20/02/2024 - 1ª - Comissão de Assuntos Sociais

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Fala da Presidência.) - Bom dia a todos e todas.
Havendo número regimental, declaro aberta a 1ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Assuntos Sociais da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A presente reunião atende ao Requerimento nº 124, de 2023, CAS, de nossa autoria, para a realização de audiência pública destinada a debater o andamento da apuração das denúncias encaminhadas pela CPI da Pandemia da Covid-19 referentes aos procedimentos adotados pela Prevent Senior.
Informo que a audiência tem a cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado, da Rádio Senado e contará com os serviços de interatividade com o cidadão: Ouvidoria, através do telefone 0800 0612211, e o e-Cidadania, por meio do Portal www.senado.leg.br/ecidadania, que transmitirá ao vivo a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos expositores via internet.
Bem, o objetivo desta reunião, como foi dito, é exatamente dar um acompanhamento aos encaminhamentos de uma ação civil pública que foi produzida em conjunto pelo Ministério Público do Trabalho, Ministério Público de São Paulo, Ministério Público Federal e que foi protocolada no dia 5 de fevereiro, para que esta Comissão e o Senado possam fazer o acompanhamento sobre esse fato.
Durante dois anos, os procuradores dos três ministérios públicos tiveram a oportunidade de ouvir profissionais, pacientes, familiares, reuniram mais de 30 mil documentos, dentre eles protocolos médicos, prontuários de pacientes, conversas de aplicativos de mensagens entre a direção da companhia e os profissionais da empresa, documentos das CPIs do Senado e da Câmara de São Paulo, processos administrativos da ANS, sindicâncias do Cremesp, entre outros.
Todos se recordam de que essa ação terminou sendo decorrência de denúncias que foram feitas quanto aos procedimentos adotados pela empresa Prevent Senior durante a pandemia de covid no nosso país. Constavam inúmeras denúncias. Entre elas, a de que a empresa teria incentivado que profissionais trabalhassem infectados pelo coronavírus, que não teria havido exigência de que os profissionais de saúde se vacinassem contra a covid. Só houve, segundo a denúncia, a exigência do uso de máscara a partir de novembro de 2020.
A empresa teria realizado experimentos de medicamentos sem aprovação dos órgãos de pesquisa e teria praticado assédio moral contra médicos, obrigando-os a prescrever medicamentos sem eficácia comprovada para o tratamento de covid-19, entre eles o chamado kit covid.
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A ação, quando apresentada, cobrou da empresa uma indenização de R$940 milhões por dano moral coletivo, o que representa 10% do faturamento líquido das empresas entre 2020 e 2021, período durante o qual teriam acontecido as irregularidades.
A judicialização, inclusive, aconteceu devido à recusa da empresa Prevent Senior em assinar um termo de ajustamento de conduta proposto pelo Ministério Público do Trabalho. Neste termo, a empresa se comprometeria a corrigir falhas após irregularidades encontradas na área trabalhista durante a pandemia da covid-19. São alvos na ação os quatro proprietários da Prevent Senior - Eduardo Parrillo, Fernando Parrillo, Andrea Parrillo, Maria Aparecida Parrillo - e seis empresas do mesmo grupo.
Para os procuradores - aspas -, "o conjunto probatório aponta para uma conduta dolosa e deliberada no sentido de colocar negócios e interesses econômicos acima da proteção da saúde e da vida de milhares ou até de milhões de pessoas".
A empresa foi investigada também pela CPI da Covid do Senado Federal e pela CPI instaurada na Câmara Municipal de São Paulo.
Há ainda uma investigação criminal em andamento no Ministério Público de São Paulo e sindicâncias abertas no Conselho Regional de Medicina daquele estado.
A Agência Nacional de Saúde Suplementar também identificou irregularidades e aplicou três multas ao convênio.
A partir do cruzamento dos dados das escalas de trabalho de 27 mil profissionais da Prevent Senior nos anos 2020 e 2021, com resultados de testes de covid-19 fornecidos pela Secretaria de Saúde de São Paulo, os investigadores concluíram que quase 10 mil profissionais trabalharam infectados, quando deveriam ser afastados, segundo as orientações das autoridades sanitárias: mais de 2,8 mil profissionais teriam trabalhado nos dois dias seguintes à confirmação; mais de 3,1 mil teriam trabalhado infectados nos sete dias seguintes à confirmação; e mais de 3,6 mil profissionais teriam trabalhado infectados nos quatorze dias seguintes à confirmação.
Sobre o uso de máscaras, a ação aponta que a empresa teria proibido no início da pandemia o uso de máscaras pelos trabalhadores; permitindo, posteriormente, o uso pelos profissionais que fizessem manuseio de vias aéreas e que permanecessem na UTI; e, só em novembro de 2020, nove meses após o início da pandemia, o uso de máscara passou a ser obrigatório para todos os funcionários.
A ação dos MPs sustenta ainda que a empresa não submeteu aos órgãos competentes, como a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), estudos com medicamentos como a cloroquina. Segundo os investigadores, "um ser humano que participa de uma pesquisa clínica, sem qualquer proteção ética, não passa de um objeto de estudo, sem direitos da personalidade: uma ‘cobaia humana’" - fecho aspas. A própria ideia de ‘cobaia humana’ causa intensa repulsa e indignação na sociedade, pois projeta a associação do ser humano a de um animal de laboratório, indicando o rebaixamento do ser humano ao negar-lhe a condição de humanidade.
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Em resumo, a ação aponta as seguintes irregularidades: ausência de afastamento das atividades dos profissionais que estavam ou com suspeita ou com confirmação de covid-19; afastamento dos funcionários positivados por período inferior a 14 dias, período determinado pelas autoridades sanitárias; afastamentos tardios, muitos dias após o início dos sintomas, bem como a ausência de vigilância e de afastamento contactante; ausência de programa articulado de vacinação dos trabalhadores ou acompanhamento efetivo do seu status vacinal, a despeito do que determina a legislação; ausência de investigação epidemiológica; ausência de acompanhamento da saúde dos trabalhadores infectados quanto à sequela, bem como de avaliação por profissional para retorno ao trabalho; retirada de autonomia dos médicos do trabalho para prescrever períodos de afastamento e tratamento; ausência de medidas de contenção da disseminação do vírus; promoção de estudos e tratamentos experimentais com trabalhadores e pacientes sem adoção de métodos científicos adequados e sem autorização, além de validação pelos órgãos competentes.
Para esta audiência pública de hoje, foram convidados:
- a Sra. Lorena Vasconcelos Porto, Procuradora do Trabalho do Ministério Público do Trabalho;
- Murillo César Buck Muniz, Procurador do Trabalho do Ministério Público do Trabalho;
- Everton Luiz Zanella, Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, que irá falar em nome também de Maria Fernanda de Castro Marques Maia, Promotora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, e de Nelson dos Santos Pereira Junior, Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo;
- também foi convidado o Sr. Arthur Pinto Filho, Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo; além de
- Kleber Marcel Uemura, Procurador do Ministério Público Federal;
- Bruna Mendes Morato, advogada;
- Andrea Montera Rotta, testemunha na CPI da Prevent Senior;
- Kátia Shirlene Castilho dos Santos, testemunha na CPI da Pandemia;
- Luiz Cezar Oliveira Pereira, testemunha na CPI da Prevent Senior;
- Elda Coelho, Presidente da Sociedade Brasileira de Bioética.
Quero informar que nós vamos realizar uma segunda audiência sobre o tema, com a presença - ou pelo menos com o convite para que esteja presente - de uma representação da empresa, além das representações dos conselhos de regulamentação profissional na área da medicina.
Bom, dito isso, eu quero chamar a atenção dos senhores e senhoras que participam desta audiência pública, já que, pela enorme quantidade de pessoas que vão se manifestar, eu serei obrigado a estabelecer um limite rígido de tempo, que será o de dez minutos para cada uma das pessoas que vão se manifestar. Está bem? Como eu disse, há uma participação de pessoas que acompanham a sessão, e já temos aqui algumas perguntas que nos chegaram por intermédio do e-Cidadania.
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Eu vou ler para todos, porque cada um poderá se manifestar e responder a essas questões ou às que quiser responder.
Thamara Correia, da Paraíba: "Qual o limite entre fazer pesquisas e buscar novas soluções e colocar em risco pessoas sem a menor segurança cientifica?".
Glaucielen Ferreira, do Rio de Janeiro: "Qual é a evidência disponível que sustenta as alegações de crimes cometidos pela Prevent Senior durante esse período?".
Paulo Santos, de Sergipe: "Quais as [...] penalidades [...] nas áreas civil e penal que podem ser atribuídas à empresa Prevent Senior e a seus dirigentes?".
Alexandre Saloti, do Paraná: "[...] em qual situação o [uso do] kit poderia causar danos à saúde [...]?".
Verônica Santos, do Rio de Janeiro: "Os pacientes [...] assinaram termo de responsabilidade para o uso de ivermectina ou azitromicina? Como eram comunicados do protocolo?".
Thiago Barros, de Pernambuco: "Necessário haver responsabilização individual pelos absurdos praticados e esclarecimentos quanto ao seu embasamento".
Teresa da Costa, de São Paulo: "Apoio essa investigação, pois não podemos ser usados de cobaia de experimento sem autorização, os culpados têm que [...] [ser punidos]".
Pedro Bessa, do Distrito Federal: "A Prevent Senior aparentemente não cometeu nenhuma irregularidade, é necessário que entidades [...] [ligadas à] comunidade médica se manifestem sobre o caso".
Então, vamos dar início aqui à nossa sessão.
Eu queria aqui, pela ordem, convidar a Dra. Lorena Vasconcelos Porto, que é Procuradora do Trabalho do Ministério Público do Trabalho.
Com a palavra V. Sa., dispondo de dez minutos para a manifestação.
Muito obrigado.
A SRA. LORENA VASCONCELOS PORTO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todas e a todos.
Os senhores e as senhoras me escutam bem? (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Escuto. Estamos ouvindo bem. Desculpe.
A SRA. LORENA VASCONCELOS PORTO (Por videoconferência.) - Eu agradeço primeiramente o convite formulado pela Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal, na pessoa do Senador Humberto Costa, para participar desta audiência pública, representando, juntamente com o meu colega Dr. Murillo, o Ministério Público do Trabalho.
Como foi ressaltado no início pelo Senador Humberto Costa, no dia 5 de fevereiro deste ano de 2024, foi ajuizada uma ação civil pública em conjunto, em litisconsórcio ativo pelo Ministério Público do Trabalho, pelo Ministério Público do Estado de São Paulo - Ministério Público estadual de São Paulo - e pelo Ministério Público Federal, em face de empresas do grupo econômico da Prevent Senior - seis empresas - e também dos seus quatro sócios administradores.
Essa ação civil pública foi elaborada a partir de inquéritos civis de investigações em curso nos três ramos do Ministério Público. Eu falarei sobre as investigações no âmbito do Ministério Público do Trabalho; o Dr. Murillo também falará sobre elas.
Nós recebemos, em setembro de 2021, uma denúncia no âmbito do Ministério Público do Trabalho oriunda de notícias divulgadas pela imprensa, pela mídia e também por conta da CPI da Pandemia do Senado Federal. Essas notícias e também a apuração feita pela CPI da Pandemia do Senado Federal traziam relatos de irregularidades no âmbito trabalhista relacionadas à Prevent Senior e às demais empresas que compõem o grupo econômico.
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No caso específico, as irregularidades trabalhistas eram relacionadas ao assédio moral, ou seja, médicos e, como se apurou também, outros profissionais de saúde estavam sendo coagidos a adotar condutas contrárias à ética profissional - no caso dos médicos, a prescrever o chamado kit covid, composto por medicamentos sem eficácia científica comprovada, aos pacientes da Prevent Senior, não apenas aos beneficiários do plano de saúde, mas também, como apuramos, aos próprios funcionários trabalhadores que, acometidos de covid, foram atendidos nos hospitais da Prevent Senior. Então, havia esse relato do assédio moral e também o relato de irregularidades no meio ambiente do trabalho.
Notadamente, os trabalhadores, mesmo acometidos e com confirmação de diagnóstico de covid-19, com teste positivo, eram obrigados a continuar a trabalhar nos hospitais, ou seja, expondo a risco de contaminação os demais funcionários, pacientes, em sua grande maioria pessoas idosas, e também os próprios familiares desses funcionários e todas as pessoas com quem eles mantivessem contato. E aí o risco de disseminação do vírus se torna exponencial.
Além disso, as denúncias relatavam que médicos e outros funcionários da Prevent não poderiam utilizar máscaras - isso no início da pandemia. Mesmo trazendo suas próprias máscaras de casa, de suas residências, havia ordem para não utilização de máscaras para, supostamente, não assustar os pacientes.
No âmbito do Ministério Público do Trabalho, essa denúncia, uma vez recebida, originou dois inquéritos civis distintos, um relacionado ao assédio moral e outro ao meio ambiente do trabalho. Foi criada, por portaria do Procurador-Geral do Trabalho, uma força-tarefa composta por cinco membros do Ministério Público do Trabalho, entre eles eu e o Dr. Murilo, que somos os promotores naturais desses inquéritos, e, por meio dessa força-tarefa, nós fizemos toda a investigação e a coleta das provas.
