Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
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| R | O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fala da Presidência.) - Desculpem o atraso. Normalmente eu não me atraso, mas tive que fazer um pronunciamento no Plenário do Senado sobre o arcabouço fiscal e corri para cá neste momento para que a gente iniciasse, então, a audiência pública de hoje. Declaro aberta a 58ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal, da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura. A audiência pública será realizada nos termos do Requerimento 63, de 2023, desta Comissão, de minha autoria e de outros Senadores e Senadoras, para debater o tema: desenvolvimento sustentável e bem-estar social na reforma tributária. |
| R | A reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados, por meio do Portal e-Cidadania na internet, em www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria 0800 0612211. Faço a fala da Presidência de forma muito rápida para situar todos os telespectadores e aqueles que estão nos ouvindo também pela Rádio Senado e saberão da notícia pela Agência Senado. Senhoras e senhores, sejam bem-vindos, todos! Reunimo-nos hoje, nesta audiência pública, para debater um tema de extrema relevância para o nosso país: desenvolvimento sustentável e bem-estar social na reforma tributária. A reforma tributária, há mais de quatro décadas em discussão, se mostra fundamental para impulsionar o crescimento. É mais ou menos o tempo que eu estou dentro do Congresso: eu vou para 40 anos de Congresso, que iniciei na Constituinte, e termino esse mandato daqui mais de três anos, o que vai dar exatamente 40 anos. Só vejo falar em reforma tributária, mas ela acaba nunca acontecendo. Enfim, o desenvolvimento da nossa nação passa pela reforma tributária, incentivando a todos, o setor produtivo, fomentando a geração de emprego, de renda, e cuidados como a saúde, a educação, a infraestrutura, enfim, é o eixo do campo econômico do nosso país. Devemos destacar a oportunidade que temos diante de nós para não apenas reestruturar o nosso sistema tributário, mas também promover o bem-estar social e a sustentabilidade, uma reforma tributária que poderíamos dizer consciente e que pudesse ser alavanca para um novo cenário, onde a saúde pública, a qualidade da alimentação da população e o consumo correto pudessem ser priorizados. Há distorções no sistema tributário atual: produtos ultrapassados, cujo impacto negativo na saúde é evidente, muitas vezes são tributados com alíquotas baixas ou até mesmo nulas. Por outro lado, os alimentos orgânicos, agroecológicos, que têm um potencial enorme de contribuir para uma população mais saudável não recebem o devido apoio, o incentivo tributário merecido. Chama a atenção um estudo que revela os impactos dessa disparidade, e aí vêm: por que a comida saudável está longe da mesa dos brasileiros? “O papel da tributação como propulsora da desnutrição, obesidade e mudanças climáticas no Brasil" é um estudo evidencia a necessidade de reavaliar o nosso sistema tributário sobre um cenário mais abrangente, considerando não apenas os interesses econômicos, mas também e, principalmente, a saúde da nossa gente, a saúde das nossas pessoas e o impacto ambiental. Desonerar a folha da cesta básica de alimentos poderá reduzir, em média, 5% o valor dos preços dos produtos. Creio que o Brasil tem capacidade de elaborar uma reforma tributária que priorize não somente o desenvolvimento econômico, mas também os direitos humanos e a saúde da nossa população. Nossa nação possui um potencial extraordinário para conciliar crescimento econômico com justiça social e ambiental. |
| R | Estamos juntos. Vamos à nossa audiência pública. De imediato... (Pausa.) Expediente, em nível de informação. A Secretaria da CDH recebeu os seguintes documentos: de mãe, que encaminha denúncia de direitos humanos, suplicando ajuda para repatriação de suas filhas de quatro e seis anos, sob graves indícios de abusos sexuais - esse é o pedido dela. Informo que, nos termos da Instrução Normativa 12, de 2019, os documentos lidos ficam disponíveis na Secretaria ou no portal da CDH, para manifestação dos membros desta Comissão, pelo período de 15 dias. Terminando o prazo e os devidos encaminhamentos, os documentos serão arquivados. Vamos agora aos nossos convidados. Primeira mesa. Convido Sra. Mônica Andreis, Diretora-Geral da ACT Promoção da Saúde. (Palmas.) Convido Letícia de Oliveira Cardoso, Diretora do Departamento de Análise Epidemiológica e Vigilância de Doenças não Transmissíveis do Ministério da Saúde. (Palmas.) Convido Marcos Aurélio Pereira Valadão, Professor da Fundação Getúlio Vargas. (Palmas.) Convido Edna Carmelo, Consultora e Especialista em Tributação de Cadeias Produtivas. (Palmas.) Na segunda página há perguntas do e-Cidadania, às quais eu passarei em seguida. Mas, de imediato, passo a palavra para a Sra. Mônica Andreis, Diretora-Geral da ACT Promoção da Saúde. Cada um terá um tempo de dez minutos e mais cinco se necessário - um máximo de 15 minutos. O tempo é seu. Botão verde ligado - é aqui. Isto! A SRA. MÔNICA ANDREIS - Aqui, né? Está certo! O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Pronto! A SRA. MÔNICA ANDREIS (Para expor.) - Obrigada, Senador. Primeiro, eu gostaria de agradecer pela oportunidade de estar participando aqui da audiência pública. Também quero cumprimentar todos os presentes e quem nos acompanha online. Eu trouxe uma apresentação. Não sei se eles já podem colocar para mim ali. (Pausa.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Pelo que eu entendi, vai ter duas mesas. Christiano, vai ter duas mesas? (Pausa.) Isso. Então, a Tathiane está na segunda mesa - com o mesmo prestígio, viu? Inclusive, quem fica na segunda mesa fica até o final. Esses aqui falam e têm que ir para o Plenário. A SRA. MÔNICA ANDREIS - Acho que ele está colocando ali. Bom, vou falar daqui mesmo, por causa do microfone, então. Eu represento aqui a ACT Promoção da Saúde, que é uma organização não-governamental brasileira, criada há 16 anos para atuar com promoção de políticas públicas, inicialmente de controle de tabaco e, depois, ampliando também para o tema da promoção da alimentação adequada e saudável, controle do álcool, promoção da atividade física. |
| R | Pode passar, por favor. Acho que já pode passar até o outro, porque o primeiro só apresenta a ACT - isso. E aqui até gostaria também de colocar que está acontecendo aqui em Brasília o nosso Seminário de Alianças Estratégicas para Promoção da Saúde. A gente teve o prazer de convidar boa parte das pessoas que estão participando do seminário para estarem aqui conosco, representando cinco estados brasileiros. Então, é uma turma que está bastante atuante também no tema da saúde e que está aqui conosco. (Palmas.) Bom, então, começando um pouquinho a falar. A reforma tributária sobre o consumo visa primordialmente à unificação e à simplificação do sistema tributário. Ela define alíquotas distintas para vários setores, mas nós entendemos que, diante da desigualdade social que existe no Brasil, a reforma tributária é também uma oportunidade para a gente melhorar, para contribuir para a promoção da equidade, do bem-estar e da saúde da população. Então, a ACT defende uma reforma tributária que garanta a tributação diferenciada para produtos não saudáveis, como tabaco, álcool e alimentos ultraprocessados. O próximo, por favor. Aqui, as principais recomendações que nós temos, enquanto organização e rede, como: a manutenção do imposto seletivo sobre produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente, tal como foi aprovado na Câmara dos Deputados, e que depois nós esperamos que possa incidir especialmente sobre esses produtos que eu mencionei, como tabaco, álcool e alimentos ultraprocessados; também defendemos a manutenção da Cesta Básica Nacional de Alimentos com alíquota zero, criada pela Câmara dos Deputados, mas também alinhada com o Guia Alimentar para a População Brasileira, garantindo uma cesta básica saudável. E, nesse sentido também, entendemos que os produtos categorizados como parte do imposto seletivo não podem estar incluídos no rol daqueles que vão ter alíquota reduzida, senão seria um contrassenso. A gente quer desestimular o consumo desses produtos, então eles não devem ter nenhum tipo de redução de alíquota, assim como também não devem receber benefícios fiscais ou subsídios, porque o que faz mal à saúde e ao meio ambiente não pode receber benefícios fiscais. Esse é o nosso entendimento. E também defendemos que a vinculação desses recursos arrecadados possa ser direcionada para o Fundo Nacional da Saúde, para o Sistema Único de Saúde, porque nós todos sabemos da importância e da necessidade de maior financiamento no nosso país. Pode passar o próximo, por favor. Aqui, só para trazer uma ideia do impacto econômico que esses produtos têm: só de tabaco, a gente tem ali cerca de 92 bilhões ao ano de perdas associadas a custos diretos e indiretos, seja por doenças associadas ao uso do tabaco, quanto também a afastamentos de trabalho e todas essas coisas; temos o custo também em torno de 100 milhões por ano de internações associadas ao uso do álcool; e quase 3 bilhões, também ao ano, do custo associado a bebidas adoçadas. Então, vamos passar para o próximo também, por favor, para a gente ver o impacto que isso tem. Os impostos seletivos sobre esses produtos têm esse potencial de diminuir substancialmente os gastos em saúde, aumentar a arrecadação e salvar vidas. Então, o aumento de preço em impostos contribuiu com mais da metade da redução da proporção de fumantes no Brasil. É a medida mais custo-efetiva que a gente tem em relação ao decréscimo de consumo de tabaco que nós tivemos no Brasil. |
| R | Então, nós consideramos que, ao elevar o imposto sobre esses produtos, a gente desencoraja o consumo e ao mesmo tempo favorece a arrecadação, o que pode permitir também o investimento em políticas públicas de cunho social e de saúde. Pode ser o próximo também, por favor? E a destinação de recursos visa não somente onerar, mas também onerar os setores cujo crescimento pode impactar desfavoravelmente as despesas públicas, ou seja, reduzir as externalidades negativas causadas por essas indústrias. E ao menos 80 países já adotaram vinculação de recursos, e, desses, cerca de 44% também usam parte ou a totalidade da arrecadação para financiamento da saúde. E aí nós temos diversos estudos mostrando esse potencial de elevação arrecadatória, a partir do uso do imposto seletivo. O próximo, por favor E aqui a gente traz uma pesquisa que saiu hoje, inclusive, publicada na Folha de S.Paulo, que é muito importante, porque mostra o apoio da população à adoção de aumento de imposto para produtos nocivos à saúde, como esses que eu mencionei, tabaco, álcool e alimentos ultraprocessados: 94%, ou seja, nove em cada dez pessoas desejam esse aumento de tributos para produtos nocivos. (Intervenção fora do microfone.) (Palmas.) A SRA. MÔNICA ANDREIS - São dados extremamente importantes. Ali também: seis em cada dez são contra que o Governo conceda incentivos fiscais para esses fabricantes de produtos que fazem mal à saúde; sete em cada dez são favoráveis a que os recursos arrecadados sejam destinados ao Sistema Único de Saúde; e nove em cada dez são a favor de que a cesta básica seja composta exclusivamente por alimentos saudáveis. Isto deveria ser óbvio: que a cesta básica fosse composta exclusivamente por alimentos saudáveis, mas, infelizmente, não é o que a gente tem. Boa parte do país ainda utiliza, por exemplo, a adoção de alimentos ultraprocessados em cesta básica. A gente reivindica que isso seja modificado, e a população apoia plenamente essa ideia, como a gente pode ver por aqui. O próximo. O próximo mostra também um pouco esse detalhamento, como é que é o apoio, de acordo com cada um dos produtos que foi questionado. Então, há ali um elevado apoio à questão do aumento tributário para produtos como cigarro, como bebidas alcoólicas, agrotóxicos. E aí você tem a diferenciação, que depois pode ser comparada. Pode passar. E aqui também a gente tem outro detalhamento. Eu vou pedir só para ele clicar. Eu não vou falar do eslaide todo, porque ele tem bastante informação, mas a gente o deixa disponível. São dados bem importantes para análise. Ali, por exemplo, nós temos 79% da população também contrária às propagandas de ultraprocessados destinados ao público infantil. Temos também, por parte do tabagismo, 84% das pessoas a favor de que as empresas que fabricam cigarros paguem ao SUS o tratamento das doenças tabaco-relacionadas. E, finalmente, metade da população, 50%, acredita que beber eventualmente também faz mal - não somente o consumo em excesso, mas até o eventual. Então, são dados extremamente importantes. Eu acho que mostram que a população, apesar de ter... Claro, ninguém vai querer imposto a mais à toa, mas, quando se fala em relação aos produtos nocivos, há essa conscientização de que esses produtos realmente devem ser mais caros, devem ser desestimulados, ao passo que a gente deve tornar mais acessíveis os produtos saudáveis. (Soa a campainha.) A SRA. MÔNICA ANDREIS - Então, acho que já está finalizando. Pode passar a próxima. |
