Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
|---|---|
| R | A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE. Fala da Presidência.) - Bom dia a todos e a todas. Desculpem-me pelo atraso, eu estava numa reunião rápida ali na Câmara. Mas, sem mais delongas, podemos começar, senhoras e senhores? Declaro aberta a 23ª Reunião da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática do Senado Federal da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura. A presente reunião se destina à realização de audiência pública com o objetivo de instruir o Projeto de Lei nº 330, de 2022, que altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, para dispor sobre o crime de má conduta científica, em cumprimento ao Requerimento nº 25, de 2025, da CCT, de nossa autoria. O público interessado em participar desta audiência pública poderá enviar perguntas ou comentários pelo endereço senado.leg.br/ecidadania ou ligar para o 0800 0612211. Encontram-se presentes no Plenário... E eu vou chamar à mesa quatro pessoas, depois mais duas que serão presenciais, aí a gente troca as plaquinhas, e mais dois participantes que o farão de forma remota. Então, quero já convidar o Sr. Osvaldo Luiz Leal de Moraes, Secretário de Políticas e Programas Estratégicos, representante do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, já agradecendo a sua presença. Chamo o Sr. Olival Freire Junior, Presidente substituto do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, o CNPq. Muito obrigada pela presença. Chamo a Profa. Denise Pires de Carvalho, Presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, a Capes. Chamo a Sra. Renata Aquino, Decana de Pesquisa e Inovação da Universidade de Brasília (UnB). Informo que também será chamado, após a fala dos que já estão à mesa, o Sr. Samuel Goldenberg, Diretor da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). |
| R | Através de videoconferência, irão participar a Sra. Márcia Teixeira, Vice-Presidente Adjunta de Pesquisas e Coleções Biológicas da Fundação Oswaldo Cruz; a Sra. Helena Bonciani Nader, Presidente da Academia Brasileira de Ciências; a Sra. Natália Trindade, Diretora da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG); o Sr. André Cabral de Souza, Gerente do Departamento de Infraestrutura de Pesquisa da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Agradeço muito a presença de todos e de todas. Nós solicitamos esta audiência pública dada a complexidade do projeto. Em pauta, além de mexer com a lei do século passado, de 1940, traz alguns componentes que precisam de uma reflexão e de um olhar de quem está nessas instituições representando a ciência. Tocar em código de ética requer realmente posicionamentos muito nítidos, posicionamentos que não deixem nem sejam retrocessos. Por isso que eu fiz o requerimento, que foi tão logo aprovado pelo Presidente desta Comissão, Senador Flávio Arns, e também por todos os nossos pares. Quando a gente tem um projeto assim, polêmico, complexo e de ampla abrangência, a gente procura instruí-lo, ouvindo a sociedade, compilando esses diversos olhares para que a gente possa ter um parecer mais tranquilo, mais consistente e que contribua para a gente avançar. Nós passamos recentemente por um período de muita negação da ciência. Isso trouxe prejuízos ao próprio conceito de ciência no Brasil. Então, nós não podemos negar a validade, o trabalho que essas instituições fazem, o que têm produzido positivamente para o Brasil. E, portanto, desejamos e temos certeza - eu já posso adiantar e dizer - de que receberemos excelentes e profícuas contribuições. Então, se a mesa não se opuser, a Sra. Helena Nader, da Academia Brasileira de Ciência, que vai participar de forma remota, está pedindo prevalência, porque tem um compromisso. Pode ser? (Pausa.) Então, vamos começar pela Sra. Helena Nader. A gente sempre destina dez minutos de fala inicial. O relógio toca. É um toque automático, um pouco estridente. Não se assustem. Quando ele toca, os senhores têm ainda um minuto para concluir o pensamento, e a gente vai modulando as necessidades. Depois a gente lê as perguntas, os comentários do e-Cidadania e volta a palavra para quem precisar fazer alguma complementação. Então, com a palavra, de forma remota, a Sra. Helena Bonciani Nader, Presidente da Academia Brasileira de Ciências. A SRA. HELENA BONCIANI NADER (Para expor. Por videoconferência.) - Então, gostaria de, na sua pessoa, agradecer à Comissão, a CCT, e aos demais signatários do pedido desta reunião. |
| R | Também quero lhe agradecer profundamente por eu poder fazer minha fala antes, porque infelizmente eu tenho um outro compromisso, que já estava agendado há alguns dias. Exma. Presidenta, Senadoras, Senadores, colegas, gostaria de registrar minha preocupação em relação ao Projeto de Lei nº 330, de 2022, que propõe criminalizar a má conduta científica, estabelecendo pena de prisão de três a cinco anos e multa para pesquisadores que violem protocolos, manipulem dados ou apresentem seletivamente resultados. A motivação do projeto é legítima: episódios graves como o da proxalutamida no Amazonas mostraram falhas sérias no cumprimento de protocolos de pesquisa e impactaram a vida de centenas de pessoas. Esses casos precisam, sim, de investigação rigorosa e responsabilização, mas, no nosso entender, a solução apresentada pelo PL 330 não é a mais adequada nem a mais eficaz. Primeiro, é porque a ciência é uma atividade baseada em incertezas. Hipóteses são testadas, resultados podem divergir, análises estatísticas podem ser interpretadas de diferentes formas. Erros metodológicos ou discordâncias entre grupos não podem ser tratados como crimes. O risco é criminalizar a própria prática científica, inibindo a inovação e a criatividade. Segundo, é porque o Brasil já possui mecanismos - acredito eu - robustos de fiscalização e punição. A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), vinculada ao Conselho Nacional de Saúde (CNS), é o órgão responsável por avaliar os aspectos éticos das pesquisas envolvendo seres humanos no Brasil. Formada por especialistas de diferentes áreas, incluindo usuários, a Conep elabora e atualiza normas de proteção aos participantes de pesquisa e coordena o sistema CEP/Conep, o qual reúne comitês locais, pesquisadores, instituições de ensino e centros de pesquisa em todo o país. No sistema, os Comitês de Ética em Pesquisa, que são os CEPs, analisam estudos de baixa e média complexidade, funcionando como porta de entrada para qualquer projeto com seres humanos. Já a Conep examina pesquisas de maior complexidade ou em áreas sensíveis, como genética, reprodução humana, povos indígenas e cooperação internacional, além de projetos do próprio Ministério da Saúde. Protocolos que exigem essa avaliação são encaminhados pelos CEPs para a instância nacional. Para ser considerada ética, a pesquisa deve respeitar a dignidade e a autonomia dos participantes, reconhecendo sua vulnerabilidade; equilibrar riscos e benefícios, priorizando a minimização de danos; prevenir prejuízos previsíveis; e demonstrar relevância social, garantindo que o conhecimento produzido tenha valor humano e coletivo. |
| R | Ainda, a Lei Arouca refere-se à Lei nº 11.794, de 8 de outubro de 2008, que regula no Brasil o uso científico de animais em atividades de ensino e pesquisa, estabelecendo o Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (Concea) e as Comissões de Ética no Uso de Animais (CEUAs), que fiscalizam a aplicação de normas éticas e o bem-estar animal, além de promover a utilização de métodos alternativos sempre que possível. O sistema estabelece normas para a criação, manutenção e utilização de animais em laboratórios, exige a adoção dos princípios dos 3Rs (que vêm do inglês), reduzir, refinar e substituir (em português), e credencia as Comissões de Ética no Uso de Animais (CEUAs), responsáveis por avaliar e aprovar projetos em nível institucional. Dessa forma, busca equilibrar o avanço da ciência e da inovação com a proteção do bem-estar animal, promovendo práticas mais responsáveis, transparentes e alinhadas aos padrões internacionais. Assim, no nosso entender, os sistemas CEP/Conep, CEUAs/Concea, os comitês de ética em pesquisa, as agências de fomento, as universidades, os hospitais e demais ICTs aplicam sanções que vão desde advertências até a cassação de financiamentos e desligamento de pesquisadores. Esses instrumentos administrativos, na nossa opinião, são mais proporcionais e eficazes. Criar sanções penais gera sobreposição, insegurança jurídica e risco de punições arbitrárias. Terceiro, é preciso lembrar que a Constituição Federal protege a liberdade acadêmica. O art. 207 assegura a autonomia universitária, e o art. 218 garante prioridade à pesquisa científica, com o texto da Emenda Constitucional 85, de 2015, que explicita que o Estado deve promover e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação tecnológica e a inovação. Ele prioriza a pesquisa científica básica em prol do bem público, a pesquisa tecnológica voltada para os problemas brasileiros e o desenvolvimento do sistema produtivo, além de apoiar a formação de recursos humanos nessas áreas. Criminalizar condutas científicas ameaça esses princípios, podendo gerar autocensura, afastar jovens pesquisadores e dificultar colaborações internacionais. O projeto, no nosso entender, também fere o princípio da proporcionalidade. Práticas como “usar inadequadamente dados estatísticos” ou “apresentar seletivamente resultados” podem decorrer de má-fé, mas também de erros técnicos ou de interpretações divergentes. Transformá-las em crime de reclusão é um excesso, no nosso entender, que não se observa nem em países com tradição de controle rigoroso da integridade científica. |
