12/11/2024 - 67ª - Comissão de Educação e Cultura

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 67ª Reunião da Comissão de Educação e Cultura da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura, que se realiza nesta data, 12 de novembro de 2024.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública com o objetivo de debater o tema "Educação Midiática, com ênfase no uso de aparelhos celulares dentro das escolas", em atenção ao Requerimento nº 88, de 2024, desta Comissão de Educação e Cultura.
Vão fazer parte desta audiência pública os seguintes convidados e convidadas: aqui à minha esquerda, a Sra. Ana Úngari dal Fabbro, Coordenadora-Geral de Tecnologia e Inovação da Educação Básica do Ministério da Educação (MEC); a Sra. Fabiane Bitello Pedro, que está também a caminho desta Comissão, Vice-Presidente da Região Sul da União dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme); a Sra. Patricia Blanco, à minha direita, Presidente do Instituto Palavra Aberta; e participará de forma remota o Sr. Ricardo Tonassi Souto, Presidente do Fórum Nacional de Conselhos Estaduais de Educação (Foncede).
Eu quero, de imediato, dar as boas-vindas e agradecer a presença dos convidados e das convidadas para debatermos um assunto que está na pauta do Brasil nesses últimos tempos - não só do Brasil, mas do mundo também -, sobre a utilização dos aparelhos celulares dentro das escolas. Porém, a Comissão de Educação e Cultura do Senado ampliou esse tema para educação midiática, porque, na verdade, temos que discutir todo o processo de educação para as mídias, para a tecnologia, para tudo aquilo que for importante para a segurança das pessoas, para o desenvolvimento das pessoas e a sua educação, mas também limites - tudo na vida tem que ter os seus limites e orientações -, para que, com esses limites, possam principalmente famílias, alunos e profissionais saber o que fazer, como fazer, o que é importante, o que é necessário. Então, este debate, esta apresentação, esta reflexão vai acontecer, na tarde de hoje, nesta Comissão.
Já conheço os participantes, os convidados e convidadas, os conselhos municipais de educação, os conselhos estaduais de educação, o Ministério da Educação e a Patricia Blanco, do Instituto Palavra Aberta, que já esteve, por inúmeras vezes, aqui no Senado Federal.
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Informo também que foi convidado o Conselho Nacional de Educação, que não indicou representante.
Antes de passar a palavra aos nossos convidados e convidadas, comunico que esta reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania, na internet, no endereço senado.leg.br/ecidadania ou pelo telefone 0800 0612211.
O relatório completo com todas as manifestações estará disponível no portal, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos expositores e expositoras.
Na exposição inicial, cada convidado poderá fazer uso da palavra por até 15 minutos. Ao fim das exposições, a palavra será concedida novamente aos expositores e eventualmente a Parlamentares, se assim o desejarem, para fazerem suas perguntas ou comentários. Incentivamos - quero enfatizar - a participação das pessoas pelo Brasil, assistindo, refletindo, pensando sobre a temática e, se desejarem, fazendo comentários ou perguntas também. É um assunto que vai ficar em pauta durante algum tempo. (Pausa.)
Muito bem. Então, nós vamos começar com o Dr. Ricardo Tonassi Souto, que está participando desta audiência pública de forma remota, Presidente do Fórum Nacional de Conselhos Estaduais e Distrital de Educação (Foncede).
Seja muito bem-vindo de novo, Ricardo. Agradeço por todas as ocasiões em que o Foncede participou, na sua pessoa, e contribuiu de maneira importante para os debates da Comissão de Educação e Cultura. Com a palavra.
O SR. RICARDO TONASSI SOUTO (Para expor. Por videoconferência.) - Muito boa tarde, Senador Flávio Arns. Boa tarde a todos aqueles que nos veem e nos ouvem, a todos os convidados. É sempre uma honra me dirigir ao Senado da República, à Comissão de Educação do Senado e especialmente ao Senador Flávio Arns, a quem eu faço questão de saudar pessoalmente pela forma sempre gentil, pela forma sempre carinhosa como me tratou todas as vezes em que estive aqui para contribuir de alguma forma com a educação brasileira.
Este é um dos assuntos mais comentados do momento, um assunto absolutamente delicado e já inicio dizendo que não existe nenhuma solução fácil para isso. Lamentavelmente, não. Se o intuito é ouvir uma resposta de que temos uma solução fácil para isso, não temos.
Boa parte das informações que eu menciono aqui fizeram parte de um artigo da Profa. Ana Karina Brenner e do Prof. Paulo Carrano, intitulado: "Os Desafios da Escola frente às Tecnologias Digitais". Os dois, professores de universidades públicas, fizeram um trabalho brilhante. Um documento é fundamental ser trazido à tona para trazer luz ao debate, que é o Relatório de Monitoramento Global, da Unesco, de 2023, intitulado "Tecnologia na Educação: Uma ferramenta a serviço de quem?", que traz apontamentos muito interessantes para se pensar a relação de crianças e adolescentes e as tecnologias digitais na escola. Ele foi realizado sob os efeitos da pandemia sobre os processos globais de escolarização e acaba reportando as consequências da educação online nesse período específico.
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Tem um complexo de fatores que torna muito problemática a implementação de novas tecnologias digitais na escola. Eu posso citar aqui o custo elevado para aquisição das tecnologias, notadamente em países de baixa renda, em estados em que a situação orçamentária e financeira não é das melhores; o bem-estar das crianças e dos adolescentes, que têm os seus dados expostos frente, ainda, à ausência ou à fragilidade de leis de privacidade de dados; e o custo ambiental das trocas de equipamentos sem uma preocupação em aumentar a vida útil dos que já estão em uso. Somado a isso, a gente ainda tem uma qualificação insuficiente do corpo profissional das escolas para lidar com as inovações tecnológicas e, por último, mas não menos importante, a distração que os celulares, levados pelos estudantes à escola, produzem nessas relações de aprendizagem quando não... (Falha no áudio.)
... pedagógicas na escola.
Aqui eu faço o meu primeiro parêntese e um corte na própria carne. É muito difícil educar quando não se dá o exemplo e não é rara - muito pelo contrário - a quantidade de professores e técnicos administrativos que, no exercício das suas funções, enquanto a exercem, utilizam o celular, seja para olhar o WhatsApp, seja para ver um recado, um vídeo importante, qualquer coisa que tenha recebido, em meio a uma aula por exemplo, quando há proibição, muitas vezes, por parte do docente, de que o aluno mexa no celular.
Então, é fundamental - eu vou usar uma palavra forte, Senador - que alijemos, que afastemos essa hipocrisia. Nós precisamos cortar na nossa própria carne e dizer que essa proibição, se for assim determinada pelo Congresso Nacional, tem que ser para todo mundo. Não pode ser só para o aluno, também tem que ser para o professor. O professor não pode ficar com o celular em sala de aula e proibir o aluno de utilizá-lo.
Quando eu falo nessa distração, eu falo aqui dos meus filhos pequenos: um vai fazer 14 e a outra vai fazer 12. A gente ensina aos filhos não mentir. Eu acho que pelo menos qualquer pai sensato e razoável ensina isso. Para que eles tenham acesso a uma rede social que, na mente deles - não é só na mente deles, mas na mente de muitos de nós -, caso eles não estejam lá, eles não estão no mundo virtual, eles mentem. Eu digo isso porque existem regras de certas redes sociais. Aqui eu faço questão de citar como exemplo o TikTok, que determina uma idade mínima para acesso.
Outro dia, eu perguntei para a minha filha: “Como é que você, com 11 anos, conseguiu ter acesso à rede do TikTok? Qual foi a data de nascimento que você colocou lá?”. Ela disse para mim - e eu fiquei espantado - que ela colocou lá na rede que ela nasceu em 1954. Isso todas as crianças que estão no TikTok, com menos de 13 anos, fizeram. Se vocês, em casa, não sabiam, podem perguntar aos seus filhos em casa que têm menos de 13 anos, por que eles mentiram ao inserir seus dados.
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E não há nenhum tipo de controle - o que deveria ocorrer de forma imediata por parte da empresa - para saber se aqueles dados estão corretos, se são verdadeiros ou não, porque senão a empresa simplesmente faz um lava-mãos, lava suas mãos com relação a isso e diz: "Não, eu perguntei antecipadamente, e eles disseram isso. Não tenho culpa se eles mentiram". Fica muito mais fácil para a empresa tratar dessa forma.
Volto ao relatório. É necessário dizer também que esse relatório denunciou a existência de interesses de mercado que atravessam os resultados de boa parte das pesquisas sobre o uso das tecnologias digitais na educação e informou que quase 90% do conteúdo disponível em repositórios da educação superior foi criado na Europa e na América do Norte, e quase a totalidade deles está disponível somente em inglês. Então, há uma concentração de produção de conteúdo digital e isso afeta o uso pelos grupos com maior dificuldade para acessar recursos de toda origem, inclusive digitais.
É fundamental também deixar aqui que, a partir dos dados de 14 países, fica razoavelmente evidenciado que estar próximo de um aparelho celular é fator de distração, e reforça-se a percepção de que os equipamentos, por si só, sem mediação pedagógica no cotidiano escolar, não produzem efeitos positivos e podem ter impactos negativos na aprendizagem e nos processos de escolarização. A falta de habilidades digitais adequadas, por assim dizer, pode dificultar o melhor uso dessas ferramentas, e os professores se sentem despreparados para dar aulas usando tecnologias. A presença de celulares não implica necessariamente e automaticamente o uso destes para os estudos, pesquisas, criações no âmbito de práticas escolares. Então, isto é fundamental: a presença, por si só, do celular gera distração se não tiver uma mediação pedagógica. Aqui eu já antecipo o meu posicionamento, de que, no cenário que encontramos hoje, Senador, acho muito difícil que tenhamos todos os elementos necessários para que haja uma mediação pedagógica razoável, para que hoje nós permitamos os celulares em sala de aula. Hoje, lamentavelmente, não consigo acreditar que isso seja possível.
É óbvio que um dos aspectos mais positivos das tecnologias digitais foi a possibilidade de inclusão educacional de pessoas com deficiência e de moradores de áreas isoladas no mundo inteiro. Então, se nós temos, por um lado, os equipamentos de tecnologia, e eles ainda são muito caros e de difícil acesso para os estudantes - óbvio, notadamente de países de baixa renda, inclusive o nosso -, por outro lado, as plataformas digitais e os aparelhos estão cada vez mais incorporando elementos de acessibilidade, que têm contribuído para reduzir as barreiras de acesso à educação por grupos educacionais e por grupos populacionais.
Então, há um balancear nessa história, mas, também, de acordo com esse relatório, constatou-se que mais de 1 bilhão de estudantes durante a pandemia conseguiram ter acesso ao ensino online. Em contrapartida, cerca de meio bilhão não conseguiu, e os mais pobres somam 72% dos que não são alcançados pelo ensino online. Então, é necessário que possamos, de alguma forma, combater essa imensa desigualdade de acesso, porque ela é profunda e demonstra o extremo da desigualdade.
