10/03/2025 - 3ª - Conselho de Comunicação Social

Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Havendo número legal, nos termos do art. 6º da Lei 8.389, de 1991, declaro aberta a 3ª Reunião, Extraordinária, de 2025 do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional, que, conforme pauta enviada anteriormente, destina-se à audiência pública sobre a regulamentação da Lei 15.100, de 2025, e o que vem depois da restrição de celulares nos ambientes escolares.
O objetivo desta audiência é discutir a utilização por estudantes de aparelhos eletrônicos portáteis pessoais nos estabelecimentos públicos e privados de ensino da educação básica. Como é de conhecimento público, tal utilização foi restringida pela Lei 15.100, de 13 de janeiro de 2025, regulamentada pelo Decreto 12.385, de 18 de fevereiro de 2025.
Nesta audiência iremos discutir os primeiros efeitos da legislação e o que deve vir após a restrição dos celulares nas escolas, bem como o impacto no ensino e também na aprendizagem de alunos, com experiências que já são bastante sentidas na cidade do Rio de Janeiro. Então a gente vai acompanhar e ver também esses dados e também discutir a nova diretriz do Conselho Nacional de Educação.
Já agradeço a presença do Prof. Israel, da Anita, do Secretário Ferreirinha e também do Rodrigo Nejm, que participam remotamente.
Bom, para debater esse assunto, participam, então, desta audiência como expositores:
- Renan Ferreirinha, Secretário Municipal de Educação do Rio de Janeiro e Relator na Câmara dos Deputados do projeto de lei que resultou na Lei 15.100, de 2025. O Secretário participa remotamente. Muito bem-vindo, Secretário. Obrigada pela presença;
- Anita Stefani, Diretora de Apoio à Gestão Educacional do Ministério da Educação. Também tem sido uma grande advogada desse tema e também da discussão sobre o uso de tecnologia em ambientes escolares. Obrigada, Anita, pela presença;
- Israel Batista, Conselheiro do Conselho Nacional de Educação e membro da Comissão de Educação Básica, Relator da resolução CNE com as diretrizes operacionais para o uso dos dispositivos digitais nas escolas e a integração curricular da educação digital e midiática. Israel, bem-vindo. O Deputado Israel - também teve passagem aqui - foi Relator de uma lei superimportante, quer dizer, de um projeto de lei, que se tornou a Lei da Política Nacional de Educação Digital. Então já tem também uma experiência bastante grande nessa área de uso da tecnologia e da necessidade de olhar para a educação digital e midiática; e
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- Rodrigo Nejm, Especialista em Educação Digital do Instituto Alana, também participa remotamente.
Cada expositor terá 15 minutos para sua fala inicial e, após o encerramento das exposições, a palavra será concedida aos Conselheiros por ordem de inscrição.
Informo que esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Para isso, as pessoas que tenham interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, e do Alô Senado, pelo telefone 0800 0612211.
Feitos os devidos esclarecimentos, damos início então às exposições. Com isso, eu passo a palavra por 15 minutos para o Secretário Renan Ferreirinha, Secretário Municipal de Educação do Rio de Janeiro e Relator na Câmara dos Deputados do projeto de lei que resultou na Lei 15.100, de 2025.
Secretário, a palavra é sua por 15 minutos. Muito obrigada novamente. E eu estava comentando aqui, antes de começarmos esta audiência, sobre a sua participação, tendo sido uma das primeiras iniciativas colocadas no Rio de Janeiro a partir da sua gestão. Então, é uma grande alegria contar com a sua participação e também ouvi-lo aqui para nos contar como está sendo a implantação dessa lei no Rio de Janeiro. Muito obrigada.
O SR. RENAN FERREIRINHA (Por videoconferência.) - Bom dia. Eu que agradeço. Queria agradecer demais o convite para estar aqui com vocês, é uma honra. Queria muito estar presente com vocês, mas obviamente aqui, remotamente, a gente vai conseguir também explanar um pouco de como foi a nossa experiência no Rio de Janeiro; e principalmente como foi a nossa jornada supercoletiva de aprovação desse marco para a educação brasileira, que foi a aprovação do projeto de lei que resultou na Lei 15.100, da restrição do uso de celulares nas escolas, e que acabou se tornando o principal assunto de educação no país nesse início de ano letivo.
E é muito bom poder estar aqui também com pessoas que eu admiro bastante, que estão junto comigo nessa jornada: Anita, Prof. Israel, Rodrigo, todo o Conselho de Comunicação Social do Senado; sei que a Dra. Angela também se encontra presente, é uma pessoa que eu admiro bastante também.
Estou com uma apresentação aqui e queria saber se eu posso projetar ou se daí vocês já têm. Eu já enviei também.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - É melhor o senhor projetar daí, eu acho que já está autorizado para compartilhamento.
O SR. RENAN FERREIRINHA (Por videoconferência.) - Está ótimo. Eu já vou compartilhar minha tela aqui. Vocês já estão vendo aqui, por acaso?
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Sim, já estamos.
O SR. RENAN FERREIRINHA (Por videoconferência.) - Maravilha!
Então, como já foi dito, eu sou Secretário Municipal de Educação da cidade do Rio, aqui com o Prefeito Eduardo Paes. Nós somos a maior rede municipal de ensino da América Latina em número de escolas: são 1.557 escolas, quase 650 mil alunos, mais de 55 mil profissionais de educação. E eu também sou Deputado Federal licenciado, por isso que assumi o mandato, para que a gente pudesse avançar com esse tema.
Tudo começou a partir do momento em que, em 2022, conversando com muita gente, ministros de educação de outros lugares do mundo, secretários de grandes redes - faço parte de alguns grupos nesse sentido -, a gente entendia que tinha um certo desconforto coletivo com o uso exacerbado das telas, dos celulares e que isso precisava ser dialogado mais por parte de atores educacionais, para que a gente pudesse pensar em políticas públicas voltadas para isso.
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E, quando a gente observa os diferentes marcos da literatura mais recente, acho que tem um em especial, que foi o relatório global da Unesco de 2023, o principal documento que a Unesco faz no ano relacionado à educação, que clama que governos tomem ações no que diz respeito à epidemia de distrações por que todos nós estamos passando, mas as crianças e adolescentes acabam sendo mais afetados por ela. Essa epidemia de distrações está diretamente correlacionada com uma piora do bem-estar, com menor curiosidade, com mais diagnósticos de ansiedade e até de depressão. Esse uso excessivo dos celulares acarreta todas essas questões. Então, regulamentar a utilização da tecnologia para um uso consciente na educação passa a ser uma grande missão. E a Unesco clama que governos, nas diferentes instâncias, tomem ações sobre isso também.
Em paralelo a isso, e eu particularmente o conheci bem no começo da sua ação de maneira ampla, o pesquisador americano Jonathan Haidt escreve um livro que acaba se tornando um best-seller mundial - aqui no Brasil, em especial, também ganha uma grande repercussão -, que é A Geração Ansiosa. Para quem não leu esse livro, eu super-recomendo, é um livro incrível que traz, de maneira muito concreta, as diferentes consequências e também razões pelas quais nós chegamos a esse estágio de uso excessivo e de alterações até cerebrais a respeito de muita exposição à tela, e como que uma infância hiperconectada tem causado transtornos mentais. Então, ele também deixa muito claro, o Jonathan Haidt, a sua defesa da restrição do uso de celular de maneira geral nas escolas - óbvio, salvo para o uso pedagógico.
Tem diversos outros artigos, diversas outras colunas. Destaco muito aqui o trabalho do pediatra Daniel Becker, que foi um grande parceiro nosso na cidade do Rio de Janeiro, quando a gente implementou de forma pioneira essa proibição. Becker tem uma coluna semanal no jornal O Globo.
Mas eu queria aqui também destacar uma jornalista, a Tania Menai, da revista Piauí, que fez um excelente artigo chamado "Braços inteiros, mentes quebradas", que mostra que, pela primeira vez na história, 2023 foi o ano que teve mais idosos quebrando braços do que crianças, nos Estados Unidos. Isso está diretamente relacionado com as crianças, Rodrigo, brincando menos; as crianças não brincam como a gente brincava na nossa infância. Então, assim, eu não estou pedindo aqui para que as crianças saiam e comecem a quebrar seus braços e seus ossos por aí, mas é uma consequência natural de quando você está brincando na rua, de quando você está brincando na escola. Eu, por exemplo, já quebrei meu braço algumas vezes, e a gente vê cada vez menos crianças de gesso. E são consequências do que a gente vê de menos brincadeira, de uma infância cada vez mais encapsulada numa redoma de vidro ou, muitas vezes, só conectada, e não num aspecto analógico, como a gente diz.
Então, isso soma-se ao fato de diversos países buscarem avançar com um aspecto normativo de proibição. Eu destaco aqui dois casos. Tem vários exemplos que a gente poderia citar, estados americanos como Flórida e Utah. Isso não tem... Acho que é um tema que é bacana e que a gente conseguiu trazer para o Brasil também. Isso está para além de uma divisão ideológica, isso não é uma pauta de direita, não é uma pauta de esquerda, não é uma pauta de centro, é uma pauta de país, é uma pauta de sociedade. Mas acho que há dois países em especial: a França, que já tem há bastante tempo, há alguns anos, a proibição do uso de celulares implementada nas suas escolas; e a Austrália, que vem liderando a discussão mundial para além da proibição do uso de celulares, mas também das redes sociais. Então, é algo que a Austrália tem colocado na mesa de uma maneira bastante pioneira.
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E eu acho que é o próximo passo do nosso país também: não se acovardar - acho que a palavra é essa mesmo, a expressão é essa - no que diz respeito à discussão da responsabilidade com as grandes empresas de tecnologia. Aqui não tem nenhum discurso moralista sobre isso, mas precisa-se, sim, atribuir uma responsabilidade de algoritmos, de vício que se acaba gerando nas crianças.
Trazendo para o caso do Rio de Janeiro, com tudo isso acontecendo, em especial após a divulgação do relatório global da Unesco - a gente já tinha uma vontade de realizar algo com isso -, eu levo ao Prefeito Eduardo Paes a ideia, então, de a gente proibir o uso de celulares nas nossas escolas. A gente começa com a proibição em todas as salas de aula, e dá muito certo. Então, a gente faz um decreto nessa linha.
Depois, nós fizemos uma consulta pública, perguntando, Ana Flávia, o que a população achava sobre a expansão da proibição para o recreio e para os intervalos. E olha que interessante: numa consulta pública com mais de dez mil participações, que é um número bastante significativo para consultas públicas remotas, nós tivemos 83% das pessoas sendo a favor da proibição também no recreio e nos intervalos; 11% somente nas salas de aula; e só 6% contrários a qualquer forma de proibição. É óbvio que a consulta pública era um aspecto. Especialistas vinham nos assessorando e nos ajudando nesse processo, como o Daniel Becker - como eu disse -, a Juíza Vanessa Cavalieri, da vara da infância, que também teve uma grande participação, e vários outros. E a gente sabia que a escola não é só um local aonde a criança vai para aprender português, matemática, ciências, mas também é um local de interação social, é um local de convivência, é um local de a criança aprender a ganhar, a perder, a cair, a levantar, a ser criança. Isso é muito importante. E, quando as crianças estão isoladas nas suas próprias telas, isso acaba não acontecendo. Então, é com isso que a gente está realmente competindo, tentando buscar colocar o debate.
Por isso é que, no Rio de Janeiro, nós fizemos esse decreto, pioneiro no país. Nós fomos a primeira cidade do país a proibir o uso de celulares nas escolas, salvo para uso pedagógico ou por motivo de saúde e acessibilidade, passando um recado claro, através do Decreto 53.918, assinado pelo Prefeito Eduardo Paes, de que a conexão do aluno tem que ser com os amigos, tem que ser com os professores, tem que ser com a escola, e não com o celular. E a gente conseguiu, através disso, obter resultados muito interessantes, desde exemplos práticos de escolas que conseguiram implementar essa medida, tendo um aspecto muito rápido... A gente conseguiu, a partir disso, escolas que conseguiram ter recolhimento de celulares ou aquelas que mantiveram o celular na mochila. Eu já vou falar um pouquinho mais sobre isso, sobre a nossa decisão - eu, enquanto Relator - da questão do porte do celular.
Aqui, por exemplo, uma das nossas escolas, o GEO Martin Luther King, que é uma escola mais voltada para aspectos esportivos, teve uma mudança no ambiente da escola muito forte. Eu recebi um depoimento de uma aluna que diz que, antes, ela sentia que o mundo dela tinha acabado, porque ela estava tão conectada, tão viciada que ela não conseguia interagir mais com os amigos. E a proibição foi fundamental para que ela pudesse restabelecer relações, para que, assim, ela pudesse evoluir. Não é fácil, mas existe um processo de evolução. Ela passa a ler mais, ela entende que o celular, naquele momento, estava tirando a concentração. Esse é um depoimento da Kamilly, de 13 anos, que consegue observar isso.
E a gente, a partir desse processo, entende que a gente tem também resultados muito fortes quando compara as escolas que no começo estavam tendo mais dificuldades com as escolas que estavam em plena proibição. Essa proibição do uso de celulares, Conselheiros, passa por um processo de adaptação.
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E olha que interessante: em janeiro de 2024, estabelecemos já essa proibição geral, e aí, no primeiro bimestre, nós comparamos as escolas que estavam em plena proibição com as escolas que estavam enfrentando certas dificuldades. E olha que interessante: o resultado dos alunos, em matemática, no 9º ano, que é o ano mais próximo da adolescência, na efervescência da adolescência, que nós temos, enquanto rede municipal, nós tivemos performance em matemática 53% maior comparada com as escolas que ainda estavam enfrentando alguma dificuldade de implementação, ou seja, o resultado acadêmico vem. Nós tivemos, enquanto cidade do Rio de Janeiro, o maior crescimento do Ideb entre todas as capitais e nós associamos, sim, esse resultado também, entre diversas ações que nós tomamos, essa melhoria à proibição do uso de celulares nas escolas. E olha que interessante: para além do resultado acadêmico, nós também tivemos reduções bastante significativas de casos de bullying e cyberbullying nas escolas, o que também mostra que é um aspecto social também.
