Notas Taquigráficas
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| R | A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 96ª Reunião da Comissão de Educação e Cultura da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura, que se realiza na data de 12 de dezembro de 2023. A presente reunião destina-se à realização de audiência pública com o objetivo de instruir o PL 1.338, de 2022, que altera as Leis nºs 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), e 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para dispor sobre a possibilidade de oferta de educação domiciliar, em atenção aos Requerimentos nºs 125, de minha autoria e da Senadora Damares Alves; 126, de autoria da Senadora Teresa Leitão; 128, de minha autoria e do Senador Flávio Arns; 129, de autoria do Senador Marcelo Castro e Senador Flávio Arns; 131, de autoria da Senadora Teresa Leitão; 133, de autoria da Senadora Damares; 136, de autoria do Senador Izalci Lucas e Senador Flávio Arns. Convido para compor a mesa a Sra. Raquel Franzim, Coordenadora-Geral de Educação Integral e Tempo Integral do Ministério da Educação; a Sra. Josevanda Franco, Presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) - Região Nordeste; o Sr. Carlos Vinícius Reis, Presidente da Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned); a Sra. Laís Cardoso Peretto, Diretora Executiva da Childhood Brasil; a Sra. Luciana Temer, Diretora-Presidente do Instituto Liberta. De forma presencial, a Sra. Mariana Luz, CEO da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal; e a Sra. Amábile Aparecida Pacios, Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação. Informo que também foi convidado representante do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), que não pôde comparecer a esta audiência e justificou sua ausência. Antes de passar a palavra aos nossos convidados, informo que a reunião está sendo transmitida através do Portal e-Cidadania na internet, no endereço senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800 0612211. O relatório completo com todas as manifestações estará disponível no portal, assim como as apresentações que forem disponibilizadas. |
| R | A exposição inicial terá o tempo de cinco minutos, podendo ser prorrogado, se necessário, chegando ao total de sete minutos, e depois nós voltaremos para os palestrantes fazerem as suas contribuições finais. Com a palavra, a Sra. Mariana Luz, CEO da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, que participa de forma remota. Quero esclarecer que eu estava ausente, eu sou Relatora da receita, nós estávamos na CMO. Está tudo o.k. para a Mariana entrar? (Pausa.) Mariana, para a sua exposição. A SRA. MARIANA LUZ (Para expor. Por videoconferência.) - Olá, muito boa tarde a todos e a todas. Eu queria, em primeiro lugar, agradecer à Senadora Dorinha por abrir esse espaço para a sociedade, que está também como parte importante na sua liderança e nesse debate. Também a todas as pessoas que participam. A Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, para quem não conhece, atua há mais de 58 anos no campo social e há 17 ela elegeu a causa da primeira infância. Então, a gente trabalha justamente para que os primeiros anos de vida, os seis anos da formação das bases do desenvolvimento humano aconteçam com qualidade, aconteçam com os estímulos necessários, uma educação de qualidade, uma parentalidade ativa, que aconteçam de uma forma intersetorial, unindo o poder público nas suas diferentes esferas de educação, saúde, assistência, cultura, proteção, para que a gente possa ter, no início da vida, um desenvolvimento saudável para as nossas crianças, porque é só assim que a gente vai vencer as desigualdades no Brasil. E o que a gente tem acompanhado de toda a literatura e da Lei 1.338, é que ela, na nossa visão, retira três camadas de direito e de proteção das nossas crianças, sobretudo no início da vida. Mas, como eu falei, que da mesma forma que os benefícios na primeira infância bem vivida perduram quase toda a vida, infelizmente também o oposto é igualmente realidade. E se a gente não tem um desenvolvimento adequado no início da vida, isso também perdura por todas as demais etapas. E a nossa visão desse debate da aprovação do homeschooling na forma como está o PL é que infelizmente ele traz essa infração do que são essas três camadas de proteção. Então, a gente está falando da primeira camada do desenvolvimento humano. O início da vida, sobretudo, é quando a gente forma as bases do desenvolvimento físico-motor, do desenvolvimento cognitivo e do desenvolvimento socioemocional. E o afastamento da escola, da sala de aula traz exatamente a impossibilidade de termos estímulos adequados em todas essas dimensões. Tanto que a gente tem visto, a partir do homeschooling e de outras experiências que retiraram alunos de sala de aula, impactos na aprendizagem, como a gente está falando, no aspecto cognitivo, também na sua saúde socioemocional, a própria autoconfiança fica danificada. Num exemplo de saúde e bem-estar que geraram, a gente pôde observar danos. Então, há muitos estudos da própria fundação e também do Núcleo Ciência pela Infância que têm trazido essas evidências e também nos aspectos de socialização. Então, esse é um tema muito importante, os aspectos de socialização, que são base, inclusive, do que vem na sequência, como a segunda camada que a gente entende que é a retirada de proteção de direitos da criança, que é a camada da aprendizagem. Então, a Base Nacional Comum Curricular prega, dentro dos seis direitos de aprendizagem, o primeiro que é o campo de experiência, e esse campo de experiência está justamente relacionado ao conviver. E o conviver é onde a gente define o que sou eu, o que é o outro e o que somos nós. E, a partir da retirada desse espaço de socialização, cuja primeira etapa é a creche, que é a primeira etapa da educação básica, seguida pela pré-escola e aí todos os anos do fundamental e do médio, eles são parte dessa socialização e desse processo de aprendizagem conjunta entre o aluno, as demais crianças na sala de aula, o professor, o corpo diretivo daquela escola e toda a relevância técnica e metodológica que tem uma intencionalidade pedagógica por trás para garantir essa aprendizagem, tanto na base da vida como por toda ela. |
| R | E a terceira camada de proteção de direito que esse PL, na nossa avaliação, retira é a camada da proteção física. Então a gente vê também... Certamente aqui outros participantes se aprofundarão nessa temática do abuso, da violência, do trabalho infantil, cujos indicadores todos a gente vê piorar na ausência do equipamento público, do olhar do Estado. Então a nossa visão é de que esses três aspectos e camadas são retirados do que é um direito de proteção das nossas crianças, um direito de acesso à escola pública das nossas crianças e, sem dúvida, uma responsabilidade de todos nós. A Constituição prevê que a responsabilidade pela proteção das crianças e pela educação é da família, é do Estado e ela também deve ser acompanhada pela sociedade, ou seja, coloca todos nós nisso. A pandemia nos trouxe uma lógica de que foi de forma involuntária que a gente teve que experimentar a ausência das nossas escolas. O Brasil foi o país que ficou com mais tempo de portas fechadas das escolas, houve muita crítica em relação a isso e houve danos para a aprendizagem dos nossos alunos que ficaram fora da sala de aula e em casa. Esse foi um experimento involuntário, mas que a gente pode dizer que fracassou a partir de todos os resultados de todos os estudos. Então, quando a gente olha para uma lei que regulamenta o ensino domiciliar, a gente entende que é praticamente a gente voluntariamente e formalmente aceitar um experimento em maior escala para crianças que não terão essas camadas de proteção e que deixarão de ser enxergadas pelo Estado. A escola é um espaço de proteção, é um espaço onde a criança vai para aprender, mas ela também vai para se alimentar, ela vai para receber vacina, ela vai para ser protegida, sentir a segurança e acolhimento dos seus pares, os alunos, mas também do corpo de professores que está preparado para fazer esse ensino acontecer, para fazer essa escuta acontecer e uma eventual denúncia em relação, sobretudo, a casos de violência. Então a gente entende que esse espaço de proteção que é a escola não pode ser tirado das nossas crianças. A gente viu aí, durante a pandemia... Os resultados do Pisa saíram na semana passada, a Comissão de Educação certamente acompanhou e todos que aqui nos ouvem aqui, e a gente viu os resultados dramáticos. E, na verdade, com o resultado do Pisa e de diversos outros estudos que a gente acompanhou durante a pandemia, de queda na aprendizagem, sobretudo de linguagem e matemática, mas também das habilidades motoras, socioemocionais e cognitivas, que são a base desse desenvolvimento, a gente pode dizer que o homeschooling realmente representaria uma expansão disso, para que a gente não tenha a condição de monitorar as nossas crianças e os nossos alunos. A gente tem que entender que o Brasil fez uma escolha, uma escolha constitucional de oferecer escola pública para todos. Nem todos os países do mundo têm essa missão ou fazem essa escolha. Então, o que a gente precisa fazer é qualificar a escola pública, é enaltecer a escola pública. E ela tem desafios. Agora, se com todo o aparato legal que a gente tem no campo da educação, com destinação orçamentária, a gente tem tantos desafios ainda para enfrentar como país, a nossa defesa é que a gente não se desvirtue do caminho de qualificar a escola pública, de qualificar a educação para todas as crianças, todos os meninos e meninas do nosso país, numa escola com qualidade, com corpo técnico e que possa oferecer de fato as condições adequadas e básicas para o seu desenvolvimento. |
