18/06/2024 - 4ª - Comissão Mista Permanente sobre Mudanças Climáticas

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. Bloco/PT - SP. Fala da Presidência.) - Boa tarde.
Havendo número regimental, declaro aberta a 4ª Reunião da Comissão Mista Permanente sobre Mudanças Climáticas da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública com o objetivo de debater a implementação do Código Florestal, suas dificuldades e desafios existentes, em atenção ao requerimento de minha autoria, Deputado Nilto Tato, aprovado na Comissão Mista sobre Mudanças Climáticas.
Antes de passar a palavra aos nossos convidados, comunico que esta reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania, na internet, no endereço www12.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800 0612211.
O relatório completo com todas as manifestações estará disponível no portal, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos expositores.
Na exposição inicial, cada convidado poderá fazer o uso da palavra por até dez minutos. Ao fim das exposições, a palavra será concedida aos Parlamentares inscritos para fazerem as suas perguntas e comentários.
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Quero convidar já, então, para compor... Nós temos uma lista de 12 convidados, aos quais quero agradecer antecipadamente.
Deputado Sergio Souza, presente.
E nós vamos fazer, então, duas etapas: uma primeira mesa com seis participantes, e depois a gente troca a mesa.
Então, quero convidar já para vir fazer parte da primeira mesa: Raoni Guerra Lucas Rajão, Diretor do Departamento de Políticas de Controle do Desmatamento e Queimadas do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima - obrigado, Raoni; Leonardo Papp, Consultor da Organização das Cooperativas Brasileiras; Nelson Ananias Filho, Coordenador de Sustentabilidade da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil; Mário Augusto de Campos Cardoso, Gerente de Recursos Naturais da Confederação Nacional da Indústria; Gustavo Spadotti Amaral Castro, Chefe-Geral da Embrapa Territorial; e também o Felipe Ribeiro, Pesquisador da Embrapa.
Esse aqui também está aqui ou é via Zoom? (Pausa.)
Está aqui.
E também a Fabíola Marono Zerbini, Diretora do Departamento de Florestas, da Secretaria Nacional de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais, do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, que fará participação remota, via Zoom.
Já quero anunciar e agradecer as presenças da Deputada Silvia Waiãpi, do Deputado Sergio Souza, do Senador Ireneu Orth e da Senadora Tereza Cristina. Obrigado.
O Código Florestal está completando 12 anos, não é isso? Talvez tenha sido um dos principais momentos que a gente teve de concertação política, dentro do Congresso Nacional. Acho que foi um momento muito rico. Muitos costumam dizer que ninguém saiu contente, mas também acho que ninguém saiu triste - podemos dizer assim -, porque foi um momento de concertação de projetos, de ideias diferentes, como a gente também celebra quando acontece isso dentro do Congresso Nacional, do ponto de vista do debate das ideias, do debate da política, do debate de projeto de país. Mas 12 anos ainda não foram o suficiente para a gente fazer com que ele acontecesse na prática ou fosse implementado. Até pelo Código Florestal...
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Segundo os dados oficiais mesmo, a gente tem cerca de 19 milhões de hectares que deveriam ser restaurados, por diversas técnicas, diversas maneiras. Há várias possibilidades de a gente fazê-lo.
Com base nesse passivo - a gente poderia dizer assim - com relação à própria Legislação, o Governo brasileiro assumiu, inclusive no Acordo do Clima, restaurar 12 milhões de hectares como parte do conjunto das nossas metas para reduzir as emissões de gás de efeito estufa que provocam o aquecimento global.
Nós temos também, ainda, uma dificuldade muito grande de implementar as ferramentas, os instrumentos previstos no próprio Código Florestal, como o cadastro e também os programas de recuperação previstos no próprio código.
Então, o intuito deste debate nesta Comissão, que é mista... Nós temos a CMO, Comissão de Orçamento, e temos esta Comissão Mista sobre Mudanças Climáticas. Portanto, é o debate para repercutir nas duas Casas. E este é um tema que nós precisamos debater com profundidade e ver como este Parlamento pode contribuir para avançarmos na implementação dessa que é uma lei fundamental, como entendimento para todos os segmentos, não só para os ambientalistas, mas também, em especial, para o setor produtivo, que já vem sofrendo as consequências das mudanças climáticas, com redução, em especial, de produtividade em algumas regiões do país. Então, é nesse intuito a realização deste debate.
Aqui quero agradecer aos convidados. Com certeza, aquilo que vocês estarão trazendo aqui para a gente dará subsídio para que esta Comissão possa elaborar propostas para ajudar na implementação do próprio Código Florestal.
O SR. SERGIO SOUZA (MDB - PR) - Pela ordem, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Deputado Sergio Souza.
O SR. SERGIO SOUZA (MDB - PR. Pela ordem.) - Sr. Presidente, eu sei que V. Exa. já colocou os termos desta audiência pública e que nós Parlamentares teremos o direito às perguntas, à palavra ao final. No entanto, o nosso dia a dia aqui no Congresso não vai me permitir ficar após às 15h. Antes disso, eu e a Senadora Tereza vamos para uma reunião com pessoas do Governo para tratar do Plano Safra, que deve ser anunciado na próxima semana, então nossa agenda é bastante tumultuada. Talvez eu consiga voltar a tempo.
Mas eu gostaria aqui, de forma bem rápida, Sr. Presidente, de dizer do carinho que eu tenho por esta Comissão. Aqui estou desde 2012. Fui eu quem instalou novamente esta Comissão lá em 2012, quando eu fiquei alguns anos aqui no Senado, e eu sei da importância que tem. Ela é temática, não é propositiva, mas é muito importante.
Inclusive, Sr. Presidente, quando aqui no Senado eu estive, Senador Ireneu, eu participei de todas as Comissões que trataram do Código Florestal, todas elas, seja do Meio Ambiente, da Agricultura, das outras que vieram depois, e alguns colegas que estão nesta Comissão participaram da elaboração do código, ou na Câmara ou aqui no Senado Federal. E este é o instrumento que é, eu tenho para mim, o mais importante para garantir a produção brasileira com sustentabilidade e para garantir a conservação do meio ambiente. Ela é extremamente importante.
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Nós não podemos ter o produtor rural como o culpado por não haver essa implementação, e é o que está acontecendo hoje. Inclusive fizemos, no Dia Mundial do Meio Ambiente, na semana passada, lá na Câmara dos Deputados, um debate muito importante sobre este tema, que é a implementação do Código Florestal, a implementação do Código Florestal através do CAR. Porque sem o CAR não há o PRA, sem o PRA não há o que V. Exa. está colocando, que são os compromissos que o Brasil assumiu perante o Fórum Mundial do Meio Ambiente, na COP de Paris - eu estava lá, inclusive, naquele momento.
Então, assim, eu primo muito para que os debates nesta Comissão sejam de fato propositivos, sugestivos, e que nós possamos encontrar, dentro dos governos dos entes federados, dos estados e dentro do Governo Federal, um caminho para a implementação do CAR e a regularização através do PRA, e tirar ali todos os embargos que nós estamos tendo hoje dentro da propriedade por conta da suspensão do CAR em muitas propriedades.
Obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Muito obrigado, Deputado Sergio Souza. Eu até... A gente tem como prática aqui... Vocês, boa parte de vocês, já participaram, os convidados já participaram de várias audiências aqui, sabem como que é a rotina e a agenda dos Parlamentares aqui. É uma correria de uma Comissão para outra. Então, a gente também tem como costume aqui... Apesar de que aqui tem uma regrinha, um roteirinho, mas a gente faz isso para aproveitar, inclusive, a oportunidade de a gente ouvir também os Parlamentares que porventura tenham outra agenda.
Por isso, então, Senadora Tereza Cristina.
A SRA. TEREZA CRISTINA (PP - MS. Pela ordem.) - Obrigada. Obrigada, Deputado Nilto Tatto.
Quero cumprimentar aqui meus colegas - Senador Ireneu, Deputada Silvia, Deputado Sergio - e dizer da minha satisfação de estar aqui. E eu tenho certeza de que esta Comissão, como disse o Sergio, é muito importante, e os debates de alto nível é o que nós precisamos para resolver os problemas do Brasil; sem achismo, através da ciência e através da implementação.
Nós fomos colegas lá na Câmara, você era o Presidente da Comissão de Meio Ambiente, e nós evoluímos muito naquela época; brigamos muito, mas avançamos. Por quê? Porque trabalhamos o melhor para o Brasil.
Eu fico muito preocupada quando a gente fala em meio ambiente e falamos só do agro. Meio ambiente não é só agro. Nós temos as cidades, nós temos o problema de saneamento, nós temos problemas importantíssimos do meio ambiente, problemas que afetam o meio ambiente e que precisam ser discutidos nesta Comissão também.
Eu acho que o Código Florestal é uma das principais políticas que esta Casa, o Congresso Nacional, como disse aqui muito bem o nosso querido amigo Deputado Nilto Tatto... Nós tivemos discussões aqui enormes. Eu não era Deputada, à época, eu era Secretária de Produção do meu estado, trabalhei muito para falar sobre os biomas que afetam a minha região e participei, então, meio de lado nessas discussões. Mas foi uma discussão que valeu a pena, fizemos uma lei, porque o Brasil quis fazer, não foi uma imposição do mundo. O povo brasileiro decidiu, através do Congresso Nacional, que queria fazer um Código Florestal e preservar a vegetação nativa dos vários biomas brasileiros.
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Então, 12 anos se passaram, o Estado brasileiro está devendo ao setor produtivo o CAR. É uma política difícil de ser implementada, mas precisa de vontade política.
Alguém pode dizer: "ah, mas a senhora esteve lá com o CAR na sua mão". Olha que eu briguei muito para a gente fazer esse CAR sair do papel para a realidade. Eu tenho conversado em várias esferas, no Judiciário, no Executivo e aqui no Legislativo, para que a gente possa ajudar os estados brasileiros a implementarem o CAR, a analisarem o CAR, e a gente poder avançar, dar um passo à frente, e o Judiciário também, porque eu vejo o Código Florestal brasileiro como uma rede, e, a cada vez que você ataca um pedaço, você desfaz uma célula, e isso vai ficando manco, vai ficando uma colcha de retalho vazada, cortada.
Então, parabéns pela iniciativa. Nós estaremos presentes aqui nesta Comissão para fazer esse debate a título de colaborar e avançar com essas ferramentas tão importantes que nós ainda precisamos avançar para fazer com que o Código Florestal brasileiro possa caminhar.
Muito obrigada e parabéns.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Muito obrigado, Senadora Tereza Cristina.
Então, vamos lá.
Convido o Prof. Raoni Guerra Lucas Rajão, Diretor do Departamento de Políticas de Controle do Desmatamento e Queimadas do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.
Dez minutos, Rajão.
O SR. RAONI GUERRA LUCAS RAJÃO (Para expor.) - Boa tarde a todos.
Senhores e senhoras, Srs. Deputados, Srs. e Sras. Senadores, é um prazer estar aqui com vocês. Na pessoa do Presidente, cumprimento todos os presentes.
Esse tema é, de fato, um tema de extrema importância, e eu vou começar ecoando a palavra da Senadora Tereza e do Deputado de como o Código Florestal efetivamente é um projeto civilizatório para o Brasil. Poucas pessoas sabem, mas efetivamente o primeiro homem público a falar de reserva legal no Brasil e da importância das florestas para poder manter as chuvas, evitar desastres, etc. foi José Bonifácio de Andrada e Silva, em 1830.
Foram necessários cem anos para, em 1934, termos a nossa primeira legislação federal - apesar de alguns estados terem antecipado isso alguns anos, algumas décadas -, e foram necessários, depois, mais 30 anos para ter um código que, de fato, não demandava uma regulamentação para poder ser implementado no chão. Foi o Marechal Castelo Branco que aprovou o Código de 1965, com base num trabalho técnico de mais de uma década, e depois ele avançou e teve as modificações posteriores.
E para poder conseguir... Um grande desafio, inclusive, desde 1934, desde o primeiro Código Florestal, é: beleza, nós temos lá a ciência, dizendo que é necessário manter a APP, manter a reserva legal, mas como é que você tem a fiscalização disso? Como é que você tem a transparência disso? Como é que você tem o controle disso?
E no Código de 1934, era esperado - pense que temos aqui ex-Ministros da Agricultura, pessoas que sabem como é que funciona na prática - que o Ministério da Agricultura editasse uma norma, uma portaria, definindo onde era a APP de cada imóvel rural do Brasil. Não é à toa que houve uma dificuldade muito grande para poder ser implementado, e é daí que veio o conceito do Código de 1965 de estabelecer que a largura do rio determina qual é a largura da APP e é o tamanho do imóvel, independente do histórico de ter várias matrículas, etc., que determina quais são os percentuais, dependendo do bioma, de reserva legal, inclusive, já em 1965, estabelecendo que na Amazônia é pelo menos 50% de conservação florestal. E toda conversão precisa de um estudo técnico. Ou seja, em 1965, já havia uma noção, inclusive - na exposição de motivos está muito claro isso -, de como ele é um bioma sensível, que necessita de uma atenção especial.
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E o CAR traz exatamente essa transparência, essa capacidade de monitoramento, junto com a capacidade do monitoramento por satélite. Eu posso dizer, com muito orgulho, que o Brasil é liderança global na capacidade de monitoramento de florestas tropicais. O Brasil ensina o mundo como fazer isso. Inclusive hoje nós estamos tendo - e vocês estão seguindo isso - toda uma discussão ligada à legislação da União Europeia. A União Europeia, inclusive, já criou um sistema próprio de monitoramento. E um dos pontos nos debates, quando chega esse tema e temos a oportunidade de falar com os nossos contrapartes, é como o sistema brasileiro é muito superior. Enquanto o sistema deles tem três anos, o nosso tem 30 anos; e 30 anos de uma expertise construída no Brasil, que nós temos, inclusive junto com o CAR, de ter como base da comprovação da sustentabilidade da nossa produção nesses debates.
Agora, o CAR...
O primeiro passo foi uma etapa que, vale dizer, deve continuar. É um desafio a cobertura completa do CAR. Mas hoje é razoável dizer que nós temos já uma malha praticamente completa. Existem algumas áreas, áreas menos habitadas, algumas partes, como, por exemplo, na própria porção norte do bioma Amazônia e algumas partes também do Nordeste, que não têm cadastro, são vazios de cadastro. Mas, efetivamente, as áreas com ocupação humana e com produção agropecuária possuem já cadastro, na sua quase maioria.
De quando o cadastro nasceu, a partir da experiência do Pará e do Mato Grosso, que tinham pouco mais de 100 mil imóveis, em 2012, hoje nós temos mais de 7 milhões de imóveis. Então vale a pena reconhecer que foram 7 milhões de produtores rurais que, voluntariamente, a partir do apoio dado, inclusive, do Fundo Amazônia - o Fundo Amazônia financiou muito dessas atividades - e dos sindicatos... Ou seja, foi um trabalho conjunto muito efetivo e muito virtuoso, e que continua inclusive acontecendo nos últimos anos.
Agora, feito isso, o desafio é: e aí, o que o CAR nos traz? Qual informação nos traz? Assim, a gente pode olhar o copo meio cheio ou meio vazio. Se nós olharmos o copo meio vazio, eu acho que existe ali uma constatação de que somente cerca de 10% dos cadastros do Brasil começaram a ser analisados pelos estados, porque é responsabilidade dos estados realizar essa análise. Pela Lei Complementar 140, aquele que licencia é aquele que fiscaliza e é aquele que analisa o CAR. Então aos estados que dão a licença, por exemplo de supressão de vegetação, cabe analisar o CAR. Nós temos ali um processo ainda lento. E só 1,5%, até fevereiro desse ano, concluíram a análise, ou seja, estão lá analisados sem pendência. Então esse é o copo meio vazio. Agora, a gente pode também olhar numa outra perspectiva, porque efetivamente nós tivemos ali um início muito lento, quando, em fevereiro de 2023, somente 42 mil imóveis tinham terminado a análise, em todo o Brasil, depois de 11 anos de implementação do Código Florestal. Em somente um ano, esses 42 mil passaram para 114 mil, ou seja, em um ano, analisou-se mais CAR do que em todos os 11 anos anteriores de implementação do Código Florestal.
Isso tem algumas explicações. Eu acho que a primeira explicação vai na direção dos incentivos, porque hoje um produtor rural... A nossa família também. Eu sou de Conceição do Mato Dentro, com muito orgulho. Produzimos queijo lá, há mais de cem anos, na mesma fazenda. Eu ajudei a minha avó a fazer o CAR dela.
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E como é que funciona? Você vai lá, tem um CAR analisado, chega uma resposta para os 10% que foram notificados. Muitas vezes, chega a resposta de um técnico, que fez o cadastro há cinco anos, que a pessoa nem segue mais. Às vezes, chega para o produtor, o produtor fica assim: "o que eu vou ganhar ao responder, ao confirmar? Mas eu posso perder. Eu tenho medo. Às vezes, eu sou multado". O que ele faz? Nada. O que acontece? Nada. Não tem estímulo.
Uma medida importante que nós tomamos, em parceria com o Ministério da Agricultura e com o Ministério do Meio Ambiente, foi, no Plano Safra - inclusive, estamos propondo manter para este ano -, um desconto de 0,5% na taxa de juros para aqueles que terminarem a análise.
Houve situação que foi chegada a nós de muitos grandes produtores rurais que ligaram para os seus respectivos Governadores e perguntaram: "Governador, o que é esse tal de CAR? Como é que eu faço para validar o meu CAR? Eu quero esse desconto".
Isso gerou uma mobilização. Hoje, nós estamos vendo os estados, efetivamente, muito mais proativos.
Outro elemento é o elemento tecnológico, que, a meu ver, é a grande saída para a gente avançar na questão do Cadastro Ambiental Rural.
Hoje, a lógica de análise, a histórica, aquela ainda adotada na maior parte dos estados, é uma análise cartorial. É um processo do século XIX, da época do José Bonifácio de Andrada e Silva, em que você tem imóvel por imóvel analisado, com todo um relatório técnico, que é mandado para o produtor, que recebe aquela lista enorme. Aí ele contrata alguém.
