26/11/2025 - 55ª - Comissão de Educação e Cultura

Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 55ª Reunião da Comissão de Educação e Cultura da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura, que se realiza nesta data, 26 de novembro.
A Senadora Augusta Brito, proponente desta sessão - eu fiz um adendo também quanto aos convidados -, está numa reunião no palácio e pediu para eu ir começando. Quando ela chegar, a gente eventualmente pode trocar a coordenação. Não vamos perder mais tempo, porque vocês já esperaram acho que uma meia hora, não é? Ela está numa reunião de preparação da CPMI. Eu também sou membro, mas, como amanhã eu não venho - eu viajo hoje -, a gente priorizou: ela está na reunião preparatória, e eu vim abrindo a sessão.
Esta sessão se destina a uma audiência pública com o objetivo de debater o fortalecimento da Política Nacional para Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiros e de Matriz Africana, em atenção ao Requerimento nº 45, desta Comissão, e ao Requerimento nº 47, de autoria da Senadora Augusta Brito e de minha autoria.
Eu quero saudar a iniciativa, saudar cada um e cada uma de vocês e dizer que a criação da Política Nacional para Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiros e de Matriz Africana é um marco inegociável, de importância fundamental, sendo a ferramenta para ajudar certamente na superação do racismo religioso, garantindo o acesso a direitos e a proteção de territórios sagrados.
A atuação do Senado Federal deve garantir que essa política seja sustentada por medidas concretas que possam contribuir na implementação, de forma ágil, das ações da política nacional para superar qualquer desafio burocrático que porventura possa existir. O Legislativo é um espaço para discussão dos mecanismos que assegurem a inviolabilidade e a segurança física dos territórios e lideranças, combatendo o racismo religioso com rigor. Precisamos nos debruçar na necessidade de promover a segurança alimentar e o desenvolvimento sustentável desses territórios, facilitando o reconhecimento e o registro do patrimônio material e imaterial da matriz africana, tratando o racismo de forma transversal, combatendo as discriminações de gênero e de raça.
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Lá em Pernambuco, o meu estado, nós temos uma legislação na qual eu vou me inspirar, quando começar a tramitar, que é a Lei Estadual 14.852, que estabeleceu a obrigação do estado em proteger todo patrimônio de origem africana.
Nós tivemos, recentemente, o tombamento do Sítio de Pai Adão, um dos primeiros territórios - em Pernambuco, certamente o primeiro ou o segundo -, que tem um trabalho e uma liderança incontestável na defesa dos povos de matriz africana.
Essa lei deu prioridade, portanto, a todo esse tipo de tombamento; tombamento a antigos quilombos e terreiros, que foram transformados, transformaram e avançaram na valorização cultural como dever legal e uma ação antirracista de reparação.
No âmbito federal, a gente tem buscado garantir essa política e que ela seja sustentada por medidas complementares, como o PL 4.403, de 2024, que propõe um protocolo de atendimento nas escolas para enfrentar o racismo e a discriminação, reforçando a lei que tornou obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana nas escolas de ensino fundamental e médio.
É uma lei importante, mas que a gente precisa sempre reforçar, porque a sua implementação está longe de ser o ideal - sempre precisamos reforçar.
É uma lei de 2003, que é um marco também legislativo, mas que ainda não saiu integralmente do papel.
Esta audiência, portanto, vai nos ajudar a recolher elementos que possam subsidiar o debate, quando aqui ele começar a ser organizado de forma mais focada no projeto que virá.
Esta audiência é interativa e está aberta à participação dos interessados, por meio do portal e-Cidadania ou pelo telefone também distribuído e citado.
E vamos ouvir as contribuições dos nossos convidados e convidadas e, também, de quem está nos acompanhando através do sistema de interação do Senado.
Eu já convido, então, para se sentar à mesa, os seguintes convidados e convidadas: a Sra. Iyá Obádèyí Carolina, Coordenadora da Região Centro-Oeste da Rede Mulheres de Axé do Brasil.
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA (Fora do microfone.) - Boa tarde.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Boa tarde.
A Sra. Priscila Carvalho Leão, Diretora de Defesa dos Direitos Humanos do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
A Priscila chegou? Chegou!
Sejam bem-vindas!
O Ronaldo dos Santos, Secretário de Políticas para Quilombolas, Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana, Povos de Terreiros e Ciganos, do Ministério da Igualdade Racial.
Ainda não chegou.
E terá participação remota o Sr. Aderbal Ashogun, Coordenador da Rede Afroambiental.
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Não chegou ainda o Sr. Morfy Bomani, mas chegou o Sr. Roberto Costa Cardoso - a quem também chamou para a mesa -, Coordenador Estadual de Mato Grosso da Associação Nacional Cultural de Preservação do Patrimônio Bantu (ACBantu). (Pausa.)
Não chegou... Ah, ele vai participar remotamente. Então...
E Aderbal também, não é? (Pausa.)
Pronto.
Então, só reforçando o nosso endereço para a participação dos internautas pelo Portal e-Cidadania, no endereço senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800 0612211.
O relatório completo, com todas as manifestações, estará disponível no portal, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos expositores.
Na exposição inicial, conforme combinado, cada convidado terá o tempo de dez minutos; e, depois, a gente faz a devolutiva.
Temos um cronômetro, que marca o tempo. Ele é automático, meio estridente; quando falta um minuto, ele apita. Não precisa terminar...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - ... correndo, desesperada. (Risos.) Pode terminar com calma, porque ele é automático e não tem como a gente controlar. Está bem?
Então, já com a mesa composta, e os nossos convidados já no sistema, para fazer parte do nosso debate, eu passo a palavra, inicialmente, para o Sr. Ronaldo dos Santos, Secretário de Políticas Quilombolas.
Desculpem-me.
Passo a palavra para a Sra. Iyá Obádèyí Carolina, Coordenadora da Região Centro-Oeste da Rede Mulheres de Axé do Brasil.
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA (Para expor.) - Olá, boa tarde a todas as pessoas.
Vou começar, primeiramente, fazendo a minha audiodescrição: eu sou uma mulher preta do Cerrado e estou carregando as representações dos meus ancestrais.
Uso uma roupa dourada, em homenagem a todas as mulheres, fazendo referência também à minha ancestral Oxum e saudando todas as mulheres negras que estiveram, ontem, na nossa segunda marcha.
Então, saúdo a mesa, Senadora, e agradeço por esta linda iniciativa, que é muito importante para nós.
Feita a minha audiodescrição, peço bênçãos a todos.
Bênção, pai Aderbal, o senhor, que está online, e aos meus mais novos, aos meus mais velhos e aos meus iguais. Que Oxum nos abençoe!
Saúdo o Ori da minha Iyá e do meu Babá, onde ele estiver agora, e peço a bênção dos meus mais velhos.
Bom, conforme fui apresentada, sou uma Mulher de Axé do Distrito Federal e quero dizer, Senadora, que isso é um grande desafio. (Risos.) Ser uma mulher preta do Cerrado, no Distrito Federal, é uma questão. E eu sou brasiliense, tá, gente? A minha alma é baiana - eu gostaria muito de ser baiana, todo mundo me pergunta isso -, mas eu sou brasiliense.
Saúdo aqui a minha grande irmã, Mariana, uma pessoa que está aqui com a gente, cuidadora, e que tira as nossas fotos nos terreiros e das nossas saídas. É uma pessoa muito importante para nós.
E eu estou muito feliz de ver... O Babá falou do nosso momento histórico. Eu acho que isto é um momento histórico.
Bom, vamos ao aquecimento e vamos passar ao que a gente veio realmente debater.
Senadora, acho que a senhora já está acostumada, já ouviu falar que o povo de terreiro gosta de falar, não é? Mas tem um motivo.
Alguém já se perguntou por que, quando a gente chega aos lugares, a gente gosta de falar muito? Porque tem uma coisa que acontece muito com a gente: nós somos silenciadas nos lugares, e os nossos corpos incomodam.
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Mas hoje eu vim aqui para falar de algo que eu falei ainda há pouco ali, na Câmara, que eu fui convidada para estar na tribuna, da Deputada Talíria.
Hoje eu vim celebrar: celebrar a nossa existência, tentar participar dessa construção de forma proativa, porque pessoas e mulheres de terreiro e comunidades tradicionais são competentes e inteligentes.
Saúdo a Diretora Luzi aqui, porque, sem ela, a gente não... Peço uma salva de palmas aqui, gente. (Palmas.)
Porque, sem ela, eu não estaria... Nós não estaríamos aqui, discutindo isso hoje, né?
A senhora traz algo muito importante na sua fala... Porque eu iria fazer a minha introdução, que é a implementação da Lei 10.639.
Eu penso que... Nós somos pessoas de terreiro, tudo começa com uma boa educação.
Essa lei foi instituída lá em 2003, mas já teve uma outra lei depois dela, lembrando aqui, que é a Lei 11.645, que garante a questão curricular, de matrizes curriculares, para todos os povos de terreiro e comunidades tradicionais. Então, é importante a gente ressaltar que a gente já está com o passo... A gente já está avançado, e essa política dessa questão pedagógica está incluindo uma questão muito importante para nós, que é a questão dos povos dos campos. Porque normalmente se faz uma referência, Senadora, a que os terreiros só estão nos campos, só estão nas questões rurais. Nós não estamos; nós estamos em todos os lugares.
Isso é importante demarcar, já que a gente está aqui para a gente criar novas encruzilhadas e novos caminhos. Lembrem-se dos terreiros urbanos, né? Temos terreiros em todos os lugares.
Lembro também que nós somos corpos-territórios. Então, quando a gente sai, o nosso terreiro vem junto conosco.
Eu aprendi isso com a Luzi. Um dia, ela falou isso numa fala lá no MIR, e eu estou aqui plagiando.
E, aí, quando a gente fala dessa questão dos povos do campo, eu trago também, Deputada, para a gente discutir, o Decreto 12.278, que institui essa política.
"Nossa, Iyá Obádèyí, você só está falando de lei". Porque eu acho que o meu papel aqui, hoje, é pedir um "cumpra-se" - um "cumpra-se".
Nós já temos, Senadora, muitas ferramentas e muitas ações que podem fomentar e garantir o nosso direito à vida, o nosso direito à existência. Essa promoção que a gente traz, nessa implementação dessa política, é uma promoção da participação, sem ineditismo, de todas as nossas comunidades - isso é importante de ser dito aqui -, o reconhecimento das nossas terras... Porque não existe saúde mental...
Saúdo aqui a minha mais velha, a Mãe Darabi, que chega agora.
Sua benção, minha mãe.
Não existe nada disso, se a gente não conseguir, Senadora, reconhecer que essas pessoas... Que nós precisamos de um lugar; nós precisamos de terra. Não existe corpo-território sem um lugar para poder retornar. Isso é muito importante de ser dito aqui hoje, para ajudar no debate.
A gente tem a promoção de saúde e do bem-estar, porque os terreiros estão, literalmente, engajados em movimentos de políticas públicas que, muitas vezes, o Governo não faz, o Governo não implementa essa política pública. Então, a gente funciona, sim, como um local de bem-estar, de saúde mental, de saúde integral.
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E a gente precisa discutir algo que é muito importante, que é a segurança e a proteção contra os nossos corpos. Não existem povos se a gente não estiver viva.
Então, acho que a gente está falando de várias coisas aqui que são muito importantes para chamar a atenção do "cumpra-se". A gente não está começando nada agora; a gente não começou nada ano passado, né?
E, aí, a pergunta que fica é: por que é que a gente não consegue o cumpra-se? - eu acho que é isso que a gente veio buscar aqui também, né? - Qual o caminho que a gente pode buscar para que isso aconteça? Por que tantos corpos têm que continuar morrendo e tantos corpos têm que continuar sendo marcados, para que a gente vire o quê? Uma placa? Não, eu não quero ser uma placa. Eu quero continuar, porque eu tenho filhos que vão vir depois de mim e que vão ocupar aquele terreno, aquele território.
