28/02/2024 - 2ª - Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática

Horário

Texto com revisão

R
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a 2ª Reunião da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática do Senado Federal da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A presente reunião se destina à realização de audiência pública para debater acerca da Assembleia Cidadã Brasileira sobre edição genética e seus desdobramentos, em cumprimento ao Requerimento nº 33, de 2023, de minha autoria. O público interessado em participar desta audiência pública poderá enviar perguntas ou comentários pelo endereço www.senado.leg.br/ecidadania ou pode também ligar para o 0800 0612211.
R
Encontram-se presentes no Plenário desta Comissão - e eu já vou nominá-los e convidá-los a participar aqui da mesa - os nossos expositores.
Vou chamar aqui o Sr. Ricardo Fabrino Mendonça, que é professor da Universidade Federal de Minas Gerais. Está presente ou é virtual? Remoto. Está presente aqui remotamente.
Eduardo Romano, convido-o para participar. Ele é pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), representando aqui o nosso Francisco José Lima Aragão. Seja bem-vindo, Eduardo.
Também convido aqui para participar o nosso representante da Universidade Estadual de Londrina, Galdino Andrade Filho, para ocupar aqui a mesa.
Remotamente, nós temos o Ricardo e também a Soraia Feliciana Mercês, que é professora de Educação Infantil da Prefeitura de Belo Horizonte, e também o Leonardo Melgarejo, doutor em Engenharia de Produção e representante da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA).
Eu vou inicialmente já passar a palavra, remotamente, ao nosso querido professor da Universidade Federal de Minas, Ricardo Fabrino Mendonça. O senhor tem dez minutos prorrogáveis. Está ouvindo bem, Dr. Ricardo?
O SR. RICARDO FABRINO MENDONÇA (Por videoconferência.) - Muito bem. Vocês me ouvem bem?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Estou ouvindo bem.
O SR. RICARDO FABRINO MENDONÇA (Para expor. Por videoconferência.) - Então, muito bom dia a todas e todos. Eu queria agradecer e cumprimentar V. Exas. da Comissão de Ciência e Tecnologia. Agradeço especialmente ao Senador Izalci Lucas, que nos recebeu na qualidade de integrante da Comissão e fez o requerimento para esta audiência.
A minha fala nesta audiência não é uma fala essencialmente sobre edição genética, mas ela é uma fala sobre a importância de participação democrática quando nós discutimos pesquisa e divulgação científica.
Cada vez mais se aposta em uma ciência mais próxima dos cidadãos e das cidadãs para ser mais efetiva e melhor. Não se trata apenas de cientistas ensinando e mandando o que as pessoas têm que fazer, porque isso se mostrou, em diversos momentos da história, inadequado e ineficiente, e existe uma crescente aposta nas tentativas de aproximação entre cientistas e cidadãos para produção de conhecimento.
Por outro lado, existe também uma aposta crescente - esse é o lugar do qual eu falo fundamentalmente - em que a democracia precisa escutar aqueles e aquelas que são afetadas por decisões políticas. Cidadãos e cidadãs não são especialistas, mas são afetados por decisões e por desenvolvimentos da ciência e têm algum saber relevante para a tomada de decisões. É nesse sentido que há uma série de experimentos acontecendo pelo mundo - na verdade, desde os anos 70, fundamentalmente. São júris dos cidadãos dos Estados Unidos, células de planificação na Alemanha, conferências de consenso na Dinamarca, um conjunto grande de experimentos que buscam colocar cidadãos e especialistas em contato para discutir e para ponderar sobre desenvolvimentos tecnológicos e sobre como, de alguma forma, desenvolver ciência, regular ciência, pensar sobre ciência. Isso não significa, eu queria deixar claro desde a saída, em medida alguma diminuir a importância de especialistas, mas significa que desenvolvimentos científicos afetam a vida de pessoas e que, nesse sentido, existe um movimento mundial para a discussão democrática sobre avanços na ciência, na tecnologia e na regulação dos mesmos.
R
Mais recentemente, você tem um crescimento muito significativo de experiências transnacionais nesse sentido. Há uma assembleia sobre mudanças climáticas acontecendo, eventos e reivindicações de eventos sobre regulação de inteligência artificial, demandas pela organização de uma discussão mais ampla de uma série de temáticas, incluindo edição genética.
Quando a gente está falando de edição genética - a gente vai ter a oportunidade de escutar especialistas que trabalham na área, e participantes também do evento do qual vou falar na sequência -, houve avanços muito significativos na última década com o desenvolvimento de técnicas que levaram à maior precisão e ao barateamento das tentativas de aplicação de engenharia genética, se eu puder utilizar um termo antigo. Mas esses avanços muito significativos em precisão, barateamento e acesso também envolvem um conjunto de riscos não totalmente antecipáveis, do ponto de vista ambiental e social, questões que vão da forma como se concebem as patentes, às formas de regulação de pesquisa, riscos geopolíticos e ambientais que atravessam o debate sobre um desenvolvimento científico muito relevante, muito promissor e com muitas aplicações no campo da saúde, no campo da agropecuária, com muitas possíveis aplicações, mas também com muitos dilemas, muitos riscos não completamente antecipáveis.
É nesse sentido que esses avanços na edição genética apontam para uma lacuna regulatória, uma lacuna regulatória que vem sendo apontada também no mundo inteiro. Então, você tem um relatório do The Hastings Center sobre isso, e órgãos como o The National Research Council, a National Academies of Science, Engineering and Medicine dos Estados Unidos, e uma comissão presidencial para o estudo de bioética dos Estados Unidos, que vêm defendendo especificamente que o desenvolvimento e a adoção de produtos e práticas na área de edição genética precisam contemplar e precisam envolver cidadãos e cidadãs que de alguma forma são afetados por essas decisões, por esses avanços tecnológicos.
No caso brasileiro especificamente, existe uma regulamentação sobre pesquisa e uso de organismos geneticamente modificados, que se dá a partir de uma lei de 2005, que é a Lei 11.105. No entanto, muitas dessas técnicas, como o Crispr, por exemplo, foram desenvolvidas depois dessa lei. E há uma Resolução Normativa nº 16, da CTNBio, de 2018, que busca lidar com esses avanços. Mas há muita incerteza, muitas lacunas e há inclusive uma disposição à revisão da regulação pela própria CTNBio, tendo em vista a necessidade de lidar com esses avanços tecnológicos mais recentes e com o que eles representam, significam e podem de alguma forma significar em termos de desenvolvimento de pesquisa e desenvolvimento de inovação tecnológica.
R
É nesse sentido que o projeto, que de alguma forma dá origem a esta audiência pública, foi concebido. É um projeto que tem início internacional, por uma equipe da Austrália, do Centro para Democracia Deliberativa e Governança Global, da Universidade de Camberra, na Austrália, que, de alguma forma, busca organizar discussões, em muitos países, sobre aplicações diferentes de edição genética em diversos contextos, para organizar uma assembleia global de pessoas que discutam aplicações em edição genética.
No caso brasileiro, nós fomos responsáveis pela construção de uma assembleia, que foi financiada pelo CNPq, coordenada pelo Prof. Yurij Castelfranchi, com a participação de pesquisadoras e pesquisadoras não apenas da UFMG, mas da Unesp, da Universidade Federal de Goiás e da Universidade Estadual de Maringá, para, de alguma forma, discutir, com pessoas comuns, o tema da edição genética e discutir a possibilidade de debater com pessoas, cidadãos e cidadãs comuns, temas muito complexos e absolutamente distantes da vida dessas pessoas.
Nossa assembleia contou com 26 participantes, recrutados com base numa pluralidade de diversos critérios, incluindo região, crença, raça, educação. Só para ilustrar, a gente teve pessoas de 16 estados da Federação.
Foram duas etapas basicamente. Em primeiro lugar, houve três semanas de preparação assíncrona, com materiais em vídeo, podcasts, imagens, textos e a possibilidade de discussão em grupos assíncronos entre essas pessoas. Depois, foram quatro dias de encontros com especialistas e dinâmicas moderadas de discussão entre participantes e esses e essas especialistas.
Agradeço ao Leonardo Melgarejo, que participou como especialista, aqui também presente, entre outros especialistas que disponibilizaram seu tempo para discutir com pessoas comuns esta temática e para engajar-se em diálogos com essas pessoas.
