03/09/2025 - 20ª - Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Fala da Presidência. Por videoconferência.) - Declaro aberta a 20ª Reunião da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática do Senado Federal da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A presente reunião se destina à realização de audiência pública com o objetivo de debater sobre a incorporação de novas tecnologias para pacientes diagnosticados com amiloidose hereditária por transtirretina (TTR) em falha terapêutica no SUS, em cumprimento ao Requerimento nº 19/2025 - CCT (Comissão de Ciência e Tecnologia), de minha autoria.
O público interessado em participar desta audiência pública poderá enviar perguntas ou comentários pelo endereço www.senado.leg.br/ecidadania ou ligar para 0800 0612211.
Encontram-se presentes no Plenário virtual, remotamente, da Comissão - quero dar as boas-vindas aos convidados e convidadas e agradecer pela participação muito importante para debater este assunto:
- Luciana Costa Xavier, que é Coordenadora-Geral de Avaliação de Tecnologias em Saúde do Ministério da Saúde, também a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec). Seja muito bem-vinda, Luciana Xavier;
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- Ramiro Nóbrega Sant’Ana, Defensor Público do Distrito Federal;
- Márcia Waddington Cruz, neurologista responsável pelo Centro de Referência em Amiloidoses da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Seja muito bem-vinda também, Dra. Márcia;
- Bárbara Coelho, Presidente da Associação Brasileira de Amiloidose Hereditária Associada à Transtirretina. Seja muito bem-vinda, Bárbara, também; e
- Jorge Luiz Neves, paciente com amiloidose hereditária.
Eu gostaria só de enfatizar dois aspectos. Em primeiro lugar, nós temos a presença do paciente, da associação, da área médica, do Ministério da Saúde, representando não só o Ministério da Saúde - a Coordenadora-Geral de Avaliação de Tecnologias -, mas a própria Conitec também, que é a comissão nacional, e do Defensor Público.
É importante que as pessoas que nos acompanham só entendam que nós vamos dar a primeira palavra para o paciente, depois para a associação. Por que isso? Porque nós temos que atuar em função daquilo que o paciente e a família trazem. A preocupação dessas pessoas tem que ser a preocupação dos órgãos públicos, da Defensoria Pública e do Senado Federal. Então, vamos sempre escutar o paciente e a família.
Ao mesmo tempo, depois deles, a Dra. Márcia... Não, Márcia não, a Dra... Desculpe-me, também... A doutora pelo Centro de Referência da Amiloidose. Ramiro, Bárbara... Lógico, a Dra. Márcia. Desculpe-me. A Dra. Márcia que vai fazer o apanhado da área médica; quer dizer, o paciente conversa, a família apresenta, a Dra. Márcia, como médica neurologista, explica, e o órgão público, o Senado e nós, vamos dizer o que nós podemos fazer para que as preocupações externadas possam ser colocadas numa perspectiva de encaminhamento, de solução. Certo? Então, esse é o primeiro ponto, até para que as pessoas que nos acompanham pelos meios de comunicação saibam disso.
Agora, quando nós falamos de uma doença rara, isso pode estar sendo abordado pela Comissão de Direitos Humanos, porque é cidadania, dignidade, é respeito, é um direito fundamental do cidadão. Pode estar sendo discutido do ponto de vista da educação, ou seja, como que tipo de educação oferecer quando existem problemas de saúde decorrentes de doenças raras - pode haver necessidade de adequações, adaptações, então, a discussão também acontece lá -, ou na CAS (Comissão de Assuntos Sociais), porque há o tratamento, eventualmente, fisioterapia, fonoaudiologia, dispensação de medicamentos - isso é saúde...
(Falha no áudio.)
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... nós queremos discutir, é prioridade da Comissão discutirmos ciência, pesquisa, tecnologia, incorporação de tecnologias e inovações.
Então, é uma interface que acontece entre várias Comissões, todas elas extremamente relevantes, sob pontos de vista diferentes. Isso é importante que se enfatize, porque alguém pode dizer: "Mas por que em ciência e tecnologia?". Porque nós queremos que as universidades, a Fiocruz, tantas iniciativas importantes que existem pelo Brasil sejam valorizadas, prestigiadas, para que a pesquisa aconteça; e que se coloquem à disposição do público iniciativas dos nossos pesquisadores e pesquisadoras - isso é importante, sob todos os pontos de vista.
Tudo vai ser explicado de maneira adequada, e agradeço sempre à Secretaria, que organiza todo evento. E nós temos uma justificativa do requerimento que eu gostaria de ler para que o assunto ficasse, assim, conhecido preliminarmente em termos da audiência.
A justificação do requerimento para a realização desta audiência.
Passo a ler.
Necessitamos de ações urgentes que garantam o acesso a terapias modernas e adequadas para pacientes diagnosticados com amiloidose hereditária por transtirretina (TTR) com apresentação neurológica.
Medicamentos como a inotersena e a vutrisirana são direcionados a adultos em falha terapêutica com as opções atualmente disponíveis, ou no estágio 2 da doença, que não possuem tratamento e cuidado disponíveis no SUS.
O cenário é alarmante: a Conitec já avaliou essas opções e recomendou sua não incorporação ao SUS, com resultados negativos divulgados em 04 de outubro de 2024, para inotersena; e, em 20 de fevereiro de 2025, para vutrisirana. Esta decisão compromete gravemente a qualidade de vida e a expectativa de sobrevida de um número significativo de pacientes que não têm alternativas adequadas de tratamento.
É preocupante saber que mais de 40% dos pacientes em estágio 1 da doença podem não responder ao tratamento disponível no SUS. Além disso, muitos pacientes enfrentam o diagnóstico tardio, o que os leva a procurar tratamento apenas quando já estão em estágio 2, condenando-os a uma falta de opções terapêuticas. A amiloidose hereditária TTR, com apresentação neurológica, é uma condição raramente diagnosticada, progressiva e fatal. Portanto, é fundamental que se priorizem a inclusão de novas tecnologias e alternativas de tratamento para atender àqueles que não respondem adequadamente às terapias existentes. Negar o acesso a essas opções é, de fato, condenar esses pacientes a um sofrimento prolongado e, muitas vezes, à morte prematura.
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Vale mencionar que muitos pacientes dependem atualmente de decisões judiciais para continuarem seus tratamentos. Muitos enfrentam incertezas sobre a continuidade do tratamento, enquanto outros não têm mais acesso ao Judiciário para buscar novas opções terapêuticas.
A realização de uma audiência pública é, sem dúvida, essencial para incentivar um diálogo abrangente e construtivo entre todos os envolvidos: o Ministério da Saúde, no geral, a comunidade científica - está aqui presente também, com a Dra. Márcia, que é neurologista, da comunidade científica, estudiosa desse assunto -, os pacientes, os familiares e as associações, a fim de encontrar soluções viáveis e sustentáveis, para assegurar um atendimento digno e integral aos portadores de amiloidose hereditária no Brasil.
Eu acho que até a justificativa reforça aquele ponto de vista de que a gente pensa, do ponto de vista da saúde, da educação, dos direitos humanos e da ciência e tecnologia, incorporações de novas tecnologias. Eu quero dizer que não só nós, mas também o Ministério da Ciência e Tecnologia tem a área de doenças raras como uma das áreas prioritárias de abordagem.
Então, eu agradeço novamente a presença de todos. Quero só ler as perguntas que já chegaram pelos canais que a gente já mencionou rapidamente. Eu peço, inclusive, que a secretaria repasse aos expositores as perguntas para, na medida do possível, irem incorporando, porque eu sei que, pelas explicações, muitas das perguntas já serão respondidas.
Sthephania, de Minas Gerais: "Qual é a previsão para que essas novas tecnologias estejam disponíveis para os pacientes no SUS?";
Sérgio, de São Paulo: "A amiloidose hereditária por transtirretina em falha terapêutica, nessa proposta, inclui o transplante de fígado? Existe um grau de prioridade?";
Jéssica, de Santa Catarina: "Como o SUS garantirá que as novas tecnologias para amiloidose hereditária por transtirretina sejam acessíveis e seguras para todos os pacientes?".
Comentários.
Ana, de São Paulo - é um comentário -: "O SUS é o melhor [abrem-se aspas] plano de saúde do mundo. Sei que irão ajudar [...] sem prejuízos, não só neste caso, mas em outros também". Quero dizer para Ana que eu concordo sobre ser o melhor plano de saúde também.
Mais algumas perguntas.
Carlos, do Rio de Janeiro: "Qual a estratégia do SUS para garantir equidade no acesso, evitando que [...] [só] quem tem dinheiro ou [...] [ação judicial] consiga [...] [os] medicamentos?";
Anísio, do Ceará pergunta: "Há protocolos clínicos do SUS para guiar médicos no uso dessas novas terapias?"
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Leliane, do Distrito Federal: "Quais cuidados de enfermagem são essenciais na adoção de novas terapias para ATTR [amiloidose hereditária por transtirretina] em falha terapêutica no SUS?".
Ludmylla, de Goiás: "Como garantir acesso rápido a essas tecnologias para pacientes em falha terapêutica?".
Felipe, do Paraná: "A incorporação de novas tecnologias no SUS é algo necessário, mas como fazê-lo de forma eficaz e dentro do orçamento disponível?".
Muito bem, essas perguntas já foram repassadas aos caros expositores e expositoras, a quem a gente agradece de novo a participação.
Passamos, então, em primeiro lugar, a palavra para o Sr. Jorge Luiz Neves.
Seja bem-vindo, não é, Jorge? Ele é aposentado e pessoa com amiloidose hereditária. Como eu disse antes, vamos principalmente escutar; não é ouvir, é escutar. Escutar é prestar atenção e pensar no que fazer em termos de encaminhamentos.
Com a palavra, Jorge.
O SR. JORGE LUIZ NEVES (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia.
Antes de mais nada, quero agradecer ao Senador por esta oportunidade de a gente poder discutir sobre as nossas necessidades como pacientes. Esta chance é sempre muito bem-vinda para nós.
Bom, eu vou explicar e explanar um pouco o problema da doença, que é bastante difícil de ser diagnosticada. A maioria dos pacientes passam por vários especialistas com diagnósticos errados, tratamentos errados. Eu levei, pelo menos, quatro anos para conseguir o diagnóstico correto. Isso aconteceu por acaso, por conhecer uma médica neurologista que estuda isso - inclusive é amiga da Dra. Márcia -, aqui em Pernambuco. O que acontece? Vem a luta para se conseguir medicação.
Existe um medicamento já incorporado ao SUS, mas... Como eu vou dizer? Ele não consegue atender quem já começa com o estágio 2, que foi o meu caso, e a maioria dos pacientes. Por quê? Para se obter a medicação, você já tem que estar agravado, dificuldade de andar, essas coisas todas. Quase, vamos dizer assim, estar no estágio 2 para conseguir o medicamento. O medicamento não atende bem a quem está no estágio 2, ele não funciona bem - esse incorporado ao SUS.
Aí começa a batalha da gente, porque a médica chega e diz: "Olha, a gente tem uma outra medicação. Tem a opção do transplante também, que é uma cirurgia invasiva e tudo, e é difícil de conseguir". Aí ela indica um outro medicamento. No caso, hoje, é o vutrisiran, mas eu tomo um outro medicamento, que é do mesmo laboratório, o patisiran, que é uma aplicação a cada 21 dias.
Eu obtive isso por meio de judicialização. Eu acho que, de certa forma, é um consenso geral de que não é a melhor maneira de você obter uma medicação. Primeiramente, porque existe o custo para o próprio Governo, em relação à judicialização, essa coisa toda. Nem todo mundo vai ter acesso a um advogado para entrar com processo. A Defensoria Pública tem muito processo, e é trabalhoso.
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Depois que você consegue dar entrada no processo para judicialização, você leva pelo menos de oito meses a um ano para obter a solução do processo, obter a liminar para poder conseguir o medicamento. E aí vêm mais uns três ou quatro meses, ou às vezes mais, como no meu caso, em que eu levei oito meses para receber a primeira dose. E a primeira dose já é uma melhoria grande para gente, porque melhora um pouco a nossa mobilidade e os problemas intestinais que a gente tem durante o processo da doença; você já consegue um declínio dos sintomas mais fortes - isso com a medicação.
Agora, com o vutrisiran, você tem uma aplicação a cada três meses; quer dizer, já te dá uma liberdade maior e o efeito é mais prolongado. Então, é muito importante que isso seja concedido para nós no SUS.
