08/10/2025 - 29ª - Comissão de Assuntos Econômicos

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Laércio Oliveira. Bloco Parlamentar Aliança/PP - SE. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 29ª Reunião da Comissão de Assuntos Econômicos da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura, que se realiza nesta data, 8 de outubro de 2025.
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Laércio Oliveira. Bloco Parlamentar Aliança/PP - SE) - A presente reunião destina-se à realização de audiência pública com o objetivo de instruir o PRS 8, de 2025, que dispõe sobre o limite global para o montante da dívida consolidada da União, em atendimento ao disposto no art. 52, inciso VI, da Constituição Federal e no art. 30, inciso I, da Lei Complementar nº 101, de 2000, em atenção ao Requerimento 96, de 2025, da CAE, de autoria do Senador Rogério Carvalho.
Convido, para tomarem lugar à mesa, os seguintes convidados:
Sr. Bruno Moretti, Secretário Especial de Análise Governamental da Casa Civil da Presidência da República.
Por favor, Bruno. Obrigado por você ter vindo.
Convido também o Sr. Marcos Pires, Coordenador do Centro de Política Fiscal - desculpe-me. Convido também o Sr. Manoel Pires, Coordenador do Centro de Política Fiscal e Orçamento Público da Fundação Getúlio Vargas, do Ibre, e Professor da UnB, que está pelo sistema remoto.
Convido também para compor a mesa o Sr. Felipe Scudeler Salto, Economista-chefe e sócio da Warren Renascença.
Por favor, Felipe. Tudo bem? Seja muito bem-vindo. É aqui mesmo.
Convido também, com muita satisfação, para compor aqui a mesa o nosso sempre colega, querido Marcus Pestana, Diretor-Executivo da IFI.
E aproveito para cumprimentar, além do nosso colega Marcus Pestana, o Diretor Alexandre Andrade e os Analistas Alessandro Casalecchi, Pedro Souza e Rafael Bacciotti, todos da IFI. Sejam muito bem-vindos aqui!
Quero também cumprimentar - e está pelo sistema remoto - o Sr. José Roberto Afonso, que é Professor e Economista.
Muito obrigado pelo convite. Sejam muito bem-vindos também vocês!
Para compor a mesa, concluindo, eu quero convidar o Sr. Rogério Ceron de Oliveira, que é o Secretário do Tesouro Nacional.
Por favor, Rogério, seja muito bem-vindo aqui.
Nós já temos aqui algumas perguntas do nosso e-Cidadania.
Muito bem-vindo! Obrigado.
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Antes de passar a palavra aos nossos convidados, eu comunico que esta reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados, por meio do Portal e-Cidadania, na internet, no endereço senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800 0612211. O relatório completo, com todas as manifestações, estará disponível no portal, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos expositores.
Na exposição inicial, cada convidado poderá fazer uso da palavra por até dez minutos, e, ao fim das exposições, a palavra será concedida aos Parlamentares inscritos para fazerem suas perguntas ou comentários.
Quero registrar aqui a presença e cumprimentar o Senador Izalci Lucas e o Senador Hamilton Mourão, que participam conosco desta audiência pública. Eu quero cumprimentar também o Senador Oriovisto, a quem eu tenho a honra de conceder a palavra para as suas considerações iniciais por cinco minutos. Por favor, Senador Oriovisto.
O SR. ORIOVISTO GUIMARÃES (Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR. Para discursar.) - Bom dia, Sr. Presidente! Cumprimentando o senhor, quero cumprimentar os Srs. Marcus Pestana, Felipe Salto, Bruno Moretti, Rogério, não é? Não consigo ler bem daqui, Rogério. Agradeço a presença de todos para tentarmos juntos elucidar este grande problema brasileiro que é a nossa dívida, a dívida bruta do Governo geral.
Para ser rápido e ficar nos cinco minutos, quero dizer que me foi dada a incumbência de fazer o relatório de um projeto encabeçado pelo Senador Renan Calheiros e assinado por outros Senadores que previa uma forma de ajuste para a dívida, que era um ajuste em 15 anos e um limite referente à receita corrente líquida. Eu apresento um substitutivo, porque entendi que o projeto inicial provocaria impactos muito sérios para o Governo, como por exemplo, já no próximo ano, ter um superávit primário na ordem de R$2 trilhões, coisa que, obviamente, seria impossível. Então, desde o início, a minha preocupação foi propor algo que fosse palatável, que fosse exequível, que não desorganizasse o Governo, que não atrapalhasse o Banco Central a fazer política monetária.
Baseados nisso - é óbvio que em cinco minutos eu não conseguirei entrar em muitos detalhes -, nós fizemos uma regra, e eu vou direto a essa regra, porque ela é muito simples, mas, por todas as razões - e cada uma dessas regras que estão aqui tem um porquê, tem uma explicação, tem um motivo -, nós estamos propondo um limite para essa dívida equivalente a 80% do PIB.
O SR. PRESIDENTE (Laércio Oliveira. Bloco Parlamentar Aliança/PP - SE) - Senador Oriovisto, com a sua permissão, eu queria dizer ao senhor que os cinco minutos foram abolidos, o senhor tem o tempo que precisar para fazer as suas considerações.
O SR. ORIOVISTO GUIMARÃES (Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Muito obrigado. Então, vou ver se em seis eu consigo, vou fazer um esforço aqui.
Mas nós ficamos, então, com uma resolução bastante enxuta, bastante simples. Aliás, Henrique Meirelles, esses dias, fez um artigo em um jornal, acho que o Estado de S. Paulo, dizendo que a regra era tanto melhor quanto mais simples fosse. Ele não entrou no mérito da questão, mas pediu sempre que fosse simples e lembrou o arcabouço fiscal dele, que era muito simples, porque era só a correção pela inflação.
Então, nós procuramos fazer algo simples, porém, que resolvesse os problemas iniciais que o Governo poderia ter. Basicamente, o projeto de resolução diz o seguinte: a dívida fica limitada a 80% do PIB ou a 6,5%... Perdão, ou a 6,5 vezes a receita corrente líquida e, quando o Governo atingisse esse patamar, ele ficaria sujeito a algumas imposições.
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A primeira delas: a União ficaria proibida de realizar operações de crédito internas ou externas, ressalvadas:
a) as destinadas ao pagamento das dívidas mobiliárias, ou seja, o Governo vai sempre poder emitir títulos para fazer a rolagem da dívida.
Então, é o primeiro cuidado de não criar dificuldades para o Governo rolar a dívida.
b) ficaria sujeito àquelas previstas no §5º do art. 4º, que é o resultado eventualmente negativo do Banco Central, que ele poderia complementar - fica liberado. O art. 6º, também da Lei 13.820, que fala no PL do Banco Central, que, quando ele apresentar algum problema, o Governo poderia emitir dinheiro para solucionar. E o art. 7º, em que eu estou excluindo todas as operações compromissadas.
É importante dizer que eu estou excluindo todos os títulos de operações compromissadas em poder do público e na carteira do Banco Central; então, eu estou excluindo a totalidade.
Senador Jaques Wagner, muito bem-vindo!
Estamos aqui fixando um limite para a dívida que vai ser terrível. (Risos.)
Item II. O Poder Executivo Federal apresentará ao Senado Federal, no prazo máximo de 30 dias a contar da divulgação da extrapolação do limite definido no art. 1º, relatório detalhado contendo as razões do descumprimento e as medidas a serem adotadas para o reenquadramento da dívida no prazo máximo de 12 meses.
Quero dizer que eu tive o cuidado de olhar, pelo menos dar uma lida, nos 85 países que têm legislação com o limite da dívida. Algumas muito boas, algumas não tão boas, algumas claramente erradas.
A dos Estados Unidos, por exemplo, a meu ver, apresenta um defeito sério que provoca shutdown, porque eles têm um limite fixo. A própria inflação faz com que o shutdown aconteça; então, estão sempre tendo que rever.
Em nosso caso, isso não existe, porque não há limite fixo; é percentual do PIB e nós nunca teremos shutdown se aprovarmos essa resolução, porque a saída está bem clara aqui qual é.
Ainda, no caso de atingir esse limite, o Ministro de Estado da Fazenda comparecerá pessoalmente à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, no prazo de 15 dias, para prestar os devidos esclarecimentos em audiência pública.
E quarto, aplica-se imediatamente as redações previstas nos incisos de I a X, do art. 167, da Constituição Federal, que são dez itens. Como não poder criar cargos, empregos, estruturação de carreiras, admissão e contratação de pessoal e vai aí uma série de itens previstos no art. 167-A.
E, o parágrafo único, que diz que a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, mediante solicitação do Ministério da Fazenda, poderá autorizar a realização de operações de créditos para recompor as reservas de liquidez da dívida pública.
Aquela questão do colchão de liquidez também está prevista aqui. Nós entendemos que isso é importante e essa resolução não vai criar problema nesse sentido.
E art. 3º, sempre que alterados os fundamentos econômicos em razão de instabilidade econômica ou alterações nas políticas monetária ou cambial - o caso da covid, por exemplo -, o Presidente da República poderá encaminhar solicitação de revisão dos limites de que trata o art. 1º.
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Então, já está prevista aqui a saída para essas ocasiões. E finalmente: "[...] entra em vigor na data da sua publicação".
Eu quero só, para terminar aqui a minha exposição, pedir que projetem para mim... Exatamente. Só para dizer que eu tive um cuidado bastante grande de não criar problemas para o Governo e estou trabalhando aqui com dados da Secretaria de Orçamento Federal de agora, 15 de abril de 2025. Quando o Governo mandou para cá o PLDO 2026, ele mandou os seguintes dados. É obrigação, pela Lei de Responsabilidade Fiscal, art. 4º, §5º, III, que o Governo envie essa previsão. É óbvio que isso é feito pela Secretaria do Tesouro Nacional, pelo Ministério da Fazenda, são dados confiáveis. Aí se apresenta a DBGG em cima e a dívida líquida embaixo. Na dívida líquida, não vou entrar em consideração, porque não é o caso, vamos tratar só da DBGG.
A trajetória que se mostra, feita não por mim, de novo, pela Secretaria do Tesouro Nacional, pelo Ministério da Fazenda, é que essa dívida começa, em 2024, com 76,5% do PIB; evolui, em 2025, para 78,5%; cresce, em 2026, para 81,8%; e vai até atingir um pico máximo de 84,2%, em 2027. E daí a curva começa a cair, ela cai um pouquinho e chega, em 2035, a 81,6%. Esse conceito é o conceito Bacen. Acho muito importante todos terem em conta isto: quando se fala em dívida, em DBGG, existe o conceito Bacen, existe o conceito FMI e existe um conceito que nós estamos criando aqui agora, especificamente para essa resolução. Muito bem.
Então, com esses dados do Governo, fica clara aqui a trajetória que está sendo prevista para a dívida. O que estou colocando aqui em seguida? Uma outra curva, que foi elaborada pela minha assessoria, considerando o conceito de dívida que eu coloquei na resolução, em que eu excluo as operações compromissadas que estão em carteira e as operações compromissadas que estão em poder do público também. Então, isso dá um diferencial para a dívida, que é este que aparece aqui. Quando o Governo está falando em 76,5%; pela nossa resolução, seriam só 66,5%, porque nós estamos excluindo essas operações compromissadas. Com isso, nós vamos ter uma evolução que mostra que, em 2034, o Governo estaria com 71,6%.
Como nós estamos colocando um teto de 80% nesse conceito que aí está, fica claro que o Governo não vai atingir esse teto, pelo menos até o ano de 2034, ou seja, nós estamos colocando um horizonte de dez anos para que o Governo possa tranquilamente pensar da seguinte maneira: "Existe uma parede, existe uma barreira imposta por uma resolução do Senado, que está a dez anos de distância. Eu tenho esses dez anos para tomar as atitudes que eu achar necessárias, como vender ativos, como fazer uma reforma da previdência, fazer uma reforma administrativa, enfim. Eu tenho dez anos para tomar todas as medidas para que a dívida não chegue aos 80% do PIB".
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Então, até aí está muito claro que nós não estamos criando nenhum problema para amanhã; nós estamos criando um problema se o Governo não se cuidar. Se a projeção da dívida que o Tesouro Nacional fez não for verdadeira, se a dívida disparar, é claro que nós podemos ter um problema em 2028, 2029. Depende dos governos que virão. Ninguém sabe ainda quem será o próximo Presidente da República. Portanto, se ele for um emérito gastador, essa dívida pode empinar, subir, ir lá para cima, e ele vai ter o limite antes da hora.
No entanto, parece-me que esses dados são de muito bom senso, muito bem fundamentados e deixam muito claro que não há nenhum problema no curto prazo. Há um limite saudável para a dívida, um conceito bem definido do que nós estamos considerando por dívida e um tempo necessário para que o Governo tome todas as providências para que o limite jamais seja atingido. Embora a resolução trate muito do que vai acontecer se o Governo for atingido, eu quero que se saiba que a resolução foi feita para o limite não ser atingido, não é?
É isso, Sr. Presidente. Estou à disposição para eventuais outras perguntas.
O SR. PRESIDENTE (Laércio Oliveira. Bloco Parlamentar Aliança/PP - SE) - Agradeço ao Senador Oriovisto por sua participação, pela relatoria. E, com certeza, daqui do Senado, o Senador Oriovisto tem toda a confiança dos pares pelo belo trabalho, pelo conhecimento. É visível o conhecimento que ele tem do tema, como tantos outros aqui.
Para iniciar as nossas exposições, eu quero passar a palavra, com muita satisfação, a Bruno Moretti, Secretário Especial de Análise Governamental da Casa Civil da Presidência da República.
Por favor, Bruno, fique à vontade. A palavra está com você.
O SR. BRUNO MORETTI (Para expor.) - Senador, obrigado pela oportunidade de vir à CAE discutir com os Senadores sobre esse projeto.
Quero agradecer particularmente ao Senador Oriovisto, que nos recebeu no gabinete dele, fez um debate muito franco, muito técnico conosco sobre a resolução. Nós estamos aqui para seguir esse debate com o Relator e com os demais Senadores.
Agradeço também a possibilidade de fazer essa discussão com todos que estão à mesa: o Ceron, meu amigo de Governo, meu colega; o Felipe, o Marcus Pestana, o José Roberto e o Manoel.
O Senador Oriovisto, com muita competência, já expôs os pontos do último substitutivo. Então, para efeito de ganhar tempo, eu vou passar aqui pela explicação, porque o Senador, melhor do que ninguém, já o fez.
Eu só queria, Presidente, saber quanto tempo eu tenho.