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Além de tudo isso, o Censo Escolar de 2023 demonstrou, aqui no Brasil, a dimensão dessa desigualdade. Na rede estadual, por exemplo, que detém a maior quantidade de números de escolas de ensino médio, 84,4% das unidades têm internet de banda larga; já o percentual de computadores portáteis, 55,4%; e de tablets para os alunos, 17,3%. Na rede privada, essa oferta de equipamento é superior e atinge 59,4% e 33,2%, respectivamente. Aí a gente vai ver que os maiores percentuais de escolas com internet de banda larga estão na Região Sudeste, 96,9%; na Região Nordeste, 88,4%; e na Região Centro-Oeste, com 88%. O Norte do país é a região com o menor percentual de internet, 63,8%, e o Sul é a região com o maior percentual de tablets para alunos, na ordem de 28% das escolas, e também é onde aparece o maior percentual de computadores portáteis para os alunos, que é 69,5%. Então, eu acho que esses elementos são importantes para que a gente vislumbre que ainda existe uma forte desigualdade na acessibilidade de conectividade, de banda larga, de aparelhos.
Aqui - eu falo especificamente do Estado do Rio de Janeiro, onde eu me encontro -, a Prefeitura do Rio de Janeiro, em fevereiro de 2024, instituiu um decreto. Aqui, especificamente na cidade do Rio de Janeiro, houve a proibição do uso dos celulares nas escolas municipais, e ela definiu as possibilidades de utilização em situações especiais, incluindo o uso pedagógico. Essa decisão foi baseada em evidências do relatório da Unesco que eu acabei de mencionar, bem como do relatório da OCDE sobre os resultados do teste internacional do Pisa, e ambos os relatórios enfatizam os fatores negativos relacionados à presença dos celulares nas escolas.
Eu acho que algumas medidas podem contribuir para o enfrentamento dessa tensão. Então, produzir processo de diálogo entre os estudantes sobre o uso dos celulares nas escolas; a partir desse diálogo, estabelecer diretrizes de uso que definam quando e como os celulares podem ser utilizados, tanto na sala de aula quanto nas demais dependências; a partir dessa reflexividade, os estudantes podem desenvolver habilidades de autorregulação, gerenciar o tempo do uso de celulares.
Isto é importante também, que os pais que nos ouvem saibam disto: existem programas de regulação parental para celulares, em que você estipula que redes podem ser acessadas, que programas podem ser acessados, qual é a quantidade de tempo que você permite que o seu filho utilize, e você controla isso do seu celular. Então, procurem programas - alguns são gratuitos, outros são pagos -, para que você possa controlar o uso do seu filho. Não precisa nem ser em ambiente escolar: na sua própria casa, muitas vezes você está trabalhando, se você não tem como fazer esse controle de uma forma mais contundente, mais presente, se você precisa que seu filho tenha um celular para se comunicar com ele, você pode fazer isso.
Eu acho que é possível também estimular que os educadores integrem o uso dos celulares nas atividades de aprendizado, ampliando o interesse dos alunos. É necessário incentivar as atividades colaborativas e lúdicas e o engajamento de estudantes através do celular e - não querendo me estender por força do tempo - promover uma consciência digital sobre os benefícios e os desafios do uso dos celulares, bem como as questões relacionadas à segurança e à privacidade online. Não querendo deixar aqui um posicionamento em cima do muro, acho que hoje é muito pouco provável que consigamos fazer isso de forma imediata. Por força disso, acho que a tendência - e eu falo isso de forma a lamentar, porque em outros países isso acabou acontecendo - é que haja realmente a proibição nas salas de aula, mesmo que isso impacte, de alguma forma, na possibilidade de utilizar esse instrumento de forma pedagógica.
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Então, o Foncede se coloca aqui, Senador, à disposição desta Casa, à disposição do Congresso Nacional para contribuir. Os conselhos estaduais e distrital de educação são órgãos reguladores da educação nos estados e muitos deles são órgãos de Estado, ou seja, suas decisões não precisam ser homologadas pelos secretários de estado ou pelo Governador, e isso é um papel importante que acabam tendo os conselhos na regulação da educação estadual e dentro de todo o cenário da educação distrital também.
Então, queria deixar aqui o Foncede à disposição do Senado Federal.
Muito obrigado, Senador Flávio Arns, pelo convite e estamos sempre à disposição de todos.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Agradeço a exposição, caro Presidente do Foncede, Fórum Nacional de Conselhos Estaduais de Educação, Ricardo Tonassi Souto. Muito bom, muito didático, muito claro e fez um panorama bem interessante e necessário. Obrigado, Dr. Ricardo.
Passo em seguida a palavra à Vice-Presidente da Região Sul da União dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme). Antes era o Foncede, dos conselhos estaduais, e agora é a Uncme, dos conselhos municipais de educação.
A Sra. Fabiane Bitello Pedro. Seja muito bem-vinda.
A SRA. FABIANE BITELLO PEDRO (Para expor.) - Boa tarde ao Senador Flávio Arns, às minhas colegas de mesa, a Ana, a Patricia, ao querido Ricardo que está virtualmente conosco e a todos que estão acompanhando este importante debate dentro do Senado, uma vez que aqui eu represento 5.152 conselhos municipais de educação, que estão distribuídos pelo Brasil. Então, é importante dizer que eu represento professores, professoras, trabalhadores em educação não docentes, pais e mães de estudantes, responsáveis legais, estudantes também - porque os estudantes, em alguns conselhos, compõem os conselhos municipais de educação -, os próprios secretários e representantes das secretarias de educação, que também compõem os colegiados, porque é importante o Governo estar também dentro dos conselhos de educação para que nós possamos fazer a discussão das políticas dentro desse território, dentro desse conjunto de atores, incluindo as escolas públicas municipais e as escolas privadas de educação infantil. Esse é o escopo de pessoas que eu estou aqui representando.
Hoje no Brasil nós temos 3 mil municípios que possuem instituído o Sistema Municipal de Ensino, que são aqueles municípios que vão ter - assim que a legislação for discutida e, caso ela seja aprovada, o Conselho Nacional de Educação também se pronuncia -, são esses quase 3 mil conselhos do Brasil que vão organizar como a política, como a ação se dará dentro dos territórios, Senador.
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Também é importante dizer que o seu convite à Uncme é muito valoroso. O senhor é nosso grande parceiro em diferentes ações, tem sido um dos grandes defensores dentro do Sistema Nacional de Educação também da presença dos conselhos municipais de educação, porque é no território que a política municipal acontece, é dentro do Conselho Municipal de Educação. É a partir desses múltiplos atores que nós, conselhos - conselheiros e conselheiras -, podemos, sim, trazer a política pensada para o território nacional, para as nossas particularidades.
O Ricardo, como Presidente do Foncede - o Foncede é um grande parceiro também da Uncme nacional -, trouxe um panorama de diferentes aspectos para a temática. Na verdade, hoje o que nós temos é uma discussão do uso do telefone celular dentro da escola, mas a gente deveria discutir o uso do telefone celular na sociedade como um todo, não somente dentro da escola, porque as nossas crianças ficam de quatro a oito horas dentro da unidade escolar. Após esse tempo, elas estarão junto das suas famílias. Por isso também a importância de que essa discussão não fique apenas na seara da unidade escolar. Nós precisamos discutir o uso dos smartphones, dos telefones celulares para além. Por isso - não é, Ana? - que a gente está agora discutindo a implementação, a complementação da Base Nacional Comum Curricular para que nós possamos discutir a cultura e construir a cultura digital dentro da educação básica no território brasileiro, porque é isso que nos falta: construir essa cultura digital firmada num pensamento do uso das tecnologias dentro do aspecto que vai contribuir com a educação.
Eu fiz uma breve pesquisa em relação a se a temática do uso de telefones nos estados onde já tem alguma legislação, decreto ou lei estadual que regule a proibição, que coloca a proibição... No Rio Grande do Sul, por exemplo, estado em que eu resido, nós já temos lei desde 2008 e nós fomos observar se algum conselho municipal de educação havia tratado do tema por competência, como nós temos uma lei estadual que abrange todo o território gaúcho, e o Conselho de Bento Gonçalves tem um parecer que dialoga sobre o uso e traz muito fortemente a divergência entre a lei estadual e também a própria Base Nacional Comum Curricular, que traz a perspectiva de uma cultura digital.
Então, na verdade, nós estamos, eu acho, trabalhando com um ator que não deveria ser o foco. Eu acho que, na verdade, o nosso foco de discussão deveria ser o uso das tecnologias como um todo, porque, na verdade, hoje o que falta para a população mundial é esse olhar. Se nós fizermos a proibição do uso nas escolas, as nossas crianças vão continuar usando ele em casa.
Quando nós vamos a um restaurante hoje, quando nós, cidadãos comuns, chegamos num restaurante, não tem bebezinhos com o telefone celular enquanto o pai e a mãe estão ali, merecidamente, jantando? Com um tablet ou um smartphone acoplado no seu carrinho ou no bebê conforto para que a criança se distraia enquanto a família possa jantar ou almoçar?
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Então, nós precisamos discutir, sendo que a Sociedade Brasileira de Pediatria proíbe o uso de celulares para crianças de até dois anos, e ela também sugere, estabelece como mais saudável que as crianças de dois a cinco anos tenham apenas uma hora diária de exposição à tela, e ainda uma exposição que seja acompanhada por um adulto.
Então, é nessa perspectiva que a Uncme vem trabalhando. E é claro que, se a legislação for aprovada, os conselhos municipais de educação vão tomar para si, Senador, esse compromisso de discutir, mas nós precisamos entender que, dentro da escola, também ele é uma ferramenta pedagógica. Nós temos muitas redes que produzem filmes utilizando smartphones, que, inclusive, a própria prefeitura municipal investe... No meu município, São Leopoldo, nós temos o São Leo em Cine, que são gravados com smartphones que foram adquiridos pela escola, com o apoio do poder público municipal, e nós temos exposição, no cinema da cidade, das produções que os nossos estudantes criam.
Então, quando a ferramenta é utilizada com acompanhamento, ela, sim, tem um grande benefício, e ali nós estamos vendo cineastas amadores, mas são cineastas que vêm produzindo filmes belíssimos, produções feitas dentro da escola, em que eles discutem o dia a dia da escola. Então, o uso de celulares precisa ser discutido com grande responsabilidade, ouvindo os especialistas - e por isso a importância de termos especialistas que tratam do tema -, mas também é preciso ouvir as comunidades escolares, ouvir os estudantes, ouvir os professores.
