31/08/2023 - 5ª - Comissão Mista Permanente sobre Migrações Internacionais e Refugiados

Horário

Texto com revisão

R
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 5ª Reunião da Comissão Mista Permanente sobre Migrações Internacionais e Refugiados, 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
Objetivo e diretriz da reunião: a presente reunião destina-se à realização de audiência pública com o objetivo de debater o mundo do trabalho para migrantes e refugiados no Brasil, em atenção ao Requerimento nº 1, de autoria deste Senador, do grande e querido Relator Deputado Túlio Gadêlha, de autoria também da Deputada Reginete Bispo, da Deputada Carol - ambas muito queridas - e do Deputado Zé Haroldo Cathedral.
De imediato, convido para tomar assento à mesa os seguintes convidados... Faremos duas mesas, porque são dez convidados. Eu vou pela ordem que recebi aqui da assessoria dos trabalhos.
R
Convido Vinícius Pinheiro, Diretor do Escritório da Organização Internacional do Trabalho para o Brasil, a nossa OIT, de todos nós. (Palmas.)
Bem-vindo.
Convido Alzira Melo Costa, Procuradora do Trabalho. (Palmas.)
Convido Lívia dos Santos Ferreira, Auditora-Fiscal do Trabalho. (Palmas.)
E convido Paulo Sérgio de Almeida, Oficial de Meios de Vida do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) Brasil. (Palmas.)
Feito. Estamos aqui com a primeira mesa.
Como é de praxe desta Comissão, a Presidência faz uma pequena fala de abertura dos trabalhos.
Fala da Presidência.
O tema da reunião de hoje é bastante oportuno, dada a situação cada vez mais difícil de migrantes e refugiados no Brasil, no que diz respeito à sua inserção no nosso mercado de trabalho.
O Observatório das Migrações Internacionais, iniciado em 2013, através de um termo de cooperação entre o Ministério do Trabalho e o seu Conselho Nacional de Imigração e a Universidade de Brasília, é uma das fontes de dados oficiais sobre migrantes internacionais e refugiados no Brasil.
Com a extinção do Ministério do Trabalho, em 2019, o Conselho Nacional de Imigração passou para o Ministério da Justiça e Segurança Pública, sem afetar a continuidade do trabalho do OBMigra.
Sempre peço para que não botem na mesma folha, dos dois lados. Estão me ouvindo lá no gabinete, não é, Carol?
Felizmente o Ministério do Trabalho foi reconstituído pelo Governo Lula, e o Conselho Nacional de Imigração e o OBMigra seguiram no Ministério da Justiça. E isso parece fazer sentido, pois as questões de migrantes e refugiados transcendem a dimensão de emprego.
O último dos relatórios do OBMigra informa que os Dados Consolidados da Imigração no Brasil em 2022 estima em 1,5 milhão o número de registros de migrantes internacionais e refugiados entre 2011 e 2022.
No entanto, no início de 2022, menos de 230 mil dessas pessoas estavam inseridas no mercado de trabalho formal. É claro que esse número não capta a participação no mercado de trabalho informal, mas revela que é um longo caminho a ser percorrido.
Precisamos compreender, e entendo que esse seja um dos propósitos desta audiência pública, quais são os gargalos que dificultam a inserção dos migrantes internacionais e refugiados no mercado de trabalho formal brasileiro.
Uma boa análise da situação pode ser encontrada em relatório relativamente recente da Acnur, a Agência da ONU para Refugiados no Brasil. Esse relatório é o "Estratégia de Meios de Vida 2019-2021 Brasil". Pelo que pudemos compreender da leitura, a falta de uma legislação adequada não parece ser o grande entrave.
Em certa medida, sobretudo na comparação com outros países, a agência da ONU elogia o ordenamento legal brasileiro, em especial a Lei 13.445, de 2017, a nova Lei de Migração, mas também a Lei 9.474, de 1997, a lei brasileira de refugiados.
R
A Acnur destaca o avanço em relação ao antigo Estatuto do Estrangeiro, uma lei de 1980, que refletia a postura da ditadura em termos de securitização dos movimentos migratórios externos e internos.
Na avaliação da agência da ONU, a nova Lei de Migração procura garantir, ao menos formalmente, direitos socioeconômicos para migrantes internacionais e refugiados, em especial quanto ao regime de visto para a residência e o trabalho.
A Lei de Migração é considerada avançada e positiva, sobretudo no caso de estrangeiros com problema de documentação, o que é muito comum quando as pessoas, por qualquer razão, deixam seus países com pressa e sem muito planejamento.
Por sua vez, a lei brasileira de refugiados é vista como importante para tratar especificamente da regulamentação do trabalho para refugiados e solicitantes de refúgio.
Um ponto positivo apontado pelo relatório é a relativa facilidade para a obtenção da Carteira de Trabalho e Previdência Social, inclusive para aquelas pessoas que ainda aguardam o devido deferimento de seus pedidos de registro como refugiados, para o que basta a apresentação do protocolo provisório de solicitação de refúgio.
No entanto, a agência da ONU identifica obstáculos de ordem prática para o acesso dos migrantes e refugiados ao mercado de trabalho. Um deles é que, apesar de as pessoas terem acesso aos mesmos serviços públicos de colocação profissional que são oferecidos aos brasileiros, não conseguem obter um atendimento adequado às particularidades da sua condição de migrante ou refugiado. As agências públicas de emprego são necessariamente ligadas às esferas de governo estaduais e municipais e a sua atuação é coordenada pelo Sistema Nacional de Emprego (Sine).
Apesar do importante apoio que prestam aos brasileiros e, em certa medida, também aos estrangeiros, a maior parte delas não consegue - estou no fim, pessoal, está longa essa minha introdução aqui - oferecer um atendimento preciso e equivalente a ambos os grupos.
O relatório aponta a falta de preparo das agências públicas de emprego para lidar com diferenças linguísticas e culturais, que se revelam, sobretudo, na relação face a face entre o cidadão estrangeiro que busca apoio e o servidor, o funcionário público brasileiro, que presta o atendimento.
Assim, apresentamos o PL 5.182, de 2020, que institui como política pública a obrigatoriedade de alocação de tradutores e de intérpretes comunitários em todas as instituições públicas federais, estaduais e municipais, de forma permanente ou através da formação de núcleos especializados de tradução e de interpretação comunitária, especialmente organizados para atender às demandas específicas de cada área.
O projeto está tramitando na Casa bem, e estou muito confiante em que vamos aprovar o projeto.
A matéria tramita na CCJ, na qual estamos aguardando ainda o parecer do Relator. É muito importante que tenhamos mais formação, sensibilização e empatia diante da condição de vulnerabilidade econômica e emocional comum à grande maioria dos migrantes e refugiados.
Enfim, essa é a introdução que fiz em nome da Comissão e desta Presidência. Vamos escutar, debater e agir para que os migrantes e refugiados do Brasil tenham garantida a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade.
R
Eu sempre digo, informalmente e formalmente, que direitos humanos não têm fronteira. Esse é um compromisso de todos nós.
Então, vamos, de imediato, passar à nossa lista de convidados.
A papelada aqui é grande, mas achei, já achei a lista com que eu tenho que convidar vocês a usar a palavra.
Então, de imediato, por dez minutos, passo a palavra ao Sr. Vinícius Pinheiro, Diretor do Escritório da Organização Internacional do Trabalho para o Brasil.
Eu já registrei a presença da Vice-Presidente desta Comissão, a nossa querida e grande Deputada Carol - não é, Carol? Ela é Vice-Presidente, e nós vamos dividir aqui. Eu fico um pouco, depois, você fica. Eu sou o autor do requerimento. E você, além de autora do requerimento, é Vice-Presidente.
Pode ser?
Então, tá.
Então, uma salva de palmas para a nossa Vice-Presidente aí... (Palmas.)
... uma grande liderança jovem, que está revolucionando, junto com outras mulheres, principalmente a Câmara dos Deputados. Tanto que a política de cotas já aprovaram lá, e eu consegui aprová-la, ontem, na Comissão de Direitos Humanos. Como Relator, a aprovamos também, sem nenhuma mudança, por unanimidade. Agora, vai para a CCJ.
Por favor, o tempo é seu, Dr. Vinícius.
O SR. VINÍCIUS PINHEIRO (Para expor.) - Bom dia a todas as pessoas.
Queria agradecer ao Senador Paulo Paim por esse convite feito. Tenho a honra de estar aqui.
Queria agradecer também à pessoa da Exma. Deputada Carol Dartora por esse convite e saudar todos os colegas da mesa, saudar todas as pessoas que estão nos escutando, os trabalhadores migrantes, que também estarão presentes aqui via conexão, e também saudar os membros e o corpo técnico da Comissão, na figura da Presidente da Mesa, a Senadora Mara Gabrilli.
Eu queria dizer, inicialmente, Exmo. Sr. Senador Paulo Paim, que o emprego tem um papel central dentro das políticas, dentro da motivação para a migração. Sabemos que a população migrante tem um papel fundamental nas economias, no mercado de trabalho. Em 2019, em todo o mundo, quase 5% da força de trabalho global, o que é equivalente a mais ou menos 170 milhões de pessoas, eram migrantes, e essas pessoas, além de serem motores da economia, também são pessoas que, como o senhor próprio falou, requerem o respeito aos direitos humanos, o respeito aos direitos laborais, porque os direitos humanos e também direitos laborais não têm fronteiras.
Em 2020 - e o colega da Acnur certamente trará números mais atualizados -, o número de migrantes no Brasil foi de mais de 1 milhão de pessoas, dentro dos quais, 54% eram homens, a maioria deles provenientes da Venezuela, Haiti, Bolívia, Argentina, Colômbia, Peru, mas também da China, dos Estados Unidos, além do Paraguai, Senegal e Uruguai. E os fluxos têm aumentado.
Então, o que era uma situação mais simples no passado tem se tornado mais complexa e mais diversificada. Não é somente que os números têm aumentado, mas também os fluxos de diferentes países têm aumentado. Entre 2011 e 2021, o número de trabalhadores migrantes, e aqui me refiro ao número de trabalhadores migrantes no mercado formal no Brasil, saiu de 62 mil para 188 mil. E também observamos uma certa feminização da mão de obra. Nesse período, houve um aumento de 30% na participação das mulheres migrantes no mercado formal.
R
Então, tudo isso para dizer que, por certo, o que leva uma pessoa a sair do seu país e buscar outras oportunidades, às vezes, tem a ver com problemas políticos, climáticos, que, na verdade, é algo que se reflete mais no número de refugiados, mas a motivação econômica tem um papel central. E mesmo que seja um motivo político ou climático, ou por guerras, quando o migrante ou refugiado chega no país, a inserção laboral é um tema central. Então, a política de emprego, os temas relativos ao mundo do trabalho têm uma centralidade fundamental na dimensão dos processos migratórios. Isso é algo que a OIT tem defendido no mundo inteiro, por intermédio de nossa inserção no Pacto Global para Migração, que, muitas vezes... E, aí, tanto em nível global quanto em nível de países, tende-se a ver a migração como um tema de fronteira ou como um tema de polícia, ou como um tema de segurança nacional, o que, claro, tem a sua dimensão, mas, por outro lado, é importante também tratar da questão da inserção socioeconômica.
Eu queria salientar também a importância do diálogo social, do diálogo tripartite, como condição-chave na formulação de políticas da migração laboral, e, nesse mérito, reconhecer e celebrar a atuação do CNig na formulação da resposta brasileira aos fluxos migratórios na última década, quando o Brasil passa a se caracterizar também como um país de acolhida. A composição tripartite ampliada do conselho e sua atuação embasada no diálogo social permitiram identificar falhas nas políticas migratórias e propor soluções céleres. Então, o diálogo social com trabalhadores, empregadores, governo e outras áreas envolvidas é fundamental para isso num contexto de integração de políticas sociais.
O segundo ponto que eu queria salientar é a importância dessa integração socioeconômica dos imigrantes como fator de desenvolvimento sustentável. A política migratória nacional deve estar alinhada à política de trabalho e emprego e também o contrário: a política de trabalho e emprego tem que considerar elementos relacionados aos trabalhadores imigrantes. E a OIT tem feito um trabalho muito importante na América Latina em conjunto com outras agências, como a Acnur, OIM e mesmo o Pnud, em termos de prover orientações, estratégias, no caso, para atender o fluxo migratório venezuelano, com vários eixos prioritários, que incluem, primeiro, a regularização e caracterização da população migrante. Então, é importante saber quem são, quais são as suas competências laborais, que tipo de serviços necessitam e como o mercado de trabalho pode absorver esses contingentes. E esse é um processo de ganha-ganha, tá? Ganham os migrantes, que têm a sua realização possibilitada no mundo do trabalho; ganham as empresas, ganha a sociedade e ganham as economias, que também vão estar, enfim, fazendo com que essa realização se transforme em ganhos econômicos.
Uma distorção enorme que tivemos durante a pandemia, não só no Brasil, mas em outros países da América Latina, é o fato de vários profissionais venezuelanos com formação médica ou em enfermagem estarem trabalhando no delivery. Então, foi um desperdício de talentos num momento em que o país e também outros países mais necessitavam de profissionais dessa área, que não podiam ter as suas competências reconhecidas e, portanto, não podiam atuar no meio médico, deixaram de salvar vidas e tiveram que sobreviver de outras formas. Então, a questão da caracterização é importante, mas também a questão da formação profissional e reconhecimento de qualificação, de competências.
A promoção do emprego seria o terceiro eixo fundamental dessa estratégia,
R
E o quarto eixo que eu gostaria de mencionar é a questão do empreendedorismo e desenvolvimento empresarial. O imigrante, e também o refugiado, já é um empreendedor de natureza. Ele já tem uma propensão para o empreendedorismo maior do que a média, porque o fato de ter deixado a sua zona de conforto e ido para outro lugar buscar novas oportunidades, por si só já é um gesto em direção ao empreendedorismo, tanto que em muitas zonas, no Brasil, nos Estados Unidos, no resto do mundo, zonas relacionadas com comércio, com micro e pequenas empresas, são zonas em que há uma grande presença de mão de obra imigrante.
A inclusão financeira seria um eixo fundamental; o acesso à proteção social e, de novo, aí incluindo o serviço de saúde novamente durante a pandemia. Em alguns países, o que aconteceu é que imigrantes não tinham acesso ao serviço de saúde porque não estavam formalmente no mercado de trabalho, isso provocou um problema seríssimo para conter a pandemia. Como é que você vai conter uma pandemia excluindo grupos do acesso ao sistema de saúde? E a coesão social. Então, são sete eixos fundamentais que fazem parte dessa estratégia latino-americana que está sendo promovida pela OIT.
No caso do Brasil, com exemplos muito concretos, houve o lançamento de uma turma de aprendizagem para jovens imigrantes no DF, em parceria com a OIM, que estamos atendendo. É um grupo de 30 imigrantes que já saem do processo de formação profissional com a carteira de trabalho e com o emprego garantido, e são, na verdade, filhos de uma primeira geração de imigrantes venezuelanos que se instalaram aqui em Brasília e que vão ter um destino diferente dos seus pais, porque vão ter emprego com carteira, totalmente inseridos, enquanto seus pais ainda estavam na informalidade. Então, para a gente, dá muita alegria, muita emoção quando eu fiz a abertura dessa turma, junto com o diretor da OIM.
Também atendemos mais de cinco migrantes no Mato Grosso, incluindo encaminhamento para políticas públicas: emissão de documentos, sensibilização de empresas, qualificação profissional e intermediação entre a mão de obra e o mercado formal.
Por fim, vejo que tem um minuto ainda, Sr. Senador, eu queria...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Com a devida tolerância da mesa. Se precisar trocar o meu voo, eu vou trocar. Porque eu vi aqui que a Carol está com um problema, e ela me explicou que não tem jeito dela ficar aqui mais do que às 10h30...
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - ... mas eu já estou trocando o meu voo, porque eu ia passar para você. (Risos.)
A reunião é tão importante que eu estou me dando o direito de fazer esse aparte. Ela só não vai ficar por um motivo que me explicou aqui, depois da fala dela, mas eu já pedi para adaptar o meu voo. Então, quer dizer que eu vou dar sempre a tolerância necessária para que se conclua, e a minha tolerância tem sido de três a cinco minutos a mais do tempo que eu tenho dado.
O SR. VINÍCIUS PINHEIRO - Não, mas eu vou concluir a tempo. Nós advogamos, a OIT advoga para que toda pessoa, independente da situação migratória, tenha acesso ao emprego produtivo, com a renda justa, que permita desfrutar de segurança e liberdade no local de trabalho, desfrutar da proteção social e assim como, de maneira geral, também ter melhores perspectivas de desenvolvimento social e integração social, com igualdade de oportunidades. Então, toda pessoa, independente da situação migratória, do status, da raça, da etnia, da opção de orientação sexual, tem que ter acesso ao trabalho decente.