Como já mencionou o Senador Humberto Costa, nós tivemos, como provas, os inquéritos civis, inclusive de outros ramos do MP, os relatórios da CPI federal e também da CPI municipal, da Câmara dos Vereadores de São Paulo. Nós tivemos também, como provas documentais, os processos administrativos da ANS, as sindicâncias do Cremesp. Nós ouvimos também quase 60 testemunhas em audiências presenciais na Procuradoria Regional do Trabalho de São Paulo. E nós também obtivemos, a partir dos celulares de algumas dessas testemunhas que nós ouvimos, conversas em aplicativo de WhatsApp de diversos grupos dos quais elas participavam - e essas testemunhas são não apenas médicos mas outros profissionais de saúde, funcionários da Prevent Senior. Nós fizemos a importação dessas conversas de WhatsApp com toda a cautela necessária para manter a integralidade da própria cadeia de custódia, para garantir a efetividade, a validade dessas provas.
Nós fizemos também... Foram analisados pela perícia médica do Ministério Público do Trabalho documentos apresentados pela empresa, como os planos ambientais, o plano de gerenciamento de riscos, o plano de controle médico e saúde ocupacional, e também houve esse cruzamento de dados, que o Senador mencionou.
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Foi realizada uma diligência pelo Ministério do Trabalho e Emprego, acompanhada pelo Dr. Murillo, na sede da empresa, para obter os controles de frequência da jornada de trabalho desses profissionais de saúde que laboravam na empresa. Esses dados foram cruzados com aqueles obtidos da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, sobre pessoas que tiveram exame, teste confirmado para o covid-19. Também foram utilizados nesse cruzamento documentos fornecidos pela Receita Federal. E toda essa análise foi feita pela Secretaria de Pesquisa e Análise de Informação do MPT, inclusive com a criação de um algoritmo específico para fazer essa análise. E o resultado foi que milhares de funcionários da Prevent Senior, entre médicos e outros profissionais de saúde, teriam laborado com diagnóstico confirmado para o covid-19.
Bem, os pedidos formulados na ação civil pública, que foi ajuizada em conjunto - além do dano moral coletivo, cujo valor nós fixamos em R$940 milhões, que corresponde a 10% do faturamento líquido da empresa nos anos de 2020 e 2021, anos de ocorrência das irregularidades -, foram pedidos de natureza trabalhista, essencialmente, para que a empresa se abstenha de praticar assédio moral e adote todos os procedimentos necessários para tanto, como: canal de denúncias; apuração dessas denúncias, preservando a vítima, apurando e punindo devidamente os responsáveis; campanhas; cursos; elaboração de cartilhas para a prevenção e repressão do assédio moral; e também todas as obrigações relacionadas ao meio ambiente do trabalho, sobre as quais o Dr. Murillo poderá falar de maneira mais específica.
E é importante nós ressaltarmos que essa ação foi ajuizada em litisconsórcio, porque o dano moral causado pela empresa, pelas empresas do grupo econômico, é de natureza indivisível, ou seja, foram causados pelas condutas da empresa: danos aos trabalhadores, aos funcionários, cuja tutela é do Ministério Público do Trabalho, mas também aos pacientes, beneficiários do plano de saúde, à saúde pública, tutelada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo; e também os danos advindos da pesquisa com seres humanos sem autorização da Conep, que é atribuição do Ministério Público Federal.
Então é exatamente por conta da necessidade de se produzir uma prova em conjunto, judicialmente, e por ser um dano a direitos tutelados pelos três ramos do Ministério Público - interesse e direitos indivisíveis -, nós fizemos esse ajuizamento conjunto da ação civil pública. Ressalto que antes do ajuizamento foi ofertada à empresa a possibilidade da assinatura do termo de ajuste de conduta relativo às obrigações de natureza trabalhista, mas, como houve a recusa pela empresa da assinatura desse termo de ajuste, seja em relação às obrigações trabalhistas, seja ao pagamento do dano moral coletivo, nós tivemos que ajuizar a ação civil pública.
Eu acredito que meu tempo já esteja no fim, então eu agradeço novamente o convite. Estou aqui à disposição para caso haja perguntas e outras indagações.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Obrigado, Dra. Lorena.
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De imediato, eu passo a palavra ao Dr. Murillo César Buck Muniz, Procurador do Trabalho do Ministério Público do Trabalho.
V. Sa. dispõe de dez minutos para a sua apresentação.
Quando essa campainha toca, está faltando um minuto para a conclusão do tempo da fala.
Com a palavra, Dr. Murillo.
O SR. MURILLO CÉSAR BUCK MUNIZ (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos e todas.
Eu cumprimento todos os presentes na Comissão do Senado, seja por vídeo, seja presencialmente, na pessoa do Senador Humberto Costa.
Gostaria de destacar apenas alguns aspectos aqui relativos a essas investigações, a esse processo, porque não me sobrou muito a falar depois do brilhante resumo feito tanto pelo Senador quanto pela colega Lorena.
A investigação se prolongou um pouco no tempo, a CPI foi um ponto de partida importante para essas investigações, assim como as denúncias na imprensa, que deram um norte para a gente na oitiva de testemunhas, no apontamento de pessoas até dispostas a falarem a respeito do assunto, porque normalmente quem continua trabalhando ou até pacientes têm uma certa dificuldade de expor e falar sobre o assunto. Então, a CPI e a imprensa tiveram um papel muito importante como ponto de partida para as investigações.
Sob o ponto de vista trabalhista, ainda faltava a análise de diversos aspectos técnicos, e essa investigação envolveu uma apuração muito técnica e cuidadosa. Além da oitiva de quase 60 testemunhas no Ministério Público do Trabalho, além da obtenção das provas dos outros inquéritos da própria CPI, e também ouviram várias testemunhas, a gente levou em conta também esses depoimentos, foram requisitados documentos de diversos órgãos e, ao final, ainda o cruzamento de dados a partir do banco de dados da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, que recebia, uniformizava e agregava os dados sobre testagens de pessoas. A partir dos dados da Receita Federal e da empresa, fornecemos esses CPFs de trabalhadores à Secretaria de Saúde; depois de uma tramitação dentro da Secretaria de Saúde, conseguimos a obtenção do banco de dados relativo a esses trabalhadores, de testagem, data de confirmação e etc. Essa me parece a prova mais contundente.
O Senador já destacou aqui alguns números, e eu gostaria de destacar só que esses números são cumulativos. Na verdade, 3.679 profissionais que trabalharam infectados nos 14 dias seguintes à confirmação é o número máximo apurado aí, porque eles abrangem também os que trabalharam nos sete dias e nos dois dias, que são números menores. Mas isso é o número mínimo, é o que foi constatado. Nesse número não estão incluídas as pessoas que não fizeram o teste, as informações que não chegaram à Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo - embora obrigatória a notificação, a gente sabe que não são todas as farmácias que testam ou todos os laboratórios que fornecem esses dados -, além da dificuldade de reunir todos esses dados. Isso representa mais de 10% dos trabalhadores da empresa, que em alguma data trabalharam em período proibido. Então, nós estamos falando aqui de dezenas de milhares de trabalhadores expondo a risco outros trabalhadores, expondo a risco pacientes.
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Eu gostaria de destacar aqui que os pacientes da Prevent Senior são praticamente todos idosos, então têm o risco agravado. E aí a gente está falando de quase 1 milhão de segurados da Prevent Senior com potencial de atendimento pelo plano de saúde e por todos os hospitais do grupo econômico. E desses profissionais a gente pode destacar, desses profissionais e desses pacientes, pelo contato com familiares, com conhecidos e com todas as pessoas com que esses pacientes e trabalhadores têm contato, o potencial de disseminação do vírus covid que foi propiciado pela falta de vigilância e cuidado no ambiente de trabalho.
Um aspecto que também não foi dito anteriormente e eu gostaria de destacar é que não houve a emissão de nenhuma comunicação de acidente de trabalho e nenhuma notificação de agravo à saúde, que também é obrigatória.
Eu considero essas investigações, esse processo um exemplo clássico de invisibilidade de tutela do meio ambiente e proteção à saúde de pessoas, justamente porque, quando não se protege o ambiente de trabalho, primeiramente são atingidos os trabalhadores e também os pacientes, e com isso há um potencial de disseminação enorme entre a sociedade.
O critério para fixação do valor postulado - e aí, agora, a decisão ficará a cargo do Judiciário... Esse valor já havia sido proposto. O Ministério Público do Estado de São Paulo, no âmbito cível, já tem até um termo de ajuste de conduta com a empresa - o Dr. Arthur pode falar melhor sobre isso. Então, as obrigações de fazer e não fazer a tutela inibitória se concentrou na parte trabalhista. Já o dano moral coletivo não foi reparado por meio desse termo de ajuste de conduta no Ministério Público estadual e nem na questão abrangida pelo Ministério Público Federal. Por isso, o ajuizamento da ação em litisconsórcio abrangente desses inquéritos feitos, que tramitaram no Ministério Público do Trabalho, no Ministério Público estadual e no Ministério Público Federal.
Eu gostaria de destacar aqui que a apuração foi muito técnica, cuidadosa e com responsabilidade, a partir de dados concretos. Muitas vezes, nesse tipo de investigação, a gente só tem prova testemunhal, mas a gente conseguiu confirmar todas as denúncias mencionadas pelo Senador e denúncias feitas por profissionais e até por pacientes, por meio de prova também digital, através de conversas de WhatsApp, de diversos grupos da própria empresa - então, tem a prova por escrito daquilo que as testemunhas disseram -, e, além disso, por meio do cruzamento de dados, que envolveu a análise de milhões de informações sobre jornada, sobre testagem de trabalhadores, dados desses trabalhadores, e que confirmou realmente o trabalho de muitos profissionais infectados, volto a dizer, por covid, sem nenhum acompanhamento dessa doença e suas consequências, ou seja, a volta ao trabalho sem nenhum acompanhamento e sem nenhum acompanhamento também por um programa de vacinação minimamente consistente dos trabalhadores. E isso a gente também está postulando para que jamais volte a ocorrer, sob pena de multa de R$100 mil, por obrigação descumprida - essa é a pretensão da ação também...
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(Soa a campainha.)
O SR. MURILLO CÉSAR BUCK MUNIZ (Por videoconferência.) - ... não só em relação à covid mas em relação a qualquer risco biológico dentro das unidades de saúde da empresa.
Com essas considerações, eu agradeço a oportunidade e continuo à disposição. Eu só tenho uma limitação de horário em relação a audiências que eu tenho no período da tarde, a partir das 13h, mas continuo à disposição e agradeço a todos e todas na pessoa do Presidente, Senador Humberto Costa.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Obrigado, Dr. Murillo César. Com certeza, vamos terminar antes de 1h, todos estamos esperando por isso.
Eu passo a palavra agora ao Dr. Everton Luiz Zanella, que é Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo. Ele vai falar não somente em seu próprio nome, mas também em nome da Promotora de Justiça do MPSP Maria Fernanda de Castro Marques Maia e do Promotor de Justiça do MPSP Nelson dos Santos Pereira Júnior.
Dr. Everton, V. Exa. dispõe de dez minutos para sua explanação.
O SR. EVERTON LUIZ ZANELLA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos e a todas. Ouvem-me bem? (Pausa.)
Sim.
Quero agradecer o convite da Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal na pessoa do Senador Humberto Costa; cumprimentar todos os presentes, meus colegas aqui de Ministério Público e os demais que estão presentes nessa sala de reunião virtual e também presencialmente.
Eu quero fazer uma exposição muito rápida até para que todos entendam os objetivos da nossa investigação.
A nossa investigação da força-tarefa de São Paulo é uma investigação conduzida por mim, pela Dra. Maria Fernanda e pelo Dr. Nelson, todos presentes aqui nesta reunião.
A nossa força-tarefa busca apurações na área criminal especificamente. O Ministério Público tem sua atuação na área da saúde pública, representada pelo Dr. Arthur, presente aqui na reunião também; como nós já ouvimos aqui, nós temos aí o Ministério Público do Trabalho fazendo um excelente papel na sua função; e também o Ministério Público Federal, hoje representado aqui pelo Dr. Kleber, trabalhando cada um dentro da sua área.
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A nossa força-tarefa foi constituída em setembro... não, em outubro de 2021, a partir, primeiro, do relatório da CPI federal da covid, que nos foi encaminhado, e também por notícias da imprensa. O nosso procedimento investigatório está chegando ao seu final. Nós pretendemos concluí-lo no máximo até o final de março. Já queríamos ter concluído antes, mas, devido à complexidade, nós estamos em fase de conclusão final. E, nesse ponto, inclusive a ação civil pública movida pelo MPT, com o MP estadual e com o MP federal, nos ajudará bastante também na delimitação de responsabilidades na área criminal.
Eu queria fazer um histórico muito rápido do nosso procedimento. São quase 90 pessoas ouvidas neste procedimento, entre pacientes que sobreviveram obviamente, familiares de pacientes, médicos e outros profissionais de saúde. Inicialmente, nós acompanhamos o inquérito policial que foi conduzido pelo DHPP. Esse inquérito policial, infelizmente - é a nossa visão -, foi concluído prematuramente, mas nós seguimos a nossa investigação própria do Ministério Público. Nós temos um procedimento investigatório próprio que não se confunde com o inquérito da Polícia Civil.
