Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
|---|---|
| R | O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 33ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura. A presente reunião destina-se à realização da segunda audiência pública para instruir o Projeto de Lei 1.388, de 2023, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade e disciplina o respectivo processo e julgamento, conforme Requerimento nº 27, de 2023, da CCJ, de iniciativa do Senador Weverton. |
| R | Esta reunião será semipresencial, sendo permitida a participação remota das Sras. e Srs. Senadores e dos convidados por sistema de videoconferência para exposições e debate. Será realizada em caráter interativo, ou seja, com a possibilidade de participação popular. Dessa forma, os cidadãos que queiram encaminhar os comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da nossa Ouvidoria 0800 0612211. De acordo com o art. 94, §§2º e 3º, do nosso Regimento Interno, a Presidência adotará as seguintes normas: os convidados farão suas exposições e em seguida abriremos a fase de interpelação pelas Senadoras e Senadores inscritos. A palavra às Senadoras e aos Senadores será concedida à ordem de inscrição. Os Senadores interpelantes dispõem de até três minutos, assegurado igual prazo para a resposta do interpelado, sendo-lhe vedado interpelar os membros da Comissão. Eu vou convidar aqui para compor a mesa - na primeira audiência pública, nós adotamos aqui a média de dez minutos para cada convidado. Obviamente, se ele necessitar de mais algum tempo... Mas tirem aí como medida, para mais ou para menos, a média de dez minutos. Nós teremos condição de fluir melhor a nossa audiência pública. Eu vou convidar aqui para a mesa a Fabiane Pereira de Oliveira, Assessora do Supremo Tribunal Federal - está convidada para já tomar assento aqui na nossa mesa de trabalho -; o Professor Caio Chaves Morau, Professor Doutor da Universidade Católica de Brasília; a Sra. Amanda Rodrigues, Diretora do Lawfare Nunca Mais. Nós temos o Sr. Pierpaolo Cruz Bottini, que está de forma remota. Nós temos a ausência justificada nesta audiência pública do Ministro Antonio Anastasia, ex-Senador da República e agora Ministro do TCU; do Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Salomão; e do Sr. Rogerio Schietti, Ministro do Superior Tribunal de Justiça. Temos também como convidado o ex-Ministro da Justiça e ex-Advogado-Geral da União, Ministro José Eduardo Cardozo, que nos confirmou a presença. Então, no decorrer da audiência, deve participar. Estamos aguardando. (Pausa.) Como o Dr. Pierpaolo está de forma remota, nós vamos começar com ele como o primeiro expositor, mas antes disso eu gostaria de agradecer aos participantes da primeira reunião, da nossa primeira audiência pública. |
| R | Nós fizemos a primeira audiência pública, para começar a instrução desse Projeto 1.388, de 2023, que trata sobre os crimes de responsabilidade e disciplina o processo e o julgamento. E a primeira providência que eu tomei, como Relator do projeto, foi ouvir o grupo de juristas que fizeram esse brilhante trabalho, dedicaram-se, dando as suas contribuições. Obviamente, também, já ouvi alguns especialistas e pessoas indicadas por colegas Senadores e Senadoras, para que possamos formar um relatório, uma opinião, para construir, dentro de um ambiente democrático, como é esta Casa, um texto que possa ser oferecido à sociedade para os próximos anos. Nós estamos falando de uma lei que ainda é muito antiga, de 1950. Então, de lá para cá, Código de Processo Civil, Penal, estatutos vários, todos são aperfeiçoados, são melhorados. Quando você vai discuti-los, não é que você quer voltar atrás, você quer sempre se adaptar. Ontem mesmo, eu falava numa entrevista aqui na TV Senado: ainda nem começamos a discussão de fato aqui, dentro da CCJ - agora é um primeiro momento, para ir acumulando as informações, como foi feito -, e como se pode ainda ter qualquer tipo de desconfiança de casuísmo ou qualquer outra situação, que não é a essência, o espírito desse projeto, que foi totalmente construído de forma republicana? Eu dei como exemplo que se trata agora de fake news e crimes que são cometidos através da internet. Olha, claro que tem que ser colocado agora, porque em 1950 não tinha internet. Como é que você ia prever um crime que nem existia? Então, você se adapta com o que você está vivendo no dia de hoje. Nesta primeira audiência, o Presidente desta Comissão de Juristas, o ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, esteve aqui presente, de forma presencial, e abriu esta primeira audiência pública, juntamente com o nosso Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, também servidor aqui desta Casa, Fernando Bandeira, e o Sr. Gregório Assagra de Almeida, que é Procurador de Justiça, aposentado, do Ministério Público de Minas Gerais e Professor do Programa de Mestrado e Doutorado da Universidade de Ribeirão Preto. Nós tivemos aqui o Sr. Heleno Taveira Torres, de forma remota, também Advogado e Professor da USP, que deu a sua contribuição, e o nosso Consultor João Trindade Calvalcante Filho. O João também tem um acúmulo grande, junto com o Bandeira, porque participaram diretamente aqui, no momento do fatídico episódio do impeachment, que nós vivenciamos nessa última quadra. Então, eu queria já agradecer esses participantes que estiveram aqui conosco na primeira audiência pública. E, para começar a segunda, eu vou convidar o Sr. Pierpaolo Cruz Bottini, que é Advogado e Professor da USP. Seja bem-vindo, Professor. O senhor tem o tempo de, aproximadamente, até dez minutos, para usar da forma que V. Sa. julgar necessário. O SR. PIERPAOLO CRUZ BOTTINI (Para expor. Por videoconferência.) - Exmo. Sr. Presidente, queria agradecer a oportunidade de dialogar, de fazer esse diálogo com o Senado Federal a respeito desse anteprojeto de lei que foi apresentado por esta Comissão. |
| R | Queria cumprimentar todas as Senadoras, todos os Senadores e todos os membros da mesa na pessoa da Dra. Fabiane, que integrou a Comissão comigo e com a qual, juntamente com outros integrantes, tivemos o trabalho de refletir um pouco sobre a atualização dessa lei do impeachment, sob a coordenação do então Ministro do Supremo Ricardo Lewandowski - Ministro que, na verdade, além da jurisdição, é professor da universidade na qual dou aula também, que é a Universidade de São Paulo, e conduziu todos esses trabalhos por esse tempo determinado pelo Presidente desta Casa, para que nós pudéssemos, então, apresentar às senhoras e aos senhores esse trabalho, essa proposta para discussão e para reflexão. Eu vou ser bem breve aqui, Sr. Presidente, até por conta do tempo, e eu acho interessante que a gente possa fazer aqui um debate. O objetivo, como o senhor bem disse, é atualizar a Lei 10.079, de 1950. É uma lei que foi aprovada no Governo do Gaspar Dutra e é uma lei que, realmente, ficou no passado. Ela tem dispositivos pouco atuais, e a gente até brincava na Comissão, Sr. Presidente, que ela parece aquela caixa de primeiros socorros que todo mundo tem no carro e fica lá para se usar em um caso de emergência, e, quando a emergência acontece, ninguém sabe usar, ou aquilo que está dentro dessa caixa acaba não servindo para muita coisa. Tanto é que, todas as vezes em que houve uma discussão de impeachment após a aprovação dessa lei, o Supremo Tribunal Federal foi chamado - muitas vezes - para tratar de como interpretar esses dispositivos que, de certa forma, estavam obsoletos. Então, para que isso fosse modernizado, para que isso fosse atualizado, nós apresentamos esse projeto de lei. Eu vou falar, rapidamente, sobre a parte dos tipos penais. O projeto de lei é dividido em dois grandes blocos: em um, nós apresentamos os tipos penais, ou seja, os crimes de responsabilidade cometidos pelas autoridades; e, em um segundo bloco, sobre o processo, ou seja, de que forma essa apuração e esse julgamento pelas Casas Parlamentares ou pelo Supremo Tribunal Federal é feito. Eu vou me limitar à primeira parte, que foi a parte em que a gente dividiu a Comissão em dois grupos e eu fiz parte da subcomissão que trabalhou um pouco a redação dos crimes, a definição dos crimes. Então, eu vou falar um pouco a respeito desse tema, destacando aqui quais são os crimes mais relevantes que nós acabamos atualizando ou inserindo na nova lei. A ideia toda, Sr. Presidente, foi, em primeiro lugar, modernizar, como o senhor mesmo disse, trazer para a atualidade aqueles que podem ser os crimes de responsabilidade; mas, em segundo lugar, também estabelecer de maneira mais precisa, de maneira mais taxativa quais são as condutas caracterizadas como crime de responsabilidade, porque, muitas vezes, uma lei penal tem termos imprecisos, tem termos abstratos demais, e isso acaba ensejando alguma insegurança na aplicação da lei ou até alguma arbitrariedade. Então, a nossa ideia foi tentar delimitar, da melhor forma possível, essas condutas políticas. Em primeiro lugar, o que nós fizemos? A lei de 1950, antes de mais nada, define quem é que pode cometer um crime de responsabilidade. Crime de responsabilidade é um crime próprio, não pode ser cometido por qualquer pessoa, só pode ser cometido por determinadas autoridades. Essa lista de autoridades de 1950 estava desatualizada, porque a Constituição de 1988 trouxe uma série de outras autoridades que também podem cometer o crime de responsabilidade - então, nós a atualizamos. Pelo anteprojeto de lei, quem é que pode, eventualmente, praticar o crime de responsabilidade e sofrer o impeachment? O Presidente da República, o Vice, os ministros de Estado, os comandantes das Forças Armadas, os ministros do Supremo, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República, o Advogado-Geral da União, os membros dos tribunais superiores, dos tribunais de contas, os chefes de missões diplomáticas de caráter permanente, os membros do Poder Judiciário e alguns outros previstos na Constituição, todos eles julgados nos seus respectivos tribunais, então, de acordo com as regras de jurisdição que existem na nossa legislação. |
