14/04/2025 - 12ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a 12ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A audiência pública será realizada nos termos do Requerimento 7, de 2025, de minha autoria, para debater sobre contribuições dos povos indígenas no desenvolvimento social, econômico, linguístico e cultural do Brasil, dentro do ciclo de debates sobre os direitos humanos e o desenvolvimento de povos e comunidades tradicionais.
A reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania, na internet, em senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria: 0800 0612211.
Nós teremos duas mesas com a participação de diversos expositores de forma online. Nesta semana a nossa Casa está trabalhando muito de forma online. Nós já imaginávamos que seria assim, mas eu quero agradecer a presença de todos que vieram a esta audiência.
Para a primeira mesa nós vamos convidar, de forma presencial, a nossa querida Cicera Patira, Embaixadora dos Povos Indígenas - Cicera, fique aqui comigo na mesa; seja muito bem-vinda, Patira! -; e queremos convidar também, para a primeira mesa, Cris Tupan, Diretor Substituto da Secretaria Nacional de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas - seja muito bem-vindo, Cris! É uma alegria ter você com a gente. Aproveito e já peço que transmita à Ministra e a todos os demais do ministério o meu abraço.
E nós teremos a participação online de: Arnaldo Pareci, indígena do povo pareci no Mato Grosso, que falará sobre produção de soja em terras indígenas; teremos a participação de Rafael Suruí, da Terra Indígena Sete de Setembro, em Rondônia, sobre a produção de café em terras indígenas; Mitore Cristiana Tiriyo Kaxuyana, articuladora da Articulação das Mulheres Indígenas, que falará sobre a contribuição das mulheres indígenas na arte, na cultura brasileira e prêmio de artesanato; teremos Henrique Terena, Professor Doutor, Presidente do Complei, que falará sobre a contribuição dos indígenas para educação, cultura e língua brasileira e sobre direito à liberdade religiosa dos povos indígenas; e teremos Raimundo Guajajara, Presidente do Conselho Supremo Nacional dos Caciques Nativos Originários Indígenas do Brasil. O que ele vai abordar? Dificuldades do empreendedorismo indígena no Brasil.
Nós estamos na semana da comemoração do Dia dos Povos Indígenas. Nós tivemos, na semana passada, o Acampamento Terra Livre - é Terra Livre que chama, né? -, em que Brasília recebeu muitos indígenas do Brasil inteiro, com pautas bem específicas, as pautas históricas da reivindicação de terra, da demarcação, da garantia de direitos. O acampamento aconteceu aqui na Esplanada. Em todos os anos, é uma festa, Brasília recebe os indígenas do Brasil inteiro em uma grande festa, mas também em um grande momento de reivindicação de direitos.
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A nossa audiência hoje vem nessa contribuição do debate, mas a gente trouxe um foco diferente para a audiência. Nós vamos ter, ao longo dos dois anos em que estou presidindo esta Comissão, inúmeros debates, inúmeras reuniões sobre a garantia dos direitos dos povos tradicionais. E aqui a gente fala dos povos originários, Cris. A gente vai discutir muito nesta Comissão os povos ciganos, os povos ribeirinhos. Nós temos 38 povos tradicionais no Brasil - classificados como tradicionais. E nós vamos fazer essa ampla discussão aqui, sem tirar o olhar das lutas históricas.
Mas hoje a gente ousa trazer, Cris, um debate sobre a contribuição dos povos. Muita gente olha para os povos, e ainda olha especialmente para os povos indígenas, como "coitadinhos". Não: acabou isso! Nossos indígenas estão ocupando espaços, não é isso, Patira? Nossos indígenas estão contribuindo com a educação no país, estão contribuindo com a ciência. Nós encontramos indígenas cientistas, nossos indígenas são médicos hoje, nossos indígenas são professores, nossos indígenas estão ocupando todos os espaços.
Então, hoje a gente vai trazer essa abordagem de que nós não somos "coitadinhos", nós só queremos oportunidade para provar que nós podemos estar em todos os espaços, ocupando todos os espaços. E eu tenho a alegria de ter comigo hoje pessoas que têm essa visão, a Patira está aqui há anos - anos! - em Brasília, fazendo a sua luta. Por um tempo, foi uma luta quase que solitária, e ela tem essa possibilidade de agregar e reunir muitas pessoas em torno dela.
Nesse sentido, a gente dá abertura a esta audiência. E a gente quer inclusive, no final, Cris, fazer encaminhamentos, a gente não quer ficar só no debate - encaminhamentos. E, com certeza, o primeiro encaminhamento: sem dinheiro não tem garantia de direitos, vamos rever o orçamento do seu ministério, vamos trabalhar para a gente ter, para as coordenações, recursos para, de fato, lá na ponta, fazer a diferença. E esta é a Comissão que discute o orçamento, orçamento para a garantia de direitos.
Mas me permitam ler um texto construído com muito carinho pela minha assessoria.
O Brasil é um país gigantesco e extraordinário, com riquezas naturais e culturais maravilhosas, destacando-se especialmente pelo seu povo heroico e pela diversidade étnica e cultural que tornam esta nação tão grandiosa e rica.
Segundo o censo do IBGE, em 2022, a população de pessoas que se autodeclaram indígenas no Brasil é de 1.694.836 indígenas, o que corresponde a 0,83% da população total do país, sendo que o maior percentual é de crianças, adolescentes e jovens, representando 56,10% da população indígena do país. Toda essa riqueza populacional está dividida em 305 etnias, falantes de 274 línguas, sendo que 1,1 milhão de indígenas, 63,2%, residem fora das terras indígenas e 622 mil residem nas 631 terras indígenas. Afirmo também, com toda a convicção, que a tutela orfanológica dos povos indígenas no Brasil foi definitivamente sepultada com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Foi a partir desta Constituição cidadã que os indígenas deixaram de ser vistos como incapazes e passaram a ser reconhecidos como sujeitos de direitos libertos do cárcere jurídico e da subjugação histórica a que foram submetidos por séculos.
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A Constituição garantiu aos povos originários o direito à sua organização social, aos seus costumes, línguas, crenças, tradições e, sobretudo, aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam. Mais do que isso, assegurou a eles o direito de ingressar em juízo de forma legítima para defender seus interesses - isso é justiça; isso é cidadania.
Ao longo da nossa história, desde o período da colonização, os povos indígenas têm sido protagonistas silenciosos da construção do Brasil. Foram eles que contribuíram com saberes, práticas e riquezas que garantiram a sobrevivência dos que aqui chegaram. Foram eles que cuidaram desta terra, que tem palmeiras onde canta o sabiá, como eternizou Gonçalves Dias em seu poema imortal.
As contribuições indígenas ultrapassam os enfeites do Carnaval: elas estão presentes na nossa mesa, na nossa fala, na nossa terra e até no nosso modo como produzimos alimento. Na gastronomia, por exemplo, quem resiste a um peixe moqueado, a uma boa tapioca, ao doce de cupuaçu, ao delicioso açaí ou à tradicional farinha de mandioca? Essas iguarias têm origem nas mãos e nos saberes dos povos originários.
Na agricultura, os indígenas já praticavam, muito antes da ciência moderna, aquilo que hoje chamamos de sistemas agroflorestais: uma forma sustentável de manejo da terra que integra árvores, culturas agrícolas e até animais, respeitando o equilíbrio da natureza.
A língua portuguesa falada no Brasil também carrega a alma indígena. Palavras como pipoca, tatu, capivara, ariranha, entre tantas outras, são heranças do tupi-guarani e fazem parte do nosso vocabulário cotidiano. E os nomes dos lugares? Maracanã, Copacabana, entre muitos outros, são vestígios vivos da presença indígena em nosso território.
Na medicina, os conhecimentos tradicionais foram cruciais para a formação da farmacologia moderna. Plantas como a ipecacuanha, o jaborandi, o salgueiro, a dedaleira, a casca de assacu foram e continuam sendo usadas no tratamento de diversas doenças, influenciando até hoje a indústria farmacêutica mundial.
Senhoras e senhores, é preciso reconhecer: os povos indígenas não são parte do passado; eles são parte essencial do presente e do futuro do Brasil. Apesar de uma política indigenista que, infelizmente, ainda persiste no isolacionismo, na dependência do Estado e na tutela do indivíduo e da comunidade, ainda assim, há avanços que merecem ser celebrados. Entre estes, podemos relembrar que, entre os anos 2010 e 2022, houve uma queda significativa nas taxas de analfabetismo entre os indígenas, especialmente entre aqueles que vivem em terras indígenas. Isso nos mostra que com políticas públicas sérias e respeitosas, é possível mudar realidades. E esses professores em área indígena têm tantos desafios, tantos desafios. Parabéns a todos eles por estarem lá na ponta, fazendo a diferença. Mas há muito a ser feito. E é por isso que estamos aqui, para, juntos com os povos indígenas do Brasil, mudar o rumo da história; para construirmos um país melhor, mais justo, mais digno para indígenas e não indígenas, um Brasil que reconhece sua pluralidade como força, não como obstáculo. A nossa luta é por um único objetivo: o bem comum. E que ele seja para todos os brasileiros e brasileiras, não importando sua origem, raça, sexo, cor e idade.
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É dessa forma que a gente começa esta audiência. Não se pode mais falar em desenvolvimento do meu país sem trazer os indígenas para a mesa. Não podemos falar em avanços tecnológicos, científicos, culturais sem os indígenas estarem presentes nos grandes debates. É dessa forma que a gente começa a audiência.
Sejam todos bem-vindos. Estamos tendo muita participação online, muitas perguntas chegando do Brasil inteiro.
E a gente agora, por dez minutos, vai ouvir Cicera Patira, Embaixadora dos Povos Indígenas. Sim, gente. Em Brasília, nós temos uma Embaixada. Inclusive você poderia começar, Patira, explicando também, para os que estão nos acompanhando, o que é a nova Embaixada dos Povos Indígenas. Bem-vinda. Você tem dez minutos. Lá atrás, tem um cronômetro. E qualquer coisa, a gente vai te avisando.
A SRA. CICERA PATIRA (Para expor.) - Meu nome é Patira, sou do povo xucuru, sou indígena.
A Embaixada dos Povos Indígenas veio para mostrar para a população indígena que a gente pode. A gente pode conseguir as coisas através do diálogo. Os povos indígenas, nós, como a Senadora falou, nós hoje temos o poder da caneta para poder nos representar.
A luta dos povos indígenas é muito sensível, não é? Eu ainda estou um pouco sem chão, devido às coisas que vêm acontecendo dentro dos nossos territórios.
A Embaixada está ainda muito pequenininha, mas a gente precisa de apoio das pessoas, das autoridades, da Senadora também, que apoie a gente, para que a gente faça um trabalho extenso, nacional com os povos indígenas, encaminhando as demandas dos povos indígenas e podendo também fazer os trabalhos dentro das aldeias, como a agricultura familiar, como a expansão do artesanato - temos um projeto de artesanato dentro da Embaixada dos Povos Indígenas, em que compramos o material das aldeias, colocamos lá e revendemos para fora - ampliando todos os trabalhos dos povos indígenas.
E, no momento, ela ainda está pequena, mas, com as pessoas vindo, ajudando, divulgando o nosso trabalho... Ainda está um trabalho muito sensível, porque o índio nunca teve nada fácil. E, quando se abre uma pequena portinha dessa para a gente, é muito grande a oportunidade de a gente falar da dificuldade dos povos indígenas.
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Como a Damares falou, hoje não é dia de falar de coisa triste, não é dia de... É uma comemoração. Nós estamos aqui, e durante esses 30 dias muita coisa aconteceu - eu ainda estou em choque. Eu vim aqui por respeito e consideração à Senadora, mas nós estamos ainda em choque com tudo o que está acontecendo.
Mas eu queria dizer: visitem a Embaixada dos Povos Indígenas, autoridades. A gente está aqui para agregar, a gente está aqui para somar, a gente não está para desafiar ninguém, a gente está para caminhar juntos. Em tudo que se tratar de povos indígenas, nós estamos aqui para somar com todos.
E, vivam os povos indígenas!
É isto que eu posso dizer, gente: que nós somos as pessoas mais lindas do mundo, nós somos maravilhosos. Quando a gente olha para um bebê indígena, para uma mulher indígena, para aquela vidinha que está lá dentro da aldeia, isso é maravilhoso. Eu trabalho na causa indígena há 32 anos, e eu sou apaixonada pelo meu povo. Tudo que acontece com eles dói na alma. Quando a gente vê as coisas que acontecem, eu sempre encaminho para os direitos humanos, sempre que vem uma pauta para mim, eu encaminho. E a gente fica em choque, hoje, ao ver como as coisas estão acontecendo com os povos indígenas.
Gente, o Brasil evoluiu, os índios hoje têm direito de caçar, de pescar, têm direito de progredir, têm direito de fazer agricultura familiar. Então a gente pode expandir no artesanato, a gente pode expandir em todas as áreas.