| R | (Intervenção fora do microfone.) A SRA. MÔNICA ANDREIS - Ah, está bom. Aqui é só para falar que também esse aumento de tributação está associado com o alcance dos objetivos de desenvolvimento sustentável, tal como previsto na Agenda 2030. A gente tem ali diversas metas na agenda que contemplam esses assuntos, então, por exemplo, a Meta 3.4, que fala na redução da mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis, a 3.5, a 3.a, a 3.c. Ou seja, ele está de acordo também com esse compromisso internacional adotado pelo Brasil. Pode passar, por favor. E aqui, só para finalizar, quero falar que a ACT também é membro do grupo e apoia plenamente a adoção de uma reforma tributária chamada 3S, ou seja, saudável, solidária e sustentável. Então, a gente tem aí nas mãos uma oportunidade de melhorar as condições tanto de saúde quanto de justiça social dentro do Brasil, para a população brasileira. Se ela for conduzida de acordo com o interesse público, pode trazer enormes ganhos tanto para a agenda de saúde quanto de sustentabilidade no nosso país, então, garantir a implementação do imposto seletivo significa zelar pela saúde, proteger gerações futuras e impulsionar o desenvolvimento sustentável. A gente coloca aqui o QR code para quem quiser conhecer mais dessa iniciativa, e peço o apoio tanto do senhor quanto de todos aqui desta Casa para que a gente consiga alcançar esse objetivo. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Sra. Mônica Andreis, Diretora-Geral da ACT Promoção da Saúde, meus cumprimentos pela exposição. E pelas palmas, vi que você agradou. (Risos.) A SRA. MÔNICA ANDREIS - Uma torcida. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Foi legal. É isso mesmo, tem que se manifestar. É como dizia Nelson Mandela e como diz também sempre o Presidente Lula: é preciso que a população se manifeste e diga o que quer, senão o outro lado só fica falando sozinho. É algo que vocês estão fazendo e merece o apoio de todos nós. Passo de imediato a palavra à Sra. Letícia de Oliveira Cardoso, Diretora do Departamento de Análise Epidemiológica e Vigilância de Doenças não Transmissíveis do Ministério da Saúde. Seja bem-vinda! A SRA. LETÍCIA DE OLIVEIRA CARDOSO (Para expor.) - Boa tarde a todos. Senador Paulo, gostaria de cumprimentá-lo e agradecer a oportunidade deste debate. Quero cumprimentar meus colegas de mesa, cumprimentar todos que nos ouvem aqui. Quero agradecer a presença de todos e também a quem nos assiste virtualmente, tanto legisladores, sociedade, colegas de profissão. Sou nutricionista, então, acredito que este debate é muito importante. Eu também trouxe uma apresentação. Então, deixem que eu me apresente. Eu falo aqui em nome do Ministério da Saúde, eu sou Diretora do Departamento de Análise Epidemiológica e Vigilância de Doenças Crônicas não Transmissíveis, e o Ministério da Saúde vê com muito bons olhos essa tramitação - finalmente, Dr. Paulo - porque a gente gostaria muito que isso avançasse. A gente ficou muito feliz com esse avanço no Legislativo e agora a gente está aqui no Senado fazendo o nosso papel. O Ministério da Saúde está aqui trazendo essa posição e eu vou fazer um recorte dessa posição muito voltada para o olhar das doenças crônicas não transmissíveis. Próximo, por favor. As doenças crônicas não transmissíveis - eu vou agrupar aqui em quatro grupos principais: doenças cardiovasculares, neoplasias, diabetes, doenças respiratórias crônicas - são as primeiras causas de óbito no país. E além disso, de serem as primeiras causas de óbito, são as primeiras causas de óbito prematura, ou seja, ceifam vidas da nossa população em idade economicamente produtiva - de 30 a 69 anos, sendo que acometem 56% dos homens e 44% das mulheres. |
| R | Ali a gente tem dados vindos de 2000 até mais recentemente, de 2020. Essa mortalidade vem caindo, mas ela vem caindo não porque a gente vem contendo os fatores de risco para doença crônica, mas porque a gente vem intervindo com tecnologia e acesso a serviço de saúde para que essa mortalidade caia. O único fator de risco em que a gente tem comprovadamente um decréscimo nos últimos anos é o tabagismo. Os demais não estão caindo. E essa é uma preocupação muito importante para a gente. Próximo, por favor. Aqui a gente tem um ranking de mortalidade com os dados do Sistema de Informação de Mortalidade, do último fechado, 2021. Nós temos aí, tirando, como a gente teve uma pandemia - não é gente? - a causa de mortalidade por covid, a segunda causa sempre é doença do aparelho circulatório, entre 30, 50 até 69 anos, 79 anos. Então é a doença mais frequente, é a doença que ceifa vidas. Quando a gente soma o número total, elas somam 700 mil mortes somente no ano de 2021. Se a gente lembrar dos números da pandemia, é quase como se a gente tivesse uma pandemia todos os anos de doença crônica. Então por que a gente não está interferindo nisso? Como a gente precisa avançar para a gente ter medidas efetivas para diminuir o número de mortes por doenças crônicas? Próximo. E aqui são os fatores de risco. Então, quais são os principais fatores de risco que levam à ocorrência das doenças crônicas? Em primeiro lugar está o tabagismo. Em segundo, consumo de bebida alcoólica, e terceiro é má nutrição. Próximo. Esses fatores de risco vêm mudando o ranking ao longo do tempo. De 2010 a 2019, a gente tem ali dados do GBD em que o tabagismo vem ainda em primeiro lugar; em segundo lugar, riscos dietéticos, má alimentação, como a Mônica comentou, o consumo de alimentos ultraprocessados; e o terceiro é o consumo de álcool, que é tão socialmente aceito na nossa sociedade, mas que precisa ser visto com muita cautela. Próximo, por favor. Vou falar um pouquinho de cada um dos fatores. O álcool. Próximo. Então, a cada hora morrem duas pessoas por causas plenamente atribuíveis ao consumo de álcool no pais. No total de mortes, a faixa etária de 20 a 39 anos é a mais atribuída ao álcool no mundo, e é o principal fator de risco para mortes e incapacitações de pessoas com 15 a 49 anos. É importante mencionar que ele está associado com um conjunto grande de doenças: doenças hepáticas, doenças cardíacas, obesidades, mas também com outras questões que afligem a nossa sociedade, como questões relacionadas à saúde mental e às violências, a acidentes de trânsito. Então, o álcool é fator de risco para diversas doenças e agravos na nossa população, como câncer, em que já tem vários estudos mostrando. Então, a gente não precisa de mais evidência para mostrar que o álcool é prejudicial à saúde. Próximo. Quando a gente olha para dados de consumo na nossa população, é algo que vem aumentando assustadoramente: 46% da população adulta tem o hábito de consumir bebidas alcoólicas; 18% consomem de forma abusiva; e nos chama a atenção o aumento do consumo abusivo entre as mulheres. Esses são dados de 2021; a gente já está com os de 2023 prontinhos para sair, estão no forno, já vão ser lançados os dados de 2023. E esse aumento do consumo de álcool abusivo em mulheres tem nos preocupado muito. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde, que abrange todo o território brasileiro, também confirmam esse consumo excessivo de bebida alcoólica pela nossa população. |
| R | Próximo. Quando a gente fala de jovens, a nossa Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar de 2019 mostra que 63% dos jovens de 13 a 17 anos já experimentaram bebida alcoólica alguma vez na vida, 34% tinham tomado a primeira dose antes dos 13 anos de idade. Então, é uma entrada de um produto que é nocivo à saúde muito precocemente na vida das pessoas. E a última informação ali: 27% dos escolares de 13 a 17 anos consumiram pelo menos em um dia nos últimos 30 dias anteriores à realização dessa pesquisa de 2019. Em 2024, vai ocorrer a nova edição da PeNSE, e nós vamos ter oportunidade de atualizar essas informações. Próximo. Aqui nós temos dados de gastos, em termos... Vai chegando na casa de bilhões. A gente tem estudos que somam gastos diretos e indiretos por causas atribuíveis ao álcool, tanto os gastos hospitalares, atendimentos ambulatoriais, mas também em termos econômicos, absenteísmo no trabalho e outros gastos na saúde. Próximo, por favor. E a gente sabe que, como a Mônica mencionou, a tributação é uma das medidas mais efetivas para a gente diminuir o consumo. Aumentar o custo desses produtos tem sido adotado em diferentes países com sucesso para diminuir o seu consumo, especialmente da população mais pobre. Próximo. No tabaco, eu não vou me alongar - pode passar. Eu não vou me alongar, a Mônica também trouxe dados. A gente sabe que é o principal fator de risco: 80% dos fumantes no mundo vivem em países de baixa e média renda, são mercados em expansão - próximo - ainda, apesar das nossas medidas de contenção. Próximo, por favor. A gente vem observando essa queda, Senador, de consumo do tabagismo, mas, se você olhar os últimos anos, 2020, 2021, ela está se estabilizando. O ritmo de queda não está seguindo os anos anteriores, e essa é uma preocupação. A gente tem monitorado isso ano a ano, e isso é uma preocupação para a gente. A gente sabe que essa estabilização da queda do consumo - próximo, por favor - tem a ver com o custo do produto. Aqui são gastos, em bilhões, por ano que o SUS gasta para reverter problemas relacionados ao tabaco, como tratamento, perda de produtividade, cuidados familiares e a pessoas próximas. (Soa a campainha.) A SRA. LETÍCIA DE OLIVEIRA CARDOSO - E os impostos retornam somente 10% desse custo que a gente tem no SUS. Então, essa é uma informação importante para a gente quanto à questão da vinculação do retorno do imposto seletivo. Próximo. Aqui também é um dado importante: conforme aumenta o preço do maço de cigarro e dos produtos relacionados ao tabaco, a gente vê uma queda. Esses dados são recentes nos últimos anos, conforme a implementação. E a gente sabe também que esse consumo vai se estabilizando conforme o preço não vai aumentando. Então, a gente sabe que tem uma relação direta mostrada ali. Próximo. |
| R | E quais são as medidas, já me encaminhando para o fim porque meus minutos estão terminando, que a gente entende como muito importantes para combater esse consumo nocivo desses produtos? Próximo. No Ministério da Saúde, a gente tem diversas políticas que envolvem essas diversas áreas. Aqui eu estou dando destaque a uma delas, que é o Plano de Enfrentamento das Doenças Crônicas e Agravos não Transmissíveis, que prevê várias ações dos anos 2021 a 2030. Dentro dessas ações, a gente é claro que inclui ações de educação, informação, aumentar o nível da informação para as pessoas - o acesso à informação é importante para subsidiar as escolhas -, mas nós não podemos perder de vista que as escolhas são moldadas pelo ambiente em que as pessoas vivem, e por isso a regulamentação e a tributação são medidas muito importantes. Portanto, o Ministério da Saúde apoia medidas como o imposto seletivo a produtos nocivos à saúde. Próximo. E aqui, falando especificamente da reforma tributária, no texto da PEC 45-A, que foi aprovada na Câmara e que veio para essa Casa, nós apoiamos, então, a criação do imposto seletivo para bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, previsto nesse art. 153, inciso VIII. Um ponto de atenção que a gente tem é o inciso IX do art. 9º do substitutivo porque, se por um lado a gente tributa, a gente não pode descaracterizar essa tributação em outros lugares dentro do texto. Próximo. E a gente também apoia a criação da Cesta Básica Nacional de Alimentos com alíquotas de tributos reduzidas a zero, prevista no art. 8º do substitutivo, e que essa composição deve ser definida em lei complementar, que ela deve seguir o Guia Alimentar para a População Brasileira - é um guia aceito, é um guia que tem destaque mundial por ser ousado na promoção da alimentação saudável, é reconhecido mundialmente como um guia importante para a promoção da alimentação saudável e proteção da saúde das pessoas. Então, a gente também entende a Cesta Básica não só como uma medida de garantia ao direito humano da alimentação saudável e sustentável, mas também como uma medida de proteção à saúde. Ela não é só um benefício social, ela é uma medida que pode ser muito importante para a proteção da saúde e prevenção de doenças crônicas. E a definição composta apenas por alimentos saudáveis. Próximo, por favor. Eu quero deixar o contato aqui da gente, do departamento, e dizer que estamos à disposição da sociedade civil, dos Senadores, para a abertura desse diálogo e alinhamento com a manutenção do imposto seletivo na pauta da reforma tributária. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Letícia de Oliveira Cardoso, Diretora do Departamento de Análises Epidemiológicas e Vigilância de Doenças Crônicas não Transmissíveis do Ministério da Saúde. Foi muito bem aplaudida também, viu? (Risos.) Nosso time está aí... está legal, parabéns. Estamos atentos, não é? De imediato... Pediram-me aqui, é um amigo meu, não tem como eu não abrir uma exceção para ele... Ele era o terceiro daqueles que estão em videoconferência, mas, por compromissos já assumidos, ele solicitou que eu o colocasse nesse momento na tela. Então, com muita satisfação, eu convido, permita que eu diga assim, o meu amigo José Gomes Temporão, ex-Ministro da Saúde, por videoconferência. (Palmas.) |
| R | O SR. JOSÉ GOMES TEMPORÃO (Para expor. Por videoconferência.) - Muito boa tarde. É um prazer revê-lo, Senador, mesmo que virtualmente. Eu quero cumprimentar todos os membros da Comissão do Senado, agradecer este honroso convite e cumprimentar todos que nos assistem pelas redes sociais. Eu aqui sou um soldado da causa, digamos assim. Com mais de 40 anos de experiência em saúde pública, o que eu vou falar aqui é, digamos assim, a reiteração dessa minha visão médico-social e a reiteração dessa minha visão de saúde pública. Eu acho que é muito interessante a gente refletir sobre o incrível sucesso da política brasileira de controle do tabaco. Eu fui Diretor do Instituto Nacional de Câncer e participei ativamente da ratificação da Convenção-Quadro da Organização Mundial da Saúde, depois, como Ministro. E eu diria que talvez a política antitabagista brasileira seja a política pública de maior impacto epidemiológico em termos históricos no nosso país. Veja que, há três décadas, a prevalência de fumantes na população adulta era acima de 30% e agora está em cerca de 12%, como acabamos de ver aqui na apresentação da representante do Ministério da Saúde. E o papel do Congresso foi central nessa vitória, ou seja, nós tivemos aqui uma articulação de medidas, leis que baniram a publicidade, políticas institucionais do Ministério da Saúde, regulação da Anvisa - por exemplo, com as fotos nos maços de cigarro -, educação, informação, escolas, serviços de saúde, medidas para tratamento da dependência e da sociedade como um todo. E o resultado é essa queda dramática. Nós estamos aí salvando milhares de vidas do câncer e de outras doenças causadas pelo tabaco, mas, quando nós olhamos a situação - e eu pude assistir às duas últimas apresentações aqui - em relação a álcool, bebidas açucaradas e alimentos ultraprocessados, ela é dramática. Aliás, alimentos ultraprocessados é uma denominação cunhada pelo pesquisador da USP Carlos Monteiro, um dos maiores especialistas do mundo. Eu diria que o quadro é desolador, ou seja, o padrão de consumo alimentar brasileiro não é o mais adequado, e isso se expressa na gravidade desse quadro epidemiológico. Metade da população acima do peso, obesidade, obesidade infantojuvenil, aumento recente de casos de câncer de intestino em pacientes jovens expressam esse padrão de alimentação - claro que aliados a uma série de outros fatores, como o consumo abusivo de álcool, inatividade física e outros. Então, acho que agora é o momento - estamos vivendo um momento de reconstrução do país - é o momento, então, de o Governo, a sociedade e o Parlamento se unirem num esforço concertado para uma radical mudança nesse padrão alimentar. Isso inclui ampliação do acesso aos alimentos in natura, aumento de impostos sobre ultraprocessados e refrigerantes, além do banimento da publicidade de fast food, álcool e refrigerante, por exemplo, que é outra medida muito polêmica. Há muito lobby, muito poder econômico, muito poder político, mas eu estou aqui falando pela saúde pública. Se nós olharmos aqui para o nosso vizinho Chile, o Chile está nos dando um exemplo importantíssimo - e não é um exemplo de agora, é de 2016 -, com uma série de medidas, de leis, legislações que levaram a um novo patamar de controle, principalmente do consumo de alimentos ultraprocessados por crianças. Acho que o mundo todo pode aprender com o exemplo chileno e nós também, não é? |