E também se convencionou, vale dizer - e a gente tem que buscar formas para evitar isso -, uma situação em que o técnico que analisa o CAR, que tem o emprego dele dentro do órgão ambiental, e o técnico que analisa o CAR para o produtor querem que a coisa continue rodando várias vezes. E ficam lá.
A não ser a vontade do Governo e do produtor, existe um meio de campo ali que está tornando difícil a gente conseguir avançar.
O que alguns estados já estão fazendo é ter um procedimento em que, automaticamente, utilizando inteligência artificial, você olha o cadastro e verifica: "tem um rio?". "Tem". A base da Agência Nacional de Águas indicou que tem um rio. Qual é a APP que se espera para aquele rio? A vegetação nativa está ali? O percentual de reserva legal está ali? Eu estou vendo alguma pendência ambiental na análise? Pronto, analisado, sem pendência: pode levar o seu desconto. Eu não estou vendo problemas ambientais. Ah, mas vai que a terra não é daquela pessoa; vai que a questão da cadeia dominial...
Isto, a meu ver, é um dos grandes desafios: a gente separar a verificação das informações - é necessária, por exemplo, uma autorização de supressão, porque o Estado não vai permitir uma pessoa a fazer uma supressão numa área que é dela, o que, para licenciamento, é essencial - de uma análise puramente ambiental, que pode ser feita de maneira mais automatizada.
Por isso nós vimos, por exemplo, no Estado do Pará, no ano passado, que o Governador Helder Barbalho apertou um botão e, depois de dez anos conseguindo analisar somente 4 mil imóveis, adicionou mais de 30 mil imóveis à base deles.
(Soa a campainha.)
O SR. RAONI GUERRA LUCAS RAJÃO - E olha que é um estado que a gente sabe que tem as suas complexidades.
Então, essa abordagem é uma abordagem que nós estamos discutindo com o MGI. Nós temos muito potencial. É algo que a gente tem discutido também com a sociedade civil. É científica. E nós acreditamos que vai ser, sem dúvida, um caminho mais otimista e mais concreto para o nosso futuro do CAR.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Obrigado, Prof. Rajão.
Depois, sobre esses dados, seria importante passá-los para a gente, aqui na Comissão.
Anuncio e agradeço a presença do Senador Jaime Bagattoli, do Deputado Arnaldo Jardim, da Deputada Marussa Boldrin, do Deputado Pedro Lupion, do Senador Zequinha Marinho.
A Fabíola está por aí? No Zoom?
A SRA. FABÍOLA MARONO ZERBINI (Por videoconferência.) - Por aqui.
Vocês me escutam?
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O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Sim, ouvindo.
Obrigado, Fabíola Marono Zerbini, Diretora do Departamento de Florestas, da Secretaria Nacional de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais, do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.
São dez minutos, Fabíola.
Obrigado.
A SRA. FABÍOLA MARONO ZERBINI (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Deputado Nilto Tatto.
Na sua pessoa, cumprimento de toda a mesa, cumprimento todos os presentes, Senadores, autoridades, colegas do Ministério do Meio Ambiente, colegas da sociedade civil.
Esse tema é mais do que relevante. E eu trago aqui uma perspectiva complementar à do meu colega Rajão, que acaba, enfim, de ser emitida ali, sob a ótica de combate, controle e prevenção dos desmatamentos. Eu trago uma ótica complementar, que é a ótica de a gente poder olhar positivamente a implementação do Código Florestal como efetivamente um motor de desenvolvimento econômico do nosso país, como um motor de internalização das florestas, como, de fato, é: é um avanço na lógica de uso da terra, mas um avanço também para a gente olhar essa perspectiva de uso da terra sob uma ótica econômica, construtiva e de distribuição de renda para todos nós.
Eu vou trazer a minha fala em três pontos.
O primeiro é fazer a conexão entre o Código Florestal, a implementação do Código Florestal, e a lei hoje de recuperação da vegetação nativa, a lei que traz ali aquela meta de recuperar 12 milhões de hectares. Vou trazer que essa lei, os 12 milhões de hectares, mais do que ajudar a implementar o Código Florestal, também se coloca a serviço de muitas outras metas com que o Brasil está comprometido nas conferências, nas convenções, e se coloca também como um vetor de atração de recursos, de otimização de recursos, para a gente implementar um modelo de uso da terra, nos territórios brasileiros, que seja, enfim, coerente com esse princípio ambiental, mas que também, do ponto de vista socioeconômico, seja positivo.
Por fim, eu vou trazer um chamado a uma pactuação política que transborda o Poder Executivo, que se conecta, é claro, com o Congresso, com as duas Casas, com a sociedade civil e com o setor privado. Para efetivamente avançar nessa implementação, a gente precisa do engajamento, do alinhamento e da pactuação política, econômica e técnica entre todos nós.
Então, começando pela Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, ela nasce em 2017, e a meta de 12 milhões de hectares - talvez alguns não lembrem ou não conectem - vem exatamente do passivo que tinha na época, em 2015, definido como de APP e reserva legal, a partir das regras, do regulamento que o próprio Código Florestal trouxe, e ela se coloca ali, a partir desse passivo, tirando uma determinada porção que poderia ser, enfim, resolvida, vamos dizer, ou solucionada, para que o produtor estivesse regulamentado, do ponto de vista ambiental, através de compensação, e dali sobram os 12 milhões de hectares, para que a gente pudesse efetivamente ter o Código Florestal, a regularização ambiental implementada.
Então, todo o arcabouço estratégico e político desse decreto, do seu plano e das comissões a ela atrelados, vem exatamente para ajudar o produtor rural, para ajudar os estados e para ajudar o Governo Federal a fazer essa grande concertação em prol da implementação do Código Florestal.
De lá para cá, e nem só de lá para cá, mesmo antes, os 12 milhões não se encerram em si. Doze milhões de hectares vão trazer balanço, vão trazer um equilíbrio, a partir do que foi acordado politicamente no Código, mas, mais do que isso, eles hoje são um dos eixos centrais da nossa política, do nosso Plano Clima: Mitigação.
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Então, é muito bom, Deputado Nilto, a gente fazer essa discussão dentro da Comissão sobre Mudanças Climáticas, porque efetivamente recuperar 12 milhões de hectares, regularizar o ambiental, implementar o código são parte estruturante da nossa meta NDC, junto, claro, com todas as políticas de conservação e combate ao desmatamento, mas não só isso. É também uma forma economicamente muito viável e muito positiva para o balanço comercial do nosso país. Então, olhar o Código Florestal também como uma ferramenta que garante a atração de recursos para o nosso país e que, mais do que isso, consegue trazer, distribuir riqueza, é um elemento bastante importante.
Não se encerra em clima. A gente tem estudos que provam, ainda mais com o contexto de emergência climática que a gente está vivendo, que o Rio Grande do Sul e outros estados e territórios brasileiros estão sofrendo diversas variações do clima. Temos estudos que mostram que se tivéssemos as nossas APPs recuperadas, a gente evitaria mais ou menos 40% dos custos que a gente tem em solucionar os problemas que estão acontecendo nas cidades devido a essas mudanças climáticas e seus impactos. Então, também a gente precisa contabilizar as externalidades negativas do ponto de vista econômico que a não implementação do código traz para o nosso país.
E, ao olhar a recuperação, o combate, a conservação, ele vai minimizar essa externalidade econômica negativa e, melhor, ele vai trazer as positivas. E aí, efetivamente, você ter, até nas falas da Senadora Tereza Cristina, exatamente esse equilíbrio do ambiental que vai muito além das florestas, mas é na combinação entre elas que a gente tem uma cidade resiliente, que depende de um Código Florestal implementado. Então, acho que esse é um ponto.
O terceiro aspecto que eu quero trazer, que é esse chamado ao alinhamento, o Planaveg, que é o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, ele foi originalmente assinado entre os Ministérios do Meio Ambiente e Ministério da Agricultura, exatamente porque ele passa, ele também é um instrumento, ele é um pacto de concertação entre esses dois setores.
Ele está sendo revisto agora num grande processo coletivo, com participação de sete ministérios, participação dos estados subnacionais, da sociedade civil, do setor privado. Isso tudo deve se encerrar agora, entre setembro e outubro, e vai ser lançado para o Brasil inteiro, de alguma forma também participar, até em consultas públicas. Mas o importante é: ele se constrói a partir do conceito de arranjo de implementação. Um dos arranjos de implementação é exatamente a gente avançar na regularização ambiental. E o conceito de arranjo que vem do Ipea, uma inovação em política pública, é que a gente faça exatamente uma concertação entre instrumentos que são regulatórios, financeiros, de governança, para de fato conseguir avançar numa agenda que é complexa, que depende de Senado, de Congresso, do Executivo, de novo, dos estados, um pacto federativo consolidado. Mas isso tudo está sendo gestado, está sendo pensado dentro dessa política de recuperação da vegetação nativa.
Então, a gente faz um convite também à Casa do Legislativo para que possamos, e nós também, nos aproximar, para que a gente possa ter uma troca. Nós aqui, como Departamento de Florestas, costumamos responder e emitir notas técnicas sobre projetos de lei que tratam do Código Florestal semanalmente. Uma leitura global desses projetos de lei precisa ser feita para que a gente possa, junto com as ferramentas e a potência de atração de recurso privados, se juntar nessa grande empreitada de recuperar 12 milhões de hectares e implementar efetivamente o Código Florestal, a regularização ambiental, que vai depender, de fato, de a gente fazer essa concertação entre todos nós.
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Deixo aqui, então, esse chamado à responsabilidade. Agradeço, mais uma vez, a oportunidade e coloco toda a expertise, enfim, toda a energia dessa frente coletiva público-privada de recuperação da vegetação nativa a favor desse movimento de implementação do Código Florestal.
Obrigada, Deputado.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Muito obrigado, Fabíola.
Já passo rapidamente a palavra para o Sr. Leonardo Papp, que é Consultor da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB).
O SR. LEONARDO PAPP (Para expor.) - Boa tarde a todos, todas.
Antes de mais nada, quero congratular o Congresso Nacional por essa iniciativa de continuar discutindo e tentar avançar numa das legislações mais importantes na área ambiental do país que é o Código Florestal e agradecer o convite que foi feito para a Organização das Cooperativas Brasileiras para, mais uma vez, ter a oportunidade de contribuir com o debate.
Para o cooperativismo brasileiro, esse tema do Código Florestal é um tema muito caro já desde o começo, por duas razões muito básicas. Uma primeira de ordem geral: um dos princípios do cooperativismo, desse modo diferenciado de organizar pessoas e produção, é justamente a atenção pela comunidade; é um princípio cooperativista e, portanto, tudo que vá na direção da sustentabilidade é algo importante para a doutrina, para o modo de pensar e para o modo de agir do cooperativismo, como é o Código Florestal. A segunda é uma razão específica: um dos ramos de atuação do cooperativismo é justamente o ramo agropecuário; nele estão reunidas quase 1,2 mil cooperativas, mais de 1 milhão de cooperados e são basicamente os destinatários das obrigações que foram implantadas pelo Código Florestal. Então, desde o primeiro momento, já lá no debate legislativo em 2012, o cooperativismo se colocou à disposição e continua a fazê-lo até hoje, nas mais diversas frentes, diante desse desafio de implantação do código.
O fato é que para aqueles - e vários daqui estão nessa condição - que acompanharam essa discussão lá desde o começo... Embora, Deputado Nilto, seja verdade que, no final, ficou um sentimento dúbio de que todos perderam e todos ganharam, o fato é que, logo depois da edição do código, houve um movimento de muita empolgação. E eu acho que esse movimento de empolgação permitiu diálogos entre o setor produtivo e o Governo, e as instâncias públicas, como a gente não via antes da edição do Código Florestal. E um dos produtos desse momento que a gente viveu acho que tem a ver com o sucesso do Cadastro Ambiental Rural.
O Governo fez a parte dele, mas eu tenho a convicção de que o envolvimento das entidades do setor produtivo, inclusive o cooperativismo, com sua capilaridade, dizendo: "Isto é bom, isto é importante, não só para o país, como para você produtor", é uma das razões pelas quais nós temos hoje 6 milhões de cadastros, 7 milhões de cadastros e - para reproduzir a frase do Secretário Raoni -, temos uma malha praticamente completa de cara.
A pergunta então é: por que nós não estamos indo para o próximo passo? Por que arrefeceu esse voluntarismo de parte a parte de nós fecharmos o ciclo de implementação do Código Florestal, o que na prática significa concluir as análises do CAR e irmos finalmente para o tão esperado Programa de Regularização Ambiental, que é onde a gente pode buscar a recomposição efetivamente dessa vegetação que foi mencionada na fala que me antecedeu?
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O Secretário Raoni deu algumas razões: nós precisamos de incentivos, e acho isso muito positivo; não implantar o código pela via da repressão, mas pela via do reconhecimento do incentivo, e nós precisamos de tecnologia. É fundamental. Se lá em 1934 era impossível você ter a fixação de uma APP individualizada para cada propriedade, mesmo hoje, em 2023, é ilógico imaginar uma análise cartorial dos 7 milhões de cadastros ambientais rurais.
Mas eu queria trazer aqui para reflexão um outro fator que eu também acho que contribui decisivamente para esse dilema que a gente vive, da velocidade de implantação do Código Florestal, e faço isso a partir daquilo que eu sou, advogado, professor de direito, a partir da minha área, que é o direito propriamente dito. Esse fator é a renitente e interminável judicialização em torno do Código Florestal, e esta é a única constante que a gente tem nos últimos 12 anos. Desde que o código foi editado, ele está judicializado. Num primeiro momento, uma judicialização que buscava discutir a própria constitucionalidade do código como um todo; uma judicialização da própria espinha dorsal do código. Área rural consolidada é inconstitucional. Tratamento diferenciado para pequena propriedade, como está previsto no código, é inconstitucional. Mecanismos de compensação são inconstitucionais. São as famosas ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas poucas semanas depois da edição do código e que se arrastam até hoje.
O Supremo decidiu boa parte do mérito em 2019, mas ainda estão pendentes de resolução os embargos de declaração que definem o critério de aplicação das formas de composição, por exemplo, de reserva legal e cota de reserva ambiental.
Passada essa primeira fase, aqueles que vivemos no direito começamos a perceber uma segunda onda de judicialização. Não mais da sua inconstitucionalidade, porque o Supremo disse que o código é constitucional na sua espinha dorsal, mas uma segunda onda de judicialização que busca restringir o máximo possível o âmbito de aplicação do código, meio numa linha: se ele é constitucional, então ele deve ser aplicado para a menor quantidade possível de situações de fato.
E aqui os exemplos pululam. Nós temos hoje no Judiciário ainda a discussão sobre a aplicação ou não das regras diferenciadas de regularização de áreas rurais consolidadas no Bioma Mata Atlântica. São 17 estados que hoje não sabem se suas áreas rurais consolidadas efetivamente podem ser regularizadas com base nas regras diferenciadas do Capítulo 13 do Código Florestal. O Supremo não adentrou no mérito. Nas outras instâncias superiores, nós temos esse debate iniciando, ainda muito longe de ser concluído.
Para dar um outro exemplo, nós ainda temos no Judiciário a discussão sobre a aplicação do Código Florestal a fatos pretéritos, o que enseja uma contradição em si, porque, se as regras diferenciadas do código, se as regras de transição são para regularizar áreas consolidadas, obviamente que elas vão tratar de situações ocorridas no passado. Não obstante a declaração de constitucionalidade desse regime pelo Supremo, nós ainda temos no Judiciário uma discussão sobre a aplicação dita retroativa destas disposições do Código Florestal.
Penúltimo exemplo que eu trago aqui, só a título ilustrativo, teriam vários outros. A discussão sobre a aplicação ou não das regras do Código Florestal a termos de ajustamento de conduta firmados anteriormente à sua vigência.
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Há um decreto... Um dos dois decretos federais que regulamentam o código diz, com todas as letras, da possibilidade de aplicação das regras do novo código para você resolver termos de ajustamento ou termos de compromisso anteriores. Isso ainda é uma questão que enfrenta discussão, enfrenta debate no Judiciário, e isso sem contar questões mais triviais. Ainda nós encontramos discussões, por exemplo, de se é suficiente a inscrição da Reserva Legal no CAR ou se, além da inscrição da Reserva Legal no CAR, ainda seria necessário o velho regime de averbação da reserva na matrícula imobiliária, confundindo questões ambientais e questões fundiárias, como o Raoni mencionou antes.
Por que estou trazendo esses exemplos? Porque eu acredito que, ao lado da necessidade de incentivos econômicos, ao lado de investimento em tecnologia, esse clima de renitente judicialização faz com que surja um ambiente de insegurança jurídica, que também é um fator relevante para a dificuldade de implementação do Código Florestal, tanto sob a perspectiva do proprietário rural - afinal de contas, ele não sabe em que bases está se regularizando, muitas vezes -, como também, especialmente, sob a perspectiva do servidor público, do secretário de estado, daquele que conduz o CAR numa determinada unidade federativa, por exemplo, em bioma Mata Atlântica. Ele vai fazer a regularização, avançar na agenda de análise do CAR, mas, em Santa Catarina, por exemplo, estado de onde venho, é possível que, dependendo da decisão do Judiciário, nenhum imóvel rural do estado possa ser regularizado via Programa de Regularização Ambiental, pela simples razão de que todo o Estado de Santa Catarina está no bioma Mata Atlântica.
(Soa a campainha.)
O SR. LEONARDO PAPP - Para concluir, Deputado - 30 segundos -, quero dizer que a gente, talvez, precise encontrar maneiras de resgatar aquele momento inicial do código, que motivou todo mundo a fazer o Cadastro Ambiental Rural. Acho que isso passa por o Executivo priorizar o CAR como uma agenda importante da política pública ambiental no país; isso passa por o setor produtivo se envolver efetivamente, de se comprometer a ser parceiro do poder público no movimento de implantação; isso passa por o Judiciário ter a sensibilidade de que nós precisamos pacificar e dar segurança jurídica ao Código Florestal. Finalmente, acho que esta Casa também tem um papel importante de, eventualmente, discutir ajustes pontuais na lei não para alterar o código, mas para reafirmar o que ele sempre foi.
Desculpe se me excedi no tempo. Essas são as minhas contribuições, que espero sejam úteis.
Eu fico à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Muito obrigado, Leonardo.
Então, já convido o Nelson Ananias Filho, que é coordenador de sustentabilidade da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil.
Nelson, dez minutos.