Como é que eu vou dizer? A gente participar da... Eu já participei de reunião da Conitec. Nós simplesmente comprovamos, o laboratório comprovou e existem estudos clínicos comprovando a eficácia do medicamento, com a melhoria. Eu tenho depoimento de quem conseguiu o medicamento pela Justiça. Tinha uma pessoa, aqui, do interior de Pernambuco que estava acamada já, não conseguia levantar da cama, e, com a primeira dose desse vutrisiran, ela já conseguia até ir ao supermercado fazer compras para ela. Ela teve a independência que ela não tinha.
E aí o que aconteceu? O próprio ministério falha na entrega do medicamento. Essa parada do tratamento e a falha de fornecimento do medicamento são bastante prejudiciais. Ela, inclusive, voltou a ficar acamada.
Um outro amigo de São Paulo que conseguiu na Justiça, pelo plano de saúde, o vutrisiran também já me disse várias vezes: "Jorge, troca o patisiran pelo vutrisiran"; mas eu tenho medo de, nessa troca, ter uma falha grande e eu ficar muito tempo sem medicamento. Já aconteceu comigo falha de fornecimento, e eu passei três meses, no ano passado, e mais três meses, neste ano, sem receber o medicamento, por falha de fornecimento do ministério. E aí o que acontece? Os sintomas se agravam rápido demais, a doença evolui rápido demais e você não consegue retornar ao estágio em que você estava; você não consegue recuperar o ganho que tinha tido.
Então, isso é bastante prejudicial. A gente tem dificuldade de caminhar, risco de queda, a gente não consegue segurar as coisas direito, porque a força da mão é bastante reduzida - são vários problemas. A perda muscular da gente é muito grande.
Quando eu comecei a investigar a doença, eu pesava 90kg; perdi 30kg e fiquei com 60kg por causa da doença - tudo por perda muscular. Já fiz cirurgia na vista porque tinha depósito amiloide no vítreo. Eu tive que extrair o vítreo, implantar uma lente e hoje, graças a Deus, estou bem. Fiz cirurgia de túnel do carpo, que também é outro problema que é ocasionado pela doença - vai obstruindo os nervos e essa coisa toda.
Então, quando você tem uma tecnologia que, de certa forma, é inovadora, mas é comprovado cientificamente que surte efeito, e a gente não tem a possibilidade de obter esse medicamento com mais facilidade, é bastante ruim para todo mundo.
Eu acho que deveria ter um consenso melhor da Saúde em relação a isso. O SUS pode muito bem fornecer. Eu reconheço que é um medicamento muito caro, as pessoas normais não têm condição de pegar e comprar o medicamento, o valor é bastante alto, mas é o tal negócio: qual é o valor que se tem da vida?
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Eu hoje me sinto capaz de trabalhar, mas não consigo trabalhar, porque o meu serviço era inspetor de pintura, trabalhava em plataformas da Petrobras, em navios da Petrobras, fazendo inspeção para controle de corrosão e tudo. Hoje em dia, eu não consigo subir uma escada direito, eu não consigo entrar num tanque de navio para fazer uma inspeção. Então, graças a Deus, mesmo já com o tempo de serviço para me aposentar - quer dizer, à época, graças a Deus, eu já tinha o período para aposentadoria -, não era uma coisa que eu queria, eu queria continuar trabalhando, só que eu não posso mais, e veio a aposentadoria. Felizmente, eu consigo hoje continuar vivendo com a aposentadoria, mas nessa tensão sempre de ter ou não o medicamento na hora certa, porque a descontinuidade do tratamento é bastante prejudicial para a gente. Então, hoje, psicologicamente, a gente é bastante afetado, a família é bastante afetada.
Quando eu descobri o meu diagnóstico, eu fui descobrir que meu avô, 60 anos atrás, faleceu com amiloidose. À época, não se conhecia o diagnóstico, mas o que está no atestado médico dele é uma das vertentes da amiloidose. Há 25 anos, meu pai faleceu com amiloidose. Ele já reclamava dos sintomas e tudo, e a gente até brincava com ele: "Pô, pai, para com isso! Como é que está no sol e está sentindo frio na mão?" - não era frio, era dormência -, mas aí a gente dizia: "Pô, quer tomar remédio toda hora e tal", e aí vai... E, mais recentemente, três anos atrás, foi o meu irmão mais velho, e eu vi como o meu irmão faleceu. Aí foi o mais pesado, porque eu estive com ele em novembro. Ele já tinha pedido à minha cunhada para colocar um saco plástico na cabeça dele, porque ele queria morrer, não aguentava mais viver daquele jeito. Para tudo precisava de assistência: ele já não se levantava da cama, era carregado para a cadeira de rodas, da cadeira de rodas para a cadeira do papai, para ir ao sanitário, para tomar banho; para tudo, ele precisava de ajuda. E aí, quando a minha cunhada me falou isso, eu peguei e fui ao Sul - ele morava em Porto Alegre - fazer uma visita a ele para levantar o astral - eu já estava tomando a medicação -, aí cheguei e vi o estado em que ele estava. Aquilo me assustou bastante. A gente vê que não tem o que fazer sem medicação, e ele não conseguiu o medicamento. Então, essas coisas são bastante chocantes para a família toda.
Eu tenho hoje quatro sobrinhos, que são diagnosticados já com amiloidose, mas, como não têm sintoma, não têm acesso à medicação. É uma coisa também que eu acho que sairia mais barato, vamos dizer assim, o custo seria menor se, a partir do diagnóstico, você já pudesse fazer alguma coisa; só que não tem o que fazer, você tem que esperar ter o sintoma grave - sintoma de dormência nos pés, de falta de movimento e essa coisa toda - para poder solicitar o medicamento. Tem os exames que têm que ser feitos, eletroneuromiografia e essa coisa toda.
E, além da medicação, a gente tem que ter um acompanhamento tremendo: consulta com cardiologista, porque a amiloidose afeta o coração também; fisioterapia constante - você tem que fazer fisioterapia pelo menos duas a três vezes por semana -; nutricionista; gastro; tudo isso. E os médicos, vamos dizer assim, você tem que procurar os médicos especializados porque, quando você vai conversar com algum médico e fala de amiloidose, nem todo médico a conhece a fundo. Não é muito conhecida do pessoal e, vamos dizer assim, não existe muito interesse em estudá-la. São poucos os médicos. Eu acho que a Dra. Márcia sabe disso, ela está sabendo da dificuldade de se conseguir médico especializado e que conheça a doença.
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Então, tudo isso - como é que eu vou dizer - psicologicamente afeta bastante a gente. Até a chegada do diagnóstico é bastante difícil. E quando a gente escuta o diagnóstico, que no meu caso foi por acaso, realmente... A minha sogra teve um AVC e ficou internada. No internamento dela, a minha esposa conheceu a neurologista que a tratou na UTI. Conversando com ela, ela disse: "Olha, eu acho que o seu marido tem amiloidose", e indicou uma médica. Quando a minha esposa me ligou dizendo: "Olha, conversei com a neurologista aqui e ela me disse que talvez você tenha amiloidose".
O que se faz hoje em dia? A gente vai direto no Google. Coloquei lá: "amiloidose". Quando eu vi sobre amiloidose, o prognóstico era de três a cinco anos de vida. Isso era o que estava escrito lá no Google. Então, quando você recebe esse impacto, é bastante chocante. Quando eu fiz a consulta com a especialista, ela pegou e disse: "Olha, você tem tratamento. Antigamente se usava o transplante, mas hoje em dia você tem medicamento. Então a gente vai tentar controlar. Não consigo reverter a doença totalmente, mas o que a gente consegue é estabilizá-la, para que ela não progrida mais, mas para isso a gente tem que ter continuidade do tratamento". É um tratamento que é para o resto da vida, então você ficar dois, três meses sem medicação é uma regressão tremenda no sintoma, no que você já tinha melhorado.
Eu acho que era o que eu podia falar da amiloidose, do meu sentimento, que é o sentimento de qualquer paciente que tem essa doença. É uma doença ainda pouco conhecida - vamos dizer assim -, de diagnóstico difícil, porque ela se confunde com outras. Eu fui diagnosticado com polineuropatia dos membros periféricos e comecei um tratamento, que não adiantou nada. Aí você vai fazendo os tratamentos errados e com isso a doença vai progredindo cada vez mais.
Então, eu acho que isto é o que eu podia fazer, dar uma explanada no que é a amiloidose, por ser pouco conhecida. Eu sei que tem gente que tem problemas maiores do que o meu. Vamos dizer assim, você tem outras doenças raras que são bem mais prejudiciais. Uma coisa que eu disse logo no início sobre o preço do medicamento e tudo, eu falei: "Caramba, eu não sabia que eu valia tanto", porque, no fundo, no fundo, é um valor alto por ano para me manter vivo. Aí um amigo meu chegou para mim e falou assim: "É, mas você já viu o quanto você produziu para o país, o quanto você pagou de imposto?". Eu: "Pô, é...", mas mesmo assim acho caro.
Deveria existir não sei se uma negociação maior com os laboratórios, como o senhor disse, uma pesquisa maior da Fiocruz, dos institutos, das universidades, para a gente descobrir um tratamento nacionalizado, vamos dizer assim, porque hoje é difícil você conseguir uma quebra de patente de um medicamento caro desse jeito. Eu sei que tem outras doenças que têm valores mais altos ainda, mas eu acho que é aquela coisa assim: quanto vale uma vida? Isso é que é o pior. E é um direito nosso, a nossa Constituição diz que a gente tem direito à saúde. Então é bom a gente ter o apoio dos políticos, dos órgãos oficiais, do próprio governo em relação a isso. Acho que o que eu podia explanar era o que eu falei. Quero agradecer, mais uma vez, por esta oportunidade de comentar sobre a amiloidose e buscar tratamentos mais eficazes para a gente.
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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Agradecemos, Jorge Luiz Neves. Muito interessante, boa e necessária a sua exposição. Ficaram extremamente claros os desafios, as angústias, apontando, inclusive, para a importância da pesquisa nessa área, para que a gente... Tem tanta gente qualificada, boa, nas universidades, na Fiocruz, que tem que receber um incentivo, para que essa pesquisa ajude nos desafios, e nós temos competência para que muitas dessas coisas aconteçam no Brasil.
Obrigado, por enquanto, Jorge. Aí você acompanhe também as falas das outras pessoas.
Passamos, em seguida, à Bárbara Coelho, que é Presidente da Associação Brasileira de Amiloidose Hereditária Associada à Transtirretina.
Seja muito bem-vinda, Bárbara.
A SRA. BÁRBARA COELHO (Por videoconferência.) - Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - E quero dizer da importância de ter uma associação brasileira que trata do assunto para organizar o povo para participar juntos. Juntas sempre as pessoas são mais fortes.
Com a palavra, então, Bárbara.
A SRA. BÁRBARA COELHO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia. Muito obrigada pela oportunidade de trazer aqui a nossa causa.
Vou abreviar o meu histórico pessoal dentro desse contexto da amiloidose. A minha mãe... Todos nós da Abpar, que trabalhamos como voluntários na Abpar - todos nós -, somos ou pacientes ou cuidadores de amiloidose hereditária. No meu caso, a minha mãe vem de uma família de 16 irmãos e, em 2017, a minha mãe, depois de muitos anos também buscando um nome para a doença de que ela estava acometida - porque era claro que ela estava doente, mas nós não conseguíamos fechar um diagnóstico -, foi diagnosticada, e aí a gente começou a juntar as peças.
A minha mãe já havia perdido seis irmãos sem diagnóstico, e não restou dúvida de que os irmãos faleceram por causa de amiloidose, o meu avô também. E, diante do diagnóstico da minha mãe, o médico recomendou que todos os irmãos vivos fizessem esse teste também: mais três irmãs da minha mãe foram diagnosticadas e mais um irmão. Eu fiz o teste também e eu não sou paciente de amiloidose.
Então, do ano passado para agora, minha mãe perdeu mais dois irmãos. Eu tive certeza de que, daquele momento, daquele diagnóstico em diante - era tudo muito incerto -, eu iria pausar a minha vida para cuidar da minha mãe. Assim foi feito, e eu cuido da minha mãe até hoje. Minha mãe tem 81 anos, a doença já evoluiu, ela já não está andando mais. E todo mês eu tenho muito trabalho, tenho que correr atrás de documentos para judicializar um medicamento para ela. Então eu resolvi compartilhar esse meu trabalho com pessoas que estavam também buscando algum tipo de tratamento para amiloidose.
Através de um médico, eu descobri que existia a associação. Eu entrei como uma cuidadora e, posteriormente, o meu representante regional, que me atendia, faleceu - ele era transplantado, portador também de amiloidose hereditária -, e eu fui convidada para atuar como colaboradora regional no meu estado, Minas Gerais. Estou desde o ano passado como Presidente da associação. Como somos voluntários, nós trocamos os postos a cada três anos. Eu represento, em média, 500 famílias, hoje, de pacientes de amiloidose hereditária.
