Notas Taquigráficas
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| R | O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Havendo número regimental, declaro aberta a 51ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Assuntos Sociais da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura. A presente reunião atende ao Requerimento nº 61, de 2023, da CAS (Comissão de Assuntos Sociais), de minha autoria, para a realização de audiência pública destinada a debater a prescrição indiscriminada de medicação para tratamento do TDAH e de outras doenças neurológicas ou neuropsiquiátricas em crianças e adolescentes, como o medicamento Ritalina. Informo que a audiência tem a cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado, da Rádio Senado, e contará com os serviços de interatividade com o cidadão, através da Ouvidoria desta Casa, pelo telefone 0800 0612211 - repito, 0800 0612211- e pelo Portal e-Cidadania, por meio do endereço www.senado.leg.br/ecidadania, que transmitirá ao vivo a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos expositores via internet. |
| R | Então, você que está nos assistindo agora, na manhã desse dia 27 de novembro de 2023, nós temos a possibilidade de encaminhar a sua pergunta sobre essa temática para os nossos especialistas aqui, que vão debater conosco nesta manhã - até entrando no começo da tarde -, um assunto que particularmente tem me deixado muito preocupado. Eu vou explicar daqui a pouquinho o porquê. Eu quero registrar também a presença da Dayane Andrade, que é do Movimento para a Inclusão, uma ONG. É aqui de Brasília? (Pausa.) É aqui de Brasília. Seja muito bem-vinda aqui a esta Comissão. Se a gente tiver um tempinho no final para você se quiser fazer alguma pergunta, alguma colocação, a gente, pelo espírito democrático que nos norteia, concede a palavra. Esta audiência se propõe a discutir um tema de extrema importância para a sociedade brasileira: a prescrição indiscriminada de medicamentos para o tratamento do transtorno de déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) e outras condições neurológicas ou neuropsiquiátricas, notadamente o medicamento Ritalina. No contexto brasileiro, observamos um aumento considerável nas taxas de prescrição de medicamentos para o tratamento de TDAH, incluindo a Ritalina. Estatísticas revelam que o Brasil é um dos maiores consumidores desses medicamentos na América Latina. Tal cenário nos impõe a responsabilidade de questionar e refletir sobre as práticas de prescrição adotadas em nosso país, as condições que levam a esse padrão e os impactos no longo prazo na saúde e no desenvolvimento de nossas crianças e adolescentes. A falta de regulamentação mais rigorosa e de diretrizes claras para a prescrição de medicamentos para o TDAH no Brasil é uma questão que merece nossa atenção. Precisamos garantir que profissionais de saúde estejam devidamente capacitados e comprometidos com abordagens multidisciplinares e individualizadas, levando em consideração as especificidades de cada criança. Ademais, é relevante considerar as disparidades regionais no acesso a diagnósticos especializados e a tratamentos adequados. Em algumas regiões do Brasil, a infraestrutura e os recursos para diagnóstico e acompanhamento adequados podem ser escassos, o que agrava a situação e aumenta a probabilidade de prescrições imprecisas. |
| R | É necessário também refletir sobre o papel das políticas educacionais e sociais em nosso país. Muitas vezes, a pressão por resultados acadêmicos e a falta de recursos nas escolas contribuem para a busca por soluções rápidas, com medicalização em detrimento de abordagens mais abrangentes, que considerem o ambiente educacional e social em que nossas crianças e adolescentes estão inseridos. Nesta audiência, conclamo todos os presentes a compartilharem suas experiências e conhecimentos a fim de construirmos uma compreensão mais ampla sobre a prescrição de medicamentos para o TDAH no contexto brasileiro. Que as discussões aqui realizadas nos guiem a todos para a formulação de políticas públicas mais eficazes e responsáveis, assegurando o bem-estar e o desenvolvimento saudável de nossas futuras gerações. Para participar deste debate, e já vou passar a palavra, eu queria agradecer a presença da Dra. Izabel Augusta Hazin Pires, representante do Conselho Federal de Psicologia; da Dra. Thicciana Maria Firminiano - desculpa, é bem italiano, não é? -, que também, gentilmente, veio presencialmente aqui conosco; da Dra. Isaura Sarto, advogada. Hã? A SRA. ISAURA SARTO (Fora do microfone.) - Mãe atípica de menino com autismo e TDAH. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Mãe também, de criança com espectro autista e TDAH. Muito bem-vinda. É ótimo, Isaura, a sua presença aqui. Também quero saudar a participação, por videoconferência, da Dra. Maria Aparecida Moysés, que vai participar, por via remota, daqui a pouco conosco. Ela é docente do Departamento de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas. Muito obrigado pela sua participação, Dra. Maria. E também agradeço a participação, por videoconferência, da Dra. Christina Hajaj Gonzalez, que é Conselheira do Conselho Federal de Medicina. Muitíssimo bem-vinda também. Obrigado pela participação. Eu vou rapidamente contar o que me motivou a sugerir esta audiência pública para os colegas Senadores - e eu agradeço aqui ao Senador Humberto Costa, que é o Presidente desta Comissão e que colocou em votação o nosso requerimento -, que foi aprovada por unanimidade na Casa. Demonstra uma preocupação realmente com a saúde do brasileiro. |
| R | Eu sou uma pessoa muito curiosa nos assuntos, em todos os assuntos, e essa questão da criança me toca profundamente a alma. Quando a gente tem prescrição médica, eu já fico tranquilo, porque médicos têm a vocação, foram capacitados, estudaram, e eu já não vejo tanto problema com relação a isso. Mas o uso indiscriminado da Ritalina, que me parece ter virado uma cultura até para comodidade, muitas vezes, de pais, de nós pais... "Ah! A criança está muito agitada, não sei o que, vamos dar uma Ritalina". Eu não sei a que ponto isso está chegando no Brasil, mas eu ouço isso acontecer muito fortemente na sociedade. E eu fico na dúvida: isso, claro, tem algum efeito a curto, médio, longo prazo para aquele ser humano, para aquela criança, para aquele adolescente. Que impacto isso tem? Essa é uma pergunta que eu já queria deixar para todos. Que sequelas isso pode ter? E também, com relação, eu assisti a um filme, na verdade, é um documentário, que está aí na Netflix, assustador, que se chama O Mistério de Maya. É um caso diferente, é um caso de uma criança que começou a ter problemas com dez anos de idade. Ninguém sabia identificar, foi a vários médicos, a família. E foi prescrito um medicamento, cetamina, é uma coisa assim. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - É um medicamento, é um alucinógeno. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Cetamina, não é? É um alucinógeno que os médicos, lá nos Estados Unidos, começaram a prescrever. A criança ficou numa situação de partir o coração, mas ela foi melhorando a partir desse medicamento. Foram vários médicos. A família não procurou um médico só, a família procurou vários médicos. O que eu também faria com meus filhos, procuraria vários médicos. E aí, olha só o que foi que aconteceu com essa família. Eles fazem, teve que fazer uma cirurgia, chegou ao ponto de fazer uma cirurgia, uma indução ao coma. Segundo os médicos, a criança ficou seis dias em coma, porque era um procedimento importante para a cura, uma coisa assim. E aí, quando volta para os Estados Unidos, a criança estava bem melhor, mas algum tempo depois teve uma recaída. E nessa recaída tiveram que levar a criança imediatamente para um hospital lá nos Estados Unidos. E nesse hospital, a mãe, aflita: "Olha, tem que dar esse medicamento, ela precisa, tem que dar". E o hospital: "Não, a gente não faz isso". "Mas está aqui, os médicos a que eu já levei aqui disseram." E a criança sofrendo dores terríveis. E aí, um médico do hospital, não sei quem foi exatamente, ficou chateado, se sentiu ofendido. Viu que a mãe estava querendo ali influenciar, tomar... E naquele momento, foi chamado o Conselho Tutelar dos Estados Unidos. Foi uma tragédia que aconteceu a partir daí. Eu não vou contar, porque senão você não vai assistir. Eu acho importante assistir a esse filme, porque eu tenho receio de que isso aconteça no Brasil. O Estado tomar, como tomaram, a guarda da criança, deixaram inclusive os pais sem ver a criança, ficou lá isolada no hospital, porque estavam dizendo que foi um abuso de medicamentos, por parte dos pais, para a criança. Olha essa situação. |
| R | Ai eu fico imaginando: e a Ritalina, que é dada muitas vezes sem prescrição médica para crianças? Isso é um abuso? Acaba de chegar aqui a Dra. Mariana Pinto, que é psicóloga. Muito obrigada pela sua participação presencial aqui nesta sessão, que eu considero histórica, porque é um tema tabu, e a gente tem que tratar disso aqui dentro do Senado, porque se uma vida for poupada ou o sofrimento de alguma criança, de mães, de pais for poupado por causa disso, para mim já valeu a pena. Eu acredito muito no despertar das consciências das pessoas. Então, uma audiência pública dessa é para levar informações. Nós estamos aqui com um grupo seleto de autoridades no assunto, que o conhecem e se propuseram a vir aqui para trazer soluções, fazer um debate. Se for necessário que a gente faça mais audiências sobre isso, nós vamos propor, porque eu fico muito preocupado com o efeito devastador que o uso indiscriminado desse medicamento, que virou moda, esteja causando para as futuras gerações no Brasil. Então, essa é a motivação. Eu queria mais uma vez agradecer a todos vocês que estão aqui. Eu vou tomar a liberdade de começar com você, Izabel, tá? A título de procedimento, se vocês concordam, eu vou estabelecer 20 minutos. Olha, já está chegando um monte de pergunta aqui. É a população participando; a população cheia de dúvidas. Eu vou já ler todas essas perguntas que estão chegando. No final, a gente faz um bloco, com cada um tendo cinco minutos para fazer as considerações finais, cada uma das convidadas - são só mulheres hoje, não é? Que beleza! Eu vou dar cinco minutos para as considerações finais e, se se sentirem confortáveis, para responder às perguntas. E eu vou fazer questão de ler todas aqui. Então, 20 minutos está bom? (Pausa.) É mais do que suficiente? Então pronto. Serão 20 minutos e, se passar um pouquinho, a gente dá uma tolerância. É importante que vocês possam compartilhar as experiências de vocês. Eu tenho certeza de que vai frutificar muito essa reunião aqui, inclusive com sugestão de políticas públicas. Se vocês tiveram para a gente, para a gente propor aqui no Senado Federal, serão muito bem-vindas. Então, com a palavra a Sra. Izabel Augusta Hazin. Falei certo? A SRA. IZABEL AUGUSTA HAZIN PIRES - É Hazin. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Hazin. Sra. Izabel Augusta Hazin Pires, que é representante do Conselho Federal de Psicologia. Muito obrigado pela sua participação, Izabel. A SRA. IZABEL AUGUSTA HAZIN PIRES (Para expor.) - Eu que agradeço. Então, bom dia, Senador Girão! Bom dia, minhas colegas de mesa! Bom dia a todas as pessoas que estão aqui presentes e a todas as pessoas que nos assistem pela TV Senado. Inicialmente, eu gostaria de agradecer, em nome do 19º Plenário do Conselho Federal de Psicologia, do qual eu faço parte - integro a Diretoria desse Plenário -, ao senhor, Senador, pela oportunidade de estarmos aqui para debater uma questão que é uma questão de saúde pública e uma questão que pede realmente urgência. A urgência dela é algo indiscutível. |
| R | Então, inicialmente, como é uma política do CFP, eu vou pedir licença para fazer a minha audiodescrição para que todas as pessoas possam me ver. Meu nome é Izabel. Eu sou uma mulher de 52 anos, branca, tenho um cabelo curto, castanho. Estou vestindo um vestido cinza com um casaco preto. Atrás de mim tem um belíssimo painel aqui no Plenário 9 do Senado. Feito isso, passo aqui às minhas considerações. Antes de mais nada, eu queria pedir licença às crianças e aos adolescentes, porque nós estamos aqui para falar sobre eles e existe um lema, Senador, dentro da comunidade que debate inclusão, que diz "nada sobre nós sem nós". Então, o ideal seria que nós pudéssemos ter o depoimento de crianças com diferentes condições de desenvolvimento, qualitativamente diferentes... Eu gosto de usar a palavra qualitativa. São formas diferentes de ser e de estar no mundo. Mas, como a gente não pode, então, eu vou pedir licença aqui para ler para vocês um depoimento de um jovem autista que eu acompanho na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, onde sou docente e pesquisadora. Um dia, conversando com ele sobre a vivência do autismo, ele me disse o seguinte: "Eu tenho uma forma mais leve do autismo. As pessoas acometidas pela síndrome de Asperger têm dificuldades na socialização e inconformidade com o mundo em que vivem". E eu perguntei para ele: "Inconformidade como? Você pode me falar um pouco melhor?". E ele disse assim: "Porque o mundo é mais complicado. O mundo é muito complicado para eles entenderem, e eles não se sentem encaixados na sociedade. A sociedade é muito complicada para eles entenderem". E a nossa sociedade é mesmo muito complicada, Senador. Nós vivemos uma época na qual as questões individuais, a lógica individualizante vem substituindo as reflexões sobre questões que são muitas vezes de ordem social. Então, a responsabilização, muitas vezes, pelo fracasso escolar, a explicação pelo fracasso nas relações sociais não pode ser circunscrita exclusivamente a uma condição da criança. É preciso que nós pensemos o quanto a nossa sociedade constrói e impõe barreiras a essas crianças. Quando a gente fala da deficiência, a deficiência não está em uma criança ou em um adolescente que tem alguma limitação; a deficiência está nas barreiras que nós construímos e que, por sua vez, impedem que essas crianças se desenvolvam e aprendam. Então, essa lógica é uma lógica que está na base do que a gente está discutindo aqui. Acho importante dizer que, quando a gente está discutindo medicalização, há uma diferença entre medicalização e medicação. Não estamos aqui acho que... A Dra. Isaura já me antecipou ali que ela vai discutir um pouquinho isso - eu não vou entrar nesta seara. Mas nós estamos falando - e o nome, o título desta audiência é muito feliz - do uso indiscriminado. E é essa substituição de uma lógica que é uma lógica apenas biológica para uma questão que é uma questão complexa. |
| R | Então, processos de desenvolvimento e processos de aprendizagem de crianças e adolescentes são processos complexos que a gente não pode reduzir a questões exclusivamente biológicas, porque, dessa forma, terminamos negando aquilo que é o mais rico da experiência humana que é a diversidade. Somos todos diferentes, somos todos diversos. Quando nós tentamos, dentro dessa lógica, homogeneizar, não reconhecer essas diferenças, negamos essa diversidade. Quando a gente olha apenas para a dimensão individual, a gente nega as influências e as determinações das nossas relações sociais e institucionais, assim acabamos encobrindo os preconceitos e as arbitrariedades que nós imputamos às nossas crianças, e aí nós convertemos questões que não são totalmente médicas, que têm, muitas vezes, origem social, que têm determinações políticas, em questões exclusivamente de ordem biológica, buscando encontrar, só no campo médico, soluções simplistas e imediatistas para problemas que são complexos. A medicalização é um desdobramento inevitável do processo de patologização da vida, promete respostas imediatas e simplistas. Se a gente examinar o caso específico do TDAH, como o senhor bem colocou aqui, é importante a gente relembrar que a gente já tem o Boletim Brasileiro de Avaliação de Tecnologias em Saúde, publicado pela Anvisa, que, na sua última edição, teve como tema o aumento do diagnóstico de TDAH entre crianças e adolescentes e aponta como esse diagnóstico vem crescendo. As estimativas de prevalência, no Brasil, desse transtorno variam entre 0,9% a 26,8%, Senador. Se a gente vai pelas estatísticas em todo o mundo, elas variam entre 3% a 5%, o que significa que também estamos precisando aprimorar o diagnóstico, também estamos precisando falar tanto de uso indiscriminado de medicação quanto de um hiperdiagnóstico, problematizando as formas como esse diagnóstico é feito. O diagnóstico do TDAH - e aqui vou circunscrever ao TDAH - é clínico que, necessariamente, precisa ser feito por uma equipe multiprofissional e que não pode jamais, como muitas vezes acontece, ser feito exclusivamente por um profissional da medicina que, em alguns casos, como já vivenciei, muitas vezes, na cidade onde eu moro, dá um diagnóstico sem sequer ver a criança. Então, há uma revisão integrativa realizada por Guilherme Godinho, publicada agora, no ano de 2023, em que ele vai destacar as consequências do uso do metilfenidato sem prescrição médica, que é o contexto que o senhor estava falando. Então, a gente sabe que hoje o uso da Ritalina vem sendo feito de forma indiscriminada, em especial por estudantes universitários. Existem muitos estudos que apontam o uso indiscriminado do metilfenidato por estudantes da graduação que buscam melhorar o foco atencional, que buscam ficar mais atentos, mais vigilantes e, muitas vezes, sem qualquer acompanhamento. |
| R | Essa revisão integrativa mostra os efeitos tardios, que apontam para: uso abusivo e dependência; mascaramento de doenças evolutivas, principalmente as de saúde mental, como ansiedade e síndrome do pânico; diminuição de apetite; diminuição do sono, levando a consequências de qualidade do sono diminuído; problemas cardiovasculares pontuais e transitórios, como aumento da pressão sistólica, frequência cardíaca e respiratória, e, se o indivíduo já tiver problemas cardíacos preexistentes, o risco de levar a óbito. Então, essa revisão integrativa é uma revisão que pegou vários estudos realizados no mundo inteiro. Mas como o meu tempo é curto, eu vou circunscrever a minha fala ao contexto educacional. Por quê? Porque a aprendizagem é a atividade central da infância. Inicialmente, destaco que as dificuldades no processo de escolarização são, hoje, responsáveis por mais de 60% da demanda das crianças que chegam aos serviços de saúde mental infantil. Então, o processo de patologização da vida tem levado a escola a mudar a sua configuração. A escola, que deve ser um espaço de desenvolvimento de aprendizagem, tem se tornado, em muitos casos, um locus de diagnóstico, um locus apenas de rotulação. Isso rouba da escola o seu principal objetivo. Uma escola precisa ser uma escola criativa, precisa ser uma escola inovadora e precisa ser uma escola que construa rotas alternativas de desenvolvimento de aprendizagem para crianças que são diferentes da dita norma, da norma que está lá presente nos manuais de desenvolvimento, que exigem, que pedem de todos nós, profissionais da educação e profissionais da saúde que olhem para essas crianças e que criem, que sejam inovadores, que sejam criativos. Que a intervenção que seja ofertada não seja uma intervenção circunscrita ao uso medicamentoso. Então, esse vazio que é deixado por essa ausência de criatividade vem sendo preenchido, por parte, tanto do discurso de alguns médicos, como do discurso de algumas psicólogas e psicólogos, que adentram o muro da escola e medicam aquelas crianças que são e estão no mundo de formas distintas desse padrão estabelecido. A gente vive um processo de homogenização dos sujeitos e de exclusão daqueles que são diferentes, considerados assim por não se adequarem a normas que são legitimadas por uma perspectiva positivista de ciência. Eu teço mais algumas considerações, Senador, a partir de um trecho de um livro que eu gosto muito que se chama A Diferença Invisível, de Julie Dachez. Mais uma vez, ofereço voz a essas pessoas. Ela diz o seguinte - abro aspas: Eu gostaria de viver em um mundo no qual eu possa ser eu mesma, onde a minha voz importa, onde eu possa ter o suporte que eu preciso, onde eu não tenha que lutar contra estereótipos e discriminação todo santo dia. Esse é o mundo que nós temos que construir. Você não é uma doença que precisa ser curada. Você é o suficiente. E como é que nós podemos, juntas e juntos, construir essa sociedade na qual as pessoas sejam suficientes pelo como e pelo que elas são? |