O SR. NELSON ANANIAS FILHO (Para expor.) - Obrigado.
Boa tarde, Deputado Nilto. Cumprimento, em sua pessoa, todos os demais Parlamentares que nos acompanham aqui. Gostaria de agradecer, em nome do nosso Presidente João Martins, da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, esta oportunidade de trazer aqui a visão do produtor rural, o principal paciente da aplicação do Código Florestal, e suas dificuldades, anseios e demandas que nosso setor do agro traz aqui da urgência em se aplicar o Código Florestal com essa visão de que, hoje, a legislação ambiental se tornou, diante de um grande ativo ambiental, de um grande potencial de contribuição, entre outras ações ambientais, mas também na preservação da vegetação nativa, do que o produtor rural vem fazendo não agora, não prometendo, daqui para os próximos anos, recuperar vegetação, mas, sim, aquele potencial e aquele ativo ambiental que ele já tem, dentro da sua propriedade, que precisa ser reconhecido e valorado.
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Então, com essa visão, eu não poderia ser mais claro sobre as questões que nós também corroboramos e que foram colocadas pelo Dr. Leonardo Papp, as questões jurídicas, mas trazendo uma visão daquele que está lá na ponta com anseio de que o Código Florestal seja implementado, para que ele consiga vencer todas as ações, tudo aquilo que lhe é imputado e lhe é obrigado, e ter a transparência necessária de dizer: "Sim, eu faço; esse ativo é meu, sou eu que estou fazendo, eu que estou bancando, eu que estou trabalhando com esse ativo ambiental e eu que estou cumprindo o Código Florestal".
Então, a minha fala aqui vem de dentro da porteira para fora, é um anseio, uma ação...
Acho que não está passando.
Um anseio pelo qual...
Você pode passar para mim, para cá? (Pausa.)
Ah, está.
É o anseio do produtor rural em sentir o reconhecimento e ter a alternativa pela qual... (Pausa.)
Então, só para deixar claro, o produtor rural aderiu ao Código Florestal, ele declarou, foi atrás, acreditou naquilo em que foi obrigado, na sua obrigação.
Aí, bem rapidamente, por estado, por região do país, uma ação pela qual o produtor rural até... Na Amazônia, há 277% da área cadastrada, a mais do que estava quantificado; o produtor rural fez, foi, declarou no seu Cadastro Ambiental... No Nordeste, 163%; 151% na Região Sudeste.
Então, num Brasil como um todo, o produtor rural se engajou. Ele comprou o Código Florestal, ele foi atrás, ele estava disposto... E, desses cadastros ambientais, Deputado, 50% já lá, quando fizeram a sua declaração de estar no Cadastro Ambiental, dispuseram-se a, em havendo passivo ambiental, participar do programa de regularização ambiental, que é um dos instrumentos do Código Florestal; ou seja, não basta participar, é se engajar em estar o.k. com a legislação e trabalhar com essa legislação para que esteja o.k.
Hoje, os instrumentos do Código Florestal transcendem o próprio Código Florestal. Estar o.k. com os instrumentos do Código Florestal não serve só para declarar que eles não têm passivo ou têm um passivo em recuperação ou ele tem um ativo ambiental. Para ele participar de outras legislações, acessar crédito e se desembargar, ele precisa estar o.k. com esses instrumentos, que hoje o Estado, o Governo não fornecem, muitas vezes eles estando o.k. com essa legislação. Então, ele se engajou e estava lá.
O grande problema ali do Cadastro Ambiental Rural, como foi colocado aqui pelo Secretário Rajão, é que o produtor entendeu à época que simplesmente declarar o Cadastro Ambiental Rural era suficiente, o que não é. Nós precisamos trazer, Secretário Rajão, esse produtor de volta, para falar e discutir aquilo que ele declarou, não só o trazendo e informando-o de que é necessário, mas a gente precisa dar uma solução para ele, mostrando que isso é viável, que ele não vai voltar ao órgão estadual do meio ambiente - que é o receio que se tem - com uma multa, muita obrigação e uma restrição qualquer que seja. A gente precisa mostrar para ele que ele voltar e revisitar o CAR dele é uma vantagem para ele e para o Brasil como um todo. Então, o gargalo está ali, revisitar, uma vez que nós temos 27% - já foi colocado esse número - dos CARs com alguma análise e apenas 1,4% definitivamente analisados, ou seja, essa revisita é um dos grandes gargalos que precisam ser vencidos.
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E hoje eu não quero... Vou me deter mais para frente com algumas sugestões para que o Código Florestal, que vai além do Cadastro Ambiental Rural, mas está baseado no Cadastro Ambiental Rural como instrumento principal dessa política... Ele já impacta diretamente na atividade do produtor rural brasileiro. Hoje, com a questão da redução de juros, que foi colocada aqui... Mas quantos? Só 1,4% tem acesso a esse desconto. Nós precisamos ampliar essa base, temos que mostrar para o produtor rural que o CAR estar analisado traz esse desconto ao crédito rural. E não é porque ele tem passivo ambiental, é porque ele não conseguiu ter o CAR analisado, é por isso que ele não tem o desconto; não é porque ele está devendo passivo, é porque ele ainda não tem, entre outras coisas...
Desembargar uma área: mesmo você estando o.k. com todo o desembargo, já tendo assinado um termo de ajustamento de conduta, estando tudo o.k., já tendo recuperado seu passivo ambiental, ele não desembarga se ele não tiver o cara analisado. Isso são muitos produtores rurais. Regularização fundiária: ele não regulariza fundiariamente a área dele se ele não tiver o CAR analisado. Crédito rural: não tem acesso. Hoje o banco está cobrando do produtor rural o cadastro ambiental analisado, mesmo o governo e o estado não dando essa análise. E ele não tem direito a outros instrumentos de incentivo, como pagamento por serviços ambientais, cota de reserva ambiental, entre outros que a gente vai trabalhar um pouquinho mais para frente.
Aqui, olha, só alguns exemplos daquilo em que o CAR não analisado impacta no produtor rural. Na questão da resolução de crédito rural, não vou me deter aqui, mas tem duas resoluções do Conselho Monetário Nacional que não permitem, estão restringindo o acesso ao crédito ao produtor rural porque ele não tem o CAR analisado, e - eu gostaria de chamar atenção - não porque ele tem passivo ambiental ou porque ele não cumpre o Código Florestal, mas porque o CAR dele está na fila de análise e não consegue caminhar ali dentro.
Outra: levantamento de embargos, como eu falei. Hoje, a instrução normativa diz que, mesmo você tendo recuperado a área, o certificado de inscrição no CAR aprovado pelo órgão ambiental competente é um pré-requisito para que seja levantado o embargo. Aqui eu gostaria de chamar atenção, até pela fala da Secretária Andréa, que muito bem diz isto: a legislação ambiental está aqui com função de recuperar o meio ambiente, não para punir. E o que acontece é que, quando a gente não analisa o crédito, nós estamos punindo aquele que não merece e não tem condição de levantar esse embargo.
Para isso, o setor agropecuário vem se mobilizando, Deputado, vem depositando a todos. Primeiro, desde que o Código Florestal foi lançado, lá em 2012, nós já prevíamos tecnologias, ações e metodologias para recuperar esse passivo ambiental. O setor privado investiu bastante dinheiro e tecnologia, juntamente com a Embrapa, no Projeto Biomas. Hoje, o produtor rural recupera uma área de passivo ambiental - entendo passivo ambiental como tecnologias que trazem não só recuperação ambiental, mas a viabilidade econômica e social daquilo. Está lá um depositório - o Dr. Felipe vai falar também depois - que promove e entrega ao produtor rural a melhor tecnologia não só para o produtor rural recuperar sabendo que ele vai ter esse recurso de volta, mas, o órgão ambiental dizendo que aquela tecnologia é carimbada pela Embrapa e que, daqui a 20 anos, vai promover a recuperação. Então, todo mundo está o.k. e assina.
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Segundo projeto: Pravaler. Nós não precisamos... A gente tem que ensinar o produtor rural a fazer o seu PRA. Por quê? Porque o PRA é o que vai entregar ao produtor rural essa recuperação. O Pravaler também entra como instrumento, e a gente deu um passo atrás. Uma vez que aquela defasagem...
(Soa a campainha.)
O SR. NELSON ANANIAS FILHO - ... entre 28% e 1,4% não traz o produtor rural, o setor está se mobilizando para trazer o produtor rural de volta e fazer essa retificação. (Pausa.)
E aí, bem rapidamente - meu tempo já está acabando -, esse aqui é o passo a passo da regularização ambiental. O setor se mobilizou para entregar ao produtor rural essa regularização. Então, a gente tem todo um trabalho que pega o produtor rural desde aquele que não fez o Cadastro Ambiental Rural até aquele que está pronto para acessar os instrumentos como um PSA, como a Cota de Reserva Ambiental, um futuro crédito de carbono, passando por todos esses passos, desde a inscrição do CAR, passando por retificar, ajustar o Cadastro Ambiental Rural e o Programa de Regularização Ambiental, entregando um produtor rural o.k. ambientalmente e apto para receber qualquer instrumento de incentivo do agro.
O RetifiCAR já analisou sozinho, em projetos-pilotos, mais de 2 mil análises de CAR, mais de 1.143 atendimentos com 481 retificações e ajustes, lembrando que tinha estados que tinham menos de cem cadastros analisados. Só esses projetos pilotos já fizeram essa ação.
E, caminhando para o final, essa aqui é uma ação.
Rapidamente, o que a gente precisa para que o Código Florestal seja efetivamente implantado?
A gente precisa - nas questões de judicialização não vou me deter, porque o Dr. Leonardo Papp já tocou no assunto - de, por exemplo: definição do que é identidade ecológica, isso está prejudicando a questão das compensações; a questão da aplicação do Código Florestal em área de Mata Atlântica; resoluções do Conama conflitantes. A gente tem resoluções do Conama que tratam de Código Florestal antes de 2012 ainda e precisam ser discutidas e muitas, revogadas. A gente precisa melhorar a legislação e os procedimentos. Não adianta automatizar se a gente não tem que a ferramenta de automatização tome as melhores decisões, por exemplo: mapas com escala de 1 para 5 milhões definindo APPs de 50m. É impossível uma automatização dessa forma. Precisamos investir em inteligência territorial. Precisamos aprimorar o financiamento e o tecnológico para análise do CAR, precisamos dar condição para os estados fazerem isso. Nós precisamos de campanha de conscientização, trazer o produtor rural para dentro. Medidas judiciais já foram aplicadas. Nós precisamos aplicar e fazer uma força-tarefa na aplicação do art. 68, ou seja, respeitar a lei vigente à época do uso alternativo daquele solo - consolidar aquilo que estava antes de 2012 e antes de 1965 e todas as mudanças do Código Florestal. Precisamos fazer o RetifiCAR, implementar o RetifiCAR e precisamos ampliar o Pravaler.
Com essas ações, nós conseguiremos caminhar para que o Código Florestal seja consolidado e seja bom para todos, inclusive para aqueles que estão dentro da porteira.
Desculpe-me passar do tempo e obrigado pela oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Obrigado, Nelson.
Antes de convidar o próximo expositor, quero já passar a palavra para o Senador Ireneu Orth.
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O SR. IRENEU ORTH (Bloco/PP - RS. Para interpelar.) - Boa tarde a todos.
Na verdade, eu escutei as explanações todas e o que eu posso afirmar é que o Código Florestal veio para ficar, é muito importante, mas eu vejo, às vezes, muitas distorções em alguns setores. O Código Florestal, para mim, é parte da questão ambiental como um todo. Então, por várias ações, várias intempéries climáticas que aconteceram no planeta, se culpa o setor agro, quando, na verdade, as questões são muito mais abrangentes. Só para ter uma ideia, 15 dias atrás, nós tivemos um problema climático parecido com o do Rio Grande do Sul, só em escala menor, na Alemanha; nesta semana, nós tivemos um problema parecido na Rússia. Então, em todas as regiões do planeta, têm acontecido, sistematicamente, problemas de enchentes, catástrofes e assim por diante, às vezes com maiores, às vezes com menores intensidades.
O problema no Rio Grande do Sul, na minha concepção, na minha ideia, foi talvez um dos maiores que já aconteceu no planeta, pela amplitude e pela abrangência da área que atingiu. Então, muitas vezes, as pessoas dizem: "Olha, foi desmatado na beira do rio, não se cumpriram as regras do Código Florestal, que prevê uma largura x de mata ciliar, na beira das matas, dos riachos menores e maiores", e assim por diante. Então, isso pode acarretar algum percentual? Pode, sim, mas não é o único problema.
E aí eu me reporto ao ano de 1941 - eu não era nascido e talvez poucos daqui -, em que o Rio Grande do Sul teve uma chuva muito mais intensa do que neste momento, e os problemas foram iguais ou até maiores. Naquela época, nós vivíamos praticamente numa mata. A cidade de Porto Alegre, na época, tinha 170 mil habitantes, 200 mil habitantes; hoje tem dez vezes mais. As matas que apareciam no estado, se você olhar foto do satélite da época, praticamente a região agrícola não existia. Então, também aconteceu um problema excessivo.
Hoje, eu inclusive culpo por parte dessa situação - não toda, mas parte - o Poder Judiciário, a questão ambiental, os ambientalistas, que, lá atrás, 15, 20 anos atrás, entraram no Ministério Público, no Estado do Rio Grande do Sul, por exemplo, pedindo que não se retirasse areia do fundo dos riachos e dos rios. Naquela época, carregava-se, por exemplo, areia na região do Rio Taquari, próximo à Estrela, e se abasteciam de areia as construções do norte do estado. Na Grande Porto Alegre, tirava-se a areia do Rio Guaíba para atender às construções naquela região. Foi proibida a retirada. Várias empresas quebraram em razão disso. E o que aconteceu? O assoreamento dos riachos, dos rios e das sangas foi algo fenomenal. Para se ter uma ideia, o Rio Guaíba, que tinha um calado de 6m, tem só 4m. E o que acontece? A água sobe, ela não tem mais local para correr.
O Rio Taquari. Eu tive uma visita do pessoal de Muçum, em outro dia, no gabinete, com pessoas já de mais idade dizendo: "Olha, o Taquari está todo assoreado". Ele subiu, porque tem muitas trancas, tranqueiras, onde pararam galhos e árvores, foi acumulando areia e pedra, e a água teve que subir. É 100% do problema? Não, certamente não, mas teríamos um problema infinitamente menor. Então, nós temos que pensar nesses problemas paralelos e não culpar extremamente o setor agro.
E o que eu quero dizer? Eu sou produtor rural. Eu cumpro a legislação do nosso Código Florestal. Nós ocupamos em torno de 8% da área com a agricultura no Brasil, em nível de país como um todo, sendo que 67%, 68% ainda são mata nativa. Querer culpar esse setor, que tem dado sustentação econômica ao país nos últimos anos, é um desastre total.
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O que vai acontecer se nós tivermos que reflorestar, como muitos querem, essas regiões altamente produtoras? Nós vamos produzir alimentos onde? A natureza deu para o Brasil a oportunidade de ser um produtor de alimentos para o Brasil e para o mundo. Nós ainda temos muita mata que poderá ser aberta dentro do percentual do Código Florestal.
Então, chamo a atenção para isso. Acho que é uma questão fora dessas áreas técnicas que foi muito bem explanada pelo Nelson e também pelo Leonardo, que têm conhecimento da área técnica. Eu não tenho essa formação técnica, eu tenho a formação na prática e sei o que acontece, o que aconteceu e certamente vai continuar acontecendo, talvez com escala menor, se nós fizermos essa aplicação efetiva daquilo que o Código Florestal diz, que é a preservação na beira de rio e tal, que a maioria dos produtores faz, com exceção daqueles que já tinham as áreas desmatadas antes do código. Aí a lei permite, porque são áreas... Como é o termo?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. IRENEU ORTH (Bloco/PP - RS) - Consolidadas, exatamente.
Eu só vou dar um exemplo. Eu fui prefeito da minha cidade, lá atrás, na época da implantação, e nós tínhamos um promotor de Justiça lá que queria canetear todo mundo. Se tivesse derrubado uma árvore e tal, era uma desgraça total. Aí convocou uma reunião dos agricultores na Câmara de Vereadores, e ele foi lá e ameaçou todo mundo. Eu falei depois dele e o contrapus dizendo: "Olha, não é assim, não pode ser desta forma. Você tem que ver o que já está consolidado". As pessoas foram a ele, e ele queria que se plantassem árvores naquela época. Virou e mexeu, o promotor não durou um mês, um mês e pouco, e foi embora da cidade.
Outro exemplo: veio um senhor de bastante idade falar comigo, tinha uns 80 anos na época, que disse: "Olha, eu vim aqui, porque o meu irmão tem 12 hectares de terra e ele foi chamado no fórum porque ele tinha que plantar árvore na beira da sanga". A terra dele era uma tripa, lá era área de minifúndio, uma tripinha, e, se ele fosse plantar de acordo com a legislação, iam sobrar, dos 12 hectares, talvez meio hectare, um pouco mais ou um pouco menos. Aí o promotor o chamou e disse: "Olha, você tem que fazer isso e tal". E ele disse: "Mas, doutor, como é que eu vou sustentar minha família? Eu agora comprei um carro novo e não consigo pagar a prestação". E o promotor disse: "Mas o senhor comprou um carro? Que carro o senhor comprou?". E ele: "Não, eu comprei um carrinho de mão para levar a mercadoria que eu produzo para a cidade para vender. Vou ter que vender este carro e não tenho como viver".
Então, essas adaptações, Nelson, foram mudando, foram melhorando. Hoje não se tem mais isso, mas, no início, o Código Florestal foi extremamente punitivo para as pessoas que infringissem a legislação.
Eu estou fazendo esse depoimento... Não sou da Comissão, mas me vi na condição de produtor, de Senador, de vir aqui fazer essas colocações, defender a posição de que nós temos que produzir, a missão do Brasil é produzir. Temos que nos adaptar às regras? Temos, sim, mas não ficar nessa de termos que reflorestar tudo de novo. Então, é uma situação um pouco diferenciada, de repente, de alguns, não de muitos, mas eu vejo o Brasil como grande produtor de alimentos daqui para frente ainda.