Depois, houve um momento de elaboração de um conjunto de diretrizes e a entrega dessas diretrizes para a SBPC, para a Academia Brasileira de Ciências, para a Rede Brasileira de Mulheres Cientistas e para a imprensa.
O momento subsequente foi de uma série de reuniões com Deputados, Senadores, com o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, para a entrega de uma nota técnica derivada dessa assembleia. Uma das demandas dessa nota técnica era exatamente a realização de audiências públicas que dessem visibilidade à temática, que trabalhassem a temática publicamente, trouxessem a temática para a esfera pública e viabilizassem a discussão mais ampla dessas questões e o conhecimento dessas questões.
Os resultados dessa assembleia - e aqui eu caminho para a conclusão - envolveram sete diretrizes, que constam dessa nota técnica.
Eu não tenho tempo hábil para apresentação detalhada dessas diretrizes, mas elas ressaltam alguns valores fundamentais a serem levados em conta na visão desses 26 cidadãos e cidadãs que se engajaram com especialistas para discutir este tema complexo e, de alguma forma, participar do debate público sobre esta questão.
Há, em primeiro lugar, a defesa sobre transparência nas pesquisas e o aperfeiçoamento do Sistema de Informação em biossegurança.
Em segundo lugar, a defesa de participação pública, plural, em diversos processos relativos ao uso de Crispr, à edição genética de uma forma geral.
Em terceiro lugar, o argumento de que finalidade importa e de que é preciso pensar critérios éticos e foco no interesse público e não só na produtividade quando se desenham políticas de incentivo a pesquisa e inovação.
Em quarto lugar, a defesa sobre a necessidade de políticas de informação e capacitação técnica sobre o uso de Crispr.
R
Em quinto lugar, uma defesa da estruturação de um fundo para estimular usos não lucrativos da técnica e mitigar problemas derivados de certas aplicações da técnica.
Em sexto lugar, uma qualificação clara de responsabilidade de fabricantes, de cientistas e de produtores em casos de problemas.
Em sétimo e último lugar, entre as diretrizes produzidas pelos 26 participantes da assembleia brasileira sobre edição genética, a defesa da regulamentação de processos, produtos e da sua comercialização, com a previsão de planos públicos e de reparação de danos.
Bom, para ficar no tempo que foi definido, eu paro por aqui, mas queria iniciar esta discussão contando um pouco da realização da assembleia e fazendo essa defesa sobre a necessidade de pensar democraticamente processos vinculados à ciência, à tecnologia e à inovação.
Muito obrigado pela atenção.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Agradeço ao Ricardo, nosso professor da universidade de Minas Gerais.
A questão da popularização da ciência, tecnologia, pesquisa e inovação é importante, evidentemente, preservando a questão do conhecimento, da patente, porque nem tudo pode ser aberto imediatamente, porque pode comprometer, evidentemente, não só o resultado como também o conhecimento do pesquisador. Mas é importante o debate para as pessoas entenderem pelo menos o processo. Então, esta audiência tem esse objetivo.
Eu tenho falado sempre, como Presidente da Frente Parlamentar de Ciência, Tecnologia e Inovação, que um dos grandes problemas que nós temos é exatamente a difusão da ciência, a importância da pesquisa. Muita gente não tem o conhecimento da profundidade do tempo, do investimento de uma pesquisa. Muitas vezes, a maioria das pessoas que não tem muito conhecimento acha que as coisas são da noite para o dia. Então, é importante esclarecer.
Vou ler algumas perguntas e comentários, porque, na medida do possível, os próximos expositores já poderiam comentar sobre isso. Perguntas. Pedro Bessa, aqui do Distrito Federal: "Como o Brasil tem avançado nas pesquisas relacionadas à genética? Há incentivo governamental e/ou apoio internacional?".
Rosenildo Cordeiro, do Rio de Janeiro: "Quais [...] os desafios éticos da [...] genética e como podem ser abordados para garantir o seu uso responsável e [...] [equilibrado]?".
Pablo Fernandes, do Rio Grande do Norte: "Quais os limites morais [...] [impostos] no avanço dos estudos da genética?".
Vagner Alexandre, de São Paulo: "Como estão os estudos relativos ao consumo de alimentos de origem geneticamente modificada? E como informar isso de forma simples aos leigos?".
Comentários. Geraldo Magela, de Minas Gerais: "Creio no avanço das pesquisas genéticas, porém acho o investimento do Governo Federal muito pequeno para uma área que pode vir a trazer curas".
João Vítor, aqui do Distrito Federal: "A edição genética é uma das tecnologias mais impressionantes que temos. É muito interessante trazer essa pauta para a audiência".
Luís Maciel, de Santa Catarina: "[...] a tecnologia a favor do melhoramento genético é vida e futuro".
Na medida do possível, se vocês puderem comentar ou responder a essas perguntas, eu agradeço.
Vou passar, agora, ao Eduardo Romano, que é Pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, nossa querida Embrapa.
R
O SR. EDUARDO ROMANO (Para expor.) - Obrigado, Senador.
Primeiramente, eu agradeço ao Senador. Eu acho, até comentei com o senhor, que esta Comissão está em ótimas mãos. Eu conheço o trabalho do senhor e fico satisfeito de ver que o senhor está à frente desta iniciativa.
Bem, eu vou falar. Eu sou pesquisador da Embrapa há 27 anos. Fui da CTNBio por seis anos. E trabalhei nessa normativa de edição gênica que é uma referência para o mundo.
Próximo.
Bom, primeiro ponto, eu quero explicar para vocês como é que foi feita essa resolução e qual é conceito dela. Primeiro, as pessoas têm que entender que todos os alimentos que nós comemos hoje foram modificados geneticamente. Se vocês virem o painel de cima, a cenoura ancestral, a alface, o tomate; o milho ancestral, à esquerda. Olhem o milho ancestral e o milho que a gente tem hoje. Então, todos os alimentos foram modificados geneticamente. Modificação genética não é uma coisa nova que surgiu com transgênico e com edição genética.
Como se fazem essas modificações genéticas? Historicamente, são feitas por cruzamento de variedades. Também uma forma muito comum de fazer é por mutagênese. As pessoas, normalmente, não sabem, mas muitos alimentos que chegam à mesa foram modificados geneticamente por mutagênese, ou seja, você modifica aleatoriamente o genoma, o DNA, e, depois, esse alimento vai para a mesa. Há exemplos aqui. O grapefruit, por exemplo, foi desenvolvido por essa tecnologia de mutagênese, ou seja, em que você modifica geneticamente, mudando o DNA de uma forma aleatória. Isso não é exceção. Se você pegar esse banco de dados da FAO, você vai ver que, aproximadamente, nos últimos 70 anos, mais de 3 mil variedades foram obtidas por mutagênese. Então, essas variedades que são modificadas geneticamente e chegam à mesa do consumidor foram modificadas por mutagênese, de forma aleatória. Arroz, milho, trigo, enfim, tudo isso é modificado geneticamente.
Quando e durante a evolução do melhoramento genético, começou-se a usar uma outra ferramenta que é o transgênico. O transgênico, basicamente, transfere um gene de uma espécie para outra. Então, você pode transferir o gene de café para soja; um gene de uma bactéria para um algodão. Mas o ponto é: até aqui, quando a gente fazia melhoramento, inclusive por mutagênese, não havia nenhuma avaliação de biossegurança, avaliação de risco. A partir dos transgênicos, houve entendimento de que era necessário fazer avaliação de riscos, porque você está colocando um gene novo. Então, isso - não dá para ver aqui embaixo -, essas avaliações de risco elas custam... São extremamente onerosas, custam - está ali embaixo, ali - até US$100 milhões para fazer. Então, houve uma diferença muito grande no melhoramento genético, em termo de custos, quando você usava as tecnologias convencionais, até que chegaram os transgênicos, quando com que você tem que gastar muitos recursos para colocar um produto no mercado.
R
O que isso causou? Isso causou uma oligopolização do mercado. Então, como, quanto aos transgênicos, para botar um transgênico no mercado, custa muito caro, pequenas empresas privadas não conseguiam mais entrar nesse mercado. Então, isso aqui é um retrato dessas... Esses círculos mostram empresas que foram adquiridas pelas empresas maiores. Então, hoje, nós temos, por conta dos altos custos de regulamentação com transgênicos, principalmente, quatro empresas que controlam aproximadamente 60% do mercado de sementes.
