Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
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| R | O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - BA. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 36ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura. A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para instruir a Proposta de Emenda à Constituição nº 148, de 2015, que "altera o inciso XIII, do art. 7º da Constituição Federal, para reduzir a jornada de trabalho semanal", conforme Requerimento nº 52, de 2025, da CCJ, de iniciativa do Senador Paulo Paim e do Senador Rogerio Marinho. Esta reunião será semipresencial, sendo permitida a participação remota das Sras. e dos Srs. Senadores e dos convidados, por sistema de videoconferência para exposições e debates. Será realizada em caráter interativo, ou seja, com a possibilidade de participação popular. Dessa forma, os cidadãos que queiram encaminhar comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria do Senado Federal, telefone 0800 0612211. Eu gostaria de convidar à mesa dois debatedores que estão presentes: o Sr. Clemente Lúcio, Coordenador do Fórum das Centrais Sindicais; e a Sra. Cirlene Luiza Zimmermann, (Palmas.) Procuradora do Trabalho e Coordenadora Nacional da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (Codemat). Eu passo a informação à Comissão de que os convidados, o Dr. José Pastore, Professor titular da Faculdade de Economia e Administração da Universidade Federal de São Paulo e da Fundação Instituto de Administração da USP; o Dr. Fernando de Holanda Barbosa Filho, Mestre em Economia da Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getúlio Vargas e o Dr. João Gabriel Pio, Economista-Chefe da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais vão participar pelo sistema remoto. |
| R | De tal forma, nós vamos iniciar esta audiência pública, como também outras que forem encaminhadas, para debater um tema que é importante no momento que nós estamos vivendo. Quero destacar e parabenizar a iniciativa do Senador Paulo Paim, Senador pelo Estado do Rio Grande do Sul, porque é da iniciativa dele essa proposta de emenda constitucional, ele que, neste Senado, tem honrado o seu estado, honrado o Brasil, sobretudo pelo comportamento ético, correto e de defesa permanente, pelo diálogo, pelo entendimento e pelas propostas de defesa do trabalho e do trabalhador. Também quero destacar a presença do Líder do Governo no Senado Federal, o Senador Jaques Wagner, que, além de Líder do Governo, é também meu Líder na Bahia, e eu vejo a presença dele com muita alegria, até porque ele também é um defensor dessa proposta, sempre condizente com as leis trabalhistas, sobretudo aquelas que reconhecem e protegem o trabalho de todos aqueles que promovem o desenvolvimento econômico do Brasil em todas as áreas. Portanto, eu passo a palavra, inicialmente, a pedido, Senador Paulo Paim - V. Exa. que vai, dentro de poucos instantes, comandar aqui a Presidência, porque eu vou para outra atividade... Pede-me o Dr. José Pastore, pelo sistema remoto, a palavra. Se a mesa já está conectada... (Pausa.) Então, o Dr. Pastore está com problemas de conexão. O outro palestrante indicado é o Dr. Fernando de Holanda Barbosa Filho, no sistema remoto. Eu passo a palavra ao Dr. Fernando de Holanda, pelo tempo de dez minutos, para a sua exposição a respeito do tema de que nós estamos tratando neste momento. Tem a palavra o Dr. Fernando de Holanda. O SR. FERNANDO DE HOLANDA BARBOSA FILHO (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia a todos. Ouvem-me? (Pausa.) Sempre é um prazer estar aqui. Bom dia a todo mundo, Senadores, convidados. É um prazer estar aqui contribuindo com este debate. Primeiramente, eu queria... Eu consigo fazer uma breve apresentação? Eu condigo compartilhar o PowerPoint por aqui ou não? O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - BA) - V. Sa. pode explicar o que pede, por favor? (Pausa.) Pode sim fazer a apresentação. O SR. FERNANDO DE HOLANDA BARBOSA FILHO (Por videoconferência.) - Eu quero compartilhar o PowerPoint. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - BA) - Pode fazer a apresentação. Que a mesa possa dar as condições de ele fazer a apresentação que deseja. O SR. FERNANDO DE HOLANDA BARBOSA FILHO (Por videoconferência.) - Vou só me organizar aqui, tem muito arquivo aberto, desculpe-me. Vamos lá. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - BA) - Fique tranquilo porque o tempo é flexível, o senhor pode ultrapassar o tempo sem nenhum problema. O SR. FERNANDO DE HOLANDA BARBOSA FILHO (Por videoconferência.) - Estou com dificuldade aqui com meu PowerPoint. Dois segundinhos e a gente já vai resolver isso. Vamos lá. (Pausa.) |
| R | Pronto. Conseguem ver com a tela cheia, Senadores? Posso continuar, gente? O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - BA) - Pode continuar, tranquilo. Pode continuar. O SR. FERNANDO DE HOLANDA BARBOSA FILHO (Por videoconferência.) - Obrigado. Vou fazer uma breve apresentação sobre a modificação na jornada de trabalho. No fundo, sobre a mudança na jornada de trabalho, na minha visão, o grande problema dela e o perigo que ela tem é o impacto negativo que ela pode ter sobre a produtividade do trabalho e sobre o produto da economia, uma vez que, por trás dela, existe uma redução da jornada de trabalho que pode ser importante. Obviamente, vêm as perguntas: quais seriam os principais beneficiados e quais os impactos sobre a economia? A gente escreveu uma nota técnica aqui no Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas sobre isso. Eu vou fazer aqui uma breve apresentação com as duas notas que a gente construiu, com os resultados, sem entrar nos detalhes de como foi elaborado. Então, o primeiro ponto que é importante ressaltar é que tem ocorrido uma redução gradual da jornada de trabalho no Brasil e no mundo. Diversos fatores contribuem para isso, e vocês podem pegar aqui que a tendência de queda vem de um longo tempo. Aqui há a mudança constitucional de 1988, que gera uma redução abrupta da jornada de trabalho, mas você pode ver que, ao longo do tempo, depois ela alcança a tendência. A gente teve uma redução grande na pandemia e voltou. Essa parte aqui em cima de constância é um pouco fora do padrão anterior. A gente não consegue descobrir ainda o que está fazendo aquela estabilidade, mas, se vocês olharem os números, a jornada média de trabalho da economia brasileira hoje é um pouco acima de 38 horas semanais de trabalho. Essa é a média. Toda média tem um termo acima e um termo abaixo. A gente faz uma simulação supondo que houvesse uma redução. Como eu estou usando 38 horas, trinta e oito vírgula poucas horas, e não as 44 horas, isso geraria uma redução da jornada de trabalho de 6,2 pontos percentuais, o que sem qualquer ganho de produtividade geraria uma perda no valor agregado que poderia variar entre 6,2 se eu adotasse somente uma função de produção com trabalho ou 3,6 se eu tivesse uma produção com trabalho e capital. Adicionalmente a isso, muito foi advogado que a redução da jornada de trabalho tenderia a aumentar a produtividade do trabalhador. Embora eu ache que isso vai ser bastante difícil dado o nosso histórico de baixo crescimento da produtividade nas últimas décadas, eu fiz uma simulação supondo que você tivesse grandes ganhos de produtividade. A PTF, no Brasil, está crescendo virtualmente zero há algumas décadas. Vamos supor que ela crescesse 0,5%, somente a mudança obrigatória da jornada de trabalho poderia gerar uma perda de produto de 3,3% e a perda da produtividade do trabalhador seria equivalente à redução da sua jornada. E aqui é um ponto importante de ressaltar porque eu acho que isso aconteceria com qualquer um de nós. A nossa produtividade no Brasil infelizmente é baixa. Não existe bala de prata, uma só solução para fazer com que a produtividade volte a crescer de forma consistente, mas certamente reduzir a jornada de trabalho de um trabalhador que, na média, é pouco produtivo não vai aumentar o produto que ele gera. Eu tenho lido que, com a redução da jornada, o trabalhador vai ficar mais feliz, vai trabalhar melhor, vai ser mais produtivo. Ótimo, mas é muito difícil você supor que ele vai ter um ganho de produtividade equivalente às horas que ele não vai trabalhar. |
| R | Então, isso aqui é uma simulação sobre os diversos cenários de redução do PIB. Tem um efeito adicional da mudança da jornada de trabalho, que é uma potencial redução do total de trabalho contratado, que vai gerar perda de valor adicionado na economia. Obviamente, a gente não tem como saber exatamente qual a elasticidade da demanda por trabalho com relação ao aumento do salário real. Eu peguei o caso mais extremo, que eu acho que é 18%, que seria se a jornada fosse 44. Eu não acho que é um número mais razoável. Eu acho que o número mais razoável é algo entre seis e dez. Isso implicaria uma redução na contratação, por quê? Porque uma vez que eu reduzo a jornada de trabalho e mantenho os salários, eu estou aumentando o salário por hora trabalhada do trabalhador. Isso vai fazer uma reação, porque o trabalho vai ficar mais caro e potencialmente algumas empresas vão ajustar os seus quadros. Supondo uma elasticidade de 10% de redução quando o salário aumenta 6%, isso vai gerar uma perda adicional de produto, que poderia gerar uma perda de 4,1% ao menos no produto da economia, ou seja, existe o potencial de a mudança gerar uma perda de produto não trivial, que vai afetar a economia como um todo. Em seguida, a gente faz um segundo artigo, uma análise setorial. E aqui eu gostaria de frisar a última coluna, JT, que é a jornada de trabalho, mostrando como existe uma variabilidade na jornada de trabalho média entre os diferentes setores de economia. O setor com jornada mais elevada é 42 horas, no setor de transporte. Obviamente, se você reduzir para 36 horas, vai ser o setor mais afetado, superior a 10%. E você tem APU, que é 36,6 horas, ou seja, esse setor vai ser muito pouco afetado. E você tem outros setores em que tem essa variabilidade. Então, isso aqui é só para ressaltar o seguinte: mexer na jornada de trabalho vai ter efeitos díspares na economia. Setores com maiores cargas, como comércio, transporte, serviços em geral, esses setores vão ter um problema. Outros serviços em que a jornada é menor vão ter menos impacto, mas o setor de comércio vai ser afetado, o setor de transporte vai ser muito afetado e extrativo idem. Então, a gente tem que pensar que o impacto de uma redução da jornada... Lembrando que eu gosto de ressaltar esse gráfico. A jornada no Brasil já está reduzindo ao longo do tempo. Isso é uma tendência histórica, e eu acho que ela deve voltar a seguir a tendência nos próximos anos. Isso vai ocasionar uma mudança abrupta em alguns setores. Nesses setores, qual é o potencial? Dá uma olhada. A taxa de crescimento da produtividade nesses setores não tem sido nada muito expressiva, muito pelo contrário. Se a gente pegar o Brasil como um todo, a taxa de crescimento médio no Brasil entre 2012 e 2024 é potencialmente 0% ao ano. É um crescimento muito baixo. A gente teve as crises econômicas no meio que tornam muito complicado esse período. Um leve ganho de produtividade entre 2016 e 2018. Mas a produtividade no Brasil está com um desempenho medíocre ao longo do tempo. Então, olhando os dados, tirando a agropecuária, que tem tido um crescimento mais forte ao longo do tempo, é difícil imaginar que os setores conseguirão compensar a queda das horas trabalhadas com ganho de produtividade dos seus trabalhadores. Impacto da redução da jornada de trabalho para 36 horas. O que a gente calcula aqui é qual seria o valor agregado contrafactual reduzindo as horas trabalhadas, ou seja, suponho que o trabalhador por hora trabalhada tenha a mesma produtividade que antes e somente reduzo a jornada dele trabalhando 36 em vez das horas médias. Obviamente, os setores mais afetados são aqueles setores que tinham maior carga horária média; os setores menos afetados são aqueles que têm menor nível de carga horária hoje em dia. |
| R | Então, de novo, os efeitos não seriam pequenos em alguns setores, podendo chegar a mais de 14%. Obviamente, alguns setores teriam um impacto menor, mas isso é só para mostrar para os senhores que a simples mudança na carga horária total semanal pode ter um impacto bastante grande na economia, com distribuição diferente dependendo do setor de atuação. Aqui, o impacto da redução da jornada de trabalho com ganho de produtividade. O que eu peguei aqui é o ganho histórico de produtividade. Você pode ver que o único setor que poderia compensar a perda da tabela anterior é a agropecuária, que tem tido um ganho histórico muito acima dos demais setores de economia; com todos os demais setores, não tendo compensação. E eu posso agora, em vez do histórico brasileiro, supor 1% ou 2%, que é maior na maioria dos setores, ou seja, um crescimento da produtividade de 2% ao ano num setor, o que seria algo extraordinário dado o histórico recente da economia brasileira, que nem é tão recente assim - pode-se calcular isso desde lá de trás; a gente está usando aqui 2012, porque são os dados da Pnad Contínua que a gente tem -, então, quando você faz isso, você observa que infelizmente a produtividade não vai ser suficiente para o risco que a gente tem de redução do PIB e redução do valor agregado de vários setores da economia. E, por último, quais são os grupos que mais se beneficiam - lembrando que é uma redução de jornada sem contrapartida do salário. A gente tem que olhar quem é o pessoal que trabalha mais horas em média. No passado, você pode ver que houve uma redução muito grande dos trabalhadores com menor grau de instrução - a jornada média deles caiu -, enquanto que a jornada média dos trabalhadores com nível superior aumentou um pouquinho, ou se manteve, e o trabalhador com médio completo teve uma pequena redução, mas muito pequena, ou seja, os trabalhadores que ganham menos, que são aqueles menos escolarizados, são em geral aqueles trabalhadores que têm uma jornada já mais baixa, o que quer dizer que, entre aspas, "o ganho em salário-hora" desses trabalhadores vai ser menor. Quem vai ter maiores ganhos em termos relativos são os trabalhadores com maior grau de escolaridade, que são aqueles que, hoje em dia, trabalham jornadas mais elevadas, em média, na economia. Por último, a gente mostra aqui a evolução: o trabalhador com ensino médio teria a ganhar uma variação do salário real dele de 9%; ensino completo, 8%; trabalhador quase sem qualificação, 0,7% somente; e o trabalhador com fundamental completo e médio incompleto, 5%; ou seja, os ganhos estão distribuídos mais na parte de cima da distribuição de renda. É verdade que a gente está aumentando a parcela de trabalhadores com ensino médio e ensino superior incompleto na economia brasileira, o que é um bom sinal, mas aqueles trabalhadores que, em tese, são mais desfavorecidos serão menos beneficiados. E, na hora em que a gente dá uma olhada aqui na taxa de crescimento do salário real por hora efetiva, a gente tem dado uma olhada que, ao longo do tempo, os trabalhadores que têm tido mais ganho já estão na parte de baixo. Por que a gente está utilizando isso? Eu não consigo calcular a produtividade por grupo de trabalhador, porque eles trabalham em diversas plantas; uma proxy razoável para você utilizar para a produtividade é o salário que é pago e como ele cresce. Supondo uma margem constante das empresas, a empresa só varia o salário real da pessoa conforme a produtividade. A gente pode dar uma olhada que nem no ensino completo, nem no ensino médio tem tido ganho recente de produtividade que fosse suficiente, vamos dizer assim, para explicar uma elevação nos salários. |
| R | Então, a redução de jornada de trabalho, na minha visão, possui custos elevados para determinados setores. Infelizmente, os ganhos de produtividade não devem ser suficientes para compensar a redução da jornada de trabalho. Grupos com mais escolaridade que trabalham mais horas são os mais beneficiados, e o aumento do salário-hora sem compensação da produtividade pode reduzir o emprego, ou seja, tem grupos que são aqueles com menor produtividade, quando houver redução da jornada e houver o aumento do salário real, eles podem ser antes do que aqueles trabalhadores mais produtivos. A redução da jornada de trabalho reduz a produtividade do trabalho, ou seja, eu sou um trabalhador, eu trabalho 40 horas, produzo tanto por ano. Agora, quando eu reduzir a minha jornada, eu vou ter um produto por trabalhador inferior, algo que a gente já observou na década de 80. Na década de 80, tinha um puzzle, que era: como que o trabalhador, ao longo de dez anos, pode se tornar menos produtivo. Eu tenho um artigo com o Prof. Samuel Pessoa, já há bastante tempo, em que a gente mostra que o que explica o grosso da queda da produtividade do trabalhador brasileiro na década de 80 foi a redução das horas trabalhadas, ou seja, o fato de você reduzir a jornada de forma abrupta - aí na Constituição de 1988 - faz com que o produto por trabalhador caia, e isso vai ser um impacto que vai ser importante na economia. No entanto, obviamente, um cálculo que a gente não consegue fazer é qual é o ganho de bem-estar aumentando o tempo de lazer, mas o que eu gostaria de ressaltar é que qualquer ganho de bem-estar que possa ocorrer, o trabalhador ter menos horas de trabalho, ele não vai ocorrer sem custos, e eu acho que neste debate a gente está, de certa forma, subestimando o custo que essa redução pode ter, não só sobre o produto geral da economia, mas, inclusive, sobre a produtividade do trabalhador e com isso colocando em risco, em alguns casos, seu emprego. A minha apresentação era só essa, gente, era isso que eu tinha preparado para mostrar para vocês hoje. Obviamente estou disposto aqui a debater o tema e a ver como é que vocês querem continuar. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Muito obrigado, Sr. Fernando de Holanda Barbosa Filho, Mestre em Economia pela Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getulio Vargas, que fez a sua exposição à distância, a quem esta Comissão, de pronto, agradece. Eu quero registrar a presença no plenário do nosso querido Rogério Carvalho, que é o grande Relator desta PEC. Fez um relatório, que, para mim, foi um dos melhores que eu já vi sobre o tema. Já o convoquei para sentar aqui na mesa, ele mandou eu esperar um pouquinho, e eu sigo a orientação do Líder. Segue o Líder. Então eu passo a palavra, de imediato, ao Sr. José Pastore, Professor Titular da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP), e da Fundação Instituto de Administração da USP. O SR. JOSÉ PASTORE (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Bom dia. O SR. JOSÉ PASTORE (Por videoconferência.) - ... Presidente Paulo Paim, grande amigo. É um prazer poder participar deste encontro. Eu penso que o Fernando de Holanda já fez uma excelente exposição, com dados muito concretos e muito relevantes, que dá uma ideia da responsabilidade e também da complexidade que os Srs. Senadores têm pela frente para decidir esse assunto. Essa é uma Casa de formulação de leis, e as leis é que garantem os direitos. E o que acontece é que cada direito tem um custo, e este que é o grande dilema do legislador: equilibrar os direitos para a população com custos toleráveis do lado da produção. |