Agradeço a oportunidade, agradeço a presença e aos palestrantes, que eu ouvi com muita atenção - tem mais alguns que certamente vão falar. Eu talvez não possa ficar até o final, porque, como o nosso Deputado Nilto já falou antes, os compromissos vão chamando, mais compromissos aqui e acolá.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Muito obrigado, Senador Ireneu.
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Eu até o convido para ficar, porque é justamente esta a ideia aqui do debate: ninguém aqui está culpando nenhum setor. Quando você tem alguém que infringe a lei, você não está cumprindo, aqui e lá tem número de CPF e tem número de CNPJ.
Então, muitos que estão colocando aqui que estão falando desse setor, daquele setor, não é isso. Esse debate é justamente para a gente ter evidências, ter ciência, para entender que, quando um produtor tem meio hectare, mas tudo é APP, esse produtor precisa sair dali, porque, se ele não recuperar a APP, por causa dele, vários outros produtores, rio abaixo, sanga abaixo, vão sofrer as consequências. É para isso que a gente faz o debate.
A gente não pode ficar sensibilizado quando alguém está ali com um carrinho de mão, porque aí pode o Estado entrar, de alguma forma, e buscar outro caminho para ele, mas jamais ele fazer algo que possa prejudicar aquele que está abaixo. É esse o entendimento - é esse o entendimento.
Nós temos uma figura na Constituição de que a minha propriedade aqui precisa cumprir função de interesse para a sociedade. Além da minha família, dos meus descendentes, ela também precisa cumprir... O alimento que eu vou produzir ali é para a sociedade, não é só para mim. O ar que eu vou produzir ali é para a sociedade, não é só para mim. A água que eu vou produzir ali é para a sociedade, não é só para mim. A gente está debatendo isso. Esse é o conceito. Se a gente não partir do princípio deste conceito de que, com aquilo que eu tenho, eu faço o que eu quiser, se a gente não partir disso, de superar isso, a gente não avança. E nós estamos aqui para debater, justamente para avançar naquilo que a lei já garante e que precisa ser feito. Nós temos um problema para acontecer. Problema para acontecer tem de várias ordens, que foram colocadas aqui - várias ordens: burocrática; às vezes, de falta de política; às vezes de falta de capacidade técnica, de não ter recursos. E é por isso que nós estamos debatendo. Aqui o debate é baseado na ciência, naquilo que nós precisamos produzir.
Por isso, eu falo assim: vamos seguir adiante, porque é para isso que nós organizamos, nesta Comissão, este debate aqui.
Convido agora o Sr. Mário Augusto de Campos Cardoso, Gerente de Recursos Naturais da Confederação Nacional da Indústria.
O SR. MÁRIO AUGUSTO DE CAMPOS CARDOSO (Para expor.) - Obrigado, Deputado Nilto Tatto. Em sua pessoa, eu agradeço, parabenizo e cumprimento todos os Parlamentares e demais presentes hoje, aqui, nesta audiência pública. Agradeço o convite para a gente falar um pouquinho sobre a implementação do Código Florestal e por que isso é importante para a indústria.
Só queria retomar uma fala sua logo do início da reunião, logo do início desta audiência pública, falando dos problemas de implementação do Código Florestal, mas, infelizmente, não é só do Código Florestal. Toda a legislação ambiental brasileira, pelo tamanho do Brasil, pelo desequilíbrio de entendimento entre as várias regiões do Brasil, é tudo muito complicado.
A gente pode puxar o Código Florestal, de 2012; a gente pode puxar a Política Nacional de Resíduos Sólidos, que também ainda não foi totalmente implementada, que é de 2010; pode puxar a Lei da Biodiversidade, que é de 2015, e que também não foi ainda totalmente implementada. Quer dizer, não faltam exemplos. O que a gente não pode perder é a constância, é a continuidade, é o norte aonde a gente quer chegar, porque, com qualquer desvio que a gente faça nesse meio do caminho, a gente pode atrasar ainda mais. A gente pode criar expectativas tanto em A quanto em B, ou de mais permissividade, ou de mais restrição, que pode causar mais tumulto e mais desconhecimento do que melhoria nesse processo todo.
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Então, acho que essa é a primeira mensagem que eu queria passar aqui agora.
Deixa eu ver por onde eu vou aqui. O Nelson passou por isso, pelo jeito...
O SR. NELSON ANANIAS FILHO (Fora do microfone.) - Eu não sei, vamos descobrir. (Risos.)
O SR. MÁRIO AUGUSTO DE CAMPOS CARDOSO - Aí, foi.
Mas, como foi dito já no começo, no mês passado, agora, no final do mês passado, fez 12 anos de Código Florestal. É a principal política pública quando a gente pensa em florestas privadas. A gente tem a Lei do Snuc, que trata de unidades de conservação, mas, em relação a florestas privadas, florestas que estão dentro, ativos florestais que estão dentro da propriedade privada, é a principal lei que a gente tem no Brasil hoje. A implementação do Código Florestal é essencial para a agenda climática, não somente para mitigação, mas também para adaptação. É bom colocar essas duas vertentes da questão climática. Ela é importante tanto na questão dos ativos florestais, para a gente sequestrar carbono, como também para manter a beira de rio, para manter as encostas do país e poder minimizar, reduzir um pouquinho o risco à nossa população.
E é essencial - aí eu vou trazer uma questão que diz respeito muito à atividade industrial, à atividade privada de modo geral, à atividade produtiva - a questão da rastreabilidade. Quando a gente vai pensar em rastreabilidade da nossa produção, a gente tem que saber de onde ela vem e saber a regularidade ambiental dessa propriedade. Para isso, é fundamental que a gente tenha um Código Florestal implementado, que a gente tenha um CAR analisado na ponta. Enquanto a gente não tiver isso, a gente vai ser sempre uma perna meio bamba desse banco nosso de comprovação de rastreabilidade. Então, é importante que todos os entes, tanto governamentais como da sociedade de modo geral, estejam olhando para o mesmo lado. Quais são os desafios que a gente tem para tornar aquela análise de Cadastro Ambiental Rural mais efetiva, mais rápida, atendendo à necessidade do país e à urgência que o país tem em função disso, em relação a isso? Sem isso, a gente não consegue, por exemplo, atender ao que está previsto na lei antidesmatamento da União Europeia, e pode ter uma dificuldade de entrada dos nossos produtos em outros países.
Bem, já comentei agora há pouco, a análise das informações declaradas no Cadastro Ambiental Rural é a etapa mais desafiadora. Mais desafiadora porque você joga essa responsabilidade, hoje, para todos os estados, os órgãos estaduais têm essa responsabilidade de fazer a análise. A gente teve também no cadastro essa responsabilidade dos estados, mas a gente tinha, de alguma forma, a "cenoura" do Fundo Amazônia. Talvez a gente tenha que repensar como a gente utiliza essas "cenouras" melhor, esses instrumentos, para trazer...
(Soa a campainha.)
O SR. MÁRIO AUGUSTO DE CAMPOS CARDOSO - ... e para facilitar esse processo por parte dos órgãos ambientais. É importante que a gente tenha qualidade de dados, é importante que a gente tenha bases cartográficas de referência, tenha equipe técnica qualificada e sistemas robustos de informação. Tudo isso custa dinheiro, tudo isso precisa, sim, de incentivo, e a gente tem que pensar junto. O Governo Federal é o principal orquestrador desse processo. Ele não é o implementador, mas é o orquestrador, sim; cabe a ele toda a articulação, junto com os órgãos ambientais estaduais, para que isso aconteça na velocidade necessária e da melhor maneira necessária. Como falei, a comunicação eficiente dos órgãos, como já foi dito anteriormente aqui, ao produtor também é muito importante, para que ele saiba o que é necessário fazer, para que ele mantenha o seu cadastro atualizado, quer dizer, é necessário que o órgão responsável por essa análise de dados, pela análise desses cadastros, tenha um canal de comunicação ajeitado ali com o produtor rural, para que a gente possa andar com isso com mais rapidez. E não vou tomar muito tempo aqui, mas só falando um pouquinho sobre isso - já foi falado anteriormente -, existem mais de 7 milhões de cadastros no país, quer dizer, isso é maior do que o número de propriedades que existem no país. Como o Nelson apontou aí, em alguns lugares, há sombreamento: 14,1% passaram por algum tipo de análise, mas, puxando esses dados no CPI, somente 2,7% tiveram a análise concluída, ou a análise feita manualmente ou a análise automatizada. Então, na distribuição dos estados, a gente percebe que a coisa ainda tem muito que avançar, ainda está muito atrasada. E é necessário para o país que essa agenda ande, quer dizer, mais do que mudança legislativa, precisamos de constância, precisamos de instrumentos adequados e precisamos de melhoria na gestão.
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Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Muito obrigado, Mário.
Agora eu quero convidar, então, o Gustavo Spadotti Amaral Castro, que é Chefe-Geral da Embrapa Territorial, e vai dividir o tempo, porque depois, na sequência, é o Felipe Ribeiro, que é pesquisador também da Embrapa.
Então, Gustavo, cinco minutos.
O SR. GUSTAVO SPADOTTI AMARAL CASTRO (Para expor.) - Obrigado, Deputado, sempre um apoiador da Embrapa. É um prazer para a gente estar aqui, eu representando a Embrapa e a Embrapa Territorial.
Vou trazer um pouco de números e mapas para adoçar este nosso debate. Números e mapas porque é o core business da nossa unidade da Embrapa. Nós não trabalhamos com biotecnologia, com nano, nós trabalhamos com ciência de dados e geotecnologias, sempre para apoiar problemas concretos, desafios que o agro possui e ainda tem como superar por meio da gestão territorial estratégica.
Já enroscou. Tem que ter fé, não é, Deputado? Para cá? (Pausa.)
Pode ir passando, então, por favor.
Este aqui é o primeiro eslaide, que versa sobre muito do que já foi dito aqui. Eu não vou mais bater em tantas teclas já debatidas, mas o principal ponto que eu quero levantar é que esse Cadastro Ambiental Rural, determinado pelo Código Florestal, foi o maior esforço colaborativo da história deste país. Sete milhões de cadastros feitos, 6,8% deles ativos, graças a secretarias estaduais, sindicatos, cooperativas, associações, entidades de classe. Cada produtor rural delimitou o seu imóvel em cima de uma imagem de satélite, sem ter um instrumento para isso, sem ter uma capacitação específica para isso. Muitos pequeníssimos produtores rurais lançaram mão dessa técnica de geoprocessamento tão avançada. O que a gente tem hoje como grande desafio é avançar no apoio aos estados principalmente, para que eles verifiquem e analisem esse CAR, para saber se o art. 67 e o 68 do Código Florestal estão sendo aplicados dentro dessa análise para verificar se existe passivo ou ativo nessa compensação. E a Embrapa Territorial tem apoiado o MGI nessa iniciativa de trabalhar com esses dados agora nesse ministério.
Próximo, por favor.
Então, essa é apenas uma análise, uma amostra de um imóvel rural.
Pode ir passando bem rápido, tá?
Aqui, para dar um contexto de uma região, e mais um para a gente dar um contexto de um estado. Essa é a encrenca do volume de dados que a gente tem que processar para um estado.
O próximo.
E, para o Brasil, esses 6,8 milhões de polígonos, que podem ter até dez outros polígonos de identidade de preservação ambiental dentro da sua propriedade.
Pode passar.
E esse é um dos resultados que saem. Então, toda vez que a gente pensar em ativos ou passivos ambientais dentro de um cadastro como esse, lembrem-se de que 93% dos cadastros são de pequenos imóveis rurais, menos de quatro módulos fiscais.
Próximo, por favor.
E o objetivo principal do Cadastro Ambiental Rural é verificar a conformidade pelo Código Florestal.
Pode passar.
E esta aqui é uma análise de uma pequena região, mostrando a conectividade que existe entre essas reservas legais e essas APPs, formando os verdadeiros corredores da biodiversidade.
Próximo, por favor.
R
Um contexto mais amplo, chegando até o país - pode passar mais um - como um todo, com seus 6 milhões de imóveis, totalizando, propriedade por propriedade, município por município, 282 milhões de hectares destinados à vegetação nativa pelos produtores rurais, pelos extrativistas, pelas RESEXs e RDS. Este é o compromisso ambiental que pode ser mensurado por meio do Cadastro Ambiental Rural: 33% do Brasil, um terço do nosso território.
Próximo, por favor.
Mais um.
E aqui é uma análise que nós fizemos sobre o valor patrimonial dessas terras que estão imobilizadas em prol do meio ambiente, que pode totalizar até R$3 trilhões em valor fundiário.
Próximo, por favor.
Aqui, quando juntamos, à direita é o compromisso dos produtores rurais, e à esquerda é o compromisso do Estado brasileiro nas áreas protegidas em unidades de conservação e terras indígenas. Quando a gente soma...
(Soa a campainha.)
O SR. GUSTAVO SPADOTTI AMARAL CASTRO - ... esses dois dados...
Pode passar.
Totalizamos 56% do Brasil, mas ainda existem aquelas áreas não cadastradas, as áreas devolutas, nesses espaços em branco.
Pode passar.
Quando a gente faz essa análise por imagem de satélite e verifica o que existe de vegetação nativa nessas áreas, totalizamos 66% do Brasil. Então, dois terços do Brasil dedicados à proteção, preservação ou conservação da vegetação nativa, e a nossa produção agropecuária centrada em pouco mais de 30% do território.
Esse é um gráfico que percorre o mundo, mostrando que é possível, como o Código Florestal preconizou, o equilíbrio entre a produção e a preservação ambiental. Esse foi o ponto-chave do Cadastro Ambiental Rural, foi no que o Código Florestal mirou e acertou.
Mas ele mirou, não mirou, mas também acertou em muitas outras funcionalidades que esse cadastro tem à disposição. Infelizmente eu tinha três ou quatro exemplos para mostrar, mas o tempo...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. GUSTAVO SPADOTTI AMARAL CASTRO - Pode passar? Bem rapidinho, tá?
Então, nós miramos... Nós não miramos, mas acertamos em outros dados.
Pode passar.
Como é o cruzamento dos dados do CAR com censo agropecuário - próximo -, que descortinou um novo mundo rural em que existem populações com CAR e sem censo, com censo e sem CAR, e um para um, um CAR e um censo. Para cada tipologia disso, existe uma explicação. São cadastros convergentes, que dão novo descortinar do mundo rural brasileiro.
Próximo, por favor.
Aqui é só um exemplo que eu dei aí, no município de Machadinho D'Oeste, em Rondônia.
Pode passar.
A gente pode utilizar o CAR para contextos de novas obras, verificando as zonas de influência de rodovias, ferrovias ou hidrovias, para apoiar licenciamento ambiental e análise de impacto de cada uma dessas obras.
Próximo, por favor.
Outro exemplo é como isso pode apoiar a conectividade, a difusão da conectividade no mundo rural. Mostrando, em São Paulo, temos 35% da área dos imóveis apenas com internet. Então isso dá problemas para você colocar tecnologias como internet das coisas, sensores etc., para você otimizar a produção agrícola.
Próximo, por favor.
Aqui um exemplo, em Campinas. Então, existem situações distintas. Como no lado leste do município, onde se concentram várias propriedades sem acesso à internet, mas na porção sudoeste ali do estado, poucas propriedades, somente duas. Então, soluções distintas para problemas distintos de conectividade.
Próximo, por favor,
Estudos que podem verificar não só a biodiversidade de flora e de fauna, a medição dos estoques de carbono nas áreas dedicadas à preservação, mas também a biodiversidade da fauna, mostrando a importância desses corredores de biodiversidade para a preservação da vegetação e também da fauna silvestre dentro das propriedades rurais. Uma parceria entre em a Embrapa, Fundecitrus e a Coca-Cola Company.
Próximo, por favor.
R
E o último exemplo, o único que eu não gostaria de dar, é como a Embrapa hoje tem apoiado, com inteligência territorial estratégica a busca por pessoas e propriedades isoladas pelas tragédias do Rio Grande Sul.
Pode passar.
Com inteligência territorial estratégica - mais um -, nós conseguimos - próximo - mapear onde estão essas áreas de inundação e qual foi a população rural atingida: mais de 21 mil imóveis atingidos e cerca de 1,9 mil domicílios na área de inundação, são as sedes, provavelmente, das propriedades rurais, sendo que 1,6 mil, quase 90%, mais de 90% delas, são pequenas propriedades rurais atingidas por essa tragédia. Então, é como o CAR também serve para outros instrumentos de inteligência e, principalmente, de gestão territorial.
Obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. Bloco/PT - SP) - Obrigado.
O SR. GUSTAVO SPADOTTI AMARAL CASTRO - Eu passo agora para o Felipe.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. Bloco/PT - SP) - Obrigado, Gustavo.
Então, Felipe Ribeiro, que é pesquisador da Embrapa.
Cinco minutos.
O SR. FELIPE RIBEIRO (Para expor.) - Muito obrigado pelo tempo que foi dado aqui para a nossa empresa, não é Cíntia? Nós estamos aqui à disposição.
Eu quero contar para vocês agora: dessa imagem aérea que a gente teve, como nós estamos trabalhando com a CNA, por exemplo, com algumas ONGs, no sentido de trazer soluções territoriais para a implementação desse Código Florestal. São ferramentas que a Embrapa tem, tecnológicas, para que a gente, junto com os parceiros, possa ter essa implementação.
Próximo, por favor.
Então, nós identificamos, juntos, aqui, que tem uma série de nós. O primeiro é a validação do CAR. Olhando como estava essa situação 12 anos atrás, como é que nós vamos elaborar esse projeto? Como é que nós vamos aderir a esse PRA e implementar esse projeto no campo? É com isto que nós estamos, com o WebAmbiente, uma série de publicações, uma como essa aqui, esse Guia de Plantas do Cerrado. Vocês imaginem, 12 anos atrás, como era você identificar, dizer para o produtor: "Você tem uma doença". "Como é que eu curo?" "Não sei, se vira!" Então, quais são as estratégias de plantio e quais são as espécies que você vai usar? Hoje, trabalhamos junto com esses parceiros - o Ministério do Meio Ambiente é um grande parceiro nosso nessa implementação - para que a gente possa fazer a adesão ao PRA. Amanhã nós estaremos lá no Espírito Santo, para, exatamente, fazer essa adesão ao PAR e mostrar essas técnicas junto com eles.
Pronto.
