17/09/2025 - 42ª - Comissão de Assuntos Sociais

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 42ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Assuntos Sociais da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
A presente reunião atende aos Requerimentos nºs 18, 19, 30 e 31, de 2025, da CAS, de autoria das Senadoras Teresa Leitão e Zenaide de Maia e dos Senadores Astronauta Marcos Pontes, Humberto Costa, Paulo Paim e Nelsinho Trad, para realização de audiência pública destinada a instruir o Projeto de Lei nº 2.294, de 2024, que altera a Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957, que dispõe sobre os Conselhos de Medicina e dá outras providências, para instituir o Exame Nacional de Proficiência em Medicina.
Informo que a audiência tem a cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado, da Rádio Senado e contará com os serviços de interatividade com o cidadão, como a Ouvidoria, através do telefone 0800 0612211, e o Portal e-Cidadania, por meio do endereço www.senado.leg.br/ecidadania, que transmitirá ao vivo a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos expositores via internet. (Pausa.)
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Bom, vamos convidar as autoridades que foram convidadas para vir a esta audiência pública, começando pela Sra. Denise Pires de Carvalho, Presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) - seja bem-vinda, Denise; o Sr. Gonzalo Vecina Neto - vai ser por videoconferência -; o Sr. Rodrigo Cariri Chalegre de Almeida, Secretário-Executivo da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM)... (Pausa.)
Diz-se que ele está aqui, mas deve ter saído, vamos aguardar. Toufic Anbar Neto, Diretor da Faculdade de Medicina em São José do Rio Preto (Faceres) - pois não, seja bem-vindo -; o Sr. Antonio José Gonçalves, Presidente da Associação Paulista de Medicina (APM) (Palmas.) Seja bem-vindo.
E Elizabeth Regina Nunes Guedes, Presidente do Conselho Deliberativo da Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup) e Conselheira da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação (CNE), que também será por videoconferência.
E vamos registrar a presença aqui - que nos honra - do Dr. Luiz Ovando, que é Deputado Federal pelo Progressistas do Mato Grosso do Sul - porque se não disser Mato Grosso do Sul eles ficam com uma raiva danada! (Risos.)
Bom, então, vamos iniciar a nossa audiência pública.
O Dr. Toufic Anbar Neto pede para ser o primeiro a falar, porque tem um compromisso de que não conseguiu se desvencilhar. Então, nós vamos passar a palavra para... é Tofic a pronúncia?
O SR. TOUFIC ANBAR NETO (Fora do microfone.) - Obrigado.
O SR. MARCELO CASTRO (Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Toufic Anbar Neto.
V. Sa. tem a palavra.
O SR. TOUFIC ANBAR NETO (Para expor.) - Obrigado.
Exmo. Presidente, Senador Marcelo Castro, Senadoras, Senadores, muito obrigado pela oportunidade. Profa. Denise Pires de Carvalho, Profa. Elisabeth Guedes, cumprimentando-as, cumprimento todos os demais presentes.
Eu sou Toufic Anbar Neto, médico cirurgião geral, que milita no ensino de Medicina há 25 anos; eu dirijo uma faculdade de Medicina há 14 anos e estudo avaliação há 20 anos, especializando-me no assunto.
Muito já se discutiu aqui o porquê de um exame. Hoje, eu proponho falar de como fazer o exame e quero falar sobre o desenho de uma prova, como está sendo proposta. Minha preocupação é direta: subestima-se o tamanho, o custo e a complexidade técnica de um exame que pretende aferir a competência clínica real do futuro médico.
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Peço que imaginem a seguinte cena: eu entrego a um estudante o manual de uma bicicleta, ele estuda o manual, decora, faz a prova e tira 10. Eu lhe dou a bicicleta para pedalar, ele vai conseguir pedalar? Provavelmente não. Na mesma linha, eu peço que se lembrem de como é que se obtém uma carteira de motorista, a CNH. Você faz a prova teórica e faz a prova prática, com o examinador ao seu lado, no veículo.
A medicina é muito mais exigente do que esses exemplos. Não basta saber, é preciso saber fazer e saber ser. É por isso que uma prova teórica, em uma única edição, não captura o que verdadeiramente importa para a segurança do paciente e para a qualidade do cuidado.
Eu faço um breve parêntese para falar sobre o que é competência na educação. Ela congrega três dimensões: o conhecimento, que é o conhecimento sobre a teoria; as habilidades, muitas delas motoras e comunicacionais, por exemplo, examinar um paciente, dar um ponto; e a atitude, que é a ética, o profissionalismo e a responsabilidade com a segurança do paciente. Uma prova teórica só mede a primeira dimensão; ela não mede a destreza para realizar procedimentos nem o componente atitudinal, que sustenta a prática clínica diária.
Por que um megaexame prático nacional é inviável? Se quisermos avaliar habilidades e atitudes com honestidade, falamos de estruturas como estações clínicas padronizadas, pacientes padronizados, examinadores treinados, rubricas calibradas, controle de qualidade, análise psicométrica - psicometria é a ciência que estuda, entre outras coisas, avaliações, garantindo sua qualidade e sua precisão.
Agora, vamos colocar isso na escala brasileira. As vagas existentes atualmente, quando maturadas, darão 42 mil formandos por ano, número que pode crescer com os repetentes e a expansão de vagas; ou seja, é uma experiência minimamente justa?
Para oferecer um exame justo, precisaríamos de uma modelagem conservadora. Fazer 200 locais de prova, cada um com dez a doze circuitos, oito a dez minutos por estação e dois dias de aplicação; mobilizaria um pessoal por polo, com dezenas de pessoas, entre examinadores, pacientes padronizados, equipe de apoio, TI, segurança e coordenação. Em escala nacional, estamos falando de 6 a 7 mil profissionais por edição; ou seja, com o custo disso, somando diárias, passagens, aluguel de espaços, infraestruturas, seguros, TI, impressão, treinamento, banco de estações, chegaremos à casa de mais de R$100 milhões por edição. E os reprovados retornam na edição seguinte, possivelmente.
Então, em poucos anos, nós teremos um exame com mais de 100 mil pessoas fazendo a prova. E a pergunta é inevitável: quem que vai pagar por isso? Os próprios recém-formados, num exame que custaria, no mínimo, R$4 mil por inscrição? Lembrando que o da OAB é R$320, mas é uma prova eminentemente teórica; a prova prática tem um custo bem maior.
Quantas edições anuais? Três, igual a OAB, como foi tão dito aqui? Ninguém tocou nesse assunto até agora.
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Há um segundo ponto. Quem deve conceber, aplicar e responder por um exame dessa natureza? Conselhos profissionais têm papel essencial de fiscalizar o exercício ético da profissão. Já o desenho e a execução de avaliações educacionais em larga escala demandam banco de itens, estações, pré-testes, calibração, análise psicométrica, isso tudo sob o olhar de uma auditoria independente. Assumir a responsabilidade por um exame e terceirizar o seu núcleo técnico não resolve o problema, pelo contrário, cria zonas cinzentas de responsabilidade e transparência. Exame de alto impacto exige padrões públicos, métricas claras, mapa de pergunta, definição de desempenho por métodos reconhecidos e prestação de contas sobre validade e confiabilidade.
O que nós aprendemos com experiências já vividas? No Brasil, já vimos provas gerando altas reprovações. Isso não prova por si que o exame é bom, pode apontar falhas na construção, conteúdo e uso dos resultados. A análise de provas feitas por conselhos regionais já apontou exames com 54% de perguntas inválidas, inadequadas para avaliar qualquer item. Em avaliação, o que importa é a validade, se a prova realmente mede o que se propõe e melhora o que importa, que é o cuidado do paciente. Um exame apressado e centralizado corre o risco de punir o egresso sem transformar a prática assistencial.
O caminho viável e responsável seria o teste de progresso seriado, feito por quem é do ramo, com matriz clínica robusta, mapa de prova e corte definido por um método reconhecido, além do pilar prático descentralizado com auditoria externa, avaliação clínica aplicada nas escolas sob padrão nacional e auditorias independentes, para garantir comparabilidade. Ainda teríamos um terceiro pilar que é a integração com a residência e o sistema de saúde, para alinhar competências avaliadas à porta de entrada da residência e necessidades reais do SUS, para que a avaliação induza uma formação melhor.
Para encerrar, eu digo a V. Exas. que não tememos exames difíceis. O nosso receio é exame mal feito, caro, instável e injusto que coloque em risco o futuro do recém-formado sem melhorar a vida do paciente. Eu sou contra a prática do "aprova primeiro e a gente vê o que faz depois". Temos que evitar debates baseados em generalizações, contação de causos e omissões.
Senhores, cuidado com o que pedem, vocês correm risco de serem atendidos. Se o exame for mal concebido, quem paga a conta é o jovem médico, as famílias e sobretudo o cidadão que precisa de cuidado seguro e competente. Trago esse alerta e esse caminho à consideração de V. Exas.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Muito bem, agradeço a colaboração do Dr. Toufic.
Vamos ao primeiro da lista, que é a Dra. Denise Pires de Carvalho, Presidente da Confederação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
V. Sa. tem a palavra.
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A SRA. DENISE PIRES DE CARVALHO (Para expor.) - Muito boa tarde.
Eu gostaria de iniciar saudando o Exmo. Sr. Senador Marcelo Castro, Presidente da Comissão de Assuntos Sociais; o Secretário-Executivo da Comissão Nacional de Residência Médica, aqui presente, Prof. Rodrigo Cariri; Prof. Gonzalo Vecina, professor da USP; Prof. Toufic Anbar Neto, Diretor da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto; Dr. Antonio José Gonçalves, Presidente da Associação Paulista de Medicina; Profa. Elizabeth Guedes, Presidente da Anup; Deputado Federal Luiz Ovando, aqui também presente; todos os demais Parlamentares e todos os que nos assistem.
É uma honra enorme participar hoje desta audiência, Senador. Na realidade, eu me formei na Universidade Federal do Rio de Janeiro, em Medicina, há 38 anos, e sou professora da mesma universidade, da minha alma mater, da universidade que foi a primeira escola médica deste país, há 35 anos. Fui Reitora da Universidade Federal do Rio de Janeiro até o início de 2023, quando fui convidada, pelo Ministro da Educação Camilo Santana, para assumir a Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação. Mas, um ano depois, o Ministro Camilo me pediu que assumisse a Presidência da Capes, essa autarquia que é responsável pelo aperfeiçoamento do pessoal de nível superior, pela acreditação, aprovação e também pela permanência, através da avaliação, de todos os cursos de pós-graduação stricto sensu do nosso país. Na época, eu disse ao Ministro Camilo que estava sendo presenteada, porque durante esses 35 anos como professora, formei muitos mestres e doutores, além de muitos médicos no nível da graduação.
A Capes é um exemplo de um Brasil que deu certo, que continua dando certo e que continuará dando certo na formação de mestres e doutores, baseada sempre na avaliação de todos os programas. São hoje 4.659 programas de pós-graduação que formam 25 mil doutores por ano, mais de 65 mil mestres e há, no sistema, 420 mil matrículas nos mestrados e doutorados do nosso país.
Neste momento, enquanto eu estou aqui, alguns comitês estão trabalhando lá na Capes. A Capes tem a excelência que tem porque a Capes é como nós, nós avaliadores. E quem são os avaliadores dos programas de pós-graduação? Os orientadores permanentes dos programas de pós-graduação, cientistas brasileiros e estrangeiros radicados no Brasil que atuam na formação de mestres e doutores.
Como eu disse antes, formamos muitos mestres, formamos muitos doutores, mas quem avalia a pós-graduação não são os egressos, não são os mestres e doutores. A avaliação, como muito bem ressaltado pelo Prof. Toufic, depende de como é feita, de qual é a comissão responsável. Eu não tenho dúvidas de que a atividade de formação e a atividade de avaliação devem passar por profissionais altamente qualificados e formadores de pessoas no nível da graduação ou da pós-graduação, que são os professores envolvidos na formação.
Digo isso porque nós estamos hoje discutindo o Exame Nacional de Proficiência, o Projeto de Lei nº 2294, que pretende trazer a avaliação para medir o nível de domínio de uma pessoa sobre determinado assunto.
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Em primeiro lugar, a Medicina não é um determinado assunto. É muito difícil avaliarmos, como o professor ressaltou, o que seriam aptidões e habilidades no campo médico por uma prova, mesmo por uma prova prática e uma prova teórica. Não é trivial.
A avaliação é uma ciência, é um campo de conhecimento que deve lançar mão de pessoas altamente qualificadas para que possamos, através das políticas de avaliação, tomar decisões. Não é trivial decidir o futuro, de qualquer pessoa que seja, através de uma simples prova, e prova essa que, segundo o projeto de lei, pretende ser realizada e organizada por uma entidade de classe.
O Ministério da Educação, que é o Ministério ao qual a Capes está vinculada, essa autarquia que avalia os cursos de pós-graduação do país, é um Ministério que também tem uma outra autarquia ligada a ele, que é o Inep. Capes e Inep são duas instituições fundamentais para avaliação da graduação e da pós-graduação no país.
