Notas Taquigráficas
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| R | A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a 48ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura. Esta é a terceira audiência pública realizada, nos termos do Requerimento nº 4, de 2025, de autoria do Senador Mecias de Jesus, de Rondônia, do partido Republicanos, do Estado de Rondônia, que tem como objetivo avaliar o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), no exercício de 2025, na perspectiva do Eixo Orientador III: Universalizar direitos em um contexto de desigualdades. Vamos aos nossos convidados de hoje, que farão o debate. Nós temos a honra de ter conosco nessa manhã Giselle da Silva Cyrillo, que eu convido para compor a mesa comigo. Giselle é Subsecretária de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais. Bem-vinda, Giselle, bem-vinda. A Giselle também foi Coordenadora Nacional do Socioeducativo no Governo anterior. Vocês vão entender por que ela está sendo convidada, essa discussão precisa ser feita. Inclusive, Giselle, semana passada, o socioeducativo foi tema de debate nesta Comissão, aprovamos um projeto de lei voltado ao tema. Há uma discussão muito grande dentro do Congresso Nacional, em que os meninos em conflito com a lei e os que estão internados precisam ter um olhar diferenciado deste Congresso Nacional. Essa discussão dentro dessa avaliação do PNDH-3 é mais que necessária, muito mais que necessária. Seja bem-vinda. Nós temos a honra de ter aqui na mesa com a gente também o Rafael Satiê, Vereador do Município do Rio de Janeiro e Presidente da Comissão de Combate ao Racismo. Quero que venha compor a mesa comigo. Ele é escritor, influencer, que desperta amor e ódio ao mesmo tempo. (Risos.) Um jovem Vereador. Bem-vindo. Um jovem Vereador, que faz um debate sobre a igualdade racial com um outro olhar, numa outra perspectiva. É uma honra, Vereador, tê-lo conosco aqui, uma honra. Eu sou sua fã, eu sigo você, eu curto e eu compartilho. E, se eu fosse do Rio de Janeiro, eu votaria em você, tá? (Risos.) Bem-vindo, Vereador, é uma alegria tê-lo conosco! Nós temos mais dois participantes, dois debatedores que farão participação online. Uma das nossas participantes, com muita honra: Mariana de Sousa Machado Neris. Ela é hoje Diretora de Políticas Públicas para Mulheres, já foi Secretária Nacional de Assistência Social e Secretária Nacional de Direitos Humanos no Governo anterior. Bem-vinda, Mariana. Que honra ter você conosco. Hoje ela está como Secretária de Políticas Públicas para Mulheres no Estado do Paraná, e faz um trabalho incrível. E morremos de saudade da Mariana, que também foi Secretária de Assistência Social em governos anteriores; e no Governo anterior, sim, ela trabalhou como Secretária Nacional de Direitos Humanos. |
| R | E temos a honra de ter conosco, também, hoje, o Dr. Thiago Vieira, Escritor e Advogado, Presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Religião. Muito bem-vindo, Dr. Thiago! É uma honra tê-lo conosco nesta audiência pública. Eu informo que a audiência está sendo transmitida, e nós temos inúmeras instituições nos acompanhando. Quero informar aos preletores que nós temos muita gente nos acompanhando - as pessoas que são interessadas no tema estão acompanhando -, mas informo que o Governo Federal foi convidado, em especial o Ministério do Esporte, porque nós vamos debater o que faz parte da universalização dos direitos, e há dentro do PNDH-3, na Diretriz 7, a promoção do direito à cultura, lazer e esporte. Então, o Objetivo VII, na verdade, VIII, da Diretriz 7, do PNDH-3, versa sobre promoção do direito a cultura, lazer e esporte como elementos formadores de cidadania. Então, nós convidamos o Ministro - ou que ele indicasse alguém - para discutir e para dizer se isso está sendo colocado em prática. Nós estamos conseguindo alcançar esse objetivo? Mas o Ministério do Esporte não mandou ninguém, o Ministro não fez nenhuma indicação e também não veio, mas nós vamos pedir, por escrito, que o ministério se manifeste com relação ao Objetivo Estratégico VIII. Nós gostaríamos muito que o Governo estivesse participando mais ativamente desta avaliação, porque o objetivo desta avaliação... Esta avaliação nos é imposta, Vereador, pelo art. 96 do nosso Regimento Interno. O art. 96 do Regimento Interno do Senado obriga que as Comissões avaliem, todo ano, uma ou duas políticas públicas da sua competência. Então, neste ano, esta Comissão está avaliando duas políticas públicas: o PNDH-3 e está avaliando o Pacto Nacional de Enfrentamento ao Feminicídio. A importância de uma avaliação pelo Congresso Nacional é exatamente cumprir o nosso papel de fiscalizador. O Congresso Nacional fiscaliza a política pública. Mas há uma outra vertente: é o Congresso Nacional que faz o Orçamento da União. Então, fazer essa avaliação é também entender a necessidade de ampliação de recursos para a política pública, a necessidade de fortalecimento da rede ligada à política pública que está sendo avaliada. Então, não é que o Congresso Nacional, que a gente se reúna aqui para avaliar negativamente um governo. Não. Nós estamos avaliando uma política pública de Estado, inclusive para dar nortes, para dar orientações, para dar encaminhamentos. É isso que nós fazemos nessa avaliação. Nossa avaliação consiste em algumas atividades, audiências públicas, e isso aqui é uma atividade da avaliação, mas nossa avaliação também trabalha com requerimentos de informações, trabalha com diligência, trabalha com dados, pesquisas, a gente faz confronto de dados, consolidação de dados, para que a gente possa entregar no final do ano um relatório. Vamos ouvir os nossos ilustres convidados. |
| R | Nós faremos o seguinte: um convidado presencial e um convidado online. A gente vai revezar. Então, nós vamos começar, neste exato momento, ouvindo a nossa querida Giselle. A Giselle vai falar sobre a experiência de Minas Gerais na implementação do Sinase e os desafios na reinserção social de adolescentes em conflito com a lei. A Diretriz 8 do PNDH fala sobre "promoção dos direitos de crianças e adolescentes para o seu desenvolvimento integral, de forma não discriminatória, assegurando seu direito de opinião e participação". E o objetivo estratégico está lá no PNDH-3. Objetivo estratégico VII: implementação do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase). E aí, Giselle, se você puder também abordar que não é fácil a implementação do Sinase... Eu fui, Rafael, a Ministra da pasta, e isso era um desafio diário. Era um desafio diário chamar os entes federados para a implementação e o pleno funcionamento do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo. A Giselle vai explicar, para quem está nos acompanhando, o que é o Sinase. Ela vai começar explicando o que é o Sinase. Poucas pessoas falam do Sinase, só quem está mesmo ligada a essa política pública. Você vai explicar o que é o Sinase, depois você vai abordar a experiência de Minas Gerais, e, se possível, apontar se PNDH-3 cumpriu a meta ou não cumpriu? Temos que melhorar nesse objetivo estratégico VII o seguinte... É isso que nós esperamos de você. Mas lembro, Giselle, que, semana passada, nós aprovamos nesta Comissão o Projeto de Lei 1.473, de 2025, de autoria do Senador Contarato. Para quem não sabe, ele é Líder do PT na Casa. Eu fui Relatora. Esse projeto de lei diz o seguinte: nós vamos ampliar o número de anos de internamento de um menino. Inclusive, Vereador, o Senador Contarato - inclusive foi uma surpresa ter vindo dele essa proposta - usou o seguinte exemplo: um menino que mata com requinte de crueldade uma mulher grávida. Esse menino é recolhido para a unidade socioeducativa, ele fica dois anos, três anos. E ele sai, porque não pode passar de 21 anos de idade lá. Então, a intenção desse projeto de lei é ampliar o número de anos que ele vai ficar lá dentro, chegando a dez anos. Então, não ser mais no máximo três anos, podendo chegar a dez anos. E aí houve um questionamento: "Mas o senhor está rompendo com uma cláusula pétrea da Constituição que fala da maioridade penal." Ele disse: "Não. Eu estou ampliando a medida socioeducativa." E aí a gente poderia te ouvir, Giselle: se essa lei for aprovada - porque ainda está em tramitação -, as unidades socioeducativas no Brasil estão prontas para ter lá dentro da unidade um menino com 28 anos de idade, sendo que a gente recolhe meninos com 12, 13 anos? Essas unidades estão prontas? Esses meninos deverão ir para o presídio? Se essa lei passa, como as unidades socioeducativas no Brasil vão receber isso? Nós temos material humano para isso? Nós temos estrutura? As nossas unidades no Brasil estão prontas para isso? Dentro das unidades nós temos meninos faccionados já. Nós temos meninos de 12 anos que cometeram um crime, mas nós temos meninos de 17 anos que já são faccionados, com 18 anos, 19 anos. Como nós vamos lidar com isso a partir de agora, se essa lei também for aprovada? |
| R | E é claro, Giselle, eu queria muito que você chocasse o Brasil também e os nossos convidados, se você puder dizer quanto custa um menino preso. Rafael, Mariana e Thiago, vocês vão se surpreender com quanto a gente gasta por mês com um menino numa unidade socioeducativa. Para a sociedade que está nos acompanhando, unidade socioeducativa é o que nós chamávamos no passado de Febem, tá? Tem muita gente que não entende o termo. É o que a gente chama lá em São Paulo de Fundação Casa. É o lugar onde ficam os meninos com menos de 18 anos em conflito com a lei, que cometeram crimes. Até com a expressão "cometer crime" a gente tem que ser polida, porque eles têm menos de 18 anos, mas é para que vocês entendam. Quanto custa manter um menino internado? A gente não fala nem preso, mas recolhido, internado. Quanto custa? Será que esse dinheiro que a gente gasta com esse menino por mês, se nós tivéssemos investido neste menino lá na primeira infância, nós não teríamos evitado que ele fosse para o crime? Então, essa discussão vai ser extremamente interessante e vai nos dar norte para a gente entregar um relatório avaliando, com muita clareza e imparcialidade, o PNDH-3. Giselle, seja bem-vinda. Você tem dez minutos, ali atrás tem um cronômetro, mas eu vou dizendo o seguinte: os dez minutos são protocolares. Se precisar se estender, fique à vontade. Eu sou uma Senadora bem generosa, está bem? Bem-vinda, Giselle. A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO (Para expor.) - Bom dia a todos. Obrigada, Senadora Damares. É um prazer reencontrar a senhora, Senadora Damares, Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos na administração passada, portanto gestora nacional do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, do sistema socioeducativo em meio fechado, com quem eu tive a alegria de poder colaborar na gerência técnica dessa política. E aí, Senadora, cumprimento a todos, todos aqueles que nos acompanham pelos canais de transmissão. E eu vou procurar - eu tenho treinado isso, Senadora - ficar agora adstrita objetivamente dentro do tempo que me é proposto. Na secretaria em que eu trabalho, em regra, eu não consigo, mas eu vou me esmerar aqui. Porque o meu compromisso maior aqui é de fazer frente aos vários desafios que a senhora propôs no âmbito desta discussão, e a senhora os propõe porque está muito apropriada da realidade. A primeira coisa, a primeira palavra que a gente pode usar para mencionar o Sinase, antes de nós entrarmos de fato nos seus conceitos técnicos, é: desafio. Porque o Sinase é um sistema que estrutura a política de responsabilização do adolescente no Brasil. Em algum momento, o ordenamento jurídico brasileiro decidiu que jovens, adolescentes entre 12 e 18 anos, não deveriam ser responsabilizados por condutas delitivas. Aqui, Senadora, em respeito aos cidadãos que nos assistem e que não são e nem têm obrigação de ser apropriados das nomenclaturas técnicas - e também porque, nos lembremos, a palavra "cachorro" não morde -, eu vou chamar a coisa do nome que ela tem. Tecnicamente a gente chama de "ato infracional", mas, no dia a dia da sociedade, sobretudo daquelas pessoas que são acossadas como vítimas "crime". |
| R | Uma pessoa entre 12 e 18 anos, entendeu o ordenador jurídico nacional que não deve ser responsabilizada como uma pessoa adulta, porque ela se encontra numa fase de desenvolvimento. Portanto, ela deve ser responsabilizada tendo uma natureza pedagógica que prevaleça sobre a natureza punitiva. E aqui é preciso que a gente diga: não é que a política, não é que o sistema socioeducativo ou as medidas socioeducativas não tragam em si uma natureza retributiva punitiva, traz, porque o adolescente é privado de liberdade, porque ele é submetido a uma série de obrigações que ele precisa cumprir no decorrer do cumprimento dessa medida, mas elas não têm uma natureza prioritariamente retributiva. O que o ordenador quis foi aproveitar este momento da vida, que é um momento de desenvolvimento, para prover a ele pedagogia, atividades educacionais, reconstrução dos seus vínculos familiares e comunitários, de forma que ele pudesse se reintegrar à sociedade com a perspectiva de uma outra atuação na comunidade que não seja a prática delitiva. Dentro dessa perspectiva, o Sinase se estrutura em dois modelos de medidas socioeducativas: aquela que nós chamamos de medidas socioeducativas em meio aberto, em que o adolescente não vai para nenhuma instituição, ele não fica vinculado, privado de liberdade em nenhuma instituição. Essas medidas são executadas pela prefeitura, são a liberdade assistida e a prestação de serviços à comunidade, e são prioritárias na lógica do Sinase, porque elas incidem no momento em que o adolescente está menos comprometido com a criminalidade. É uma oportunidade de o Estado, lá no território do adolescente - e a prefeitura é que conhece a história daquele garoto, a sua trajetória, as suas referências familiares -, incidir e responsabilizá-lo no âmbito do seu território, junto com a escola a que ele já está vinculado, aos equipamentos e políticas de assistência a que ele já deve estar vinculado. E aqui é impossível, Senadora, eu não me remeter àquele que era o nome do ministério - o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos -: na sua família, nas suas referências familiares, porque nós não podemos nos esquecer de que nós temos um mandado constitucional que responsabiliza a família, a sociedade e o Estado pela garantia de direitos e pelo dever de cuidado de crianças e de adolescentes. E aí, numa perspectiva muito realista e de fato cidadã, invocando aqui a liberdade e a autonomia inerentes ao conceito de cidadania, nós temos que nos lembrar desta escala de prioridades: nós temos a família em primeiro lugar, como responsável pelo cuidado e pelo direcionamento da criança e do adolescente; o equipamento social, a malha social do seu entorno, a igreja, a escola, o clube, as associações; e o Estado como quem vai conceber e gerir as políticas públicas que estão em volta desse cuidado familiar e societário desse adolescente. E, por fim, as medidas em meio fechado, que é aquilo de que cuido no Estado de Minas Gerais, gerencio no Estado de Minas Gerais, gerenciei aqui no âmbito do Governo Federal, que são as medidas de privação e restrição de liberdade, que são direcionadas para aqueles adolescentes que tiveram uma atuação mais grave, que têm mais engajamento com a trajetória criminal, ou que cometeram de fato atos infracionais mais graves e que, portanto, ficam institucionalizados. Ficam internados, ficam nas casas de semiliberdade, nas unidades de internação. |
| R | Senadora, nós tivemos, durante muitos anos, no Brasil, um grande desafio, que era pelo menos comprometedor, de que nós pensássemos de maneira mais qualificada em tudo que é preciso, para responsabilizar esse jovem na medida socioeducativa, que era um quadro de superlotação dramática no sistema. Nós tínhamos aí, no Brasil, no ano de 2019, uma média de aproximadamente 120% de superlotação. Quando a gente pensa numa perspectiva comparativa com o sistema prisional, a gente fala, isso é um suco, não é? Isso não é nada, mas a gente tem que pensar que a estrutura de uma unidade prisional, de um corpo de policiais penais, da equipe que está ali, preparada para garantir a segurança e o atendimento numa unidade prisional, é completamente diferente de uma unidade socioeducativa, pela diferença da natureza dessas políticas. A medida socioeducativa tem uma natureza prioritariamente pedagógica, o que se reflete na sua infraestrutura, o que se reflete em como são preparados e como atuam esses profissionais. Então, 120% de lotação num equipamento socioeducativo é um drama muito mais aprofundado do que seria esse mesmo número numa unidade prisional. No ano de 2019 e no ano de 2020, nós temos dois marcos que são muito fundamentais na mudança dessa lógica. Nós temos o julgamento de um HC, de um habeas corpus, pelo Supremo Tribunal Federal, que calhou no estabelecimento de numerus clausus de ocupação do sistema socioeducativo. Eu não posso ter, no sistema socioeducativo, em nenhuma unidade socioeducativa de internação do Brasil, mais adolescentes do que eu tenho de vagas. Não importa a demanda. Se eu tenho 50 vagas naquela unidade, eu só posso ter 50 adolescentes. No ano de 2020, nós tivemos aí o advento da pandemia pela covid-19, que mudou todos os protocolos de atuação das políticas públicas. As políticas de privação de liberdade, pela própria natureza de um equipamento de liberdade, eram um vetor transmissor por excelência da moléstia com a qual lidávamos. E aqui eu preciso dizer que tudo na vida é pelo menos uma moeda bifacetada, não é, Senadora? A gente teve todas as questões, os desafios da pandemia, sobre os quais a gente não precisa dizer, porque nem é o nosso objeto de discussão aqui, mas nós tivemos algo que é o primeiro grande desafio de reinserção dos adolescentes e que nós conseguimos, àquela época, fazer frente, que é a integração das políticas públicas. A pandemia obrigou que o Poder Executivo, o sistema de Justiça e o sistema de garantia de direitos, sofisticassem o seu nível de articulação. Então, nós conseguimos, àquela época, pelos ministérios gestores dessa política, pelos conselhos superiores do sistema de Justiça, consolidar protocolos que permitiram que a população do sistema socioeducativo se mantivesse adequada... (Soa a campainha.) A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO - ... àquelas contingências sanitárias impostas pela pandemia. E aí foi possível que nós nos desdobrássemos sobre outros desafios para a implementação do Sinase. E aqui eu já quero trazer um pouco do nosso exemplo, porque é um exemplo prático, verificável, não é? E aqui já pensando na análise da política pública baseada em dados, em evidências do Estado de Minas Gerais. Esse foi um momento que permitiu aos gestores brasileiros que se voltassem para o fortalecimento daquele instrumental metodológico e de orientação do trabalho, que é fundamental para a reinserção desse adolescente. |
