Notas Taquigráficas
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| R | O SR. PRESIDENTE (Alan Rick. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - AC. Fala da Presidência.) - Sob a proteção de Deus, iniciamos nossos trabalhos. Declaro aberta a 4ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura do Senado Federal. Antes de iniciar os nossos trabalhos, eu proponho a dispensa da leitura e aprovação da ata da reunião anterior. Os Srs. Senadores e Sras. Senadoras que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.) Está aprovada, Senador Zequinha. A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para discutir as diretrizes e os procedimentos que estão sendo adotados pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública e pelo Ministério dos Povos Indígenas, em especial pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), a respeito dos processos de demarcação de terras indígenas no país após a aprovação do marco temporal pelo Congresso Nacional no final de 2023, em atendimento ao Requerimento nº 3, de 2024, desta Comissão, de iniciativa do Senador Sergio Moro. |
| R | Quero agradecer a presença dos oradores: Klauss Dias... Permitam-me verificar aqui o sobrenome: Kuhnen, certo? Cadê o Klauss? Kuhnen, está certo? (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Alan Rick. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - AC) - Obrigado. Klauss Dias, Procurador Jurídico da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep); Maria Janete Albuquerque de Carvalho, Diretora de Proteção Territorial da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) - Maria Janete, obrigado -; Heraldo Trento, Prefeito do Município de Guaíra, que tive o prazer de conhecer - Prefeito Heraldo, muito obrigado -; Pedro Henrique Viana Martinez, Diretor de Promoção de Acesso à Justiça da Secretaria de Acesso à Justiça do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que está aqui - obrigado, Pedro -; Nina Paiva Almeida, Coordenadora-Geral de Identificação e Delimitação da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) - muito obrigado, Nina, pela sua presença -; Matheus Antunes de Oliveira, Procurador-Chefe da Procuradoria Federal Especializada junto à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) - Matheus, muito obrigado pela presença. Gostaria de, neste momento, passar a Presidência desta audiência pública ao autor do requerimento, ilustre Senador Sergio Moro. Presidente, assuma aqui a sua cadeira. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Quero agradecer aqui ao Presidente da Comissão de Agricultura, Senador Alan Rick, pelas palavras e pela introdução. O Senador Alan Rick é o nosso Presidente da Comissão de Agricultura do Senado, que tem se destacado sob a Presidência de V. Exa. E agradeço igualmente a presença de todos os convidados. Para nós começarmos, quero só fazer uma referência rapidamente ao Deputado Sergio Souza, que foi Presidente da FPA, está aqui presente, especialmente, porque é aniversário dele hoje também. (Soa a campainha.) O SR. ALAN RICK (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - AC) - Se o senhor me permite, eu farei esta homenagem ao querido Sergio Souza, que foi nosso Presidente, Parlamentar do mais alto quilate, um grande defensor do pequeno produtor, do médio produtor, daqueles que lutam no Brasil para levar comida à mesa dos brasileiros. Parabéns, Sergio, pela sua trajetória e por mais uma primavera concedida por Deus. Receba o nosso abraço e as felicitações desta Comissão de Agricultura e Reforma Agrária. Parabéns, querido! O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Ele disse que só não vai falar a idade aqui, viu? Esta audiência pública foi requerida principalmente, Senador Alan Rick, porque existe uma certa insegurança jurídica, nos campos e nas cidades, a respeito dos processos de demarcação de terra indígena envolvendo a aplicação da lei do marco temporal. Isso tem gerado algumas situações no país todo, mas, em particular, no oeste do Paraná, de bastante insegurança nas regiões de Terra Roxa e Guaíra. Então, a ideia é que nós possamos discutir essa questão nesta Comissão. Por isso, foram convidados tanto o Prefeito de Guaíra como o procurador jurídico da Faep, que é a Federação da Agricultura do Estado do Paraná, mas também ilustres funcionários da Funai e do Ministério da Justiça. Eu vou convidar os oradores para se sentarem à mesa. (Pausa.) |
| R | Quero registrar aqui também um cumprimento especial ao nosso querido Senador Zequinha Marinho. Sabemos que esse problema também aflige bastante o seu estado e é necessária a preocupação aqui com a aplicação da lei. E também o Deputado Tião Medeiros, que é o Presidente da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados - bem-vindo, Deputado. É um tema também... Não só pela sua Presidência lá, mas também por ser V. Exa. do Estado Paraná, certamente está atento a essa problemática. Eu vou pedir primeiro aqui... Vou passar a palavra para o... (Pausa.) Eu vou passar aqui a palavra inicialmente... Cada um dos convidados terá dez minutos para fazer sua exposição. Não necessariamente é um tempo contado em segundos, então pode ser estendido se necessário, mas também não precisa ser totalmente consumido. Teremos aí, ao final, as perguntas dirigidas aos expositores. Então, aguardaremos todas as exposições para depois abrir para debates e para as perguntas. Eu vou passar inicialmente aqui a palavra ao Dr. Klauss Dias Kuhnen, que é o Procurador Jurídico da Faep. Existe ali uma apresentação. (Pausa.) O SR. KLAUSS DIAS KUHNEN (Para expor.) - Bom, antes mais nada, Ilmo. Sr. Senador da República Sergio Moro, gostaria de agradecer, em nome da Federação da Agricultura do Estado Paraná, e, na realidade, de todos os produtores rurais paranaenses, por esse convite e pela oportunidade de trazer este assunto, um tema tão relevante para nós e aqui para esta Casa, que eu acho que realmente é o lugar para a gente buscar soluções. Nós aqui vamos fazer uma abordagem diante da preocupação do que está acontecendo com os produtores rurais, é esse o nosso papel. Eu trouxe uma pequena apresentação aqui para contextualizar as senhoras e os senhores a respeito dessa temática, mas, antes de iniciar, se me permite, não poderia deixar de cumprimentar toda a mesa que faz parte aqui, a convite do Senador Sergio Moro, em especial, o nosso Prefeito Heraldo Trento e a pessoa da Nina Paiva, Coordenadora da Funai. Também não poderia deixar de cumprimentar o nosso Deputado Sergio Souza e também o nosso Deputado Federal Tião Medeiros, todos do Estado do Paraná, e, como diz o Dr. Ágide Meneguette, Presidente da Federação da Agricultura, a outra Senadora do Paraná, Senadora Tereza Cristina. É um prazer tê-los aqui. Vamos lá. Em relação ao cenário que nós temos aqui, não podemos perder de vista que estamos tratando especificamente da questão da lei do marco temporal. Aprovada, teve uma série de sanções, todos os senhores sabem, foram vetadas pelo Presidente da República. E esta Casa contribuiu para a derrubada desses vetos e, especificamente, o Presidente desta Casa, Senador Rodrigo Pacheco, que sancionou a lei no final de dezembro de 2023, a Lei 14.701, de 2023. Portanto, é uma lei hígida e que deve ser respeitada por todos. |
| R | Aqui, para a luz de qualquer discussão, nós tivemos aí essa informação, estou pegando aqui o ano de 2011 como uma referência, porque a imagem vai ficar muito clara para todos os senhores e todas as senhoras: é uma propriedade no Município de Terra Roxa, que é extremamente produtiva, fica claro pelas fotos. Essa propriedade assim estava em 2011, são dados do Google Earth. Efetivamente, muito antes disso, mesmo em 1988, essa propriedade já produzia - a questão das parcelas que eram um pouco diferenciadas, por isso que nós recebemos essa imagem de 2011, para facilitar em relação ao que ocorreu. Efetivamente, em 2014, nós tivemos a invasão tekoha yvyraty porã. Aqui demonstra claramente que é a mesma parcela de que nós estamos tratando, que foi invadida por indígenas. Essa invasão ocorreu a partir de 2014. Essa foto já é um relato agora no ano de 2022, mais recente, mas que traz à luz da nossa discussão, no que diz respeito ao marco temporal, que os indígenas não ocupavam essa área em 1988. Aqui, para tirarmos qualquer tipo de dúvida em relação a quem está nos acompanhando, a mesma imagem em 2011 e 2022. Mesma situação agora em Guaíra, no Município de Guaíra, ao lado de Terra Roxa. Essa imagem é de 2011. Aqui já estamos tratando especificamente como área rural - desculpe, área urbana, anteriormente era uma área rural -, mas, em razão da expansão territorial do município... Dá para verificar que ali ainda tínhamos uma área produtiva em 2011; em 2014, ocorreram algumas invasões. Já por esta foto de 2022, depreende-se, sem sombra de dúvidas, que a invasão se deu após a questão tratada aqui, que é o marco temporal. Então, é também para fins de visualização, para não perdermos de vista a hipótese daquilo de que nós estamos tratando aqui. São as mesmas áreas, uma em Terra Roxa e outra em Guaíra. Bom, rapidamente, vou trazer aqui aos senhores e às senhoras a importância do agronegócio paranaense, que muitos já conhecem. Se me permitem, vou fazer um pequeno aparte, porque não poderia deixar de cumprimentar o nosso Deputado Pedrinho Lupion. É um prazer tê-lo aqui, Deputado. Esse é o agronegócio paranaense, que os Deputados que fazem parte dessa bancada conhecem bem e também o nosso Senador, a importância do Estado do Paraná no que diz respeito ao caráter produtivo. Nós estamos falando aí da quarta economia do país. É de 1,5 milhão a produção rural do Estado do Paraná, entre outras tantas informações aí. O agronegócio responde por 74% das exportações do Estado do Paraná. Por respeito ao tema, depois dessa palestra, essa apresentação, melhor dizendo, Senador, vai ficar aqui nos Anais do Senado Federal. Mas vamos lá. Mais um destaque da importância do Estado do Paraná em relação à sua produtividade. Nós estamos falando do primeiro estado produtor e primeiro estado exportador de carne de frango, de tilápia, também de produtos florestais. Da mesma forma, é o segundo produtor de milho e sexto exportador; de carne suína, somos o segundo produtor; leite, segundo produtor, quinto exportador; soja, somos o segundo produtor de soja, terceiro em exportação; cana-de-açúcar, quinto produtor; e de carne bovina, nono produtor. |
| R | Então, aqui quero deixar claro que a alternativa, a diversidade de produção que nós temos no Estado do Paraná e a par de qualquer dificuldade, seja de invasões de indígenas, seja de invasões de sem-terra, é esse cenário que está em risco. E é sobre isso que nós temos que ter toda a atenção e a defesa da produção rural paranaense. Se me permitem, com a desculpa de que nós tratamos aqui, nós vamos mostrar para os senhores a questão da segurança jurídica. Não podia perder de vista o trocadilho, porque neste momento o que nós estamos tendo, efetivamente, é uma real situação de insegurança jurídica para o produtor rural. E vou fazê-la em duas situações. Uma aqui diz respeito ao Cadastro Ambiental Rural, porque esta Casa também se debruçou sobre esse tema, e, junto com a aprovação do Código de Florestal, em 2012, trouxe a figura para os produtores do respeito ao Cadastro Ambiental Rural. Situação atual de indígenas. Rapidamente, nós estamos hoje com 775 áreas no Brasil: 142 em identificação, 46 já identificadas, 66 declaradas e outras 521 já homologadas. Mas a situação que nos traz mais perplexidade, mais curiosidade, nós estamos tratando das Portarias 136 e 139 da Funai, que buscam... Vamos ver se tem uma luz aqui, não sei. Ficou um pouco pequeno, mas lá vocês conseguem identificar, os senhores podem identificar. A parte hachurada em vermelho é a área que está em estudo de delimitação, 24 mil hectares, conforme a gente pode identificar na parte superior. São 24 mil hectares dos Municípios de Guaíra, Terra Roxa e Altônia. Especificamente, essa situação representa, responde por: 1.402 hectares no Município de Altônia; 8.275 hectares no Município de Guaíra; e 14.296 hectares no Município de Terra Roxa. Se nós fizermos um comparativo e uma conta rápida, o Município de Terra Roxa conta com 80.080 hectares, 14 mil estão em estudo nesse momento, fora outras áreas que já estão sendo ocupadas por indígenas. Nós estamos falando aí de algo em torno de 18% do território do Município de Terra Roxa para ser demarcado como área indígena. Em Guaíra não é muito distante: de 56 mil hectares, 8 mil hectares em estudo para demarcação, algo em torno de 14%. Com todo o respeito, isso tem que ser muito bem calculado e muito bem trabalhado. Mais do que isso, as duas primeiras telas que eu trouxe à luz para todos os senhores e todas as senhoras deixam claro que, desde 1988, essas áreas eram ocupadas, produzidas, por produtores rurais, todos eles com títulos, então isso deve ser respeitado. Aqui está ainda dentro desse mapa, isso está no site Terras Indígenas, todas as informações, esse estudo de delimitação dos 24 mil hectares está nessa fase, ainda está sendo identificada, não foi concluída, não estamos falando de área declarada, tampouco de área homologada. (Soa a campainha.) O SR. KLAUSS DIAS KUHNEN - Para concluir, no aspecto da preocupação com a insegurança jurídica, aqui nós temos um Cadastro Ambiental Rural de um produtor, nós separamos alguns itens ali, mas a situação está como pendente, como os senhores podem verificar. Lá na parte superior, a data de inscrição desse cadastro: foi feita em 29 de agosto de 2015, portanto, o produtor cumpriu o papel dele, mas está na situação de pendente. Qual é o motivo da pendência? Sobreposição da terra indígena Tekohá Guasu Guavira. É desta área que nós estamos tratando. |
| R | O que isso significa, senhoras e senhores? Com base na resolução do Conselho Monetário Nacional de 2023, rapidamente, no Art. 1º: 5 - Não será concedido crédito rural para empreendimento situado em imóvel rural total ou parcialmente inserido em terras ocupadas por indígenas [...]: a) as terras ocupadas por indígenas devem constar como homologadas, regularizadas ou definidas como Reserva Indígena [...]. (Soa a campainha.) O SR. KLAUSS DIAS KUHNEN - Ora, essa área ainda não está definida como reserva indígena. O produtor rural já está sendo... Por todas as situações decorrentes disso, ele não está conseguindo financiamento no banco e sequer seguro para a sua safra. Portanto, ele já está em plena situação de insegurança rural. Rapidamente, adiante, ainda há uma preocupação que tenho que trazer para esta Casa e acho que é importante as Sras. e os Srs. Senadores se debruçarem sobre isto: estamos falando de insegurança jurídica no que diz respeito ao aspecto da sanidade animal. Rapidamente, esse é o mapa do Brasil que foi tratado na última reunião do Mapa (Ministério da Agricultura). As áreas em verde, na parte superior, na Região Sul e um pouco na Região Norte, são as áreas que já estão livres de vacinação, sem febre aftosa. Nas áreas em laranja, já foi realizada a última vacinação em novembro, o que significa dizer, pelo que o próprio Ministério da Agricultura falou, que já no próximo mês todas elas também estarão hachuradas de verde como áreas livres de aftosa, sem vacinação. (Soa a campainha.) O SR. KLAUSS DIAS KUHNEN - Então, isso tudo já está regularizado. O risco que nós temos: ao lado, o Paraguai, que está livre de aftosa, mas com vacinação. E as senhoras e senhores sabem que, infelizmente, a população indígena, com dados da sua tradicionalidade, não respeita territorialidade, eles têm, dentro do conceito deles, que são áreas por eles habitadas. E, infelizmente, nós temos relatos de trânsito de animais, seja contrabando ou outras hipóteses, que vão de um estado para o outro. Nós estamos colocando em risco a segurança animal do Brasil, um tema em que a Sra. Senadora Tereza Cristina sabe o quanto foi difícil chegarmos nessa situação de um estado livre de... Perfeito. Só para concluir, o que nós esperamos, em nome dos produtores rurais? A Lei 14.701, de 2003, deixou claro estes itens: são terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas brasileiros... (Soa a campainha.) O SR. KLAUSS DIAS KUHNEN - ... aquelas que, na data da promulgação da Constituição Federal... Estas áreas, repito, não estavam ocupadas pelos índios. E, para concluir, na pior das hipóteses, em sendo declaradas áreas indígenas, o produtor, como diz o art. 9º, antes de concluído o procedimento demarcatório, deverá ser indenizado. Então, até lá ele tem o direito de gozar e usufruir dessas áreas. Obrigado, Senador. Desculpe pelo tempo excedido. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Agradeço a exposição do Dr. Klauss. É sempre bom ouvir falar bem do Paraná. Embora o objeto não seja exatamente esse da exposição, é sempre oportuno nós sabermos os bens jurídicos que estão sendo colocados em risco pela insegurança jurídica dessa situação. Antes só de passar a palavra aqui ao próximo expositor, quero destacar a presença da nossa querida Senadora Margareth Buzetti e da Senadora Tereza Cristina, de quem agora fiquei com ciúme ali - viu? - por conta dessa referência, mas cabe mais um lá no Paraná, não tem problema. E quero destacar também a presença aqui do querido Deputado Pedro Lupion, que é o Presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, juntamente com os demais nominados que já destaquei anteriormente. |
