá um enfoque a partir das suas experiências em Santa Catarina, mas, ao mesmo tempo, fala da questão nacional e da questão global da indústria do veneno.
Muito bem, belas contribuições.
Eu vou agora permitir que a Juliana A. Costa, que foi uma das que organizou esta nossa audiência pública, e quer dar um recado rápido... E, naturalmente, quem organizou...
Eu só venho aqui, sento e passo a palavra para um e para outro. Eu estou no lugar mais confortável, mas para esse palco acontecer eu sei que teve muita gente que trabalhou.
A palavra é de vocês.
Use o microfone que quiser.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Está bem.
A SRA. MIRELE GONÇALVES (Para expor.) - Filhos da época.
Somos filhos da época
e a época é política.
Todas as tuas, nossas, vossas coisas
diurnas e noturnas,
são coisas políticas.
Querendo ou não querendo,
teus genes têm um passado político,
tua pele, um matiz político,
teus olhos, um aspecto político.
O que você diz tem ressonância,
o que silencia tem um eco
de um jeito ou de outro político.
Até caminhando e cantando a canção
você dá passos políticos
sobre um solo político.
R
Versos apolíticos também são políticos,
e no alto a lua ilumina
com um brilho já pouco lunar.
Ser ou não ser, eis a questão.
Qual questão, me dirão.
Uma questão política.
Não precisa nem mesmo ser gente
para ter significado político.
Basta ser petróleo bruto,
ração concentrada ou matéria reciclável.
Ou mesa de conferência cuja forma
se discuta por meses a fio:
deve-se arbitrar sobre a vida e a morte
numa mesa redonda ou quadrada.
Enquanto isso matavam-se os homens [e as mulheres],
morriam os animais,
ardiam as casas,
ficavam ermos os campos,
como em épocas passadas
e menos políticas. (Palmas.)
A SRA. FRAN PAULA (Para expor.) - Assim, em nome do coletivo de organizações que compõe a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, a gente quer agradecer por este momento à Comissão de Direitos Humanos, ao Senador Paim, a todos os expositores e expositoras que fazem parte dessa luta contra os agrotóxicos, pela agroecologia, por este momento, pelos subsídios técnico-científicos aqui trazidos; e quero dizer que a campanha, desde a sua criação, tem como bandeira de luta a promoção da saúde da sociedade e do planeta, e que a gente segue aí, juntos e juntos, pela vida, pela agroecologia, pela saúde da população brasileira.
É isso.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Viva la vida!
Foi uma breve interrupção na voz dos painelistas, mas com muito conteúdo. O que vocês disseram rapidamente aqui é viva la vida, cuidado com a vida e que tudo passa pela política, para o mal ou para o bem. Se nós não fizermos política para o bem...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - ... alguém a fará para o mal. A doutora até me ajudou aqui, alguém a fará para o mal.
Então, parabéns.
Nós vamos agora pedir, senhores e senhoras, que voltem ao plenário, com uma salva de palmas pelo brilhantismo da exposição. (Palmas.)
Muito, muito obrigado. Vamos chamar a segunda mesa.
Deixa eu dar tchau aqui para vocês. (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu vou convidar, neste momento - e já vou chamar a segunda mesa -, por videoconferência, o Deputado Federal Padre João, que é Presidente da Frente Parlamentar Mista de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional e de Combate à Fome no Brasil.
Então, eu chamarei agora a segunda mesa, e quem abre a segunda mesa é o Deputado Federal Padre João.
Convido para a segunda mesa Diego Moreira, representante do Setor de Produção do MST. Seja bem-vindo! (Palmas.)
Maria Juliana Moura Corrêa, Diretora do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde. Seja bem-vinda! Estava em um evento comigo, lá dos quilombolas e das mulheres caribenhas, lá no Rio Grande do Sul. (Palmas.)
R
Agora, Matias Rebello Cardomingo, Coordenador-Geral de Análise de Impacto Social e Ambiental da Subsecretaria de Desenvolvimento Econômico Sustentável da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda. (Palmas.)
Prazer, Matias. Seja bem-vindo!
O SR. PADRE JOÃO (Por videoconferência.) - É rapidinho, só para eu fazer uma fala.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Aproveito para informar ao Ministro Haddad que o convite que ele fez para a bancada está confirmado. É só chamar que a bancada está lá. Parece que vai ser na próxima quinta-feira.
Então, eu passo a palavra neste momento ao Deputado Federal Padre João, Presidente da Frente Parlamentar Mista de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional e de Combate à Fome no Brasil, que vem fazendo um belo trabalho. Essas duas frentes vieram também, na forma muito carinhosa e respeitosa, me convidar, como Presidente da Comissão de Direitos Humanos, para estar com vocês hoje aqui neste espaço.
Muito obrigado, viu, Deputado Federal? Estou muito feliz de estar aqui, porque percebo a qualidade do debate e o avanço que poderíamos ter para defender o planeta.
O SR. PADRE JOÃO (Para expor. Por videoconferência.) - A gente que agradece, Senador Paim, à Comissão de Direitos Humanos, todos...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - A tela não... Você não... Agora, sim. Vamos lá, é com você. Pode começar agora.
O SR. PADRE JOÃO (Por videoconferência.) - Agradeço, então, ao Senador Paim e à Comissão de Direitos Humanos, assim como a todas as organizações que vêm contribuindo com esta importante luta. Não tenho dúvida de que esta segunda mesa, com as companheiras e companheiros que aí estão, não será de qualidade menor do que foi a apresentação da Ana Paula, a da Paula Johns, a do Marcelo, a do Marcos - ou Marquinhos, se me permite.
A minha fala será breve, Senador, e nesse sentido do grande desafio que está, assim, para nós - e quem sabe aí no Senado consiga avançar o que não foi feito também aqui na Câmara, ou que pelo menos a gente tenha esta certeza de que o importante é plantar, semear, vamos semeando. Infelizmente, as condições políticas não possibilitaram tanto assim o avanço necessário.
Eu quero só endossar as falas e dizer do grande desafio que temos, porque o que nós temos que entender é o que é o papel do Estado brasileiro - o papel do Estado brasileiro. E é incoerente, é incoerente quando o Estado dá uma isenção, permite certas isenções, e está comprovado, as evidências estão aí há décadas, que essas isenções geram um rombo no próprio Estado. Isso tem sido a realidade - isso tem sido a realidade. É uma luta nossa, Senador, desde o primeiro mandato federal nosso. A gente vinha nessa luta como Deputado Estadual.
Então, Marcos José, esperamos aqui no Congresso para somar força, porque a correlação de força aqui infelizmente não permite a gente avançar na Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, na redução do uso do agrotóxico.
R
Mas retomo a razão desta audiência, Senador. Desde o primeiro mandato nós pudemos buscar evidências com grandes pesquisadores, com universidades, do nexo do agrotóxico com várias doenças. Inclusive, sobre o estado do senhor, eu lembro os dados da depressão e, inclusive, do suicídio relacionado ao cultivo do tabaco. O produto que é usado no cultivo do tabaco desencadeia uma série de doenças, doenças que vão onerar o próprio Estado, sem falar do câncer, não é?
Então, nesse sentido, é uma grande luta, mesmo num governo que, posso dizer, sonhamos que seja mais nosso. É nosso, mas ainda não nesse sentido de a gente poder avançar com as políticas. Ainda não é nosso totalmente, basta ver a liberação de novos produtos, novos agrotóxicos. Então, não é só a questão do incentivo, mas também o problema de continuar uma força dentro deste Governo com a liberação de venenos.
O Marcos citou um produto aqui: o fipronil. Gente, o extermínio de abelhas é assustador! É assustador o extermínio de abelhas! A gente está... (Falha no áudio.)
Então, é avançar com a questão da tributação. Quem gera doença tem que ser mais tributado, e não ser isentado! E são doenças que estão sendo bancadas não é pelo sistema privado: estão sendo bancadas pelo SUS. Não é justo o próprio Estado gerar um roubo dele mesmo.
Então, é mais para dizer, Senador, do desafio que está colocado para nós. E nós só vamos avançar com a força popular. É por isso também que a presença dos movimentos nessa mesa é estratégica, porque nós temos que dialogar com a cidade que está sendo envenenada, com a cidade que está sendo - podemos dizer assim - adoentada pela comida, pela boca, embora também haja a questão do meio ambiente, do extermínio da biodiversidade.
Eu digo que o próprio agronegócio, quando eles não nos permitem avançar com a redução do uso do agrotóxico e não nos permitem avançar com a Política Nacional da Agroecologia e da Produção Orgânica, quando dificultam isso, eles também dão um tiro no coração, não é nem um tiro no pé, porque nós sabemos que muitas culturas, sobretudo as frutíferas, dependem da polinização feita pelas abelhas, e eles estão promovendo o seu extermínio e, assim também, vão ter problemas na produção.
É mais essa a manifestação da Frente Parlamentar de Segurança Alimentar e de Combate à Fome. Nós temos que dar incentivos a quem produz a comida de verdade, essa é uma tarefa deste Governo.
R
Ontem falava com a Ministra Nísia e, hoje, na própria CPI do MST, vou estar apresentando para o colega Deputado, mas hoje Ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira. Nós não podemos nos vender, deixar a pressão, às vezes interna, dentro do próprio Governo, nos intimidar e assim não avançarmos com políticas e programas que permitam a redução dos agrotóxicos, com a política também propositiva no sentido de avançar na agroecologia e produção orgânica, mas também na tributação. Quem gera doença e promove um rombo no Estado, através das doenças, tem que pagar - tem que pagar. Infelizmente, na Câmara, nós não avançamos, mesmo com textos, com sugestões. A própria CD produziu vários grupos, e não avançamos. Quem sabe aí no Senado, com essa força maior, a experiência que tem, com a habilidade que tem, podemos avançar.
Um abraço a todas e todos que estão participando. Eu vou continuar acompanhando remotamente, como pude ouvir todas e todos da primeira mesa.
Obrigado. Um grande abraço para todos.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Um abraço carinhoso, Deputado Federal Padre João. Fiquei muito feliz de ver ali o nosso inesquecível e querido Florestan Fernandes. Fui Constituinte junto com ele. Que orgulho sentar ao lado dele e do Bisol, que eram dois grandes intelectuais, aí me convidaram, eu peão, para ficar ali com eles. Eles me davam aula todo dia, eu falava pouco, eles falavam mais, sempre com um conteúdo enorme.