| R | O que precisamos não é de prisão para cientistas, mas, sim, de fortalecimento institucional. Propomos que avancemos em medidas como: ampliar a capacidade e os recursos da Conep e dos comitês de ética; tornar obrigatória a formação em integridade científica em todos os níveis da educação, educação básica, ensino médio, graduação, pós-graduação; criar repositórios nacionais de dados para aumentar a transparência; incentivar boas práticas com programas de integridade e auditorias regulares. Exmos. Srs. Senadores e Sras. Senadoras, não se trata de relativizar a gravidade da má conduta científica, mas de encontrar o caminho correto para combatê-la. O direito penal deve ser reservado a situações extremas de dolo e dano comprovado. Para os demais casos, os mecanismos já existentes são suficientes, desde que fortalecidos. A ciência brasileira vive um momento crucial, recuperando investimentos, buscando atrair talentos e aumentando sua presença internacional. Aprovar um projeto que criminaliza a pesquisa significará, no nosso entender, seguir na direção oposta, instalando o medo e a desconfiança dentro da própria comunidade científica. Por isso, manifesto nossa posição contrária ao PL 330, de 2022, e recomendo que esta Casa busque alternativas que preservem a integridade sem comprometer a liberdade acadêmica e o avanço da ciência no Brasil. Muito obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Nós é que agradecemos, Sra. Renata, pelos esclarecimentos... Helena, desculpe. Helena Bonciani Nader. Agradecemos pela precisão dos seus argumentos, pelas apresentações de todo o respaldo legal, administrativo também, que já existe na preservação da ética na ciência e na pesquisa. Vamos voltar à mesa. Nós distribuímos... A SRA. HELENA BONCIANI NADER (Por videoconferência.) - Se a senhora permitir, Senadora... A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Pois não. A SRA. HELENA BONCIANI NADER (Por videoconferência.) - ... o texto vai ser encaminhado para vocês. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Ótimo. Agradeço muito. Na minha condição de Relatora, será ótimo. A SRA. HELENA BONCIANI NADER (Por videoconferência.) - Muito obrigada à senhora por ter feito esta audiência pública muito relevante. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada também pela presença. A SRA. HELENA BONCIANI NADER (Por videoconferência.) - Peço desculpa aos demais, mas vou me retirar para outra reunião. Obrigada. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Vamos dar sequência, pela ordem de chamada, já informando aos nossos queridos convidados e convidadas que a assessoria distribuiu as perguntas que chegaram pelo e-Cidadania. Se alguém quiser incorporar alguma dessas questões nas suas falas, fiquem à vontade. Passo a palavra agora para o Sr. Osvaldo Luiz Leal de Moraes, Secretário de Políticas e Programas Estratégicos substituto do Ministério da Ciência e Tecnologia. O SR. OSVALDO LUIZ LEAL DE MORAES (Para expor.) - Bom dia, colegas. Bom dia, Senadora. Bom dia, pessoas presentes aqui. Bem, depois da manifestação da Presidente da Academia Brasileira de Ciências, a Helena, fica, digamos assim, mais fácil a nossa manifestação. |
| R | Eu gostaria, antes de fazer alguns comentários sobre o porquê a ética em pesquisa é importante, de fazer uma pequena reflexão sobre um livro que eu uso sempre como um livro de cabeceira que é O mundo assombrado pelos demônios, do Carl Sagan. Nesse livro, ele faz uma defesa intransigente da ciência, e uma das coisas que ele coloca no livro é qual foi a maior contribuição que a ciência deu para a humanidade. Nós podemos pegar diferentes exemplos, e, talvez, a área da saúde seja uma das áreas pelas quais o avanço da ciência propiciou que, hoje, nós estejamos nos aproximando de uma vida quase centenária. No século XVII, a pessoa mais importante do planeta, que era a Rainha da Inglaterra, teve 11 filhos, e apenas um dele passou de dois anos de idade - hoje em dia, isso é quase que impensável, não é? Mas qual foi a maior contribuição que a ciência deu para a humanidade, de acordo com Carl Sagan? E eu uso daquilo que o Caetano Veloso diz que é a cultura generalizada de que as pessoas se apropriam como se fosse delas, porque alguém foi mais brilhante em colocar inicialmente. A contribuição mais importante que a ciência deu para a humanidade foi o método científico. Por que é que o método científico é importante? Porque o método científico permite nós diferenciarmos quem é charlatão de quem usa um procedimento padrão para poder fazer as afirmações que faz. E isso tem muito a ver com esta audiência de hoje. E, muitas vezes, não é o cientista que é o responsável pelo mau uso da informação. Ontem, na Assembleia Geral das Nações Unidas, nós vimos uma pessoa defender que as mudanças climáticas são um charlatanismo. Nós tivemos, durante a pandemia, a defesa da cloroquina. Muitas vezes, quem faz inapropriadamente o uso da informação científica talvez tenha que ser mais responsabilizado do que o próprio cientista. Eu não tenho dúvida nenhuma de que a ética em ciência é importante. Não se discute quanto a isso. E eu lembro que, quando eu estava fazendo meu doutorado, o meu orientador dizia para mim uma coisa muito simples: "Lembre-se de que, quando você for escrever a sua tese, ela tem que ser tão clara que, daqui a 40 anos, quando você não estiver presente para falar sobre o que você escreveu, quem ler vai ter que entender o que você escreveu, e quem fizer uso dos mesmos dados que você usou vai ter que chegar ao mesmo resultado". Todos nós aprendemos, ao longo de nossa vida de formação para sermos pesquisadores, a seguir algumas coisas que são muito caras para quem é cientista. Eu vou fazer algumas considerações rapidamente aqui, considerando meu tempo, não é? Há várias razões pelas quais é importante aderir às normas éticas em pesquisas. Primeiro: as normas promovem os objetivos da pesquisa, como conhecimento, verdade e prevenção de erros. Por exemplo: proibições contra fabricar, falsificar ou deturpar dados de pesquisas promovem a verdade e minimizam erros. |
| R | Em segundo lugar, como a pesquisa frequentemente envolve muita cooperação e coordenação entre muitas pessoas diferentes, em diferentes disciplinas e instituições, os padrões éticos promovem os valores essenciais ao trabalho colaborativo, como confiança, responsabilidade, respeito mútuo e justiça. Em terceiro lugar, muitas das normas éticas ajudam a garantir que os pesquisadores possam ser responsabilizados perante o público. Por exemplo, políticas federais sobre má conduta em pesquisa, conflitos de interesse, proteção de seres humanos e cuidados e uso de animais são necessárias para garantir que pesquisadores financiados com recursos públicos possam ser responsabilizados perante o público. Em quarto lugar, as normas éticas em pesquisas também ajudam a construir apoio público para a pesquisa. As pessoas têm maior probabilidade de financiar um projeto de pesquisa se puderem confiar na qualidade e integridade da pesquisa. E uma última questão é que muitas das normas de pesquisa promovem uma variedade de outros valores sociais e morais importantes, como responsabilidade social, direitos humanos, bem-estar animal, cumprimento da lei e saúde e segurança pública. Falhas éticas em pesquisas podem causar danos significativos em seres humanos e animais. Por exemplo, pesquisador que fabrica dados em um ensaio clínico pode causar danos ou até mesmo a morte de pacientes. E um pesquisador que não cumpre os regulamentos e diretrizes relativos à radiação, por exemplo, pode colocar em risco a sua própria saúde. Assim, há valores que, para nós pesquisadores, são importantíssimos. A questão de honestidade. O que é honestidade para nós? Honestidade significa: relate dados, resultados, métodos e procedimentos e um status de publicação que não engane colegas, patrocinadores de pesquisas ou o público. Nós temos que ser objetivos, não é? Buscar evitar vieses em delineamentos experimentais, análise de dados, interpretação de dados que facilitem a revisão por pares. Outra questão importantíssima para nós é o cuidado. O que é cuidado para um cientista? Evitar erros e negligência. Nós temos que examinar cuidadosamente e criteriosamente o nosso próprio trabalho para podermos avaliar o trabalho dos pares. Nós temos que manter bons registros de como nós fazemos pesquisas, como os dados são armazenados, como os dados são compartilhados. Outra questão importantíssima é a abertura. O que significa abertura? Os dados que eu coleto não são meus, nós temos que compartilhar dados, nós temos que compartilhar ideias, ferramentas, recursos. Nós temos que estar abertos a ouvir críticas, nós temos que ser transparentes, nós temos que divulgar como a gente faz a nossa pesquisa, quais são as nossas premissas, quais são as nossas análises. E responsabilidade. Nós temos que assumir as nossas responsabilidades na participação de pesquisa e temos que estar preparados para prestar contas. Quando a Capes ou o CNPq, por exemplo, financia a nossa pesquisa e nos pede os relatórios, é exatamente isso que está pedindo. Quando eu faço um relatório para a Capes ou para o CNPq, eu não estou apenas cumprindo a regra do jogo, eu estou tentando demonstrar como eu fiz a minha pesquisa, qual foi a transparência que eu usei, quais foram os dados que eu usei. E muitas vezes os pesquisadores são negligentes com isso, mas nós não podemos esquecer que nós somos financiados no Brasil, principalmente, com recursos públicos. Então, ser transparente, ser responsável com os recursos que nos financiam é essencial. |