Então, a gente está falando de questões que parecem simples, mas não são.
O nosso ancestral traz ferramentas, para que a gente consiga implementar isso. E eu vou falar repetidamente hoje: cumpra-se.
A gente não está pedindo nada; a gente já conseguiu a política. Por que é que a gente fica parado?
Há um atravessamento de uma questão de intolerância religiosa? Acredito que sim.
Há um apagamento histórico das nossas existências? Estou entendendo que sim.
Então, por que, quando a gente chega à escola da minha filha - aqui, eu sou brasilense -, ela nunca ouviu falar de nenhum ancestral que não fosse um ancestral europeu?
Ela não se sente representada. Minha filha é uma menina indígena, de 15 anos, da etnia fulniô.
Eu falo isso com muito orgulho, né? Para além de uma mulher negra, eu pari uma indígena. Isso é muito importante de ser demarcado também.
Mas até quando a gente vai ficar só demarcando? Até quando os nossos corpos irão adoecer, frente a tantas batalhas que a gente implementa?
Porque essa política... - está aqui a nossa Diretora Luzi, que não nos deixa mentir: foram muitas coisas que fizemos para que isso acontecesse. O desgaste foi muito grande, né? Ela teve um cuidado muito especial conosco. Ela abriu, ela conversou, ela lutou...
E agora? E o cumpra-se? Sim, vou repetir: e o cumpra-se?
Nós não podemos ter medo de exigir o que já estamos fazendo lá atrás.
E muito obrigada, Senadora, pela sua atitude de querer nos ouvir. Nada de nós sem nós, né?
Mas não pode ser de qualquer jeito. A gente não está mais aqui para aceitar o de qualquer jeito, que vai ser assim...
"Ah, porque a gente tem ali a lei". O.k., tá.
(Soa a campainha.)
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA - A gente tem a lei, mas a gente quer uma ação.
E a gente agradece, enquanto Mulheres de Axé do Brasil, essa oportunidade de estar aqui com a senhora, de poder debater, abrir para o debate.
Eu li as perguntas do site e quero agradecer a todas as redes que eu estou vendo aqui, que também participaram, e ao Pai Aderbal, que nos proporcionou este encontro.
Saúdo mais uma vez Mãe Darabi, que é a minha mais velha, que está aqui.
E agradeço, Luzi, mais uma vez, por toda a sua generosidade conosco nesse processo.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada também.
Passo agora a palavra para Priscila Carvalho Leão, Diretora de Defesa dos Direitos Humanos do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, já mandando um abraço para a Ministra Macaé.
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A SRA. PRISCILA CARVALHO LEÃO (Para expor.) - Será dado.
Boa tarde a todos, todas e todes.
Peço licença também aos mais velhos. Louvo os ancestrais.
É uma grande honra estar aqui hoje, debatendo um tema tão importante, caro para nós, principalmente a gente que está no Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, porque tem sido uma grande prioridade da Ministra Macaé esta pasta nossa.
Como a que me antecedeu - eu inclusive saúdo como uma filha de Iansã, filha de uma mãe pernambucana e um pai baiano, sou baiana também -, penso e repenso todos os dias, desde o meu processo de escolarização, como é difícil ser uma mulher negra nesta sociedade e neste Brasil.
A marcha, ontem, dizia muito sobre isso. A gente acompanhou muitas mulheres dialogando e protestando por mais espaço, mesmo com legislações que já nos respaldam. É sobre isso que a colega que me antecedeu faz a reflexão e nos convoca a debater.
Nós, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, aqui representando a Secretaria Nacional de Promoção e Defesa de Direitos Humanos, estamos concentrados em algumas políticas e ações de defender. Ainda estamos naquela esfera de promoção e defesa, e a gente já queria estar um passo à frente, mas, infelizmente, é isso.
A gente está num campo de relações de forças, de correlação, e a gente, arduamente, trabalha todos os dias, para avançar nessa política de combate ao racismo, da intolerância religiosa, de proteção aos povos de terreiro.
O MDHC tem elaborado algumas estratégias de ação, através da nossa Diretoria de Promoção e Direitos Humanos, da sua Coordenação-Geral de Promoção e Liberdade Religiosa, no que toca a algumas políticas de enfrentamento, que a gente não faz sozinha; a gente discute, dialoga, e temos elaborado e feito parcerias com Termos de Execução Descentralizada.
Recentemente... Inclusive, será divulgado agora, na nossa Conferência Nacional de Direitos Humanos, de 10 a 12 de dezembro, um importante estudo, que inclusive é inédito no Brasil, que mapeia violências sofridas por comunidades de matriz africana e orienta a formulação de políticas públicas de proteção em todos os territórios nacionais.
Através de um TED do MDHC e a Unirio, em parceria com a Renafro, o projeto Respeite Meu Terreiro vem demonstrar o quanto ainda somos violentados em nossos espaços de culto, em nossos espaços de defesa, em nossos espaços de luta.
O projeto prevê... Já foi divulgado na plataforma Power BI, foi lançado agora, no último 23 de novembro, e vai ser divulgado, lançado também em solenidade na Conferência Nacional de Direitos Humanos - já está disponível inclusive no nosso site.
É importante que vocês acessem, principalmente as entidades, autoridades aqui presentes que trabalham com políticas públicas destinadas a esses povos em específico.
Nós temos algumas pastas, dentro do Ministério dos Direitos Humanos, que têm desenvolvido algumas ações centradas também no processo de defesa, de estudos e de desenvolvimentos de povos e comunidades tradicionais de matriz africana, no tocante aos direitos sociais e previdenciários das pessoas idosas e com deficiência.
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A Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa tem valorizado esses povos e essas comunidades tradicionais, através também de várias ações no eixo da cultura, da economia sustentável, das tecnologias, valorizando recursos naturais, locais, e práticas de saberes de pessoas idosas e povos de comunidades tradicionais, que são, inclusive, o público-alvo dentro desses territórios mais respeitados e festejados, porque são com os mais antigos que a gente aprende e se perpetua na nossa ancestralidade.
Nós temos uma parceria - eu acho que o Ministério da Igualdade Racial já deve ter chegado e vai falar um pouco sobre isso. Este é o proponente, o MIR -, um Acordo de Cooperação Técnica, firmado em 2024, junto com o MIR e o Ministério das Mulheres, para desenvolver e celebrar um protocolo de tensões no setor aéreo, que vai proporcionar um ambiente mais inclusivo, acessível, seguro e respeitoso, nesse setor, a esses povos de comunidades tradicionais. Eu acho que o MIR também vai se aprofundar um pouco.
A promoção permanente de campanhas em defesa da liberdade religiosa, com temas específicos, que envolvem assédio religioso, direito à infância de axé, direitos da maternidade no axé, mobilidade social, o sagrado, o terreiro legal...
São projetos que a gente desenvolve através da Assessoria Especial de Comunicação Social, da Coordenação-Geral de Promoção da Liberdade Religiosa, e que têm avançado e se aperfeiçoado cada vez mais, considerando as demandas que chegam, na contemporaneidade, a todo momento.
E não é novidade que, através do nosso Disque 100, recebemos, em nossos canais de denúncia, diversas situações de violação de direitos desses povos tradicionais no Brasil e afora.
Estamos atuando, através da nossa Ouvidoria, na defesa e no combate a esta intolerância, que, na verdade, nada mais é que a manifestação do racismo estrutural.
Nós, do MDHC, lidamos todos os dias com diversas violações de direitos humanos e situações de tortura, mas o que nos toca, em especial, é a cor desse público, de quem é violentado.
Em todas as nossas pastas, na maioria delas, o violentado é sempre o preto, a preta, o pobre, e isso nos leva a refletir, a pensar políticas destinadas à defesa intransigente desses públicos em especial, que são os mais violentados e marginalizados na sociedade brasileira.
E são a maioria, não são minoria - minoria no sentido de espaço, de oportunidade; mas são a maioria -, são quem representa este Brasil e são a cara do Brasil, porque nós somos constituídos como brasileiros, a partir desse povo da África.
Então, é nesse sentido que o MDHC, através da nossa Ministra Macaé, tem refletido e tem dialogado com diversas instâncias da sociedade.
Entre elas, nós temos um Comitê Gestor da Política Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiro e Matriz Africana, recém-lançado nos dias 18 e 19 de novembro. Foi instalado esse comitê, para discutir e dialogar questões dessa pasta.
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É preciso estreitar essas parcerias com a sociedade civil, com os povos de terreiro, para que nós discutamos juntos ações efetivas, que garantam realmente a efetividade do cumprimento da lei, do cumprimento ao culto, do cumprimento à reparação do Estado em relação a essas violações.
Não é possível mais nós estarmos em 2025 e ainda nos depararmos com casos emblemáticos de pessoas violentadas, crianças pretas, negras, nas escolas sendo violentadas, pais e mães ainda tendo que defender esse espaço já constituído e garantido pelo ser, como foi constituído e como é constituído este Brasil.
Então, nesse sentido, o MDHC se coloca à disposição para este debate, para estreitar a discussão. Nós estamos de portas abertas.
A nossa Ministra é muito emblemática quando diz: "Não fazemos sozinhos".
Nós estamos em um espaço de correlação de forças, então é chegando assim, como uma boa preta, uma boa negra, e devagarinho, que a gente vai conquistando nosso lugar, nosso espaço, porque não é fácil viver em uma sociedade e em um governo em que a gente se depara ainda com preconceitos e com intolerâncias nesta mesma Casa, aqui, em que estamos debatendo.
Nesse sentido, eu quero agradecer o espaço e me colocar à disposição, para encaminhamentos, para agendas...
A gente está aqui para contribuir e, com vocês, que aqui são maioria, mulheres pretas, de povos de terreiro - dá para ver pelas nossas simbologias aqui representadas e entidades que aqui estão -, para que a gente possa somar nessa luta.
Quero agradecer e colocar-me à disposição.
Obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Somos nós que agradecemos, Priscila, e também nos colocamos à disposição do ministério para as alianças e os debates necessários.
Agora, de forma remota, eu vou passar a palavra para o Sr. Aderbal Ashogun, Coordenador-Geral da Rede Afroambiental.
Nós vamos abrir a tela ali. Ele já está conectado.
O SR. ADERBAL ASHOGUN (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde.
Eu queria agradecer a oportunidade de estar aqui, falando pelo meu povo, neste espaço tão necessário.
Eu sou um homem negro, rasta, tenho 60 anos, sou da cultura tradicional dos povos de matriz africana, sou Mestre de Cultura Viva, coordeno a Rede Afroambiental, coordeno o Pontão Articula Matriz Africana e sou Diretor da Escola Afroclimática Mãe Beata de Yemanjá.
Eu acho providencial esse tema de educação e cultura. Eu acho que é providencial que a gente aproveite e acelere esse tempo de desaprendizado desse modelo que está aí de educação e de cultura, que é feito para atender aos interesses da branquitude.
Quando a gente fala de educação do povo de santo, como éramos chamados antigamente, como os povos de terreiro eram chamados antigamente, lembro que nós utilizamos a ferramenta do sincretismo religioso, para que pudéssemos manter vivo todo o nosso complexo cultural e nos educar através desse conhecimento repassado por mestres e mestras de cultura tradicional, e não religiosos, como o sistema coloca, para tentar reduzir o nosso conhecimento e subdimensionar a nossa colaboração com a humanidade.
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A gente está falando aí de uma educação, no Brasil, que é fundamentada no conhecimento eurocêntrico, judaico-cristão. A gente está falando aí de uma educação em que o ensino...