| R | Eu passarei a palavra agora aqui à Dra. Maria Janete, para a sua exposição. A Dra. Maria Janete, só para esclarecer aqui, é Diretora de Proteção Territorial da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), também com habilitação e mestrado em antropologia. A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO (Para expor.) - Agradeço. Boa tarde a todos e todas. Primeiramente, eu gostaria de agradecer o convite para poder dialogar nesta Casa de direitos e defensora da democracia em relação, especificamente, aos processos de regularização fundiária das terras indígenas no Brasil. Primeiramente, só fazendo uma contextualização, a política indigenista tem mais de cem anos de aplicação, a partir de 1910, e os processos de regularização fundiária vêm sendo aplicados no Estado brasileiro desde então, com algumas mudanças na legislação. Em 1988, a promulgação da Constituição Federal foi o seu marco mais relevante dos últimos 50 anos. Ao mesmo tempo, esse processo de identificação e delimitação das terras indígenas, de regularização fundiária, deve obedecer a uma série de processos, procedimentos e normativas para, justamente, podermos garantir aos povos indígenas as terras que tradicionalmente ocupam, conforme previsto na Constituição Federal, cumprindo, assim, uma missão institucional do Estado brasileiro, desde 1910 - primeiro com o SPI; em 1967, com a Funai; e agora, em 2023, com a grande força da criação do Ministério dos Povos Indígenas, sempre em parceria com o Ministério da Justiça e Segurança Pública. Tenho uma apresentação que está em PDF. Enquanto isso, eu vou aproveitar para explicar, inclusive, a estrutura da Funai nos processos de regularização fundiária. A regularização fundiária é realizada a partir de reivindicações dos povos indígenas - desejos, cartinhas, informes -, para que a Funai possa estudar, a partir de equipes multidisciplinares, se é alguma reivindicação que pode ou não se configurar como uma terra indígena, uma reserva indígena ou outras possibilidades de regularizações fundiárias previstas em lei. Para isso, a Diretoria de Proteção Territorial foi criada, desde sempre - antigamente ela se chamava Diretoria de Assuntos Fundiários. Desde 2009 é Diretoria de Proteção Territorial -, e tem coordenações técnicas especializadas e especialistas em relação à regularização fundiária, passando por pelo menos três etapas: a identificação e delimitação, o georreferenciamento e a regularização fundiária propriamente dita. Em relação... Eu vou iniciando por conta do tempo também. Os instrumentos legais que delimitam a nossa atuação legal... E lembro que, como somos parte de serviço público, toda a nossa ação é devidamente marcada por processos legais e normativos. A Constituição Federal é a nossa grande lei maior, especialmente os arts. 231 e o 232. Com isso, a regulamentação do processo, da normativa, do fluxo do processo é dada por meio do Decreto 1.775, de 1996. Junto com isso, o Ministério da Justiça, em 1996, emite a Portaria 14, que também delimita e esclarece quais são os elementos necessários para o relatório de identificação e delimitação, para as peças técnicas necessárias, para que seja iniciado o processo de regularização fundiária. |
| R | É importante dizer que o Decreto 1.775 garantiu a todos os interessados a possibilidade de contraditório desde o início do procedimento de regularização fundiária. Ao mesmo tempo, quando se publiciza o relatório de identificação e delimitação, abre-se um prazo, a partir da publicação no Diário da União e dos estados, de 90 dias para a apresentação de contestações administrativas; a Funai tem mais 60 dias para poder responder; e, depois disso, todo esse processo, com as respostas da Funai, é enviado ao Ministério da Justiça, que deve avaliar todo o processo e tomar a decisão, podendo aprovar, reprovar ou pedir novas diligências. Tudo isso está normatizado desde 1996. Em 2011, o Ministério da Justiça também, buscando garantir a participação ampliada dos entes federados, publicou a Portaria 2.498, que justamente determina e obriga a necessidade, não só de informação como de participação dos entes federados em todo o processo de regularização fundiária, com destaque para o levantamento fundiário propriamente dito. A gente só consegue fechar um relatório de identificação e delimitação após uma grande reunião em que as propostas de limite que serão disponibilizadas para contestação e ao Ministério da Justiça sejam também apresentadas aos entes federados, prefeituras e estados. Além disso, em 1973, um pouquinho antes da Constituição, a Lei 6.001 também trouxe elementos que ajudam na regulamentação e regularização das terras indígenas no Brasil. E agora, em dezembro de 2023, foi promulgada a Lei 14.701, que também traz outros elementos que, como é uma lei vigente, devem ser incorporados aos processos de regularização fundiária do Estado brasileiro. Especificamente em relação... Só para localizar o colega, eu estou no quarto eslaide. Isso, obrigada. O Decreto 1.775, de que eu falei anteriormente, traz basicamente cinco etapas - o colega que se apresentou anteriormente já tinha inclusive citado essas etapas. A primeira etapa é realizada totalmente pela Funai, com a participação dos entes federados, com o Incra e demais que possam participar, que é a de identificação e delimitação. É um grupo técnico multidisciplinar, composto por antropólogos, ambientalistas, historiadores quando necessário, engenheiros agrônomos, que vai justamente, a partir da história e territorialidade dos povos indígenas e ocupação regional, fazer um estudo para identificar e delimitar a proposta de terra indígena que atenda a reprodução física e cultural daquele povo, conforme previsto na Constituição Federal. Passada a etapa de identificação e delimitação, é feita a publicação no Diário Oficial da União, no Diário Oficial do estado. É publicizado, torna-se totalmente público após a publicação e a tomada de decisão da proposta que a Funai publica. E, depois de passado todo o processo de contestação, do contraditório, o processo é enviado ao Ministério da Justiça, que tem que decidir sobre a portaria declaratória, que é a segunda etapa - então, a parte azul é de responsabilidade da Funai, a parte laranja é de responsabilidade do Ministério da Justiça. Se a terra for declarada, volta para a Funai para a gente fazer a demarcação física da área: colocar os marcos, as placas e fazer alguns ajustes finos que possam ter, devido ao processo de georreferenciamento e à tecnologia existente. |
| R | Feita a demarcação física, o processo é encaminhado de novo ao Ministério da Justiça, para conferência, e depois à Presidência da República para homologação do processo de demarcação física. Depois da homologação, a gente registra na SPU e nos conselhos regionais de imóveis, por se tratar de uma terra da União. É uma terra pública com usufruto exclusivo dos povos indígenas. Há alguns números atuais que eu gostaria de trazer também, justamente porque não é um processo simples; ele exige muita técnica e muito estudo por parte de todos os técnicos da Funai e colaboradores que possam estar trabalhando conosco. Atualmente, nós temos mais de 400 registros de reivindicações fundiárias indígenas. O que são as reivindicações? É o direito de cada povo ou cada cidadão de entrar com uma cartinha, uma solicitação para que seja verificada uma área. Isso quer dizer que vão virar novas 400 terras indígenas? Não; são reivindicações, são cartas. E nós, como órgão público, temos a obrigação e o dever de receber todas, qualificá-las, entender aquelas que podem ou não continuar, porque podem trazer elementos justamente para serem estudadas para serem reconhecidas enquanto terras indígenas ou reservas indígenas ou não. E só depois isso é publicado num grupo de trabalho, quando a gente tem mais informações. Muitas dessas cartinhas também podem se referir à mesma reivindicação, então você pode ter duplicidade de pedidos. (Soa a campainha.) A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO - Então, eu gostaria só de deixar claro que isso não significa que todas as reivindicações que a Funai recebe necessariamente se tornarão terras indígenas. Atualmente, nós temos 138 grupos de trabalho, trabalhando em campo ou em gabinete, para consolidar os relatórios de identificação e delimitação. Desde já eu gostaria de pedir até o acréscimo de um minuto ao Sr. Presidente da sessão, se for necessário. Muito obrigada. É só para eu concluir. Tem 138 grupos de trabalho em estudo. Eles ainda não têm a definição de superfície. Os casos que foram trazidos aqui do oeste do Paraná ainda estão na fase de identificação e delimitação. Um deles foi publicado; o outro, ainda não. E 11 procedimentos estão em fase de contraditório e ainda não foram enviados ao Ministério da Justiça. São cerca de 300 processos em que há contestações, que é o direito de quem quiser contestar os trabalhos que a Funai faz, já que são propostas e precisam ser avaliadas. Atualmente, a gente tem também... A próxima, por favor. Há mais de 61 decisões judiciais, demandando e obrigando à Funai a conclusão dos estudos. E temos mais 33 decisões judiciais para a constituição de novos grupos técnicos. Ao mesmo tempo em que há uma grande judicialização contrária aos direitos dos povos indígenas, há também uma grande judicialização a favor dos direitos dos povos indígenas, e cabe à Funai, como órgão público, cumprir a nossa missão institucional dentro de parâmetros legais e jurídicos adequadamente instituídos. Finalizando já a minha apresentação, é importante dizer, agora especificamente sobre a região... (Soa a campainha.) A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO - ... do oeste do Paraná - nós temos esses dois grupos, como foi citado aqui -, que é uma região realmente densamente povoada e que tem grandes empreendimentos, tanto do agronegócio quanto a hidroelétrica binacional de Itaipu, que também demarcou uma grande mudança de ocupação territorial entre os anos 70 e 80, com os povos indígenas também sendo afetados tanto pelo alagamento da UHE de Itaipu quanto por algumas remoções compulsórias naquela década de 1980. Então, tudo isso tem que ser levado em consideração quando a Funai executa seus estudos técnicos altamente especializados. |
| R | Queria só registrar mais uma vez que a Funai está sempre à disposição para o diálogo, estamos abertos. Quaisquer que sejam as dúvidas - a Senadora já esteve lá na Funai, a equipe do Senador Zequinha Marinho também esteve lá -, a gente está sempre à disposição para esclarecer os procedimentos técnicos, legais e jurídicos que... (Soa a campainha.) A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO - ... como órgão público temos que cumprir. Desde já agradecemos bastante. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Eu agradeço à Dra. Maria Janete pela explanação e também pela disposição da Funai em nos atender aqui, não só vindo a esta Casa, mas igualmente se colocando à disposição para esclarecer nossas dúvidas. Quero registrar aqui a presença também do Senador Jaime Bagattoli, do Senador Hamilton Morão, da Senadora Teresa Leitão - agradeço a presença. Tem uma lista para inquirições. Alguns já se escreveram. Para aqueles que eventualmente não se escreveram só alerto para a existência dessa lista. Eu vou passar a palavra agora aqui à Dra. Nina Paiva Almeida, que é a Coordenadora-Geral de Identificação e Delimitação da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Destaco aqui que tem uma dúvida. Uma questão premente da realização dessa audiência pública é nós podermos entender a posição da Funai em relação à Lei do Marco Temporal, que foi aprovada pelo Congresso. Se a senhora pudesse também abordar essa questão na sua exposição, agradeceria. A SRA. NINA PAIVA ALMEIDA (Para expor.) - Boa tarde a todos e todas presentes. Só me apresentando, meu nome é Nina Paiva, sou especialista em indigenismo da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) há quase 14 anos e, atualmente, respondo pela Coordenação-Geral de Identificação e Delimitação da Diretoria de Proteção Territorial, que é o setor da Funai responsável pela primeira etapa dos estudos do processo demarcatório, que, como a Diretora Maria Janete apresentou, é um processo de fases, de várias etapas. Então, a Coordenação-Geral de Identificação e Delimitação é a área técnica da Funai que recepciona as reivindicações fundiárias indígenas e conduz, coordena essa primeira etapa, que são os estudos de identificação e delimitação. É importante dizer que esses estudos são conduzidos, por óbvio, em plena conformidade com a legislação vigente, que, hoje em dia, a gente pode citar como sendo o art. 231 da Constituição Federal de 1988; o Decreto nº 1.775, de 1996; a Portaria 14, do Ministério da Justiça, de 1996; a Portaria 2.498, também do Ministério da Justiça, de 2011; a Lei 6.001, que é o Estatuto do Índio, que ainda tem dispositivos relevantes para o tema; e, mais recentemente, a Lei 14.701, de 2023. O Decreto 1.775 coloca as fases do processo demarcatório e dispõe sobre a maneira como esses estudos de identificação e delimitação vão ser conduzidos, por grupo técnico multidisciplinar, que é coordenado por um profissional da antropologia, um antropólogo de qualificação reconhecida nos termos da lei. Mas é importante destacar que são estudos multidisciplinares e que abordam, para além dos aspectos antropológicos, outros aspectos de natureza histórica, sociológica, jurídica, ambiental, fundiária, cartográfica. São estudos bastante complexos. E, por isso, não raro, têm sido estudos muito morosos, demorados, longos, que ensejam a produção de um relatório circunstanciado de identificação e delimitação, RCID - a gente costuma chamar de Rcid. Esses relatórios são peças técnicas bastante robustas e passam por análises muito criteriosas dentro da Fundação Nacional dos Povos Indígenas. |
| R | Essa primeira etapa do processo demarcatório... É sempre bom lembrar que o processo demarcatório se inicia na Fundação Nacional dos Povos Indígenas, mas passa pelo Ministério da Justiça e passa pela Presidência da República; são diversas etapas e instâncias do Poder Executivo que incidem no processo. Mas essa primeira etapa é muito importante porque, em conformidade com a lei, são os estudos multidisciplinares de identificação e delimitação que podem dizer se aquela reivindicação fundiária indígena consiste em uma terra de ocupação tradicional ou não. E é importante dizer também que, em toda a legislação vigente, estão previstas outras modalidades de regularização fundiária de terras indígenas, que não as terras de ocupação tradicional, como as reservas indígenas, áreas dominiais, enfim. É importante destacar também que, para além da obediência à lei - e aí, sendo bem clara, toda a legislação vigente obviamente é respeitada e plenamente assistida; como servidores públicos e órgão público não teria como ser diferente -, o trabalho técnico também tem observado, por óbvio, todos os debates no âmbito jurídico que se dão a respeito do tema. Então, cada vez que, principalmente a partir da Constituição Federal de 1988, se avança na condução de processos demarcatórios para contextos com uma malha fundiária mais complexa, a gente tem também tornado essas análises e a produção desses estudos e análises que se faz sobre eles mais criteriosas e mais robustas, procurando incorporar ao máximo esse tipo de informação relacionada ao próprio histórico de colonização das regiões, à formação da malha fundiária, à situação dos processos de titulação que vão conformar essa realidade. Então, acho que o principal que eu queria colocar aqui nesta primeira fala, em que não vou me estender muito, é que os estudos são absolutamente criteriosos. A ideia é que esses estudos de identificação e delimitação possam, sim, promover a efetivação dos direitos territoriais dos povos indígenas, mas também contribuir para o ordenamento fundiário em todas as regiões do país. Eu acho que é importante colocar isso, assim, no sentido de que é um trabalho e um dever do Estado brasileiro. É importante também ressaltar que a legislação vigente prevê e garante a participação dos entes federados durante o processo demarcatório, em específico no processo de identificação e delimitação. Os entes federados têm uma participação especialmente importante nesse momento dos estudos de natureza fundiária, que é a caracterização da ocupação não indígena, o levantamento das ocupações não indígenas na região. Os entes federados são sempre instados a participar, e é desejável que participem, porque têm informações importantes a serem consideradas na produção desse relatório circunstanciado. E também a participação está garantida a qualquer interessado, inclusive considerando a possibilidade de apresentação de contraditório administrativo desde o momento em que os estudos de identificação e delimitação são iniciados até 90 dias após a publicação do relatório, se aprovado, no Diário Oficial da União e no Diário do estado onde a terra indígena se insere. |