| R | Aqui, no Estado de Minas Gerais, já para apontar, Senadora, futuramente aqueles que são os nossos maiores desafios, que vêm ao encontro da necessidade da avaliação do PNDH de que se ocupa agora esta Comissão no Senado, que é a integração de fato da política de atendimento socioeducativa com as políticas de proteção, de prevenção social à criminalidade e um diálogo com as políticas de segurança pública. E aqui, Senadora, há quem vá querer me matar saindo daqui, mas é preciso que eu diga, não é possível a gente conceber atendimento socioeducativo sem que nós tenhamos em vista políticas de segurança pública, porque a senhora bem disse, hoje a gente vive uma realidade que não vivíamos antes, que é a cooptação ativa desses adolescentes, cada vez mais jovens, pelas facções e pelas organizações criminosas. Essa hoje é uma realidade. Quando eu entrei no sistema socioeducativo, apesar de parecer não ter idade suficiente para isso, 15 anos atrás, isso não era uma realidade. O garoto era aquele garoto, perfil ex-Febem, batedor de carteira no centro, puxava aqui a correntinha da senhora. Esse era o garoto. Hoje, não. Hoje esses garotos são ativamente engajados com a organização criminosa. Então a gente não faz política de direitos humanos desconsiderando que a segurança não é uma força de repressão, a segurança é um direito fundamental que o Estado deve garantir. Então, o Estado de Minas Gerais tem uma articulação entre a política de atendimento socioeducativo e as políticas de segurança pública. Por isso que é um dos únicos estados do Brasil em que a pasta de atendimento socioeducativo está alocada na Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública, e que tem uma interface direta com a pasta de prevenção social à criminalidade, que também está na Justiça e Segurança Pública, com a pasta de política sobre drogas, que também está na Justiça e Segurança Pública, porque nós somos um repositório que nos retroalimentamos de informação e direcionamento do trabalho aquele agente, aquele gestor das forças de segurança pública que está lá na ponta, e nós, que somos operadores de uma política, sim, de garantia de direitos humanos, mas que não podemos desconsiderar essa realidade que acossa a nossa juventude - a gente está em agosto, mês da juventude -, que acossa a nossa juventude hoje. Nós, Senadora, disputamos a nossa juventude com o tráfico de drogas e toda a estrutura que está por trás, que é extremamente sofisticada. E aqui eu vou pedir licença à senhora para já fazer um juízo de valor. Nós temos um PNDH - como ele está estruturado - que hoje desconsidera vários elementos da nossa realidade: a mudança da sociedade, a mudança do perfil desses adolescentes, da dinâmica social. Hoje nós tivemos, pouco tempo atrás, a denúncia trazida a público da adultização da infância, que é algo de que a senhora fala desde priscas eras, embora também seja muito jovem, é preciso que a gente diga. Mas, eu preciso dizer que a adultização da juventude, das crianças e dos adolescentes, não é algo, Senadora, que está restrito à questão da erotização e da sexualidade. A adultização da criança e do adolescente também está no contexto da violência. Agora, às 10h da manhã, há um sem-número de crianças e adolescentes que estão na deep web, na dark web, consumindo e produzindo conteúdos de uma violência bestial. Não há outro adjetivo para eu chamar aqui. |
| R | Então, nós temos essa integração de política de atendimento socioeducativo, prevenção social à criminalidade, política sobre drogas; essa articulação com as políticas de segurança pública, que nos permite, inclusive, antecipar isso. Hoje nós temos nas unidades socioeducativas o que não tínhamos antes, que era um perfil que eu chamava de perfil do psicopata da Netflix. A gente só via lá, que era aquela coisa meio anglo-saxã, O Canibal de Milwaukee, o Assassino de Green River. A gente não via isso no Brasil. A gente vê... a gente tem hoje, no sistema, adolescentes que cumprem medida por ataques à escola, ataques aleatórios. Mata a garota que era sua amiga, sua companheira de igreja, que frequentava a sua casa e, banalmente, diz: "É porque eu tinha inveja da alegria dela". Isso é algo orquestrado. Existe um movimento por trás disso, que leva as nossas crianças e os nossos adolescentes a essa banalização da violência. E a gente precisa fazer frente a isso no sistema. Em Minas Gerais - essa é a nossa experiência de integração dessas políticas, falando de uma maneira muito pragmática aqui também -, há a estruturação de um programa que acompanhe o adolescente que sai da medida socioeducativa. Em Minas Gerais é denominado programa Se Liga, que é um programa que acompanha esses adolescentes que passaram pela medida, voltado a garantir que eles permaneçam na escola, voltado a garantir que eles permaneçam naqueles equipamentos sociais aos quais eles foram vinculados durante o cumprimento das medidas, que garante atendimentos que fortaleçam os seus enlaçamentos com os seus vínculos familiares e comunitários, que é algo em que a gente sempre insiste. Não existe cidadania, não existe reinserção, ressocialização sem a família. Não há estado que dê conta desse trabalho se nós não engajarmos uma família funcional, estruturada, em que cada um tem o seu papel e o seu lugar de condução, educação e formação daquele adolescente. Então nós temos consolidados hoje e atuando essa metodologia e esse programa de acompanhamento ao adolescente que cumpriu medida, antigamente chamado adolescente egresso. Eu não sei por que não se pode mais usar esse nome aí. Tem uma corrente que diz isso porque as pessoas pensam que a palavra "cachorro" morde, mas, para que você que está em casa compreenda, é o adolescente egresso. Não é bonito dizer isso mais, mas este é o nome: "egresso" é o adolescente que cumpriu medida. Nós temos uma integração com os programas de prevenção social à criminalidade, como o programa Fica Vivo!, que atua nos territórios, fazendo oficinas, enlaçando esses adolescentes aos equipamentos sociais de dentro dos seus territórios, às ações voltadas ao fortalecimento das comunidades étnicas, das comunidades tradicionais - aí, Vereador Rafael, muito dentro do matiz com que o senhor trabalha -, e também com a política sobre drogas, acompanhando a dinâmica de envolvimento, de engajamento, de cooptação desses adolescentes também na perspectiva do uso. Tudo isso voltado para fortalecer o seu vínculo com a comunidade depois da saída da medida socioeducativa; para acompanhar isso e ser capaz de gerar evidências de efetividade dessas políticas públicas, porque são políticas públicas caras. A senhora me deu o desafio aqui de dizer o preço de um adolescente. É sempre bom que a gente se lembre de que não existe dinheiro público, o que existe é o dinheiro do contribuinte que paga imposto. Então a gente precisa ser capaz de dizer o quanto essas políticas públicas estão resolvendo o problema que elas vieram resolver - e política pública existe para isto: para resolver problemas, e não para vir ao encontro de concepções ideológicas. Isso também é importante que a gente diga. |
| R | E aí, Senadora - eu sei que eu já extrapolei meu tempo, acho que duas vezes -, eu vou aqui caminhar para o fim, lançando a informação que a senhora pediu, dizendo sobre quanto custa o adolescente. Hoje, um adolescente numa unidade de internação - isso sofre variações de acordo com o estado, estruturação de quadro funcional, tamanho da unidade - pode custar entre R$8 mil, R$9 mil R$10 mil até R$23 mil por mês - por mês. E aqui considerando todos os custos, inclusive os custos de pagamento do pessoal da equipe técnica, de segurança, de gestores que estão ali engajados para o atendimento a essa política. Isso é importante dizer para que a gente saiba que é preciso que a gente se debruce sobre essa política e que a gente a atualize de acordo com as nossas necessidades concretas, Senadora. É preciso que a gente dê conta de responsabilizar adolescentes a esse custo. A gente não tem a opção de uma política ineficiente a esse custo. É claro que a gente sabe que a política socioeducativa, muitas vezes, vem num momento em que todas as outras políticas públicas se ausentaram da vida daquele adolescente. Esse é um déficit que se reflete no custo. O adolescente entra no sistema socioeducativo com uma defasagem de idade-série superior a cinco anos. Então, é como se não estudasse há cinco anos. Em regra, a gente recebe adolescentes de 15, 16 anos, com 1,92m, 100kg, analfabetos absolutos. Eles não reconhecem símbolos, letras e números. Então, esse déficit vai se traduzir no custo, inevitavelmente. Agora, conquanto isso justifique, também nos dá o ônus de estruturar e de executar uma política que resolva o problema social que ela foi concebida para resolver, que é tirar o adolescente do contexto da criminalidade. São essas as minhas considerações iniciais, tentando me manter dentro das linhas que a senhora me propôs, Senadora. Muito obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Uau! Uau, Giselle, desafiador! Como é que a gente vai lidar com isso dentro do PNDH-3, que propõe uma política para um adolescente de 2009? Esse adolescente hoje é outro, como ela disse. E eu quero lembrar o seguinte, Giselle. As pessoas, quando olhavam para o nosso ministério, diziam assim: "Ai, que bonitinho o trabalho com criança! Que bonitinho esse ministério!". Nas unidades socioeducativas tem motim, tem rebelião, tem tortura, tem assassinato. O nosso telefone não parava no final de semana. Enquanto o Ministério da Justiça cuida dos presídios de adultos, é o Ministério de Direitos Humanos que cuida das unidades. Então, os desafios eram os mesmos. E as pessoas acham que é tão romântico... Não tem nenhum romantismo nisso. Tem é muito desafio, tem é muita, muita coisa para fazer e para mudar. Giselle, eu vou só fazer uma pergunta. Depois, no final, vou te dar a palavra para considerações finais. A pergunta que não se cala: no sistema socioeducativo, esses meninos estão no Ministério dos Direitos Humanos, o.k.? Há um movimento antigo para que essas unidades saiam do Ministério de Direitos Humanos e passem para o Ministério da Justiça e Segurança Pública. Mas há resistência do Direitos Humanos em mandar essas unidades para o sistema de justiça, de segurança, que acha que têm que ficar no Sistema de Direitos Humanos. Essa discussão vocês fazem internamente, vocês, os agentes, vocês, os gestores do Sinase? As unidades devem continuar no Ministério dos Direitos Humanos ou devem ir para o Ministério da Justiça e serem cuidadas pela área de segurança? |
| R | A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO - Senadora, eu não tenho nenhuma dúvida de que a política socioeducativa é uma política de atendimento a direitos humanos. Agora, existe uma questão, que é fundamental, que é a necessidade do reconhecimento da importância da segurança, inclusive da qualificação e da profissionalização da segurança, nessa perspectiva de uma mudança de dinâmica. Hoje nós temos um perfil de adolescentes, de engajamento com a criminalidade que nós não tínhamos há dez anos. Então, se eu não sou... Em Minas Gerais, o que eu posso dizer é que foi muito feliz a escolha política do estado, da manutenção da política na Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública. Isso, inclusive, não é nenhum impeditivo de que nós tenhamos fluxos de atendimento, de orientação e de incidência, execução da política, muito bem definidos com a Secretaria de Desenvolvimento Social, que é a pasta que cuida dos direitos humanos em nível de estado, Secretaria de Educação, Secretaria de Saúde. Com isso, eu quero dizer que o mais importante é que a gestão do sistema socioeducativo, esteja ela no MJ, esteja ela no MDH, seja capaz de articular as políticas transversais que são responsáveis pelo atendimento do adolescente na ponta e pela garantia de um trabalho possível dos operadores na ponta. E aí, pensando nas coisas como elas são hoje, é preciso que os atuantes das políticas de direitos humanos entendam que segurança e direitos humanos não são perspectivas mutuamente excludentes. A segurança está abarcada pelos direitos humanos. Então, não vejo nenhum impeditivo de que elas permaneçam alocadas no Ministério dos Direitos Humanos, mas é preciso que o Ministério dos Direitos Humanos se fortaleça na articulação com a Justiça e Segurança Pública e se fortaleça na articulação com as políticas transversais de atendimento ao adolescente. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Só mais uma pergunta, depois a gente volta. O Sinase está devidamente implementado? Alcançamos o objetivo do PNDH em todo o país? A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO - Senadora, nós fizemos uma pesquisa ainda aqui no Governo Federal, sob a gestão da senhora, em que nós fizemos exatamente essa pergunta: nós implementamos o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo no Brasil? E a resposta redonda, rotunda e inequívoca foi: "Não, não implementamos o Sinase no Brasil". E há questões que são estruturantes, não é o detalhe, não é a maquiagem; existem ainda desafios que são estruturantes para que a gente possa dizer que uma política de responsabilização pedagógica do adolescente foi implementada no Brasil. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Giselle. É desafiador. O Vereador estava aqui do meu lado: "Eu não sabia nada disso". Antes de passar a palavra para a Mariana, deixe-me fazer uma reflexão com quem está no plenário comigo. Este menino custa, vamos imaginar, R$22 mil para uma unidade por mês. Aí ele fica três anos na unidade, gastamos R$22 mil por mês. Só que ele sai da unidade, ele volta para onde? Para a casa dele. E a gente tem... A Giselle me falava muito sobre isso, quando o carro está levando-o de volta, na esquina já está o traficante esperando em pé, morrendo de rir: "Meu soldado está voltando", depois que ele ficou três anos custando R$22 mil. Se a gente estivesse pagando para esse menino uma faculdade fora, nos Estados Unidos, ficaria mais barato. Se estivéssemos trabalhando como ela está fazendo, o acompanhamento... |
| R | A família tem que ficar nesse lugar, nesse mesmo lugar, para o menino voltar para o mesmo lugar e continuar sendo soldado do crime? Ou esse valor poderia ser usado para relocar essa família para um outro lugar, para dar uma chance a esse menino para, quando sair da unidade, morar em outro lugar? Vocês estão vendo como tudo isso é complexo? É muito complexo, porque, às vezes, ele já sai da unidade com missão. Ele tem que cumprir missão, porque lá dentro ele encontrou um faccionado e ele vai ter uma missão aqui fora - por mais que as unidades se esforcem. Eu quero, Giselle, cumprimentar o Governo de Minas Gerais pela forma como ele está lidando com isso durante o período em que o menino fica e depois, o acompanhamento. Nas suas considerações finais, eu queria que você falasse para mim sobre quantos meninos têm em uma unidade - parece que a unidade pode ter, no máximo, 91 meninos - e sobre as visitas íntimas, que eram um grande desafio, e agora não só a visita íntima, mas o Conanda fala também que, se dois meninos se apaixonarem dentro do Sinase, eles vão morar juntos na mesma cela e, se duas meninas se apaixonarem, também vão morar juntas. Como vocês estão lidando com isso? No final, eu queria muito que você dissesse para mim sobre reincidência: qual é o percentual de reincidência? O sistema está dando certo, esses meninos voltam para o crime ou não? Obrigada, Giselle. Eu acho que o Sinase tinha que ser um tema de debate de um dia inteiro nesta Comissão. A unidade socioeducativa tem que ser um tema de debate de um dia inteiro. Você também ficou de me responder, se puder, anote aí: vocês estarão prontos para receber meninos para ficar mais de dez anos lá dentro? Esta é a pergunta. Pronto, vamos respirar e vamos agora... Espero que ela venha com boas notícias. Nós vamos ouvir agora a nossa ex-Secretária Nacional de Direitos Humanos, a Mariana Neris, que hoje está no Estado do Paraná como subsecretária, coordenadora nacional de políticas para mulheres. Mariana, ninguém tem mais propriedade de avaliar o PNDH do que você, que esteve como Secretária Nacional de Direitos Humanos, e nós vamos trabalhar com você o tema, agora de manhã, sobre desafios na universalização do registro civil e acesso à documentação básica para populações em situação de vulnerabilidade. A gente falará sobre a Diretriz 7 do programa, que é: "Garantia dos Direitos Humanos de forma universal, indivisível e interdependente, assegurando a cidadania plena". Gente, os objetivos são tão lindos, vou repetir: "Garantia dos direitos humanos de forma universal, indivisível e interdependente, assegurando a cidadania plena", essa é a Diretriz 7. Objetivo estratégico I: "Universalização do registro civil de nascimento e ampliação do acesso à documentação básica". Alcançamos ou não o objetivo, Secretária Mariana? Seja bem-vinda, Mariana Neris. A SRA. MARIANA DE SOUSA MACHADO NERIS (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todas as pessoas que nos assistem. Bom dia, Senadora Damares, cumprimento na sua pessoa todos os Parlamentares. Quero também cumprimentar a Giselle e o Rafael, aí presentes, e o meu amigo Thiago, que está também aqui online. Eu estou em Curitiba, está frio aqui, imagino que também para o Thiago esteja um pouco frio. Eu quero agradecer já o seu convite, Senadora, e o da sua equipe, para que nós pudéssemos compartilhar aqui um assunto de grande relevância para todo o país. |
