15/05/2024 - 10ª - Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a 10ª Reunião da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática do Senado Federal da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A Presidência comunica o arquivamento do Aviso nº 134 - GP/TCU, do Aviso nº 171 - GP/TCU e do Aviso nº - 251 GP/TCU, lidos na 8ª Reunião, realizada dia 24 de abril de 2024, sem que tenha havido manifestação de Senador, membro da CCT, para análise da matéria por este Colegiado, conforme Instrução Normativa da Secretaria-Geral da Mesa nº 12, de 2019.
A presente reunião se destina à realização de audiência pública para discutir a Proteção Regulatória do Dossiê de Testes para produtos farmacêuticos destinados a uso humano, em cumprimento aos Requerimentos nºs 27, 28, 31, 32, 34 e 37, de 2023, da CCT.
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O público interessado em participar desta audiência pública poderá enviar perguntas ou comentários pelo endereço www.senado.leg.br/ecidadania ou ligar para 0800 0612211.
Encontra-se presente, por meio do sistema de videoconferência, Leandro Pedron, Diretor do Departamento de Programas Temáticos da Secretaria de Políticas e Programas Estratégicos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI); Ana Claudia Dias de Oliveira, Especialista em Propriedade Intelectual, Inovação e Biodiversidade da Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades (Abifina); Adriana Diaféria, Vice-Presidente Executiva do Grupo FarmaBrasil; Julia Paranhos, Coordenadora do Grupo de Economia da Inovação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), representante de Lia Hasenclever, Pesquisadora do Grupo de Economia da Inovação da UFRJ; Susana van der Ploeg, Coordenadora do Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual da Rede Brasileira pela Integração dos Povos (GTPI/Rebrip); e Ana Carolina Navarrete, Consultora de Saúde do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), representante de Marina Magalhães, Analista de Saúde do Idec.
Registro aqui a presença do nosso Senador Marcos Pontes.
Eu vou imediatamente passar a palavra então para o Sr. Leandro Pedron, que é Diretor do Departamento de Programas Temáticos da Secretaria de Políticas e Programas Estratégicos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
Prof. Leandro Pedron.
O SR. LEANDRO PEDRON (Por videoconferência.) - Bom dia a todos.
Só me confirma se consegue me escutar bem?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Está ótimo.
O SR. LEANDRO PEDRON (Para expor. Por videoconferência.) - Ótimo, maravilha.
Quero cumprimentar o Sr. Senador pela iniciativa desta audiência pública. Meu bom-dia aos demais também.
Bom, a audiência tem o objetivo de discutir a Proteção Regulatória do Dossiê de Testes (PRDT) para produtos farmacêuticos destinados ao uso humano no Brasil.
O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, especificamente dentro das competências da Secretaria de Políticas e Programas Estratégicos, à qual o departamento que no momento estou dirigindo se vincula, tem como uma das competências incentivar a interlocução com pesquisadores, identificar as demandas e auxiliar a promoção da formação de cientistas, dentre outras. Então, acho que, dentro do que nos cabe em relação ao fomento da pesquisa na área da saúde, se conecta diretamente com a PRDT.
Dentro de um contexto regulatório, no entendimento à PRDT, ela é conhecida como exclusividade de dados e é um mecanismo que visa proteção de informações tanto clínicas quanto pré-clínicas, submetidas às autoridades reguladoras. No Brasil, cabe à Anvisa a aprovação de novos medicamentos e, em alguns outros contextos, ele vai impedir que essas informações possam ser utilizadas por terceiros para obter aprovação de produtos relacionados à área da saúde, desenvolvimento de fármacos para humanos, por um certo tempo específico. Então se conecta diretamente com uma proteção parecida com ativos de propriedade intelectual, que seria a exerção de um direito negativo, aqui neste contexto, especificamente em relação ao dado para acesso a terceiros.
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Essa proteção já existe em alguns países. Não vou correr o risco aqui de citar como é que isso é feito dentro de outros países, mas é sabido que Estados Unidos, União Europeia, Japão, Canadá, entre outros, enfim, países que a gente conhece que têm um histórico de desenvolvimento de produtos para a área da saúde e um investimento público grande em ensaios clínicos, também têm um tipo de proteção parecida. E o meu intuito aqui não é especificamente defender, mas trazer - dentro de um contexto regulatório não só nacional, mas também internacional - como se dá a proteção disso.
Esses países que eu citei têm, de certa maneira, uma legislação específica internalizada dentro de cada país que protege os dados obtidos a partir dos testes clínicos e pré-clínicos. A União Europeia é uma das que, salvo engano, tem um período mais extenso, de oito anos, com possibilidade ainda de reserva de mercado para, a depender da exclusividade de mercado, um período que pode ser estendido por mais um ano.
Quando tratamos especificamente do Brasil, como eu comentei no início, é uma situação... é uma competência dos dados de envio - e proteção deles - à Anvisa, uma vez que é o órgão responsável pela regulamentação e supervisão de medicamentos - é uma autarquia. O que identificamos como possibilidade de desafios, e o debate deve ser feito... Então, mais uma vez, quero parabenizar a Comissão de Ciência e Tecnologia por trazer esse ponto ao debate, porque são alguns desafios que, talvez, precisamos sempre discutir para tentar ter sempre o melhor consenso na formulação de políticas públicas.
Um dos primeiros que eu elencaria seria a parte de inovação versus acesso, que é: a gente tem que sempre pensar no equilíbrio entre como vamos promover a inovação e a necessidade de garantir o acesso à população. Como estamos tratando de dossiê de testes clínicos, enfim, em última instância, isso vai resultar no desenvolvimento e na possibilidade de acesso da população a medicamentos. Como a gente consegue ter esse equilíbrio e sempre...
Considerando que temos um Sistema Único de Saúde, acho que é sempre importante prezar que o interesse grande do SUS consiga internalizar novos medicamentos e, assim, atender à população no contexto geral. Devemos sempre pensar como é que conseguimos fazer o equilíbrio, especificamente aqui acerca da PRDT, entre inovação versus acesso.
Um outro ponto eu acho que é a parte de harmonização internacional, como eu comentei. Alguns países já têm isso implementado, mas isso não quer dizer que nós, como Brasil, devemos seguir exemplos de outros países. Acho que é sempre interessante entender e saber como é feito o contexto no cenário internacional, especificamente dentro de legislações de outros países, e o que nós podemos tirar desse aprendizado. Então, acho que o debate também tem que seguir por essa linha.
Vale sempre lembrar: o Brasil também faz parte da OMC e, considerando que haveria proteção, derivada do Acordo TRIPS, para a propriedade intelectual relacionada, isso também tem que seguir uma harmonização internacional. Então são dois aspectos.
Especificamente como comentei no começo, nós como ministério temos essa interlocução, como dever institucional, como missão, como competência, com a academia, ainda que pendamos a um debate mais próximo com eles acerca dos assuntos.
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Especificamente sobre a PRDT, eu acho que vale a pena trazer quatro pontos principais, que eu tomei a liberdade de elencar e que talvez representem um posicionamento da academia ainda não consolidado. De novo, ressalto que devemos colocar isso no debate com a comunidade acadêmica mais específica, mas o primeiro seria a ressalva acerca do acesso a medicamentos.
Há alguns que defendem que a proteção do dossiê de testes prolongaria o período em que medicamentos genéricos ou biossimilares se tornariam acessíveis e poderiam entrar no mercado, o que, em algum ponto, poderia fazer com que o preço de medicamentos inovadores se tornasse mais alto e, assim, haveria dificuldade de acesso à população. E também leva-se a um ponto de impacto no sistema de saúde pública. Mas, de novo, falta bastante debate sobre o assunto.
Um outro ponto, que eu elencaria como dois, é a parte de justiça e equidade social. Considerando justamente que o direito à saúde é um direito fundamental - caso se entenda que uma política que restringe acesso a medicamentos seria eticamente problemática, caso também se continue o debate no entendimento de que a PRDT possa trazer algum tipo de impedimento ao acesso do direito à saúde -, então, teríamos que verificar e conduzir a construção disso de uma maneira que facilitasse e produzisse, gerasse a equidade e justiça social.
Na parte de inovação e pesquisa, como eu comentei, talvez haja uma preocupação grande de que a exclusividade de dados possa criar barreiras para pesquisadores acadêmicos que desejam conduzir estudos independentes sobre o aproveitamento de dados a partir de testes já conduzidos. Então, talvez, em alguma instância, isso poderia trazer uma barreira também ao fomento e inovação local, gerando uma restrição ao desenvolvimento de medicamentos genéricos e biossimilares, impedindo, assim, em última instância, uma indústria farmacêutica mais dinâmica e competitiva no Brasil.
São fatores que também devemos sempre considerar na construção e na discussão da PRDT.
Como eu comentei lá em cima, uma preocupação da academia também é entre a harmonização internacional versus realidade local. Devemos sempre analisar o contexto nacional, não para necessariamente estar alinhado com os contextos internacionais, mas para cada país entender, dentro das suas necessidades, dentro das suas competências locais.
Enfim, apenas para concluir - eu tentei ser o mais breve -, a gente deve sempre prezar pela inovação do setor industrial, do complexo econômico industrial da saúde, desenvolvimento de novos produtos que, em última instância, visem sempre a atender a população dentro da nossa necessidade local como país.
Então, a discussão acerca desses temas eu acho que é superimportante. E eu estou sempre prezando... Inclusive, quero deixar aqui ressaltado que o objetivo principal é atender gargalos e demandas que resultem no atendimento, na garantia de direitos fundamentais, como o acesso à saúde, que é respaldado por nossa Constituição.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Obrigado, Sr. Leandro.
Tenho algumas perguntas e comentários aqui, que eu já vou ler, porque, na medida do possível, vocês já respondem também essas perguntas.
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O Gustavo, aqui do Distrito Federal, diz o seguinte: "Com proteção dos dados do dossiê, como garantir que a PRDT não irá impedir a entrada de genéricos e o acesso à medicamentos com preço justo?".
A Emanuelle, do Mato Grosso: "Como as associações farmacêuticas veem a PRDT em termos de impacto nos interesses dos pacientes, na inovação e na competitividade do setor?".
Esaú, do Ceará: "Qual o impacto no tempo de disponibilidade do medicamento, caso haja alguma mudança? Qual a probabilidade de diminuir a burocracia?".