| R | Então, é isso. Queria fazer uma fala inicial curta, colocar-me à disposição para o esclarecimento de possíveis dúvidas e reafirmar, como a Diretora Maria Janete falou, a nossa abertura total e absoluta para o diálogo em relação ao tema. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Eu agradeço, Dra. Nina Paiva, a exposição, bastante esclarecedora. Eu ouviria agora o Prefeito Heraldo Trento, de Guaíra, mas acho que vou seguir uma ordem aqui. Vou ouvir primeiro todos da Funai para, depois, passar-lhe a palavra. O Dr. Matheus Antunes de Oliveira, que é Procurador-Chefe da Procuradoria Especial Federal Especializada junto à Funai, dispôs-se a vir aqui, a esta Comissão, para fazer também uma exposição - eu agradeço, doutor, a sua disposição e lhe concedo a palavra. Eu só reiteraria que o grande objeto desta Comissão é que há uma grave incerteza em relação à posição do Poder Executivo sobre a Lei do Marco Temporal. Isso tem trazido insegurança jurídica profunda, por exemplo, lá em Guaíra e em Terra Roxa, no oeste do Paraná, podendo até descambar para a violência. E o Poder Executivo, imagino, tem uma posição. É exatamente esse o objeto desta audiência pública hoje, e nós gostaríamos de ouvir a Funai e o Ministério da Justiça depois sobre essa posição. Então, eu lhe passo a palavra e pediria a gentileza de, possivelmente, abordar essa questão. E também, já que a gente fala da situação específica lá de Guaíra, Terra Roxa e também Altônia, pergunto se o doutor poderia também nos informar algo sobre os processos lá, caso esteja também envolvido naqueles processos. Muito obrigado. O SR. MATHEUS ANTUNES DE OLIVEIRA (Para expor.) - Boa tarde a todos e a todas. Gostaria de cumprimentar os Exmos. Senadores e Senadoras que estão aqui; gostaria de cumprimentar o Exmo. Senador Sergio Moro e agradecer-lhe a disposição em permitir a participação da Procuradoria junto à Funai - acredito que nós possamos contribuir muito com esse tema -; cumprimentar todos os demais convidados e presentes. Meu nome é Matheus Antunes de Oliveira, sou Procurador Federal e estou na Chefia da Procuradoria junto à Funai. A Procuradoria junto à Funai é um órgão da Advocacia-Geral da União, responsável por prestar consultoria jurídica para a Funai e também contribuir para informações em processos judiciais. Nós não atuamos diretamente nos processos judiciais - existem outros colegas procuradores federais que atuam diretamente nos processos judiciais -, mas contribuímos com informações para esses processos. Então, sim, Senador, consigo prestar algumas informações em relação ao tema. Exatamente na função de prestar consultoria jurídica para a Funai, já pontuando o primeiro questionamento que V. Exa. nos fez... Como já foi ressaltado pela nossa Diretora e pela nossa Coordenadora-Geral, a Funai, a partir das orientações da Procuradoria, tem seguido o ordenamento jurídico como um todo, incluindo a Lei 14.701. |
| R | Nós sabemos que houve o ajuizamento de ações diretas de inconstitucionalidade, de três ADIs, uma ADC perante o Supremo Tribunal Federal, a quem competirá decidir de acordo com o princípio da separação dos Poderes. E, nos processos que aportaram na Procuradoria relacionados a casos concretos - nós nos pronunciamos em casos concretos -, neste ano, nós já passamos a incorporar, nas orientações, as disposições da Lei 14.701, com certeza. Em relação aos processos judiciais da área específica, a Funai promoveu os estudos e elaborou relatórios circunstanciados - lógico cumprindo sua missão institucional -, a partir do rigor técnico, que é característico da Funai, mas também em razão de decisões judiciais. Havia decisão judicial determinando que a Funai realizasse os estudos sob pena de multa, decisão essa reiterada em vários momentos, a partir de requerimentos do Ministério Público Federal. Paralelamente, houve também ações que questionaram o processo de demarcação, uma ação especial movida pelo município. E essa municipalidade... A sentença, em razão de questão procedimental - não houve nenhuma questão relacionada ao mérito, à demarcação ou não, mas, por uma questão procedimental -, considerou que era necessário suspender. Houve uma decisão para a suspensão e considerou-se necessário anular o procedimento. Houve apresentação de apelação pelo Ministério Público Federal e, paralelamente, na Ação Cível Originária 3.555, recentemente o Ministro Fachin sustou, suspendeu essas decisões judiciais. Os processos judiciais já estavam suspensos, em razão de decisão do Ministro Alexandre de Moraes, mas, mais recentemente, houve essa decisão do Ministro Edson Fachin, que suspendeu essas decisões judiciais que tratavam da suspensão do processo de demarcação em si. Então, eu gostaria de ser breve. Estamos aqui para dialogar, para escutar. Acredito que a primeira pergunta de V. Exa. foi respondida, e estou à disposição para mais informações que sejam necessárias. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Agradeço aqui ao Dr. Matheus Antunes pelas explicações. Certamente, os colegas depois têm indagações para aprofundar em relação a isso. Eu vou passar a palavra aqui, agora, ao Prefeito Heraldo Trento, do Município de Guaíra. O Prefeito tem vivenciado uma situação bastante difícil na sua cidade, como representante daquela comunidade. Embora o Dr. Klauss já tenha abordado inicialmente alguns problemas relacionados à Brasília, é o Prefeito que acaba sendo muitas vezes o ouvidor-geral das reclamações e da insegurança daquela cidade. Isso tem acontecido também em Terra Roxa, Altônia e também em outros municípios do Paraná. Eu agradeço enormemente a presença aqui de V. Exa., Prefeito, e creio que ninguém melhor do que o senhor para poder nos transmitir não só as dificuldades, mas também o drama que a população tem vivido ali, tanto a população indígena como a população não indígena, por conta dessas inseguranças. O SR. HERALDO TRENTO (Para expor.) - Bem, primeiro, eu gostaria de agradecer muito. Eu me sinto muito honrado de estar aqui, hoje, representando o Município de Guaíra, e queria agradecer realmente o convite para estar aqui, especialmente a V. Exa., Senador Sergio Moro. |
| R | Eu gostaria de cumprimentar todos aqui da mesa e todos os Parlamentares que se fazem presentes aqui, Senadores e Deputados. Não há como nós falarmos dessa problemática que nós estamos vivenciando, que, diga-se, não é de hoje... Há 20 anos, nós estamos tratando dessa matéria. Eu preciso esclarecer algumas coisas que talvez sejam importantes neste momento para as pessoas entenderem o grau de complexidade do que nós estamos vivenciando. O Município de Guaíra fica às margens do Rio Paraná, divisa com o Mato Grosso do Sul, lá onde nós temos uma ponte em homenagem ao grande Ayrton Senna. É uma ponte extensa e inicialmente estava programada para ser uma ponte de serviço em razão de uma usina hidrelétrica chamada Usina Hidrelétrica de Ilha Grande. A responsabilidade da construção dessa usina seria da Eletrosul. Mais para frente, eu vou tratar desse assunto. Eu preciso citar aqui alguns aspectos que afetam, até hoje, o nosso desenvolvimento; eu preciso fazer essa contextualização histórica para que as pessoas realmente entendam. Nós perdemos as Sete Quedas, que tinham 20 vezes... Eram consideradas a sétima maravilha do mundo. E não se trata de saudosismo. Nós fomos altamente lesados do ponto de vista econômico, turístico, social, psicológico da nossa população, porque, em razão da formação do Lago de Itaipu, houve o alagamento total das nossas queridas e saudosas Sete Quedas. O ICMS gerado pela Usina de Itaipu - e falo isso com muita propriedade, porque fui um dos últimos Presidentes do Conselho de Desenvolvimento dos Municípios Lindeiros ao Lago de Itaipu... Inicia-se o lago na nossa querida Guaíra e estende-se até a Foz de Iguaçu, onde está a Usina Hidrelétrica de Itaipu. Eu me lembro como se fosse hoje de que o Senador José Serra entrou com um projeto de lei que foi aprovado, e 50% do ICMS gerado por energia elétrica... E é bem pouquinha energia - não é? - que Itaipu... Evidentemente que eu estou sendo irônico neste momento, mas afetaram outra vez a cidade de Guaíra, porque o projeto passou, então, a dizer que quem tinha direito a 100% do ICMS pela energia gerada e comercializada pela Usina Hidrelétrica de Itaipu seria o município sede, e não mais... Anteriormente, eram 50% do município sede e o resto dos 50% eram divididos para os 14 outros municípios paranaenses e um do Mato Grosso do Sul, Mundo Novo. Mais uma derrota para a nossa cidade. A Usina Hidrelétrica da Ilha Grande fora uma promessa, tanto é que o canteiro de obras tem o nome de um bairro nosso que virou um caos. Nós tivemos que criar um programa de regularização fundiária municipal específico para aquele bairro, porque a usina, deixando de ser construída - num primeiro momento foi adiada; num segundo momento também postergada; até que foi simplesmente extirpada, e a Eletrosul abandonou seu canteiro de obras -, em torno de mil residências, posteriormente foram invadidas. Imaginem o caos disso tudo! É pancada em cima de pancada em cima do nosso município. |
| R | Quanto aos critérios que se utilizaram para ressarcimento e indenização dos municípios, a compensação financeira pela utilização dos recursos hídricos em relação aos royalties, eu quero falar bem claramente - aos royalties -, o único critério, em nível nacional, utilizado foi quilômetro de área alagada. Ora, se nós tínhamos as Sete Quedas e o salto maior era de 140m de altura - eu nunca vi água subir -, é óbvio que iria alagar mais território na parte de baixo, nos municípios a jusante, até chegar à Foz do Iguaçu. Para que os senhores tenham uma ideia, 4,86% dos recursos a título de royalties foram designados para Guaíra; e Santa Helena, 25%; Itaipulândia, 16% ou 17%; municípios em que... Guaíra já chegou a ter no passado quase 40, 50 mil habitantes. Com essas injustiças todas, nós caímos para 22%. Hoje o município está dando a volta por cima e está vencendo essas agruras. Hoje nós temos em torno de 35 mil habitantes, com ascensão e crescimento, dadas as políticas públicas realizadas não só por este Prefeito, mas pelos que me antecederam também. Em 2003, iniciaram-se as ocupações irregulares ante a mais que centenárias propriedades com cadeias dominiais perfeitamente registradas e devidamente documentadas. Aí eu preciso dizer que o direito de propriedade trata-se de uma cláusula pétrea da nossa Constituição Federal, que é a nossa lei maior. Eu percebo que, neste momento, nós estamos vivenciando uma insegurança jurídica tremenda que nós precisamos resolver. Nós defendemos o bom diálogo, nós defendemos a pacificação dessa situação. No bojo da ACO 3.555, que já foi abordada anteriormente aqui, o Município de Guaíra entrou com um agravo regimental. Guaíra nunca fez parte - nunca foi ouvida, nunca foi soberana - desses processos, pretensos processos de demarcação. Eu nunca vi isso! Se não está nada homologado e nada demarcado, por qual razão há essas restrições a crédito bancário por parte dos nossos queridos produtores? Desses absurdos é que eu preciso fazer registro neste momento. Registre-se que são ocupações urbanas e rurais no Município de Guaíra. |
| R | Já foram abordados por algum dos meus antecessores os riscos fitossanitários. A população que se diz indígena, ou descendente de indígenas, seja lá como for - depende de quem fala e quem interpreta -, mas eu tenho... Eu conheci Guaíra em 1973, aos meus 13 anos, e eu tenho 63. Nós chamávamos aquela população - carinhosamente, diga-se - de queridos bugrinhos, perfeitamente incorporados na nossa sociedade, registrados com carteira de trabalho, trabalhando em Guaíra. E hoje nós estamos presenciando uma... Eles podem transitar de um país a outro, inclusive se utilizando de embarcações, passam pela ponte... (Soa a campainha.) O SR. HERALDO TRENTO - ... têm livre trânsito, e esses riscos são iminentes. Eu fico preocupado, porque, no Estado do Paraná, tilápia, suíno, frango podem, sim, ser contaminados. Os senhores já imaginaram o prejuízo que isso causaria por uma cadeia de cooperados? Eu me refiro aos frigoríficos, aos aviários. Enfim, é muita coisa que está em jogo. Repito: eu não vim aqui para falar mal de descendentes de indígenas, não. Não! O município, inclusive, Senador e senhores, tem feito a sua parte, acolhido as crianças, que não têm culpa alguma, no nosso sistema educacional, distribuindo merenda escolar, uniformes, material escolar, para que não haja nenhum tipo de discriminação. Então, quero enfatizar isto: são seres humanos e precisam ser respeitados. E nós estamos fazendo a nossa parte lá no município. Nós estamos em fase de implantação, discussão e elaboração do nosso novo plano diretor, que já adiamos por duas vezes. O que é plano diretor senão o planejamento do território do nosso município? Tivemos que adiar por duas ocasiões! Esperamos que isso se resolva o mais rápido possível, porque eu quero terminar o meu mandato, o segundo mandato consecutivo, botando a cabeça no travesseiro e de consciência absolutamente tranquila. (Soa a campainha.) O SR. HERALDO TRENTO - Nós, nesse planejamento municipal, estamos prevendo que Guaíra tenha uma localização privilegiada. Nós podemos implementar a Hidrovia Paraná-Tietê. Nós temos duas BRs. Quem conhece a Ponte Ayrton Senna sabe do que estou falando. A BR-163 começa lá no seu estado, Senador, e termina onde? Lá no Pará. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Fora do microfone.) - Prefeito, fique tranquilo porque até de paraquedas eu saltei em Guaíra. O SR. HERALDO TRENTO - Então, conhece, não é? Nós precisamos... |
