Notas Taquigráficas
07/04/2025 - 10ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, Comissão de Assuntos Sociais
| Horário | Texto com revisão |
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| R | A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a 10ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa, conjunta com a 6ª Reunião da Comissão de Assuntos Sociais, ambas do Senado - duas Comissões aqui presentes hoje -, da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura. A audiência pública será realizada nos termos dos Requerimentos 21, 27 e 29, da CDH, e do nº 7, de 2025, da CAS, todos de minha autoria, para debater sobre os desafios e os direitos das mulheres com endometriose, mobilizando a sociedade para as medidas de prevenção e os tratamentos inerentes à doença. |
| R | A reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania; na internet, em senado.leg.br/ecidadania; ou pelo telefone da Ouvidoria, o 0800 0612211 - eu vou repetir o telefone: 0800 0612211. Pode ligar, porque não tem custo nenhum essa ligação. Nós vamos ter duas mesas nesta sessão: a primeira mesa será composta pela Dra. Cristiane Britto, Dr. Eduardo, Dr. Jean e Dr. Norberto; e depois nós teremos uma segunda mesa. Antes de chamar os componentes desta mesa, eu quero informar que esta audiência chamou a atenção de muita gente no Brasil. Até quinta-feira, por volta de 14h - depois a gente não conseguiu mais contar na sexta, no sábado, no domingo -, nós recebemos, via internet... Nós divulgamos a pauta e, no momento em que nós divulgamos, nós recebemos mais de 45 perguntas e comentários. Nós não conseguimos contar mais agora quantas perguntas e comentários, o que mostra que o assunto... E perguntas que vieram do Brasil inteiro, comentários que vieram para esta Comissão do Brasil inteiro. Nós sabemos que neste momento tem grupo de mulheres reunidas em associações no Brasil inteiro, com a televisão ligada, assistindo. Nós sabemos, Doutores, que tem igrejas que abriram as portas dos templos hoje, à tarde, e ligaram o telão para assistir a esta audiência juntos, o que mostra que o assunto está despertando interesse na sociedade e que - eu assinei como coautora alguns requerimentos, mas tem requerimentos de que eu não sou a autora principal - os Senadores das duas Comissões acertaram em começar esse debate no Parlamento. Isso mostra que mostra que o Parlamento não pode ficar fora mais dessa discussão. A mulher com endometriose sofre. E nós não vamos discutir aqui na Comissão de Direitos Humanos o tratamento, a medicação - isso está sendo discutido na Comissão paralela, que é a CAS, que está aqui presente, de que eu também sou membro -, mas, na Comissão de Direitos Humanos, nós vamos dar uma abordagem à luz dos direitos. Como estão os direitos das mulheres com endometriose no país? Eu fui Ministra da Mulher, eu sou Senadora da mulher, eu sou militante da causa feminina há mais de 35 anos. Eu sou Pastora, e, por ser Pastora, quantas vezes, no gabinete pastoral, o que eu recebi eram mulheres gritando de dor, incompreendidas pelos maridos, com casamentos destruídos, porque elas não estavam dando conta da obrigação conjugal - vocês entenderam o que eu estou falando? Quantas mulheres perderam o emprego, porque estão com muitas dores? Isso há 35 anos. E qual a relação com o patrão para explicar que esta mulher precisa ser vista de uma outra forma? Nos últimos anos, o debate aconteceu no Senado, na Câmara, legislações foram trazidas, temos projetos de lei tramitando nas duas Casas - eu sou Relatora de um importante projeto de lei sobre o assunto -, mas, nesta Comissão, nós estamos no mês da saúde e esta Comissão de Direitos Humanos vai discutir os direitos humanos de uma mulher com endometriose. É com isso que nós vamos começar. |
| R | E, claro, nós vamos também ter aqui na mesa médicos que vão falar do tratamento, do remédio, do diagnóstico. E aí, Doutores, a gente vai se deparar com o diagnóstico. Quantas mulheres neste país imenso chamado Brasil, em regiões isoladas, estão gritando de dor sem saber por que estão com dor?! Quantas mulheres estão sendo chamadas de "mimizentas", exageradas, estéricas, loucas por que não têm um diagnóstico?! E a gente vai se deparar com essa realidade. Então, eu acredito que esta é uma importante reunião nesse ciclo de debate sobre saúde e direitos que a Comissão está fazendo ao longo deste mês. Hoje pela manhã, nós tivemos uma audiência pública, que terminou agora, depois das 13h20, em que nós discutimos doenças raras e direitos dos pacientes com doenças raras. Foi um momento de muita emoção, em que nós nos deparamos com o quanto estamos ficando para trás na garantia de direitos das pessoas com doenças raras. Por exemplo, para quem não esteve de manhã, sentou ao meu lado o Gabriel, representante do movimento Somos Todos Gigantes, Ministra Cristiane. Ele é líder de um movimento que fala sobre as pessoas com nanismo e os desafios. E ele tem baixa estatura. Na hora em que ele sentou nessa cadeira, nós observamos que essa mesa não estava pronta para ele, que o Parlamento não está pronto para pessoas com baixa estatura. Que vergonha! E aí os desafios o tempo todo estão chegando, estão postos, e nós vamos ter que dar respostas a todos os desafios que estão sendo trazidos para esta Comissão. Neste momento, nós vamos discutir um tema ao qual, com certeza, vamos sair daqui desafiados a dar respostas. E aí, com muita alegria, eu cumprimento os internautas, eu cumprimento as pessoas que estão nos assistindo pela TV Senado. Podem mandar suas perguntas. As perguntas a que a gente não conseguir responder aqui na audiência nós vamos encaminhar aos preletores, aos expositores por e-mail, para que a gente encaminhe aos internautas, depois, as respostas. Na nossa primeira mesa, cada expositor terá dez minutos, mas todos sabem que eu sou extremamente generosa e não tem como a gente falar de dor e limitar a dez minutos. A assessoria não gosta que eu fale isso, mas eu serei generosa, eu não vou deixar a campainha tocar, mas vamos tentar ficar nesse prazo, porque as nossas mídias fazem um cronograma de quanto tempo vai durar a audiência e separam a TV Senado, o YouTube para esse período, para que se alcance o maior número de pessoas. Então, se a gente conseguir ficar no tempo determinado, mais pessoas vão acompanhar o nosso debate. Convido para compor a mesa a Dra. Cristiane Britto, Advogada, militante da pauta feminina e ex-Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos do Governo anterior. Convido para compor a mesa com a gente o Dr. Eduardo Schor - acertei o nome, doutor, Schor? -, Presidente da Sociedade Brasileira de Pesquisa e Ensino em Medicina. Doutor, que prazer recebê-lo na nossa Comissão, seja muito bem-vindo, é uma alegria. Dra. Cristiane, eu não fiz isso, não, porque você já é de casa, né? Convido o Dr. Jean Pierre Barguil Brasileiro, Médico da Secretaria Estadual de Saúde do DF e Diretor do Instituto Verhum - Verhum? Está certo? -, Vídeo Endoscopia e Reprodução Humana. Dr. Jean, obrigada, obrigada por tirar esse tempo para gastar conosco! Eu fico imaginando a agenda dos senhores, e os senhores gastando esse tempo conosco, aqui na Comissão, para este importante debate! |
| R | E para esta primeira mesa ainda, eu convido o Dr. Norberto José Maffei Junior, Médico Ginecologista e Obstetra. Doutor, muito bem-vindo! É uma honra recebê-lo. Obrigada por ter tirado tempo da sua agenda. Eu espero que nenhum neném nasça sem sua presença enquanto o senhor estiver aqui hoje! Muito bem-vindo, Doutor! É um prazer recebê-lo, Dr. Norberto. Eu informo aos nossos expositores que lá atrás tem um painel, o.k.? Aquele painel vai marcar dez minutos, mas não se assustem, está bem? Não se assustem. Antes de a gente começar, deixem-me fazer uma audiodescrição. Nós estamos numa mesa de madeira clara. Todos nós temos um microfone à nossa disposição. Eu estou com uma roupa preta, um blazer preto; embaixo, uma camisa preta. Estou no centro da mesa. Eu uso óculos; meus óculos têm hastes pretas. Meu cabelo é um cabelo morena iluminada - acertei agora? -, um cabelo escuro iluminado. Eu sou uma mulher branca, de pele branca. Eu tenho 60 anos - não parece -, 61, mas não parece; tenho um rostinho de 30. Sou ainda, Doutor, a Senadora mais bonita do Brasil, mas, médico aqui de Brasília, por favor, não fale isso para a Senadora Leila, por favor. Nós estamos num plenário do Anexo II do Senado Federal, onde há bancadas que também têm microfone. E nós temos pessoas participando aqui de forma presencial. Essa é a minha audiodescrição e a audiodescrição do nosso ambiente. Por dez minutos, Dra. Cristiane Britto, ex-Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Esta é uma Comissão em que a gente vai debater os direitos da mulher com endometriose. Muito bem-vinda e obrigada pela presença. A SRA. CRISTIANE BRITTO (Para expor.) - Boa tarde a todos. Também vou pedir licença para fazer minha audiodescrição. Peço que não conte, não compute no meu tempo. Eu sou Cristiane Britto. Este é meu sinal em Libras. Eu sou uma mulher branca com cabelo também meio iluminado, para esconder os brancos já. Eu estou usando óculos de hastes marrom-escuras, uma blusa verde e um colar com detalhes verde, marfim e marrom. Tenho 46 anos e estatura mediana. Bem, Senadora, muito boa tarde. Boa tarde aqui aos Doutores que compõem esta mesa. Eu também queria fazer um cumprimento muito especial ao meu médico, que está aqui presente, o Dr. Frederico Corrêa, que tem cuidado de mim durante todos esses anos. Eu queria dizer que hoje não estou aqui como ex-Ministra dos Direitos Humanos, da Mulher e da Família. Eu estou aqui como paciente, como uma mulher que foi acometida por endometriose e que passou por uma jornada muito cruel, eu diria, para chegar a um diagnóstico de verdade. Eu menstruei muito cedo, com 11 anos de idade, e tinha uma menstruação com muita cólica, muita. Sou baiana e, lá no Nordeste, o que os médicos me falaram? "Não se preocupe: quando casar, passa." E todos os meses eu passava muito mal. Cheguei a desmaiar na escola. Tomava uma injeção de Voltaren para conseguir passar pelos cinco primeiros dias do ciclo da menstruação mesmo. Então, eu sempre sofri muito e esperei casar para passar. Casei cedo, mas não foi por conta disso, não, tá? Casei cedo, com 18 anos, e não passou. Pelo contrário, as dores foram aumentando a ponto de começar a prejudicar minha qualidade de vida. Então, eu dizia para os médicos, na época, que a única posição confortável para mim era deitada, porque, sentada, o peso do meu corpo sobre o meu abdômen já trazia muitas dores. E eu não podia ficar todos os dias tomando muito medicamento analgésico, porque atrapalhava a minha faculdade - eu já estava fazendo curso de Direito. Então, eu estava perdendo a qualidade de vida. Isso foi em 1999, quando eu percebi que tinha algo de errado. Eu tinha 20 anos e eu comecei a percorrer os médicos aqui, já em Brasília - já havia casado, já estava aqui em Brasília -, e eu recebi inúmeros distintos diagnósticos. |
| R | Eu recebi diagnóstico de que era uma inflamação crônica. Eu fiz lavagem intrauterina. Eu fiz lavagem natural de tudo quanto é jeito. Eu usava muita medicação. Eu tive diagnóstico até mesmo de câncer, Senadora. Eu tive diagnóstico de tudo. E tive a recomendação de um médico para que, se eu quisesse que a minha dor sumisse, tirasse o útero. E eu digo pra vocês que tinha dia que a dor era tão intensa que eu pensava nisso; mas eu tinha um sonho de ser mãe. Até que, passados muitos anos, eu ouvi falar de um médico em São Paulo que era a referência em ginecologia, que era o Dr. José Aristodemo Pinotti, o saudoso Prof. Pinotti, e fui até ele. E lá ele mandou que eu repetisse todos os exames de ultrassom. E aí, digo aqui, as mulheres que estão nos ouvindo e que têm endometriose sabem: no ultrassom não dava absolutamente nada. Nada! Não tinha nada de irregular nos meus exames. E, inclusive, o que mais me chocou foi um médico que me atendeu aqui em Brasília que, na frente do meu esposo - eu, recém-casada, eu tinha quatro anos de casada -, falou: "Isso é psicológico, porque seus exames estão normais. Então, essa sua dor é psicológica". E eu saí de lá chorando muito, porque meu esposo me olhou com um olhar de dúvida. Eu, recém-casada, cheia de dor; e o médico, que não sabia fechar o diagnóstico, duvidava da minha dor. Quando ele falou que era psicológico, ele duvidou da minha fala, do meu depoimento para ele. E eu recebo, hoje, muitos depoimentos de mulheres que passam pelo que eu também passei. E eu cheguei para o Prof. Pinotti e falei: "Eu não estou mentindo, eu tenho muita dor. Meus exames estão normais, sim, mas eu não sei o que eu tenho e eu preciso que o senhor me diga na frente do meu esposo, porque eu não estou mentindo. E eu quero qualidade de vida para mim e para o meu casamento". E no exame de toque, o Dr. Pinotti falou: "Eu tenho quase 100% de certeza que você tem endometriose, porque o seu útero não tem mobilidade alguma no exame de toque". Marcamos a cirurgia. Foi bem difícil também o plano de saúde liberar. Tive que notificar o plano de saúde na época, porque se falava de endometriose muito raramente. E, no meu caso, depois que eu saí do centro cirúrgico - fiz uma videolaparoscopia, o médico falou que era a única coisa que tinha para fazer para fechar o diagnóstico -, ele falou que foi o terceiro caso mais grave que ele viu de endometriose, porque o meu útero estava grudado com a bexiga e com partes do intestino. Ele falava que era um grande grude, por isso é que a minha dor era tão intensa. E ele falou: "Não consegui tirar todas as aderências". Depois eu descobri que, naquela época, o exame de videolaparoscopia tinha suas limitações, sim. Mas ele falou que eu já estava há muito tempo na mesa, que ele não tinha conseguido tirar todas as aderências e que eu tinha perdido mais de 80% do meu ovário esquerdo. Mas ele falou: "Não se preocupe, porque você tem grandes chances de engravidar". |