Nós que moramos aqui também, no DF... São índios maravilhosos, gente. Eles vivem ali naquele cantinho no Noroeste, mas eles têm uma forma de viver, eles não perderam sua língua, eles não perderam seu costume - é uma aldeia tradicional. Temos várias etnias lá dentro, e a gente poderia construir uma coisa melhor lá dentro, sem tanto atropelo. Poderia ser um cartão postal de Brasília, lá dentro do Noroeste. Então, eu peço apoio às autoridades e para o pessoal do Noroeste, para que a gente possa crescer, Senadora. Junto com isso, levar a sustentabilidade para lá - para as aldeias do Brasil também.
Eu também queria dizer que seu trabalho é maravilhoso quanto aos povos indígenas.
É só isto que eu quero dizer, gente: apoiem os povos indígenas. A gente está precisando de apoio, a gente está precisando de uma mão amiga, estão entendendo?
É difícil falar. Para mim, como indígena, a situação em que eu vejo o meu povo às vezes dá uma sensação de impotência. A gente bota a mão na cabeça e dá aquela sensação de impotência, mas vamos em frente, vamos trabalhar, vamos unir as mãos, vamos fazer por onde construir um Brasil melhor, porque este Brasil é dos povos originários. Este Brasil é nosso, ele é nosso - todo o território nacional.
É só isso mesmo.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Patira...
Eu acho que ela merece aplausos. (Palmas.)
Ela deu aqui, para quem não sabe, uma aula de resiliência.
Ela está vindo de uma semana que foi triste. E aqui, como Comissão de Direitos Humanos, a gente registra o nosso repúdio ao lamentável episódio que aconteceu na semana passada. O acampamento estava tão bonito! O acampamento estava lindo! Eu não fui ao acampamento este ano.
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Mas, para quem não sabe, eu tenho uma filha indígena. Sou mãe de uma menina indígena de 26 anos. Linda. Você conhece desde pequenininha. Todo ano ela passa pelo acampamento e é muita alegria, é um momento em que os jovens riem, se encontram, é o momento em que essa nova geração se encontra, em Brasília. O acampamento é bonito. Aqueles que criticam é porque nunca foram ao Acampamento Terra Livre. Eu acompanho há anos. E estava tudo tão lindo, organizado!
O episódio que aconteceu aqui, próximo ao Congresso Nacional, nós repudiamos. Nós registramos nossa solidariedade. Eu estou acompanhando a apuração do episódio, um episódio em que nós tivemos uma legítima representante indígena, eleita democraticamente, agredida. E nós vamos acompanhar o desdobramento da investigação do que está acontecendo, mas esta Comissão não pode se silenciar.
Eu estava fora da Esplanada. Quando eu vi as imagens que foram chegando, vim correndo para cá, mas, quando eu cheguei, já tinham dispersado, já tinham... Foi tudo muito rápido. Mas a gente lamenta. Eu acho que o acampamento não poderia ter sido encerrado daquela forma, porque foi um dos acampamentos mais bonitos que aconteceram. E aquele incidente trouxe uma visão de que o acampamento estava desorganizado, de que o acampamento foi uma provocação. Não foi. O acampamento aconteceu como acontece todos os anos. Não desistam de se reunir.
E aí, Patira, você também tem um outro problema. Vocês estão enfrentando sérios problemas aqui no Noroeste - nós temos indígenas aqui do Noroeste. Mas ela deixou o problema dela de lado e falou como um todo. Eu sei que a vontade, como ativista, era a de abrir a boca, agora, e falar tudo o está acontecendo no Noroeste, mas ela não quis trazer o problema tão somente dela. Ela veio aqui... Mesmo num momento difícil para você, para a sua comunidade, você veio e celebrou. Isso é resiliência, é a capacidade que os nossos indígenas têm, no Brasil, de serem resilientes. Você não fez desta audiência um debate local. O nosso problema, no Noroeste, é local. Você não quis vir aqui à mesa para a gente afrontar o atual Governo do DF, as autoridades do DF, mesmo com vontade. Eu sei que a vontade é de falar do que está acontecendo no Noroeste. E daqui eu também reitero o meu apoio à luta das comunidades que estão ali no nosso Noroeste. É um direito conquistado a duras penas, nenhum passo atrás. Conte comigo.
Obrigada, Patira.
As mulheres indígenas são isso: são fortes, são resilientes, são mulheres que lideram. Há mulheres indígenas em lugar de posição: temos duas Deputadas Federais indígenas, Deputadas Estaduais, Vereadoras mulheres indígenas.
Todo o meu aplauso e admiração a vocês, mulheres indígenas.
Muito obrigada pela sua participação, muito obrigada.
Na sequência, de forma presencial, vamos ouvir... Já agradeço ao Cristian por estar aqui com a gente nesta manhã. Um abraço a sua Ministra. Por dez minutos. Se precisar passar um pouquinho mais, a gente deixar passar. Eu sou gentil. Somos tolerantes com o tempo aqui. Por dez minutos.
O SR. CRIS TUPAN (Para expor.) - Muito obrigado, Senadora Damares.
Eu vou pedir licença aqui. Eu esqueci os meus óculos de grau e esses aqui têm grau, para poder ler aqui.
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Com licença.
Antes de mais nada, quero saudar todos os presentes em nome do tiramoi Álvaro Tukano, que está aqui presente, uma liderança histórica não só em Brasília, mas dentro da luta da cultura dos povos indígenas do Brasil inteiro. Na pessoa dele, eu saúdo todos e todas presentes aqui e aqueles que nos acompanham também, de forma remota, pela internet.
Agradeço à Senadora Damares pela oportunidade que foi franqueada ao Ministério dos Povos Indígenas, aqui representado por mim, que teve todo o cuidado, Senadora, para, justamente, fazer deste momento da sessão aqui da CDH um momento, assim, de celebração, de conquista e de reivindicação sempre, porque nós povos indígenas temos esse papel.
Mas a gente reivindica sempre, Senadora, com alegria, porque a alegria, já dizia o Oswald de Andrade, é a prova dos nove. Então, essa é a sensação nossa. A gente luta, mas também come fruta. A gente é alegre. Nós não perdemos a oportunidade de sorrir, mesmo que nos faltem dentes, às vezes.
Eu também tenho que colocar aqui um ponto importante, uma vez que estamos sendo gravados, um registro dos povos indígenas com relação à solidariedade. Nós povos indígenas somos reconhecidos pela solidariedade e eu não posso deixar, neste momento, de me solidarizar com o Deputado Federal Glauber Braga, que se encontra, há mais de cinco dias, em resistência a uma cassação, possível cassação do seu mandato, fazendo aquilo que é também resiliência, que é pacificamente fazer uma greve de fome. Então, nossa solidariedade, dos povos indígenas, ao Deputado Glauber Braga.
A Senadora Damares pontuou, de forma incorrigível, o que aconteceu na semana passada. Então, digo a ela aqui que nós indígenas - isso já foi mostrado por ela mesma - não andamos sós. Diante do ataque à Deputada Célia Xakriabá e do ataque a todos os parentes dela, que ocorreram na semana passada, nós aqui entendemos que é importante a apuração, é importante a identificação dos responsáveis e a punição deles pela situação ocorrida, lamentavelmente.
As contribuições dos povos indígenas, Senadora, para a constituição do Brasil naquilo que diz respeito à economia, à cultura, à língua, ao desenvolvimento como um todo são inúmeras. Muitas delas a senhora aqui já elencou no discurso de abertura, mas outras tantas eu gostaria de assinalar, que são muito importantes também.
Mas não só - e isso é um marco entre nós povos indígenas - nós nos reconhecemos apenas em um Estado nacional. Nosso país é um estado transfronteiriço.
Então, fazemos fronteiras com países irmãos e esses países irmãos têm populações indígenas. E eles também têm contribuições que são, para nós, ancestrais, com a formação do povo indígena mundial.
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Eu cito, por exemplo, Senadora Damares, um caso que é exemplar para a situação inclusive de discussão política mundo afora hoje, especificamente nos Estados Unidos, o dos povos iroqueses. Os povos iroqueses são aqueles que moram no noroeste do Estado de Nova York, que vai fazer divisa ali com o Canadá. São eles, Senadora, e não outros, que vão contribuir, segundo os registros históricos, para a formação do federalismo estadunidense. É dali que nasce a ideia de Federação daquele país, não de outro lugar: ela é inspirada nos conselhos dos anciões, nos territórios e na autonomia desses territórios para tomar as decisões, ou seja, os Estados Unidos são concebidos a partir do autogoverno indígena dos povos iroqueses, os the big six peoples - assim são chamadas essas nações, essas grandes nações que vão dar esse exemplo.
Uma outra situação, Senadora, que nós temos de contribuição fundamental para a constituição do continente americano como este continente plural, diverso, são as civilizações Inca, Asteca e Maia, que vão contribuir com desde modelos de construção de cidades-estados até a conformação da alimentação do nosso continente como o milho, a abóbora, o feijão. Nós temos essa contribuição histórica, também, do povo mais próximo aqui da gente, na Bolívia, com os quíchuas, com os aimara, que vão ensinar a receita, para os ingleses, do fish and chips, que é boliviana: peixe e batata frita; peixe frito e batata frita. É dali essa contribuição, não só para o Brasil, onde também adoramos peixe, adoramos batatas, mas para o mundo.
Nós temos aqui os povos que contribuirão e contribuem muito com a nossa base alimentar, que é a mandioca, já caçoada algumas vezes, como quando foi pronunciado pela então Presidente Dilma, que foi, como mulher, ofendida, por conta de mencionar a questão da rainha mandioca. A mandioca é a base alimentar dos povos tupis-guaranis, então, ela é muito importante para a gente na questão da alimentação, não só ela como também a castanha, a pupunha. Quem nunca comeu um x-caboquinho com pupunha e um cafezinho? É um pouco doce demais para o meu gosto, mas combina, harmoniza perfeitamente. Isso para não falar dos registros portugueses sobre os vinhos! Diversos eram os registros sobre os vinhos de abacaxi aqui, o vinho de milho - que, entre nós guaranis é o avati, que faz a nossa tradicional bebida.
Há outros exemplos, Senadora, de resistência que vão conformar o nosso país.
O amado Maranhão, da Ministra Sonia Guajajara, teve a revolta da Balaiada, que vai dar conformidade... Vai ser a primeira grande revolta organizada por povos indígenas, camponeses, mas liderada, essencialmente, por indígenas escravizados. A revolta da Balaiada uniu indígenas, negros, sertanejos contra uma elite agrária, o que não é muito diferente do combate atual que nós fazemos, que também é contra uma elite agrária - não contra o agro que produz. E essa é uma falsa polêmica, Senadora, porque o agro que produz, o agro tecnológico, o agro sério, que é certificado, não é inimigo de ninguém, mas há, sim, grileiros invadindo terras indígenas; há, sim, pessoas, organizações e inclusive, com todo o respeito, políticos envolvidos numa grande trama de roubo de terras indígenas ainda hoje.
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A revolta do fusango da então agora agredida, mas já resistente, de pé, Célia Xakriabá, que foi ali em Minas Gerais. A terra de Minas Gerais ali da Deputada Célia Xakriabá teve indígenas recrutados à força para trabalhos em mineração, e não aceitaram, se ergueram e fizeram um levante, inclusive contra o próprio estado e venceram os povos xakriabá, krenak e pataxó.
A mais antigas de todas, Álvaro, que a gente conhece como revolução dos ta'mõi, mas também chamada de revolução dos Tamoios, incorretamente, que foi a luta do povo Guarani, a aliança do povo Guarani contra a escravização.
A Cabanagem, Senadora. Outro exemplo de resistência...
(Soa a campainha.)
O SR. CRIS TUPAN - ... povo tembé, munduruku, mura, também aliados entre si, para se organizarem contra as injustiças.
Por último, Senadora, a revolta da Cabanada, que é o povo xukuru-kariri e wassu, também em defesa das suas terras ameaçadas pela monocultura da cana de açúcar.
Eu quero encerrar. A Senadora Damares deu essa oportunidade aqui para falarmos também propositivamente, Senadora... a situação do orçamento, acho que para todos os ministérios, para todas as causas, realmente é algo a sempre se estar reavaliando e aprimorando, enfim... Inclusive, Senadora Damares, é de opinião da população brasileira - e aí eu volto ao início, é o motivo inclusive da tentativa de cassação do Glauber Rocha - é a questão do orçamento secreto, porque a gente pensa que os orçamentos devem observar o rigor da transparência. Este é um princípio que o orçamento deve garantir: a transparência, para que nós, povos indígenas e o povo brasileiro, possamos ter controle social e participação social conforme prevê a lei, nada mais, nada menos, para que outras críticas possam ser feitas...