| R | Olha, a Ferroeste está programada para ir para lá. Veja, nós estamos ampliando o nosso aeroporto, fazendo recapeamento. Nós queremos voos regulares e voos maiores. Nós temos que resolver isso. (Soa a campainha.) O SR. HERALDO TRENTO - Eu tenho conversado com todas as instituições, inclusive com a Itaipu Binacional. Parece-me que, no bojo dessa Ação 3.555, talvez nós tenhamos a oportunidade de fazer uma grande negociação para pacificarmos definitivamente isso. Ora, se há uma dívida histórica - porque isso envolve três aspectos: administrativo, político e jurídico -, nós temos que encontrar o bom termo para que nós solucionemos e pacifiquemos definitivamente essa situação. Eu agradeço demais por estar aqui, hoje, Senador e todos os senhores que nos veem, que nos assistem e que nos prestigiam neste momento. Se há um entendimento por parte da Itaipu Binacional - e me parece que há - de que se adquira, se compre... (Soa a campainha.) O SR. HERALDO TRENTO - ... desde que haja a possibilidade... O proprietário precisa querer vender, não se pode obrigar, mas é um mecanismo interessante encontrar áreas longe da fronteira para evitarmos crimes transfronteiriços e a insegurança fitossanitária. Muitíssimo obrigado pela oportunidade. Quero me colocar à disposição para responder qualquer tipo de pergunta que os senhores tenham. Muito obrigado! O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Agradeço, Prefeito Heraldo Trento. De fato, todos nós conhecemos a história de Guaíra. Eu, inclusive, quando era criança e adolescente, frequentava muito ali, viajava muito para visitar as Sete Quedas. Hoje, infelizmente, ela vive outro drama da insegurança decorrente dessas demarcações pendentes e dessas dúvidas sobre os critérios jurídicos que serão empregados. Eu vou passar a palavra agora, aqui, ao representante do Ministério da Justiça, Dr. Pedro Henrique Viana Martinez, que é Diretor de Promoção de Acesso à Justiça da Secretaria de Acesso à Justiça do Ministério da Justiça e Segurança Pública, reiterando apenas, Dr. Pedro, a nossa questão fundamental: ouvimos o Dr. Matheus falando que será observada a lei do marco temporal, se eu entendi, compreendi perfeitamente a resposta de S. Exa. Pediria também que essa questão fosse abordada em relação ao Ministério da Justiça. Muito obrigado. O SR. PEDRO HENRIQUE VIANA MARTINEZ (Para expor.) - Boa tarde a todas e todos. Cumprimento o Senador Sergio Moro, Presidente da audiência; também os meus colegas e minhas colegas aqui de mesa. Cumprimento também todos os Senadores e as Senadoras, na figura da Senadora Teresa Leitão; também os Parlamentares da Câmara, na figura do Deputado Pedro Lupion; membros da imprensa; demais convidados presentes e também os que nos assistem virtualmente. Senadores, hoje eu gostaria de fazer uma fala simples e também rápida - teremos também perguntas posteriormente. É importante iniciar destacando que nós temos este mandamento constitucional de que o Estado deve garantir aos povos indígenas os direitos originários sobre as terras tradicionalmente ocupadas, com destaque ao art. 231 da Constituição. |
| R | Esse procedimento demarcatório é bem complexo, como nós pudemos ver aqui pelas exposições dos servidores da Funai. E, em razão disso, pelas complexidades variadas, ele, em grande parte das vezes, leva décadas, inclusive, para ser concluído. E, assim como outros procedimentos relacionados a questões fundiárias não só em terras indígenas, mas também em outros cenários no campo e também na cidade, esses procedimentos muitas vezes acabam causando conflitos de várias ordens, inclusive como esse que foi referido aqui no Paraná. O Ministério da Justiça, historicamente, vem cumprindo também este papel de atuar de forma a mitigar esses conflitos. É importante que... A Funai, inclusive, passou décadas vinculada ao Ministério da Justiça. Então, o ministério, historicamente, vem... Durante esse período, houve muitas demarcações, e sempre se buscou que isso fosse feito de uma forma com essa mitigação, com essa mediação de conflitos das variadas ordens. A demarcação de terras indígenas é uma questão cara, importante para o Ministério da Justiça e para o Governo, de forma geral, e queremos que isso seja encaminhado, sim, no sentido da mitigação desses conflitos que possam eventualmente envolver cada uma dessas terras, pautado na segurança jurídica necessária para a atuação do Governo de uma forma geral. É muito importante que o Governo atue, obviamente, dentro dessa segurança jurídica, para, como eu disse, então, mitigar esses conflitos e não para criar mais. Eu não posso deixar de mencionar que, como os senhores e as senhoras bem sabem, houve o julgamento de um recurso extraordinário no Supremo Tribunal Federal no ano passado com repercussão geral no Tema 1.031, julgamento que ainda não se finalizou por completo. A Advocacia-Geral da União, inclusive, na semana passada, apresentou embargos de declaração, solicitando esclarecimentos. Temos também outras ações em que se discute a constitucionalidade, como a ACO 1.100, e as próprias ações em relação à Lei 14.701, que se discute hoje aqui. |
| R | Em relação aos processos demarcatórios atualmente e à atuação do Ministério da Justiça, Senador Sergio Moro, cabe a mim aqui colocar que o Ministério da Justiça vai continuar fazendo aquilo que é o seu dever, a sua competência, que é justamente fazer os levantamentos técnicos com análises, levantamentos técnicos que passam também por análise jurídica, para subsidiar a tomada das decisões. Então, é isso o que o ministério, neste momento, continuará fazendo. Em relação às terras da região de Guaíra, no Paraná - o Prefeito Heraldo bem explanou a situação -, o que eu tenho a dizer no âmbito do Ministério da Justiça é que esse procedimento não chegou ao ministério. A Dra. Janete colocou ali as fases do procedimento demarcatório, e, pelo que eu pude identificar da fala do Dr. Matheus, ele está numa fase inicial de identificação, não chegou nessa fase ao Ministério da Justiça. Então, não teríamos nenhuma informação a prestar a respeito desse caso específico, Senador. Só reforço, já me encaminhando aqui para finalizar a fala, que o Ministério da Justiça se pauta por essa atuação técnica, visando essa mitigação de conflitos. Nesse sentido, estamos à disposição também para as perguntas que podem vir agora, mas estamos, em momentos posteriores, à disposição de todas e todos, das senhoras e dos senhores para eventuais esclarecimentos adicionais. Isso pode ser feito das variadas formas. E agradecemos também esse convite para participar aqui da audiência pública neste tema tão relevante. Obrigado, Senador. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Eu agradeço aqui ao Dr. Pedro Henrique Viana Martinez, também pela sua disposição para responder as indagações que forem feitas. Vamos para a fase de inquirições dos Senadores, mas, antes de passar a isso, o Prefeito aqui me alertou que ele tinha um vídeo de um minuto que tem ali um retrato um pouco dos problemas da região. Se puderem passar o vídeo só... (Pausa.) Vão conseguir ali? (Pausa.) Não suporta? Então, vamos fazer aqui a última forma, como diria o nosso Senador Hamilton Mourão. Antes de passar a palavra aqui para os nossos Senadores, tomando aqui a liberdade, quero fazer uma pergunta aqui da Presidência da Mesa, para deixar claro. E aqui eu dirijo a pergunta ao Dr. Matheus e ao Dr. Pedro. A lei do marco temporal, Lei 14.701, estabelece que as demarcações considerarão as terras ocupadas pelas populações indígenas ou povos originários em 1988, e ocupações posteriores não seriam consideradas, pelo que estabelece a legislação. Nas demarcações que serão feitas após a publicação dessa lei, esse critério vai ser observado pela Funai e pelo Ministério da Justiça? (Pausa.) (Intervenção fora do microfone.) |
| R | O SR. MATHEUS ANTUNES DE OLIVEIRA (Para expor.) - Excelência, como já mencionado pela Diretora e pela Coordenadora-Geral, existem várias normas que tratam do processo de demarcação de terra indígena, e todas elas são, sim, observadas. O ordenamento jurídico é rico de normas que devem ser observadas. E, nas orientações da Procuradoria Federal Especializada junto à Funai, nós temos, sim, orientado a observância da legislação, da Lei 14.701, dos seus dispositivos. Nossa análise ocorre nos casos concretos. Então, a partir da análise técnica dos casos concretos, são encaminhadas dúvidas, caso existam dúvidas, e nós apresentamos a manifestação com base na análise de todo o ordenamento, dentro do qual há as disposições da Lei 14.701. Isso, sem dúvida. O SR. PEDRO HENRIQUE VIANA MARTINEZ (Para expor.) - Senador, a Funai é responsável por instruir os processos nessa primeira etapa e enviar ao Ministério da Justiça. E, como eu disse, o que me cabe responder aqui é que o Ministério da Justiça vai pautar a sua atuação pelos aspectos técnicos e jurídicos existentes. Portanto, esse é o indicativo do Ministério da Justiça. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - É que o ponto é exatamente essa insegurança jurídica. Por exemplo, foram mostradas aqui, se é que está certa essa situação - e, claro, isto vai ser discutido no caso concreto -, pelo Procurador da Faep áreas do Município de Guaíra que não eram ocupadas em 2011 e que foram ocupadas a partir de 2015, sob a alegação de que seriam áreas tradicionalmente indígenas. Então, o objetivo desta audiência é exatamente a gente ter uma resposta dos órgãos encarregados da demarcação sobre essa questão, até para dar a tranquilidade necessária aqui ao nosso Prefeito de Guaíra, mas não especificamente a ele, no fundo, à população da região e de todo o Brasil. Eu vou passar a palavra aqui aos Senadores e, se possível, gostaria que isso fosse respondido. A Senadora Tereza Cristina tem a palavra. A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS. Para interpelar.) - Obrigada, Senador Moro. Quero cumprimentar a todos pelas exposições. Desculpem, tive que sair um minutinho, porque aqui a gente não tem como ficar aqui o tempo todo, mas eu quero aí agradecer a todos que vieram. Quero colocar aqui um ponto. Em 2018, nós tivemos um despacho da Fundação Nacional do Índio, da Funai que ratificava a identificação da Terra Indígena Tekohá Guasu Guavira, situada em Altônia, Guaíra e Terra Roxa, como foi exposto aqui pelo Procurador e por outros palestrantes, que foi suspenso pelo Tribunal Regional Federal (TRF), que acatou a solicitação da Faep (Federação da Agricultura do Paraná). Foram interrompidos os procedimentos demarcatórios das terras indígenas nos municípios do oeste do Paraná. Na ação, foi reconhecida a ilegalidade praticada pela Funai ao longo de todo o processo administrativo. Em 15 de janeiro de 2024, o Ministro Edson Fachin, por meio de uma decisão monocrática, revogou decisões judiciais que impediam a Funai de dar continuidade ao processo de demarcação, reconhecidamente viciado. Com isso, os processos administrativos foram retomados, suscitando questionamentos quanto ao procedimento de demarcação a ser adotado, em especial diante da publicação da Lei 14.701, de 2023. |
| R | Diante do cenário jurídico atualmente em vigor no Brasil, é fundamental que a Funai, o Ministério da Justiça e Segurança Pública e o Ministério dos Povos Indígenas esclareçam como a lei aprovada pelo Congresso Nacional está sendo aplicada pelo Poder Executivo. Eu acho que isso não é o caso do Paraná, é o caso... O Brasil todo precisa saber como é que isso vai se dar. Essa é a grande insegurança jurídica que nós temos hoje. Então, considerando a previsão do art. 14 da Lei 14.701, de 2023, com a aplicação imediata da lei, qual está sendo o procedimento no âmbito da Funai, no Ministério da Justiça e Segurança Pública e no Ministério dos Povos Indígenas para a adequação dos processos administrativos em curso? Essa é a primeira pergunta que eu gostaria de colocar. Especificamente em relação aos processos de demarcação da Terra Indígena Tekohá Guasu Guavira, qual a atual situação, considerando que pela lei é impossível qualquer impedimento a regular a utilização das áreas pelos atuais proprietários? Nós vimos aqui o CAR do proprietário, hoje ele impedido de qualquer atuação na sua área, sendo que isso... Como é que isso vai se dar? Então, de novo, é a insegurança jurídica total. Os CARs foram suspensos. Será que eles deveriam já estar suspensos? A Funai já adequou os procedimentos de demarcação à Lei 14.701, de 2023, que está em vigor? Ela foi aprovada, homologada, os vetos derrubados pelo Congresso Nacional. E aí eu quero fazer uma pergunta. O que motiva a Funai a pedir ao STF a suspensão da aplicação da Lei 14.701, de 2023? A Funai não reconhece a legitimidade do Congresso Nacional para legislar sobre o tema? Essa é uma pergunta que todos querem saber, todos querem uma resposta. Como estão os andamentos dos procedimentos para a criação das reservas indígenas? E a Funai está assegurando o pleno acesso de interessados aos procedimentos administrativos em curso? Acho que essas são as perguntas que muitos querem saber, e nós precisamos levar isso para que as pessoas possam ter tranquilidade, tanto os indígenas quanto os produtores, enfim, para as áreas urbanas, em que temos aí em curso... Essas eram as minhas perguntas. Muito obrigada, Senador Moro. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Seguimos respondendo um a um e depois passamos... O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Fora do microfone.) - De três em três. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Três em três? Está bom. Então, na ordem, seria aqui o Senador Zequinha Marinho para suas indagações, Senador. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Fora do microfone.) - Sobrou alguma coisa para você? O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA. Para interpelar.) - Sobrou não. Eu vou repetir aqui, o que talvez acrescente de alguma forma, mas a nossa Tereza Cristina foi no fígado. |
| R | Eu queria aqui cumprimentar o Senador Sergio Moro pela iniciativa. Sei que o Paraná tem problema, mas o parente do Paraná que é o Pará... Na sequência dos filhos, os pais vão só mudando um pouquinho, não é, Prefeito? O Pará sofre possivelmente muito mais do que o Paraná neste momento. E, em tudo que se ouviu aqui, todo mundo está falando da questão legal, legal, legal, legal... Do meu ponto de vista, nem tudo está tão legal. E é com relação a isso que eu gostaria de ouvi-los neste momento, Sr. Procurador, senhor representante do Ministério da Justiça. Primeiro, como já foi citado aqui pela Senadora Tereza, a partir do requerimento para ser debatido, a área, o CAR... A Funai já vai lá e coloca o impedimento na terra do cara. O cara não tem mais acesso a financiamento, porque está sobrepondo terra indígena. O Dr. Klauss colocou isso ali ainda há pouco. É legal isso? Isso está previsto em lei? Para mim não está. Então, esse é o primeiro ponto que eu queria colocar. Por que a dificuldade de acessar os processos administrativos na formação de uma terra indígena? Ou o meu pessoal está ruim de internet, pois não conseguem, ou eles não estão à disposição para a visitação pública, como foi dito aqui ainda há pouco. O processo é criado e tal, e você tem direito de fazer isso. Nós não conseguimos até agora nenhum - mas nenhum! Não sei se nós estamos errados, alguns assessores estão aqui, mas eu queria que nos dessem, então, este endereço: "Entre aqui e você vai encontrar tudo que você precisa". É porque as pessoas, lá no meu estado, estão desesperadas tentando se manifestar de alguma forma. Outra situação que eu queria colocar aqui: como são escolhidos os antropólogos que fazem os laudos dessas áreas? De que maneira o serviço público está escolhendo essas pessoas? À boca miúda, se conta um negócio meio esquisito, esquisito, são militantes dessa causa. Por onde eu conheço, o estudo antropológico foi feito dizendo que já morou índio lá. É claro que não tem como. Se eu perguntar a três, quatro gerações para trás, eles não dão notícia de índio nessa região. No entanto, o antropólogo disse que lá tinha índio, que morava... E a Constituição fala - e os senhores repetiram aqui por vezes - em áreas habitadas tradicionalmente. Lá no meu estado, tem algumas; no resto é tudo muito novo, muito novo. Então, eu queria saber como é que está sendo, que tipo de transparência pública está tendo para a escolha desses antropólogos que estão realizando esses laudos. Lá no meu estado, o pessoal diz que são todos fraudulentos, mentirosos, que induzem a Funai e o Governo a tomarem posições que não devem. A outra é sobre o marco temporal, mas já entendi: ele não está sendo levado em conta. Nem o Procurador nem o representante do Ministério da Justiça, o Sr. Pedro, não garantiram isso. Naturalmente, isso está sendo questionado no Supremo, e esta Casa precisa tomar outras medidas. Nós temos aí a caminho - está aqui o Relator - a PEC 48. Na semana que vem, o relatório estará pronto, vamos ter que votar. E, em vez de explicar, vamos ter que desenhar, Prefeito - explicar é uma coisa, desenhar é outra -, porque, lamentavelmente, o Supremo não lê da forma como está escrita na Constituição a questão do marco temporal. Então, a redação agora é simples, curta, grossa, direta, um verdadeiro desenho, para que se possa entender essa questão de marco temporal. |