| R | Só que mal sabia eu que a minha saga ainda ia continuar. Eu tive que tomar uma tal de injeção de Zoladex, que me deixou com sintomas de menopausa. Pense em uma mulher de 22 anos, que eu tinha completado na época, com sintomas de menopausa. Eu queria morrer, porque parecia que eu estava surtando. Depois de quatro meses usando aquela injeção de Zoladex na barriga, que doía para caramba, eu descobri que minha dor estava voltando; estava voltando porque a endometriose estava voltando. Então, com menos de um ano de operada, a minha endometriose voltou. E aí eu não sabia mais o que fazer. Comecei a pesquisar e me falaram que eu tinha que procurar um médico que bloqueasse a minha menstruação e ficar tomando um anticoncepcional, porque quanto mais eu menstruava, mais a minha aderência aumentava. E foi o que eu fiz. Depois, eu procurei o Dr. Elsimar Coutinho, também vivo na época, coloquei o implante dele para ficar meses sem menstruar. De seis em seis meses eu trocava, mas ainda assim eu sentia a dor. Até que eu procurei o Dr. Frederico, mais ou menos em 2010, salvo engano, e eu falei, "Doutor, não é possível que a medicina não tenha avançado. O que eu posso fazer? Eu quero fazer outra cirurgia!". E eu me lembro de que ele me colocou os riscos: "Você tem muita aderência. Você já quer ser mãe". E aí eu sabia que, quanto mais cirurgia eu fizesse, mais aderência eu poderia ter; e também não era sinal de cura para mim, porque não existe cura para a endometriose. Então o Dr. Frederico ficou cuidando de mim para estabilizar aquela endometriose. Ele sempre me dizia que eu tinha que fazer ressonância magnética, que, na época, também não fazia parte desse diagnóstico. Eu tenho ainda uma aderência no intestino, e a preocupação minha é só ficar controlando. Tenho várias outras aderências, mas a minha saga ainda continuou quando eu quis engravidar. Aí eu descobri que a endometriose estava em uma das minhas trompas, e eu tive essa dificuldade para engravidar. Outro grande desafio da mulher que tem endometriose é quando ela se depara com a esterilidade. Então não é só a dor, não é só a perda da qualidade de vida, é uma doença que tira o seu sonho de ser mãe. E o que mais me revolta é que, quanto mais tardio o diagnóstico, menor chance você tem de ser mãe - e eu passei mais de dez anos para receber um diagnóstico. Só depois de 19 anos de casada, eu consegui realizar meu sonho, por milagre, porque eu cheguei num momento em que eu falei: "Doutor, eu estou disposta a fazer nova cirurgia para ver se agora eu consigo engravidar". E milagrosamente... Eu tenho até hoje o zap que eu mandei para o Dr. Frederico, na madrugada, falando: "Inexplicavelmente, eu estou grávida". Mas muitas mulheres não passam pelo milagre que eu passei, não têm essa graça. E o que eu vejo hoje: as mulheres nem sequer têm acesso a um medicamento adequado para o alívio da sua dor. Ela procura o SUS, gente, e ela não consegue tomar, às vezes desesperadamente, nenhum medicamento que lhe dê a chance de pelo menos continuar trabalhando ou continuar estudando. Tem mulheres que já chegaram para mim e falam: "Eu preciso de morfina quando eu estou menstruada, mas eu chego no SUS e não consigo isso". Então, além de não existir nenhum fluxo - pelo menos eu desconheço - adequado para garantir qualidade de vida, um centro que garanta a essa mulher um tratamento de dor crônica, um diagnóstico ou, então, uma videolaparoscopia antes, pelo menos, de dois anos, o que a gente vê são mulheres que passam três, quatro anos tentando fazer uma videolaparoscopia, mulheres ainda, no Norte, no Nordeste, que recebem o conselho de tirar o útero para o alívio da sua dor. |
| R | E eu, depois que engravidei, procurei o Dr. Frederico e falei: "Agora eu quero tirar o útero". E ele falou: "Não adianta, a endometriose está fora do útero". Então até eu mesma, que já entendo dessa doença e sou uma paciente, ainda tinha no meu imaginário que depois da gravidez eu pudesse tirar o útero e ficar livre da endometriose, mas isso infelizmente não acontece. E aí eu queria trazer, Senadora, para esta reflexão aqui, para esta audiência pública, primeiro, que, depois de tantos anos enfrentando essa doença, para mim é de grande emoção ver o Senado Federal, felizmente e finalmente, discutindo essa temática, que assola mais de 10 milhões de mulheres, que não têm perspectivas. Tem mulheres que estão incapacitadas. Eu tenho uma sobrinha que, com 21 anos de idade, estava praticamente perdendo todo seu curso de Medicina, porque ela estava incapacitada, todo mês tomando morfina. Felizmente, ela tem um plano de saúde para receber esse medicamento. Tem mulheres que estão desesperadas, que já perderam o sonho da maternidade. E o que a gente vê de avanço no SUS? Nenhum avanço. Então o que eu quero trazer aqui de reflexão é que, mais do que nunca, a gente precisa de um SUS que realmente chegue a tempo até essa mulher. Essa mulher não pode passar dois, três, quatro anos atrás de um diagnóstico. A conscientização... Quantos médicos há ainda - desculpe-me a classe médica - que não investigam, que tratam como se fosse uma simples cólica e mandam a paciente embora, para tratar como se fosse uma cólica. Nem sequer cogitam a possibilidade de ser endometriose. Foi o que aconteceu comigo: eu passei por seis médicos aqui em Brasília, na capital federal, e nenhum deles sequer cogitou ser endometriose. Eu tive a oportunidade de ir para um Pinotti da vida, mas e as que não têm? Então é isto: trazer a conscientização, para essas meninas que precocemente já vivem esses sintomas, de procurar ajuda; de que não é normal você ter essa cólica intensa, dor pélvica, os problemas intestinais que vêm com as aderências, os problemas para urinar também, tudo isso; da questão de não conseguir ter filho e também de o médico nem sequer cogitar ser endometriose, tratar de tudo, menos de endometriose, Senadora; e mais, da qualidade de vida para essas mulheres que têm endometriose. Ninguém aguenta viver com dor. Casamentos, como a senhora falou, se acabam, porque o homem não consegue, tem determinado momento em que ele acha que é mi-mi-mi. Tem homem que não consegue, ele procura sua mulher e ela fala: "Não aguento, porque eu tenho muita dor". Então o casamento acaba, a qualidade de vida dessa mulher acaba. O patrão também não entende todo mês ela faltar ao trabalho porque está com dor intensa, a faculdade também não espera por essa mulher. Enfim, qualidade de vida, respeito, conscientização, estrutura pública, pelo menos medicamento para dor para essa mulher com endometriose. Muito obrigada, Senadora. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Ministra Cristiane. A Ministra Cristiane me sucedeu no ministério. Enquanto Ministra da Mulher, o nosso gabinete recebia muitas visitas, Doutores, de grupos de mulheres pedindo mais políticas públicas para as pacientes com endometriose. Eu avisei aos senhores, no início, que eu estou relatando o Projeto de Lei 1.069, de 2023. Ele nasce na Câmara, de autoria da Deputada Dayany Bittencourt, do Ceará. Esse projeto, Doutores, institui diretrizes básicas para a melhoria da saúde das mulheres com endometriose e faz, inclusive, uma alteração na Lei Orgânica da Saúde. |
| R | Eu estou preparando o relatório, e acreditem que os encaminhamentos, as discussões desta audiência, também serão usados para a confecção do meu relatório. Se nós vamos ter uma lei que institui diretrizes básicas, que seja uma lei que atenda a todas as mulheres, eu estou aqui, inclusive, disposta e disponível para receber sugestões para essa diretriz básica que nós vamos instituir por força de lei. E por que a Deputada entra com projeto de lei? Nós temos políticas públicas, mas muda o governo, as políticas públicas são modificadas. Quando a gente tem uma política pública instituída por lei, o governo que entrar é obrigado a cumprir. Então, tem muitas propostas tramitando para instituir políticas públicas no Brasil, aqui, nesta Casa e na outra, que são para garantir a continuidade do programa, que são para garantir o atendimento de todos, independentemente do governo que está no poder. Então, estou relatando o Projeto de Lei 1.069. Transmito um abraço à Deputada Dayany Bittencourt pela iniciativa. E está na Comissão de Direitos Humanos. Vai passar logo? Daqui ela vai para outra Comissão, depois para outra, depois para o Plenário. Se houver modificação no Senado, volta para a Câmara. Então, entendam que nós não vamos, possivelmente, ter uma lei imediata, mas quem sabe desta audiência pública - a Secretaria preste atenção - não saia um encaminhamento de urgência a esse projeto de lei, e a gente estabeleça, com urgência, as diretrizes básicas? Dra. Cristiane, obrigada pela sua participação. Nós vamos ouvir agora três médicos na sequência. Entre as perguntas que chegaram para nós, eu vou ler as perguntas, doutores. Se os senhores quiserem usá-las para nortear a fala dos senhores também... Jéssica, de Minas Gerais, diz o seguinte: "Muitas mulheres com endometriose enfrentam infertilidade, mas não têm acesso à fertilização in vitro por falta de recursos. Como garantir esse direito?". Emanuela, do Distrito Federal: "Exames diagnósticos e tratamento humanizado e multidisciplinar no SUS. Possibilidade de histerectomia pós-diagnóstico". Augusto, da Bahia: "Pacientes com [é legal homens participando do debate] endometriose sofrem com dor crônica. O acesso a medicamentos de controle da dor deveria ser incluído nas políticas do SUS". Alberto, de São Paulo: "Assim como é obrigatório tomar vacinas, deveria ser criada uma agenda onde as mulheres sejam anualmente cuidadas e ouvidas". Dandara, do Distrito Federal: "Já que a endometriose pode ter vários estágios e sintomas, existe algum protocolo para o atendimento dessas mulheres?". Luísa, do Ceará: "Como garantir atendimento humanizado pelos profissionais de saúde para mulheres com endometriose que não desejam ter filhos?". Totalmente contrário do que você disse. A senhora queria, Ministra, manter o útero, ter tratamento para ter filhos, mas tem mulheres que estão em sofrimento e não querem ter filhos. Como garantir atendimento humanizado para elas? Milena, do Paraná: "Há propostas para evitar desinformação acerca da influência de certos alimentos no desenvolvimento da doença, por exemplo, glúten?". E Glacir, do Rio Grande do Sul: "De que forma os mitos e tabus sobre a menstruação e a dor menstrual impactam o reconhecimento da endometriose como uma doença grave?". Inclusive, vou dizer para algumas mulheres: não é falta de fé; é endometriose. Na sequência, nós vamos ouvir o Dr. Eduardo Schor, Presidente da Sociedade Brasileira de Pesquisa e Ensino em Medicina. Dr. Eduardo, muito obrigada. O senhor tem dez minutos, mas já percebeu que eu sou generosa, né? |