Por último, Senadora, eu gostaria de ler agora nosso parente laureado na Academia Brasileira de Letras, Ailton Krenak, e, com isso, encerrarei minha fala aqui:
[...] eles podiam ter todos morrido de inanição, escorbuto ou qualquer outra pereba nesse litoral. [...] [Se] essa gente [...] não os tivesse acolhido, os ensinado a andar aqui e dado comida para eles, porque os caras não sabiam nem pegar um caju. Eles não sabiam, [...] [aliás], que caju era [uma] comida. [Eles] chegaram aqui famélicos, doentes. Darcy Ribeiro diz que eles fediam. Quer dizer, baixou uma turma na nossa praia que estava simplesmente podre. A gente podia ter matado [todos eles] afogados. Durante muito mais do que cem anos [mas o que] [...] [fizemos] foi socorrer os brancos flagelados chegando na nossa praia [...]
Então, uma grande contribuição, Senadora, nossa foi não ter afogado os que aqui chegaram primeiro, tê-los deixado vivos para tentar construir uma nação, que eternamente é do futuro, mas que parece que ainda se prende a um passado, mas, dado os momentos históricos, conseguiremos avançar para uma sociedade plural, democrática e realmente, aquela que o povo brasileiro merece.
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Então, vivam os povos indígenas e viva o povo brasileiro!
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Muito obrigada, Cris, muito obrigada. (Palmas.)
Ele trouxe um outro aspecto que muita gente talvez não lembrava: a contribuição dos nossos povos indígenas para a nossa soberania, para sermos a nação que somos. Eles foram para a guerra, eles foram para os conflitos, para que a gente tivesse hoje uma nação independente, uma nação para a gente chamar de nossa. E muita gente se esquece da contribuição de vocês, dos povos indígenas, para que a nossa soberania fosse garantida.
Inclusive, Cris, eu estive em um dos países da África, eu estive em Angola, e lá eu encontrei um monumento aos indígenas brasileiros que saíram do Brasil e guerrearam em Angola. Eles foram considerados soldados extraordinários para que Angola fosse independente. Então, é essa contribuição também dos guerreiros, que não têm medo, que foram para cima, para que o Brasil fosse Brasil.
Parabéns por essa abordagem! Muito obrigada.
Eu disse no início, Patira, que são duas Deputadas indígenas eleitas, mas são três. A Sonia Guajajara é uma Deputada também eleita, que está de licença por ser Ministra. Mas são três mulheres indígenas na Casa ali do lado. Quem sabe logo nós não teremos uma indígena aqui também na Casa maior?
Muito obrigada, Cris, pela sua participação.
Nós ouviremos agora Arnaldo Pareci, indígena do povo pareci, no Mato Grosso. Todos sabem no Brasil que é um dos povos que tem se destacado na produção agrícola. Nós vamos ouvir um pouco da experiência desse povo que tem avançado na área da produção agrícola.
Antes quero registrar a minha admiração e o meu carinho pelo Álvaro Tukano, que está aqui com a gente. Quando eu cheguei a Brasília, em 1998, em 1999, para me somar à luta dos povos, foi ele que me acolheu, foi ele que me abraçou e me ensinou muita coisa. Lembra? Ele me ensinou muita coisa. Ele ia lá na sala: "Doutora, deixa eu lhe explicar". Ele e o Sr. Henrique Terena pegaram na minha mão e me ajudaram muito a ser parceira na luta. E é muito bom vê-lo aqui hoje, muito bom. Que Deus o abençoe e obrigada por tudo que o senhor tem feito aqui - e muita gente não sabe -, nos corredores, às vezes de forma silenciosa, pela garantia dos direito dos povos. Obrigada por estar conosco. Toda a minha honra, a minha admiração, o meu louvor ao seu trabalho. Obrigada.
Arnaldo Pareci, seja bem-vindo!
O SR. ARNALDO PARECI (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, Senadora!
Consegue me ouvir?
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Sim, perfeito. Está muito bom.
O SR. ARNALDO PARECI (Por videoconferência.) - Obrigado pela oportunidade, Senadora.
Primeiro eu gostaria de lamentar não estar presente. Eu estou a caminho de Brasília, mas, por alguma razão, eu não consegui chegar ainda. Mas logo estarei aí.
Meu nome é Arnaldo. Sou da etnia pareci, sou morador de uma terra indígena no Município de Campo Novo.
Talvez possa parecer um pouco estranho, no meu relato, o meu trabalho, aquilo que eu vou apresentar, mas eu venho justamente de uma superação.
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A minha etnia, como haliti-paresi, conseguiu ultrapassar essa barreira que, podemos dizer assim, nos dias atuais ainda, elimina povos indígenas, extermina, através de mortalidade infantil, de desnutrição, de evasão das suas terras. Então, isso também ainda é um extermínio.
Se virmos agora os últimos dados do IBGE, ficamos tristes por ver a grande quantidade de indígenas morando fora do seu território. Apesar de nós termos somadas, no nosso território, áreas de preservações e áreas de territórios indígenas, nós temos 30% do nosso país de área preservada com essas duas modalidades. Infelizmente, ainda a gente vê indígenas saindo dessas terras para morarem na cidade. Foi o que acontecia com o nosso povo há 25 anos, 30 anos, quando nós paramos, sozinhos, sem o apoio de ninguém, para pensar: o que está acontecendo com essa etnia? O que está acontecendo com o nosso povo, que, na década de 30, chegamos a pouco mais de 380 índios?
Foi quando paramos para pensar: estamos perdendo a nossa cultura, tendo nosso território demarcado e estamos buscando trabalho fora. O que fazer para poder voltar aqui dentro, erradicar a mortalidade infantil e viver novamente? Foi quando buscamos o Estado brasileiro, que, infelizmente, não deu resposta à altura, a não ser programas de assistencialismo que não somavam em nada, apenas atendiam de forma emergencial, mas, quando aquilo se acabava, toda a problemática voltava, aliás, voltava com muito mais força.
Foi quando nossas lideranças apresentaram um projeto de desenvolvimento econômico para o nosso povo. Aí paramos para pensar: desenvolvimento econômico, se nós precisamos de recursos para nos manter dentro da terra indígena, para manter a nossa cultura e para conseguir ter uma qualidade de vida, como fazer para buscar esses recursos?
Foi quando nós olhamos: o que nós sabemos fazer? Nós somos trabalhadores rurais da agricultura mecanizada de toda aquela população que tem no nosso entorno.
Aí eu gostaria muito de aproveitar e parabenizar o meu antecessor, o Cris, que falou. Pela primeira vez, eu consigo ver uma pessoa com tanta lucidez diferenciar o agronegócio da grilagem de terra indígena. Parabéns! Fiquei muito contente com a sua fala, porque, realmente, nós povo pareci somos produtores rurais. Nós somos produtores rurais da parte legal, do bem praticado na agricultura brasileira. Nós também somamos com o desenvolvimento econômico e nós temos um histórico que hoje nós carregamos como uma grande responsabilidade, porque todos os outros povos indígenas estão de olho em nós para ver se o nosso projeto vai ser bem-sucedido, porque somos a esperança de muitas outras etnias que ainda precisam desenvolver atividades econômicas aqui dentro.
Foi dessa forma que nós decidimos optar por atividades agrícolas mecanizadas de grande escala dentro dos territórios Pareci, Manoki e Nambiquara, que são três etnias.
Eu até mandei um material que apresenta um pouco do nosso trabalho. Não sei se vai ser possível, não sei se o tempo vai dar, mas, se for possível, eu gostaria muito de mostrar.
Eu tenho um com áudio, através de inteligência artificial, um áudio um pouco ruim, mas, pelo fato de eu não estar presente, foi o meio que eu achei de fazer esta apresentação. Se for possível, eu gostaria; se não, eu me apego aqui ao meu tempo para tentar falar um pouco mais sobre a importância do desenvolvimento de atividades econômicas dentro das terras indígenas. E eu falaria o que para nós hoje existe como gargalo na política brasileira, gargalos esses que precisam ser superados, para que a gente possa fazer as atividades econômicas dentro dos territórios indígenas, com responsabilidade, respeitando toda a legislação, tanto a ambiental como a questão social e cultural dos nossos povos.
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A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Arnaldo, você já pode compartilhar sua apresentação.
Você consegue compartilhar daí?
Nós estamos...
O SR. ARNALDO PARECI (Por videoconferência.) - Não, acho que não vou conseguir compartilhar daqui. Eu estou só no celular. Esse é um material...
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - O.k.
O SR. ARNALDO PARECI (Por videoconferência.) - Mas tudo bem. Eu vou me apegar um pouco, no resto do tempo, para falar sobre aquilo...
Eu vou tentar resumir aqui. Quando chegar o meu tempo, por favor, avisa-me, tá?
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - O.k., pode continuar.
O SR. ARNALDO PARECI (Por videoconferência.) - Está o.k. Então, nós estamos vindo de uma população que estava praticamente extinta. Vinte anos atrás, vinte e dois anos atrás, nós éramos 1.250 índios. Desses 1.250 índios, 270 eram moradores de cidades e outros, mais de 300, moradores das fazendas. E quando nós implantamos esse nosso...
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Nós vamos interromper. O Arnaldo tentou chegar em Brasília, mas não conseguiu, está na estrada.
Vocês perceberam que ele está em um ambiente comercial...
O SR. ARNALDO PARECI (Por videoconferência.) - Imediatamente, nós...
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Eu acho que ele está com problema de conexão.
Nós podemos interromper a fala dele e, se ele conseguir voltar depois, a gente traz.
É uma pena. O Arnaldo Pareci...
O povo pareci tem se destacado na produção da soja. É um povo que tem... Inclusive, a história deles tem motivado outros povos também a irem para a área da produção, de uma produção mais organizada, uma produção com tecnologia. Eles estão usando tecnologia na área deles. E seria interessante a gente ver as imagens. Mas fica aqui o registro.
Nosso agradecimento ao Arnaldo.
E quero orientar a quem está nos acompanhando pela TV Senado e pela internet: conheçam a história do povo pareci, um povo que era reduzido, um povo que estava em muito sofrimento e decidiu ousar e produzir. Produzir com tecnologia, uma produção sustentável, com acompanhamento dos órgãos indígenas e acompanhamento também dos órgãos federais na área da produção, da pesquisa, como a Embrapa e tantos outros.
Parabéns aos parecis pelo que estão fazendo, inspirando outros povos também.
Na sequência, nós vamos ouvir Rafael Suruí, da Terra Indígena Sete de Setembro, em Rondônia - a gente sai do Mato Grosso, agora vai para Rondônia -, que vai compartilhar conosco a história de sucesso da produção de café em terra indígena.
Rafael, seja muito bem-vindo.
Obrigado por estar conosco nesta audiência. (Pausa.)
Estou recebendo a notícia que também o Rafael não está conectado ainda.
Vamos continuar, temos outros preletores, via online.
Estamos com Raimundo Guajajara, Cacique Presidente do Conselho Supremo Nacional dos Caciques Nativos Originários Indígenas do Brasil. Ele vai falar sobre as dificuldades.
Nós iríamos ter dois exemplos de sucesso, os parecis e também a outra apresentação, de Rondônia. Eles vão voltar a falar ainda, mas vamos ouvir o Raimundo Guajajara falando sobre as dificuldades de os povos empreenderem.
Raimundo, dez minutos.
Seja bem-vindo e obrigado por estar conosco.
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O SR. RAIMUNDO GUAJAJARA (Para expor. Por videoconferência.) - Em primeiro lugar, quero agradecer a Deus por esta rica oportunidade para mim. É um rico espaço para nós, Senadora Damares, num momento tão triste pelo qual nós estamos passando hoje no Brasil, neste momento, em que nós estamos passando pelo Governo Lula, por como ele está nos tratando. E eu não poderia deixar de falar e trazer esta voz, porque é uma oportunidade única, e nós sentimos de levar ao conhecimento do Senado, ao conhecimento da sociedade, ao conhecimento de todos, porque, nesses últimos dias, a gente não vem sendo ouvido, Senadora.
Agradeço ao Senado, agradeço à senhora, como Senadora, e também a todos os amigos que nos acompanham neste exato momento.
E, aqui, eu quero falar um pouco na minha língua, porque tem parente indígena nosso, da etnia guajajara, participando desta reunião, entendeu?
(Pronunciamento em língua indígena.)
O SR. RAIMUNDO GUAJAJARA (Por videoconferência.) - Então, Senadora, desculpe-me pela minha fala, nesse exato momento, em meu idioma, mas tem parentes nos ouvindo, e muitos, muitos parentes aqui do Maranhão queriam estar participando. Minha irmã também tentou entrar, mas não conseguiu; e outros mais lá da região de Arariboia. O Cacique Evaldo, lá de Arariboia, queria falar; o Bira; o Zé Marcos também, do Arame, queria falar; entre outros.
Mas agradeço, aqui, nesta oportunidade. E eu quero dizer o seguinte: nós aqui estamos sem apoio do Governo Federal - do Lula -, entendeu? Nós estamos sem apoio da Ministra Sonia Guajajara, que realmente encanta muito e prega muito só coisas boas por aí, mas no nosso conhecimento aqui, no Estado do Maranhão, é, realmente, só pregação mentirosa e enganosa, pelo que está acontecendo aqui.