| R | A ética é alguma coisa intrínseca para nós, mas isso não significa que nós não tenhamos também pessoas que se passam por cientistas e que não tenham o cuidado que a imensa maioria dos cientistas tem. Por isso, eu acho que a este projeto de lei a que a Academia Brasileira de Ciências expõe de uma maneira muito clara a sua contrariedade... De alguma maneira, nós cientistas temos que estar sempre atentos para essas questões de normas e de ética. Muito obrigado, Senadora. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada. A cada intervenção a gente vai juntando a realidade do que já se faz com a pesquisa e com o cuidado ético. Eu passo a palavra agora para o Sr. Olival Freire Junior, Presidente substituto do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Em seguida, vamos ouvir a Capes. O SR. OLIVAL FREIRE JUNIOR (Para expor.) - Senadora Teresa Leitão, me permita inicialmente estender a saudação ao autor da proposta, o Senador Mecias de Jesus, que não está aqui presente, também ao Relator, o Senador Hamilton Mourão, e ao próprio Presidente da Comissão, a CCT, o Senador Arns, pela importante iniciativa desta audiência e, eu diria, a importante iniciativa de se preocupar com a legislação que diga respeito à conduta ética e à integridade na produção da pesquisa. Então, eu inicialmente queria saudar a iniciativa do Senado. E eu creio que, nesse sentido, essas iniciativas estão dentro de uma tradição importante, eu diria, historicamente. Nós sabemos que a ciência moderna, quando se afirma, particularmente na obra do Galileu, aqui reportado pelo colega Osvaldo, um valor absolutamente fundamental era a autonomia da comunidade científica. Eu diria que naquela altura não havia uma preocupação com controles éticos da comunidade científica, porque tratava-se da emergência de uma forma de saber, uma forma de cultura que conflitava com outras formas estabelecidas e sancionadas na sociedade. De fato, a pesquisa, por exemplo, com a busca pela limitação, pelo controle, por exemplo, na vivissecção de animais em pesquisa... Isso é algo que emerge na metade do século XIX por iniciativa do Parlamento britânico. Então, nesse sentido, eu acho que o Senado, eu diria, está em boa companhia ao se preocupar com essa medida. Quero dizer também... E, se eu citei aqui o exemplo do Galileu, foi porque - àquela altura, havia a preocupação da autonomia diante do saber científico, diante de uma outra forma de saber que era a teologia - essa ênfase da autonomia era datada historicamente, aquilo era a emergência de uma forma de saber, uma forma de cultura no século XVII. Com o passar do tempo, a própria comunidade científica aprimorou suas preocupações buscando combinar a defesa da autonomia com a adoção de procedimentos éticos. |
| R | E eu cito já, apenas a título de exemplo, duas situações, no século XX, que foram iniciativas da comunidade científica para restrição ao modo como a pesquisa científica deveria ser conduzida. O episódio mais famoso é da década de 70, quando o avanço nos métodos de manipulação genética gerou uma preocupação na comunidade científica e uma declaração de moratória adotada pela própria comunidade científica, moratória quanto ao avanço dessas pesquisas, enquanto a sociedade preparava normas éticas para a condução dessas pesquisas. Todos aqui devem se lembrar do nome Antinori, um médico italiano que - para escapar desse controle social sobre a pesquisa - realizou pesquisas, por exemplo, em ilhas no Mediterrâneo, coisas desse tipo. Nós temos um antecedente também importante na fissão nuclear, quando foram percebidos e descobertos os impactos que ela poderia trazer na produção de armas. Foi a atitude dos cientistas - não do conjunto dos cientistas, mas os cientistas que estavam alinhados com as potências aliadas - de também proceder a uma moratória na publicação de dados científicos, naquele momento, para evitar que os cientistas que estavam trabalhando para as potências do Eixo pudessem se beneficiar daquela produção de conhecimento. Eu estou colocando esses elementos para dizer que não é nenhuma novidade que a própria comunidade científica e a própria sociedade, representada pelos seus órgãos legislativos, se preocupem com a questão dos procedimentos éticos e procedimentos de integridade, mesmo porque esses procedimentos têm evoluído historicamente. Agora, falando pelo CNPq, eu cito como exemplo que, em 2024, nós estabelecemos, criamos um código de conduta ética, de procedimentos éticos, para os processos de avaliação de projetos de pesquisa que eram submetidos ao CNPq. Se nós criamos isso em 2024, é porque antes isso não era considerado necessário. Dez anos antes, em 2012, foi quando o CNPq criou a Comissão de Integridade na Atividade Científica. Então, portanto, antes não era absolutamente necessário. Existe, portanto, uma evolução, um amadurecimento da sociedade, da comunidade científica quanto a quais são os padrões, quais são as condutas aceitáveis ou não aceitáveis. Dito tudo isso, eu creio que o problema com este projeto de lei se restringe a uma discussão de outra natureza. Eu diria que é... E aqui eu vou muito na linha do que a Profa. Helena Nader aqui nos apresentou. Nem todo remédio... As pessoas que trabalham em geral com a sociedade sabem. Nem todo medicamento é remédio, ou seja, tudo depende, pode ser medicamento, pode ser veneno, dependendo da dose, dependendo das circunstâncias. Toda essa discussão hoje na sociedade brasileira sobre dosimetria também mostra isso. O problema é saber se este projeto de lei, como está redigido, ajuda, se ele vai nessa direção do aprimoramento ou se ele tem limitações. E aí as limitações já foram, na nossa apreciação, bem apresentadas pela Profa. Helena Nader. Permitam-me aqui só acrescentar um ou outro elemento. |
| R | Particularmente, a referência, por exemplo, à má-fé na seletividade do tratamento estatístico... E, de novo, a Profa. Helena Nader já fez referência a isso, mas eu queria enfatizar. Aqui, o conceito de má-fé não tem como ser materializado no momento da eventual judicialização. Portanto, se adotarmos esse conceito do que é má-fé, como distinguir a má-fé do erro, erro que é inerente à atividade científica, nós estaremos abrindo um espaço para uma excessiva judicialização da atividade científica. Há referência também a métodos, e aqui me permita discordar um pouco do meu colega Osvaldo. Eu tenho muita identidade com a ideia de que a ciência tem métodos, no plural, porque o método da antropologia não pode ser o mesmo método de um laboratório, de ciências biomédicas. E como que você vai... Vejam nós aprendemos muito sobre a nossa condição humana graças à antropologia. Todo mundo conhece aqui a frase da Margaret Mead que diz que o primeiro traço de humanidade que os arqueólogos identificaram é um osso curado, porque é aquele momento em que seres humanos, em vez de deixarem para trás aquele que teve um fragmento, cuidaram dele e o alimentaram, milhares de anos atrás. É evidente que esse tipo de método é diferente, digamos assim, de um método estatístico num ensaio clínico. Portanto, há dificuldade aqui de utilizar termos genéricos como estão aqui. Por exemplo: violar protocolos de pesquisa... Quais são os protocolos? Se existem métodos, existem protocolos no plural. E, portanto, esta legislação, se aprovada nesses termos, vai abrir um espaço para uma excessiva judicialização da atividade científica e, portanto, pode se converter no oposto do que o legislador teve como intenção. Em vez de resguardar a sociedade e a atividade científica... (Soa a campainha.) O SR. OLIVAL FREIRE JUNIOR - ... nós poderemos ter um efeito contrário: um efeito de freio à atividade científica. Em nome do CNPq, eu gostaria, por final, de dizer que, nos termos em que a proposição está feita, ela não nos parece adequada, mas, pelo espírito que presidiu a proposição, o Senado deveria encontrar, com apoio das entidades, formas de valorizar, eu diria assim, a educação e o valor da ética e da integridade na produção científica. Aqui, sim, nós temos limitações. Eu diria que nossas instituições de pesquisa, nossas agências, nossas universidades não têm feito um trabalho de educação desde os primeiros momentos em que a pessoa começa uma atividade de iniciação científica para que ela aprenda que o domínio da técnica que ela utiliza no é tão importante quanto a preocupação com padrões éticos. Então, certamente, uma atividade educativa é de extrema importância, mas volto a dizer - é a opinião do CNPq - que, nos termos em que a proposta está feita, ela cria mais problemas do que resolve. Muito obrigado. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada, Sr. Olival, representante do CNPq, que deve ter avaliado também muitos projetos que lá chegam, conforme foi colocado pelo Sr. Osvaldo. |
| R | Passo a palavra agora para a Profa. Denise Pires, Presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). A SRA. DENISE PIRES DE CARVALHO (Para expor.) - Muito bom dia, Senadora Teresa Leitão. Eu a parabenizo pela organização desta audiência pública da maior relevância para discutir um projeto de lei, o Projeto de Lei 330, de 2022 - que aguarda votação no Plenário do Senado -, tornando crime a má conduta científica que atenta contra a integridade científica. Inicialmente, eu gostaria de falar não como Presidente da Capes, mas como cientista que sou desde a época da minha iniciação científica, quando fui treinada nos laboratórios da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e digo que, quando defendi a minha tese em 1994, o Brasil não tinha ainda as instituições que tem hoje. Quero agradecer o posicionamento da Profa. Helena Nader, a primeira mulher a assumir a cadeira da Presidência da Academia Brasileira de Ciências, que merece todo o nosso respeito por toda a sua atuação como uma cientista de renome não apenas nacional, mas também internacional. Faço minhas as palavras da Profa. Helena Nader e também as dos meus colegas Prof. Osvaldo e Prof. Olival. Como cientistas, nós sabemos que somos humanos, e toda atividade humana é falível - não temos dúvida disso -, mas precisamos tomar muito cuidado com um projeto de lei ou uma lei que tenta ou tentará criminalizar a atividade científica por pessoas que nem sequer cientistas são. E nós sabemos - nós todos que somos cientistas - que, com a redemocratização do nosso país a partir de 1985, 1986, várias instituições foram criadas, fortalecidas, e a democracia tem feito com que o Brasil avance muito no sentido daquilo que o mundo todo vinha fazendo há muito tempo. Para falar especificamente da motivação, da justificação para este projeto de lei, que é a questão ligada a projetos de pesquisa com seres humanos, eu gostaria de lembrar que existe a Declaração de Helsinque, que data de 1964. Essa declaração, a qual o Brasil atende, define princípios éticos para a pesquisa médica envolvendo seres humanos, como eu disse, desde 1964. Ela vem sendo ratificada - a última, se não me engano, foi em 2013 - através de conferências de associações médicas mundiais, e o Brasil faz parte dessa associação. Nós temos um sistema com a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa(Conep), que é diretamente ligado ao Conselho Nacional de Educação, e nós o chamamos de sistema CEP/Conep, que foi instituído há quase 30 anos no nosso país e que vem trabalhando com muita seriedade e fazendo com que a pesquisa na área clínica tenha avançado muito, de forma que o Brasil hoje é um país que é o 13º, 14º produtor de ciência no mundo. |