| R | O SR. EDUARDO SCHOR (Para expor.) - Obrigado, Senadora. Obrigada pelo convite e pela honra de poder estar aqui defendendo, falando em nome de milhões de mulheres com endometriose. A senhora comentou e agradeceu o tempo precioso que a gente dedicou para estar aqui, e este tempo aqui vale ouro. É mais precioso do que o meu tempo em algum outro lugar neste momento. Estou há 30 anos no serviço público, Hospital São Paulo, Unifesp, Escola Paulista de Medicina, exclusivamente no ambulatório de endometriose, do qual sou Coordenador. Essa história que a Cristiane contou eu acompanho todo dia há 30 anos. Não é uma coisa nova e não é uma coisa velha; é uma coisa velha que se mantém até hoje. Então, é muito bom estar aqui falando com vocês. Uma boa-tarde a todos os ouvintes, presentes ou online. Eu acho muito importante isto: começar a falar, pensar e debater endometriose. Tem milhões de mulheres sofrendo por aí. O que é que a gente pode fazer? Eu costumo dar uma aula de diagnóstico, aulas em congressos médicos, e aí eu menciono a demora no diagnóstico da doença. Isso é um problema mundial, não é um problema de saúde pública brasileiro. É de sete a dez anos. Por quê? Nessa aula, eu ponho, depois, um eslaide grande e falo assim: "Onde estamos errando no diagnóstico?". E as pacientes... Eu escuto essa história, Cristiane, como aconteceu com você, no público e no privado. É semelhante. Volto a dizer que não é um problema exclusivo de saúde pública, SUS. E eu falo para as pacientes que o problema... Elas perguntam: "Onde está o problema? Por que é que isso aconteceu? Por que eu levei tanto tempo? Por que eu passei por diversos médicos?" - como a Cristiane mencionou -, e eu costumo falar que o problema está dos dois lados da mesa. As mulheres e o entorno - famílias, às vezes parceiros, amigas - procuram normalizar a cólica menstrual. E muito médico, infelizmente, não valoriza o sintoma. E, aí, perde-se o diagnóstico. As palavras "cólica" e "menstrual" estão ligadas à mulher. Então, muita gente acha, de forma errada, que isso faz parte do universo feminino, que mulher nasceu para ter cólica. Está errado! Infelizmente, a gente vive numa sociedade estruturalmente machista. Então, patrões, colegas, maridos e afins acham que é normal, acham que é mi-mi-mi, acham que... Então, tem que ser feita alguma coisa. E a Senadora Damares falou que a gente está aqui para discutir direitos. Quais são os direitos dessas mulheres? Primeiro direito fundamental: saber o que ela tem, saber por que ela sofre, saber que não é mi-mi-mi, saber que não é psicológico. Ela tem que saber, e o entorno dela tem que saber. Então, esse é um direito fundamental. É aí que começa a história. Digo isso porque, fazendo o diagnóstico precoce, dando esse direito para as mulheres, empoderando mulheres e os médicos que atendem a essas mulheres também, a gente vai ter o diagnóstico precoce e impedir que a doença evolua em grande parte dos casos. Impedindo que a doença evolua, a capacidade de tratamento medicamentoso, não cirúrgico, de sucesso é muito maior, a capacidade de gestação espontânea é muito maior, e o SUS... E eu falo isto no privado e falo no público também: a gente, como médico, tem que garantir o direito de ela ter filho. Se ela vai ter ou não, é uma decisão dela, mas essa decisão não pode ser da endometriose. |
| R | Então, a nossa obrigação, como médico, é esta, deixar tudo certinho, para que ela resolva se ela quer ter um, dois, três, se ela não quer ter nenhum. Isso é ela que vai resolver. Mas, infelizmente, a gente vê ainda muito colega médico, quando faz o diagnóstico de endometriose, dizendo "você tem que engravidar, senão você não vai conseguir nunca", e a menina tem 25, 27 anos, não tem namorado, não tem noivo, está nem pensando em engravidar. E desde quando gravidez é receita médica? Filho é muito importante para ser uma prescrição médica. Então, isso está errado também. Então, ela tem direito de saber o que ela tem, de ter informações sobre o que ela tem, e, depois disso, ela tem direito ao tratamento, à melhora de qualidade de vida. Ela não pode viver com dor durante toda a vida reprodutiva dela, toda a vida menstrual. Tem como ser feito isso, seja com medicação, seja com cirurgia. A gente tem uma tese que foi defendida, que eu orientei dois anos atrás, na Escola Paulista (Unifesp), que procurou avaliar a eficácia do tratamento medicamentoso. Isso, em mulheres com endometriose profunda, ou seja, avançada. Setenta a oitenta por cento dessas mulheres melhoram, retomam a qualidade de vida. Então, se eu tenho um diagnóstico possível de ser feito em atenção primária à saúde, e o diagnóstico é eminentemente clínico, eu não preciso de uma ressonância magnética, de um exame especial caro para fazer o diagnóstico, é um bate-papo do médico com a paciente, é um exame ginecológico bem feito. O diagnóstico da Cristiane, como ela mencionou, foi feito no exame ginecológico. Então isso é possível. O tratamento clínico é com medicação simples. Pode ser contraceptivo, progestágeno, mas dá para ser feito em atenção primária à saúde. Então minha grande briga, há 30 anos, e eu falava isso em congressos médicos, endometriose é uma doença para ser tratada no seu consultório, porque 40 anos atrás, havia o conceito de que o diagnóstico da doença era eminentemente cirúrgico. Precisava de uma laparoscopia para fazer uma biópsia e dizer que é endometriose. O que foi que isso fez? Fez com que toda a suspeita de endometriose caísse no colo dos laparoscopistas. Eu me incluo entre eles. Mas eu comecei a abrir isso aí há 30 anos. Eu falei assim: "É para tratar no consultório". Mioma todo médico trata, ginecologista trata no consultório. Não precisa ser um especialista em mioma. Por que é que precisa ser um especialista em endometriose? Então, eu acho que uma das saídas para que isso comece a acontecer é a gente instrumentalizar a atenção primária de saúde a fazer o diagnóstico clínico, fazer o tratamento clínico. Obviamente, quando não funciona, quando não tem objetivo, ou sucesso, vai para o terciário, mas isso não acontece hoje. Eu trabalho num terciário, e, assim, a fila para operar endometriose... Toda que vai para a fila para operar é porque não respondeu à medicação. Três anos. Três a quatro anos. E, se ela vai para a fila, é porque não respondeu à medicação; se não respondeu à medicação, é porque ela tem dor. Então, ela fica três a quatro anos na fila. Eventualmente, morfina e pronto-socorro, aquelas que têm acesso, mas não é toda mulher que pode, de repente, de madrugada, acordar com dor e pegar o carro e ir ao pronto-socorro e receber morfina. A gente sabe que não é assim. Então, mulher tem direito a isso também, é o tratamento adequado, e tudo isso pode ser feito no Centro de Atenção Primária à Saúde. Basta instrumentalizar os médicos para fazerem isso. |
| R | Não precisa de aparelho, não precisa de exame caro, não precisa de nada; só de uma mesa e de duas cadeiras. Então, a gente consegue fazer isso. Eu, como representante de universidade federal, e acredito que várias outras universidades federais, a gente tem capacidade de fazer essa força-tarefa. Basta haver demanda pelo Sistema Único de Saúde. É aumentar o arsenal terapêutico? Também tem que se aumentar. O tempo da laparoscopia diagnóstica foi 1980, em que a gente olhava, fazia uma biópsia via e era endometriose. De 1980, a técnica cirúrgica para endometriose, até hoje, se fez assim - nós estamos num robô. O tratamento medicamentoso para a doença continua aqui; o diagnóstico da doença continua aqui. Então, tem um desalinho entre o que pode ser feito. É óbvio que a gente não vai conversar sobre robô em atenção primária à saúde primária, no SUS, mas a gente tem o que fazer. Se a única solução para essas mulheres fosse uma cirurgia com robô, tudo bem, vamos brigar por isso. Mas não; a gente tem uma solução mais fácil, mais barata, mais prática, para devolver a qualidade de vida dessas mulheres. E, hoje em dia, eu tenho o prazer de poder coordenar um ambulatório de endometriose onde eu tenho nutrição, uma nutricionista, uma fisioterapeuta, uma psicóloga, enfermeira e acupunturista. Então, esse é o atendimento ideal. E saliento: todas que trabalham lá trabalham absolutamente sem nenhuma remuneração. Não são contratadas pela universidade, pelo ministério, nada, mas estão lá, dando gás, para ajudar essas mulheres. E já se sabe que, hoje, o atendimento multidisciplinar é importantíssimo para devolver a qualidade de vida. Não basta olhar a endometriose, olhar aqueles focos de endometriose na pelve, ir lá e tirar, de uma forma cirúrgica, brilhante. Se a gente não olhar a mulher como um todo, vai diminuir a chance de sucesso do tratamento. Quando a cirurgia é indicada, ela é uma das ferramentas, mas eu tenho que ver a mulher como um todo. Então, colocar esse tipo de profissional por dentro da endometriose, instrumentalizar esse tipo de profissional - nutricionista, fisioterapeuta, psicólogo -, para atender a essas mulheres também vai ajudar muito. Então, Senadora, desculpe-me, mas eu me empolgo muito. Fico meio irritado quando eu vejo essas mulheres, na minha frente, que a gente pode ajudar, mas não consegue. Muito obrigado. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Fantástico, Doutor. Fantástico. Para quem está ligando a televisão agora ou acessando as nossas redes, acabou de falar o Dr. Eduardo Schor, Presidente da Sociedade Brasileira de Pesquisa e Ensino em Medicina, que nos trouxe aqui uma aula, mas nos trouxe uma aula com o coração também. Destaco, na sua fala, Doutor, exatamente o que a Milena, do Paraná, falou: "Há propostas para evitar desinformação acerca da influência de certos alimentos no desenvolvimento da doença [...]?". Isso quer dizer que não é só o ginecologista, e o senhor tem um grupo multidisciplinar. Então, eu acho que vou ter que trazer isso para a minha relatoria do projeto: não é só o ginecologista; tem os demais profissionais. O senhor falou do fisioterapeuta, e eu ouso falar que eu acho que vamos ter que ter um psicólogo junto. Essas mulheres chegam tão machucadas, essas mulheres chegam tão destruídas... Quando eu falei a frase - e olhei ali para a minha assessora Cíntia - "não é falta de fé, é endometriose", é na igreja que elas buscam cura, ou no terreiro, ou nos curandeiros, e, às vezes, não são curadas das dores porque não têm fé. Não é falta de fé; é endometriose. |
| R | É na igreja que elas buscam cura, ou no terreiro, ou nos curandeiros, e, às vezes, não são curadas das dores porque não têm fé. Não é falta de fé; é endometriose. A igreja podia ser um espaço de informação também. Por que não trazer a sociedade civil para esse espaço de informação? Para quem está nos acompanhando, quero lembrar que hoje é o Dia Mundial da Saúde e que esta Comissão está na segunda audiência pública em comemoração e celebração ao Dia Mundial da Saúde. Hoje pela manhã nós discutimos as doenças raras: direitos, diagnósticos, encaminhamentos. Agora à tarde, como esta Comissão também discute os direitos da mulher, nós estamos dedicando este debate a discutir o direito das mulheres com endometriose. É um debate inédito nesta Comissão e esse debate está sendo feito em parceria com a Comissão de Assuntos Sociais do Senado. Dr. Eduardo, muito obrigada. Na sequência, vamos ouvir o Dr. Jean Pierre Barguil Brasileiro, médico da Secretaria Estadual de Saúde do DF e Diretor do Instituto Verhum Videoendoscopia e Reprodução Humana. Dr. Jean, muito obrigada por estar conosco. O SR. JEAN PIERRE BARGUIL BRASILEIRO (Para expor.) - Boa tarde a todos. É com imenso prazer que estou aqui hoje para conversar um pouco com todos vocês, Senadora Damares, senhoras e senhores, profissionais de saúde e demais representantes da sociedade civil. Eu queria ler, Senadora Damares, porque eu acho que é importante o que eu tenho para falar e eu não queria perder nada da minha fala. Hoje nos reunimos para dar voz a milhões de mulheres que convivem em silêncio com uma doença invisível, mas devastadora, que é a endometriose. A endometriose não é uma doença da moda. Ela é antiga, ela é silenciosa, é negligenciada no seu dia a dia, mas, hoje, menos invisível que anteriormente. Sabemos que é uma condição que atinge uma em cada dez mulheres, quer dizer, uma em cada dez mulheres em idade reprodutiva tem endometriose, uma doença que rouba a sua qualidade de vida, que compromete a sua saúde mental, interrompe sonhos de maternidade e ainda segue cercada por tabus, negligências e desinformações. Sabemos que é a doença dos seis "d", que são: dor da cólica, que é a dismenorreia; dor pélvica; dor ao defecar, que é a disquesia; dificuldade para engravidar; dor para ter uma relação sexual. Enfim, são vários "d" mostrando o que é uma endometriose. Nós estamos aqui tentando romper realmente esse silêncio, Senadora Damares. A endometriose é uma doença ou ela é uma questão apenas social? Reafirmamos que a doença não é normal, ter dor não é normal. Dor não é mi-mi-mi, dor não é ser esquisita no seu ambiente de trabalho. O que não é aceitável é esperar sete, oito, dez anos por um diagnóstico. Que nenhuma mulher deva ser chamada de exagerada, de fraca ou de instável por sentir dor incapacitante. E o que diferencia uma dor de cólica de uma dor da endometriose? A dor da cólica você pode ter todo mês, a mulher pode ter dor de cólica mensalmente, mas daquela dor que é incapacitante, como daquela menina jovem que tem dor, que não consegue ir à aula, que falta ao exercício, a gente tem que prestar atenção a esses pequenos detalhes. |