| R | Certamente, essa mudança só vai ocorrer se agirmos em duas frentes: uma mudança de cultura e uma intervenção do Estado, notadamente através da formação dos profissionais e também da população em geral, além da garantia do direito de crianças e adolescentes à saúde e à educação de qualidade. Eu relembro aqui uma resolução publicada pelo Conanda e pelo Conselho Nacional de Saúde que dispõe sobre o direito da criança e do adolescente de não serem submetidos à excessiva medicação. O Brasil, como o senhor falou, Senador, é o segundo país do mundo no consumo de metilfenidato, sendo esse usado inclusive de forma indiscriminada por estudantes universitários em busca de melhorar a atenção e a concentração, mas sem atentar para os possíveis efeitos colaterais. O Conanda reforçou que a criança e o adolescente têm direito à proteção integral, particularmente ao acesso a alternativas não medicalizantes para seus problemas de aprendizagem, comportamento e disciplina, que levem em conta aspectos pedagógicos, sociais, culturais, emocionais e étnicos, envolvendo famílias e os profissionais responsáveis pelo cuidado de crianças e adolescentes e a própria comunidade. No âmbito da educação, o Conselho Federal de Psicologia tem lutado incansavelmente por essa sociedade, em especial através da inclusão dos profissionais de psicologia e de serviço social na escola. Nós aprovamos, no final de 2019, a Lei 13.935, que garante a presença desses profissionais, mas ainda estamos lutando para sua implementação. É lei, mas estamos numa luta diária para que ela seja finalmente implementada em municípios e estados. O profissional de psicologia na escola não é um profissional que avalia e diagnostica, mas é um facilitador que atua em conjunto com a comunidade escolar, contribui para desconstrução dessa compreensão medicalizante dos comportamentos dos alunos e contribui para uma visão macro das dificuldades dos alunos, não os reduzindo a um problema psicológico. A orientação à comunidade escolar é importantíssima nesse processo. No âmbito da saúde, a psicologia defende que existem outras formas de cuidado e acolhimento das crianças para além do uso de medicações. A Resolução 17, de 2022, do Conselho Federal de Psicologia, dispõe sobre os parâmetros para práticas psicológicas em contextos de atenção básica, secundária e terciária de saúde. Essa destaca que o exercício profissional da psicóloga e do psicólogo é buscar qualificação do cuidado em saúde, por meio de ações de apoio, suporte, matriciamento e principalmente construção de projetos terapêuticos singulares junto aos usuários e seus familiares - e sei que a Dra. Cida vai aprofundar melhor esse ponto -, compartilhamento de saberes, práticas colaborativas e articulações intra e intersetoriais, e uma educação permanente, educação popular e comunitária, preceptoria e formação. O CFP também tem produzido distintas publicações - distribuímos aqui duas delas para vocês -, realizado lives e apresentado seu posicionamento nas diversas representações que ocupa junto à sociedade civil e governamental. Este conselho defende que a identificação de perfis distintos de desenvolvimento é um trabalho necessariamente multiprofissional, cujo intuito maior não é rotular, mas compreender, identificar forças e fragilidades, e assim guiar os profissionais para inovar, revolucionar e construir rotas alternativas de desenvolvimento e aprendizado, como preconizado pelo psicólogo russo Lev Vygotsky, já na década de 40, quando ele afirmava que dessa forma se transforma o negativo da deficiência no positivo da compensação. |
| R | Adicionalmente, esse mesmo psicólogo afirmava que a deficiência não está na criança, mas na sociedade, que impõe barreiras e limitações às diferenças. Então, dessa forma, reafirmo aqui o compromisso do Conselho com a defesa intransigente dos direitos humanos, reconhecendo a diversidade das existências e lutando pelo direito da pluralidade dos distintos modos de ser. Não vamos nos resignar a amarras que rotulam, que homogenizam, que roubam o que temos de mais belo, que é a nossa idiossincrasia e o direito ao bem viver. Para tanto, Senador, é necessário que pesquisas com cunho crítico e científico continuem apontando os impactos desse fenômeno, observando não somente as motivações sociais envolvidas nesse processo, mas também trazendo o resultado de sua propagação no bem viver da sociedade. A ciência traz clareza para aquilo que se busca ignorar, nascendo, assim, a exigência de que desta se assuma a responsabilidade de levar dados, casos, experimentos e estudos que comprovem e suplantem tudo aquilo que se opõe à saúde. Então, esse é o nosso compromisso. Estamos aqui abertos ao diálogo, a respostas às questões que surgem. Agradecemos mais uma vez a iniciativa e colocamos o Conselho Federal de Psicologia à disposição para que possamos, juntos, enfrentar e superar esse contexto, que é um contexto que fere os direitos das crianças e que traz muito sofrimento tanto às próprias crianças quanto aos seus familiares. Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Muitíssimo obrigado, Dra. Izabel Augusta Hazin Pires, representante do Conselho Federal de Psicologia. Ficou bem dentro do tempo, cravado, a apresentação. E você é de um estado vizinho ao meu. Eu sou do Ceará, você é do Rio Grande do Norte, estado por que tenho uma admiração grande. A SRA. IZABEL AUGUSTA HAZIN PIRES - Eu sou pernambucana. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Ah, você é pernambucana! A SRA. IZABEL AUGUSTA HAZIN PIRES - Mas já moro lá desde 2006. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Ah, desde 2006. Então, o coração já está lá, já é potiguar. Foi muito boa apresentação. Enquanto a senhora falava aí... Realmente, este fato eu esqueci de mencionar no começo: existe muita gente que usa... Muitas pessoas que vão fazer Enem, curso ou concurso vão lá na Ritalina. É um uso realmente indiscriminado. Aí vem aquela coisa: e o efeito colateral disso? E o efeito colateral para aquelas crianças que não têm... que são totalmente dependentes, a quem os pais dão por uma questão de comodidade, sem prescrição médica, sem ter... Então, causa dependência? É isso que a gente... Que tipo de efeito colateral tem? Porque tem um efeito que é o inverso, porque fica mais agitado, tem pessoas que ficam mais agitadas, mas tem também a dependência que é causada. Como é que fica isso? A que ponto há responsabilidade em relação a isso? O que a gente pode fazer? Eu quero passar a palavra imediatamente à Dra. Isaura Sarto, que é advogada e sempre está aqui presente, no Senado... Na época do rol taxativo, estava aqui conosco, na vitória que nós conseguimos aqui, não é, Dra. Isaura? Ela é mãe de uma criança com espectro autista e de outra que tem TDAH, não é isso? |
| R | Então, a senhora tem 20 minutos para a sua exposição. Muito obrigado pela sua presença aqui enriquecendo o nosso evento. A SRA. ISAURA SARTO - Está ligado? O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE. Fora do microfone.) - Só apertar. Agora está. A SRA. ISAURA SARTO (Para expor.) - Bom dia a todos. Quero agradecer ao Senador Girão pelo convite, pela oportunidade de trazer aqui a minha vivência como mãe e também como advogada. E cumprimento os demais integrantes da Mesa e todos aqui presentes. Peço licença para compartilhar a minha história como mãe com o meu filho, antes de fazer algumas considerações técnicas. O meu filho hoje tem 12 anos, mês que vem vai completar 13. O nome dele é Vitório. Ele recebeu o diagnóstico de autismo aos três anos, após uma longa investigação que se iniciou quando ele tinha um ano e quatro meses. E ele recebeu o diagnóstico de autismo depois de eu passar por vários profissionais aqui em Brasília, médicos, psicólogos, fonos, T.O., e eu tive que ir a São Paulo porque ninguém se entendia sobre o diagnóstico. O fato é: Vitório não atingia os marcos esperados de desenvolvimento para um bebê, para uma criança. Então, ele recebeu o diagnóstico do Dr. Salomão Schwartzman, que é uma das maiores autoridades em autismo no Brasil. E, quando ele foi diagnosticado, o Dr. Salomão falou: "não vou prescrever nenhuma medicação para ele. É terapia, terapia, terapia. Fono, T.O., psicóloga pelo método ABA e muita estimulação, estimulação, estimulação. E vocês, pais, vocês devem estudar o assunto para que, ao longo da vida do Vitório, vocês tomem decisões sobre o tratamento dele com mais segurança". E ele também pontuou que sabia que era muito difícil para nós irmos até São Paulo, a consulta não é barata, ficar lá com uma criança autista hospedada em hotel, aquela coisa toda. E ele falou: "Olha, eu só quero alertar que, se você levar o Vitório em algum outro profissional, o Vitório... eu estou aqui falando do Vitório, não estou falando de outro autista. Não dê risperidona para ele [que é uma outra medicação muito prescrita para crianças autistas], porque o Vitório não precisa disso. Então, o Vitório. Outras crianças autistas precisam, ele não. Mas eu quero deixar que isso fique marcado para que vocês não deem essa medicação para ele no momento, da forma como ele está, porque tem que fazer um acompanhamento de perto". E aí, assim começamos a saga de terapias. Vitório é um menino privilegiado porque ele teve acesso e tem a todas as terapias possíveis e imagináveis com evidência científica. Nunca me aventurei em terapias, em métodos que não têm evidência comprovada. E Vitório foi se desenvolvendo até os 11 anos e meio sem nenhuma medicação, só com terapia. Ele veio a falar, por exemplo, aos 8 anos. E, quando ele começou a se comunicar através da fala, ele foi também diagnosticado com apraxia de fala na infância. E aí, teve que redirecionar todo o tratamento com a fono para isso. E hoje o Vitório é um menino que está muito bem. Ele está no sétimo ano do ensino fundamental. Ele acompanha os conteúdos, mas ele precisa de uma acompanhante terapêutica para mediar as relações dele com os colegas, com os professores. Aos 11 anos, Vitório começou com um comportamento de autolesão. Ele começava a se cutucar e fez várias feridas pelo corpo, especialmente nas pernas, que colocaram em risco a sua saúde por risco de infecção. |
| R | Com todas as terapias, todos os profissionais que o acompanham, que é uma equipe gigantesca, não conseguimos fazer com que ele parasse com isso, porque estava afetando a saúde dele, as relações sociais. Todo mundo ficava olhando: "Que doença esse menino tem, com tantas feridas no corpo?", e era ele mesmo que provocava isso. E aí a psiquiatra dele, daqui de Brasília, muito experiente, com mais de 40 anos de atuação com essas crianças, com autistas, enfim, depois de muito avaliar, ela falou: "Isaura, eu vou prescrever uma medicação para tratar isso". E quando ela falou isso, Senador, foi um sofrimento muito grande para mim por ignorância, porque a gente vê essa questão do uso indiscriminado, e eu ficava: "Eu não vou dar uma medicação psiquiátrica para o meu filho". Sofri muito, chorei muito, foi uma fase terrível. Ela falou: "Temos que tentar, para salvar a vida dele, porque daqui a pouco esse menino vai estar internado com uma infecção". E tentamos essa medicação. Como se diz lá em Minas - eu sou mineira -, quando ele começou a tomar a medicação, foi a mesma coisa de "retirar com a mão", ele parou com a autolesão; mas foi um outro medicamento, não foi Ritalina, foi sertralina. Ali, nós começamos a perceber uma mudança de comportamento do Vitório com relação à ansiedade, os stims, que o pessoal chama de estereotipia. Nós começamos a perceber que ele ficou mais presente, que ele ficou mais tranquilo, e fomos seguindo, ele sempre com as avaliações dos profissionais, tanto de médicos quanto de terapeutas, e a psiquiatra falou para a gente, para mim e para o meu esposo que está até aqui presente, o Gustavo... a psiquiatra, após um tempo de uso da sertralina, falou: "Eu diagnostico o Vitório com um transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. Agora que ele está tranquilo com essa medicação, eu consigo visualizar isso, então eu quero prescrever a Ritalina" - a mais simples, porque tem vários modelos de medicação, tem aquela que dura 12 horas, e ele toma a mais simples, cuja caixinha custa R$28. Ela ainda teve o cuidado de dar a dose mais baixa e dividir essa dosagem para dar no período da manhã e da tarde, para observar. E, quando o Vitório começou a tomar a Ritalina... teve muito sofrimento também, porque ela falou: "Essa decisão é de vocês, não é algo que precise ser para hoje, mas, na minha experiência, eu acho que ele vai se beneficiar muito dessa medicação". Demoramos algum tempo. Muitas conversas depois, resolvemos iniciar com a Ritalina. E, para nossa surpresa, grata surpresa, Vitório passou a não precisar tanto da acompanhante terapêutica dele na escola. Ele começou a ficar mais independente nas relações, em tudo, em casa, também, no convívio conosco, nas tarefas. Ele ficou mais responsivo às pessoas, ao convívio social. Então, eu posso dizer e afirmar aqui - e estou falando do Vitório - que a Ritalina fez uma diferença na vida dele, mudou a qualidade de vida dele, mudou o meu filho. Agora que contextualizei, com a minha experiência, tentei resumir, porque é uma história bem longa... Senador, pais e mães, pelo menos no nosso caso, e eu conheço vários assim, quando os médicos prescrevem alguma medicação, é muito sofrimento para darmos, porque nós ficamos assim: "Meu Deus, eu vou dar uma medicação psiquiátrica para o meu filho, para a minha criança", é muito sofrimento. Não é para nossa comodidade, não, porque tem muito sofrimento aí. Se pudéssemos optar, não daríamos. |
| R | Mas agora eu quero fazer alguns apontamentos. Existem duas razões para que o uso de um medicamento como a Ritalina seja regulado, com a exigência de prescrição médica controlada: uma razão é de saúde pública e a outra razão é de mercado. A razão de saúde pública tem por objetivo preservar dos efeitos adversos as pessoas que não têm a condição para a qual o medicamento é indicado. E neste ponto, caberia até a discussão se uma pessoa adulta, bem informada dos efeitos adversos poderia decidir buscar efeitos benéficos off label de um medicamento, como o aumento do rendimento escolar ou no trabalho. Mas existe também a razão de mercado para que o medicamento seja controlado. Se uma parte da oferta do medicamento é direcionada para pessoas que não apresentam a condição para a qual o medicamento é indicado em bula, pode faltar o medicamento para as pessoas que possuem essa condição, ou seja, para aqueles que realmente precisam do medicamento por motivos de saúde. E isso não pode acontecer. Medicamento é importante para quem dele precisa. Bloquear ou dificultar o acesso de forma indiscriminada prejudicará os pacientes que dele necessitam, que tiveram melhora significativa na qualidade de vida após o seu uso. Se há comprovação de que pessoas estão tendo acesso, de forma indiscriminada, a um medicamento que só pode ser adquirido com receita médica específica... No caso, aqui no DF, é uma receita amarela, que o médico tem que buscar pessoalmente lá no setor responsável e é controlado, tipo, o médico não pode chegar lá e falar, eu quero mil. Não, é um bloquinho, e tem um número limitado, que eu não sei a quantidade exata, mas algum médico pode informar sobre isso. Então, se há a comprovação de acesso, de forma indiscriminada, a esse medicamento que só pode ser adquirido com receita médica específica, devemos falar sobre a qualificação dos médicos prescritores. Será que esses profissionais têm qualificação técnica para o diagnóstico e tratamento? Sabemos que, na rede pública, os pacientes enfrentam dificuldades para conseguir um agendamento de consultas, o que consequentemente também dificulta o acesso a medicações que só podem ser adquiridas com receituário médico específico. Na rede pública, há uma submedicação. Cientes disso, podemos direcionar a nossa investigação para o setor privado, nas suas duas modalidades: pessoas que são pacientes de médicos de plano de saúde e pessoas que são atendidas por profissionais que só atendem na modalidade particular. Os profissionais de plano de saúde geralmente são mal remunerados e, muitas vezes, não têm a qualificação adequada para o diagnóstico e tratamento dos transtornos do neurodesenvolvimento, de aprendizagem e psiquiátricos. E ainda têm que atender pacientes de 15 em 15 minutos para conseguir uma remuneração minimamente satisfatória. Não é preciso sermos médicos para que saibamos que em 15 minutos não se faz um diagnóstico e acompanhamento adequado, porque para entender o contexto, diagnosticar e orientar demora mais tempo, demanda muita atenção. Na realidade que vivo com meu filho autista e que tem transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, aqui em Brasília, sempre tivemos que recorrer a profissionais fora da rede credenciada do nosso plano de saúde, para que ele fosse melhor avaliado e acompanhado, e para que pudéssemos tomar as decisões com mais segurança. E olha que o nosso plano é um dos melhores. |
| R | O usuário não pode pagar pela falta de qualificação dos profissionais que prescrevem de forma indiscriminada, até mesmo para pessoas sem diagnóstico de transtornos psiquiátricos, de aprendizagem e do neurodesenvolvimento. Não é difícil encontrarmos profissionais que prescrevem para pacientes que já chegam, em seus consultórios, com o pedido da prescrição, para melhorar o seu rendimento no trabalho ou nos estudos. É importante frisar que qualquer mudança que se venha a fazer na regulamentação atual, com vistas a combater o uso indiscriminado, não pode dificultar, ainda mais, a vida de quem realmente precisa do medicamento, tanto no SUS quanto na rede privada. Então, era o que eu tinha para dizer, quis ser bem breve. É a minha contribuição para este debate. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Muitíssimo obrigado, Dra. Isaura Sarto, advogada, com a presença do seu marido. Como é o nome dele? (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Gustavo. Muito obrigado, Gustavo, também. Parabéns pelo compromisso e pelo empenho. Essa dedicação de vocês aos filhos repercute para os filhos de muitos brasileiros. Eu acompanho o trabalho da sua esposa. Aliás, o trabalho não, o idealismo dela, que é, realmente, de arrepiar. Ela trouxe um fato interessante aqui, a questão do diagnóstico, que é um problema grave que nós temos que enfrentar, aqui no Brasil, o diagnóstico, tanto das pessoas com espectro autista como com TDAH. É muito difícil, muito demorado e sem acessibilidade; ainda mais quando você vai para o interior e, ainda mais, lá no Nordeste, a situação é gravíssima. É um filme de terror, porque as famílias estão totalmente desguarnecidas do Governo, do Estado. Agora, a gente já fez outras audiências públicas aqui, e é um ponto, parece-me, pacífico entre médicos e pessoas que entendem do assunto: daqui a 20 anos, cada núcleo familiar terá uma criança com espectro autista. Daqui a 20 anos, repito, cada núcleo familiar terá uma criança com espectro autista compondo a família. Aí a gente tem que correr, é uma obrigação nossa correr para se preparar para isso, e nós estamos atrasados. A senhora falou da Ritalina, com todas as letras aqui, que teve uma análise profunda, e foi necessária. O médico prescreveu, porque achou necessário, e a senhora ainda teve um impacto, mas obedeceu o que o médico colocou, e teve um resultado excelente. A senhora falou aqui. |
| R | Isso é muito bom saber, porque a informação que a gente tem é esta, para alguns casos, sim, a partir da prescrição daqueles que estudaram, que têm conhecimento do assunto; mas e aquelas pessoas que fazem uso indiscriminado para os seus filhos? Eu tenho cinco filhos, eu me coloco no lugar dessas pessoas, não é fácil cuidar de cinco filhos, não é fácil, mas a gente precisa ter muita calma nessa hora, porque, no afã de acalmar a situação em casa, você pode gerar um problema muito mais grave para o seu filho, para a sua família, a longo prazo. É isso que eu queria também abordar, a questão desse uso indiscriminado. A senhora falou de outro medicamento também, como é o nome? A SRA. ISAURA SARTO - Sertralina foi o que ele começou a tomar depois da autolesão. Um medicamento muito receitado para crianças autistas, e logo no início do diagnóstico, é a risperidona. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Risperidona, a senhora falou da risperidona, que é muito indicado para... A SRA. ISAURA SARTO - Crianças autistas. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Crianças autistas. A SRA. ISAURA SARTO - Muitas crianças se beneficiam dele, quando bem indicado. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Aí é que está o detalhe. A SRA. ISAURA SARTO - Só que há aquela questão também, crianças, na rede pública, que às vezes esperam anos para uma consulta, as famílias, aí vão em profissional de plano de saúde que, em dez, quinze minutos, faz o diagnóstico e está aqui a receita, sem orientar, sem explicar. Essa é a questão. Não podemos também demonizar as medicações porque, quando bem indicadas, elas fazem muito bem aos pacientes. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Exatamente. É aí que está o detalhe, a indicação. E aí vem o que a senhora falou. Às vezes, na ânsia, qualquer adulto que toma por uma questão de foco no trabalho, estudo, como a gente viu aqui, e aí vai faltar para quem precisa. A senhora colocou essa questão do mercado. A SRA. ISAURA SARTO - Já fui comprar e não tinha no mercado, rodei todas as farmácias e não tinha. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - A senhora já foi comprar e não tinha no mercado, e seu filho precisando. A SRA. ISAURA SARTO - Eu cheguei a ligar para a minha família em Minas para pedir para mandar, porque aqui em Brasília não achava. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Então é a questão também do egoísmo, de a gente ter pessoas que não precisam disso, que estão indo por esse caminho que tem efeitos colaterais e podem estar deixando quem precisa sem medicação. É uma questão interessante que a senhora trouxe aqui, eu não tinha me atentado. Eu imediatamente passo a palavra agora à Dra. Thicciana Maria Firminiano, daqui para o final da reunião eu acerto sem parar. A senhora está com a palavra, Neuropsicopedagoga. A SRA. THICCIANA MARIA DAMASCENO FIRMINIANO (Para expor.) - Obrigada. Bom dia a todos e a todas presentes. Saúdo aqui a mesa, na pessoa do Senador Eduardo Girão, a quem agradeço imensamente o convite para participar deste debate, com pessoas que estão aqui já há algum tempo trabalhando essa causa do TDAH, que é realmente algo muito preocupante atualmente, que merece toda a nossa atenção, enquanto profissionais que atuamos diretamente com essas crianças que têm esses transtornos, dentre outros transtornos do neurodesenvolvimento. Fiz aqui algumas anotações, algumas das minhas falas já foram pontuadas aqui pelas minhas amigas, pelas colegas aqui presentes. Porém, estou na condição de neuropsicopedagoga e irei ressaltar na minha fala os impactos dessa medicação na aprendizagem, como ela realmente impacta sim numa melhoria, numa qualidade de vida das crianças que fazem uso de forma adequada, de forma realmente necessária, Senador, porque nós entendemos que um transtorno é algo que é para vida toda. Então, a gente não pode pensar em um transtorno como algo passageiro. |