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Quase sempre esses pacientes... O primeiro diagnóstico de uma família... Quando esse paciente nos encontra, ele já está no segundo para o terceiro estágio da doença. Porque ela é progressiva e, sem tratamento, às vezes, esse paciente só vai progredindo. E hoje tem apenas um medicamento incorporado no SUS para atender esses pacientes, e esse medicamento traz um benefício para esses pacientes: é um estabilizador dessa proteína e traz benefício apenas para o primeiro estágio da doença, quando os pacientes começam a precisar já de algum apoio para andar, uma bengala, e já começam a ficar incapacitados de trabalhar, de fazer suas funções normais, perdem suas capacidades laborais e a maioria tem que se aposentar.
O impacto emocional dessas famílias, todas afetadas também, é enorme. Eu sempre enfatizo o papel de um cuidador, que é o meu caso também, porque eu já vivo há dez anos em... eu vivo por conta de tratar da minha mãe.
Os medicamentos que a gente trouxe aqui em questão, para tentar incorporar para o paciente no segundo estágio da doença, foram todos submetidos a estudos clínicos, eles são todos aprovados pela Anvisa - e a Dra. Márcia, posteriormente, vai falar que... Eu acho que, de todas as negativas que a gente recebeu de incorporação desses medicamentos, em nenhuma foi contestada a eficácia desses medicamentos, nem a segurança; muito pelo contrário, é comprovada a urgência e a necessidade desses medicamentos. A resposta que nós tivemos, todas as vezes, foi a questão do impacto orçamentário.
Então, eu não sei, assim como o Senador iniciou hoje aqui esta audiência... O senhor mencionou que, como cidadãos, como uma sociedade civil, é muito importante que todos nós... a partir daqui, que as dúvidas sejam sanadas, mas que nós tenhamos essa consciência de colaboração com essas famílias, com esses portadores de amiloidose. Se a questão é impacto orçamentário, é possível, posteriormente, algum tipo de negociação com a indústria, para que possamos chegar a um resultado efetivo para esses pacientes, né?
Então, nós viemos aqui para solicitar que seja feita essa incorporação, que seja revisada essa questão de impacto orçamentário.
Os nossos pacientes, hoje, já buscam um diagnóstico num estágio tardio. E eu acho que muitos desses pacientes, assim como o Jorge disse, poderiam, sim, continuar trabalhando, contribuindo com a nação, e parece que estão precificando vidas mesmo. A gente, como associação representando esses pacientes, eu acho que a gente trabalha muito, muito: eu não fico um dia sem trabalhar, apesar de ser um trabalho voluntário. Eu divido o meu dia com os cuidados, os muitos cuidados que eu tenho que ter com a minha mãe, que já nem anda mais, depende de mim para tudo - se eu não ficasse por conta dela, a gente teria que contratar uma pessoa -, e esse é o cenário de todos esses pacientes.
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Então, nós viemos aqui hoje pedir essa incorporação. Nós acompanhamos as indústrias, a gente consegue ver a evolução dos medicamentos. Hoje tem tratamento para esses pacientes. Às vezes, a gente é convidado para congressos internacionais, em que a gente se senta com outras associações de outros países, e o assunto quase sempre é: "O meu médico trocou o meu medicamento por um melhor, que está sendo mais efetivo". E, infelizmente, já há alguns anos, o nosso assunto, quando a gente vai para esses congressos, é que ainda não temos tratamento aqui para esses pacientes.
A questão da judicialização é muito difícil. A maioria dos pacientes não tem nem a condição... Quando não se tem a condição financeira para buscar um advogado, é possível ser assistido pela Defensoria Pública - inclusive, a minha mãe toma um medicamento para acometimento cardíaco através de judicialização -, mas a maioria dos pacientes já não tem nem saúde mais para correr atrás disso.
Nós perdemos vidas todos os dias na associação. Nós perdemos familiares. Eu diria que convivo com a amiloidose desde que eu nasci. Meu avô morreu 45 anos atrás. Eu tenho tios que faleceram sem diagnóstico: hoje os meus primos começaram a ter os sintomas e agora descobriram que, certamente, os pais morreram de amiloidose também. Eu tenho falado sobre a minha família, mas é porque é um caso real, assim como o do Jorge, que a gente traz do que são os sintomas, o impacto emocional que atinge todas essas famílias.
Esse seria o nosso apelo hoje. Essa é uma doença endêmica, progressiva. Nenhum paciente de amiloidose pediu para ter essa doença. Então, eu acho que nós todos deveríamos exercer algum papel para tentar, com efetividade, assistir a esses pacientes, pois já existe o tratamento. Foram quatro tentativas de incorporação de medicamentos, em que não foi contestada a eficácia. Então, é muito importante que isso seja lembrado para tentarmos o que mais puder ser feito para a gente conseguir ajudar esses pacientes.
São vidas que são pausadas, são famílias impactadas. Como o Jorge mesmo disse, ele teve que parar de trabalhar. Minha mãe também... Eu diria que ela até hoje estaria trabalhando. Minha mãe é costureira. Ela empurra o tecido para dentro de uma máquina de costura hoje com a ajuda de uma chave de fenda. Emocionalmente é isso que a mantém viva.
Mas a pessoa tem filhos, tem família, aquela incerteza de se o filho também herdou - esse teste só pode ser feito com os pacientes acima de 18 anos. Eu tenho visto também várias famílias em que vários familiares optaram por não fazer o teste genético, por medo e pela questão de saberem que não tem uma garantia de tratamento ainda incorporado no Sistema Único de Saúde. E o preço desse medicamento é muito alto.
Então, eu estou à disposição para quaisquer dúvidas que eu possa trazer aqui para vocês, mas o nosso apelo é para que seja revista essa questão da não incorporação dos medicamentos já existentes e para que a gente chegue a isso de uma forma efetiva. Todo mundo tem um compromisso aqui, como o Senador falou, para, posteriormente, a gente tentar resolver essa questão dessa incorporação dos medicamentos.
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Eu agradeço muito a oportunidade de estar aqui, trazer voz para essa associação, relatos pessoais meus também, que já convivo há dez anos com os tratamentos de amiloidose hereditária. Agradeço muito a oportunidade, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Nós que agradecemos a você, Bárbara Coelho, Presidente da Associação Brasileira de Amiloidose Hereditária Associada à Transtirretina.
Só quero também externar palavras sempre de coragem, de esperança, de organização. Se já é difícil tendo uma associação brasileira, imagine se cada um estivesse sozinho aí. Então é importante todos e todas que nos acompanham pelo Brasil estarem juntos com uma associação brasileira, porque aí a luta é coletiva, por uma boa causa, né? Vou sempre dizer, somos fiéis à causa do bom atendimento das pessoas e das famílias.
E o seu depoimento também foi muito importante, assim como havia sido importante o do Jorge, como paciente; você, não como paciente, mas com toda a família, como você relatou, sendo afetada também por esse desafio, e a associação. No que nós pudermos contribuir com a associação, estamos à disposição também.
Muito bem.
A SRA. BÁRBARA COELHO (Por videoconferência.) - Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Então, nós falamos com o paciente, a família, a associação, e agora vem o ponto de vista médico para mostrar as pesquisas, os entendimentos, os encaminhamentos. E para isso nós temos, com muito prazer, a participação da Dra. Márcia Waddington Cruz, que é Neurologista e responsável pelo Centro de Referência em Amiloidoses da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Parabéns pelo trabalho e peço transmitir também o abraço para todos da UFRJ.
Com a palavra, então, Dra. Márcia.
A SRA. MÁRCIA WADDINGTON CRUZ (Para expor. Por videoconferência.) - Primeiramente, eu gostaria de agradecer ao Senador pela honra e pela oportunidade de esclarecer um pouco e ajudar os pacientes, a todas as autoridades presentes e à Abpar, que sempre depositou em mim muita confiança, ao longo dos anos.
Eu vou compartilhar a minha tela. (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Só não está em tela cheia.
A SRA. MÁRCIA WADDINGTON CRUZ (Por videoconferência.) - Eu coloquei agora.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Agora sim, está ótimo. Muito bom.
A SRA. MÁRCIA WADDINGTON CRUZ (Por videoconferência.) - Bom, então, voltando, estou na UFRJ desde 1988 e, desde 1989, eu me ocupo desse centro de referências, que, claro, foi crescendo à medida que os tratamentos foram surgindo. Eu sou a investigadora principal, quer dizer que eu coordeno estudos clínicos com todas essas drogas que foram surgindo ao longo do tempo. Eu acompanho desde o transplante de fígado até as drogas de que eu vou falar a seguir, drogas que visam estabilizar, drogas que visam silenciar a produção dessa proteína anômala. Então, esse é o meu conflito de interesses, mas é, ao mesmo tempo, aquilo que eu faço ao longo dos anos e que é inerente à profissão e ao tratamento desses pacientes.
Para quem não conhece a amiloidose, muito rapidamente, eu tenho dez minutos, então eu tenho que escolher o que falar. Eu não posso...
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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Dra. Márcia, a gente até mudou. Você tem 15 minutos para falar, foi o tempo que a gente destinou para as outras pessoas também. Então, por favor.
A SRA. MÁRCIA WADDINGTON CRUZ (Por videoconferência.) - Muito obrigada. De qualquer forma, eu preparei uma apresentação que visa ser sucinta e corroborar o pleito dos pacientes.
Então, o que é essa amiloidose? A amiloidose é uma doença que é decorrente do depósito de amiloide. Temos um amiloide marcado em vários tecidos: na glândula salivar, no nervo periférico, no coração. E de onde vem esse amiloide? Uma vez que está lá nos tecidos, ele causa lesão. Ele vem de uma proteína que é produzida no fígado, que se chama transtirretina, que é esta aqui, com essa estrutura quaternária. Quando ocorre uma mutação, uma simples troca de aminoácido, essa proteína se torna instável na circulação, acaba por se fragmentar em monômeros; esses monômeros vão se dobrando de forma inadequada, se depositam nos tecidos sob forma de amiloide, e aí então vem a doença. Vai depender do tecido onde ela se deposita. Ela vai se depositar em tudo quanto é lugar, daí a gravidade da doença.
Nós temos as duas mutações mais comuns no mundo. Essa V30, que é a substituição do aminoácido valina por metionina, que é da nossa origem portuguesa; e essa outra mutação, a 122, isoleucina por valina, vem da nossa afrodescendência. Todas as duas... Nós fomos premiados com as duas principais mutações; temos, portanto, doença de todo tipo.
A forma de manifestação vai depender da mutação, conforme eu já disse. Então, se nós estivermos lidando com essa mutação da nossa origem portuguesa, nós teremos uma doença principalmente neurológica e principalmente de pacientes jovens, entre os seus vinte e poucos anos, trinta. Se for a mutação de origem africana, será principalmente uma doença cardíaca. Mas, mais cedo ou mais tarde, esses pacientes evoluem para um lado ou para o outro, isso para não mencionar tantas outras mutações, e vão ter uma doença sistêmica, uma doença que afeta múltiplos órgãos.
Como o Jorge já muito bem falou, se a mutação - e eu acredito que seja essa V30 a dele - se apresentar após os 50 anos de idade, ela já se apresenta como uma doença tanto neurológica quanto cardíaca. Então nós estamos lidando com uma doença sistêmica; uma doença que é severa, é progressiva, é fatal, se não for tratada corretamente; afeta múltiplos órgãos - eu não vou entrar nesses detalhes todos, mas é só para os senhores terem uma noção da complexidade dos múltiplos órgãos e tecidos que podem ser atingidos pelo depósito de amiloide, com a consequente disfunção -; e a sobrevida vai de dois a dez anos, a depender de inúmeros fatores. Por exemplo, para a mutação V30, ela pode ser mais lenta; para a mutação 122, devido ao fato de afetar o coração logo de início, vai ser mais grave. Então, se não tratada ou se não tratada corretamente, é uma doença que evolui inexoravelmente para o óbito.
Eu vou apresentar a seguir algumas fotos, para que os senhores tenham uma noção da gravidade da doença, muito no tocante ao aspecto neurológico, porque eu sou neurologista. Então, os pacientes precocemente perdem a capacidade de perceber o frio, o calor, a dor, eles se queimam. Às vezes se abrem úlceras tróficas, como essas, que podem evoluir para amputações. Até o estágio final da doença, que é esse, por desnutrição, diarreias, vômitos, que são coisas muito graves. Nós não queremos mais ver esse tipo de coisa.