| R | A gente não é contrária e a gente entende a visão de muitas das famílias que fazem homeschooling e gostariam de ter isso de uma forma mais ampla, mas a gente entende que, ao amplificar a lei, a lei regulamentada, ela de fato permitirá que pessoas que não têm condições de oferecer o homeschooling ofereçam-no a seus filhos, ou coloquem as crianças em situação de violência. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Mariana, nós temos que terminar. Você já estourou o seu tempo. A SRA. MARIANA LUZ (Por videoconferência.) - Tá. Acho que tenho mais.... O último desafio que eu queria trazer então, Senadora Dorinha, é o seguinte. Eu tinha me preparado para dez minutos, que tinha sido o tempo inicial do qual a gente tinha sido informada. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - É porque, quando começar o Plenário, eu tenho que encerrar, e isso prejudica todo mundo. Está bem? A SRA. MARIANA LUZ (Por videoconferência.) - Tá. É uma questão que o Brasil avançou no acesso, e a gente precisa avançar na qualidade. A outra coisa é que a gente fala muito das experiências internacionais. Eu queria dizer que as experiências internacionais estão focadas em países desenvolvidos, e, mesmo assim, elas apresentam desafios, e a gente tem evidências de muitos dos problemas que são ali apresentados. Então, eu queria trazer este aspecto de que o Brasil não é um país desenvolvido, o Brasil é um país de dimensões gigantescas, que tem dificuldades e desigualdades gravíssimas que também foram enaltecidas na pandemia, e a gente não tem a condição de fazer essa escolha porque a gente não tem condição de fiscalizar e de bem implementar. O Congresso Nacional sabe, melhor do que ninguém, que o desafio não é escrever uma lei. A gente tem bons exemplos de legislação de Código Florestal, na própria educação, no campo da segurança pública, mas a gente infelizmente não consegue implementá-la, a gente não consegue colocar em prática. A gente não tem a condição de assumir esse custo, esse ônus. E aí eu queria trazer o caso da Alemanha. A Alemanha trouxe dois argumentos para não regulamentar o homeschooling. O primeiro: ele não era de interesse público, ele não era de interesse geral. E o segundo é que ele gerava uma sociedade paralela. A gente no Brasil precisa focar no que realmente é constitucional: um direito e um dever deste Estado, das famílias e de nós da sociedade civil, que não vão gerar um custo para o país, não vão gerar dano para as crianças e que não vai piorar e agravar a desigualdade do nosso país. Então, essa é a nossa posição. Agradeço a oportunidade, e estou à disposição para novas conversas. Muito obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Está certo. Quem não conseguir no tempo e quiser enviar a documentação, as sugestões por escrito, para que a gente possa ver as contribuições... Quem não for... Pelo tempo é realmente muito curto, até porque era programação uma audiência, mas foram tantos requerimentos que eu li aqui... E, no tempo, talvez a gente não consiga ouvir. Eu vou ler as perguntas que já chegaram pelo e-Cidadania, para se alguém quiser aproveitar para fazer algum comentário... Larissa Grabowski, do Paraná, pergunta: "Seria possível intercalar períodos de ensino domiciliar com ensino escolar?". Daniel Torres, do Distrito Federal: "[...] [Como] a garantia de liberdade [...] [para as] famílias adotarem um modelo de educação domiciliar pode ajudar o sistema escolar tradicional?". Caio Jorge, de Roraima: "O projeto assegura flexibilidade curricular para atender às necessidades únicas das crianças? Valoriza o aprendizado personalizado?". Ângela Fátima, de São Paulo: "A escola é um espaço de proteção e denúncia contra violência doméstica. Como garantir essa proteção para crianças no ensino domiciliar?". |
| R | Rosana Braúna, do Piauí. "[...] [Alunos autistas, com deficiência intelectual, dislexia, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade] poderiam se beneficiar [...] [com o] homeschooling?". Andréa Bueno, de Goiás: "A escola presencial [...] [é uma instância] fundamental [...] [para] convivência das diferenças que toda a sociedade precisa aprender a respeitar". É um comentário. André Bohn, de Santa Catarina. "Liberdade de educação: não pode ser imposto um método, uma pedagogia ou uma instituição para realizar a educação". Gabriel Vidal, da Paraíba: "A educação domiciliar responsável é uma alternativa aos constantes abusos, bullying e atentados que infelizmente [...] [têm acontecido em] muitas escolas". A Regina Lúcia, do Espírito Santo, um comentário também: "Família e escola são lugares diferentes e com funções próprias e insubstituíveis. Uma criança não deveria ser privada do convívio escolar". As questões estão aqui, se algum participante quiser pegar o documento. Eu passo a palavra agora para Raquel Franzim, Coordenadora-Geral de Educação Integral e em Tempo Integral do Ministério da Educação. A SRA. RAQUEL FRANZIM (Para expor.) - Boa tarde. Quero cumprimentar a todas e todos os presentes, e a Senadora Dorinha, em nome do Ministério da Educação e do Ministro de Estado, Camilo Santana. E cumprimento também os meus colegas aqui de painel e de debate. A Constituição Federal de 1988 inaugurou a doutrina de proteção integral às crianças e adolescentes no Brasil e estabeleceu uma responsabilidade compartilhada entre o Estado, a família e a sociedade. Essa mesma Constituição consagrou um dever de colaboração, um dever de solidariedade entre família e Estado para essa proteção integral acontecer. E tanto os arts. 205, 206 e a própria LDB reforçam esse princípio de solidariedade, que no mundo todo se mostra mais eficaz para proteger as crianças de violências e violações de direitos e também de promover o seu desenvolvimento pleno ou seu desenvolvimento integral. Esse mesmo princípio de solidariedade preserva a liberdade de escolha das famílias, o seu protagonismo em relação a crenças, valores e o seu importante papel desempenhado no desenvolvimento e na educação das crianças. Portanto, a família não pode ser substituída e nem a escola pode ser substituída pela família. As duas devem seguir juntas, as duas devem se complementar, jamais em substituição. O controle total do direito à educação de crianças e adolescentes é algo temerário e perigoso não só aqui, mas como em outros países adotantes da prática de ensino domiciliar. Primeiro, porque o direito de aprender, permanecer na escola, acessar - e hoje a gente tem crianças aqui no plenário -, esse direito das crianças foi reconhecido recentemente. E direitos humanos não podem ser flexibilizados quando nem todas as crianças ainda acessaram e tiveram esse direito efetivado. Portanto, esse argumento da liberdade de escolher a melhor instrução que será ministrada aos seus filhos precisa ser esclarecida, porque o sistema educacional brasileiro assegura possibilidades de escolhas, por exemplo, escolha entre instituições públicas e privadas e entre as privadas confessionais. |