E ainda, Padre João, permita-me, gostei muito do termo semeadura, de semear, de falar de plantar para colher. É o que nós estamos fazendo aqui. Sabemos que o embate é duro, mas estamos fazendo, como sempre dizia o meu sempre querido amigo, até hoje líder, Olívio Dutra, a semeadura fundamental, semear, semear para colher o bem.
Obrigado, Deputado Federal Padre João.
Vamos agora para a segunda mesa.
De imediato, passo a palavra para Diego Moreira, representante do setor de produção do MST, do qual tenho uma bandeira no meu escritório.
O SR. DIEGO MOREIRA (Para expor.) - Companheirada, bom dia. É uma satisfação estar aqui.
Quero cumprimentar o nosso Senador, essa memória da democracia brasileira, Senador Paulo Paim pela iniciativa, como foi bem dito aqui, por nos oportunizar este momento tão importante. Também quero reconhecer e agradecer o convite da Campanha Nacional contra os Agrotóxicos e pela Vida.
Esta audiência tem uma simbologia muito grande por duas questões. Primeiro, por nós podermos voltar ao Senado Federal neste momento de reconstrução do Brasil, poder ter esta oportunidade de diálogo; a outra simbologia é a ciência. Então, eu vou me permitir, Senador, ficar no generalismo, porque as falas anteriores foram muito embasadas cientificamente; então, isso nos permite. A ciência poder voltar a ter protagonismo no nosso país depois de tanto negacionismo é muito importante, e o Senado Federal oportunizar isso também é muito simbólico.
Nós estamos dizendo o seguinte: infelizmente, nós não estamos vivendo um tempo de mudança, mas uma mudança de tempo na agricultura. O ideal era que estivéssemos vivendo um tempo de mudanças em que nós pudéssemos abrir portas e janelas para avançar numa perspectiva de projeto popular e soberano, que é com que tanto sonhamos, mas essa mudança de tempo é causada principalmente pela hegemonia desse modelo que tomou conta da agricultura brasileira após a ditadura militar, a partir da Revolução Verde, que colocou a agricultura totalmente dependente, a indústria totalmente dependente do tal do pacote tecnológico e dos agroquímicos.
R
Se olharmos a história da nossa agricultura, nós vamos perceber que até os anos 70... É só olharmos o número de agricultores que tínhamos no campo, a população do campo e o que esse modelo provocou do ponto de vista do êxodo rural, do ponto de vista da criação das grandes periferias. Não que a periferia não seja importante, é um patrimônio, mas foi construída da forma desordenada e causa contradições gigantes para a nossa sociedade e para o nosso país.
Esse modelo hegemônico é baseado em dois pilares principais: um é o modelo predatório, destruidor, que desde então vem destruindo tudo que temos de vida e de recurso natural; e um modelo baseado no lucro. Então, são seres humanos que não pensam nas futuras gerações, não pensam no dia de amanhã, não pensam na vida, pensam só no lucro.
E o modelo, assim como foi em 1500 o modelo agroexportador da madeira, do diamante, do ouro, ainda é um modelo agroexportador. E podemos dizer, Senador, que nenhum país no mundo, mesmo os vieses capitalistas, se desenvolveu sendo país agroexportador. Então, esse modelo hegemônico que está aí, que se gaba permanentemente de bater recorde, de produzir toneladas e toneladas é um modelo que não levou e não levará o nosso país para o desenvolvimento. Ao contrário, levará o nosso país a uma barbárie se tivermos sorte, como diz István Mészáros. Então, é nesse ponto do oceano que estamos remando e esperamos que nós população, a ciência e a política nos tirem dessa inércia e nos tirem dessa condição.
E essas contradições são as seguintes: a migração... Nunca se teve tanta migração na história da humanidade, fugindo de conflitos, fugindo da fome. E olhe que nos desenvolvíamos como nômades, migrando de um canto para o outro em busca da sobrevivência, mas nunca houve na história da humanidade tanta migração, populações inteiras tendo que sair dos seus locais, dos seus territórios, abandonar cultura, fugindo da fome, fugindo dos conflitos, fugindo da violência.
Os extremos climáticos... Nunca houve na história da humanidade, já foi muito bem dito aqui, tantos extremos climáticos. Tenho ido sempre lá no Rio Grande amado, como nós chamamos. A situação que vive o Rio Grande do Sul, estiagens longas, submetendo a produção, submetendo... Agricultores e agricultoras, para não verem seus rebanhos morrerem de fome... Eu ouvi isso de agricultores da fronteira de Bagé. Agricultores, para não verem seu rebanho morrer de fome, soltam o rebanho pela estrada para que fosse embora para ele não ver a vaca de leite morrer de fome. Então, quem imaginou dez, quinze, vinte anos atrás que nós veríamos o Rio Grande do Sul em uma situação quase semelhante ao Semiárido brasileiro? Então, os extremos climáticos, provocados por essa contradição...
Há endemias e pandemias permanentes. Estamos saindo de sequelas que certamente não serão recuperadas, como foi a covid-19. Mas as pandemias e as endemias se mantêm perseguindo a humanidade e as populações. Há um desemprego estrutural nunca vi isso na história da humanidade, e a ferida que teima a não se fechar na humanidade, em especial no nosso país, que é a fome.
Então, esse modelo que se diz tão moderno, tão estrutural, que equilibra a balança comercial, produz esse conjunto de contradições que leva a humanidade a dilemas e leva a humanidade a um verdadeiro caos. E esse é um modelo também que provoca crises. Uma das crises é a crise política. Como eles sequestraram a democracia e a política, eles provocam a crise e, principalmente, a crise política. Então, a cada tempo, quando lhes interessa, para desequilibrar o Estado e a democracia, eles provocam a crise, porque eles sequestraram a democracia e sequestraram os Parlamentos. É só nós vermos a tal da FPA.
R
Então hoje, Senadora, é um dia especial para nós, porque nós estamos achando que essa CPI contra o MST... Nós estamos quase a colocando no caixão e impondo uma derrota não só ao MST... A sociedade brasileira e também a nossa valente bancada no Congresso o Governo, estamos colocando essa CPI no caixão e esperamos que semana que vem estejamos fazendo o velório e, na outra semana, a missa do sétimo dia. (Palmas.)
Então, a crise política é uma face do agronegócio, e eles sempre vão provocar a crise política, como fizeram agora com a...
O que foi a CPI? A CPI foi provocar uma crise política para esconder os crimes que eles fizeram no dia 8 de janeiro. Esse era o principal objetivo da CPI.
Eles sabem que o MST não tinha nenhum crime a responder, mas eles precisavam colocar um bode na sala, porque eles precisam negociar os crimes que eles cometeram no dia 8 de janeiro contra a Constituição, contra a democracia e contra o Estado brasileiro.
Mas também provocam crise econômica, também provocam crise civilizatória, porque, como eles provocam a violência, a violência nos grandes centros urbanos, a violência na periferia, que tem nome, identidade, etnia e gênero... Como eles provocam a violência, eles provocam crise civilizatória, porque é melhor nós iguais ficarmos brigando entre nós do que observarmos quem são os inimigos estratégicos da humanidade e da população.
E provocam a pior das crises, como eu já disse, que é a crise social, que tem uma das suas piores faces: a fome.
Assim, nós precisamos construir uma nova era, precisamos construir um novo tempo, e esse novo tempo tem dois pilares principais: um é a produção de alimentos saudáveis, e nós achamos que o Presidente Lula vai protagonizar no mundo um grande pacto de combate à desigualdade, e isso passa pelo alimento, e nós estamos falando de alimentos saudáveis.
Nós precisamos enfrentar e construir política na perspectiva da produção de alimentos. O outro é o cuidado com a natureza: se nós queremos, enquanto humanidade, preparar o futuro das futuras gerações, nós precisamos enfrentar com força o tema da produção de alimentos saudáveis e o tema do cuidado com a natureza.
E, para isso, nós precisamos, companheiros, de reforma agrária. Sem reforma agrária, não há condição... (Palmas.)
... de avançar na produção de alimentos e no cuidado com a natureza.
Para isso, nós precisamos democratizar a terra. Como dizia o saudoso Adão Pretto: não se faz feijoada sem feijão. Pode ter de tudo, não se faz reforma agrária sem democratizar a terra. Pode ter crédito, pode ter assistência técnica, pode ter plantinha bem zelada, mas, se não tiver terra, não tem nada disso.
Então, precisamos que as populações tradicionais, as populações camponesas deste país, tenham acesso à terra. Mas, também, são muito importantes as políticas públicas. Primeiro, uma política pública de segurança alimentar, de segurança, e nós estamos falando de segurança alimentar num país que vai ter a menor produção de arroz e feijão dos últimos 20 anos - a menor produção de arroz e feijão.
Como você combate a fome num país onde os dois principais alimentos vão ter a menor produção dos últimos 20 anos? Um país que não corrige o conceito de cesta básica desde 1938, quando ela foi criada pelo então Presidente Getúlio Vargas.
Nós estamos, ainda, falando de segurança alimentar, segurança alimentar é encher a barriga. Nós estamos falando de 33 milhões de brasileiros, mais de 33 milhões passando fome, 120 milhões vivendo em insegurança alimentar, que não têm direito de encher a barriga. Nós não estamos falando de nutrição, mas, além de segurança, nós queremos avançar na soberania alimentar. Por isso, nós precisamos construir uma política nacional de abastecimento.
É vergonhoso, após este Governo de destruição que teve, os armazéns da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) estão vazios, estão sucateados, estão destruídos. Um país que não tem uma política nacional de abastecimento, uma política nacional de combate à fome. Precisamos construir!
R
Precisamos de assistência técnica, assistência técnica e extensão rural voltadas para os trabalhadores e trabalhadoras do campo na perspectiva da produção de alimentos. A assistência técnica do pacote tecnológico ao agronegócio já tem quem faça, é privada. Agora, o Estado brasileiro precisa construir uma política nacional de assistência técnica e extensão rural voltadas para a produção de alimentos.
Precisamos pensar na mecanização agrícola, não estou falando aqui dos grandes tratores, mas em ciência e tecnologia. Tem engenharia mecânica hoje, Senador, que nos diz que tem mais de mil, em parte da Europa e da China, equipamentos, pequenos equipamentos agrícolas voltados...
(Soa a campainha.)
O SR. DIEGO MOREIRA - ... para a agricultura camponesa e familiar.