A última agora é que estão perseguindo os índios, que geralmente buscam um meio de sustento já sem apoio do governo, buscam o seu sustento, sustentar a sua família, sustentar a sua comunidade. E aqui, na minha região, os índios estão se suicidando, porque o Governo não dá perspectiva de vida pro nosso povo.
E a gente tenta não falar essas coisas, mas é a oportunidade que nós temos de levar ao conhecimento do Governo, ao conhecimento do Congresso e ao conhecimento das autoridades, para que possam tomar uma providência sobre o que realmente está acontecendo conosco.
Nesses dias, aqui, no começo do ano, nós tivemos um suicídio por questão de fome; e agora teve outro que morreu por questão de fome também, entendeu?
Nós temos um Ministério dos Povos Indígenas, que cuida das populações indígenas, e só faz pregar, mas o que realmente é pra se fazer... O Ministério dos Povos Indígenas foi uma esperança pra nós, mas, pelo jeito que está acontecendo, ele está nos perseguindo, está nos matando no papel e caneta. É só discurso bonito, só fala bonita, quando, na verdade, nós é que estamos sofrendo a cada dia nas nossas aldeias, sem projeto, com os índios sendo perseguidos, os caciques sendo desrespeitados, como aconteceu agora, nesses dias, com o Cacique Evaldo, da Aldeia Indígena Arariboia. Um cacique sendo desrespeitado dentro do seu próprio comando, dentro da sua própria comunidade, que não roubou, que não invadiu nada de ninguém, que só está criando seus gadinhos lá para sustentar a sua família, para somente preservar a sua saúde, e, de repente, vem sendo realmente atacado pelo Ministério dos Povos Indígenas, pelo aparato que realmente a Sonia está mandando fazer?! Isso para nós é a família da Sonia que está sendo atacada, ela mesma está atacando a família dela. Então, eu não queria dizer isso não, mas é isso que está acontecendo.
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Então, desde já, ilustríssima Senadora, pedimos que a Comissão de Direitos Humanos venha visitar Arariboia e venha visitar o Maranhão, ouvir as nossas lideranças - e, logo, entendeu? -, porque eu não quero só eu falar, porque tem muitos aqui nessa situação. A verdade está aqui nas nossas aldeias. Eu preciso, eu quero que realmente venha uma Comissão de Direitos Humanos visitar as nossas comunidades, porque nós estamos sofrendo, nós estamos sofrendo e nós queremos trabalhar, mas, da forma como está acontecendo aqui... Nós temos um trabalho, os parentes estão trabalhando no topo do manualzinho ali, aí de repente a polícia vem e ainda estraga, corta as cercas, que realmente preservam para não ter problema com outro parente.
São situações, Senadora, de que eu não queria estar falando não, mas é o único meio de a gente estar levando essa voz desse povo, e nós queremos, sim...
E outra coisa: a Ministra não serve para nós. O Governo tem que tomar providência de tirá-la e colocar pessoas que têm compromisso com nossa realidade, compromisso com as populações indígenas, compromisso de proteger os nossos princípios e os nossos direitos, porque, da forma como a gente está aí, realmente, nós estamos, nós não sabemos nem... A gente está muito triste, muito triste mesmo. A pessoa que realmente deveria nos dar esperança está dando é desespero para nós.
Então, é isso que eu tenho a dizer neste exato momento. Eu fico feliz pela fala do parente aí, mas esse discurso aí, parente, não serve para nós, não. Vocês estão usando só essas falas de vocês bonitas aí, quando o nosso povo está é se acabando na aldeia aqui. Sinceramente, eu...
Está aqui o nosso repúdio do nosso conselho. Nós queremos um diálogo, mas um diálogo que venha dar melhoria de condição para nós, e nós não sermos atacados que nem está acontecendo, porque, se isso está acontecendo aqui no Maranhão, imagine com outros povos, imagine com outros povos, como os ianomâmis, largando as suas aldeias para viver nas periferias? Isso é coisa realmente impossível! É inadmissível o índio largar seu território!
Olhe, o que nós queríamos que acontecesse no Ministério dos Povos Indígenas era mais projetos, mais melhoria, mais educação, mais saúde. Nós temos que ter um diálogo, conversar, nos entender. Se a Ministra estiver vendo uma coisa de errado nas comunidades, pois então se sente com os povos indígenas, dialogue com os caciques - entendeu? -, mas não agindo de forma realmente tão absurda que nem está acontecendo.
Eu, infelizmente, fico envergonhado com isso, e outros também. Está tendo esse acampamento aí em Brasília, é louvável, é o único palanque que os parentes têm para levar a sua voz, levar a sua reivindicação para os poderes públicos aí de Brasília, para que as providências sejam tomadas. Mas de uma coisa eu discordo: essa cachaçada que está tendo no meio disso aí, isso aí realmente já nos envergonha, que nem agora o fato que aconteceu aí. Eu realmente repudio, entendeu? Se os caciques forem para Brasília, para a ATL, que realmente pensem na melhor forma possível, pensem na sua comunidade que ficou aqui para trás, mas não é para, realmente, ficar vivendo de cachaçada aí, isso aí não faz parte da nossa cultura, não! Ou alguém está usando esse movimento para causar esse tipo de prejuízo para nossa população, entendeu? Isso é um gasto grande que está acontecendo, esse dinheiro que está servindo à ATL era para estar servindo às aldeias, com projeto, melhoria de condição de vida para nossa população indígena. É isso que eu tenho que dizer neste exato momento. Nós queremos providência e queremos que a Comissão de Direitos Humanos venha visitar nossas aldeias aqui, no Maranhão, e nos ouvir diretamente, não só eu, mas todos os caciques que realmente precisam ser ouvidos, porque nós não estamos sendo ouvidos por este Governo, não; porque o Governo ouve só as ONGs, mas indígena mesmo, da base, a gente não está sendo ouvido, a gente está sendo é perseguido, ameaçado.
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É isso, Senadores, senhores. Desculpa pela minha fala, é porque eu não tenho outro meio aqui de falar, porque esse é o nosso sofrimento, essa é a nossa real situação que nós estamos vivendo diante desse Governo do Lula, né? Não tenho nada contra, mas eu estou levando essa minha fala aqui, porque ele é responsável por todos nós, e, se a gente não reclamar para ele, então a gente vai reclamar para quem? A gente não tem um outro Governo, a gente tem de Governo só ele, então ele é responsável por nós todos.
Por isso está aqui a minha fala, e é somente isso. Agradeço a oportunidade aqui, em nome de nosso grandioso Deus, Jesus.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Cacique Raimundo Guajajara, representante do Conselho Supremo Nacional dos Caciques Nativos Originários Indígenas do Brasil, que trouxe aqui a dificuldade de os indígenas empreenderem. Eu destaco uma frase da fala dele: "Nós queremos trabalhar, nós queremos produzir".
Inclusive, eu perguntei ao representante do ministério se o representante gostaria de dar uma resposta. Ele disse que não e ele disse uma frase aqui: "Os indígenas têm o direito de protestar, inclusive entre eles". E aí a gente traz aqui essa diversidade. Muita gente, Patira, pensa que os nossos indígenas do Brasil são uma massa de manobra, são pessoas que são manobradas; e a gente vê um indígena se opondo à própria Ministra indígena. O que mostra isso? Nossos indígenas pensam, falam, são articulados. Nossos indígenas são inteligentes, eles divergem, eles protestam, eles também entram em consenso, eles se reúnem, eles discutem, eles debatem. Então, mostrou-se aqui, hoje, nesta audiência, a diversidade, inclusive a pluralidade de pensamento entre os povos indígenas.
Obrigada, Raimundo. Nós vamos também acolher a sua reivindicação de um olhar especial para o que está acontecendo em sua área. Após esta audiência, nós vamos telefonar para você, vamos entender o que está acontecendo, Cacique, e, entendendo o necessário, nós vamos até a área, vamos entender o que está acontecendo, vamos conversar com o ministério também, com a Funai, e nós vamos acompanhar.
Quero agradecer a participação celebrando os povos originários, celebrando os povos indígenas, agentes detentores de direitos. Eu acho que essa é a frase com a qual a gente vai sair daqui nesta manhã.
Na sequência, de forma online também, vamos ouvir Henrique Terena. Ele é Professor, ele é Doutor e Presidente do Complei, que é um Conselho Nacional de Pastores e Líderes Evangélicos Indígenas. Sim, os indígenas também têm o direito de escolher a religião deles, e o Prof. e Dr. Henrique Terena vai falar sobre a contribuição dos povos para a educação, a cultura e a língua brasileira.
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E aí a gente destaca que são 274 línguas indígenas diferentes. Quando Ministra, quando eu ia à ONU, Patira, eu dizia: "Na minha nação, nós falamos português, nós temos outra segunda língua oficial, que é Libras, a língua brasileira de sinais, mas na minha nação também nós falamos 274 línguas indígenas". Gente, que pluralidade, que nação extraordinária, que nação incrível nós temos! Dizer para o mundo que nós temos aqui 274 línguas indígenas mais duas línguas oficiais, são 276, mas nós temos também os ciganos, que falam outro idioma, então que pluralidade cultural é a minha nação! E nós devemos isso aos povos originários, aos povos tradicionais.
Prof. Dr. Henrique Terena, por dez minutos. Seja bem-vindo.
O SR. HENRIQUE TERENA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos, em especial à Senadora Damares, meus amigos da mesa que puderam contribuir numa fala importante. Pena que nós não pudemos terminar a fala do Arnaldo, é um grande amigo que tem contribuído, ao longo desses anos, em especial com sua produção nas comunidades parecis, ele tem sido de muita importância e relevância para nossa comunidade tribal, não somente no Brasil, mas ao redor do mundo.
Senadora Damares, fico muito feliz por poder estar aqui. Primeiramente, agradeço a Deus e também pela especial contribuição de podermos ter aqui essa pluralidade, como a senhora mesma disse, essa diversidade, em que nós podemos ter esta mesa de diálogo, muitas vezes de contestar aquilo que falamos, aquilo que ouvimos, mas acima de tudo também lembrar que nós pertencemos a povos diferentes, culturas diferentes, línguas diferentes e, acima de tudo, essa importância no cenário brasileiro dessa contribuição singular que todos nós como indígenas temos.
Eu quero começar falando dessa diversidade linguística que temos e ainda a gente escuta, ao longo de nossa caminhada, alguém pensando que o Brasil apenas fala uma língua tribal, a língua guarani. Não é verdade, nós acabamos de ouvir a respeito das diferenças das línguas, essa coisa bonita que temos no nosso país, pouco mais de 350 etnias, com essa diversidade linguística, cultural, e a importância que ela tem no cenário brasileiro hoje, em aspectos muito claros no nosso país. Nós temos, por exemplo, ruas, cidades, lugares que têm essa nomenclatura indígena, o que faz lembrar que temos em nosso país essa diversidade, em que podemos olhar para uma rua, para um estado e ali ter nomes que reverberam as línguas tribais do nosso país.
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Língua e cultura estão interligadas. Eu sempre digo que os povos que perderam a sua língua perderam a sua identidade. Muitos de nós, muitas vezes, pensamos: "Ah, espera aí, mas o português é importante?". Não tenha dúvida nenhuma, mas nós, como indígenas, temos que entender que temos uma língua, a nossa língua, e, no meu caso específico, por exemplo, a terena, do povo tereno, eu falo a minha língua. Então, muitas vezes, os nossos parentes perderam a sua língua e, quando se perde a língua, perde-se a sua própria identidade. É importante que nós tenhamos essa consciência de que a nossa língua é importante.
Nos anos 90, nós começamos um movimento no Brasil chamado Conplei (Conselho Nacional de Pastores e Líderes Evangélicos Indígenas) que, então, junto com os demais irmãos, era um grupo de acadêmicos que se sentou para discutir assuntos relevantes, entre eles a preservação da nossa cultura, o convívio com outras culturas, sobretudo com essas demandas que nos cercam a cada dia. Eles eram evangélicos e precisavam entender um pouquinho essa demanda. E, a partir dali, então, começou esse movimento em que nós tivemos, assim, a grata satisfação e a importância de que hoje... A Senadora Damares, desde lá, nos ajudou nesse caminho, nos dando incentivo, nos acompanhando, nos encorajando para que de lá pudéssemos caminhar ao longo desses anos com toda essa proposta, não somente na questão religiosa, que é importante. Todos nós temos o direito de escolhas. Nós viemos de um país de pluralidades, como nós falamos, e a escolha dos nossos caminhos religiosos é importante. Todos nós temos essas escolhas, e é importante que escolhamos bem os nossos caminhos.
E o Conplei é um movimento que já existe desde 1990, 1991, praticamente foi o seu início, portanto, por mais de 30 anos já como existente e temos vivido momentos muito especiais. Trabalhamos na área da cultura, trabalhamos na área da língua, da preservação da língua, trabalhamos na área também da parte social, com médicos, com universidades, com escolas e com alguns convênios com a universidade para que os nossos irmãos indígenas possam assumir responsabilidades, mas através do conhecimento.