| R | Lembro que o Brasil tem 178 mil escolas de educação básica orientadas pelo art. 3º da LDB, que preconiza um pluralismo de ideias e concepções pedagógicas. Portanto, não estamos falando de um modelo único de escola no Brasil. Essa mesma organização não impede ou cerceia a liberdade das famílias de transmitir os seus valores, crenças e visões de mundo. O limite que ocorre é um limite, não um cerceamento; ele é concomitante ao trabalho das escolas. Continuando, é importante também esclarecer que a LDB já assegura a plena participação das famílias nos processos educativos das crianças por meio de conselhos de escola, associação de pais e mestres e outros arranjos para viabilizar o diálogo e essa participação tão importante que as famílias têm na vida de seus filhos. O Plano Nacional de Educação é outro instrumento jurídico importante, com a Meta 19, que efetiva o que convoca as escolas a ter gestão democrática e estratégias de intensa participação das famílias na construção dos projetos político-pedagógicos, dos currículos e dos regimentos escolares. Diante disso, não procede o argumento de liberdade de escolha das famílias. Isso já está posto, está assegurado no ordenamento jurídico brasileiro. O ensino domiciliar também é temerário não só por não reconhecer o direito da criança - a criança é titular de direitos na nossa Constituição Federal, não apenas as suas famílias -, mas ele também é temerário porque ele provoca uma distorção na responsabilidade parental. A responsabilidade parental implica mais deveres junto ao Estado do que prerrogativas, e uma prerrogativa como essa do ensino domiciliar abre exceções perigosas e temerárias. Concluindo, diferentemente de outros países do mundo, o Brasil logrou o direito à educação há menos de cem anos. Só na década de 90, nós tivemos a universalização do acesso às crianças e atualmente ainda temos 2 milhões de crianças para fora. Infelizmente, pesquisas mostram que é o ambiente familiar o espaço mais vulnerável para violência e violações de direitos, e isso se mostrou na pandemia. Vou deixar os demais debatedores falarem. Esse avanço da escola como espaço de proteção social se dá na identificação e no encaminhamento de violências de ordem física, psicológica, sexual, de insegurança alimentar, de trabalho infantil e de tantas violações de direitos que crianças e adolescentes no Brasil sofrem. A educação brasileira enfrenta diversos e severos desafios. Com isso todos nós concordamos, mas não será com iniciativas individuais que essa mesma educação vai melhorar. Importante lembrar também que, no âmbito educacional, a gente tem, além de 2 milhões de estudantes para fora, metade das crianças que não chegam ao segundo ano sem alfabetização. Esse problema não vai ser atacado com iniciativas individualizadas; são necessárias políticas públicas. (Soa a campainha.) A SRA. RAQUEL FRANZIM - É por isso que o Governo Federal, concluindo, tem três estratégias para a educação básica brasileira que correm longe de uma matéria como essa, que, apesar de ter famílias bem-intencionadas, não tem relevância de prioridade de política pública no Brasil. O investimento do Governo Federal na expansão do tempo integral, no Compromisso Nacional Criança Alfabetizada e nas escolas conectadas é intenso e enorme junto aos estados, aos municípios e ao Distrito Federal. |
| R | Termino dizendo que a opinião pública no Brasil já se manifestou sobre o assunto, sobre a matéria do ensino domiciliar ano passado no bojo das audiências públicas realizadas na Câmara dos Deputados. Segundo pesquisa realizada pelo Cesop Unicamp e o Instituto Datafolha, oito em cada dez brasileiros rejeitam o ensino domiciliar; 89,9% dos participantes acreditam que as crianças têm, sim, o direito de frequentar as escolas mesmo quando seus pais não queiram; e 99% da população brasileira acreditam que a escola é o maior equipamento de proteção social, portanto, inegociável e insubstituível. Agradeço a oportunidade e fico depois para o debate. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Muito obrigada, Sra. Raquel Franzim, Coordenadora de Educação em Tempo Integral. Com a palavra, a Sra. Josevanda Franco, Presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) da Região Nordeste. A SRA. JOSEVANDA FRANCO (Para expor.) - Boa tarde. Queria saudar a Professora Senadora... Primeiro professora! Quero saudar a Professora Senadora Dorinha e dizer o quanto é significativo para todos nós que fazemos a Undime... A União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação é uma instituição de 37 anos neste país e que congrega os mais de 5,5 mil municípios, que respondem por mais de 49% da matrícula educacional no Brasil. Eu trouxe uma pequena apresentação que vou deixar, mas, em razão do tempo, vou preferir aprofundar algumas colocações que já foram feitas, e muito benfeitas, pelas minhas antecessoras, tanto a Mariana quanto a Raquel. Na realidade, o posicionamento da Undime evidentemente é contrário a essa alteração tão substancial na educação brasileira, partindo do princípio das questões legais que já foram postas, tanto na Constituição Federal como na Lei de Diretrizes e Bases e no Estatuto da Criança e Adolescente, mas fundamentalmente por uma concepção de moralidade. Nós precisamos compreender a responsabilidade do Estado, e o art. 227 da Constituição é muito claro: "É dever da família, da sociedade e do Estado...". Isso não procede, não deve acontecer separadamente, mas de uma forma consubstanciada; todos os entes e todos os cidadãos brasileiros e instituições estão comprometidos com a garantia de uma educação necessariamente de qualidade. Mas eu gostaria de destacar as razões que nos levam a acreditar que o conteúdo do PL não traz nenhuma substancialidade àquilo que nós buscamos, que é a melhoria da prestação dos serviços educacionais, o crescimento da escola enquanto instituição. E partimos do princípio de que a escola é um equipamento de proteção, é um equipamento de segurança e que nós precisamos fortalecer esse equipamento: há uma ameaça muito clara de abandono intelectual, e abandono intelectual nesse país é configurado como um crime. A gente sabe perfeitamente que algumas famílias poderão até conseguir cumprir esse objetivo, mas até quando? Partindo do princípio da integralidade dos níveis de educação nesse país, evidentemente em algum momento, nem que seja no ensino superior, esse indivíduo vai precisar conviver socialmente, e a escola é esse espaço tão importante de conviver social. |
| R | Além do mais, o PL nega o entendimento da educação com cientificidade. No universo da escola, nós praticamos, evidentemente, todo um traçado pedagógico, metodologicamente ajustado, com procedimentos e processos que têm um objetivo final. E, Senadora Dorinha, preocupa-nos significativamente o monitoramento desse tipo de educação, da qualidade da educação que será oferecida, partindo do princípio de que nós não teríamos uma estrutura capaz de promover esse monitoramento. Então essa certificação seria feita a partir de quê? De que forma, por exemplo, os conselhos, que têm tanta dificuldade para fazer o monitoramento de instituições, passariam a fazer monitoramento de famílias? São vários os grandes gargalos que se apresentam. Negar a educação enquanto ciência é um retrocesso. Nós conquistamos a duras penas chegar até aqui. A educação brasileira, eu não falo só da educação brasileira, mas da educação mundial... Nós levamos muito tempo para chegarmos a essa condição em que estamos agora e seria, assim, promover um retrocesso, uma segregação racial. (Soa a campainha.) A SRA. JOSEVANDA FRANCO - Eu sou historiadora de formação e sempre penso nos preceptores do Império, em que apenas as famílias abastardas tinham condição de prover uma educação para os seus filhos. A educação pública é, sim, a saída. O que nós precisamos é fortalecer a educação pública. Evidentemente a nossa Constituição permite a iniciativa privada. E é louvável. Nós temos excelentes instituições, e, como foi dito anteriormente, a opção já está posta na legislação que está em vigência, considerando que os pais podem perfeitamente escolher que tipo de, vamos dizer assim, linha educacional querem ministrar para os seus filhos. Então a Undime se manifesta de forma contrária e volta a discutir, a fortalecer a ideia de uma educação pública tal qual como prevista na Constituição Federal: gratuita, universal e de qualidade. Nós não podemos concordar com nenhum processo que gere segregação para crianças e adolescentes. É bom lembrar que o equipamento que mais viola direitos de crianças e adolescentes nesse país é exatamente a família. Então o Estado tem uma obrigação moral e legal de prover todas as condições para que esse acompanhamento aconteça e que crianças e adolescentes estejam, sim, no ambiente escolar. Obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Obrigada, Josevanda. Ainda sobrou tempo. Faltava 1min45. A título de esclarecimento para quem nos acompanha - quero cumprimentar o meu colega de luta pela educação, nosso querido Deputado Israel, daqui de Brasília; é um grande prazer, Israel, estar aqui com você -, esse PL ele veio da Câmara. Ele já foi aprovado em plenário. Então ele, com certeza... Eu fui inclusive um tempo Relatora e me aprofundei bastante em relação ao próprio tema, mas, quanto aos argumentos, algumas questões, vou falar só para esclarecer: ele está aqui no Senado, mas ele já foi aprovado na Câmara. Eu passo a palavra agora para a Sra. Luciana Temer, Diretora Presidente do Instituto Liberta. A SRA. LUCIANA TEMER (Para expor.) - Boa tarde a todas e todos. Eu agradeço à Senadora Professora Dorinha por esse espaço. Vou falar rapidamente. Essa aqui é uma apresentação que nós do Instituto Liberta, que trabalhamos com o enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes, preparamos, mas, devido ao tempo, eu não vou apresentar. Eu pediria, Senadora, que ficasse disponível depois nas audiências. |