Tem 22 anos que a Lei 10.639 está para ser implementada. A implementação tem que ser já! A gente sabe muito bem quais são os motivos da não implementação da história e cultura afro-brasileira e africana no Brasil.
Nós temos a bancada da Bíblia; nós temos as escolas fundamentais nas regiões metropolitanas e nas periferias. São relegadas, são dadas como oferta para as igrejas, para que elas possam catequizar e professar a fé no ensino confessional dentro da escola no Brasil, um Estado laico.
Quando a gente fala de educação, a gente quer falar desse ensino em que a gente não vê a capoeira como esporte nacional, como ferramenta de transformação, com a sua pedagogia eficiente na dança, no cântico, nas artes. É dessa educação que a gente está falando. Uma educação que é barrada pelo racismo religioso, que tem que ser barrado pela segurança pública e pela Justiça, porque é crime.
Nós estamos cansados de botar os nossos, que já são vulneráveis, em posição de conflito, de vulnerabilidade, com o crime, com verdadeiras facções que levam dinheiro do tráfico e que não permitem o exercício da nossa cultura. A gente está falando dessa educação.
A gente não pode dizer que Lélia Gonzalez está feliz, porque, de lá para cá, a gente não avançou. E não podemos dizer que Joel Rufino esteja feliz, porque, de lá para cá, não avançamos.
A gente está falando de uma educação em que a pesquisa, até hoje, é higiênica e que se refere ao nosso conhecimento e aos nossos corpos como objeto.
Nessa educação que está posta aí hoje, nós não somos a fonte inesgotável de conhecimento da humanidade e que, para o Brasil, veio nessa diáspora forçada e, mesmo assim, manteve, no seu orixá, na sua cabeça... Orixá nada mais é do que raciocínio. É a ferramenta que nós usamos para sobreviver, primeiro, na natureza e depois, na violência do opressor, do sanguinário, da besta-fera.
A gente está falando aí de uma pesquisa que se especializou em plagiar e espoliar o conhecimento de matriz africana, que se origina na África.
A gente está falando aí de uma extensão que ainda não concebe que o conhecimento de matriz africana, a cultura dos povos tem que ser o quarto pilar da educação.
É dessa educação que a gente está falando.
É dessa educação que eu aprendi dentro dos terreiros no Brasil. Uma educação plena, uma educação do campo, da água, da floresta, mesmo não tendo, mesmo estando na cidade.
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Mesmo nessa cidade, nós trouxemos o espírito e o encantamento desse campo, dessa floresta, dessa água, dessa terra. Fazemos esse trabalho desde sempre.
Mas hoje a gente vê aí uma educação ambiental, que nós também incentivamos, na Eco 92 - colaboramos com o Tratado de Educação Ambiental Global -, e não está o conhecimento dos povos tradicionais de matriz africana, dos povos de terreiro, do povo de santo.
A gente vê, nos documentos dessa COP - que é a FIFA do meio ambiente -, comunidades locais, e a gente precisa normatizar o que é comunidade, o que é povo.
Povo são os povos de terreiro que se mantiveram, desde a África para cá, e que têm origem.
O Estado vem cometendo epistemicídio, quando reduz os povos de terreiro à religião. Hoje, nós vivemos um caso de calamidade, calamidade cultural, por conta do epistemicídio em curso, por conta de algumas lideranças neopentecostais.
Tem que ser real! Não pode mais a gente ficar aqui, falando da 10.639, e, na narrativa do Estado, não estarem povos de terreiro como detentores do conhecimento original de África no Brasil. Não estão.
Quando nos botam em conflito com outros povos, é porque não nos atendem igual a outros povos.
Nós temos que ter o nosso ministério ou, pelo menos, sair deste Governo com uma secretaria dentro do Ministério da Igualdade Racial, para dar conta desse complexo cultural de matriz africana.
E, aí, eu agradeço por ter ao lado essa mulher singular, guerreira de Xangô, no dia de hoje, Luzi Borges.
Airà kò so, oba jó, jó.
Nós estamos em luta, não estamos em guerra; estamos em luta para manter uma cultura. Uma cultura que, até hoje, não é reconhecida dentro do Sistema Nacional de Cultura.
Nós não estamos no conselho enquanto povos tradicionais de matriz africana; nós estamos como arte afro-brasileira, não sei o quê, não sei o que mais lá, mas, antes, nós fizemos esse exercício.
Eu pedi a dois amigos, e trabalhamos juntos, três, para exigir do Ministério da Cultura que nós tivéssemos um assento no Conselho Nacional de Política Cultural, e conseguimos. E, aí, depois, entrou o inominável e quebrou o Ministério da Cultura.
Mas aí nós voltamos, ajudamos a eleger este Governo, e nós queremos de volta esse assento.
Nós fizemos um plano setorial de povos de matriz africana, com o nosso abá, o nosso mais velho, Bàbá Paulo Ifatide - kawo -, e Táta Kinamboji - kawo.
(Soa a campainha.)
O SR. ADERBAL ASHOGUN (Por videoconferência.) - A gente está falando de uma cultura que sustenta este Brasil; a gente está falando de uma cultura que está sendo espoliada - desde o Carnaval até a apropriação de patrimônio histórico - da memória, em museus da branquitude, com sinhazinhas e sinhazinhos filantrópicos tomando conta dessas obras.
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Não se fala em repatriação, assim também como não se fala em reparação.
Hoje, o epistemicídio em curso nos dá a certeza de que nós temos que normatizar. Nós somos povos: povos indígenas, povos ciganos, povos de matriz africana, de terreiro. Então, a gente tem que partir daí.
Eu acho que o trabalho a ser feito é barrar o racismo científico pela educação, é barrar o racismo ambiental, através do não exercício da nossa ecologia e cultura no ambiente, e o racismo religioso tem que ser combatido com justiça e segurança pública.
Isso não é função de nós, lideranças e mestres de cultura tradicional.
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - PE) - Muito obrigada também, Aderbal, pelas suas palavras.
Como eu disse no início, esta audiência foi requerida pela Senadora Augusta Brito - eu fiz um adendo de convidados e nós fizemos um bem-bolado aqui de horário. Ela estava numa reunião, como eu expliquei, mas ela chegou. E, aí, devido à minha atividade, tenho que correr, porque vou viajar ainda hoje.
Mas quero, antes de passar para a Augusta, agradecer a oportunidade de ter estado aqui com vocês e, mais uma vez, dizer à Senadora da importância de ela ter trazido este debate para o âmbito da Comissão de Educação e de passar a coordenação a ela, que vai concluir a composição da mesa, com os dois últimos convidados a falar, e depois abrir o debate.
Muito obrigada.
Vamos para a luta!
Não estamos em guerra, mas estamos em luta, como disse Aderbal. (Palmas.) (Pausa.)
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Boa tarde.
Quero aqui agradecer imensamente a todos e todas que aqui estão presentes nesta audiência pública e reafirmar o que nossa querida Senadora Teresa já acabou de falar, da importância deste momento para que a gente possa estar discutindo aqui com os verdadeiros atores que foram convidados a participar e que têm total legitimidade para falar nesse espaço aqui do Senado Federal, onde a Comissão de Educação, a qual a Teresa preside, aprovou esta audiência pública, para que nós pudéssemos aqui ouvir e, além de ouvir, discutir, debater, e seguir alguns encaminhamentos que sejam aqui tomados, a partir desta audiência pública.
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Como não sou eu que vou falar (Risos.)... nós temos os nossos convidados e convidadas, quero ter o prazer de ouvir o Sr. Ronaldo, que veio aqui compor a nossa Mesa, já agradecendo a sua disponibilidade. Eu não sei quanto tempo a Teresa estava... Dez minutos? Pois, então, vamos continuar com os dez, mas, se precisar de mais, não se preocupe, a gente acrescenta.
O SR. RONALDO DOS SANTOS (Para expor.) - Boa tarde a todas as pessoas. Saudação, Senadora, às pessoas que acompanham comigo esse dispositivo; Diretora Luzi Borges; toda a equipe da SQPT aqui presente; temos Conselheiros do Cnpir aqui presentes, do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial.
Estamos aqui em mais uma agenda nesta Casa Legislativa, em que é fundamental debatermos e discutirmos as questões que importam à sociedade brasileira, ampliando os debates acerca da nossa própria identidade, uma vez que temos, historicamente, subtraídos ou negados ou invisibilizados, elementos fundamentais daquilo que nos constitui enquanto povo brasileiro, enquanto sociedade brasileira, e só o debate, só o debate em espaços estratégicos, como, por exemplo, o Senado Federal, pode trazer de volta o significado daquilo que nós somos, daquilo que nos constitui.
Essa é uma agenda fundamental nesse Novembro Negro, um debate fundamental, uma vez que os povos de comunidades tradicionais de matriz africana e de terreiro... Historicamente, todo o processo de construção da nossa, em todo o nosso processo de colonização, todo o processo de construção da República é pautado na violência contra os povos africanos e contra os povos afrodescendentes.
A abolição da escravidão se dá - a abolição inconclusa - no ano de 1888 e é seguida imediatamente pela proclamação da República, que traz consigo um pacote de agenda antipresença da população negra e seus símbolos e seus significados. E a criminalização e o uso da força, da repressão, foram - e ainda são, ainda que não oficialmente - instrumentos muito efetivos nesse projeto de construção de uma nova República, de uma República que pretendia ser menos negra do que a condição daquele momento já indicava que seria, e, obviamente, já indicava, pelo grande contingente de população negra desembarcada no Brasil por ocasião da escravidão, do processo de escravização da pessoa negra.
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O Brasil teve um dos fluxos migratórios do tráfico negreiro mais intensos da história, e foi o último país a admitir o fim da escravidão tal qual ela existia e era legalizada.
E, obviamente, a Nova República surge com uma massa significativa de pessoas agora livres, porém sem nenhum projeto de reparação, que passam a construir e a constituir suas próprias formas de existir nesse lugar, apesar desse Estado republicano.
E aí a população negra necessariamente se organiza para enfrentar toda forma de discriminação e de criminalização, haja vista que o samba já foi crime, a capoeira já foi crime, tudo aquilo que é parte do que a população negra trouxe da terra-mãe, enquanto matriz, enquanto referencial cultural, foi criminalizado por esse novo Estado republicano.
Dessa forma, as religiões, as expressões religiosas e espirituais de matriz africana foram criminalizadas por esse novo Estado republicano, e é muito recente a admissão no Estado brasileiro das práticas culturais desse povo, que é o povo que descende de África, ainda que estejamos falando de povo brasileiro.
Importante dizer ainda que esse conjunto de expressões culturais, na medida em que se supera a etapa da criminalização, que é uma parte que sustenta, que alicerça o processo de encarceramento da população negra - o sistema carcerário não é preto, não é obra do acaso, é fruto de uma política de Estado que determinou que fosse assim -, na medida em que essas práticas vão sendo descriminalizadas, elas se tornam patrimônio brasileiro. Elas perdem, inclusive, a autoria; elas perdem, inclusive, a propriedade intelectual. Aquilo que era do povo preto e era crime agora passa a ser de todos nós, é patrimônio brasileiro, porém, o legado fica, e fica, inclusive, no comportamento da sociedade no que diz respeito a lidar com o outro, na sua diferença, na sua diversidade.
Ontem, eu tive o prazer de receber a Mãe Lúcia, que veio da Paraíba para a Marcha das Mulheres Negras - aliás, salvem as mulheres negras pela belíssima marcha realizada aqui em Brasília -, mas, infelizmente, a Mãe Lúcia vinha trazer mais uma denúncia. Estávamos eu, Augusto, a Nahiane, que está aqui na nossa equipe.