O Ricardo trouxe a nossa grande dificuldade. De fato, nós não fomos educados com o uso das tecnologias digitais, mas, hoje, os nossos estudantes nos chamam para esse movimento. Nós passamos pela pandemia, tivemos uma dificuldade tremenda em aprender a entrar numa sala para uma reunião virtual. Hoje, nós conseguimos utilizar, como profissionais da educação, as ferramentas tecnológicas, mas ainda nós carecemos de que a universidade prepare os professores para esse uso tecnológico também, que isso esteja dentro das licenciaturas, planejado na formação inicial e na formação continuada dos professores, porque o uso das tecnologias se faz, sim, importante, mas nós precisamos entender que, entre o remédio e o veneno, a diferença é a dose.
Então, nós precisamos entender, eu acho que nós adultos precisamos ser educados para esse uso consciente, para que as nossas crianças e os nossos estudantes tenham o direito ao lazer, à brincadeira externa, que nós acabamos nos esquecendo. Acho que todos que estão aqui subimos em árvore, brincamos na rua. Eu tenho filhos, os meus filhos não brincam na rua. Eles brincam no pátio de casa, pela segurança. Então, a importância de pensarmos as nossas cidades também para esse espaço, os parques naturalizados, espaços de convivência para a comunidade, principalmente para a periferia, onde, sim, nós possamos dar condições, porque, para a gente dizer que as nossas crianças precisam ir para a praça brincar, a praça tem que ser segura, tem que ter balanço, tem que ter um parquinho, tem que ter uma areia limpa para as nossas crianças poderem brincar. É isto que transforma uma sociedade: uma cidade pensada para as crianças. E aí a gente vem com a discussão do Plano Nacional pela Primeira Infância, de pensar os primeiros mil dias de vida de uma criança. Então, são muitas ações que o Brasil vem discutindo e nós precisaríamos "linkar" todas essas ações para que, de fato, possam surtir o efeito dentro da escola.
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Então, este debate, Senador, é um debate que eu acredito que tem que chamar toda a sociedade para que, de fato... E o Ricardo trouxe que nós temos que ser muito verdadeiros. Então, a importância de sermos verdadeiros no debate, principalmente para dizer que não é apenas um debate da escola; é da escola também, mas precisa ser da sociedade.
Então, a Uncme nacional vem, sim, trazendo, dentro do seu conjunto de ações, esse compromisso e assume com o Senado a ideia de que é importante e é crucial a discussão, mas que nós possamos ouvir aqueles que, de fato, vivem a docência, vivem a escola, para que nós, sim, possamos ter um planejamento que possa ser exequível. Muitas escolas já têm, nos seus regimentos escolares, a organização do uso dos smartphones, e isso os conselhos municipais de educação estimulam e, inclusive, orientam quando nós aprovamos os regimentos escolares, porque é uma das nossas atribuições aprovar os regimentos. E nós temos orientado que as escolas também façam essa delimitação, até para que ocorra o uso consciente e adequado dessa ferramenta tecnológica, mas, principalmente - o Ricardo também trouxe outro ponto importante - não é só para a criança e para o estudante, é para o corpo de profissionais.
Quando nós fazemos uma vistoria numa escola, por vezes nós pegamos os professores com o seu telefone na mão. Às vezes, estão fazendo a chamada, porque também a chamada hoje ocorre no smartphone - muitos municípios adquiriram plataformas digitais e toda a vida escolar é feita no smartphone. Então, tem isso também, muitos municípios investiram na aquisição de smartphones por causa disso, certo? -, mas também para postar as interações pedagógicas das crianças. E aí vem uma outra discussão que a gente carece fazer: o uso indevido da imagem das nossas crianças nas redes pessoais dos professores e das professoras, porque os pais assinam uma autorização para as redes sociais da escola, não para as redes sociais dos professores.
Então, temos, sim, muito a discutir a respeito dessa grande cultura digital, e a BNCC Computação vem nos convocar e nos trazer esse debate, não só por agora ser uma das condicionalidades do VAAR, para que nós possamos organizar dentro dos nossos sistemas de ensino, mas também para que nós possamos trazer este debate e trazer as nossas fragilidades, seja pelo uso adequado das ferramentas, seja pela interpretação inadequada da própria ferramenta dentro da escola.
Nós assumimos, sim, esse compromisso, e o Senador pode contar com a Uncme para todos os debates que forem da educação para que a gente consiga auxiliar as nossas crianças e estudantes para um Brasil ainda mais justo, mais equânime e para que a gente consiga, de fato, dar condições de aprendizagem significativas.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Muito interessante também. Parabéns. Extremamente didático, realista e colocando os desafios.
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Eu, inclusive, quero... Nós sempre temos tido o apoio extraordinário da Uncme, sabe? Do Foncede também, do MEC e da Palavra Aberta. Aliás, nós estamos muito solidários em muitos aspectos dessa caminhada. Ouvindo também o Ricardo e ouvindo agora você, Fabiane, a gente pensa que vocês poderiam nos auxiliar a escrever um pré-projeto. Eu acho que o MEC, junto com a Uncme, com o Foncede... para que aí pudéssemos chamar os outros setores da sociedade, inclusive os estudantes, a Ubes, por exemplo, União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, e também outras entidades para fazer o debate a partir de uma proposta. Eu acho que isso...
Até o MEC, talvez daqui a pouco... Também a... não a Patricia, a Ana, vai falar. O MEC talvez até tenha uma proposta, não sei se já tem elaborada, mas agradeço muito, Fabiane. Você, residente em São Leopoldo, ainda quero te dar a nossa solidariedade, de novo, em função das enchentes no Rio Grande do Sul. Eu tenho parentes que moram também em São Leopoldo e eles relataram que foi algo inacreditável, uma devastação total. Então, a nossa solidariedade a vocês, ao povo. Transmita lá.
Inclusive, aqui nós tínhamos emendas da Comissão de Educação e Cultura, e a Comissão de Educação e Cultura deliberou que toda e qualquer emenda da Comissão de Educação e Cultura fosse direcionada para o Rio Grande do Sul - essa foi uma deliberação dos 27 titulares e 27 suplentes -, para o Rio Grande do Sul de uma maneira geral. Mas quanto a São Leopoldo, eu sei que foi grandemente afetado o município, não é?
Vamos em frente.
Passamos em seguida a palavra à Patricia Blanco, que já esteve também no Senado por diversas vezes e tem um trabalho muito bom também nesta área, há muito tempo, porque é Presidente do Instituto Palavra Aberta. Com a palavra.
Com a palavra, então.
Palavra aberta...
A SRA. PATRÍCIA BLANCO - Com a palavra aberta, não é? (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - ... para vocês aí, Patricia. (Risos.)
A SRA. PATRICIA BLANCO (Para expor.) - Muito obrigada, Senador Flávio Arns.
É sempre uma honra estar aqui podendo discutir, contribuir com este debate que é tão relevante para a nossa sociedade.
Ana, Fabiane... Ana, já somos, já temos trocado muitas informações, sempre muito solícita em relação às discussões, em relação à educação midiática. Fabiane, é um prazer te conhecer, te ouvindo eu vibrava aqui porque acho que muito do que você trouxe são questões por que também a gente passa, a gente discute dentro do Instituto Palavra Aberta, também o Ricardo. E quero agradecer de novo a possibilidade de poder participar deste importante debate.
Eu trouxe aqui uma apresentação, mas queria passar mais para a gente organizar um pouco o conceito da educação midiática e como ela pode ajudar nessa discussão sobre proibir ou não proibir, educar para o uso, até discutindo questões que vão muito além de simplesmente a proibição por si só, porque se a gente olhar hoje, discutir: "vamos proibir o celular da sala de aula", será que só a escola é o locus, como bem a Fabiane colocou, o locus de preocupação para o uso correto, seguro, ético, responsável da tecnologia? Será que a gente determinar um único dispositivo como sendo nosso inimigo da vez, dizendo: "o problema é o celular", para todos os outros problemas complexos de uma sociedade moderna, conectada em que a gente vive, vai solucionar o problema?
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Então eu vejo que este debate se dá num momento de extrema relevância, principalmente pelo fato de que nós gostamos muito de legislar, nós gostamos muito de achar que uma lei vai resolver todos os nossos problemas. E muitas vezes, a lei vai simplesmente não pegar, como a gente sabe, Senador, que muitas leis, no Brasil, acabam não pegando.
E aí, eu queria lembrar um ponto que eu acho que a Fabiane trouxe aqui, na questão da lei, de São Leopoldo, que foi de 2008. A lei que proíbe o uso do celular nas escolas do DF é de 2007. Então, desde 2007, existe uma legislação que proíbe o uso. Ela está sendo efetivada? Ela está sendo, de fato, seguida?
Então é um problema muito mais complexo, que eu acho que a gente não pode usar, não pode ter uma posição maniqueísta, de sim ou não, 8 ou 80. A gente precisa olhar de uma ótica para encarar a complexidade do nosso tempo.
E aí, até para falar um pouco da complexidade, aqui rapidamente, Palavra Aberta é uma entidade sem fins lucrativos, que atua, já há quase 15 anos, na defesa e promoção da liberdade de expressão, liberdade de imprensa e da educação midiática como direito do cidadão, para que ele, de fato, se torne um cidadão empoderado, autônomo, independente, para que ele possa participar ativamente do ambiente informacional e midiático com todos os seus direitos e exercendo a sua liberdade de expressão, esse direito fundamental.
Mas também a gente tem programas voltados para a terceira idade. O EducaMídia é voltado para as escolas; o EducaMídia 60+, para a terceira idade; o #FakeToFora, para combater a desinformação no período eleitoral. Tudo alinhado à Base Nacional Comum Curricular.
Mas olha essa questão da complexidade. Eu gosto de trazer sempre esse gráfico, esse gráfico foi atualizado recentemente, para mostrar o que acontece em um minuto na internet. Então quando a gente fala da complexidade do mundo digital, em que a gente está discutindo banimento ou não banimento, proibição ou não proibição, a gente tem que olhar também o que a gente está fazendo para preparar o cidadão para essa complexidade que está aqui, quer dizer, olha quantos milhões de posts, de comentários, de vídeos subidos no YouTube, de informação sendo gerada, de dados sendo gerados o tempo todo, por todos.
A gente vive hoje numa era da superabundância de informação e de estímulos. A gente tem estímulos o tempo todo. A gente tem estímulo para olhar o celular a cada notificação que entra, para a gente olhar as redes sociais a cada momento, para a gente verificar o produto mais recente, para a gente ver o vídeo, a música mais recente da Taylor Swift, está aqui, o que ela sobe de conteúdo e o que a rede dos fãs, das swifters sobem de conteúdo. Então a gente vive num momento de uma abundância informacional absurda, com novos formatos, novos desafios, com uma convergência nunca antes experimentada entre produtores de conteúdo e consumidores de informação o tempo todo.