Então, para além disso, a gente consegue entender que dá certo, e é por isso que, a partir desse processo... E eu reassumo o mandato de Deputado Federal em 2024. Eu fui a Brasília, enquanto Parlamentar, mais de dez vezes antes de reassumir o mandato, e a gente conseguiu avançar com essa discussão de uma maneira bastante célere na Casa. Eu assumo a relatoria na Câmara dos Deputados, e a principal discussão que nós realizamos, na Câmara dos Deputados, referente ao meu texto, foi a discussão entre o uso e o porte de celular nas escolas. Existia uma corrente que acreditava que o simples porte, ou seja, levar o celular para a escola, já deveria ser proibido. Eu sou contra essa parte. Eu acredito que levar o celular para a escola muitas vezes é importante por quê? Porque a gente não pode perder o apoio das famílias. As famílias, muitas vezes em contextos urbanos ou até rurais, precisam saber se a criança chegou ou não à escola. Por exemplo, no Rio de Janeiro, o filho, que mora em qualquer canto da cidade, que precisou pegar um transporte público, que está indo sozinho com 12, 13 anos, às vezes com 11 anos de idade, avisa: "Mãe, pai, cheguei; vou guardar meu celular". E guardar o celular pode ser deixar na mochila ou entregar para a escola se tiver alguma situação voltada para isso, ou seja, se tiver alguma questão que seja de armazenamento próprio da escola. Mas o que nós não podemos achar normal é uma família achar que vai ser tranquilo ficar tantas horas sem saber se a criança chegou à escola ou até saiu de lá. Então, por exemplo, quando terminou o horário da escola também, não tem nenhum problema a criança pegar o celular e falar: "Mãe, pai, estou indo para casa". Ou: "Vou ficar no clube de jornalismo". Ou: "Vou ficar para estudar com os meus amigos". Essa comunicação antes do início da primeira aula e após o término da aula é muito importante para as famílias. E, segundo a nossa lei que foi aprovada tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado, e sancionada pelo Presidente, isso se encontra de uma maneira autorizado. O que está proibido é o uso dos celulares salvo para questões pedagógicas, para questões de acessibilidade e de saúde.
Para terminar, a gente tem, então, a sanção presidencial no dia 13 de janeiro de 2025. Essa é uma sanção muito simbólica. E aqui algo muito interessante, Anita - e agradecendo ao nosso Ministro Camilo Santana pela parceria, a todo mundo -, é que esse foi um assunto suprapartidário. Foi um assunto em que a gente teve Deputados e Senadores da esquerda, da direita, do centro, e teve o Presidente Lula deixando claro que essa pauta é de país. E agradecemos que isso pudesse acontecer. E é muito importante que tenha acontecido essa sanção em janeiro, para que nós pudéssemos começar - e aqui o Israel, o nosso Professor querido, amigo Israel, representando o nosso conselho -, antes do início do ano letivo, com essa medida em vigor, em todo o nosso país.
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E, para concluir, eu deixo uma pergunta que muita gente me traz... Aqui a Anita vai poder explicar um pouco mais sobre a questão dos próximos passos, ações que nós recomendamos enquanto rede sobre a questão de capacitar os professores e gestores, preparar as escolas, monitorar e principalmente sobre o suporte contínuo. Dá para funcionar, precisa-se de resiliência nesse processo. Tem lugares, como a cidade do Rio, que conseguiram implementar isso e que mostram que os resultados conseguem vir de maneira bem rápida.
Mas há uma pergunta que a gente escuta muito: quer dizer que nós somos contra a tecnologia? Então, tudo que a gente está falando quer dizer que nós não acreditamos na tecnologia na educação? De forma alguma. A gente acredita que a tecnologia pode ser uma grande parceira desde que ela seja utilizada de forma consciente e responsável, porque, do contrário, ela pode virar uma vilã do processo educacional.
E nós temos, aqui no Rio de Janeiro, um exemplo, que são os GETs (Ginásios Educacionais Tecnológicos), que já são 200 espalhados pela cidade, com mais de 100 mil alunos, através dessa experiência maker, de colaboratório, de colaboração, onde a gente tem raciocínio lógico, criatividade, novas tecnologias, cultura maker, educação mão na massa. Então, a gente acredita muito na tecnologia, mas a tecnologia precisa ser utilizada como uma parceira, sempre com intuito pedagógico. Não faz nenhum sentido a tecnologia que o aluno está utilizando para ver uma rede social quando o professor está dando uma aula, está tentando explicar uma aula; estar no jogo do tigrinho quando está tendo uma tentativa do professor de explicar matemática. Isso, infelizmente, é algo muito predatório. Toda vez que o aluno recebe uma notificação é como se ele saísse da sala de aula. A gente não pode normalizar essa situação.
Por isso que a gente acredita muito nessa proibição do uso de celulares. Tem dado certo em vários lugares do mundo; deu certo na cidade do Rio de Janeiro. Eu compartilho aqui o nosso link educacaoia.prefeitura.rio/celular. A gente conta a trajetória do Rio de implementação dessa medida no Brasil, de maneira pioneira, e depois também a nossa expansão em nível nacional.
Agradeço mais uma vez o convite. A gente fica muito feliz com que esse assunto tenha ganhado a importância que precisa, e que a gente possa expandir essas boas práticas pelo país! Muito obrigado. Fico à disposição.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Obrigada, Secretário.
Eu tive a oportunidade de conhecer uma unidade do GET no Rio de Janeiro, no ano passado. E realmente é um projeto muito interessante de uso da tecnologia com fins pedagógicos, com propósito. E tive a oportunidade de conhecer uma unidade que tinha o jornal da escola, a unidade de mídia, de produção e fiquei fascinada com as crianças virando repórteres.
O SR. RENAN FERREIRINHA (Por videoconferência.) - Que bom, Patricia!
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Para a gente que trabalha aqui com a questão do jornalismo e da importância da valorização dessa profissão ver aquelas crianças de sete, oito, nove anos fazendo reportagem foi de fato de arrepiar. Então, vale a pena conhecer.
Muito obrigada, agradeço a sua participação.
O SR. RENAN FERREIRINHA (Por videoconferência.) - Obrigado, Patricia.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - E já rapidamente passo a palavra para a Anita, para que ela possa fazer uso da sua fala, Anita Stefani, Diretora de Apoio à Gestão Educacional do Ministério da Educação.
Anita, 15 minutos, por favor.
A SRA. ANITA STEFANI - Obrigada. Bom dia a todos e a todas! Quero agradecer novamente pelo convite aqui, Patricia; a todos os colegas da Comissão; ao Prof. Israel, parceiro; ao Secretário Ferreirinha, também, que está nos ouvindo. Acho que o Rodrigo está online também, né?
Como foi falado, esse tema mobilizou muitos atores de diversos espectros políticos do Executivo, do Legislativo, das redes estaduais e municipais de educação, principalmente nós aqui do Governo Federal, com nosso papel complementar de orientação, de fomento e de apoio para que as ações de educação básica possam ser realizadas.
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Como todos nós sabemos aqui, a educação básica no Brasil é muito federativa. O Governo Federal não possui escolas de educação básica ou possui muito poucas. E realmente a responsabilidade da execução, da implementação das políticas de educação básica no país está na mão das secretarias estaduais e municipais de educação. E nós enquanto Governo Federal, o Executivo e principalmente o Ministério da Educação, temos essa função complementar para apoiar para que as políticas educacionais aconteçam da melhor forma possível.
Eu vou trazer alguns dados aqui. Acho que o Secretário Ferreirinha já provou um pouco - não só pela experiência do Rio, mas pelo debate que ele conduziu ao longo das discussões da Lei 15.100 - a importância deste tema. Então, eu vou passar rapidamente pelos dados de saúde mental, de uso excessivo de telas por crianças e adolescentes, que justificam a decisão do país para essa lei da restrição de uso de celulares nos ambientes escolares, mas depois eu vou entrar um pouco mais no que nós do Ministério da Educação, o Ministro Camilo e a Secretária Katia Schweickardt, que estão muito atentos a isso, com muita articulação com o Conselho Nacional de Educação, vemos e estamos fazendo de apoio.
Em termos de contexto, os dados que a gente tem é que cada vez mais cedo as crianças e os adolescentes começaram a ter acesso a celular. Ainda que a tecnologia e o celular já estejam nas nossas vidas da sociedade há algum tempo, essa diminuição da idade inicial do uso do celular vem se acelerando.
Esses dados que eu vou trazer são da pesquisa do ano passado da TIC Kids, do Cetic.
Ela traz que 93% da população de 9 a 17 anos - então, crianças e adolescentes - já usam a internet regularmente e que 98% delas afirmam que é pelo celular, que é, então, o nosso principal dispositivo. E muitas estão começando esse uso a partir dos 6 anos de idade, a gente está falando ainda da primeira infância, ainda na educação infantil. E isso vem aumentando ao longo do tempo, a gente não trouxe a série histórica, mas esse número vem crescendo. Então, também a necessidade de a gente trazer uma lei de restrição agora neste momento é porque isso vem se aprofundando. É algo com que temos que lidar enquanto sociedade nas escolas, que é o ambiente... E 80% das matrículas da educação básica estão nas escolas públicas, e, então, nós enquanto poder público temos uma responsabilidade ainda maior de tentar, em alguns ambientes onde temos um pouco mais de ingerência, ajudar para a proteção em relação a esse uso muito precoce e, às vezes, excessivo do celular, das telas fora de um contexto pedagógico.
Outra questão... E aí tem muito a ver com mercado, com incentivo também à compra de celulares e presentes. É muito comum você ver os pais dando presentes de celulares para as crianças cada vez mais cedo. Então, esse é um tema que não tem a ver com a escola, porque a compra de um dispositivo pessoal é de responsabilidade individual dos pais, principalmente nesses momentos, mas isso impacta também o uso, a frequência de uso das crianças também dentro das escolas.
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O Ferreirinha comentou que tem uma parte da questão do uso de redes sociais que é para além do smartphone só, do tipo de uso do smartphone, que também tem aumentado muito. Ainda que haja regras de restrição de idade por perfil, infelizmente, ainda não é algo tão fortemente cumprido não só no Brasil, tem vários países com essas questões, e é algo com que, enquanto sociedade, precisamos lidar também.
Em relação à saúde mental, os próprios adolescentes nessa pesquisa trazem que eles tiveram, por conta de conteúdos sensíveis que são expostos na internet, a que eles têm acesso, algumas questões de impacto direto físico e psicológico na vida deles. Vocês podem ver aí, a partir dos 11 anos de idade, um número relevante de tentativas de se automachucar, de cometer suicídio, questão de corpo, de magreza, de bullying. Então, é um ambiente em que... Na sanção da lei, o Presidente Lula e o Ministro Camilo até comentaram, falaram que normalmente nós, sempre que possível, protegemos nossas crianças na rua, a gente fala assim: "Não vá andar sozinha, não vá ter contato com tal pessoa", e, na internet, a gente nem sempre consegue, porque, como parece que não tem esse perigo, não é uma coisa visível, é virtual, muitas vezes as crianças estão sozinhas na rua, estão sozinhas na rua virtual que é a internet. Então, esse papel de orientação, de cuidado é muito importante, porque realmente afeta a saúde mental das crianças - de todos nós, de adultos também, mas para as crianças e para os que estão em formação é ainda mais grave.
Aqui alguns relatos. É muito bacana essa pesquisa porque é a fala, a voz dos próprios adolescentes e jovens, trazendo algumas consequências desse uso. Como o Secretário Ferreirinha falou, a Camille, que é aluna lá do Rio, comentou: "Foi difícil. Achei que o meu mundo tinha acabado quando tiraram o celular, proibiram o celular nas escolas". Mas eu percebi que teve uma consequência em curto prazo. As crianças e os adolescentes são muito adaptáveis. A adolescência é um período muito importante para o desenvolvimento da capacidade cognitiva, para o desenvolvimento integral das pessoas. Esse é um momento que a gente tem que aproveitar, captar o melhor para avançar.
Então, olha que importante: 30% de jovens de 15 a 17 anos falam que passam menos tempo com a família, fazendo amigos ou fazendo lição porque ficam na internet. E isso é em todo tempo da vida dele, no dia inteiro. Quando a gente traz para escola, a gente precisa garantir que 100% do tempo dedicado à escola seja de desenvolvimento integral, intencional, com muito cuidado. Por isso tudo - não vou trazer todos os dados, acho que o Rodrigo vai trazer também, porque ele tem uma apresentação superinteressante -, nós decidimos, enquanto país, essa aprovação da lei. E o Ministério da Educação, em parceria com todos os demais atores, tem apoiado, para garantir uma boa implementação, que é o nosso próximo desafio. A gente não pode deixar que essa lei seja lei apenas no papel.
Então eu não vou passar muito aqui, depois a apresentação fica disponível, mas tem os principais argumentos ali. E a gente sempre reforça isso no começo das apresentações, porque a gente sabe que, nesse início de ano letivo, as escolas estão nesse momento de convencimento, de argumentação com a comunidade escolar, com os alunos, com os pais, e é uma transição, é um processo gradual de mudança cultural. A gente precisa, cada vez mais, trazer esses dados para apoiar que essas conversas, esses diálogos aconteçam, sempre com base em evidência, sempre com muito cuidado e também com a preocupação principal, que é a proteção às nossas crianças e adolescentes, para que haja de fato o desenvolvimento mais positivo possível.