| R | Eles aprovaram uma legislação que coloca avisos... Não aquela coisinha que você tem que olhar com uma lupa o que está contido ali - quando você está comprando um alimento no supermercado e você pega o produto, você tem que olhar com lupa o conteúdo, o quanto tem de açúcar, de sal, de gordura. Eles lá colocaram avisos grandes. Todo produto com alta quantidade de açúcar, de calorias, de sódio ou de gorduras saturadas são altamente destacados para que qualquer pessoa simples olhe e veja: este produto não faz bem à saúde. Eles também avançaram na taxação do consumo de bebidas açucaradas e avançaram muito na restrição à publicidade: programas infantis, na internet, na televisão, cinemas, locais de grande circulação de crianças. Eles avançaram nisso. E há a proibição de venda em escolas - já estamos assistindo no Brasil a algumas iniciativas meritórias de prefeituras nesse sentido. Lá no Chile, as empresas de alimentos e bebidas foram proibidas de usar, por exemplo, ferramentas publicitárias para crianças, como personagens de desenhos animados ou mascotes, o que é muito comum. Isso acabou. E, por fim, o Governo proibiu a venda e a distribuição gratuita de ultraprocessados em escolas e creches, ou seja, a lei chilena passou, então, a cobrir o que comem e bebem as crianças e a controlar a sua exposição, mesmo pela publicidade, aos ultraprocessados. Então, eu acho que agora, Senador, se abre uma nova oportunidade para o país e uma nova oportunidade para o Legislativo com a reforma tributária. As propostas que foram apresentadas aqui pela ACT, pela Abrasco, pelo Cebes, pela Frente pela Vida e pelas sociedades médicas reiteram a necessidade urgente de que nós apoiemos essa agenda. Essa é uma agenda da saúde pública, é uma agenda da defesa da vida, é uma agenda de melhores condições de vida para a população brasileira. Muito obrigado pela oportunidade. Um abraço a todos. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Nossos cumprimentos ao sempre Ministro José Gomes Temporão, ex-Ministro da Saúde. Veio mais um pedido aqui por videoconferência - são quatro -: a Dra. Marcia Cristina Kamei Lopez Aliaga, Procuradora Regional do Trabalho e Coordenadora Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora do Ministério Público do Trabalho (Codemat), perguntou se ela não poderia também falar neste momento. Então, Dra. Marcia, por favor, o tempo é seu - dez minutos com mais cinco, se necessário. A SRA. MARCIA CRISTINA KAMEI LOPEZ ALIAGA (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde a todos, todas e "todes". Vocês me ouvem bem? (Pausa.) Primeiramente, eu gostaria de agradecer ao Senador Paim pelo convite feito ao Ministério Público do Trabalho para participar desta audiência pública, esse verdadeiro fórum democrático, e dizer que já fiquei muito nervosa por falar depois do Ministro Temporão, então aqui já peço desculpas, antecipadamente, por qualquer deslize da minha parte. Também gostaria de parabenizar a Comissão e todos os seus integrantes pela escolha desse tema, um tema tão importante quanto instigante. Falar de desenvolvimento sustentável, mudanças climáticas e alimentação, três temas que são muitas vezes tratados de forma muito fragmentada, e trazer tudo isso para este debate eu acho que enriquece muito essa discussão, principalmente dentro do contexto da questão da tributação e dessa reforma tão almejada, como já colocou o Senador Paim, que está em compasso de espera há muitas décadas e para a qual nós fazemos votos para que realmente se concretize nesse período. |
| R | Bom, eu devo, antes de mais nada, advertir que a minha participação tem muitas limitações quanto ao aspecto tributário em si, já que o Ministério Público do Trabalho não trata desse tema de forma direta. Porém, a minha fala aqui e o que justamente nos animou a participar deste debate é essa inter-relação dessas questões que, em regra, são tratadas de forma isolada e cuja fragmentação traz muitos prejuízos para a criação de sistemas coerentes, consistentes e hábeis a contribuir para o desenvolvimento sustentável. E a tributação tem papel essencial para direcionar essas políticas, para incentivar ou desincentivar aquilo que se fala de alguns hábitos. Então, nesse aspecto, nesse ponto de vista, o trabalho também tem que estar inserido nessa discussão, porque tanto trabalho como trabalhador fazem parte dessa equação, do próprio conceito de desenvolvimento sustentável, que integra no seu bojo aspectos sociais que não podem ser relegados a segundo plano. Então, a questão da estruturação desse sistema tributário não pode perder todos esses aspectos de vista. E, quando se fala em impactos para a saúde pública, acredito que isso vá muito além do sentido do acesso à alimentação saudável, mas também diz respeito ao modelo produtivo atualmente em voga. É inegável que a alimentação ocupa papel central nas sociedades, é vital mesmo para a sobrevivência de todos. É um direito humano e deixa clara a relação entre o meio ambiente e as relações sociais e econômicas. Foi o início da agricultura que permitiu o surgimento das civilizações, o abandono do nomadismo, e em torno disso se organizam as sociedades. Porém, essa mesma cultura coloca hoje em risco a sobrevivência da própria espécie humana. Há muito tempo esse nosso sistema produtivo e de distribuição de alimentos dá sinais de desgaste. Passa a ser um desafio trazer segurança alimentar, não deixar ninguém para trás e não dar tratamento injusto a grupos e segmentos econômicos menos favorecidos - entre eles, os grupos de trabalhadores. O que será trabalhar agora com o aquecimento global? Como vai ser o trabalho desenvolvido e as formas de proteção desse trabalhador que tem que trabalhar, muitas vezes, a céu aberto - os trabalhadores aí da agricultura - e sem alimentação adequada? Nesse sentido, a estruturação de um sistema tributário que tenha um olhar voltado para todos esses aspectos e que não tenha foco unicamente na visão desenvolvimentista a todo o custo é essencial para trazer justiça social. E, aí, quando se fala de alimentação e das consequências para a saúde, muitas vezes tenta-se incutir a ideia de que se trata de um comportamento individual, que tudo isso decorre de escolhas. E é extremamente conveniente delegar culpa ao indivíduo, pois ele seria o único responsável por essas escolhas. Mas isso conta apenas uma parte da história, que decorre de um sistema que, em verdade, conduz as escolhas dos indivíduos. |
| R | Quando uma garrafa de refrigerante tem o mesmo valor de uma garrafa de água num bar ou num restaurante, no supermercado, para onde esse sistema nos conduz enquanto consumidores, principalmente consumidores, muitas vezes, desinformados, já que não há campanhas ou, então, políticas voltadas para essa informação? Quando a qualidade da água que vem da rede de abastecimento público não é confiável, levando as famílias a consumirem água de outras fontes, isso é uma escolha do indivíduo? Quando a oferta dos superprocessados é abundante e barata, para onde é direcionada a escolha das pessoas e da população trabalhadora que hoje se utiliza desses alimentos? A falta de tempo para cuidar da própria alimentação, da alimentação das famílias também é utilizada como fator indutor para se recorrer a esse tipo de alimento. E, nesse aspecto, eu queria acrescentar as questões relacionadas ao mundo do trabalho, onde são muito comuns as jornadas longas, exaustivas, a necessidade de deslocamento por longas distâncias e, com isso, o consumo de tempo; tempo que poderia ser dedicado a atividades físicas, a cuidados básicos, como o lazer. Sim, o lazer, as atividades religiosas são resguardados pela Constituição, mas a uma parcela considerável da população, e da população trabalhadora, esse direito é negado. Então, é um sistema que está justamente voltado... Nós estamos inseridos num sistema muito voltado para a produção e - por que não dizer? - para a reprodução desse mesmo sistema, que dá sinais claros de que está quebrado e precisa mudar. E um desses sinais vem das mudanças climáticas. Os relatórios do IPCC já destacam há muito tempo os impactos que esse sistema de produção alimentar tem na emissão dos gases de efeito estufa, com destaque para a produção de arroz e para os rebanhos bovinos. São atividades que precisam ser repensadas no sentido da redução de resíduos, métodos alternativos de produção para redução do impacto na emissão de gás metano, mas também é necessária uma mudança do comportamento e dos hábitos alimentares, que, de algum modo, impulsionados pelo sistema de taxação mais coerente, possam ser, vamos dizer, estimulados. O desequilíbrio socioambiental decorrente desse tipo de produção voltada para a geração de commodities e que tem em mira, muitas vezes, superávits na balança comercial, aumento de PIB... Não estou aqui falando que esses fatores não são importantes, mas nós temos que destacar que o sistema também tem que olhar para a distribuição de renda gerada por esses empreendimentos. E há aí também um outro sinal evidente do esgotamento, do desgaste do nosso sistema. E um aspecto que revela isso, essa inconsistência, é justamente a pandemia da covid-19, que deixa muito claro o desgaste desse sistema. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) já alerta, há décadas, para os perigos decorrentes da criação intensiva de rebanhos, para a queda da diversidade genética, para um modelo de produção que reduz áreas florestais e, portanto, a biodiversidade e que cria oportunidades para o surgimento de vírus zoonóticos, entre eles as gripes aviárias, que são o exemplo clássico desse tipo de vírus, em que o SARS-CoV-2 também se insere, enquanto zoovírus, uma experiência que indubitavelmente abalou todo mundo e revelou como tudo - saúde, meio ambiente, trabalho e economia - está interligado. |
| R | A outra questão que revela a falência desse sistema é o uso intensivo de antibióticos na produção de animais para abate e seus reflexos na criação das superbactérias, da resistência aos antibióticos, o que coloca em risco a saúde humana e dos animais - 75% dos antibióticos vendidos no mundo são usados em animais. Então, é um sistema que precisa ser repensado. Por esse motivo, a relação entre sistemas de geração de alimentos e sistemas de saúde precisa ser repensada. O Regulamento Sanitário Internacional da OMS destaca a necessidade de reforçar o sistema de vigilância, um sistema que merece se expandir e abrigar esse conceito novo denominado One Health, saúde única, que considera os cuidados conjuntos de saúde humana, saúde animal e a relação com o meio ambiente como um meio de garantir o bem-estar das populações. E a pandemia revelou um grave déficit de investimentos na área da saúde, que contribuiu para um sistema de saúde que se mostrou pouco resiliente e que praticamente colapsou em todo o mundo. E aí aqui uma advertência: saúde não é apenas assistência à saúde, não se trata apenas de leitos de enfermarias, de hospitais, UTIs, medicamentos; saúde também se faz com vigilância, tanto vigilância sanitária como vigilância de rastreamento de contatos, de ingressos, de vigilância nas fronteiras, tanto aéreas, terrestres e marítimas, mas também atividades como saneamento básico, que têm implicações na qualidade e na potabilidade da água consumida pela população. A pandemia revelou fragilidades severas na maioria dos países, com o colapso dos hospitais. Mas, antes de tudo, há um colapso anterior, invisível e imperceptível aos olhos da população que é o enfraquecimento dos sistemas de vigilância. Países que investiram na vigilância despenderam muito menos recursos financeiros, preservaram mais vidas e retomaram a economia e a vida social muito rapidamente. Experiências em outros países, como Austrália, Nova Zelândia, Coreia, Vietnã, Nigéria e Uganda, mostram isso. Enfim, creio que a política tributária tem que ser coerente com os anseios sociais, com as políticas sociais e econômicas, e é urgente que repensemos o nosso sistema. Mas, atualmente, eu vivo num estado que se notabiliza pela produção agrícola em pequenas propriedades rurais, que é o Estado de Santa Catarina, e que também se destaca pelos altos índices de desenvolvimento humano. Porém, eu também acompanho os desafios dos pequenos produtores. Parcela considerável é dependente das grandes indústrias que compram as suas colheitas e que controlam todos os aspectos relacionados à produção, reduzindo muito o rendimento dessas famílias. Um desses exemplos está associado à cultura do tabaco, com destaque para o uso intensivo de agrotóxicos. Não há políticas para transição ecológica, para uma transição justa para esses meios de produção menos poluentes. Sem garantia de compra, sem financiamento, não há perspectiva de sobrevivência desse modelo de produção. E os que se dedicam à agroecologia acabam enfrentando desafios enormes para sobreviver, justamente pela falta de incentivo e de financiamento. Então, é dentro desse espírito que a gente se coloca aqui à disposição do Ministério Público e do Trabalho, para contribuir com esse debate. Fazemos votos, sim, para que essa reforma seja muito abrangente, que ela inclua também todos esses aspectos e, principalmente, a destinação desses recursos advindos desses tributos, para que eles sejam realmente alocados para a saúde, que eles realmente reforcem esses sistemas de vigilância. |