Nós saudamos muito essa nova iniciativa, inclusive está prevista para ser lançada na próxima reunião da Assembleia Geral em Nova Iorque, pelo Governo brasileiro, pelo Governo americano, de promoção do trabalho decente. Achamos que essa iniciativa também deveria ter um componente relacionado com os migrantes, porque como se trata de uma iniciativa global, nada melhor do que aproveitar esse conjunto de países para impulsionar uma agenda de trabalho decente em relação aos migrantes.
R
E também dentro desse ensejo, eu queria fazer referência, Exmo. Sr. Senador, a instrumentos, convenções da OIT que estão em tramitação nesta Casa. Hoje, desde que o Governo começou no dia 1º de janeiro, já foram enviados para o Congresso cinco instrumentos: a Convenção 190, que trata do assédio e da violência no mundo do trabalho, que ainda está em tramitação na Câmara; a Convenção 156, que trata de cuidados, de repartição de trabalho na área de cuidados - e as duas convenções têm a ver também com o mundo dos trabalhadores migrantes. Além disso, está a Convenção 187, que trata da saúde e segurança no trabalho, também um tema que afeta todos os trabalhadores, inclusive migrantes, e aí muito importante, o protocolo da Convenção 29, que é a convenção do trabalho forçado da OIT. A gente sabe que, infelizmente, os migrantes, pela sua condição de vulnerabilidade, migrantes e refugiados, estão mais propensos à exploração. Isso quer dizer exploração em relação ao trabalho análogo à escravidão, a exposição ao trabalho infantil, a exposição à discriminação, a exposição ao trabalho em condições degradantes.
(Soa a campainha.)
O SR. VINÍCIUS PINHEIRO - Então, esse avançar em relação à adoção por parte do Congresso desses protocolos, dessas convenções nos parece também um passo fundamental para garantir o trabalho decente para todos, inclusive para migrantes e refugiados.
Muito obrigado, colegas; muito obrigado, Sr. Senador. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Muito bem, Sr. Vinícius Pinheiro, diretor do Escritório da Organização Internacional do Trabalho para o Brasil (OIT). Parabéns - vou ser muito rápido aqui para ganhar tempo para que todos possam usar a palavra - pelas iniciativas que anunciou aqui, muito positivas, e essa sua sensibilidade, quando diz que existem muitos profissionais excelentes e que não são valorizados, e deu o exemplo de médicos e enfermeiros. Parabéns.
Dra. Carol Dartora, Vice-Presidente desta Comissão e uma das autoras desse requerimento, junto com este Senador e mais outros colegas.
A SRA. CAROL DARTORA (PT - PR. Para discursar.) - Bom dia a todas e todos.
Primeiro, quero começar parabenizando esse momento, parabenizando a todos os participantes dessa audiência.
O tema da migração é um tema muito caro para nós, a gente vem construindo uma rede para implementar a política de migração no Brasil. Hoje, a gente sabe que o Brasil está na rota da migração, mas infelizmente esse nosso país, tão diverso, ainda impõe condições muito precárias para os migrantes porque o nosso país sofre com essa fragilização das condições de trabalho e sofre também com o que eu acho que é mais pernicioso, que é o preconceito, o racismo, a xenofobia. Tudo isso traz muitas dificuldades. Então, esse tema é muito caro para nós. Eu estou muito feliz que a gente possa realizar essa audiência.
Quero cumprimentar especialmente aqui o Presidente desta Comissão, o Senador Paim; cumprimentar os convidados: o Vinícius Pinheiro, diretor do Escritório da Organização Internacional do Trabalho para o Brasil; a Alzira Melo Costa, Procuradora do Trabalho; a Lívia dos Santos, Auditora-Fiscal do Trabalho; o Paulo Sérgio de Almeida, da Acnur; a Luana Maria Guimarães; a Patrícia Gimenez Camargo, representante do Sindicato Nacional dos Tradutores; Angel Mesias, migrante venezuelano; a Marina Rongo, Assessora de Fortalecimento do Espaço Democrático da Conectas Direitos Humanos; a Niusarete Margarida de Lima, Coordenadora de Atenção ao Migrante e Refugiados no Sistema Único de Assistência Social e Coordenadora do Subcomitê Federal para Acolhimento e para Interiorização; a Lutiana Valadares Fernandes, Defensora Pública Federal; e o Ministério do Trabalho e Emprego.
R
Sei também que tem companheiros aqui do Ministério da Justiça acompanhando. Então, fico muito feliz pela presença dos convidados, por terem aceitado esse convite.
Quero fazer a minha fala aqui sobre a questão da migração e do mundo do trabalho, mas antes pontuar um quase colapso que o Brasil está vivendo.
Essa semana, no Plenário da Câmara dos Deputados, a gente votou um requerimento de urgência sobre um projeto que trata de interiorização dos migrantes que estão chegando, migrantes venezuelanos que estão chegando em Roraima, Pacaraima. A gente sabe que esse município está recebendo mais de 200 migrantes por dia e isso está gerando um colapso. Então é muito importante que o Estado brasileiro se coloque para construir as soluções necessárias para garantir os direitos humanos nessa condição e também para dar suporte para o município, que é um município muito pequeno. Então isso fala dessa urgência da política migratória que a gente tem o desafio de construir.
Esse é um projeto que avilta o direito dos migrantes porque tenta forçar uma interiorização, forçar que os migrantes vão para outros lugares, e a gente sabe que as pessoas têm o direito de construírem as suas vidas aonde elas quiserem, aonde elas desejarem. Então eu queria colocar isso porque é muito importante que a gente fique atento aos projetos, às propostas que chegam na Câmara.
E aí quero dizer que o mundo do trabalho para migrantes e refugiados no Brasil, como o próprio nome já diz, é algo muito hostil, tem sido muito hostil. Recentemente, no Paraná, o estado de onde eu venho, um dos estados que mais recebe migrantes, tivemos um caso grave envolvendo a morte de sete trabalhadores haitianos em uma explosão na Cooperativa C. Vale, em Palotina. Inclusive estive acompanhando de perto essa situação e prestando solidariedade às vítimas. Foi uma situação que ocorreu porque os trabalhadores haitianos ali estavam nas piores condições de trabalho. Então esse acidente foi um acidente que poderia ser evitado. Para além disso, esses imigrantes morreram queimados nessa explosão e não tiveram nem o direito de que suas famílias fossem avisadas. Então isso fala um pouco dessa hostilidade que é o mundo do trabalho.
São muito tristes e preocupantes essas condições a que os migrantes estão submetidos aqui no nosso país e que promovem dificuldades decorrentes da própria migração, como, por exemplo, a violência racista. O Brasil infelizmente é um país reconhecido mundo afora como um país acolhedor, porém se demonstra na realidade muito violento.
Eu destaco ainda a migração venezuelana, que vem crescendo cada vez mais no país. E aí a gente tem que pensar quais são as condições de trabalho que a gente tem oferecido para essas pessoas.
Então, que o trabalho dessa Comissão, que o trabalho que essa Comissão desempenha, trabalho fundamental para que a gente possa pensar nas ações de combate à violência, possa gerar as soluções de que a gente precisa urgentemente. Também é muito importante a gente pensar as condições das mulheres migrantes. A gente sabe que quando a gente intersecciona gênero e raça, outras problemáticas decorrem disso. Sabemos que as mulheres têm mais dificuldade de serem inseridas com dignidade no mundo do trabalho e são inseridas geralmente na pauta do cuidado, que é aquilo que está posto para as mulheres como um todo.
R
Então, eu reforço meu compromisso e minha disposição para atuar para mudar essa realidade, principalmente essa realidade dos migrantes negros, haitianos, venezuelanos, que são extremamente precarizados e que merecem condições dignas.
Eu peço desculpas, adoraria seguir aqui na audiência e poder fazer a continuidade, presidir a audiência, mas eu parto para Curitiba daqui a pouquinho - 10h50 é meu voo -, então daqui a pouquinho eu vou ter que me ausentar, mas agradeço a todas e todos. Estou aqui, contem comigo, estamos à disposição, assim como a Comissão como um todo. Muito obrigada! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Parabéns, querida Deputada Federal Carol Dartora, que é Vice-Presidente desta Comissão. Eu era Vice, ela assumiu o meu lugar, porque aqui nós temos um sistema de rodízio. É automático o rodízio e ela foi escolhida por unanimidade para ser a Vice-Presidente desta Comissão. Eu já fui Vice no passado, já fui Presidente no passado e você será Presidente ali na frente, no futuro, tenho certeza absoluta. Carol Dartora, Deputada Federal do Paraná, é uma liderança corajosa, competente, preparada. Olha, dizem por aí que tu vais ser Prefeita de Curitiba. É verdade isso?
A SRA. CAROL DARTORA (PT - PR. Fora do microfone.) - Olha, eu quero!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Se já quer... Para ganhar, eu aprendi nos meus 40 anos de Congresso, tem que querer. E se você quer, vai ser. Boa viagem, Carol!
Passo de imediato a palavra à Procuradora do Trabalho, Dra. Alzira Melo Costa. Eu sei que todos são doutores, viu? Então o "doutor" vale para todo mundo aqui, só não vale para mim.
A SRA. ALZIRA MELO COSTA (Para expor.) - Muito obrigada, Senador.
Bom dia a todos e todas! Gostaria de cumprimentar todos os colegas na Mesa, na pessoa do Senador Paulo Paim. Gostaria de cumprimentar também a Deputada Carol e cumprimentar todos os colegas que trabalham na pauta migratória, que aqui assistem, a todos os migrantes e refugiados que também acompanham a audiência online.
Inicio minha fala agradecendo a possibilidade de representar o Ministério Público do Trabalho na presente audiência pública nesta Comissão Mista Permanente para Migrações e Refugiados com o objetivo de debater o mundo do trabalho para migrantes e refugiados no Brasil. A pauta migratória sempre foi um tema muito caro para o Ministério Público do Trabalho, em especial porque nós acreditamos que o trabalho decente, ou seja, aquele adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, equidade, segurança, capaz de garantir uma vida digna, é o ponto central para a inclusão de migrantes e refugiados no Brasil, sendo fato que migrantes e refugiados, em especial migrantes por questões humanitárias e refugiados, são muito mais vulneráveis à precarização no mundo do trabalho, à discriminação no emprego e até mesmo às práticas criminosas de trabalho escravo, tráfico de pessoas, em especial para fins trabalhistas, que novamente é o tráfico de pessoas para fins de trabalho escravo, tráfico de pessoas para fins de exploração sexual e prostituição.
R
Dentro de todo o arcabouço de direitos humanos, a gente tem várias regras esparsas, diluídas em diversos instrumentos, em especial as convenções da Organização Internacional do Trabalho, convenções da ONU, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Convenção da América sobre Direitos Humanos, e todas as questões versadas nesses instrumentos cuidam sempre de proteção, de igualdade de tratamento entre trabalhadores migrantes e nacionais e, sobretudo, da necessidade de o ser humano trabalhador ser atendido como um todo.
A Declaração dos Direitos e Princípios Fundamentais da OIT, adotada em 1998, para mim, em especial, estabelece marcos no que diz respeito aos princípios e direitos fundamentais do trabalho dos trabalhadores migrantes, entre eles, liberdade de associação, reconhecimento efetivo dos direitos de negociação coletiva, eliminação de todas as formas de trabalho forçado, abolição do trabalho infantil, eliminação de todas as formas de discriminação no emprego e na ocupação.
A nossa Constituição garante, por sua vez, igualdade de tratamento entre brasileiros e estrangeiros residentes no país, garantindo-lhes uma série de direitos. E aí, como bem falado pelo senhor, Senador, dentro de todo esse arcabouço normativo que já tinha sido citado, somente, em 2017, com a Lei de Migração, é que a gente teve realmente, dentro do país, uma modificação na percepção de como o migrante era visto. Ele deixou de ter aquela visão do Estatuto do Estrangeiro, de ser uma ameaça aos trabalhadores, uma ameaça à segurança nacional, e passou a ser visto dentro de um outro contexto muito mais colaborativo e dentro de todos esses princípios que foram citados nesse arcabouço normativo de direitos humanos internacional, que são os princípios da universalidade dos direitos humanos, da não criminalização da migração, do repúdio à xenofobia, ao racismo e a qualquer tipo de discriminação, além da proibição das práticas de expulsão e deportação coletivas.
A Lei de Migração busca assegurar aos migrantes igualdade de tratamento e de oportunidade. Em que pese tudo isso - e como é bonito o nosso arcabouço normativo, o Brasil realmente é muito avançado nisso -, é fato que migrantes e refugiados, seja pela urgência de gerar renda para o autossustento de suas famílias, seja pela ausência de uma rede de apoio, seja pela dificuldade relacionada ao idioma, seja pelo desconhecimento dos próprios direitos, se colocam em situações difíceis, potencializando a exposição a todas as formas de exploração; sujeitando-se a maiores jornadas, a menores salários; privando-se de alguns direitos fundamentais que são garantidos a todos os trabalhadores, entre eles, recolhimento de FGTS, alguns direitos previdenciários; sujeitando-se, mais uma vez, a práticas criminosas, e tudo pela premência do autossustento.
Outras vezes, quando conseguem ser inseridos no mercado de trabalho, estão sujeitos a subempregos, não se considera a qualificação nem as capacidades laborais que foram adquiridas no seu país de origem, e eles são obrigados a se adaptar em busca do seu sustento.
Quando, dentro desse quadro, a gente faz um recorte para as mulheres, como bem abordado pela Deputada Carol, as dificuldades se acentuam. Se entre nacionais e estrangeiros, migrantes ou refugiados tem uma diferença no patamar salarial, quando nós pegamos dois estrangeiros, um do sexo masculino e outro do sexo feminino, ela vai ganhar menos e vai ser submetida a maiores jornadas e a outras piores condições de trabalho.
R
Outro grupo que possui maior dificuldade e menos visibilidade são justamente os jovens, porque não têm a experiência prévia que, muitas vezes, se exige, não conseguem ser inseridos na aprendizagem e ficam no limbo: "Não tenho experiência, não consigo ser inserido na aprendizagem e muitas vezes eu não consigo a escola adequada".
É urgente e necessário, e aí me volto aqui para os colegas do Ministério da Justiça...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. ALZIRA MELO COSTA - Muito obrigada.
É que essa cadeira é para gente grande, viu, Senador? Eu que sou pequenininha aqui, vou afundando, gente, daqui a pouquinho estou lá atrás, mas muito obrigada.
É urgente e necessário, e aí me volto para o Ministério da Justiça, eu sei que foi feito ali um esforço hercúleo de conseguir fazer o debate com todas as instituições, com a política nacional de migrantes, refugiados e apátridas, mas é urgente e necessário que se prevejam soluções duradouras para a inserção no mercado de trabalho.
Estou chefe da Procuradoria do Trabalho no Amazonas e em Roraima, que são os dois estados mais impactados com o fluxo migratório venezuelano.
A média, Deputada Carol, de entrada/mês, de janeiro a julho, é de 11,9 mil pessoas que adentram as fronteiras por mês, então, a média é de 390 pessoas por dia. É um fluxo que permanece intenso.
É necessário que tenhamos, para além da resposta humanitária emergencial, uma política que preveja uma solução duradoura para esses migrantes e refugiados.
Dentro desse contexto inteiro, o Ministério Público tem um papel fundamental na promoção de direitos, indução de políticas públicas, defesa da democracia, construção de uma sociedade livre, justa, solidária, seguindo todos os contornos delineados em nossa Constituição e em todo esse sistema jurídico internacional de direitos humanos.
É um tema complexo e multidisciplinar o acolhimento, a inclusão de migrantes e refugiados na sociedade brasileira, bem como a proteção dos seus direitos. Nisso, o Ministério Público do Trabalho faz a atuação de garantia de direitos não só repressiva, isso nos limitaria demais e apequenaria a atuação ministerial, mas a gente participa de diálogos com grupos e sociedades envolvidas, fóruns de debates, sociedade civil, e, sobretudo, Senador, o Ministério Público atua concretamente na defesa desses direitos laborais através do financiamento, por meio das suas reversões, de projetos relacionados à geração de emprego e renda em diversas ações.
Aqui, o meu colega de mesa, Vinícius, referiu as ações da OIT. É com muito orgulho que eu falo que nós financiamos, só no Amazonas, 110 pré-aprendizagens para jovens e, desses, 57 já estão como aprendizes.
Por que era necessário fazer essa pré-aprendizagem? Para fazer ali um conjunto de habilidades e interesses que eles pudessem, com participação da Acnur... A Acnur é muito parceira nossa em diversos projetos que são assinados pelo MPT do Amazonas e Roraima.