Bom, e aí surgiram as tecnologias de edição gênica, que vieram com a promessa de reverter esse quadro de oligopolização e colocar pequenas empresas do setor privado - e há as empresas públicas também no mercado - pela redução dos custos.
Bom, basicamente, as técnicas de edição de genoma são um conjunto de técnicas que geram produtos semelhantes àqueles que eu mostrei para vocês, que são obtidos por mutagênese, só que de uma forma muito mais segura, porque aquela mutagênese é feita de forma aleatória; esta aqui você dirige, você faz um corte no DNA, no local preciso, e faz uma pequena modificação no DNA. Então, pelo fato de as técnicas de edição genética serem muito semelhantes, gerarem produtos muito semelhantes aos obtidos por mutagênese, isso foi usado como princípio - é um pouco mais complexo, mas basicamente é isso -, que nós desenvolvemos, nosso CTNBio, essa resolução normativa, que basicamente fala: "Se você faz a edição genética precisa, em poucos nucleotídeos do DNA, e você não está inserindo um gene novo, essa planta não é transgênica". De fato, não é transgênica. Então, ela não é tratada como transgênica, e você não tem que gastar, Senador, US$100 milhões para colocá-la no mercado.
Bom, então, nós fizemos isso, vocês podem ver, em 2018, e fomos um dos primeiros países do mundo a fazer essa resolução, e hoje, aqui, vocês veem, em junho de 2022, em verde, são os países que seguem uma legislação semelhante à brasileira. Então, vocês podem ver que os principais países agrícolas e os principais parceiros comerciais do Brasil seguem a mesma legislação que a brasileira. Então, você pode ver: Estados Unidos, Canadá, Rússia, China, Índia, Austrália, Argentina, Chile, Equador, Colômbia, Paraguai, Honduras, Guatemala, enfim; praticamente... A maior parte dos países, com exceção da Europa - como sempre, ela é mais restritiva a modificação genética; só que este mês, este mês, aqui, o Parlamento europeu votou uma normativa, uma lei, que basicamente se equipara à norma brasileira. Ou seja, edição genética fazendo pequenas modificações precisas não é transgênico. Você não precisa gastar US$100 milhões para botar um produto no mercado. Bem, então, se nós formos ver neste painel aqui, hoje em dia, boa parte daquela parte vermelha está seguindo a mesma normativa que o país. Então, o primeiro ponto que eu queria colocar, na minha opinião, é que, primeiro, existe uma forte convergência, no mundo, a respeito da regulamentação, que é esta: plantas editadas com pequenas mutações são consideradas não transgênicas. E, na minha opinião, não faz sentido o Brasil retroceder nesse entendimento que hoje é amplamente aplicado no mundo, principalmente pela importância que a agricultura tem para o país.
R
Então, a pergunta que a gente deve fazer, e eu acho que essa assembleia... Eu achei bastante interessante o comentário do primeiro colega, as preocupações que ele tem, preocupações sociais que ele tem, a primeira que a gente tem que responder é: o Brasil precisa de edição de genomas? Para mim é evidente que precisa. A primeira publicação que surgiu na descoberta...
(Soa a campainha.)
... desta tecnologia foi em 2013. Em 2020... Olha como foi rápido. Em 2020, as inventoras ganharam, simplesmente, o Prêmio Nobel, de tão revolucionária que é a técnica. E essa técnica permite fazer, de uma forma simples, em princípio barata, e em um tempo muito mais curto do que o melhoramento tradicional, uma série de produtos. Todos os produtos aí, eu poderia ficar aqui horas falando dos produtos, tem centenas de produtos que já foram desenvolvidos - milho tolerante à seca, porco resistente a vírus, trigo enriquecido com fibra, bovinos mocho, porcos com maior produtividade, soja resistente à seca, milho ceroso. Eu posso falar aqui centenas de produtos. A Embrapa vem desenvolvendo uma série de produtos editados, não vou ter tempo de falar de todos, inclusive, incluindo a primeira cana-de-açúcar editada não transgênica do mundo, a primeira cana-de-açúcar editada não transgênica do mundo, desenvolvida pela Embrapa!
Então, a pergunta é: o Brasil precisa de técnicas de edição de genoma? É evidente que o Brasil não pode abrir mão de uma tecnologia que permita desenvolver produtos de uma forma mais simples, em velocidade mais rápida e custos muito mais reduzidos, em tese, pelo fato de ter regulamentação simples. E, se você mudar a regulamentação, isso tudo deixa de valer.
E por que é importante a edição gênica? Primeiro, porque é uma ferramenta fundamental para o agronegócio nacional ficar mais competitivo. Hoje, a gente não pode mais pensar num agronegócio moderno. Daqui para frente, Senador, não tem mais como pensar em desenvolver produtos para o agronegócio ficar competitivo, inclusive, porque todos os países vão usar essa tecnologia. E também para a agricultura familiar produzir mais alimentos e auxiliar no combate à fome. Essas tecnologias podem e devem ser utilizadas para combater a fome. Arroz mais produtivo, com mudança estrutural, mudança arquitetônica, tolerante à seca, combater as mudanças climáticas. Enfim, nós não podemos abrir mão dessa tecnologia.
R
Agora, uma coisa interessante, que eu acho que tem que ser o foco desta discussão, não essa questão de rotulagem, outras questões, mas o que limita o uso dessa tecnologia no Brasil e no mundo para efetivamente - aqueles produtos que eu mostrei para vocês - chegarem ao mercado. O que limita são as patentes.
Já estou concluindo.
Existem poucas patentes que protegem essas tecnologias. Na principal, a Crispr/Cas9, existe uma disputa judicial entre duas universidades, dois institutos, mas o fato é que essas patentes são tão restritivas que hoje, até onde vai o meu conhecimento, só chegaram duas plantas no mercado, Senador.
O potencial é gigantesco, mas o que está no mercado? São duas plantas: esse tomate no Japão, reaquecido com gaba; e uma soja que foi desenvolvida com uma melhor qualidade de óleo.
Então, para resumir o que eu queria falar, eu acho que edição gênica não tem como não ter no agronegócio. Hoje, não tem como pensar no agronegócio brasileiro e na agricultura familiar sem as tecnologias de edição gênica.
Na regulamentação, nós fomos pioneiros praticamente. Eu acho que não há mais espaço para haver retrocessos nessa regulamentação. Hoje é a regra no mundo inteiro, inclusive na União Europeia, o que foi até uma certa surpresa, então, não há mais espaço para haver retrocessos.
Agora, na questão de propriedade intelectual -e para inserir o Brasil nessa nova era, porque realmente essa, sim, vai ser uma revolução tecnológica -, nós precisamos pensar nas questões, o Brasil precisa de uma estratégia para desenvolver produtos nacionais. Então, uma das possibilidades é a de que nós temos que ter a nossa ferramenta de edição, e isso não é um esforço simples, não é um projeto... Inclusive eu tenho um projeto nesse sentido, mas não é um projeto isolado que vai fazer isso, é uma iniciativa nacional para colocar...
(Soa a campainha.)
O SR. EDUARDO ROMANO - ... investimento, pensar em termos de propriedade intelectual e até em leis.
Outra possibilidade é uma iniciativa governamental para um acordo de licenciamento global para se usar essas tecnologias pelo menos para alguns produtos específicos, para a gente poder usar sem pagamento de royalties. Por exemplo, para a redução de fome, para o combate ao aquecimento global e também na questão de saúde.
Não está aparecendo aqui embaixo.
A outra coisa é pensar também na possibilidade de discutir até onde vão essas patentes, porque as patentes são importantes para a inovação, quem investe tem que ter um retorno. Ele investiu, tem que ter retorno, mas nós temos que pensar que não podem ser tão amplas que restrinjam o desenvolvimento tecnológico.
O Parlamento Europeu pretende banir as patentes...
(Soa a campainha.)
O SR. EDUARDO ROMANO - ... relacionadas com a edição genética. Acho que a gente não precisa ser tão radical nesse sentido.