| R | Este QR code, na verdade, só para explicar a quem quiser fazer uso depois, é o QR code para a apresentação e que também faz link para todas as referências de dados e pesquisas que nós apresentamos. Então, eu queria dizer, em primeiro lugar, o seguinte: o Liberta se preocupa muito com a aprovação da educação domiciliar. Eu não vou entrar aqui em questões pedagógicas, porque não é a minha seara e eu não tenho competência para fazer isso. O que eu vou dizer aqui é que a nossa preocupação está totalmente pautada na questão da violência. Veja bem: não tem nenhuma criminalização nem perseguição a famílias que querem, pretendem ou já educam os seus filhos em casa. Eu mesma conheço pessoas maravilhosas que têm intenção ou educam os filhos em casa. Não é sobre isso que nós estamos falando. Nós estamos falando sobre a possibilidade de tornar isso uma regra aberta a todas as pessoas e colocar milhares de crianças em risco. Que risco é esse? O risco, infelizmente, Senadora, é da violência intrafamiliar. Nós temos, para quem não sabe, mais de quatro meninas de menos de 13 anos estupradas por hora no país. Estes são dados policiais. Isto representa cerca de 10% da realidade do Brasil. Mais de 72% desses estupros acontecem dentro de casa; 44,4% praticados por pais e padrastos; e mais de 70% por outros familiares. Então, eu estou falando aqui... Na apresentação, nós temos dados de maus-tratos, lesões corporais decorrentes de violências intrafamiliares, enfim. O fato é que é muito triste, é muito duro e a gente não quer olhar para isso. Mas a família não é o espaço de proteção para as crianças do Brasil. A família hoje é a grande violadora do direito de crianças e adolescentes, e a gente diz isso com muita tristeza e já me desculpando com as famílias maravilhosas que existem neste país, mas essa é uma realidade. Outra realidade, Senadora, é que nós temos, hoje, no Brasil, cerca de 2 milhões de pessoas, de jovens, entre crianças e adolescentes, de 11 a 19 anos, fora da escola - hoje, quando é obrigatória a frequência na escola! E nós sabemos que a busca ativa, que é um instrumento maravilhoso, não dá conta de trazer essas crianças para a escola, não tem dado hoje. Esse projeto de lei prevê, sim, certas garantias, como, por exemplo, a matrícula na escola; prevê o acompanhamento, fiscalização do Conselho Tutelar; prevê o acompanhamento de um tutor da escola. Quer dizer, em tese, nós temos - em tese! - seguranças possíveis, só que nós, no Brasil, sabemos que isso não acontecerá, Senadora. Isso não acontecerá, porque isso não acontece hoje! E é sobre hoje, sobre a possibilidade de um desastre muito maior e de uma perda total de controle que nós teremos se esse projeto de lei for aprovado. Eu acho muito triste que a gente não possa defender que as famílias, realmente todas, atuem da forma que quiserem, mas a gente tem que olhar para os dados de realidade. Aí me dizem: "A escola também é violenta". Sim; mas, por favor, acessem os dados aqui que eu não vou ter tempo de apresentar. A gente fez um paralelo. Aqui, na verdade, tem um quadro mostrando todos os dados do Disque 100, de violência psíquica, violência física e violência sexual registrados... (Soa a campainha.) A SRA. LUCIANA TEMER - ... no ambiente da escola e no ambiente da família. Não tem comparação! A gente tem aqui, por exemplo, violência física, no primeiro semestre, no Brasil, dados do Disque 100: na instituição de ensino, 5.334 denúncias; na casa da vítima, 40.707 denúncias. Então, sim, a violência é intrafamiliar; sim, Senadora, se a gente aprovar isso como regra, milhares de crianças estarão em uma situação de vulnerabilidade. |
| R | E nós temos, todos, responsabilidade. Nós somos responsáveis por cada criança deste país. Se uma criança, só uma criança, estiver em risco maior de permanecer em violência, nós somos responsáveis, porque, quando a criança vai para a escola, ela convive com um adulto, fora do círculo familiar, para quem ela pode pedir socorro. "Ah, mas o vizinho pode pedir! Ah, mas a família pode..." Eu sugiro que vocês vejam a pesquisa feita pela Fundação José Luiz Egydio Setúbal junto com o Instituto Galo da Manhã, que mostra que 64% das pessoas adultas, se vissem uma violência praticada por pais contra os filhos, não faria nada. Sabe por quê, Senadora? Porque nós temos uma crença, neste país, de que os pais sabem o que é melhor para os filhos. Infelizmente, os dados mostram que nem sempre e nem todos os pais sabem o que é melhor para os seus filhos. E é sobre isso que o Liberta vem dizer aqui. Nós sentimos muito. Nós queremos ter uma liberdade maravilhosa para todas as famílias, mas não; nós não podemos permitir que crianças permaneçam em situação de violência. Existe um estudo americano, que eu sei que a Laís vai falar: mais de 72% dos casos de violências graves são praticadas por famílias em educação domiciliar, inclusive com letalidade, porque as crianças ficam até oito anos em regime de tortura. Muito obrigada, Senadora. Desculpe a empolgação, mas é, realmente, algo que nos move muito. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Muito obrigada. Passo a palavra para Laís Cardoso Peretto, Diretora Executiva da Childhood Brasil. A SRA. LAÍS CARDOSO PERETTO (Para expor.) - Boa tarde. Inicialmente, eu gostaria de agradecer a V. Exa., Senadora Professora Dorinha, por abrir este espaço para a gente, e a todos e todas. Eu sou a Laís Peretto, Diretora Executiva da Childhood. Por que a Childhood está aqui? A gente luta, há 25 anos, contra o abuso sexual de crianças e adolescentes. E, nesse sentido, eu quero fazer este recorte: eu concordo com todas as outras minhas debatedoras, que mostraram um escopo muito mais amplo, mas a gente foca neste pedaço para o qual, talvez, pouquíssima gente esteja olhando e que há evidências para as quais a gente tem, sim, uma sensibilidade maior. Como a Childhood é uma organização internacional - a gente foi fundada pela Rainha Silvia, da Suécia -, temos escritórios em quatro países do mundo: Suécia, Alemanha, Brasil e Estados Unidos. E, logicamente, todas as vezes nas quais a gente se aventurou em pressionar por políticas públicas, a gente sempre olhou as experiências desses lugares. E é com esse intuito que a gente, hoje, está aqui. A gente, inclusive, na época da aprovação da 13.431, que é a Lei da Escuta Protegida, da qual nós trabalhamos intensamente pela aprovação e hoje trabalhamos intensamente pela sua implementação - e é o que as minhas colegas disseram: é uma dificuldade enorme implementar uma lei aqui neste país -, quando a gente fez isso, olhou para as experiências de fora e a gente continua olhando, para falar como é que a gente pode melhorar isso. No sentido do homeschooling, não é diferente. A Suécia não tem previsão de autorização de homeschooling. Não existe homeschooling na Suécia. Na Alemanha, como também já mencionado aqui anteriormente, somente em raríssimas exceções. O último dado do Ministério da Cultura era de que alguma coisa entre 500 a 1.000 crianças estavam em educação domiciliar. Não estou conseguindo virar aqui. Está certo? De qualquer forma, com tudo isso, a gente foca - agora andei bastante - muito nos dados dos Estados Unidos. E é aqui que preocupa a gente, porque o homeschooling nos Estados Unidos começou a se tornar uma realidade na década de 80. Em 1985, Utah foi o primeiro estado que de fato o implementou legalmente. E hoje, com essa regulamentação... Na verdade, a regulamentação sempre foi assim: nos Estados Unidos, é toda segmentada por estados. Existe uma colcha de retalhos no que é permitido e o que não é permitido em cada um deles, mas, em todos eles, com uma fragilidade muito grande. São 3 milhões de crianças em regime de homeschooling nos Estados Unidos. Eu só queria que vocês guardassem esse número, porque depois acho que a gente tem que fazer uma equivalência com o que a gente está caminhando para ser no caso de uma aprovação integral dessa legislação. O fato é que os Estados Unidos têm lacunas significativas no regramento para proteger as crianças e adolescentes. |