| R | Estou também extremamente surpresa com todas as informações que a Giselle nos passou e realmente provocada por tudo que nos foi passado, mas eu vou tentar me ater aqui ao nosso tempo, porque eu acredito que tenha também outras informações tão relevantes ao longo deste dia. Eu queria começar dizendo que nós... Deixe-me ver se eu consigo aqui fazer a apresentação. Vocês estão enxergando a apresentação? A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Sim, estamos enxergando. Está muito boa, inclusive. A SRA. MARIANA DE SOUSA MACHADO NERIS (Por videoconferência.) - Tá. Então, eu quero dizer, primeiro, que o nosso nome é a primeira história que nós recebemos. Isso quem nos disse foi a Clarice Lispector. Então, eu queria começar fazendo a minha apresentação e gostaria de colocar - desculpem-me, acho que eu fechei aqui - que possuo também três sobrenomes: o sobrenome da minha mãe, de Sousa; Machado, do meu pai; e Neris, do meu esposo, Pedro. Da minha trajetória, como a Senadora já mencionou, eu sou servidora de carreira e estive à frente da Secretaria Nacional de Proteção Global do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, cuja liderança esteve na mão da nossa Senadora e então Ministra Damares, nos anos de 2021 e 2022, e atualmente eu sou Diretora de Políticas Públicas para Mulheres no Paraná, junto com a nossa Secretária Leandre Dal Ponte. Eu gostaria primeiro de relembrar que, dentre as competências dessa secretaria que eu liderei ali, em 2021 e 2022, havia a competência de coordenar as ações referentes à política de promoção do registro civil de nascimento e o acesso à documentação básica. Ocorre que eu não estive sozinha, e eu acho muito importante relembrar aqui os atores estratégicos que foram fundamentais para que a gente conseguisse o alcance dessa política pública. Primeiro, a própria Senadora Damares hoje, então Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, que impulsionou a política nacional de universalização da documentação básica. Também preciso relembrar do apoio das Secretárias Tatiana Alvarenga, Viviane Petinelli, Ana Lúcia Munhoz dos Reis, do Secretário da Criança Maurício Cunha, da Secretária Fernanda Monteiro e também da Secretária Cristiane Britto, que se tornou também a nossa Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Na Secretaria de Proteção Global, que é a Secretaria de Direitos Humanos, nós também tivemos o Sérgio Queiroz, o Alexandre Magno, o Eduardo Melo, o Jailton Almeida e a Natammy Bonissoni. Esses atores foram fundamentais para o desenvolvimento dos programas e da avaliação que nós teremos aqui. Então, eu gostaria de começar dizendo que o registro civil de nascimento garante um nome, um sobrenome, uma relação de filiação e uma nacionalidade. Isso é extremamente importante, não só para que a gente tenha uma identificação pessoal, mas para que a gente acesse direitos básicos de cidadania. Eu quero aqui mencionar que isso se dá em uma legislação muito abrangente - hoje nós não vamos conseguir explorar toda ela -, que remonta desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948. Como esta Casa é de leis, é bem importante que esta Comissão de Direitos Humanos se atente a monitorar cada uma das convenções e protocolos que respaldam a importância de se ter um nome, uma nacionalidade, um sobrenome, e isso se dá desde a proteção da criança até os direitos civis e políticos. Mais recentemente, eu quero só destacar o Marco Legal da Primeira Infância, que foi uma lei extremamente importante, que buscou já trazer a identificação dos bebês com biometria, além da criação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, da Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas, da criação do programa Pró-DH, que financiou a aquisição de equipamentos de modernização, inclusive para o registro civil de nascimento; a criação do Programa Nacional de Educação Continuada em Direitos Humanos, na gestão do Presidente Bolsonaro... E agora, recentemente, Senadora Damares, nós identificamos um projeto de lei, que tramita na Câmara dos Deputados - PL nº 1.626, de 2025, do Deputado Adail Filho, do Republicanos -, que institui o Plano Nacional de Identificação Biométrica Neonatal. Então, já deixo aqui para os Senadores a oportunidade de se debruçarem sobre esse projeto de lei, com vistas inclusive a fortalecer esse instrumento tão importante, que é o registro civil de nascimento. |
| R | Bom, mas é importante a gente relembrar que o próprio Programa Nacional de Direitos Humanos é bem abrangente. Ele foi criado em 2009 e atualizado em 2010 e ele tem seis eixos orientadores, 25 diretrizes, 82 objetivos estratégicos e ações programáticas. E, nesse conjunto, nesse universo deste grande programa, nós já temos um marco legal reconhecendo o registro civil de nascimento como um direito humano fundamental e o primeiro passo para o exercício da cidadania plena. Então, durante o Governo Bolsonaro, toda a equipe do ministério, juntamente com outras políticas públicas, como a Casa Civil, o Ministério da Economia, a Segurança Pública, entre outros atores, não só do poder público, mas também da sociedade, construíram uma avaliação, uma análise de todo esse programa e publicaram relatórios que são objeto, inclusive, dessas audiências públicas que estão sendo promovidas pelo Senado Federal. Eu quero falar aqui especificamente sobre o Eixo III da universalização dos direitos em um contexto de desigualdades: a Diretriz nº 7, que é a garantia dos direitos humanos de forma universal, indivisível e interdependente, assegurando a cidadania plena, e a universalização do registro civil de nascimento e ampliação do acesso à documentação básica. E o grande pressuposto de que nós precisamos nos lembrar é que a universalização do registro, da documentação, assegura o acesso aos direitos básicos. Ela amplia e iguala o acesso aos direitos fundamentais, contribuindo para a redução das desigualdades. E as desigualdades aqui, neste contexto, vão além da questão econômica e consideram questões como discriminação, violência e falta de documentação como barreiras que impedem o acesso a direitos, porque, afinal, o que se pretende combater com o acesso a uma documentação é, em primeiro lugar, a exposição a graves violações de direitos humanos, como o tráfico humano, o desaparecimento e o tráfico de órgãos. Também uma criança sem documento não só está exposta à violação de direitos humanos, mas também a falta de filiação ou a ruptura dos vínculos com os seus familiares, com os seus pais e com a sua nacionalidade oportuniza a troca de bebês, sequestros, adoção ilegal e também apatridia, que a gente não lembra, mas o quanto é importante ter uma nacionalidade. Em terceiro lugar, a gente entende que ter uma documentação suplanta as barreiras de acesso aos direitos como saúde, educação, assistência social e os direitos políticos, porque também, sem documento, ninguém pode votar e ser votado. E, além disso, toda a política nacional de universalização da documentação básica também impõe a responsabilidade para o poder público, a sociedade, as famílias, o sistema de justiça e também os cartórios. |
| R | Então, quais foram as primeiras impressões que nós tivemos, os diagnósticos que nós tivemos? Em 2018 - aqui a imagem não está muito boa, porque a gente fez aqui um print do próprio relatório da análise ex ante do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos -, tinha sido identificado, pelos dados do IBGE, que cerca de 3% dos registros de crianças e adolescentes eram tardios, ou seja, tinham sido registradas as crianças nascidas nesse período mais de um ano depois do nascimento delas. E cerca de 68% dessas crianças residiam nas Regiões Norte e Nordeste do país. Nós também vimos que a disparidade, em cada estado, era bastante significativa, tanto em 2018 como em 2019. Só no Estado de Roraima, por exemplo, nós tínhamos esse registro tardio de cerca de 18%. Isso foi reduzindo aí, então, para o ano de 2019, mas nós tivemos, basicamente, mais de 20 estados que reduziram o sub-registro de nascimento de um ano para o outro, entre 2018 e 2019. Regiões Sul e Sudeste tinham uma taxa menor, mas as Regiões Norte e Nordeste ainda eram bastante expressivas. Isso se deve a vários fatores, como a questão mesmo da distância e das desigualdades regionais. Mas nós tivemos avanços, Senadora. Em 2018, o Ministério da Saúde, em conjunto com o CNJ, lançou diretrizes para obrigatoriedade de registro biométrico de bebês e de suas mães em maternidades, e Brasília serviu de piloto para o projeto ser amplamente implementado em outros estados. Essa implementação e a validação de toda essa trajetória se deram muito em virtude do apoio que nós tivemos com a iniciativa do Governo Federal, e foi através de um compromisso nacional, criado em 2019 pelo Decreto Presidencial nº 10.063, que se instituiu o Compromisso pela Erradicação do Sub-registro Civil de Nascimento, um marco institucional importante, que amparou muitas ações que vieram depois. O que nós construímos, então? Uma política nacional, porque, através deste compromisso, estruturamos um comitê nacional gestor que coordenou ações interministeriais; elaborou documentos de apoio aos estados; estimulou a criação de comitês gestores estaduais e municipais para implementação local desta política; criou campanhas, como a semana nacional de mobilização para sensibilização e atendimento; financiou unidades interligadas em maternidades e cartórios; desenvolveu pesquisas e também um curso na Escola Virtual de Governo ligada à Enap. Nós tivemos avanços na área de tecnologia, na coleta de dados, como a biometria neonatal, e a interligação de cartórios interoperados com outras políticas públicas. Nós sabemos que hoje já existem novas tecnologias que surgiram no mercado para viabilizar o registro civil de nascimento. Os cartórios passaram a ser mais tecnológicos, porque o Brasil passou por uma revolução digital, incluindo melhorias no Sistema Nacional de Informações de Registro Civil, Sistema Eletrônico dos Registros Públicos, unificando os cartórios no país. Então, nós tivemos várias iniciativas. Eu vou correr aqui por causa do nosso tempo. As unidades interligadas dentro das maternidades proporcionaram, então, que o bebê, ao nascer, já pudesse ter a captura do seu registro junto com a sua mãe, e, dessa forma, a gente não perdesse mais o bebê com a mãe nem fizesse com que essa criança saísse da maternidade sem um registro. |
| R | Qual foi o resultado, então, Senadora? Nós atingimos, já em 2023, a taxa de sub-registro no Brasil de 1,05%, o menor índice já registrado na série histórica, mas, embora pareça reduzido, nós estamos falando ainda de 26,8 mil crianças que tiveram seus registros tardios, ou seja, que puderam estar expostas às violações que eu já mencionei. Então, quase batemos a meta de 100%, mas ainda temos de monitorar especificamente essas crianças. E nós também avançamos na unificação de dados. Em 2022, já estava em andamento, por iniciativa dos Ministérios da Economia e da Casa Civil, a nova carteira de identidade nacional no modelo único, que foi, então, objeto de bastante debate e construção, no ano de 2022, e que hoje já está em implementação em todo o país. Nós temos ainda desafios, como a Região Norte, em que, historicamente com menores índices de registro, a gente teve uma evolução expressiva: passou de 92%, em 2010, para 97,3% de registros de crianças, em 2022. E todas as regiões do país alcançaram índices superiores a 97% de registro civil de nascimento, e cerca de 20% dos municípios brasileiros já cumpriram a meta de 100% de cobertura de registros, segundo o IBGE. Nós temos ainda desafios estruturais, Senadora. Nós temos a dificuldade ainda do acesso geográfico, pois a distância dos cartórios ainda é muito grande em regiões remotas; a falta de documentação dos pais, o que dificulta o registro dos filhos; o desconhecimento sobre os procedimentos, especialmente em populações vulneráveis; fatores socioeconômicos, como pobreza extrema, que dificulta o deslocamento; fatores culturais, como resistências em algumas comunidades tradicionais; e ainda, muito presente, o racismo institucional, com a discriminação no atendimento ocorrendo muitas vezes e desestimulando o atendimento. E também, no campo das tecnologias, nós sabemos que, embora a digitalização tenha avançado significativamente, ainda persistem: a desigualdade digital entre cartórios de grande porte e pequeno porte, a infraestrutura tecnológica limitada em municípios menores, a necessidade de capacitação para profissionais dos cartórios e da rede de atendimento e a ausência ou insuficiência de integração entre sistemas de diferentes órgãos públicos. Temos algumas recomendações para finalizar. Então, quero recomendar, Senadora, que o Senado possa se desdobrar, através dos relatórios divulgados pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, que apontam a necessidade de se intensificarem ações específicas para grupos prioritários, especialmente populações indígenas e tradicionais, que têm uma taxa de sub-registro ainda maior. Quero recomendar: expandir programas de capacitação para servidores públicos em direitos humanos que precisam fazer esses registros; fortalecer parcerias entre União, estados e municípios; ampliar investimentos em infraestrutura digital para regiões remotas; e desenvolver políticas inovadoras digitais, transversais, que possam ser interoperáveis com sistemas e bases de dados integrados entre cartórios e políticas públicas. E deixo aqui a frase de Hannah Arendt: "O direito de ter direitos começa pelo reconhecimento da pessoa como sujeito". Fico à sua disposição, Senadora, Ministra Damares, para o que for necessário a gente complementar aqui. Muito obrigada. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Secretária Mariana. Eu não sei se é ético eu falar aqui na mesa, mas eu vou falar: nós estamos morrendo de saudade de você e do seu trabalho - morrendo de saudade. A SRA. MARIANA DE SOUSA MACHADO NERIS (Por videoconferência.) - Muito obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Paraná ganhou, mas o Brasil perdeu a sua gestão. |
| R | Mariana, o censo de 2022 apontou mais de 114 mil crianças de até cinco anos que não apresentavam registro civil, crianças vivas. Aqui eu quero fazer essa observação, Vereador. O censo fala de 114 mil crianças vivas sem certidão de nascimento. Não sabemos quantas nasceram e morreram sem certidão de nascimento e sem declaração de óbito. Esse é o país que nós temos. Nós vimos, no seu gráfico, que Roraima despontava com muito destaque em relação aos outros estados. Eu acredito, Mariana, e eu queria que você confirmasse, que é pela questão indígena, por mais de 70% do Estado de Roraima serem território indígena. A subnotificação de nascimento em área indígena é, inclusive, objeto do relatório que nós entregamos na semana passada e aprovamos aqui. Nós não sabemos, de fato, quantas crianças indígenas nascem; portanto, não sabemos quantas crianças indígenas morrem. Qual é a realidade? Aí eu te pergunto isto: se essa diferença proporcional de Roraima em relação aos outros estados é por conta de ser território indígena. A segunda pergunta que lhe faço é se é possível, Mariana, a gente fazer o seguinte... Os pais não registram essas crianças, mas eles batizam ou consagram em uma igreja evangélica ou em uma outra religião de que eles participam. É possível a gente ter aí um programa de integração poder público com as religiões: as religiões não consagrarem nenhum bebê, ou a Igreja Católica não batizar - a Igreja Católica é inclusive mais organizada - nenhum bebê sem o registro desse batismo e compartilhar esse registro com o poder público? Na igreja evangélica - eu sou pastora -, especialmente em igrejas pequenas, Rafael, o pai chega, na hora do culto, com a mãe e com o bebê, ele leva o bebê, o pastor pega, pergunta qual é o nome do bebê, ora, acabou, vai embora, o pai e a mãe nunca mais voltam e não se sabe mais desse bebê. Mas trazer as religiões para esse programa, trazer as igrejas seria ferir a liberdade religiosa, já que o pai não quis registrar, mas trouxe para a igreja? Seria uma afronta à Lei Geral de Proteção de Dados? Mas a gente tem um desafio. Nós temos muitas crianças sem documento; na verdade, Mariana, muitos adultos. Quando a gente esteve no Marajó - você esteve comigo -, nós encontrávamos pessoas de 65 anos sem certidão de nascimento, portanto sem identidade, sem CPF, pessoas que eram invisibilizadas para o Estado. Então, a pergunta é: você acha que um programa nacional envolvendo a sociedade civil... Outra coisa que eu lhe pergunto, Mariana: na região ribeirinha, essas crianças nascem, muitas nascem com parteiras tradicionais, parteiras tradicionais, na sua grande maioria, analfabetas. Como que elas preenchem a declaração de criança nascida viva? A parteira tem um catálogo, assim, um bloquinho em casa, e, a cada hora que ela vai fazer um parto, ela o preenche? Depois que ela o preenche, ela entrega onde esse documento? Nós temos parteiras fazendo partos, mas, se a gente for cruzar os dados, tem mais partos do que crianças registradas. Como lidar com esse desafio, sendo que é uma meta do PNDH-3 a universalização dos documentos? |
| R | A SRA. MARIANA DE SOUSA MACHADO NERIS (Por videoconferência.) - Perfeito, Senadora. Nós temos uma taxa - estava aqui tentando localizar - de 96,7%, se eu não me engano, 98% dos partos sendo realizados em maternidades ou hospitais. Isso significa que o foco da política nacional foi diretamente atingir essas unidades que são maternidades, oficialmente os espaços onde se tem o parto, mas obviamente as crianças, os bebês, nascem em todo lugar, não só em maternidades. Então, de fato, nós temos uma grande taxa de sub-registro em regiões onde os bebês não nascem em maternidades. De fato, as Regiões do Norte e do Nordeste têm essa expressão de índices mais elevados, justamente porque contam com comunidades tradicionais, que muitas vezes não acessam essas maternidades e esses hospitais para que os bebês venham ao mundo. Então, nós temos, sim, em Roraima e em outros estados, essas taxas maiores, sem dúvida, em virtude das comunidades tradicionais indígenas, ribeirinhas, entre outras, que são responsáveis por essa taxa elevada. E também pela questão tecnológica, Senadora, porque nós temos ainda um Estado de Roraima que tem muitas fragilidades em relação a essa questão tecnológica, entre outras questões, que são de dificuldade de acesso, muitas vezes, e de orientação, né? Então, nós trabalhamos juntamente com instituições, como a Caixa Econômica Federal, para que se pudesse, através dos barcos - não só no Estado de Roraima, mas na Região Norte como um todo -, ter dentro do banco da Caixa Econômica a unidade de registro civil. Assim, quando a família vai acessar o Bolsa Família, ela pode ali, enquanto vai sacar o benefício, enquanto vai fazer o seu cadastro, pode já fazer o registro da criança. Então, também é muito importante a gente contar com as instituições bancárias, porque muitas vezes ter um filho, ter mais uma pessoa na família impacta diretamente as questões que são financeiras da própria família. Portanto, o benefício pode vir também a partir daí. Sem dúvida, trabalhar com as igrejas e com a sociedade civil como um todo, com as universidades, com as escolas, em programas de extensão universitária, também contribui para que a gente consiga levar essa conscientização, a partir da importância de uma documentação básica. Às igrejas pode ser um ótimo projeto desenvolver esta viabilidade de que a criança, ao ser levada ao batismo ou a outra forma de apresentação na igreja, possa ter, da parte da sua liderança, daquela comunidade, esta reflexão: "Olha, traga a pessoa para o registro civil, faça a certidão de nascimento da criança". Isso é um acesso a direito. Então, as igrejas têm esse papel de, também, promover o acesso aos direitos. Sem dúvida, o Thiago Vieira vai poder nos dizer que isso não é uma violação de forma alguma, porque o Brasil tem que trabalhar em colaboração com cada uma dessas instituições religiosas. É a laicidade colaborativa que nós vivemos no Brasil. Então, sem dúvida, é dever, né? O Thiago está mostrando o livro dele ali, que nós já lemos, e temos essa mesma compreensão de que as igrejas, as famílias são parceiras na garantia dos direitos. Nós temos, sim, que relembrar esses instrumentos. E não só a certidão de nascimento, como disse bem a Senadora, mas a de casamento também, porque nós temos direitos civis e deveres relacionados aos compromissos que se firmam, seja a certidão de casamento, seja o divórcio, toda essa parte civil implica também em acessos a benefício. |