A própria Damares, a nossa eterna ministra, disse que nós indígenas estamos buscando saberes, conhecimento, muitos de nós com formação acadêmica muito boa. Queremos agradecer aos nossos pais e àquelas pessoas que estavam ao nosso redor, que nos incentivaram a viver essa vida, a buscar essa vida acadêmica, mas não esquecendo das nossas bases, das nossas raízes.
Então, o movimento Conplei tem esta finalidade: trabalhar não somente a questão espiritual, mas também as questões sociais; nas demandas na área do alcoolismo, que batem fortemente dentro de nossas comunidades; na área das drogas, nós temos um centro de recuperação de indígenas; na área do vício, com equipamentos, com médicos, com sociólogos, com profissionais que acompanham esses irmãos indígenas. Trabalhamos também com a área da criança, de trazê-las para uma vivência não somente dentro das suas comunidades, mas também fora. Trabalhamos com as mulheres. Sabemos perfeitamente que as mulheres têm uma força enorme nas comunidades indígenas, então trabalhamos com elas. E trabalhamos com os jovens.
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Nós descobrimos recentemente, senhores e senhoras presentes, que um pouco mais da metade da população indígena no Brasil está buscando conhecimentos. E, só no nosso caso, do povo terena do Mato Grosso do Sul, que é onde nós estamos atualmente, segundo uma pesquisa que fizemos aqui, 70% dos nossos jovens terenas estão na universidade. Mas eles criaram um bloco; eles não se encontram bem dentro de uma universidade e, quando voltam para suas comunidades, sentem também um certo desprezo pelo conhecimento acadêmico que eles têm. Então, nós olhamos para esse mundo importante que é a nossa juventude e criamos um movimento para eles, especificamente para os jovens. Nós nos reunimos, em três a quatro encontros por ano, e, a cada encontro desses jovens, há em torno de mil a 1,5 mil jovens reunidos por três dias, discutindo o que eles precisam fazer para suas comunidades, o avanço da tecnologia e as melhorias de vida.
Trabalhamos também com várias outras etnias. O Conplei hoje é um movimento em que temos, aproximadamente, um pouco mais de 120 etnias ligadas ao movimento; um pouco mais de 3 mil líderes indígenas no Brasil hoje fazem parte desse movimento. E, a cada encontro que temos, de quatro em quatro anos, reunimos de 3 mil a 5 mil líderes; reunidos para sentar, ter uma comunhão, orar junto, conversar, debater assuntos específicos das nossas comunidades. Agora, nos dias 28 a 31 de agosto, lá em Porto Velho, na Base da Missão Jocum, estamos esperando 5 mil líderes para esse grande encontro. Então, queremos convidá-la, Senadora Damares. Se puder estar conosco nesse dia, será um privilégio e um prazer muito grande para nós.
Encerro a minha palavra aqui, Senadora, dizendo que nós estamos envolvidos não somente na questão espiritual, mas na questão social e queremos ver esse movimento crescer. Nós temos hoje no nosso país pessoas que podem debater de igual para igual, e não apenas um viés, não apenas um lado da história. Queremos debater um todo, levar consciência para o nosso Brasil de que há indígenas que pensam, há indígenas que podem conversar, que podem debater, que podem trazer à mesa situações, que podem contribuir de modo mais amplo com o movimento indígena no nosso país. Nós não queremos ficar isolados, nós não cremos que precisamos ficar isolados; nós precisamos avançar cada vez mais. Nós não podemos viver de histórias apenas, do passado, queremos viver na realidade de hoje. As histórias são boas? Excelentes. Elas fazem parte da nossa caminhada, mas nós não precisamos ficar no passado, contar histórias de pessoas, de etnias que viveram no passado. Eles são importantes? São de suma importância, mas nós queremos viver o presente. Como nós como indígenas, hoje, agora, neste momento, podemos contribuir para o nosso país, para o progresso do nosso país?
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Então, a minha fala, nesta manhã, é trazer a reflexão para nós, enquanto povos indígenas, trazer essa realidade dessa cultura, dessa língua, dessa socialização que nós temos, enquanto povos tribais em nosso país, que têm ideia, têm pensamento, que sabem falar, mas não deixaram a sua cultura, não deixaram a sua base, não deixaram as suas origens.
Então, Dra. Damares, muito obrigado por este tempo em que estamos aqui falando. Agradeço aos meus pares que falaram agora há pouco. E ressalto aqui a importância de, talvez em algum outro momento, trazer em debate, talvez, a palavra do Arnaldo, porque ele tem muito a contribuir para nós no cenário de produtividade em nosso país.
Que Deus abençoe! (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Dr. Henrique Terena, Pastor. Eu me esqueci de falar que o senhor também é Pastor - Pastor, Doutor, Prof. Henrique Terena.
Dr. Henrique Terena, nós estávamos vendo a sua imagem aqui, e eu até conversei com a Patira e com o Cris: a sua estante atrás tem cestos artesanais e livros. Essa sua estante atrás, só ela, foi um recado de que é possível fazer o artesanato, é possível ter o meu cocar, o meu colar, mas é possível também ser doutor, as coisas não se separam.
E aí eu queria lhe fazer uma pergunta, Dr. Henrique. O senhor falou que o senhor é o líder de um movimento de pastores indígenas, líderes e pastores indígenas, o senhor falou que tem mais de 3 mil líderes evangélicos indígenas - líderes indígenas evangélicos -, e todo mundo pergunta, inclusive eu vejo esta pergunta o tempo todo: é possível se converter ao catolicismo, se converter ao evangelho, ou mesmo ser muçulmano... Eu já encontrei indígenas brasileiros muçulmanos, indígenas brasileiros espíritas. É possível se converter a uma outra religião e manter a sua cultura, Dr. Henrique?
O SR. HENRIQUE TERENA (Por videoconferência.) - Sem dúvida nenhuma, Senadora Damares.
O indígena é um ser humano como qualquer um, tem direito às suas escolhas e nós escolhemos servir a Deus, servir a Cristo. E, nessa população ampla, segundo o IBGE, um pouquinho mais de 30% da população de índios no Brasil são evangélicos. Então, esses 3 mil líderes indígenas, que estão aqui, que representam o Conplei hoje no Brasil, são de várias etnias, um pouco mais de 120 etnias.
Então, sem dúvida nenhuma, nós temos essa liberdade de escolha. E outra coisa: o evangelho não é uma religião, o evangelho tem um nome, ele se chama Jesus Cristo de Nazaré. Então, nós, como crentes em Cristo Jesus, temos também, como indígena, como qualquer outro ser humano na face da terra, o direito de escolhas e nós optamos pela escolha dessa nova vida no Senhor Jesus.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Dr. Henrique Terena. Muito obrigada.
Nós vamos para a última expositora, a Mitore Cristiana, que é da Articulação das Mulheres Indígenas.
Mitore, seja muito bem-vinda. Obrigada por ter aceitado o convite para participar desta audiência.
A SRA. MITORE CRISTIANA TIRIYO KAXUYANA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos. Bom dia, Senadora.
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Meu nome é Mitore, eu sou daqui da Região Norte, entre o Amapá e o norte do Pará. Sou articuladora das mulheres indígenas tiriió, caxuiana e txikiyana.
Então, falar um pouco sobre a contribuição dos povos indígenas do Brasil, em relação ao nosso papel, à nossa contribuição como mulheres, mulheres indígenas, para o Brasil.
No nosso trabalho, nós temos uma articulação das mulheres, em que nós mulheres da nossa região nos articulamos para a gente poder planejar ou fazer o nosso trabalho dentro do nosso território. O nosso trabalho está voltado para desenvolvermos o fortalecimento intergeracional, dos mais jovens e dos mais velhos também.
Na parte de geração de renda, nós mulheres trabalhamos com artesanato, tanto de miçangas, como de sementes que tiramos das florestas do nosso território. Trabalhamos não só nessa questão das miçangas, não é só em um aspecto, trabalhamos também com sementes, como eu já falei. O nosso trabalho é sempre amplo: são sementes, são cantos, são danças, são rituais de iniciação. Os jovens estão aprendendo com os mais velhos a fazerem artesanato, aprendendo o canto.
O nosso trabalho está voltado mais para estas questões: trabalhamos com artesanato para gerar renda para nós mulheres e, dentro e fora do território das mulheres, sempre estamos fazendo nossas artes. Nós temos trabalhado com vários artesanatos, pimentas, entre outros trabalhos que estamos desenvolvendo dentro do nosso território. Quando a gente produz essas artes, a gente vende dentro do território e fora do território também.
Então, esses são os papéis nós estamos desenvolvendo e fazemos disso tudo um pouco: a gente fala que é o movimento de autonomia das mulheres. Esse é o tipo de organização das mulheres nas políticas, em que as mulheres também estão organizadas para participar de encontros.
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Dentro e fora do nosso território, nós temos realizado encontros anuais, para podermos conversar, dialogar entre nós mulheres da nossa região.
E também, atualmente, a gente tem participado dos movimentos indígenas fora do território, que são em nível nacional, regional. O nosso povo, as mulheres têm feito, participado, lutado para podermos defender o nosso direito, o interesse das mulheres, o direito das mulheres.
Apesar de nós, o povo tiriió, caxuiana e txikiyana, ainda falarmos a nossa língua - não falamos bem a língua, mas compreendemos português -, em nossas gerações, nós passamos para nossos jovens, para os nossos filhos que aprendam a nossa língua, o nosso modo de viver dentro do nosso território, para que elas possam levar essa língua materna nossa para as futuras gerações, porque a nossa cultura, a nossa língua, o nosso modo de viver é a nossa identidade. A gente fala isso sempre. Nós indígenas, como os parentes falaram, hoje em dia, temos essa tecnologia que usamos para podermos trabalhar, aprender as coisas de não indígenas, mas nós nunca deixamos de ser indígenas, porque isso está no sangue, está na memória, é nosso. A gente traz, a gente vai levando, aprendendo e repassando para nossas gerações.
Então, a Apitikatxi, a nossa articulação está trabalhando voltada para estas questões de fortalecimento do trabalho das mulheres, do trabalho e da renda das mulheres e dos homens também. Hoje em dia, a gente vai trabalhar com os jovens também, porque eles... Os jovens são os que a gente considera as futuras lideranças, os futuros caciques. Então, a gente está nessa formação, tirando um pouco dos nossos ancestrais, trazendo um pouco do outro conhecimento. Eu acho que esse compartilhamento de dois lados é muito bom, é importante, porque, hoje em dia, a gente tem esses dois lados. Então, a gente tenta aprender um pouco, para a gente poder adquirir esse conhecimento - que não é da gente, não é? - e manter o nosso conhecimento, que é o conhecimento dos nossos ancestrais. Então, eu acho que é muito importante.
Nós mulheres temos contribuído muito para o desenvolvimento do Brasil nesta questão, cuidando da natureza, cuidando dos rios. O território, para nós, é como se fosse nossa mãe - não é? -, para a gente cuidar dos nossos filhos, do nosso alimento... Hoje em dia, a gente está trabalhando muito na questão de fazer roça sem queimada, porque, hoje em dia, a gente percebe que existem mudanças climáticas, a gente está sentindo essas mudanças climáticas dentro do território da gente. Às vezes, há muito sol, e o alimento não cresce.
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Então está tendo tudo isso para a gente poder... Nós indígenas sempre contribuímos para essas coisas, porque a gente protege a natureza, as florestas. Então, é essa também a nossa contribuição como indígena, como mulher, para o mundo, para o Brasil.
Eu acho que nós mulheres estamos fazendo esse trabalho, dentro e fora do nosso território. Então a gente busca, nesse sentido, contribuir para o Brasil. E nós mulheres temos percebido, aqui no Brasil, os nossos parentes sofrendo com o garimpo. Garimpo no território não é bom para nós indígenas, porque a gente depende muito de água potável - que é oferecida pela natureza - e da caça e pesca. Eu acho que tudo isso está contribuindo para que ocorram essas mudanças climáticas dentro do nosso território.
É disso que eu queria falar um pouco, e do desafio da caminhada das mulheres na política. Hoje em dia, nós mulheres, de todo o Brasil, sentimos que, quando a gente quer ocupar aquele espaço, a gente se sente um pouco discriminada. Tem aquele preconceito: "Olha, a indígena ainda é pequena, pensa pouco, é incapaz"; mas, não, nós mulheres, nós indígenas somos capazes, sim, de estar nesses espaços políticos. Eu acho que é muito importante a gente participar dessas decisões, porque a gente conhece a nossa realidade. Nós somos brasileiras, nós somos desse país, nós somos originários. Então eu acho que é muito importante a gente ter esse espaço para nós, para que as mulheres tenham os seus projetos apoiados, para incentivo e fortalecimento de sua cultura.