Se nós éramos, sempre fomos, produtores de conteúdo - quando escrevíamos uma carta, estávamos produzindo conteúdo -, hoje a gente produz, dissemina, curte, compartilha, posta e faz todo esse processo tudo na palma da mão. Então essa complexidade se torna ainda mais intensa quando a gente olha, por exemplo, que dentro de um feed de notícias, dentro de uma rede social, ou até mesmo em qualquer serviço de mensageria, a gente tem informação, desinformação, opinião, sátira, propaganda, publicidade, discurso de ódio, apostas online, bets, tudo junto e misturado num ambiente para o qual a gente precisa olhar e falar: "Opa, espera aí, o que é isso de fato?".
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Mas como a gente vai fazer isso se a gente já tem aqui - segundo pesquisa da TIC Kids Online, de 2024, recém-divulgada -, entre jovens, crianças e jovens de nove a dezessete anos, 93% que já acessam a internet, o que corresponde a mais de 25 milhões de jovens nessa faixa etária. Há 98% que acessam a internet via celular; 69%, pela TV, as smart TVs, - e as smart TVs não estão nas escolas, elas estão nas salas de casa -; 37%, pelo computador. Olha que pouquinho pelo computador. Games ficou uma coisa até muito fora do contexto.
Mas eu queria trazer um outro dado, que é esse de baixo: 83% desses jovens de nove a dezessete anos têm perfil próprio nas redes sociais, sendo que 45% usam o Instagram; 43%, o YouTube e 37%, o TikTok. E há só um dado que eu acho que seria interessante a gente trazer e que não está aqui: 81% desses jovens já possuem celular próprio, sendo que, na faixa etária de nove a dez anos, 67% da população já tem um celular próprio; na faixa de 11 a 12, 79%; de 13 a 14, 77%; e de 15 a 17, 93%, ou seja, o celular está na mão das crianças, já é uma realidade.
A gente, olhando isso, sempre tem essa questão que é colocada: "O jovem que nasceu hoje é nativo digital, ele já nasceu sabendo". Ele pode ter uma facilidade muito maior do que nós, que não somos nativos digitais, que somos... Eu brinco, Senador, que nós somos jovens há mais tempo, e a gente não consegue, de fato, mexer naquele dispositivo de forma tão ágil, tão fácil como um jovem, mas eles são inocentes digitais. E aí a gente precisa olhar para esses inocentes digitais e instruí-los, oferecer ferramentas para que eles possam criar a autonomia necessária para usar esse ambiente no qual eles já estão imersos de forma ética, responsável e com segurança.
Então, a gente precisa de fato olhar para a educação midiática como sendo uma... Eu falo educação midiática como um guarda-chuva mais amplo, mas é a educação digital e midiática, é a educação voltada para o uso das tecnologias de informação e computação, é o que está na BNCC Computação, é o que já está na BNCC no que tange à questão de cultura digital, e assim por diante.
E lembro que o baixo letramento informacional, ou seja, de toda a sociedade, é um fator seriíssimo de exclusão. Por quê? A pessoa que não é letrada, que não sabe identificar um conteúdo, que não sabe se colocar corretamente, que não sabe se proteger de golpes, por exemplo, está suscetível a cair em desinformação, a ser vítima de discurso de ódio, de teorias da conspiração, de jogos online, de exposição a riscos, de exposição exacerbada da imagem - como bem colocou a Fabiane, do uso da imagem por parte de professores, ou até mesmo dos pais. Tem até um termo para isso, o parenting, que é o fato de os pais usarem as redes para divulgar de forma absurda a imagem dos filhos. E também há a questão de você reafirmar preconceitos que precisam ser desconstruídos desde o início, desde os anos iniciais do ensino fundamental, por exemplo.
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Então, a educação midiática é esse conjunto de habilidades para acessar, analisar, criar e incentivar a participação ética responsável no ambiente informacional, seja no ambiente online, seja no ambiente offline. E aí, toda essa questão do uso... O fato de hoje nós estarmos, todas as nossas relações, inseridos nesse universo digital, em que as nossas relações são mediadas por tecnologia, determina que a gente precisa conhecer o seu funcionamento. A gente precisa entender quais são as estruturas sociais, técnicas, o que está por trás dos algoritmos, o que está por trás da construção dessas redes para que a gente possa, de fato, empoderar o cidadão para que ele faça um bom uso, saber usar de forma segura, eficaz, responsável, ética. A gente entende, então, que a educação midiática, nesse contexto, é um direito de todos e precisa, de fato, chegar ao chão da escola.
Aqui, estão outras questões. A gente brinca muito lá no Palavra Aberta que o Paulo Freire não disse isso, mas que, com certeza, teria falado, teria apoiado, porque sempre pregou a educação emancipadora. E a gente entende a educação midiática no contexto dessa superabundância de informação como um pilar importante para, de fato, a emancipação do cidadão perante as tecnologias.
A educação midiática vai evoluindo ao longo dos anos. Ela começa com a discussão toda do uso da educação para os meios, a educação para o entendimento das mídias, o letramento informacional propriamente dito e hoje ela chega olhando também para a questão do letramento algoritmo. Exatamente para a gente entender o que é feito dos nossos dados, como é que a gente, de fato, olha o que a gente está vendo ali no nosso feed. Será que é aquilo que a gente escolheu ou alguém escolheu pela gente? Tem alguma outra camada que a gente não está enxergando? Então, de novo, é a questão de a gente olhar as competências midiáticas como um fator de inclusão e de proteção da criança.
O conceito de literacia muda à medida das novas tecnologias e a forma como essa circulação vai trazendo. Então, ser educado midiaticamente é aprender a ler criticamente esse ambiente, é dar voz, desenvolver essa voz, é dar protagonismo ao jovem fazendo com que ele participe de forma ética e responsável da sociedade.
Eu vou passar rapidamente aqui para a gente chegar ao ponto fundamental, que é a questão do uso do celular em sala de aula com a intencionalidade pedagógica. Mas, antes disso, só queria trazer esse quadro aqui, que é um pouco a questão do que a gente defende: que a educação midiática tangibiliza os novos paradigmas pela segurança e os direitos digitais ao empoderar, de fato, a sociedade para o uso correto, ético e responsável da tecnologia.
E aí, essa discussão toda - acho que a Fabiane colocou muito bem - tem que ser uma discussão, Senador, que deixa de ser única e exclusivamente do chão da escola. Porque discutir a proibição ou não do uso do celular dentro da sala de aula é a gente limitar a uma discussão que, muitas vezes, precisa estar na sociedade como um todo. Naquela questão de oferecer uma tela para um bebê de dez meses e achar bonitinho que o bebê já passe a mão e falar "ah, que bonitinho, ele já sabe, ele já nasceu sabendo", a gente já está introduzindo uma ferramenta que não foi cuidada, não foi pensada para ser utilizada por essa criança nessa idade. Ela não está acompanhada de um cuidado pedagógico, com essa intencionalidade pedagógica, para o uso correto desse dispositivo.
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Então, a gente precisa olhar para essa discussão não demonizando a tecnologia; muito pelo contrário, a gente precisa educar para o uso. E eu acho que isso é muito importante de a gente ressaltar. Não dá para a gente demonizar. Não sei se vocês já ouviram isso, mas o termo que é utilizado para definir a nossa sociedade é "figital": somos todos físico e digital ao mesmo tempo. A nossa persona online e a nossa persona digital são a mesma, não tem mais separação. O que a gente faz no offline reflete no online e vice-versa. Vejam, por exemplo, os ataques com discurso de ódio, o cyberbullying, e o quanto isso afeta o cidadão ali na sua individualidade, na sua saúde mental.
Então, a gente precisa olhar para essa discussão de uma forma responsável. O uso pedagógico da tecnologia pode acontecer e pode acontecer com este critério: você pode regular o uso do celular, mas você tem que educar para o uso. Eu tenho falado muito que, se regular é preciso, educar é urgente, porque a regulação demora. A educação está aqui, é o que a gente pode fazer neste momento.
Eu trouxe aqui, muito rapidamente, já nos meus minutos finais, algumas dicas, mostrando que dá para a gente usar a tecnologia, dá para a gente usar o dispositivo tanto no ambiente online como no offline. A gente pode falar de tecnologia sem a tecnologia ali, a gente pode se desconectar para falar da tecnologia até para que a gente olhe outros espaços e veja outras possibilidades.
Alguns dos pontos que a gente sugere são: aprender a fazer buscas qualificadas; saber, com os resultados de busca, avaliar a confiabilidade da informação; saber verificar a fonte; saber olhar o que aquela informação quer da pessoa; fazer questionamentos em relação à integridade da informação tão necessária para o desenvolvimento e até para a proteção do cidadão; reconhecer os fundamentos dos ambientes algorítmicos a partir de exemplos e do que está por trás de cada uma das redes - já estou concluindo -; observar as relações por trás das tecnologias; e também praticar o uso positivo. Por que não? Olhem quantos usos positivos a gente tem, quantas vozes surgiram no ambiente digital, com mais pluralidade, com mais diversidade, com o envolvimento até de líderes estudantis, de pessoas que estão ali, ajudando o seu entorno, tendo voz ativa, tendo protagonismo para melhorar a sociedade. Aqui, olhem quantos exemplos positivos desse uso seguro da tecnologia, do dispositivo, dessa ferramenta tão importante, tão crucial para o exercício da cidadania e também para que a gente possa avançar no desenvolvimento social e na inclusão.
Eu queria deixar aqui esse último eslaide, que é como a gente vê. Nessa discussão entre banimento e não banimento, a gente precisa olhar a educação midiática como um fator de inclusão e de cidadania.
De novo, é olhar para o uso seguro da tecnologia, empoderando o cidadão, fazendo com que ele tenha autonomia para que ele possa exercer os seus direitos.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Queremos agradecer a você novamente, Patricia Blanco. Foi muito interessante, muito importante a apresentação.
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A Patricia é Presidente do Instituto Palavra Aberta.
Parabéns pelo trabalho, também, no decorrer dos anos, vários anos!
Passo, em seguida, a palavra a Ana Úngari Dal Fabbro, que é Coordenadora-Geral de Tecnologia e Inovação da Educação Básica, do Ministério da Educação (MEC).
Com a palavra, Ana.
A SRA. ANA ÚNGARI DAL FABBRO (Para expor.) - Muito obrigada, Senador.
Primeiramente, boa tarde a todos e a todas. Queria começar cumprimentando o Senador Flávio Arns, agradecendo muito o convite e esta oportunidade de estar aqui, hoje, discutindo esse tema que está, acho, tão na boca de todo mundo, um tema tão importante para a gente no Ministério da Educação. Queria cumprimentar também o Ricardo Tonassi Souto, Presidente do Foncede; a Fabiane, da Uncme; e também a minha colega Patricia, do Instituto Palavra Aberta.