E o último eslaide, só apenas para finalizar, eu queria mostrar que isso também é utilizado para a saúde. Inclusive o Reino Unido aprovou recentemente um tratamento, mas é o que eles falam ali: é um tratamento para curar uma doença séria, humana - olhem o que eles colocam ali -, mas a tecnologia é cara por causa das patentes.
Então, nós temos que pensar que, se não houver uma mudança nessa estrutura de propriedade intelectual, esses benefícios todos para o agronegócio brasileiro, para o combate à fome e para a saúde, nós não vamos alcançá-los em sua plenitude.
Então, é basicamente isso o que eu queria falar.
R
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Na questão da proteção intelectual, realmente há grandes investimentos. Evidentemente que tem que ter o retorno, mas, de fato, temos que buscar uma regulamentação melhor com relação a isso.
Obrigado pela apresentação, Eduardo.
E já passo imediatamente ao Leonardo Melgarejo, representante da Articulação Nacional de Agroecologia.
O SR. LEONARDO MELGAREJO (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senador.
Agradeço à Comissão a possibilidade de participar deste importante debate.
É um fato relevante encontrar aqui o Russomanno. Participei com ele da CTNBio há alguns anos, no período em que essa Resolução Normativa nº 16 foi elaborada. Não participei da votação, teria votado contra. E encontrar também o Prof. Galdino, que atualmente participa comigo da CTNBio.
Quero chamar a atenção para a importância deste debate e para a necessidade de cotizarmos as interpretações dos dois primeiros palestrantes: o primeiro fala da necessidade de democratizarmos o acesso ao conhecimento e o acesso às decisões; e o segundo traz a preocupação com os oligopólios e com as barreiras que beneficiam esses oligopólios.
Na minha contribuição, queria inicialmente lembrar que a abrangência dos tópicos relacionados à edição gênica, à transformação genética, não se refere, a abrangência, os riscos não se referem exclusivamente à biologia molecular. Portanto, eles não podem ser avaliados sob o ponto de vista de modificações pequenas. Pequenas entre aspas, porque a anemia falciforme decorre da alteração de um nucleotídeo em 3 bilhões de nucleotídeos. É pequena, mas tem um impacto enorme, permite a ocupação de áreas endêmicas, assim como permite a ameaça de morte às pessoas que têm os dois Gs, que têm homozigose com relação à expressão da anemia falciforme.
O fato é que os impactos das edições gênicas, os impactos das transformações se diluem e se ampliam em termos de geografia, em termos do tempo e em termos do clima. Vejam, a soja responde à luminosidade. Então, uma soja adaptada ao sul do Brasil não se ajusta exatamente ao norte do Brasil, embora tenha o mesmo genoma, porque as possibilidades de expressão relacionadas à composição genética são condicionadas pelo ambiente, assim como a suscetibilidade familiar a algumas doenças, alguns tipos de câncer são potencializados por gatilhos relacionados à nutrição. O contato com alguns agrotóxicos potencializa a possibilidade de emergência de doenças relacionadas à estrutura genética.
Nesta situação, eu gostaria de trazer o debate para uma questão filosófica relacionada ao surgimento da vida. A vida surgiu no planeta de alguma forma seguindo as orientações dos códigos genéticos e se diferenciou em todas as formas que hoje se combinam e ocupam todos os biomas em função da adaptação às condições ambientais. Basicamente todos os organismos vivos são formados pelas mesmas bases nucleotídicas, pelos mesmos elementos que nós estamos acostumados a ver nas informações relacionadas à estrutura dos genes: "C" de citosina, o "T" de timina, o "A" de adenina. Aquelas quatro letras se agrupam em códons, em arranjos de três em três letras, e formam aquilo que nós entendemos como genes, que são combinações de grandes quantidades desses arranjos. E, no seu todo, o conjunto de genes forma as possibilidades da expressão de tudo que nós vemos em todos os seres vivos.
R
O fato é que, com a evolução do conhecimento da genética, identificou-se uma associação entre determinadas características e determinadas partes, determinadas combinações daquelas bases nucleotídicas, daquelas letras do código genético. Com o avanço do conhecimento, identificou-se também a possibilidade de transferência de características de um organismo para outro usando aquelas partes do genoma identificadas como associadas a determinadas características. O que o Russomanno terminou de falar sobre a transgenia diz respeito a isso. Identificado que uma determinada bactéria não morre na presença de um determinado agrotóxico e identificada a composição genética dessa bactéria, o gene que está associado a essa tolerância, a transferência desse gene para uma planta levaria a essa tolerância e isso permitiria ganhos de mercado no comércio dessa planta.
O mapeamento dos segmentos associados às características, com a evolução dos conhecimentos, levou à identificação de que é possível obter transformação nos organismos não necessariamente transferindo genes, mas alterando os genes que ali existem, um processo que é chamado de edição gênica. Isso permitiu alterar os processos de diferenciação dos organismos, reduzindo os custos e, ao mesmo tempo, aumentando a possibilidade de pressões políticas e de privatizações dos conhecimentos com base nas expectativas que a sociedade tem a respeito dessas promessas de modificação, que são, de fato, muito interessantes - mas isso também vem associado à construção de discursos favoráveis aos aspectos positivos, ocultando os riscos.
É esse ponto que temos que levar em consideração. O que justificaria, numa determinada sociedade - digamos assim, qualquer sociedade, mas chamando a atenção para o que ocorre no Brasil -, a desistência de controles sobre os processos de modificação que podem trazer riscos que se espalham no tempo, que se espalham no espaço e que se espalham nos processos de organização da sociedade?
Como funciona a edição gênica no seu método mais sofisticado do momento, que é o Crispr, do qual nós estamos falando? O mapeamento do gene do indivíduo, do organismo que você quer modificar, informa um local onde existe informação genética que exprime a característica desejada, seja ela qual for. Pode ser associada à produtividade, pode ser associada à tolerância à seca, pode ser associada ao porte. O fato é que, definindo 24 daquelas letras do código genético, você pode direcionar um mecanismo de corte sobre aquele espaço do genoma que é caracterizado por aquelas 24 letras. E aí começa o problema da tecnologia, porque ela define precisamente um corte no módulo identificado, mapeado por um conjunto de 24 letras num universo de 3 bilhões de letras. E é impossível admitir, sob o ponto de vista estatístico, que não existirão outros locais com as mesmas combinações de 24 letras ou que não existirão locais onde o corte vá ocorrer de forma, vamos chamar assim, impura, sob combinações de 23 letras ou 22 letras. O fato é que a precisão do corte num local determinado, em função da alteração de uma característica desejada, obriga a ocorrência de cortes em outros locais do genoma. E esses cortes determinam a reação do organismo afetado, do organismo de teste, para reparo natural da alteração ocorrida. E o reparo pode ser feito também de forma não natural, com a inserção de uma informação que o geneticista, que o criador, o gerenciador do processo de transformação pretenda inserir.
R
O fato é que a identificação de comparação do organismo geneticamente modificado, naturalmente do organismo geneticamente editado, com base na composição do gene na região de foco, não é suficiente para garantir a ausência de impactos na segunda geração daquele organismo, ou em outra região do planeta, onde a insolação seja diferente e isso afete o metabolismo do organismo. Não é possível definir a segurança com base no exame de um determinado conjunto de informações genéticas do organismo que tem uma infinidade de conjuntos.
Vejam, para que se obtivesse ao natural...
E o grande argumento que se utiliza é que essas modificações - correspondendo à edição do genoma sem a inserção de informação genética subtraída a um outro organismo, sem a transgenia -, que a edição do genoma poderia acontecer naturalmente, dado que as transformações são efetuadas sobre uma base que já existe na planta. Vejam: uma modificação numa planta de soja ao natural que implicasse a alteração de alguma das suas características, como essas que estão sendo buscadas, por exemplo, no caso da tolerância seca, exigiria que a modificação ocorresse em duas plantas. (Pausa.)
Quinze segundos?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Já prorroguei.
Pode continuar.
O SR. LEONARDO MELGAREJO (Por videoconferência.) - Obrigado.
Exigiria a ocorrência em duas plantas da mesma lavoura, na mesma safra, e que essas plantas obtivessem a possibilidade de romper o mecanismo que na soja é de autopolinização, obtendo polinização cruzada, gerando uma semente viável com aquela modificação, e essa modificação teria que oferecer vantagens competitivas, para que aquela planta fosse cultivada e se expandisse em populações.