O que nós queremos falar - e o Senador falou aqui - é sobre a preocupação com a agricultura. Nós estamos trabalhando com esses serviços ecossistêmicos mais do que com serviços ambientais. O que a agricultura está prestando, junto com o ambiente, junto com a APP e com a reserva legal? Esses serviços para a nossa sociedade. Nós temos uma série de boas práticas agropecuárias que estão prestando esses serviços. Então, a gente quer trazer a nossa empresa aqui, a Embrapa, com esses resultados de boas práticas agropecuárias que estão também prestando serviços ecossistêmicos para a nossa sociedade.
Esta é a grande preocupação. Este é o grande ativo - viu Nelson? - que a gente tem nessa parceria: mostrar o que a gente tem de resultados de pesquisa na agricultura, na conservação dos recursos naturais, para que o produtor rural possa ser remunerado por essa quantidade de terra que o Gustavo trouxe para nós, mostrar como nós vamos valorizar esse produto que a gente tem.
Então, esses serviços ecossistêmicos: de regulação de água; preservação de diversidade; fornecimento de recursos para a recuperação, que é a recuperação de APP e reserva legal... Todos esses sete itens podem trazer para a gente. O Cerrado, por exemplo, é responsável por 94% da água que circula no Rio São Francisco. Qualquer coisa errada que nós fizermos aqui - como é a preocupação do Rio Grande do Sul -, se fizermos coisas erradas aqui, nós vamos refletir na bacia do São Francisco.
Temos essa ferramenta WebAmbiente para simular, trazer as estratégias e as espécies nativas para o produtor rural. Ele simula, ele tem essas estratégias. Aqui está cada uma das espécies. Eu vou deixar esse documento com o senhor aqui, para que a gente possa documentar o que a Embrapa tem produzido aqui para essa recomposição de APP e reserva legal.
R
Está aqui a biblioteca digital com essas experiências de recomposição. A gente tem uma rede de restauração na Embrapa. Essa rede tem 120 funcionários da Embrapa, 120 colaboradores, dentro da Embrapa, para implementar essa rede e para que a gente possa disseminar muito mais rapidamente essas informações, com modelos de cooperação de ecossistema, com ações de transferência de tecnologia, cursos de EAD e a atuação junto a políticas públicas, junto com o Serviço Florestal Brasileiro, o Ministério do Meio Ambiente, o MDA e o BNDES.
Outra coisa. A gente tem uma página do Código Florestal, eu gostaria de lembrar, que se chama Lei de Proteção da Vegetação Nativa. E aí nós não estamos só falando de floresta, nós estamos falando de savanas e estamos falando de áreas campestres.
(Soa a campainha.)
O SR. FELIPE RIBEIRO - Não é, Andréa?
Agradeço. Só mais um minutinho aqui. Não é, Andréa? Nós estamos trabalhando exatamente com esses serviços ecossistêmicos que os campos estão prestando nessa captação de água.
Aqui, eu desliguei, então. Aqui, já...
Eu quero destacar esse projeto Paisagens Rurais para fazer a gestão integrada da paisagem: 4 mil propriedades onde nós estamos fazendo a recomposição da vegetação nativa e trazendo, no mesmo cardápio...
Desculpa. A gente fica querendo contar tanta história boa. E aí nós colocamos à disposição a nossa empresa. Não é, Cíntia? Aqui tem cinco minutos, que vocês utilizem essa informação.
Então, nem a recomposição da vegetação nativa, o pasto e ...
Vamos lá. Aqui está o livro, está com essas informações.
Nesse processo de recomposição, diagnóstico, planejamento, implementação e monitoramento.
Aqui tem um exemplo de uma propriedade rural. Em 2011, o pessoal da Guzerá da Capital, Neto e Adriano, que alguns de vocês conhecem, sabem muito bem... (Risos.)
São parceiros nessa história. Olha como é que estava essa área em 2011 e como é que ficou, em 2018; na implementação, que aconteceu lá em 2012; e como é que ela está hoje. Então, nós temos - essa notícia é de hoje - 2 toneladas de castanhas de baru, que é uma planta nativa. É pouco, se a gente for considerar em termos de negócio, mas é um começo. Está ali o baru produzido nessas áreas aí.
Então, nós temos essa preocupação de ter espécies nativas de uso econômico, não é simplesmente a preservação, é a conservação dessas espécies, de modo que a gente possa expandir essas áreas de produção, junto com esses produtores rurais. Está aqui o exemplo lá de como estava em 2018, seis anos. E uma outra área, como está aqui hoje, em 2022.
E nós temos também... Convido a vocês, quem quiser ir - isso fica aqui no PAD-DF -, para visitar essas áreas. Teremos o maior prazer de acompanhá-los nesse sentido. Então, hoje, a gente sabe como recompor APP e a reserva legal e como recompor ou mesmo renovar pastagens, chegando junto com o produto. O produtor rural é parceiro, precisa saber e entender como é que as duas coisas podem acontecer e ter um serviço ecossistêmico dessas duas atividades dentro da propriedade dele e não simplesmente criminalizar as ações. Então, nós estamos trabalhando com isso.
Esse é um curso de EAD. Já foi lançado com o Serviço Florestal para a recuperação do Cerrado. E nós estamos fazendo isso para cada um dos biomas nacionais.
Está acabando. Faltam três eslaides aqui.
R
Então, como empresa, nós queremos trabalhar - agradeço aqui a oportunidade com vocês - e ter ferramentas de diagnóstico, planejamento e implantação, não apenas WebAmbiente aqui para plantas nativas, mas como é que a gente traz Qualidade do Solo, WebAgritec, Plantio Certo, Pasto Certo? São uma série de tecnologias que a Embrapa tem e que a gente quer colocar dentro do PRA, para que a coisa chegue ao produtor rural como um todo, para que ele olhe a propriedade, não apenas ali no problema que ele acha que tem com a reserva legal; não, mas como um todo, com uma solução que a Embrapa tem para tudo que a gente conhece, para, encontrando uma propriedade nessas condições, saber onde está a reserva legal, a APP, a área de uso alternativo do solo, trazer essa série de soluções que nós temos e queremos compartilhar com a sociedade para transformar nessa situação. Não é, Nelson? Nós estamos falando isso juntos, aí, com esse alvo nosso, muito bem. Estamos aqui ajudando, trabalhando com o Ministério do Meio Ambiente, no programa União com os Municípios. Vejam só, isso aqui é quase do tamanho da Europa, a atividade... E a Embrapa quer participar, junto com o Governo nessa regularização ambiental, na assistência técnica e extensão rural, e recuperação produtiva da vegetação nativa, para que a gente possa trazer o sucesso nessas situações.
Quero finalizar agradecendo aqui o tempo que vocês estão permitindo e falando que eu tenho muita honra e orgulho de pertencer a essa empresa que fez esse balanço social. E cada real que foi colocado na nossa empresa, trazendo esses resultados - não é, Gustavo? -, trazendo esses resultados para vocês, se transforma aí em R$21,23 para a sociedade. Então, eu tenho muito prazer de estar aqui nessa missão de viabilizar soluções de pesquisa, desenvolvimento e inovação para a sustentabilidade da agricultura e benefício.
Muito obrigado. Agradeço o tempo que vocês me deram aqui para contar essa história. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Obrigado, Felipe.
Quero agradecer aos convidados; então, a Fabíola, o Raoni, o Leonardo, o Nelson, o Mário, o Gustavo e o Felipe. Quero agradecer, porque, agora, eu vou pedir para vocês se sentarem ali no plenário.
E, já para retomar a segunda mesa...
O SR. IRENEU ORTH (PP - RS. Para interpelar.) - Presidente, eu poderia fazer uma pergunta?
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Sim.
O SR. IRENEU ORTH (PP - RS) - Para o Raoni.
Como a análise por inteligência artificial pode se adequar às exigências dos arts. 66, 67 e 68 do Código Florestal?
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Raoni, é rápido isso aí? Bem rápido? (Pausa.)
Deixa eu só convidar...
Só um minutinho, Senador, porque eu convido para a gente ganhar tempo.
Convido agora, para a próxima mesa: Andréa Vulcanis, Secretária de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Goiás e Vice-Presidente da Abema para a Região Centro-Oeste; Marcelo Marques Spinelli Elvira, Secretário-Executivo do Observatório do Código Florestal; Suely Araújo, especialista sênior em Políticas Públicas no Observatório do Clima; Fernanda Rodrigues, Coordenadora-Executiva Nacional da Organização Diálogo Florestal; Laura Barcellos Antoniazzi, especialista em agricultura e sustentabilidade e membro da Coordenação da Araticum; e Jarlene Gomes, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia.
Então, Raoni, vai respondendo aí, enquanto eles vão se colocando aqui à mesa. Depois, eu passo a palavra aqui, tá?
O SR. RAONI GUERRA LUCAS RAJÃO (Para expor.) - Prezado Senador, muito rapidamente, o ponto-chave são dois elementos: o primeiro é a existência de dados - e estamos falando principalmente de dados de imagens de satélite, mas também tem outras fontes -; e o segundo é a implementação de regras. Então, basicamente, o que esses estados estão fazendo - inclusive é um processo que nasceu da ciência, em cooperação com a sociedade civil; eu, como professor, inclusive, participei ativamente disso, teve vários artigos científicos -: você considera, por exemplo, qual era a situação do imóvel em 2001, no caso da Amazônia. Dois mil e um é um marco importante, porque, antes de 2001, era 50%; depois, você tem 80%. Aí você coloca: olha em 2008; aí você aplica as regras específicas com relação à área consolidada. No resto do Brasil, você tem uma outra questão. Você tem 89 para o Cerrado, tem um debate acontecendo especificamente em São Paulo. Já foram feitos, inclusive, levantamentos com imagem de sobrevoos. E aí, depois, você tem a aplicação das regras especificamente para poder conseguir fazer esses descontos e aplicar as exigências específicas a cada período.
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Então, é possível, sim. Já foi testado, inclusive comparando análise humana com análise automática e mostrando a convergência a partir disso, conseguindo aplicar de maneira mais massiva.
O SR. IRENEU ORTH (PP - RS. Fora do microfone.) - Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Obrigado, Raoni.
Então, vamos iniciar. Andréa Vulcanis, Secretária de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Goiás e Vice-Presidente da Abema para a Região Centro-Oeste. Dez minutos, Andréa.
A SRA. ANDRÉA VULCANIS (Para expor.) - Muito obrigada, Deputado. Quero cumprimentar a todos aqui da mesa. Agora, gostei, porque estamos em maioria de mulheres. Na outra, era só homem. Agora, vocês ficaram aqui, em minoria. Quero cumprimentar a todos aqui na nossa plateia.
Falarei aqui representando a Abema (Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente). E vou trazer aqui, Deputado, talvez algumas reflexões, porque eu acho que muito foi dito sobre os desafios na implementação do Código Florestal. E muito se traz quando, sobretudo, se fala do Cadastro Ambiental Rural e de todas as estratégias que estão previstas lá no Código Florestal, as atribuições definidas na lei para os estados. E eu vou ser bastante transparente no sentido de que me incomoda bastante esse discurso de que cabe aos estados, agora, analisar o CAR, e que o CAR não está sendo analisado por culpa dos estados ou por alguma responsabilidade estadual.
É preciso que a gente entenda um pouco isso e eu vou passar por isso muito rapidamente, porque todo mundo já falou desses desafios. Mas acho que, fundamentalmente, esta audiência nos convoca aqui a uma reflexão bastante profunda sobre o que está acontecendo no nosso país e por que a gente tem tantas dificuldades, Deputado. A sua fala me chama muito a atenção, sobre a necessidade de a gente refletir: por que está tão difícil? Acho que essa é a pergunta que precisamos responder.
Sobre o CAR - e aqui eu falo de um estado que opera no Sicar, que é o sistema federal, que estava no serviço florestal e agora foi para o MGI e, enfim, vem passando de mão em mão ao longo dos últimos anos -, é preciso que a gente entenda que, hoje, para que vocês tenham uma ideia, a análise implica... Cada tela que o nosso analista ambiental, lá dos estados, precisa analisar no CAR. Só para ele girar, fica aquela rodinha rodando o tempo todo lá, são de 20 a 25 minutos por tela. Isso significa que, hoje, nós temos uma análise - o Raoni falou isso, e é verdade - que é absolutamente anacrônica. O sistema está - eu vou dizer a palavra que ele está - falido em todas as perspectivas. Ele perde dados, é um sistema que não funciona. O produtor rural lá declara, a gente não consegue ver do lado do órgão ambiental. Nós analisamos, e a informação não chega do outro lado.
Isso pode parecer: "Ah, mas é um simples sistema". É um sistema que, da forma como foi pensado e estruturado, não tem como operar. Quando a gente viu o desafio de milhões de imóveis, sobretudo porque nós temos outros desafios... Não é só a equipe dos estados ou a boa vontade ou a intenção dos estados em realizar esse conteúdo, mas nós temos problemas com bases de referência. Hoje, as bases de referência que são necessárias, as bases de áreas consolidadas, não temos; bases de remanescente de vegetação, não temos - considerando o que nós estávamos falando há pouco, por exemplo, no caso do Cerrado, seriam os campos -; bases de áreas não consolidadas; bases de hidrografias; bases de relevo...
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Então, sabe como é que o nosso analista faz? Ele pega a imagem disponível, lá de 2008 - e, para quem nunca viu essa imagem, ela fica parecendo aquelas ecografias de bebê: só o médico consegue interpretar aquilo -, e aí o que ele tem que fazer? Ir para uma imagem anterior, ver, tentando entender se tinha uma vegetação; aí, ele olha uma imagem posterior... Gente, isso é impossível no universo de imóveis que a gente tem no Brasil, como um todo. No meu estado, são 213 mil imóveis na base do CAR, mas, em estados como Minas Gerais, são 800 mil imóveis! Não é possível que a gente acredite que vá funcionar isso, analisando imóvel por imóvel, ou, então, vindo aqui alguém dizendo: "A culpa é dos estados". Aí outro diz: "Não, a culpa é do produtor rural". Um outro diz que a culpa... Isso me chama muito a atenção para o fato de que, semana passada, eu estava num evento em Goiás, o Fórum Infantil - Mudanças Climáticas. As crianças traziam as reivindicações, e muito se pôde observar que a educação ambiental que foi realizada ali foi a das crianças reivindicando do Governo que entregasse um resultado para elas.
Eu acho que a nossa reflexão aqui neste momento é muito esta: como é que a gente - Governo Federal; estados; municípios; produtores rurais; empresários; instituições, como a CNI, que esteve aqui, e a CNA, que esteve aqui - dá as mãos? Como nós, juntos, construímos uma política pública que seja eficiente, eficaz?
Eu, em Goiás, por exemplo, tentei customizar o Sicar. Nós contratamos o serviço, e o Governo Federal não nos passou o código-fonte, em 2021. Agora, eu contratei um novo sistema, por R$5 milhões. O Estado de Goiás está investindo para poder ter um sistema que opere, porque ninguém nos dá uma resposta sobre quando o sistema federal efetivamente estará apto a funcionar. Até que ele esteja apto a funcionar - eu posso atestar aqui com segurança -, o CAR e o Código Florestal não vão funcionar, porque não é possível a gente acreditar que cabe aos estados resolver um problema que é nacional.
E isso porque eu estou falando, por exemplo, do meu Estado de Goiás, em que a gente tem uma base fundiária resolvida. E nos Estados da Amazônia, que não têm base fundiária resolvida? O desafio é muito maior, e nós temos que entender que... Muito bem: então, consertamos o problema do sistema, consertamos o problema das bases de referência - que nós não temos; a gente tem que construir bases de referência. Passaram-se 12 anos do Código Florestal. Será que até então não se entendeu que essas bases de referência precisam estar lá? A malha dinamizada, que foi vendida aqui com uma solução - e ela é - precisa da base de referência certa e segura; senão, como é que o computador vai analisar algo? Porque hoje o analista, pessoa física, consegue interpretar a imagem. O computador não faz isso; ou o sistema está lá, íntegro, ou ele não vai realizar.
Aí, entendido que, superando as questões tecnológicas, nós temos outras questões, porque o CAR é um sistema declaratório. Ainda que o computador analise, precisa submeter isso ao proprietário rural, e ele diz "concordo" ou "não concordo"; "aqui tem um problema de desvio de 30m na minha APP", ou de 100m; ou "esta área de altitude aqui é APP" ou "não é APP". E ele não faz isso sozinho, porque em geral, nenhum de nós, que não sejamos técnicos da área, consultores, responsáveis técnicos, conseguimos fazer isso. E, a partir desse momento, nós não temos hoje, no Brasil, consultores técnicos habilitados em número minimamente suficiente para realizar essa ação. Estava aqui o Nelson falando, nós estamos capacitando pessoas para poder apoiar os produtores rurais na análise do CAR, porque eles mesmo não vão conseguir fazer. Então, o desafio, minha gente, é monumental. E não adianta a gente acreditar que, enquanto isso, enquanto o Estado brasileiro não funciona, e esta é uma realidade... Eu não estou falando de um ou outro estado, nós temos problemas graves para fazer o Estado brasileiro operar com uma máquina pública eficiente neste tema do Código Florestal. Isso é um fato e, até que isso esteja construído, do que adianta a gente pegar um setor produtivo inteiro, que é a base econômica desse Estado, e acusá-lo de ser o vilão da vez ou do momento, e achar que nós vamos resolver isso com fiscalização, com comando e controle, achando que a gente muda a lei e no outro dia tem alguém que é obrigado a cumprir a lei?
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Eu ouvia isso no meu estado todos os dias, quando cheguei lá, em 2019: "Secretária, mesmo que a gente queira a gente não consegue cumprir a lei florestal neste país". E é uma verdade, é uma verdade! Ele não consegue acessar o CAR, ele não consegue acessar um instrumento de licenciamento adequado. Ele não consegue ter uma autorização.
E aí, minha gente, não adianta a gente fechar os olhos, colocar uma venda, porque são muitas mãos trabalhando. A gente viu aqui a Embrapa falando uma coisa importante, Deputado. Eles estão construindo as bases técnicas da restauração florestal, porque, assim que o CAR funcionar, vamos entrar no PRA. E nós vamos precisar restaurar.