Então, o Estado brasileiro precisa, a partir da engenharia mecânica, a partir da engenharia agrícola, a partir das universidades, a partir de termos de cooperação, que podemos fazer com outros países, enfrentar o tema da mecanização no campo.
Temos que 70% da agricultura familiar brasileira está no Nordeste. E, no Nordeste, só temos apenas 4% de mecanização - 4% de mecanização! -, isso é uma contradição gigante. Então, como pensar uma mecanização agrícola voltada para a agricultura familiar e camponesa, voltada para a produção de alimentos? Como pensar um Programa Nacional de Bioinsumos? Como pensar um Programa Nacional de Bioinsumos estatal?
Nós não podemos deixar que essa bandeira dos bioinsumos, produzida e defendida por nós da agricultura familiar, seja tomada das nossas mãos pelo agronegócio. Então, como pensar um programa nacional e uma política nacional de bioinsumos? Uma política nacional de agroindústrias, de pequenas agroindústrias, de médias agroindústrias e de grandes agroindústrias, como nós temos a nossa do arroz orgânico?
Nós, do MST, somos o maior produtor de arroz orgânico da América Latina e... (Palmas.)
... para isso, você precisa de agroindústria. Então, nós precisamos desde as pequenas agroindústrias da farinha da mandioca, dos panifícios, das médias agroindústrias, mas precisamos das grandes agroindústrias também para a agricultura familiar, camponesa e reforma agrária, e precisamos, também, de incentivo fiscal, que é o objeto aqui.
Então, como taxar os grandes que precisam ser taxados, mas estão sendo isentados, e como construir políticas tributárias que beneficiem o pequeno e a produção de alimentos?
Então, acreditamos que esta audiência pública pode nos ajudar a avançar nessa perspectiva de construir incentivos fiscais, de construir uma política tributária para as cooperativas, para as agroindústrias, mas diretamente para aquele agricultor e para aquela agricultora que está produzindo, tanto para a aquisição dos insumos, semente e insumos, quanto para o seu processo de comercialização da produção depois. Então, nesse aspecto nós precisamos avançar, pois insumos, sementes e correção de solo são fundamentais na perspectiva de nós avançarmos nessa política.
Por fim e não menos importante, nós precisamos avançar num programa nacional de agroecologia. Nós precisamos transitar para essa matriz tecnológica, para essa ciência popular, que é a agroecologia que, como já foi dito aqui, o nosso povo faz. Então, como também construir um programa nacional de agroecologia? E, nesse programa nacional de agroecologia, um programa nacional de incentivo à produção de alimentos?
E, por fim, por fim mesmo, que possamos continuar na cabeça aquela famosa frase do Caio Prado Júnior, que diz que o nosso país ainda, infelizmente, é a longa transição "Do Brasil colônia de ontem ao Brasil nação de amanhã". E nós só vamos construir esse país, nação se nós aqui, junto ao povo brasileiro, junto a políticos sérios e comprometidos, como o nosso Senador Paulo Paim, enfrentarmos as tarefas do nosso tempo. E as tarefas do nosso tempo são enfrentar os inimigos de ontem, de agora e que certamente aparecerão amanhã de novo. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Diego Moreira, representante do setor de produção do MST, que fez aqui eu viajar um pouquinho no tempo e lembrar do... Como eu estou aqui há quase 40 anos, eu vivi com Covas, vivi com Ulysses, vivi com Olívio Dutra, vivi com Lula - éramos Constituintes -, mas ele marcou muito o meu tempo, que foi o nosso querido Adão Pretto.
R
Sabe que um dia eu inventei de fazer uma greve geral aqui, exigindo aumento do salário mínimo. O Presidente era o Collor. Adivinha quem ficou comigo a noite toda e dois dias? Adão Pretto.
O Edegar Pretto, que hoje é o Presidente da Conab, foi Deputado Federal, foi Presidente da Assembleia - um grande quadro, um quadro jovem, eu diria -, conta sempre a história de que ele ligou naquela noite para o pai dele, e o Adão Pretto, o pai, disse-lhe: "Estou aqui cumprindo a minha obrigação, estou aqui no Plenário do Senado, e vamos ficar aqui, sim, até que venha o reajuste para o salário mínimo". Daí o Collor, de fato - tenho que reconhecer -, mandou um abono de emergência, graças a essa resistência, e a sua fala vai nessa linha da resistência.
Então, parabéns!
Eu acompanho um pouco lá o Adãozinho também, o trabalho em Viamão.
O SR. DIEGO MOREIRA (Fora do microfone.) - Ele vai estar aqui hoje.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vai estar aqui hoje? Então, ele vai me visitar, com certeza. Acompanho aquele trabalho belíssimo lá em Viamão, inclusive o do arroz. Em Santa Rita, também tem um belo trabalho, que eu pude visitar já.
Mas parabéns, viu?
Bela fala aqui, com uma visão geral, mas com conteúdo e apontando caminhos, inclusive, na linha dos outros painelistas.
Agora passamos a palavra para Maria Juliana Moura Corrêa, Diretora do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde.
O tempo é seu: dez minutos mais cinco; mais cinco minutos, se necessário.
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA (Para expor.) - O.k.
Obrigada.
Cumprimento o Senador da Comissão de Direitos Humanos, Senador Paulo Paim, e, na pessoa dele, a todos os demais Parlamentares que nos antecederam e que acompanham esta importante audiência pública; também os movimentos - o Fórum de Combate aos Agrotóxicos e a Campanha Permanente -, que têm há longo tempo essa luta; a Fiocruz, aqui representada por meus queridos amigos Marcelo Firpo e Fernando Carneiro; e a Procuradora Ana Paula. Quero dizer que são pessoas que representam essa luta há muito tempo.
Foi lembrado aqui Olívio Dutra, e ele sempre fala da boa semeadura e da boa luta. E essa, Senador, é a boa luta, não é?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Mas a completa é essa.
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA - É uma luta difícil, é uma luta de conflito de interesses.
Do ponto de vista do Ministério da Saúde, que, neste momento, eu estou aqui representando, eu não posso dizer da gravidade da situação do nosso país em relação à questão dos agrotóxicos, da liberação frequente e do aumento cada vez mais, não só do consumo de agrotóxicos para aquelas populações de risco, que viola, sim, os direitos humanos e que retira a saúde da nossa população, e não são apenas alguns territórios ou alguns trabalhadores que estão mais atingidos, mas todos nós, como disse aqui o Diego Moreira, do MST.
R
Nós temos uma mudança na concepção toda, inclusive, do nosso modelo de saúde, que hoje nos desafia com tragédias, com mudanças climáticas, com a desorganização do ecossistema, que põem em risco não só a soberania, mas a vida de todos nós, independentemente do território onde estejamos.
A gente está falando... Aqui foi lembrado do Rio Grande do Sul, e eu quero dizer para vocês que eu estou nessa pauta também há algum tempo, e parece que a tragédia nunca chega para nós, mas, no mês passado, eu perdi três pessoas da minha família no ciclone que ocorreu na região rural do Rio Grande do Sul, em Osório. Pessoas que foram para um território com plantação orgânica, morar perto do rio, e que optaram por uma vida mais saudável, e, em questão de segundos, morreram todos juntos, sem que o Estado e sem que a gente, até o momento, tenha capacidade de compreender e de ter mecanismos e estruturas para assistir na conjuntura atual do país, porque eu acredito que a maioria não se deu conta ainda da gravidade que são esses desastres. A gente viveu a pandemia que também colocou os países de joelho, como o Diego disse, e nós falamos em combater a fome com uma contradição imensa em relação a que saúde e que alimentos são esses que a gente está discutindo. Então, é nessa contradição que a gente precisa da força de todos.
Por favor, pode passar.
Eu quero trazer um pouco, em nome do Ministério da Saúde, a nossa responsabilidade, que é muito grande para um departamento, que também tem, na sua atuação, a dificuldade de implementar políticas públicas, porque a gente considera... E a nossa posição é que os incentivos fiscais violam os direitos humanos, porque eles vão na contramão não só dos avanços do que se pretende implementar de políticas públicas no nosso sistema em defesa da vida, uma vez que eles incentivam a prática da morte, do agrotóxico e do veneno. Eles foram criados para a guerra, já foi dito aqui pela mesa que me antecedeu, e retiram a saúde, devolvem os riscos e devolvem as sequelas para um sistema de saúde pública dar conta - uma fonte de risco que nós podíamos modificar. E os incentivos vão, então, na contramão das políticas centrais do departamento em que eu estou hoje, que defende a saúde dos trabalhadores, a saúde ambiental, a vigilância ambiental e a vigilância em saúde do trabalhador, que é uma competência nossa, mas que nós temos muitas dificuldades de implementar no Sistema Único de Saúde, nos estados e nos municípios. E esse incentivo impacta, sim, diretamente não só no direcionamento dos recursos públicos, mas também no fortalecimento dessas políticas que a gente precisa que sejam muito mais fortes do que a gente ficar trabalhando só nas suas causas, do que o enfrentamento da fonte que estimula e das fontes de risco. E o sistema tributário acaba incidindo nessas fontes de fomento, de financiamento e de orçamento das políticas públicas de saúde, que são por si só contraditórias, por isso estão na contramão do direito à vida, dos direitos humanos e do direito à saúde.
R
Você pode passar, por favor?
Então, por isso esses são os motivos centrais por que a gente está aqui, Senador, com o objetivo de debater a contradição também das nossas competências no Estado brasileiro, de um sistema único que não é único e que a gente acaba, a todo momento, se confrontando com a contradição de que nosso país assumiu, na Agenda 2030, compromissos e acordos de tratados internacionais, os quais a gente, muitas vezes, não consegue efetivar. A Ana Paula trouxe alguns, eu trouxe outros, trouxe o 2.4, em que nós assumimos que teremos sistemas sustentáveis de produção de alimentos e de implementação políticas agrícolas resilientes, como o Diego falou, para aumentar a produção, para manter o ecossistema.
Então a gente assina o acordo, mas a capacidade de efetivar esses acordos entra no debate que nos antecedeu, do Objetivo 6.3, em que a gente diz que vai investir na melhoria da qualidade da água, reduzindo a poluição, minimizando a liberação de produtos químicos; do 3.9, de reduzir substancialmente o número de mortes e doenças por produtos químicos perigosos; do 12.4, que até 2020, que já passamos, de alcançar o manejo ambientalmente saudável dos produtos químicos, de todos os resíduos ao longo do ciclo da vida e reduzir a liberação desses produtos na água, no solo, nos alimentos, para impedir o impacto negativo deles sobre a vida humana e o meio ambiente.