Para além disso, e aí peço para exibir um filme, o vídeo será curto... Quando foi gravado, nós tínhamos capacitado apenas 90 mulheres. Hoje, nós já conseguimos...
(Soa a campainha.)
A SRA. ALZIRA MELO COSTA - ... fazer a capacitação de 200 mulheres em Manaus, 50 em Boa Vista, num projeto que se chama Mujeres Fuertes, que é justamente voltado para migrantes e refugiadas chefes de família sozinhas.
Quando essa mulher de família monoparental precisa ser reinserida no mercado de trabalho, ela sofre muito mais dificuldades, principalmente pelo ônus do cuidado do seu familiar, criança ou adolescente, idoso ou alguma outra pessoa que precise de cuidado especial de saúde.
Então, eu peço para exibir e encerro a minha fala após o vídeo, se o senhor me permitir.
R
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Vamos ao vídeo.
O vídeo é bem curto, segundo ela, como discurso de político - sobe no palanque para falar um minuto.
(Procede-se à exibição de vídeo.) (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Parabéns, parabéns pelo vídeo! Foi curto, objetivo. Muito bom! Parabéns! Meus cumprimentos.
Pode concluir.
A SRA. ALZIRA MELO COSTA - Muito obrigada, Senador.
Este projeto tem um distintivo, não é uma mera capacitação. Cada fase é executada ao longo de quatro meses. São criadas e foram instituídas mitigações de barreiras, entre elas uma bolsa de R$300 para que a mulher possa ter ali justamente esse respiro, três meses dessa bolsa, para que ela consiga ir... É dado o vale-transporte para a mulher e para os filhos, aqueles que já precisam pagar. É estabelecido um espaço seguro, um local de lanche, para que elas consigam, realmente, ter essa formação e ter essa mudança de perspectiva também.
A mulher que vem, principalmente as que entram pela nossa fronteira a pé, chegam muito maltratadas. E os relatos são surpreendentes. Elas precisam, realmente, desse empoderamento, desse fortalecimento, enquanto ser, precisam dessa diluição de conhecimento. Não adianta pegar uma mulher dessas e dar uma capacitação de 80 horas em uma semana, porque ela não vai ter condição de progredir e avançar pelas próprias pernas.
R
(Soa a campainha.)
A SRA. ALZIRA MELO COSTA - Então, realmente, é uma satisfação muito grande o Ministério Público poder participar também de estratégias de respostas. Essas estratégias foram pautadas também em pesquisas: o que as mulheres mais tinham habilidade de realizar e qual era a capacidade do mercado de trabalho de inseri-las?
Em que pese ser um projeto voltado para o empreendedorismo, elas são capacitadas pelo Sistema S - Senai e Sebrae -, de forma que, não querendo mais ficar no Amazonas ou em Boa Vista, elas levem essa certificação para qualquer lugar do Brasil.
É isso.
Muito obrigada pela oportunidade, mais uma vez. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Muito bem.
Meus cumprimentos, Alzira Melo Costa, Procuradora do Trabalho, pela sua exposição e também pelo vídeo, e por esse investimento naquilo que eu chamo de ensino técnico profissionalizante, não é?
E lembrou o Sistema S.
Olha, eu sou um defensor do Sistema S aqui dentro do Congresso, porque eu também era um vendedor de flores e de banana na feira livre, em Porto Alegre. Fiz o curso técnico no Sistema S - na época, era um tempo mais longo e eu tinha uma ajuda mensal. A Vinícola Rio-Grandense que me dava essa ajuda mensal, porque, a cada cem, eles tinham que ter tipo um afilhado na empresa, e eu entrei numa dessas bolsas. E até hoje defendo muito, muito, a preparação... Até aí, agora, com a inteligência artificial, isso tudo no mundo - não é? -, se a nossa gente não se prepara não tem como exercer uma profissão com salário digno.
E você explorou bem também aquilo que eu chamo de situação análoga ao trabalho escravo, que é mais ou menos isso... Infelizmente, eu sempre digo que não há um estado neste país que não tenha trabalhador análogo a essa situação de escravidão. E você lembra dos refugiados, também, pela forma que são ainda, infelizmente, discriminados no país, apesar do esforço que percebo de todos vocês.
Vamos em frente.
Passo a palavra, de imediato, à Auditora-Fiscal do Trabalho, Dra. Lívia dos Santos Ferreira.
A SRA. LÍVIA DOS SANTOS FERREIRA (Para expor.) - Bom dia a todos e todas.
Primeiro, eu quero agradecer o convite que a Comissão fez ao Sinait e quero agradecer ao Senador Paulo Paim.
Eu sou Auditora-Fiscal do Trabalho, mas eu estou aqui representando o Sinait (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho), não estou representando o Ministério do Trabalho. Então, o convite foi feito ao Sinait, e aqui eu venho representá-lo.
Quero cumprimentar todos que estão na Mesa e, na minha fala, eu pretendo fazer, Senador, uma reflexão, baseada na minha experiência também como inspetora do trabalho, no combate ao trabalho escravo, porque eu trabalho em São Paulo e fiquei seis anos como Coordenadora do Combate ao Trabalho Escravo. Nessa oportunidade, eu tive a experiência de conversar e trabalhar com muita gente que atua na área da migração, porque os nossos atendidos eram quase 100% imigrantes e refugiados.
Quero fazer uma reflexão sobre a dissonância que eu enxergo entre a política de migração no Brasil e a política trabalhista.
E vou trazer também um contexto da questão da construção da discussão da Lei de Migração, o que aconteceu anos antes da aprovação da lei, e dizer o que aconteceu nesse contexto e como eu enxergo essa dissonância.
R
Bom, é indiscutível... E aqui as pessoas já falaram, na mesa, sobre a importância do trabalho para os imigrantes como aspecto essencial e central para que eles tenham uma vida digna, no local de destino onde escolheram ou tiveram que migrar. Os imigrantes são trabalhadores que estão mais na ponta do mercado de trabalho, engrossam os números da informalidade. Quando o Brasil vivia o pleno emprego, mais ou menos em 2010, o índice de informalidade entre imigrantes era de mais de 40%, mesmo vivendo o pleno emprego. Portanto, para as políticas públicas trabalhistas conseguirem atingir essa população de imigrantes é preciso muito empenho, muita vontade política e muita estratégia e inteligência para conseguir chegar a esses trabalhadores.
No que diz respeito à atuação da inspeção do trabalho no Brasil, ela se volta mais para estabelecimentos e atividades mais formalizadas do mercado de trabalho e vêm atuando pouco - essa é uma crítica que e faço - na camada mais informal do mundo do trabalho. Então, tem dificuldade de chegar a esse trabalhador, de levar as políticas, a inspeção do trabalho para esse trabalhador. Essa ampla informalidade, como eu já falei, exige estratégias robustas e outras frentes de enfrentamento.
Trazendo um pouco do contexto da nova Lei de Migração, da época em que se discutia, em que se construía a nova Lei de Migração, faz-se necessário trazer um pouco desse contexto histórico para entender o que aconteceu naquele momento e para a gente entender o que a gente tem hoje. É um contexto histórico, mas muito recente, mais ou menos de 2015 a 2017. Então, vou rememorar brevemente esses acontecimentos. A nova Lei de Migração vinha sendo discutida nesses anos. É importante lembrar que, no contexto dessas discussões, foi pensada até mesmo uma proposta de lei no sentido de repensar os papéis tradicionais do Ministério das Relações Exteriores, do Ministério da Justiça, da Polícia Federal, do Ministério do Trabalho, do CNIg, inclusive, uma proposta de se criar uma agência nacional de migração, fundada na nova Lei de Migração. Houve essa discussão. Então, seria uma mudança bem profunda e que iria trazer um marco muito inovador, na minha percepção, em relação ao tratamento da política migratória no país. Discutia-se uma mudança muito profunda na forma como o Brasil trataria a sua legislação e políticas migratórias.
O CNIg sempre teve um papel muito importante, que possibilitava certos avanços no tratamento dos imigrantes, dos refugiados, a despeito da legislação antiquada que a gente tinha na época do Estatuto do Estrangeiro, que tinha um viés mais voltado para a questão de segurança nacional, da proteção do Estado brasileiro.
Menos de um ano antes da aprovação da nova Lei de Migração, quando fervilhavam as discussões em torno da nova lei, nós tivemos importantes reveses políticos no Brasil, em 2016. E aí eu falo da questão do impeachment da Presidenta Dilma. E esses reveses tiveram efeito na configuração e na efetividade da nova Lei de Migração.
R
Tivemos a aprovação do novo marco regulatório, que foi a Lei 13.445, 2017, que representou, de fato, um grande avanço no tratamento da questão migratória, mas que veio acompanhada de 20 vetos na sanção presidencial e também de desafios no que diz respeito à sua regulamentação.
Na época, setores conservadores e empoderados, também pelos reveses políticos que tivemos, pretendiam que não houvesse avanços importantes nas políticas migratórias. Esses setores se mostraram bem articulados para atuarem no processo de regulamentação da lei e conseguiram fazer regredir pontos importantes nos quais a nova lei representou avanços.
Coloco uma lupa sobre a questão do CNIg também: como, nesse processo, o CNIg foi esvaziado e como o diálogo social foi esvaziado dentro do CNIg. A importância da representação da sociedade civil, de certa forma, percebia um esvaziamento dessa participação.
Lá na frente, depois da aprovação da lei, em 2019, com a extinção do Ministério do Trabalho, o CNIg foi transferido para o Ministério da Justiça. Havia, naquele contexto, no âmbito da discussão e da aprovação da lei, uma certa tentativa - até para poder consolidar esses retrocessos - de captura da pauta migratória pelo viés da segurança pública e pelo viés policial.
Em 2019, a gente teve o fim do Ministério do Trabalho e, com isso, o CNIg sai de um órgão mais voltado para a questão trabalhista e vai para o Ministério da Justiça. Assim está até hoje, Senador. Então, mesmo com a recriação do Ministério do Trabalho e Previdência, em 2021, esse órgão que tinha atuação protagonista, o CNIg, não reconquistou o seu protagonismo.
O Decreto 11.348, de 2023, que aprovou a estrutura regimental do Ministério da Justiça, já agora na gestão do Governo Lula, atribuiu à Secretaria Nacional de Justiça a responsabilidade de promover as ações sobre política migratória laboral. Então, a gente tem um contexto em que um órgão que era muito importante, em termos, principalmente, de construção de política migratória laboral, naquele contexto, teve uma certa captura pela pauta da segurança e isso foi consolidado com a saída definitiva de dentro do Ministério do Trabalho.
Bom, eu trago também algumas questões que percebo na prática, até para exemplificar essa questão da dissonância que eu trago entre a política laboral e a política migratória. Como que eu percebo isso quando estou atuando, na ponta, como inspetora do trabalho, no meu dia a dia? Por exemplo, existe uma resolução normativa do CNIg, a nº 2, de 2017, que trata sobre contrato de trabalho com vínculo empregatício. Então, se um empregador quer trazer um trabalhador de fora do Brasil para trabalhar no Brasil...
(Soa a campainha.)
A SRA. LÍVIA DOS SANTOS FERREIRA - ... ele pede por meio desse procedimento do CNIg.
Não vou me alongar muito mais.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Tranquilo. Há tolerância. É dez com mais cinco.
R
A SRA. LÍVIA DOS SANTOS FERREIRA - Então, essa resolução possibilita que o empregador peça um visto de trabalho, digamos assim, para o Estado brasileiro, para esse trabalhador imigrante. O que acontece? Essa resolução do CNIg permite, por exemplo, que tenha um intermediador de mão de obra ou uma agência de emprego nessa relação, sendo que o Brasil não tem legislação que regule esse tema. E é muito perigoso, não é? Em quase todos os casos de trabalho escravo e tráfico de pessoas, existem os denominados "gatos", que é um intermediador, é a agência de mão de obra.
A gente tem poucos instrumentos legais. A inspeção do trabalho busca combater essas violações, mas é difícil quando o Brasil não tem instrumentos legais que tratam sobre esse tema. O nosso sistema de intermediação de mão de obra, o público, vem sendo inefetivo há muitos anos. E o Brasil não ratificou, por exemplo, a convenção da OIT que trata sobre as agências privadas de emprego, que traria algum tipo de arcabouço legal até para a inspeção do trabalho poder atuar. Então, temos essa dissonância, não é? O CNIg permite, mas a gente não tem nenhum tipo de regulação desse tipo de permissão.
Por outro lado, temos também, por exemplo, a previsão da concessão de residência para vítima de tráfico de pessoas e trabalho escravo na Lei de Migração, e isso foi uma novidade do CNIg. O CNIg que começou a fazer resoluções dando a residência dessas pessoas como obrigação do Estado brasileiro em atender essas vítimas dessas violações ocorridas no seu território. Isso foi para a nova Lei de Migração.
No entanto, quando chega à portaria do Ministério da Justiça, o Ministério da Justiça restringe a concessão à vítima à decisão da autoridade policial. Então, o que o CNIg legislava pela resolução normativa, de que qualquer autoridade, até mesmo trabalhista, que constatasse violação de direitos humanos concedesse a residência àquela vítima, o que é uma situação básica para restabelecer o direito daquelas pessoas violadas, quando chega à portaria do Ministério da Justiça, restringe-se a decisão à autoridade policial.
Então, são situações em que a gente percebe uma dissonância. E eu acredito que não é o único motivo, mas um dos motivos também, por termos essa dissonância, é também esse órgão, que era tão importante, que tinha um protagonismo do Ministério do Trabalho, que era o CNIg, que estabelecia as políticas migratórias laborais, hoje não tem diálogo, ou esse diálogo está muito diminuído com as políticas trabalhistas.
Então, nesse sentido, como representante do Sinait, eu venho advogar pelo necessário retorno do CNIg ao Ministério do Trabalho e Emprego.
O trabalho digno e o amplo acesso aos direitos sociais passam preponderantemente pela criação de políticas trabalhistas que sejam capazes de alcançar os trabalhadores nacionais e não nacionais. Então, a gente defende que a política migratória deva ser discutida e desenvolvida prioritariamente no Ministério do Trabalho e Emprego, sob o manto de um órgão que tem entre as suas atribuições as políticas trabalhistas, sociais e de direitos humanos.
Bom, era isso que eu tinha para falar. E agradeço muito a oportunidade. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Muito bem, muito bem, Dra. Lívia dos Santos Ferreira, Auditora Fiscal do Trabalho, que deixa uma série de sugestões no campo da legislação, desde esse retorno do CNIg, de que você falou durante todo o tempo, e também outras contribuições às relações.
E eu só peço então que todas as falas fiquem aqui na Comissão. A Comissão depois fará um resumo, e a gente estabelece um diálogo com o nosso Governo, que é um Governo de diálogo, para ver no que é possível avançarmos.
R
Claro que a gente não decide aqui, mas o que chega a gente encaminha para os órgãos competentes na busca do melhor entendimento em relação às políticas humanitárias.
Parabéns pela sua fala!
Por favor, Dr. Paulo Sérgio de Almeida, Oficial de Meios de Vida do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados.
Vamos já combinar: dez minutos, com mais cinco.
O SR. PAULO SÉRGIO DE ALMEIDA (Para expor.) - Obrigado, Senador.
Bom dia a todas as pessoas aqui presentes.
Eu gostaria de agradecer, em nome da agência da ONU para refugiados, o Acnur, o convite da Comissão para que a gente pudesse estar presente neste importante debate.
Quero saudar aqui o Senador Paulo Paim, saudar os demais integrantes da mesa, saudar também todas as pessoas que nos acompanham, presentes aqui neste Plenário e também pela internet, saudar colegas que aqui estão também de outros órgãos, dos ministérios, do Ministério da Justiça, do Ministério do Trabalho, enfim, e também saudar as pessoas refugiadas, as pessoas migrantes que estejam aqui conosco neste momento.
Primeiro, eu queria parabenizar o Parlamento brasileiro, por meio da Comissão Mista, pelo trabalho, na verdade, que vem realizando, Senador Paim. Acho que é um trabalho muito importante de analisar a questão da migração, a questão do refúgio. E eu tenho certeza de que o trabalho desta Comissão vai levar a melhorias no processo de acolhida dessa população aqui no Brasil.
De fato, o foco em pessoas refugiadas - eu já puxo um pouco para o tema do refúgio - é muito importante porque, como sabem, o contexto global no mundo atual é bastante desafiador. Nós passamos por um momento em que vemos o maior número, na história recente, de pessoas refugiadas buscando proteção em vários países no mundo. Nós estamos falando de 110 milhões de pessoas que foram forçadas a sair dos seus países, sair das suas casas, das suas cidades, como resultado de guerras, de conflitos, mas também de perseguições, perseguições pela sua opinião política, pela sua religião, por pertencer a um determinado grupo social ou etnia. Então, são pessoas que não têm outra opção que não sair do lugar onde vivem. Essas pessoas não gostariam de fazer isso, mas têm que fazer isso para salvar as suas vidas. Então, é um número que vem crescendo. Nos últimos dez anos, dobrou o número de pessoas nessa situação no mundo. Então, hoje uma a cada 74 pessoas no mundo é uma pessoa deslocada de forma forçada, e o Brasil não está fora desse contexto.