| R | A Dra. Janete falou que nós temos 138 GTs trabalhando, e eu queria perguntar ao ministério, ao Dr. Pedro, de forma mais específica, como é que o Ministério da Justiça, que é o coordenador de tudo isso legalmente, vê essa militância política das ONGs, usando os indígenas, se associando ao Ministério Público e ao ministério atual dos povos tradicionais, dos povos originários, nessa corrida louca por criar tantas terras indígenas. Por mais que, no nosso censo de 2022, tenha aumentado o número, porque é uma graça, é graciosa a pergunta que é feita para aumentar o número de pessoas indígenas, por mais que tenha crescido, não tem onde colocar, a menos que se faça o que se está fazendo lá no Pará: pegam uma família daqui, colocam lá na frente e ali buscam criar uma terra indígena; pegam um pouquinho de outra família aqui, colocam em outro lugar e buscam criar uma terra indígena. Aí, sim, dá para você espalhar pelo Brasil todo e criar mais. Na verdade, meus números não são 400, Doutora, mas mais de 600 terras indígenas. Tudo bem, eu vou ficar com o número que a senhora passou. É muita terra e, com certeza, não tem índio para botar em tudo isso. Como é que o senhor está avaliando essa militância política dessas instituições nessa loucura para devolver ao Brasil a questão indígena como era originalmente aqui, no passado, 524 anos atrás? Prova disso é a quantidade. Nenhum órgão do Governo, olha só, nenhum órgão de Governo corre tanto como a Funai está correndo neste momento: 138 GTs analisando pedidos, solicitações, requerimentos. E nós sabemos que aqui, Prefeito - não sei lá no seu estado, mas no meu -, quem é que comanda isso. Não são os nossos indígenas, porque o Pará é tão grande, tão espaçoso que o coitado do índio fica perdido, não sabe a dimensão da sua terra, mas as ONGs, que comandam, que tocam isso, que têm dinheiro, que captam recursos. Essa questão ambiental é uma questão interessante. Eles vão lá fora, captam recursos, se fortalecem aqui, transportam, correm de avião, de carro, têm como levar, têm como trazer, têm como dar comida, têm como pagar hotel, têm como fazer tudo. |
| R | Por isso eu estou perguntando: como é que o ministério está vendo isso? Qual é a análise que o ministério tem feito dessa loucura? Não tem razão, nunca teve isso, não tem necessidade disso, mas tem uma vontade maluca. Eu queria saber do Dr. Pedro como é que eles estão avaliando isso, se essa luzinha amarela já acendeu lá, se estão ligados, não é? Era isso, Sr. Presidente. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Eu passo a palavra à Senadora (Fora do microfone.) Margareth Buzetti. A SRA. MARGARETH BUZETTI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MT. Para interpelar.) - Obrigada, Presidente. Bem-vindos todos os que nos esclareceram a questão do Paraná, mas a questão do Paraná não é só no Paraná. Faço minhas as palavras da Senadora Tereza Cristina. Nós estamos, no Mato Grosso, com um problema seriíssimo por causa de demarcações. E a maioria... A Janete sabe que eu estive lá no começo do ano pedindo: onde estão e quais áreas seriam demarcadas? Aí, me foi solicitado um ofício para o Ministério da Justiça, assim eu o fiz, e, até hoje, depois de um ano, eu não tenho acesso a essas demarcações. Sabe-se, fala-se, mas lá nós estamos com um conflito numa reserva dos povos originários que foram colocados lá. E não tem dez indígenas. Isso é uma coisa muito séria. Maria Janete, você falou que a União tem a obrigação de proteger os povos originários e as suas propriedades. A União tem a obrigação de proteger todos os brasileiros. Nós temos que conviver em paz, senão não vai dar certo. Ou nós chegamos a um consenso, ou não vai dar certo. Em Brasnorte, nós perdemos 156 mil hectares para uma reserva e 205 para outra. Quer dizer, é um município só de produtores rurais. Então, é uma indagação que eu faço a vocês. O Ministério da Justiça não me respondeu. Eu viajei com o Ministro Flávio Dino, fui ao Mato Grosso, ele foi falar com representantes rurais, viu o que está acontecendo, e nós ficamos na mesma. Nada é respondido diretamente para nós. Como está? Como vai ficar? Em que hora vai parar isso? E por que o Governo não reconhece a nossa lei, que foi aprovada no Congresso Nacional? Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Tendo as questões de três Senadores, eu passaria aqui às respostas. A Senadora gostaria de dirigir as suas perguntas para quais deles? A SRA. MARGARETH BUZETTI (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MT. Fora do microfone.) - Pode ser a Dra. Maria Janete, o Procurador do Paraná e o Ministério da Justiça também, é importante. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Eu pediria então, de repente, para começar pela Funai, pelo que eu acho que é a questão fundamental e a que esta Comissão merece uma resposta objetiva, que é se a 14.701 vai ser cumprida ou não vai ser cumprida. Aqui, desculpe, Doutor, mas precisamos de uma posição do Ministério da Justiça bastante clara. Dizer que a gente vai seguir ordenamento jurídico acaba jogando um pouco uma dúvida: se dentro desse ordenamento jurídico a gente está considerando a 14.701. Então, passo a palavra, primeiro, à Dra. Janete. |
| R | A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO (Para expor.) - Obrigada. Buscarei tentar responder de forma muito objetiva. A Lei 14.701 é uma lei em vigor e estão sendo adotados os procedimentos, inclusive para a adequação daquilo que tem que ser feito. Existem alguns questionamentos em relação até, em termos de materialidade, nem entrando no mérito, mas, em termos do processo administrativo em si, porque a Funai não é regida apenas pela Lei 14.701. Todo o processo de regularização fundiária, como bem falou o Dr. Matheus, tem um arcabouço legal que precisa ser, todo ele, observado. Nesse sentido, a gente está observando o arcabouço como um todo para poder adequar os procedimentos da Funai à aplicação irrestrita dos procedimentos legais e das normativas vigentes. Em relação ao caso concreto, inclusive, cabe lembrar que as terras estão em estudo, elas estão na primeira fase. Os processos não se iniciaram agora. A suspensão feita pelo STF foi agora, janeiro, após a promulgação da lei, em dezembro de 2023, e, imediatamente, o que a Funai tem feito é justamente observar o processo e, em diálogo com a nossa Procuradoria, questionar a continuidade dos processos considerando os procedimentos legais existentes. A gente está exatamente nesta fase em que há um questionamento da área técnica à área jurídica para justamente a gente poder adequar. Em relação ao CAR, a Funai não opera o CAR. Não cabe à Funai colocar ou não impeditivo. É o sistema que existe. O Sigef também não é da Funai, e é autodeclaratório, inclusive, o CAR. Então, não cabe à Funai levantar um impedimento que não é da Funai. A gente está fazendo estritamente o nosso trabalho... (Soa a campainha.) A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO - ... a nossa missão e o nosso procedimento técnico legal. (Intervenção fora do microfone.) A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO - Acho que respondi a todas. Sim, a Senadora perguntou sobre o acesso aos processos, o que também está previsto na lei. Existem outras leis também que falam sobre acesso à informação, e a gente está tentando justamente fazer essa adequação. Uma vez publicados os estudos, são amplamente públicos, basta solicitar, e a gente vai disponibilizar. Quanto aos procedimentos preparatórios, aqueles documentos que são restritos por força de outros dispositivos legais, também estamos tentando ver em que medida podem ser colocados para, justamente, não comprometer o trabalho técnico, que é especializado também. Da mesma forma que não são disponibilizados claramente projetos de engenharia em relação a grandes empreendimentos para o público em geral, os procedimentos preparatórios da Funai também têm esse direito de estar ainda em discussão, que é uma discussão técnica, a gente não chegou a conclusão nenhuma. Quando eles estão em estudo, os grupos de trabalho estão em estudo, não há uma conclusão acerca de se vai realmente ser uma terra indígena, se não vai. A gente ainda está estudando. Quando é publicada a proposta de limites, publicada no Diário Oficial, é que há um posicionamento claro e irrestrito da Funai de que aquela é a proposta para o cumprimento da Constituição Federal. Então, em relação aos processos, é isto: há a publicidade já garantida desde a publicação dos relatórios em Diário Oficial. E, em relação aos procedimentos preparatórios, como temos que observar um grande arcabouço de leis para além da 14.701, a gente não pode simplesmente deixar todo o nosso arcabouço de processos disponível por uma questão de segurança de informação, como todo órgão público, mas, fazendo a solicitação, também a gente pode disponibilizar. |
| R | A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS. Para interpelar.) - Queria fazer uma pergunta: quem lança as áreas indígenas que serão passíveis de demarcação? É a Funai? É o Ministério da Gestão? Quem lança? Quem faz esse lançamento, que, daí, dá o impedimento do CAR imediato? A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO (Para expor.) - As bases cartográficas e georreferenciadas de terras delimitadas, aquelas que já têm limite conhecido, publicados no Diário Oficial, são dados públicos. Como há uma integração dos sistemas, enfim, já há o conhecimento dessas terras delimitadas. Não é a Funai que entra lá no CAR e coloca uma terra indígena, até porque o CAR é autodeclaratório. Em relação a isso, é isso, os dados são públicos. (Intervenção fora do microfone.) A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO - O Sigef, até por dispositivos legais e de ordenamento justamente da informação pública do ordenamento territorial, a Funai disponibiliza esses dados, sim, do Sigef. E, inclusive, diante não só do julgamento do STF quanto do novo dispositivo legal, também estamos em ajustes para poder justamente adequar a nova normativa legal em relação ao Sigef. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Doutora, só para esclarecer, para ver se eu entendi bem: então, a Funai, a partir da publicação da lei, vai considerar como terra demarcável apenas aquela ocupada em 1988 ou vai seguir o critério anterior? A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO - Desculpe, Presidente? Desculpe. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Após a publicação da 14.701, a Funai vai considerar então como terras demarcáveis apenas aquelas que eram ocupadas em 1988 ou também aquelas que foram ocupadas posteriormente? A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO (Para expor.) - Então, mais uma vez, o processo de regularização fundiária permite outras modalidades. Aquelas que não se adéquam como terras tradicionalmente ocupadas previstas na Constituição e demais arcabouços legais podem ser regularizadas de uma outra maneira. Tudo tem que ser levado em consideração na avaliação do relatório de identificação e delimitação. E aí a gente tem que aguardar, inclusive, orientação com base nas análises jurídicas, nos embargos declaratórios, que já foram especificados, para justamente a gente ter clareza também para poder adequar os procedimentos técnicos. Então, a gente também... Desde a promulgação da Lei 14.701, a Funai não delimitou nenhuma área. A gente não andou. Temos áreas, estamos finalizando vários processos. Eu só queria, até, já tentando responder ao Senador Zequinha Marinho, dizer que, dos GTs de que a gente falou, poucos deles foram começados por agora. Tem GTs que foram iniciados há mais de dez anos e que têm dificuldades justamente por vários interpostos judiciais, que acabam agravando também essa situação de insegurança jurídica que os Senadores têm reportado. Haveria uma necessidade de a gente, inclusive... E a gente entende isto muito claramente: que a demora nesses processos de regularização fundiária pode agravar situações de violência e que não é para ninguém... A Funai defende os direitos dos povos indígenas, é sua missão institucional, mas isso não quer dizer que está sendo negado qualquer direito de qualquer cidadão brasileiro. Devemos, como servidores públicos, servir a população brasileira. No nosso caso específico, somos especializados no direito dos povos indígenas, mas há necessidade, talvez, de a gente, inclusive, reforçar o trabalho indigenista da Funai para que a gente possa não demorar tantos anos, causando essa insegurança jurídica, administrativa, porque a ocupação do território, o ordenamento territorial do país é dinâmico. |
| R | Ao mesmo tempo que a gente não pode negar o direito de quem quer que seja não indígena, os direitos dos indígenas também têm que ser respeitados, porque são igualmente cidadãos brasileiros. E é neste sentido que a gente está trabalhando: para tentar esclarecer os processos de regularização fundiária, concluí-los, tentar pacificar essa situação, que não é boa para ninguém, na verdade. Nesse sentido, a Funai tem trabalhado arduamente para tentar clarear. Às vezes, a gente falha, de fato, em relação à celeridade, justamente por falta de uma equipe técnica especializada para a gente terminar e trazer essa segurança jurídica tanto para proprietários quanto para Prefeitos, Governadores e, especialmente, no nosso caso, da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, para os povos indígenas. O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA. Para interpelar.) - Presidente, me permita fazer mais um pedido? Ela está indo muito bem na explicação, muito didática - muito bem, Doutora! Eu questionei a questão das escolhas dos antropólogos. A senhora poderia acrescentar, dar uma sequência aí? A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO (Para expor.) - Claro. Muito obrigada pela oportunidade. Então, quanto à escolha dos antropólogos, a princípio, até, a legislação também fala que tem que ser por profissionais reconhecidamente capazes, enfim, para desenvolver esses estudos. Então, a Funai também vai buscar... Assim como os grandes empreendedores buscam os melhores profissionais da engenharia, enfim, nós também buscamos os melhores profissionais para estar em campo com amplo conhecimento do fazer antropológico, especialmente das etnias envolvidas, justamente para tentar fazer essa tradução da forma tradicionalmente ocupada, de como foram as estratégias indígenas, para tentar fazer essa tradução inclusive para os nossos olhares e para os nossos processos, para a gente poder entender também, já que há uma diversidade de territorialidades aqui dentro do país. Então, na escolha dos antropólogos, a princípio, a gente busca isso. De preferência, seriam servidores da Funai. Infelizmente, nós temos pouquíssimos, hoje em dia, servidores da Funai antropólogos. Eu sou uma, meu cargo é de antropóloga da Funai, eu trabalho há mais de 20 anos na Fundação Nacional dos Povos Indígenas, mas, infelizmente, nós não temos antropólogos para todos os grupos de trabalho. Então, geralmente a gente busca parcerias com as universidades federais, com outros profissionais de reconhecido gabarito profissional do fazer antropológico e geralmente de conhecimento das etnias envolvidas para justamente trazer, repito, essa tradução de uma territorialidade, de um modo de vida, como previsto na Constituição, para elementos que a gente consiga entender, inclusive. O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA) - A Funai paga por isso, para a elaboração desses laudos? A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO - A gente tem buscado fazer termos de cooperação com as universidades federais e, aí, por serem também servidores públicos, a gente paga só o deslocamento e diárias, como é previsto na legislação. A gente tem algumas dificuldades de contratação de profissionais adequados, de profissionais em geral no serviço público, mas a gente busca primeiro fazer essas parcerias com outros servidores públicos. O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA. Fora do microfone.) - Muito bem. A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO - Não havendo, a gente pode fazer termos de cooperação. A gente faz processos seletivos, inclusive, para a contratação desses profissionais. |