No caso do milho, há um estudo que diz que uma mutação envolvendo cinco pares de bases, para ocorrer ao mesmo tempo em duas plantas da mesma lavoura, na mesma safra, precisaria, sob o ponto de vista estatístico, que se plantassem nesse mesmo ano 48 milhões de quilômetros quadrados com a cultura do milho. Isso aí é mais do dobro do que existe no planeta. A probabilidade de ocorrência de uma modificação natural homozigótica em dois, por duas plantas que cruzassem entre si e gerassem uma progene viável, é de 2,5 vezes 10-15. É absolutamente irreal, sob o ponto de vista estatístico, afirmar que essas modificações poderiam estar ocorrendo naturalmente. E, se ocorressem, ainda deveriam oferecer uma vantagem competitiva que levasse aquela transformação a ser transferida para a população, aquela transformação obtida num organismo.
R
Enfim, nós estamos... No meu roteiro, eu teria muito mais elementos a comentar, mas o fato é que, no momento em que a CTNBio desiste de fazer, em que a CTNBio assume que um organismo geneticamente modificado por edição gênica não é um organismo geneticamente modificado e, portanto, pode ser dispensado da avaliação de biorrisco previsto na Lei de Biossegurança, a CTNBio está permitindo que nós não tenhamos as informações necessárias para monitorar os impactos dessa modificação sobre as populações de planta, sobre os serviços de utilização dessa tecnologia e sobre os impactos dessa tecnologia sobre a saúde humana e ambiental.
O grande argumento da minha fala - e eu vou encerrar nele para não tomar muito o tempo dos senhores - é que nós assumimos, por exemplo, que a identificação de um gene extraído de uma bactéria, o gene EPSPs, que confere tolerância ao glifosato, sendo idêntico ao gene EPSPs inserido na planta, sendo biologicamente idêntico, poderia ser considerado como natural na planta, poderia ser obtido por edição gênica também, mas o fato é que a presença dessa modificação permite que nós usemos no Brasil 250 milhões de litros de glifosato todos os anos.
Então, há implicações sobre as ações humanas e sobre as organizações das sociedades que não podem ser avaliadas e monitoradas olhando a estrutura do gene, olhando a modificação, fazendo inferência sobre o tamanho dessa modificação e sobre o quão natural ela é. Nós precisamos avaliar os impactos sobre as ações humanas, e, para isso, nós precisamos democratizar os processos de avaliação e democratizar os processos de definição e posicionamento da sociedade a respeito do que é positivo e do que é negativo em tecnologias que são necessárias, que são de fato necessárias, como essas das evoluções de conhecimentos relacionadas à manipulação dos organismos vivos para obter ganhos de vantagens para a sociedade.
Nós estamos dispensando o monitoramento e dispensando a avaliação de risco, e, com isso, nós estamos ocultando da sociedade informações que podem ser de extrema relevância e que são muito maiores durante os processos de edição, porque agora nós trabalhamos ao mesmo tempo com várias espécies, com várias partes do genoma dessas espécies, em vários locais diferentes, com vários grupos de pesquisadores, porque o custo de fato se reduziu e a atratividade dos benefícios é muito grande. Nós precisamos manter os processos de avaliação e, portanto, precisamos rever a RN 16. Não se trata de transgenia, mas de cisgenia, de alteração no próprio organismo, o que, como tentamos demonstrar, não se poderia obter ao natural em função da impossibilidade, das dificuldades estatísticas de se conseguirem essas modificações.
Agradeço a paciência e a tolerância por ter passado o tempo previsto.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Obrigado, Leonardo.
Eu passo, imediatamente, a palavra para Soraia Feliciana Mercês, que é professora de educação infantil na Prefeitura de Belo Horizonte.
A SRA. SORAIA FELICIANA MERCÊS (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos os presentes!
R
Agradeço pela oportunidade de estar, aqui, representando os demais participantes da Assembleia Cidadã Brasileira sobre Edição Genética.
O que eu tenho a dizer, um pouco, sobre essa participação é que foi, para mim e para o meu povo também, algo importante e relevante nas nossas discussões, pela maneira como foi possível, a todos nós que estávamos lá, ampliar o nosso entendimento e conhecimento sobre coisas que nos afetam no nosso dia a dia.
Como foi dito, éramos 26 pessoas de diferentes localidades, com diferentes experiências de vida, cultura e crença. Foi muito rica a forma como, apesar de todas as diferenças, nós fomos capazes de chegar ao comum, ao que nos afeta como sociedade brasileira. Então, a experiência da assembleia foi rica, muito rica, e ficou o desejo de que houvesse outras, para discutir outros assuntos que também são de nosso interesse.
No entendimento das pessoas, a gente viu como a gente se sente inseguro. Como foi dito, vários alimentos chegam à nossa mesa e, muitas vezes, não temos conhecimento de que foram modificados e da forma como foram modificados. Como eu sou do povo puri, a gente entende que a alimentação não é só a quantidade, mas a qualidade do que se ingere, porque a gente não consome só a planta, só o animal, a gente consome também o espírito desses seres e a forma como viveram, a forma como foram percebidos e tratados. Tem muitas coisas a respeito da produção de alimentos que acreditamos que precisam ter um cuidado maior por parte dos nossos representantes na forma de legislar e conduzir essas pesquisas.
Foi de entendimento geral...
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Soraia, se você puder ajustar a sua câmera, está aparecendo só parte do seu rosto. É só adequar. (Pausa.)
Aí está bom.
A SRA. SORAIA FELICIANA MERCÊS (Por videoconferência.) - ... a importância do incentivo às universidades, principalmente às universidades públicas, nas pesquisas e também de que nós, como sociedade brasileira, não queremos que a nossa saúde, a nossa qualidade de vida e soberania alimentar estejam voltadas, exclusivamente, à obtenção de lucro. O lucro a gente sabe bem para onde vai, mas os custos são distribuídos para todos nós, enquanto sociedade. Então, a gente quer, sim, uma alimentação de qualidade, mas a gente acredita que a grande produtividade não é, realmente, o que combate a fome e o que dá qualidade de soberania alimentar para a população.
R
Então, mais uma vez, eu gostaria de agradecer pela oportunidade de participar desta assembleia, pela importância da divulgação científica para todos nós e nossas áreas de atuação na sociedade e também pela questão de que nós, como cidadãos, esperamos, por esta Casa, pelo Governo como um todo, pelo Estado, estar protegidos. Não é só para a necessidade do lucro, a gente espera mais.
Agradeço pela escuta.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Obrigado, Professora Soraia.
Vou passar, imediatamente, então, ao nosso Professor da Universidade Estadual de Londrina e representante da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, o Dr. Galdino Andrade Filho.
O SR. GALDINO ANDRADE FILHO (Para expor.) - Bom dia.
Eu gostaria de agradecer ao Senador Izalci pela oportunidade de dar voz aqui à CTNBio.
Eu fui convocado pelo Presidente da Comissão, Dr. Astarita, para que me fizesse presente aqui para expor alguns pontos neste debate.
Acho que o contraditório é extremamente importante. A gente está vendo que tem posições aqui bastante diferentes, dos opositores que me antecederam, mas eu gostaria de colocar algumas coisas.
Nós estamos falando aqui de edição gênica, mas eu gostaria de esclarecer que, por exemplo, no caso da transgenia, que é tão mal falada por alguns setores, as pessoas se esquecem de dizer que centenas de milhões de vidas são salvas devido à transgenia, com a qual nós conseguimos produzir a insulina, que hoje mantém a qualidade de vida excelente de milhares de pessoas no mundo.
Acho que as pessoas também se esquecem de falar da questão da vacina da covid, que algumas delas eram transgênicas e salvaram, como todos sabem, que é um fato muito recente, milhões de vidas no planeta inteiro.
Bom, sobre a questão da edição gênica, a gente tem o seguinte: as mutações... A gente fala muito em Crispr, em edição gênica... Eu vou falar de uma forma bastante didática aqui - eu sou professor há 35 anos -, porque eu estou vendo que tem muita gente da sociedade civil, que não tem o conhecimento técnico que nós temos. Então é o seguinte, gente: as mutações ocorrem naturalmente na natureza, e elas são aleatórias. Então, hoje, neste exato momento que eu estou falando aqui, milhões de mutações estão acontecendo no meio ambiente, nos organismos, inclusive em nós. E a edição gênica nada mais é do que uma mutação induzida e precisa de um gene alvo, não é?