| R | Eu vou apresentar alguns dados aqui baseados exatamente no estudo do Fernando, e depois eu também ficarei à disposição para o debate. Estou pedindo para compartilhar a minha apresentação. (Pausa.) Queria ver se está dando para ver direito. (Pausa.) Não entrou, não? O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Ainda não. O SR. JOSÉ PASTORE (Por videoconferência.) - E agora? Entrou? O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Agora sim. Tranquilo. O SR. JOSÉ PASTORE (Por videoconferência.) - Está bom. Então, eu vou apresentar alguns dados aqui, e a gente pode debater. Qual é a PEC que está em discussão de autoria do nobre Senador Paulo Paim desde 2015? A ideia do Senador é implantar uma redução de jornada que seja gradual; ou seja, a partir de 1º de janeiro, a jornada passa a ser de 40 horas, e depois ela vai diminuindo uma hora por ano até atingir 36 horas por semana. É bom frisar que essa redução será feita sem redução de salário mensal. Não é o salário-hora, mas o salário mensal que será mantido. Se fosse para manter o salário-hora, seria outra situação, mas é o salário mensal. Muito bem. Vamos ter uma exposição rápida aqui. Tipos de jornada de trabalho. Eu acho que os Senadores estão bastante familiarizados com o fato de que existem basicamente dois tipos de jornada de trabalho: uma, que é fixada por lei, e os senhores têm a responsabilidade disso no Congresso; e outra, que é fixada por negociação. Se olharem nessa tabela, os senhores poderão verificar que a jornada fixada por lei tende a ser mais alta do que a jornada fixada por negociação, seja a negociação fixando horas por semana ou seja a negociação fixando horas por ano. O exemplo mais interessante é o da Alemanha. A Alemanha é um país avançado, que, atualmente, negocia horas de trabalho entre as partes e está com 34,2 horas por semana de trabalho efetivo, mas a jornada legal permanece com 48. A Alemanha não mudou a jornada legal. É essa que está sendo questionada e que se pretende mudar no Brasil. A Argentina também tem 48 horas legais, mas trabalha 37 por semana. O Chile tem 40 horas, já menos do que nós, e trabalha 40,4, um pouquinho mais, por semana. Colômbia tem 48... Enfim, eu não vou destacar todos os números dessa tabela, mas o básico é o seguinte: a jornada legal tende a ser mais alta, por quê? É uma segurança que o país tem. Se, por acaso, precisar trabalhar mais, a lei permite. Ao mesmo tempo, o país fala: vocês podem negociar para baixo o quanto quiserem. Essa é a sistemática do Brasil também. Na Constituição Federal, está escrito assim: a jornada é de 44, mas pode negociar para baixo. E o Brasil tem negociado para baixo, como o Fernando já mostrou. |
| R | A jornada anual é uma soma de tudo aquilo que se trabalha ao longo do tempo, ao longo do ano. E há um número interessante aqui: um país cuja economia está mais próxima da do Brasil nessa tabela, que é o México, tem uma jornada anual de 2.255 horas, uma jornada semanal de 43,7 horas e a jornada legal é de 48 horas. Então, esses são os números da OIT, mostrando que há um padrão mundial de manter a jornada legal mais alta. A única exceção é a França. A França, alguns anos atrás, reduziu a jornada legal para 35 horas, mas já modificou o sistema, porque ela está dizendo o seguinte hoje: é de 35, mas se quiserem negociar para cima, podem negociar para cima. Ela colocou um patamar baixo, o que destoa dos demais países, porque ela perdeu a segurança que os demais países têm no caso de precisar trabalhar mais. Então, esse é o primeiro dado que eu queria mostrar. O segundo dado é uma pergunta: como é que têm sido feitas as reduções de jornada na maior parte dos países ao longo do tempo? E a resposta é esta que acabei de dar: por negociação lenta, uma negociação que o próprio Fernando já mencionou aí. Essa tabela - peço desculpa porque tem muito número, mas eu não vou explorar nenhum número desses aqui em detalhe - dá a redução da tabela anual. Como é que acontece a redução ano após ano nos vários países? Vamos pegar o caso dos Estados Unidos, que está em vermelho aí. Em 2010, os Estados Unidos tinham 1.810 horas por ano; em 2011, subiu um pouquinho, negociou um pouco mais, 1.819; em 2012, subiu mais um pouquinho, foi para 1.826; em 2013, baixou para 1.824; em 2015, voltou a subir de novo. Então, vejam que isso vai variando, e vai variando de acordo com a conjuntura, de acordo com o desempenho da economia. Depois passou a reduzir, reduzir, e chegou a 1.799 horas por ano, lentamente - todos os países, lentamente. Esse é um dado da OECD, de 2024, está bastante atualizado, e mostra que as reduções são pausadas. Aliás, a proposta do nobre Senador Paulo Paim é também de uma redução gradual. Alguns exemplos da lentidão do ritmo de redução de jornada. Naquela tabela lá, se os senhores observarem bem, Estados Unidos reduziram 11 horas anuais em 15 anos e sempre por negociação, quer dizer, em 15 anos, eles reduziram 11 horas anuais por negociação. Os países da OCDE reduziram 55 horas anuais em 15 anos também. E de que maneira? Por negociação. Agora, aqui no Brasil, se nós considerarmos 48 semanas anuais, com uma redução de 4 horas - isso aqui é de acordo com a proposta do Senador Paulo Paim -, são quase 200 horas em um ano; e, depois, a redução de mais 48 horas por ano, no final do processo. Então, depois de 5 anos, quando a gente completar todo o processo de redução, o Brasil terá reduzido 384 horas por ano, em 5 anos - em 5 anos. Os Estados Unidos reduziram 11 horas em 15 anos. Então, qual é a conclusão inicial que a gente pode tirar? Que a PEC 148 visa a reduzir quase 400 horas em apenas 5 anos, e sem negociação, o que destoa bastante dos outros países. Eu não estou aqui fazendo nenhuma crítica, estou apenas mostrando como é que é feito esse processo que todos pretendem fazer no Brasil. Eu acho que todo mundo gostaria de trabalhar menos e ganhar mais, não é? É isso que é sempre o objetivo de todas as pessoas. |
| R | Ou seja, se esse processo de reduzir jornada legal funcionasse e garantisse a sobrevivência da economia, das empresas, dos trabalhadores, dos empregos, dos salários, nós poderíamos reduzir logo para 30 horas por semana. E eu sei que há propostas desse tipo no Congresso Nacional. Mas, repetindo, toda vez que se cria um novo direito, uma nova proteção, há um custo, e esse custo precisa ser pensado e precisa ser estimado. Então, eu acho que os Senadores têm pela frente uma tarefa para meditar bastante antes de tomarem uma decisão desse tipo. Será que é possível atender interesses de empregados e de empregadores nesse campo da redução da jornada? Como é que isso pode ser feito? Bom, a resposta é sim, é positiva: dá para atender interesses de empregados e de empregadores. Como? Por meio da negociação coletiva. Assim tem sido feito no resto do mundo, assim tem sido feito no Brasil - é o que está previsto na Constituição de 1988. Esse é o gráfico que o Fernando elaborou e que mostrou já, que mostra que o Brasil também está nesse caminho, reduzindo a jornada muito lentamente, muito lentamente. Aqui no final, nos anos 2020-2021, tem um dente, que isso foi devido à pandemia, que teve uma redução muito forte de jornada, e depois voltou ao ritmo normal, ao ritmo regular. Quer dizer, o Brasil está avançando na forma como os demais países estão também modernizando o seu modo de trabalhar. Qual é a troca que se faz na negociação coletiva para reduzir jornada? Produtividade do trabalho. Esse é o principal ingrediente que é trocado entre empregados e empregadores, para poderem se acomodar os interesses, como eu falei nesses eslaides aqui, de empregados e empregadores. Como? Negociação. Do quê? Produtividade do trabalho. O que quer dizer isso? Fazer mais com menos, ser mais eficiente, ser mais produtivo. E como está a nossa produtividade do trabalho segundo os dados da OIT? - esse dado também é recente. A produtividade do trabalho no Brasil é de US$17 por hora, quer dizer, o trabalhador brasileiro, em média, trabalhando uma hora, produz US$17. Se nós pegarmos os países avançados, a diferença é brutal. A OIT diz que na Noruega, em uma hora, o trabalhador produz US$93; na Holanda, US$80; Estados Unidos, US$70; no Brasil, US$17. E o Fernando mostrou que dar um salto nessa produtividade não é nada fácil, não. É uma coisa difícil. Produtividade depende de muitos fatores. Depende de tecnologia, depende da administração da empresa, depende de várias condições econômicas em torno da empresa, depende de infraestrutura, depende da qualificação do empresário e depende da qualificação do trabalhador. Para que tudo isso aqui aconteça de repente, é pouco provável. Então, esse é o desafio que os Senadores têm pela frente. É atender o interesse dos empregados e, ao mesmo tempo, acomodar isso economicamente com aquilo que é o necessário para a economia poder funcionar. A nossa diferença de produtividade é muito grande. Muito bem, por que a negociação é viável, é o jeito que mais atende as duas partes? O que a negociação leva em conta? Qual é a mágica que ela faz que permite acomodar os interesses das duas partes? Em primeiro lugar, ela leva em conta as características dos setores, dos ramos e dos trabalhadores. Quando o setor pode trabalhar menos, porque é muito eficiente, trabalha menos. O setor bancário, por exemplo. O setor bancário brasileiro tem uma eficiência incrível, está tudo eletrônico, tudo mecanizado, tudo computadorizado. Eles podem trabalhar, trabalham 30 horas por semana. A mesma coisa com os ramos. Os ramos têm diferenças de produtividade e de eficiência. E a mesma coisa com os trabalhadores. Então, a negociação ajusta isso aqui. A negociação também leva em conta os ciclos da economia. Quando a economia está em crise... Por exemplo, nós tivemos a época da pandemia, em que foi necessário até reduzir a jornada e até o Governo manteve um esquema de manter o salário com uma ajuda pública, para poder fazer os trabalhadores sobreviverem com as suas famílias. Quando a economia está indo muito bem, está indo tudo certo, você pode ampliar isso aqui e ativar de uma maneira diferente a força de trabalho. |
| R | A negociação ajusta também as variações de oferta de mão de obra. No momento, aqui no Brasil, nós estamos passando por um ciclo de falta de mão de obra em muitos setores. Então, é preciso levar isso em conta. E não é só a questão de saber o que vai acontecer hoje ou amanhã, mas, ao longo do tempo, a oferta de mão de obra vai variando e a negociação vai variando. É por isso que os senhores viram naquela tabela das horas anuais que de vez em quando um país chega e aumenta o número de horas trabalhadas por semana, depois diminui, aí aumenta. Depende da oferta de mão de obra. Depende da competitividade das empresas. O que é a competitividade das empresas? De que maneira elas se colocam perante as outras empresas? Se elas têm um produto bom, de boa qualidade, de preço baixo, que atrai o consumidor, isso é muito importante para a própria empresa investir, para expandir os seus negócios e para gerar emprego. Competitividade é uma das forças mais importantes para a geração de empregos. E, finalmente, a produtividade do trabalho, que já foi bastante explicada pelo Fernando. Muito bem, se nós fizermos uma análise - e aqui eu me baseio novamente nos estudos que o Fernando tem produzido e outros-, uma jornada de 36 horas por semana, que seria o fim do ciclo da proposta do Senador Paulo Paim. |
| R | Então, vamos admitir o seguinte: fim do ciclo, depois de cinco anos, 36 horas por semana, quatro dias por semana também. Quando ele tem um salário de R$2,2 mil para uma jornada de 220 horas mensais, como é hoje, o custo-hora é de R$10. Se nós passarmos isso para 180 por lei - não por negociação, por lei -, ou seja, 36 horas semanais, o custo-hora vai passar para R$12,22. É um aumento de 22,2%, o que é fortíssimo. E é fortíssimo e é o mínimo, porque há outras implicações que elevam esse custo para um nível ainda mais alto. Vejam um desafio que nós temos pela frente na economia brasileira. As empresas que vão ter essa redução da jornada de trabalho por lei, mantendo o mesmo salário, mantendo a mesma folha de pagamento, a receita delas permanecerá a mesma durante um bom tempo. Pode ser que ao longo do tempo, cinco, dez, quinze anos, a receita aumente, mas de imediato a receita... A receita de um supermercado não vai aumentar só porque reduziu a jornada para 36 horas e porque as pessoas estão trabalhando menos. O salário é o mesmo, o poder de compra é o mesmo, as vendas vão ser praticamente as mesmas. Então, se a venda é a mesma, a receita é a mesma, mas aumentou muito a folha de salário, aumentou 22,2%, o que as empresas tendem a fazer? No mundo inteiro é assim: transferir para os preços. Isso daria o quê, como resultado? Inflação. Ou então, encerrar atividades. Isso daria como resultado desemprego. Então, vejam, é um problema sério esse de você criar, por lei, uma sobrecarga em cima das empresas, que terão que pagar uma folha de salário sem que a receita aumente. Isso dá um desarranjo. Esse desarranjo pode dar inflação ou desemprego, ou as duas coisas juntas. Há mais uma peculiaridade: e o setor público, como é que vai fazer? Porque o setor público, para trabalhar também 36 horas e quatro dias por semana só, ele vai ter que contratar mais funcionários, porque como é que eu consigo... Aliás, tem um problema sério aqui no setor público. Como é que uma agência da Previdência Social, por exemplo, vai poder funcionar só quatro dias por semana para atender o público? Não pode. Como é que um tribunal de Justiça vai funcionar só quatro dias por semana para atender o público? Ou seja, terá que contratar mais funcionários. Será que estão disponíveis esses funcionários? E mais importante do que isso: será que há recurso disponível no Governo? Há recursos no orçamento para enfrentar esse aumento de folha salarial e de emprego também? Muito bem, e no PIB, qual é o impacto que teria na economia como um todo? Estou usando aqui novamente o trabalho do Fernando. Veja que ficou muito bom vocês colocarem o Fernando como primeiro expositor, porque estou aqui me ancorando nos estudos do Fernando, de enorme competência. Ele tem mais condições até de poder defender esse trabalho do que eu. Uma das estimativas dele, que é a mais provável, é que, se nós reduzirmos para 36 horas por semana, o PIB terá uma redução imediata de 6,2%. É uma coisa fantástica isso aqui, é um número enorme. E é uma estimativa ainda conservadora, porque, se nós levarmos em conta a questão de escalas, de turnos, da necessidade de contratar folguistas, isso pode aumentar ainda mais e vai dar um impacto maior no PIB, ou seja, é muito grave nós fazermos uma mudança abrupta dessa por lei. Por negociação, não, pode ir que vai dar tudo certo. |
| R | Muito bem, se o PIB reduz, a arrecadação do Governo também reduz. Se tiver uma redução maior de, vamos supor, 10%, isso vai piorar os serviços públicos e vai atingir em cheio os mais vulneráveis no Brasil. Então, vejam, Senadores, os senhores têm pela frente aí uma proposta que é muito atraente do ponto de vista popular, do ser humano - o ser humano prefere trabalhar menos, com mais folga e ganhar mais, e ter mais lazer, ter mais tempo para cuidar da saúde, da família, etc. -, mas há certos limites, esses limites são dados pela economia, que precisa ser levada em conta. Então, a tarefa dos senhores é uma tarefa complexa. Eu estou sugerindo aqui muita meditação e muito cuidado para tomar uma decisão desse tipo. Vejam, o PIB cair 6,2% é uma barbaridade. Lembrem que, na recessão que nós tivemos no Governo Dilma, ele caiu 3,5% em 2015 e caiu 3,6% em 2016. Quer dizer, nesses dois anos, caiu 7,1%, nós estaríamos perto disso. Então, vejam, se vai gerar inflação quase com certeza, se vai provocar desemprego quase com certeza, se vai fazer o PIB cair quase com certeza, se vai a arrecadação diminuir quase com certeza, se os serviços públicos vão ficar piores, quase com certeza, o que nós vamos ter aqui são vários efeitos boomerang de uma proposta que é humanitária, que é meritória, que vale a pena se pensar, que pode ser praticada e que vem sendo praticada, mas não por esse método da lei, é pelo método da negociação coletiva. Além disso, há outros impactos. Eu já mencionei aqui: quando vamos trabalhar para o sistema 4x3 e 36 horas, as empresas que fazem turnos terão que contratar muitos folguistas para fechar as horas. Por exemplo, uma farmácia. Uma farmácia vai ter que contratar mais folguistas para fechar as horas porque ela fica aberta o dia inteiro, algumas ficam abertas 24 horas. Um supermercado, um posto de gasolina, um hospital, são várias as áreas no comércio, na indústria, no transporte, no agro também que vão exigir a contratação de mais pessoas para atender. No agro, por exemplo, há limites muito estreitos até em termos de força de trabalho e de necessidade de mão de obra. Nós não podemos falar para a vaca diminuir o jeito que ela dá o leite ou as galinhas que botam o ovo. Então, nós temos que ter em mente essas estratégias para os diversos setores, que podem dar impactos diferenciados em termos de custo de produção. Além do mais, nós teríamos novos problemas trabalhistas, viu, Senador? Veja bem, no curto prazo, uma empresa pode fazer o seguinte: "Olha, aumentou a minha folha de salário, sabe o que eu vou fazer? Eu vou começar a contratar os novos empregados com redução de salário, eu não vou pagar a mesma coisa que eu estou pagando para os antigos, vou pagar menos.", mas isso cria problemas gravíssimos do ponto de vista legal. A questão da isonomia salarial, se levada à Justiça do Trabalho, será uma condenação certa de quem pratica um sistema em que dois empregados executam a mesma tarefa, na mesma empresa, no mesmo estabelecimento, ganhando salários diferentes. Esse é um problema adicional bastante sério. E no longo prazo? Se for no longo prazo, ela pode gradualmente ir trocando os trabalhadores mais caros por trabalhadores mais baratos em termos salariais. O que seria o resultado final desse processo? Seria a esterilização de todo o esforço que foi feito para reduzir a jornada de trabalho. |
| R | Fazendo uma conta do que aconteceria com as jornadas anuais, no sistema 4x3, levando em conta as férias do Brasil, os feriados nacionais, municipais, estaduais, religiosos e outros - às vezes até concessões de município - o Brasil passaria a trabalhar 161 dias e a descansar 204 dias, ou seja, o Brasil seria um país onde se remuneraria mais o descanso do que o trabalho, por força de lei. Estou sempre frisando aqui: se for por negociação, acho que está absolutamente correto. Agora, por força de lei, nós temos uma verdadeira jabuticaba aqui no caso da remuneração do trabalho. Resumo, os grandes desafios dessa PEC do Senador Paulo Paim, com o relatório, também, que foi apresentado pelo Senador Geraldo, que eu li agora há pouco tempo... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - O Relator é o Senador Rogério Carvalho. O SR. JOSÉ PASTORE (Por videoconferência.) - Desculpe, Rogério Carvalho. Isso mesmo. Desculpe, Senador, troquei seu nome aí. Não estou muito familiarizado com todos os Relatores, mas eu li o relatório, também. Então, levando-se em conta... quais são os desafios dessa PEC aí? Olha, vejam esses desafios: manter o mesmo salário, com menos horas de trabalho, com a mesma receita da empresa e a mesma produtividade. É uma equação que é muito difícil de fechar. Além do mais, tem várias disfunções, porque pode haver destruição de empregos formais, como o Fernando já apontou, que é um efeito bumerangue... E também temos que levar em conta que, na literatura econômica e de relações de trabalho que nós conhecemos, não há nenhum estudo que prova que é possível gerar emprego por lei. Se isso fosse possível, tenho a impressão de que todo governante, no primeiro dia da posse dele, ia procurar aprovar uma lei acabando com o desemprego e gerando emprego. Não é possível gerar emprego por lei, simplesmente porque todo direito tem custo. Cada direito a mais tem um custo a mais também. E há algumas dificuldades adicionais do momento. Nós estamos numa quadra de uma grave escassez de mão de obra. Isso aí acontece na construção civil, no agro, no comércio... Em vários setores está faltando mão de obra, mesmo porque muitos não querem trabalhar, porque estão mais acomodados em outros programas de vida, por exemplo, os de assistência social. Então, esse é um problema. Hoje nós temos essa questão da escassez de mão de obra. Nós temos também hoje as incertezas do ajuste fiscal que está em marcha. O Governo está fazendo um esforço aí para fazer um ajuste fiscal e é difícil porque há muitos gastos, muitas despesas. Isso poderá agravar ainda mais o dispêndio do Governo. |
