Notas Taquigráficas
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| R | O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta da 12ª Reunião, Ordinária, da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura. Conforme a pauta publicada, a reunião será dedicada à audiência pública, em atendimento ao Requerimento 14/2024, da CRE, de autoria da Senadora Tereza Cristina, com a finalidade de receber como convidado o Exmo. Sr. Celso Amorim, Assessor-Chefe da Assessoria Especial da Presidência da República, para tratar de sua atuação como enviado do Brasil para acompanhar as eleições presidenciais na Venezuela. A reunião, como todos sabem, será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania, na internet, em senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria (0800 0612211). Eu tenho a honra de cumprimentar o convidado para integrar esta mesa de trabalho, Exmo. Sr. Embaixador Celso Amorim. Esclareço a todos as diretrizes que seguiremos. Inicialmente será dada a palavra ao convidado pelo tempo de até 30 minutos para sua exposição inicial. Em seguida, abriremos a fase de interpelações pelas Sras. Senadoras e pelos Srs. Senadores inscritos, pelo prazo de cinco minutos, em blocos de três interpelantes. |
| R | Na sequência, o convidado terá um prazo de cinco minutos para a resposta. Por fim, poderá ser concedida réplica ou tréplica, com o limite de até três minutos para ambas. Como disse anteriormente, a presente reunião é consequência da aprovação do requerimento da Senadora Tereza Cristina, com a finalidade de ouvirmos o ex-Ministro e Assessor Especial, Embaixador Celso Amorim. Nunca será excessivo repetir que nossas relações internacionais são regidas pela Constituição Federal de maneira absolutamente cristalina, um decálogo que, observado e respeitado, sempre nos conduzirá por caminhos seguros e democráticos. Os dez mandamentos da política externa brasileira são exatamente: a independência nacional, a prevalência dos direitos humanos, a autodeterminação dos povos, a não intervenção, a igualdade entre Estados, a defesa da paz, a solução pacífica de conflitos, repúdio ao terrorismo e racismo, cooperação para o progresso da humanidade, concessão de asilos e a integração da América Latina. A eleição da Venezuela, como todos sabem, está sendo observada de perto por todo o mundo democrático. Há múltiplos questionamentos, especulações, contestações, lacunas e, sobretudo, uma opacidade que não colabora em nada para dissipar as dúvidas levantadas por organismos internacionais, agentes públicos e privados mundo afora, entidades civis, organizações não governamentais, entre outras. A transparência é um componente indissociável da legitimidade de qualquer pleito. Onde há sombras, onde falta luz, as suspeitas se multiplicam e ampliam a sensação de que lá não se vive uma democracia plena e, como se sabe, não existe democracia relativa. Para dar início ao debate, eu tenho a honra e a satisfação de conceder a palavra ao Exmo. Sr. Embaixador Celso Amorim. V. Exa. dispõe de até 30 minutos. O SR. CELSO AMORIM (Para expor.) - Exmo. Sr. Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal, Senador Renan Calheiros, é um prazer estar novamente aqui com V. Exa.; Exmos. Srs. Líderes do Governo no Congresso Nacional, Senadores Jaques Wagner e Randolfe Rodrigues; Exma. Sra. Senadora Tereza Cristina, autora do convite que me traz aqui hoje, na pessoa de quem cumprimento os demais Senadores e Senadoras e todos os presentes, é uma honra e também uma satisfação voltar ao Senado Federal, onde já tive o prazer de estar em diversas ocasiões, inicialmente como Chanceler do Presidente Itamar Franco, depois do Presidente Lula e como Ministro de Defesa na gestão da Presidenta Dilma Rousseff. Hoje venho numa posição distinta, de Assessor Especial do Presidente da República. Como gosta de dizer o próprio Presidente Lula, eu fui incumbido de ser o seu assessor para assuntos conflituosos, que então são, por definição, difíceis e muito polêmicos. |
| R | A política externa do atual mandato do Presidente Lula representa uma volta do Brasil ao mundo e aos princípios da diplomacia brasileira, que acabam de ser enunciados pelo Presidente. Na minha nova função, tenho tratado de exercitar um desses princípios, a defesa do diálogo e da paz, uma diretriz que tradicionalmente pautou a atuação externa do Brasil. Desde janeiro de 2023, temos recuperado a nossa vocação universalista. As três primeiras viagens que o Presidente Lula fez, nesse seu terceiro mandato, foram muito simbólicas. O primeiro destino, ou melhor, dois destinos, foram a Argentina e o Uruguai, representando a prioridade que conferimos ao nosso entorno regional. Os destinos seguintes foram os Estados Unidos e a China, mostrando que somos avessos a rivalidades geopolíticas e alinhamentos automáticos. Dialogamos com todos. Só neste ano de 2024, o Presidente recebeu chefes de Estado e de governo de quatro países europeus - Espanha, França, Croácia e Itália - e visitou cinco países da América do Sul - Guiana, Colômbia, Bolívia, Paraguai e Chile. Na nossa região, encontramos um cenário muito mais difícil do que nos mandatos anteriores do Presidente Lula e mesmo no mandato do Presidente Itamar, a quem também servi como Ministro do exterior. Entre 2002 e 2015, os países tinham divergências políticas, mas sabiam que a nossa união traria benefícios concretos para todos. O exemplo que sempre damos é de Hugo Chávez e Álvaro Uribe, polos opostos em termos ideológicos, mas que eram pessoas capazes de dialogar e procurar soluções para os problemas, e nós mesmos estivemos muitas vezes envolvidos nessa discussão. Estamos empenhados em reconstruir esse ímpeto. No ano passado, fizemos uma primeira reunião de presidentes sul-americanos desde 2014. Eu acho que é desnecessário sublinhar a importância geopolítica, econômica e social da América do Sul. Nós falamos América Latina, mas a América do Sul é a nossa casa mais imediata. Por exemplo, vejo esforços muito grandes na integração - sobretudo da nossa Ministra Simone Tebet - na parte de infraestrutura. Dessa reunião do ano passado, resultou um mecanismo chamado Consenso de Brasília, que tem promovido discussões sobre questões importantes que atravessam fronteiras e demandam ações coordenadas como infraestrutura, respostas a desastres naturais e segurança pública. Paralelamente, continuamos engajado em reorganizar a Unasul. Eu sei que a Unasul desperta muita polêmica, mas, só para lembrar dois ou três organismos muito importantes: o Isags, que era o Instituto de saúde sul-americana, com sede no Rio de Janeiro; o Conselho de Defesa Sul-Americano, que contribuiu muito para evitar conflitos, inclusive entre a Venezuela e a Colômbia, dirigidos por países com visões opostas, e a parte toda de infraestrutura também, que já tinha uma origem mais antiga. Um dos maiores desafios da integração regional hoje é, precisamente, o processo político venezuelano. Temos um histórico de contribuições construtivas à solução de impasses políticos na Venezuela. |
| R | A minha primeira visita à Venezuela como Chanceler foi ainda com o Presidente Itamar Franco, quando assinamos - talvez lembre o Senador -, nessa época, o acordo de La Guzmania, que foi o primeiro grande acordo, uma grande declaração, quase numa reunião conjunta entre os gabinetes venezuelano e brasileiro, e um esforço, o começo de um esforço de olhar mais para a parte norte da América do Sul, que sempre ficou um pouco abandonada em função da prioridade natural do Prata. Mas, já mais adiante, logo no início do primeiro mandato do Presidente Lula, ajudamos a encaminhar a crise que seguiu à tentativa de golpe contra Hugo Chávez, em 2002. Só para lembrar, em meados do último ano do Presidente Fernando Henrique Cardoso, houve um golpe de Estado, chegou a ser reconhecido por alguns países - pela Espanha, pelos Estados Unidos - e o Brasil, o Presidente Lula, quando chegou à Presidência, coordenadamente com o Presidente Fernando Henrique, começou as primeiras ações de apaziguamento interno. Mas uma delas, já de responsabilidade do Presidente Lula, foi a criação do Grupo de Amigos da Venezuela. Eu chamo atenção por esse ponto, embora já pareça longínquo, há mais de 20 anos, mas eu chamo atenção por esse ponto, porque na época havia dúvidas e o próprio Presidente Chávez queria a criação de um grupo de amigos, mas foi preciso o Presidente Lula - o grupo de amigos deles incluiu o Brasil, o Chile talvez, mas talvez a Rússia - dizer a ele que não era um grupo de amigos do Chávez, era um grupo de amigos da Venezuela. E por isso, nesse grupo, nós incluímos os Estados Unidos, incluímos a Espanha - do Primeiro-Ministro Aznar, que tinha reconhecido o governo do golpe -, incluímos Portugal, que também tinha um governo de direita, além de Chile e México. E, graças à atuação desse grupo de amigos, liderada pelo Brasil, pelo Presidente Lula, especificamente, foi possível convocar um referendo revogatório, que é previsto na Constituição venezuelana, mas que não estava sendo muito... não era objeto de muito empenho, nem dele nem de outros, porque outros desejavam outras soluções, uns queriam um plebiscito imediato, outros queriam novas eleições. Mas, finalmente, foi possível convencê-lo a convocar o referendo revogatório, que ocorreu em 2004, meados de 2004. E não só isso, mas também uma observação internacional muito forte, sobretudo da própria Organização dos Estados Americanos, então chefiada pelo ex-Presidente Gaviria, da Colômbia. Naquela época, a OEA gozava de uma reputação, para dizer francamente, melhor que a de hoje, depois do que aconteceu nos episódios na Bolívia. Então foi possível fazer isso, houve uma certa resistência do Presidente Chávez, mas finalmente nós conseguimos, e quem chefiou a missão da OEA foi um brasileiro, que era o nosso embaixador na Organização dos Estados Americanos. Enfim, então foi um esforço muito grande, mas de grande cooperação, obviamente, sempre com a orientação do Presidente. Eu falei várias vezes, inclusive, com Colin Powell, trocamos correspondências, chegou a haver uma situação em que o Colin Powell deu para mim - ou melhor, deu para que fosse lido pela minha assessoria - um discurso que ia ser feito no Congresso americano e que poderia agravar um pouco a situação. Foi uma coisa, assim, pouco comum o Brasil dar nihil obstat para um pronunciamento interno americano. |
| R | Mas, enfim, o fato é que houve isso. Obviamente, isso conseguiu abrandar a situação naquele momento, mas seguiram-se outras eleições e as dificuldades não desapareceram. A sociedade venezuelana - quem já esteve lá sabe- é muito dividida e acho que uma das coisas que deixaram de ocorrer foi uma tentativa mais forte de unificar a sociedade. Ela continua muito dividida até hoje e isso é, digamos, para mim, a raiz desses problemas que também se expressam no plano político. Bem, não preciso contar todos os problemas que surgiram depois. Houve fortes crises na Venezuela, houve algumas eleições - algumas tiveram, digamos assim, uma vantagem muito clara, como foi a do Chávez com o Capriles, mas já na do Maduro com o Capriles foi muito apertado. A morte do Presidente Chávez também deixou o próprio governo com uma liderança menos nítida, afinal o Chávez era quem tinha feito as grandes transformações e promovido a nova Constituição. E isso coincide também com o momento em que o Brasil meio que se afasta um pouco da Venezuela. E isso, penso eu, também não contribuiu para os eventos que se seguiram. Houve a eleição de uma assembleia de oposição e uma Assembleia Nacional Constituinte, criando - digamos - um duplo poder legislador, que, evidentemente, não é positivo. Bem, depois disso, com grande... a Venezuela sempre é objeto de um grande isolamento externo, ao contrário do que tinha acontecido nos anos do Chávez, pelo menos até certo ponto. Houve a autoproclamação do Juan Guaidó como Presidente interino, em 2019, com muita resistência interna também e uma atuação internacional complexa. Por exemplo, a Venezuela até hoje não é membro da OEA. O Guaidó se foi, mas a Venezuela saiu e não voltou. Então, por exemplo, quando se vai votar uma resolução sobre a Venezuela na OEA, eu, pessoalmente, tenho sérias dúvidas com a resolução sobre um país que não é membro. Bem, mas o fato é que faltou um pouco de diálogo nesse período. E o que nós procuramos fazer - já chegando ao período mais próximo, já agora em... Só vou dar um pequeno dado sobre o comércio para também se ter uma noção de como chegou a ser importante a relação com o Brasil. Chegou, em 2012, o comércio - e quase totalmente exportações brasileiras, porque a gente exporta muito pouco -, a US$6 bilhões. A Venezuela foi o terceiro ou quarto maior mercado do Brasil em determinado momento. E ela caiu em um total de 90%. Está recuperando um pouquinho, mas ainda é muito pouco. Eu acho que o ano passado foi cerca de US$1,5 bilhão, mas isso é depois já de um esforço de recuperação. Bom, eu só quis fazer esse parêntese para se ter uma ideia da grandeza. Mas, ao mesmo tempo que nós perdemos mercado, nós perdemos também, com o isolamento, fontes de informação próprias. O Brasil tinha muito poucas fontes de informação dele, e isso, obviamente, também reduziu muito a nossa capacidade de influência. Eu não vou já entrar no mérito de certas ações, mas foi muito dramática, por exemplo, a participação do Brasil na chamada intervenção humanitária. |
| R | Eu acho que foi muito um gesto muito dramático. E, na minha opinião - eu tenho 60 anos aqui de diplomacia -, nós chegamos muito perto de uma guerra, porque uma guerra você nunca sabe como começa, e menos ainda como acaba, porque, às vezes, ainda que em uma entrada com boa intenção no território de um outro país, pode haver um tiro e pode haver algum episódio, e isso desencadeia um conflito que pode ser muito perigoso. Bem, desde janeiro de 2023, nós fizemos um esforço para restabelecer as relações com a Venezuela. A mando do Presidente Lula, eu viajei a Caracas e fui recebido pelo Presidente Nicolás Maduro, mas, nessa ocasião, eu fiz questão também de ver a oposição. Estive com o coordenador da oposição, da plataforma unificada, Gerardo Blyde, com quem mantive contato permanente e tenho mantido, como mencionarei mais tarde. Enfim, nosso interesse era trazer a Venezuela de volta para a América do Sul e, com isso, poder exercer alguma influência, porque à distância, com isolamento, não há influência possível. Pouco depois, no mês de abril, eu fui a Bogotá, numa conferência que os colombianos organizaram sobre a Venezuela. E o maior interesse aí era poder ter contato também com atores de fora, sobretudo da União Europeia, como Josep Borrell, e também com os norte-americanos - embora o contato com os norte-americanos nunca tenha sido interrompido. Eu vou mencionar mais adiante fatos específicos, se houver tempo, mas cito o meu contato - e nosso contato na assessoria, digamos - com o assessor de segurança nacional norte-americano, que é um cargo lá muito importante - basta lembrar que o Kissinger foi assessor de segurança nacional. Eu tenho contato constante com ele, e Venezuela é sempre um tema, para justamente procurar ver se há uma solução para as questões que se colocam. Em junho, houve uma cúpula organizada pelo Presidente Macron - o Presidente Lula participou como copresidente, na realidade, da reunião -, em que mais uma vez esteve presente a oposição, representada pelo Gerardo Blyde, e da qual participou também a Vice-Presidenta venezuelana, Delcy Rodríguez. Nada disso é fácil, nada disso se resolve, nada disso é uma solução definitiva, mas é um diálogo. E o diálogo vai ajudando a superar alguns problemas. Em outubro, eu estive novamente, a mando do Presidente Lula, em Caracas... Perdão, em outubro, eu estive, a mando do Presidente Lula, em Barbados, como representante do Brasil, para testemunhar a assinatura do acordo de promoção dos direitos políticos e garantias eleitorais entre o governo e a oposição. Esse acordo estabeleceu uma série de medidas para assegurar eleições justas, desde a revisão das inabilitações até o levantamento de sanções. Claro que passar do papel para a realidade é um esforço muito grande, mas, de qualquer maneira, havia ali diretrizes e uma expectativa de que se pudesse avançar. Pouco depois, eu voltei à Venezuela, a mando também o Presidente, como sempre, para conversar com o Presidente Chávez... Presidente Maduro, que me recebeu na sua residência - aliás, para mim, surpreendentemente modesta, dentro de um quartel. |