A Liliane, de Goiás: "Qual o impacto da PRDT [...] para os interesses do setor farmacêutico e para o paciente?
Giovanni, também do Ceará: "Como a PDRT trará segurança à saúde da população brasileira, no tratamento de medicamentos com baixa inovação, sendo esses muito caros?".
Comentários.
Margery, do Paraná: "A proteção regulatória é importante como uma forma de incentivo para que haja mais investimento nessa área em nosso país".
Antes de passar para os próximos expositores, eu pergunto ao ex-Ministro e nosso Senador Marcos Pontes se quer fazer alguma colocação, antes da exposição.
O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP. Pela ordem.) - Obrigado, Presidente.
Antes de mais nada, queria parabenizá-lo pela iniciativa. É um tema extremamente importante e que envolve muitos fatores e setores. Não é só uma questão de dados. Mas, sem dúvida, essas exposições de hoje vão nos deixar mais atentos por perspectivas diferentes do setor e vão nos ajudar a ter qualquer tipo de providência ou auxiliar o desenvolvimento, sempre visando a melhorar tanto a inovação no Brasil quanto a vida dos pacientes, os potenciais usuários. Então, sem dúvida nenhuma, isso vai ser importante.
A gente viveu isso durante a pandemia, o desenvolvimento de vacinas no Brasil, medicamentos, etc. Então, isso aí é uma coisa importante de se discutir e acho que aqui é o local correto.
Então, parabéns pela iniciativa.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Obrigado, Senador.
Vou passar, então, a palavra para a Ana Claudia Oliveira, que é Especialista em Propriedade Intelectual e Biodiversidade da Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina.
Com a palavra, a Ana Claudia.
A SRA. ANA CLAUDIA DIAS OLIVEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, bom dia a todos.
Eu gostaria de agradecer ao Senador Presidente e à CCT pelo convite para participar desta importante audiência pública e já me colocar à disposição para auxiliar no entendimento desse tema.
Eu sou bióloga, doutora em Biotecnologia pela UFRJ, doutora em Propriedade Intelectual pela Academia do Inpi e atualmente estou fazendo pós-doutorado no Instituto de Medicina Social da Uerj. Sou ex-examinadora de patentes farmacêuticas e de biotecnologia e trabalho com propriedade intelectual há 25 anos.
Bom, hoje eu estou aqui representando a Abifina (Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades).
É importante ressaltar que a Abifina possui, entre os associados, laboratórios públicos, como os laboratórios da Fiocruz e Vital Brazil, e indústrias nacionais, não só dos setores farmoquímico e farmacêutico de uso humano, mas também empresas produtoras de intermediários químicos, de saúde animal e de defensivos agrícolas.
Eu preparei uma apresentação. Vocês estão vendo?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Sim. O.k.
A SRA. ANA CLAUDIA DIAS OLIVEIRA (Por videoconferência.) - Bom, eu preparei uma apresentação para tentar facilitar a compreensão desse tema, que, a princípio, parece um tema simples, no entanto é complexo. E o entendimento, como o Senador Marcos Pontes falou, é um entendimento diferente. Dentro do mesmo setor tem entendimentos diferentes.
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A proteção de dados de testes no Brasil existe através da Lei nº 10.603, de 2002, e ela protege os dados de testes para medicamentos veterinários e defensivos agrícolas. Os medicamentos de uso humano foram excluídos dessa legislação e esse contexto foi pensado já há muitos anos. O Senador José Serra, na época, alertou o Congresso Nacional para o retrocesso que o país viveria na área de saúde com a adoção do data protection para medicamentos de uso humano.
Então, a gente tem que entender que esse assunto está voltando à tona, mas ele já foi muito debatido e muito criticado pela sociedade, justamente por uma questão muito simples: ele barra e atrasa o acesso aos medicamentos no Brasil.
Bom, a lei que existe para a saúde animal e para defensivos agrícolas funciona, gera uma extensão, uma proteção de dez anos da concessão do registro ou até a liberação das informações. Isso pode ser reduzido para cinco. Agora, existe um problema de conceito que é um pouco grave. Ela considera nova entidade química ou biológica toda e qualquer molécula ou organismo ainda não registrados no Brasil, podendo ser análogos ou homólogos a outras moléculas ou organismos. O.k. O que isso significa? Ele não traz inovação. Não é uma molécula ou um organismo novo no mundo. É uma molécula que ainda não foi registrada aqui no Brasil.
Então, é uma falácia você dizer que o data protection vai trazer inovação para o nosso país, porque ele não vai. Ele vai trazer moléculas ainda não registradas aqui, protegendo-as ainda mais do que o tempo de patentes e atrasando, ainda, o acesso à saúde pública.
Mas por que a retomada desse debate agora? Em 2021 teve o julgamento do STF da ADI 5529 sobre a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 40 da Lei de Propriedade Industrial do Brasil, ou seja, decretaram inconstitucional, decidiram como inconstitucional o parágrafo único do art. 40 e deram fim à extensão da vigência de patentes para além dos 20 anos da lei. Isso gerou uma modulação com efeito retroativo para patentes relacionadas à saúde. Isso foi em 2021.
Desde 2021 vem-se discutindo no âmbito do Gipi (Grupo Interministerial de Propriedade Intelectual) e um dos temas foi data protection. Um dos temas também foi a extensão da vigência de patentes e a compensação desse prazo de vigência, que tem total relação com o tema que a gente está trazendo aqui hoje. A decisão do Gipi foi de encerrar a discussão, porque a medida proposta não era do interesse da administração.
Então, isso foi discutido ao longo de pelo menos dois anos entre todos os ministérios, todas as empresas, todo mundo que fazia parte do Gipi.
Bom, então, em 2021, o STF derruba a prorrogação do prazo de patentes. Em 2022, confirma a impossibilidade de se estender o prazo de vigência de patentes no Brasil. Em 2023, farmacêuticas movem vários processos judiciais que barram a entrada de genéricos para importantes doenças, como câncer, diabetes, HIV - uma avalanche de ações.
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É feito um estudo pela UFRJ, onde é evidenciado que é uma falácia, como eu falei, a atração de inovação farmacêutica pelo data protection - a Dra. Julia está aqui, ela vai poder descrever bastante sobre o estudo que a UFRJ fez.
Ano passado, Fux libera laboratório para produzir genérico entre o fim da patente e a publicação da ADI 5529, justamente em cima da decisão retroativa dos medicamentos para a saúde. Então, ao longo desses dois últimos anos, e ainda este ano, vão acabar diversas patentes, vão cair diversas patentes de medicamentos que são blockbusters no mundo, indicados para diabetes, para câncer, para leucemia mieloide crônica, para HIV, para doenças neurodegenerativas.
Paralelo a isso, estão acontecendo outras estratégias de prorrogação do monopólio, como as ações PTA, que já são de conhecimento de todos que estão aqui; as ações contra a mora do Inpi; as ações visando à internalização desses instrumentos que não existem aqui no Brasil e que não estão previstos no TRIPS, em acordos bilaterais e multilaterais. Foi interessante o Dr. Leandro citar os países que têm data protection - não sei se vocês perceberam, mas são só países desenvolvidos. Então, o que ele falou foi importante, a gente tem que ver o cenário que a gente tem aqui no Brasil de desenvolvimento industrial.
Como eu falei, cerca de 200 patentes, pelo menos, vão cair em 2024, e aqui tem alguns exemplos: Revlimid, Venvanse, Januvia, Stelara. São medicamentos que custam até R$50 mil a dose. Então, é disso que a gente está falando, é o acesso ao medicamento, é o acesso à saúde pública.
E aqui embaixo tem um gráfico bem simples para entender isso, que é o monopólio de patentes, que são de 20 anos, e, a partir do fim dos 20 anos, a entrada dos genéricos. Com o data protection, pelo menos cinco anos vão ser acrescidos aí.
Estudos foram realizados - isso vai ser falado mais aqui - e outras estratégias são adotadas pelo mercado. Houve uma decisão histórica do Tribunal de Justiça da União Europeia, que houve fraude de documentos de primeiro registro e fraude de entradas de dados para medicamentos de segunda geração. Retirou o dossiê de primeira geração perto do fim da exclusividade do data protection para colocar o de segunda geração.
Então, essas são estratégias em que, mesmo que condenadas, como ocorreu nesse caso na Europa, os valores com o lucro desses medicamentos exclusivos, com o monopólio desse medicamento, passam e compensam a penalidade. Então, a Abifina é contrária ao data protection; o INPI já reduziu o backlog de pedidos de patentes com propostas de novos fluxos; a Anvisa já reduziu a fila de registros de medicamentos - os dois precisam de estruturação -; o STF já decidiu pelo fim da extensão da vigência de patentes; estudos robustos, como o da UFRJ, evidenciaram que a decisão por inovar não depende da existência da exclusividade de dados, mas de outras variáveis, como o custo Brasil; e a introdução do data protection no Brasil vai reduzir a entrada de genéricos e biossimilares, gerando atraso no acesso aos medicamentos. Então, só esse eslaide já responde a várias das perguntas que foram feitas. Vai, sim, ter um impacto negativo na saúde pública; vai, sim, ter um impacto negativo para a sociedade.
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Então, agradeço a sua atenção.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Obrigado, Ana.
Antes de passar para a Adriana, o Senador Wellington Fagundes pediu que eu fizesse aqui algumas perguntas. Eu já vou fazê-las, porque, na medida do possível, os expositores poderiam aproveitar e responder a essas questões.
O Senador Wellington Fagundes pergunta aqui, primeiro: "Após quase uma década de tramitação no Congresso Nacional, aprovou-se recentemente o Projeto de Lei (PLS) 200, de 2015. A proposição, que aguarda a sanção presidencial, regula diversos aspectos das pesquisas com seres humanos no país, em especial os ensaios clínicos para o desenvolvimento de novos medicamentos. A iniciativa resultou de demanda de pesquisadores brasileiros, devido à demora na aprovação dos protocolos de pesquisa e à falta de segurança jurídica na regulação da matéria, que era tratada apenas no âmbito infralegal. A expectativa é que a atividade de pesquisa científica com novos medicamentos seja impulsionada com a entrada em vigor da nova lei".