Dentro desse nosso procedimento investigatório, além de todas as oitivas que fizemos, nós também acompanhamos algumas oitivas que foram feitas pela CPI municipal de São Paulo, que era capitaneada pelo Vereador Donato e alguns outros Vereadores, que fizeram um excelente trabalho também; nos encaminharam bastantes subsídios. Nós temos um procedimento - só para que todos tenham uma ideia - que tem mais de 2 mil páginas só de ofícios, certidões, numa aba principal que é dividida em diversos anexos. Nós temos 22 anexos; cada anexo tem subpastas. Só de prontuários médicos, nós fizemos uma análise de 192 prontuários médicos, que são bastante complexos. Não sei se todos também têm conhecimento, mas para cada um desses prontuários alguém da família nos autorizou a pedir diretamente a quebra do prontuário ao operador de saúde, mas, em vários deles, a gente fez por meio judicial. Então, são ações de quebra de sigilo. O prontuário vem e, claro, é analisado por uma equipe médica. Nós tivemos o apoio do Imesc para essa função e de uma equipe médica de Ministério Público que agora nos ajuda a fazer uma leitura das perícias médicas também que são feitas ou foram feitas já pelo Imesc. Os nossos médicos compõem um órgão chamado CAEx, que fez um estudo muito aprofundado sobre os fatos, estudo inclusive que, salvo melhor juízo, está até sendo utilizado na ação civil pública do MPT, da saúde pública, com o MP federal, que é um estudo bastante completo.
Nós apuramos também, no curso do nosso procedimento, que a empresa distribuiu mais de 24 mil kits de covid em domicílio. Grande parte das pessoas que receberam esse kit sequer tinham feito algum tipo de exame ou de consulta médica; alguns tinham feito apenas consulta pela telemedicina. Então, tudo isso foi apurado e, claro, também os medicamentos não eficazes dados em hospitais.
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Mas vejam: aqui, na área criminal, nós temos, então, um certo cuidado. Qual que é o certo cuidado? Ainda que a gente apure que a empresa agiu com uma conduta não adequada em dar medicamentos não eficazes, para haver uma responsabilidade criminal, nós temos que comprovar, no mínimo, que esses medicamentos geraram um perigo de vida aos pacientes, se, claro, não causaram o resultado morte, porque, se causaram o resultado morte, o crime é mais grave.
Então, aí eu já até respondo a uma das perguntas que foram feitas, e perguntaram dos crimes... Eventualmente, pode ter, claro, homicídio culposo, lesão corporal culposa ou o crime de perigo abstrato, do art. 132 do Código Penal.
E até, Senador Humberto Costa, a nossa força-tarefa, na sua conclusão final, que será feita até o final do mês que vem - a gente tem plena convicção disso -, a gente até proporia ao Senado, encaminharíamos um ofício, porque a gente acredita que deve haver uma criminalização específica para o ato de fazer pesquisas não autorizadas em seres humanos, ainda que isso não resulte num resultado lesivo, porque, só de fazer pesquisa sem uma autorização do Conep é algo muito grave, e a gente, estudando toda a legislação penal, a gente não encontra algo tão específico assim. A gente, claro, tem que medir o perigo contra a saúde pública, mas talvez um crime bem específico acho que seria até interessante que fosse levado adiante, se o senhor permite, que a gente encaminhe uma proposição para que isso seja feito... Eu acho que seria bem interessante.
Eu queria também fazer uma observação, que, desses 192 prontuários que nós analisamos, a gente analisou tanto prontuário de pessoas que procuraram o Ministério Público como de pessoas... A gente pegou uma lista de pacientes que faleceram na Prevent Senior no período de março de 2020 a outubro de 2021 - o período que compete à força-tarefa. Foram quase 11 mil pessoas mortas na rede de saúde, 40%, aproximadamente, por covid. E a gente, analisando essa listagem, juntamente com uma equipe médica, nós estamos solicitando alguns prontuários específicos, sem que a empresa soubesse qual seria o prontuário, para que a gente não tivesse aí nenhum tipo de alteração, alguma coisa assim, e a gente fez uma análise bastante contundente.
Fizemos um - vou colocar entre aspas - "pente-fino", para pegar casos mais graves, nos quais a gente entende que pode haver uma responsabilidade, e aprofundar nas perícias. Então, nós temos aí alguns casos, dos quais estamos finalizando a análise agora, nos quais a gente aprofundou bastante com a equipe médica, e eu vou citar aqui, porque estão presentes na reunião, o caso da Suely, o caso do Fábio e o caso da Sra. Irene, porque eu sei que os parentes estão aqui, o Luiz César, a Andreia e a Kátia.
Veja, esses três casos são três dos casos em que nós, efetivamente, nos aprofundamos, por entender ali que as condutas médicas não foram adequadas.
Agora, claro, a gente depende aí dessa prova, como mencionei, de um nexo de causalidade, e a gente está finalizando exatamente essa análise, que é técnica. Vejam: não é uma análise que eu...
(Soa a campainha.)
O SR. EVERTON LUIZ ZANELLA (Por videoconferência.) - ... o Dr. Nelson e a Dra. Maria Fernanda, a gente olha e consegue fazer, porque ela é médica. Então, tem uma equipe técnica muito competente que está ao nosso lado, para a gente terminar essas análises.
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O que eu posso garantir é que nós estamos finalizando e nós apresentaremos um relatório final de tudo o que foi feito, com todos os encaminhamentos possíveis. Aqueles casos em que a gente não apurar responsabilidades, eles serão naturalmente arquivados e os familiares serão comunicados; e aqueles que a gente apurar responsabilidade, nós vamos judicializar essa demanda, como já foi feito pelo Ministério Público do Trabalho, pelo MP da Saúde Pública e pelo Ministério Público Federal.
Então, eu acho que é isso, o meu tempo também está se esgotando.
Senador Humberto Costa, agradeço a sua consideração e o seu convite para o Ministério Público de São Paulo.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigado, Dr. Murillo.
Eu não me manifestei antes, mas o trabalho que o Ministério Público - de um modo geral, tanto o Ministério Público do Trabalho como o Ministério Público de São Paulo e o Ministério Público Federal - tem feito, neste caso, é exemplar, inteiramente digno de elogios.
A contribuição que V. Sa. sugere para nós aqui, eu quero dizer que é até bom que chegue o mais rápido possível, porque nós estamos começando aqui, no Senado, um debate sobre um projeto de lei que altera a legislação sobre a realização de pesquisas clínicas no Brasil. Já foi aprovado na Câmara e está aqui no Senado. É um projeto muito polêmico e essa contribuição poderia cair bem para a nossa discussão aqui, quem sabe para a incorporação da sugestão.
Eu vou passar a palavra, agora, à Dra. Elda Coelho de Azevedo Bussinger, que é Presidente da Sociedade Brasileira de Bioética.
Ela tem um compromisso um pouco mais cedo e nós fizemos aqui uma pequena troca sem qualquer prejuízo.
Então, V. Sa. dispõe de dez minutos para a sua manifestação.
A SRA. ELDA COELHO DE AZEVEDO BUSSINGUER (Para expor.) - Olá, bom dia a todos, bom dia a todas.
Eu gostaria de cumprimentar a todas as autoridades presentes, cumprimentar a sociedade civil, cumprimentar os familiares das pessoas que tiveram suas vidas e os seus corpos violados pela Prevent Senior e por todas as outras instituições que assim o fizeram por todo o país.
Eu gostaria de cumprimentar o Senador Humberto Costa, dizendo, Senador, da minha profunda admiração pela sensibilidade e compreensão que o senhor teve e tem com relação à gravidade do tema e à necessidade de abrir o debate para capilarizar essas informações, para que todos possam ter acesso àquilo que muitas vezes se torna hermético nos processos que não chegam ao conhecimento público. E, nesse sentido, eu digo que as audiências públicas são, de fato, um grande instituto a ser valorizado por nós e que deveríamos utilizar com maior frequência, dando a essas audiências o valor que elas têm do ponto de vista da participação da sociedade.
Eu gostaria de parabenizar o Ministério Público. Na realidade, parabenizar os ministérios públicos pela compreensão de que há interconexões fundamentais que não permitiriam ou que fragilizariam uma ação caso elas fossem picotadas e tratadas cada um buscando o seu próprio lugar, buscando, então, um papel ou exercer o seu papel isoladamente. Importante essa compreensão. Nós precisamos entender que, assim como as polícias precisam se conectar, os ministérios públicos e as entidades precisam se inter-relacionar para que nós possamos potencializar as ações e os resultados; compreender a necessidade de que atuar de forma coletiva é fundamental e indispensável ao alcance da Justiça.
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Eu gostaria de cumprimentar a sociedade civil por entender que direitos não são dados, direitos são frutos de lutas por reconhecimento, direitos são frutos de lutas, muitas vezes, sangrentas. E, nesse sentido, a minha admiração profunda à advogada Bruna Morato e a todas as mulheres que, a despeito de sofrerem profunda discriminação no sistema de Justiça, se colocam como uma potência revolucionária a ter coragem de enfrentar o poder econômico, a ter coragem de enfrentar o massacre que vem de todos os lados quando as mulheres se posicionam de alguma forma - uma mulher corajosa e mulheres corajosas devem ser valorizadas.
As lutas com o poder econômico são sempre difíceis de serem travadas, e essa é uma luta na qual o poder econômico se coloca como ponto principal e nevrálgico, e a Sociedade Brasileira de Bioética de Bioética, que aqui represento, quer registrar que os bioeticistas deste país estão atentos a todos os desvios éticos e jurídicos que comprometem a dignidade e os direitos humanos, e este é um caso farta e largamente comprovado de violações éticas e de violações jurídicas, e não temos nenhuma dúvida com relação a isso.
A pandemia é um momento histórico do qual nos lembraremos certamente por séculos como um divisor de águas em que, no Brasil especialmente, a crueldade humana se manifestou de forma inquestionável, mas a história é pedagógica e deve ser trazida à memória para nos servir de norte e conter nossos impulsos vis de poder e de controle do outro.
Nuremberg precisa ser trazido à memória, ainda que falar no nazismo nos cause incômodos, mas é preciso nos lembrarmos de que os médicos nazistas brincaram de Deus, se sentiram acima do bem e do mal, violaram todos os princípios éticos e jurídicos, apesar de muitas vezes dizermos que eles o fizeram não ao arrepio da lei, mas o fizeram baseados em normativas jurídicas. Eles comprometeram a vida e comprometeram a saúde.
No caso em tela que analisamos, o mesmo aconteceu. Foram ignorados todos os princípios que sustentam e validam o Estado democrático de direito. Violaram o direito à vida. Violaram o direito à saúde. Violaram a integridade humana. Violaram a dignidade humana. Entidades que deveriam lutar pela saúde, em um momento de grave crise, em que a solidariedade social deveria estar posta do ponto de vista da solidariedade constitucional e dos princípios norteadores do art. 5º da Constituição, entidades fizeram associação criminosa com o Governo Federal, um Governo reconhecidamente antidemocrático, um Governo anticiência, um Governo que se utilizou e que foi utilizado pelo poder econômico, contraditoriamente, um Governo anticiência, que se apropriou da ciência, colocando-a a serviço do negacionismo.
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A Prevent Senior - isto está clara e fartamente comprovado - realizou pesquisas com seres humanos, com pessoas idosas, reduzindo-as a menos que cobaias, porque, inclusive, a legislação das cobaias, de animais utilizados em pesquisa, é respeitada e tem critérios éticos e jurídicos para nortear essas pesquisas.
Nem mesmo se fossem animais não humanos, os atos praticados sem observância da ciência e da ética feriram e esqueceram-se do que foi produzido pelo Tribunal de Nuremberg, quando nós saímos daquele tribunal, quando nós temos, hoje, uma Declaração Universal de Bioética e Direitos Humanos, de que o Brasil é signatário, que diz respeito aos princípios da confidencialidade, que diz respeito ao princípio da autonomia, que diz respeito ao princípio de que as pessoas, de que o ser humano têm o direito de saber aquilo que diz respeito a ele mesmo, que diz respeito à ciência e ao conhecimento humano.
Nós chegamos a um estágio fantástico do desenvolvimento humano, mas fomos nos perdendo e retrocedendo do ponto de vista dos valores éticos e morais que sustentam uma sociedade.
Brincaram de deuses. Brincaram de violações do Estado democrático de direito, violando todos os princípios jurídicos que sustentam e que norteiam o nosso sistema.
Estamos vivendo, hoje, um ataque às pesquisas com seres humanos.
O projeto de lei que tramita e que hoje está no Senado mostra como as empresas e como o setor privado...
(Soa a campainha.)
A SRA. ELDA COELHO DE AZEVEDO BUSSINGUER - ... têm interesses em desenvolver pesquisas sem que haja controle da sociedade civil.
Nós corremos risco hoje.
E esta é uma luta da Sociedade Brasileira de Bioética e das entidades de saúde para que nós não possamos repetir o que aconteceu naquele local com pesquisas com cobaias, com pessoas transformadas em cobaias, com células-tronco que foram utilizadas em pesquisas com células-tronco no pulmão, com heparina inalatória, com ozonioterapia em casos contraindicados, com kit covid, com nanopartículas, pesquisas que foram, todas elas, feitas ao arrepio da ética, ao arrepio da lei. E precisam receber o tratamento que merecem, aqueles que fizeram todos esses tipos de violação.