| R | E lá a conversa principal foi sobre um assunto novo, que eu não sabia que ia aparecer - e quer dizer, o assunto mesmo é antigo, mas o fervor do assunto era novo -, que é a questão de Essequibo. A Venezuela tem uma reivindicação histórica sobre uma parte do território da Guiana, que é mais da metade, na realidade, do território guianense. E, em meio a esse processo eleitoral, essa questão, que estava meio dormente... Ela nunca desapareceu. Eu fui, jovem, secretário na Organização dos Estados Americanos, quase 50 anos atrás, e já se reclamava disso. Não é porque era um governo de esquerda; é uma questão aberta, mas ela estava meio dormente. Você chegava à Venezuela, via o mapa assim um pouquinho hachurado, que era a região de Essequibo, mas não era uma questão viva; pelo contrário, o Presidente Chávez tinha uma relação próxima com o Caribe, muito próxima com os países do Caribe, e isso incluía a Guiana. Eu não posso julgar - não estou dentro da cabeça das pessoas -, mas talvez, por causa da iminência do processo eleitoral, haja uma nova ênfase nesse problema de Essequibo. Só para lembrar, a Venezuela perdeu esse terreno, ou pelo menos considera que perdeu essa parte do terreno, por uma decisão, na época, em um enfrentamento com o Reino Unido - a Inglaterra, como se dizia mesmo na época - e com a Rainha Vitória. Era impossível. O Brasil também perdeu um pedaço, não tão grande, mas, de qualquer maneira, o Brasil aceitou. O Brasil, que é um país que tem dez fronteiras, tem uma política de pacta sunt servanda - "não vamos mexer nas nossas fronteiras, deixem tudo como está; queixas antigas, não". Enfim, não estou questionando a legitimidade da reivindicação venezuelana, mas o seu aquecimento, digamos assim, no momento pré-eleitoral é uma questão complexa. Basta lembrar do que aconteceu na Europa nos anos 30. Enquanto a questão de fronteira é tratada por diplomatas, ela é uma questão meio técnica, que sempre tem alguma reverberação política; mas, quando ela se torna um tema popular, ela é extremamente perigosa - extremamente perigosa. Eu disse isso ao Presidente Maduro, e ele me respondeu até de uma forma um pouco jocosa, que eu repito aqui apenas para... Disse assim: "Pode levar ao Presidente Lula a mensagem de que eu não sou Saddam Hussein, e a Guiana não é o Kuwait", enfim, como quem diz "não vai haver nada". Mas, ao mesmo tempo, ministros seus falavam que, se houvesse o plebiscito e se ele fosse vitorioso, as forças armadas ganhariam um mandato, algo assustador. E isso foi dito a eles várias vezes, nas várias reuniões, inclusive em uma imediatamente depois, em São Vicente e Granadinas, da qual participei, como representante do Presidente Lula, e na qual se chegou a um acordo que não resolveu propriamente a substância do problema - nem creio que ele vá ser resolvido -, mas pelo menos impediu que houvesse ou dificultou que houvesse um agravamento realmente de natureza militar. Essa questão é uma questão em aberto e muito perigosa. É uma questão que merece ser olhada com atenção, inclusive pelos Srs. Senadores e Sras. Senadoras. Eu retornei à Venezuela para acompanhar o processo eleitoral. Estive em Caracas dos dias 26 a 30 de julho. Procurei, durante todo período, manter contato com o governo e com a oposição. |
| R | Ao chegar, fui recebido pelo Chanceler... E era uma exigência deles, na verdade, porque houve um momento em que eles não queriam receber ninguém. Mas o Presidente Lula insistiu, falou:" Bom, vocês não querem? Está bem, não vai ninguém". Aí, depois, eles mudaram de ideia, desde que o meu primeiro encontro fosse com o Chanceler, o que era normal também. O Chanceler é a porta de entrada, de qualquer maneira, política para um país. Eu estive com o Chanceler Yván Gil. No dia seguinte, conversei separadamente com o negociador do governo, que era o Presidente da Assembleia Nacional, Jorge Rodríguez, e com o negociador-chefe da oposição, Gerardo Blyde, sempre fazendo questão de manter esse equilíbrio. Ambos lados pareceram muito convictos da vitória, embora com muita desconfiança mútua. Não vou tomar muito mais tempo, acho que em cinco a dez minutos eu termino. Também recebi, na residência oficial do Brasil, ex-Presidentes que estavam acompanhando a eleição, entre eles o Presidente do conselho, José Luis Zapatero, da Espanha; Leonel Fernández, da República Dominicana; entre outros. Eu me reuni com integrantes do Centro Carter, com o coordenador da ONU em Caracas e com um dos membros do painel da ONU designado pelo Secretário-Geral António Guterres. Aí tinha dados técnicos sobre como seria a eleição, o que se esperava, etc. Também procurei colher elementos de analistas independentes, vinculados a universidades e institutos de pesquisa. A Embaixadora Glivânia Oliveira, que faz um trabalho admirável, me serviu de grande apoio, assim como os meus colegas que acompanharam. Todos com quem falei, governo, oposição e especialistas, demonstravam, pelo menos para mim, total confiança em relação ao sistema eletrônico da votação. Avaliaram que eventuais intercorrências poderiam ter a ver com fatores humanos não definidos, e não com o sistema propriamente dito. Meu objetivo lá não era atuar como observador eleitoral, até porque eu não dispunha de ferramentas técnicas para isso. Fui como enviado especial do Presidente Lula, com o objetivo de me colocar à disposição, caso surgisse a necessidade de facilitar o diálogo entre governo e oposição. Antes das eleições e durante o tempo em que as urnas ficaram abertas, não chegou ao meu conhecimento nenhum indício significativo de incidentes. Circulei pela cidade e senti um clima até de tranquilidade. No sábado, que era véspera da eleição, fui visitar o Presidente da Assembleia, que era o negociador principal do Presidente, e vi, nas ruas, crianças jogando futebol, o comércio ainda aberto, etc. Comecei a receber relatos de problemas na noite do dia 28 de julho, já depois do término das eleições. Nessa noite, recebi a informação de que os fiscais da oposição não teriam conseguido obter cópias de atas em algumas mesas eleitorais. Transmiti essa informação ao Centro Carter para que pudessem averiguar o ocorrido. Os resultados foram anunciados pelo Conselho Nacional Eleitoral entre 23h e meia-noite. Haviam sido apurados 80% dos votos. Segundo o anúncio, Nicolás Maduro teria ganho por 51,2% dos votos, e Edmundo teria 44,2%. Esses resultados foram atualizados em 2 de agosto, com 99,97% da apuração. Nessa atualização, Maduro contaria com 51,96% dos votos; e González, com 43,18%. Mas as atas não foram apuradas. |
| R | E aí eu quero frisar um ponto que eu acho que é importante: no dia seguinte à eleição, eu me reuni com o Presidente Maduro - pedi uma audiência a ele, que foi prontamente oferecida -, que estava acompanhado pelo Presidente da Assembleia Nacional, Jorge Rodríguez, e com o candidato Edmundo González. Meu colega Audo Faleiro me acompanhou nessa visita. Maduro atribuiu o atraso na divulgação dos resultados - perguntado por mim naturalmente - a um ataque cibernético e sinalizou que apresentaria as atas nos próximos dias - dizendo ele -, como sempre foi feito. Isso são palavras do Presidente Maduro para mim. Estava lá também testemunhando o meu colega Embaixador Audo Faleiro. Na noite do mesmo dia, eu recebi o candidato da oposição, Edmundo González, que foi até a residência da Embaixada do Brasil e reforçou a necessidade de transparência. Ao sair do Palácio de Miraflores, passei perto de uma manifestação. A estrada para o aeroporto chegou a ser bloqueada. Aliás, quando eu saí do aeroporto, perguntaram até se o meu carro era blindado. A estrada para o aeroporto chegou a ser bloqueada, mas, quando fui embora, no dia seguinte, havia resquícios apenas desses problemas na rua. Segundo a missão de verificação dos fatos do Conselho de Direitos Humanos da ONU, 23 mortes teriam sido registradas, já no período pós-eleitoral, e 1260 pessoas teriam sido detidas desde 28 de julho. Aliás, curiosamente, o governo dá um número maior, o que não é o que, em geral, se ouve, provavelmente com o objetivo de criar um temor. O impasse em torno da publicação das atas foi levado pelo governo ao Tribunal Supremo de Justiça do governo. E governo e oposição têm posições distintas sobre o papel da Corte: a oposição argumenta que o órgão estaria invadindo as competências do poder eleitoral; o governo critica a oposição por não ter comparecido à Corte - problemas cuja conciliação não é sempre fácil, também, Senador. A posição no Brasil obedece a princípios muito importantes: a defesa da democracia, a não ingerência em assuntos internos e a resolução pacífica de controvérsias. Por isso, temos insistido na publicação de atas. Não sei se isso agrada ou não ao Presidente Maduro, mas nós nunca deixamos de insistir na publicação das atas. Como disse o painel de especialistas da ONU, a transparência é essencial para a credibilidade de qualquer processo eleitoral. A solução precisa ser construída pelos próprios venezuelanos, e não imposta de fora. O que nós podemos fazer é ajudar nesse diálogo. Estou terminando. Estamos acompanhando de perto esse processo político, porque assumimos um compromisso, como se garante no acordo de Barbados. Mantivemos coordenação com a Colômbia e o México, que são países democráticos, indiscutivelmente, e que também têm diálogo com o Governo de Caracas, porque não adianta ter uma pressão de países que não chegam a conversar. O Presidente Lula falou com os Presidentes López Obrador e Petro no dia 1º de agosto. Nesse dia, foi publicada uma declaração conjunta dos três Presidentes, favorecendo uma solução negociada. Em 8 de agosto, voltou a haver uma declaração, dessa vez dos chanceleres. E, ontem, 14 de agosto, o Presidente falou novamente com o Presidente Petro. Antes de passar ao final aqui, eu gostaria de mencionar também que inclusive o porta-voz do Departamento de Estado norte-americano elogiou muito a ação de Brasil, Colômbia e México, porque são países latino-americanos, cuja palavra é mais bem aceita do que de uma ex-potência colonial ou de uma grande potência, seja ela qual for. |
| R | O Presidente Lula também foi procurado por interlocutores importantes, como o Presidente Biden, dos Estados Unidos, que deve falar com ele hoje ou amanhã, não sei - de qualquer maneira, é uma ligação que ele já aceitou -, o Presidente Macron, da França, com quem ele falou logo depois, e o Primeiro-Ministro do Canadá, Justin Trudeau, com quem ele falou ontem. Ontem ou anteontem? O SR. AUDO ARAÚJO FALEIRO (Fora do microfone.) - Anteontem. O SR. CELSO AMORIM - Anteontem. Também manifestaram apoio aos esforços do Brasil. De minha parte, tenho mantido contato com o Conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan - vai mudar, não sei se já mudou; mas, quando eu falei com ele, ainda era ele -, com o Alto Representante da União para assuntos estrangeiros, Josep Borrell, da Espanha, e com o Conselheiro de Segurança Nacional do Reino Unido, Tim Barrow. Até o Vaticano tem se manifestado. Anteontem recebi, a pedido dele, ligação do Secretário de Estado da Santa Sé, que já trabalhou na Venezuela e conhece bem a realidade do país. Os principais dilemas que temos no momento são a questão da transparência dos resultados e as divergências em torno da atuação do Tribunal Supremo de Justiça. Todos os nossos interlocutores concordam que a prioridade é encontrar uma forma de pacificar o país, que já sofreu com tanta instabilidade. Somos favoráveis à solução que venha do diálogo - é difícil, mas tem que ser tentada. Para explorar o caminho da negociação, temos que manter capacidade de diálogo com todos os envolvidos. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Nós agradecemos a intervenção inicial do Embaixador. Tenho a honra e a satisfação de conceder a palavra, em primeiríssimo lugar, à Senadora Tereza Cristina, como autora do requerimento de convite ao Embaixador. Com a palavra, V. Exa. A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS. Para interpelar.) - Muito obrigada, Presidente, Senador Renan. Quero aqui cumprimentar, dar um bom-dia muito especial a todos os colegas e dizer que estou feliz com esta audiência hoje, com a presença maciça aqui dos nossos colegas Senadores. Quero cumprimentar, de maneira especial, o nosso convidado, Embaixador Celso Amorim. Seja muito bem-vindo ao Senado. Obrigada por ter atendido ao nosso convite para participar desta reunião aqui na Comissão de Relações Exteriores. Embaixador, ouvindo aí todo o seu relato sobre esses 20 anos em que o senhor participou na diplomacia, indo à Venezuela, conhecendo os problemas até o dia de hoje, isso me dá mais certeza de algumas perguntas que nós precisamos lhe fazer, indagar-lhe, para a gente entender o posicionamento do Brasil em relação à Venezuela e o que acontece hoje na Venezuela. O senhor participou do antes, do durante e do depois de todo o processo que culminou nas contestadas eleições da Venezuela, eleições para as quais, segundo o tratado de Barbados - e o senhor também esteve lá -, houve um acordo para que fossem limpas e com uma governança com clareza, para que todos pudéssemos ver, talvez, a Venezuela de volta ao cenário mundial, tendo as sanções levantadas, para que o povo venezuelano pudesse viver melhor. Hoje nós sabemos da tragédia que nós temos na Venezuela: fome, pessoas saindo... Mais de 7 milhões já deixaram o país, largando suas vidas para trás, a maioria delas, porque não deve ser um bom regime, não deve ser um bom lugar de se viver. |