O Brasil também integra esse contexto de um número crescente de pessoas que se deslocam de maneira forçada para buscarem proteção aqui no território brasileiro. Então, nós estamos falando hoje de cerca de 650 mil pessoas de diferentes nacionalidades que vivem no Brasil na condição de pessoa refugiada reconhecida, de solicitante do reconhecimento dessa condição de refugiada, pessoas numa situação semelhante à de refugiado, pessoas com necessidade de proteção internacional.
R
Então, é um tema bastante importante.
O Brasil tem sido protagonista nessa questão, seja pela legislação moderna, uma legislação protetiva, uma legislação robusta e reconhecida internacionalmente, de acolhimento de pessoas refugiadas, pessoas que chegam e pedem refúgio, pessoas que entram com visto humanitário e depois pedem refúgio no Brasil... Então, o Brasil tem sido, de fato, um país que tem estabelecido políticas bastante importantes no acolhimento dessa população, que, como eu falei, é de diferentes nacionalidades. Nós estamos falando de pessoas que vêm da Venezuela, do Haiti, do Afeganistão, mas também da Síria, da República Democrática do Congo, de diferentes países, e que encontram aqui um local onde podem preservar as suas vidas, mas também recomeçar as suas trajetórias, ter um futuro digno. Então, é isso que nós, como Acnur, buscamos junto ao Governo brasileiro.
E, de fato, reconstruir a vida significa... O primeiro passo para isso é, de fato, a inclusão no mercado de trabalho. É, de fato, a pessoa ter acesso ao mundo do trabalho. O Brasil tem uma legislação, aqui já foi várias vezes mencionado isso, uma legislação muito favorável: refugiado, solicitante de refúgio e essas outras pessoas podem acessar, desde um ponto de vista legal, o mercado de trabalho. Porém, também, como aqui já ressaltado, na prática não é bem isso que acontece. O ambiente normativo é favorável, mas há diferentes obstáculos que muitas vezes vão impedir que essas pessoas de fato acessem esses direitos e de fato deem efetividade a esses direitos.
Enfim, aí eu queria trazer aqui algumas evidências disso, para que a gente... Porque é isso, na construção da política pública, na construção das estratégias das diferentes organizações, é importante que elas sejam construídas em cima de evidências. E um parceiro do Acnur, um dos parceiros do Acnur, que é o Banco Mundial, desenvolveu, em 2021, implementou, em 2021, conduziu, em 2021, uma pesquisa tentando mapear quais eram, naquela ocasião, os desafios à integração local de pessoas refugiadas no Brasil, e fez alguns achados bastante importantes. Por exemplo, pessoas refugiadas têm apenas 30% das chances de uma pessoa brasileira de conseguir uma vaga de emprego formal no Brasil. Apenas 30% das chances. Então, isso claramente nos mostrou o quê? Que essas pessoas estão ficando para trás no que diz respeito à inclusão do mercado de trabalho. Mas não só. O tema de acesso à educação de crianças e adolescentes também é um tema bastante importante. O tema de acesso à assistência social. Então, são todos esses direitos, serviços previstos na legislação, mas, na prática, as pessoas não têm os mesmos acessos que a população brasileira tem, nas mesmas condições.
R
Uma outra questão importante que essa pesquisa revelou é que quando as pessoas refugiadas acessam o mercado de trabalho, elas o fazem numa situação de rebaixamento ocupacional. Ou seja, a pessoa tem uma formação, a pessoa exercia uma profissão no seu país de origem, mas, quando chega aqui, ela não consegue atuar na mesma profissão, na mesma ocupação, e ela acaba aceitando outros empregos, empregos abaixo da sua qualificação por uma questão de sobrevivência.
Então, a questão da inserção no mercado de trabalho é um tema e a qualidade dessa inserção no mercado de trabalho também é um tema bastante importante.
E aí, quando a gente olha os dados do próprio Cadastro Único do Ministério de Desenvolvimento Social e como essa população acessa o CadÚnico, a gente percebe que é uma população que tem níveis de pobreza e extrema pobreza maiores do que a população brasileira.
Então, essa falta de acesso ao mercado de trabalho, essa inserção com uma qualidade não adequada levam a que essas pessoas estejam numa situação de pobreza e extrema pobreza pior, vamos dizer assim, do que a própria população brasileira.
Então, isso nos indica claramente a necessidade de uma série de ações em relação ao que está por trás disso. E a pesquisa também indica...
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO SÉRGIO DE ALMEIDA - ... então, por exemplo, a baixa proficiência no português é um tema. Então, é fundamental que as pessoas possam acessar cursos, aprender o português. Isso faz uma diferença enorme na inserção no mercado de trabalho.
O insuficiente acesso a mecanismos de intermediação de mão de obra. Então, é fundamental o Sine, os mecanismos para que a população possa acessar as oportunidades de emprego que existem e estejam disponíveis.
O tema da revalidação de diplomas e reconhecimento de certificados. É fundamental, Senador Paim, que possamos avançar na simplificação dessas legislações porque isso impacta sobremaneira a qualidade da inserção dessa população.
E um tema que também é muito importante é o maior acesso à informação e mecanismos mais efetivos para impedir isso que já foi também muito mencionado nessa mesa, que é a exploração laboral. Como já foi dito pelo diretor da OIT, o Vinícius Pinheiro, que eu cumprimento, populações de refugiados e imigrantes são mais vulneráveis à exploração laboral. Portanto, o Estado, a sociedade tem que ter uma atenção mais efetiva para que essa população não seja sujeita à exploração no mercado de trabalho.
E aí, eu queria trazer uma questão que é o seguinte, quando a gente fala de população refugiada e imigrante, a gente está falando de fluxos de diferentes partes do território brasileiro, mas fluxos importantes na Região Norte do Brasil. E o Estado de Roraima é um estado que tem recebido um fluxo importante e é um estado que, como a gente sabe, não tem uma economia capaz de absorver a quantidade de pessoas que está chegando. A pessoa entra por Roraima, mas ela vai para outras partes do Brasil.
Então, lá atrás, aqui foi mencionado o Conselho Nacional de Imigração. Lá atrás, o CNIg apoiou, junto com o Observatório das Migrações, uma pesquisa para entender se as pessoas queriam ou não ficar em Roraima.
R
E aí, naquela época, mais de 70% das pessoas indicavam que, se tivessem apoio, elas gostariam de ir para outras partes do Brasil, porque é isso. Pela falta de condições econômicas, as pessoas vão ficando em abrigos, numa situação nada adequada, e, quando as pessoas permanecem por um longo tempo abrigadas, as pessoas não podem ficar tanto tempo abrigadas, isso acaba afetando os seus próprios direitos fundamentais. Então, lá atrás foi feito isso e foi estabelecida uma estratégia de interiorização voluntária, ou seja, as pessoas que voluntariamente e assim desejassem poderiam ter acesso a oportunidades de inclusão em outros estados brasileiros. Eu gostaria de dizer que, talvez, a estratégia de interiorização tenha sido um dos mecanismos mais efetivos - mais efetivos - de acesso dessa população à oportunidade de trabalho, à inserção no mercado de trabalho em outros estados brasileiros, porque, lá onde elas estavam, isso não era possível.
Então, o Acnur - junto com o Unfpa, junto com a ONU Mulheres e com o apoio da Universidade Federal de Minas Gerais e com a parceria com a Universidade Federal de Roraima - implementou uma série de pesquisas para entender a situação das pessoas que foram interiorizadas. E esses são dados muito reveladores, porque, por exemplo, mostram que as pessoas que foram realocadas voluntariamente, que o nível de desocupação delas é quase três vezes menor que o das pessoas que permanecem acolhidas lá em Roraima. Então, elas têm uma inserção no mercado de trabalho muito maior, é quase três vezes menor o índice de desocupação. É claro que existe uma questão aqui entre gêneros, ou seja, mulheres têm uma inserção menor do que os homens, isso é importante registrar, essa é uma questão que precisa ser aperfeiçoada. Então, a taxa de desemprego, por exemplo, a taxa de desocupação entre mulheres interiorizadas é muito superior à taxa de desocupação da população masculina.
Então, é uma população que acabou conseguindo se inserir no mercado de trabalho, como eu falei, muito pelo emprego formal, mas também com uma taxa alta de informalidade, isso é importante registrar. E o rendimento dessa população que foi interiorizada também é algo que vale a pena pontuar, porque a pesquisa indica que as pessoas que foram interiorizadas têm rendimentos...
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO SÉRGIO DE ALMEIDA - ... duas vezes maiores do que as pessoas que ficaram em Roraima. E isso é algo que para nós é bastante importante e que precisa ser aperfeiçoado, mas é preciso ter um olhar também para essas estratégias para que as pessoas possam acessar locais com melhores oportunidades de emprego.
E, para concluir, eu também gostaria de mencionar uma outra questão, que é o tema do português, do ensino do português. Também a gente tem pesquisas que indicam que a pessoa que tem proficiência no português tem 42% a mais de chance de conseguir um emprego no mercado de trabalho formal, e isso tem uma consequência de renda para essa pessoa. Então, as pessoas que conseguem falar português vão estar melhor empregadas, vão gerar renda, pagar impostos, gerando uma melhor situação, inclusive, para as próprias comunidades de acolhida. Então, investir em programas públicos... As despesas com programas públicos de ensino de português não são despesas, são investimentos. Isso vai gerar, depois, repercussões em termos de maior arrecadação de impostos e outros benefícios que isso traz para essas pessoas.
Para concluir mesmo, é importante que, quando a gente olhar para essa população...
(Soa a campainha.)
R
O SR. PAULO SÉRGIO DE ALMEIDA - ... a gente olhe não só para perfis de mulheres, mas também para mulheres chefes de famílias monoparentais e outras pessoas que tenham perfis ainda mais complexos e que precisam ter um olhar das políticas públicas, e também para as nacionalidades, porque isso também impacta o processo de integração.
Desculpe se me alonguei, Senador.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Não, ficou dentro do tempo. (Palmas.)
Muito bem, Dr. Paulo Sérgio de Almeida, Oficial de Meios de Vida do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), que traz pesquisas muito interessantes e muito preocupantes também.
Os dados são alarmantes, tudo o que eu ouvi aqui - que nós ouvimos -, mas vai ser muito bom para esta Comissão trabalhar em cima de tudo o que foi colocado aqui.
Eu pediria a esta Mesa que, se puder retornar para o Plenário, eu chamarei a segunda Mesa.
Fica aqui uma salva de palmas a todos pelo brilhante trabalho que estão fazendo. (Palmas.)
Tem uma frase que eu uso muito: fizemos muito, mas temos que fazer muito, muito mais.
Obrigado a todos. Obrigado.
Obrigado, Doutora. Obrigado, Doutor. (Pausa.)
Chamamos, de imediato, a Coordenadora-Geral do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) do Departamento de Migrações da Secretaria Nacional de Justiça, Dra. Luana Medeiros, a quem eu recebo com o mesmo carinho de todos os outros. (Palmas.)
Dra. Patrícia Gimenez Camargo, representante do Sindicato Nacional dos Tradutores; seja bem-vinda.
Convido Angel Mesias, migrante venezuelano, que me informaram que está a caminho. Teve um acidente na ponte, por isso ele está ainda atrasado, mas virá.
Seja bem-vinda, doutora.
Convido Marina Rongo, Assessora de Fortalecimento do Espaço Democrático da Conectas Direitos Humanos.
E já vou convidar também... a Marina terá participação remota, e já anuncio também Niusarete Margarida de Lima, Coordenadora de Atenção ao Migrante e Refugiados no Sistema Único de Assistência Social e Coordenadora do Subcomitê Federal para Acolhimento e para Interiorização. Ela também estará remotamente.
E Lutiana Valadares Fernandes, Defensora Pública Federal, com participação remota.
Então, vamos de imediato com os que estão aqui na Mesa e vamos intercalando.
Dra. Luana, por favor. (Pausa.)
Assessoria é para isso, não é?
Pediram-me que eu desse dois informes.
Gostaríamos de chamar a atenção para a grave crise humanitária resultante da saída das tropas americanas do Afeganistão, em 30 de agosto, há dois anos.
Nesse contexto, o Brasil desempenha um papel fundamental no acolhimento dessas pessoas vulneráveis.
Solicitamos que, durante a reunião da Comissão de Migrações e Refugiados, seja feita uma menção ao ato político que representa a saída das tropas americanas e que essa questão seja colocada em pauta para as futuras discussões.
R
É crucial que a Comissão esteja ciente dessa crise humanitária e que esteja disposta a debater e tomar medidas para lidar com essa situação de forma humanitária e efetiva.
Agradecemos, antecipadamente, pela atenção e pelo comprometimento com essa questão tão importante.
Atenciosamente,
Joyce Matias, Presidente Nacional da UGM (União Global das Mulheres).
Está feito o registro e nós passaremos à Presidente da Comissão.
Está presente, também, na Comissão, o Diretor de Relações Institucionais da Casa Venezuela BR, o Sr. Tomas Alejandro Guzman.
Está feito também o registro e vamos, de imediatamente, para a Dra. Luana, Coordenadora-Geral do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), do Departamento de Migração da Secretaria Nacional de Justiça.
A SRA. LUANA MARIA GUIMARÃES CASTELO BRANCO MEDEIROS (Para expor.) - Bom dia a todas as pessoas aqui presentes.
De início, eu gostaria de agradecer, em nome do Ministro Flávio Dino e do Secretário Nacional de Justiça, Augusto de Arruda Botelho, o convite para que o Ministério da Justiça e Segurança Pública compartilhasse com esta Comissão os seus entendimentos, as suas ações, sobre esse importante tema para a população migrante, refugiada e apátrida no Brasil. Cumprimento os meus colegas de mesa, na pessoa da minha colega de trabalho e amiga, Niusarete Margarida, que nos acompanha online.
Eu me permito, também, fazer um agradecimento ao Coordenador-Geral de Migração Laboral, que, oficialmente, deveria estar aqui no meu lugar, mas que não pôde comparecer hoje à audiência, o colega Jonatas Pabst, porque estamos, neste momento, na terceira reunião anual do Conselho Nacional de Imigração, mencionado aqui anteriormente. Então, é até oportuno que esta audiência ocorra justamente no dia de uma reunião nacional do CNIg.
Então, falando um pouco já da pauta da nossa conversa aqui de hoje. Como é do conhecimento, eu acredito, de todos aqui presentes, em janeiro deste ano, o Ministro Flávio Dino lançou uma portaria determinando que a Secretaria Nacional de Justiça regulamentasse o art. 120 da Lei nº 13.445, de 2017, a Lei de Imigrações, para que, depois de muitos anos de espera - o que também já foi comentado aqui pela colega do Sindicato dos Auditores Fiscais do Trabalho - fosse criada a tão esperada Política Nacional de Migrações, Refúgio e Apatridia.
A forma de trabalho escolhida pelo Ministério da Justiça para regulamentar esse artigo, para iniciar e construir essa política, foi a criação de um grupo de trabalho com a participação de diversos órgãos do poder público, ministérios, secretarias de Estado, secretarias de municípios, órgãos de controlo e promoção de direito, como o Ministério Público do Trabalho, que também participou desta mesa, representantes da academia, de diferentes organizações da sociedade civil e participação também, direta, de migrantes, refugiados e apátridas.
O GT iniciou os seus trabalhos com cinco eixos de discussão. Desses cinco, eu gostaria de destacar dois que estão muito afetos à matéria que a gente discute hoje, que são justamente a promoção e a proteção de direitos, com foco também em combate ao racismo e à xenofobia, e a integração local.
Entre os diferentes objetivos, entre os diversos objetivos dessas discussões, desses eixos, estava justamente realizar um diagnóstico da situação, da integração local, da participação social e da promoção de direitos de migrantes, refugiados e apátridas no Brasil, mapear boas práticas locais, internacionais, que vêm sendo feitas, que vêm sendo construídas historicamente nesse tema e, principalmente, identificar necessidades de ação do Estado em temas como saúde, educação, participação social e, obviamente, acesso ao trabalho e emprego dignos e justos.