Hoje, fica uma pergunta: "Como é que restaura?". No Cerrado, isso é complicado. Não é tão simples, mas está lá a Embrapa trabalhando. Dali que a Embrapa trabalhou, e essa informação chegou lá no produtor rural, para ele saber quais são as espécies que ele tem que plantar, e onde ele vai plantar, e onde ele compra, ou ele vai ter que produzir a muda? Será que ele sabe produzir muda nativa? Será que ele entende de muda nativa? Onde é que ele vai contratar todo esse serviço?
Hoje, nós estamos com um projeto de restauração ambiental em Goiás, chamado Juntos pelo Araguaia, um projeto que é belíssimo na perspectiva de envolver aquele produtor rural, orientá-lo nessa estratégia, fazer com ele e para ele...
(Soa a campainha.)
A SRA. ANDRÉA VULCANIS - E o custo disso é altíssimo. Nós estamos falando de algo em torno de R$80 mil o hectare.
Então, nós precisamos entender que nós falamos de restaurar não sei quantos milhões de hectares, ou não sei quantos milhões de árvores. Isso envolve recurso, envolve técnica, envolve tecnologia. E isso é um desafio, minha gente, para todos os estados. Eu acho que passou da hora de a gente chegar e ficar nessa troca de acusações mútuas entre nós, e não entender o que cada parcela da sociedade pode fazer para que a gente avance em direção a resultados em que realmente precisamos avançar. Enquanto nós estivermos nessa ação de ataque a um, ou a outro; ou acusações de uma, ou de outra parte. Eu digo: o problema é o Governo Federal que esse CAR não funciona; o outro diz que o problema é o produtor rural; o outro diz que o problema é o setor... Não adianta.
Nós não sairemos desta realidade brasileira que realmente precisa olhar para o Código Florestal com um olhar não só de cumprir a lei, porque parece que a lei vira o grande deus brasileiro, quando a gente está falando disso. Nós estamos falando de uma ação regenerativa, uma ação regenerativa que vai muito além de cumprir uma obrigação, mas que vai para um olhar de como esse produtor rural pode olhar para o seu território e entender que ele faz parte de um contexto maior, que a ação que ele realiza ali naquela localidade produz, como o nosso Deputado aqui falou logo antes, efeitos difusos sobre outras realidades. Isso é uma consciência que hoje não existe, é fato isso. A gente encara isso todos os dias, em todas as propriedades rurais, e eu faço questão de estar em todas elas, para entender a demanda. As pessoas não têm a relação de causa e efeito, elas não compreendem isso.
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Então, o nosso problema é muito mais profundo do que um problema de estado, ou de tecnologia, ou de uma solução legal. Ele é um problema de consciência humana e vai, portanto, ao único lugar no qual o ser humano é capaz de se transformar: pelo coração, pela forma amorosa como a gente conduz a nossa sociedade, que deve deixar de ser uma sociedade polarizada, para entender que temos um objetivo em comum, um alvo em comum, em que governos e sociedade devem agir em conjunto, para buscar esses resultados mais efetivos.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Obrigado, Andréa.
Convido agora Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas, no Observatório do Clima.
Dez minutos, Suely.
A SRA. SUELY ARAÚJO (Para expor.) - Boa tarde a todos.
Em primeiro lugar, queria agradecer o convite ao Observatório do Clima, para participar deste importante debate.
Eu gostaria de puxar a sardinha para o lado do Observatório do Clima e começar debatendo a parte diretamente relacionada às emissões de gases de efeito estufa.
No caso brasileiro, a mudança de uso da terra (MUT), que é basicamente desmatamento, responde por 48% das nossas emissões brutas. Isso são dados do Seeg (Sistema de Estimativas de Emissões), do Observatório do Clima, que controla isso há mais de dez anos, e isso é, inclusive, usado como dado oficial em mais de nove estados brasileiros. Nós temos dados de emissões dos 5.570 municípios brasileiros, com um ano, apenas, de atraso.
Esses 48% são números de 2022, da última publicação do Seeg.
O Brasil está entre os grandes emissores de gases de efeito estufa. Não é por termos grandes áreas florestadas que nós não emitimos. Nós emitimos muito, porque desmatamos muito. Então, 48% são mudanças de uso da terra; a agropecuária, principalmente a pecuária, por causa do metano, responde por 27%; e depois 18%, energia.
Esse nosso padrão de emissões é bem distinto da maior parte dos países. Nós temos um padrão parecido com o da Indonésia, com o do Congo, países com florestas tropicais e que têm um número de desmate muito alto. É preciso entender essa realidade e entender a importância do controle do desmatamento, para a questão climática.
Isso é, realmente, fundamental e tem conexão direta com a lei florestal e com outras leis que tratam da proteção da vegetação nativa. Essa ligação desmatamento-clima é muito importante de entender.
O desmatamento tem que ser controlado, para nós reduzirmos nossas emissões; nós temos que fazer recuperação florestal e de outras formas de vegetação nativa, para nós sequestrarmos carbono; e temos, também, que replantar a vegetação nativa, para termos uma maior resiliência a eventos extremos.
E, sim, eu queria destacar a recuperação de vegetação nativa, em situações como a do Rio Grande do Sul, na reconstrução. Para nós é elemento necessário para garantir resposta adequada a futuros eventos extremos, que virão, porque a mudança do clima é uma realidade do planeta como um todo. Nós estamos numa outra época e temos que trabalhar para amenizar essa situação e para estarmos mais fortes, para aguentar tudo isso. Esse é o principal recado.
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Em termos de Código Florestal, então, é importante - muito importante - avançar nas validações do CAR, para partirmos, até que... É inadmissível. E a gente entende todas as dificuldades expostas, por exemplo, pela Secretária Andréa; a gente entende as dificuldades na prática dos estados, e eu não estou botando culpa em ninguém. Eu só estou falando que nós temos que avançar para os programas de regularização ambiental, porque é nos programas de regularização ambiental que vão estar os compromissos efetivos de recuperação ambiental. Isso envolve automatização, e eu assino embaixo das palavras do Raoni, ele sabe que eu acredito na automatização dessa análise do CAR, mas envolve uma parceria bem forte nesse sentido, que inclui, sim, Governo Federal ajudando os estados em tudo isso - pelo menos, isso é a minha leitura.
Nós temos que avançar, a lei realmente tem que ser aplicada. A grande inovação da lei de 2012, na verdade, foi esta dupla: CAR e PRA. O resto é meio parecido, com ajustes, com a lei de 1965, como ela estava já perto da lei de 2012. Então, realmente, o que se inovou foi o pacto com o agro, a questão dos programas de regularização ambiental, e isso foi um grande pacto político, bacana e bonito. A gente reconhece isso, mas tem que ser aplicado, isso tem que virar realidade concreta.
Nesse sentido, eu queria chamar a atenção para uma tendência de se forçar flexibilização da legislação florestal, que protege as florestas e demais formas de vegetação nativa. Isso aconteceu em 2021, com a lei que delegou aos municípios a fixação das áreas de preservação permanente em áreas urbanas. Vários municípios, no país inteiro, já estão diminuindo as faixas de proteção de APP. Isso em época de crise climática é bastante preocupante. E, na lista do que as organizações não governamentais chamam de pacote da destruição, tem uma série de projetos que flexibilizam a proteção da vegetação florestal, isso em plena crise climática, após um evento, uma tragédia triste com que todos nós ficamos comovidos, no Rio Grande do Sul. Acho que estamos bem longe de saber como a gente vai reconstruir tudo aquilo, e todo o país tem que ajudar, eu acho que isso tem que ser um esforço coletivo.
Mas, se pegarmos exemplos como o que aconteceu no Katrina, os Estados Unidos têm muito mais dinheiro que a gente, e eles demoraram 15 anos, mais ou menos, com o processo de reconstrução, e eles têm dinheiro. Então, a coisa não é simples, e nós temos que nos preocupar em não piorar a questão do nível de proteção da vegetação.
Eu cito, no pacote da destruição, propostas que preocupam bastante: o PL 364, que tratava originalmente, na Câmara, da proteção dos Campos de Altitude no bioma Mata Atlântica, mas a redação aprovada pelas Comissões na Câmara está desprotegendo, na verdade, toda a vegetação não florestal de um país como um todo. Isso implica, por exemplo, desproteger 50% do Pantanal. E eu estou até dando um exemplo que não são os Pampas, que também estão prejudicados por esse projeto.
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Tem projetos, como o PL 3.334, no Senado, viabilizando a redução da reserva legal na Amazônia em determinadas situações; tem projetos ampliando a data da lei florestal, aquela data da flexibilização das regras, de 22 de julho de 2008 para 2012, e isso significa menos responsabilidade sobre a recuperação ambiental; tem projeto flexibilizando áreas de preservação permanente para implantação de empreendimentos ligados à irrigação; tem o projeto que suprime o controle da vegetação secundária em áreas de uso alternativo do solo, e a estimativa é de você perder o controle sobre 17 milhões de hectares de florestas regeneradas ou em processo de regeneração; e por aí vai. São exemplos.
Então, eu queria chamar a atenção para, entendendo-se a conexão da proteção da vegetação nas florestas e demais formas de vegetação nativa com a questão climática e com o momento em que nós estamos, em plena crise climática... E isso é planetário, isso não é Brasil. Isso é planetário, só que o planeta não tem fronteiras políticas. Nós temos que estar preparados, primeiro, para não piorar a situação; depois, para estarmos mais fortes, para aguentar, ter resiliência para os eventos extremos, que serão uma realidade.
A seca na Amazônia nós não sabemos se vai ser igual ao ano passado, mas os cientistas já estão apontando que ela vem, e vem agora, este ano ainda. O Pantanal está pegando fogo hoje - hoje.
Então é preciso muito cuidado - acho que esse é o principal recado em termos do Observatório do Clima - com a flexibilização da legislação ambiental, e é preciso fazer a conexão direta com a questão climática. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. PT - SP) - Muito obrigado, Suely.
Convido agora o Marcelo Marques Spinelli Elvira, que é Secretário-Executivo do Observatório do Código Florestal.
Marcelo, dez minutos.
O SR. MARCELO MARQUES SPINELLI ELVIRA (Para expor.) - Obrigado, Deputado.
Boa tarde a todas e todos. É uma honra e uma satisfação estar aqui debatendo esse tema tão importante, essa lei que, possivelmente, como já disseram, foi das leis mais debatidas neste Parlamento.
Antes de entrar propriamente no tema, só queria dar algumas breves palavras sobre o Observatório do Código Florestal. O observatório foi criado em 2013, são quase 50 organizações hoje que compõem o observatório, organizações que trabalham com geração de dados, com ciência, com projetos no campo, com mercado, com finanças, enfim, é um espectro bem grande, e isso dá toda a potência de uma discussão ampla.
O observatório trabalha com monitoramento, advocacy, a gente está aqui no Congresso acompanhando os projetos de lei, análise e diretrizes, geração de conteúdo, e a gente tem algumas plataformas e campanhas. E eu destaco esse sexto item como o mais fundamental de todos: o observatório é um espaço de diálogo, e eu acho que, de tudo que a gente já ouviu aqui nesta mesa, a impressão que passa é de que está todo mundo com interesse de dialogar, com interesse de trocar e com interesse de implementar o que é positivo. A Secretária Andréa trouxe aqui esta problemática de ficarem colocando a culpa em um e a culpa no outro. Então, eu trago este recado de que o observatório é um espaço de diálogo para a gente construir ideias para a implementação do código, porque esta é a nossa principal visão: o código já está maduro, ele não precisa ser mudado, ele precisa ser implementado.
Destaco só duas ferramentas, bem rapidamente, do observatório. As colegas que vão falar depois de mim vão entrar um pouco mais no detalhe, mas já deixo aqui o destaque.
O Portal do Código é uma plataforma em que se dá para ver dados sobre implementação de PRAs, informações também envolvendo o setor financeiro e empresas; e o Termômetro do Código Florestal, que é uma base de dados bem robusta e mostra como é que está, de fato, a situação dos cadastros, as informações envolvendo o Código. E, no Termômetro, a gente tem a informação de que hoje, no Brasil, são cerca de 19 milhões de hectares de passivo de vegetação nativa, aproximadamente 3 milhões de áreas de preservação permanente e 16 milhões a título de reserva legal.
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Já caindo na discussão aqui do evento hoje - os desafios da implementação do código -, então, mais uma vez, reforço que não é um tema de mudar a lei. Não vai ser por um PL - como a Suely já trouxe -, que muda a proteção da reserva legal na Amazônia, que a gente vai conseguir implementar o código. Não é esse o problema. Não vai ser uma lei que vai mudar o regramento sobre a área de preservação permanente para permitir barramento que vai facilitar a implementação do código. Não é isso.
No código, tem algumas ideias que já foram trazidas antes, mas, fundamentalmente, tem um tema de transparência de dados que é importante. Eu já ouvi várias audiências públicas aqui no Congresso e as pessoas falando: “Ah, o CAR é importante porque é como se fosse a placa de um carro, que, se você passa em alta velocidade, você toma uma multa e a multa chega na pessoa”. Só que, se a gente não tem condições de saber qual é o CPF daquela pessoa que está ligada ao CAR e se a gente não consegue ter uma mínima integração de dados, inclusive de embargos das áreas, isso dificulta inclusive...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. MARCELO MARQUES SPINELLI ELVIRA - ... a análise e a validação. Esse é o próximo tópico, que o Raoni já trouxe bem aqui, como o grande desafio que está caminhando - nesse último ano, foi um avanço expressivo no número de casos validados -, mas, quanto mais a gente conseguir ter informação, claridade e transparência sobre os métodos em que essas análises vão ser feitas, será melhor.
Acho que um outro desafio, que é fundamental a gente destacar, é em relação ao CAR-PCT, o cadastro dos povos e comunidades tradicionais. Esse ainda é um gargalo, são poucas as comunidades que estão inscritas no CAR. Tem muitos estados que não estão nem disponibilizando o sistema para que isso seja feito. Muitas vezes, as comunidades precisam, inclusive, do esforço do próprio estado para que isso aconteça. É um contrassenso a ideia do autocadastramento. A gente sabe que o CAR, apesar de ele não ser um instrumento de regularização fundiária, não é um título, ele traz uma segurança. Tem muita comunidade que está sendo ameaçada por empreendimentos que colocam a reserva legal em cima dos seus territórios, porque, sobretudo no Cerrado, as áreas mais protegidas são as áreas de comunidade, são as áreas verdes. Então, jogam o cadastro de uma reserva legal em cima de uma área de comunidade, e tem toda uma série de ameaças de violências, porque supostamente aquela área vira de uma grande fazenda.
Então, dar vazão para o CAR e fazer um cadastro massivo de PCTs é um gargalo, e isso é importante de ser observado nesses próximos passos de implementação do código.
Já muita gente falou em implementação do PRA; inclusive a implementação do PRA como uma forma de dar vazão a toda uma agenda positiva, sobretudo de restauração. Tem gente que vai falar depois de mim, que vai entrar mais em detalhe; então, também não vou aprofundar tanto.
Tem o desafio de base de dado, cada estado tem sua base de dado, são várias bases de dados diferentes que não se comunicam. A Secretária Andréa trouxe agora exatamente essa reflexão.
Enfim, aí é uma política. A gente tem hoje um Ministério de Gestão e Inovação; tem uma expectativa de que isso possa ser de fato discutido lá dentro, porque as bases precisam conversar.
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Enfim, como um último desafio, os retrocessos legislativos - a Suely já comentou um pouco.
E aqui eu quero trazer um exemplo bem emblemático deste problema do CAR, em relação aos cadastros que, às vezes, surgem, e como é importante ter uma validação que analise, de fato, o que está posto no papel.
Isso é só o Estado do Amazonas, entre 2022 e 2023. Em um projeto, junto com a UFMG, foram identificados quase 600 cadastros acima de 1,5 mil hectares, isso em uma margem de um pouco mais de um ano, sendo que o maior desses cadastros tinha 2,5 milhões de hectares. Então, uma pessoa faz um cadastro de uma área de 2,5 milhões de hectares e de uma área de floresta pública, do dia para a noite. Isso mostra como o CAR, também, muitas vezes, é usado para justificar ilegalidades, toda uma agenda da grilagem.
Só nesse estado, então, o dado ali mostra que são 157 sobreposições com UC e 27 sobreposições com terra indígena. Enfim, o próprio Nelson falou, na apresentação dele, que, na Região Norte, são 272% de área cadastrada; então, acho que esse é um bom exemplo de por que isso acontece. A gente já está investigando esses casos, entendendo um pouco melhor, porque é uma área muito grande.
Sobre os retrocessos, a Suely já comentou um pouco. Eu só queria também aqui fazer uma menção a essa Lei Federal 14.285, que foi aprovada em 2021. Eu acho que foi muito interessante o que a Senadora Tereza Cristina disse antes, que o Código Florestal não é uma questão só do agro. De fato, não é, porque essa é uma discussão urbana. Foi uma lei que mudou a possibilidade do tamanho das áreas de preservação permanente nas cidades, e tudo o que se refere à redução de área de preservação permanente é problemático.
Desde 1934, o código já tratava das florestas protetoras como uma forma de segurar a água de drenagem e ter uma estabilidade hídrica; então, faz, praticamente, cem anos que a legislação já prevê isso, e qualquer mudança de APP é problemática.
O PL 2.168 também é um PL problemático que tenta transformar barramentos, estruturas de utilidade pública. O Rio Grande do Sul passou uma legislação como essa. Eu não quero ser leviano de falar que foi essa legislação que causou o que causou, mas é um acúmulo. Então, qualquer intervenção em APP é problemática.
Aqui, já para encerrar, no observatório a gente tem conversado muito sobre a possibilidade de uma real implementação da agenda de restauração. São muitos hectares de passivo de vegetação nativa no país, seja de APP ou de reserva legal.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO MARQUES SPINELLI ELVIRA - Quanto à agenda da restauração, tem uma colega que vai falar mais em detalhes sobre isso. A gente está na década da restauração. Foi lançado, ano passado, na COP, em Dubai, o Arco de Restauração da Amazônia. Enfim, tem todo um contexto político muito favorável a isso. A NDC brasileira também fala de restauração; então, este binômio - Código Florestal e restauração - pode ser uma forma muito potente de implementar o código.