Então, foi dito aqui, por exemplo, que a sequência de 24 pares de base, a probabilidade de existir essa mesma sequência numa célula é de 10-24. O que seria 10-24, para vocês entenderem? É zero vírgula 24 zeros e 1 lá. Então, a probabilidade de acontecer isso é a mesma de um meteoro cair na minha cabeça neste exato momento, fazendo uma analogia para vocês.
Então, quer dizer o seguinte: a edição gênica por Crispr não apresenta o menor risco à saúde humana, animal ou ao meio ambiente.
R
Como aqui o Eduardo já falou - eu vou ser um pouco repetitivo -, as plantas e muitos outros produtos que hoje estão no mercado, mas, principalmente nas décadas de 50, 60, 70, foram induzidos por raios gama e por outros agentes mutagênicos, que eram aleatórios; e, de 1950 até hoje, nunca ouvi falar de nenhum tipo de risco à saúde humana, animal e ao meio ambiente. Nunca foi descrito nenhum tipo de... E o CRISPR é uma mutação de uma forma muito mais precisa, porque ela pega diretamente o gene específico que a gente quer.
Só para vocês serem uma ideia, por exemplo, uma planta... Um inseto, uma praga do algodão, por exemplo, reconhece o algodão porque essa planta emite alguns produtos voláteis, algumas moléculas voláteis que esse inseto reconhece como sendo de um hospedeiro. O que você, às vezes, pode fazer é silenciar esse gene para que essa planta, esse algodão deixe de produzir esse feromônio, essa molécula volátil, e aí o inseto deixa de reconhecer essa planta como hospedeira, como comida. E isso aí vai fazer o quê? Vai fazer com que, imediatamente, se deixe de usar veneno, inseticida para o controle dessa praga.
A Lei de Biossegurança, a nossa atual, não exige nenhum tipo de controle da mutagênese, e, uma vez que não há transferência de genes de um microrganismo a outro, não há risco para a saúde humana, animal e ao ambiente. Quer dizer, mutagênese você faz na própria célula; você não insere - como o Eduardo falou e como o Dr. Melgarejo também falou - você não insere genes de outros microrganismos naquele organismo.
E outra coisa: na CTNBio, a gente tem um extremo rigor para avaliar se é edição gênica ou não. Como é feito isso? Na CTNBio, é sempre analisado caso a caso. Então, vem o processo para análise. Uma das coisas que a gente faz é ver se há presença de genes de outros organismos. Como a gente faz isso? Através do sequenciamento genético desse organismo que foi editado. Então, se não há presença de sequências de gene exógeno, quer dizer que esse organismo é considerado uma edição gênica.
A RN 16, de cuja elaboração eu participei junto com o Eduardo - foi uma grande discussão e um tremendo avanço para o país -, foi um grande avanço da biotecnologia. Por quê? Ela simplifica o processo de liberação, o que está permitindo um grande avanço da biotech no Brasil. Por exemplo, hoje centenas de novas empresas brasileiras, inclusive startups de universidades e de centros de pesquisas, estão trabalhando com a edição gênica e submetendo produtos, processos dentro da CTNBio para serem avaliados. Quer dizer, houve uma profunda democratização do conhecimento nesse sentido, porque se permitiu que pequenas empresas, até como startups, que têm um pequeno capital, obtivessem produtos para serem avaliados pela CTNBio, sendo que, como o Eduardo mostrou muito bem, na transgenia, aconteceu, ao invés da democratização, uma aglomeração e incorporação pelas grandes empresas.
As principais economias do mundo têm convidado membros da CTNBio para elas conhecerem a nossa normativa RN 16. Eu mesmo, antes da pandemia, fui para a China, convidado pela CAS (Chinese Academic of Science) para debater com eles. Eles queriam entender o que era a nossa RN 16, como a gente estava tratando a questão da edição gênica como não OGM. Diversos membros da CTNBio foram para a Europa, foram para o Canadá e vão para o mundo inteiro para explicar para os países como isso está acontecendo, porque a nossa lei é o modelo para o mundo inteiro.
Como o Eduardo também já disse aqui, a União Europeia aprovou, acho que no mês passado...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. GALDINO ANDRADE FILHO - Neste mês, não é?
R
Neste mês, ela considerou a edição gênica como um não transgênico. A União Europeia vem dizer aqui para o público que é uma das regiões do planeta mais resistentes à questão da engenharia genética, e eles determinaram, neste mês, reconheceram que a edição gênica não é um OGM.
O baixo custo da técnica já permitiu startups, como eu falei, não é?
Outra coisa importante é a consolidação da bioeconomia avançada. Hoje, a bioeconomia vem crescendo no Brasil, não só na agricultura - de que a gente está falando -, mas na saúde, na indústria também de fermentação, na obtenção de novos polímeros. Os micro-organismos editados também estão em número crescente, sendo apresentados esses processos na CTNBio, quer dizer, nós estamos num avanço tremendo da bioeconomia no país, graças à RN 16 e também à RN 21.
Concluindo, a simplificação não significa permissividade, pois uma análise rigorosa do genoma é feita para verificar se há presença ou não de gene exógeno no organismo editado, o que resulta na completa ausência de DNA e RNA exógeno.
Também há casos na Argentina, Chile, Colômbia, Paraguai, Uruguai e Costa Rica que estão mostrando que eles também consideraram os editados como não OGM e estão tendo o mesmo avanço que nós estamos tendo, aqui no país, na indústria local de biotecnologia.
Basicamente, é isso o que eu tenho para dizer e fico à disposição para qualquer pergunta.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Ótimo! Obrigado, Dr. Galdino.
Eu vou passar, agora, para as considerações finais, para a gente fazer o encerramento.
Na medida possível, pedi até ao Eduardo, e peço ao Dr. Galdino também, se puder, ou aos demais, se quiserem, para responder essas perguntas. Elas foram feitas pelo Pedro, aqui do Distrito Federal; Rosenildo, do Rio de Janeiro; Pablo, do Rio Grande do Norte; e Vagner, de São Paulo. Eles fizeram algumas perguntas, e, se vocês puderem responder, eu agradeço.
Eu vou passar, para as considerações finais, para o Dr. Ricardo - está ainda...? (Pausa.)
Dr. Ricardo, para as suas considerações finais.
O SR. RICARDO FABRINO MENDONÇA (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado. Vou tentar me colocar em relação a vários pontos. Acho que as perguntas também apontam em muitas direções.
Queria começar agradecendo a oportunidade do debate. O nosso objetivo era exatamente esse.
Em segundo lugar, queria dizer que, na base do projeto e das discussões, nunca houve uma contestação ou uma ideia de o Brasil ficar para trás ou, de alguma forma, de burocratizar a possibilidade de avanços científicos e tecnológicos. É inegável o quanto a ciência caminha, é inegável quantas oportunidades foram criadas, não só no campo da agricultura, que é o foco principal desta discussão, mas também, fundamentalmente, no campo da saúde, dos tratamentos, do desenvolvimento de vacinas, como mencionado.
O que eu queria destacar e talvez ponderar, aqui neste debate, são duas coisas.
Em primeiro lugar, simplificar e desburocratizar não significa, necessariamente, desregulamentar completamente e abrir mão das possibilidades de avaliação de risco e monitoramento. Nesse sentido, a gente convoca e convida para uma discussão mais ampla, até porque há muitas camadas da discussão sobre edição genética, e não apenas as suas aplicações na agricultura. Então, em primeiro lugar, é importante entender que o desenvolvimento de certas técnicas tem implicações cruzadas e e afeta áreas correlatas.
R
Eu posso testemunhar também, porque estive agora na Austrália, que há uma discussão específica sobre regulação de edição genética aplicada a humanos em uma outra assembleia que foi realizada lá. Essas discussões, então, não visam, em hipótese alguma, levantar, desconsiderar os avanços que são fundamentais ou, de alguma forma, criar amarras, mas pautar a necessidade de debates, como foi levantado por vários dos participantes, como, por exemplo, o Rosenildo Cordeiro, sobre a necessidade de discutir os desafios éticos da genética. Inclusive, até para que os cidadãos e as cidadãs se sintam confortáveis com certos desenvolvimentos, que eles possam ser legitimados.