O SR. PRESIDENTE (Laércio Oliveira. Bloco Parlamentar Aliança/PP - SE. Fora do microfone.) - Dez minutos.
O SR. BRUNO MORETTI - Dez minutos. Perfeito. Vou me controlar aqui.
O SR. PRESIDENTE (Laércio Oliveira. Bloco Parlamentar Aliança/PP - SE. Fora do microfone.) - Se precisar de mais um pouquinho, sem problema.
O SR. BRUNO MORETTI - Está bem. Então, vamos lá.
Eu vou fazer uma apresentação bem sucinta e objetiva para estabelecer um debate dos pontos que eu reputo ainda como problemáticos, pontos que mereceriam mais discussão, para que a gente possa seguir fazendo este debate.
Bom, o primeiro ponto é que, quando a gente examina a literatura econômica, acho que a questão não é tanto sobre um patamar específico para a dívida. Houve quem tentasse estabelecer esse patamar máximo, mas, a rigor, essa é uma questão no mínimo controversa na literatura. E, mais importante do que um ponto máximo do qual a dívida não poderia passar, é a questão da sua trajetória e da sua sustentabilidade.
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O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - Presidente, só uma questão: como tem muita gente assistindo, e nem todo mundo é economista e contador, quando tiver esses negócios de D, DP, GG...
O SR. BRUNO MORETTI - Eu vou falar. Pode deixar, Senador.
O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF) - ... a gente colocar para a turma, para o pessoal entender o que é isso.
O SR. BRUNO MORETTI - Perfeito, Senador. Pode deixar.
O SR. PRESIDENTE (Laércio Oliveira. Bloco Parlamentar Aliança/PP - SE) - Bem colocado.
O SR. BRUNO MORETTI - Então, como o Relator já colocou, o conceito central que ele trouxe na resolução é o de dívida bruta do governo geral, não no conceito exatamente do Banco Central, mas no conceito que desconta as obrigações dos entes subnacionais e as operações compromissadas do Banco Central, o que nos daria ali, mais ou menos, hoje, um patamar de 66,5% do PIB. Nossas contas ficaram iguais nesse sentido.
Portanto, como disse o Relator, haveria ainda um espaço até se chegar aos 80%, dependendo dos fatores condicionantes da dívida, e é esse tempo que haveria, seja lá qual for o Governo, para se adaptar e tomar as providências necessárias. Então acho que o Relator está, nesse ponto, embora colocando um ponto máximo ali de dívida, mais preocupado com a questão da trajetória e criando um intervalo de tempo para que as medidas sejam tomadas, o que é ótimo.
Agora, do meu ponto de vista, a questão central são as medidas capazes de afetar a trajetória da dívida. Não é o limite em si da dívida que vai nos colocar frente a uma trajetória sustentável. Então, quando a gente observa os fatores que condicionam a dívida, a gente só tem fundamentalmente, em essência, três fatores: os juros reais, a taxa de crescimento real do PIB e o resultado primário. Basicamente, quando a gente olha a diferença entre os juros reais e o que cresce a economia, estabilizar a dívida de uma vez só exigiria fazer resultados primários suficientes, para essa dívida ser estabilizada.
Naturalmente, não está sob o controle do Governo propriamente. Ele pode influenciar, induzir, apoiar, mas não estão sob o controle direto do Governo o PIB e os juros reais. Então a grande discussão é sobre o resultado primário do Governo e, portanto, as medidas de controle da despesa e as medidas de arrecadação.
Nesse sentido, eu preciso colocar que é importante se colocar em que patamar nós estamos em relação a despesas e receitas. Desde que nós introduzimos o arcabouço fiscal, aprovado pela Câmara, aprovado pelo Senado Federal, sancionado pelo Presidente Lula, o último ano fechado, o ano de 2024, nós temos despesas aí da ordem de 18,8% do PIB. E o arcabouço tem sido importante para a gente limitar a despesa e fazer escolhas dentro desse limite. Hoje a despesa se situa, mais ou menos, 0,7 ponto percentual abaixo do patamar de 2019. Esses são dados oficiais do Tesouro Nacional. O Secretário está aqui ao meu lado e pode confirmar a seguir.
Do ponto de vista da receita, o que nós temos buscado, em diálogo com o Congresso, que tem sido decisivo nisso, é uma maior progressividade tributária e a busca de uma recomposição da arrecadação. Hoje a receita líquida, que é a que importa para efeito de resultado primário, descontando as transferências, a repartição de receita, as transferências obrigatórias aos entes subnacionais, está em 18,4% do PIB. Ainda é um patamar, para os senhores terem ideia, próximo ao de 2009. Então nós tivemos um processo de recomposição da receita.
Essa curva, essas duas curvas, a curva azul mostra a receita primária líquida, descontadas as repartições de receita, e a gente percebe certa recomposição da receita, mas num patamar, como eu disse, que ainda é similar ao de 2009.
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O que a gente percebe é que houve, em certo momento, um processo de redução de receita que explica, em alguma medida, a piora dos resultados primários. E, do lado da despesa, houve um crescimento, como proporção do PIB, passando ali no início dos anos 2000, o que vai culminar lá na pandemia, evidentemente, em condições extraordinárias. Atualmente, como eu disse, ela está estabilizada num patamar abaixo de 19% do PIB, que é um patamar equivalente ao de exercícios anteriores. Em 2023, há uma pequena subida desse patamar e, em boa medida, essa subida se explica por passivos relativos a precatórios que somam mais ou menos 1% do PIB.
Quando a gente junta as curvas de despesa e receita, o resultado é a obtenção dos resultados primários do Governo central e, a partir do momento em que o arcabouço passa a operar, a partir do momento em que o Congresso aprova medidas de recomposição de receita, a gente sai de um déficit primário em torno de 2% do PIB, em 2023, e passa a um resultado em torno de 0,4% do PIB, se aproximando de um orçamento equilibrado e verificando-se um processo de consolidação fiscal, que precisa seguir para que a gente busque, justamente, a sustentabilidade da trajetória da dívida.
Quando a gente olha os fatores condicionantes da dívida expostos pelo Banco Central, fica muito claro o que eu coloquei. Quando a gente olha, por exemplo, entre 2023 e 2024 - eu vou evitar falar de 2025 pelo simples fato de que não temos um exercício fechado -, a gente vê o seguinte: a dívida bruta entre 2023 e 2024 variou 2.7. O que a gente olha é que o efeito maior é dos juros nominais, que são aqueles 7.5 pontos percentuais.
As emissões líquidas dão uma contribuição positiva, ou seja, diminuem a dívida por uma razão muito simples: como o resultado primário do Governo melhorou, as emissões líquidas caíram. E o efeito de crescimento do PIB também ajuda a conter a dívida. Então esses dados explicam bem que nós, necessariamente, precisamos lidar com essas três variáveis: PIB, juros e resultado primário, que afetam as emissões líquidas.
Então, já chegando aqui à minha conclusão, passando pelos dados, eu ainda sou...
(Soa a campainha.)
O SR. BRUNO MORETTI - ... da visão de que o mais eficiente seria pactuar com o Congresso Nacional medidas efetivas de controle da despesa obrigatória, da trajetória da despesa obrigatória, para que a gente aumentasse a resiliência do arcabouço fiscal, a aprovação de medidas de recomposição da receita, que estão em discussão neste momento.
Nós temos uma MP nesse sentido para ser votada hoje, a 303, temos um projeto de lei de gastos tributários - inclusive o Senador Oriovisto foi o Relator de um projeto muito bem-feito sobre a matéria que está na Câmara -, seguindo a trajetória de consolidação fiscal em curso. Porque o meu ponto central é: não adianta a gente estabelecer um limite para a dívida se nós não tivermos as medidas efetivas de controle.
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E aí, nós temos, inclusive, uma dúvida jurídica, Senador Oriovisto, porque o senhor - e eu não estou falando do mérito - basicamente determinou o ativamento de gatilhos que estão na Constituição, com contenção de despesas, caso o limite seja alcançado, mas nós temos uma dúvida jurídica real sobre se uma resolução do Senado pode ativar gatilhos na Constituição, que são gatilhos relativos aos entes subnacionais, inclusive.
Então, de novo, o meu ponto é se o instrumento que nós precisamos discutir é a resolução ou projetos de lei complementar, ou projetos de lei, ou até propostas de emenda à Constituição que sejam capazes, efetivamente, de controlar a despesa.
Eu lembro, por exemplo, de um Projeto de Lei Complementar aprovado, proposto por nós, aprovado pela Câmara e pelo Senado, que determina o ativamento de gatilhos quando há déficit primário ou redução da despesa discricionária. Eu acho que, dificilmente, nós não vamos acionar esses gatilhos a partir de 2027 com proibição de benefícios tributários e outras questões.
Atualmente, a emissão de dívida financia, inclusive, benefícios previdenciários, despesas obrigatórias. Então, tem uma outra questão de constitucionalidade: é que a proibição de emissão para custear despesas obrigatórias nos levaria ao não pagamento dessas despesas, que são obrigatórias nos termos da Constituição. Então, também acho...
Nada disso, como o Senador bem colocou, é algo para o curto prazo, mas é uma discussão que precisa ser feita do ponto de vista jurídico: se a resolução pode vedar essas despesas e ativar gatilhos. Eu acho, e tem colegas, juristas, que acham que a resolução não poderia fazê-lo, então tem uma discussão de constitucionalidade mesmo.
E algo que eu vou deixar - imagino que o Ceron vá tratar mais amiúde - é um possível efeito sobre o colchão de liquidez da dívida. porque isso ficaria sujeito a uma aprovação da CAE. Se a gente retira a flexibilidade do Tesouro para fazer a gestão da dívida, para reabastecer a Conta Única, nós podemos estar contratando um risco maior no mercado de títulos, com impacto sobre as taxas de juros desses títulos e com efeito, portanto, contrário ao pretendido, que é tornar mais cara a dívida pública brasileira.
E para concluir, Presidente, sob esta hipótese de vedação para que se façam as emissões e se reabasteça a Conta Única, a gente pode supor o seguinte: seria usado o saldo da Conta Única, até que fosse possível fazer novas emissões, e isso, naturalmente, equivaleria a um aumento de reservas bancárias. Foi uma experiência próxima ao que aconteceu na pandemia. E esse aumento de reservas precisa ser esterilizado pela autoridade monetária, com títulos - como o Relator colocou - que podem ser, digamos assim, usados na política monetária. Isso, portanto, implicaria em um aumento das operações compromissadas, com mais dívida de curto prazo e "selicada".
Então, eventualmente, teria um efeito contrário ao que se pretende, na medida em que você não poderia fazer novas emissões e teria que custear, por exemplo, despesas obrigatórias, que não podem deixar de ser pagas, com o saldo restante da Conta Única, o que resultaria, repito, num aumento de liquidez no mercado interbancário, determinando uma necessidade de enxugamento da liquidez, que, em regra, se faz com títulos públicos e, portanto, voltando a repercutir sobre a dívida pública.
Frente a esses problemas que a gente ainda identifica na resolução, a proposta que eu traria aqui para os senhores era que nós não deliberássemos imediatamente o projeto de resolução.
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Acho que nós não temos nenhuma divergência em relação à necessidade de medidas de controle de despesa, de seguir e acentuar o processo de consolidação fiscal, mas frente a esses problemas - às vezes econômicos, às vezes de mérito, às vezes jurídicos - é que a gente gostaria de seguir na discussão com o Relator, em um debate franco, sem procrastinação, mas realmente voltado a mitigar esses problemas levantados e a dar soluções que fossem juridicamente menos arriscadas.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Laércio Oliveira. Bloco Parlamentar Aliança/PP - SE) - Cumprimento e agradeço a exposição do Bruno Moretti.
Agora, pelo sistema remoto, eu passo a palavra ao Manoel Pires, que é o Coordenador do Centro de Política Fiscal e Orçamento Público, da Fundação Getulio Vargas Ibre e Professor da UnB.
Muito bem-vindo, Prof. Manoel. A palavra está com o senhor.
O SR. MANOEL PIRES (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos!
Senador, obrigado pelo convite. Gostaria de cumprimentar V. Exa. e parabenizar pela organização desta audiência. Quero cumprimentar o Senador Oriovisto e parabenizá-lo pelo ótimo trabalho e pela exposição muito elucidativa da proposta, bastante bem fundamentada. Cumprimento também o meu colega Bruno Moretti e o Secretário do Tesouro, Rogério Ceron. Parabenizo os dois pelo trabalho que têm feito no Governo. A gente sabe que esse tema das finanças foi sempre muito difícil. Quem se dispõe a avançar nesse tema, trabalhar e apoiar matérias governamentais nesse assunto merece sempre o nosso reconhecimento. Quero cumprimentar também o José Roberto Afonso, o Felipe Salto e o Marcos Pestana.
Antes de iniciar a minha apresentação, eu gostaria de lembrar que, em 2015, a gente teve um debate muito parecido - exatamente dez anos atrás - sobre limites de dívida. Na época - se eu não estou equivocado -, eu me lembro de ter dividido, compartilhado esta mesa com o José Roberto Afonso, que também teve a oportunidade de debater esse assunto em uma resolução do ex-Senador José Serra. Naquele momento, a gente vivia um período de crescimento de dívida igual a hoje, principalmente com juros muito altos. Então, as circunstâncias têm algumas semelhanças.
Eu quero iniciar a minha abordagem, a minha fala inicial - como a gente está em uma audiência pública, que está sendo transmitida para várias pessoas -, dizendo um pouquinho sobre qual o papel da regra de dívida dentro de um sistema fiscal. Depois, eu entro em outros temas relacionados aos tipos de regra de dívida, a relação entre dívida pública e política monetária e os limites de dívida do Estado, como é que se comparam com essa discussão da União.
Então, o primeiro ponto a chamar a atenção é que todo mundo é a favor de controlar a dívida pública. Dívida pública é um indicador de patrimônio, de riqueza governamental e, como é uma dívida, a gente deseja controlar isso. É um indicador de solvência governamental. Então, é importante ter algum tipo de controle sobre a dívida. No entanto, o que causa a dívida, como o Bruno Moretti lembrou, é o resultado fiscal do Governo. Quando eu tenho um déficit nominal relevante, a dívida vai crescer. O déficit nominal se decompõe entre resultado primário e pagamento de juros da dívida pública. Então, o limite de dívida tem um papel muito particular no sistema fiscal, porque ele olha para o sintoma. O crescimento da dívida é um sintoma do problema fiscal, não a causa do problema fiscal. Então, ele tem um papel muito particular dentro desse ecossistema, desse sistema fiscal que a gente constrói em cada país.