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Existem estágios da doença, conforme já foi dito aqui - aquele estágio sempre clássico -, estágios 1, 2 e 3. No estágio 1 é aquele paciente que só tem alterações sensitivas ou sensitivas e motoras, mas ainda é capaz de caminhar sem auxílio. No estágio 2, já se passaram quatro ou cinco anos de doença, ele necessita de apoio para caminhar. E o estágio 3 é aquele paciente que não caminha, está restrito ao leito ou à cadeira de rodas.
Como é que evoluiu o tratamento? Primeiramente, eu queria dizer que só 5% das doenças raras têm um tratamento eficaz, e a amiloidose é uma delas. Então nós estamos diante de uma coisa rara, que nós temos obrigação de diagnosticar e tratar adequadamente, porque é, de certa forma, um privilégio podermos tratar.
Nos anos 90, surgiu o transplante de fígado como opção terapêutica. Mais tarde, em 2011, foi aprovado na Europa e, mais tarde, no Brasil, drogas que estabilizam essa molécula, a transtirretina. Lembrem que eu disse que ela sofre mutação e fica instável, então esses estabilizadores tendem a deixar a molécula estável e interromper essa cascata inexorável de desagregação e de deposição em tecidos e doença.
Aqui, o primeiro transplante de fígado, que eu acompanhei, do Prof. Silvano Raia, do Instituto do Fígado, em São Paulo. Mais tarde, essa plaquinha, que me foi dada por um dos nossos pacientes do Rio de Janeiro. E o transplante de fígado, então, ficou durante muito tempo como sendo o único tratamento. Mas, evidentemente, ele não pode ser o tratamento para o número de casos que nós temos, que não é negligenciável, é da ordem das centenas ou milhares, no Brasil. Ainda há uma especulação em relação a isso, porque nós não temos registros, mas os registros que já existem realmente corroboram que nós caminhamos por esse número de pacientes. E não pode ser, não pode servir como tratamento para todo mundo, até porque existem vários outros aspectos médicos a serem considerados, como a progressão da doença e como a falta de órgãos para todos, etc., etc.
Então, o primeiro medicamento aprovado, como eu já disse, na Europa, em 2011, no Brasil, em 2018, foi o tafamidis, que é essa droga que se liga, estabiliza a molécula e evita então a desagregação e o restante. Foi uma conquista muito importante, um trabalho junto à Conitec, uma dedicação muito grande da Conitec em incorporar essa medicação e tornar disponível, através do SUS, em todo o território nacional - aproveito aqui para também dizer que sou fã do SUS -, mas que, porém, não resolve tudo. Nós gostaríamos muito - todos - que fosse a solução para tudo, mas não é.
Eu vou mostrar quais são essas necessidades não atendidas que exatamente fazem parte do pleito dos pacientes, principalmente aqueles pacientes que não respondem ao tafamidis.
Por exemplo, na minha casuística de vida real, os que não respondem são mais ou menos, digamos assim, um terço, por diversas medidas que nós fizemos; e, nas casuísticas mundiais, por exemplo, como a de Portugal... Eu já citei que a nossa mutação principal vem de Portugal. Então, eles têm casuísticas muito grandes e já estudaram muito bem, e ficou bem determinado que existem aqueles que não respondem, aqueles que respondem parcialmente e aqueles que respondem. Aqueles que respondem quase sempre são aqueles que iniciam o tratamento o mais cedo possível, coisa que nem sempre é possível por diversas situações, além daqueles que já estão numa fase mais avançada; quer dizer, o paciente pode começar precocemente, mas, por inúmeros motivos individuais, que estão sendo estudados, não responde adequadamente ao tafamidis, que é essa droga que é disponível no SUS, ou ele pode já estar numa fase mais avançada, naquela fase estágio 2, quando ele precisa de auxílio para caminhar. E, dentro da minha casuística de um tempo atrás, isso é mais ou menos 24% dos pacientes. Eu vou dar um exemplo aqui de vida real, de um paciente jovem, com essa dificuldade para caminhar, já em estágio 2. E percebam o peso corporal, como o paciente está emaciado, emagrecido, com baixa qualidade de vida, essa neuropatia causa disautonomia. Todo o controle que o sistema nervoso autonômico faz, do batimento cardíaco, da motilidade gastrointestinal, dos esfíncteres, tudo isso está comprometido, então esse paciente, além dessa dificuldade para caminhar e da desnutrição, que vem de vômitos, de diarreia, tem que usar uma sonda, ele também tem doença cardíaca - eu não vou entrar aqui no âmbito da doença cardíaca, não é a minha área, mas ela é muito importante - e tem doença renal também.
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Vejam, esse paciente infelizmente já veio a óbito, ele veio a óbito por conta desse tipo de úlcera, que se forma devido à neuropatia. Então, nós não estamos diante de qualquer doença, qualquer neuropatia, é uma neuropatia gravíssima. Eu já mostrei isso aqui, as queimaduras, as úlceras, que muitas vezes evoluem para osteomielite. Aí o nosso paciente teve que... não amputou, mas precisou colocar todos esses pinos cirúrgicos, as amputações, e esse é o final de vida.
Então, se eu puder voltar aqui um eslaide, que é este... Nós falamos, então, do transplante nos anos 90, dos estabilizadores - esse é distribuído pelo SUS a partir de 2018 -, mas existem os silenciadores. Entre outras coisas, entre outras drogas, existem esses silenciadores, aquelas moléculas que vão lá no interior do fígado e causam o que a gente chama de knockdown, cessam a produção da transtirretina. Já existem silenciadores de primeira geração, de segunda geração, nós temos que... O tempo passou, em 2015 começaram os de primeira geração, atualmente nós já estamos com os de segunda geração. Esses tratamentos já foram publicados em várias casuísticas - eu vou parar de compartilhar a minha tela -, já foram publicados em revistas de alto impacto, todos estão convencidos da eficácia, no mundo inteiro os pacientes já têm acesso.
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Eu tenho participado sempre da reunião da Conitec, sempre entro como consultora, quando eles me pedem, e eu também tenho notado todo o trabalho deles no sentido de reconhecer a eficácia das medicações, das diversas que existem. Fizeram menção principalmente a duas, mas existem até outras.
E é importante que a gente faça alguma coisa, que incorpore alguma coisa, para atender a essas necessidades não atendidas, que são aqueles pacientes que não respondem à droga distribuída atualmente pelo SUS ou aqueles que estão numa fase mais avançada. E o preço a se pagar por não tratar adequadamente é esse que eu mostrei aos senhores aí, no que toca à sobrevida, no que toca à qualidade de vida, etc., etc. E, muito embora tenha havido esse esforço por parte da Conitec, ainda não se chegou a um acordo, e a decisão final foi a de não incorporação, mas é fundamental que nós cheguemos a algum meio-termo.
Eu termino e agradeço muito, mais uma vez, a oportunidade de poder ajudar a todos.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Agradecemos muito a você, Dra. Márcia Cruz - quero até repetir aqui -, Neurologista e responsável pelo Centro de Referência em Amiloidoses da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). E quero parabenizá-la pelo trabalho também. São quase quatro décadas, né? Você mencionou 1989, não é?
A SRA. MÁRCIA WADDINGTON CRUZ (Por videoconferência.) - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - De 1989, 1990, são...
A SRA. MÁRCIA WADDINGTON CRUZ (Por videoconferência.) - Quarenta anos.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - ... quase quarenta anos. Olha, é muita segurança, muito apontamento.
E algo que a gente discute muito também é o custo-benefício, porque uma pessoa bem tratada é uma pessoa... É claro que tem o custo do medicamento, mas, se não for tratada, ela vai para o hospital, tem os problemas decorrentes da doença, precisa ser atendida, a família deixa de trabalhar, porque afeta a família toda também. Então, isso tudo também tem que ser levado em conta, mas parabéns pelo trabalho, pela pesquisa.
E quero dizer que a gente fica à disposição na Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação para que possamos também, sob sua orientação, articular iniciativas que vocês julguem relevantes que o Congresso Nacional aborde.
Agradecemos muito e queremos manter esse contato na sequência, porque uma audiência pública tem que apontar aspectos que têm que ser aprofundados depois, na sequência, também junto com o Executivo, o Legislativo, as famílias e os pesquisadores da área, como é o seu caso.
Parabéns pelo trabalho.
A SRA. MÁRCIA WADDINGTON CRUZ (Por videoconferência.) - Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Passo, em seguida, a palavra à Luciana Costa Xavier, que é Coordenadora-Geral de Avaliação de Tecnologias em Saúde, do Ministério da Saúde, representando também a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec).
Com a palavra, então, a Dra. Luciana Costa Xavier.
A SRA. LUCIANA COSTA XAVIER (Para expor. Por videoconferência.) - Olá. Bom dia, Senador Flávio Arns.
Na sua pessoa, eu queria cumprimentar os colegas que participam conosco aqui desta audiência pública, as pessoas que nos acompanham virtualmente.
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Como o senhor já apresentou, sou Luciana, servidora do Ministério da Saúde, atualmente Coordenadora-Geral de Avaliação de Tecnologias em Saúde, do Dgits (Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde), que também é responsável pela Secretaria-Executiva da Conitec.
Então, é um prazer poder participar e discutir com vocês. Fico muito feliz com a fala das pessoas que me antecederam. Eu acho que a gente consegue ter uma discussão - foram apresentações bem condizentes.
Eu trouxe uma rápida apresentação da Conitec, do que já foi feito até aqui. Eu vou tentar compartilhar e, se eu não conseguir, eu vou pedir ajuda para o pessoal aí da Secretaria, tá?
Só um instante, então, por favor. (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Se você precisar de ajuda, a Secretaria está à disposição também. Ah, sim!
A SRA. LUCIANA COSTA XAVIER (Por videoconferência.) - Eu acho que agora foi, não é?
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Acho que está dando certo. Só falta a tela cheia ainda.
A SRA. LUCIANA COSTA XAVIER (Por videoconferência.) - Então, só um minutinho. Vou voltar aqui para o início.
Para começar, eu acho que todos vocês já sabem, mas é sempre importante...
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Luciana, desculpe-me até estar interrompendo, mas a Secretaria pode orientar, só para aparecer... porque senão depois você não vai conseguir passar o...
A SRA. LUCIANA COSTA XAVIER (Por videoconferência.) - Os eslaides? Mas eu estou conseguindo aqui. Posso continuar, então?
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Passe um só para ver se consegue passar, senão a gente tem que colocar na tela cheia, porque não está na tela cheia.
A SRA. LUCIANA COSTA XAVIER (Por videoconferência.) - Ah, não está? Para mim está.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Não.
A SRA. LUCIANA COSTA XAVIER (Por videoconferência.) - Então, deixe-me interromper aqui e compartilhar mais uma vez.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - O Leomar, com a Secretaria, se houver qualquer problema, ele... (Pausa.)
A SRA. LUCIANA COSTA XAVIER (Por videoconferência.) - Está bem, vou fazer isso já então. (Pausa.)
Deu certo agora? Está em tela cheia para vocês? (Pausa.) Não?
Então, se vocês puderem pôr por aí, por favor... (Pausa.)
Isso, eu prefiro, já que aqui eu não estou conseguindo colocar na tela cheia.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Agora está perfeito.
Você só vai pedindo para o pessoal passar, quando for necessário, para o seguinte. Está bem?
A SRA. LUCIANA COSTA XAVIER (Por videoconferência.) - Está ótimo. Muito obrigada. Então, podemos começar?
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Desculpe aí a interrupção.
A SRA. LUCIANA COSTA XAVIER (Por videoconferência.) - Que isso!
Próximo eslaide, por favor.
Então, eu acho que muitos já conhecem, mas é sempre importante lembrar o que é a Conitec, quem é a Conitec. É um órgão colegiado permanente que integra a estrutura do Ministério da Saúde e tem por objetivo assessorar o Ministério da Saúde nas atribuições relativas à incorporação, à exclusão ou a alterações em tecnologias no SUS, bem como na constituição ou alteração de protocolos clínicos. Então, quero deixar claro que não é a Conitec que decide: a Conitec recomenda ao Ministério da Saúde, e o Ministério da Saúde é quem toma a decisão.
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Próximo eslaide, por favor.
A Conitec, como funciona hoje, não foi sempre assim. Então, esse processo de usar avaliação de tecnologias em saúde começou lá em 2006, mas a Conitec, como funciona hoje, esse processo foi instituído em 2011, por meio de uma lei, de um decreto, que também foram aprimorados até se chegar à constituição que a gente tem hoje, às regras de funcionamento e como que a gente trabalha.
Próximo eslaide, por favor.