Análises dinamizadas. Tem alguns exemplos de estados que fizeram isso. São Paulo acho que é um exemplo bem interessante, também, por ter colocado muito recurso, muita gente trabalhando. Eu acho que não tem muito segredo para sair do problema: não é mudando a lei, é implementando, colocando gente, colocando recurso, fazendo a coisa acontecer.
Integração de dados. Eu falei um pouco do Ministério de Gestão (MGI). Uma oportunidade interessante também são os instrumentos fiscais e econômicos. Por exemplo, o Bacen ter alguma regulamentação que conecte a análise do CAR, do próprio cadastro, com os créditos, isso é uma possibilidade interessante.
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E, para encerrar, eu acho que uma reflexão importante é como a gente consegue também atualizar nossa forma de entender esse tema, porque a gente tem pensado a relação entre homem e natureza, entre ser humano e natureza ainda de uma perspectiva muito de sujeito com objeto de dominação, e a natureza não é um objeto, mas um sujeito também, e eu acho que o conhecimento tradicional ensina à gente isso. É uma outra relação, é uma outra dinâmica, sobretudo porque o que é essencial é invisível aos olhos.
Então, eu acho que esse é o recado do observatório. O código tem que ser implementado, mas não tem que ser mudado, e a gente está aberto ao diálogo.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. Bloco/PT - SP) - Muito obrigado, Marcelo.
Convido agora Fernanda Rodrigues, que é Coordenadora Executiva Nacional da Organização Diálogo Florestal.
Dez minutos, Fernanda.
A SRA. FERNANDA RODRIGUES (Para expor.) - Muito obrigada, Deputado Nilto Tatto, pela oportunidade e a abertura deste espaço aqui, no Congresso Nacional. Esses espaços são muito valiosos e são uma ferramenta de desenvolvimento para o país.
A gente está sentindo na pele os efeitos adversos das mudanças climáticas e, ao mesmo tempo, atravessando a década da restauração dos ecossistemas das Nações Unidas.
Aqui, um breve raio-X do Diálogo Florestal.
Somos 237 membros distribuídos em 7 fóruns regionais, que incluem empresas do setor florestal, organizações da sociedade civil, povos indígenas, instituições de ensino e pesquisa, também governos, em alguns desses fóruns, e nossa missão é promover o diálogo e a colaboração para construir soluções relacionadas ao uso e à conservação de paisagens sustentáveis.
Eu fiz questão de trazer isto... Em especial, também teve uma fala da Secretária Andréa sobre o que cada parcela da sociedade pode fazer. A gente vem praticando isso há quase 20 anos no contexto do setor florestal, e um dos temas prioritários é a implementação do Código Florestal. Por que esse tema é tão prioritário para o Diálogo Florestal no Brasil? Porque depende da implementação do Código Florestal a sustentabilidade do agronegócio, a aceitação dos produtos, dos nossos produtos brasileiros no exterior, a conservação da biodiversidade, a manutenção dos serviços ecossistêmicos, como foi bem falado pelo colega da Embrapa na sessão anterior. E, só para dar um exemplo, temos muitas boas práticas já acontecendo. O setor de plantações de árvores no Brasil, por exemplo, é pioneiro, lidera muitos desses esforços na construção de mosaicos sustentáveis de paisagem. Hoje, são cerca de 10 milhões de hectares de árvores plantadas, junto com 6,7 milhões de hectares de áreas de conservação, incluindo reserva legal e APP. E considerando esse planejamento da paisagem, que foi tão falado hoje e é tão primordial dentro desse nosso debate...
E temos também... O Brasil é reconhecido como um dos países que têm o maior número de iniciativas de construção de paisagens sustentáveis. E aqui eu trago o exemplo do setor de papel celulose em embalagens, e está disponível numa publicação recente do CDP e do Proforest.
Esta aqui é a principal parte da minha fala de hoje. Como o Marcelo citou anteriormente, tem o portal do Código Florestal, tem ali embaixo o endereço, idealizado pela BVRio, pelo Observatório do Código Florestal e outros parceiros, e tem aqui um ótimo resumo da situação da implementação dos PRAs, de acordo com o art. 59 do Código Florestal.
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Então, vocês podem ver que os estados que estão em verde são os que já têm PRA regulamentado com validação e adesão de imóveis rurais em andamento, em diferentes estágios. Em amarelo, o PRA está regulamentado, mas ainda não tem adesão de imóveis rurais. E, em vermelho, o estado não tem PRA regulamentado. Então, com essa imagem, dá para ter uma ideia desta parte que segue o que foi tão falado e é tão relevante, que é a análise e a validação do CAR. Mas a gente, enquanto Diálogo Florestal, em parceria com o Observatório do Código Florestal, com a Coalizão, com os coletivos de restauração, a depender do estado em que atuamos, realizamos seminários virtuais no contexto de 18 estados e 2 no âmbito da União, reunindo representantes dos governos, da sociedade civil, do setor produtivo e também de instituições de ensino e pesquisa para debater o estágio de implementação do PRA em cada um desses estados que foram objeto dessa série de webinários.
Então vocês podem ver ali que teve apoio da Abrampa (Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente) e dos coletivos de restauração, a depender do estado, a Aliança pela Restauração da Amazônia, Pacto da Mata Atlântica. Então isso trouxe para a gente um acúmulo de experiências que vão ser lançadas agora no próximo mês, durante a conferência da Sobre (Sociedade Brasileira de Restauração Ecológica). Lá na Bahia a gente vai lançar essa publicação no contexto da segunda série. E já temos também acumulados outros trabalhos que estão disponíveis no site do Diálogo Florestal, como Cadernos do Diálogo, que traz então toda a reflexão da primeira série que conduzimos e englobou nove estados, se não me engano. Temos também uma publicação sobre paisagens florestais e protagonismo das mulheres, trazendo esse recorte de gênero que é bastante importante e fundamental na implementação de qualquer política pública, e também ali a experiência com mosaicos florestais sustentáveis.
Especialmente pensando um pouquinho em desafios, já foi muito falado do CAR, da importância de avançar na regulamentação e na implementação do PRA nos estados, e isso pode também promover uma melhor remuneração para quem de fato provê os serviços ecossistêmicos. Os produtores rurais, as produtoras rurais que estão em campo, que estão conservando as florestas, que estão produzindo tanto madeira quanto alimentos, também podem acessar esses mecanismos de incentivo financeiro, desde que essas agendas andem com celeridade.
Desafios relacionados ao PRA e aos PRADAs que surgiram nessas séries que eu vou mencionar muito rapidamente. Então, falta de ferramentas de monitoramento para acompanhar a recuperação das áreas nos estados que já têm adesão de imóveis rurais ao PRA; diferença de interpretação entre estados sobre a obediência ao Código Florestal ou legislações mais regionalizadas, como a Lei da Mata Atlântica; também desafios na implementação do formato autodeclaratório, e já existem experiências com diferentes níveis de sucesso nesse formato autodeclaratório do PRA; e, obviamente, a necessidade de recursos, pois são necessários recursos financeiros, recursos humanos para que essa etapa seja cumprida.
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Acreditamos que não se deve esperar a solução, a análise e a validação de todos os CARs para pensarmos nessa etapa do PRA. Isso já está acontecendo em muitos estados, com ótimas iniciativas. Não quero esquecer nenhum estado, mas o Pará tem uma iniciativa muito interessante, o Mato Grosso, o Espírito Santo e São Paulo também. Então, já podemos ter referências excelentes.
Como oportunidades, destaco a implementação do Código Florestal, como várias pessoas aqui já falaram, não em alterações constantes... É claro que a legislação é mutável, porém é imprescindível que haja o debate com a sociedade civil. Estes espaços, Deputado Nilto, são fundamentais para promovermos este debate, para podermos até melhor informar nossos representantes aqui do Senado e da Câmara, para evitarmos a insegurança jurídica que enfrentamos e sofremos há tanto tempo e para evitarmos o abalo reputacional do setor produtivo em seus mercados. É claro que o Brasil, como eu disse antes, é uma liderança tanto do agro, incluindo aqui o setor de árvores plantadas... Porém, como é que vamos, de fato, demonstrar essa idoneidade com que sabemos que a maior parte desses setores atua se não conseguimos avançar com celeridade nessas agendas básicas do Código Florestal?
Então, o Planaveg e as outras políticas de restauração são fundamentais e devem ser apoiadas com recursos financeiros inclusive, para que possamos também avançar na política de PSA e dos mecanismos financeiros para que o recurso chegue à ponta.
E adotar o conceito de planejamento de paisagem; não basta apresentarmos números absolutos da cobertura vegetal do país, sendo que a visão de paisagem não está sendo adotada. Pode ser que tenha um grande território...
(Soa a campainha.)
A SRA. FERNANDA RODRIGUES - ... com um déficit gigantesco de áreas protegidas e isso influencia, inclusive, na produção, necessitando de mais insumos agrícolas, porque não tem área de vegetação nativa para os animais sobreviverem, para manter a biodiversidade local.
Eu agradeço - aqui são algumas organizações do Conselho de Coordenação do Diálogo Florestal - e me coloco à disposição.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. Bloco/PT - SP) - Muito obrigado, Fernanda. (Palmas.)
Convido, agora, a Laura Barcellos Antoniazzi, especialista em agricultura e sustentabilidade e membro da coordenação da Araticum.
A SRA. LAURA BARCELLOS ANTONIAZZI (Para expor.) - Obrigada, Deputado Nilto Tatto. Obrigada por esta oportunidade. Como já falaram: é muito bom a gente poder conversar com vários setores juntos sobre a implementação do código. Agradeço também todas as falas anteriores, várias já me ajudam aqui em vários pontos da minha fala.
Eu estou aqui representando a Araticum, vou explicar um pouco o que é a Araticum, e a minha fala vai muito na linha do que a gente precisa fazer para colocar o Código Florestal no chão na parte da implementação, na parte da restauração. Muita gente falou aqui sobre toda a parte de CAR e de PRA, então não vou falar muito dessa parte que já foi bastante falada, mas vou trazer principalmente a parte prática da operação que ainda muita gente também põe em xeque: "Mas a gente consegue fazer essa restauração? E, se validarem todos os CARs? A gente tem semente, tem muda? A gente consegue colocar isso no chão?". Muita gente coloca isso em xeque como se não fosse possível, pela grandeza do desafio, mas eu vou trazer aqui para vocês, então, alguns exemplos, experiências, mostrando que, sim, a gente tem capacidade operacional para implantar esse desafio.
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A Araticum é uma articulação pela restauração do Cerrado, é uma rede colaborativa, multissetorial - vários setores estão representados -, e tem o objetivo de promover a restauração em larga escala do Cerrado, aliada à inclusão social. Então, na Araticum, a gente faz questão de que a restauração seja feita de uma maneira inclusiva, pensando não só nos aspectos ecológicos, mas também no aspecto social. O Cerrado traz muito essa desigualdade que a gente tem no Brasil como um todo - no Cerrado também tem. Tem Cerrado em São Paulo, Estado mais rico do Brasil, e também nos estados mais pobres do Nordeste.
Como objetivo específico, a gente quer alavancar a restauração de todas as fitofisionomias, mas, especialmente, dar uma atenção especial para as fitofisionomias não florestais: as savanas e os campos. O Felipe já falou um pouco sobre isso, a importância disso, outras pessoas também, então queremos destacar a importância. Às vezes, a gente tem esse papel meio chato de não usar o termo "restauração florestal", e usar o termo "restauração ecológica" ou "restauração da vegetação nativa". O próprio Código Florestal não se chama mais Código Florestal, ele foi atualizado e é Lei de Proteção da Vegetação Nativa, porque ele cobre todas as formas de vegetação nativa.
E um outro objetivo específico é fortalecer as organizações locais. A gente quer fazer esse trabalho de baixo para cima. Aqui, para ilustrar um pouco melhor o que o Felipe já tinha mostrado, como o Cerrado tem essa diversidade de formações, desde as florestais, passando pelas savânicas até as campestres, e todas elas são importantes e têm um papel fundamental, tanto para a biodiversidade, mas, em especial, para a parte de conservação dos recursos hídricos.
A Araticum é um movimento de restauração do Cerrado e de outros biomas. Todos os biomas hoje têm esses coletivos, que são formados por empresas, governos, sociedade civil organizada, academia, a Embrapa está presente nisso. É legal trazer aqui para vocês que existem esses movimentos em todos os biomas, com pessoas com disponibilidade, vontade, que podem fazer esse apoio para a implementação no chão e já com muitas experiências, com uma bagagem concreta de projetos de restauração no chão.
Os seis coletivos também são associados da Sobre (Sociedade Brasileira de Restauração Ecológica) e da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, então, tem todo um movimento da sociedade civil apoiando a restauração.
E aí, como eu falei, tem várias etapas. A gente está falando muito de CAR, de PRA, do termo de compromisso. No final, ele vai ter que ter a validação pelo órgão responsável. É importante aqui destacar que uma necessidade também do órgão responsável é ter um indicador bem específico e definido do que é uma restauração final, o que significa essa restauração final - alguns estados têm, outros estados não têm -, o que de fato significa a restauração ter obtido sucesso, mas, nessa parte do meio, então, da implantação, a gente tem todas essas etapas de preparo do solo, de comprar insumo, de plantio, de manejo e monitoramento, e cada vez mais a gente tem acumulado experiências práticas junto com os agricultores e com a ciência da restauração e a ciência da agronomia também. Então, temos um conhecimento acumulado nisso, mostrando que é possível fazer. O Felipe mostrou grande parte desse conhecimento, dessas práticas que estão na Embrapa. O Nelson também mostrou como a CNA está aplicando isso. Então, dá para fazer. Resolvidas as questões legais e de operação, a gente consegue implementar.
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Vale também aqui destacar essa questão de que a restauração ecológica também pode ser produtiva, então, não se trata de uma área só protegida. A lei de proteção da vegetação nativa permite o uso. Então, a gente também precisa quebrar essa dicotomia e usar melhor essas áreas também para manejo e para a produção de diversos produtos. Isso é uma tendência mundial, mas, na prática, também precisa ganhar volume e aumentar as experiências e as cadeias, as cadeias da biodiversidade ou da sociobiodiversidade, que são baseadas em nossa vegetação nativa.
Queria dar um destaque aqui também a uma experiência que é conduzida por diversas organizações, como Caminhos da Semente e Redário, para promover restauração com sementes nativas. Quando a gente fala de restauração, muitas vezes o que mais vem à mente é o plantio de mudas, a técnica principal, mas já tem aí um acúmulo de experiências de restauração com sementes que pode proporcionar uma redução de custos muito significativa, porque você pode mecanizar totalmente a operação. Isso, para a área do Brasil, para as condições que a gente tem, é fundamental e também se consegue benefícios ecológicos. Você consegue usar as diversidades de espécies com as sementes e pode ter uma série de benefícios sociais quando essas sementes são produzidas por agricultores familiares, comunidades tradicionais. Então, você consegue ter esses três benefícios juntos e isso já está sendo feito em escala de maneira colaborativa.
Aqui um fato, na verdade, mostrando essa evidência de como a produção de sementes nativas de base comunitária está crescendo. Isso é importante destacar para que ninguém repita mais um argumento que às vezes é usado: "Não, mas não tem semente disponível, não tem mudas". A produção de sementes de base comunitária hoje é feita, a gente fala, com o freio de mão puxado. Então, as organizações poderiam produzir muito mais, e não produzem e não vendem mais porque não tem quem compre. E o mesmo se dá também com a produção de mudas. Vários dos viveiros estão com a sua capacidade ociosa, podendo produzir mais. É claro que, se você pede em cima da hora, pode ter uma questão pontual de alguma região por você fazer uma encomenda em cima da hora. Mas, de maneira estrutural, a gente tem condições de produzir muito mais sementes e muito mais mudas, e isso não é um gargalo real...
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(Soa a campainha.)
A SRA. LAURA BARCELLOS ANTONIAZZI - ... para a restauração hoje. Já são então 84t de sementes nativas produzidas de base só das 24 redes de base comunitária, com esse alto impacto social que eu mencionei.
E, aí, então, só para fechar, quero reforçar que é possível a gente planejar e executar os projetos de restauração em escala, na escala de que a gente está falando. Claro que, quando falam: "Ah, mas vocês vão conseguir? Dá para plantar 12 milhões?". A gente não vai chegar aos 12 milhões de repente. A gente vai crescer paulatinamente e as estruturas de insumos, de mudas e sementes e das operações vão conseguir dar conta disso. E tem muita sinergia com o setor agro, claro, porque a gente tem uma tecnologia muito acumulada. Então, é possível a gente fazer isso e mais, gerando todos esses cobenefícios. É desafiador? É, mas a gente tem um acúmulo de conhecimento e de experiências. É possível, então, fazer isso.
E destaco aqui que a gente tem um amplo apoio da sociedade para isso, porque restauração de vegetação nativa é uma coisa muito fácil de ser entendida pela sociedade. Como a Andréa falou, sobre as crianças, enfim, é uma coisa que é muito fácil as pessoas perceberem a importância disso e de valorizar. Então, a sociedade quer.
A gente não está ainda nessa larga escala dos milhões de hectares por esses vários gargalos de que já se falaram antes, mas conseguimos chegar lá, e por essa questão de que os diferentes modelos estão em diferentes velocidades. Tem alguns modelos que já conseguem ser aplicados numa escala maior e outros que ainda estão numa escala menor. A gente tem que avançar nessa velocidade para todos esses modelos, os ecológicos, os produtivos, os mistos.
Considerando também a diversidade dos biomas, as fitofisionomias do Cerrado, as não florestais, têm seus desafios, também as suas particularidades, de plantar capim, de plantar formações que não são florestais. Mas, de novo, já existem experiências, já existe conhecimento, é possível fazer.
Destaquei aqui também algumas experiências, algumas estaduais: o Reflorestar, que é do Governo do Espírito Santo; o programa Nascentes, do Governo do Estado de São Paulo; e algumas experiências do setor privado também, a re.green, de novo, Caminhos da Semente, Belterra. Então, os exemplos estão aí, as experiências estão aí, e é possível, sim, fazer e plantar os 12 milhões ou mais milhões de hectares de que o Brasil e o mundo precisam. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. Bloco/PT - SP) - Muito obrigado, Laura.
Eu convido agora Jarlene Gomes, que é pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia.
Dez minutos, Jarlene.