| R | Um transtorno impacta diretamente em todos os aspectos e o TDAH não é diferente. Então, nós temos aí uma atenção que é fragmentada, a memória desse paciente é também fragmentada, hiperatividade, impulsividade diante de alguns fatos, principalmente em relação à regulação do comportamento, que é também impactado. São características do próprio transtorno. Então, pegando aqui um pouco da fala da Izabel, eu reforço... Hoje, um dos meus objetivos também é falar sobre a preocupação dessa medicalização e dizer que ela já está acontecendo. Hoje, pegando os relatos pessoais aqui da amiga ao lado, a gente observa que essa medicalização já acontece. E por que acontece? Eu acho que o ponto seria esse. E por que acontece? Por que tem acontecido dessa forma? Podemos levantar várias hipóteses, dentre elas, a realização de um diagnóstico, talvez, rápido, como nós temos visto muito, diagnósticos realizados em pequenas sessões, às vezes por um profissional somente. Eu penso que é essa questão que nós devemos fiscalizar, devemos acompanhar, monitorar, porque nem todos, Isaura, nem todas as pessoas do nosso país têm acesso a esses privilégios de ter ali um neurologista, de poder pagar uma consulta, de poder comprar a medicação, depois. Então, a gente vive numa realidade totalmente diferente. Infelizmente, quem pode consegue. Muitas vezes, quem pode e não precisa tem uma facilidade para encontrar essa medicação, para ter acesso a essa medicação. Então, eu acho que esse é o ponto importante para a gente daqui em diante. Eu acredito que uma só audiência não será suficiente para tratar do assunto. Porém, é preciso entender dessa forma: partir do princípio de que o rigor científico da avaliação precisa ser levado em conta, precisa ser levado em consideração. Um diagnóstico não pode ser feito em 30 minutos ou em 5 sessões, 3 sessões, como nós temos visto muitas clínicas ofertando aí no mercado. Muitas vezes o pai, naquela situação de desespero, por cobrança da escola ou até por questões do próprio estafamento de conviver o dia a dia com uma criança que tem o transtorno, que nós sabemos que não é fácil... Eu também tenho uma criança dentro do espectro, eu sei exatamente o que é lidar no dia a dia. Então, nós, mães de crianças atípicas, vamos dizer assim, vivemos para eles. É uma dedicação muito maior que nós precisamos ter em todos os sentidos, em todos os aspectos. É preciso pensar nesse relatório multidisciplinar e com uma equipe realmente composta por diversos especialistas que possam direcionar e realmente identificar, porque o TDAH não é simplesmente a criança ser agitada, ser hiperativa e aí já tem TDAH. Então, não é tão simples assim. Para que realmente a gente tenha um diagnóstico preciso, eu preciso fazer uma anamnese bem feita, que eu não consigo fazer em 15 minutos, como a Isaura trouxe aqui sobre alguns médicos de plano de saúde. |
| R | E eu acredito, Isaura, que essa questão já tem caído por terra, porque hoje nós vemos o rigor dos planos de saúde também na contratação dos profissionais. Então, eu vejo que já não é mais tão assim - ouviu, Isaura? Hoje a gente já tem, realmente, planos de saúde bons e profissionais bons também, que respeitam esse rigor científico. Então, é preciso entender que em 15 minutos não tem como se fazer ali uma anamnese bem feita, investigar essa criança, na sua essência, desde o seu nascimento - anamnese é tirar do útero essa criança. É preciso entender que esses comportamentos não são comportamentos somente do agora, oito, nove, dez anos em diante. Não. São comportamentos que a criança já apresenta desde o seu nascimento e que muitas vezes não são percebidos, porque essa criança está na fase de desenvolvimento. Ela está numa fase de maturação cognitiva, ou seja, se pensarmos o quanto nós aprendemos do zero aos três anos de idade, a gente entende aí que é muita coisa, desde o sugar da alimentação, o sugar, o andar, o falar, o se alimentar, em diante. Então, quando essas crianças ainda são muito pequenas, a gente não consegue, a olho nu, vamos dizer assim, identificar alguns comportamentos. A não ser que esses comportamentos realmente sejam comportamentos muito atípicos, muito acentuados, vamos dizer assim, comportamentos que são perceptíveis, dos quais os pais, às vezes, fazem até comparações: "Nossa! Mas o meu filho tem a mesma idade que o seu. Por que o meu apresenta esses comportamentos?". Então, preocupar-se com essa questão, principalmente com as crianças menores, eu acho que é o nosso objetivo aqui, levantar a importância, sim, da medicação para as pessoas que precisam, que necessitam, e entender isso, por que não, como uma medida de política pública. Para quem tem acesso financeiramente e pode comprar esta medicação, tudo bem, vai ter acesso sem problema nenhum. Inclusive, é essa receita amarela que a Isaura citou aqui, que é a receita que é emitida aqui no DF. E os que não podem? E os que realmente precisam dessa medicação por terem um diagnóstico realmente bem feito? Porque, assim, pensar no laudo... O laudo não é o fim. O laudo é o início do tratamento. E uma outra coisa que a gente tem visto também nas famílias é esse entendimento de que o laudo é o fim. E aí, então, depois que a gente realiza esse laudo... Eu integro a equipe multidisciplinar, eu não me apresentei, eu integro a equipe multidisciplinar da Casa Saberes e também do Instituto Caminhar, no qual eu tenho até amigos aqui que estão comigo presentes - queria agradecer por terem vindo - e, assim, a gente entende o rigor desse laudo, sabe? Então, pensar nesse laudo que não é feito por um só profissional, como muito bem trouxe a Isabel, eu penso que é uma medida sobre que o Conselho de Psicologia deveria ser mais... Vocês que têm uma abrangência muito grande em relação a isso. Conversar com os outros conselhos também em relação a essa questão e sobre que profissionais podem integrar... Entender que esse transtorno do neurodesenvolvimento impacta diretamente na atenção, na aprendizagem e não só nisso, que é o que a gente tem visto muito, a gente ficar somente na aprendizagem, só no intelecto. Entender que esse transtorno não afeta somente a cognição intelectual. |
| R | O maior problema é a socialização, a relação dessa criança em outras esferas para além da escola, porque a escola, infelizmente, nós temos... Vamos dizer assim, a gente, que acompanha diariamente, vê que essas crianças... Infelizmente, nós ainda não temos uma escola preparada para receber esse público, e eu acho que é uma luta do Movin, uma luta do Yuri, uma luta de todos nós, pais, que somos da área da educação, porque a educação é como se fosse nossa segunda casa. É lá que a gente vai aprender a conviver, é lá que a gente vai aprender a se socializar com os demais; mas como eu vou me socializar se eu não sou aceito, se eu sou rotulado, se eu sou visto como uma criança, vamos dizer assim, diferente? Essa percepção, muitas vezes, não é só dos coleguinhas, porque a criança é criança, a criança fala o que sente, no impulso ali. Se ela gostar, ela gosta; se não gostar, tudo bem; mas, quando isso vem de profissionais, quando esse rótulo é visto lá no momento em que você vai escolher a sua sala? "Bom, eu não quero essa sala, porque essa sala tem criança atípica, tem criança com TEA aqui, tem criança com TDAH, então eu não quero". Então, a gente observa que é uma questão muito mais séria a que a gente tem vivido. Pensar que essa criança vai passar tantas horas e, muitas vezes, se depara com um professor que não queria a presença dela ali, isso, para nós, mães, é muito doído. Eu penso em pensar no diagnóstico do TDAH de forma mais precisa, nesse sentido de oferta em todos os âmbitos dos quais esse ser faz parte, não somente na escola, mas nos demais também. Agora, a gente entra na questão da nossa medicação, dessa medicação. Quanto a essa medicação, é comprovado cientificamente que tem efeitos positivos. Eu atendo crianças que fazem uso dessa medicação e que demonstram um comportamento realmente significativo ali para a aprendizagem. Nós sabemos que a gente aprende ou por cristalização ou... (Intervenção fora do microfone.) A SRA. THICCIANA MARIA DAMASCENO FIRMINIANO - Isso, por repetição. Então, entender que se eu faço a ingestão de uma medicação que me ajuda a ter um foco, a manter a regulação do meu corpo de uma forma tranquila ali, eu consigo ouvir o meu aprendente... Aliás, ele consegue me ouvir de uma forma mais segura, então, possivelmente, essa aprendizagem pode acontecer. Ela acontece de imediato? Não. Ela vai acontecer como com as outras crianças que não têm o transtorno? Possivelmente não. Porém, a medicação ajuda que essa criança ao menos regule e consiga interagir com aquela questão. Os próprios estudos mostram para nós que ainda não temos uma comprovação científica realmente que afirme que aquele conhecimento aprendido no momento da regulação do comportamento, no momento do foco, no momento da atenção, perdure de uma forma abrangente; no entanto, nós entendemos que, para aprender, nós precisamos ter atenção. Então, se naquele momento eu consigo realizar essa intervenção, aí, sim, a gente entende que a medicação é necessária em muitos casos, casos em que realmente o paciente necessite; casos nos quais esse laudo tenha sido realmente elaborado por profissionais que conhecem o transtorno. Eu não posso falar de um transtorno se eu não conheço esse transtorno. |
| R | Eu tenho relatos de mães no consultório que chegam assim: "Olhe, é incrível, doutora. O médico olhou para o meu filho e disse: "olha, ele tem TDAH". Eu sentei na cadeira, ele conversou um pouco comigo, eu já saí com a prescrição do medicamento. Assim, isso seria até engraçado se não fosse trágico. Então, são essas posturas que nós observamos que precisam ser fiscalizadas. Precisa ser cobrado um rigor realmente científico, porque laudar uma criança a gente entende que é para a vida toda. Um laudo é para a vida toda. Assim como nós temos laudos em que às vezes a criança manifesta realmente aquelas dificuldades, nós temos também laudos em que no decorrer da avaliação, no decorrer da intervenção com aquela criança, ao final você chega: "não, gente, essa criança não apresenta esses comportamentos". E aí, a gente tem tido até a solicitação de reavaliação desses pacientes. Eu acho que a partir do momento em que a gente entende que a medicação precisa ser utilizada por quem realmente precisa e ser ofertada de forma segura... Quando uma medicação entra no SUS, não é dizer assim: ela vai entrar e vai ser distribuída para todo mundo. Não, tem todo um rigor. Tem todo um rigor científico que vai atestar quem realmente pode utilizar e quem realmente pode ter acesso àquela medicação. Então, vamos pensar que até pais que às vezes possam ter condições... Mas uma medicação que precisa ser tomada diariamente, digamos que tenha um dia em que ele não possa comprar a medicação. Então, se eu tenho, a minha criança precisa e eu tenho acesso a essa medicação, por que não pensar também nessas pessoas? Então, quem pode, tudo bem, mas quem não pode? Então, nós temos aí uma renda do brasileiro que infelizmente nem todo mundo consegue comprar uma caixa de metilfenidato LA por R$480, que é mais ou menos esse o valor. Ou da Ritalina simples, que é a de 10mg, em torno de R$36 a R$48. Então, são medicações que são caras, visto o perfil, a renda per capita dos brasileiros. E aí, eu pontuei aqui também algumas questões. Eu acho que é importante a gente ressaltar essa questão do hipodiagnóstico, que é algo que também nos preocupa. Então, eu já recebi pacientes com laudos de TDAH, de TEA, de ansiedade, de TAG, transtorno de ansiedade generalizada, que é um CID muito sério, muito perigoso. E nós temos aqui quatro fatores diagnósticos em uma só criança. E aí, a gente fica se perguntando: mas como, como isso acontece? Como é que tem sido essa avaliação, como é que ela está realmente sendo realizada? E aí, surgem realmente as preocupações para nós, pais, e para nós profissionais, que atuamos diretamente com essas crianças lá. E aí, tendo todos esses CIDs, o que acontece, Senador? Essa criança vai precisar de outras medicações. Não só o psicoestimulante, que é a Ritalina, que atua diretamente nas funções executivas do córtex frontal, mas também de outras medicações ansiolíticas. Porque, como foi muito bem dito aqui pela Izabel, essa medicação tem as suas contraindicações, assim como qualquer outra medicação também tem as contraindicações. |
| R | Então, se nós formos pensar nas contraindicações da dipirona, ninguém toma dipirona; assim como as contraindicações da Ritalina também são pontuais. Porém, para o fim ao qual ela é determinada, ela apresenta, sim, uma significância muito grande, uma relevância nesse comportamento da criança, do adolescente. E aí o senhor traz na sua fala também uma preocupação, que é essa questão da automedicalização, que, aí sim, falar de medicalização nessa esfera... Eu até recebi algumas mensagens perguntando assim: "Mas como assim 'de forma indiscriminada'?". E aí vamos pensar que essa palavra "indiscriminada", que foi pontuada aqui nesta audiência hoje, está relacionada a de forma desregulada, sem controle, que é o que a gente tem visto aí. Quando a Isaura vai lá na farmácia e não encontra a medicação que o filho dela precisa, porque falta no estoque, isso acende uma luzinha para a gente. Será que todo mundo daquele setor, daquela área em que a Isaura mora faz uso dessa medicação? E aí várias luzes vão acendendo, luzinhas amarelas vão acendendo, caminhando para, acredito, este debate de hoje, que é exatamente para falar sobre isso, sobre essa prescrição indiscriminada. Por quê, gente? O psicólogo não lauda. A equipe multidisciplinar não lauda. Somente quem lauda é o neurologista ou o neuropediatra. Então, quero deixar bem claro isto: que os laudos precisam do CRM, que é o Conselho de Medicina. Nós levantamos hipóteses diagnósticas, porém, dentro da nossa equipe, nós não podemos entregar esse laudo para o neurologista, que vai ler - ou pelo menos se subjaz que lê - aquele trabalho de mais de dez encontros, viu, Senador? Então, não é um trabalho de cinco sessões, um trabalho de três sessões, como muitas clínicas ofertam, por ser, ainda, a avaliação neuropsicológica de um valor caro para a nossa realidade, mas, sim, de, no mínimo - e isso os conselhos deixam bem claro -, no mínimo, oito e, no máximo, dez ou mais sessões, dependendo do caso. Então, é uma investigação realmente profunda, é uma investigação realmente séria. Então, quando, ao final dessa avaliação, eu entrego um laudo com mais de cinco hipóteses diagnósticas, será que, realmente, eu observei e utilizei os instrumentos necessários para aquela avaliação daquele ser singular, daquele ser que pode ou não apresentar comportamentos para com o comportamento do outro? Então, também é algo que a gente precisa ver em relação a essa questão: de que forma está sendo realizada essa avaliação? Então, os inventários, os protocolos que são utilizados, os testes que são aplicados por cada profissional no seu segmento, como é que tem sido isso se, ao final desse relatório, eu tenho lá mais de cinco hipóteses? O que vai acontecer? Muitas vezes, o neuro recebe esse laudo, ele confia no trabalho da equipe, ele confia no profissional que emitiu aquela hipótese, então ele vai lá e prescreve. Então, a gente observa que é um efeitozinho dominó, é um efeito dominó, porque ele vai confiar e aí ele vai laudar. Realmente, uma equipe sinalizou que essa criança de seis anos de idade tem TAG. E aí? Ele teve um encontro, talvez de 40, 50 minutos no primeiro momento, e depois ele teve um outro encontro, que é quando essa família volta com um laudo para ele dar o CID, como nós chamamos dentro da classe, bater o martelo. Então a gente faz todo o trabalho e ele bate o martelo ali, confiando no profissional que emite. Por isso, dentro deste debate, eu trago aqui essa necessidade desse rigor, ainda mais com quem realiza esses laudos, que não seja só um profissional, mas realmente seja um laudo emitido a várias mãos, porque essa criança, esse ser, esse sujeito, esse paciente vai ter esse diagnóstico para a vida toda, porque, em relação a transtorno, é algo em que existe um comprometimento realmente. |
| R | E, por que não, Senador... Deixo aqui o senhor pensar nessa questão de políticas públicas nas quais as pessoas que realmente precisam dessa medicação possam ter acesso, é claro, e, aí sim, a gente talvez estaria barrando um pouco dessa indiscriminação e medicalização que temos visto diariamente, principalmente nos nossos adolescentes e jovens acadêmicos. Muito obrigada. É isso. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Eu que lhe agradeço. Nós do Senado Federal lhe agradecemos muito, Dra. Thicciana Maria Firminiano - acertei? Pronto, antes do final. Obrigado pela sua participação. Quando a senhora fala realmente em políticas públicas, a gente tem visto aqui, conversado bastante, eu visito os municípios do meu estado, na capital, em Fortaleza, também, e vejo os Caps, como a gente precisa avançar. Falta tudo, falta médico, falta medicamento. Então esse olhar realmente a gente precisa ter. Com relação à questão do medicamento, a senhora falou do efeito dominó, começa lá no laudo. É muito interessante o que a senhora falou: aí vem o efeito dominó. Essa questão do uso indiscriminado - ou então podemos até colocar também a prescrição indiscriminada - é o que assusta, aí vai da responsabilidade daqueles que fizeram o juramento de Hipócrates, porque os efeitos colaterais, estou com a bula, no caso da Ritalina - não sei se a Dra. Maria Aparecida Moysés vai querer falar um pouco, me disseram que ela conhece bastante e vai passar por essa análise na sua fala -, mas eu vou contar um caso pessoal que eu tive: desde a minha adolescência, começo da adolescência, na minha casa, banalizou o Tylenol - banalizou. A gente começar a ver o pai, a mãe, e, aí, uma dor de cabeça, Tylenol; estou começando a gripar, Tylenol. E isso eu fui levando. Graças a Deus - a tecnologia é uma coisa fantástica -, chegou um dia e tinha lá a assinatura de uns médicos mostrando a tragédia que é para o fígado o uso indiscriminado de Tylenol, que não tem nem prescrição, você vai à farmácia, pega e compra. Quando eu li aquilo, eu tive aquele negócio que você para, o chão some. Eu disse: "Minha Nossa Senhora, o que eu fiz durante esses anos"?. E ali eu comecei a tomar... Aí, na primeira dor de cabeça, eu pensei "não vou tomar", mas a dor foi aumentando, "eu não vou tomar". Segurei, dormi chorando, mas não tomei. Mas, olha, foi difícil esse desmame dessa coisa. E aí, foi, foi, até que foi saindo, porque criou uma dependência. |
| R | Depois, eu já no Senado - isso foi antes de eu chegar aqui no Senado, uns 15 anos atrás; eu estou há cinco anos aqui no Senado quase -, no primeiro ano de Senado, eu recebo outra informação... Não, acho que vi uma entrevista num desses documentários de saúde aí, alguma coisa desse tipo. Eu vi... Estava falando um médico, acho que era americano, uma coisa assim, falando da relação entre esse medicamento e a possibilidade de desenvolver o autismo. Gente, quando eu vi aquilo, eu disse: "espera aí, tenho obrigação agora, mais do que nunca". E a gente fez uma audiência pública aqui. Aí eu fui pesquisar com a nossa equipe, e a gente viu - não é, Adriana? - diversos médicos do Brasil, aqui no Brasil e no exterior, que pesquisavam isso. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Na gestação, o uso do Tylenol na gestação seria uma das causas que poderia levar a isso. E a gente trouxe essas pessoas aqui. Depois eu queria até que você me trouxesse a relação daquela audiência para as pessoas que quiserem depois pesquisar. Foi aqui na Comissão de Assuntos Sociais. Teve uma médica que inclusive veio dos Estados Unidos para cá, para o Brasil, para o Senado Federal, para falar aqui e falou, mostrou todo o estudo dela e tal. Então... A SRA. THICCIANA MARIA DAMASCENO FIRMINIANO - Senador... O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Fica à vontade. A SRA. THICCIANA MARIA DAMASCENO FIRMINIANO - Quero falar que o autismo são fatores genéticos. Então, pode até ser a utilização de algum tipo de medicação. Por isso não são prescritas medicações quando a mãe está gestante, para que não tenha nenhum impacto. É só uma consideração de que o autismo, em 86% dos casos, me ajude aqui, Renata, se eu estiver enganada, é de ordem genética. Mas nós temos, sim, alguns índices, em torno de 2%, de que ele pode ser adquirido através de acidentes vasculares cerebrais, entre outras patologias. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Pronto. É um bom debate. Eu acho que isso aí é algo em que a gente precisa jogar luz. Você também gostaria de falar, Isaura? Fica à vontade. A SRA. ISAURA SARTO (Para expor.) - A única medicação que os obstetras permitem que as mães tomem durante a gestação é Tylenol. Eu li muito sobre isso. Eu já tinha essa informação quando eu estava grávida, porque eu acompanhava lá nos Estados Unidos. E, aí, eu perguntei para o meu obstetra: "O que eu posso tomar se eu tiver uma dor de cabeça, uma dor na garganta, não sei o quê?". "Olha, você não pode tomar nada, mas Tylenol você pode." Então, é muito complicado. É muito controverso. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - É um assunto polêmico, mas foram apresentados aqui - não só por um médico, não; por mais - estudos que mostram... Por isso que é nosso papel aqui mediar. Foram apresentados estudos... Essa audiência está, inclusive, no YouTube da TV Senado para quem quiser assisti-la. Foi quando que a gente fez, Adriana, essa audiência? Foi no ano passado? |