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Aqui, reforçando a lei, ela não é uma lei que proíbe celular na escola; então, o porte está permitido pela lei, e o uso intencional pedagógico é incentivado pela lei inclusive - não só ele não é proibido, como ele é incentivado. É esse contexto que a gente traz também, de algumas das ações que o Ministério da Educação tem feito, que até são anteriores à restrição da lei e que tratam dessa questão do uso de tecnologia para o desenvolvimento das crianças e adolescentes como competências digitais. Nós estamos num mundo cada vez mais digital. Então, não dá para negar a tecnologia; a gente tem que entendê-la e utilizá-la para o desenvolvimento - não como um distrator, e, sim, como um incentivador.
Depois, aqui, eu acho que o Prof. Israel vai trazer os detalhes da diretriz que foi recentemente aprovada no CNE. A gente fica muito feliz e agradece muitíssimo ao Conselho Nacional de Educação, porque tínhamos essa preocupação de trazer... A lei é muito ampla, é uma lei curta, inclusive. O decreto presidencial depois também aborda alguns aspectos, mas não chega num detalhe operacional, mesmo porque, como eu falei, a competência da educação básica é dos estados e municípios. Então, a lei federal coloca ali qual é a orientação, mas a operacionalização disso fica realmente a cargo de cada rede, e, com o parecer e as orientações que o Conselho Nacional de Educação colocou, vai ajudar para este momento de implementação, principalmente nesse começo.
Bem, o que o MEC tem feito para orientar e apoiar as redes? Desde janeiro, a gente já tem feito vários webinários e lives. Então, tudo fica salvo na página do MEC, no YouTube do MEC, com especialistas, com professores, com os próprios secretários, como no caso do Secretário Ferreirinha e outros que também têm experiências positivas já prévias de implementação para apoiar secretários estaduais e municipais neste momento.
Depois, em fevereiro, a gente fez um webinário para família, porque, como a gente falou, ainda que seja uma responsabilidade da escola e das redes a aplicação da lei, não adianta nada se na escola é mais rígido e em casa continuam as mesmas questões. Então, a gente precisa trabalhar isso como um pacto social mesmo, mais amplo.
E agora, em março, nós estamos, recentemente, com a aprovação das diretrizes do CNE sobre... Em março ainda, o Ministro Camilo deve homologar isso, mas nós construímos isso muito junto com o conselho. Então, já está praticamente valendo aquelas diretrizes. Temos cursos e vamos lançar até o final do mês novos cursos no Avamec, para os professores, para este momento de acolhimento, de tratar a questão psicossocial também - às vezes até de abstinência que pode acontecer, dependendo da faixa etária de crianças e adolescentes, de retirar ou restringir o uso do celular.
Temos também alguns materiais disponíveis na nossa plataforma do MEC RED, que vão ser planos de aula, roteiros de diálogos, de roda de conversa, conversando muito também - principalmente agora em março, porque as aulas, de fato, voltaram - com os grêmios escolares, principalmente para os alunos do fundamental II, dos anos finais do fundamental e do ensino médio, para que eles entendam também isso e, ainda que, talvez, tenham resistência alguns no começo, se apropriem disso e consigam utilizar de maneira mais proativa esse tema.
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Dentro do Ministério da Educação, em 2023, já no Governo Lula, foi lançada a Estratégia Nacional de Escolas Conectadas, que tem esse olhar abrangente e sistêmico sobre o uso de tecnologia na escola. Então, veja, em 2023 a gente já estava olhando de uma maneira sistêmica para diversas dimensões de uso de tecnologia, que vão desde a parte de infraestrutura de escolas, ou seja, garantir que haja capacidade de as escolas usarem internet para fins pedagógicos... Desde sempre tem essa questão de um uso intencional, positivo e reflexivo. A gente tem outras legislações e normativos que já tratam da questão da tecnologia. A Patricia comentou da Pned, que teve a própria homologação do complemento à BNCC e que traz as competências da computação na educação básica - que são chamadas da BNCC da computação na educação básica -, que basicamente olha elementos e questões de pensamento computacional, de cultura digital, de mundo digital, e que devem ser ensinadas nas escolas desde a educação infantil até o ensino médio. Isso é muito importante. Mesmo na educação infantil, você tem que trabalhar as competências digitais, só que você trabalha de uma forma desplugada, desconectada; você trabalha a lógica desse mundo tecnológico que nós vivemos, justamente para que haja desde criança uma conscientização, um uso mais saudável da tecnologia.
Todas essas dimensões no site do MEC tem com mais detalhes, tem materiais que estão disponíveis - gratuitos, claro - para os professores, para os gestores escolares, para os secretários de educação, para apoiar neste momento: "Agora que esse tema foi colocado na mesa com mais intencionalidade, vamos trazer isso para o bem; então, vamos aproveitar que vamos falar de tecnologia: o que temos que desenvolver de competências digitais do ponto de vista pedagógico, o que tem que adaptar no seu currículo?". Nas redes municipal e estadual, o que se tem que alterar no currículo, que precisa incorporar o componente de educação digital e midiática?
Quando a gente conversou com o Conselho Nacional de Educação, a gente trouxe muito que...
(Soa a campainha.)
A SRA. ANITA STEFANI - Olha, é importante a gente trazer desde sempre esse olhar conectado do tema; então, não só restringir o celular, mas, ao restringir o celular, quais as formas de incorporação e implementação do componente de educação digital e midiática, que é obrigatório. Ele está em lei, ele está na BNCC. Então não é opcional às nossas escolas tratarem desse tema. É algo, sim, que precisa de ser implementado, mas nós sabemos que é um processo, é algo que é novo relativamente, e temos questões de formação de professores, de infraestrutura, e para todos esses aspectos a gente, no Ministério da Educação, tem trabalhado para apoiar as redes.
Por fim, eu queria trazer a questão de como a agenda pedagógica da educação digital está estruturada. Então, como falamos, tem uma escadinha de alguns elementos, alguns normativos, e todos eles estão disponíveis para apoiar as escolas públicas neste momento. Então não se sintam sozinhos, não sofram sozinhos; é um processo. Nós do Ministério da Educação, o Governo Federal inteiro, na verdade, está à disposição.
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Amanhã vai ter o lançamento do Guia de Telas, que é uma iniciativa do Governo Federal liderada pela Secom, da Presidência da República, que olha para além das escolas - claro, é numa perspectiva mais de uso de crianças e adolescentes de telas no geral, então ele é mais amplo do que a gente está tratando aqui, que é bem focado no ambiente escolar -, e tudo isso tem a ver com o compromisso, enquanto sociedade, da discussão e do cuidado das nossas crianças em relação ao uso excessivo, não saudável, não equilibrado de celulares. E nas escolas nós temos mais ainda responsabilidade, para que, quando for usar a tecnologia, seja um uso muito intencional, favorecendo ainda mais o desenvolvimento das competências digitais dos nossos alunos.
Então, contem com o Ministério da Educação. Aqui tem alguns QR codes tanto sobre a Estratégia Nacional de Escolas Conectadas, essa visão sistêmica que abrange vários eixos, como também a questão específica do uso de celulares na escola, que está mais ali quente, dado esse início do ano letivo, a aprovação da lei, a aprovação das diretrizes do conselho. E o MEC lançou três guias bem práticos, bem didáticos sobre o uso consciente do celular nas escolas para os gestores, para os professores e para as famílias.
Contem conosco, estou à disposição, muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Anita, muito obrigada. Acho que você trouxe questões que são bem interessantes. A escola não é lugar de uso recreativo do celular, acho que esse é um ponto que a gente tem que ter em mente. E há o desafio que se passa para as famílias em relação a isso: se você já organiza isso dentro do ambiente escolar, como é que você passa agora para as famílias essa responsabilidade?
Sem muito mais tempo para falar, queria ouvir agora, então, o Prof. Israel Batista, Conselheiro do Conselho Nacional de Educação, membro da Comissão de Educação Básica e Relator da resolução do CNE com as diretrizes operacionais para o uso dos dispositivos digitais nas escolas e integração curricular da educação digital e midiática.
E só um ponto que acho que é muito importante aqui desta questão, que é esse olhar sistêmico da questão digital e midiática, quer dizer, não só você olhar a educação no sentido de hardware, mas também de soft skills, da questão da análise crítica, do pensamento crítico aqui trazido, que eu vejo dentro do eixo educação midiática.
Então, Israel, a palavra é sua.
O SR. ISRAEL BATISTA - Primeiramente, eu quero agradecer pelo convite, Patricia, e dizer que esse tema é muito importante, é o grande tema da atualidade.
Compor esta mesa com a Anita, que foi fundamental para que a gente fizesse as diretrizes em tempo recorde, é muito honroso para mim - viu, Anita? Estar aqui com o Renan, meu amigo querido, Deputado e Secretário, que deve estar nos acompanhando e que trouxe este debate à tona, como representante popular, como Secretário... Para mim é muito honroso estar aqui no Conselho neste dia de hoje.
Nós fizemos as diretrizes de maneira muito veloz, mas isso não quer dizer que essas diretrizes não foram bem estruturadas. Havia um acúmulo, a sociedade brasileira estava discutindo esse assunto havia um tempo, e chegou o momento de nós tomarmos providência sobre esse assunto.
Eu fui Relator na Câmara dos Deputados da Política Nacional de Educação Digital e eu fiquei particularmente feliz por relatar esse tema no Conselho Nacional de Educação, porque é como se fosse um fechamento de um trabalho.
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Eu começo, então, trazendo para vocês... Eu vou apresentar o texto que foi aprovado no Conselho Nacional, para que vocês tenham a dimensão de como as secretarias estaduais e municipais vão ser orientadas sobre esse assunto.
As diretrizes operacionais foram apresentadas à Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, o Presidente da Comissão foi o Conselheiro Heleno Araújo, e aí nós fizemos uma votação que aprovou as diretrizes, e essas diretrizes, portanto, passam a valer para todo o território nacional; todas as secretarias de educação, tanto municipais quanto estaduais, todos os conselhos municipais e estaduais agora têm diretrizes claras sobre como implementar a Lei 15.100.
A ideia dessas diretrizes é de que a gente fizesse, Patricia, um uso estruturado, um uso pedagógico, um uso intencional dessas tecnologias nas escolas. O celular entrou nas nossas vidas de maneira irrefletida, tanto para nós, adultos, quanto para as crianças. Nós, adultos, estamos meio que viciados, não tem como negar isso, nós estamos o tempo inteiro dividindo a atenção entre o presente, o agora, e o que está distante e que você sente uma emergência em responder. Então, esse é um problema para todos nós. Quando nós discutimos aqui no Congresso Nacional a Política Nacional de Educação Digital, a gente se preocupava com essa questão. E não são só os estudantes: é toda a sociedade brasileira - e, de certa forma, a sociedade global - que está sendo afetada pelo uso das tecnologias, pela hiperconexão desse mundo, e que está sendo afetada de maneira negativa, a gente ainda não sabe muito bem quais vão ser os efeitos dessa nova forma de viver.
Então, a legislação que foi aprovada aqui tratava, por exemplo, de um eixo de cidadania digital. Isso era para mostrar que não são só os estudantes nas escolas que precisam de uma orientação, todo mundo precisa. A gente precisava discutir, por exemplo, o acesso à informação. Um cidadão comum brasileiro tem um pacote de internet que limita a sua capacidade de navegação, e essa limitação faz com que ele seja mais suscetível à ação de fake news, porque ele recebe a mensagem pelo WhatsApp, e o plano, o pacote de dados dele permite que ele leia aquela mensagem no WhatsApp, mas esse mesmo pacote não permite que ele confira com o checador de fatos aquela mensagem que ele recebeu.
Isso é uma discussão importante, que é sobre cidadania digital; então, a legislação era maior. Nós tentamos trazer para essas diretrizes não só a orientação sobre o uso de celulares, mas também algo maior que isso, que era a educação midiática, a educação digital nas escolas, seguindo a orientação da legislação que já tinha sido aprovada.
Bem, então, eu começo trazendo as bases legais, que vocês conhecem: a Política Nacional de Educação Digital, que eu acabei de citar, a política de Educação Conectada, a regulamentação do uso dos celulares, como a gente viu aqui, o decreto que regulamenta o uso dos celulares, que aconteceu pouco antes da regulamentação do Conselho Nacional, e, é claro, a Base Nacional Comum Curricular. Tudo isso aqui orienta as diretrizes que o Conselho Nacional produziu. São essas as legislações que lastreiam o nosso trabalho.
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A ideia é que as diretrizes permitam o uso intencional planejado, orientado especialmente pelos princípios da Base Nacional Comum Curricular, para evitar o improviso e para evitar que os aparelhos digitais entrem na escola de maneira não assistida. É como se o estudante levasse um amiguinho da rua dele ou o primo para dentro da sala de aula, sem que esse primo ou esse amiguinho estivessem matriculados ali. Imagine como isso prejudica a dinâmica da sala de aula. O Renan falou muito bem: a sala de aula é lugar para fazer amigos também, as paredes da escola alfabetizam também. Então nós tínhamos aí um elemento de distração, um elemento que prejudicava, sem sombra de dúvida, a aprendizagem. Eu acho que essa legislação e essas diretrizes estão lastreadas por evidências muito fartas, evidências que nos deixam tranquilos para tomar uma decisão como essa.