| R | Há também as incertezas da reforma tributária, que é nova e que vai entrar agora em vigor. E há também as incertezas derivadas da guerra tarifária em escala mundial, que atinge o Brasil. Então a conclusão que eu tenho que oferecer aos Senadores, para que todos os senhores meditem bem, meditem bem, com muito cuidado, sobre o que vão fazer, porque não há nada de automático entre uma decisão legal e o comportamento do mercado de trabalho. Redução de jornada de trabalho é possível? É. De que maneira? Por negociação coletiva. Era isso que eu tinha que apresentar. Agradeço o convite para participar desta reunião e espero um bom trabalho ao longo do dia. E mais do que isso, na hora de examinar essa PEC com todo o cuidado que ela impõe, para que a gente torne viável, para empregados e empregadores, essa redução da jornada. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Muito bem, Sr. José Pastore, Professor Titular da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP) e da Fundação Instituto de Administração da USP. Queria agradecer muito, já nos encontramos diversas vezes ao longo desses meus 40 anos aqui no Congresso, ao Sr. José Pastore. E eu fico triste quando o setor empresarial não indica alguém para falar, para termos uma visão ampla dos dois setores, empregado e empregador, e fazer o bom debate. Então fiquei muito feliz aqui de o senhor participar deste debate e expor o seu ponto de vista. Digo o mesmo do Sr. Fernando de Holanda Barbosa Filho, que é Mestre em Economia pela Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getúlio Vargas, que defendeu, com argumentos diferentes, claro, uma posição semelhante à sua. Eu quero falar menos e ouvir mais. Então, neste momento, pediu, também à distância, a Deputada Erika Hilton. Ela é Deputada Federal. Permita-me que eu diga, Rick Azevedo, mas essa marca é de vocês dois, não? Essa marca aqui... O SR. RICK AZEVEDO (Fora do microfone.) - Da classe trabalhadora. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Não, mas eu digo quem criou a marca, eu quero valorizar quem criou. Poderia dizer que era minha, eu ficaria bem feliz. A marca 6x1, foram vocês que criaram. O SR. RICK AZEVEDO (Fora do microfone.) - Vivi na pele 12 anos, Senador. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Como? O SR. RICK AZEVEDO (Fora do microfone.) - Vivi na pele 12 anos... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Isso, não é? Então, neste momento em que a Erika vai falar, a marca 6x1 pegou em todo o Brasil para o debate, naturalmente. Ninguém aqui tem bola de cristal para informar o que vai acontecer. Todos nós que temos compromisso com essa PEC, como essa minha, naturalmente vimos com muito bons olhos o fim da escala 6x1. Então é com muita satisfação, Deputada Erika Hilton, que neste momento, o tempo é seu. Da mesma forma como foi para os dois que a antecederam. (Pausa.) Não sei se ela estava... (Pausa.) |
| R | Eu pergunto se ela conseguiu entrar, se não, vamos em frente e ela entraria em um outro momento. (Pausa.) Não está conseguindo? Ela está conectada, mas não… (Pausa.) Bom, vamos lá, vamos ganhar tempo. Então, eu passo a palavra agora para, na sequência aqui, o Sr. João Gabriel Pio, Economista-Chefe da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais. Tem que ver se ele está no remoto também, senão vamos seguindo... O SR. JOÃO GABRIEL PIO (Para expor. Por videoconferência.) - Todos conseguem me escutar? O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Opa! Estamos ouvindo bem. Prazer tê-lo conosco nesta manhã, neste bom debate. O SR. JOÃO GABRIEL PIO (Para expor. Por videoconferência.) - Excelente! O prazer é todo meu. Primeiramente, bom dia a todos e a todas. Eu agradeço o convite. Também gostaria de cumprimentar todas as autoridades presentes e os professores que falaram de uma forma brilhante anteriormente a mim. Bom, eu também tenho uma apresentação, mas antes de iniciá-la, eu não posso deixar de destacar: eu tenho a plena convicção, como bem colocado pelo Prof. Pastore, de que ninguém - ou pelo menos a maior parte das pessoas - é contra a redução da jornada de trabalho. Na verdade, isso tende a ser uma tendência de todos. O ponto central é como viabilizar isso sem que o custo ou os impactos negativos superem muito os eventuais benefícios. Essa é a discussão central, que veio na fala do Prof. Pastore e do Prof. Fernando. Eu vou compartilhar a minha tela, eu tenho uma apresentação breve. Bom, todos conseguem ver a minha tela? O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Sim, estamos vendo. O SR. JOÃO GABRIEL PIO (Por videoconferência.) - Perfeito. Eu acho que a minha apresentação, de certa forma, complementa a apresentação do Prof. Pastore e a do Prof. Fernando em alguns dados, mas o primeiro ponto que eu gostaria de destacar são alguns dados que eu peguei também da Organização Internacional do Trabalho, que trazem informações sobre a carga horária semanal efetivamente trabalhada. Olhem que interessante: o Brasil tem uma carga horária efetivamente trabalhada de cerca de 39 horas. Ela é menor do que a média global, de 39,9, e, quando nós comparamos essa carga horária semanal efetivamente trabalhada, ou seja, aquela em que se descontam férias, licença, parada, enfim, outros fatores, ou seja, aquela carga horária efetivamente dedicada à atividade laboral, o Brasil tem uma carga horária menor do que a média de países com renda similar a ele, os de renda média, renda média alta. O Brasil, no caso, teria uma carga horária semanal efetivamente trabalhada maior apenas do que a média dos países de alta renda, ou seja, dos países mais desenvolvidos, ou os países desenvolvidos, como bem colocado pelo Prof. Pastore: Alemanha, Dinamarca, Suécia, porque geralmente se usam esses países para comparar com o Brasil. Aí o ponto central, que eu acho que vai muito na linha do que foi apresentado anteriormente, é: por que esses países desenvolvidos possuem uma carga horária semanal efetivamente trabalhada menor do que países como o Brasil? E a resposta é bem objetiva e bem direta: a gente está falando aqui de eficiência produtiva. Esses países, com a mesma quantidade de insumos e tempo, conseguem produzir de uma maneira muito mais eficiente do que a economia brasileira. |
| R | E qual é a distância dessa eficiência? Aqui eu peguei alguns dados da The Conference Board, que traz alguns dados sobre produtividade por hora trabalhada, travei os Estados Unidos como 100% e analisei as demais economias em relação aos Estados Unidos. E por que os Estados Unidos? Os Estados Unidos tendem a ser a economia mais produtiva do mundo, então é interessante avaliar a distância em que os pais estão dos Estados Unidos. E olha que interessante e até mesmo trágico, infelizmente. O Brasil tem cerca de 23% da produtividade dos Estados Unidos - 23%. Isso significa que, em média, um trabalhador, nos Estados Unidos, produz quatro vezes mais do que um trabalhador aqui no Brasil. E, vejam bem, eu não estou falando nacionalidade americana ou brasileira, eu estou falando de que pelo simples fato de você estar numa economia americana você produz, em média, quatro vezes mais do que um trabalhador aqui no Brasil. E esse não é o efeito negativo, vamos dizer assim, maior. Quando nós comparamos o Brasil com outras economias, o Brasil tem uma produtividade menor do que a média global, menor do que a média da América Latina, menor do que a média de alguns países emergentes e muito distante do que os países maduros e desenvolvidos. E essa não é a pior notícia, infelizmente! Quando a gente... E foi até apresentado pelo Prof. Holanda, pelo Prof. Fernando, anteriormente, quando nós olhamos a taxa de crescimento da produtividade de 1990 até 2024, a média de taxa de crescimento da produtividade do Brasil foi apenas de 0,9%, muito abaixo da média mundial, que foi em torno de 2,1%, e atrás de países como Costa Rica, Chile, Polônia, Coreia do Sul, Índia e nem se fala da China. O que isso significa na prática? Isso significa que o Brasil produz de uma maneira menos eficiente do que as outras economias e a cada ano que passa essa distância vai aumentando. Isso é péssimo, vamos dizer assim, para o desenvolvimento econômico do país. E uma pergunta que eu acho interessante de se fazer, Senadores, é: por que o Brasil tem essa produtividade baixa? Ela é culpa exclusivamente do trabalhador? Uma vez que nós estamos falando de produtividade do trabalho. Fizeram-me essa pergunta recentemente e é interessante refletir como a comunicação é algo que a gente precisa trabalhar constantemente, a gente tem a percepção de que produtividade é um tema que todos conhecem, mas ela é difícil mesmo. E respondendo a minha pergunta: não, o trabalhador tem zero, ou muito próximo a zero, de contribuição para essa baixa produtividade. Na verdade, os grandes gargalos dessa baixa produtividade são fatores já conhecidos e estruturais da economia brasileira. Como bem foi colocado pelos professores, é déficit na infraestrutura, é complexidade regulatória, alta carga tributária, nível pífio da qualidade da educação no Brasil, baixo nível de intensidade tecnológica. Então, você percebe que não tem a ver necessariamente com o trabalhador, mas com fatores que acabam dificultando a atividade produtiva, o que ficou conhecido e o que é conhecido pela maior parte das pessoas como custo Brasil, que dificulta o nosso ambiente de negócio. |
| R | Então, voltando à frase que eu falei no início, se o objetivo for reduzir a jornada de trabalho sem que os impactos negativos superem em muito os eventuais benefícios que podem trazer - e, de fato, tem alguns benefícios -, é preciso atacar esses elementos estruturais da economia brasileira para que a produtividade comece a crescer e você permita minimizar os eventuais impactos negativos sobre a produtividade. Bom, e quais seriam esses impactos? Aqui na Fiemg, nós também fizemos um estudo e há uma série de limitações. É difícil você chegar a um número preciso, mas é nossa responsabilidade tentar dar clareza nas possíveis consequências econômicas. No caso, nós fizemos aqui dois cenários: uma redução da jornada de trabalho sem ganho de produtividade e um segundo cenário em que nós assumimos um ganho de produtividade de 1%. Como bem colocado pelo Prof. Fernando, ter ganho de 1% de produtividade do trabalho é muito difícil, é muito penoso, mas, mesmo assim, nós consideramos esse cenário mais otimista, imaginando que uma possível realocação da força de trabalho entre os setores dê esse ganho de eficiência - um cenário mais otimista. Bom, nós utilizamos aqui, como metodologia - não vou me aprofundar muito -, a matriz de insumo-produto/modelo de equilíbrio geral computável, que tem como base a matriz de insumo-produto do IBGE, de 2015. E o diferencial, talvez, dessa metodologia é que ela permite captar os efeitos em cadeia entre os setores da economia. Então, nós avaliamos que essa metodologia seria adequada para avaliar os impactos econômicos de uma eventual redução da jornada de trabalho. Bom, o efeito estimado, aqui sendo bem objetivo, sobre o PIB, num período de cinco a dez anos, para maturar esse efeito, seria uma queda no PIB de 16% no cenário I, que daria ali uma redução de média anual de 2% a 2,4% ao ano até completar o efeito nesse período de cinco a dez anos. E olhe que interessante: no segundo cenário, mesmo com um eventual ganho de produtividade, o efeito tende a ser muito intenso, algo em torno de 14%, o que daria ali uma redução de média anual, nesse período de cinco a dez anos, de 1,8%, 2% ao ano. Resumindo, para finalizar a minha fala, que eu acho que está muito em linha com o que foi colocado pelo Prof. Pastore e pelo Prof. Fernando, se o objetivo for reduzir a jornada de trabalho sem efetivamente gerar um custo muito maior do que o eventual benefício não tem outro caminho, é preciso avançar com a produtividade - e isso, de fato, é muito difícil. Há aí um longo caminho para nós avançarmos na nossa produtividade. Bom, basicamente era isso. Fui bem objetivo na apresentação e fico à disposição para qualquer esclarecimento, qualquer dúvida. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Muito obrigado digo eu e o plenário todo aqui. O Brasil agradece a participação de representantes do setor econômico e dos trabalhadores, porque, na verdade, todos estão na busca da construção de uma proposta que seja viável para o país. Eu volto a chamar, se ela já estiver habilitada, a Deputada Erika Hilton. (Pausa.) Então, de imediato, passamos a palavra para o Sr. Clemente Ganz Lúcio, Coordenador do Fórum das Centrais Sindicais. (Palmas.) Nós temos quatro Senadores inscritos. O primeiro é o Senador Rogerio Marinho. E aí, a partir do momento em que esses últimas três falam... |
| R | (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Como? (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Manterá, prometo. Prometo que terá. Que ele fique aqui, hein! Faço questão que o senhor esteja presente, sabe disso. Sempre é um bom debatedor, um debate equilibrado e de alto nível, assim como está aqui o Jaques Wagner também, que vai na mesma linha do bom debatedor, de um debate no mais alto nível. De imediato, Clemente Ganz Lúcio, Coordenador do Fórum das Centrais Sindicais. Terá o mesmo tempo que tiveram os que o antecederam. O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO (Para expor.) - Bom, bom dia. Bom dia a todos e a todas. Agradeço, em nome das centrais sindicais, o convite feito por esta Comissão, na pessoa do Senador Paim, para estar aqui fazendo este debate. Segundo, saúdo os que me antecederam, o Pio, o Pastore e o Fernando, pela exposição que fizeram, pelos números e pela reflexão que aportaram, e saúdo a iniciativa e o relatório do Senador Rogerio sobre a redução da jornada de trabalho. É bom nós começarmos essa reflexão neste momento, 37 anos depois de que, nesse mesmo Congresso... O Senador Paim já estava aqui, foi um dos responsáveis. Eu estava no Dieese, no Paraná, na época, Senador, e fazíamos todo um trabalho, debatendo a redução da jornada de trabalho, naquela época, para 40 horas. Mas é bom sempre lembrar que, naquela Constituinte, não só a redução da jornada de trabalho, mas férias, contribuição para o INSS, bom, vários direitos sociais foram incorporados naquela oportunidade. E, mediado por esse conjunto de mudanças normativas do ponto de vista trabalhista, acordou-se uma redução de 48 para 44 horas. Naquela época, a quase certeza, como disse o Pastore, também se fez presente no debate. O Senador Paim deve lembrar que havia quase certeza de que tudo iria ladeira abaixo, se o país aprovasse aqueles direitos e a redução da jornada de trabalho. A inflação cresceria, o desemprego aumentaria, a informalidade se expandiria, a inflação teria uma pressão grande, as proteções provavelmente seriam inviabilizadas e o país entraria em uma trajetória de crises sem precedente. Mas nós não fomos inovadores nesse momento, Paim, porque, em 1926, Henry Ford apresentou, nos Estados Unidos, a proposta de uma escala de trabalho de 5x2, e ele foi atacado por representações empresariais, dizendo que aquilo era um absurdo, apesar de ele ser um empresário, e um empresário que estava em uma atividade produtiva importante. Centros de produção de conhecimento produziram informações e quase certezas sobre o fracasso que essa medida teria. Bom, nós conhecemos a história, e conhecemos a história de sucesso desse empresário, que transformou essa escala de trabalho em uma escala padrão, e na sequência de um processo político nos Estados Unidos, em 1938, Roosevelt reduz a jornada para 44 horas e, dois anos depois, para 40 horas. Não há nenhum registro, na história econômica, de que houve um fracasso, nos Estados Unidos, dessas medidas. Pelo contrário. Henry Ford tem uma produtividade elevada porque ele diz: "Olha, o que eu vou receber de retorno são trabalhadores satisfeitos, em condições, para trabalhar, adequadas; vou ter tempo disponível para usar o carro que eu produzo, tempo para consumir, tempo para viver. Isso vai melhorar a produtividade, combinada com a tecnologia, com o investimento e assim por diante". |
| R | A primeira coisa que acho que nós temos que organizar neste debate, para fazer o debate adequado, é colocar o debate da produtividade no seu devido lugar. Produtividade é um resultado que combina investimento, inovação, incremento de tecnologia, inovação de produto, inovação de processo de trabalho, reorganização da atividade econômica e formação profissional - qualificação -, e trabalhador e trabalhadora em condições adequadas de presença no mundo do trabalho. A chamada produtividade marginal do trabalho está associada às condições com que o trabalhador chega no processo de trabalho e pode trabalhar uma hora a mais. O que os estudos mostram é que, neste caso, a tecnologia tem alterado significativamente a intensidade do trabalho e a condição de trabalho e de presença de trabalhadoras e trabalhadores, o que está indicando que é muito salutar, do ponto de vista da condição de trabalho, que nós tenhamos uma redução da carga do horário, dado que a tecnologia está intensificando cada hora de trabalho. Mas isso é uma discussão importante do ponto de vista da saúde e da condição de trabalho hoje. O que acho importante nós observarmos é que as quase certezas desses números apresentados anteriormente podem ser referenciadas não em hipóteses, mas na verificação da história econômica real: o que acontece após Henry Ford reduzir para 5x2 e se os fracassos que foram identificados naquele momento se confirmaram ou se as quase certezas se mostraram mentiras do ponto de vista da história real, ou seja, a economia naquele contexto cresceu, os empregos cresceram, a formalidade cresceu e assim por diante. Em 1988, nós poderíamos fazer a mesma pergunta. Portanto, nós não estamos fazendo no Brasil uma iniciativa, Senador, que é inovadora do ponto de vista da sua origem. Ela é inovadora porque ela coloca este debate neste momento. E a pergunta é: é pertinente? É pertinente a gente debater a redução de 44 para 40, de 40 para 36, como propõe o projeto, em etapas? Está no momento de fazer isso, 37 anos depois? Bom, a hipótese levantada é "isso vai nos levar ao fracasso". Essas hipóteses, apresentadas até então, foram também apresentadas em 1988. E, se nós formos verificar qual é o resultado, em 1988, trazido com a redução de 48 para 44 e mais uma série de benefícios que aumentaram o custo... Por exemplo, nove pontos percentuais no custo da forma de pagamento direto - nove pontos percentuais. Nós estamos falando em 14, a redução. Nós lá não aumentamos nove só nos encargos; havia mais a licença-maternidade, mais as férias, mais... Nós aumentamos o custo. Bom, era para nós termos feito, em 1988, Senador, uma destruição total da economia por expandir os direitos trabalhistas e sociais da forma que nós expandimos. |