| R | E qual é o papel do Estado no enfrentamento dessa doença? E o dos convênios, também, na parte privada? Nós reivindicamos aqui o que é básico, o que é justo, o que é de direito para as mulheres: direito ao diagnóstico precoce e qualificado, com acesso a exames especializados no sistema público e também no privado, seja ela a ecografia transvaginal com preparo intestinal, seja ela a ressonância magnética também com preparo intestinal; direito ao tratamento completo e humanizado, incluindo medicamentos, cirurgias quando necessárias, suporte psicológico e também reprodutivo. No nosso DF, nós temos um serviço gratuito para as mulheres que necessitam de uma reprodução assistida e lutamos diuturnamente, há muitos anos, por aparelhos mais sofisticados, com tecnologia para tratar a parte cirúrgica da endometriose. E o nosso Brasil como está? Como se comporta hoje? Nós estamos falando da capital do nosso país. Reivindicamos direito à informação, para que toda menina e mulher saiba que dor pélvica intensa, sangramento anormal e infertilidade não devem ser ignorados. Eu sempre falo: "O que nós devemos, o que nós podemos fazer para incluir isso nas mídias, nas empresas, nas escolas? Como fazer?", ou "Precisa fazer, incluir isso nos nossos livros escolares para que todo mundo possa ter acesso a essa informação desde cedo". Isto é uma coisa que eu sempre questiono: a gente tem tantas outras informações, às vezes não tão interessantes para nossas crianças, e um assunto tão sério não é colocado nos nossos livros escolares. Reivindicamos direito à dignidade no trabalho com acolhimentos e políticas que respeitem as limitações impostas pela doença; e direito ao sonho da maternidade com acesso a técnicas de reprodução assistida quando houver comprometimento da fertilidade. Tudo isso não é um pedido; é uma exigência de justiça, de humanidade e de reparação histórica que nós vivemos. Eu sou representante da parte da endometriose no serviço público do Distrito Federal e sei o quanto nós sofremos para colocar um serviço multidisciplinar no nosso serviço público, seja com proctologistas, seja com psicólogos, seja com nutricionistas, seja com psicólogos... É extremamente difícil! É hora de tirar a endometriose da invisibilidade, é hora de garantir orçamento, protocolo, acesso e voz a esse tipo de situação, porque as mulheres com endometriose não querem piedade; elas querem respeito, querem cuidado e querem ação. Quando foi falado anteriormente, Senadora Damares, quanto à paciente que quer fazer uma histerectomia, não é que ela deseje fazer uma histerectomia, é porque ela não aguenta mais de dor e ela acha que tirar o útero é a solução do problema, porque toda vez que ela menstrua ela tem dor insuportável. E nós estamos realmente negligenciando neste momento, porque são outros os tratamentos. Como disse o Prof. Schor, tem outros caminhos a serem seguidos, muitos mais sérios e simples, talvez, porque uma sociedade que cuida da dor feminina é uma sociedade mais justa, mais empática e mais saudável para todos. |
| R | Eu sempre falo para todas que vieram antes desse silêncio em que nós vivemos, por todas que sofrem atualmente de endometriose, por todas que ainda virão depois. Debater é o primeiro passo para transformar. Mobilizar é o caminho para garantir diagnóstico e dignidade para essas pacientes. E ouvir as mulheres é o único jeito de fazer justiça com elas. Estamos juntos aqui nesse manifesto, não só pela vida, mas pela saúde e pela dignidade dessas mulheres que são afetadas e que sofrem o tempo todo com essa bendita endometriose. Meu muito obrigado. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Uau! Dr. Jean, fantástico! O senhor resumiu aí, acho, que tudo que a gente queria ouvir. Mas eu vou fazer um destaque na sua fala: as campanhas, a escola. Se uma adolescente tiver informação disso lá na escola... Será que a Cristiane teria sofrido tanto se a escola tivesse falado para ela quando ela era adolescente? E nós temos no Brasil o Março Amarelo, que é um mês inteiro dedicado à campanha sobre conscientização da endometriose. Quem sabe nesse projeto de lei aqui a gente não institui oficialmente esse Março Amarelo? Porque eu não tenho certeza se ele foi instituído por lei. A gente instituindo o projeto de lei... Porque, quando a gente institui oficialmente, a escola, lá na ponta, vai ter que falar; as instituições terão que falar; o teatro vai ter que falar; vai ter que ter um cartaz no ônibus; a prefeitura vai ter que falar. Então, informação é tudo - acho que o senhor trouxe aí: por que não está isso nos livros didáticos? Por que não está essa informação acessível aos jovens cada vez mais cedo? O SR. EDUARDO SCHOR - Poderia só fazer um comentário, Senadora? A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Pode sim. O SR. EDUARDO SCHOR - A gente tem hoje um debate muito grande sobre educação sexual na escola. Tudo bem, mas precisa ter também ensino de educação menstrual. Quer dizer, volto ao machismo estruturado. Quer dizer, tem que ter esse tipo de educação. O aconselhamento dessa jovem sobre menstruação com dor, irregular, é com a mãe, que às vezes não tem o conhecimento necessário, ou tabus entre as amigas. Então, isso também é uma coisa importantíssima. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Fantástico! Mais uma anotação para o meu relatório do projeto de lei. Eu quero registrar a presença de Adriana Ferreira, que é do Instituto Menopausa Feliz. A Adriana está me desafiando a discutir a menopausa feliz nesta comissão, que é a Comissão das mulheres. Inclusive autora do livro Menopausa Sem Medo. (Intervenção fora do microfone.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - O.k., mais um. Você me deu um outro, o outro eu não tenho. Registro a presença de Priscila Lima Machado, Presidente da Comissão de Direito Médico e da Saúde da OAB Águas Claras. Ela está sempre com a gente. Dra. Priscila, obrigada, obrigada! Ajude-me a escrever o relatório, Dra. Priscila? -; Herika Rodrigues, Instituto Lado a Lado pela Vida. Cadê a Herika? (Pausa.) Obrigada, Herika, pela presença. Olhem as instituições aqui representadas: Ana Chacel, Uriel Rodrigues e Cleonice Paixão, os três representantes da Subsecretaria da Mulher; Luana Malta, a Secretária da Mulher do Distrito Federal - um abraço na Giselle, um abraço na Luana. A Secretaria é sempre presente! E aí, eu desafio: o Março Amarelo no ano que vem, juntos! Leve o desafio para a Secretária. Vamos colorir o DF de Amarelo no mês de março, ano que vem. Ana Paula Batista, da Associação Nacional Movimento Ostomizados do Brasil - Ana Paula, obrigada pela presença, pela participação. E, claro, não poderia faltar e está aqui conosco a nossa querida Cosete Ramos Gebrim, da AMA. É a líder do Movimento Brasília Capital da Felicidade essa mulher linda e incrível que nos desafia todos os dias a transformar Brasília na capital da felicidade. |
| R | Obrigada por estar conosco! É uma mulher com uma história incrível, na luta pelos direitos da mulher. Na sequência, nós vamos ouvir agora o Dr. Norberto José Maffei Junior, médico ginecologista e obstetra. Se algum dos nossos preletores precisar sair depois da fala, entendemos a agenda de um médico. Nós vamos entender. e os senhores estão liberados. Dr. Norberto José Maffei Junior. O SR. NORBERTO JOSÉ MAFFEI JUNIOR (Para expor.) - Primeiro, Senadora Damares, é uma honra estar aqui nesta Casa hoje, podendo discutir um assunto tão importante, que são os direitos das nossas mulheres - milhões! - com endometriose. Eu queria fazer dois agradecimentos. Primeiro, à Adriana Ferreira, do Menopausa Feliz, que indicou meu nome até aqui, e, segundo, à 42ª Turma de Medicina da Universidade Estadual de Londrina, turma onde me formei, onde eu tenho muito mais que amigos, eu tenho uma família. Em momentos em que eu precisei muito, eles estavam lá. Se não fosse por eles, talvez eu não estivesse aqui hoje. Quando nós falamos de endometriose, temos que lembrar de algumas coisas. A primeira é que nós não temos prevenção de endometriose. A gente não conhece ainda sequer todos os mecanismos que fazem com que uma mulher tenha ou não endometriose, mas nós sabemos que o diagnóstico precoce é fundamental para evitar as complicações da endometriose. Dentre essas complicações, há uma vida de dor, de sofrimento e de infertilidade, de esterilidade. E nós falamos de quantas mulheres? Nós sabemos que 10% a 15% de todas as mulheres em idade fértil podem ser acometidas pela endometriose. Se nós formos muito conservadores, nós estamos falando de mais ou menos 5 milhões de mulheres aqui no Brasil - sendo muito conservadores. Então são 5 milhões de mulheres jovens, principalmente entre 25 e 35 anos, que estão sofrendo todos os meses, desde a sua primeira menstruação, desde a sua menarca. E esse sofrimento não é só pela dor, é pela incompreensão. É como a Cristiane falou aqui. Ela ouviu que ser mulher é assim mesmo; que ela é fraca; que, depois que ela se casar, vai melhorar; que, depois que ela tiver um filho, ela vai melhorar; que, se ela não consegue manter as relações pela dor, ela precisa relaxar, quem sabe tomar um vinho. E ela ouviu isso de quem? Das pessoas em quem ela confiava e que deviam dar apoio: da mãe, da tia, da amiga e - o pior de tudo, Dr. Schor - dos médicos. Nós sabemos que ainda hoje essa é uma realidade. Cristiane, em números europeus, uma mulher leva, como o Dr. Schor já disse, de oito a dez anos e passa por quatro médicos para conseguir um diagnóstico de endometriose. Nós não temos esses números aqui no Brasil, nós não temos essa pesquisa, mas eu tenho quase certeza de que esse número é ainda maior. A Adriana me mandou dois documentos. O primeiro é Endometriose Brasil, e, o segundo, o Projeto de Lei 1.069, de 2023, de que a Senadora Damares falou aqui. Ela me mandou num domingo, e eu não li no dia. Na terça-feira, eu cheguei do meu consultório e falei assim: "Bom, deixa eu dar uma olhada no que está para trás". Quando eu terminei de ler, eu peguei o meu telefone e mandei uma mensagem para ela na hora. Por quê? Endometriose Brasil faz mais ou menos o que o Dr. Eduardo Schor falou aqui: primariza o diagnóstico e o tratamento da endometriose. Ele treina desde o médico do postinho até o agente comunitário de saúde. Isso é fundamental. Nós temos que tirar isso da mão do médico ginecologista especialista em endometriose. Não pode ser assim. |
| R | Sobre o Projeto de Lei 1.069, eu falei com a Adriana: "Adriana, isto aqui é tudo o que nós médicos que atendemos pelo SUS queremos e o que as pacientes com endometriose precisam". Aqui, nós temos garantidos o diagnóstico, o tratamento, o tratamento multidisciplinar, que é muito importante: nós precisamos do psicólogo, nós precisamos do nutricionista, nós precisamos do fisioterapeuta pélvico, nós precisamos do educador físico. Boa alimentação, exercícios regulares, tratamento da parte emocional e psicológica dessa mulher são pontos fundamentais. E tudo isso está neste projeto de lei. Isto aqui é do que nós precisamos. Eu não saberia o que mais eu poderia colocar, na minha visão como médico que está trabalhando ali na linha de frente. E a Adriana falou o seguinte para mim: "Norberto, é exatamente por isso que você vai lá. Você vai para dizer o que você, como médico do SUS, tem e o que falta. Então, nós vamos discutir isso". Eu sou do Estado do Paraná, um estado rico. E o que eu tenho no meu ambulatório do SUS, seja na prefeitura que eu atendo, seja no ambulatório da Universidade Estadual de Londrina? Eu tenho à minha disposição medroxiprogesterona, Ciclo 21, diclofenaco. E o que eu mais tenho lá é dor, sofrimento e frustração. Eu também atendo no meu consultório pacientes com endometriose. Eu tenho muito orgulho de falar que tudo o que eu faço dentro do meu consultório eu tento levar para os meus ambulatórios do SUS. Mas eu só tento, eu não consigo. Quando eu estou no meu ambulatório do SUS e eu prescrevo um dienogeste, um desogestrel, que custam, às vezes, R$20, R$30, R$40, boa parte das minhas pacientes não tem dinheiro pra comprar essa medicação. Às vezes, ela está lutando para ter comida na mesa. O Dr. Malavasi era para estar aqui e, infelizmente, não está. No ano passado, o Dr. Eduardo apresentou o Estudo Glade, que, de maneira brilhante, mostrou a eficácia da gestrinona do tratamento da endometriose, principalmente nos quadros de dor. Eu uso no meu consultório. Só que, quando eu vou usar no sistema público, se eu for usar um creme vaginal ou um strip oral, isso daí custa em torno de R$150 por mês. Se eu for usar os implantes, R$5 mil, R$6 mil por ano. Só que a minha paciente não tinha R$40 pra pagar o dienogeste. As minhas pacientes do consultório, praticamente todas aquelas que não estão em acompanhamento psicológico, são encaminhadas. São pacientes que chegam destruídas dentro do consultório. A Cristiane está aqui. Ela sabe como é. E a sua realidade, Cristiane, é a realidade das mulheres com endometriose, hoje, ainda. As minhas pacientes vão para o psicólogo. As minhas pacientes passam pelo nutricionista. As minhas pacientes passam pela fisioterapia pélvica, muito importante para a gente tentar melhorar o quadro de dor. As minhas pacientes são estimuladas a ter atividade física regular, a fazer exercícios físicos. Eu faço tudo isso no SUS, mas nem sempre eu consigo. Eu não tenho fisioterapia pélvica à minha disposição. Eu tenho nutricionista e psicólogo, mas eu tenho os do município, que são poucos para muitos pacientes. Eu não consigo dar o atendimento que eu gostaria. No meu consultório, eu uso muitos canabinoides, e eu tenho um resultado muito bacana, principalmente na dor e na ansiedade dessa paciente. Eu tento prescrever no SUS. Só que hoje um óleo vai custar R$500, R$600 - já foi R$1,8 mil -, e a minha paciente não tinha R$40 para comprar o dienogeste. Ela não pode ter isso. E se eu precisar de uma cirurgia em uma paciente? Não são todas as pacientes que precisam, isso tem que ficar claro, a gente tem indicações para a cirurgia de endometriose: a paciente que quer ser mãe; a paciente que tem alterações de anatomia, que tem lesões ali na bexiga, no rim, no ureter; as pacientes que têm lesões extensas de intestino; e as que não responderam ao tratamento clínico. |