| R | O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA) - Interessante. Há um caso, lá no meu estado, e eu queria ouvir a Funai com relação a isso. Por exemplo, se o laudo não convencer de que, naquela região, no passado, pelo menos - não é que não tenha hoje, mas em algum passado -, tenham morado, vivido índios, a Funai, ainda assim, avança, e faz, e acontece, ou para exatamente ali, por falta de argumentação técnica do laudo? A SRA. MARIA JANETE ALBUQUERQUE DE CARVALHO - Se o relatório não atender ou trouxer elementos muito pequenos, é reprovado. O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA) - Nós temos um caso - talvez a senhora conheça esse caso -, que é uma expansão - não é a terra original, é uma expansão - da Terra Indígena Apyterewa, a expansão da Terra Indígena Apyterewa. Tem um processo em que a própria Funai diz que as informações trazidas pelo laudo não motivam a criação daquela expansão - não estou tratando da terra original -, que tem sido motivo de muito debate lá no Pará e das piores injustiças que eu já vi se cometer aqui na terra com aquela gente lá, porque a narrativa, meu caro Ministro e Senador, é de que o pessoal invadiu a terra indígena, mas não é. A verdade dos fatos - eu falo porque moro, tenho 64 anos e moro há 50 anos naquela região lá - é que a terra indígena é que invadiu aquela turma, e foram tirados na pancadaria de lá agora, coisa mais louca do mundo. Claro, isso aí já é um problema não mais da Funai, isso é um problema já da Justiça e do Ministério Público. Se a senhora observar lá, inclusive nós estamos trabalhando em cima disso... Se a Funai não se convence de que as informações contidas no principal documento da criação de uma terra indígena, por que aquilo aconteceu? Por isso que eu digo, repito aqui a questão da militância política na busca, no afã de se transformar tudo em terra indígena. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Eu vou passar as perguntas agora para os próximos Senadores. Vou pedir para, como se aproxima lá a Ordem do Dia, se possível, contando com a compreensão de V. Exas., serem bastante objetivos. Então, temos aqui o Senador Jaime Bagattoli, a Senadora Teresa Leitão, o Senador Esperidião Amin e depois temos também Deputados que se inscreveram: os Deputados Pedro Lupion, Sergio Souza e José Medeiros. Senador Bagattoli. O SR. JAIME BAGATTOLI (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO. Para interpelar.) - Quero cumprimentar aqui o nosso Senador Sergio Moro, Presidente desta audiência pública. Já quero deixar o que eu vou falar aqui - as perguntas - à Maria Janete e ao Pedro Henrique. Primeiramente, igual fala o Senador aqui que eu fui expulso de Santa Catarina, ele sempre fala que eu era cacique - mas isso é brincadeira - xoclengue. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Fora do microfone.) - Ele nasceu lá. O SR. JAIME BAGATTOLI (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) - A primeira pergunta que eu quero fazer: o Supremo Tribunal Federal, igual falou a nossa Senadora e eterna Ministra Tereza Cristina, votou o marco temporal em cima daquela reserva indígena lá de Santa Catarina que pega dois Municípios, o José Boiteux e o Vitor Meireles, antigamente pertencendo a Ibirama. Eu nasci lá, conheço a reserva, a reserva era de 14,5 mil hectares, continuam os 14,5 mil hectares. Agora, o Supremo Tribunal Federal votou o marco temporal lá. |
| R | Eu quero saber se vocês vão realmente cumprir o que o Supremo votou e tirar 860 famílias do campo. Nós estamos falando aqui, eu e o Zequinha Marinho - o Zequinha Marinho é do Pará, eu sou de Rondônia; nasci lá, mas estou em Rondônia há 50 anos -, se vão tirar essas famílias com escritura pública - 75%, 80% das escrituras são centenárias, mais de cem anos. Então, nem vamos falar em Constituição de 1988, mas se votou lá. Eu quero saber, porque deve ser de conhecimento, como o Supremo votou, se vão tirar essas famílias, vão indenizar, porque as famílias estão desesperadas, tem gente que já se matou lá. Como vão indenizar uma propriedade da quarta, quinta, sexta geração? Fui para Rondônia, chego lá a Rondônia em 1973, 1974, quando começou o maior projeto de reforma agrária já visto no Brasil. Volto a repetir: o maior projeto de reforma agrária visto no Brasil. Não existia nenhuma companhia em Rondônia vendendo terra, não existe nenhum documento de terra através de uma companhia. São 100% Incra, 100% Incra. Começaram lá os estudos em 1972, 1973; nós já estávamos em final de 1973, 1974; a demarcação e a licitação para as áreas maiores começou em 1975; e as pessoas do Brasil inteiro foram para o Estado de Rondônia - estado, não; território, porque só passou a ser estado em 1981 para 1982. Então, era um slogan no Jornal Nacional, às 20h, a hora em que começava o Jornal Nacional: projeto de integração, "integrar para não entregar". O que queria dizer integrar? Você sabe quanta gente foi do Paraná: pessoas do Paraná, do Brasil inteiro foram para lá. Muito bem. Não existiu nenhuma terra demarcada pelo Incra em que não existisse uma negativa da Funai. Tinha que existir uma negativa da Funai, senão não podia fazer as demarcações. No meu Município de Vilhena, município de 1,15 milhão de hectares, 57% já são reserva indígena sacramentada, não tem o que fazer. Está certo, está lá, ali não tem mais nenhum hectare com problema, mas vamos aos outros municípios. Lá, o Município de Monte Negro era um município em que fizeram um assentamento de 1,8 mil famílias. Agora estão querendo aumentar a reserva. Não é. O assentamento o Incra fez em 1977, documentou, colocou essas pessoas lá. Agora querem aumentar a demarcação das terras indígenas, para tirar mais 120 famílias do campo. Essa reserva parece que está próxima de 1 milhão de hectares, quinhentos e poucos índios. Aí vão aumentar para tirar essas 120 famílias sofridas, que estão lá desde 1977. Aí vamos à Gleba Corumbiara. Na Gleba Corumbiara, para vocês entenderem, tudo foi feito pelo Incra, 100% sacramentado. Aí surgiu a Funai, que alegava que tinha cinco ou seis índios dispersos, que tinham saído da aldeia e tinham se perdido. Encontraram os cinco, seis índios. |
| R | (Soa a campainha.) O SR. JAIME BAGATTOLI (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) - Aí todos vocês ouviram falar do tal do Índio do Buraco. Foi conhecido pelo Brasil inteiro. Aí não se achava o Índio do Buraco. Não se achava, localizava; só faltava ele. No ano passado - se não me falha a memória, em novembro, em dezembro; deve ter dados da Funai, a senhora deve ter esses dados -, foi no final do ano passado, acharam o índio, parece que o índio morreu. Acharam numa mata lá, o índio morreu. Meus Srs. Senadores, Deputados Federais, os que estão presentes, quem nos está acompanhando pelo Brasil, por causa disso, foram interditados 23 mil hectares - 23 mil hectares. E agora não existe mais, não tem mais, só existia ele. Sabe o que eu vejo? Eu vi no Supremo uma decisão dizendo que os 23 mil hectares, que são dos produtores, vão ficar em memória ao Índio do Buraco. (Soa a campainha.) O SR. JAIME BAGATTOLI (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) - Gente, meu Deus. Nós precisamos, igual ao que disse a Senadora Tereza Cristina, dar tranquilidade, paz no campo. Nós queremos paz. Ninguém quer... Nós sabemos dos nossos direitos. Nós temos muito respeito pelos povos originários e precisamos ter, porque, se vocês levarem um antropólogo, em qualquer lugar deste Brasil, os índios estiveram lá. Vocês imaginem na Amazônia, como vai dizer que a divisa estava lá, estava lá, estava lá, mas as áreas foram demarcadas até 1988. O que nós queremos, o que o Congresso Nacional quer, o que os Senadores, os Deputados, o que o povo brasileiro quer é paz no campo. E o que nós só queremos é que respeite... (Soa a campainha.) O SR. JAIME BAGATTOLI (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) - ... igual ao que falou o Senador Sergio Moro... Nós queremos só... Essa pergunta é que nos resta: vai ser respeitada a Constituição de 1988? Vai ser respeitado o que o Senado e a Câmara Federal votaram aqui ou não? Se não, nós vamos ter outra audiência para marcar outra audiência. Meu muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Passo a palavra à Senadora Teresa Leitão. A SRA. TERESA LEITÃO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para interpelar.) - Obrigada, Sr. Presidente. Quero cumprimentar todos os convidados e convidadas, como também os Senadores aqui presentes. Eu me atenho inicialmente ao requerimento do Senador que preside esta sessão, Sergio Moro, que, na sua justificação, pontuou que, embora a demanda venha dos poderes locais de Guaíra e Terra Roxa, municípios do oeste do Paraná, onde se localiza a Terra Indígena Guasú Guavirá, o debate pode se expandir para outras demandas - e é isso que nós estamos vendo aqui -, porém, como Senadora que preza o municipalismo e Senadora de um estado que tem a segunda maior população indígena do país, o Estado de Pernambuco, embora seja um estado territorialmente muito menor do que aqueles estados onde estão muitas terras indígenas, eu quero fazer do exemplo do Prefeito um exemplo de como o município pode expandir aquilo que acontece lá para o que acontece no Brasil. |
| R | O nosso Exmo. Prefeito, ao explanar toda a sua relação com a terra indígena lá do município que ele governa, colocou que conheceu os indígenas em 1973, assim que ele chegou lá, aos 13 anos de idade, e os indígenas estavam, portanto, lá na região de Guaíra, em 1988, que é a data da nossa Constituição, conhecida como Constituição Cidadã, e que tratou dessa questão de um modo, até, no ano passado, ser retomado com a Lei 14.701. Então, essas coisas nos devem servir de lição ou de exemplo para compatibilizarmos o que acontece com uma história, que a princípio é uma história pessoal, mas que se tornou pública, visto que o Prefeito é uma pessoa pública, com aquilo que acontece em outros estados do Brasil. Acho que militante todo mundo daqui desta sala é. Eu não nego que sou militante de várias causas: causa da educação, causa do direito das crianças e adolescentes, causa dos direitos humanos, causa dos povos indígenas, embora não entenda tanto quanto eu presenciei nesta sala, nos depoimentos e nas perguntas que foram feitas por vários Senadores. Eu acho que não vale a pena a gente diminuir a expressão militante, contrapondo essa expressão a uma possível competência técnica, porque não são excludentes: uma ilumina e sustenta a outra. Quando um militante não tem competência técnica, Senador Amin, sabe como a gente chama? De "militonto". Quando um técnico não tem sensibilidade para aquilo que o povo deseja para uma causa, a gente o chama de saco vazio. Então, não são excludentes essas coisas. Eu reconheço aqui, em todos os Senadores que me antecederam, um viés de militância muito grande e quero fazer jus e homenagear a forma direta, concisa com que a Senadora Tereza Cristina fez as perguntas. Não estou parodiando a loja, mas, de mulher para mulher, a Maria Janete respondeu diretamente. Agora, o que emoldura a Lei 14.701? (Soa a campainha.) A SRA. TERESA LEITÃO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Nós debatemos muito isso aqui, Senador Sergio Moro - estou concluindo. No processo de discussão dessa lei, nós debatemos, inclusive, os conflitos que poderiam advir desta lei com a própria Constituição. Se não fosse assim, esta reunião não estava ocorrendo; se não fosse assim, não haveria as ações diretas de inconstitucionalidade. Eu acho que é muito boa esta reunião - é muito boa. Ela pode reposicionar muita coisa desta Casa, do Supremo, dos órgãos que aqui estão representando: a Procuradoria-Geral da Funai - sobretudo a Funai - e o Ministério da Justiça. Eu espero que nós Senadores e Senadoras que enfrentamos esse debate, que democraticamente teve um resultado vencedor e um resultado de quem também perdeu, mas isso faz parte do debate democrático, possamos conduzir essas coisas com... Concluo a parte final... (Soa a campainha.) A SRA. TERESA LEITÃO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - ... do requerimento do Senador, que diz: "As incertezas quanto à firme aplicação da lei do marco temporal pelo Poder Executivo", ponto; eu botaria interrogação: incertezas? |
| R | Eu acho que é isto que precisa ficar validado aqui - são incertezas, é projeto, é implementação? -, para que a gente não torne a militância de todos nós aqui uma coisa ruim e improdutiva para uma resolução que está com três ou quatro ações diretas de inconstitucionalidade e que envolve vidas de todos os lados. Como bem disse aí, é para defender os indígenas? Sim, e defender o povo também. É para defender o povo? Sim, e os indígenas fazem parte deste povo. Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Eu passo a palavra aqui ao Senador Esperidião Amin para suas colocações. Agradeço à Senadora Teresa Leitão. A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA. Pela ordem.) - Eu queria só me inscrever, Presidente. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Tá, sim. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Para interpelar.) - Sr. Presidente, eu quero fazer minhas as palavras da Senadora Teresa Leitão, primeiro, nessa sua abordagem sobre o que é militante e informado - eu acho que, quanto mais bem informado, mais esclarecedora será a sua militância e o seu apostolado, se quisermos dizer, que deve ser respeitado - e quero fazer minhas também as palavras da Senadora Teresa Leitão pela oportunidade desta reunião. Queria me congratular com V. Exa., Senador Sergio Moro, porque nós estamos diante de um fato, e o método indutivo, que é, a partir de um caso concreto, você conhecer as consequências, é muito oportuno. Eu tenho, na minha mesa de trabalho aqui, um texto do Morris West, um livro, As Sandálias do Pescador, que diz assim: "Homem algum permanece imutável [ou não mudado] depois da experiência do poder. (Soa a campainha.) O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Alguns são corrompidos até pela bajulação. E é muito fácil ser corrompido pela não ciência das consequências das suas decisões". Então, não medir as decisões é uma forma de corrupção, e isso tem a ver com a colocação do nosso querido amigo e Senador Jaime Bagattoli, que é oriundo de josé-boatense. Quero acrescentar a experiência de cada um à minha experiência. Eu sou filho de imigrantes, por parte de pai e por parte de mãe. Portanto, eu sou um alienígena, apesar de já ser manezinho da Ilha de Santa Catarina, e meus pais foram muito bem recebidos no Brasil. Então, eu gostaria de contribuir para um caminho de paz. Por isso, gostaria de informar tanto ao nosso pessoal da Funai que nós fizemos educação para índios. As duas escolas que eu tenho como exemplo para isso: uma fica na Terra Indígena Xokleng, lá de José Boiteux, e a maior delas é na nossa maior reserva - e temos também a escola dos guaranis -, que era a maior escola de ensino médio do Brasil na época, inauguramos no dia 22 de abril de 2000, escola de ensino médio desenhada pelos índios, pelo índio Bira, do Estado do Pará. São 22 salas de aula, um espaço de esporte, com telhas francesas, e um espaço recreativo - este em forma de tatu e o outro em forma de cágado. E ela está sendo restaurada pelo Governador atual, Jorginho Mello, recuperada. Fizemos financiamento agrícola para os índios dessa reserva Cacique Vanhkre, a mais numerosa de Santa Catarina, e eles pagaram. Pagaram um empréstimo avalizado pelo estado dentro de um sistema de escambo. Então, eu tenho o desejo de agregar. |
| R | Agora, eu tenho duas perguntas para fazer: primeira, a quem beneficia a insegurança jurídica que nós temos semeado no Brasil a propósito dessa questão? Cui prodest, como dizem os advogados, a quem beneficia? Segunda, nós temos tantas salvaguardas, que eu não quero deixar de fazer - eu me dirijo ao representante do Ministério da Justiça e Segurança Pública -, a Súmula 650 do Supremo Tribunal Federal, conhecida como súmula de Copacabana, que fala dos aldeamentos remotos, que não existem mais, esses não valem. Aldeias indígenas que deixaram de existir, porque o Mem de Sá tocou fogo, essas não valem. E quero relembrar os textos da nossa Constituição. Por incrível que pareça, Senadora Tereza, não é a Constituição Cidadã a que foi mais generosa com os direitos dos índios, não é. Num estudo comparativo dos artigos respectivos, Constituição de 1934, de 1937, de 1946, de 1967, de 1969 e de 1988, a mais generosa e ampla, abrangendo inclusive recursos de subsolo, foi a Emenda à Constituição de 1969. Foi a que mais esgotou o artigo, cuidando inclusive dos direitos de usufruto dos índios. Agora, todas tinham uma coisa em comum: todas colocavam o direito no presente do indicativo do verbo: ocupam. Portanto, nós temos um marco temporal evidente. Fugir do marco temporal e considerar que o indicativo de um verbo pode ser subjuntivo ou que seja gerúndio, o gerúndio ainda vai; agora futuro ou passado não dá - ocupam. Eu acho que isso foi resolvido - dirijo-me ao Sr. Pedro Henrique - pelo Ministro Sydney Sanches: ocupam. Depois veio o acórdão do Ministro Ayres Britto e agora vira lei. E, para terminar, como disse o Senador Zequinha, eu recebi a incumbência de ser Relator de uma das PECs - uma das PECs do nosso querido amigo, a nossa entidade roraimense, que é o Senador Hiran Gonçalves, uma grande figura da política e também da ciência aqui no Senado. Eu recebi esta incumbência e estou fazendo um estudo comparativo. Na semana que vem, o consultor que está me assistindo estará retornando de férias. Eu vou me valer muito desta reunião para fazer o meu relatório. |
