28/11/2024 - 38ª - Comissão de Assuntos Sociais

Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 38ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Assuntos Sociais da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A presente reunião atende ao Requerimento nº 98, de 2024, CAS, da nossa autoria, para a realização de audiência pública destinada a debater sobre a reforma tributária e seus impactos para a saúde.
Informo que a audiência tem a cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado, da Rádio Senado e contará com os serviços de interatividade com o cidadão, da Ouvidoria, através do telefone 0800 0612211, e do Portal do e-Cidadania, em www.senado.leg.br/ecidadania, que transmitirá ao vivo a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos expositores via internet. Alguns, inclusive, já chegaram.
Nós vamos ter uma mesa composta por participações presenciais e participações à distância.
Nossos convidados e convidadas.
Fabio da Silva Gomes, Assessor Regional de Nutrição e Atividade Física da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), que vai participar através de videoconferência. Seja bem-vindo.
Ana Paula Leal Teixeira, Servidora da Comissão Nacional para Implementação da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco e de seus Protocolos do Instituto Nacional do Câncer (Inca), também por videoconferência. Já estamos vendo Ana Paula na nossa tela. Seja bem-vinda, Ana Paula.
Luciana Monteiro Vasconcelos Sardinha, Diretora Adjunta de Doenças Crônicas Não Transmissíveis da Vital Estratégias, já está aqui presente. Agradeço, Luciana, a sua presença.
Bruna Pitasi Arguelhes, Coordenadora da Coordenação de Apoio às Ações de Promoção da Alimentação Saudável do Departamento de Promoção da Alimentação Adequada e Saudável da Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, também por videoconferência. Já está presente. Seja bem-vinda. Bom dia, Bruna.
Luciana Phebo, Chefe de Saúde e Nutrição do Fundo das Nações Unidas para a Infância no Brasil (Unicef), já está aqui presente também na nossa mesa.
José Angelo Divino, Coordenador do Programa de Mestrado e Doutorado em Economia da Universidade Católica de Brasília (UCB), através de videoconferência.
Ainda por videoconferência, Mônica Andreis, Diretora Presidente da ACT Promoção da Saúde. Mônica também já está na nossa telinha. Bom dia, Mônica. Seja bem-vinda.
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E, para compor a mesa presencialmente, Luiza Machado, Advogada, Mestre em Direito Tributário da UFMG e Coordenadora de Incidência Legislativa do Grupo de Pesquisa, Tributação e Gênero da Fundação Getúlio Vargas. Presença confirmada, já aqui na nossa mesa.
Agradeço a presença de todos.
Vou rapidamente fazer uma justificativa para vocês para ficar clara a nossa contextualização do porquê desta reunião. E ela se dá, coincidentemente, um dia após o anúncio do Governo a respeito de algumas questões relacionadas ao que vem a ser a nossa reforma tributária, mediante o arcabouço e as medidas complementares.
A reforma tributária, assim como ela foi pensada, tem como objetivo a simplificação do sistema fiscal brasileiro. Com foco no consumo, a proposta impactará a vida dos brasileiros em diversos aspectos, dentre eles, o aspecto social, o do meio ambiente e da saúde. É de extrema importância discutir e observar tais aspectos, visando melhorar a qualidade de vida da população, reduzir as externalidades negativas e garantir o acesso a direitos humanos fundamentais.
É possível, através da reforma tributária, promover alimentação saudável e combater a fome a partir da cesta básica nacional de alimentos com alíquota zero e alíquota reduzida para outros alimentos essenciais, tornando-os mais acessíveis.
É possível também desestimular o consumo do tabaco, bebidas alcoólicas e alimentos ultraprocessados, por meio do Imposto Seletivo, visando melhorar os indicadores de saúde, especialmente dos grupos mais vulneráveis da população.
Ainda os recursos arrecadados com o Imposto Seletivo, se vinculados ao sistema de saúde, podem fortalecer o SUS, hoje subfinanciado, além de beneficiar outros entes da Federação.
Por fim, a reforma tributária terá impacto direto no perfil de consumo dos brasileiros e brasileiras. Precisamos pensar uma reforma que vise reduzir desigualdades, observando os produtos que estão desonerados, bem como ter o Imposto Seletivo como uma iniciativa que onera produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente, visto que as populações mais vulneráveis, que sofrem com o impacto do racismo ambiental, têm acesso insuficiente à rede pública e ao saneamento básico.
A nossa proposta foi aprovada com essa justificativa, por unanimidade aqui.
E nós vamos passar ao nosso roteiro usual de audiências públicas. Nós vamos conceder um tempo inicial para cada um dos palestrantes de 15 minutos. São muitos, e, por isso, eu peço a atenção ao tempo. Nós ficamos com muitas dúvidas de reduzir a participação diante do leque tão grande de abrangência desse aspecto na reforma e, ao mesmo tempo, de tantos estudos que são feitos pelas diversas entidades, pelas diversas pessoas que atenderam esse nosso convite. Depois daí, a gente faz as perguntas do e-Cidadania e as considerações - podem chegar mais algumas no decorrer da nossa exposição.
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O tempo será marcado, é automático, mas não se sintam pressionados. A gente vai organizando. E a gente já começa pela ordem que me foi entregue aqui pela assessoria, caso não haja nenhuma contraposição. Podemos fazer pela ordem de chamada?
Então, Fabio, você é o primeiro.
Fabio da Silva Gomes, Assessor de Nutrição da Opas.
O SR. FABIO DA SILVA GOMES (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado.
Vocês me ouvem bem?
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito bem.
O SR. FABIO DA SILVA GOMES (Por videoconferência.) - Vou compartilhar, assim que permitirem, a minha tela, para compartilhar meus eslaides.
Obrigado.
Bom, a minha apresentação se divide basicamente em três momentos. Um momento que aponta as recomendações.
Antes de mais nada, agradeço a oportunidade, em nome da Organização Mundial da Saúde e da Organização Pan-Americana da Saúde, por esta oportunidade de comparecer nesta ocasião.
A primeira parte da apresentação é muito voltada para o reconhecimento do impacto que esses produtos não saudáveis têm na saúde e no desenvolvimento de vários países, incluído o Brasil. A gente tem muitos dados revelando o quanto esse conjunto de fatores de risco - a gente está falando desses produtos como tabaco, álcool e bebidas adoçadas - são os principais fatores de riscos modificáveis das doenças cônicas no Brasil, a principal causa de morte e adoecimento no mundo e no Brasil. Esses produtos são responsáveis por 10 milhões de mortes todos os anos e têm um custo de mais de US$4 trilhões para a humanidade. Por essa razão, eles impactam não só a saúde, mas também o desenvolvimento sustentável em todo o mundo.
E uma das coisas que a gente também já sabe é que os custos decorrentes da exposição da população a esses produtos não saudáveis são muito superiores à arrecadação de impostos provenientes desses produtos. Então, isso justifica a necessidade de a gente avançar, no Brasil e em outros países, com a correção dessa falha que o mercado gera com essa exposição de fatores desses produtos não saudáveis para a população.
E além dos impactos que a gente conhece na saúde e na economia, que acabo de mencionar, também há os impactos sobre o meio ambiente, o impacto que cada um desses produtos pode promover tanto do ponto de vista das mudanças climáticas, mas também das mudanças ambientais não climáticas. No caso do tabaco, a gente sabe o quanto é evidente a interferência da indústria do tabaco em tentar evitar que se substitua o cultivo do tabaco por outros cultivos, o que poderia contribuir para solucionar as crises alimentares mundiais do país. Além disso, as bebidas alcoólicas também interferem no processo produtivo, de um modo geral, na agricultura, porque exige uma quantidade de água muito maior para a sua produção e também, com essa expansão desse monocultivo, tem um efeito muito negativo sobre a biodiversidade, o que vai não só afetar negativamente o ambiente, mas também o clima. E, finalmente, os alimentos e bebidas ultraprocessadas, incluídas as bebidas açucaradas e bebidas adoçadas, que, além de estarem associados com o aumento da emissão de gases de efeito estufa, da pegada hídrica e ecológica, são os principais poluidores plásticos. Esse estudo foi publicado na revista Science e reuniu as marcas que mais poluíam com plástico no mundo, somando os últimos cinco anos de coleção de dados, entre 2018 e 2022. Ele revelou que os maiores poluidores de plástico no mundo são empresas de produtos ultraprocessados, álcool e tabaco. Então, a gente regular esses produtos é fundamental para todas essas dimensões da saúde humana e planetária.
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Nesse sentido, a aplicação dos impostos saudáveis promove esse triplo ganho. Agora a gente tem começado a falar do quádruplo ganho, porque a gente começa a somar também o ambiental - não é? -, como mencionei anteriormente, mas elas são eficazes na redução do consumo de produtos não saudáveis, reduzem os custos ao sistema de saúde - então, mais um ganho: promove o bem-estar e a saúde das populações - e geram receitas estáveis, que podem fortalecer o sistema de saúde e impulsionar o desenvolvimento sustentável. Então, juntando esses três mais o benefício que a gente vê da prevenção dos impactos ambientais, a gente poderia até somar mais um quarto além do triplo, que é já é bem conhecido.
Nossas recomendações são baseadas nesse conjunto de manuais que foram desenvolvidos pela Organização Mundial da Saúde, sobre administração e implementação de políticas de impostos para tabaco, álcool e bebidas açucaradas, e também numa recente diretriz da OMS sobre políticas fiscais para alimentação saudável, que envolve não só a taxação sobre bebidas açucaradas, mas também outros elementos de políticas fiscais para alimentos para outros alimentos além das bebidas açucaradas.
Então, acho que, em relação às nossas recomendações, as recomendações que estão presentes nos documentos da Organização Mundial da Saúde e fazendo um paralelo e uma análise do projeto de lei, eu acho que em relação ao tabaco vamos muito bem. Eu acho que, neste momento, devo aproveitar para parabenizar o Brasil, uma liderança nessa matéria, que segue avançando nessa busca de melhorar a tributação desse produto no país.
Então, acho que manter impostos equivalentes sobre todos os produtos é fundamental, evitar que os consumidores possam ter alternativas menos tributadas, garantir essa abrangência dessa medida extrafiscal e, nesse sentido, estender essa estrutura mista proposta para outros produtos. Acho que isso já é uma questão em que tem se avançado. Esperemos que possa se concretizar.
E devemos manter e atualizar o preço mínimo do varejo regularmente. Isso é muito importante, porque, como eu comentei no início, a arrecadação é muito insuficiente em relação ao que a gente tem de impactos negativos sobre a economia e sobre a saúde das pessoas no país. Então, se a gente não garante essa atualização, a gente vai causando uma erosão desse efeito positivo que a medida pode ter se ela não é ajustada. Então, é fundamental esse ajuste ser garantido.
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Em relação às bebidas alcoólicas, um ponto que é fundamental, que está garantido para os produtos fumígenos e tabaco, mas a gente precisa reforçar - a mesma recomendação se faz para as bebidas alcoólicas e açucaradas -: a importância da incidência do imposto se dá no preço final, de varejo, para o consumidor. Então, quanto mais essa incidência ocorre para perto do fabricante, pior é a medida, no sentido de impactar a mudança de consumo da população, que é o que vai garantir os benefícios para a saúde, para o desenvolvimento do país de maneira sustentável.
Então, esse é um ponto que seria importante repensar, a fim de pensar num projeto de lei para que essa incidência possa ocorrer bem próximo ao consumidor - no preço final, de varejo, para o consumidor.
E, além disso, quero aqui outra vez felicitar o país por avançar em adotar uma alíquota que considera o teor alcoólico sobre o componente ad rem, porque isso garante uma efetividade e simplifica a administração bastante, alinhando com as melhores práticas que a gente recomenda.
Em relação às bebidas açucaradas, quero reconhecer mais uma vez o avanço que é reconhecer as bebidas açucaradas como um produto não saudável e a necessidade de aplicar imposto sobre ele e destacar alguns pontos que poderiam reforçar, para alinhar melhor com as melhores práticas e recomendações da Organização Mundial da Saúde.
Um deles tem a ver com a alíquota específica, ou seja, seria e é recomendável adotar uma estrutura que inclua uma alíquota específica, justamente para minimizar essa manipulação de preços e a migração do consumidor para marcas que poderiam ser mais baratas, mas, ainda assim, bastante nocivas para a população, por se tratarem de bebidas açucaradas.
Então, por exemplo, um novo inciso para o §1º do art. 419 que pudesse incluir as bebidas açucaradas com alíquotas específicas, considerando o volume dos produtos, poderia, como um exemplo, contribuir nesse sentido.