| R | (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - No dia 15 de dezembro do ano de 2022. Para quem quiser assistir, está na TV Senado. Daqui a pouco eu vou dar o nome da audiência pública para você pesquisar e assistir. Ela deu uma grande repercussão, mas eu acho importante que a gente possa trazer. Eu não sou dono da verdade, eu apenas tenho a obrigação de, se eu tenho uma informação de médico - eu que não sou médico -, trazer aqui e debater. Quem pensa diferente, quem tem posições diferentes que coloque... Agora, foi a audiência pública para discutir os riscos do uso do paracetamol em gestantes, conforme alerta dado por pesquisadores. Esse foi o debate que nós promovemos aqui na Comissão de Assuntos Sociais. E teve matéria jornalística que embasou a nossa audiência pública; teve uma declaração de alerta da Nature Reviews Endocrinology, que fez uma publicação sobre isso também; teve pesquisadores da Universidade do Paraná, o Anderson Martino Andrade; teve também a doutora... Já, já eu coloco o nome dela aqui, eu vou pegar a relação dos... Tem uma doutora que veio dos Estados Unidos, é Bruna... Daqui a pouco eu coloco. A SRA. ISAURA SARTO - Senador... O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Pois não. A SRA. ISAURA SARTO - ... quando eu contei que os obstetras permitem, é porque eu tenho essa preocupação. Até hoje os médicos falam para amigas minhas que estão grávidas: "Pode tomar". Aí, eu que alerto, eu falo: "Não tome". O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Perfeito. A SRA. ISAURA SARTO - Porque eu não tomei na minha gestação, porque eu tinha a informação, porque eu acompanhava lá fora. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Perfeito. A SRA. ISAURA SARTO - Então, isso me preocupa muito, porque é a única medicação no Brasil que os obstétricos dizem para as mães: "Olhe, você tem que tomar muito cuidado com tudo o que você toma, até com os cosméticos que você usa... O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Isso. A SRA. ISAURA SARTO - ... mas, se você tiver qualquer coisa, pode tomar Tylenol". O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Isso. Agora, eu vou dar um testemunho - é muito bom o que você colocou -, o testemunho que eu dou é o seguinte: eu hoje só tomo remédio em último dos últimos casos, quando é prescrição, quando é alguma coisa... Mas é interessante esse alerta... Quer dizer, você já estava com isso no radar, você já estava olhando para os Estados Unidos quando estava grávida, não é? O paracetamol virou uma cultura, banalizou-se o uso. E, se tem 2% de chance, se tem 3%, se tem 10%, eu acho que se tiver 0,01% de chance de alguma forma acontecer, não deve tomar. Enfim, é outra vida, não é a sua vida, é uma outra vida que está ali sendo gerada e a gente precisa ter o maior cuidado possível. Mas vamos lá. Vamos ouvir a Dra. Maria Aparecida Moysés - muito obrigado, Dra. Maria Aparecida -, que é da Unicamp, lá de São Paulo, participando aqui diretamente por videoconferência. Ela é docente do Departamento de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas (Unicamp). A senhora tem a palavra por 20 minutos, com a tolerância aqui desta Casa. Muito obrigado pela sua participação. A SRA. MARIA APARECIDA AFFONSO MOYSÉS (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos, todas e "todes". |
| R | Eu inicio agradecendo ao Senador Eduardo Girão pelo convite e por ter chamado uma discussão sobre esse tema tão relevante. Cumprimento todos aqui presentes e também os que estão nos assistindo pelos canais da internet. Eu vou pedir um parêntese no meu tempo, porque eu levantei a mão e não tive tempo de ver. É o seguinte: por falar em indústria farmacêutica, marketing e mercado, tem algo importante que é: a dipirona foi desenvolvida por uma farmacêutica italiana, a Carlo Erba, certo? Por isso, ela foi tão desqualificada pelas indústrias farmacêuticas, as outras, dos Estados Unidos e do restante da Europa. Por isso, usa-se tanto o paracetamol e tão pouco a dipirona, que, para efeito analgésico e antitérmico, é muito melhor. Eu volto agora para a minha fala, mas eu não podia deixar de falar isso porque eu acho que está dentro do que a gente está discutindo. Eu inicio... Não sei se todos estão acostumados, mas se exige que médicos e médicas, ao apresentarem palestras, ao se apresentarem publicamente ou publicarem textos, declarem os seus conflitos de interesse. E, como eu digo, infelizmente, há de ter motivos e, também infelizmente, isso não deveria mais ser exigido só dos médicos, mas também dos outros profissionais da saúde. Então, eu declaro que não tenho conflito de interesses com a Novartis, nem com a Janssen, nem com a Shire. A Novartis comercializa o metilfenidato com o nome de Ritalina; a Janssen comercializa o metilfenidato com o nome de Concerta; e a Shire comercializa a lisdexanfetamina com o nome de Venvanse. Os nomes são lindos, não é? Também, publico livros, mas não ganho dinheiro com isso. Não tenho nenhum conflito de interesse com esse tema, mas tenho, sim, alguns compromissos que são intransigentes, porque são princípios, como o compromisso com a qualidade de vida de crianças, homens, mulheres, adolescentes, todos os seres vivos e até alguns inanimados, porque é melhor a gente se proteger. Senador, o senhor citou a história de Maya, que é extremamente interessante, mas eu queria dizer que mais comum do que ser acionado o equivalente ao Conselho Tutelar porque a família exige um determinado tratamento, nos Estados Unidos, é as crianças serem retiradas da guarda dos seus familiares porque os familiares não querem usar substâncias psicoativas. Eles recusam o uso de substâncias psicoativas por vários motivos, muitos deles porque perceberam que os seus filhos acabavam passando mal com essas substâncias. Tem sido muito comum isso, infelizmente, e esse é o temor que a gente tem para cá. Eu também quero iniciar... Eu sou formada pela USP. Este ano, eu completei 50 anos de formada, tive uma festa na Faculdade de Medicina da USP. Sou Doutora em Medicina e sou Professora Titular de Pediatria da Unicamp, já há mais de 20 anos, e sempre trabalhei com crianças, com desenvolvimento cognitivo, com avaliação de desenvolvimento, com a medicalização e a patologização da vida de crianças e adolescentes. Então, talvez eu me alongue um pouco, peço desculpas, porque foram faladas várias coisas a respeito de medicamentos, e acho que eu sou obrigada a falar sobre isso. Eu quero iniciar saudando o Sistema Único de Saúde e saudando a política pública de saúde. Como profissional, eu formo médicos e atuo com eles na rede pública de saúde e acompanho o trabalho deles também na rede privada de saúde. |
| R | Eu acho que fazer essa discussão por um eixo de público versus privado só nos empobrece e pode acabar de vez com o Sistema Único de Saúde, que é a única possibilidade, sim, de atender a todos com qualidade, e uma privatização de política pública, que eu considero que não nos levará a nenhum lugar de sucesso. E tenho certeza de que o Senador compartilha com isso. Eu quero colocar, para situar de que estamos falando, alguns dados de órgãos oficiais. Não vou usar dados de órgãos oficiais do Brasil, porque não existem. Então eu vou falar rapidamente. Nos Estados Unidos, o Instituto Nacional de Saúde Mental e o Centro de Controle de Doenças afirmam que 46% da população estadunidense preenchem critérios diagnósticos de algum ou alguns transtornos mentais. Na Europa Ocidental, esse número é 38% da população que teriam algum transtorno mental. Se a gente pensar especificamente em crianças e adolescentes, que acho que é o nosso foco principal, há alguns dados do início deste século XXI. Também esses dados não são muito comumente divulgados. Nos Estados Unidos, estima-se que 13% a 20% das crianças experimentam pelo menos um, aspas, "episódio de transtorno mental" por ano. Episódio de transtorno mental, eles estão se referindo a surtos psicóticos ou surtos, crises de algum transtorno mental. Uma em cinco crianças. Ainda nos Estados Unidos, as crianças levadas a médicos, em busca de tratamento de transtorno mental, aumentou 35 vezes em dez anos. Isso não tem parâmetro de comparação com nenhuma área da medicina. Eu acho que isso é importante ressaltar. Quando falamos de transtorno mental, lidamos com dados muito estranhos ao conhecimento médico de todas as outras áreas. O diagnóstico de transtorno bipolar em crianças e adolescentes aumentou 40 vezes em dez anos. Nos Estados Unidos, nós temos mais de 10 mil, quase 20 mil crianças com menos de dois anos de idade tomando, Senador, psicoestimulantes para tratar o que eles definem como "tempo cognitivo lento", seja isso o que for numa criança de dois anos. Em relação aos números de TDAH, varia muito, cada hora é um número que é divulgado. Hoje se divulga muito que a média no mundo seria em torno de 10% a 12%, esse seria o número no mundo, e isso confirmaria que é uma doença inata, biológica e que independe de contexto social. Entretanto, estudos de metanálise realizados pelo Centro de Medicina Baseada em Evidências da Universidade de McMaster, do Canadá, que é o mais reconhecido nessa área, encontraram que, no mundo, os dados de prevalência de TDAH variam de 0,5% a 20%, dependendo do contexto social e cultural, ou seja, como o senhor bem colocou na sua justificativa, o contexto social é fundamental. |
| R | Agora, eu queria perguntar - vejam, quando a gente lida com esses números assustadores e que fogem de qualquer parâmetro médico - como são construídos esses números? Como se chega a isso? Porque, quando se divulga o número, ao contrário do que se exige em critérios de cientificidade de publicações, não se diz como foi feito o levantamento, com base em quais critérios, quem foi selecionado. Isso não é colocado. Então, acho que essa é uma questão fundamental para a gente estar pensando: como é que esses números são construídos? Espera um pouquinho que caiu a... (Falha no áudio.) ... do meu notebook. Outro dado é que com esses números, Senador, é impossível pensar, propor, implementar qualquer política pública. É impossível. Com isso, como o senhor bem apontou, tem um processo grande de medicalização, patologização da vida de crianças e adolescentes que apenas estão fora de parâmetros sociais artificiais e, nesse meio, se perdem as crianças que realmente têm algum problema, que precisam de uma atenção e que precisariam de uma política pública voltada para elas. Mas para 40%, para 12% é impossível. Eu queria lembrar que em Medicina nós só usamos porcentagem... E a gente está falando, desculpem-me, do campo da Medicina. Podem chamar de transtorno ou de doença, mas é o campo médico. Em Medicina, nós só usamos porcentagem para doenças socialmente determinadas: fome, desnutrição, anemia, verminose. Aí sim. Para doenças inatas, orgânicas, a porcentagem é um dado muito grosseiro. Então, a gente usa 1 para 10 mil, 1 para 100 mil, 1 para milhão. Quando se fala em genético, é mais raro ainda, sem contar a dificuldade de se comprovar que uma determinada patologia realmente tem uma origem genética. Isso em todos os campos da Medicina. No campo de transtornos mentais se colocam, tranquilamente, esses dados, sem questionamento. Eu acho que é isso o que nos preocupa. Eu acho que quando o senhor fala em prescrição indiscriminada, talvez a gente possa falar em diagnóstico e prescrição exagerados. Acho que é disso que a gente está tratando. Porque vejam, se esses dados fossem reais, eu seria obrigada - e eu tenho certeza de que o senhor concorda comigo - a dizer que nós estaríamos falando de uma doença socialmente determinada e não de uma doença inata, biológica. Se uma doença é socialmente determinada, quem está doente é a sociedade e quem precisa ser tratada, cuidada, é a sociedade. Aí sim, com políticas públicas: políticas públicas voltadas para a atenção à saúde, com qualidade para toda a população; política pública voltada à educação de qualidade para toda a população; políticas públicas que privilegiam a acessibilidade, o lazer, a alimentação - nós não queremos ninguém mais passando fome -; políticas públicas que incentivem o respeito às diferenças e o combate às desigualdades; políticas públicas que trabalhem, também, no campo da formação profissional, não só de médicos. Como uma formadora de médicos, eu posso dizer, tranquilamente, que a formação médica precisa, sim, ser muito melhorada, mas também posso garantir que a formação de psicólogos, de pedagogos, de neuropsicólogos, de neuropsicopedagogos, de psicopedagogos, de fonoaudiólogos, precisa ser melhorada, porque todos somos formados em um mesmo ideário, como o senhor bem apontou, de medicalização e patologização da vida em que a singularidade, a pessoa desaparece nesse ideário. É esse o contexto em que está sendo discutida essa questão aqui. E eu acho que isso é importante frisar. |
| R | Mas eu queria dizer que esses dados reais são construídos artificialmente. Eles não refletem a realidade. E são construídos por um ideário que não aceita diferenças, que não aceita questionamentos, que não aceita a singularidade. Um ideário que nos quer padronizados, normalizados, não questionadores, submissos, respeitadores do status quo e que não queiramos mudar nada, transformar nada, ou seja, um ideário que pretende o genocídio do futuro, porque, se hoje estamos diferentes de há 50 anos, de há 100 anos, há mil anos, é porque muitos ousaram questionar e não se submeter às regras impostas. É disso que a gente está falando. Então, nós vivemos uma epidemia não de transtornos mentais, mas uma epidemia de diagnósticos de transtornos mentais. E isso, sim, é o processo de medicalização e patologização da vida. E eu quero destacar que eu sou médica, eu atendo, eu prescrevo medicamentos. Não é disso que a gente está falando. Não estou negando a existência de pessoas com problemas reais. O que eu estou questionando são diagnósticos controvertidos, questionados pela medicina no mundo todo e, principalmente, esses números que nos são apresentados e que passamos a aceitar tranquilamente, porque vêm dos Estados Unidos. Não é assim. Temos que questionar, porque esses números são irreais. Então, o número exagerado de diagnósticos é confirmado até por autores que defendem fazer o diagnóstico, que defendem usar medicamentos, que defendem os critérios. Eu posso dar o exemplo de um docente do Instituto de Psiquiatria da USP, Guilherme Polanczyk, que pesquisou, no Brasil, adolescentes que tinham diagnóstico de TDAH e que encontrou que 75% deles não preenchiam nem mesmo os critérios frouxos, vagos e imprecisos do DSM e do SNAP-IV. Vejam, nem esses critérios frouxos são preenchidos por 75%. Isso dá a dimensão de quanto o diagnóstico é, sim, exagerado, de quanto a prescrição é, sim, exagerada. Eu acho que a gente precisa usar a expressão exagerada. E é óbvio que, quando a gente fala de epidemia de diagnósticos, nós falamos de uma epidemia de uso de substâncias psicoativas. No campo de transtornos mentais, é isso que vem sempre junto. Então, eu quero falar de duas substâncias psicoativas só, que foram bastante citadas aqui. Uma, o metilfenidato, conhecido como Ritalina e Concerta. Acho que um dado... Aliás, eu queria dizer que quem tem acesso aos dados de produção e consumo, na verdade, é só a indústria farmacêutica. Nem mesmo a Anvisa tem acesso a esses dados e divulga os dados com regularidade. Então, no mundo, em 2006, foram produzidas e consumidas 72 toneladas de substâncias psicoestimulantes. Das 72 toneladas, 38 eram metilfenidato e 34 eram todos os outros psicoestimulantes geralmente usados em adultos, e que têm várias contraindicações em adultos, mas em crianças se usam tranquilamente. |
| R | Em 2014, a produção e o consumo de metilfenidato no mundo subiram de 38 toneladas para 72 toneladas. Gente, desculpa, este dado não tem parâmetro na medicina, em nenhuma área da medicina, seja em número de transtornos que aparecem, e que aparecem a cada ano um número maior, lançados pela Academia Americana de Psiquiatria, seja em número de quantidades de diagnósticos, seja em número de quantidade de prescrição de substâncias psicoativas. Não há parâmetro na medicina, esse dado é estranho à ciência médica. E interessante é que, ao contrário do que se diz, as melhoras não são tão evidentes e nem são inquestionáveis. Acho que o que a gente precisa perguntar é: por que é que está aumentando tanto os transtornos mentais? O senhor falou de um dado citado, que em 20 anos teremos uma criança com TEA por núcleo familiar. Por que? Ela não é genética? O que está acontecendo? Será que é o TEA que está aumentando ou é o diagnóstico de TEA? Acho que é algo para a gente se questionar. Em relação à risperidona, é um antipsicótico de terceira geração, que até poucos anos atrás era usado apenas em surtos psicóticos graves em pacientes com esquizofrenia severa - no surto, depois era retirado -, hoje é prescrita tranquilamente para crianças pré-escolares. Para tratar uma agressividade, quando uma criança com autismo tem um componente de agressividade, ela precisa ser tratada com um antipsicótico? E aí eu queria perguntar se a agressividade é um componente do autismo, é um componente do TDAH, é um componente de transtorno mental ou é uma reação de um sujeito que vem sendo discriminado, desumanizado, segregado, sujeito a vários modos de desrespeito? E aí ele reage, e aí ele é que é o agressivo. É muito semelhante a quando a gente vê, por exemplo, um adulto que tem um AVC. É fácil de imaginar: um adulto no auge da sua vida, com seus quarenta e poucos anos, tem um AVC, desmaia, apaga e, quando volta, ele não consegue falar e não consegue mexer, por exemplo, o lado esquerdo do seu corpo. E ele não tem, lhe é negado o direito de minimamente ficar revoltado com a situação. Eu acho que é o que a gente espera que ele tenha. Ele tem o direito de se revoltar e de viver esse luto, essa perda da vida que ele tinha. Mas aí ele é rotulado de agressivo e ele é agressivo porque ele teve um AVC e precisa ser medicado. Será? Ou somos nós que não estamos sabendo lidar com as diferenças e com as pessoas que realmente têm necessidades? O senhor citou, no seu texto e também nas suas falas, e eu queria enfatizar: toda substância psicoativa tem inúmeras reações adversas. Não estou falando de efeitos colaterais, estou falando de reações adversas, que é algo diferente. |
| R | Reação adversa é algo extremamente grave e que indica: retire imediatamente a droga, porque algo também está errado. Se a gente falar - o senhor está com a bula da Ritalina? - do metilfenidato, vejam que ele age em reações adversas em todos os órgãos e sistemas do organismo. Então ele atua no sistema cardiológico com arritmia, taquicardia, bradicardia e parada cardíaca. E há um dado assustador, levantado por uma pesquisa feita por uma professora, psiquiatra e epidemiologista, com apoio do FDA dos Estados Unidos. Ela encontrou o quê? Morte súbita inexplicada, que é aquela morte súbita de que não se encontra a causa. É quatorze vezes maior em adolescentes que vinham tomando metilfenidato há pelo menos três anos. Uma das coisas que se sabe é que as substâncias psicoativas, todas elas, depois de um tempo de uso crônico prolongado - em média, isso é em torno de 36 meses -, provocam alterações anatômicas irreversíveis no sistema nervoso central. Por isso é indicado que não se prolongue o uso de nenhuma substância psicoativa por mais de 36 meses. Inclusive o uso de antipsicóticos por mais de 36 meses pode levar a uma atrofia do lóbulo frontal. É uma lobotomia química que se faz, irreversível. É disso que estamos falando. Tem ações no sistema neurológico, sem falar da questão de sistema endócrino, de crescimento - e ficam mais baixos, sim, porque interfere no crescimento -, mas eu quero enfatizar o neurológico: insônia, sonolência, agitação, irritabilidade, apatia. Fenômenos opostos, todos eles são provocados como reação adversa ao metilfenidato, inclusive suicídio, numa quantidade que não é desprezível. Mas o mais comum, o mais usado, e consta em qualquer livro de farmacologia, é que uma das reações adversas do metilfenidato é o chamado efeito zumbi like, que é conseguir prestar atenção em uma única coisa. Vejam que isso é uma reação adversa e que indica: retire a droga. O metilfenidato é usado em crianças e adolescentes com essa reação adversa, não é por um efeito terapêutico, não tem esse efeito terapêutico. O que se chama de focar atenção, desculpe-me, mas é um jogo de palavras, Senador. Não foca atenção, reduz atenção. No mundo que me quer multifocado, prestando atenção em várias coisas, inclusive quando estou estudando, eu preciso prestar atenção em várias coisas; quando estou aprendendo, eu preciso prestar atenção em várias coisas. Esse efeito, essa reação adversa me faz prestar atenção numa única coisa de cada vez. Por isso que na bula que está na sua mão recomenda-se não dirigir máquinas, não guiar, não subir em árvores - aí sou eu que estou falando, porque, se não pode guiar, também não pode subir em árvores, não pode andar de bicicleta. "Se você tomou metilfenidato, meu filho, hoje você não pode andar de bicicleta. Você também não pode nadar, porque ao nadar a gente tem que prestar atenção em tudo". Ao andar de bicicleta, eu tenho que prestar atenção em tudo, eu não posso olhar só a bicicleta. |
| R | Agora, prestar atenção em uma única coisa é uma única coisa indiferenciada e genérica, não importa o que seja; não é o estudo, não é fazer a lição, é o que passar e prender a minha atenção. Essa é uma reação adversa, Senador. Isso, que é vendido como efeito terapêutico, indicaria: não use essa substância em crianças e adolescentes, porque você está provocando uma reação adversa extremamente importante. Foi falado aqui em dependência química, e eu posso dizer que, sim, metilfenidato leva à dependência química de substâncias mais pesadas porque tem o mesmo mecanismo de ação que a cocaína e as anfetaminas, mas com um poder de provocar a dependência maior do que a da cocaína. Depois, se quiserem, eu posso explicar qual é esse mecanismo, mas isso é bastante comprovado e não é questionado. Outro dado importante sobre o uso de substâncias psicoativas em crianças por longos períodos é que, nos Estados Unidos, as clínicas de tratamento e de internação de adolescentes com surtos psicóticos graves relatam que 75% deles não tinham, no seu histórico de vida, nada que indicasse que eles poderiam apresentar um surto psicótico, mas todos eles estavam usando substâncias psicoativas, especialmente psicoestimulantes, há, pelo menos, três anos. Então, isso é para a gente falar de como agem e dos riscos dessas substâncias que estão sendo usadas indiscriminadamente, sim; exageradamente, sim. E os resultados que se apregoam como sendo tão fantásticos e que há mais de 10 mil papers provando que funcionam? Quando a gente busca metanálises feitas por centros de medicina baseadas em evidências - e no mundo só tem seis desses centros, e o mais proeminente é o da Universidade McMaster, que eu já citei -, eles têm uma metanálise extremamente importante que começa com o seguinte: quando eles avaliam os 10 mil, 15 mil papers de que tanto se fala, ao analisá-los, primeiro, por critério de cientificidade, a imensa maioria, Senador, foi jogada no lixo, sobrou uma dúzia. É literal: 12 textos publicados foram considerados como preenchendo critérios de cientificidade por analistas independentes que não trabalham com o tema; eles analisam a cientificidade do texto. Eles encontraram que só 12 não tinham conflitos de interesse, não tinham análises equivocadas, não tinham seleções equivocadas; 12 eram textos científicos. Nesses 12, eles encontraram que não havia melhora de rendimento escolar, não havia melhora de aprendizagem, não havia melhora de sociabilidade; eles encontraram um único efeito positivo em meninos - meninos homens -, com a idade em torno de nove anos: melhorava o comportamento deles em sala de aula; ou seja, eles deixavam de importunar a sala. É para isso que é usada essa substância com tanto risco? Deve ser, porque vamos lembrar que, nos fins de semana, as crianças não tomam esse medicamento, que não é bem um medicamento, não é? |