| R | Tem vários estudos que tentam mensurar esse tipo de impacto. Eu fui pegar um estudo de economistas, que não é do campo da esquerda, do nosso campo, porque eu trabalhava no Dieese. No Dieese fizemos vários estudos, não vou trazer os estudos do Dieese, que são clássicos. Eu fui pegar um estudo do Naércio, do José Márcio Camargo e do Gustavo, que são economistas - vamos chamar de liberais - que foram mensurar qual foi o impacto sobre o emprego, sobre o salário, sobre a formalidade, sobre a economia, que é o estudo que eles fazem, olhando 1987, 1988, 1989, 1990, sobre qual é o percurso da economia brasileira pós-Constituição de 1988. As hipóteses a levantar naquele momento se verificaram? O resultado deles é que não, o que se verificou, pós-1988, foi que houve uma efetiva redução da jornada de trabalho para 44 horas; o desemprego não cresceu, pelo contrário, no grupo de pessoas que teve a redução da jornada de trabalho, a taxa de desemprego foi menor do que no grupo que não teve. Portanto, não houve um impacto sobre o desemprego, pelo contrário, houve uma leve queda na incidência do desemprego. Daqueles que estavam ocupados, naquele momento, considerando a rotatividade, a informalidade e toda a dinâmica perversa do nosso mundo do trabalho, quantos continuaram ocupados pós-implementação? Sessenta por cento continuaram ocupados, com toda a rotatividade que nós temos. Um a cada dois trabalhadores na construção civil perde o emprego ao longo de um ano. (Soa a campainha.) O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Em dois anos, 100% da força de trabalho roda no setor da construção civil. Oportunidade sem fim para fazer o ajuste para baixo do custo do trabalho. Qual é o dado que a pesquisa também... que a análise que eles fazem revela? Houve uma leve queda na remuneração média dos trabalhadores, e vou verificar por quê. Porque, fundamentalmente, houve uma maior aceleração da inflação, não foi decorrente da redução da jornada de trabalho. Então, a conclusão que eles trazem é: a redução - isso é o texto dele, é a frase que eles fazem em final do estudo que eles analisam essa consequência - da jornada de trabalho, em 1988, não teve os efeitos negativos sobre empregos, salários e informalidade. Isso é a verificação econômica de um fato real. Por que aquela tragédia anunciada não aconteceu? Por que a tragédia anunciada para Henry Ford, lá em 1926, não aconteceu nos Estados Unidos? Por que a gente diz que a Alemanha trabalha 48 horas, quando, na prática, ela tem uma jornada média de 33 horas? Porque nós estamos comparando coisas totalmente diferentes. Em 1988, como provavelmente acontecerá agora... E acho que seria muito interessante, Senador, se nós convidássemos os empresários para virem aqui relatar como é que eles fizeram a reorganização do sistema produtivo em 1988, para nenhum deles quebrar, porque nenhum deles quebrou, porque a redução caiu. E, efetivamente, eles absorveram 48 para 44, e fizeram de alguma forma. Eu gostaria que eles viessem explicar para nós como é que eles fazem. O que os estudos mostram é, há um processo de adaptação das empresas, sem dúvida, e cada uma delas faz de um jeito e de um jeito criativo. Portanto, a redução incentiva as empresas a serem criativas em reorganizar o processo produtivo: reorganizam o processo de trabalho e, muitas vezes, fazem investimentos que não faziam, em formação, qualificação e tecnologia, para melhorar a produtividade. Melhora por quê? Porque tem mais máquina, mais tecnologia, reorganiza o processo de trabalho e investe em formação profissional. |
| R | Há, de outro lado, um efeito positivo da redução da jornada de trabalho que também não é considerado do ponto de vista do agregado econômico: menos tempo no posto de trabalho e mais tempo livre têm um efeito muito dinâmico sobre a economia, do ponto de vista de aumentar a demanda agregada. Se eu tenho mais quatro horas por semana livre, isso significa que esse tempo livre vai ser dedicado a alguma coisa que tenha efeito sobre demanda: ou vou ao cinema, ou vou jogar futebol, ou vou comprar um livro, ou vou ao bar tomar uma cerveja - não importa. Mas esse tempo livre... Era o que Henry Ford dizia em 1926: quando eu libero tempo de trabalho, não é só o tempo que eu ganho, do ponto de vista da qualidade no local de trabalho, mas esse tempo livre vai resultar em um aumento da demanda na economia, e eu vou vender mais carro, vou ter mais empregos, vou ter mais lucro e vou ter mais salário. Ou seja, é essa dinâmica que a redução da jornada de trabalho propicia para que nós consigamos fazer esse ajuste acontecer em dinâmicas que favoreçam a redução da jornada de trabalho. A pergunta é: o Brasil está no momento de fazer essa redução? Os fatores que podem impulsionar a produtividade estão sendo empurrados? Acho que nós retomamos vários desses fatores que nos permitem incrementar a produtividade. Mas aí é um debate sobre qual é a estratégia de crescimento econômico e de produtividade. E eu vou dar um exemplo, porque acho que a gente consegue caracterizar melhor quando a gente olha para um exemplo concreto: nós estamos num enorme embate sobre as tarifas, o tarifaço imposto ao Brasil. E há todo um trabalho feito pelo Congresso, pelo Governo, pelos empresários em recolocar essa relação da tarifa com os Estados Unidos em outro patamar. A assessoria empresarial nos Estados Unidos desenvolveu um argumento que foi capa de página, Senador Jaques, do Valor Econômico, dizendo: pedimos ao Governo americano que elimine a tarifa sobre o café importado do Brasil. Por quê? Porque cada dólar de café que nós importamos do Brasil - e nós produzimos o café - nós transformamos aqui nos Estados Unidos em US$43. Isso é produtividade. A pergunta que nós temos que nos fazer, Senador, é: por que esses US$43 não são agregados de valor aqui? Eu acho que nós estamos, finalmente, retomando a possibilidade de agregar esse valor aqui, se tivermos política industrial, investimentos em ciência e tecnologia, crédito, taxa de juros decente. Bom, um conjunto de vetores que estão sendo impulsionados para quê? Para que nós tenhamos uma economia capaz de agregar valor. E a agregação de valor é a combinação entre o produto e a nossa capacidade de produzir tecnologia, ciência, inovação, trabalho, formação, e assim por diante. A pergunta é: a redução da jornada de trabalho nos permite impulsionar a produtividade? A história econômica nos diz que sim. Se nós temos, simultaneamente, um projeto de país que faz o desenvolvimento econômico - investimento, crédito, produção e assim por diante - se mobilizar do ponto de vista de uma produção econômica, que é a vocação do país - e nós estamos discutindo missões, projetos, fronteiras, fazendo, portanto, o processo de desenvolvimento -, a redução da jornada de trabalho pode ser um grande fator mobilizador de uma condição adequada para o incremento da produtividade. |
| R | Há um trabalho recente de um economista português que fez um pós-doutorado na Inglaterra e é professor em universidades na Inglaterra, olhando o impacto do que ele propõe à escala 4x3, Rick, neste livrinho: Sexta-feira é o Novo Sábado. O que é importante nesse trabalho que ele faz, que é recente? Ele procura olhar, ao longo da história, qual é o impacto da redução da jornada de trabalho nas economias e como os grandes pensadores, os grandes economistas... O orientador dele era um Nobel de Economia. Por exemplo, ele pega 30 grandes economistas e tenta olhar como é que esses economistas olhavam a redução da jornada de trabalho. E ele vai trazer oito argumentos estruturantes para dizer: "Olha, a redução da jornada de trabalho, historicamente, por aquilo que a gente verificou ao longo da trajetória econômica, tem um impacto muito importante no estímulo à economia via demanda, no aumento da produtividade, no desencadeamento de inovações e, principalmente, no tempo livre. O que ele estuda nos vários estudos que ele resgata é: as pessoas com tempo livre começam a inventar - não só inventar coisas para produzir, mas inventar melhores formas de viver. Uma das coisas que têm que ser reinventadas no Brasil é a partilha entre homens e mulheres no cuidado da família. (Palmas.) Mais tempo livre significa que nós teremos, provavelmente, famílias mais equilibradas do ponto de vista da distribuição da responsabilidade familiar. Isso tem um impacto positivo sobre a oferta de mão de obra. Nós temos, no Brasil, mais ou menos, 18 milhões de mulheres que poderiam estar no mercado de trabalho, e muitas delas não estão porque têm a responsabilidade familiar como principal atributo. Nós temos outros 18 milhões de pessoas que estão no subemprego. Quando a gente fala que a nossa jornada média é de 39 horas, não é porque, em média, nós trabalhamos 39 horas cada um de nós; é porque tem alguns que trabalham 48; a grande maioria, 33 milhões de celetistas, 44; e uma massa enorme de trabalhadores trabalham quatro horas por dia, três horas por dia, duas horas por dia, seis horas por semana, e assim por diante. E quando se pergunta para essas pessoas, grande parte delas diz: "Eu gostaria de trabalhar a jornada integral, porque eu preciso de uma remuneração de tempo integral". Então, a nossa jornada média baixa parece ser uma jornada média baixa perversa, decorrente de uma baixa organização do processo produtivo, de empregos precários, de baixa qualidade, e assim por diante. No Brasil, hoje, nós temos 33 milhões de pessoas celetistas que trabalham 44 horas por semana. Se nós somarmos aqueles que trabalham acima disso, dá quase 35 milhões de pessoas. Portanto, é esse contingente que essa legislação vai atingir. E se nós olharmos a característica do nosso mercado de trabalho, nós vamos ver que temos uma outra quantidade de força de trabalho na economia informal. E qual é a característica dessa economia informal? É que ela se referencia na economia real. Em pesquisa que nós já fizemos - e fazemos -, perguntamos aos trabalhadores e trabalhadoras do Brasil todo com mais de 14 anos na força ativa ou inativa: se você trabalha na economia informal, que direitos você tem? |
| R | Acima de 60% dos trabalhadores da economia informal respondem que têm décimo terceiro salário - a economia informal paga décimo terceiro salário -, têm férias, têm jornada de trabalho de 44 horas e têm benefícios, como, por exemplo, o afastamento por direito de maternidade, que às vezes é garantido na economia informal. Essa é a nossa economia real. Portanto, provavelmente, uma redução para 40 horas ou para 36 horas de forma gradativa terá também um efeito sobre a economia chamada informal. Ela será cada vez mais formal - nós vemos isso na dinâmica econômica, na medida em que o crescimento econômico se consolida com uma estratégia de médio e longo prazos. (Soa a campainha.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Um minuto. O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Por fim, além de olharmos para o passado e havermos a oportunidade, eu queria destacar, meu Senador, um olhar sobre o futuro: por que a redução de jornada de trabalho olhando o futuro é fundamental? Primeiro, nós precisamos considerar que a mudança tecnológica é uma mudança disruptiva. Estamos em processo de mudança tecnológica radical, com o impacto em todos os setores e com o impacto sobre a produtividade, o que ninguém consegue estimar. Todos sabem que será grande, todos sabem que será intenso, todos sabem que será permanente, de longo prazo, mas ninguém sabe exatamente qual é a extensão dela. Essa tecnologia aumenta a intensidade do trabalho e aumenta o ritmo de trabalho. Seja pela produtividade, seja pela saúde, é oportuno que nós pensemos uma redução da jornada de trabalho. Segundo, nós estamos no processo, infelizmente, de uma emergência ambiental em que nós não deveríamos estar, mas estamos. E o efeito dessa emergência ambiental sobre o mundo do trabalho é dramático. As pessoas precisarão ter tempo para se reorganizarem na vida, organizarem o enfrentamento da crise, organizarem uma forma de se relacionarem no dia a dia. (Soa a campainha.) O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Portanto, a emergência climática exigirá das pessoas tempo livre para se reorganizarem do ponto de vista da vida em sociedade. Terceiro, nós estamos numa mudança demográfica radical. Caminhamos para uma sociedade que terá uma expectativa de vida nas próximas décadas se aproximando de cem anos. Isso significa que as pessoas vão ter que trabalhar muito mais tempo. Os estudos mostram que um aposentado que larga tudo, adoece mais rápido e morre mais rápido que alguém que continua tendo vida produtiva, e laboral, e comunitária de algum jeito. Nós vamos ter que reorganizar os processos de trabalho, escalas de trabalho, para trabalharmos menos ao longo do dia e mais ao longo da vida, e trabalharmos bem, e trabalharmos de forma colaborativa. A mudança geopolítica e produtiva coloca desafios do ponto de vista do incremento da nossa capacidade econômica monumental, e, portanto, nós temos que ter capacidade de atrair a força de trabalho fora do mercado de trabalho para o mercado de trabalho. Para atrair as mulheres para o mercado de trabalho, a redução do jornal de trabalho é um elemento essencial - essencial. (Soa a campainha.) O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Por fim, as experiências também mostram que a democracia se fortalece quando nós temos pessoas em condições de terem presença na vida pública e comunitária de forma mais permanente. E o último elemento é que muito se tem usado do ponto de vista do argumento de que nós temos que jogar a redução de jornada de trabalho para a negociação coletiva. Sim, nós defendemos, no movimento sindical, que nós temos que ter a jornada de trabalho como um elemento essencial da negociação, inclusive a regulação das escalas, Rick. Agora, é bom que a gente tenha muito claro: quando nós estamos falando de uma Alemanha, de uma União Europeia, nós estamos falando de um conjunto de países, de 27 países que têm uma cobertura sindical e da negociação coletiva de 80% da força de trabalho, 80% da força de trabalho está protegida por acordos coletivos. |
| R | Vamos olhar para o Brasil. No Brasil, a cobertura sindical da força de trabalho assalariada, que é metade da força de trabalho, metade já está excluída, é da ordem de mais ou menos 60%. Quando nós olhamos a cobertura das contratações coletivas, olhando para a força de trabalho total, os 100 milhões de trabalhadores, nós vamos falar que mais ou menos 25 a 30 milhões têm cobertura sindical com contratação coletiva. (Soa a campainha.) O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Nós queremos expandir para que os 100 milhões tenham cobertura sindical, mas nós não podemos comparar que nós teremos a mesma força na negociação que a União Europeia tem. E, terceiro, nós temos que considerar que o processo de negociação coletiva é resultado da força dos trabalhadores, da força dos empresários e do marco regulatório. É bom que a gente lembre que, em 2017, nós retiramos o poder de negociação dos sindicatos, do ponto de vista da jornada de trabalho, colocando uma série de dimensões da jornada de trabalho para a negociação individual, não para a negociação coletiva. Várias iniciativas, eu não vou aqui relacionar porque não tenho tempo, mas são várias iniciativas que retiram a jornada de trabalho como elemento central da negociação coletiva. Então, mesmo... E nós consideramos essencial que a negociação coletiva seja fortalecida, mas nesse quesito, inclusive, Senador, seria necessário que nós recolocássemos para a agenda da negociação coletiva por lei várias dimensões da jornada de trabalho que foram retiradas na lei. E, talvez fosse muito interessante... Outro dia, participava de um debate e o Prof. Helio Zylberstajn dizia: "Clemente, talvez nós devêssemos propor ao Congresso que tornasse obrigatório, nas negociações coletivas, o tratamento da jornada de trabalho". Eu disse: "Helio, pode ser uma proposta interessante: que a legislação diga que jornada de trabalho e escala de trabalho são temas permanentes da negociação coletiva". Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Muito bem, Sr. Clemente Ganz Lúcio, Coordenador do Fórum das Centrais Sindicais. (Manifestação da plateia.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Vamos em frente. O SR. ROGERIO MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RN. Pela ordem.) - Sr. Presidente, eu peço uma gentileza a V. Exa. Ainda existem dois debatedores, não é isso? O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Isso. O SR. ROGERIO MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RN) - Dez minutos cada um? O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Dez minutos ou até quinze, se necessário for. O SR. ROGERIO MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RN) - Eu pediria o seguinte, que no intervalo do subsequente me fosse permitida a fala, porque eu tenho uma outra Comissão... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Está garantida. Está garantida. O SR. ROGERIO MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RN) - Eu gostaria de falar um pouco. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Sem problema, sem problema. V. Exa. usa a palavra logo depois de um pequeno vídeo de quatro minutos que a Deputada Erika Hilton tinha deixado. Ela tentou entrar ao vivo, não conseguiu. Então, eu peço que a gente passe o vídeo de quatro minutos da Deputada Erika Hilton, autora de uma das propostas de redução da jornada. A SRA. ERIKA HILTON (Bloco/PSOL - SP. Para expor. Por vídeo.) - Senador Paulo Paim, Rick Azevedo, demais pessoas que aí estão. Tentei entrar online, estava falando quando o senhor me chamou, mas eu acho que, por alguma falha de comunicação tecnológica, os senhores não me escutavam. Faço, então, este vídeo para demarcar a importância da audiência de hoje no Senado Federal, a importância da leitura do voto do Relator na semana passada com relação à proposta do Senador Paulo Paim e a necessidade de que esses movimentos nos fortaleçam, para destravarmos os nossos embates na Câmara. |