Acho que quero começar, inclusive, elogiando as excelentes contribuições de vocês nas suas falas. Vocês já traçaram um quadro bastante completo do tema que a gente tem aqui para discutir.
Queria começar um pouco... Na minha apresentação, vou inverter e ir um pouco para essa discussão do micro e dos celulares nas escolas e, depois, falar desse tema tão importante da educação digital e contar como a gente tem visto esse debate no âmbito do Ministério da Educação e o porquê da importância dele e da urgência também.
Começando, esse debate dos celulares nas escolas é um debate bastante relevante, um debate que tem sido traçado não só aqui internamente, mas é um debate de muita discussão no contexto internacional - não só esse tema da educação digital e midiática, mas, mais especificamente, inclusive, essa questão da restrição da utilização de celulares dentro das escolas.
O documento base da Unesco para a última reunião que aconteceu da Global Education Meeting, em Fortaleza, na semana passada ou retrasada, já apontou até uma mudança bastante significativa do cenário internacional. Então, o último relatório já trazia que a gente tinha, pelo menos, um quarto já das escolas, mundo afora, com algum tipo de restrição em relação a esse uso, e um salto aqui, nos últimos dois anos, para mais ou menos um terço.
A gente tem vários países já adotando recomendações de restrições de formas diferentes, modelos diferentes, mas eu gostaria aqui de mencionar a experiência já da França, da Holanda, da Itália, da Finlândia, da Espanha, e da Austrália também, que vem até restringindo bastante o uso de redes sociais, de uma forma geral, por crianças e adolescentes.
A gente tem, neste momento, um debate já nacional. Então, a gente tem a experiência recente que tem sido muito discutida do Rio de Janeiro, que é a primeira capital que aprovou, por decreto, uma proibição do uso dos celulares dentro das escolas, e um projeto de lei também, que está em discussão na Câmara, e que acaba de ser aprovado na Comissão de Educação, que também tem promovido muitos debates.
No âmbito do Ministério da Educação, a gente tem discutido bastante. O Ministro Camilo tem comentado muito a importância e a urgência desse debate, e eu queria trazer um pouco dos motivos por trás dessa discussão. Antes mesmo de mencionar isso, eu queria trazer essa informação de que existe um contexto, um problema mais profundo. A gente está discutindo aqui esse tema dos celulares nas escolas, mas, por trás disso, existe um debate muito grande sobre a presença de crianças e adolescentes nesse mundo digital e de que forma que essa presença tem se dado nesse contexto atual. É importante também olhar esse tema sob essa ótica mais ampla. Vou focar aqui hoje mais nesse olhar específico da educação, mas esse é um debate que envolve a presença de crianças e adolescentes num ambiente digital que não foi feito e não foi pensado para elas - e eu acho que esse é um ponto bastante importante. A gente tem hoje diversas plataformas, redes sociais, que foram pensadas para adultos, e acabam sendo acessadas por crianças, plataformas essas com algoritmos específicos exatamente com o intuito de prender ao máximo a atenção. Então, acho que esse contexto mais amplo também de organização do mundo digital é bastante importante para essa discussão que a gente está tendo aqui nesse ambiente mais reduzido da educação.
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Acho que, de forma geral, todos os outros colegas aqui já trouxeram isso, mas é importante a gente entender que, para além das restrições a respeito dos celulares nas escolas, é muito importante a gente discutir isso de uma forma mais ampla: falar sobre a educação digital e pensar essas coisas de forma bastante articulada. Então, eu vou trazer, em seguida, a estratégia hoje do Ministério da Educação em relação a esse tema e mostrar como esse tema não está solto dentro do Ministério, mas articulado com uma série de outras ações estruturantes a respeito desse tema da educação digital.
Também acho que um ponto bastante importante para a gente entender essa discussão é pensar no equilíbrio dos princípios de proteção, provisão e participação, que já vêm de todos os documentos que orientam os direitos de crianças e adolescentes - entender que uma discussão é sobre o uso dos celulares por adultos, mesmo por profissionais da educação; e outra discussão é a gente pensar nas nossas crianças pequenas, nos nossos adolescentes, e pensar muito esse uso das tecnologias, de uma forma geral, numa ótica de uma participação progressiva, de uma autonomia progressiva desses estudantes no uso das tecnologias, de uma forma geral, e, mais especificamente aqui, a respeito dessa questão dos celulares.
Esse tema vem sendo muito discutido, acho que também não só dentro do Ministério da Educação - é importante falar isso. Existe um grupo de trabalho já puxado pela Presidência da República, pela Secom, que já vem discutindo com o Ministério da Saúde, o Ministério da Justiça esse tema, com a sociedade civil também, incluindo especialistas, de uma forma mais ampla, para além da educação. Mas aqui queria trazer já um pouco de como isso vem avançando dentro das gestões do ministério.
Então, quais são as principais preocupações, de uma forma geral, em relação a esse uso de celulares por crianças e adolescentes? Muito do que a gente traz aqui vem embasado em diversos estudos e pesquisas recentes sobre esse tema - de pesquisas internacionais também, não só pesquisas feitas aqui no contexto nacional, é importante pontuar - que já vêm sendo apontados alguns indícios desses problemas desses riscos associados por uso de redes sociais por crianças e adolescentes e por uso excessivo de telas.
A gente observa já vários estudos que apontam correlações em relação a problemas de distúrbios de sono, de isolamento social de crianças e adolescentes, casos também de ansiedade e de depressão. Acho que todos nós sabemos dos nossos próprios desafios ao participar e atuar em redes sociais. Imaginem crianças e adolescentes ainda em processo de formação e de desenvolvimento tendo que lidar com toda essa exposição nas redes sociais, com todas essas questões. Isso tem surgido muito já também nos estudos e também - acho que esse é um ponto importante - até impactos relacionados ao próprio desenvolvimento da linguagem dos estudantes, desenvolvimento cognitivo e motor, de uma forma geral.
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Existem também muitas preocupações, muitos riscos associados à exposição a conteúdos inadequados. A gente sabe que, se o acesso no mundo digital não for mediado por professores, por pais com todas essas preocupações, os estudantes acabam acessando conteúdos que não foram pensados, feitos para crianças e adolescentes.
A gente tem ouvido muito das escolas - e isso aparece também nos estudos - sobre o aumento dos casos de cyberbullying. A gente sempre teve problema de bullying nas escolas, mas a gente vê uma mudança muito grande do perfil: antes, casos isolados, que eram lidados entre alguns poucos estudantes; hoje, jovens, muito precocemente, sendo às vezes completamente expostos nas redes sociais, com imagens sendo compartilhadas - e a gente sabe que o que sai uma vez na internet fica para sempre gravado - e todo o impacto de lidar com isso, precocemente, na adolescência.
Há também toda a questão, aqui, de violação de dados de crianças e adolescentes e esse risco também associado.
Em relação ao ambiente escolar, mais especificamente, vários estudos têm apontado a associação com a questão do foco das crianças e dos adolescentes durante as aulas. Eu mesma, quando estou no Ministério da Educação e preciso mesmo me concentrar muito em alguma atividade, tenho que tirar o celular de perto, porque aquela própria notificação que fica pulando, que todo mundo sabe que distrai, puxa a atenção. Então, isso tem sido um fator bastante distrator de atenção, de concentração dos estudantes durante as aulas, o que, obviamente, afeta a aprendizagem dos estudantes, e também tem sido um fator de redução das interações sociais no ambiente escolar. Acho que aí estamos olhando mais para os adolescentes, principalmente, mas esse uso acessível no ambiente escolar também tem prejudicado as interações sociais.
Acho que é importante trazer todo esse mapeamento de riscos para entender o porquê de essa discussão ter ficado tão urgente de a gente ter e todos esses impactos que a gente tem visto dentro das escolas. E por que a importância, então, de a gente discutir a educação digital e midiática?
Outro fator importante é a gente conseguir separar os usos das tecnologias. A gente não pode também colocar tudo no mesmo balaio. Existe um uso que é o uso não mediado, exclusivo do estudante, de conteúdos que não são apropriados para ele, ou em momentos que não são apropriados - um uso excessivo -; e outra coisa é, de fato, o uso pedagógico das tecnologias. Quando a gente fala, aqui, em uso pedagógico das tecnologias, a gente está falando muito do planejamento consciente e direcionado dos professores de terem uma atividade pensada para os estudantes, com a finalidade exatamente de educar os estudantes em relação ao uso dessas tecnologias, ao uso equilibrado dessas tecnologias não só para o próprio aprendizado, mas até para aprender a fazer essa autorregulação tão importante hoje em dia, que vai garantir a saúde mental dos nossos estudantes; de ter a tecnologia como meio, não como fim; de ter a reflexão crítica sobre o uso das tecnologias - a Patricia falou bastante sobre isso -; e de essa estratégia, é claro, ser contextualizada dentro da educação.
Então, acho que também, do ponto de vista do Ministério, a gente acha muito importante separar o que é a discussão sobre restrições dentro das escolas relacionadas aos usos não pedagógicos - celular no intervalo, celular durante a aula, sem orientação do professor - daquela sobre um uso mediado pelo professor, que é tão importante para a implementação da educação digital nas escolas. A gente tem hoje professores com práticas incríveis com uso de tecnologia, que têm conseguido trazer esse debate para dentro da sala de aula, e esse debate é absolutamente importante para a formação dos estudantes como cidadãos digitais, como cidadãos que conseguem estar presentes no mundo digital da forma mais adequada, responsável, segura.
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Então, este debate da educação digital e midiática não é novo. A gente tem, desde 2017, na Base Nacional Comum Curricular já a Competência Geral nº 5, que traz a importância de a gente trazer para os currículos das nossas escolas o uso consciente, responsável, crítico das tecnologias. A Piec foi aprovada em 2021 também falando da importância do uso pedagógico das tecnologias dentro das escolas. Em 2022, a gente tem a aprovação do parecer da Câmara de Educação Básica, que aprovou a BNCC Computação, que traz a importância dessa educação digital voltada para a cidadania digital - e falo um pouco mais disso à frente.
Tivemos também, no ano passado, a aprovação da Política Nacional de Educação Digital, que reforça a importância da tecnologia não só como uma ferramenta pedagógica importante, mas também como objeto de estudo e discussão dos impactos da tecnologia na sociedade dentro de sala de aula e o lançamento de Escolas Conectadas pelo Ministério da Educação em setembro do ano passado.
E qual é essa visão que a gente traz dentro do MEC de educação com tecnologia? Então, é uma educação com tecnologia voltada para a inclusão de todos os estudantes, independentemente da região do país onde eles vivam, independentemente de deficiências ou não, voltada exatamente para a gente formar esses novos cidadãos digitais, que vão saber fazer esse uso seguro, crítico e responsável das tecnologias.