Aquele encontro, que poderia ser um encontro de celebração, foi mais um daqueles encontros de dores.
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E a Mãe Lúcia trazia a denúncia sobre o racismo religioso sofrido por causa dos aplicativos, Uber, transporte por aplicativo, sistematicamente. Quando essas pessoas, esses motoristas percebem quem é o cliente que está chamando, convidando, cancelam a corrida, não vão. E aí, em alguns casos, como foi aquele caso, ainda fazem... ainda falam questões que violentam duas vezes. Ele fala "o sangue de Jesus tem poder", "passa para outro", cá-cá-cá, coisas desse tipo.
Mãe Lúcia, como uma cidadã, aciona o sistema de justiça e tem, inclusive, uma interpretação de um juiz que diz que ela está praticando o racismo religioso, intolerância religiosa quando ela se ofende com o "sangue de Jesus tem poder". Ou seja, o juiz faz uma interpretação transformando a vítima na pessoa que discrimina, que violenta.
Ou seja, esse episódio está narrado um conjunto de violências e discriminações em escala, porque o motorista do aplicativo não está autorizado e nem orientado a fazer como ele fez...
(Soa a campainha.)
O SR. RONALDO DOS SANTOS - ... ele está apenas pautado numa consciência que foi forjada por uma história que nós temos enquanto sociedade.
Esse juiz que, por sua vez, também tem seus parâmetros ideológicos e religiosos, julga a partir de um arcabouço de consciência adquirida, forjada num contexto social.
Então, esse é só um exemplo daquilo com que nós nos deparamos quando nos desafiamos - agora falando enquanto Poder Executivo - a lançar o decreto que cria a Política Nacional para Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiro e de Matriz Africana, Decreto 12.278, de 29 de novembro de 2024, onde precisamos... Sabemos que isso é só um passo...
(Soa a campainha.)
O SR. RONALDO DOS SANTOS - ... mas entendemos que precisamos, com iniciativas como essa, fortalecer o enfrentamento ao racismo religioso. Com isso queremos dizer que a instalação dos núcleos de acolhimento Mãe Bernadete, que lançaremos em algumas cidades, é uma iniciativa de acolhimento e enfrentamento ao racismo religioso, mas também pensa o fortalecimento e empoderamento dessa comunidade frente a esse conjunto de violências sofridas.
E a gente está falando de cidadania, a gente está falando de cultura, a gente está falando de produção, porque são pessoas que produzem, são pessoas comuns...
(Soa a campainha.)
O SR. RONALDO DOS SANTOS - ... porque não faz sentido um motorista de aplicativo diferenciar, na hora de escolher, se quer ou não quer levar aquela pessoa para o seu destino.
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Bom, encerrado o nosso tempo, a gente segue aqui para o debate. Nós entendemos que é a primeira vez que nós temos um conjunto de ações previstas num decreto do Presidente da República voltado especificamente para o fortalecimento de uma parte da nossa comunidade, que são os Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiro e de Matriz Africana.
Esperamos, assim, que o legado construído e os resultados construídos, que, obviamente, partem de lutas e esforços que vêm...
(Soa a campainha.)
O SR. RONALDO DOS SANTOS - de outros tempos, de outras pessoas, que, a seu lugar, fizeram as lutas que precisavam ser feitas, que possamos, a partir daqui - nós, enquanto Poder Executivo, junto com o Poder Legislativo, que se propõe a trilhar juntos essa luta por emancipação do povo negro no Brasil - deixar um melhor legado para as próximas gerações e as próximas lutas.
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Obrigada. Nós que agradecemos aqui.
E, antes de convidar, também com muito prazer aqui, o Sr. Ronaldo dos Santos, que vai participar de forma remota, eu queria dizer que nós temos algumas perguntas que foram encaminhadas de forma virtual - acho que já foram distribuídas para os nossos convidados - e eu queria também aproveitar e fazer já só uma pergunta sobre a questão do decreto que foi citado aqui. É o 1.228? Eu não peguei aqui o número do decreto. (Pausa.)
É 12.278. Que a gente possa pensar - não sei, é que eu estou querendo já dar algum encaminhamento, uma sugestão -, que a gente possa pensar, especificamente nesse exemplo que foi dado, da Irmã Lúcia, do aplicativo, qual a ação mais concreta, além do decreto do Poder Executivo, o que o Poder Legislativo também pode fazer, vindo uma sugestão, proposição de vocês. Assim, para que a gente pense, é um exemplo: tem um decreto. Que, em cima do decreto, a gente possa criar alguma lei, a gente possa fazer alguma coisa também no Legislativo para que a gente não termine na audiência pública, mas que a gente continue, depois dela, com o grupo de trabalho, formulando alguma proposta também para a gente apresentar no Legislativo, porque aí a gente dá tanto visibilidade para combater como também uma efetividade da nossa audiência pública e do Poder Legislativo... Como sugestão, eu pensei, senão eu esqueço, e já falei logo.
Mas agora já quero chamar e ter o prazer de ouvir, de forma remota, o Sr. José Roberto, que vai participar. Já pode abrir aqui o áudio. Tem dez minutos e, se for necessário, não se preocupe, a gente acrescenta o tempo.
O SR. JOSÉ ROBERTO COSTA CARDOSO (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde.
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Começo louvando os meus ancestrais, aqueles que, desde que chegaram a terras brasileiras, vindo nos porões daqueles navios negreiros, foram escravizados e lutaram para que acontecessem momentos como este, momentos em que nós podemos discutir o futuro do nosso povo, o futuro do nosso povo de santo.
Peço a bênção a todos os meus mais velhos, aos meus mais novos e aos meus iguais que fazem parte dessa luta e que se fazem presentes por esta transmissão.
Sou o Baba Roberto, aqui da cidade de Campo Grande, Estado de Mato Grosso do Sul.
Os relatos que escutamos, inclusive do Sr. Ronaldo, para nós, povos de santo, não é novidade, porque passamos por isso diariamente. Diariamente, escutamos relatos dos nossos irmãos que passaram por essas situações ou por outras mais difíceis também.
Vivemos em um país em que falamos de uma lei, a Lei 10.639, que depois é trabalhada com a 11.645. Temos leis, temos decretos, e acredito que realmente precisamos que seja cobrado que essas leis se cumpram.
Aqui no estado, especificamente no município, fiz um levantamento: são 214 escolas municipais, e temos a Lei 10.639. Fui fazer uma pesquisa em cada escola, para saber como era aplicada. Dessas duzentas e poucas escolas e instituições, somente oito fazem alguma coisa, trabalham algo sobre a Lei 10.639. Nós ainda temos essa resistência. Somos um país que deveria, de fato, ser laico. E precisamos estar atentos quando falamos de leis.
Nós falamos da perseguição e de prepararmos também quem está à frente de alguns órgãos para que recebam as nossas denúncias, porque, quando chegamos a determinados locais para fazermos o boletim de ocorrência e registrarmos a situação por que passamos, nós somos indagados: "Isso é racismo? Isso é racismo religioso? Existe isso?". Então, temos que nos preocupar com a execução da lei e também com o preparo: que de fato tivesse uma lei que entrasse em vigor e que esses órgãos que vão nos atender tivessem também o preparo, tivessem o estudo de como abordar e como receber essas denúncias.
Querem nos calar, há muitos anos, porém nós, povos de santo, vamos sempre estar dando o nosso jeito de resistir, com nossos atabaques. Então, são leis, são decretos que precisam ser revistos.
Na maioria das vezes, nós, povos de santo, povos de terreiro, ficamos à sombra de outros órgãos. A política pública que, de fato, é feita, é construída para o nosso povo precisa ter um olhar mais específico e mais direto no cumprimento da lei.
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Nós queremos ser diferentes, não. Não somos diferentes dos demais segmentos, dos demais parentes evangélicos, dos parentes católicos, mas nós queremos esse respeito e esse respaldo de uma lei que, de fato, possa nos representar. Que eu tenha onde buscar e saber que eu vou ser acolhido, que eu vou ser escutado, que vou ser ouvido naquele momento em que eu vou levar essa reclamação, buscando uma solução, porque nós acreditamos na lei.
Aqui no estado onde eu vivo, de janeiro até o mês passado, nós tivemos 188 denúncias de racismo religioso ou injúria racial, porém algumas dessas informações ainda são sucumbidas. Então, nós precisamos também preparar essas pessoas, mostrar que existe essa lei e que ela precisa ser cumprida. As situações que acontecem no Norte, Nordeste, Sul, Centro-Oeste do racismo e da intolerância estão em todos os municípios.
Hoje eu faço parte de uma secretaria em que nós sentimos mais a necessidade de o nosso povo ser ouvido. Nós estamos aqui até discutindo a questão de uma subsecretaria para os povos de terreiro, a criação de uma delegacia específica, porque nem todos os municípios, nem todos os estados têm um órgão capacitado - ou nem sequer existe um órgão para isso. Eu acredito que esse seria um passo que iria abraçar todo o nosso povo, todos os nossos segmentos culturais, religiosos no nosso país.
Nós temos PLs, nós temos decretos, nós temos leis, mas nós precisamos também estabelecer parcerias: estado, município, federativo. Nós precisamos que venha algo de cima que possa nos contemplar dessa forma, e não ficar somente no olhar de um governante: "Se eu achar que eu devo olhar para esse povo dessa forma, eu vou olhar", ou: "Não devo olhar, vou olhar para outro segmento".
Mesmo a gente sendo amparado, tendo leis, PLs, nós precisamos, todos os dias, provar que nós somos pessoas de bem. Embora nós não precisemos provar para os outros, a sociedade, dentro desse racismo... Entra pelo racismo de pele, vai pelo estrutural, e assim vai se programando, até chegar ao racismo religioso, com que nós sofremos muito.
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Nós tivemos uma situação em um órgão público aqui no estado onde teve a entrega de comendas. Ao terminar, uma pessoa funcionária da casa olhou para nós e disse esta fala: "Isso não é de Deus, vocês vão tudo para o inferno".
Então, precisa muito desse preparo, precisa desse olhar dos nossos governantes para o nosso povo, nosso povo de santo, que vem sendo massacrado há muitos e muitos anos.
E que bacana! Louvo toda a minha ancestralidade, a minha espiritualidade por este momento de hoje, por este olhar de construção.
Eu espero, de verdade, que os meus filhos possam professar a fé, a nossa crença, a nossa espiritualidade, sem medo de uma represália, sem medo de ser chamado de filho do inimigo, de filho do demônio. Quando nós falamos aqui, nós não estamos falando que é mi-mi-mi: nós sofremos esse racismo religioso, estrutural e várias outras formas de racismo no dia a dia - no dia a dia.
Hoje, existe um programa aqui no meu estado que se chama MS Sem Racismo, por meio do qual nós conseguimos contemplar o nosso povo nos decretos e na lei que foi acolhida, porque nós nos sentíamos muito a par. Eu estou escutando alguns relatos aí, escutando sobre criações, e alguns dos nossos municípios não têm esse conhecimento de que existem mais leis, de que existe decreto, mas nós também precisamos nos apoderar do que nos foi constituído.
Que bom que o Presidente tem esse olhar para nós e que nós podemos sonhar com algo melhor para o nosso povo!
E quero parabenizá-la, Senadora, pela iniciativa de nos receber. É uma pauta difícil, é uma pauta para a qual muitos não querem ter um olhar, mas é uma pauta que está presente, que construiu a nossa fé, a nossa crença, a nossa espiritualidade e que está presente no respirar e no ar deste país.
Muito obrigado.
E que Ogum abençoe a todos! (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Obrigada.
Nós agradecemos também ao José Roberto. A gente já vai passando aqui para a segunda fase, que são as considerações dos nossos convidados e convidadas. Ele falou também e fez uma reflexão, que é bom pontuar, de que já existem leis, de que já tem decreto e de que, muitas vezes, falta conhecimento sobre elas.