| R | Aqui a minha fala foi muito voltada para a questão dos vírus emergentes e reemergentes. Mas, é claro, a fala da Dra. Letícia se coaduna muito com os estudos da OIT que revelam também que essas doenças são as mais prevalentes nos ambientes de trabalho - as decorrentes de exposição ocupacional - e não podem ser negligenciadas. Então, o sistema de saúde precisa sim... A gente está num momento de discutir o financiamento desse sistema de saúde amplo e de acesso universal, e creio que todos esses debates vêm em muito boa hora. Gostaria de deixar aqui, mais uma vez, o Ministério Público do Trabalho à disposição para esse debate e enfrentamento dessas questões. Muito obrigada, mais uma vez, pela oportunidade. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Parabéns à Dra. Marcia Cristina Kamei Lopez Aliaga, Procuradora Regional do Trabalho e Coordenadora Nacional de Defesa do Meio Ambiente de Trabalho - no mundo do trabalhador e da trabalhadora! Parabéns pela fala, que focou essa questão do mundo do trabalho com muita competência. Agora nós vamos voltar à nossa mesa. Passo a palavra, neste momento, ao Sr. Marcos Aurélio Pereira Valadão, Professor da Fundação Getulio Vargas. O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO (Para expor.) - Boa tarde a todos e todas. Eu agradeço ao Senador Paulo Paim pelo convite, a quem cumprimento como Presidente da nossa mesa. Quero destacar aqui que, na minha opinião, é um dos mais brilhantes Senadores da nossa República, com um trabalho profícuo... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Obrigado. Brilhante é porque eu estou aqui do lado de estrelas, só agora, e, por causa disso, o elogio eu agradeci. O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO - Não, o elogio não é gratuito, pode ter certeza. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Obrigado. O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO - Cumprimento também as colegas Mônica Andreis, Dra. Edna e Dra. Letícia, e também pelas exposições que fizeram anteriormente. E cumprimento a plateia presencialmente, aqui, e também a audiência online. Boa tarde a todos e todas novamente. Bom, a minha fala vai tratar mais especificamente da tributação seletiva e a questão da saúde pública no contexto da reforma tributária. Esse é o nosso foco. Tenho que render homenagens aos colegas: o trabalho que eu vou apresentar aqui é fruto de pesquisa no âmbito da Universidade Católica de Brasília e da Fundação Getulio Vargas, com os colegas Jose Angelo, Osvaldo Candido, e Philipp, que têm produzido material relativamente à pesquisa de tributação do tabaco e bebidas alcoólicas. Então, seguindo, esse é o roteiro da apresentação. Vou tratar de uma questão mais geral e depois aprofundar em temas mais específicos - e tenho que passar rápido por alguns pontos por conta do tempo. Eu vou tentar me manter aí no nosso tempo. É esse mesmo o eslaide. Bom, o nosso sistema tributário está passando por uma reforma, o que já foi comentado aqui, desde 1988. Na verdade, logo após a Constituinte, já se pensou e se começou a falar em reforma, porque é um sistema herdado da Emenda 18 de 1966. Na verdade, o sistema é bem longevo, cuja estrutura mudou pouco de lá para cá. E ela envelheceu, enrijeceu, ficou ineficiente, do ponto de vista econômico. E, quando a gente quis - quando a gente quis não... E, quando, efetivamente, a União utilizou o PIS-Cofins com fins arrecadatórios gerais e atrelados à desvinculação de receita também e tornou o PIS-Cofins não cumulativo, a gente passou a ter um sistema que era complicado, complicadíssimo e ineficiente. A gente tem ICMS, IPI, PIS-Cofins, que são IVAs parciais e ineficientes, cada um com base, com critérios de crédito diferentes, o ISS cumulativo e o IOF. O IOF, que é um imposto multifacetado regulatório e arrecadatório, em algumas circunstâncias, não entrou na reforma. O que entrou foi ICMS, IPI, PIS-Cofins e ISS. |
| R | Bom, o que teremos depois da reforma? Um imposto não cumulativo, tipo o IVA, que vai ser compartilhado entre estados e União. Basicamente, a mesma coisa, mas receita da União, receita do estado, e um imposto seletivo - esse que é o ponto da nossa discussão. O Imposto Seletivo substitui parcialmente o papel do IPI, que é o imposto regulatório por excelência que a gente tem - vai acabar em 2032 -, mas que é extremamente... Tem até colegas que dizem que ele é esquizofrênico: não sabem se ele é arrecadatório, regulatório... Tem uma formatação de alíquota muito complexa e também as suas formas de incidência, de creditamento parcial ineficiente. Esse IPI, no aspecto de regulação, controle, interferência extrafiscalidade, vai ser substituído pelo Imposto Seletivo. O que diz o texto atual da reforma? Eu penso que não deve mudar muito nesse aspecto. A União vai poder instituir imposto sobre produção, comercialização e importação de bens e serviços prejudiciais à saúde. O nosso foco é saúde. Não vou tratar muito do tema do meio ambiente aqui - é saúde, esse é o ponto. Então, a gente vai ver que a gente tem detalhamentos em relação de apoio a esse tratamento seletivo. Isso é feito em muitos países do mundo. E um ponto importante, que talvez seja importante também aprofundar na discussão de hoje, é a vinculação da receita, ou, pelo menos, de parte da receita do Imposto Seletivo à saúde pública. Claro, o IS (Imposto Seletivo) está vinculado a FPM e FPE, mas não todo ele. A parte que sobra é 50%, 45%. Poder-se-ia estudar esse aspecto. Eu penso que a gente deve aprofundar essa discussão no Senado para poder fazer essa vinculação, porque é extremamente importante, do ponto de vista até de tornar, para a sociedade, mais evidente e transparente para onde está indo a receita desses produtos prejudiciais à saúde e como ela tem um reflexo efetivo no orçamento da saúde pública. Bom, próximo. Rapidamente, a tributação seletiva de produtos nocivos à saúde é comum em todos os países. Eu trago o exemplo dos Estados Unidos, que, inclusive, tem uma agência específica para tabaco, bebida e também armas e munições. Destacou-se do IRS, do serviço de rendas norte-americano, e virou uma agência específica que fiscaliza a tributação disso. Praticamente todos os países envolvidos ou países organizados do mundo têm tributação seletiva sobre esses produtos. Os Estados Unidos chegam a ter tributo seletivo estadual. Próximo. A organização, a agência norte-americana se chama ATF, que fiscaliza a arrecadação desses tributos. Não é o IRS; é um imposto federal, mas não é o IRS que fiscaliza. |
| R | A União Europeia tem uma diretiva específica para tratar dos impostos seletivos, de forma como todos estão, digamos, de certa forma, dentro do direito europeu, autorizados e são, na prática, obrigados a ter esse tipo de atributos, sobre especialmente tabaco e bebida alcoólica. Aí tem bebida alcoólica. Tem uns países que têm uma tributação menor, mas todos eles têm uma tributação seletiva sobre esses produtos. E a autorização também para alguns outros produtos, mas o foco nesses dois produtos é importante por conta da saúde. Então, o ponto que eu quero levantar aqui é que isso é comum em todos os países organizados - a tributação desses produtos nocivos à saúde -, justamente com o objetivo de quê? Próximo eslaide, por favor. De atingir esses objetivos que estão aí. O uso desses produtos, especificamente tabaco e álcool, provoca enormes custos sociais, ou seja, diminuição das horas trabalhadas por internação por doenças precoces; diminuição da longevidade de horas trabalhadas das pessoas, a perspectiva de vida até do ponto de vista de aposentadoria mesmo; aumento dos gastos públicos com saúde, tanto preventiva quanto em tratamento ambulatorial; e aumento da mortalidade por acidentes, especialmente de trânsito - no caso do álcool os números são bem expressivos. Esses custos têm dois aspectos que devem ser suportados pelos usuários. Como esses custos são maiores, os custos sociais e os gastos do Governo são maiores do que o tributo arrecadado, eles devem ser aumentados para que quem faça a opção de usar esses produtos, que causam custos sociais, arque com esses custos. Como se faz essa transferência? Através de tributos. É a chamada tributação pigouviana, um economista que tratou desse tema. Não há proibição, há regulação. Quem assume o risco de usar, não pode impor ao resto da sociedade os custos dessa opção - esse é um ponto central. Além do quê, e aí eu volto ao ponto, a vinculação - isso está relacionado com o que eu falei anteriormente - das receitas desses impostos aos gastos com saúde é importante, até por conta desses aspectos aqui. Bom, mais especificamente do ponto de vista do tabaco, do álcool e da reforma tributária, eu vou trazer aqui alguns números para mostrar ou tentar dar uma direção através de estudos econométricos sobre como temos que nos preparar na legislação de cada tributo, do Imposto Seletivo para o álcool e para o tabaco, em termos de quantificação dessas alíquotas. Como isso pode ser pensado? E aqui, esses números vêm de dados públicos. Eu vou explicar um pouco essa tabela. Esses dados públicos são do IBGE, Vigitel, PNS 2019 - a gente fez a verificação com relação a 2013 e depois atualizou com a de 2019 -, os dados de arrecadação da Receita Federal, do Tesouro Nacional, do IPI, PIS-Cofins e também do ICMS, de forma que são dados de fontes públicas. Esses dados estão organizados, tabulados e chegamos a esses números. Aqui é a tributação do tabaco. O baseline significa o estado atual hoje. A carga tributária do cigarro tem PC2 e PC3, são cigarros mais baratos, a média de preço deles é de R$6,81 e os cigarros mais caros que são o PC3. O PC1 é o cigarro ilegal, não está aí na tabela, abaixo de R$5. O cigarro premium é o médio, R$10,96 o máximo. Bom, isso é o que temos hoje. |
| R | O cenário 1 é um cenário em que a gente está considerando que soma do IBS mais a CBS, que são os tributos que vão substituir o IPI, ICMS, ISS, PIS/Cofins, vai estar em 27%. Bom, e, aí, quanto vai ter que ser o imposto especial, o imposto seletivo sobre o tabaco, sobre o cigarro para manter a mesma carga tributária? Quarenta e dois por cento. Então, o número já está dado. Pode ter um ajuste em função de como vai ser a incidência do imposto seletivo, porque isso não está muito claro, se sobre o preço de fábrica, se seria sobre o preço de varejo, mas, se for sobre o preço de fábrica, isso pode ser um pouco maior, mas esses cálculos estão feitos com dados públicos e atualizados, então, esses são os números, o.k.? Fizemos também um exercício: bom, até quanto eu posso aumentar a tributação - não, volte isso -, até quanto eu posso aumentar a tributação do tabaco para maximizar a tributação? Eu posso aumentar a alíquota do seletivo dado, CBS mais IBS, imposto estadual mais o federal, o IVA, os dois IVAS, em 27%, e eu posso, no máximo, chegar a 47,9%. Por que a gente diz que pode chegar? Porque, a partir daí, a redução do consumo é tão alta que você passa a perder a arrecadação. Então, esse é o máximo que o senhor consegue aumentar sem perder a arrecadação. E, aí, a variação do consumo nesse segundo cenário: a gente diminui em 35% o consumo de cigarro no Brasil. É claro que, se continuar aumentando o preço, cai o consumo, só que cai a arrecadação também. Isso é um cenário hipotético, evidentemente. Então, essa discussão de que não se sabe de quanto vai ser a alíquota, como fazer, pelos estudos que a gente está fazendo já, digamos, adiantou-se a discussão... (Soa a campainha.) O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO - Peço, Senador, um pouquinho mais de tempo, tenho dois ou três eslaides só. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Com certeza. O senhor tem, no mínimo, cinco minutos, seis minutos. O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO - Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - No mínimo. Se precisar de mais, eu vou dar. O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO - Obrigado. Então, os cálculos estão pré-formatados. Essa discussão de que, quando for fazer a legislação do imposto seletivo, for ter que formatar a alíquota na lei, esses números estão dados. Uma discussão que não levei aqui, mas que pode aparecer - inclusive, na União Europeia e nos Estados Unidos, é feita - é que a maioria dos impostos seletivos não é ad valorem, é calculada de maneira específica, ou seja, tantos reais por maço ou tantos reais por litro, inclusive, na União Europeia, a tributação leva em conta o teor alcoólico da bebida. Então, isso é possível ser refinado. Idealmente, do ponto de vista técnico, embora haja controvérsias, a gente pensa que a tributação do formato do IPI hoje, que tem uma parte fixa e uma parte ad valorem, para não ter um cigarro muito barato, é um formato muito bom não só ad valorem, porque ad valorem os cigarros mais baratos acabam tendo uma tributação muito baixa, assim como a bebida, e a tributação ad rem, a pura, acaba subtributando os produtos mais caros; então, uma alíquota mista tem uma eficiência maior, embora sobre isso haja controvérsia na literatura. Então, sobre a tributação do tabaco, esse é o cenário desenhado. Por favor, próximo. E bebidas? Bom, aqui, uma ressalva: por que tributos sobre cervejas com álcool? Essa tabela aqui, que tem uma ideia semelhante à anterior, fala só sobre cerveja porque não pesquisamos ainda, não adiantamos a pesquisa relativamente a vinhos e bebidas destiladas, mas cerveja representa 90% do mercado, 88%, 90% - número arredondado. Portanto, ela representa o mercado, do ponto de vista estatístico. Vinho, 6%, 7%; 2%, 3%, destilado. Agora lembrando que tomar uma garrafa de cerveja é diferente de tomar uma garrafa de destilado, em termos de conteúdo alcoólico. Isso aí é o volume consumido. |
| R | Bom, por que tem duas outras elasticidades? Há controvérsia sobre a elasticidade, se é em torno de -1,15, -0,62, ou seja, mais elástico, menos elástico. Então, como isso é meio controverso, a gente preferiu deixar os dois números... mas veja que, em termos de alíquota final, não tem muita variação, a alíquota para manter a mesma arrecadação. Então, novamente aqui, a receita tributária em bilhões, e a carga tributária é 40,79%. A carga tributária média da cerveja hoje é - porque tem variados, isso varia também porque tem uma tributação mínima de PIS/Cofins e IPI - 41% a carga tributária média. Então, no cenário I, mantendo o IVA 27%... e quando eu falo IVA é IDS, CBS, alíquotas somadas, a estadual e a federal, 27%. O que se precisa ter, se a elasticidade, que a gente acredita que é mais próxima de 1,15, porque tem alguma elasticidade, seria em torno de 35%, o IVA, desculpe-me, o imposto seletivo, para manter o mesmo peso tributário, a mesma carga tributária da cerveja hoje. O cenário II aqui é um pouco diferente do cenário II do cigarro, porque o cenário II é pensado para que nenhum estado perca receita. Isso é relevante porque as alíquotas, no sistema novo, não vamos nivelar as alíquotas do CBS e do IBS, o IVA estadual e o IVA federal, elas não vão variar por cerveja, para produtos como cerveja, cachaça, como variam hoje. Então, você tem estados que têm 22% na alíquota de cerveja e outros tem 37%. Claro que quando você mudar o sistema, as alíquotas ficarem iguais, tanto a estadual como a federal, vai ter uma mexida em termos de arrecadação. Então, esse cenário tem algumas consequências. Por isso é que o ideal aqui é pensar que nenhum estado perca a receita. Então, para esse cenário, mantendo uma perspectiva mais, digamos, factível de elasticidade, é 55%. Seria... (Intervenção fora do microfone.) O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO - Sim. (Soa a campainha.) O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO - Por favor, próximo. Estou terminando, só mais um eslaide. Aqui é a comparação dos estados, o que que vai acontecer com a mudança cenário II. Percebam que alguns estados vão ter ganhos maiores que outros. Por quê? São os estados que hoje têm alíquota menor, São Paulo e Rio, por exemplo, têm alíquota de 22%. Então, eles vão ter um ganho maior na arrecadação do que os outros estados. Estados que têm uma tributação, uma alíquota muito alta já, como é o caso do Amapá, vão ter ganho menor, quando a alíquota for para 55% do seletivo e 27% do IDS mais CBS. Então, ao longo do tempo isso vai ser equalizado, isso é só no momento imediatamente seguinte da mudança, o.k.? Da reforma sobre o efeito na cerveja. Não deve ter grandes diferenças nas outras bebidas, mas esse é o cálculo que a gente fez para as cervejas. |