| R | Ocorre que, desde o princípio, desde o início do processo eleitoral, esse acordo foi desrespeitado, e a oposição foi reprimida violentamente. Eu quero aqui fazer uma deferência especial à Maria Corina Machado, que tem sido uma guerreira. Não é fácil ser oposição e manter as suas posições firmes. Eu quero dizer que ela tem sido uma guerreira na manutenção da democracia. Ela foi impedida de se candidatar, fato que levou os Estados Unidos a retomarem as sanções, e a União Europeia a mantê-las. Três semanas depois do resultado oficial desconhecido das urnas, na prática, nós temos lá o Maduro dizendo que ele é o vencedor. O senhor colocou aí os números. Agora, por que não aparecem essas atas? O Brasil está esperando há quantas semanas? O mundo está esperando há quantas semanas, não é? O México parece que já saiu. O México está numa posição hoje diferente da do Brasil. Hoje Brasil e Colômbia estão aguardando. Eu entendo que o Brasil espera a pacificação - todos nós esperamos -, mas será que nós vamos ter pacificação com as atitudes que Maduro tomou e vem tomando? Se ele tivesse ganhado as eleições, por que não apresentaria essas atas? Estou dizendo na lógica. "Eu ganhei as eleições, e estão aqui as atas. Ganhei por 51 a 43...". Cadê? Onde estão essas atas? Por que essa demora? Eu acho que isso é incompreensível, e nós precisamos ter essas explicações. Diante desse quadro absurdamente antidemocrático, o senhor depois sugeriu ao Presidente Lula - pelo menos, foi o que eu li na imprensa brasileira - que sejam feitas novas eleições na Venezuela. A minha pergunta, Embaixador, é simples: guardadas as diferenças, o senhor faria essa mesma recomendação aqui no Brasil se o Presidente Lula estivesse disputando as eleições como opositor nessa eleição e tivesse em seu poder 80% dos boletins oficiais de urnas que atestariam sua vitória, como aconteceu com a oposição na Venezuela? Eu acho esquisito esse conselho. Fazer, diante de todos esses indícios de fraude, uma nova eleição? Quem iria conferir essa nova eleição? As pessoas que estão lá e que não entregaram ainda as atas, não é? Então, eu acho que essa questão da Venezuela está a cada dia complicando mais a posição brasileira, porque o Maduro disse que ganhou as eleições, mas não mostra as atas. E o Brasil e a Colômbia, os dois esperando por essas atas, que eu acho que não virão. |
| R | Eu queria lhe fazer uma segunda pergunta e depois deixar... Eu teria muitas perguntas a lhe fazer, mas eu acho que todos os companheiros aqui querem também lhe perguntar, porque é um assunto que nos preocupa aqui no Senado Federal. Eu também gostaria de saber por que o senhor não recebeu a Maria Corina e o González. Ou os recebeu? Eu queria lhe fazer esta pergunta: se o senhor os recebeu ou não. A gente tem relatos e tem ouvido que a Maria Corina e a sua equipe têm 80% dessas atas oficiais, em que se dá esse resultado pró-oposição. Então, por que o senhor não os recebeu? Eu tenho... (Pausa.) É a Siri. (Risos.) É um perigo. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Fora do microfone.) - ... não se esquece daquilo. O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR. Fora do microfone.) - O González ele disse que recebeu; a Corina ele não recebeu. A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS) - Então, eu gostaria de saber... O Senador Moro está me dizendo que o senhor recebeu o González. Enfim, eu vi uma fala do senhor que me deixou... Achei interessante. O senhor disse o seguinte, quando esteve lá na Venezuela: "Sou amigo de César, mas sou mais amigo da verdade. Estou procurando a verdade". Eu queria que o senhor dissesse para nós qual é a verdade, na sua visão. Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Muito bem, muito bom. (Fora do microfone.) Eu vou conceder a palavra ao Embaixador Celso Amorim para responder à autora do requerimento. Em seguida, nós daremos a palavra, pela ordem, ao Senador Sergio Moro, ao Senador Esperidião Amin e ao Senador Nelsinho Trad. Aí, o Embaixador responderá em bloco, conforme as regras pré-definidas, preestabelecidas. O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AP) - No bloco seguinte, se V. Exa. puder me inscrever... O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Está bom. Com a palavra, o Embaixador Celso Amorim. A SRA. AUGUSTA BRITO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Presidente, eu gostaria de me inscrever também para o próximo bloco. O SR. CELSO AMORIM (Para expor.) - Obrigado, Presidente. Eu mesmo acho importante responder inicialmente os questionamentos da Senadora Tereza Cristina, que foi quem iniciou a convocação. São muitas perguntas. Se eu deixar alguma de fora, a senhora... Eu vou tentar responder, eu acho, talvez as mais importantes. Fico muito grato que a senhora leia ou ouça as minhas falas com atenção, porque, de fato, eu disse isso lá na Venezuela ainda, quando me perguntaram: "Ah, você é amigo do Maduro?". Eu falei: "Não, eu sou amigo de César, mas sou mais amigo da verdade". Então, temos que procurar a verdade. E isso ficou claramente estabelecido quando, no dia seguinte da eleição, o Presidente Maduro me recebeu e disse claramente - eu estava acompanhado do Embaixador Audo, que, talvez, por ser mais jovem, tenha melhor memória do que eu; e estava presente também o Presidente da Assembleia, que é o principal negociador dele com outras forças -: "As atas sairão em alguns dias, como sempre ocorre". Essas foram as palavras, o que, naquele momento - claro que nunca me deu tranquilidade absoluta -, me tranquilizou. Eu não tinha mais muito o que fazer lá e saí. |
| R | Não recebi a Maria Corina porque, deliberadamente, achei que devia manter... Alguém tinha que manter contato com o Governo, e eu achei que precisava... Mas eu, sim, recebi o candidato que era quem, na realidade, digamos... Todo mundo sabe das influências recíprocas - não vou entrar nessa questão -, mas recebi o candidato, que foi à Embaixada e que achei até uma pessoa muito tranquila: não ameaçou, não fez... Ele apenas disse que eles tinham... O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Fora do microfone.) - Ele é Embaixador. O SR. AUDO ARAUJO FALEIRO (Fora do microfone.) - Ele é diplomata. (Intervenção fora do microfone.) O SR. CELSO AMORIM - Ah, ele é Embaixador também, e isso facilita até a conversa. Recebi o Embaixador - que, aliás, é um título que não se perde, mesmo quando se aposenta -, Edmundo González e tive com ele uma conversa muito tranquila. Não sei se você estava presente também ou se eu estava sozinho, mas, enfim, eu tive uma conversa muito tranquila. E o nosso objetivo aqui... O Presidente Lula reiterou, falou várias vezes: "Tem que aparecer essas atas, e as atas têm que ser publicadas pelo CNE, pelo Conselho Nacional Eleitoral", o que é problemático, difícil, e a gente não sabe bem ainda onde pisar, até porque a legislação parece, às vezes, meio contraditória, porque a legislação diz que a Casa, a Sala - que assim eles chamam, é uma expressão comum, como se fosse uma subcomissão - da Corte Suprema, a Sala Eleitoral permite ao Supremo considerar, mas o caminho que ela diz é que, se ela verificar que a vontade popular não está sendo respeitada, ela pode anular a eleição. Então, acabaria resultando no que a senhora e muitos outros chamam de minha proposta de novas eleições. Bom, então, isso foi, digamos, em termos das pessoas com quem eu tive contato. Eu sei que há outros contatos do Governo brasileiro com a Sra. Corina. Então, era uma divisão de trabalho que facilitava, digamos, para eu ser recebido pelo pessoal do Governo. Mas eu recebi o coordenador da plataforma, do partido pelo qual o candidato foi apresentado. Então, nós tivemos uma conversa ampla. Aliás, em determinado momento, esse coordenador fez uma denúncia - que é algo que eu pulei aqui, não porque quisesse pular, mas porque era muita coisa - de que, em certas circunscrições, foi dificultado o acesso dos que eles chamam de testigos, que são os fiscais. Eu repassei essa informação para o Centro Carter. Eu não teria condição... Nós éramos três pessoas, ou quatro. Eu repassei essa informação para o Centro Carter para ele fazer a apuração. E, de fato, parece que, em algumas circunscrições... Mas não acho que seja uma coisa que dê para mudar o resultado num sentido ou outro, mas, de qualquer maneira, passei adiante. Enfim... Então, mantive todos os contatos possíveis. Os contatos com a Sra. Corina continuam, mas achei natural que eu tivesse contato com os dois candidatos: o Maduro, que é o atual Presidente, mas era o candidato; e o Embaixador Edmundo González, que era o candidato da oposição. Isso, nossa parte. Deixa eu ver aqui um pouquinho, que eu anotei. O México, de fato, está um pouquinho retraído, eu acho, nesse momento. Estou dando aqui... Não quero fazer nenhum julgamento sobre o México, mas tenho a impressão de que não é pelos motivos a que a senhora, de alguma maneira sutil, aludiu. Acho que eles estão numa transição, acho que o Presidente não quer se pronunciar num sentido que possa parecer uma pressão, às vésperas de ele deixar o poder... Eu acho que é mais uma situação desse tipo do que realmente uma colocação filosófica. Até porque, em outras situações, como, por exemplo, na votação na Organização dos Estados Americanos, o México se recusou até a se sentar. Então, eu acho que ele não tem nenhuma simpatia, nem acho que é outra... A razão é outra. |
| R | Finalmente, para abordar o tema que é o que agrada mais à imprensa, eu não fiz uma proposta. Nós nunca fizemos uma proposta de novas eleições. É um tema, e eu ouvi isso pela primeira vez - não posso dizer de quem, se me permitirem - de um não brasileiro, desses muitos contatos internacionais... "Como é que vamos resolver? Só se fizerem novas eleições". E eu acho que, digamos... O que é curioso de novas eleições é que tanto um quanto o outro podiam aceitar facilmente, porque, se eles dizem que ganharam, ganhariam de novo. Bom, mas enfim... E com uma supervisão... (Intervenção fora do microfone.) O SR. CELSO AMORIM - Não, porque a senhora mencionou um ponto importante... V. Exa. mencionou um ponto importante que eu quero abordar - às vezes, a gente passa para o coloquial sem querer -: nós achávamos muito importante, e isso fazia parte, inclusive, do Acordo de Barbados, uma supervisão internacional forte. E a principal... Tem duas entidades, que eu saiba, que têm capacidade de fazer isso. Eu já participei, algumas vezes, acompanhei no Brasil, acompanhei em outros lugares... Elas são a OEA e a União Europeia. A OEA é impossível. A OEA, depois do que aconteceu na Bolívia... Eu não vou entrar aqui no mérito, porque senão a gente iria para um outro campo. A OEA não tem credibilidade junto aos regimes progressistas na América Latina. Então, a União Europeia seria natural. Eu acho que a União Europeia cometeu um grande erro, porque ela foi convidada, mas manteve as sanções sobre algumas... Era um quid pro quo. Ela devia levantar as sanções, mas as manteve sobre algumas pessoas fundamentais: a Vice-Presidenta, o presidente do partido... Aí o Governo... Se foi pretexto ou motivo, eu não tenho como dizer, mas foi oferecido um pretexto, de certa maneira, para ela ser desconvidada. E, sem a OEA, ninguém tem... O próprio Centro Carter, que tem muita reputação... Por exemplo, eu mencionei aqui que, em 2004, nós fizemos o referendo revocatório. O Centro Carter tinha lá 17 pessoas. Você não tem condição de fazer uma coisa. Dá lá uma opinião, olha e tal, mas não tem. Então, acabou que... Então, se houvesse novas eleições, teria que ser com uma verificação importante, sólida, robusta, mas isso implicaria também o levantamento de sanções por parte do órgão. Essa é uma ideia que está aí, como surgem outras, tem outras. O Presidente Petro já falou publicamente também, por exemplo, em garantias recíprocas. Eu acho que, aliás, poder-se-ia até compor um quadro. Agora, não tem nada que o Brasil, enquanto Brasil, esteja defendendo. Nós estamos promovendo o diálogo e vendo se do diálogo nasce alguma ideia. Às vezes, é preciso pensar um pouco fora do quadrado, mas é o jeito, para ver o que acontece. O nosso objetivo principal, Senadora, é manter a paz, porque eu acho a situação na Venezuela muito perigosa. Eu não quero entrar no mérito de quem tem mais culpa ou quem tem menos culpa. Eu visitei... Um último comentário: eu visitei a Venezuela, pela primeira vez, no Governo Itamar Franco, na minha condição de Ministro - tinha visitado outras vezes por outras razões. O Embaixador lá, o saudoso Clodoaldo Hugueney, organizou um almoço de empresários. Em determinado momento do almoço, os empresários ligados a Mato Grosso... (Intervenção fora do microfone.) O SR. CELSO AMORIM - Pois é. Em determinado momento, os empresários pararam de falar comigo, homens de negócios - e eu digo homens, porque eram todos homens mesmo -, e passaram a falar uns com os outros sobre a possibilidade de golpe. E o Governo era o Caldera. |
| R | A Venezuela era um país... A senhora já esteve na Venezuela, ou não? Há muito tempo, você subia e via um país moderníssimo, com as melhores obras de arte, que você só encontra no Museu de Nova York, e a maior favela do mundo, uma das maiores favelas do mundo. Isso já era assim, isso não foi criado pelo... Não estou defendendo o Chávez, mas eu digo que isso já era assim, já era um país muito dividido. Agora, se o Presidente Chávez também errou muito, se a política econômica errou, e isso levou à saída das pessoas, é verdade também, e tem que deixar o povo escolher. Eu acho que a gente tem que encontrar a melhor maneira. O dilema que a gente tem hoje é que você tem, de um lado, o candidato, que é o Presidente, que diz que ganhou, mas não mostra as atas; e, de um outro lado, o grupo da oposição, que tem as atas... Mas como é que nós poderemos, no futuro - se isso é um bom precedente - reconhecer o Presidente pelos documentos de que dispõe a oposição? Eu não estou dizendo que eles... Então, é preciso ter uma solução que seja correta, que seja certa, e eu acho que o diálogo tem que ser incentivado. Eu acho que esse é o papel de países como o México, Colômbia e Brasil. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Senadora Tereza Cristina. A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS) - Muito obrigada, Embaixador. Eu queria só lhe perguntar quais serão os próximos passos do Brasil se essas atas não aparecerem. O senhor acha que é lógico se eu ganhar a eleição, eu seguro a ata, não as mostro e deixo o mundo inteiro contestar as eleições, porque essa ata está debaixo do meu braço e eu não quero mostrar para ninguém? Então, não tem lógica. E o Brasil vai ter que se pronunciar. Eu acho que quanto mais tempo nós levarmos para uma decisão, mais difícil ela vai ficando para nós, mais no canto nós vamos ficando. Eu entendo e concordo com o senhor no sentido de que nós temos que procurar a paz. Agora, novas eleições na Venezuela, eu não vejo a menor... (Intervenção fora do microfone.) A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS) - Não, eu entendi o seu ponto. Mas eu não vejo chance de ser razoável, porque quem vai estar lá cuidando é quem é do Maduro. E o Maduro tem hoje... Ele controla todos esses tribunais, as forças armadas, os generais, enfim. A gente sabe, e eu não vou me estender mais aqui. Então, o que o Brasil pretende fazer? Quais são os próximos passos? Encerro aqui, agradecendo muito as suas respostas. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Embaixador. O SR. CELSO AMORIM - Bom, eu não sou o único ator nisso, o principal é o Presidente Lula, (Fora do microfone.) mas, de qualquer maneira, abaixo do Presidente Lula e imediatamente abaixo e acima de mim está o Chanceler. O Chanceler está indo lá. Eu apenas fui para lá, porque o Presidente vê em mim uma pessoa para ficar nas situações de crise. Mas o Presidente... E eu não sei por quê. (Risos.) Mas, enfim... Eu sou da paz também, então eu quero estar longe. E a função em que eu passei mais tempo foi em negociações econômicas e comerciais. Mas, enfim, é assim. Ele é o Presidente, manda, e lá eu vou. Hoje mesmo, não é? Está indo lá? Já foram até? O SR. AUDO ARAUJO FALEIRO (Fora do microfone.) - Foram ontem à noite. O SR. CELSO AMORIM - Foram ontem? O Chanceler já foi para a Colômbia para conversar, para discutir. Todos temos a mesma preocupação que V. Exa. tem. A única questão que eu sei que eu posso dizer que na diplomacia é uma coisa... Com 60 anos de vida diplomática, eu posso dizer que a impaciência não é boa conselheira. Então, nós vamos encontrar uma solução que seja, como, aliás, já constou de uma resolução anos atrás da OEA, no tempo em que ela tinha mais credibilidade, que seja democrática, eleitoral e pacífica. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Eu concedo... Agora passamos ao primeiro bloco. Eu concedo a palavra ao Senador Sergio Moro. O SR. CELSO AMORIM (Fora do microfone.) - Posso só para terminar... O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Pode. Pode, sim. O SR. CELSO AMORIM - Já que a gente está falando também das redes, elas são inevitáveis, está aqui: "Lula diz que Maduro deve explicação ao mundo e pede 'bom senso': 'poderia convocar novas eleições'". O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Com a palavra, o Senador Sergio Moro. O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR. Para interpelar.) - Sr. Embaixador Celso Amorim, o senhor normalmente é considerado o principal assessor internacional do Presidente Lula e foi enviado por ele à Venezuela para acompanhar essa crise. Então, eu creio que posso considerar, e também é uma pergunta, que as suas posições, em regra, refletem as posições do Presidente Lula nesses assuntos em particular. Depois o senhor pode responder, quando for a pergunta. O senhor mencionou a questão da paz, que o Governo brasileiro busca a paz na Venezuela. Mas o senhor mesmo aqui reconheceu, e isso tem sido denunciado, inclusive pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, as detenções, as prisões arbitrárias que estão ocorrendo na Venezuela, não só de opositores, mas de manifestantes. O senhor mencionou aqui o número de 1,2 mil pessoas, que é um número que tem sido apontado, mas o próprio Governo Maduro tem se jactado de prisões em maior número, chegando a 2 mil. Como pode ter paz, Embaixador, com essa política de prisões arbitrárias, acusações de tortura, inclusive, sobre a oposição? É essa a paz que o Brasil está defendendo na Venezuela? Eu tenho aqui, por exemplo, algumas referências. Williams Dávila Barrios, era ex-Governador do Estado de Mérida, dirigente do partido Ação Democrática, da oposição, foi preso em 8 de agosto, logo após as eleições. Temos aqui María Oropeza, que era Coordenadora do Comando Vente Venezuela no Estado de Portuguesa, foi presa em 6 de agosto, inclusive conseguiu filmar e colocar na internet momentos antes da sua prisão. Freddy Superlano, dirigente da Voluntad Popular. Todas essas pessoas estão sendo presas, há até denúncia de tortura. Nós estamos voltando com aqueles desaparecimentos forçados. O Brasil, o senhor protestou junto ao Governo Maduro, de maneira formal ou informal, essas detenções arbitrárias? E como o senhor consegue conciliar esse desejo pela paz com esse tipo de política que tem sido adotada pelo Maduro? Inclusive, tem sido denunciado por órgãos internacionais reconhecidos, como o Alto Comissariado das Nações Unidas, tem sido noticiado pela imprensa. Eu gostaria de saber qual é a posição do Governo brasileiro em relação a essas prisões arbitrárias. O senhor mencionou também, Sr. Embaixador, V. Exa. mencionou que recebeu o Edmundo González, e nisso fez muito bem, elogia-se a sua posição, mas o senhor se recusou a receber a principal líder da oposição, a María Corina Machado, que é uma pessoa hoje ameaçada, não só de morte, mas de prisão arbitrária pelo Governo Maduro. O senhor não acha que o Governo brasileiro, o principal representante do Governo Lula, recebendo a Corina Machado, isso não daria alguma proteção a ela, pelo menos? Ou a reconhecendo como uma legítima representante da oposição, líder da oposição? O senhor não acha, Sr. Embaixador, que seria uma postura mais adequada? Eu lembro aqui que tivemos, na época da ditadura, em que foram muito elogiadas as posturas da Igreja Católica brasileira, D. Evaristo Arns, que visitava pessoas presas, que recebia líderes para até protegê-los, para dar uma visibilidade. Não seria essa uma postura adequada por parte do Governo brasileiro, seus representantes na Venezuela? |
| R | Sr. Embaixador, o senhor visitou ou pediu para visitar alguma prisão, algum centro de detenção no qual essas pessoas estão arbitrariamente detidas, lá na Venezuela? Ou, se o senhor não fez isso, algum representante do Brasil, na Venezuela, da Embaixada... (Soa a campainha.) O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - ... seja um alto diplomata, um diplomata de menor nível, chegou a pedir para fazer alguma visita a alguma dessas pessoas arbitrariamente detidas, lá na Venezuela? Faço aqui uma concessão, Sr. Embaixador: elogio a postura do Brasil em não reconhecer a vitória de Maduro enquanto não forem apresentadas essas atas. Acho essa postura positiva. Em relação, porém, à oposição, a informação que nós temos é que cada ata eleitoral tinha um QR code e que a oposição, apesar de toda a repressão que sofreu, conseguiu copiar, tirar cópia dessas atas antes que elas fossem levadas ao centro eleitoral e, com base nessas informações do QR code, já fez um levantamento de mais de 80% das atas, e apontaram essas atas a vitória da oposição na eleição da Venezuela. Países têm reconhecido, inclusive, essa vitória, como os próprios Estados Unidos. O Centro Carter tem tido posições bastante firmes quanto às arbitrariedades do Governo Maduro. Qual a sua opinião sobre essas declarações do Centro Carter? Como é que o senhor, Embaixador, vê a posição do Centro Carter? O senhor reconhece o Centro Carter como um observador que faz um trabalho de qualidade no acompanhamento dessas eleições internacionais? Eu me espantei com uma declaração de V. Exa. Embora louvadamente não tenha reconhecido a vitória de Maduro e tenha cobrado essas atas, li na imprensa, e V. Exa. pode confirmar ou não essa declaração, que V. Exa. teria dito que fez uma falsa equivalência em relação à posição do Governo Maduro e da oposição. V. Exa. teria dito que Maduro teria que apresentar as atas, mas que V. Exa. não confiava nas atas da oposição. Mas a oposição não tem as atas, quem tem o poder sobre as atas é o Governo Maduro. Essa equivalência, não sei se V. Exa. a fez de fato, mas me parece absolutamente inapropriada quando coloca na mesma vala oposição e situação ali na Venezuela. A oposição, com a reconstrução das atas através desses QR codes, demonstrou efetivamente que a vitória foi de Edmundo González e por uma larga maioria. Não seria o caso de o Brasil reconhecer essa vitória do Edmundo González ali dentro da Venezuela, como fizeram outros países? (Soa a campainha.) O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - V. Exa. também mencionou que participou da costura do Acordo de Barbados, e isso foi uma posição louvável do Governo brasileiro. |
| R | Agora, gostaria de saber de V. Exa. se, em vista de tudo o que aconteceu desde então - inabilitação arbitrária da líder da oposição, Corina Machado; prisão e sequestro dos seus assessores, e que não começou agora, mas agora se acirrou, desde o Acordo de Barbados; eleição na qual o Governo não apresenta os resultados, em que todos os indicativos são de que a oposição ganhou a eleição, e, no entanto, o Governo Maduro não reconhece a derrota; prisões de 1,2 mil pessoas, 2 mil pessoas, há notícias até de tortura, desaparecimentos forçados -, se V. Exa. entende que o Acordo de Barbados foi cumprido pelo Governo Maduro, se ele fez a sua parte. E, caso ele não tenha sido cumprido, qual vai ser a posição do Brasil? V. Exa. mesmo disse aqui que o Brasil é garante do Acordo de Barbados. Mas se o Brasil vai tomar uma postura mais rigorosa, se fará alguma declaração pública mais enfática em relação ao Governo Maduro ou se vai persistir em tentar fazer essa falsa equivalência entre oposição e Governo Maduro. Sinceramente, Sr. Embaixador, eu reconheço a parte louvável de o Governo brasileiro não reconhecer a vitória de Maduro e exigir as atas. Mas, de resto, a percepção que nós temos aqui no Brasil e a percepção internacional é de que o Governo brasileiro, o Governo Lula tem atuado para minimizar essas fraudes e essas violências praticadas pelo Sr. Maduro. Espantei-me aqui quando V. Exa. fez até quase uma referência elogiosa, de que visitou o Maduro e percebeu e ficou espantado com a humildade do recinto. Trata-se aqui... E eu posso falar isso, V. Exa. não pode falar isso, talvez, por questão diplomática, mas trata-se de um ditador que fraudou uma eleição, que está prendendo e torturando pessoas na Venezuela. Sinceramente, penso que o Governo brasileiro deveria mudar a sua política em relação à Venezuela. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Agradecemos a intervenção do Senador Sergio Moro. E tenho a satisfação de conceder a palavra ao Senador Esperidião Amin. Com a palavra, V. Exa. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Para interpelar.) - Agradeço, quero cumprimentar o Sr. Assessor Especial, o Embaixador Celso Amorim, também o seu ponto, assim como a Senadora Tereza Cristina tinha um ponto há pouco, no telefone, o Sr. Embaixador Audo Faleiro, diplomata. Queria só registrar, nos antecedentes, que nós aprovamos aqui na Comissão, no dia 21 de março deste ano, um requerimento, subscrito pelo Senador Sergio Moro, pelo nosso aniversariante de hoje, Senador Mourão, e firmado por mim também, para que ouvíssemos a Sra. María Corina Machado, e não conseguimos fazê-lo ainda. Portanto, eu também o subscrevo. A minha... Digamos, eu lamento que nem nós nem o representante do Executivo, que é quem firma a política, tenhamos podido conversar com essa senhora, que foi proscrita da eleição - essa que é verdade. E a sua substituta, que seria outra Corina, também o foi. |
| R | Acho até estranho, às vezes, que a Bancada Feminina nunca tenha se solidarizado, nem a senhora o tenha proposto. A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS. Fora do microfone.) - Uma liga no continente... O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Não custa nada lembrar: eu sou obrigado a defender sempre as mulheres, porque eu sou do único estado feminino do Brasil, Santa Catarina, e a história da Catarina de Alexandria é muito bonita, então eu queria rememorar. Em homenagem aos 21 minutos que o senhor destinou aos antecedentes nas suas falas, que eu subscrevo tudo o que a Senadora Tereza Cristina e o Senador Sergio Moro falaram sobre os antecedentes. O que eu vou é tentar obter a fotografia do presente versus a posição do Brasil. O que nós temos lá? Duas mil pessoas presas. Começou com 1,2 mil, mas já deve ter passado de 2 mil. A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS. Fora do microfone.) - Aumentou... O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Presos. O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - É paz na Venezuela. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Quer dizer, e com ameaça de prender os próximos que forem à rua. Eu não sei qual foi o grau de vandalismo lá. Ninguém quebrou relógio, não houve danos materiais nas instituições, mas muito rolo na rua. E é feito para intimidar, nós sabemos disso. Sobre a questão da polarização, eu concordo com o senhor. O senhor tem 60 anos de experiência, não é? A polarização sempre houve, o que está havendo hoje é uma calcificação da polarização; ou seja, deixou de haver bambu ou alguma coisa flexível para ficar cada um com a sua coluna de concreto armado. E é difícil. O Obama já tinha reconhecido isso no discurso que ele fez em Atenas, no dia 16 de novembro de 2016... (Soa a campainha.) O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - ... quando o Trump ganhou. Então, a minha colocação é que nós não podemos ficar na posição de aguardar as atas, sem data, porque é claro que as atas... Daqui a pouco vai haver um incêndio e as atas serão perdidas - ou uma enchente, um dilúvio. Não há propósito... É evidente que as atas não serão mostradas. E, enquanto isso, o processo repressivo prossegue, o processo repressor, constrangedor. Então, eu acho que, em nome daquilo que é a democracia, que todos nós anelamos, e os estatutos da OEA também falam... Os nossos requisitos para, por exemplo, participação no Mercosul da Bolívia, nós aceitamos sub judice. A comissão exigiu... Nós exigimos, está constituída ou está sendo construída uma comissão para verificar o que está havendo na Bolívia, o senhor sabe disso. E o Cid Gomes, nosso Vice-Presidente, cuidou para que isso também fosse aprovado no Plenário. Agora, nós não somos o agente dinâmico, nós Senado ou Comissão de Relações Exteriores. O agente dinâmico é o Presidente da República, ou seja, é o Executivo, está na Constituição. Então, o que eu queria dizer é o seguinte: tem que haver uma data para que nós não caiamos no ridículo e nós não fiquemos isolados no mundo. Aí, sim, todo o esforço para que o Brasil não seja um pária, que eu muitas vezes já ouvi... Nós hoje estamos fortes candidatos a sermos o pária, porque o México está recuando, o Presidente está saindo; a Colômbia está vivendo o drama de ser muito vizinha. Nós somos vizinhos, mas ela é muito mais vizinha da Venezuela do que nós, não é? |