A outra questão que é muito importante para as bebidas açucaradas é que essa tributação seja abrangente. Se a gente aplica só para um número restrito de bebidas açucaradas, os consumidores tendem a migrar para outros produtos também nocivos, por serem bebidas açucaradas, e isso faz com que a medida não tenha um efeito sobre a saúde, que é o desejável. Então, a importância de se considerar todos os códigos que possam conter essas bebidas açucaradas tal como a Organização Mundial da Saúde define, para que a gente não tenha substituições negativas e indesejáveis.
E, finalmente, a mesma consideração que foi feita para as bebidas alcoólicas acho que também se aplica para bebidas açucaradas: garantir que a incidência seja sobre o preço final, de varejo, em relação a ad valorem, e acumular isso com ad rem, mas, quanto à ad valorem, que isso incida sobre o preço final, de varejo.
E, finalmente, as recomendações sobre outros produtos. Essa é a nossa diretriz sobre a importância de tributar outros produtos alimentos, considerar outros alimentos que não contribuam para a alimentação saudável.
E garantir que não existam subsídios como redução de IVA ou outros tipos de subsídios, como créditos, sobre alimentos que não contribuam para a alimentação saudável.
Esse é um conjunto de recomendações que a gente encontra nessa diretriz da OMS publicada este ano. E isso significa, para o projeto de lei em concreto, pensar ou repensar as alíquotas reduzidas ou zeradas para alimentos que não são recomendados como parte de uma alimentação saudável.
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Um dos elementos, que é a definição de produtos majoritariamente consumidos por populações de baixa renda, considera o volume de consumo desses produtos pela população de baixa renda, mas é importante considerar que, quando a população de baixa renda - e a gente já realizou vários estudos sobre isso em outros países também - consome produtos não saudáveis, isso impacta nas despesas que elas têm com outros bens e serviços essenciais, como os relacionados à educação, saúde, transporte e habitação. Então, a gente tem que olhar também para o fato de que as pessoas consumirem majoritariamente produtos não saudáveis não deveria justificar a isenção ou a redução de impostos sobre esses produtos, porque a gente pensa que estará onerando essa população, mas, ao contrário, a gente estará permitindo que essa população tenha mais recursos para investir em outros elementos que, inclusive, são mais essenciais. Com isso, estarão dificultando a possibilidade de essa população poder exercer a sua capacidade de comprar ou de acessar serviços mais essenciais, como os que eu comentei inicialmente.
E o terceiro ponto é a questão da coerência, de que trata essa diretriz. No momento em que o projeto reconhece as bebidas açucaradas como um produto não saudável, não incluir ou não eliminar esses produtos de qualquer possibilidade de receber créditos, nesse caso, por exemplo, o IBS, a CBS, poderia resultar numa incoerência. Então, seria importante buscar esta maior coerência para que produtos não saudáveis, além de estarem tributados, não possam receber qualquer tipo de crédito.
Esse é um resumo, e vou encerrar por aqui por conta do tempo.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Nós lhe agradecemos, Fabio. Foi muito boa a sua explanação, muito objetiva e, ao mesmo tempo, muito abrangente no que diz respeito ao tabaco, às bebidas alcoólicas e às bebidas não adoçadas.
Para quem chegou agora nas redes, nós ouvimos Fabio da Silva Gomes, da Opas, que tratou de impostos saudáveis, trazendo inclusive algumas recomendações em relação a esses três produtos.
Vamos dar sequência, passando a palavra agora para Ana Paula Leal Teixeira, também por videoconferência, e, em seguida, para a Luciana Monteiro, aqui da mesa.
Pois não, Ana Paula, para seus 15 minutos iniciais.
A SRA. ANA PAULA LEAL TEIXEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada.
Vou colocar em modo de apresentação aqui. (Pausa.)
Acredito que estejam vendo...
Eu tentei colocar como nós fizemos antes aqui, mas acho que não está em modo de apresentação, não é? (Pausa.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Não está em modo apresentação. Nós estamos vendo só um pedacinho.
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A SRA. ANA PAULA LEAL TEIXEIRA (Por videoconferência.) - É porque eu estou colocando em modo apresentação para mim, mas depois não aparece a opção compartilhar a tela. Deixe-me ver se consigo agora.
Vou seguir assim para a gente não perder tempo.
Gostaria de agradecer à Sra. Senadora Teresa Leitão a oportunidade de estar aqui apresentando esse trabalho, que é da Secretaria-Executiva da Comissão Nacional para a Implementação da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco.
Apenas uma contextualização. O que é esta comissão? A comissão vem para implementar a Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, que foi promulgada pela Presidência da República do Brasil em 2006.
Considerando que o tabaco é o único produto legal que mata metade dos seus usuários, que causa cerca de 8 milhões de mortes por ano em todo o mundo e que 80% dos seus usuários estão em países de baixa e média renda, com carga econômica mundial de US$1,4 trilhão ao ano - fonte Tobacco Control -, em função disso, a convenção-quadro tem como seu objetivo principal proteger as gerações presentes e futuras das consequências devastadoras para a saúde e também ambientais e econômicas do consumo do tabaco e também da exposição à fumaça de tabaco. A convenção-quadro tem medidas abrangentes de controle do tabaco, inclusive o Artigo 6, que trata de aumento dos impostos e preços de produtos fumígenos com o objetivo de reduzir o consumo.
A Comissão Nacional para a Implementação da Convenção-Quadro, cuja Secretaria-Executiva eu venho representar aqui, tem como missão articular a implementação dessa política pública. Em 2023, ela teve uma reorganização; ela é formada apenas por representantes do Governo Federal, entre eles o Ministério da Fazenda, que é representado pela Receita Federal do Brasil. A Receita Federal do Brasil comanda, coordena praticamente, por causa da expertise dela e da prerrogativa da Receita Federal de ser responsável no Governo Federal pelos tributos da União. Ela trabalha conosco nesse grupo de trabalho que implementa o Artigo 6 e vem subsidiando os tomadores de decisão no sentido de regulamentar o Imposto Seletivo sobre produtos fumígenos, que tem como objetivo por natureza reduzir o consumo.
Como o Fabio comentou, temos esse estudo da carga do tabagismo, que foi um estudo feito em parceria e a pedido do Instituto Nacional de Câncer. Nós já tivemos estudos feitos no passado e agora fizemos essa atualização com base nos dados de 2022, que demonstram que o tabagismo causa uma carga econômica de R$153,5 bilhões ao ano para o Governo e para a sociedade, valor que corresponde a 1,55% do Produto Interno Bruto do Brasil. Parte desse valor, R$67 bilhões são relacionados à assistência médica; os R$45 bilhões restantes são os custos indiretos, que são relacionados à produtividade por morte prematura e incapacidade.
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O que trouxe de novo nesse estudo de 2022 foi esse valor relacionado ao custo do cuidador informal por perda de produtividade. É aquela pessoa da família que deixou de trabalhar para cuidar do seu familiar doente em casa.
E, por outro lado, a arrecadação federal em 2022 foi de R$8 bilhões com IPI e com PIS-Cofins relacionados à produção de cigarros no Brasil.
Também tem um outro fator, que é o comprometimento da renda familiar. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2019 indicam que fumantes comprometem mensalmente 7,8% do seu rendimento domiciliar em gastos com cigarro, enquanto eles poderiam estar transferindo esse valor para lazer, para uma alimentação mais saudável, para coisas mais saudáveis, para uma vida mais saudável, não é?
E qual o impacto? Nesse mesmo estudo, foi calculado o impacto em dez anos se aumentássemos 50% do cenário atual da carga tributária. Só nesse cenário, seriam evitadas 145 mil mortes, seria evitado o custo direto para a saúde de R$64 bilhões ao ano, aumentaria a arrecadação tributária em R$26 bilhões. Também haveria uma redução nos anos perdidos por mortes prematuras de 5,5 milhões, casos evitados de doenças cardíacas de 113 mil, casos evitados de acidente vascular cerebral de 97 mil, casos evitados de doença pulmonar obstrutiva crônica de 270 mil. Só com o aumento de 50% do que temos hoje, em dez anos, já teríamos essa redução, esse impacto para a sociedade e para o Governo Federal.
Nós temos aqui... O Brasil faz esse inquérito por pesquisa telefônica, que é a Vigitel, que é feita pelo Ministério da Saúde desde 2006. Nele podemos ver claramente a experiência bem-sucedida da Receita Federal, quando em 2011 promulgou um decreto aumentando a alíquota efetiva do maço de cigarro entre 2011 e 2016. Pode-se perceber aqui que nesse período já vinha tendo uma queda por uma elevação que também houve no passado, mas, especificamente nesse período de 2011 a 2016, houve uma redução significativa da prevalência de consumo de tabaco por conta desses aumentos anuais que ocorriam tanto na alíquota ad valorem quanto na alíquota ad rem. Contudo, esse decreto apenas previu os aumentos até 2016. De 2017 até 2023, não houve nenhum aumento, principalmente no imposto específico, que é o que causa mais impacto naqueles produtos que são de preço mais reduzido, consequentemente atingindo a população de sociedade de mais baixa renda - tem um impacto mais positivo, inclusive. Então, como não houve nenhum reajuste nesse período, já teve uma retração, uma redução nessa queda da prevalência. Felizmente, agora, no final de 2024 - inclusive, entrou em vigência agora, a partir de novembro -, esse imposto específico sofreu já um pequeno reajuste e já vamos conseguir uma retomada no aumento dessa carga tributária. Mas ainda há muito que se fazer e que se espera conseguir agora, com este momento da reforma tributária, em que está sendo apreciado o PLP 68.
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E por que, então, aumentar a carga tributária sobre produtos fumígenos? Porque o Imposto Seletivo é o instrumento que nós temos hoje para reduzir esse desequilíbrio econômico entre os gastos do Governo e da sociedade e ele deve ser aplicado a todos os produtos de tabaco e seus derivados. Então, não há por que se pensar em tipo de produção, se é uma forma mais caseira... não é nem que seja caseira, mais artesanal, porque na verdade nós temos aqui, como eu falei, na nossa comissão, representantes da Receita Federal que participam e que já fizeram fiscalização nessas empresas artesanais, e que de artesanal realmente não há nada. Então, temos que pensar que é o momento de o PLP não abrir nenhum tipo de exceção para qualquer tipo de forma de fabricação diferente desses produtos.
Esse aumento tem esse poder de reduzir o poder de compra e o acesso aos produtos. Por quê? Quando se aumenta a carga tributária, diminui-se o acesso ao produto. E temos que pensar também que nesses aumentos, como eu falei antes, a exemplo do que aconteceu entre 2011 e 2016, tem que ser garantido que seja feito um reajuste anual dessas alíquotas, principalmente da ad rem, para se manterem os preços acima, principalmente, da inflação.
Isso tudo vai poder contribuir para a queda do consumo, pela redução do acesso, promovendo essa redução da carga do tabagismo para o Governo e para a sociedade, reduzindo mortes, adoecimentos e esses sofrimentos das famílias.
Então, como recomendação também do protocolo... Porque o Brasil, além de ter ratificado e promulgado a convenção-quadro, também em 2018 ratificou o Protocolo para Eliminar o Comércio Ilícito de Produtos de Tabaco, que se refere ao art. 15 da convenção-quadro. E o PLP também tem esse artigo previsto, o art. 412, que trata da pena de perdimento nas hipóteses de transporte, depósito ou exposição à venda dos produtos fumígenos desacompanhados de documentação fiscal comprobatória de sua procedência, porque isso é um problema que a Receita Federal nos coloca: quando eles encontram determinados transportes nas rodovias, eles não conseguem fazer uma ação muito efetiva de perdimento, porque não há uma previsão muito explícita legal que permita. Então, o PLP traz aí essa oportunidade também.
E há um mito nessa questão: a carga tributária sobre produtos de tabaco não contribui para o aumento do comércio ilícito, porque o comércio ilícito também desloca o seu preço acompanhando qualquer tipo de aumento. Nós temos vários estudos, como esse mencionado, que podem comprovar essa questão.
Então, o que eu gostaria de colocar é isso.
Mais uma vez, quero agradecer essa oportunidade e colocar a Secretaria-Executiva da comissão nacional que implementa a convenção-quadro à disposição, também das perguntas que vierem, e mais uma vez agradecer também ao Fabio pela exposição que ele fez.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigada, Ana, pela exposição e parabéns pelo trabalho da comissão. Realmente são questões que precisam vir a público. Muita coisa pode ser evitada se a gente cuidar.
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Vou passar agora a palavra, como avisei antes, para a Luciana Monteiro Vasconcelos, Diretora Adjunta de Doenças Crônicas não Transmissíveis da Vital Strategies e, em seguida, para Luiza Machado, ambas presencialmente aqui na mesa.
A SRA. LUCIANA MONTEIRO VASCONCELOS SARDINHA (Para expor.) - Bom dia a todos e a todas.