Eu acho que é essa a importância para nós, mulheres dessa região: a gente estar nesses espaços e garantir os direitos, o território. Tem muitos parentes que ainda não têm território, e a gente precisa garantir esses espaços para eles, porque está garantido na Constituição, mas no papel; na prática, ainda há muitas pessoas querendo demarcar seu território, o reconhecimento do seu território.
Então, eu acho que é tudo isso. A gente está contribuindo neste sentido: com a nossa cultura, com a nossa culinária, com a nossa dança. Eu acho que, com tudo isso, com essas coisas a gente está contribuindo.
Então era isso que eu queria falar. Obrigada.
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A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Mitore, muito obrigada! Você trouxe uma abordagem que nos trouxe muita alegria. As mulheres indígenas estão se reunindo em associação - a Mitore participa da articulação das mulheres indígenas de três povos -, mas a gente está vendo isso no Brasil inteiro, Patira, as mulheres indígenas se organizando, uma fortalecendo a outra, uma cuidando da outra.
Os mesmos desafios que nós enfrentamos, aqui fora, as mulheres indígenas, em seus territórios, também enfrentam: elas enfrentam o dia a dia da violência contra a mulher indígena, como nós enfrentamos, aqui na sociedade, a violência contra as mulheres; a dificuldade para a mulher indígena ascender, da mesma forma que nós temos as nossas dificuldades, aqui fora, para a mulher não indígena ascender; da mulher indígena na política. Olha como ela falou da dificuldade: "Não acreditam no nosso potencial", mas, mesmo não acreditando, elas estão avançando. Há três Deputadas Federais eleitas; a Ministra dos Povos Indígenas é uma mulher; a Presidente da Funai, hoje, é uma mulher - mulher indígena ocupando lugares de destaque.
Eu quero que vocês entendam que isso não foi fácil, foi uma luta muito difícil. Elas merecem todos os aplausos por romperem, inclusive, barreiras culturais da violência, da subjugação. Assim como nós aqui, do lado de cá, também enfrentamos, todos os dias, as barreiras, porque querem nos colocar num lugar de ostracismo, de silêncio, a mulher indígena também encontra essas dificuldades. E elas estão se organizando, elas estão se unindo. Parabéns pelo trabalho que vocês fazem de perpetuar a cultura, a língua, de ensinar as novas gerações, mas também lutar pelos espaços aqui fora, e os espaços de poder e de decisão também na comunidade de vocês! Muito obrigada por sua participação, muito obrigada!
Inclusive, Cristian, esta Casa tem aprovado leis, e a cada momento em que uma lei de proteção da mulher é trazida para votação, a primeira coisa que eu pergunto: vai alcançar a mulher indígena? Nós estamos, infelizmente, neste Congresso, aprovando leis sem pensar na aplicabilidade delas lá na aldeia, lá na comunidade, lá na ponta. Não se pode mais falar em leis, em políticas públicas, sem alcançar todos, e que sejam para todos. Muito obrigada pela forma como você trouxe a sua abordagem, as mulheres indígenas contribuindo para a nossa nação.
Nós estamos chegando ao final de nossa audiência, mas eu quero dizer que nós estamos tendo muita participação online. Eu vou ler algumas das participações, e a gente já vai para o encerramento, devolvendo a palavra para quem estiver online ainda para agradecimentos, considerações finais, assim como a Patira e o Cristian.
Aline, do Rio de Janeiro, pergunta: "Como o Estado tem garantido a demarcação e proteção dos territórios indígenas diante das pressões do agronegócio e da mineração?". Se quiser responder a alguma das perguntas, fique à vontade.
Júlia, do Rio Grande do Sul, pergunta: "Como a Convenção nº 169 da OIT fortalece a defesa dos direitos dos povos tradicionais frente a conflitos e violações no campo?".
Cristiano, de São Paulo: "Quais os principais gargalos na implementação da política nacional de atenção à saúde dos povos indígenas?".
Daniel, do Rio de Janeiro: "Além da demarcação de terras, que medidas o Estado deve tomar para assegurar os direitos indígenas nos âmbitos social, histórico e político?".
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Arthur, de Minas Gerais - gente, o Brasil inteiro participando -: "Como incluir saberes indígenas em políticas públicas sem [...] apropriação ou apagamento de suas culturas?".
Leandro, do Amazonas: "Como ampliar o acesso à saúde indígena, respeitando [...] [medicinas] tradicionais e [...] [superando] impactos da pandemia [...]?". Nós temos uma universidade no Acre, a Universidade da Floresta, que une o saber tradicional com a ciência. Que experiências como essa possam acontecer em todo o país!
Alberico, de Rondônia: "[...] [como] os povos indígenas podem contribuir [...] [para o] desenvolvimento econômico [...] sem violar sua [...] cultura [...]?".
Aline, do Rio de Janeiro: "Como está sendo implementada a educação escolar indígena bilíngue e intercultural nas comunidades?".
Davi, de Tocantins: "[...] [que] ações legislativas [...] [podem] reconhecer [...] saberes tradicionais indígenas como patrimônio imaterial da nação?".
Anderson, do Rio de Janeiro: "Os povos originários contribuem com a preservação dos recursos naturais [...]". Acho que isso já foi respondido.
Janine: "As contribuições dos povos originários são de suma importância se quisermos transpor os desafios ambientais [...]".
Maria, do DF: "Como o Governo vem protegendo as terras indígenas [...] [para tentar cuidar de cada uma de suas culturas]?". A essa pergunta acho que você pode responder.
Kawan, do Ceará: "Quais são os direitos dos povos indígenas [...] mais frequentemente [...] [violados]? [...] [e que medidas] o Estado tem [...] [tomado para combater isso]?".
Matheus, do Rio de Janeiro: "[...] [que] políticas públicas de participação social estão incluindo de maneira efetiva a participação dos povos originários?".
Cristian, de São Paulo: "Qual o papel dos povos indígenas na preservação da biodiversidade [...]?".
Alexandra, do Paraná: "O europeu e seus descendentes [...] adoram dizer que a terra é deles, esquecendo que os povos [...] [originários] ainda estão aqui". Forte, não é, Cristian?
E Frederico, do Espírito Santo: "[...] os indígenas foram os primeiros moradores do Brasil". Temos que respeitar os direitos deles.
Eu agradeço. Isso aqui são algumas das contribuições que estão chegando. São várias interações via internet. Obrigada aos internautas por estarem participando deste momento que para a nossa Comissão é muito importante.
A nossa Comissão não deixou de celebrar o Dia dos Povos Indígenas, e com uma outra abordagem: desenvolvimento, universidade...
Há 40 anos, quando eu comecei a trabalhar com a garantia dos direitos dos povos indígenas, nós tínhamos reivindicações como o direito à alfabetização. Hoje, a gente vê o Dr. Henrique falando que 70% dos jovens da etnia dele estão na universidade. Hoje, a gente está falando com doutores. O Dr. Henrique foi formado, inclusive, fora do país. Então, hoje, nós não queremos só a alfabetização, nós queremos ir para o doutorado, para o mestrado, não é isso, Álvaro Tukano? Queremos ir para a academia. Estamos em academia de letras. Nós queremos ir para o cinema. Nós queremos ir para a ciência. E eu fico muito feliz com isso. Avançamos? Avançamos, mas ainda temos muito a fazer.
Por cinco minutos, para considerações finais, eu vou devolver, primeiro, ao Henrique Terena - está conectado ainda? -, porque os que estão conectados podem perder a conexão.
Henrique Terena, cinco minutos para agradecimentos finais e considerações. E parabéns pelo seu trabalho aí na ponta! Dr. Henrique Terena.
O SR. HENRIQUE TERENA (Para expor. Por videoconferência.) - Senadora Damares, demais amigos aí da mesa e todos que estão nos ouvindo, que momento ímpar para todos nós trazer aqui à mesa essas discussões importantes no cenário brasileiro, sobretudo essa contribuição dos nossos irmãos indígenas ao longo desses anos todos!
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Lembro que nós temos ainda muito a fazer, temos um caminho longo, porém na certeza de que nós temos também trilhado momentos importantes da nossa história.
Muito obrigado. Quando precisarem, nós estaremos sempre à disposição para trazer um debate tranquilo, um debate coerente, numa linguagem ampla, em que todos nós possamos nos entender nas nossas diversidades.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Dr. Henrique Terena; muito obrigada.
Nós vamos...
A Mitore ainda está online ou não?
Mitore, para agradecimentos e considerações finais.
A SRA. MITORE CRISTIANA TIRIYO KAXUYANA (Para expor. Por videoconferência.) - Só queria agradecer mesmo à Dra. Damares por ter nos convidado a participar deste momento muito importante para a gente colocar como a gente contribui para o Brasil. Estamos aqui para contribuir e vamos contribuir sempre, não é? É isto que os povos indígenas estão fazendo: sempre contribuindo, desde o início.
Eu só queria agradecer mesmo pela minha participação, por ter nos convidado.
Era isso.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - O.k.
Obrigada, Mitore, muito obrigada. Um abraço a toda a comunidade indígena do Amapá - lembrando que nós temos uma indígena Deputada Federal pelo Amapá, que é a Deputada Silvia Waiãpi, nossa amiga, nossa parceira.
Obrigada! Um abraço a todas as mulheres indígenas do seu estado.
Raimundo Guajajara, cinco minutos para agradecimentos e considerações finais.
O SR. RAIMUNDO GUAJAJARA (Para expor. Por videoconferência.) - Em primeiro lugar, fico muito feliz, Senadora, pelo espaço que a senhora tem nos oferecido aqui.
Quero também lembrar que nós estamos num momento de comemoração esta semana - apesar de que não é só hoje que vamos existir, não; nós somos o índio de ontem, de hoje... Sempre vamos ser essa mesma pessoa, entendem?
A identidade do nosso país, do Brasil, somos nós indígenas. Aqui, não vivemos de favores; aqui, nós somos legítimos, natos e vivemos do direito que realmente nos assiste, conforme nossos ancestrais. Hoje, estamos nos adequando à cultura do branco, o que é uma coisa que as pessoas sempre vão querer apontar para nós. Não precisam apontar para nós, nós não chamamos essa cultura; se essa cultura nos inclui é porque realmente nós também pertencemos a ela, porque ali na Constituição está claro que todos têm direitos iguais perante a lei.
Então, aqui, Senadora, eu fico muito feliz pelo espaço.
Eu não sei bem falar português, mas eu estou à disposição da senhora, à disposição do Senado, é esse que é a via democrática de uma Constituição. A senhora está dentro de uma democracia contendo a participação das nações, a realidade, é isso que eu entendo que é democracia real. Eu fico muito feliz pela sua forma de... pela oportunidade que a senhora vem dando para a nossa população indígena levar a sua voz. É disso que nós estamos precisando; precisamos de melhoria, precisamos de desenvolvimento, não precisamos mais... O passado também foi importante, mas hoje nós estamos existindo ainda como índio de ontem e de hoje.
É somente isso.
Muito obrigado e feliz Semana dos Povos Indígenas. A comemoração e a liberdade de ter essa homenagem tão importante acho que é para nós sermos lembrados que nós somos natos deste país, o Brasil, a nossa identidade verdadeira.
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Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Cacique Raimundo Guajajara, Presidente do Conselho Supremo Nacional dos Caciques Nativos Originários Indígenas do Brasil.
Só que eu estava aqui lembrando, para vocês não esquecerem, que os guajajaras ficam no Maranhão - no Maranhão. A nossa Ministra Sonia Guajajara foi eleita pelo Estado de São Paulo. Isso é um fato que precisa ser observado. Ela morava em São Paulo, os eleitores de São Paulo reconheceram a capacidade de liderança dela. Ela é eleita por São Paulo, mas os guajajaras são do Maranhão.
Nós vamos agora, por cinco minutos, ouvir Patira.
Patira, só explica onde fica o seu povo, porque você falou qual é o seu povo. A Patira lidera, mora no Noroeste, mas o povo originário dela também está em outro estado.
Patira, cinco minutos para considerações finais - ela está aqui angustiada, quer fazer um desabafo.
Cinco minutos.
A SRA. CICERA PATIRA (Para expor.) - Eu vou aproveitar muito bem esses cinco minutos.
Eu queria que a Comissão de Direitos Humanos... Agora, no momento, eu vou fazer a coisa que eu mais gosto; agora minha língua desenrolou porque a Senadora me deu essa pauta para eu falar. A Maria perguntou como os indígenas são tratados dentro do DF.
Eu me encontro numa situação dentro do Noroeste... Eu não podia me calar, gente; eu estava aqui em tempo de morrer. Eu queria que os direitos humanos registrassem isto: há dias nos tivemos tratores dentro das nossas terras, estamos com a ordem de despejo dentro da reserva indígena, reserva na qual há mais de 20 anos os índios do Noroeste moram.
Temos a família tucano, temos a família guajajara e temos a família fulniô, a qual têm o direito da terra com uma sentença, e um acordo sem escrúpulo nenhum chegou e tenta se apossar dessa terra.