| R | E queria, finalmente, fazer uma pergunta para a Dra. Maria Janete: a senhora conhece os casos da reserva de Mato Preto, no Rio Grande do Sul, que se confunde com a reserva Mbiguaçu, de Santa Catarina... (Soa a campainha.) O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - ... - eu não vou dizer o nome da antropóloga -, em que a antropóloga foi acusada de escrever algo no laudo antropológico, com todo o respeito? O pai dos antropólogos é catarinense, Egon Schaden, que nasceu em São Bonifácio, Santa Catarina, é um dos grandes professores da USP. Mas o que eu queria chamar a atenção é para o seguinte: no laudo antropológico, uma escrita. E sobre o mesmo assunto, na tese acadêmica, a antropóloga escreve o seguinte: que ingeriu ayahuasca e viu os sonhos que ela descreveu no laudo. Deu para entender? Mato Preto. E se o nosso Senador Moro permitir, eu tenho um relato de que um dos alcançados pelo laudo antropológico se suicidou na frente dos filhos. Confere? (Intervenção fora do microfone.) O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Então, o laudo antropológico não pode ser considerado como dogma de infalibilidade. E eu acho que nós ainda temos - e aí concluo - que o laudo antropológico tem que ser respeitadíssimo. Vale tanto para a Súmula 650 quanto para constatações atuais. Agora, ele não pode ser considerado uma peça infalível. São os meus comentários e o meu pedido de sua colocação. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Como nós temos apenas dois presentes ainda inscritos, eu vou tomar a liberdade de passar a palavra a eles antes de passar a indagação às respostas dos convidados. Então, passo aqui à Senadora Eliziane Gama, pedindo, se possível, fazer no máximo em cinco minutos, Senadora, por conta do adiantado da hora. A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA. Para interpelar.) - Muito obrigada, Presidente. Eu o cumprimento, cumprimento os colegas e cumprimento todos os presentes aqui nesta audiência pública. E já inicio, Presidente, destacando a importância do debate. O debate é sempre muito fundamental para o fortalecimento e, sobretudo, para a efetividade e resultados promissores do ponto de vista do marco legal, que eu acho que é um dos debates que nós estamos fazendo nesta audiência de hoje. Nos últimos meses precisamente, eu diria até que nos últimos anos precisamente, nós tivemos um debate muito aprofundado acerca desses direitos, não é? E tivemos agora mais recentemente uma aprovação pelo Congresso Nacional do projeto de lei do marco temporal. Eu sei que esse é um debate que, para além da questão de ordem formal, nós precisamos atentar para a questão ética, para a questão moral e do que representam, na verdade, os povos indígenas para a nossa sociedade brasileira, quando a gente pensa uma sociedade brasileira, a partir da visão da inclusão social, da visão isonômica da sociedade brasileira. Mas eu queria destacar aqui, Presidente, um ponto que eu julgo muito importante e que nós discutimos com muita profundidade quando da avaliação desses projetos de lei lá atrás, que foi a questão, eu diria, de erros do processo legal. |
| R | Quando a gente fala de povos indígenas, todos nós sabemos que nós temos uma Constituição Federal brasileira, que é clara em relação a esses direitos lá no art. 231, ou seja, se eu vou discutir mais uma vez sobre essa temática, é uma coisa muito elementar: eu preciso, na verdade, fazer a alteração na Constituição Federal. Ora, se eu tenho um artigo da Constituição Federal que trata desses direitos, para que eu possa fazer qualquer tipo de alteração, eu preciso também fazer a partir da alteração da Constituição brasileira e não com um processo infraconstitucional, que foi o que aconteceu mais recentemente. Nós aprovamos um projeto de lei aqui nesta Casa e nós, por várias vezes - eu diria nós, com o meu voto contrário, mas o Congresso Nacional como um todo é um colegiado -, aprovamos claramente com uma iniciativa que era inconstitucional e que é inconstitucional. O projeto de lei foi aprovado, veio da Câmara, veio para cá, foi aprovado, foi para a mesa do Presidente da República, ele vetou o projeto, vem para o Congresso Nacional, e há uma derrubada do veto. É claro que, quando você faz uma avaliação dos Poderes constituídos, considerando princípios que são fundamentais, como a questão da separação dos Poderes, mas também a harmonia dos Poderes, esta Casa é a casa que legisla, mas a gente tem que legislar respeitando na verdade, o guarda-chuva maior que é a Constituição brasileira. A gente não pode mudar uma lei sem respeitar esse princípio legal, que foi o que aconteceu. E o que nós temos resultante disso? Hoje nós temos várias ações questionando a constitucionalidade desse projeto de lei, que é inconstitucional. E é bom lembrar que o Congresso aprova depois de uma decisão do Supremo Tribunal Federal, já proferida através de colegiado, ou seja, o Congresso cria uma lei, não respeita a constitucionalidade, e surgem, com isso, várias ações. Aí às vezes fica se questionando aqui mesmo, nesta Casa, sobre o ativismo do Judiciário. Ora, o ativismo do Judiciário, por várias vezes, é fruto da omissão ou de algum erro que é cometido aqui. É claro que eu não estou generalizando, tem casos e casos, mas, nesse caso específico, é um caso claro. E aí nós estamos hoje aqui com um debate, e lá na frente... (Soa a campainha.) A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) - ... nós, mais uma vez, poderemos ter uma decisão do Supremo Tribunal Federal reafirmando a decisão que já foi tomada de que o marco temporal é inconstitucional no país. Então, eu queria, Presidente, apenas fazer esse relato e - na verdade, não é nem relatar, é relembrar o que nós já discutimos aqui nesta Casa - cumprimentar, porque hoje nós temos uma Ministra do Meio Ambiente comprometida com as causas ambientais, nós temos uma Ministra dos Povos Indígenas comprometida com as causas dos povos indígenas no Brasil, com a Funai e com os órgãos que estão aqui diante de nós, na verdade, nesse debate. E eu queria parabenizá-los pela responsabilidade e parabenizá-los pelo cuidado, porque a Constituição, como todos nós sabemos, não é uma norma estática em si, não é? Ela tem o seu dinamismo, ela tem a sua transformação, ela tem as suas mudanças, mas, sobretudo, mudanças que respeitam, na verdade, esse ordenamento jurídico. E, em nome dessa responsabilidade, eu acho que os senhores estão tendo responsabilidade e fazendo valer aquilo que está acima de tudo, que é a nossa Constituição brasileira. Então, os meus cumprimentos a todos aqui que participam do debate e, sobretudo, aos senhores e às senhoras que, com muita maestria, têm trabalhado nos órgãos nos quais os senhores estão representando. Muito obrigada, Presidente. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Obrigado pelas ponderações, Senadora Eliziane. Só faço uma observação, Senadora, porque a maioria da Casa entendeu que a lei é constitucional, e acho que até o Supremo foi intérprete disso, mas o Executivo é vinculado à lei. Acima de tudo, o Executivo não tem essa prerrogativa de poder desobedecer à lei ou entender que a lei não deve ser aplicada. Então, eu só faço uma... A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) - Presidente, eu queria... O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Sei que temos posições aí divergentes... A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) - É, mas eu... O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - ... nesse ponto, mas eu me sinto aqui compelido só a colocar essa ponderação. A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) - Presidente, mas eu quero dizer para o senhor que nem o Executivo, nem o Legislativo, nem ninguém está acima da lei. E a Constituição é uma norma que define. Se nós tivéssemos mudado esse quesito através de uma PEC, eu não estaria fazendo o debate. Era uma decisão do Congresso Nacional. Altera-se PEC através de PEC. Não se altera PEC através de um projeto de lei ordinária. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Enfim, eu estou colocando... A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) - Foi o que aconteceu nesta Casa. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Não estou colocando para a gente estrar num debate aqui. O Executivo tem que cumprir a lei. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Essa é só a observação, que é a posição desta Casa. A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) - Mas tem uma Constituição, que é superior a ela, Presidente. (Intervenção fora do microfone.) A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) - Foi uma lei infraconstitucional para mudar a Constituição. É uma questão elementar, pelo amor de Deus. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Eu vou passar a palavra aqui ao... A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) - Você não muda uma Constituição com um projeto de lei. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - É uma lei em vigor. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Eu vou passar a palavra aqui ao... A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) - Foi declarada pelo Supremo Tribunal Federal. Foi declarada pelo Supremo Tribunal Federal. O marco temporal foi resultante disso. Nós tivemos uma votação em Plenário, por favor. (Soa a campainha.) A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) - Não, vocês querem fazer uma avaliação política. Aí é um outro debate, mas, do ponto de vista da avaliação formal, V. Exa. e inclusive Parlamentares aqui que têm conhecimento jurídico sabem disso, por favor. (Soa a campainha.) O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Eu vou passar a palavra aqui ao Deputado Pedro Lupion, que é Presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária e está aflito aqui há tempos para falar. É que a gente tem que evidentemente respeitar aqui a questão dos Senadores... O SR. PEDRO LUPION (PP - PR) - Claro. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - ... mas eu vou tomar a liberdade, até com a vênia do nosso Senador Hiran, que já autorizou, e também do Senador Marcos Rogério e dar para a palavra, por não mais do que cinco minutos. O SR. PEDRO LUPION (PP - PR. Para expor.) - Presidente, cumprimento-o, cumprimento os Senadores todos aqui presentes. Eu quero, obviamente, lhe agradecer e pedir perdão pela aflição aqui que eu tive que morder o lábio aqui algumas vezes, porque ainda não estou no tapete azul, quem sabe um dia, Presidente. Estou lá no nosso tapete verde da Câmara dos Deputados, que muito me orgulha. Presidente, eu acho que, sobre esse debate em relação à constitucionalidade ou não da lei, eu não vou nem entrar nesse tema. É só a gente ver que o veto do Presidente da República foi derrubado aqui neste Senado da República por 53 votos. Então, há uma maioria, há um entendimento claro em relação a essa legislação e também o desafio em relação à PEC. Está aqui o Senador Esperidião Amin, que é o Relator da PEC 48, na Comissão de Constituição e Justiça, e temos votos para aprová-lo. Espero que ela possa tramitar o mais rápido possível, se há algum questionamento quanto à constitucionalidade disso. A grande verdade, Presidente, é que a Lei 14.701, de 2023, marco temporal, foi promulgado por este Congresso Nacional, no dia 27/12, após a recusa do Presidente da República em sancioná-lo. Foi promulgado, no dia 27 de dezembro, e é uma lei, está vigente, existe, está em vigor e tem que ser cumprida, tem que ser respeitada. Causou-nos - e aí falo como representante do Estado do Paraná, como produtor rural e também por ter estado, Presidente, lá com o Prefeito Trento, com o Dr. Klauss, e com tantos outros produtores rurais do Paraná, na cidade de Guaíra, no debate em relação a essa questão e à decisão do Ministro Fachin - extremo espanto simplesmente esquecer ou simplesmente ignorar a lei vigente no país e também a decisão do próprio Pleno do Supremo Tribunal Federal, que decidiu, por maioria, no voto do Ministro Dias Toffoli, falando que só se demarca terras atualmente no Brasil com indenização prévia e justa de terras nuas e benfeitorias. Tanto que a própria Funai - estão aqui representantes da Funai - entra com o pedido no Supremo Tribunal Federal, para que, enquanto houvesse a vigência da lei ou enquanto a lei estiver vigente, não se façam demarcações no país e se suspendam os processos para que não tenha que cumprir a legislação que este Congresso Nacional aprovou. |
| R | A gente não está aqui para legislar do jeito que o Supremo gosta ou não. Esses dias, em uma discussão com o Presidente do Ibama sobre a lei de defensivos agrícolas, que nós aprovamos aqui também no Congresso Nacional, o Presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, olhou para mim e falou assim: "Ah, mas o STF não vai gostar". Eu não estou aqui para legislar para o STF, eu estou aqui como representante da população do Paraná e, os senhores e as senhoras representantes dos seus estados, para nós legislarmos conforme o nosso entendimento no que prevê as nossas liberdades constitucionais e as nossas atribuições. É exatamente isso que nós estamos fazendo em relação ao marco temporal. Nós aprovamos nesta Casa, trabalhamos na legislação e buscamos, única e exclusivamente, colocar em lei o que o próprio Supremo Tribunal decidiu no voto do Ministro Ayres Britto lá atrás, Senador Amin. E eu gosto muito de ouvir o senhor, porque o senhor é uma aula de história e nos explica detalhadamente cada um dos fatos do que aconteceu no nosso país. Nós não inovamos em absolutamente nada. Nós colocamos claro na lei aquilo que estava previsto lá da demarcação de Raposa Serra do Sol lá atrás. Aí quando eu ouço as servidoras, a quem respeito muito, da Funai, dos órgãos federais - e já adianto que vamos continuar esse debate na Câmara dos Deputados, onde também já solicitamos uma audiência nesses termos -, que nós não temos ainda os processos adaptados para a Lei 14.710. Então, suspendam-se todos os processos. Se nós não temos a condição ainda - a Funai - de se adaptar à nova lei, que não faça. Da mesma maneira que quando houve o pedido da medida provisória para a reorganização dos ministérios, nós deixamos claro a responsabilidade de ser o Ministério da Justiça, Dr. Pedro Henrique, o responsável pelas demarcações de terras indígenas, porque sabíamos da militância política e ideológica presente na Funai e sabíamos que isso aconteceria no país inteiro. Da mesma maneira que a suspensão do CAR (Cadastro Ambiental Rural) não pode ser feita como está sendo, em que produtores em pleno processo de cultivo das suas lavouras, de plantio, de colheita e de financiamento bancário, de empréstimo bancário e de crédito agrícola, têm uma decisão de suspensão dos seus cadastros ambientais rurais... (Soa a campainha.) O SR. PEDRO LUPION (PP - PR) - ... por uma decisão estritamente política, para prejudicá-los, porque estão numa área próxima a uma área de interesse. E o mesmo mapa que diz que eles podem ter o CAR e que eles têm o CAR registrado é o mesmo mapa que diz se há sobreposição ou não. Então não venham me dizer que ainda não estão adaptados para ver esses mapas. A realidade é que os produtores estão sendo prejudicados, ocupantes de boa-fé, que têm os títulos das suas propriedades, que herdaram essas terras há muitos anos e que hoje estão sendo claramente prejudicados! E não falo só de produtores, falo de cidades, falo de regiões agrícolas e regiões urbanas. Esses dias, eu conversava sobre um laudo antropológico do ex-Presidente da Funai, Márcio Meira, que falava sobre essa situação do Noroeste ou do Sudoeste aqui de Brasília - depois vocês me lembrem, eu não me lembro, ou o Noroeste ou o Sudoeste - que tem uma questão de demarcação também. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PEDRO LUPION (PP - PR) - Noroeste. As questões que surgem com laudos antropológicos e não é demérito algum aos antropólogos, à formação, à condição técnica e ideológica de cada um e intelectual... (Soa a campainha.) O SR. PEDRO LUPION (PP - PR) - ... mas do mesmo jeito que um juiz de direito é escolhido por processo aleatório para relatar um caso, deveria ser assim também nos processos indígenas. Foi questionada a Sra. Diretora Maria Janete em relação aos processos e como era feito o pagamento desses processos por parte da Funai... A gente sabe que boa parte deles são doados por ONGs, gente que tem interesse na exploração econômica dessas demarcações. É essa a realidade que nós estamos vivendo no país em detrimento total desse livro aqui, a nossa Constituição Federal, que prevê o direito de propriedade, que tem o tempo verbal claro no tempo presente de 1988, no art. 231. Vamos continuar esse debate, Presidente, na Câmara dos Deputados, e eu quero muito parabenizá-lo por essa iniciativa; quero dar as boas-vindas ao Prefeito Trento; quero me solidarizar com o desafio na cidade de Guaíra, na cidade de Terra Roxa e também Altônia; assim como quero parabenizar o Klauss, da nossa Federação da Agricultura. Eu estive na sua cidade dizendo que os produtores rurais de lá não estavam sozinhos e acho que essa é a grande prova, como está o Ministro Moro, que é nosso Senador pelo Estado do Paraná. |