| R | O próximo. Já partindo para as conclusões. E aqui alguns números que são decorrentes daquelas tabelas e algumas sugestões. A reforma representa uma oportunidade para aumentar a carga tributária sobre cigarros, elevando o preço, reduzindo o consumo, diminuindo os custos sociais do seu uso e ampliando a arrecadação dos impostos. Aquela diminuição da prevalência do tabagismo está intimamente relacionada com o aumento da tributação. É claro que, também, as outras políticas aumentam a eficiência, mas ela está intimamente... Isso foi mostrado por duas ou três vezes aqui hoje, inclusive. Na minha tese de doutorado, inclusive, eu fazia um gráfico bem parecido, 15 anos atrás. O imposto especial deve ser escolhido de forma a evitar a perda de arrecadação tributária para os estados. A gente discutiu isso. Caso contrário, pode resultar em queda de preço, aumentando o consumo. Admitindo um IVA federal de 10,3% e um IVA estadual de 16,7%... Esses números nós não os tiramos da cartola; esses são os estudos do Ipea, Orair e Gobetti, publicaram. O imposto especial sobre cigarros deve ser de 42,4% para que reproduza a arrecadação atual. Então, no mínimo, isso. Isso é o minimum minimorum para manter a carga atual. Tem que se ter bastante atenção a isso. Estados vão perder a arrecadação tributária, porque têm alíquotas, neste caso, muito alta e a alíquota vai cair, mas a carga tributária não cai dos cigarros, ou seja, o preço do cigarro vai continuar, por conta do tributo, no mínimo, igual ao que é hoje. Admitindo, novamente, um IVA de 10,3% e um estadual a 16,7%, o imposto sobre cerveja deve ser de 55 para que nenhum estado perca arrecadação tributária. Novamente, a escolha inadequada do imposto especial pode reduzir o preço e ampliar, substancialmente, o consumo de cervejas, provocando aumento de doenças relacionadas ao consumo de bebidas alcoólicas e sobrecarregando o sistema de saúde. Portanto, é relevantíssimo que mantenhamos a atenção voltada para a elaboração dessas leis quando fixarem as alíquotas e a forma como essas alíquotas vão incidir na produção e venda de tabaco, produtos do tabaco, especialmente cigarro, e bebidas alcoólicas, sob pena de a gente ter uma reversão das vitórias, das políticas de sucesso em relação a esses produtos que tivemos nas últimas décadas. Só mais um detalhe. Eu, vendo o ex-Ministro Temporão falando aqui do tratado de tabaco, eu e outros colegas que estavam aqui, estivemos na primeira composição do Conicq. Eu representava o Ministério da Fazenda na comissão de negociação do tratado de controle do tabaco. Então, foi um momento também histórico aí. Muito bom lembrar isso. Agradeço a atenção de todos. Muito obrigado pela oportunidade. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Marcos Aurélio Pereira Valadão, professor da Fundação Getúlio Vargas, que fez a palestra com números, com dados, com estatísticas e, como a gente fala, os números não mentem. Meus cumprimentos, Dr. Marcos. De imediato, chamo, para usar a palavra, a Dra. Edna Carmelo, consultora especialista em tributação de cadeias produtivas. A SRA. EDNA CARMELO (Para expor.) - Boa tarde. Boa tarde a todos. Senador, saudações gauchescas! E obrigada pela oportunidade. Eu espero contribuir com esse debate dentro do meu nível de conhecimento. O primeiro ponto para que eu gostaria de alertar, isso é importante... O que eu vou falar aqui é fruto de estudos de bastante tempo. A tributação é vetor de tomada de decisões. Então, se uma empresa vai para o lado A, lado B, se o agricultor planta soja ou mexe com gado, a tributação sempre, sempre vai ter importância. Então, nós estamos discutindo aqui algo absolutamente relevante para o país. |
| R | Outro aspecto que eu acho que é prioritário: neste dia de hoje, a gente está discutindo algo que talvez nenhum de nós venha a conversar novamente, que é o texto tributário. Então, está aqui nesta Casa do Senado a oportunidade de refinar um texto já aprovado para dizer o que a gente vai querer fazer com este país para os próximos 30, 40 ou 50 anos, ou de simplesmente fazermos mais do mesmo e sermos bastante modestos. Então, acho que as falas dos colegas todos remetem a isso, a essa urgência de tratar na reforma tributária o que é urgente para a sociedade - notadamente muito bem falado sobre tabaco, sobre álcool e sobre alimentação, que é algo que a gente tem estudado. A reforma aprovada trouxe já uma grande janela de oportunidades, que eu acho que convém destacar. Foram muito exitosos. Primeiro, a correção um pouco das distorções tributárias, porque tem um mundo todo que a reforma não toca, conforme o professor comentou, mas essa correção de um pouco dessas distorções já é um ganho imenso para o país. Outro aspecto absolutamente relevante no que diz respeito à alimentação saudável foi o que a gente costuma falar no nosso ambiente de trabalho: uma área de livre comércio de alimentos saudáveis. Ao se criar a redução a zero do IVA - a vou chamar de IVA o IBS e a CBS para a gente alinhar aqui -, ao reduzir dos hortifrútis e ovos a zero, desde já na Constituição, significa que esses produtos vão poder transitar o país todo. Então, a gente não vai ter uma fronteira geográfica para a boa alimentação. Isso é extremamente positivo. Sabemos que ali não alcança todos os minimamente processados, há limitações, mas tem um alcance muito relevante. Isso é ótimo. E trazer para a reforma tributária o conceito de cesta básica, que é algo que estava lá no Decreto-Lei de 1934, muito bem escrito, por sinal. Agora ele ganha, décadas depois, o status constitucional. Isso realmente é um ganho magnífico e, desde já, com o IVA igual a zero, um ganho espetacular. E também uma discriminação positiva do pequeno e médio agricultor, produtor, com a possibilidade de ele não ser contribuinte do IVA. Eu destaco como ganhos. Mas essa reforma está aqui, nesta Casa, para ser refinada, para trazer um pouco dessa modernidade que se deseja. E aí há algumas preocupações que visam basicamente elucidar pontos que a gente precisa olhar para além do que já foi observado pelos colegas. O primeiro ponto que eu comentaria é a redução do IVA de 60%. A redução de 60% sobre alimentos é genérica. Então, ela não contempla o que os colegas aqui vêm falando da qualidade dos alimentos. Embora os hortifrútis estejam em uma outra caixinha, muito bem protegidos - e ovos e feijões também estão lá -, existe um outro universo de consumo que a gente precisa descer uma cunha para dizer: "Isto aqui está no hall de alimentos que promovem a doença; então, não deveriam ser tão beneficiados". Então, este é o primeiro ponto fundamental: separar o joio do trigo aí, digamos. E outro ponto também, que apareceu depois de aprovada a reforma, que a gente já está estudando um pouquinho, é a contribuição estadual criada. Numa reforma tributária que visa a unificar, criou-se uma nova contribuição cumulativa - não é, Professor? - pesada, que vai durar muito tempo. O Estado de Goiás, neste ano, por exemplo, já a está cobrando. Ela é pesada, ela é na veia, ela não tem a ver com o valor agregado, ela não quer saber do seu lucro, se teve ou não teve. E ela pesa muito e vai pesar na cesta básica e nos hortifrúti, que, conforme eu disse, foram beneficiados. |
| R | Aqui mais uma preocupação: com relação à cesta básica, cria-se o IVA, diz-se que o IVA vai ser zero, e temos o produtor rural contribuinte e o não contribuinte. Quando a gente relaciona o não contribuinte produtor do alimento da cesta básica, a cadeia produtiva funciona bem, está praticamente desonerada até o consumo. Então, o efeito tributário vai ser muito virtuoso, conforme se deseja. No entanto, quando a gente pega o produtor rural contribuinte do IVA, ou seja, o que vai apurar e pagar, com o produto da cesta básica, há um problema, porque o produtor rural contribuinte vai pagar sobre o lucro que ele aufere, sobre o que ele agrega de valor ao processo. Em princípio, o.k., mas a indústria que compra - porque não existe arroz em casca na cesta básica, ele tem que ser beneficiado -, a indústria que beneficia vai comprá-lo, mas a sua saída não vai estar tributada e não tem previsão, neste texto constitucional aprovado, de nenhum crédito tributário, nada vinculado que diga que ele possa usar esse crédito vinculado à compra dessa matéria-prima. Então, um crédito que eu não utilizo vira custo. Então, ele encarece a cesta básica. Então, esse é um ponto importante de ser cuidado, penso que fácil de ser trabalhado; no entanto, é necessário ser observado. E, do ponto de vista do produtor rural contribuinte, ou seja, aquele com receita acima de R$3,6 milhões ao ano - isso é muito pouco para o perfil, para o padrão da nossa agricultura -, temos um problema também. Ao ser contribuinte, ele paga sobre o valor agregado, isso está o.k., é justo. No entanto, como eu disse, a decisão de consumo sempre vai depender muito da tributação. Se eu tenho a opção de pagar por esse produto ou não pagar por esse produto, a minha opção é a mais econômica. Veja bem: o texto tributário diz que o produto de exportação vai ser completamente desonerado do IVA, como é hoje, fruto da Lei Kandir. Ao fazer isso, o alimento da cesta básica e o hortifrúti vão ter uma tributação que a commodity de exportação não vai ter. Então, eu, proprietário que tenho meu quinhão de terra, vou ser mais ainda tentado, digamos assim, a produzir commodity, em vez de alimento para consumo direto, em vez de hortifrúti. Então, temos um problema aí na reforma tributária, que é um risco de direcionar ainda mais a nossa potência agrícola para produtos que são muito bons para o país, obviamente, mas que não são de consumo direto da população. A ACT tem dito que a área de hortifrúti no país tem decrescido de forma muito acentuada. E se isso não for observado com cuidado e adotada uma medida ainda no texto tributário, há um risco muito grande de a coisa se perder em leis complementares e, o que é pior, não haver meios jurídicos e técnicos de promover mudança, sob risco de... |
| R | (Soa a campainha.) A SRA. EDNA CARMELO - ... se ter uma nova reforma tributária. Enfim, esses são os pontos mais relevantes que eu gostaria de comentar. Perfeito, obrigada. Então, eu sugeriria, em princípio, eu diria não ter medo... A gente tem uma grande conquista de ter a Cesta Básica Nacional como algo instituído, mas ela precisa dizer um pouquinho sobre saúde e meio ambiente. Ela precisa dizer um pouquinho que a cesta básica deve ser constituída de alimentos saudáveis e sustentáveis, seja referindo-se à lei de segurança alimentar e nutricional, porque essa reforma veio muito com essas referências... A lei joga uma lei para um status constitucional e, a meu ver, isso é ótimo, isso é importante. E penso também, acho que é um caminho interessante, como a cesta básica está desonerada, e isso é ótimo, para não haver risco de perda tributária, deve-se focar naqueles alimentos que efetivamente são essenciais para um consumo saudável da população pobre, rica, super-rica e classe média, porque a saúde pública afeta a todos, o acesso ao consumo aos mais pobres, é claro. Então, deve-se direcionar isso aí e, ao direcionar, também olhar a produção agrícola, que já vimos que está afetada, para que não seja desestimulada. Deve-se olhar isso para um lado e para o outro. O setor terciário, ao que tudo indica, está bem contemplado. Quanto à redução de alimentos, também há uma necessidade de vincular, desmembrar um pouquinho entre o alimento saudável e o não saudável. A contribuição estadual é fundamental. Se não isentarmos o produtor, que hoje é isento, os 3,6 milhões, o pequeno e o médio produtor, nós teremos um problema. Se a gente não isentar dessa contribuição estadual o produtor agrícola das matérias-primas da cesta básica, a gente vai ter um grande problema. Então, são pontos que precisam ser organizados, e eu acho que nesta Casa. Era basicamente isso que eu gostaria de falar. Espero estar contribuindo e que se façam bons trabalhos. Obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem! É a Edna Carmelo, Consultora e Especialista em Tributação de Cadeias Produtivas, e falou muito dos alimentos e do meio ambiente, de forma direta e objetiva. Parabéns! Eu vou convidar os senhores e as senhoras para que retornem ao Plenário. E nós vamos para a segunda mesa, com a participação de mais três convidados, de forma virtual. Eu convido para essa segunda mesa a Sra. Tathiane Piscitelli, Professora de Direito Tributário da Fundação Getúlio Vargas. (Palmas.) E vai fazer companha a ela aqui nesta mesa Paula Johns, representante também da ACT Promoção da Saúde, em entendimento feito aqui já com a Dra. Mônica. (Palmas.) |
| R | Eu consultei: "Posso?". "Deve", disse ela. (Risos.) (Pausa.) Se vocês permitirem, eu vou, neste momento da segunda mesa, começar com a Dra. Vanessa Negrini, Diretora do Departamento de Análise Epidemiológica e Vigilância de Doenças não Transmissíveis do Ministério da Saúde. Ela está na tela. (Pausa.) A SRA. VANESSA NEGRINI (Por videoconferência.) - Boa tarde a todas e todos! Vocês me ouvem? O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Já estamos ouvindo-a muito bem. Seja bem-vinda! A SRA. VANESSA NEGRINI (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigada, companheiro Paulo Paim. Na verdade, eu estou Diretora de Proteção, Defesa e Direitos Animais aqui no Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Eu gostaria de começar esta minha fala dizendo da alegria que estou sentindo de poder participar desta mesa, primeiramente ao lado do Senador Paulo Paim. Eu não sei se ele se recorda, mas ele foi o Relator de uma sugestão, de uma proposta que a gente apresentou pelo e-Cidadania, ainda em 2018, pela revogação do teto dos gastos públicos, uma proposta de participação popular que atingiu 77,2... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Relatamos e aprovamos na Comissão de Direitos Humanos por unanimidade. A SRA. VANESSA NEGRINI (Por videoconferência.) - Exato. Perfeito. Exatamente. Lá atrás, como cidadã, a gente apresentou essa proposta, e o senhor relatou, o que nos deixou muito honrados, e hoje... Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Como eu já estou aqui há muito tempo, eu já estou com história para contar por muitos e muitos anos, e ela era muito jovem ainda. E aprovamos a tempo. (Risos.) A SRA. VANESSA NEGRINI (Por videoconferência.) - Verdade. Fico muito honrada de voltar a esta Casa, agora na qualidade de diretora dessa pasta, que foi criada este ano pelo Presidente Lula, pela Ministra Marina, aqui no Ministério do Meio Ambiente, nesse reconhecimento de que a pauta animal ganha importância hoje na sociedade. É uma reivindicação, é uma questão, porque, como eu costumo falar, a pauta animal hoje não é só para quem gosta de animais, mas é uma questão de saúde única, importa para a vida humana, importa para as economias do país, vide agora, e não nos esqueçamos jamais, a covid-19. A covid-19 foi uma zoonose, e olha o impacto econômico, o impacto de vidas que foram tolhidas por uma questão de saúde única. Nós estamos, por exemplo, vivendo, recentemente, no Brasil, a questão da gripe aviária. Novamente, mais uma zoonose com impacto tanto para os direitos animais quanto para a saúde única, quanto também para as economias do país. Olhando por esse olhar, e com todas as falas que me antecederam a gente concorda muito plenamente, eu gostaria de trazer, na verdade, uma fala bem breve complementando todos esses olhares que me antecederam, trazer também e agregar a visão da proteção dos direitos animais no contexto do desenvolvimento sustentável e bem-estar social na reforma tributária. |