E para isso a gente vem trabalhando em seis frentes, e a gente entende que essas seis frentes, de forma articulada, vão garantir o sucesso, de fato, de um uso positivo das tecnologias dentro do ambiente escolar, em detrimento desses usos que vêm causando riscos para as nossas crianças e adolescentes.
Então, a gente está falando da garantia de uma conectividade nas escolas, de fato, voltada para a finalidade pedagógica. A gente vem falando do acesso a dispositivos e daí dispositivos adequados para o aprendizado dos nossos estudantes, na mão dos estudantes, com os professores dentro de sala de aula; desse alinhamento curricular tão necessário que traga esses novos temas de educação digital, que envolvem o tema do pensamento computacional, do mundo digital, para os nossos estudantes entenderem o funcionamento desse mundo digital, entenderem qual é a lógica dos algoritmos por trás exatamente de todas essas plataformas, de todos esses conteúdos que eles acessam, exatamente para conseguirem desenvolver um pensamento crítico e uma visão da cultura digital. É importante este debate vir para as salas de aula. Então, a gente vem trabalhando muito nessa frente dentro do Ministério da Educação.
A importância de a gente olhar, então, para a formação dos professores. Os nossos professores sabem usar a tecnologia, mas em que medida estão conseguindo usar essa tecnologia com intencionalidade pedagógica dentro de sala de aula e também com essa visão de cidadania digital, de uso seguro e responsável da internet? E também aqui - não vou me estender hoje, mas essa dimensão é importante - a gente pensar a transformação digital das nossas secretarias e o acesso a recursos educacionais digitais.
Então, por conta do tempo, focando mais aqui nessas duas missões mais relacionadas à parte de currículo, competências digitais e recursos educacionais, a gente vem trabalhando em duas grandes frentes, sendo uma delas a educação digital nos currículos e materiais didáticos. Então, a gente vem discutindo esse tema já com seminários e oficinas com todas as secretarias de educação pelo país. A gente está com uma assessoria técnica específica para as secretarias estaduais de educação exatamente para implementar esse tema da educação digital nos currículos de todas as escolas. Essa mesma assessoria vai ser ofertada para os municípios a partir do início do ano que vem.
A gente tem discussões já hoje dentro do Conselho Nacional de Educação a respeito de diretrizes operacionais voltadas para a educação digital. Esse tema foi aprovado na Câmara de Educação Básica na semana passada.
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Então, sob provocação do Ministério da Educação e da Secom, da Presidência, trata-se da importância de a gente dar orientações mais específicas para secretarias em relação a todos esses desafios hoje de implementação da educação digital nas escolas. Nas diretrizes curriculares do ensino médio, esse tema também já foi contemplado. São diretrizes que foram aprovadas na semana passada. Então, isso já entra também agora em todos os currículos do ensino médio no Brasil; então, está também presente nas diretrizes. Isso vem entrando em todos os materiais didáticos hoje ofertados pelo MEC, no âmbito do Programa Nacional do Livro Didático. Então, também isso chega, nos próximos anos, a todas as escolas, exatamente por conta da relevância do tema.
Vale também mencionar que o MEC tem feito um esforço com várias ações direcionadas para pensar a formação de professores para o uso das tecnologias. Então, a gente sabe da importância de os nossos professores conseguirem usar essas tecnologias de forma pedagógica para, de fato, conseguirem contribuir com o aprendizado dos estudantes e conseguirem também traçar esses debates tão importantes sobre cidadania digital, sobre uso equilibrado das tecnologias. Então, a gente lançou também agora, no segundo semestre, um referencial de saberes digitais docentes. Quais são esses novos saberes que todos os docentes da educação básica precisam desenvolver? A gente tem três grandes dimensões: uma que é exatamente essa dimensão da prática pedagógica do professor, outra que olha para a cidadania digital, e uma pensando no desenvolvimento profissional dos professores, e também um autodiagnóstico que já traz para o professor não só em qual nível que ele está, que é um diagnóstico que ele próprio responde, mas que já traz aí uma oferta de cursos relacionados a esse tema que já estão disponíveis na plataforma do MEC, que é o Avamec. E a gente vem trabalhando também - acabamos de anunciar na semana passada - na criação de novos laboratórios de tecnologia, com apoio de formação de professores, numa parceria com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, que é o Programa Mais Ciência na Escola.
Então, são diversas ações em que o Ministério da Educação vem trabalhando de forma articulada. E acho que mais detalhes de tudo isso também podem ser acessados aqui, diretamente na página do MEC, no Escolas Conectadas, em que estão todos esses materiais que foram mencionados.
Para finalizar, acho que os principais recados que eu queria trazer aqui é que a gente precisa ter uma abordagem, de fato, que olhe para todas essas dimensões de forma simultânea. A gente tem que pensar a formação de professores, pensar os currículos de educação digital das nossas escolas, mas a gente também precisa entender que os nossos estudantes, principalmente as crianças pequenas, precisam de ajuda a mais para conseguirem fazer esse uso equilibrado das tecnologias hoje dentro da sala de aula. E por isso é tão importante esse debate sobre o uso equilibrado das tecnologias dentro das escolas, focado muito mais no uso pedagógico; e, por isso, a importância e a urgência também do debate sobre as restrições do uso de celulares nas escolas.
Não vou me alongar, por conta do tempo, mas estou aqui também à disposição para continuar a conversa.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Agradeço a você, não só eu, mas toda a Comissão. É muito importante - viu, Ana? - a abordagem que você fez, que reflete, assim, as discussões, os desafios, a importância disso. E quero parabenizá-la também pela apresentação. Penso que todas as exposições foram muito boas, ilustrativas, didáticas.
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Eu leio, neste momento, perguntas e comentários que vieram de pessoas que estão nos acompanhando pelo Brasil, o que é bom também para ver a preocupação da sociedade em relação ao tema.
Letuza, de São Paulo: “Como garantir o acesso às tecnologias digitais de forma inclusiva e igualitária nas escolas?”.
Eu até peço que possa dar uma cópia também para o pessoal, se quiser.
Bruno, do Rio Grande do Sul “[...] quais são as implicações da inteligência artificial para o futuro da educação?”.
Eduardo, de Minas Gerais: “Como podemos estruturar o uso de celulares na sala de aula para fortalecer o aprendizado, o pensamento crítico e as habilidades de pesquisa?”.
Eu penso que várias perguntas já foram de alguma forma refletidas, pelo menos. Não é uma resposta direta. Muitas vezes, é difícil fazer isso, mas pensar, refletir. Pensarmos juntos no desafio é o importante.
Rafael, de Pernambuco: “Como as escolas podem ensinar sobre a privacidade digital e a segurança online no uso de celulares?”.
Letícia, do Distrito Federal: “Como criar um ambiente educacional para uso de aparelhos digitais de forma consciente e equilibrada?”.
Alguns comentários.
Adelgício, de Minas Gerais: “Deve haver controle no uso desses meios de comunicação nas escolas, principalmente com relação a sites que propagam desinformação”.
Ana, da Paraíba: “O uso de celulares pode enriquecer o aprendizado, com acesso a recursos digitais e atividades interativas, mas exige regras para tal uso”.
Lucas, do Rio de Janeiro: “O uso de aparelhos celulares na escola é prejudicial para concentração dos alunos e interfere no trabalho dos professores”.
Temos mais algumas perguntas que vieram na sequência.
Demerson, do Ceará: “Como os professores podem ser capacitados para lidar com os desafios de celulares em sala de aula?”.
Eloísa, de São Paulo: “Estudos indicam que [...] o uso excessivo de telas [é prejudicial]. Orientar o uso é uma prerrogativa. Como pretendem inserir esse tema?”. Foi bastante discutido isso.
Luan, de Minas Gerais: “[De] que tipo de formação os professores e educadores precisam para incorporar a educação midiática no uso em sala de aula?”.
Ainda dois comentários.
Érika, da Paraíba: “Concordo com a proibição em ambiente escolar, [...] [mas é] essencial disponibilizar tecnologias [...] [para uso educacional] como pesquisas [e aprendizado]”.
Lucas, do Rio de Janeiro: “o uso de aparelhos celulares na escola é prejudicial para a concentração dos alunos [novamente] e interfere no trabalho dos professores”.
Então, algumas perguntas e comentários. Depois, todas as apresentações vão ser organizadas.
Nós temos, inclusive, a presença da Consultoria do Senado, para que isso também se reflita no projeto de lei a ser apresentado.
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O Marden Ribeiro, que está aqui, que nos acompanha sempre também, mas com a participação da Uncme, do Foncede, do MEC, do Palavra Aberta e das demais instituições, no Brasil, que se dedicam ao tema.
O que a gente observa é que existe na sociedade um apoio muito grande para a proibição do uso de celulares nas escolas - 80%, em torno disso, de acordo com as pesquisas. Muitas pessoas perguntam, inclusive, se isso não é reflexo da agonia, do desespero dos pais, pensando que talvez a proibição lá vá ajudar no uso excessivo em casa.
Então, também acho que seria importante até avisar os pais: "Olha, estamos juntos nessa caminhada". Todo mundo tem que fazer a sua parte no esforço. A criança e o adolescente estão na escola, quatro, oito, sete horas, durante o dia, e o resto do tempo está em casa, com os colegas, com os amigos, com os pais... E os pais usando o celular na hora do almoço, na hora da janta, em vez de conversar com o filho ou com a filha.
Havia um psiquiatra, inclusive, que dizia: "Olha, tem tanto problema de comportamento psiquiátrico hoje em dia. Eu dizia para os pais antes: 'Olha, passe uma hora pelo menos com o filho, bata papo e tal'. Hoje em dia, só peço uns quinze minutos, porque o pessoal não tem mais tempo para conversar com o marido, com a esposa, com os filhos..."
Então, é todo um trabalho organizado, da responsabilidade de todos nós, estejamos na escola ou na sociedade. Mas o tema da proibição do uso do celular na escola tomou conta da discussão no Brasil. Por isso, quisemos ampliar essa abordagem, como foi muito bem abordado aqui, para a educação midiática, importante, necessária, com instrumentação adequada, porém uma educação para o uso.
Gostei muito da frase: se proibir é importante, educar é urgente. Se proibir é importante, necessário, educar é urgente. Até foi colocado que o instrumento que está nas nossas mãos é a educação. São 40 milhões de pessoas que estão nas escolas, mais de 40 milhões, desde a educação infantil até o final da educação básica. E as mudanças em casa acontecem a partir, eu penso, da educação dos filhos. A restrição ao uso do cigarro, em muitas ocasiões, aconteceu por causa da educação das crianças na escola: "Não, pai, o senhor está fumando aí! O pessoal disse que dá câncer, dá problema de pulmão, dá isso, dá aquilo, tem que parar de fumar, é o cheiro e tal, não sei o que..." E o pai no final dizendo: "Olha, está bem! Vamos, concordo com você".