| R | Estava aqui o Tião Medeiros, nosso Deputado Federal; o Sergio Souza, Deputado Federal, e nós todos que estamos trabalhando pelos interesses dos produtores do Paraná. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Antes só de passar a palavra para os demais Senadores, tem um vídeo de um minuto que foi preparado aqui pelo pessoal de Guaíra. O SR. HERALDO TRENTO - É só vídeo. Não tem áudio. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Se quiser narrar, explicar, enquanto passa. (Pausa.) O SR. HERALDO TRENTO - São imagens bem autoexplicativas. Como eu falei na minha fala - e eu respeitei o tempo -, é onde fica comprovado, através de imagens que são públicas e de fácil acesso por qualquer pessoa, que essas invasões começaram apenas em 2003. É isso. São oito invasões, algumas urbanas e outras rurais. Dizem que índio respeita meio ambiente, não sei o quê, e há beira de rio sendo devastada, sendo destruída. Não sei... São questões que precisam ser realmente pacificadas, porque nós não aguentamos mais essa insegurança jurídica que nós vivenciamos no nosso dia a dia lá. Acho que essas imagens falam muito forte. Muito. O SR. DR. HIRAN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) - Prefeito, qual é o tamanho dessa área, por favor? O SR. HERALDO TRENTO - De qual delas? O SR. DR. HIRAN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) - Dessa área pretendida por essa comunidade indígena aí. O SR. HERALDO TRENTO - A pretensão da demarcação representa 15% aproximadamente do nosso território. O SR. DR. HIRAN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) - Qual é o tamanho, em hectares? O SR. HERALDO TRENTO - Oito mil e poucos hectares. Oito mil. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Esse é o problema da insegurança jurídica, que propicia essas oportunidades para invasões, tentativa de fazer justiça com as próprias mãos, risco de violência. No fundo, o que está acontecendo em Guaíra, Terra Roxa e Altônia é um microcosmo do que pode acontecer no país. Por isso que é importante que a lei seja cumprida. Pode-se ter um entendimento diferente no Supremo Tribunal Federal, mas o Executivo está vinculado à lei. O Executivo não tem essa liberdade de poder deixar de cumprir a lei. Eu vou passar a palavra, com a vênia dos nossos expositores. Pelo adiantado, vou passar para as manifestações dos Senadores. Senador Hiran. O SR. DR. HIRAN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) - Bom, Presidente Moro, nossos participantes dessa audiência, Sras. e Srs. Senadores, eu estava em outras agendas e me atrasei um pouco, mas eu não podia deixar de vir aqui manifestar minha opinião sobre um tema de tanta relevância para o país e em particular para o meu Estado de Roraima. Eu sou Senador pelo Estado de Roraima, lá no Hemisfério Norte do Brasil. Prefeito, lá a questão são 8 mil hectares. Nós temos em uma reserva, Prefeito, no nosso estado, 9 milhões e 600 mil hectares. Numa outra, que é um pouco menor, mas foi demarcada através de um laudo antropológico muito contestado por todos nós, que juntou várias etnias numa só e várias regiões geográficas numa só, que foi a Raposa, que é uma coisa, e Serra do Sol, que é outra. |
| R | Os antropólogos não sabiam disso, mas a gente sabe lá que são completamente distintas: biomas distintos, características geográficas distintas, povos distintos - lá nós temos macuxi, ingaricó, patamona, uapixana, temos vários. E ali um laudo antropológico determinou que deveria se demarcar essa reserva contínua de 1,7 milhão de hectares. Mas isso... Vamos lá. Nós temos lá, Prefeito, senhoras e senhores, 33 reservas indígenas demarcadas e muitas outras pretendidas, que o nosso Procurador da Funai e a Funai sabem. Temos uma... eu acho que é uma... é algo que eu não consigo definir com palavras, o que é a cobiça de se marcar terras indígenas no meu estado. Nós somos vítimas disso. É um absurdo. É um sofrimento para todos nós. Quando se começou a dizer: "Olha, o que nós vamos aprovar aqui vai ser vetado pelo Presidente. Como é que nós vamos fazer?", muitos agricultores da agricultura familiar, pessoal do agronegócio... O nosso estado é um estado essencialmente agrícola; as terras começaram a se desvalorizar, Senador Moro, muitas pessoas começaram a vender suas terras, a ficar preocupadas com insegurança jurídica. E nós aqui, nesta Casa, minha querida Senadora Eliziane Gama, por quem tenho muito respeito e amizade, nós aqui estabelecemos paz no nosso país. Quando a gente diz assim: "Olha, até 5 de outubro de 1988, vamos demarcar; depois, chega, já tem muita terra indígena neste país"... Aliás, a gente deveria estar preocupado aqui com o que nós estamos fazendo de políticas públicas para dar subsistência, para dar possibilidade de vida digna aos nossos indígenas. Porque, lá no meu estado, apesar do maior programa de agricultura familiar indígena, que é feito pelo nosso governo, o maior da história do nosso país, do nosso Governador Antonio Denarium, muitas populações ainda são absolutamente dependentes de ações do poder público, seja federal, estadual, seja dos municípios onde estão inseridas essas reservas indígenas, de forma que a minha preocupação... No decorrer ainda da discussão e da votação do marco temporal, do projeto de lei aqui na nossa Casa, eu já apresentei a PEC 48, para que a gente possa... (Soa a campainha.) O SR. DR. HIRAN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) - ... continuar discutindo. E aqueles que colocam que há uma fragilidade jurídica em relação ao projeto de lei que foi aprovado aqui nesta Casa, que foi derrubado através de veto do Presidente, e nós derrubamos o veto, que está em vigor... Porque é esta Casa que faz as leis, não é o Supremo que faz as leis; é esta Casa que faz as leis. E nós precisamos, ao mesmo tempo, obedecer essa lei em vigor e trabalhar o mais rápido possível aqui, querido Senador Bagattoli, para que nós possamos aprovar a PEC 48 também, para continuar dando paz e segurança às comunidades, às populações naturais, aos indígenas. Ninguém está aqui tirando terra de índio, aqui nós respeitamos... no nosso estado, nós respeitamos as terras indígenas; à exceção de alguns pequenos locais onde há garimpo na Terra Yanomami, de 9,6 milhões de hectares. (Soa a campainha.) |
| R | O SR. DR. HIRAN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) - Nós temos 12,6 hectares, mais ou menos, onde o garimpo ilegal se instalou. E nós somos contra garimpo ilegal. Precisamos discutir, aqui nesta Casa, a exploração de nossas riquezas em terras indígenas, como diz a nossa Constituição. Isso precisava ser regulamentado em lei complementar, desde a Constituição, e até hoje a gente não discute sobre isso. Nós nos damos ao luxo de, no nosso estado, ter uma imensa província mineral, das mais ricas do mundo, e aquilo ali fica guardado não sei para quem, com pouca inteligência de quem dirige este país. Então, nós estamos aqui, realmente... Eu acho que esta audiência é muito pertinente. Que nós estejamos aqui juntos, quem gosta deste país, quem respeita a propriedade privada, quem respeita as populações naturais, para darmos o exato marco legal, para que não haja dúvida, para que a gente garanta a subsistência dos nossos indígenas, sua vida digna, e para que a gente garanta, também, aqueles que trabalham e produzem. Realmente, são aqueles que - e só eles - fazem crescer o nosso país, a agricultura familiar e o agronegócio, porque a indústria do nosso país anda de lado, mas o agronegócio é responsável pelo nosso crescimento e pela produção da coisa mais fundamental para a nossa vida que são os alimentos. Eu quero parabenizar V. Exa. e dizer que nós estaremos aqui sempre unidos para que possamos aprovar essa PEC nº 48, que é de minha autoria e será muito bem relatada pelo nosso Esperidião Amin, que é um grande conhecedor da matéria e que vai defendê-la aqui e encaminhá-la com a maior brevidade possível, para a paz no nosso país. Presidente, muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Muito obrigado, Senador Hiran. Faço minhas as suas palavras. Rogo que seja aprovada a PEC, mas independentemente disso, temos a lei, habemus a lei, desde logo, sem prejuízo e esforço pela PEC. Passo ao Senador Marcos Rogério para suas colocações. O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO. Para expor.) - Sr. Presidente, eu quero inicialmente cumprimentar V. Exa. pela condução desta sessão tão importante na Comissão de Agricultura, cumprimentar todos os expositores que aqui estiveram trazendo suas contribuições acerca de um tema que é tão importante e tão sensível para o Brasil inteiro. Eu tive a incumbência de ser o Relator da Lei do Marco Temporal no Senado Federal. Relatei essa matéria, que foi aprovada aqui e depois passou por todas as fases do processo legislativo. Há muita desinformação em razão da lei do marco temporal. O Supremo Tribunal Federal nunca julgou Lei do Marco Temporal. Isso é uma desinformação, fake news. O que o Supremo fez foi mudar de posição. O Supremo fixou o entendimento no caso Raposa Serra do Sol. Naquele caso, não havia o reconhecimento do instituto da Repercussão Geral. Posteriormente, esse mesmo Supremo, instado que foi sobre uma situação concreta, agora reconhece a repercussão geral e muda de posição. Foi o Supremo que mudou de posição, não foi o Parlamento, não foi a Constituição que mudou, foi o Supremo que mudou de posição. Agora - eu estava no gabinete acompanhando aqui o debate - não reconhecer, não aceitar o marco temporal nas condições em que ele está hoje, como lei válida, é não aceitar o papel do Legislativo. |
| R | Eu vou repetir o que estou dizendo aqui, porque essa afirmação tem um sentido, um alcance importante para a democracia: não aceitar a Lei do Marco Temporal nas condições em que ela está hoje é um ato antidemocrático. Fala-se tanto em democracia, Senador Hiran, mas aí... Dirijo a minha fala aqui ao Governo. O Governo, que fala tanto em democracia, pratica o oposto, começando por deslegitimar o Parlamento. Veja: nós votamos essa lei, aprovamos no Senado, foi aprovada na Câmara, o Presidente da República vetou, nós enfrentamos e derrubamos o veto... Aliás, o Presidente, depois da derrubada do veto, não teve a decência de cumprir o seu ato protocolar. Ele não promulga a lei, ele deixa transcorrer o prazo constitucional, e quem foi instado a validar aquilo que quis o legislador foi o Presidente do Congresso Nacional, o Presidente Rodrigo Pacheco. Então, repito: não aceitar a Lei do Marco Temporal, não reconhecer a Lei do Marco Temporal é um ato antidemocrático, diferentemente de entender o cabimento de recursos, seja a ação declaratória de constitucionalidade, que foi a primeira a ser impetrada, seja a ação direta de inconstitucionalidade, que secundou a primeira. Está tudo certo, está tudo dentro do processo. Agora, houve o exaurimento do processo legislativo quanto a essa matéria. Negar isso é negar o óbvio, é negar o devido funcionamento, o regular funcionamento do Parlamento. Bom, se assim pensam, então proponham o fechamento do Congresso Nacional. Porque é isso que eu estou ouvindo aqui, na interpretação que faço. "Não, a lei...". A lei está válida - a lei está válida! -, o Supremo não julgou a inconstitucionalidade da lei e espero que não o faça... (Soa a campainha.) O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) - ... porque foi uma lei que nasceu das condicionantes derivadas da própria decisão do Supremo Tribunal Federal no caso Raposa Serra do Sol. Ali foram apresentadas as condicionantes, havia um limbo que precisava ser preenchido pela via do processo legislativo, propôs-se essa legislação e ela foi aprovada nas duas Casas do Congresso Nacional. Nasceu derivada da decisão do Supremo Tribunal Federal. Agora, onde é que está o instituto da segurança jurídica? Se nós temos... É claro que a Suprema Corte é feita, é composta por homens e mulheres, por seres humanos que são suscetíveis de mudança de entendimento de posições. Agora, o Parlamento tem a sua prerrogativa. (Soa a campainha.) O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) - Eu queria... É apenas para poder ressaltar aqui que nós estamos diante de uma situação em que ou nós reconhecemos validade nessa norma até que o Supremo enfrente a questão ou, então, significa anular o papel do Poder Legislativo, de maneira clara. Nós estamos diante de uma situação em que se discute a questão da segurança jurídica. Eu não estou nem entrando no mérito aqui das questões, poderia entrar. Áreas em que famílias estão em cima da terra com título, com escritura pública há mais de 50 anos e, de repente, em razão de uma mudança de entendimento, todo mundo é posto de fora, como se fossem invasores, como se fossem criminosos, e muita gente achando que está tudo normal. Não está normal. Como não é normal não aceitar o papel do Legislativo. |
| R | Eu concluo aqui, Sr. Presidente, o que me parece mais grave, neste momento, em uma quadra onde se fala tanto em democracia, em defesa da democracia, alguém desafiando aquilo que foi fruto de um debate democrático, plural e majoritário do Parlamento brasileiro. Se tem algo que representa violação à separação de Poderes, violação aos ditames da democracia, é isso. Então, eu reafirmo a necessidade de o Brasil dispor da Lei do Marco Temporal. Ela gera segurança jurídica para o índio e para o não índio. Muito obrigado, Sr. Presidente. O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Perfeito. Eu fui informado de que a sessão do Senado está sendo retomada, então, eu vou ter que encaminhar para o encerramento. Apenas gostaria de cumprimentar o Senador Marcos Rogério, não só pela relatoria do projeto do marco temporal, mas também pelas palavras. Se tem uma coisa que a gente aprende, lá na escola de Direito, é que a administração pública só pode fazer aquilo que a lei autoriza, e existe uma lei. Pode se questionar se, eventualmente, é constitucional ou não, mas o Executivo está vinculado a essa lei. O que nós gostaríamos de ouvir seria que o Executivo, seja o Governo Federal, sejam seus órgãos, Funai, Ministério da Justiça, Ministério dos Povos Originários, todos eles estivessem respeitando e seguindo a Lei 14.701. Embora tenha ouvido informações nesse sentido aqui, não penso que as recebi com tanta clareza. De todo modo, aproveito aqui, para finalizar, para rogar ao Poder Executivo, ao Governo, que cumpra a lei, porque nós estamos vendo o que está acontecendo no país, e os prejuízos causados pelo descumprimento da lei passam a ser de responsabilidade do Poder Executivo, inclusive dos servidores. Casos de invasões e casos de violência, muitas vezes, são causados por essa insegurança jurídica, mas faço apenas uma última rogação a todos aqui presentes. Finalizo, agradecendo, mais uma vez, a gentileza de todos os presentes convidados: o Dr. Pedro Henrique, do Ministério da Justiça; a Dra. Maria Janete, da Funai; a Dra. Nina Paiva, igualmente da Funai. Faço um cumprimento especial aos que vieram de longe: de Curitiba, o Dr. Klauss Kuhnen; e o Prefeito do Município de Guaíra, o Dr. Heraldo Trento. Muito obrigado. Declaro encerrada a reunião. (Iniciada às 14 horas e 07 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 51 minutos.) |