| R | O direito público, que é composto por diversas áreas - entre eles o direito administrativo e o tributário -, já vem considerando a questão ambiental há muitos anos, mas a questão animal ainda não. Até a própria antiga Lei de Licitações e a atual Lei 14.133 já tratam da questão ambiental no critério de seleção de empresas, contratações públicas, mas nenhuma delas menciona a questão do bem-estar ou dos direitos animais, da mesma forma que a gente não vê esse debate com relação ao direito tributário. Atualmente, os animais ainda são considerados pelo Código Civil como coisas, como bens, patrimônios; são comercializados livremente, inclusive pela internet, e muitas vezes enviados por serviços de transporte como se fossem meros objetos. A gente faz esse apelo para que a gente leve isso em consideração. A reforma tributária precisa também considerar a questão das práticas de bem-estar animal - por exemplo, quando a gente puder falar da questão da taxação de comércio de animais, até como forma de desestímulo a essa prática. Lembro, contextualizando, que, em 2022, foi aprovada pelas Nações Unidas a publicação da Resolução Nexus, de bem-estar animal e desenvolvimento sustentável, e foi a primeira vez que as Nações Unidas fizeram o reconhecimento do nexus entre o bem-estar animal e a sustentabilidade ambiental, reconhecendo que não tem como você falar de uma sem outra. A gente vê isso de forma muito clara. Por exemplo, os animais de produção, quando são produzidos sem critérios de bem-estar animal, você impacta o meio ambiente, você tem a utilização massiva de antibióticos, você tem a predação excessiva do meio ambiente. Então, nesse contexto, entendemos ser imperativo que a reforma tributária, dentro de todos esses atributos que já foram comentados - a questão da valorização de produtos que sejam saudáveis para as pessoas -, também passe a considerar e valorizar aqueles que dialogam também com a pauta do bem-estar animal. A Organização Mundial da Saúde, inclusive, já recomendou noções do Inca, desde 2007, por exemplo, na questão de carnes processadas, não é recomendada nenhuma quantidade de carne processada, porque comer salsicha, linguiça, bacon, todas essas coisas de carnes processadas aumenta o risco de câncer em humanos, e esses produtos são classificados pela OMS como Grupo 1 de alimentos de potencial cancerígeno. Ou seja, que a gente pudesse ter um olhar atento, até porque, quando a questão econômica aperta, acaba que você empurra a sociedade para, muitas vezes, consumir esses determinados tipos de alimentos, que acabam sendo mais acessíveis. Então, nesse sentido, a gente pensa que uma reforma tributária ambientalmente responsável poderia também incorporar princípios que garantam os direitos humanos, os direitos ambientais e os direitos animais, porque a gente acaba percebendo, Senador, que tudo está conectado. Nesse sentido, eu penso que seria interessante que pudéssemos fazer a promoção e o incentivo de alternativas de alimentação saudável que valorizassem o incentivo de fontes alternativas de proteínas à base de planta. O Brasil é tão rico! A gente tem o feijão, o tremoço, a lentilha, o grão-de-bico, o amendoim, uma vasta variedade de fontes alternativas de proteína que poderia estar alimentando a população, com menor impacto ambiental, regenerando o meio ambiente, com práticas mais saudáveis e mais ambientalmente corretas para as pessoas, para a vida humana, para a vida animal e para a saúde humana. |
| R | Então, essa busca por um bem-estar integral eu penso que precisa ser o objetivo primordial da nossa reforma tributária. O direito ambiental, intrinsecamente, está ligado aos direitos humanos. O art. 225 consagra o direito de todos a um ambiente saudável, constituindo, assim, um direito humano fundamental também. Eu convido a que gente possa fazer uma reflexão e dar um passo além, para enxergar, nos direitos animais, essa oportunidade de uma extensão dos direitos humanos. Inclusive, como já foi colocado por palestrantes anteriores, garantindo o direito ao acesso à informação. Quais escolhas a nossa população poderia fazer se tivesse oportunidade, acesso à informação e o incentivo tributário para ter escolhas mais ambientalmente corretas e melhores para a sua saúde e para o meio ambiente? A vida humana, inegavelmente, está atrelada à saúde ambiental e à saúde dos animais. Então, esse é o nosso convite. Muito obrigada. Muita honra em poder voltar a esta Casa e poder participar desta audiência tão importante para a vida das pessoas, do meio ambiente, de todos os animais, para a saúde das pessoas e a saúde planetária. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Vanessa Negrini, Diretora do Departamento de Proteção, Defesa e Direitos Animais do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Uma jovem que, muito tempo atrás... Eu presidia - como presido, eu vou e volto para a Presidência da Comissão de Direitos Humanos - e eu vi aquela SUG ousada para acabar com o teto de gastos... Disse: "É comigo mesmo!". Peguei para relatar, trabalhei, trabalhei, trabalhei e aprovamos por unanimidade. Eu não a conhecia, só tinha o nome dela. Foi uma alegria vê-la aqui, em uma causa que eu também defendo, que é a causa dos animais. Achei muito legal ela dizer que estamos todos conectados. Se não entendermos que os seres humanos, a causa animal e todo o meio ambiente - o ecossistema - estão todos conectados... Olha, a causa animal mexe comigo. Eu vou dar uma salva de palmas à causa animal, que eu sei que vocês todos defendem! (Palmas.) De imediato, ainda por videoconferência, para irmos para o final da segunda Mesa presencial: Marcos Lopes, Coordenador-Geral do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Na tela. O SR. MARCOS LOPES (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado! Gostaria de, mais uma vez, agradecer ao Senador pelo convite e parabenizar os membros da Comissão por esta iniciativa. Eu sou Marcos Lopes, Coordenador-Geral do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional da Presidência da República. Eu trago os cumprimentos da Presidenta do Conselho, a Profa. Elisabetta Recine, que está, neste momento, em São Tomé e Príncipe, no continente africano, participando das atividades da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, então, não pôde estar presente, mas pediu que eu deixasse aqui os cumprimentos e a gratidão, por esta oportunidade, para que o Consea se manifestasse sobre esse tema, que é um tema muito caro para nós. |
| R | Acho que muito do que eu tinha para dizer já foi dito. Então, eu só queria reforçar alguns elementos a partir das manifestações que o Consea já produziu este ano sobre esse tema. O Consea se manifestou por meio de uma nota técnica ao grupo de trabalho na Câmara, o grupo de trabalho sobre o sistema tributário nacional, e também ao Relator do Projeto de Lei 45, de 2019, e o Consea emitiu uma recomendação, que é o instrumento máximo que o Consea emite, uma recomendação ao Governo brasileiro para que o Governo atuasse ativamente por uma reforma tributária que, efetivamente, fosse uma reforma garantidora de direitos. Eu quero começar por esse ponto, reforçando esse ponto, especialmente porque quem nos acolhe nesta tarde é a Comissão de Direitos Humanos. Aqui, nós estamos diante de uma oportunidade singular de entender ou de decidir, enquanto nação, se nós queremos uma reforma tributária que seja baseada em direitos e que reforce a garantia de direitos ou se nós vamos optar por uma reforma tributária que siga atendendo apenas a interesses econômicos, interesses econômicos, tradicionalmente, de alguns grupos, e não de todo o conjunto da população brasileira. O Consea, para quem não o conhece, é um conselho de assessoramento direto ao Presidente da República que tem entre as suas competências zelar pelo direito humano à alimentação adequada em toda a sua amplitude, com interfaces muito diretas ao direito à saúde e ao direito ao meio ambiente adequado. Então, a temática aqui não poderia ser uma temática mais cara para nós nesse sentido. Eu queria também resgatar algo que já foi dito pela colega do Ministério da Saúde e também pela colega da ACT, que o momento que nós vivemos é um momento que exige que essa decisão civilizatória que está em curso - não é só um processo legislativo no Senado, mas é uma decisão civilizatória - é um momento que exige urgência. Nós estamos no meio de um processo denominado pelos especialistas de sindemia global, que é a combinação de diferentes pandemias, nesse caso a pandemia de fome e desnutrição, a pandemia de obesidade e uma pandemia de mudanças climáticas. E, como já foi dito aqui, essa reforma dialoga diretamente com essas três pandemias. Então, esse pode ser um instrumento muito importante e muito robusto para enfrentar o que são os determinantes estruturais dessas três pandemias, enfrentar o que são os determinantes comuns. |
| R | Por que essas três pandemias são chamadas de uma sindemia? Porque se identifica que os determinantes dessas três pandemias são os mesmos, muitos desses determinantes são determinantes comuns. Acho que já foi muito bem trabalhado como o álcool e o tabaco são parte desses determinantes, então eu queria focar um pouco mais na agenda dos alimentos ultraprocessados e a importância de que os alimentos ultraprocessados sejam trabalhados de duas formas nesse processo: que de nenhuma forma eles sejam incluídos na lei complementar que vai discutir a cesta básica, mas também que, na medida do possível, esses alimentos, por serem produtos nocivos à saúde, sejam também tributados de forma seletiva, sejam contemplados no processo de discussão da tributação seletiva. Acho que Edna, que me antecedeu, falou muito bem sobre como a reforma pode facilitar uma alimentação adequada e saudável, tanto do ponto de vista do estímulo à produção, mas também do estímulo ao consumo. O Consea produziu essa nota técnica, ou melhor, sistematizou o conjunto de argumentos que reforçam a importância de que o Guia Alimentar para a População Brasileira seja a referência, algumas colegas também fizeram essa menção. E por que o Guia Alimentar ser essa referência, não é? Acho que, para nós que somos do meio, é uma fala óbvia, mas talvez muitas e muitos que estão nos assistindo ou tomando contato com essa discussão agora em primeira vez não tenham tanta clareza do que é o Guia Alimentar para a População Brasileira e nem por que ele deve ser essa referência. E aí acho que há dois elementos principais, o Guia é um documento muito rico, é um instrumento de orientação de políticas públicas instituído pelo Ministério da Saúde em 2014, mas, para além de ser um instrumento rico de orientação de políticas públicas, acho que tem dois elementos importantes a serem destacados aqui, que são de grande valia para essa discussão. Acho que um primeiro elemento é: o guia organiza os alimentos em nível de processamento. Então, quando nós falamos de alimentos ultraprocessados, o que nós queremos dizer? Nós queremos dizer aqueles alimentos que praticamente já não são mais alimentos, que não contêm, em sua maioria, o alimento de fato; são alimentos que passaram por processos industriais, que requerem altíssimo nível de processamento tecnológico e que recebem uma série de edulcorantes, conservantes, enfim, que distorcem a característica daquele alimento, aumentam a conservação, a durabilidade, isso é verdade, mas também aumentam o quanto o alimento se torna viciante, o quanto esse alimento se torna mais distante de ser um alimento. Então, quando a gente diz que a cesta básica, que esse debate da reforma tributária precisa ter o Guia Alimentar como uma referência, a gente está dizendo que o que é alimento adequado e saudável, que garante o direito à alimentação adequada e saudável, que é um direito constitucional, é o alimento de verdade, é a comida de verdade, é o alimento in natura, minimamente processado, não é o alimento ultraprocessado, esse alimento que é praticamente um produto industrial. |
| R | Mas tem um segundo elemento do guia que é bastante importante aqui para o nosso debate, já que a gente está considerando esses três "s" da reforma tributária, o guia traz como esse alimento deve ser produzido. Então, quando a gente fala somente de nível de processamento, a gente poderia inferir, por exemplo, que a soja, por ser um produto in natura, poderia ser um produto incluído nessa cesta, ou que, por exemplo, o milho para a produção de alimentos ultraprocessados, o milho enquanto uma commodity, também poderia. Então, tem esse segundo elemento do guia, que é muito importante para a nossa reflexão, que é sobre como esse alimento é produzido. E o guia traz que o alimento que garante o direito a uma alimentação adequada é aquele alimento produzido pela agricultura familiar, produzido de forma social, econômica e ambientalmente sustentável. Então, quando a gente olha para o guia como essa referência, a gente tem que considerar não só o nível de processamento, mas a gente tem que considerar o guia como um todo. O guia é essa referência para o debate do que é o alimento adequado e saudável, do que deve compor a cesta, mas ele também é a referência para a gente pensar em quais são os produtos que deveriam ser incluídos em eventuais impostos seletivos. E por que o guia também é uma referência? Porque, se ele diz claramente o que é, ou o que são, quais são os alimentos que compõem uma alimentação adequada e saudável, como esses alimentos são produzidos, aqueles alimentos que não são os alimentos adequados e saudáveis, que não são produzidos de uma forma social, econômica e ambientalmente sustentável, são alimentos que violam o direito humano à alimentação adequada e que, diante da interdependência e da complexidade dos direitos humanos e fundamentais, a gente pode inferir que são um produto nocivo à saúde. Acho que, para além deste debate sobre a cesta e sobre a tributação seletiva em torno dos impostos seletivos, o Consea também se manifestou sobre a importância desse processo como uma forma de diminuição das desigualdades, para que haja uma consciência e uma atuação deliberada nesse processo de redução das desigualdades. Então, quando a gente fala dessa tributação seletiva e quando a gente fala da simplificação do sistema, é muito importante a gente ter a referência de que o crescimento do consumo de ultraprocessados entre as populações, os menores quintis de renda é quase duas vezes superior ao dos demais quintis. Então, quando a gente tributa, quando a gente debate a tributação seletiva sobre ultraprocessados enquanto um produto nocivo à saúde, a gente também está enfrentando as desigualdades no acesso à alimentação adequada e saudável, mas também a desigualdade que hoje é mais uma carga, uma sobrecarga para as populações com os menores quintis de renda, porque o aumento do consumo de ultraprocessados e, por consequência, de desfechos negativos na saúde nesses grupos é significativamente maior do que nos outros quintis de renda, sobretudo nas periferias das grandes cidades. |