| R | A área na qual o Brasil mais produz é a área da saúde. Entre as produções científicas nacionais com empresas, a chamada inovação, a interação da pesquisa com as empresas, entre as dez empresas com as quais os pesquisadores brasileiros mais produzem, oito delas são indústrias farmacêuticas multinacionais, obviamente, através de estudos clínicos, que não teriam sido publicados, que não estariam fazendo o Brasil brilhar nessa área do mundo se não fossem feitos de maneira muito criteriosa e baseada nos princípios da integridade em pesquisa. Por falar em integridade em pesquisa - porque o projeto de lei trata disso -, eu não sei se os Senadores e as Senadoras conhecem, mas nós, há muitos anos, participamos de congressos sobre integridade em pesquisa. O último deles foi realizado em dezembro de 2024: o VII Brispe. Não é a primeira vez que o Brasil discute essa questão. Eu vou falar um pouco agora de como a Capes se envolve nessa questão. É absolutamente necessário, porque a maior parte da produção científica parte dos programas de pós-graduação, das teses e dissertações que sempre têm a análise das CEUAs, quando estão envolvidas pesquisas em animais de experimentação, como bem ressaltou nossa Presidente da Academia Brasileira de Ciências. Então, há o sistema CEP/Conep, CEUAs, todos os comitês de ética em pesquisa que existem nas nossas universidades, que existem nas pró-reitorias de pesquisa e de pós-graduação, que existem nas unidades de pesquisa do nosso país. Eu enviei uma carta aos organizadores do VII Brispe, no ano passado, como Presidente, e eu vou ler o início dessa carta: 1. A CAPES foi uma das principais apoiadoras da 4ª Conferência Mundial sobre Integridade em Pesquisa [...], realizada [...] em 2015. 2. O Brasil ocupa hoje uma posição destacada [e ressalto que isso ocorre após a redemocratização do nosso país], em termos de ações e políticas educacionais para fomentar uma cultura de integridade científica no cenário regional da América Latina e mundial. Além disso, a CAPES, em consonância com o CNPq, [...] [as fundações de amparo à pesquisa dos estados] e outras agências de fomento internacionais [assim como indústrias, como a indústria farmacêutica, que eu já exemplifiquei], tem a convicção de que a qualidade da pesquisa está diretamente conectada à integridade na sua proposição, execução, comunicação e revisão. Anteriormente à organização da conferência mundial, em 2013, o Brasil, por meio do CNPq, e a Alemanha, por meio da Fundação Alemã para a Pesquisa (DFG), lideraram a organização do Global Research Council, [...] [realizado] em Berlim, tendo a integridade em pesquisa como tema catalisador das discussões e acordos firmados. Por isso tudo que eu ressaltei até agora, foi surpreendente que, no nosso país, durante a pandemia, nós tivéssemos pessoas que preconizavam o uso não simplesmente de medicamentos off-label, mas que preconizavam o uso de medicamentos sem escutar a comunidade científica brasileira. O Prof. Osvaldo citou a cloroquina; ele poderia ter citado a ivermectina ou a nitazoxanida ou qualquer outro medicamento que não estava indicado para o tratamento para virose respiratória. Mais do que isso, não perguntaram aos cientistas, porque, se há uma coisa que cientista sabe fazer com base no método científico é elaborar as perguntas, é observar. Com relação à cloroquina, como cientista - eu disse que inicialmente falaria como cientista -, perguntei a uma amiga especialista que usa cloroquina nos seus pacientes cronicamente, e a minha pergunta científica foi: os seus pacientes que usam cloroquina diariamente, uso crônico, estão sendo acometidos pela covid-19? E a resposta dela foi "sim". Imediatamente, obviamente, não haveria nenhuma indicação para o uso da cloroquina, a não ser por interesses particulares, interesses de que nós não sabemos definitivamente os motivos. |
| R | Mas a metodologia científica serve para isto, para que as falhas humanas sejam mitigadas, para que nós... (Soa a campainha.) A SRA. DENISE PIRES DE CARVALHO - ... quando escutamos especialistas, quando escutamos aqueles que são os cientistas, baseados em evidências científicas, na metodologia científica iniciada por Francis Bacon lá no século XVI... Ressalto o século XVI, porque foi após a Idade Média, na época do Renascimento, quando o mundo sai daquele período de trevas, inquisição e perseguição dos cientistas. Preocupa-me muito um projeto de lei que criminaliza os cientistas e a ciência em um país que é referência mundial em integridade científica, que nós possamos ter aqui exemplos de perseguição de cientistas como aquela perseguição feita ao Galileu Galilei. Galileu Galilei - já citado aqui - foi perseguido. Ele foi na verdade perseguido e preso. Galileu Galilei foi preso porque defendia que a Terra girava em torno do Sol, defendia o heliocentrismo, mas nós vimos uma parte da sociedade brasileira, aquela que não conhece o método científico, aquela que não conhece a história da ciência, recentemente ainda questionar se a Terra é ou não redonda. Portanto, eu termino a minha fala dizendo que a Capes, assim como o CNPq, o sistema CEP/Conep, todas as comissões de ética em pesquisa, a Academia Brasileira de Ciências, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, a Sociedade Brasileira de Bioética, todos os organizadores dos congressos de integridade em pesquisa no Brasil, estamos todos de parabéns. A sociedade científica brasileira avançou muito nas últimas décadas e nós somos referência em várias áreas para o mundo. Que continuemos assim, entre os melhores cientistas do mundo, e que o Brasil possa avançar cada vez mais com critérios éticos e de integridade. Eu queria, por último, parabenizar as perguntas que foram feitas aqui através do e-Cidadania e dizer especificamente para o Nicolas, do Rio Grande do Sul, que pergunta: "Como podemos criminalizar a má conduta cientifica sem ameaçar a liberdade de pesquisas? Como tomar medidas legais que não sejam arbitrárias?". Eu respondo ao Nicolas que a história nos mostra ser impossível que haja cada vez mais estruturação de comissões de ética em pesquisa, como o Sistema CEP/Conep, que deve ser fortalecido. |
| R | E eu conclamo, por último, Senadora, demais autoridades aqui presentes, toda a sociedade brasileira - toda a sociedade -, que estude a história da ciência. Muito obrigada. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada, Profa. Denise, em especial pelo seu resgate histórico, indo ao Renascimento, e nos mostrando como temos ainda o que defender e o que afirmar. Vou passar a palavra agora para a Sra. Renata Aquino, Decana de Pesquisa e Inovação da Universidade de Brasília, e, em seguida, para a Márcia Teixeira, de forma remota, representante da Fiocruz. A SRA. RENATA AQUINO (Para expor.) - Bom dia a todas as pessoas. Muito obrigada pelo convite, em nome da Universidade de Brasília. Gostaria de cumprimentar a Senadora Teresa pela iniciativa de conseguir, com o Senador Flávio, esta audiência extremamente importante. Coloco inicialmente uma das realidades da questão da pesquisa e do resultado científico, que é a análise dos pares e o uso do método científico. E uma das coisas mais importantes nesse processo é que a gente trabalha a partir dessa ciência, que conversa entre os cientistas muitas vezes de maneira aberta, e, a partir dessa conversa, nós conseguimos avançar nas conclusões. Esta manhã é um exemplo. Nós temos um acumulado de argumentos, de referências, que vêm nesse contexto do olhar do método científico, uma convergência de argumentos que, ao serem somados, vai fazer esse embasamento possível a esta Comissão de tomar uma decisão confortável, conclusiva, sobre o PL. Mais do que isso, nós vemos a convergência de argumentos a partir de diferentes olhares ou propostas metodológicas de abordagem para o problema, o que é importante na ciência e que está no cerne da existência do método. Eu gostaria de começar dizendo da nossa preocupação com o PL, é um PL que, ao nosso olhar, criminaliza, cria o crime do cientista, em vez de olhar para todos os mecanismos e todos os processos de acompanhamento da ética na pesquisa e no fortalecimento desses mecanismos. A gente coloca... É bom lembrar que a motivação colocada para o PL é o caso da proxalutamida, que foi utilizada em testes no Amazonas e resultou em mais de 200 mortes, e quero dizer que nós só conhecemos esse resultado pelo correto funcionamento do Sistema CEP/Conep, que identificou, denunciou e gerou os mecanismos de acompanhamento e punição, então, mostrando a fortaleza do mecanismo de autorregulação da ciência já instalado e que conta com o Sistema CEP/Conep, com as comissões de ética do CNPq e da Capes, com os mecanismos de avaliação, de cumprimento do objeto e acompanhamento em todas as universidades. |