Então a gente assume esses compromissos, mas a contradição e a definição política de orçamento, de prioridades acaba contrapondo todas essas iniciativas, mesmo dos nossos compromissos.
Pode passar, por favor?
Eu não vou reproduzir aqui os dados que já foram colocados. É só para dizer que em relação a substâncias químicas, a gente perdeu 53 milhões de pessoas, de anos perdidos, de pessoas ajustadas por incapacidade. Quando a gente relaciona com essas substâncias químicas, que é uma medida feita na epidemiologia, que faz parte da vigilância em saúde, acompanhar e monitorar doenças, a gente também monitora doenças que estão relacionadas com as exposições às substâncias químicas.
E quando a gente olha agrotóxico...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA - ... a gente teve mais de 6.245.000 anos de vida perdidos. E o que é mais importante? Quando a gente compara com os anos anteriores, a gente viu que aumentaram enormemente os anos de vida perdidos, que em 2016, eram 45 milhões e passaram para 53 milhões. Então a gente vem perdendo pessoas que não deveriam morrer de forma natural, mas por exposições que a gente libera.
E, além disso, a gente vem acompanhando o crescimento do câncer, não é? Dos dados que a gente consegue captar no sistema e de uma subnotificação, que ainda é bastante grande, da dificuldade de fazer o diagnóstico e a relação com a exposição passada que essas pessoas tiveram devido ao longo período de latência até o desfecho.
Pode passar. Eu vou tentar passar de forma mais rápida.
R
Então, nós temos vários acordos e tratados internacionais, como a Convenção da Basileia, a de Roterdã, a de Minamata, a de Estocolmo, a de Montreal, e a SAICM, que estão relacionadas a essas substâncias e nós temos que, a partir deste momento, aprofundar essa questão, também, da contradição com todos os tratados que a gente assina e não consegue implementar em função desses conflitos de interesses em que a gente vive, o tempo inteiro, no país.
Pode passar, por favor.
Todos eles estão relacionados a substâncias químicas e à redução e ao nosso monitoramento, além do que é importante a gente lembrar que, na nossa Constituição Federal, então, desde o art. 196, a saúde é um direito de todos e dever do Estado e que nós temos que protegê-la a partir de medidas e a partir de garantias de políticas sociais e econômicas. Não só a saúde, mas a inter-relação dela com os outros ministérios e políticas para que a gente garanta a saúde e reduza graves doenças. E compete a nós fiscalizar, inspecionar a questão dos alimentos, das águas, do consumo humano e nutricional em relação, especialmente, à questão das substâncias e produtos químicos tóxicos ou radioativos; é de competência do SUS.
Pode passar, por favor. Eu vou acelerar para poder dar conta.
Vou passar um panorama das nossas competências e responsabilidades enquanto Ministério da Saúde nesse departamento.
Então, nós temos um conjunto de ações e de instituições que também se inter-relacionam nessa competência. Do ponto de vista de instituições acadêmicas, falou antes o Marcelo Firpo, representando a Fiocruz, que também é Ministério da Saúde e que tem a competência de fazer todo esse processo de investigação, a nossa vigilância de saúde ambiental, de saúde laboratorial, de toxicovigilância, de saúde do trabalhador, de epidemiologia, de vigilância sanitária, e a sociedade civil, que organizou, junto, esse evento, e essas competências se articulam com a conformação do Sistema Único de Saúde participativo para garantir a vida.
Nosso departamento realiza essas ações que estão integradas a partir de vários componentes que se integram não só com a sociedade civil, mas, muitas vezes, com as instituições de pesquisa em função da necessidade, como disse Diego, de se conhecer novas formas de adoecer e também modalidades de intervenção para garantir a vida e a saúde.
Você pode passar, por favor?
Já foi falado aqui da exposição.
Então, nós temos uma exposição do ponto de vista tanto ambiental como ocupacional que atinge populações, quer sejam de trabalhadores que lidam direto com os agrotóxicos do ponto de vista da indústria, comércio e transporte, quer sejam as populações que vivem no entorno desses locais e suas famílias.
Então, nós temos territórios que acabam tendo uma população maior de expostos - e foi falado da pulverização aérea que contamina territórios, águas, solos e população. Desses grupos, assim como de qualquer outra política de saúde que monitora a meningite, a tuberculose, é nossa competência identificar essas populações que são mais suscetíveis para o atendimento, para diagnóstico, intervenção nas fontes de risco e para estruturar as vigilâncias.
R
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA - Pode passar.
A gente tem uma vigilância específica que é a Vspea (Vigilância em Saúde de Populações Expostas aos Agrotóxicos). Ela é estruturada dentro do Sistema Único de Saúde, e a gente elenca regiões e os agrotóxicos com maior concentração em territórios para avaliação.
Pode passar, por favor.
Envolve as duas coordenações. A gente ainda tem desafios muito grandes a serem realizados, mas enquanto estratégias, em 2019, a gente conseguiu incluir o indicador no Plano Nacional de Saúde. Foram elaborados documentos de operacionalização dessa vigilância específica para agrotóxicos, a gente tem outras. Os instrumentos, então, para implementar junto aos estados, municípios, a partir de oficinas, estruturação de diretrizes, como se faz para outros agravos, para as intoxicações agudas, porque elas são extremamente difíceis de serem realizadas... Isso mostra também, isso tem efeito no número que a gente tem hoje de poder identificar, porque é um diagnóstico difícil de ser feito para além das dificuldades de notificação. Então, os números apresentados são alarmantes por si sós, mas o cenário é pior do que essa pontinha do iceberg que a gente consegue identificar.
Foram realizadas notas técnicas. Nós temos todo o apoio laboratorial, especialmente em relação ao agrotóxico na água. É preciso avançar na quantidade de identificação de agrotóxico, porque hoje é um número bem menor que é realizado pela Fiocruz. A nossa proposta é de aumentar agora, em 2023, o elenco de agrotóxicos, porque, se a gente não identifica o produto, a gente não faz a análise laboratorial. Então, essa é uma das dificuldades que se tem de trazer a dimensão real do problema. E tem todo o processo de formação, de diretrizes, de protocolos em que temos que avançar enquanto Ministério da Saúde, e isso está acontecendo.
Duas questões importantes deste ano que eu acho importante trazer para esta audiência é que nós conseguimos incluir como prioridade do PPA para 2024 e 2025 o agrotóxico, a vigilância de agrotóxico. A gente espera que passe por todas as fases e com isso, com a prioridade de poder ter ação nos estados, espero assim conseguir apoio para que a gente mantenha essa ação articulada com os outros ministérios e secretarias. E o biomonitoramento humano de substâncias químicas, onde vai entrar mercúrio e agrotóxico como a prioridade do Governo para 2024.
No Censo, na Pesquisa Nacional de Saúde, nós teremos junto com o IBGE este ano, além de toda a pesquisa, a introdução do biomonitoramento de substâncias químicas que nós vamos agregar junto ao censo e à Pesquisa Nacional de Saúde. Então, esse é um avanço, porque daí nós vamos ter dados mais reais da população brasileira.
Pode passar, por favor.
Aqui só rápido para dizer que a gente tem um painel de informação por agrotóxico.
Vocês veem como ainda é pequeno o número de municípios que notificam as informações e onde a gente tem essa vigilância implantada. Isso mostra a dimensão do problema que a gente ainda tem e o quanto que a gente precisa para avançar.
Quero dizer que esse departamento é um departamento que se estrutura, porque ele é um departamento mais jovem dentro da área de vigilância. Então, ele tem um processo histórico mais recente e uma dificuldade nos avanços.
R
Pode passar.
Aqui, são os dados das notificações que a gente tem lá na Vigilância, de intoxicação exógena de uma década, de 2013 a 2023, em que aparece o Estado de São Paulo com o maior número de registros. E entre as principais circunstâncias de exposição estão: o suicídio - o acidental, o habitual e o ambiental. Então, no suicídio a gente tem muitas regiões onde já tem estudos no sentido de que são regiões com uso intensivo de agrotóxico, onde há exposição tanto dos trabalhadores como dos familiares no entorno.
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA - Pode passar.
Eu vou tentar encerrar.
Quando a gente olha - o Senador na abertura já tinha falado isso -, as notificações atuais mostram as populações negra e parda, se a gente juntar, com quase 50% dos intoxicados por substâncias químicas. A maioria, homens de uma faixa etária jovem, de 20 a 29.
Por favor, pode passar. Pode passar todos que eu vou...
Então, isso é mais para trazer assim como o Ministério da Saúde vem se comprometendo com a temática, construindo instrumentos de notificação, fazendo a formação dos municípios, intervindo e buscando nas nossas políticas públicas dar visibilidade à gravidade do problema dos agrotóxicos no Brasil e, com isso, eu quero dizer que essa audiência é de suma importância para que a gente possa efetivar o nosso papel enquanto vigilância em saúde...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA - ... de proteger essa população e de reduzir casos de câncer, que podem ser 100% evitáveis.
Muito obrigado e fico à disposição. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Maria Juliana Moura Corrêa, Diretora do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde, que fez uma bela exposição sobre o que o ministério vem trabalhando para combater o veneno, o agrotóxico. Isso tem sido muito importante.
Eu lembro que você se lembrou do Rio Grande do Sul, do ataque ao ecossistema, ao meio ambiente. Lá no Rio Grande do Sul - eu sou de lá também, o pessoal deve saber que eu sou, eu sempre digo, sem nenhum bairrismo, que todos nós somos gaúchos e gaúchas de todas as querências, de todo o Brasil, isso não é bairrismo, não, viu? É uma piada que tem lá no Rio Grande, claro, com maior carinho a todos os estados -, o que aconteceu? Numa época - você pode me ajudar inclusive -, seca, seca, seca, seca e seca. Em outra época, chuva, chuva, chuva, cidades e cidades cobertas de água. Então, foi o ataque ao meio ambiente que levou a isso.
Mas chamamos aí o Governo, que, por duas vezes, já mandou para lá quatro ou cinco ministérios para ajudar no socorro às pessoas, mas a luta tem que ser antes, para não acontecer o que vem acontecendo lá: um período só de seca, de atingir isso que tu falaste aqui, 300, 400 cidades - são 497 -, e, num outro período, cidades e cidades de baixo d'água - para ver a gravidade da situação nossa do meio ambiente.