(Soa a campainha.)
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Através da divulgação ou de um trabalho - eu não sei como, mas eu estou falando aqui para que a gente possa pensar juntos - não só de divulgação, mas também de cobrança, para que essas leis que já existem sejam verdadeiramente efetivadas e saiam do papel...
Não é um processo fácil, desde a formação da lei até a execução, para que ela seja botada em prática, mas o caminho já começou a ser feito. Eu sei que nada especialmente do que nós estamos falando aqui foi conquistado sem luta. E, apesar de a gente estar aqui, hoje, falando o que seria óbvio, que é simplesmente respeitar o direito do outro, a gente precisa...
Ele disse que precisa provar todo dia que é gente boa. Isso é muito forte. Se a gente pensar o que é essa frase - eu fiquei arrepiada, porque você ter que provar todo dia que você é gente boa... -, foi uma das frases dos últimos tempos que eu vi que mais pesou. É muito pesado. É a mesma coisa... Não é a mesma coisa. É um sentimento de também provar que você pode ocupar aquele espaço, provar que você... Enfim, é muito cansativo, mas também é muito gratificante quando a gente consegue melhorar para que os que venham depois da gente não passem pelo que a gente está passando, pelo que vocês estão passando.
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Eu estou fazendo essa reflexão, porque eu fui sugerir para a gente fazer uma lei do que não tem ainda e que seja necessário - não é fazer por fazer, né? -, para dar visibilidade, para dar debate, para cobrar que seja executado, para aproveitar, no bom sentido, desse período que tem um Presidente que está com um olhar diferente, que respeita realmente essa questão das religiões, respeita, eu acredito, todos e todas e quer ter esse olhar diferenciado... Que a gente possa também fortalecer o que ainda não tem em lei e pegar o que já tem e, não sei se através do ministério, fazendo um trabalho junto com os municípios - porque eu entendi que os municípios também não têm conhecimento do que já existe -, fazer um trabalho mais intenso com os municípios de divulgação, de cobrança, enfim, de uma parceria, para que a gente possa cobrar a efetivação dessas leis, que elas sejam botadas em prática.
Eu vi aqui uma pergunta que chegou agora... Eu falo demais, né? Eu disse que não ia falar, eu queria só ouvir, mas eu vi uma pergunta aqui, da Juliana, lá da Bahia, que fala assim: "Quais medidas estruturais podem reduzir o racismo institucional [...]?". É o que também foi falado, que ele é muito forte, mas nós estamos no Poder Executivo, vamos dizer aqui, a nível nacional, então vamos usar este espaço, em que nós estamos tendo oportunidade, para que a gente possa pensar como fazer para desconstruir, se assim eu posso falar, esse racismo religioso. Como agir diante das instituições que são ligadas ao Executivo, ao Legislativo, enfim, a todos, ao Judiciário... E ela pergunta: "[...] que dificulta acesso a saúde, moradia e renda para povos de matriz africana?".
Também tem a Monique... Eu estou lendo porque, se algum dos nossos convidados se sentir à vontade para fazer um comentário ou responder... A Monique, lá de Goiás, pergunta: "Como garantir proteção dos territórios e tradições dos terreiros, combatendo racismo e intolerância [...] [por meio de] políticas públicas eficazes?".
Aqui eu escutei um pouco, antes, quando eu cheguei - e eu cheguei um pouco atrasada porque eu estava em outra reunião -, eu acho que é o Aderbal, quando ele falou que a segurança tem que ser garantida pelo poder público, que a gente não tem que ficar querendo se defender, é uma obrigação do Estado. Então, a gente tem que pensar e realmente cobrar que a segurança seja feita por quem tem que fazer, e não a gente ficar querendo cada um se proteger porque não tem o acesso a essa segurança do poder público, que era para ter.
O Lucas, do Rio Grande do Sul: "Os educadores antirracistas estão [...] [enfrentando dificuldades] para [...] [realizar] seus trabalhos nas escolas. O que o Estado fará para garantir a segurança do docente?".
São essas três perguntas que chegaram aqui, agora, no decorrer da audiência pública, que eu já quero aqui passar para os encaminhamentos. Quem se sentir à vontade para responder ou fazer algum comentário, fazer alguma colocação a mais fique à vontade, mas eu já passo aqui a palavra para a Sra. Iyá...
É assim? Como é? Vá, me ensine, por favor, não quero errar. (Risos.)
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA - É Iyá Obádèyí Carolina Saraiva.
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Iyá...
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA - Obádèyí...
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - ... Obádèyí Carolina Saraiva.
Pronto, é o maior prazer. É um nome lindo.
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA (Fora do microfone.) - Obrigada.
Já é para as considerações finais ou é para responder?
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE. Fora do microfone.) - Responder e considerações finais.
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A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA (Para expor.) - Vamos saudar aqui o nosso Secretário Ronaldo, que está aqui compondo. Seja bem-vindo.
Bom, eu acho que a Juliana e a Monique trazem questões que são muito importantes de a gente debater e quero dizer, assim, que a estrutura só é combatida quando ela é destruída por dentro mesmo, né? Vou dar um exemplo simples. Para eu poder entrar aqui hoje, tive uma dificuldade tremenda, porque eu não sou reconhecida como Obádèyí. Quem é Obádèyí? Esse nome não é um nome que você... A Polícia Federal não me identifica. Então, você não poderia estar na audiência pública, né? Então, o Cesar foi gentilmente lá me buscar para eu não ser barrada na Casa que é a Casa do Povo.
As medidas estruturais devem ser mantidas porque elas têm uma política de Estado. Elas foram feitas para nos matar. Então, eu agradeço aqui à Senadora, que está aqui disposta a comprar essa luta, e quero dizer assim: pessoal, quando a gente chamar pessoas de povos tradicionais e originários, fiquem atentos aos nomes dessas pessoas, né? Não as barrem só por barrar, porque, ontem mesmo, eu estava aqui nesta Casa, vestida de psicóloga, e eu não fui barrada. Então, tem alguma coisa que a gente precisa entender.
E garantir... a Monique fala da garantia das tradições de terreiros combatendo a intolerância por meio de políticas públicas. As políticas públicas já existem. Mais uma vez: elas só precisam ser realmente implementadas, porque racismo é crime.
Enquanto as delegacias não entenderem que, quando chega lá essa denúncia, isso é tratado como um crime, vai continuar sendo feito de forma ao deus-dará, né? As pessoas vão entender que vai ser mi-mi-mi mesmo: "Ah, é mais uma...", né? Não, não é. São os nossos corpos que estão sendo violentados e aviltados cotidianamente.
Peço licença aqui a esta mesa para ler e para fortalecer a existência das Mulheres de Axé do Brasil, que é um coletivo muito importante. Vou refazer uma frase que disse ainda há pouco: todos nós nascemos de uma mulher, então merecemos respeito. Merecemos todas as reverências, e reverencio todas as mulheres presentes e o meu coletivo, que é muito importante para mim e para minha existência enquanto uma mulher negra aqui no Cerrado.
Peço também, Senadora, já para os encaminhamentos... que a gente precisa de dinheiro. A gente precisa de recurso para que as nossas políticas e implementações sejam realmente reconhecidas. Nós precisamos subir a rampa com o Presidente. Nós não subimos a rampa. Então, muito obrigada, Presidente, pela política, mas a gente precisa subir a rampa. A gente precisa ser reconhecido enquanto povos.
Lembramos também, Senadora, que a gente não é processo religioso: nós somos maneira de viver. Isso é uma maneira de existência. Povos de terreiro de matrizes africanas não são só processo religioso. Quando a gente diz que a gente é uma mulher de povos tradicionais, a gente vive enquanto mulher de povos tradicionais. É um modo de vida. Então, deve ser destituído, como cultura, achar que a gente é só processo religioso. Não, não é. A religião eu diria que é a última fase do nosso processo. Eu diria, assim, com muito cuidado e com muito amor; digo isto: somos modo de vida.
Peço licença para ler uma carta, rapidamente, que foi feita e instituída pelo Coletivo Mulheres de Axé do Brasil e que foi organizada por lideranças sociais, culturais e de comunidades de matriz africana.
"Apresento uma denúncia formal com base em vivências, escutas, pesquisas, registros e incidências nacionais e internacionais realizadas em participação na construção do Plano Nacional de Povos de Comunidades de Matriz Africana e Povos de Terreiro, a partir das escutas territoriais e 'Abre Caminhos' realizados pelo Ministério da Igualdade Racial, do Encontro Nacional de Mulheres de Axé, realizado em julho de 2025, no Rio de Janeiro, da Cúpula dos Povos Tradicionais na COP 30, Belém do Pará, e da 2ª Marcha das Mulheres Negras, em Brasília. Esses passos consolidaram diagnósticos, denúncias, vivências e reivindicações legítimas de mulheres negras e de axé, guardiãs ancestrais do equilíbrio entre a vida, território e natureza.
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Este documento constitui uma denúncia formal [Senadora] sobre as violações históricas, estruturais e contemporâneas vividas pelos povos africanos."
(Soa a campainha.)
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA - Eu vou querer mais um tempinho...
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE. Fora do microfone.) - Pode ir, pode ir.
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA - Porque todos os homens tiveram três, quatro minutos. Eu vou requerer isso aqui publicamente. (Palmas.) (Risos.)
"Este documento constitui uma denúncia formal sobre as violações históricas, estruturais e contemporâneas [...].
A denúncia se fundamenta no Encontro Nacional de Mulheres de Axé; na participação da nossa Presidenta Iyalaxé Juçara na COP 30, Belém; na ausência quase total de mulheres negras neste espaço [isso deve ser dito aqui nesta Casa]; povos de axé e vozes da diáspora africana nos espaços decisórios da diplomacia. [Houve a travessia pelo Rio Amazonas, o que, para os povos tradicionais, é algo muito importante para nós.]
A inquietude se origina [Senadora] de uma denúncia persistente da exclusão de mulheres negras, que há séculos enfrentam invisibilidade, apagamento institucional, violência racial e patriarcal, e a dominação das autoridades brancas sobre os espaços que definem as políticas sobre os nossos corpos, vidas e territórios.
Temos que olhar para o tráfico transatlântico, a escravidão e o crime estrutural e continuado. Denunciamos a escravidão, o processo de escravização, estados e monarquias europeias, impérios coloniais, empresas mercantis, bancos e instituições religiosas europeias. [Não estou falando nada de novo, mas isso deve ser demarcado nesta Casa.] Por mais de 350 anos, esses agentes promoveram captura e sequestro de milhões de africanos, deslocamentos forçados intercontinentais, torturas físicas, psicológicas e espirituais, genocídio, extermínio sistemático e a destruição cultural e territorial dos nossos povos, exploração econômica baseada na violência, separação de famílias e a desumanização total dos nossos corpos negros.
Vou passar agora [para finalizar a minha fala] a falar sobre a crise climática, que é uma violação dos direitos humanos que atinge de forma desproporcional as comunidades negras e tradicionais. Nós temos que tentar exercer este reconhecimento da responsabilidade histórica: que Portugal, Inglaterra, França, Espanha, Países Baixos, Bélgica, Vaticano e as instituições de Igreja Católica reconheçam a sua participação direta nesse processo, com efeitos acumulados até o presente. [Precisamos de reparação histórica, mas também precisamos de reparação financeira, isso é importante deixar aqui registrado. A gente não tem coragem de falar sobre isso, mas aqui as mulheres de axé se encorajaram para falar.] É importante essa justiça climática com a participação negra plena.