| R | Eu sei que há muitos números que são colocados, de maneira muitas vezes até alarmante, para defender que é impossível avançarmos pela legislação com o enfrentamento à 6x1, que é preciso fazer isso via negociação, etc., sem levar em consideração as transformações do mundo do trabalho, a relação do mundo do trabalho, o quanto o trabalho foi precarizado, modernizado, alterado. Usam números como, por exemplo, a redução do PIB em números que nem mesmo a pandemia com o lockdown foi capaz de promover. Óbvio que nós sabemos que o processo tem que ser de transição, que há impacto na economia e que é preciso fazer isso com calma e com responsabilidade. Com o que nós estamos preocupados, batalhando incansavelmente, é que nenhuma economia ou nenhum número da economia despreze a vida, a dignidade, o descanso e a qualidade de vida do trabalhador brasileiro. A economia e a vida das pessoas precisam caminhar alinhadas. Este é o nosso propósito quando defendemos a redução da jornada de trabalho no nosso país a partir de uma legislação, porque, sim, nós sabemos que se deixarmos isso para as negociações, nem sempre será possível, nem sempre há um trabalho onde essas negociações são aplicáveis. Por isso nós estamos ouvindo um clamor que é popular, por isso nós estamos ouvindo um clamor das ruas e das pessoas que estão angustiadas. Por onde nós passamos, nos quatro cantos do Brasil, nos perguntam: "Deputada, quando é que nós teremos a redução da jornada de trabalho?". "Deputada, eu quero conviver com a minha família, eu quero ver o meu filho." Nós sabemos hoje, por exemplo, que a inflação não está ligada ao custo de mão de obra do trabalhador, os números da inflação não estão relacionados ao trabalhador, à escala do trabalhador. É preciso fazermos, sim, com seriedade, com responsabilidade, com compromisso econômico essa discussão, mas temos convicção - e cada vez mais, ouvindo especialistas, economistas, setores do Brasil, inclusive setores que já estão fazendo essa adaptação, antes mesmo da legislação, porque entenderam a importância e se sentem pressionados por essa discussão - de que temos maturidade econômica para fazermos este debate, que é possível, sim, avançar e que traremos, inclusive, benefícios aos cofres públicos. Quando nós olhamos, por exemplo, para questões previdenciárias, para o INSS, os números exorbitantes gastos em questões de adoecimento do trabalho por conta da saúde emocional, são bilhões de reais que voltam aos cofres públicos. A sociedade brasileira, a classe trabalhadora brasileira está esgotada, exaurida, cansada, sem perspectiva de vida e de futuro, está vendo o trabalho consumir a sua dignidade, a sua vida, e isso não pode ser desprezado, isso não pode ser diminuído, não pode ser secundarizado. É preciso colocar todos os números na mesa e atuar com responsabilidade, mas é preciso colocar a vida, é preciso colocar o ser humano, porque também importam para a economia. Sem as pessoas, a economia não é movimentada. Nós estamos cada vez mais buscando estudos, entendendo quantos novos postos de trabalhos poderão ser abertos com organizações sérias que produzem essa discussão. Estamos entendendo que este debate de destruir a economia, de que o Brasil não suporta, etc., etc., etc., não é um debate que pare em pé e por isso estamos ouvindo a todos. Não estamos fazendo essa discussão de portas fechadas, porque queremos ouvir a todos, queremos concluir essa discussão, queremos aprovar na Câmara dos Deputados, aprovar no Senado Federal uma nova legislação que dê ao trabalhador vida além do trabalho, como nos provoca o Movimento VAT, liderado pela nossa liderança, que aí está, Rick Azevedo. Espero poder contribuir e seguir contribuindo com essa discussão. |
| R | Estamos juntos! Obrigada, Senador Paulo Paim, por promover esta audiência pública. O relatório do Senador Rogério está impecável e excelente e nós seguiremos na batalha. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Muito bem. Essa foi a Deputada Erika Hilton, Deputada Federal, que tem uma proposta praticamente idêntica ou muito parecida com essa que está em debate, que é o 148, de 2015. De imediato, passo a palavra... Quero que todos entendam que Senadores e Senadoras pedem a palavra no momento que eles entenderem mais adequado. E assim o fez, com muita elegância, o Senador Rogerio Marinho, a quem eu passo a palavra neste momento. O SR. ROGERIO MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RN. Pela ordem.) - Agradeço a V. Exa. e peço vênia aos palestrantes. Esta audiência pública, inclusive, foi fruto de um debate que tivemos aqui há duas ou três semanas, e eu não gostaria de simplesmente assistir o debate sem dar uma opinião a respeito, para que as pessoas possam ter, inclusive, um contraponto. Saúdo todos aqui, todos os presentes, em especial os nossos convidados, que estão aqui pessoalmente e os que estão virtualmente, a Deputada Erika Hilton, o Sr. Pastore, o Fernando de Holanda, o João Gabriel e aqueles que aqui vieram - desculpem-me aqui, eu tenho que tirar os óculos para ver -, o Clemente, o Henrique e a Sra. Cirlene. Muito obrigado, Sr. Senador. Este debate é extremamente importante, porque não se trata apenas de um projeto de lei. O projeto de lei, quando ele é implementado, tem consequências e esse tem uma consequência muito forte, porque ele atinge diretamente aproximadamente 20 milhões de cidadãos brasileiros que hoje têm uma jornada de 44 horas semanais. Nós temos, hoje, 41 ou 42 milhões de brasileiros com carteira assinada e metade deles tem uma jornada de 44 horas nos diferentes ramos da nossa economia, nos setores da nossa economia. Nós temos aqui, como brasileiros, uma tentação de tentarmos mudar a economia por caneta, por uma ação legislativa, e não necessariamente por uma ação de sociedade. Eu participei, com muita ênfase, de um debate aqui em 2016 a 2018, que foi a mudança na estrutura trabalhista do país e, naquela oportunidade, um dos temas que não foi debatido, apesar de ter sido tangenciado, foi a unicidade sindical. Eu tenho visto e tenho ouvido muitas centrais importantes defenderem o fim dessa unicidade e eu diria até a liberdade sindical no seu sentido mais amplo. Quando eu escuto aqui comparações com países europeus, é bom lembrar que, nesses países, o sistema sindical não é o nosso. Lá, na grande maioria deles, não tem a unicidade sindical, que me parece mais uma jabuticaba brasileira. Nós temos hoje uma PEA (população economicamente ativa) que chega a quase 110 milhões de brasileiros, se eu não estou enganado, e a gente está falando de 40 milhões ou um pouco mais - vou dar uma aproximada nos dados -, ou seja, pouco menos de 40% dessa população é empregada no regime do CLT. Um regime que tem mais de 80 anos, que, mesmo com as modernizações foi tratado, foi pensado para um modelo de trabalhador que não é o que a sociedade nos apresenta hoje. E tanto isso é verdade que boa parte daqueles que estão ingressando no mercado de trabalho, e as pesquisas mostram isso, não querem ser celetistas. Eles querem ser empreendedores, que é uma palavra que os partidos políticos têm dificuldade de entender, porque diz respeito à liberdade, diz respeito à flexibilidade, diz respeito a poder prover, gerir, tomar conta do seu tempo e não ter uma subordinação muito direta, muito específica. Essa maneabilidade que o cidadão brasileiro que ingressa hoje no mercado de trabalho procura não tem muita aderência com o modelo que nós apresentamos. E os sindicatos, de uma forma geral, pretendem que a CLT seja ampliada para o conjunto dos trabalhadores brasileiros. |
| R | Uma coisa são os direitos, e os direitos precisam ser exercidos na sua plenitude. Todo cidadão brasileiro tem que ter direito a uma jornada de trabalho; a um descanso semanal remunerado; se houver necessidade, a uma licença gestante; a uma garantia previdenciária, que o próprio sistema está se encarregando de destruir, porque fizemos uma mudança no nosso sistema previdenciário, há três, quatro anos, em que os índices demonstrados pelo Governo atual mostram que isso foi corroído de uma forma geométrica e com uma rapidez nunca vista, graças às ações que o Governo tomou. Nós estamos com um déficit estratosférico. E, quando a gente fala de redução de jornada de trabalho com manutenção de salário, essa é uma equação em que nós temos que nos debruçar. É evidente que as empresas vão se adaptar, é claro que sim. O ser humano se adapta ao deserto. O ser humano se adapta ao gelo extremo. O ser humano se adapta a perder um membro. O ser humano se adapta a qualquer coisa. Nós somos seres adaptáveis. Nós somos seres que povoamos o mundo, que passamos por intempéries, por guerras mundiais, por problemas pandêmicos que nos jogaram para trás e para a frente, para quedas de civilização - é evidente. Agora, qual o preço dessa adaptação? De que forma a sociedade vai reagir? Qual vai ser o custo dessa adaptação? No mundo inteiro, isso ocorre com o aumento da produtividade. Eu vi aqui um exemplo sobre Henry Ford. Ora, Henry Ford foi um setor específico da indústria americana que privilegiou a automação, que diminuiu o número de trabalhadores para ter um ganho maior na produtividade. Não sei se é esse o efeito que nós queremos. Diminuir empregos ou o número de empregos que vão ser oferecidos à sociedade? Crescimento econômico é um fator também que necessariamente impacta a diminuição da jornada de trabalho, capacitação, qualificação da mão de obra, melhoria da educação... E nós estamos vendo que o Brasil, infelizmente, quando se compara a outros países do mundo, tem a sua proficiência sofrível, porque aqui no Brasil vários estados instituíram o que nós chamamos de progressão automática, para mascarar os números do Ideb. Então, um dos fatores que define o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) é o número de pessoas que passam de ano. Ora, se você faz a progressão automática, é evidente que esse número está mascarado, ele não expressa a realidade da proficiência, da qualificação daquele aluno, se ele de fato absorveu ou não aquele conhecimento. |
| R | E, vejam, nós temos no Brasil um elemento, que aqui foi contextualizado, chamado livre negociação. O que existe no Brasil não é uma vedação para que haja uma jornada de 5x2 ou 4x3, não há vedação, não há proibição expressa; há a possibilidade real... E está concretamente demonstrado que, se temos 41 milhões de brasileiros com carteira assinada, 22 milhões têm uma jornada de trabalho menor do que 44 horas. Há a negociação coletiva, caso a caso, que privilegia e fortalece inclusive a ação dos sindicatos. Há um rol exaustivo do que pode e do que não pode ser negociado; e, entre esses itens, estabelecida a vedação de que não se podem extrapolar as 44 horas semanais, você tem o teto, quem pode mais pode menos. Então o que nós estamos discutindo aqui é retirar esse teto, baixar esse sarrafo e colocar uma espécie de moldura ou de forma na economia brasileira, e que a indústria e a economia se adaptem a isso, porque historicamente nós tivemos exemplo de que isso ocorreu no passado recente, como em 1988. Em 1988, quase como via de consequência a uma inflação extraordinária, a um desarranjo econômico, houve a abertura da economia e, subsequentemente, o Plano Real, com que todos nós concordamos hoje, mesmo que na época tivéssemos votado contrariamente - eu falo do Partido dos Trabalhadores -, que foi uma rearrumação na nossa economia que nos deu estabilidade, que nos deu possibilidade de andar de uma forma diferente. E, neste mundo que estamos vivendo, em que há uma competitividade exacerbada com outros países do mundo, em que há novas formas de empregabilidade, desde a questão dos aplicativos até esse novo mundo que é a inteligência artificial, em que o home office, que aliás foi convalidado por ocasião da reforma trabalhista, porque existia nos órgãos do Judiciário, mas não estava regulamentado no mundo das relações do trabalho de uma forma geral, e que, por ocasião da pandemia, passou a ser quase uma unanimidade, você trabalhar na sua residência... E nós estamos tratando agora de que forma esse trabalho pode ser definido, ele pode ser determinado, ele pode ser supervisionado sem que haja intrusão, mas ao mesmo tempo se resguardando direitos, inclusive relacionados à questão da saúde do trabalhador que exerce essa atividade. Então, dada essa contextualização, eu acredito que é, sim, necessário termos debates como esse. Eminente Senador Paulo Paim, Senador Rogério, que é o Relator, Senador Contarato, que nos observa atentamente, como sempre, que é um Senador que tem muita sensibilidade em temas dessa natureza, eu tive o cuidado de recolher aqui as apresentações e vou recolher as apresentações... (Soa a campainha.) O SR. ROGERIO MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RN) - ... que os senhores farão de forma subsequente, porque eu tenho uma característica de tentar me debruçar sobre um tema com fatos, com dados, com objetividade. Eu não sou contra por ser contra, nem sou a favor por ser a favor. Eu acho que esse tema é um tema que impacta tanto e de forma tão extraordinária o nosso país que seria leviano e açodado apenas entoarmos uma palavra de ordem e acharmos que isso por si só vai equacionar o problema. Tem que se colocar numa planilha, numa mesa de negociação, os prós e contras, e se fazer cenários e se rodar modelos e se avaliar se, de fato, o que nós estamos propondo vai ser eficaz para nós e para os nossos descendentes. Isso é um legado para o nosso futuro. |
| R | Então, não estou aqui, eminente Senador Paulo Paim, fechando portas, mas estou fazendo a minha parte de proferir um alerta de que existem exemplos, como foi proferido pelo Sr. Clemente, pelos que me antecederam, em vários lugares do mundo, para o bem e para o mal e que existem fatores que têm que ser observados, até porque a conjuntura econômica que nós passamos hoje... Se, por um lado, o Governo comemora uma melhoria no mercado de trabalho, por outro lado, nós temos a maior taxa de juros do mundo - perdemos para a Turquia -, e é o mesmo Governo; se, por um lado, nós comemoramos o fato de que nós temos um número recorde de pessoas que hoje recebem recursos de projetos sociais do Governo - estimam-se mais de 90 milhões de pessoas -, por outro lado, nós tivemos um aporte de mais de 27 novos impostos, em pouco mais de dois anos e dez meses. Então, que modelo de país nós queremos? De que forma nós vamos trabalhar, para que, no futuro, os nossos filhos - e eu tenho quatro filhos - se insiram nesse mercado de trabalho e tenham a tranquilidade e a capacidade e a condição de proverem as suas famílias e imaginarem um futuro para elas? Então, eu tenho muito receio de palavras de ordem, mas eu tenho, assim, um respeito muito grande a dados, a números e a comparações empíricas, em função não apenas da realidade de outros países, mas, sobretudo, da realidade do nosso país - mas é evidente que nós podemos trazer essas experiências para cotejar com o nosso. Então, agradeço a oportunidade. Peço vênia aos palestrantes, por ter interferido um pouco aqui, na ordem dos trabalhos, mas, como expliquei ao Senador Paulo Paim, eu pertenço aqui a oito Comissões diferentes, e está havendo uma votação e uma discussão na Comissão de Segurança Pública. Desejo boa sorte e vou participar, efetivamente, desse debate. Agradeço. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Muito bem, Senador Rogerio Marinho. Deixou claro o seu ponto de vista. Achei interessante que ele coloca que não é contra o debate nem a proposta, mas tem que aprofundar, e vamos aprofundar. Essa é a intenção desta Comissão, sei que é a do Relator e também a da Casa. Eu passo a palavra agora ao Senador Rogério Carvalho, que é o Relator, que está na mesma correria dos outros Senadores que aqui estiveram. O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - SE. Como Relator.) - Obrigado, Senador Paulo Paim. Queria cumprimentar todos os expositores, todos os debatedores, cumprimentar o Senador Rogerio Marinho, o Senador Fabiano Contarato... Em primeiro lugar, eu quero dizer que nós não temos, no Brasil, infelizmente, uma consolidação maior do movimento sindical e dos sindicatos brasileiros, principalmente o setor que é o setor que representa os trabalhadores. Enquanto os trabalhadores, os seus sindicatos foram, de certa maneira, atacados e tiraram deles o poder e o equilíbrio que, minimamente, se construíram ao longo de alguma décadas, na relação entre a representação patronal com a representação dos trabalhadores, o setor patronal ficou absolutamente intacto, porque, para determinados setores, o Sistema S é um grande fomento, ou seja, bilhões e bilhões a serviço dos sindicatos patronais e das entidades que representam o patronato brasileiro, enquanto os trabalhadores não têm essa... E aí uma crise do movimento sindical, que é a quantidade de demanda de negociação com uma redução a 30% da capacidade de financiamento desses sindicatos. Então, quando a gente fala em equilíbrio de negociação, nós estamos desconhecendo profundamente que nesta relação, a deixar em função da negociação, nós vamos sair de 44 para 52 horas e não vai haver redução de jornada de trabalho; vai haver aumento da jornada de trabalho pela racionalidade e pela lógica defendida aqui da livre negociação. Nós não temos nem equilíbrio; hoje não existe equilíbrio de forças entre quem representa os trabalhadores e quem representa o setor patronal, não existe equilíbrio de forças. Se não existe equilíbrio de forças, há uma premissa que eu julgo um tanto quanto despropositada para garantir que este debate flua, que é deixar a critério da negociação entre as partes. |
| R | Então, dito isso, vamos para a segunda parte dessa discussão. A segunda parte é que nós estamos falando de uma sociedade em que existem os senhores - historicamente, os senhores escravagistas, os senhores do capital - e em que o nosso movimento sindical e os nossos trabalhadores são pouco organizados, e aqueles que se organizaram já sofrem o problema das mudanças no modo de produção, ou seja, então isso abre para a gente a necessidade de o Parlamento e o Governo terem posição, porque, se a gente for esperar pelos trabalhadores... A organização dos trabalhadores está enfraquecida, propositalmente foi enfraquecida, e não é por incompetência ou por baixa qualidade dos nossos dirigentes sindicais; é porque, intencionalmente, estas Casas Legislativas atuaram para enfraquecer a representação sindical dos trabalhadores, enfraquecer, na correlação de forças entre patrão e empregado, a posição dos trabalhadores para diminuir o seu poder de negociação - como eu disse, teríamos 52 horas e não 48, percebe? Então, diante disso, eu acho que nós estamos agora numa tentativa de estas Casas fazerem o que foi feito. Se a gente for analisar a redução de jornada em 1945, quando foi para a CLT, e em 1942, quando, eu acho, foi definido que seriam oito horas e 48 horas semanais, foi uma iniciativa por clamor do Governo. Em 1988 foi na Constituinte. E agora só vai acontecer redução de jornada se as vozes de alguns aqui que representam a voz que não chega, que não faz parte do lobby e que não tem força para influenciar movimentos aqui dentro, através de alguns Parlamentares ou de muitos Parlamentares, consigam emplacar essa mudança de novo. Caso contrário, não vai haver redução de jornada no Brasil. É só uma tese que não se materializará, porque não há base para dizer que ela vai se materializar, certo? Na prática, é isso. Ou seja, se não quer realizar, se não quer reduzir a jornada, diz que tem que ser na negociação. É uma forma suave de dizer que essa discussão não nos interessa, "vamos deixar que as partes negociem". Só tem uma parte. A outra parte que influencia nisso e que pode ter força nisso é o Parlamento e o Governo. Se tiver um Governo e um Parlamento que assumam essa bandeira, essa pauta vai adiante. Se o Parlamento não assumir... Portanto, eu quero dizer que, se não tivermos redução da jornada de trabalho, é porque a maioria deste Parlamento não foi, não quer e não quis encontrar os caminhos para redução da jornada, porque representa um grupo de interesses que não permite que estas Casas definam. Não é por uma questão objetiva, não é. "Ah, nós não temos incorporação, a produtividade do nosso trabalhador é baixa". É verdade. Nós temos um excedente de força de trabalho, mão de obra barata... Por que você vai incorporar tecnologia? Por que você vai aumentar a produtividade incorporando tecnologia nos modos de produção? Se eu tenho força de trabalho abundante e barata, com jornadas enormes, não vamos melhorar a produtividade do nosso trabalhador. Não tem estímulo para isso. Estímulo é, no momento em que você tiver menos força de trabalho, você vai precisar contratar menos... Senão você vai automatizar desde um estabelecimento de prestação de serviços até o processo industrial, até na agricultura, até na pecuária. Você vai automatizar parte do processo produtivo, porque vai faltar mão de obra e porque a jornada vai ter que ser menor. E essa incorporação significa aumento de produção no setor industrial, que vai demandar uma força de trabalho, mas uma força de trabalho também com uma jornada menor e menos extenuante. |