Mas, por fim, vamos lá para o último painelista. Depois do último painelista, eu tenho uma série de perguntas que vieram - e muitas do e-Cidadania. Daí, eu vou dar três minutos para cada um dos painelistas responderem todas as perguntas. São mais de 20, viu? Cada um pegue duas ou três e veja como faz.
R
Vamos lá. Matias Rebello Cardomingo, Coordenador-Geral de Análise de Impacto Social e Ambiental da Subsecretaria de Desenvolvimento Econômico Sustentável da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda.
O SR. MATIAS REBELLO CARDOMINGO (Para expor.) - Bom dia a todas e todos. Bom dia - ainda não almoçamos, não é? Então, bom dia.
Bom, quero começar agradecendo o convite ao Ministério da Fazenda. Venho representando a Subsecretária Cristina Reis, que é Subsecretária de Desenvolvimento Econômico Sustentável, uma área nova na Secretaria de Política Econômica da Fazenda, criada pelo Secretário Guilherme Mello para colocar, no coração da formulação de política econômica, a preocupação do enfrentamento à crise climática.
Acho que isto é fundamental colocar: essa nova organização da Secretaria. Quero colocá-la à disposição de todos os participantes aqui, mas também do Senador e de todos os outros órgãos que estiverem lidando com o assunto.
Eu acho que o Diego trouxe uma boa imagem do Caio Prado da longa transição e, para mim, esse é o grande tema da nossa discussão sobre a produção... a produção agrícola como um todo, mas, de maneira geral, a organização da atividade econômica brasileira e a organização do Estado. Nós estamos num momento em que, se a gente não semear os novos tempos, nós não teremos tempo algum. É um momento de crise sistêmica e uma crise essencial para a existência da própria vida no planeta, em particular a nossa.
Meus pêsames, Maria Juliana, pela sua perda. Eu acho que é mais um sintoma da falta que faz uma preparação do Estado para lidar com a crise climática, e isso se torna cada dia mais evidente.
Esse período de transição é, fundamentalmente, um período também de transição dessa herança maldita que nós temos de um período colonial extremamente concentrador. O Caio Prado, no seu livro de história econômica, coloca como o Brasil foi fundado em uma estrutura econômica extremamente concentradora. Isso nos legou hoje sermos quarto país com maior concentração na renda do 1% do topo.
Isso significa que, se o país tivesse cem pessoas, a pessoa mais rica deste país ficaria com nada menos do que um quarto de toda a renda gerada.
Se nós não fizermos uma transição dessa estrutura de concentração de poder e riqueza, nós não conseguiremos construir, como também já foi colocado nesta mesa, uma nação minimamente solidária.
Ontem nós tivemos uma boa consolidação de avanços. Eu, que sou oriundo do movimento estudantil e lutei pelas cotas no ensino superior, ontem... Quero também saudar aqui o Senador pela atuação na nova lei, na lei de revisão de cotas, garantindo essa política fundamental, que é essencial para qualquer debate de transição e redução de desigualdades. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Permita-me só uma frase. (Fora do microfone.) Nós estávamos preparando... Já venceram os dez anos no ano passado, mas nós não quisemos arriscar de votar no ano passado e cair na mão, vamos dizer, do ex-Presidente, para não citar nomes.
R
Esperamos o Presidente Lula chegar, deu todo o apoio, um belíssimo trabalho da Bancada Feminina, da Bancada Negra, enfim, de toda a Bancada do Governo lá na Câmara dos Deputados. Eu tive a alegria de estar lá, foi uma noite histórica. A Dandara foi a Relatora, a Maria do Rosário foi a autora. Fizeram um trabalho belíssimo. Só teve um cidadão que me deixou muito triste, um cidadão que foi à tribuna atacar a política de cotas dizendo um monte de besteiras. Só vou dizer isso e não vou falar nem nome, mas fiquei muito triste. Eu procurava não olhar, mas não adianta, eu estava lá e eu ouvia o que ele falava. Uma tristeza, não é? E, felizmente, a bancada e a maioria que estavam lá diziam: "Olha, não respondam e vamos trabalhar para aprovar". Foi aprovado, foi um momento bonito. Eu fiquei muito feliz para subir no palanque junto com aquela meninada lá. Teve meninada que me segurava do lado: "Paim, daqui dá para tu entrar, olha". Foi um momento histórico, viu?
E aqui no Senado já teve orientação do Líder e também do Presidente do Senado, o Rodrigo Pacheco, também do Flávio Arns, da Comissão de Educação, e do Presidente da CCJ para que o Senador negro que está aqui seja o Relator. Estou bem feliz, viu? Vou relatar a política de cotas aqui. (Palmas.)
O SR. MATIAS REBELLO CARDOMINGO - Parabéns, Senador. E parabéns pela atuação essencial.
E quero colocar, então, que aquilo que o Ministério da Fazenda vem planejando e formulando a respeito de uma política de enfrentamento à crise climática é uma política de transição. Uma transição em relação à desigualdade que o país hoje vive cotidianamente, resultando em uma série de questões graves para a vida, seja ela na manifestação da violência, seja ela no enfrentamento à crise climática e nas suas consequências mais diretas. Mas nós também precisamos de uma transição da estrutura produtiva brasileira.
E aí começo aqui com um breve diagnóstico da relevância que hoje tem para a economia brasileira o agronegócio como um todo. E acho que isso é parte essencial desse legado de um período colonial não superado, que hoje resulta numa pauta de exportação do Brasil cuja metade está associada ao agronegócio, sendo que, dessa metade, 40% é a soja, e da soja só 30% tem algum tipo de valor adicionado sobre ela; todo o restante é a exportação da soja em grão. O Brasil se tornou o maior exportador de proteína animal, que representa nada menos do que 16% dessa metade da nossa pauta de exportação.
Ninguém está negando a importância disso. Nós recuperamos este ano US$20 bilhões das reservas que foram queimadas ao longo do último Governo. Nós havíamos perdido US$60 bilhões em reservas e isso foi recuperado, em partes, pelo potencial e pela competitividade desse setor no Brasil. O agro, no primeiro trimestre deste ano, em comparação com o ano passado, cresceu 20%, muito mais do que todos os outros setores. E hoje o Centro-Oeste apresenta a maior média de renda salarial entre todas as regiões do país. O que isso tudo indica? Isso tudo indica que um setor tão relevante como esse precisa ter uma política de transição muito bem desenhada, para que todos os incentivos econômicos sejam para a construção de um novo tipo de produção no agronegócio.
R
E, para isso, o Ministério da Fazenda está desenhando uma série de instrumentos voltados para incentivar uma nova direção desse setor.
Hoje, o Brasil é o país que mais usa pesticida quando a gente vai fazer o cálculo per capita. Segundo dados da FAO (Organização da ONU para Alimentação e Agricultura), o Brasil usa 3,3kg por habitante de pesticidas para a produção agrícola. Isso é comparável... O país mais próximo que eu encontrei foi a Austrália, para a gente também comparar com regiões parecidas em clima. A Austrália utiliza 2,4kg de pesticidas para a produção, ou seja, mesmo quando a gente vai tentar comparar com um país que é um pouco mais parecido, mesmo assim, nós estamos num nível muito acima, para não falar, por exemplo, da Indonésia, que usa 1kg de pesticida por habitante, ou seja, nós usamos mais do que o triplo nesse padrão de produção.
E isso não é necessário, como a gente muito bem sabe pela produção aqui representada pelo Diego, mas também pelo conjunto de movimentos de produtores agrícolas, seja da agricultura familiar, seja dos movimentos sociais. E não só isso: a gente sabe das tecnologias de integração pecuária-floresta, das tecnologias de integração pecuária-lavoura, das tecnologias de integração pecuária-lavoura-floresta, que são capazes de capturar carbono em vez de emitir, no líquido, considerando as emissões e as capturas de gás metano e de gás carbônico, o CO2.
E essas tecnologias foram desenvolvidas pela Embrapa, estão aí disponíveis para a gente implementar em larga escala. São tecnologias capazes de fazer com que, por exemplo, a produção de carne, altamente dependente dos grãos na sua produção, passe a emitir, por tonelada de carne gerada aqui no Brasil - nós já temos exemplo disso -, 40% da média mundial de emissões, o que resulta em mais ou menos 11 toneladas de gás carbônico por tonelada de carne. E isso é fruto do nosso investimento em pesquisa e tecnologia.
Para efetivar um modelo de produção diferente, o Ministério da Fazenda, em conjunto com o Ministério do Meio Ambiente e com o Ministério da Agricultura, elaborou um Plano Safra que é novo, um Plano Safra que é o maior da história já lançado, e o Pronaf foi mais do que duplicado.
(Soa a campainha.)
O SR. MATIAS REBELLO CARDOMINGO - E agora ele tem uma inovação: em vez de nós termos o programa da Agricultura de Baixo Carbono (ABC), há um incentivo a qualquer produtor que adotar práticas mais sustentáveis: redução de um percentual ali na taxa de juros, que vai ficar em mais ou menos meio ponto percentual, para cada produtor que adotar essas práticas sustentáveis. E a ideia é que esse incentivo seja crescente ao longo do mandato para que a gente incentive com cada vez mais força.
Além disso, a gente está desenvolvendo no Ministério da Fazenda a chamada taxonomia sustentável, que é uma classificação de atividades produtivas que podem corroborar e devem fazer parte de um programa de transição brasileiro em mudança da sua estrutura produtiva. E ela é basicamente uma classificação de quais são as atividades que vão fazer parte desse novo modelo de produzir que é alinhado às necessidades de enfrentamento à crise climática.
R
A taxionomia vai chamar sustentável e não verde, como nós temos em outros países da região, exatamente porque ela não vai focar apenas na parte ambiental. Ela vai incluir também critérios sociais para que funcione como um instrumento de indicação, principalmente para os incentivos creditícios, mas também, eventualmente, para incentivos fiscais, que incluam uma consideração de quais são os empregos gerados, qual é a composição do quadro funcional dentro das empresas, levando tudo isso em consideração, para criar esse instrumento que já é implementado na Europa, por exemplo, de maneira mandatória. Aqui no Brasil, nós vamos ter todo um período de discussão pública de adaptação dessa ferramenta, para que, só então, ela se torne uma ferramenta de uso vinculante.
Para além disso, o Governo criou uma nova parceria de mecanização da agricultura familiar para o Nordeste, numa parceria com o Governo chinês.