A SRA. JARLENE GOMES (Para expor.) - Obrigada, Deputado. Muito obrigada pelo convite, pelo espaço deste rico debate.
Pegando o teu gancho, Laura, sobre o entendimento, eu vou contar uma rápida história. O Ipam tem alguns projetos de recuperação de áreas no Estado do Pará, no Acre e no Mato Grosso, e isso, em parceria com alguns estados. Antes de a gente implementar esses projetos, a gente vai às áreas entender as demandas e as realidades dos produtores. E, ao visitar uma área, Deputado, a gente viu uma iniciativa de restauro com sistemas agroflorestais. Aí, eu perguntei para ele: "Por que o senhor decidiu abrir mão da sua área, já, de pastagem aberta para investir em um sistema agroflorestal?". Ele disse: "Porque, primeiro, eu ganho mais dinheiro, porque eu estou vendendo cacau, açaí, banana e tudo em um período diferente. E, segundo, quando eu só tinha pasto, eu não tinha água, as nascentes secaram. Agora, você pode ver que a água está nascendo aqui de novo, e a gente tem aqui um solo rico, um solo mais fértil, em que eu consigo produzir".
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Então, eu queria iniciar falando que é possível, sim, com pouco incentivo, mas a gente precisa, de fato... Eu entendo totalmente a fala da Secretária Andréa, porque a gente precisa ter ali as condições necessárias, desde a parte de cadastro, análise, até a parte de como você gera as condições de realmente ter a recuperação.
Felipe, eu fiquei muito feliz com a tua apresentação, porque a Embrapa está fazendo um trabalho excelente, com soluções ricas, para a gente avançar nessa agenda.
Entrando na pauta, a primeira coisa que eu quero destacar é que, dentro do Observatório do Código Florestal, a gente produz vários dados a partir da ciência; e a gente quer trazer principalmente a importância e o uso desses dados e informações. Para que a gente usa? Primeiro, a gente quer promover a transparência e que tenham mais clareza de como a gente consegue implementar essas legislações socioambientais, subsidiar as tomadas de decisão públicas, e privadas também, sobre o uso sustentável dos recursos.
E, Secretária Andréa, a gente também quer dar a mão aos estados, como a gente faz - o Secretário Rodolfo também está ali -: apoiar, aumentar a capacidade de resposta do estado, os sistemas, o que está por trás de uma análise dinamizada. Então, esse também é o nosso papel no trabalho do Observatório.
Eu trouxe a questão do cadastro. Só para lembrar, o cadastro surge como uma ferramenta muito rica, principalmente de planejamento ambiental. E, nesse planejamento, a gente não olha somente a questão ambiental; há um olhar de paisagem da questão econômica, do combate ao desmatamento, ordenamento territorial, de que a gente pouco tem falado, mas que é fundamental para a gente conseguir implementar várias das políticas públicas.
As bases de dados permitem avaliar, principalmente, a adequação das propriedades e os parâmetros do Código Florestal, e são um importante instrumento de implementação da política pública.
E, Deputado, várias pessoas falaram do desafio da análise e validação. A análise e validação vão mostrar o quê? É o passo seguinte: o que está em conformidade com o Código Florestal - quais são as áreas de passivo, de ativo, de excedente.
Dentro do Observatório, a gente lançou o termômetro do Código Florestal, uma plataforma de análise dos dados da implementação do Código. O objetivo dele é fornecer informações consolidadas para contribuir com o entendimento da implementação. Então, a gente não substitui a informação da análise do estado, mas a gente traz uma estimativa de como está essa conformidade do Código Florestal em cada estado. O nosso filtro é estado, município e bioma e também assentamentos e povos e comunidades tradicionais.
Aqui é para mostrar como que a gente faz isso. Primeiro, a gente analisa os cadastros. A gente tem uma rede de atores, que formam o Comitê Técnico do Observatório, em que estão o Imaflora, o ISA, o Centro de Inteligência Territorial, o ICV. E cada um com a sua expertise, Deputado, agrega para a geração dessas informações.
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Dentro do termômetro, a gente traz três camadas de informações: primeiro, de imóveis rurais, territórios tradicionais e assentamentos. E dentro dessas três camadas, a gente divide a informação ali, para ter um olhar para o Brasil como um todo, para biomas, estados e municípios.
Por fim, a gente olha qual o tamanho da área cadastrada, o balanço, trazendo ali as principais informações, mas também tem um olhar para as sobreposições, que a gente sabe que é um dos desafios também do Cadastro Ambiental Rural.
Na plataforma, a gente tem os dados bem detalhados, a metodologia, e eu trouxe alguns grandes números. Em termos de cadastramento, a gente tem ali o cadastramento de imóveis rurais, de PCTs. Como o Raoni colocou na fala dele, a malha está bem coberta, só que a gente tem alguns conflitos nas sobreposições, então, a gente qualifica também essa informação. A gente traz a informação da área cadastrada por bioma, então, o Cerrado tem cerca de 150 milhões de áreas cadastradas de imóveis rurais, que são 36% do total do que tem cadastrado no Brasil de área e os dados de sobreposições.
E aí eu chamo a atenção para as sobreposições com imóveis rurais, que são mais de 52 milhões. A gente traz esses dados qualificados. Então, do montante de sobreposições, o que está sobreposto com o quê? No Brasil, a gente tem essas sobreposições também com terras indígenas, com unidades de conservação, com áreas quilombolas, assentamentos e, com as florestas públicas, tem uma área superior a 51 milhões de hectares.
A gente traz esse destaque em termos dos imóveis rurais que estão sobrepostos com florestas públicas não destinadas. A gente sabe que esse é um dado para o qual a gente precisa de muita atenção, porque, no Brasil, cerca de 30% das sobreposições estão nessas áreas de florestas públicas não destinadas, Deputado. Isso soma uma área superior a 15 milhões.
Eu não poderia deixar de falar do Estado do Amazonas. O Marcelo trouxe aquela informação de que são cadastros recentes que entraram nessa base. Então, a maior sobreposição está ali no Estado do Amazonas, em florestas públicas não destinadas, que é uma área superior a 13 milhões de hectares.
Dentro do termômetro, a gente tem um dado muito intuitivo para você olhar e entender o que a gente está querendo trazer de mensagem. Então, a gente tem os números do total de remanescente de Reserva Legal, de APP, o passivo de Reserva Legal de APP também e o número de excedentes. Com esses números... Não são números exatos porque não é uma análise real, é uma modelagem para fazer essa estimativa, mas você consegue entender e direcionar para a política pública os esforços que a implementação do Código Florestal precisa ter, olhando para esses números. Ali você consegue ver por imóvel rural pequeno, médio e grande. Lembro que temos esses números também para assentamentos rurais. Trazendo essa parte da conformidade com o código, dessas estimativas, a gente tem o remanescente de APP, que está em torno de 8,5 milhões de hectares, e o remanescente de Reserva Legal, que soma ali mais de 111 milhões de hectares. Então, esses são os números de vegetação nativa.
A gente tem essa distribuição por bioma também: a Amazônia concentra 48% dessa vegetação nativa, e a gente tem detalhado por cada bioma.
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Aqui são os números do passivo, Deputado. Então, a gente mostra assim: olha, a gente tem um desafio grande, que é o tanto de área que...
(Soa a campainha.)
A SRA. JARLENE GOMES - ... precisa ser recuperada no Brasil. E aí eu vou... Depois, vocês vão poder visitar um pouco melhor a plataforma e entender com mais detalhes.
Então, de APP, a gente tem 33% do passivo de APP em imóveis rurais na Mata Atlântica. É um número também que chama a atenção. De reserva legal, a gente também tem esses números.
Eu vou passar um pouco mais rápido, mas esses números aqui também são interessantes, Deputado, de a gente trabalhar, porque são os números de excedente da reserva legal. Então, a gente tem ali que cerca de 39% da reserva legal, de excedente, estão no Cerrado. E o Cerrado a gente sabe o quanto está sendo ameaçado, principalmente essa área de excedente. Isso a gente pode discutir um pouco melhor em outro momento.
E aí, Deputado, ainda dentro dessa iniciativa, a gente traz um dado sobre transparência, transparência sobre área embargada - e a gente faz o cruzamento dessa área embargada com o CAR, trazendo ali por categoria fundiária também, no Brasil, como essas áreas se sobrepõem. A gente traz também a autorização de supressão de CAR, cruzando ali com o CAR - e, aí, a gente vê que, em alguns estados, é como se não tivesse autorização. Mas para isso aqui eu quero chamar a atenção, que é um desafio na transparência, no fornecimento das informações para que a gente possa cruzar juntamente com o CAR.
E avançando aqui sobre a transparência e abertura de dados públicos, que é uma pauta também do Observatório, a gente quer que esses dados sejam usados para estimular práticas sustentáveis, ampliar a disponibilidade de dados públicos para a gente conseguir fazer esse tipo de análise, melhorar a acessibilidade e qualidade dos dados abertos e proporcionar uma maior integração das informações.
E aí, Suely, a gente fez um exercício preliminar dentro da iniciativa do Observatório, que é o seguinte: se a gente olhar para os estoques dos gases de efeito estufa, que são dados do Seeg, olhando para o passivo de APP e passivo de reserva legal, a gente tem ali um passivo total de mais de 19 milhões de áreas. Desse passivo, se ele for restaurado, a gente tem ali aquele valor de toneladas de carbono que serão removidas - isso se for restaurado. Então, esse é um dado também importante, que a gente ainda vai aprofundar, mas só para trazer essa discussão aqui para a gente.
E, olhando para o excedente, que é a área de risco, principalmente com o PL nº 3.364, que você citou, Suely, que propõe ali a redução da reserva legal, a gente teria aqui... A gente tem, hoje, mais de 79 milhões de excedentes, a partir dessa análise que a gente fez, e, uma vez que esse excedente não seja protegido, que não tenha incentivos para a sua proteção, a gente corre o risco de emitir esse tanto de toneladas de carbono. Então, é um dado também que a gente está cruzando para chamar a atenção sobre como é importante a implementação do Código Florestal.
E, por fim, trazendo aqui algumas considerações, eu acompanho muito os estados - viu, Secretária? - e a gente sabe o quanto a segurança jurídica, inclusive para o técnico da análise, é fundamental.
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Então, a gente precisa de mais protocolos, de mais regulamentação, de mais orientações de como vai ser feita essa análise, para a gente conseguir avançar nas demais etapas.
As regulamentações. Temos uma oportunidade no Código Florestal, que é o Capítulo X. Esse capítulo é fundamental no avanço da implementação do Código, porque traz o programa de apoio, o incentivo à preservação e à recuperação do meio ambiente.
Senhores, aqui está contido o art. 41. O art. 41 traz várias possibilidades, inclusive de pagamento por serviços ambientais. Eu não vou me aprofundar muito aqui, mas tem muitas oportunidades que precisam ser olhadas para avançar nessa implementação. E a gente precisa que o CAR seja olhado tanto como um instrumento de planejamento ambiental, mas também que se conecte com outras políticas: as políticas produtivas, as estruturações da cadeia, como bem a Laura trouxe. Para você restaurar, precisa de toda uma cadeia, desde a semente até chegar ali ao mercado. Porque, se eu produzir e não vender, não vou ter estímulo para continuar com essa cadeia. Então, a gente precisa ter esse olhar de paisagem para apoiar a geração de informações de melhores práticas e a transição para um modelo de desenvolvimento econômico com conservação, como muito bem foi colocado por vários colegas aqui.
Então, essas são as principais mensagens.
Mais uma vez, eu agradeço.
Estamos à disposição para discutir no âmbito do Observatório do Código Florestal e do Ipam. Obrigada! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Nilto Tatto. Bloco/PT - SP) - Muito obrigado, Jarlene.
Chegando ao final desta audiência, primeiro, percebemos a riqueza das contribuições, da diversidade aqui exposta, dos desafios, evidentemente, que a gente tem para fazer acontecer na prática o Código Florestal, depois de toda a concertação que foi feita lá em 2012.
Aqui é uma Casa política. Evidentemente, a gente tem gargalos do ponto de vista técnico para a implementação, do ponto de vista burocrático. É uma Casa política, portanto, precisa trabalhar no sentido de fazer valer o entendimento de todos de que o Código precisa ser implementado. Mas é importante a gente perceber, inclusive, nuances das falas, às vezes, de Parlamentares, quando se escondem atrás ou generalizam uma determinada realidade para escamotear ou não querer enfrentar os problemas.
Eu vou citar exemplos. É diferente... Eu lembro que, quando meu pai tinha uma pequena propriedade, a gente fazia a roça com enxada, facão, foice e arado puxado por junta de boi; a gente tem ainda um pouquinho dessa realidade. Esses aí, provavelmente, têm até conhecimento sobre quais são as variedades e as espécies que precisam colocar lá, esses até têm. Mas, às vezes, não têm a consciência da importância de recuperar e da preservação permanente. Quantos são no Brasil esses? Tem gente hoje que usa drone para tudo - para tudo. Drone! Esses não têm conhecimento da legislação. Tem gente que tem dez, quinze, vinte, trinta, cinquenta hectares - ou até alqueires, dependendo da região -, mas tem gente que tem 10 mil, 50 mil, 100 mil.
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Tem CAR feito em cima de terra pública - CAR feito em cima de terra pública. Eu estou falando isso porque, nesta Casa política, quando se juntam para aproveitar... Por exemplo, na prorrogação do PRA - que está vencendo de novo agora, não é? -, em alguns momentos, vieram artigos para a regularização fundiária, regularização fundiária de terras públicas. Então, tem esses - sabe? -, esses que foram colocados aqui, como CAR em terra pública. Daqui a pouco vai vir um projeto, uma emenda para regularizar aquele CAR como propriedade daquele que colocou um CAR em cima.
O que eu estou dizendo aqui é: quando é para defender esses que têm condições de fazer a sua lição de casa, a sua parte, aqui dentro tem uma força política que se junta para fazer e muitas vezes tem base, tenta produzir base teórica através das suas organizações para poder tentar convencer a sociedade de que não dá para implementar o CAR, não dá para avançar, não dá para fazer aquilo; que tem que trazer e retrazer aqui, mudar inclusive o Código, para trazer para o Código a situação que estava lá em 2012, das APPs, aí nega a importância da APP, nega a importância da reserva legal.
Aqui é uma Casa política, em que, por trás, às vezes, dessas coisas, dessas ideias, há o não querer implementar. E aí não adianta dizer... Quando vêm setores, falam assim: "Fale a verdade". Eu estou falando, porque foi por isso que eu falei assim: não é todo o setor produtivo, mas é todo o setor produtivo que sofre as consequências da minoria que não faz a lição de casa. O problema é que a representação política aqui sai em defesa da minoria que não faz a lição de casa. Entenderam qual é o problema? Aí, é muito fácil ter o escudo de dizer: "Estão criminalizando o agro". Ninguém criminaliza o agro; criminalizam o ogro, e o ogro é a minoria, que mancha a imagem do agro, que mancha, que não quer colocar adiante.
É neste sentido que a gente quer fazer o debate das ideias aqui: colocar claramente, para poder definir claramente, porque aqui fica muito exposto, às vezes. Tem desafios tecnológicos para fazer, mas às vezes é possível superar o desafio tecnológico quando se tem vontade política de fazer, quando se tem esforço. Eu imagino que todo o investimento que tem do Estado brasileiro para o setor... E tem muito; tem muito subsídio, porque tem força política que consegue isso no orçamento. A gente sabe dessa realidade. Poderia ter um esforço muito grande do setor. Estou falando das corporações que ganham muito dinheiro, do sistema financeiro que ganha muito dinheiro, inclusive, que financia os grandes empreendimentos do agro, porque não é só o setor produtivo, o setor financeiro está lá dentro. Esse esforço nós deveríamos concentrar para poder acontecer, para o bem do agro, para o bem do país - para o bem do agro e para o bem do país. É isso que nós precisamos fazer e é nesse sentido que a gente organizou esse seminário, para ter essas contribuições aqui, para a gente tentar avançar. Mas, para avançar, nós precisamos enfrentar na política aquilo que segura, aquilo que trava, aquilo que não deixa avançar a lei, porque nós precisamos superar, superar e dar como entendido, como acordado, o que foi feito lá em 2012. Se a gente não dá como acordado o que foi feito lá, a gente não avança.
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Muitos aqui falaram... Os ambientalistas, na semana seguinte inclusive, falaram, entraram com ações, mas pega a trajetória dos ambientalistas que acompanham aqui, como avançaram no sentido do diálogo, de tentar buscar solução, de tentar construir alternativa, de tentar construir tecnologia. Não era papel de ambientalista ficar fazendo isso, mas foram para campo, exercitar para fazer acontecer. Isso é esforço no sentido de buscar caminhos.
O que a gente viu de determinados segmentos da política, da representação daqueles que falam que representam o agro? A radicalização no sentido de falar o seguinte: "Estão querendo mexer com a nossa propriedade, não temos direito de fazer o que a gente quer na nossa propriedade". É esse o discurso. E aí não pode.
Se for nesse caminho, daqui a pouco vão querer mudar a própria função social da propriedade, achando que podem fazer qualquer coisa. Como exemplo do colega Parlamentar que disse: "O cara tinha lá 30m da propriedade dele na beira do rio, e ele não podia fazer nada". Não pode fazer nada, não pode, ele tem que ser tirado de lá. O Estado tem que dar outro lugar para ele. Por que ele não pode fazer nada? Porque ele vai ferrar com quem está ali para baixo; e com outros, consequência.
Agora, para quem acha que, na propriedade dele, tudo pode, ele não está nem aí com o que vai acontecer lá para baixo, ele quer fazer a coisa que ele tem que fazer lá. Essa mentalidade precisa mudar - essa mentalidade precisa mudar. É esse o grande esforço que todos nós precisamos fazer.
Antes de encerrar, eu quero informar que as participações feitas por meio do e-Cidadania ficarão disponíveis na página da Comissão.
Antes de encerrar também o nosso trabalho, submeto à deliberação do Plenário a dispensa da leitura e a aprovação da ata desta reunião.
Os Parlamentares que aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
Nada mais havendo a tratar, agradeço a presença de todos e declaro encerrada a presente reunião.
Muito obrigado a todos vocês que estiveram aqui com a gente. (Palmas.)
(Iniciada às 14 horas e 18 minutos, a reunião é encerrada às 17 horas e 10 minutos.)