Muito obrigada, Senadora, por esta oportunidade de estar aqui debatendo um tema tão importante e central para o país neste momento.
Eu sou Luciana, trabalho na Vital Strategies, que é uma organização global de saúde, e nós temos um grande projeto no Brasil junto com a ACT Promoção da Saúde e a Universidade Católica de Brasília, trazendo informações para monitorar tanto o que já está acontecendo com os custos do álcool quanto para subsidiar novas políticas e ações, como agora na questão da reforma tributária.
Aqui são algumas informações. O Fabio já colocou algumas e a Ana Paula também.
O álcool é um dos dez principais fatores de risco para morte no mundo. Ele causa aproximadamente 200 doenças e lesões. O dano associado ao álcool já está bem consolidado na literatura e é quase o dobro do causado pelo tabaco. E aí a gente tem a questão de que ele é socialmente aceito. Os dois são muito prejudiciais, mas nós temos esse ponto. E, aqui no Brasil, a gente tem que, para felicitações, para alegria, tudo envolve a questão da bebida alcoólica. Então é um olhar mais direcionado para o álcool também por conta disso.
Estima-se hoje que 104 mil mortes são atribuíveis ao álcool anualmente e 80% dessas mortes anuais são de doenças cardiovasculares e digestivas, câncer - o câncer de mama está completamente associado à questão do consumo de álcool - e outras lesões. Essas lesões incluem violência, violência doméstica, violência infantil, câncer e outras doenças, além de sinistros de carro - dos acidentes de carro, existe uma grande parte que tem uma relação direta com o consumo de álcool - e de suicídios, a violência autoprovocada. Nós temos um dado aqui que é muito interessante porque ele fala que os jovens correm maior risco de morte principalmente nessa faixa etária de 25 a 29 anos, que é bem a faixa economicamente produtiva desses jovens no Brasil.
Nós realizamos um inquérito populacional em 2023 e aqui tem alguns dados bem alarmantes: 41,5% da população costuma consumir bebida alcoólica e consumiu nos últimos 30 dias; 22,1% tiveram episódio recente de consumo abusivo - e aqui o abusivo significa quatro doses para mulher e cinco doses para homem - nos últimos 30 dias; 7,2% bebem pelo menos ou mais de três dias por semana; e 4% apresentam consumo de risco ou provável dependência, a partir de uma escala que nós aplicamos, a Audit.
Os resultados estão aqui, eu não vou ler todos, mas tem alguns que chamam muito a atenção: 23% daquela população que refere beber, dos 41,5%, percebem que não conseguiram parar de beber - eles começaram em algum momento, deveriam parar ali naquele movimento e não conseguem -; 14% perceberam que não conseguiram cumprir suas tarefas no dia seguinte - aqui a gente está falando de estudantes, de trabalhadores, então, podem até chegar a ir para o trabalho, a famosa ressaca, mas não conseguem produzir o que deveriam; isso é um custo econômico para o país -; e 5,6% referem que já ficaram feridos ou feriram alguém após beber nos últimos 12 meses.
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A gente sabe que todos esses dados aqui são subnotificados, porque aqui é alguém que teve a coragem, com muitas aspas, de dizer que feriu alguém ou foi ferido, que não conseguiu produzir no dia seguinte. Então a gente está falando de um grave problema realmente de saúde pública e econômica para o país.
Nós fizemos um estudo para o tabaco, para os ultraprocessados, como foi apresentado, a Ana Paula e o Fabio também apresentaram, que acabou de ser lançado com a participação da Senadora, em que nós temos R$18,8 bilhões de custos diretos e indiretos relacionados a doenças e a agravos relacionados diretamente ao consumo do álcool. Dos custos diretos nós temos R$903 milhões em hospitalização e R$224 milhões em custos ambulatoriais. E aqui a gente está falando só do SUS. Aqui a gente tem toda uma rede privada que não está incluída aqui.
E o custo indireto, que é o que eu estava falando, esse potencial custo econômico para a sociedade: R$17 milhões são gastos em mortalidade prematura, porque você tira indivíduos no auge da sua vida produtiva do mercado; R$47,2 milhões em previdência social; R$644 milhões em perdas adicionais, como absenteísmo, doenças, redução da sua produtividade. Então, não é pouca coisa, é algo bem sério, e a gente tem uma oportunidade agora única no Brasil, com a questão da reforma tributária, de tributar aqueles produtos que são prejudiciais à saúde.
Nós já temos, já veio no texto da lei da Câmara dos Deputados que tenha uma estrutura mista, que tenha um componente ad valorem e um componente específico, o que é muito positivo. E a gente acredita que os produtos alcoólicos devem ser cobrados com taxas mais altas para os produtos com maior teor alcoólico, porque nós temos aqui a questão do teor alcoólico em cada dose, porque é diferente você tomar uma dose de um destilado ou de uma cerveja ou de um vinho; você tem doses e a quantidade de etanol em cada uma delas. Então, a gente defende que devem ser as taxas, principalmente no componente específico e do ad valorem, com relação ao teor alcoólico.
Quanto ao Imposto Seletivo, nós estamos defendendo com uma alíquota que dê conta de uma redução de pelo menos 20% no consumo dos produtos no Brasil, porque é uma meta dos ODS e nós temos que cumprir isso até 2030 - o Brasil assinou e é signatário -, então nós precisamos fazer essa redução. Então essa é a nossa defesa.
E uma pesquisa do Datafolha, encomendada pela ACT Promoção da Saúde, é um dado desta semana, diz que 77% dos entrevistados disseram que deveria ter imposto mais alto para aqueles produtos que causam dano à saúde - isso é a população dizendo. No passado foi realizada essa mesma pesquisa, e a gente teve um acréscimo para este ano das pessoas concordando com isso.
Então, o que realmente a gente defende? Nós estamos apoiando algumas emendas. São elas: a 1.478 e a 1.658, de autoria das Senadoras Zenaide Maia e Augusta Brito, que retomam a previsão de atualização anual dos valores das alíquotas específicas do Imposto Seletivo pela variação do IPCA. Isso também já foi colocado aqui pelo Fabio, pelos meus antecessores, pela Ana Paula. Isso é muito importante. A gente precisa dessa atualização, senão chega a um determinado momento que perde a razão de ter.
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Nós apoiamos também a Emenda 1.703, de autoria da Senadora Zenaide Maia, que garante que, durante o período de transição, essa tributação seja pelo menos mantida como está, sem a perda de arrecadação, porque nós sabemos as diferenças atuais entre as unidades da Federação. Então, nesse período de transição, que não tenha perda para nenhum deles.
E a Emenda 1.530, de autoria da Senadora Teresa Leitão, que suprime o §4º do art. 419 do projeto, que corrige uma distorção que foi acrescida no último momento na Câmara dos Deputados, quando veio para o Senado, que permite a alíquota do ad valorem ser por teor alcoólico, introduzida na última hora, como eu coloquei aqui.
Então, são essas as nossas defesas. A gente está num momento ímpar no país, quando a gente pode contribuir para a redução do consumo do álcool e assim dar mais qualidade de vida à nossa população.
Só um dado a mais, a gente vem acompanhando, pelo estudo do Ministério da Saúde, um inquérito desde 2006. Como foi mostrado aqui anteriormente, a gente tem não uma estabilidade, mas um pequeno acréscimo de aumento no consumo do álcool para os homens; para as mulheres, ele está exponencialmente aumentando, assim como a introdução ao consumo do álcool: a idade média está cada vez menor e as meninas já estão igual ou passando na introdução do consumo do álcool. Então a gente tem que ter uma atenção muito especial com a questão das nossas mulheres no país.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigada, Luciana.
Nós destacamos - só um complemento, não é, Luciana? - como a questão da vida das mulheres é impactada: primeiro, porque, nos casos de violência, a violência doméstica é contra as mulheres, contra as crianças e, ao mesmo tempo, por ser o consumo de álcool socialmente aceito, é um brinde, é um festejo, é uma celebração, "vamos ali tomar uma, vamos brindar". E as campanhas, diferentemente das campanhas do tabaco, ainda não alcançaram o imaginário como o tabaco alcançou. A gente ainda tem muitos problemas - não é? -, mas a propaganda contra o fumo tem mais eficácia, tem mais visibilidade do que as propagandas contra as bebidas alcoólicas, com esse dado estarrecedor de a idade mínima estar cada vez mais mínima, isso a gente percebeu. E não é à toa também que as emendas são nossas - não é? -, de mulheres, não é uma coincidência.
Muito obrigada, Luciana.
Agora vamos passar para a Luiza Machado, a nossa Coordenadora de Incidência Legislativa do Grupo de Pesquisa Tributação e Gênero da Fundação Getúlio Vargas.
São 15 minutos iniciais, Luiza, que também está aqui na mesa.
A SRA. LUIZA MACHADO (Para expor.) - Obrigada, Senadora Teresa.
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Quero dizer que é um prazer estar aqui. É um alento ter uma audiência em que as convidadas e os convidados estão discutindo propostas verdadeiramente para pensar a perspectiva de saúde na reforma tributária. Isso é uma exceção; não tem sido a regra, viu, Senadora Teresa?
Então, quero agradecer mais uma vez pelo espaço; dizer que a senhora é uma grande parceira do Grupo de Pesquisa Tributação e Gênero; e aproveitar também para saudar as minhas colegas do grupo que estão aqui, as pesquisadoras Jacqueline Mayer e Kamile Kemp, e também saudar as pesquisadoras do Made (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da USP), na pessoa da Letícia Graça, que estão aqui também nessa luta por uma perspectiva de gênero e raça na reforma tributária.
E aí, sem mais delongas, eu quero trazer três propostas que nós temos do Grupo de Pesquisa em Tributação e Gênero à reforma tributária, ao PLP 68. Queria dizer que a reforma tributária avançou em diversas medidas na questão da inclusão da perspectiva de gênero, mas nós temos distorções ainda muito graves, que precisam ser corrigidas. E a primeira delas, que nós precisamos urgentemente discutir, é a inclusão de armas e munições no Imposto Seletivo.
Então, as emendas estão listadas, já foram protocoladas, e a gente precisa discutir a inclusão de armas no Seletivo. Quando a gente compara as outras propostas aqui, nós estamos até um passo atrás, porque, na nossa proposta, a gente está lutando para tentar manter a tributação como está, para não ter uma drástica redução na tributação de armas. Justamente porque as armas causam dano à saúde, então elas deveriam estar no Imposto Seletivo, e nós temos diversos exemplos internacionais que mostram que precisamos sobretaxar as armas.
Então, só para retomar um pouco, a reforma tributária vem para unificar esses quatro... quatro ou cinco, na verdade, tributos aqui em torno do IVA - IBS e CBS - e também do Imposto Seletivo. O Imposto Seletivo vai tributar esses bens que fazem mal à saúde e ao meio ambiente, e o IVA vai ter essas quatro faixas de tributação para bens e serviços. E nós continuamos tendo a essencialidade como um critério para distinguir quais produtos precisam estar na alíquota cheia e quais produtos devem estar nas alíquotas reduzidas e zeradas.
E qual é a questão das armas? As armas hoje têm, a exemplo dos revólveres, uma tributação de quase 90%, somando IPI, PIS-Cofins e ICMS. Com a reforma, elas passarão a ser tributadas na alíquota padrão, e deveria haver a inclusão no Seletivo justamente para tentar manter essa tributação. Como as armas não estão incluídas no Seletivo, nós teremos uma redução de 70% na tributação de armas. Isso significa uma ampliação do acesso a armas. Isso pode ampliar a violência contra a mulher, isso pode ampliar os gastos do SUS, como nós veremos aqui, isso pode ampliar a violência nas escolas, então é um dano que a gente vai ter muito grave. As armas terão a mesma tributação que perfumes e fraldas, por exemplo, o que nós não podemos deixar acontecer.
Então o primeiro ponto é que nós precisamos incluir as armas e munições no Seletivo, para pelo menos manter a tributação como está, para não deixar ter uma drástica redução na tributação das armas. E as armas estão dentro da hipótese de incidência do Seletivo; se o Seletivo, o "imposto do pecado", vem para tributar os bens que fazem mal à saúde e ao meio ambiente, e as armas causam danos à saúde pública, por que as armas não estão no Seletivo?
Quase 70% dos homicídios no país são causados por armas de fogo, que vitimam especialmente jovens negros. Só no ano de 2022, foram mais de 33 mil homicídios por armas de fogo, sendo que também temos 17 mil internações hospitalares para o tratamento dos feridos por armas de fogo. E aí, quando a gente vai observar - é uma pesquisa feita pelo Instituto Sou da Paz, com dados do SUS -, o valor gasto numa internação por armas de fogo é muito superior ao das outras violências. Por exemplo, o valor médio da internação por violência armada é R$2,3 mil. A despesa pública federal per capita é R$737. Então, o peso que as armas de fogo tem para o sistema de saúde é gigantesco, é muito maior do que o gasto médio per capita que o Governo Federal tem com cada um. O custo de internação por armas de fogo é 59% maior do que dos ferimentos por outros meios.