O que orienta as diretrizes são os seguintes princípios. Primeiro, o uso pedagógico planejado. A ideia é integrar a tecnologia ao ensino sem prejudicar a aprendizagem. O segundo é manter a capacidade de inovação estabelecendo os limites para que o celular não entre na sala de aula da maneira como a gente tem visto até aqui, como um elemento de distração, um elemento de prejuízo de saúde mental. Autonomia das redes e escolas porque havia uma pergunta constante. Todas as perguntas que eu recebi como Relator sempre vinham com estas questões no meio ali: "Como é que a gente vai guardar os celulares? Como é que eu vou falar para a família que o menino vai ter que desligar o celular?". E aí o Conselho Nacional, encastelado aqui em Brasília... A gente precisa se enxergar, é claro. Nós estamos aqui em Brasília, no Senado, no Conselho Nacional. Não dá para a gente imaginar que sejamos capazes de alcançar a diversidade deste país continental. Então este foi um princípio importante para nós: as redes podem ter alguma margem de manobra porque elas se conhecem melhor do que nós as conhecemos. Então as instituições, as secretarias podem ter aí uma margem para a definição de regras que melhor se adequem à sua realidade. E a gente também trouxe, obviamente, o princípio da inclusão, da acessibilidade. O celular não é um vilão necessariamente, ele é uma ferramenta e pode ser usado para que pessoas com problemas de visão, por exemplo, com problemas auditivos possam ter mais acessibilidade, mais capacidade de aprendizagem. Então a gente manteve tudo isso.
O documento foi estruturado com as disposições gerais; o uso de dispositivos nas escolas; e as orientações curriculares para a educação digital e midiática, que eu acho que é muito importante, porque é como se nesse documento nós disséssemos que a escola brasileira não está negando que a tecnologia é uma realidade, a escola brasileira não está se furtando aos fatos. Não é isso. Mas a escola brasileira decidiu encarar esses fatos e não seguir a reboque de uma tecnologia que chega, que é disruptiva e que muda toda a nossa forma de estudar, de nos relacionar. A escola passa a encarar isso de maneira mais intencional. Nas disposições gerais, o que a gente traz é que as diretrizes valem para o Brasil inteiro, em todas as modalidades de ensino da educação básica. A implementação vai ser gradual, vai ser participativa, vai respeitar a autonomia das redes. Nós vamos ter aí as diretrizes alinhadas às diretrizes do Conanda sobre direitos digitais, articuladas com a Base Nacional Comum Curricular e com fundamentos que estão consagrados, fundamentos que incluem estudos de organismos internacionais, estudos acadêmicos, etc.
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O Ministério da Educação e as redes de ensino precisam promover esclarecimento para as escolas. Isso é uma obrigação, e o Ministério já tem feito isso. E eu vi também... recebi muitas informações de que as secretarias estão se adiantando e estão usando o material do MEC para fazer as suas próprias orientações. Eu acho isso muito bom, especialmente porque recentemente nós vivemos aqui, Anita, um apagão da gestão federativa. A gente sabe que, num país federativo como o Brasil, os diversos entes federativos precisam dialogar, precisam ter ações conjuntas, precisam estar sempre integrados, e a gente teve um apagão federativo no Brasil. O Ministério da Educação, durante o período de pandemia, por exemplo - eu era Presidente da bancada aqui no Congresso -, não fazia coleta de dados sobre os estados. Isso é muito ruim porque, num país grande como esse, você precisa de um órgão entre os entes que faça essa coleta, que compare, que consiga escalar políticas bem-sucedidas em um município para outros municípios.
Então, eu acho que esse texto das diretrizes nos trouxe um alívio, que é o alívio de que voltamos a ter coordenação federativa no Brasil. Isso é muito importante. Independentemente do governo de plantão, tem que se ter. Essa é uma característica que o nosso país exige.
Nós estabelecemos também que essa vedação para o uso não pedagógico é legal, está na lei, mas aí a gente abre as exceções: tecnologia assistiva para estudantes com deficiência, monitoramento de condições de saúde, garantia de direitos fundamentais, situações de emergência. Então é óbvio que a gente sabe que existem escolas de periferias violentas, dominadas pelas milícias, pelo tráfico, que precisam de um uso diferenciado. A gente reconhece isso, a gente estabelece aqui um pacto de confiança com a secretaria municipal de educação, com a secretaria estadual, com a direção escolar, a gente entende isso.
Os modelos de guarda representam muito bem essa nossa preocupação em garantir que as realidades regionais sejam respeitadas. Os diretores das escolas precisam ser ouvidos, eles são a grande autoridade aí. Então tem escola que vai permitir que o estudante guarde na mochila; tem escola que já diz que não é bom, porque isso pode gerar um conflito entre o estudante e o professor, e você tem ali um cenário de violência subjacente, uma dificuldade em se manter o pacto pedagógico mestre e aluno. Então, é melhor que se guarde ali num lugar longe do estudante. Outras escolas vão colocar na entrada, vão guardar ali quando o estudante chegar à escola. Claro que nem toda escola pode fazer isso. Em regiões conflagradas, essa salinha onde se vai guardar o celular pode se tornar alvo de ladrões, por exemplo. Tudo isso a gente está respeitando aqui, dando autonomia para as escolas.
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(Soa a campainha.)
O SR. ISRAEL BATISTA - E aí a gente tem essa preocupação com a formação docente e com a saúde mental. O professor tem que estar sempre sendo capacitado. A gente precisa reduzir o impacto do uso excessivo das telas sobre os estudantes e a gente precisa trazer para eles bem-estar digital.
A escola, para ser a escola que a gente quer - uma escola plural -, tem que respeitar a própria diversidade. Existem professores que vão ter facilidade em trazer o uso pedagógico intencional do celular, e a gente tem que aproveitar esses professores. Tem aquele outro professor, mais velho, que talvez não seja muito afeito à tecnologia, mas ele traz uma experiência muito importante, porque a nossa escola hoje é intergeracional e isso é maravilhoso. A gente tem que aproveitar isso. Então, a ideia é que o professor se apodere desse conhecimento e possa usá-lo.
A escola vai precisar fazer o seu contrato pedagógico, e aqui a gente segue as orientações da lei de gestão democrática no Brasil. A escola, ao construir um pacto pedagógico que consiga envolver famílias, professores, estudantes, certamente vai ter mais sucesso na implementação desse pacto. A ideia é causar movimento, causar discussão, fazer com que as escolas sejam obrigadas a trazer esse assunto para todas as suas instâncias de discussão.
A gente também evitou a ideia de proibição do sinal de celular, porque isso traz consequências negativas para a vizinhança, para a própria escola. Também nos preocupamos em colocar nas diretrizes um ponto que chame a atenção do professor, porque não adianta o estudante estar sem o celular e o professor na sala de aula estar ocupado com o celular, estar desatento por causa do celular. Então, nós fizemos questão de colocar nas diretrizes - não obviamente fazendo qualquer proibição ao professor, porque isso não está na lei e a gente não pode ultrapassar a lei - chamando a atenção para que ele faça o uso pedagógico e para que ele se assuma como exemplo ali na sala de aula.
Para encerrar, sobre educação digital e midiática, a gente traz essa educação para o currículo, isso é fundamental; a gente permite que as escolas, aliás, que as redes ofereçam essa educação digital e midiática como um componente curricular se quiserem, mas também permite que elas façam uma abordagem interdisciplinar - é o que a gente acha que a maioria vai fazer -; e a ideia é trazer conteúdo sobre cidadania digital, combate à desinformação, segurança online.
Então, o que a gente quer ao final? A gente quer que o estudante seja livre da distração que o celular traz; a gente quer que o estudante aprenda a diferenciar uma notícia real de fake news, a gente quer que o estudante entenda qual é o modelo de negócio por trás das redes sociais, ele precisa entender que as redes monetizam a sua atenção e ele precisa fazer a construção da maturidade para dizer se ele quer ou não que a sua atenção seja monetizada.
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Então, a gente pretende trazer essa educação midiática para a escola para que nós sejamos, como sociedade, capazes de viver uma vida saudável com essas novas tecnologias. Essas novas tecnologias vieram para ficar, elas estão aí. Agora, nós não poderíamos simplesmente deixar que essas tecnologias entrassem e seguíssemos a reboque disso, sem nenhum tipo de reflexão sobre o que está acontecendo.
Então, acho que o Renan Ferreirinha arrebentou ao trazer essa discussão, acho que foi muito bom. Essa discussão não encerra o assunto, obviamente, mas o Brasil encarou, e eu tenho certeza de que essa legislação brasileira que bebeu de outras fontes também vai servir de fonte para legislações de outros países. E, quando a gente fizer a avaliação dessa política pública daqui a alguns anos, Anita, a gente vai ver bons resultados. O que não dá é para a gente continuar tendo estudantes completamente distraídos, afetados pelas telas e completamente submetidos a uma comunicação que os faz cada dia mais confusos. A ideia aqui é que a gente consiga dar um freio de arrumação e falar: "Vamos entender o que está acontecendo. Vamos parar, vamos entender". Você está recebendo mensagem pelo WhatsApp, existe uma diferença entre o áudio de um suposto médico falando sobre medicamentos, vacinas e um relatório da Universidade de Oxford. O estudante, por incrível pareça, não sabe que tem essa diferença e ele adota para si a opinião da mensagem que ele entendeu. Geralmente o áudio do WhatsApp é fácil de entender: "Vacina gera autismo", isso é fácil. Agora até explicar para ele que o médico que criou essa notícia foi preso, foi cassado, que a notícia foi desmentida, que houve várias pesquisas posteriores que desmentiram, é muito difícil. Então é difícil, mas o Brasil tomou a decisão de enfrentar essa dificuldade. E eu tenho muito orgulho de ter feito parte desse processo decisório.
Obrigado, Patricia. Patricia, eu sou Relator da Comissão de Educação Ambiental lá no conselho. E daqui a pouco você vai ver o Presidente Callegari enlouquecido me ligando aqui, aí eu vou perder toda a moral para fazer essa regulamentação.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Prof. Israel, muito obrigada. Você já tinha dito mesmo que teria esse outro compromisso. A educação ambiental é tão importante quanto a digital, a midiática. Então fique tranquilo. Obrigada pela sua presença, pela sua participação e por ter liderado esse projeto lá no CNE também. Muito obrigada.
Eu queria, antes de passar a palavra para o Rodrigo, registrar a presença da Mariana Chagas, que é de relações institucionais da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), que está aqui com a gente acompanhando. E depois queria ouvi-la um pouquinho sobre isso.
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Eu vou passar a palavra para o Rodrigo, que vai participar remotamente. Rodrigo Nejm - eu nunca sei falar seu sobrenome, mil desculpas - é Especialista em Educação Digital do Instituto Alana.
Rodrigo, obrigada pela sua participação, você tem 15 minutos.
O SR. RODRIGO NEJM (Por videoconferência.) - Bom dia.
Bom dia, Patricia. Bom dia a todas e a todos, presentes e remotos também. É uma honra enorme participar deste momento ao lado de vocês. A Patricia é uma pessoa que eu acompanho há muitos anos e cujo trabalho eu respeito muito, e na pessoa de quem eu parabenizo pela iniciativa do Conselho de fazer esse chamado para essa agenda. E é uma honra enorme escutar os colegas, o Secretário Renan, com essa experiência tão inspiradora; o Prof. Israel, que tão gentilmente e tão cuidadosamente tem construído esse trabalho no CNE, para que as várias perspectivas sejam contempladas e possam ser incorporadas nessas orientações muito bem elaboradas pelo Conselho; e também a Anita, que tem feito um trabalho incrível com todo o time do MEC para esta ação acontecer de fato: a conectividade significativa tão desejada e almejada por todos nós, para que o Brasil possa desfrutar das oportunidades que as tecnologias digitais têm, certamente, para melhorar não apenas na educação das nossas crianças e adolescentes, mas também no nosso desenvolvimento como país, como nação. Eu acho que esse debate é bem amplo.
Como muito bem dito pelo Prof. Israel, a gente tem insistido nestes termos: é um freio de arrumação essa lei. A Lei 15.100 é um freio de arrumação, ou talvez a gente pudesse exagerar e dizer que ela é quase uma forma de estancar uma sangria, uma situação de emergência de saúde mental, de desatenção na sala de aula, de dificuldades de socialização, e todas as outras evidências que a gente já ouviu aqui, eu não vou repetir.
Fico muito feliz de ver a sinergia e a sintonia, além da importância dos dados que estão subsidiando as falas dos colegas e as decisões que a gente tem tido.
Aqui no Instituto Alana também a gente sempre preza por olhar essa diversidade de infâncias, mas também a diversidade de violências. E, neste caso aqui, a gente deve lembrar a diversidade da própria internet, do próprio mundo digital, como a gente tem resumido, que vai para muito além do celular. O celular poderia ter sido... Acreditávamos muito nisto e talvez precisemos recuperar a esperança de que o celular pode, sim, ser o melhor laboratório portátil para fazer experiências científicas e sociais dentro das escolas, com potencial de transformação, mas a gente tem dados evidentes de que mais tecnologia não automaticamente gera melhorias na educação.
A gente, infelizmente, aceitou um pouco esse imaginário de que mais tecnologia, mais digital melhora, e muitos países, inclusive os nórdicos, que têm, historicamente, investido muito, recuaram. Nos relatórios da Unesco já citados aqui, a gente tem visto que esse equívoco ainda impera em muitas famílias, que, às vezes, vulneráveis, investem bastante dinheiro para poder garantir algum dispositivo digital para suas crianças muito pequenas.
Além dos dados vários que já foram mencionados, eu só queria complementar com mais um dado, do Cetic, muito útil e importante para essa discussão, que é o dado, por exemplo, dessa - ilustrando isso para o que a Anita chamou atenção - conexão cada vez mais precoce. A gente está falando de crianças de zero a dois anos que começam já a ter acesso e, depois, de três a cinco, que não só acessam o celular diretamente, mas também acessam a internet. E esse acesso à internet é muito mais intenso nessa fase da primeira infância, que a gente sabe que é crucial para o desenvolvimento não apenas acadêmico - todo desenvolvimento integral de uma criança ou adolescente tem, nesses primeiros seis anos de vida, momentos... Cada dia conta muito.