Nós temos, tramitando no Parlamento do nosso país, um Projeto de Lei Complementar que institui o Sistema Nacional de Educação (SNE), que pretende, para muitos, ser o SUS da educação; é um sistema que leva em consideração o papel do Ministério da Educação, junto aos entes federados, de maneira tripartite, como faz o nosso Sistema Único de Saúde. E esse Sistema Nacional de Educação, já aprovado aqui no Senado, que sofreu alterações no âmbito da Câmara dos Deputados, agora aprovado, e que retorna ao Senado para que seja aprovado finalmente - o autor é o Senador Flávio Arns e o Relator é o Deputado Rafael Brito -, traz, no seu art. 36, que os padrões de qualidade da educação superior, definidos na forma da lei, integram - não vou citar todos os artigos e todos os incisos - a avaliação nacional da educação superior em nível de graduação, e que a avaliação nacional da educação superior em nível de graduação afere periodicamente os padrões de qualidade da oferta educacional por meio de indicadores.
Está aí o Inep, que faz isso há mais de 20 anos através dos Sinaes (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior). E a União, por intermédio do MEC, coordenará o processo de avaliação da educação nacional, junto com os estados, com o Distrito Federal, com os municípios e demais instâncias previstas. Parágrafo único desse artigo. O Inep e a Capes subsidiarão o MEC na formulação de políticas educacionais e são responsáveis por realizar a avaliação da educação nacional no âmbito de suas respectivas competências.
Por falar em competência, qual deveria ser o órgão a medir a competência para a atuação profissional, se não esses órgãos que regulam a formação, os cursos de graduação, e que têm todas as prerrogativas e toda a sabedoria, através da ciência da avaliação, para avaliar qualquer profissional que seja?
As entidades de classe deveriam promover debates, como é o caso do Conselho Federal de Medicina, também dos Conselhos Regionais de Medicina, importantíssimos para o nosso país, cuja atribuição seria de promover debates sobre a adequação da atuação profissional, se a atuação profissional está sendo feita da maneira correta, os preceitos da ética profissional, da conduta médica ou da má conduta médica. Os registros médicos devem ser eternos no nosso país? Os especialistas não deveriam se atualizar? O papel da formação continuada na atuação médica não deveria ser revisto pelos conselhos de classe? Quando um registro profissional deveria ser cassado? Essa é outra questão, mas que não é abordada nesse projeto de lei, que pretende apenas coibir que jovens concluintes de cursos médicos possam exercer a sua profissão e poder se tornar bons médicos no futuro, através dos programas de especialização, como a residência médica que nós temos.
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(Soa a campainha.)
A SRA. DENISE PIRES DE CARVALHO - Eu tenho algumas perguntas para terminar, Senador.
Uma delas é o que acontecerá com os formandos que não forem aprovados, caso essa prova seja aprovada aqui no Parlamento? Quantas vezes esses formandos poderiam repetir o exame? O que eles fariam enquanto isso? Haveria proliferação de cursinhos preparatórios para essas provas? Elas seriam cobradas? Qual o valor dessas provas? Como a prova seria calibrada, uma vez que os médicos em exercício, segundo o projeto de lei, não se submeteriam à prova? Qual seria a nota de corte? Como uma entidade de classe poderia ser responsável, se muitos profissionais sequer se atualizam no nosso país? A prova seria fonte de recursos para a entidade médica? E, por último, não menos importante, essa prova teria questões ideologizadas? Qual seria a resposta correta caso a entidade de classe perguntasse para os médicos recém-formados a conduta sobre vacinas? Porque nós vimos essas entidades serem contra a vacinação, tomarem, sinceramente, atitudes anticiência, não sei se essa entidade será uma boa entidade para realizar exames, seja qual exame for, para medir uma atividade que é tão baseada em ciência e que depende de evidências científicas. Será uma prova baseada na experiência daquele profissional apenas, sem levar em consideração os recentes avanços da medicina? Será uma prova baseada no antibiótico que nós aprendemos a prescrever há 40 anos, quando nos formamos, ou será uma prova baseada em evidências?
A pesquisa à qual eu fui apresentada, que foi feita pela Frente Parlamentar Mista de Medicina, diz que a classe médica apoia a realização dessa prova de proficiência e que 90% dos médicos brasileiros defendem o exame. Eu deixo aqui a última pergunta nesta audiência: quantos desses médicos aceitariam passar por esse exame?
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Agradecendo aqui a participação da Dra. Denise, passo a palavra ao próximo convidado, que é o Sr. Gonzalo Vecina Neto, que o fará através da internet, à distância.
V. Sa. tem a palavra, Dr. Vecina.
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O SR. GONZALO VECINA NETO (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde a todos e a todas. Quero cumprimentar, particularmente, o Presidente da Comissão, o Senador Marcelo Castro, quero cumprimentar os demais representantes presentes nesta discussão, cumprimentar a Profa. Denise Pires de Carvalho, Presidente da Capes, cumprimentar as demais autoridades legislativas presentes aqui no nosso Plenário.
Eu, como a Profa. Denise já mencionou, também estou formado há 48 anos e labuto na área da saúde pública, na Faculdade de Saúde Pública, aqui da USP, desde 1988. E, quando fui convidado para esta honrosa posição de discutir essa questão da avaliação dos nossos futuros médicos, eu lembrei que eu sou um pouco filho de um momento semelhante a este. Em 1972, quando eu entrei na faculdade de Medicina, o Brasil estava formando alguma coisa em torno de 3 mil médicos por ano. Dez anos depois, próximo aos anos 80, nós passamos a formar 9 mil médicos, saímos de 3 mil médicos para 9 mil médicos: houve uma explosão de faculdades de Medicina naquele período, na medida em que médicos estavam faltando e uma série de providências foram tomadas pela ditadura na época para ver se conseguíamos aumentar o número de médicos. Nós saímos de 3 mil para 9 mil, assim como hoje nós estamos dando um salto imenso na formação de médicos também.
Tivemos esta discussão naquele tempo: em que nós vamos nos formar? Eu, no caso, me formei numa faculdade... Eu entrei na quarta turma da Faculdade de Medicina de Jundiaí, que era uma autarquia municipal, e após a formatura fiz a residência, mas a situação era muito semelhante. Nós, hoje, temos falta de médicos, continuamos tendo falta de médicos e temos um problema de distribuição; o problema de distribuição dos médicos vai ser muito mais complexo de ser resolvido.
O Carlos Gentile de Mello, lá naquela época, no início dos anos 70, fez um estudo relacionando a presença de médicos em cidades onde houvesse agências bancárias, e a correlação foi próxima a um, ou seja, onde tem agência bancária tem médico, o que significa que os médicos preferem ir aonde existe uma estrutura para sustentar uma vida com boa qualidade, nada além disso. E o que nós vamos ter que conseguir fazer para levar os médicos aos nossos rincões é estabelecer condições de vida e da prática da saúde para que eles se estabeleçam nos nossos rincões.
De qualquer maneira, eu me perguntei muito sobre o objetivo desse PL 2.294, de 2024, que quer resolver o problema da má formação dos médicos. O problema é a má formação dos médicos, e o remédio que está sendo proposto é algo semelhante ao que os advogados fazem com o exame da Ordem. No Exame da Ordem, nós temos que um advogado, que fez um curso de cinco anos, em tempo parcial, chega ao final do curso, faz o Exame da Ordem e não passa. O que vai acontecer com esse advogado, que não vai poder exercer a advocacia? Ele tem muitas oportunidades alternativas para realizar a sua atividade técnica ou mesmo uma profissão qualquer. Um médico formado, depois de 6 anos de um curso integral, vai fazer o quê? Vai fazer cursinho para fazer o próximo exame.
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Nós estamos vitimizando os alunos pela incapacidade dos cursos de Medicina, que eles frequentaram, de conseguir realizar uma boa formação. Nós estamos vitimizando os alunos das faculdades de Medicina pela incompetência também do Estado de realizar a regulação da oferta de cursos e a regulação da boa qualidade desses cursos, ou seja, nós estamos usando um remédio errado. Nós não temos que vitimizar os alunos. Nós temos que fechar as faculdades que não funcionam. E, para tomar essa decisão, nós temos que conseguir montar um sistema de avaliação das faculdades, que nós vamos ter que avaliar. A solução, portanto, é uma solução que não sei se é mais difícil ou menos difícil. Depois de ouvir o Prof. Toufic falar e descrever o tipo de dificuldades para realizar o exame, eu não sei o que é mais complicado.
Uma coisa é certa: nós tivemos, devido à incapacidade do Estado brasileiro de segurar de forma adequada a criação de novas faculdades, um enxame de faculdades abertas sem as devidas condições e com ações judiciais. O Judiciário não cometeu nenhum crime, o Judiciário simplesmente cumpriu o que a lei determinava e, como a lei era uma lei incompleta, inadequada, o que o Judiciário fez não tem nenhum erro. O que nós temos é que corrigir esses erros a partir de agora. Então, os órgãos de regulação, principalmente o MEC e o Ministério da Saúde, têm que retomar esse jogo, junto com as instituições que a Profa. Denise muito bem já mencionou.
Qual é o remédio? O remédio é constituir comissões técnicas para a análise das condições de funcionamento dos cursos que estão sendo oferecidos. Esse é o remédio. Isto é que tem que ser proposto nessa lei: tem que criar um sistema de avaliação contínuo de todas as faculdades que estão funcionando no Brasil. Esse sistema não acontece de vez em quando, ele acontece de forma contínua, com grupos técnicos que tenham a capacidade para fazer a análise de funcionamento dessas faculdades, para saber se elas têm hospitais, escolas, se tem centros de saúde para formação na atenção primária desses profissionais que estão nas suas faculdades.
Segundo, tem que verificar o resultado do trabalho dessas faculdades fazendo os exames seriados, como já foi mencionado também aqui pelo Prof. Toufic, o teste de progresso seriado. Tem que fazer, pelo menos, no segundo ano, no quarto ano e no sexto ano. Haverá reprovados? Haverá reprovados - e tem que ser dada uma possibilidade de continuidade para esses reprovados - mas, certamente, não será a quantidade de reprovados que nós vamos ter com este exame da ordem realizado pelo Conselho Federal de Medicina, que, como já demonstrado também pela professora Denise, é absolutamente incompetente para realizar esse tipo de atividade. Então, constituir comissões para avaliação técnica das condições em que os cursos estão sendo oferecidos e fazer os testes de progresso variado são as alternativas que eu consigo enxergar para não usar um remédio absolutamente inadequado. Não se trata de punir os alunos que estão recebendo um tipo de formação que, por falta de capacidade do Estado de regular essas atividades, vão ser reprovados. Acho fundamental que essas faculdades sejam adequadamente avaliadas e, se mal avaliadas, que se tenha uma estrutura legal que dê suporte a mandar fechá-las, a conseguir que elas sejam fechadas. Por quê? Porque não deveriam estar funcionando. Para isso, o suporte legal tem que ser adequado, para que o Judiciário não tenha que tomar decisões que mantenham essas instituições que estão funcionando de maneira inadequada abertas.
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Essas são as minhas contribuições, Senador.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Quero agradecer a participação do Dr. Gonzalo Vecina.
Vamos agora ao próximo, que é o Sr. Rodrigo Cariri Chalegre de Almeida, Secretário-Executivo da Comissão Nacional de Residência Médica.
Com a palavra V. Sa.
O SR. RODRIGO CARIRI CHALEGRE DE ALMEIDA (Para expor.) - Boa tarde, Senador. Boa tarde, demais colegas da mesa. Agradeço a oportunidade.
Queria dizer que, num primeiro momento, eu vou aqui apresentar algumas informações genéricas sobre o Sistema Nacional da Comissão e colocar um pouco da minha opinião como Secretário-Executivo e como professor da Universidade Federal de Pernambuco, médico de família e comunidade, Doutor em saúde pública.
Meu doutorado foi sobre políticas de educação e políticas de saúde, sobre quando elas se encontram para produzir inclusão social, redução de desigualdade e desenvolvimento. Então, as posições que eu vou apresentar aqui não retratam, necessariamente, Senador, a posição do plenário da comissão, que é um plenário heterogêneo, com 16 representações. Eu, enquanto secretário, trago aqui informações sobre a residência médica no Brasil e, quando me posicionar acerca do teste de proficiência, eu o estarei fazendo como professor e pesquisador do campo.
Então, um breve sobrevoo sobre a residência médica no país.
Nós temos, atualmente... Isto é o retrato da nossa gestão: na comissão, do ano passado para cá, nós tivemos um crescimento de 8%, de 1.037 instituições para 1.120 instituições. Atualmente temos 1.120 instituições que oferecem programas de residência médica no Brasil. Com essa distribuição regional, o senhor pode ver que, apesar do crescimento, que é significativo, de 8% em um ano, a gente não reduziu absolutamente em nada as desigualdades.
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Permita-me falar especialmente, com muito carinho, do Piauí, que para nós é um estado importantíssimo no cenário nacional, em relação àquilo que os que me antecederam comentaram, que há escassez e má distribuição de profissionais.