| R | Nós, na Universidade de Brasília, temos cinco CEPs instalados, com essa atuação. Nós temos uma Comissão de Ética no Uso de Animais instalada e apoiada. O mecanismo precisa muito mais de um olhar de fortalecimento e apoio. Hoje, o sistema CEP/Conep está em discussão na Câmara. Existem tentativas de mudança, de enfraquecimento dos mecanismos de acompanhamento dessa ética, via desconstrução do mecanismo CEP/Conep, que talvez seja o mais importante, como um olhar para esta Casa. Mais do que isso, a autorregulação da pesquisa trabalha com mecanismos somatórios, do ponto de vista estatístico. Nós temos o sistema CEP/Conep que tem característica administrativa e jurídica. Nós temos todos os mecanismos de avaliação por pares, que é acadêmica, que identifica as fraudes, que aponta. Foi possível, a partir do mecanismo de identificação por pares, identificar o caso de um pesquisador que teve 34 artigos retratados, despublicados, respondeu a processo e foi exonerado do serviço público. Existem os mecanismos de retratação de artigos que são levados, publicamente, para toda a sociedade da pesquisa. As instâncias administrativas têm processos disciplinares instalados, mas, principalmente, nós trabalhamos continuamente para a formação ética dos estudantes, para a formação desde do Pibic, desde a iniciação científica. Eu também. Na minha iniciação científica, o meu orientador: "Se você escreveu, qualquer um precisa pegar a sua tese e ser capaz de reproduzir o todo e encontrar o mesmo resultado". Essa é a premissa, desde o ano 2003, quando eu defendi a minha tese, em cotutela com a Universidade Pierre e Marie Curie. A minha orientadora foi muito rígida também nisso. E isso é muito importante e previne. Nessa formação você trabalha o lado positivo de que a ciência vai contribuir para formar uma sociedade capaz de fazer, de fazer a reflexão e de saber quando ela deve aceitar um medicamento off label, quando ela deve usar o chá de limão para deixar básico o sangue, num erro científico básico. Então, é muito importante a valorização da formação em ética dentro das universidades e o reforço desses mecanismos que já temos, que fazem com que a gente tenha uma pesquisa autorregulada. Mais ainda... Eu vou pegar aqui a lista de algumas preocupações. Primeiro, a gente vê uma certa redundância perigosa no projeto. Já existem - na nossa Constituição Cidadã, no nosso arcabouço legal - mecanismos legais instalados para averiguações criminais quando da má conduta profissional, em qualquer área de atuação. Nós não precisamos de uma lei específica para o crime do cientista. Nós precisamos de reforço aos mecanismos de acompanhamento de ética em pesquisa. Mais do que isso, nos preocupa a subjetividade e a seletividade de alguns termos, como a ideia de apresentação seletiva, o uso inadequado de dados estatísticos... Porque isso pode confundir o erro científico, que é genuíno, que faz parte, com uma fraude deliberada. Mas ainda temos preocupação com o caráter ideológico do entendimento do que é uma pesquisa, a interpretação arbitrária. |
| R | O medo dessa criminalização pode nos fazer regredir no que diz respeito ao caráter inovador das nossas pesquisas. Ontem, ou esta semana, saiu o resultado da Wipo, da OCDE, do ranking global de inovação, e o Brasil, nos últimos dez anos, subiu da posição 66 mundial para a posição 52. Somos referência em inovação, principalmente em pesquisa de saúde, como a própria professora Denise já vem destacando. Muita dessa pesquisa, utilizando, inclusive, a biodiversidade brasileira, as possibilidades de interação com essa capacidade, com esse patrimônio. Então, trazer uma ciência que não vai inovar, criminalizando, é um problema e é uma posição muito difícil para a ciência. Mas, de modo final, estou olhando ali, tenho um minuto e meio apenas, a percepção é de que esse PL precisa ser efetivamente rejeitado. Temos que reafirmar o compromisso com a ciência livre, autônoma, autorregulada, capaz de se desenvolver em bases éticas e de confiança mútua, e como capaz de gerar progresso científico, defendendo a inovação no Brasil, mas, principalmente, que esta Câmara encontre mecanismos de apoio e reforço aos instrumentos já existentes, e estruturação, porque o sistema CEP/Conep precisa de apoio, precisa de estrutura e precisa ser valorizado e reconhecido. Mais do que isso, a gente tem muita preocupação com segurança jurídica, e com possibilidade do espaço da perseguição ideológica aos resultados ou aos temas de pesquisa. (Soa a campainha.) A SRA. RENATA AQUINO - Mas, destacando que o acumulado desta mesa, é a ideia de que a ciência brasileira, sobretudo, funciona muito bem, inova, tem mecanismos de autorregulação robustos, e pode contribuir para que tenhamos mais visibilidade. Obrigada, gente. Desculpa. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Obrigada. Muito obrigada, Profa. Renata. Esclarecimentos também muito nítidos. Quero anunciar a presença aqui, na nossa audiência pública, de Tiago Emmanuel Braga, Diretor do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict). Seja muito bem-vindo. Vou passar a palavra agora para a Sra. Márcia Teixeira, de forma remota, Vice-Presidenta adjunta de Pesquisa e Coleções Biológicas da Fundação Oswaldo Cruz. Em seguida, já na mesa, pelo rodízio que nós fizemos, Samuel Goldenberg, Diretor da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Então, vamos conectar, Dra. Márcia Teixeira, para a sua apresentação, de maneira remota. |
| R | A SRA. MÁRCIA TEIXEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos e todas que nos acompanham presencialmente na sala do Senado e a todos aqueles que nos assistem através da transmissão remota. Eu também gostaria de parabenizar a Senadora Teresa Leitão pela oportunidade de termos esta audiência pública em torno de um tema tão relevante e, na figura da Dra. Denise Pires, que nos antecedeu, quero saudar todos aqueles que estão convidados e que farão uma contribuição aos trabalhos da Comissão. Eu faço também uma saudação especial à Dra. Helena Nader, que é bastante importante não só na trajetória e na história do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia, mas pela qual a Fundação Oswaldo Cruz, que represento nesta sessão, tem um apreço bastante profundo. Eu vou compartilhar agora a minha apresentação. (Pausa.) Ela já está no modo de apresentação? Se não, descompartilho. Vocês me ouvem e assistem? Posso começar? (Pausa.) A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Agora ajustou. A SRA. MÁRCIA TEIXEIRA (Por videoconferência.) - Eu vou começar a passar a apresentação. Vocês estão assistindo adequadamente? Porque eu parei de vê-los infelizmente, mas vou começar a apresentação. Bem, antes de começar a apresentação, eu gostaria de deixar claro que a Fundação Oswaldo Cruz, a exemplo de outras instituições que me antecederam, manifesta-se contrária à aprovação do PL, por uma série de motivos que já foram apresentados sobretudo pela Dra. Helena Nader e pela Dra. Denise Pires, mais por algumas outras razões e argumentos que eu espero poder discorrer na minha apresentação. Eu vou perguntar novamente: vocês estão vendo bem a apresentação? (Pausa.) Acho que o primeiro ponto que eu gostaria de salientar é traçar um painel bastante sucinto das atividades da Fiocruz que têm uma relação imediata com o sistema de integridade e de garantia da ética na pesquisa. Então, a Fiocruz tem um número bastante elevado, desde a década de 90 e em pleno processo de crescimento, de pós-graduações stricto e lato sensu, mestrados e doutorados acadêmicos e profissionais. Temos um número bastante expressivo de projetos de pesquisa aprovado e também de cooperações internacionais e grupos de pesquisa. Um pouco mais à frente, voltarei a chamar atenção para os instrumentos de cooperação e para o volume. Esses dados são de abril de 2025, e, na realidade, em relação à cooperação internacional, nós já temos um número bastante expressivo de acordos e, neste momento, em avaliação e possível assinatura. Eu acho que isso traduz em números e materializa o que nós estamos falando, em termos de atividades. |
| R | Gente, está tendo um pequeno problema aqui. Desculpe, não estou conseguindo passar aqui a apresentação. Acho que, enquanto resolvo aqui esse pequeno problema informático, eu vou falando. Na realidade, desde o final dos anos 90, a Fiocruz, a exemplo de outras instituições de pesquisa, se dedicou à constituição de um aparato dedicado à integridade à pesquisa e também à ética em pesquisa, aparato esse que é ligado à Vice-Presidência de Pesquisa e Coleções Biológicas e à Vice-Presidência de Educação, que, como vocês viram, têm uma participação hoje bastante relevante. Eu estou deixando um pouco de fora, obviamente, da minha fala toda a questão da produção, que é muito ligada e depende, na verdade, da pesquisa clínica e dos ensaios clínicos; estou me prendendo apenas a alguns aspectos. Esse sistema, obviamente, embora tenha uma ligação com as Vice-Presidências, com as coordenações, tem a independência e a autonomia. Eu acho que é bastante importante frisar, embora a Dra. Denise já tenha dito isto: a preservação da independência e da autonomia, tanto dos CEPs, quanto do Fórum de CEPs, como da própria Comissão de Integridade em Pesquisa; autonomia e independência, que são necessárias para a concepção das suas atividades. É exatamente sobre isto que nós estamos discutindo: a independência e o fortalecimento desse aparato institucional, que já existe, a exemplo da Fiocruz, em todas as instituições, pelo menos as públicas de ensino e pesquisa nacionais. Eu trouxe uma tela - e não vou me prender muito aos tecnicismos, mas acho importante complementar as falas dos que me sucederam - de que as Comissões de Ética e de Integridade, todas elas seguem um fluxo de investigação que pode ou não resultar na aplicação de sanções ou medidas apenas educativas que não só guardam relação com a legislação vigente, mas também guardam relação e uma reciprocidade com as próprias instituições internacionais e organismos internacionais que atuam tanto na garantia da integridade à pesquisa, quanto na ética. Então, é importante entendermos que já existe o fluxo e já existe um conjunto de sanções que são seguidas pelas instituições que possuem um sistema estabelecido de integridade e de ética da pesquisa - é o caso da Fiocruz, é o caso da UnB, é o caso da UFRJ, da Unicamp e de várias outras instituições públicas de pesquisa e ensino nacionais. Eu trouxe esta tela, e não vou, evidentemente, ficar discorrendo sobre cada um desses sistemas, mas esta tela tem duas intencionalidades: a primeira intencionalidade é marcar que a Fiocruz mais uma grande parte das instituições públicas de pesquisa e ensino, sejam os institutos vinculados ao CNPq, sejam as universidades, possuem acordos de cooperação e colaboração, já de várias décadas, com instituições ligadas a esses países. |