| R | Pois bem, quais são os tipos penais, ou seja, os crimes de responsabilidades que podem ser praticados? Em primeiro lugar, nós deixamos claro que só crimes dolosos são crimes de responsabilidade, ou seja, aqueles praticados com intenção. Os crimes culposos, ou seja, por imprudência, por imperícia, não podem, não existem no caso de crime de responsabilidade. Então, ninguém pode sofrer impeachment por ser imprudente, por ser imperito, por ser negligente, só se pode sofrer impeachment se efetivamente houver uma intenção de praticar aquele crime doloso. Ele pode ser consumado ou tentado, evidentemente, e pode ser praticado por ação ou por omissão. Quais são efetivamente os crimes que... Claro que eu não vou ler todos aqui, mas eu vou destacar nestes minutos aqui que me restam, os crimes talvez mais importantes, que mereçam mais atenção de V. Exas. nessa lista que foi apresentada. Em primeiro lugar, foram estabelecidos os crimes que podem ser praticados pelo Presidente da República, então, pelo primeiro mandatário do Poder Executivo. E quais são esses crimes, Sr. Presidente? Em primeiro lugar, os crimes contra a soberania nacional - então, aqueles crimes que envolvem a manutenção do território nacional, que envolvem a preservação de segredos de Estado, que envolvem a preservação da posição do Estado numa eventual declaração de guerra. Tudo isso é relevante Em segundo lugar, são os crimes que podem ser praticados contra as instituições democráticas. O Congresso Nacional, em 2021, aprovou uma nova Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito e incorporou uma série de crimes no Código Penal para a proteção das instituições democráticas, e nós entendemos por bem, na esteira do que já foi decidido pelo Poder Legislativo, aproveitar essa inovação e inserir essas inovações na lei, no projeto de lei do impeachment. Então, por exemplo, o ato do Presidente da República de impedir o funcionamento dos demais Poderes é caracterizado como um crime de responsabilidade. Também é caracterizado como crime de responsabilidade o ato, por exemplo, de divulgar, direta ou indiretamente, por qualquer meio, fatos sabidamente inverídicos, com o fim de deslegitimar as instituições democráticas. Então, esses atos e uma série de outros foram caracterizados como crimes passíveis de impeachment. Para além disso, os crimes contra garantias fundamentais. Então, se o Presidente, por exemplo, estimular o preconceito ou incitar a violência, civil ou militar, ele também responde por crime de responsabilidade, cuja pena será o impeachment. Para além disso, os crimes contra a probidade na administração. Nós entendemos por bem inserir na lei do impeachment alguns crimes que também são crimes comuns, que podem ser praticados por qualquer funcionário público, mas, se praticados pelo Presidente da República, evidentemente ganham uma natureza política mais destacada, em especial os crimes de corrupção e os crimes de prevaricação. Então, para esses crimes também, além da pena normal, da pena de restrição de liberdade, também a pena de impeachment. |
| R | Para além disso, os crimes contra a lei orçamentária, então todos aqueles atos do Presidente da República contra a lei orçamentária - e aí, nessa parte, contribuiu bastante o Prof. Heleno Torres, que já esteve expondo nessa Comissão há algum tempo, mas a ideia era definir melhor esses crimes contra a lei orçamentária para evitar também uma imprecisão e uma insegurança jurídica. Esses os do Presidente da República. Em relação a outras autoridades, também foram previstos novos crimes, e aqui eu já caminho para a conclusão, para não estourar o tempo que me foi designado, mas foram definidos os crimes de responsabilidade que podem ser praticados pelos comandantes de Forças Armadas, como, por exemplo, manifestações políticas partidárias e incitação de greve ou de motim. Em especial, Sr. Presidente, e eu quero encerrar nesse último ponto, foram estabelecidos crimes que podem ser praticados por magistrados e por membros do Ministério Público. E aí, o Ministro Ricardo Lewandowski, que é alguém que conhece muito a magistratura e zela pelo cumprimento das regras disciplinares e éticas da magistratura, então, apoiou que nós prevíssemos esses crimes, já aproveitando a legislação anterior, mas atualizando-a. Então, por exemplo, o magistrado que participe de um julgamento sabendo-se impedido para participar desse julgamento comete um crime de responsabilidade; se ele exercer atividade político-partidária; se ele se manifestar a respeito de processos em andamento que ele é competente para julgar; se ele revelar documentos sigilosos e se ele tomar decisões fora da sua jurisdição, ele acaba também cometendo crimes de responsabilidade. Então, Sr. Presidente, como uma primeira aproximação, eu acho que é isso. Esses são os principais crimes que nós apresentamos como resultado desse trabalho, mais uma vez frisando que a nossa ideia não foi criar a roda, não foi reinventar a roda, não foi fazer qualquer espécie de pirotecnia, mas justamente pegar tudo aquilo que já foi construído pela tradição jurídica nacional e atualizar com base na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e com base na experiência que alguns membros da Comissão tinham, inclusive de acompanhamento da Casa Parlamentar, como o senhor mencionou o Dr. Bandeira, por exemplo... Pegamos essa experiência e essa jurisprudência e, de certa forma, apresentamos, então, esse anteprojeto que nós esperamos que seja apreciado por esta Casa. Então, Sr. Presidente, esta era a minha apresentação inicial. Fico à disposição das Sras. e dos Srs. Senadores para qualquer esclarecimento que se fizer necessário. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - O Prof. Pierpaolo Cruz Bottini é Professor da USP, Advogado. Excelente apresentação. Muito obrigado. Eu vou convidar agora para fazer uso da palavra a Sra. Amanda Rodrigues, Diretora do Lawfare Nunca Mais. A Amanda está aqui acompanhada... Nós temos aqui a honrosa presença da Cleide Martins e da Isabel Gomes, que são também diretoras da rede Lawfare Nunca Mais e são da Comissão de Estudo e Combate ao Lawfare daqui da OAB do DF Sejam bem-vindas! Amanda, você tem até dez minutos ou o tempo que você julgar necessário para fazer a sua exposição. A SRA. AMANDA RODRIGUES (Para expor.) - Obrigada. Bom dia a todos e todas! Eu queria, primeiramente, parabenizar pela iniciativa de todos os envolvidos na exposição desse PL. Dialogando com o Senador Rogério e sua equipe, ele fez uma proposta de emenda ao PL 1.388, que trata exatamente do lawfare. É muito bom estar aqui hoje, nesta Casa, no Senado Federal, com a representante da Suprema Corte e com tantos estudiosos da área de Direito. Eu não vou aqui adentrar no mérito do direito, até porque não sou advogada, mas sou, na verdade, uma vítima de lawfare. |
| R | Então, é muito importante a gente poder fazer este debate com a sociedade sobre essa prática, que lá nos anos 50 não existia, talvez, dessa forma no país e que hoje acontece de forma muito cruel. E o lawfare é exatamente o uso estratégico do direito para fins de deslegitimar e para prejudicar ou aniquilar o inimigo. É usar a arma, é usar as instituições, parte das instituições, para aniquilar as vítimas e esgotá-las do ponto de vista emocional, financeiro, físico, psicológico e emocional - como eu falei anteriormente -, e degradá-las do ponto de vista moral também, perante a sociedade. E esta pessoa aqui que vos fala é vítima do lawfare. Eu sou denunciada numa operação do Estado da Paraíba por ser casada com alguém, então está lá escrito na denúncia, uma denúncia pesada de misoginia, de preconceito, e está lá escrito... Eu não sou, inclusive, qualificada nessa denúncia, eu não tenho CPF, eu não tenho pai, não tenho mãe, não tenho endereço; eu tenho apenas um companheiro, e por isso eu sou denunciada - e tantos outros companheiros. E, quando eu me vi envolvida nessa operação, eu precisei estudar direito, porque eu me vi envolvida numa operação que envolveu a vara da família, a Justiça Criminal, a Justiça Eleitoral e a parte administrativa, o direito civil. Então, eu precisei estudar para entender o que é que eu estava passando. E aí eu perpassei a minha vida e fui estudar a vida de outras pessoas também. Eu terminei escrevendo um livro e virando Diretora da Rede Lawfare Nunca Mais, junto com Cleide e Isabel, em que a gente agrupa uma quantidade de vítimas de lawfare Brasil afora, que sofre das mesmas dores e que não tem consolo algum. Não tem consolo algum porque isso não é visto; porque nós sofremos processos que estão fora da Constituição; porque responder a um processo, qualquer um de nós aqui, qualquer pessoa da sociedade pode responder a esse processo. Agora, existem normas, a legislação existe para permear esse processo. Você não pode ser condenado antecipadamente na mídia, e, quando você vai olhar o seu processo, você já está condenado, execrado pela população, e dentro do seu processo não tem absolutamente nenhuma prova. E um promotor o denuncia, e um magistrado aceita essa denúncia, e aí você fica como eu estou há cinco anos: respondendo a um processo que não tem uma única prova, que não tem um único caminho de desvio de recurso algum. Inclusive eu sou denunciada porque participei de uma reunião de um conselho do qual eu era obrigada a participar por conta do cargo que exercia. Não defini exatamente nada, nada de importante, e sou denunciada por isso, mas sem qualificação. Mas não é para me atingir, é para atingir o meu companheiro. A minha denúncia... E é exatamente isso que acontece, é uma perseguição inclusive cruzada, em que se denuncia toda a família daquela pessoa que é escolhida para ser perseguida. E aí envolve todo tipo de ação possível. Tudo o que puder prejudicar aquela pessoa, que puder prejudicá-la financeiramente, que puder prejudicá-la emocionalmente vai ser feito - e com a pitada, com todo o sabor que a mídia faz, porque tudo é mandado antecipadamente para a imprensa, antes, inclusive, de a defesa ter acesso. Então, assim, eu acho de extrema importância... E o Brasil viu aí, foi desnudada a Lava Jato e tantas outras operações que, se você tiver a capacidade de entrar nos meandros, nas entrelinhas delas, nas combinações de magistrados e de promotores que acontecem Brasil afora, a gente vai ter a capacidade de desnudar o que acontece no país e de interromper isso que está acontecendo, porque aconteceu comigo, aconteceu com vários companheiros, mas, Senador, pode acontecer com o senhor amanhã, pode acontecer com a digníssima representante do STF, que está aqui ao meu lado, porque, num dado momento, alguém é escolhido para essa prática, e a sociedade precisa efetivamente olhar para isso. |
| R | Eu sofri vários danos, inclusive eu perdi um filho com cinco meses, ele nasceu morto, nasceu vivo e morreu porque não tinha capacidade de sobreviver, porque meu corpo não aguentava mais, meu corpo não tinha mais condição, não aguentava mais. O Reitor Cancellier se suicidou. Esta semana, uma vítima de lawfare que eu acompanhei, que está no meu livro, passou seis anos... é um advogado de um clube de futebol que foi denunciado por executar um parecer simples, que era sua atribuição, e foi inocentado semana passada, mas teve um infarto, perdeu tudo o que tinha, um rapaz de menos de 50 anos. Ele não morreu porque Deus protegeu esse cidadão, mas ele perdeu o escritório que tinha, perdeu o emprego que tinha, por pouco não perdeu sua esposa e seus filhos, porque era um casal companheiro, mas, se não fosse, tem muitos que perdem até sua família e ficam sozinhos. Então é algo que a gente precisa olhar e olhar com seriedade. Os processos se alastram nos tribunais e ninguém observa. Como é que você faz um estardalhaço na vida de alguém, você o acusa de um roubo milionário e não mostra o caminho desse dinheiro? Como é que alguém é acusado de lavagem de dinheiro, mas você não tem caminho do dinheiro, não tem o percurso. Então eu acho que essas coisas precisam ser observadas, que a sociedade precisa olhar, que esta Casa precisa olhar para o lawfare e precisa olhar Brasil afora, porque a gente sabe, a gente teve um caso emblemático, o caso do Presidente Lula, em que a gente pôde acompanhar as mensagens da Operação Spoofing, o que aconteceu ali dentro. A sociedade pôde ver o que aconteceu, mas é um caso de alguém muito importante no nosso país e no mundo, mas existem vários outros casos que estão margeados, em que pessoas estão sofrendo e continuam a sofrer, inclusive, Senador, pagando pena sem ter um crime estabelecido. Quando você analisa o processo, judicialmente falando, você não encontra absolutamente nada que possa condenar aquela pessoa. Tipificações criminais, fazem denúncia com tipificações criminais que não têm nada a ver com a narrativa. Eu acho que as instituições deste país são importantíssimas, o Ministério Público é uma instituição muito importante, o Ministério Público Federal, o STJ, o STF, os tribunais de justiça pelo país são fundamentais para que a nossa sociedade seja organizada, mas tem uma parte aí dentro, e aí a gente não pode generalizar nunca porque temos excelentes quadros nessas instituições, a gente não pode generalizar, mas é preciso que seja observado, é preciso que esta Casa encontre maneiras de controlar e de punir quem está punindo severamente a vida de outras pessoas apenas para fazer uma perseguição política, midiática ou seja ela qual for. Eu acho que o direito não pode jamais ser utilizado para este fim. Eu agradeço este espaço, até me desculpo se, por acaso, usei algum termo que não deveria, mas realmente é um tema que mexe muito comigo, porque eu ainda sofro hoje consequências gravíssimas do lawfare, a minha vida está interrompida por conta de uma perseguição que não me cabe e de uma luta que eu não tenho como lutar, porque não é de pessoas, é de instituições contra um cidadão, contra uma cidadã. E eu não encontro resposta onde eu gostaria, no âmbito da Justiça. Meu processo é postergado, postergado, postergado. |