| R | No meu estado, o Paraná, não existe nenhum serviço que faça esse tipo de cirurgia. E essa é a realidade da maior parte dos estados. Em São Paulo nós temos, mas temos poucos, Doutor, e o senhor sabe disso. A fila são três anos - isso das que vão para a fila - e as que não chegam à fila? Em 2021, eu fui fazer uma Pós-Graduação em Cirurgia Robótica, no Einstein, em São Paulo, e fiquei encantado com aquilo. Eu falei assim: "Não, eu vou levar isso aqui para quem não pode pagar". E eu passei três anos tentando. Eu tentei campanhas; eu tive até o apoio de um grande apresentador de televisão; depois, fui conversar com um Deputado Federal, e, infelizmente, por questões burocráticas a gente não conseguiu tirar o programa, mas eu não desisti, porque eu via que eu estava cada vez mais perto de conseguir. Até que, em 2023, um Deputado Estadual do meu Estado do Paraná me convidou para apresentar um projeto na Assembleia Legislativa. Semanas de preparação, em que eu conversei com o hospital, conversei com as equipes médicas, com ginecologistas, com urologistas e com cirurgiões do aparelho digestivo - porque a cirurgia não é só o ginecologista -, conversei com anestesistas, com fornecedores, conversei com Prefeitos que eu conhecia, para a gente conseguir espaço físico para montar um ambulatório, para a gente conseguir as outras especialidades, a psicologia, a nutrição, a fisioterapia pélvica... E, depois de algumas semanas, poxa, eu consegui tudo. E fui apresentar o meu trabalho na Assembleia Legislativa. Fui recebido na Comissão de Saúde e, poxa, foi um sucesso. A Comissão de Saúde aprovou, a Comissão de Direitos da Mulher aprovou, a Bancada Feminina da Assembleia Legislativa assinou o meu projeto - eu não lembro, mas acho que foram 18 Deputados. Depois de algumas semanas, sem nenhuma resposta, eu fui conversar com esses Deputados, que me falaram assim: "Olha, Norberto, agora não é mais com a gente. Isso daí agora está na mão da Secretaria de Saúde". E aí, como eu conheço o Secretário de Saúde, que é médico, e que é um Deputado Federal licenciado, peguei o telefone e liguei para ele: "Fulano, e aquele projeto?". "Ah, Norberto, eu não sei se é a hora". "Não, mas nós precisamos, nós não temos". "Não, Norberto, talvez eu faça em Curitiba". Eu falei assim: "Faz onde você quiser, Curitiba, Londrina, Cascavel, Maringá, mas vamos fazer". E a resposta dele foi que isso não era de interesse do estado. E essa resposta, Senadora, me quebrou. Essa resposta tirou o meu ânimo. Eu parei até de falar nas minhas redes sociais de endometriose, porque a dor e o sofrimento das mulheres com endometriose não era importante para o estado. O meu trabalho não era importante para o estado. Eu não tinha mais o que fazer. Até que, em 2024, no My Pausa, eu assisti a uma palestra de uma mineirinha arretada, que falou muito, que colocou o dedo na ferida, que é a Adriana Ferreira. E quando ela terminou, eu fui lá falar com ela. Falei do que eu sentia, falei dos meus projetos, das minhas frustrações e da minha desistência. E ela falou assim: "Não, Norberto, você não vai desistir. Nós falamos por quem não tem voz. Você vai dar um jeito de arrumar sua energia, e nós vamos voltar a fazer isso, porque, se nós não fizermos, a gente não vai conseguir". E ela falou o seguinte: "Nós vamos fazer coisas muito grandes". |
| R | E é por isso, Senadora, que hoje eu estou aqui nesta Casa. É por isso que eu fechei o meu consultório, é por isso que eu cancelei cirurgias, é por isso que eu peguei um avião, cheguei aqui, porque aqui nesta Casa existe o poder de mudar a realidade; existe o poder de mudar vidas. No art. 196 da Constituição, Senadora, está escrito que a saúde é um direito do cidadão e um dever do Estado. Tanto nós, médicos, como o Estado, estamos falhando miseravelmente com as mulheres com endometriose. No art. 196 da Constituição está escrito o seguinte, que a mulher com endometriose tem o direito de ser acolhida, de ser respeitada, de ser diagnosticada e de ser tratada. Também está escrito que esta Casa, o Senado, como representante do Estado, tem o dever, não só constitucional, mas moral, de provar, não para mim, não para o Dr. Schor, não para a Adriana, mas para os mais de 5 milhões de mulheres, que a vida, a dor e o sofrimento delas importam, sim. Muito obrigado. Pedrinho e Carol, papai ama vocês. Turma 42 Nutella, estamos aqui. (Risos.) (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Dr. Norberto, na verdade a sua fala foi um soco no estômago do Legislativo, mas foi desafiadora também. Não desista. O SR. NORBERTO JOSÉ MAFFEI JUNIOR (Fora do microfone.) - Não vou desistir. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Não desista. A gente instaura hoje um novo ciclo no debate sobre a endometriose no país, e o senhor está fazendo parte deste ciclo, agora, deste novo momento. Às vezes, a gente não entende... Eu sou religiosa e eu não posso deixar de falar de Deus, é difícil eu deixar Deus lá fora, ele está aqui. Tem gente que fala: "Deixe Deus lá fora, não fale porque o Estado é laico". Impossível, mas eu acredito que tem pessoas que nascem para missões, e em alguns momentos eu me perguntei: por que sou Senadora? Eu não queria ser Senadora, e disseram: "Vai lá, sai candidata que você ganha". Eu acreditei e ganhei. Eu acho que eu tenho uma missão, e esta Comissão dá início a um novo debate sobre a endometriose no país, e o senhor vai fazer parte desta história, Doutor. Muito obrigada por estar aqui com a gente. Muito obrigada. Que Deus o abençoe. Na sequência, nós vamos ouvir o Dr. André Luís Malavasi Longo de Oliveira, Médico Assistente no Centro de Reprodução Humana da Divisão de Ginecologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Ele vai falar por meio de videoconferência e ele precisa sair correndo para uma cirurgia. Então, Dr. André Luís, muito obrigada por estar gastando esse seu tempo precioso com este debate, obrigada por estar conosco, mas eu vou provocá-lo. Josivan, da Bahia, está perguntando: "Existe alguma predisposição genética [para a endometriose]?". Já o provoco com essa pergunta. O senhor tem dez minutos ou o tempo que for necessário. O SR. ANDRÉ LUÍS MALAVASI LONGO DE OLIVEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Senadora Damares. Eu queria dizer que é uma honra, é uma grande responsabilidade estar aqui falando com a senhora, que teve essa iniciativa de grande nobreza. Quero cumprimentar a todos os colegas que estão na mesa, a Dra. Cristiane, o meu grande amigo Eduardo Schor, a Adriana, o Dr. Norberto, por quem eu tenho uma grande admiração. E, sim, Dra. Damares, existe uma predisposição genética para endometriose: basta ser mulher, as mulheres são as grandes vítimas da endometriose. |
| R | Toda pessoa que tem útero e que menstrua está de alguma forma predisposta a ter endometriose, uma doença muito prevalente... Claro, que existe uma predisposição - se a mãe dessa paciente teve endometriose, se a irmã dela tem endometriose -, nós sabemos que existem questões genéticas, questões ambientais envolvidas, mas o fato de a pessoa ser mulher já é uma grande candidata a ter endometriose. Isso explica a grande prevalência que nós temos nessa doença. Eu, durante dez anos, fui Vice-Diretor do Hospital Pérola Byington, aqui em São Paulo, um hospital que infelizmente hoje não existe mais e agora se transformou numa OS, chama-se Hospital da Mulher. Mas, no antigo Pérola Byington, nós tínhamos um volume muito grande de pacientes com endometriose nas suas formas mais severas. Como foi dito de forma muito enfática pelos colegas que me antecederam, como a endometriose é uma doença cujo tratamento cirúrgico dispende, necessita de uma equipe multiprofissional, de um cirurgião, de um ginecologista habilidoso, muitas vezes de um cirurgião do aparelho digestivo, de um proctologista, precisamos de um urologista, então são cirurgias caras, são cirurgias demoradas, são cirurgias que necessitam de um aparato de que a maioria dos centros públicos hoje não dispõe no Brasil. Identificando, então, essa grande demanda, esse grande volume de mulheres que sofriam de endometriose, com filas cirúrgicas longas, nós idealizamos, então, um tratamento clínico, um tratamento alternativo, que foi o implante de gestrinona. Fizemos um estudo, um estudo muito impactante, o estudo Glade, que está para se finalizar agora em maio, no qual nós colocamos o implante de gestrinona em mulheres com endometriose. Os resultados foram muito significativos, nós já tivemos oportunidade de ir ao Ministério da Saúde mostrar esse estudo e houve interesse por parte do Ministério da Saúde. E o estudo, agora, se mostrando realmente positivo, portanto com eficácia, existe interesse em trazer esta tecnologia para o Sistema Único de Saúde para que nós possamos trazer para as mulheres brasileiras mais uma alternativa de tratamento da endometriose para aquelas que não têm ainda indicação cirúrgica ou para aquelas que têm indicação cirúrgica, mas, por questões operacionais de logística de onde elas vivem, não há ainda a possibilidade de um tratamento cirúrgico imediato. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Dr. André, pela sua participação. É desafiadora a sua fala de que nós temos implante, e aí a gente ouviu o Dr. Norberto falar de robótica... Isso quer dizer que é possível a gente encontrar caminhos para fazer a vida dessas mulheres bem melhor. Obrigada, Dr. André, eu vou liberá-lo porque sei que você tem que ir correndo para o centro cirúrgico. Foi um prazer tê-lo aqui e nós vamos acioná-lo para a gente construir um relatório nesse projeto de lei e entregar para o Brasil uma política pública para que chegue em todos. O senhor falou que basta ser mulher. E eu tinha feito uma pergunta para o Dr. Eduardo Schor aqui ao meu lado: "Qual é a incidência entre mulheres indígenas?". E ele disse: "A gente não tem números, a gente não tem números". Mas imaginem uma mulher indígena numa área isolada, gritando de dor! Nós vamos, inclusive, fazer um requerimento de informação à Secretaria Nacional de Saúde Indígena. Primeiro encaminhamento, Comissão, um requerimento de informação sobre o registro de mulheres indígenas com endometriose. Eu lhe passo a palavra depois, Adriana, pode ser? (Pausa.) Nós, agora, estamos já inaugurando a segunda mesa. Eu quero chamar para a mesa - estamos todos ansiosos para ouvir - o médico que cuidou da Dra. Cristiane e é o responsável pela vinda do Flavinho para o mundo. Dr. Frederico José Silva Corrêa, ocupe esta mesa conosco. |
| R | O senhor troca de lugar com ele, Dr. Jean? O Dr. Jean está cedendo o lugar, e nós vamos fazer o seguinte, Dr. Frederico... Dr. Jean, obrigada. O Dr. Frederico é Diretor da Sociedade Brasileira de Endometriose. O que nós vamos fazer, Dr. Frederico? Todas estão na expectativa para ouvi-lo. Então nós vamos deixá-lo por último. Nós vamos ouvir agora a Coordenadora-Geral de Ações Temáticas e Diversidade da Secretaria Nacional de Articulação Institucional, Ações Temáticas e Participação Política do Ministério das Mulheres. Dra. Josilene, a senhora tem dez minutos. (Pausa.) Dra. Josilene, pode falar? (Pausa.) Está com problema de áudio? Então, nós vamos deixar a Dra. Josilene para depois. Ela consegue falar? (Pausa.) Problema no fone. Pode falar, Dra. Josilene. Consegue? (Pausa.) Não? Então, nós vamos ouvir agora, com muita expectativa, o Dr. Frederico José Silva Corrêa, Diretor da Sociedade Brasileira de Endometriose. Se depois da fala dele, a Dra. Josilene tiver condições de entrar, a gente devolve a fala para ela. Dr. Frederico, muito bem-vindo. Obrigada por estar aqui. O SR. FREDERICO JOSÉ SILVA CORRÊA (Para expor.) - Obrigado, Senadora. É um prazer enorme poder estar aqui discutindo esse assunto, esse tema tão relevante para a nossa sociedade. Eu parabenizo a Comissão, a senhora pela iniciativa e a Cristiane, que está aqui do meu lado, que sei, como minha paciente, que luta há muitos anos também pelas mulheres que têm endometriose e que sofrem com essa doença. Em 1999, eu era residente no Hospital Materno Infantil de Brasília, eu fazia residência em Reprodução Humana e atendi uma paciente que se chamava Juliana. Juliana tinha 33 anos de idade. A Juliana estava com dor crônica intensa e incapacitante há anos. A Juliana tinha acabado de terminar um casamento, porque não conseguia mais manter uma vida sexual conjugal saudável com o parceiro. A Juliana estava tentando ter filhos há quatro anos sem conseguir. A Juliana tinha sido demitida, porque todos os meses faltava o trabalho quatro, cinco dias, porque simplesmente não conseguia sair da cama. A Juliana, nesse dia, já estava em uso de terapia hormonal há alguns anos, e essa terapia hormonal não estava mais fazendo o efeito que nós desejamos, que é, no mínimo, reduzir a dor e o sofrimento dessa paciente e, se possível, acabar com essa dor. E a Juliana me disse, nesse dia, que ela estava a ponto de cometer um suicídio. Então eu quero dizer para os senhores, para toda a sociedade e para todo mundo que nos ouve que a endometriose, apesar de ser considerada cientifica e tecnicamente uma doença benigna, está matando aos poucos as mulheres portadoras dessa doença no Brasil. São 5 milhões, 6 milhões, 7 milhões de mulheres portadoras. A grande maioria não tem ideia de que tem essa doença. A mãe, o pai, a avó, a bisavó estão dizendo ainda para elas que a cólica menstrual faz parte da vida da pessoa que tem XX, que é mulher, como o colega acabou de relatar. Então nós temos um problema cultural, porque, dentro da própria casa daquela adolescente, as pessoas não acreditam que ela tem uma doença. |