Quais foram as mudanças advindas da criação da Conitec? Temos prazos a serem cumpridos, o prazo para avaliação é de 180 dias, podendo ser prorrogado por mais 90. A Conitec não avalia o uso de procedimentos experimentais. Todos os temas submetidos à avaliação da Conitec são disponibilizados para consulta pública. E temos também que a incorporação, as avaliações, a recomendação são baseadas em evidências de eficácia e segurança e também em estudos de avaliação econômica, principalmente o estudo de custo-efetividade.
O próximo, por favor.
E quais são as competências da Conitec? Emitir relatórios com recomendações sobre incorporação, exclusão ou alteração de tecnologias no SUS, bem como a constituição ou a alteração de protocolos; e propor também a atualização da Rename (relação nacional de medicamentos essenciais). Então, como eu disse, a Conitec emite relatório, recomenda, e é o Ministério da Saúde quem decide.
E como é que a Conitec está organizada hoje? De acordo com o último decreto, nós temos três comitês. Temos um Comitê de Medicamentos, que discute questões relacionadas a medicamentos; um Comitê de Produtos e Procedimentos, que discute exames, equipamentos, uma série de questões que não são relacionadas a medicamentos; e temos também um Comitê de Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas, que discute os protocolos que o Ministério da Saúde está elaborando, que também vão para consulta pública e passam por discussão com esse grupo de membros.
E aí, temos a Secretaria-Executiva da Conitec, que é realizada, que é exercida pelo Dgits, que é o departamento no qual eu trabalho e que integra a estrutura do Ministério da Saúde, ficando sob responsabilidade da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico-Industrial da Saúde.
Próximo, por favor.
Quem compõe a Conitec? Hoje são 15 membros. Então, a gente tem representantes das secretarias do Ministério da Saúde, da Agência Nacional de Saúde Suplementar, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Conselho Nacional de Saúde, dos Conselhos de Secretários estaduais e municipais de Saúde, do Conselho Federal de Medicina, da Associação Médica Brasileira e também um representante do Núcleo de Avaliação de Tecnologias. Então esses 15 membros, em conjunto, se reúnem mensalmente - hoje mesmo, a gente está tendo reunião da Conitec - para discutir os pedidos de avaliação que chegam até a comissão.
Lembrando sempre que a Conitec precisa ser demandada. Então qualquer pessoa, associação, instituição pode demandar a Conitec. A gente precisa receber esse pedido para fazer esse processo de avaliação de tecnologias. E como eu disse, lá quando eu falei das questões legais, a gente tem um prazo. Então, a partir do momento em que a Conitec recebe um pedido, ela tem 180 dias para fazer essa avaliação; pode ser prorrogado por mais 90. A Conitec emite uma recomendação, e o Ministério da Saúde decide. Essa decisão é publicada no Diário Oficial da União, então tem lá a portaria incorporando ou não incorporando. E depois as áreas técnicas têm um prazo de 180 dias para disponibilizar o que foi incorporado no SUS, então para comprar medicamento, para fazer pactuação, para organizar a rede assistencial.
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O próximo eslaide, por favor.
E aí, qual é a ferramenta, o cerne do trabalho da Conitec? É um processo chamado ATS, que é um processo de avaliação de tecnologias em saúde, "é um processo multidisciplinar que usa métodos explícitos para determinar o valor de uma [determinada] tecnologia". Só lembrando que isso não acontece só no Brasil, vários sistemas de saúde públicos, como o Sistema Único de Saúde, principalmente em países como Canadá, Inglaterra, Austrália, utilizam essa metodologia. E o objetivo, então, dessa metodologia é trazer informações para tomada de decisão e promover principalmente a equidade, a eficiência e a qualidade do Sistema Único de Saúde. Então a ATS é a nossa ferramenta de trabalho.
Para todo processo, todo pedido de avaliação que chega à Conitec, é elaborado um relatório de recomendação, que tem uma série de informações em relação à doença, à tecnologia, quais são as evidências, questões relacionadas à avaliação econômica, de impacto orçamentário, perspectiva do paciente - a gente sempre tem, nas reuniões da Conitec, os pacientes que são convidados para falar -, como é que está a experiência internacional em relação ao uso daquela tecnologia, se tem novas tecnologias para chegarem ao mercado, quais são as contribuições que foram recebidas durante a consulta pública. Então é um documento muito técnico, muito robusto, que tem todas essas informações, que são trabalhadas durante o processo de avaliação pela Conitec.
Próximo, por favor.
E aí, quais são os parâmetros que são levados em consideração para a tomada de decisão? A gente tem aspectos clínicos relacionados àquela tecnologia, em relação à eficácia, à segurança, à efetividade. Aspectos relacionados ao paciente também são levados em consideração, como fatores éticos, qual é a aceitabilidade, talvez se o paciente prefere uma tecnologia em relação a outra, por questões de posologia ou de conveniência. Temos também alguns aspectos organizacionais, de como o sistema público de saúde brasileiro está organizado, quais são as questões relacionadas à difusão da tecnologia, aceitabilidade, logística, se precisa de rede de frio ou não, se os centros de saúde ou as unidades estão preparadas para receber aquele paciente, para fazer diagnóstico, se precisa de uma outra tecnologia - porque, muitas vezes, não adianta só ter o medicamento, se a gente tem dificuldade de exame ou de outros procedimentos para diagnóstico.
E também são levados em consideração os aspectos econômicos, de impacto orçamentário, qual é o recurso que o SUS, que o Ministério da Saúde vai precisar para prover aquela tecnologia. São levados em conta também fatores de custo-oportunidade, de custo-efetividade: aquela nova tecnologia, em relação ao que o ministério, o SUS já oferece, o que ela vai fornecer a mais e por quanto? Então atualmente a gente já tem um limiar de custo-efetividade estabelecido, em que pese a gente não ter um limiar estabelecido para doenças raras ou ultrarraras. Tem uma flexibilização aí desse limiar como um parâmetro que também é levado em consideração.
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Então esse aqui é só um resgate. Eu sei que estou conversando aqui com pessoas que entendem bem desse processo, do que a Conitec faz, mas eu acho que é importante resgatar que não é apenas um critério, são vários aspectos que são levados em consideração para a recomendação da Conitec.
Próximo, por favor.
Em relação a esse grupo de condições clínicas relacionadas à transtirretina, a Conitec já trabalhou muito disso. Então a gente teve um pedido de avaliação em 2018, quando foi a incorporação do tafamidis meglumina para PAF. Tivemos um outro pedido em 2022, que foi o tafamidis meglumina para cardiopatia, e aí não foi incorporado. Em 2023, tivemos dois pedidos de incorporação, do inotersena e da patisirana, e não foram recomendados. Em 2024, tivemos, de novo, dois pedidos de avaliação de inotersena, agora para um grupo menor, para uma população menor; também não foi recomendada a incorporação. E tivemos também um pedido de avaliação do tafamidis para pacientes com cardiopatia; nesse caso, foi recomendada a incorporação. E, este ano, também tivemos a avaliação do pedido de incorporação de vutrisirana, e também não foi recomendado.
Eu acho que as pessoas que me antecederam já falaram desses processos. Então a Conitec já avaliou, as empresas já demandaram, e o que a gente teve incorporado foi só a incorporação do tafamidis meglumina e do tafamidis 61mg.
Na sequência...
Próximo, por favor.
... eu tenho um histórico um pouco mais detalhado em relação a essas incorporações, quem pediu, quem foram os demandantes. Em todas as vezes, os demandantes foram os próprios detentores do registro, os laboratórios fabricantes. E aí, o que é que a gente tem? Como eu disse, em 2018, foi incorporado o tafamidis para amiloidose associada à transtirretina em pacientes adultos com polineuropatia. E houve a recomendação, condicionada a uma negociação de preço e PCDT. Então esse PCDT foi publicado já, e esses pacientes estão tendo acesso, a Dra. Márcia já falou, o paciente, a associação de pacientes. Então a gente já tem os pacientes usando o tafamidis.
Na sequência...
Próximo, por favor.
... a gente teve o pedido de incorporação do tafamidis para os pacientes com cardiomiopatia. E aí não foi recomendado. Por quê? Já foi até comentado aqui, os membros concordaram que tem uma demanda para uma condição clínica rara, tem boa evidência, mas tinha uma razão de custo-efetividade e o impacto orçamentário alto, e algumas incertezas relacionadas à população elegível. Isso lá em 2022.
Na sequência...
Próximo, por favor.
... então, em 2023, foi avaliada a incorporação de inotersena e da patisirana. Além desse rito normal, que é a avaliação da Conitec, esses dois pedidos de avaliação foram submetidos a uma audiência pública. A legislação permite, então as empresas votaram, discutiram isso um pouco mais, compararam, houve uma comparação de um com o outro. A patisirana apresentava alguns resultados melhores em alguns aspectos. E finalmente, na sequência, não recomendou a incorporação desses medicamentos, em relação ao impacto orçamentário elevado, que prejudicaria a sustentabilidade do Sistema Único de Saúde.
Próximo, por favor.
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E aí...
Desculpe-me, pode voltar: é 2024.
Na sequência, pessoal...
Aí, obrigada.
Na sequência, a gente teve um outro pedido do inotersena, de novo, para um grupo de pacientes menor, em que talvez seria um impacto orçamentário menor, mas o plenário viu algumas incertezas em relação aos estudos para esse subgrupo, e também, de novo, um valor de custo-efetividade incompatível com o limiar que a gente tem estabelecido.
E aí, também em 2024, teve mais uma vez a decisão de incorporar o tafamidis, e, dessa vez, para pacientes com cardiomiopatia.
Na sequência, o próximo, por favor.
E a última avaliação que a gente teve foi da vutrisirana, que foi para pacientes diagnosticados com amiloidose em estágio 2, e em que não foi recomendada a incorporação. A gente... Como eu trago aqui, em um trecho do relatório: "Mesmo após ampla discussão e entendendo a necessidade médica, a eficácia do [...] [tratamento] e os esforços da empresa com o desconto apresentado [foi apresentado um desconto pela empresa, mas, ainda assim], [...] os resultados apresentados [...] [na] avaliação econômica tornam a tecnologia não sustentável para o SUS".
O próximo, por favor.
O que a gente tem hoje? Então, a gente tem um PCDT das amiloidoses associadas à transtirretina, e ele prevê o tratamento com tafamidis - ou meglumina ou 61mg -, transplante hepático, apoio psicológico e social e aconselhamento genético.
Então, em que pese todo esse esforço da Conitec de avaliação de todos esses medicamentos, o que foi percebido? Tem evidências, mas a gente tem ainda um impacto orçamentário muito alto, considerando o limiar que a gente tem estabelecido, considerando a preocupação com a sustentabilidade do SUS.
Então, o que a gente pode deixar aqui de sugestão de encaminhamento ou para reflexão? A gente viu uma tentativa da empresa em conceder um desconto para a compra, mas esse desconto ainda é insuficiente para os padrões que o SUS, com o Ministério da Saúde, precisariam para tornar essa tecnologia custo-efetiva.
Então, a gente precisaria, talvez, de uma mobilização maior junto à empresa, em relação à oferta de um desconto maior, capaz de viabilizar a incorporação dessas tecnologias para o tratamento dessas condições clínicas.
E, também, a gente percebe uma necessidade de aumentar o orçamento do Ministério da Saúde, para que essas e outras tecnologias possam ser viabilizadas, porque, com o que a gente tem hoje, não é possível. Como eu disse, a gente já viu que tem eficácia, que a evidência é boa, mas a questão que prejudica, que dificulta essa recomendação, são esses aspectos orçamentários e financeiros em relação a essas tecnologias. Tá bom?
Então era isso o que eu trouxe aqui, para apresentar para os senhores, e fico à disposição para contribuir com essa discussão, tirar alguma dúvida.
Muito obrigada pela oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Agradeço a participação inicial da - de você, permita-me chamá-la de você, com todo o respeito - Luciana Costa Xavier, que é Coordenadora-Geral de Avaliação de Tecnologias em Saúde do Ministério da Saúde, representando, nesta audiência pública, a Conitec também, que é a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do Sistema Único de Saúde.
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Obrigado pela apresentação.
Passamos em seguida a palavra ao Defensor Público do Distrito Federal.
Até eu quero explicar, Dr. Ramiro, que a gente começou com o paciente; fomos para a associação nacional que se organiza para defender os direitos, necessidades dessas pessoas e famílias; fomos depois para a parte científica - vamos dizer -, com a Dra. Márcia, que já, há quase 40 anos, se dedica com muita competência a essa área; passamos ao Ministério da Saúde; e, agora - vamos dizer -, é a Defensoria Pública, que pensa nesses aspectos todos do ponto de vista dos direitos, da cidadania, do apoio às famílias e aos pacientes.