| R | Um órgão diz que é eleitoral, o outro diz que é criminal. Ninguém julga, ninguém olha para isso. E eu estou prejudicada, mas aí eu não falo por mim. Eu falo por uma quantidade de pessoas neste país que sofreram e sofrem, margeadas por perseguições que estão sendo feitas com a utilização das instituições mais importantes do nosso país, que são as instituições de Justiça. Obrigada, Senador. Obrigada a todos. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Obrigado, Amanda Rodrigues, Diretora do Lawfare Nunca Mais. Eu convido agora e concedo a palavra ao Sr. Caio Chaves Morau, Professor Doutor da Universidade Católica de Brasília. O SR. CAIO CHAVES MORAU - Bom dia, Sr. Presidente. Gostaria de cumprimentar também as colegas que dividem a mesa comigo, os servidores presentes, João Trindade, Marina Barão, Luiz Freire. Gostaria, Sr. Presidente, em primeiríssimo lugar, tentando respeitar esse tempo de dez minutos, parabenizar o trabalho que foi feito pela Comissão. Primeiro por uma razão muito simples, é fácil, a partir de um texto pronto, fazer críticas e pensar em sugestões de aperfeiçoamento, mas o trabalho de fazer esse anteprojeto, que agora é um projeto de lei, é muito duro. Então, imagino o esforço que foi envidado pelos membros da Comissão de Juristas e parabenizo todos nesse sentido. Não há dúvidas de que essa lei que atualmente regra os crimes de responsabilidade precisa efetivamente ser aperfeiçoada. Ela tem 73 anos de vigência, ou seja, há 13 anos ela já é idosa. E o idoso pode envelhecer se mantendo jovem, não é o caso, me parece, dessa lei de 1950. É uma lei que precisa de grandes mudanças para que ela consiga caminhar neste cenário que nós temos hoje. Houve de fato mudanças no ano 2000. Então, a Lei 10.028, de 2000, foi promulgada no segundo mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Houve alterações muito pontuais nessa lei de 2000, mas eu penso que são alterações muito tímidas. A minha opinião é de que elas não conseguem fazer essa atualização, esse acompanhamento, que se faz tão necessário nos dias de hoje. Eu gostaria de elogiar quatro grandes pontos, Sr. Presidente, desse projeto de lei para que, na sequência, eu faça alguns comentários sobre eventuais sugestões que V. Exa. poderia eventualmente considerar na condição de Relator. Primeiríssimo ponto. O projeto de lei consegue, através de seus dispositivos, atenuar, mitigar esse poder quase imperial dos Presidentes das Casas. Um poder muito grande para dar andamento ou deixar de dar andamento a essas denúncias que são formuladas. Segundo ponto. A inclusão e o detalhamento da responsabilização de autoridades públicas que foram ignoradas pela lei de 1950 me parecem também um avanço importantíssimo. Como bem expôs o Prof. Pierpaolo, várias autoridades passam a estar objetivamente e detalhadamente sujeitas a esses crimes de responsabilidade. Em terceiro lugar, cria-se um rito próprio capaz de dar efetividade aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Esse me parece um ponto importantíssimo desse projeto de lei. E, como quarto e último ponto que eu enuncio, haveria muitos outros para elogiar, diz respeito à descrição de um modo técnico e objetivo das condutas que ensejariam os crimes de responsabilidade, também afastando aquelas prescrições que já não fazem sentido nesta quadra histórica. |
| R | Feitos esses apontamentos e elogios ao projeto de lei, eu gostaria de me focar também em quatro outros pontos, que eu penso que poderiam eventualmente ser considerados quando da produção do relatório pelo Senador Weverton. São eles: os crimes de responsabilidade atribuídos aos Ministros do Supremo, que também dizem respeito a outras autoridades; o prazo para exame das denúncias que são recebidas nas Casas Legislativas; a legitimação dos proponentes, dos denunciantes dos crimes de responsabilidade; e, por fim, o fatiamento das sanções eventuais que sejam culminadas aos denunciados. Com relação aos crimes de responsabilidade, então - esse é o primeiro dos quatro pontos -, o Capítulo IV Título II do projeto de lei já enuncia que estes crimes se aplicam também a ministros de tribunais superiores, ministros de cortes de contas, juízes e desembargadores de tribunais de justiça, entre outras autoridades, especialmente do Poder Judiciário, ou seja, o regramento sobre os crimes de responsabilidade de Ministros do Supremo, que se inicia no art. 14, é bastante amplo e cobre diversas outras autoridades. Um ponto sensível que eu notei, Sr. Presidente, que inclusive já é objeto de algumas emendas que foram apresentadas, é o fato de que o projeto de lei não contempla duas condutas importantíssimas que estão atualmente previstas na lei de 1950 e que não são replicadas. Quais são elas? A primeira: ser patentemente desidioso no cumprimento dos deveres do cargo; e a segunda: proceder de modo incompatível com a honra, a dignidade e o decoro das suas funções. Por que essas duas condutas me parecem muito importantes? A gente está diante de uma aparente contradição nesta parte. Sob o meu ponto de vista o projeto de lei enumera mais condutas que encontrariam subsunção em crimes de responsabilidade, mas, ao mesmo tempo em que ele cria mais condutas, essas condutas, na minha visão, não seriam suficientemente abrangentes para abarcar alguns tipos de situação. Então, eu penso que seria extremamente prudente manter essas duas condutas e incorporá-las ao texto do projeto de lei. Então, a conduta que pune os magistrados que são patentemente desidiosos e que exercem a sua função de modo contrário à honra, à dignidade e ao decoro, porque essas duas condutas são suficientemente abertas, mas não com uma abertura exagerada, para que nós consigamos contemplar alguns tipos de conduta que, a meu ver, não estão previstas nos incisos do art. 14. Além disso, a própria Loman, a Lei Orgânica da Magistratura Nacional, nos seus dispositivos do art. 35, determina, por exemplo, que os juízes não excedam injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar, para determinar as providências para que os atos processuais se realizem, os juízes precisam comparecer pontualmente à hora de iniciar o expediente, ou seja, a própria Lei Orgânica da Magistratura Nacional, que já disciplina como é que deve ser o comportamento dos magistrados, muito embora haja uma interpretação de que os Ministros do Supremo não se sujeitariam à Lei Orgânica da Magistratura Nacional, eu penso que o que está previsto nela é um reforço para a necessidade de que essas duas condutas estejam presentes no texto. |
| R | Eu penso que seriam uma garantia de uma maior sindicabilidade dos membros do Poder Judiciário, ou seja, essas duas condutas, em específico, me parece que poderiam abrir um panorama mais amplo para a responsabilização dos magistrados. Segundo ponto, o projeto de lei me parece que andou muitíssimo bem ao estabelecer alguns prazos, especialmente para o exame das denúncias que são remetidas a cada uma das Casas do Congresso Nacional. O art. 29, caput, deste projeto de lei fixa o prazo de 30 dias úteis. Eu penso, Sr. Presidente, que esses 30 dias úteis por, na prática, serem um mês e meio, talvez sejam um prazo um pouco demasiado, alongado. Penso que, eventualmente, poderia haver uma diminuição... (Intervenção fora do microfone.) O SR. CAIO CHAVES MORAU - Como? Exatamente, exatamente. Eu penso que, eventualmente, uma diminuição pela metade, quem sabe, 15 dias úteis - isso daria três semanas -, poderia ser algo interessante, porque também interessa ao denunciado ter uma decisão mais célere. A Dra. Amanda estava falando das aflições de quem se torna alvo de práticas de lawfare, mas, sendo práticas de lawfare ou não, o fato é que a pessoa que está envolvida em algum tipo de acusação quer uma resposta rápida. E eu penso que, neste ponto específico, eventualmente, seria interessante uma redução, quem sabe, pela metade: 15 dias úteis corresponderiam, na prática, a três semanas. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA. Fora do microfone.) - Isso seria na fase de... O SR. CAIO CHAVES MORAU - De recebimento das denúncias porque... (Fora do microfone.) ... os presidentes teriam esse prazo de 30 dias úteis para despacharem. (Intervenção fora do microfone.) O SR. CAIO CHAVES MORAU - Exatamente. Eu penso que, pelas autoridades envolvidas, pela gravidade das acusações, talvez fosse interessante, Senador Weverton, pensar em um prazo mais enxuto. Já vi que há emendas também nesse sentido, que propõem um prazo mais enxuto. Isso poderia dar uma celeridade a esse processo, ou seja, o fato de criar um prazo em si mesmo já é muito bom, já é algo excelente e absolutamente necessário, e eu penso que, para ficar melhor ainda, quem sabe ponderar sobre uma redução desse prazo de 30 dias. |