O Piauí, apesar de ser um estado com talentos e com grandes referências nacionais da medicina, hoje dispõe de praticamente um número abaixo da média nacional em todas as especialidades, além do fato de não ter várias especialidades que possam ter formações no Estado do Piauí.
Esse é o número total de programas. Eram 7,3 mil, aproximadamente, em 2024. Passamos para 7.875 e os senhores podem constatar que a distribuição entre Regiões também permanece a mesma. O crescimento foi de 8%.
Aqui é uma breve comparação do que a gente tinha em número de instituições, num passado recente, e de programas, respectivamente em laranja e em verde, nos anos anteriores, e o crescimento que a gente acabou de demonstrar nos últimos anos.
Aqui está detalhado o número de vagas autorizadas e de vagas ocupadas. Nós crescemos 6,7% em termos de vagas autorizadas e 8,2% em termos de ocupadas. Então, nós crescemos mais do que na autorização, na ocupação de vagas, e temos atualmente 19 mil residentes de acesso direto no Brasil, o que é um elemento que vem sendo perseguido pelo Governo Federal para atacar a questão da falta de qualificação de profissionais no Brasil
E é sobre isso que eu queria concentrar a minha fala a partir de agora.
Aqui é a distribuição por ano e aqui, o financiamento. Hoje o Ministério da Saúde é o principal financiador, com 20 mil bolsas e, nesta distribuição aqui por ano, você vê que, a partir de 2009, o Ministério da Saúde passa a assumir o protagonismo na oferta de bolsas de residência, honrando o princípio constitucional e suas atribuições legais de ordenar a formação de recursos humanos.
Acho que isso também é algo que precisava ser destacado no debate. Pelo que eu saiba, esse artigo da Constituição continua vigendo e diz que é responsabilidade do SUS esse ordenamento.
É importante dizer que o Ministério da Saúde não faz sozinho. As secretarias estaduais e municipais também têm um papel importante nesse sentido.
A gente vê, e aqui eu começo a chamar a atenção de vocês - esse gráfico está se tornando bastante recorrente no debate -, o crescimento do número de escolas, de cursos e de estudantes que estão se formando. Em 2023, eram 32 mil. Agora, 36 mil.
A nossa projeção, Senador, é de que a gente estabilize na ordem dos 60 mil egressos por ano.
E a gente tem ainda aqui, em 2024, 17 mil e, como eu mostrei, 19 mil vagas de residentes de acesso direto. Dezenove, vamos dizer 20, para 60 são 40 mil de estoque de médicos sem residência no Brasil hoje.
Então, isso é o que nos preocupa e o que a política pública aponta é para a necessidade do crescimento da residência médica. Isso, sim, é o que acompanha...
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI. Fora do microfone.) - Hoje quantos estão se formando e quantos tem de egressos?
O SR. RODRIGO CARIRI CHALEGRE DE ALMEIDA - Formaram-se, em 2023, 32 mil. O número de 2024 a gente ainda não tem. O Inep ainda não o produziu. Ele deve ser em torno de 36 mil. E entram 56.
A gente imagina que isso deva se estabilizar, porque - eu vou falar mais adiante... Com tudo o que foi feito por parte do Governo para que a gente interrompesse essa abertura desordenada de cursos, a gente imagina que deva se estabilizar em torno de 60 mil egressos/ano.
E essa é a nossa meta e referência.
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI. Fora do microfone.) - Desses 60 mil que são formados, quantos fazem residência?
O SR. RODRIGO CARIRI CHALEGRE DE ALMEIDA - Hoje são 19 mil de acesso direto.
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI. Fora do microfone.) - Quarenta mil não fazem residência?
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O SR. RODRIGO CARIRI CHALEGRE DE ALMEIDA - Quarenta mil daqui a seis anos, porque, hoje, formam 36 mil; e, hoje, são 20 mil, aproximadamente, que estão nesse...
Para comparar internacionalmente, a gente tem meia vaga de residência por egresso no Brasil, enquanto na OCDE tem 1,2. Então, para o nosso entendimento, o desafio hoje, uma vez que a gente aponta para a estabilidade no número de egressos da graduação, é ampliar a residência para perseguir esse indicador.
Também é interessante observar a experiência internacional, para ver que os outros países desenvolvidos e com sistemas universais consideram a formação médica uma continuidade, sem interrupção entre a graduação e após, no exercício profissional, como muito bem falou a Profa. Denise.
Os países que fazem avaliação de proficiência e licenciamento também fazem o relicenciamento, de cinco em cinco anos ou de dez em dez anos, por princípio de coerência e ética. Se eu estou avaliando o egresso, eu também devo avaliar quem já está formado; e devo permanecer avaliando não só o médico generalista, como também cada um dos especialistas.
O que a gente persegue hoje é constituir um ambiente formativo que começa no ensino médio, que conta com um processo de admissão no ensino superior, que radicalizou, no sentido da democratização, que é o Enem, um modo de graduação que autoriza, no Brasil, desde 1958, o exercício vitalício da profissão, sem licenciamento e sem recertificação; ou seja, o profissional pode sair direto da graduação para o mercado de trabalho, com autorização para o exercício irrestrito. Nisso ninguém quer mexer.
Em vários países do mundo, nós vamos ter um licenciamento parcial. Então, eu autorizo quem concluiu apenas a graduação a fazer determinadas...
Boa tarde, minha Senadora!
A gente autoriza a fazer determinadas práticas, por exemplo, atuação na atenção primária, mas não autoriza todo o exercício profissional, sem a devida avaliação.
Então, a gente trabalha para a universalização também do acesso à residência. Hoje, nós temos uma grande prova nacional feita pela Ebserh, que é o Enare, e temos a residência médica como outra porta para o mercado de trabalho, essa mais certificada; mas o senhor sabe tão bem quanto eu que a residência médica, hoje, no Brasil, também não avalia o egresso. O concluinte do programa de residência entra no mercado e tem autorização vitalícia também para o exercício da especialidade. Também não estamos tratando disso nesta matéria.
Portanto, a ideia de uma avaliação pontual, nesse preciso momento da linha formativa, interrompe, na minha opinião, Senador, um debate e uma construção de uma política pública consistente da formação de médicos.
Assim como os que apresentaram antes de mim, eu acho que o instrumento, como foi dito pelo Prof. Gonzalo, é um tratamento inadequado para o problema. Eu tenho um problema e ele é reconhecido por todos, mas eu estou propondo uma medida que não atende ao problema. Ela pode, como disse o Prof. Toufic, também piorar o problema, porque aqui a gente vai criar uma outra linha de fuga, que, além do mercado de trabalho, são os bacharéis da Medicina que não têm opção do exercício profissional.
Então, nós vamos, indiscutivelmente, apostar no aumento do exercício ilegal da medicina com uma medida como essa, sem atacar os outros elementos da cadeia formativa, das etapas formativas, que são necessários, e sem atacar os problemas que a gente já conhece, como a má distribuição.
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Então, eu acho que a gente sempre deve... Perdoe-me, mas eu acho que usar o exemplo do Piauí é muito interessante para pensar uma medida como essa como ela atende ao problema de escassez e má distribuição de médicos para o Estado do Piauí. Esse exame que está sendo proposto vai ajudar a população do Piauí, vai ajudar Floriano, vai ajudar o pessoal de Parnaíba, vai ajudar o pessoal do interior a ter mais acesso à saúde? Esse é o propósito e essa é a motivação original dessa medida?
Para concluir, eu queria dizer que no âmbito da residência nós estamos desenvolvendo um sistema, a exemplo do Sinar, o Sistema Nacional de Avaliação de Residências, que presume um instrumento específico de avaliação de cada programa, um teste de progresso para a residência e uma avaliação prática, mas isso vai ser construído e conduzido pela Comissão Nacional, até que tenhamos maturidade avaliativa, Senador, para poder trazer o debate para o Congresso Nacional e ousar pensar em alguma legislação que dê conta disso. Então, este é um disciplinamento interno da Comissão Nacional avaliativo, que permite às instituições conhecerem melhor os residentes que estão se formando e aos próprios residentes saberem de suas capacidades, antes de pensar em punir exclusivamente os residentes e os alunos.
Para concluir, eu queria chamar a atenção para que... Primeiro, gostaria de elogiar, Senador, a condução que o senhor vem fazendo e o debate democrático que a gente vem instalando. Acho que caminhamos para a construção de alguns consensos de que de fato é preciso fazer alguma avaliação. Ninguém discute isso. A questão está entre quem vai fazer e quais são os seus propósitos.
Hoje nós firmamos um consenso em torno de uma agenda pública de qualificação do exercício profissional e de avaliação, com revisão das diretrizes curriculares, com a criação do Enamed e a retomada dos editais para abertura de curso, o que reduz a abertura indiscriminada de curso de graduação, revisão dos processos de judicialização, o que freou a abertura de novas escolas, revisão dos instrumentos avaliativos dos Sinaes, o que aponta para a diretriz daquilo que o Gonzalo falou, que é fechar curso, diminuir a entrada de curso que não tem condições de funcionamento e a institucionalização do sistema de avaliação de residência.
A medida da instalação de um teste de proficiência neste momento - na minha opinião, Senador, eu posso estar equivocado - interrompe essa agenda pública e aposta em um instrumento minimalista para resolver um problema extremamente complexo e pode - acompanho o Prof. Toufic -, pode oferecer muito mais riscos, tanto à categoria e à profissão quanto ao sistema de saúde.
Muitíssimo obrigado. Eu concluo aqui. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Agradecendo a participação do Dr. Rodrigo Cariri Chalegre de Almeida, vamos ao próximo convidado que é o Dr. Antonio José Gonçalves, Presidente da Associação Paulista de Medicina (APM).
V. Sa. tem a palavra.
O SR. ANTONIO JOSÉ GONÇALVES (Para expor.) - Boa tarde a todos. É uma satisfação muito grande estar aqui. Agradeço ao Senador pelo empenho. Esta audiência pública realmente torna muito mais democrático este debate.
Eu sou professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa, faço 50 anos de formado, achei que era o médico mais velho, mas o Senador me corrigiu aqui que ele tem 51, então, ele está ganhando de mim. (Risos.)
Bom, eu represento aqui a Associação Paulista de Medicina, que hoje é uma senhora vetusta de 95 anos, está fazendo este ano. Nós temos 25 mil associados em todo o estado, 70 regionais. Está aí a nossa distribuição geográfica no estado, abrangemos praticamente todo o estado. Os nossos pilares fundamentais são dois: a boa formação do médico e o atendimento de qualidade à nossa população.
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Aqui a gente vê a taxa de crescimento do número de médicos e da população geral, então a gente vê que a taxa de médicos vem subindo progressivamente, que é o gráfico em azul ali em cima, nós não temos um pointer que aponta ali, desculpem, mas embaixo é o crescimento da população. Isso se acentuou depois do Programa Mais Médicos, em 2013.
Aqui é a evolução do número de cursos de graduação em Medicina, então houve realmente, em 20 anos, de 2004 até agora, um crescimento de 305 cursos, considerando 448 cursos até hoje, então aproximadamente 15 cursos por ano, mais do que um curso por mês. Então é impossível você ter corpo docente, você ter infraestrutura para dar conta dessa necessidade de professores, de hospitais e de infraestrutura para formar bem esses alunos. Então esse dado já diz que a formação dos nossos alunos de Medicina realmente tem muitos problemas.
Aqui a gente mostra a evolução em termos de escolas públicas e privadas. O que aconteceu foi um aumento exagerado de escolas privadas. A qualidade é inaceitável, porque, na última avaliação do Enade, de 2023, nós vemos que foram avaliadas 308 escolas, só seis obtiveram a nota máxima, que é a nota 5, metade delas notas 1, 2 e 3. Então veja, o aumento foi de 60% nas escolas públicas e mais de 500% nas escolas privadas. Isso mostra claramente a mercantilização na medicina. Vejam ali no gráfico da esquerda, a Afya, que é um grupo educacional, tem 23 mil alunos de Medicina. Façam a conta, senhores: na média, R$12 mil cada um, é uma movimentação de dinheiro extremamente grande e isso prejudica a formação. O objetivo de uma escola médica, em primeiro lugar, eu, como professor universitário há 44 anos, acho que tem que ser a formação do médico. A mercantilização, o dinheiro, vem depois. Isso é importante, mas é secundário. Primeiro a gente tem que pensar efetivamente na boa formação do médico.
Aqui é uma historinha do Exame Nacional de Proficiência. Ele está aí há 18 anos, passou por 11 projetos na Câmara Federal, todos andando. Agora foi aprovado um requerimento de urgência do Deputado Dr. Luizinho, foi aprovado agora, no 16 de julho passado, e aqui está caminhando esse Projeto de Lei 2.294, que já foi aprovado por unanimidade na Comissão de Educação e Cultura. O Senador Dr. Hiran, que presidiu essa Comissão, conseguiu aprovar esse projeto por unanimidade na Comissão de Educação e Cultura, e agora nós estamos nesta audiência pública, que é o momento atual desse projeto.