| R | Eu atendi uma adolescente, certa feita, que, graças a Deus, conseguiu ter acesso a um exame, um diagnóstico, e concluiu-se que ela era portadora de endometriose. Naquele dia, ela e sua mãe estavam na consulta, ela pegou o exame, mostrou para a mãe, na minha frente, e disse para a mãe dela: "Eu falei para você, o tempo todo, que não era invenção minha; vocês nunca acreditaram em mim". Essa menina estava na escola com dor e ligava para a mãe, para poder voltar para casa, porque não conseguia nem sequer ficar na escola; e a mãe lhe dava uma bronca e a obrigava a ficar na escola, porque ela estava inventando uma dor para não assistir à aula. Então nós temos um problema muito sério, cultural, que extrapola a sociedade, que entra na área da saúde, na área técnica da saúde. Já foi relatada aqui pelos nossos colegas a grande deficiência que nós médicos, de forma geral, temos também em levantar a hipótese de diagnóstico da endometriose. Essa questão cultural de que a cólica é normal está também na cabeça dos médicos, que dizem para as mulheres - e nós todos aqui já ouvimos isso - que aquilo ali é uma cólica normal, que vai passar, que vá para casa, que tome um remédio, que, quando começar a ter vida sexual, vai melhorar, quando se casar, vai melhorar, quando tiver um filho, vai melhorar. Já foi dito pelo Prof. Schor que gravidez não é tratamento para endometriose, e várias mulheres já ouviram isso de colegas ginecologistas. Então nós temos um problema na formação do médico, nós temos um problema no acesso dessas mulheres aos profissionais qualificados e nós temos um problema no diagnóstico precoce. Se nós conseguirmos, através da educação - o que foi muito bem colocado aqui pelo Jean, pelo Norberto, enfim -, levar às escolas, às adolescentes essas orientações, essa discussão da cólica menstrual, provavelmente nós teremos uma próxima geração de mulheres que, mesmo que tenham endometriose, não terão endometriose intestinal, não terão que fazer uma cirurgia para tirar um rim, por causa de uma endometriose profunda que obstruiu o seu ureter; não terão, talvez, infertilidade porque a endometriose se agravou tanto que agora ela não consegue mais ter filhos e tem eventualmente o seu estoque de óvulos, a sua reserva ovariana comprometida. |
| R | Existe um programa na Austrália, já há alguns anos - acho que o Schor e o Norberto devem saber desse programa -, um programa nacional, em que eles levaram para as escolas a discussão a respeito da endometriose, e incluíram nessa discussão não só as meninas, mas também os meninos adolescentes, que não têm noção do que se passa com uma menina de 14 anos que está morrendo de cólica dentro de casa. Foi comentado aqui sobre uma pergunta - que veio de um homem, né? Interessante. Muitos dos parceiros sofrem, sofrem calados, porque eles não sabem o que fazer em casa com essa mulher que está morrendo de dor. Tem uma pesquisa, um estudo muito interessante sobre isso, em que se colheram depoimentos dos parceiros, dos maridos dessas mulheres, e eles relatam muito isso. Eles também estão perdidos nessa situação. São 5 milhões, 6 milhões, 7 milhões de mulheres, que têm pai, mãe, irmão, marido. Nós não estamos falando de 6 milhões de pessoas, nós estamos falando de 30 milhões de pessoas que estão sofrendo, porque uma mulher com endometriose dentro de casa leva um sofrimento para a família inteira. Eu acredito, Senadora, que a educação é sempre o melhor caminho, educação precoce nas escolas, nas universidades, onde nós temos aí mulheres com 18, 19, 20 anos, e que elas entendam que as que têm endometriose podem ter problemas ou dificuldades para ter filhos, que não adiem tanto a gravidez, desde que seja possível, ou que eventualmente preservem a fertilidade de alguma forma. Educação para os médicos. Os médicos ginecologistas passam três anos na residência médica aprendendo sobre ginecologia e obstetrícia, eles têm por obrigação saber fazer esse diagnóstico. E, talvez, se nós investirmos muito na educação, nós não tenhamos que investir tanto no robô, apesar também de entender que a robótica é muito importante, assim como a laparoscopia. A cirurgia minimamente invasiva é essencial para o tratamento de endometriose, que deve ser tratada em centros especializados. Não é possível se admitir que uma moça de 26 anos que não tem filhos tenha o seu útero retirado, aqui na capital do país, para tratar uma dor crônica provocada pela endometriose. Um mês depois da cirurgia que essa moça realizou, ela foi ao meu consultório fazer uma consulta. "Doutor, eu tirei o meu útero, porque eu estava desesperada." Ela é uma domadora de cavalos lá de Palmas. Eu a examinei, solicitei exames de imagem, e a endometriose continuava lá. E o útero, que não tinha culpa na história, foi retirado. Então, isso é para defender que a endometriose, especialmente a endometriose profunda, não pode ser tratada fora de equipes treinadas e centros que realmente entendam o que é o tratamento da endometriose. É uma doença agressiva, cuja cirurgia é difícil, complexa, porque você tem que tirar uma doença que invadiu o intestino, invadiu a bexiga, mexeu no ovário, e, ao mesmo tempo, preservar a fertilidade daquela mulher. Eis a complexidade da doença. |
| R | Então, eu termino minha fala agradecendo mais uma vez a oportunidade, disponível a participar também dessa discussão como sociedade, para ajudar essas mulheres que tanto sofrem neste país. Obrigado. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Dr. Federico, muito obrigada! Que honra! E que desafiadora a sua fala! A Dra. Gabriela, de Minas Gerais, uma das internautas - a gente tem médicos acompanhando esta audiência - diz o seguinte: "A atenção primária tem recebido capacitação suficiente para reconhecer e encaminhar casos suspeitos de endometriose?". "Como médica clínica vejo a dolorosa luta das pacientes em busca [...] [do diagnóstico] e tratamento. Vamos dar apoio sempre a essa causa". Eu tenho aqui inúmeras perguntas, mas eu vou destacar a de Lucas, de São Paulo: "Haverá [mesmo] campanhas nacionais de conscientização sobre endometriose nas escolas e unidades de saúde?". As pessoas estão acompanhando e perceberam que campanha também é uma resposta. Eu fico muito contente, e a gente vai trazer isso para o relatório do nosso projeto de lei. O Ministério da Mulher conseguiu se conectar? (Pausa.) Sim? (Pausa.) Nós vamos ouvir a Dra. Josilene Lúcia do Santos, Coordenadora-Geral de Ações Temáticas e Diversidade da Secretaria Nacional de Articulação Institucional, Ações Temáticas e Participação Política do Ministério das Mulheres. Dra. Josilene. A SRA. JOSILENE LÚCIA DOS SANTOS (Para expor. Por videoconferência.) - Estão me ouvindo agora? A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Estamos ouvindo. A SRA. JOSILENE LÚCIA DOS SANTOS (Por videoconferência.) - Que bom! Boa tarde a todas as pessoas! Primeiramente, eu quero parabenizar a Senadora Damares por esse tema. Esse tema é importantíssimo para as mulheres. Faz um bom tempo que a gente... A gente também, antes de ser gestão, é articuladora e mobilizadora da política integral de saúde da mulher. Estar num momento destes, debatendo um assunto destes é importantíssimo para a gente. Quero saudar toda a mesa, na sua pessoa, Senadora, por conta deste debate. Eu estive aqui ouvindo todas as pessoas falarem e, como a senhora falou no início que nós não íamos tratar aqui da questão politicamente, etc., mas sim dos direitos, eu quero iniciar com uma questão que é muito pertinente para a gente. São justamente as perguntas que a população e que as mulheres têm em relação a esse problema, a questão dos tabus e dos mitos, que tratam, muitas das vezes, a doença como se fosse um problema que leva ao câncer. Aí nessas perguntas e nesses mitos, é importante a gente dizer que é uma doença benigna, mas que é extremamente dolorosa e que também leva à morte, assim como outras doenças, por conta de n situações. |
| R | Quanto à questão da infertilidade, a infertilidade pode ser, sim, um problema da endometriose, mas é importante a gente ressaltar que ela não é um sinônimo... A endometriose não é sinônimo de infertilidade, e tudo aquilo que se pode discutir para que se tire esses mitos é importante. Outra questão também que causa muito tabu e muitas dúvidas e que muitas vezes prejudica no diagnóstico é associar a endometriose apenas à idade reprodutiva. Muitas pesquisas, muitos debates levam as informações de que crianças também desenvolvem a endometriose, porque ela está associada à questão de possuir o estrogênio ativo, e, se não for feita essa discussão, a gente pode impossibilitar que muitas crianças também possam fazer o tratamento e fazer esse diagnóstico sobre a endometriose. Mas é assim: as consequências da endometriose são justamente por conta do diagnóstico tardio, são justamente por conta da necessidade de o Parlamento, não só do Parlamento, mas de ter uma articulação entre os movimentos, entre os movimentos que lutam pelo direito à saúde da mulher, entre os movimentos de mulheres, entre o controle social e o Parlamento, que é fundamental, porque é o Parlamento que legisla, é o Parlamento que pode criar as leis e pode nos ajudar a criar um programa que possa fazer um trabalho de discussão da endometriose, não só nos departamentos de saúde, mas na escola, na igreja, na construção civil, onde estão os homens, porque os homens precisam conhecer a doença, para poder entender as suas mulheres, para nós não termos um grande quantitativo de mulheres que acabam tendo o fim do relacionamento por conta dos problemas que têm, por conta do sofrimento que têm, e os maridos não entenderem. Eu ouvi a doutora, de que não me recordo o nome, mas acho que é Cris... A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Cristiane Britto. A SRA. JOSILENE LÚCIA DOS SANTOS (Por videoconferência.) - Cristiane. Ouvi a Cristiane falar que um profissional da saúde fez uma fala que acabou a constrangendo na frente do marido. Isso é uma realidade, e a gente precisa trabalhar também a educação em saúde, a formação dos trabalhadores. A gente precisa acabar com estigmas, a gente precisa acabar com discriminação e preconceito no atendimento, a gente precisa de profissionais que tenham a capacidade de diagnosticar essas mulheres, porque, se a gente não tiver um diagnóstico preciso, as mulheres terão muitos problemas, como a própria infertilidade; como, por conta do diagnóstico tardio ou por conta de um diagnóstico errado, a mulher fazer cirurgias em que perde o útero... Muitas das vezes, não só... (Falha no áudio.) ... cirurgia, mas essa mulher passa por outras cirurgias reparadoras. Uma mulher que faz uma cirurgia de endometriose com diagnóstico errado faz uma, faz duas, faz três... A gente tem acompanhado e pesquisado que um diagnóstico errado, que problemas na cirurgia e etc. levam, muitas vezes, a mulher ao suicídio, leva as mulheres a problemas psicológicos... |