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Eu queria também trazer só mais um dado. Eu apaguei aqui vários dados que mostraria, porque já foram destacados, inclusive da TIC Kids, muito bem trazidos pela Anita, mas quero lembrar que, na TIC Educação, também do Cetic, a gente tem que ser honesto: muitas escolas, muitos gestores, muitos professores já faziam suas políticas de restrição nas escolas há muitos anos, na série histórica da TIC Educação, inclusive até antes da pandemia, com mudanças depois da pandemia. E essa Lei 15.100 é muito bem-vinda para nivelar essas experiências, esse freio de arrumação para o qual Prof. Israel chamou atenção, para estancar essa sangria. E o mais importante é esse trabalho que o CNE produziu de orientar que é o ponto de partida a 15.100, e não o ponto de chegada. É um ponto de partida para a gente repensar a presença digital das crianças não apenas na escola, mas também fora das escolas; porque - o Prof. Israel trouxe e o Prof. Renan também - a gente tem os dados de que o tipo de engajamento hoje é majoritariamente o engajamento em plataformas de redes sociais, plataformas de vídeos curtos de entretenimento, que, como o Prof. Israel lembrou, são desenhadas para outros fins que não os fins pedagógicos, são desenhadas para outros fins que não os fins de melhoria na saúde mental ou de bem-estar de crianças e adolescentes. Então, é essa qualificação da presença digital dos nossos estudantes que essa lei impulsiona - um debate que está sendo muito rico e muito produtivo para que a gente possa de fato converter as oportunidades do mundo digital em benefícios, não apenas acadêmicos, mas benefícios nas várias esferas da vida das nossas crianças adolescentes. Porque é cruel ver crianças de nove anos tendo que se virar em plataformas que foram feitas inclusive para maiores de 13 anos. E a gente sabe todo esse desafio do design dessas plataformas.
E um outro dado que me chama muito a atenção, complementando todos que já foram ditos antes, é que os próprios adolescentes, que a gente supõe que são super-habilidosos, carecem de habilidades digitais também, não são só os professores, os pais, nós adultos, inclusive gestores, legisladores. Todos nós estamos aprendendo diariamente a domar essas tecnologias, mas os estudantes também não têm as habilidades digitais críticas fundamentais para poder fazer um bom uso não apenas do celular, mas de todas as outras plataformas digitais disponíveis pelo celular, ou pelo tablet, ou pelo computador, ou outros dispositivos. Quando a gente vê que metade dos adolescentes no Brasil hoje dizem que o primeiro resultado da busca é o mais importante, o mais relevante, ignorando completamente a operação dos algoritmos que filtram esse conteúdo ou os links patrocinados... Hoje em dia você tem dez, quinze resultados que aparecem antes do resultado não patrocinado.
Então, nessa percepção de habilidades é importante a gente avançar - já trazendo alguns desafios. É muito bom o material do autodiagnóstico de competências digitais que a Profa. Anita trouxe, e a gente precisa avançar. O MEC, inclusive, tem feito com o Inep essa conversa - foi feito um seminário muito rico e importante no ano passado -, mas é urgente a gente ter mais dispositivos para ter indicadores das competências digitais dos estudantes nas diferentes etapas de ensino, nas diferentes idades da vida, não apenas da percepção sobre a sua própria habilidade, que a pesquisa de equipes já pega, mas a gente precisa ter instrumentos mais avançados e inovar também na forma de avaliar competências digitais, para que a gente tenha exercícios práticos.
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Como a gente tem as provas de matemática e de linguagens, a gente precisa ter também provas com exercícios práticos para que os estudantes possam ser avaliados de alguma maneira nas suas habilidades, efetivamente, dentro de uma plataforma digital. Será que eles sabem denunciar quando sofrem uma violência? Como que eles fazem a verificação de notícias? Como que eles de fato se apropriam do material riquíssimo que o Palavra Aberta vem desenvolvendo para a educação midiática? A gente precisa ter esses instrumentos de medição, não para dar nota, mas para guiar as políticas públicas de educação digital e midiática. E me parece um superdesafio, porque esses dados de habilidades críticas tão baixos na pesquisa TIC Kids nos desesperam em alguma medida.
Então, esse freio de arrumação da restrição do celular é para partir para um outro caminho, que a gente chama, aqui no Instituto Alana, de um caminho de emancipação digital, essa educação digital e midiática a serviço de uma emancipação digital que amplifique o repertório das experiências dos nossos estudantes. Dá para contar, numa única mão, nos dedos de uma única mão, o número de aplicativos que ocupam 90% do tempo de telas dos nossos adolescentes e das nossas crianças; isso é muito pouco. O digital é muito maior do que esse pequeno repertório, e a escola é esse lugar tão poderoso para fazer, sim, o uso pedagógico das várias tecnologias. Inclusive tem outras melhores que os celulares e há as desplugadas, como também já foi dito aqui.
Mas, com essa Lei 15.100, a gente está muito animado, justamente por ela ser esse ponto de partida para a amplificação do repertório digital; a amplificação, inclusive, das experiências digitais dos estudantes dentro do ambiente escolar, para fazer coisas com o celular que eles jamais fariam sentados no sofá das suas casas. É essa provocação que a gente precisa ter a partir de agora, os próximos passos para a gente de fato ter essa diversidade do que a gente chama, às vezes, de dieta digital, inclusive da família. Os dados da TIC Kids também mostram que os estudantes são os que ensinam os seus familiares, os seus avós, os seus pais a usarem serviços de banco digital, a acessarem benefício público, a acessarem uma informação sobre saúde ou até mesmo a verificarem uma informação sobre a qual estão em dúvida na internet. Então nossos estudantes são transformadores também do conjunto maior das nossas famílias e da nossa sociedade, que ainda é tão pouco letrada do ponto de vista do analfabetismo funcional e também do ponto de vista digital.
Então, eu queria, como psicólogo, chamar atenção, olhando para os desafios daqui em diante, o que é um pouco o convite desta nossa audiência hoje. Agora o desafio está posto, já foi dito e eu enfatizo: é o nosso desafio de coordenação dessas ações, de implementação dessa restrição do uso do celular junto com as orientações para a educação digital e midiática, que foram tão bem apresentadas e produzidas pelo Prof. Israel, coordenando o trabalho no CNE. E eu queria acrescentar também a importância dessa conexão com o que tem feito o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) - a Profa. Pilar está no CNE, mas também no Conanda -, com a Resolução 245 e a Resolução 257, que criam as diretrizes da política nacional de proteção das crianças nos ambientes digitais.
É a hora de convergir essas ações, porque de fato os nossos estudantes sofrem emocionalmente para além dos celulares, inclusive; os celulares agravaram o sofrimento emocional, o que a pesquisa do IBGE já vem mostrando. Estou muito curioso para ver a pesquisa com os dados de 2024, que estão prontos para sair, parece-me. Dizem que esses dados são assustadores: 30% dos estudantes dizem que ninguém se preocupa com eles na maior parte do tempo na vida, sendo isso muito mais prevalente entre meninas do que entre meninos; 21% dizem que a vida não faz mais sentido. É muito preocupante ter esse cenário de saúde mental, e entram essas plataformas digitais agravando um cenário que já não é tão favorável, especialmente quando a gente olha essa digitalização das várias formas de violência que o Anuário da Segurança Pública no Brasil mostra.
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Acho que aqui a provocação é para a gente ter esse olhar integrado, sistêmico das múltiplas infâncias sofrendo múltiplas violências com múltiplas plataformas digitais agora em que convergem de alguma maneira essas violências. Por isso, é tão importante esse olhar da educação também para que as crianças tenham mais acesso à natureza, com momentos desplugados. Repensar também as cidades com o planejamento urbano tem tudo a ver com restrição do celular, porque, quando a gente ouve as famílias, ouve as crianças e adolescentes, eles falam: "Eu queria ir a uma praça no meu bairro, mas não tem. Eu queria brincar com meus amigos na rua, mas eu não posso sair de casa, porque é perigoso. Eu queria até fazer esporte na escola, mas não tem um pátio com quadras". Então, essa conversa agora exige essa integração das várias frentes de políticas e programas que a gente precisa olhar de uma forma integrada, inclusive de acesso à natureza por crianças e adolescentes.
E, com isso tudo, já para terminar e ficar dentro do meu tempo aqui, é a gente respeitar as etapas de desenvolvimento da criança e adolescente, não apenas as etapas do próprio desenvolvimento do cérebro de crianças e adolescentes, mas também isso que a gente chama de autonomia progressiva. Muito cuidado - talvez a única ressalva para que a gente tenha chamado atenção, inclusive na nota técnica que o Instituto Alana fez, antes mesmo da lei - na educação infantil. A gente não tem ainda evidências que nos garantam os benefícios de uso de telas digitais na educação infantil, ainda que a gente saiba que existem muitos aplicativos, mas o ponto é respeitar essas diferentes etapas da vida, os diferentes momentos do desenvolvimento das emoções, do desenvolvimento da fala, da aquisição das habilidades sociais... Isso tudo exige muita cautela. E, na dúvida, é bom ser um pouquinho mais conservador na educação infantil, porque...
E aí eu queria terminar com um ponto que foi pincelado, mas que no Instituto Alana a gente tem trabalhado muito que é pensar como enfrentar esse design manipulativo dessas plataformas, desses modelos de negócio que abusam da vulnerabilidade do desenvolvimento de crianças e adolescentes. Os Profs. Israel e Renan trouxeram com muito destaque o relatório de Unesco, e eu queria chamar a atenção para outro, de que a gente não tem falado tanto, mas que é superatual ainda, que é o da tragédia das edtechs. É um cenário em que a gente vê uma inversão de lógica em que escolas, professores e redes de ensino inteiras estão se adaptando a produtos de tecnologia educacional, em vez de ser o contrário. A indústria de tecnologia digital precisa se adaptar às demandas dos professores, dos gestores e, inclusive, dos estudantes. A gente viu a inversão dessa lógica ser banalizada e a gente precisa usar de novo este momento de discussão para reposicionar que o interesse pedagógico, o cuidado com o bem-estar, a proteção dos dados pessoais... Isso tem que ser o ponto de partida para a adaptação e digitalização da educação e não adaptá-la aos produtos que o mercado oferece.
No Instituto Alana, a gente vê na pesquisa que a gente fez com o Datafolha que as famílias estão muito sensibilizadas também. O Prof. Renan trouxe o cenário do Rio, e a gente vê no Brasil todo essa concordância quanto ao senso de urgência das famílias brasileiras. E, como eu disse também, os estudantes que a gente escutou, que teve o privilégio de escutar - e vão ser anunciados os depoimentos desses estudantes que a gente escutou para contribuir com a produção do Guia de Telas, que vai ser anunciado amanhã -, estão clamando por mudanças também, os próprios estudantes. Aqui eu também reforço, Patricia: queria muito, muito mesmo, ouvir a estudante que está aí no Plenário. A gente conversou com o Hugo, da Ubes, inclusive, tem conversado com muitos estudantes, e a gente acredita que os próximos passos... Na verdade, a gente precisa recuperar o passo que a gente perdeu, que é o de ter o protagonismo dos estudantes, inclusive, com o mesmo tempo de fala, se fosse possível, que a gente teve aqui, para que a gente tenha a perspectiva dos estudantes não apenas num espaço como este, mas também na construção das soluções, na construção desses próximos passos. A gente vai precisar de ajuste de rota, a gente vai precisar corrigir alguns ponteiros, como o Prof. Israel trouxe, de acordo com cada território. E os estudantes também têm uma leitura muito fina dos seus usos de tecnologia digital no território para além da escola.
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Então eu queria terminar reforçando que, aqui, no Instituto Alana, a gente tem destacado que, assim como a Lei 15.100, de restrição do celular, não significa, de forma alguma, menos educação digital - pelo contrário, ela traz um novo panorama para mais educação digital e midiática -, a gente precisa de mais educação digital e midiática, só que a gente precisa de um novo formato desse... E, da mesma forma, não significa que a proteção de direitos de criança e adolescente precisa ser um entrave ou um atraso, porque é muito cruel com as escolas, é muito cruel com as famílias quando algumas empresas têm uma postura de dizer que isso atrapalha a inovação ou que isso dificulta as oportunidades. A gente tem tecnologias disruptivas e a gente precisa ser também disruptivo na hora de inovar, fazer tecnologia digital para educação com ética, com privacidade, com cuidado com o bem-estar. Esse é um desafio que não pode ser uma externalidade negativa ou visto como um atraso: a gente inova e depois cuida da proteção das crianças. Isso é muito cruel com as nossas crianças.
A gente clama aqui, no Instituto Alana, por inovação tecnológica, sim, mais inovação em tecnologia educacional nas escolas inclusive, mas com parâmetros, com parâmetros éticos, com parâmetros de inovação ética no design educacional. Isso é possível compilando tudo isso que a gente tem e já foi dito: a gente tem a BNCC, a gente tem a política nacional, o próprio marco civil da internet já nos inspirava, a gente tem inclusive a Enec e o Piec e agora vai ter o Guia de Telas, que se soma, inclusive, ao Plano Brasileiro de Inteligência Artificial, que é pauta de um outro debate, mas que se conecta aqui. Porque a gente tem que pensar em que modelo de inteligência artificial a gente quer e para produzir que efeitos na educação e que efeitos na saúde e no bem-estar das nossas crianças. Porque a gente está conseguindo dar um superimportante passo com a restrição do celular, mas o modelo de design ético e seguro de tecnologias na educação precisa se estender para as outras todas tecnologias que a gente pretende usar nas nossas escolas.
E prometo que termino, Patricia, destacando quão fundamental é a gente ter mais indicadores para monitorar a implementação da Lei 15.100 e para monitorar a implementação de toda a política de educação digital e midiática.