| R | O penúltimo tópico que eu gostaria de explorar - e já estou encaminhando para o final, Senador Weverton - diz respeito à legitimação, ou seja, para que as pessoas que estão efetivamente elencadas no rol deste projeto de lei apresentem uma denúncia por crime de responsabilidade. A decisão que a Comissão de Juristas tomou no anteprojeto, no sentido de excluir a possibilidade de o cidadão individualmente considerado oferecer uma denúncia por crime de responsabilidade, a meu ver, é bastante acertada. Isso não quer dizer que haveria uma redução na possibilidade de acesso dos cidadãos a esse instrumento, na possibilidade de formular uma denúncia; ao contrário, me parece uma decisão prudente no sentido de que pode e há efetivamente muitas denúncias que são apresentadas sem lastro, sem lastro jurídico, e que, com esse prazo que está sendo designado, acabariam representando um acúmulo de trabalho para as Presidências das Casas - e, muitas vezes, há um viés eminentemente político nessas denúncias que são apresentadas individualmente. Com isso, não se quer dizer que o cidadão vai perder a voz. O projeto deixa muito claro, e me parece também uma ótima solução que foi encontrada, usar-se o quórum, os requisitos que se utilizam para a proposição de uma lei de iniciativa popular. Então, se para uma lei de iniciativa popular a própria Constituição já prevê requisitos objetivos, me parece sensato e compatível que essa mesma lógica seja aplicada para os cidadãos que queiram apresentar uma denúncia. Então, se eles conseguirem se reunir de acordo com os critérios que são adotados para a lei de iniciativa popular, eles conseguem formular a denúncia. E não só isso; eles podem ser representados por sindicatos, pela OAB, por entidades, por partidos políticos, enfim, há muitas opções que estão à disposição do cidadão. Uma sugestão, eventualmente, Senador Weverton, para ser considerada seria uma espécie de contrapartida; quer dizer, se de um lado nós estamos tirando essa legitimação individual do cidadão, quem sabe, por outro, nós não poderíamos criar uma possibilidade para os Parlamentares, não individualmente, mas, quem sabe, respeitando, por exemplo, o quórum que se exige para a instalação de uma CPI. Então, se eu tenho pelo menos um terço dos Senadores ou Deputados que subscrevem uma denúncia por crime de responsabilidade, essa denúncia poderia ser aceita, poderia ser formalizada. Então, me parece justo tirar a possibilidade de que o cidadão individualmente apresente a denúncia, mas também me parece razoável que não só o partido político possa apresentar essa denúncia, mas também um terço dos Parlamentares de uma das Casas penso que seria um quórum interessante para que os Parlamentares fossem legitimados. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - No estudo que foi apresentado, o Parlamentar, individualmente, não poderia solicitar? O SR. CAIO CHAVES MORAU - Não pode. O Parlamentar, individualmente, no texto que está hoje, no projeto de lei, não pode individualmente apresentar. |
| R | Então, a ideia seria exigir, quem sabe, um terço, que seria o mesmo quórum exigido para a criação e instalação de CPIs. Se houver esse preenchimento de um terço no Senado ou na Câmara, eu penso que já poderia ser suficiente para a instalação, para o oferecimento dessa denúncia por crime de responsabilidade. Por fim, Sr. Presidente, para não me alongar - acho que já até ultrapassei o tempo regimental -, uma última consideração a respeito de um ponto certamente polêmico e que sei que foi muito ponderado pelos juristas que compuseram a Comissão, que diz respeito ao fatiamento da pena, ou seja, uma vez condenado o denunciado, será que haveria a possibilidade de julgar separadamente a perda do cargo e a inabilitação por oito anos? Como V. Exª bem apontou, Senador Weverton, esta Comissão de Juristas e os debates, evidentemente, não são casuísticos, não há nenhuma pretensão de se ater a fatos que aconteceram na nossa história. Mas, o fato é que, muito embora haja um precedente de 2015, 2016, da Presidente Dilma Rousseff, em que houve essa separação, eu penso - com a devida vênia a quem entenda de modo diverso - que o art. 52, parágrafo único, da Constituição não autorizaria essa divisão. O art. 52, parágrafo único, fala em perda de cargo com inabilitação, usa-se a partícula "com", e, a meu ver, essa partícula "com" não permitiria esse fracionamento. Se nós olharmos os arts. 67 e 68 do projeto de lei, nós veremos que há uma evidente separação. Primeiro, pergunta-se se a autoridade deve ser condenada à perda do cargo e, na sequência, demanda-se se deve haver a inabilitação por oito anos. E não é só isso, o projeto de lei ainda traz alguns pontos que podem ser considerados para diminuir essa pena de oito anos. Então, por exemplo, fala-se em considerar antecedentes, a personalidade, a conduta social do acusado, etc. O grande óbice, Presidente Weverton - e já encerrando a minha participação -, parece-me justamente o texto constitucional. Eu penso que, para haver esse fracionamento, seria necessária a propositura de uma PEC, de uma proposta de emenda à Constituição. Não me parece, diante desta redação do art. 52, parágrafo único, da Constituição, que haja essa possibilidade de fatiamento. Peço perdão a V. Exa. por ter extrapolado um pouco o tempo e agradeço pelo tempo e pela oportunidade de estar aqui. Muito obrigado, Presidente. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Prof. Caio, muito obrigado, excelente participação. Eu vou convidar agora, de forma remota, o ex-Ministro da Justiça e ex-Advogado-Geral da União José Eduardo Cardozo. Nós estamos combinando aqui, Ministro, que cada convidado tem a média de dez minutos para utilizar, da forma que achar melhor, para mais ou para menos, mas fique à vontade. E é bom revê-lo. O SR. JOSÉ EDUARDO CARDOZO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, Sr. Presidente. Peço-lhe desculpas. Eu queria estar aí de forma presencial, mas tive uma série de contratempos familiares que me impediram de poder, a tempo, pegar um meu avião para ir a Brasília. |
| R | Mas, seja como for, Senador Weverton, é um prazer e um privilégio poder estar com os senhores nesta manhã, inclusive com uma mesa tão seleta, formada por juristas, por pessoas como a Fabiane, que participaram ativamente da prática de um processo de impeachment. Portanto, eu fico muito feliz em poder participar. Eu queria apenas levantar alguns pontos, Presidente Weverton: primeiro, é muito bem-vinda essa lei - é muito bem-vinda! A lei atual consegue ser mais velha que eu, de idade, Presidente. Então, imagine como está a passada. Ela sobreviveu a várias Constituições. Ela ultrapassou a Constituição de 1967, a de 1988; foi obrigatório o Supremo se posicionar, numa ADPF, em relação ao que havia sido recebido, ao que não foi recebido... É muito bem-vinda! Do ponto de vista, digamos assim, da topografia jurídica, o projeto de lei é excelente: define situações, afirma procedimentos. Então, acho muito bem-vinda essa lei. Faz falta uma lei que atualize o processo de impeachment nos marcos do direito brasileiro. Alguns pontos, porém, eu acho que precisariam ser colocados. Eu vou apenas pontuar e ir para o meu WhatsApp, porque tenho muito pouco tempo. Cada um desses tópicos que eu vou mencionar e tantos outros exigiriam aí uma análise de três, quatro, cinco horas de debate entre os juristas e os membros do Senado Federal. O primeiro ponto: a grande discussão sobre a natureza jurídica do impeachment - grande discussão! Eu sempre me posicionei achando que ela não é função jurisdicional atípica realizada pelo Legislativo. Eu sempre entendi - e, já antes do processo de Dilma Rousseff, em congressos, em debates, sustentei - que é uma função administrativa atípica. E por que isso? Porque ela não gera coisa julgada. O próprio Supremo Tribunal Federal já entendeu que, pelos aspectos formais, o processo de impeachment pode ser revisto. O que não gera coisa julgada função jurisdicional não é. E, sendo função administrativa, isso nos desloca para um problema, Presidente Weverton: até onde o Judiciário pode controlar o processo de impeachment? Claro, a Constituição brasileira diz que nenhuma lesão de direito ficará afastada da apreciação do Poder Judiciário. E há uma grande discussão entre juristas, atuais e antigos, sobre o que é controlável ou não no processo de impeachment. Por exemplo, Paulo Brossard, o autor da mais festejada monografia sobre o tema, dizia que não se pode rever nada do processo de impeachment. O Supremo avançou e disse que aspectos formais podem ser observados. Eu, todavia, sigo aqui a linha de alguns juristas que entendem que, se eu estou diante de uma função administrativa, os pressupostos de controle do Poder Judiciário sobre o impeachment são os pressupostos de controle de validade do ato administrativo. Por exemplo, o processo de impeachment começando com desvio de poder, como, a meu ver, foi o caso de Dilma Rousseff, poderia ter esse aspecto controlado pelo Poder Judiciário. Um processo de impeachment que não tem os pressupostos fático-valorativos que ensejassem o motivo para o seu desencadeamento pode ser controlado pelo Judiciário, a meu ver. Não foi essa a posição tomada pelo Supremo Tribunal Federal no caso de Dilma Rousseff, que entendeu que o mérito não deveria ser considerado e englobou, no mérito, não só o plano de valoração política do ato, mas a afirmação do reconhecimento dos pressupostos fáticos para desencadear o processo de impeachment. Ora, a meu ver, uma oportunidade que essa lei tem é de delimitar o campo de até onde existe o controle jurisdicional, porque a Constituição, da forma em que se apresenta, traz dúvidas, traz polêmicas. |
| R | Outro ponto que gostaria de frisar, Sr. Presidente, diz respeito à questão relativa ao desencadear do processo de impeachment. Concentrá-lo nas mãos do Presidente da Câmara me parece algo não recomendável, embora a lei, o projeto de lei tenha melhorado bastante nesse aspecto. Por quê? Pelo que me recordo, o projeto de lei chega a dizer que o Presidente tem um prazo para apreciar essa matéria, todavia diz que no silêncio o pedido de abertura do impeachment fica rejeitado. Não me agrada essa solução - quero ser sincero, Presidente -, porque é muito fácil um Presidente do Legislativo não encarar um pedido de impeachment para deferir ou para indeferir e simplesmente silenciar - não me agrada. Algum outro procedimento deveria ser adotado: ou remeter à Comissão de Constituição e Justiça caso ultrapassasse o prazo, para uma avaliação da Comissão... Alguma coisa tem que ser pensada. Se o senhor me perguntar qual seria a solução melhor, eu fico aqui com o Sócrates: "Só sei que nada sei". Mas eu diria que a forma como está colocada me parece que não é a melhor, porque não cai bem no processo de impeachment a postura de Pôncio Pilatos: "Lavo a mão e rejeito". Isso não me parece o melhor. Outro aspecto - eu peguei aqui o final da magnífica exposição do meu antecedente sobre a questão do fatiamento, e eu faço aqui a minha fraterna discordância do doutor -, eu não tenho a menor dúvida de que a Constituição, do ponto de vista da interpretação literal, realmente diz que não poderia haver o fatiamento, como se julga. Literalmente é isso, mas no direito não se interpreta só literalmente. Há toda uma historicidade por trás disso. Esse fatiamento acabou sendo decidido pelo Presidente Lewandowski, a partir de um parecer de um jurista, professor da UNB, que formulou, que vem da Constituição dos Estados Unidos da América relativamente ao processo de impeachment. Mas, a meu ver, o principal argumento que se colocou diz respeito ao seguinte: o Supremo Tribunal Federal, quando julgou a ADPF, que redefiniu o processo de impeachment em um voto vencedor do Ministro Luís Roberto Barroso, mandou adotar o procedimento do rito Collor adotado na época. E vamos lembrar que, quando houve o impeachment do Presidente Collor de Mello, ele renunciou antes da decisão. E, naquele momento, o Presidente do Judiciário, que presidiu o impeachment, levantou a dúvida e falou: "Olha, ele renunciando, se eu entender pela literalidade da Constituição, perdeu a validade qualquer imposição de pena, inclusive de suspensão dos direitos políticos; se eu entender, interpretativamente, que há uma dissociação, que é uma pena acessória a despeito da literalidade da Constituição, eu poderei julgar em separado; caso contrário, não poderei fazê-lo". Então, o Presidente do Supremo Tribunal Federal coloca em votação - apesar da renúncia e da pena do objeto do impeachment - a suspensão dos direitos políticos. E o Senado aprova por suspender o Presidente Fernando Collor de Mello dos seus direitos políticos. O Presidente Fernando Collor de Mello vai ao Supremo e perde. Ou seja, o Supremo referendou a ideia de que havia uma dissociação das duas hipóteses a despeito da literalidade do texto constitucional. Ou seja, no fundo, o que se entendeu é que, dentro de uma interpretação sistêmica, nós não poderíamos permitir que um Presidente burlasse a Constituição, pedindo a perda do seu mandato previamente para escapar de uma pena que seria um efeito. Se fosse um efeito, aí sim, então, eu não poderia julgar. |