Quero dizer para a Diretora Maria Juliana que não só nós estamos num processo de vinculação do Orçamento aos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) - isso está sendo feito pelo Ministério do Planejamento -, mas também, na Secretaria de Política Econômica, nós estamos revisando os gastos tributários e as isenções e identificando a quais ODS cada um dos gastos está associado. E isso vai ser fundamental para a gente estabelecer o ciclo orçamentário sustentável, que vai integrar tanto a parte da avaliação da política orçamentária quanto a sua formulação e concepção, já sob orientação do novo PPA, que traz uma série de diretrizes sustentáveis nesse sentido.
Nós também começamos no Ministério da Fazenda um grupo de trabalho sobre cadeias de valor, com foco em resiliência, para garantia da segurança alimentar e energética, pensando não só na questão climática, na necessidade de enfrentamento aos problemas que a crise climática vai trazer para geração de energia - nós somos muito dependentes da hidrelétrica, que é uma das energias mais suscetíveis à mudança climática -, mas também em um programa de segurança alimentar. E aí, como bem colocou o Diego, há a preocupação com a política de abastecimento, por exemplo, com a necessidade de formular uma política integral não só na garantia de oferta de energia e alimentação, mas também de pensar em maneiras de contribuir com o nobre Presidente do Banco Central, que estava no Plenário mais cedo ou que deve estar lá ainda, de contribuir para a gestão de forma mais integrada da política econômica e a gestão de preços.
Junto a isso, também está em formulação um projeto de lei para implementação do mercado de carbono regulado. Cristina Reis não pôde comparecer aqui, porque está em outra reunião discutindo exatamente esse tema. Vai ser outro instrumento de indução do setor produtivo para que adote tecnologias menos emissoras.
Eu acho que esse conjunto de políticas - quero aproveitar que o meu tempo está acabando para endereçar um pouco a questão que motivou a audiência - aponta de que forma o Ministério da Fazenda quer incentivar através de vários instrumentos...
R
(Soa a campainha.)
O SR. MATIAS REBELLO CARDOMINGO - ... uma mudança da estrutura produtiva brasileira para pensar o enfrentamento da crise climática e a redução das desigualdades.
A reforma tributária é essencial num programa de modernização da legislação brasileira, de facilitação da promoção de negócios. E ela tem uma longa agenda ainda para a sua regulamentação e para o detalhamento de qual será a incidência de cada um dos instrumentos da reforma. Isso vale para a redução das alíquotas, isso vale para o imposto seletivo, isso vale para os vários instrumentos que estão sendo discutidos e que demandarão uma lei complementar.
Nós sabemos que contamos com uma atuação combativa, com a boa luta dos nossos Parlamentares e que todos os setores estarão focados em analisar quais são esses incentivos que são hoje dados - como todo mundo já comentou e está sob análise agora do STF, sob pedido de vista - para que a gente implemente um novo modelo que facilite a produção, que reduza a necessidade de comprometimento de recursos humanos e financeiros para essa adequação à tributação, mas que também vai vir em um segundo momento... Nós temos a certeza de que o Congresso vai dar prosseguimento a essa reforma tributária. Já foi apontada pelo Ministro Haddad a necessidade de a gente avançar sobre a tributação de lucros e dividendos e dos fundos exclusivos. E esse conjunto de medidas vai integrar esse grande plano de transformação ecológica, que não deve ser visto...
(Soa a campainha.)
O SR. MATIAS REBELLO CARDOMINGO - ... apenas como um enfrentamento à crise climática, como já coloquei, mas principalmente como a superação desse legado colonial, a superação da desigualdade e uma mudança de sofisticação da economia brasileira.
Quero agradecer o convite, agradecer aos outros painelistas também e dizer que estamos à disposição no Ministério da Fazenda e na nova Subsecretaria de Desenvolvimento Econômico Sustentável. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, muito bem. Parabéns, Matias Rebello Cardomingo, que representou aqui o Ministério da Fazenda, apontando caminhos.
Eu, antes de passar para as perguntas... Eu pedi ali para o Secretário da Comissão... Nem só notícias ruins, uma notícia boa. Eu me lembrei - e acho que vários de vocês fizeram parte disto - de que, no dia 15 de maio, nós realizamos uma reunião aqui na Comissão de Direitos Humanos, uma audiência pública, a pedido dos movimentos sociais, porque, lá no Ceará, um projeto do Deputado Estadual Renato Roseno tinha assegurado que não poderia - vou usar o termo - despejar, jogar agrotóxico de avião sobre as comunidades, sobre as plantações, pois atingia principalmente indígenas e quilombolas. Os movimentos sociais, que vocês representam aqui, estiveram aqui e disseram: "Olhe, Paim, vamos tentar aqui o último apelo. A votação no Supremo, porque eles recorreram para derrubar a lei dele, vai ser na semana que vem. Vamos fazer uma audiência pública, nós vamos falar desse tema de ponta a ponta". Olhe, estiveram aqui acho que uns 20 painelistas, mais ou menos isso, todos com muito conteúdo. Para alegria nossa, o Supremo decidiu, e a lei dele foi considerada constitucional, legal. Então, no Ceará, é proibido jogar veneno sobre as plantações e sobre a população de avião. Eu acho que isso merece uma salva de palmas. (Palmas.)
R
Às vezes, eu critico tanto o Supremo; de vez em quando, eu tenho que elogiá-lo. Não é que eu o critique sempre, mas eu fiquei muito chateado com um tema em que o Supremo decidiu - e vai trazer um problema enorme para os trabalhadores que vivem sob a escravidão, sob trabalho escravo - que a terceirização na atividade fim é legal, quando peleamos aqui dentro, e vamos continuar peleando, para dizer que a terceirização na atividade fim é ilegal. Por quê? De cada dez trabalhadores que são resgatados no regime de trabalho escravo, oito são terceirizados - oito são terceirizados. Então, como eu critiquei o Supremo da tribuna, neste momento, aqui eu o elogio por essa posição.
O SR. MATIAS REBELLO CARDOMINGO - Senador, vou ter que pedir desculpas, pois tenho que sair. Como temos outra reunião lá no ministério, peço desculpas, porque não vou poder ficar até o final.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não, eu lhe agradeço muito a presença. Uma salva de palmas aqui para você. (Palmas.)
Os outros farão as considerações finais.
Um abraço no Haddad.
O SR. MATIAS REBELLO CARDOMINGO - Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Na próxima, estaremos lá.
Eu vou agora passar para as considerações finais dos nossos convidados, mas, de ofício, eu tenho que fazer as perguntas, e vocês as respondam dentro do possível. Se precisarem de cópia, a assessoria passa para vocês.
André Moraes, Pernambuco: "Por que, contrariando a literatura científica que aponta os enormes riscos à saúde da população, usamos tantos venenos nas plantações?".
Jéssica Darkside, Santa Catarina: "[...] [Se] os benefícios fiscais concedidos aos agrotóxicos [fossem reduzidos, haveria] mais dinheiro para subsidiar a agricultura familiar orgânica?".
Nathaly da Silva, de Pernambuco: "De que maneira a priorização fiscal para agrotóxicos impacta comunidades tradicionais e suas práticas agrícolas sustentáveis?".
Pedro Lucas, de Alagoas: "Quais são [...] [as vantagens e desvantagens dos] benefícios fiscais para os agrotóxicos e qual relevância disso para a sociedade?".
Mais duas aqui.
Magaly Leonello, de São Paulo: "Sabemos que sem os agrotóxicos não haveria comida suficiente para todos, [...] prejudicial é a falta de fiscalização para boas práticas".
David Kenned, do Rio de Janeiro: "Agrotóxicos deveriam ser proibidos. Vamos investir mais em engenharia genética para produzir uma safra resistente ou imune a flagelos".
E, por fim, Kauana Floriano, do Paraná: "Temos pesquisas referentes a outras alternativas (que não sejam agrotóxicos), sendo financiadas pelo Governo?". Aqui ela faz uma pergunta nesse sentido.
Aparecido Silva, de São Paulo: "Agrotóxicos, defensivos agrícolas, pesticidas, praguicidas, biocidas, agroquímicos, [isso] é uma forma de manter fábricas de armas químicas?". Ele deixa como pergunta, mas não deixa de ser uma afirmação também.
Bruna Almeida, do Paraná: "Quais são os benefícios do uso de agrotóxicos?".
R
Essas são as perguntas. Se vocês quiserem dar uma olhada, eu passo as folhas na hora em que... Ele vai já providenciar aqui.
Começo de novo com a Ana Paula. Ana Paula, se quiser...
São três minutos para cada um. Não tem problema nenhum, porque depois nós responderemos aqui pela Comissão, se assim entendermos necessário. O que vocês podem fazer são considerações finais. Fiquem bem à vontade para responder a alguma pergunta ou não. A gente fará, se necessário for.
Ana Paula Carvalho de Medeiros, Procuradora da República, Ministério Público Federal.
A SRA. ANA PAULA CARVALHO DE MEDEIROS - Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu quero só dizer aqui para a Shirley que eu vou lhe dar o direito que você pediu - eu achei bonito até - de fazer um agradecimento a todos no encerramento. Está aí a Shirley esperando? O.k.? Você vai falar no encerramento. Eles serão rápido. São três minutinhos, daqueles pequenininhos, cada um. Alguém vai dizer: "Ah, não sei que minutinho é. É maior ou menor, ou é um minuto, ou não é um minuto?". (Risos.)
Por favor, Doutora.
A SRA. ANA PAULA CARVALHO DE MEDEIROS (Para expor.) - Eu vou responder aqui à pergunta da Magaly: "Sabemos que sem os agrotóxicos não haveria comida suficiente para todos". É o que ela comenta. E isso não é... Já há vários estudos indicando que isso não é verdade, que poderia haver... É claro que, no atual sistema, vigente aqui no país, demandaria um tempo para haver essa alteração, essa transição de toda a produção para a agroecologia, mas... E, inclusive, sobre isso é importante ressaltar, a maioria dos alimentos que são consumidos pela população brasileira é produzida pela agricultura familiar, não por esses grandes monocultivos. E são os monocultivos que dependem atualmente de agrotóxicos e que dependeriam de um tempo talvez um pouquinho maior para essa transição. Então, não é uma questão de faltar alimentação.