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E aí, Senadora Teresa, a gente tem que as Regiões Norte e Nordeste, justamente por um aumento da violência, têm um gasto 1,5 vez maior que a média nacional com internações por armas de fogo. Então, os sistemas de saúde das Regiões Norte e Nordeste estão mais sobrecarregados e gastando mais com internações por armas de fogo do que a média nacional. E esse valor decorrente das internações por armas de fogo poderia ser utilizado para fazer 10 milhões de hemogramas completos ou 934 mil mamografias. É um valor que poderia ser utilizado na prevenção, na descoberta de doenças, na prevenção do câncer de mama das mulheres e está sendo utilizado para tratar vítimas de armas de fogo.
E a gente fala em números, mas a gente também precisa falar na vida das pessoas, das mulheres que têm tido a vida ceifada por armas de fogo. Elas são o principal instrumento utilizado no assassinato de mulheres. E há também uma relação com álcool. As pesquisas demonstram que, em 25% dos casos de violência contra a mulher - e aí complementando as falas que me antecederam -, os agressores haviam feito uso de álcool. Então, há uma relação também com álcool, uso de armas de fogo, violência contra a mulher.
A gente teve o caso da Jane, como ela gostava de ser chamada, como ela era chamada, que, no último final de semana, foi assassinada em plena 25 de Março pelo seu ex-companheiro por armas de fogo, em plena luz do dia, sábado, em frente a sua loja, onde ela era dona, proprietária do seu negócio. Então, é tudo muito simbólico. E, só nesse final de semana, foram diversos feminicídios. Infelizmente, todos os dias as mulheres morrem vítimas de feminicídio. Nicoly foi outra vítima de feminicídio por armas de fogo, foi encontrada morta.
E, para além da vida das mulheres, nós também precisamos falar que até as forças de segurança pública, porque há essa discussão... Aos defensores das armas, essa proposta excepciona as armas adquiridas pela administração pública, porque as armas têm que estar na propriedade da administração pública, das forças de segurança, e não na mão de civis, justamente porque até as forças de segurança são vitimadas pelas armas nas mãos de civis. A gente viu aquele caso do Rio Grande do Sul, em que o atirador assassinou vários membros da sua própria família e também assassinou um policial de 31 anos, Everton Júnior, que foi vitimado e deixou um filho de 45 dias. Esse atirador tinha um registro CAC, tinha todos os registros corretamente, mas teve o amplo acesso a armas de fogo, e a gente viu a tragédia que foi.
Então, a gente tem também... Na experiência internacional, tributam-se sim armas no Imposto Seletivo ou há outras formas de tributar mais as armas de fogo. A gente tem nos Estados Unidos, desde 1937 - os Estados Unidos, que são o exemplo de liberdades individuais, etc. - um imposto específico sobre armas de fogo e munições. E esse recurso arrecadado é, inclusive, vinculado a um fundo, que foi criado à época, ligado ao meio ambiente, justamente porque se tratava de uma tributação sobre caçadores, enfim. Hoje, a realidade é outra no uso de armas de fogo nos Estados Unidos, mas é um exemplo que nós temos de um país que tributa mais, sim, armas de fogo e munições.
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No Chile - Excise Tax -, o imposto específico tributa álcool, tabaco, gasolina e armas de fogo e bens de luxo. Na Colômbia, a gente tem um imposto como se fosse um IPVA sobre armas, o imposto sobre propriedade das armas, que incide todo ano, são 10% do salário mínimo. É uma tributação que acontece todo ano como se fosse um IPVA sobre as armas que se tem que pagar. Então, é mais uma forma de desincentivar o uso das armas de fogo e munições, também isento para as Forças Armadas, como todos os outros tipos.
E aí, passando para a próxima proposta, nós temos a discussão em torno das fraldas infantis e geriátricas, que é também a emenda que já foi protocolada pela Senadora Eliziane Gama... desculpem, Zenaide Maia, a Emenda 459. As fraldas infantis e geriátricas, hoje, estão na alíquota máxima de IVA. Então, na alíquota máxima de IBS e CBS, que será 26,5%, 27%, nós temos as fraldas na mesma tributação que perfumes, joias, relógios, armas. Então, não faz sentido para o nosso sistema tributário as fraldas serem tributadas como produto de luxo, e elas assim estão no texto.
Então, a gente tem que hoje 53% dos idosos dependentes, que são aqueles que precisam de ajuda para realizar atividades da vida diária, estão nos lares com renda per capita menor que um salário mínimo. E das crianças na primeira infância, 55% estão nos lares cadastrados no CadÚnico. É por isso que, quando a gente observa o peso das fraldas na cesta de consumo, essa planilha, esse estudo do Banco Mundial elencou 160 cestas de produtos de acordo com a representação no orçamento das famílias. O que pesa mais no orçamento das famílias que estão nos 40% mais pobres versus nas famílias que estão nos 10% mais ricos. As fraldas são o oitavo item mais representativo, que mais pesa no orçamento da parte de baixo da pirâmide quando comparado com os 10% mais ricos, justamente por essa representação maior de idosos dependentes e crianças na primeira infância nesses lares.
E aí falar de fraldas também é falar das mulheres, porque quem cuida de crianças, quem cuida de idosos são as mulheres. As mulheres gastam o dobro de tempo de trabalho de cuidado do que os homens, e esse dado não tem se alterado muito nos últimos anos. Há uma sobrecarga feminina no trabalho de cuidado, mas não só em tempo, as mulheres gastam seu recurso com o trabalho de cuidado, justamente. Então, quando a gente observa os gastos das famílias, uma família chefiada por uma mulher negra gasta cerca de 80% mais do orçamento com produtos ligados a higiene e cuidados, quando a gente compara com uma família chefiada por um homem branco. As mulheres gastam mais na subsistência dos lares, na subsistência da família do que os lares chefiados por homens, as pesquisas têm demonstrado isso. Então, por isso que é fundamental que as fraldas sejam reconhecidas como essenciais na perspectiva tributária, porque nós sabemos que as fraldas são essenciais para a saúde, mas, na perspectiva tributária, não estão sendo consideradas essenciais.
E o terceiro pleito que nós temos, emendas que também foram protocoladas, é a inclusão de medidas fiscalizatórias e de participação social sobre benefícios tributários.
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Nós acreditamos que temos no ordenamento jurídico brasileiro já diversas medidas que impõem que precisamos fiscalizar benefícios tributários, porque se trata de renúncia de receita, se trata de gasto tributário e é um recurso público que precisa ser fiscalizado. Então, nós temos, por exemplo, experiências internacionais que mostram diversos países que já fizeram uma redução de tributação sobre absorventes. Em alguns países, conseguiu-se apurar redução no preço; em outros países, não se conseguiu apurar redução no preço, ou seja, os industriais e comerciantes se aproveitaram desse benefício tributário. Em outros, houve, sim, redução no preço.
Nova Jersey, Austrália, Alemanha foram estado e países em que houve, sim, redução no preço, por quê? Foram países que implementaram medidas fiscalizatórias e de participação social dos benefícios tributários. Uma das propostas, por exemplo, é que a gente tenha canais de defesa de consumidor que possam receber denúncias das consumidoras dizendo: "Olha, aqui não houve redução no preço. Cheguei aqui à farmácia e não houve redução no preço da fralda, não houve redução no preço do absorvente".
Então, é possível envolver a população para fazer essa fiscalização social porque é fundamental que a população se envolva nisso. A gente tem esse estudo na Alemanha, especificamente, que mostra - é esse último gráfico aqui - que as medidas, ao longo das semanas, até a mudança da legislação que reduziu a tributação de absorventes... A gente observa que, antes mesmo de passar a lei, já houve queda no preço. Por quê? Porque havia uma mobilização social tão grande que já houve redução do preço nas farmácias, enfim, nos estabelecimentos, porque havia uma participação social. Esse estudo linca, inclusive, a quantidade de tweets...
(Soa a campainha.)
A SRA. LUIZA MACHADO - ... e a queda no preço. Então, quando há um engajamento popular, quando há uma fiscalização, há uma forma de pressionar para que haja, sim, repasse no preço.
Eu concluo dizendo que essas são nossas três propostas principais.
Estamos completamente favoráveis à questão dos ultraprocessados, inclusive, porque precisamos retirar os ultraprocessados da lista de alíquotas reduzidas e incluir mais ultraprocessados no Seletivo, mas quero dizer que eu foquei nessas três principais emendas sobre inclusão de armas e munições no Imposto Seletivo. Inclusive, nós temos um ofício que foi assinado por mais de 140 entidades e gostaríamos de contar, inclusive, com mais assinaturas. Continuamos colhendo assinaturas para incluir armas e munições no Imposto Seletivo, mas, também, a redução da tributação sobre fraldas, porque são essenciais, e as medidas fiscalizatórias e de participação social.
Obrigada, Senadora.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Nós é que agradecemos, Luiza.
Vocês estão percebendo que o leque está se ampliando, as intervenções estão muito complementares, mas guardando muita coerência entre si, no sentido de cuidarmos da saúde e de termos uma reforma tributária justa nesse aspecto, ou seja, justa e saudável.
Então, eu vou passar a palavra agora, voltando para a videoconferência, para a Bruna Arguelhes, Assessora do Departamento de Promoção de Alimentação Adequada do MDS.
Bruna, seus 15 minutos iniciais.
Já quero agradecer a disciplina no tempo. Todo mundo está muito disciplinado, porque eu tenho meio-dia uma entrevista na TV Senado, mas é aqui pertinho, não se aperreiem.
A SRA. BRUNA PITASI ARGUELHES (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todas e todos.
Muito obrigada pelo convite e pela oportunidade de estar aqui.
Vou compartilhar minha apresentação, só um momento. (Pausa.)
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Já apareceu aí para vocês?
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Sim.
A SRA. BRUNA PITASI ARGUELHES (Por videoconferência.) - Está ótimo.
Como já foi apresentado, eu sou a Bruna Pitasi e trabalho na Coordenação de Promoção da Alimentação Saudável que fica na Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.
Vou falar um pouquinho aqui também sobre a questão, além do Imposto Seletivo, da cesta básica na reforma tributária.
Em março deste ano, o MDS junto com o Ministério da Saúde, o Ministério do Desenvolvimento Agrário e o Ministério da Fazenda publicaram um decreto presidencial que traz diretrizes e orientações sobre a composição da cesta básica de alimentos. Esse decreto estabelece que a cesta básica é um conjunto de alimentos que busca garantir o direito a uma alimentação adequada e saudável, à saúde e ao bem-estar da população brasileira. Ela deve ser orientadora das políticas públicas de segurança alimentar e nutricional e deve ser composta por alimentos in natura ou minimamente processados e ingredientes culinários.
Para a elaboração dessas diretrizes do decreto, a gente usou como critério o Guia Alimentar para a População Brasileira, um instrumento publicado pelo Ministério da Saúde, que traz todas as orientações sobre a promoção da alimentação saudável para a população brasileira, e também o Alimentos Regionais Brasileiros; e os alimentos da sociobiodiversidade. Eles devem compor essa cesta básica, que é uma cesta básica que promove a alimentação adequada e saudável da população.
Nessa cesta, a gente tem uma lista de grupos de alimentos que devem compor a cesta. E aí esses grupos são grupos que vão ser compostos por alimentos in natura e minimamente processados e ingredientes culinários, que são feijões, cereais, raízes e tubérculos, legumes e verduras, frutas, castanhas, nozes, carnes, ovos, leites, queijos, gorduras, sal, açúcar, café, chá, mate, especiarias. Isso está totalmente alinhado com as recomendações do guia alimentar.
E qual é a proposta, voltando aqui só rapidinho? A proposta desse decreto é que ele oriente as diversas políticas públicas de segurança alimentar e nutricional e também a política tributária. Por exemplo, o Plano Safra pode se basear nessa cesta básica para ver quais alimentos vão ser estimulados na produção no Brasil. A gente tem discutido também que a própria doação de alimentos pelos estados e municípios e pelo próprio MDS deve seguir essas orientações do decreto, entre outras diversas políticas que podem e devem usar o decreto como orientador para a promoção de uma alimentação adequada. E, por isso, isso dialoga totalmente também com a discussão da reforma tributária.