Eu acho que é interessante a gente colocar as diferenças do Exame Nacional de Proficiência, que nós estamos propondo e somos favoráveis, e do Enamed. O Enamed foi lançado 15 dias depois de que foi solicitada esta audiência, que demorou quatro meses para ser marcada, foi lançado pelos Ministérios de Educação e da Saúde. Ele vai substituir o Enade, que é o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes, no caso nosso, para Medicina, e vai ser integrado ao Enare. Aliás, o Enare vai ser agora, no dia 19 de outubro, se não me falha a memória, e tem 87 mil candidatos inscritos - acho que o Cariri pode me corrigir se eu estiver errado.
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Então, veja, no Enamed, mesmo se os alunos forem reprovados nesse exame, eles vão obter o registro profissional e vão atender os pacientes, isso arrisca a população. Por outro lado, o Exame Nacional de Proficiência é feito em vários países. Nos Estados Unidos da América, que é o exemplo aí, o médico não consegue o seu registro antes da residência médica. Então, não são seis anos, são seis mais quatro, ou cinco, ou seis. É um período muito mais longo de formação, dada a complexidade e a responsabilidade da profissão médica. Então, isso tem que ser anotado aqui com muita ênfase, para que a gente não se esqueça disso. E os médicos que forem reprovados não vão obter o registro profissional.
O Prof. Gonzalo é um amigo meu de longa data, eu o admiro muito, mas, com todo o respeito, permito-me discordar dele. A vitimização dos alunos. Eu pergunto: e a vitimização dos pacientes? Como é que fica? Fechar escolas. Eu tenho lá uma escola com 150 alunos por ano, vai fechar a escola. Nós não vamos vitimar os alunos dessa escola fechada ou eles vão para as outras escolas, que já estão com excesso de alunos? Como é que nós vamos resolver esse problema?
Então, veja, eu também não acho que um exame só é a solução imediata, mas nós temos seis anos para regulamentar isso. Nós temos tempo para regulamentar, nós temos tempo para avaliar isso e nós temos, inclusive, comissões de avaliação, que vão apontar para a escola, através do teste de progresso, a que nós somos absolutamente favoráveis, para que essa escola corrija os rumos - ela corrija -, para que ela possa melhorar o ensino e ela possa formar médicos que, efetivamente, vão dar qualidade à nossa assistência médica, que, aliás, é muito boa, de maneira geral, mesmo no SUS, com alguns problemas, mas ela é uma assistência de muito boa qualidade. Temos problemas no SUS, com certeza, mas eu acho que o médico melhor formado vai ajudar, inclusive, a melhorar isso.
Acho que a especialização já foi colocada. Eu coloco este gráfico aqui da esquerda, que mostra a evolução do número de alunos: 280 mil, de 2018 a 2024. Foi de 160 mil para 280 mil, arredondando os números. E embaixo, ali em marrom, é a residência médica. Quando eu me formei, em 1975, era inimaginável um médico graduado não fazer a residência médica, que é, realmente, a cereja do bolo, que é onde o médico se especializa, onde ele consegue, realmente, atingir um nível adequado para atender a população com qualidade. Ele se torna um especialista ali.
Veja, o Prof. Cariri também já colocou as vagas autorizadas de residência, estão ali no gráfico da direita. Em 2024, que é a última coluna, são 24 mil autorizadas, mas só 19 mil ocupadas. Então, nós temos quase 5 mil vagas não ocupadas. E aqui estão as especialidades que têm esse problema.
Então, vejam, eu acho que nós temos com as sociedades de especialidade, que são afiliadas à Associação Médica Brasileira... São 54 sociedades. E existem programas de residência símile, que são credenciados e fiscalizados pelas sociedades de especialidade. Nós temos quase 5 mil médicos se especializando, mas são programas de residência símile. Não são essas especializações inadequadas, essas pós-graduações que são de 300, 400, 500 horas, mas com uma carga horária similar à residência médica, com 2,88 mil horas anuais.
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Então, essas, sim, podem ser aprovadas. Por que não usar esse orçamento que já está aí para fazer com que as sociedades de especialidades...
(Soa a campainha.)
O SR. ANTONIO JOSÉ GONÇALVES - ... e isso pode ser feito daqui a pouco, no ano que vem se quiser. Essas vagas ociosas; passar para as sociedades de especialidade para financiar esses 4 mil médicos que estão fazendo essa especialização sem receber bolsa nenhuma, e muitos deles pagando para fazer essa especialização.
Eu já estou finalizando.
Então, a situação vai se agravar com esse número de...
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Fique à vontade.
O SR. ANTONIO JOSÉ GONÇALVES - Muito obrigado, Senador.
Então, veja, um outro aspecto é a carreira de Estado - acho que foi colocado aqui. Esta é a demografia médica nacional: nós temos uma distribuição, no Distrito Federal, de 6,28 - naquele gráfico ali em cor-de-rosa, ali no meio -; e, no Maranhão, 1,27. Se a gente for pegar regiões longínquas da Amazônia, isso é menor ainda. Tem regiões que não têm nem 0,5 médico por mil habitantes, e o recomendado pela Organização Mundial de Saúde são três médicos por mil habitantes.
Então, vejam, a projeção é de que nós teremos 1,15 milhão de médicos em 2035, daqui a dez anos. Vai dar 5,25 médicos para cada mil habitantes. É uma pletora enorme. E o pior disso: não é só o número; é a qualidade. Vão ser médicos mal formados. E nós temos responsabilidade nisso, senhores. Então, nós precisamos não de mais médicos, mas de melhores médicos e uma distribuição mais racional. E isso só vai ser conseguido com uma carreira de Estado, sem dúvida alguma. Nós temos problemas. Temos também dois projetos, pelo menos, de carreiras de Estado no Parlamento, e acho que essa vai ser a nossa próxima briga.
Só para finalizar, urge a aprovação desse projeto de lei, e os motivos que eu digo são os seguintes: vai proteger a população contra o médico mal formado; vai obrigar que o médico estude mais para ser aprovado; vai melhorar o nível dos nossos médicos, que vão atender melhor, vão pedir menos exames, vão fazer diagnósticos mais precisos e mais rápidos, o que vai dar qualidade e economia para o nosso sistema de saúde, que já é subfinanciado.
O exame de proficiência é feito na maioria dos países. Os países desenvolvidos que têm uma qualidade profissional, uma qualidade médica adequada, todos eles fazem o exame de proficiência. Por que nós temos que ser diferentes? Por que vamos penalizar a nossa população? Os alunos vão ter que voltar para a escola, os que não forem aprovados. A escola tem que assumir a responsabilidade que ela teve quando abriu, quando pediu autorização para o MEC para funcionar. E as escolas com alto percentual de reprovação vão ser fechadas. Só que elas vão ter uma oportunidade de se corrigir através do teste do progresso. Não vai ser de imediato.
E, mesmo se aprovado, ainda vão se formar daqui a seis anos... Nós temos seis anos para regulamentar isso, gente! Então, nós temos tempo para fazer isso de uma maneira adequada.
E eu concordo com a Profa. Denise: acho que a avaliação da Capes, o processo de avaliação da Capes é um dos melhores que nós temos no país. Eu coordenei a pós-graduação da Santa Casa durante cinco anos, na época do Francisco Sampaio, e realmente é uma avaliação das mais sérias que existem no país. Foi por isso que a nossa pós-graduação cresceu, e nós formamos um número significativo de doutores, embora insuficiente ainda, né?
Então, veja - só para finalizar -, segundo a Datafolha, 95% da população aprova o teste. E eu acho que, se esta é realmente a Casa do povo, e eu tenho certeza absoluta de que é, ela tem que ouvir a voz do povo, tem que ouvir esse clamor da sociedade por uma qualidade melhor, por médicos que realmente sejam bem formados, possam atender melhor os pacientes e melhorar o nosso sistema de saúde.
Muito obrigado. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Agradecendo a participação do Dr. Antonio José Gonçalves, vamos à última convidada, que é a Sra. Elizabeth Regina Nunes Guedes, Presidente do Conselho Deliberativo da Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup) e Conselheira da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação (CNE), que está à distância, remotamente.
Com a palavra V. Sa., Dra. Elizabeth.
A SRA. ELIZABETH REGINA NUNES GUEDES (Por videoconferência.) - Eu estou sem som.
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Não, o som está bom aqui.
A SRA. ELIZABETH REGINA NUNES GUEDES (Para expor. Por videoconferência.) - Ah, é? Desculpe...
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Pode falar.
A SRA. ELIZABETH REGINA NUNES GUEDES (Por videoconferência.) - ... é porque não estou vendo vocês. Poderia, por favor, pedir à mesa para ligar a câmera também porque eu não estou conseguindo acesso?
Pronto. Agora, sim.
Muito obrigada, Senador. Quero desejar uma boa tarde a todos, agradecer esta oportunidade de mais uma vez estar aqui com os senhores, debatendo um assunto tão relevante. Quero cumprimentar minha colega Denise, Profa. Denise, Presidente da Capes, e, na pessoa dela, quero cumprimentar a todos que me antecederam.
Senador, em primeiro lugar eu gostaria de dizer que eu e o Senador Hiran temos muitas coisas em comum, assim como o Senador Nelsinho, a própria Senadora Teresa Leitão; nós temos militado em muitas causas comuns entre nós, então, estamos alinhados.
Em relação à questão do exame de proficiência, eu temo que eu tenha uma divisão com o nosso querido Senador Hiran. Falo não como Conselheira, mas falo como ex-Presidente da Anup e autora da ADC 81, que, justamente, veio fazer com que a farra da abertura de cursos de Medicina por liminar fosse pelo menos interrompida com a medida cautelar dada pelo Ministro Gilmar Mendes.
O Conselho Federal de Medicina não entrou como amicus curiae nessa ação. Então, para mim causa muita estranheza que ele tenha problemas com a abertura de novos cursos, quando a Anup ficou ali sozinha, com a AMB, tentando impedir essa enxurrada de absurdos que nós temos visto com essas aberturas de cursos por liminares. E aí nós temos que, mais uma vez, louvar a ação do MEC, que não só organizou a fila de entrada, como fez todas as portarias necessárias e criou o padrão decisório que nos tem permitido indeferir muitos desses pedidos.
Queria, Senador, também dizer ao senhor que tudo na vida deveria responder a uma necessidade. Esse exame de proficiência está respondendo a que necessidade? Certamente não é à necessidade de melhoria da educação médica, porque a educação médica não se mede testando alunos.
Nós temos hoje o Ministério da Educação ativamente estudando e trabalhando nessa questão - já foi avisado, já foi anunciado o Enamed. As diretrizes populares nacionais, das quais eu tive a honra de ser a Relatora, junto com a Conselheira Ludhmila Hajjar, já colocaram o exame do quarto ano. Então, nós acreditamos que o teste de progresso, esse sim, é capaz de acompanhar a evolução do aluno. Esse teste de proficiência vai ser mais um cartório, mais uma fábrica de cursinhos preparatórios para alunos recém-formados. E nós temos o MEC ativamente também no exame anual e censitário.
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O exame de proficiência não faz nada pela educação médica: ele culpabiliza o aluno e não resolve o problema da formação, que é o curso, que é a falta de estrutura, que é a falta de vagas para estágio, perdão, para internato, que é a falta de laboratórios, de campos de prática, enfim, dos convênios todos com o SUS, que precisam ser feitos, porque a gente sabe que a formação médica é estruturante em relação ao SUS, ou que o SUS é estruturante em relação à formação médica.
E o exame de proficiência, na verdade, vai simplesmente dizer, "olha, você tem as competências ou você não tem as competências". Eu vou criar um subgrupo de alunos não aprovados, com o que vamos criar um problema novo, que é um problema que nós não temos hoje, e com o Enamed, nós deixaremos de ter, porque esse aluno vai ser testado ao longo do curso, e eu vou ter a oportunidade, Senador, de entrar onde importa, que é dentro da estrutura dos cursos que estão formando esses médicos, bem formados ou mal formados.
Uma prova de proficiência não descredencia ninguém, não limpa, não higieniza o ambiente e nem garante que nós teremos melhores alunos, haja vista o que acontece com a OAB. O que foi que a OAB fez em relação ao número de cursos de Direito? Absolutamente nada. Se o senhor levanta uma pedra, hoje tem um curso de Direito ali embaixo, sendo feito, com a diferença de que o aluno que não tem a carteirinha da OAB tem outras ocupações como advogado. E no caso da medicina, nós temos uma situação totalmente diferente.
Eu acho, com todo respeito, que o exame de proficiência é isso. Ele vai ser um cartório, vai ser um puxadinho na avaliação, quando nós temos o Saeme, que já é uma coisa maravilhosa, que qualifica os cursos e que deveria ser o foco do trabalho do Conselho Federal de Medicina, e não...
E nós temos notado também - e aí, quero, sempre com o maior respeito, porque eu sou bem recebida no Conselho Federal de Medicina, temos tido discussões ali muito profícuas - que há um excesso de ativismo no conselho hoje, usurpando funções de regulação e de avaliação que são próprias do MEC, como foi agora a última resolução, que quer disciplinar campo de estágio, quer disciplinar coordenadores.