Então, ele pergunta: "Em que medida a ausência de proteção regulatória do dossiê de testes (PRDT) para produtos farmacêuticos destinados a uso humano pode impactar os avanços esperados da nova lei? A eventual adoção do PRDT pode implicar algum conflito com as disposições do PLS 200 referentes aos requisitos de publicidade dos ensaios clínicos, conforme o Capítulo VIII do texto normativo enviado à sanção?".
Diz ainda: "A proteção regulatória do dossiê de testes, defendida nesta audiência, poderia ensejar algum conflito com as disposições da Lei 12.527, de 18 de novembro de 2011, mais conhecida como a Lei de Acesso à Informação, especialmente no que se refere às informações sobre os efeitos adversos dos produtos sob investigação?".
E por último: "Qual tem sido a conduta habitual da Anvisa em relação ao sigilo das informações contidas nos dossiês de testes? Há casos confirmados de divulgação das informações contidas nesses dossiês?".
Então, são as perguntas do Senador Wellington Fagundes. Se puderem, na fala, responder, eu agradeço.
Vou passar agora a palavra, então, à nossa Adriana Diaféria, que é Vice-Presidente-Executiva do Grupo FarmaBrasil.
A SRA. ADRIANA DIAFÉRIA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, Senador Izalci Lucas; bom dia a todos.
Primeiramente, gostaria de agradecer imensamente a oportunidade de nós termos esse espaço para debater um tema que se mostra de grande relevância para o nosso país, para toda a sociedade brasileira. Como os meus colegas que me antecederam colocaram, existem questões e fatores que, de alguma forma, trazem dimensões diferenciadas, perspectivas diferentes de visão acerca desse tema. O Grupo FarmaBrasil vai trazer uma contribuição.
Se o senhor me permitir, eu vou compartilhar uma apresentação, um pouco para a gente situar a nossa visão em relação a esse tema e por que consideramos absolutamente relevante termos bastante espaço para esse debate público, para que as ideias fiquem colocadas, todas à mostra, para essa discussão ser estruturada.
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O Grupo FarmaBrasil, eu vou fazer aqui o compartilhamento da imagem...
Bom, o Grupo FarmaBrasil é uma entidade que representa um grupo composto por empresas farmacêuticas, 100% brasileiras, todas detentoras de capital nacional, que objetivaram - com a criação do FarmaBrasil - focar nesse trabalho de articulação junto às instâncias governamentais, junto ao Congresso, junto ao Judiciário, para demonstrar esse movimento que hoje a indústria nacional vem fazendo em busca da consolidação do desenvolvimento da inovação de medicamentos no Brasil.
Graças a políticas acertadas que tivemos na década de 90, já como bem mencionado aqui, a política de genéricos possibilitou a consolidação de um parque industrial bastante expressivo na produção de genéricos e similares, que tem permitido às nossas empresas nacionais terem liderança de mercado já há alguns anos.
Então, se nós pegarmos um ranking de participação no mercado de varejo, entre as 20 posições, a gente já pode ver que as quatro primeiras são empresas nacionais. E temos ainda a participação de outras que inclusive são associadas do FarmaBrasil.
Esse grupo de empresas tem gerado uma contribuição significativa para o nosso país, porque gera empregos formais já há alguns anos, e, cada vez mais, com a expansão das fábricas e com a expansão dos seus centros de pesquisa e desenvolvimento, tem ampliado a possibilidade dessa agregação de pessoas com especialidades bastante relevantes para esse desenvolvimento.
Além disso, a indústria, que de fato inova no nosso país, por dados recentes demonstrados pela Pintec... Aqui há um dado - que é a última consolidação que a Pintec traz a público - que demonstra que esses investimentos em P&D, no setor farmacêutico e farmacoquímico, têm alcançado em torno de R$1,5 bilhão, em 2017, com um crescimento em torno de 186% desde 2000. Mas, se fizermos uma atualização em relação à projeção até 2023, esses valores são muito mais significativos.
E por que é importante trazer esse dado? Porque, se nós olharmos com base nesses dados da Pintec, a efetiva participação no desenvolvimento da inovação no território local ocorre de fato com a participação das empresas nacionais. Se a gente faz essa análise de projeção ao longo do tempo, a gente percebe que há uma retração do desenvolvimento da inovação na indústria estrangeira localmente, porque houve uma redução significativa do parque industrial de multinacionais no território local, e há uma redução significativa de seus centros de desenvolvimento. Então, basicamente hoje nós podemos considerar que essa atividade é realizada pelas indústrias que estão aqui localizadas no Brasil.
Um pouco aqui, a gente também faz um comparativo em termos de investimentos em P&D ao longo desse período projetado pela Pintec. A gente consegue ver que, de fato, essa diferenciação mostra que há um movimento efetivo do desenvolvimento da indústria nacional.
Também um outro dado da Pintec demonstra que, entre dos setores da economia, quem tem realizado o maior dispêndio para a atividade de P&D, em relação ao total de empresas da indústria, continua sendo o nosso setor farmacoquímico e farmacêutico. Então, o percentual de participação tem sido bastante significativo.
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E também quero acrescentar mais esta informação relevante de que, para além de todo esse esforço a que, ao longo dos últimos anos, essas empresas têm se dedicado, elas estão absolutamente comprometidas com as recentes políticas lançadas no sentido de apoio à produção industrial, fortalecimento do complexo industrial e econômico da saúde, buscando cada vez mais expandir esse parque fabril e expandir a atividade de pesquisa e desenvolvimento no Brasil.
Portanto, nós colocamos esse cenário para demonstrar para os senhores que hoje nós temos uma condição que traz uma realidade de mercado em que, se não houver uma avaliação precisa dessas decisões em relação à adoção de institutos que podem estimular um retardo do desenvolvimento, inclusive da produção de genéricos e similares, isso pode ter um impacto direto não só para a questão do acesso à população de medicamentos com custos reduzidos e de uma forma expandida, mas especialmente um impacto direto no desenvolvimento da inovação nesse parque industrial local.
Então, essa é uma questão que precisa ser posta, que precisa ser aclarada para demonstrar que hoje qualquer medida TRIPS-Plus ou qualquer medida de proteção adicional pode ter um efeito perverso e irreversível para essa indústria local que tem feito seus esforços para oferecer para a população os seus medicamentos.
Aqui, com esse dado, a gente também contribuiu com a NIB na criação de uma plataforma, um banco de dados no sistema Power BI em que você permite a todos acessarem os dados do INPI e entender o comportamento dos pedidos de patentes que são realizados aqui no Brasil.
Então, a gente só traz esse dado para demonstrar o que de fato acontece. A quantidade... Os que estão em azul claro são pedidos de não residentes e o que está em amarelinho são os pedidos de residentes. Então, a gente percebe que há um esforço efetivo das indústrias nacionais para começar a consolidar em seus modelos de negócio o salto para inovação. Estamos em um estágio, em um momento de transição, bastante crítico e bastante relevante, em especial, depois de todo o período da pandemia que nós enfrentamos, quando sentimos na pele a necessidade de termos um parque local fortalecido. E aí a gente percebe que, se nós fizermos um movimento errado neste momento, podemos criar uma circunstância de não conseguirmos mais fazer com que essa indústria farmacêutica local consiga dar o passo que precisa ser dado para termos inovação no Brasil.
E por que eu trago, então, esse contexto todo? Vou falar muito rapidamente - a Ana já teve a oportunidade, de forma excelente, de explanar essa questão. Como ela disse, tivemos uma situação em que foi levada para o STF uma discussão sobre a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 40, que era como se fosse um colchão de conforto para, na hipótese de análises morosas por parte do INPI dos pedidos de patente, as empresas terem períodos adicionais.
Isso caiu, criou um equilíbrio e criou uma justiça no nosso sistema, mas instantaneamente após essa decisão, como a Ana disse, uma série de ações judiciais começaram a ser interpostas aqui na Justiça de Brasília, questionando de alguma forma essa decisão, porque o objetivo da maior parte dessas ações é exatamente tentar adquirir, como que uma indenização in natura, prazos adicionais de patentes. E como nós sabemos, qualquer prazo adicional de patente é tempo de exclusividade no mercado.
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Então, essa discussão que está posta agora sobre a proteção regulatória de dossiê de testes, como a Ana também disse, não é atual. Ela é uma discussão antiga e é uma discussão que não se mistura com outros temas, como até a gente já teve em uma das perguntas, porque proteção regulatória de dossiê de testes não é proteção de dados pessoais e, portanto, não tem nenhuma correlação com a ANPD, mas, sim, com a Anvisa. Ela não tem a ver com patentes, porque o objetivo da proteção são os dados que são apresentados para a obtenção do registro sanitário na Anvisa; portanto, não tem a ver com o que é o objeto das patentes; não tem a ver com o Linkage, que é um outro instituto jurídico, assim como a exclusividade de mercado, que são utilizados para, de alguma forma, protelar os prazos de proteção e manter essa exclusividade estendida por mais tempo.
O Acordo TRIPS estabeleceu essa previsão - de fato, o Brasil recepcionou essa orientação de termos a questão da proteção dos dados de testes -, porém fez uma escolha intencional de focar essa proteção para o mercado de medicamentos de uso veterinário, porque, à época, havia um entendimento de que, se fosse estendido para uso humano, nós estaríamos, basicamente, destruindo a possibilidade da política de genéricos avançar. Então essa lacuna foi intencional, nas palavras do Ministro Relator Felix Fisher, no sentido de ter sido feita uma escolha deliberada para não proteger dados de teste que impediriam o avanço da expansão do acesso a medicamentos no seu formato genérico.
Então aqui a gente inclusive traz à tona, para conhecimento, ou à memória dos Srs. Parlamentares, a mensagem que o Senador José Serra, na época, expressou, quando da conversão da medida provisória na Lei 10.603, em que ele deixa claro este posicionamento: se fosse estabelecido o data protection para medicamentos de uso humano, nós geraríamos um retrocesso para a política de genéricos no país. Então, essa foi a discussão, na época, com a Lei da Propriedade Industrial, lá em 2002.