R
E aqui eu gostaria de destacar que o objetivo do Ministério da Justiça ao criar essa política nacional é que as ações na área migratória do Governo Federal do Brasil como um todo, do Estado brasileiro sobrepassassem a mera regulamentação, a regularização documental do migrante e as ações emergenciais que também já foram mencionadas aqui. A nossa ideia não é, também, criar sistemas paralelos de atenção a migrantes, refugiados e apátridas; muito pelo contrário, a ideia é assegurar, garantir que o direito constitucional de acesso às políticas públicas, que está lá no art. 5º, que garante os direitos e o acesso a todas as políticas públicas brasileiras a todas as pessoas que estão aqui no nosso território, independentemente de sua nacionalidade e de seu status migratório, que esse direito seja efetivamente concretizado nas diferentes políticas públicas que existem aqui no Brasil, quer seja pelo Sine, quer seja no Suas, quer seja no SUS, na área educacional.
Obviamente que a gente sabe que adaptações, quer sejam linguísticas, quer sejam interpretações culturais, são necessárias e é importante que essa política consiga trazer esses instrumentos necessários, instrumentos concretos que sejam necessários para que essas adaptações ocorram e políticas específicas sejam desenvolvidas quando necessárias.
Algumas importantes constatações que nasceram desse trabalho do GT é que, obviamente, o trabalho precisa ser feito de forma transversal e integrada e em coordenação federativa, porque os migrantes, refugiados e apátridas, como todos nós brasileiros, vivem em suas cidades e estados. É o estado, é a cidade, é o município, é o território que vai ser o contato direto com aquela população.
Então, o Governo Federal precisa atuar, obviamente, com capacitação técnica, com recursos financeiros, sempre que possível, oportunos e necessários, mas, principalmente, na parte da coordenação dessa política, fornecendo os instrumentos e mapeando as necessidades de ações e melhorias.
Trazendo, agora, para as ações concretas que o Ministério da Justiça tem feito nesta área, eu gostaria de iniciar a minha fala neste tema ressaltando uma parceria que, este ano, completa dez anos, que é a parceria com o Observatório das Migrações, o Obmigra, que foi citado aqui na fala introdutória do Senador Paulo Paim.
Enfim, o Paulo Sérgio, colega que está aqui, participou lá, há dez anos, do começo dessa empreitada. O Obmigra é um observatório, é um instituto de pesquisa, vinculado à Universidade de Brasília, que estuda o fenômeno das migrações internacionais no Brasil e tem, historicamente sempre teve, um foco muito grande na inserção laboral desses migrantes, refugiados e apátridas no Brasil. O Obmigra compila, reúne uma série de dados de diferentes sistemas do Governo Federal, desde os sistemas de migração, de autorização de residência, de refúgio, os sistemas do Ministério do Trabalho, os sistemas da Receita Federal, do Ministério das Relações Exteriores, e produz, anualmente, relatórios críticos que fazem uma análise das tendências da migração no país e uma análise também regionalizada, focada em cidades, focada no perfil sociodemográfico dos migrantes que aqui estão.
R
Anualmente, entre os seus diversos estudos, o Obmigra divulga um relatório que a gente chama de Dados Consolidados da Imigração, que sugiro que todos consultem aí no nosso Portal de Imigração. Está disponível. Como eu falei, esse estudo mostra as tendências, em números, dos fluxos migratórios que chegam ao país, sua distribuição geográfica no território nacional, destacando os diferentes aspectos em que a migração contribui para o crescimento da economia brasileira.
O último relatório, que foi lançado agora em junho deste ano, trouxe algumas informações bem interessantes, que eu vou compartilhar aqui com vocês muito rapidamente.
Primeiro, o aumento, que já foi mencionado aqui também, acredito, pelo colega da OIT, do número de mulheres e crianças no fluxo migratório. Não obstante a maior participação de pessoas em idade ativa, ali dos 25 aos 39 anos, ou melhor, que a maior parte dos migrantes esteja entre os 25 e os 39 anos, os migrantes menores de 15 anos já superam as pessoas acima de 40 anos. Então, a gente tem um número muito grande de migrantes - 50 mil - menores de 14 anos que ingressaram no Brasil, no ano passado.
Outro número que também gostaria de destacar é que, no ano passado, foram concedidas mais de 25 mil autorizações de residência, com base laboral, aqui no Brasil, quer seja pela Resolução n° 02, já mencionada pela colega auditora fiscal, quer seja por uma resolução de estudo, pesquisa ou investimento. As principais nacionalidades que obtiveram autorizações de residência foram os filipinos, chineses, estado-unidenses e britânicos. Esse perfil de imigrantes que receberam autorização para fins laborais e de investimento foram, majoritariamente, homens com idades entre 35 a 49 anos, com ensino superior ou médio completo.
O relatório do Obmigra também destaca que o mercado se recuperou um pouco, em 2022, depois da pandemia, e que foram criadas mais de 35 mil vagas para migrantes no Brasil - vagas de trabalho formal.
(Soa a campainha.)
A SRA. LUANA MARIA GUIMARÃES CASTELO BRANCO MEDEIROS - Estou quase na metade da minha apresentação. Então, vou chegar lá! (Risos.)
Vagas de trabalhos formais. E o principal número de imigrantes empregados no país são os venezuelanos, com 147 mil movimentações laborais; os haitianos, com 62 mil movimentações laborais no ano passado.
Um outro dado que eu gostaria de destacar é que nós temos um tipo de autorização de residência, que é a autorização para fins de investimento, que eu acho que é muito importante que a gente relembre à nossa população que a migração também contribui bastante, significativamente, para o desenvolvimento da economia brasileira. Só no ano passado, foram R$336 milhões investidos no Brasil pelos imigrantes.
Enfim, é um relatório muito rico. Não posso trazer tudo aqui, mas eu sugiro que todo mundo consulte não só o deste ano, mas os dos anos anteriores.
E, sobre essa parceria, eu queria destacar que o Brasil é um dos únicos países do mundo, se não o único, que consegue produzir mensalmente dados sobre imigração. Isso demonstra uma institucionalização das políticas, mas também a importância que é dada ao tema nos diferentes órgãos de governo. E vale ressaltar que a produção de dados e estudos não é um fim em si mesma quando a gente fala de políticas públicas; ela é ensino, porque, obviamente, para você desenvolver políticas públicas de qualidade você precisa de dados, saber quem são e onde estão aquelas pessoas para quem a gente trabalha; ela funciona como catalisador para a produção de conhecimento sobre o tema, o que também retroalimenta o Estado com insumos para as políticas públicas; e, neste tema que a gente trata aqui especificamente, ela é muito importante para tornar o tema visível, e a gente sabe que isso é essencial na pauta migratória, principalmente quando a gente fala de combate à xenofobia e ao racismo para a população migrante, refugiada e apátrida.
R
Além dessa parceria do Obmigra, eu queria destacar algumas ações bem concretas do Ministério da Justiça e também alguns projetos que estão em desenvolvimento este ano - já estou finalizando, Senador. Um é um projeto de português como língua de acolhimento - foi mencionado aqui por vários dos colegas -; o primeiro entrave, a primeira barreira que o migrante precisa superar quando ele chega em um novo país é justamente o aprendizado do idioma. O idioma faz com que você aumente exponencialmente sua capacidade de obtenção de emprego, mas também que você consiga conviver com as pessoas que estão ao seu redor, que você comunique melhor no sistema de saúde quais são as suas deficiências, se comunique melhor na escola e em todas as outras políticas públicas e, enfim, em todos os outros aspectos, em geral, da vida em sociedade.
O Ministério da Justiça, por meio do Comitê Nacional para os Refugiados, do qual eu sou coordenadora, lançou agora em julho, um programa de português como língua de acolhimento focado na população haitiana, e é um programa diferente porque ele está formando multiplicadores de ensino de português. Então, nós, com a parceria do Acnur, selecionamos 20 pessoas, 20 nacionais haitianos que já têm o domínio da língua portuguesa e essas pessoas estão sendo capacitadas para ensinar português em suas comunidades. É um programa bastante inovador que tem um potencial de replicação e essas pessoas estão em todas as regiões do Brasil. Nós temos alunos de 19 cidades diferentes no Brasil todo.
Nós também temos cursos de educação financeira focados na população migrante. Este ano já realizamos turmas para a população indígena no Aral, turmas para migrantes empreendedores em São Paulo e estamos em conversa com a Receita Federal do Brasil para criar um programa semelhante de educação fiscal focado na população migrante, para, enfim, aprender a declarar o imposto de renda e todas as outras coisas que a gente faz todo ano no Brasil.
Eu gostaria também, já falando um pouco do que está em andamento, o Ministério da Justiça tem estudado e desempenhado muito em resgatar o protagonismo do Cnig na pauta migratória. Está em discussão a reformulação do comitê, sua ampliação, o resgate da participação social, o aumento do número de membros observadores. Eu acho que foi uma pauta, um ponto bastante importante resgatado pela colega que falou anteriormente.
Também mencionado pela colega, está em revisão, acho que na verdade já passou pela consultoria jurídica, a revisão da Portaria n° 87, que é a autorização de residência para vítimas de tráfico de pessoas, e muitas das colocações que foram feitas pela colega já estão contempladas nessa revisão. Também foi feito um grupo de trabalho com a participação do Ministério Público do Trabalho, com a participação da DPU e isso tudo, acredito, já esteja contemplado e espero que a nova portaria seja publicada em breve, pois já está em versões finais.
(Soa a campainha.)
A SRA. LUANA MARIA GUIMARÃES CASTELO BRANCO MEDEIROS - Uma última coisa que eu gostaria de destacar... Eu já não estou mais nem conseguindo entender a minha letra aqui.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Fique tranquila que ainda tem dois minutos.
A SRA. LUANA MARIA GUIMARÃES CASTELO BRANCO MEDEIROS - Dois minutos a mais.
Eu falo rápido porque no Piauí a gente fala assim. Vai ser rápido.
Enfim, nós também temos uma parceria com o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, em São Paulo. O Tribunal Regional do Trabalho tem um programa interno de empregos no próprio tribunal para populações vulneráveis e acredito que são 5%, e nós estamos sugerindo que esse número seja aumentado, e o TRT, junto com o Conare - um desses públicos vulneráveis é justamente mulheres migrantes -, e junto com o TRT nós estamos fazendo esse mapeamento das pessoas, sugestão de currículos para que essa população possa ser empregada nesse programa muito bom do tribunal.
R
É isso. Muito obrigada. O ministério fica à disposição.
(Soa a campainha.)
A SRA. LUANA MARIA GUIMARÃES CASTELO BRANCO MEDEIROS - E é isso. Obrigada, Senador. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Muito bem, muito bem, Luana Medeiros, Coordenadora-Geral do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) do Departamento de Migrações da Secretaria Nacional de Justiça, que coloca o ministério totalmente à disposição para o diálogo e, muitos talvez - talvez porque tem outros - fruto dessa audiência pública e, ao mesmo tempo, faz um relato das iniciativas do ministério.
De imediato, eu passo a palavra, porque ela está com problema também de deslocamento, para a Dra. Niusarete Margarida de Lima, coordenadora de Atenção ao Migrante e Refugiados no Sistema Único de Assistência Social e Coordenadora do Subcomitê Federal para Acolhimento e para Interiorização.
Já registro a presença na mesa do Sr. Angel Mesias, imigrante venezuelano. Seja bem-vindo. Como fiz com todos que aqui chegaram nossas palmas a você.
O SR. ANGEL MESIAS (Fora do microfone.) - Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Nesse momento, eu passo a palavra, então, à Dra. Niusarete Margarida de Lima.
Ela estava com problema de horário e pediu para ser chamada logo que você terminasse.
Ela me informa... Oi!
A SRA. NIUSARETE MARGARIDA DE LIMA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Oi, vamos lá.
A SRA. NIUSARETE MARGARIDA DE LIMA (Por videoconferência.) - Bom dia, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Bom dia.
A SRA. NIUSARETE MARGARIDA DE LIMA (Por videoconferência.) - É que o áudio não estava liberado ainda.
Bom dia, Senador. É uma alegria estar aqui, participando desta audiência conduzida pelo senhor, já grande parceiro de longas datas. Somos parceiros na área de direitos humanos já há muitos anos, não é, Senador?
Muito obrigada. Então, eu cumprimento a todos os Parlamentares na pessoa do senhor e cumprimento aos demais, que estão assistindo online e também presencialmente na pessoa do Angel, migrante, porque eu acho que a política nacional, uma política nacional, qualquer ação na área de migração a gente tem de o fazer na presença e com a participação dos migrantes refugiados, porque eu acho que é aquele nosso lema antigo: "nada para nós sem nós". Então, acho, Angel, muito bom, ter você aí à mesa também.
Realmente, eu estou aqui numa pauta, exatamente nessa área de monitoramento e acompanhamento de migrações e refúgio aqui, em Roraima. Estivemos em Pacaraima também na fronteira. Então, eu estou aqui numa agenda bem ligada ao tema.
E eu gostaria, para iniciar, também, de fazer um pouquinho uma retrospectiva da nossa atuação enquanto Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome na coordenação, do Subcomitê Federal para Acolhimento e Interiorização, daqui, da migração venezuelana, que é uma migração que a gente está vivenciando muito mais intensa nos últimos tempos.
Então, nós estamos aqui, coordenando toda essa parte aqui, na fronteira, em parceria com o Ministério da Defesa, com as agências da ONU, na coordenação do Comitê Federal de Assistência Emergencial da Casa Civil e estamos aqui mensalmente, acompanhando e monitorando.
Realmente, já foi falada, pelos meus colegas, uma série de informações da entrada. A gente continua ainda tendo uma entrada de em torno de 300, 400 pessoas/dia, permanecendo no Brasil. Então, ainda temos que a trabalhar muito fortemente na ampliação desse deslocamento voluntário das pessoas para outras unidades da Federação, no intuito de desafogar um pouco todas essas estruturas aqui, em Roraima, que não comportam uma entrada ainda tão intensa se a gente não tiver uma outra estratégia de deslocamento.
R
Bem, a gente vem trabalhando, então, nessa articulação com os demais entes federados, no intuito de fazer esses deslocamentos. A Operação Acolhida é uma referência aí mundial de acolhida humanitária no mundo, mas nós ainda temos que melhorar muito, ainda temos que trabalhar muito juntos, para que a gente possa oportunizar a esses migrantes refugiados condições dignas de trabalho e de inclusão socioeconômica em nosso país.
Para o senhor ter ideia, nós trabalhamos aí nos três eixos. Luana falou um pouco aí também e o Paulo Sérgio também, do Acnur, nosso parceiro aí no acolhimento desses imigrantes. Nós ainda temos essa entrada intensa na fronteira, no acolhimento da fronteira, mas estamos conseguindo aprimorar os serviços já na entrada da fronteira com relação à regularização migratória.
Recentemente, o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social implantou, já na fronteira, um posto do Cadastro Único, para que essas pessoas já saiam com a documentação regularizada e já sejam cadastrados no Cadastro Único, já na fronteira, no intuito de a gente desafogar um pouco os equipamentos da assistência social dos territórios. Agora, em setembro, vamos inaugurar um outro posto também aqui, em Boa Vista, no Ptrig de Boa Vista, intuito de o imigrante já ser informado dos direitos, dos benefícios socioassistenciais que ele tem no nosso país.
Nós ainda temos, Senador, em torno de 7 mil, quase 7,5 mil pessoas abrigadas nos abrigos de gestão federal, em parceria com o Acnur.
Quanto a essas pessoas abrigadas, ainda temos que trabalhar para que elas sejam deslocadas voluntariamente, obviamente, para outras unidades da Federação. São em torno de, mais ou menos, 2.685 pessoas, nas idades de 18 a 59 anos; portanto, numa idade laboral ativa. Então, para essas pessoas, nós também precisamos trabalhar muito em sintonia com a sociedade, para que toda essa parte que foi colocada já aí, de discriminação, de xenofobia, de falta de conhecimento de que essas pessoas têm direitos no nosso país... para que elas tenham acesso.
Dessas pessoas abrigadas, nós ainda temos em torno de 2 mil pessoas, que são grupos familiares, e em torno de 1,5 mil mulheres chefes de família; são mais ou menos 165 a 200 pessoas idosas, com quem ainda a gente tem que trabalhar também, porque, embora sejam pessoas já na faixa de 65 anos, de 60 para cima, são pessoas que ainda têm uma força de trabalho, e a gente também tem um desafio para que essas pessoas possam continuar produzindo e tendo autonomia.
Nós ainda temos ainda um desafio muito grande aqui, na fronteira, em várias unidades da Federação, com a população indígena venezuelana. E aqui, em Roraima, só nos nossos abrigos de gestão federal, nós ainda temos em torno de 2 mil indígenas venezuelanos acolhidos e que também participam dessa estratégia da interiorização.