Então nós estamos vivendo um momento, eu acho que de confusão de papéis. Acho que o conselho federal está perdendo um pouco o seu foco como órgão de representação da categoria profissional, e não um órgão que vai interferir na avaliação.
Os colegas que me antecederam já exploraram esses argumentos de uma forma muito competente, e eu volto a dizer ao senhor, Senador, que o exame de proficiência é um exame tardio, sem nenhuma indicação, sem nenhum farol. Só vale a pena você fazer uma avaliação se ela for um farol para o futuro, se ela se refletir na melhoria dos processos, na melhoria da formação médica, na melhoria do que está ocorrendo nas relações de internato, de residência.
A gente teve aqui o colega que mostrou a defasagem das vagas de residência, mas isso não tem nada a ver também só com a avaliação dos alunos, não é? E eu acho que o Inep tem tido uma atitude corajosa," de enfrentar, punir e prometer a redução de vagas e a suspensão de vestibulares.
Nós temos que ser muito práticos nas nossas medidas avaliativas. O exame da ordem, como o exame de proficiência de medicina, não terá nenhum efeito prático sobre as escolas. Ele vai simplesmente separar um conjunto de alunos e dizer, "você aprendeu, você não aprendeu", e as fábricas de malfeitos e as fábricas de bem-feitos continuarão funcionando normalmente, porque sobre elas não haverá nenhum controle.
Então eu quero propugnar aqui, Senador, com o maior respeito, pela rejeição desse projeto do teste de proficiência pelo Conselho Federal de Medicina.
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Se, de todo, ele for necessário, o local não é no Conselho Federal de Medicina, é dentro do Inep, é no Inep que vai se fazer isso, e não dentro de um conselho de classe que inclusive... São médicos maravilhosos, tenho certeza disso, muitos deles professores, mas o Inep tem uma máquina de pesquisadores, de pessoas que estudam avaliação, que são profissionais na tarefa de montar esse processo avaliativo.
Então eu vou encerrar minha fala, é uma fala breve. O último sempre é meio... O último fica sempre prejudicado, porque senão fica repetindo demais, mas eu queria dizer ao senhor que eu acho que esse projeto de lei é um erro, ele usurpa atividades de avaliação e de regulação... De regulação são através das resoluções, mas, de avaliação, são do Inep e do MEC. O Enamed está aí, vai ser aplicado, censitariamente, anualmente, vão fazer o exame para o Enare também.
Então eu acho que ou isso é inevitável e o local dele não é o Conselho Federal de Medicina - é dentro do MEC -, ou, se ele for evitável, eu acho que o Brasil vai agradecer, porque nós teremos menos um cartório e menos uma burocracia que não vai iluminar a melhoria da educação médica no Brasil.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Chegamos à última convidada do dia, que foi a Dra. Elisabeth.
Eu pergunto aos presentes se gostariam de usar a palavra. (Pausa.)
Dr. Luiz Ovando, V. Exa. tem a palavra.
O SR. DR. LUIZ OVANDO (Bloco/PP - MS. Para expor.) - Senador...
Alô...
Senador Marcelo Castro, Presidente desta audiência pública, na sua pessoa eu quero saudar a todos os médicos presentes e também a Senadora e os convidados.
Eu quero me apresentar aqui inicialmente: eu sou Luiz Ovando, nome Parlamentar, Dr. Luiz Ovando, sou de Mato Grosso do Sul, médico, graduado há 50 anos, professor aposentado do curso de Medicina. Nós somos da mesma época, Dr. Antonio, de formatura - 1975, agora dia 20 de dezembro completamos 50 anos.
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Eu sou de 1974.
O SR. DR. LUIZ OVANDO (Bloco/PP - MS) - Então você é mais velho.
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Até agora eu sou o campeão aqui.
O SR. DR. LUIZ OVANDO (Bloco/PP - MS) - Você é o campeão aí, Marcelo.
Desde então, estou ativo e continuo atuando ainda no consultório - nas horas vagas, mas de forma regular.
Eu quero aqui, rapidamente, colocar uma situação que nós estamos vendo.
Há prós e contras na apresentação de vários. O que a gente percebe é que o MEC é muito pouco citado aqui, Profa. Denise, e é o grande responsável por essa crise que nós estamos vivendo.
Nós vimos o Prof. Gonzalo falando que, quando ele entrou na escola, em 1972, eu já era acadêmico de terceiro ano de Medicina, naquele ano, quando ele se formou, foram 3 mil, e, depois, passados dez anos, 9 mil.
E aqui é sempre bom a gente relembrar que, por ocasião do Governo Dilma, nos seis anos, foram instaladas 151 escolas médicas neste país, e a gente sempre questiona se há a verdadeira condição de orientação adequada ao aluno. Recentemente nós escrevemos um artigo, está publicado na Gazeta do Povo, sobre como diploma não mede competência.
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Eu sempre fui contra esse exame que está sendo debatido aqui porque eu sempre acreditei na faculdade médica, nos professores, mas eu cheguei a um ponto em que não dá mais para segurar. Por quê? Porque o MEC não assume o seu papel. E eu vou dizer por quê.
Eu fui Relator de um projeto de lei na Comissão de Seguridade Social e Família, que foi desdobrada, agora é Comissão de Saúde, a Comissão de Seguridade Social e Família ficou à parte. Esse projeto visava reduzir... Houve um consenso - direita, esquerda, centro - e todo mundo optou e votou favoravelmente por limitar o EaD de cursos envolvendo saúde, vários, nove ou dez, em torno de 20% da carga horária. Nós tivemos várias reuniões, inclusive com o pessoal do MEC forçando a barra para que isso não fosse aprovado. Aprovamos, mandamos à frente e está parado, há dois anos, na Comissão de Constituição e Justiça. E agora, através de um documento do MEC, soltaram uma nota proibindo o EaD. Mas, ao mesmo tempo, nós tivemos aqui o Enamed.
Eu sou professor do curso de Medicina, trabalho com aluno há muito tempo, fui coordenador do Programa de Residência em Clínica Médica na Santa Casa por 20 anos, e tinha alunos. E o que acontece à beira do leito? Aluno não vai mais à beira do leito. O professor, Toufic, prefere ficar no ar-condicionado, em torno de uma mesa, discutindo teoria e evidências científicas, o que é lamentável. Aqueles alunos mais brilhantes, o pessoal pega e diz assim: "Ó, você vai preparar para o Enade". E o MEC aceita aquilo tranquila e serenamente. E aí a escola tem classificação x, mas na hora que vai para uma avaliação geral, nós temos aí em torno de 8 mil alunos com nota um e dois saindo no mercado, sem condição.
O que aconteceu? Eu, quando me formei, o meu professor levava era no centro cirúrgico, tinha que aprender. Quando saímos, nós fomos mandados para o interior. Com 26 anos, depois de três, quatro anos, já em prática constante, sem residência médica, nós conseguíamos fazer cesárea, conseguíamos fazer parto, conseguíamos puncionar lombar e fazer peridural e raqui, conseguíamos fazer uma laparotomia baixa, inclusive para resolver problemas, reduzir fratura, tratar criança, insuficiência cardíaca, pneumonia e assim por diante. Hoje o indivíduo fica na cidade. E o que está acontecendo, lá no meu estado? Nós levantamos, rapidamente, uma cidade. Eles andam, por semana, 27 mil quilômetros - por semana - levando paciente.
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Hampton e Peterson, já em 1975, publicaram um trabalho dizendo que história clínica e exame físico resolvem, diagnosticamente, 80% dos casos. Hoje nós estamos tendo alunos saindo sem condição, aglomerados em cidades. Vitória tem 18 médicos por mil habitantes. Brasília não deve ser diferente, deve ter em torno de seis, sete por mil habitantes.
No meu estado, quando eu me formei, era um médico para cada 2 mil habitantes. Hoje nós temos no estado, de uma maneira geral, 3,5 médicos para mil habitantes no interior e, em Campo Grande, um pouco mais, em torno de seis.
E a viagem continua. Nós não estamos resolvendo... Então, o que nós vamos fazer?
O MEC não está fechando escolas, como o senhor disse, Antonio. Se fechar escola, nós vamos penalizar o aluno também.
Então, a única forma é fazer com que a sociedade, aquele que vai buscar o conhecimento, como é o aluno, avalie, pelos resultados, aquela determinada escola e diga: "Eu não vou para essa escola, porque depois eu vou ter problema". Quem deveria fazer isso era o MEC. E o MEC não faz. E agora nós estamos com o Enamed, que é mais um disfarce, é mais uma acomodação para não se pôr o dedo na ferida.
Nós temos aí mais de 50 escolas médicas, Profa. Denise, autorizadas sem condição. No meu estado, vai começar uma escola médica na cidade de Dourados com prova de admissão pelo computador - o indivíduo a faz em casa.
Então, nós chegamos a uma vulgarização e a uma banalização em que não se justifica esse tipo de discurso, falando: "Não, nós vamos penalizar o aluno, porque não vai ser...". E a população? E esse mesmo aluno, no dia em que ele terminar, vai fazer o quê?
Então, eu me coloco aqui favoravelmente a esse curso, que, é claro, não pode ser num estalo de dedos. Diploma não mede competência. A avaliação, como o senhor disse, Prof. Toufic, tem que ser ampla, tem que ser inclusive emocional, se for possível. É fundamental que seja assim. Não é simplesmente a teoria e a prática, mas a prática tem que fazer parte. Como abordar o paciente? Quais são as hipóteses diagnósticas mais frequentes? Isso tudo tem que constar desse programa.
E quem vai fazer isso? Vai levar tempo? Vai levar tempo. Vai ser o Conselho Federal de Medicina? Que seja o conselho, fiscalizado, ou que sejam outras instituições, inclusive o MEC, participando. Agora, o MEC é o grande responsável por isso até então. E isso não é de hoje.
Quando o Prof. Gonzalo e o Sr. Dr. Antonio falavam: "O que nós queremos do médico?"... Eu participei de muitas aulas, inclusive, do Prof. Clementino Fraga Filho, que vocês devem conhecer, buscando o médico que resolve o problema. E nós continuamos nessa luta. E, até hoje, nós não conseguimos resolver o problema, e o problema está cada vez pior. E, agora, nós estamos numa situação... Numa encruzilhada.
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É preciso fazer alguma coisa, caso contrário, nós não teremos médicos resolutivos, porque a residência está tendo, inclusive, problema, Prof. Rodrigo, com a diferença salarial: na residência de 60 horas ganhando R$4.109, ao passo que, na residência que exige 39 horas, que é a residência da saúde da família, ganham-se dez mil, seiscentos e alguma coisa - 5,5 vezes mais! -, mostrando que o aluno tem que ficar folgado e que, na verdade, o residente tradicional é o que mais trabalha - e o cara não está querendo mais, porque há cursos que ele pode pegar, aí coloca o título lá em cima, e a avaliação realmente não tem sido à altura. Então, ele não vai para a residência, porque trabalha muito e ele não está preparado; ele vai para cursos paralelos, e, lamentavelmente, o Governo está achando que está fazendo grande coisa, mas não está cobrando.
Eu gostaria... Eu tenho perguntado isso e não acho ninguém para responder! A resolubilidade do que sai do programa de estratégia de saúde da família, ou... Quantos vão resolver, quantos voltam para solucionar? A gente não tem esses dados. Eu fui ao TCU para saber disso. Ninguém sabe; é uma incógnita! Mas o programa está aí colocado, com essa diferença salarial, e o pessoal indo. Eu acho que é um chamariz, mas tem que haver uma exigência maior e uma carga horária muito mais exigente para que, verdadeiramente, a gente possa ter solução futura.
Era isso, Sr. Senador. Muito obrigado pela oportunidade.
Quero aqui, só para terminar... Chamaram-me a atenção aqui porque foi falado pela Dra. Elizabeth que o CFM não faz parte do amicus curiae - isso é um termo jurídico; com meu filho, de vez em quando, eu converso... Aqui eu fui alertado para corrigir isso, porque o CFM faz parte desse amicus curiae, conforme a ADC 81.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. JAYME CAMPOS (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - MT) - Presidente, eu gostaria de pedir pela ordem, por favor...
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Pois não, Senador Jayme...
O SR. JAYME CAMPOS (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - MT) - ... nossa ilustre e querida Senadora Teresa...
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - ... V. Exa. tem a palavra, pela ordem.
O SR. JAYME CAMPOS (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - MT. Pela ordem.) - Só prestando atenção nas palavras do Deputado Dr. Luiz, em relação a essa discussão nesta audiência pública, eu só quero fazer uma pequena observação a V. Exa., Deputado, em relação à questão de médicos.
Eu fiz um comparativo aqui em relação a Dourados, Três Lagoas e Campo Grande, a capital do nosso querido Mato Grosso do Sul. É bom que você deixa muito bem esclarecida também aqui nesta audiência pública a questão da distribuição de médicos no Brasil, Senador Marcelo Castro. Eu venho lá do Mato Grosso, fui três vezes Prefeito, Governador do estado, duas vezes Senador da República. Talvez a facilidade, talvez até a má formação acadêmica dos nossos médicos seja pelo fato de que há uma má distribuição, e com isso houve, até certo ponto... Facilitaram, como ele bem disse aqui: no Governo Dilma Rousseff, 151 novos cursos de Medicina surgiram no Brasil.