É importante entender que essas avaliações de risco não se resumem à existência de riscos à saúde. Quais são os impactos ecossistêmicos de forma um pouco mais ampla? Qual é o perigo de uma modalidade, de uma certa variedade de planta que pode suprimir a existência de outras em termos mais amplos? E são movimentos como esses que centros como o Hessen-Center e como a Academia de Ciências norte-americana têm puxado para dizer: olha, é fundamental que, tendo em vista a potência, a necessidade desses desenvolvimentos tecnológicos, que se discuta, que se pense, que se avalie e que não haja um rechaço a priori a quaisquer possibilidades de discussão pública, de avaliação e de monitoramento.
Nesse sentido, como é que a gente pode fazer isso de forma democrática, de forma a impulsionar a ciência brasileira, de forma a assegurar a inovação tecnológica que é necessária? Mas lidando - basta olhar as perguntas dos cidadãos e das cidadãs - com uma série de preocupações e, mais do que isso, com estudos avançados para compreender potenciais impactos para muito além da saúde, para entender o que isso significa em termos de adoção dessas técnicas.
Por isso eu estou muito feliz e muito satisfeito com essa oportunidade criada pelo Senador Izalci Lucas para que esse debate exista e seja colocado, para que se possa pensar e refletir prós e contras acerca de vários dos pontos, vários dos elementos, e para que, se essa é uma discussão ampla... E não é o nosso objetivo dizer aqui, como organizadores da assembleia, se trata-se de transgênico ou não, o que é obviamente um debate bastante antigo, ou de como considerar esses organismos geneticamente modificados, mas existem demandas de muitos cidadãos e cidadãs - inclusive, vocês podem ver nos comentários desta audiência pública - para dizer, por exemplo: está bom, tecnicamente, pode não ser transgênico, mas isso impede que haja rotulagem? Só vale rotulagem para transgênicos? Ou é possível que haja um outro sistema de informação para que se compreenda, inclusive, quais são as técnicas adotadas e empregadas? A existência de mais informação nesse sentido significa algum tipo de violação a patentes, a segredos, ou significa algum tipo de restrição ao desenvolvimento científico? Eu acho que foi esse tipo de discussão, esse tipo de questão, que os cidadãos e cidadãs colocaram na assembleia. O.k., os riscos à saúde podem ser mínimos em certos casos, mas, se houver riscos ambientais, não valeria a pena existir algum fundo que possa servir para mitigar esses riscos? Como é que nós lidamos com essas situações?
R
O nosso intuito aqui - eu queria deixar clara esta frase - não é criar nenhuma obstrução ao avanço da ciência, mas pensar formas democráticas e moralmente justificadas de desenvolvimento da ciência, da tecnologia e da inovação.
Muito obrigado novamente pela oportunidade de fala.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Obrigado, Ricardo.
Passo imediatamente aqui, para as considerações finais, para o Eduardo Romano, da Embrapa.
O SR. EDUARDO ROMANO - Quantos minutos, Senador?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Cinco.
O SR. EDUARDO ROMANO (Para expor.) - Bom, eu achei que foi muito interessante a discussão.
Para concluir, eu gostaria de falar primeiro da questão da regulamentação. Bom, como foi bem colocado aqui, a regulamentação que existe hoje no Brasil foi quase que pioneira e serviu de modelo para vários países do mundo, que usam a mesma regulamentação que o Brasil. Praticamente o mundo inteiro usa a mesma regulamentação, e isso demonstra que nós estávamos certos fazendo isso. E eu acho que não há espaço para o Brasil retroceder na regulamentação. Eu acho que seria um grande atraso para a sociedade brasileira rediscutir a RN 16, como alguns querem sugerir.
Bom, aqui, outro ponto que o Ricardo colocou é que ele acha importante ter rotulagem, rastreabilidade, mas o que eu penso é o seguinte: essa é uma demanda de quem? Existe realmente uma demanda para isso? Eu não vejo essa demanda. O que eu acho e o que eu vejo que é uma demanda real é a gente combater a fome no país; eu acho que uma demanda realmente necessária é tornar o agronegócio mais competitivo. E acho que essa discussão é interessante, mas a discussão está no caminho errado. A gente tem que pensar essa discussão no sentido de como ter uma estratégia nacional de usar essas tecnologias que são revolucionárias em prol da sociedade brasileira. Eu acho que a discussão tem que ser por aí, e não ficar repetindo uma fórmula que teve quase 30 anos atrás. "Ah, tem que ter rotulagem de alimento". Tem que ter rotulagem para quê? Quem é que está demandando isso? As pessoas estão demandando é prato de comida na mesa, é agronegócio mais competitivo, e isso passa por uma estratégia nacional de usar essas tecnologias de edição gênica.
E, eu repito, para mim, as três vertentes que temos que seguir: desenvolver tecnologias, uma ferramenta própria para o país poder usar essa tecnologia; discutir até onde vão essas questões de patentes, se uma patente de base, por exemplo, pode bloquear o uso de outras empresas, de outras ferramentas, como está sendo essa discussão na União Europeia atualmente; e outra possibilidade é um licenciamento global do uso dessa tecnologia.
Bom, basicamente era isso.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Obrigado, Eduardo.
Passo, então, também para as considerações, para o Leonardo, nosso representante aqui da Articulação Nacional de Agroecologia.
O SR. LEONARDO MELGAREJO (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senador.
Quero agradecer esta oportunidade, em nome da Associação Brasileira de Agroecologia e do Movimento Ciência Cidadã; enfatizar a importância do tema, enfatizar a importância do avanço do conhecimento e enfatizar a importância da extensão da democracia participativa para todas as áreas de decisão; e fazer alguns reparos a observações anteriores.
R
Vejam: as vacinas e as terapias gênicas - que são muito importantes, são necessárias, são fruto do avanço desses conhecimentos - são aplicadas em indivíduos e são processos de trabalho monitorados por médicos, por cientistas, e a liberação de organismos vivos alterados no ambiente foge a qualquer tipo de controle e passam a ser sujeitos às influências do clima, às influências do ambiente e às possibilidades de desdobramento sobre as quais nós não temos controle. Nós precisamos monitorar isso, porque as transformações e as mutações genéticas nos indivíduos podem se fixar nas populações, e isso pode trazer problemas que tendem a ser expandidos potencialmente, se nós não monitorarmos o seu início.
O caso do milho geneticamente modificado talvez possa ser usado como exemplo de implicações desse tipo, dado que praticamente não temos mais ou temos uma quantidade muito pequena de milho crioulo não geneticamente modificado para a tolerância a herbicida e também temos praticamente um índice de contaminação por agrotóxicos das águas das áreas de cultivos do agronegócio que extrapola de longe o razoável, sob qualquer ponto de vista científico.
Com relação à probabilidade de o meteoro cair na identificação de sequências de 24 pares de bases em lugares não definidos para corte, a ocorrência de efeitos off targets é tão grande que, nos estudos em que se buscam os off targets, se encontra a presença desses casos em praticamente 40% dos estudos identificados, seja processo de edição por biobalística, seja processo de edição por infecção bacteriana. O índice de 40% de alterações é praticamente a possibilidade de cair um meteoro a cada dois anos. Portanto, aquela argumentação não se sustenta.
Nós precisamos de métodos científicos de análise e de monitoramento que se baseiem na dúvida, e não na certeza. O método científico evoluiu com base na dúvida. Essa presunção de que estamos seguros e de que não acontecerá problema é equivocada. Nós precisamos, sim, revisar processos que dispensam análise de risco e que se baseiam no fato de não haver elemento exógeno para dispensar a análise de risco de alterações em organismos geneticamente modificados, porque são geneticamente modificados, dado que tiveram o seu genoma alterado, e isso ser dispensado de monitoramento gera perigos para a sociedade.
A rotulagem é uma maneira de obter participação democrática, porque o consumidor, decidindo se quer ou não quer consumir um produto que resulta de investimentos nessa área, estará ajudando o Governo a priorizar o investimento de recursos do Plano Safra, a financiar um tipo de cultura ou outro. A ausência da informação impede essa participação democrática e frauda a democracia participativa.