Em 2021, o Ministério do Desenvolvimento, na época Ministério da Economia, resolveu fazer uma atualização sobre essa discussão no nosso país e o Mdic contratou a Dra. Julia Paranhos para fazer um estudo robusto para identificar se o país estaria em condições de recepcionar esse instituto jurídico para medicamentos de uso humano. Esse estudo foi apresentado - a Dra. Julia está aqui na mesa; eu não vou me aprofundar, porque ela vai ter a oportunidade de falar -, mas ele foi questionado pelo estudo apresentado massivamente pela Interfarma, realizado pelo Instituto Copenhagem Economics. E esse estudo faz uma abordagem, levando em consideração 53 mercados em um período de dez anos ou mais, para identificar os efeitos da data protection.
Então, nós, pelo FarmaBrasil, contratamos um conjunto de quatro outros estudos, fazendo uma avaliação desse estudo, trazendo a perspectiva econômica, uma outra perspectiva econômica da própria UFRG, com o Prof. Ricardo Torres; um estudo que traz a dimensão econômica com a empresa Ferres Economia; temos um estudo jurídico com a jurista Dra. Laura Schertel Mendes, e temos um estudo da área regulatória feito pela Dra. Claudia Cilento, com bastante especialidade na ciência regulatória.
Então, aqui rapidamente, só para pontuar, eu acho, Senador Izalci, que, seria bom termos a oportunidade de fazer um debate bastante aprofundado, pois são estudos extremamente complexos, são dados bastante complexos, que precisariam de tempo para uma análise aprofundada. Eu até sugiro à Comissão que gere uma oportunidade para ter o confronto desses especialistas para essa abordagem mais precisa em relação aos estudos, que serão entregues, de toda forma, a esta Comissão para os estudos e avaliações e decisão sobre os temas.
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Só um dado relevante que a Ferres Economia trouxe para nós. Com base nessa avaliação do que foi aportado pela Copenhagem, os medicamentos novos têm preços em média cinco vezes maiores que os genéricos e três vezes maiores que os medicamentos similares. Então, a gente não consegue enxergar qual é o grau de eficiência e de contribuição que isso poderá trazer no país a partir da adoção do data protection.
A outra questão também que foi levantada é que se estima que um acesso a medicamentos superior em quase 1,2 bilhão de doses seria vendido a preço médio de genéricos e similares em vez de preço de novos.
O que a gente está querendo apontar aqui, já quase caminhando para o fim? Que a adoção desse instituto da proteção de dados de teste vai retardar a entrada de novos medicamentos e resultar num aumento significativo dos preços medicamentos. Estima-se que mais de 350 milhões de doses deixarão de ser consumidas ao ano se forem inseridas no mercado com esse medicamento protegido em vez do medicamento genérico ou similar. No melhor cenário de inovação, estima-se uma retração de quase 10% no consumo de medicamentos, o que equivale a quase 500 milhões de doses. Portanto, a adoção desse instituto só vai aumentar os gastos com saúde, vai reduzir o acesso a medicamentos da população e pressionar ainda mais o orçamento público da saúde, que já tem tantas frentes para se preocupar. Então, a gente não consegue identificar, na perspectiva de Ferres Economia, qual é o benefício e a eficiência gerada pela implementação dessa proteção.
Na questão regulatória, a gente também faz algumas considerações - o parecer vai ficar disponível -, mas especialmente em relação à questão de expor os pacientes a testes desnecessários, uma vez que eles já foram realizados nessa primeira versão do medicamento referência. Portanto, na perspectiva regulatória, para além de adicionar um custo regulatório adicional à Anvisa, que já passa por problemas estruturais significativos, já temos problemas sérios na fila do registro, quiçá seria considerar uma estrutura interna para avaliação dessa dimensão regulatória com o data protection.
Por fim, coloco alguns aspectos do ponto de vista jurídico, porque, quando se trata desta discussão, a gente está basicamente falando de um direito fundamental previsto na nossa Constituição Federal, que estabelece como dever do Estado a obrigação de promover a saúde de toda a população.
A eventual adoção de qualquer regime de exclusividade para dados de teste - e, como sua consequência, a ampliação do prazo do monopólio do inventor sobre esse medicamento - vai, necessariamente, exigir um sopesamento das eficiências geradas por essa regulamentação.
Por fim, a gente não poderia deixar registrar: pelo princípio da vedação ao retrocesso social, não são permitidas alterações de legislações infraconstitucionais que possam afetar negativamente o direito social já concretizado.
Aqui, só um compartilhamento de um último eslaide, para passar uma mensagem para os senhores de que os Estados Unidos, com toda a sua potência e toda a sua pujança tecnológica, científica, quando se sentem ameaçados, tomam decisões na busca de fortalecimento da sua indústria nacional.
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Então, o que nós pedimos aqui, para os senhores, é que tenham uma cautela bastante excessiva, porque temas de propriedade intelectual e correlatos, como o caso do data protection, são temas que passam no âmbito de discussões internacionais, para sopesar os interesses estrangeiros versus os interesses locais.
Portanto, pedimos a cautela, pedimos a atenção, porque esse instituto, se adotado neste momento no nosso país, vai causar um efeito irreversível para o desenvolvimento da indústria nacional brasileira.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Obrigado, Adriana.
Passo imediatamente para Julia Paranhos, Coordenadora do Grupo de Economia da Inovação, da Universidade do Rio de Janeiro.
A SRA. JULIA PARANHOS (Por videoconferência.) - Eu não estou conseguindo abrir o meu vídeo. (Pausa.)
Bom dia.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Bom dia.
A SRA. JULIA PARANHOS (Para expor. Por videoconferência.) - Agradeço a oportunidade para apresentar este estudo aqui, sobre o qual a Adriana e a Ana Cláudia já comentaram
É realmente um tema muito importante de ser debatido, e a gente traz algumas evidências científicas para fortalecer o debate e ampliar a discussão, como a Adriana falou, de um tema que realmente pode trazer muitos efeitos, tanto para a saúde da sociedade brasileira, quanto para a indústria farmacêutica nacional.
Eu tenho uma pequena apresentação também. Eu estava sem autorização para compartilhar... Agora, eu já tenho.
Bom, eu sou Coordenadora do Grupo de Economia da Inovação. Sou Mestre e Doutora em Economia. Não sou da área farmacêutica, mas estudo a indústria farmacêutica brasileira há quase 20 anos.
Eu realizei esse estudo, como a Adriana comentou, sobre contratação do Mdic com financiamento do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
Deixe-me ver se eu consigo aqui abrir a minha apresentação. (Pausa.)
Esse estudo foi realizado pela universidade brasileira... Na verdade, são pesquisadores de três universidades públicas federais: a Universidade Federal do Rio de Janeiro, a Universidade Federal da Paraíba e a Universidade Federal do Paraná, que trazem algumas evidências científicas sobre a avaliação dos impactos da exclusividade sobre dados de testes de registro de medicamentos para a inovação e o sistema de saúde brasileiro.
Então, pela primeira vez, nós trazemos estudos sobre o mercado de medicamentos como um todo, para o Brasil, e seus efeitos sobre o sistema público e privado de saúde, utilizando uma metodologia internacional já bastante consolidada; e também os efeitos sobre inovação de medicamentos na indústria brasileira, com uma metodologia inédita desenvolvida por essa equipe de pesquisadores, com metodologias quantitativas e qualitativas.
A gente fez uma pesquisa de campo também, além dos dados que eu vou apresentar aqui, para tratar desse tema e de seus efeitos sobre a inovação na indústria brasileira. Além da equipe dos pesquisadores, nós contamos com acompanhamento de equipes técnicas da saúde, da propriedade intelectual, das relações exteriores, da indústria e da inovação do Governo brasileiro.
Esse estudo foi desenvolvido durante oito meses, um estudo de bastante robustez científica e também de debate com indústria e com Governo, para a gente poder trazer dados e evidências que fortaleçam e deem base para um debate bastante importante para a sociedade brasileira.
Para desenvolver, para analisar esses impactos, a gente criou cinco cenários alternativos de exclusividade de mercado e/ou de exclusividade de dados.
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O cenário 1 traz a manutenção do que existe hoje no Brasil, que é a não exclusividade de dados para medicamentos de uso humano.
E foram então criados outros quatro cenários com base em legislações internacionais ou acordos comerciais de países desenvolvidos com países em desenvolvimento. E aí trago o ponto que a Ana Claudia comentou, de que os países em desenvolvimento que adotam esse tipo de mecanismo adotam por pressão dos países desenvolvidos no estabelecimento de acordos comerciais. Então, tem um forte interesse dos países desenvolvidos e da indústria desses países em estender a proteção intelectual em mercados pelo mundo, particularmente nos países em desenvolvimento.
Então, nesses cenários, o cenário 2...
Eu vou explicar rapidamente, só para depois, quando eu trouxer os resultados, a gente ter um panorama do que está sendo tratado.
No cenário 2, a gente estabeleceu um cenário em que há cinco anos de exclusividade de mercado para produtos químicos e biológicos. Isso significa que a empresa produtora de genérico pode fazer o pedido durante esse período de exclusividade, mas ela só pode compartilhar após os cinco anos, quando a exclusividade de mercado termina.
No cenário 3, eu já tenho cinco anos de exclusividade de dados para produtos químicos e biológicos. Isso implica que o pedido para o genérico só pode ser feito após os cinco anos. Então, a gente vai ter um tempo adicional ao período de exclusividade, que é o período em que a Anvisa vai analisar e vai, eventualmente, autorizar essa comercialização. Então, há uma diferença aqui entre esses dois mecanismos.
O cenário 4 envolve cinco anos de exclusividade de dados e dois anos de mercado para produtos químicos e biológicos.
E o cenário 5 traz o que está na legislação dos Estados Unidos, que são 5 anos de exclusividade de dados para medicamentos químicos e 12 anos para medicamentos biológicos - de exclusividade de dados também para medicamentos biológicos. Esses são os cenários básicos que a gente inclui para fazer as simulações do estudo.
Então, nos efeitos para o mercado de medicamentos, é o primeiro estudo que trata do mercado de medicamentos como um todo, não focando somente em determinadas classes, nos efeitos para os gastos em saúde.