Eu peço à desembargadora agora que está nesse momento... Na sexta-feira... na quinta-feira eu fui à Funai, e gerou-se um documento, no qual eu tenho um laudo antropológico do povo fulniô, que são os verdadeiros donos daquela terra, porque ali foi rota de fulniô, foi rota de tapuia, foi rota de bororo e de muitos outros povos, e nós estamos sendo coagidos dentro do Noroeste, está entendendo, gente?
No começo eu falei porque minha voz estava sendo calada. Então, eu sou o tipo da mulher da luta, eu sou Embaixadora dos Povos Indígenas. O trabalho da Embaixada dos Povos Indígenas é divulgar o que a gente passa, o que o meu povo passa... Eu não sei passar mão na cabeça de ninguém. Nós estamos sendo acuados aqui, em Brasília, nós temos... Peço a vocês dos direitos humanos que entrem dentro da aldeia do Noroeste, que façam um levantamento, que conversem com os indígenas lá - isso é um apelo.
Eu peço também à desembargadora, hoje, que está com o processo na mesa que tenha consciência, porque a Funai já deu o seu parecer de que lá realmente são indígenas, não são invasores.
Nós estamos sendo tratados como pessoas que invadiram terras lá dentro. Isso não é a verdade! Nós moramos lá desde antes do começo de Brasília; só eu tenho mais de 20 anos lá. Minha filha tem 19 anos. Ela sofreu quando a nossa casa - ela tinha cinco anos de idade - foi derrubada, teve traumas psicológicos e hoje, com 19 anos, reviveu tudo isso.
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Eu quero agradecer à Damares, que quebrou todo o protocolo daqui do Senado, da Casa do Povo, e deu a mão para a gente. Ela vem trabalhando com a gente, dentro do Noroeste, há muitos anos, dando suporte e nos ajudando. Eu quero agradecer a ela esse espaço que ela deu, e quebrou todo o protocolo.
Eu sei que depois ela vai passar por alguns percalços, mas a Damares é coração. Ela lida com direitos humanos. Inclusive, muitas denúncias que chegam até a mim, eu passo para o Ezequiel aí, para que ele trabalhe, para que ele aja na causa indígena.
Gente, a causa indígena é sensível, são direitos humanos. Por favor, iniciem uma sindicância dentro do Noroeste. Vamos trabalhar em cima do documento dos papéis Fulni-ô.
Eu tenho toda a documentação, que está aqui na minha mão. Se vocês quiserem, a gente pode passar a sentença e o número do acordo. A gente pode passar toda a documentação, para que vocês venham e entrem com essa ação, para que não deixem essa retaliação dentro do Noroeste, porque nós estamos sendo retaliados lá dentro, está entendendo? Nós estamos sendo retaliados. Então entrem, ajudem a gente.
São crianças, mulheres gestantes, que pariram em frente de trator, está entendendo? E eu não posso me calar, porque eu sou mulher indígena, eu sou da luta indígena.
(Soa a campainha.)
A SRA. CICERA PATIRA - Eu não poderia me calar, gente.
Muito obrigada.
E agradeço à Casa por acolher esse pedido de socorro do povo do Noroeste.
Muito obrigada, Comissão de Direitos Humanos, que está agora nos ouvindo e que abriu essa pequena pauta por cinco minutos. Mas nós temos documento. Se quiserem iniciar, ele está com nossa advogada, que é a Samia.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Patira... Gente, quando ela chegou aqui, ela disse: "Senadora, eu fui convidada para celebrar. Eu vou cumprir o objetivo da audiência, mas agoniada, porque não é só celebrar". Ela começou a falar dela no início. Apesar de tudo... E ela estava sufocada. Apesar de tudo que estamos passando... E aí ela, nas considerações finais, fez.
E eu vou fazer o seguinte: oficialmente, vou receber a denúncia como Comissão.
Eu tenho acompanhado toda a luta de vocês: primeiro, lá atrás, como ativista; depois como Ministra, depois como Senadora, de forma individual, mas a gente recebe agora como Comissão, e eu vou determinar à Comissão de Direitos Humanos, à Secretaria, de a gente fazer uma expedição, uma diligência à área.
Nesta semana, nós estamos com poucos Senadores na Casa. Vou convidar Senadores membros, para a gente tentar ir esta semana ainda, porque é urgente, porque está em fase de decisão, e a gente poderia ir lá ainda esta semana. Se os Senadores não puderem ir, peço para indicar um representante do gabinete; e, consultoria do Senado, é a gente tentar ainda esta semana.
Se a gente não conseguir essa semana, porque tem este feriado da Páscoa, e a Casa vai trabalhar online, na próxima semana nós faremos uma reunião lá, não aqui; lá na comunidade, com vocês, para ouvi-los, agora de forma oficial, como Comissão. Não a Damares, no mandato dela, mas a Comissão de Direitos Humanos, e convidando a Comissão de Direitos Humanos da Câmara para nos acompanhar também.
A SRA. CICERA PATIRA (Para expor. Fora do microfone.) - Inclusive, tem que ser muito mais rápido, porque...
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Pode falar.
A SRA. CICERA PATIRA - Inclusive, Senadora, tem que ser rápido, porque nós estamos com esse documento, e o prazo foi de 20 dias. Nós recebemos na semana passada.
E a Funai intercedeu realmente autenticando que ali são indígenas, que existe um GT dentro da terra, existe realmente uma sentença de 4ha, que está sendo tirada da mão da gente ilegalmente, dentro de uma fraude de documentos. Temos tudo isso como comprovar.
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Então, eu peço que a senhora vá o mais rápido possível, com a Comissão de Direitos Humanos lá, e comece a atuar dentro da área, antes que tenha uma sangria lá dentro, porque já teve casos assim de socorrer, levar para o hospital, gente machucada. Está entendendo?
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Quem está nos acompanhando e não está entendendo: mas tem indígena no DF? Tem.
A SRA. CICERA PATIRA - Tem, sim.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - São mais de 8 mil indígenas que residem no DF.
É isso, né, Álvaro Tukano?
A SRA. CICERA PATIRA - Com língua, tradição e costumes.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - E há um grupo que mora em um local. Desde que eles chegaram em Brasília, na construção, antes da construção, eles já estavam nessa área.
E essa área já é reconhecida legalmente como uma área deles, mas, por ser uma área muito próxima, na verdade, dentro - né, Cristian? - de uma das áreas nobres de Brasília, existe sempre conflitos por conta da especulação imobiliária, dos interesses econômicos naquela área. Então, eles não têm um minuto de descanso. E, nestes dias, eles estão passando, de novo, por algumas investidas contra eles naquele território.
A Comissão estará lá.
A sua advogada está aqui, Dra. Samia, a única não indígena para quem a gente vai dar três minutos. A mesa foi toda com indígena.
Dra. Samia, antes de o Ministério falar, porque o Ministério também está acompanhando essa demanda, três minutos para a senhora. Eu sei que a senhora está angustiada para falar.
É celebração, mas é espaço também de reivindicação.
A SRA. SAMIA WALESKA PEREIRA BARBOSA DE CARVALHO (Para expor.) - Senadora, eu agradeço.
Eu sou uma pessoa cristã que já tem 35 anos de advocacia. Eu sou originária de Fortaleza, onde, em 1993, eu me tornei advogada da comunidade indígena Tremembé de Almofala, comunidade essa que hoje, inclusive, também está sendo afrontada no seu reconhecimento étnico, no seu reconhecimento da identidade indígena.
Existe uma empresa que, antigamente, era Ducoco Agrícola S.A. e que, hoje, é Agricoco. Ela busca o cancelamento do reconhecimento da etnicidade e da reserva indígena que foi homologada pela Funai.
Eu saúdo o Governo do Brasil. Não é Governo de direita, não é Governo de centro, não é Governo de esquerda. Foi o Governo do Brasil que fez esse resgate histórico, criando o Ministério dos Povos Indígenas.
Também saúdo a iniciativa da associação que fundou a Embaixada dos Povos Indígenas, que pretende ser exatamente essa ponte.
E eu não posso deixar de falar do que, para mim, é um livro sagrado. A Bíblia nos instrui muito, e eu pautei a minha vida profissional dentro desta afirmação contida em Provérbios, 31, versículos 8 a 9, porque está escrito: abra a tua boca a favor do mudo, pelo direito de todos que se acham desamparados. Abra a tua boca, julga retamente e faz justiça aos pobres e aos necessitados.
(Soa a campainha.)
A SRA. SAMIA WALESKA PEREIRA BARBOSA DE CARVALHO - Muitas vezes, Senadora, concluindo, a questão indígena é confundida com a questão fundiária, que é exatamente o que está acontecendo, hoje, no Noroeste.
Ali, trata-se de uma situação de identidade indígena. E isso tem que ser preservado. E isso tem que ser defendido.
Nós temos que dizer não à especulação imobiliária. Nós temos, realmente, não só no Distrito Federal, mas em todo o Brasil, através do Ministério, que compor uma luta para integrarmos a cultura indígena, a cultura secular e a cultura social, porque, hoje mesmo, tivemos a notícia de que o Governador do Distrito Federal está em Dubai, lançando o projeto Brasília Ambiental.
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Ora, que Brasília Ambiental é essa que exclui socialmente os indígenas que formaram este país; que exclui socialmente uma comunidade inteira; que fez um acordo esdrúxulo com apenas uma única família, mas que as reportagens da época diziam tratar-se de reconhecimento da Reserva Fulni-ô? Ora, pelo que eu saiba, o povo Fulni-ô, no Noroeste, e os demais que estão integrados não se resumem a uma única família, mas existem mais seis famílias que foram reconhecidas pelo laudo antropológico da Funai, laudo esse de agosto de 2011, e que hoje estão sofrendo, estão na iminência de sofrer uma desocupação forçada, por conta do Governo do Distrito Federal, através da sua empresa fundiária, que é a Terracap. Então, que isso seja analisado.
E conclamo aqui mais indígenas neste Brasil afora para que venham ocupar os bancos universitários, para que venham a ser advogados, juízes, promotores e, quiçá, Ministros do Supremo Tribunal Federal, Ministros do Superior Tribunal de Justiça, para que o direito indigenista seja reconhecido, para que não fique apenas na história, como na época do Império, em que tivemos o primeiro advogado indigenista, José Peixoto Ypiranga dos Guaranys, em 1850, mas que a realidade lá de trás, seja hoje, com tanto acesso à informação, com tanto acesso à cultura, com tanto acesso à universidade, que esses espaços sejam, sim, ocupados pelos descendentes dos povos originários deste país. Isso é uma questão de direito e é uma questão de justiça.
Muito obrigada pela oportunidade.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Dra. Samia. Obrigada pela sua participação.
Vamos agora para o último expositor, que tem seus cinco minutos, lembrando que Cris trouxe abordagens diferentes quando falou dos nossos indígenas que lutaram pela soberania nacional.
E aí, Cris, quero aqui mandar um abraço para todos os indígenas que estão no Exército. Quem vai à área de fronteira e conhece os pelotões do Exército de Fronteira sabe que a grande maioria é formada por jovens indígenas. Nossos jovens indígenas estão no Exército Brasileiro.
Cris.
O SR. CRIS TUPAN (Para expor.) - Pois não.
Senadora, eu vou começar aqui pela Cicera e pela fala da parenta, dizendo que trabalho, atualmente, estou diretor... Sou indígena guarani nhandeva, vice-cacique da minha aldeia, que fica em Santa Catarina, em Palhoça, chama Pirarupá, e mando um abraço para o meu cacique Marco. Entendo...
Moro em Retomada, parente. Aquela nossa Retomada já foi violentada, já sofreu tiro, já foi incendiada. A sua dor eu não sinto apenas da boca para fora. Eu sei o que é viver sob ameaça.
Atualmente tento exercer aquilo de que fui responsabilizado através das atribuições do Decreto 11.355, que constituiu o Ministério dos Povos Indígenas, que são as políticas públicas para povos indígenas.
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Nós temos um departamento, o Depin. Nesse departamento, nós temos a Coordenação de Políticas para povos Indígenas em Contexto Urbano. Sobre a situação aviltante que vocês passaram aqui, nós mandamos diretamente Maike Terena, que acompanhou-a do começo ao fim e esteve presente diante da situação.
Nós geramos um processo, Doutora, e eu peço que a senhora anote: 01120000112/2025-23. Nesse processo, Senadora, no SEI, estão todas as ações que o departamento, o qual estou aqui representando, vem tomado sob a minha coordenação com relação ao setor. A última entrada, Doutora, nesse processo diz respeito a uma decisão que impede a remoção e condiciona qualquer ação - para aquela situação de vocês - ao cumprimento estrito da lei.