Exigimos, Senadora, assento permanente de mulheres negras e povos da diáspora na UNFCCC, cotas obrigatórias de delegações afrodiaspóricas, financiamento para projetos comunitários, reconhecimento de saberes tradicionais como uma ciência, mecanismos obrigatórios de consulta prévia e a criação do observatório internacional da reparação de justiça climática..."
(Soa a campainha.)
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA - Já estou encerrando.
"... composto por mulheres negras da diáspora, pesquisadoras independentes, organismos internacionais, lideranças comunitárias."
Para o encerramento, Senadora.
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE. Fora do microfone.) - Pode falar com calma.
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA - "Este documento se completa após a travessia do Rio Amazonas. A terra falou, os ancestrais falaram, agora cabe ao mundo ouvir. Reafirmamos, enquanto Mulheres de Axé do Brasil, que a escravização é um crime de lesa-humanidade; que é responsabilidade dos países europeus e da Igreja Católica; que não pode mais haver continuidade do racismo estrutural; e que esses impactos climáticos passam, sim, sobre os corpos negros principalmente e pelo direito à plena reparação histórica, moral, climática e financeira."
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Senadora Augusta, a hora é agora. Contamos com a senhora e com todas as pessoas que estão à frente dessa luta.
Muito obrigada.
A carta vai estar disponível. Vou repassar aqui de forma simbólica para a senhora.
E conte conosco para elucidar e "escurecer" alguns pontos que não foram lidos.
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE. Fora do microfone.) - Com certeza.
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA - Muito obrigada. (Palmas.)
(Manifestação da plateia.)
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Obrigada.
Eu fico muito feliz. Sempre vou dizer e repito aqui: para além da audiência pública de discutir e encaminhar, nós temos aqui a oportunidade de aprender. Então, eu sempre aprendo nas audiências públicas, e, sobretudo nesta, estou aprendendo muito.
E eu quero dizer que a gente tem que fazer o nosso dever de casa. Como é que a gente, no Senado Federal, barra e comete exatamente o racismo que a gente está aqui fazendo uma audiência pública para combater? Então, eu sei que são coisas assim: "Ah, isso não é para acontecer". Não é, mas, infelizmente, acontece, e nós temos o exemplo de hoje. Nós fizemos uma audiência pública para discutir, debater - eu vou só citar este exemplo - a questão da violência doméstica e familiar com as mulheres indígenas, e aí, aqui, por coincidência, no dia, nós recebemos aqui vários homens indígenas, axés e tal... Não, como é que a gente chama?
(Manifestação da plateia.)
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Pronto, os pajés, todos aqui. E eu fiquei superemocionada achando que eles iam defender o projeto de lei que as indígenas estavam aqui para discutir. E aí, nessa audiência pública que era para falar sobre esse projeto de defesa das mulheres indígenas que sofrem violência doméstica, enfim, eles vieram aqui, ocuparam o espaço e fizeram reivindicações que não tinham nada a ver com as indígenas, muito menos com o projeto. Aí, eu disse: olha, a gente faz uma audiência pública, e na própria audiência pública a mulher sofre violência. Para vocês verem como esse espaço ainda precisa de muita desconstrução, em todos os sentidos.
E aí eu falo - eu disse que não vou falar, mas acabo me empolgando - que hoje estou tendo a oportunidade de estar na Procuradoria Especial da Mulher aqui do Senado Federal, e lá nós estamos fazendo uma reestruturação, porque ela especificamente tem entre os seus objetivos dar um apoio ao combate à violência, seja ela qual for, contra as mulheres. E a gente tem lá uma questão específica para falar sobre o racismo, para que a gente consiga incluir a mulher negra. Nós temos a mulher negra lá também. "Ah, isso é bondade." Não, isso não é bondade, não; é competência, é exatamente isso, o espaço é dela, não é cota, não tem nada disso.
E, a partir daí, a gente quer construir ações também da Procuradoria, e eu estou aproveitando a oportunidade de pegar aqui, de pedir ajuda, de botar e construir na Procuradoria também, ouvindo e fazendo os encaminhamentos. Isso já de outra pauta. Já estou botando outra pauta no meio, mas que eu acho muito importante e necessária, que a gente já vai construir lá na Procuradoria.
E eu quero pedir às nossas mulheres que estão sendo representadas aqui, por todas, obviamente, para que a gente possa fazer uma conversa de trabalho para a gente determinar e definir algumas ações específicas - diferenciadas e específicas - também na Procuradoria, porque é outra ferramenta do Senado.
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Porque lá nós vamos fazer, por exemplo - outro exemplo -, um cine debate, para passar um documentário que fala sobre a importância do homem no combate à violência contra nós mulheres, desconstruindo a história do machismo, etc. e tal. E por que não fazer também ações para que a gente possa botar...? Vamos começar dentro de casa, botando aqui os nossos servidores, enfim, para entender e para saber melhor, para não fazer nenhum tipo de discriminação, como já foi sofrido aqui hoje. Então por que não pensar também em uma ação aqui dentro de casa? Vamos pensando. Aos poucos, a gente vai conseguir, com certeza.
Já estou pensando aqui em outras ações. Vamos discutir, para chegarmos numa forma de ampliar o que temos que fazer, que é o combate a qualquer tipo de preconceito, de racismo, enfim, de discriminação que possa acontecer. Vamos começar em casa, né? O exemplo aqui foi dado.
E agora já vou passar também, com muito prazer... Pode ficar tranquila, comigo o tempo... Meu tempo era só porque eu não podia chegar, mas depois que eu cheguei, agora também, se vocês tiverem disponibilidade, eu posso ouvir com o maior prazer. Quero passar para a Priscila Carvalho Leão, que também poderá fazer o uso que for necessário para as suas considerações finais, resposta.
Fique à vontade, Priscila.
A SRA. PRISCILA CARVALHO LEÃO (Para expor.) - Obrigada, Senadora. Agradeço o espaço.
Quero dizer que nossas ações foram apresentadas aqui, do MDHC. Espero que você possa retomar o histórico do início da audiência, para que a gente possa estabelecer parcerias também aqui com esta Casa. Eu acho importante a gente estreitar os laços.
Eu vou fazer comentários e minhas contribuições a partir de duas perguntas, para depois a gente fazer o encerramento. Vou até usar o resto do meu tempo inicial lá, vou aproveitar o ensejo aqui da nossa Obádèyí, para poder também reivindicar nosso tempo de fala.
Juliana, da Bahia, perguntou: "Quais medidas estruturais podem reduzir o racismo institucional, que dificulta o acesso a saúde, moradia e renda para povos de matriz africana?".
Olha, não dá para a gente reduzir o racismo institucional sem uma medida efetiva e política pública estrutural. Só conseguimos combater o racismo estrutural com políticas estruturais. Quando a gente se refere a políticas estruturais, a gente está se referindo a políticas de Estado. Quando a gente pensa em combater o racismo estrutural a partir da intersetorialidade, com políticas de saúde, moradia, políticas de direitos humanos, políticas para mulheres, a gente está falando de ações intersetoriais, a gente está falando de políticas interministeriais.
É preciso a gente entender que, nos ministérios, existem pastas específicas, que precisam se correlacionar. Precisamos nos dar as mãos aqui também no governo, isso é importante. Nós já temos diversas parcerias e ações interministeriais com o Ministério das Mulheres, com o Ministério de Igualdade Racial, mas é preciso ampliar para outros ministérios. E o MDHC tem feito esse movimento em diversas ações, no combate às diversas violações de direitos humanos, fazendo um chamamento a essas ações interministeriais. E a gente precisa fazer políticas juntas, porque elas são mais fortes. A gente precisa combater o estrutural com o estrutural.
Danielle, do Distrito Federal: "Como envolver universidades, centros de pesquisa e instituições culturais na valorização, preservação e difusão do patrimônio afrorreligioso?".
Danielle, para começar, a gente precisa levar pesquisas e desenvolver pesquisas através desse centro, das instituições de ensino por aí afora. A UnB, por exemplo, é um espaço propício, porque é uma universidade conceituada, e eu digo: a gente precisa empretecer a UnB. Eu digo isso porque eu fui fazer algumas disciplinas de doutorado da UnB e o meu campo de estudo não foi muito interessante, porque eu queria falar da assistência estudantil para os pretos e os pobres do Nordeste, mas eu tive dificuldade de continuar esse estudo e escolhi pleitear doutorado em outras universidades.
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É preciso que os nossos docentes, de todas as universidades brasileiras, pensem pesquisas e desenvolvam diagnósticos para a gente elaborar a política pública, porque são essas pessoas que vêm para o Governo trabalhar.
Eu sou da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Lá é uma instituição de ensino superior em que o estado - o estado mais preto do Brasil - desenvolve políticas para preto, defende cotas, exerce controle social dentro da sua sala de aula. Nós somos uma universidade a partir da política de interiorização do ensino superior, a partir da decisão do Presidente Lula de levar universidades e ampliar o ensino superior no Nordeste para preto e pobre.
Então, é assim que a gente desenvolve centros de pesquisa e instituições com mais valorização e com foco nessas minorias, para que a gente traga para o governo diagnóstico consistente para desenvolver políticas públicas.
(Soa a campainha.)
A SRA. PRISCILA CARVALHO LEÃO - E, já concluindo, para as minhas considerações finais, queria só dizer a José Roberto, que nos abrilhantou com suas reflexões, que é do povo bantu, dizer que, como a nossa Senadora até chamou a atenção à fala quando ele disse que temos que provar que somos bons todos os dias, mais do que isso, temos é que provar que existimos. Precisamos, todos os dias, provar nossa existência. E são todos os dias, porque a realidade deste Brasil é que as mulheres negras, as mulheres de santo, que têm a sua espiritualidade colocada pela sua ancestralidade, isso faz parte de sua existência, e isso sendo velado, negado e violentado, a gente, logo, não existe. Então, isto é o que a gente faz todos os dias: provar que existe, como a nossa Iyá acabou de fazer hoje, lá na frente, na recepção desta Casa.
Nesse sentido, eu, como representante do MDHC hoje, estou aqui evocando nossas ancestralidades e nosso poder de fala e desses espaços que nós ocupamos, que são tão raros, né? Estar à frente de uma gestão com uma Ministra preta, mulher, para mim e para muitas mulheres hoje é representatividade.
Então, estamos à disposição sempre. As parcerias interministeriais, as parcerias com a sociedade civil existem e são valorizadas dentro do MDHC. A gente está à disposição para estabelecer essas parcerias com esta Casa, com esses que aqui nos ouviram, com esses que estão, no remoto, nos ouvindo, para que a gente possa unir força e desenvolver política pública de Estado, e não de governo, porque é isso que fica.
(Soa a campainha.)
A SRA. PRISCILA CARVALHO LEÃO - Então eu encerro minha fala. Vou aproveitar aqui e citar Conceição Evaristo, que nos abrilhantou, também, em diversas ações no Rio de Janeiro recentes, no organizar da Marcha das Mulheres Negras, como inspiração. Vou puxar aqui só, porque eu separei, mas... E ela nos diz: "Nossos passos vêm de longe. Superar é carregar as dores e as lutas dos nossos ancestrais e transformar isso em força para seguir em frente".
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Então, sigamos, por mais espaços de poder, por mais canetas, por mais recursos, por mais reflexões como essas aqui hoje e por mais política pública para negro...
(Soa a campainha.)
A SRA. PRISCILA CARVALHO LEÃO - ... para povo de santo e povos de terreiro.
É isso. Obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Obrigada, Sra. Priscila.
Antes de passar a palavra de forma remota para o Sr. Aderbal Ashogun - é isso? -, eu vou passar aqui só para a nossa querida... Para eu não errar...
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA - Obádèyí.
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Obádèyí. Pronto, Obádèyí.
A SRA. IYÁ OBÁDÈYÍ CAROLINA - Gente, são menos de dez segundos.