Por outro lado, é bom que se esclareça não só da má formação, nós temos que ver também com muito carinho e responsabilidade, sobretudo dos nossos órgãos públicos, particularmente do nosso conselho regional de medicina, a picaretagem que também está havendo muito - é bom que se esclareça aqui - em relação aos cursos de Medicina, na medida em que, pelo que eu tenho percebido hoje, passaram muitos profissionais descompromissados com a boa prática, visando muito dinheiro. Também isso são dados, são informações que eu tenho, porque muitas vezes eu fico perplexo, estarrecido e, sobretudo, indignado de ver a prática de alguns médicos.
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Todavia, eu acho que esses cursos que foram criados e estão criando mais, novos, com essa possibilidade é com a visão, talvez, de levar também o médico a comunidades nos mais longínquos e distantes municípios de nosso país.
Para que vocês tenham conhecimento - V. Exa., Marcelo, que é médico também -, nós temos cidade do Mato Grosso, das 142 cidades, que não tem médico, por incrível que pareça. O cidadão vai em cima da carroceria de uma caminhonete, em uma ambulância caindo aos pedaços, e quando chega lá aonde ele gostaria e o paciente já chega praticamente morto. Anda 400km de distância, e o cidadão, muitas vezes, chega até já falecido, é só botar no caixão e voltar para trás.
Então, é um assunto extremamente importante, a questão desta lei que está sendo proposta para ser aprovada aqui no Senado Federal, que é a da proficiência, e eu espero que daqui saiamos conscientes da nossa responsabilidade, votando aquilo que é melhor para o nosso país.
Nós não podemos soltar aí os maus profissionais. Na pandemia, lamentavelmente, o que morreu de brasileiro por falta de médicos competentes, de médicos que, muitas vezes, não tinham nem se formado ainda, que estavam no quinto ano de Medicina e já estavam nos hospitais tentando entubar.
Eu tenho dois irmãos médicos, eu tenho sobrinho médico, sobrinha médica etc, etc., tem um caminhão de médicos lá. De vez em quando eu mesmo chamo na moral algum deles lá e falo: "amigo, faça um serviço com responsabilidade", sobretudo, com amor ao próximo. Porque só pensam em querer mais construir não sei o quê, e etc., crescer, visando só a questão financeira.
De forma que eu espero aqui, Marcelo, Senador Marcelo e demais presentes aqui, que eu acho que são pessoas extremamente competentes para discutir essa matéria, que façamos com certeza também justiça, não muito para o céu e muito menos para a terra. Façamos uma lei em que possamos dar segurança e, sobretudo, dar oportunidade para que o cidadão brasileiro mais distante dos grandes centros deste país também tenha assistência médica.
Essa é minha pequena observação, e espero que nós possamos votar essa matéria com a maior brevidade possível. Com certeza, já está se arrastando aqui na Casa há algum tempo, eu mesmo já participei como membro titular desta Comissão de vários debates aqui e espero que possamos aprimorar melhor ainda este projeto de lei para atender à necessidade, sobretudo, das pessoas humildes que dependem dos postos das unidades de saúde do serviço público.
Obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Pois não, Senador Jayme Campos.
Passo a palavra agora à Senadora Teresa Leitão.
A SRA. TERESA LEITÃO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada, Presidente.
Quero cumprimentar todos os convidados e as convidadas, a presencial e a remota.
Vou inicialmente repetir o que eu disse na última audiência, Senador Marcelo Castro, porque V. Exa. não estava. Eu tive o prazer de presidir a segunda das três audiências que realizamos nesta Comissão. A audiência foi proposta por mim, em um momento, Denise, de extrema tensão nesta Comissão, porque o projeto chegou para ser aprovado e, eu tive a ousadia de dizer que não estava pronta para votar. Não participei da discussão na Comissão de Educação - foi na legislatura passada talvez ou, então, em um momento em que eu não estava. Hoje, eu presido a Comissão e desde que eu a presido não chegou nada deste porte para votarmos lá. Porque eu não sou da área e muitos disseram isso a mim naquele momento, colegas Senadores: "você não é da área". Estava cheio isso daqui porque ia ser votado, aprovado e comemorado.
Eu quero ressaltar que o Senador Marcelo Castro, da área, médico, foi um parceiro. Juntamente com os outros dois Senadores médicos, Dr. Humberto Costa, Dr. Rogério Carvalho, que disseram que, sim, tínhamos que discutir.
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Eu não estava fazendo um juízo de valor, apenas dizendo que a matéria é complexa e que não poderia ser votada de supetão.
Acho que foi um benefício, uma riqueza que esta Comissão nos proporcionou, a quem é da área e a quem não é da área.
Eu me coloco na área também. Sabe, Presidente, por quê? Porque eu sou professora, e o que eu vi e percebi, em todas as quase 20 participações aqui, se não me engano - se não foram 20, foi um pouco mais ou um pouco menos, mas foram três audiências, algumas com seis pessoas, outras com oito pessoas -, foram mais de duas dezenas de especialistas, de pessoas com vivência na área da saúde, de pessoas com perspectivas diferenciadas, de concepções, de pensamentos, de vivências. Foi muito enriquecedor.
A Presidência teve o cuidado de organizar as escutas com as diversas posições, não apenas posições ortodoxas, fechadas, "eu sou contra o projeto", ou posições "eu sou favorável ao projeto".
Não, o que nós vimos aqui, Senador, foram momentos de muita reflexão, momentos de reconhecimento do grave problema que o Brasil enfrenta e momentos também de perspectivas, momentos de soluções anunciadas, que não são soluções mágicas.
Tudo, na dinâmica social que a gente vive hoje, ou quase tudo é transitório. O avanço da ciência e da tecnologia tem-nos imposto isto: quase tudo é transitório.
Aí eu me pergunto: qual é o problema mais focal que eu vi de todos? É o problema da formação, que é nosso, né, Denise? Nós lutamos por ele há quantas dezenas de anos, há quantos Planos Nacionais de Educação - há um próximo para chegar aqui, está chegando -, que tem a ver com exercício profissional, tem a ver com identidade da profissão escolhida, tem a ver com valorização do fazer profissional.
E a profissão está ligada ao acompanhamento, à avaliação, ao monitoramento, a reposicionamentos, a redireções.
E aí eu pergunto, Presidente: uma prova de proficiência vai resolver? Essa é a minha dúvida, além de uma dúvida que eu tenho também em relação ao papel dos conselhos profissionais.
Nós lidamos, na minha profissão, com um problema seriíssimo de um Conselho profissional de Educação Física, que tem o direito de fiscalizar o exercício da profissão de educação física, mas, paralelamente a isso, você tem o professor concursado para exercer o magistério de educação física, que não é regido e nem fiscalizado pelo conselho. É regido pelo Estatuto do Magistério.
Aí vejam as contradições e os dramas que a gente enfrenta nisso: o papel do conselho, o papel do estatuto, o papel do gestor público da educação municipal ou da educação estadual.
Então, fica a mim uma pergunta e uma lacuna a respeito do que é fiscalizar o exercício de uma profissão, papel central dos conselhos profissionais, e o que é interferir na formação a ponto de impedir que alguém formado, ou bem formado, ou malformado, possa exercer essa profissão?
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Acho que foi de uma riqueza muito grande, todos a que eu assisti - peço desculpas até porque cheguei atrasada por causa de outra atividade e não pude assistir a todos, mas é preciso fazer alguma coisa,, eu diria que é preciso fazer muitas coisas, e a gente está centralizando, centrando tudo na força de uma prova de proficiência. Acho que é essa a reflexão que a gente tem que fazer.
No mais, Senador Marcelo, muito obrigada por ter compreendido a minha angústia naquele dia. Temos enfrentado quem veio aqui para comemorar a aprovação do projeto. Não sei se ele vai ser aprovado ou não. Eu dou muito valor ao processo, muito valor, muito mais valor ao processo do que ao produto.
O processo foi muito rico e esperamos que possa iluminar o produto, iluminar esse resultado, e trazer o que for melhor para o exercício da medicina que, por tabela, é o melhor para o atendimento da população.
Então, V. Exa. está de parabéns pela condução - dividimos com o Dr. Hiran as coordenações e estamos, a meu ver, muito mais preparados do que estávamos há alguns meses, algumas semanas atrás, para a votação - e pelo que aconteceu daquele período para cá e com algumas medidas tomadas pelo MEC.
O MEC é muito requerido, é muito cobrado, eu compreendo - e acho que deve ser -, mas compreendo também que o MEC e o Ministério da Saúde, como aqui a gente percebeu, nas audiências passadas, não estão parados. Estão refletindo, estão produzindo, estão também querendo melhorar o exercício da medicina no país.
Muito obrigada, Sr. Presidente. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Nós é que agradecemos a participação de V. Exa., Senadora Teresa Leitão.
Passo agora ao Deputado Eduardo Velloso.
V. Exa. tem a palavra.
O SR. EDUARDO VELLOSO (Bloco/UNIÃO - AC. Para expor.) - Boa tarde, Senador Marcelo, boa tarde a todos que compõem a Mesa.
Eu vim hoje aqui debater sobre a proficiência médica.
Como médico, formado na Universidade Federal do Amazonas... Sou do Norte do Brasil, do Estado do Acre - talvez um dos estados com a pior distribuição de médicos do Brasil - e, ao longo desses anos - estou formado desde 2002 -, desde que me formei, venho observando... Naquela época, tive a oportunidade de fazer um curso federal - não existia no Acre, fiz no Amazonas. Tive a oportunidade, também, de passar em Roraima, e optei pelo Amazonas.
Sabemos da dificuldade do acesso em si de um cidadão para ter uma formação médica e da dificuldade de concentração desses médicos, que talvez seja um dos propósitos de qualquer Governo, levar médicos onde não se tem médicos, principalmente naquelas cidades com mais de 50 mil habitantes.
O Acre hoje tem apenas duas cidades acima de 50 mil, ou seja, dos 22 municípios, 20 não têm mais de 50 mil e sabemos da dificuldade que é se fixar um médico lá.
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E aí foram criados vários programas do Governo, para que isso, de alguma forma, fosse minimizado, mas, mesmo assim, até hoje, nós observamos que essa distribuição dos médicos no Brasil é o problema.
E foram se criando várias faculdades, a princípio eu acho que até mesmo para suprir essa dificuldade; e nós não observamos, ao longo desses anos, nos locais que realmente precisam, essa fixação do médico. Eu falo com propriedade do meu estado. Hoje, lá no meu estado, nós temos a faculdade federal, temos uma faculdade particular, na capital, e uma no interior. E, nessa cidade do interior, já não tem o médico especialista, conforme gostaríamos que tivesse, mas tem uma faculdade lá.
E nós observamos, ao longo desses anos, que, aqui, no Brasil, foram se abrindo várias faculdades, a princípio para tentar suprir isso de alguma forma. E o que está sendo observado? Está sendo observado que a concentração desses médicos não está se fixando nesses locais mais distantes, talvez por não ter um plano nacional de cargos e salários, talvez por essa dificuldade de municípios darem um salário digno.
Hoje, no Estado do Acre, nós perdemos por volta de dois profissionais por mês que vão embora do estado. Hoje, não tem emprego para médico lá e falta médico; e nós temos três faculdades de Medicina. Ao longo desses anos, aumentou, como mostra aqui, em 506% o questionamento de erro médico; e isso bota em xeque a formação. E aí, quando se bota em xeque, vão surgindo vários tipos de curso. Tem o de pós-graduação, tem curso sem ser de pós-graduação, tem o do final de semana. Isso aí é para deixar o médico, de alguma forma, às vezes - como é que eu falo para vocês? -, realizando um exame a mais, fazendo algo que ele começou; a estética está muito em evidência, e aí vai misturando. E, hoje, nós observamos que algo tem que ser feito.
E, aqui, seguindo o exame de proficiência, seguindo os países mais desenvolvidos, eu acho que isso, talvez, Senadora, não se resolva do dia para a noite, meu Deputado, mas eu tenho certeza de que as faculdades vão começar a olhar melhor a qualificação que elas vão fazer com os estudantes que elas detêm. Não tem outra forma de você melhorar a não ser cobrando.
Parabenizo, aqui, os Senadores que estão à frente disso. O Senador Hiran é o Relator, não é isso, Senadora?
A SRA. TERESA LEITÃO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE. Fora do microfone.) - Isso!
O SR. EDUARDO VELLOSO (Bloco/UNIÃO - AC) - O Senador Hiran é o Relator, é oftalmologista, assim como eu também sou oftalmologista; e sabemos dessas dificuldades. E quero, aqui, falar que também sou a favor disso, para que, de alguma forma, nós tenhamos médicos de melhor qualidade em todo o Brasil, porque essa dificuldade que nós passamos lá no Estado do Acre, de fixar o nosso médico, está muito grande.
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Hoje, o salário no Estado do Acre... Meu pai é mineiro, foi para lá 52 anos atrás. Teoricamente, com o salário que ele ganhava, comprava dois carros. Hoje a gente não paga a parcela de um carro. Então, mudou muito, e não tem espaço.