Agradeço, finalmente, a oportunidade.
Imagino que seria muito importante que nós déssemos continuidade a essa proposta de avaliação cidadã, que é trazida pela Universidade Federal de Minas Gerais, num envolvimento que, pelo que entendi, então, é global e, portanto, atende processos de evolução que são necessários para a consolidação da democracia ameaçada não apenas aqui.
Obrigado pela oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Obrigado, Leonardo.
Passo também, para as suas considerações finais, para a Profa. Soraia. (Pausa.)
A Profa. Soraia está aí ainda?
A SRA. SORAIA FELICIANA MERCÊS (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde.
Sim, estou aqui.
Agradeço-lhe, mais uma vez.
R
Como participante da assembleia e como professora também, cidadã brasileira, eu gostaria de frisar mais uma vez que a gente não quer somente o prato na mesa. A gente quer saber o que tem no nosso prato, o que a gente está consumindo, e a rotulagem dos produtos é fundamental. Tanto é que a sociedade brasileira está aí, há tantos anos, nessa luta.
Então, a gente quer, sim, a identificação dos alimentos. A gente quer o comprometimento do Estado com a proteção da sociedade em relação não só à questão da agropecuária, mas em relação a todas as outras atividades. Agora mesmo a gente vive aí com a maioria das cidades sofrendo com a questão da dengue e outras doenças e, como não dizer da implicação dos nossos métodos, da atividade mineradora e tantas outras e do impacto na sociedade, nas pessoas do entorno das cidades também.
Então, a gente precisa, sim - mais uma vez reforço -, de que a atenção seja para o cidadão, para a qualidade de vida da sociedade como um todo, e não só para um grupo de alguns.
Agradeço mais uma vez.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Obrigado, Profa. Soraia.
Passo agora, então, para o nosso último expositor, o Prof. Galdino.
O SR. GALDINO ANDRADE FILHO (Para expor.) - Bom, eu vou falar rapidamente.
A questão primeira é a seguinte. Continuo insistindo na questão da análise de risco de organismos editados. Risco de quê? Se for assim, nós teremos que fazer avaliação de risco de todas as plantas que hoje são variedades comerciais, que estão sendo usadas há décadas do mundo inteiro. Nós teremos que fazer análise de risco dessas plantas também.
Então, assim, é uma analogia muito clara. Não há o menor risco dos organismos editados. Por quê? Porque existe uma precisão muito grande.
A questão do meteoro. O meteoro continua... É a mesma probabilidade de cair na minha cabeça agora, porque o que o Dr. Melgarejo falou sobre a questão da biobalística e da questão do agrobacterium, isso se obtém em transgênicos, não em editados.
Então, nos organismos transgênicos, sim, é feita a análise de risco durante cinco anos, quando liberados comercialmente. É feita toda uma liberação, quer dizer, existe um processo de liberação que começa, primeiro, em contenção, depois, em campo, e, depois, para ser liberado comercialmente, tem uma série - uma série -, dezenas e centenas de estudos e avaliações que são feitas, com relação ao ambiente, com relação à saúde humana, com relação à saúde animal.
Essa é a questão dos transgênicos. Pode ver que ninguém cita aqui a questão, por exemplo, aleatória de uma planta editada, ou de um organismo editado. Às vezes, só está focando em planta, mas a indústria que produz mil moléculas está avançando demais no Brasil com essa questão, na saúde, na indústria de biotecnologia e também na agricultura.
Então, são setores que estão avançando demais não só no Brasil, em todos os países do mundo que consideram os editados não-OGM.
Agora, o Senador Izalci pediu para eu responder a algumas perguntas aqui dos participantes.
O Pedro Bessa: "Como o Brasil tem avançado nas pesquisas relacionadas à genética? Há incentivo governamental e/ou apoio internacional?". O Brasil tem avançado muito. Principalmente as indústrias estão investindo, as startups estão investindo. A Embrapa é um exemplo claro aí no Brasil na questão da agricultura.
Então, não é ideal a quantidade de recursos, mas, sim, nós estamos avançando.
R
O Rosenildo, do Rio, pergunta: "Quais os desafios éticos da [...] genética e como podem ser abordados para garantir [...]". Olha, Rosenildo, todas as universidades e institutos de pesquisa têm uma comissão de bioética onde esses projetos são tratados e analisados. Então, isso é muito bem regulado antes desses projetos. Você não pode levar um projeto desse se você não tem aprovação da comissão de bioética.
Pablo Fernandes, do Rio Grande do Norte: "Quais os limites morais [...] no avanço dos estudos da genética?". É o mesmo caso. Existem as comissões de bioética, dentro das instituições de pesquisa, que fazem essa avaliação.
Vagner Alexandre, de São Paulo: "Como estão os estudos relativos tanto a consumo de alimentos [...] [geneticamente modificados]?". Quanto aos estudos, é o seguinte, nós estamos consumindo alimentos geneticamente modificados há mais de 30 anos. Eu não vi em ninguém crescer antena na cabeça, nem ficar com escama verde, nem com olho vermelho e nenhum tipo de problema, até hoje, em toda a população. São centenas de milhões de pessoas consumindo, diariamente, e animais também. Quer dizer, não há o menor risco. (Pausa.)
Geraldo Magela: "Creio no avanço das pesquisas genéticas, porém acho o investimento do governo federal muito pequeno pra uma área que pode [...]". Não, não é pequeno, é razoável, mas poderia ser melhor.
João Vítor: "A edição genética é uma das tecnologias mais impressionantes que temos. "
(Soa a campainha.)
O SR. GALDINO ANDRADE FILHO - Muito interessante trazer essa pauta para a audiência". É, realmente, é. A gente está discutindo isso aqui e o contraditório, volto a dizer, é muito importante também, as várias visões sobre um mesmo tema.
Luís Maciel, de Santa Catarina: "... tecnologia a favor do melhoramento é vida e futuro!". Concordo com você, é vida e futuro.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - DF) - Obrigado, Prof. Galdino.
Bem, primeiro, gostaria de dizer da nossa obrigação aqui de debater os temas. Eu tenho uma preocupação muito grande, sempre falei isso, com relação à popularização da ciência, mas temos que ter, realmente, o mínimo de conhecimento para debater essas questões. Quando pego uma bula, eu não entendo nada daquilo. Eu tomo ou não tomo? Eu confio no médico ou não confio? Às vezes, até assusta a gente, quando a gente lê a bula, mas a gente não pode democratizar um assunto como esse se as pessoas não tiverem o mínimo de conhecimento do que significa isso, então, a gente tem que ter esse cuidado.
Agora, é importante que a população entenda isso, principalmente a importância da pesquisa, como ela é feita. A questão de patente, muita gente fala em patente aqui, mas, como foi dito aqui, são 100 milhões para você soltar um produto transgênico, 100 milhões. Lógico, quem investe isso vai querer o retorno...
Então, vamos quebrar todas as patentes? Vamos acabar com os investimentos em pesquisa, é óbvio... Tem que ter uma certa lógica. Agora, é evidente que há, sim, uma preocupação popular com relação a essas questões. Por isso, são importantes aquelas pessoas que dominam, que têm conhecimento. Eu acho perfeitamente viável uma discussão técnica entre os pesquisadores, entre as pessoas que entendem e que podem, realmente, argumentar tecnicamente, mas eu, como contador, fico meio impedido até de discutir sobre transgênicos, apesar de ter sido, duas vezes, Secretário de Ciência e Tecnologia. Acompanhei a Embrapa de perto, desde o início, e tenho orgulho muito grande e, se o Brasil é o que é, deve muito à Embrapa.
Agora, precisamos popularizar, para as pessoas entenderem, porque, ainda mais neste momento que a gente vive aí de fake news, há muita fake news e muita coisa que acabam dando insegurança para todo mundo.
R
Mas eu quero agradecer a participação de todos os convidados aqui, os expositores.
Evidentemente, é importante manter essa relação aí. Eu tenho certeza de que o ministério e todos os órgãos governamentais também estão abertos para a discussão dessa matéria tão importante.
Então, agradeço a todos.
Declaro encerrada esta audiência pública.
(Iniciada às 11 horas e 11 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 36 minutos.)