| R | Dito isso, eu quero falar de uma outra dimensão em que a gente não pensa. Quando a gente fala em redução de jornada, não tem ninguém que defenda a manutenção da jornada atual, que fale que isso é bom para as pessoas, que isso é bom para os trabalhadores, que isso vai melhorar a conexão social, que vai melhorar o convívio familiar - ninguém. Só se fala de uma coisa: "vai quebrar". Porque a gente está submetido a uma relação de força de determinado setor, que é o setor econômico, a uma necessidade de coisificação das pessoas e de que as pessoas têm que estar a serviço - a qualquer custo, inclusive da própria sobrevivência, da sobrevivência da família, da sobrevivência das relações sociais - da produção de riqueza, que não é para todos, é para ficar acumulada com alguns. |
| R | Ou seja, esse esquemão, esse sistemão de que a gente ouve falar tanto e que é tão combatido é o sistemão e o esquemão para a manutenção de privilégios. E a gente precisa enfrentar o esquemão da manutenção e de reprodução de privilégios. A gente só vai quebrar esse esquemão e esse sistemão, que uma parte da política brasileira diz que está combatendo, mas que, na verdade, é quem mais legitima esse esquemão, que é o esquemão do privilégio, da manutenção de privilégios... Porque, vejam, a acumulação de riqueza não vai ficar com os trabalhadores, vai ficar com um segmento só da sociedade. (Soa a campainha.) O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - SE) - Então, eu acho que a gente tem que botar o foco sobre isso. Vejam só, são mais de... Aliás, a redução de jornada vai atingir mais de 150 milhões de brasileiros - praticamente toda a população brasileira vai ser atingida por isso. Eu diria que é a maior revolução social que nós vamos ter no Brasil depois do fim da escravidão, depois que a gente instituiu uma lei, a CLT, depois da Constituição de 1988 e depois dos governos que criaram uma política de inclusão pelo direito, que fortaleceram a política de direito. Essa seria a ação mais efetiva de mudança da vida de brasileiros e brasileiras. (Palmas.) Não tem outra, por quê? Porque você vai mexer na vida de todo mundo. Como foi dito aqui, vai mexer nas famílias - porque vai mudar a relação interna -, vai mexer com o lazer... E eu duvido que... Eu aposto que a redução da jornada vai aumentar o PIB brasileiro. E quer que eu lhe diga por quê? Porque outras atividades econômicas surgirão; porque mais dinheiro vai circular na economia; porque mais demandas serão geradas para esta economia; porque vai haver mais distribuição de riqueza e, quanto mais distribuição de riqueza existe em uma sociedade, mais ela cresce e se sustenta economicamente. É só a gente olhar o que aconteceu nesses dois anos e dez meses do Governo do Presidente Lula: quando distribuiu riqueza, a economia... A inflação é a menor da história de um governo e não é desses últimos governos, é da história do Brasil. A gente tem o maior ganho de remuneração e de massa salarial. A gente tem o maior crescimento econômico dos últimos tempos, sabem por quê? Porque teve distribuição consistente de renda. Agora, vocês imaginem, redução da jornada, de forma escalonada, ao longo do tempo... Isso tudo está aberto para a gente discutir, mas a gente precisa reduzir a jornada pelo bem do Brasil, pelo bem dos brasileiros, pelo bem da nossa sociedade, que se pretende ser civilizada. Por isso, Senador Paulo Paim, ao senhor, como autor, quero dizer que este é um grande legado que o senhor deixa como grande Parlamentar que V. Exa. é. E eu fico muito feliz de ser o Relator desta matéria, que, na minha humilde visão, tem um impacto que vai para além das relações econômicas que o tempo todo a gente tenta restringir. Não é uma relação econômica que está em discussão, é o modelo de sociedade em que a gente acredita; é o modelo de relações familiares em que a gente acredita; é o modelo de relação das pessoas com o ambiente onde elas vivem. Ou seja, nós estamos falando de uma política que pode mudar a forma de viver de toda a sociedade brasileira. Isso é extraordinário! A gente só não pode ter medo de ir atrás do extraordinário. |
| R | Eu já fiquei tão contaminado por este debate que hoje eu estou absolutamente convencido do caráter extraordinário que tem essa política, porque ela mexe com toda a estrutura da sociedade brasileira. Parabéns, Presidente! E vamos à luta fazer essa mudança de que o Brasil e o povo brasileiro precisam. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Parabéns a V. Exa., Relator. O Relator Rogério Carvalho fez um belo relatório, e a exposição que fez agora mostrou que é um estudioso do tema e, por isso, fala com tanta segurança. Então, parabéns a V. Exa. O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - SE. Fora do microfone.) - Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Eu tenho muito orgulho de poder dizer lá no meu Rio Grande, em que eu participo dos debates, que o seu relatório ficou impecável. O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - SE) - Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Parabéns! O Senador Contarato está inscrito. Eu apenas pergunto para ele: só faltam dois, mas falaria um, se V. Exa. concordar, e, em seguida, V. Exa. Se prefere agora, vai falar agora. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - O Senador Contarato é muito compreensivo. Na política, a gente fala: "Depois de um grande orador, eu não quero falar, não; quero falar depois do intervalo". E foi o Rogério Carvalho, mas V. Exa. não encabulou, não. É com o senhor. Vamos lá. Dez minutos, com mais cinco, se necessário. O SR. FABIANO CONTARATO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - ES. Pela ordem.) - Sr. Presidente, parabenizo V. Exa. pela autoria deste projeto. Parabenizo os convidados ao passo em que parabenizo também o Senador Rogério Carvalho pela relatoria. Não posso deixar de registrar aqui a minha satisfação pela atuação do Vereador Rick Azevedo. Parabéns! Parabéns à Erika Hilton! Mas eu queria fazer aqui algumas considerações que eu reputo importantes, e tudo o que eu estou falando aqui parte da Constituição Federal. O art. 1º da Constituição Federal, no inciso III, estabelece que um dos fundamentos da República Federativa do Brasil é promover a dignidade da pessoa humana. Aí ela vai além: o art. 3º, inciso III, fala que um dos objetivos também do Brasil é erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades sociais. E ela continua. O art. 7º vai falar que a União tem que instituir um salário mínimo digno, capaz de suprir as suas necessidades, as da família, com saúde, educação, moradia, lazer, vestuário, higiene, trabalho, previdência... E nós temos esse ínfimo salário de R$1.518. Para complementar, o art. 5º fala que todos somos iguais perante a lei, o que me assusta, porque esta Casa, a Casa Legislativa, seja a Câmara dos Deputados ou o Senado, é uma Casa que sistematicamente fecha as portas para a classe trabalhadora; é uma Casa que, infelizmente - e é com dor que eu falo isto -, criminaliza a pobreza; é uma Casa que diferencia um trabalhador terceirizado de um efetivo e de um comissionado. Eu lembro que, quando tomei posse aqui, os funcionários terceirizados eram submetidos ao detector de metal; os outros, não. Naquele momento, esta Casa criminaliza a pobreza, criminaliza os mais pobres. O elevador não podiam usar... Então, é uma grande hipocrisia. |
| R | E aí eu vejo que esta Casa, com todo respeito, quando vê outras categorias estabelecendo um piso de R$15 mil para 20 horas semanais... Aí pode, aí não tem responsabilidade fiscal, aí o país não vai quebrar... Eu faço um resgate histórico. Com a Constituição de 1988, as mulheres ganharam o direito à licença maternidade, um grande avanço. O que as empresas começaram a fazer? Não contratar mulher ou exigir atestado de esterilidade. Quantas mulheres foram subjugadas e vítimas dessa conduta imoral, criminosa? Quantas mulheres foram vítimas disso? A mulher tem direito à licença maternidade: "Ah, o país vai quebrar", "as empresas vão quebrar". Por que, sempre, para o trabalhador, esta Casa arranja motivo para fechar as portas? E fecha as portas para a população preta, fecha as portas para a população parda, fecha as portas para os povos indígenas, fecha as portas para as mulheres, fecha as portas para as pessoas com deficiência, fecha as portas, efetivamente, para as pessoas que mais precisam. Uma garantia constitucional, no art. 6º, são direitos sociais. Vejam, não sou eu que estou falando! Foi o legislador Constituinte, desde o dia 5 de outubro de 1988. São direitos sociais o direito à educação, à saúde, à moradia, ao lazer e assim sucessivamente. Mas, na hora de falar sobre direito de trabalhador, aí não temos. "Não, nós temos que ver, porque tem que ter cautela, porque as empresas"... As empresas? Isso vai gerar emprego, eu não tenho dúvida de que isso vai gerar. O mundo caminha para isso. (Palmas.) Aliás, o mundo caminha para isso, e eu fico questionando, Senador, com todo respeito, o senhor sabe da minha admiração e do amor que eu tenho pelo senhor. Às vezes, num momento reflexivo, eu falo assim: meu Deus, na vida da gente... Nós temos 24 horas no dia. Quantas horas eu tiro para o meu lazer, para o meu prazer? Quantas horas eu tiro para estar com meus filhos, que são a razão da minha vida? Quantas horas eu tiro para estar com minha família? Quantas horas eu tiro para comemorar o meu aniversário? Nós aprovamos, com a ajuda do senhor, o piso da enfermagem. As pessoas estavam ganhando um salário mínimo, com dois, três vínculos. Não tinham sábado, domingo, feriado, final de semana, Natal, Ano-Novo, nem nada. Mas, para os grandes empresários, que têm desoneração de folha, que têm incentivos fiscais, que são quem mais ganha às custas da classe trabalhadora... Eu ouso falar que essa escala 6x1 equivale ao crime de redução à condição análoga de escravo, previsto no Código Penal! (Palmas.) Não tem como! E tudo parte da Constituição. Um dos fundamentos da República Federativa do Brasil é promover a dignidade da pessoa humana. Que dignidade da pessoa humana, com um trabalhador, com 44 horas semanais, trabalhando 6x1? Que dignidade é essa? Qual é o tempo que ele vai ter para a família? Qual é o tempo que ele vai ter para lidar? Outra coisa. Eu queria fazer um desafio aos nossos colegas: viva com R$1.518! (Palmas.) Viva com R$1.518, sem ter direito a um plano de saúde, sem ter direito a nada. Aí falam assim "vem a reforma trabalhista" com o discurso "vamos alavancar a economia, gerar emprego e renda", e foi a pior coisa que aconteceu. Vilipendiou os direitos dos trabalhadores! |
| R | Eu ando muito de uber e, todas as vezes, eu pergunto ao motorista... Em outro dia, eu peguei uma motorista grávida. Eu falei "coitada dessa mulher quando ela ganhar neném! O Estado tem que ser um Estado grande, com "e" maiúsculo, porque, do contrário, ela vai estar ali subjugada, sem nenhum direito que lhe assegure. Aí vem a precarização da relação trabalhista, vem a reforma da previdência, e cada vez o abismo existente entre os milhões de pobres e a concentração de riqueza na mão de tão poucos fica cada vez maior. E, na hora em que este Congresso é chamado, é instado a taxar bets, bilionários e banqueiros, falam "não pode". Gente, isso é hipocrisia! Tem um samba que diz "deixe a máscara cair que eu quero ver você sorrindo, ponha fé no seu olhar que o amanhã será bem-vindo". É preciso provocar a queda das instituições que compõem o Estado, a queda de máscaras das instituições, entre elas, esta Casa, porque falar que o Congresso representa o povo está longe de ser uma realidade. Eu queria, com toda humildade, que entrasse mais por essa porta representante maior da população preta, parda, indígena, quilombola, dos trabalhadores, dos trabalhadores que ganham um salário mínimo. (Palmas.) Senador Paulo Paim, eu não falo isso por vitimismo. Eu tenho orgulho de falar da minha origem. Meu pai foi motorista de ônibus por 40 anos; minha mãe, semialfabetizada, desenhava o nome, quando estudou. Aí eu ouço aqui do Governo, que não investe na educação... Meu amigo, uma coisa que eu tenho é gratidão! No Espírito Santo, tinha uma escola técnica quando eu passei, e foi no Governo do Presidente Lula que nós passamos a ter 26. Foi no Governo do Presidente que nós passamos a ter o Prouni, de o filho poder estudar numa escola. E o filho do pobre vai poder entrar e fazer um curso de Medicina, sim, porque o Governo é inclusivo, porque o Governo tem empatia. Eu acredito muito no líder que nós temos, num líder mundial que é o Presidente Lula, para aprovar o fim dessa escala 6x1, porque isso é um ato de humanidade, isso é uma reparação histórica! Eu lembro, quando nós aprovamos aqui - o senhor sabe disso - o aumento da cota racial no serviço público de 20% para 30% que eu ouvi um Senador falando em meritocracia. Eu falei: "Senador, meritocracia, para quem, se, na largada, uns já largaram há muito tempo antes?". Meritocracia, para quem, se 83% das escolas públicas da educação básica não têm laboratório de ciências, se 73% não têm biblioteca, não têm acessibilidade? Meritocracia, para quem? Quando você viu um Embaixador preto assumindo um posto em qualquer lugar do mundo? (Soa a campainha.) O SR. FABIANO CONTARATO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - ES) - Quando isso acontece, ele não está ali sozinho. Ele está carregando milhões de brasileiros. Eu tirei... "Paciente se recusa a ser atendida por médica negra". Quando um preto faz um curso de Medicina, faz uma residência, vai trabalhar, ainda sofre esse tipo de preconceito e discriminação racial! Isso é com as mulheres, isso é com a população LGBT, isso é com todo mundo! E, nesta Casa, na hora em que é para enfrentar temas sobre direito trabalhador, nós temos que ter responsabilidade. É claro que nós temos! Nós temos responsabilidade com a espinha dorsal do Estado democrático de direito que se chama "Constituição da República Federativa do Brasil", que determina que todo trabalhador tem direito a um salário digno de acordo com a extensão e complexidade, que determina que o salário tem que ser digno, capaz de suprir as suas necessidades e as da família com saúde, educação, moradia, lazer, vestuário, higiene, previdência e que todos têm direito à dignidade de pessoa humana. Quanto vale? Perguntem a esse trabalhador que ganha R$1.518, que está na informalidade, qual é o momento que ele tem com a família dele? Eu acho que é isso que tem que motivar a gente. Agora, eu não me deixo seduzir por este discurso de que "não, as empresas falaram que, quando as mulheres tiverem direito à licença-maternidade, décimo terceiro, vai quebrar o país". Não quebrou e não vai quebrar. O país é rico, tem arrecadação. O país tem que parar é de fazer aceno para aqueles que mais ganham, isso sim, e tem que lutar para reduzir a desigualdade. |
| R | Eu finalizo aqui, Senador Paulo Paim, acho que estou sendo... Eu sou muito emotivo em relação às minhas convicções, porque o que me move a estar na política - o senhor sabe - é a empatia, é a capacidade de me colocar na dor do outro. Sempre que ando no uber, sempre que vejo um motorista de ônibus, quando lembro do meu pai, sempre que vejo uma trabalhadora, sempre que vejo uma pessoa em situação de rua, falo: "Meu Deus, o que eu posso fazer para dar dignidade a essa população?". É isso que me move a estar na política. E, às vezes, com essa redução da escala, da famigerada escala 6x1, eu lembro muito de um poema do Mário Quintana, que vai falar do tempo. Por isso, eu acho que a gente tem que ter uma boa dosagem disso. Ele foi muito sábio quando disse: A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa. Quando se vê, já são seis horas! Quando se vê, já é sexta-feira! Quando se vê, já é natal… Quando se vê, já terminou o ano… [Quando se vê, já não sabemos mais por onde andam os nossos amigos] Quando se vê perdemos o amor da nossa vida. Quando se vê passaram 50 anos! Agora é tarde demais para ser reprovado… Se me fosse dado um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio. Seguiria sempre em frente e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas… [Seguraria todos os meus amigos, que já não sei onde e como estão e diria: vocês são extremamente importantes para mim] Seguraria o amor que está a minha frente e diria que eu o amo… [Dessa forma eu digo] [...] não deixe de fazer algo de que gosta devido à falta de tempo. Não deixe de [...] [estar com quem você ama] por puro medo de ser feliz. A única falta será desse tempo que, infelizmente, não voltará mais. No que depender de mim, vou estar lutando com toda a minha força para acabar com esta famigerada escala 6x1, e não tem discurso nenhum que vai me convencer do contrário. Obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Muito bem. Esse foi o grande Contarato. Sabe quando ele falou ali da redução... Não da redução... Você falou tantas coisas importantes, mas uma delas foi das cotas, e tenho muito orgulho de ser o autor, mas V. Exa. foi o Relator. Cotas abrem portas. E quando eu disse que tinha falado um grande jogador, agora falou outro grande jogador, a quem faço questão de dar também as minhas palmas. (Palmas.) Esse é o Contarato. O Contarato tem que sair, mas ele fez questão de pedir... Gentilmente ele pediu para tirar uma foto conosco aqui, com a mesa. Eu o convido, neste momento, então, e depois nós vamos para os últimos dois. Aqui, Sr. Contarato, seguindo a sua orientação aqui... (Pausa.) |