Então, a transformação na sociedade, essa criação de uma cultura midiática, eu penso que, realmente, através da escola, pode acontecer.
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Até me refiro a um outro exemplo. Fui Secretário de Educação no Paraná: das 2,1 mil escolas, cerca de 1,8 mil não estavam autorizadas a funcionar pelo Corpo de Bombeiros, praticamente 100% das escolas. Daí eu disse: "Meu Deus do céu! Se acontecer alguma coisa, um incêndio, alguma coisa, a gente vai ser responsabilizado".
Então, reunimos a polícia, o Batalhão de Patrulha Escolar, os bombeiros e o Conselho Estadual de Educação, que já considerava a causa perdida, para organizarmos uma abordagem, e foi, então, criado o que se chama defesa civil nas escolas, criação de um grupo também na própria escola para se organizarem, verem, fazerem exercício de abandono, um programa de dez anos - e já se passaram os dez anos.
Brigada escolar e defesa civil nas escolas, muito antes do episódio da Boate Kiss, lá em Santa Maria, um ano antes, que também foi uma tragédia sobre a qual até hoje a gente pensa: "Puxa vida, como as famílias devem estar sofrendo!". Mas, com isso, o Corpo de Bombeiros falou que foi o programa mais importante da história do Corpo de Bombeiros, para se criar uma cultura de proteção, de brigada escolar, de defesa civil, para que uma pessoa entre num shopping, por exemplo, num cinema e veja onde está a saída, rota de fuga, indicação, uso do extintor.
Então, é criar a cultura midiática pela criança e pelo adolescente também. Acho que é um tema que a gente pode pensar juntos - não é, Ana? - em como colocar isso no papel. Já tem tanta coisa elaborada, como você mostrou, no decorrer dos anos, mas talvez sintetizar isso numa abordagem que possa atender à necessidade.
Muito bem!
Eu passo, de novo, a palavra a vocês, então.
Começamos pela Fabiane para as considerações finais. E o que fazer? O que você sugere? Você já falou tudo isso na sua apresentação também, mas reforçando que a sociedade faça, que a família faça e que nós do Congresso possamos fazer também.
A Uncme, não há dúvida, vem se esmerando nesse sentido, mas o que, essencialmente, vocês esperam que o Congresso faça?
A SRA. FABIANE BITELLO PEDRO (Para expor.) - Bom, Senador, é importante dizer que hoje, dentro das escolas, nós temos dois documentos que são fundamentais, que seriam importantes instrumentos para essa regulação de utilização pedagógica dentro da escola: um deles é o regimento escolar, que eu trouxe antes; e o outro é o projeto político-pedagógico da escola, que traz o conjunto de ações pedagógicas que os profissionais... Esses dois documentos são feitos pela comunidade escolar com a participação não só do corpo docente, mas também com a participação dos estudantes e das famílias. Então, é importante dizer que instrumentos para regular o uso dentro das escolas nós já temos. Eu acredito que nós precisamos é organizar dentro do projeto político-pedagógico dos regimentos escolares essa utilização.
Como eu disse antes, que o Senado consiga escutar quem vive a educação, que são os professores e os estudantes das escolas, para que essa regulação seja feita, mas da forma que venha a auxiliar a educação dentro das nossas escolas.
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A Ana trouxe diferentes pontos que são importantes, porque, na verdade, a gente tem que ter esse cuidado em relação ao mau uso das ferramentas tecnológicas. E isso não é uma discussão que a gente tem que acreditar que é menor; pelo contrário, ela é muito grande.
A gente tem, infelizmente, estudantes que tiram as suas vidas em função de situações que acontecem com o cyberbullying, com o uso equivocado das ferramentas tecnológicas, mas essa discussão precisa transpor o muro da escola. Por isso, a Uncme reafirma que é uma discussão que não deve ficar focada apenas na utilização dentro da escola.
Hoje, se cada pai e cada mãe que está aqui acompanhando pegar o telefone do seu filho e olhar por quantas horas ele utilizou cada um dos aplicativos que ele tem instalado no telefone, nós vamos observar que alguns deles ficaram mais tempo do que quatro horas utilizando qualquer um dos aplicativos. Esse exercício é importante.
E nós temos ferramentas gratuitas que dão aos pais a possibilidade de restringir o acesso a diferentes aplicativos. O pai, no seu próprio smartphone, vai lá e consegue fazer isso. A gente, então, precisa instruir as famílias. Então, para além da escola, a gente precisa instruir a sociedade como um todo para o uso das ferramentas, para que, de fato, a cultura digital se permeie em toda a sociedade.
Então, é importante dizer que é um debate que está dentro da escola, mas que precisa sair da escola. É uma responsabilidade muito grande para ficar apenas nessa discussão intraescolar. Ela tem que ser extraescolar, para que, mais uma vez, a escola não tenha para si uma responsabilidade que não é só dela; é de toda a população. Para isso, a gente precisa discutir com todos os atores.
Muito obrigada, Senador. Nosso Presidente, Manoel Humberto, lhe manda um abraço e agradece, mais uma vez, essa parceria. Ana, Patricia, grata por essa partilha e por tantas aprendizagens; Ricardo, que está conosco virtualmente. E quero dizer que a Uncme está à disposição para este e para todo o bom debate da educação no nosso território brasileiro.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Agradecemos a você, Fabiane Bitello Pedro, que está representando a Uncme (União Nacional dos Conselhos Municipais da Educação) - lá no município, lá na ponta mesmo.
Parabéns! Foi muito boa a sua participação; a gente agradece muito.
Também, em seguida, passamos, então, a palavra à Patricia Blanco, que é Presidente do Instituto Palavra Aberta.
A SRA. PATRICIA BLANCO (Para expor.) - Obrigada, Senador. De novo, foi um momento de grande troca e de muito aprendizado da minha parte.
Eu acho que a sua pergunta vem muito na linha do que fazer, não é? E eu gostei muito da fala da Fabiane, porque ela trouxe a questão da dimensão coletiva da abordagem desse tema. Não é uma questão única e exclusivamente da escola; se fosse, estaria tudo resolvido. Eu acho que a gente não pode achar que uma solução simplista vai resolver todos os problemas, porque não vai.
E, até corroborando um pouco essa fala de que se precisa transcender os muros da escola, volto aqui à Pesquisa TIC, que é online, do Cetic.br, divulgada recentemente, que mostra o local de acesso à internet pelas crianças de 9 a 17 anos: nas classes A e B, 100% em casa; na classe C, 100% em casa; nas classes D e E, 97% em casa.
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Então, se a gente olhar o que é possível fazer dentro da escola, dos marcos legais, dos acordos coletivos e de regramentos que possam acontecer, até para fazer com que o professor retome o poder de decidir em que momento ele vai usar o dispositivo para uso pedagógico ou não... Se a gente olhar uma lei que venha regular isso, Senador, pode ser muito importante, pode ser muito interessante, porque, muitas vezes, o que a gente vê e ouve dos professores é que eles não têm mais autoridade para recolher um dispositivo, porque a criança ou o adolescente fala: "Você vai tirar de mim?". Então, ter uma regra de uso pode ser importante para restabelecer esse poder.
Mas o que a gente precisa olhar é a preservação do uso pedagógico da tecnologia, para preparar essa criança, dentro do universo da escola, para que ela possa atuar na sociedade. E, aí, eu acho que foi a Ana aqui que falou - a Ana da Paraíba - que o uso de celulares poderia enriquecer o aprendizado. Sim, pode enriquecê-lo, e precisa de regras. Então, se forem estabelecidas regras claras, transparentes, entre os alunos, os pais e a comunidade escolar, independentemente da lei, já seria possível de a gente ter ganhos - ganhos, inclusive, para a sociedade como um todo.
Só concluindo, teve uma pergunta sobre inteligência artificial. A questão da inteligência artificial ou da inteligência artificial generativa só agrega uma camada a mais de complexidade. Se a gente olhar, por exemplo - e eu sempre dou esse exemplo, a Michele, que está aqui, já me ouviu falar dele -, o que leva um aluno a usar uma ferramenta de inteligência artificial generativa para criar nudes, para colocar a foto de colegas no corpo nu de outras colegas para praticar o cyberbullying? Não é uma questão do uso da tecnologia, é uma questão ética, que antecede o uso da tecnologia. Com que direito eu posso pegar uma ferramenta de tecnologia qualquer, mudar e fazer um deepfake, ou promover um discurso de ódio em relação àquela determinada colega ou professora ou qualquer outra pessoa? Então, é uma discussão que vem primeiro, que antecede.
Mas a educação midiática e digital também pode ser um instrumento para direcionar o uso seguro da inteligência artificial generativa, e também a educação digital aí, preparando os estudantes para que eles possam utilizar a inteligência artificial generativa para o mercado de trabalho. A gente vai ter aí uma mudança radical no mercado de trabalho. Então, a gente também precisa olhar a educação voltada para isso, para preparar para o uso da tecnologia.
E só uma última questão: eu queria agradecer, Senador, a sua sempre disponibilidade para tratar desse tema. Queria lembrar que foi o Senador Flávio Arns o primeiro Senador que aderiu à causa da educação midiática aqui no Senado, promovendo a primeira audiência pública lá em 2018. A gente estava ainda começando a discutir a BNCC, recém-promulgada, e o Senador Flávio Arns foi, então, esta nossa liderança aqui, que vislumbrou e abriu espaço para que a gente discutisse esse tema.
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Então, eu agradeço, mais uma vez, este espaço e conte comigo no que precisar.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Agradecemos a você também, Patricia Blanco, Presidente do Instituto Palavra Aberta.
E o tempo passa, não é? Desde aquela audiência, já foram seis anos, quase sete anos.
A SRA. PATRICIA BLANCO (Fora do microfone.) - Exatamente.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Mas uma audiência muito importante, que foi antes da pandemia, porque a pandemia, de fato, alterou muitos dos conceitos que nós tínhamos a respeito também da questão midiática.
Hoje mesmo, fazendo esta audiência pública, não há necessidade de a pessoa estar presencialmente aqui, o que era impensável antes da pandemia.
Mas imagine também as vantagens disso em termos do trabalho, dos expositores, das expositoras, do médico, por exemplo, que esteja lá no Amazonas, que pode interromper o seu trabalho por duas horas; caso contrário, teria que vir a Brasília, voltar, cancelar consultas. Quer dizer, houve uma dinâmica, uma nova dinâmica na sociedade.
Muito obrigado, Patricia, são extraordinários os trabalhos que o Instituto Palavra Aberta desenvolve.
Quero passar a palavra a você, Ana - permita-me chamá-la assim -, Ana Úngari Dal Fabbro, que é Coordenadora-Geral de Tecnologia e Inovação da Educação Básica do Ministério da Educação (MEC).
A SRA. ANA ÚNGARI DAL FABBRO (Para expor.) - Obrigada, Senador.