E quero externar, inclusive, o meu respeito absoluto à instituição Defensoria Pública. Parabéns para todos os defensores públicos do Brasil. Precisaríamos ter muito mais defensores e defensoras, porque é o acesso da população, do povo organizado, à Justiça.
Então, seja muito bem-vindo, Dr. Ramiro.
O SR. RAMIRO NÓBREGA SANT’ANA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia ao senhor
Estão ouvindo bem?
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Estamos ouvindo. Um pouquinho baixinho - é que a gente já tem um problema de audição junto, então...
O SR. RAMIRO NÓBREGA SANT’ANA (Por videoconferência.) - Vou tentar falar mais alto aqui.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Agora está bom.
O SR. RAMIRO NÓBREGA SANT’ANA (Por videoconferência.) - É que eu tinha... Não sei por que não está querendo funcionar. Estou usando o áudio do computador.
Felizmente a obra que estava acontecendo aqui ao lado de casa parou agora, para a gente poder conversar.
Senador, eu agradeço muito o convite à sua pessoa, e agradeço muito pelo que aqui já aprendi, principalmente com o Jorge, ouvindo o depoimento dele e o de cada um de vocês na sua luta: a associativa, a luta na clínica e a luta na organização do SUS, porque a Dra. Luciana, aqui, muito bem expôs os desafios que a Conitec tem na avaliação e incorporação dos medicamentos.
Eu vou tentar trazer um outro viés, um outro aspecto, que é multifacetado, que é o do sistema de justiça. E aí foi mencionado algumas vezes, e, normalmente, com uma sensação - tanto pela Presidente da associação quanto pelo Jorge -: "Olha, é quase um mal necessário. Gostaria muito de ir até o meu médico, minha médica, ter a prescrição e ir até uma farmácia do SUS e buscar o medicamento", mas isso não tem acontecido para as pessoas com amiloidose e não tem acontecido para várias pessoas, principalmente para as pessoas com doenças raras, e aí o acesso ao sistema de justiça é a alternativa.
É uma alternativa que é custosa, e eu percebo isso. Eu sou defensor público desde o chão de fábrica. Atendo desde 2011 pessoas, todos os dias, para esse tipo de atendimento - atendi milhares e milhares de pessoas. Sou estudioso da área, fiz mestrado e doutorado sobre esse assunto da judicialização da saúde e faço um acompanhamento institucional em fóruns muito privilegiados, como no Senado, como no Conselho Nacional de Justiça - sou membro do Fórum Nacional do Conselho Nacional de Justiça.
Então, eu tenho observado - desde a motivação das pessoas até a movimentação das instituições - como o sistema de justiça tem se integrado com a administração do SUS, com os movimentos sociais e com a própria organização do sistema de saúde, para tentar, ali, ser um auxiliar na oferta dos tratamentos.
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O sistema de justiça evoluiu muito nesses últimos tempos, e nós tivemos um grande marco, que é o Tema 1.234 e o Tema 6. As associações inclusive me indicaram ao senhor, e o senhor, gentilmente, me convidou para que eu trouxesse essa visão.
Desde o início, é claro que o ideal é que as políticas públicas sejam ofertadas administrativamente e as pessoas tenham um acesso mais rápido, porque, de fato, o acesso via Judiciário é demorado, lento e tem um desgaste para as pessoas. Nós enfrentamos problemas de acesso à Justiça, mas felizmente a defensoria tem lidado muito bem com esse tipo de problema.
Mas todos esses aspectos que nós indicamos aqui como sendo problemas da judicialização se exacerbaram a partir de 2024, com a adesão do Supremo Tribunal Federal, que aqui, para resumir, quero registrar que é uma decisão desfavorável aos pacientes - muito desfavorável - e tomada de uma forma que merece críticas.
E, com isso, eu peço licença ao senhor para compartilhar uma apresentação, porque talvez ela possa ser útil.
Os senhores conseguem ver?
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Sim, está perfeito.
O SR. RAMIRO NÓBREGA SANT’ANA (Por videoconferência.) - Muito bem.
Tem um detalhe para a gente entender o que aconteceu, Senador, no Supremo Tribunal Federal, no final do ano passado: é a gente compreender que a judicialização da saúde não é uma coisa nova; ela está aí desde 2003... Eu atuo com judicialização desde 2003, 2004. Quando eu ainda era estudante de Direito eu já pesquisava a área, então, eu tenho uns 20 anos de pesquisa na área - um pouquinho mais - e uma atuação de 14 anos como defensor público.
A jurisprudência, que é a decisão e o posicionamento dos tribunais, evoluiu muito nesses 20 anos, mas ela tem como marco principal, em 2009, uma audiência pública no Supremo Tribunal Federal. Essa audiência pública foi muito importante, porque foi a primeira vez que todos os atores se sentaram em uma audiência, com todo mundo observando, e trouxeram seus pontos de vista. E uma das conclusões daquele momento, no que tange às pessoas com doenças raras, é que não existia uma política para doenças raras. Tanto é que a Política Nacional de Doenças Raras surge em 2014, cinco anos depois dessa audiência, embora a necessidade já estivesse aí há muito tempo.
E não existia a Conitec. Essa instituição, da qual hoje a Dra. Luciana muito bem expõe a estrutura, não existia. Então, um dos problemas que foi apontado naquele momento foi a falta de uma instituição para isso, e, a partir daquelas iniciativas ali tomadas no Supremo, acelerou-se a criação da Conitec, que foi criada em 2011, dois anos depois. Então, o interessante é que a judicialização da saúde é uma mola propulsora da organização da incorporação de tecnologia no sistema. A Lei 12.401, que cria a Conitec e organiza a incorporação de tecnologia no sistema de saúde, é fruto da judicialização também. E não só nesse momento aconteceu, outros aconteceram depois.
Em 2018, a gente tem uma primeira grande decisão de um tribunal brasileiro que é obrigatória a ser seguida pelos juízes, chamada de repercussão geral. Essa decisão é a decisão chamada de Tema 106, do STJ, em 2018. Depois, nós temos o Tema 500, do STF, que tem a ver com medicamentos não registrados na Anvisa, o Tema 793, que tem a ver com a repartição do custeio desses medicamentos que são comprados e, mais recentemente, em 2024, essa decisão do Supremo.
Eu quero mostrar para os senhores que tudo o que hoje o Supremo discutiu já tem um histórico de 15 anos de decisões que iam num sentido e, dessa vez, o Supremo mudou sensivelmente a sua posição.
A ideia de que o produto tem que ter registro na Anvisa, a ideia de que eu tenho que ter os protocolos do SUS como a principal alternativa, de que eu tenho que justificar por que eu estou pedindo um tratamento que não está no protocolo - por exemplo, uma falha terapêutica, que são vedados os tratamentos experimentais -, tudo isso já estava sedimentado no entendimento dos tribunais desde 2009.
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Foi isso que o Supremo decidiu em 2009, e o STJ decidiu, quase dez anos depois, algo muito semelhante, dizendo: "Olha, paciente, você quer um medicamento que o SUS não incorporou? Você tem que me dar boas razões para isso. Tem que provar que esse medicamento é necessário para o seu tratamento, que você usou as alternativas do SUS, que elas não funcionaram e que o medicamento que você está pedindo tem uma evidência científica de que funciona". Era isso que era solicitado, e me parece muito razoável.
E assim evoluiu a jurisprudência, inclusive em relação a medicamentos sem registro na Anvisa. Eu não vou me ater aqui muito ao detalhe, porque a gente tem um tempo que tem que ser bem utilizado. Mas, em 2020, o Supremo entra numa discussão sobre quem paga a conta, sobre como fica a repartição das competências, a repartição do custeio. E o Supremo tomou uma decisão que não foi muito bem compreendida, uma decisão que não foi muito clara, e cada tribunal brasileiro seguiu por um caminho.
Nesse meio tempo, em 2024, em nova decisão dos Temas 6 e 1.234, a judicialização da saúde continuou aumentando de forma muito consistente, com 685 mil ações ajuizadas no ano de 2023 e 663 mil no ano de 2024, um aumento aí de 20%, 30% de ações para cada ano. E restou uma questão, além do aumento das judicializações em si, em relação a como a gente faz com os municípios e, principalmente, com os pequenos estados brasileiros.
Tem município e tem estado que estão respondendo por ações judiciais de medicamentos de milhões de reais e isso está inviabilizando alguns municípios e, eventualmente, alguns estados. Essa é uma reportagem da Folha, de 2024, alguns meses antes do julgamento do Supremo, por isso que eu a estou usando como exemplo. E aí o Supremo se sentou para se debruçar sobre essa questão aqui: "Quem é o ente responsável pelo pagamento?".
Essa resposta deveria ser dada no âmbito do Tema 1.234 - quem é o responsável pelo pagamento? Mas tinha um outro tema em julgamento no Supremo, que era o Tema 6, que perguntava: "Quais são os critérios constitucionais para que uma pessoa tenha acesso a um medicamento que não está incorporado?".
O Supremo, então, tinha essa discussão aqui para fazer: "Quando uma ação vai para a Justiça Federal, em que é a União que vai pagar, e quando ela pode ficar na Justiça estadual, em que quem vai pagar é o Estado?". Ele decide fazer uma coisa diferente; ele decide fazer uma Comissão. Esta Comissão se reúne e começa a definir vários assuntos. Só que ela era uma Comissão para definir competência, quem era competente. E ela entra em cinco questões: sobre competência, sobre definição do que são medicamentos não incorporados - que era importante -, segundo a plataforma nacional... E entra em duas que não tinham muito a ver com isso. Uma delas tinha a ver com custeio, mas não só sobre quem pagava a conta; começou-se a definir regras para como fazer sequestro de verba pública. Isso é muito importante, porque tem tudo a ver com a dificuldade que o Jorge disse aqui para gente. E essa aqui: diretrizes estritas ao controle jurisdicional. Ele entrou numa seara para dizer quais são os requisitos que um juiz deve avaliar para que uma pessoa possa ter acesso a um medicamento que o SUS não incorporou.
Esses dois medicamentos que a gente está discutindo aqui, por exemplo, a inotersena e o vutrisirana - difícil falar esses nomes. Se alguém não concordar com o que a Conitec fez e pedir, e tiver boas justificativas... Quais são os requisitos para isso? Só que isso não era objeto desse julgamento. E porque não era, porque o objeto do julgamento era só a repartição de competência, o Supremo Tribunal Federal fez o quê? Ele montou uma Comissão paritária entre membros da União e dos estados e municípios.
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Veja bem: metade membros da União, metade estados e municípios. Por que não um terço de cada um? Porque o que estava em embate era a visão do Ministério da Saúde versus a visão das secretarias estaduais e municipais. Para que houvesse um equilíbrio, foi metade de um lado, metade do outro. A União ficou com o dobro de membros dos outros entes, porque os outros entes estavam em bloco, juntos.
Então, a solução foi uma Comissão paritária equilibrada. Isso se mostrou na votação final, em que eu estava presente - eu fui o representante das defensorias públicas brasileiras lá, para observar, não para votar, só para observar - e a votação final foi de dez a dez.
Aqui eu trouxe um eslaide para mostrar as definições, mas eu vou avançar um pouco mais e dizer o seguinte.
Em relação ao que deveria ter sido definido, sobre quem é competente, o Supremo homologou uma decisão e considerou que o medicamento não incorporado é não só aquele medicamento que não está na lista, mas também o medicamento que está na lista para uma doença e você o está pedindo para outra, ou você o está pedindo fora do protocolo clínico que uma das subcomissões da Conitec escolhe. Isso é o medicamento não incorporado. Não é só o que não está na lista. É o que está na lista, mas eu não consigo acessar, porque não atende ao protocolo. É uma visão ampla do que é um medicamento não incorporado.
Então, ele não fez essa diferença, o que é muito importante. Eu não vou descer ao que é essa importância não, mas eu vou trazer qual foi a decisão principal do Supremo em relação à competência. Ele tomou uma decisão clara: se o custo do medicamento é acima de 210 salários mínimos, o que hoje dão R$318 mil, essa ação tem que ir para a Justiça Federal. E o Supremo deu critérios claros de como se calcular isso. Se o custo for abaixo de R$318 mil, o tratamento anual, isso vai para a Justiça estadual. E tem lá um mecanismo em que a União auxilia os estados e municípios que forem condenados, principalmente os estados, a pagarem esse valor. Tem um apoio, um custeio da União.
Alcançou-se uma decisão muito boa, muito clara para o sistema de justiça e justa entre os membros ali que representavam os três entes da Federação, a União, os estados e os municípios, os três níveis da Federação, porque tinha uma composição paritária que fez um bom acordo sobre isso. E a gente tem visto funcionar muito bem essa questão da competência. Inclusive, para ter muito cuidado, o Supremo Tribunal Federal falou o seguinte: "Olha, do que ficou para trás, mantém-se onde está o processo, para não ter uma dança de processo, uma migração. Vai valer daqui para frente". Ótimo.