| R | Senador, o que é que estamos fazendo com as nossas crianças e adolescentes? Eu quero citar rapidamente uma experiência importante de Campinas. Campinas é um município, uma cidade que tem uma rede de saúde pública extremamente importante, que foi construída ao longo de muito tempo e que atende com qualidade. Campinas tinha um consumo de metilfenidato em números absolutos maior do que a cidade de São Paulo, portanto, maior do que qualquer cidade no Brasil, embora tenha menos de 10% da população de São Paulo. Foi com base nesses números que a Coordenação de Saúde Mental da Secretaria de Saúde - a coordenação era de uma psiquiatra, doutora em psiquiatria - chamou um grupo de trabalho para discutir. Discutiram intensamente, chamando muitos profissionais da rede, chamando os psiquiatras da rede e neurologistas também, além de psicólogos, educadores. E chegaram a um protocolo que foi implantado. Esse protocolo estabelece que toda criança será atendida por uma equipe multiprofissional. Desculpem: uma equipe multiprofissional de fato, e não de fachada. Existem muitas equipes multiprofissionais de fachada. Essa equipe multiprofissional, que inclui obrigatoriamente um pediatra e um neuropediatra ou um psiquiatra infantil - tem que ter um dos dois -, discute e chega ao diagnóstico de TDAH. Eles... (Pausa.) Quanto? O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Dra. Maria Aparecida, eu já fiz algumas prorrogações aqui, mais ou menos uns dez minutos a mais do tempo, mas eu vou lhe dar mais dois. Se a senhora puder concluir, eu agradeço demais. Está sendo muito interessante a sua exposição. A SRA. MARIA APARECIDA AFFONSO MOYSÉS (Por videoconferência.) - Estou acabando. Essa equipe deve construir um projeto terapêutico singular para cada criança, de acordo com as necessidades de cada criança. A prescrição da substância psicoativa é decisão do psiquiatra ou do neuro, que trabalham em equipe. Um dado fundamental, que é conhecido no mundo todo, é que, quando psiquiatras trabalham sozinhos, tendem a prescrever mais. E eles reclamam de se sentirem isolados. Então, ele é membro de uma equipe, seguem as normas do DSM, da Associação Psiquiátrica Americana, e, fazendo isso, a prescrição de metilfenidatos, em um ano, caiu a 10% do número anterior. Um detalhe importante é que todos os profissionais da rede avaliando bem o resultado, as famílias também, as crianças passando muito bem e as escolas também. Então, como proposta, eu acho que podemos caminhar, a gente tem que pensar em estabelecer critérios diagnósticos rigorosos e que devem ser seguidos rigorosamente. Aliás, a Conitec já tem essa discussão, e isso é na rede pública e principalmente na rede particular, nos consultórios particulares. Os médicos não devem atuar isoladamente, mas numa equipe multiprofissional de fato, com critérios rigorosos para a prescrição de substâncias psicoativas e um acompanhamento constante pela equipe. Um laudo é para a vida toda, mas um relatório não é. A criança muda, todos nós mudamos e esses relatórios e o projeto terapêutico singular têm que ser avaliados e revistos a cada seis meses. Um dado importante é que uma substância psicoativa só é prescrita em crianças com mais de oito anos e por um tempo definido, máximo de 24 meses, para evitar os 36 meses. |
| R | E a grande discussão é: Projeto Terapêutico Singular, porque cada pessoa é única, é singular, com necessidades específicas. Senador, se, para tratar uma bactéria, uma infecção, não há um único antibiótico, depende da idade, da condição de saúde, da condição clínica, da imunidade, das possibilidades de antibiótico, tem uma gama de antibióticos a serem escolhidos - e eu estou falando de algo puramente orgânico, biológico, como uma bactéria e um antibiótico -, o que falar, quando a gente entra no campo psi, de modos de comportamento e de aprendizagem, que é o campo mais complexo, mais sofisticado, que é o que nos diferencia como seres humanos? Não se pode pretender que haja uma única terapia, única, para todos os casos. Eu não quero e eu não aceito - e eu acho que não podemos aceitar -, eu não aceito como professora escolar de Pediatria, como formadora de médicos, eu não aceito que se trate um autista. Eu não aceito nem mesmo que se trate uma criança autista. Porque o Pedro, que pode ter autismo, ele é muito maior do que o autismo: o Pedro mora em tal lugar, com tal família, com tais condições, com tais acessos, com tais facilidades, com tais dificuldades, sendo aceito ou não sendo aceito. O Pedro é único. Então, não há uma terapia que iguale Pedro, João e Maria; temos que ter projetos terapêuticos singulares. Então, acho que um erro que temos que evitar na definição de políticas públicas é propor, por lei, que determinada (Falha no áudio.) seja tratada com um único modo de terapia no campo emocional. E nós precisamos de políticas públicas - e aí eu conto com o senhor, Senador -, políticas públicas voltadas para a melhoria da qualidade de vida de todas as pessoas e que visem transformar esta sociedade, que ainda é tão capacitista, tão preconceituosa, tão voltada ao desrespeito das diferenças e a ignorar desigualdades. Acho que esse é o desafio que temos. Eu agradeço e peço desculpas se me alonguei, mas é que as falas anteriores me provocaram muito. Obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Muito obrigado, Dra. Maria Aparecida Moysés. Muito obrigado pela sua participação. Trouxe uma fala com muito entusiasmo - isso é muito importante -, com dados, com pesquisas tanto dos Estados Unidos como da Europa. E foi muito interessante a sua participação, eu lhe agradeço demais. Essa questão do lobby da indústria farmacêutica é uma coisa que também me incomoda muito. Eu, particularmente, sou adepto à homeopatia. Eu vejo isso, inclusive as práticas integrativas, eu vejo isso com muito bons olhos, fui muito beneficiado por elas, que inclusive estão no SUS - eu acho importantíssimo isso. E o que a gente percebe muito com relação à questão do... A sociedade está doente mesmo. Essa é a grande realidade. A gente percebe um adoecimento. E aí... A gente já fez debates aqui, promovidos por mim, aqui nesta Comissão e na de Direitos Humanos, sobre a questão, por exemplo, do vício em telas, do vício em pornografia. |
| R | A gente está vendo a sociedade - cada um, isolado, não é? -, e é muito preocupante o momento que a gente está vivendo, essa provação que a gente está vivendo na humanidade. Todos nós com visões distintas do mundo, mas buscando diálogo. Sempre é importante o diálogo, porque ninguém é o dono da verdade. A gente tem que ouvir e buscar o entendimento, buscar soluções com relação a esse tema. E é um tema intrigante, um tema que diz respeito à saúde, à vida, que é o bem mais precioso que a gente tem. Nós estamos vivendo uma pandemia neste momento. Sabe qual é a pandemia que a gente está vivendo? A do suicídio. O suicídio é algo que está acontecendo, nos bastidores, no submundo, embaixo do tapete, que tem levado amores de vida de pessoas aos montes. E a tendência, infelizmente, segundo nós também fizemos aqui audiências, que eu propus, sobre suicídio, é aumentar. Como conter isso? O que a gente precisa fazer? Eu acho que esta audiência joga um pouco de luz e vai despertar muitos Senadores. Hoje é segunda-feira, muitos Senadores não puderam estar aqui, e a gente entende. Geralmente, é uma cultura que existe - de terça a quinta -; então, o Senador hoje está na sua base. Sexta-feira também. Terça, quarta e quinta, geralmente está aqui. Mas aqueles que não estão, estão acompanhando. Os seus assessores estão também anotando tudo, e eu acho que é um trabalho em conjunto que a gente precisa fazer. Olha a quantidade de perguntas! Não para. Não param de chegar perguntas de todas as regiões, de todos os estados do Brasil. Daqui a pouco eu vou ler. Nós vamos ouvir aqui a nossa última palestrante, e depois eu vou ler as perguntas. (Pausa.) Oh, perdão, está faltando - vai ser agora - a Dra. Mariana Pinto e depois a Dra. Christina Gonzalez. Então, faltam mais duas palestrantes. Aí eu vou fazer aqui a leitura das perguntas e deixar cinco minutos para cada uma das expositoras fazer as suas considerações finais e responder alguma pergunta com que se sinta confortável, dentro da sua especialidade. Então, vamos partir... Ah, uma coisa... Promessa é dívida. Eu fiquei de falar aqui da audiência pública sobre o paracetamol, relacionado à questão da gravidez, do uso na gravidez, que poderia gerar a questão do autismo. E está aqui. A finalidade da audiência pública foi debater a pesquisa que emitiu declaração de consenso e alerta para os riscos e sugere recomendações para o uso do paracetamol por gestantes de todo mundo. Publicada em 2021 no periódico Nature Reviews Endocrinology. |
| R | A audiência foi realizada em caráter interativo aqui, nesta Comissão, e os participantes foram: a Dra. Bruna Pitaluga - essa foi a médica que veio dos Estados Unidos para o Senado e fez a sua apresentação aqui, a Dra. Bruna Pitaluga; o Dr. Anderson Joel Martino Andrade, professor da Universidade Federal do Paraná; o Etelvino de Souza Trindade, membro da Câmara Técnica de Ginecologia e Obstetrícia do Conselho Federal de Medicina; a Dra. Janini Selva Ginani, Coordenadora-Geral de Saúde Perinatal e Aleitamento Materno, do Ministério da Saúde; Marli Martins Sileci, Vice-Presidente Executiva da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para o Autocuidado em Saúde; a Dra. Valquiria Zago Matheus, Presidente da Associação Brasileira de Ayurveda; e Marcela Montandon, Presidente do Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal. Nós realizamos aqui, em 2022, essa audiência pública. Inclusive chamamos aqui o laboratório, não foi? (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Ah, está certo. Aqui a Vice-Presidente Executiva da Associação Brasileira da Indústria de Produtos... mas não veio, não é? Acho que ela não participou. Nós chamamos aqui. (Pausa.) Ah, aqui estão aqui as que... Então, ela veio. Ela fez uma apresentação aqui, é verdade. É porque é muita informação, são muitas audiências públicas, mas perdão. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Vamos ouvir? Se a gente puder ouvir... porque, depois, cada um vai ter cinco minutos para a gente... Daqui a pouco nós vamos ter sessão de discursos lá no Plenário, e eu sou o segundo inscrito, mas vai dar tempo. Começa 2h da tarde - vai dar tempo. Vamos lá! Vamos ouvir agora a Dra. Mariana Pinto, que é psicóloga. Muito obrigado pela sua participação, por você ter vindo aqui, ao Senado Federal. A senhora tem 20 minutos para a exposição. Muito obrigado. A SRA. MARIANA PINTO (Para expor.) - Muito obrigada eu pelo convite. Fico muito feliz de participar e poder trazer aqui um pouco da minha visão. Eu sou psicóloga desde 2008. Estou com a apresentação aqui, vou aproveitar... Posso ficar de pé? O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Pode. A SRA. MARIANA PINTO - Obrigada. Pronto, melhor. Aponta para cá? Para lá. Tem aqui um pouquinho da minha experiência. Eu sou psicóloga, me formei pelo Ceub em 2008 e, logo após a formação, já entrei também na pós de psicodiagnóstico, justamente por esse interesse em, de fato, olhar o ser humano não só pelo que ele representa externamente, mas também por todo o desenvolvimento dele interno. Então, são mais de 15 anos já em atendimentos clínicos. Eu tive o prazer de ser estagiária do Dr. Salomão, como a Isaura trouxe aqui. Eu atendi muitos pacientes dele. Eu estagiei com a Dra. Ana Maria Bereohff, que também atuou bastante e atua ainda nessa área do autismo E tenho muitos pacientes com essa questão do transtorno de déficit de atenção. Atuo muito em escolas. Então, muitas das queixas que eu ouvi aqui hoje, desde esse último relato da Dra. Maria Aparecida, da Thicciana - falei certo? - também, da Izabel e da Isaura, como mãe... É um fato real que as escolas não estão preparadas, capacitadamente mesmo, de forma à sua equipe, os professores, coordenação e tudo mais... Muitas já estão à frente do seu tempo, trazendo a psicologia para capacitar esses profissionais. |
| R | Isso é muito bom, e a gente deve, sim, estimular esse treinamento de capacitação dos professores, porque eles são os primeiros que reparam que essa criança é desajeitada, que essa criança é desastrada, que essa criança incomoda a aula, que, na hora em que a professora pede que todos sentem, escrevam e copiem a tarefa, sempre tem um que levanta, que vai na mesa do colega, que vem até a mesa da professora, que diz não saber onde está o lápis, diz não saber onde está a borracha. E aí a gente começa a ter, então, uma dificuldade de interação, de relacionamento, uma dificuldade de aprendizagem, desde que essa criança inserida nesse meio revele essa necessidade, talvez, de mais acolhimento, de mais cuidado, porém, é visto como um comportamento desafiador, uma queixa, e aí vai para a coordenação: "Vou ligar para o seu pai. Vou ligar para a sua mãe. Sai da minha sala, porque não é, de fato, o tempo necessário que eu tenho para dedicar a esse cuidado". Não estou aqui sendo generalista; obviamente que inúmeros professores já têm uma postura diferenciada, mas a gente vê que, ainda assim, é muito desafiador para um professor, numa sala de 30 alunos, conseguir, de fato, dar a atenção necessária para uma criança atípica, que precisa, sim, de um acompanhamento especial, de um olhar especial. É esse olhar especial que eu proponho. Um transtorno precisa ser bem pesquisado, precisa ter uma validade superior à maioria dos outros e seguir, sim, alguns padrões de avaliação. A gente tem o DSM-IV, a gente tem o CID-10, como eu trouxe ali. Então, fundamentalmente, ele é clínico com base nessas duas bíblias, como a gente chama na psicologia, mas a gente precisa ir além: a gente precisa de exames de neuro, a gente precisa de testes, a gente precisa conhecer essa família, a gente precisa sentar e ouvir o que essa família tem a dizer, o que esse professor tem a dizer, o que essa criança e o que esse adolescente tem a dizer, porque o que ele representa, o comportamento externo, eu vejo, você vê, todos nós vemos, mas o que, de fato, ele sente para se comportar assim? O que, de fato, provoca esse comportamento? O comportamento é reação. Então, eu penso algo, eu sinto algo e eu me comporto de determinada maneira. Então, por que meu comportamento é inadequado? Será que não estou canalizando o meu sentimento e a minha necessidade, comunicando isso de forma aceita, de forma não violenta e não agressiva? Então, é aí que a gente precisa de fato enquadrar essa criança dentro de um dos três sintomas mais clássicos do TDAH, que são a desatenção, a hiperatividade, a impulsividade. A gente trabalha com diagnóstico individual ou combinado. Então, a criança pode ter transtorno de déficit de atenção com alto grau de desatenção ou com alto grau de hiperatividade e impulsividade. Aqui eu já diferencio o tratamento porque, se ela tem alto grau de desatenção, eu já preciso de outras práticas para ela; se ela tem um transtorno combinado, aí, sim, eu já direciono para outro lado. Normalmente esse transtorno está associado a um comprometimento funcional da vida acadêmica, profissional e relacional. Como a gente trouxe aqui também, os dados são esses, a criança se isola, não se enxerga, não tem uma boa autoestima, não tem uma crença de força e de realização, elas se acham burras. Eu tenho relatos aqui, estudos de caso que eu até trouxe; se der eu leio algumas frases. "Eu achava que eu era burra; eu não sou burra? Então, eu tenho um transtorno? Ah, que bom! Então, agora alguém pode me ajudar a resolver o meu transtorno". "Sim, eu vou te ajudar a lidar com esse comportamento. Você não é burra, porque você ainda não consegue copiar - você não é burra. O Joãozinho, que já consegue copiar, tem outro tipo de aprendizagem, e você vai precisar de outro canal, de outra pessoa, de outro tempo". Então, a gente precisa também pensar nisso. A gente tem os dados: de 3% a 6% das crianças são atingidas por esses transtornos, e claro que elas persistem, que esse transtorno persiste na vida adulta em mais da metade dos casos. Eu até trago que geralmente o transtorno aparece quando a criança sai da primeira infância e entra no primeiro ano. Geralmente, no primeiro e no segundo ano, é quando a criança de fato precisa ter regras dentro de sala, precisa ter comandos diretivos que ela obedeça de primeira. É aí que abre a lanterna: "Opa, essa criança não está obedecendo. Essa criança não está fazendo o que está sendo proposto". Aí, sim, a gente aumenta, então, o olhar e o número de diagnósticos por isso. A partir dos sete, oito anos é quando a gente, de fato, começa a perceber um aumento dos casos. |
| R | E aí a gente tem, ao longo dos anos, inúmeros estudos que mostram, sim, alterações neuroquímicas de origem genética, em especial nesse sistema, que é justamente onde o MFD, que é esse mental... (Intervenção fora do microfone.) A SRA. MARIANA PINTO - Isso, eu o chamo de MFD, já virou... É, de fato, onde ele atua. Então, são alterações que são contornadas ou minimizadas com medicamentos - olhem só: contornadas ou minimizadas. Elas não são curadas, elas não desaparecem, elas não somem; elas são minimizadas e contornadas. Tanto é que a Dra. Maria Aparecida trouxe também inúmeros dados do aumento do uso, porque a gente quer minimizar o comportamento desafiador da criança. A gente não quer tratar o comportamento; a gente quer deixá-la quieta, a gente quer deixar essa criança silenciada, e aí, por isso, a gente vai lá e medica para que a gente tenha um momento de paz, para que a sala possa funcionar, para que o grupo possa render. Então, esse comportamento não é tratado; ele é minimizado. Hoje, de fato, a gente tem estudos, tem casos. Cada caso é um caso, e, para alguma determinada situação, a gente percebe que, sim, o medicamento atua de uma forma capacitadora, atua de uma forma que até alivia o cenário da família, porque o diagnóstico envolve a família. O diagnóstico não é da criança; é da família, a família passa a fazer parte do tratamento, do acompanhamento e de todas as conversas a respeito disso. Então, o medicamento, muitas vezes, atua também nessa rede que é a família. A gente tem alguns obstáculos que descrevem... os vários obstáculos que dificultam, de fato, essa identificação e obtenção dos dados. Eu acredito que vocês já os trouxeram muito bem; não vou mergulhar tanto nisso. Também temos grandes avanços, porque a gente passa a enxergar todo o conjunto. Esse diagnóstico, geralmente, está atrelado a outros diagnósticos, a outras comorbidades. Essa criança está inserida num meio que, às vezes, propicia esse comportamento e aumenta, de fato, esse transtorno. Então, o que a gente tem que pregar é um diagnóstico completo, como todos colocaram aqui. Esse projeto singular, que a Dra. Maria Aparecida citou, já acontece de forma semelhante aqui, em Brasília. Vou dizer que é semelhante, porque ainda não está tão completo quanto o que ela trouxe, mas eu já faço um diagnóstico completo com uma equipe de pediatra, fono, pedagogas, professoras e psicólogas. O nome desse projeto está ali, é o Verbalize Kids. Então, a gente olha para cada criança, acolhendo essa família, fazendo essa anamnese, levantando esses desafios, olhando para soluções específicas para essa criança, capacitando a equipe da escola, capacitando a babá, capacitando a cuidadora. Geralmente, são famílias que têm tanto o estado civil como casal e também como novas configurações de família, e vem todo mundo. Geralmente, eu falo: "O tratamento não é só para o seu filho; o tratamento envolve você, o seu ex-marido, o seu atual marido, o seu filho mais velho, o seu filho...", é todo mundo. Então, a gente precisa, sim, trazer. É imprescindível que essa estratégia avalie essa criança e essa família por completo, descartando quaisquer outros transtornos, como a Thicciana trouxe aqui. A gente tem muito TAG, a gente tem muita dislexia, apraxia, tem uma série de outros transtornos que, de fato, fazem com que essa criança seja desatenta. Então, não é o TDAH primeiro; talvez ela tenha uma outra dificuldade, e a desatenção seja uma consequência, mas o que é visto acima é o contrário. Então, é visto primeiro o TDAH, quando, na verdade, ela pode ter um outro diagnóstico anterior. O tratamento medicamentoso atua, sim, nessa mudança de comportamento, como a doutora trouxe. |