No sistema público e privado, a gente faz uma simulação de 30 anos, de qual seria o efeito da introdução dessas exclusividades em 30 anos. E todos esses cenários apresentaram a mesma tendência, que é: aumento na vigência e no leque dos produtos sob exclusividade. Porque é uma falácia dizer que a exclusividade já vai ficar incluída na proteção da patente. Para o caso brasileiro, o tempo médio entre o depósito da patente no INPI e o registro do medicamento na Anvisa é de cerca de 16 anos. Então, mesmo que a gente estivesse somente no cenário 2, com cinco anos de exclusividade de mercado, você tem, no mínimo, um ano a mais, você teria 21 anos de período de exclusividade; isso contando somente o cenário 2. Para os demais, então, a gente vê que esse período seria ainda maior.
E isso geraria, consequentemente, uma intensificação do déficit da balança comercial de medicamentos, que, em 2019 - que é um dado do estudo, mas esse déficit é crescente -, foi de US$5,7 bilhões. Então, a gente já tem uma dependência externa muito forte, e a ampliação da exclusividade, a ampliação da proteção intelectual, nesse sentido, geraria uma intensificação desse déficit.
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Para ficar bastante claro - eu acho que esse eslaide responde a várias das perguntas que foram feitas no início -, haveria, sim, uma postergação da disponibilidade de genéricos e biossimilares, que geraria a ampliação no nível de preços; a redução no consumo de medicamentos; a redução no faturamento e na participação das empresas nacionais, considerando principalmente que elas são as grandes produtoras de genéricos no país; e a ampliação das despesas públicas, ou seja, do Ministério da Saúde, mas também as despesas das famílias com medicamentos. E aqui esses dados apresentam as variações entre o cenário 2 e o cenário 5. No estudo, obviamente, isso está tudo detalhado.
Para a gente ter uma ideia, principalmente no cenário 2, geraria um efeito para 2048: o aumento dos gastos do Ministério da Saúde seria de 19,5% do que foi o gasto em 2018. Então, a gente vê aqui neste gráfico uma intensificação no início da introdução da exclusividade de dados na perda do consumo, mas o que é mais importante mostrar é que, ainda que esse efeito se reduza, no final, na simulação de 2048, em todos os cenários, a situação final é pior do que a situação em 2019, ou seja, não há nenhum benefício para o sistema de saúde, para o consumo de medicamentos, para o acesso a medicamentos da implementação desse mecanismo.
Em relação à inovação, nós fizemos uma análise, então, em relação aos produtos novos na introdução de inovação radical no país. Considerando, então, as três classes terapêuticas que nós estudamos, nos registros de medicamentos, de aparelho digestivo e metabolismo, por exemplo, para diabetes, a gente viu que o Brasil, que não adota esse mecanismo, tem um tempo de entrada de medicamentos novos em relação aos Estados Unidos menor do que o Canadá e o México que adotam. E, por outro lado, nas outras classes terapêuticas que foram analisadas, os intervalos foram semelhantes. Então, não há ali nenhum benefício claro. Além disso, o México, que adota esse mecanismo e que tem um perfil de desenvolvimento mais próximo ao Brasil, tem um tempo médio de entrada de dois anos superior à entrada de medicamentos novos, superior ao Brasil, e tem uma menor disponibilidade desses produtos.
Então, o que a gente identificou é que a adoção da exclusividade de dados de teste de registro não tem uma correlação direta com o tempo de entrada de medicamentos novos e nem com a maior disponibilidade de medicamentos novos, que é o argumento que vem por trás da defesa desse mecanismo no Brasil. E aqui eu estou trazendo evidências de dados levantados no Brasil, no Canadá e no México.
Por fim, com relação aos produtos com inovação incremental - que é onde a indústria farmacêutica nacional começa a avançar na inovação, como a Adriana apresentou ali os grandes esforços que estão sendo feitos -, na simulação para esses cinco cenários, naquelas mesmas três classes terapêuticas, há uma ampliação do tempo médio da introdução desses medicamentos inovadores em 17 anos, ou seja, a inovação também é atrasada, a entrada da inovação também é atrasada, ou então ela vai encarecer a entrada de medicamentos inovadores concorrentes no mercado, porque a empresa concorrente ou vai ter que pagar para a empresa que detém o dado para poder solicitar o seu registro, ou para usar aquele registro como comparador, ou ela vai ter que realizar novos testes clínicos, o que se torna uma ineficiência econômica, uma ineficiência social, uma questão ética ao se reproduzirem testes clínicos.
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Por fim - eu já estou aqui terminando -, os registros, as empresas estrangeiras, entre 2010 e 2019, e continuam hoje, são as maiores detentoras, tanto dos registros dos produtos novos como dos inovadores. A inovação incremental é bastante incipiente na indústria nacional. Então, a ampliação dessa proteção para as empresas e o bloqueio aos concorrentes vai gerar uma reserva de mercado para as empresas que já são detentoras dos registros dos produtos novos. Como resultado, para a inovação, a exclusividade de dados teria um efeito de ampliação da participação das empresas transnacionais, que são as principais detentoras dos registros de produtos novos e inovadores, e, principalmente, de um bloqueio ao avanço da inovação incremental da empresa farmacêutica nacional, que tem esforços recentes, crescentes.
A Adriana apresentou o conjunto como um todo. A gente tem estudos mostrando que os esforços das nacionais, no Brasil, são ainda mais significativos do que os das transnacionais, que fazem seus esforços, particularmente, no exterior, seus esforços em inovação. Então, a questão da inovação também tem que estar no cerne dessa discussão.
Eu agradeço. O tempo é muito rápido para apresentar muitas informações. Ficou bastante coisa aqui faltando, mas eu me coloco à disposição, não só para as perguntas como para eventuais outros debates.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Obrigado, Julia.
Chegaram mais algumas perguntas aqui que eu vou também já antecipar.
Marcos, do Rio de Janeiro: "Qual o custo estimado para a indústria se o PRDT for regulamentado? Espera-se impacto nos preços para os consumidores finais?".
Antônio, do Rio Grande do Norte: "Qual impacto real essas disposições legais e/ou regulatórias relacionadas ao PRDT terão sobre a população?".
Marcela, de São Paulo: "Quais as implicações do PRDT sobre a ética em pesquisa em seres humanos com a potencial duplicação de ensaios clínicos desnecessários?".
Lia, do Rio de Janeiro: "A proteção regulatória resulta em extensão da validade das patentes?".
Juliana, do Paraná: "Existem exemplos de países onde o PRDT influenciou significativamente a inovação farmacêutica? Como isso poderia se refletir no SUS?".
E Thiago, de São Paulo: "Quais informações e documentos são necessários para compor o Dossiê de Testes e garantir sua conformidade com os regulamentos vigentes?".
Vou passar, imediatamente, a palavra à Coordenadora do Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual da Rede Brasileira pela Integração dos Povos, Susana van der Ploeg.
A SRA. SUSANA VAN DER PLOEG (Para expor. Por videoconferência.) - Olá! Bom dia a todos e todas.
Muito obrigada pelo convite.
Agora está autorizado o vídeo.
A princípio, eu gostaria de expressar toda a solidariedade do GTPI e da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS a todo o povo do Rio Grande do Sul, que está passando por uma tragédia climática sem precedentes. Como isso também afeta a saúde de todo o seu povo! É uma tragédia verdadeira!
Eu gostaria de compartilhar a minha tela. (Pausa.)
Bom, o tema desta audiência eu acho que a Adriana, a Ana Claudia e a Julia Paranhos expuseram muito bem, a Proteção Regulatória do Dossiê de Testes (PRDT), mas a gente poderia chamar também de exclusividade de dados para produtos farmacêuticos destinados ao uso humano.
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Bom, meu nome é Susana. Eu sou Coordenadora do GTPI, tenho mestrado em Direito e Inovação pela Universidade Federal de Juiz de Fora e, agora, estou no doutorado na Uerj sobre Atividades Econômicas.
Quem somos? O Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual da Rede Brasileira pela Integração dos Povos trabalha há 20 anos com o impacto das patentes e da propriedade intelectual sobre a saúde do povo brasileiro. Nós somos um GT formado por organizações da sociedade civil que defendem o interesse dos usuários do SUS e que defendem uma saúde pública de qualidade. Também fazemos parte de diversas redes internacionais, como a Rede Latino-Americana por Acesso a Medicamentos; a Make Medicines Affordable, que reúne 24 países do mundo; e a The People's Vaccine Alliance, que também reúne diversas organizações de acesso a medicamentos.
Eu acho importante a gente começar reafirmando que "a saúde é direito de todos e dever do Estado". E aí eu grifo que é importante que esse direito seja "garantido mediante políticas sociais e econômicas", políticas que são formuladas dentro do Congresso Nacional, no Senado Federal, na Câmara dos Deputados e também dentro do Executivo, e que é dever de nossos representantes defender a saúde de todo o povo brasileiro e defender o sistema único de saúde.
Mas o que é exclusividade de dados? Eu acho que parte das perguntas podem ser respondidas nesses próximos eslaides.
Para que um medicamento possa ser utilizado no Brasil, ele precisa de um registro sanitário que é concedido pela Anvisa. A Anvisa avalia, durante essa análise, a eficácia, a segurança e a qualidade dos produtos. É importante a gente mencionar aqui também - eu, como Coordenadora do GTPI, não poderia deixar de mencionar - que nós tínhamos um papel na Anvisa, dentro do Escritório Brasileiro de patentes, do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, o papel da anuência prévia, que foi retirado logo depois do fim, da extinção das patentes pelo STF, através de uma medida provisória em que esse papel de defesa da saúde pública foi retirado do INPI. E agora nós não temos, dentro da análise dos requisitos de patenteabilidade uma perspectiva da defesa da saúde pública. É lamentável, mas, enfim...
Antes da solicitação do registro, o produto precisa ser submetido a estudos para demonstrar sua atividade no corpo humano. Esse é o dossiê. Então, são feitos inicialmente estudos pré-clínicos, que envolvem os animais, que são sucedidos por estudos clínicos, que envolvem os seres humanos. E esses estudos clínicos aumentam o grau de complexidade; então, temos estudos de Fase I, Fase II e Fase III. Os objetivos desse estudo são: determinar a segurança, os níveis seguros de toxicidade; a eficácia, ou seja, ter no paciente os efeitos desejados - então, aí tem a qualidade.