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Nesse sentido, aí eu entro no meu primeiro ponto principal. Eu gosto de classificar as regras de dívida em dois tipos. Então, o primeiro tipo de regra de dívida que a gente vê nos países é a regra de dívida que funciona como uma referência. O Senador Oriovisto apresentou esse ponto de vista, muito bem. O que é isso? É uma referência na qual o Governo tem que trabalhar para se planejar, adotar as medidas cabíveis, e evitar que se chegue àquele ponto, está bom? Então é um instrumento que ajuda o Governo a se planejar para evitar uma determinada situação tida como indesejada. Exemplo de países em que a regra de dívida tem esse papel: Nova Zelândia, na própria Europa, em que, no Tratado de Maastricht, você também tem algo muito similar.
Então, é o segundo conjunto de regras de dívida que impõe limitações para a dívida pública, ou seja, se você atingir este limite, algo vai acontecer. E a resolução, muito em função da própria LRF, tem algumas consequências, traz algumas consequências caso você atinja esse limite de dívida.
Avaliação empírica - e minha leitura da literatura, dos estudos sobre esse assunto - é que, quando a gente tem um limite de dívida que funciona como referência, ele serve como uma âncora muito suave. Em geral, muitos países, quando superam esse limite de dívida, não conseguem trazer isso para baixo, e aí você fica com uma regra fiscal que é desobedecida recorrentemente, e, em muitos casos, passa a ser esquecida. Isso claramente aconteceu com a Europa depois da crise financeira de 2008.
Do outro lado, indo para o outro caso, quando você tem regras de dívida que impõem limitações de fato, a depender da limitação, na medida em que você chega nesse limite, você pode ter um problema. E, em muitos casos, a gente observa aumento de taxa de juros, aumento de risco fiscal em função da proximidade desses limites de dívida.
Um exemplo que aconteceu recentemente foi nos Estados Unidos. A gente sabe que a regra dos Estados Unidos é um extremo, porque ela é fixada em limites nominais, mas, do ponto de vista das consequências, ela tem algumas similaridades com a regra de dívida, que está colocada aqui, que impõe algumas limitações para financiamento não da dívida pública atual, corrente, mas, no financiamento do déficit. Lembrando que se a dívida pública está crescendo, é porque eu tenho déficit. Se eu tenho alguma restrição para o financiamento do déficit, depois que eu atinjo esse limite, eu vou ter uma incerteza sobre como essa questão vai ser resolvida e incerteza gera percepção de risco e aumento de custo.
Então, de um lado, eu tendo a ser favorável a uma regra de dívida que favoreça esse mecanismo de referenciamento da política fiscal a longo prazo. Por outro lado, meu entendimento é que a resolução e principalmente a LRF podem trazer essa consequência. Eu acho que é um tema que precisa ser discutido. A LRF é de 2001, e, quando ela foi concebida, a visão que se tinha sobre regras fiscais era uma visão em que você impunha restrições realmente. E hoje em dia a visão de regras fiscais é uma visão muito mais flexível do que era na época, tá?
Um segundo ponto que eu quero abordar sobre limite de dívida tem a ver com o papel da dívida pública na política monetária. A dívida pública é uma forma de controle da liquidez de um país. Se a política monetária é feita por meio... Esse controle de liquidez efetuado pela política monetária é feito a partir da venda e compra de títulos. Então, quando o Banco Central quer aumentar a taxa de juros, ele enxuga a quantidade de moeda da economia, reduz a quantidade de moeda da economia, em contrapartida, ele coloca títulos em mercado. Então, um limite de dívida puro no Brasil acaba gerando algum constrangimento para a política monetária no Brasil e, consequentemente, para capacidade de o Banco Central atingir a meta de inflação.
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A resolução que o Senador apresentou trata disso. Ela exclui, por exemplo, as operações compromissadas, que são os títulos que o Banco Central opera para fazer esse controle de liquidez. Quando você tira as operações compromissadas para atender essa questão do Banco Central, aí me surgem duas dúvidas, duas questões que eu acho que vale a pena uma reflexão. A primeira é a seguinte: da mesma forma que o Banco Central faz controle de liquidez, o Tesouro, indiretamente, acaba fazendo também quando ele administra a gestão da dívida. Quando o Tesouro emite dívida, ele recolhe liquidez da economia e fica na Conta Única. Então existe uma relação entre política monetária e política fiscal que é muito forte.
Com a resolução do jeito que está hoje, separando esses dois conceitos, acho que a gente pode vislumbrar a possibilidade de duas situações muito diferentes ocorrendo, e que podem ser indesejadas. A primeira é a seguinte: vamos imaginar que o Tesouro esteja próximo desse limite de dívida e aí ele não emita mais títulos, mas ele tem caixa, então ele vai financiando o déficit por um tempo com caixa. O que o Banco Central tem que fazer para aumentar a taxa de juros? Ele vai vender título e vai aumentar as compromissadas, ou seja, a exclusão das compromissadas, dado o papel de controle de liquidez que o Banco Central tem que efetuar, acaba gerando um vazamento muito importante, de modo que a dívida pública vai continuar crescendo, que é o oposto do que a resolução deseja fazer. Essa é uma questão muito importante em regras fiscais: toda vez que você exclui algo do agregado que você quer controlar, você acaba gerando a possibilidade de um esvaziamento das regras fiscais.
Agora, por outro lado, qual é a consequência de algum tipo de limitação para emissão do Tesouro nesses termos? O Tesouro, este ano, ampliou muito as suas emissões, não somente para financiar o déficit que a gente tem, mas para fazer recomposição de caixa. Por que ele fez isso? Porque ano que vem é um ano de eleição. Toda véspera de ano eleitoral, o Tesouro faz essa prática. Por quê? Porque, em ano de eleição, existe muita incerteza. Então o mercado reage mal às informações da eleição, os juros podem aumentar, o câmbio pode depreciar. Então o Tesouro, de forma precavida, reforça o seu caixa para se proteger e fazer uma gestão da dívida pública mais eficiente. Se a gente tiver um limite de dívida somente sobre o Tesouro, esse papel de gestão da dívida, de suavizar as emissões e poder se proteger de eventos potencialmente arriscados, vai se perder e, muito provavelmente, a gestão da dívida pública vai ficar um pouco mais complicada. Então queria colocar essas duas questões, que me parecem que surgem a partir da discussão da política monetária e da tentativa de se produzir uma solução para isso desta forma.
Por fim, um terceiro ponto relacionado a essa questão da política monetária - aí eu volto para o meu ponto original, a gente quer controlar a dívida pública, porque dívida pública é um indicador de solvência governamental. Se o mercado olha para dívida bruta, às vezes para dívida líquida, a gente vai criar um terceiro conceito de dívida que poucas pessoas no mercado provavelmente vão estar olhando. Então o eventual benefício de ter um outro conceito de dívida que pouca gente olha me parece que vai atenuar bastante um eventual impacto em percepção de redução de risco que poderia surgir advindo da aprovação de um limite de dívida em um horizonte de longo prazo. Então acho que uma criação de um novo conceito de dívida teria pouco efeito em termos de redução de prêmio de risco que poderia ser alegado.
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O terceiro ponto dessa minha observação, dessa minha fala inicial, tem a ver com um argumento que eu ouço recorrentemente e que serve para justificar a resolução, a proposta de limite de dívida no nível federal, que tem a ver com o fato de que existe limite de dívida para os estados.
O primeiro ponto é que estados e municípios são diferentes da União, exatamente pelas questões que eu mencionei aqui, a existência de Banco Central, uma institucionalidade muito particular que não está presente em outros países que têm limite de dívida, como, por exemplo, na Europa, em que o limite de dívida é nacional, mas o Banco Central é supranacional; então, as relações são separadas. Nos Estados Unidos, o FED é uma instituição apartada do governo; então, você consegue separar essas coisas melhor do que a gente - a gente não consegue fazer isso com a institucionalidade atual.
Agora, do ponto de vista da efetividade, é bom lembrar que a gente tem limite de dívida para os estados e municípios há muito tempo e a gente está às voltas com o refinanciamento de dívida dos estados - neste ano mesmo, a gente aprovou um novo refinanciamento de dívida dos estados do Propag. E vários desses estados que têm dificuldades financeiras estão atingindo limites de dívida. Isso é só para relativizar um pouco a importância dos limites de dívida como indicador de solvência governamental, na forma como ela está concebida na LRF.
Para finalizar esta minha fala inicial, queria chamar atenção para o fato de que, de novo, a gente - eu vou insistir neste ponto - tem um déficit público e está às voltas com essa problemática fiscal desde 2015, inclusive quando eu tive a oportunidade de avaliar uma proposta similar. A dívida pública cresceu nesse período, e a gente tem tido uma dificuldade muito grande de controlar o déficit público, que é a principal razão do crescimento dessa dívida. E a gente tem várias propostas no Congresso que estão tentando consertar isso.
A gente vê uma experiência internacional em que as regras fiscais estão aumentando muito, porque o mundo tem apostado nas regras fiscais para resolver o conflito fiscal. Eu tenho uma visão diferente: eu acho que quem tem o papel e a função de fazer esse controle fiscal é o Parlamento. Nos processos orçamentários avançados, o Parlamento é o fiel da balança. Então, é importante que o Parlamento se atenha às medidas que o Governo Federal está apresentando.
Hoje, por exemplo, é o último dia de validade da Medida Provisória 1.303 - acho que vale a pena a olhar com bastante cuidado. Você tem um projeto de lei complementar que faz a revisão dos gastos tributários, que é extremamente importante e uma medida aguardada por vários especialistas. Do ponto de vista da despesa, no ano passado o Governo fez uma proposta importante sobre a reformatação da concessão de benefícios de prestação continuada, a reforma dos militares, a questão dos supersalários; e aprofundar o debate em torno desses temas eu vejo como sendo muito mais eficiente para a gente resolver o problema fiscal que a gente tem no país.
Agradeço o convite e me coloco à disposição para tirar dúvidas e manter, aqui, o nosso diálogo.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Laércio Oliveira. Bloco Parlamentar Aliança/PP - SE) - Obrigado, Prof. Manoel Pires, por sua participação. Fique ligado aí com a gente, porque, certamente, nós vamos conversar um pouco mais à frente.
Eu passo a palavra agora para o Felipe Salto, que é Economista-Chefe e sócio da Warren Renascença.
Por favor, Felipe - prazer em tê-lo aqui -, a palavra é sua.
O SR. FELIPE SCUDELER SALTO (Para expor.) - Bom dia a todos.
Em primeiro lugar, cumprimento o Senador Laércio, o Senador Oriovisto Guimarães e os demais Senadores presentes, o Senador Mourão, a Senadora Tereza Cristina, e também o Marcos Pestana, que me sucedeu na Instituição Fiscal Independente.
Para mim, é sempre um prazer voltar aqui, ao Senado, para rememorar os anos em que eu tive a oportunidade de assessorar o Senador José Serra, que, há 15 anos, já tentou apresentar e aprovar um limite para a dívida pública da União, e também os anos em que eu tive a oportunidade de dirigir a Instituição Fiscal Independente.
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Quero cumprimentar também o Secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron; o Secretário Bruno Moretti, da Casa Civil - e parabenizar pelo trabalho que tem feito aí na área fiscal, sobretudo na recuperação de receitas e no combate a incentivos fiscais desmedidos, vamos chamar assim -; e o Manoel Pires e o José Roberto Afonso, que também estão conectados conosco.
Bom, o primeiro ponto que eu gostaria de destacar é que o Senador Renan Calheiros e o Senador Oriovisto Guimarães merecem todo o nosso aplauso, porque a Constituição de 1988 determina a fixação do limite, não é uma questão de escolha. Ela diz que o limite para a dívida consolidada deve ser estabelecido por iniciativa do Senado Federal, a partir de mensagem do Presidente da República, mensagem essa que foi enviada ainda pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, em 2001, Senador Izalci. Em 2001, isso foi feito, e essa mensagem teve um desdobramento que foi a apresentação de um projeto de resolução para a dívida da União e outro para a dívida dos governos subnacionais. Este segundo virou resolução, e os estados e municípios estão sujeitos a essa limitação.
Eu fui Secretário da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo e vi quanto dói uma saudade, porque as restrições fiscais para estados e municípios são muito maiores do que para a União. A União tem liberdade plena, total e irrestrita para se endividar, porque não existe essa limitação. "Ah, mas temos as regras fiscais." Temos, e elas avançaram muito.
Eu fui daqueles que, quando o Governo atual apresentou o novo arcabouço fiscal, a Lei Complementar 223, aplaudi, porque ela bebeu da fonte do teto de gastos - a Emenda 95, de 2016 - e também bebeu da fonte da Lei de Responsabilidade Fiscal e das metas de resultado primário, que também nasceram no Governo do Presidente Fernando Henrique, em 1999, fruto do acordo do então Ministro da Fazenda Pedro Malan com o Fundo Monetário Internacional, que resultou na fixação da primeira meta anual de superávit primário.
E esse modelo foi vitorioso, Senador Oriovisto, porque, por dez anos, até que se iniciasse a prática da chamada contabilidade criativa em 2008, 2009, o Brasil teve queda de juros, queda da dívida com proporção do PIB, principalmente da dívida líquida - e dívida bruta ficou praticamente estável, mas nós estancamos a sangria -, e isso passou por governos de matizes políticos e partidários diferentes; quer dizer, o Presidente Lula, quando assumiu em 2003, manteve exata e precisamente igual a política do Governo anterior de superávit primário.
Então nós chegamos a ter 3,8% do PIB de superávit. O déficit nominal, que é aquele agregado, que inclui a conta de juros, chegou a quase 1% do PIB. Hoje, está em 8% do PIB - 8% do PIB. É claro que a dívida não para de crescer. "Ah, mas a culpa é dos juros." O problema é que, em economia - e o Prof. Marcos Pestana, que está aqui do meu lado, pode me corrigir ou confirmar -, o efeito dos juros e a relação com a política fiscal é uma coisa endógena. Então, o jabuti está em cima da árvore não é porque subiu sozinho: ou é enchente ou é mão de gente.
Então, com essa taxa nominal de juros de 15%, que implica uma taxa real de 9%, não há Cristo que aguente investir no Brasil. É impressionante que o empresário brasileiro e o industrial consigam investir com uma taxa real de 9%. Mas por que isso acontece? Porque nós temos um déficit primário.