| R | Vamos tocar. Nós temos a nossa foto final ainda, todos nós juntos, hein! Vamos continuar a nossa audiência agora. (Pausa.) Passo a palavra para esse grande líder, Rick Azevedo, Vereador da Câmara Municipal do Rio de Janeiro e fundador do Movimento Vida Além do Trabalho. (Pausa.) O SR. RICK AZEVEDO (Para expor.) - Muito boa tarde. Agradeço ao Senador Paim pelo convite. Cumprimento os coordenadores do Movimento VAT (Vida Além do Trabalho) que estão acompanhando pelo YouTube, em nome do nosso Coordenador Lucas Sidrack, que está aqui presente. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS. Fora do microfone.) - Onde ele está? Cadê ele? O SR. RICK AZEVEDO - Ele estava por aqui. (Risos.) Está se movimentando, mas ele está presente. É muito importante a atuação dele aqui em Brasília. Então, saúdo esta Casa em nome do Movimento VAT e saúdo esta mesa na pessoa do Senador Paim. Agradeço pelo espaço, agradeço pelo convite, agradeço por este debate ter chegado até aqui, porque foi graças à classe trabalhadora, que se uniu, se juntou e disse: "Chega! Chega de escala 6x1!". Lucas Sidrack chegou. Saudei-o aqui, cumprimentando o Movimento VAT, em nome da sua atuação. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS. Fora do microfone.) - Eu perguntei onde é que ele está. Eu vou pedir para ele se levantar, para a gente dar uma salva de palmas. O SR. RICK AZEVEDO - Sim, por favor. (Palmas.) O SR. RICK AZEVEDO - Atuação importantíssima, Lucas Sidrack. Parabéns! Bom, continuando, sou ex-balconista de farmácia, fundador do Movimento VAT (Vida Além do Trabalho), que fundei com inúmeros trabalhadores, e agora estou Vereador. Mas a minha fala aqui é de um ex-trabalhador da escala 6x1 que passou 12 anos nesse regime escravocrata. É preciso ficar claro: é um regime escravocrata! Muito se falou em dados, muito se falou em economia, mas eu sou os dados. Eu vivi 12 anos na escala 6x1, eu adoeci na escala 6x1, eu tive burnout na escala 6x1, eu tive depressão na escala 6x1. A escala 6x1 me impediu de me formar, de ter um curso superior; a escala 6x1 me tirou o que eu tenho de direito que é a humanidade. Eu não me sentia pertencente, eu não me sentia gente, eu não me sentia família, eu não me sentia parte da sociedade. Então, esse discurso "ah, a economia..." foi usado quando não queriam acabar com a escravidão; e, agora, ele está sendo usado novamente, para a manutenção de um modelo que é resquício da escravidão. |
| R | A escala 6x1 vem de um modelo lá de trás, quando os escravos começaram a ter liberdade, que aí tinham o domingo para descansar; trabalhavam nas lavouras as semanas inteiras, semanas e semanas, durante a semana, e no domingo tinham esse direito ao descanso. Nós estamos falando de um modelo de trabalho que só permite um dia de folga. São seis dias consecutivos, mais de 44 horas semanais. O trabalhador brasileiro trabalha mais de 44 horas semanais, porque a gente precisa falar do transporte público precarizado deste país. Um trabalhador, em média, leva duas horas para ir... Isso alguns trabalhadores, porque eu conheço trabalhadores que levam até três horas para chegar ao trabalho e três horas para voltar. Então, não venham com essa conversa de que são 40 horas semanais, não, são mais de 44 horas semanais. O Congresso Nacional brasileiro deveria ter vergonha, deveria ter vergonha de manter essa escala presente na vida da classe trabalhadora. Aqui eu vi estudos - com todo o respeito, Senador - que têm a profundidade de um pires: sem vivência nenhuma, sem realidade, sem, de fato, acompanhar o trabalhador brasileiro. Se todos esses senhores que apresentaram esses estudos fizessem uma rotina de pelo menos uma semana comigo num transporte público, numa cidade do Rio de Janeiro, de São Paulo, de BH, entre outras capitais, durante uma semana, sem motorista, transporte público, VR de R$7 por dia... (Intervenção fora do microfone.) O SR. RICK AZEVEDO - ... quem tem - alguns não têm, porque a gente sabe que o cartão de alimentação e refeição não é uma obrigatoriedade -, aí eu poderia levar a sério esses dados. Eu não posso, Senador Paim, eu não posso levar a sério o que foi colocado aqui, o que eu ouvi aqui, colocando a economia em um lugar e colocando a classe trabalhadora em outro lugar, como se a economia conseguisse sobreviver sem a classe trabalhadora. Que discurso é esse? De onde essas pessoas estão tirando que a economia vai sobreviver sem a classe trabalhadora saudável, sem a classe trabalhadora tendo o direito à vida além do trabalho? Que discurso é esse? De onde essas pessoas estão tirando isso? Em que mundo essas pessoas estão vivendo? Só em 2024, tivemos 470 mil afastamentos por doenças ocupacionais. Nós estamos falando de um número bastante expressivo. De onde essas pessoas estão tirando que a economia vai sobreviver com as pessoas adoecendo, com as pessoas tirando a própria vida? Nós estamos falando de um país em que as pessoas estão se matando porque não aguentam mais a jornada de trabalho excessiva, não aguentam mais trabalhar seis dias consecutivos para apenas um dia de folga, mais de 44 horas semanais, por um salário mínimo de R$1.518 - quando descontam, fica R$1.300 e pouco. Como essas pessoas estão achando que a economia vai suportar? A economia já está colapsando. |
| R | Muito se falou aqui de que vai faltar mão de obra. Não, não vai faltar mão de obra, já está faltando mão de obra. Está faltando mão de obra, porque as pessoas não estão aceitando esse modelo de trabalho que é a manutenção da escravidão neste país. A escala 6x1 um infringe os direitos humanos, a escala 6x1 tira a vida do trabalhador e da trabalhadora. Nós estamos falando de pessoas que não conseguem sequer ter um almoço em família. E muitos aqui pregam também a favor da família. Que raio de família é essa que não pode ter um almoço, que não pode ter um jantar, que não convive? Os pais não conseguem criar os próprios filhos. Então, Senador, o que eu venho fazer aqui hoje, nesta audiência, é trazer um recado bastante incisivo do Movimento VAT (Vida Além do Trabalho), da classe trabalhadora, do país inteiro... (Soa a campainha.) O SR. RICK AZEVEDO - ... de vários movimentos sociais, de várias organizações: a redução da jornada de trabalho, o fim da escala 6x1 vai acontecer. (Palmas.) Isso não depende do querer de meia dúzia de Deputados ou Senadores. Quem comanda este país, quem sustenta este país é a classe trabalhadora. Quem acorda às 4h da manhã para que este país esteja de portas abertas é a classe trabalhadora. Então, a gente não está pedindo um favor. Estamos, sim, dialogando, mas estamos com pressa. Não queremos calma, precisamos de pressa, porque as pessoas estão morrendo e a economia não pode estar acima da vida das pessoas, porque, se as pessoas não têm condições saudáveis, não tem economia. Se as pessoas não têm força para trabalhar, não tem economia. O que nós estamos vendo aqui não só nesta audiência, mas em todo discurso econômico é que sempre vem "ah, vai quebrar o país", como foi usado com o décimo terceiro, com as férias remuneradas, como foi usado também quando foi para conseguir o direito de carteira assinada para as empregadas domésticas. "Não pode, o país não vai aguentar, vai ter desemprego". O que nós estamos vendo é o mesmo malabarismo, como sempre querendo explorar e escravizar o trabalhador. Nós estamos falando de um país que está há quase 40 anos sem reduzir a jornada de trabalho - quase 40 anos. Alguém nesta sala consegue citar qual foi a última conquista desta Casa, do Congresso Nacional, para a classe trabalhadora? Alguém consegue citar a última conquista da Casa do povo para a classe trabalhadora, para o povo? Não tem, porque o Congresso Nacional brasileiro está longe de ser a Casa do povo. |
| R | E não adianta o Sr. Hugo Motta contratar publicidade. Não adianta as turminhas ficarem fazendo malabarismo retórico, porque nós estamos organizados. Temos uma ferramenta a nosso favor - a internet -, e a internet sabe que o fim da escala 6x1 ainda não aconteceu, porque Parlamentares estão travando a PEC que põe fim a essa jornada de trabalho desumana, a essa jornada que é incompatível com a realidade humana. Para finalizar, eu quero dizer e deixar registrado: no ano que vem, temos eleições, e o Movimento VAT (Vida Além do Trabalho) vai fazer questão de expor o rosto - um por um - daqueles que estão contra essa proposta, que é sobre vida, que é sobre humanidade, que é sobre o direito de poder ter tempo para viver a própria vida, é sobre vida além do trabalho. A redução da jornada de trabalho, o fim da escala 6x1 vai acontecer, custe o que custar. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Muito bem, meus parabéns, Rick Azevedo, Vereador da Câmara Municipal do Rio de Janeiro e fundador do Movimento Vida Além do Trabalho. Para mim, aqui é uma alegria, viu? Os Senadores fazendo um belo discurso, os sindicalistas e o companheiro Vereador aqui, né? Vereador do Rio de Janeiro, falando aqui em nome não só dos Vereadores, mas falando em nome dos Deputados, Senadores, Vereadores e sindicalistas que têm compromisso com essa causa, ou seja, com o direito dos trabalhadores. Eu fico feliz de perceber que esse movimento começou e não vai parar, como você colocou muito bem. Oxalá o ano que vem... Eu não estou achando que vão aprovar neste ano, não - digo, nas duas Casas -, mas, no ano que vem, que é ano eleitoral, tem tudo para ser aprovado definitivamente. Eu sei que cada um de nós vai dizer: “Nós temos pressa”. É claro que temos pressa, mas nem sempre a nossa pressa é a pressa que nós conseguimos emplacar aqui dentro. Eu tenho muita esperança nos debates que vamos fazer ainda neste ano. E votando - quem sabe? - lá na Câmara ou aqui, no ano que vem, a gente aprove definitivamente a redução da jornada. Eu fui Constituinte, estou aqui desde a Constituinte, e lá na Constituinte eram 48. Aprovamos 44, queríamos 40, mas nem sempre dá tudo aquilo que a gente quer. Isso faz parte da democracia. Mas vamos lá. A nossa última convidada é muito preparada, posso dizer assim. Ela vem aqui e arrasa sempre, viu? A Sra. Cirlene Luiza Zimmermann, Procuradora do Trabalho, Coordenadora Nacional da Coordenaria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalhador e da Trabalhadora. Por favor, está com a senhora a palavra. |
| R | A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN (Para expor.) - Bom dia, boa tarde a todas as pessoas que nos acompanham... Acho que não está funcionando. (Fora do microfone.) Boa tarde a todas as pessoas que nos acompanham. Senador Paim, é uma satisfação poder ter acompanhado este debate aqui hoje de manhã. Normalmente, o MPT chega, fala primeiro e, muitas vezes, já tem outro compromisso, mas como é importante estarmos aqui para acompanhar este debate, ouvir justamente essa posição também das empresas, dos economistas, ouvir esses supostos argumentos contrários, porque, a partir daí, também possamos talvez aprimorar este debate, aprimorar a nossa fala e trazer outros argumentos que precisam efetivamente ser trazidos e ser considerados, sim. A gente até entende que o tempo do Congresso não é o tempo da pressa, que o Rick tanto pede aqui... O SR. RICK AZEVEDO (Fora do microfone.) - Está muito atrasado! A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - Mas está muito atrasado; exatamente! O SR. RICK AZEVEDO (Fora do microfone.) - Quarenta anos quase... A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - E a própria PEC do Senador é de 2015! Estamos há dez anos já com esse objetivo, esse desejo, que, como o Senador bem lembrou, era o desejo lá em 1988, já... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS. Fora do microfone.) - Na Constituinte. A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - ... lá na Constituinte, e não por outro motivo, porque... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS. Fora do microfone.) - Já se passaram 40 anos e não avançou uma vírgula, né? A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - Pois é. E por que em 1988 isso já podia ser um desejo? Vejam, nós temos uma recomendação, a 116, de 1962, da Organização Internacional do Trabalho - de 1962! -, que diz que o padrão social, em termos de tempo de trabalho decente, é de 40 horas. Então, vejam, já era um intuito, nesse início da segunda metade do século XX, que a gente chegasse a um padrão de 40 horas, tempo de trabalho decente, para ter tempo para além do trabalho, para ter tempo de realizar essas outras dimensões da vida de que tanto falamos aqui. Nós falamos que não temos uma produtividade adequada - ouvimos isso aqui, hoje de manhã - porque temos deficiências em termos de capacitação, mas, vejam, quando o trabalhador sequer tem tempo para descansar, para ter horas de sono adequado, quando ele vai se preparar para estudar, para se capacitar mais? Nós queremos ter mais tempo, realmente, de vida além do trabalho para realizar essas outras dimensões da vida. Eu quero voltar aqui para a minha fala inicial, porque minha Coordenadoria, minha atuação prioritária no âmbito do Ministério Público do Trabalho é a de defesa do meio ambiente de trabalho e da saúde do trabalhador e da trabalhadora, e este tema, jornada de trabalho, tem relação, conexão direta com essa pauta. E por que eu afirmo isso? Riscos ocupacionais são elencados em diversas listas, em diversos estudos. Entre esses riscos ocupacionais, reiteradamente, a gente observa justamente a questão das extensas jornadas de trabalho. Em 2022, a Organização Internacional do Trabalho e a Organização Mundial da Saúde publicaram um estudo que apontou que 81% das mortes decorrentes do trabalho decorrem de doenças não transmissíveis, ou seja, doenças adquiridas no ambiente de trabalho em função desses riscos existentes no ambiente de trabalho e nas condições de trabalho. Agora, surpreendam-se: o risco apontado como o maior gerador de adoecimentos e mortes de trabalhadores e trabalhadoras são as extensas jornadas de trabalho. Aí, eu costumo fazer um desafio: quem aqui já viu uma comunicação de acidente de trabalho (a famosa CAT) apontando, como agente causador do acidente ou da doença, a jornada de trabalho? Não se reconhece que isso adoece e que isso mata, mas de que forma mata? Doenças cardíacas, acidentes vasculares cerebrais, transtornos mentais - todos associados às extensas jornadas de trabalho. A lista de doenças relacionadas ao trabalho, do Ministério da Saúde, que foi publicada e atualizada no final de 2023, depois de mais de 20 anos também, trouxe as jornadas de trabalho como um agente de risco relacionado a diversas doenças, dentre elas: transtornos mentais, doenças cardiovasculares, doenças metabólicas e até câncer. |
| R | Acidentes do trabalho - agora vamos falar de acidentes traumáticos -, aqueles em que o trabalhador eventualmente vem a amputar um membro, vem a perder a vida, às vezes, é sugado por uma máquina acontecem também em jornadas extenuantes, com trabalhadores submetidos a jornadas extensas de trabalho. Um levantamento feito pelo Repórter Brasil, no início deste ano, apontou que, das 20 categorias que têm os maiores índices de acidentes de trabalho no Brasil, 12 delas são aquelas que estão entre as jornadas mais extenuantes, mais excessivas. E eu vou falar só de três delas aqui, para a gente entender do que a gente está falando. Motoristas profissionais é uma dessas categorias. Se nós olharmos o Observatório de Saúde e Segurança do Trabalho no Brasil, veremos que a categoria que mais morre no trabalho são os motoristas profissionais, em termos notificados - estamos falando de trabalho formal. Por quê? Porque estão submetidos a extensas jornadas de trabalho, porque se admite, e isso se admitiu... O Rick perguntou: "O que conseguimos em termos de avanços?". Não conseguimos, mas conseguimos retrocessos, porque se admitiu, para esses motoristas, negociação coletiva para estender a jornada até 12 horas por dia. E quando querem que estudem, quando querem que estejam com as famílias, quando querem que descansem para efetivamente cumprir a sua jornada de forma adequada? Hoje, esses motoristas profissionais são vítimas do trabalho, morrem no trabalho, porque têm que trabalhar submetidos a jornadas de 10, 12 horas, ou seja, muito mais ainda do que esse cenário cuja redução estamos defendendo aqui. Outro setor: alimentadores de linha de produção, que são vítimas de acidentes, mas que linha de produção é essa? Vou dar um exemplo aqui de uma categoria: trabalhadores de frigoríficos - jornadas normalmente extensas, ritmos intensos de trabalho, num setor em que, normalmente, em função do próprio ambiente frio, você já tem uma redução de maleabilidade daqueles membros superiores e você tem, nesse cenário, adoecimentos psíquicos e acidentes também na linha de produção, muitas vezes com amputações, muitas vezes com adoecimentos que levam a essa redução da capacidade para o trabalho. E vou trazer um terceiro setor, elencado entre esses que mais se acidentam no trabalho e que têm extensas jornadas de trabalho: profissionais da saúde. E muitos vão me dizer: "Não, mas eles trabalham em plantões, 24x72, 12x36". A maioria deles tem outro vínculo nas supostas 36 ou 72 horas de trabalho - senão outros dois vínculos. Isso interessa à sociedade brasileira? Interessa que o atendimento dos profissionais de saúde seja feito por profissionais cansados, exaustos? Isso interessa ao paciente? Imaginemos nós indo a um atendimento sabendo que esse profissional virou a noite, e agora ele tem que me furar aqui, fazer um procedimento médico, mas ele virou a noite. "Ah, não, mas ele virou à noite, mas ele teve, na noite anterior, outro plantão". Ele está virando duas noites, três noites. E, é claro, os acidentes acontecem. |
| R | Então, saúde e segurança do trabalho são uma questão diretamente relacionada ao debate aqui. Redução da jornada de trabalho, tempo de trabalho decente é uma questão diretamente relacionada à saúde e à segurança do trabalho. E veja o que a reforma trabalhista nos trouxe. Falaram tanto de negociação coletiva aqui hoje de manhã. O que se disse? "Negociação coletiva, livre, ampla". Mas se disse o seguinte: "jornada de trabalho não tem nada a ver com saúde e segurança do trabalho. Então, pode-se negociar livremente". Se fosse para reduzir a jornada, não estaria nem escrito - não estaria nem escrito. Diz-se isso porque era para autorizar o incremento das jornadas, a implementação dessas jornadas em plantões, o elastecimento dessas jornadas de trabalho, mas que impactam diretamente nesse cenário de adoecimento e de acidentes que eu trouxe aqui para vocês. Outro ponto de que a gente precisa falar aqui que já foi tão debatido e acho que o Rick trouxe perfeitamente: é bom para a classe trabalhadora, reduzir a jornada é bom para a classe trabalhadora. Quando eu ouço, quando nós ouvimos, no âmbito do MPT, argumentos do tipo - e isso não é incomum -: "mas o trabalhador gosta de fazer hora extra". (Soa a campainha.) A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - Ele não gosta de fazer hora extra, ele gosta de ganhar bem, ter renda digna. (Palmas.) Ele quer satisfazer as suas necessidades básicas, aquelas previstas na Constituição. Se para isso ele precisa fazer horas extras, ele se submete, ele tira o tempo da sua família, o tempo do seu estudo, mas ninguém gosta de fazer hora extra. Então, veja, vamos superar essa questão. Outra questão que o Prof. Pastore trouxe aqui... O Fernando, Professor da FGV, disse: "olha, nós temos entre... As jornadas já estão bastante reduzidas no Brasil". E ele apontava que entre os trabalhadores com menor escolaridade, essa jornada já estaria bem mais baixa, inclusive, abaixo de 40 horas. Aí a gente justamente ouve o depoimento do Rick, para não dizer que eu não estou falando uma bobagem aqui, que são mais quatro horas de trânsito por dia, quando não mais seis. E quando esse trabalhador vai descansar, para ser mais produtivo, para ser mais criativo no seu ambiente de trabalho? Esse tempo de descanso não há, e tudo isso, sim, precisa ser somado. Então, quando a gente tem um cenário de debates, trazido também pelo Senador Rogerio Marinho: "o trabalhador brasileiro quer ser empreendedor, porque ele quer ter mais flexibilidade no trabalho". Veja, ser CLT não é impedimento para ter flexibilidade no trabalho. (Palmas.), Não é preciso ser um motorista plataformizado para ter tempo de levar o filho na escola, ou para ter tempo de levar o filho para um atendimento médico. Isso pode ser negociado. Num ambiente de trabalho que é um ambiente de confiança, é possível fazer esse tipo de negociação, e ser CLT não é impedimento para isso, definitivamente. Então, aceitar a precarização das relações de trabalho ao argumento de que a CLT não é moderna, porque não permite esse tipo de flexibilidade? É errôneo pensar dessa forma. A gente precisa realmente avançar. De fato, esse movimento e essa adesão orgânica... Porque, nem na época da reforma trabalhista, Senador Paim, a gente teve, da classe trabalhadora, essa adesão no sentido de lutar contra tudo isso que estava vindo. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS. Fora do microfone.) - Perfeito. A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - E veio muita coisa ruim. Mas, agora, nesse movimento da redução da jornada de trabalho, de uma forma orgânica, essa adesão veio. Por quê? Porque é aquilo que impacta no dia a dia das pessoas, é onde ela percebe de imediato: "poxa, vai ser bom eu ter um dia a mais para estar em casa com a minha família, para estudar, para cumprir com essas outras dimensões da minha vida: religiosas, quaisquer que sejam". Mas essa adesão aconteceu de uma forma natural. |