| R | É disso que os mexicanos dizem, falam, lamentam, não é? "Muy lejos de Dios e muy cerca de los gringos". Eles também estão muito perto. Então, eu queria, numa pergunta, formular um apelo: isso vai ter que ter uma data para uma reconversão, para uma inflexão de posição. E eu fico preocupado que, antes disso, nós ganhemos um carimbo de pária não de minha parte, mas de parte da opinião pública, e principalmente daqueles com os quais mais nos relacionamos. É isso. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Concedo a palavra ao Senador Nelsinho Trad. O SR. NELSINHO TRAD (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MS. Para interpelar.) - Sr. Presidente, Senador Renan, demais colegas que participam da sessão de forma presencial e virtual, cumprimento aqui o Embaixador Faleiro e o Embaixador Celso Amorim, assessor para assuntos delicados, espinhosos da Presidência da República. Quero dizer que, quando a gente se depara com uma pessoa que tem 60 anos de experiência em um determinado assunto, há que se respeitar e louvar toda essa trajetória. E eu quero aqui deixar isso registrado. V. Exa. tem de experiência o que muitos aqui têm de vida. Mas nós estamos diante de uma situação realmente fora da razão. E vou fazer aqui algumas considerações e a minha pergunta vai ser assim muito direta, muito cirúrgica - eu sou médico. Nós temos... Eu sou o chefe da delegação do Parlasul, e nós temos na institucionalização desse Parlamento o Observatório da Democracia, que já teve, na nossa pessoa, na pessoa do Senador Humberto Costa, que é um assíduo participante do Parlasul, inúmeras atividades de acompanhamento das eleições em vários países. E, logo que começaram os conflitos pré-campanha, campanha da Venezuela, o nosso observatório provocou para que se pudessem acompanhar as eleições. Não nos foi permitido, dizendo que nós não seríamos sequer ser convidados. Muitas situações estão evidenciadas: 8 milhões de pessoas refugiadas da Venezuela. Dessa quantia, quase 1 milhão veio para o Brasil. Nós temos aqui um histórico de uma dívida da Venezuela para com o nosso país, de empréstimos oferecidos em outros governos, de US$2,5 bilhões. Recentemente, o BNDES aventou a possibilidade de abertura de novas linhas de crédito para obras de infraestrutura dentro da Venezuela. O que está evidente nessa história toda? Essas atas não vão aparecer. Se tivessem que aparecer, já teriam aparecido. A ata, na minha avaliação modesta, representa um diploma, um certificado da lisura de um processo e da vitória obtida. Se eu tivesse ganhado uma eleição num processo limpo, transparente e tivesse a ata, eu seria a primeira pessoa que iria querer mostrar. |
| R | (Intervenção fora do microfone.) O SR. NELSINHO TRAD (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MS) - Muito obrigado pela parte. Ocorre que essa ata não vai aparecer. E, em ela não aparecendo, o indício, o indicativo, a suspeita de que houve manipulação, fraude na eleição, é mais do que evidente. Não precisa de nenhum Sherlock Holmes para poder chegar a essa conclusão. Aí a pergunta: o Brasil vai tomar uma posição mais firme em detrimento do não aparecimento dessas atas? Porque a gente vai ter que ter, na minha avaliação... (Soa a campainha.) O SR. NELSINHO TRAD (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MS) - ... uma posição pedagógica nesse sentido, para repudiar aquele que participa de processos eleitorais e os faz, torna-se um ditador e vira as costas para a democracia, situação essa que a gente espera que o nosso país não venha a corroborar. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Nós concedemos a palavra ao Embaixador Celso Amorim, para responder às interpelações feitas pelos Senadores Sergio Moro, Esperidião Amin e Nelsinho Trad. Com a palavra V. Exa. O SR. CELSO AMORIM (Para expor.) - Presidente, anotei aqui, procurei anotar todos os pontos, mas, obviamente, se faltar algum estarei pronto a voltar; não quero omitir nenhuma... É que, às vezes, as questões se juntam realmente. A questão da dívida: é 1,6 bilhão; é um valor alto. Não se pode esquecer que o Brasil, durante anos e anos, teve saldos enormes com a Venezuela, em grande medida, mas eu acho que talvez fosse mais adequado deixar isso para um outro dia; virei, com maior prazer, para discutir a relação econômica. O Brasil tinha saldos de quase 4 bilhões todos os anos. Era natural, um sistema de empréstimo. Depois as relações se romperam. A última pessoa, depois da saída da Presidenta Dilma, que eu me lembro de ter tido um contato importante foi o então Ministro da Defesa, no Governo Temer, que foi visitar inclusive o seu correspondente. Então, aí eu não estou justificando. Nós estávamos no processo de começar a discutir, reconciliar os números, para que eles possam pagar. Então, isso é natural. Nós não estamos abandonando o nosso crédito com a Venezuela de maneira nenhuma, mas houve uma ruptura absoluta. Então, aí se aproveitou para não pagar. Não estou dizendo que está certo, que está errado, mas enfim, nós iríamos recuperar certamente isso. Inclusive, há muito interesse de empresários na Venezuela, empresários brasileiros que procuram para ver, etc. e tal. Mas eu não vou entrar nisso porque não é talvez o tema central, e eu talvez não tenha todos os dados. Talvez um outro dia eu possa... Desculpe, eu estou indo aqui na ordem inversa porque a questão está mais imediata. Eu queria também, Senador Esperidião Amin, antes, lembrar que nós participamos até de um live juntos, em defesa da democracia, em determinado momento, não faz... Alguns anos. Tenho muito prazer, portanto, de estar de novo ouvindo aí a sua sabedoria e experiência. Mas o que eu lhe diria - não sei se esse é o seu ponto principal - é que o Senador pode ficar tranquilo, que o Brasil não corre o risco de ser pária. Primeiro, a própria posição do Brasil tem sido elogiada pelos Estados Unidos, pelos países da Europa. Todos querem saber o que o Brasil está fazendo, como é que está agindo, e nenhum deles... Quantos países reconheceram o governo do... a vitória do Edmundo González? Muito poucos, muito poucos. O próprio Governo americano foi e voltou, não se sabe bem em que posição está. Disse: "Não, não houve reconhecimento, mas nós achamos que ele ganhou". Mas isso não é reconhecimento, no sentido formal da palavra, quer dizer, porque há uma resistência natural. |
| R | Eu não estou negando que provavelmente essas cópias possam refletir a realidade - eu não estou negando -, mas não é um bom precedente você começar por aí. Então, eu acho que é uma coisa com que todos têm essa preocupação; não é só o Brasil. E todos têm uma preocupação também de que haja uma solução pacífica. Com a questão de direitos humanos, eu não posso deixar de concordar. Eu concordo absolutamente, é criticável. Agora, o que eu posso lhe dizer é que, na época do Presidente Chávez, frequentemente me aconteceu... Aliás, no caso até era uma mulher mesmo, que estava... Não estou vendo aqui a Senadora, desculpe. Era uma mulher que estava presa, a Condoleezza Rice me ligou, e eu liguei... Eu não me lembro mais de se eu liguei para o Chávez ou para o chanceler na época; eu sei que ela foi solta pouco tempo depois. Nós tínhamos um diálogo. Agora, eu não falei desse assunto porque isso aconteceu depois. Eu fui lá para ver a questão das eleições, e foi o que me motivou. Estive com o Edmundo, estive com o candidato no próprio dia das eleições, não foi? O SR. AUDO ARAUJO FALEIRO (Fora do microfone.) - No dia seguinte. O SR. CELSO AMORIM - No dia seguinte às eleições. Então, era o que eu tinha que fazer naquela época. Essa questão dos direitos humanos é muito importante. Eu condeno, pessoalmente, acho um erro. Às vezes... Tem a frase famosa: pior que um crime é um erro. É um erro. Isso não deveria estar acontecendo. E eu tenho a impressão de que isso está acontecendo como uma espécie de ameaça para deixar a situação mais difícil. Agora, veja bem, a nossa função, a função do Brasil é apaziguar, é encontrar uma solução que seja pacífica. Obviamente, se houver uma solução pacífica, esses 1,2 mil... Eu não acredito nessa cifra de 2 mil; eu acho que isso, provavelmente - estou dando uma opinião - é uma... não há de ser um número maior, na realidade, do que a própria oposição diz. É porque é para uma ameaça, digamos. E eles todos serão soltos, provavelmente. Então, provavelmente; se não forem, nós agiremos. Agora, uma questão que tem sido colocada, da ata, nessa manchete que eu li, está muito clara a impaciência também já do Presidente Lula com relação à demora das atas. Isso é, evidentemente, uma preocupação. Agora, colocar uma data fixa, um ultimato, eu acho que não é produtivo. A minha experiência, para o que ela possa valer, indica que isso não traz bons resultados, mas seguiremos atentos. Eu não sei se eu atendi a todas as perguntas. Tem alguma muito importante? Porque eu não fui na ordem e acabei me perdendo um pouco aqui... Com relação à Corina, ela tem... O Senador vai me permitir, nós não estamos numa certa sessão reservada, nós estamos numa situação pública, mas há contatos em nível muito alto com a Sra. Corina. Então, eu acho que, se isso o tranquiliza, eu transmito isso. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Senador Sergio Moro. |
| R | O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR. Para interpelar.) - Só para confirmar, Sr. Embaixador, V. Exa. mesmo, então, não visitou nenhuma dessas pessoas que foram presas ou fez algum protesto público? O senhor transmitiu ao Maduro a preocupação do Governo brasileiro com essas prisões arbitrárias, com essas violações de direitos humanos? E o corpo da embaixada hoje, dos diplomatas brasileiros, tem feito alguma iniciativa nessa linha? Porque sejam 1,2 mil, sejam 2 mil pessoas, o fato é que nós temos aqui ações típicas de ditadura. E a minha preocupação, como disse, é: sim, nós temos que buscar a paz. O Brasil tem um raio de ação limitada, mas o que nós assistimos, desde que o Brasil figurou como garante, nesse Acordo de Barbados, é que simplesmente o ditador Maduro tem feito o que quer: inabilitado opositores, prendido opositores - mesmo antes das eleições, tiveram pessoas presas arbitrariamente. Isso foi acirrado agora, essas prisões. No entanto, a visão, particularmente da opinião pública brasileira, inclusive - os jornais são muito categóricos nesse sentido -, a posição de vários grupos latino-americanos, inclusive compostos por ex-Presidentes latino-americanos - grupo Idea, grupo Liberdade e Democracia -, é de que o Brasil tem atuado de maneira muito complacente. Queremos a paz, sim, temos instrumentos limitados, mas até quando Maduro vai violar esses acordos, vai prender opositores, vai fraudar essa eleição? E o Governo brasileiro vai permanecer nessa posição de relativa platitude, que mal... Desculpe aqui a expressão, mas essa é a percepção que nós temos. Chega o momento em que o Brasil, o Governo brasileiro tem que dizer: "Chega! Olha, eu não quero mais tratar disso. Vi que tudo o que eu tentei não deu certo. Bem, vou tomar as providências que eu posso tomar em relação a esse país. Não reconheço, entendo que houve uma fraude". Claro, ninguém vai invadir a Venezuela ou coisa parecida, mas não podemos ficar passando a mão na cabeça do ditador. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - O Esperidião Amin. O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Para interpelar.) - Eu queria lembrar que, há dois dias, no dia 13, o Presidente da Assembleia da Venezuela anunciou o seguinte, que o que o instituto Carter falou merece um destino: o lixo - o lixo. E está colocando em votação uma lei, uma reforma nas leis eleitorais da Venezuela, com o objetivo de que nenhum estrangeiro possa se pronunciar. Olhe bem: lá não poderá ser divulgado nenhum pronunciamento de estrangeiro a respeito das eleições do país, ou seja, não é um propósito circunstancial; é um propósito duradouro. Tem que se prestar atenção nos sinais. Os sinais são estes: instituto Carter: lixo, e estrangeiro se meter aqui... Não estou parodiando o Texas. No Texas, tem uma regra, Senador: don't mess with Texas, não se meta, não venha bulir conosco. |
| R | Então, é um afastamento. Eles preferem ser párias, ser considerados como tal, do que aceitar conselho, observação ou qualquer posição que conteste a inexistência de comprovante do resultado eleitoral. Ou seja, eles têm voto auditável - voto auditável até num modelo perigoso, em que o eleitor pega o voto para depois depositar com um chip, muito mais invasivo do que o paraguaio ou o chinês. (Soa a campainha.) O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Aliás, o da Índia. Então, eles têm até isso. O Presidente Maduro, inclusive, debochou, quando fez o plebiscito sobre Essequibo, com grande maioria a favor, porque lá o voto é auditável. Ele disse isso. Então, todas as provocações, e agora esta iniciativa legislativa de "não se metam conosco". É isso que eu queria reforçar e ouvir a sua opinião, se esses sinais estão sendo avaliados. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Com a palavra o Embaixador Celso Amorim. O SR. CELSO AMORIM (Para expor.) - Primeiro, eu queria responder diretamente uma questão do Senador Moro. Não, eu não visitei prisões, porque esse não foi o mandato que me foi dado. Eu fiquei três dias na Venezuela para acompanhar as eleições. Eu não estou dizendo que esse assunto não nos interesse. Eu queria acrescentar que o Governo brasileiro, - não eu, o Governo brasileiro -, há mais tempo, ofereceu-se, inclusive, para retirar os assessores da Sra. Corina que estão presos ou estão exilados na Embaixada do Brasil. O Brasil está interessado e continuará interessado em resolver e ajudar na questão de direitos humanos. Agora, nós estamos enfrentando um perigo mais imediato, que é de um conflito muito grande. Então, estamos tentando resolver esse antes e depois os outros. Aliás, não necessariamente sequencialmente, até porque essa oferta, até de mandar um avião brasileiro para retirar as pessoas que estavam antes na Embaixada da Argentina e agora estão sob os cuidados brasileiros - para retirá-los de lá. É uma oferta que está de pé. Agora, se você não conversa com outra pessoa, você não consegue. Então, o que nós estamos tentando fazer é resolver essas questões pelo diálogo, não como algumas pessoas pensaram em fazer no passado. Nós não vamos impor a democracia à Venezuela. Nós vamos conversar, e vai, como eu disse, em várias ocasiões... E isso aconteceu efetivamente. Eu dei um exemplo da Condoleezza Rice, foi um, mas houve vários outros. Nós tivemos muitos encontros. Isso era na época do Presidente Chávez. Houve um isolamento muito grande da Venezuela, que não contribuiu para a melhora da situação. Nós estamos tentando atuar agora e levando em conta a absolutamente correta preocupação do Senador com os direitos humanos - correta, Senador. Agora, é uma situação que se reproduz em outros países. Por exemplo, eu não quero aqui entrar em discussão sobre outros países, mas em nenhum país latino-americano há um ex-Vice-Presidente preso, doente. E também nós não conseguimos tirar. O que eu posso fazer? A gente faz, o Presidente Lula faz gestões, conversa, e os países que têm mais interesse no Brasil ou respeito pelo Brasil atendem. Os outros às vezes não, mas eu não posso afixar um ultimato, porque o ultimato, se você cumpre, é um desastre; se você não cumpre, você perde a credibilidade. Então nós estamos tentando, com grande... A declaração que eu li hoje aqui, do Presidente Lula, é clara a esse respeito. Nós estamos, digamos, usando todos os instrumentos pacíficos para que a gente chegue a uma conclusão. |