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Essa é a fala da Sociedade Brasileira de Bioética e, certamente, de muitas entidades da saúde pública em nosso país.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigado, Dra. Elda Coelho, pela sua participação, pela sua manifestação, muito pertinente, muito importante aqui para não somente a discussão deste processo, mas para que estejamos em alerta em relação a essas tentativas de inovação na pesquisa clínica que deixam de levar em consideração aspectos tão importantes no campo da ética.
Obviamente, precisamos, sim, promover inovações, precisamos adotar novas regras para que o país não fique em descompasso com o que acontece em termos mundiais. Mas isso não pode, de forma alguma, ser algo que está a serviço meramente do interesse das empresas, considerando as pessoas num lugar secundário.
Mas vamos fazer essa discussão com muita intensidade aqui no Senado Federal.
Eu passo a palavra, agora, ao Dr. Arthur Pinto Filho, que é Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, para que ele faça a sua manifestação.
O SR. ARTHUR PINTO FILHO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todas e todos.
É um prazer muito grande participar desta reunião.
Agradeço o convite para esta audiência pública da Comissão de Assuntos Sociais e cumprimento todos os presentes na pessoa do Senador Humberto Costa, que tem prestado serviços relevantes ao país já há muitos anos.
Eu queria, inicialmente, agradecer o monumental trabalho que a CPI federal fez e que facilitou demais o TAC firmado com a Prevent, no dia 21 de outubro de 2021.
Eu acompanhei aquela CPI praticamente toda. Se eu perdi alguma coisa, foi coisa mínima.
E a CPI me lembrava um pouquinho daqueles velhos jogos de futebol no rádio, em que você ia andando pela cidade e ouvindo, nas casas, as rádios falando de futebol. Eu andava, aqui no meu bairro, e ouvia rádios de carro. Parava para tomar café, as TVs estavam ligadas na CPI, e as pessoas conversavam, falavam, profundamente, sobre as questões debatidas na CPI. A questão do kit covid, aquilo tudo virou realmente um assunto nacional.
Isso facilitou demais o meu TAC, o TAC que o Ministério Público Estadual firmou com a Prevent Senior, que foi num momento muito importante.
No meio da CPI, nós pedimos que a Prevent, através dos seus representantes, comparecesse ao Ministério Público e, juntamente com a Associação Paulista de Medicina, com o Idec e com o Sindicato dos Médicos, entrando no TAC com anuências, nós fizemos o TAC com várias obrigações muito importantes, que foram cumpridas pela Prevent. Isso é preciso que se esclareça.
Entre essas obrigações, havia uma que me pareceu fundamental: ela não enviar ou distribuir o chamado "kit covid", que era composto por diversos medicamentos, entre eles a cloroquina, a flutamida, a ivermectina etc.
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Por que isso foi importante? Porque, assim que a Prevent fala "olha, esses medicamentos, nós não vamos mais distribuir, chega; os nossos pacientes não vão receber mais esses medicamentos", isso foi muito importante porque deu um sinal para a sociedade que, de fato, aquilo que a CPI apurava era verdadeiro.
Esses medicamentos, além de não fazerem bem, eram altamente perigosos, porque, como já se disse aqui, se mandavam esses medicamentos para as casas das pessoas por telemedicina, sem nenhum tipo de análise mais criteriosa. E as pessoas usavam esses medicamentos na fé de que aquilo lhes faria bem.
Então, a primeira obrigação da Prevent foi parar com o envio do kit covid.
A segunda obrigação foi a não realização de tratamentos experimentais com pacientes suspeitos ou confirmados com covid sem autorização prévia e explícita da Anvisa e do Conep. Por quê? Porque aquilo que se apresentou à sociedade como sendo uma análise criteriosa, um serviço que foi feito pela Prevent que comprovaria a eficácia dos medicamentos, ficou comprovado que não era nenhum tipo de coisa séria. Aquilo não servia para absolutamente nada.
Então, ficou muito claro que eles não poderiam fazer mais isso.
Eles atualizaram também os protocolos internos nos moldes das diretrizes da Sociedade Brasileira de Infectologia, da Associação Médica Brasileira e da Associação Paulista de Medicina, isto é, os protocolos clínicos internos que eles utilizavam para fazer tratamentos da covid foram completamente alterados dentro dos moldes das sociedades médicas respeitáveis.
Criou-se também a figura do ombudsman, que existe.
E o mais importante: eles se comprometeram a publicar e a divulgar - e assim o fizeram. Publicaram, em anúncio nos jornais, nas rádios, as seguintes informações: primeiro, "os resultados divulgados pela empresa ou por terceiros acerca da eficácia da cloroquina e da hidroxicloroquina não correspondiam efetivamente a uma pesquisa científica, limitando-se a dados obtidos internamente para cunho estatístico, sem qualquer viés científico; a Prevent [...] não obteve autorização do [...] Conep para a realização de estudos científicos envolvendo a cloroquina [...]; inexiste [...] pesquisa científica" da Prevent que conclua pela eficácia da cloroquina e dos demais medicamentos do kit covid, tampouco que ateste a eficácia do denominado tratamento precoce.
Isso foi publicado nos jornais de grande circulação do país. A Prevent publicou esse documento e informou à sociedade, claramente, que aquilo que se dizia eficaz para o tratamento da covid não tinha eficácia alguma.
Isso gerou na sociedade uma ideia de que, de fato, havia algo errado com aquele negacionismo.
Então, esse nosso TAC foi muito importante naquela ocasião, porque brecou aquela loucura de tratamento alternativo pela covid.
Pois muito bem. Feito isso, já naquela ocasião, nós alertávamos que íamos tentar junto ao Ministério Público Federal e ao Ministério Público do Trabalho uma articulação para gerar uma ação conjunta, porque nós poderíamos, cada qual dos ramos do Ministério Público, entrar com uma ação, e seria péssimo, porque seriam três ações muito parecidas, em três juízos diferentes, ouvindo as mesmas testemunhas, as mesmas perícias. Seria um horror.
Então, nós articulamos, junto ao MPT e ao MPF, essa possibilidade de entrarmos com uma ação civil pública única, e assim fizemos. Por que na Justiça do Trabalho? Porque essa ação civil pública tem, vamos dizer assim, duas classes de pedido. Uma classe é específica do Ministério Público do Trabalho, e os colegas Lorena e Murillo já explicitaram exatamente qual foi o pedido.
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E a segunda classe, aí sim, é um pedido coletivo, nos três ramos do Ministério Público, buscando um dano moral e social coletivo, um valor de R$940 milhões. Para onde vai esse dinheiro? Segundo a ação, esse dinheiro vai, uma vez a ação tida como procedente e, enfim, já não cabendo mais recursos, esse valor vai para fortalecer o SUS. Quer seja o SUS municipal, quer seja o SUS estadual, quer seja o SUS federal. Por quê? Porque essa ação da Prevent gerou dano no país inteiro. Muita gente dizia: "Olha, eu não tomo vacina, eu uso o kit covid, porque a Prevent está dizendo que é muito bom". E alguns também negacionistas começaram a falar disso.
Isto é, as ações da Prevent deram base ao negacionismo, inclusive do ex-Presidente da República, que cansou de dizer, inclusive em fóruns internacionais, que no Brasil se tratava o covid com cloroquina, um vexame internacional, e isso foi uma das bases, foram essas ações desfechadas pela Prevent.
Pois muito bem. Isso está em trâmite. Muito provavelmente vai haver uma audiência de tentativa de conciliação. Nós já tentamos administrativamente essa conciliação, não foi possível. Vamos ver se isso acontece em âmbito judicial.
Eu queria, para terminar, também renovar meus respeitos pela Dra. Bruna Morato, que me auxiliou demais no meu inquérito civil público, algumas certidões estão aqui também, mas a Dra. Bruna foi fundamental porque ela me deu os caminhos de investigação. Eu não sabia, eu não tinha conhecimento exatamente de como funcionava a Prevent. E a Dra. Bruna me auxiliou demais com muita coragem, muita competência técnica, e eu faço questão de, neste momento, renovar meus respeitos.
Eu queria agradecer muito a gentileza, Senador, e me colocar à disposição para eventuais indagações.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigado, Dr. Arthur. Eu queria mais uma vez aqui ressaltar a importância do trabalho que foi desenvolvido pelos três Ministérios Públicos. Nós, inclusive, tivemos a oportunidade de visitar o Ministério Público de São Paulo, em um determinado momento, até para cobrar uma agilidade nesse processo.
E agora, neste momento da investigação, nós estamos absolutamente convencidos de que foi um trabalho extremamente sério que foi feito, que aconteceu no tempo em que era necessário, e eu tenho certeza de que a Justiça levará em consideração as conclusões apresentadas pelos três Ministérios Públicos em relação a esse caso tão rumoroso. A outra coisa que eu gostaria de dizer é que nós que participamos daquela CPI, consideramos que o nosso trabalho ainda não se esgotou. Primeiro, estamos fazendo isto aqui, como uma parte daquilo a que chegamos, em termos de conclusão, e que precisava ser devidamente investigado, como foi.
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Nós sabemos da limitação nossa, na CPI, seja pelo tempo, seja pelos instrumentos para essa investigação; portanto, fizemos um encaminhamento para que o Ministério Público pudesse fazer essa investigação, da mesma forma como fizemos em relação à Procuradoria-Geral da República de então. Infelizmente, muitos dos processos, muitas conclusões da CPI que foram encaminhadas à Procuradoria-Geral da República, com o objetivo de apurar eventuais crimes, sejam do então Presidente da República, sejam dos Ministros de Estado, terminaram por serem arquivadas. E a nossa tarefa hoje será a de, diante de um novo Procurador-Geral da República, pedir o desarquivamento desses processos porque ali o tema da impunidade está muito evidente.
Não houve interesse da Procuradoria-Geral da República de fazer essa apuração.
E agora, com o novo Procurador, é nossa obrigação pedir a ele que reavalie esses processos arquivados e, se possível, faça esse desarquivamento. Mas disso nós vamos cuidar nos próximos dias. Já tive a oportunidade de conversar com alguns integrantes da então CPI e todos têm se manifestado de acordo com essa iniciativa, que deveremos tomar em conjunto.
Bom, dito isso, passo a palavra ao Dr. Kleber Marcel Uemura, que é Procurador do Ministério Público Federal.
V. Sa. dispõe de dez minutos para a sua manifestação e eu quero, de antemão, aqui, agradecer a todos os oradores que se manifestaram dentro desse limite de tempo que nós temos hoje.
Com a palavra o Dr. Kleber.
O SR. KLEBER MARCEL UEMURA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos e a todas.
Obrigado, Senador Humberto Costa, pelo honroso convite. Gostaria de agradecer à Comissão, na pessoa de V. Exa., pelo honroso convite para participar desta audiência pública.
Acho muito importante esse debate, essa transparência e esse diálogo com a sociedade civil.
As questões relacionadas à investigação e à propositura da ação já foram muito bem abordadas pelos meus colegas, nas falas anteriores, de maneira que esgotaram praticamente o que eu teria a dizer nesse sentido.
Então, eu gostaria de tentar responder a duas perguntas que foram formuladas, pelo que, mais ou menos, eu consegui entender, rapidamente.
Uma delas questiona sobre os limites da pesquisa científica em seres humanos.
Então, é justamente esse o papel do Comitê de Ética em Pesquisa e da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, avaliar os riscos e os limites éticos para o desenvolvimento de uma pesquisa científica em seres humanos.
O progresso científico depende de pesquisa científica. Então, a pesquisa científica é necessária. Mas, por outro lado, toda pesquisa científica envolve riscos. Então, é justamente este o papel do sistema CEP/Conep: avaliar esses riscos envolvidos em toda pesquisa científica em seres humanos, verificar se esses riscos são aceitáveis, são toleráveis, se podem ser realizadas essas pesquisas diante desses riscos. Então, se o potencial ganho científico não compensar os riscos do que pode causar à saúde das pessoas envolvidas na pesquisa humana, na pesquisa científica, essa pesquisa não pode ser levada adiante, ela não pode ser aprovada. Então, são esses limites, os limites éticos, que cabe justamente à Comissão de Ética em Pesquisa aprovar. E é por isso - não é por outra razão - que a legislação exige que toda pesquisa científica envolvendo seres humanos seja previamente aprovada por um Comitê de Ética em Pesquisa.
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Em relação à outra questão, sobre as possíveis sanções, o Dr. Everton já expôs sobre as sanções penais, então eu gostaria de falar da repercussão civil. Como o Dr. Everton já falou, realmente essa é uma legislação que prevê uma obrigação, mas não prevê uma sanção expressa na lei, seja do ponto de vista penal, seja do ponto de vista administrativo. Então, apesar de prescrever a obrigatoriedade de se submeter toda pesquisa científica, todo projeto de pesquisa científica em seres humanos à prévia aprovação por um Comitê de Ética em Pesquisa, não há uma sanção expressamente prevista na legislação. Então, talvez, aderindo à proposta do Dr. Everton, talvez se poderia pensar na possibilidade de acrescentar na legislação uma sanção expressa em relação ao descumprimento dessa obrigação. De qualquer forma, como a legislação exige essa prévia autorização por um Comitê de Ética em Pesquisa, o simples fato de realizar a pesquisa descumprindo essa previsão normativa por si só já caracteriza um ato ilícito. E o ato ilícito, se provocar um dano - que, no nosso caso, no caso concreto, se configurou um dano moral coletivo, um dano social -, esse ato ilícito, o que provoca esse dano, exige uma reparação, um ressarcimento, uma indenização deste dano. Então, essa é, do ponto de vista civil, a sanção para o descumprimento desta exigência normativa.