Nesse processo, como o Paulo Sérgio colocou, da estratégia, em que a gente considera efetiva à interiorização, da possibilidade do deslocamento voluntário dessas pessoas para serem inseridas socioeconomicamente em outras unidades da federação, até julho, em torno de 110 mil pessoas nós já interiorizamos para mais de 970 municípios, ou seja, precisamos de que as outras unidades da Federação também nos deem condições de deslocamento para outras unidades. Nós temos aí já mais de 5,5 mil municípios. Então, a gente precisa também expandir para outras unidades da Federação.
R
Essas pessoas contam com o apoio da nossa rede de assistência social. São em torno de mais de 8,5 mil Cras espalhados por todo o país, que contribuem para a orientação dessas pessoas que são interiorizadas, para a possibilidade dessa inclusão socioeconômica. Eles estão, sim, tendo acesso aos benefícios socioassistenciais, embora a gente precise ainda melhorar essa estratégia de comunicação.
Para o senhor e todos que estão nos assistindo terem ideia, nós temos em torno de 249 mil migrantes refugiados venezuelanos no Cadastro Único - isso são dados de junho -, e, desses, 141 mil receberam, em junho, o Bolsa Família. E ainda temos também o benefício de prestação continuada para pessoa com deficiência. Há em torno de 4 mil pessoas recebendo o benefício de prestação continuada.
Na estratégia de interiorização, embora a gente já tenha interiorizado mais de 110 mil pessoas, apenas 12% dessa população foram interiorizados já com vaga de emprego sinalizada, que é uma das nossas modalidades. E aí o Paulo Sérgio, do Acnur, já citou as pesquisas que foram feitas, indicando que é uma força de trabalho, sim, que se mantém no emprego, mas a gente precisa melhorar as condições de acesso, porque, muitas vezes, essas pessoas estão indo para postos de trabalho aquém da sua formação e da sua capacidade laboral. Então, a gente precisa oportunizar a esses migrantes refugiados a questão da melhoria do curso português e a questão da revalidação dos diplomas, para que eles possam, efetivamente, contribuir com o nosso país, com a força de trabalho e com seu perfil laboral adequado. Então, nisso ainda a gente precisa melhorar muito.
Precisamos também - é um dos desafios que a gente tem - da compreensão da sociedade brasileira com relação à diversidade cultural que nós temos também. Então, oportunizar esses mediadores interculturais também, porque a gente precisa não apenas dizer que eles precisam falar o português, que eles precisam nos entender, mas nós precisamos compreendê-los também. Então, tem também toda a questão da capacitação de profissionais e idiomas, não apenas do migrante no nosso português, mas também das nossas equipes em todas as áreas para que tenham capacitação para poder contribuir melhor para isso.
E aí, Senador - eu tenho a mania, o pessoal diz que eu falo muito -, também eu penso que nós precisamos sair de apenas citações de marco legal - e a nossa legislação é aberta, perfeita, em termos de direitos humanos - e dizer que temos uma legislação nisso, nisso e nisso, para partir para ações concretas e realmente implementar o direito do migrante refugiado de acordo com o seu direito e igualdade de condições com nacionais, porque todos nós somos responsáveis por isso.
Nós estamos, neste Governo, ampliando...
(Soa a campainha.)
A SRA. NIUSARETE MARGARIDA DE LIMA (Por videoconferência.) - ... essa compreensão não apenas na área da assistência social e na área da Justiça, mas em outros ministérios também. O Presidente Lula, na nova estrutura de Governo, já aprovou. A gente já tem várias instâncias, em diferentes ministérios, cuidando da parte de migração e refúgio. Como exemplo, no Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, tem uma coordenação-geral de migração, de emergência e calamidade, que é para abarcar toda a questão da migração e refúgio também.
Estamos trabalhando numa câmara técnica para dentro do Suas, mas com a participação dos ministérios setoriais também, no intuito de não pensarmos apenas a migração como uma situação de emergência, mas já termos, nas nossas tipificações, medidas que a gente possa implementar imediatamente, no momento em que estivermos vivenciando uma situação de emergência, para que a gente não se assuste e não tenha tanta dificuldade como nós tivemos com a migração venezuelana no nosso país.
R
Nós estamos aqui, Senador, em Roraima. Estou aqui com uma comitiva de, em torno, 12 pessoas do Ministério da Educação, porque eu penso que a educação é uma das pautas em que a gente precisa implementar ações mais efetivas, principalmente aqui, na fronteira, para que as pessoas tenham essa oportunidade de equivalência na área educacional, de revalidação de diplomas, de formação de professores, de formação dos próprios imigrantes e de professores imigrantes também.
Então, a gente está aqui numa pauta das principais secretarias do Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, Superior, do FNDE e da Capes. Nós já tivemos aqui articulações com a Universidade Federal de Roraima e com o Instituto Federal de Roraima. Hoje teremos uma reunião com a Secretaria Municipal de Educação e ontem estivemos com a Secretaria de Estado, no intuito de o Governo Federal apoiar efetivamente os entes federados e, principalmente, aqui, em Roraima, nessa questão de ampliação da educação na área dessa imigração e refúgio.
Eu penso que já vamos sair daqui com algumas pautas e alguns encaminhamentos bem interessantes para que a gente possa mitigar as dificuldades que não só os profissionais da rede têm, mas principalmente que os imigrantes também tenham.
Então, eu penso que, nesse sentido, nós vamos já, partindo para algumas medidas efetivas, como eu disse anteriormente, ao invés de ficar apenas nas citações da legislação, mas na implementação de ações que possam beneficiar os imigrantes e refugiados.
Temos também algumas ações que nós apoiamos para os entes federados. Tem uma determinação do nosso Ministro Wellington Dias e também do nosso Secretário de Assistência Social André Quintão e estamos na qualificação das equipes da Secretaria do Cadastro Único também, no sentido de ampliar essa cobertura do Cadastro Único. Essa pauta da educação é também uma pauta importante porque nós temos as condicionalidades de acesso ao Cadastro Único e, se a gente não implementar ações de acesso a essas crianças, por exemplo, às escolas, tanto nas fronteiras como nos destinos, estaremos impedindo o acesso dessas pessoas aos benefícios socioassistenciais a que têm direito.
Então, é uma determinação do nosso ministro apoiar e estar próximo dos entes federados, principalmente oportunizando aos imigrantes o acesso a todos esses benefícios que nós temos.
Estamos também apoiando os entes federais, estados e municípios, aqueles municípios que estão tendo uma grande demanda também, a exemplo da imigração afegã. Estamos com uma equipe também já em articulação com o Ministério da Justiça e Direitos Humanos apoiando lá, no Estado de São Paulo, o Município de Guarulhos, no intuito de oportunizar a esses imigrantes afegãos também condições mais ágeis de acolhimento e também encaminhamento aos direitos a que eles fazem jus.
Eu fico por aqui, Senador, acho que os meus colegas já passaram muito sobre a questão de indicadores e de dados e coloco o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome à disposição de todos vocês.
Convido-os a visitar aqui (Falha no áudio.)... porque é uma experiência única, e é muito importante que todos conheçam para que possam implementar ações nos seus territórios. Inclusive Parlamentares que não conheçam, é interessante que conheçam para que a gente possa encaminhar medidas adequadas e em sintonia com as demandas que a gente tem aqui na fronteira também.
Muito obrigada e um abraço a todos vocês.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Muito bem. (Palmas.)
Os meus cumprimentos à Sra. Niusarete Margarida de Lima, Coordenadora de Atenção ao Migrante e Refugiados no Sistema Único de Assistência Social e Coordenadora do Subcomitê Federal para Acolhimento e Interiorização.
R
A Comissão já esteve aí com uma delegação grande, mas o convite sempre é bem-vindo, e seremos acolhidos, tenho certeza, na Operação Acolhida.
Parabéns pela sua fala.
As sugestões todas colocadas serão analisadas aqui pela Comissão e remetidas aos canais competentes.
Eu queria agora chamar Marina Rongo, Assessora de Fortalecimento do Espaço Democrático da Conectas Direitos Humanos.
A SRA. MARINA RONGO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos, todas e “todes”.
Cumprimento, na pessoa do Senador Paulo Paim, a Presidenta da Comissão, Senadora Mara Gabrilli; a Vice-Presidente, Deputada Carol Dartora; o Relator, Deputado Túlio Gadêlha; os demais membros da Comissão; os participantes e pessoas que acompanham a audiência.
Eu vou fazer brevemente minha descrição. Eu sou uma mulher branca, uso óculos, tenho cabelos castanhos, estou usando um casaco preto.
Bom, eu não vou me deter muito nos dados também, porque colegas já os expuseram brilhantemente aqui, e a gente pode perceber como trabalhadores migrantes são parte integrante da economia mundial. Os dados mais recentes mostram que os trabalhadores migrantes são 5% da força de trabalho global, e os números são impressionantes.
No Brasil, só no mercado formal, já é um número bastante grande, mas a gente sabe que esse número é muito maior pelo número de trabalhadores que se encontram no mercado informal, infelizmente, ainda.
A gente pode trazer dados aqui também mostrando como esses trabalhadores são importantes e contribuem para o desenvolvimento socioeconômico das comunidades que os acolhem. Então, por exemplo, a gente pode trazer um estudo, de 2020, da Fundação Getúlio Vargas, que revelou que o Estado de Roraima registrou indicadores positivos de atividade econômica no período de intensificação do fluxo venezuelano, com aumento de índices de exportação, crescimento de 25% no recolhimento de ICMS, crescimento do PIB da região acima da média de outros estados brasileiros, entre 2016 e 2017. Só alguns dados para a gente ver o quanto a migração também é uma parte importante do desenvolvimento socioeconômico.
Eu queria detalhar um pouco mais aqui sobre algo, que também já foi trazido, mas vamos estender um pouquinho mais, que é o instrumento internacional que assegura os princípios fundamentais e os direitos essenciais a esses trabalhadores migrantes, que é a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias. Ele é o único, dos nove grandes tratados de direitos humanos da ONU, que o Brasil ainda não ratificou, e nós somos uma das únicas nações sul-americanas que ainda não aderiram a esse instrumento.
A convenção foi adotada em 18 de dezembro de 1990 pela ONU, ou seja, há quase 33 anos, e entrou em vigor em 2003, portanto, há 20 anos, há bastante tempo.
R
A Mensagem presidencial nº 696, de 2010, que encaminhou o texto da convenção ao Congresso, tramitava há 12 anos na Câmara dos Deputados e recebeu um parecer favorável somente em dezembro do ano passado, em 2022, pela Comissão Especial. Essa Comissão transformou o texto no PDL 405, de 2022, e o encaminhou para Plenário, mas, até então, a gente não teve essa matéria em pauta.
Então, eu deixo aqui que é de extrema importância a gente ratificar esse instrumento, que o Congresso Nacional ratifique a Convenção, que, dentre outros avanços, submeteria o Brasil a ser revisado pelo Comitê da ONU sobre Trabalhadores Migrantes, composto por peritos independentes, responsáveis por verificar o grau de implementação da Convenção em cada país-membro, analisando medidas legislativas, judiciais, administrativas, dentre outras.
E é importante ressaltar ainda que a ratificação é objeto de nove recomendações feitas no último ciclo da Revisão Periódica Universal do Brasil e de outras sete no ciclo anterior, no terceiro ciclo. E aí, nesse sentido, eu gostaria de saudar também esta Comissão Mista sobre Migrações Internacionais e Refugiados pelo envio de ofício ao Presidente da Câmara dos Deputados, Presidente Arthur Lira, solicitando a tramitação mais célere do PDL 405, de 2022.
Outro ponto que eu gostaria de abordar aqui, que eu acho de extrema importância quando a gente trata de migração laboral, é a regularização migratória. Esse é um passo fundamental para garantir trabalhos mais dignos às pessoas migrantes, porque, quando elas estão indocumentadas, estão mais expostas a todos os tipos de exploração, de trabalho precário, de trabalho desprotegido.
O Comitê da ONU sobre Trabalhadores Migrantes aponta, em seus comentários gerais, que uma das formas mais eficazes de prevenir o tráfico de pessoas e contrabando de migrantes é promover o acesso de formas regulares de migração baseadas na demanda. O Pacto Global para uma Migração Segura, Ordenada e Regular, do qual o Brasil voltou a ser parte no início deste ano, estabelece, como um de seus 23 objetivos para a cooperação internacional no tema, aumentar a disponibilidade e a flexibilidade dos caminhos para a migração regular, e a própria Lei de Migração brasileira traz, como princípio, em seu art. 3º, a promoção da entrada regular e de regularização documental. No entanto, a gente sabe que ainda há muitas pessoas migrantes indocumentadas no Brasil, seja por consequência de políticas discriminatórias adotadas durante a pandemia, que geraram uma grande demanda reprimida por documentação, seja pela falta de hipótese de regularização para alguns grupos de migrantes.
Um primeiro passo importante seria regularizar todas as pessoas migrantes que se encontram no país, e, nesse sentido, é recomendada a aprovação do PL 7.876, de 2017, que se encontra na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados. E é importante dizer que, se o Brasil aprovasse esse projeto, não seria a primeira vez que o Brasil adotaria uma medida como essa, porque já foram aprovadas leis nesse sentido em 2009, 1998, 1985, 1980, então já é um processo que acontecia - não acontece há muito tempo, mas já aconteceu com alguma frequência -, e a própria Lei de Migração, aprovada pelo Congresso Nacional em 2017, previa concessão de regularização ampla a pessoas migrantes que tivessem entrado no país até julho de 2016, mas, infelizmente, esse dispositivo foi vetado pelo ex-Presidente Michel Temer. Por isso, eu reitero que seria essencial a aprovação do projeto, para diminuir consideravelmente o número de pessoas indocumentadas e, consequentemente, a sua situação de vulnerabilidade frente a essa condição.
R
Por outro lado, é preciso que sejam criadas normas que ofereçam soluções de mais longo prazo. Por exemplo, criar uma via de autorização de residência para microempreendedores individuais e, especialmente, vias para pessoas migrantes de nacionalidades com fluxo significativo para o Brasil, como Angola, Nigéria, Cuba. Nesses casos também seria uma medida importante de reparação histórica.
Além disso, também seria importante oferecer alternativas de regularização migratória às pessoas que apresentam riscos de retornar aos seus países, mas não necessariamente se encaixam na definição clássica de refúgio, e também para solicitantes de refúgio que tiverem seus pedidos indeferidos, após transcorrido muito tempo da solicitação, quando eles já estão estabelecidos no Brasil.
Por fim, eu também queria deixar a nossa felicidade com o anúncio da reformulação do CNIg. Também era um ponto que tinha colocado aqui de fala, mas fico feliz com o anúncio da Dra. Luana dessa reformulação que vai promover mais participação social.
(Soa a campainha.)
A SRA. MARINA RONGO - E o meu último ponto seria também algo que já foi trazido, sobre revalidação de diplomas, que é um passo essencial para que as pessoas migrantes possam atuar em suas áreas de formação.
Apesar de avanços recentes que saíram na Portaria 1.151, de 2023, ainda há dificuldades, e seria preciso haver mais incentivo para que as universidades disponibilizem vagas e que haja padronização em relação à cobrança de taxas, por exemplo.
Seria também necessária a garantia de que a pessoa que vai tentar a revalidação possa ter um número de tentativas que ela quiser e precisar, porque hoje esse número é limitado a duas tentativas, e também possivelmente seria ótima a criação de uma lei sobre o tema, porque hoje o tema é muito regulado por portarias, mas uma lei traria mais segurança e mais padronização para esse processo, que é muito importante para a inserção no mercado de trabalho formal dos trabalhadores migrantes.
Então, eu agradeço novamente pelo convite para participar desta importante audiência. Gostaria de colocar a Conectas à disposição para colaborar com os trabalhos da Comissão.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Muito bem, Marina Rongo, Assessora de Fortalecimento de Espaço Democrático na Conectas Direitos Humanos.
Eu pedi socorro aqui para a Luana, e ela me informou que o projeto a que tu te referes é do Orlando Silva. Está na Câmara dos Deputados, mas nós vamos fazer um movimento para ajudar, no sentido de que ele seja aprovado.
Tudo que você falou é importante. Destacou, como outros, o Revalida, para que isso permita que todos possam se habilitar na sua profissão.
De imediato, eu passo a palavra a Lutiana Valadares Fernandes, Defensora Pública Federal, também por via remota. Depois, nós teremos mais duas fala da mesa e encerramos.
R
A SRA. LUTIANA VALADARES FERNANDES (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde a todas e (Falha no áudio.)
Vocês me ouvem bem?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Ainda não, mas creio que vai dar certo. Tenta de novo. (Pausa.)
Olha, se não está conseguindo conectar, nós vamos ter que avançar aqui.
Enquanto esperamos um pouquinho para ver se ela consegue entrar, eu vou fazer algumas leituras que, por ordem de ofício, eu tenho que fazer.
Registramos a presença do Sr. Pablo Ribeiro, representante da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro.