| R | O tratamento medicamentoso atua sim, nessa mudança de comportamento, como a Doutora trouxe, o foco da atenção passa a ser exclusivo a um único estímulo, e a gente precisa avaliar qual é esse estímulo, qual é o estímulo ao qual eu quero que a criança preste atenção, qual é a necessidade que eu tenho dela naquele momento. Como eu disse aqui, eu tenho alguns depoimentos de pacientes que começaram a tomar o remédio. Eu tenho um paciente de 8 anos, que está no 2º ano, e, de fato, foi tentada com ele uma série de estratégias, e ele não conseguiu acompanhar. Ele é muito inteligente, ele tem notas muito boas, mas ele, de fato, não conseguia ficar sentado. Durante a aula, ele ficava rodando pela escola, caminhando. Ele ia ao 5º ano, sentava no 5º ano e assistia a uma aula, aí ele voltava, sentava e fazia um exercício. Na hora de ensinar ou tirar dúvida, era ele que ia para o colega falar e, de fato, a mãe chegou ao medicamento por conta de uma necessidade até social, porque ele não se relacionava com a turma, ele não era convidado para os aniversários, e a mãe sofria - quem sofre é a mãe -, a criança às vezes não sofre, quem sofre mais é a família. E a mãe falou: "Eu preciso que ele faça amigos, eu preciso que ele pertença a um grupo, então eu preciso que ele seja pertencente àquela turma", e por isso, também, foi feito o uso do medicamento. Ela, obviamente, percebeu algumas melhorias e, de fato, ela só usa o medicamento quando existe uma necessidade extrema, não é um uso recorrente. O que a gente percebe muito hoje, nessas famílias que têm acompanhamento, é que elas identificam que não há uma recorrência do uso, é usado de uma forma mais pontual e específica, tá? Eu trago, então, uma outra classificação, que vai além do DSM-IV, que envolve essas cinco grandes categorias. São 40 perguntas que a gente aplica para a família: então, dentro da área de organização e iniciativa, como é que está essa criança? Como é que está essa família? Você tem uma rotina? Você tem um horário? Como é a refeição, cada um está por si, as crianças estão na tela? O que é um outro ponto, é um outro fator, que deixa as pessoas desatentas: enquanto você está mexendo no celular, você não consegue perceber quem está ao seu redor. Se alguém fala alguma coisa com você, e você está mexendo no celular, eu duvido que você consiga responder de forma presente; você vai responder de forma automática. Então, sim, a gente precisa avaliar outros aspectos. Focalização e sustentação da atenção, eu descarto vários diagnósticos. Tem até uma psiquiatra que me odeia aqui em Brasília, porque sempre eu recebo e faço todo esse acompanhamento. Eu viro para a família e falo assim: "Eu não diagnostico com a sua filha com TDAH. Ela tem sabe o quê? Um interesse específico, talvez um outro transtorno, que pode ser um TEA, pode ser um Asperger", e, aí, o interesse que ela tem é dela, é individual, e essa professora quer que ela tenha um interesse padrão. E o diagnóstico vem porque ela não está sendo comum, ela está sendo excepcional. Talvez ela tenha até altas habilidades, e a atenção e o foco dela vão ser direcionados para outra coisa. Pegue um jogo, vamos ver, um quebra-cabeça. Traz um quebra-cabeça de 200 peças. Vamos ver se essa criança senta e monta esse quebra-cabeça. Então, a gente quebra muito o diagnóstico a partir dessa "experienciação", dessa vivência e dessa atenção que é dada para essa criança e para esse adolescente. Então, o propósito da avaliação é determinar um plano de tratamento que envolva o paciente e a família. A medicação é a última etapa, naquele caso em que o plano não funcionou. O plano, de fato, não foi efetivo, e a criança, ainda assim, continua tendo comportamentos desafiadores, inadequados. Então, vamos avaliar agora o uso da medicação, tá? Envolve avaliações complementares com outros profissionais, outras especialidades. Eu trabalho muito em parceria com a "fono", trabalho em parceria também para descartar o Dpac, que também é muito confundido com o TDAH. O Dpac é o Déficit do Processamento Auditivo Central. Então, às vezes, uma "fono" faz um teste, identifica que a criança tem um Dpac, e o TDAH cai por terra, porque, de fato, o Dpac leva a uma desatenção, leva a um desinteresse, mas não é por um comportamento, é por uma dificuldade fisiológica, neurológica, etc. Então, a gente precisa também olhar para isso. |
| R | Metilfenidato, é esse aí, olha, MFD, que, de acordo com a farmacotécnica, traz o uso em horários mais adequados, que sempre são antes das atividades. Então, se a criança estuda de manhã, ela vai tomar no café da manhã, se ela estuda à tarde, ela vai tomar na hora do almoço. E ainda tem também a possibilidade de tomar à tarde, mas sempre evitando antes das 18h. A Ritalina hoje, em alguns casos, foi substituída por esse Concerta, que também foi citado aqui, porque o Concerta acaba sendo liberado de forma osmótica, então ele tem um uso, um tempo de reação mais prolongada. Então tem famílias que acabam preferindo, porque aí a criança fica um pouco mais controlada durante mais tempo, mais focada, mais envolvida naquela atividade. E essa fórmula oferece vantagens no que se refere à aderência terapêutica e manutenção dos efeitos a longo prazo. Então eu não digo nem que eu sou contra, nem que eu sou a favor; eu digo que depende. Depende de quem é a criança, depende de quem é a família, depende de quem é a equipe e depende do que é que essa criança está sendo... Que tratamento está sendo oferecido para essa criança, porque como ela disse, o tratamento é individualizado e subjetivo. Trouxe os efeitos colaterais mais comuns: irritabilidade, ansiedade, dor de cabeça, que é cefaleia, insônia, labilidade emocional é a variação muito rápida e extrema do humor, dores abdominais, alterações de humor, tiques, pesadelos e o próprio isolamento social, até porque quando a criança é medicada, ela acaba tendo, sim, um hiperfoco e até perde interesse em se relacionar. Então olha só que engraçado, às vezes ela tem dificuldade em socializar, e eu dou medicamento para ela. E como efeito do medicamento, eu tenho isolamento? E aí? Será que o medicamento, apenas ele garante? Agora vamos falar de solução. Acho que a gente já viu aí todos os problemas decorrentes desse transtorno e de outros. Então como é que a gente, de fato, desenvolve essa terapia? Trago alguns pilares, que são: uma adequada avaliação diagnóstica; avaliar as possíveis comorbidades; exames de imagem; educação sobre o transtorno para os pais e para os mestres, eu preciso que a família, a escola estejam unidas, olhando para essa criança com o mesmo objetivo; identificar os sintomas e os prejuízos. A primeira pergunta é quais são os desafios que você encontra hoje dentro da sua casa, dentro da sua rotina? Aí a primeira fala, adivinha. "Ela não me obedece, ela não faz o que eu peço, ela não me escuta." E aí, a gente vai tratar também essa dificuldade que a família tem de enxergar essa criança como uma criança desobediente. Não é que ela é desobediente, mas é porque talvez você não esteja sabendo pedir o que, de fato, ela pode oferecer para você. Então você precisa melhorar a comunicação com o seu filho. Não é que ele é desatento e desobediente; é porque você talvez não esteja falando com ele na linguagem dele, certo? Desfazer esses rótulos prévios, intervenções psicoeducativas, aumentar essa autoestima, trazer um repertório de instruções de fácil internalização. Geralmente eu pergunto para a família: como é que seria o ideal, seu mundo ideal? "Ah, mundo ideal é que a criança acorde, troque de roupa, forre a cama, escove o dente, vista o uniforme, arrume o material, tome o café, lave a louça." Nossa, você quer um robô então, você quer uma criança robô, porque um adulto hoje não faz isso tão bem assim. Então a gente precisa, de fato, trazer instruções para essa criança que façam sentido para ela. Por que é que eu quero que você tome café? Por que é que eu quero que você bote a louça na pia? Por que é que eu quero que você esteja no elevador tal horário? Então não é só faça, é por que é que você precisa fazer esse comportamento. Então eu preciso da instrução de fácil internalização para essa criança. Para a gente sair, eu preciso que a casa esteja arrumada; para a gente ir para a escola, eu preciso que você esteja de uniforme; lá na sua sala, você vai precisar de material; o material está na sua mochila? A criança é muito inteligente. Eu tenho três filhos. Eu nem me apresentei direito aqui, não é? Uma de 18, um de 13 e uma de três. Sim, fui dessas que esperei um tempo entre eles e sou muito feliz, graças a Deus. A minha filha de 3 anos, desde os 2, arruma as coisas dela; ela que guarda os brinquedos, que arruma as roupas. Ela tem essa liderança, essa autonomia, porque, de fato, foi instruída para isso. Então, a criança é uma esponja, aprende tudo aquilo que vê, tudo aquilo que vivencia. Então, se hoje você favorece e estimula a autonomia dessa criança, com certeza ela vai ser uma criança obediente, entre aspas, daquela que você julga que é para ser obediente para se trocar, comer, se lavar, guardar. Então você precisa trabalhar na base para que ela, de fato, um dia, se torne esse adulto responsável que você tanto deseja que ela seja. Mas será que você está trabalhando para esse adulto se formar responsável ou será que você está deixando a vida formar esse adulto? |
| R | Conversas consigo mesmo no espelho. Eu gosto muito de atender crianças. Eu começo com 3 anos, tem crianças que eu já recebo no consultório a partir dos 3 e a minha ludoterapia é divertida. A criança precisa brincar, precisa gostar de estar ali. A minha terapia não é uma terapia de imposição. A criança precisa querer me encontrar, porque ela estando aberta é quando eu vou conseguir essa transformação. Então a gente brinca, a gente brinca de teatro, a gente brinca de desenho, a gente conta histórias, a gente teatraliza e tudo isso é registrado. Então, essa criança precisa, de fato, entender o que está sendo estimulado, ela precisa, de fato, entender o que está sendo esperado dela. A gente treina resolução de problemas, a gente monitora essas avaliações, essas ações que ela tem e, por fim, mas não ainda sendo o fim do processo terapêutico, a gente planeja novas rotinas, novos cronogramas. Ao passo que essa criança vai crescendo e que essa família vai se capacitando... Concorda comigo que a próxima ação é um pouco mais desafiadora? A cada degrau que eu subo da minha escada, eu gasto mais energia, eu posso estar mais forte, mas ainda assim eu preciso de atenção e eu preciso de dedicação. Então, o foco é acolher essa família, mostrar para ela que há uma solução e colocá-la também para trabalhar nesse desenvolvimento de solução. Então, a gente fortalece o sistema de crenças, a gente entende, de fato, quais são os conceitos dos desafios e os desejos. Muitas vezes, a família traz "ah, eu quero que ele me obedeça", mas o que é obedecer? Traduza para mim o que é obedecer? Ela diz para mim tudo o que ela quer que o filho faça. E tudo bem. Então, vamos fazê-lo entender o que você quer. Quando ele entender o que você quer, de fato ele vai atender a sua necessidade. A gente precisa sempre focar nas três funções executivas, que são o corpo, o cérebro e os olhos. Eu não consigo trabalhar de forma separada. A gente precisa, sim, trazer experimentos práticos em que essa criança brinque, corra, pule, salte, deite, descanse. A gente precisa trazer, também, um desenvolvimento cognitivo e a gente precisa trazer o afeto, o olhar é a janela da alma. Então, a gente tem... Tem uma dinâmica que a gente faz em família, durante 40 segundos: a mãe e o filho têm que se olhar no olho. Muitas famílias, hoje, não conseguem estabelecer uma conexão visual por mais de 20 segundos porque ficam com vergonha, não conseguem olhar para o filho, só olhar. Começam a pensar, a criticar, a julgar, a rotular. Então, essa conexão precisa ser genuína. É aquele olhar de quando o bebê nasce, lembra? (Soa a campainha.) A SRA. MARIANA PINTO - Eita, estou terminando. É aquele olhar que é estimulado lá quando o bebê nasce, que você fica horas e horas analisando e olhando aquele bebezinho. Por que isso se perde na infância? Então, vamos olhar para essa criança com uma conexão genuína, com um olhar profundo, sem julgamento, porque o julgamento já vai existir naturalmente lá mais para a frente. A gente aprende, de fato, a trabalhar com essa criança e com essa família, entendendo que não necessariamente um pedido é uma ordem. A gente precisa fazer com que a criança entenda o motivo desse pedido. A gente precisa, sim, pregar uma comunicação não-violenta e a gente precisa, sim, fazer bons combinados. Essa aí é a receita de uma terapia de sucesso, de uma conexão e de uma relação. Na verdade, de um processo de educação saudável: quando você identifica, sim, quem é essa criança, quais são as necessidades que ela tem e propõe para ela bons combinados. |
| R | Muitíssimo obrigada. Meu nome é Mariana, sou psicóloga. Como eu disse, atuo aí no consultório há mais de 15 anos. E, desde 2009, desculpa, 2019, eu sou criadora do programa Verbalize Kids, que traz essa verdade para famílias. Então, meu objetivo é fazer com que todas as famílias consigam ter uma relação saudável, respeitosa e afetuosa com seus filhos, independentemente de quantos filhos você tenha. Lá em casa são três. Na casa da Bárbara, que é a minha sócia, é um, na de Dani, que é professora do meu time, são dois e por aí vai. É uma equipe muito grande de profissionais, todas, praticamente, mães e a gente alia sempre a ciência e a experiência, porque a gente acredita na maternidade que a gente prega. Então, se a gente consegue desenvolver bons relacionamentos com os nossos filhos, não há nada nem ninguém que vai impedir você de desenvolver também um bom relacionamento com o seu filho, independentemente do diagnóstico, independentemente de qualquer dificuldade que ele venha a ter. O seu filho precisa de amor, ele precisa de cuidado, ele precisa de afeto, ele precisa de você. (Soa a campainha.) A SRA. MARIANA PINTO - Obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Obrigado. Muitíssimo obrigado, Dra. Mariana Pinto, advogada... (Pausa.) A SRA. MARIANA PINTO (Fora do microfone.) - Eu? Não! (Risos.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - ... psicóloga, desculpa, psicóloga e fundou... Isso é uma ONG, a Verbalize Kids? Não - não é? A SRA. MARIANA PINTO (Fora do microfone.) - Quase uma ONG. (Risos.) O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Pode explicar no... Só para a gente entender. Eu achei muito boa a apresentação. A SRA. MARIANA PINTO - Obrigada. É um programa. A partir da minha dificuldade como mãe, eu percebi que era necessário, sim, trazer estratégias práticas para que essa mãe pudesse se relacionar com esse filho. Então, o Verbalize Kids é um projeto que, desde 2019, propõe encontros para famílias... O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Certo. A SRA. MARIANA PINTO - ... para que essas famílias tenham, sim, conexão, afeto e conhecimento. A gente agrega também ferramentas práticas e muita teoria para que você, de fato, conheça o seu filho. Então, eu vou dizer... Você vai avaliar o seu filho e descobrir qual é o perfil comportamental que ele tem - perfil comportamental Disc -, que vai traduzir para você maneiras de se relacionar, de se comunicar. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Tá. A SRA. MARIANA PINTO - Ele aponta também quais são os desafios e as dores maiores que essa criança tem... O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Perfeito. A SRA. MARIANA PINTO - ... e oferece soluções para que você se relacione com ela. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - É uma associação, podemos dizer. A SRA. MARIANA PINTO - Isso. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Hoje é uma associação. E estão aqui... A SRA. MARIANA PINTO - Uma empresa. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - ... Dani e Barbara, é isso? A SRA. MARIANA PINTO - Isso. Daniela, Bárbara. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Estão aqui presentes. Daniele? A SRA. MARIANA PINTO - Daniela. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Daniela. Sejam muito bem-vindas aqui ao Senado Federal! Muito obrigado pela apresentação. Quando você falou ali sobre a questão do olho no olho, quantos segundos você falou, Mariana? A SRA. MARIANA PINTO - Quarenta segundos. Um desafio aí para vocês. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Quarenta segundos. É esse desafio, 40 segundos. A gente percebe esse fenômeno que está acontecendo na sociedade hoje, que é um negócio que chama a atenção. Você vai a um restaurante, por exemplo... A SRA. MARIANA PINTO - Todo mundo na tela. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - ... quem não já presenciou isso? Os pais, cada um na sua rede social, os filhos no tablet. É como se estivessem separados, completamente longe. Eles estão fisicamente perto, mas a cabeça está em outro lugar. A SRA. MARIANA PINTO - É o que a gente chama de bolha. Cada um na sua bolha. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - É, da bolha. Então, a questão dos segundos ali também em casa, muitas vezes, é porque estão no vício ali de ir para a rede do seu interesse ali. E isso é uma coisa para o que tem que se ter o despertar mesmo, porque, quando você for atrás... É aquela velha história. Eu estava numa palestra daquela jogadora de basquete, que foi campeã mundial, a Hortência do basquete, e aí ela disse: "Olha, a oportunidade, quando ela passa, você tem que segurar". Ela deu um exemplo, que seria como um cavalo que tem a cauda - aquele rabo do cavalo, a cauda dele, atrás - na cabeça - imaginem o cavalo com a cauda na cabeça, o rabo do cavalo -, na hora em que ele passa, se você não pegar, quando você vai atrás, você não consegue pegar mais. |
| R | Então, a criança vai crescendo, e esse tempo não volta. E o sentido da vida, o sentido da vida é o amor, é evoluir junto, é auxiliar, é amparar, porque é uma missão. Ser pai é uma missão, é uma missão de vida, esse é o meu entendimento. Muito obrigado pela sua participação, e eu quero dizer que a apresentação da Dra. Mariana, assim como todas as outras apresentações - inclusive a bula da Ritalina vai estar oficialmente aqui -, eu quero pedir à Secretaria atenciosa aqui da Comissão de Assuntos Sociais que todo esse material que foi apresentado aqui seja incluído nos Anais da Casa. Isso vai servir como fonte de pesquisa, vai servir... eu tenho certeza de que tem muita gente assistindo. Mas, ao longo do tempo, é assim que acontece nas nossas audiências públicas. Nelas, muita gente vai, depois, um vai passando para o outro: "Olha, que interessante ver a fala da Dra. Izabel, ver a fala da Dra. Thicciana; olha que legal". E isso vai multiplicando e vai crescendo as visualizações, a partir do estudo, a partir das pesquisas que vão ser feitas. Então, eu quero chamar a última expositora de hoje, que vai nos dar a honra aqui de participar, é uma alegria para nós todos, que é a Dra. Christina. Aí, se eu tiver errado, ela vai me corrigir logo. É Hajaj? A SRA. CHRISTINA HAJAJ GONZALEZ (Por videoconferência.) - É Hajaj. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Olha aí, não foi nenhuma das coisas que eu falei. É Hajaj. A SRA. CHRISTINA HAJAJ GONZALEZ (Por videoconferência.) - Sim. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Dra. Christina Hajaj Gonzalez, que é Conselheira do Conselho Federal de Medicina. Muito obrigado pela sua participação. A senhora tem 20 minutos. A SRA. CHRISTINA HAJAJ GONZALEZ (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada, Senador. Boa tarde a todos. Como o Senador estava falando, meu nome é Christina Hajaj Gonzalez, eu sou Conselheira Federal efetiva, pelo Estado de São Paulo, no Conselho Federal de Medicina. E aqui em São Paulo, eu sou Professora de Psiquiatria da Universidade Federal, da Unifesp, antiga escola de medicina. E na psiquiatria, eu sou professora de algumas disciplinas, como, por exemplo, a disciplina de psicopatologia e a disciplina também de psicofarmacologia, entre algumas outras. Então, também, só para declarar meu conflito de interesses: eu não tenho nenhum conflito de interesses com indústria farmacêutica ou com outras entidades; não tenho. |
| R | A ideia era falar um pouquinho sobre o que é o TDAH. Mas, mais importante de falar o que é o TDAH, a minha preocupação é falar das possíveis consequências para a vida da pessoa que tem TDAH. Quando não é adequadamente diagnosticada, adequadamente tratada, essa doença pode causar uma série de dificuldades, de sofrimentos, tanto para a pessoa portadora do TDAH quanto para a família e para a sociedade em geral como um todo. A gente sabe que é uma doença caracterizada principalmente por sintomas relativos à falta de atenção e por alguns sintomas relativos à hiperatividade e impulsividade. Eu também não vou entrar em detalhes nesses sintomas, mas é importante a gente falar que tem algumas diferenças quando a gente fala desses sintomas e dessas pessoas que podem ter TDAH. Claro, cada pessoa, cada criança, cada adolescente, cada adulto, cada um é cada um. O que a gente acaba vendo é que alguns números que a gente tem de prevalência de TDAH entre crianças e adolescentes no mundo - realmente, os trabalhos variam bastante - fala-se aí em, aproximadamente, 3% a 5%; alguns estudos mostram números maiores, alguns estudos mostram números menores. No Brasil, a gente tem apenas dois estudos, que mostram números também ligeiramente diferentes: o primeiro estudo mostrou uma prevalência de 5,8% de TDAH entre crianças e adolescentes; e outro estudo, um segundo estudo, mostrou 1,8%. São números bem diferentes, mas a gente imagina que no Brasil, como em outros países do mundo, deve estar em torno de 3% a 6%, 7% de TDAH entre as nossas crianças e adolescentes. Eu acho que uma das coisas mais importantes para a gente falar é que - quando a gente está falando de uso indiscriminado, a gente está falando de um uso não adequado, de um uso para o qual não deve servir aquele tipo de terapêutica, seja um remédio, seja um procedimento, enfim -, quando a gente fala de uso indiscriminado, parte-se do princípio de que está sendo feito ou por um diagnóstico que não é o diagnóstico para o qual se deva utilizar esse tipo de substância ou, por exemplo, não foi feito um diagnóstico por médico. Como o Senador mesmo estava falando, algumas famílias dão medicação para a criança sem saber o que ela tem, se ela tem mesmo, se ela precisaria usar aquela medicação. Isso que a gente está falando é de um uso indiscriminado. Então, acho que uma das coisas mais importantes, que também as colegas que me precederam falaram, é o adequado tratamento. E aí a gente tem sistemas diagnósticos na psiquiatria, como a Dra. Mariana Pinto falou agora há pouco, em que a gente tem que usar alguns parâmetros para fazer um diagnóstico adequado. Os parâmetros mais utilizados são a classificação da Associação Psiquiátrica Americana, que é o chamado DSM-5; a Classificação Internacional de Doenças, a CID-10; e, daqui a pouco tempo, vai entrar em vigor, então, a Classificação Internacional de Doenças da Opas e da Organização Mundial de Saúde, que é a CID-11, que tem critérios diagnósticos para que a gente possa fazer esse diagnóstico. |