Então, em linhas gerais, acho que eram as perguntas que eu consegui entender, e eu também me coloco à disposição dos senhores, de V. Exa., para quaisquer outros esclarecimentos que se fizerem necessários.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigado, Dr. Kleber. Muito esclarecedora a sua manifestação, inclusive com a preocupação de responder às pessoas que se dirigiram a esta Comissão por meio do e-Cidadania.
Bom, eu vou passar a palavra agora à Dra. Bruna Mendes Morato, que já é uma pessoa bastante conhecida pela sua participação direta nesse processo específico da Prevent Senior. Ela, inclusive, por esse trabalho firme, corajoso, chegou a ser objeto de um processo, e vai poder nos descrever aqui, a partir da sua experiência, como enxerga este momento que hoje vivemos no que diz respeito às investigações relativas à ação da Prevent Senior durante o processo da pandemia.
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Com a palavra, Dra. Bruna, por dez minutos, para a exposição de V. Sa.
A SRA. BRUNA MENDES MORATO (Para expor.) - Assim como os demais, eu gostaria de agradecer pela oportunidade, pelo convite para estar aqui, mais uma vez, abordando esse assunto tão importante. Cumprimento, portanto, a figura do Senador Humberto Costa, por toda a determinação, por todo o engajamento nesse caso, especialmente por todo o tempo que ele dedicou, no curso da CPI, para abordar a questão e para se aprofundar.
Muitos pensaram e acharam, na época, que se tratava de uma denúncia superficial e não conheciam o trabalho que toda a equipe do Senador se preocupou em fazer e se preocupou em aprofundar. Depois, junto com outros Senadores, com outros assessores, e aqui faço ressalva ao importante trabalho do Senador Randolfe, do Senador Otto Alencar, do Senador Rogério e de todos os demais que se dedicaram a esse tema.
Venho para Brasília desta vez com mais alegria e satisfação em saber do trabalho do Ministério Público, da evolução com relação aos relatórios e, especialmente, da unificação das forças-tarefas.
Tenho imensa admiração e respeito pelos promotores envolvidos.
O Dr. Arthur me ouviu numa oportunidade, se não me engano, em abril de 2021, ou seja, meses antes de nós apresentarmos a denúncia à CPI. A denúncia foi encaminhada ao Dr. Arthur, diferentemente daquilo que foi alegado pela própria empresa como sendo uma estratégia para prejudicar a empresa dentro da CPI. A empresa dizia que essas denúncias nunca tinham sido encaminhadas às autoridades, mas que haviam sido encaminhadas diretamente à CPI, fato que não é verdadeiro.
Então, agradeço ao Dr. Arthur por todo o trabalho e dedicação que ele também teve com relação a esse caso, a rápida abordagem com relação ao primeiro TAC que foi assinado pela empresa, precisamente um mês depois do meu depoimento, em outubro de 2021, e, depois, pela dedicação em continuidade desses trabalhos e continuidade com relação à preocupação, ao efetivo dano moral coletivo que, de fato, ocorreu.
Tenho grande admiração e respeito ao trabalho dos promotores do Ministério Público do Trabalho, e faço ressalva ao trabalho da Dra. Lorena e do Dr. Murillo por toda dedicação.
O cruzamento de dados que foi feito foi algo que eu considero sem precedentes. É uma ação civil pública composta, observo aqui, por 37 mil documentos anexados à ação.
Diziam, no início das denúncias, que não tínhamos provas, que eram apenas falácias, que esses médicos eram ex-médicos, e aqui me chama a atenção chamar esses profissionais de ex-médicos.
Não existem ex-médicos. Existem médicos. Alguns que atuaram junto à Prevent Senior, outros que, na época da denúncia, continuavam atuando na Prevent Senior, inclusive médicos que estão até hoje na Prevent Senior e que colaboraram e muito com todo o processo de investigação e que continuam na instituição, justamente em prol da segurança desses pacientes e por preocupação com relação à saúde dos beneficiários, uma vez que não é objetivo de ninguém aqui prejudicar a operadora de saúde, prejudicar o plano de saúde. Na verdade, o interesse de todos nós é que as pessoas, que esses pacientes, que esses beneficiários sejam tratados com a dignidade devida, com o respeito devido.
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Então, eu abro um espaço aqui para agradecer especialmente a alguns médicos que colaboraram e continuam colaborando com as investigações, dado o respeito ao sigilo, o qual me foi solicitado, mas gostaria de agradecer nominalmente aos médicos Dra. Daniela, Dr. Fernando - os dois - e Dr. Sérgio e fazer uma ressalva também aos médicos que sofreram coação, que foram perseguidos, alguns ainda na operadora de saúde, como o Dr. Felipe, que foi obrigado, praticamente, na época da CPI, a fazer uma ata notarial, dizendo que não me conhecia, que não tinha qualquer tipo de contato comigo, e também a coação que os médicos - que aí, sim, haviam sido desligados da empresa - também sofreram, especialmente Dr. Walter, a Dr. Andressa e o Dr. George, que sequer, no início da denúncia, eram responsáveis pelo encaminhamento dessas provas, pelo encaminhamento da denúncia.
Ressalto a coragem, também, desses médicos em assumir para eles a responsabilidade, uma vez que eles eram rostos que poderiam aparecer, já que os demais médicos estavam tentando resguardar o máximo possível o sigilo de que a denúncia dependia e precisava para ser realizada.
Nesse sentido, eu gostaria de demonstrar e destacar aqui a importância da presença da Dra. Elda, porque, desde o início de todo esse processo, nos chamou muita atenção a forma como foram conduzidos esses tratamentos, a forma como esses pacientes e beneficiários foram desrespeitados em seu direito à vida, como muito bem ela disse, em seu direito à dignidade e à saúde. Essas pessoas foram submetidas também, como ela disse muito bem, à condição inferior à de cobaia humana.
Agradeço o trabalho do Ministério Público criminal, que apurou diversos testemunhos, entre eles o da profissional de saúde que me explicou aquela expressão que ficou tão conhecida, de que "óbito também é alta", profissional essa que me explicou como era o funcionamento de toda a equipe da Prevent Senior e como eles transformaram isso num modus operandi, modus operandi esse que era condizente com a cultura organizacional assumida pela empresa, que também foi muito bem desenvolvida no trabalho de unificação dos três ministérios públicos na atuação do processo, que destacaram inclusive um capítulo específico para tratar a respeito dessa cultura organizacional.
Então, eu falo brevemente aqui e retomo as irregularidades praticadas pela empresa, e, felizmente, todos os pontos foram confirmados - da denúncia. Desde a submissão dos pacientes, que sequer tinham a covid positiva, ao receber o "kit covid", à toxicidade desse "kit covid", que também é algo muito preocupante, porque, mais uma vez, esses pacientes não eram submetidos a um tratamento ineficaz; esses pacientes eram submetidos a um tratamento potencialmente letal, e esse que é o risco.
Não se trata de dar um medicamento que não faz efeito; trata-se de prescrever um medicamento que faz mal - faz mal porque estava associado com outros sete componentes, uma vez que o kit, na sua última formação, era composto por oito itens que, de forma associada, eram altamente tóxicos - a uma população idosa e que já fazia uso de polifarmácias.
Uma vez que esses pacientes eram submetidos à utilização desse kit, quando buscavam - em razão do agravamento do quadro clínico - a emergência, em vez de serem internados, eram orientados a retomar o tratamento, ou seja, era reforçada a importância de utilização do kit.
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Esses pacientes não recebiam tratamento adequado e, quando a situação se agravava de tal forma, que não tinha como não internar esses pacientes, esses pacientes novamente eram submetidos a outro conjunto de testes experimentais. E aí, aos tratamentos com nanopartículas, tratamentos com células-tronco, tratamentos com ozonoterapia, tratamento com heparina inalatória e tantos outros que foram feitos de maneira absolutamente inadequada.
E aí destaco especialmente o que aconteceu com os que estão presentes. Então, com o Fábio, o marido da Andrea, que está aqui presente, a D. Sueli, a mãe do Luís, ao Joaquim, filho da Dione, que também está assistido, a D. Joana, avó do Tomás, a D. Irene, mãe da Kátia, e tantos outros que estiveram presentes e foram submetidos a esse sistema de teste.
Então, eu vejo com muita admiração o trabalho da CPI. É um honroso trabalho, e, graças a vocês, eu acredito que situações como essa não voltem a ocorrer. É um precedente que abrimos na história da medicina do país.
(Soa a campainha.)
A SRA. BRUNA MENDES MORATO - Eu acredito que isso dará ensejo a propostas legislativas, como bem colocado pelo Dr. Everton, com o auxílio da Sociedade Brasileira de Bioética, que é fundamental e que, a meu ver, deveria estar presente.
E, finalizando a minha fala, gostaria de agradecer muito o apoio das associações de vítimas, com especial destaque à Associação Vida e Justiça, que tem nos apoiado e tem nos amparado, acompanhado todo o meu trabalho, prestando auxílio não só às vítimas diretas dessa tragédia, mas também às vítimas indiretas, na luta de direitos dessas pessoas e lutando especialmente para que essas propostas cheguem a um ponto em que situações como essa não voltem a ocorrer.
É necessário pensar na proteção social dessas pessoas, desses beneficiários, desses pacientes e na responsabilização dos agentes responsáveis por toda a barbárie que foi, de fato, praticada nesse plano que, desde o início da CPI, foi nomeado como um plano macabro, plano esse que eu continuo chamando de macabro, e hoje já comprovado que, de fato, foi.
Então, mais uma vez agradeço a oportunidade. Agradeço à Dra. Elda pela fala, muito obrigada. Agradeço aos promotores pela participação e me coloco aqui à disposição para o que for necessário.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Obrigado, Dra. Bruna. Mais uma vez, eu quero registrar aqui a nossa admiração pela força, pela coragem, pela competência do trabalho que V. Sa. executou nesse episódio.
Sem dúvida, sem a participação de V. Sa., seria impossível que nós pudéssemos chegar aonde chegamos na CPI, no sentido da apuração do que ocorreu ali, naquele momento, com os pacientes da Prevent Senior.
Eu vou passar a palavra agora à Dra. Andrea Montera, que foi testemunha na CPI da Prevent Senior de São Paulo, capital.
Com a palavra V. Sa. (Pausa.)
Parece que a conexão dela caiu. Eu vou passar a palavra à outra pessoa e, ela voltando, nós restituiremos a ela a palavra assim que essa pessoa concluir.
Então, eu chamo o Dr. Luiz Cezar Oliveira Pereira, que também foi testemunha na CPI da Prevent Senior, na cidade de São Paulo.
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O SR. LUIZ CEZAR OLIVEIRA PEREIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, Senador Humberto Costa.
Agradeço a oportunidade de poder externar aqui o nosso sentimento nesse período em que a gente não ouvia falar, não tinha notícias. Pelo contrário, eram só notícias que nos deixavam pessimistas cada vez que a gente lia uma notícia anterior a essa audiência.
Vocês estão me ouvindo bem?
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Sim, sim, muito bem.
O SR. LUIZ CEZAR OLIVEIRA PEREIRA (Por videoconferência.) - Eu quero cumprimentar respeitosamente a Procuradora Lorena, o Procurador Murillo, o Promotor Everton Luiz Zanella, o Promotor Arthur Pinto Filho, a Promotora Maria Fernanda e o Promotor Nelson dos Santos Pereira; o Procurador Kleber Marcel, a Dra. Bruna Morato, as testemunhas Andrea e Kátia e a Presidente da Sociedade Brasileira de Bioética, Elda Coelho.
Eu estou extremamente nervoso e quero dizer que essa carta vai expressar uma crítica pelo período que nós ficamos - nós, como vítimas - no escuro, né? Sem ouvir, por exemplo, o que o Dr. Everton acabou de falar, dando um prazo de resposta até março.
Então, essa carta foi feita anteriormente ao monte de informação que nós tivemos agora, tá? Então, eu preciso ler esse sentimento, tá bom?
Meu nome é Luiz Cezar Oliveira Pereira. Sou um trabalhador paulistano e filho da Sra. Sueli Oliveira Pereira, morta aos 70 anos de idade, no dia 3 de agosto de 2021, no Hospital da Prevent Senior, na Vila Olímpia, que não tinha inclusive alvará de funcionamento.
No elevador que levou minha mãe até o 8º andar, onde ela foi internada, mal coube sua maca. O que ouvi dos médicos foram informações contraditórias, e, a cada hora, eles surgiam com um novo medicamento, como se ela estivesse sendo usada como um experimento, uma cobaia para testes, simplesmente testes para ver as reações. Não era tratamento.
No hospital, minha mãe tomava remédios que não deveriam ter sido ministrados aos doentes da covid-19, segundo ficou provado tanto na CPI do Senado quanto na CPI da Câmara Municipal de São Paulo. Ninguém melhor que a Dra. Bruna, aqui presente, para falar do assunto.