| R | Então, interpretando a Constituição a partir dos seus próprios valores, dos seus próprios princípios, o Supremo Tribunal Federal respaldou o Senado dissociando as duas coisas, dizendo que é melhor que isso seja tratado à luz da Constituição como situações separadas e não como um mero efeito, para evitar distorções sistêmicas que, obviamente, ocorreriam, como ocorreria no caso do Presidente Fernando Collor de Mello. Quero lembrar que, naquele momento, salvo melhor juízo, não existia aquela regra de que o Parlamentar não poderia exonerar, não poderia pedir exoneração, que seria processado se fosse pedir, antes de um processo, a renúncia ao seu mandato. E aquilo não estava colocado na Constituição nem para uma aplicação analógica, então, sistemicamente, se entendeu, do ponto de vista histórico, a partir da Constituição dos Estados Unidos da América, de precedentes, etc., que se deveria tratar, a despeito da literalidade da Constituição, como uma interpretação sistêmica, e isso foi recolocado no caso de Dilma Rousseff, ou seja, já havia uma jurisprudência, a ADPF disse que nós teríamos que seguir o rito de Fernando Collor de Mello, e, portanto, teria que o Presidente da Suprema Corte, e, no caso, o Presidente Ricardo Lewandowski, colocar em votação no Senado para que o Senado fizesse a interpretação autêntica ou alterasse a avaliação ou a afirmasse. Efetivamente, assim foi feito, o Senado Federal entendeu que deveria tratar, também, mais uma vez, como uma sanção autônoma. Isso ensejou a impetração de mandatos de segurança, esses mandatos de segurança não tiveram a liminar concedida, e está em julgamento, hoje, no Supremo Tribunal Federal, esse mandato de segurança, com o voto da Ministra Rosa Weber, um voto muito alentado, a Relatora, com o Presidente do Supremo Tribunal Federal, dizendo que não poderia reapreciar o campo dessa matéria que qualifica como interpretação autêntica, a partir de variantes interpretativas que o texto da Constituição oferece. Então, portanto, acho que a lei também fará uma interpretação autêntica, seguindo a tradição da jurisprudência brasileira nessa linha, e, portanto, se o Supremo entendeu que, no caso de Collor, deveria manter a situação, se, no caso de Dilma, se entenderá, me parece, essa mesma situação, acredito que a lei vem seguindo a trilha exatamente do que é melhor, a despeito da literalidade da Constituição, fazer uma análise de dissociação punitiva entre impeachment e suspensão dos direitos políticos, justamente para que o Senado possa apreciar, em cada caso, o que é melhor, não estando manietado por um texto da Constituição apenas por uma questão gramatical, mas estar submetido a uma lógica sistêmica e também, evidentemente, aos fatos do caso concreto. Em síntese, Presidente, peço desculpas pela exposição em velocidade, mas, como eu disse a V. Exa., eu precisaria, para cada tema desse, de umas dez horas de exposição, mas me cingi a apenas três aspectos que julgo absolutamente relevantes, que são a questão de até onde o Supremo Tribunal Federal pode controlar o processo de impeachment, a questão da concentração de poderes do Presidente da Câmara, e a afirmação de um silêncio tácito como rejeitando um pedido de impeachment - não me parece a melhor saída - e, em terceiro e último lugar, essa questão do fatiamento, que acho que, com todas as vênias de entendimento contrário, o entendimento adotado pela lei é o melhor. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Obrigado, ex-Ministro José Eduardo Cardozo. Eu vou, agora, convidar a Fabiane Pereira, assessora do Supremo Tribunal Federal. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Para expor.) - Senador Weverton, primeiro, eu quero externar a minha alegria de estar aqui debatendo este tema e parabenizá-lo imensamente por esta iniciativa. |
| R | Eu tive a oportunidade de ser Relatora da Comissão de Juristas que, por quase um ano, trabalhou intensamente nesse anteprojeto de lei apresentado pelo nosso Presidente Pacheco à Casa, e a relatoria, agora, é de V. Exª. Eu sou testemunha ocular de um trabalho extremamente sério que foi realizado por todos aqueles 12 juristas integrantes da Comissão. Realmente foram dias e noites de trabalho, um exercício de dever cívico muito bonito por cada uma dessas autoridades, que dedicaram seu tempo, seus estudos e sua experiência prática a ela. Nós tivemos na Comissão o nosso hoje Ministro Anastasia, que foi Relator aqui no Senado Federal, durante o processo de impeachment da Presidente Dilma. Tivemos também o nosso Presidente da Comissão, Ministro Lewandowski, a quem eu rendo todas as homenagens não apenas pela carreira jurídica que eu pude construir a seu lado, mas porque hoje ele é meu orientador no doutorado da USP. Graças a Deus eu estou finalizando essa trajetória acadêmica - na verdade, sempre começando, recomeçando, não é, Prof. Caio, nosso doutor aqui, civilista. O Ministro Lewandowski foi o Presidente do Supremo Tribunal Federal e, portanto, o Presidente do Senado para os fins do impeachment de Dilma Vana Rousseff. . Eu tive a oportunidade, à época, como Secretária-Geral do Supremo Tribunal Federal, de coordenar os trabalhos e de fazer essa interface tão interessante entre Judiciário e Legislativo. Foi uma experiência que carrego comigo e tenho certeza de que a prática acrescenta muito à teoria. E o nosso querido Bandeira, que foi escrivão do processo e, à época, era o Secretário-Geral do Senado, além de todos os outros grandes juristas: Prof. Heleno, o Ministro Rogerio Schietti, do Superior Tribunal de Justiça. Enfim, pararei por aqui, senão posso ter o disparate de esquecer o nome de algum nobre colega. Em segundo lugar, Presidente, eu quero também falar da minha alegria de dividir esta mesa com uma outra mulher, a Amanda, porque, vejam, esses temas políticos são temas normalmente reservados a espaços masculinos, e, à época, quando a Comissão foi instalada, eu me lembro de que a própria opinião pública reclamou pelo fato de eu ser a única mulher integrante da Comissão de Juristas. E, hoje, a nossa Amanda deu um testemunho absolutamente necessário, esse olhar feminino para o debate de um tema tão importante como o lawfare e impeachment no Brasil. Eu me lembro que, assim que nós terminamos o processo de Dilma, nós finalizamos a Presidência do Supremo Tribunal Federal poucos dias depois, e a Universidade de Salamanca, na Espanha, convidou-me, juntamente com o Prof. José Eduardo Cardozo, a dividir uma bancada lá naquela universidade para relatar a experiência do impeachment no Brasil. |
| R | Qual não foi a minha atenção para o fato de que determinados setores da Espanha tinham uma convicção de que Dilma Vana Rousseff havia sido impitimada, única e exclusivamente, pelo fato de ser mulher. Não é o tema, não trataremos sobre isso, mas isso apenas reforça o quanto é importante que a sociedade efetivamente tenha representatividade com as mulheres, hoje maioria no Brasil, aqui nas bancadas dos temas mais sensíveis para a nossa nação. A Amanda trouxe, então, o tema do lawfare, o tema em que muitas vezes as autoridades não respondem adequadamente pelos seus atos. E, Amanda, eu fico feliz em ouvi-la, porque essa foi uma preocupação cotidiana da Comissão. Nós tínhamos plena certeza de que o princípio republicano repudia - repudia - o exercício da autoridade sem responsabilidade. Responsabilidade é algo inseparável do conceito de democracia. Então, querido Senador Relator do nosso anteprojeto, eu quero falar que nós estamos absolutamente em um estado de incompletude constitucional quando não integramos autoridades que a Constituição exige que estejam, neste anteprojeto e agora neste projeto de lei, sendo responsabilizadas pelo crime de responsabilidade. E eu ouso aqui discordar de vozes que querem que nos mantenhamos restritos a Presidente da República, Ministros do Supremo Tribunal Federal, Procurador-Geral da República ou Governadores. Não, a Constituição elenca expressamente, fala que são sujeitos de crime de responsabilidade Advogado-Geral da União, os membros das Forças Armadas, da diplomacia, o chefe da diplomacia e tantos outros, como já foi mencionado não apenas hoje como também na primeira audiência pública. Então, nós estaremos sob um impasse: se retirarmos essas autoridades, conclamamos que o Congresso Nacional escreva um projeto de lei que retrate e tipifique os crimes de responsabilidade dessas autoridades, porque nós não podemos mais, no Brasil, viver um estado em que juízes, Ministério Público e tantas outras autoridades não respondam conforme os ditames da nossa Constituição Federal. Esse é um primeiro ponto que eu acho absolutamente importante retratar. Um segundo é com relação ao momento em que essa lei vigente hoje foi editada. Nós estávamos em uma lei que vinha regulamentar um comando de uma Constituição Federal de 1946. Era um outro momento absolutamente distinto da quadra vivida, vínhamos de um processo de autoritarismo. Eu tive a oportunidade de escrever, numa obra em homenagem ao Ministro Lewandowski, um artigo, e as minhas reflexões são no sentido de que a nossa atual Lei do Impeachment no Brasil é um estoque autoritário na nossa democracia. E por que estoque autoritário? Porque é uma lei que concentra nas mãos dos Presidentes das Casas se se deve ou não prosseguir com processo de tamanha gravidade como esse, um processo que traz rupturas, seja do Presidente da República, seja de um ministro do Supremo Tribunal Federal, seja de um Procurador-Geral da República. |
| R | Nós continuaremos ainda sob essa vigência? Não. A nossa Constituição de 1988 é plural, é democrática, conclama à colegialidade. As vozes são múltiplas. E nós estamos aqui exatamente no Senado Federal, a Casa maior de todas as vozes. É por isso que com muito cuidado a Comissão trabalhou a questão de se permitir que, em um recurso, a Casa possa debater a abertura ou não. Com relação ao prazo, Caio, o que eu posso lhe dizer é que esse é o menor dos problemas. Parece-me que o Senador Lasier Martins inclusive tem um projeto propondo acho que 15 dias úteis, se não me engano. A Comissão propôs 30. Esse é o menor dos problemas. O importante é que esse prazo exista, porque realmente não é possível que fique um vácuo sobre o prosseguimento ou não daquele processo, e isso vire inclusive assunto para a mídia, uma exposição indevida a essas autoridades. Elas também não podem ficar sujeitas ao lawfare, se é que a gente poderia fazer uma simbologia com o que foi retratado aqui. Porque também deve ser muito difícil para uma autoridade dessa saber que ela está aqui com a cabeça entregue numa bandeja e não se resolve se esse processo se arquiva ou se vai adiante. Então, da mesma forma que nós falávamos sobre responsabilidade, a responsabilidade precisa ser não apenas para as autoridades sujeitas, mas também para os autores e para aqueles que podem trabalhar pela abertura ou não. Falando em autores, realmente nós também trabalhamos, dentro desse princípio da responsabilidade, com que ninguém pode imputar nada a alguém sem ser responsabilizado pelo que imputa. É por isso, Caio, que nós trouxemos a questão da iniciativa popular e, evidentemente, para que, quando partidos políticos, sindicato ou os outros legitimados, a OAB, ou outros legitimados entrem com esse pedido, que esse pedido já venha lastreado minimamente, sob pena de serem responsabilizados, porque realmente - e o Caio como civilista - há aqui um dano à imagem. A autoridade não pode ficar exposta sem que depois se se responsabilize quem indevidamente quis muitas vezes se valer daquele período para o seu próprio momento de fama. Então, isso é muito, muito importante. |