| R | E, como eu disse, voltando ao ponto de ontem, eu não quero insistir muito nisso, mas ontem - ou anteontem, eu acho; eu não sei, eu confundo os dias - eu recebi uma ligação do Secretário de Estado do Vaticano. Se ele achasse que o Brasil era um pária, ele não iria ligar, não iria telefonar. E não telefonou para me dar conselho; telefonou para saber o que estava acontecendo, como é que era. Da mesma forma, governantes da França e de vários outros países - da França eu me lembro mais claramente - têm manifestado confiança na mediação do Brasil. Eu acho que é esse o caminho. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Nós vamos iniciar agora o segundo bloco, que será constituído pelo Senador Dr. Hiran, pelo Senador Humberto Costa e pelo Senador Randolfe Rodrigues. Com a palavra V. Exa., Hiran. O SR. DR. HIRAN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR. Para interpelar.) - Presidente Renan, Embaixador Celso, Embaixador Faleiro, estou aqui, à direita de vocês. Estou aqui, ó! Bom dia! Bom dia a todos! Bom dia a todos os Senadores e Senadoras presentes. O SR. CELSO AMORIM - Eu tenho uma deficiência auditiva; eu tenho que ler o lábio. O SR. DR. HIRAN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) - Vou falar mais alto. O SR. CELSO AMORIM - Não, está bem, está falando muito bem. Eu que estava virado para lá. O SR. DR. HIRAN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) - Embaixador, bom, primeiro eu quero também reiterar o que já foi falado pelos que me antecederam e falar à V. Exa. que, realmente, o Brasil não reconhecer essa vitória, ser prudente, já é um bom sinal. Agora, nós não podemos admitir que uma eleição, que acontece... Olhem só, Senador Moro: 12 milhões de eleitores votaram. O senhor sabe quantos venezuelanos vagam em situação de vulnerabilidade absoluta pelo mundo? Quase 8 milhões, segundo o Acnur. Eu tenho dados aqui. Já passaram só lá pelo nosso Estado de Roraima - eu sou de Roraima, Embaixador -, já passaram pela Operação Acolhida - dados oficiais da Polícia Federal -, mais de 1 milhão e 200 pessoas. Quer dizer, uma eleição que acontece com 7 milhões de pessoas de um país onde houve uma votação de 12 milhões nunca vai ser uma eleição com credibilidade. Aliás, no ano passado, eu até manifestei no Plenário o meu descontentamento absoluto como médico, com bom senso, com sensibilidade, porque nós recebemos esse ditador sanguinário aqui, no país, com pompas e circunstâncias. Eu não consegui entender, porque, olhem só, de 2017 para cá, Senador Renan, Sras. e Srs. Senadores, nós já gastamos aproximadamente R$2 bilhões com aquilo que é o modelo para o mundo de acolhimento de imigrantes, que é a Operação Acolhida, que o senhor conhece muito bem. Mas fora da Operação Acolhida, nós recebemos hoje cerca de 700 ou 800 pessoas por dia, lá em Roraima; 350 pela Operação Acolhida. O resto fica vagando, de Pacaraima a Boa Vista, em todos os municípios, em situação de absoluta pobreza e necessidade, o que gera demandas sociais inomináveis para todos nós. |
| R | E vou dizer aqui... O Senador Amin, que conhece bem, eu conheço muito bem. Eu sou oftalmologista, operei de 1990 a 1995, mensalmente, no Estado de Bolívar, na capital do Estado de Bolívar, na cidade de Bolívar, e, realmente, houve uma degradação na qualidade de vida das pessoas. Existia, realmente, sempre uma discrepância social grande na Venezuela, mas essa crise se agudizou, e não existe democracia na Venezuela, Senador Amin, porque, veja bem: quando houve uma tentativa de golpe militar, em 1992, através do ex-Presidente Chávez, estava lá um homem que manda na Venezuela até hoje, que se chama Diosdado Cabello. Ele manda na Venezuela de lá até agora. Ele é a pessoa mais influente do Governo do Presidente Maduro. Então, eu acho que nós precisamos, realmente, ter uma posição mais enérgica... (Soa a campainha.) O SR. DR. HIRAN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) - ... com um governo que causa tanto sofrimento humano. É o maior êxodo humano do nosso século, Sr. Embaixador. Então, um país que causa esse dano inominável aos seus nacionais não pode ser reconhecido por nós, que somos um exemplo de acolhimento, de democracia, de tolerância... Agora, nós não podemos tolerar esse genocídio que tem acontecido com o povo venezuelano, que tem sido ignorado inclusive pelo próprio Governo Maduro. Quando nós conversamos com alguém da embaixada venezuelana, negam-se a reconhecer que há esse êxodo no mundo, de quase 8 milhões de pessoas. Como é que nós vamos acreditar numa eleição... Vamos considerar que 3 milhões sejam crianças e vamos... Como é que a gente pode dar credibilidade a uma eleição em que a gente cerceia o direito de 5 milhões de pessoas num universo de 12 milhões de eleitores, dessa eleição ser uma eleição com alguma credibilidade? Então, eu queria aqui fazer um apelo a V. Exa.: transmita ao nosso Presidente Lula essa preocupação e essa posição nossa. Eu acho que passou da hora de nós selecionarmos melhor as nossas companhias internacionais, porque a Venezuela não é uma boa companhia para o nosso país, que é um exemplo de democracia, tolerância, progresso e diversidade. Você vê aqui como há pensamentos tão distintos e convivências tão fraternas. É porque nós respeitamos uns aos outros, o que não acontece naquele país. Muito obrigado ao senhor. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Concedo a palavra ao Senador Humberto Costa. O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para interpelar.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Sras. Senadoras, Embaixador Celso Amorim, nosso prezado amigo, companheiro... Em verdade, eu me sinto muito satisfeito com as respostas e os questionamentos que foram feitos ao Ministro. Queria apenas fazer algumas observações. Mas, antes de fazê-las, acho que é importante nós fazermos alguns registros aqui da incoerência desse segmento da extrema direita no nosso país. Obviamente que qualquer tipo de desrespeito aos direitos humanos, onde quer que aconteça... Obviamente, onde aconteça lawfare, nós temos que nos manifestar, mas não cabe autoridade política à extrema direita deste país nem para falar de lawfare, nem para falar de democracia e direitos humanos. Com episódios recentes... Lawfare? |
| R | Em 2018, o atual Presidente da República foi impedido de disputar uma eleição, que ele venceria, por causa de um lawfare praticado no Brasil, seja lá em Curitiba por um juiz de primeira instância, seja pelo próprio Supremo Tribunal Federal. Então, carece de autoridade política para falar sobre esse tema, para criticar quem quer que seja, ainda que a crítica possa ser verdadeira, assim como para falar de liberdade e democracia. Felizmente, o que se propunha para o dia 8 de janeiro de 2023 não se concretizou. Se tivesse se concretizado, muito provavelmente, isso que nós estamos fazendo aqui não faríamos. Este Congresso, provavelmente, estaria fechado. Teríamos um ditador de plantão e teríamos, como sempre sói acontecer nos países em que há ditaduras, algum tipo de arremedo de Parlamento, para tentar vender a ideia de algum grau de legitimidade. Então, faço questão de fazer essas observações, porque as coisas não podem ter dois pesos e duas medidas. Agora mesmo: o Brasil assumiu, em relação à Venezuela, no que diz respeito às embaixadas de alguns países - o que foi falado da Argentina, de outros mais -, uma atitude política importante. Primeiro, deveria ser reconhecida. Segundo, os mesmos que manifestam essas preocupações ficaram caladinhos aqui quando o Presidente do Equador mandou invadir a embaixada - era a do México - e prender, na Embaixada do México, um ex-Vice-Presidente da República. Eu não vi a extrema direita brasileira dizer nada aqui, nem nesta Comissão, nem no Plenário, nem em lugar nenhum. Então, eu acho que é importante... O nosso Governo tem autoridade política para debater essas questões e tentar produzir alguns entendimentos. Mas eu queria insistir numa tese, numa questão que foi levantada aqui... Não uma tese, mas uma questão, porque nos preocupa a todos. É lógico que não se trata de estabelecer qualquer tipo de ultimato, mas o Brasil tem que ter a previsão do que vai acontecer. Até quando nós vamos aguardar a entrega dessas atas? E se elas não forem entregues? Quais são as consequências? Nós vamos declarar que não reconhecemos o governo anterior, o Governo de Maduro? Nós vamos... (Soa a campainha.) O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - ... abrir um debate para a construção de algum tipo de entendimento político? Onde para a fronteira de uma mediação para evitar uma violência política, uma guerra civil, e começa uma interferência política propriamente dita? Eu tenho ouvido alguns comentários em relação a isso. Eu teria esse interesse de saber. Segundo, eu pergunto: será que o Brasil não está assumindo... Estou fazendo não é nem uma crítica; um questionamento construtivo: será que o Brasil não está assumindo uma responsabilidade muito grande em relação a isso? Porque veja: vários países dizem "não, quero saber como é que o Brasil vai agir, quero saber como o Brasil vai fazer. Estamos confiando no que o Brasil vai fazer". Até que ponto não é uma omissão também de muitos desses países ao jogarem uma responsabilidade muito grande no Brasil, especialmente se acontecer isso que eu estou dizendo? O que é que nós vamos fazer se essa ata não aparecer? E até onde vai a nossa participação nesse processo, para que isso não se configure como uma interferência política? |
| R | O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Concedo a palavra ao Senador Randolfe Rodrigues. O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AP. Para interpelar.) - Obrigado, Presidente Renan. Meu caríssimo Embaixador Celso Amorim, é sempre uma honra enorme para todos nós aqui apreciar seu conhecimento e suas informações, V. Exa., que é um orgulho da nossa chancelaria e do nosso Itamaraty. Eu acho que, na preliminar, é necessário ser registrado isso, porque, ao ver o senhor aqui falar, como já vi anteriormente o Embaixador Mauro Vieira, nós apreciamos o retorno da tradição diplomática brasileira, tradição diplomática brasileira que sempre destacou este país como uma nação multipolar com relação a todas as nações no mundo e baseado nos princípios constitucionais que estão no art. 3º da Constituição, e é assim que nossa diplomacia está atuando agora, conforme muito bem relatado pelo senhor. E essa atuação do Brasil, que foi, de ontem, com chanceleres como José Maria Paranhos, que fundou a nossa diplomacia moderna, e é de hoje, com o senhor, que tem garantido que o Brasil não está isolado do mundo; que o Brasil não é pária. Aliás, o Brasil, nos últimos dois anos, tem demonstrado, concretamente, que voltou ao mundo. Talvez o Brasil fosse pária, se o Presidente brasileiro estivesse atacando a Primeira Dama de qualquer outro país à toa. Não é o caso do atual. Talvez o Brasil se tornasse pária, se o chanceler fizesse uma crítica genérica do chamado globalismo internacional de forma desqualificada. Não é o caso. Talvez o Brasil fosse pária, se, durante uma pandemia, o Governo brasileiro não reconhecesse as diretrizes da Organização Mundial de Saúde. Não é o caso. Eu quero aqui externar, primeiramente, uma posição pessoal, particular: a Venezuela não é uma democracia. O Governo do Sr. Nicolás Maduro é um regime de exceção, e eu quero externar claramente isso, que as instituições democráticas na Venezuela, no meu sentir, no meu entender, foram rompidas. Dito isso, é importante que todos os colegas aqui, do Plenário, percebam e acompanhem quais são os passos da diplomacia brasileira nesse caso. Basta ver as notas da diplomacia brasileira logo após o resultado das eleições. Na primeira, a Nota 336, o Ministério das Relações Exteriores da nossa diplomacia reafirmou o princípio da soberania popular na Venezuela e cobrou a apresentação da comprovação do resultado eleitoral pelo Governo do Sr. Nicolás Maduro. Nas notas seguintes, as Notas 347 e 358, esta já junto com os Governos de Colômbia e México... Que isolamento do mundo é esse, em que outras duas nações dizem que vão acompanhar as mesmas medidas e a condução feita pelo Governo brasileiro? Esses princípios foram reafirmados. Sobre direitos humanos, percebam a Nota 358 da nossa chancelaria, em que foi pedido ao Governo do Sr. Nicolás Maduro o respeito aos princípios de direitos humanos. Isso é a declaração mais forte contra qualquer ato arbitrário por parte da Venezuela. Mais do que isso era impossível ter. |
| R | Às vezes, nossos colegas querem ser, parece-me, alguns colegas meus... Eu lhe peço desculpas, Ministro Amorim, porque, às vezes, alguns colegas meus querem ser mais realistas que o rei. Quem elogiou a posição brasileira foi a Maria Corina Machado. É a Maria Corina Machado quem diz assim: "Líder da oposição venezuelana agradece a Lula [Senador Hiran] pela posição firme em defesa da democracia na Venezuela". É a líder da oposição venezuelana quem diz isso. Somente isso, aqui, para destacar. A posição brasileira tem sido chancelada pelo Presidente Biden, que ligou pessoalmente para o Presidente brasileiro; a posição brasileira tem sido chancelada pelo Presidente Macron... (Soa a campainha.) O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AP) - ... e por toda a comunidade europeia; a posição brasileira tem sido chancelada até pela oposição venezuelana. Por fim, Presidente Renan e Ministro Amorim, sejam malditas todas as ditaduras, sejam de esquerda, sejam de direita, em qualquer lugar. Encher ministérios de militares, sem critério, e entregar empresas estatais para alguns militares é condenável, Senador Hiran, na Venezuela e aqui. Prometer violência, caso seja tirado do poder, é condenável, Presidente Renan, na Venezuela e aqui. Fomentar desinformação e teorias conspiratórias, como faz o Sr. Maduro, é condenável, na Venezuela e aqui. Usar discurso violento, perseguir a imprensa, Senador Hiran, e perseguir opositores, até com uso do aparato do Estado, é condenável, seja pelo serviço de informação da Venezuela, seja com a Abin, aqui no Brasil. Não aceitar derrota, em caso de eleição, é condenável, na Venezuela e aqui. Usar a máquina do Estado, seja a Polícia Rodoviária Federal venezuelana - não sei se tem -, seja a Polícia Rodoviária Federal brasileira, é condenável, na Venezuela e aqui. Por fim, Ministro Amorim, eu queria lhe agradecer e queria cumprimentar um colega de oposição - não está aqui mais. O Senador Moro -, porque eu vi do Senador Moro, aqui, a posição dele de rechaçar, de denunciar o Judiciário e o regime venezuelano por impedirem opositores de concorrer nas eleições. É uma evolução e tanto. Então, valeu muito esta audiência. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Concedo a palavra ao Embaixador Celso Amorim. O SR. CELSO AMORIM (Para expor.) - Eu estava aqui pensando nas coisas que foram ditas. Bom, Senador Hiran, quanto ao seu apelo, eu estou de pleno acordo. É preciso respeitar os direitos humanos lá, é preciso melhorar a vida das pessoas lá, para que não haja essa migração em massa, que afeta particularmente o seu estado. Mas, como V. Exa. disse, em alguns casos os problemas antecedem o governo. Agora, eu não estou defendendo, de maneira nenhuma, eu não estou querendo aqui fazer elogio a ninguém, nem ao Presidente Maduro, muito menos ao Presidente da Assembleia, que criticou o Centro Carter. Eu não estou fazendo isso. Eu estou querendo lembrar que a missão do Brasil, aqui... Condenar é muito fácil. É muito fácil. Agora, o difícil é você ajudar a resolver os problemas. Esse que é o difícil, e essa é a verdadeira tarefa da diplomacia. Porque, senão, a gente ficaria aqui, só emitindo notas, não tendo diálogo... Não vai acontecer nada na Venezuela. Agora, se nós atuamos, como ele disse... |