Segundo o atestado de óbito, minha mãe morreu devido a uma série de complicações, mas tudo desencadeado por uma covid mal tratada, que ficou provado pelo seu prontuário.
Por que estou aqui? Estou aqui para pedir justiça às autoridades, senhores servidores públicos pagos com os nossos impostos para nos dar proteção, para nos fazer sentir cidadão brasileiro.
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Justiça lenta não é justiça. Não posso perder a fé na Justiça brasileira.
Neste momento, dirijo-me ao Ministério Público de São Paulo, que criou uma força-tarefa para apurar e punir os culpados por esse genocídio, que teve repercussão mundial, com centenas de reportagens feitas e publicadas na mídia escrita, falada e televisionada. Portanto, eu peço, principalmente ao MP de São Paulo, que aponte os culpados e ofereça denúncia à Justiça. São quase três anos, quase três anos já se passaram, e até agora nós não temos resposta. Quais são as dificuldades que os senhores tiveram? Hoje é um dia importante para podermos externar todas as dificuldades que os senhores tiveram. Nós precisamos de uma resposta.
Eu quero reforçar, apesar de os senhores promotores já saberem, que minha mãe saiu de um hospital, que tinha toda a estrutura para tratar dela com UTI, que ficava na unidade do Paraíso, na Rua Maestro Cardim, e foi transferida para um hospital que era conhecido - e eu tive o cuidado de consultar, Dra. Bruna, para eu não falar bobagem - como matadouro, o prédio era conhecido como matadouro. Então, levaram minha mãe de um hospital, que tinha estrutura para tratar dela, e a transferiram para um hospital conhecido como matadouro. Então, hoje, depois de estudar, eu lembro que ela entrou pela recepção do prédio - era uma entrada de pedestres -, saiu da ambulância, entrou pela entrada da recepção, levaram-na para o fundo. Nesse fundo, que era visível pela recepção, tinha um lavabo, tinha um banheiro ao lado da minha mãe toda entubada. (Manifestação de emoção.)
Continuando: muito pior do que saber que minha mãe foi morta por maldade, por falta de ética profissional, é saber que os culpados por essa desgraça continuam clinicando, inclusive com cargos na diretoria da empresa, como se nada tivesse acontecido. É o caso, por exemplo, de 20 médicos, que a Câmara de Vereadores de São Paulo pediu o indiciamento de todos eles ao Ministério Público de São Paulo por terem participado de um estudo fraudulento para o Presidente Bolsonaro, dando conta que a hidroxicloroquina era o remédio certo para o combate à covid-19. Bolsonaro apresentou o estudo em cadeia nacional de rádio e TV, distribuiu o estudo para o Brasil, e as consequências foram mais mortes, mas, até hoje, ninguém fala sobre o assunto. Eu preciso ter respostas sobre isso.
Pergunto: por que o MP do Trabalho, o MP da saúde está fazendo soluções mais rápidas? Espero que esta audiência não se torne uma audiência política. Fico na torcida e confio que este evento e informações demonstradas aqui cheguem ao mandatário da nação, ao Sr. Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
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Por fim, eu me solidarizo com cada um e cada uma que perdeu seus entes amados, pelos crimes cometidos durante a pandemia da covid-19, seja pelo Estado brasileiro ou pela empresa de saúde suplementar, que deveria ser fiscalizada rigorosamente por esse mesmo Estado.
O meu agradecimento à Dra. Bruna, ao Renato, ao Eduardo Homem de Carvalho, aos enlutados das associações Vida e Justiça e Avico Brasil, que foram atuantes e continuam sendo. Que a verdade, memória e justiça sejam feitas para as vítimas da covid-19.
Antes de concluir, eu quero lembrar de uma pequena amostra e homenagear citando o nome. Minha homenagem à Dra. Irene Castilho, ao Tercio Felippe Bamonte, à Zuila de Gois, à Policena da Silva Lança, à Terezinha de Jesus Nascimento, ao João Batista Acaiabe, à minha mãe Sueli Oliveira Pereira, ao Joaquim e ao marido da Andrea.
Agradeço, Dr. Everton, o senhor, o Dr. Arthur e a Dra. Maria, precisamos dos senhores, precisamos dos senhores e conto com esse retorno de resposta até março.
Dra. Bruna, muito obrigado. Renato, muito obrigado. Obrigado por todos. Obrigado, Paola Davico. Obrigado, gente. Bom dia.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Obrigado, Dr. Luiz Cezar.
Todos nós aqui ficamos comovidos com o depoimento de V. Sa. e todos nós estamos aqui crentes de que teremos, num espaço de tempo curto, a conclusão de toda essa investigação. Por fim, o desejo de que tudo isso resulte em justiça para os familiares, para o Brasil de um modo geral.
Eu passo a palavra agora à Dra. Andrea Montera Rotta, que estava conosco e caiu o seu link no momento em que ela iria fazer uso da palavra.
V. Sa. tem dez minutos para a realização da sua manifestação.
Estamos caminhando já para o final, teremos ainda a fala da Dra. Kátia Shirlene Castilho dos Santos e do Dr. Walter Correa de Souza Neto, e aí darei o encaminhamento necessário.
Com a palavra, Dra. Andrea Rotta.
A SRA. ANDREA MONTERA ROTTA (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde a todos. Como o senhor já falou, minha conexão caiu bem na hora, parece brincadeira. Eu gostaria de agradecer o convite e dizer que eu espero de todo o meu coração que a Justiça nos dê um mínimo de alento, porque, depois de tanto sofrimento, nós merecemos.
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Eu sempre fico preocupada, eu já chorei aqui, já voltei, as coisas ficam martelando muito, ainda tudo está muito latente. Relembrar tudo o que eu vivi com o Fábio... Colocando só aqui para vocês: o Fábio tinha acabado de fazer 51 anos, e a gente tinha uma fertilização in vitro agendada, então, a Prevent não matou só o Fábio. A Prevent me matou, eu não consigo ter vida, eu só trabalho, trabalho, tomo remédio - eu falei que eu não iria chorar, mas é muito difícil - e eles mataram o meu sonho de ser mãe, de ter uma filha com ele, que inclusive já tinha nome, a Clair.
É muito difícil a gente conseguir seguir com tanto questionamento, achando que nada vai resolver, que nada vai acontecer.
A Prevent Senior zomba de vocês, ela zomba da gente. Eles têm a certeza absoluta de que nada vai acontecer, eles continuam agindo como uma organização criminosa. Então, pelo amor de Deus, eles já brincaram de ser Deus, pelo amor de Deus, façam alguma coisa, ajudem a gente.
É impossível sobreviver ou ser obrigada a acordar todo dia com esse peso de ainda achar que eu deveria ter tirado o Fábio de lá, que ele morreu porque eu não o ouvi. Ele implorou: "Me tira daqui, eles não sabem o que estão fazendo". Então, eu ainda sou obrigada a acordar e a dormir com esse sentimento de que eu deveria tê-lo tirado de lá. Se eu o tivesse tirado de lá, ele não teria morrido.
Então, quer dizer, a Prevent faz tudo o que faz, acaba com a vida da gente, acaba com o sonho, acaba com tudo, e a gente só espera que vocês, pelo amor de Deus, façam alguma coisa, façam isso acontecer, mostrem que o Brasil não é brincadeira, que existe justiça.
Outra coisa, uma frustração muito grande, eu nem gostaria de falar o nome dele, mas é coação à testemunha. O Tadeu está vivo, um dos poucos, dos 11 mil, que sobreviveu e foi coagido nitidamente a dizer que nada aconteceu. Então, é muita indignação, é muita frustração.
Eu peço desculpas pelo meu choro, mas eu sempre acho que eu já chorei tudo, que eu não vou ter mais lágrimas, mas eu não consigo.
Então, eu acho que é isso, o Fábio tinha uma vida pela frente, negligenciaram, internaram o Fábio, porque depois da quinta vez, da sexta vez que a gente voltou, eu gritei, fiz um escândalo, no dia seguinte ele já foi intubado e nunca mais voltou - 51 anos, gente!
Enfim, independentemente da idade, a gente tinha uma vida pela frente e eu ainda estou procurando... (Manifestação de emoção.)
... me entender como gente.
Eu não consigo mais falar.
Perdoem-me.
Dra. Bruna, querida, muito obrigada.
Gente, me desculpa, me desculpa.
É isso. (Manifestação de emoção.)
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O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Obrigado, Dra. Kátia... Dra. Andrea, desculpe.
Realmente, a fala de V. Sa. é muito forte, sensibiliza a todos que a ouvem aqui no Senado Federal.
Eu estou aqui, inclusive, com a presença da Senadora Soraya Thronicke, que participou da CPI.
O nosso compromisso é que, enquanto nós pudermos, nós vamos lutar para que se faça justiça. Entendemos perfeitamente a sua dor, nos solidarizamos com ela e nos comprometemos, até em nome da dor de cada uma das pessoas que foi vítima nesse processo, a lutar para que tenhamos justiça para todos e para todas.
Eu vou passar a palavra à Dra. Kátia Shirlene, que também foi testemunha na CPI do Senado Federal.
Por último, ao Dr. Walter Correa de Souza Neto.
Não sei se a Senadora Soraya quer se manifestar. No momento em que ela quiser... (Pausa.)
O.k.
No final, então, eu darei a palavra a V. Exa..
Dra. Kátia com a palavra.
A SRA. KÁTIA SHIRLENE CASTILHO DOS SANTOS (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos, a todas as autoridades e aos presentes.
Estão me ouvindo bem - não é? Estão me ouvindo?
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Sim, estamos.
A SRA. KÁTIA SHIRLENE CASTILHO DOS SANTOS (Por videoconferência.) - O.k., obrigada.
Eu me chamo Kátia Castilho, sou filha de uma vítima da Prevent Senior, a minha mãe, Irene Castilho, que amava a vida, amava estar com os filhos e netos, com toda a família e que acreditava nessa instituição Prevent Senior.
Eu vou procurar resumir. Eu fiz algumas anotações aqui, mas acho importante relembrar alguns pontos do que aconteceu lá dentro daquele hospital.
Em março de 2021, infelizmente, minhas irmãs e eu vivemos momentos de terror naqueles 37 dias de internação da minha mãe, porque, antes de conseguirmos interná-la, ela passou com uma consulta da telemedicina, relatando os desconfortos que ela teve. Entregaram o kit covid para ela, via motoboy, como todos já têm conhecimento, que tinha vários remédios, a azitromicina, a hidroxicloroquina, a ivermectina, a colchicina, entre outros, e essa receita era assinada pelo Dr. Rafael Souza da Silva, que, depois descobriu-se, assinou várias receitas, descobriram várias receitas no nome dele.
Aí começamos a fazer a medicação dela, tudo certinho, mas percebemos que ela não estava melhorando. Pelo contrário, ela estava piorando. E aí a gente a levou para a Prevent, lá para a unidade da Mooca e, chegando lá, estava muito lotado o hospital, inclusive com pessoas misturadas, pessoas que estavam e que não estavam com covid. O médico a examinou, falou que não havia preocupação, que ela poderia voltar para casa. E, nisso, ficamos mais de três horas lá. Pedimos para ele fazer uns exames mais assim, a gasometria, a tomografia, mas ele achou que não teria necessidade. Voltamos para casa, só que ela continuou com a saturação muito baixa.
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E aí eu liguei para a telemedicina de novo, isso já era mais meia-noite, e aí pediram para... Ela falou: "Eu não posso fazer nada". E pediram para a gente retornar para o hospital. Minha mãe já estava supercansada. Ela ficou lá, ela não tinha lugar para ficar sentada, uma pessoa com mal-estar, com falta de ar, desculpa. E aí a gente resolveu, então, não a levar para o hospital. Vamos controlar a saturação dela, à noite, e de manhã a gente leva para o hospital. Mas nós não sabíamos que nós iríamos receber uma notícia tão triste de que, infelizmente, o meu pai que também estava internado no SUS, com covid, havia falecido. (Manifestação de emoção.)
Ele faleceu, foi um grande... Foi um terror lá dentro de casa, a gente não sabia se contava para a minha mãe - minha mãe mal, para as minhas irmãs. Uma delas foi arrumar toda a documentação do enterro do meu pai, e eu segui para o hospital com a minha outra irmã, internamos a minha mãe, porque eles descobriram que ela estava com mais de 50% do pulmão comprometido. A gente estava dando esse medicamento e achando que estava cuidando. E isso daí é um peso muito grande para a gente, porque fizemos tudo certinho. Mas não, a gente estava matando minha mãe. E isso é muito complicado, é muito difícil a gente aceitar a perda. Eu perdi meu pai, eu perdi minha mãe. Minha mãe confiava na empresa, e mal sabia ela que estava entrando num hospital que ia fazer o que fez.
E aí eu fiz algumas anotações aqui, até pulei algumas já, porque a gente fica nervosa. Vale lembrar que, em março de 2021, já se sabia da ineficácia do protocolo conhecido como kit covid. E o que mais revolta é isso, que a gente deu esse medicamento e nada melhorou.