Então, a primeira vez que um fabricante for solicitar o registro de uma nova entidade química - e, como a Ana Claudia e a Adriana também colocaram, não necessariamente é um medicamento inovador, mas pode ser um medicamento novo no Brasil -, ele tem que apresentar os dados dos estudos pré-clínicos e clínicos, e aí se tem o dossiê. No caso do registro do medicamento genérico, esses dados não precisam ser apresentados novamente. Então, para obtenção do registro genérico é preciso ter os testes de bioequivalência: mostrar que o medicamento tem qualidade e é intercambiável com o produto de referência; então, que pode haver uma troca entre o produto de referência e o medicamento genérico. Mas o que a exclusividade de dados faz? Ela impede que as autoridades reguladoras - a Anvisa - utilizem como base de dados para aprovação desse novo medicamento o dossiê que foi apresentado inicialmente pelo registro do medicamento inovador.
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Então, o que nós temos em risco com o medicamento genérico e o medicamento biossimilar no Brasil?
A Agência Senado publicou, em 2021, que: "Lei dos Genéricos é divisor de águas para a saúde no Brasil" - isso foi avaliado pelos Senadores. Então, eu trago aqui a fala do ex-Senador José Serra, que eu espero que esteja com saúde e se cuidando bem. Serra coloca que os genéricos ampliaram fortemente a oferta e a diversidade de medicamentos, levando a significativa redução de preços; "do ponto de vista econômico, além de gerar milhares de empregos [o que foi apresentado pela Adriana], os genéricos foram um divisor de águas para a indústria brasileira". E o Senador Nelsinho Trad, também médico, coloca que a chegada dos genéricos incentivou a inovação com concorrência entre fabricantes e mais uso de tecnologia em favor da medicina. Então, "todos ganharam com a Lei de Genéricos [fala o Senador Nelsinho Trad]: a população, os fabricantes e os profissionais da saúde [...]".
Temos agora 25 anos da Lei dos Genéricos, e 37% dos medicamentos brasileiros são genéricos. É um marco que nós temos. A Anvisa também publicou sobre os 25 anos dos medicamentos genéricos, colocando que: "Essa política não apenas garantiu a equivalência em qualidade, eficácia e segurança entre os medicamentos genéricos e os produtos de referência, como também democratizou o acesso a tratamentos essenciais, reforçou a cadeia de saúde brasileira e impulsionou a economia nacional".
Nós temos aqui, em resumo, danos à saúde pública e ao povo brasileiro. A exclusividade de dados vai impedir o registro de novos medicamentos genéricos, permitindo um monopólio mesmo sem patentes. E eu acho importante, quando a gente for construir políticas públicas no Brasil envolvendo propriedade intelectual, que a gente utilize os estudos empíricos, como os apresentados tanto pela Adriana, como pela Ana Claudia, como pela Julia Paranhos, mas a gente também ver as realidades dentro da América Latina, com o que aconteceu, por exemplo, na Colômbia, com a adoção da exclusividade de dados através de um tratado de comércio bilateral. Então, a exclusividade de dados limita a concorrência, restringe o acesso e permite preços altos. Ela prejudica a saúde pública e o orçamento público, ela prejudica a indústria nacional, ela prejudica a política pública do complexo econômico industrial da saúde e prejudica o povo brasileiro.
Mas quem é o maior interessado? O maior interessado são as empresas farmacêuticas transnacionais - é preciso a gente deixar isso claro. Existem diversas propostas legislativas caminhando dentro do Congresso Nacional que têm como seu maior impulsionador representantes da indústria farmacêutica transnacional, como a Intrapharma. Então, nós temos aqui nessa imagem um homem gigante, carregando uma mala com a inscrição "Big Pharma", dizendo: "Seu dinheiro ou sua vida". Então, quando a gente passa por questões de saúde, as pessoas vendem suas casas, vendem seus carros, vendem todos os seus bens para garantir a saúde daqueles que amam. Isso se chama uma política perversa, que o Governo brasileiro e os Parlamentares não podem defender. Então, é pelo acesso a medicamentos que a gente luta dentro do GTPI.
Mas eu questiono também de que lado estão os Senadores: do povo brasileiro ou da big pharma? Aqui eu trago um trecho do estudo da Julia Paranhos, de que a exclusividade de dados, a "apropriação privada de informações submetidas à regulação pública tem efeitos sobre políticas públicas sensíveis, especialmente as políticas de saúde e assistência farmacêutica [...], afetando a produção de medicamentos genéricos e o desenvolvimento de melhorias e adaptações de medicamentos para populações [...]".
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Quem defende? "Empresas farmacêuticas transnacionais de países de alta renda, como os Estados Unidos (EUA), União Europeia (UE), Japão e os membros da Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA), [que] têm demandado", dentro dos acordos bilaterais de comércio, que seja protegida a exclusividade de dados. E é importante colocar, quando se colocou sobre a harmonização internacional legal, que não há no Acordo TRIPS a previsão de exclusividade de dados.
Então, de que precisamos? É hora de reduzir os preços de medicamentos, e não os direitos da população. Então, dentro de um contexto de direitos humanos e justiça social, é imperativo afirmar e promover princípios como igualdade, equidade, universalidade e solidariedade para erradicar o sofrimento humano decorrente da exclusão do acesso às tecnologias de saúde. Então, o que a gente não precisa é de exclusividade de dados.
A gente precisa de transparência da indústria farmacêutica. A gente precisa regular o preço dos medicamentos. É preciso que seja indicado o porquê do preço alto dos medicamentos.
A gente precisa defender o SUS com financiamento adequado e sustentável. A gente precisa ampliar os investimentos do SUS; a gente não pode diminuir. Então, a ideia de acabar com o piso constitucional da saúde é um grave erro para toda a população brasileira. A gente não pode deixar isso acontecer.
A gente precisa defender também o uso das salvaguardas de saúde do Acordo TRIPS, que estão previstas tanto no acordo internacional como na legislação nacional para promover a eliminação de barreiras de propriedade intelectual, reduzir os preços e estimular a produção local e regional de medicamentos, vacinas e outras tecnologias de saúde.
A gente precisa também defender a proteção dos cidadãos no desenvolvimento de ensaios clínicos e o acesso aos resultados desses ensaios clínicos e às tecnologias derivadas para toda a população. A gente precisa de repartição de benefícios dos ensaios clínicos. A população brasileira não pode ser cobaia. E, aí, eu chamo a atenção para nota que o GTPI também assinou, da Abrasco, pedindo vetos ao Presidente nesse PL que foi aprovado, que a gente chama de "PL das cobaias", porque a gente não pode deixar o povo brasileiro ser cobaia.
Para finalizar, a gente deve rejeitar - e aí eu peço aos Senadores - todas as iniciativas regulatórias que vão contra o direito à saúde e o acesso a tecnologias de saúde. Então, é não à exclusividade de dados, é não à PEC do plasma. Não podemos deixar que comercializem nosso sangue e partes do corpo humano.
É isso.
Muito obrigada. Estou à disposição de todas e todas, e seguimos juntos na luta por um SUS mais forte e pelo direito à saúde a todos os usuários.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Obrigado, Suzana.
Eu passo, rapidamente, a palavra à Consultora de Saúde do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), Ana Carolina Navarrete.
A SRA. ANA CAROLINA NAVARRETE (Para expor. Por videoconferência.) - Olá, bom dia, Sr. Senador Izalci, na pessoa de quem cumprimento os demais membros dessa mesa. Bom dia a todas as pessoas presentes!
Eu estou tentando aqui... Ah, agora foi. Minha tela foi liberada.
Queria agradecer de novo a oportunidade de o Idec participar dessa discussão também. Eu espero que a minha fala contemple muitas perguntas do Gustavo, acho que da Giovana, que estão perguntando qual é o impacto direto da exclusividade de dados para o usuário, para os consumidores e para o acesso a medicamentos. Então, a minha fala vai se concentrar a partir disso.
E eu queria também fazer coro à solidariedade que foi exposta pela Susana ao povo do Rio Grande do Sul, que está sofrendo com o desastre climático das enchentes.
Vou aqui compartilhar a minha tela. Deixa eu ver... Vocês conseguem ver minha tela, pessoal? (Pausa.)
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Dá pra ver?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Está o.k. É só ampliar lá embaixo, lá no... Como é que chama lá o...
A SRA. ANA CAROLINA NAVARRETE (Por videoconferência.) - Assim, não é? Dá pra ver a passagem?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - É, falta colocar no modo de apresentação - acho que é ali embaixo.
A SRA. ANA CAROLINA NAVARRETE (Por videoconferência.) - Não entrou o modo de apresentação?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Embaixo. Do lado direito, lá embaixo, tem. É só apertar ali - como é que chama esse botão aí? (Pausa.)
A SRA. ANA CAROLINA NAVARRETE (Por videoconferência.) - Aqui para mim entra, mas não consigo...
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Modo apresentação - lá embaixo, assim; à direita e embaixo. (Pausa.)
Se você entrar lá embaixo, à direita e embaixo, tem um modo apresentação.
A SRA. ANA CAROLINA NAVARRETE (Por videoconferência.) - É, aqui em cima também tem.
Aí, pronto!
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - É, qualquer um, o de cima ou o de baixo.
A SRA. ANA CAROLINA NAVARRETE (Por videoconferência.) - Foi agora? Foi?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Não.
A SRA. ANA CAROLINA NAVARRETE (Por videoconferência.) - Agora foi. (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Coloca lá embaixo. Aperta o botãozinho lá embaixo, à direita, ali embaixo.
A SRA. ANA CAROLINA NAVARRETE (Por videoconferência.) - Eu estou apertando, mas não está entrando. Deixa eu ver se eu consigo pela guia do PDF. (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Você tem que fazer isso aí antes de compartilhar a apresentação.
A SRA. ANA CAROLINA NAVARRETE (Por videoconferência.) - Dá pra ver maior agora?
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - O.k.
A SRA. ANA CAROLINA NAVARRETE (Por videoconferência.) - Vamos com o PDF, então. Eu vou passar, então...
Eu falo em nome do Idec. O Idec é o Instituto de Defesa de Consumidores, uma organização que, há 37 anos, trabalha para orientar, conscientizar e defender o consumidor brasileiro a respeito da ética e direitos dos cidadãos em suas relações de consumo.
O Idec trabalha em sete programas temáticos: alimentação, consumo sustentável, saúde, energia, telecomunicações e direitos digitais, serviços financeiros e mobilidade urbana. A gente trabalha numa perspectiva muito ampla como é a relação de consumo mesmo, e eu falo aqui do programa de saúde.