| R | Por fim, quero só lembrar também, Senadora, que nós tivemos um apoio importante através da Política Nacional da Pessoa Idosa. Pela primeira vez, a Secretaria Nacional da Pessoa Idosa constituiu, ainda na pandemia, uma varredura dentro das instituições de longa permanência, para identificar as pessoas idosas sem registro de nascimento, ou que chegaram lá em abandono, ou que tiveram dificuldades de poder localizar as suas famílias, para que, através da tecnologia de biometria - que não é neonatal, mas é de biometria também, igual -, pudessem fazer a identificação dessas pessoas idosas para localização das suas famílias. Então, o quanto é importante a gente também fazer incentivos na área de tecnologia, na área de sistemas, para que a gente consiga integrar as bases de dados e constituir assim, então, o acesso à cidadania plena de todas as pessoas, não só bebês e suas mães, mas também das pessoas idosas. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Mariana, obrigada, muito obrigada. Nós ainda vamos - se você puder ficar mais um pouquinho, Mariana - para as considerações finais e, com certeza, teremos mais perguntas, mas, se precisar sair, todos os expositores, se precisarem sair, a gente entende e a gente continua o diálogo por e-mail com os senhores. Vamos agora ter a alegria de ouvir o Vereador Rafael Satiê, Vereador do município do Rio de Janeiro, escritor e Presidente da Comissão de Combate ao Racismo. O tema que o Rafael vai trazer é a importância de políticas públicas focadas na igualdade racial e no combate à discriminação, com dados sobre o impacto do racismo na sociedade. A Diretriz 9 do PNDH, Rafael, fala sobre "Combate às desigualdades estruturais", e Objetivo I dessa diretriz fala: "Igualdade e proteção dos direitos das populações negras, historicamente afetadas pela discriminação e outras formas de intolerância". O PNDH-3 alcançou esse objetivo? O SR. RAFAEL SATIÊ (Para expor.) - Bom, muito bom dia a todos. É uma honra muito grande poder estar aqui com cada um de vocês. Senadora Damares, é um prazer estar aqui, na Casa Alta, inclusive, pela primeira vez, fazendo uso da palavra num tema tão pertinente e importante para nossa sociedade. Meu nome é Rafael Satiê, sou Vereador eleito na cidade do Rio de Janeiro, defendendo os valores da família, da pátria, os valores cristãos, que, evidentemente, nos conduziram até aqui, como sociedade, e o ocidente inteiro como sociedade, no crescimento tecnológico, no crescimento dos direitos, bem como também no crescimento dos deveres e direitos do cidadão. Bom, sou Vereador na cidade do Rio de Janeiro. Pela primeira vez, na história da Câmara Municipal, eu sou um Presidente da Comissão de Combate ao Racismo, que é uma Comissão Permanente, Comissão essa presidida, pela primeira vez, por um conservador, contra, infelizmente, muitos pretos que deveriam se orgulhar, no momento de conquista, evidentemente, de um Vereador negro, conservador, assumindo uma pasta que, de fato, é pertinente a uma pessoa negra, mas, infelizmente, não foi dessa forma que eu fui recebido ali pelos meus colegas, inclusive, de Parlamento. Homens e mulheres pretas, porque acreditam, entendem e vivem por um outro prisma e por um outro espectro ideológico, decidiram rechaçar, zombar ou até mesmo ignorar a minha Presidência, mas, graças a Deus, diante de uma equipe técnica muito bem preparada, a gente tem conseguido conduzir com maestria e com, de fato, o valor e o merecimento de que a pasta evidentemente precisa. Eu, no Rio de Janeiro não sou, de fato, uma pessoa que tem inovado, porque muitas coisas estão escritas e, se a gente, de fato, praticar aquilo que está escrito, a gente vai fazer muita diferença. |
| R | Bom, mas eu criei uma frase no Rio de Janeiro, que é uma frase, Senadora Damares, que gerou muito impacto, diante de um caso do Igor Melo, um homem negro que foi alvejado por um policial, quando estava voltando do trabalho. Ele, que tem duas jornadas de trabalho, jornalista fazendo a cobertura do Clube Botafogo, que é um clube nacionalmente conhecido, e à noite ele trabalhava num restaurante. Voltando para casa, ele foi alvejado por uma bala deflagrada por um policial militar, e ele, nessa ocasião, teve o seu rim perfurado, ele perdeu o rim direito e parte do seu intestino em uma cirurgia. Bom, a mídia, evidentemente, no primeiro momento, disse que era racismo, e esse foi o primeiro caso que caiu na minha mesa como Presidente da Comissão de Combate ao Racismo na cidade do Rio de Janeiro. E, Senadora Damares, a gente foi fazer uma análise técnica precisa, sem critério emocional - como a gente diz no Rio de Janeiro, com os pés no chão -, e nós constatamos que não foi racismo, evidentemente, porque o policial que alvejou o Igor Melo também era um homem negro, e um homem negro retinto, diferente de mim, que sou mais pardo, digamos assim, do ponto de vista da própria certidão de nascimento. Bom, eu me considero uma pessoa preta, negra, mas há também, por uma questão de militância esquerdista, a colorimetria, onde, infelizmente, dentro da paleta de cor da militância, da colorimetria da militância, eu, por ser um preto mais claro, sou mais privilegiado do que um preto mais retinto. É uma situação complexa e a gente não vai debater sobre esse tema. A questão é: a frase que eu disse, amplamente divulgada nas redes de TVs, na cidade, no Estado do Rio de Janeiro, foi: "Todo racismo é crime, mas nem todo crime é racismo". O que aconteceu com o Igor Melo, de fato, foi algo criminoso, e esse policial precisa ser responsabilizado, responder pelos seus atos e, na minha visão, sumariamente exonerado do seu cargo policial e das suas prerrogativas de Polícia Militar da cidade do Rio de Janeiro, tendo em vista a irresponsabilidade em fazer o manuseio da sua arma de fogo para atingir alguém que nenhum crime havia cometido naquele momento. Agora, alegar que aquilo fosse algo de teor racista seria leviano e irresponsável da minha parte. Assim, eu começo presidindo a Comissão de Combate ao Racismo lá na cidade do Rio de Janeiro, no Rio de Janeiro, e, por esta razão, sendo odiado por muitos da militância, sobretudo do movimento negro, que é pioneiro na cidade do Rio de Janeiro, bem como na cidade de São Paulo. Então, falar sobre a questão dos direitos humanos é muito importante para mim, muito pertinente. E, antes de começar, de fato, a minha fala nesse sentido, eu parabenizo, inclusive, aqueles que me antecederam, pela tecnicidade, pela maneira como conduziram e pelas informações cruciais que trouxeram. Mas eu gosto também... Além de me comunicar tecnicamente com os meus pares aqui presentes, bem como com os que estão presentes aqui nesta Comissão, neste auditório, eu também não me furto em comunicar com aquelas pessoas simples que estão nos assistindo e que, posteriormente, nos assistirão, essas pessoas que estão dentro das comunidades, que estão dentro das favelas - assim, no Rio de Janeiro, dizemos; em São Paulo, nas periferias -, em todos os rincões deste Brasil. Por essa razão, eu também quero me expressar, além da maneira técnica, de uma maneira bem simples, a fim de que essas pessoas compreendam a realidade, a atual situação em que nós nos encontramos hoje, fazendo um panorama rápido sobre a questão histórica dos direitos humanos. A gente vai ver diversas vertentes, inclusive históricas. E não é um assunto de agora, né? |
| R | Às vezes, alguns grupos políticos tentam se apoderar dessa questão dos direitos humanos, dizendo que eles são os criadores e que, de fato, eles são os únicos que têm - abro aspas - "o lugar de fala" - fecho aspas - para tocar em determinados assuntos ou representar determinada minoria. De fato, eu discordo veementemente dessa terminologia e dessas ações, tendo em vista que a prática dos direitos humanos é uma prática milenar, a começar pelo Código de Hamurabi. Isso eu estou falando da sociedade babilônica, de centenas, de talvez milhares, milhares de anos, melhor dizendo, dos dias que nós estamos aqui. Passando disso, você tem a Carta Magna, uma coisa mais atual, a Grande Carta, numa tradução livre em português, que é do Parlamento britânico. Ela basicamente tirava todo o poder absoluto da monarquia. A gente está falando de algo e de uma diretriz do século XIII, precisamente do ano de 1215, ali na Europa, na Inglaterra. Depois, a gente vai falar também do Renascimento. Os direitos humanos vão passar por esse período. Eles passam pela reforma protestante - talvez um assunto que o nosso Prof. Thiago Rafael vá abordar aqui com a gente. Então, eles passam pela reforma protestante. E, Senadora Damares, todas as vezes que eu vejo alguém que representa os direitos humanos, de maneira sumária, essa pessoa nos restringe - "nós", cristãos protestantes ou cristãos católicos apostólicos romanos - de um debate de que fomos cruciais na construção, a partir de 1517, com Martinho Lutero, que foi um dos grandes protagonistas, e outras pessoas, cristãos protestantes, que levantaram a bandeira dos direitos humanos. E aí, vai passar pelo iluminismo também e chega, talvez, aos dias atuais, digamos assim, à 1948, evidentemente. Bom, o tema, além de ser um tema técnico, trata de alertar sobre os riscos de um projeto político-ideológico disfarçado de promoção de direitos humanos. Bom, eu sou Vereador no Rio de Janeiro, tenho um cargo eletivo, então, faço política propriamente dita com o meu mandato, e eu não poderia me furtar de falar sobre o tema e não falar sobre o sequestro da pauta ideológica - ou da militância - por grupos esquerdistas, desse tema tão pertinente, que não deveria ser. Os direitos humanos não deveriam ser uma pauta sequestrada, não deveriam ser uma pauta simplesmente dominada por determinado tipo de pessoas que inviabilizam qualquer forma de expressão retórica de grupos distintos daquilo em que aquela pessoa acredita. É como se eu, um homem negro, não tivesse a possibilidade ou - abro aspas - "o lugar de fala" - fecho aspas - para falar de um outro homem negro, porque eu não sou um negro que compartilha do mesmo espectro político-ideológico dessas pessoas que se apoderaram dessa pauta ou a sequestraram, digamos assim. O Decreto 7.037, de 2009, assinado pelo Governo Lula, aprovado como política nacional, é a terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos, que é um extenso plano de ação baseado em eixos, diretrizes para o Estado brasileiro. (Soa a campainha.) O SR. RAFAEL SATIÊ - E onde está o problema disso? Aparentemente o texto traz bandeiras muito nobres - é óbvio, é sempre com bandeiras muito nobres, sempre com bandeiras que a gente olha ali, do ponto de vista didático e teórico, muito bonitas, muito pertinentes -, mas ao analisarmos com atenção, percebemos a subversão da autoridade institucional - já entrando agora, de fato, na minha fala, pertinente ao eixo que fui conduzido aqui pela Senadora Damares, as diretrizes que defendem um combate à violência institucional. |
| R | O que seria o combate à violência institucional ou o que seria, de fato, a violência institucional ou a redução da letalidade policial? Escondem um viés ideológico de enfraquecimento das forças policiais, evidentemente. O que seria, de fato, a redução da letalidade policial? E por que a letalidade está sempre antecedendo a palavra policial? E por que não se fala de letalidade do tráfico de drogas? E por que não se fala da letalidade do uso das drogas? E por que não se fala da letalidade de tantas outras coisas que levam os nossos jovens pretos, pobres, periféricos e favelados à morte precoce ou ao aprisionamento precoce? Bom, talvez você não conheça a fundo, mas quem vos fala é uma pessoa que, de fato, tem esse - abro aspas - "lugar de fala" - fecho aspas -, afinal de contas, esse Vereador que vos fala é filho de um ex-traficante que ficou preso durante oito anos, irmão de um outro homem que foi morto pelo tráfico de drogas há aproximadamente quatro anos, e também irmão de um homem - mais novo do que eu, eu sou o filho mais velho de cinco - que encontra-se nesse exato momento no Complexo de Gericinó, Bangu 3, por assalto à mão armada e, enfim, diversos outros - o meu irmão assalta com mão armada, que é o art. 157, me parece, e depois o 155 também, sem armas. Por que este que vos fala tornou-se Vereador da segunda cidade mais importante do Brasil, e culturalmente falando, a cidade mais importante do Brasil? Porque as decisões são individuais - as decisões são individuais. Eu não sou fruto do meio, eu não sou fruto da região, eu não sou fruto do Complexo do Lins, de onde eu vim, ou da Favela do Jacarezinho. Bom, eu não necessariamente preciso de políticas públicas ou talvez um lugar de fala dado por um Governo para que eu possa prosperar e crescer na minha vida. Eu não compactuo com esse tipo de pensamento e, por essa razão, entendo que, muitas vezes, as políticas de direitos humanos propostas pelo atual Governo - desculpe, Senadora Damares - são políticas que mais afastam o preto, o pobre e o favelado do sucesso e mais o aproximam do fracasso. (Palmas.) Então, termos, como erradicação da tortura, são usados de forma ampla, deslegitimando a atuação e criminalizando o policial militar, que hoje é o verdadeiro garantidor da paz das comunidades. Bom, há, sim, os excessos da polícia militar, evidentemente; há, sim, os excessos das forças de segurança no âmbito da cidade do Rio de Janeiro, talvez numa incursão, talvez numa operação. Sim, possivelmente há. Eu também não posso colocar a minha mão no fogo por todos os membros da polícia militar, mas eu nunca vi um policial militar arrancando a cabeça de um bandido. Ninguém fala da altíssima taxa de letalidade entre os bandidos para com os bandidos, porque o que me parece, quando o Governo faz uma declaração dessa ou um plano desse sem avaliar minuciosamente a realidade dos rincões e as diferenças das regiões do Brasil, é que isso se torna um processo totalmente irresponsável, sem avaliar o conflito de facções entre as próprias facções. Porque, no Rio de Janeiro, quando se fala de problemas de tráfico de drogas, a interferência do tráfico de drogas na sociedade, a gente tem que falar de várias camadas. Diferentemente de São Paulo, em que a gente tem uma única facção e, por essa razão, ao que me parece, as coisas parecem mais ordenadas e menos letais. |
| R | Você não vê na cidade de São Paulo, por exemplo, um homem andando com um fuzil invadindo uma outra comunidade com outro fuzil. Por que isso não acontece? Porque São Paulo é melhor ou pior? Não, porque existe só uma facção. Agora, quando você fala de Comando Vermelho, de Terceiro Comando, de Amigos dos Amigos, de milícia e de toda a sorte de coisas ruins que assolam as áreas periféricas do Rio de Janeiro, você não pode, simplesmente, taxar a polícia militar ou as forças de segurança como forças que exercem altíssimas taxas de letalidade. E por que isso é perigoso, Senadora Damares? Porque esse tipo de ação e esse tipo de projeto fazem com que se criem políticas públicas como, por exemplo, a evocada pelo PSB, no Supremo Tribunal Federal, por uma decisão monocrática do Ministro Edson Fachin, a ADPF 635, que é uma política pública baseada na taxa de letalidade da polícia e que, durante o ano de 2020, na pandemia, que foi a causa justificatória para esse fato ou para esse ato da ADPF 635, simplesmente impediu a polícia militar de fazer as suas operações nas favelas, aumentando ainda mais a expansão territorial das facções criminosas. Senhoras e senhores, nós estamos falando de uma política pública baseada em projetos e planos de direitos humanos que inviabilizou o trabalho da polícia militar, fazendo com que a abrangência do tráfico de drogas na cidade do Rio de Janeiro crescesse exponencialmente como nunca visto na história. Bom, quando se fala de direitos humanos, durante muitos anos foi denunciado nas redes sociais, pela direita, evidentemente, o "direito dos manos", não é? Pois só se versava sobre a linha ou o aspecto de quem estava cometendo um crime. E o direito humano é muito mais amplo do que isso. Historicamente - eu dei dados históricos aqui, da Babilônia, da Carta Magna da Inglaterra, da própria Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948 - não podemos reduzir esse trabalho, evidentemente, brilhante, não podemos reduzi-lo ao criminoso; não podemos reduzir àquele que comete crime. Ou, afinal de contas, o pai de família não é digno dos direitos humanos quando sai da sua casa e depois tem que voltar para sua casa? Ou, afinal de contas, a mulher que sai da sua casa para trabalhar ou que permanece em casa para cuidar de seus filhos não merece ser assistida pela política de direitos humanos? A família... Bom, por essa razão, essa releitura ideológica e histórica nacional tem impactado. O Eixo 6, por exemplo, trata do direito à memória e à verdade, mas apenas sob a ótica da esquerda. Ignora os crimes cometidos por alguns grupos armados revolucionários, distorcendo a história da luta armada contra o regime militar. Esse eixo sustenta comissões parciais que atacam militares e promovem o revanchismo. Você tem a doutrinação educacional e tantos outros. E para finalizar, Senadora Damares, porque eu também não quero me ater... É um tema muito pertinente, e por isso eu agradeço à senhora. Muitas vezes a gente é convidado para falar de temas sobre os quais a gente fica até engessado, né? São temas pertinentes, mas não têm uma profundidade técnica e uma abrangência grande. Então me sinto muito honrado, nesta manhã de segunda-feira, em estar falando sobre um tema muito pertinente e sobre o qual pouquíssimas pessoas estão falando. |