| R | Todos esses países e regiões, no caso da União Europeia, possuem um sistema sólido de garantia da integridade e de ética em pesquisa. Todos eles também se caracterizam - essa é a segunda intencionalidade dessa tela - e se irmanam no fato de que a investigação de possíveis problemas no conhecimento científico produzido é investigada no interior do próprio sistema de integridade de ética na pesquisa. Acho isso bastante importante. E, no âmbito das cooperações internacionais que a Fiocruz e outras instituições brasileiras mantêm com instituições desses países, algo que deve ser observado é que há uma confiança das instituições internacionais no sistema de integridade e de ética na pesquisa. Acho que isso é bastante importante, porque modificações do nosso marco legal ou alterações na forma como essas instituições trabalham nos seus fluxos, nos seus ritos podem, de fato, trazer uma quebra de confiança dessas instituições parceiras no nosso sistema e na nossa sistemática de apuração de possíveis problemas. Eu trago agora, rapidamente, alguns elementos - vou passar rápido essa tela - que nós destacamos na apreciação do PL. São elementos que consideramos fundamentais, evidentemente, para a apuração de possíveis problemas em artigos ou em conhecimento científico produzido, mas a tela é para observar que todos eles já possuem o seu possível encaminhamento de apuração na legislação existente, tanto na Lei 14.810, de 2024, quanto na Lei - é a tela seguinte - 6.437, de 1977. A própria LGPD, no tocante à proteção de dados sensíveis, também pode ser utilizada por comitês de éticas e comissões de integridade à pesquisa. Vou passar rapidamente para as considerações finais porque acho que nós levantamos alguns riscos, mas esses riscos já foram contemplados pelas falas anteriores. Então, vou direto para algumas recomendações que a Fiocruz faz à Comissão: a primeira é o fortalecimento de uma cultura de responsabilidade do pesquisador e das instituições de pesquisa sobre o conhecimento produzido; a segunda é a necessidade de investimento na estruturação, na capacitação permanente e num fomento de comitês de ética e de integridade à pesquisa. Ela está diretamente relacionada à necessidade de investimento público na educação permanente para a conduta responsável em pesquisa. Acho que esses dois pontos são muito importantes, porque as mudanças tecnológicas pelas quais todas as áreas da pesquisa em saúde - e mesmo aquelas que não estão contempladas pela pesquisa em saúde - passam exigem que os comitês de ética e as comissões de integridade à pesquisa permanentemente se qualifiquem para desempenhar as suas atividades da melhor forma possível, para que possam fazer análises baseadas em conhecimento científico robusto; a quarta é a adoção de instrumentos corretivos proporcionais - isso também já foi salientado pelo representante do CNPq -, que podem ir de uma gradação, desde medidas educativas até a retratação, a suspensão de bolsas e financiamentos, até, de fato, a sanções administrativas e disciplinares. |
| R | Por fim, nós gostaríamos de deixar como mensagem a necessidade do fortalecimento dos instrumentos administrativos e disciplinares, a investigação especializada e, novamente, as sanções proporcionais. Eu encerro a minha fala, também chamando a atenção para a necessidade de que a educação permanente e a formação não se restrinjam aos pesquisadores, mas, no caso principalmente dos ensaios clínicos, que elas se estendam aos médicos e à equipe de enfermagem; que as associações de pacientes e principalmente os pacientes e a sua rede de apoio também possam encontrar, de uma forma fácil, com uma linguagem fácil, apoio nas Comissões de Ética e nas Comissões de Integridade em Pesquisa nas respectivas instituições, porque um aspecto importante para assegurarmos a boa ciência é o fortalecimento do controle social. O controle social não será fortalecido com o punitivismo; ele será fortalecido com acesso à informação e à educação permanente de todos aqueles envolvidos com a produção de conhecimento. Eu agradeço, mais uma vez, ao Senado, a oportunidade de participar e coloco à disposição dos Senadores, das Senadoras a Fundação Oswaldo Cruz para continuarmos com este debate. Muito obrigada. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Somos nós que agradecemos, Dra. Márcia, pela rica exposição. Quero destacar, nesse ponto final, um procedimento que deve ser muito caro a nós Parlamentares que é a valorização do controle social. Nós estamos aqui discutindo punição, criminalização... A CCJ, aqui junto, está discutindo a PEC da blindagem. Vejam como nós somos plurais e diversos, não é? (Risos.) Eu espero que tenha um elo comunicante entre aqui e a CCJ, que ainda está ocorrendo. Muito obrigada. Registro a presença do Dr. Diego Menezes, Presidente da Associação Brasileira das Instituições de Pesquisa Tecnológica e Inovação. Passo a palavra, já aqui na mesa, ao Dr. Samuel Goldenberg, Diretor da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que este ano sediou o encontro na minha cidade. O SR. SAMUEL GOLDENBERG (Para expor.) - Isso, exatamente. Bom dia a todas as pessoas. Eu gostaria de agradecer, inicialmente, à Senadora Teresa Leitão pela organização desta sessão da CCJ, desculpa (Risos.)... da Comissão de Ciência e Tecnologia - a senhora falou de CCJ aqui, e eu me confundi -, que é extremamente importante. |
| R | E eu fiquei muito feliz que esta sessão foi aberta pela Profa. Helena Nader, Presidente da Academia Brasileira de Ciências, mas, sobretudo, porque a Profa. Helena Nader é Presidente de Honra da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, que eu aqui estou representando. Em benefício da objetividade e devido ao tempo, eu vou ler esta manifestação. Essa discussão sobre conduta científica transcende o círculo restrito do meio acadêmico e ganha alta relevância diante do impacto e da importância da ciência para a sociedade. Essa questão tem ocupado o dia a dia da maioria dos pesquisadores, e os principais periódicos científicos vêm discutindo intensamente os problemas relacionados à integridade científica. Felizmente, as instituições de fomento têm buscado mecanismos que priorizem critérios mais qualitativos na análise de projetos de pesquisa. Além disso, as melhores universidades e centros de pesquisa vêm fortalecendo suas políticas internas de controle, através da criação de comitês de integridade em pesquisa. Algumas ações de pesquisa têm efeitos quase imediatos na sociedade devido ao seu impacto, o que exige uma atenção especial aos riscos e benefícios. Por exemplo, o desenvolvimento de um novo inseticida pode afetar toda uma cadeia biológica, envolvendo não só a saúde animal e o meio ambiente, mas também a saúde humana. Da mesma forma, pesquisas envolvendo medicamentos ou vacinas devem seguir protocolos rigorosos e bem estabelecidos, com diferentes fases de testes e avaliações, garantindo que todas as etapas sejam passíveis de verificação. Desde os horrores da Segunda Guerra Mundial, com os experimentos em humanos nos campos de concentração e o estabelecimento do Código de Nuremberg, diversas reuniões internacionais foram realizadas com a participação da comunidade científica para regulamentar a pesquisa com seres humanos. Como resultado disso, tivemos as Declarações de Helsinque, como mencionado pela Profa. Denise, em vários anos sucessivos, e o importante Relatório Belmont, de 1978. Este relatório balizou a Resolução nº 196, de 1996, do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta a pesquisa clínica no Brasil. Nesse sistema, os protocolos são submetidos à Plataforma Brasil e devem passar pelo parecer do Comitê de Ética em Pesquisa, para eventuais ajustes e aprovação - é o sistema CEP/Conep, também mencionado pela Profa. Denise. Assim, temos um sistema bem estabelecido, robusto e em pleno funcionamento, baseado nos princípios de respeito, que é o termo de consentimento livre e esclarecido; beneficência, segurança e bem-estar dos participantes; e justiça, que é a igualdade no acesso às informações e aos benefícios. A nossa discussão nesta sessão é sobre a criminalização da conduta científica. A criminalização da ciência pode gerar consequências nefastas; exemplos históricos incluem a condenação de Galileu, como já foi discutido aqui por vários de nós, bem como a repressão da genética durante o stalinismo, impulsionada pela ideologia de Trofim Lysenko, que causou o atraso de várias áreas do conhecimento na antiga União Soviética e o desterro de vários cientistas para a Sibéria na época. A condenação de cientistas, além de contribuir para a distorção do debate público, pode reforçar discursos de negação e antagonismo à própria ciência. O negacionismo foi particularmente perverso durante a pandemia de covid-19, quando protocolos sem comprovação científica de eficácia foram adotados - como o uso de ivermectina, hidroxicloroquina e a recusa vacinal -, resultando na perda de milhares de vidas, como já foi mencionado aqui. |
| R | No Brasil, recentes exemplos de pesquisadores que enfrentaram ataques e ameaças incluem Marcus Lacerda, que estudou a cloroquina, mostrando que era sem efeito para a covid; Larissa Bombardi, sobre os impactos de agrotóxicos; e Ricardo Galvão, Presidente do CNPq, com a questão do desmatamento da Amazônia. Essas ações demonstram o quanto o negacionismo pode colocar em risco a saúde pública, a ciência e a democracia. O Projeto de Lei 330, de 2022, segundo seu enunciado, é para punir criminalmente as graves violações éticas na pesquisa, a fim de proteger a integridade científica. O exemplo citado pelo PL - o estudo com proxalutamida para covid-19 conduzido pelo Médico Flavio Adsuara Cadegiani - repercutiu internacionalmente devido à suspeita de dados inconsistentes. Importa mencionar que o Presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia à época, o Dr. Clovis Arns da Cunha, afirmou: “Não podemos colocar a saúde da população brasileira em risco com diretrizes sem evidência científica”, referindo-se ao uso dessas drogas antiandrogênicas e antiprostáticas, entre elas a proxalutamida, no contexto do tratamento de covid. É de triste lembrança mencionar que muitas pessoas receberam medicamentos sem respaldo científico para seu uso, como ficou evidente na CPI da covid conduzida por este Parlamento. Importa destacar que o médico responsável pelo estudo a que se refere a justificativa do PL ora em discussão foi patrocinado por um laboratório interessado na droga e não atuou vinculado a nenhuma instituição pública. Para fins de informação adicional, o Médico Flavio Cadegiani possui diversos estudos defendendo o uso de ivermectina para profilaxia da covid. Assim, o exemplo apresentado pelo Senador Mecias para justificar o PL está muito distante da realidade da pesquisa clínica no Brasil - para usarmos o termo específico ao qual esse PL deveria se referir. Um fruto podre fora do cesto não pode servir de exemplo para uma argumentação que almeja criminalizar toda a pesquisa científica. É importante ressalvar que, dentro da comunidade científica, nas agências de fomento e nas instituições de pesquisa, existem mecanismos sólidos capazes de detectar e punir fraudes. Esses mecanismos podem levar ao cancelamento dos recursos investidos, à demissão do infrator, sem contar o reconhecimento negativo dos responsáveis pelos seus pares. Do ponto de vista regulatório, o Sistema CEP/Conep é bastante rigoroso. Como prova disso, o Conep apresentou denúncia à Procuradoria-Geral da República envolvendo o estudo da proxalutamida, tendo sido providenciado o devido encaminhamento judicial. Para concluir nossa intervenção, a Lei nº 14.874, de 2024 - mencionada aqui pela minha colega Márcia Teixeira -, promulgada em 28 de maio de 2024, dispõe sobre a pesquisa com seres humanos e institui o Sistema Nacional de Ética em Pesquisa. A referida lei é bastante completa e abrange nos seus termos diversas orientações éticas na condução de estudos. |