Dentro do programa de saúde, a gente trabalha com uma série de relações de consumo, entre elas o acesso a medicamentos. Na linha de acesso a medicamentos, a gente trabalha o uso racional de medicamentos - acesso sem excesso - e também as lutas por preço justo de medicamentos, muito na linha do que a representante do GTPI trouxe.
A gente tem um assento no Comitê Nacional para a Promoção do Uso Racional de Medicamentos, ligado ao DAF, no Ministério da Saúde. A gente tem também uma campanha que é Remédio a Preço Justo - eu vou falar um pouquinho sobre isso ao final. E, basicamente, o que a gente tenta fazer também é articular as discussões de avaliação de tecnologia em saúde, com as de regulação de preço e as práticas da indústria farmacêutica também.
Eu sei que a discussão já foi abordada em múltiplas perspectivas - tanto da perspectiva da indústria nacional, da indústria de química fina, do desenvolvimento tecnológico no país, das entidades de patologia, dos movimentos de acesso a medicamentos -, e eu vou falar muito da perspectiva do usuário, o consumidor que vai à farmácia comprar o seu medicamento. É uma perspectiva um pouco mais simples, mas eu espero que também passe a mensagem, ou seja, um pouco dessa perspectiva de quem está acessando no varejo farmacêutico os tratamentos para a sua saúde.
Se a gente fosse resumir a vida de um medicamento, o ciclo de vida, ele começa com pesquisa e desenvolvimento, vai para a fabricação, comercialização, uso e descarte. Esse debate que a gente está fazendo sobre exclusividade de dados, sobre estudos de teste tem muito a ver com a fase de pesquisa e desenvolvimento, que, como já foi apresentado aqui, envolve etapas pré-clínicas e estudos em seres humanos e culmina no registro feito pela Anvisa. São esses estudos, que envolvem a fase pré-clínica e a fase de estudos clínicos, que formam esse dossiê regulatório sobre o qual - se deve ou não ser disponibilizado para acelerar a produção de genéricos, a gente deve disponibilizar - é o debate que a gente está travando aqui. Acho importante - e sei que isso já foi muito bem endereçado nas falas que antecederam a minha - dizer que, da perspectiva da inovação tecnológica, a gente já viu que tem evidência científica muito bem mostrada pela Profa. Julia Paranhos de que você promover exclusividade de dados, de que você permitir que a indústria farmacêutica que fez os testes clínicos e pré-clínicos tenha cinco anos ou um período ainda maior em que esses estudos não possam ser disponibilizados para registro de novos medicamentos genéricos acaba atrasando muito a entrada de medicamentos genéricos no país. A gente sabe que hoje no Brasil é possível registrar medicamentos usando os mesmos dados de pesquisa de um medicamento inovador. Isso facilita, acelera processos e exige do fabricante do genérico comprovar apenas que o seu produto é igual ao medicamento de referência. A questão é justamente essa. E essa ideia simples e genial, que foi muito encabeçada pelo ex-Senador e ex-Ministro José Serra, é a base principal, é o coração da política de genéricos do Brasil, que é promover o acesso através da ampliação de concorrentes que possam ofertar no mercado, sem os mesmos gastos e riscos com a inovação, aqueles em que incorreram os produtores do medicamento inovador de referência, que têm, em remuneração e em contrapartida pelos seus custos com inovação, 20 anos de proteção patentária, monopólio. Então, não ter que repetir esses testes é um fator barateador muito importante e também um fator ético muito importante. Por quê? Porque, quando a gente fala de pesquisas em seres humanos, ter que repetir pesquisas em seres humanos, de novo, sabendo já o resultado dessas pesquisas, também é uma questão ética muito, muito relevante. Assim, não ter exclusividade de dados, que é a situação que a gente tem hoje no Brasil, é um atalho importante para a gente promover concorrência e acesso a medicamentos por meio da política de genéricos.
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Aqui vou trazer uma pesquisa feita também dentro do Grupo de Pesquisa de Economia da Inovação, que é liderado pela Profa. Julia Paranhos, que é uma das grandes referências nesse tema, mostrando uma comparação entre preços de genéricos e preços de medicamentos referência. Ela analisa o impacto da política de genéricos na perspectiva de concentração do mercado - e uma das conclusões desse estudo é de que a política tem um fator importante em termos de redução das concentrações -, mas chamo a atenção especialmente para esta parte aqui, este quadro final que fala da diferença de preços praticados: aproximadamente 92% das apresentações comerciais de genéricos praticavam diferença de preço em relação ao medicamento inovador, ao medicamento de referência superior a 35%, e 37% das apresentações comerciais de genéricos praticavam diferença de preço em relação ao medicamento de referência superior a 60%. Ou seja, os genéricos são bem mais baratos que os medicamentos inovadores. Em pouquíssimas exceções, o genérico tem um preço acima, mas é a exceção que confirma a regra de que genérico não só garante uma oferta mais barata como também puxa os preços dos medicamentos de referência para baixo e tem um efeito importante no longo prazo, porque amplia a concorrência, e, ampliando a concorrência, a gente tem uma oferta mais barata.
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E aí também trouxe também alguns dados que não são só do pessoal do Grupo de Economia da Inovação, mas que também são do Idec. O Idec faz monitoramento de preço no varejo. A gente faz pesquisa de preço na farmácia e compara muito com o teto da Cmed, que é o órgão regulador de preço de medicamento no Brasil. Enfim, eu não vou falar muito sobre a metodologia com que a gente coleta essas informações, mas queria chamar atenção só para o fato de que, diferentemente da pesquisa que compara o preço de genérico com o do medicamento referência, a gente percebe que, mesmo olhando para medicamentos diferentes de marca ou genéricos, os descontos de farmácia, as políticas de desconto que a gente vê no varejo farmacêutico, tantos os aplicados pelo medicamento referência quantos os aplicados pelos genéricos, acontecem. A gente vê descontos para os dois medicamentos, mas em média os descontos de medicamento genérico são maiores. Então, é só para trazer um pouquinho essa informação da realidade do consumidor em termos de mostrar que eles têm um impacto importantíssimo para garantir acesso.
E aí eu vou passar um pouco rápido para cumprir o meu tempo.
Eu queria deixar bem sopesada a mensagem de que, de um lado... Isto já foi colocado antes, mas acho importante a gente trazer isto. Acho que um dos patrimônios, uma das coisas mais importantes que a gente tem hoje em termos de acesso a medicamento é a política de genérico, e essa política é essencialmente baseada no fato de as fabricantes de genérico poderem acessar os estudos clínicos, o dossiê regulatório, que é feito no âmbito do registro sanitário. Então, permitir exclusividade de dados é retardar a entrada de genéricos e é retardar a concorrência no Brasil. O tempo importa. Poder utilizar os dados de teste antes de expirada a patente é um diferencial na prontidão da indústria fabricante de genérico.
Utilizar a concorrência junto à defesa do consumidor compõe a ordem econômica brasileira. Sei que a gente já usou muitos argumentos em termos de direito à saúde e de vedação ao retrocesso social - acho que isso foi colocado pela Adriana, inclusive -, mas também é importante dizer que a nossa ordem econômica está estruturada no sentido de equilibrar os interesses. E aqui trago o que diz não só a Constituição Federal no art. 170, mas o que diz o art. 4º do Código de Defesa do Consumidor, que vai falar que a Política Nacional de Relações de Consumo tem que harmonizar os interesses dos participantes da relação de consumo, compatibilizando proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico. Então, esse equilíbrio, que eu acho que foi bem colocado também pelo Leandro na fala dele, de interesses de acesso a medicamento, acesso a insumos essenciais para a saúde com o desenvolvimento tecnológico é extremamente importante. E aí não ter a exclusividade de dados é justamente o que permite a gente chegar a esse equilíbrio. Por isso, a gente entende que efetivar a exclusividade, permitir ou regular a exclusividade de dados para medicamentos de uso humano no Brasil é uma ofensa à ordem econômica, porque isso tem o potencial de destruir instrumentos relevantes de livre concorrência no país, como a política de genéricos. A política de genéricos permite equilíbrio e justiça econômica, entre muitos interesses, e alguns deles são de interesse de defesa do consumidor e desenvolvimento tecnológico.
É importante também fazer a ressalva de que o Acordo TRIPS não obriga o Brasil a fazer a regulação da exclusividade de dados ou de data protection, enfim, outros nomes. Ele não é explícito quanto a isso, ele deixa essa escolha para os Estados-membros. Por isso, o Brasil é livre para decidir como quer colocar essa política e já decidiu como quer colocar essa política quando tomou a decisão por implementar a política de genéricos no país.
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Eu queria encerrar a minha fala com essa mensagem, agradecendo de novo a oportunidade e me colocando à disposição, e queria, rapidamente, apenas fazer uma menção a que, nesta Casa, tramita outro projeto de lei extremamente importante que trata de regulação de preço de medicamentos, que tangencia o tema aqui, mas quero só deixar também os Senadores a par desta medida que é o PL 5.591, de 2020, que está neste momento na CCJ. Acho que vale a pena também que ele seja do conhecimento de vocês, porque traz questões de governança, regulação e transparência de preços.
É isso.
Muito obrigada novamente.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Obrigado, Ana.
Ficou muito claro aqui, nesta audiência pública, que todos que falaram são exatamente favoráveis a um ponto só - a gente não viu aqui o contraponto. É lógico que com tudo que foi falado aqui eu particularmente concordo plenamente, 100%. Agora, eu, por coincidência, sou contador e sou auditor; então, eu entendo de contabilidade de custo. Quanto é que custa esse investimento no caso de patente, no caso dessa pesquisa que é feita? Quanto é que custa isso no preço do medicamento? Deve ser bastante significativo. Então, quando você utiliza esses dados de alguém que fez a pesquisa, é evidente que copiar é muito mais fácil do que promover e, então, merece realmente um estudo mais fácil, mas é evidente que todos que aqui apresentaram, que fizeram apresentação... Com tudo que foi falado aqui todo mundo concorda, acho que ninguém discorda disso aqui. A questão é que - a gente não viu o contraponto -, para você desenvolver medicamento ou qualquer inovação, isso custa, e alguém paga a conta. Quem paga a conta é o consumidor. Agora, o que o Brasil tem que fazer é verificar, na importação desses medicamentos, qual é a condição da importação. Pode colocar regras sobre isso. Eu vi, durante a pandemia, se quebrando a patente da vacina. O Paim apresentou um projeto, não é, Marcos? Você lembra? Houve um pedido de quebra de patente. É lógico que, naquele momento da covid, era até razoável, todo mundo concorda com isso, mas, se não houver investimento em pesquisa, quem é que vai fazer investimento se não vai poder colocar no preço do remédio? Então, é realmente um debate, um assunto que, nesta audiência, parece muito simples, mas que não é tão simples em função de que, se não houver investimento, não haverá o produto.