E aqui um apelo para que a gente tenha mais financiamento para a pesquisa brasileira, pesquisa pública brasileira nas universidades, nos centros de pesquisa, para que a gente acompanhe... É cruel, e eu praticamente sofro, quando a gente fica sempre usando os dados muito bons que a gente tem de pesquisas em outros países sobre saúde mental e uso de celular, sobre desempenho acadêmico. A gente tem poucos dados, além dos dados do Cetic e alguns dados do IBGE, mas pesquisas qualitativas também são muito necessárias para a gente entender os vários territórios brasileiros, como têm usado ou não a educação digital como um fator de emancipação. Já foi apresentada - e quero parabenizar essa iniciativa do MEC - a avaliação de competências digitais, dos saberes digitais. Por fim, a gente aposta muito nessa combinação. Não sei se o Prof. Israel ainda está aí, mas essa combinação das orientações do CNE com as diretrizes da política nacional feitas pelo Conanda, nas Resoluções 245 e 257, eu acho que a gente tem um panorama muito, muito inspirador para enfrentar esse desafio nos próximos anos e fazer, de fato, a educação digital crescer com respeito e proteção, em prioridade absoluta aos direitos das nossas crianças e adolescentes. Eu termino compartilhando aqui o material que a gente fez, o Instituto Alana, reforçando essa ideia do ponto de partida para uma emancipação digital. E contem com o Instituto Alana para que a gente possa somar energias. A sociedade civil tem muito também que pensar nessa coordenação, nesse trabalho articulado, nessa integração de esforços, porque os problemas, a gente sabe, são muito maiores do que a nossa capacidade de resposta imediata para fazer, com gestão democrática, a implementação da restrição e mais educação digital a partir dessa restrição.
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Eu paro por aqui; agradeço de novo. Desculpe-me se passei alguns minutinhos, Patricia. Parabéns, Ana, de novo, pela audiência e pela condução dos trabalhos aí, no Conselho.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Obrigada, Rodrigo. Acho que foi ótima a sua fala.
Essa questão do repensar a presença digital serve não só para crianças e adolescentes, mas para todos nós. Quando a gente pega os dados, hoje, de pesquisas, mostrando a vulnerabilidade do público 60+ e a necessidade de a gente olhar essa presença digital para todos, para além dos muros da escola, é fundamental também.
Obrigada, Rodrigo.
Eu queria também já trazer aqui uma informação. O Hugo Silva - que é Presidente da Ubes e é representado aqui pela Mariana Chagas - foi convidado a participar dessa audiência, e não houve resposta, mas acho que a Mariana está aqui e poderá também falar um pouquinho sobre isso.
Eu queria já - agradecendo mais uma vez a todos os expositores - abrir inscrições para os Conselheiros que quiserem fazer uso da palavra.
Cada Conselheiro poderá fazer uso... Não vou nem ler isto aqui, desculpa.
Os Conselheiros poderão fazer uso da palavra conforme o Regimento, art. 36, inciso I. Eu sei - viu, Walmar? - que a gente tem que ler, mas eu queria deixar aberto aqui aos Conselheiros.
Mariana, se você puder dar uma palavrinha rápida para a gente, só contando um pouquinho a sua experiência, acho que vai ser importante.
Obrigada.
A SRA. MARIANA CHAGAS - Agora mesmo?
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Agora mesmo.
Vamos deixar os cinco minutos regulamentares dos Conselheiros. Então, por favor, você tem cinco minutos.
A SRA. MARIANA CHAGAS - Primeiramente, bom dia a todos.
Eu me chamo Mariana Chagas. Atualmente eu sou Diretora de Relações Institucionais da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas.
O Hugo não pode vir hoje; ele está cumprindo uma agenda no Rio Grande do Norte, com estudantes de lá, com os grêmios, inclusive em parceria com a Secretaria de Educação, com que a gente tem as construções. Então, não pôde vir. Acho que ele acabou repassando o e-mail e esqueceu de informar a minha presença.
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Mas a gente agradece muito a construção, pelo Conselho, de a gente ter uma audiência pública, né? Acho que hoje, quando a gente fala principalmente das nossas reivindicações, a maior e a principal delas é a de ser escutado, de estar presente de forma ativa na construção dos projetos, na construção das leis e de ter essa parceria e esse acompanhamento na implementação deles, sendo a gente esse cabo, essa ponte principal com os estudantes hoje no dia a dia e, como a Anita trouxe, até a construção dos grêmios estudantis. Acho que muito do que a gente fala hoje, principalmente quando a gente saiu da pandemia, é da ressignificação do ambiente escolar, principalmente depois da reforma do ensino médio, do novo ensino médio; então desse processo de adaptação que a gente teve dos estudantes com aquele espaço escolar, já tendo essa realidade de pandemia, já tendo essa realidade de tecnologia, né?
O Rodrigo disse, ele trouxe a dificuldade da socialização, e a Anita trouxe os dados da relação precoce com a tecnologia. Isso é algo que preocupa muito a gente. E algo que o Israel trouxe de uma forma muito linda, que é a segurança digital. Isso para a gente é algo que pesa muito. Eu, por exemplo, sou do Estado do Paraná, e lá a gente teve um caso no maior colégio do estado, onde a gente tinha o aparelho digital fornecido pelo estado para utilização na escola e ele não tinha segurança digital. Então os estudantes podiam entrar em sites violentos, em sites pornográficos; eles tinham acesso, dentro da sala de aula, a esse tipo de conteúdo. Quando a gente fala do acesso à tecnologia, dessa relação que a gente tem dentro da escola, precisa ser uma tecnologia segura, né? Precisa ter esses entraves para que os estudantes não se percam em sites de apostas. Então esse processo de letramento digital é algo em que a gente tem muito interesse na construção e no acompanhamento. E uma coisa que a gente cobra muito é isto, é a formação dos professores, é a formação dos profissionais de educação, e essa formação vem num conjunto, num pacote, que é estrutura.
A gente está falando de tecnologia e a gente vai retirar o principal instrumento tecnológico hoje da mão da juventude, que é o celular? Inclusive tem vários recursos do Google, tanto das empresas parceiras que a gente tem hoje de educação digital nas escolas, que são facilmente acessados pelo celular. Hoje, no próprio aplicativo do Governo do estado, você já tem o link que entra para essas plataformas de estudos, para essas plataformas de educação digital que hoje a gente têm construído, né? Mas tudo isso foi construído muito sem a formação, sem esse processo de letramento e, principalmente, a adaptação das autonomias regionais, que acho que foi trazido aqui mais recentemente pelo... Meu Deus, ele acabou de falar!
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. MARIANA CHAGAS - Pelo Rodrigo mesmo.
... de a gente ter essa política que vem para atender às demandas e não a gente ter que se adaptar à política que vem de cima.
Então, essa é uma cobrança que a gente tem muito nesse processo de construção da educação do letramento digital: ter essa segurança segura, mas, do projeto da estruturação. Se a gente tira esse aparelho digital, aí a gente vai colocar o quê? Muitas escolas hoje recebem kit de robótica, mas não têm o laboratório, não têm a rede de internet, não têm um profissional qualificado para dar esse acesso a ela.
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIANA CHAGAS - E só para terminar, falando uma coisa que é muito, muito cara para a gente hoje, que é o cumprimento da Lei 13.935, de 2019, que garante a contratação de psicólogos e assistentes sociais nas escolas. Então, quando a gente se sentou para falar com o CNE sobre essa construção de um protocolo, das diretrizes, do que se precisa fazer para que esse projeto dê certo, para que a proibição dê certo, esse processo de acompanhamento e a saúde mental hoje é algo que nos preocupa muito, porque são muitos incentivos, são muitas propagandas, é vendida muita coisa do que foi falado aqui sobre o processo de monetização, de a gente entender para onde a gente está dando a nossa atenção, para onde está sendo monetizado. Então, isso mexe muito com a saúde mental. Às vezes, é um refúgio do que a gente tem e vive de cyberbullying. Então, é algo que é muito caro para a gente essa assistência social, esses psicólogos e esse processo de acompanhamento da saúde mental, e por isso a reação abrupta pelo proibimento dos celulares nas escolas.
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Mas a gente está muito feliz com tudo que foi apresentado aqui. Pedimos inclusive os eslaides, para que a gente possa conversar também internamente com as nossas lideranças estaduais sobre como tem sido essa implementação, como a gente ajuda na construção.
Então, obrigada novamente pelo espaço.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Mariana, muito obrigada. Eu acho que sua fala é bem potente nesse sentido, e trazer a voz dos estudantes é fundamental para que a gente possa construir mesmo nessa construção coletiva. E uma coisa que a Anita colocou bem: que a lei não fique no papel, que ela seja de fato resultado de algo construído coletivamente e implantado, que a lei não vire aquela "que não pegou" - a gente ouve tanto isso aqui no Brasil.
Então, eu queria abrir agora... Obrigada pela sua participação. E tanto a audiência pública como os eslaides ficam disponíveis no site do Senado, e tem o link também do Conselho.
Eu queria, então, perguntar se algum Conselheiro quer fazer uso da palavra. (Pausa.)
Conselheira Maria José e até já... (Pausa.)
O Walmar está me falando que o Secretário Renan Ferreirinha teve que se ausentar, mas a assessora dele está acompanhando a audiência e passará para ele as perguntas que porventura vierem.
Então, Conselheira Maria José, só coloco que, na reunião passada, nós falamos muito sobre a questão da educação como processo. Então, eu acho que esta audiência pública vem ratificar isso.
Conselheira, por favor.
A SRA. MARIA JOSÉ BRAGA - Bom dia a todo mundo que está aqui, que está nos ouvindo remotamente, nos vendo remotamente.
Eu começo agradecendo aos nossos convidados e à nossa convidada.
É um tema que, na verdade, tem uma conexão bastante forte com a comunicação.
Felizmente nós estamos aqui numa audiência pública que tem um caráter inédito. Em todas as nossas audiências públicas aqui do Conselho nos últimos dois anos, nós discutimos projetos de lei que estavam em andamento e precisando ser aprovados com urgência. Infelizmente a urgência não é tão urgente assim, e a maioria deles ainda não foi aprovada, inclusive o PL 2.630, que trata da regulação das plataformas digitais, algo extremamente necessário dentro desse cenário que a gente está discutindo aqui.
Eu vou aproveitar o gancho do Rodrigo, que colocou que a aprovação da Lei 15.100 é o começo. E agora a gente precisa entrar... É claro que é um começo necessário, e eu vou dar um exemplo pessoal: eu fui Professora de ensino superior de Jornalismo por um curtíssimo período, e o primeiro pacto que eu fiz com os meus alunos em sala de aula foi o de que não teria uso de celular a não ser o intencional, a não ser quando fosse para que todos da sala de aula estivessem utilizando o seu aparelho de telefone celular.
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Então, é uma lei extremamente necessária a meu ver, justamente para resguardar as relações entre professores e alunos e resguardar as relações sociais dentro da escola, o que é algo cada vez mais grave, e vocês, nossos convidados, trouxeram isso aqui muitíssimo bem. A gente diz que a gente tem mundo conectado, mas pessoas cada vez mais solitárias, e essa solidão é realmente causadora de adoecimento mental, principalmente entre os adolescentes - isso já está mais do que comprovado.
Quando eu falo que a aprovação da lei, necessária, é o começo é porque eu acho que a gente tem... E aí, puxo para o nosso debate do Conselho de Comunicação Social, porque o nosso debate passa pela discussão das tecnologias, mas ele passa necessariamente pela discussão da utilização dessas tecnologias, inclusive na difusão dos conteúdos que essas tecnologias nos permitem difundir, e é aqui que entra esse segundo processo, que já está em andamento, pelo que vocês disseram e principalmente pelos elementos que a Anita traz, tanto do MEC quanto da Secom, que é o processo de educação digital e midiática.
Então, nós precisamos - e vale para os nossos estudantes, crianças, adolescentes, jovens e vale também para o mundo adulto - de fazer o debate e chegar a implementar...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA JOSÉ BRAGA - ... planos, projetos, ações de educação digital e midiática. Isso é cada vez mais urgente. O cidadão, a cidadã, independentemente da idade, precisa de saber se mover nesse mundo digital, e saber se mover nesse mundo digital passa necessariamente pelo desenvolvimento da criticidade, inclusive em relação à tecnologia - e não é só quanto ao conteúdo, é ao uso mesmo da tecnologia. A gente está cansado de ver, num restaurante, um casal, cada um no seu celular. Para mim é uma coisa deprimente ver um casal num restaurante, cada um no seu celular. É uma coisa deprimente ver dois adolescentes juntos, cada um no seu celular. É uma coisa deprimente ver uma família na mesa de domingo e cinco, de seis, com o celular na mão.
Então, a gente precisa de fazer esse processo de educação digital e midiática acontecer no nosso país, como outras tantas medidas - e, entre elas, reforço, a regulação das plataformas digitais, a sua atuação no país, mas a gente precisa de fazer esse processo educativo.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Obrigada, Conselheira.
Eu acho que um ponto que é muito relevante é essa questão da união de esforços, né? Foram citados aqui todos os marcos legais, mas tem também a Estratégia Brasileira de Educação Midiática, que junta justamente essa questão do crítico com o uso do dispositivo propriamente dito. Então foi bom você ter colocado até para a gente lembrar.
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Conselheira Angela, por favor.
A SRA. ANGELA CIGNACHI - Bom dia a todos e todas.
Eu parabenizo os expositores pelas excelentes apresentações que foram feitas aqui em relação tanto ao conteúdo trazido como às experiências. E tudo que já foi implementado é de grande valia.
Acho que... Eu só gostaria... Não tenho perguntas, mas eu gostaria de fazer algumas reflexões aqui muito rapidamente.