O plantão que é pago lá é menor que o de Brasília, parece que vai subindo, vem de Rondônia, Mato Grosso, Goiás, Distrito Federal, e o plantão vai aumentando. Então, essa fixação do médico lá também precisa da valorização do profissional naquela ponta, nem que seja por auxílio a cidades com menos de 50 mil habitantes. Algo também tem que ser feito em conjunto a isso, senão nós não vamos conseguir fixar o profissional lá.
Então, essa é uma preocupação que eu tenho. O nosso estado hoje tem três faculdades de Medicina. Inclusive, na cidade de Cruzeiro do Sul, é um mercado, conforme foi falado aqui, bilionário. Eles estão dando esse local de moradia para a pessoa estudar lá na faculdade particular. Foi comprado um terreno, e está em construção, então, daqui a um ou dois anos, o aluno que for de fora para morar lá terá - já inclusa na mensalidade da faculdade - a moradia para o estudante ficar lá.
Então, algo tem que ser feito, temos que repensar, porque... Não sei se é verdade ou não, quando se tem esses aportes, essas fusões de faculdades, um estudante de Medicina dizem que vale mais de 20 milhões numa bolsa de valores. Então, nós temos que estar atentos a isso...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. EDUARDO VELLOSO (Bloco/UNIÃO - AC) - São 22 milhões?
O SR. ANTONIO JOSÉ GONÇALVES (Fora do microfone.) - São 2 milhões.
O SR. EDUARDO VELLOSO (Bloco/UNIÃO - AC) - Como?
O SR. ANTONIO JOSÉ GONÇALVES (Fora do microfone.) - São 2 milhões, hoje abaixou para 1 milhão.
O SR. EDUARDO VELLOSO (Bloco/UNIÃO - AC) - Ah, já baixou para 1 milhão... Mas, enfim, algo tem que ser feito para melhorar a qualidade de acesso, que essa é a preocupação que nós temos como médicos e Parlamentares, melhorar o acesso das pessoas, principalmente as que usam o Sistema Único de Saúde.
Era isso que eu tinha para falar, Senador.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Pois não.
Um dos nossos convidados aqui, o Dr. Toufic, pede a palavra.
O SR. TOUFIC ANBAR NETO (Para expor.) - Obrigado, Senador.
O exame de ordem nos Estados Unidos - no modelo que existe, Senador, existe desde 1992 - são três etapas. E o que acontece? O que se observa nos Estados Unidos? Hoje, o gasto com saúde nos Estados Unidos é da ordem de 17,8% do PIB, e, até 2032, atingirá 20% do PIB dos Estados Unidos. Agora, a expectativa de vida nos Estados Unidos é quatro anos inferior a todos os outros países da OCDE.
Então, nós trabalhamos na Faceres, na nossa faculdade, com o conceito ampliado do papel da escola médica na sociedade, porque a escola ter um bom desempenho numa prova é uma coisa. Agora, qual o papel social da escola? O quanto ela altera os indicadores de saúde da população? Qual o impacto que ela tem na comunidade dela?
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E aí, o que acontece? Nos Estados Unidos, temos 33 anos no modelo atual de prova, são três provas teóricas, e os indicadores sociais dos Estados Unidos são péssimos, em comparação com os outros países desenvolvidos.
Em uma breve observação sobre carreira de Estado, seriam necessários 200 mil médicos para preencher todas as possíveis vagas de uma carreira de Estado. A minha preocupação não é o escopo do nosso debate hoje, senão eu teria trazido mais números, mas são 200 mil médicos e minha preocupação é onde arrumar um médico para seguir a carreira de Estado, porque eu acho que seria uma possível solução, Deputado e o Senador que falou do estado dele também, mas me preocupa também de onde sairia o financiamento para custear esse médico na carreira de Estado e a progressão dele na carreira.
Por fim, quero cumprimentar o Deputado Luiz Ovando, permita-me chamá-lo de professor, porque o senhor deu aula para dois primos meus, o Rodrigo e o Rafael Anbar, lá em Campo Grande.
O SR. DR. LUIZ OVANDO (Bloco/PP - MS. Fora do microfone.) - Os gêmeos?
O SR. TOUFIC ANBAR NETO - Os gêmeos. Exatamente.
É só, Senador. Obrigado pela oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Pois não.
A Dra. Denise Pires pede a palavra também.
V. Sa. tem a palavra.
A SRA. DENISE PIRES DE CARVALHO (Para expor.) - Muito obrigada, Senador, eu gostaria de saudar todos que se manifestaram depois da mesa, o Senador Jayme Campos, o Deputado Eduardo Velloso, a Senadora Teresa Leitão e o Deputado Luiz Ovando, mas eu pedi para comentar porque pretendo ser mais clara na minha conclusão final.
O Enamed é um exame nacional que foi lançado neste ano, no mês de abril, Exame Nacional de Avaliação da Formação Médica, sob responsabilidade do Inep. E ele será um exame, sim, obrigatório para todos os estudantes que concluirão o curso de Medicina e, neste ano, haverá a primeira prova do Enamed.
O Governo e o Ministério da Educação, através do Ministro Camilo Santana, estão extremamente preocupados com todas as questões levantadas e têm agido no sentido de atuar para que a população tenha cada vez mais contato com profissionais muito bem formados.
Infelizmente, havia falta de regulação com relação à criação das escolas médicas, houve uma moratória em 2018 que não impediu a criação de escolas médicas, é importante ressaltar escolas essas que foram criadas devido à judicialização.
Então, estamos no Ministério da Educação trabalhando para que essa regulação, inclusive do ensino à distância - que foi ampliado e foi citado pelo Deputado, foi ampliado de maneira exorbitante no Brasil -, que ele também pudesse ser regulamentado através de um novo decreto presidencial que faz com que os profissionais da área da saúde - como médicos, enfermeiros, dentre outros - e também os professores não possam mais ser formados em cursos 100% EaD.
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Trouxe esses exemplos para mostrar a seriedade com a qual a equipe do Ministério da Educação está trabalhando, mas quero concluir que a Capes é responsável pela avaliação dos cursos de pós-graduação e faz isso com excelência - por isso o Brasil é um dos países que mais produz conhecimento no mundo -, mas quem avalia não são os egressos, não são os profissionais, mestres e doutores; quem avalia são os professores, docentes, orientadores dos programas de pós-graduação.
Então, eu falei isso durante a minha fala e ressalto agora que a prova para concluintes do curso de Medicina, como por exemplo o Enamed, deve ser feita como é feita essa prova - o professor citou - nos Estados Unidos da América. Não é uma prova realizada pelo equivalente ao Conselho Federal de Medicina americano. Quem realiza a prova é o Conselho Nacional de Examinadores Médicos. O Conselho Nacional de Examinadores Médicos americano teria como equivalente no Brasil uma Comissão Nacional de Avaliadores de Cursos Médicos, que deve ter a sua localização no Inep, que é a estrutura, que é a autarquia do Ministério da Educação que deve ser a responsável pela avaliação não só da formação, mas também dos concluintes. Tem feito, através do Enade, agora a Prova Nacional Docente, o Enamed.
Por último, a grande questão com relação a esse PL é a atribuição equivocada ao conselho de formação, que não é um conselho de formação profissional, é um conselho para atuação profissional, porque é essa a atribuição das entidades de classe, como é o Conselho Federal de Medicina, como são os Conselhos Regionais de Medicina. Está equivocado o PL porque, mesmo no âmbito, ressalto mais uma vez, do Sistema Nacional de Educação, que será votado aqui em breve, essa questão é uma atribuição do Ministério da Educação, através das suas autarquias.
Muito obrigada mais uma vez, Senador. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Nós que agradecemos.
Dra. Teresa Leitão, eu pediria a V. Exa., se possível, para me substituir, porque eu não pensei que fosse estender tanto, e eu tenho uma audiência agora no Ministério da Educação, às 16h.
A SRA. TERESA LEITÃO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE. Fora do microfone.) - Já está nos finalmentes, não?
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Já está nos finalmentes, mas ainda tem três inscritos aqui. (Risos.)
Então, eu concedo a palavra ao Dr. Antonio José Gonçalves, que a solicitou. Depois disso, Dra. Teresa, tem o Dr. Gonzalo Vecina e o Dr. Rodrigo Cariri.
A SRA. TERESA LEITÃO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE. Fora do microfone.) - Vai dar tempo, não é?
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Castro. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - PI) - Vai, sim. (Risos.)
V. Sa. tem a palavra.
O SR. ANTONIO JOSÉ GONÇALVES (Para expor.) - Muito obrigado, Senador.
Eu só queria dizer para a Senadora Teresa Leitão que, quando ela solicitou a audiência pública, quando foi apresentado o projeto pela primeira vez aqui na Casa, eu fiquei muito chateado, mas hoje eu vejo, pelas próprias palavras dela, a importância disso. Eu acho que nós conseguimos esclarecer melhor os Senadores para que votem com mais consciência e com mais conhecimento de causa em um projeto tão importante como esse.
Depois da solicitação da audiência, eu tive a oportunidade de comparecer à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Lá são 96 Deputados, apenas um deles é médico - são dois médicos, mas um está de licença médica. A Deputada Bruna Furlan me convidou para ir lá e nós fizemos uma apresentação parecida com essa, de 20 minutos, e deu para a gente depreender a falta de conhecimento do Parlamento da situação do ensino médico no nosso país. Existe realmente essa falta de conhecimento. Então, Senadora, eu acho que a sua solicitação de audiência foi extremamente bem-vinda, e eu acredito que os Parlamentares que vão votar agora vão votar com muito mais conhecimento de causa - e eu espero que votem favoravelmente. Nós conseguimos, inclusive, na Assembleia Legislativa de São Paulo, um espaço para fazer um seminário sobre ensino médico, que vai ser feito agora em novembro. A Deputada Bruna Furlan já fez o requerimento e vai haver esse seminário. Na segunda-feira, eu devo fazer o programa junto com esse Deputado médico que é de São José dos Campos, para a gente poder discutir isso mais profundamente e fornecer algum subsídio para os Deputados do Estado de São Paulo, porque tem lá 13... o número de residentes e tem um terço dos programas de residência médica e um terço das escolas também. São 80 escolas só no Estado de São Paulo.
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Então, veja, o exame de proficiência pode ser que não seja perfeito, mas a gente tem que começar de alguma maneira, eu concordo com o Deputado. Eu acho que o teste do progresso pode ser implantado junto também e vai ajudar as escolas a melhorarem. As escolas têm que assumir sua responsabilidade quando elas aceitaram, quando elas pediram para ter alunos. Se tem que ter aluno, eles têm que ter uma boa formação. Então nós temos que exigir isso. E eu acho que, na hora em que as escolas souberem que vai existir uma avaliação do egresso, elas vão melhorar - elas vão melhorar. Quantas escolas nós conseguimos fechar no nosso país até hoje? Nenhuma, zero escolas. Zero escolas foram fechadas, não é fácil fazer isso. Então, veja, pode ser que não seja o melhor remédio, mas, às vezes, a gente dá um remédio que não é o melhor, mas resolve o problema. Pode demorar um pouquinho mais para o doente ficar curado, mas vai resolver o problema.
Então eu queria deixar esta última fala concluindo que a gente é favorável. Eu também fui por muito tempo contrário a isso, mas hoje não há mais condições.
Só um último exemplo: os Estados Unidos, que têm 400 milhões de habitantes, formam 28 mil médicos por ano, dados de 2022 - 28 mil médicos. Nós estamos formando... vamos chegar a 60 mil, palavra do Dr. Cariri. Como é que nós vamos fazer isso? Com metade da população, como é que nós vamos administrar isso? Como é que vai ficar essa formação? Então isso nós temos que levar em consideração. São dados concretos, absolutamente relevantes e que têm que ser considerados por esta Casa, para que a gente possa tomar a melhor decisão possível para a nossa população. Eu espero que isso aconteça.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada, Dr. Antonio.
O Deputado quer dois segundinhos para complementar o pensamento anterior.
O SR. EDUARDO VELLOSO (Bloco/UNIÃO - AC. Para expor.) - Isso. É só para deixar registrado que nós defendemos, sim, que o CFM faça fiscalização preventiva, em defesa da boa prática médica, da qualidade do atendimento da saúde. Como autarquia federal, nós temos todas as qualificações para exercer essa prerrogativa. Nós não queremos resolver o problema da educação médica - isso aí, sim, fica com o Ministério da Educação -; o que nós queremos é prevenir que maus profissionais, profissionais mal formados atendam a nossa população. É só isso que nós queremos. Era isso que eu queria deixar registrado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada.
Vou passar a palavra agora, de forma remota, para o Dr. Gonzalo Vecina.
O SR. GONZALO VECINA NETO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom, muito obrigado, Senadora.
Eu queria recuperar aqui a importância da ação reguladora do Estado. Estive trabalhando, durante muitos anos, com vigilância sanitária, e a vigilância sanitária tem esta responsabilidade: no lugar do Estado, buscar garantir a segurança sanitária dos medicamentos que são consumidos pela população. É função da regulação sanitária garantir a segurança sanitária dos produtos, é função do Ministério da Educação garantir que os cursos sejam adequadamente realizados.