| R | Bom, com relação à questão dos direitos e garantias do acusado, eu quero lembrar que a mudança extraordinária da Constituição de 1988 foi destinar direitos e garantias fundamentais topograficamente no início do documento. Se os senhores analisarem todas as outras Constituições do Brasil, nunca antes direitos e garantias fundamentais estiveram em primeiro lugar na Constituição. Na nossa Constituição, os primeiros artigos, o primeiro título é "Dos Direitos e Garantias Individuais". Nós tivemos Constituição em que esse foi o último título. Esse é o primeiro! O que isso quer dizer? Isso quer dizer que todos, absolutamente todos, devem ter os seus direitos e garantias fundamentais respeitados, inclusive a autoridade sujeita a um processo de tamanha envergadura como esse. Foi por isso que a Comissão teve toda uma preocupação com o direito à ampla defesa, ao devido processo legal, a que o Presidente da República, o Ministro do Supremo Tribunal Federal ou qualquer outra autoridade possa, a todo momento, ter acesso aos autos, uma defesa diligente, participativa e direito, inclusive, de ser ouvida. Nós tivemos, no período de Dilma Rousseff, mais de 13 horas dela sentada, inclusive ao meu lado, debatendo com cada um dos Senadores. Isso é direito e garantia a um devido processo legal, a poder retrucar, a poder contestar e participar ativamente. Então, nós ficamos muito preocupados com esses direitos e garantias fundamentais. E aí eu também preciso discordar, com a devida vênia, mas veementemente, do nosso Prof. Caio, porque está nos direitos e garantias fundamentais o princípio da individualização da pena. A perda do cargo é uma pena, uma pena máxima. A Constituição é muito clara: limita-se a perda do cargo com... O "com" é para dizer que este é o limite máximo, a soma dos dois é o limite máximo, mas, em nenhum momento, se consegue fazer a leitura, pelo menos da minha parte, de que eu não poderia ter um limite mínimo. Limites são aquilo que varia dentro de uma escala, e evidentemente, com os precedentes, desde Collor, nós já havíamos tido essa mecânica; não houve qualquer tipo de inovação nesse sentido. E, por fim, eu teria inúmeros outros também, mas acho que diversos aspectos já foram falados na primeira audiência e agora, e eu quero reforçar a necessidade de que esta Casa, de que o Congresso Nacional aprove uma lei do impeachment. Isso é urgente! Não é possível que nós tenhamos uma lei de 1950! Eu, como cidadã brasileira, me sinto absolutamente decepcionada com essa paralisia, com essa inércia do nosso Legislativo. Nós já temos 35 anos de Constituição federal e uma série de leis não regulamentadas pelo Congresso, apesar de um comando expresso da Constituição para que essas leis tenham eficácia plena no Brasil. E aqui eu falo desde a regulamentação à licença paternidade, ainda não tratada pelo Congresso Nacional, ao rito do impeachment. São 35 anos! |
| R | E as pessoas criticam o ativismo judicial do Supremo Tribunal Federal, mas o Supremo apenas responde às reivindicações e aos pedidos da sociedade. E sabem por que o Supremo está tendo que julgar? Porque o Congresso Nacional não legisla. Nós pedimos e conclamamos que o Congresso, efetivamente, cumpra o seu papel de legislar uma lei do impeachment no Brasil. E aqueles que ficam de plantão, chamando de casuísmo... Isso aí, desde 2016, eu que participo ativamente dessas discussões escuto. Nós já estamos em 2023! Chega! A gente pode facilmente resolver esse problema com uma vacatio legis. A gente pode muito bem... E nós não o fizemos. Aliás, é importante que se diga isso - e o João está aqui presente, o João esteve conosco na Comissão -: nós decidimos, Relator, no nosso último artigo, dizer que a lei estaria em vigor na data de sua publicação, mas isso não impede que outro seja o prazo estabelecido por esta Casa. Isso resolve o problema do casuísmo. Para que ninguém diga que nós estamos ou pensando em Bolsonaro ou em Lula, ou em quem quer que seja, coloque-se a lei para viger daqui para frente, daqui a dois anos, três anos, nas próximas eleições. Esse é um problema absolutamente fácil de se resolver. E não dá mais para a gente cair nessas falácias de mídia ou de opinião pública a respeito. Portanto, eu quero falar do meu orgulho de estar aqui, debatendo um tema de tamanha gravidade e importância para o Brasil, e eu espero que nós não deixemos mais que esse assunto seja retratado, ou discutido ou definido pelo Poder Judiciário, pelo Supremo Tribunal Federal, porque isso é competência do Congresso. E, em termos de impeachment, nada é óbvio. Ainda que nós já tenhamos tido precedentes, nós não sabemos se, em havendo um próximo impeachment, já estaremos com todas as balizas e os parâmetros definidos, não. E eu tenho um exemplo muito claro para dar aqui sobre isso. Foi por oito votos a três que o Supremo decidiu agora, no caso do último impeachment no Brasil, que o Senado poderia, sim, fazer um juízo sobre a instauração ou não do processo de impeachment. Vejam que interessante: o art. 51 da Constituição fala que compete privativamente à Câmara dos Deputados autorizar o processo e compete privativamente ao Senado Federal processar e julgar. E o Supremo, então, precisou decidir se, uma vez a Câmara autorizando o processo, o Senado estaria de mãos amarradas e seria, então, levado a... não poderia mais rediscutir o assunto quanto à abertura. Isso não foi unânime no Supremo Tribunal Federal! Nós tivemos três ministros que entenderam que o Senado estaria amarrado e que não poderia fazer um segundo juízo de admissibilidade. Os nossos Ministros Fachin, Dias Toffoli e Gilmar Mendes entenderam que, da leitura literal dos arts. 51 e 52, compete privativamente ao Senado apenas processar e julgar. Mas oito ministros entenderam que o bicameralismo, vigente no Brasil, autoriza que o Senado tenha, sim, competência para não instaurar, caso entenda que as provas são frágeis e, portanto, insuficientes para o prosseguimento de um processo dessa natureza. |
| R | Portanto, eu trago um exemplo muito claro da urgência de isso ser debatido pelo nosso Congresso. E eu, como cidadã brasileira, terei muito orgulho de participar desse processo até o fim. Muito obrigada, Presidente Weverton. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Eu que agradeço, Fabiane Pereira, Assessora do Supremo Tribunal Federal. Quero aqui cumprimentar e parabenizar a participação de todos que deram aqui a sua contribuição para esta relatoria, para a Casa e a sociedade como um todo, que está acompanhando esse importante projeto. Eu gostaria de fazer uma pergunta e já ir tirando algumas dúvidas. Primeiro, lá no anteprojeto, vocês chegaram a tratar da questão... Porque aí você está definindo um prazo para definir se aceita ou não, lá no início dele, a apresentação qualificada - vamos dizer assim, porque aí já não vai ser mais individual -; para essa apresentação qualificada da denúncia, o Presidente da Câmara, porque começa pela Câmara, teria o prazo de "x" dias - aqui ainda se vai ter a discussão sobre qual vai ser o prazo definido -, mas, nesses "x" dias, a pergunta é: há prazo para o ato cometido? Tipo, a autoridade cometeu esse crime, esse suposto crime que vai ser denunciado, três anos atrás ou no mês ou no ano em que se está... Foi tratado esse ponto? A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - Não, não foi tratado. (Fora do microfone.) Não foi tratado. É interessante o questionamento. Expressamente isso não foi tratado. Evidentemente, espera-se que tenha sido no exercício desta... deste... enfim, a depender da autoridade, não sei que termo eu uso, mas tem que ser ali durante o mandato. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - No exercício da função dele que ele esteja... A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - Isso, do mandato, exatamente. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Tá. E, no caso, por exemplo, de ser uma função vitalícia? Ele praticou um determinado crime de responsabilidade que pode ser denunciado, e ele o praticou 20 anos atrás. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - É interessante. Isso não foi tratado. Não foi, não. Realmente, o senhor trazendo... Um ministro que não é mais ministro, no sentido... Ministro é sempre ministro, porque o cargo é vitalício, mas eu digo um aposentado, um ministro aposentado, ele poderia responder por esse processo...? Isso não foi tratado, realmente não foi. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Tá. Eu queria pedir essa sugestão para os colegas Senadores e para a Comissão de Juristas, para que a gente tivesse esse gatilho, de até qual prazo se teria para poder fazer... A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - Seria quase uma prescrição, não é? O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Isso, pronto. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - Um prazo prescricional. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Para não virar casuísmo, não é? "Ah, aquela quadra ficou difícil, então vamos aproveitar aquele momento para poder daquilo ali fazer uma denúncia", por exemplo. O SR. CAIO CHAVES MORAU - Presidente, se senhor me permite, eu também penso que, claro, mesmo sem esse regramento a respeito, seria muito provável que qualquer denúncia que remontasse, por exemplo, a um tempo muito antigo, em que aquela determinada autoridade não estivesse exercendo o cargo, ou mesmo que o estivesse exercendo, acho que muito possivelmente seria derrubada judicialmente. Mas eu penso que vale, sim, a pena pensar num regramento para o projeto de lei, para que não haja dúvidas, para que se pense num prazo razoável, para evitar perseguições por fatos antigos também, entrando no que a Dra. Amanda havia dito. Parece-me relevante pensar a respeito, sim, Presidente. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Eu me lembro de que, na época do impeachment - eu era Deputado e participei da Comissão -, até pedi aqui o prazo, e foram três meses o que foi acatado naquele momento ali pelo então Presidente Eduardo Cunha. Tinha o grupo de juristas que apresentou, eles apresentaram um determinado período, e três meses depois foi o que foi aceito, diante de uma situação pública em que todos sabiam por que aquilo aconteceu, o que não é o caso desta audiência pública. Mas uma das preocupações - e eu percebo que, tanto oposição quanto Governo, todos vão ter e têm - é justamente esse cuidado de não se utilizar esse instrumento para virar um casuísmo. Por exemplo, eu fui Relator aqui da Lei de Improbidade. Ouvi muitos relatos - muitos relatos - de gestores, em que não teve absolutamente nenhuma possibilidade de dolo da parte deles em determinado ato durante sua gestão, e o promotor local vai lá e: improbidade administrativa nele, porque ele tinha condição de fazer, de qualquer forma ali, de propor uma ação tão dura dessa, como o nome já está dizendo, que é por um ato de improbidade. Hoje, já está claro isso aqui, no que nós aprovamos, que tem que ter realmente um dolo para você poder tipificar um processo tão duro, porque, quando você entra, principalmente aqui no Brasil, você já começa acusado, já começa numa situação de desvantagem muito grande. Então, temos que nos debruçar e ter essa preocupação em relação a como vamos fazer para evitar que venha qualquer tipo de dúvidas, na questão de possibilidade de casuísmos, nesse momento em que todo mundo está na rua, contra determinado chefe de poder ou autoridade, e que naquele momento ali se tenha uma possibilidade de se criar condição para utilizar esse caminho, porque tem outros caminhos legítimos que se poderiam usar. A outra questão é quando se trata - gostei do termo utilizado pela Fabiane - da incompletude constitucional, porque hoje essa legislação está ali. Há críticas, Fabiane, aqui, sobre a questão dos crimes de rede social, a chamada fake news. Eu queria que vocês fizessem um pouquinho desse comentário sobre como o grupo de juristas trabalhou e o que vocês entenderam a respeito, para poder avançar nessa proposição que foi feita, incluindo esse rol que hoje é uma realidade, a questão da internet. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Fora do microfone.) - É, o tema realmente... O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - E também, Fabiane, os que estão de forma remota, se quiserem dar sua contribuição, é só levantar a mão, e nós imediatamente já convidamos para falar. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Para expor.) - O tema realmente foi muito, muito debatido, porque nós vivemos... Todas as leis precisam ser um reflexo da sociedade em que estamos inseridos, isso é um fato. A gente sabe que é muito difícil uma lei absolutamente regrar todo e qualquer tipo de conduta, porque as condutas humanas são infinitas, mas nós precisamos ter uma legislação que seja adequada ao seu tempo. E aqueles que estão achando que essa lei veio em razão do 8 de janeiro precisam entender que esses estudos profundos foram realizados anteriormente, como o nosso Relator e Presidente dos trabalhos bem disse ontem em entrevista. |
| R | E nós estamos vivendo a era da tecnologia. Nós falamos de disruptura; a todo momento, nós estamos aqui conectados nas redes sociais. Então evidentemente que a questão da responsabilização na arena digital tem que estar presente numa Lei do Impeachment. Então realmente nós debatemos muito sobre as fake news, porque, às vezes, a verificação da veracidade ou não de uma informação não é tão rápida quanto o disparo dela, e pode trazer danos tenebrosos não apenas às autoridades, como, enfim, à população em geral. Então é por isso que nós debatemos e trouxemos a questão das fake news. E lembrando que as autoridades também precisam estar atentas àquilo que elas postam ou repostam, porque, realmente, se ela é uma autoridade pública, a sua responsabilidade é muito maior do que a do cidadão comum. Ela tem todo um aparato estatal, todo um apoio, um assessoramento para verificação desses dados. Então foram esses os parâmetros da Comissão. A responsabilidade sempre foi o olhar atento da Comissão. E a autoridade pública evidentemente tem maior responsabilidade do que um cidadão comum. É como a gradação do nosso crescimento. Uma criança não tem tanta responsabilidade quanto um adolescente, quanto um adulto. Então evidentemente que as autoridades precisam estar muito atentas, porque é um quadro novo, um momento novo. Às vezes, a gente recebe aquele dado digital e já tem o impulso de replicá-lo. Mas sabemos que os danos podem ser muito nefastos, dada a celeridade de viralização, é o termo do momento. Então às vezes, as pessoas comentam que dormiram fazendo uma postagem meia-noite, e 6h da manhã, já tem milhares, às vezes até milhão de visualizações. Então isso é muito ruim para a democracia, uma informação que não possa ser mensurada, verificada. Então, realmente foi uma preocupação da Comissão nesse sentido. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - O Prof. Pierpaolo também quer dar a sua contribuição. V.Sa. tem até três minutos. O SR. PIERPAOLO CRUZ BOTTINI (Para expor. Por videoconferência.) - Não, Sr. Presidente, eu só queria complementar sobre essa indagação que o senhor fez. Nós previmos, na verdade, entre os crimes do Presidente da República contra as instituições democráticas, o anteprojeto, no art. 7º, inciso V, em que há uma proposta de caracterizar como crime o ato de divulgar, direta ou indiretamente, por qualquer meio, fatos sabidamente inverídicos, com o fim de deslegitimar as instituições democráticas. É claro que isso não substitui todas as discussões em andamento, de inserção de fake news no Código Eleitoral e no Código Penal e em outros diplomas específicos, mas nós entendemos aqui, nessas discussões que a Dra. Fabiane mencionou, que esse dispositivo seria relevante para, de certa forma, inibir que o Presidente da República, seja por meio direto, ou seja através de redes sociais, dissemine fatos, aqui, com o fim de deslegitimar as instituições democráticas, mas a ideia aqui é coroar toda essa legislação sobre divulgação de notícias inverídicas, também estabelecendo na Lei do Impeachment uma menção a isso. |
| R | Então, só para complementar a resposta da Dra. Fabiane, eu achei que era importante fazer essa menção específica aqui. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Outra coisa que nós colocamos na audiência passada e que eu queria ouvir aqui dos senhores e das senhoras é a respeito de como que seria, ao juízo ou ao olhar de vocês, a aplicação dessa lei na questão da municipalidade, no que trata de Prefeitos, por exemplo. Prefeitos estão em outra legislação, mas como seria, ao juízo de vocês, a aplicação também dessa mesma lei no que se refere a essas autoridades municipais? A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Para expor.) - É, esse foi um tema também muito debatido e nós sabíamos que isso viria a ser tratado, retratado, num futuro momento, mas, como a comissão que nos instituiu, o ato que nos instituiu, melhor dizendo, foi muito específico no comando para um pedido de atualização da Lei 1.079, e como a Lei 1.079 não trata da municipalidade, nós ficamos com receio de extrapolar o munus que recebemos de atualizar a lei. Agora, a minha opinião, pessoal, é de que seria fantástico se se pudesse realmente trabalhar em conjunto com a discussão da responsabilidade dos gestores municipais. Também é uma lei antiga, um decreto-lei, se não me engano, de 1967, que também já não é mais consentâneo com os tempos vividos. Eu acho que seria fantástico se realmente pudesse avançar esse tema aqui no Senado. O SR. CAIO CHAVES MORAU (Para expor.) - Sr. Presidente, apenas um brevíssimo comentário a respeito desse tema. Eu acho que deve haver efetivamente uma prudência quando se trata de Prefeitos - e não foi, como bem disse a Profa. Fabiane, o escopo do projeto de lei. De fato, a conduta dos gestores municipais já tem esse tratamento pelo decreto mencionado e pela lei de improbidade administrativa, e sempre com aquela visão, considerando a extensão do nosso país, os diferentes níveis de instrução dos Prefeitos, Brasil afora, para evitar aquele fenômeno que nós chamamos de apagão das canetas. Quer dizer, o Prefeito sempre com receio de praticar algum determinado ato por medo de poder ser responsabilizado. É claro, tem que haver prudência na prática, mas é preciso também dar uma retaguarda para os Prefeitos, para que eles tenham essa possibilidade de atuarem como gestores. Eu penso que, tanto nessa questão, Sr. Presidente, como na questão anterior, em que V.Exa. tratou das fake news, eu, com uma visão pela minha formação mais no direito privado, penso que sempre é interessante analisar a extensão dos danos. Ou seja, uma situação é um juiz de direito em primeiro grau, que está contemplado aqui pelos crimes de responsabilidade, dizer uma frase infeliz em uma audiência com as partes; outra coisa muito distinta é um Ministro do Supremo Tribunal Federal, ou outra autoridade que esteja prevista na lei, fazer o mesmo discurso em uma entrevista à imprensa. Se o discurso é feito pelas redes sociais, qual é o alcance da rede social de quem fez essa declaração? Então, acho sempre importante analisar qual é a extensão desses danos, porque, muitas vezes, a mera conduta, ainda que seja reprovável... Nesse caso de fake news, é evidente que as condutas que menoscabam as instituições democráticas são todas reprováveis, mas há contextos em que essas falas adquirem uma densidade, produzem efeitos de maneira mais grave. |
| R | Então, eu só queria chamar a atenção, Senador Weverton, para essa necessidade de vislumbrar, no caso concreto, se houve uma extensão considerável dos danos ou se aquela informação inverídica foi circulada em um meio mais restrito. E acho que há aí uma necessidade de graduar e individualizar eventuais punições. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Muito bem. Ao tempo também que a gente faz a seguinte reflexão de que se isso não seria também uma maneira de proteger os Prefeitos, porque você tem centenas de casos, Brasil afora, de Prefeitos que, às vezes, ficam reféns do outro Poder por conta de conjunturas, discussões políticas ali locais e acabam sendo, muitas vezes, vítimas de todo tipo de achaques possíveis por medo, porque hoje é muito frágil, é muito aberta a forma como é... Quando se decide que vamos cassar, chegam lá e fazem, mas dentro de uma legislação que poderia, na verdade, dizer: "Olhe, se politicamente não está alinhado, tem que ter responsabilidade no que seria imputado àquele chefe daquele determinado Poder". Também seria um ponto em que eu queria pedir sugestão também para que... Não estava no ato, mas eu vou agora instituir um novo ato pedindo contribuição da Comissão. (Risos.) Nós iremos também conversar aqui com os colegas Senadores, mas que pudessem, de repente, unificar para podermos ter tudo junto e, com isso, facilitar, até amanhã, eventual intervenção do Judiciário, o que facilitaria esse processo. O Ministro Lewandowski até chegou a dizer, no caso do Prefeito, quem seria que faria a sessão para julgar aquele determinado... Seria o juiz da comarca, por exemplo, em vez de ser o Presidente da Câmara para ser mais isento? Então, acho que nós poderíamos pensar, de repente, algumas possibilidades que dessem também essa segurança e também essa condição. Falando em segurança, muito também tem se ouvido já nos comentários sobre a questão do exercício da defesa, da acusação, da paridade que se vai ter durante esse eventual processo, com esse rito bem definido, para não ser um rito de acordos e sim um rito que está lá claro na legislação, para que se evitem conchavos ou qualquer tipo de ato que venha a ficar desproporcional para quem quer que seja o envolvido. E, na questão dos militares, eles não estavam antes e agora estão? O que é que muda dentro desse novo formato sugerido ao Congresso Nacional na questão dos militares na Lei de Responsabilidade? A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - De novo, reforço a ideia de que a Comissão apenas trouxe as autoridades que a Constituição expressamente definiu como autoridades sujeitas a crime de responsabilidade. E realmente - não vou me lembrar agora de memória qual é o artigo, o dispositivo constitucional que traz essas autoridades - Comandantes de Exército, Marinha e Aeronáutica estão expressamente na Constituição Federal. Isso não foi invenção da Comissão e muito menos casuístico. Em absoluto! De novo, qualquer pessoa que estudar a Constituição... E hoje em dia fica fácil, a gente pode abri-la remotamente, faz aquele Ctrl-F, não é? Ou localizar. Se a gente pesquisar a palavra "responsabilidade", vai sair cada uma das autoridades que precisam ser sujeitas ao crime de responsabilidade. E esses comandantes estão lá na Constituição Federal. Então, não teve em absoluto nada a ver com ... |