Acho que essa nova lei que proíbe os celulares nas escolas, me parece, traz muitos aspectos não apenas relacionados à educação, como foi aqui já muito debatido. A gente tem a questão da educação nas escolas, a questão da saúde das crianças e dos adolescentes e a questão de segurança também. Então acho que, nos três pontos, talvez os maiores orçamentos do país estejam relacionados à educação, à saúde e à segurança. E essa pequena lei, essa curta Lei 15.100, se eu não me engano, consegue atingir vários níveis da nossa sociedade. Então são consequências que virão - e eu espero que venham.
Assim, como mãe aqui de dois adolescentes, a primeira indagação - obviamente meus filhos tiveram resistência - é: como assim proibir? Isso é normal, acho que todas as crianças e adolescentes, a maioria, tiveram como primeira reação essa e me perguntaram: "Mas qual é a consequência para a escola que não cumprir essa lei?". E o mais bonito disso - eu espero e todos nós esperamos que isso venha a acontecer - é que não há nenhuma sanção pela não aplicação dessa lei nas escolas, mas eu acho que já há uma consciência coletiva na nossa sociedade que vai fazer com que essa lei seja implementada. E isso aqui, as exposições que foram feitas aqui hoje - e muito bem-feitas - demonstram uma consciência coletiva, um engajamento de todos. E isso tem que ser mantido pelo Governo Federal, pelos governos estaduais, pelas escolas e pelas famílias. Acho que é um trabalho de toda a sociedade, em conjunto, para a proteção das nossas crianças e dos nossos adolescentes.
Nós estamos vendo o que tem acontecido com crianças e até com adultos, o que o uso exacerbado dos celulares de forma indiscriminada tem trazido como questão principalmente de saúde, ansiedade, depressão e tudo mais. E acho que esse pacto, como foi dito pela Anita, de toda a sociedade para a implementação dessas políticas é fundamental, e todos nós temos que estar engajados nisso e comprometidos com isso.
Era só isso que eu queria ponderar.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Obrigada, Angela. Acho que esse ponto do pacto social é importante entre todos.
Eu vou ler algumas perguntas que chegaram pelo e-Cidadania e depois passo a palavra para a Anita e para o Rodrigo.
A Thayná, de Sergipe, pergunta: "Qual será o nível de flexibilidade...".
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Ah, desculpe. Depois eu passo para você, então, Renato.
"Qual será o nível de flexibilidade para o uso dos celulares em um momento de emergência? Quem ficará responsável [...] por fazer a avaliação?"
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Andréa, do Rio de Janeiro: "[...] [Inspeção], acompanhamento e avaliação. Quais mecanismos e recursos serão destinados aos municípios?".
Viviane, de São Paulo: "Quem serão os responsáveis pela guarda dos aparelhos [...] nas escolas, caso [os seus alunos] levem? E caso o aluno não queira entregar, como abordá-lo?". Eu acho que esse ponto da questão da guarda já foi bem colocado pelo Prof. Israel.
O Pedro, de São Paulo: "Qual a real efetividade da lei? Qual a perspectiva de avanços[...] [na] capacitação pedagógica com a tecnologia em sala de aula?".
Júlia, do Rio Grande do Sul: "Como a regulamentação da lei afetará o uso de celulares nas escolas e quais serão as consequências para a comunidade escolar?". Isso foi colocado pela Conselheira Angela.
Carlos, do Rio de Janeiro: "[...] [Há] previsão de melhoria da infraestrutura escolar, de forma a proporcionar áreas com acesso à tecnologia (como [...] [laboratórios] de informática)?".
Lucas, de São Paulo: "[...] [Há] alternativas à proibição [...] de celulares, [...] [de modo a] equilibrar o uso responsável desses dispositivos, com o foco no aprendizado?". Acho que isso também já foi colocado como as exceções à lei, que traz o uso pedagógico intencional do dispositivo.
E alguns comentários aqui.
Natália, do Rio Grande do Sul: "[...] Atuo em escolas e sei o quanto [...] o uso[...] inadequado prejudica o aprendizado os alunos".
A Ediane, do Maranhão: "A regulamentação do uso de celulares nas instituições de ensino cria um espaço mais propício para a aprendizagem, sem distrações".
André, da Bahia: "O smartphone é uma salvaguarda para o registro de eventuais abusos cometidos pelos servidores públicos (professores). É direito dos alunos".
Adriano, do Distrito Federal: "A presença de profissionais da psicologia em espaço educacional é de extrema importância para desenvolver trabalhos de conscientização".
O Jorge, de Minas Gerais: "Sou contra as restrições. Os jovens precisam aprender a conviver com a tecnologia e os professores [...] [precisam ser mais bem preparados]".
O Alain, de Rondônia: "O uso de aparelhos celulares em sala de aula é um símbolo da globalização e do acesso a textos. Sou a favor, com autorização do docente".
André, do Espírito Santo: "Sou professor da rede estadual. [...] [Graças à] falta de regulamentação de como a escola pode cercear o uso do celular na prática [...] [nada mudou]".
Eu quis ler todas essas ponderações e comentários e perguntas para mostrar o quanto este debate é rico, o quanto este debate está na sociedade, até para que a gente possa, de fato, olhar para ele e trazer aqui para dentro do âmbito do Conselho de Comunicação Social essas questões.
Renato, por favor.
O SR. RENATO GODOY DE TOLEDO - Obrigado, Presidente.
Eu também estou muito feliz da representatividade neste debate. Nunca tivemos tantas perguntas assim ao final de um debate. Quero parabenizar os expositores e parabenizar este Conselho por esse processo e parabenizar todos os envolvidos pelo processo de aprovação dessa lei. A gente conseguiu construir de fato uma unanimidade política, quase uma unanimidade política no país em torno dessa necessidade, em torno desse freio de arrumação, como alguns dos expositores colocaram aqui essa metáfora muito importante.
E o meu comentário é mais um comentário/pergunta, uma das muitas perguntas aqui aos expositores.
A gente tem neste ano um locus muito importante para a incidência... para trazer todas as perspectivas para a política pública brasileira, que é a política pública de educação - o nosso documento mais importante, o nosso diploma mais importante -, que é o Plano Nacional de Educação, que vai passar por uma revisão este ano. Certamente a gente espera que ele passe aqui na Câmara e, posteriormente, no Senado.
Eu queria ouvir dos convidados, sobretudo aqui da Anita - com o Rodrigo, a gente tem alguma...
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A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Proximidade.
O SR. RENATO GODOY DE TOLEDO - ... proximidade, mas acho importante que ele traga também aqui -, quais são as perspectivas que a gente está debatendo com relação à inserção desses temas no Plano Nacional de Educação.
E também, enfim, quero fazer um convite aos colegas e ao Conselho - a gente não sabe qual será a gestão do Conselho durante o processo de tramitação do PNE, visto que o nosso mandato termina agora em maio -, mas acho que é muito importante que o CCS seja um órgão de excelência para o debate, como tem sido em vários temas, para que o debate do PNE passe por este Conselho.
É essa colocação que eu faço aqui para ouvir os colegas expositores, agradecer mais uma vez e parabenizar todas e todos por este processo de audiência.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Obrigada, Renato.
Então, já não tendo mais inscrições, eu passo a palavra para a Anita para as respostas e também já para suas considerações finais.
A SRA. ANITA STEFANI - Está ótimo.
Bem, obrigada. Acho que foi riquíssimo mesmo. A gente vem participando, enquanto Ministério da Educação, de algumas mesas de debate sobre o tema, e com alguns atores a gente já vem dialogando mais e está sendo muito bacana ouvir na perspectiva aqui no Senado, do Conselho, porque, quando a gente trata de educação, acaba sendo um grande locus de mudança social, onde principalmente as transformações acontecem. Para nós é uma honra estar aqui.
Eu vou trazer algumas respostas de algo que a gente não conseguiu aprofundar tanto nos 15 minutos e também dialogando muito com a Mariana aqui pela Ubes. Muitos dos comentários vieram de jovens e adolescentes, e nós no Ministério da Educação recebemos muitos pedidos de acesso à informação, muitos Fala. BRs, muitos canais abertos, o que é ótimo, porque isso faz parte da democracia - que, ainda bem, ainda temos - e dessa disputa. É uma lei, tem muito consenso, como foi falado, mas há também espaço de divergência, de melhorias, de complementações. Sei que já há um projeto de lei para uma emenda a essa lei, por exemplo, que está tramitando aqui no Congresso, que traz, por exemplo, a discussão que é um dos principais pontos ainda de divergência e de disputa, que é válido, do uso dos celulares nos intervalos e nos recreios. Então, acho que a gente ainda vai ter muito acúmulo e muita discussão nesse momento de implementação inicial.
Bem, a Thayná perguntou da flexibilização em casos de momento de emergência. As diretrizes do CNE trazem ali também um pouco mais detalhado isso, mas várias das perguntas aqui falam sobre a proibição: "Ah, isso é perigoso, precisa ter algum momento que se use o celular, é importante, é um direito, etc.". Lembro que a gente não está falando de uma proibição do uso de celular na escola: é uma restrição do uso quando ele não tem uma intencionalidade pedagógica, quando ele não está previsto em alguma exceção, que é, por exemplo, em caso de inclusão e acessibilidade ou de emergência. Nesse sentido, sempre, assim como... Antes do celular, já tinha a escola. Como funcionava quando tinha uma emergência? A gente procurava o adulto responsável, então é exatamente isso que a gente tem que continuar fazendo nas escolas. O gestor escolar, os professores são responsáveis pelo ambiente escolar, eles são os adultos nessa relação na educação básica, e, para isso, a ideia é continuar aproximando. Então, o adolescente ou o jovem não precisa se sentir responsável por ele resolver conflitos ou situações de emergência sozinho porque tem já o celular. Realmente, nesse diálogo e nessa parceria entre os adultos e os jovens, os adultos e as crianças, na resolução de conflitos ou de emergências, continua a mesma coisa.
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Também aparece muitas vezes alguns responsáveis, familiares falando: "Eu preciso entrar em contato com o meu filho, com o meu sobrinho. Antes, com o celular, eu podia, a qualquer momento eu sabia, se eu estava preocupada com ele". Todas as escolas precisam ter um canal de comunicação, um telefone, um celular mesmo, da direção escolar. E isso continua sendo... Antes mesmo do celular, da internet do celular, já tinha sempre essa questão "tem alguma emergência, preciso entrar em contato". Então, nada disso a gente está restringindo, tá? É realmente o uso ali que distrai o aluno, que tira o foco, que perde a possibilidade de conexão tão importante do aluno com o professor, do aluno com os outros alunos.
E esse é um ponto também que a gente vem discutindo bastante, a gente dialoga com a Ubes, nessa questão da importância da interação social. Assim, é de cortar o coração algumas mensagens que a gente recebe, no Ministério da Educação, que a gente tem que responder, de adolescentes, principalmente - tem vindo mais em torno dos 14, 15 anos -, falando assim: "Ah, mas eu não tenho amigos; se eu não tiver o celular, vocês querem que eu faça o quê? Que eu fique olhando para a cara dos outros?". E a gente sente essa dor, a gente sente essa questão, que não é uma questão individual, é a nossa sociedade, como uma sociedade da era da informação, de uma tecnologia cada vez mais presente, como nós temos que lidar com isso.
Então, a importância do atendimento psicossocial também, que está previsto na lei, a gente vem discutindo isso, inclusive no Ministério da Educação, no sentido de que é uma responsabilidade das redes de ensino; muitas redes, dependendo da localização no país, sequer têm profissionais disponíveis em quantidade suficiente por escola. Então, se não é possível por escola, que seja pela rede, que tenha ali um profissional, um psicopedagogo, um psicoterapeuta, para fazer esse acompanhamento. A lei prevê isso, a lei fala da importância de espaços de escuta e acolhimento psicossocial neste momento de implementação. Está bom?
Então, eu queria reforçar isto: é um tema que é multidisciplinar, então você vê que a gente está falando de várias coisas que são para além da educação. No final das contas, muito sobra para a educação. Muita gente fala assim: "É tudo culpa da comunicação ou a solução é a educação", mas tem que envolver assistente social, tem que envolver saúde, tem que envolver segurança, realmente é esse trabalho de muitas, muitas áreas para que a gente consiga proteger as nossas crianças, inclusive dessa distração, desse uso indevido de tecnologia. Então, acho que eu respondi a algumas sobre essa questão da restrição versus proibição em casos de exceção.
Uma outra pergunta que eu achei interessante aqui trazer, que eu não consegui aprofundar muito na minha fala, foi sobre formação de professores e de gestores. No Ministério da Educação, nós ficamos relativamente longe da educação das escolas. Então, o nosso papel é um papel indutor, a gente tem cursos e ofertas formativas, principalmente à distância, principalmente online, que estão disponíveis gratuitamente. Nós apoiamos também, por meio de especializações. A gente acabou de lançar uma especialização em parceria com a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, que é EaD, mas tem momentos síncronos e assíncronos, que todas as redes de ensino municipais e estaduais vão poder indicar técnicos para fazer. É uma formação em educação digital e inovação pedagógica, em que a gente já traz a questão da restrição do uso do celular, de como, a partir do momento em que você tem uma restrição de uso não pedagógico, que eu uso pedagogicamente.
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Então, é uma especialização gratuita, com certificação da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. Estão abertas as inscrições no sistema do MEC, no Simec, e é um curso que vai apoiar para que a gente tenha embaixadores da educação digital e midiática em todo o Brasil. A ideia é a gente formar essa grande rede de gestores, professores, para ajudar a trazer a palavra da educação digital e midiática dentro das escolas. São mais de 5 mil vagas - então, tem vaga para todos os municípios -, e, no nível da escola dos professores, a gente tem ofertado cursos online pelo Avamec. Muitas redes estaduais e municipais têm trabalhado nisso, sabe?