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Agora, partir da premissa de que o Ministério da Educação não está fazendo o que deve fazer e que nós vamos fazer isso através do Conselho Federal de Medicina, são dois erros. E o segundo erro, que é entregar ao Conselho Federal de Medicina, pode ser que termine no mesmo lugar em que o primeiro erro está terminando. Então, o que nós temos que garantir é que nós tenhamos um melhor funcionamento dos órgãos que fazem a regulação da educação no Brasil. E o órgão que deve fazer a regulação do produto final é o Ministério da Educação.
Dr. Antonio, com todo o respeito que temos, eu acho que nós estamos punindo os alunos e não punindo as faculdades. Eu acho que as faculdades é que têm que ser punidas, e temos que garantir que os alunos sejam bem formados. Não quero que os alunos sejam mal formados e vão atender a nossa população, mas não é o Conselho Federal de Medicina que vai fazer isso; não é, porque não é ele que deve fazer. Quem deve fazer é o Ministério da Educação dentro de um Estado que se supõe democrático e em que a distribuição dos Poderes deve existir: o Legislativo faz uma coisa, o Executivo faz outra e o Judiciário uma terceira; e, quando o Legislativo falha, o Judiciário toma parte. E é por causa disso que nós tivemos uma explosão de cursos de Medicina.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Nós é que agradecemos a sua participação, Dr. Gonzalo.
Passo a palavra para o último integrante da mesa que pediu a inscrição, o Dr. Rodrigo Cariri. E, finalizando a nossa audiência, eu vou passar a palavra para a Senadora Zenaide Maia.
O SR. RODRIGO CARIRI CHALEGRE DE ALMEIDA (Para expor.) - Obrigado, Senadora.
Eu queria concluir dizendo que eu estive na Universidade Federal de Pernambuco, durante os anos de 2019 a 2022, e presenciei, como pesquisador da área da educação, acho que o retrato da realidade que o Deputado Luiz Ovando está apresentando, de um Ministério da Educação completamente omisso. Nesse caso, eu concordo integralmente com o Deputado, porque nós tivemos situações em que tínhamos ministro indicado com currículo falso, que precisou ser desindicado, e tivemos ministro indicado e tomado posse com currículo falso, e boa parte da sociedade brasileira não tinha absolutamente nenhuma observação a fazer.
Nesse período, de fato, é difícil para qualquer pesquisador localizar alguma política pública que tenha partido do Ministério da Educação e, quando se trata de educação na saúde, esse componente de interface entre os dois sistemas, aí, sim, é que a gente não vai ver absolutamente nenhuma política, mas essa realidade mudou. Desde 2023, o Governo abriu a agenda para discutir a avaliação e já se apresentou com medidas concretas de reformulação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, alterou instrumentos, como eu falei na minha apresentação, incluiu o Enade, virando o Enamed agora, para os cursos de Medicina, com regularidade anual. Então, todas as sinalizações foram ofertadas no sentido objetivo e material de uma mudança de postura.
Senadora, eu realmente faço votos de que a gente avance numa agenda de consenso de que é necessário, sim, haver avaliação, é necessária, sim, a preocupação com a qualidade dos médicos formados, mas isso não pode ser bravata ou ser contraditório com a pulsão ou a demanda para a abertura de cursos, que muitas vezes acontece por parte da própria Casa aqui, do Congresso Nacional. Há muitos Parlamentares que defendem essa abertura. É preciso fazer o encontro dos dois discursos.
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Eu acho que o caminho prudente entre esses dois caminhos é o que se está alinhando de atribuição formal ao Ministério da Educação, o que lhe cabe, e a construção de uma avaliação multidimensional, porque a consequência da instituição por lei de um exame de proficiência que é puramente teórico, a repercussão disso diante do que está sendo apresentado aqui, a repercussão disso dentro do ambiente escolar é: as escolas vão abrir mão dos campos de prática, do compromisso com o ensino na beira do leito, do compromisso do ensino ético e humanístico do paciente para ensinar a fazer prova. Fazer prova é uma competência. Brasília é o centro nacional e internacional dos concurseiros. Então, a gente sabe que, quando eu tenho um concurso, ele disciplina todo o processo formativo anterior. Se eu disser que agora para ser médico eu vou ter que passar em uma prova, ninguém mais estará preocupado com o estágio, com dar plantão, com fazer parto, com fazer cirurgia; todo mundo vai se preocupar somente em passar na prova.
Nesse caso, é como se eu estivesse usando um antimalárico - antimalárico que é um remédio para tratar malária - para tratar um vírus. Esse equívoco no Brasil a gente não comete mais. A gente sabe que vírus não tem remédio para tratar e que cloroquina trata malária, não trata covid. Então, dizer que, porque a gente não tem outra alternativa, vamos utilizar a alternativa pior é usar cloroquina para tratar covid. É um negacionismo educacional, da mesma forma como é um negacionismo político, e essa época eu acho que a gente já superou. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada, Dr. Rodrigo.
Senadora Zenaide, eu não tinha visto o pedido de inscrição de uma das nossas convidadas. Vou conceder a palavra primeiro a ela e, depois, passo para a senhora.
Sra. Elizabeth Guedes, que também está online.
A SRA. ELIZABETH REGINA NUNES GUEDES (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigada, querida Senadora Teresa Leitão, com quem convivo de forma muito harmoniosa no Fórum Nacional de Educação e tem o seu mandato profundamente dedicado à educação.
Eu vou ser muito breve porque o Dr. Gonzalo e as pessoas que me antecederam foram muito completas no comentário que eu gostaria de fazer.
Concordo com o Dr. Gonzalo quando diz que os dois erros serão acumulados e vão resultar no mesmo resultado de hoje, que é nenhum. Nós precisamos ter esse exame, o Enamed, censitário, anual, como lembrou a nossa Profa. Denise, sendo realizado pelo Inep, com instrumentos novos, como também foi dito pelo meu antecessor agora - os instrumentos foram todos revistos por comissões de especialistas, que são todos coordenadores de cursos médicos e do Basis, do Inep -; com instrumentos novos, com uma nova prova, com uma nova forma de avaliar e, principalmente, com a avaliação da parte prática, que será feita no teste de progresso. Quero lembrar os senhores que, no quarto ano, nós passaremos a ter uma prova, como foi definido nas DCNs de Medicina que estão para ser homologadas pelo Ministro. Então, nós estamos falando de um teste de progresso, da possibilidade de corrigir a rota daquele aluno que não está aprendendo, da possibilidade de iluminar mantenedores sérios com possibilidade de melhorar os seus projetos pedagógicos, o seu campo de prática, enfim, o seu curso de uma maneira geral, e vamos colocar essa prova no lugar onde ela deve estar.
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O dever do Estado é o dever de fiscalizar, acompanhar. Inclusive ele é constitucional, está na Constituição que a educação superior tem que ser acompanhada, avaliada e regulada pelo MEC. Então o lugar dessa prova, nossa Senadora Teresa Leitão, é no Ministério de Educação, dentro do Inep, utilizando os instrumentos de avaliação que estão revistos, e mais: as regras regulatórias e os padrões decisórios definidos pela Seres, que tem sido ativa no impedimento da abertura de novos cursos e de ampliação de vagas.
Então eu gostaria de agradecer, mais uma vez, a oportunidade de estar aqui. Peço, de novo, aos Senadores que rejeitem esse projeto, que não haja aprovação do exame de proficiência. E, se ele for acontecer, que ele aconteça no lugar certo, que é dentro do Ministério da Educação.
Obrigada e até a próxima. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada, Elizabeth Guedes, pela sua contribuição.
Agora passo para a última Senadora inscrita, médica, Dra. Zenaide Maia.
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - RN. Para interpelar.) - Boa tarde a todos e a todas aqui presentes. Quero aqui cumprimentar a Senadora Teresa Leitão, nossa Profa. Denise Pires, Dr. Antonio José Gonçalves, Rodrigo Cariri, Toufic.
A coisa salutar que eu acho do advento do Projeto de Lei 2.294 é que chamou a atenção da sociedade. Era hora de se discutir.
Agora, gente, querer dizer que é o Conselho Federal de Medicina quem vai dizer que você é médico ou não, isso é a função do MEC. Se o MEC estava falhando, esse projeto veio a tempo, e já foi visto isso aqui, o Enamed, essa avaliação, que já foi feita. Eu sou médica da Universidade Federal. A gente tinha essa passagem, e não terminava a turma toda, porque muitos alunos eram reprovados e repetiam a matéria.
Nós temos que acabar, neste país, com esta história: se algo não está funcionando, nós vamos cortar caminho e botar outra instituição, que não é a responsabilidade do Conselho Federal de Medicina. Eu cito isso aqui porque está tão presente, Profa. Denise, Dr. Rodrigo, que aqui estão querendo aprovar, eu sei que o assunto não é aqui, essa horizontalidade. Eles querem aprovar a legalidade do cigarro eletrônico, e a desculpa é porque não tem policiais rodoviários federais nem federais para inibir o contrabando de cigarro eletrônico. Quer dizer, não é por aí.
O papel da gente aqui, de todos que estão aqui é: vamos cobrar do Ministério da Educação e Cultura o que é de direito dele. Não vamos abrir mão.
Aqui surgiu essa questão da proficiência médica, mas foi falado com o Dr. Rodrigo: você imagine se todo mundo pensasse só... Porque o aluno hoje quer ir para a prática mesmo antes de ter tido a teoria. Se tiver um staff que o leva, ele já quer ficar olhando pelo visor as cirurgias. Mas, se tivesse essa função, que não é do Conselho Federal de Medicina; é do MEC... E nós, esta Casa aqui, o Congresso, temos obrigação de ficar cobrando esse acontecimento, como a gente passou a cobrar o Revalida, que passou anos sem ser feito.
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Por isso, como já foi feito esse histórico, eu já venho acompanhando que abriram muitas universidades, e cabe a isso... Inclusive, iam abrir uma no Rio Grande do Norte, e parece que foi suspensa... O Supremo. É por isso que aqui... Eu mostro que aqui se reclama muito da Justiça, se diz que o Supremo interfere nos outros Poderes: se não se resolve aqui, é claro que vai aparecer outro poder tentando resolver.
Sou contra esse exame de proficiência. Isso não é a solução nem é o papel do conselho. É bom a gente mostrar isso para a população, porque fica dando a entender: "Ela é a favor de médicos que não sabem de nada, que estão se formando sem saber". Não é verdade, gente. O que a gente precisa é cobrar dos órgãos competentes, porque é o Estado brasileiro que tem a obrigação de ver que tipo de profissional... Como se falou aqui da Anvisa. É assim que funciona, não é cortando caminho e apresentando uma proposta que não tem nada a ver para a solução.
Eu espero que a gente não deixe aprovar algo, no mínimo, esdrúxulo.
Obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada, Senadora Zenaide.
A Senadora foi a última inscrita, fazendo as honras da Casa.
Eu quero agradecer a presença de todos - desta vez, de todas também, as nossas duas convidadas.
Encerramos, com isso, a terceira audiência do ciclo que aprovamos. A princípio seria uma, mas foi tão desafiador que realizamos a segunda, chegamos à terceira, com momentos de calmaria, com momentos de tensão, mas acho que isso é bom para o processo, enriquece.
E a palavra que foi dita aqui por vários é de que o que a gente construiu e acumulou pode ser conteúdo suficiente para se buscar um consenso, para se buscar um consenso que tenha como foco o atendimento de qualidade à população. Dão-se muitos exemplos dos Estados Unidos. A cada vez, em uma Comissão, se dão exemplos. Ontem mesmo eu tive um debate na CAE sobre isso. Sempre se dão exemplos dos Estados Unidos, mas um país que tem SUS não precisa pedir licença a ninguém.
O Brasil construiu o Sistema Único de Saúde, graças a vocês, médicos, aos médicos-sanitaristas da reforma sanitária. É tanta coisa que este país produz em nome e em defesa da boa medicina. Então não vamos jogar fora a criança com a água do banho. Vamos produzir novos elementos, novas condições para que a gente consiga, de fato, qualificar cada vez mais os nossos profissionais naquilo que lhe é dever. E cada qual com a sua atribuição.
Eu também já fui conselheira. A minha profissão não tem conselho e nós somos contra ter conselho de professores, porque nós temos uma gama muito grande de regulamentações na área de educação, Zenaide. Começa logo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação. A divisão das competências na educação é federativa, é regime de colaboração. Nós estamos agora aprovando o Sistema Nacional de Educação, na semana que vem, provavelmente. Então, quem regula a nossa profissão? É o Estado. E somos avaliados da hora que entramos na sala de aula até a hora que saímos. E, agora, vamos ter a prova docente para nos ajudar, mais ainda, a qualificar a nossa experiência.
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Então, parabéns a todos e a todas que aqui vieram dar sua contribuição.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião.
(Iniciada às 14 horas e 26 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 40 minutos.)