| R | Nesse sentido, eu até trago para vocês um projeto em que a gente lá nos Estados Unidos está agora investindo, que é o Coalition for Responsible Home Education. Tem um site sobre isso, depois o material vai ficar disponível para vocês também. É um grupo de ex-alunos de homeschooling, de educação domiciliar, que tinham como objetivo pesquisar e mitigar os riscos de educação domiciliar naquele país. Essa pesquisa que foi feita, ela é muito... Existem nesse site várias pesquisas, eu peguei duas. Essa aqui foi feita por uma pediatra que, cansada de ver, nos atendimentos muito mais graves de violência doméstica, o que acontecia contra as crianças, fez um levantamento que durou alguns anos dos casos onde eram evidenciados o que havia de tortura, e 47% dessas vítimas que estavam em idade escolar tinham sido retiradas da escola para serem educadas em casa, dessas que estavam na situação extrema de tortura; 29% nunca sequer tinham sido matriculadas. (Soa a campainha.) A SRA. LAÍS CARDOSO PERETTO - Então a conclusão é que, sim, a educação domiciliar isolava ainda mais essa vítima. O que acontecia através do Serviço de Proteção da Criança: eles não conseguiam pedir socorro. A outra pesquisa é essa também de 2018, que avaliou os três anos anteriores, com foco em seis distritos nos Estados Unidos de crianças que tinham sido retiradas da escola. Eles compararam o registro do nome dessas crianças com o registro, justamente, do que é o equivalente ao nosso Conselho Tutelar aqui, o Child Welfare Report. E constatou que 36% dessas crianças que estavam em regime de educação domiciliar estavam em famílias que tinham, pelo menos, uma denúncia. Tem umas coisas muito piores, porque, além dessas denúncias, dessa uma denúncia, pelo menos, tem algumas, 65%, que eram múltiplas denúncias. Então, os casos são gravíssimos. Aqui eu trouxe outros sites. Por ter crianças na sala, nem vale a pena contar, mas são casos gravíssimos. Quem pensa que o homeschooling é um caminho sem risco deveria avaliar o Homeschooling's Invisible Children. Realmente recomendo que isso seja feito. Eu tenho certeza de que a maior parte das pessoas que defendem o homeschooling o fazem pela maior das boas intenções. Querem dar melhor educação para os filhos em casa e têm capacidade, mas talvez se esqueçam de que, ao aprovar, algumas pessoas perversas, que já devem inclusive estar avaliando essa situação, vão se aproveitar e ter também essa possibilidade para essas crianças. Então, eu acho que é nisso aqui que a gente tem que focar. E aí a gente tem que fazer o exercício nosso aqui. Nós temos aqui no Brasil 53,7 milhões de crianças, pelo último dado do IBGE. Essa aqui é a quantidade de boletins de registros de ocorrência. Desculpa, vamos voltar aos dados: 53 milhões aqui no Brasil. Estados Unidos têm 75 milhões. Dos 75 milhões que eles têm, 3 milhões estão em regime domiciliar. Se a gente seguir o mesmo caminho dos Estados Unidos, nós estamos falando que vamos ter 2 milhões de crianças em regime de homeschooling. |
| R | (Soa a campainha.) A SRA. LAÍS CARDOSO PERETTO - Será que a gente tem hoje infraestrutura para isso? Será que a gente tem orçamento para isso? Eu tenho certeza de que não. Eu tenho certeza de que o recurso que eventualmente a gente tem que fazer... A dificuldade que a gente vê na implementação da Lei da Escuta Protegida é ínfima perto do que vai ser proteger essas crianças dentro das casas delas, muito possivelmente perto de pessoas que podem ser possíveis predadores. Bom, esse é o meu recado final. Aqui a gente tem alguns dados de violência também. Eu queria só fazer uma outra avaliação aqui, voltando aos dados dos Estados Unidos. Hoje já existem 35 mil famílias que têm crianças em regime domiciliar, cerca de 70 mil crianças e adolescentes. Só que nesse regime de exceção, a gente está falando que 90% dessas crianças e adolescentes estão no ensino fundamental, 8% no básico e 2% no médio. Isso eu já acho que é grande demais para o nosso poder de fiscalização. Na hora em que a gente cresce isso para 2 milhões, e olhando para os Estados Unidos, o que muda o foco e pulveriza toda essa base, eu realmente acho que nós não vamos ter capacidade de prover proteção à infância e adolescência no nosso país, como é um direito estabelecido em lei e em Constituição para elas. Muito obrigada. Nós somos veementemente contra a aprovação desse projeto na forma como ele está escrito. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Eu passo a palavra para a Sra. Amábile Aparecida Pacios, Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação. Ela está em forma remota. (Pausa.) Só enquanto... Todos os documentos estarão disponíveis. Oi, Amábile! A SRA. AMÁBILE APARECIDA PACIOS (Por videoconferência.) - Tudo bom, Professora Dorinha? Eu acho que eu estou com problema no vídeo aqui. Eles não estão conseguindo ativar meu vídeo. Eu posso falar só pelo som, Professora? A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Pode, se não consegue. Estamos ouvindo bem. A SRA. AMÁBILE APARECIDA PACIOS (Para expor. Por videoconferência.) - Que pena, eu não sei o que aconteceu. Acho que vai entrar. Vamos ver. Bom, eu vou cumprimentar a todos, pedir perdão por não estar aí pessoalmente, mas quem deveria estar aqui... (Falha no áudio.) É o menino aí da técnica de vocês me ligando. Quem deveria estar aqui conosco seria o nosso Presidente, o Prof. Luiz Roberto Liza Curi. Ele não pôde estar e me pediu para estar com vocês por essa razão. Eu tinha um treinamento para fazer, por isso não podia ir pessoalmente. Você sabe que eu gosto sempre de estar aí com você, me perdoe por não estar presente neste momento com vocês. Eu quero te agradecer imensamente por ter lembrado do Conselho Nacional de Educação para essa discussão. Eu quero dizer que anteriormente a Deputada Luísa Canziani foi convidada muitas vezes a estar no Conselho Nacional de Educação, mas ela não pôde, não compareceu. Então, o Conselho Nacional de Educação não participou dessa discussão. Nós temos uma comissão que trata de homeschooling, mas essa comissão não conseguiu fazer um diálogo com a Deputada Canziani. Por essa razão, nós entendemos que esse texto não teve a reflexão e a participação do Conselho Nacional de Educação. Como o nosso tempo é curto, eu quero concordar com todas que estiveram falando antes de mim. Essa tem sido, de fato, a nossa preocupação, o nosso debate no Conselho Nacional de Educação. Concordamos com todas vocês, inclusive com aquelas que falaram sobre a violência. Nós temos esses dados no Conselho Nacional de Educação. Na época da pandemia, esses dados nos assustaram imensamente. Nós concordamos que, de fato, a escola é um direito constitucional da criança e, para ser retirado, ele precisa ser muito bem pensado, muito bem debatido com a sociedade e, sobretudo, com órgãos que estão aqui hoje nesta audiência pública. Eu quero concordar com todos e quero acrescentar apenas algumas coisas que conversamos no Conselho Nacional de Educação e que não apareceram nas falas anteriores. |
| R | Nós concordamos com relação ao abandono intelectual, ao abandono, inclusive, físico. Concordamos que isso é, de fato, uma verdade. Agora, dentro do CNE, nós temos mais uma preocupação além daquelas que já foram ditas. Nós temos conversado, temos debatido muito com relação ao EaD no ensino superior. O nosso receio é que, abrindo essa possibilidade do homeschooling, a gente traga a possibilidade do EaD para a educação básica. Nós falamos isso não por achismo nosso, mas porque ele aparece nessa discussão do EaD no ensino superior. Quando começamos a falar sobre o EaD no ensino superior, sempre existe uma fala querendo ampliar o EaD para a educação básica ou querendo justificar o EaD na educação básica. Isso nos assusta. Acrescentando então a tudo aquilo que já nos preocupa, temos também essa preocupação. Recentemente, o nosso Presidente Curi e eu conversávamos sobre isso, sobre o perigo de, de repente, a gente ter um debate que é quase a mesma coisa que a gente tem no EaD, só que agora para a educação básica. Isso de fato nos assusta. Outra coisa também que não foi dita, mas sobre a qual, no CNE, a gente tem conversado muito é que nós não acreditamos nessa possibilidade de terceirização que o texto da lei permite. Nós acreditamos que é um perigo enorme você poder terceirizar a alguém que ou tenha condições, ou que a pessoa, a família julgue que tenha condições. (Soa a campainha.) A SRA. AMÁBILE APARECIDA PACIOS (Por videoconferência.) - Eu mesma conheço pessoas assim. E durante a pandemia isso foi um fato. Nós percebemos, no Conselho Nacional de Educação, que muitas famílias tiraram as crianças da escola, mesmo sendo on-line, e fizeram condomínios com uma única professora em salão de festa, alguns em garagens. Ali faziam uma sala multisseriada, não garantindo nenhuma aprendizagem e nenhuma segurança para as crianças. Então, além de tudo que já foi dito, e eu quero assinar embaixo como Conselho Nacional de Educação, eu quero acrescentar estas duas preocupações que nos incomodam no Conselho Nacional, que não foram conversadas aqui, a saber: o EaD, o perigo que corremos do EaD chegar à educação básica, e a questão da família entender que ela pode contratar uma terceirização, pode continuar com a vida dela normal, e é essa pessoa terceirizada que seria a responsável pela educação da criança. Professora Dorinha, muito obrigada, minha sincera admiração por você, muito obrigada por tudo que você faz pela educação no nosso país. Eu quero agradecer inicialmente o convite, e pedir desculpas porque eu não sei o que houve com a técnica que eu não pude aparecer no vídeo. Um bom Natal para você, um bom ano. |