E, só para finalizar, queria dizer que os subsídios tributários acabam distorcendo, esses subsídios tributários distorcem os custos dos diferentes métodos para controle de pragas e doenças e tornam a utilização dos agrotóxicos preferível do ponto de vista econômico, o que acaba por desestimular a transição agroecológica.
E é por esse motivo que eu acredito que seja um momento agora muito importante, um momento de discussão e debate aqui no Senado muito importante, em que se pode mudar o rumo dessa situação e abrir caminho efetivamente para um modelo de produção sustentável, que defenda a saúde da população e o meio ambiente.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Muito bem, Dra. Ana Paula de Carvalho de Medeiros, Procuradora da República, Ministério Público Federal, pelas suas contribuições neste debate que é para salvar vidas e salvar o planeta.
Paula Johns, ACT Promoção da Saúde - Sistema Tributário 3S.
A SRA. PAULA JOHNS (Para expor.) - Eu acho que vou fazer comentários gerais e não responder especificamente às perguntas.
Preocupa-me... Eu acho que a gente tem... Em primeiro lugar, eu acredito fortemente no poder do debate, em a gente trazer as coisas à tona, para a gente poder discutir os desafios coletivos que a gente tem. E acho que a gente tem o que eu chamaria de uma guerra de narrativas, porque a gente vem sendo bombardeado com este "agro é pop", "agro é tudo" nesse modelo de exportação de commodities, com uso intensivo de agrotóxico. E, como foi colocado aí, há uma certa dependência, estamos todos um pouco reféns desse sistema no Brasil, mas, obviamente, tem uma área que está ganhando muito dinheiro com isso. Então, como é que você vai fazer uma transição nesse jogo de forças com quem está ganhando? Obviamente, quem está ganhando com o status quo não quer mudar o status quo, isso é uma reação natural do ser humano.
R
Então, quando a gente olha até para esse Parlamento hoje e vê quem está ganhando, quem são as bancadas mais fortes aqui dentro, preocupa-me, assim, como a gente vai conseguir... Eu acredito que a gente possa conseguir, eu acho que a gente tem histórias no Brasil de conseguir superar esse tipo de desafio, mas a gente precisa ser muito contundente também, assim, de demandar que essa transição não seja uma transição... Quando é trazida pelo Ministério da Fazenda: "Ah! Vamos fazer uma transição!". Uma transição de quanto tempo, de 100, 200 anos? Isso é tempo demais para a crise climática que a gente tem hoje, para a crise da saúde. A gente não pode se dar a esse luxo.
Então, a pergunta é: em termos de narrativa, como a gente vai fazer para neutralizar, primeiro, esse poder econômico que se traduz em poder político aqui dentro da Casa, para neutralizar essas forças? Porque como eu trouxe antes - eu queria lembrar -, se a gente dialoga com a população, em nível de opinião pública, as pessoas entendem. Ninguém quer dar subsídio para produto que faz mal à saúde, mas concretamente, na prática, a gente dá.
E, assim, às vezes, me preocupa mais... Eu acho que o meu colega aqui trouxe o elemento de a gente estar falando entre pares, e é muito gostoso isso, mas me preocupa a ausência daqueles que querem que o sistema continue como está...
(Soa a campainha.)
A SRA. PAULA JOHNS - Eles não se expõem publicamente e isso me preocupa muito, porque onde eles estão? Eu vejo que eles estão atuando nos bastidores. Então, eu gostaria que viessem a público para a gente poder, de fato, fazer essa disputa de narrativa em cima do que a ciência nos dá, em cima dos fatos concretos que a gente tem, em cima dos dados, em cima das melhores práticas e, sobretudo, com a esperança de que a oportunidade, a capacidade que a gente tem no Brasil em termos do número de agricultores familiares que a gente tem neste país, se a gente criar uma estrutura, um sistema de apoio, um sistema de produção que faça mais sentido para todo mundo, a gente tem uma potencialidade absurda! Como a gente vai fazer valer essa potencialidade?
Então, acho que tenhamos, assim, essa consciência e essa certeza de que, sim, a gente pode mudar a realidade, mas não vai ser fácil com a conjuntura de forças atual porque poucas pessoas estão ganhando muito dinheiro com isso e estão vendendo...
(Soa a campainha.)
A SRA. PAULA JOHNS - ... falsas narrativas para a população brasileira.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Obrigado, Paula Johns, pela sua colaboração enorme para esse debate, que interessa a todo o povo brasileiro.
De imediato, Marcelo Firpo Porto, Coordenador do Neepes (Núcleo Ecologias, Epistemologias e Promoção Emancipatória da Saúde) e pesquisador da Fiocruz.
O SR. MARCELO FIRPO PORTO (Para expor. Fora do microfone.) - Bom, vou ser bem sintético.
Primeiro... (Pausa.)
Desligou. Ah, tá!
Por que tanto agrotóxico? Isso já foi falado muito, mas eu vou colocar num tema que, inclusive, se aproxima...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO FIRPO PORTO - ... da discussão do Diego.
Isso aí já foi para mim? Mal comecei. Não?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. MARCELO FIRPO PORTO - Ah, está ótimo. Obrigado.
É importante a gente entender que a produção do que se chama estrategicamente de Revolução Verde, que é um nome complicadíssimo para algo que é a construção do agronegócio, da agricultura capitalística mundial, ela faz parte de um processo estratégico construído principalmente a partir da Segunda Guerra Mundial de uma lógica imperialista de ampliação da produção de alimentos na lógica da lucratividade, dentro da disputa geopolítica que se desenvolveu ao longo do século XX.
R
Então, há toda uma construção estratégica que vai criando as políticas públicas, as tecnologias e as atuações de governos favoráveis à lógica da transformação de alimentos em mercadorias e em commodities. Acho que essa é a questão fundamental que explica por que tanta dependência do agrotóxico, dos agroquímicos, que faz parte de um projeto político de uma lógica geopolítica mais ampla.
Uma outra questão, sobre as comunidades tradicionais, indígenas, quilombolas, que é uma questão importante e que foi, de alguma maneira, pouco tocada no debate de hoje, é um debate estratégico para a transição e para o futuro. Eu ouvi aqui o representante do Ministério da Fazenda. Existe uma gramática importante nessa discussão. A gente não fala, na saúde pública, de pesticida ou de defensivo agrícola, a gente fala de agrotóxico para demonstrar que, acima de tudo, essa substância tem, como objetivo, matar a vida.
Quando a gente toma um antibiótico, mata uma microfauna interna que fica dentro do corpo da pessoa que está precisando, naquele momento, numa situação. No caso, a gente está falando de uma substância que é colocada no ambiente e que mata diferentes formas de vida.
É por isso que a transição não ocorrerá sem a ampliação das zonas livres de agrotóxicos e de transgênicos, porque não adianta apenas a gente ter comunidades tradicionais produzindo, como sempre se produziu até boa parte de toda a história da humanidade. Só depois da Segunda Guerra Mundial e nas últimas décadas é que se tornaram cada vez mais dependentes dos agroquímicos e agrotóxicos. Sempre se produziu alimento sem veneno.
O que essas comunidades tradicionais continuam a fazer é muito difícil quando, cada vez mais, as nuvens de veneno, as formas de dispersão alcançam essas comunidades pela expansão do agronegócio.
Então, essa é uma questão absolutamente estratégica para o futuro.
O último comentário: É falso dizer que não é possível acabar com a fome...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO FIRPO PORTO - ... e produzir alimento para toda a humanidade.
Cada vez mais existem estudos que mostram a importância e o aumento da produtividade dentro da agricultura familiar e da média, e mesmo de propriedades de um certo tamanho, desde que compatível com os agroecossistemas; e esse aumento de produtividade vai ser tanto maior - e aí a importância da tributação - quanto menores forem as externalidades negativas; ou seja, se o lucro, usando o agrotóxico, e o câncer, a morte, o gasto do SUS, a perda de emprego pelas pessoas contaminadas, doentes ou intoxicadas, se tudo isso não é tributado, a gente tem uma perversidade que, inclusive, camufla a ideia do que é a real produtividade. Enquanto a gente não incorporar saúde e interesses...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO FIRPO PORTO - ... em sociedade, nada se transformará.
Esse é o tema central. É isso.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Nossos cumprimentos ao Dr. Marcelo Firpo Porto, coordenador do Neeps (Núcleo Ecologias, Epistemologias e Promoção Emancipatória da Saúde) e pesquisador da Fiocruz.
R
Deputado Estadual Marcos José Abreu, Presidente da Comissão de Turismo e Meio Ambiente da Alesc que é representante do Fórum Catarinense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos.
O SR. MARCOS JOSÉ ABREU (Para expor.) - Obrigado.
Primeiro eu quero dar uma informação. Houve algumas perguntas que mostram que é importante trazer o contraditório aqui, é fundamental para o debate. Houve algumas perguntas sobre a possibilidade de produzir alimentos sem o uso de agrotóxicos e alimentar o mundo, e também se sem agrotóxicos não haveria mais fome.
Esse debate foi muito superado, a gente tem evidências científicas já comprovadas de que superamos isso e, muito pelo contrário, a gente tem contradições, inclusive algumas pesquisas estão demonstrando que onde nós temos os maiores centros de produção com agrotóxicos é onde também nós temos as maiores contradições entre os mais ricos e os mais pobres. Então, essa concentração de renda, de terras e de produção também produz e reproduz um sistema muito injusto, um abismo gigantesco.
Então eu convido quem está nos acompanhando a baixar um e-book que está disponível em vários sites, como no site do Idec - idec.org se não me engano -, também no site da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e no site do Cepagro. Nele são mencionados os dez mitos e verdades da questão da tributação e os impactos dessa tributação dos agrotóxicos para a população brasileira. Vale a pena buscá-lo e, inclusive, usá-lo como subsídio no debate aqui na Casa.
Eu queria também reforçar uma questão importante. Primeiro: na questão da tributação dos agrotóxicos, a gente precisa cuidar, porque muitas vezes os agrotóxicos são referidos como "insumos agrícolas". Insumos agrícolas envolvem uma diversidade enorme. Ali nós temos os bioinsumos, por exemplo, dentro dos insumos agrícolas, nós temos mudas, sementes e assim por diante.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS JOSÉ ABREU - Então é perigoso. A gente tem que tratar agrotóxico como agrotóxico, essa foi sempre uma grande luta. Inclusive o carro-chefe do PL chamado Pacote do Veneno foi acabar com o nome "agrotóxico" e trazê-lo para "insumo agrícola", para "produtos fitossanitários" e assim por diante. Então é fundamental a gente compreender isso e, nesse processo interno sobre a tributação, colocar e alocar os produtos químicos sintéticos para controle de pragas e doenças como agrotóxicos. Acho que esse é um debate bem importante.