Gostaria de fazer uma retratação pública aqui. A carta tinha quatro páginas e eu não citei a Rede Afroambiental, que nos proporcionou que a Rede Mulheres de Axé do Brasil fizesse essa travessia, Pai Aderbal. Está citada na p. 3 da carta.
Então, assim, peço àgò, e nós da Rede Mulheres de Axé do Brasil agradecemos a oportunidade que o senhor nos proporcionou para fazer essa travessia.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Obrigada. Agora já passo a palavra de forma remota, para também fazer as suas considerações finais ou responder a alguma pergunta, ao Sr. Aderbal. É um prazer ouvi-lo.
O SR. ADERBAL ASHOGUN (Para expor. Por videoconferência.) - Bem-vinda, Senadora.
Nós falamos sobre educação, num primeiro momento, eu quis aproveitar o tempo para dedicar à educação, mas a cultura é vital para que se restabeleça uma educação com a identidade real do povo brasileiro.
Nós estamos falando aí de 56% da população, que vê seu patrimônio cultural ser espoliado com o engodo do domínio público, a reforma dos direitos autorais do Ecad que não acontece, o patrimônio imaterial que não define e nem nos dá autonomia para fazer a gestão do nosso patrimônio natural dentro das nossas comunidades.
A gente está falando de uma cultura - obrigado pela lembrança, Iyá Obádèyí, sua benção -, a gente está falando de um patrimônio natural, a gente está falando de como nós somos orgânicos, somos "uni" com a natureza. E esse patrimônio cultural não está explícito nessa salvaguarda - registro -, nessas ferramentas de proteção do patrimônio.
Hoje mesmo um território que a companheira do MDHC citou, Cachoeira, o berço da cultura de matriz africana, na Bahia, é um território hoje que vem sendo ameaçado pelo racismo ambiental. A Penha celulose se diz detentora de 48% daquele território sagrado.
A gente está falando de uma cultura de que só agora, durante a COP, nós tivemos sancionada a lei nacional de cultura, que vem compor o Sistema Nacional de Cultura. O Sistema Nacional de Cultura tem conselho, plano e fundo.
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O Conselho é onde tem a representação. É ali que estão pessoas que representam, que fazem a participação social. Mas esses espaços de participação social vêm sendo embranquecidos ao longo dos anos por conta de uma ferramenta de escolha e de eleição que não contempla os povos de matriz africana nem suas lideranças: mestras e mestres de cultura tradicional de matriz africana.
Então, se a gente não proteger nossa cultura através de outra paleta de cores, vão sempre achar que nós somos mais ou menos alguma coisa. E aí nós vamos ficar com esses vários nomes que tem aqui: "Política Nacional para as Religiões Afro-Brasileiras". Nos textos da ONU tem "povos afrodescendentes"; nos textos da COP tem "comunidades locais"; nos textos do PL - do Plano, tem "Povos de Comunidade Tradicional de Matriz Africana e de Terreiro". Essa não normatização de quem somos nós promove uma confusão na gestão, que é quase impossível de implementar alguma ação proveniente daí.
Eu acho que o exercício é buscar essa episteme de quem é o povo de matriz africana no Brasil. Quem são esses pretos e pretas? E aí, sim, estabelecer uma câmara técnica que, de fato, seja desse povo. Porque o que a gente vê hoje, a cada dia, é o embranquecimento dessas áreas de participação social.
Então, quando a gente está dentro de um Conselho Nacional de Políticas Culturais... Então existem os terreiros tombados, existem as referências mais antigas, nós temos a nossa história, nós temos as nossas referências. Parece que é uma coisa que cada um faz o que quer. Parece que esse povo não tem língua. Èmi sòrò Yoruba: eu falo iorubá. Èmi ounje jeun: eu como minha comida. Èmi xirê: eu danço, eu me encontro.
Então, nós temos que normatizar essa situação para dizer: o que nós queremos não é a religião. O que nós queremos é proteger o nosso patrimônio cultural comunitário, porque é de toda a comunidade. Eu sou filho de uma liderança, Mãe Beata de Iemanjá, que se encantou, está aqui entre nós, tendo o prazer de escutar a fala do filho dela, que é um homem negro que sobreviveu aos grupos de extermínio na Baixada Fluminense, enquanto os bem-nascidos fugiam.
Eu falo de um homem negro que escapou dessa estatística de 60 mil jovens pretos e pobres mortos. E essa consciência de Zumbi, de preto, tem que chegar...
(Soa a campainha.)
O SR. ADERBAL ASHOGUN (Por videoconferência.) - ... para esses meninos também.
Nós, homens pretos, não somos um violador branco. Não somos escravocratas brancos. Nós somos homens negros matriarcais, sustentados, mantidos, ensinados, orientados por Dona Menininha do Gantois, por Mãe Stella, por minha Mãe Olga, por minha Mãe Beata, por minha Mãe Ruinhó, por minha Mãe Aninha; e por vários homens: meu Pai Procópio, meu Pai Zezito, meu Pai Vicente, meu Pai Djalma de Lalu, Mãe Mirinha de Portão.
Então, não ter o reconhecimento... reconhecimento não, não reparar essas famílias é dizer que nunca vai haver reparação. Nunca vai haver reparação se você não chegar a essas famílias...
(Soa a campainha.)
O SR. ADERBAL ASHOGUN (Por videoconferência.) - ... e dizer que elas vieram de um povo que detém o conhecimento original de África.
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E essa cultura é uma cultura ecológica, foi isso que nos levou à Eco 92. Foi um questionamento de Mãe Beata de Iemanjá, pela ignorância dos homens que diziam que era recurso mineral, recurso hídrico. E minha mãe disse, eles não sabem nem do gênero com que estão lidando. O ayê, a terra, é nossa mãe. Isso não quer dizer que o filho da terra é ruim.
Nós, homens, vivemos uma situação de violência extrema. O genocídio da juventude preta e pobre, na sua maioria, 90% são de homens, na sua faixa mais produtiva, que deveria estar em uma escola onde ele se identificasse com o Xangô, como eu, e soubesse que minhas origens são o reino do Benin na África, é no Daomé, é em Ifé. Essas são as referências que me tiraram da estatística da Baixada Fluminense, não foi a escola convencional que me dizia que Pedro Álvares Cabral tinha descoberto o Brasil, nem que a sinhazinha filantrópica Isabel tinha libertado o meu povo.
Não, aprendi foi com Ogum: Ògún alákáyé/Osin ímole Ògún/Ògun kángunkàngun Ògun/Ògún Alàgbède òrun ògun/Ògún yé. Ogum o guerreiro de Òlorum, Oló, senhor, Òrum Astros.
É dessa cultura que estou falando. É desse conhecimento que estou falando, é por isso que descemos o Rio Amazonas, para nos encontrar com nossa mãe Oxum, que é a referência de fertilidade, beleza e amor.
Nós descemos o Rio Amazonas para encontrar uma COP que se arvora de querer salvar o mundo, mas sonega o fundo verde. Tira do Sul Global o protagonismo da luta ambiental. Nós precisamos da nossa escola, essa escola que está aí, está com o tecido necrosado de vaidade, com embaçamento do olhar, com preconceito.
Isso não é uma coisa de dez anos, e a gente fala como se fosse novidade. A Lei nº 10.639 tem 22 anos sem ser implementada. Então, a gente hoje precisa implementar - implementar, reparar...
A gente não pode, por mais que o nosso Presidente tente tirar da inércia, essa gestão tem que se fazer como uma ferramenta de tecnologia real. Precisa cuidar dos povos de matriz africana como cuida dos povos indígenas. Nós precisamos do nosso ministério, nós somos 56% da população. Enquanto não tivermos essa equidade dentro do Governo, do Estado democrático de direito, nós vamos ter chacinas como a do Alemão, da Penha... E é normal, todo mundo já se esqueceu, porque são pretos e pobres, mas não fabricam fuzil nem refinam cocaína.
Então, neste mês da consciência negra, que Zumbi seja lembrado e saudado por cada homem negro desta pátria que perdeu a vida sem chance de reação, sem chance de lutar. Mas voltem para o conhecimento de orixá, o raciocínio, para que a gente possa diminuir esse impacto nefasto desse sistema brutal e patriarcal branco que nos oprime, nos viola e nos assassina.
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Obrigado pela oportunidade. Eu acho que daqui para a frente a gente espera que tenha mais participação desse tipo, e quero dizer que nós estamos preparados, não é mais... Nós estamos em todo lugar: nas universidades, dentro do Estado democrático, dentro da legislatura, basta que o Estado faça o seu trabalho, que é ser laico, para que a gente não seja vítima da bancada da Bíblia e da bala.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Obrigada, agradecemos imensamente a participação e a contribuição aqui na nossa Comissão de Educação.
Eu quero agora já passar, também para as suas considerações finais, a palavra para o Sr. Ronaldo dos Santos, também de forma virtual...
Não, ele está aqui, presencial. Desculpa, Ronaldo, eu pensei que tinha invertido aqui. Pois Ronaldo, será um prazer ouvi-lo novamente.
O SR. RONALDO DOS SANTOS - Está joia. A gente encerra esta audiência agradecendo pelo espaço, Senadora, e por liderar esse processo. A gente quer estender esse agradecimento também ao Senador Jaques Wagner, que foi um parceiro fundamental para tornar este momento possível, atuando de forma a garantir o agendamento da nossa audiência pública. Também quero saudar a Mãe Darabi, o que eu não fiz na minha primeira fala, em nome de quem eu saúdo todas as autoridades religiosas aqui presentes.
A Senadora levantou uma questão sobre criar novas leis, se isso viria a ser uma demanda.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. RONALDO DOS SANTOS - Eu ia falar exatamente isso: o problema do Brasil não é lei. Em todo e qualquer tema que a gente puder pensar, nós temos um aparato legal, um arcabouço legal, que é bastante relevante para a gente resolver todos os nossos problemas.
Infelizmente, quando a gente cria uma lei como a Lei 10.639, de 2003, citada pelo Tata Aderbal Ashogun, na verdade, é legislar sobre o óbvio. E isso já se tornou uma prática necessária para nós. Dizer que temos leis suficientes não é suficiente. E aí, muitas das vezes, a gente precisa, sim, criar e pensar novas leis, ou que se pense a problemática como um todo, ou um recorte da problemática.
Sim, a gente poder pensar em saídas legislativas para determinados problemas da atualidade é sempre importante, o que também não significa que teremos o seu cumprimento efetivo, haja vista a própria Lei 10.639, de 2003, que é a legislação sobre o óbvio, mas que, passados 22 anos, a gente vê o quanto ela, apesar de relevante, é ignorada, burlada por quem deveria estar cumprindo a legislação.
Eu quero dizer que na Câmara Federal existe o Projeto de Lei Makota Valdina, que é de idealização de um conjunto de lideranças de matriz africana. Já é uma iniciativa legislativa que existe no Congresso Nacional e acredito que se precise de impulsionamento político para essa iniciativa, sem prejuízo de qualquer outra que possa ser induzida pelo Senado ou pela própria Câmara. O próprio Projeto de Lei Makota Valdina precisa ser objeto de apreciação nossa enquanto sociedade, enquanto Congresso Nacional, para que a gente possa avançar na garantia de direitos dos povos de terreiro.
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Eu dei uma olhada aqui nas muitas perguntas - nessas perguntas que a gente recebeu -, e aí tem uma questão que é bem comum nas questões, que é a questão da violência. E aí vem pergunta do tipo "o que fazer para proteger os terreiros das violências e tal?".
Eu acho importante a gente, primeiro, olhar para o Brasil como um todo e pensar, por exemplo, que o Congresso Nacional é aquele que pega um projeto de lei de enfraquecimento ao crime organizado e enfraquece a Polícia Federal e a Receita Federal.