| R | Um grande abraço a todos que estão aí. Eu não pude estar - muitas desculpas -, mas a gente, uma hora, se encontra. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Muito obrigada à Profa. Amábile, que, com certeza, estaria aqui. Sempre que é convidada, desde à Câmara até aqui no Senado, em todas as oportunidades, ou representando o Conselho Nacional de Educação ou como representante da Federação, esteve. Eu agradeço. Qualquer documento que queira enviar, nós estamos à disposição. Antes de passar a palavra ao Carlos Vinicius Reis, hoje Presidente da Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned), quero só esclarecer que, como eu li aqui, são vários requerimentos. Hoje acabou ficando um número muito maior de instituições que são contrárias, mas a ideia é a de que, em todas as mesas, a gente tenha diferentes representações. Em virtude de já ter começado a Ordem do Dia, talvez eu não consiga retornar para a gente fazer a conclusão, mas eu vou passar para o Carlos e dar-lhe um tempo maior, em virtude do tempo. Eu quero só colocar, primeiro, que eu fui Secretária de Educação do Estado do Tocantins, ou seja, eu acredito na escola e no sistema de educação. De igual forma, eu não acredito em nenhum tipo de argumento que use a educação domiciliar para colocar um problema da escola pública. Eu acho que a escola pública tem muitos problemas, muitos desafios. Durante todo o tempo em que eu estudei a educação domiciliar, como alguém que tem tudo para defender o institucional, eu acho que a educação domiciliar não é para dizer: "A escola pública tem problema demais" e "Eu não quero meus filhos ali". Eu me deparei com outro tipo de argumento. Também não é verdade que são pais que não querem ou querem se desobrigar da educação, ao contrário. Eu fui Relatora de um PL na Câmara que exigia que o optante do Bolsa Família, que quem é beneficiário do Bolsa Família devesse ir uma vez por semestre, pelo menos, à escola. E não tive apoio dos colegas. Inclusive, na época, era uma gestão de esquerda, que disse isto: que a gente estava colocando como uma condicionalidade, o que seria um absurdo, o pai ir uma vez. O que eu me deparei ao estudar foi com famílias que se organizavam muito para assumir a gestão da educação dos seus filhos. Essa era uma lógica que eu verifiquei. Também não acho que é correto a gente falar que o que a gente viu na pandemia foi homeschooling. Nós vimos pais que, de repente, se viram obrigados a fazer uma educação, viram e passaram a valorizar muito mais as dificuldades e os desafios da escola. Eu era Relatora na época, e muita gente perguntava: "E, agora? Homeschooling?", "Todo mundo está fazendo homeschooling?". Não, gente. Nós estávamos vivendo um período de exceção em que a pandemia obrigou os pais que puderam... Porque o que nós vimos foi a grande maioria - e eu falo pela dificuldade de acesso, de internet, de formação... Uma coisa é quem assume a tarefa de educar; outra é quem viu negado o direito de frequentar a escola e teve de enfrentar. Então, acho que não é uma boa comparação. |
| R | O sistema majoritário nosso é educacional, é escolar. Quando a gente fala do homeschooling, é uma situação pontual. Na minha opinião, se for regulamentado, depende do sistema local se organizar, porque não são todas as escolas que terão condições de receber. Esta foi uma das preocupações: as crianças optantes do homeschooling precisam estar matriculadas, vinculadas a uma escola. Elas poderão ter acompanhamento. E o que é pior: alguns argumentos foram colocados, como: "Infelizmente, a gente não tem isso para as nossas escolas". Todo argumento, quando a gente fala da questão da violência intrafamiliar e da família violenta, violadora, termo que foi utilizado aqui pela Luciana, é o de que o homeschooling prevê várias seguranças. Parece-me que texto está, inclusive, avançando em condições de proteção que a gente não está conseguindo garantir para as nossas escolas. Se as famílias estão nesse nível de violência e de violação de direito, este é um desafio em que eu gostaria que todo mundo, independentemente desta pauta, pensasse: como a gente consegue fazer isso. Eu tenho visto, no meu estado, meninas de 12 anos, de 13 anos, de 14 anos violentadas por pai, padrasto, tio, padrinho, de 15 anos - eu até falei com a Secretária Izolda -, que vão todos os dias para a escola e que estão chegando aos 15 anos sem saber ler e escrever, o que é uma violência gigantesca, fora a violência física. Esse adolescente de 14 anos, de 15 anos não saber ler e escrever, a ele foi negado o direito fundamental de aprender. É como se a gente tivesse dando um cheque sem fundo. A escola está dando um cheque falso, um cheque sem fundo para os pais. Às vezes, o pai e a mãe tiram do corpo, tiram comida da boca para a criança ir para a escola, e muitas vezes não tem nem chinelo para ir para a escola, não tem nem roupa para ir para a escola, e a gente está achando que é normal. Eu sei que nenhum de nós aqui acha que é normal, mas como a gente consegue avançar em relação a isso? A gente nunca conseguiu nem votar, na Câmara ou no Senado, a lei de responsabilidade educacional. Será que a gente consegue avançar em relação a isso? Aqui, nós estamos falando de mais de 40 milhões de alunos que vão todos os dias para a escola. Eu não trato da questão da violência na escola dizendo: "Ah, meu filho vai para escola e não está protegido, pode ter crime". Não é isso, porque nós não podemos nunca negligenciar, mas estou dizendo desta violência do não aprender, do não ensinar. Quando a gente fala de abuso e violência, ao mesmo tempo, a gente reconhece que a escola não está dando conta de pensar nisso. Recentemente, não quero nem potencializar, a gente tem visto muita denúncia da negligência na própria escola, do professor que não se sente protegido para fazer a denúncia, que mora numa comunidade em que todo mundo conhece todo mundo. Eu acompanhei de perto uns casos recentes de jovem de 12 anos que sofria abuso, violência, de pessoas que sofrem violência e que cometem violência, porque é a linguagem a que elas estão acostumadas. Independentemente do debate do homeschooling, sobre o que nós vamos ter várias audiências públicas, que a gente possa imaginar, pensar sobre isso, porque, quando a gente fala de educação integral, não é só mais tempo na escola; é sobre de que tipo de educação a gente está falando. Não adianta ficar o dia inteiro e sair, de novo, sem saber ler e escrever, porque o tempo em que deveria estar na escola é um tempo que não está sendo aproveitado. Eu sei que todo mundo que lida aqui, que a gente não aceita isso. Eu sei que é uma luta permanente da Undime, do Consed, das instituições. |
| R | O que a gente precisa fazer para cuidar dos mais de 40 milhões de alunos que estão na escola e que vão, todos os dias, acreditando nessa escola? A gente precisa criar uma rede. Por isso eu apresentei um PL da ampliação do tempo do PNE, porque não adianta a gente terminar todos os 10 anos, eu vou pegar o meu segundo PNE, e a gente fechar o PNE sabendo que não cumpriu meta nenhuma. Aí discute o próximo, se compromete com várias metas, e o orçamento não reflete isso, não tem punição para quem prometeu, nem para o município, nem para o estado, nem para a União. A minha proposta foi a de ampliar a duração deste PNE enquanto a gente debate o próximo, porque não adianta ficar quatro anos sem nenhum PNE e a gente não colocar o orçamento como consequência. Eu estou prometendo metas, eu vou aumentar vagas no ensino fundamental, mas não tem dinheiro direcionado para isso. Desculpem-me essa fala, mas não vou conseguir falar depois. Passo a palavra, agora, ao Carlos Vinicius Reis, Presidente da Associação de Educação Domiciliar (Aned). Reforço para todos os que estão aqui conosco que a gente pode continuar este diálogo, inclusive, em separado, em virtude do tempo e do necessário debate. Por favor. O SR. CARLOS VINICIUS REIS (Para expor.) - Obrigado, Senadora Professora Dorinha, na pessoa de quem cumprimento toda a mesa, também quem nos está acompanhando ao vivo pela transmissão do Senado, famílias presentes, aqueles que participam da educação domiciliar no Brasil. Gostaria de cumprimentar, com muito carinho, Professora Dorinha, todos os professores, profissionais de educação de escolas públicas, de escolas particulares, todos os professores que também, muitos desses, têm optado pela educação domiciliar com os seus próprios filhos, professores de escola pública que têm admirado a própria educação domiciliar. Quero dizer, de uma maneira bem clara, na minha introdução, que homeschooling não é uma oposição às escolas. Pelo contrário, é um somatório de esforços para o bem melhor de nossos filhos, para o bem melhor da educação no nosso país. O que nos traz aqui hoje, na verdade, ao longo destas décadas, por uma regulamentação da educação domiciliar, é um único propósito: sim, o melhor interesse das crianças, da melhor educação, do melhor desenvolvimento das suas habilidades, das suas capacidades, da sua preparação para vida adulta, da pluralidade de concepção pedagógica, da liberdade educacional, conforme preconiza a nossa Constituição Federal. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Só um minuto, Carlos. Talvez a Aned tenha que voltar em outras mesas, mas todas as abordagens que foram mencionadas são reais. O SR. CARLOS VINICIUS REIS - Perfeito. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Todas as representações aqui trazem temas. E qualquer Senador que for votar vai pensar em todos os argumentos que foram aqui colocados. Oportunamente, no tempo que você conseguir ou em outro momento... Quero só que desconte do tempo dele a minha fala. Tudo o que foi abordado tem bastante pertinência. O SR. CARLOS VINICIUS REIS - Excelência, Senadora, eu gostei muito das suas colocações, especialmente sobre todo o cenário. Somos todos imbuídos e totalmente contra qualquer tido de violência contra crianças e adolescentes durante a sua jornada educacional, familiar, em qualquer ambiente a que elas possam ir ou que possam frequentar. Na foto aqui, nós temos a pequena Juliana, vestida de preto, de saia vermelha, em 1998. Famílias educadoras, uma cooperativa de famílias que faziam homeschooling naquela época visitaram o Palácio do Planalto, fizeram apresentação musical. Ali estavam junto com o então Ministro Pelé àquela época. E uma das pautas daquele encontro foi pedir a regulamentação do homeschooling. |