| R | E, quando se fala, tratando-se ali do Rio de Janeiro, tal qual cidade e estado, simplesmente é pelo viés ideológico e pelo viés vitimista, infelizmente, reduzindo a ação do homem negro, a ação daquele que sempre precisa e que nunca é capaz de entregar ou de fazer nada. Bom, eu sou contra essa estatística. Eu não faço parte dessa estatística. Sou empresário, sou escritor, sou político muito bem-sucedido, sem precisar de cota racial ou qualquer tipo de coisa que, talvez, me eleve ao nível de um homem branco. Desculpas os homens brancos desta sala não me devem, não me devem perdão. Muito pelo contrário: vocês não são maiores do que eu. Eu sou igual a você e talvez maior do que muitos de vocês. (Palmas.) Para finalizar, Senadora Damares, meus pares, a audiência que também está nos assistindo neste dia, é inegável que o Brasil traz marcas da desigualdade. Reconhecer isso é necessário, mas não significa transformar o passado em justificativa para dividir a sociedade e criar privilégios permanentes. Bom, existe, sim, um problema e uma cisão racial. Não dá para se negar o racismo. Eu já sofri racismo, meu Deus! Eu já andei pelo bairro de Ipanema, e a senhora que estava na minha frente segurou um pouco a bolsa. Bom, em certo ponto, isso pode ser considerado um racismo, mas também pode ser uma questão de segurança e estatística. Afinal de contas, hoje, existe um índice de estatística de que a maior probabilidade de você ser assaltado no Rio de Janeiro é com dois homens sobre uma moto. Isso significa que, todas as vezes, dependendo de um período do dia, em que dois homens sobre uma moto passem próximo de você, a probabilidade de você ser assaltado é grande. Não significa que, se a mesma senhora esconder a bolsa de dois homens de moto, seria "motofobia". Afinal de contas, tal senhora está respeitando a estatística. Bom, podemos também usar esse mesmo exemplo e chegarmos à conclusão de que a grande maioria dos assaltos cometidos na cidade do Rio de Janeiro são por pessoas pretas, pardas e assim por diante. Podemos também chegar à conclusão de que uma senhora, ainda que seja preta, negra, parda, ao ver um homem preto se aproximando, pela estatística, pode achar que vai ser assaltada. E isso, de igual modo, com o motoqueiro, não é racismo. É um respeito à estatística. Então, ter essa visão e ter essa percepção com sobriedade é o que esta audiência propõe e é parte da minha fala nesta manhã. Por essa razão, a gente milita, sobretudo, inclusive nas vestimentas do homem preto. Originou-se, no Movimento Negro Unificado, na cidade de São Paulo, que uma das vertentes do movimento negro, além da fala, além da oratória, além da etiqueta, era a vestimenta. Bom, eu sou apaixonado pelo Flamengo, mas não faz sentido algum eu vir a uma audiência pública nesta Casa Alta vestido com a camisa do Flamengo. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF. Fora do microfone.) - E nem entrava. Nesta Comissão, talvez entrasse. (Risos.) O SR. RAFAEL SATIÊ - E nem entrava, né? Com toda a vênia, acho que está por baixo aqui. Cada local necessita de um dress code ou de uma vestimenta necessária para cada ambiente. |
| R | Por esta razão, não adianta o preto dizer que está sendo discriminado, num determinado local, porque ele é preto. Na verdade, ele está chamando a atenção, porque não está atendendo o dress code daquele local. Vá para dentro do Palácio do Itamaraty, de bermuda e de boné para trás; você vai ser olhado torto, sim, e isso não é racismo! O óbvio precisa ser dito. De fato, a igualdade perante a lei, prevista na Constituição, já é o maior instrumento contra qualquer tema de discriminação. O que precisamos é aplicá-la de maneira real e imparcial. Bom, nós estamos, ou estávamos, muito mais avançados do que a sociedade norte-americana, onde teve uma guerra civil entre norte e sul, nortistas e sulistas, escravagistas e os que eram contra a escravidão. Guerrearam, numa guerra civil, a fim de que isso acabasse, terminasse. Pois bem. Eles finalizam uma guerra, vem a Constituição dos Estados Unidos, na cidade de Filadélfia, se não me falha a memória em 1776. Até então, o negro não tinha o direito ao voto. Bom, eles fazem uma guerra civil, e a Constituição não garante ao negro norte-americano um lugar digno na sociedade. Isso só vai acontecer nos anos 50, 60, com o pastor protestante Martin Luther King. No Brasil, diferente disso, na nossa Constituição, já nasce o direito à igualdade do homem preto, assim como o homem branco. Nós estávamos mais avançados do que eles, mas essas políticas retrógradas, militantes, fizeram com que o negro e o preto brasileiro não desenvolvessem a medida do preto norte-americano. Por quê? Porque o racismo, nos Estados Unidos, é um homem com a arma apontada na sua cara. Sim, existe o racismo estrutural nos Estados Unidos: rua de preto, bairro de preto, música de preto, restaurante de preto e até igreja de preto, em que eu tive a honra de ir em Nova York, no Brooklyn. Aquelas senhoras com chapéu, no domingo de manhã, com dress code perfeito para a ocasião. Todo mundo de terno, todo mundo alinhado, aqueles negões de dois metros de altura. (Soa a campainha.) O SR. RAFAEL SATIÊ - Em determinado momento, eu falei: "Senhor, por que é que eu nasci no Brasil?". Bom, agora eu finalizo de fato: a sociedade norte-americana, mesmo com o racista com uma arma apontada sobre o seu rosto - ou seja, ele sabe quem é o racista; ele sabe onde está o racista -, mesmo assim, a sociedade norte-americana tem o maior jogador de golfe da história, o Tiger Woods, um homem preto; o maior jogador de basquete da história, o Michael Jordan, um homem preto; a maior jogadora de tênis da história, Serena Williams, uma mulher preta; um Presidente da República. Embora seja democrata, sim, teve um Presidente preto nos Estados Unidos. E a Oprah, que é, ou que foi, a maior apresentadora de televisão da história dos Estados Unidos, uma mulher preta! Bom, por que é que nos Estados Unidos, onde o racismo é um homem apontado com a arma na cara, onde todo mundo sabe onde está o racismo, um homem preto conseguiu chegar a patamares inimagináveis, e, no Brasil, onde o racismo é uma pessoa com a arma apontada na sua nuca, você não sabe quem é o racista, você não sabe quem ele é... E pasmem, senhores: pode ser que o racista seja aquele que viva o tempo todo chamando você de racista, e a manutenção e a retroalimentação do poder dele consistem em manter você na senzala ideológica. E por que o preto brasileiro, hoje, infelizmente, quando aparece em alguma rede de TV, aparece com black power, com a camisa da África, grafitando um muro ou dançando hip hop? |
| R | Cadê os pretos advogados? Cadê os pretos engenheiros? Cadê os pretos médicos? Cadê os pretos Senadores da República? Já tem um preto Vereador. (Risos.) Eu finalizo a minha fala com esta frase: o desafio do PNDH-3 é universalizar direitos sem cair em narrativas políticas que conduzam os direitos humanos a bandeiras de minorias. O Brasil precisa de uma política de direitos humanos que seja realista, justa e aplicada ao cidadão comum, respeitando nossa Constituição e os valores que unem a nossa nação. Muito obrigado, senhoras e senhores. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Uau, Vereador! Uau! Esta é a graça do Parlamento: trazer para a mesa as diversas manifestações, os diversos pensamentos. Por muitos anos, eu estive ali, sentada, como assessora, vendo os debates nesta Comissão apenas sob um ângulo. Trazê-lo, hoje, para fazer essa análise sobre o racismo é a gente realmente ousar que esta Casa seja a Casa, Vereador, das múltiplas ideias. Isso aqui é diversidade de verdade. Podemos nem concordar com tudo que você fala, mas a gente precisa te ouvir. Voltando, Vereador, à questão do racismo, ao que o PNDH se propõe, o enfrentamento ao racismo: o que a gente viu é que houve um enfrentamento aguerrido de um movimento. Mas, por exemplo, cadê os ciganos, que também sofrem preconceito e discriminação? Nós não estamos vendo uma luta nacional pelo fim da discriminação aos ciganos. Há um outro público que já tentou encontrar espaço nesta Comissão e foi recebido de forma tímida - mas acho que esse público precisa ter um espaço no debate -, que são os mestiços. Esta é uma nação com muitos mestiços. No Norte do país, nós encontramos pessoas que não são indígenas, não são negras e não são brancas. Elas se autodeclaram mestiças. E a gente não vê programas de enfrentamento ao preconceito ao mestiço. Eles já vieram aqui. Eles não estão nem no censo. No censo, estão pardo, branco, negro, mas não tem mestiço. Mas esta é uma nação, na sua grande maioria, formada por mestiços. A gente não viu esse grupo sendo respeitado. E também o que é que a gente tem visto hoje? Um letramento contra o racismo, um policiamento muito grande, inclusive a palavras. Inclusive, quando eu faço debate sobre racismo, eu pergunto: "Como é o nome desta dor?". A minha filha, que é indígena, já foi expulsa de elevador. A minha filha, quando criança, era desconvidada para festa de aniversário. Já falei sobre isso. Marisa me acompanha desde quando eu adotei a Lulu. Eu lembro que acontecia muito isto na escola, Giselle: ela vinha com o convitinho de aniversário - porque o aniversariante distribuía para todos os coleguinhas da sala - e, no dia do aniversário, a mãe da criança me ligava: "Olha, a festinha foi cancelada". Nós já tínhamos comprado o presentinho para Lulu levar. Foi uma vez cancelada - na segunda-feira, ela levava o presentinho para a coleguinha -, duas vezes... Na terceira vez, eu disse: "É muito cancelamento de festa." Eu peguei o carro e fui. A festinha estava acontecendo, e foi cancelada apenas para a minha filha, que era indígena, porque a coleguinha dava com carinho, mas a mãe dizia: "Eu não quero a índia na festa, porque índio é doente, índio tem piolho" - especialmente se a festa tivesse piscina. |
| R | As mães das crianças brancas não aceitariam suas filhinhas lindas, loiras, mergulhadas numa piscina junto com a minha filha indígena. Eu passei por isso. Que nome dar a essa dor que Lulu sentia? É racismo? Nós temos que falar sobre isso de uma outra forma? Essa briga do movimento negro, que se fez necessária em um momento, precisa continuar da forma como continua? O PNDH deixou outros segmentos para trás, Vereador? Os indígenas, os ciganos, os imigrantes... Hoje a gente vê aí muito preconceito, discriminação aos imigrantes, especialmente aos venezuelanos e a outros segmentos. Como nós vamos lidar? Que proposta eu poderia trazer para um novo PNDH em que todos os segmentos que sofrem preconceito e discriminação possam ser alcançados? O SR. RAFAEL SATIÊ - É evidente, Senadora, que o PNDH deixou sim outras minorias, diversas outras... O PNDH-3, melhor dizendo, deixou outras minorias de fora: os indígenas, os ciganos e tantas outras minorias no nosso Brasil, e é óbvio que, por essa razão, eu faço essa denúncia da politização, da ideologização do PNDH-3, justamente por isto, porque não deveria ser politizada ou muito menos polarizada a pauta dos direitos humanos - eu também sou Vice-Presidente da Comissão de Direitos Humanos da cidade do Rio de Janeiro, na Câmara Municipal da cidade do Rio de Janeiro -, porque direitos humanos é para todos, é o direito humano da pessoa humana. No entanto, simplesmente se fecha esse assunto dentro da pauta preta ou da questão racial. E aí você vai abrir várias vertentes, e uma das vertentes, como a senhora muito bem explanou aqui, é o letramento racial. Não sei se vocês que estão nos assistindo ou vocês que estão aqui também no Plenário sabem o que é o letramento racial. É, por exemplo, a proibição da palavra denegrir, a proibição da palavra esclarecer, a proibição da palavra buraco negro, por exemplo. A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO (Fora do microfone.) - O emburrecimento... O SR. RAFAEL SATIÊ - Hã? A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO (Fora do microfone.) - O emburrecimento... O SR. RAFAEL SATIÊ - O emburrecimento linguístico, melhor dizendo, é o que eles chamam de letramento racial. Bom, mas por que focam tanto na pauta preta e, evidentemente, negligenciam os indígenas, negligenciam os mestiços, negligenciam também os ciganos e tantas outras minorias, como, por exemplo, os imigrantes, que são uma grande dificuldade que a gente vive hoje? Nós recebemos muitos imigrantes, por exemplo, da América Latina, oriundos de uma ditadura sanguinária. E talvez seja esse o motivo e a razão pelas quais, ou pelos quais, eles não sejam inseridos, porque inserir, talvez, um imigrante dentro do PNDH-3, como uma minoria a ser assistida, é praticamente a declaração e aceitação de que os países vizinhos, como Nicarágua - não tão vizinho - ou Venezuela - sim, vizinho, de costas -, de fato, é uma ditadura, e é o que o atual Governo não quer, evidentemente, deixar claro. Então, sim, as minorias ou todas as minorias não foram atendidas, e é necessário revisar sim e - por que não, Senadora Damares? - propor um PNDH-4, estrutural, que seja abrangente a todas essas minorias, sobretudo as minorias que foram negligenciadas no PNDH-3. |
| R | A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Vereador. Obrigada. Nós vamos passar a palavra depois para vocês fazerem agradecimentos, considerações finais. Eu queria que você falasse do seu livro depois, onde as pessoas podem encontrar. É uma nova visão sobre o enfrentamento ao racismo no país, e quero dizer, Vereador, que foi uma alegria tê-lo conosco neste rico debate. Vamos ouvir agora o último expositor, que é o Dr. Thiago Vieira, advogado, escritor, inúmeras obras que ele assina como autor e como coautor, e hoje ele é Presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Religião. O tema do Thiago será a liberdade religiosa e a laicidade do Estado como pilares para a convivência pacífica em uma sociedade plural. É a Diretriz 10 do PNDH-3, que é a garantia da igualdade na diversidade, e Objetivo estratégico VI: respeito às diferentes crenças, liberdade de culto e garantia da laicidade do Estado. Dr. Thiago, eu quero lhe fazer um desafio, porque as nossas falas estão muito conectadas. Quando a Gi traz um menino negro no sistema, quando o Rafael traz esse combate ao preconceito, quando a Mariana traz a região ribeirinha e indígena com sub-registro, os temas estão muito entrelaçados. E aí, Dr. Thiago, meu querido amigo, eu fui vítima de preconceito por muitos anos por ser religiosa, por ser cristã. Eu sofri na escola porque eu usava saia, a minha igreja pedia saia. Eu era objeto de ridicularização o tempo todo. Eu sofri bullying o tempo inteiro, por conta da minha fé e da minha saia, e a vida inteira foi isso. Eu ia a um debate na área de direitos humanos, estava lá: "Ativista de direitos humanos". Quando alguém na mesa dizia "mas ela é crente?", todo o meu debate era desqualificado. Eu era às vezes convidada a ser retirada, como se crente não pudesse entender de direitos humanos. O maior exemplo, Thiago, e aí eu faço esse desafio a você, foi quando eu fui convidada a ser Ministra de Direitos Humanos. Eu fui objeto de ridicularização no Brasil. "Como uma pastora pode ser Ministra de Direitos Humanos?". E aí, Thiago, o preconceito não era pelas minhas ideias conservadoras. Eu fui, nos últimos anos, Rafael - e a Gi também sabe -, o maior exemplo de discriminação por religião. Eu fui rejeitada tão somente por ser evangélica. Eu virei motivo de gozação, quando eu falei da minha fé na infância, o exemplo de Jesus no pé de goiaba, aquela minha história, criança na infância... Gente, não sei se vocês sabem, eu fui carro alegórico. No Carnaval de 2019, teve carro alegórico com Jesus no pé de goiaba, rindo da minha história. Eu fui fantasia de carnaval! Teve uma boate no Nordeste que todo mundo estava... Era a boate inteira com bruxas em vassoura, mas o rosto da bruxa era eu, marcha de carnaval - eu poderia até ganhar dinheiro com isso, pedir direitos autorais, né? -, fantasia, personagem de novela, personagem de programa de humor... Só tem um que eu autorizo, que é o Tom Cavalcante. Continue, então. (Risos.) Eu amo quando o Tom me imita. Tudo isso porque eu era religiosa. |