E um ponto importante que ficou de fora dessa composição, o que foi um grande avanço para a gente, foram os alimentos ultraprocessados. E por que os alimentos ultraprocessados não devem compor a cesta básica? Acho que o Fabio já trouxe alguns dados e reforço aqui o impacto dos ultraprocessados na saúde. A gente tem diversos estudos aí apontando o aumento da prevalência da obesidade no Brasil atribuível a esse aumento do consumo de alimentos ultraprocessados. Outro estudo mostra que o consumo de alimentos ultraprocessados é responsável por aproximadamente 57 mil mortes prematuras entre adultos.
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E há diversos estudos relacionando o aumento de risco do consumo de alimento ultraprocessado com diversas doenças crônicas não transmissíveis, mortalidade por câncer, transtornos de saúde mental, doenças respiratórias, cardiovasculares, gastrointestinais e metabólicas.
Além disso, a gente sabe que, além de os ultraprocessados terem uma composição nutricional desbalanceada, eles também afetam negativamente a cultura alimentar, porque a gente sabe que muitas vezes eles substituem aquele alimento tradicional da família por um alimento que nem se pode chamar de alimento, por um produto que é fabricado por uma indústria que não traz nenhuma relação com a cultura alimentar daquele povo, fornece calorias excessivas associadas com as doenças, além do que não está colocado aqui, que é o impacto também no meio ambiente. A gente sabe que tanto a produção quanto o descarte, por exemplo, das embalagens dos alimentos ultraprocessados têm impacto negativo no meio ambiente e em toda a cadeia do sistema alimentar.
Por isso, a Organização Mundial da Saúde, a FAO, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura vêm produzindo uma série de documentos e materiais que recomendam então que os alimentos ultraprocessados devem ser evitados, considerando todos esses impactos negativos para a saúde.
E aqui eu queria trazer um outro ponto, reforçando a importância de a cesta básica ser composta por alimentos saudáveis e adequados, alimentos in natura: um estudo super-recente que avaliou o decreto da cesta básica relacionando os grupos que estão colocados lá com o consumo alimentar, a POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) 2017-2018, observou que o maior consumo de alimentos in natura e minimamente processados está entre as famílias de menor renda. Isto é um ponto muito positivo para a gente pensar no caso da reforma tributária: a gente quer que essas famílias mantenham esse consumo desses alimentos. E em relação aos ultraprocessados, ao contrário, a participação aumenta conforme aumenta a renda. Então, a gente quer proteger essas famílias, que elas mantenham esse consumo de alimentos in natura e minimamente processados, mas tem um ponto de atenção, um ponto de alerta: se a gente olha ao longo dos anos, vem aumentando a velocidade com que os ultraprocessados estão participando da dieta das famílias de baixa renda. Então, isto é um ponto de atenção: a gente não quer que esse consumo aumente mais e que ele substitua o consumo de alimentos saudáveis.
Então, só fazendo uma síntese desse estudo, a base da alimentação das pessoas de baixa renda é de alimentos saudáveis, representando mais de 80% das calorias consumidas. Portanto, aquele argumento de que a gente não pode taxar os ultraprocessados porque vai impactar no consumo das famílias mais pobres não é verdadeiro, porque a base da alimentação delas é de alimentos in natura e minimamente processados. Então, a nova cesta básica, além de saudável e sustentável, reflete um padrão alimentar amplamente praticado pela população brasileira.
E, aí, agora, eu entro na questão da reforma tributária. A gente considera que a reforma tributária é um grande avanço para a política de segurança alimentar brasileira quando cria, lá na emenda constitucional, a cesta básica nacional de alimentos, que, como está no texto, deve ser composta de produtos destinados à alimentação humana e prevê alíquotas reduzidas a zero para a cesta básica. Então, isso, para a gente, é um grande avanço, é uma grande conquista.
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Prevê ainda, no seu art. 9º, alíquota zero para os produtos, hortícolas, frutas e ovos e a possibilidade da redução dos 60% para outros alimentos, além da possibilidade do Imposto Seletivo para produtos prejudiciais à saúde - aí, por fim, entraram as bebidas açucaradas.
Bom, quando a gente olha para o Projeto de Lei Complementar 68, que é o que está em discussão agora, no Senado, a maioria dos alimentos in natura e minimamente processados, que são preconizados lá por esse decreto presidencial, ficaram na alíquota zero ou na reduzida. Então, isso é muito importante, isso não é pouca coisa, e é importante a gente sempre reforçar e defender que isso seja mantido, que a gente não tenha um retrocesso, no sentido de que essa conquista e esse avanço que foi colocado pelo projeto de lei seja mantido e garantido.
Também essa avaliação quinquenal que vai haver, das listas complementares, em que foi incluída essa vinculação dos alimentos in natura e minimamente processados serem sempre considerados para a composição dessa cesta básica - isso também é um grande avanço.
Bom, além de a gente celebrar essa conquista dos alimentos in natura e da cesta básica, a maioria, estarem na alíquota zero ou na alíquota reduzida, a gente também tem alguns pontos de atenção que se precisa para uma qualificação e melhoria do que está proposto hoje.
Bom, o primeiro ponto, como eu já falei, é manter nas listas de alimentos da cesta básica e reduzida apenas os alimentos in natura e minimamente processados, como previsto no decreto, manter essa avaliação quinquenal, que eu já comentei, e retirar os produtos alimentícios ultraprocessados. Então, quando a gente olha lá para a lista dos alimentos com alíquota zero, ainda entraram alguns ultraprocessados, como a margarina, os cafés aromatizados e solúveis e preparações à base de extratos, essências ou concentrados de café, que são alimentos ultraprocessados.
Então, é importante - e aí a gente está sugerindo - que sejam retirados esses produtos da alíquota zero e da alíquota reduzida também, em que entraram massas ultraprocessadas, como macarrão instantâneo, pão de forma, bebidas lácteas. Então, também se deve retirar da lista da alíquota reduzida todos os alimentos ultraprocessados, para estar totalmente alinhado com o decreto da composição da cesta básica.
Além disso, incluir na alíquota zero, como parte da cesta básica, arroz quebrado e grãos trabalhados. Isto aqui, por uma questão lá da nomenclatura, acabou ficando excluído. É importante, para não deixar de fora esses grãos.
Como parte dos produtos hortícolas e frutas, que têm a redução de 100%, que têm que estar na alíquota zero, incluir alimentos da sociobiodiversidade. Isso também é muito importante, como as castanhas, algumas leguminosas que acabaram ficando de fora, garantindo essa tarifa reduzida para alimentos da sociobiodiversidade - isso, para a gente, também é muito importante.
Por fim, fazendo uma síntese da minha apresentação, a gente precisa defender que a gente tenha uma cesta básica de alimentos saudáveis e adequados nutricionalmente, que promova o acesso e o consumo de alimentos in natura e minimamente processados, especialmente para os mais pobres.
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Então, nesse sentido, é importante a gente garantir e manter que a cesta básica de alimentos seja composta apenas de alimentos saudáveis e excluir todos os ultraprocessados que estão previstos tanto na alíquota zero quanto na alíquota reduzida - isso é muito importante - e também uma reforma tributária que desincentive o consumo de ultraprocessados. Além de excluir da lista, a importância do Imposto Seletivo, como já foi muito bem aqui colocado por outros colegas, e que os alimentos ultraprocessados não tenham nenhum tipo de benefício ou mecanismos de devolução de imposto, cashback, e que a gente possa, de fato, ter uma reforma tributária que vá contribuir para a promoção da saúde, para a promoção da segurança alimentar nutricional, pensando nessa questão da equidade, pensando na população mais vulnerável do nosso país, e também contribuindo para uma alimentação mais sustentável, que proteja também o meio ambiente.
Então, essa era a mensagem que eu queria deixar aqui, e fico à disposição para qualquer dúvida.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigada, Bruna. Essa é uma visão bem ampla da importância da cesta básica no combate à fome e na promoção da alimentação saudável. Precisa ser, realmente, muito valorizada.
A nossa próxima convidada que vai fazer uso da palavra é Luciana Phebo, Chefe de Saúde e Nutrição do Unicef.
Luciana vai falar aqui da mesa, presencialmente.
A SRA. LUCIANA PHEBO (Para expor.) - Bom dia a todas as pessoas aqui presentes e também online.
Em nome do Fundo das Nações Unidas para a Infância e Unicef, eu agradeço à Senadora Teresa Leitão o convite para estarmos aqui debatendo um tema tão importante, tão atual.
Eu vou trazer outras perspectivas, que complementam as falas aqui. Eu vou falar sobre direito.
Estamos falando sim sobre saúde, sobre segurança alimentar, mas eu vou falar sobre as perspectivas do direito, impactando especialmente as crianças.
Atualmente, a má nutrição de crianças é um dos principais desafios do Brasil na garantia dos direitos de as crianças sobreviverem, desenvolverem-se plenamente e prosperarem.
Quando nós falamos de má nutrição, nós estamos falando da desnutrição - desnutrição crônica e agora também aguda, pensando aí na saúde indígena -; estamos falando de deficiências de micronutrientes... E o Brasil ainda se encontra nessa situação, mas agora, mais do que nunca, nós estamos também falando de obesidade e sobrepeso, que afetam tantas crianças e tantos adolescentes, e tudo isso é o que nós chamamos da tripla carga da má nutrição, que afeta o Brasil e tantos outros países da América Latina e do mundo e está afetando cada vez mais o direito da criança e do adolescente.
E, quando nós falamos em direito - eu vou apresentar mais adiante -, é uma questão não de escolha individual e sim de todo um contexto obesogênico que o país, que os municípios, que as comunidades impactam na vida de famílias, e famílias das mais vulneráveis. São implicações para hoje, implicações para todo o futuro de uma geração e, certamente, implicações para um país que se espera que esteja em desenvolvimento. O não desenvolvimento das crianças significa o não desenvolvimento de uma nação.
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Então, aqui eu passo.
Aqui vocês podem ver... Está um pouco cortado em cima, mas é a realidade da região da América Latina e Caribe: 4,2 milhões de crianças abaixo de cinco anos já são afetadas nesse contexto obesogênico que eu estou trazendo e que os países já vivem.
Então, vocês podem ver que o Brasil, ali na marquinha de coloração vermelha, já se encontra com alta prevalência de crianças que são afetadas, que já se encontram no estado de sobrepeso ou obesidade - isso com relação a crianças menores de cinco anos. No Brasil, em torno de 10% das crianças menores de cinco anos já se encontram em sobrepeso ou obesidade. Quando se avança na faixa etária, incluindo agora adolescentes até 19 anos, esse percentual chega quase a 30% no Brasil e também aqui em toda a América Latina. Vocês podem ver pela coloração também de vermelho a roxo os países que estão muito afetados, com prevalência maior ou igual a 25%. Em 25 países na nossa região, crianças e adolescentes já se encontram na faixa de sobrepeso e obesidade. Então, realmente é um sério problema de saúde pública.
Eu estou apertando, e o negócio não vai...
Aponto para cá? Agora. Eita, agora foi mais. Menos um.
Então, aqui eu quero trazer especificamente o que já falei, mas representado no gráfico. Essa relação... É uma escolha individual ser obeso ou estar em sobrepeso ou é um contexto político, econômico, um contexto imposto por indústrias, pelo comércio?
Ele avançou sem eu apertar. Podemos voltar? Estou sofrendo aqui com o passador. Não, está indo para frente. Então, volta dois.
Vocês vão poder ver nessa mandala, na parte inferior, que são questões que afetam o ambiente pessoal. É o acesso, são os recursos para acessar alimentação saudável, a disponibilidade. Mais acima, vocês podem ver que o que mais afeta realmente, de novo, são os recursos, a acessibilidade - ir ao mercado e encontrar alimentos saudáveis com o preço do meu orçamento. Isso, realmente, nós sabemos que é o que mais conta. É o contexto mais amplo que conta e que afeta as possibilidades de escolha. O poder de escolha não está nas mãos das mulheres, das mães de família, mas muito além das possibilidades e até mesmo do desejo, do desejo de escolha, porque o marketing nocivo afeta especialmente famílias pobres e famílias com crianças pequenas.
E aí nós podemos ver que, no Brasil, 36% das crianças estão em pobreza alimentar moderada. O que significa pobreza alimentar? É quando a criança é restrita na sua alimentação, conforme as classes de alimentos.
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Eu apresento ali as diferentes classes de alimentos, e, nesse estudo recém-lançado, foi visto que 36% das crianças estão reduzidas a uma monotonia alimentar exatamente pela dificuldade de acesso, levando também à insegurança alimentar. Crianças com coexistentes formas de má nutrição estão assim representadas e os impactos na sua saúde, como anemia, crescimento inadequado e/ou excesso de peso.
E eu quero trazer aqui - ainda não foi falado - a relação de excesso de peso e saúde mental, outro aspecto também muito discutido como um grande problema de saúde pública, não só no Brasil como no mundo. O excesso de peso também está diretamente ligado à saúde mental dessas crianças e famílias.