| R | Uma das coisas importantes para a gente falar é que ter apenas, entre aspas, "sintomas de déficit de atenção ou sintomas de hiperatividade", não faz com que a gente feche o diagnóstico. Esses sintomas têm que estar presentes, por exemplo, há mais de seis meses. Esse sintoma tem que atrapalhar a vida daquela criança, daquele adolescente ou mesmo daquele adulto. Se não atrapalhar a vida, provavelmente não é uma doença, é uma situação temporária, etc. Como eu falei também, se não durar pelo menos seis meses, também a gente não tem por que fazer o diagnóstico. Além disso, se tiver outra doença que explique melhor aquele tipo de sintoma, pode ser que não seja um TDAH. Então, por exemplo, uma criança que tem um transtorno de ansiedade generalizada, por exemplo, pode ser que por conta da ansiedade não consiga prestar atenção, que seja mais agitada fisicamente, então, tem alguns sintomas que até se sobrepõem com TDAH, mas não necessariamente aquilo vai ser um TDAH. Então, quer dizer, tem algumas condições que a gente realmente tem que prestar atenção para poder fazer um diagnóstico adequado. Eu acho que quando a gente fala disso é bem importante, porque é o ponto a partir do qual a gente vai instituir uma terapêutica adequada ou não, fazer um diagnóstico adequado e, para isso, a gente tem algumas formas de fazer. A minha preocupação também é, quando a gente não faz um diagnóstico adequado e não faz um tratamento adequado, que pessoas que vivem com esse tipo de doença possam ter consequências em sua vida afora bem importantes. Então, elas podem, já na própria infância e adolescência, ter uma baixa autoestima, achar que, como a Dra. Mariana falou agora há pouco, são burras, que não conseguem aprender as coisas, que são mais devagar do que as outras, ou que ela é, vamos dizer assim, estabanada, não consegue dar conta de fazer as coisas, não consegue planejar, não consegue parar quieta, por exemplo, para prestar atenção em alguma conversa, algum filme, alguma tarefa que está fazendo. Essas crianças podem ter uma sonolência diurna, são geralmente pessoas que a gente fala que uma das dimensões do déficit de atenção é a impulsividade, então, pessoas mais impulsivas, com um pavio mais curto, pessoas que têm dificuldade, por exemplo, para, quando entram em uma conversa, esperar a sua vez para falar, já vão falando, já vão interrompendo todo mundo, pessoas que podem ter oscilações de humor importantes, que uma hora estão irritadas, nervosas, outra hora estão tristes, quietas, pessoas que podem, assim, mais facilmente, quando não há um tratamento adequado na adolescência e na vida adulta, buscar mais álcool e outras drogas. |
| R | Então, também é uma das consequências de um TDAH não bem diagnosticado e não bem tratado, que a gente vê, depois, na vida adulta, ter outras doenças, como, por exemplo, o uso de álcool e drogas, e pessoas que podem ter dificuldades também nos relacionamentos interpessoais, porque, muitas vezes, não só a família direta - pai, mãe e irmãos-, mas a família estendida, na escola e depois no trabalho, quando a pessoa fica adulta e tal, pessoas que têm dificuldades nos relacionamentos interpessoais, por exemplo, de esperar sua vez para falar, de cumprir aquela tarefa que ela se determinou a cumprir - e aí ela não consegue cumprir, ela fica conhecida como uma pessoa que não cumpre o que promete, etc. Então, são uma série de consequências, além dessas que eu estou enumerando, que podem atrapalhar bastante a vida da pessoa. Então, acho que esse é o principal motivo de a gente querer diagnosticar e fazer um tratamento adequado. A gente sabe também que de 30% a 60% de todas as crianças que têm TDAH podem continuar tendo sintomas na vida adulta. Os sintomas vão ficando um pouco diferentes na vida adulta. Eles passam a não ter tanta impulsividade e hiperatividade e ficam mais nos sintomas de desatenção. É claro que isso vai variar muito de pessoa para pessoa, mas a gente vê com uma certa frequência esse tipo de situação. E aí, quando a gente chega na questão do tratamento - e as colegas que me precederam falaram bastante sobre maneiras de você fazer abordagens psicossociais... Então, é importantíssimo a orientação da família, da escola, de professores e mesmo de outros alunos; eventualmente, até de famílias de outros alunos também. É importante esse tipo de orientação para saber como ajudar melhor essas pessoas. No Brasil, para o tratamento medicamentoso do TDAH, a gente tem duas substâncias que tem, na bula, indicação de primeira linha de tratamento para a TDAH. Essas medicações, eventualmente, podem também tratar outras coisas, que são o que a gente chama de fora da bula ou o termo que é usado em inglês, off-label. E a gente tem outras medicações no Brasil que podem também ajudar a tratar o TDAH, mas que não é a primeira indicação, não é a primeira linha de indicação. Também temos medicações que não existem no Brasil para tratar a TDAH, mas que existem, por exemplo, nos Estados Unidos. Então, no Brasil a gente tem essas duas medicações que já foram bastante citadas: o metilfenidato e a lisdexanfetamina. O metilfenidato tem algumas formulações comerciais. Então, hoje a gente tem a famosa Ritalina, que é do Laboratório Novartis Biociências e, também, dois laboratórios que também produzem o genérico de cloridrato de metilfenidato no Brasil, que são os laboratórios Althaia S.A e EMS, que produzem o cloridrato de metilfenidato 10mg por comprimido. E tem mais um laboratório que produz um similar, que chama Tedeaga, o nome comercial, 10 mg de metilfenidato por comprimido. Esse laboratório é o Legrand Pharma. Então, são esses os quatro laboratórios que produzem o metilfenidato na forma simples, que não é de liberação prolongada. |
| R | De liberação prolongada, a gente tem então dois laboratórios. Um deles é a Novartis, que produz a Ritalina LA, que é de liberação avançada, de longa ação, de liberação avançada, porque ela não libera assim tudo rapidinho - o pessoal toma e já "tchum" -, não é? Então, é uma medicação que você pode, por exemplo, tomar de manhã e ela vai sendo liberada ao longo do dia até o fim da tarde - evita ter que tomar mais vezes durante o dia. Então, tem a Ritalina LA de 20mg, 30mg e 40mg. E a gente tem também uma outra formulação, do Laboratório Janssen-Cilag, que é o Concerta, que tem nas formulações de 18mg, 36mg e 54mg, que tem uma liberação prolongada também, mas com uma tecnologia um pouco diferente, para ir, vamos dizer assim, ao longo do dia, também liberando a medicação. Além disso, a gente tem o dimesilato de lisdexanfetamina, que tem dois nomes comerciais no Brasil, que são o Venvanse e o Juneve, os dois, a mesma coisa, do Laboratório Shire Brasil; e essa outra medicação tem liberação também, vamos dizer, prolongada, e é uma medicação um pouco diferente do metilfenidato, e eles têm também nas formulações de 30mg, 50mg e 70mg. Quando a gente vai olhar para a dispensação desses medicamentos, a gente tem regras no Brasil a respeito da dispensação de medicamentos. Então, as medicações que são prescritas têm que ser prescritas, nesse caso, por um médico. No Brasil, nós temos só três profissionais que são prescritores, que prescrevem medicação, que são o médico; o médico-veterinário, mas aí nas competências do médico-veterinário; e o cirurgião-dentista, o dentista, o odontólogo, mas aí o odontólogo também vai prescrever medicamentos que têm a ver com a área da competência dele ali, da odontologia. Então, em termos gerais, o único profissional no Brasil que pode prescrever esses dois medicamentos - o metilfenidato e a lisdexanfetamina - é o médico humano. Para que a gente possa fazer a prescrição dessa medicação, necessariamente, em todo o território nacional... Eu aproveitei e peguei aqui, porque eu estou aqui no consultório, eu peguei aqui meu calendário de receita tipo A. Então, obrigatoriamente, tem que ser numa receita dessa tipo A, que é para medicamentos que fazem parte de uma lista da Anvisa que é uma lista que chama de medicamentos tipo A - A3, no caso, psicotrópicos -, que é a categoria em que estão esses dois medicamentos. Esse tipo de receita é bem complicado para o médico conseguir, não é uma coisa fácil. Não sei se, aproximando aqui... Talvez dê para ver que tem uma marca d'água, um brasão do Estado de São Paulo, ou seja, eu não posso mandar fazer esse talonário numa gráfica normal, ele é feito numa gráfica do estado. Da vigilância sanitária estadual, é feito esse... Eu mando um carimbo com os meus dados - eu mando para lá - e é carimbado lá, folha por folha, e cada talonário só tem 20 folhas. Então, isso aqui é justamente para tentar evitar, vamos dizer assim, o abuso desse tipo de prescrição. Isso em todo o território nacional. |
| R | Então, quando se fala também dessa questão do uso indiscriminado, ou, por exemplo, quando eu penso no uso indiscriminado, eu penso numa pessoa que quer estudar para um concurso, que quer estudar para o vestibular e vai lá e "Ah, eu quero tomar Ritalina", não sei o quê; alguém, um médico precisa fazer essa prescrição. Então, tem essa etapa por que, necessariamente, se tem que passar. Quando o Senador fala, por exemplo, que uma família vai lá e faz uma prescrição, "Ah, a criança está muito agitada", vai lá e dá um comprimido para a criança, eu não sei de onde que essa prescrição está saindo, se tem algum médico que está, em algum momento, fazendo essa prescrição, ou, se... Enfim, se se consegue através de um mercado paralelo, não sei o que que acontece. Mas, o importante é sempre isto: a gente falar que tem que ter um diagnóstico adequado, uma prescrição adequada, para a gente evitar esse tipo de uso abusivo. Eu tinha algumas outras coisas, que eu ia falar, mas, eventualmente, vão ficar aí para a nossa discussão, para eu poder me ater aqui ao tempo que me foi dado. Mas o importante é falar isto: essas medicações, quando bem utilizadas, bem indicadas, bem prescritas e bem acompanhadas, são relativamente seguras, são medicações seguras que não provocam dependência química, quando bem indicadas, bem utilizadas, e podem, de verdade, junto com o restante do tratamento necessário, mudar a história de vida dessas pessoas. Em vez de a pessoa se achar um ninguém, um nada, um burro que não consegue fazer nada, etc., ela pode ser uma pessoa que vai poder ter todo o seu potencial exercido na sua vida e contribuir bastante para a sua família, para a sociedade como um todo. Então, muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Nós é que agradecemos a sua participação. Foi uma bela exposição feita aqui para nós, Dra. Christina Hajaj Gonzalez, Conselheira do Conselho Federal de Medicina. Daqui a pouco, a senhora pode fazer, nas considerações finais, essas últimas falas que a senhora gostaria de colocar. Eu lhe agradeço aqui por ter obedecido ao tempo. É importante que se diga que o objetivo aqui é a gente trocar ideias, experiências. Esse é um problema que existe, todos nós sabemos que existe, não adianta a gente querer tapar o sol com a peneira, ele existe e eu fico feliz em saber que, no Estado de São Paulo, tem essa marca d’água, esse brasão, o que é uma coisa que permite um controle maior, uma fiscalização maior. Eu espero - e talvez seja um encaminhamento, uma das ideias que surgem aqui - que, nos outros estados da Federação, se tenha isso, porque o que a gente vê, no dia a dia da sociedade, e chegam informações, é o uso indiscriminado, é a prescrição indiscriminada. Isso tem um efeito a curto, médio, longo prazo, que não é saudável - não é saudável. Quando eu digo que a sociedade está doente, ela está doente, e a gente não precisa ir longe. Eu já participei de várias audiências públicas aqui, em que isso foi demonstrado por pessoas com pensamentos totalmente distintos, médicos, especialistas. |
| R | Tem na Netflix aí. Você vai ver vários documentários mostrando, inclusive, o adoecimento, e é um ciclo. É uma loucura, porque é um ciclo que acaba lá na indústria farmacêutica e até na indústria alimentícia. Mostram-se, em alguns desses documentários, medicamentos, enlatados, situações que levam ao câncer e que têm o patrocínio de, inclusive, hospitais e da indústria farmacêutica para evitar que aquela informação chegue às pessoas, que aquilo é ruim para a saúde das pessoas. Então, é um negócio. Não é teoria de conspiração, não, está lá, com documentos mostrados e tudo. Então, é porque é montado... Eu confio sempre na boa-fé - quero deixar isso muito claro - e na capacidade de reflexão das pessoas, mas a gente vive num mundo de muitos interesses, e, às vezes, esses interesses são lucro, apenas o lucro. Então, adoecer vai gerar um lucro para alguém ali, para outros setores. É difícil, mas a gente precisa despertar as pessoas para uma vida saudável sempre. Vamos continuar aqui. Então, conforme combinado, eu vou ler aqui as perguntas, e nós vamos para cinco minutos para cada palestrante. Eu vou pedir, encarecidamente, que a gente fique no tempo, porque vai já começar a sessão do Plenário, e eu sou o segundo a falar. Eu vou ler rapidamente as perguntas. Cinco minutos para vocês, palestrantes, fazerem as suas considerações finais. Quem se sentir confortável em responder dentro da sua área as perguntas, fique à vontade para anotá-las agora e responder. Então, vamos lá. Cláudio Ribeiro, do Rio de Janeiro: "Por que o setor público não investe em campanhas com [...] exercícios físicos e mentais [em conjunto com o tratamento medicamentoso]?". Cristiane Michele, do Paraná: "Qual a faixa etária prevalente [...] [no diagnóstico do] TDAH?". Lilian Macedo, de Rondônia: "Quais estratégias podem ser adotadas para promover uma maior visibilidade e conscientização sobre medicação [para TDAH] e sua [real] necessidade [...]?". Paulo César, de São Paulo: "Em quais momentos é recomendado o uso de medicamentos para tratamento do quadro de TDAH e TEA [...]?". Ana Eliza, de São Paulo também: "Quando o TDAH vai entrar na legislação como PCD para empregos, concursos [...]? É de extrema importância que tenham os seus direitos". Luciana Magalhães, do Rio de Janeiro: "O acesso precário ao atendimento multidisciplinar leva a um agravamento dos quadros relacionados à saúde mental de crianças e adolescentes". Aqui é um comentário que a Luciana faz. Antônia Oliveira, do Acre: "[É preciso] criar posto de referência no sistema de saúde, com médicos especialistas em TDAH, [além de se] prescrever a medicação correta, para um tratamento eficaz". A Antônia também fazendo aqui um comentário, não é uma pergunta específica. |
| R | Outro comentário da Cátia Soares, de São Paulo: "A partir do momento que o medicamento é inserido no tratamento, é imprescindível que tenha por objetivo melhorar a qualidade de vida do sujeito". Outro comentário do Moisés Batista, do Rio de Janeiro: "[...] O Brasil carece de bons profissionais nessa área. Muitos diagnósticos errados. Uso de remédios nocivos". A Manoela Bertelli, de Santa Catarina: A possibilidade de restrições mais severas pode gerar dificuldades adicionais para quem realmente precisa? A Vera Regina, de São Paulo: "Adultos diagnosticados tardiamente são avaliados a partir de suas capacidades de desenvolvimento ou somente pelas dificuldades?". A Aline de Paiva, do Rio de Janeiro: "Por que o TDAH [sendo um transtorno neurológico incurável] não é reconhecido como deficiência no Brasil [...]? A Rhaquel Tessele, do Paraná: Há planos para oferecer, pelo SUS, medicamentos com menor potencial de dependência? Falando aqui sempre com relação à Ritalina. A Aline Kátia, de São Paulo - acho que ela já tinha feito uma pergunta também, mas ela fez outra aqui: Como melhorar o acesso ao atendimento multidisciplinar e reduzir as prescrições de psicoativos? A Laura Dornelas, de Minas Gerais: Como enfrentar a prescrição indiscriminada originada por diagnósticos apressados? A Luana Nodari, de São Paulo: "Prescrição indiscriminada é uma infração ética. Discutir como melhorar o protocolo de avaliação e fiscalizar não seria mais eficiente?". E o Lorenir Ribeiro, de Rondônia: "Existe outro medicamento que pode substituir a Ritalina e que cause menos efeitos colaterais sem causar dependência?". Então, a gente vê aqui que muitos questionamentos já foram respondidos pelos palestrantes em suas falas, mas eu vejo uma participação muito bacana de todos os estados... Não, não digo de todos os estados, mas das regiões do país, estão aqui o Sul, o Sudeste, o Centro-Oeste, bem representado, e o Nordeste. Eu queria dizer que fico extremamente feliz com o que a gente ouviu, até, agora, agradecendo a participação de todos vocês. Vamos agora abrir para os cinco minutos finais. Eu lhe prometi que se você quiser dar uma palavrinha no final, a gente consegue os três minutos, mas eu vou passar para a Isaura, porque ela pediu para... Nós vamos fazer na mesma sequência que a gente fez, só a Isaura pediu para inverter, ela foi a segunda e vai ser a primeira agora, porque vai ter que sair para um outro compromisso. Então, você tem a palavra, só peço cinco minutos, porque eu vou ter que realmente cortar em cinco minutos. Obrigado. A SRA. ISAURA SARTO (Para expor.) - Serei bem breve, como da primeira vez. Eu recebi aqui várias mensagens de mães, porque eu faço parte de uma rede de mães do Brasil inteiro, angustiadas com algumas falas que ouviram aqui, falando: "Mas o meu filho está se beneficiando, o meu filho é bem acompanhado, fez os exames médicos, é super bem acompanhado, e tudo que...". Aí, uma fala específica da Dra. Maria Moysés, deixou essas mães muito preocupadas, mas elas disseram que estão seguras com o tratamento dos filhos. |
| R | Então, o que eu quero dizer aqui? Profissionais da área da saúde, sejam médicos, sejam psicólogos, vocês todos são essenciais na vida dos nossos filhos. Mas, com a devida vênia e mui respeitosamente, eu digo: profissionais vêm e vão na vida dos nossos filhos. Quem permanece é a família, somos nós mães. E nós mães, cada uma de nós, somos especialistas nos nossos filhos. Eu sou especialista em Vittorio. Então, eu tenho muita segurança com tudo o que foi feito com o meu filho. E eu digo a você, mãe que está aqui nos assistindo, mães que mandaram mensagens, se vocês têm segurança, vocês abdicaram da sua vida - muitas de nós abdicamos da nossa vida profissional para estudarmos, para tomarmos as melhores decisões com segurança; famílias de autistas são as famílias mais abnegadas e dedicadas que eu conheço ao desenvolvimento dos seus filhos -, se vocês têm segurança no tratamento do seu filho, siga por esse caminho, porque os profissionais são muito importantes, mas eles divergem entre opiniões. E profissionais vêm e vão. É isto: fiquem e seguras, porque vocês são especialistas nos seus filhos. É só isso que eu queria pontuar, Senador. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Muito bom, Isaura Sarto, falando com o coração e com a experiência de uma mãe dedicada. Eu vejo aqui a sua dedicação não apenas para sua família, mas para tantas outras famílias. No caso do rol taxativo, você e seu marido estão de parabéns, participaram ativamente para a grande vitória. É amor puro! Só quem tem um filho autista ou alguém com outras deficiências sabe o quanto é amor, é luz pura! Os pais, realmente, são um exemplo de amor, de dedicação. Eu quero agradecer-lhe a participação. A SRA. ISAURA SARTO - Sou eu quem agradeço, Senador. Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Muito obrigado. Eu quero passar, agora, a palavra para Izabel Augusta Hazin Pires, representante do Conselho Federal de Psicologia, agradecendo-lhe muito a participação, a colaboração a esta sessão. A senhora tem cinco minutos para as considerações finais ou para responder a algum questionamento que tenha ficado sem resposta. A SRA. IZABEL AUGUSTA HAZIN PIRES (Para expor.) - Obrigada, Senador. Agradeço, mais uma vez, a todas colegas aqui presentes. Agradeço todas as perguntas que chegaram. É muito importante a participação do país como um todo. Começo resgatando: se a gente olha para o somatório das falas, a gente vê o quão complexo é o objeto sobre o qual esta sessão se debruçou. Quando a gente fala de ser humano, de criança, de adolescência, a gente está falando também ainda de muito mais perguntas do que respostas. E isso faz com que nós tenhamos posicionamentos distintos, posicionamentos distintos, certamente todas aqui presentes, todas as falas, com pelo menos um único objetivo que é o objetivo de contribuir para o bem viver de todas as crianças e adolescentes. O que eu queria trazer à ponderação, à minha fala final é o que fica para mim de tudo isso. Hoje, temos na nossa sociedade um grande desafio que é como nos tornarmos, como sociedade, uma sociedade menos capacitista e uma sociedade mais inclusiva. |