Agora esses aqui são do e-Cidadania, que ficam registrados. Se um dos convidados que ainda não falou quiser usar o tempo para responder, fique à vontade. Nós passamos para vocês.
Perguntas do e-Cidadania:
Gabriela Araújo, do Rio de Janeiro: "Como as políticas de inclusão no mercado de trabalho estão impactando a experiência dos migrantes e refugiados no Brasil?".
José Roberto, do Paraná: "Existe possibilidade do Governo brasileiro desenvolver programas de incentivo ao empreendedorismo direcionados aos refugiados?".
Paulo Marcos, do Rio de Janeiro: "Há um órgão de fiscalização e controle para que estas pessoas não sejam submetidas a trabalhos escravos e desumanos?".
Maria Virgínia, de Minas Gerais: "Como funciona a revalidação de diploma para essas pessoas terem melhores condições de trabalho e oportunidades em suas áreas?".
Eu já vou passando aqui ao lado.
Ainda a Aynne Carmencita, de Rondônia: "Poderão existir incentivos ao ingresso em universidades e outros sistemas de ensino profissionalizante para os refugiados?".
Leomar de Franca, de Mato Grosso: "Há a possibilidade de criação de norma exigindo, de forma positivada, que todas as cidades tenham uma cobertura de apoio ao migrante?".
Cechim José, do Paraná: "Em que medida o mundo do trabalho no Brasil é um espaço de possibilidades ou de barreiras para migrantes e refugiados?".
Sílvio Ricardo, do Acre: "Como é tratada a discriminação de migrantes e refugiados no país que sofrem com a barreira do idioma?".
Por fim, Nicole Matos, de Rondônia: "Como o preconceito afeta migrantes no trabalho no Brasil? Como enfrentar esses desafios através de abordagens individuais e coletivas?".
Pelo que percebi, a Lutiana não voltou, não é? (Pausa.)
Voltou.
Pode falar, Lutiana.
A SRA. LUTIANA VALADARES FERNANDES (Por videoconferência.) - (Falha no áudio.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Pronto. O tempo é seu.
A SRA. LUTIANA VALADARES FERNANDES (Por videoconferência.) - Estou aqui, Senador. Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - O que aconteceu?
A SRA. LUTIANA VALADARES FERNANDES (Para expor. Por videoconferência.) - A gente teve um problema em como "desmutar" o Zoom.
Boa tarde a todas e todos.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Boa tarde.
A SRA. LUTIANA VALADARES FERNANDES (Por videoconferência.) - Inicialmente, eu agradeço o convite do Sr. Presidente, o Exmo. Senador Paulo Paim, e também da Deputada Federal Carol Dartora. Cumprimento, ainda, Angel Mesias, migrante venezuelano, na pessoa de quem cumprimento todas as pessoas presentes, especialmente migrantes e refugiados.
Eu agradeço o convite que foi feito à Defensoria Pública da União para participar deste importante debate.
R
Eu sou Lutiana Valadares Fernandes Barbosa, sou Defensora Pública Federal e atualmente estou Coordenadora do Grupo Nacional de Trabalho Migrações, Apatridia e Refúgio da DPU.
Bom, a DPU é a instituição autônoma e permanente que, de acordo com a Constituição, tem como função, como expressão e instrumento do regime democrático, a orientação jurídica e a promoção dos direitos humanos em defesa, em todas as instâncias, dos direitos individuais e coletivos das pessoas em situação de vulnerabilidade. E a DPU trabalha diuturnamente prestando assistência jurídica e promoção dos humanos de migrantes e refugiados.
Eu fiz aqui quatro breves apontamentos sobre os desafios dos trabalhadores migrantes, do trabalho para migrantes, que, em alguns pontos, até dialogam com a fala recente da Conectas.
Primeiro, eu queria destacar que, durante a pandemia, muitas pessoas ingressaram de forma irregular e permanecem de forma irregular, e isso é uma barreira para o trabalho. Então, a pandemia da covid não eliminou os motivos que levam à migração forçada; muito pelo contrário, ela aumentou, devido à crise econômica e social que provocou. Os Estados estabeleceram restrições para os que cruzassem fronteiras, os processos migratórios foram criminalizados, os migrantes passaram a enfrentar ainda mais barreiras de entrada e permanência. No Brasil, não foi diferente: várias portarias ministeriais criavam obstáculos à migração, determinando que aqueles que infringissem as restrições de entrada estariam sujeitos à repatriação imediata, à deportação e ao impedimento de solicitar refúgio, por exemplo. Essas portarias violaram os direitos humanos de migrantes e refugiados... (Falha no áudio.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Está falhando novamente a sua fala...
A SRA. LUTIANA VALADARES FERNANDES (Por videoconferência.) - ... tratados internacionais, a evolução e a pressão já de retirada coletiva compulsória.
Vocês me ouvem bem?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Está congelando a tua fala. Deve estar com algum problema na internet, Lutiana.
A SRA. LUTIANA VALADARES FERNANDES (Por videoconferência.) - Vou tirar o vídeo.
Agora vocês me ouvem melhor?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Melhorou.
A SRA. LUTIANA VALADARES FERNANDES (Por videoconferência.) - Melhorou?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Hã-hã.
A SRA. LUTIANA VALADARES FERNANDES (Por videoconferência.) - Ótimo!
Então, é muito importante a gente revogar as portarias ainda vigentes desse período da pandemia, bem como rememorar esses acontecimentos para que eles não se repitam e para que sejam tomadas todas as medidas para a regularização migratória daqueles prejudicados por essas portarias ilegais. Nesse sentido, a DPU já realizou mutirões de regularização migratória, mas o ideal é que seja tomada uma medida de regularização em massa. A regularização migratória é de extrema relevância para a inserção no mercado formal de trabalho e gozo das garantias trabalhistas.
E aqui eu rememoro o PL da anistia, que está na CCJ da Câmara, o PL 7.876, de 2017, recentemente mencionado pela Conectas. É esse PL que originalmente concedia autorização de residência aos migrantes que ingressaram até o início da vigência da lei, se assim o requeressem dentro prazo de 18 meses, independentemente da situação migratória. Infelizmente houve uma emenda da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional para abranger apenas aqueles que ingressaram até 21/11/2017, que foi a data da vigência da nova Lei de Migração. O projeto foi aprovado na CCJ com essas alterações, e a gente entende que é salutar uma anistia, especialmente nos termos do projeto original. O Estatuto do Estrangeiro teria pouquíssimas alternativas de regularização migratória, e a solução de muitos migrantes foi recorrer à solicitação de refúgio, de solicitar acesso, e o faziam não para fraudar o instituto do refúgio, mas por conta da insuficiência da resposta estatal em termos de regularização migratória.
R
Em alguns casos, a solicitação de refúgio era a única alternativa de regularização migratória. Como consequência, tem inúmeras solicitações de refúgio de pessoas já totalmente integradas ao país, mas que não fazem jus à proteção. Nos casos em que não se identifica com a hipótese de autorização de residência, mesmo que essa pessoa esteja integrada ao país há bastante tempo, poderá haver-se na irregularidade.
A anistia teria a virtude de evitar situações como essa e também possibilitar o exercício do trabalho informal. Atualmente, por conta da ausência de uma anistia, constroem-se soluções ad hoc parciais, como, por exemplo, a resolução conjunta que, recentemente, permitiu aos solicitantes de refúgio com CTPS assinada até 21/11/2017 a obtenção da autorização de residência. A anistia é desejável sempre que há mudanças na política migratória, como representa a Lei de Migração. Ela permite que seja zerado o passivo migratório.
Em resumo, a anistia amplifica um princípio da Lei de Migração, que é a promoção da regularização documental. A regularização documental permite a inclusão formal no mercado de trabalho e aponta para a garantia do trabalho decente, com todos os benefícios daí advindos, para o trabalhador e para o Estado. É importante ver, na amplificação da regularização documental, promovida pela anistia, um mecanismo de desenvolvimento social manifestado especialmente por meio do trabalho formal e decente.
O segundo ponto que eu quero ressaltar aqui é o conceito de trabalho para fins de regularização documental. Esse outro ponto diz respeito às exigências para a regularização migratória com base no trabalho.
No Brasil, não é qualquer imigrante que trabalha que pode obter a regularização migratória. A Lei de Migração assegura autorização de residência por trabalho sem estabelecer qualquer limitação ao conceito de trabalho, que é amplo. Porém, há limitações estabelecidas pelo Decreto 9.199, de 2017, e pelas regulamentações do CNIg.
Para o trabalho com vínculo empregatício, exige-se um contrato individual de trabalho ou um contrato de prestação de serviços. Além disso, exige-se a compatibilidade entre a atividade que será exercida e a qualificação e experiência profissional. Significa dizer que não é qualquer trabalhador com contrato que pode se regularizar. Ele tem que comprovar - ele ou ela - uma qualificação e experiência profissional bastante restritas de que diversos imigrantes, em especial aqueles de baixo perfil, não dispõem. Basta ver que é bastante raro que algum imigrante assistido da Defensoria Pública da União reúna esses requisitos de qualificação e experiência. Como consequência, eles não conseguem a regularização.
Já para o trabalho sem vínculo empregatício, há uma indicação de hipóteses taxativas igualmente restritas. Como consequência, pela regulamentação, não é possível regularizar o autônomo contribuinte individual ou mesmo o Microempreendedor Individual (MEI). Esse quadro acaba por desestimular o empreendedorismo do migrante.
O terceiro ponto que eu quero ressaltar aqui é a importância de revalidação de diplomas. Certamente, um dos grandes gargalos que enfrentamos para a integração laboral dos imigrantes é a necessidade de revalidação de diplomas. A precariedade de informações sobre documentação e os direitos dos migrantes e refugiados criam desafios para diversas coisas. E esse desafio da revalidação dos diplomas, em razão de altas taxas cobradas pelas universidades - custo de tradução de documentos e exigência de apresentação de documentos emitidos pelo país de origem.
R
Eu rememoro aqui que, no Brasil, a Lei 9.474, de 1997, que prevê os mecanismos para implementação do Estatuto dos Refugiados, prevê que teve a ver com flexibilidade na exigência de apresentação de documentos por refugiados e, especificamente, com a facilitação para reconhecimento de certificados e diplomas emitidos no exterior.
A Lei de Migração prevê, entre os princípios e diretrizes que regem a política migratória, a promoção e o reconhecimento acadêmico e prática profissional. Então, precisamos pensar em medidas para facilitar a revalidação de diplomas para possibilitar o exercício das práticas profissionais para o que as pessoas se qualificaram e, assim, termos uma melhor integração desses migrantes.
Por fim, eu vou falar de uma recomendação recentemente enviada pela Defensoria Pública da União à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal para ratificação da Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias, por meio da aprovação do PDL 405, de 2022.
Em 1990, a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos...
Eu vou tentar religar a câmera, porque acho que agora a minha internet está melhor.
Então, em 1990, a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias foi adotada pela Resolução 45/158, no âmbito da 48ª Sessão da Assembleia Geral da ONU, e esse instrumento incorporou mais de 30 anos de discussão dentro da ONU, a respeito das relações entre direitos humanos e migração, inovou proteções mínimas aos trabalhadores migrantes e às suas famílias, independentemente de sua situação migratória. A despeito de configurar um marco na construção do regime internacional dos direitos humanos, apenas 58 países aderiram à convenção. É a menor adesão de um tratado de direitos humanos promovido no sistema das Nações Unidas, até a presente data.
O Brasil se inclui, infelizmente, entre os países que não ratificaram a convenção, apesar de ter iniciado as tratativas para fazê-lo no ano de 2010, por meio da submissão, no texto da convenção, à consideração do Congresso Nacional, pelo Presidente da República, através da Mensagem 696, de 2010. Nos anos seguintes, por duas vezes tentou-se criar uma Comissão Especial no Congresso para proferir um parecer da Mensagem 696, o que viria a concretizar-se somente na terceira tentativa, no ano de 2022. Assim que foi instalada a Comissão Especial, foi aprovado por unanimidade o parecer favorável do Relator à convenção, e, ao final de 2022, a Comissão Especial propôs o Projeto de Decreto Legislativo nº 405/2022, a fim de aprovar o texto da convenção e dar andamento à sua ratificação.
Considerando que o PDL 405, de 2022, está pronto para entrar em votação em Plenário, cabe enfatizar a importância da incorporação da Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias ao ordenamento jurídico brasileiro. A convenção é a única das nove convenções internacionais fundamentais sobre proteção de direitos humanos da ONU que não foi ratificada pelo Brasil. A adesão ao instrumento reforçaria o compromisso do nosso país com a proteção dos direitos humanos, tanto na esfera internacional quanto em nível nacional, fortalecendo direitos e garantias previstas pela Lei de Migração.
R
Dessa forma, a ratificação da convenção sinalizaria o comprometimento do Estado brasileiro com a promoção de condições dignas de existência e subsistência a essa população, que, por sua condição migratória, está mais suscetível a situações de vulnerabilidade e de exploração.
Ainda que a Lei de Migração esteja mais abrangente e mais protetiva em relação a trabalhadores e trabalhadoras migrantes em muitos aspectos, do ponto de vista internacional a convenção continua sendo um importante marco civilizador, do qual o Brasil faz parte, em especial à vista da retomada da participação brasileira nos debates internacionais de defesa de direitos humanos.
Muitíssimo obrigada.
Em nome da Defensoria Pública da União, eu me coloco aqui à disposição e agradeço o convite que nos foi feito. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Muito bem, Dra. Lutiana Valadares Fernandes, Defensora Pública Federal.
Mais uma vez, os defensores mostram todo o seu compromisso com os mais vulneráveis. E você fez a fala que fez quase que um grande resumo daquilo que todos falaram, mas avançou em alguns temas, lembrando a importância dessa convenção internacional, da sua ratificação via PL 425, não é?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - E aprovando o PL 425.
Muito obrigado. Ficam aqui nossas palmas pela sua contribuição. (Palmas.)
Vamos de imediato, agora, para o nosso convidado líder Angel Mesias, imigrante venezuelano.
Embora o tráfico tenha te prejudicado, você está aqui resistente.
O SR. ANGEL MESIAS (Para expor.) - Meu nome é Angel Mesias, sou refugiado venezuelano. Vai fazer três anos que cheguei ao Brasil.
É complicado lembrar como eu saí do meu país, porque a gente não saiu de férias; a gente foi obrigado a sair de lá por uma situação que para todo mundo não é um segredo.
A fome é uma coisa que ninguém merece. De minha parte, eu posso ser espancado, posso ser humilhado e explorado, mas a fome... Não quero voltar a passar por isso.
Consegui trazer toda a minha família, trabalhando muito em todo tipo de área. Estou com meu pai e com todos os meus irmãos, que estão estudando, graças a Deus. Eu sou cozinheiro e trabalho num restaurante há um ano e meio.
Não vou me estender muito. Se vocês têm alguma pergunta, eu posso responder tranquilamente.
Estou muito agradecido por estar hoje aqui com vocês, que são nossos irmãos brasileiros, e por me darem essa mão amiga, apoiando o migrante refugiado.
É muito difícil sair do nosso país, não tendo muitas oportunidades sem ele. Quando eu saí, durei três dias na selva, passando fome, passando necessidade. Eu sou estudado, sou administrador, tenho faculdade e passei dois meses na rua, quando cheguei ao Brasil, passando todo tipo de necessidades, mas segui lutando no dia a dia. Eu estou aqui hoje com trabalho, consegui trazer toda a minha família, porque, apesar do meu corpo estar aqui, meu coração estava na Venezuela.
É difícil sair e não saber falar. Ela falou um ponto muito importante: para a gente entrar no campo laboral e a gente ter uma melhor qualidade da vida, a gente tem que falar o idioma, tem que fazer curso, porque eu cheguei aqui e não sabia que se falava outro idioma. Eu peguei minhas coisas, peguei minha mala e falei: "Vou embora". Eu não sabia que aqui tinha outros costumes, outro idioma, outra religião. E para mim foi muito supressivo, não é? Mas agradeço, porque Deus colocou muitas pessoas boas no meu caminho - não quero pessoas ruins.
R
Só o que quero falar é sobre o que ela falou. A gente, para ter uma melhor qualidade de vida, a gente tem que ter um trabalho. Eu não cheguei aqui ao Brasil e disse: "Não, eu quero que me deem tudo". Não. Eu luto, a gente luta, porque o venezuelano é assim.
Também falo de outro ponto. A gente tem que ter documentos... Eu cheguei ilegal, eu não tinha documento, passei um ano sem documentação. Agora, tenho todos os documentos e posso ter um emprego legalmente.
Se vocês tiverem alguma pergunta, eu posso responder tranquilamente.
E essa é a minha apresentação. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Muito bem, Angel Mesias!