| R | (Intervenção fora do microfone.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Música, marchinha de carnaval. Eu fui um dos maiores exemplos de perseguição religiosa no Brasil. Por exemplo, quando eu contei aquela historinha que eu vi Jesus na infância... E eu vi, gente. Se vocês não veem Jesus, o problema é de vocês, mas eu vi na infância. As crianças veem anjos na infância. Aí nós temos uma apresentadora de televisão - e eu não vou dizer o nome, porque ela não me ama - que viu um duende, adulta. Ela disse que viu um duende, na fase adulta, e ela não foi objeto de ridicularização. Pelo contrário, foi cultuada por ter visto um duende. Eu vi Jesus na infância e fui objeto do ridículo. Então, Thiago, o PNDH-3 me deixou para trás. Foi! Não existia um programa, não existiam políticas públicas, nada de campanha para se evitar o preconceito à fé cristã. E a gente tem que enfrentar tudo. Este um país plural, este é um país de todas as religiões. Gente, eu acho isso incrível no Brasil! Nós temos os budistas, nós temos o pessoal das religiões de matriz africana, nós temos os cristãos, nós temos os judeus, nós temos diversas religiões no Brasil, e a gente consegue conviver com isso. Mas eu fui um objeto de... Meu Deus do céu, como foi difícil! Teve até um momento em que eu pensei em desistir de ser Ministra. Foi no dia em que um jornalista escreveu - gente, um jornalista! - que eu era louca. porque eu tive a oportunidade de ter relações sexuais com Jesus no pé de goiaba e eu não transei com Jesus. Quer dizer... Naquele momento... Eu me lembro de que estava em Belo Horizonte recebendo um prêmio de direitos humanos quando a matéria saiu. Eu comecei a chorar. Uma coisa é eu ser perseguida por minha fé - eu suporto -, mas ridicularizarem o meu Jesus para me alcançar... Então, era o contrário; agora estavam atacando Jesus para me atacar. Naquele momento eu disse: "Será que eu preciso ser um objeto de escárnio? Será que eu preciso estar aqui para atacarem o meu Jesus?" E aí eu queria desistir, mas alguém disse: "Não, não desista, continue". Que bom que eu continuei! E eu fui muito feliz até o final do meu trabalho no ministério. Mas a pergunta é, Thiago: como lidar com a liberdade religiosa no país? Como fazer o enfrentamento a todos os preconceitos por conta da religião e como garantir a laicidade do Estado? Bem-vindo, Dr. Thiago. E o PNDH-3 alcançou o seu objetivo ou não nessa área? Música, marchinha de carnaval. Eu fui um dos maiores exemplos de perseguição religiosa no Brasil. Por exemplo, quando eu contei aquela historinha que eu vi Jesus na infância... E eu vi, gente. Se vocês não veem Jesus, o problema é de vocês, mas eu vi na infância. As crianças veem anjos na infância. Aí nós temos uma apresentadora de televisão - e eu não vou dizer o nome, porque ela não me ama - que viu um duende, adulta. Ela disse que viu um duende, na fase adulta, e ela não foi objeto de ridicularização. Pelo contrário, foi cultuada por ter visto um duende. Eu vi Jesus na infância e fui objeto do ridículo. Então, Thiago, o PNDH-3 me deixou para trás. Foi! Não existia um programa, não existiam políticas públicas, nada de campanha para se evitar o preconceito à fé cristã. E a gente tem que enfrentar tudo. Este um país plural, este é um país de todas as religiões. Gente, eu acho isso incrível no Brasil! Nós temos os budistas, nós temos o pessoal das religiões de matriz africana, nós temos os cristãos, nós temos os judeus, nós temos diversas religiões no Brasil, e a gente consegue conviver com isso. Mas eu fui um objeto de... Meu Deus do céu, como foi difícil! Teve até um momento em que eu pensei em desistir de ser Ministra. Foi no dia em que um jornalista escreveu - gente, um jornalista! - que eu era louca. porque eu tive a oportunidade de ter relações sexuais com Jesus no pé de goiaba e eu não transei com Jesus. Quer dizer... Naquele momento... Eu me lembro de que estava em Belo Horizonte recebendo um prêmio de direitos humanos quando a matéria saiu. Eu comecei a chorar. Uma coisa é eu ser perseguida por minha fé - eu suporto -, mas ridicularizarem o meu Jesus para me alcançar... Então, era o contrário; agora estavam atacando Jesus para me atacar. Naquele momento eu disse: "Será que eu preciso ser um objeto de escárnio? Será que eu preciso estar aqui para atacarem o meu Jesus?" E aí eu queria desistir, mas alguém disse: "Não, não desista, continue". Que bom que eu continuei! E eu fui muito feliz até o final do meu trabalho no ministério. Mas a pergunta é, Thiago: como lidar com a liberdade religiosa no país? Como fazer o enfrentamento a todos os preconceitos por conta da religião e como garantir a laicidade do Estado? Bem-vindo, Dr. Thiago. E o PNDH-3 alcançou o seu objetivo ou não nessa área? O SR. THIAGO VIEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Muito bom dia, Senadora Damares, sempre Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Na sua pessoa, cumprimento todos os que estão presentes nesta audiência pública. Também tenho a alegria aqui de compartilhar este espaço - além da senhora, minha amiga - com a Mariana e com o Raphael. Aproveito também para cumprimentar a Dra. Giselle, que eu estou tendo o prazer de conhecer neste momento, os Parlamentares que porventura estão na sessão e todos aqueles que nos assistem no canal do Senado Federal, via YouTube. São muito importantes as suas colocações. Não há dúvida de que a senhora foi vítima de perseguição religiosa. Estou sendo o último a falar e eu me Lembro de que quando eu fiz a primeira audiência da minha vida, eu tinha 23 anos, recém-saído da universidade... |
| R | Eu fui fazer uma audiência criminal ou uma audiência de um ato infracional de um menor infrator - foi minha primeira audiência -, e eu fui o último a falar, porque eu era o defensor, motivo pelo qual eu comemorei, porque para o último a falar, nessa circunstância, é sempre melhor. Aqui, não; aqui ser o último a falar apenas aumenta a minha responsabilidade, depois de falas tão brilhantes e tão práticas de todos que me antecederam. Minha fala vai ser um pouco mais teórica, tendo em vista que sou um acadêmico inveterado, mas vou tentar trazer também para o mundo prático, para o mundo da vida de todos nós, não é? Já entrando nesse aspecto prático e tentando iniciar uma resposta ao seu questionamento, talvez alguém até possa dizer que falar de liberdade religiosa, falar de Estado laico é batido, é chover no molhado, que isso já está... Que todo mundo sabe que tem liberdade religiosa no Brasil, que o Brasil é um Estado laico, mas não é verdade. Nós precisamos reiterar as liberdades, especialmente esta, que é a primeira das liberdades. Por exemplo, em todos os continentes nós temos altos níveis de perseguição religiosa, e na América não é diferente. Entre os tops 30 países com maior perseguição religiosa, temos Cuba, Nicarágua, México. E o Brasil, que já esteve entre os países com menor perseguição religiosa no mundo, já está entrando, daqui a pouco, entre os tops 50. Além de a senhora sofrer essa perseguição que está sofrendo agora - eu não sei se a senhora sabe, mas está sofrendo agora, porque eu fui ao canal do YouTube, e tinha pessoas falando do pé de goiaba nos comentários, agora, ao vivo -, tem pastores e padres sendo processados criminalmente por falar que pecado é pecado nas suas igrejas, no púlpito de suas igrejas. Inclusive, um padre no Rio de Janeiro, Padre Antonio, lá em Niterói, Vereador Raphael; um pastor aqui em Porto Alegre. Os casos aumentam. Há discriminação também contra terreiros, contra religiosos de matriz africana. Infelizmente, o Brasil não é mais o mesmo Brasil de antes, se formos pensar em liberdade religiosa. Mas eu quero pedir vênia para trazer outro aspecto da liberdade religiosa que, infelizmente, no Brasil é pouco falado pela doutrina. A gente fala muito nos livros acadêmicos e nos livros que são publicados sobre o âmbito protetivo da liberdade religiosa, que é a proteção aos direitos de manifestar, ensinar, assistir, cultuar e se organizar enquanto religião; é a proteção individual do religioso e coletiva da religião. Mas eu quero falar aqui sobre a dimensão objetiva da liberdade religiosa ou função estruturante, que é pouco discutida, pouco ensinada pela doutrina especializada brasileira. Na Europa e na América, chovem livros, chovem livros, Mariana, que falam sobre essa função estruturante. Agora, nós estamos começando a sentir o petricor, ou seja, o cheiro de chuva que bons ventos estão trazendo; uma chuva serôdia de especialistas a se debruçarem sobre esse tema. Enquanto essas obras não são produzidas, vocês vão ter que realmente ficar comigo mesmo aqui e eu mesmo vou ter que falar sobre isso. |
| R | Mas a liberdade religiosa, além da proteção da pessoa religiosa - e isso é importante, Parlamentares que estão me vendo, que estão me assistindo -, é um princípio de organização social e de configuração política, isto é, é um direito humano fundamental que expande os seus efeitos, além de uma disciplina jurídica de proteção do religioso, para impregnar a vida pública. Como ensina o português Jorge Miranda, é a partir da liberdade religiosa que a liberdade política floresce. Sem liberdade religiosa, não há liberdade política. Sem liberdade política, estaríamos vivendo sob a égide de um regime totalitário, servindo a um só deus, com "d" minúsculo, encarnado na figura de um ditador, de um partido único ou de uma oligarquia. E sabem por que isso acontece? - eu vou pedir vênia aqui para fazer um "merchan" e ler uma página do livro que Jean e eu escrevemos. Na p. 139, diz assim: Todas as atividades que o ser humano realiza, ou em que deposita suas esperanças, aquela que define sua relação com Deus lhe é a mais sagrada, ocupando um lugar privilegiado. O encontro da pessoa humana com a pessoa divina requer um espaço de liberdade que transcende a existência do próprio Estado e de sua estrutura. Se o Estado não conseguir respeitar esse primeiro âmbito de liberdade, nascente no coração de cada um, não há outro espaço da vida humana que não sofrerá diretamente a intromissão estatal; ou seja, se o estado conquistar o espaço sagrado da relação Deus-homem, terá toda [toda] a atividade humana aos seus pés. Então, onde a liberdade religiosa é negada, todas as outras liberdades civis fundamentais desaparecem, como diria o Prof. Ignacio Rubio López, sob a sombra crescente de um Estado opressor. E, daqui, Senadora, decorre a importância do Estado laico, mas não um Estado laico que nasceu por ódio da religião, como o laicismo francês do século XVIII, que pregava que a liberdade só seria possível após o enforcamento do último rei pelas tripas do último padre. Não é dessa laicidade que eu estou falando. Eu estou falando de uma laicidade nascida na América, fruto de um pacto entre os puritanos, católicos e sem religião, ancorados na Plymouth Rock, no convés do Mayflower. É uma laicidade pactuada para proteger (Falha no áudio.) ... sem exceção, pessoa religiosa da sanha opressora do Estado. É um Estado laico, cuja laicidade nasceu para proteger o religioso, e não para persegui-lo. E essa laicidade foi mais bem desenvolvida no século XX, após os horrores de duas guerras mundiais. Nasceu em países europeus que compreenderam que o fenômeno religioso é (Falha no áudio.) ... Alemanha, Espanha, Portugal e Itália entenderam a importância de contar com a fé e de desenvolver uma laicidade cooperativa, demonstrando que o Estado não deve impor, interferir nas fés, mas pode, pode contar, e deve, com elas... (Falha no áudio.) |
| R | E foi o Brasil, o nosso Brasil... Eu ouvi, quando estive numa audiência lá na Câmara Alta da Inglaterra, da Parlamentar Elizabeth Berridge, que o Brasil - o Brasil, o país da liberdade, da diversidade - foi o que melhor desenvolveu o sistema da cooperação. Acrescentando, Senadora, a igual consideração... Já vou pedir vênia para passar do tempo. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Fique tranquilo, fique tranquilo. O SR. THIAGO VIEIRA (Por videoconferência.) - O Estado deve colaborar com a religião, mas de forma igualitária, porque é apenas - e é aqui que eu vou entrar na igualdade, que é um eixo aqui do PNDH - com a liberdade religiosa, em seu plexo de direitos, que citei antes, em pleno exercício e proteção, que podemos ter uma sociedade plural, uma sociedade inclusiva e uma sociedade que reflita, como diria Ulysses Guimarães, uma Constituição cidadã, porque é com a liberdade religiosa que diferentes cosmovisões, distintas formas de ver o mundo se encontram na arena pública. Em um Estado laico, que verdadeiramente prestigia a participação dos religiosos - e não discrimina, como aconteceu com a senhora -, em que as visões de mundo, diferentes, estão em todos os espaços, é que existe diversidade. E, com a diversidade, acontece o importante adjetivo do PNDH chamado pluralidade. O ambiente plural qualifica qualquer democracia, gerando o que Tocqueville, há quase 200 anos, falava: condições gerais de igualdade. Queremos ter condições gerais de igualdade, queremos ter igualdade, precisamos ter pluralidade, e uma sociedade plural só é possível com liberdade religiosa plena. Depois, nós temos a inclusão da religião majoritária, da religião minoritária, da tradicional, da milenar, da recém-criada. Essa igualdade, gente, que tanto buscamos, não é aquela igualdade artificial, em que o Estado interfere ao alvidre do Governo do dia, mas uma igualdade gerada, uma igualdade que nasce, uma igualdade que floresce, e floresce porque as pessoas têm voz no espaço público, porque as pessoas podem viver as suas vidas, porque as pessoas não são objeto - como diria a minha falecida mãe - de chocarrices, porque as suas crenças mais íntimas, por mais que discordemos delas, podem ser vividas em qualquer espaço. |
| R | Essa atual situação de coisas que vivemos no Brasil, em que parece que cancelar é a forma de tratar aqueles de quem discordamos, inclusive nas mídias digitais - cancelar, excluir as pessoas da comunidade -, isso é supressão do pluralismo, supressão da democracia e da própria dignidade da pessoa humana. Cancelar, excluir, ser alvo de chocarrice é o novo ostracismo que acontecia ao cidadão grego, e a gente só vai conseguir desenvolver uma sociedade plural, uma sociedade inclusiva, que tenha igualdade quando todos possam ter espaço. E aí - encaminhando já para o final da minha fala - alguém pode dizer o seguinte: "Tá, mas é que existem religiões que são antagônicas, que são muito diferentes, que, se tiverem espaço na arena pública, vão digladiar, vão gerar tensão", como o pastor que diz que os deuses da Umbanda são do Diabo, dando um exemplo. Gente, a gente precisa lembrar que o florescimento humano, que nós só crescemos enquanto pessoas com o confronto de ideias. E o confronto de ideias só é possível numa sociedade plural, porque aí nós somos instigados a pensar criticamente, a refletir e a exercitar nossa inteligência, até para vencer no debate o outro. É assim que nós crescemos. Não é bebendo o leite da mamãe a vida toda. Então, a plena liberdade religiosa é a que permite uma sociedade plural, uma sociedade igual, enriquece a sociedade, fortalece a cidadania e gera uma sociedade plural. Impedir o debate, impedir a diferença é criar uma geração de autômatos. Lembrando o clássico The Wall, de Pink Floyd, ou 1984, de George Orwell, é essa nação que a gente quer, de autômatos? Uma geração monocórdica, uma geração que só tem uma nota? Ou nós queremos uma geração sinfônica de diversas notas, com uma linda melodia de notas tão diferentes como um dó e como um si bemol, mas que juntas fazem um Brasil melhor? Muito obrigado. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Uau, Prof. Dr. Thiago! Nós só temos que lhe agradecer. O senhor realmente nos inspira e o senhor nos provoca o tempo todo com suas falas. Muito obrigada, doutor. Nós vamos agora para o final da audiência em que eu vou devolver a palavra aos expositores por três, quatro minutos para agradecimentos finais e respostas. E, na sua resposta, Dr. Thiago, eu queria fazer uma pergunta. Nós estamos vendo um crescimento muito grande do antissemitismo no Brasil, e isso tem me preocupado, mas me preocupado de forma absurda, porque eu tenho visto cenas no mundo inteiro... Essa onda de antissemitismo tem crescido, mas no Brasil em especial. Já estamos vendo, inclusive, violência contra judeus no Brasil. Eu queria te ouvir sobre isso. E outra coisa, Dr. Thiago. O senhor falou o seguinte: "A liberdade religiosa no Brasil tem que ser garantida em qualquer espaço". Aí eu quero trazer um espaço e lhe fazer essa pergunta. O indígena é brasileiro, o.k.? A Constituição também é para ele. Então, todas as garantias constitucionais também alcançam os indígenas. Mas a gente vê um movimento antropológico, por exemplo, em que nenhuma instituição que tenha origem religiosa, especialmente cristã, pode entrar em área indígena, nem para fazer trabalho social. |
| R | Ao indígena é proibido conhecer outras religiões. Isso é uma violação, doutor? Nós temos, inclusive indígenas, que são católicos e que, às vezes, não podem entrar na sua própria aldeia porque eles são católicos ou porque são evangélicos. Quando os próprios indígenas se convertem ao cristianismo, os antropólogos acham que eles deixaram de ser indígenas; e a gente sabe que isso não é verdade. Eu vou lhe ilustrar com a minha história, inclusive. Quando o Governo Bolsonaro se iniciou, a Funai, com a política indígena, iria para o Ministério dos Direitos Humanos, do qual eu era a Ministra. Aí houve um movimento dentro do Congresso - a Marisa se lembra disso - de que a Funai não podia ficar comigo porque eu era evangélica, como se eu fosse usar a Funai para evangelizar índio. Esse movimento cresceu e, na hora de se votar a MP da estruturação do Governo Bolsonaro, a Funai foi para o Ministério da Agricultura - que não tinha nada a ver - e, depois, voltou para o Ministério da Justiça; mas a Funai não podia ficar com uma Ministra evangélica. Eu entendi ali como mais uma discriminação e perseguição religiosa à Ministra - o.k. Aí, depois, os mesmos que tiraram a Funai de mim vieram dizer que eu matei indígenas ianomâmis e queriam me cassar. Eu não podia cuidar dos indígenas, porque eu era evangélica, mas, quando os indígenas morreram, especialmente na pandemia, a culpada era a Ministra evangélica. Então, é muita confusão no Brasil, mas eu queria ouvi-lo. Dentro de um acampamento cigano, pode ter uma missa? Pode ter um culto, se o cigano quiser? Dentro de uma aldeia, eles podem querer conhecer, por exemplo, o cristianismo, o budismo, a religião de matriz africana? O indígena pode - o indígena brasileiro - ter o direito à liberdade religiosa? Eu queria ouvi-lo sobre isso, tá? E, agora, a gente vai para o final, e nós vamos fazer esta fala final, de considerações finais e agradecimento, com a Giselle; mas eu vou provocá-la, Giselle: quantos adolescentes podem ter numa unidade? Quanto custa para se construir uma unidade, mais ou menos, hoje? E sobre, claro, visitas íntimas. A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO (Para expor.) - Bom, como estas são as considerações finais, eu queria, muito brevemente, Senadora, mais uma vez, agradecer à senhora pelo fomento deste espaço, pelo convite e pela promoção deste diálogo tão caro, agradecer e dizer que foi um prazer, aqui, ouvir a Mariana, o Dr. Thiago e o Vereador Rafael - eu estou encantada pelo senhor, inclusive a gente tem o mesmo cabelo, guardadas as proporções, e uns óculos muito parecidos. (Risos.) Estamos juntos. Eu quero o senhor falando para os meus adolescentes em Minas Gerais e, inclusive, levando o seu livro também. Bom, Senadora, eu vou começar pelo início, pelo mais prático. Nós temos, pelo Sinase, a limitação de até 90 adolescentes em uma unidade socioeducativa de internação. Nas casas de semiliberdade, que, segundo as diretrizes arquitetônicas do Sinase, devem observar padrões residenciais, essa lotação máxima é de 20. Essa restrição da capacidade, inclusive, tem uma comunicação direta com o valor per capita do adolescente. Hoje, nós temos, considerando todas as unidades de internação e semiliberdade do Brasil, cerca de 14,5 mil adolescentes em cumprimento de medida. Esses são os últimos dados tornados públicos pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. |