| R | Eu disse que falaria, porque acabou o meu tempo. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não sou eu, é a moça. (Risos.) O SR. MARCOS LOPES (Por videoconferência.) - Acho que aí é o terceiro ponto. O primeiro ponto é o do guia, de como ele é essa referência nesses dois debates, tanto da composição da cesta quanto do tributo seletivo. O segundo... (Soa a campainha.) O SR. MARCOS LOPES (Por videoconferência.) - ... é que seja, conscientemente, um instrumento para o enfrentamento das desigualdades. E quero trazer, como último elemento importante aqui, o que foi pontuado pela Edna, sobretudo sobre como essa reforma pode... (Soa a campainha.) O SR. MARCOS LOPES (Por videoconferência.) - ... estimular outros processos de produção. Ela pode estimular outras formas de produção - acho que a Vanessa também trouxe isso -, outras cadeias produtivas. Acho que a gente tem que ter sempre o cuidado de saber quando essas novas cadeias produtivas não são falsas soluções, são efetivamente as soluções, mas temos que pontuar a importância de que esse debate inclua uma discussão séria no Senado - porque na Câmara, do nosso ponto de vista, não houve espaço político para isso ser feito - sobre como a reforma estimula outros modelos de produção, sobretudo o modelo de produção da agricultura familiar, uma produção que não utiliza agrotóxicos. Enfim, quero deixar essas três contribuições. Mais uma vez, quero agradecer, em nome da nossa Presidenta, a Professora Elisabetta Recine, pela oportunidade. Quero deixar os cumprimentos e dizer que o Consea está à disposição para seguir contribuindo e ser também um espaço para que este debate seja aprofundado com o conjunto da sociedade. Obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Marcos Lopes, Coordenador-Geral do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, que falou muito do Guia Alimentar. Acho que grande parte da população não conhece o Guia Alimentar. Eu falava aqui com a Paula e com a Tathiane que nós teríamos que, talvez, construir um caminho para que as pessoas conheçam mais o Guia Alimentar pela importância - eu vou dizer que inclusive eu, porque por magro eu não passo, não é? Acho que o Guia Alimentar vai me ajudar, não vai? A SRA. PAULA JOHNS (Fora do microfone.) - Com certeza. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Então tá. Agora nós vamos para a nossa mesa presencial. E, depois, cada um de vocês que falaram terão direito a uma fala de dois a três minutos, só comentando a reunião. Tathiane Piscitelli, Professora de Direito Tributário da Fundação Getúlio Vargas - prazer. A SRA. TATHIANE PISCITELLI (Para expor.) - Muito obrigada. Boa tarde a todos e a todas. Muito obrigada, Senador Paulo Paim, pelo convite. É um prazer estar aqui junto com a Paula Jonhs para discutir esse tema. Saúdo os participantes da mesa anterior, também os participantes online e quem nos assiste também online. É um prazer estar aqui para discutir esse tema. O foco da minha fala aqui vai ser o imposto seletivo a partir de uma premissa que é fundamental e da qual a gente não pode se afastar. O imposto seletivo é necessário na reforma tributária. E isso, apesar de óbvio, precisa ser repetido, porque ontem mesmo, nesta Casa, houve uma audiência pública, na CCJ, em que a tributação seletiva foi muito discutida e muito criticada. E criticada no sentido de que ela deveria ser eliminada do texto da PEC 45, justamente pela abertura constitucional, pelo fato de que muitas coisas fazem mal à saúde, muitas coisas fazem mal ao meio ambiente, portanto, o imposto seletivo seria um cheque em branco para a União. |
| R | É muito importante que a gente desconstrua esse discurso, porque esse discurso inclusive ignora que hoje nós já temos uma tributação seletiva, não é? Como o Prof. Valadão muito bem mostrou aqui, a política tributária aplicada ao tabaco é consistente - o Ministro Temporão também reforçou esse ponto. Ela é consistente, sólida e eficaz na redução do consumo do cigarro. Ela é eficaz no aumento do preço e, portanto, é um modelo tributário, uma política tributária que funciona e que já é aplicada no Brasil. Então, o que a gente tem aqui é um risco muito grave de retrocesso. Um retrocesso e uma prevalência de grupos de interesse que justamente querem eliminar a tributação seletiva que temos hoje e substituir, então, essa sobretributação por uma tributação sobre o consumo, o que seria muito menor. Na pior das hipóteses, uma alíquota do IVA dual - também aqui para simplificar - muito alta seria de 27% a 29%, contra ser mais de 70% - não é, Prof. Valadão? -, se eu não estiver enganada, que nós temos hoje sobre o tabaco. Então, nós precisamos ficar muito atentos a isso, e eu espero que esta Casa não admita esse tipo de retrocesso e não admita a eliminação do imposto seletivo da PEC 45. Dito isso, é importante também mencionar que a tributação seletiva frequentemente é vista por esses grupos de interesse - e aí tem uma argumentação nesse sentido - como algo paternalista, não é? Então, é o Estado invadindo a minha esfera de autonomia e a minha escolha individual, e se eu quiser... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Tathiane, desculpe-me atrapalhar. A SRA. TATHIANE PISCITELLI - Pois não. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - A gente está percebendo que muitos, devido a compromissos, terão que retornar, enfim, a seu local de moradia, não é? Então eu noto, quando eu disse que todos vão falar novamente, que o Plenário se movimentou. Eu conversei aqui com a mesa rapidamente - aqui vocês vão falar normalmente - no sentido de que uma pessoa falasse em nome dos painelistas; que vocês escolhessem, e essa seria a fala de encerramento. Aí me pediram muito uma foto coletiva - olha, já escolheram ali. Depois vamos para a foto coletiva, o.k.? Eu vou dar seu tempo de volta. A SRA. TATHIANE PISCITELLI (Fora do microfone.) - É, por favor. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ah, com certeza. A SRA. TATHIANE PISCITELLI - Sem a campainha, não é? (Risos.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não, seu tempo volta lá, olha. Volta lá já. Pronto! E um minuto ainda. A SRA. TATHIANE PISCITELLI - Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Está nos nove já. A SRA. TATHIANE PISCITELLI - Então, só retomando, é importante também que a gente se afaste dessa ideia de que seria uma tributação paternalista, contra a autonomia do indivíduo, porque a tributação seletiva tem naturalmente a função de inibir o consumo, pelo fato de que aquele bem vai ficar mais caro, mas ela também tem uma função arrecadatória. E é justo que tenha a função arrecadatória, porque é necessário que se compensem os gastos públicos que são gerados em razão do consumo de bens que fazem mal à saúde e, na redação do 153, VIII, ao meio ambiente. Então acho que essa é uma premissa da qual a gente não pode se afastar. A tributação seletiva é necessária, ela já existe, e a eliminação desse dispositivo na PEC, como se pretende, seria um retrocesso considerável. E, reforço, espero que esta Casa não aceite. |
| R | Dito isso, como mais nós podemos melhorar o texto da PEC? - porque eu imagino que esse também seja o objetivo desta audiência pública. Eu acho que tem dois pontos aqui importantes. Um primeiro ponto, que foi muito mencionado pelo Marcos Lopes e também pela Edna, nas falas anteriores, situa-se naquele dispositivo que trata das reduções de alíquota do IBS e da CBS. Naquele dispositivo, que é o art. 9º da PEC, está mencionado que nós podemos ter alíquotas reduzidas para insumos agropecuários e para alimentos destinados ao consumo humano. Eu queria destacar só esses dois. Sobre esses bens - na verdade sobre todos os bens que estarão sujeitos à redução de alíquota - não poderá haver a tributação seletiva. Por que essas disposições em especial são problemáticas? Primeiro porque, quando a gente prevê a redução de alíquota para insumo agropecuário, isso dá uma margem para, dentro desses insumos, nós colocarmos agrotóxicos. E os agrotóxicos são produtos que, notoriamente, fazem mal à saúde e que, internacionalmente, são mais tributados. A tendência é a de que haja uma tributação maior de agrotóxicos. Em alguns países se adota, inclusive, a tributação progressiva de agrotóxicos. E essa abertura desse termo permitiria, então, não apenas a ausência da tributação seletiva dos agrotóxicos, mas também uma redução tributária sobre eles, o que seria absolutamente descabido. Aqui é importante que a gente diga o seguinte: quando a gente está diante da necessidade de tributação e da necessidade de financiamento do Estado - e esse financiamento se dá por meio dos tributos -, há uma escolha que precisa ser feita: como é que eu vou distribuir os ônus e os bônus da tributação? E parece-me contraditório que os bônus da tributação sejam distribuídos para produtos que causam mal à saúde. Então, acho que esse também tem que ser um motor dessas discussões. Então, seria importante que houvesse uma limitação desse termo, insumos agropecuários, justamente para que os agrotóxicos fiquem de fora e a tributação seletiva seja possível. Em relação aos alimentos destinados ao consumo humano, essa expressão também é uma expressão guarda-chuva, que permitiria fazer com que houvesse redução tributária para alimentos ultraprocessados, o que seria também uma enorme contradição; contrário, inclusive, às diretrizes do próprio Ministério da Saúde, às diretrizes do Guia Alimentar. Portanto, um detalhamento maior nesse sentido seria necessário porque, de novo, se eu coloco alimentos destinados ao consumo humano, e a lei permite a inclusão de alimentos ultraprocessados, automaticamente eu descarto a possibilidade da tributação seletiva. O Marcos Lopes, na fala dele agora, falou bastante em desigualdade. E aí eu queria anotar o seguinte: a tributação favorecida de bens que causam mal à saúde tem, de fato, um impacto direto na desigualdade, mas eu queria avançar um pouquinho para dizer que essa desigualdade que é gerada em razão da tributação desses bens é uma desigualdade de gênero e raça. Por quê? Porque, na medida em que eu tenho o consumo desses bens como geradores de males à saúde, os adoecidos certamente serão cuidados por mulheres, porque são elas as responsáveis pela economia do cuidado, e essas mulheres que estão em maior situação de vulnerabilidade são as mulheres negras. Então, é importante que a gente entenda que, quando a gente fala em desigualdade, a gente não está falando em desigualdade genericamente considerada. É importante que a gente faça a intersecção entre gênero e raça para entender que a tributação favorecida de bens que causam mal à saúde é uma tributação que favorece a desigualdade de gênero e raça no nosso país, cujos níveis já são alarmantes. Então, esse é um primeiro ponto, esse olhar para o art. 9º, que fala das alíquotas favorecidas. Um segundo ponto importante, sobre o qual eu tenho visto pouca gente falar, se refere ao fato de que o imposto seletivo vai ser utilizado como um mecanismo de compensação para a Zona Franca de Manaus. Isso está no art. 92 do ADCT, na redação proposta ao art. 92 do ADCT, que diz que é importante que o IBS, a CBS e o imposto seletivo mantenham o diferencial competitivo da Zona Franca de Manaus. Isso está no caput. Aí, o §1º diz assim: olha, inclusive, em relação ao imposto seletivo, será admitida a ampliação da incidência desse imposto para que ele incida sobre os produtos que também sejam industrializados, produzidos na Zona Franca de Manaus, garantindo-se, assim, o diferencial competitivo da região. |
| R | O que eu estou imaginando diante disso? Estou imaginando que a gente não vai mais ter uma tributação seletiva que se concentre em produtos que causam mal à saúde e ao meio ambiente; a gente vai ter uma tributação, entre aspas, "seletiva", porque ela é completamente desnaturada, de todo e qualquer produto que seja produzido na Zona Franca de Manaus. E aí, na Zona Franca, eu não vou ter a tributação seletiva, mas eu vou tê-la fora. Mas aí, para garantir o diferencial competitivo, qual seria uma saída? Atribuir o crédito ao adquirente, que é exatamente o mecanismo que a gente tem hoje em relação ao IPI, mecanismo esse que causa inúmeras distorções. Então, esse dispositivo precisa ser olhado com muito cuidado para que a tributação seletiva, em primeiro lugar, não seja desnaturada, e a gente não tenha, simplesmente, um IPI repaginado; e, em segundo lugar, não se torne inútil, porque, na medida em que eu garanto créditos do imposto seletivo na entrada de bens que sejam provenientes da Zona Franca de Manaus, então eu anulo a tributação seletiva. E aí isso se relaciona com outro ponto que está vinculado com a minha premissa, que é o fato de que a tributação seletiva não pode ser não cumulativa. Eu já vi redações de emendas que serão possivelmente apresentadas à PEC 45 no sentido de se assegurar a não cumulatividade da tributação seletiva. Se ela for não cumulativa, ela não vai cumprir com o seu papel, que é, justamente, onerar os bens, onerar o consumo, onerar a produção. Então, um primeiro ponto: a gente tem que tomar cuidado com essa não cumulatividade. Um segundo ponto: deve ser mantida a tributação do imposto seletivo embutida no IBS e na CBS. A PEC já prevê que o imposto seletivo integra a base de cálculo do IBS e da CBS. Isso é adequado, porque o objetivo aqui é justamente onerar o consumo. O objetivo é fazer com que o produto seja mais caro e que o tributo seja, de fato, repassado no preço, como seria nessa hipótese. E um terceiro ponto importante é assegurar que o imposto seletivo também possa incidir, cumulativamente, sobre insumos, então, na produção de um bem que vai... (Soa a campainha.) A SRA. TATHIANE PISCITELLI - ... gerar males à saúde, como é o caso dos concentrados em relação à indústria de refrigerantes. Então, em relação à tributação seletiva, esses eram os pontos que eu queria destacar. E acho que o ponto central é: a gente precisa lutar pela manutenção dessa tributação na PEC, mas dessa tributação configurada, então, da forma como ela deve ser, e não simplesmente como um IPI repaginado, com não cumulatividade, porque ela iria perder totalmente a função da seletividade nesse caso. |