O arcabouço fiscal... Eu peguei aqui o texto para ser fiel ao da Lei Complementar 200. Eu pedi para a assessoria do Senador imprimir para eu poder ler aqui.
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O art. 2º, §1º, diz explicitamente que:
a sustentabilidade da dívida [..] e o estabelecimento de metas de resultados primários [...] [deverá ser], nos termos das leis de diretrizes orçamentárias, até a estabilização da relação entre a Dívida Bruta do Governo Geral [isso é uma lei complementar] (DBGG) e o Produto Interno Bruto (PIB), conforme Anexo de Metas Fiscais [...]
Depois lá no, no art. 11, da mesma lei, que modifica a Lei de Responsabilidade Fiscal... É o art. 4º, §5º, inciso III, da Lei de Responsabilidade Fiscal, que foi introduzido pelo art. 11 da Lei Complementar 200. Só para lembrar, a Lei Complementar 200 é do atual Governo de 2023, e ela diz o seguinte: até o décimo ano contado da promulgação da Lei Complementar 200, a dívida tem que se estabilizar. Então, na verdade, o que o Senado está propondo com o PRS 8 nada mais é do que reforçar o que já está na Lei Complementar 200 e já está na Constituição, que foi introduzido pela Emenda 109: também o princípio da sustentabilidade fiscal. Bom, sem contar o art. 52, inciso VI, que já vem desde 1988, mandando fixar o limite da dívida consolidada.
Agora, o diabo mora nos detalhes. Ninguém está dizendo que tem que ser um limite que vai levar o Governo ao shutdown, à paralisação, ou obrigar o Banco Central a reduzir juro da noite para o dia, ou fazer com que o Tesouro Nacional pare de emitir, de repente, da noite para o dia. É claro que não. O limite precisa levar em conta todas essas questões. Então, nós temos o refinanciamento da dívida. Tem a necessidade de eventualmente engordar a carteira do Banco Central, porque o Banco Central faz política monetária com título público. Desde dois anos depois da promulgação da Lei Complementar 101, o Banco Central é proibido de emitir títulos próprios. Antes, ele emitia as LBCs, as Letras do Banco Central, que eram mais ou menos similares às LFTs do Tesouro, indexadas à Selic. Depois disso, ele ficou proibido e o Tesouro é quem fornece os títulos para o Banco Central poder garantir que a meta Selic, hoje de 15%, seja observada no mercado secundário.
Então, o Banco Central... Não significa que, quando ele fixa essa meta de 15% ou de quanto ele acha que tem que ser o juro para cumprir a meta, ele vai conseguir isso apenas por imposição. Ele vai conseguir, porque ele vende e compra títulos públicos no mercado, são as chamadas operações compromissadas, para garantir que a taxa de juros fique exatamente onde ele quer, ou, pelo menos, varie muito pouco em relação à meta Selic. É assim que se garante o cumprimento da meta de inflação.
O Tesouro, por sua vez, além de refinanciar a dívida vincenda, de pagar os juros da dívida e de financiar o déficit primário, que ainda existe - a projeção, para este ano, no nosso caso da nossa corretora, da Warren, é um déficit primário de R$72,2 bilhões; para o ano que vem, o déficit primário é de quase R$90 bilhões -, ele emite títulos públicos. O que a Lei de Responsabilidade Fiscal garante no caso de rompimento do limite de dívida, que ainda nem foi fixado, mas a LRF já tem todo esse arcabouço? Ela diz: "Olha, o Tesouro está garantido, ele pode refinanciar a dívida". Só que isso é muito pouco, porque o Tesouro também tem uma tarefa - e certamente o Secretário Rogério Ceron vai falar sobre isso - que é a de garantir um colchão de liquidez necessário para fazer frente aos períodos mais turbulentos.
Então, hoje, por exemplo, o Tesouro tem uma gestão excepcional da dívida pública: o Brasil conseguiu esse avanço nos anos 1980, com o fim da conta de movimento, com a separação das funções de fomento do Banco Central e do Banco do Brasil, e com a criação da Secretaria do Tesouro, o que nos legou essa gestão profissional da dívida pública, que só vem melhorando ano após ano. Está aqui o Subsecretário Daniel Leal também, que hoje coordena toda essa área de dívida lá no Tesouro, para fazer esse registro.
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Então, nós temos hoje um colchão de liquidez, Senador Izalci, que dá conta de pelo menos oito meses de necessidades de financiamento. O que significa isso? Se o Tesouro eventualmente enfrentar um cenário turbulento de juros muito altos...
(Soa a campainha.)
O SR. FELIPE SCUDELER SALTO - ... de incerteza, de risco país, etc., ele pode usar desse colchão de liquidez para guarnecer todas as necessidades de financiamento do Estado.
Então, o relatório do Senador Oriovisto teve o cuidado de excepcionar as operações compromissadas, de excepcionar as operações que o Tesouro faz para engordar o colchão de liquidez, e também o dispositivo que remete à Lei 13.820, que é uma lei que eu me lembro também de quando foi forjada, com a participação de especialistas como Marcos Mendes, que foi justamente para cuidar do relacionamento Tesouro-Banco Central. Está excepcionada aqui no texto final do Senador Oriovisto esta possibilidade de o Tesouro enviar títulos para o Banco Central se necessário, para recompor a carteira, etc., nos termos da Lei 13.820.
Agora, a única sugestão que eu daria... Eu quero dizer desde logo que eu sou a favor do limite e acho que ele tem que ser aprovado o quanto antes, já perdemos muito tempo. Em 2015, já poderia ter acontecido isso, mas não houve o apoiamento necessário, mas agora é uma nova oportunidade. A sugestão que eu faço - e acho que os dados que o Senador Oriovisto mostrou foram muito didáticos, porque são as projeções do próprio Tesouro -, então, é: se o Tesouro acha que a dívida vai no máximo para 84% do PIB em três ou quatro anos e se descontando esses itens todos que estão excepcionados ela vai para algo como 70%, 74%, então o limite de 80% que está sendo proposto não é nada absurdo.
O próprio Governo determinou na Lei Complementar 200 - na verdade, a lei aprovada pelo Congresso - que a sustentabilidade da dívida é o grande objetivo. Então, quando o Secretário Bruno Moretti fala que os instrumentos não são diretamente a dívida, mas são o controle de gasto e o aumento de receita, justamente. Quer dizer, a presença do limite vai funcionar como um guarda-chuva para que o Governo tenha um incentivo para não mexer nas metas fiscais, para ter metas de superávit mais duras, para que a gente possa conseguir chegar no superávit primário que estabiliza a dívida o quanto antes. Quer dizer, essa é a tarefa primordial, a meu ver, daquilo que o saudoso Affonso Celso Pastore falava, que é o ajuste macroeconômico que nós estamos postergando há muito tempo. Claro, o atual Governo, é preciso reconhecer, conseguiu produzir um aumento de receitas expressivo no ano passado, o déficit primário - que havia sido de mais de 2% do PIB no primeiro ano, em razão inclusive da incorporação de precatórios que vieram do Governo anterior, de R$92,4 bi, mais R$26,7 bilhões que foram pagos aos estados - entrega agora um resultado melhor, mas ainda deficitário. Quer dizer, o juro real não vai diminuir, o custo da dívida não vai diminuir enquanto nós não voltarmos a gerar superávit.
Peço desculpas aí porque eu excedi o tempo, mas quero agradecer mais uma vez, Senador, pelo convite, parabenizar pela iniciativa e dizer que fico à disposição para contribuir.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Nós é que agradecemos, Felipe Salto, pela sua brilhante exposição.
Eu assumo a Presidência a pedido do Senador Laércio, que teve que se ausentar, no aguardo que chegue o nosso Presidente Renan.
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Enquanto isso, vamos continuar, agora, com a vez de ter a palavra, o Diretor-Executivo da IFI, Dr. Marcus Pestana.
O senhor tem a palavra no tempo de dez minutos.
O SR. MARCUS PESTANA (Para expor.) - Bom dia a todos.
Meu caro Senador Oriovisto Guimarães, um dos grandes defensores do equilíbrio macroeconômico e da responsabilidade fiscal aqui, no Senado; a cara amiga Tereza e Izalci, dois colegas que eu tive na Câmara, durante os oito anos em que eu estive lá; o Senador Mourão, que estava aqui; o Laércio que também teve que se ausentar; o Bruno Moretti, representando aqui a Casa Civil; o Manoel Pires, um dos maiores especialistas em finanças públicas da mais tradicional instituição voltada para a questão fiscal, que é a Fundação Getulio Vargas; meu amigo, grande economista, meu antecessor na IFI, pai da IFI e ex-Secretário de São Paulo, o Felipe Salto; o José Roberto Afonso, que está além-mar, na terra de Fernando Pessoa, e que é o pai, um dos pais da Lei de Responsabilidade Fiscal, talvez a constituição institucional mais significativa como marco fiscal; o Secretário do Tesouro Nacional, que ocupa a função mais simpática, popular e fácil do Governo, enquanto todo mundo está se divertindo na festa ele vai lá, abaixa o volume e fala o que tem que ter; o que todo mundo sonha e ele vem e corta: "Não, não dá; tem um negócio chamado restrição fiscal". Então, é uma função por que eu não invejo; a equipe da IFI que está aqui, o Diretor Alexandre Andrade e os nossos analistas, a todos vocês.
Conhecendo os meus colegas e sendo o quarto, eu estou naquela situação, como dizia o Embaixador Botafogo, do nono marido da Elizabeth Taylor, tendo que ser original e encantador. (Risos.)
Então, vou procurar trazer elementos novos, porque eu imaginei que a gente teria uma convergência grande, em geral, na abordagem, mas crise fiscal é igual água e luz: a gente só dá importância quando falta. A gente só se dá conta quando tem escassez, e aí a gente fala que a gente não pode viver sem água e luz.
No caso da questão fiscal - e o Manoel falou bem, que a dívida é um sintoma -, ela se apresenta quando falta financiamento para rolagem. Quando os investidores falam assim: "Não, eu não confio nesse título, eu não vou pôr o meu dinheiro nisso". E aí caminha para uma situação de default, de moratória e tal; muitos países e o Brasil já passaram por situações assim no passado.
Agora, eu selecionei ali países latino-americanos, emergentes, BRICs e desenvolvidos, porque tem essa discussão de se a dívida é alta ou baixa. E aí eu lembro de uma frase que o Dr. Ulysses Guimarães gostava muito do filósofo espanhol Ortega y Gasset: "Eu sou eu e as minhas circunstâncias". E, por outro lado, na dívida importa mais o filme do que a foto.
Então, levando em consideração as circunstâncias, se a gente comparar ali, o Japão tem a maior dívida. Esse é o critério do FMI, não é o critério do Banco Central, porque são as comparações internacionais, o conceito do Banco Central é aplicado só aqui, e a IFI adota o conceito do Banco Central.
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Mas o Japão tem a maior dívida - aí são dados de 2024 -: 240% do PIB. No entanto, rolava sua dívida com títulos longuíssimos, com taxa de juros negativa, pela solidez, pela confiança, pela credibilidade, pela consistência da economia japonesa.
Se a gente comparar com os Brics e com os emergentes aí - eu botei só a Turquia, que está candidata também a entrar no nos Brics -, o Brasil está na média. Se comparado com os países desenvolvidos, você vê Estados Unidos, Itália, França, com um nível muito superior, mas com uma outra circunstância.
Entre os latino-americanos, nós estamos emparelhados com a Argentina, mas bem acima de México, Chile, Uruguai e outros países que estão aí.
Então, é só para ilustrar, porque tem sempre a discussão: carga tributária é alta ou baixa? Aí alguém vem e fala assim: nós estamos na média da OCDE. Ora, os países desenvolvidos, a França tem 46% do PIB de carga tributária, mas, nas nossas condições, quando se compara com países latino-americanos e emergentes, a nossa carga é muito alta. Então, tudo é relativo, a depender das circunstâncias.
Eu queria comparar o Brasil com a Grécia, no sentido da foto e do filme. A Grécia teve a maior crise fiscal da União Europeia e foi objeto de uma intervenção do FMI e da própria União Europeia - a trinca lá entrou. Ela tinha uma dívida de 220%; agora está em 150%, tendendo a 130%. O Primeiro-Ministro foi reeleito com folga, porque a população adotou o programa de ajuste fiscal, e a Grécia ganhou grau de investimento, por conta do filme.
E, aí, o nosso filme... Essa é a projeção, dentro do conceito do Banco Central, saindo do conceito comparativo internacional do FMI e vindo para a projeção da IFI.
O Senador Oriovisto apresentou a projeção do Tesouro. Obviamente, a nossa curva é diferente. Quer dizer que alguém está falseando os dados? Não. O Secretário Bruno Moretti falou muito bem: a relação dívida/PIB depende de três variáveis: o crescimento do PIB, a taxa de juros implícita e o resultado primário, que pode corrigir, melhorar, estancar ou agravar a situação de endividamento.
Então, você tem essas três variáveis. A nossa curva é diferente, porque as premissas... Depende do interlocutor, se ele é mais otimista ou pessimista ou, como o Ariano Suassuna gosta de dizer, um realista esperançoso.
A IFI procura ser um ter um realismo esperançoso, mas a nossa projeção, considerando a taxa de juros, dentro das regras atuais, ceteris paribus - se as regras do jogo mudarem, o jogo muda -; dentro da realidade atual, a nossa projeção é de um crescimento bastante significativo, fechando este ano com coisa aí de 76% e 82%, e aí tendendo a 100% - dentro das regras atuais, dentro da nossa projeção de resultados primários, do crescimento médio para os próximos dez anos, que, na nossa projeção, é de 2,2% do PIB.
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E aí o último eslaide, antes de entrar nas considerações finais. Considerando a taxa de juros implícita, o PIB médio projetado, qual seria o primário necessário, segundo a IFI, dentro da realidade atual, das regras atuais, para estabilizar a dívida? Seria 2,1% do PIB, de superávit primário.
Nós, desde 2014, acumulamos déficits primários. O Brasil já fez, no passado, um ajuste fiscal de 4% do PIB. Não é fácil cortar gastos, aumentar receita, mas é a tarefa, se efetivamente nós queremos. E o grande calcanhar de Aquiles... A economia brasileira está prenhe de desenvolvimento sustentado. Qual é o calcanhar de Aquiles? É o fiscal. O monetário está blindado com o sistema de metas, com a independência do Banco Central. No cambial nós temos uma situação: a nossa dívida felizmente é expressa em reais. Não temos um problema igual à Argentina, um conteúdo extremamente cambial que se comunica com o fiscal. Então nós temos uma vantagem de que nossa dívida é expressa em reais.