| R | Em seu art. 59, ela, explicitamente, dispõe que: “Conduzir pesquisa com seres humanos em desconformidade com o disposto nesta Lei constitui infração ética e sujeita o infrator às sanções disciplinares previstas na legislação do conselho profissional ao qual [...] [seja] vinculado, sem prejuízo das sanções civis e penais cabíveis.” Portanto, diante da exposição apresentada e da existência de dispositivos legais adequados, a SBPC manifesta-se contrária ao... (Soa a campainha.) O SR. SAMUEL GOLDENBERG - ... PL 330, de 2022. Obrigado. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada. Eu vou pedir ao Dr. Samuel e aos demais que deram o seu posicionamento sistematizado e por escrito que deixem aqui para a Comissão, para que eu mesma também possa conversar com o Relator, oportunamente. Passo a palavra agora, em forma remota, para a Natália Trindade, Diretora da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) Em seguida, o Sr. André Cabral de Souza, da Finep. A SRA. NATÁLIA TRINDADE (Para expor. Por videoconferência.) - Olá, bom dia. Ouvem-me bem? A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Sim. A SRA. NATÁLIA TRINDADE (Por videoconferência.) - Maravilha! Bem, bom dia a todas as pessoas presentes. Saúdo aqui a mesa, e quem está de modo remoto, como eu, na pessoa da Senadora Teresa Leitão, que preside esta audiência pública. Chamo-me Natália Trindade, sou doutoranda em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Diretora da ANPG e da Associação de Pós-Graduandos da minha universidade, e trago aqui, senhoras e senhores, a opinião da nossa entidade, a Associação Nacional de Pós-Graduandos, com muita preocupação, acerca do PL 330, de 2022, que visa criar o tipo penal de má conduta científica, seguindo aqui a reflexão trazida, sobretudo pela Presidenta da ABC, a Sra. Helena Nader, e pelos demais aqui, a quem, mais uma vez, saúdo pela pelas apresentações. Venho aqui cumprir três papéis que se condensam no que eu vou expor no que tange a essa preocupação. Aqui falo primeiro enquanto representante dos pós-graduandos do Brasil, sujeitos que são responsáveis pela ampla maioria das pesquisas realizadas no nosso país, e é importante ressaltar que o ser pós-graduando no Brasil consiste em ser estudante, conforme dispõe a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, e ser trabalhador, conforme a gente observa no cotidiano da produção científica, com as nossas publicações, nossas apresentações, o processo de escrita, de leitura, enfim. Ser estudante é estar em pleno processo de formação. E nós, pós-graduandos, estamos justamente em formação enquanto pesquisadores. O processo pedagógico não combina com medo. O processo pedagógico é composto não só por acertos, mas por erros e falhas ao longo desse processo de aprendizado. Por isso, a gente observa, quando nós entramos na pós-graduação, dois institutos muito interessantes, que são o nosso direito a ter orientação individualizada ao longo dos nossos cursos e o instituto do estágio. Isso configura, para nós, perfeitamente, o que é ser estudante e configura justamente a importância da formação pedagógica ao longo do nosso ser pós-graduando, nessa construção. |
| R | Isso precisa ser resguardado, inclusive sob o risco de o Estado brasileiro seguir um caminho contrário ao que dispõe a Constituição Federal, acerca da ciência e da tecnologia, se tornando um agente desmobilizador do ofício de cientista. Isso, para nós, já caracteriza essa preocupação que apontei aqui no início. No que se refere a ser trabalhador, quando eu falo nessa composição do sujeito pós-graduando, nós estamos imersos num eclipse de ausência de direitos, que é produzido, também, pelas ausências do Estado brasileiro. Nós acreditamos que não precisamos de mais um peso nesse processo de formação e de trabalho em pesquisa, que é o controle policial e judicial proposto pelo referido projeto de lei. Quando nós criamos um tipo penal específico, como já foi falado aqui, não é apenas um trabalho em torno da produção legislativa, mas aponta a necessidade de o Estado brasileiro passar a investigar e judicializar, tomar posição através do Poder Judiciário, acerca da conduta, aqui se referindo à má conduta. Nós acreditamos que, quando a gente fala de ser trabalhador dentro da perspectiva de ser pós-graduando, nós precisamos que o Estado brasileiro esteja mais interessado na garantia dos direitos previdenciários, do reajuste anual e dessa valorização do fazer científico. Nada disso combina com o que vem sendo proposto pelo projeto de lei que nós estamos aqui debatendo. É importante aqui também, senhoras e senhores, salientar o tamanho da diversidade e da complexidade de que falamos aqui quando nos referimos à ciência. Eu, como me apresentei, estou doutoranda em Direito, que é uma área completamente diferente da saúde, das ciências humanas, das engenharias, das agrárias. Enfim, o debate acerca da ética, da integridade científica, essa construção, deve garantir e valorizar essa diversidade e essa complexidade, que são uma riqueza no campo científico. E aqui falo, já me posicionando enquanto jurista formada em um dos maiores centros de excelência do nosso país, a Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, para refletir com as senhoras e os senhores alguns pontos do projeto de lei que é alvo aqui da discussão da audiência pública da Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado. O projeto de lei, como foi falado, objetiva justamente essa criação de um tipo penal, alterando o Código Penal de 1940. Mas tem um ponto anterior sobre o qual a gente aprende ali nas cadeiras da graduação que é a teoria geral do delito. O que é um crime? O que é tornar uma conduta crime? O crime é um comportamento em separado, ou seja, distinto dos demais. A gente organiza essa separação a partir de uma avaliação social negativa acerca daquela conduta, ou seja, quando o legislador produz um tipo penal, ele vai apontar que a sociedade não deseja aquele comportamento e, por isso, constatado esse comportamento indesejado, estabelece uma sanção. Esse é um debate importantíssimo. Por isso que é importante valorizar, mais uma vez, esse espaço de discussão. Contudo, é importante que o legislador se atenha a que é necessário separar com mais atenção esse comportamento. E aqui volto ao que falei anteriormente sobre a prática pedagógica, sobre o processo de formação e a importância de resguardar esse processo. |
| R | Existe o erro honesto, e o erro honesto não pode ser confundido com fraude. Essas são duas condutas completamente distintas e, para que a gente possa distingui-las, você precisa... Se você entrega todas as condutas de uma forma pouco criteriosa, você entrega à autoridade policial o dever e essa competência de dizer o que é fraude e o que é erro honesto. Isso fere a autorregulação, como já foi falado aqui, da comunidade científica, esse entendimento entre os pares justamente do que é um erro honesto e do que é uma fraude. O projeto de lei, na reflexão trazida pela Prof. Olival, não distingue os diferentes níveis de formação e de responsabilidades que existem no campo científico, equiparando todos os agentes que se encontram nesse campo. E aqui quero reforçar o que a Profa. Renata Aquino bem trouxe. O projeto de lei não pondera a existência de tipos penais - que já contemplam a preocupação do legislador -, ao se escrever esse projeto de lei e sua justificativa, como, por exemplo, aqui posso elencar alguns, o crime de estelionato, os crimes em torno do falso, sobretudo a falsidade ideológica, o crime de plágio, entre outros tipos penais existentes no Código Penal. Ou seja, a sociedade já se preocupa com práticas que visam enganar, prejudicar o outro, porque essas condutas são passíveis de ocorrer em qualquer lugar. Isso não é uma prática exclusiva do campo científico. Acredito que é equivocado acreditar e indicar através de uma lei que essa má conduta apenas ocorre no campo científico. Além disso, quero refletir com as senhoras e os senhores aqui presentes que o tornar crime, o criminalizar incorre em judicializar, em onerar o poder estatal para investigar, para julgar externamente o que a comunidade científica já faz historicamente - como a Profa. Denise Pires de Carvalho trouxe aqui -, essa reflexão histórica da ciência que institui a sua autorregulação através de mecanismos de correção e retratação, e aqui, no Brasil, de reforço à importância do Sistema CEP/Conep. Por isso, senhoras e senhores, brevemente, nessa reflexão que escrevi e venho aqui apresentar às senhoras e aos senhores, a Associação Nacional de Pós-Graduandos vem, de forma enfática, defender a rejeição ao Projeto de Lei 330, de 2022, considerando tudo que apresentei aqui, pela não criminalização do fazer científico, pelo fortalecimento do Sistema CEP/Conep, com mais recursos, a fim de que a gente possa aprofundar a implementação e a difusão nos locais de pesquisa das práticas internacionais com relação à temática de ética e integridade em pesquisa, com comissões específicas sobre esse tema, para ampliar a pesquisa e a formação em boas práticas e em cultura de prevenção. Além disso, vem a Associação Nacional de Pós-Graduandos dar ênfase à sua pauta histórica sobre a valorização dos pós-graduandos e dos pesquisadores como uma ação em prol do desenvolvimento social e econômico do Brasil. Desse modo, eu encerro e agradeço, mais uma vez, o espaço disponibilizado para que possamos discutir esse tema que para nós é muito caro. Muito obrigada. (Palmas.) |