Vamos?
Esse foi um estudo que o Unicef fez, especialmente com famílias de baixa renda, ou seja, famílias do Bolsa Família. E nós observamos, através desses estudos, que 80% das famílias relataram o consumo de ao menos um tipo de alimento ultraprocessado no dia anterior às entrevistas. E são crianças, gente, da primeira infância, crianças abaixo de seis anos. E aí vocês podem ver os campeões de audiência, que começam pelos biscoitos, mas também bebidas lácteas. E isso é muito importante falar aqui, porque nós estamos sabendo que a questão atualmente é do Imposto Seletivo especificamente para refrigerantes. Já foi falado aqui pelo meu colega Fábio e por outros que, quando o Imposto Seletivo se limita a um tipo de bebida açucarada, o que acontece é a migração, por exemplo, para bebidas lácteas. E, como nós podemos já ver aqui, as bebidas lácteas são campeãs também no consumo por crianças pequenas.
Aqui é a relação. Eu não estou conseguindo ler à distância, eu não consigo ler nada, mas vocês podem ver que o consumo de alimentos, de bebidas lácteas está aí não só na rotina da família, que é na coluna esquerda, como também no consumo de fato das crianças.
Essa fotografia é muito significativa: é um bebê tomando Coca-Cola dentro de uma mamadeira. Imagino que vocês já tenham visto essa cena no Brasil e que para nós, do Unicef, mas acredito que para vocês também, choca tanto. Isso é uma realidade e uma realidade, infelizmente, muito frequente no contexto brasileiro.
E nós entendemos que, quanto mais cedo começar, quanto mais cedo a família tiver acesso à informação, ao conhecimento da importância da boa nutrição, quanto mais cedo os alimentos saudáveis forem de fácil acesso, não só economicamente, mas de fácil acesso à mulher que vai ao mercado, à família que vai fazer a compra do mês, o impacto é melhor. O impacto, novamente, não só na saúde da criança, mas no seu desenvolvimento, no seu desenvolvimento social, nas possibilidades de também se desenvolver e prosperar na vida. Essa é uma abordagem sistêmica não só do acesso ao alimento, mas de todo esse contexto obesogênico.
Junto com a Organização Mundial da Saúde, o Unicef traz um framework, uma proposta de regulamentar esse ambiente obesogênico não só através de tributos de bebidas adoçadas, mas também como guias para a população adulta e para criança. O conhecimento é muito importante.
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O Brasil já conta com o guia, inclusive é referente para outros países essa ação do Ministério da Saúde, do Ministério do Desenvolvimento Social, da sociedade civil brasileira também, fortemente representada nas diferentes formas de incidência. O Brasil também vem trabalhando com redução da publicidade, especialmente aquela que afeta crianças e adolescentes, mas ainda falta. Ainda há uma necessidade de avançar, como foi falado também, na melhoria da cesta básica, mas ainda falta - foi muito bom ter escutado a colega aqui do MDS na minha fala anterior - a implementação da rotulagem frontal, que também foi estabelecida - ainda falta. Estamos em todos os itens, como vocês podem ver. É um processo, mas um processo que ainda precisa avançar.
E, agora, na tributação de bebidas adoçadas, é necessário avançar, especialmente neste momento em que estamos na virada, no sentido de que não são só bebidas adoçadas, é também ultraprocessado; não são só refrigerantes, é também uma gama maior - bem maior - de bebidas adoçadas, inclusive adoçadas não só por açúcar, mas também por adoçantes artificiais.
O objetivo da tributação sobre bebidas açucaradas é, sim, aumentar o preço no varejo das bebidas açucaradas. O objetivo central aqui é reduzir a compra, é reduzir o consumo, mas vai além disso: é incentivar uma mudança para o consumo de água potável e segura - então, isso com muita comunicação, com muita educação entre pares, com muita participação da escola, integrando a alimentação saudável no currículo escolar -; mudar as normas sociais, enviando uma mensagem de que o consumo regular de bebidas açucaradas não faz parte de uma alimentação saudável e nutritiva, o suquinho não faz parte de alimentação saudável, a bebida láctea não faz parte de uma alimentação para crianças da primeira infância e para ninguém; reduzir a ingestão de açúcar livre na população, particularmente das crianças, particularmente das crianças na primeira infância; e gerar uma receita governamental significativa, que pode ser revertida para a saúde, para o bem-estar social.
Nós estamos agora saindo do G20, em que foi, com muita honra do Brasil, aprovada a Aliança Global contra a insegurança alimentar, contra a pobreza e contra a fome. Então, essa receita governamental, que pode ser incentivada por esse incentivo tributário, participa também do G20, para que essa Aliança Global seja de fato colocada na prática. Foi muito bom, foi muito bonito, muitas celebridades juntas e autoridades presentes, mas agora é o momento de colocar a Aliança Global na prática, e estamos falando sobre isso.
O que mais? Imposto Seletivo, bebidas açucaradas, aumento do preço de fato, para que se aumente a receita do Governo - para que se aumente - e essa receita vá para a saúde e programas sociais. Com isso, também pensamos, acreditamos que a redução de sobrepeso e obesidade possa impactar nas doenças crônicas não transmissíveis e isso diminua o custo, como já foi colocado aqui, do Governo, especialmente na atenção de doenças como a hipertensão, a diabetes, o câncer e tantas outras levadas por conta da obesidade e por conta das bebidas açucaradas e dos ultraprocessados.
No mundo, a tributação já está acontecendo.
(Soa a campainha.)
A SRA. LUCIANA PHEBO - Em 81 países já acontece e também em 16 estados e representações subnacionais. O Brasil precisa entrar nesse mapa. Na região latino-americana isso já vem acontecendo em diferentes países, como a senhora pode ver, Senadora. Países também levam essa tributação para bebida lácteas, como é o caso do Peru, do Panamá, não só se restringindo a bebidas carbonizadas, que são os refrigerantes.
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Aí são exemplos, eu vou deixar aqui para sua apreciação, exemplo do México e exemplo do Chile. Meu tempo está acabando, então eu não vou passar por esses pontos, mas certamente eu espero que essas informações sejam úteis, porque eu sei que a senhora, como tantas outras Senadoras atentas, está tentando ampliar essa tributação.
Temos nossas premissas. O consumo de ultraprocessados faz mal, para as crianças especialmente. Também temos a premissa de que quanto mais precoce acontece, pior - e são as crianças e a juventude que têm uma exposição mais longa no sentido de tempo de vida. E essas evidências de diversos países revelam que a taxação de bebidas açucaradas de fato reduz o consumo e de fato melhora a condição de vida, especialmente de famílias mais pobres - isso é uma questão que já é colocada.
E trago aqui, para terminar, o seu trabalho, Senadora Teresa Leitão, que está aqui conosco, com o Unicef, ampliando a tributação de bebidas açucaradas. Quem sabe a gente consiga também para os ultraprocessados, mas que se vá pelo menos além dos refrigerantes.
É isso. Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigada, Luciana. Sugestões e recomendações aceitas, pode ficar tranquila.
Vamos passar agora para o nosso penúltimo expositor, que é José Angelo Divino, Coordenador do Programa de Mestrado e Doutorado em Economia da Universidade Católica de Brasília, que vai participar por videoconferência.
Professor, seus 15 minutos iniciais.
O SR. JOSÉ ANGELO DIVINO (Para expor. Por videoconferência.) - O.k., obrigado.
Vou compartilhar aqui a minha tela.
Inicialmente, cumprimento os meus colegas da mesa. Agradeço à Senadora pelo convite para participar dessa audiência pública e também a cumprimento pelo excelente trabalho que está realizando diante de tema tão relevante para a sociedade brasileira.
A minha fala, de certo modo, complementa um pouco as falas anteriores. Eu vou focar em dois temas principais: reforma tributária e tabaco e reforma tributária e bebidas alcoólicas. As informações que eu vou mencionar, os dados vieram de estudos publicados, inclusive, de um grupo de pesquisadores que reúne professores da Universidade Católica de Brasília e da Fundação Getulio Vargas, conforme mencionado aqui nesse eslaide.
Bom, vamos começar pelo tabaco. Acho que é consensual que o aumento da tributação, que gera um preço mais elevado, é uma das medidas mais eficazes para se reduzir a prevalência, vários estudos em nível mundial comprovam isso. Porém, no Brasil isso ainda não está totalmente explorado, tem margem para a gente aumentar imposto e com isso elevar o preço do cigarro, principalmente, e reduzir o consumo. Isso porque o Brasil tem um dos cigarros mais baratos da América Latina, perde normalmente só para o Paraguai. Agora, com o aumento recente do preço mínimo, houve um acréscimo, foi um avanço importante, mas ainda assim cigarro aqui é muito barato, pouco mais de US$1 por maço se você pegar as marcas mais baratas, enquanto que, em alguns países, chega a US$20 o maço, por exemplo.
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Uma preocupação e uma questão recorrente para tentar evitar esse aumento de impostos é a questão do mercado ilícito, que surge com um argumento forte, principalmente por parte dos fabricantes e da indústria, dizendo que, se você aumenta imposto e com isso eleva o preço, a única consequência será o aumento do mercado ilegal de cigarros, uma preocupação relevante para as autoridades, porque o mercado ilegal é uma parcela importante do mercado de tabaco aqui no país. Porém, esse argumento é bem falacioso, como a gente vai ver nos dados que eu vou mostrar daqui a pouco. Então, diante da oportunidade única oferecida pela reforma tributária, é importante que se busque alinhar ao contexto mundial e, com isso, elevar os preços de cigarros aqui no Brasil.
Para contrapor esse argumento de que, se aumentar imposto, vai aumentar mercado ilegal, a gente usa dados oficiais da Pesquisa Nacional de Saúde, conduzida pelo IBGE e representativa do país como um todo, cujos dois anos mais recentes são 2013 e 2019.
A próxima questão que a gente enfrenta ao usar esses dados é como que se identifica o mercado ilícito. Tem duas maneiras principais, e a primeira é considerando o preço mínimo do cigarro. A política foi instituída em torno de 2011, o último reajuste tinha sido em 2016, quando foi para R$6. Era R$5 e, agora recentemente, a partir de setembro, passou a R$6,50. Então você pode usar o preço mínimo da seguinte maneira: cigarros vendidos acima desse preço mínimo seriam legais; abaixo, por definição, ilegais. É claro que tem alguns cigarros ilegais que podem ser vendidos acima do preço mínimo, mas é uma fração muito pequena, os estudos mostram isso. O mercado ilegal tende a vender mais - pelo menos o cigarro mais barato - abaixo do preço mínimo. Isso a gente comprova, por exemplo, na pesquisa de 2009, da PNS, que introduziu uma nova forma de se identificar o mercado ilegal, que é uma pergunta para o fumante de qual marca de cigarro ele comprou na sua última aquisição. Com base em uma classificação de marcas da Anvisa, a gente pode saber se aquela marca é de cigarro legal ou de cigarro ilegal.
Tem uma segunda forma de identificar esse mercado com dados de 2019 - em 2013, somente o preço mínimo. Aí a gente usa métodos estatísticos e econométricos sofisticados. Não é o caso de entrar nos detalhes aqui, mas a ideia é que a gente confronte indivíduos que fumam cigarro ilegal e também fumam cigarro legal com mudança de preço. Muda-se o preço equivalente ao ilícito e equivalente ao lícito e avalia-se o comportamento, se esse indivíduo vai mudar, se vai migrar de um mercado para o outro conforme o preço muda. Fazemos vários testes, várias análises para tornar os resultados criveis e robustos.
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Aqui tem uma tabela de números que inicialmente pode assustar, mas eu vou focar apenas nos aspectos fundamentais. Então inicialmente que a gente tem os resultados para PNS de 2013, nessas duas primeiras colunas numéricas. No meio, a gente tem as duas reunidas. Aqui é uma amostra grande de mais de 3,5 mil indivíduos no país inteiro, 2013 e 2019; e, nas duas últimas colunas, 2019.
Os números que nos interessam mais aqui são os que estão marcados em verde e os que estão marcados em azul. Os números marcados em verde representam os efeitos de uma mudança no preço do cigarro legal para o consumo do cigarro ilegal. Então, se o preço do cigarro legal aumentar, porque aumentou o imposto, vai elevar o consumo de cigarros ilegais? E os resultados aqui são unânimes para todos os anos informando que não. Por que não? Porque nenhuma das estimativas foi estatisticamente significante. Pode até haver uma mudança marginal, mas estatisticamente não é significante. Então, não provoca essa migração.