| R | O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Então, não seria o membro das Forças Armadas, seria o comandante... A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - Isso. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - ... daquela... A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - Somente... O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - O comandante. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - A Constituição é muito clara: somente os Comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - E os membros do Ministério Público? A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - Todos eles. Aí, inclusive, um promotor. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - O promotor da comarca lá de Afonso Cunha, lá de Penalva, lá de... A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - Sim. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Ele é submetido a essa legislação? A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - Ele é sujeito, ele está sujeito porque a Constituição fala em todos os membros do Ministério Público. Aqui a Constituição não elencou somente o Presidente do Ministério Público Federal não. Inclusive, ele tem... O Procurador-Geral da República é um caso apartado, mas todos os membros do Ministério Público e todos os membros da magistratura, juízes... O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - O juiz da comarca de onde quer que ele esteja, de qualquer município do Brasil, também está submetido a essa legislação? A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - Exatamente. Juízes substitutos. Não precisa ser titularizado, não é? Juiz substituto já está sujeito aqui à nossa lei. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Eu fiz essa provocação pedindo também para que vocês se manifestassem, porque durante a semana também fiz esses esclarecimentos, mas é importante, para quem está nos assistindo, ter uma ideia da abrangência do projeto. Acho que um ponto fundamental que foi colocado hoje, vamos reafirmar, porque sabemos que ainda terá, infelizmente, gente que vai chegar lá para o mês de novembro e falar que está muito açodado o debate, que precisa de mais tempo e que precisa conversar mais, como acontece em outros temas, em outras quadras, ocasiões, enfim. Mas vamos vencendo aos poucos, de forma contundente, de forma muito focada. Eu acho que essa missão que foi dada a esta Comissão e agora dada ao Congresso e a mim conferida essa responsabilidade de tocar é fundamental, e espero que nós possamos, ainda este semestre, entregar essa matéria, pelo menos no ponto para que a Casa possa deliberar. E é uma decisão política dela se vai ou não, mas pelo menos está madura para isso. Então, eu queria... A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Fora do microfone.) - Senador, eu queria só... O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Claro. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - ... um aparte, usando um pouquinho do termo aqui dos senhores. Eu me esqueci de um dado histórico que eu acho tão interessante. Impeachment é um tema tão sensível que a primeira liminar em habeas corpus no Supremo Tribunal Federal, que foi no ano de 1964, foi dada, foi deferida essa liminar, em um tema de impeachment. Discutia-se o impeachment do Governador de Goiás. Ele estava naquele momento ali conturbado do autoritarismo e queriam cassá-lo, e ele pediu uma liminar em habeas corpus no Supremo Tribunal Federal, que nunca antes havia concedido liminares em habeas corpus, e esse instituto foi criado justamente num processo de impeachment. Eu acho isso muito significativo. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA. Fora do microfone.) - Foi concedido? A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA - Foi concedido, foi deferido. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Naquele processo de impeachment da Dilma, eu utilizei uma frase, que ontem também nessa entrevista a repórter lembrou, a Renata, da qual nem eu estava mais me lembrando. E ela disse: "Naquele impeachment você disse que remédio para governo ruim é voto, não é golpe.". Você não pode utilizar... Essa que tem que ser a preocupação de todos, para não acontecer isto: uma lei que está sendo feita para amanhã perseguir o Lula ou o Bolsonaro. Não pode ser isso porque isso é para o futuro, isso é para frente, não pode ser para pessoas - jamais! Não tem como. Então, você não pode também ter uma legislação que vire um instrumento que, naquele momento ruim, politicamente, de quem quer que seja da autoridade ali constituída, seja esse tipo de instrumento utilizado para ferir a nossa democracia, que nos custa muito caro e tem que ser todo o tempo ali... como até falei ontem, é como um casamento, você tem que estar todo o tempo ali reafirmando, todo o tempo conquistando, todo o tempo mantendo, cuidando, porque não é fácil. Então, é muito, muito... Temos que ter muito desprendimento - todos - para que todos baixem aqui a temperatura, se desarmem e entendam que essa legislação está sendo construída para o futuro, para a garantia da democracia e para o fortalecimento das instituições; assim, nós conseguiremos avançar. Então, eu gostaria aqui de passar a todos. Nós estamos ainda com o Prof. Pierpaolo e com o Prof. Cardozo ainda na... (Pausa.) Já saíram. Então, agradeço a eles a presença. Eu queria aqui conceder até três minutos para que a Amanda pudesse aqui se despedir e fazer a sua fala final. Em seguida, para o Prof. Caio e para a Fabiane. A Amanda está com a palavra. A SRA. AMANDA RODRIGUES (Para expor.) - Bom, eu queria agradecer, neste momento, esta oportunidade de participar deste debate. Queria parabenizar a Dra. Fabiane. É muito bom ter uma mulher com essa consciência democrática no STF - é extremamente importante. Sinto-me feliz enquanto cidadã de tê-la lá. Agradeço a presença de todos e desejo, como cidadã, que este PL seja aprovado e que todas as discussões ainda se desdobrem para que a legislação do nosso país, com respeito à responsabilização dos entes e de todos que tenham que ter essa responsabilização, seja aprovada da melhor forma, porque nós não podemos presenciar o nosso país tendo a sua democracia atacada a todo momento, tão fragilizada, e ver também as instituições de Justiça sendo utilizadas como tribunal de inquisição. Ver pessoas sendo torturadas através das instituições de Justiça é um momento muito triste do nosso país, e eu espero que a gente possa virar essa página com o pé direito, com este PL aprovado. |
| R | E eu tenho certeza de que esse grupo de estudo está fazendo isso da melhor forma, junto com esta Casa Legislativa. Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Obrigado, Amanda. Sr. Caio. O SR. CAIO CHAVES MORAU (Para expor.) - Senador Weverton, muitíssimo obrigado por esta oportunidade. Gostaria de agradecer também aos colegas e aos presentes, apenas reafirmando o que disse no início. Acho que nós estamos no momento ideal para que esse projeto de lei possa tramitar e ser finalmente aprovado. Não há como continuarmos com um diploma de 73 anos, que, como disse, poderia ter se mantido jovem, especialmente com as alterações no ano de 2000, mas não foi assim. Ele está efetivamente defasado, com lacunas que precisam ser preenchidas. Nos casos concretos, o Supremo tem se manifestado com muita recorrência para preencher essa falta de detalhamento da lei de 1950, de modo que eu penso que o projeto, como está hoje, está, de fato, muito interessante, muito generoso no sentido de atender às demandas que se apresentam no dia de hoje, nos momentos que nós estamos vivendo nessa quadra histórica. E essas sugestões que eu apresentei brevemente... e também tive o cuidado de ler todas as emendas que foram apresentadas pelos Senadores. Há ali excelentes emendas, algumas das quais contemplam os pontos que eu tratei hoje. Então, eu penso, Senador Weverton, que V. Exª terá nos debates que ainda virão, e em razão das emendas que foram apresentadas, muita matéria para debate. Eu penso que V. Exª terá diante de si boas emendas - e já tem -para aprimorar o texto, que, no geral, como disse, está excelente, mas que, com esses pequenos ajustes, penso que poderá ficar melhor ainda. Desejo a V. Exª muito sucesso para cumprir essa missão na relatoria. O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) - Concedo a palavra à Fabiane Pereira. A SRA. FABIANE PEREIRA DE OLIVEIRA (Para expor.) - Senador Weverton, a mim realmente agora só resta agradecer-lhe imensamente e parabenizar uma vez mais pelo excelente trabalho. Eu tenho reafirmado muito isso, nós precisamos sair desse estado de incompletude constitucional. Há diversos pontos em que a nossa Constituição não está regulamentada ainda, são 35 anos, e a lei está sobrevivendo porque ela é teimosa em sobreviver, a Lei 1.079, porque ela já está em frangalhos, totalmente recortada, picotada, e até hoje os temas de impeachment de Governador de Estado chegam ao Supremo cotidianamente. Nós tivemos agora o caso de Santa Catarina. Novamente foram até o Supremo Tribunal Federal - estou falando agora de dois anos atrás - querendo saber, perguntando o que ainda vale da Lei 1.079, apesar de o Supremo ter debatido na ADPF 378 a Lei 1.079. E, na ADPF 379 - eu a tenho aqui porque isso aqui é meu estudo constante -, foram quase 500 páginas de decisão do Supremo Tribunal Federal e mesmo assim, até hoje, os Governadores ainda têm dúvidas sobre o que sobreviveu da Lei 1.079. Então, nós precisamos superar esse problema, e eu tenho certeza de que o nosso Congresso vai chegar a bom termo, e estaremos muito felizes com isso. Muito obrigada mesmo pela iniciativa. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA. Fala da Presidência.) - Obrigado, Fabiane. A nossa próxima audiência pública, que continuará instruindo esta relatoria da Lei nº 1.388, de 2023, que trata sobre a Lei de Crimes de Responsabilidade e disciplina o respectivo processo de julgamento, a chamada Lei do Impeachment, fica marcada para próxima quinta-feira, dia 28, às 10h da manhã, aqui na Comissão de Constituição e Justiça. Todos os assessores dos colegas Senadores e Senadoras que estão nos acompanhando mantenham-nos informados das reuniões e das audiências que estão acontecendo, porque, logo depois do dia 28, eu já irei pedir ao Presidente Davi Alcolumbre pauta, aqui na CCJ, para começarmos o devido processo de discussão para, se Deus quiser, podermos já deliberar sobre este importante projeto. Nada mais havendo a tratar, eu declaro encerrada a presente sessão. (Iniciada às 10 horas e 20 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 13 minutos.) |