| R | Então, são "n" situações que precisam ser trabalhadas, inclusive a questão da intersetorialidade, inclusive a questão dos multiprofissionais, trabalhar essas questões de especialistas... Aí a mulher precisa do nutricionista, porque, sem o nutricionista, a mulher acaba consumindo alimentos que são inflamatórios e que vão prejudicá-la muito mais ainda, que vão causar mais problemas de dor, que vão potencializar essas dores; a gente precisa ter fisioterapeutas, a gente precisa ter psicólogos... Então, é um trabalho que precisa ser feito, para que essa mulher tenha dignidade, para que essa mulher tenha direito verdadeiramente à atenção integral à saúde. E aí, para que a gente tenha isso, a gente tem também o debate, tem uma discussão, que é a questão da criação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher. Existe sim a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, que, ano passado, fez 20 anos, mas a mulher tem a sua especificidade, e, para discutir essa especificidade da mulher, a gente precisa de programas que tratem esses problemas que levam a mulher a não ter os seus direitos garantidos. A endometriose, muitas vezes, é incapacitante, e a gente tem que discutir a assistência social para essas mulheres, a gente tem que discutir a questão da previdência, a questão do auxílio para essas mulheres. Então, são muitas as coisas que a gente precisa discutir, e, tenho certeza, a gente está à disposição da Senadora que está sendo Relatora de um projeto de lei e a gente pode, Senadora, discutir minuciosamente esse programa para o acompanhamento (Falha no áudio.)... A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Josilene, seu microfone foi interrompido. Ligue de novo. Josilene... Ela não está ouvindo. Eu acho que a gente pode interromper a transmissão. Obrigada. Nós fizemos a leitura verbal. Suas duas últimas frases a gente não ouviu. É a leitura labial. D. Josilene, muito obrigada. É bom saber que você está à disposição. Nós vamos encaminhar para o Ministério das Mulheres um pedido de parecer ao PL 1.069, de 2023, assim como também peço à Secretaria que anote o seguinte encaminhamento: eu gostaria do parecer do Conselho Nacional de Saúde e do Conselho Nacional dos Gestores de Saúde. E a gente vai para o final desta audiência lamentando a ausência do Ministério da Saúde nesta audiência. Estava indicada para falar nesta audiência a Renata de Souza Reis, Coordenadora-Geral de Atenção à Saúde das Mulheres do Ministério da Saúde. Esta audiência não fica completa sem o Ministério da Saúde. Ela avisou recentemente à Secretaria que não pôde vir e também não encaminhou nenhum técnico para representá-la, mas nós vamos fazer o seguinte: as perguntas à Coordenadora-Geral de Atenção à Saúde das Mulheres do Ministério da Saúde nós faremos por escrito e nós vamos dar visibilidade a todos os senhores das respostas. E, se sentirmos necessidade de que esta audiência não se encerre aqui sem a participação do Ministério da Saúde, nós vamos apresentar um novo requerimento para que ela venha, tão somente ela, trazer as informações sobre a Coordenação-Geral de Atenção à Saúde das Mulheres do Ministério da Saúde. |
| R | Eu quero agradecer aos nossos convidados, o Dr. Noberto, que saiu do Paraná, pegou um avião, atravessou um estado e veio participar desta audiência; assim como o Dr. Eduardo Schor, que veio de São Paulo e sentou-se nesta mesa para falar sobre endometriose; e os demais convidados, como o Dr. Frederico, a Dra. Cristiane, o Dr. Pierre, que já se ausentou, que deixaram suas atividades e vieram. Eu vou acreditar que, por ser hoje o Dia Nacional da Saúde, realmente o Ministério da Saúde está muito ocupado, mas eu gostaria muito que os órgãos federais atravessassem a Esplanada, 100m, 200m, para estarem nas audiências públicas. Hoje, pela manhã, estavam aqui crianças com mobilidade reduzida, que vieram com a maior dificuldade, mães com doenças raras, e o Ministério da Saúde falou via videoconferência, estando aqui do outro lado da rua. E a gente promete, mesmo eu sendo uma Senadora de Oposição, todo o respeito, porque eu fui muito respeitada nesta Casa, quando o Ministro e a Oposição me convidavam. Atravessar a Esplanada e olhar para as famílias que estão aqui faz toda a diferença. Eu sei que a Josilene, hoje, como Coordenadora da Saúde da Mulher do Ministério da Mulher, também está muito ocupada. É um dia de muita atividade. Mas a gente vai continuar insistindo. Eu quero que o Ministério da Saúde seja acionado para se manifestar sobre o projeto de lei, o Ministério das Mulheres, o Conselho Nacional de Saúde e também o Conselho Nacional de Secretários de Saúde dos estados. Eu vou encerrar esta audiência. A Adriana pediu dois minutos e depois a Ana Paula também dois minutos, e a gente vai para o encerramento com os senhores aqui fazendo os agradecimentos finais. Adriana... Sim. Para quem está ligando agora, a Adriana é do Instituto Menopausa Feliz. A SRA. ADRIANA FERREIRA - Está ouvindo? A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Sim. A SRA. ADRIANA FERREIRA - Boa tarde. Como a Senadora mesmo já me apresentou, meu nome é Adriana Ferreira, eu sou Presidente do Instituto Menopausa Feliz. E vocês devem estar pensando: "O que a menopausa tem a ver com a endometriose?". Então, pasmem: quando as mulheres passam a conviver e a sobreviver com a endometriose, elas estão na faixa etária de 15 a 45 anos, 46 anos; logo após o término desse sofrimento - diga-se de passagem, como os doutores disseram muito bem -, ela vai adentrar a menopausa. Então, algumas perguntas que eu queria justamente até acrescentar, para enriquecer - Dr. Schor, maravilhoso, tenho certeza de que o Dr. Norberto e o Dr. Malavasi também poderiam responder com a maior presteza -, são: "Como é a vida da mulher que tem endometriose quando ela entra na menopausa? A menopausa, literalmente, termina com a endometriose, com a dor da endometriose, com o sofrimento da mulher com endometriose? E existe algum estudo que especifica como que é a endometriose mediante a nossa riqueza étnica brasileira? Em mulheres quilombolas, indígenas, é diferente nelas? Como seria?". Eu fiz um vídeo - eu não sei se eles podem passar -, que é um vídeo com que eu faço propaganda no meu Instagram, falando especificamente da endometriose, e houve uns eventos que aconteceram pelo Ministério da Saúde nos quais ficou claro que eles fizeram mais de 145 mil atendimentos - atendimentos. Nos últimos cinco anos, eles fizeram mais de 43,6 mil internações, mas não mencionaram cirurgias. |
| R | E existe, Senadora - eu gostaria muito que essa entidade estivesse presente, mas eu não consegui contactá-la -, na cidade de Santos, um Centro de Referência em Endometriose, onde em três anos se fizeram 200 cirurgias de endometriose. Então, existem condições e existe a vontade da mulher de ter, de fato, uma endometriose feliz. O nosso trabalho chama-se Menopausa Feliz, porque a gente acredita que existe menopausa feliz desde que se tenha, como o doutor mesmo colocou, e a senhora também colocou precisamente, educação em saúde. É disto que nós precisamos: médicos capacitados, educação em saúde e medicamentos ou tratamentos disponíveis em tempo hábil. Não é esperar a mulher adoecer, ficar acometida com outras doenças, para depois se dizer: "vamos tentar fazer alguma coisa". E, para finalizar, eu falo isso porque, quando eu estava no climatério, eu estava com 47 anos. Eu sou uma mulher hoje de 58 anos. Quando eu estava com 47 anos, eu fiz a cirurgia de histerectomia por causa de miomas. E, só após muito sofrimento e quando eu fiz essa cirurgia, foi que eles mencionaram: "olha, nós vamos tirar o seu útero e as tubas e vamos deixar o ovário; e você faça acompanhamento porque você tem um pouco de endometriose". Então, olhe para você ver a dificuldade: eu sofri e, entrando na menopausa, quando a endometriose era causada literalmente por alterações hormonais e pelo excesso de estrogênio... Como é, quando você entra na menopausa, em que você não tem estrogênio - seu corpo não produz mais - e você tem que, literalmente, fazer a terapia de reposição hormonal? Eu gostaria que os médicos exemplificassem para poder demonstrar-se o alcance, Senadora, desta sua audiência e a importância que é termos médicos qualificados e especializados na temática. Muito obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Adriana. Eles não vão responder agora porque a Ana Paula já vai fazer a intervenção dela e, de repente, pode ter uma pergunta. Aí, os senhores terão condições de responder e já fazer as considerações finais e agradecimentos. Antes, não posso deixar de registrar a presença de Fabíola Lima Constâncio, do Instituto Esporte e Saúde - obrigada, Fabíola -; e também, mais uma vez, com muita alegria, da Dra. Vanessa de Medeiros, representante da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Doenças Crônicas e Raras da OAB. Gostaria muito que a OAB visse o Projeto de Lei 1.069 também e emitisse um parecer sobre a política para mulheres com endometriose. Ana Paula Batista, da Associação Nacional Movimento Ostomizados do Brasil - dois minutos, Ana Paula. A SRA. ANA PAULA BATISTA (Para expor.) - Obrigada, Senadora. Eu quero cumprimentá-la e, na sua pessoa, cumprimentar a todos aqui presentes e, de forma especial, todas as mulheres com endometriose do Brasil. Eu faço parte dessa estatística. Eu não poderia deixar, obviamente, de participar de um debate avançado, de acordo com todas as falas que eu ouvi. Eu me identifiquei em cada fala dos senhores, porque fiquei com endometriose aos meus 23 anos de idade. Hoje sou uma jovem de quase 50, e a endometriose me acompanha. Mas a endometriose vai muito além na minha vida, além de todo... É tão difícil falar de endometriose, porque a gente se vê em tantas situações delicadas, como já foi falado: falta de informação, falta do próprio cuidado. Eu sou uma usuária do Sistema Único de Saúde, e isso me ficou em falta, porque a proposta é uma histerectomia agressiva total sempre. |
| R | Eu não tenho filho, mas eu fui diagnosticada, logo depois, com leiomiossarcoma, que é um câncer raro; consequentemente, eu fiquei uma mulher com ostomia, e nós sabemos que a endometriose também pode causar uma ostomia. E eu, na qualidade de liderança nacional da ostomia, venho dizer, Senadora, com muito respeito ao Sistema Único de Saúde, que a gente vive um paradoxo - e hoje é um dia de reflexão e de debate, mas também quero dizer: nós temos uma Constituição normativa, mas falta efetividade. Falta dialogar para que nós possamos ter acesso à dignidade e a uma vida com qualidade de vida. Eu quero ter, de fato, o direito de ir e vir. Eu quero trabalhar, eu quero ser benquista dentro de casa quando eu estiver choramingando porque eu estou com muita dor, e a endometriose que eu trato desde lá de Salvador, da Bahia, é de grau avançado, e ainda não tem cura para essa endometriose. É medicação que tem dificuldade... E, quando eu me mudei para o Distrito Federal, logo ouvi: "Ana, permaneça com seus médicos lá em Salvador porque aqui eu não sei como vai ser". E isso é triste. Apesar de a gente ouvir aqui o representante do nosso Governo do Distrito Federal e saber que a gente tem esses cuidados, a gente precisa avançar mais ainda. E eu entendo que nesse paradoxo em que a gente não consegue efetivar os direitos - e não é fácil porque tem um povo que grita por dias melhores, por uma vida digna dentro das suas casas -, a gente ainda caminha a longos passos. E aí, Senadora, quando a gente vem aqui e vê um debate tão importante... Eu costumo me apropriar de vez em quando de um diálogo, de uma frase, um slogan, abro aspas: "De mulher para mulher". A mulher precisa ouvir a dor da outra mulher. Eu, como uma mulher com deficiência, sinto falta disso, de a outra mulher me reconhecer sempre. Então, com este dia que a senhora está propondo, eu sei que nós vamos avançar e muito... Muitas mulheres, mas muitas, Senadora, em todo o Brasil, são ostomizadas por conta da endometriose, que paralisa vidas e paralisou a minha vida. Eu não tinha diagnóstico. Tem uma medicação que a gente usa que paralisa, traz outras questões para a nossa vida, e eu sofro disso constantemente, com a endometriose e, paralelo a isso, com outros cenários que nos acompanham. Nós temos o direito de existir, de viver com dignidade, mas eu acredito, Senadora, encerrando a minha fala, que nós - ouvindo uma mulher maravilhosa ontem falando -, mulheres, somos muitas e podemos transformar e fazer, neste país, realmente uma vida de solidariedade para todo cidadão, obviamente junto com os senhores, que fazem o científico muito bem. A gente precisa avançar, e a capital do Brasil precisa ser exemplo. Um abraço a todas as mulheres com endometriose e com ostomia do Brasil. Muito obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Ana Paula. Muito obrigada. (Palmas.) |