Além das medicações que compunham o kit covid fizeram experimentação com a minha mãe, com a medicação flutamida, utilizada para câncer de próstata, sem qualquer comprovação científica e indicação para tratamento da covid-19. Perguntamos ao médico quais seriam os efeitos colaterais e se teria alguma contraindicação. Ele falou que para pessoas que tinham problemas hepáticos não era recomendado. Então, a minha mãe já tinha feito uma cirurgia em que ela tinha retirado 50% do fígado. E aí a gente falou: doutor, então a gente não autoriza. Mas, mesmo assim, eu fiquei com ela na enfermaria e teve uma enfermeira que estava dando a flutamida para ela. Eu falei de novo que não podia dar a flutamida, mas, para minha surpresa, minha mãe foi para o UTI e depois que a gente pegou o prontuário, com mais de mil páginas, a gente descobriu que foi dada, por mais de 10 dias, a flutamida para minha mãe dentro da UTI.
Como se já não bastasse isso o que eles fizeram, eles fizeram o seguinte... A minha mãe era alérgica a dipirona, descobrimos também no prontuário... Minha mãe era alérgica a dipirona, assim, estava tudo anotado que ela era alérgica. Se a minha mãe tomasse água em um copo que estivesse com um pouquinho de dipirona ou mal-lavado, ela ficava toda inchada. E a gente descobriu que eles deram, de seis em seis horas, a dipirona para ela, na UTI. Inclusive, eu tenho fotos aqui para provar isso, eu não vou apresentar, mas eu tenho fotos. A minha mãe... Eles enfaixaram toda a mão da minha mãe, as duas. Nós perguntamos o porquê daquilo, e aí pedimos para retirar a faixa. Estava todo roxo o dedo dela, a mão, e foi comprovado que foi um choque anafilático que deu na minha mãe. Minha mãe acabou falecendo no dia 26 de abril e nunca me conformei com o que aconteceu naquele lugar.
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Fiquei em busca de ajuda. Procurei a Abric Brasil para obter informações, e foi quando me indicaram o Guilherme Balza, que estava dando uma ajuda. E aí eu descobri que tinha muita gente que era vítima, muita vítima, o que deixou a gente mais ainda desesperado.
Deixa eu colocar aqui porque eu me perdi um pouco. Bom, a CPI da covid também foi muito importante. Eu assisti a quase todos porque eu queria saber o que tinha acontecido com a gente no Brasil. E aí, a gente descobriu. Através da CPI da Pandemia, descobrimos episódios fatais e não isolados que faziam parte de uma engrenagem de poder e política muito maior. E principalmente envolvia o enriquecimento vertiginoso da operadora de saúde, gabinetes paralelos dentro do Governo Federal, incentivo e venda de cloroquina em massa bem como de outras medicações, além de promover desinformação da população sobre medidas contra a covid, inclusive o incentivo contra a vacinação.
Quisera eu, se meu pai e minha mãe tivessem chance de terem sido vacinados, porque eles não tiveram a chance, infelizmente. Passamos dias terríveis durante a pandemia, mas eu queria agradecer porque eu me sentia como se eu estivesse num buraco, gritando e ninguém me ouvindo. Mas eu não posso deixar de agradecer às pessoas que nos ouviram e nos deram voz, como a Paola, da Associação Abric Brasil; o Renato, da Associação Vida e Justiça; o Jornalista Guilherme Balza, a Dra. Bruna Morato, que sempre foi muito corajosa, muito empática e solidária, os Senadores da CPI da Covid, que foi algo fundamental para que descobrissem todos esses absurdos cometidos, e ao Ministério Público de São Paulo.
E, assim, eu não posso deixar de mencionar também o caso do Joaquim, o Quinzinho, filho único da D. Dione, que era piloto da Prevent Senior e teve seu pulmão perfurado quando foi entubado, além da demora no atendimento. Não estamos aqui apenas para visibilizar a nossa dor, mas também para pedir ao Estado brasileiro que faça justiça, pois o que aconteceu com nossos familiares mais parecia um projeto de extermínio e experimentação clínica, no qual os criminosos que o executaram acreditavam profundamente que o poder econômico o qual disputavam os blindaria, deixando-os impunes.
Senhoras autoridades, peço encarecidamente que as investigações continuem, sobretudo na esfera criminal, pois só teremos o mínimo de justiça quando essa máfia da saúde estiver presa e condenada para que nunca mais isso aconteça com ninguém.
Obrigada, Senador Humberto, pelo espaço e obrigada por me ouvir.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigado, Dra. Kátia. Também a manifestação de V. Exa. é profundamente importante e nos sensibiliza a todos. E reafirmamos esse nosso compromisso de ir até o fim, nós lutarmos para que tudo seja esclarecido e os responsáveis por essa tragédia nos diversos níveis sejam responsabilizados.
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O último a falar, o Dr. Walter Correa de Souza Neto, é médico, foi médico da Prevent Senior, e foi testemunha aqui na CPI do Senado.
Logo após sua fala, eu vou conceder a palavra à Senadora Soraya Thronicke para que nós possamos já ir nos dirigindo para o final dos nossos trabalhos de hoje.
Dr. Walter, com a palavra.
O SR. WALTER CORREA DE SOUZA NETO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos. Primeiro, quero agradecer ao Senador Humberto, aos promotores, à Dra. Bruna, que foi quem nos auxiliou nisso e permitiu que essa denúncia fosse capaz, também. E quero me solidarizar com os familiares das vítimas que estão aqui também, só Deus sabe a dor que eles estão sentindo pela perda dos familiares.
Eu acho que a minha fala, agradeço por esta oportunidade de me manifestar aqui, mas a minha fala acho que tem que ser mais no sentido de fazer um alerta sobre o que ainda está acontecendo. Apesar do que está sendo feito aqui hoje, a Prevent permanece num crime continuado, como colocou a Andrea; a Prevent continua nos coagindo.
Depois disso, a gente sofreu uma série de processos. Eu tenho processo no CRM, tenho processo por danos morais, tenho um processo de R$300 mil, que é maior do que a soma de todo o meu patrimônio, entendeu? Inclusive, onde a Prevent pôde nos prejudicar, a Prevent nos prejudicou. E quem denunciou, os médicos, a Dra. Andressa, o Dr. George, perderam trabalhos, tiveram que se mudar, tudo por causa de perseguição, enquanto as pessoas que são responsáveis por isso continuam na Prevent sem nada ter acontecido.
O que a gente viu até agora - aliás, agradeço ao Dr. Murillo e à Dra. Lorena-, a única ação concreta que a gente viu até agora foi essa denúncia do MPT. Agora, a gente continua aguardando alguma ação. A Prevent vê ações como essa que nós estamos fazendo aqui e, do ponto de vista da Prevent, os cães ladram e a caravana passa. A Prevent continua absolutamente impune.
Aliás, entendo que o Dr. Éverton, a Dra. Maria Fernanda e o Dr. Nelson estão trabalhando nisso, eles já nos receberam algumas vezes, nos ouviram, ouviram as nossas angústias, prestaram contas de que o trabalho continua sendo feito, que as investigações estão em andamento, mas é uma coisa muito angustiante ver que nada acontece com a empresa enquanto a gente sofre isso.
A Dra. Bruna citou ex-médicos, que não gostam que se use o termo "ex-médicos", mas a Prevent Senior, com processos contra mim no CRM, de fato, quer que eu me torne um ex-médico. Eles chegaram a... Pouco depois das denúncias, há algum tempo, há até pouco tempo, eu recebia mensagens de colegas que trabalharam comigo na Prevent Senior: "olha, não faça denúncias como ele fez, porque, se você fizer, você vai perder o CRM igual ele vai perder, porque nós vamos caçar o CRM dele". É essa a ameaça da Prevent, a Prevent continua fazendo isso.
Eu recebi, há pouco tempo, outro processo do CRM sem pé nem cabeça de outra denúncia da Prevent Senior que não tem absolutamente embasamento nenhum no CRM, e a gente sabe qual vai ser esse desfecho lá. Se não fosse a Dra. Bruna a me ajudar com os processos, eu não teria condição financeira nem de arcar com os custos de advogado para me defender nesses processos, entendeu? Agora, a gente não vê uma ação. Eu entendo que, se houver um mínimo de justiça, a Prevent deveria ser responsabilizada por isso, por essa coação à testemunha que é tão evidente. O Tadeu, que foi falar comigo, que também foi ouvido na CPI da Prevent junto comigo, que foi vítima e para quem foram prescritos cuidados paliativos sem indicação e a família não permitiu, felizmente sobreviveu, e a gente se tornou amigo depois da CPI. Ele estava simplesmente arrasado e desesperado com os processos da Prevent em cima dele. Tinha um processo de R$100 mi. e ele não tinha como pagar aquilo, estava desesperado. Ele foi coagido e aceitou assinar um acordo absurdo, dizendo coisas absurdas a respeito da Prevent - foi absolutamente coagido. Assim, isso está registrado em papel. Logo depois de tentarem fazer esse acordo com ele, eles me ligaram. Eu tenho a gravação da ligação do Dr. Antônio, que responde por algum cargo de diretoria hoje na Prevent, com conexões políticas importantes, já foi político, Prefeito de cidade do interior de São Paulo. A Prevent continua com tentáculos onde se imaginar dentro da sociedade, influenciando a sociedade nos bastidores de formas que a gente não imagina, e tentou um acordo comigo também, o qual eu recusei, porque eu jamais vou fazer acordo com bandido. Agora, é muita indignação ver esse tipo de coisa, e, assim, a gente não vê uma ação nesse sentido.
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A ameaça do Pedro, por exemplo, que foi gravada e a gente transmitiu isso na CPI, entendeu? Eu acho que esse caso está sendo revisto atualmente pela Promotoria, mas ele tinha sido arquivado, entendeu? E o Pedro, que era o superintendente da Prevent, um dos responsáveis, que foi indiciado pela CPI por crimes contra a humanidade, continua recebendo um cala-boca da Prevent até hoje de R$154 mil por mês, mesmo tendo sido "demitido" da Prevent - entre aspas.
Então, assim, a gente vê as pessoas que fizeram toda essa tragédia e que levaram a tragédia a inúmeras famílias assim, como se nada tivesse acontecido, enquanto quem denunciou está passando um inferno. Isso é absolutamente... não tem como não ficar indignado, entendeu? A gente vê qual é o poder econômico da Prevent Senior. Você tem um poder econômico muito grande na mão de pessoas que não têm nenhum escrúpulo.
A gente vê o que aconteceu no inquérito da Polícia Civil, que é um inquérito, no mínimo, suspeito. Eu, aliás, fui policial civil por dez anos e, apesar de saber que existem pessoas com reputação absolutamente ilibada dentro da Polícia Civil, onde a gente tem pessoas absolutamente honestas, infelizmente a gente sabe que comprar uma autoridade policial no Brasil não é caro; é algo barato, ainda mais por uma empresa bilionária como a Prevent Senior. Então, assim, isso é o que foi apurado, não houve nenhuma corregedoria, não houve nada depois do que aconteceu também, depois daquela decisão absolutamente estranha.
Então, assim, eu queria reforçar os pedidos - o pedido do Luiz -, para que o MP, quando for fazer as denúncias criminais, que, por favor, atente-se para essas coisas, que seja o mais rígido possível. A gente ouve às vezes coisas como: "Ah, a Prevent é muito grande para quebrar. A gente vai deixar esses pacientes assistidos." E, às vezes, isso caminha num sentido de que não se vai fazer nada com eles. Não está acontecendo nada. Os médicos que estão envolvidos lá e que participaram até inclusive... Uma das revoltas do Tadeu e de ter aceitado essa coação foi porque nada tinha acontecido com a médica que instituiu os cuidados paliativos nele sem indicação. Igual ao Tadeu, com quem aconteceu isso, eu fiquei nove anos na Prevent, e eu posso dizer para vocês que esses casos talvez sejam centenas, talvez sejam milhares de pessoas que passaram por esse tipo de tratamento sem indicação.
Não é possível que uma empresa como essa vá continuar funcionando, que os donos da empresa continuem bilionários sem nenhum tipo de ação contra eles, que eles continuem nos coagindo. Eu provavelmente, inclusive, vou tomar outro processo por estar falando aqui hoje. Todas as vezes que eu me manifestei publicamente, a Prevent me processou, e isso provavelmente vai acontecer de novo. A Prevent quer calar a gente de qualquer forma, de qualquer forma.
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Enfim, o que eu espero é que isso, realmente, resulte em alguma punição para a Prevent. Eu não vejo nada como mais justo do que a empresa acabar e esses pacientes terem... E os donos da empresa serem responsabilizados criminalmente. E, quanto a pessoas que foram indiciadas pela CPI, que esse indiciamento, realmente, continue pelo MP, e que isso siga na Justiça, que não fique somente de uma forma simbólica.
É isso. E é o que eu espero. Desculpe se eu fui muito contundente, mas é uma situação difícil que a gente tem passado, e a indignação é muito grande. Mas é isto: espero que as coisas caminhem num sentido mais positivo.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigado, Dr. Walter, é muito importante a manifestação de V. Sa. Aliás, V. Sa. teve um papel muito importante na CPI. De forma corajosa, denunciou a Prevent Senior e continua nesta luta, que, nós sabemos, ao final terá sucesso, e nós vamos conseguir fazer justiça.