Mas nós precisaríamos...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCUS PESTANA - ... para estabilizar, nós precisaríamos de um superávit.
Então, para concluir, eu queria, para levantar questões novas... Há uma questão em que os filósofos, os economistas se debruçaram ao longo dos séculos, que é o pacto intergeracional. O passado, o presente e o futuro têm que ter compromissos. O presente tem que ter compromisso com o futuro. E há duas correias de transmissão entre o presente e o futuro: previdência e dívida. Trocar gasto presente por dívida futura é uma injustiça com os nossos filhos, nossos netos. É muito fácil empurrar com a barriga, gastar hoje e deixar a conta para nossos filhos e netos.
Há a famosa frase do Ministro Delfim Netto, que era um grande economista: "dívida não se paga, é para rolar". Mas há circunstâncias para a rolagem.
Então o projeto, que, no substitutivo do Senador, aponta na direção correta... Primeiro, o Senado está cumprindo sua função, que é regulamentar a Constituição e a Lei de Responsabilidade Fiscal. Há uma lacuna - e o Felipe fez todo o histórico das tentativas de suprir essa lacuna. Então é uma iniciativa que merece todo o apoio e todo o elogio.
Certamente o Secretário Ceron trará contribuições, e o Bruno também fez as contribuições, do ponto de vista do Governo. Isso não é uma questão de governo, é de Estado. Dívida tem que ser igual a previdência: dentro do pacto intergeracional, tem que ser pensada a longo prazo e é uma questão de Estado. Então facilita muito esse diálogo, para a construção de soluções sólidas.
O substitutivo aponta na direção correta. E, Senador Oriovisto, o Brasil é um dos poucos que não controla a dívida. A União Europeia tem uma regra de que é 60% do PIB - muita gente está desajustada, como na minha tabela ficou claro - e 3% de déficit nominal. É um cacoete, é o uso do cachimbo. No Brasil, a gente trabalha o primário. Ninguém trabalha o lado financeiro do orçamento. Então, é preciso incorporar e cumprir o mandamento constitucional que é regular. Os Estados Unidos regulam não o primário, mas a dívida.
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Está fácil? O Izalci nos pediu que fôssemos didáticos. Nós Estados Unidos está lá o shutdown, um impasse. O Governo quer um déficit maior, quer incrementar o endividamento e, portanto, tem que ter autorização do Congresso, mas o Congresso não está dando. E aí tem consequências imediatas.
A União Europeia está renegociando - tinha uma divergência que foi sanada entre a Alemanha e a França, semana passada - uma nova regra, porque a pandemia fez a suspensão da regra. Estão construindo uma nova regra no sentido tendencial de que vão manter as duas metas de 60% do PIB e 3% de déficit nominal, e não primário, como nós estamos acostumado a lidar, mas têm uma regra para a dívida, o Brasil, não.
O substitutivo faz a separação entre o fiscal e o monetário para não inviabilizar a política monetária, muito corretamente, e isola também os entes subnacionais, que já são objeto de regulamentação. Então, o trilho do substitutivo nos coloca tendencialmente em direção a um bom caminho, a um bom porto. Agora, o importante - e a OCDE fala isso - é que a regra fiscal seja simples, crível e verificável, facilmente verificável. E tem que ter consistência. São essenciais a consistência, a credibilidade da regra fiscal e a efetividade.
Outro dia, um grande especialista, que eu não declino aqui por observância da privacidade, porque ele me falou bilateralmente, disse: "O Brasil fracassou na construção de regras fiscais".
Veja bem, o teto de gastos, que foi votado ainda no Governo Temer, que ancorou as expectativas e levou a Selic ao menor nível da história da série, no final, virou... O teto estava tão cheio de goteiras que o arcabouço, o teto de gastos, não se sustentou. Aí, na PEC da transição, em dezembro de 2022, foi extinto o teto e prevista a aprovação, em 2023, da expansão de gastos e de uma nova regra. O Congresso votou o arcabouço proposto pelo Governo e já tivemos mudanças de meta, em 2024. E a PEC 66, recém aprovada, tirou os precatórios, 90%, em 2027, e aí vai abatendo os precatórios. Mas na vida como ela é esses descontos valem para a meta, porém a dívida não perdoa. Os gastos, mesmo excepcionalizados, vão impactar a dívida. Nós íamos caminhar para o estrangulamento absoluto. A própria LDO em tramitação, o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias, projeta, no anexo, metas discricionárias negativas a partir de 2027 e crescentemente negativas em 2028 e 2029. E aí foi feita essa excepcionalização dos precatórios, criando-se um espaço fiscal.
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Então, o papel de uma regra fiscal tem dois objetivos básicos: disciplinar o gasto e ancorar a expectativa. Se não cumpre nem uma função, nem outra, a norma, como esse especialista me falou, não está sendo efetiva.
E eu digo o seguinte: nós estamos vivendo uma crise fiscal. Como fui Secretário de Saúde de Minas por oito anos, eu uso muito metáforas da saúde. Não é um infarto, não é um AVC, não é uma doença aguda; é igual à diabetes, é uma doença crônica que vai minando a saúde do doente. Se a gente não corrigir o rumo, certamente não teremos um processo de desenvolvimento sustentável e sustentado que faça frente ao potencial e às expectativas da sociedade brasileira.
Obrigado pelo convite.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Agradeço ao Dr. Marcus Pestana pelas suas palavras.
E, de imediato, passamos ao Dr. José Roberto Afonso, que é professor e economista e que vai falar por via remota - ele está em Portugal - e tenho certeza de que suas palavras vão ajudar muito a nós entendermos esse assunto.
Professor, o senhor está com a palavra.
O SR. JOSÉ ROBERTO AFONSO (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde, Senador Oriovisto. Na pessoa do Senador, cumprimento todos os demais Senadores e colegas aqui deste debate.
Eu vou acrescentar um pouco... Essa é minha apresentação, espero que esteja já projetada, porque a gente daqui de fora não consegue ver. Pontuando, nós estamos aqui discutindo o limite constitucional do montante da dívida consolidada da União. Eu acho que isso é bastante importante. Como o Senador Relator colocou de início, a gente precisa simplificar, e eu acho que é até mais simples do que está, porque nós temos muita coisa já definida no texto constitucional, na Lei de Responsabilidade Fiscal e também na lei dita do arcabouço.
O que cabe ao Senado, exclusivamente ao Senado, segundo a Constituição, fixar? Os limites globais para o montante da dívida consolidada da União. Isso se insere no esquema...
Aqui colocando muito rapidamente, o que é a dívida consolidada? Isso está definido na Lei de Responsabilidade Fiscal. Resolução do Senado não muda a lei complementar; e a lei complementar de 2023 não mudou nada sobre dívida da lei de 2000, ela acrescentou mais regras, como já foi colocado aqui por alguns colegas. O conceito de dívida está na lei complementar, a definição do montante cabe ao Senado, esse montante tem que ser fixado, segundo a lei complementar, em percentual da receita corrente líquida - e depois a gente pode até conversar um pouco sobre isso -, já tem todo um arcabouço montado para monitoramento do cumprimento deste limite, já tem a expertise longa de estados e municípios, e tem, sim, flexibilidade. Aliás, eu acho impressionante aqui no Brasil como se comenta a Lei de Responsabilidade Fiscal, mas não se lê a lei. Tem muitas regras e tem muita flexibilidade lá já contemplada.
Como eu disse, é muito simples. A União publica um relatório de gestão fiscal - aliás, ele é assinado pelo Ministro da Fazenda e o Ministro do Controle Interno, e não pelo Presidente do Banco Central, porque são conceitos completamente diferentes e têm objetivos diferentes. Aqui é o objetivo legal. E toda a dívida consolidada compreende toda a dívida da União, e não apenas a dívida que se tem junto ao mercado financeiro. Restos a pagar estão dentro da dívida consolidada; precatórios estão dentro da dívida consolidada. É problema isso? Não. Já está considerado, computado - está aqui o relatório. Como a gente pode ver, inclusive, este aqui é o último relatório de agosto, a posição mais recente: a dívida bruta de 724% da receita; a dívida líquida, 509%. E falta só um limitezinho, que, aliás, infelizmente aqui o gráfico ficou em cima. Basta o Senado fixar qual é o percentual sobre a receita corrente ao qual se aplica isso.
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Isso já foi feito para estados e municípios e, quando a gente olha na trajetória pós-LRF, funcionou muito bem. É bem claro aqui: a curva de estados, a longo prazo, está para baixo. Lógico, você tem contratempos, mas hoje, por exemplo, nós temos apenas dois estados que não é nem que estouram o limite do Senado, são dois estados que estão no limite de alerta. Na LRF tem sinal amarelo, sinal vermelho. Os municípios, inclusive, estão caminhando para ter dívida líquida negativa, ou seja, mais dinheiro em caixa do que devem. E como a gente vê, quem não ficou sujeito ao limite é onde está o problema do endividamento público no Brasil.
Como o Manoel colocou, estamos aqui de novo, dez anos depois, para falar as mesmas coisas. Eu vou pular, porque acho que muito já foi dito e acho que mais importante do que a gente falar é o Senado discutir e decidir.
Limite de dívida é uma regra tradicional, a mais usada em todos os países do mundo. Na apuração e debate costumam usar o PIB, mas é comum, e nós optamos no caso brasileiro, na LRF, colocar receita, por uma razão muito simples: ninguém arrecada PIB; nós arrecadamos receita. E receita é líquida e certa: entrou, calculou, está no caixa. O PIB, a metodologia muda, não só a metodologia muda, como você apura os parâmetros ex-post e, muitas vezes, muda a série. E você não pode, daqui a dois ou três anos, aplicar punições ou retroagir em decisões sobre o seu limite da dívida, porque o que a gente está discutindo aqui é o limite do montante da dívida, o que a Constituição manda. E o montante decorre de você aplicar um limite sobre a receita, acha um valor e esse valor é comparado com a dívida que foi medida.
Sobre as expectativas já se falou. Nós temos flexibilidade, já vou comentar em seguida, e já foi bem dito. A experiência norte-americana é das primeiras, e acho que por isso paga o erro de ser o primeiro. Agora, é bom lembrar que, nos Estados Unidos, o serviço da dívida não entra no orçamento. Então eles definem um limite de dívida nominal, mas aí todo o fluxo - juros, amortização - não passa pelo orçamento como no Brasil. É uma regra necessária, ainda mais em federações.
Saiu um estudo, há poucos dias, do FMI, que coloca, faz essa apuração toda e mescla. É comum - no passado, você tinha só limite de dívida e, cada vez mais, você tem limite de dívida aplicado com outros limites. Todos os outros limites que são usados nós temos aqui na Constituição, na LRF, na Lei do Arcabouço.
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Nós já regulamentamos tudo, só falta regulamentar o limite, por resolução do Senado, da dívida consolidada da União; por lei ordinária, da dívida mobiliária federal; e, também, nós temos limites para emissão de títulos, que é algo de que pouco se fala.
É problema desenquadrar? Não. Aliás, inclusive na LRF, na lei de crimes fiscais, a punição é caso você tenha desenquadrado e você não tome providências para ajustar - por isso que a lei detalha. Eu acho que a resolução do Senado não precisa repetir o que já está na lei complementar, apenas acrescentar, se quiser colocar mais instrumentos para se fazer o enquadramento. Desenquadrou, você publica o relatório e você tem um ano para corrigir o limite em relação ao limite ou à trajetória de limite, que é provavelmente o que a gente precisa.
Tem recessão, o que obviamente derruba sua arrecadação... No caso brasileiro, a LRF não fala nem em recessão, fala em baixo crescimento. Cresceu menos de 1% do PIB, o prazo para ajustar dobra. Tem restrições para o último ano de mandato, a gente sabe bem o porquê.
A coisa fundamental, que eu acho que ninguém fala, é que a lei prevê que todo ano o Presidente da República encaminhará ao Congresso, junto com a proposta orçamentária, uma avaliação da dívida, dos seus limites e uma proposta de manutenção ou de alteração. Nunca foi feito isso. Quer dizer, eu acho que a explicação é que, como nunca teve limite para a União, nunca se mandou essa avaliação. Se o Senado fixasse esse limite, o Presidente, naturalmente com a sua equipe econômica, poderá ter a possibilidade, de novo, de todo ano chegar e dizer: "Está bom, estamos cumprindo o limite". Ou: "Não, aconteceram aqui imprevistos, nós estamos com essa dificuldade, por isso a gente propõe alterar, endurecer ou flexibilizar".
Além disso, além de todo ano poder fazer isso, a lei complementar já prevê que, em caso de instabilidade econômica ou alterações drásticas da política monetária ou cambial - a gente já relatou aqui, porque isso já aconteceu -, de novo, no meio do ano, não precisa esperar nem chegar a próxima proposta orçamentária, o Presidente da República pode pedir ao Senado para revisar os limites.
No caso de calamidade pública, o que foi bem lembrado aqui como a covid, aí não precisa nem pedir; está automaticamente suspensa a contagem, enquanto tiver calamidade você não precisa cumprir os limites. Eu acho que eu nem chamaria isso aqui de flexível, eu chamaria de inteligente, eu acho que a lei foi muito inteligente.
Dívida consolidada líquida da União. Quando a gente olha o Relatório de Gestão Fiscal do Tesouro - de novo, volto a insistir, isso já está medido, é publicado, é auditado pelo Banco Central, faz parte das prestações de contas da União -, a evolução é essa. Aqui nós estamos falando, olhando o último relatório, que é de agosto do ano passado, que a gente tem a posição: quanto se arrecada, na casa de 1,5 trilhões nos últimos 12 meses. Qual é a dívida consolidada bruta? Onze trilhões. Dessa dívida se deduz o que se tem em caixa e os haveres financeiros. Aliás, eu pessoalmente concordo que o Tesouro tenha que ter, óbvio, um colchão de liquidez, mas o colchão já está contemplado aqui, até porque eu acho que, eu ainda estou supondo, o colchão está dentro ou do caixa ou dos títulos que estão no próprio Tesouro.
Vou caminhar aqui para concluir.
Eu acredito que a gente também poderia fazer... Aqui o que foi proposto, originalmente, de ajustes ao substitutivo, mas o que é necessário para cumprir a lei de acesso... Mas o que eu queria concluir aqui e reforçar é que, secundando os meus colegas anteriores, de novo, a dívida consolidada eu acho que a gente não precisa inventar; já está lá, já está prevista, já está regulada, já é medida, já é apurada.