Por outro lado, se a gente considera o efeito do preço do cigarro ilegal sobre o mercado legal, sobre o consumo legal, aí é um efeito interessante. Se o preço do cigarro ilícito aumenta, o consumo do cigarro legal vai aumentar. Ou seja, as pessoas migram do mercado ilegal para o mercado legal quando o preço do cigarro ilegal aumenta. Isso a gente observou em 2013 e observou também na amostra conjunta, de 2013, e 2019. Somente em 2019 o efeito não foi também tão significante. E, logicamente, se o preço do cigarro aumenta, o consumo do cigarro naquele mercado reduz. E essa redução é porque alguns vão consumir menos, outros vão migrar para outros produtos, aí tem várias razões para explicar isso. Agora, esse efeito é sempre maior no mercado legal. As pessoas que fumam cigarro ilícito, aqui os números vermelhos mostram isso, são menos sensíveis a variações de preço, porque há menos variabilidade. Algumas questões podem ser usadas para explicar isso.
Resumindo, o resultado principal dessa tabela aqui, com dados da PNS de 2013 e 2019, com amostra conjunta - dados oficiais -, não tem nenhuma evidência de que, se aumentar o preço do cigarro legal, por causa, por exemplo, de impostos mais elevados, não tem nenhuma evidência de que vai haver migração para o mercado ilegal de cigarros.
Bom, algumas recomendações para o setor de tabaco é que não tem esse efeito de mudança de demanda, esse é o nosso resultado principal. A reforma tributária é uma oportunidade única para se alinhar a tributação de cigarros no Brasil com outros países, países mais avançados do mundo. A gente já conseguiu avanços importantes, conforme foi demonstrado há pouco na apresentação do Inca, mas ainda tem espaços para melhoria. O cigarro ainda mata muitos brasileiros: a metade dos consumidores, por exemplo.
O preço mínimo após o reajuste voltou a ser um instrumento de política interessante e eficaz. O aumento não cobriu totalmente a inflação do período, de 2016 a 2024, quando ele ficou sem reajuste, mas ainda assim foi um avanço importante. E o mínimo é fundamental para garantir um preço mais elevado para os cigarros mais baratos. São justamente os cigarros mais baratos que os grupos mais vulneráveis consomem: que os jovens iniciam no fumo. Então é fundamental ter um mínimo mais alto para evitar que isso aconteça.
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Agora, não dá para ficar parado no tempo de novo. Então o reajuste do mínimo anualmente pelo IPCA é uma política bastante desejada. Por que o IPCA? Porque é a nossa medida oficial de inflação, não é um índice manipulável, é referência para toda economia, então pode ser também para reajustar anualmente o valor desse preço mínimo que subiu agora, em 2024.
Outro ponto: que o combate ao mercado ilícito seja feito de forma legal, com mais fiscalização, repressão, apreensão de cigarros - aí tem as forças responsáveis por isso.
Não se deve fazer política de preço para tentar reduzir ou minimizar o mercado ilegal, isso não existe em lugar nenhum do mundo. Então, política de preço no caso de tabaco deve ser usada para reduzir consumo, aumentando preço, aumentando arrecadação, até para custear os gastos com saúde das doenças relacionadas ao consumo de tabaco, então é para isso que serve política de preços no mercado de tabaco, e não para tentar conter, usando esse argumento falacioso, o tamanho do mercado ilícito, o aumento do mercado ilícito.
Bom, o próximo tópico que eu gostaria de tratar é sobre bebidas alcoólicas, reforma tributária e bebidas alcoólicas. Aqui tem uma questão crítica, porque o Imposto Seletivo deve ser aplicado para bebidas alcoólicas; caso contrário, se permanecer somente o IVA comum a todos os bens e serviços, vai haver uma queda importante da carga tributária nesse setor, como eu vou mostrar daqui a pouco. Isso aí logicamente não só implicaria uma imensa perda de arrecadação, como também efeitos muito danosos à saúde, porque aumentaria o consumo dessas bebidas. Então é fundamental que haja uma escolha adequada do Imposto Seletivo para as bebidas alcoólicas.
E, como haverá uma equalização entre os estados, mesmo com o Imposto Seletivo, deve-se tentar evitar que alguns estados percam arrecadação, principalmente aqueles que atualmente tributam mais e, consequentemente, arrecadam mais no setor de bebidas. Esses estados, depois da reforma, poderão perder receita, porque haverá a mesma carga tributária para todos, mesmo com o Imposto Seletivo. Então, quem tinha uma carga tributária baixa vai ganhar para chegar ao valor nivelado entre os estados; quem tinha uma carga tributária alta vai perder. Então é fundamental que se pense em uma forma de definir o Imposto Seletivo de maneira a evitar a perda de arrecadação dos estados e também reduzir o consumo, na ótica das recomendações da OMS, por exemplo, a queda de pelo menos 20% no consumo.
Outro ponto é que o Imposto Seletivo deve combinar dois componentes: um ad valorem, ou percentual, e um específico, ad rem, que é o valor em reais cobrado de cada produto. É importante que ele varie entre produtos alcoólicos com diferentes teores de álcool e também que ele seja reajustado anualmente para não perder eficácia ao longo do tempo, e o reajuste deve ser pela inflação do IPCA também.
Aqui é um retrato do setor com os últimos dados mais recentes que a gente tem, tanto do IBGE quanto da Receita Federal.
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A participação de cerveja no mercado é massivamente superior: ela responde por 86,5%; depois vem cachaça, com 9%; vinho, 3%; e destilados, 1%. E aqui, em termos de teor alcoólico, cerveja seria o menor; depois vinho, intermediário; e cachaça e destilados, os maiores teores alcoólicos, mais ou menos com o mesmo nível. Quanto ao preço médio, tem uma variação entre eles. E quanto à carga tributária, a carga tributária de cerveja é aproximadamente 37%; 47% para destilados; 39% para vinhos; e 43% para cachaça - é o cenário atual, antes da reforma.
Então, se for nivelado por um IVA de 26% ou 28%, dá para perceber aqui que todos os produtos vão ter carga tributária reduzida; não faz sentido. Então tem que se pensar no Seletivo para, no mínimo, compensar a carga tributária e evitar que os estados percam arrecadação.
A receita: quase R$36 bilhões em cerveja - receita média -, e a dos outros aqui um pouco menor. E o consumo: o brasileiro consome aproximadamente 13 bilhões de litros de cerveja por ano, é uma coisa bem elevada. Daí a importância de se definir de forma adequada o Imposto Seletivo para bebidas.
Aqui uma ilustração. Na estrutura atual a gente tem o IPI e o PIS-Cofins, que são impostos federais, então têm as mesmas alíquotas entre os estados. E o que varia é o ICMS: os estados aqui definem uma política mais ou menos agressiva na tributação de bebidas alcoólicas. Aqui não são taxas, aqui é simplesmente a participação de cada um nessa arrecadação. Então a participação maior para todas as bebidas alcoólicas é o ICMS, chega a 72% aqui em cervejas, por exemplo, na principal fonte de arrecadação, que é o imposto estadual. Aí, se a gente olhar aqui para os estados, as menores tributações estão em São Paulo e Rio, que são os maiores mercadores consumidores, e esses estados têm os maiores preços. A margem de lucro das empresas nesses estados é a maior possível, são os maiores mercados consumidores. Então tem espaço para a gente aumentar a tributação e, com isso, reduzir o consumo de bebidas alcoólicas.
Bom, o tempo está terminando, deixe-me acelerar aqui.
No caso de bebidas alcoólicas, a sugestão é que seja adotada uma estrutura mista, com um componente ad rem e um ad valorem; que isso seja escolhido de maneira cuidadosa, para evitar que haja perda de arrecadação e perda de receita; e que o componente específico - ad rem - seja reajustado anualmente pelo IPCA, para que não perca valor ao longo do tempo. E, como referência, uma recomendação interessante na linha da OMS é que o consumo seja reduzido pelo menos 20% após a reforma.
Bom, acho que é isso. Muito obrigado pela atenção.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Nós que agradecemos, Professor.
Estávamos aqui comentando sobre como a cerveja é a rainha do consumo de bebidas alcoólicas, não é? E isso está muito ligado também a patrocínios de festas, de shows, de Carnaval, de eventos; porque esse patrocínio é feito por cervejas, entre as bebidas alcoólicas é a que mais patrocina. Na minha cidade, que tem o maior, o melhor Carnaval (Risos.)...
A SRA. LUCIANA PHEBO (Fora do microfone.) - Há controvérsias!
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - ... de Pernambuco, lá em Olinda, se fecha o patrocínio para uma marca de cerveja só. E é uma coisa impressionante, impressionante.
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Mas vamos adiante, não é?
Vamos ouvir agora Mônica Andreis, Diretora-Geral da ACT Promoção da Saúde. Mônica é a nossa última convidada a se expressar e vai por videoconferência também.
A SRA. MÔNICA ANDREIS (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada. Bom dia a todos e todas, especialmente à Senadora, pela oportunidade de a gente estar aqui.
Queria também cumprimentar todas as pessoas que falaram, me antecederam aqui nesta audiência, e dizer que, enfim, o conteúdo de todas as apresentações foi excelente, não é? E, mesmo sem combinar, eu acho que elas acabam sendo complementares.
Então, eu vou falar um pouquinho também aqui. Vou dividir a apresentação para comentar um pouquinho também a respeito desse tema, representando a ACT Promoção da Saúde, que é uma organização não governamental brasileira que trabalha pelas políticas públicas de prevenção, promoção da saúde, especialmente o controle dos fatores de risco das doenças crônicas não transmissíveis.
Nós temos acompanhado esse tema da reforma tributária já desde o início, as discussões na Câmara dos Deputados, agora aqui no Senado. Então, temos estado bem próximos e agradecemos, inclusive, a Senadora pelo apoio e por todas as oportunidades que a gente tem de diálogo.
E vou apresentar um pouquinho, então, que a ACT também participa de um grupo mais amplo que defende aí a reforma tributária 3S: saudável, solidária e sustentável, ou seja, a simplificação do sistema tributário, que é prevista na reforma, pode ir além disso, ela pode ir muito mais no sentido de promover um futuro mais saudável à população e mais sustentável para o Brasil. E, nesse sentido, os impostos seletivos elevados sobre tabaco, álcool e bebidas açucaradas são essenciais para atingir as metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030, com que o Brasil se comprometeu em 2015. E, nesse sentido, a gente acredita que agora é uma oportunidade única que o Brasil tem de corrigir distorções e, de fato, passar a promover mais a saúde, a justiça social e a sustentabilidade no país.
Esse trecho que eu copiei aqui está contido nesse documento, que é o Impostos a Favor da Saúde, lançado agora em 2024. Ele tem representantes de vários países participando. Michael Bloomberg liderando essa iniciativa, mas também com representantes de vários países, inclusive a nossa Ministra da Saúde, a Nísia Trindade Lima, que também participa dessas discussões em nível internacional. E tomamos conhecimento de que foi enviado para uma série de pessoas, como, por exemplo, aí do Senado - talvez a senhora mesma tenha recebido, Senadora - esse material que eles traduziram para o português e que é bem oportuno, porque eu acho que fala exatamente do que nós estamos tratando hoje aqui no Brasil.
Ele tem como mensagens-chave cinco pontos - eu vou ler só os títulos para não me alongar aqui - e reitera que é necessária uma ação urgente para reduzir as mortes e as doenças associadas ao consumo de tabaco, álcool e bebidas açucaradas, especialmente nos países de baixa e média renda, que é o que a gente ouviu de praticamente todas as pessoas aqui nesta audiência.
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Os impostos a favor da saúde são bons para a saúde, bons para os orçamentos, para a economia, o que os torna uma solução política única e oportuna para a policrise atual. A prioridade máxima é que todos os países aumentem e reformem os impostos sobre tabaco, porque continua tendo o maior impacto em termos de número de mortes e doenças associadas ao tabagismo. Sem uma ação decisiva hoje, milhões de vidas serão perdidas desnecessariamente. E, por isso, através desse documento, se apela a todos os países para que aumentem urgente e substancialmente os impostos a favor da saúde, dando prioridade ao tabaco, e continuem a aumentá-los acima do nível da inflação e do crescimento econômico.
Então, assim como nós tivemos esse documento internacional, eu vou mostrar na minha apresentação outros documentos também de órgãos significativos internacionalmente que reiteram essas mensagens, o que eu acho que é muito importante aqui, porque a gente já viu uma série de dados nacionais, de estudos que refletem a situação aqui do país, mas isso tem um respaldo internacional também que é importante considerar.
Então, os impostos a favor da saúde são os impostos certos para aumentar agora, porque são eficientes, corrigem preços incorretos que tornam o tabaco, o álcool, bebidas açucaradas baratos em relação a seus custos sociais, ou seja, externalidades.