| R | E, aqui, eu vou aproveitar que estamos falando de estrutura para responder a pergunta da senhora sobre a eventual preparação ou não do sistema para lidar com a eventualidade de uma mudança legislativa no que diz respeito ao tempo possível de cumprimento de medida, que hoje, pela lei, é de, no máximo, três anos ou até o adolescente completar 21, entendendo, inclusive, que ele pode ser apreendido para o cumprimento da medida depois de já ter completado 18 anos, se essa medida tiver sido decretada antes, e passaria a dez anos. A resposta, Senadora - sem fazer qualquer juízo de valor sobre o aumento do tempo do cumprimento de medida, entendendo-o como um anseio social muito legítimo e considerando que essa é uma sociedade acossada por números de violência que remetem à guerra -, é que o sistema socioeducativo precisa ser preparado para essa mudança legislativa. Primeiro porque é muito importante que nós possamos garantir uma separação etária desses adolescentes. Aqui quem é pai ou mãe de adolescente, quem foi adolescente muito recentemente e, portanto, consegue se lembrar - como eu (Risos.) -, a gente sabe que é muito preponderante a diferença entre um garoto de 12 e um garoto de 14 anos - são duas pessoas completamente diferentes -, entre um garoto de 15 e um garoto de 18. Então, não dá para a gente conceber, dentro da proposta do atendimento socioeducativo, coexistindo na mesma unidade, garotos. Conquanto eles possam ser internados, inseridos em medidas a partir de 12, a faixa etária preponderante, Senadora, é entre os 16 e os 18 anos. Esse é um dado hegemônico, em todo o Brasil é assim. Não entendo como adequado - empiricamente, não se mostra adequado - que convivam, dentro do mesmo programa, dentro da mesma unidade, adolescentes de 16, 17 e aqueles que poderão ter até 31 anos. Se a gente pensar na possibilidade de apreensão para o cumprimento da medida depois da maioridade, desde que aplicada antes e que o tempo máximo seja até os 21, a gente pode ter um jovem senhor de 30... Apesar de que agora a adolescência é cada vez mais postergada, né? A geração Z é cheia de adolescente de 30 anos. A gente pode ter adolescente de até 30 anos dentro de uma unidade socioeducativa. Então, é preciso que o sistema seja preparado em termos de infraestrutura, mas também em termos de proposta de atendimento, porque... (Soa a campainha.) A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO - ... um homem de 25 anos tem que trabalhar, já um adolescente de 13 tem, inclusive, uma série de limitações legislativas que nos vão fazer encaminhá-lo para as atividades de orientação, de preparação profissional, mas ele tem limitações objetivas para o exercício profissional. Um homem de 25 anos, se a gente está falando em responsabilização, no mínimo, esse homem tem que trabalhar - no mínimo, ele tem que trabalhar. Então, tem que ter estruturas diferentes e inclusive um nível de preparo diferente dos operadores do sistema socioeducativo. Aqui, Vereador Rafael, eu quero fazer coro com o senhor - com o que entendo também que é o pensamento da Senadora Damares, como alguém que está, neste momento, avaliando o PNDH com o repertório de uma atuação de muitos anos nessas políticas - quanto à necessidade da construção do PNDH-4. Estamos fechados nisso aqui, além das nossas outras semelhanças, que saltam aos olhos. (Risos.) É preciso que nós instrumentalizemos os operadores do sistema socioeducativo, Senadora. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Giselle, quando você fala em instrumentalizar, deixe-me fazer uma pergunta: o agente socioeducativo pode usar arma dentro da unidade? Se eu vou ter um menino lá - se a lei passar - de 30 anos, menino, esse agente, como é que ele lida com uma rebelião, com um motim? Vocês podem usar arma? Como é que funciona isso? |
| R | A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO - Eu vou falar. O agente não pode usar arma dentro da unidade e hoje - enfim, é uma temática extremamente judicializada - nem fora da unidade. E aí nós temos duas questões que são essenciais. As diferenças entre o sistema socioeducativo e o sistema prisional são muito patentes dentro desse programa, mas para o operador, quando ele está na rua e é abordado por um bandido, e encontram a carteira funcional dele de agente socioeducativo, ninguém vai fazer diferença entre ele, o policial penal e o policial militar: ele vai morrer, pela carteira funcional. Esse é o primeiro ponto. Em segundo lugar, nós temos uma diferença do perfil de adolescentes e nós temos hoje um debate, dentro do sistema socioeducativo, que é desolador, porque nós temos hoje, Senadora, judicialização - eu nem vou chegar na arma - do uniforme do agente. Minas Gerais implementou um uniforme para os agentes socioeducativos e é preciso que a gente lembre que o uniforme é um equipamento de proteção individual, concebido considerando as circunstâncias a que aquele usuário do uniforme vai se submeter. O uniforme, a farda do bombeiro militar tem uma razão de ser, que é a exposição ao calor extremo, que é a necessidade de mobilidade; a do policial penal e a do agente de segurança, idem, não tem nada a ver com você querer impor um ambiente militarizado e hostilizado, como se um ambiente militarizado fosse por si hostil, né? Há pouco tempo, eu recebi uma sugestão de suprimir de documentos técnicos a palavra disciplina. Eu falei, gente, mas veja, sem disciplina, a gente não consegue ser nem um adulto funcional, eu não conseguiria estar aqui, porque eu estaria desatenta ao horário, eu não conseguiria pegar meu voo, eu não ia, é isso. Então, veja, é muito dramático, Senadora, o que vivemos hoje em termos de discussão, para que a gente entenda o que é garantia de socioeducação com disciplina, com qualificação de segurança, inclusive uniforme, porque o argumento é que o uniforme é algo que militariza o sistema e que oprime os adolescentes. Eu não consigo, com a educação e o decoro que esta Casa exige, sobretudo com o fato de que minha mãe está me assistindo lá em casa, pelo canal Senado, dizer o adjetivo para uma ideia que surge nesse ponto. (Soa a campainha.) A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO - Por fim, as visitas íntimas. Senadora, eu vou usar uma expressão que está em voga e com que todo mundo começou a se preocupar agora, por ocasião de ter sido usada por um influencer. A visita íntima começou lá no sistema prisional, essencialmente, como uma contenção da agitação dentro de uma unidade. Então, vamos organizar aqui, vamos deixar esses caras receberem suas senhoras, suas namoradas. A gente tem aqui, esse é o histórico, não estou falando da normatização, estou falando de um histórico. São homens adultos, são homens, no mais das vezes, casados ou que têm estabelecidas relações com suas companheiras há muito tempo. No sistema socioeducativo, como eu disse, eu recebo um garoto de 1,85m, 100kg, que nunca foi ao dentista, que é um analfabeto absoluto, que é rompido com a escola há dez anos, com a família há não sei quantos, filho de pai ausente, de mãe vulnerabilizada, exposto e atravessado, embora eu deteste essa palavra, por toda sorte de carências e vulnerabilidades. E aí eu me preocupo em dar a ele uma visita íntima, quando ele não tem repertório psicológico para estabelecer uma relação salutar nem entre ele e os pais, que são a primeira relação que uma psiquê saudável desenvolve. Então, queiram desculpar-me os entusiastas desse direito, mas a visita íntima não é nada mais nada menos - alô, Felca - do que a adultização da adolescência. É isso. (Palmas.) |
| R | O garoto está ali para ser responsabilizado, o garoto está ali para entender que o que ele cometeu a gente chama tecnicamente, sim, de ato infracional, mas que é um crime; ele está ali para voltar para a escola, está ali para construir uma perspectiva profissional e porque é preciso. Hoje, ele fica, em média, um ano. A lei permite que fique três. Em média, no Brasil, ele passa um ano em cumprimento de medida. E aí eu tenho que devolver um Harry Potter para a sociedade, mas o cara, quando entrou lá, era um analfabeto absoluto. E ele tem o direito de sair da unidade para ir ao território dele, para exercer todos os afetos que ele achar que tem que exercer, inclusive esse. E eu o desencorajo, inclusive, adolescente, a fazer isso, vá estudar, vá ler um livro, você vai ter muito tempo para isso tudo depois. Não é na unidade que a gente tem que fazer isso. Na unidade, a gente tem que preparar um jovem, um adolescente, para que possa sair, tendo nós a chance mínima de ganhar a concorrência com a criminalidade, porque os garotos e as garotas que hoje, Senadora, estão no tráfico - e aqui eu faço muito um linque com a fala do Vereador Rafael - não estão só para amealhar renda. Conquanto o ranking dos atos seja esse, todos eles com caráter, obviamente, patrimonial (furto, roubo, tráfico de drogas), não se trata de levar o pão de cada dia para dentro de casa - isso não lhes falta -, trata-se de algo que na psicologia a gente chama de inscrição social. A gente tem, no Brasil, em marcha, a instalação de uma cultura que incute na mentalidade desses garotos que eles se tornam respeitáveis, que eles se tornam grandes quando estão na criminalidade. Eles encantam as meninas, subjugam a família, tornam-se o chefe da casa porque chegam lá com uma 9mm. Eu não sou muito versada nessa coisa de armas não, embora trabalhe com um monte de militares, na Sejusp, eu não conheço muito bem. Mas é disso que se trata. Então, a gente precisa, para ter chance de tirá-lo desse substrato... Não dá tempo de ficar oferecendo motel nas unidades. Gente, desculpem-me, mas temos que ter outras propostas para responsabilizar esses adolescentes. Essas são as minhas considerações a respeito da visita íntima, o que significa dizer, portanto, que na gestão do Estado de Minas Gerais nós não somos nem um pouco entusiastas dessa ideia. Nós queremos responsabilizar adolescentes. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Uau, Giselle! Eu quero lhe agradecer, Giselle, mas quero lembrar a quem está nos assistindo que um menino de 14 anos que está numa unidade... De 15, vamos colocar 15. Que idade tem a namorada dele para ter visita íntima? Aí nós vamos permitir que uma menina de 14 anos vá para uma unidade socioeducativa ter relações com o seu namorado. "Ah, mas tem que ter a comprovação da união estável". Mas eles estão em união estável lá fora. Infelizmente, o Brasil é o quarto país do mundo em casamento infantil. Eles estão em união estável aqui fora. |
| R | Aí a gente vai pegar essa menina, passá-la por uma revista íntima e mandá-la se deitar com o namorado numa unidade que não está preparada para isso - vocês não têm cama para isso -, e um agente socioeducativo na porta, esperando os dois adolescentes terem relação sexual, tipo assim: "Levanta que tem mais um casal aqui. Levanta". Eu não consigo imaginar vocês sendo pagos para isso, sendo que, Giselle, aqui fora, para entrar num motel, tem que ter 18 anos de idade. E como é que a gente vai permitir um motel para esses adolescentes nas unidades financiado por verba pública? Então, assim, tem alguma coisa errada. Então, para essa discussão, a gente não pode fechar os olhos. Está dentro do PNDH-3, está dentro do Sinase, não é uma discussão ideológica, por favor. Por eu ser religiosa, já vão dizer que eu quero implantar abstinência. Não. Pelo amor de Deus. Eu estou falando do dia a dia. Vou pagar um agente para ser porteiro de quarto de motel. Então, a gente precisa rever. Que bom que foi você que falou, e não eu. Que bom! E a gente tem aí também um outro elemento, que é a identidade de quando dois meninos se apaixonam dentro da entidade terem que ficar na mesma cela ou, quando duas meninas se apaixonam, terem vida conjugal dentro da unidade. Isso também me preocupa porque, como você disse, na unidade tem um menino de 16 anos, mas nós podemos ter um de 25 anos agora. Esse de 25 anos que já é faccionado vai pegar aquele menino que chegou ali por causa de um furto, de 14 anos, e dizer assim: "Você vai ter que comprovar que nós estamos apaixonados". Eu tenho medo disso. A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO (Fora do microfone.) - Isso acontece. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Isso acontece. E aí a unidade vai ter que pegar o de 14 anos e colocá-lo na mesma cela com o de 25 anos que o está obrigando a dizer que eles são um par, e não são. Então, ele está obrigando. Então, assim, é delicado. Esta Comissão toca em temas delicados. Nós não podemos fechar os olhos para isso. É nesta Comissão, e eu não tenho medo de fazer o debate. Então, Giselle, você colaborou demais. Nós vamos apresentar um relatório. Você colaborou demais, mas não se pode escrever um outro PNDH sem essa atenção especial ao Sinase, aos agentes e aos meninos que estão na unidade socioeducativa. Que meninos nós queremos depois? Qual é o índice de reincidência? É muito alta a reincidência, Giselle, só para encerrar? A SRA. GISELLE DA SILVA CYRILLO (Para expor.) - Hoje nós não temos a medição da reincidência em nível nacional. E isto eu preciso dizer: com todos os FCRs, existe uma resistência ideológica à aferição da reincidência no sistema socioeducativo total. Nós temos alguns estados que a executam com metodologias diferentes, o que coloca esse dado, portanto, sob questionamento. Nós temos aí algo desde os 20% até os 40% em iniciativas esparsas que fazem essa aferição, Senadora. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Ter o gasto de R$20 mil por mês com esse menino, ele sai e volta. Essa é a realidade que nós temos no Brasil. Nós vamos ter que falar sobre isso afastando as brigas políticas, as brigas ideológicas desse tema. Obrigada, Giselle. Foi uma alegria recebê-la nesta Comissão. Na sequência, vamos ouvir Mariana Neris. Mariana está online ainda? A SRA. MARIANA DE SOUSA MACHADO NERIS (Por videoconferência.) - Olá, Senadora e todas as pessoas. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Mariana, antes da sua fala, permita-me só dizer que o Brasil é o quarto país no mundo, entre 195, em casamento infantil. O.k.? |
| R | Nós estivemos no Marajó agora - a Comissão foi ao Marajó - e descobrimos o seguinte: uma menina, com menos de 14 que engravida, porque ela se casa com menos de 14... Nem todas as gravidezes lá foram violentas, mas a nossa legislação diz que é estupro, porque ela tem menos de 14, mas ela está casada, morando com a anuência da família. Quando ela engravida, por ela ter menos de 14, ela não faz o pré-natal, porque, se ela chegar ao postinho médico para fazer o pré-natal, como ela tem menos de 14, automaticamente a polícia tem que ser notificada e o marido ser preso. Portanto, se ela não faz o pré-natal, ela também não registra esse bebê. Então, nós temos filhos de adolescentes que não são registrados, porque a mãe não quer que o pai vá para a cadeia. Como lidar com isso, Mariana? Observando essa questão da regionalização, acontece. Somos o quarto país, infelizmente - o quarto país! -, do mundo com mais casamentos infantis. Como enfrentar a subnotificação diante desse fato também, Mariana? Com a palavra. A SRA. MARIANA DE SOUSA MACHADO NERIS (Para expor. Por videoconferência.) - Quero também aqui agradecer as palavras da nossa Senadora em relação ao momento de saudade. Sinto também muita saudade, Senadora. Tenho uma missão aqui no Paraná de trabalhar também as políticas voltadas à maternidade e às mulheres, que também sofrem muito com as questões de discriminação. Quero aqui ser solidária à sua luta e à sua dor, durante a sua trajetória pessoal e profissional, não só a violência religiosa, a intolerância religiosa pela qual a senhora passa, mas também toda a violência política pela qual a senhora vem passando, por ser uma mulher, por ser uma mulher conservadora, uma mulher cristã, que tem valores. E quero aqui trazer também o meu reconhecimento pela sua coragem, pela sua luta, pela sua dedicação à infância, à proteção dos direitos humanos que acompanhei, durante dois anos ininterruptamente, dia e noite, todos os finais de semana, em que nós vimos o seu grande compromisso com este país. Também quero fazer um reconhecimento à sua dedicação relacionada às Regiões Norte e Nordeste, ao Centro-Oeste, à sua região do Distrito Federal, e ao quanto o trabalho junto à infância tem sido a sua luta e nos desafiado a todos. Então, quero também trazer aqui este reconhecimento. E quero dizer que muito do que nós tratamos aqui, ao longo desta manhã, foi relacionado ao que o Thiago nos traz, que é a cosmovisão, a visão de mundo, e eu acho que é este o grande debate que nós precisamos agora trazer para o centro da nossa discussão: qual é a visão de mundo que embasou o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3)? Foi uma visão de mundo relacionada às partes, como nos disse o Vereador Rafael, como nos disse também a Giselle, que é a parte pelo todo e parece que isso desqualifica todo o conjunto. Então, está na hora de a gente enxergar o ser humano na sua integralidade, buscando compreender que nós podemos ser, ao mesmo tempo, uma mulher, uma Senadora, uma pastora e podemos estar, inclusive, na gestão pública, por que não? Então, essa é a dimensão da compreensão de que nós temos multifunções e que nós precisamos ser respeitadas e respeitados em qualquer espaço onde nós tenhamos liberdade em exercer plenamente a nossa função. Então, por isso também defendo a bandeira da liberdade como já foi tratado aqui. |