Passo a palavra ao Senador Marcos Pontes para suas considerações.
O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP. Para discursar.) - Obrigado, Senador Izalci.
Eu gostaria de aproveitar e agradecer a todos os participantes pelas informações, pelas apresentações.
Primeiro, eu me sinto muito à vontade e feliz em participar desta audiência, sendo que ela trata de um tema que foi iniciado pelo - um tema de muito apreço dele - Senador José Serra, de São Paulo. Eu estou aqui no lugar que era do Senador José Serra e, logo após a minha eleição, fiz questão de conversar com ele, com a família, no sentido de dar prosseguimento aos projetos do Senador José Serra. Então, isso é importante. No ano passado, inclusive, eu prossegui com muitas das emendas dos projetos que ele tinha também. Eu acho importante isso. Da mesma forma, eu fiz no ministério: peguei o que vinha na sequência, o que estava acontecendo no ministério, dei prosseguimento nos projetos, alinhei, criei outros projetos para trazer mais sinergia a tudo isso. Acho que essa é uma importante providência, um procedimento ou um sistema, uma metodologia para economizar dinheiro público, energia, tempo e tudo mais. Então, estou feliz em poder participar aqui.
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Vou tentar resumir um pouquinho o que eu entendi com relação a este tema, e, depois, se for necessário, havendo algumas correções, isso seria interessante.
Nós estamos falando aqui sobre proteção regulatória de base de testes. Essa proteção é relativa aos dados que são coletados durante as fases de testes pré-clínicos com animais e depois nos testes clínicos em Fases I, II e III, que são necessários em qualquer medicamento ou qualquer vacina para utilização humana. Não há dúvida de que os custos envolvidos nisso, para que esses testes sejam realizados, são custos altos. No ministério, por exemplo, eu coloquei recursos para que esses testes fossem feitos em vacinas nacionais - que continuam no seu desenvolvimento - para a covid e que não só precisam ser úteis para a covid, mas também para outras doenças ou para as próximas pandemias também. Nós temos, inclusive, um sistema que nós introduzimos no ministério, junto com a Universidade Federal de Minas Gerais, para o desenvolvimento de vacinas no Brasil. O Brasil nunca tinha desenvolvido nenhuma vacina antes e agora o Brasil tem capacidade de fazer isso, graças a esse trabalho que foi feito no ministério, junto com a Universidade Federal de Minas Gerais e o BH-Tec. Hoje nós temos um centro nacional de desenvolvimento de tecnologia de vacinas nacionais. E ali deu para ver bem o custo de se fazerem esses testes clínicos. Primeiro, há a dificuldade em se ter um sistema de produzir pequenos lotes de insumo para testes pré-clínicos com animais, de ter um biotério próprio com boa qualidade, logicamente; e há toda a necessidade ali de melhores práticas de laboratório para que isso seja feito e depois de melhores práticas de produção, para que também os lotes sejam feitos com essas melhores práticas. Isso tem que ser avaliado e outorgado pela Anvisa.
Nós estamos falando em custos, em termos do Brasil, para que sejam feitos esses testes clínicos, da ordem de R$400 milhões. Inicialmente, é a fase pré-clínica com animais; depois, é a Fase I, com poucos seres humanos escolhidos dentro de uma faixa etária adequada para aquilo, e aí é testada a segurança inicial da vacina, com voluntários; depois, é a Fase II, já com a ampliação da quantidade de voluntários para testar, em que começa o teste de eficiência da vacina; e há a Fase III com milhares de voluntários para testar realmente a eficiência em fase final. A segurança vem sendo testada o tempo todo. É um processo lento, é um processo difícil de fazer, é difícil conseguir os voluntários também, mas tem que ser feito em qualquer tipo de desenvolvimento de medicamento ou vacinas para os seres humanos.
E, o Brasil, em que nós precisamos de desenvolvimento de inovações, em que precisamos de desenvolvimento de medicamentos e de vacinas, tem que fazer parte de testes clínicos.
A parte de que eu discordei um pouco é que isso é antiético. Não, isso é um procedimento normal feito em todos os países para o desenvolvimento da indústria, para o desenvolvimento de produtos da indústria farmacêutica. Isso é normal e é feito com todos os itens de segurança colocados ali para que, logicamente, seja feito com o maior nível de segurança possível. Essa é a parte na defesa disso.
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Agora, as empresas, as indústrias, principalmente no exterior, que desenvolvem novos medicamentos, logicamente, têm um custo de desenvolvimento, um período grande de pesquisa e desenvolvimento até você chegar à fórmula de um medicamento químico ou biológico, e, depois, têm um custo grande para o desenvolvimento disso, sem dúvida nenhuma, mas, por outro lado, esse custo é computado dentro do preço do medicamento, e existe aí um período de patente, 20 anos, em que a empresa recupera esse investimento - logicamente, ela tem um retorno de investimento dentro desse período.
O Brasil ainda não tem uma indústria capaz de fazer a inovação, no nível de Estados Unidos e outros países, em medicamentos, infelizmente, mas a gente vai chegar lá. Para isso, a gente precisa de providências daqui, do Ministério de Ciência e Tecnologia e outros ministérios, para apoiar a nossa indústria farmacêutica local.
Uma dessas maneiras de o Brasil reduzir os custos de medicamentos... Logicamente, o medicamento custa caro. Se a gente olhar medicamento para doenças raras, por exemplo, é um absurdo, são milhões de reais - a gente está falando de R$15 milhões, R$16 milhões um medicamento. Então, a gente precisa desenvolver isso no Brasil, mas, enquanto a gente não tem, os genéricos são uma solução muito acertada, colocada pelo Senador José Serra, que o Brasil já tem utilizado durante todo esse tempo. Isso faz com que nós tenhamos menor custo para a população, menor custo para o Sistema Único de Saúde, e, além disso, as empresas do Brasil que participam com os genéricos acabam desenvolvendo inovações através desse conhecimento, mesmo inovações incrementais dentro daquilo ali. Ou seja, isso aí também ajuda a inovação na indústria brasileira, além de fortalecer a própria indústria aqui. A gente viu ali um percentual alto de venda de genéricos, mais de 30%.
Então, o que a gente está discutindo aqui são alguns pontos: o custo de medicamento original é alto; o Brasil usa genéricos como uma ótima solução; as empresas nacionais desenvolvem inovações com base nesses genéricos, o que também aumenta a capacidade da indústria nacional; os genéricos são feitos depois que vence, que termina a patente original - depois de 20 anos, que é quando os genéricos podem começar a ser feitos, ou seja, existe uma proteção das empresas originárias daquele medicamento, que desenvolveram o medicamento.
A proteção desses testes, dos testes clínicos, dos dados de testes clínicos, a proteção regulatória da base de testes feitos amplia o período em que é impossível para as empresas de genéricos poderem começar a fabricar - ou seja, atrasam o desenvolvimento dos genéricos no Brasil as consequências advindas disso aí -, ou se exigem novos testes, o que vai custar caro, e eu acabei de falar aqui quanto é que custa isso aí, o que vai, de certa forma, aumentar o custo do medicamento genérico também se formos fazer isso, além do tempo necessário para fazer isso, o que não é uma coisa rápida de fazer, pois demora muitas vezes anos fazer isso.
Outro ponto importante é que esses testes clínicos colocam algumas outras variáveis dentro desse sistema que podem dificultar, inclusive, o prosseguimento daquele mesmo medicamento, se acontecer, e a probabilidade é extremamente baixa, porque ele está utilizando a mesma fórmula. Mas, quando a gente fala de biológicos, as coisas podem ser diferentes - se acontecer, pode inviabilizar aquele medicamento também.
Em consequência disso aí, a aprovação dessa proteção regulatória de base de testes para medicamentos humanos pode trazer aumento de custo para o SUS, aumento de custo do remédio para a população e aumento de custo para o SUS; maior tempo também para que seja disponibilizado esse remédio no Brasil; e prejudica a indústria nacional.
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Então, do que eu vejo, isso foi o que eu retirei daqui dessa informação, e eu não vejo nenhuma vantagem em se ter essa proteção regulatória neste momento no país. Quando a gente chegar em nossa indústria com capacidade de desenvolvimento claro de medicamentos de alto nível, com alto nível de tecnologia - e a gente vai chegar lá em um tempo, como os Estados Unidos e outros países -, aí você já não precisa mais dessa proteção do genérico. E, nesse caso, seria mais pertinente se ter uma legislação desse tipo aqui.
Neste momento, eu não vejo nenhuma vantagem.
É isso que eu retiro, Presidente.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Eu acho que ficou muito claro, tanto pela fala do Senador Marcos Pontes como também pelas apresentações.
É evidente que todos aqui, acho que todos os Senadores, têm interesse em manter realmente a situação hoje, sem regulamentar isso.
Agora, o genérico, evidentemente, passou por uma grande negociação, porque, se você quebra a patente, se você abre os dados antes de vencer a patente, isso pode ocasionar situações em que as empresas deixam de fornecer o medicamento para o país. Então é evidente que tudo isso interfere.
Mas acho que ficou claro aqui que, da forma como está, é a melhor forma para manter realmente o genérico funcionando melhor. Então, acho que foi bastante esclarecedor.
Acho que vale a pena, depois, fazer uma audiência do contraponto para ver a situação, para ver de que forma nós poderemos buscar um entendimento que seja bom para o consumidor, para as pessoas e para o país.
Então, eu agradeço a participação de todos os expositores.
Nada mais havendo a tratar, eu declaro encerrada a presente reunião.
Obrigado. (Pausa.)
Temos mais duas audiências já marcadas sobre esse tema.
(Iniciada às 11 horas e 19 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 58 minutos.)