| R | O Vaticano. O homem mais forte do Vaticano, depois do Papa, me telefonou ontem, porque ele quer saber o que é que o Brasil acha. O Presidente da França ligou para o Presidente Lula, para saber o que é que ele pode fazer. Eu concordo com o que foi dito, antes, pelo meu amigo Humberto Costa, de que eles estão um pouco jogando nas nossas costas. Isso tem os dois lados. Quer dizer, tem o respeito enorme... Agora, eu acho que é bom eles entenderem que precisam da gente, em vez de ficarem só ameaçando com sanções, aumentando isolamento... Isso não adiantou nada! Isso foi o que foi feito antes, e só agravou a situação. Eu não vou resolver - eu, Brasil -, mesmo com o apoio dos senhores, digamos, nós não vamos resolver o problema da Venezuela facilmente. É complexo. É muito complexo. Eu citei aqui o exemplo, quando visitei lá, à época ainda do Presidente Caldera: já era complexo. Ficou mais complexo? Houve uma época que melhorou, depois ficou mais complexo. Agora, é tendo relacionamento com os países, comerciando com eles, fazendo investimentos, que você influi, que influi de uma maneira adequada, democrática, republicana... Eu sou totalmente a favor de a gente exercer essa influência, mas de uma maneira que os países possam receber. Eu não sou a favor da política... Era contra a política do Big Stick, lá, dos americanos do Theodore Roosevelt, e sou contra que o Brasil também utilize uma política de Big Stick com os seus vizinhos. O Brasil tem que ter... Você goste ou não goste de determinados... E nós não gostamos muito de alguns, mas respeitamos. Respeitamos. Eu não vou aqui entrar em julgamento de outros chefes de Estado porque não me cabe aqui, não é minha função, mas o que eu quero dizer é o seguinte: nós temos que ter... O Brasil sempre foi, tem uma capacidade de mediação muito grande, desde o Ruy Barbosa e de muitos outros, obviamente, o Rio Branco e muitos outros, sobre os quais eu não preciso me estender aqui. É essa capacidade que a gente tem que usar. Isso decorre da nossa existência. Um país que tem dez fronteiras... V. Exas. provavelmente sabem que só há três países no mundo que têm fronteiras com dez países, mas o único que não tem uma guerra há 150 anos é o Brasil. Quase teve uma com a Venezuela. Poderia até ser sem intenção, a tal intervenção humanitária: você entra lá, leva um tiro... As guerras começam assim. Aquele... Esqueci o nome dele. O homem que deu o tiro lá no Arquiduque Francisco Ferdinando. Ele não estava achando que estava começando a Primeira Guerra Mundial. Ele achou que estava dando um tiro num representante da monarquia austro-húngara. Enfim... Então, não é... É uma coisa que requer paciência, requer trabalho... (Soa a campainha.) O SR. CELSO AMORIM - Bom, eu não sei se faltou alguma, se eu não falei de todos. Fiz algumas referências rápidas, mas, enfim, acho que mais ou menos o que eu queria dizer foi dito. Vai surgir oportunidade de... Não vou ficar dizendo aqui que concordo com o Senador Randolfe, isso é mais ou menos óbvio, mas eu me lembro de que nós tivemos alguns embates, sempre construtivos, quando eu era Ministro da Defesa, porque cada um, no seu posto, estava tratando de restabelecer a Comissão da Verdade, restabelecer os direitos humanos, e não é uma tarefa fácil, e nós avançamos um pouquinho. Não tanto quanto eu gostaria, mas enfim... O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - O Senador Humberto fez uma pergunta objetiva... (Intervenção fora do microfone.) |
| R | O SR. CELSO AMORIM - Qual é a pergunta? Desculpe, eu... O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Não, é sobre a questão da mediação e sobre a questão da interferência. Na verdade, o Brasil está cumprindo um papel neste momento em que há uma responsabilidade imensa colocada sobre nós e uma referência para muita gente, mas eu perguntei sobre até onde nós vamos, sem chegar a uma posição de um ultimato. O que é que faremos se a posição será de que não haverá o reconhecimento? E a partir de que ponto nós passamos da condição de uma intermediação para quase uma interferência política sobre o que fazer lá? O SR. CELSO AMORIM - É difícil especular sobre o futuro, não é? Temos que lembrar um princípio do direito internacional de que não há reconhecimento de governos, há reconhecimento de Estados. O Brasil não deixará e não deveria ter deixado de ter jamais relações com a Venezuela, como foi feito - retiraram até os embaixadores, a nossa embaixada estava lá jogada ao lixo. Jamais. O reconhecimento é de Estados. Agora, não creio, não creio que nós... Se não houver algum acordo que possibilite avançar, nós não vamos reconhecer um governo se essas atas não aparecerem. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Passamos ao terceiro bloco. Esse bloco é composto pela Senadora Augusta Brito, pelo Senador Veneziano Vital do Rêgo e pela Senadora Damares Alves. E nós vamos, com a aquiescência de todos, incluir neste bloco a Senadora Rosana Martinelli também. Com a palavra, a Senadora Augusta Brito. A SRA. AUGUSTA BRITO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE. Para interpelar.) - Obrigada ao Presidente, Presidente Renan, que aqui preside esta audiência de uma forma tão democrática e sábia. Aqui eu quero, antes de começar, desejar boas-vindas ao nosso querido Celso, que aqui está tão bem, com paciência, escutando, explicando e mostrando realmente o que nós percebemos dentro do Governo Lula, pois é indiscutível realmente como o Governo Lula vem tratando - a diplomacia vem tratando - realmente esses assuntos com seriedade, com diálogo. É algo que eu percebo e confirmo aqui. Depois da fala aqui dos meus dois amigos, tanto o Humberto Costa, que fez a pergunta que eu queria também fazer, bem objetiva, como o Randolfe, que fez todo o resumo do que eu também penso e com que, enfim, concordo - e quero aqui pedir a transcrição de toda a fala dele que me antecedeu -, eu queria só registrar que nós estamos realmente retomando o protagonismo do Brasil no mundo, porque, com essa diplomacia que está sendo estabelecida através do Governo do Presidente Lula, a gente percebe a diferença. A gente percebe e constata o respeito que nós estamos tendo, tanto que estão atribuindo uma grande responsabilidade de o Brasil se manifestar numa questão que nós sabemos que é uma questão fundamental hoje para que a gente possa evitar conflitos de que possam até surgir guerras sobre isso. Isso também mostra, demonstra a recuperação do protagonismo e do respeito do Governo do Presidente Lula mundialmente. Então, fico feliz - eu não vou fazer mais as perguntas que eu ia fazer - em saber realmente que está sendo bem conduzido. E hoje eu vim aqui para assistir a toda esta audiência pública. Parabenizo também a Senadora Tereza, que teve aqui a autonomia de pedir, de convidá-lo para vir até aqui, para que a gente pudesse ter certeza, esclarecer e não ficar com nenhuma dúvida de qual é a posição do nosso país sobre isso. Eu não tenho dúvida nenhuma de que é exatamente de construir a paz e construir o diálogo através da diplomacia que já está sendo feita, da forma que eu acredito que tem que ser feita, que é a forma de procurar não ter o conflito, não acirrar o conflito, mas, sim, fazer com que o nosso país ajude esse conflito a não se aprofundar ainda mais do que já está. É só parabenizá-lo e agradecer ao Presidente pela oportunidade também de fazer esta manifestação. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Agradecemos a intervenção da Senadora Augusta. Concedo a palavra ao Senador Veneziano Vital do Rêgo. O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PB. Para interpelar.) - Presidente, os meus cumprimentos. Boa tarde a V. Exa. - já passando do meio-dia - e aos companheiros e companheiras que integram o nosso Colegiado. Saudações ao Ministro Celso Amorim, ao Embaixador Audo, aos integrantes da diplomacia brasileira. Eu quero fazer algumas rápidas considerações, até porque as perguntas vão se tornando de certa forma, o que é plenamente justificável, repetitivas. E, ao ouvi-lo na última indagação repetida do colega Senador Humberto Costa, já fico mais aliviado, porque já tenho resposta a uma dessas que faria e que renovo, como os demais outros, a partir da nossa autora queridíssima e estimada Senadora Tereza Cristina, que é exatamente nós termos, evidentemente, um corte de decisões. Nós não podemos permanecer, por mais que reconhecidas sejam... E eu quero que as minhas palavras, Embaixador, Ministro, Chanceler, sejam no sentido do reconhecimento à extraordinária capacidade diplomática brasileira, secular, reconhecida por todos indistintamente, e aqui não haveria espaço para desconhecê-la, por mais que estejamos num fórum de debates políticos e também ideológicos. O Itamaraty sempre soube se posicionar exatamente pelas conduções em diversos momentos em que historicamente foi cobrado. E salientemos que, nesses dois últimos anos, nós recuperamos, sim, boa parte daquilo que nós próprios, na diplomacia muito equivocada não feita pelo Governo anterior, terminamos nos deixando levar. Perdas de relações, afrouxamentos, enfim, isso é evidente. E não estou aqui na condição de um aliado, porque sabidamente sou um aliado do novo Governo que se instalou, não, mas é fato: o Brasil voltou a conversar, a dialogar, a restabelecer-se, a criar ligas que outrora foram sendo perdidas, com grandes apelos econômicos. V. Exa. diz que nós temos um tempo. V. Exa. reconhece que a posição do Brasil pode ser definitiva, porque leva legitimamente a uma tomada de decisão por parte do atual Governo, que, a meu ver, Ministro Celso, se instala ou se reinstala de forma ilegítima. No que disse aqui a Senadora Tereza, eu queria ouvi-lo em termos de opinião pessoal: o senhor não tem dúvidas de que essas atas não aparecerão? Evidentemente, V. Exa. poderá ou não responder, mas intimamente o senhor sabe que elas não existem, elas não vão aparecer. E, evidentemente, se o atual Presidente tivesse minimamente a segurança de que foi vitorioso, ele seria o primeiro, ainda na madrugada da apuração, a dizer: "Estão aqui, vocês que estão ávidos em saber das nossas atas, estão aqui". É óbvio! Então, a gente tem que ter um paradeiro, temos que ter um paradeiro. |
| R | E não é estabelecendo esse paradeiro, Ministro Celso, Embaixador, que nós deixaremos de ter o comedimento ou deixaremos de aplicar os princípios da diplomacia, com a marca, entre as quais, da paciência, e V. Exa. é o protótipo, o perfil da paciência. Nós precisamos assumir a nossa responsabilidade enquanto maior nação, enquanto mais importante país da América do Sul. Pergunto também a V. Exa. se existem pressões de outras... (Soa a campainha.) O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PB) - ... nações, econômicas, para que nós não assumamos e nos comportemos proximamente - e eu espero que o proximamente se dê -, dizendo que, se o Brasil adotar essa postura, ele poderá perder em relações com outros países com que economicamente são mantidos esses laços. É uma preocupação nossa. Por fim, quando V. Exa. fala sobre paz, nós temos duas: a desejada por todos nós, que é a paz entre nações, entre países, nas nossas fronteiras, mas é também desejável uma paz interna. É muito doloroso observar que, aqui, palmo acima de alguns milhares de quilômetros, cidadãos venezuelanos estejam sob uma inaceitável e desumana pressão, com nítidos atos de violência, gerando a não paz interna. Isso também deve ser uma preocupação nossa. Mantê-la, produzi-la, promovê-la entre as nações, entre os nossos dez outros países que fazem fronteira conosco, perfeito, essa é a nossa obrigação primordial, mas também há a de poder colaborar com tantos daqueles que estão amordaçados, asfixiados institucionalmente. Novas eleições a mim me parecem ser inapropriadas, porque ter novas eleições, com todo um trabalho de asfixiamento por parte do Governo venezuelano, é ter, entre aspas, "novas eleições" com lisura. Isso é a meu ver. E vejam que eu tenho um comportamento - os senhores e as senhoras bem o sabem - extremamente comedido. Penso que o Brasil tem que dar um tempo, tem que estabelecer um tempo, até em razão de não perder de vista... (Soa a campainha.) O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PB) - Vou encerrar, meu Presidente. ... aquilo em que avançou, que realcançou, que reconquistou nesses dois últimos anos. Não concordo com o meu querido estimado e respeitabilíssimo Senador Amin, quando coloca que o Brasil possa ser apresentado ao mundo como pária. Acho que, inclusive, passamos muito mais perto de sê-lo anteriormente, proximamente. Não! Agora, a gente não pode se dar o luxo de assistir de forma, vamos dizer assim, sempre postergatória. Não dá para ser enganado. Não existem atas, não vão ser apresentadas as atas. Nós poderíamos dizer que o Brasil estabeleceu esse prazo e, se não apresentadas... Se apresentadas, auditemos. Quem pode auditar? A autoridade europeia ou uma outra, mas que o façamos, porque, senão, fica muito a cavaleiro a atual realidade... (Soa a campainha.) O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PB) - ... do Presidente Maduro. Muito obrigado. E desculpe, Presidente Calheiros. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Não, que isso? Prazer grande. Agradecemos a intervenção do Senador Veneziano. E tenho a satisfação de conceder a palavra à Senadora Damares. A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF. Para interpelar.) - Obrigada, Presidente. Embaixador Celso Amorim, eu acho que o senhor percebeu que nós temos na Casa hoje uma oposição inteligente, sensata e uma oposição muito séria. |