| R | Em relação às violações de direitos humanos contra as crianças, elas são também base dessa fala que eu venho trazer aqui. Nós não enxergamos as crianças em sua integralidade, por isso também não enxergamos que elas são sujeitos que dependem de uma proteção do Estado; não enxergamos que esses adolescentes são sujeitos em desenvolvimento, essas crianças de 12, 13 e 14 que estão em unidades socioeducativas. Por isso, nós fazemos com que outros direitos que são atribuídos a pessoas adultas sejam estendidos às crianças, isso também - eu concordo com a fala da Dra. Giselle - é uma adultização, e nós precisamos, sim, trazer para o centro do debate. Agora, é o seguinte: nós temos que enxergar a vida para além de tudo isso. O direito à vida, que é um direito humano primaz que suplanta todas essas outras questões, tem que estar na nossa discussão. Por que nós o estamos trazendo para a discussão de uma política que deveria proteger atributos que são para a desproteção da infância? De fato, isso precisa voltar em um plano nacional de direitos humanos, em uma política séria de proteção a todas as pessoas, humanas, de qualquer idade. Trago também a compreensão de que, sim, o casamento infantil deve ser a exceção da exceção, pelas características antropológicas, pelas características de grupos e populações específicos que trazem na sua cultura esse mecanismo - isso deve ser tratado de uma forma pontual e não como um direito universal. Quando a gente fala da universalização, nós temos muitos outros direitos que vêm antes, como a questão do desenvolvimento cognitivo, do desenvolvimento infantil, como já foi falado, do direito à educação, do direito à formação enquanto seres humanos, enquanto pessoas que vão lidar com o dia a dia, seja de uma maternidade... Isso, sim, deve ser objeto de políticas públicas. Para duas infâncias - uma menina de 12 anos que já tem um bebê -, de fato, deve haver políticas públicas sérias, comprometidas com o desenvolvimento infantil. Nós temos, sim, que olhar atentamente. Agora, uma menina que tem uma filha, um bebê, aos 12 anos, aos 13 anos, não pode ser apartada de acessar os direitos. Não ter um registro de nascimento não coloca essa pessoa fora das políticas públicas. O que precisa acontecer é: uma vez que uma unidade de saúde identifica que essa pessoa não tem um registro de nascimento, é necessário, sim, chamar o conselho tutelar, chamar a rede de proteção da infância, primeiro, para identificar quais são as razões. Às vezes, é pelas questões de discriminação, de acesso aos territórios, de acesso ao cartório, de informação, mesmo, de que se precisa ter um registro, mas, às vezes, pode ser violência dentro da própria família: o domicílio é, ainda, o ambiente mais violador de direitos humanos de crianças e de mulheres. Então, nós precisamos entender e não deixar de acessar as políticas públicas. E, sem dúvida, uma vez que haja casamentos infantis devidamente identificados por questões culturais em comunidades tradicionais em que isso é permitido, é claro que o Ministério Público e a Defensoria Pública estarão à disposição (Falha no áudio.) ... proteção daquela situação em que há, de fato, uma relação conjugal, mas isso é a exceção da exceção: nós vemos no Brasil, inclusive, que o número de casamentos na adolescência tem sido reduzido ao longo dos anos, justamente pela (Falha no áudio.) ... da infância de uma forma mais alargada. No entanto, nós temos que, sim, adotar como referência todas essas questões. Eu recebi também aqui uma sugestão, Senadora, de que nós (Falha no áudio.) ... colocar aqui - foi o Adevane Júnior que me mandou - para que a gente consiga colocar no radar do nosso planejamento, ainda na perspectiva de universalização dos direitos, a necessidade de se resgatar o projeto da biometria neonatal (Falha no áudio.) ... junto com o registro civil, em uma única operação das maternidades, porque isso também faria uma redução desse sub-registro. Sem dúvida, mutirões específicos em comunidades tradicionais, com a presença da Funai, a presença de organizações da sociedade civil que possam fazer o acompanhamento desses povos tradicionais, são extremamente importantes. Eu citei um dado aqui equivocado, vou só corrigir. Eu comentei sobre a cobertura de partos em hospitais e maternidades. Esse dado então é de 98,4%, ou seja, nós ainda temos em torno de 1,6% de territórios que não são abrangidos por maternidades e hospitais e que precisam, sim, de estratégias específicas, de mutirões para registros de nascimento e |
| R | (Falha no áudio.) ... agora única. Então também é muito importante trabalhar as regiões mais isoladas, ribeirinhos, quilombolas, indígenas, para que a gente consiga avançar. Por fim, quero aqui deixar também franqueado que nós já temos novas tecnologias sendo implementadas, várias empresas que estão atuando no Brasil. Uma mais conhecida é a Infant.ID, a Natosafe, que tem trabalhado com o poder público, mas nós temos também a Synolo, que é uma empresa que tem chegado através da (Falha no áudio.) que tem trazido, pela Fundação Bill Gates, várias tecnologias que permitem a rastreabilidade da imagem e a usabilidade sem contato digital, embora seja biometria, para atingir também todas as idades. A Synolo tem trazido essa nova tecnologia, e é algo sobre o qual também a gente pode se debruçar, pensando nessa integração de tecnologias, nessa integração de estratégias, para que a gente consiga então superar essa ausência de reconhecimento das pessoas ao longo da história, fazendo com que as pessoas sejam visíveis, enxergadas pelas políticas públicas e acessem plenamente a cidadania. Agradeço, Senadora, e coloco-me à disposição. Agradeço aos colegas aqui que dividiram esta mesa, parabenizo-os por tanto aprendizado. E coloco-me à disposição não só como especialista, mas também aqui no Governo do Paraná, para o que se fizer necessário. Muito obrigada. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Secretária. Deixe-me só informar a todos: nós estamos tendo uma grande audiência, não param de chegar perguntas e manifestações via online. Na sequência, o Vereador Rafael, para considerações finais, agradecimentos. O SR. RAFAEL SATIÊ (Para expor.) - Bom, primeiro quero agradecer, mais uma vez, à Senadora Damares pelo convite. É uma honra muito grande poder estar aqui com vocês na Câmara Alta, na Casa Alta, no Senado Federal, para evidentemente falar sobre esse tema tão pertinente, que é o tema dos direitos humanos. Bom, eu quero agradecer também à Mariana, à Giselle - parabenizo por essa sinergia, por razões óbvias, não é? - e ao Prof. Thiago Vieira também, que eu conheci inclusive em Assunção, quando nós estávamos falando sobre a questão da perseguição religiosa. Na minha palestra lá em Assunção, no Paraguai, sobre a perseguição política que a gente viu no Brasil, na ocasião, estávamos no Banco Central do Paraguai, um lugar também muito icônico. É uma honra estar com o senhor, ainda que online, aqui nesta manhã. E eu finalizo a minha participação falando algo sobre o tema evidentemente. Direitos humanos não são seletivos, não servem para dividir a sociedade entre oprimidos e opressores. Eles devem ser universais, aplicados igualmente ao trabalhador honesto, ao jovem que busca oportunidade, à família que quer viver em segurança. |
| R | A verdadeira defesa dos direitos humanos exige um olhar para a realidade atual do Brasil: violência crescente, insegurança nas ruas, famílias desestruturadas, jovens sem oportunidade. Tratar desses problemas concretos, à luz dos direitos humanos, é muito mais efetivo do que discursos ideológicos que isolam o tema a pautas de grupos específicos. Direitos humanos não devem ser apropriados por ideologias ou reduzidos a bandeiras de grupos específicos. Eles não são de partidos, não são de movimentos sociais organizados e não podem se restringir a causas de minorias que buscam transformar direitos em instrumentos de política. Na sua essência, os direitos humanos pertencem a todos. Eles existem para proteger o cidadão comum, a família que trabalha, o idoso que precisa de dignidade, a criança que deve ter acesso à oportunidade e, também, o trabalhador que cumpre seus deveres e exige respeito da lei. A base é clara: vida, liberdade, segurança, dignidade e igualdade de oportunidades. Mais uma vez, meu muito obrigado. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Vereador, obrigada. Na sequência, nós vamos ouvir o nosso último expositor para as considerações finais. E, se puder, responda, Thiago, no tempo que lhe é permitido, sobre o antissemitismo e a questão do "qualquer espaço". Dr. Thiago. O SR. THIAGO VIEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Senadora. Primeiramente, reitero os meus cumprimentos a todos os que participaram desta importante audiência pública. Quero dizer que estou com saudade da Mariana, das nossas reuniões em defesa da liberdade religiosa, lá no ministério, assim como também da Senadora mais bonita do Brasil, a minha amiga, Senadora Damares Alves... A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Esse homem não mente. (Risos.) O SR. THIAGO VIEIRA (Por videoconferência.) - É isso aí. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - O Dr. Thiago não mente, viu, gente? O SR. THIAGO VIEIRA (Por videoconferência.) - É isso aí. Não tenho nenhuma dúvida disso. O Rafael, que é meu xará - meu nome do meio é Rafael -, tive a alegria de conhecer lá em Assunção. A Giselle estou conhecendo agora. Enfim, a todos... Eu quero começar pela situação que a senhora levantou dos indígenas, primeiramente para dizer o seguinte: a liberdade religiosa é um direito humano fundamental. O que isso implica dizer? Implica dizer que é uma condição intrínseca ao fato de ser humano. Se eu sou humano, eu tenho liberdade religiosa. Por que ela é chamada de uma das primeiras liberdades? Porque foi a primeira liberdade pela qual o ser humano lutou. Se nós... Tem um livrinho muito interessante, de que eu recomendo a leitura, de Benjamin Constant, A liberdade dos antigos comparada à dos modernos, que demonstra que no passado não existia ideia de liberdade. As pessoas não tinham nada de liberdade. A ideia de liberdade é algo que nasce, primeiramente, no povo de Israel, lá na confederação das doze tribos - aquele povo que entra em Canaã; lá nasce a ideia de liberdade -, e depois é desenvolvida, pela graça divina e por obra do Espírito Santo, pelo apóstolo Paulo, nas suas cartas, e pelo próprio Jesus Cristo. É a partir desses aportes - ou seja, dos aportes da tradição judaico-cristã, e isso é inegável - que nós temos, então, a ideia de liberdade: que o ser humano, por ser humano, é livre. E o indígena é um ser humano? É óbvio que é um ser humano. Então, se um indígena é um ser humano, ele tem liberdade religiosa. Se ele é um ser humano, ele tem o direito de ouvir e ser ouvido com questões relacionadas à religião - não importa qual religião. |
| R | Evidentemente que nós temos, no direito ocidental, especialmente, muito por escritos de católicos, o princípio da autodeterminação dos povos indígenas. Devemos, de novo, esse princípio à religião. Foram os (Falha no áudio.) ... católicos que defenderam, lá no século XVI, o Direito dos Índios, em O Direito das Gentes, que era o antigo Direito Internacional. Então, a tribo indígena tem o direito de autodeterminação. O que eu quero dizer com isso? Que só uma pessoa pode negar o acesso a um missionário: é o cacique. O cacique pode dizer: "Damares, nós não queremos você aqui, você não entra aqui". Agora, o Estado não pode interferir na relação indígena com o missionário, com qualquer pessoa que queira fazer prosélito. E aqui eu quero entrar em uma outra situação rápida. Direito humano também é denominado de direito fundamental. Quando é que é um direito fundamental? Quando ele está previsto, internalizado, na Constituição de um país. Direitos humanos são aqueles que estão no catálogo dos direitos humanos na DUDH, que foi falado aqui pelo Rafael. Quando um país internaliza aqueles direitos humanos, ele se torna fundamental naquele país. Pois muito bem, se o direito humano à liberdade religiosa é fundamental, como é que uma portaria da Funai o restringe? Então ele não é fundamental. Talvez, Mariana, ele seja fundamentalzinho, talvez. Não, não existe direito fundamentalzinho, e nem direito fundamentalzão. Todos os direitos humanos são fundamentais, inclusive o direito humano do índio de ter acesso à religiosidade, diferente da dele, que está previsto inclusive na Constituição, no art. 231, se eu não me engano. E, um pouquinho de teoria constitucional, todo direito fundamental tem (Falha no áudio.) E esse núcleo, segundo, por exemplo (Falha no áudio.) ... Jorge Bacelar Gouveia e muitos outros doutrinadores (Falha no áudio.) ... objeto de total (Falha no áudio.) ... do Estado (Falha no áudio.) ... ou seja, o núcleo de um direito fundamental não pode ser restringido totalmente. E qual é o núcleo do direito fundamental da religião? Eu vou dizer para vocês: ensino religioso e proselitismo. O proselitismo é nuclear da liberdade religiosa. Sabe por quê, Rafael? Porque sem proselitismo a religião deixa de existir. Se eu não tiver o direito de falar da minha fé para outra pessoa, para que ela tenha a mesma fé que eu confesso, ao longo das gerações, a minha fé deixa de existir. Então o proselitismo é o oxigênio da religião. E, se é o oxigênio da religião, assim como o ensino, deve ser ainda mais preservado. Essa patacoada, desculpe a expressão, de que proselitismo ofende direitos, isso é um absurdo. Não há religião sem proselitismo. Não há direito humano da liberdade religiosa sem proselitismo. |
| R | E agora eu vou entrar na questão dos judeus. Discriminação não é proselitismo. Discriminação é crime, e crime dá cadeia. Quando é que nós estamos diante de discriminação, de racismo e não de proselitismo? Quando alguém diz: "Eu e o fulano lá, o índio, somos diferentes". Isso é discriminação? Não, não é; é uma constatação. Os seres humanos são diferentes, foi o que eu falei antes. O Estado não pode gerar igualdade artificialmente. Graças a Deus, somos diferentes. Segundo, por causa dessa diferença, há valoração. Ainda não estamos na discriminação. Estamos na discriminação quando, por causa da diferença, eu proíbo ou interfiro no exercício de direitos fundamentais do outro. Então, no momento em que um missionário não pode entrar numa tribo indígena, isso é discriminação, é crime inafiançável, art. 20 da Lei do Racismo. Quando um judeu é valorado e, por causa da sua etnia, é excluído, é cancelado, crime inafiançável, grade para quem faz isso. Então, uma coisa é conflito de direitos humanos, que é normal numa sociedade plural; a outra coisa é, em razão da condição intrínseca que a pessoa tem de ser humano, retirar o espaço dela da sociedade: você não pode ter espaço aqui porque você é preto, você não pode ter espaço aqui porque você é índio, você não pode ter espaço aqui porque você é judeu. Não importa se foi oral, se foi escrito, se foi à força; é crime, e crime tem que ser punido da forma mais severa possível pelo Estado. Por quê? Porque, se não for punido, nós teremos a desordem, e a desordem é exatamente o oposto do bem comum. Então, não sei se eu respondi à senhora, mas, agradeço-lhe novamente o espaço e a oportunidade. Eu e o IBDR estamos sempre à disposição. Quero também trazer aqui o abraço a todos do nosso Presidente de Honra, Dr. Ives Gandra, e também do Presidente do nosso conselho, Dr. Davi Charles Gomes, e quero falar que o Jean Regina mandou um abraço para a senhora, porque, se eu não falo e ele vê a gravação depois, ele fica me xingando: "Mas você não falou que eu mandei um abraço para a Senadora". Então, também estou mandando um abraço do Jean Regina para a senhora. A SRA. PRESIDENTE (Damares Alves. Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) - Obrigada, Dr. Thiago. Dê um abraço em todos eles. Tenho saudade dessa turma e de fazer essa discussão nesse nível sobre liberdade religiosa, que é um direito constitucional garantido e um direito intrínseco ao ser humano. Eu posso continuar, sim, falando que eu vi Jesus num pé de goiaba e quero respeito porque é a fé de uma criança que tem que ser respeitada. Chegamos ao final de nossa audiência. As apresentações que foram mostradas vão ficar à disposição do público. Qualquer pessoa pode baixá-las, guardá-las. Se vocês tiverem alguma dúvida, podem mandar pergunta. Eu encerro registrando só algumas participações online. Guilherme, de São Paulo, pergunta o seguinte: "Como o PNDH-3 poderia ser atualizado para lidar com desigualdades no momento socioeconômico do país, verificando os direitos de cada pessoa?". |
| R | Gisele, da Bahia: "Como o PNDH-3 aborda desigualdades específicas, como a das mulheres negras, evitando uma visão genérica dos direitos humanos?". Ana, de São Paulo: "Quais ações o PNDH-3 prevê para proteger os ecossistemas marinhos e garantir os direitos das comunidades costeiras e pescadores artesanais?". E, aqui, eu acrescento as nossas marisqueiras, que foram deixadas para trás. Precisamos falar das marisqueiras, lembra, Giselle? Pergunta da Regiane, do DF: "O PNDH-1 e o PNDH-2 foram orientadores; o PNDH-3 buscou implementar normas. Houve mecanismos mais severos nessa atualização?". Não, nem monitoramento tem, tá, Regiane? Leonardo, do Espírito Santo: "Como integrará inovação, sustentabilidade e formação cidadã, preparando também [para] enfrentar desafios socioambientais e tecnológicos do Brasil?". Esse é um desafio para o próximo PNDH. A tecnologia mudou; tudo mudou. Hoje, nós temos crimes cibernéticos que não existiam quando o PNDH-3 foi apresentado. O mundo mudou. Gabriel, de São Paulo: "Como pretendem enfrentar a letalidade policial na atualização do PNDH-3, alinhando a segurança pública aos direitos humanos?". Liliane, da Bahia: "O programa conseguiu dialogar com as demandas de direitos humanos relacionadas ao trabalho e à precarização contemporânea?". Que pergunta! E a gente vem com comentários. Isaque, do DF: "Transformar o PNDH em lei é crucial. Direitos humanos devem ser política de Estado, não de governo, garantindo continuidade e estabilidade". E isso a gente tem discutido muito, Rafael. Entra um governo e acha que direitos humanos é isso e aí faz isso; entra outro, acha que é aquilo e faz aquilo. Então, talvez a gente deva transformar essa diretriz que o PNDH tentou ser em uma lei, para ter sustentabilidade, norte e continuidade de algumas ações. Airton, do Rio Grande do Sul: "Reativar a disciplina de OSPB para mostrar aos adolescentes seus direitos e deveres num Estado democrático de direito!". Enquanto você falava, ele estava mandando a pergunta. Nílton, de São Paulo: "Direitos humanos é saúde sem corrupção na compra de equipamentos e remédios, com administração competente e profissionais da área sérios". Nós concordamos com você - pelo menos nós da antiga gestão de direitos humanos - que corrupção é violação de direitos humanos. Adelgício, de Minas Gerais: "Acho importante a proteção dos indígenas diante das mineradoras e indústria de madeiras". Finalizando, Adão, do Rio Grande do Sul: "O PNDH-3 deve ter garantias no principal foco do nosso país: desigualdades sociais, na humanização dos Cras, incluindo pessoas [em situação] de rua". Úrsula, do Paraná: "A política nacional deve contemplar mecanismos mais sólidos e efetivos de proteção de ativistas, que seguem pouco protegidos ainda". Eu fiz a leitura de algumas perguntas e alguns comentários, para os senhores terem a ideia da participação popular. É uma reunião de avaliação; não é uma reunião para a qual a gente chama toda a sociedade. A gente avisa que vai acontecer, mas prioriza para o convite os especialistas na política; mas a sociedade está participando e está acompanhando. Eu agradeço a audiência, agradeço à TV Senado, à Agência Senado, a todos que estiveram presentes no plenário, à Secretaria, aos consultores do Senado que estão acompanhando para a produção de um relatório e aos nossos debatedores. Que riqueza de debate! |
| R | Esta audiência vai ser reprisada inúmeras e inúmeras vezes, vocês vão se ver muitas vezes ainda na TV Senado. Quero agradecer! Assim, cumprido o objetivo desta reunião e nada mais havendo a tratar, declaro-a encerrada. (Iniciada às 9 horas e 34 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 30 minutos.) |