| R | A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Nós que agradecemos, Natália, a sua presença e por trazer esse aspecto mais vinculado ao Código Penal e às suas decorrências relacionadas com o PL. Passo a palavra para o nosso último convidado, Dr. André Cabral de Souza, Gerente do Departamento de Infraestrutura de Pesquisa da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Ele vai se apresentar de forma remota. O SR. ANDRÉ CABRAL DE SOUZA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos e a todas. Parabenizo o Senado, a Comissão de Ciência por essa iniciativa. Senadora Teresa Leitão e demais membros da mesa, muito obrigado por essa oportunidade, por esse convite. Confesso que é um tema um pouco delicado, até como eu já ouvi os demais colegas falando, mas foi uma grande oportunidade para a Finep estar presente nisso. Então, eu agradeço em nome do Presidente, Luiz Antonio Elias; do Diretor da área de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, Diretor Carlos Aragão; do Superintendente da área, que é o Prof. Ricardo Gattass. Falo aqui na visão de um economista, não de um jurista, com 40 anos de experiência na Finep, já tendo passado por vários momentos, em várias formas de financiamento à pesquisa, não só para empresas, como também para startups, como também para universidades e outras ICTs. É um tema delicado, na minha visão, porque ciência é um processo contínuo, em desenvolvimento constante, conforme falou Thomas Denny, da Duke University. E nós temos que ter uma visão de que, para você desenvolver uma pesquisa, você tem uma metodologia que é apresentada, que é escrita no momento em que o projeto é submetido à Finep. Só que, como é uma situação que se movimenta a todo momento, pode haver mudanças durante o processo nessa metodologia. E isso não representa erro, não representa má conduta e nem fraude. Isso é uma questão normal num projeto de pesquisa. E nós da Finep temos mecanismos para tratar disso tudo durante a avaliação do projeto, durante a execução do projeto, durante a contratação do projeto. Então, eu já vi muitos projetos aqui que tiveram uma obra abandonada, e não foi por responsabilidade da universidade, não foi por responsabilidade da coordenação, não foi por responsabilidade da equipe; foi simplesmente porque o empresário que foi contratado para fazer aquela obra, através de um processo de licitação, abandonou a obra no meio do caminho. Como é que nós vamos punir um projeto dessa natureza? |
| R | E, no entanto, se fossemos seguir ipsis litteris ali o que determina, nós teríamos que punir; e a universidade, devolver o recurso liberado. Entretanto, nós tivemos as iniciativas de dar uma oportunidade, de acompanhar, verificar in loco o que estava acontecendo, e demos essa oportunidade para essa universidade continuar com esse projeto. E ela hoje tem 2,5 mil metros quadrados com 31 laboratórios, que já vêm apresentando resultados satisfatórios, inclusive em pesquisas de combate ao câncer - esse projeto está sob a coordenação da Dra. Kely de Picoli. E nós vemos isso como uma grande vitória para a Finep, para o sistema de ciência e tecnologia e para o Brasil. Então, essa questão de você tratar esses três pontos que esse projeto de lei traz merece uma reflexão maior. Eu senti falta de uma distinção clara do que seria erro, do que seria má conduta, do que seria fraude científica. E nós temos que ter cuidado porque, se isso for aprovado, se isso for implantado, nós podemos inibir o desenvolvimento da pesquisa no Brasil, contribuindo dessa forma para aumentar o atraso tecnológico de aproximadamente 40 anos que nós já vivemos. Será que é esse o nosso objetivo? Não, não é. Então, eu penso que isso carece de uma maior reflexão, carece de uma maior discussão. Eu acho que foi fundamental essa iniciativa de trazer lideranças do setor de CTI para essa discussão, ouvir as opiniões e, pelo que eu assisti, essas opiniões convergem num mesmo ponto, que é uma reflexão maior, que é uma discussão maior, de modo que a gente não iniba o desenvolvimento científico e tecnológico no Brasil, principalmente agora que nós temos uma disponibilidade de recurso que o Presidente Lula conseguiu - agora, em 2025 -, um aumento da disponibilidade de recursos, que com isso vai beneficiar o desenvolvimento dessa pesquisa; vai tentar tirar o Brasil desse atraso tecnológico. Então, nós temos que pensar muito nisso. Quando você verifica as instituições existentes no Brasil que se dedicam à ciência, tecnologia e inovação, nós vemos um verdadeiro parque com uma defasagem tecnológica, num estado de deterioração. Então, foi o que eu falei na abertura da avaliação de projetos de pesquisa de um dos fundos de que a gente cuida aqui, o CT-Infra: "Pesquisa é importante, mas não esqueçam que tudo começa com a infraestrutura, com a disponibilidade de equipamentos, com a disponibilidade de estruturas, infraestruturas coerentes com a realidade para que essa pesquisa avance no Brasil". Então, isso é um ponto importante, de que a gente tem que ter consciência. |
| R | Quando a gente chega a um momento de avaliação desses projetos, nós contamos com membros da comunidade científica que são convidados para virem participar do debate desses projetos e selecionarem os que realmente estiverem bem elaborados, os que tiverem uma equipe adequada à execução daquele projeto, uma metodologia adequada. Com isso, a gente já minimiza, na avaliação e na seleção dos projetos, qualquer erro. Podem ocorrer erros? Podem. Mas aí nós já temos o processo de contratação. Quando o projeto é contratado, existem, no convênio da Finep, no contrato da Finep com as instituições, cláusulas padrões que exigem parecer do Comitê de Ética em Pesquisa, registrado na Comissão Nacional de Ética em Processos ou na Comissão de Ética no Uso de Animais, e Credenciamento Institucional para Atividades com Animais em Ensino ou Pesquisa. Então, já existem essas leis, já existe uma declaração de atendimento às leis do Concea, certidões negativas. E há a questão de também mostrar se aquele projeto, se aquela pesquisa vai causar algum impacto no meio ambiente. A Finep já tem esse mecanismo. Quando esses projetos são contratados e nós começamos a acompanhar esses projetos, o que acontece? Você acompanha através de documentos que essas instituições apresentam com relação ao desenvolvimento científico e tecnológico do processo e às avaliações feitas in loco. Eu acho que a Finep e o sistema têm uma interligação para facilitar o desenvolvimento de bons projetos e a obtenção de resultados que favoreçam a sociedade. Esse é o meu ponto de vista. Agradeço imensamente o convite e espero ter contribuído, em nome da Finep e da DRCT, com as colocações. A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Somos nós quem agradecemos, Dr. André Cabral. Já fiz consultas aqui à mesa, não há mais nada até o momento a declarar. O momento é sempre de transição. Amanhã, quem sabe; depois de amanhã, quem sabe. No momento, inclusive, as perguntas e comentários do e-Cidadania, sobre os quais eu passei uma vista, foram todos já integrados nas exposições dos nossos convidados e das nossas convidadas. Quero dizer que foi uma manhã riquíssima, de muito conteúdo, o que nos dará, certamente, muita tranquilidade na observância e na tomada de posição em relação ao PL 330. Esse é um movimento que sempre é feito pelas Comissões. Instruir um projeto significa exatamente isto: ouvir quem é da área. Nós, legisladores, temos ampla liberdade de legislar. As restrições são limitadas. Quem nos limita, muitas vezes, é a Constituição e o vício de iniciativa, mas a criatividade e as necessidades, ou o olhar sobre os movimentos e a dinâmica da sociedade, sempre nos ensejam a apresentar uma lei ou um projeto de lei. Mas a gente precisa ouvir quem já lida com o objeto, daquele projeto. |
| R | Acho que aqui nós tivemos visões importantes, complementares, evidentemente muito profundas, olhando sobre vários ângulos. E o que me deixa muito tranquila é que já existem procedimentos, já existem mecanismos que salvaguardam a sociedade. E o que a gente precisa, pela palavra de todos, é reforçar, estruturar, fomentar, apoiar o que já existe para o seu aperfeiçoamento rumo à inovação científica, à pesquisa, que muda vidas, que muda a sociedade e que faz com que o Brasil se insira no mundo a fazer suas próprias pesquisas e a dialogar com as pesquisas internacionais. Gostei muito quando a Renata disse: "Aproveitar tanto a nossa biodiversidade para o bem". Alguns vêm explorar essa biodiversidade, levam uma folhinha, levam uma plantinha, levam um pedaço para pesquisar lá fora, aí, depois, vem um remédio que a gente termina comprando, em vez de nós próprios podermos produzi-lo. Então, quero agradecer muito a leitura, as exposições de cada um de vocês, e dizer que vamos fazer toda a transcrição, todo o repasse, para os autores. Estamos com dois momentos muito tensos aqui hoje, no Senado: a votação da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até cinco salários mínimos, que acabou de ser aprovada, por unanimidade, na Comissão de Assuntos Econômicos... (Palmas.) Tive o prazer de registrar meu voto pelo celular, vocês devem ter visto. E também há o debate que ainda está acontecendo na Comissão de Constituição e Justiça sobre a PEC da blindagem. Então, é um grande dia: inserir esse debate, aqui, na Comissão de Ciência e Tecnologia, em meio a debates também tão importantes para a autonomia e para a democracia do nosso país. (Palmas.) Muito obrigada a todos e a todas. Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião. (Iniciada às 10 horas e 17 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 11 minutos.) |