Só que o que aconteceu? O Supremo Tribunal Federal foi além. Ele definiu também os critérios para acesso a medicamentos. E, ao fazer isso, tomou essa definição, aplicando-a aos tratamentos, na verdade, aos tratamentos judicializados, às ações já em curso. E o que aconteceu? Trouxe requisitos muito mais rigorosos e isso, inclusive, causou a revisão de vários processos e a interrupção de tratamentos em curso.
Eu vou explicar o que é esse aumento do rigor, de que eu estou falando.
A Defensoria - eu botei aqui embaixo - tentou mudar isso aqui e não conseguiu. E aí eu estou dizendo aqui: "O Tema 1.234 além dos seus limites", com o Supremo Tribunal julgando algo que não estava no processo. E aí isso criou um grande problema, porque, quando o assunto era divisão de custeio, a gente tinha uma composição paritária, mas, quando eles começaram a discutir quais eram os critérios para os pacientes acessarem os medicamentos, a composição era absolutamente parcial, ilegítima e não paritária. Por quê? Dos 24 membros, apenas uma pessoa era do controle social, uma pessoa era paciente - de nome Priscila -, e os outros 23 eram, de alguma forma, representantes da gestão federal, estadual ou municipal, procuradores de Estado. Então, nós tínhamos ali uma discussão de quais eram os requisitos para que uma pessoa, um paciente tivesse direito de acesso a um medicamento, vamos dizer assim, contra a avaliação que foi feita pelo SUS, e só tinha representante do SUS! É como se a gente fosse discutir aqui superendividamento bancário e o Senado montasse uma comissão com 23 banqueiros e um representante dos consumidores, dos correntistas. Foi isso que o Supremo fez. Aí, o procedimento se tornou bem injusto, e o resultado acabou sendo injusto, e em que sentido? Injusto no sentido de que aumentou muito o rigor para acesso a esses medicamentos que não estão incorporados pela Conitec e, portanto, não incorporados ao SUS.
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Mas, além disso, o Supremo Tribunal Federal definiu que, quando for feito um sequestro de verba pública para a compra de um medicamento - e acontece muito! O Jorge deixou isso muito claro, a Presidente da associação deixou muito claro que muitas vezes vem a ordem judicial e não é cumprida. O Jorge falou: "Demorei oito meses para receber". Por quê? Porque muitas vezes vem a ordem judicial contra o estado, contra a União, contra o Estado da Bahia, contra o Estado do Rio, contra a União; enfim, se isso não era cumprido, a gente tinha o caminho do sequestro de verba pública. Mas o Supremo Tribunal Federal destacou alguns requisitos e fixou um preço máximo, que é o preço máximo de venda ao Governo.
O preço máximo de venda ao Governo é um preço de atacado; o Governo compra em atacado. Daí, começou-se a exigir que os pacientes conseguissem orçamentos de um preço de atacado numa situação de varejo. Com isso, vários tratamentos que já tinha dificuldade para se iniciar começaram a ser interrompidos ou a demorar mais ainda para se iniciar, porque as pessoas começaram a ter muita dificuldade de conseguir orçamentos a preço de atacado numa compra de varejo. Inclusive, o Supremo Tribunal falou que o Judiciário, que cada juiz deveria, vamos dizer assim, "dar seu jeito", tomar as atitudes para que essas empresas, essas indústrias fornecessem isso, fornecessem o orçamento a um preço adequado, mas não é o que nós estamos vendo nos processos. Nós estamos vendo... Eu tenho aqui vários processos que eu estou acompanhando - recebo 30, 40 por dia - de pessoas que não estão conseguindo esse orçamento. Sofrimento e interrupção dos tratamentos tem sido a consequência.
Vou trazer para o senhor quais foram os quatro pontos que as defensorias levaram ao Supremo Tribunal Federal para que ele revisse a sua decisão, e ele não reviu. O primeiro foi em relação a esse uso do preço máximo de venda ao Governo, que é um preço de atacado. A gente pediu que fosse usado o preço máximo ao consumidor, que é um preço de varejo. Isso não foi acatado. O outro é considerar que a pessoa, para conseguir ter acesso ao medicamento que a Conitec rejeitou - que é o caso desses dois medicamentos que a gente está discutindo aqui -, teria que provar uma ilegalidade do ato de incorporação da Conitec; além disso, a pessoa teria que provar uma alta qualidade na evidência científica, o que é muito difícil para os raros. E o quarto ponto que as defensorias trouxeram foi a aplicação imediata desse entendimento.
Então, as pessoas entraram com ações, muitas vezes oito, seis, quatro anos atrás, sob um paradigma do que era necessário provar, e agora veio uma mudança das regras do jogo enquanto o jogo acontecia.
Bom, vou trazer rapidamente para os senhores quais são esses requisitos, para entender como isso tem prejudicado...
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Se pudesse, Dr. Ramiro, ir para a conclusão, em função do tempo...
O SR. RAMIRO NÓBREGA SANT’ANA (Por videoconferência.) - Perfeito.
A conclusão, Excelência, é que o procedimento que foi tomado no Supremo Tribunal Federal acabou sendo injusto e não democrático. Por quê? Porque ele não trouxe os pacientes para a discussão, e, com isso, duas coisas muito complicadas aconteceram para os pacientes de doenças raras.
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A primeira delas é que, agora, as pessoas com doenças raras, caso o medicamento não tenha sido incorporado pela Conitec, têm que provar uma ilegalidade do ato da Conitec. A pergunta é: como se prova a ilegalidade de um ato de uma instituição instituída que pode não incorporar por razões técnicas e por razões políticas? Ela pode não incorporar porque entende que o medicamento é muito caro. Como é que eu provo que isso é ilegal? E o que é provar uma ilegalidade? É ilegal para a situação da pessoa? A gente ficou num âmbito de incerteza, insegurança jurídica, e vários pacientes agora estão tendo o seu tratamento indeferido, única e exclusivamente na avaliação da Conitec de custo-efetividade - isso, de uma decisão tomada sem participação dos pacientes, numa comissão formada praticamente apenas por gestores.
A segunda questão é que foi exigido que se prove a eficácia do medicamento com medicina baseada em evidências de alta qualidade, e isso apenas com estudos randomizados e estudos de revisão sistemática de duplo-cego. São tipos de estudo - Senador Flávio, eu não tenho tempo aqui de tecer em detalhes - que exigem determinados protocolos de pesquisa que pessoas com doenças raras não conseguem cumprir. Não há um número de pacientes existente no contexto brasileiro para fazer essas pesquisas, em muitos desses casos, então, por vezes, é impossível para pessoas com doenças raras e também para tratamentos pediátricos fazer o tipo de pesquisa que dá o alto nível de evidência científica que o Supremo agora exige para que se solicite.
Esses entendimentos, esses dois requisitos rigorosos foram aplicados a todos os processos em curso, e isso não é exigido, por exemplo, de planos de saúde, o que traz uma assimetria do tratamento entre pacientes do SUS e pacientes de planos de saúde. Os requisitos para superar o rol da ANS são muito menos exigentes! Isso trouxe uma desigualdade injusta no acesso a tratamentos, e isso compromete a própria ideia de trazer ao SUS igualdade no acesso à saúde, que era a própria intenção dessa decisão do Supremo Tribunal Federal.
Então, nós tivemos uma situação em que o Supremo forma uma comissão, define a sua composição, exclui os usuários, homologa um acordo, cria uma súmula, e isso passa a ser aplicado a todos os juízes e juízas, que têm que seguir isso, e a toda a administração pública. Isso, Excelência, tem o efeito de uma lei. Isso...
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Agora... É só porque eu estou preocupado com o tempo, Dr. Ramiro.
O SR. RAMIRO NÓBREGA SANT’ANA (Por videoconferência.) - Ah, sim. Eu encerrei, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - É porque a gente deu para todo mundo 15 minutos.
O SR. RAMIRO NÓBREGA SANT’ANA (Por videoconferência.) - Perfeito.
Senador, então eu encerro dizendo que essas decisões tiveram o efeito de uma lei, uma lei que traz um problema, e aí eu encerro para colocar que, hoje, para qualquer população de doenças raras, ter a sua exigência de acesso a algum medicamento avaliado pela Conitec é um momento de apreensão e receio. Por quê? Porque se a Conitec avaliar e incorporar, ótimo, isso foi incorporado; se a Conitec incorporar e rejeitar, isso vai trazer um obstáculo quase intransponível para que eles tenham acesso a esses medicamentos pela Justiça. Tudo isso foi feito numa decisão que, infelizmente, não contou com a participação dos usuários.
Obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Eu agradeço ao Sr. Dr. Ramiro, que é Defensor Público do Distrito Federal. Eu até lamento não olhar com mais tempo nesta audiência pública, mas todo o material ficará disponível na página da Comissão de Ciência e Tecnologia para consulta de todas as pessoas que nos acompanham pelo Brasil.
Eu já queria até convidá-lo para nós detalharmos com mais profundidade os argumentos trazidos, com a participação da Consultoria do Senado, para ver o que pode ser feito dentro do Congresso Nacional a partir da sua apresentação e já fazermos uma reunião de trabalho nesse sentido. Então, se o senhor concordar, se V. Exa. concordar, a gente faz isso na sequência, também, porque é um material muito bom, e lamento, inclusive, que a gente não possa ter o tempo nesta audiência.
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Muito bem. O nosso tempo já está, assim, chegando ao seu limite.
Eu vou passar de novo a palavra aos expositores para, em dois minutos, fazerem alguma consideração que achem importante.
Eu gostaria só que houvesse um comentário também, da parte da Dra. Márcia - porque alguns medicamentos não foram incorporados: a vutrisirana, a inotersena e o tafamidis -: qual é a consequência disso para os pacientes? O processo de negociação tem que sempre continuar. Eu cito, por exemplo, a atrofia muscular espinhal, para a qual, no processo de negociação, passando o tempo, chegou a um quinto do valor original; era bem alto e passou a um quinto. E qual é a prevalência dos casos na população em geral? Isso é importante.
Também para a Doutora... Para a Doutora...
Poxa vida, eu estou aqui com um problema.
... Para a Dra. Luciana, que é do Ministério da Saúde, representando a Conitec... Inclusive, nesta audiência, só na composição não constou lá o que foi colocado na Lei 15.120, de 7 de abril de 2025, que haverá um "assento destinado ao representante [...] da sociedade civil de caráter nacional [...] [e] de ocupação rotativa [...] preenchido pela entidade cuja representatividade seja afeta à condição de saúde analisada". Então, haverá mais um lugar para a sociedade civil na composição, de acordo com essa lei, de abril de 2025. Isso é muito importante, porque dá voz à área, dentro das reuniões da Conitec.
Mas passo a palavra... Porque também o Jorge mencionou uma coisa que eu considerei muito importante, que é essa falta de certeza de que o medicamento estará disponível, os autorizados. Como é que isso está acontecendo também?
Passo então a palavra, de maneira mais rápida, para o Jorge Luiz Neves, agradecendo a participação, aposentado e paciente com também a situação de amiloidose hereditária.
Com a palavra, Jorge. (Pausa.)
Está presente aí?
O SR. JORGE LUIZ NEVES (Para expor. Por videoconferência.) - Estou sim.
Bom dia.
É porque...
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Ah, sim. Desculpe-me.
Pois não.
O SR. JORGE LUIZ NEVES (Por videoconferência.) - Essa falta de medicamento, como eu comentei, já ocorreu comigo. Eu tomo um medicamento, a patisirana, já há três anos; quatro anos, para falar a verdade. E, todo início de ano, existe a falta do medicamento. Então, o que é que acontece? A gente tem que estar com o advogado bem atento para alertar a juíza, no caso a que atende o meu caso, para que ela force o Ministério da Saúde, aí faz aquele bloqueio de verba, no valor do medicamento. A gente tem que estar buscando proposta do laboratório e isso tudo leva uns três meses, mais ou menos; foram os períodos em que eu fiquei sem medicamento, em 2023, 2024, e agora em 2025 também.
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Então, essa falha de fornecimento do medicamento é uma falha, vamos dizer assim, do sistema de compra do Ministério da Saúde, acredito eu, que não dá andamento numa sequência ideal para se ter o medicamento em estoque, já que tem alguns pacientes já com esse tratamento, entendeu? Então, essa falha acontece.
Aí, o advogado, como é que eu vou dizer, tem que tomar ciência, a gente dá ciência ao advogado e ele começa a buscar de novo o fornecimento, a complementação do fornecimento.