| R | E, para as empresas, é bom. Tivemos tantos argumentos: "não, mas vai reduzir a produtividade, vai reduzir a produtividade." Mas, veja, essa produtividade é o que exatamente? E a produtividade faz sentido se ela não estiver efetivamente implementando e estando a serviço da justiça social, do bem-estar das pessoas? Que produtividade é essa? Essa produtividade realmente nos interessa? A gente tem que buscar um pouco também das experiências, porque os números foram trazidos, a princípio demonstrando esse cenário catastrófico. O Clemente trouxe uma apresentação fantástica aqui para contrapor. Nós tivemos algumas experiências piloto com relação àquela semana de quatro dias no Brasil. E as 19 empresas que aderiram ao experimento no Brasil... Dá para estudar, para olhar o estudo todo, mas eu quero só reforçar dois aspectos: o que elas apontaram? Que 61% apontaram melhoria na execução dos projetos, com maior capacidade para cumprir prazos. Por quê? Porque as pessoas estão mais descansadas, são mais criativas, conseguem fazer uma entrega com maior produtividade. E o segundo ponto é que 72% das empresas afirmaram que houve aumento da receita, ou seja, começaram a lucrar mais, mesmo com as pessoas descansando mais. Quem está se propondo está percebendo melhorias. Nós tivemos um outro cenário, esse muito recente, agora no final de setembro. O Valor Econômico publicou uma matéria envolvendo dois setores que tradicionalmente trabalham em 6x1 - comércio varejista de roupas e farmácias, a sua experiência, Rick -, mas trazendo a situação de duas grandes empresas no Brasil que estão fazendo a redução da escala para 5x2. E o que elas apontam? Que elas querem assegurar qualidade de vida e bem-estar para os trabalhadores, porque isso vai gerar aumento de produtividade. Isso não sou eu que estou dizendo, está na matéria do Valor Econômico, com os responsáveis, diretores dessas empresas, trazendo esse tipo de depoimento. Então, vejam, produtividade. O que isso exatamente significa é que, se, nesses trabalhos com escalas extensas, com escala 6x1, nós estamos tendo rotatividade, absenteísmo, é porque ninguém aguenta. (Soa a campainha.) A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - Então, interessa e é produtivo esse tipo de rotatividade no setor da construção civil, que, como você citou, em dois anos, muda todo mundo, porque ninguém aguenta? Isso é produtivo realmente? Ou é justamente em função disso que o nosso Brasil não está sendo tão produtivo, porque as condições de trabalho não estão sendo as mais adequadas? Então, é preciso realmente fazer esse enfrentamento. O quarto ponto que eu quero trazer aqui para vocês é justamente a necessidade de que este debate não pode ser no vazio. Nós precisamos assegurar que essa redução de jornada aconteça efetivamente para todos os trabalhadores e todas as trabalhadoras. O art. 7º da nossa Constituição fala em todos os trabalhadores urbanos e rurais, ele não fala em celetistas e empregados. Então, nós precisamos assegurar que, efetivamente, não se utilizem essas formas de contrato precárias para deixar de cumprir os direitos sociais previstos no art. 7º da Constituição, assegurados para todos os trabalhadores e todas as trabalhadoras. Em algum momento, alguém desvirtuou isso e justamente começou a implementar essas relações e esses contratos precários com o objetivo de fugir do art. 7º. Mas em que momento o Constituinte disse que ele era só para os empregados, só para os celetistas? Nós precisamos fazer esse enfrentamento de forma muito séria, sob pena de estarmos fazendo esse debate no vazio. Se nós aprovarmos essa PEC e não tivermos mais celetistas e entendermos que não se aplica para as outras relações de trabalho, fizemos um debate no vazio e não podemos assegurar isso. Então, é enfrentar, sim, essa pejotização, esse empreendedorismo que supostamente os trabalhadores querem ter. Ser empreendedor para trabalhar 24 horas por dia sete dias por semana, sem direito a férias, décimo terceiro, horas extras, limitação de jornada? Com certeza, não é o desejo de nenhuma pessoa com sua mentalidade ali num cenário de sanidade, evidentemente. |
| R | (Soa a campainha.) A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - Então, esse enfrentamento precisa ser feito, e assegurar isso efetivamente para todos os trabalhadores é algo necessário, não é um favor do Estado, não é uma concessão econômica, é algo que efetivamente a gente vai fazer para garantir essa melhoria das condições sociais, que é o objetivo maior. Está escrito no caput do 7º da Constituição também. São esses direitos, além de outros, que visam à melhoria das condições sociais dos trabalhadores e das trabalhadoras. Conseguimos alguns desses direitos por meios de negociação coletiva? Sim, conseguimos. Há muitos sindicatos com excelentes exemplos, mas nós temos que concordar que os sindicatos estão enfraquecidos. O Senador Rogério Carvalho muito bem nos trouxe essa realidade. Não adianta compararmos a realidade sindical brasileira com a da Europa ou dos Estados Unidos. Nós estamos em outro cenário. As forças estão muito díspares. Então, nós não vamos alcançar essa melhoria das condições sociais senão com a adesão também desta Casa, sim, que precisa ser do povo, precisamos recuperar isso a essa luta. Esse debate e esse avanço precisam acontecer. Por último, eu quero enfrentar especificamente três pontos, que me chamaram muito atenção no pedido dessas audiências públicas, porque o Senador Rogerio Marinho fez o pedido, e três pontos me chamaram muito atenção. Disse-se o seguinte: países que reduziram significativamente a jornada de trabalho fizeram isso em contextos de alta produtividade, maior formalidade e robustez institucional, e essa não seria a realidade brasileira. Veja, alta rotatividade já enfrentamos aqui em vários momentos, mas alta rotatividade, produtividade em si não é um atributo exclusivo da força de trabalho; é, sim, um resultado de escolhas estratégicas, de escolhas organizacionais... (Soa a campainha.) A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - ... e tudo isso precisa ser levado em conta. Produzir bens de alto valor agregado, produzir tecnologia, produzir inovação... Claro que isso gera maior riqueza por hora trabalhada. No Brasil, nós produzimos commodities. Nós queremos realmente fazer esse tipo de comparação? Essa alta produtividade precisa ser considerada nesse cenário distinto que nós vivemos no Brasil também, mas, ainda assim, nós temos uma produtividade extremamente significativa, considerando o cenário brasileiro, e podemos, sim, com a redução da jornada, incrementar essa produtividade como vários aqui já falaram. O Prof. Pastore disse: "Não é possível criar empregos por lei". Durante os debates da reforma trabalhista, o que mais se ouvia nesta Casa Legislativa é que a reforma precisava ser feita, os direitos precisavam ser reduzidos para criar 10 milhões de empregos. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS. Fora do microfone.) - Dez milhões, era o que eles diziam. A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - Era o que se dizia, não era? (Soa a campainha.) A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - Estou aqui mentindo? Não estou. E agora se diz que por lei não é possível criar empregos. O discurso está de acordo com o momento histórico. O Senador Fabiano Contarato nos diz que, se é para defender a classe trabalhadora, não tem espaço, não tem tempo, não dá para discutir. Então, veja, podemos, sim, melhorar as condições de trabalho e, com isso, melhorar a produtividade, melhorar a renda e melhorar, sim, as condições sociais do povo brasileiro. |
| R | Mas quero enfrentar os dois últimos argumentos: maior formalidade. Não estamos num cenário de formalidade das relações de trabalho suficiente no Brasil para permitir essa redução da jornada. Mas, vejam, isso foi sendo permitido justamente a partir da reforma. Essas precarizações foram sendo toleradas e hoje estão em discussão, e todos deveriam estar protestando na frente do STF para dizer para o Tema 1.389 que a pejotização não vai ser aceita, que isso é precarizar as relações de trabalho, que isso é, sim, reduzir a formalidade... (Soa a campainha.) A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - ... e é isso que a gente precisa enfrentar, quando eu dizia, na minha fala anterior, que a gente precisa assegurar isso para todos os trabalhadores e todas as trabalhadoras. E, por último, robustez institucional. Vejam o enfrentamento que tem sido feito com relações às instituições que defendem as relações de trabalho, o mundo do trabalho, a Justiça do Trabalho, o Ministério Público de Trabalho, o Ministério do Trabalho, sempre no sentido de enfraquecer essas instituições. Elas precisam, sim, ser robustas e elas querem ser robustas, querem estar aqui para cumprir a sua missão constitucional; inclusive, a partir da sua atuação, elas podem enfrentar, justamente, a concorrência desleal, impedindo que essas relações precarizadas gerem essa concorrência desleal. Então, elas precisam ser instituições robustas e estão aí para ser. Temos 900 auditores fiscais do trabalho para serem nomeados. Precisamos de mais, porque ainda não vamos ainda suprir toda a demanda de que a gente precisa. Mas, sem essas instituições robustas, efetivamente, a gente não vai ter relações de trabalho saudáveis, e é isso que a gente precisa assegurar. A gente está num cenário em que este debate acaba também se conectando com outro... (Soa a campainha.) A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - ... que é o decorrente da decisão do STF, na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão 73, que trata da regulamentação da proteção do trabalho frente à automação, que está lá no art. 7º da Constituição. O STF declarou que este Congresso está omisso com relação a essa regulamentação, e isso, evidentemente, tem que acontecer num cenário acompanhado desse debate com relação à redução da jornada, porque a automação, em regra, vai significar mais tempo para a vida, ou deveria significar mais tempo para a vida, com a redução da jornada de trabalho. Então, acaba sendo também um debate conectado e a gente vê que é efetivamente possível avançar. Essa modernização das relações de trabalho, a partir da automação e dessas novas tecnologias, não pode significar, de forma alguma, redução e enfraquecimento desse necessário dever de assegurar a proteção social; pelo contrário, a gente precisa assegurar essa justiça social, precisa assegurar dignidade... (Soa a campainha.) A SRA. CIRLENE LUIZA ZIMMERMANN - ... precisa assegurar inclusão e a redução de jornada, quando bem planejada, como está proposto aqui, com uma redução imediata, porque esse é o padrão social que a OIT defende desde 1962, para 40 horas. Depois, com mais uma redução gradual, acompanhada de políticas públicas, nós vamos, sim, alcançar um cenário em que a gente quebre essas barreiras - elas não são barreiras intransponíveis -, e, ao final, teremos, sim, uma justiça social muito melhor concretizada e o enfrentamento efetivo das mazelas que este Estado brasileiro ainda enfrenta. E, já que o Senador Fabiano Contarato terminou com poesia, eu também vou citar o nosso conterrâneo Mário Quintana - Das Utopias. Ele dizia: Se as coisas são inatingíveis... ora! Não é motivo para não querê-las... Que tristes [seriam] os caminhos, se não fora A mágica presença das estrelas! Então, olhemos para as estrelas. O nosso objetivo está traçado, e nós vamos alcançar o fim da escala 6x1. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Muito bem, Cirlene Luiza Zimmermann, Procuradora do Trabalho e Coordenadora Nacional da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora. (Risos.) Eu estou acelerando, pessoal, porque às 14h eu tenho que estar na tribuna lá no Plenário; e ainda queremos encerrar agora, rapidamente. |
| R | Todos falaram por, no mínimo, 20 minutos - os que usaram a palavra -, e isso foi bom, porque aprofundamos o debate. Eu queria aqui deixar uma recomendação somente: esse movimento, com as redes sociais, sindicatos, federações, confederações, sociedade civil, todos estão trabalhando. Mas, num outro dia, eu falei e vou falar de novo: você que está aí no seu município, você que está aí no seu estado, organize uma atividade na câmara de Vereadores, no seu sindicato, na assembleia legislativa. Eu aprovei algumas dezenas de leis aqui, e todas que aprovei com muita mobilização. Naquele tempo - porque eu venho de outros tempos -, eu não tinha tanta rede social como vocês felizmente têm. (Risos.) Era muito mais difícil. O que eu fazia? Eu visitava os 27 estados. Em cada estado, eu fazia uma atividade na assembleia e trazia de lá uma carta daquele estado pela aprovação da lei. Foram tantas leis que, ontem, quando eu estava fazendo um relatório no Plenário, alguém disse: "Pô, mas você vai trabalhar até as 5h ou 6h da tarde" - e comecei às 14h, fazendo um pequeno relatório. Mas dá certo, pessoal! Sindicatos nós temos em todos os municípios do país. Ao sindicato que está me ouvindo, organize, chame os sindicatos dos municípios e faça uma atividade lá, coloque nas redes sociais; faça na assembleia esse movimento de pressão nos três Senadores. Nós somos só três. Pressione os Senadores de cada estado. A pressão é democrática, legítima e justa. Todo mundo sabe que eu trato a todos com o maior respeito. Na Constituinte, se tivemos muito sucesso - fizemos uma Constituição Cidadã, e a maioria não era de esquerda, não - foi porque foi com muito diálogo e muita pressão aqui dentro e lá fora, e isso deu certo. Alguém poderia dizer para mim: "Pô, mas nós gostaríamos tanto que aprovassem, neste ano, a PEC definitivamente", mas vamos lembrar que nós temos um mês e meio para terminar o ano. Nós temos um mês e meio! E nós temos também, nesse um mês e meio, três dias por semana aqui dentro. Então, nós sabemos que é possível aprovar... Eu sei que muita gente vai dizer: "Ô, Paim, tinha que aprovar amanhã". Eu também gostaria - quem não gostaria de aprovar amanhã? -, mas, nas limitações do tempo e do espaço, para aprovarmos essa proposta tão importante, que eu chego a dizer que é uma proposta que tem o dom de aglutinar todo o povo brasileiro, precisa-se de muita firmeza, de muito embate, de muita discussão. É possível? É, mas com grande, grande mobilização. Eu queria cumprimentar todas as centrais sindicais que estão aqui hoje, que estão participando de todos os eventos. Queria cumprimentar todos os sindicatos, pelo número de correspondências que eles mandam aqui para nós. Queria cumprimentar todas as federações, cada um no seu limite e no seu espaço, que estão abraçando também essa caminhada. E quero cumprimentar aqueles também que estão fazendo abaixo-assinados nas portas de fábrica. Eu já recebi aqui milhões de assinaturas para eu entregar para o Presidente do Senado e, dentro do possível... Claro, na Câmara, eles estão fazendo igual. São muitas assinaturas! Então, a nossa gente está trabalhando para conseguir que seja realidade o fim da escala 6x1. |
| R | Eu aprendi, na vida, a ser sempre um otimista. Se aprovei o Estatuto do Idoso, o da Igualdade Racial, o da Pessoa com Deficiência, a política de cotas nos serviços públicos, a política de cotas nas universidades, salário mínimo de inflação... Quando eu viajei pelo Brasil, eu botei a inflação com o dobro do PIB, porque eu sabia que eu tinha que negociar ali na frente, e deixei depois só o PIB, como um bom sindicalista - e vocês aqui me ensinaram. Por isso, pessoal, eu queria que a gente saísse daqui convencido de que é possível - é possível -, mas com grande mobilização. Não dá para acreditar que, somente com um setor tocando, vai acontecer. Perguntaram-me: "Vai ter mais audiência pública?". Alguém me disse: "Não, vamos votar já semana que vem". Aqui tudo tem que ser medido, pessoal. Estou falando como quem tem 40 anos aqui dentro. Votar semana que vem para perder? É o momento exato a semana que vem? Tudo bem, vamos fazer mais uma audiência pública, e daí? O bom é nos aprovarmos, oxalá, aqui, no Senado, neste ano, mas tem que conhecer a Casa e conhecer como fazer para que as coisas, de fato, andem. Eu aprendi muito aqui dentro. Acho que está na hora de ir para casa, não é? Tem uma campanha que diz: "Fique, Paim." Eu digo: "Fique em casa, Paim, porque está na hora de ver os netos e bisnetos já". (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Tem que ter vida além do trabalho, e não só aqui dentro. Mas eu... (Intervenção fora do microfone.) (Risos.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - Mas, enfim, pessoal, eu estou muito feliz por ter a presença de vocês aqui. Cumprimento todos os painelistas, um melhor que o outro. Que bom que os empresários vêm e dão seus argumentos. Isso é bom, faz com que a gente se contraponha com os argumentos que nós entendemos fundamentais, como foi colocado aqui por vocês, pelos Deputados nossos que estiveram aqui também. Nossos Senadores e Deputados... Em outra vez, tivemos três ou quatro Deputados, além da Erika... Quem se lembra do nome dos Deputados que já estiveram aqui nesta Comissão? A Erika... (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - RS) - ... o Reginaldo, a Daiana, a Carol estiveram aqui debatendo a mesma posição. Isso é bom. Eu me comprometi, um dia, a ir à Câmara também, mas não tem jeito, até agora não consegui. Olhem que é só atravessar de um vidro para o outro. Mas eu quero encerrar dando uma grande salva de palmas à classe trabalhadora do campo e da cidade, da área pública e da área privada. Na área pública, eu sei que muita gente vai dizer: "Mas já tem 40". Os 40 podem ter, mas não tem 36; e a nossa proposta final é 4x3. Eu sei que tem algumas áreas que já têm 4x3. Só que não é só para vocês que já têm 4x3, nós queremos para todo o povo brasileiro. Vida longa ao povo brasileiro! (Palmas.) Vida longa a essa jornada de todos nós! Está encerrada a audiência pública. Registro a presença do Tiago Ranieri, Procurador do Trabalho e Diretor de Assuntos Legislativos da ANPT. (Iniciada às 10 horas e 09 minutos, a reunião é encerrada às 13 horas e 19 minutos.) |