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O que a gente pode e deve fazer é refinar o que a própria LRF prevê do que seja dívida consolidada líquida. E aí - concordo com o que foi dito aqui -, no caso do Banco Central, no caso do Tesouro, da União, você precisa deduzir coisas que não valem para estado e município, porque o estado e município não têm o Banco Central. E a minha sugestão é que se deduza o saldo do relacionamento entre o Banco Central e o Tesouro.
É um pouco diferente da operação compromissada. Eu acho que a operação compromissada é problema de política monetária. Nós estamos tratando aqui de instituições fiscais. Ou seja, a diferença entre a dívida mobiliária que está na carteira do Banco Central, menos o que tem na sua conta única, essa diferença é que eu acho que deveria ser deduzida do cálculo da dívida líquida. Por que razão? Porque, no caso brasileiro, a gente tem uma peculiaridade: o Banco Central é uma autarquia, uma autarquia federal, pertence ao Governo, diferentemente do resto do mundo.
Proponho também que, para efeito de controle social, todo Relatório de Gestão Fiscal preveja que, no caso da dedução - por conta do relacionamento entre o Tesouro e o Banco Central -, se essa variação de dívida for superior à apurada na dívida bruta, que haja uma justificativa, uma manifestação explicando a razão dessa diferença ao Banco Central. Acho que aqui é meio comum... O que a gente precisa aqui é separar o quanto a dívida pública sobe por razões fiscais e o quanto sobe por razões monetárias e cambiais também - aliás, vamos registrar aqui, o Banco Central por vezes precisa de títulos do Tesouro para fazer o enxugamento e nem sempre ele apenas faz isso com compromissada.
A isonomia com estados e municípios eu acho que é pertinente, mas é lógico que, como se demorou muito tempo para fixar o limite da dívida federal, eu acho que poderia se dar... Ou aumentar o prazo, até dobrar o prazo de ajuste de estados e municípios, que foi de 15 anos - acho que a União podia até ter 30 anos -, e/ou aumentar o limite de dívida, porque quatro vezes é o quanto foi previsto em 2000; como nós vimos lá no gráfico original, em 2000 mudou tudo.
Um comentário - depois a gente pode voltar ao debate -: nós estamos com vários conceitos... Eu estava aqui fazendo um apelo para a gente não criar novos conceitos. A gente já tem vários conceitos de dívida, várias exigências e nem sempre... Coitado do Ceron, da CGU e do TCU. Em algum momento a gente estava precisando fazer um código fiscal para harmonizar (Falha no áudio.) ... e confio que o Senado não vá perder essa oportunidade, sobretudo porque nós estamos comemorando 37 anos da Constituição Federal de 1988, a mais longa da época da democracia. E eu acho que nada é mais importante do que tirar do papel poucas regras que estavam no texto constitucional de 1988 e que ainda não foram aplicados.
Acho que, com serenidade, com diálogo, com boa disposição, como a gente está vendo aqui dos Senadores e dos técnicos, mais um item está sendo aplicado e, certamente, não criará constrangimentos à boa execução da política fiscal e monetária, mas, sim, vai dar um norte.
Muito obrigado.
Fico à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Agradeço ao Dr. José Roberto Afonso por suas palavras.
Na sequência, nós teríamos as palavras do Dr. Rogério Ceron de Oliveira, Secretário do Tesouro Nacional. No entanto, eu recebi aqui um pedido da Senadora Tereza Cristina e do Senador Izalci, porque eles têm compromisso, precisam se ausentar e gostariam de fazer uma rápida manifestação, deixar algumas questões no ar. Eu pediria, então, licença ao Dr. Rogério para, primeiro, conceder a palavra a esses dois Senadores e, já em seguida, lhe passo a palavra, Dr. Rogério.
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Primeiro, a Senadora Tereza Cristina, por favor.
A SRA. TEREZA CRISTINA (Bloco Parlamentar Aliança/PP - MS. Para interpelar.) - Muito obrigada, Senador Oriovisto.
E eu quero parabenizá-lo e também o Senador Renan por esta iniciativa de resgatarmos o que a Constituição já diz. Como disse agora o nosso palestrante José Roberto Afonso, é uma das poucas coisas que ainda precisamos implementar em termos de legislação. Eu sou absolutamente de acordo com o encaminhamento desse PRS 8, de 2025. Então, aqui quero deixar claro que serei favorável na votação na Comissão, no Plenário, enfim. Eu acho que passou da hora de resolvermos esse problema.
Eu queria parabenizar a todos: Sr. Bruno Moretti, que é o Secretário Especial de Análise Governamental da Casa Civil; Sr. Manoel Pires; Felipe Salto; Marcus Pestana, meu amigo querido; José Roberto Afonso - nós tivemos aí uma audiência especial para falar sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal, foi um show de sessão especial que tivemos aqui nesta Casa -; e Sr. Rogério Ceron - infelizmente não vou poder assistir, mas depois vou resgatar, através do nosso Senado, para que eu possa ouvir as suas palavras, porque este assunto muito me interessa.
Cumprimento aqui meus colegas, Senador Mourão e Senador Izalci.
Eu queria dizer que atualmente a dívida pública está crescendo, como todos vocês já colocaram, principalmente por causa das taxas de juros. Eu até brincava aqui com o Senador Oriovisto quando ele estava aqui ao meu lado: isso é como o ovo e a galinha, a gente não sabe quem nasce primeiro e como é que essas coisas caminham. E a gente tem visto aí o Presidente do Banco Central, o Sr. Gabriel Galípolo, que já disse que as taxas de juros vão continuar altas por períodos prolongados para tentar controlar a inflação. A atual direção do Banco Central está buscando fortalecer a sua credibilidade, diferentemente do ocorrido no passado, no Governo Dilma, quando o Banco Central reduziu as taxas de juros sem condições técnicas e aí acabou perdendo a credibilidade, e a gente viu o que deu: naquela época, sem credibilidade, a inflação subiu, o Banco Central teve que elevar ainda mais os juros, provocando a maior recessão da nossa história.
Na opinião dos economistas que estão participando deste debate, o que o Ministério da Fazenda poderia fazer para conter o crescimento das despesas correntes e ajudar o trabalho do Banco Central em controlar a inflação com taxas de juros mais baixas? Porque isto é o que a gente ouve do setor produtivo, de onde eu venho, toda a minha vida ligada ao setor produtivo, e a gente vê a reclamação geral: como é que nós vamos investir com as taxas de juros que tem aí? E aí o Brasil vive refém disso: a gente não consegue crescer, a dívida não diminui, e, enfim, a gente fica aí que nem cachorro correndo atrás do rabo e não sai do lugar.
Como a falta de controle e a expansão do déficit das empresas estatais prejudicam o trabalho do Banco Central de controlar a inflação com taxas de juros mais baixas?
O Governo poderia vender alguns ativos e reduzir a dívida bruta para pagar menos juros aos rentistas?
Eram as três perguntas que eu gostaria de deixar aqui colocadas, e depois eu vou ouvir as respostas dos ilustres palestrantes.
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Quero agradecer a presença de vocês nesta audiência de alto nível.
Eu acho que nós deveríamos até ter mais Senadores aqui presentes para ouvir o que todos vocês nos colocam sobre esse grave problema da nossa economia.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Obrigado, Senadora Tereza Cristina.
Senador Izalci.
O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - DF. Para interpelar.) - Eu vou primeiro fazer das palavras da Senadora Tereza as minhas palavras para economizar os elogios.
Eu queria fazer algumas perguntas rápidas aqui.
Primeiro ponto. O Felipe Salto sempre costuma dizer que o Brasil é pródigo em criar regras fiscais, mas não em cumpri-las. Então, a gente cria um monte de regra, mas, na hora de cumprir, esse é o problema. O que garante que desta vez será diferente? Já temos a regra de ouro, a meta do resultado primário, o limite da despesa primária, o limite de despesa com pessoal e tantas outras regras. O maior exemplo disso é o atual limite de despesas primárias, criado pelo arcabouço fiscal, que apresenta várias exceções ao seu cumprimento, comprometendo evidentemente a sua credibilidade. Não seria o caso de fortalecer a governança e o controle das regras atuais em vez de acrescentar novas regras? Então, essa é uma pergunta que eu deixo aqui no ar.
Por que estabelecer dois limites de endividamento baseados em indicadores diferentes, porém, altamente relacionados? Quando o produto da economia aumenta, as receitas públicas também aumentam e vice-versa. Isso não pode trazer confusão ao comunicar as consequências da violação dessa regra ao grande público? Em uma situação hipotética em que um deles está sendo cumprido e o outro não, como uma pessoa não versada no assunto poderia classificar o endividamento do país? Alto, baixo, razoável, excessivo ou não?
A receita corrente não é um termo técnico demais para ser usado em uma regra fiscal pretensamente simples?
Eu vou deixar depois escrito aí para...
Segundo o último relatório das projeções fiscais do Tesouro Nacional, seguindo a dinâmica atual, a dívida bruta do governo geral (DBGG) atinge um pico, em 2028, de 84,3% do PIB. Segundo o Prisma Fiscal da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, a mediana das expectativas de mercado para o mesmo indicador é de 83,8% do PIB, já para 2026, isso reflete uma política fiscal expansionista e insustentável do Governo Federal. À luz da experiência com outras regras fiscais baseadas em limites de agregados orçamentários, como o antigo teto de gastos e o atual arcabouço fiscal, como um limite de dívida poderá atenuar o apetite por mais despesas mantido pela atual gestão à frente do Palácio do Planalto?
Eu vou deixar essas indagações para... Tenho mais uma aqui rápido. Não sei se eu posso mais uma rápido aqui, Presidente. Eu vou deixar por escrito.
Foi feito algum estudo para fixar o patamar de 80% do PIB como um limite adequado para o desenvolvimento sustentável do país para o valor da dívida pública do Governo geral, ajustado nos termos da última versão do relatório legislativo do Senador Oriovisto? Segundo esse mesmo relatório, por esse conceito, a dívida pública se encontra atualmente em 64,05% do PIB. Não seria razoável supor que, dado o atual quadro fiscal, a aprovação de uma regra que autoriza o Governo Federal a expandir o seu endividamento em 16 pontos do PIB poderia trazer mais instabilidade à economia? O que esperar também da permissão para esse expansionismo com os entes subnacionais?
Agradeço-lhes e os parabenizo.
Eu tenho um compromisso agora inadiável, tenho uma palestra.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Izalci, pelas suas contribuições.
Vamos retomar a nossa ordem dos oradores.
Eu passo, de imediato, a palavra ao Sr. Rogério Ceron de Oliveira, Secretário do Tesouro Nacional.
Por favor.
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O SR. ROGÉRIO CERON DE OLIVEIRA (Para expor.) - Muito obrigado.
Boa tarde a todos.
Cumprimento o Senador Oriovisto, os demais Senadores, o Senador Mourão que nos acompanha aqui também e meus pares aqui da mesa: Moretti, parceiro aqui da batalha por manter a funcionalidade e a organização das finanças no funcionamento do Governo; Salto, que também é sempre um grande parceiro e um ótimo debatedor; Marcus Pestana, Manoel Pires e José Roberto Afonso, sempre trazendo - e já elogiando aqui o brilhantismo ao trazerem - questões não só do passado, mas questões conceituais importantes.
Eu vou começar tentando ser o mais breve possível, pelo adiantar da hora, mas vou falar um pouquinho sobre as questões de mérito e depois sobre algumas questões operacionais que são relevantes aqui para este debate, primeiro, de novo, reforçando que um debate de alto nível como este é muito saudável, faz muito bem a qualquer sistema democrático saudável.
Bom, no mérito, como o próprio Moretti comentou logo na fala inicial, não há nenhuma divergência. Acho que, em nenhuma das falas, ninguém tem nenhuma divergência da necessidade, da importância de manter a dívida pública sob controle. Isso é inequívoco entre todos os debatedores aqui. Como posição de Governo, obviamente, a dívida pública precisa ser controlada.
Um primeiro debate que surge - até o Senador Izalci também já fez este questionamento - é se o que é mais importante é o nível ou é a dinâmica, é a fotografia ou é o filme. Então, essa questão de qual é o nível adequado da dívida pública é um debate hipercomplexo, vai depender da realidade de cada país. O Marcus Pestana trouxe aqui um pouco do exemplo de como a economia japonesa pode trabalhar com um percentual de dívida extremamente elevado, porque tem um custo de financiamento muito baixo e tem um custo de financiamento muito baixo, porque tem uma poupança de longo prazo muito elevada. Enfim, são questões... A economia é uma ciência complexa que se relaciona em todas as suas variáveis. O Salto também abordou um pouco sobre isso. Eu me alinho aqui mais à visão do Moretti também em que mais importantes do que o nível são a sua trajetória, a sua estabilização e a sua redução ao longo do tempo. Isso é o que de fato importa, ainda mais em um endividamento público focado, centralizado majoritariamente em moeda local. Isso faz muita diferença. Então, com tudo isso, eu tendo a, entendendo tecnicamente, me alinhar àqueles que defendem que a trajetória é mais importante do que o nível. Então, a estabilização dela é mais importante do que se ela é 80%, 90% ou 85% do PIB ou qualquer outro que seja o critério.
Bom, dado isso, vale mencionar... Eu acho que o José Roberto trouxe um pouco de todo o histórico da LRF, do que ela já prevê, e eu acho que vale a pena fazer uma ponte entre LRF e a Lei Complementar 200, o arcabouço fiscal, porque nós temos muitas regras, nós temos muitas nuances que precisam ser externalizadas.
Ainda no mérito, a gente tem duas divisões - também foi tratado um pouco disso. A necessidade de financiamento geral tem um componente que é o resultado primário. Se ele for negativo, eu estou adicionando necessidade de financiamento. E eu tenho a variável financeira, que é o custo de carregamento e financiamento daquela dívida. O resultado nominal junta esses dois resultados. Então, quando eu tenho um déficit primário recorrente e elevado no tempo, eu vou adicionando dívida que vai ter que ser financiada, e esses juros podem se elevar ao longo do tempo.
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Bom, aqui eu começo uma pequena e leve discordância de algumas ponderações aqui.