Eu vou conceder a palavra à Senadora Soraya Thronicke. Ela foi integrante da nossa CPI, teve um papel destacado naqueles trabalhos, e eu agradeço a sua presença hoje, aqui, nesta audiência pública cujo objetivo é, exatamente, reforçar a necessidade de aprofundamento das investigações e de responsabilização das pessoas que deram caso a essa tragédia.
Com a palavra, a Senadora Soraya Thronicke.
A SRA. SORAYA THRONICKE (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - MS. Para interpelar.) - Bom dia, Sr. Presidente, Senador Humberto Costa.
Bom dia, Dra. Bruna Mendes Morato. É um prazer revê-la, mas eu gostaria de rever todas essas pessoas em uma situação melhor, depois de praticamente quatro anos.
Gostaria de parabenizar o Senador Humberto Costa pela iniciativa desta audiência pública e a iniciativa dos nossos trabalhos a partir de agora. Nós devemos nos empenhar e cobrar o Ministério Público de São Paulo, para que tome providências criminais, porque esse crime está a ponto de prescrever. É triste demais essa situação. Não há justificativa, depois de tantas provas. São robustas; é público e notório.
É com muita indignação e com muita tristeza que eu gostaria de lembrar à população brasileira algumas, apenas algumas frases do ex-Presidente Jair Bolsonaro sobre a questão da covid.
Ele disse, no dia 20 e também no dia 24 de março de 2020, que não passava de uma "gripezinha".
Em 20 de abril, quando foram questioná-lo sobre isso, ele disse que não era coveiro - vocês se lembram disso.
Em 28 de abril de 2020, ele falou: "E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê?".
No dia 19 de maio de 2020, ele fez um trocadilho engraçadinho com cloroquina e tubaína.
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No dia 10 de novembro, ele disse que era um país de maricas, e falava do superdimensionamento da covid. Já tinham morrido 162.829 pessoas.
No dia 17 de dezembro, ele fez aquela fala sobre jacaré, sobre mulher ter barba - de quem tomasse vacina - e que, se acontecesse qualquer coisa desse tipo, a culpa não era dele.
No dia 11 de fevereiro de 2021, ele falava: "Tem gente aí na pilha da vacina! Esse povo é idiota".
No dia 4 de março de 2021, ele falou: "Vai comprar vacina, só se for na casa da sua mãe!".
No dia 4 de março de 2021, ele falou a famosa frase: "Chega de frescura e de mi-mi-mi! Vão chorar até quando?".
No dia 17 de maio, ele disse: "Até hoje" - naquele momento - "tem alguns idiotas que ainda ficam em casa". E naquele momento eram 436.537 mortes.
No dia 24 de dezembro de 2021, ele falou que não havia mortes suficientes de crianças que justificassem a vacinação para as crianças.
No dia 22 de janeiro de 2022, ele falou: "Lamento profundamente sobre essas mortes, mas o número é insignificante". Eram 622.801 mortes.
E em duas ocasiões, em 2021, nos dias 6 e 18 de maio, em duas lives, ele imitou pessoas morrendo com falta de ar.
Nós trabalhamos arduamente na CPI da Covid. Fizemos um trabalho robusto. A Dra. Bruna e outros médicos, várias pessoas foram, inclusive, perseguidas e ameaçadas. O Exército, naquela produção desenfreada de cloroquina, deixou vencerem 83 mil comprimidos.
Eu gostaria de lembrar aqui o nosso saudoso Major Olimpio, que morreu de covid, meu grande amigo; o Senador Arolde de Oliveira; o Senador José Maranhão; a Luciana de Jesus Oliveira da Cunha, esposa do meu motorista, que teve o seu bebê numa segunda-feira, se não me engano, e, na outra segunda-feira, faleceu de covid. Graças a Deus, o Mateus está forte, mas está sem a mãe.
Mas ele tem um pai. Quantos órfãos existem? Cadê esses números exatos? O que nós estamos fazendo para ajudar esses órfãos? Irmãos foram separados, porque um avô ou outra tia não tinham condições de ficar com todos os irmãos. Famílias dilaceradas!
Quero lembrar aqui também o meu amigo e irmão da minha comadre Giuliana, o Luiz Maurício Mendonça de Faria, que deixou dois filhos também.
Quero também lembrar ao povo brasileiro que empatia e compaixão é algo que, numa nação como a nossa, que é formada de um povo cristão, de um povo afável, é o mínimo que nós esperamos; respeito pelas pessoas. É o mínimo que nós esperamos: respeito pelas pessoas que perderam entes queridos. Se você não perdeu nenhum ente querido, nenhum amigo, feliz de você. Nossa! É tudo por que a gente torcia e sempre trabalhou. Mas a falta de empatia que a gente percebe em muita gente que diz "Deus, Pátria, Família" é chocante. As pessoas não se lembrarem desse número de mortes... E a gente ter provas robustas, e esse crime prescrevendo...
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Eu peço aqui ao Dr. Everton Luiz Zanella, membro do Ministério Público de São Paulo...
Não é ele que vai julgar. O Ministério Público oferece a ação penal. O julgamento virá depois. Por que não oferecer? Esta é a pergunta: por que não ofereceu até agora? Esta é a pergunta que ele deve nos responder.
E que todos os juízes, servidores, deem prioridade, Dra. Bruna, para que essas famílias sejam ressarcidas moralmente. Esse dinheiro, quase R$1 bilhão, não vai mudar a realidade dessas pessoas e para cada uma delas vai ser pouco perto do drama e da perda que tiveram. Mas, Senador Humberto, Presidente, eu quero me unir a V. Exa. para que possamos cobrar, mas cobrar mesmo, sob pena de cometimento de prevaricação. Então, temos que buscar também o CNJ, o CNMP, para que tomem uma providência, urgente - urgente.
Então, é duro ouvir tanto choro e saber que a dor dessas pessoas... Isso volta muito forte em mim, e eu me sinto muito mal, Senador Humberto, como Senadora ainda, por a gente não ter conseguido avançar. Que possamos, definitivamente, avançar.
Eu peço que possamos entregar, inclusive, Senador, novamente, o relatório final da CPI para o atual PGR. Que possamos fazer essa visita - vamos marcar - a Paulo Gonet, e ao CNMP e CNJ. Vamos tomar essa atitude agora: entregar; reviver esse momento, tão triste e tão trágico, porque nós temos que dar uma resposta para essas famílias.
Obrigada, e desculpem-me por qualquer coisa.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Obrigado, Senadora Soraya. Muito pertinente a fala de V. Exa. Muito importante essa retrospectiva dos fatos que V. Exa. fez aqui.
Dá até para nós uma oportunidade de colocar a par a população sobre algumas das iniciativas, entre elas o projeto de lei que garante uma pensão para os filhos de vítimas da covid, que está na Comissão de Assuntos Econômicos, aguardando um Relator. Precisamos conversar com o Presidente da Comissão para que essa designação aconteça logo. E fico muito contente com a disposição de V. Exa. de irmos todos ao Ministério Público Federal, à Procuradoria-Geral da República, pedir o desarquivamento daquelas ações que foram rejeitadas pelo Ministério Público, pela Procuradoria-Geral da República. Já fizemos um levantamento sobre quais são essas ações e precisamos agora ter uma conversa, entre nós que compúnhamos aquele chamado G7, para marcarmos uma data e irmos até o Procurador para cobrar.
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O Dr. Everton pediu um espaço aqui para que ele pudesse se manifestar, responder algumas questões. Eu acho que é pertinente. E, após a fala dele, nós poderíamos concluir os trabalhos de hoje, lembrando que nós vamos realizar uma segunda audiência pública sobre esse tema e vamos continuar acompanhando de perto esse trabalho do MP.
Dr. Everton.
O SR. EVERTON LUIZ ZANELLA (Por videoconferência.) - Boa tarde, me ouvem?
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Pode ser cinco minutos - o senhor acha que consegue?
O SR. EVERTON LUIZ ZANELLA (Por videoconferência.) - Sim, Senador, é coisa rápida.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Obrigado.
O SR. EVERTON LUIZ ZANELLA (Para expor. Por videoconferência.) - Na verdade, a nossa fala já foi feita, em dez minutos, eu não sei se a Senadora Soraya chegou a ouvir a nossa fala, mas eu pedi a palavra porque ela nos acusou de prevaricação, então é necessário que seja dada uma resposta.
O Ministério Público trabalha muito sério. Quando a Senadora diz que basta oferecer a denúncia, que quem julga é o juiz; denúncia não pode ser algo irresponsável. A gente não pode denunciar alguém sem responsabilidade. É muito fácil falar num palanque, mas temos que trabalhar duro, e nós estamos trabalhando duro.
Como eu falei aqui no começo, nós analisamos mais de 192 prontuários e estamos com uma equipe médica muito qualificada. Nós estamos analisando ponto por ponto - tem prontuário de mais de mais de 10 mil páginas -, e estamos fazendo tudo isso sem prejuízo da atribuição normal. E trabalhamos dia a dia, muito duro, nesse caso. Ninguém está prevaricando em momento nenhum. Estamos, inclusive, nos reunindo com os familiares com certa frequência. Ontem mesmo atendemos uma delas. Nós estamos avançando muito na investigação, prometemos a conclusão até março e vamos concluir até março, que é o prazo que a Procuradoria-Geral nos deu, porque o mandato do atual Procurador-Geral vence em abril. Então, estamos trabalhando dentro deste prazo.
Há uma grande dificuldade. Muitas das provas que nós já colhemos foram utilizadas na ação civil pública do MPT, com o MP da Saúde - o laudo do CAEx, o ofício da empresa Master. Estamos trabalhando sério, sim; estamos trabalhando duro, sim. Os crimes não estão perto de prescrever. Quem diz isso é porque não conhece o direito penal. Nós conhecemos o direito penal, e os crimes não estão perto de prescrever. Nós vamos denunciar com muita responsabilidade os casos que têm que ser denunciados e vamos promover o arquivamento, fundamentadamente, dos casos que têm que ser arquivados. Podem confiar no Ministério Público.
Alguns estão aqui: a Dra. Bruna está aqui e conversou com a gente várias vezes, está aqui a Sra. Kátia, está aqui o Sr. Luiz, está aqui a Sra. Irene. Estamos assumindo a responsabilidade junto a eles de trabalhar da forma mais correta e com o maior empenho possível.
Demora? Demora, porque a investigação é complexa, mas o Ministério Público não está prevaricando, o Ministério Público não está fazendo corpo mole nessa investigação. Muito pelo contrário. O Procurador-Geral nem precisaria fazer essa força tarefa; ele a fez porque acredita que tem que ter uma investigação séria. E tanto eu, como a Maria Fernanda e como o Dr. Nelson somos muito responsáveis. Não temos problema nenhum com a Corregedoria.
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Se quiser ir até ao CNMP, que vá - que vá! Eu faço questão que vá mesmo. Aliás, se for o caso, a gente mesmo encaminha, para ver como o trabalho é sério e como está sendo feito.
É isso, Sr. Senador.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Bem, nós não queremos estabelecer uma polêmica, mas a Senadora Soraya Thronicke foi citada, e eu queria passar a ela a palavra.
Após essa manifestação, nós concluiremos.
Com a palavra, V. Exa.
A SRA. SORAYA THRONICKE (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - MS. Pela ordem.) - Eu apenas gostaria de dizer ao Promotor de Justiça que eu disse que, diante da farta documentação - que eu acredito que nós tenhamos, sim...
A SRA. BRUNA MENDES MORATO (Fora do microfone.) - São 37 mil documentos.
A SRA. SORAYA THRONICKE (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - MS) - São 37 mil documentos que foram juntados; a documentação é farta.
E o que eu disse foi que... Eu perguntei por que ainda não ofereceu denúncia, sob pena de prevaricação - é só voltar o vídeo. Sob pena; não o acusei de prevaricação. Eu fiz perguntas, e ele veio responder. Eu não acompanhei a fala do Promotor; por isso, eu fiz a pergunta e disse - vou repetir -: sob pena de cometimento de prevaricação.
Então, a Dra. Bruna está aqui reiterando que foram 37 mil documentos enviados. É lógico que eles devem ser lidos e devem ser robustos.
Mas a outra questão que é importante destacar é que este crime prescreve, segundo a advogada, em quatro anos - qual artigo é, doutora, a senhora se recorda?
A SRA. BRUNA MENDES MORATO (Fora do microfone.) - São os crimes...
A SRA. SORAYA THRONICKE (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - MS) - São os crimes de menor potencial ofensivo, porque eu acho que vai ser individualizado cada um.
Então, nós também, Dr. Everton, somos responsáveis nas nossas falas e nos nossos deveres.
Nós iremos, sim. E, se o senhor já puder adiantar o trabalho, envie para o Ministério Público, envie para o CNJ, para o CNMP também, porque, sim, nós iremos cobrar uma atitude dos órgãos que podem tomar alguma providência.
Muito obrigada, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Humberto Costa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Obrigado, Senadora Soraya Thronicke.
Quero agradecer a presença de todos e todas que participaram desta audiência pública. Foi muito importante, muito relevante. Nós vamos, inclusive, dar mais publicidade aqui a esta audiência pública pelas redes sociais do Senado e dos Senadores, enfim.
Lembro que amanhã, às 9h, teremos reunião extraordinária desta Comissão, destinada à deliberação de proposições.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião.
Muito obrigado a todos e a todas.
(Iniciada às 10 horas e 12 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 35 minutos.)