| R | Nós vamos agora finalizar com... Se quiserem responder à pergunta de Adriana... Mas ela trouxe uma coisa muito séria, a diversidade, a diversidade racial no país. Todos nós sabemos que por um tempo, quando uma mulher negra chegava ao hospital para ter o bebê, se dizia, ela aguenta mais que a branca, ela é forte, ela vem dos escravos, o corpo dela aguenta. É mulher do mesmo jeito. E ela fez essa referência à questão racial no país, à mulher indígena, à mulher negra, à mulher cigana, que tem tantos tabus para ir buscar um ginecologista, à mulher ribeirinha, à mulher dos quilombos. Então os senhores fiquem à vontade para responder à pergunta de Adriana. Cinco minutos para despedida, agradecimentos e resposta. Vamos começar pelo Dr. Norberto, vamos mudar a ordem de fala. O SR. NORBERTO JOSÉ MAFFEI JUNIOR (Para expor.) - Está funcionando? A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Está, está. O SR. NORBERTO JOSÉ MAFFEI JUNIOR - Eu nunca li nenhum trabalho que mostrasse essas diferenças, em relação à endometriose, em questões étnicas e raciais. Não foi de minha leitura nenhuma vez. Mas eu acredito que, como nós temos até dificuldades de atendimento básico de saúde, nós não tenhamos esses números para poder mostrar para você. Não sei se o Dr. Schor ou o Doutor conhece, mas eu não conheço. Em relação a menopausa e endometriose, as sequelas da endometriose vão permanecer para sempre. Elas não vão ser tratadas na mulher com endometriose. Em relação à terapia hormonal, sim, é possível. Talvez não a terapia hormonal tradicional. Talvez a gente não possa usar as mesmas doses de estradiol. Talvez nós nem usemos estradiol. Então é mais uma dificuldade. Mas, se a menopausa vai terminar com todo o sofrimento da endometriose, não. As sequelas vão permanecer para sempre. E só respondendo àquela colega que falou sobre a atenção primária e endometriose, Senadora, se o médico que está na atenção primária souber que quase 50% das mulheres que tiverem cólicas fortes e dor pélvica podem ter endometriose, ele não precisa saber nada. Se eles souberem que a mulher que tem dispareunia, dor durante a relação, pode ter endometriose; se o médico que está lá no atendimento primário souber que uma mulher que tem dor intestinal, dor anal, dor na evacuação, durante o pré e o pós-menstrual pode ter endometriose e souber para onde encaminhar, isso já está perfeito. Então ela não precisa saber nada de endometriose. Só para ilustrar, um dia um colega ortopedista me mandou uma paciente. E ela tinha uma endometriose diafragmática. E por quê? Porque, de ficar conversando no centro cirúrgico, ele atendeu uma paciente com uma dor no ombro que ele não conseguiu explicar. E ele falou assim: "Olha, Norberto, eu não sei mais o que fazer. Não é meu. E eu vejo vocês conversando lá. Dá uma olhada aí." E ela tinha endometriose. Então, se você conhece o básico, você não precisa conhecer nada da doença. Então, se o médico que está na linha de frente souber que dor pélvica e cólica forte podem ser endometriose, que dispareunia, dor durante a relação, pode ser endometriose e encaminhar para quem possa fazer o diagnóstico, já está fazendo o trabalho dele de maneira perfeita. Eu só tenho, mais uma vez, a agradecer por estar aqui e poder participar deste debate de um assunto tão importante e que atinge milhões e milhões de mulheres no nosso país que sofrem todos os dias. Muito obrigado. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Dr. Norberto, posso lhe pedir uma coisa? O SR. NORBERTO JOSÉ MAFFEI JUNIOR - Claro. |
| R | A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - O projeto que o senhor compartilhou com o Governo do seu estado e que não foi para a frente, o senhor poderia compartilhar com a gente? Quem sabe a gente o faz se transformar numa realidade em nível de país. (Palmas.) O SR. NORBERTO JOSÉ MAFFEI JUNIOR - Faço questão de fazer isso. Faço questão. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Dr. Eduardo Schor, para agradecimentos, considerações finais, e, se quiser, responder às perguntas. Fique à vontade. O SR. EDUARDO SCHOR (Para expor.) - Bom, vamos lá, à pergunta da Adriana, sobre menopausa e etnia. Primeiro, em relação à menopausa: existe a conversa de que, quando a mulher chega à menopausa, a endometriose para de dar dor. Tudo bem, ela passou a vida menstrual inteira sofrendo com dor, chega à menopausa, para a dor, mas começa outro problema, que é a deficiência hormonal; quer dizer, se estende o sofrimento dessa mulher, primeiro por uma causa, depois por outra. Então, é um absurdo o que se fala por aí: que quem tem endometriose não pode fazer reposição hormonal. Pode. Pode e deve. Eu defendi meu mestrado exatamente sobre isso. Tem uma reposição diferente? Tem, mas é hormonal, que é o que ela precisa. Talvez... Na minha proposta eu pensei nisto: fazer uma endometriose feliz. Ela tem endometriose, mas ela vai ter a vida feliz, com uma menopausa feliz. A mulher pode estar na menopausa e pode ser feliz. As duas coisas coexistem. Em relação à etnia, a gente não tem nada no país relacionado a isso, mas saiu um trabalho norte-americano, um mês atrás, em que foi feito um levantamento, em Washington, para ver o grau. Existem graus de estigma, uma tabela que é feita para você poder determinar quanto estigma a mulher tem. Em Washington, o estigma da mulher negra que tem endometriose é assustadoramente maior do que o da mulher branca. Você acha que aqui vai ser diferente? Eu acredito que não. Então, a gente vai levar essa ideia para a escola, começar a estudar, para poder levantar esse problema e falar "estão aqui os dados brasileiros", mas deve ser ou parecido ou, eventualmente, pior do que nos Estados Unidos. Mais uma vez, quero agradecer a oportunidade. Para mim, aqui, hoje, eu espero que seja o começo do sonho de que a endometriose possa ser atendida em sistema primário. Um colega ginecologista com uma boa conversa, com um bom exame de toque ginecológico vai fazer o diagnóstico, vai começar o tratamento, e - como acontece com várias outras doenças -, quando sair da alçada dele, vai para o secundário ou terciário. Esse é o meu sonho. A quantidade de mulheres que vai se beneficiar com isso é assustadora. A quantidade de dinheiro que vai ser poupada, do Governo, é gigantesca. Então, esse é o meu sonho, de que eu espero que tenha plantado uma sementinha aqui. Muito obrigado a todos. Obrigado, Senadora. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Doutor. Dr. Eduardo, Dr. Norberto, Dr. Frederico, esta audiência foi de um alto nível científico e acadêmico. Eu estou impressionada. Eu quero agradecer muito, muito, Dr. Eduardo, a sua presença, a sua participação. A gente vai dar todas as respostas numa audiência? Não. Mas, acreditem, à mulher que está do outro lado, nos assistindo agora - são muitas mulheres -, que está numa cama, sentindo dor, e vê que a gente parou tudo no Senado para discutir, gente levou esperança a essa mulher. E acho que esta finalidade desta audiência - esta, especialmente - foi alcançada: nós levamos esperança lá para a ponta hoje, com vocês aqui na mesa, nos desafiando a entregar ao Brasil uma política pública de verdade que alcance todas as mulheres, de todas as raças e línguas, de todas as cores, Adriana. Eu estou muito feliz com o alto nível do debate desta audiência. |
| R | Dra. Cristiane Britto, vou passando para a senhora para fazer as suas considerações finais. Ela compartilhou aqui comigo. Nós temos muitas Vereadoras assistindo à gente. Então, vou mandar um recado para todas as Vereadoras e Vereadores: façam um debate igual na sua Câmara de Vereadores. Nós temos 5,6 mil municípios no Brasil. Se todas as nossas Vereadoras promoverem uma audiência pública... Leve o Secretário de Saúde do seu município. Não tem os grandes especialistas, eles não vão ter horário para ir, leve um ginecologista da cidade para conversar, leve uma instituição de mulheres para falar. Faça um debate na Câmara de Vereadores e convide as mulheres todas da cidade para participarem. Vocês não têm ideia do que uma audiência pública pode, com certeza, levar de informações e salvar vidas. Obrigada às Vereadoras que estão nos assistindo. A SRA. CRISTIANE BRITTO (Para expor.) - Senadora, quero, mais uma vez, agradecer a oportunidade de trazer esse debate tão importante. A senhora está dando voz a milhões de mulheres com endometriose que estão sofrendo e que acham que não têm mais saída, que estão literalmente invisibilizadas. O Governo precisa enxergar essas mulheres, como foi dito aqui. A gente sabe que a endometriose não tem cura. A vida toda eu tenho endometriose. Tem mulheres aqui com endometriose; a Manuela Lopes, que sofreu cinco abortos espontâneos e hoje tem o Samuel, felizmente. Muitas mulheres estão em silêncio e continuam sofrente, mesmo depois de a maternidade chegar. As sequelas são para sempre? São para sempre. Mas o Governo precisa enxergar essas mulheres, porque condenar essas mulheres a uma vida de dor é uma violação aos direitos humanos, e isso a gente não pode aceitar. Muito obrigada, Senadora. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Dra. Cristiane Britto. A Dra. Cristiane Britto esperou se casar para ficar curada. (Risos.) E a gente ouve isso ainda hoje, não é, Doutora? A SRA. CRISTIANE BRITTO - Estou há 27 anos casada e curada. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Dr. Frederico, suas considerações finais. Se quiser responder a alguma pergunta... A nossa representante das mulheres está conectada ou já saiu? (Pausa.) Dr. Frederico, pode falar. O SR. FREDERICO JOSÉ SILVA CORRÊA (Para expor.) - Em relação à questão das ostomizadas e da importância da sua presença aqui e dessa fala. Neste momento eu estou com uma paciente internada, aqui em Brasília, com estoma, porque fez uma cirurgia muito extensa - uma paciente de 27 anos - e teve uma complicação. Nós sabemos que são cirurgias em que, obviamente, em algumas situações, temos essas complicações. E aí a gente se depara com essa outra questão, quer dizer, de uma doença grave de novo, um diagnóstico tardio: uma doença grave, cirurgia, estoma, depois outra cirurgia para fechar o estoma. Enfim... E a situação fica cada vez mais crítica. Um dia eu ouvi de uma adolescente, lá pelos seus 16 anos, assim: "Pai, não dá para você tirar o meu útero, congelar ele e, depois, quando eu quiser ter filho, você volta ele para mim?". A minha filha, desde os 14 anos, sofre com muita cólica; aos 17, nós fizemos exames, e ela foi diagnosticada com endometriose. Graças a Deus, uma endometriose inicial, com um diagnóstico precoce. Eu disse para ela: "Você tem muita sorte. Você tem um médico que entende de endometriose na sua casa; você tem acesso a exames dos melhores possíveis, dos melhores profissionais; se você precisar de uma cirurgia um dia, você vai fazer a cirurgia num bom hospital". |
| R | E esse é o sonho que todos nós temos para as nossas pacientes - e que isso se estenda ao Sistema de Saúde. Não é possível uma mulher esperar quatro anos com uma dor incapacitante para fazer uma cirurgia, sendo que a terapia hormonal, para ela, já não funciona mais! Para muitas, vai muito bem, mas chega um momento em que só a cirurgia vai conseguir resolver aquela dor. E como é que você a coloca num livro em que ela vai esperar quatro anos? Então, é uma dor que nós sentimos. Nós todos aqui nos compadecemos das mulheres portadoras de endometriose e, por isso, eu parabenizo a Senadora, a Cristiane e a Comissão, por mais uma vez abordarem esse tema tão importante, tão relevante para a vida das mulheres da sociedade brasileira. Parabéns. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Dr. Frederico. A Josilene, para os agradecimentos finais... Ela está conectada ainda? (Pausa.) Ela consegue? (Pausa.) Não, não consegue, não é? Nós vamos conversar com ela depois. Eu quero agradecer muito a participação dela. Nós chegamos ao final desta audiência pública. Nesta Comissão, tem uma fábrica: uma fábrica de encaminhamentos, de ofícios, de requerimentos, de indicações e de projetos de lei. Hoje de manhã, Doutor, enquanto a gente fazia a audiência pública, a gente dava encaminhamento e eles corriam lá, faziam, traziam aqui. Nós fizemos muitos encaminhamentos nesta tarde, mas eu quero mais dois. Quero enviar um para que as Procuradorias da Mulher da Câmara e do Senado incentivem as Vereadoras do Brasil inteiro a fazerem um debate nas Câmaras de Vereadores. Tem cidade em que é possível que não tenha um ginecologista, mas tem uma Vereadora. Então, é para elas fazerem o debate. E também há o segundo encaminhamento, que eu peço à Secretaria: nós temos dois grandes programas dentro das igrejas cristãs no Brasil, o programa Se Liga, Irmã, cuja coordenadora nacional está aqui, que é ligado à Igreja Evangélica, e tem um programa que é da Igreja Católica, o Não Temas, Maria!, que é para falar com mulheres sobre direitos das mulheres. Gostaria que fosse um ofício para o programa Não Temas, Maria!, com as informações que nós tivemos aqui, para que as mulheres nas igrejas compartilhem informações sobre endometriose. E quero convidar esses dois programas que estão ligados à Igreja - e outros, se tiver de mais alguma outra religião - para a gente fazer campanhas em março do ano que vem, uma grande campanha, para a gente deixar as igrejas amarelas no ano que vem, deixar as escolas amarelas no ano que vem e falar do assunto. Eu agradeço a presença de todos. Estou muito feliz com o resultado desta audiência pública. O Senado Federal dá início a uma nova fase na discussão de uma menopausa feliz, de uma endometriose feliz, de políticas públicas para mulheres com endometriose. Agradeço a presença de todos e, nada mais havendo a tratar, eu declaro encerrada esta sessão. (Palmas.) (Iniciada às 14 horas e 42 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 47 minutos.) |