(Soa a campainha.)
O SR. RONALDO DOS SANTOS - Isso está no contexto da correlação de força que nós temos hoje. Então, as violências sofridas pelo povo de matriz africana e povo de terreiro não estão dissociadas de um conjunto de violências que viemos sofrendo enquanto sociedade como um todo. Estamos, inclusive, tendo dificuldade de enfrentar, porque, no Congresso Nacional, existe uma frente de enfrentamento ao enfrentamento à violência. Então, não dá para não dizer isso.
Em que contexto nós vamos - e com isso eu não estou negando a necessidade, mas eu estou realmente problematizando, para que a gente busque saídas -, em que contextos nós organizamos, articulamos um sistema de proteção, um sistema de justiça que assegure o direito do povo de terreiro, do povo de comunidade tradicional de matriz africana, de exercer o seu modo de vida, de exercer a sua fé e religiosidade, de exercer tudo, como qualquer cidadão e cidadã, tudo aquilo que lhe apraz, tudo aquilo que desejar?
Mas aí eu queria, assim, problematizar - e refletir coletivamente também - que talvez a gente esteja vendo, enxergando um dos maiores pactos contra um grupo social, um povo, uma população no Brasil. E talvez o inominável, inelegível e agora encarcerado seja uma síntese; ele, pessoalmente, seja uma síntese disso. Quando, mesmo não sendo cristão, ele se diz cristão; é uma pessoa da política...
(Soa a campainha.)
O SR. RONALDO DOS SANTOS - ... há algumas décadas, mas, ao mesmo tempo, se diz militar e, ao mesmo tempo, é cheio de conchavo com a milícia. Isso é bem uma síntese, e "o meu Rio de Janeiro" traz isso de forma muito forte. E o que a gente vê? Quem é que violenta, sistematicamente, os povos de terreiro no seu dia a dia? São empresários, são políticos, são docentes - porque aí existe uma disputa ideológica, inclusive, dentro das escolas -, agentes da segurança pública e o próprio crime organizado. E aí são as facções... a última grande aberração são as facções religiosas, que operam enquanto facção criminosa, mas em nome de Jesus, em nome de um Deus.
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Então, para a gente encontrar saída para coisas e situações inimagináveis, a gente precisa ser muito criativo, realmente - é sobre isso que estamos sendo convocados -, criativos e dispostos. Como a gente amplia esse debate de forma a construir mecanismos efetivos de enfrentamento a este momento que estamos vivendo?
Bom, eu preciso, só para concluir, dizer, primeiro, sobre o Decreto 12.278, de 2024, sobre seus eixos de atuação, que são o direito sociocultural e a cidadania, entendendo que precisam ser assegurados, pelo Estado brasileiro, os direitos socioculturais e a cidadania a esse povo.
O enfrentamento ao racismo religioso é só um eixo - ele não é a política como um todo, mas é um eixo, eu diria -, um eixo relevante...
(Soa a campainha.)
O SR. RONALDO DOS SANTOS - ... dada a situação que nós vivemos, sobretudo atualmente. Então, o enfrentamento ao racismo religioso.
E o fortalecimento territorial e produtivo, entendendo que são territórios. Quando as pessoas falam "a minha roça", esse precisa ser um espaço protegido, de direito jurídico assegurado e onde o seu fator produtivo seja financiado - inclusive, como o agronegócio é há 500 anos e como outras áreas da produção nacional são financiadas pelo próprio Estado.
Eu queria trazer ainda a informação de que nós temos trabalhado muito, dialogando com as questões que foram levantadas aqui; nós temos investido na formação de agentes públicos, entendendo - dialogando com a companheira...
(Soa a campainha.)
O SR. RONALDO DOS SANTOS - ... que disse que a estrutura só se enfrenta por dentro da estrutura -, então, que a formação de agentes públicos nas diferentes áreas do serviço público é uma estratégia fundamental.
E a última informação é de que a política nacional é uma política aderida pelos entes subnacionais, estados e municípios. Então, existe um esforço hercúleo para que a gente tenha o máximo de adesão de estados e municípios, para que esse seja um esforço conjunto e não só o esforço de um Governo Federal ou de uma gestão, mas que seja, realmente, uma política estruturada em toda a esfera federativa.
Então, concluo agradecendo por esse espaço de diálogo, colocando o Ministério da Igualdade Racial à disposição para, todas as vezes que se fizerem necessárias, sentarmos, discutirmos e pensarmos em encaminhamentos.
Mais uma vez, quero agradecer à Senadora e desejar um ótimo trabalho.
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Obrigada, Ronaldo.
Eu tenho certeza de que nós vamos fazer parcerias, ainda mais depois dessa audiência pública, porque eu sempre gosto de ter tarefas, de ter encaminhamentos...
Aqui eu vejo a Eva e já quero selecioná-la para ser uma das organizadoras do grupo de trabalho para que a gente possa, junto aos ministérios, junto, também, a todos os que participaram aqui, que a gente possa construir uma pauta ou do Legislativo ou do próprio Executivo, mas que o Senado também possa estar fortalecido.
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Eu ouvi aqui, já antes de passar para o Sr. José Roberto, eu ouvi aqui algumas coisas que foram chamando a atenção.
Eu tinha sugerido formular lei, mas já vi que tem lei demais, né? Então, eu fiquei... Pois é. Eu fiquei pensando como fazer dentro de um grupo de trabalho, se assim for necessário, junto com todos que aqui estão, um estudo, para que a gente possa fazer... ou uma cartilha de apresentação dessas leis, para que elas sejam verdadeiramente conhecidas também. Como foi dito aqui, várias cidades não conhecem, não sabem que existe a lei. Que a gente possa fazer uma divulgação diferente, né? Assim, fazendo e chamando a atenção, ou através de cartilha. Eu estou só aqui provocando para que a gente pense em uma forma de divulgar essas leis existentes e cobrar a sua efetividade.
E, agora, já passo para o Sr. José Roberto - agora, sim, de forma virtual, mas muito presente aqui com a gente, sempre na tela -, que poderá também fazer suas considerações finais.
Já pode, pode falar, Sr. José Roberto. (Pausa.)
É só abrir o microfone, está faltando o seu.
Não, abriu ainda, não, mas vai abrir.
Agora, sim, pronto. Pode começar.
O SR. JOSÉ ROBERTO COSTA CARDOSO (Para expor. Por videoconferência.) - Vamos lá.
Quero tomar a benção às minhas mães que estão aí, sentadas ao lado da senhora. E falar, assim, que muito me orgulha ver que a nossa religião, por ser matriarcal, além de uma religião, ser uma cultura, ser uma vivência, nós temos mulheres de santo, mulheres de axé, que estão na luta e que sempre estão à frente, buscando o melhor caminho. Muito me orgulha em ter as senhoras como lideranças, como representatividade do nosso povo.
Senadora, então, diante de várias falas aí, nós voltamos um pouco à minha fala inicial, quando nós falamos da formação institucional nos vários órgãos, justamente para que não venha a acontecer isso, que não é normal, mas acontece com muita frequência.
Há que se estabelecer, também, parcerias com outros órgãos para que essa política chegue à ponta, que essa política seja, de fato, executada, e garantir a reparação simbólica e material dos nossos terreiros que são invadidos, dos nossos terreiros que são ameaçados.
Quando a mãe colocou: "falamos de verba"; sim, nós falamos. Muitos dos nossos terreiros, para fazer política... muitos das nossas casas, dos nossos axés fazem um papel fundamental de Governo, abrindo as nossas portas para fazer o filantrópico, para recebermos a sociedade e, quando digo, não é só no acolhimento espiritual, mas no material, no aconselhamento, em todos esses segmentos.
O cumprimento da lei... A senhora falou em criar lei. Muito bom isso. Precisamos de outras, sim. Mas nós precisamos de uma lei - olha a que ponto nós chegamos - precisamos que se crie alguma lei para que se cumpra uma outra lei.
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E precisamos que tivesse um monitoramento, tivesse um canal mais ativo e que desse resposta para os nossos povos quando nós buscamos uma ajuda urgente para o que está acontecendo nesses nossos territórios sagrados.
Mas eu quero responder ao Lucas, ele fez uma pergunta lá atrás sobre a questão de como colocar a Lei Antirracismo, a Lei 10.679, em sala de aula. Eu vou passar para ele como, diante de várias dificuldades, tentativas - porque nós, povos de santo, nós não desistimos... A gente vai de um lado, vai do outro e busca, diante do nosso sagrado, um canal no qual a gente consiga alcançar.
Lucas, aqui nós não tínhamos tanto êxito. Criamos um grupo chamado Fortalecer, para o qual nós convidamos MPE, PM, órgãos da educação, os órgãos municipais, estaduais, e, dentro desse grupo denominado Fortalecer, nós criamos um projeto pegando esses vários segmentos e hoje nós temos um pouco mais de acesso a trabalhar a Lei 10.639, trabalhar a cultura. As pessoas ainda misturam muito a lei, que fala da cultura, com a parte religiosa.
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ ROBERTO COSTA CARDOSO (Por videoconferência.) - Não é a parte religiosa que nós vamos levar. Nós vamos trabalhar a nossa cultura dentro do nosso sagrado. E foi assim que nós conseguimos ter êxito e levar um pouco mais para essas oito escolas. Hoje já se multiplicou um pouco mais por causa desse trabalho. Infelizmente, nós, povos de matriz, povos de terreiro, nós precisamos fazer o nosso trabalho e, às vezes, também o trabalho governamental.
Que Olodumarê, que meu Pai Ogum, abençoe a cada um. Mais uma vez, parabenizo a senhora, Senadora, que Ogum e que toda espiritualidade te ampare, te dê bom discernimento e continue olhando pelo nosso povo.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Augusta Brito. Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) - Obrigada. Eu que agradeço a oportunidade dessa audiência pública de aprender, de ouvir e de construir, porque eu acredito que, dessa audiência pública, nós vamos poder construir ações ou projetos junto com ministérios que aqui estão representados, aos quais eu quero agradecer muito, parabenizar o trabalho que vem sendo construído, porque foi do zero.
Nada é fácil, eu sei que precisa, não existe política pública sem orçamento. É muito difícil fazer o pouco, e eu sei da condição. Tem que provar que é necessário e que pode fazer e depois consegue o orçamento. Mas aí a gente consegue provar, não é? Já estão provando.
Eu quero só dizer a vocês que eu fico feliz. Agradeço muito aqui a todas as participantes, os participantes, convidados, todos foram muito especiais. Nós temos algumas anotações... À própria Comissão quero agradecer muito pela atenção - sempre eu dou trabalho, porque eu excedo o horário -, a Comissão que vai, com certeza, fazer um relatório de tudo que foi apresentado aqui.
A nossa querida Eva, que agora nós vamos ter uma tarefa a mais para que a gente possa construir com todos e todas aqui um projeto ou um programa ou uma forma... desse grupo de trabalho, algumas ações que a gente vai poder fazer em parceria, que seja com a Procuradoria, que eu quero que a gente use desse órgão que existe aqui no Senado Federal - do Senado como um todo -, mas vou contar com as Mulheres de Axé.
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Eu quero agradecer muito a vocês... Eu, infelizmente, não posso ficar mais - eu ficaria, a Eva sabe, porque começou ali o Plenário -, mas eu quero encerrar esta audiência pública dizendo que foi muito valiosa. Tenho certeza de que a gente vai ter muitos encaminhamentos e vamos nos encontrar muitas vezes também.
Então muito obrigada a todos e todas, uma ótima tarde, que a gente siga sempre na luta. Obrigada. (Palmas.)
(Iniciada às 14 horas e 34 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 41 minutos.)