| R | E aí, por último, já que eu tenho cinco minutos adicionais, queria fazer uma outra consideração que não tem a ver com a tributação seletiva, mas que se relaciona com uma fala que a Edna fez aqui, no final, sobre a cesta básica nacional de alimentos. E tem até relação com uma conversa que eu tive antes aqui de começar a audiência pública. Existe um debate sobre a possibilidade de a cesta básica nacional de alimentos, que naturalmente deve conter alimentos que não são ultraprocessados, alimentos in natura ou minimamente processados e esses, sim, devem ter alíquota zero, mas existe um debate sobre a manutenção desse benefício fiscal, sobre o fato de que se a gente vai manter mesmo a alíquota zero em relação a esses alimentos, porque, afinal de contas, isso seria desnecessário em relação ao mecanismo de cashback, em razão do mecanismo de devolução. Eu acho que foi um ganho enorme a gente ter no texto da PEC 45 a cesta básica nacional de alimentos com tributação zero. E eu acho que retirar isso do texto seria também um retrocesso na medida em que o mecanismo de compensação, de devolução dos tributos chamado de cashback, não vai ser suficiente para abranger toda a população de baixa renda. Então, no mínimo, a gente precisa garantir que não haja tributação sobre esses bens como forma, como disse a Edna, de viabilizar o alimento, o consumo do alimento saudável nacionalmente. Então, uma zona de livre comércio para essa alimentação saudável. A existência do cashback não pode refrear essa possibilidade, porque não há recursos orçamentários para assegurar o cashback para toda a população que precisa dele. Então, tem-se falado em beneficiar a população que está inscrita no Cadastro Único, que naturalmente deve ter esse benefício, mas que é uma população que está na linha da pobreza ou da extrema pobreza. E há muita gente que tem uma renda baixa e que se não tiver uma tributação baixa sobre os alimentos in natura, sobre esses alimentos que irão compor a cesta básica, essas pessoas vão optar por alimentos mais baratos, que são alimentos ultraprocessados, e haverá impacto na saúde, impacto na desigualdade, impacto na desigualdade de gênero e raça. Então, acho que esse é um outro ponto bastante importante e não se pode, na minha opinião, ser seduzido por esse argumento do cashback, que é relevante, ele mitiga regressividade, mas ele não pode ser uma panaceia, ele não pode ser o único recurso para mitigação da regressividade e para que se assegure o direito à saúde, o direito ao mínimo existencial e ao acesso a alimentos saudáveis. Então, essas eram as minhas contribuições. Eu agradeço novamente o convite. É um prazer estar aqui. Obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem! Meus cumprimentos, Tathiane Piscitelli, professora de Direito Tributário da Fundação Getúlio Vargas, e que trouxe à luz a questão da desigualdade de gênero e raça, com muitos pontos que levantou com muita competência e que eu nunca tinha me debruçado sobre esse ponto específico, entre tanta coisa boa que eu ouvi hoje boa, boa no sentido do alerta de que temos que avançar na busca de uma reforma tributária que leve em consideração uma alimentação de qualidade e o meio ambiente e com toda a visão do ecossistema que vocês colocaram, da questão animal também. Por favor, Dra. Paula Johns, representante da ACT Promoção da Saúde. E já lembrando que já foi escolhida quem vai fazer o discurso de encerramento e vai ser a Dra. Mônica Andreis, Diretora-Geral da ACT Promoção da Saúde. |
| R | A SRA. PAULA JOHNS (Para expor.) - Bom, em primeiro lugar, obrigada, Senador, pela segunda vez consecutiva - na semana retrasada, estávamos aqui com uma audiência também sobre agrotóxico, um tema superimportante. Acho que essa continua dialogando ainda sobre esse tema e trazendo outros temas para a agenda. Eu vou falar, acho, o que já foi dito com palavras diferentes, talvez algumas, nem todas. Mas, primeiro, quero reforçar alguns pontos. O tamanho da oportunidade que a gente tem em mãos e também o risco que a gente está correndo, que eu acho que sempre tem. Se por um lado tem uma oportunidade, você tem um risco, porque obviamente você tem setores interessados em manter o status quo; outros setores que estão interessados em fazer com que o status quo melhore ainda mais para eles. Eu acho que é o caso da indústria de alimentos ultraprocessados. Acho importante falar isso com todas as letras, porque a gente está observando a pressão, inclusive no que aconteceu. Acho que a Profa. Tathiane já trouxe isso em relação às falas que foram feitas na audiência de ontem, atacando o imposto seletivo, ou seja, a gente corre um risco real de uma completa distorção da finalidade do imposto seletivo. Ele já veio lá com o jabuti da Câmara dos Deputados - estou usando um termo aqui da Casa, perdoem-me a informalidade -, ele já veio da Câmara com essa grave distorção de fazer com que deveria ser... o imposto seletivo teria a finalidade de onerar um produto e de você criar uma trava para que ele não onere o que faz mal à saúde através daqueles trechos do texto que falam tanto de insumos agropecuários, como de produtos para consumo, de alimentos para o consumo humano. A gente, inclusive, tem uma proposta, em relação a isso aqui no texto - eu também vou aproveitar mais uma vez para entregar em mãos. Esse sistema tributário que a gente tem hoje, que é cheio de distorções, precisa ser corrigido. Com a configuração da Casa, eu sei que isso não é uma tarefa fácil, por isso que eu gostaria de parabenizar mais uma vez por trazer esse debate, porque eu acho que a única coisa que a gente tem de mais importante em mãos, em primeiro lugar, é a força da evidência. Eu acredito na força da evidência, na evidência baseada na ciência, baseada também em dados empíricos, baseada no que a gente tem de estudos e análises concretas do que significa na prática, de como a tributação é uma ferramenta do Estado fundamental para a gente direcionar para onde a gente vai enquanto sociedade. E aí trazer novamente o ponto aqui da reforma tributária 3S, enquanto parte desse coletivo que está olhando para a reforma tributária não só do ponto de vista da saúde com esses produtos específicos, novamente: cigarro, álcool, alimentos ultraprocessados, agrotóxicos, especialmente aqueles que são, inclusive, proibidos em outros países. Eu acho gravíssimo a gente ter a possibilidade que um produto proibido em outro país venha a ter isenção no Brasil. Em pleno 2023, isso acontecer - a gente com a Agenda 2030 batendo à nossa porta - é a gente estar ampliando um fosso que já é um pouco gigantesco aqui no Brasil. E no ponto de vista da reforma tributária 3S, a gente precisa até fazer uma analogia com a fala da colega anterior, que falou sobre direito animal também, a gente precisa olhar... A gente está falando de produtos in natura, mas a questão da carne tem um impacto ambiental que a gente não pode negar. Para além da questão do bem-estar animal, ela tem um impacto também no meio ambiente que é inegável. Então, a gente precisa olhar para a interseção não só da saúde, mas do meio ambiente e também da justiça social, porque ela também é fundamental e as três coisas não podem ser dissociadas. Então, acho que esses três elementos, o que está na interseção desses três elementos precisa ter um tratamento diferenciado e precisa ter imposto seletivo no sentido de você desestimular o consumo. |
| R | Então, eu acho que a gente está aqui para se colocar à disposição para contribuir. Eu acho que a Mônica já trouxe os dados da pesquisa Datafolha. Eu já tinha adiantado aí uma prévia na audiência sobre o agrotóxico, mas eu acho que é importante a gente se lembrar disso o tempo todo. A gente vai fazer através da rede que compõe aqui... Não somos uma organização isolada; tem centenas de organizações que estão envolvidas nesses debates de diferentes formas, em diferentes lugares, em todo o país, e, da nossa parte, a gente pretende fazer com que essas organizações colaborem e contribuam para o debate, porque eu acredito muito no debate público. É claro que ele tem que ser baseado na verdade, não em fake news - tem todos aqueles poréns, aqueles parênteses -, mas eu acho que, através do debate, a gente consegue conscientizar a população, e eu estou convencida de que estamos todos assim: não tem planeta B. Então, assim, a urgência é realmente urgente. Eu acho que já até mudou a nomenclatura, a gente não está mais nem falando de aquecimento global, está falando de ebulição global. Será possível que a gente vai aprovar uma reforma tributária que amplificará isso ainda mais? Eu acho que não é possível. A gente não pode se dar ao luxo de fazer hoje, ou que amplie as desigualdades, ou que amplie as distorções que a gente já tem. E eu vou fechar trazendo um ponto aqui, que a Tathiane também mencionou, da compensação da Zona Franca de Manaus. Eu acho que esse é um ponto de atenção muito sério. Hoje, o que a gente tem, através de crédito tributário na Zona Franca de Manaus, beneficia diretamente a cadeia produtiva dos refrigerantes e da cerveja; não é só a dos refrigerantes, porque a indústria da cerveja também se beneficia. Por ela também estar na Zona Franca de Manaus, ela também se beneficia desse mesmo, porque a indústria de refrigerantes ligada à indústria de cerveja está sediada na Zona Franca de Manaus e acaba utilizando esse crédito tributário, que já não deveria ir para refrigerantes, e eu diria que também não pode ir para a cerveja, em hipótese alguma, e hoje isso acontece. Então, a gente não pode também deixar de olhar para isso. Em relação ao álcool, acho que a gente também precisa olhar que hoje a gente tem algumas distorções no sentido. Até, Valadão, ali eu vi, em uma apresentação também até do Jose Angelo, nesse mesmo estudo que vocês fizeram, como Rio e São Paulo pagam menos imposto de cerveja do que outros estados. Então, acho que aquela preocupação em relação à questão regional, acho que também é importante que se esteja atento para esse aspecto porque, novamente, é uma oportunidade. Tudo que é uma oportunidade é uma oportunidade para o bem e pode ser uma oportunidade para o mal, mas quero crer que a gente vai ter força suficiente para que seja uma oportunidade para o bem. Mais uma vez, agradeço. E aí estava lembrando, Senador, assim, muitas vezes, nesta Casa aqui... Eu sei que estamos como Comissão de Direitos Humanos, mas a gente está aqui na sala da Comissão de Relações Exteriores, e foi aqui que eu a conheci, 20 anos atrás, por ocasião da ratificação da Convenção Quadro do Controle do Tabaco... (Palmas.) ... e aí é simbólico estar aqui novamente. Mais uma vez, agradeço. Foi um marco importante. Eu espero que a gente consiga um novo marco importante para a saúde. Agradeço também a participação de todo mundo que está aqui presencial, essa grande rede, e de quem também está nos assistindo online. Faremos a nossa parte de fazer essa incidência junto ao Senado como um todo e à população. Obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem! Paula Johns, representante da ACT, por tudo que falou na outra e nesta, meus parabéns! Não tenho nenhum comentário. Eu vi que você falou na outra, falou nessa também, que há produtos que lá fora são proibidos e aqui parece que são incentivados, com subsídios, inclusive. É algo que não dá para esquecer. |
| R | Como combinamos, em seguida vamos para a foto coletiva, nos esperem aí, vai ser logo agora. Eu vou pedir que a Mônica Andreis, Diretora-Geral da ACT, faça a fala final. Aí eu dou a sessão por encerrada e vamos para a foto. A SRA. MÔNICA ANDREIS (Para expor.) - Obrigada, Senador. Como o senhor me passou aqui também algumas perguntas que vieram a mais... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Uma missão. E vou explicar. Eu já devia ter colocado antes, eu esqueci. E como ela vai ser a última a falar, ela vai responder agora. A SRA. MÔNICA ANDREIS - Não tem problema. Eu vou focar até em duas que tem aqui. Uma é do Indy Nunes, de São Paulo, que pergunta de que forma a reforma tributária pode impulsionar a sustentabilidade e o bem-estar social, considerando os desafios atuais; e a da Cláudia Xavier, de Minas Gerais, que pergunta também como a reforma tributária pode contribuir para o desenvolvimento sustentável, considerando aspectos como incentivos fiscais. Eu acho que tudo que a gente colocou aqui hoje dá algumas respostas nesse sentido, de como a reforma tributária pode contribuir para a sustentabilidade, para o bem-estar social, para a promoção da saúde da população. Então, por exemplo, quando se pergunta aqui, considerando os aspectos de incentivos fiscais, eu retomo isso que a Paula acabou de falar. A gente tem que ter incentivos fiscais para produtos saudáveis, ou seja, ter a cesta básica acessível à população brasileira, com alimentos saudáveis, e não ter essa política de benefício ou de incentivo fiscal a produtos que são nocivos à saúde e ao meio ambiente. Isso está previsto, inclusive, quando se fala das fontes de financiamento, por exemplo, para a Agenda 2030, que é um compromisso internacional assumido pelo Brasil e por todos os outros países membros da ONU, se considera que uma fonte inovadora de financiamento para o desenvolvimento sustentável é justamente a tributação de produtos nocivos, como o tabaco, como a questão dos combustíveis fósseis, como foi dito aqui também de agrotóxico. Então, o tempo todo acho que a gente colocou isso. A gente tem que reverter essa lógica, a gente tem que passar a promover a saúde da população, promover a saúde do planeta. E isso pode ter um efeito muito grande a partir das decisões que forem tomadas agora nesta Casa a respeito da reforma tributária. Com isso, eu também queria dizer que a gente está aqui representando - acho que todos nós aqui, tanto a ACT quanto todas as pessoas que estão aqui hoje - a sociedade civil organizada do Brasil. Acho que a gente de alguma forma está tentando ser porta-voz dessa sociedade. Quando a gente trouxe também o Datafolha, com dados que foram de pesquisas junto à população, nos mais diversos estados do Brasil, a gente também está tentando ser porta-voz dessa população. E ela está dizendo, e a gente concorda com isso, que a gente quer um futuro mais saudável para a gente, para a nossa família, para o nosso planeta, para o nosso Brasil. Então, eu terminaria, Senador, com um pedido, que é o seguinte: acho que o senhor já é extremamente sensibilizado para essa causa, mas nos ajude a fazer essa pauta, essa agenda, tudo isso que foi dito aqui, chegar aos demais Senadores desta Casa. Nós sabemos que vai ser um debate intenso, que vai haver pressões de todos os tipos, mas nós estamos aqui, enquanto grupo, representando a sociedade e gostaríamos que isso pudesse chegar também aos demais Senadores e Senadoras e, por isso, a gente conta com seu apoio, conta com a sua ajuda, para que a gente possa transmitir e levar essa mensagem a todos aqui, que vão discutir um tema tão importante como o da reforma tributária. É isso. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dra. Mônica Andreis, Diretora-Geral da ACT Promoção da Saúde. |
| R | A melhor forma, neste momento, de eu agradecer a bela participação de todos vocês, os que falaram e os que não puderam falar, mas que gostariam também de ter falado, é dizer que o que estiver ao meu alcance nós vamos fazer; e vamos pedir que esta audiência pública e a outra que fizemos sejam remetidas aos 81 Senadores. Isso é possível, por intermédio da nossa Comissão. A melhor forma de agradecê-los simbolicamente, antes de eu encerrar, é pedir a todos, de pé, uma salva de palmas para esse time belíssimo aqui, pelas causas que defende. (Palmas.) Assim encerramos a audiência pública de hoje. Agora, vamos para a foto coletiva. (Iniciada às 14 horas e 49 minutos, a reunião é encerrada às 17 horas e 16 minutos.) |