Ao contrário de muitos, eu acho que o Brasil vem avançando muito, há muito tempo, em várias temáticas, inclusive na temática fiscal. Eu sou daqueles que acreditam que os instrumentos fiscais e as regras fiscais estão sendo aprimorados. E tanto isso é verdade que isso precisa ser posto num debate como este, olhando-se para o resultado primário. E o resultado primário é o que consensualmente representa o esforço do Governo - as outras variáveis não estão exatamente no controle do Governo, dependem de muitas outras nuances -, o esforço do Governo, que é o resultado primário, vem há mais de uma década num cenário muito crítico, mas vem num processo de recuperação. E por que - e vou citar números - eu digo isso? Se você olhar os três últimos ciclos de governo, todos tiveram déficit primário. Nos últimos dois ciclos de governo, declaradamente fiscalistas, fizeram ações para tentar recuperar o fiscal, conseguiram manter o déficit primário em torno de 2% do PIB - aqui, de novo, com todos os esforços, não estou entrando no juízo de valor se dava para fazer mais ou menos. Com as novas regras fiscais, nós já estamos com 1,15% de déficit primário do PIB. Está ótimo? Claro que não, mas a recuperação é inequívoca do ponto de vista do resultado primário. A previsão até 2026 é ficar abaixo de 1% do PIB, já considerando o pagamento do estoque de precatório, que era um problema que também era importante ser resolvido, porque é importante também a gente manter o pagamento em dia das obrigações. Tudo isso traz segurança institucional, segurança para os investidores. Então, do ponto de vista fiscal, há um processo de recuperação, as regras estão funcionando, estão recuperando o resultado primário.
Tem um debate legítimo que existe sob o ponto de vista do resultado primário: essa recuperação não deveria ser mais célere, o país não precisaria acelerar ainda mais esses processos de recuperação? Apesar desse debate, não dá para deixar de lado - e aí eu tenho que fazer só um leve contraponto aqui - que eu acho que as regras estão, no que tange à recuperação do resultado primário, funcionando. Você pode discordar e achar que ela deveria ser: "Sim, está recuperando, porque é inequívoco nos números, mas precisa ser mais, precisa acelerar esse processo". E aí podemos discutir se precisa algum reforço nas regras, mas a gente deveria trabalhar sempre no aprimoramento de regras do que ficar tentando reinventar todo o arcabouço existente. Isso é por um lado.
Do ponto de vista do estabelecimento de um teto de dívida, e aí indo para o debate central aqui do que nós estamos discutindo, há nuances que precisam ser levadas em consideração.
Apesar de se propor um limite que pode ser alto neste momento, ou até acima do que é a nossa projeção de trajetória de estabilização da dívida, ele já traz problemas concretos para o presente. Isso é importante também de se frisar, e acho que ninguém acabou tendo a oportunidade de comentar. O mercado, os agentes em geral trabalham com uma boa racionalidade, e tudo o que acontece para o futuro é trazido, de alguma maneira, para o presente, para valor presente, ponderado pelo risco daquilo se materializar ou não. Então, por mais que tenha várias ressalvas, e o Relator realmente incorporou muitas das preocupações que já tinham sido alertadas, o mero estabelecimento dele continua criando alguns óbices. E eu cito alguns. O fato de interromper - supondo que haja o risco de rompimento desse limite -, naturalmente, vai cair no enquadramento, que o próprio José Roberto Afonso brilhantemente evidenciou, do descumprimento da LRF. Então, a despeito do que eventualmente esteja previsto na resolução, a Lei de Responsabilidade Fiscal vai ter uma hierarquia superior e vai ter que ser seguida. E lá ela é muito clara: só poderão ser realizadas novas operações de crédito para o pagamento da dívida mobiliária. Então, o pagamento da dívida não mobiliária, ou seja, todas as operações contratuais não serão pagas, não poderão ser financiadas.
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Todas as garantias que o Governo Federal honra de operações de estados e municípios que acabam ficando inadimplentes com suas operações de crédito não poderiam ser pagas com operações, com novas emissões. O próprio colchão de liquidez também não poderia ser recomposto, não porque a resolução não permite, porque ela até trouxe a possibilidade de ser questionada, ser solicitada essa autorização para o Senado, mas a lei complementar não permite.
E o mais grave ainda - isso dá a dimensão do desafio - é que a LRF exige que esse retorno para a trajetória ocorra em três quadrimestres. Isso gera um impacto, hoje seria como se tivéssemos que... Olhando para o passado recente aqui, em que o Banco Central sinalizou um incremento em três pontos percentuais da Selic, que faz parte da política monetária para cumprir o seu objetivo, o seu mandato, e está corretíssimo na sua condução, isso geraria um impacto imediato da ordem de R$150 bilhões na dívida, ou seja, imediatamente nós teríamos que fazer um ajuste primário adicional de R$150 bilhões, R$200 bilhões, num único exercício...
(Soa a campainha.)
O SR. ROGÉRIO CERON DE OLIVEIRA - ... o que equivale a mais de 2% do PIB. Muito difícil de se imaginar, e a gente sabe o quão difícil é esse debate sobre a recomposição fiscal.
Tudo isso para dizer que, bom, do ponto de vista do mérito, ele é necessário. Do ponto de vista do que já existe hoje, nós temos muito a aproveitar do que já existe na LRF, do que existe no arcabouço fiscal. Lembro que no arcabouço fiscal - foi trazido aqui - já há um limite, já há uma trajetória que precisa ser evidenciada de estabilização em dez anos. E nós precisamos, então, agora discutir um pouco - o Moretti trouxe isso - do que nós já temos.
A Lei Complementar 200 já tem previstos alguns gatilhos: gatilhos para o caso de permanência de resultados fiscais primários negativos, gatilhos para o caso de a discricionária se reduzir a partir de um patamar; e eles têm alguns acionamentos, algumas sanções. Podemos discutir, mas olhar para as leis complementares seria fundamental nesse debate. Podemos ter um gatilho para caso essa trajetória de estabilização não mostre ou chegue num patamar de alerta que evidencie um risco de não cumprir essa estabilização em dez anos? Por exemplo, o Marcos Pestana trouxe aqui, olha, projeção da IFI: vai atingir 100% do PIB. Nas nossas projeções, das nossas equipes técnicas, não, ela vai se estabilizar em torno de 84%. Segundo o mercado, a mediana da expectativa Focus, ela se estabiliza também no horizonte de dez anos, mas em 94%. Enfim, quem está certo ou quem está errado, isso em economia é absolutamente impossível de dizer, mas a gente precisa trabalhar para poder ter os cenários de equacionamento.
E aí é muito mais importante a gente ter regras, e ninguém é contra ter regras, para que os gatilhos que serão acionados não criem uma situação pela qual você vai antecipar e criar um problema insolúvel que vai poder de fato desorganizar o sistema financeiro e todo o sistema macroeconômico por consequência.
Então, tudo isso que eu estou colocando aqui - tentando ser o mais breve possível, mas o debate exige, pela complexidade da matéria - é que eu acho que a Lei Complementar 200 traz já um arranjo que prevê essa recuperação do resultado primário, que está acontecendo. Ainda ele está num cenário de déficit primário, como foi mencionado, mas em recuperação; e em recuperação célere em relação ao que a gente observou aí na última década. Então, a gente está caminhando para virar daqui a pouco e gerar superávit primário, e aí vai ser uma discussão de qual é o superávit primário aí para estabilizar a trajetória da dívida. Mas ela prevê que isso precisa ser estabilizado no horizonte de dez anos.
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Talvez possa ser feita uma discussão mais aprofundada sobre como a gente compatibiliza o que está previsto na LRF, desde lá de trás, como a gente adéqua para o caso da União esses gatilhos, porque os gatilhos previstos na LRF para o retorno para a trajetória, para o patamar de endividamento do limite previsto, talvez eles sejam incompatíveis com a harmonização com a política monetária. Então, talvez, se a gente se juntar e fazer um debate aprofundado, talvez esteja em algum aperfeiçoamento de lei complementar o caminho para a gente atingir o objetivo que é comum.
Então, com isso aqui eu encerro, mas também reforço o pleito do Bruno Moretti de que a matéria demanda... Ela é nobre, o país precisa discutir e perseguir este objetivo de estabilização da trajetória da dívida, é relevante, é fundamental, mas ele precisa ser feito em um debate, de novo, sem postergações, mas um debate profundo, construtivo, para que a gente saia com um aprimoramento e não crie um problema que, por mais que pareça que é lá no futuro, não é, ele vai ser trazido a valor presente, e nós vamos ter um desarranjo imediato no mercado de dívida, na credibilidade das finanças públicas, por mais a contrario sensu que pareça. Ao se criarem essas regras sem harmonizar a LRF com a Lei Complementar 200 e com a resolução, nós teremos ali um resultado talvez pior do que o atual e muito distante do que é almejado.
Então, por tudo isso, Relator e Presidente, aqui peço e também insisto aqui, acho que é um bom debate, o debate correto para o país, um debate não de governo, um debate de Estado, mas que precisa ser aprofundado para ter essa harmonização. Acho que tem vários elementos muito importantes que o José Roberto Afonso trouxe, que, com as demais contribuições de todos que aqui falaram, nós podemos, sim, claramente caminhar para ter um pequeno aprimoramento eventual nas leis complementares que permitam atingir o objetivo, e, aí sim, eventualmente até estabelecer um limite de dívida, mas que ele tenha uma forma de condução posterior de "sanções", entre aspas, mas de medidas que reduzam, que ajustem esse processo de forma consistente no tempo; e invariavelmente que essas medidas tenham relação com as despesas obrigatórias. A gente não vai conseguir resolver o problema simplesmente estabelecendo limites ou criando, enfim, um shutdown. Ele vai ter que ser gatilhos - ou deveria ser, do ponto de vista técnico, gatilhos - que de alguma forma reduzissem a dinâmica das despesas obrigatórias, e, aí sim, você conseguiria ao longo do tempo garantir a estabilização da trajetória da dívida.
Bom, para não me alongar mais, porque a matéria exigiria, mas realmente sem o tempo, eu paro por aqui e fico aqui à disposição para as próximas rodadas.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Eu agradeço as palavras do Dr. Rogério Ceron de Oliveira.
Quero, agradecer a todos, e, em função do adiantado da hora e ciente dos compromissos que todos têm, antes de encaminhar para o encerramento quero ainda deixar a palavra livre. Se alguns dos componentes da mesa querem ainda fazer alguma manifestação, algumas palavras finais...
Começaria...
O SR. MARCUS PESTANA (Para expor.) - Quero só reafirmar que é um assunto de Estado, de longo prazo, que tem que ser pensado em 10 anos, 50 anos e está em ótimas mãos, do Senador Renan e do Senador Oriovisto. Eu acho que a partir desta audiência se estabelece uma mesa de diálogo para aprofundamento.
A pergunta do Izalci é importante; quer dizer, há muitas regras fiscais, e o que importa é credibilidade, consistência e efetividade, mas não existe uma norma específica sobre dívida - e há uma lacuna.
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Eu fui Deputado por oito anos, e o caminho da resolução contempla a economia processual, mas o ideal é que houvesse uma lei complementar que substituísse o arcabouço e colocasse as três variáveis fundamentais - o teto de gastos, o resultado primário e o limite da dívida - num contexto só. Mas aí tem todo um processo tortuoso de tramitação parlamentar, e a legislação confere ao Senado essa capacidade de estabelecer esse item por uma resolução sua.
Então, eu acho que... A pergunta do Izalci: fortalecer as regras atuais ou normatizar a dívida? Não, eu acho que é preciso normatizar a dívida, mas compatibilizando com a legislação existente. E o que o Izalci pontuou também é que - o Senador Oriovisto, eu acho que se preocupou com isso -, obviamente, as regras do jogo têm que ser claríssimas, né? Qual é a base de cálculo? Quais são as metas que têm que ser cumpridas? Não pode ter ambiguidade, e eu não enxergo isso.
Agora, tudo que eu estudei é que, por exemplo, a negociação da União Europeia caminha para a nova regra ser focada no filme, e não no ponto, na foto. É valorizar o tendencial, porque, por exemplo, a França está encalacrada, provavelmente vai ter o maior déficit nominal este ano: 5%, 5,1% do PIB. É uma dívida já de 115% do PIB. Então, não está numa trajetória de ajuste, e a meta lá é 60% do PIB. Então, se valorizaria na regra a tendência, a questão tendencial da convergência da dívida para a meta, que vai ser mantida lá, na União Europeia, em 60%, com o limite de 3% de déficit nominal.
Agora, o importante é ter uma regra duradoura, não ficar trocando, porque isso mina a credibilidade. E regra só tem valor se ela tiver consequências. Aí as consequências efetivas têm que estar previstas e têm que ser cumpridas, porque senão é só para inglês ver, para falar que o Brasil tem uma regra fiscal, e isso não serve nem para ancorar, nem para disciplinar o orçamento público.
Muito obrigado pelo convite, Senador. Boa sorte em mais uma tarefa aqui, também o Imposto de Renda... Não, o Renan...
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - O Renan.
O SR. MARCUS PESTANA - ... vai relatar, mas boa sorte. O senhor tem experiência e habilidade para orquestrar esse diálogo e chegar ao texto mais preciso para regulamentar essa importante questão.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Dr. Marcus Pestana, muito obrigado pela sua participação.
Dr. Felipe Salto, quer fazer algumas considerações finais?
O SR. FELIPE SCUDELER SALTO (Para expor.) - Quero apenas agradecer, Senador, cumprimentá-lo, mais uma vez, pela iniciativa e, modestamente, sugerir que, talvez para compatibilizar essa apreensão do Secretário Rogério Ceron, que eu entendo... A realidade concreta das coisas, é uma dívida crescente e um gasto público também crescente, a despeito do arcabouço fiscal, a despeito das regras em vigor. A sugestão é que, por meio do seu gabinete, do gabinete de V. Exa., se fizesse uma tentativa de encontrar uma trajetória para ser colocada no texto.
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É a única sugestão que eu faço, no lugar do número fixo de 80, ou de 6,5 vezes, colocar uma trajetória. Então, que seja, por exemplo, a que o Tesouro estima neste momento.
A Instituição Fiscal Independente poderia dar a sua colaboração, porque hoje o Senado tem esse privilégio de ter uma instituição que, a meu ver - e eu acompanho isso desde que eu entrei na vida laboral, a contas públicas -, o Senado tem hoje a instituição que faz as melhores projeções, inclusive considerando o mercado financeiro, que é a Instituição Fiscal Independente. Então, a IFI, junto com o Tesouro e eventualmente o Banco Central, que tem quadros que acompanham o tema da dívida há muito tempo também, podem encontrar uma trajetória que pudesse prever um período de waiver, porque todo mundo sabe que a dívida ainda vai crescer dois, três anos num cenário otimista. As nossas projeções mostram que a dívida pode chegar a 97% do PIB até 2030. Então, sentar com os técnicos e chegar a um período de crescimento, depois estabilização e queda. Isso, a meu ver, afastaria todas essas apreensões que o Tesouro tem e que são corretas, são legítimas.