| R | O pano de fundo que eu queria trazer para a figura de todo este debate é como sermos uma sociedade em que essas pessoas, essas crianças, esses adolescentes que têm uma trajetória distinta, ou seja, que têm modo de desenvolvimento, modos de aprendizagem, modos de ser e de estar no mundo distintos daquilo que é considerado típico, tenham o direito de existir dentro dessa sua peculiaridade, dessa sua forma de ser e de estar. Não se trata tanto de a gente debater se há, se não há, mas muito mais como é que nós como sociedade, como profissionais da área da saúde, profissionais da área da educação, como é que os nossos Parlamentares, que representam o povo brasileiro, somamos esforços para a gente poder pensar políticas públicas que garantam a essas crianças esse direito. E essas políticas públicas, pelo menos acho que, com isso, todas nós aqui concordamos, passam por formação profissional, passam por campanhas que atinjam a sociedade do ponto de vista de uma mudança de cultura. Seria muito bom que a gente pudesse ter, nessa relação figura e fundo, que essas crianças, nas suas trajetórias individuais, nas suas existências individuais, estivessem à frente dos seus diagnósticos, que as escolas também exercessem esse lugar de pensar muito mais como inovar, como serem criativas e como criarem estratégias de aprendizagem do que simplesmente se acomodarem a esse diagnóstico e colocarem na conta de cada criança "ah, ela é uma criança TDAH", "ela é uma criança TEA", "é por isso que...", "é por isso que não aprendem"," é por isso que não se desenvolvem". Este é o nosso grande desafio: somar todos os esforços para que a gente possa passar essa página, para que a gente possa passar a funcionar de uma maneira diferente, para que a gente possa, em cada um desses espaços, construir alternativas, lembrando que TDAH, TEA ou qualquer outro transtorno do neurodesenvolvimento que a gente traga para cá não é algo circunscrito a uma criança, a um adolescente. Diz respeito a um sistema complexo que envolve sociedade... (Soa a campainha.) A SRA. IZABEL AUGUSTA HAZIN PIRES - ... família, escola, os profissionais; ou seja, esse é um problema de todos nós. Se passamos a pensar e a considerar desse ponto de vista, já vamos estar dando um passo muito importante, com o Estado pensando em como contribuir para a formação e em como contribuir para uma sociedade que aceite que existem formas distintas de ser e de estar, então, uma sociedade mais inclusiva, uma sociedade em que a diferença não seja um limite, uma sociedade que derrube as suas barreiras e que, cada vez mais, então, contribua para o bem viver de todas as pessoas. Muito obrigada, Senador, mais uma vez, pela oportunidade e parabenizo-o pela iniciativa. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Muito obrigado. Quem agradece somos nós do Senado Federal, Dra. Izabel Augusta Hazin Pires, representante do Conselho Federal de Psicologia. Este Parlamentar, dos 594, entre Deputados Federais e Senadores, eu sou um, mas podem contar. O nosso gabinete é o 21 da Ala Teotônio Vilela. |
| R | O que tiver de iniciativa, de proposição a plateia que está aqui também, não apenas os expositores, nós estamos à disposição. A Aléxia, aquela moça que está lá no fundo da sala, trabalha comigo, na assessoria, e está à disposição para receber pessoalmente, e a gente fará os encaminhamentos que devemos fazer. Contem comigo. Essa causa é nossa. Eu já passo a palavra imediatamente à Thicciana Maria Firminiano. (Intervenção fora do microfone.) A SRA. THICCIANA MARIA DAMASCENO FIRMINIANO - Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Eu me esqueci de um outro sobrenome? A SRA. THICCIANA MARIA DAMASCENO FIRMINIANO - É porque é grande, acontece. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Ah, mas aí não tinham me informado. É Thicciana Maria Damasceno Firminiano. A SRA. THICCIANA MARIA DAMASCENO FIRMINIANO - Isso, sou eu. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Perfeito. Está concluído. Muito obrigado pela sua participação. Você tem cinco minutos para responder alguma pergunta que não foi respondida ou apenas fazer suas considerações finais. Muito obrigado pela sua presença. A SRA. THICCIANA MARIA DAMASCENO FIRMINIANO (Para expor.) - Muito obrigada ao senhor pelo convite; aos demais pais aqui presentes, às equipes multidisciplinares, como nós temos aqui a representante da Inova, não é isso? Inova Kids? O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE. Fora do microfone.) - Verbalize. (Intervenções fora do microfone.) A SRA. THICCIANA MARIA DAMASCENO FIRMINIANO - Verbalize! Da Verbalize, dentre outras instituições que já têm trabalhado de forma multidisciplinar dentro desse transtorno do neurodesenvolvimento, que, como eu citei no início, é algo passível de pesquisa, de entendimento. E, para realmente a gente adentrar nesse assunto, é importante entender também as vivências - viu, Senador? -, porque na teoria acaba sendo muito fácil; a prática é muito diferente. E, sim, a gente vê realmente que, embora existam todas as contraindicações dessa medicação, como a doutora trouxe para a gente, existe também a questão de que, quando ela realmente é utilizada da forma correta, com o acompanhamento do neuropsiquiatra, dos médicos e de toda a equipe que faz parte desse tratamento posterior ao laudo, ela realmente também tem a sua eficácia. Mas é aquilo que nós pontuamos no início: a importância desse diagnóstico, dessa anamnese bem-feita; de que todo o processo que conduz a esse laudo, que vai ser para a vida toda desse paciente, seja realmente muito criterioso, cuidadoso, envolvendo realmente todos os profissionais e entendendo que essa criança é um ser em desenvolvimento, é um ser que atua nas diversas esferas sociais, e não somente na sua cognição em sala de aula. E aqui fica um pedido de uma mãe e também de uma profissional que atua nessa área: quero pedir encarecidamente que os profissionais, principalmente os profissionais das nossas escolas, das escolas públicas e também das escolas particulares, tenham um olhar e que procurem seguir exatamente os direitos garantidos a essas crianças que já temos na Constituição. Então, nós temos muitas leis que já amparam, que já mostram para a gente a importância desse acompanhamento na escola, com maneiras diferentes de ensinar, entendendo essa singularidade do sujeito, porque nós não somos iguais. Ninguém é igual a ninguém. Cada um aprende da sua forma, do seu jeito, alguns mais teóricos, outros mais reflexivos, outros mais ativos, mas todos nós aprendemos de maneiras diferentes. E é isto que nos faz especial: é exatamente essa diversidade que nos une. |
| R | Então, que a gente entenda que as adaptações são necessárias, as modificações na forma de avaliar essa criança dentro da sua esfera educacional, elas precisam ser mudadas. Os pais precisam ser orientados, porque muitas vezes você recebe um laudo, e os pais... A gente tem vários processos de amigas psicólogas que sabem: muitos pais entram num processo de luto, o que é natural, porque ninguém se prepara para ter uma criança atípica. Pelo contrário, nós nos preparamos para ter uma gravidez tranquila, o momento mais especial da maternidade para uma mulher. E, quando acontece, nós não podemos simplesmente ignorar... (Soa a campainha.) A SRA. THICCIANA MARIA DAMASCENO FIRMINIANO - ... nós passamos por um processo. Porém, esse processo precisa ser respeitado pela própria família, também pelas esferas sociais e principalmente pelos profissionais. E, se for necessária e comprovada a utilização dessa medicação com eficácia para quem realmente precisa, por que não investigarmos um pouco mais e ofertarmos isso de uma forma rigorosa, assertiva e com todo o compromisso e comprometimento que ela nos proporciona? Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Eu que agradeço, em nome do Senado Federal, Dra. Thicciana Maria Damasceno Firminiano. Olha aí, perfeito - muito obrigado -, agora foi bem, não teve uma paradinha de nada. Muito obrigado, mais uma vez! Eu passo imediatamente a palavra para a Dra. Maria Aparecida Moysés, diretamente de Campinas, São Paulo. A senhora tem cinco minutos para as suas considerações finais ou para responder a algum questionamento que, no seu entendimento, tenha ficado sem resposta. Muito obrigado. A SRA. MARIA APARECIDA AFFONSO MOYSÉS (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada, Senador. Acho que, em relação aos questionamentos, às perguntas encaminhadas, fica um pouco difícil falar delas, porque a gente se deteria em aspectos específicos e perderia esse contexto geral. Eu quero iniciar falando diretamente para a Isaura e para o grupo de mães dela. Veja, eu enfatizo que eu não nego, como médica, a existência de problemas reais, não nego o sofrimento das pessoas e de seus familiares. Questionar o processo de medicalização e patologização não significa atacar as pessoas que são submetidas a esse processo. Pelo contrário, toda a discussão que eu faço e tudo o que eu venho discutindo - e que eu quero enfatizar, mais uma vez, aqui - é, primeiro, o respeito à Isaura pelo modo como ela cuida do Vittorio. É isso que eu defendo, nós temos que cuidar do Vittorio! Um dogma da medicina, da medicina clássica, da medicina grega é que nós tratamos, cuidamos das pessoas, não tratamos das doenças e, no caso de transtornos mentais, isso está um pouco invertido. Isaura, parabéns pelo modo como você cuida do Vittorio! E é isto: o Vittorio é uma criança muito maior do que o autismo; ele tem autismo, mas ele tem mil outras coisas. Portanto, ele não pode ser enquadrado numa caixinha de diagnóstico e muito menos em regras de tratamentos padronizados, sejam medicamentosos ou no campo psíquico. Não pode! Tem-se que olhar o Vittorio e cada criança - é isso que eu chamo de projeto terapêutico singular -, cada criança em especial. Então, eu quero enfatizar isso e dizer que eu não ataco as crianças e não ataco as mães. Pelo contrário, eu defendo que elas sejam acolhidas, e respeitadas em seu sofrimento, e cuidadas. |
| R | Eu fui citada por várias companheiras aqui, algumas vezes meio que igualando a minha fala com as outras. Não há. Aqui existem confluências e existem discordâncias, então não vamos tentar homogenizar para anular diferenças. Existem aqui em discussão algumas concepções bastante distintas e até opostas de sujeito, de mundo, de conhecimento, de ciências. Posto isso, eu acho que é fundamental, Senador, a gente pensar que não podemos naturalizar, não podemos aceitar tranquilamente que se diga que 40%, 50% da humanidade tem um transtorno mental. Há algo de errado nisso, muito errado. Isso tem que ser criticado, sim, isso é o processo de medicalização, que não quer dizer nada com o Vittorio, pelo contrário: é cuidar do Vittorio. Então, eu acho que nós precisamos pensar em propostas - e aí eu confio no senhor como um formulador de políticas públicas -, em fortalecer as políticas públicas de qualidade, especialmente no campo da saúde e da educação; que sejam públicas, de acesso universal e que sejam socialmente referenciadas, como está, aliás, previsto em várias leis. Nós precisamos fortalecer o SUS. Privatizar o sistema de saúde não resolve o problema, só vai dificultar o acesso e facilitar o mercado e o marketing, que é o que nós não queremos. Nós queremos que as crianças e adolescentes tenham acesso, e para isso tem que fortalecer a política pública e o SUS. Nós temos que fortalecer e atuar no campo da formação profissional, que ela seja não medicalizante, não patologizante, e que os profissionais, médicos, psicólogos, todos aprendam que se cuida das pessoas, que não se tratam doenças, não se tratam transtornos. E, por fim, eu acho que precisamos, sim - e conto com o senhor -, ampliar e aprofundar as discussões críticas sobre o número de diagnósticos de transtornos mentais, que vem crescendo assustadoramente no mundo e no Brasil. E nós estamos, sim, colocando em risco o próprio futuro, porque as mudanças acontecem com questionamentos, com insubordinações, com desobediências. Quando eu uso uma droga que faz com que a criança aceite tudo - não é por acaso que ela mundialmente é chamada de droga da obediência -, que não questione, que ela se submeta integralmente, há algo de muito errado. Nós podemos estar provocando, como bem disse um psicanalista uruguaio, o genocídio do futuro, pela ausência de questionamentos e propostas e diferenças. Muito obrigada, e parabenizo mais uma vez o senhor. Agradeço a oportunidade de estar aqui. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Quem agradece somos nós, aqui do Senado Federal, Dra. Maria Aparecida Moysés. Eu digo assim: nós estamos aqui do mesmo lado, cada um com sua visão, com seu modo de pensar, mas querendo auxiliar, querendo ajudar as pessoas, e eu vejo um debate aqui de altíssimo nível. Para mim foi... Eu estou saindo daqui com o dia ganho, porque foi uma audiência que trouxe muita luz aqui para essa situação, que muitas vezes a gente não quer olhar. E a senhora enriqueceu muito esse debate, pelo seu comprometimento, pela sua paixão nessa causa. Muito bom, muito bom. Agradeço-lhe mais uma vez. Seja sempre muito bem-vinda ao Senado Federal. |
| R | Passo a palavra, imediatamente, à Dra. Mariana Pinto, que é psicóloga e idealizadora, com a Daniela e com a Barbara... A SRA. MARIANA PINTO - Isso. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Memória está boa, não é? A SRA. MARIANA PINTO - Está ótima! O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Olha aí. ... idealizadora do Verbalize Kids. A SRA. MARIANA PINTO (Para expor.) - Exato. Bom, para concluir o nosso pensamento, eu me coloco também superdisposta a cada vez aprender mais e conhecer todas as possibilidades, que eu acredito que são infinitas ainda, para que a gente possa estar do mesmo lado, sempre pregando a saúde emocional, social e familiar. Eu acredito muito nessa tríade. E, caso seja necessária alguma outra estratégia, que a gente possa aprender sobre ela, para que de fato ela possa ser incluída aí no nosso tratamento. O que não dá mais é para viver com essa dificuldade de enxergar a criança e o adolescente fora de si, ou diagnosticar com base apenas em alguns comportamentos observáveis que não definem quem de fato ele é, mas sim o momento em que ele está. Então, muitas vezes o comportamento é reflexo de uma situação, de um sentimento, de uma necessidade. Que a gente possa olhar para esse comportamento com mais consciência e com mais clareza. E me coloco à disposição, para que a gente possa debater mais, conversar mais e procurar entender o que de fato se passa na cabeça e no coração dessas crianças e adolescentes. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Muitíssimo obrigado, Dra. Mariana Pinto, pela sua participação aqui, e a suas parceiras nesse projeto da Verbalize Kids. Seja muito bem-vinda aqui ao Senado Federal sempre. Eu já, também, para encerrar, passo a palavra à Dra. Christina Gonzalez, que está diretamente conectada conosco de São Paulo e vai fazer as suas considerações finais ou, se quiser, de alguma forma se sentir confortável, responder alguma daquelas perguntas. E eu também vou encaminhá-las. Aqui, eu vou pedir para nossa Secretaria, sempre muito atenciosa e competente, para encaminhar essas perguntas para todos os palestrantes, porque depois podem estabelecer um contato - não sei se tem o contato das pessoas aqui... Tem o e-mail delas e tudo? (Pausa.) Ótimo. E aí, depois, podem estabelecer um contato e respondê-las se possível. Dra. Christina Gonzalez, muito obrigado pela sua participação. A SRA. CHRISTINA HAJAJ GONZALEZ (Para expor. Por videoconferência.) - Primeiro, para finalizar, quero agradecer de novo ao Senador pelo convite, pela possibilidade de participar. Eu acho que boa parte das perguntas, de alguma forma, foram respondidas nas falas. E algumas não foram exatamente perguntas; foram algumas considerações que algumas pessoas teceram. Eu acho que outras perguntas que foram realizadas talvez sejam muito do ponto de vista do gestor público do que exatamente para os profissionais que se colocaram aí em relação aos seus saberes - por exemplo, se vai ser incluído como uma deficiência ou não, etc. Então, eu acho que tem algumas outras considerações que podem ser feitas que não têm exatamente a ver com as questões, talvez, técnicas ou os conhecimentos dos profissionais. Mas, para encerrar, quero só realmente agradecer de novo a participação. E a gente se coloca à disposição do Senador e do Senado quando a gente puder ajudar, quando puder acrescentar nas discussões. Obrigada. Boa tarde! O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Muitíssimo obrigado. Nós é que agradecemos à senhora, Dra. Christina Hajaj Gonzalez. |
| R | A senhora falou e tem razão mesmo, tem algumas perguntas ali que foram direcionadas para os agentes públicos e para os legisladores, e nós vamos responder, está bem? Já estou aqui e vamos passar isso para a gente já levar para o gabinete e responder às pessoas. Antes de encerrar, eu queria agradecer profundamente aos colaboradores da Secretaria da Comissão de Assuntos Sociais. Não é a primeira audiência que a gente faz aqui, fizemos várias ao longo desses cinco anos, e essa equipe tem sido muito atenciosa, muito profissional, dedicada. Às vezes, aqui passa... já tivemos audiência aqui que passou foi muito da hora do almoço. Muito obrigado. Eu tenho certeza de que uma audiência como essa... Eu tenho convicção de que vai ajudar, que vai despertar, que vai jogar uma reflexão e que, de alguma forma, a qualidade de vida de uma família, de uma criança, vai ter um resultado; os Senadores que estão conectados conosco, que estão com seus assessores aqui, vão ter alguma iniciativa, alguma ideia. É só o início do processo. Então, eu quero agradecer ao Ewerton Pacheco de Souza; à Francisca Gonçalves Sobrinha; ao Guilherme Assis Lima; ao Ivan Cerqueira Filho; à Ivani Vieira do Lago; à Marcia Andrea Renno Silva Negreiros; ao Rodrigo de Sousa Barreto; e ao Saulo Kleber Rodrigues Ribeiro. Muito obrigado por toda a dedicação de vocês. A gente fica muito feliz quando vê servidores públicos exemplares, comprometidos, como tem os milhares aí, no Brasil, fazendo o seu trabalho, honrando esta nação. Eu, como prometi, vou pedir apenas, no máximo, três minutos à Daiane Andrade, do Movimento para Inclusão. Então, muito obrigado pela sua presença. Está desde o começo aqui da sessão, participando, assistindo a tudo, anotando. Se quiser fazer alguma consideração, eu lhe agradeço. A SRA. DAIANE ANDRADE (Para expor.) - Inicialmente, muito obrigada pelo movimento, pela plenária. Eu também sou mãe atípica, sou mãe de TDAH com TDAH também, diagnosticada na vida adulta, e a minha filha já vai fazer 20 anos mês que vem. Quinze anos atrás, eu nunca imaginei ter um movimento como esse. Isso, para nós, é um marco; e, em nome do Movimento para Inclusão, a gente agradece essa oportunidade, esse movimento. Com relação ao movimento, a gente entende a importância do uso de medicamento, mas com equilíbrio, para aquelas pessoas que realmente necessitam. Precisamos conversar, sim, sobre esse tema, levar esse tema à mesa. Hoje, nós temos aproximadamente 200 famílias que nós atendemos, orientando, identificando. Eu, particularmente, faço parte da comissão de atendimento e acolhimento às famílias, e eu quero agradecer e me colocar à disposição, também, para ajudar, auxiliar, trazer conhecimento. Sou psicopedagoga, sou mãe, sou educadora, estou em diversas linhas de atuação. Muito obrigada, Senador, e uma boa tarde a todos. O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Muitíssimo obrigado. |
| R | Olhe, é óbvio que, se tem um diagnóstico que foi analisado, acredito que deveria mesmo, como colocou a Dra. Maria Aparecida Moysés... Eu não sou médico, não tenho um conhecimento, mas a minha avaliação como pai: eu iria ouvir os médicos, uma equipe multidisciplinar. Se dissesse para dar, por exemplo, a Ritalina, ouvindo e vendo que a posição é essa a dos médicos, eu daria. Eu não iria contra a ciência. Eu daria. Agora, o que a gente vê na sociedade... Não vamos ser hipócritas, está acontecendo isto: "Ah, meu filho está muito..."; não tem diagnóstico, não tem nada que embase aquilo ali. É, às vezes, uma comodidade para o pai poder ter uma festa na sua casa com as pessoas e não ver o filho incomodar, e vai dar a Ritalina. Isso é um absurdo. Isso é algo que é perigoso, tem efeitos, e a gente precisa ter esse cuidado. É só esse alerta, que eu acho que esta sessão pôde esclarecer, o uso indiscriminado, a prescrição indiscriminada para quem não tem necessidade. Só isso. Então, eu vi um caso, lá em Fortaleza - para encerrar mesmo - que me chocou muito, no centro da cidade. Eu estava caminhando ali pela região da Praça do Ferreira, que é bem no centro da nossa capital, e me abordou um senhor, um senhor que vinha com uns 15 controles remotos na mão. Ele veio falar que estava acompanhando o trabalho, "muito obrigado" e tudo. Eu fiquei olhando para aquele controle. "Não, tudo bem, estou fazendo o meu dever e tudo". Aí eu disse: "Responda-me uma coisa, por que o senhor está com 15 controles remotos na mão?" Aí ele se emocionou. Ele disse: "O senhor tem um tempo para ver um vídeo aqui?" Aí eu: claro. Ele me mostrou o filho dele, foi chocante. Isso foi no ano passado. Imediatamente nós acionamos a equipe nossa, e entrou-se com as autoridades da área da saúde, junto com o pai, claro, que estava pedindo socorro. Não sei como é que... São gigantes esses pais, mas eu não sei como é que aguentam, porque é coisa de gente realmente muito preparada, muito iluminada, muito abençoada por Deus para levar uma situação dessa com serenidade. O amor que ele tem por esse filho: ele comprava os controles, o filho estava numa sala, numa coisa, e tinha momentos em que ele saía, tinha uma situação delicada de saúde mental. Eu não sei exatamente qual era, eu não estou lembrado aqui, mas o filho quebrava os controles e queria agredir. Estava o filho numa situação de quase cárcere; mas, por amor. Ele ali - sabe? - levava os controles e comprava toda semana os controles da televisão. Como lidar com uma situação dessa? Então é algo que... Isso é uma responsabilidade muito grande de todos nós, que fazemos parte da sociedade, para buscar realmente... Porque isso não deve estar acontecendo só na casa dele, devem estar acontecendo, nos rincões do país, situações como essa, que afligem, que deixam realmente as pessoas com o coração na mão. |
| R | É isso. Cumprida a finalidade desta sessão, desta audiência pública, nada mais havendo a tratar, agradecendo a audiência sua, agradecendo a paciência de todos vocês que participaram desta sessão, à equipe da Comissão de Assuntos Sociais, aos participantes que mandaram perguntas aqui, aos internautas, a todos vocês, desejando uma ótima semana, de muita luz, muita paz para todos vocês, declaro encerrada a presente reunião. Muito obrigado. (Iniciada às 10 horas e 40 minutos, a reunião é encerrada às 14 horas e 22 minutos.) |