Como o Prof. Israel falou, não é uma responsabilidade individual do MEC. Tudo que nós fazemos no Ministério da Educação, por orientação do Presidente Lula, por orientação do Ministro Camilo, é em regime de colaboração. O nosso papel, enquanto Governo Federal, é trazer a discussão, é orientar, é fomentar, é induzir, mas a aplicação e a implementação dos estados e municípios têm sido muito boa. A gente tem casos de muitos municípios que já fizeram os seus próprios decretos, as suas próprias legislações, regulamentando. Agora, com essa resolução do Conselho Nacional de Educação, a gente também entende que vai apoiar aqueles que estavam esperando talvez um pouco mais de orientação federal.
A gente entende que estamos começando o ano letivo com bastante apoio normativo, e isso dá segurança jurídica para os envolvidos. Tem muitos professores que têm medo e falam assim: "Ah... Se eu falar que eu preciso restringir o uso do celular, vão falar que eu estou tirando o direito de alguém, que estou confiscando, vou ser responsabilizado...". Então, todos os normativos que estão nessas apresentações dão segurança jurídica para todos os envolvidos na comunidade escolar, e as ações práticas, seja com essas formações que a gente tem falado aqui, seja com os guias, com os materiais, que ajudem nessa conversa, nesse diálogo... Agora, em março, a gente vai começar um trabalho dos grêmios, para que os grêmios também possam ajudar nessa conversa coletiva, não só os adultos, mas os próprios adolescentes e jovens também ajudarem nessa discussão e nesse diálogo.
Para isso, reforço, a gente tem a plataforma do Avamec, que é gratuita, com muitos cursos. Acho que a gente já tem mais uns 15 cursos só dessa temática de educação digital e midiática e vamos lançar mais alguns. Acho que estão para ser lançados 60 cursos até o final agora de abril e essa especialização - que é um curso mais lato sensu, mais longo -, justamente para fortalecer e estruturar, para não ser uma coisa pontual, e sim uma transformação do currículo e da educação básica, incorporando de forma crítica, reflexiva e responsável o uso da tecnologia.
A gente tem dois incentivos que eu acho que acabam dando também essa parte mais formal da necessidade da aplicação da lei, da incorporação de educação digital. No Fundeb, como vocês sabem, tem um fator: uma parte do financiamento da educação é de acordo com resultados educacionais. Aqueles entes que avançam em alguns resultados educacionais, que fazem algumas condicionalidades ganham um pouco mais de recurso, uma indução positiva financeira. Uma das condicionalidades do Vaar do Fundeb é a implementação da BNCC. Como a BNCC, em sua grande maioria, já tinha implementado o tronco básico, a gente está trazendo a questão da educação digital e midiática como esse fator de condicionalidade.
Então, ao longo dos próximos anos... Em 2024, a gente fez um mapeamento para saber quais redes municipais e estaduais já tinham esse tema incorporado no currículo; em 2025, a gente vai continuar perguntando; e, em 2026, até por conta da homologação do parecer do CNE, é obrigatório que todos os currículos de educação básica do país tenham o componente de educação digital e midiática incorporado, já implementado. Então, esse é o último ano de ajustes textuais do currículo; em 2026 ele precisa estar já, em sala de aula, aplicado.
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E também, este ano, a gente vai ter o Pisa, que é uma avaliação internacional de que o Ministério da Educação faz parte. E, pela primeira vez, vai ter a verificação de competências digitais dos estudantes. Então, vai ser uma linha de base, claro, só para alunos de 15 anos, mas é também algo que, ao longo dos anos - o Pisa é a cada três anos -, a gente espera ir acompanhando para garantir.
O Plano Nacional de Educação, na proposta do Ministério da Educação que foi enviada ao Congresso, fala sobre educação digital e midiática; não tem especificamente a questão do uso do celular, porque foi posterior também à discussão da lei, mas, nos resultados educacionais, porque é uma das grandes metas a gente melhorar a aprendizagem, melhorar a aprendizagem de matemática, o Ideb, etc., a gente entende que essa restrição vai ajudar, porque, como a gente foi verificando ao longo dos últimos tempos - e, no Rio de Janeiro, eles provaram isso com uma pesquisa comparativa -, escolas que fazem uma boa restrição do uso do celular, que o utilizam somente para fins pedagógicos, têm desempenho acadêmico da aprendizagem melhor. Então, também a gente sente que é uma consequência positiva que, ao longo dos próximos anos, a gente vai verificar. Mas é muito importante, nessa discussão da validação do PNE, também trazer esse tema.
E, por último, a infraestrutura. A gente sabe que existem escolas ainda com desafios de infraestrutura no Brasil. Em termos de conectividade, para viabilizar o uso pedagógico da tecnologia, a gente precisa ter um nível mínimo de capacidade da internet, porque imagine que o professor vai querer mostrar um vídeo no YouTube, e aí fica lá carregando, carregando... Isso já desestimula, já perde a aula. Então, a gente vem trabalhando na expansão da qualidade da internet nas escolas. A gente já está com 51% das escolas de todo o Brasil com um nível adequado de internet para fins pedagógicos e temos várias iniciativas do Governo Federal, com financiamento pelo Fust, pelos recursos do edital do 5G, pelo Programa Dinheiro Direto na Escola, que nós colocamos para apoiar essa área. Então, a gente entende que, do ponto de vista complementar, porque é responsabilidade do Ministério da Educação apoiar a infraestrutura - a responsabilidade da infraestrutura das escolas é dos estados e municípios, mas nós temos um papel complementar -, temos feito isso ao longo desse mandato.
Acho que é isso. Acho que eu consegui passar pelo menos pela perspectiva de quase tudo aqui.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Muito bom. Passou, sim. Até trouxe informações adicionais aqui.
Eu queria passar a palavra, então, para o Rodrigo.
Rodrigo, para comentários e já considerações finais, por favor.
O SR. RODRIGO NEJM (Por videoconferência.) - Obrigado, Patricia.
É muito bom ouvir a Anita, que realmente complementou com pontos bem fundamentais a discussão e com esses níveis de detalhes operacionais - não é, Anita? - que são tão fundamentais, nessa coordenação e indução que o MEC faz, para materializar agora, nos próximos passos, a implementação, de fato, de acordo com as demandas de cada território. Muito feliz de ver esse trabalho do MEC, toda essa agenda de educação digital.
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E, como foi mencionado duas ou três vezes aqui pelo Prof. Renan e pelo Israel também, é realmente importante marcar a mobilização em torno dessa Lei 15.100 - e desse tema especificamente - como ponto de partida, mas, ao mesmo tempo, um ponto de partida para uma discussão que é uma discussão de Estado, é uma discussão sobre modelo de presença digital e modelo de negócios também de plataformas digitais que são usadas por nossas crianças e adolescentes -, isso é bastante profundo e é mérito de muitos trabalhos de vocês todos, especialmente do MEC e da Secom, que têm feito um trabalho muito intenso nessa agenda, o Governo Federal e o próprio Congresso Nacional também, que têm pautado esse tema.
Então, eu complemento a questão do Plano Nacional de Educação que o meu colega Renato, a quem eu agradeço muito também pelos aprendizados, e trocar essa trajetória profissional com o Renato é um privilégio também... Eu acho que o PNE traz, lá no texto que está em discussão, a questão da Estratégia, dos objetivos, 7, relacionados à educação digital, que são fundamentais, e é um ganho já o fato de estar a palavra "cidadania digital" explicitamente mencionada, ao menos nesse texto que está em debate, em construção pelos diferentes atores da sociedade. E ali inclusive tem pontos muito fundamentais para que de fato isso seja uma política de Estado. E dez anos é até pouco se a gente for pensar nas transformações profundas que a gente tem que construir.
E claro, os governos mudam, faz parte da democracia, mas esse compromisso coletivo que a gente está assumindo, esse pacto coletivo em torno do celular, a gente pode se inspirar nele para se estender para o Plano Nacional de Educação e levar de fato a cidadania digital, a educação midiática, como está sendo a priori incluído no texto do PNE. Eu acho que é muito, muito... Esse, sim, é um ponto de chegada, a gente ter um PNE representando essas demandas, esses desafios inclusive para tecnologias que a gente não sabe ainda quais são, não é, Patricia? Inteligência artificial, mais uma onda disruptiva, e termos salvaguardas para podermos nos sentir confortáveis na educação também, como na área da comunicação e outras, para essas disrupções que estão aparecendo.
E, nesse sentido, eu queria terminar enfatizando a importância de projetos de lei. Mencionaram o 2.630; para a nossa discussão aqui, eu queria destacar a importância fundamental do Projeto de Lei 2.628, que agora foi para a Câmara dos Deputados, e ele de fato é um projeto que prioriza os direitos da criança e do adolescente no formato em que está, veremos o formato que vai ganhar, mas é justamente tornar na lei uma perspectiva de proteção integral aos direitos da criança e do adolescente prioridade seja qual for o nome da tecnologia. A gente está discutindo agora celular, a gente está discutindo redes sociais, a gente agora começa a discutir IA, daqui a pouco vai vir a IA geral e outras coisas que a gente não sabe nem nomear agora. Então, como que a gente faz um projeto de lei como o 2.628 garantir princípios, diretrizes - e aí há uma coisa que o PNE tem e que o 2.628 também tem são parâmetros -, parâmetros e requisitos de software, requisitos técnicos que possam não prescrever, de forma alguma, porque isso, sim, seria prejudicial para a inovação, mas parâmetros técnicos de avaliação de risco, de avaliação de impacto, parâmetros que uma startup, um desenvolvedor de tecnologia, uma grande ou pequena corporação, ou um grupo de jovens da periferia que estão criando tecnologias, inclusive ter mais incentivos para que mais inovação aconteça pelos próprios jovens e os vários territórios para descentralizar a ideia de que inovação tecnológica só acontece nas grandes corporações internacionais? Não, se a gente tiver de fato uma educação digital crítica, é possível criar novas tecnologias com baixos recursos e inovar também nessas formas de usar tecnologia para solucionar problemas da vida e dos territórios.
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Então, isso também, de alguma forma, passa pela educação digital, pela cidadania digital, que está no PNE (Plano Nacional de Educação), mas acho que tem uma lacuna aí que a gente tem ainda a regular nesse conjunto de diretrizes que a gente falou que temos para a educação digital, que é a regulação para as plataformas serem mais corresponsáveis por essa proteção dos direitos dos estudantes, das crianças e dos adolescentes no ambiente digital. Isso está no PL 2.628. Para quem tem interesse, vale a pena aprofundar no debate. Isso está especialmente em sinergia, como eu já disse, com a Resolução 245 do Conanda e as diretrizes da política nacional prevista na Resolução 257, que a gente espera que se torne lei como política nacional de proteção das crianças e adolescentes no ambiente digital. E ali também tem previsões e parâmetros para que a gente possa ter essas avaliações de risco.
A colega - esqueci o nome da Conselheira - comentou sobre os conteúdos, a importância dos conteúdos, e a Anita disse todo o conjunto de informações, mas a gente tem também aí um desafio... O McLuhan dizia que o meio é a mensagem também. O modelo de negócio das plataformas educa também. A escolha do design dos botões, do fluxo, do feed infinito, dos parâmetros de comparação social, as funções da plataforma digital também educam e também modelam nossos comportamentos, não são apenas os conteúdos. É por isso que uma regulação como o PL 2.628 é tão fundamental, e não tenho dúvida de que ele vai contribuir para que as tecnologias na educação sejam tecnologias mais éticas, saudáveis e seguras.
E um último ponto. A gente falou de muita coisa, como saúde mental nas escolas, infraestrutura dos pátios, infraestrutura das cidades para poderem ter espaço de lazer desconectados, contato com a natureza, e a gente sabe também que o desafio é tão grande... Não dá para pensar a capacitação de professores e de gestores sem pensar também as condições para os trabalhadores da educação: condições de salário, condições de estrutura, tempo para fazer formação, tempo para planejar projetos inovadores, tempo para usar e criar tecnologias na educação. A gente tem esse desafio também que eu acho que é importante mencionar.
E, por fim, agora terminando mesmo, eu queria parafrasear aqui uma frase do Rubens Paiva quando diz que a gente tem... Desculpem, é Rubem Alves, estou me confundindo aqui - já com fome. Ele diz que algumas escolas são gaiolas e que outras escolas são asas, que permitem criar um senso de emancipação para as nossas crianças fazerem os seus voos livres. A gente pode usar a mesma relação: a gente quer não só escolas que sejam asas, mas tecnologias digitais também que sejam asas e que não sejam gaiolas para as nossas infâncias e adolescências. Eu aposto muito que é possível, sim, inovar tendo a prioridade na proteção e no bem-estar das crianças e dos adolescentes.
Agradeço novamente, parabenizo e fico totalmente à disposição para contribuir nos trabalhos em diante.
A SRA. PRESIDENTE (Patricia Blanco) - Obrigada, Rodrigo. Não precisa se desculpar, estamos todos impactados com o Oscar de Ainda Estou Aqui... (Risos.)
A sua fala foi... É interessante mesmo. A gente precisa pensar em como dar asas para que a criatividade, de fato, aconteça. Que a gente possa ressignificar esse ambiente, essa presença digital.
Lembro a todos os membros do Conselho que, a partir das 14h, retornaremos a esta sala para a 4ª Reunião de 2025 e declaro então...
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Agradeço, mais uma vez, à Anita, pela sua presença aqui, ao Rodrigo e também ao Prof. Israel e ao Secretário Ferreirinha pela participação nesta audiência pública. Obrigada.
Está encerrada a reunião.
(Iniciada às 9 horas e 38 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 49 minutos.)