Então, parabenizo-o mais uma vez. Acho que as modificações que o senhor fez, que V. Exa. promoveu junto com os seus técnicos - o Silvio, que está aqui, e o Dalmo - no texto original foram muito positivas. Elas contemplam essas questões do Banco Central, principalmente da gestão da política monetária. Então, não há outro caminho que não seja acelerar esse tema para finalmente nós termos um limite de dívida consolidada, que é sinônimo de dívida bruta, com os detalhes e as diferenças que o Prof. José Roberto Afonso pontuou.
Muito obrigado mais uma vez.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Obrigado, Felipe Salto.
Dr. José Roberto Afonso, por favor, para suas considerações finais.
O SR. JOSÉ ROBERTO AFONSO (Para expor. Por videoconferência.) - Senador, muito rapidamente, eu voltarei a insistir: eu acho o que senhor colocou, o Senador Izalci e Senadora Tereza, vamos simplificar. Eu acho que a resolução não tem que criar novos conceitos de dívida.
Como já colocou aqui a preocupação do Secretário Ceron, o conceito de dívida está lá, a base está lá, que é a receita. Eu acho que a única coisa que se precisa tratar é, nas deduções para apuração da dívida consolidada líquida, também excluir a dívida do Tesouro que é emitida por razões monetárias cambiais, mas acrescentar uma exigência de divulgação desses dados e de esclarecimento sobre seu comportamento. Eu acho que, se isso for feito, a dívida atual e a dívida consolidada líquida seriam quatro vezes e meia a receita corrente líquida, ou seja, com um teto de quatro, teria 50% de receita líquida a ajustar. Eu acho que é algo palatável e, como foi dito, óbvio, com certeza, uma trajetória, e eu acho que essa trajetória não deve ser igual a dos estados e municípios, e sim maior. Lá foram 15 anos; aqui a gente pode falar em 20, 30 anos. Acho que um ajuste de um vinte avos, um trinta avos é mais do que suficiente do ponto de vista fiscal, dá um norte fiscal, e, de novo, não cria nenhum constrangimento para a execução da política financeira. Não é só monetária, não, mas de novo, insisto, cambial, mas com a sua devida transparência e controle fiscal sobre o que está acontecendo com essa dívida. Ou seja, a gente teria a dívida consolidada líquida fiscal e a dívida consolidada líquida monetária correndo em paralelo e sendo também acompanhada.
Muito obrigado, Senador. Fico à disposição para qualquer debate além aqui da audiência.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Muito obrigado ao senhor. Tenha a de certeza que suas contribuições serão levadas em conta, assim como as de todos os outros que vieram aqui nos prestigiar hoje e trazer elementos realmente importantes nessa discussão.
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Dr. Manoel Pires, por favor, as suas palavras finais.
O SR. MANOEL PIRES (Para expor. Por videoconferência.) - Senador, quero agradecer a oportunidade de poder expor alguns elementos aí para reflexão dos Senadores e de todas as pessoas que estão nos assistindo.
Queria até responder a observação do Senador Izalci sobre a questão dos dois indicadores. De fato, os dois indicadores podem... Os dois limites de dívida, os dois conceitos de dívida podem criar alguma confusão. É possível se ver numa situação em que você descumpra um dos critérios e não descumpra o outro. Isso, obviamente, é uma situação indesejada. Então, tentar achar um indicador mais apropriado é importante.
Queria fazer a ressalva... Quero reforçar os pontos do Secretário do Tesouro que também refletem minhas preocupações com relação a algumas restrições que estão postas lá na Lei de Responsabilidade Fiscal e à possibilidade de fazer esse limite de dívida se conjugar bem com o restante do sistema fiscal, em particular a questão da recondução das trajetórias, o tempo requerido para isso e a vedação de financiamento de déficits quando você atinge o limite. Isso, a meu ver, pode causar, sim, alguma repercussão no mercado e gerar algum tipo de problema de mau funcionamento no mercado de títulos.
No mais, o Zé Roberto Afonso trouxe uma contribuição que eu acho muito interessante, sobre a ideia de um código fiscal. Eu acho que é necessário a gente ter um código amplo, abrangente e harmonioso, que trate desse tema. E, apesar das minhas ressalvas com relação à necessidade de fazer o debate sobre a relação entre Tesouro e Banco Central nesse contexto de limite de endividamento, para a gente separar bem essas funções, eu acho, sim, que, ao conseguir separar essas funções e achar um bom meio-termo para essa questão, a gente precisa trabalhar em aumentar a transparência das ações de política monetária e fiscal.
A gente aprovou recentemente a lei de autonomia do Banco Central, mas avançou pouco na questão da prestação de contas. Na medida em que você dá autonomia para um órgão público, é necessário também aprimorar o sistema de prestação de contas dele, ou seja, um grande poder como esse tem que vir com uma grande responsabilidade, e a prestação de contas com a sociedade é fundamental. Acho que isso atende a uma preocupação da Senadora Tereza Cristina, que mencionou a questão da taxa de juros.
Agradeço mais uma vez aí a possibilidade de participar deste debate.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Nós é que agradecemos o seu tempo e as suas contribuições.
E, em função do adiantado da hora, coloco a palavra à disposição do Dr. Bruno Moretti para suas considerações finais.
O SR. BRUNO MORETTI (Para expor.) - Senador, obrigado.
Vou ser bem breve.
Quero parabenizar o senhor mais uma vez, porque este debate muito técnico, num tema, como disse o Marcus Pestana, de Estado, tem aperfeiçoado o texto, o substitutivo.
Vou começar reforçando o pleito - e sem repetir todos os pontos, em função do tempo - para que nós sigamos neste debate para aperfeiçoar ainda mais o texto. Se o senhor nos permitisse seguir nessa discussão, acho que seria bastante produtivo.
Alguns pontos muito rapidamente.
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Eu acho que, retomando um ponto que o Ceron falou, nós precisamos preservar o que está funcionando. Esse é um ponto importante. Então, quando a gente olha a despesa, como eu tinha mostrado aí, como proporção do PIB, é fato que ela caiu, é fato que ela se mantém ali em torno de 18,8%, 18,7% do PIB, ela é menor do que foi em alguns exercícios e é menor do que foi a de 2023. E, do ponto de vista de resultado primário, ainda que se possa discutir a questão de ritmo - como bem colocou o Ceron -, o processo de recomposição de receita tem nos aproximado de um terreno, digamos assim, próximo ao Orçamento equilibrado. Quero lembrar que, quando eu falo numa despesa de 18,8% do PIB, eu não estou falando da despesa sujeita ao arcabouço fiscal, estou falando da despesa primária do Governo central. Então, aqui não tem nenhuma exclusão, nem nada parecido. Nesse sentido, eu acho que é importante a gente fazer esse reconhecimento para aperfeiçoar os instrumentos, especialmente de controle da despesa obrigatória.
Um ponto que acho que não foi tematizado - de que a gente poderia tratar em outras ocasiões - são os próprios procedimentos, isso valendo para o Governo, valendo para o Congresso e valendo, inclusive, para a Justiça, de criação da despesa obrigatória. Ontem mesmo, nós tivemos matérias com impacto fiscal relevante aprovadas. E os procedimentos de lado a lado para reforçar, por exemplo, o art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal - que o Zé Roberto conhece tão bem, porque foi central na gestação disso - são muito importantes para que a gente possa dar consequência à discussão da estabilização da trajetória da dívida, para que a gente tenha instrumentos efetivos e não puramente um ponto máximo que a dívida não poderia ultrapassar.
Quero reforçar também que eu acho que essa discussão do monetário ainda merece mais debate, Senador, porque é isso... Como disse o Ceron, se nós trazemos a valor presente questões que afetam a possibilidade de reabastecer a conta única, isso, em última instância, tem impacto no monetário. Ainda acho que a gente precisa trabalhar melhor isso, porque isso afeta a liquidez do mercado interbancário. Então, a gente realmente precisaria avançar nessa discussão para não ter efeitos contrários àqueles que a gente pretende.
Por tudo isso, acho e repito - concluindo - que é fundamental a gente seguir neste debate, se o senhor assim entender, de modo a seguir aperfeiçoando o substitutivo.
E agradeço muito a oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Eu é que agradeço, Dr. Bruno Moretti.
Estive em aberto para este debate antes desta audiência pública, continuo me enriquecendo com este debate e estarei à disposição para conversarmos o quanto for necessário.
Quero tranquilizar os dois representantes do Tesouro, do Governo: esta não é uma obra do Relator, isto tem que ser aprovado na CAE e, depois da CAE, tem que ir para o Plenário. Ainda pode ter pedido de vista, pode ter ainda um longo debate pela frente. A nossa grande preocupação é não prejudicar o bom andamento do Governo, é permitir que o Governo tenha todos os instrumentos e as possibilidades para exatamente controlar a dívida.
Agora, estamos sempre diante de um problema central: a nossa Constituição prevê claramente que o Senado fixará um limite para essa dívida. Eu acho que nós temos obrigação de cumprir essa questão constitucional, mas não de forma abrupta, não de forma sem muita discussão, não de forma descuidada.
Como o último a fazer o uso da palavra, eu passo a palavra ao Dr. Ceron.
Por favor, Dr. Ceron.
O SR. ROGÉRIO CERON DE OLIVEIRA (Para expor.) - Obrigado, Senador.
Mais uma vez, parabenizo o debate.
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Vou ser bem sucinto aqui, mas é importante.
Agrada-me muito, pelo menos do ponto de vista de transparência, a sugestão que o José Roberto Afonso trouxe de fazer, vamos dizer, o que é a dívida consolidada fiscal separando-a da monetária. Eu acho que isso traz um ganho de transparência, evidenciando que a gente foge um pouco desse... Consegue-se pelo menos organizar um pouco melhor este debate do que é o efeito da política fiscal e do que é o efeito da política monetária, por mais legítimos que sejam, mas para a sociedade seria um ganho entender: "Ah, não, a dívida está subindo por conta do monetário, do fiscal, é o déficit, em qual proporção?". Então, eu acho que só do ponto de vista de transparência já seria um ganho. Do ponto de vista prático, do que é o esforço do Governo, do que está no controle do Governo, também ajudaria que você tenha uma regra e tenha uma responsabilidade ali relacionada ao que você possa realmente atuar.
Meu único ponto, de fato, que retomo, é que eu acho que pode ter um caminho, na linha do que o Salto também comentou, de ter uma trajetória, que o José Roberto também comentou na mesma linha, mas insisto, eu acho que também precisa ter gatilhos automáticos que não sejam relacionados a pagar coisas e, sim, sobre como a gente reduz a dinâmica da despesa e da receita e atrela à dinâmica da despesa e da receita primária para poder contribuir com esse processo de atendimento ou de retorno a uma trajetória daquilo que é responsabilidade do fiscal. Esse eu acho que pode ser um caminho frutífero e me parece que é um ajuste simples em que a gente poderia trabalhar e pensar do ponto de vista de aprimoramento em alguma das leis complementares, para que você tenha algum tipo de gatilhos que ajudem a controlar a dinâmica da despesa obrigatória, no caso de acontecer uma situação como essa. Eu acho que aí a gente organiza bem o debate. Se a gente conseguir separar bem o que é o efeito da política fiscal se distanciando de uma trajetória almejada pelo Legislativo, haveria ali gatilhos automáticos para você não ter que ficar com uma insegurança sobre o que acontece, então, se ultrapassar esse limite. Trazendo previsibilidade, previsibilidade ajuda muito os investidores, ajuda muito o mercado, dá estabilidade institucional. Então, minha única contribuição adicional seria essa.
Eu acho que é um caminho interessante, tanto pelo lado da despesa, quanto pelo gasto tributário, no qual também teríamos que ser muito mais rigorosos também para evitar situações como a que o próprio Moretti comentou. Precisamos de todos os Poderes muito alinhados no cumprimento desse objetivo de estabilização da trajetória da dívida, sinalizando isso com regras claras, com institucionalidade, que não tenha um rompimento de obrigações e de regras. Eu acho que o país ganha e eu acho que nós estamos próximos.
Fechando aqui, reforçando o que o Moretti solicitou, se a gente tiver um tempo para construir algo... Acho que foi um debate de altíssimo nível que foi feito aqui. Não me parece que, em muitas outras rodadas, com um público qualificado como este, debatendo de forma séria, pensando no Estado, a médio prazo... A gente sai com uma solução que vai ser muito boa para o país.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Oriovisto Guimarães. Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - PR) - Bom, eu quero, antes de encerrar, agradecer aos telespectadores da TV Senado. Quero agradecer à Maria, de São Paulo; ao Carlos, do Rio de Janeiro; ao Brener, do Distrito Federal; ao Thiago, do Rio de Janeiro; ao Thiago, do Paraná; ao Cristiano, de São Paulo; enfim, a todos que mandaram perguntas e mandaram comentários. Quero pedir perdão a eles, porque, pelo adiantado da hora, eu não farei essas perguntas. Quero agradecer a todos que nos acompanharam pela TV Senado.
Quero agradecer a todos os debatedores. Sei da preciosidade do seu tempo. Tenho certeza de que tudo que aqui foi dito está gravado. Este Relator continua absolutamente em aberto para receber sugestões, até por escrito, se assim o desejarem fazer, não é? E o debate continua. Vamos tentar fazer o melhor pelo país e tentar cumprir algo que já faz muitos anos que está previsto desde 1988. Tivemos um bom tempo já para esse debate, tivemos tentativas anteriores que não deram em nada e que foram arquivadas. Vamos ver se, dessa vez, o final não seja simplesmente fazer, com essa resolução, o que se faz com a dívida: rolar, rolar, rolar. (Risos.) Nós queremos terminar essa resolução e não enrolar, dar um limite para essa dívida.
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Por uma imposição constitucional e da lógica, ninguém pode ter uma dívida que tenda ao infinito, ninguém pode ter a possibilidade de dever um valor que não tenha um limite. Isso seria sair do campo da economia e cair no campo da magia, não é? É por isso que, sabiamente, a nossa Constituição estabeleceu que o Senado fixará um limite para a dívida do Governo geral.
Agradeço a todos de coração, muito obrigado, e espero que a gente continue essa conversa.
Encerro a sessão neste momento.
(Iniciada às 10 horas e 46 minutos, a reunião é encerrada às 13 horas e 03 minutos.)