O que está, Senadora... E aí eu peço à senhora que dialogue com o diretor da Terracap. O próprio Governo tem um entendimento mais humano para aquela situação - o Governo de Ibaneis - do que a diretoria da Terracap, que trata de terra, não trata de gente. Ele tem que conversar ali com outra perspectiva, que é a dos direitos e das garantias fundamentais de aqueles povos ali permanecerem, já reconhecidos pelos organismos de Estado, no caso federal, porque cabe ao Estado nacional reconhecer uma terra indígena, não ao Governo do Distrito Federal.
E eu conheço a situação desde muito antigamente. Trabalhei em consultorias aqui para aquela situação, ainda em 2011. Então, conheço muito bem, e é uma situação que está amplamente documentada em todos os espaços. Com relação a isso, eu pedi aqui para que o Maike Terena, que é o Coordenador-Geral de Políticas e cidadania em Contexto Urbano, enviasse isso, e depois eu compartilho - a senhora já tem o meu contato.
Por último - acredito que eu tenho aqui um tempo -, Senadora, eu gostaria de pedir às pessoas que enviaram as perguntas - elas têm o site do MPI - que colocassem ali. Então, o site do MPI tem o e-mail do Depin, que é o departamento. Terei enorme prazer em responder a cada uma, porque a participação na internet é muito importante, e nós do MPI fazemos questão de dar transparência a nossas ações, inclusive ações essas...
Quando o parente Cacique Raimundo estava falando, a Senadora, muito assertiva - porque assim devemos ser -, perguntou: "Você gostaria de responder"? "De forma nenhuma", eu disse. Não, todos os parentes têm direito à livre opinião, livre manifestação, a protestar da forma que bem entender - isso é claro. E aqui é uma audiência para a gente celebrar um momento e avançarmos; e não vai ser retrucando pontos A B ou C, mas, sim, entregando trabalho; mas é um fato que nós demarcamos 13 terras indígenas nos últimos três anos - que estavam paradas. Nós demarcamos 13 terras indígenas.
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Nós avançamos no atendimento, na proteção territorial, garantindo transferência de renda para 270 mil famílias indígenas, totalizando 800 mil pessoas. Nós avançamos no investimento de proteção junto aos povos ianomâmis, fazendo com que o garimpo ali fosse retirado e reduzindo a 85% a mortandade e os ataques ali. São dados a serem celebrados. Nós trabalhamos na questão da saúde indígena também, com muito afinco de entrega.
Contudo, aqui eu volto ao começo da fala da Senadora Damares. Nós temos o debate amplo a ser feito a respeito do orçamento público. Nós temos um orçamento...
(Soa a campainha.)
O SR. CRIS TUPAN - ... público da União - vou concluir e peço dois minutinhos - que, devido às alterações legais que foram feitas, não permite que o Executivo tenha o orçamento necessário para que os seus ministérios possam fazer política. Não que os Senadores, não que os Deputados não devam fazer política - inclusive, aqui é a Casa para isso -, mas uma obra específica, principalmente dos políticos da Câmara, dos Deputados Federais, que seria a fiscalização do Executivo na execução, tomou o papel de Executivo da política. E ele pode fazer isso? Pode, tem uma lei que o autorizou. Não estou aqui contestando, mas, desde que se obedeça, conforme decisão do STF, à transparência, à participação social, ao controle social, e é o que está se exigindo. Então, o Orçamento, tal como ele está posto, hoje inviabilizou a maioria das ações do Executivo.
E olhe aqui, Senadora Damares: sim, há que se ter e sempre houve orçamento para os Senadores, sempre houve orçamento para os Deputados Federais, Deputados Estaduais, mas isso deve ter maior equilíbrio, e equilíbrio é tudo na gestão de contas públicas, porque nós não podemos contar somente o dia de hoje, se há o dia de amanhã e outros que virão.
Por último, o parente Henrique, salvo engano, trouxe umas reflexões muito importantes a respeito aqui da organização, da juventude, da fé, da universidade e o quanto nós avançamos. Eu tive - eu já vou fazer meus 5.0, Senadora - oportunidade... Eu conheço o Álvaro, eu estudei com Daiara, a gente é de uma geração em que não existia política de ações afirmativas e vencemos as barreiras, mesmo sem existir as políticas de ações afirmativas. Fiz meu mestrado, fiz um doutorado - ainda não o defendi -, consegui estudar e, em todos os momentos em que nós entramos... E Daiara, Álvaro, é partícipe desses momentos. Nós chegamos lá e lutamos pelas políticas de ações afirmativas, apesar de a gente não desfrutar delas - e, mesmo assim, ficaram legadas -, no doutorado ainda não existiam, no mestrado ainda não existiam.
O que eu quero ilustrar com isso? Sim, há lutas, há diferenças na luta, há diferentes posicionamentos, há diferentes fés. A questão da espiritualidade indígena se manifesta da umbanda, do candomblé, do kardecismo, do cristianismo, nas suas mais variadas congregações; e também politicamente somos distintos, temos indígenas, sim.... Eu sou um indígena de esquerda, comunista, socialista, e tenho muito orgulho disso, não nego; agora, eu respeito e estou aqui no diálogo com todos os parentes de todos os matizes ideológicos, e é assim que a gente vai construir uma sociedade.
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O meu povo guarani, quando guerreou... Ele guerreou, inclusive, contra franceses, contra portugueses, mas também guerreou com os tupiniquins. Nós temos outras... Nós somos um povo de luta. Nós, nhandeva, lutamos na Guerra do Paraguai. Nós temos lado, e, o que não tem que ter - eu concluo aqui - é indígena sem-terra, é indígena sem floresta, é indígena sem direito, mas indígena com ideologia distinta, indígena com fé distinta, é o que faz a nossa sociedade brasileira ser plural, ser diversa, ser linda, ser altiva e ativa nos seus direitos, e é isso que nós queremos nos povos indígenas.
Eu, estando agora no ministério ou como cidadão e lutador do meu povo - e do meu povo não só guarani, mas do povo indígena -, acredito que a pluralidade e a diversidade são o que vão fazer realmente o encontro da beleza, Senadora Damares Alves. É disso que a gente... O encontro da beleza, mas não a beleza da estética, é a beleza de se alimentar bem; é a beleza de poder correr livre nas suas terras, nos asfaltos das periferias; é não ter medo da violência. Isso é o encontro da beleza, é a fartura não só do alimento do corpo, mas também aquele da alma.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Muito obrigada, Cris. Muito obrigada pelas reflexões. Agradeço a sua participação, abrilhantou muito a nossa audiência.
No auditório,3 nós temos o nosso querido Tukano, Álvaro Tukano. O rosto mostra a idade, a sabedoria, precursor na luta pelo direito dos povos por muitos momentos, lutou tanto aqui nos corredores; mas, no auditório, eu tenho também Nayara Apurinã, uma jovem indígena, esposa do Cacique Adriel Kokama, lá da Aldeia Yawara. Então, a gente vê gerações diferentes aqui, Patira, gerações diferentes, povos diferentes.
Falaram nesta audiência: indígena do Mato Grosso do Sul, Henrique Terena; indígena do Mato Grosso, o Pareci. Nós ouvimos uma mulher indígena do Amapá, nós ouvimos o Cris, que é de Santa Catarina... Aí tem gente perguntando: tem indígena no Sul? (Risos.)
Em todos os estados do Brasil, nós temos comunidades indígenas. Acho que apenas no Rio Grande do Norte que eles não eram originários... Porque o estado foi dividido, mas lá também temos grandes comunidades indígenas, no Rio Grande do Norte, em todos os estados, com a sua cultura, sua língua, seu jeito especial de ser em todo o país. Povos incríveis.
Mas estão me cobrando, Álvaro - que a gente está falando muito do senhor -, se o senhor quer dar uma palavra para a gente finalizar.
Alguém liga o microfone para o Álvaro Tukano? Não tem como deixá-lo em silêncio.
Ligue o microfone e aí a gente encerra, com a palavra da sabedoria, da idade, da coerência, do respeito, que é do nosso grande líder, o Álvaro Tukano.
O SR. ÁLVARO TUKANO (Para expor.) - Bem, em primeiro lugar, eu quero agradecer ao Grande Espírito, que ele é muito poderoso, por isso nós não somos coitados.
Na língua tucana, nós chamamos de (Expressão em língua indígena.), os povos primeiros habitantes de muitas terras onde nós continuamos.
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Quero agradecer à Senadora Damares e a este Senado. Quando nós admiramos grandes oradores que defendem a Constituição brasileira, quando se trata da questão indígena, isso me faz lembrar dos velhos amigos do povo terena, porque o Professor disse: "Não, deixe o passado". Eu vou dizer o passado e saudar o meu amigo irmão Domingos Veríssimo Marcos, que foi o primeiro Presidente da União das Nações Indígenas; Modesto da Silveira, Pastor; Reginaldo, Pastor; Marçal de Souza, uma grande liderança do povo guarani. E hoje está vivo aqui em Brasília o Marcos Terena, também um terena, e outras grandes lideranças.
Lembro meu amigo Mário Juruna, que, no dia 27 de novembro de 1980, condenou a ditadura militar no tribunal internacional de Roterdã. A ditadura foi condenada nesse tribunal internacional, que foi presidido por um índio chamado Mário Juruna. Eu estava lá. E também quero dizer que nós condenamos também as missões religiosas, que até hoje continuam perturbando a vida de líderes tradicionais, que, no nosso caso, foi no Rio Negro, e os missionários foram condenados, porque sempre estiveram ligados aos militares da ditadura militar. Quem conhece o que é ditadura militar nem quer saber mais da volta da ditadura. Eu quero dizer às pessoas, principalmente a certas lideranças do país, que ainda suplicam, rezam pela volta da ditadura militar: isso é impossível para quem conhece o que é ditadura militar. Quero agradecer, portanto, por todo esse progresso que nós tivemos. O Mário Juruna foi também o primeiro Deputado Federal aqui no Estado brasileiro, e hoje nós temos uma nova geração, nós crescemos geralmente, em todos os níveis.
Fui dirigente, sim, do movimento indígena até quando foi aprovada a Constituição Federal. Quero agradecer, portanto, ao meu amigo e irmão saudoso Ulysses Guimarães; dizer também a mesma coisa ao Bernardo Cabral, que foi Relator desta Carta Magna aqui; e agradecer a todos os dirigentes do Brasil hoje que são lideranças indígenas, que vêm aqui para defender esta Constituição brasileira e reprovar a atitude de certas pessoas que acham que é o marco temporal que tem que definir o futuro dos povos indígenas. Para quem sabe, para quem acompanhou, essa pauta é inconstitucional, o que nós não podemos aceitar. Eu, pelo menos, não aceito. Eu quero agradecer assim às novas lideranças. Claro que nós temos divergências, como ouvimos aqui o parente nosso. Muitos parentes nossos têm divergências. Eu também tenho com aquelas pessoas que são muito conservadoras, que seguem esquecendo os verdadeiros líderes. Então, eu sei quais são as verdadeiras lideranças, os verdadeiros povos. Muita gente hoje também me faz... pensa diferente, porque muita gente nem estava aqui 40 anos atrás. Eu estive 40 anos atrás aqui. Eu sou militante do movimento indígena desde 1970. Em nenhum momento disputei cargos políticos dentro da organização, sempre estive nos bastidores e conheço muitas lideranças deste país.
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Quero saudar, em nome deles, a democracia, a Constituição brasileira, e dizer, no caso do Noroeste, que nós ficaremos!
Gratidão. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Vocês entenderam por que ele não poderia ficar em silêncio?
E, Cris, quando ele começou a falar o nome de todas as pessoas com quem trabalhou e foi parceiro, a gente fez um passeio histórico - um passeio pela história dos últimos anos do país. O Álvaro Tukano estava lá. Quando eu cheguei aqui, foi ele quem me ensinou muito.
A gente pensa diferente em algumas coisas? Pensa! Mas o que nós queremos pensando diferente? Uma única coisa: o povo protegido, com os direitos garantidos, as crianças protegidas e as mulheres protegidas, com direito ao seu território e com direito às suas manifestações culturais.
Obrigada, Álvaro Tukano, por nunca ter desistido da luta.
E é um líder de bastidores, eu sei o que ele é, aquele líder da articulação dos bastidores, que fez discípulos. Eu sou uma discípula, você sabe disso, o quanto você me orientou.
Obrigada por estar com a gente hoje, obrigada por ainda estar na luta, de forma corajosa, ousada e inteligente.
E, assim, nós encerramos esta audiência.
A Comissão de Direitos Humanos marca presença nas celebrações do Dia dos Povos Indígenas, mas, para nós, não é só um dia, todos os dias são dias dos povos indígenas.
Que Deus abençoe os nossos povos, que Deus nos dê sabedoria, a nós que estamos num lugar de poder e de decisão, Cristian, a fazer o melhor pelos povos.
Muito obrigada.
E o Brasil é deles, o Brasil também é deles!
E o Noroeste também, não é, Patira? O Noroeste também.
Que Deus abençoe vocês e obrigada a todos pela participação.
Nada mais havendo a tratar, nós declaramos encerrada esta reunião.
(Iniciada às 10 horas e 12 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 26 minutos.)