Acho que queria começar comentando um pouco do que o senhor falou sobre esse apoio amplo da sociedade em relação a essa discussão sobre os celulares nas escolas.
Eu acho que isso aponta exatamente para uma percepção coletiva de que a gente precisa chegar num modelo mais equilibrado de uso das tecnologias de uma forma geral na sociedade, mas acho que é ainda mais importante essa discussão dentro das escolas. Então, acho que também a gente tem discutido muito no MEC não só essa questão da restrição, mas da promoção, de novo, das atividades offline, da convivência desplugada dentro das escolas, da retomada das brincadeiras nos intervalos, de a gente ter que incentivar cada vez mais as trocas entre os estudantes, trocas reais de conversas entre a comunidade escolar de uma forma geral. Então, há a importância desse debate sobre o uso equilibrado de uma forma geral. Nesse debate da educação digital, a gente realmente precisa conseguir avançar agora em todas as secretarias de educação, em todas as escolas, tanto com a educação digital dos nossos estudantes, mas também dos nossos professores.
Acho que a Patricia retomou um ponto bastante importante, que a gente discute muito dentro do Ministério da Educação, que é a importância exatamente do protagonismo e desse fortalecimento do papel do professor dentro da escola, como exatamente esse mediador dos momentos em que a tecnologia pode vir, de fato, para agregar o aprendizado daquele estudante, dos momentos em que a tecnologia às vezes nem é a estratégia pedagógica mais adequada, porque outras estratégias pedagógicas podem ser melhores, mas também dos momentos em que a gente de fato vai valorizar outras experiências que são absolutamente importantes para o desenvolvimento integral dos nossos estudantes.
Acho que é importante também a gente discutir a educação digital, mas nessa perspectiva da educação integral dos nossos estudantes, que também é um debate que a gente tem puxado muito dentro do Ministério da Educação. Quando a gente fala desse desenvolvimento integral dos nossos estudantes hoje, não tem como a gente não falar sobre esse desenvolvimento dentro desse contexto do mundo digital, que traz desafios muito novos para todos os nossos jovens. Acho que muito se fala de quanto os nossos jovens são nativos digitais, acho até que os professores, às vezes, se sentem inseguros de usar tecnologias dentro de sala de aula, por saberem que muitas vezes os estudantes entendem mais, sabem mexer melhor nas tecnologias, mas a gente vê também muitos estudos que mostram que o que os estudantes sabem, na verdade, é o uso do celular para o fim muito específico das redes sociais, e vários desses estudantes, ditos nativos digitais, têm tido dificuldade ao usar a tecnologia no contexto do mundo de trabalho. Então, a importância de a gente conseguir ir além de simplesmente um saber usar genérico para um saber usar intencional também e numa perspectiva não só do uso equilibrado da tecnologia, mas também da tecnologia como uma ferramenta poderosa de resolução de problemas.
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E os documentos que a gente vem... As diretrizes curriculares vêm muito neste sentido: de os nossos estudantes saberem discutir os riscos e as questões que demandam essa discussão do uso equilibrado, mas também entenderem o pensamento computacional, entenderem essa lógica toda computacional, que é muito poderosa também para a solução de problemas, no uso da robótica também dentro das escolas. Então, tem também potenciais muito importantes para a gente desenvolver nos nossos estudantes, novas habilidades mesmo para usar a tecnologia a favor do nosso desenvolvimento sustentável e tantas outras questões.
Então, é essa educação digital que a gente está propondo que avance dentro das escolas e que é tão urgente. E isso passa por essa camada absolutamente central de a gente conseguir também formar melhor os nossos professores para conseguirem tanto trazer esses debates para dentro da sala de aula, mas também saberem fazer o uso intencional e conseguirem ser exatamente esses mediadores dentro da escola, que vão saber pensar nas necessidades dessa aprendizagem integral dos nossos estudantes e entender em que momento fazer uma atividade de pesquisa com o uso de notebooks é algo que vai contribuir para o que aquele estudante precisa e em que momento também ainda o livro didático impresso é absolutamente importante no desenvolvimento cognitivo e motor dos nossos estudantes.
E o papel do Ministério da Educação em tudo isso é exatamente o de conseguir apoiar as secretarias de educação na implementação dessa educação digital. Então, a gente tem tentado estar cada vez mais próximo das secretarias estaduais de educação, das secretarias municipais de educação no apoio da implementação. A gente sabe que são muitos desafios, são realidades muito diferentes. Então, é importante também... Eu não falei tanto disso hoje, mas como a gente tem pensado isso também no Ministério da Educação de forma a atender esses diferentes contextos. A gente sabe que a gente tem diferentes contextos, inclusive do uso de tecnologias, de conectividade, dependendo da região do país. A gente vem exatamente trabalhando para corrigir essas desigualdades e acho que agora também estamos aqui para apoiar as secretarias, apoiar as escolas nessa discussão importante sobre o uso de celulares no dia a dia da comunidade escolar e também acho que apoiar as escolas nesse debate que tem que ser ampliado, como todo mundo trouxe aqui, para além da escola, mas trazer... Acho que é importante a gente conversar sobre isso com os estudantes, ouvir os estudantes.
A gente teve até uma atividade muito interessante na semana retrasada no Ministério da Educação com os estudantes, em que a gente ouviu muitas perspectivas deles sobre esse uso do celular dentro das escolas. Então, é importante também envolver os professores e os estudantes nessa discussão, e tenho certeza de que conseguimos chegar a arranjos que vão ser muito positivos para todos. O Ministério tem trabalhado muito nessa frente agora de conseguir colocar esse tema mais em discussão e ampliá-lo.
E a gente vem acompanhando, é claro, os debates que vêm sendo travados na Câmara dos Deputados, aqui também no Senado Federal, a respeito de eventuais novos normativos que possam vir a apoiar exatamente essas preocupações relacionadas a esse uso equilibrado das tecnologias e também à educação digital. Então, a gente está superaberto para discussões.
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Queria finalizar agradecendo muito o convite para estar aqui, colocando também o Ministério absolutamente à disposição para outras conversas e outros debates sobre este tema.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Muito bom. Nós que agradecemos também a você, Ana Úngari dal Fabbro, que é representante do MEC nesta área. Peço também para transmitir ao Ministro um abraço nosso, ao Ministro Camilo Santana, que já esteve nesta Comissão por diversas vezes.
Eu sempre penso, nessas horas, que um dos avanços que precisamos ter é a constituição do sistema nacional de educação. Está previsto no Plano Nacional de Educação, mas eu penso que, inclusive, deveria anteceder o Plano Nacional de Educação, porque, se nós pensássemos na educação midiática e no desafio para implantá-la no Brasil, isso deveria ser objeto dessa gestão tripartite, ou seja, o que o Governo Federal vai realizar nesta área, os Governos estaduais, junto com os conselhos estaduais e os Governos municipais. Os desafios de uma escola municipal, que oferta habitualmente educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental ou o ensino fundamental completo, são diferentes dos desafios dos estados, que ofertam educação técnica profissionalizante, ensino médio. Cada nível da educação básica com as suas necessidades, como educar uma criança na educação infantil. Nessa área, as famílias que estão muito mais abertas, receptivas para receber a orientação: pegam a criança pela mão, levam a criança à escola, nas séries iniciais do ensino fundamental e no ensino fundamental, até o quinto ano. Depois, há uma espécie de abandono... (Risos.)
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - ... "Não, você já é grande, crescido, agora vai sozinho para a escola".
Então, como articular? E, no sistema nacional, tem que haver essa pactuação, essa articulação, essa colaboração, para que cada um saiba exatamente, lá no Rio Grande do Sul, com tantas iniciativas importantes e boas, o que está sendo feito. É o regimento, mas também temos o regimento no estado. Como orientar as escolas a fazerem esse debate com a comunidade escolar, para ver o que constar do regimento, porque aí a gente tem que medir também quantas escolas fizeram esse debate, seja no município, seja no estado, seja no âmbito federal, inclusive os institutos.
Hoje de manhã ainda discutíamos o transporte escolar e a alimentação escolar nos institutos federais de educação, que constituem educação básica de uma rede federal, em que também o debate tem que acontecer. A família fica agoniada também, porque não sabe o que fazer, como controlar, como ter o aplicativo, como fazer essa orientação em casa.
Então, essa discussão local, como foi colocado e a Fabiane também colocou isso bem, a Patrícia, a Ana e o Ricardo também... O Ricardo até pediu para se justificar porque ele tinha um outro compromisso, que é o Presidente da Foncede.
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O sistema nacional amarraria todos esses aspectos de uma maneira que fosse, assim, adequada. Você teria esse tema, esse objetivo da educação midiática, até para medir se nós estamos avançando ou não, termos metas a serem cumpridas, com o apoio da Uncme, com o apoio da Foncede, da Undime, do Consed, porque todos estão aptos, animados e com perspectivas de ajudar, de colaborar, mas é um trabalho, como foi dito, coletivo, não pode haver um trabalho individualizado.
Então, Ana, peço que leve de novo essa preocupação, porque o projeto de lei do sistema nacional de educação já foi aprovado no Senado Federal e está na Câmara dos Deputados já faz uns dois, três anos, mais ou menos, dois ou três anos lá. Não é necessário concordar com aquele projeto, pode ser modificado, melhorado, mas o objetivo é que a gente tenha um sistema nacional e que haja uma articulação, uma pactuação, uma convergência sistemática.
Não basta dizer que estamos trabalhando juntos, o que é importante, mas trabalhar juntos de uma forma pactuada, negociada, com objetivos a serem cumpridos. Isso é um sistema, um sistema de educação midiática, mas não só nessa área, em todas as áreas isso é importante, mas na educação midiática eu considero essencial.
Espero que a audiência pública - não só espero, como tenho certeza - tenha contribuído muito para a compreensão do assunto, dos desafios, que são amplos, que vão muito além do uso de celulares, mas é importante também resgatar essa autoridade do professor para dizer: "Não, a lei diz que é proibido, então, vamos fazer o que a lei determina". É importante também porque, de fato, como é que a pessoa vai proibir, vai fazer, se sente desamparada muitas vezes. Tudo isso tem que ser bem pensado e analisado para constar de uma iniciativa legislativa, que vai acontecer, mas que seja bem discutida com vocês, obviamente, que estiveram aqui hoje e com a sociedade toda também.
Muito bom, então, agradeço a presença novamente. Agradeço a participação aqui da secretaria, da consultoria, dos meios de comunicação, de todos e de todas que nos acompanharam pelo Brasil. Penso que foi um momento extremamente importante, bom, de muita reflexão e de muitas ideias do que pode ser feito nessa área em termos de orientação da sociedade.
Declaro encerrada a presente reunião.
Obrigado.
(Iniciada às 14 horas e 04 minutos, a reunião é encerrada às 15 horas e 55 minutos.)