Ele é um imigrante venezuelano que faz um depoimento emocionado da luta dos imigrantes, enfim, e que ele aqui, com muita resistência, com muita coragem, com muita fibra, eu diria, e competência... E competência tem e "só nos deem oportunidade". Ele mostrou aqui o bom combate que ele está fazendo, e trouxe todos os familiares, inclusive - não é? -, o que é muito bonito, muito importante. E recomendando a todos que estudem, que se preparem. Oportunidades existem. Eu trabalho muito com o ensino técnico, e o que eu mais ouço, devido aí, claro, a essa chamada inteligência artificial, as novas tecnologias, enfim, é que é fundamental o preparo dos nossos colegas.
O SR. ANGEL MESIAS - A gente também tem um coletivo, em que ajudamos a pessoas que estão chegando agora da Venezuela, junto com a ONU. E ajudamos a elas com roupa, coisas de casa, para elas terem uma ajuda para sustentarem-se e conseguirem um emprego. Ajudamos também com documentação.
É um pequeno coletivo, de nós mesmos venezuelanos, porque quem mais que eu que já passou por tanta necessidade? Quero trazer a vocês o que o imigrante é de verdade. Não é só falar: "Não. Eu saí no Brasil e pronto". Não. A gente passa muita coisa.
E, se alguma pessoa brasileira vai sair para outro país, tem que falar outro idioma, adaptar-se à cultura. Assim como a gente tem direito, a gente tem deveres também. A gente não vai trazer... Eu cheguei aqui ao Brasil: "Quero toda ajuda e...". Não, a gente tem que lutar, no dia a dia, por cada coisa que a gente quer.
Eu não consegui essa melhoria no meu país por causa da situação, mas aqui consegui. Eu estou lutando por minha família todo dia, todo dia, todo dia. E eles também estão aqui. E, assim como eu, tem muitas mulheres solteiras que tem um filho, e também a gente presta esse apoio para que elas não se sintam sós aqui, porque é muito complicado partir de seu país e sentir-se só. Isso é uma coisa que a gente não consegue como expressar, entendeu? Tem muitas pessoas ao redor, mas se sentem vazias, se sentem sós. É uma coisa que é supercomplicado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Muito bem! Meus cumprimentos, mais uma vez, Angel Mesias, imigrante venezuelano que dá aqui um depoimento de vida, de vida pessoal, e deixa recomendações para outros tantos e sobre a importância do apoio do Governo brasileiro e de nós todos que temos essa causa também como a um norte de vida. Por isso, estamos nesta Comissão.
Agora nós vamos para a Dra. Patrícia Gimenez Camargo, representante do Sindicato Nacional dos Tradutores - ela é a última painelista -, com o tempo necessário para as suas considerações, de dez minutos com mais cinco.
R
A SRA. PATRÍCIA GIMENEZ CAMARGO (Para expor.) - Muito obrigada.
Bom dia a todas as pessoas aqui presentes.
Prezado Senador Paulo Paim, gostaria de cumprimentá-lo e também cumprimentar todas as pessoas aqui que nos acompanham nesta manhã e que também nos acompanham online.
Em nome do Sintra (Sindicato Nacional dos Tradutores), eu estou aqui representando nossa Presidente Ana Beatriz Caldeira Ferreira Braga Dinucci e demais membros da diretoria e agradeço o convite desta Comissão para participar de audiência pública tão relevante. Não tenho palavras para expressar nosso contentamento em poder contribuir com o debate, especialmente por, tradutores e intérpretes que somos, lutarmos incansavelmente na salvaguarda de direitos de refugiados e migrantes de todas as nações e especialmente da migração sul a sul - o sul global -, especialmente quando falamos da mobilidade forçada e das questões linguísticas envolvidas.
Minha presença nessa data memorável para o nosso sindicato e para mim, em particular, corrobora os achados de pesquisa acadêmica desenvolvida durante meu doutoramento, defendido na Universidade de São Paulo, em 2020, em que estudei a questão da interpretação comunitária médica e, junto a outros colegas, a questão da interpretação comunitária e dos direitos linguísticos de migrantes e refugiados.
Expor essas questões cruciais do mundo do trabalho - o que vocês fizeram muito bem - que nós sabemos que refugiados e migrantes enfrentam em nosso país tem implicações legais, uma vez que direitos humanos é garantia expressa em nossa Constituição; mas há ainda implicações de ordem prática, uma vez que entender como as instituições funcionam também é um direito dos refugiados e migrantes, ao menos se considerarmos a comunicação em idioma diferente do português como um direito linguístico da população refugiada e migrante, como bem nos apresentou o Angel nessa manhã.
Sem que essas barreiras linguísticas sejam dirimidas ou atenuadas, através da interpretação de línguas oralizadas que são as utilizadas pelos refugiados, as línguas dos povos originários ou ainda línguas de sinais, por meio da atuação do profissional intérprete comunitário, decerto afasta-se ainda mais a possibilidade do estabelecimento de relação de igualdade em qualquer esfera da vida em sociedade e, consequentemente, no mundo do trabalho. Aos refugiados e migrantes é, portanto, penoso cumprir atividades de ordem comum, tais como participar da vida em sociedade, com dificuldade aumentada no caso em que tem tutela de menores.
A utilização de serviços públicos é dificultada sobremaneira por conta da não comunicação ou de uma comunicação deficitária em língua portuguesa, o que leva, muitas vezes, à não regulamentação da documentação devido a medos diversos.
A falta de profissional intérprete qualificado nos mais diferentes ambientes de atendimento - serviços públicos, serviços médicos, esfera jurídica - conduz à falta de zelo pela proteção dos direitos humanos, conforme pontuam Ventura e Yuja em uma pesquisa de 2019.
Para os refugiados e migrantes, a dificuldade de prover o sustento está, em grande parte, relacionada à não comunicação em língua portuguesa do Brasil. Por outro lado, as empresas também enfrentam dificuldades na contratação de refugiados por um equívoco no entendimento do processo de contratação, conforme apontou pesquisa realizada pelo Prof. Leandro de Carvalho, do Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos da Universidade de Brasília, aqui nesta capital. Os números são alarmantes: 91% dos recrutadores indicaram não ter clareza sobre o processo de contratação, 65% confundem a condição de refugiado com a de muita pobreza, somente para explicitar alguns achados daquela pesquisa. Tanto o refugiado quanto o solicitante de refúgio que se encontrem em situação regular no Brasil podem trabalhar normalmente.
R
Entre os documentos que o estrangeiro recebe logo que pede refúgio está a carteira de trabalho. A entrada no mercado de trabalho fortalece a economia brasileira, uma vez que o refugiado passará a contribuir também com a nossa nação. No entanto, sem falar o idioma, geralmente migrantes e refugiados recorrem a métodos informais de busca de emprego que muitas das vezes são ineficazes e reduzem as chances de empregabilidade. As mulheres, por sua vez, ficam mais expostas, fazendo da busca de emprego um momento perigoso, pois são mais comumente expostas ao assédio sexual, conforme indicam pesquisas realizadas em nosso país.
A fim de estabelecer uma condição mais justa no mercado de trabalho, a atuação do intérprete comunitário incluiria, ainda que não exclusivamente, interpretações de entrevistas, preparação para as entrevistas de trabalho, solicitação de documentos, além de orientação quanto ao atendimento, entre eles o atendimento médico. Sabemos que vacinação é assunto de especial atenção, uma vez que as orientações e informações são de fundamental importância para o entendimento e a compreensão do sistema de saúde e do funcionamento das nossas mais diversas instituições, que, como sabemos, são bem diferentes de cultura a cultura. Cria-se, então, uma rede de apoio, ou uma rede que nós chamamos de referência, que tem por objetivo maior facilitar a convivência e a entrada saudável no mercado de trabalho.
Fornecer capacitação linguística deve ser uma preocupação, como nós temos e como ouvimos da Dra. Luana. No entanto, algumas pesquisas nos mostram que aprender o idioma não é uma questão primordial e primeira para esses refugiados e migrantes, porque eles estão ainda na luta para ter as suas necessidades primárias atendidas, entre elas: o trabalho, sustento, a manutenção da família. Ainda que o refugiado ou migrante demonstre interesse em aprender o idioma - o português brasileiro -, sabemos que o tempo é um limitador para a comunicação eficaz, afinal não aprendemos um idioma do dia para a noite.
Origuela, em 2022, indica outras questões que podem levar à dificuldade de se aprender um idioma, entre elas: passagem pelo país sem que haja planos de se estabelecer, nós sabemos que alguns migrantes e refugiados usam o nosso país, estão no nosso país como uma questão de passagem; falta de condições emocionais, temporais, financeiras, apego a questões religiosas, dentre inúmeras outras possibilidades.
Esperamos que o PL 5.182, de 2020, de autoria do Senador Paulo Paim, a quem cumprimento novamente, traga a possibilidade de alocação de tradutores e de intérpretes comunitários em todas as instituições públicas federais, estaduais e municipais, e que seja de forma permanente, conforme temos no texto daquele PL, ou através de formação de núcleos especializados de tradução e interpretação comunitária, especialmente organizados para atender às demandas específicas de cada área.
Nesse sentido, esperamos que o PL renda frutos e que nós tenhamos profissionais tradutores e intérpretes comunitários para atender às necessidades e dirimir as barreiras linguísticas enfrentadas por refugiados e migrantes que aqui se encontram. A regulamentação e a regulação da profissão de tradutor e intérprete comunitário é urgente. O Brasil é um país multilíngue, com habitantes que não têm proficiência em Língua Portuguesa, seja por serem falantes de línguas indígenas, seja de outras línguas. Esses cidadãos precisam ter apoio do Estado para que tenham assegurado o acesso aos direitos que lhes são garantidos pela Constituição Federal. Nós, tradutores e interpretes, temos o preparo necessário para atender a estas demandas e estamos prontos para trabalhar em prol dessa acessibilidade. Mas há hoje uma falsa crença de que tradutores que atuam nas áreas de acessibilidade, como libras, legendas para surdos, audiodescrição, e que trabalham para refugiados e migrantes residentes no país devem trabalhar sem remuneração, como voluntários, mesmo sendo este um trabalho especializado como qualquer outro.
R
É nosso dever, no entanto, enquanto Sindicato dos Tradutores, alertar acerca das armadilhas que podem ser criadas caso não tenhamos uma clara visão e entendimento dos limites da profissão...
(Soa a campainha.)
A SRA. PATRÍCIA GIMENEZ CAMARGO - ... dos valores a serem recebidos pelos profissionais, das competências e habilidades a serem relacionadas no perfil profissional desejado, de forma a continuar resguardando a segurança de refugiados e migrantes no mundo do trabalho e nas esferas da vida cotidiana.
Nossa argumentação está apoiada em estudos acadêmicos desenvolvidos a partir de entrevistas e da vivência com refugiados e migrantes, que demonstram a necessidade de formação de uma rede de intérpretes comunitários com um preparo adequado para que as barreiras linguísticas sejam atenuadas.
Receber e acolher refugiados e migrantes, levando-se em consideração os direitos garantidos, entre eles o direito linguístico, permite que eles participem da nova vida, enriquecendo a sociedade brasileira a partir da ampliação da bagagem cultural compartilhada, da pluralidade de ideias e do desenvolvimento de competências, ocorridos nas trocas multiculturais.
Além da atuação dos intérpretes comunitários brasileiros, há a possibilidade da formação de refugiados e migrantes para atuarem como intérpretes comunitários também, em médio ou longo prazo, como acontece em diferentes países ao redor do mundo, principalmente quando estamos perante idiomas raros, cuja oferta de intérpretes comunitários será menor e de maior dificuldade.
Promover a igualdade, quando se fala do idioma do refugiado ou do migrante, traz garantias das mais diversas ordens. Nesse sentido, o Sindicato dos Nacional dos Tradutores, como representante legal de tradutores e intérpretes, sempre vigilante quanto aos interesses da categoria e da população atendida, coloca-se à disposição para desenvolver, de forma excelente, as indicações de competência e habilidades a serem alcançadas no estabelecimento da profissão de intérprete comunitário, bem como na formação adequada de intérpretes refugiados e migrantes que, caso desejem, possam atuar e atender ao vasto mercado da valiosa comunicação multicultural e globalizada, como acontece em diversos países que contam com intérpretes comunitários.
Considerando a diversidade linguística como oportunidade e não como um problema, somente dessa forma conseguiremos ampliar nossos valores como o país e como povo.
Eu agradeço imensamente a oportunidade e o momento da fala. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Muito bem. Muito bem, Dra. Patrícia Gimenez Camargo, representante do Sindicato Nacional dos Tradutores.
Eu já falei na Comissão sobre esse projeto, e há aqui todo um entendimento já, uma opinião formada de que é uma das prioridades da Comissão esse projeto que regulamenta definitivamente a profissão de vocês para que eles possam atender. Eu perguntava aqui para a Luana, para me ajudar, que disse, entre migrantes e refugiados, nós estamos com mais de 1,5 milhão no Brasil, dos mais variados países. Aí a importância do trabalho de vocês.
R
A SRA. PATRÍCIA GIMENEZ CAMARGO - E também há a formação desses migrantes e refugiados que já se encontram conosco, que falam português - alguns deles excelentemente bem - e que poderiam também atuar como intérpretes comunitários. Então, cria-se uma via para a inserção no mercado de trabalho.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. PT - RS) - Muito bem.
Para concluir, eu recebi aqui do Sr. Tomás Alejandro Guzmán, que representa aqui Venezuela Global, Casa Venezuela. Ele me deu alguns dados que eu achei interessante, só para registro. Aqui são só de venezuelanos os dados que ele me passou. Onde se encontram os venezuelanos no Brasil: Roraima, 134.727; Santa Catarina, 45.053; Amazonas, 41.976; Paraná, 41.016; São Paulo, 30.463; Rio Grande do Sul - não falei mais forte Rio Grande do Sul, para não dizer que eu sou bairrista, mantive a linha -, 26.133; Mato Grosso do Sul, 9.526; Minas Gerais, 8.994; Mato Grosso, 8.757; Distrito Federal, 5.617; Rondônia, 4.789; Rio de Janeiro, 4.691; Goiás, 4.477; Pará, 2.252; Bahia, 2.114; Ceará, 1.473; Pernambuco, 1.457; Paraíba, 1.187; Espírito Santo, 926; Rio Grande do Norte, 524; Maranhão, 520; Acre, 483; Piauí, 296; Alagoas, 226; Sergipe, 211; Tocantins, 181; e Amapá, 106. Isso são só venezuelanos.
Eu queria agradecer muito, muito a todos vocês. Esta audiência pública atingiu, no meu entendimento, o objetivo que era de ter o retrato do mundo do trabalho.
Aqui, dou como notícia para vocês que... Uma SUG construída pela sociedade civil chegou à Comissão de Direitos Humanos há cinco anos... Como a CLT estava sendo - não vou dizer desmontada, mas vou dizer retalhada - retalhada, tirando uma série de direitos dos trabalhadores, eu acabei assumindo a relatoria do que seria a nova CLT, a CLT do século XXI, o mundo do trabalho. E, a partir desta audiência pública, eu vou pedir para os juízes, promotores, procuradores... Tem todo setor ali no trabalho; tem empresário, tem todos. Eu até tenho uma reunião com o Ministro Marinho para conversar sobre inúmeros temas, que vai ser agora neste mês ou no mês de setembro, e vamos falar também, claro, dos projetos pontuais como esse, importantes, para que circulem aqui, no Congresso. O Ministro Marinho, quero elogiá-lo, porque ele gostaria muito de estar aqui hoje e não pôde. Ele disse que gostaria, mas vamos conversar no dia 11 de setembro, se eu não me engano, em que tenho uma reunião com ele - sei que é na primeira quinzena de setembro - para falar do mundo do trabalho.
R
Mas eu vou fazer um capítulo específico da questão migrantes e refugiados, específico dentro da legislação global, naturalmente, mas com um carinho especial para esta sessão. Por que isso? Eu sempre digo que eu gostaria que lá fora eles tratassem os brasileiros como nós tratamos aqui os migrantes e refugiados. Esse é o meu sonho. Que eu não veja um colega, um amigo que tenha nos Estados Unidos, ou no Japão, ou na Nicarágua, em qualquer país para o qual ele, por um motivo ou outro, se deslocou... Eu dei como exemplo global, independentemente da questão ideológica. Mas que ele seja lá tratado como nós os tratamos aqui no Brasil.
Encerrada a nossa reunião, uma salva de palmas a vocês pelo brilhante trabalho que estão fazendo. (Palmas.)
Isso se chama políticas humanitárias.
Se vocês concordarem, eu gostaria, ao encerrar - está encerrado o trabalho da Comissão -, de tirar uma foto com todos vocês.
(Iniciada às 9 horas e 15 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 02 minutos.)