Eu passei o início deste ano sem medicamento - janeiro, fevereiro e março - e agora eu tenho medicamento até novembro, mas quando chega agora em setembro eu já começo a alertar a juíza para o fornecimento, para a segunda dose do início de novembro.
Agora teve uma outra surpresa para a gente, que é uma segunda decisão do STF, que foi divulgada na sexta-feira, se eu não me engano. Dia 28, ele tomou a decisão de que inclusive os processos já em andamento, ou seja, o meu tratamento já fica sujeito a não receber o medicamento por fornecimento do Ministério. Isso foi o que o STF divulgou dia 28 agora, uma decisão final lá em relação a esse processo que estava em andamento lá em 2024.
Então, é isso que eu tinha para falar.
E quero agradecer, mais uma vez, essa colaboração sua e de todo o Senado a nosso favor.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Agradeço, nós que agradecemos a você, Jorge Luiz Neves, parabéns pela fala, pela apresentação. O que você aponta é mais uma razão para nós nos sentarmos, Dr. Ramiro, com calma para analisarmos junto à consultoria do Senado também, no que o Congresso Nacional pode atuar em função do que o Jorge acabou de mencionar.
Parabéns, Jorge, conte com o Senado Federal nessa caminhada, nessa luta.
O SR. JORGE LUIZ NEVES (Por videoconferência.) - E contem comigo também, podem contar comigo para o que for necessário. Para qualquer esclarecimento, estou à disposição. A gente está sempre disposto...
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Obrigado, abração aí.
O SR. JORGE LUIZ NEVES (Por videoconferência.) - Um abraço.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Passa a palavra à Bárbara Coelho, que é Presidente da Associação Brasileira de Amiloidose Hereditária Associada à Transtirretina.
Com a palavra então, Bárbara.
A SRA. BÁRBARA COELHO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom, mais uma vez, eu preciso agradecer esta oportunidade. Nós passamos anos em busca de um órgão que pudesse nos ouvir, entender a nossa causa, as nossas demandas. Durante esse trajeto, a gente perde familiares...
E eu preciso agradecer também muito ao Sr. Ramiro, porque a minha mãe tem quatro anos que usa um medicamento judicializado através da Defensoria Pública do meu município, onde eu sou muito bem assistida. E eu vejo que a Defensoria, eu não posso falar por todos, mas, aqui no meu município, está aqui para nos defender mesmo, para abraçar a nossa causa. E, onde é possível conseguir esse medicamento, eles estão sempre do nosso lado. Então, eu quero agradecer muito e enobrecer o trabalho desses defensores.
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Vamos sair aqui desta reunião, conforme eu falei anteriormente, eu espero que cada um com uma consciência, com uma responsabilidade de trazer alguma resposta para esses pacientes, visto que existem os medicamentos, então eu acho que já não é muito mais... É difícil justificar que a gente está perdendo vidas, que essas pessoas estão deixando de trabalhar por falta de medicamento.
Eu acho que juntos somos mais fortes e eu, principalmente, saio daqui de verdade com esse senso de responsabilidade. Vou aguardar uma resposta, para finalmente poder trazer uma resposta para todas as pessoas, as famílias que são impactadas por essa doença.
Eu agradeço imensamente a oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Parabéns, Bárbara, continue firme.
A sua... (Falha no áudio.)
... a importância de uma associação. Juntos somos mais fortes! Um anima o outro, não deixa o outro desanimar. Tem problema? Vamos juntos, vamos em frente. Importante, contem com a gente.
Passo, em seguida, a palavra à Dra. Márcia Cruz, que é neurologista, responsável pelo Centro de Referência em Amiloidoses da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Quero, novamente, externar os parabéns, um trabalho de muita profundidade, competência; e saber que existe, assim, um centro de referência tão importante, tão bom no Brasil.
Com a palavra, Dra. Márcia.
A SRA. MÁRCIA WADDINGTON CRUZ (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada pelo elogio, pelo reconhecimento, pelo convite.
Do ponto de vista médico, não existe mais dúvida. O Dr. Ramiro muito bem citou que, muitas vezes, esses estudos são criticados, porque lidam com populações pequenas e, muitas vezes, não conseguem ter o rigor científico de outros; mas, do ponto de vista da amiloidose, esses estudos foram evoluindo ao longo do tempo e não há dúvida quanto à eficácia, quanto ao perfil de segurança, inclusive porque as drogas foram evoluindo. Nós fomos falando de transplante, estabilizadores, silenciadores de primeira geração, segunda.
Há um esforço muito grande, também, de toda a comunidade científica nacional, no sentido de diagnosticar precocemente, manter equipes multidisciplinares para atender esses pacientes, realizar os ensaios clínicos, porque, enquanto essas drogas estão em ensaios clínicos, protocolos, aprovados pela Anvisa, pela Conep, etc., os pacientes recebem essa medicação, todas elas, sem custo algum e vão receber pelo resto da vida, mas isso não alcança a totalidade dos pacientes. Então, esses ficam, quando não respondem ao tafamidis, ficam sem ter o que usar.
E, como bem já disseram vários aqui, a judicialização é um processo oneroso, é um processo lento. Para cada dose é uma nova declaração que tenha sido feita, são declarações com sete ou oito páginas, e eu conto nos dedos de uma mão aqueles pacientes que têm condições de ir adiante com relação a isso.
Então, eu reconheço o trabalho da Conitec, como já foi muito bem explanado pela Dra. Luciana aqui, no sentido de tentar colocar isso tudo dentro do orçamento, mas, de alguma forma, nós temos que chegar a uma conta que seja boa para todo mundo. Reconheço também a necessidade de que esses preços sejam reduzidos e que caibam dentro do SUS - e eu acho que tem que ser um esforço de todos nós.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Só poderia dizer a prevalência do... Não sei se...
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A SRA. MÁRCIA WADDINGTON CRUZ (Por videoconferência.) - Nós não temos ainda um registro único que possa dar um número exato. Existe uma publicação, da qual eu participei há um tempo atrás, que usou casos já muito bem... a prevalência muito bem determinada em países da Europa, como, por exemplo, Espanha, como Portugal, como Inglaterra, extrapolados para nossa população - isso apenas para mutação V30 -, e o número estimado é em torno de 5 mil.
Na realidade, é maior, porque depois nós temos as outras mutações aí, principalmente, a 122.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Muito bem.
Agradeço, Dra. Márcia, e, inclusive, reitero o convite para a orientação desse centro de referência em relação ao trabalho da própria Comissão (Falha no áudio.) ... tecnologia, pesquisa, tantas coisas novas que vêm acontecendo nessa área no mundo, e sempre à disposição para que a amiloidose hereditária, também objeto dessa audiência, possa também receber essa atenção.
A SRA. MÁRCIA WADDINGTON CRUZ (Por videoconferência.) - Obrigada. Fico ao dispor...
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Obrigado. Ficamos à disposição também.
Passo em seguida a palavra à Luciana Costa Xavier, que é Coordenadora-Geral de Avaliação de Tecnologias em Saúde do Ministério da Saúde e representa aqui também a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde.
Com a palavra, Luciana.
A SRA. LUCIANA COSTA XAVIER (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada, Senador.
A gente quer agradecer o convite, a oportunidade de apresentar o nosso trabalho, de discutir. Percebi que aqui não temos divergências, estamos todos imbuídos da mesma missão. Então, não tem divergência em relação à evidência, já foi isso bem colocado. Então, a questão que eu acho que fica para trabalharmos em conjunto é essa questão de redução de preço - a Dra. Márcia também enfatizou essa questão. Então, se pudermos fazer conjuntamente uma articulação com a indústria, enfim, se o Legislativo puder ajudar em relação a essa situação, a gente está à disposição para continuar a discussão.
E quero colocar que foi bem apresentada pelo senhor a questão da Lei 15.120. Ela foi sancionada em 7 de abril e tem 180 dias para entrar em vigor. Então, o Ministério da Saúde já está trabalhando para essa regulamentação, e a gente espera que, nas próximas reuniões da Conitec, a gente já vai ter a composição dos comitês alterados para inclusão de um membro das organizações da sociedade civil, tá? Então, isso já está em andamento, em breve já estará sendo executado.
No mais, quero agradecer mais uma vez o convite, colocar o Ministério da Saúde e a Conitec à disposição para participar desta e de outras discussões relacionadas ao nosso trabalho.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Agradeço, Luciana, e até aponto para Bárbara, que é Presidente da associação brasileira, porque justamente a mudança dessa lei foi para que as entidades nacionais representativas, de fato, da área pudessem também participar desse processo de decisão, o que é muito importante, né? Parabéns!
Obrigado, Dra. Luciana. Transmita também um abraço ao Ministro Padilha e a todos do Ministério da Saúde.
A SRA. LUCIANA COSTA XAVIER (Por videoconferência.) - Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Passo em seguida a palavra ao Dr. Ramiro Nóbrega Sant’Ana, Defensor Público do Distrito Federal. Ele foi bastante elogiado também pela Bárbara, na figura do defensor público municipal, mas eu quero estender esse elogio para toda a Defensoria Pública do Brasil, porque é, assim, a esperança de muitas pessoas em nosso país.
Com a palavra, Dr. Ramiro.
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O SR. RAMIRO NÓBREGA SANT’ANA (Para expor. Por videoconferência.) - Bárbara, Jorge, nós conhecemos a luta de vocês em cada aspecto, cada dificuldade, processos e tratamentos; Dra. Márcia, nós conhecemos as dificuldades que os médicos têm nesse descompasso entre a prescrição adequada e a capacidade de acesso aos medicamentos. Nós compreendemos todas as vicissitudes, os problemas enfrentados pela Conitec, Dra. Luciana, que precisa, sim, ter uma avaliação de custo-benefício e está num cenário em que a capacidade de produção industrial brasileira de medicamentos está reduzida. Então, a gente tem que pensar no complexo industrial da saúde. Isso vai ser um caminho para a Conitec conseguir trabalhar melhor, ter mais recursos.
E todos esses aspectos, Senador, estão aí reunidos, e o melhor lugar para reavaliá-los é o Senado Federal, é o Parlamento brasileiro. Peço ao senhor - e ofereço toda a ajuda da Defensoria Pública, a expertise que nós tivermos com que nós pudermos contribuir - para que possamos alcançar um marco legal, um marco normativo que componha as dificuldades da gestão, mas também leve em conta as necessidades dos pacientes e dê ferramentas para que médicos e médicas no Brasil inteiro, como a Dra. Márcia, possam dar as prescrições e conseguir dar acesso aos tratamentos adequados aos pacientes.
Muito obrigado pela oportunidade e coloco sempre a Defensoria à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Por videoconferência.) - Nós é que agradecemos.
Essa será a prioridade, não há dúvida, a partir da semana que vem: trabalharmos no Congresso Nacional, avaliando os dados que a Defensoria Pública, através da sua pessoa, tem já de todo o processo. Isso vai auxiliar no encaminhamento de algo que seja bom, adequado, de acordo com a realidade, mas, principalmente atendendo a pessoa, com uma doença rara. São 8 mil doenças raras no Brasil, mais ou menos - em torno disso -; só 700 das quais têm algum tipo de encaminhamento, e a amiloidose hereditária é uma delas.
Então, é também de se verificar, não no caso da amiloidose, mas como trabalharmos nesse conjunto, para que a gente possa ter assim os encaminhamentos adequados. E eu sempre penso muito na pesquisa - inclusive, com toda a competência que o Brasil tem -, para não ficarmos dependentes unicamente de descobertas externas, que a pesquisa seja valorizada para se encontrar soluções, sejam medicamentosas, de interrupção de doença ou até de cura, eventualmente. A gente vê tantas coisas boas acontecendo nessa área, que o Brasil participe intensamente desse esforço.
Mas eu quero agradecer. Então, permitam-me chamar vocês, expositores e expositoras. Da minha parte, apreciei muito a audiência pública, ficou bastante clara em termos dos desafios que a área enfrenta.
Quero agradecer a todos e a todas que nos acompanharam pelo Brasil, mandando perguntas, comentários. A página, o site da Comissão fica disponível para mais comentários, sugestões - muita gente deve estar acompanhando esses assuntos em nosso país. Os meios de comunicação do Senado, que transmitem para o Brasil todo essa iniciativa, e também sempre a consultoria do Senado, que inclusive faz parte da Comissão também, e a própria Secretaria, que faz um trabalho sempre exemplar, obrigado novamente. A gente é muito grato a vocês todos.
R
Penso que, assim, concluídas essas observações e tendo cumprido os objetivos da audiência pública, eu declaro encerrada a presente reunião.
Obrigado.
(Iniciada às 10 horas e 02 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 09 minutos.)