| R | A forma como o senhor foi recebido por essa oposição aqui hoje acho que mostra. Muita gente achava que o senhor viria aqui para ser massacrado, que essa oposição iria criticá-lo. Não! A oposição reconhece a sua sabedoria, nós reconhecemos a sua trajetória, fomos respeitosos com o senhor. O senhor veio aqui, porque nós da oposição entendíamos e entendemos que um brasileiro teve a chance de dizer para um extremo ditador "mostre as atas", e esse brasileiro foi o senhor. Especialmente... E desculpe, Embaixador, é que eu sou movida pelo extremo amor às crianças e movida por uma extrema repulsa a um ditador aqui do continente. Talvez as minhas palavras soem ásperas, mas não, é extremo amor às crianças e extrema repulsa, porque crianças da Venezuela atravessaram as fronteiras sozinhas. Pergunte ao Hiran: nós temos crianças sozinhas nos abrigos de Roraima. Um país em que suas crianças fogem de um ditador... A gente precisa ter uma atenção muito especial a esse país e ao que esse ditador está fazendo, um ditador que tem como bandeira de paz prisão e sangue. Inclusive, Embaixador, eu tenho contato com comunidades religiosas do país, e adolescentes com autismo foram presos agora, na semana passada. A gente precisa rever isso, a gente precisa ver isso. Meninos com autismo sendo presos porque protestaram, mas isso é só o que é o caráter daquele ditador sanguinário. E aí o senhor está aqui, porque nós tivemos um brasileiro que entrou quando outros observadores não puderem entrar na eleição, e a gente queria muito ouvir se o senhor teve a oportunidade de dizer para o ditador: "Apresente as atas". E era só isso que a gente queria. O senhor é um homem sensato, a gente sabe disso, o senhor é um homem respeitado por muitos líderes mundiais. E o senhor teve e tem a oportunidade de dizer para ele: "Ponha fim a essa tensão, mostre as atas". E, quando ele mostrar as atas, Embaixador, uma fala sua vai cair, pois aquele país não está dividido, a gente sabe que mais de 70% das pessoas o rejeitaram, não há uma divisão meio a meio, 70% não o querem, com certeza. Então, a gente queria ouvi-lo. O senhor teve a oportunidade de dizer: "Pare de tensionar". O senhor conseguiu fazer isso, o senhor tem essa motivação? Talvez não seja a sua atribuição, mas o senhor é um homem ouvido por líderes. E aí era isso que nós queríamos ouvir aqui. E saio feliz desta audiência, porque a extrema-esquerda reconhece que precisamos de um prazo: até quando o Governo vai esperar a apresentação dessas atas ou não. E eu quero só terminar aqui a minha fala fazendo uma homenagem a uma líder feminina no continente. Nós que somos mulheres que lutamos tanto por mulheres na política, Embaixador Celso Amorim, estamos vivendo um momento histórico: uma mulher teve coragem de enfrentar um sistema. E Corina precisa, sim, ser homenageada por nós. Mesmo que algumas mulheres não concordem com a posição política dela, nós temos uma mulher muito corajosa no continente que merece todo o nosso respeito. E, por último, Embaixador, só aqui para a extrema-esquerda... É porque eles me chamam tanto de extrema-direita que eu me sinto à vontade de chamá-los de extrema-esquerda. O Brasil não perdeu protagonismo no Governo passado. Eu fui a Ministra dos Direitos Humanos, não sei se o senhor sabe, eu estive em todos os fóruns internacionais, e meu maior problema nos fóruns eram as tais reuniões bilaterais: todos os países... (Soa a campainha.) A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - ... queriam falar comigo. Fomos candidatos à comissão de direitos humanos e ganhamos no 2020 com recorde de votos. |
| R | Está aqui a Ministra Tereza, ex-Ministra. Quantos comércios internacionais você abriu, Tereza? Dezenas e dezenas. Como é que ainda se sustenta este discurso de que o Brasil esteve isolado no Governo passado?! Não! Eu acho que a gente vai ter uma audiência pública logo aqui nesta Comissão e mostrar que nós não estivemos isolados. Nós não falamos com ditadores no Governo anterior, mas nós não estivemos isolados. Pelo contrário, nós caminhamos muito em parceria com grandes nações. E, por último, só uma pergunta... Eu fiz duas. Quando eu cheguei, o senhor estava fazendo uma ácida crítica à OEA, mas quem tirou a Venezuela da OEA foi o Maduro. A pergunta é: algum movimento de que o Brasil se retire da OEA, algum conselho ao atual Governo para que o Brasil se retire da OEA, ou foi uma impressão minha, porque eu cheguei já no final de sua fala? Obrigada. E eu registro aqui todo o meu respeito e admiração pelo seu trabalho. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Nós agradecemos à Senadora Damares. E concedo a palavra à Senadora Rosana Martinelli. Com a palavra, V. Exa. A SRA. ROSANA MARTINELLI (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - MT. Para interpelar.) - Muito obrigada, Presidente. Parabéns pela condução de todas as audiências. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Ah, obrigado, obrigado. A SRA. ROSANA MARTINELLI (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - MT) - Muito obrigada pela presença, Embaixador. Eu quero reiterar as palavras tanto do nosso Senador Veneziano Vital quanto da Damares sobre a nossa preocupação. Nós sabemos do poder conciliatório do país, do nosso Presidente, e a gente não pode perder essa representatividade de que tanto realmente o nosso Presidente e vocês do Governo falam - e praticam. Então, qual é a data limite? É isso que nós queremos saber. Qual é a data limite em que o Governo vai ficar esperando para tomar o posicionamento? Como eles falaram, nós não acreditamos que tenha essas atas. Senão, ele teria entregado. Não tem o porquê. A verdade é soberana. Quando paira a dúvida, põe-se em dúvida a respeitabilidade de um governo. Então, realmente, nós aqui Senadores, com todo o respeito, queremos saber qual é o prazo realmente limite em que o Governo brasileiro vai estar aguardando o Governo Maduro. E, a observar o modelo eleitoral da Venezuela, eu gostaria que V. Sa.... Eu gostaria da opinião do senhor: o senhor recomendaria que fosse implantado o voto impresso no Brasil, como hoje tem possibilidades? Hoje, o senhor recomendaria, a exemplo da Venezuela, que hoje pode ter as atas que podem ser conferidas? Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Concedo a palavra ao Embaixador Celso Amorim. O SR. CELSO AMORIM (Para expor.) - Bom, acho que à Senadora Augusta Brito não tenho nada a dizer, ela fez um elogio, que obviamente me tocou muito. O Senador Vital do Rêgo, quando fala... Não tenho discordância, nem vou aqui defender novas eleições. Eu não propus isso, isso não está sendo discutido, mas eu quero fazer uma pequena observação. É claro que, se fossem novas eleições, teria que - ou com qualquer outra solução que se queira dar, que possa ser consensual - ser sob um sistema de vigilância diferente do que houve agora. Então, não é a mesma coisa. Não sei se V. Exa. já estava aqui quando eu mencionei isto: a União Europeia foi convidada e depois desconvidada, porque manteve as sanções. Acho que teríamos que encontrar uma solução para garantir que não se repita a mesma situação. Não sei exatamente qual. Isso é algo que teria que ser discutido, está sendo discutido. O Presidente Lula ontem conversou com o Presidente Petro sobre outras hipóteses. São várias hipóteses, mas qual delas é, digamos, ao mesmo tempo, a mais eficaz e a mais pacífica? A mera condenação, mesmo que ela venha ocorrer em algum momento, não vai resolver o problema da Venezuela. A situação da Venezuela só se deteriorou ao longo dos anos. Não vou dizer que foi culpa nossa tê-la deixado, mas o isolamento não ajudou em nada. Nós estamos querendo encontrar uma solução que seja verdadeiramente conducente a uma vitória de uma verdadeira democracia na Venezuela. Então, esse é o seu trabalho, e qualquer solução terá que vir nessa linha. |
| R | Da Senadora Damares acho que uma das perguntas eu já tinha respondido, eu não anotei aqui, mas a segunda, que é se o Brasil vai sair da OEA: não, o Brasil não está pensando em sair da OEA. A OEA tem seus defeitos e suas qualidades. Não é aqui o momento de a gente discutir, mas a OEA teve muita importância, por exemplo, no reconhecimento dos direitos das mulheres. Ela foi pioneira nisso como organismo internacional, então já seria um motivo suficiente para a gente continuar. Agora, a OEA também participou recentemente - quer dizer, recentemente na história - de ações muito duvidosas, como foi o golpe de Estado na Bolívia, na minha opinião. Então, é uma questão para ser discutida, mas o Brasil não pensa em sair da OEA. Mas V. Exa. tinha feito uma outra pergunta que me escapa. O SR. AUDO ARAUJO FALEIRO (Fora do microfone.) - Se falou com Maduro. O SR. CELSO AMORIM - Ah, se eu falei com Maduro? Sim, eu estive com ele no dia seguinte da eleição e, depois de uma conversa inicial mais genérica, até para criar um ambiente minimamente favorável, eu insisti na importância da entrega das atas. E ele me disse - o Audo estava presente, mas se dirigindo a mim, e na presença do Presidente da Assembleia -: "Elas sairão nos próximos dias". Eu passo daí para a questão do prazo, que acho que foi a última que foi colocada. Eu aprendi que na diplomacia não se estabelecem prazos. Eles podem até ser usados em alguns momentos, mas não são verdadeiros, são apenas um estímulo a que as coisas possam acontecer. Eu acho que não adianta nada eu fazer um prazo hoje e, depois de amanhã, eu descobrir que as coisas estão evoluindo, mas que vão tomar mais tempo. Eu participei de inúmeras negociações internacionais dos mais variados tipos - digamos, negociações econômicas -, em que os prazos finais eram estourados seguidamente. A gente não podia dizer: "Então, vamos parar, porque o prazo acabou". Então, eu acho que nós estamos chegando a um ponto em que é preciso sentir uma evolução real. Eu tenho dito isso e repetido, o Presidente Lula disse... (Soa a campainha.) O SR. CELSO AMORIM - ... mas eu acho que seria leviano dizer: "Olha, se até domingo não aparecerem as atas, nós vamos...". Se na segunda-feira a gente perceber que tem alguma coisa, eu vou dizer não, porque eu tinha dito que era no domingo? Então, eu acho que nessas coisas a gente tem que ter um pouco de cuidado, mas é claro que não é uma coisa para sempre. Agora, eu queria lembrar um ponto, só que eu acho que foi esquecido aqui por mim também e que é muito importante. O Presidente Maduro tem pela frente quase seis meses de acordo com a Constituição atual. Então, ele é o Presidente da Venezuela de acordo com a Constituição atual. E o que nós queremos é que, qualquer que seja a solução, esses seis meses não se transformem, não ofereçam um palco para violência de um lado ou de outro. Criticamos e criticaremos a violação dos direitos humanos, mas temos que trabalhar de uma maneira eficaz. |
| R | Eu trabalhei muito com direitos humanos, fui Embaixador em Genebra, como a Senadora sabe, e, por exemplo, uma das resoluções que o Brasil propôs no tempo em que eu era Embaixador - não era nem o Governo Lula, era o Governo Fernando Henrique Cardoso - era considerar que o racismo é incompatível com a democracia. As chamadas democracias resistiram muito a isso, não queriam - não queriam. E teve até uma cena bizarra de um Embaixador americano para esse órgão, que era negro, me pedir para retirar essa resolução. Para ver quanto a gente tem que confiar nas palavras das pessoas, no final a resolução passou por consenso. Acho que foi a única resolução no Conselho de Direitos Humanos que foi aprovada pelos árabes e por Israel. Mas, enfim, isso tem que ver o andamento das coisas. (Soa a campainha.) O SR. CELSO AMORIM - Agora, repito, o Brasil não reconhecerá um Presidente que não esteja fundado nas atas. A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS) - Muito obrigada. A SRA. ROSANA MARTINELLI (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - MT) - Eu gostaria de saber da resposta, se o Embaixador recomendaria o voto impresso no Brasil, opinião pessoal do senhor. O SR. CELSO AMORIM - Você está perguntando a mim? A SRA. ROSANA MARTINELLI (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - MT) - Sim. O SR. CELSO AMORIM - Eu não sou técnico em direito eleitoral. O SR. RENAN CALHEIROS (Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Senadora Tereza Cristina. O SR. CELSO AMORIM - Eu sou contra a manipulação (Fora do microfone.) ... das propostas para atrapalhar as eleições. Isso eu sou contra. Agora... A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS) - Embaixador, obrigada pela sua vinda aqui. Eu acho que foi muito produtiva esta nossa manhã aqui, discutindo esse assunto, esclarecendo algumas posições do Governo brasileiro em relação à Venezuela, às eleições na Venezuela, aos direitos humanos, enfim, o que pensa o Executivo. Quero deixar registradas duas coisas, além do meu agradecimento pela sua vinda. Quero dizer que eu tenho o maior orgulho da carreira diplomática do Itamaraty, o que essa carreira de Estado faz pelo nosso país. Eu tenho o maior orgulho de ser brasileira e ter um Itamaraty como o que nós temos. Segundo, eu queria lhe dizer que eu estava ouvindo aqui uma declaração agora da Sra. María Corina Machado no Instagram, agradecendo. Tenho a impressão de que ela participou, ouviu e de que ela gostaria que, com essa força que a gente vem dando e que o Brasil tem, o Brasil fique atento aos próximos passos que virão nos próximos dias na Venezuela. Então, eu quero aqui enaltecer, Damares, Rosana, a figura da María Corina, porque tem que ser muito corajosa para enfrentar todo um sistema. Ela foi inabilitada para concorrer, mas assim mesmo continuou liderando esse movimento de oposição, organizou a oposição venezuelana. Tanto é que essas atas eles não fizeram de improviso; isso eles estavam já coordenados na sua base para que pudessem ter isso, porque sabiam que as eleições com certeza seriam contestadas. As atas existem. O Governo, a Suprema Corte - não sei como é que chama lá... (Intervenção fora do microfone.) A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS) - O CNE não quer entregar. Elas existem, tanto é que a oposição tem a cópia de quase todas. Acho que elas não serão entregues. |
| R | Eu concordo com o senhor. E aí, mais uma vez, eu cumprimento a diplomacia brasileira, porque vocês são grandes negociadores, vocês são treinados para negociações. Então, não pode ter prazo, mas também isso não pode ficar indefinido, porque desgasta a figura do Brasil. Se o Brasil tem esse papel de mediador e outros países estão se aconselhando e nos ouvindo sobre a situação da Venezuela, eu acho que o Brasil vai precisar dar uma resposta. Se o Brasil não aceitar as eleições e se as atas não forem entregues, eu acho que será um gol para o Brasil não concordar com uma ditadura que não quer nem minimamente entregar os resultados para dizer que ela é uma democracia. Então, as eleições não foram ganhas, mas, enfim, vamos aguardar. Cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém, mas têm prazo: até depois do parto, você toma por 40 dias, depois tem que voltar à vida real. Então, muito obrigada pela sua presença, e nós temos que lá votar agora o destaque. Peço licença para poder ir ao Plenário, porque nós temos lá uma votação importante e eu tenho que defender um destaque feito por mim. Muito obrigada. Muito obrigada, Embaixador Audo, também, pela sua presença. O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Como todos sabem, a reunião é consequência da aprovação do requerimento da Senadora Tereza Cristina, o Requerimento do Senador Ciro Nogueira convidando o Chanceler Mauro será agendado tão logo Ministro volte ao Brasil, e havia um terceiro requerimento que foi retirado pela autora de convite para a Embaixadora em Caracas. Eu quero agradecer a presença do Embaixador. É muito importante. E esta Comissão demonstra sobretudo que debater a eleição na Venezuela não fere ou interfere na soberania daquele país e que debater não é nenhum tipo de intervencionismo, tentativa de invadir competência das autoridades locais; muito pelo contrário, o Brasil - todos sabem - tem um relevante papel a cumprir na restauração da paz e da democracia na Venezuela, e esta Comissão fará qualquer esforço nessa direção. Agradeço, mais uma vez, ao Embaixador e, nada mais havendo a tratar, nós declaramos encerrada a presente audiência pública. (Iniciada às 10 horas e 05 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 34 minutos.) |