E depois a gente também, como foi bem perguntado aqui, precisa saber que essa taxação e essa tributação não têm impacto direto sobre o valor desse alimento ou sobre a vida desse agricultor. Os trabalhadores rurais estão quatro vezes mais suscetíveis a doenças crônicas não transmissíveis...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS JOSÉ ABREU - ... assim como a suicídios do que um trabalhador urbano, por conta da exposição que eles têm aos agrotóxicos e a esses produtos químicos sintéticos. É fundamental compreender isso.
E a agricultura familiar é a que mais sofre com isso. A agricultura familiar não é sinônimo de agricultura sem agrotóxicos, muito pelo contrário. Quero dizer que os trabalhadores rurais familiares, os pequenos agricultores, são os que mais sofrem com a exposição a esses produtos.
E quero dizer da sua problemática, do quanto é complexo o tema, porque hoje nós temos a pulverização com drones utilizados pelos pequenos agricultores e com uma série de consequências, porque nós não temos mecanismos mínimos de barreiras, de controle, de fiscalização, e isso é de uma profundidade que a gente não mede as consequências do uso indiscriminado desses produtos.
R
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS JOSÉ ABREU - Então, quero agradecer, mais uma vez, ao Senador Paulo Paim e me colocar à disposição e também o Fórum Catarinense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Deputado Estadual Marcos José Abreu, Presidente da Comissão de Turismo e Meio Ambiente da Alesc e representante do Fórum Catarinense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos.
Parabéns pela sua fala, que contribuiu muito para o debate.
Vamos para a segunda mesa.
Diego Moreira, representante do setor de produção do MST.
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA - Eu preciso...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Então, sem problema. O Diego, gentilmente, já cedeu.
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA - Obrigada, Diego.
Vou tentar ser rápida.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O Diego já tomou a decisão pela mesa, não é?
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA - É, no lugar do Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA - O nosso candidato a Senador. (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Então, passamos, de imediato, para Maria Juliana Moura Corrêa, Diretora do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde.
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA (Para expor.) - Vou tentar responder de forma breve.
Quero dizer também que a nossa secretaria muda de nome neste Governo. Ela acrescenta a letra "a", de ambiente, pela importância política. Então, ela passa a ser Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente. Isso não é meramente uma vogal a mais, mas é a intenção política deste Governo de avançar nessas questões que a gente está trazendo.
Questão importante que a Nathaly colocou aqui: o impacto dos agrotóxicos em relação às comunidades tradicionais.
Quero dizer que, como já foi dito aqui, nós temos urgência por essa transição. Nós temos as mudanças climáticas nos atingindo drasticamente, do ponto de vista do perfil epidemiológico, da sustentabilidade das nossas cidades e das políticas econômicas, e uma necessidade de transição de Estado.
Que Estado é esse de que nós estamos falando que dá conta dessa nova problemática que o mundo inteiro passa a ter que responder e a fazer frente? Nós tivemos um ensaio com a pandemia dessas mudanças que nos trouxeram alternativas de a gente discutir, enfim, que modelo econômico, que modelo de desenvolvimento os Estados precisam para garantir a vida e a saúde da população.
O Pedro pergunta: "Quais são as vantagens dos agrotóxicos?".
Para nós, na saúde, não tem vantagens, tem só desvantagens, porque nós temos pessoas morrendo precocemente, adoecendo, não só de câncer - a gente cita o câncer como emblemático -, mas nós temos toda uma questão em relação à saúde da mulher, à saúde do homem, à infertilidade de uma população, à saúde reprodutiva, que está atingida no Brasil. E temos uma questão importante que é a da biodiversidade, sobre a qual os povos tradicionais vêm discutindo conosco.
Nós também temos a pauta das mudanças climáticas para o Mercosul...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA - ... em que nós vamos estar, em setembro aqui no Brasil. Nós fizemos um plano de ações em relação às mudanças climáticas para o Mercosul, em que todas essas questões se atravessam, e em relação à necessidade de o Estado brasileiro passar a monitorar a qualidade do ar e da água para o consumo humano para a preservação.
Essas comunidades estiveram com a gente. Os povos tradicionais também são atingidos pelas questões dos agrotóxicos, porque muitos deles estão em territórios onde as águas do entorno estão contaminadas, onde o conhecimento ancestral das ervas está atingido, porque a vegetação está contaminada.
R
Então, nós temos que fazer este debate das políticas públicas com essas populações que são resilientes e que têm propostas não só da agroecologia, mas também do que nós estamos chamando, Senador, e constituindo, neste Governo, como saúde única, que reúne a questão do humano, do animal e da vegetação.
Dessa forma, eu encerro...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA JULIANA MOURA CORRÊA - ... dizendo que essas são linhas que nós precisamos fortalecer. E eu gostei de estar aqui a Fazenda, porque nós temos que tributar, sim, esses territórios com produção agroecológica, de conhecimento ancestral, comunidades resilientes que estão na defesa da vida e da saúde, ao contrário do que a gente está fazendo com a desoneração dos agrotóxicos.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Parabéns, parabéns, Maria Juliana Moura Corrêa, Diretora do Departamento de Vigilância de Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador, do Ministério da Saúde. Muito obrigado.
De imediato, passo a palavra para o último painelista, Diego Moreira, representante do setor de produção do MST.
O SR. DIEGO MOREIRA (Para expor.) - Está bem. Apesar das adversidades e de ainda estarmos, digamos assim, na defensiva, eu acredito que nós estamos em melhores condições de construir uma ofensiva, para essa ideia de destruir essa concepção de o nosso país ser uma grande fazenda. Ele foi concebido como a grande fazenda e ainda continua sendo essa grande fazenda agroexportadora. Então, que possamos, Governo e sociedade civil, através e na sociedade civil, fazer esse papel importante dos movimentos sociais e o papel importante da ciência! Essa junção de movimento social e ciência é muito importante para nós avançarmos nessa direção. Primeiro, nós estamos numa batalha ideológica, então nós vamos precisar acertar a narrativa - essa narrativa ciência e movimento social, para incidir na sociedade civil -, pois ela é muito importante; como nós vamos construir essa sinergia para aproximar a ciência do fazer e o fazer da ciência, para que nós possamos construir, nessa batalha de ideias, uma narrativa que vá conquistando corações e mentes da sociedade brasileira?
Os dois temas centrais são a preservação da natureza e o tema do alimento - o tema do alimento -, nós vamos conquistar corações e mentes através do estômago, não tenham dúvidas. Então, nós precisamos alimentar esses milhões de brasileiros e brasileiras que estão passando fome. Nós precisamos avançar nessa perspectiva.
Além da batalha das ideias, há construção de políticas públicas. Então, nós esperamos que possamos retomar as políticas públicas e avançar nelas para que, de fato, cimentem o nosso caminho para nós construirmos uma agricultura sustentável e tudo isso que nós estamos propondo aqui. Nós precisamos construir esse movimento alicerçado nessa perspectiva.
Apareceu uma pergunta aqui bastante importante: se os benefícios fiscais concedidos aos agrotóxicos fossem reduzidos, haveria mais dinheiro para a agricultura familiar e para as políticas públicas? Esse panfleto da campanha contra os agrotóxicos diz que só em 2021 o Brasil deixou de arrecadar 13 bilhões - 13 bilhões! - em isenção.
(Soa a campainha.)
O SR. DIEGO MOREIRA - Vou dar um exemplo aqui, Senador, e quero já pedir a sua ajuda nisso também, o PAA, que é o principal Programa de Aquisição de Alimentos do Governo Federal para combater a fome... Foi aberta uma chamada pública, a agricultura familiar apresentou uma demanda de 1,1 bilhão, o Governo disponibilizou 250 milhões. Então, o orçamento que nós temos hoje é de 250 milhões. Nós precisamos, de imediato, de 1,1 bilhão para contratar os programas que já estão apresentados na Conab e no MDS. Só de isenção, em 2020, foi 13 bilhões. Então, não tenho dúvida de que, se nós avançarmos numa luta política para reduzir esses benefícios, ou para acabar com esses benefícios, nós vamos ter orçamento para a política pública, para a reforma agrária, para a ciência e tecnologia, para a educação, para o combate à fome.
R
Então, nós precisamos construir essa energia, essa sinergia em torno desse movimento para nós avançarmos nessa perspectiva.
(Soa a campainha.)
O SR. DIEGO MOREIRA - Daí, o movimento social, a ciência e a política precisam estar conectados a essa perspectiva.
Quero agradecer a possibilidade de participar aqui, agradecer novamente a campanha contra os agrotóxicos, ao nosso Senador Paulo Paim e dizer que nós, do MST, não faltamos, não faltaremos e estaremos sempre à disposição. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Diego Moreira, representante do setor de produção do MST, que também fez uma bela explanação.
Por favor, Shirleyde, venha, por favor, para fazer o encerramento final aqui do nosso evento.
Eu só vou falar no encerramento do encaminhamento, que são duas frases praticamente.
A SRA. SHIRLEYDE SANTOS (Para expor.) - "Lutar pela terra, lutar pelas plantas, lutar pela agricultura, porque se não vivermos dentro da agricultura, vamos acabar. Não tem vida que continue sem terra, sem agricultura". Ana Primavesi.
"A dúvida é se a civilização pode mesmo travar esta guerra contra a vida sem se destruir e sem perder o direito de se chamar de civilizada". Rachel Carson.
Agrotóxico mata!
Obrigada a todos e a todas que estiveram juntos conosco nesta manhã. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Shirleyde.
Pessoal, vamos encerrar mesmo agora, porque muita gente disse que já são quase duas horas.
Encaminhamento nº 1. A Comissão se compromete a encaminhar aos membros da CCJ, da CAE e ao Relator da reforma tributária, Senador Eduardo Braga, link com os dados e informações apresentados na reunião.
Encaminhamento nº 2, que depende de vocês. Os que entenderem que devem apresentar emendas - claro, o instrumento vai ser nosso -, apresentem emendas que nós encaminharemos para o Relator, o.k.?
Muito obrigado a todos. (Palmas.)
Está encerrada a nossa brilhante audiência pública em defesa da vida.
(Iniciada às 10 horas e 36 minutos, a reunião é encerrada às 13 horas e 40 minutos.)