| R | Essa é a Juliana, atualmente graduada em Ciência da Informação pela Unirio, com estágio na IBM e mestre em Ciência da Computação. Ela foi engenheira de software da Microsoft, trabalhou na Google e hoje é Engenheira sênior na Gemini Trust Company. O Eliseu foi estudante domiciliar no interior da Bahia, em Ilhéus, e formou-se em Medicina pela Uesc (Universidade Estadual de Santa Cruz Cabrália), no Sul da Bahia. Hoje, ele já é pós-doutorando em Comportamento Humano, fazendo pesquisas na área de doenças de Parkinson e também com grande notoriedade internacional. Ali temos a Yasmin, que entrou na Universidade de Lisboa, e também foi educada em casa. Ela cursou Línguas, Literaturas e Culturas, fala francês, inglês, italiano, português do Brasil e de Portugal. Atualmente, é pós-graduada em Educação Bilíngue e pós-graduanda em Arqueologia, Cultura e Sociedade. Por fim, ali nós temos a Elisa, que passou em quinto lugar no curso de Engenharia Civil da Escola Politécnica da USP. Porém, não foi permitido a ela assumir a cadeira na USP, porque ela tinha sido educada em casa. Foi privada ela do direito ao acesso à universidade no Brasil por causa disso. Como resultado, ela foi convidada por universidades americanas e hoje trabalha e estuda nos Estados Unidos, em companhias americanas. Estes são apenas alguns exemplos... (Soa a campainha.) O SR. CARLOS VINICIUS REIS - ... daquilo que tem acontecido no ambiente da educação domiciliar, onde tem-se promovido educação de qualidade, educação para a formação do indivíduo, para as suas habilidades, dando a eles oportunidades. A educação domiciliar é um direito natural dos pais e das crianças, reconhecido na Declaração Universal dos Direitos Humanos e nos tratados internacionais de direitos humanos. Negar esse direito é um atentado histórico. Temos exemplos, ao longo da história, de pessoas que também foram educadas em casa, como o nosso Barão de Mauá, Carlos Gomes, Serena e Venus Williams. Thomas Edison foi um dos exemplos mais claros daquilo que foi gerado nele através da educação domiciliar, e a gente poderia percorrer tantos outros aqui. Foi citada a Alemanha. É interessante que a Alemanha, ao tratar pela primeira vez do aspecto da educação domiciliar, teve um decreto de Hitler, o Reich de 1938, na Alemanha, em que Hitler decretou a educação escolar compulsória com a vedação da educação domiciliar dirigida pelos pais. Essa é uma origem da qual resultou na Declaração Universal dos Direitos Humanos, para que não mais acontecessem os grandes malefícios que tivemos na humanidade com o controle centralizado da educação, sem a participação e sem a liberdade dos pais de escolherem qual gênero de ensino deve ser ministrado aos seus filhos. Por isso, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que ontem completou 75 anos, no seu Artigo 26, 3, diz: "Os pais [têm o direito,] têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos". Não só a Declaração Universal, mas tratados como a Convenção sobre os Direitos da Criança, como o Pacto de São José da Costa Rica, o Pacto dos Direitos Civis e Políticos, todos eles são tratados ratificados pelo Brasil na década de 90, estão todos garantindo a primazia, o respeito, a liberdade e a escolha dos pais de optarem pelo homeschooling. O Global Home Education Exchange também trouxe ao Brasil, em 2016, numa sequência de conferências globais, começando na Alemanha, inclusive, em 2012, e na Rússia, em 2018, um dos seus princípios bem claros ali, que é que o direito à educação domiciliar é um direito fundamental das famílias, crianças e pais. Portanto, é dever do Estado respeitar e assegurar esse direito. |
| R | Hoje, no mundo, são mais de 10 milhões de estudantes que optam pela educação domiciliar, como a Laís trouxe, e os Estados Unidos, sim, é o que tem a maior população hoje. Durante a pandemia, passou, inclusive, de 4 milhões, Laís. Ele já é regulamentado em mais de 85% dos países da OCDE, e mais de 65 países ao redor do mundo já o regulamentaram, não só países desenvolvidos, mas países em desenvolvimento, países subdesenvolvidos, tanto no continente africano quanto no continente europeu, no asiático e aqui, na América do Sul, no Chile... (Soa a campainha.) O SR. CARLOS VINICIUS REIS - ... no Paraguai, na Colômbia, no Equador. Nós temos a Oidel, uma organização que faz a avaliação da liberdade educacional no mundo e presta consultoria junto à Unesco, que traz ali o ranking da liberdade educacional. O Brasil, infelizmente, ocupa a 58ª colocação na última medição feita, e o Chile está ali em 7º lugar. A própria Oidel faz uma correlação com os resultados do Pisa. Quanto maior a liberdade educacional de um país, melhor é o desempenho educacional desse mesmo país nas avaliações internacionais. Pesquisas científicas... Falamos muito aqui sobre a importância do fundamentar dessas nossas avaliações, Professora, e as pesquisas são vastas ao tratar desses resultados, especialmente de formação, de socialização, de proteção às crianças, daqueles que fazem a educação domiciliar. São vastas as pesquisas internacionais e nacionais que tratam desses diferentes temas, preocupadas, sim, porque os pais e os atores, imbuídos desse mesmo zelo, fazem esse acompanhamento, e, por isso, as pesquisas evidenciam exatamente que a proteção também é uma preocupação e a proteção, sim, acontece por parte das famílias que fazem educação domiciliar, porque são famílias protetivas. Como a senhora bem colocou, não estamos aqui para fazer um confronto, como se a educação domiciliar fosse contra a escola, mas não é porque, como o próprio DataSenado levantou, 7 milhões de crianças passaram por violência, entre 2022 e 2023, nas escolas que nós vamos defender que as escolas sejam fechadas. Pelo contrário, vamos defender que as escolas sejam melhoradas, que a educação no Brasil seja melhorada, que essas crianças sejam protegidas no ambiente escolar. A educação domiciliar é uma opção para alguns, é verdade, mas não é porque qualquer pessoa pode se valer de maneira errada de qualquer que seja o instrumento que deveria ser vedado àqueles que se valem da maneira correta, imbuídos do melhor interesse das crianças e dos direitos humanos. Então, isso nós trazemos aqui de uma maneira bem clara também. Eu vou deixar esses dados de pesquisa que falam do desenvolvimento educacional, da socialização, do desenvolvimento acadêmico, do nível de leitura, tão aplicada para aqueles que fazem educação domiciliar, da participação em voluntariado, em habilidades sociais, enfim. Para fechar, caminhando aqui para a conclusão, Senadora, e agradeço pelo tempo extra, a educação domiciliar é um fato social, histórico, consolidado, crescente, e, sim, é imparável no Brasil. E não é algo de elite. Pelo contrário, 38% daquelas pessoas que praticam educação domiciliar hoje no Brasil recebem só até quatro salários mínimos. Não é uma prática de elite. Famílias e crianças têm sido perseguidas e desrespeitadas em seus direitos. Muitas estão abandonando o país por causa dessa perseguição, desse desrespeito. Essas famílias são protegidas. Não há evidências ou condenação por abuso envolvendo famílias educadoras no Brasil. E é um movimento suprapartidário e participativo aqui neste processo legislativo. A Professora Dorinha acompanha a participação das famílias educadoras aqui, no Brasil, desde 2012, quando teve o Projeto de Lei 3.179, do qual ela foi Relatora, e o próprio comportamento das famílias educadoras ali ao longo desse tempo. E o próprio DataSenado também traz assim: "O que levaria uma família a optar pela educação domiciliar"? Muitos deles estão relacionados sim a desafios encontrados tanto no ambiente escolar, mas também buscando o melhor interesse das crianças, das suas necessidades, atendendo a questões de saúde, a questões do próprio desenvolvimento. Se a gente pode dar o melhor, por que não? Por que se evitar isso? |