E aqui eu retomo algo que as pessoas também já puderam comentar: os preços dos produtos nocivos não contemplam atualmente os seus custos sociais, ou seja, o ônus acaba ficando muito mais para a sociedade, enquanto as empresas ficam com os lucros. Então, a gente tem aí os registros tanto de gastos com tabaco quanto com ultraprocessados e com o álcool atingindo bilhões de reais ao ano, o que impacta, e muito, no nosso orçamento, impacta no Sistema Único de Saúde, por exemplo, e na vida de todas as pessoas que acabam tendo consequências gravíssimas associadas ao consumo desses produtos.
Esse é um outro documento do Banco Mundial, também recente, que analisou impostos de saúde e especificamente trata da questão do Brasil, e reitera o quanto esses produtos, como tabaco, bebidas alcoólicas e bebidas açucaradas, têm um impacto no país.
Então, no Brasil, mais de 20% das mortes anuais têm relação com o consumo desses produtos. Em relação, por exemplo, aos cigarros, já foi dito aqui até que é o segundo menor preço da região da América Latina, e é o mais barato da região dos países do G20. No caso da cerveja, é o quinto mais barato na região da América Latina e no G20. Destilados são o quarto menor preço na América Latina e também o terceiro menor preço no G20. Então, esses dados são importantes para a gente analisar, porque na verdade esses produtos no Brasil estão com um preço muito aquém do que deveriam.
Esses outros documentos, também ainda falando um pouco sobre o tema do tabaco, mostram... tanto a OCDE fez um estudo sobre a taxação de tabaco na América Latina e no Caribe quanto também este outro grupo chamado Tobacconomics, que hoje em dia é chamado Economics for Health, também fez uma avaliação mostrando que o Brasil teve um aumento na acessibilidade de cigarros, por exemplo, que não seria desejável, porque, claro, a gente quer tornar esse produto menos atraente, menos acessível à nossa população, e não o contrário.
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Então, entre as recomendações desse documento, também consta que o Brasil deveria aumentar significativamente o imposto sobre cigarros para aumentar os preços e implementar um reajuste automático que supere os índices de inflação e crescimento econômico.
Em relação ao tema de tabaco e álcool, a gente chama atenção aqui na reforma tributária para alguns pontos que nossos colegas anteriores também já falaram. A importância de a gente ter a previsão de um mecanismo de ajuste com base na inflação. Então, havia no texto original a menção de que seria feito um reajuste anual pelo IPCA. Foi retirada a menção ao IPCA. Então, é importante que isso retorne para que não haja dúvidas ou insegurança jurídica sobre isso, também uma transição sem redução de carga tributária em nenhum estado e sem exceções ou brechas, como se vem tentando também através de algumas emendas, de ter uma tributação diferente, por exemplo, para produtos fumígenos artesanais. Isso, do ponto de vista da saúde, não se justifica absolutamente. Todos esses produtos são maléficos à saúde, independentemente até de serem legalizados ou não, independentemente de serem produzidos de uma forma ou de outra, então não cabem essas brechas. E o modelo misto com componentes específicos e ad valorem para todos os produtos fumígenos.
Em relação à alimentação também defendemos alinhar a cesta básica e lista de produtos com alíquota reduzida ao guia alimentar, que nos dá a referência para a classificação dos produtos, seja in natura, minimamente processados ou ultraprocessados, então é importante que haja esse alinhamento. Como também já foi dito aqui, a gente se preocupa bastante com o aumento de consumo de produtos ultraprocessados entre as crianças.
Aqui a gente vê que, por esse estudo, o consumo diário de calorias com alimentos ultraprocessados é maior entre crianças de dois a cinco anos do que a média da população adulta no Brasil, o que acarreta uma série de problemas. Por isso, a gente defende a ampliação e a inclusão de ultraprocessados adoçados, principalmente os mais consumidos entre crianças e adolescentes. A gente viu na apresentação também da representante da Unicef que eles estão mesmo entre os mais consumidos ali pela pesquisa que foi realizada com crianças, que são os biscoitos, por exemplo, as bebidas adoçadas lácteas, chocolates, sorvetes etc. Então, essa seria uma ampliação importante que nós poderíamos ter agora como oportunidade na reforma tributária. E, minimamente, não conseguindo ampliar para ultraprocessados, é termos uma ampliação para não ficar somente o refrigerante dentro da categoria das bebidas açucaradas, e sim para outras bebidas adoçadas, como foi falado aqui, para bebidas lácteas e outras, que são também bastante consumidas por esse público infantil e que deveriam estar incluídas também como bens e produtos sujeitos ao Imposto Seletivo.
Eu gostaria também de enaltecer aqui e elogiar a iniciativa da Comissão de Assuntos Sociais, que fez um requerimento pedindo a opinião formal de organismos internacionais sobre esse tema do Imposto Seletivo. Nós tivemos a manifestação, pelo que a gente pôde acompanhar na tramitação, da Opas, do Unicef, do Banco Mundial; todos reiterando essas recomendações que a gente está apresentando aqui hoje.
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Tivemos de forma complementar, também, uma outra carta da Campaign for Tobacco-Free Kids, que é uma organização americana, que também reuniu uma série de assinaturas de outras organizações recomendando que a gente adote o Imposto Seletivo para produtos de tabaco, bem como outros produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente. E, como eu mencionei anteriormente, também a iniciativa da força-tarefa sobre impostos saudáveis, que também encaminhou a mesma recomendação a Parlamentares do Brasil. Então, vejam que várias organizações, tanto em âmbito nacional quanto internacional, apoiam essa iniciativa do Imposto Seletivo tal como está sendo discutida e proposta atualmente.
E a gente tem também essa pesquisa mostrando o apoio maciço da população brasileira. Isso saiu na Folha de S.Paulo ontem, essa pesquisa do Datafolha, que foi encomendada pela ACT e mostra que seis a cada dez brasileiros são a favor de impostos sobre ultraprocessados, mas a gente vê ali que, sobre todos esses produtos que eu estou mencionando aqui hoje, é muito alto o apoio da população. Então, 82% da população apoia o aumento de impostos para cigarros e outros produtos de tabaco; 77% para as bebidas alcoólicas; 64% para os alimentos ultraprocessados e bebidas adoçadas, por exemplo. Então, esse é um dado fundamental, porque a gente está vendo a própria população já consciente e apoiando esse tipo de iniciativa.
E o que a gente não quer ver são notícias como esta, manchetes como esta: "Alimentos saudáveis têm aumento de preços superior a ultraprocessados no Brasil". A gente precisa corrigir essa distorção pensando no futuro da nação, como bem disse a colega do Unicef. Nós temos que reverter isso, nós não queremos esse tipo de notícia. E nem esta: "Preço de arroz e feijão sobe mais que cerveja e cigarro", por exemplo. Isso é uma distorção. O que nós estamos estimulando a população a consumir? Cerveja, cigarro e ultraprocessados? Nós temos a oportunidade de mudar isso agora. E essa outra matéria, que saiu ontem, também falando que a "Cesta do brasileiro tem mais cigarro e menos café em outubro, diz a pesquisa". Então, é tudo isso que nós queremos e podemos mudar agora com a reforma tributária.
E aí a gente levanta esta pergunta: quanto custa pagar pouco por produtos que destroem a saúde? Na verdade, é o barato que sai caro. Esses produtos vão causar um impacto muito grande não só na saúde, mas na vida de todos os brasileiros, e a gente tem a oportunidade de reverter e transformar esse futuro agora. Para finalizar, o momento é agora: uma política vencedora com estratégias políticas de sucesso. E a importância de a gente, então, usar essa oportunidade e promover uma reforma tributária saudável, solidária e sustentável.
Obrigada mais uma vez pela atenção.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Muito obrigada, Mônica. Agradeço demais a sua participação.
Combinei aqui com quem está presente de a gente fazer tão somente a leitura das contribuições do e-Cidadania, até porque muita coisa - ou a maioria das perguntas - foi respondida. Nós temos aqui um grupo de pesquisadoras também da Fundação Getulio Vargas que depois a gente vai atender... (Pausa.)
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E da USP também. Depois a gente vai atender no nosso gabinete, devido ao adiantado da hora.
Vou rapidamente ler as contribuições.
"Como a reforma tributária está considerando junto ao SUS os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030?" Foi falado explicitamente. De Bruna, do Rio de Janeiro.
Antonio, do Ceará: "Quais os mecanismos de avaliação dos impactos da reforma sobre a saúde da população, especialmente dos grupos mais vulneráveis?" Também fartamente respondida.
Lasie, do Rio de Janeiro: "Quais os impactos do Imposto Seletivo na indústria alimentícia e farmacêutica?"
Acir, do Rio de Janeiro. Comentário: "Sugiro estabelecer uma alíquota diferenciada ou isenção tributária para medicamentos essenciais e tratamento de doenças graves". Embora não tenha sido focado isso aqui, Acir, isso já fez parte de audiências anteriores.
Vinicius, de Minas Gerais: "É necessário zerar impostos de medicamentos de difícil acesso para minimizar a dor de pacientes com doenças graves".
Leon, do Paraná: "Existe uma cadeia de consumo de bebidas alcoólicas que influenciam no turismo, como no Rio Grande do Sul [a terra do vinho, não é, Leon?]. Como isso será tratado?"
Jailma, do Rio Grande do Norte: "Quais são as mudanças na estrutura de arrecadação e impactos no financiamento da saúde?". Termina por beneficiar pela despesa, pelos custos aumentados do SUS.
E Gustavo, do Paraná: "A sobretaxação dos produtos fumígenos, das bebidas alcoólicas e das bebidas açucaradas deve ser mantida para desestimular o seu consumo".
Acho que tivemos uma sintonia muito grande de leituras diversas, de pesquisas, de estudos, de análises acadêmicas, de análises governamentais, da presença da sociedade civil. Isso enriquece, sem sombra de dúvida, muito a nossa audiência. Ao mesmo tempo, nos desafia.
Enquanto a gente está aqui com tanta coincidência de propósitos e de objetivos, a pressão vocês sabem que existe em uma Casa aberta ao povo, como deve ser o Parlamento, e, ao mesmo tempo, uma Casa bastante plural. Todos os dias os nossos gabinetes são visitados.
Felizmente, eu acho que se avançou tanto neste debate publicamente, que eu acho que essa leitura a respeito da saúde está avançando também. E os elementos que vocês trouxeram aqui, todos - os nossos convidados -, para nós, Senadores e Senadoras, são elementos muito importantes de uma argumentação que defenda essa perspectiva da reforma tributária saudável, da reforma tributária justa e da reforma tributária que preserve esta e as futuras gerações que estão aí vulnerabilizadas, expostas a uma sociedade de consumo.
Eu destacaria como síntese, portanto, desta audiência quatro aspectos. A importância do Imposto Seletivo, que temos todos nós, e posso dizer aos senhores e às senhoras que essa consciência existe aqui no Senado.
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A relação reforma tributária com a saúde. Isso atinge os três aspectos mais tocados aqui: o tabaco, as bebidas alcoólicas e os multiprocessados, incluindo os alimentos superaçucarados. A importância de correlacionar os itens a serem taxados, para que não haja migração para outros itens tão nocivos quanto e também para que tenha uma certa relação com o que foi muito bem colocado pelo Prof. José Divino, porque isso é uma grita muito grande de municípios e de estados em relação à perda de arrecadação, dependendo da qualidade do imposto.
Por fim, eu acho que nós temos aqui na fala de todos vocês deixas... Eu não sou da comunicação, sou professora, mas professor tem a obrigação de saber se comunicar, e eu acho que vocês nos deixaram aqui deixas muito importantes para um programa ofensivo, ostensivo, ou seja, para um programa ousado de propagandas educativas. Nós temos que utilizar isso com mais força, com mais articulação, com mais objetivo estratégico, porque a gente briga contra a propaganda que eleva isso a alta potência.
Não foi fácil, por exemplo, nós, mulheres, tirarmos a imagem feminina das propagandas de cerveja. Foi luta! Era a prioridade das propagandas de cerveja era o corpo feminino, mas conseguimos. Então, muita coisa do que foi colocado aqui como conteúdo de conscientização, eu acho que pode virar, transformar-se em excelentes peças de comunicação e de uma propaganda formativa.
Então, muito obrigada a todos e a todas.
A nossa audiência teve um excelente acompanhamento pela internet e pelos canais aqui do Senado. Com certeza, lembraremos de tudo que nos foi colocado aqui como alertas, para a gente aperfeiçoar o que está proposto pela reforma tributária, que já não é pouco, mas sempre tem um espaço para a gente aperfeiçoar e melhorar.
Muito obrigada a todos e a todas.
Tenham uma boa tarde.
A quem nos seguiu pelas redes também, muito obrigada. (Palmas.)
Desculpe-me. Desculpe-me, porque faltou o protocolar.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião.
(Iniciada às 10 horas e 16 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 30 minutos.)