| R | E a Constituição Federal é muito clara, como já mencionado: é um direito e um dever tanto do Estado, mas também da família. Veja o art. 206, os princípios de liberdade de aprender, de ensinar e de pesquisar. Só para caminhar aqui para a conclusão, Senadora, o Ministro Alexandre de Moraes, num julgamento em 2018, já cravou que a Constituição Federal não proíbe, sendo possível a sua criação e regulamentação por meio de lei editada pelo Congresso Nacional. São mais de 1,1 mil apoiadores: instituições de ensino apoiam, acadêmicos apoiam, juristas apoiam. Essa grande jornada que nós temos pela regulamentação da educação domiciliar não começou agora. São praticamente 30 anos que vai completar agora dessa jornada. E nós podemos ver ali, nessa jornada pela liberdade educacional, pelo reconhecimento, que foi em paralelo à própria LDB. A LDB é clara, no seu art. 1º, ao dizer que aquela lei se destina à regulamentação da educação escolar, porque, naquele mesmo período, o PL para regulamentar a educação familiar ou domiciliar estava sendo apresentado também lá pelo Deputado João Teixeira, em 1994. Em 2008, por exemplo, nós temos o Deputado Henrique Afonso, do PV, do Acre, apresentando um projeto também para que fosse regulamentada a educação domiciliar. E o 3.179, de 2012, é o principal, e que está em vigência até hoje, que se transformou no atual PL 1.338, de 2022. Então, ao longo de todas essas décadas, nós estamos falando do reconhecimento de um direito humano cravado na Declaração Universal e na nossa Constituição, agora chegando a esse ponto. Só para deixar esse registro, Senadora, há a participação das famílias educadoras e, como ouvimos ali, das crianças. Ao longo de todas essas décadas, elas têm acompanhado, sabido que é um processo legislativo, e participado desse processo de construção legal no Brasil. Eu queria agradecer, mais uma vez, a oportunidade de vir aqui para dizer da importância do respeito à liberdade educacional, como preconizado na nossa Constituição. Obrigado, Senadora. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Obrigada, Carlos. Eu queria fazer umas questões. Sobre a proposta de vocês da educação domiciliar, qual seria o papel da Aned em relação às famílias domiciliares? Se você puder anotar, porque são algumas questões. Há a questão do currículo. Um dos grandes desafios para a gente que imagina a educação é saber como os pais ou a família vai gerenciar, ou seja, qual condição ela tem, no exercício deste direito da educação domiciliar, de gerenciar a questão do currículo? Nós que lidamos com a educação formal temos uma batalha muito longa em relação à qualidade da formação do professor. O professor vai para a universidade e a gente está fazendo qualificação e requalificação o tempo todo. A gente luta com essa questão da escola, do monitoramento. Como é que vocês pensam em relação a essa questão? Então: o papel da Aned, a questão do currículo e o preparo dos pais, como a educação vai ser conduzida. Eu sei que não é o pai que vai dar aula, que é um novo modelo, que é uma questão pedagógica num formato de continuar aprendendo, de buscar o conhecimento, mas acho que seria interessante você mencionar isso. Também chamo a atenção para uma fala, para uma coisa para a qual vocês precisam estar muito atentos, que é quando vocês mencionam a questão da liberdade dos pais. Eu acho que o pai a tem, porque quando ele lida com a criança, com o vulnerável, ele tem esta responsabilidade de cuidar, mas tem que estar sempre equilibrada com o direito da criança, com o direito de aprender, com o direito de escolha... Ela depende desse cuidado dos pais. Quero chamar a atenção em relação a isso, porque ela também é plena de direitos. Então, como você imagina esse equilíbrio da qualidade, do direito de aprender? E que papel a Aned poderia, pretende ter ou tem hoje... Eu não conheço muito bem o funcionamento da Aned. |
| R | O SR. CARLOS VINICIUS REIS - Obrigado, Senadora, pela oportunidade de esclarecer esse ponto. Não sei se seria possível voltar a apresentação... Tem um eslaide, um eslaide apenas, que mostraria em resumo, mas eu digo... Tranquilo. Se puderem passar aqui? Desculpa, voltando. Aqui nós temos um resumo, Senadora Dorinha, do PL 1.338 exatamente para o debate nesta audiência pública. Nós temos aqui todos os requisitos, todas as condições. Foi um PL extremamente debatido - a senhora também acompanhou -, no âmbito da Câmara dos Deputados, porque o Supremo Tribunal Federal, em 2018, com a decisão do Ministro Alexandre de Moraes e do Plenário, estabeleceu também algumas condições, alguns requisitos que deveriam constar da legislação que viesse a regulamentar o homeschooling. E aqui eles estão de maneira ainda bem mais explícita, de maneira bem pontuada ali: requisito de formação para os pais: está estabelecido lá nível superior de pelo menos um dos pais ou de um preceptor que vai acompanhar essa criança; a proibição para pais ou responsáveis com antecedentes criminais; matrícula em uma instituição de ensino, então, tem toda essa vinculação; avaliação anual; acompanhamento pedagógico por tutor de instituição; observância da BNCC. Estão previstos também no projeto de lei: encontros semestrais conduzidos pela instituição de ensino; garantia de acesso a competições e avaliações nacionais; garantia da convivência familiar; fiscalização do Conselho Tutelar; manutenção de registros de atividades pedagógicas; edição de diretrizes pelo Conselho Nacional de Educação; e retorno à escola em caso de insuficiência avaliativa. Quando a gente fala de liberdade - e a gente está trazendo aqui uma liberdade com solidariedade, junto a uma regulamentação do Estado -, nós estamos falando de algo onde nós temos um grupo da sociedade que está vendo o Estado dizer... Nós entendemos que a regulamentação é importante, é necessária, para que se separe o joio do trigo, para que se separem, exatamente, as famílias protetivas de qualquer pessoa que possa se valer disso, como hoje, em termos de evasão escolar, em termos de falta de possibilidade de acompanhar, acaba acontecendo, seja no âmbito escolar, seja no âmbito familiar de qualquer família desestruturada, e isso nós não queremos para o homeschooling. Nós queremos para o homeschooling exatamente uma legislação que garanta essa proteção. E essa legislação tem todo esse aspecto. O papel da Aned é de representação e defesa das famílias, de garantia sempre desse direito; nunca é de assumir um posicionamento de uma instituição de ensino. Não é esse o papel da Aned, Senadora. Obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Professora Dorinha Seabra. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - TO) - Inclusive, vários desses pontos estavam no meu relatório, que a Deputada Luísa incorporou. Logicamente, eu estive inclusive no Ministério da Educação e, no meu entendimento, o sistema de ensino, caso seja aprovado como uma possibilidade de opção, tem que assumir a responsabilidade, dizer que consegue fazer, porque demanda uma série de responsabilidades e de custos para as escolas. Em nem todas as escolas as crianças poderão estar - porque a ideia era uma vinculação com a escola para que essa escola pudesse acompanhar, monitorar as atividades, se vai ter uma feira de ciências, que tivesse momentos de... E tudo isso demanda uma organização do sistema municipal ou estadual de educação e, logicamente, a introdução da questão de das avaliações as crianças participarem, para a gente ter a garantia de que estão aprendendo. Então, tem uma série de requisitos. |
| R | Eu peço desculpas, mas, em virtude do tempo - está tendo votação nominal e aqui a gente toma falta também e tem corte de ponto, corte no salário -, a gente já deveria ter encerrado, mas, em virtude do atraso... Nós vamos ter outras mesas e acho que a gente poderá assegurar essa diversidade. Agradeço muito a participação qualificada, comprometida, extremamente ponderada de todos os que estiveram aqui conosco nesta Mesa e peço que todas as apresentações sejam disponibilizadas, porque a gente deixa na página da Comissão. Feitas as considerações finais, nós vamos encerrar. Por meio do e-Cidadania, recebemos as manifestações, que também estão disponíveis. Nada mais havendo a tratar, eu agradeço a presença de todos e declaro encerrada a presente reunião. Quero cumprimentar as crianças com a camiseta da educação domiciliar. Na audiência pública que eu fiz na Câmara, me impressionou muito a educação das crianças. Foi muito longa e com muitas participações. Então, muito obrigada a todos que nos acompanharam. O nosso objetivo é ouvir e construir o que for possível sempre com a preocupação, que é o nosso papel, de pensar no direito, no direito de aprender, no direito da criança e do adolescente, e de garantir que a gente... Nós queremos muito mais do que a educação tem dado ao nosso país. Nós queremos mais porque a gente acredita, de verdade, no papel da educação. Muito obrigada. (Iniciada às 15 horas e 47 minutos, a reunião é encerrada às 17 horas e 08 minutos.) |

